08/04/2015 - 4ª - Comissao Mista da Medida Provisoria nº 665, de 2014

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Zé Geraldo. PT - PA) - Havendo número regimental, declaro aberta a 4ª Reunião da Comissão Mista destinada a examinar e emitir parecer sobre a Medida Provisória nº 665, de 2014.
Quero convidar o Sr. Hélio Zylberstajn, Professor Associado da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP).
Muito obrigado pela presença.
O Sr. Clemente Ganz Lúcio, Diretor Técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE).
O Sr. Marcos Verlaine da Silva Pinto, Assessor Parlamentar do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP).
Registro a presença do nosso Relator, Senador Paulo Rocha.
Nós vamos adotar o seguinte...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Zé Geraldo. PT - PA) - Sim; a Relatora revisora... Então, vou deixar para você, que é quem vai... Está certo.
Nos vamos conceder 10 minutos para os expositores. Naturalmente, se for necessário ultrapassar esse tempo, a Mesa terá tolerância, ainda porque, inclusive, há um expositor que tem alguns PowerPoints para exibir. Então, se precisarem de mais tempo, não há problema, haja vista que as audiências públicas são exatamente para que nós possamos acumular ao máximo as informações.
Ontem, nós ouvimos as centrais e os movimentos sociais, enquanto o Presidente, Senador Pimentel, ouvia os especialistas. Hoje, o Senador Pimentel está ouvindo as centrais e nós estamos aqui ouvindo os especialistas. Amanhã, conjuntamente, os dois Presidentes e as duas Relatorias - tanto da MP nº 664, como da MP nº 665 - estaremos reunidos com os Ministros para que nós possamos fazer também o diálogo com o Governo. A partir daí, a matéria vai ficar aqui para que, principalmente, os Relatores possam trabalhar na peça conclusiva, que é o relatório a ser apresentado ao Congresso Nacional, para a respectiva discussão e votação.
Após a exposição da mesa aqui composta, nós ouviremos os Srs. Parlamentares presentes.
Então, vamos abrir os trabalhos ouvindo a exposição do Sr. Clemente Ganz Lúcio.
É você que tem os vídeos, não é isso?
O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - Isso.
O SR. PRESIDENTE (Zé Geraldo. PT - PA) - Você terá o tempo necessário para a sua exposição e a complementação com a sua fala.
O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - Sr, Presidente, Deputado Zé Geraldo, em primeiro lugar, em nome do DIEESE, agradeço a V. Exª o convite feito, em nome desta Comissão, ao DIEESE para participar desta audiência.
As centrais sindicais já estiveram ontem aqui, e boa parte do trabalho que o DIEESE faz é o de suporte às centrais, dando-lhes elementos para tratarem dessas duas medidas.
Eu trouxe três apresentações - não vou passá-las todas, ainda porque estão na íntegra aqui copiadas para quem quiser acessar - e queria destacar alguns elementos para pensarmos nas questões que as medidas estão trazendo para o debate.
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Em primeiro lugar, não vou entrar no debate sobre a relação entre essas medidas e a questão fiscal. Não julgo adequado fazermos a discussão das medidas de seguro do sistema público de emprego relacionada à questão fiscal. Acho que essa é outra discussão, não cabe aqui entrar nesse debate. O que me parece importante é olharmos para a questão do comportamento do mercado de trabalho, o papel do seguro-desemprego e o papel que o Fundo de Amparo ao Trabalhador tem, como fundo, para dar qualidade às políticas públicas de emprego e trabalho e renda. Então, vamos lá.
Quando falamos do mercado de trabalho, estamos falando do mercado de trabalho que mobiliza, ao longo do ano - vamos pegar 2013, último dado consolidado, já com a RAIS -, 75 milhões de vínculos. Desses 75 milhões de vínculos, tivemos, ao longo do ano de 2013, usando o último dado como referência, 26 milhões de rompimentos de vínculos. Portanto, estamos falando de 26 milhões de rompimentos de vínculos que, potencialmente, poderiam estar acessando o seguro-desemprego. Ou seja: rompeu o vínculo, o seguro passa a ser um instrumento que pode ou não, a depender da regra e da qualificação desse trabalhador para acessar, ser usado. Portanto, estamos falando de um mercado de trabalho que sai, de 2002 para 2013, 11 anos depois, de 12 milhões de desligamentos para 26 milhões de desligamentos.
Evidentemente, qualquer um que olhe para isso vai identificar que o universo de pessoas que estavam se habilitando pela condição de desempregado para acessar o seguro-desemprego mais do que dobra em 11 anos. É natural, portanto, que o dispêndio com seguro-desemprego, frente a um contingente que mais do que dobra, também cresça só pelo crescimento do número de pessoas que passam a fazer parte deste universo do qual ninguém quer fazer parte, o universo dos demitidos.
O que é interessante observar é: nesse período, detectamos simultaneamente um processo de ampliação da formalização, redução das taxas de desemprego e iniciativa continuada de captação de força de trabalho por parte das empresas. E o que é interessante observar também é que, nesse mercado de trabalho, numa situação positiva como essa, a intensidade do rompimento de vínculos não cai. Portanto, cresce o universo dos contratados e, na mesma proporção, continua crescendo aqueles que são demitidos, apesar de as empresas declararem que precisam dramaticamente de força de trabalho. E essa é a contradição que leva a que, infelizmente, grande parte do debate que vai para a opinião pública nos meios de comunicação coloquem a medida provisória como uma medida corretiva de fraudes e distorções, o que, no meu entender, é um equívoco estrutural para analisar o comportamento desse instrumento de proteção.
O que temos que olhar é como um mercado de trabalho altamente contratante durante mais de dez anos continua tendo um comportamento de alta intensidade de rompimento de vínculos. É isso que deveríamos olhar, já que esse é um fenômeno que tem que ser interpretado, uma vez que representa determinada eficiência, no nosso entender, uma eficiência que busca a extração da produtividade da forma mais perversa, chamada produtividade espúria. Essa não é a produtividade que achamos que uma economia deveria ter.
Bom, para frente.
Neste eslaide, olhamos para o ritmo de rompimento de vínculos e definimos que esse ritmo de rompimento de vínculos, portanto, demissão e contratação, tem o nome geral de rotatividade, ou seja, a taxa de rodízio da força de trabalho em geral no mercado de trabalho brasileiro. E, se observarmos o período de 2003 a 2013, veremos que a taxa de rotatividade que chamamos de descontada permanece praticamente igual. O que é taxa descontada? É a taxa de rotatividade geral, lá em cima, retiradas as mortes, aposentadorias, realocações de uma filial para outra e pedidos de demissão.
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Se tirarmos esses quatro elementos, que poderíamos chamar de rotatividade relativamente natural, porque as pessoas, infelizmente morrem, pedem demissão, são realocadas de uma unidade para outra, o que resta são as demissões por iniciativa da empresa. E, em um mercado de trabalho altamente contratante, a taxa de demissão por iniciativa da empresa permanece praticamente igual ao longo de 11 anos.
Portanto, mesmo as empresas afirmando, de forma continuada, que falta mão de obra e que estão procurando, avidamente, força de trabalho que não encontram, elas continuam demitindo na mesma taxa em um mercado de trabalho que mais do que dobrou. Em tese, isso é uma contradição, porque, se ela está demandando força de trabalho, por que está demitindo? E a resposta a essa pergunta é aquilo que deveríamos investigar. Qual é a lógica ou a eficiência de uma economia que amplia força de trabalho, mas continua rodando essa força de trabalho no mesmo ritmo? Aparentemente não tem lógica ou não teria funcionalidade. Com que eficiência estaria operando uma economia desse jeito?
Para frente.
Bem, aqui temos a evolução da cobertura do seguro-desemprego frente aos demitidos. Ela diminui levemente: sai de quase 54% para um pouco mais de 51%. Isso é natural na medida em que as pessoas que são demitidas, mais rapidamente, encontram postos de trabalho. Portanto, não há uma explosão no gasto porque mais pessoas estão acessando; ela vem levemente caindo. Esperávamos que caísse mais rapidamente, mas não cai.
Vamos para frente.
Aqui é um dado importante. Quando olhamos aqueles desligamentos, aqueles 26 milhões de desligamentos, vamos ver que 31%, e cresce, dos postos de trabalho, um terço deles - 8,5 milhões, quase 9 milhões - têm até três meses de vínculo. Portanto, são empregos com três meses de vínculo, os chamados contratos de experiência. A hipótese que temos é de que boa parte desses vínculos são rompidos no prazo legal do contrato de experiência, o que não gera nenhum ônus de demissão por parte da empresa em termo de indenizações, além do próprio salário. Se olharmos até seis meses, são mais 15%, portanto, temos quase 46% da força de trabalho dos 26 milhões que nem completam seis meses de vínculo. Portanto, na regra atual dita "frouxa", como se o Brasil, ao pagar seguro-desemprego, tivesse uma regra "frouxa", já seriam excluídos, de partida, 46% da força de trabalho. Então, ela não é tão frouxa.
O que, na verdade, há é que o nosso mercado de trabalho é construído sob uma regra de total flexibilidade de demissão por parte da empresa: 45% da força de trabalho é demitida com seis de vínculo, menos de seis meses de vínculo. Essas pessoas já estão estruturalmente excluídas do acesso da atual regra do seguro-desemprego, ou seja, da regra que vigia até final do ano passado.
Se tomarmos mais ou menos em torno de cinco milhões...
(Soa a campainha.)
O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - ... em torno de cinco milhões de pessoas que estariam acessando, pelo primeiro emprego, o seguro-desemprego, desses cinco milhões, mais ou menos, 1,7 milhão efetivamente acessavam na regra anterior do seguro-desemprego. Portanto, de 1,7 milhão para 5,5 milhões, temos, mais ou menos, de 3 a 4 milhões de pessoas que, já na regra anterior, não acessavam o seguro-desemprego porque tinham menos de seis meses no primeiro vínculo. Eles iam acessar no segundo, terceiro, quarto ou quinto vínculo, porque a pessoa acessava o seguro-desemprego pela primeira vez no momento em que completava seis meses de vínculo. Tínhamos, ao mesmo tempo, um contingente de pessoas que não acessavam o seguro-desemprego porque tinham postos de trabalho.
Aqui é um dado importante para considerarmos, olhando para frente. Boa parte das simulações que foram feitas e publicadas estão considerando as projeções olhando para o mercado de trabalho de 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014, quando o mercado de trabalho era contratante, o tempo de desemprego era curto e a realocação era rápida. Essa medida em vigor em um momento em que o desemprego volta a crescer - tende a crescer o tempo de desemprego - e os demitidos serão os mais frágeis: os ajudantes, auxiliares, assistentes, ou seja, essa turma que está na contratação mais frágil.
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Então, quando se projeta que tínhamos 1,7 milhão de pessoas que acessavam o seguro-desemprego e que, agora, com a nova regra, teremos outro contingente, se esquece de que, se 1,7 milhão de pessoas acessavam na regra anterior, mais ou menos 2 milhões não acessavam ou porque conseguiam emprego ou porque não tinham acesso pelo tempo. Essas pessoas não vão conseguir emprego e vão bater na porta do seguro-desemprego, e o número que está sendo projetado é muito maior porque, nessa situação de desemprego crescente, que é o que deve acontecer em 2015, o contingente que vai procurar o seguro-desemprego será maior. Com a regra, boa parte da população que vai para o seguro-desemprego não vai ter acesso ao seguro porque não preencherá o critério colocado no projeto.
Para frente.
Vamos passar direto, para frente.
Aqui há um dado importante para considerarmos acerca desse fenômeno: nas primeiras linhas, trata-se de faixas de desligamentos, ou seja, empresas que têm até 25 vínculos e empresas que têm mais de 25 vínculos e, embaixo, o total de estabelecimentos, na mesma proporção.
O que se está querendo dizer aqui? Seis por cento dos estabelecimentos - estamos falando de 3,5 milhões, 3,8 milhões - são responsáveis por 63% da rotatividade. Seis por cento dos estabelecimentos foram responsáveis por 63% da rotatividade. Noventa e quatro por cento são micro e pequenas empresas. É uma quantidade enorme de empresas, micro e pequenas em boa parte, com um contingente menor de trabalhadores.
Para frente.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - Bom, para frente.
Naquela mesma tabela, vemos que 0,5% das empresas, portanto, estamos falando de 18 mil estabelecimentos, são responsáveis por 34% dos desligamentos do setor privado. Dezoito mil estabelecimentos fazem mais de um terço dos desligamentos do total de 3,8 milhões de estabelecimentos. Portanto, dá para atuar. Dá para atuar inclusive do ponto de vista de uma gestão que age no sentido de identificar as causas da rotatividade. Acho que é isso.
Depois, vamos ter dados por atividade econômica, o.k.?
Quero mostrar uma transparência para mostrar um dado, antes de terminar.
Pode passar.
Passa.
Volta.
Aqui, na verdade, estamos olhando o número de demissões e de admitidos no total do exercício, no total do ano, e do primeiro emprego. Então, temos ali uma proporção do chamado primeiro emprego no total das admissões feitas ao longo do ano. Estamos falando de, mais ou menos, 4,5 milhões dos 29 milhões. Esses 4,5 milhões são primeiro emprego, o que é objeto, em boa parte, da medida provisória. Ela se refere a esse primeiro emprego.
Para frente.
Aqui é o primeiro emprego; aqui se está associando que o primeiro emprego é do jovem, do jovem que chegou ao mercado de trabalho e que, portanto, tem mais condição. Ele usa esse primeiro emprego como forma de acessar o seguro-desemprego e tirar um tempinho de férias e juntar aquela coisa toda, aquela explicação bem científica, bem assentada em fundamentos.
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O que esse dado está mostrando é que o primeiro emprego até 24 anos representa 53% das contratações; 47% são de pessoas que têm mais de 25 anos; de 25 a 29 anos, 14%; quase 19%, de 30 a 39 anos; acima de 40 anos, quase 9%. Portanto, o que nós estamos falando, mesmo agora depois de dez anos de inclusão, é que você tem quase metade da força de trabalho no primeiro emprego com mais de 25 anos de idade, ou seja, reflexo do processo positivo de inclusão pela formalização do trabalho. Tem muito trabalhador com mais de 40 anos no primeiro emprego, porque pela primeira vez na história da sua vida ele teve carteira de trabalho assinada, certo? Portanto, aquela ideia de que é predominantemente de jovens, sim, os jovens são mais da metade, mas ainda temos um mercado de trabalho que positivamente, nestes últimos anos, trouxe para a formalização uma força de trabalho expressiva.
O que mais?
Pode passar para a frente.
Pode passar.
Acho que é isso.
Pegue o último ali, porque há mais uma transparência só.
Pode ir para a frente.
Aqui nós olhamos dez anos do seguro-desemprego - pode ir para a frente -, fizemos uma simulação. Vou deixar aqui, não vou apresentar.
Pode passar.
Aqui nós tentamos simular várias situações em que o acesso ao primeiro emprego ocorresse dependendo de que critério? O critério até 5,4 meses, que na verdade são 6 meses, ou 5 a 12, 12 a 18, qual seria o impacto na primeira, na segunda e na terceira solicitação, para nós vermos o impacto que dá em cada uma dessas situações. Na situação atual, nós já estamos observando que a atual regra impacta próximo a 2 milhões de trabalhadores que serão excluídos do acesso ao seguro-desemprego em 2015. Dependendo da severidade do desemprego, esse número aumenta. E fizemos simulações tentando imaginar quais seriam outros critérios para o acesso ao primeiro seguro-desemprego se fosse simulado em outros prazos: em vez de 18 e 24, 12 e 24, 10 e 24, 9 e 24. Fomos simulando para ver qual é o impacto que tem, só para termos a noção de qual é a alternativa, que alternativas geram que tipo de impacto sobre o seguro-desemprego.
No caso do abono, para finalizar, também tenho os dados do abono aqui no material, o que vale a pena destacar são duas coisas: primeiro, tem toda a discussão constitucional, eu não vou entrar nela, mas o que é importante considerar é que o abono salarial é um recurso, e isso é importante que a gente entenda, o abono foi originalmente constituído como um mecanismo que gerava, no seu ponto de partida, um instrumento para conter o crescimento do salário mínimo. O salário mínimo, na época, era um instrumento de indexação forte da economia. Para que o aumento do salário mínimo não gerasse uma repercussão geral nos preços, o abono salarial foi o instrumento criado para elevar o salário em 8,5% quase com o dispêndio do Estado.
A Constituição de 88 transforma e cria, a partir desse fundo de financiamento, um fundo coletivo para financiar as políticas públicas de emprego, trabalho e renda, ou seja, dá-se outra qualidade. E o abono passou a ser uma política de renda a que os trabalhadores passavam a ter acesso se tivessem cumprido alguns requisitos. Isso está na Constituição.
Bom, em 2007/2008, as centrais sindicais fecharam com o Governo Federal um acordo de valorização do salário mínimo e, naquele momento, o então Ministro do Trabalho colocou na mesa de debate com as centrais sindicais a necessidade, talvez futura, de revermos, em função do crescimento do salário mínimo, algumas das políticas, entre elas a do abono. E as centrais sindicais sempre se colocaram à disposição para negociar possíveis mudanças na política. É bom que se registre que essa negociação nunca ocorreu. Nunca o Governo Federal tomou a iniciativa de chamar uma negociação para rever a política do abono. Pela primeira vez, nós temos uma medida que altera a regra do abono, mas sem nenhuma discussão.
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Por exemplo, se nós considerássemos que o abono salarial é uma política de renda positiva, ela deveria ter a lógica, na sua alteração, da que está instruindo a sua mudança. Quanto menos tempo de vínculo, portanto, mais precário o trabalho, maior deveria ser a proteção da política, se é uma política para proteger a renda do trabalho. Alguns vão dizer: "Ah, mas se fizer isso vai estimular a informalidade." Bom, mas já disseram tantas verdades que, depois, a realidade mostra!
Nós poderíamos discutir: qual é a intenção dessa política de abono, além de ser uma base, um fundo coletivo para sustentar a política pública? Em que medida o abono continuará sendo uma política de renda do trabalho? Esse é um debate que nós precisamos fazer. Não foi feito esse debate, o que é um pressuposto de que a política tem de ser alterada.
Parece-me claro que o critério usado é um critério fiscal, porque nós poderíamos ter várias outras alternativas se fosse para pensar um sentido de mudança, se ela couber, e se for o caso de acharmos que está no momento de haver a mudança. Não estamos nem convictos de como está no momento. Mas, se estivermos, deveríamos discutir quais são os critérios.
Não me parece que esse critério usado seja o melhor, até porque ele é um critério que favorece quem tem a melhor estabilidade, o melhor vínculo e a melhor condição no mercado de trabalho entre os que estão em pior condição, porque são os que ganham os menores salários. Portanto, mais uma vez, a política é regressiva do ponto de vista da incidência em relação à condição do trabalho. Se é uma política para minimizar desigualdades, talvez devesse ter um outro sentido e não o que está sendo indicado na medida provisória.
Desculpe-me por passar do tempo. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Zé Geraldo. PT - PA) - A Mesa agradece.
O nosso Relator vai acolher todo esse subsídio que você trouxe organizado em vídeo. Esses subsídios, naturalmente, vão servir para a gente também poder dialogar com o Governo.
Vamos ouvir o Hélio, Professor Associado da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (USP). V. Sª tem até dez minutos, mas, se for necessário, a Mesa terá tolerância, até porque temos um número bem menor do que ontem.
O SR. HÉLIO ZYLBERSTAJN - Muito boa tarde.
Quero agradecer à Comissão, ao Deputado Zé Geraldo, ao Senador Paulo Rocha pelo convite.
Eu venho aqui com muita alegria por poder contribuir com este debate tão importante. São temas relevantes para o trabalhador brasileiro, portanto, para a sociedade brasileira.
Eu vou fazer uma apresentação bastante rápida. Eu trouxe um PowerPoint para guiar a minha apresentação, mas eu vou tentar ser bem, bem breve.
Por favor, o primeiro.
O objetivo da medida provisória. Claramente é uma medida provisória de caráter fiscal. Então, ela mexe em políticas sociais com o objetivo fiscal, claramente, de reduzir o gasto com seguro-desemprego e o gasto com abono salarial. E a justificativa é a rotatividade e fraudes.
Eu também quero ressaltar que ela é adotada exatamente no momento em que a gente começa a enfrentar uma recessão e com um aumento no desemprego. Quer dizer, na hora em que o desemprego vai crescer, portanto, normalmente os países utilizam o seguro-desemprego como uma política contracíclica não só para assistir o trabalhador, mas para manter o nível de atividade na economia, nessa hora, a gente está reduzindo o gasto do seguro-desemprego.
Eu tenho alguns números também para mostrar para vocês.
Por favor, o próximo.
Isso aqui é o gasto com o seguro-desemprego e o abono salarial. Está muito pequeno, os senhores não estão vendo, mas o mais importante é que, entre 2002 e 2013, portanto, doze anos, o gasto, já descontada a inflação, triplicou. O gasto com esse programa, com esses dois programas triplicou em termos reais. E é isso que assustou o Governo. Está crescendo demais.
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Vamos ver como é que se deu esse crescimento. Está muito difícil para ver aí. Eu vou tentar resumir. É o seguinte: o nosso ponto é que o crescimento do gasto com o programa seguro-desemprego e abono se deveu a dois fatores: primeiro, o crescimento do salário mínimo; o salário mínimo está muito ligado ao gasto com seguro-desemprego. A grande maioria dos benefícios é de um salário mínimo ou muito próximo do salário mínimo. O salário mínimo, em termos reais, descontada a inflação, cresceu 5,3% ao ano em média. A outra coisa que cresceu foi o emprego formal, que, nesse período, cresceu 5,4% ao ano. E o gasto com o seguro-desemprego cresceu 11% ao ano no mesmo período. Então, se a gente junta, o que explica o crescimento do gasto? Foi o salário mínimo e a formalização. Não foi a rotatividade, não foi, como alguns dizem, o aumento da rotatividade. Até, a rotatividade se manteve nesse período. Ela é altíssima, mas ela se manteve. Então, essas foram as causas do crescimento do gasto com seguro-desemprego.
E nós fizemos uma simulação - peço desculpas porque aí está muito pequeno, é essa tabelinha aí embaixo - em que a gente pegou o gasto de 2002, cresceu o salário mínimo de 2002 para 2014 e cresceu o emprego formal de 2002 para 2014, e chegamos a um gasto de 46 bilhões, que teriam sido gastos, em 2002, se o salário mínimo fosse o mesmo de hoje e se o emprego formal fosse o mesmo de hoje. O gasto de hoje é de 46 bilhões. Então, o crescimento do gasto com seguro-desemprego se deveu única e exclusivamente ao alargamento do mercado formal e ao crescimento do salário mínimo. A rotatividade não interferiu nesse aumento de gasto.
Por favor, o próximo.
Vou falar um pouquinho do abono salarial. O abono salarial é uma excelente política de incentivo à formalização. Ela não foi concebida com esse objetivo, mas hoje poderia ser usada. Só que está sendo usada, o incentivo, da forma como está sendo usada, é muito fraco. Nós poderíamos fortalecer. A medida provisória, nesse sentido, está na direção correta, está condicionando o valor do abono salarial à inserção formal no mercado de trabalho. Essa é uma coisa interessante porque incentiva a formalização. É uma boa medida, na nossa avaliação, e a gente até se atreve a sugerir um passo adiante. Por que o abono salarial tem de ser pago no outro ano de uma vez só? Ele poderia ser pago em doze parcelas que dariam mais ou menos R$67,00 por mês, que é um valor significativo para essa faixa de renda. Ele poderia ser pago mensalmente. Nós poderíamos condicionar, por exemplo, a que o trabalhador ficasse seis meses no emprego formal e, a partir daí, passasse a receber o abono salarial dividido em parcelas de doze meses. Isso fortaleceria o incentivo à formalização.
Vamos falar um pouquinho do seguro-desemprego. Primeiro ponto, eu acho que nem se discute isto: o seguro-desemprego é essencial em qualquer economia de mercado. O seguro-desemprego é essencial exatamente para sustentar a renda do trabalhador, para proteger o trabalhador na vicissitude do desemprego. Não se discute isso, além de que o seguro-desemprego tem esta outra qualidade: ele ajuda a sustentar o consumo, portanto, a demanda, portanto, a atividade econômica numa recessão. Assim, ele é uma coisa absolutamente desejável.
Diversas formas de seguro-desemprego, de proteção ao emprego. Seguro-desemprego baseado num fundo solidário, que é exatamente o caso do FAT. Nós formamos um fundo e esse fundo é dividido entre os trabalhadores no momento em que eles ficam desempregados. Esse é um formato.
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O outro formato que existe no mundo também é o seguro-desemprego financiado por meio de uma conta vinculada, uma conta parecida com o FGTS. Na verdade, o nosso FGTS é um seguro-desemprego, só que é um seguro-desemprego que é formado por uma parte do salário que é retida, porque os 8% do FGTS têm natureza salarial, e que o trabalhador pode sacar, entre outras ocasiões, na ocasião do desemprego. Então nós temos também essa forma de proteção do emprego.
O outro, é a indenização na demissão. Nós também temos uma indenização na demissão que são os 40% sobre o Fundo de Garantia.
Outra forma de proteção do emprego são os subsídios ao emprego.
E nós também temos, entre outras coisas, o próprio abono salarial.
Quer dizer, é uma coisa interessante, porque o Brasil é um dos casos raros de países que adotam todos os formatos de proteção ao desempregado. Nós temos um conjunto de políticas. Talvez fosse o caso, mesmo que não seja agora, ou que seja agora, de discutir uma refundação de tudo isso; não é eliminar, mas são tantas políticas e tão diferentes que talvez elas estejam enfraquecidas por terem objetivos diferentes. Mas nós temos as quatro políticas.
Próximo, por favor.
A rotatividade no Brasil é excessiva. Eu acho que é bom lembrar que um pouco de rotatividade é sempre desejável, porque, muitas vezes, o trabalhador não está bem na empresa, a empresa não está gostando do trabalhador, então que haja um pouco de rotatividade para que se promovam encontros melhores, isso é normal, agora, não o que nós temos no Brasil. Aqui nós temos um excesso de rotatividade e as causas disso vão ao nosso passado de relação de trabalho, e acho que não é momento para discutir. Mas uma das causas é também o formato do seguro-desemprego.
Por que eu digo isso? Qualquer seguro provoca mudanças no comportamento do segurado. Exemplo: o seguro de automóvel. Com o seguro de automóvel, talvez você deixe de colocar o seu carro no estacionamento. "Para que eu vou gastar para proteger se eu já estou protegido pelo seguro?" O mesmo ocorre com seguro saúde ou qualquer tipo de seguro. Como o detentor daquele direito está mais protegido, isso altera o comportamento. Isso é muito humano, é muito natural. A mesma coisa ocorre com o seguro-desemprego. Isso não é necessariamente ruim. É bom que o trabalhador se sinta mais protegido. Se ele não está bem na empresa, ele não vai temer tanto a demissão.
Agora, talvez a gente tenha um pouquinho de incentivo a mais por causa da combinação dessas políticas. O nosso seguro-desemprego é recebido automaticamente. Quer dizer, no momento da demissão, o trabalhador já recebe o formulário preenchido - aliás, agora, o formulário está sendo preenchido na internet, pela empresa -, e, com esse formulário, ele passa na Caixa e vai receber cinco, três parcelas a que ele tem direito e não precisa dar satisfação para ninguém. Em geral, exige-se alguma contrapartida do trabalhador: ele tem que demonstrar um esforço, que está procurando emprego. Talvez - ele tem que passar no posto pra receber uma vez por mês - a gente possa pedir que ele passe uma vez por semana, conversar com ele, encaminhá-lo para uma vaga, e esse esforço a gente não faz aqui. Quer dizer, é muito fácil. Isso é um incentivo na direção que eu estou falando.
Outra coisa importante: a medida provisória corta gastos. Ela foi feita com esse objetivo fiscal. E ela vai atingir os mais vulneráveis e não vai corrigir essas distorções. Isso não foi tocado na medida provisória.
Como eu disse, nós estamos em recessão. Vamos ter, infelizmente, um crescimento do desemprego este ano, parece inevitável, e o Governo vai gastar muito com o seguro-desemprego, apesar da medida provisória. Talvez essa economia que ele esteja tentando fazer vá ser superada pelo gasto agora maior com demissões que vão ocorrer inevitavelmente.
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Talvez fosse bom aproveitar o ensejo da votação da medida provisória e abrir a possibilidade de criar formas alternativas de utilização do FAT para o desemprego. Muitos países fazem um arranjo muito interessante. É o seguinte: a empresa precisa demitir; então ela negocia com os trabalhadores e, ao invés de demitir, ela reduz a jornada, reduz o salário, o que foi feito muito recentemente na indústria na crise de 2008/2009. Isso vai voltar a acontecer. Agora, o seguro-desemprego poderia dar uma mão nisso. O trabalhador poderia ter o complemento do seu salário que foi reduzido, então ele não seria demitido, o Governo gastaria menos com o seguro-desemprego, a empresa manteria o seu capital humano e o trabalhador permaneceria empregado; tudo isso. A gente poderia abrir essa possibilidade que, evidentemente, teria que ser negociada em cada caso, mas talvez isso fosse uma coisa boa para antecipar o cenário ruim que está chegando aí.
Quero dizer uma coisa muito rapidamente sobre o financiamento do seguro-desemprego, o financiamento do FAT. Há razões históricas para que o seguro-desemprego seja financiado por um imposto sobre o faturamento e o valor adicionado, que o PIS. Nenhum país faz isso. O seguro-desemprego, tipicamente, é financiado por um imposto, por uma taxa sobre a folha de salário, sobre o valor do que está sendo segurado. E essa taxa pode ser agravada, pode ser aumentada pelo histórico de rotatividade da empresa - uma empresa que roda muito paga um percentual maior, uma empresa que roda pouco paga um percentual menor. Assim como o seguro de automóvel: um jovem de 20 anos vai pagar um prêmio no seguro muito maior do que uma senhora de 45 anos. Ele é mais arrojado ao dirigir e o risco é maior. Então o princípio do seguro é esse.
No Brasil a gente cobra o seguro-desemprego no faturamento. Por que isso é assim? Porque na votação da Constituição - vocês podem imaginar o debate que houve em torno da destinação do FAT -, a bancada, digamos, mais preocupada com os trabalhadores conseguiu assegurar o dinheiro do PIS para os programas de assistência ao trabalhador. Então é a razão. Não havia condições de substituir por um outro imposto e foi isso. Em algum momento seria interessante a gente rediscutir esse financiamento.
Quero aproveitar a ocasião, eu tenho insistido muito nisso, ou seja, na ideia de reformatar as duas proteções que nós temos: o seguro-desemprego e o Fundo de Garantia. A gente poderia juntar, fundir esses dois programas. O seguro-desemprego poderia ser uma conta vinculada, talvez com uma alíquota maior do que a do Fundo de Garantia, e ele poderia ser sacado apenas no desemprego e na aposentadoria. Quer dizer, nós estaríamos transformando o FAT de hoje e o Fundo de Garantia de hoje em um único fundo individual do trabalhador que ele vai acumular.
Por que eu proponho isso? Aliás não sou só eu, mas vários colegas economistas têm proposto isso há muito tempo. Porque isso poderia corrigir um pouco das distorções que eu apontei. Se eu estou desempregado e eu estou vivendo de sacar o meu Fundo de Garantia, isso é um incentivo para eu tentar arrumar mais rapidamente um novo emprego, porque quanto mais tempo eu ficar, mais eu estou sacando contra a minha aposentadoria. Então é um desenho que poderia permitir uma mudança salutar no comportamento.
Próximo.
Deixe-me falar um pouquinho sobre a questão dos pescadores. Eu acho que os pescadores merecem um programa. Eles merecem ser assistidos, porque a atividade deles é sazonal. Mas tem uma coisa importante aqui: o defeso é diferente do desemprego. O desemprego é imprevisível. A gente não sabe quem vai estar empregado ou não daqui a um mês. Mas a gente sabe o dia que começa o defeso. Então, ele está misturado com a noção de seguro-desemprego.
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Talvez a gente devesse repensar, não eliminar o programa, mas repensar esse programa, reforçar, por exemplo, a promoção de atividades complementares na época de defeso, reforçar a organização dos pescadores para essa atividade, promover emprego, promover treinamento e tentar separar um pouquinho, porque as lógicas são diferentes. É hora de repensar. Eu nem estou falando nas fraudes - aparentemente, esse é um problema sério nesse programa específico.
Era isso.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Zé Geraldo. PT - PA) - Muito obrigado pela sua participação e colaboração com todas essas informações.
Vamos para o último convidado inscrito para esta Mesa, Sr. Marcos Verlaine da Silva Pinto, Assessor Parlamentar do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP).
Informo também a V. Sª que, se precisar ultrapassar os 10 minutos, a Mesa será tolerante.
O SR. MARCOS VERLAINE DA SILVA PINTO - Deputado Zé Geraldo, boa tarde!
Boa tarde a todos e todas!
Nós estamos discutindo, fazendo este debate das medidas provisórias em um momento politicamente muito interessante. Essas medidas provisórias foram editadas no final do ano de 2014, portanto, pegaram toda base social principal que apoia o Governo de surpresa. E, em alguma medida, nós podemos dizer, sem cometer nenhum engano, que o discurso da Presidente, depois de uma campanha extremamente dura, extremamente disputada, diferente das campanhas anteriores, nós podemos dizer que foi um certo estelionato eleitoral, porque ela editou duas medidas provisórias retirando direitos dos trabalhadores, sobretudo da parte que mais necessita dessa proteção. Então, grande parte da crise política que está colocada aí tem origem não no problema da corrupção, mas no fato de que temos uma economia deprimida, que faz com que a parcela que apoiou a Presidente na eleição vá para a rua porque, evidentemente, tem direitos diminuídos, tem direitos mitigados.
Com base nesse raciocínio, nós precisamos observar três aspectos do ponto de vista político: houve um erro no método, porque não dialogou e era absolutamente possível dialogar com as centrais sindicais e os trabalhadores em relação à edição das medidas provisórias. Certamente os problemas em relação ao conteúdo dessa matéria diminuiriam sobremodo se tivesse dialogado com o movimento sindical, porque o movimento sindical não desconhece os problemas nesses benefícios que são concedidos aos trabalhadores. O segundo aspecto político está na forma: edição de medida provisória que tem força de lei imediatamente. Ou seja, além dessa base social, além dessa parcela que é a base principal de apoio da Presidente Dilma, ela foi editada por meio de medida provisória, não dando tempo para os trabalhadores dialogarem sobre as medidas que restringiriam direitos aos trabalhadores por meio de suas entidades - centrais e sindicatos. Então esse é um segundo problema no aspecto político. Por quê? Porque a medida provisória de desoneração da folha veio para o Congresso e foi devolvida, foi devolvida.
A alegação do Presidente do Senado, do Presidente do Congresso, Senador Renan Calheiros, de não ter devolvido as duas medidas provisórias é a de que o Congresso estava de recesso. Disso a gente discorda, porque nos períodos de recesso há a Comissão Representativa. Então, poderia ter reunido a Comissão Representativa e ter devolvido as duas medidas provisórias tal como fez com a medida provisória da desoneração da folha. Então, são dois pesos e duas medidas para problemas absolutamente iguais: medidas fiscais, medidas fiscalistas para reduzir impacto financeiro para o Governo, que têm tratamento diferenciado. Esse é um outro aspecto que também é importante esta Casa observar no momento em que for elaborar o parecer para tentar diminuir o impacto para os trabalhadores dessas medidas restritivas e fiscalistas. É razoável. E o conteúdo, evidentemente, tem o objetivo de corrigir distorções.
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O movimento sindical obviamente não fecha os olhos para as distorções que existem no seguro-desemprego, só que, se tivessem dialogado com o movimento sindical, obviamente essas regras de transição tão drásticas em função da grande rotatividade da mão de obra teriam diminuído os impactos para os trabalhadores. Então, esse é outro aspecto que deve ser observado, que é a questão do conteúdo. Isso dava para ter equacionado melhor se tivesse havido uma discussão mais permanente, não só em relação às medidas fiscais do Governo, mas antes.
Isso impactou a base social que apoia a Presidente, que foi para a rua fazer sua campanha. E agora, está aí uma crise. Obviamente, tem um discurso nesta Casa e numa parte da sociedade brasileira que é absolutamente superável, que é o problema da corrupção, porque este Governo foi o que mais combateu a corrupção. Nós fizemos um estudo no DIAP e constatamos que o Governo Dilma foi o que mais produziu medidas contra a corrupção; mais do que o governo Lula e mais do que o governo Fernando Henrique Cardoso, cada um nas suas edições: 1994, 2002, 2003, 2006. Então, isso é importante.
Outro aspecto que queremos lembrar é que na última década os trabalhadores conviveram com ambiente de sustentação de perspectivas, um ambiente de perspectivas positivas, de esperança. De repente, isso é quebrado do dia para a noite. Do final da eleição ao início de um novo ano, a Presidente Dilma editou duas medidas provisórias que restringem drasticamente direitos.
Se comparado, por exemplo, com a desoneração, com as medidas de desoneração fiscal, é absolutamente irrisório. As desonerações e isenções fiscais geraram uma conta para o Governo de R$263 bilhões. Se comparado com o ônus do Governo em relação a essas medidas fiscais, é ínfimo: R$19 bilhões. Quer dizer, dava para o Governo ter chamado a sua Base, discutido, para tentar mitigar esses problemas e superá-los aqui, no debate, nesta Casa, com muito mais facilidade.
Então, há uma dificuldade do Governo em dialogar com os setores da sociedade brasileira, sobretudo com os setores que o apoiaram na sua primeira edição e agora, nessa segunda edição. Os setores que apoiaram se sentem objetivamente e substantivamente traídos por essas duas medidas provisórias.
Então, é preciso que esta Casa se debruce sobre essas demandas, a partir desses debates, para que tentem diminuir os problemas dessas medidas fiscalistas.
Aqui também apontamos duas inconstitucionalidades. A primeira inconstitucionalidade contraria o princípio da vedação do retrocesso social. E a segunda inconstitucionalidade, no caso do abono do PIS, é por ferir o §3º do art. 239 da Constituição Federal. O que diz esse artigo?
Art. 239........................................................................
....................................................................................
§ 3º - Aos empregados que percebam de empregadores que contribuem para o Programa de Integração Social ou para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público, até dois salários mínimos de remuneração mensal, é assegurado o pagamento de um salário mínimo anual, computado neste valor o rendimento das contas individuais, no caso daqueles que já participavam dos referidos programas, até a data da promulgação desta Constituição.
O texto desse parágrafo é autoaplicável, não comporta interpretação e nem pede regulamentação. O trabalhador que teve vínculo empregatício no ano anterior da remuneração igual ou inferior a dois mínimos mensais tem o direito a um salário mínimo de abono. Então, essa medida é inconstitucional, se for olhar a letra da lei e da Constituição.
Qual a conclusão que temos disso, companheiros e companheiras, Senadores, Deputados, Deputadas? Que o ajuste é necessário, mas não pode recair sobre os assalariados, a parte mais fraca da população.
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O segundo aspecto da conclusão é que mesmo que haja sacrifício, o Governo precisa observar a Constituição e dialogar com os setores afetados pelas medidas fiscais.
O terceiro é que seria possível ter mandado essas matérias por meio de projeto de lei, para proporcionar aos afetados um maior tempo de discussão, e a Casa se debruçaria por mais tempo no debate, para tentar fazer ajustes mais adequados.
Agora, há duas medidas provisórias com força de lei vigorando e o Congresso debatendo. A tendência, obviamente, é criar uma série de problemas políticos, depois, difíceis de serem resolvidos. As medidas estarão vigorando e depois teremos dificuldade de fazer adaptações do ponto de vista de acertar as lacunas que precisam ser corrigidas, porque nós as reconhecemos.
Um dos aspectos da Medida Provisória 664, por exemplo, que trata de matéria previdenciária: está no texto da justificação corrigir o problema das periguetes. Olhem a argumentação apresentada pelo Governo! Quer dizer, dava para corrigir o problema das periguetes, por exemplo, para usar uma expressão que o Governo usou, sem criar um problema como esse. Por exemplo, se uma jovem se casa com uma pessoa mais velha e tem filho, o que vai acontecer com esse filho se o pai morrer, sendo o pai infinitamente mais velho? Então, o Governo não observou essas contradições, que poderiam ser resolvidas com mais tempo de discussão.
Quando o Governo editou as medidas provisórias - deve ter passado no mínimo uns seis meses estudando essas matérias e os impactos que elas causariam nos principais afetados -, chamou o movimento sindical, depois das medidas estarem prontas, chamou as seis centrais sindicais e pediu opinião, depois de uma apresentação dos eslaides do Ministro da Fazenda, do Ministro da Previdência e da Casa Civil, e pediu um posicionamento das centrais sindicais. Ora, os Ministros, o Governo deve ter demorado uns seis meses para construir as duas peças. E pediu, depois, em algumas horas de explicação, uma opinião do movimento sindical. É óbvio que o movimento sindical não poderia ter dado, por absoluta falta de conhecimento da matéria e dos seus impactos e dos interesses do Governo, uma opinião abalizada sobre temas que afetariam - como afetaram - os trabalhadores, sobretudo a parte mais fraca da sociedade brasileira.
Os impactos dessa medida provisória afetam sobremodo grande parte dos trabalhadores da construção civil, grande parte dos trabalhadores rurais, que têm alta rotatividade da mão de obra. Então, como vamos resolver esses problemas com medidas fiscais, com medidas que vão de encontro aos interesses dos trabalhadores? Como no governo anterior, nos dois mandatos do Presidente Lula: na crise, medidas anticíclicas; na crise, mais emprego; na crise, mais renda, para que circule mais dinheiro no mercado, para que pudéssemos transitar para superar a crise com condições objetivas. Nas condições que estão sendo colocadas agora pelas medidas fiscais, vamos superar essa crise com muito mais dificuldade, com depressão, com rebaixamento da renda, com rebaixamento do emprego, com menos perspectiva, com sonhos embargados.
Então, obviamente a Presidente, quando editou essas medidas provisórias, incorreu em contradições fundamentais que precisam ser superadas, já que para superar as crises é preciso renda; e nós estamos restringindo a renda. Para superar a crise nós precisamos de emprego, estamos restringindo o emprego. Para superar a crise nós precisamos apresentar perspectivas e esperanças concretas para os trabalhadores, e essas perspectivas e esperanças concretas foram restringidas por essas duas medidas provisórias.
Para fazer uma comparação, os empresários ganharam, no Congresso Nacional, pelo menos mais uns três meses com a devolução da medida provisória e o envio do projeto de lei, porque obviamente o impacto do projeto de lei só terá efetividade depois de aprovado e sancionado pela Presidente da República. As medidas provisórias, não. Então, o que temos aqui são dois pesos e duas medidas.
E mais, para concluir, Senador Paulo Rocha, Deputado Zé Geraldo, essas medidas provisórias têm um impacto absolutamente ínfimo se comparado com o que pode acontecer depois da aprovação do projeto de lei que trata da expansão da terceirização no Brasil.
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Vejam, mais de cinco centenas de emendas foram apresentadas às duas medidas provisórias. É absolutamente contraditório alguém apresentar emendas a essas duas medidas provisórias restritivas e depois aprovar um projeto de lei que expande a terceirização, precarizando os direitos dos trabalhadores da iniciativa privada, dos trabalhadores do setor público e das empresas mistas. Então, há uma esquizofrenia. E o Governo não interveio nesse processo porque é um dos maiores terceirizadores do Brasil. Apenas interveio para cuidar dos seus interesses mais particulares, que nós não negamos: o problema da arrecadação de tributos. Então, há uma contradição nessas medidas fiscalistas.
Neste instante, a Câmara dos Deputados debate com vias de aprovar um projeto de lei que vai precarizar ainda mais as relações de trabalho no Brasil, e agora o Congresso Nacional debate duas medidas provisórias para fazer ajuste. Quer dizer, onde nós vamos parar? Obviamente, todas essas matérias restritivas vão criar mais crise econômica, mais crise social, e o debate político ficará muito mais difícil neste Congresso Nacional infinitamente mais conservador do que o Congresso anterior, porque está prestes a aprovar uma medida que é discutida há onze anos por esta Casa Legislativa e só agora encontrou as condições objetivas para ser aprovada, porque há um ambiente mais conservador, com expectativa de retrocesso jamais visto nos últimos 20 anos.
Então, Senador Paulo Rocha, nós debatemos essa matéria fazendo essas críticas para dizer que elas não irão contribuir para a solução dos graves e complexos problemas sociais dos brasileiros, muito pelo contrário, essas medidas fiscais vão aprofundar essa crise e deprimir mais a economia brasileira.
Era isso que o DIAP tinha a apresentar aos senhores e senhoras.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Zé Geraldo. PT - PA) - Senador Lira, o senhor está inscrito? (Pausa.)
Primeiro, o Senador.
O SR. BENEDITO DE LIRA (Bloco Apoio Governo/PP - AL) - Sr. Presidente, Sr. Relator, senhores debatedores, na verdade as duas medidas provisórias, mais precisamente a Medida nº 665, de que estamos tratando agora, tratam exatamente de matérias que dizem respeito àqueles que dependem da ação do Governo.
Eu ouvi atentamente as exposições do Hélio e do Clemente, e agora a do Marcos. O companheiro Relator vai ter muito sobre o que se debruçar com relação a essas hipóteses levantadas.
Eu gostaria, aproveitando a oportunidade, de dizer que a Casa onde se discutirão os aspectos legais das duas medidas provisórias é exatamente o Congresso Nacional. A medida provisória chega do Governo para apreciação no Congresso Nacional e, lógico, através das audiências públicas, dos debates que serão travados entre os Parlamentares que compõem a Comissão, iremos encontrar os caminhos que possam atender às necessidades do País e que, evidentemente, não tragam consequências nem prejuízos consideráveis àqueles que são a força do trabalho.
Nenhum de nós aqui está para puxar o pescoço do trabalhador. Temos dito isso inclusive nas reuniões com as lideranças do Governo, com as lideranças do Congresso, principalmente nas reuniões que as lideranças que constituem a Base de sustentação do Governo têm tido. Ontem mesmo, tivemos uma grande reunião que se prolongou por algumas horas. Temos dito isso e conversado sobre isso.
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Não é um fato acabado. A medida provisória traz no seu contexto determinadas as ações, o que não é definitivo nem acabado. É aqui que ela vai ser burilada e, consequentemente, aperfeiçoada, ou até rejeitada. O Congresso não tem o compromisso de dizer: "Está aprovado aquilo que vier do Poder Executivo". Não! Lógico que terá que ter sensibilidade para conciliar o interesse, principalmente o interesse dos trabalhadores.
Aqui, nós estamos falando do seguro-desemprego, e, nessa medida provisória, também tratamos do seguro-defeso. Um é diferente do outro, a meu modo de observar. O seguro-desemprego é uma ação que independe do governo, uma ação muito mais entre o trabalhador e o empregador, enquanto o seguro-defeso é uma determinação de governo, principalmente dos órgãos de meio ambiente, que atinge diretamente o pescador, o trabalhador da pesca, que é o trabalhador mais antigo do mundo, se nós fizermos uma análise histórica.
A pesca, no Brasil...
O SR. PAULO ROCHA (Bloco Apoio Governo/PT - PA) - Desde São Pedro.
O SR. BENEDITO DE LIRA (Bloco Apoio Governo/PP - AL) - Pois é. É isso aí. O Paulo complementa o raciocínio dizendo que é da época de Cristo, com o trabalhador que entrou mar adentro em busca da sua sobrevivência.
A legislação atual estabelece um período de carência para que o trabalhador possa ter esse direito. Se, por acaso, não houvesse as normas impostas pelo Governo ou pelos órgãos de meio ambiente, lógico que o pescador gostaria de continuar pescando os 365 dias do ano e durante todo o tempo. Infelizmente, há um determinado período do ano em que ele é proibido de exercitar a sua atividade.
Então, eu queria me dirigir agora ao Relator e aos debatedores, dizendo que nós vamos analisar essas medidas com absoluto cuidado, porque todos nós temos a consciência de que o trabalhador não pode pagar a conta sozinho. E nós temos dito ao Governo, à Presidenta Dilma, que, em determinados momentos, para o encaminhamento de qualquer que seja a mensagem que diga respeito a ajuste fiscal ou econômico, temos que ter um diálogo antes. Quando se tratar do trabalhador, um diálogo com o segmento dos trabalhadores. E do que reclamam as centrais sindicais? É de que esse entendimento, esse diálogo não tem havido, para que as coisas, quando chegarem ao Congresso, já venham um pouco amaciadas, negociadas, o que facilita, inclusive, o trâmite da matéria na Casa.
A medida provisória, como disseram o representante do DIAP e outros debatedores, realmente, ao ser publicada, já passa a ter vigência. Mas a vigência definitiva dela é a aprovação do projeto de conversão e a sanção pela Presidente da República.
Mas, como eu dizia, Sr. Presidente, dirigindo-me agora ao Relator, que vai ter a responsabilidade de trazer para nós um relatório capaz de nos convencer, a legislação atual, no que diz respeito ao seguro-defeso, estabelece um ano de vigência para que o pescador possa ter direito ao seguro-defeso. A medida provisória traz de um para três anos.
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Considerando que não tenho mais como apresentar emenda,até porque a legislação que estabelece o trâmite das medidas provisórias na Casa diz que, após até o sexto dia da publicação, poderão nascer as emendas - e, às vezes, as medidas provisórias são publicadas até em finais de semana, de quinta para sexta, de sexta para sábado -, então, cabe a V. Exª receber as demandas, as sugestões, analisá-las e colocá-las em prática no seu relatório.
Aqui, o que diz a legislação, no seu art. 2º, item I:
Art. 2º...........................................................................
I - registro de pescador profissional devidamente atualizado, emitido pela Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca da Presidência da República, com antecedência mínima de um ano da data do início do defeso [...]
Essa é a legislação vigente.
A medida provisória trata, no mesmo artigo, no primeiro item:
Art. 2º...........................................................................
§ 2º .............................................................................
I - registro como Pescador Profissional, categoria artesanal, devidamente atualizado no Registro Geral da Atividade Pesqueira - RGP, emitido pelo Ministério da Pesca e Aquicultura, com antecedência mínima de três anos, contados da data do requerimento do benefício [...]
Pois bem, Sr. Presidente, era desejo nosso apresentar uma emenda, e ela está até aqui posta, mas eu transfiro para V. Exª essa condição. O que diz essa emenda que eu iria apresentar? Ela altera o art. 2º da Medida Provisória nº 665, de 30 de dezembro de 2014.
Art. 2º .........................................................................................................................................................................................
§ 2º .............................................................................................................................................................................................
I - registro como Pescador Profissional, categoria artesanal, devidamente atualizado no Registro Geral da Atividade Pesqueira - RGP, emitido pelo Ministério da Pesca e Aquicultura, com antecedência mínima um ano [...]
Então, eu lhe faço essa sugestão e o apelo para que V. Exª, no seu relatório, inclua essa hipótese, mantendo a legislação atual, para que a gente não cause maiores transtornos e maiores constrangimentos e perdas àquele que, na verdade, não motivou sua paralisação, não foi responsável por ela. Ele atende a uma determinação governamental que diz que ele não pode trabalhar, pelo menos por durante seis meses. Ora, se eu não posso trabalhar, quem vai manter a minha família? Então, não vamos esticar, na minha concepção, na minha ótica, esse prazo de um para três anos.
Essa é a sugestão, Presidente, Relator, que eu trago para V. Exª. Espero que, no decorrer, na hora do debate do seu relatório, a gente possa configurar essa hipótese.
Ao mesmo tempo, quero dizer especialmente ao representante, ao assessor parlamentar do Diap que o senhor trouxe aqui informações de que todos nós já temos noção e que eu não tenho dúvida de que nós debateremos esses assuntos, porque não acredito que haja interesse do Governo e, muito menos, da sua Base em prejudicar o trabalhador. Pelo contrário, teremos que encontrar os caminhos, e este é o foro do debate, que traz a representação dos trabalhadores, dos empresários, de outros segmentos da sociedade, para que a gente possa apurar e definir exatamente o texto final das medidas provisórias que dizem respeito àqueles ganhos ou perdas para os trabalhadores brasileiros.
Muito obrigado, Presidente.
Essa, Sr. Relator, é a nossa sugestão, e sei que V. Exª, um dos mais interessados nesse segmento, principalmente no que diz respeito ao seu Estado, um dos maiores produtores de pescado. Tenho certeza absoluta de que V. Exª terá sensibilidade para tranquilizar esse segmento, de que não vão se assustar, de que não vão esperar mais tempo do que o que já está previsto na lei.
Obrigado. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Zé Geraldo. PT - PA) - Obrigado, Senador Benedito de Lira, que também é Vice-Presidente desta Comissão.
Passo a palavra ao nosso Relator, Senador Paulo Rocha, para que faça suas considerações.
O SR. PAULO ROCHA (Bloco Apoio Governo/PT - PA) - Boa tarde a todos.
Quero agradecer a presença dos nossos convidados, nossos debatedores, e dizer que eu também sou crítico em relação à forma como o Governo mandou para cá os ajustes, sem antes conversar com os interessados, principalmente com as centrais sindicais, onde já havia um ambiente de diálogo. O Governo acabou não usando o método do diálogo e mandando medidas que interessavam diretamente aos trabalhadores para cá, e aqui acabaram chegando desta forma: sofrendo grandes críticas de todos os setores aqui, inclusive de mim e do meu Partido.
Naturalmente, a gente vai cumprir um papel perante as representações classistas e perante a sociedade e o Governo no sentido de buscar um ajuste capaz de assegurar o necessário, o que a nossa economia está a exigir, mas, ao mesmo tempo, não colocando por terra as conquistas dos trabalhadores, as conquistas da própria sociedade, os avanços que tivemos, seja através da luta sindical, da luta dos movimentos sociais, na época da Constituinte, que conseguiu colocar na Constituição brasileira conquistas importantes na relação capital-trabalho principalmente, mas também avanços importantes que tivemos nos últimos anos de Governo, algumas conquistas sociais, principalmente uma conquista...
Eu queria chamar a atenção do nosso professor e também do DIEESE porque eu gostaria de um comentário de vocês. Nos últimos tempos, desde o governo Lula, promoveu-se uma política econômica baseada no consumo, na geração de emprego. O crescimento que houvesse promoveria distribuição de renda, condição de aumentar o poder aquisitivo dos mais baixos, no caso, dos que recebem salário mínimo etc. Com isso, produziram-se, inclusive, políticas públicas de inclusão social, como, além do Bolsa Família, o Minha Casa, Minha Vida, o Luz para Todos etc.
O Governo, agora, com essas medidas... E há os críticos dessa política, para os quais teria que haver um ciclo, teria que haver uma política para que pudesse haver um crescimento capaz de bancar esses avanços. O Governo vem agora com uma medida como essa, restritiva, com a justificativa de que tem que haver um ajuste. Porém, e aí peço o comentário de vocês, com essas medidas, da forma como vieram, na visão de governo, a economia voltaria a processar um crescimento capaz de assegurar esses direitos e essas conquistas. Eu gostaria que vocês fizessem um comentário sobre essa questão.
Quando volta a crescer? Porque o senhor, professor, disse que este ano iria ser difícil, que iria aumentar o desemprego, chegou a falar até daquela situação de negociar a precariedade, reduzir salário etc., etc. Se é verdade que o Governo tomou essas medidas para chamar o sacrifício de todos, mas, no caso só chamou o sacrifício dos trabalhadores, eu diria, esse ajuste, quando provocará essa retomada do crescimento etc.?
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Professor, lá atrás, aquele bloco lá atrás é todo de pescador, de representante de pescador, é o pessoal da colônia. O senhor levantou uma questão interessante, e eu digo isso porque eu fui um dos criadores do seguro-defeso. Cheguei aqui como Deputado Federal, logo após a Constituinte, naquele período das regulamentações, de regulamentar os pontos da Constituição. Um desses pontos de regulamentação foram as leis complementares sobre o seguro-desemprego. Foi naquela oportunidade que a gente criou o seguro-defeso, e não só com essa visão que o senhor colocou aí. Inclusive o senhor pergunta: "Se há uma previsão de quatro meses de defeso, por que não se busca outra alternativa?". A alternativa que foi discutida inclusive com os pescadores, na época, foi a de que a criação do seguro-defeso era para ter essa visão de seguro-desemprego, mas muito mais para proteger o cardume, dado que o defeso é exatamente para assegurar a reprodução e ter o cardume, para ter condição de manter o processo da pesca. Por isso que eu provoquei... Cadê o Abrão?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PAULO ROCHA (Bloco Apoio Governo/PT - PA) - O senhor colocou que há uma discussão, no fundo, de que queriam até acabar com o seguro-defeso. O senhor propôs, até provocou essa discussão, que eu sei que eles ficaram... Por que não se prevê outra coisa?
Então seria importante o senhor comentar isso, porque lá estão todos os principais dirigentes das colônias de pescadores de todo o País, os representantes dos pescadores.
Eles sabem, eu vou cumprir um papel aqui de relator exatamente para mediar aquilo que não foi feito antes de mandarem essas medidas para cá, que, quanto a essas conquistas já asseguradas pela luta e pelo processo de avanço de governos democráticos e populares, vamos fazer de tudo para que esses ajustes não caiam sobre os trabalhadores, principalmente sobre essas conquistas que foram alcançadas a duras penas pelos trabalhadores.
Existem distorções? Existem. O Estado tem instrumento para corrigir distorções através da fiscalização, criando instrumentos de transparência para processar isso.
No caso do seguro-defeso, a distorção não é na questão de prazo, de passar de um ano para três ou vice-versa. É outra coisa que há ali, que é o controle de quem é credenciado para ser pescador. E pode ser credenciado um ano depois, um mês depois que se propôs, por necessidade, a entrar nesse mercado ou nesse trabalho lá. Aliás, no nosso interiorzão lá do Pará, ele já começa a ser pescador, se é filho de pescador, até com seis, oito, dez anos de idade. Então, esse processo, a distorção do seguro-defeso não é essa questão do tempo. É outra coisa que o Estado brasileiro tem condições de corrigir sem emendas drásticas que colocam por terra conquistas importantes.
Então eu gostaria, principalmente dos dois, desse comentários sobre os ajustes, a consequência deles e a retomada do crescimento do nosso País.
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Por outro lado, já que vou provocar o companheiro do Dieese, ontem, no debate que as centrais trouxeram para nós, falou-se também sobre essa questão do emprego. Que o Governo tem condições de melhor organizar algo que chamaram até de um sistema público de proteção ao emprego etc., que envolve todo um conjunto de coisas que já existem no Governo, mas que atuam separadamente, como combater a rotatividade, por exemplo, com a qualificação da mão de obra etc. Gostaria também que se aprofundasse mais essa discussão.
O SR. PRESIDENTE (Zé Geraldo. PT - PA) - Então vamos ouvir os três, na réplica, estabelecendo um tempo de até cinco minutos para a réplica.
O SR. HÉLIO ZYLBERSTAJN - Há um programa na televisão chamado Saia Justa. Eu estou me sentindo nesse programa agora. (Risos.)
Primeiro, a questão do ajuste. Há um aspecto aí nesse ajuste que está sendo proposto que tem sido pouco salientado. Por que o ajuste? Uma das razões é que, por causa das políticas anticíclicas dos governos Lula e Dilma, que duraram demais - eles não perceberam o timing de recolher um pouco -, nós chegamos a essa situação, e agora a gente precisa de um ajuste.
O Ministro Joaquim Levy anunciou que quer tentar obter um superávit de 1.2% do PIB. Só que esse não é o tamanho do ajuste, porque nós saímos de 2014 com déficit de alguma coisa entre 3% e 5% do PIB. Vamos deixar 4%. Se o déficit é 4%, e a gente quer passar para 1,2%, nós temos um ajuste de 5% do PIB para ser feito em um ano. Não é pouca coisa. É um ajuste muito grande, muito grande. Por que precisa ser feito esse ajuste? Porque, por causa desse crescimento na despesa por diversas outras razões, BNDES também está nessa conta, enfim, um conjunto de políticas que foram adotadas, nós estamos agora com uma relação de dívida com o PIB excessivamente alta e ela precisa começar a cair. E por que ela precisa começar a cair? Porque no momento em que a dívida começar a cair, os investidores, os empreendedores vão passar a confiar e aí nós vamos retomar o crescimento. Essa é a cadeia de acontecimentos que se espera quando se promove um ajuste.
Quanto tempo isso vai durar é muito difícil dizer. Eu acho que a duração, em parte, vai depender deste debate que está sendo feito aqui e da maior ou menor facilidade que o Governo vai ter de conseguir fazer esse ajuste pretendido, que eu repito, é enorme, é muito grande. Um ajuste desse tamanho precisaria ter sido precedido de uma ampla discussão e infelizmente isso não aconteceu devido a razões políticas.
Todos nós sabemos como foram as eleições, o timing; terminadas as eleições, era preciso começar outro governo, novo enfoque econômico, aquela corrida toda. Então, respondendo objetivamente, eu não sei quanto tempo vai demorar porque hoje o problema não é só econômico, é um problema político também. Quer dizer, qual a intensidade de ajuste que vai ser negociado aqui nesta Casa? Vai depender disso aqui.
Quanto à questão do defeso, o que eu quis dizer é que o defeso é uma coisa previsível. E, nesse sentido, ele é diferente do seguro-desemprego, que é imprevisível. Então, se se vai adotar uma política de preservação da renda do pescador durante o defeso, e eu não estou discutindo se é certo ou errado, acho até que tem sentido, porque a não pesca contribui para a preservação da própria pesca e do ambiente - está tudo justificado -, mas eu acho que, talvez, os recursos para isso devessem ser tirados do próprio setor.
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Por que nós temos que onerar toda a atividade econômica para sustentar a renda de um setor específico? Será que não dá para preservarmos um pouco da renda desse setor, para sustentá-lo nesses meses em que não há atividade?
São perguntas que eu faço.
Qual é o mecanismo de preço? Qual é o mecanismo de renda que existe nesse setor? Será que não daria para explorar um pouco esta questão? Talvez fosse um caminho.
O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - Bom, eu vou tentar comentar um pouco as questões que o Senador Paulo colocou, começando pela questão do crescimento, do ajuste, o sentido do ajuste.
Olha, Paulo, a primeira questão é que do ponto de vista do debate e da compreensão falta o sentido do ajuste para a estratégia de crescimento. Ou seja, esse ajuste não está conectado claramente, no debate, em termos das escolhas, com o tipo de transição para que nós estamos conduzindo em nossa economia para o crescimento.
Observado o ajuste em si, no contexto das restrições por que a economia passa, parece-me que o ajuste pode levar-nos a uma tragédia econômica, cujos efeitos ninguém sabe exatamente quais serão, não do ajuste em si, mas do contexto em que o ajuste está sendo feito no momento e das demais condicionantes ao crescimento que estão impondo sérias restrições, de cuja combinação ninguém sabe qual é o resultado. Ninguém sabe.
Evidentemente, quando o Governo pensa inicialmente o ajuste em si e trabalha um pouco nesta perspectiva que o Hélio falou, ela é uma perspectiva normativa que não encontra respaldo na realidade. A dinâmica da realidade é muito mais perversa, no sentido de desmobilizar a atividade econômica, do que a gente está imaginando, da crise política da Lava Jato, da repercussão dela, da Petrobras, na cadeia Petrobras, petróleo e gás, construção, efeito na construção, pesado investimento do PAC, começa a relacionar a crise da água, crise de energia; o conjunto de efeitos econômicos restritivos neste cenário é muito grave. Essa medida é também restritiva.
O questionamento é: Se a nossa estratégia econômica, que veio até então, teve sucesso, ela claramente precisava vir com um suporte em uma segunda geração de estratégia de crescimento sustentado no investimento, incremento de produtividade, mobilização de investimento público e privado, o que a Presidenta Dilma tenta fazer no primeiro mandato e não consegue. E não há uma resposta clara sobre por que o empresariado não veio para a segunda geração de investimento. O Governo tomou as medidas em uma agenda empresarial e o capital privado não veio. Não veio! E aí o déficit está claro. Ou seja, há um conjunto de exonerações visando à mobilização do capital e o capital não veio. O rombo ficou porque o crescimento esperado não veio.
Bom, aí o ajuste se faz necessário. Faz-se necessário para qual estratégia para frente? No debate que nós temos feito, esse ajuste só faz sentido... Não estou dizendo este ajuste enquanto medida. Um ajuste fiscal só faz sentido se nós tivermos uma estratégia de crescimento, e no nosso entendimento essa estratégia de crescimento deveria estar fortemente assentada em uma estratégia de desenvolvimento produtivo. E, nessa perspectiva, a política cambial é fundamental. Política do ponto de vista da reorganização da política monetária, dívida pública, Selic, pois é esse conjunto de coisas que faz do rentismo um grande negócio. E deslocar o rentismo para o investimento produtivo. Nós nem passamos por perto, pelo contrário, nós estamos agravando um instrumento que desqualifica e desmobiliza o investimento produtivo. Isso é contraditório.
Esse ajuste fiscal, para ser mais claro, faria todo o sentido - um ajuste fiscal - se nós tivéssemos simultaneamente uma política monetária de redução de juros, ao mesmo tempo uma clara intenção do Governo declarando que tomaria medidas para desindexar plenamente a economia e, terceiro, desvincular a Selic da dívida pública e reorganizar a dívida pública e a relação entre juros de curto prazo e juros de longo prazo.
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Nós somos um dos poucos países que pagam no overnight a taxa de juros de longo prazo. Não há atividade produtiva interessada em investir porque não há lugar para ganhar tanto dinheiro fácil quanto no rentismo brasileiro. Não há taxa de retorno do capital que suporte uma taxa de retorno de rentismo que temos aqui no overnight. É um escândalo.
Bom, se isso não for feito e nós não sustentarmos para a atividade produtiva - leia-se um câmbio de desenvolvimento produtivo -, não há ajuste fiscal que resolva. O que o ajuste fiscal resolveria, se nós tivéssemos essas duas medidas? Com a política cambial e uma política monetária coerente, você liberaria demanda interna e demanda externa. É isso. E o ajuste fiscal é parte da liberação de demanda interna.
Aí ele poderia ser rapidamente um instrumento de retomada do crescimento. Portanto, teríamos sacrifícios de toda a sociedade de curtíssimo prazo para rapidamente voltar a crescer.
A ausência desses dois elementos, faz com que essa política seja uma política de pisada forte no freio. E aí ninguém sabe, porque ninguém sabe como sair de uma recessão econômica. Não se sabe quanto tempo, não há quem consiga fazer previsão, porque a recessão, na verdade, é uma desmobilização das expectativas. E a constituição de novas expectativas onde o empresário vai dizer: "Eu vou investir." O Estado vai dizer: "Eu estou com capacidade de recolocar o investimento." Ninguém sabe em quanto tempo essas coisas acontecem.
O Governo faz uma série de medidas no sentido de reduzir gastos. Como o Hélio falou, pode ser que os gastos aumentem. Contraditoriamente? É, porque a recessão pode ser de tal magnitude que aqueles que virão para o seguro-desemprego pode representar muito maior a demanda do que o corte que aparentemente o Governo está fazendo, porque ele faz o corte pensando num cenário favorável. E o cenário que vem pela frente não é favorável.
Podemos falar disso e de outros impactos.
Então, a primeira questão é: o ajuste em si está desconectado, pelo menos no nosso entendimento, porque as ações que estão em curso não revelam necessariamente essa intencionalidade no curto prazo de uma estratégia de um desenvolvimento produtivo clara.
Do ponto de vista, na questão do defeso, na linha que o Hélio estava falando, no caso de pensar essas medidas, Paulo, o interessante seria pensar que o seguro-defeso, mais do que uma proteção, ele devia ser complementarmente pensado como uma política de incentivo à produção sustentável.
Essa é uma produção econômica cuja natureza da sua sustentabilidade econômica e ambiental - e portanto um modelo do que é um bom desenvolvimento - é ter no defeso um instrumento de incentivo à produção. E não somente de proteção. Portanto, a lógica dele é uma lógica de incentivar a produção. Assim, ele devia ser muito mais pensado como uma política de produção econômica onde a proteção do pescador é condição para o sucesso da atividade econômica do que, simplesmente, uma proteção no sentido do desemprego.
Por último, você lembrou da questão da proteção do emprego. Hélio levantou um dos exemplos. O nosso sistema público de emprego é um sistema montado para proteger o desempregado. Se nós queremos ter uma estratégia de desenvolvimento produtivo e de sustentação do crescimento, sabendo que diversidades externas atingem empresas, que não dependem dela, um bom sistema público de emprego tem instrumentos voluntários que empresas e trabalhadores podem acessar para proteger o emprego, proteger o investimento que a empresa fez naquela ocupação, proteger investimento que o trabalhador fez, proteger a renda, proteger a ocupação e proteger o próprio Estado, porque, preservando emprego, preservam-se demanda interna, atividade econômica, e assim por diante.
O nosso sistema não tem... o que nós temos de proteção do emprego, na verdade, hoje, é o lay-off, que é um negócio horrível. Só quem passou pelo lay-off sabe o que é encaminhar o lay-off em qualquer empresa.
O que nós estamos propondo é que o nosso sistema deveria ter instrumentos mais baratos do que o seguro-desemprego para proteger o emprego. Nós fomos conhecer exemplos da Alemanha, na Europa, montamos propostas. Programas que podem ser usados pelas empresas e pelos trabalhadores em comum acordo para proteger o emprego.
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E poderíamos ter isso em várias situações com instrumentos diferenciados, dando alternativas a que a economia, numa estratégia de crescimento, possa, em momentos diversos, proteger, diante de contextos que impactam a empresa de fora para dentro, o emprego, a atividade econômica e, provavelmente, a atividade econômica e geral da própria economia.
Então, eu acho que o nosso sistema carece desses elementos, que poderiam dar muito mais robustez a um sistema, aí sim, que apoie o desenvolvimento produtivo. Mas me parece que, como elemento estruturante, falta termos o debate sobre qual é essa estratégia de desenvolvimento produtivo que é fundamental ao País para podermos, aí sim, pensar todos os ajustes que possam e que devem ser necessários para que nós coloquemos a economia nessa perspectiva.
Não é simples, não é um debate fácil, as escolhas são muito difíceis e acho que, sem um grande acordo social, sem um grande acordo entre empresários e trabalhadores e governo, não teremos essa saída, porque isso significará escolhas difíceis, como a realocação de recursos públicos e privados que precisam ser feitos na economia para que a gente tenha uma outra trajetória.
Caso contrário, a nossa trajetória pode ser muito difícil. E aí a medida em si pode agravar um problema que está começando a aparecer. Nós podemos, se errarmos na mão, entrar em um período de longa restrição econômica.
O SR. PRESIDENTE (Zé Geraldo. PT - PA) - Muito bem.
Márcio.
O SR. MARCIO POCHMANN - Senador Paulo Rocha, Senador Benedito de Lira, acho que essas medidas de ajuste têm um componente política com muita relação com algumas dificuldades do Governo Dilma.
O Governo Dilma, em alguma medida, podemos dizer sem sombra de dúvida, foi capturado pela pressão do mercado, em função das suas próprias dificuldades. Obviamente que as medidas anticíclicas, construídas pelo governo Lula e continuadas pela Presidente Dilma, tiveram limitações, como disse o professor. O Governo não soube dar o freio de arrumação e, aí, apresenta duas medidas restritivas e fiscalistas que, obviamente, impactam infinitamente mais a economia.
Qual é a lógica das medidas anticíclicas? É, na crise, produzir mais emprego e mais renda, exatamente para que circule mais dinheiro no mercado. O capitalismo tem uma lógica - sem querer fazer digressões ideológicas - em que o mercado tem uma capacidade maior de pressionar os agentes públicos, o Congresso, o Judiciário, o próprio Governo porque ele detém informações estratégicas que podem pressionar evidentemente o Governo a fazer ajustes e tomar medidas para, primeiro, resolver os seus problemas. E secundariamente, resolver os problemas da população e dos trabalhadores de um modo geral.
Por exemplo, quando o Governo adota o IPI para diminuir o custo da compra do veículo, ele não está querendo resolver o problema do consumidor, do comprador, do trabalhador - sobretudo dos trabalhadores. Ele está querendo resolver as demandas de mercado que querem preços melhores para produzir. Os preços dos carros, no Brasil, são infinitamente superiores do que na Europa, no Japão e nos Estados Unidos. Qual é a justificativa disso? Não existe nenhuma justificativa racional. A lógica é o seguinte: os preços dos carros no Brasil são maiores porque os consumidores no Brasil aceitam isso. Só isso.
A produção do aço no Brasil é mais cara do que na Europa, nos Estados Unidos, no Japão! O capitalismo brasileiro, em função do rentismo, tem uma lógica para pressionar os agentes públicos para resolver os seus problemas, as suas contradições, para que possa construir um ambiente econômico muito mais favorável.
No governo Lula, havia um componente, numa conjunção política muito interessante, com o capitalismo produtivo. Quando o Vice-Presidente batia nas altas taxas de juros, ele batia com consentimento do capital produtivo, porque ele era um representante do capital produtivo numa unidade política que deu certo.
Então, quando o José Alencar batia no rentismo, no lucro, é uma disputa que foi vencida pelo capital especulativo. As taxas de juros foram reduzidas, o spread bancário foi reduzido, depois voltou e, agora, com uma força infinitamente mais avassaladora.
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O Clemente está correto. Não dá para dizer em que momento nós vamos sair da recessão. A saída da recessão não depende só da economia brasileira. A saída da recessão depende da economia norte-americana - sobretudo dos Estados Unidos -, depende da economia chinesa, que tende a crescer menos. Se a economia chinesa crescer menos, nós vamos fazer menos negócios com aquela parte do mundo, que tem uma grande relação comercial com o Brasil. Obviamente que esse quadro impacta a economia.
A contradição fundamental - e é isso, Senador Benedito de Lira que este Congresso tem que discutir - é encontrar, fazer um encontro entre o Governo propôs e o que este Congresso pode diminuir. Fazer o encontro da proposta do Governo com o que este Congresso pensa a partir desses debates, a partir da pressão dos setores organizados, para mitigar essas medidas de ajuste.
A tendência, em função de que o Governo, por erros políticos e erros muito localizados no perfil político da Presidente Dilma, foi capturado pela lógica do mercado. É só ver quem é a Ministra da Agricultura. É só ver quem é o Ministro do Desenvolvimento Econômico, quem é o Ministro da Fazenda.
Em função do duro debate político que foi feito nas eleições e da pressão que o mercado exercia ali, e continua exercendo para influenciar na escolha dos ministro a partir da lógica do mercado, isso continua prevalecendo.
Então, essas medidas, Senador Paulo Rocha, têm esse componente político de dificuldade do Governo de dialogar com os setores para tentar encontrar caminhos e tentar encontrar interseções que pudessem diminuir a crise política. A crise política tem, nesse aspecto, também um componente econômico, que é a depressão da economia. Se os salários tivessem uma perspectiva mais favorável de crescimento, se a Câmara dos Deputados não estivesse discutindo um projeto de lei que claramente restringe os direitos dos trabalhadores, com a expansão da terceirização, obviamente que o ambiente política seria outro. Não há dúvida.
Claro que a economia é o motor. A economia, como diria aquela figura dos Estados Unidos: "É a economia, estúpido." É óbvio que a situação seria infinitamente diferente. Agora, a gente observa que a Presidente Dilma tem uma dificuldade de dialogar e essa dificuldade de dialogar gera essa crise política e aí ela foi capturada pelos interesses de mercado. As medidas vêm nessa direção: resolver os interesses de mercado.
O que justifica as medidas com grande impacto na economia e o Governo abrir mão de R$263 bilhões com as desonerações da folha no setor cinza, no setor branco? E querer penalizar exatamente os setores mais pobres da sociedade brasileira - os pescadores, os trabalhadores da construção civil, os jovens trabalhadores, onde há mais rotatividade, os trabalhadores da agricultura, sobretudo a agricultura familiar. Essas medidas restritivas não afetam a grande agricultura, a agricultura exportadora, o agronegócio. Afeta a agricultura familiar.
Então, é preciso encontrar uma interseção entre o que o Governo propôs - o Congresso vai ter esse trabalho, o Senador Paulo Rocha vai ter que ter esse trabalho, com ele está essa tarefa -, um ponto de equilíbrio entre as duras medidas propostas pelo Governo e o que este Congresso pensa a partir desses debates construídos nessas audiências públicas.
Então, Senador, é difícil fazer uma previsão de quando nós vamos sair da depressão porque ela não depende só de medidas do Governo, adotadas com essas medidas provisórias discutidas aqui por este Congresso Nacional, depende da economia internacional.
A economia internacional está em crise também. Começa a haver uma retomada nos Estados Unidos, mas a economia chinesa tende a diminuir. Ela não é nem será capaz de manter o seu crescimento de 7% a 10%. Tende a cair até 2025 a 4,5% - essa é um pouco a realidade do mundo.
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Então, com essas medidas restritivas, a impressão que temos é de que o Governo aprofunda a crise econômica ao invés de sair dela.
Então, imaginamos que é preciso construir novas medidas como essas propostas, quando se coloca a questão do abono. É uma saída razoável, de fato, com a finalidade de se diluir isso em doze meses, agora, sempre discutindo com os trabalhadores e suas organizações, porque o movimento sindical tem proposta para isso. Não há qualquer dúvida.
Se tivessem ouvido o movimento sindical, certamente, os Senadores, os Deputadores, o Congresso Nacional, a Câmara dos Deputados, teriam infinitamente menos trabalho, porque conseguiríamos produzir propostas mais consensuais, a fim de superar a crise colocada, que não começou agora. Ela foi escondida na campanha eleitoral e começa a aparecer, porque não há jeito de escondê-la. Ela impacta no cotidiano concreto das pessoas com redução de salário. Sem emprego, o poder de compra é drasticamente afetado.
Então, Senador Paulo Rocha, a tarefa deste Congresso é exatamente tentar encontrar um ponto de equilíbrio entre o que o Governo propôs e o que este Congresso pensa.
Obviamente, não há condição de se fazer qualquer previsão, sobretudo com essas medidas, de quando vamos sair da crise com esses elementos fiscalistas colocados pelo Governo e sendo aprovados pela Câmara dos Deputados, como o Projeto da Terceirização, que deve ir a votos hoje.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Zé Geraldo. PT - PA) - Deputado Izalci, estávamos caminhando para o encerramento. V. Exª quer usar da palavra?
O SR. IZALCI (PSDB - DF) - Só vim para conversar depois com o Relator, porque temos uma pendência também nessa área previdenciária, trabalhista, sobre o que quero falar com ele.
O SR. PRESIDENTE (Zé Geraldo. PT - PA) - Antes de encerrar, queria dizer a todos os presentes e aos convidados de hoje que tivemos, ontem e hoje, nas treze exposições, um farto material e também muitas informações importantes, principalmente para os nossos Relatores, Senador Paulo Rocha e Deputado Carlos Zaratini.
Estamos percebendo que precisamos das medidas saneadoras. Os programas precisam de ajustes, mas a nossa percepção é a de que essas medidas, para serem aprovadas no Congresso, precisam realmente passar por profundas mudanças.
Eu, como Presidente desta Comissão de Medida Provisória, vou fazer o possível, junto aos Relatores e ao Governo, para que possamos aproveitar essas medidas e aprovar aquilo que for importante para os programas e as políticas. Inclusive, concordo que os representantes dos pescadores deste País, que estão neste debate, devam aproveitar também o momento, já que se discute a economia e o emprego, com os dois Ministros, o da Pesca e o da Reforma Agrária principalmente, os dois Ministérios, para que possamos ter os financiamentos e as políticas adequadas, a fim de que, nesse período, que é de quatro meses, na maioria dos casos, no Pará, por exemplo, possamos ter as atividades de produção de peixe, numa Amazônia tão rica de clima, de água...
Conhecemos rios em que não há mais peixe. Se formos ao rio Canaticu, em Curralinho, no Marajó, não há muito peixe para pescar, porque este foi explorado ao longo dos anos. Podemos potencializar esses rios na produção de pescado, para que, nesse período, os pescadores possam ter peixes produzidos e render muito mais do que, inclusive, o peixe pescado nos rios.
Então, penso que, neste momento, devemos ir aos bancos, que têm muita dificuldade de financiar associações e cooperativas de pescadores para aquisição de máquinas, para construir tanques ou comprar tanques- redes etc, etc.
Assim, tenho certeza de que vamos lapidar esta medida provisória, de forma a que ela não venha a ser prejudicial aos nossos trabalhadores e aprová-la.
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Naturalmente, essa responsabilidade passa a ficar, a partir de amanhã, na mão dos Relatores, com o Governo.
Não tendo mais nada a tratar, encerro esta reunião, agradecendo a presença de todos, que enriqueceram muito esta audiência pública de hoje.
Muito obrigado.
(Iniciada às 14 horas e 43 minutos, a reunião é encerrada às 16 horas e 38 minutos.)