Notas Taquigráficas
| Horário | Texto com revisão |
|---|---|
| R | O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Declaro aberta a 85ª Reunião Extraordinária da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura. A presente reunião destina-se à realização de audiência pública nos termos do Requerimento nº 24, de 2015, de autoria do Senador Magno Malta. O objetivo é instruir a SUG nº 15, de 2014, que regula a interrupção voluntária da gravidez, dentro das 12 primeiras semanas de gestação, pelo Sistema Único de Saúde. Esta audiência pública será realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. Para isso, as pessoas que têm interesse podem fazê-lo por meio do portal e-Cidadania, link www.senado.leg.br/ecidadania e do Alô Senado, através do nº 0800-612211. No dia de hoje, haverá duas Mesas. A primeira Mesa será formada por Maria Teresa Blandón, ativista feminista da Nicarágua; por José Eustáquio Diniz Alves, Doutor em Demografia e Professor Titular do Mestrado e Doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (ENCE/IBGE); Nazareno Vasconcelos Feitosa, integrante do Movimento Brasil Movida do DF; e Padre Pedro Stepien, Diretor Nacional do Pró-Vida. A segunda Mesa será formada por Olímpio Barbosa de Moraes Filho, Vice-Presidente da Comissão de Abortamento, Parto e Puerpério da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo); por Stela Barbas, Doutora e Mestre em Direito, Professora Universitária de Portugal; por Maria José Rosado Nunes, Coordenadora-Geral do movimento Católicas pelo Direito de Decidir; e Adelice Leite Godoy D'Ávila, integrante do movimento Pró-Vida de Campinas, São Paulo. Todos sabem que nós estamos fazendo nesta comissão uma série de audiências públicas sobre o tema do aborto, principalmente, neste caso, baseados na provocação apresentada pela SUG nº 15. Eu acho que já houve uma dúzia de reuniões aqui, em que segmentos diferenciados colocaram o seu ponto de vista, o que é muito positivo, uns a favor, outros contra. Segundo o próprio Relator da matéria, Senador Magno Malta, que acredito que virá ainda a esta audiência, nós pretendemos exaurir o tema com a profundidade que ele exige para que, então, esta Comissão possa dar o seu parecer final. Eu vou começar, de imediato, com a primeira Mesa, chamando Maria Teresa Blandón, ativista feminista da Nicarágua. (Palmas.) |
| R | Eu tive a satisfação de conhecer Nicarágua na época ainda do confronto entre os sandinistas com os chamados contra, que estavam na fronteira. Eu estive lá durante 15 dias em uma missão de alto nível do Brasil. Eu fui como líder sindical, acompanhado por uma delegação de padres e também de líderes partidários do Brasil. Isso foi logo lá atrás, bem no início. Já se passaram, de lá para cá, mais de 30 anos. Era mais ou menos isso, naquela época. (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Exatamente. Seja bem-vindo. Nicarágua, sempre Nicarágua. A SRª MARIA TERESA BLANDÓN - Muchas gracias. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - José Eustáquio Diniz Alves, Doutor em Demografia e Professor Titular do Mestrado e Doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas. Seja bem-vindo, Doutor. O SR. JOSÉ EUSTÁQUIO DINIZ ALVES - Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Chamamos, agora, Nazareno Vasconcelos Feitosa, integrante do Movimento Brasil Movida do DF. Seja bem-vindo. (Palmas.) Chamamos o Padre Pedro Stepien, Diretor Nacional do Pró-Vida. (Palmas.) De imediato, pergunto aqui se você quer começar. Pode ser? (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Pode. A senhora fala em espanhol, não é? O pessoal entende espanhol - se até eu entendo, vocês vão entender também. Então, com muita satisfação, chamamos a Srª Maria Teresa Blandón, ativista feminista da Nicarágua - Nicarágua, sempre Nicarágua - para usar a palavra neste momento. A SRª MARIA TERESA BLANDÓN - Muito obrigada, senhoras senadoras e senhores senadores, deputados e deputadas. Agradeço a oportunidade de compartilhar a situação difícil em que vivem as mulheres do meu país, a Nicarágua, em consequência da criminalização do aborto, em termos absolutos, que esteve vigente desde 1879 até outubro de 2006. A criminalização absoluta por parte do Congresso da República, mesmo tendo sido ratificada pelo atual presidente, Daniel Ortega, em um contexto eleitoral, onde os principais partidos em disputa haviam acumulado importantes doses de descrédito em consequência da corrupção e da falta de respostas efetivas diante dos altos índices de pobreza do país. E foi utilizada como estratégia para difundir um falso discurso em defesa da vida. No debate que aconteceu no final de 2006 e no ano de 2007, não valeram de nada os argumentos apresentados pela Sociedade de Ginecologia e Obstetrícia, cujos argumentos científicos, éticos e irrefutáveis defendiam a necessidade de manter o aborto terapêutico na legislação nicaraguense para proteger a vida e a saúde das mulheres, em um país que apresenta altas taxas de mortalidade materna, de até 125 mortes por cada 100 mil nascidos vivos, certamente a segunda mais alta da América Latina. Um país onde 28% do total das gestações são de meninas e adolescentes menores de 18 anos. E onde a cada ano mais de 1.500 meninas, entre 10 e 14 anos, engravidam. Gestações que apresentam, como já sabemos, quatro vezes mais risco de morte se comparadas às gestações de mulheres adultas. Quais são as principais consequências da criminalização do aborto na Nicarágua? Depois da criminalização absoluta, aumentou o percentual de mortes obstétricas indiretas. Entre os anos de 2012 e 2013, 47% das mortes maternas poderiam ter sido evitadas, se essas mulheres tivessem interrompido a gravidez. Nesse período, as estatísticas também relatam mortes que não apareciam antes da criminalização absoluta, tais como as causadas por gravidez ectópica. |
| R | Existem evidências de mulheres grávidas, às quais lhes foi negado ou retardado o tratamento contra o câncer e contra outras doenças para supostamente favorecer o desenvolvimento do feto. Tornou-se público o caso de uma mulher de 27 anos, que só começou a receber o tratamento contra o câncer, depois da pressão de organismos dos direitos humanos da sociedade civil nicaraguense e do Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Também há casos de atendimento tardio nos hospitais públicos. Há mulheres que chegam com claras evidências de estar em processo de aborto, sendo que algumas dessas mulheres acabam morrendo, porque o médico não realiza a intervenção adequada por medo de ser acusado de praticar um aborto. Existem também evidências de mulheres diagnosticadas com gravidez de anencefálicos, que foram obrigadas a levar até o fim gestações que inevitavelmente terminam com a morte do feto e colocam em risco a saúde da mulher grávida, além da tortura que significa viver uma situação como essa. Questionamos a este respeito: quais seriam as implicações éticas que situações como estas, nas quais o médico obriga as mulheres a passar por semelhantes situações de sofrimento e risco, inclusive risco de morte? Quais foram os critérios que levaram os legisladores e o presidente da República a definir legalmente que as mulheres com gravidez de risco não são titulares do direito à vida e devem morrer na tentativa de gerar uma nova vida à custa de sua própria vida? A criminalização absoluta do aborto nos mostra um Estado que não reconhece o direito à vida das mulheres, especialmente daquelas que vivem em condições de pobreza, que são a maioria, criando situações que não só distorcem o sentido da maternidade, ou seja, dar a vida e perder a própria vida, cuidar e desfrutar da nova vida gerada. No entanto convertem a gravidez num fator de medo, diante do qual o Estado aparece como carrasco, e não como o que na teoria deveria ser: um Estado garantidor dos direitos humanos dos cidadãos sem nenhum tipo de discriminação. Além disso, temos que analisar a criminalização absoluta do aborto com relação à gravidez em consequência da violência sexual. Entre 2009 e 2012, a polícia nacional registrou 2.790 denúncias de violação contra meninas menores de 14 anos. Dados do Instituto de Medicina Legal, do ano de 2013, informam que dentre as 5616 vítimas de violência sexual, seis de cada 10 eram meninas menores de 13 anos. De acordo com o Ministério da Saúde, entre 2009 e 2012, foram registrados 100.404 partos de meninas entre 10 e 14 anos. Todas essas meninas estão sendo obrigadas pelo Estado a levar até o fim gestações que põem em risco suas vidas, sua saúde e seu desenvolvimento integral. Diante desta grave situação de violação dos direitos humanos das mulheres e das meninas, as organizações feministas, os organismos independentes de direitos humanos, a Sociedade de Ginecologia e Obstetrícia, entre outros, patrocinamos uma campanha permanente em defesa do aborto terapêutico, permitindo que na atualidade a grande maioria de médicos, de ambos os sexos, que prestam serviços em 12 hospitais públicos do país, estejam de acordo com a necessidade de restabelecer o aborto terapêutico para salvar a vida das mulheres e das crianças. |
| R | Continuamos demandando à Corte Suprema de Justiça uma resolução que confirme a ilegalidade da lei que criminaliza o aborto, sempre que essa lei vá de encontro aos postulados da Constituição e aos marcos internacionais dos direitos humanos. Por sua vez, o Comitê de Sedal, o Comitê de Direitos Humanos, o Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e o Comitê Contra a Tortura recomendaram que o Estado da Nicarágua revisasse a legislação relativa ao aborto com o objetivo de suprimir disposições punitivas, evitar penalizar os profissionais da área de medicina no exercício de suas responsabilidades profissionais, garantir o tratamento imediato das mulheres que necessitem de atendimento médico, proporcionar serviços de qualidade para o tratamento das complicações derivadas de abortos realizados em condições de risco, adotar medidas que ajudem as mulheres a evitar gravidezes indesejadas. A Nicarágua constitui um claro exemplo de como o estado pode invocar a proteção da vida como fetiche e provocar com leis injustas a morte de milhares de mulheres que são obrigadas a viver em condições de pobreza, de discriminação e de violência. E para finalizar, quero compartilhar a reflexão da teóloga María López Vigil, que mora na Nicarágua, para quem, diante de uma gravidez indesejada, é sempre terapêutico interromper essa gravidez, de modo a possibilitar que as mulheres desfrutem de um estado de saúde integral. Muito obrigada pela sua atenção. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem. Essa foi a Srª Maria Teresa Blandón, ativista feminista da Nicarágua, que relata a situação do seu país e dá aqui um testemunho sobre a importância desse debate, explicitando o seu ponto de vista em relação ao tema que tem suscitado enormes debates no Brasil e no mundo. Vamos, de imediato, ao Sr. José Eustáquio Diniz Alves, que é Doutor em Demografia e Professor Titular do Mestrado e Doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas. O SR. JOSÉ EUSTÁQUIO DINIZ ALVES - Bom dia a todos e a todas. Agradeço ao Senador Paulo Paim, um grande Parlamentar, uma grande liderança do povo brasileiro. Agradeço toda a oportunidade. Esta apresentação foi feita junto com o Dr. George Martine. Como demógrafos, participamos das entidades Associação Brasileira de Estudos Populacionais, Associação Latino-americana de População e Iussp, que é a associação internacional - ali estão as datas de fundação das associações. E eu vim falar um pouco aqui de uma notícia muito boa. Às vezes, poucas pessoas conhecem essa notícia, mas vou falar um pouquinho da transição demográfica, de como essa transição se encontra atualmente e um pouco de demografia e direitos reprodutivos. A primeira notícia muito boa da história do Brasil é que estamos passando por uma transição demográfica. E a transição demográfica é o fenômeno de comportamento de massa mais importante da história da humanidade. Por quê? Este é um gráfico que mostra a transição demográfica desde o final do século XIX, quando foi feito o primeiro censo demográfico no Brasil. E a notícia superboa começa quando vemos a redução das taxas de mortalidade. Durante toda a história da humanidade, as taxas de mortalidade foram muito altas. Elas começaram a cair exatamente no século XIX, e o Brasil está nesse processo. As taxas vêm caindo, e estamos no nível mais baixo dessas taxas de mortalidade. A taxa de natalidade, como sempre acontece no mundo todo, demora um certo tempo para começar a cair depois que as taxas de mortalidade iniciam a queda. O que acontece? Nesse período aqui, há uma aceleração do crescimento vegetativo da população, e muita gente analisava esse período aqui de crescimento vegetativo da população como se fosse uma explosão populacional, mas, na verdade, isso é só uma fase, que todos os países do mundo passaram, em que a mortalidade cai primeiro e a natalidade demora um certo tempo para cair. Logo depois, as taxas de natalidade começam a cair, e aí a taxa de crescimento vegetativo também cai. Isso aconteceu no mundo todo e está acontecendo no Brasil. |
| R | Esse fenômeno da transição demográfica mostra que a aceleração do crescimento acontece só num período pequeno, e, depois, a tendência é a queda da população. Junto com a transição demográfica, há uma transição da família. Isso também acontece no mundo todo, alguns autores chamam isso de segunda transição demográfica. E vemos o seguinte: a família - isto é definição da ONU - é um núcleo social composto por, no mínimo, duas pessoas, independentemente do sexo, ligadas por relações de consanguinidade, parentesco, filiação ou adoção, ou casamento. E aqui vemos esses dados do Censo 91, do IBGE, e de Censo 2010, que mostram que a família tradicional composta por um casal com pais e com filhos, que era a grande maioria da população brasileira, está diminuindo, caiu para 49% em 2010; e os outros tipos de família, considerando, inclusive, domicílio unipessoal, subiram para 51%. Isso é um processo que também acontece no mundo todo. Junto com a transição demográfica, há uma mudança nas relações das famílias. Passados quase 200 anos da Independência do Brasil, o que vemos? O período de maior crescimento populacional, em torno de 3% ao ano, aconteceu no quinquênio 1960 a 1965; depois disso, essa taxa vem só caindo. O pico da população, o máximo da população brasileira, segundo as projeções da ONU, que estou usando aqui, vai ficar em torno de 240 milhões na metade do século e, depois, começa a cair - vou mostrar rapidamente. E qual foi a maior conquista nestes 200 anos? A esperança de vida ao nascer, que era em torno de 25 anos, quando foi proclamada a Independência, já está três vezes maior, 75 anos, e deve chegar em torno de 77 anos em 2022. E a mortalidade infantil, aqui já são dados do IBGE, que era 137 por mil em 1950, está em torno de 15 por mil e deve cair para 12 por mil em 2022. Então, vê-se o seguinte: o Brasil vive nas melhores condições demográficas de sua história, tanto a história passada como a futura. Estas são as três projeções da ONU até 2100. A projeção média, que é mais provável, é a de que o Brasil vai chegar em torno de 240 milhões de habitantes e, depois, cai um pouco. Se a fecundidade subir, que é pouco provável, a população vai para 300 milhões; se a fecundidade cair muito, muito - tem de cair muito mesmo -, ela vai ficar em torno de 130 milhões. O mais provável é essa projeção média. Isto são as projeções de fecundidade. A projeção média, a verde, que é a mais provável, é um pouco abaixo do nível de reposição. Então, isso significa que, a longo prazo, a população, se não houver uma migração internacional muito forte, vai diminuir ligeiramente. Isto aqui é a estrutura etária da população. Em 1985, havia uma pirâmide, que chamamos de egípcia, em que cada grupo era maior do que o anterior. E vamos passar para um retângulo, com uma estrutura etária muito diferente do que foi durante toda a história brasileira. Isso significa que vamos ter um envelhecimento populacional. Isto também são três projeções do envelhecimento. Aqui, é a idade mediana. O mais provável é essa do meio, em que a idade mediana ficará em torno de 50 anos. Vejam só, agora em 2010, a idade mediana é um pouco menor do que 30 anos e vai chegar em torno de 50 anos. Se a fecundidade subir um pouco, a idade mediana fica um pouco mais baixa; se a fecundidade cair muito, a idade mediana fica um pouco mais alta. E aqui é a razão de dependência, que é o seguinte: quando há a transição demográfica, todos os países do mundo que passaram pela transição demográfica passaram também pela mudança da estrutura etária. Isso cria uma oportunidade, que é única, que só acontece uma vez em cada país, que se chama de bônus demográfico. O que é o bônus demográfico? Diminui-se muito a razão de dependência demográfica, e isso favorece o desenvolvimento do país, favorece a redução da pobreza, favorece, inclusive, o empoderamento das mulheres. |
| R | O Brasil está em pleno bônus demográfico, e, como em todo país do mundo, ele passa também. Então, até 2030, mais ou menos, passa o bônus demográfico. O que acontece se a fecundidade cair muito? Se a fecundidade cair muito, no primeiro momento, é bom para o bônus demográfico, porque a razão de dependência cai mais ainda. Só que acontece que a razão de dependência sobe muito no futuro. Se a fecundidade subir, isso é ruim para a razão de dependência no curto prazo, mas, no longo prazo, não é tão ruim. E, se for a projeção média, é uma coisa mais equilibrada. Então, é o seguinte: o fato é que temos um bônus demográfico, que continua ainda, mas depois, inevitavelmente, seja qual for o cenário da fecundidade, esse bônus demográfico vai passar. Então, temos que aproveitar bem este momento. Isso aí é uma representação - eu não vou entrar em todos os detalhes - em que essa linha mostra o seguinte: quanto mais cresce essa linha, mais estamos colhendo o bônus demográfico. Então, resumindo: o bônus demográfico ajudou o Brasil a diminuir a pobreza e a aumentar os níveis educacionais. O bônus demográfico feminino contribuiu para o empoderamento das mulheres. Eu queria mostrar que não houve a explosão demográfica no Brasil. Ao contrário, estamos vivendo o melhor momento demográfico da história brasileira. Mas e o futuro? O que vai acontecer? Nós vamos ter uma implosão demográfica? Muita gente argumenta isto: fala que, se a fecundidade cair muito, vai faltar gente etc. Usam muito esta expressão: apagão de mão de obra. Então, vamos ver a situação do Brasil hoje, com dados bem recentes da Pesquisa Mensal de Emprego: aqui, a linha azul é a população em idade ativa, que está crescendo, mas a população ocupada está estagnada e a taxa de ocupação está caindo. Esse outro aqui é para mostrar que, na Região Metropolitana de São Paulo - para vocês terem uma ideia, a Região Metropolitana é maior do que Grécia e Portugal juntos -, a população ocupada está diminuindo de 2010 para 2015. E, aqui, é o que chamamos de geração "nem nem" - os jovens que nem trabalham nem estudam -, e há em torno de 10 milhões de jovens de 15 a 29 anos que nem trabalham nem estudam. (Soa a campainha.) O SR. JOSÉ EUSTÁQUIO DINIZ ALVES - Eu vou acelerar um pouco. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS. Fora do microfone.) - Cinco minutos. O SR. JOSÉ EUSTÁQUIO DINIZ ALVES - São dados da PNAD Contínua de 2015 que, resumidamente, mostram que temos uma população de 203 milhões de habitantes, mas só há 92 milhões de pessoas realmente ocupadas e só 36 milhões de pessoas empregadas com carteira de trabalho no setor privado. Isso aí é para mostrar o seguinte: não há apagão de mão de obra no Brasil. Na verdade, há uma grande subutilização de mão de obra. Então, essa questão de falar que a fecundidade vai provocar uma escassez, pelo menos nas próximas décadas, está muito longe da nossa realidade. O verdadeiro escândalo que consideramos para o Brasil é isto: em 2012 - e em 2013 foi mais ou menos isso também -, foram 152 mil mortes por causas externas: homicídios, acidentes de trânsito e suicídio. O Brasil não precisa controlar nem aumentar a fecundidade, mas, sim, aproveitar melhor a sua força de trabalho, principalmente os jovens, além de reduzir a mortalidade por causas externas, especialmente a dos homens. Numa eventual escassez de força de trabalho, a imigração internacional pode ser uma opção mais efetiva do que o aumento da fecundidade. O Brasil não está caminhando para explosão nem para implosão demográfica. O que existe no Brasil é uma subutilização da força de trabalho, e a Previdência deve ser financiada pelo aumento da produtividade. Não é correto usar a dinâmica demográfica para argumentar contra a legalização do aborto no Brasil. Vilmar Faria, um grande sociólogo, já mostrou que há um efeito perverso: a gravidez indesejada acontece principalmente na população mais pobre, a população negra, a população com menor nível de educacional, que queria ou adiar a gravidez ou encerrar o tamanho da prole. |
| R | O estudo do Dr. George Martine, que fez um trabalho ainda na década de 90 estudando a questão reprodutiva no Brasil, aponta os seguintes pontos: a motivação para controlar a prole surgiu com a urbanização e a modernização; na ausência de programas de planejamento familiar, a fecundidade caiu devido principalmente ao aborto e, depois, à esterilização; antes de surgirem métodos modernos de anticoncepção, o aborto era o único método conhecido; em 1969, no Rio de Janeiro, 22% de mulheres jovens e pobres já tinham realizado pelo menos um aborto; quase todos esses abortos eram realizados em condições insalubres e perigosas; com o avanço do acesso das mulheres aos métodos contraceptivos e à esterilização feminina e masculina, o percentual de abortos caiu; mesmo assim, a recente Pesquisa Nacional de Saúde do IBGE, de 2013, reportou 7,6 milhões de abortos espontâneos e 1,1 milhão de abortos provocados, entre as mulheres de 18 a 49 anos; são as mulheres de baixa renda e baixo nível educacional as principais vítimas da falta de direitos reprodutivos. Esses são os dados da pesquisa, que estão disponíveis. Depois, vocês podem dar uma olhada. Para concluir, mostramos o seguinte: o aborto decorre da gravidez indesejada e não deve ser resolvido via uma gravidez forçada, mas, sim, como uma questão de saúde pública, na perspectiva do direito sexual reprodutivo, que, no âmbito da ONU, é o filho caçula dos direitos humanos. E, para finalizar, realmente, há os tratados internacionais, desde a CIPD do Cairo, em 1994, passando pelos ODM. Nesta semana a ONU vai definir os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável em Nova York - começa amanhã a Assembleia Geral da ONU. Houve a Conferência Regional, que aconteceu em 2014, no Uruguai, com a presença, inclusive, do Presidente Mujica, em que foi definido o Consenso de Montevidéu. Todos esses instrumentos falam da necessidade de alcançar o acesso universal à saúde reprodutiva. E é isto que é o fundamental: reduzir a gravidez indesejada, e, no caso de alguma falha, a questão deve ser resolvida no plano da saúde pública e não através de uma gravidez forçada. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, José Eustáquio Diniz Alves, Doutor em Demografia e Professor Titular de Mestrado e Doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas. Passo a palavra, agora, ao Padre Pedro Stepien, Diretor Nacional do Pró-Vida. O SR. PEDRO STEPIEN - Bom dia a todos. Bom dia, Presidente desta Comissão. Deputados, Senadores, todos que estão aqui, sou muito feliz, porque posso falar e defender aqueles que não podem se defender, aqueles que não podem pedir socorro. Eu sou polonês e trabalho, há 12 anos, aqui, nesta terra linda, com um povo ordeiro, pacífico, um povo humilde, um povo trabalhador. E fui convidado para esta Comissão de Direitos Humanos, que fala do aborto, da regularização do aborto - desculpe-me se não me pronuncio, estou aprendendo a língua portuguesa. Amo este povo. Queridos, o que é o aborto? Quando entrei aqui, eu quis passar este filme da realidade do aborto, dura realidade: O Grito Silencioso. São alguns minutinhos que mostram o que é o aborto, que mostram cenas da criança que quer se defender, que pede socorro, mas ninguém escuta a voz dessa criança. Sou muito triste, porque não podia colocar essas cenas da criança que grita. Esse filme se chama O Grito Silencioso. |
| R | A moderna tecnologia ultrassônica revela agora a reação de uma criança que está sendo abortada com 12 semanas. Vejam como uma criança ainda não nascida tenta escapar do instrumento abortivo! Seus movimentos podem ser vistos e se tornam desesperadamente agitados, e seu coração bate duplamente. O procedimento abortista é explicado em termos científicos pelo Dr. Bernard Nathanson, que, no início de sua profissão, dirigia a maior clínica de aborto do mundo e, agora, é um ardoroso pró-vida. O Dr. Nathanson dedica-se a expor a verdade sobre o aborto provocado. Trouxe muitas vezes os jovens a esta Casa, Senado, e Congresso, e fui expulso desta Casa do Povo. Quis mostrar a realidade do aborto, as crianças no ventre materno, a beleza da vida, o milagre da vida e também cenas chocantes que estão contidas neste filme. Para ser breve, porque não tenho muito tempo, preparei muita matéria, mas respeito o horário - pela democracia, devemos respeitar, podemos não concordar, mas devemos respeitar... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Só para orientar, o senhor tem dez minutos e, depois, mais cinco, como todos os convidados. O tempo é igual para todos. O SR. PEDRO STEPIEN - Eu quero citar o testemunho de uma senhora que se chama Amparo Medina, que saiu da ONU e revela tudo o que está acontecendo por trás da legalização do aborto no mundo inteiro. Após anos de trabalho para a ONU, a ex-agente denuncia a estratégia da organização para minar a fé católica e implantar o aborto em todos os países do mundo. Eu vou citar: Por trás dos projetos da ONU, atrás das palavras bonitas que usam quando falam de saúde reprodutiva, na realidade, há toda uma promoção do aborto e dos contraceptivos. É o único objetivo para toda América Latina. Na entrevista de Amparo à cadeia de televisão norte-americana EWTN, denunciava que no livro [...], editado pelas próprias Nações Unidas, se reconhece a promoção das relações sexuais com crianças desde os 10 anos. E que nele se explica claramente três coisas: - que os pais não devem ser informados da educação sexual que seus filhos recebem; - que as escolas devem distribuir contraceptivos a seus alunos sem o conhecimento e consentimento dos pais; - e que, se um professor ou médico chegasse a informar aos pais que seus filhos estão usando contraceptivos, esse professor ou médico deve ser expulso de seu trabalho por romper o sigilo profissional. Amparo, e não só ela, denuncia a existência de um todo um negócio em que não se desperdiça nada: promove-se as relações sexuais entre crianças e adolescentes, e se lhes vendem preservativos. Como estes falham, então se lhes oferece o aborto ou a pílula do dia seguinte. Como o aborto produz restos humanos, estes servem bem para a experimentação ou bem para extrair algumas sustâncias que depois se usam em cremes, xampus, etc. Negócio completo. |
| R | Não é preciso ser estudioso para saber que vida humana começa na concepção. Eu quero dar dois exemplos. Primeiro, o óvulo fecundado de um casal branco implantado no útero de uma mulher negra. Vai nascer uma criança branca. De um óvulo fecundado de um casal negro implantado no útero de uma mulher branca vai nascer uma criança negra. O Governo Federal infelizmente, o nosso Governo Federal, infelizmente, adotou política antivida e antifamília. Só para comprovar minha tese, cito dois exemplos. Em junho de 2002, o Governo brasileiro declarava, por intermédio do Secretário de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde, Helvécio Magalhães, que o sistema de saúde brasileiro passará a acolher as mulheres que desejam fazer aborto e a orientá-las sobre como usar corretamente os métodos existentes para abortar. Centros de aconselhamento indicarão quais são, em cada caso, os métodos abortivos mais seguros do que outros. E também a Ministra Eleonora Menicucci, da Secretaria de Políticas para as Mulheres, disse que somente é crime praticar o próprio aborto, mas o Governo entende que não é crime orientar uma mulher sobre como praticar o aborto. Sem comentário. Como legalizar a morte se queremos a vida? Como legalizar a morte dos inocentes se queremos a vida? Política absurda, mentalidade nazista. A palavra é forte, mas verdadeira. Esse filme conta em suas cenas fortes que a realidade é forte, a do aborto. Política absurda, política sem futuro. Nação que mata seus próprios filhos é nação sem futuro. Como nós queremos construir o futuro se matarmos futuras gerações na raiz? Como nós queremos construir um futuro melhor se permitimos matar a bênção da nação que são nossas crianças? Se permitirmos legalizar esse crime hediondo, nós perderemos moral para enfrentar qualquer tipo de violência. (Soa a campainha.) O SR. PEDRO STEPIEN - Se permitirmos legalizar esse crime hediondo, nós perderemos moral para enfrentar qualquer tipo de violência. Por isso continua a violência na família. Se não pararmos com esse genocídio silencioso, nós vamos ter problemas mais à frente com a saúde mental, psicológica e física das mulheres. Isso é muito sério. Isso é muito sério. Aborto é exploração máxima da mulher. Não se tem respeito nenhum pela mulher. A Ministra Eleonora Menicucci disse que somente é crime praticar o próprio aborto, mas que o Governo entende que não é crime orientar uma mulher sobre como praticar o aborto. Obviamente, não é o Governo brasileiro quem entende que orientar a mulher a praticar o abordo não é crime. É a Fundação Rockefeller e suas associadas que assim o entendem e que assim querem impor. Utilizam e escondem-se atrás do Governo brasileiro, fazendo-o apresentar como suas essas palavras ao povo, mesmo tendo conhecimento de que o Governo tem perfeita conhecimento de que o Governo tem perfeita consciência de que, não importa de onde venha o discurso, o povo pensa exatamente o contrário. O povo brasileiro é contra a legalização do aborto. |
| R | Ontem participei de um ato público e da vigília contra a legalização da maconha. Estou inteiro, cansado, mas muito feliz, defendendo o futuro da nossa Nação, defendendo os jovens. O Ministro Fux já falou que a maioria do povo não quer a legalização da maconha, da droga. O povo não quer. O povo não quer. Se existe democracia, a maioria decide. O próprio Ministro Fux disse isso. Vamos matar crianças. Se não conseguirmos, vamos dar maconha, crack, droga? Esse futuro nós queremos? Esse futuro nós queremos? Eu trouxe o nosso trabalho, os panfletos que salvaram muitas vidas. Nós temos centros de aconselhamento para mulheres. Por muitos motivos ela pode querer fazer aborto, mas na verdade, ela não quer. Ela não tem apoio do Governo, ela não tem apoio do povo. Falam: "Faça isso e se resolve o problema". Nós salvamos muitas crianças e vamos continuar. Esta Comissão, esta audiência mais me fortalece, mais me fortalece para defender os pequenos brasileiros. Eu, um estrangeiro, vim de longe para defender a Nação de vocês, uma Nação tão linda, tão bela, tão pacífica. Muito obrigado pela atenção. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Esse foi o Padre Pedro Stepien, Diretor Nacional do Pró-Vida. Concluindo esta Mesa, passamos a palavra para o Sr. Nazareno Vasconcelos Feitosa, que é integrante do Movimento Brasil Movida do Distrito Federal O SR. NAZARENO VASCONCELOS FEITOSA - Exmo Senador Paulo Paim, demais convidados, participantes, trabalhadores, todos que aqui se encontram, nós agradecemos a oportunidade de estar aqui, contribuindo com mais informações para subsidiar as decisões da Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal. Vamos ao objetivo, discutir a Sugestão nº 15, que regula o aborto - não é interrupção voluntária da gravidez, é aborto - nas 12 primeiras semanas de gestação dentro do SUS, ou seja, o SUS iria pagar pelo aborto. Eu quero confessar às senhoras que sou um feminista, só não sou abortista, é claro, como muitas feministas não são. Sou grande admirador do trabalho de vocês. Quantas conquistas fizemos, não é? Vocês fizeram! Vejam como a humanidade tem evoluído nos direitos humanos, fazendo sacrifícios. As mulheres, os negros, os índios, os criminosos, os judeus, os deficientes e os homossexuais já foram considerados pessoas inferiores. Então, quanta coisa boa! Não havia direito à liberdade, ao trabalho, ao voto, direitos individuais, sociais, coletivos, direitos dos animais, leis contra maus-tratos, a Lei Maria da Penha, que tem salvado tantas vidas, etc. Então, temos avançado muito. Hoje temos até o direito ao planejamento familiar, ou seja, não é negado. Hoje temos inúmeros métodos contraceptivos. Há a vasectomia, também a ligação de trompas, enfim, há até a pílula do dia seguinte, em que pese nós sabermos que há divergências sobre se ela é abortiva ou não. Vejam que os estudiosos dos direitos humanos dizem que eles caminham cada vez mais para a universalização, ou seja, para que cada vez mais esse universo seja ampliado, mais pessoas tenham direito aos direitos humanos. Mas e o direito à vida? Um ovo de crocodilo já tem proteção à vida, mas o embrião de um ser humano não tem ainda? Será que não é um paradoxo? Vejam que, nas questões jurídicas sobre as quais a doutora de Portugal vai falar muito bem, existe a antinomia entre os princípios. Qual deve prevalecer? Quando há princípios constitucionais ou princípios fundamentais, temos que ver qual é o mais importante ou o primeiro. Será que é mais importante o direito à vida ou a autonomia da vontade? Se quero matar alguém, quero assassinar, quero cometer homicídio, eu, que tenho a vontade, então, eu, que tenho a vontade, então a minha vontade deve prevalecer em relação ao direito à vida? Não, não é verdade? O direito à vida deve prevalecer. |
| R | Nós somos parciais, eu quero confessar a vocês. Eu, com ideologias humanistas, com filosofias espiritualistas, religiosas. Há cientistas contrários e, do outro lado, também há interesses financeiros, apoio do Governo atual, causas "feministas", entre aspas, porque nem todas são abortistas, cientistas a favor, médicos que querem lucrar também com a legalização do aborto no Brasil. Enfim, nós temos que dar esse desconto. Então, essas duas informações têm que ser analisadas. Agora, não podemos mentir nem omitir informações. O Governo deve orientar sobre quais são as consequências do aborto e as consequências da legalização do aborto. Não podemos usar mentiras nem falsos eufemismos. Não é a interrupção antecipada da gravidez. Depois da vigésima semana é parto prematuro. Antes é aborto. Não tem essa. Nós começamos a usar esses eufemismos. E isso é quase como a mentira disfarçada. Os riscos e consequências do aborto para a mulher, nós vamos ver aqui rapidamente, porque são muitas informações. As imediatas são risco de hemorragia, perfuração do útero, infecção, a infecção generalizada, que provoca a morte. As possíveis sequelas: câncer de mama, câncer de útero, aumento de câncer de ovário, gravidez ectópica, abortos espontâneos, partos prematuros, síndrome de Asherman e complicações tardias, frigidez, esterilidade. Nós vamos tirar um dos direitos da mulher, que é o direito à reprodução, de que vocês falam tanto, o direito reprodutivo, o direito sexual também, com a frigidez. Então, vejam como o aborto, na verdade, é ruim para as mulheres, não somente para as crianças. Se fosse bom, meus amigos, seria até mais fácil defender. Mas vejam só, questões psicológicas, a síndrome pós-aborto já catalogada, a queda da autoestima, o sentimento de culpa, a frustração. É poderoso o instinto materno. Então, o sentimento de culpa, muitas vezes, vai surgir, provocando transtornos psiquiátricos, ansiedade generalizada, neuroses diversas, síndrome do pânico, depressões profundas, dependência química, alcoolismo, sete vezes mais índices de suicídio observados. Essas são estatísticas americanas. Todas as fontes estão no nosso eslaide, que será disponibilizado no site do Senado. O período da menopausa é crucial. Aqui estão as pesquisas sobre câncer de mama - não poderemos ler todas por conta do tempo -, as questões da gravidez ectópica, tendências suicidas. São várias pesquisas, não é uma pesquisa isolada, sobre os vários métodos utilizados para o aborto, que são terríveis, trágicos. Não trouxemos fotos sobre o assunto, mas há a aspiração, a chamada extração menstrual com solução hipertônica salina, a própria histerectomia, enfim, uma série de complicações, inclusive tardias, provocando inclusive a isoimunização em pacientes RH negativo e partos complicados futuramente. Na criança, dores intensas - o feto é sensível à dor -, morte violenta, aborto de crianças vivas. Há crianças que nascem vivas, e têm que deixar morrer, colocar no incinerador ou até aproveitá-las para pesquisas e uma série de outras utilizações menos nobres. Sobre as crianças que nascem depois, vamos ter aborto de repetição no primeiro e no segundo trimestre de gravidez, partos prematuros, nascimento prematuro, parto difícil, gravidez ectópica, uma série de questões, além de malformações congênitas por causa de placenta imperfeita e morte perinatal por prematuridade extrauterina. Os prematuros sobreviventes são excepcionais, muitas vezes com paralisia cerebral e disfunções neurológicas. Então, isso tem que ser informado para as mulheres. Eu tenho certeza de que vocês todos são contrários ao aborto. Vocês podem ser a favor da legalização do aborto até a décima segunda semana, mas todos vocês são a favor da vida, disso eu tenho certeza. Se isso fosse mais divulgado, as mulheres pensariam duas vezes antes de cometer o aborto. Nós reduziríamos sensivelmente o número de abortos somente com essa esta mudança, Senador: estimular o Governo a divulgar que existem pesquisas mostrando todas as consequências negativas do aborto para a mulher, não somente para o feto. Então, vamos lá. As mentiras. Não se devem usar mentiras. Apesar da parcialidade, vamos tentar ser os mais isentos possível. O número de abortos clandestinos nós sabemos. O maior abortista do mundo, Dr. Bernard Nathanson, do filme O Grito Silencioso, ele próprio confessou, no Congresso em Madrid e também no livro América que Aborta, que os números eram multiplicados por cem, por mil, porque era interesse a todo custo, ou seja, a todo custo, ou seja, os fins justificam os meios. Eles sabiam disso. |
| R | No caso do Uruguai, aqui do lado, recentemente, um exemplo concreto, Senador. No primeiro mês de legalização, foram 200 abortos. Depois, 300 a 400. Ora, a estimativa de lá era de que haveria 30 mil abortos, não é? Onde estão os outros 29 mil? Em 2013, foram 4.400 abortos. Então, são hiperinflacionadas porque querem dizer que acontecem milhões de abortos no Brasil e morrem milhares de mulheres, o que não é verdade. Eu já fui a favor do aborto. Quando recebi essas informações de que milhares de mulheres morriam por causa do aborto, eu pensei: não, nós temos que legalizar. Mas não era verdade, era mentira. Muitas vezes, a maior causa de morte, como foi demonstrado aqui demograficamente pelo Datasus, enfim, a Senadora Heloísa Helena mostrou que 0,03% de morte materna é por conta de aborto. Então, nós estamos falando de um problema de saúde pública mínimo, se comparado com uma série de outros, que pode ser evitado com a prevenção, com o esclarecimento, com a divulgação das informações de pesquisa. A Drª Isabela Mantovani também mostrou que legalizar o aborto não diminui a mortalidade materna. O Chile reduziu imensamente, de 275 para 18 mortes. Na Índia, onde o aborto é legalizado, o índice de mortalidade materna é imenso: 200 em 2010. E onde é legalizado, como a Polônia, também reduziu de 11 para 2 em 2000. Nós precisamos defender as mulheres. O que diminui a mortalidade materna é assistência no pré-natal, no parto, no puerpério e depois. Nós temos aí a proposta do ex-Deputado Luiz Bassuma, que defende o que foi chamado de Estatuto do Nascituro por um erro, porque não é Estatuto do Nascituro. É o Estatuto da Mulher Gestante, é o Estatuto da Mulher, para defendê-la, para apoiá-la, para dar todo o sustento, todo o apoio, porque muitas vezes não é ela quem decide. Mais de 80%, diz a Doutora Lenise Garcia em pesquisas, são forçadas pela família, pelo marido, pelo pai, pelo amante, pela sociedade. Se fosse por ela, ela não abortaria, ainda mais porque se trata de uma prática clandestina que é perigosa, não é verdade? As mulheres do nosso País morrem por falta de acesso ao sistema de saúde oportuno. Crianças nascem tardiamente, não é verdade? Há falta de hospital, falta de leito, falta de médico, falta de recurso, falta de educação e de informação. Esse é o nosso problema. Precisamos defender as nossas mulheres. Quais são as consequências da legalização? Se legalizarmos o aborto, o que acontecerá? A primeira coisa seria como um grande pesquisador, um grande jornalista falou. Foi o Goulart. Não me lembro do seu primeiro nome. Ele disse: "Olhe, esse negócio de legalização das drogas é como a questão da corrupção". A corrupção existe há muito tempo e tem aumentado muito. Agora, basta desistir da corrupção? Não. Vamos legalizar a corrupção? Não, nós não vamos legalizar a corrupção. Vamos continuar lutando, continuar defendendo. Então, não é porque existe aborto que nós vamos desistir. Agora, vai legalizar? Isso é um contrassenso. Vai haver maior oferta, então vai haver maior demanda. Vai haver aumento do número de abortos, como em todos os países que legalizaram. Quando não houve aumento foi porque a estatística era intencionalmente hiperinflacionada, era aumentada para enganar o povo, para enganar o governo, para enganar a Suprema Corte, como foi nos Estados Unidos. Aumenta o sofrimento das mulheres, aumenta o número de DSTs e de AIDS. As pessoas usam preservativo não por causa da DST, mas para evitar a gravidez. Agora, se engravidar não tem problema. A pessoa pensa não tem nada, então mais casos de DSTs, mais casos de soropositivos HIV, uma doença muito grave. Com a sensação de que se é legal é moral, vai haver maior renda para médicos, para enfermeiras, para as clínicas. Vamos ter no Brasil uma indústria do aborto, com mortes acobertados, como o filme Blood Money - e o diretor esteve aqui - denunciou. Elas são acobertadas, porque a própria família tem vergonha de dizer que a moça vai fazer um aborto. E colocam no atestado de óbito outras informações. Há hospitais já compactuados com as clínicas. Possibilidade de aumento do comércio de órgãos. Foi filmado, recentemente, uma das diretoras do Planned Parenthood vendendo órgãos lá. Está no YouTube, disponível para todos. O maior gasto público com abortos. Uma participante daqui também mostrou como gastaríamos muito mais com o aborto. E não só com aborto, mas também com o tratamento das mulheres com depressão, com dependência química, com problema de suicídio, com transtorno de variada ordem, uma série de questões de gravidez ectópica. Todos os direitos da mulher e a sua saúde seriam afetados. As pessoas ricas continuarão buscando as melhores clínicas, não é? |
| R | Vão continuar nas melhores clínicas. Não vamos conseguir igualdade, não vamos todos para o SUS. Não, elas vão continuar indo para clínicas agora legalizadas. Haverá mais desgaste, Senador Paim, e rejeição para os partidos que adotarem essa bandeira. Então o PT precisa rever essa política, em que pesem todos os avanços. Nós admiramos muito os avanços sociais do Partido dos Trabalhadores, mas precisamos verificar essa questão. Diminuição da renda. Vejam que coisa curiosa. Vai haver diminuição até da renda das ativistas e das ONGs pró-aborto. Por quê? Porque na hora em que legalizarem terão conseguido o que queriam. Não precisam mais de vocês. Vamos desfazer a ONG de vocês. Não há mais necessidade. Vejam que até isso deve ser analisado. Vantagens, entre aspas. Maior facilidade de escolha. Não será inteiramente livre para decidir. Já disse a Drª Lenise Garcia. Redução dos abortos clandestinos. Sim, é verdade. Redução da natalidade, o que vai gerar um problema de previdência, segundo alguns. O doutor acaba de contestar, não é? Mas há informações nesse sentido. Vamos poder matar os bebês com mais segurança e o processo será legal. Essas são as chamadas vantagens. Agora, vejam que paradoxo! O Brasil recebe milhares de refugiados, de imigrantes estrangeiros. Isso é belíssimo! Mas o País não pode acolher as suas crianças que fogem da morte, nem as suas mães. Não pode ajudar as suas mães! Que país é este? O que precisamos fazer, Senador, é proteger e auxiliar as gestantes. Está lá o Estatuto do Nascituro? Não, o Estatuto da Gestante. O nome está errado. Eu já disse até para o Deputado Bassuma. Responsabilizar o pai. Há exames de DNA hoje. É fácil descobrir quem é o pai. Por que o pai não se responsabiliza? Por que ele não vai ajudar? Diminuir a mortalidade materna é simples, ampliar a Rede Cegonha, dar apoio às crianças com creches etc., ampliar os direitos da mulher. Ampliar os direitos da mulher! Apoio às mulheres gestantes e com crianças pequenas; campanhas publicitárias que mostrem os malefícios do aborto para as mulheres, não só para as crianças; campanhas que informem todo o apoio que o Brasil dará às suas mulheres, que o Governo dará às suas mulheres. Isso é importante. Agora se discute: bebê até a 12ª semana não é um ser humano? Ora... (Soa a campainha.) O SR. NAZARENO VASCONCELOS FEITOSA - ... a partir da concepção, o DNA... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Um minuto. O SR. NAZARENO VASCONCELOS FEITOSA - ... é de um ser humano. O DNA é uma prova fraca. É uma prova fraca? Não, o DNA já é de ser humano. Há várias correntes de pensamento divergentes. Há quem diga que na quinta semana já existem os primeiros neurônios, há quem diga que na oitava semana existe todo o sistema nervoso básico, com poucos dias um embrião já engana o sistema imunológico da mãe e com 21 dias, já começa a produzir neuropeptídeos, que é o sistema de comunicação entre o sistema nervoso, o endócrino e o imunológico, como defende a Drª Candace Pert com várias pesquisas. Pesquisas também com imprinting, modelo organizador biológico. Então, quem não sente dor pode ser morto? Não. É porque não sente dor. Mesmo que não sentisse, há várias pessoas que não sentem dor, como o paciente em coma, usando morfina, analgia, aquelas doenças raras em que a pessoa não sente dor alguma. Ah, então podemos matar? Ah, não, podemos matar. Ora, se há dúvidas, se há opiniões opostas, da ciência inclusive, no Direito Penal temos uma frase: in dubio pro reu. Será, Senador, que o bebê seria pior do que um criminoso? Para concluir, opiniões de algumas pessoas que lutaram pelos direitos humanos e contribuíram para um mundo melhor, mostrando que também os religiosos fazem a sua parte muito grande em favor dos direitos humanos. Gandhi vai dizer que "me parece claro como um dia de sol que o aborto é um crime." Madre Teresa de Calcutá vai dizer: "Um país que aceita o aborto não está a ensinar os seus cidadãos a amar, mas a usar a violência para obter o que querem". E é por isso que o maior destruidor do amor e da paz é o aborto. E Martin Luther King, o criador dos direitos civis, ele que vai fazer essa grande transformação dos nossos irmãos negros, vai dizer o quê? "O negro não pode ganhar nada enquanto ele está disposto a sacrificar as vidas de seus filhos por conforto e segurança. Como o nosso sonho pode sobreviver se assassinamos nossos filhos? Cada bebê abortado é como um escravo no ventre de sua mãe, onde a mãe decide o seu destino." Chico Xavier: "Se o anticoncepcional veio favorecer a movimentação das criaturas, por que vamos legalizar ou estimular a matança de crianças indefesas?" O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Seu tempo terminou, amigo. O SR. NAZARENO VASCONCELOS FEITOSA - Obrigado, Senador. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Para que possamos dar um tempo igual a todos. O SR. NAZARENO VASCONCELOS FEITOSA - O que desejamos para eles: a morte ou a vida? Obrigado, Senador. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Esse foi o Sr. Nazareno Vasconcelos Feitosa, integrante do Movimento Brasil Movida do Distrito Federal. Esta Mesa cumpriu o seu objetivo nessa primeira etapa. Vamos agora para a segunda Mesa. Convido os meus caros painelistas para retornarem à primeira fila. A placa, a assessoria vai colocar no lugar em que os senhores se sentarem. Eu vou chamar a segunda Mesa. Começo chamando Olímpio Barbosa Moraes Filho, Vice-Presidente da Comissão de Abortamento, Parto e Puerpério da Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia. (Palmas.) |
| R | Stela Barbas, Doutorada e Mestre em Direito, Professora da Universidade de Portugal. (Palmas.) Sejam bem-vindos! Chamamos a Coordenadora Geral do Movimento Católicas pelos Direitos de Decidir, Srª Maria José Rosado Nunes. (Palmas.) Convidamos agora a integrante do Movimento Pró-Vida de Campinas, São Paulo, Adelice Leite Godoy D'avila. (Palmas.) Sejam todos bem-vindos à nossa segunda Mesa. Todos acomodados? Começo, de imediato, com o Dr. Olímpio Barbosa Moraes Filho. O SR. OLÍMPIO BARBOSA MORAES FILHO - Bom dia a todos. Bom dia, Senador. Agradeço o convite para estar aqui. Só estou corrigindo, porque estou hoje representando a Febrasgo. Eu sou Vice-Presidente da Febrasgo, Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia. São 18 mil ginecologistas sócios da Febrasgo, que faz parte da FIGO, Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia. Tanto a Febrasgo como a FIGO são alinhadas com a Organização Mundial da Saúde. Então, estou aqui como médico. As ações médicas são baseadas em evidências científicas. O aborto é um problema de saúde pública, como foi dito aqui, porque mata as mulheres e causa sequelas. Eu vou falar como médico, não com crenças, mas com ações efetivas, como o mundo, a Organização Mundial de Saúde encara o problema e, automaticamente, como a ciência encara o problema do abortamento. Acredito que todos nós que estamos aqui temos um ponto de convergência. Como o colega Nazareno já falou, ninguém é a favor da morte, ninguém é a favor do aborto propriamente dito. Agora, a diferença que separa os dois grupos é como enfrentar o problema: se resolve ou dá resultado criminalizar a mulher, considerando que ela deve ir para a cadeia, ou tratar como a Organização Mundial da Saúde, como a Febrasgo, a FIGO e a ciência, baseadas nos trabalhos científicos, nas evidências científicas, têm encarado o problema. Os países desenvolvidos, que respeitam os direitos humanos, o direito à vida, também, tratam a questão totalmente diferente dos países em que não se respeitam os direitos humanos, como a maior parte dos países subdesenvolvidos. Eu estou aqui com o Padre, eu o ouvi. Ele é polonês, é da Europa, onde em praticamente todos os países, até mesmo a Itália, onde se encontra o Vaticano, o aborto é direito da mulher até doze semanas, como em Portugal também, como na América do Norte, e agora, recentemente, no Uruguai. Então, como é que nós, médicos, encaramos o problema? Quando o problema é tratado como saúde pública, ou seja, é permitido, como é o caso dessa proposta de lei de até doze semanas, o aborto passa a ser feito de forma segura. Quando é feito de forma segura, ou seja, no SUS, no Brasil, como seria o caso, essas mulheres são acolhidas e tratadas da melhor forma possível. Elas não vão ter as complicações que o Nazareno informou. É tudo verdade o que está naquele eslaide que o Nazareno mostrou. Cientificamente, a maior parte é verdade, mas quero esclarecer um problema que há ali. Trata-se de abortamento inseguro. O abortamento inseguro causa esterilidade, infecção, vários problemas para a saúde da mulher. Quando o abortamento é seguro isso não acontece. O que os psicólogos e psiquiatras que trabalham o problema dizem é que o maior dano para a mulher é tirar o seu poder de decidir, é decidir por ela, como foi colocado, porque tem a pressão do marido, de tudo isso. Mas, no final, cabe a voz dela. Colhendo todas as repressões, ela vai decidir o que vai fazer com a própria situação. Quando informamos que ela vai ser atendida no hospital, que ela pode procurar com segurança e ser atendida, ela vai sair do estado de vulnerabilidade, porque o que acontece hoje no Brasil... Eu trabalho num hospital... Eu sou Diretor do Cisam - Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros, da Universidade de Pernambuco. É a segunda maior maternidade do Estado de Pernambuco. |
| R | O nosso serviço, desde 1996, atende mulheres vítimas de violência e abortamento previsto em lei. Eu tenho 53 anos, sou pai de três filhos, casado com a mesma mulher, católico. E as pessoas que trabalham comigo são católicas. Há espíritas e ateu. E lá na maternidade acolhemos toda mulher por abortamento previsto em lei. Existe objeção de consciência. É respeitado. Há colegas nossos que não fazem. Um grande amigo meu, que é espírita, não faz aborto. Mas, como médico, ele tem o dever ético e médico de seguir as normas, os postulados de obstetrícia que são baseados em evidência. Ele acolhe a mulher, dá informações e respeita o direito dela. Ele não faz. Mas esses médicos internam e encaminham para os colegas que realizam o aborto previsto em lei. Isso é bioético e aceito. Nós não podemos confundir a nossa fé com a atividade médica. Do mesmo jeito que estou vendo aqui - e eu creio que há mais católicos do que de outras religiões - se um católico for atendido por um médico testemunha de Jeová, olhem o que poderia acontecer: seria ético você, num caso de um acidente automobilístico, precisar de sangue, o médico, que é testemunha de Jeová, não fazer a transfusão de sangue e você morrer porque ele é testemunha de Jeová? Então, o médico tem de respeitar o direito do outro, a autonomia do outro. Nós não podemos colocar as nossas crenças sobre a medicina baseada em evidência. Então, voltando, o mundo todo discorda do que completamente foi dito. Os dados mostram, na década de 70, 60... Na Alemanha, foi em 1930 que o aborto deixou de ser crime. Ficou até 12 semanas. Na Inglaterra, foi na década de 20. Nos Estados Unidos, em 70. Na França, em 72. Na Espanha, recentemente. E todos os dados mostram que, quando o aborto é tratado como problema de saúde pública, ele aparece. E começa o Estado a investir para que não aconteça. As mulheres vão à maternidade e saem com método contraceptivo seguro, porque elas não desejam gravidez. Quando o aborto é clandestino, ela resolve na própria favela, com as curiosas. E ela não vai ter acesso a um método contraceptivo seguro. Ela continua na vulnerabilidade. E os dados mostram que, em cinco anos, ela volta novamente a ter uma gravidez indesejada e a repetir o aborto. Então, eu quero dizer que todos nós queremos diminuir o aborto. A diferença é como enfrentar, não é? É como enfrentar o problema. Será que o mundo todo, será que há um conluio de todos os cientistas do mundo, da Organização Mundial de Saúde, que congrega 189 países de diferentes religiões, de pesquisadores no mundo todo, será que todos os países desenvolvidos? Quem está certo somos nós ao tratar a questão dessa maneira? Realmente, o Chile tem um bom exemplo. No Chile, é proibido o aborto, mas ele tem um sistema de anticoncepção muito efetivo. Concordo. Então, vou colocar por partes como é que os médicos brasileiros ginecologistas encaram o problema. Todos nós somos contra o aborto. Todos nós. Todos os médicos são. Eu sou a favor da vida. Eu sou a favor da vida. E os médicos que trabalham no Cisam, também. Então, como é que encaram o problema? Tem de haver educação sexual. Eu discordo assim. Da família, da escola, mas tem de tocar no assunto. Tem de trabalhar os adolescentes, para que eles não tenham uma gravidez indesejada. Não tem como. Isso está demonstrado em vários estudos. Educação, acesso aos métodos contraceptivos. Foi falado. Quando um médico atende uma adolescente que tem vida sexual, é dever ético do médico, se ele considerar que ela tem discernimento, guardar o sigilo médico. É a mesma coisa se eu for a um padre e contar um pecado. Ele vai guardar o segredo, mesmo que seja de um adolescente. Ele não vai quebrar esse segredo. Se quebrar esse sigilo da paciente, ele pode causar um mal, porque a paciente não retorna mais ao médico, não vai confiar em contar alguma coisa para o médico. Isso está garantido em lei e no Código de Ética Médica. Devemos agir dessa maneira e preservar o sigilo das nossas pacientes que têm vida sexual. Claro, se considerar que ela não tem discernimento ou que existe uma violência, como muitas vezes acontece, de estupro ou violência doméstica até, é dever do médico acionar o Conselho Tutelar. Mas o médico tem de verificar isso. Eu fico muito triste quando atendo na maternidade, que hoje está atendendo... |
| R | Hoje tem um caso: uma menina de 12 anos está para parir. Doze anos! Semana passada, uma de 14, o terceiro filho, terceira cesárea. Eu vejo o pré-natal realizado, e em nenhum momento o colega ou a enfermeira procurou saber o que está acontecendo na casa dessa família, com a menina de 13 anos. Quem é o pai? O marido, o namorado da mãe? E fecham os olhos, não dizem nada, não informam que é um caso de estupro, que é um caso de polícia. Nesse caso, sim, de entrar o Conselho Tutelar. Há o caso da menina de até nove meses que tomou Baygon. Duas vezes e foi internada. E você não faz nada? Como aconteceu, há quatro anos, com a D. Severina, na cidade de Caruaru, que foi violentada durante 14 anos pelo pai. Engravidou seis vezes, teve três abortamentos espontâneos e três filhos. Toda a sociedade de Caruaru - os médicos, a igreja e até a polícia - sabia, e ninguém fez nada. E, quando ela já estava trabalhando, o seu pai tentou violentar a filha mais velha dela, de 11 anos. Ela matou o pai e se entregou à polícia. O Estado de Pernambuco foi julgado, considerado culpado e paga indenização a ela. Então, creio que há muita confluência de interesses. Falta encarar como fazer isso. Eu espero que um dia o Brasil siga o exemplo dos direitos humanos que são adotados pelos países desenvolvidos. Eu quero que se diminua o número de abortos. Para quem trabalha, há 30 anos, em contato com essas pessoas... Eu estudei no colégio Marista. Se fosse 30 anos atrás, eu estaria torcendo por vocês dois. Mas quando você tem contato com o sofrimento, encontrar aquela menina, aquela mulher, mesmo que não seja, sentir a gratidão, o acolhimento de uma aquela pessoa humilde, desesperada, e lhe dar acolhimento, eu acredito que estamos salvando vidas, porque essas mulheres morrem. E essas mulheres que morrem não estão sentadas aqui. Com o devido respeito, Paulo Paim, se fossem as nossas filhas ou as filhas de Senadores e de Deputados que morressem de aborto, isso já tinha mudado. Como são mulheres que não estão sentadas aqui, são mulheres pobres... No Brasil, o aborto não é crime para uma parcela da população que faz aborto seguro nos hospitais. Discordo totalmente de que os médicos tenham interesse em ganhar dinheiro. Há, sim, os médicos que fazem aborto ilegal, que eu nunca fiz. Que continuem assim, porque eles cobram R$2 mil, R$3 mil. No dia em que o SUS começar a fazer, eles vão perder a sua fonte de renda. Um dos médicos mais ricos de Pernambuco, com haras, que, por sinal, é muito católico, faz aborto por R$3 mil, com aspiração, no seu consultório. E toda a sociedade sabe, mas ninguém vai prender, porque ele atende as amantes e filhas dos Deputados e dos Senadores, da população que tem direito. Se atendesse pessoas pobres, estaria preso. Então, eu fico triste por morar em um país em que ainda se discuta. Ouvi todas as frases que foram mostradas ali. São de pessoas muito respeitadas, mas todas religiosas. Agora, vou dizer uma opinião de médico, Presidente da Figo: as mulheres continuam morrendo não porque não saibamos como salvá-las na questão do direito reprodutivo. É porque nós, sociedade, ainda não consideramos importante salvar a vida dessas mulheres. Obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Esse foi o Dr. Olímpio Barbosa Moraes Filho, Vice-Presidente da Comissão de Abortamento, Parto e Puerpério da Federação Brasileira de Ginecologia - Febrasgo. Vamos agora, de imediato, à Drª Stela Barbas, Doutorada e Mestre em Direito e Professora Universitária em Portugal. Grande Portugal! Falei da Nicarágua. Tenho que render minhas homenagens também a Portugal. Grande parte dos nossos antepassados - até os meus, que vieram da África - passou por Portugal. Doutora, sinta-se em casa. A SRª STELA BARBAS - Muito obrigada. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Acendendo a luzinha verde, funcionou. A SRª STELA BARBAS - Funcionou. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - É isso. A SRª STELA BARBAS - Muito bom dia. Gostaria de começar por cumprimentar o Sr. Presidente da Comissão de Direitos Humanos. É um prazer e uma honra conhecê-lo pessoalmente. Quero cumprimentar todos os colegas da minha mesa e a ilustre audiência. Queria agradecer o convite que me foi feito e dizer que representa para mim grande honra estar, uma vez mais, a apresentar uma comunicação no Brasil e agora, em especial, no Senado Federal de um país que tanto admiro, a que me ligam fortes laços de amizade. E me orgulho de participar como oradora em inúmeros congressos, debates, aulas há mais de 15 anos. Cada vez mais me sinto em casa. E, se me é permitido dizer, eu me sinto em casa no nosso querido Brasil. Muito obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem. A SRª STELA BARBAS - Reconheço publicamente que pensei em diferentíssimas abordagens das que hoje apresentarei. Inicialmente, pensei numa comunicação com um pendor demarcadamente jurídico, atendendo à minha experiência profissional como professora universitária e jurisconsulta, mas, salvo melhor opinião, julgo que o enfoque dessa temática deve ser mais interdisciplinar, eu diria mesmo multidisciplinar e, consequentemente, chamaria à colação não o discurso religioso e o não religioso, porque, como já vimos, há religiosos que são a favor do aborto e não religiosos que são contra o aborto. Mas chamaria à colação o importantíssimo contributo da Ciência Médica, da Bioética e da Filosofia do Direito, áreas em que também modestamente milito. Iniciando, portanto, com um brevíssimo enquadramento jurídico, eu diria que a inviolabilidade do direito à vida encontra-se consagrada em várias constituições, em declarações, convenções, pactos e tratados internacionais. O art. 5º da Constituição Federativa do Brasil consagra esse direito à vida. Ao lado de ser um direito fundamental, esse direito à vida, consagrado no art. 5º, além de ser um direito fundamental, é uma cláusula pétrea, ou seja, direitos que não podem ser suprimidos da Constituição, nem por emenda constitucional. E o Brasil firmou ainda a Convenção Americana dos Direitos Humanos, mais conhecida como Pacto de São José da Costa Rica, que, no seu art. 4º, expressamente consagra - passo a citar: Toda pessoa tem direito de que se respeite sua vida, e esse direito deve ser protegido pela lei em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado de vida arbitrariamente. Fim da citação. E mais outros exemplos de legislação poderíamos trazer aqui à colação. |
| R | Bem, strict to the point, o ponto nuclear na audiência pública é de instruir a Sugestão 15/2014, que visa regular a interrupção voluntária - voluntária, voluntas, por vontade - de gravidez dentro das 12 primeiras semanas de gestação pelo SUS. Por exemplo, nós, em Portugal, é até as dez semanas. Nós aqui estamos a pretender interrupção até as 12 semanas, patrocinada pelo SUS. E eu perguntaria: interrupção do quê? Interrupção de quem? De que estamos a falar ou de quem é que estamos a falar? No fundo, no fundo, estamos a interromper a vida de um ser humano. Não há qualquer dúvida. Alguém tem dúvida de que estamos interrompendo a vida de um ser humano? Não estamos perante uma coisa; nós estamos perante um ser humano. Se não, não eram passadas dez semanas que essa coisa se transformaria em ser humano. Se assim não for, o que é isso? Durante essas dez semanas, qual o critério? Por que são dez semanas? São várias teses que procuram explicar a distinção entre ser humano e pessoa. E eu pergunto: mas há pessoas que não são seres humanos, e há seres humanos que não são pessoas? Em que ficamos? Há mil e um critérios que poderíamos trazer à colação, e eu admito publicamente que eu inicialmente era natalista na esteira do meu ordenamento jurídico e civilista. Em Portugal, só temos personalidade jurídica - não é questão final, é questão civilística - a partir do nascimento completo e com vida, só aí o Código Civil Português concede personalidade jurídica. Vejam a disparidade: por um lado a questão do aborto é partir de sistema. Estamos a interromper a tal vida, ser humano, pessoa, mas, para o direito civil português só há personalidade jurídica a partir do nascimento completo e com vida. Podemos ir mais longe: o anterior Código Civil, que vigorou até finais do século XX, exigia nascimento completo, com vida e com figura humana. O Código vigorou até finais do século XX. E o que é isso da figura humana? Quem somos nós para olhar para aquilo que sai nascido e considerar que ele tem ou não tem figura humana, que é pessoa ou não é pessoa? Porque ninguém duvida de que é um ser humano. Eu poderia trazer aqui à colação, várias teorias sobre a distinção do ser humano e da pessoa. Há quem diga que é confirmação do sistema nervoso central, organogênese. Há quem diga que é com viabilidade fetal. Há quem diga que é com concessão, porque é a partir desse momento em que se forma o código genético que nos vai acompanhar ao longo de toda a nossa vida. Mas há até quem defenda que nem sequer o nascimento é condição de atribuição do estatuto de personalidade jurídica. E são muitos os que ainda hoje defendem nem sequer o nascimento. É o estatuto para ser atribuída personalidade jurídica. Então, como é que seria a personalidade jurídica? (Soa a campainha.) A SRª STELA BARBAS - Seria aferida pelo critério da utilidade para a sociedade em que estamos inseridos. E uns até adiantam que, para se poder avaliar esse estatuto do início da vida humana, tem que se averiguar qual é a importância dessa vida para os demais, e, consequentemente, só seria pessoa humana a que for útil, ou seja, o critério pessoa humana como um critério tira e põe. Um débil mental, uma pessoa que está em coma - isso é defendido ainda hoje - deixaria de ter personalidade jurídica. É dignidade, senhores doutores, senhoras doutoras, ilustre audiência. É um valor que subjaz a todos os direitos fundamentais e a toda a ordem jurídica. |
| R | Nessa linha da orientação, eu pergunto o seguinte: hoje, dez semanas; provavelmente depois avançaremos para as 24 semanas. E em um futuro muito próximo, quiçá, até antes do nascimento, dias antes do nascimento... Ou mesmo após o nascimento. Infanticídio! Eu tenho aqui uma série de relatos ao longo da história, que, dado o adiantado da hora, vou passar à frente, em que as crianças, após o seu nascimento, eram avaliadas e verificavam se tinham os requisitos, se eram ou não eram perfeitas. E, em virtude dessa pseudoperfeição, o que e isso de perfeição, eram ou não eliminadas. Não vamos mais longe! Em pleno século atual, eu lembro os países onde hoje existe um elevado número de infanticídio feminino. Nós, porque somos mulheres, somos do sexo que não é o pretendido e somos colocadas nas jaulas da morte! Esse é um dado adquirido. Infanticídio feminino. Nós estaremos a caminhar para uma reedição de eugenia, ou do eugenismo. Francis Bacon, Galton, Thomas Morus. Em abertos horrores do eugenismo político, econômico e social, lembro ao longo da história, as medidas que foram tomadas pelos próprios Estados em torno da afronta à dignidade humana. Caminhamos para uma sociedade em que o ser humano deixa de ser o sujeito para passar a ser o objeto, uma coisa que se compra, vende, troca, manipula, joga fora, se rejeita, se descarta porque não tem as características procuradas... "Porque não é perfeito?" Mas o que é isso de perfeição? E quando o pai da criança quer o filho, mas nós, mulheres, não queremos o filho. O pai não tem o direito de ficar com o seu próprio filho? E por que nós é que temos o direito de decidir, e o pai não tem o direito de decidir sobre a vida do próprio filho, o direito à vida do filho? O direito à vida é um direito indisponível, e não é transmissível a outrem. Não existe um direito sobre a vida, mas sim um direito à vida. E, para terminar, eu diria simplesmente que referi, inicialmente, há imensa legislação no sentido da consagração da inviolabilidade do direito à vida. Todo ser humano tem direito à vida seja qual for a sua raça. Não vamos abrir portas! Não vamos abrir portas! Seja qual for a sua cor, não vamos abrir portas; seja qual for o seu sexo, não vamos abrir portas. Pensem na questão do sexo. Em Portugal, a interrupção voluntária da gravidez deu origem a uma generalização, a uma banalização, é recorrente... Quando o Estado não pode assegurar o aborto, o Estado paga, o nosso Serviço Nacional de Saúde, às clinicas privadas para fazer o aborto. São dados que podem consultar na internet! Eu digo, para terminar, agora apenas: nós todos, como seres humanos, temos direito a nossa vida, a nossa existência. (Soa a campainha.) A SRª STELA BARBAS - Não podemos ser discriminados pela cor, o sexo, a raça, mesmo que não tenhamos as características pretendidas. Independentemente das nossas diferenças, idiossincrasias gozamos de iguais direitos. Todos diferentes, mas todos iguais em direitos. Temos o direito às diferenças e a não sermos discriminados. Como dizia Ortega y Gasset, eu sou eu e as minhas circunstâncias. Cada ser humano é único e irrepetível, e é precisamente essa diferença que enriquece a humanidade. Minhas senhoras e meus senhores, é pertença da humanidade o direito à diferença e o direito pelo respeito ao direito à vida. Minhas senhoras e meus senhores, tenho dito. Muito obrigada. (Palmas.) |
| R | O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Drª Stela Barbas, Doutora e Mestre em Direito, professora universitária em Portugal, que aqui expressou o seu ponto de vista com toda a sua convicção. Agora, passamos a palavra a Srª Maria José Rosado Nunes, Coordenadora Geral do Movimento Católicas pelo Direito de Decidir. Eu só quero, antes que a senhora use a palavra, primeiro cumprimentar a doutora, pelo pronunciamento, como fiz a todos os outros, independentemente da posição de cada um, dizer que às 11 horas nós vamos ter a entrega, no plenário, do Prêmio Direitos Humanos, e eu sou um dos organizadores desse evento, até porque presido a Comissão de Direitos Humanos. Então, às 11 horas, provavelmente um outro Senador assumirá e eu terei que ir ao plenário, mas sintam-se como se aqui eu continuasse. Eu estarei lá participando, mas esse tema aqui é um tema de que eu estou cuidando com carinho, estamos falando de um debate que no Brasil é muito polêmico - muito polêmico. E todos nós temos a obrigação de construir aqui uma redação final que represente, efetivamente, o que a média de pensamento dos painelistas que aqui passaram colocaram. Então, eu já estou adiantando que, infelizmente, terei que sair daqui a alguns minutos. Por favor, Srª Maria José Rosado Nunes, com a palavra. A SRª MARIA JOSÉ ROSADO NUNES - Muito obrigada. Cumprimento aqui o Senador Paulo Paim, as pessoas aqui da Mesa, componentes da Mesa e todas as pessoas aqui presentes. Eu agradeço a oportunidade de estar aqui mais uma vez, especialmente, porque eu considero ser fundamental, em um país democrático, que nós multipliquemos os espaços de debate, especialmente em um momento em que tantas manifestações obscurantistas se manifestam na sociedade brasileira. (Palmas.) Nós vivemos tempos bastante difíceis. Eu sou socióloga, sou professora universitária, fiz meu doutorado na França, sou pesquisadora e professora na Universidade Católica de São Paulo. Mas não é nessa condição que eu me apresento aqui, eu estou aqui porque integro a coordenação, a direção do Movimento Católicas pelo Direito de Decidir. E quero referir um elemento, um dado do meu currículo que muito me orgulha: eu fui, entre outras mulheres brasileiras, indicada, há alguns anos, para o Prêmio Nobel da Paz. (Palmas.) Nós acabamos de ouvir uma enfática defesa do embrião, do feto. Eu farei a defesa da vida e dos direitos das mulheres brasileiras. A Profª Maria Teresa Blandón, da Nicarágua, do nosso país vizinho, mostrou a ilegalidade do aborto como instrumento de morte. É essa morte das mulheres brasileiras que eu não quero que continue a acontecer na escala em que acontece, entre outras razões, mas muito fortemente, pela ilegalidade do aborto em nosso País. E eu gostaria de iniciar falando da maternidade. Pode parecer estranho que, discutindo uma proposta que torna o aborto legal dentro de certos limites, eu proponha aqui trazer o tema da maternidade. Estranho, porque sempre que se debate a questão do aborto, esse aparece isolado do contexto maior do processo reprodutivo. A meu ver, não há como discutir e entender o significado e as consequências de se ter uma lei que regule a realização do aborto, a não ser entendendo em face do fato ineludível da capacidade que temos, nós mulheres, de fazermos novos seres humanos. Uma capacidade transcendental e única. |
| R | No entanto, para que a maternidade seja considerada em sua grandeza, é absolutamente necessário que compreendamos como resultado de uma decisão, de uma escolha, como uma opção entre tantas outras de realização das mulheres. Nós, mulheres, somos seres humanos com projetos de vida, seres de pensamento, seres de desejo e não podemos, sob hipótese alguma, sermos consideradas unicamente pela nossa capacidade de colocarmos, na comunidade humana, novos seres. Essa é uma das possibilidades que tínhamos... O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Doutora, permita-me. A SRª MARIA JOSÉ ROSADO NUNES - Pois não O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - O Dr. Medeiros é um mestre da área pública, é um grande Senador da República e atendeu meu apelo. Falei do tema. Tenho que abrir outra sessão sobre direitos humanos. De imediato ele disse: "Não, Paim, estou indo aí, conte comigo. Faço questão de acompanhar esse debate." Com muito orgulho, passo a Presidência para o Senador Medeiros neste momento. (Palmas.) Com certeza. Não se preocupem pessoal, que o Medeiros é mais democrático do que eu, inclusive. Dará todo o tempo necessário para o debate, até o meio-dia nós podemos ficar tranquilamente que o debate acontecerá, uma oportunidade de ainda algumas pessoas no plenário falarem. Estão em boas mãos. Um abraço para todos. O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Continua com a palavra. A SRª MARIA JOSÉ ROSADO NUNES - Então, como eu dizia, nós mulheres temos a possibilidade de sermos mães, mas essa é uma das possibilidades que temos em nossas vidas, está longe de ser a única. Ora, a maternidade, como ato plenamente humano, deve resultar, como eu disse, do desejo, da reflexão, e não ser apenas a realização de uma capacidade biológica, o que nos igualaria a animais reprodutores. Pensar assim não significa que toda gravidez não planejada, inesperada resultará em um aborto, ela poderá ou não ser assumida e levada adiante. A consideração das mulheres apenas como mães reflete um pensamento determinista de caráter essencialista. Lembro que as pesquisas mostram que a maioria das mulheres que abortam já são mães, elas têm filhas e filhos de quem cuidam e desejam continuar a criá-los e a criá-las, e é muitas vezes esse desejo que as leva ao aborto e tantas vezes à morte. Mas há, também, aquelas mulheres, cujos projetos de vida não incluem a maternidade, e, diante de uma gravidez indesejada, têm pleno direito de interromper esse processo gestacional. Só compreendendo, portanto, a maternidade como resultado de opção e de escolha é possível entender o alcance ético de uma proposta que permite às mulheres acederem a um aborto quando assim considerarem necessário. Quero ainda reafirmar o que tantas e tantas vezes já reiteramos e que o Dr. Olímpio também acabou de reiterar. Apoiar que haja no País uma legislação sobre o aborto não é banalizar a vida. A vida não existe na abstração das afirmações retóricas. O que existe é a vida de pessoas concretas, com seus problemas, suas alegrias, suas dores, enfim com suas vidas reais. Como bem lembrou o Dr. Olímpio, as mulheres, aquelas que mais necessitam neste País de que o aborto seja legalizado, são aquelas que não podem estar aqui, são as mulheres pobres e negras. Isso é a realidade. Quando falamos de aborto, este, como a maternidade, não existe no vazio. Nós estamos falando de mulheres que têm nomes, são nossa vizinha, a mulher que trabalha em nossas casas, nossa aluna na universidade, uma sobrinha, uma filha, uma namorada. |
| R | São dignas de apoio, de compreensão. São cidadãs brasileiras que devem ter suas decisões respeitadas, seus direitos efetivados por políticas públicas adequadas. Um segundo ponto que proponho à consideração de todas e todos é que, apesar do fato inegável de que o aborto se tornou, em nosso País, objeto de discussão pública, o que é muito bom, é sempre necessário voltar a algumas questões, especialmente, como já disse, em um contexto político em que há constantes ameaças de se violar a Constituição, retirando direitos democraticamente já conquistados. Uma dessas questões diz respeito ao alcance de uma legislação sobre o aborto. Uma legislação assim permite sua realização em certas circunstâncias e obriga o Estado a oferecer condições dignas e adequadas para que as mulheres não tenham sequelas ou morram nesse procedimento. Salva, portanto, a vida das mulheres, mas a lei não obriga qualquer mulher a realizá-lo. Depende do livre consentimento dela e pune responsáveis por um aborto realizado contra a sua vontade. Uma outra questão. Uma vez que, nas últimas legislaturas, temos visto uma crescente atuação política de Parlamentares vinculados a igrejas e grupos religiosos, gostaria de voltar a lembrar que o Estado brasileiro respeita constitucionalmente as religiões, assim como respeita todas as pessoas e grupos sem religião, ou ateus, ou ateias, e não pode, constitucionalmente, guiar-se por doutrinas e princípios oriundos de uma fé religiosa. Não nos enganam discursos... (Soa a campainha.) A SRª MARIA JOSÉ ROSADO NUNES - ... que se apresentam como vindos do campo científico. Por exemplo, as inúmeras pesquisas que reiteradamente nos apresentam e às quais poderíamos apresentar outras que apresentam dados exatamente opostos. Dizia discursos que se apresentam como vindos do campo científico ou do campo jurídico, mas escondem, na verdade, seu caráter religioso. Decisões no âmbito do Congresso Nacional afetam a vida concreta de todas as cidadãs e cidadãos deste País. O caráter laico do Estado é condição imprescindível para o pleno exercício da cidadania, para proteção dos direitos constitucionais à liberdade, à autodeterminação. Por isso, não se pode impor a toda a sociedade a agenda moral das religiões, traduzindo-as em políticas públicas destinadas a toda a sociedade. Isso seria violar a nossa Constituição. Muitos dos argumentos contrários à liberdade de decisão das mulheres no campo reprodutivo, embora se apresentem como do campo laico, são, na verdade, a expressão de uma doutrina e de uma moral religiosa específica. Nós, Católicas pelo Direito de Decidir, não escondemos que baseamos a nossa defesa da agenda feminista em um horizonte cristão. Por isso mesmo, dado que a nossa sociedade continua, majoritariamente cristã, e uma parte das e dos Parlamentares no Brasil seguem esse credo, retomo o princípio cristão, sempre reafirmado na Igreja Católica por teólogas, teólogos e pelos papas. Trata-se da proposição segundo a qual o princípio norteador de decisões em todos os âmbitos da vida é, em última instância, a própria consciência. |
| R | É o que fazem as mulheres que decidem abortar: pensam, refletem, discutem e decidem por aquilo que lhes dita a consciência, como melhor caminho naquele momento, como recorda um teólogo latino-americano. Para terminar, quero reafirmar que o aborto, antes de ser uma questão moral ou religiosa, é uma questão de justiça social, como já reiterado nesta mesa. A maioria das mulheres que sofrem as consequências da sua ilegalidade são as mulheres negras e pobres. É também uma questão ética de respeito à capacidade moral das mulheres de tomarem decisões sobre suas vidas, pautadas sobre valores e princípios religiosos ou não, que são legítimos e respeitáveis. O que queremos é o respeito às mulheres, a defesa incondicional das suas vidas. Essa é a defesa da vida que fazemos. Obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Com a palavra, a Drª Adelice Leite Godoy D'Ávila. A SRª ADELICE LEITE GODOY D'AVILA - Obrigada. Bom dia a todos; bom dia, Senador, em nome de quem cumprimento todos os demais membros da Mesa. Vou falar rapidinho, já de cara, porque o tempo é curto e tenho muita coisa. Uma coisa que sempre me chama a atenção em todas as audiências de que já participei é que muitas pessoas que defendem a legalização do aborto dizem o seguinte - e nesta audiência não foi diferente -: "Ninguém é a favor do aborto", ninguém é a favor do aborto, ninguém quer a morte do bebê, mas temos uma situação crítica, o aborto é ilegal, existe o aborto clandestino e precisamos, então, legalizar essa situação. Isso sempre acontece repetidamente. Muito bem. O que vou tentar demonstrar aqui um pouquinho para vocês é que isso, na realidade, não é verdade. Por quê? Porque as principais organizações promotoras do aborto, na realidade, o que querem é promover o aborto, não é, na realidade, simplesmente tratar do caso do aborto clandestino. Sei que, no Brasil, isso parece um pouco fantástico, as pessoas falarão "não, essa não é minha intenção, sou a favor do aborto e, na realidade, não é isso que tenho em mente". Só que, na realidade, é isso que as pessoas que controlam esse processo pensam. Na realidade, a intenção é promover uma reforma e não somente uma reforma da legislação do aborto, mas também da moralidade relacionada ao aborto. Vou explicar um pouquinho o que significa isso. Pensem o seguinte: se o objetivo fosse acabar somente com o aborto clandestino, somente a legalização já seria o suficiente, não precisaríamos fazer essa alteração de moralidade. Mas por que se fala da alteração da moralidade? Olha, se sou uma pessoa que sou favorável ao aborto e procuro uma clínica clandestina, não vou mudar de ideia porque o aborto foi legalizado, continuaria a fazer, agora legalmente. Até mesmo a pessoa que é favorável ao aborto, mas não quis fazer numa clínica clandestina, porque acha que isso não é correto, porque é um crime, uma vez legalizado, também vai fazer legalmente. Agora, para isso, não precisamos mudar a moralidade em relação ao aborto, porque, na realidade, o que se pretende é fazer com que o aborto seja mais aceito. O que você pretende é, de fato, banalizar o aborto de forma que aquela pessoa que via isso como sendo errado, passe a ver como não sendo um problema. Um dos objetivos é justamente a reforma dessa moralidade. Para que consigamos avançar um pouquinho nesse pensamento, vou falar um pouquinho para vocês como foi a liberação do aborto no Estados Unidos. Vejam que, nos Estados Unidos - e vocês não vão ouvir isso em audiências e não vou ouvir também na mídia, porque as pessoas não falam disso -, o aborto é liberado até o nono mês da gravidez. Você pode fazer um aborto até um dia antes do nascimento. Existem clínicas de aborto de terceiro trimestre. Então, isso é liberado até o nono mês. |
| R | Inicialmente, o aborto era proibido em todos os Estados norte-americanos. Alguns Estados passaram a liberar o aborto para algumas condições um pouco mais controladas, somente até três meses. Em 1970, o governador do Estado de Nova York era o Nelson Rockefeller. Ele criou uma comissão para estudar a liberação do aborto, e o aborto acabou sendo liberado no Estado de Nova York. Nos dois primeiros anos após a liberação dessa lei, mais de 400 mil abortos foram feitos no Estado de Nova York, e isso virou um escândalo público. Existem biografias que relatam que havia filas de carros na frente das clínicas. Isso fez com que a população norte-americana ficasse escandalizada, porque viu o absurdo daquela situação. Muitos Estados que estavam caminhando em direção à legalização retrocederam: "Nós não vamos mais legalizar o aborto." Não só não legalizar, mas começaram a fazer leis mais restritas. Só que, em 1973, um caso chegou à Suprema Corte dos Estados Unidos. Os juízes da Suprema Corte legislaram, praticamente. Eles, ao contrário do que muito bem explicitou aqui a Drª Stela, decidiram que não se podia dizer que havia vida antes do nascimento. Vou ler rapidamente a parte da sentença que trata disso. Eles disseram o seguinte: "A Constituição americana não define o que seja pessoa. O uso da palavra é tal que ela somente pode ser aplicada após o nascimento. Ao definir os cidadãos, a 14ª Emenda diz que são pessoas nascidas ou naturalizadas nos Estados Unidos. Nada indica que a palavra pessoa possa ter uma aplicação pré-natal possível. Tudo isso nos persuade de que a palavra pessoa não pode incluir os não nascidos." Vocês vejam que é justamente o contrário do que falamos aqui. Eles decidiram que um não nascido não era uma pessoa. Com base nisso, o aborto foi liberado, nos Estados Unidos, até o nono mês. O que isso causou? Várias clínicas começaram a ser montadas nos Estados Unidos, principalmente, clínicas de aborto tardio, abortos de terceiro trimestre, porque não existiam na época. Pergunto: vocês acham que clínicas de aborto de terceiro trimestre é política para acabar com o aborto clandestino ou é para promover aborto? Para que serve uma clínica de aborto de terceiro trimestre, quando a criança já é viável e já está quase a nascer, nós optamos por interromper a sua vida? Depois disso, ainda tivemos propostas um pouco mais ousadas. Recentemente, em 2012, dois cientistas, Giubilini e Minerva, fizeram um artigo publicado no Jornal de Ética Médica. O título do artigo é "Aborto pós-nascimento: por que o bebê deveria viver?" É uma defesa clara do infanticídio. Não posso entrar aqui nesse ponto, porque o tempo corre, mas, de qualquer maneira, justamente, depois, 12 semanas, vamos para 24, vamos para o infanticídio, e a coisa vai num crescendo. Aí vocês vão dizer: "Ah, mas isso é lá nos Estados Unidos. Aqui nós estamos discutindo 12 semanas." |
| R | Mas aqui, no Brasil, já houve uma proposta para liberar o aborto até os nove meses de gravidez. Só que ninguém vai falar para vocês que era isso. Por quê? Porque, no ano de 2005, foi colocado em pauta um Substitutivo do Projeto 1.135, durante o governo Lula, que liberava aborto até os nove meses. No primeiro artigo, ele dizia que o aborto era até 12 semanas, só que depois, no nono artigo ele revogava o art. 124 do Código Penal. O que diz esse artigo do Código Penal? É o artigo que justamente criminaliza o aborto, porque o aborto, mesmo o dito legal, é um crime, só não é punido. Então, você diz que vai fazer aborto até 12 semanas, mas aí você exclui o artigo do Código Penal que diz que o aborto é crime. Você liberou para nove meses. Só que quando a gente falava isso nas audiências públicas, as pessoas diziam que não. Mas é exatamente assim. Então, isso não é política pública para acabar com o aborto clandestino. Isso é política pública para promover o aborto. Mais ainda, alguns outros exemplos que nós temos. A Fundação Rockefeller, quando buscou difundir um pouco o método do aborto medicamentoso - e o que é o aborto medicamentoso? É aquele aborto em que você não vai fazer uma extração cirúrgica, você dar um medicamento para a pessoa. Quando eles estavam difundindo esse medicamento, houve um congresso justamente sobre aborto medicamentoso, e um dos principais assuntos tratados foi a facilidade de substituir... Na realidade foi como você consegue promover o aborto de segundo trimestre substituindo o aborto cirúrgico pelo aborto medicamentoso. E por que isso? Vejam bem, um médico, ao fazer um aborto, tem todo o problema, principalmente um aborto tardio, de segundo trimestre, existe ali uma pessoa, você perde a abstração do feto, aquilo deixa de ser abstrato e passa a ter feições de pessoa, principalmente com ultrassom. Então, à medida que o aborto é mais tardio, fica mais difícil para o médico fazer esse aborto. Então, existem médicos que não querem fazer, mas que não se oporiam ao aborto medicamentoso, porque isso tira, vamos dizer assim, essa personalidade do feto, esse parecer um ser humano. Então, vamos examinar a coisa de forma clara. Nós não estamos falando em acabar com aborto clandestino. Promover aborto de segundo trimestre não é para acabar com aborto clandestino, é para outra agenda, é para aumentar, promover o aborto. O Padre Paulo Ricardo, na última audiência, quando esteve aqui, já mencionou a respeito do relatório da Fundação Ford, que se chama Saúde Reprodutiva: uma estratégia para os anos noventa. Nesse relatório, a própria Fundação Ford diz o seguinte: nas décadas de 50 e 60, as fundações financiaram a pesquisa e o desenvolvimento de políticas públicas destinadas a reduzir as taxas de crescimento populacional. E essas políticas incluíam a oferta de serviço de planejamento familiar e de aborto. A partir dos anos 80, foi percebido que isso não era suficiente, e que o objetivo de diminuir o crescimento populacional, na realidade, não ia ser atingido. Por que isso era importante? Porque foi feito um relatório, Relatório Kissinger, que era de segurança interna dos Estados Unidos. E ali as pessoas atentaram para o fato de que, se a população continuasse crescendo, isso era um problema interno para os Estados Unidos, principalmente nos países pobres. |
| R | Então, o que era necessário fazer? Era necessário que você diminuísse o crescimento populacional. Então, o que aconteceu é que a Fundação Ford viu que, sem o aborto, isso não ia ser possível, você não ia ter uma redução e você não ia ter o crescimento populacional zero. Dentre outras coisas que a Fundação Ford fez, ela passou a promover uma organização que era ainda pequena, mas que, com esses investimentos, acabou crescendo, que é justamente a Católicas pelo Direito de Decidir. A Frances Kissling explicita isso muito bem na sua entrevista de 2002, onde ela diz o seguinte: que o que, na realidade, ela acredita que foi, vamos dizer assim, que catapultou esses investimentos, na realidade foi o fato de que ela reconhecia que os movimentos não podiam se limitar apenas a discutir a legalização, mas sim que era necessário questionar a moralidade do aborto. Então, vejam bem aqui o ponto onde nós queremos nos concentrar neste caso: se o objetivo de todos esses trabalhos fosse somente acabar com o aborto clandestino, por que é que seria necessário a gente alterar a moralidade do aborto? Conforme eu já falei antes: o objetivo é que você mude a opinião de quem é contrário ao aborto. Porque quem é a favor já é a favor. E um artigo que a Frances Kissling escreveu na revista Conscience intitulado O aborto deve ser mesmo diminuído?, ela critica... (Soa a campainha.) A SRª ADELICE LEITE GODOY D'AVILA - ... os militantes do aborto que dizem que o aborto deve ser fácil, barato, legal e raro. Ela diz: "Por que raro?" Veja bem, quando você fala que o aborto tem que ser raro, você está denegrindo as mulheres que fazem um aborto. Você está dizendo que deveria diminuir o número de abortos. Então, nós já vemos aqui isso muito bem explicitado na palestra da Drª Isabela Mantovani, que a legalização do aborto aumenta o número de abortos e não tem uma nenhuma influência na diminuição de morte materna, nem de aumento, e nós vimos também com a Drª Fernanda Takitani que o objetivo dessas fundações justamente é promover o aborto clandestino - promover o aborto, inclusive nos países onde ele é clandestino. E eu concluo justamente dizendo que isso não visa legalizar o aborto, na realidade essa é uma estratégia para promover o aborto. E nós somos um país soberano e não devemos ficar sendo controlados por uma elite globalista, formada pelas fundações, e, por mais que as pessoas fiquem falando para nós: "Ah, não, isso é teoria da conspiração", não, não é teoria da conspiração, porque todos esses documentos são públicos. O tempo que nós temos aqui para falar é pouco para a gente poder explicitar o que está por trás de toda essa documentação. Mas na realidade a estratégia é a promoção do aborto e não se tem por objetivo diminuir aborto. O objetivo é diminuir o crescimento populacional e promover o aborto. Eu agradeço imensamente pela oportunidade de falar para vocês e para todos na Mesa. Muito obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Como nosso tempo é curto e há bastantes pessoas para falar ainda, já vamos direto passar a palavra para o Dr. George Martine, que tem a palavra por três minutos. O SR. GEORGE MARTINE - Eu quase escapei a tempo. Realmente, essa discussão aí eu acho extremamente complicada. Eu não sou especialista em aborto, eu sou pesquisador nessa área de população, e um dos motivos por que eu vim aqui inicialmente é porque já fui citado numa sessão anterior por uma pessoa extrapolando - a partir das informações, dos estudos meus - para uma conclusão parecida com a que a última pessoa que falou aqui chegou, ou seja, que basicamente o aborto é a continuação de uma política imperialista visando à redução da fecundidade. |
| R | (...) para uma conclusão parecida com aquela a que a última pessoa que falou aqui chegou, ou seja, que, basicamente, o aborto é a continuação de uma política imperialista visando à redução da fecundidade. Pode até acontecer isso, mas é uma coisa muito secundária e marginal em toda a trajetória do crescimento populacional e das organizações que estão interessadas na redução da fecundidade. Na realidade, todos esses organismos que tiveram interesse na redução da fecundidade, em razão de interesses políticos próprios, promoviam o planejamento familiar até como uma forma de reduzir o aborto. Então, esse tipo de discussão tipifica um pouco o que estou sentindo aqui como um desvio ideológico que encobre uma tremenda ignorância. Escutei aqui, por exemplo, coisas do tipo: "A ONU é que promove o aborto." Se isso não fosse piada, se alguém dissesse isso seriamente, realmente seria preocupante. Trabalhei por 25 anos com a ONU. Trabalhei com a FAO, trabalhei com a OIT, trabalhei com a Cepal, trabalhei com a UFPA e, em nenhum momento, vi discutida a possibilidade de que a ONU estivesse favorecendo a prática do aborto. Quer dizer, não é porque deveriam ou não deveriam fazê-lo. Não estou discutindo isso. Estou discutindo o fato de que, quando as pessoas fazem esse tipo de afirmação, o resto da argumentação que estão fazendo... (Soa a campainha.) O SR. GEORGE MARTINE - ...fica realmente impossível de ser acreditada. Quer dizer, tem de haver um mínimo de respeito com a realidade, com a inteligência das pessoas, com o conhecimento científico. O mesmo ocorre quando começam a ligar aborto com a liberação da maconha. Nada tem a ver uma coisa com a outra, com as calças, como se diz. São coisas que fazem com que a gente duvide da inteligência das pessoas que estão defendendo determinados pontos de vista. Eu lamento muito isso. Então, acho que toda essa discussão aqui realmente carece de um embasamento um pouco mais objetivo, científico. É preciso deixar de lado essas informações absolutamente esdrúxulas, que complicam muito a discussão de um assunto muito sério. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Só quero informar que temos o Portal e-Cidadania. Está havendo uma audiência muito grande, pois as pessoas estão participando. Só nos últimos minutos, recebemos 278 comentários. A população está participando. Vou citar alguns comentários. Isabel Cristina diz o seguinte: "De novo esse assunto? Nada de aborto com dinheiro público ou com meu dinheiro! Se querem aprovar, cadastrem os contribuintes que se recusam a patrocinar assassinatos de bebês e deem o devido desconto de imposto para nós. E que os apoiadores paguem." (Palmas.) Segue-se nessa linha. Então, as pessoas estão participando, fazendo muitos comentários. Enfim, está um debate quente. Vou, rapidamente, passar a palavra para a Regiane Souza. A SRª REGIANE SOUZA - Bom dia a todos! Estou aqui para falar em nome das mulheres negras e pobres. Eu tenho 40 anos, eu vim da cidade do Rio de Janeiro. Fui violentada por um traficante de drogas. Isso ocorreu quatro anos atrás. Eu engravidei desse estupro e tive a oportunidade de ir até o hospital. A única coisa que o Núcleo de Apoio às Mulheres pôde fazer por mim foi me acompanhar até o hospital. Eu tenho uma filha, que está aqui presente e que é fruto de estupro. As pessoas falam sobre o planejamento familiar para a gente, para as mulheres negras e pobres. É só isso que a gente escuta. Mas, pela primeira vez, estou tendo a oportunidade de falar, porque sou negra, sou pobre e sou mãe. Optei por ter minha filha, mesmo ela tendo sido fruto de um estupro. |
| R | Se a gente tivesse um acompanhamento por ser negra e pobre, um planejamento familiar, não existiriam abortos em clínicas clandestinas, nem nada. Não tive o apoio de ninguém, não tenho o apoio do Estado, ninguém nunca me forneceu ajuda nem o acompanhamento correto. Fui desfeita pelo Cedim, do Rio de Janeiro, e pela Semira, de Goiânia. Moro em Trindade, em Goiânia, e vim para participar deste debate. Esta não é a primeira vez. Sou mãe. Estou um pouco nervosa porque o tema é meio polêmico. Todos que estão aqui, mesmo os que são a favor do aborto, têm mãe. Então, que refletissem em casa, olhassem para a sua própria mãe e falassem assim: "Hoje em dia, sou a favor do aborto, mas você foi a favor de me dar a vida." A vida é prioritária. Tenho minha filha, não tenho receio. Então, que os Estados fornecessem para as mulheres pobres e negras... Sempre isto está em debate. Quem não tem opção... Quem tem a opção de fazer aborto são as mulheres pobres e negras. Sou pobre. Infelizmente, sou muito pobre e não tenho acompanhamento de nenhum órgão. Passei pelo planejamento familiar, mas nunca ninguém me acompanhou, pela idade que têm minhas crianças. Tenho uma filha de 22 anos, participei de planejamento. O Estado fornece planejamento familiar só a partir da gravidez, mas não acompanha a família, não faz nada. (Soa a campainha.) A SRª REGIANE SOUZA - Se a gente tivesse um planejamento e se a mulher pobre e negra fosse acompanhada em toda a vida, a partir da gestação das crianças, não existiria aborto. Ou uma mãe que optasse por abortar seu filho... Acho que precisamos de uma oportunidade, por sermos pobres e negras. As pessoas pensam em fazer aborto porque são pobres ou negras? Não. Elas só optam pelo aborto porque o Estado não dá a oportunidade de elas sustentarem a criança. Sustento minha filha sozinha. Ela é fruto de estupro. E nunca ninguém me deu apoio nenhum, de forma nenhuma, principalmente o Núcleo de Apoio às Mulheres. Nunca me ligaram, nunca fizeram nada por mim, mas me levaram para o hospital para fazer o aborto. Quando optei por ela, a menina da Semira me disse que, se eu tinha optado pelo problema, eu tinha de ficar com meu problema, que a escolha tinha sido minha. Agradeço a oportunidade. Estou tensa. Muito obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - O seu nome é Regiane, não é? Regiane, isso é interessante. Você levantou um tema aqui que serve para fazermos outra audiência, que é o debate em torno da primeira infância. Penso que, se o Estado começar... (Palmas.) ...a pensar em investir na primeira infância, até do ponto de vista econômico, ele se dará bem melhor. O caso que você trouxe aqui, com certeza, serve como estudo de caso para refletirmos sobre políticas públicas nesse sentido. ORADORA NÃO IDENTIFICADA (Fora do microfone.) - Políticas para crianças de 0 a 6 anos. O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Exatamente. Vou passar a palavra, imediatamente, para a Paula Viana. Acertei o nome agora, não é? A SRª PAULA VIANA - Acertou. O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Paula Viana dispõe de três minutos. A SRª PAULA VIANA - Bom dia a todas e a todos! Sou Paula Viana, sou enfermeira há mais de 30 anos, sou parteira, tenho uma experiência muito grande com a saúde reprodutiva das mulheres. Tenho acompanhado grupos de formação de profissionais também que estão na ponta trabalhando com mulheres. Sou do movimento feminista também há quase 30 anos. Primeiro, eu queria dizer de alguns pontos. Vou tentar ser bem rápida. Em primeiro lugar, eu me senti bem ofendida aqui, primeiro, por ter sido igualada, como feminista, a uma pessoa que se disse feminista. Na verdade, estamos em caminhos opostos, porque o feminismo luta por igualdade entre homens e mulheres. E parece que esse caminho que traçamos são caminhos opostos. Outro ponto também me deixa preocupada: comparam-me, como mulher, a uma "crocodila". Fico ofendida porque a "crocodila" come seus filhotes. |
| R | Quando alguns correm perigo, ela escolhe e termina comendo seus filhotes, para dar qualidade de vida a outros. Então, eu também me sinto ofendida como mulher, quando se traz esse tipo de argumentação tão pobre. Vejo correntemente essas pessoas que considero pró-morte trazerem essas argumentações tão pobres, que desvirtuam tanto nosso caminho de trabalho. (Soa a campainha.) A SRª PAULA VIANA - Nós feministas somos e fomos quem desvelou o tema do aborto, o tema tabu do aborto no Brasil. E vimos fazendo isso sistematicamente. Nós tiramos os véus disso. Estamos falando disso. Parabenizo o Senado Federal por trazer este debate. Considero a fala do Dr. George e me incorporo à fala dele, quando ele diz: "Por favor, melhorem esses argumentos. Vamos tentar fazer um debate inteligente, baseado realmente no que acontece no Brasil." Nós não estamos manipulando informações e dados, como vocês manipulam. Infelizmente, a última fala desta Mesa trouxe várias inverdades, trouxe vários dados e informações completamente desvinculados da verdade. Espero que vocês, por favor, estudem e leiam para chegar aqui em condições de debater conosco. Trouxemos aqui especialistas. Desde a primeira audiência, trouxemos especialistas que trabalham com a saúde e que não têm essa posição que vocês, que dizem querer que esse assunto seja debatido com base no total respeito à inteligência das pessoas. Quero dizer à Regiane: "Que bom que ela pôde escolher!" É isso que nós queremos. (Palmas.) Nós queremos que as mulheres possam escolher. Apoiamos a Regiane ou quem for que queira escolher manter sua maternidade, seguir com sua maternidade, com qualidade de vida. É por isso que trabalhamos pela humanização do parto, pela melhoria do pré-natal. Um dos Objetivos do Milênio que o Brasil alcançou se deu na questão da mortalidade infantil. E isso não se deu de graça, não porque houve governo bonzinho ou mauzinho, mas porque os movimentos feministas e os movimentos de mulheres pela saúde estavam lá e ainda estão lá lutando pela qualidade de vida das mulheres. Obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Agora, tem a palavra a Drª Eliane Oliveira. A SRª ELIANE OLIVEIRA - Bom dia a todas e a todos! Sou pediatra neonatologista. Trabalho há 29 anos com recém-nascidos na Maternidade Escola Assis Chateaubriand, da Universidade Federal do Ceará. Sou professora de Embriologia na Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará. Acho importante citar esta informação, porque se desqualifica o discurso religioso de forma incorreta: o Estado laico significa que não temos uma religião oficial, que temos liberdade para acreditar e para desacreditar. Então, como pediatra que cuida de recém-nascidos e que estuda um pouco de Embriologia modestamente, o aborto mata uma criança vulnerável e incapaz, que não pode se defender. É um crime hediondo, que significa pena de morte para um inocente. É legitimar o homicídio sob a forma de aborto. O aborto desumaniza e coisifica a mulher, é fruto de uma visão de mundo hedonista, pragmática e utilitarista. O primeiro de todos os direitos humanos é o direito de viver. Os estudos são embasados tecnicamente, desde 1827, com Von Baer, o pai da Embriologia moderna, no fato de que a vida humana começa na fecundação, onde se define o sexo genético, o sexo cromossômico, onde existe o embaralhamento genético. |
| R | Com 21 dias de vida, o coração está batendo; com sete semanas, o bebê tem terminações nervosas em torno da boca. Quanto mais prematurinho o bebê, mais dor ele sente, de forma mais intensa e mais prolongada do que um adulto. Com oito semanas, o bebê tem todos os órgãos formados. Os embriões congelados podem ficar indefinidamente congelados. (Soa a campainha.) A SRª ELIANE OLIVEIRA - O Liam James ficou por 19 anos congelado. O aborto tem, sim, consequências físicas e psicológicas devastadoras para a mulher, para o homem, para a equipe de saúde. O Estado tem de acabar com a pobreza, e não com o pobre. O Estado tem de acabar com a pobreza, e não com o pobre. Os problemas decorrem de má gestão dos nossos recursos. O Estado tem de acabar com a pobreza, e não com o pobre. Mais de 80% da população brasileira são contra o aborto. Temos de promover uma cultura de respeito ao nascituro. Convoco toda a sociedade civil a comparecer à Marcha em Defesa da Vida contra o Aborto, que ocorrerá no dia 3 de outubro, no sábado, às 16h, na Praia de Iracema, em Fortaleza, no Ceará. Muito obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Só ressalto que esta audiência foi convocada pelo Senador Magno Malta, que, infelizmente, por um problema de saúde, não pôde comparecer. Mas ele está acompanhando a reunião via TV Senado. Quero passar, imediatamente, a palavra para Ângela Freitas. A SRª ÂNGELA FREITAS - Bom dia! Sou Ângela Freitas, sou socióloga, sou comunicadora social e trabalho em defesa dos direitos reprodutivos das mulheres há 30 anos. Quero aqui apoiar pessoas como Paula e como o Dr. Martine, que mencionaram a agressão à inteligência, à nossa inteligência, ao nosso discernimento em relação a algumas falas aqui, como se as mulheres brasileiras não fossem capazes de ter clareza a respeito do que pensam e do que querem para suas próprias vidas, não fossem capazes de perceber teorias conspiratórias que querem decidir por elas. Penso que é preciso olhar o aborto na sociedade brasileira como um fato que acontece na vida de todas as mulheres, independentemente de classe, de raça, de etnia, de condição social. Venho de uma família católica de seis filhos. As meninas foram educadas pelas Ursulinas e pelas Doroteias, e os meninos foram educados pelos Maristas e pelos Beneditinos. Transformei-me, sem saber dar este nome, numa "Católica Pelo Direito de Decidir", porque fui educada pela Igreja da Libertação, que nos ensinou a ter compaixão, a ter solidariedade. Nessa educação, eu não recebi informação sobre educação sexual, sobre contracepção, nem mesmo sobre o que era menstruação. Essas coisas nós aprendíamos com as colegas, com as amigas, com as vizinhas, conversando, e os laços de solidariedade eram grandes. Nós aprendíamos, logo cedo, que acontecia uma coisa com as mulheres que engravidavam sem desejar, sem querer, sem planejar, que era o aborto. (Soa a campainha.) A SRª ÂNGELA FREITAS - Então, do mesmo jeito que a menstruação, a vida sexual, os casamentos e os namoros aconteciam, aconteciam as gravidezes indesejadas. Eu tive experiência direta com isso, ajudando uma empregada doméstica, que engravidou indesejadamente, a abortar. Foi aí que aprendi que havia um dilema moral. Por solidariedade, por compreender que era uma questão humana de apoio a uma pessoa que, se não tivesse ajuda, ia sofrer risco de vida, fazendo malfeito, ajudei essa mulher a fazer um aborto com condições mais seguras. Minha vida seguiu, e entrei para um movimento que trabalha pelo direito de decidir. Nós não defendemos o aborto por eugenia. Não se trata disso. Não se trata de defender o aborto até a nona semana. Essa lei que estamos discutindo aqui não diz isso. Não compactuo com essa conspiração de que o que queremos fazer é algo que vá ferir o desejo das mulheres, a necessidade das mulheres e a condição de vida das mulheres. |
| R | Convido a companheira negra e pobre do Rio de Janeiro a visitar o Cedim. Eu sou Conselheira do Cedim pela Articulação de Mulheres Brasileiras e quero convidar veementemente essa companheira a uma visita, para que ela relate de que forma ela se sentiu agredida, a fim de que possamos democraticamente discutir a questão que ela sofreu. Defendo até a morte, se for preciso, que uma mulher que não deseja abortar nem mesmo filho de estupro não seja obrigada a isso. Mas também defendo que aquela que toma essa decisão possa fazê-lo em condições seguras. E muitas mulheres o fazem. Quero acrescentar à lista que foi apresentada aqui, das autoridades masculinas que têm acesso a aborto para suas filhas, namoradas e amantes, os padres. O Crime do Padre Amaro não é algo perdido na história. Também padres engravidam e também padres levam suas amantes, namoradas e esposas ocultas para abortar. Então, há uma hipocrisia nesse discurso. A última coisa que quero dizer é que, se há, sim, uma opinião pública sendo revertida neste País contra o direito das mulheres de decidir, há de se ver também que existe um tom de discurso profético contra o aborto que move consciências, que move consciências à base do apelo à dramaticidade e à criminalidade que se supõe existir aí. Nem mesmo na Nicarágua, o aborto é considerado crime hediondo. É considerado aborto e é encarado de maneira diferente do homicídio. O que acontece no Brasil? Não se respeita a Lei de Comunicação Social. Os meios de comunicação de massa estão nas mãos de igrejas, que fazem proselitismo religioso nos canais de concessão de rádio e de televisão. Há uma propaganda forte. E eu quero saber qual é a diferença entre financiamento para uma campanha antiabortista e redes nacionais e internacionais de apoio ao direito das mulheres de decidirem e saúde pública e defesa da saúde e da vida das mulheres. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Agora, com a palavra, o Dr. José Miranda de Siqueira. Estamos com o tempo realmente muito apertado. O SR. JOSÉ MIRANDA DE SIQUEIRA - Sr. Presidente, Senador José Medeiros, senhoras e senhores, em primeiro lugar, sou cidadão brasileiro, sou advogado e professor de Direito. Tive a honra de ser aluno da Prof. Stela no curso de doutoramento em Direito, em Portugal. Eu apenas queria pontuar, Presidente, um aspecto que não foi colocado aqui, embora a Professora tenha tocado na questão da inviolabilidade do direito à vida. Todos nós sabemos que a Constituição está em vigor. E o artigo da Constituição que declara a inviolabilidade do direito à vida é uma cláusula pétrea. Disso todo mundo sabe. Agora, talvez, aqui, Sr. Senador, não saibam a genética constitucional. Já que estamos falando de aborto, de feto, vamos falar um pouquinho de genética constitucional. Como nasceu o art. 5º da Constituição do Brasil? Nasceu através do que nós chamamos de poder constituinte originário. O poder constituinte originário, segundo o atual Ministro do Supremo Tribunal, professor de Direito Constitucional, que foi inclusive quem assinou a petição do aborto dos anencéfalos, o Ministro Luís Roberto Barroso, é o que há de mais sagrado em Direito Constitucional. Isso é o que diz Luís Roberto Barroso. Imagino que ele seja um grande jurista. Ele diz que nada é mais sagrado do que o poder. Por que ele diz isso? Porque o poder constituinte originário emana da vontade do povo brasileiro, da vontade popular. Quando fizeram a Constituição, em 1988, na Assembleia Nacional Constituinte, havia movimento a favor do aborto, movimento feminista, partidos políticos que defendiam a interrupção do aborto em qualquer situação. Todos os segmentos da sociedade civil brasileira participaram da Assembleia Nacional Constituinte através de seus Deputados constituintes. E, depois de árduo debate - basta ler, quem tiver interesse em conferir, o Prof. José Afonso da Silva, em seu Curso de Direito Constitucional Positivo -, tentaram... (Soa a campainha.) O SR. JOSÉ MIRANDA DE SIQUEIRA - ...aprovar a expressão "direito à existência digna", mas não conseguiram. O que se aprovou foi "inviolabilidade do direito à vida". Então, com todo o respeito, Sr. Senador, senhoras e senhores, qualquer discussão para tentar aprovar aborto no Brasil é golpe de Estado. (Palmas.) É um golpe de Estado tão grave quanto o da ditadura militar de 1964! E nós não podemos admitir! (Palmas.) |
| R | Parafraseando a nossa colega, eu não compactuo com conspiração e com golpe. Não posso permitir isso. Por último, Sr. Senador, pela ordem, eu gostaria de fazer um requerimento formal, como cidadão e participante desta assembleia. Um dos palestrantes, o médico Olímpio Barbosa Filho, fez uma declaração aqui - nós até o parabenizamos pela sua coragem - de que existe uma clínica clandestina de aborto em funcionamento hoje na cidade de Recife e de que o proprietário possui um haras e ganha muito dinheiro com isso. Ele cobra, se não me falha a memória, entre R$2 mil e R$3 mil por aborto. Então, requeiro, desde já, a V. Exª que conste em ata um requerimento para oficiar à Procuradoria-Geral do Ministério Público de Pernambuco, para que adote as medidas cabíveis, tendo em vista tratar-se de crime de ação penal pública, previsto no Código Penal. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Nosso tempo já está bastante extrapolado. A associação Católicas pelo Direito de Decidir foi citada e pede o direito de resposta após as intervenções. Vou conceder-lhe um minuto. Depois desse minuto, teremos de encerrar a reunião, porque tenho uma reunião agora e já não vou poder ficar aqui, infelizmente. A SRª MARIA JOSÉ ROSADO NUNES - Sou eu. O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Então, já fica concedido o minuto que tem. A SRª MARIA JOSÉ ROSADO NUNES - Seria outra coisa o minuto final. De qualquer forma, como Dr. George falou, houve muita mentira expressa aqui, e uma delas foi aquela que citou Católicas pelo Direito de Decidir, dizendo que a Fundação Ford nos apoia - isto é verdade, ela nos apoiou desde o início no nosso trabalho - e que ela nos apoia para promovermos o direito ao aborto. Disseram que temos interesses outros quando fazemos isso. Isso não é verdade. Nós somos transparentes no nosso orçamento da nossa ONG. Podem ver isso. A Fundação Ford sempre nos ofereceu recursos para que pudéssemos trabalhar com a agenda que temos. Ela nunca nos propôs a promoção do aborto. Outra coisa é a defesa da vida das mulheres, é a consideração de que, como disse muito bem e mostrou aqui com dados a Profª Teresa Blandón, a ilegalidade do aborto é um instrumento de morte. Portanto, não há lógica em se dizer defensor ou defensora da vida quando o que se defende, na verdade, não é a vida, mas princípios abstratos ou relacionados a concepções, inclusive, que se reclamam da Medicina e da Genética, mas que poderiam ser contestados... O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Doutora, pode concluir. A SRª MARIA JOSÉ ROSADO NUNES - ... por outro tipo de concepção, inclusive genética etc.. O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - O Dr. Olímpio foi citado e dispõe de um minuto. O SR. OLÍMPIO BARBOSA MORAES FILHO - Acho que não podemos ser hipócritas. Eu não sei qual é a cidade em que o senhor mora, mas, provavelmente, há uma clínica de aborto também na sua cidade, como existe em qualquer capital ou cidade com mais 50 mil habitantes. Eu não sei se vamos fazer isso no Brasil, porque assim muitas pessoas... Se você procurar quem são os clientes, vamos prender muitas pessoas, provavelmente amigos seus, amigos meus. O SR. JOSÉ MIRANDA DE SIQUEIRA - Felizmente, não tenho amigos que causam a morte de ninguém, doutor. (Manifestação da plateia.) O SR. JOSÉ MIRANDA DE SIQUEIRA - Graças a Deus, eu sou da vida e pela vida! Graças a Deus! O SR. OLÍMPIO BARBOSA MORAES FILHO - Então, é uma informação que uma colega... Peço só mais um minuto. É o seguinte: essa questão está errada, como eu disse. Não se trata de perguntar quem é a favor ou contra. Realmente, se se fizer uma pesquisa sobre quem é a favor do aborto, vou dizer que sou contra. Agora, se você perguntar sobre uma situação em que a mulher vai morrer, se perguntar se sou contra ou a favor, vou dizer que sou a favor. No caso de estupro, sou a favor. No caso em que vai causar um dano à saúde mental da mulher, em que ela não tem nenhuma condição de criar a criança? Essa é uma escolha dela. Sou a favor. Quando você faz isso, sobe o percentual para 70%, para 80%. E se pergunta à população brasileira em várias pesquisas: você é contra o aborto, mas você é a favor de que as mulheres sejam presas, tenham a pena de reclusão, como estão querendo, de três anos, de cinco anos ou de dez anos? Aí 70% da população respondem que não são a favor. Um deles é o próprio Senador Sarney, que foi perguntado sobre isso e disse: "Não! Sou contra a mulher ser presa". |
| R | Então, o que estamos discutindo aqui é se a maneira correta é colocar a mulher na prisão ou tratar isso como saúde pública. E se vai mais longe. Quando é perguntado se uma pessoa que você conhece deve ser presa - o senhor não conhece ninguém que provocou aborto; eu conheço várias pessoas, até padres -, quando se pergunta se mulheres amantes de padres ou outras mais da sociedade devem ser presas, 90% dizem que as pessoas conhecidas não devem ser presas. Essa questão deve ser tratada aqui sem hipocrisia. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Dr. Nazareno... A SRª ADELICE LEITE GODOY D'AVILA - Eu somente gostaria de esclarecer que, desde a Conferência de Glen Cove, que ocorreu em 1996, os comitês de direitos humanos da ONU passaram a atuar em relação aos direitos reprodutivos e passaram a trabalhar junto aos países onde havia o aborto não legalizado para legalizar o aborto. Muito me espanta, então, que o Dr. George tenha trabalhado na ONU tanto tempo e desconheça esse fato. O segundo ponto é que, quanto aos meus argumentos, eu gostaria de mencionar que os meus argumentos são frutos de muito estudo, mas é um estudo descomprometido, porque ele não é financiado por ninguém, além de mim mesma. Sou eu que financio este meu estudo. É por isso que não recebo dinheiro de fundação milionária, eu não recebo dinheiro de organizações que possuem clínicas de aborto. Então, o meu estudo é livre. Eu posso fazê-lo. E o compromisso que eu tenho naquilo que eu estudo é com a verdade, com a minha própria consciência e com o meu próprio discernimento. (Soa a campainha.) A SRª ADELICE LEITE GODOY D'AVILA - Por último, eu gostaria de dizer à D.Maria José que um bebê não é abstrato, ele é concreto. O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Peço que conclua, Doutora. A SRª ADELICE LEITE GODOY D'AVILA - Muito obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Dr. Nazareno, o senhor dispõe de um minuto. O SR. NAZARENO VASCONCELOS FEITOSA - Senador Medeiros, apenas como fui citado, eu quero deixar clara a nossa posição. Em nenhum momento, eu quis comparar nenhuma mãe, nenhuma mulher a um crocodilo. Apenas falei que o direito à vida e os direitos humanos progrediram tanto, que, hoje, um ovo de um jacaré recebe proteção de Estado, enquanto um ser humano, um embrião fecundado não recebe essa proteção. Essa foi a diferença. Eu não fiz nenhuma comparação. Desculpem-me se eu não fui claro na minha exposição. Eu apenas reforço que acho que nosso esforço aqui, Senador, é no sentido de buscar soluções. Existe um problema. Nós não podemos, realmente, continuar mascarando esse problema. Então, é preciso buscar soluções, com apoio à mulher, com apoio à mulher gestante. O Estatuto do Nascituro está em pauta, está tramitando neste Congresso. Vamos dar todo o apoio. Há a Rede Cegonha e tantas outras maneiras de prevenção e de informação. A população precisa saber das consequências que o aborto provoca em muitas mulheres. (Soa a campainha.) O SR. NAZARENO VASCONCELOS FEITOSA - Então, com educação, com esclarecimento, com prevenção e com políticas públicas, nós vamos conseguir o que tenho certeza que todos aqui desejam, que é a redução do aborto e da morte de todos, das crianças, das nossas mulheres, buscando a saúde das nossas mulheres também. O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Eu queria informar que os dados colhidos aqui servirão para instruir o relatório do Senador Magno Malta. Agradeço a presença de todos. Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada a presente reunião. (Iniciada às 9 horas e 11 minutos, a reunião é encerrada às 11 horas e 53 minutos.) |
