22/10/2015 - 33ª - Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. Bloco Oposição/PSDB - MG) - Bom dia, senhoras e senhores.
Havendo número regimental, declaro aberta a 33ª Reunião, Extraordinária, da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura.
A presente reunião destina-se à realização de audiência pública para instruir a Proposta de Emenda à Constituição nº 47, de 2012, que altera os arts. 22, 24, 61 e 220 da Constituição Federal, conforme o Requerimento nº 29, de 2015, CCJ, de iniciativa do Senador José Pimentel.
São convidados a essa audiência pública: o Exmo Ministro de Estado da Justiça José Eduardo Cardozo, que será representado pelo Exmo Sr. Gabriel Sampaio, digno Secretário Nacional de Assuntos Legislativos;
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o Dr. Marcus Vinicius Furtado Coelho, eminente Presidente Nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, que será representado pelo eminente Dr. Renato da Costa Figueira, Conselheiro Federal da OAB; o Exmo Sr. Deputado Estadual Sandro Locutor, Presidente da União Nacional dos Legisladores e Legislativos Estaduais, que será representado pela Deputada Ana Maria do Socorro Magno Cunha, do PSDB do Estado do Pará, Vice-Presidente da Unale, e pelo Deputado Fernando Capez, do PSDB de São Paulo, Presidente da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo e também Presidente do Colegiado de Presidentes das Assembleias Legislativas.
Justificaram sua ausência o Exmo Sr. Ministro Francisco Cândido de Melo Falcão Neto, Presidente do egrégio Superior Tribunal de Justiça, e o Professor Dalmo de Abreu Dallari.
Convido para que tomem seus lugares à mesa os eminentes debatedores desta audiência pública: o Secretário Nacional de Assuntos Legislativos, Dr. Gabriel Sampaio, do Ministério da Justiça, o eminente Dr. Renato da Costa Figueira, Conselheiro Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, e os eminentes Deputados Estaduais, Deputada Ana Maria Cunha e Fernando Capez, representando respectivamente a Unale e o Colegiado de Presidentes das Assembleias Legislativas dos Estados.
Por gentileza, assumam seus lugares.
Antes de dar início, queria cumprimentar todos os presentes, de modo especial, os Deputados Estaduais de diversos Estados da Federação que aqui se encontram e a Deputada Distrital Celina Leal, eminente Presidente da Câmara Distrital de Brasília, que nos honra, mais uma vez, com sua ilustre presença, a qual muito agradeço, nesse tema que é tão candente para as Assembleias Legislativas e para os Deputados Estaduais de todo o Brasil.
Agradecendo muito a presença de todos os eminentes convidados, informo que, de acordo com o art. 94, §§2º e 3º, do Regimento Interno, a Presidência adotará as seguintes normas: cada convidado fará sua exposição e, em seguida, abriremos a fase de interpelação pelas Senadoras e Senadores eventualmente inscritos. A palavra às Senadoras e aos Senadores será concedida na ordem da inscrição. Os interpelantes disporão de três minutos, assegurado igual prazo para a resposta do interpelado, sendo vedado interpelar os membros da Comissão.
Igualmente concederei a cada expositor o prazo de 15 minutos para a sua exposição sobre a PEC 47.
Desse modo, havendo a aquiescência de todos, passo a palavra, em primeiro lugar, ao eminente Presidente da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, Deputado Fernando Capez, para sua exposição, pelo prazo de 15 minutos.
O SR. FERNANDO CAPEZ - Exmo Sr. Senador, Prof. Antonio Anastasia, em nome de quem cumprimento e saúdo todos os Senadores aqui presentes e membros da Comissão de Constituição e Justiça; minha querida colega, Deputada Ana Cunha, 1ª Vice-Presidente da Unale, representando nosso estimado colega Sandro Locutor, que não pôde estar aqui, uma vez que está com outras dezenas de Deputados Estaduais num compromisso em Milão, em que está havendo um debate mundial sobre o papel dos Poderes Legislativos dos Estados em seus respectivos países, e que, por essa razão, aqui se faz representar, com muita honra, pela nossa Deputada Ana Cunha.
Quero cumprimentar aqui os Presidentes de Assembleia, todos os Presidentes de Assembleia, nas pessoas do nosso querido Deputado Josué Neto, Celina Leão, que, inclusive, é 1ª Vice-Presidente do Colegiado de Presidentes das Assembleias, e Márcio Miranda, do nosso querido Estado do Pará. Amazonas, Pará, Brasília, aqui representados.
E cumprimento, também, os Deputados do meu Estado, na pessoa do Deputado Delegado Antonio Olim, que veio comigo e que está enfrentando um problema lá de briga entre a Polícia Civil e a Polícia Militar no nosso Estado. Temos que ter muita sabedoria para caminhar com isso.
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Bem, a nossa manifestação vai ser bem objetiva e vai ser feita a partir do parecer do Senador Antonio Anastasia. Como eu já havia tido oportunidade de falar na semana passada, o parecer foi percuciente, lógico, preciso, substancioso e retirou alguns pontos que eram muito duvidosos na proposta original, que chegou aqui em 2012, subscrita por 15 assembleias legislativas. A primeira proposta de emenda constitucional, após a Constituição Federal, subscrita por assembleias legislativas. Nos termos da Constituição, por mais da metade das assembleias.
O parece é perfeito, preciso. Na verdade, a partir desse parecer, o que nós desejamos é fazer valer o primado do princípio federativo em nosso País. O art. 1º da Constituição Federal diz que o Brasil é uma República Federativa, unindo portanto a forma de governo republicana com a forma de Estado Federação. Como se sabe, pela forma de Estado Federação, essa forma pressupõe distribuição de competências entre os entes federados.
E por uma razão ou outra, critérios que não cabem aqui novamente ser debatidos, quando da elaboração da Constituição Cidadão, em 5 de outubro de 1988, data de sua promulgação, a competência dos Estados acabou ficando espremida entre a competência dos Municípios. Como dizia o saudoso Senador Governador e Prof. André Franco Montoro, as pessoas moram nos Municípios, não moram nos Estados. Então, tudo o que é de peculiar interesse, que mexe mais proximamente com a vida das pessoas fica a cargo das câmaras municipais.
A União, por sua vez, ficou com todos os outros grandes temas. E os Estados, com a competência residual. Então, nós poderíamos, obviamente, numa simplificação, mas que retrata hoje a realidade constitucional em que vivemos, a União fica com tudo, exceto o interesse peculiar dos Municípios. E, tirando o interesse peculiar dos Municípios, tudo o que restar fica com os Estados.
Por óbvio que nós não estamos aqui procurando legislar em defesa de setores, de competências de assembleias legislativas. Estamos todos na função pública de passagem, por onde nos encontramos. Na República, somos todos meros comodatários de um espaço público por tempo determinado. Então, quando nós estamos discutindo isso, não são deputados estaduais discutindo em defesa dos seus mandatos, até porque, o Senador José Serra até aconselhou não falar isso, mas, na realidade, muitos talvez não estarão mais nos cargos de deputados estaduais quando entrar em vigor essa proposta de emenda constitucional. É algo importante para o País. O principal problema que hoje atravessa o País é hoje a insegurança jurídica, a instabilidade de regras, de normas. Isso decorre muitas vezes de uma natural demora na produção das regras legislativas pelo tamanho, pelas dimensões continentais de nosso País.
Por essa razão, foi feita essa proposta de emenda constitucional. E, eu diria, por um capricho do destino, Deus acabou por abençoar essa proposta de emenda constitucional porque ela tem bons propósitos. E quis o destino que ela fosse distribuída a um homem da cultura humanística, jurídica, geral, política, histórica, como o Senador Antonio Anastasia. Quando esteve no encontro de presidente de assembleias no Estado de São Paulo, S. Exª impressionou todos com um discurso longo, substancioso, cheio de detalhes, rico em informações a respeito da evolução histórica do processo legislativo constitucional em nosso País.
Fica, a partir do parecer do Senador Antonio Anastasia, a análise dos seguintes pontos - de maneira bem resumida, aquilo que é essencial no espírito da proposta de emenda constitucional.
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O art. 22 da Constituição Federal dispõe sobre a competência privativa da União. A diferença entre competência privativa e competência exclusiva é que a competência exclusiva não pode ser delegada, ao passo que a competência privativa, por lei complementar federal, pode ser delegada aos Estados. Então, o art. 22 disciplina e elenca os temas de competência privativa da União. Para que os Estados possam legislar sobre esses temas, será necessária uma lei complementar federal que venha a outorgar genericamente aos Estados essa competência.
Pois bem, esse art. 22, Senador Anastasia, traz 29 incisos, e nesses 29 incisos, mais ou menos 50 temas de competência da União. O que a Proposta de Emenda à Constituição nº 47, de 2012, está pedindo? Desses 50 itens, distribuídos em 29 incisos do art. 22, a PEC postula que os Estados possam legislar concorrentemente, sem retirar a competência da União, concorrentemente e somente se o tema for de predominante interesse regional. Portanto, de todos esses itens, apenas cinco itens basicamente, de quase 50, a PEC pede que sejam transferidos para os Estados.
Quais são esses itens? No inciso I, é competência privativa da União legislar sobre Direito Civil e continuará sendo. A PEC não pede transferência de competência sobre Direito Civil. Direito Comercial, do mesmo modo, continuará sendo competência privativa. Direito Penal, do mesmo modo, continua sendo competência privativa. Direito Eleitoral, Marítimo, Aeronáutico, Espacial e do Trabalho, todos continuam competência privativa da União. Desse inciso I, o que se pede é apenas a competência concorrente para legislar sobre Direito Processual e Direito Agrário.
Uma observação: a Constituição em vigor já permite que os Estados legislem sobre procedimento, mas não sobre processo. Agora, a diferença entre processo e procedimento, os juristas, os processualistas estão há mais de 50 anos, desde que Enrico Tullio Liebman introduziu o processo no Brasil, estão discutindo o que é processo e o que é procedimento. Então, processo é sequência de atos processuais mais relação jurídica processual. É um conceito muito abstrato. Procedimento, a mera sequência de atos.
Os Estados podem legislar sobre procedimento. Mas por exemplo, jamais se aceitou que o Estado, que a Constituição Federal autoriza a legislar sobre procedimento, jamais se cogitou de ele fazer alguma regra de natureza procedimental no inquérito policial, para agilizar a tramitação do inquérito, de acordo com as peculiaridades regionais, de acordo com o volume de inquéritos, com o índice de criminalidade que afeta determinado Estado. Claro que a realidade criminal no eixo Rio-São Paulo, o número de crimes, o tipo de crimes que são praticados difere de outras regiões do Estado. Há uma grande concentração de crimes, o que pode demandar uma disciplina específica sobre o procedimento de inquérito policial.
Nós temos, por exemplo, no Estado do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rondônia, Roraima, Amazonas, Acre, talvez uma tramitação mais rápida, que recomende inquéritos que apurem danos ambientais, crimes contra o meio ambiente, já que lá se encontra a reserva ecológica, o patrimônio ecológico de todo o mundo.
Então, quando se fala em competência concorrente para que os Estados também possam legislar sobre processo, é a possibilidade de o Estado, junto com a União, legislar sobre itens que serão, na maior parte, procedimentais e desde que haja um interesse predominantemente regional.
Nós estamos aqui tentando disciplinar... Nós temos hoje o problema... O Senado em boa hora aprovou a proposta de emenda à Constituição incluindo como Direito Civil e garantia individual de todo cidadão o Direito Civil a um processo terminar em um prazo razoável.
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Há Estados em que, por exemplo no Estado de São Paulo, você leva dez anos, doze anos, para que o processo termine de ser julgado em segunda instância. Existem 24 milhões de processos! Pessoas aguardando a solução de 24 milhões de processos! A um custo, Senador, de R$13 bilhões por ano para manter a máquina do Judiciário em funcionamento.
Pois bem, dos 24 milhões de processos, 14 milhões são execuções fiscais. E execuções fiscais que poderiam não ser judicializadas. Nós poderíamos estabelecer um procedimento prévio de conciliação em que o Estado, o Município e até a União - já que por lá tramitam, na Justiça Estadual, execuções de débitos federais... estabelecer um procedimento prévio de convocação dos devedores, parcelamento dos débitos, protesto, para só então ingressar com a execução fiscal.
Esse é um tema, é só um exemplo, não estamos debatendo sobre isso. Mas, se o Estado for mexer nesse tema - nós estamos tentando legislar - já surgem inúmeras dúvidas quanto à constitucionalidade. Isso é procedimento? Ou isso já é processo?
Então, nesse item I, a competência concorrente para os Estados legislarem sobre Direito Processual - e desde que seja interesse predominantemente regional - seria o interesse da sociedade, da população que mora no País, no Estado e nos Municípios que integram esse Estado.
O 2º item do inciso I - são só cinco -, Direito Agrário. As questões agrárias normalmente estão concentradas no âmbito do Estado. E o Direito Agrário tem relação direta com o Direito Ambiental. Então, o Direito Ambiental, Deputada Celina - a senhora que está fazendo uma revolução na Câmara Legislativa de Brasília -, é tema de competência concorrente, já é estabelecido pela Constituição. E o Ambiental e o Agrário, como os senhores sabem, muitas vezes se tangenciam - quando não se misturam. Então seria apenas uma complementação. Como, aliás, ressaltou, repito, o primoroso parecer do Senador Antonio Anastasia.
(Soa a campainha.)
O SR. FERNANDO CAPEZ - Procurando avançar e sem abusar do tempo, já que o importante aqui é passar a mensagem, no inciso XI - trânsito e transporte -, competência concorrente. Hoje o transporte na região metropolitana dos Estados que congregam mais de um Município, nobre Senador, é um tema que fica... não é mais do Município, porque as pessoas não moram mais em cidades, as pessoas hoje moram nas regiões metropolitanas, com o transporte coletivo integrado. O Estado poderia ter a condição de legislar sobre transporte e trânsito. Sempre competência concorrente, desde que haja interesse predominantemente regional.
E normas gerais de licitação. A contratação que vai ser feita pelo Estado - enquanto pessoa jurídica de direito público - por uma sociedade de economia mista estadual, por uma empresa pública estadual, pelo princípio da Federação, deveria ser regulada a partir de uma legislação própria dos Estados. Tema que, aliás, não passou despercebido pelo preciso parecer do Senador Antonio Anastasia, que retirou, repito, excessos - que é forçoso reconhecer - que existiam na proposta original.
Bom, eu tive - nosso querido representante do Ministério da Justiça - o cuidado de conversar com o nosso Ministro da Justiça que é, além de Ministro da Justiça, um emérito e festejado administrativista. É um dos grandes professores de Direito Administrativo e um profundo conhecedor desta matéria. E o Ministro se declarou - e não me pediu sigilo - favorável. Disse que para a Federação é útil e é importante. E tenho certeza de que, ao receber o voto do Senador Anastasia, foi decisivo na formação desse conceito.
E aí vem o art. 24. Nós mexemos no art. 22 - que trata da competência privativa da União -, levando esses cinco itens para a competência concorrente, e mexemos no art. 24: "Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre" - ficaria, então, na proposta do Senador Anastasia - "matéria processual".
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Onde diz, no inciso XII, "previdência social e defesa da saúde", acrescentar-se-ia assistência social, normas gerais de licitação, trânsito, transporte e Direito Agrário.
E a proposta, que é fantástica, no parecer, define o que são normas gerais. O que são normas gerais? Vai deixar para a doutrina? A doutrina nunca construiu um conceito seguro sobre o que são normas gerais. Então, define-se, aqui no §2º do art. 24, que "normais gerais são aquelas que versam sobre princípios, diretrizes e institutos jurídicos".
Agradecemos ao Senado Federal o carinho, a atenção e o espírito democrático, porque nós estamos aqui falando em nome de mais ou menos - um pouco mais do que menos - mil Deputados Estaduais, que falam diretamente com suas bases. Ficamos muito impressionados com a atenção, com o carinho, com o tempo que tivemos para expor este ponto de vista. Nós, das Assembleias Legislativas, pedimos socorro. Viemos aqui representando a população que os senhores representam, representam os Estados e representam a população que mora nesses Estados.
Nós viemos aos senhores pedindo socorro. Esta pauta aqui - já no meu encerramento - contém 867 projetos parados, travando a Ordem do Dia. Foi quando eu assumi, no dia 15 de março, a Presidência da Assembleia Legislativa de São Paulo: quase 900 vetos parados na Ordem do Dia. Não é possível que um Poder Legislativo, que consome recursos, que está representando a tripartição de poderes dos Estados, legisle sobre tudo que ele legisla e verse um veto por algum argumento de inconstitucionalidade. Isso não é do interesse do Estado e não é interesse dos senhores, brilhantes Senadores que honram esta Casa.
Obrigado pela atenção. Em nome de todos os Deputados Estaduais, quero manifestar gratidão à composição atual do Senado brasileiro. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. Bloco Oposição/PSDB - MG) - Muito obrigado, eminente Presidente Fernando Capez, que além de ser um político festejado, vitorioso, como todos conhecem, é também um dos mais famosos, vitoriosos e competentes professores de Direito do Brasil. Receba nossos cumprimentos pela sua belíssima exposição.
Antes de passar a palavra ao Secretário Nacional de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Dr. Gabriel Sampaio, eu queria também cumprimentar o eminente Deputado Márcio Miranda, que preside a Assembleia Legislativa do Estado do Pará. Está aqui o nosso Senador Flexa Ribeiro, que representa o Pará com tanto garbo e tanto denodo. A delegação do Pará foi a mais expressiva na semana passada e está também hoje aqui em grande número, Senador Flexa, demonstrando esse carinho pelo tema. Quero saudar também o Senador Ataídes.
Passo a palavra, por 15 minutos, ao Secretário Nacional de Assuntos Legislativos, representando o Ministro Eduardo Cardozo, que vai também dar a sua versão sobre o tema. Muito obrigado, Dr. Gabriel.
O SR. GABRIEL SAMPAIO - Muito bom dia a todas e a todos! Gostaria de agradecer as palavras do Senador, nosso ilustre Governador Antonio Anastasia, que também teve uma passagem brilhante pelo Ministério da Justiça, um histórico político e acadêmico que muito nos orgulha; Deputado e grande Prof. Fernando Capez, a quem trago um abraço especial do Ministro, pela amizade de anos com V. Exª; Deputada Ana da Cunha, também as nossas deferências; nosso colega advogado, Renato Figueira, a quem também faço os meus cumprimentos; a todos os Senadores presentes, Parlamentares, e ao público.
Agradeço imensamente a oportunidade de tratar de um tema tão bem tratado aqui, e justamente por engajar não só os representantes de 15 Assembleias Legislativas, ter aqui no Senado Federal um brilhante relator e um trabalho exaustivo de discussão, demonstra o nível da sua importância, o quanto ela remonta para aspectos mais elementares e vivos da nossa própria história. Toda vez que nós discutimos o federalismo brasileiro, nós nos encontramos com aspectos bastante peculiares e ligados às raízes históricas do nosso País.
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Nós, dentro da América Latina, tivemos um formato nacional que foi capaz de se distinguir em relação à colonização feita pela América espanhola. Tudo isso permitiu que tivéssemos um país continental, com uma origem de Estado mais similar àquele formato unitário, que conseguiu dar uma unidade nacional a esse tamanho continental de Nação, e, por isso, trouxe também uma peculiaridade na nossa formação de federalismo. Se, de um lado, falamos num federalismo estadunidense, que surge a partir de um movimento ao centro, um movimento centrípeto, no nosso País, formamos uma Federação com esta característica de um Estado unitário que foi essencial para construir essa nação continental. E não posso deixar de fazer o parêntesis que isso também custou muito sangue de pessoas com o fenótipo parecido com o meu. E, para acumulação de muitas riquezas do nosso País e construção desse Estado, tivemos muitas dores para que conseguíssemos construir e alimentar a Colônia com tantas riquezas e, com esse poder e essa forma, até em alguns momentos autoritária, que esse nosso federalismo se constitui.
Também está explicado um pouco por essa natureza, que também tem um traço autoritário, que tenhamos nesse movimento do centro para reconhecer a autonomia nas nossas unidades políticas, alguns pontos, e aqui o mais claro, de disfunção desse sistema em que precisamos amadurecer para construir um novo cenário, um cenário que, de fato, como bem colocou o nosso Prof. Fernando Capez e o que o Relator também reconhece em seu relatório, que, evidentemente, o espaço dos Estados da Federação fica realmente defasado dentro de uma compreensão de Estado federal que valorize de forma equilibrada cada um dos seus entes. É importante fazer essa observação, porque, na nossa história, se explica também esse elemento.
Nesse sentido, a nossa contribuição traz esse viés de compreensão, essa necessidade premente de que as unidades da Federação e o nosso País desenvolvam esse debate. Tanto a proposta original - e faço um elogio especial - como o parecer do nosso Relator Antonio Anastasia nos trazem elementos bastante importantes, pois reconhecem, de um lado, a forma federativa também no seu aspecto de cláusula pétrea, de fundamento do nosso Estado democrático de direito e, portanto, dentro dessa nova formatação que se propõe aqui respeitado um aspecto essencial da competência privativa que, há possibilidade inclusive de delegação. Acho que, nesse aspecto, teremos um debate importante a ser feito do ponto de vista republicano, que é como se dará esse elemento da aplicação ou da criação das normas, como o Deputado Fernando Capez bem colocou.
Vou trazer apenas como paralelo o exemplo do parágrafo único do art. 23, que não diz respeito às competências legislativas, sabemos, diz respeito às competências materiais da Constituição, mas um exemplo que, desde 1988, para cá, dentro desse arranjo legislativo em que se permite que seja tratado na essência maior da forma federativa entre União, Estados e Municípios, numa distribuição de competência, só tivemos uma legislação, uma lei complementar que expressasse essa possibilidade constitucional de que as unidades da Federação tratassem dessas competências materiais.
Penso que, do ponto de vista desta discussão da competência legislativa, é necessário que o debate continue, inclusive, para que tenhamos delineamentos a respeito de como ele vai se materializar nas legislações.
E, aqui, enfim, até para respeitar o tempo e, em alguma medida, trazer uma contribuição a esse debate, acho que um dos que vai nos exigir maior esforço é o debate a respeito do Direito Processual.
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Como o professor bem colocou nas lições dele, acho que nesse ponto, inclusive porque a Casa tem um debate muito importante sobre o novo Código de Processo Penal... Aliás, sobre os dois códigos processuais. O Senado Federal deu uma demonstração bastante importante e histórica, inclusive, em relação ao tema processual, porque trouxe a iniciativa de dois códigos para esta Casa legislativa. É um tema que, na nossa história dos códigos, foi uma inovação, uma inovação que já ocorria ao tempo em que o nosso Ministro já ocupava o cargo em que hoje se encontra e viu com muito bons olhos o movimento do Legislativo - o Senado Federal, no caso - ter a iniciativa de trazer à sociedade o debate sobre novos códigos processuais, tanto o Código de Processo Civil quanto o Código de Processo Penal. Então, esta Casa, por ter trazido esse debate, que sempre teve a iniciativa do Executivo - até em alguns momentos que não eram democráticos -, tem uma legitimidade especial para que esse debate seja aprofundado.
Isso é muito importante porque, quando nós lidamos - falo mais por ser minha área de formação, e há aqui um professor para me corrigir caso cometa algum deslize teórico -, por exemplo, com Direito Processual Penal, certamente, o desdobramento dessas normas tem um impacto muito grande do ponto de vista legislativo - isso já seria muito claro -, mas também uma dificuldade especial para conseguirmos delimitar o quanto dessas normas, como bem colocou o professor, pode ser encarado como normas procedimentais; ou o quanto dessas normas, até do ponto de vista processual, por conta da sua imbricação com direitos materiais, pode, de fato, ser tratado em legislações que possam ter algum nível de disparidades ou divergências; o quanto um prazo criado dentro de uma unidade da Federação pode ou não ter a imbricação com o direito de defesa, com a duração razoável do processo, como isso vai para além das demandas e da predominância dos interesses regionais, que é a marca e o fio condutor dessas normas. Como elas vão dialogar com esses preceitos fundamentais e com esses direitos fundamentais? Em que medida a norma vai poder ou vai ser encarada como uma norma essencialmente do interesse regional ou uma norma que tem uma relação tão direta com direitos e garantias fundamentais, que, então, ficaria sob aquilo que deveria ser tratado como norma geral.
Esse é um desafio que reputo essencial até para que nós possamos, a partir do momento da promulgação da emenda constitucional, ter uma clareza na compreensão por parte das unidades da Federação e da própria sociedade para que possamos, a partir dessa clareza, dispor de regras que fortaleçam essa iniciativa constitucional.
Portanto, entendo que este é um debate muito importante. Esta Casa tem toda legitimidade, inclusive por ter sido iniciadora dos debates dos códigos processuais. E faço um destaque de que, inclusive em um tema que bastante me debruço, que é o Código de Processo Penal, esta Casa deu uma contribuição fundamental. O Código hoje tramita na Câmara dos Deputados, mas traz avanços fundamentais do ponto de vista de um código adaptado aos direitos e garantias insculpidos na nossa Constituição, harmonizando um processo penal de origem em 1941, que, a partir da iniciativa do Senado Federal, pode ser tratado como iniciativa adaptada à Constituição e às convenções das quais o País faz parte.
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Portanto, delimitar esses espaços vai ser fundamental para que tenhamos, a partir de promulgada essa emenda constitucional, a clareza por parte de todos em relação a como essas normas vão se desdobrar.
Acho que o de mais essencial em relação aos nossos pontos, além de louvar a iniciativa feita pelas assembleias o relatório do nosso Governador, é trazer essa contribuição e reforçar o nosso papel nesse debate instrumental, naquilo que for necessário pelo Ministério da Justiça em contribuir com essas discussões, com esses debates, com as Assembleias Legislativas naquilo que for necessário. É nosso papel e dever trazer todo apoio institucional para a iniciativa.
Em relação aos pontos que nos digam respeito e que possamos conjuntamente evoluir no debate, também nos colocamos à inteira disposição.
Parabenizando, então, pela iniciativa as assembleias, nos colocando à disposição e agradecendo, mais uma vez, o convite para esse debate. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. Bloco Oposição/PSDB - MG) - Agradeço muito as palavras lúcidas, proficientes, que demonstram um grande preparo do nosso Secretário Nacional de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Dr. Gabriel Sampaio, a quem peço leve os cumprimentos ao eminente Ministro de Estado, Dr. José Eduardo.
De fato, como havia dito há pouco o Prof. Fernando Capez, é o desdobramento exato das ponderações feitas por S. Exª o Ministro, que o Dr. Gabriel, de maneira muito clara, aqui demonstrou.
Meus cumprimentos. Agradeço muito suas palavras que me lembraram também de minha passagem saudosa para mim do Ministério da Justiça.
Antes de dar a palavra ao eminente Dr. Renato da Costa Figueira, Conselheiro Federal da OAB pelo Estado do Rio Grande do Sul, que representa S. Exª o Dr. Marcos Vinicius Furtado Coêlho, que é o Presidente Nacional da Ordem, eu gostaria de indagar novamente ao eminente autor do requerimento, Senador José Pimentel, que é o Vice-Presidente da Comissão, se não quer assumir a presidência, senão, posso ser acusado de usurpação de função, e não gostaria jamais de ter sobre mim essa espada, e da mesma forma saudar o Senador Randolfe.
O SR. JOSÉ PIMENTEL (Bloco Apoio Governo/PT - CE) - Senador Antonio Anastasia, eu quero primeiro registrar que a condução dos trabalhos por V. Exª é o que tem de melhor nesta Casa. Por isso todos nós nos sentimos perfeitamente atendidos com a sua presença e com a sua coordenação.
Além disso, V. Exª é o nosso Relator e ninguém melhor que o Relator para estimular os nossos expositores a contribuírem com esse tema que é de interesse nacional. E nós precisamos ter uma unidade, para que na próxima quarta-feira possamos votar. Está em boas mãos a condução dos trabalhos.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. Bloco Oposição/PSDB - MG) - Muito obrigado, Senador Pimentel.
Passo a palavra ao Dr. Renato da Costa Figueira, eminente Conselheiro Federal da OAB, pelo prazo de 15 minutos.
O SR. RENATO DA COSTA FIGUEIRA - Preclaro Senador Antonio Anastasia, que com tanto saber preside esta Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do colendo Senado Federal, ao saudá-lo, seguramente estou a saudar a coletividade, a comunidade jurídica do Estado de Minas Gerais. E V. Exª, como representante do Estado de Minas, seguramente representa a coletividade jurídica nacional, pelo prestígio, pelo saber, pela imedida cultura de V. Exª.
Consequentemente, cumprimento ainda também o eminente Professor, Deputado, Presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, jurista Fernando Capez.
Também quero saudar o eminente advogado Dr. Gabriel Sampaio que engalana a Secretaria do Ministério da Justiça e que, há pouco, se fez ouvir.
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Eminentes Senadores da República, nobre e culto Plenário aqui presente, eminente Senador Anastasia, fui designado para o honroso mandato que pretendo e me esmerarei para cumprir, representando aqui a Presidência do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, mandato este me outorgado pelo eminente Presidente Marcus Vinicius Furtado Coêlho, que me outorgou, há poucos minutos, para aqui comparecer.
À medida que me dirigia para este Senado, lembrei-me de que a matéria de que vamos tratar hoje, nesta PEC, traz e nos aproxima de um fato histórico, pois, até 1930, os Estados podiam legislar, entre outras matérias, sobre processo. Mas, em 1929, e, de primeiro plano, lá estavam os mineiros, para, juntamente com os gaúchos, buscar e alterar os princípios políticos, sobretudo, campeantes, à época, no Senado da República brasileira. Aí se formou a Aliança de 1930, que este Senado conhece com perfeição.
O que se combatia? A Aliança Liberal e, sobretudo, meus conterrâneos Flores da Cunha, João Neves da Fontoura, aliado inspirado em tantos mineiros, em tantos paraibanos, realizamos uma revolução, na busca da mudança de regras e de princípios que dominavam o cenário político nacional. Vitoriosa essa aliança! Entre outras medidas adotadas, extinguiu-se a competência dos Estados para legislarem sobre processo.
Em sequência, eminente Senador Antonio Anastasia, quero cumprimentá-lo pelo lúcido, luminoso parecer de V. Exª. Cumprimento também as lúcidas manifestações aqui produzidas pelo Prof. Fernando, pelo Prof. Gabriel, e peço permissão - que não me apedrejem -, porque eu tenho por São Paulo a maior admiração. No Conselho Federal, a bancada do Rio Grande do Sul ladeia-se, bem próximo, à bancada de São Paulo. E eu tenho por São Paulo, especialmente pelos nobres representantes de São Paulo, no Conselho Federal, como Guilherme Batochio, para ilustrar e para se breve, com quem tenho mantido uma proximidade muito grande.
Então, perdoe-me São Paulo, se eu disser, se afirmar algum ponto aqui que se confronte ao que aqui foi produzido, com rara luminosidade, pelo eminente representante de São Paulo. Isso não carrega nenhum colorido, a não ser uma questão de convencimento da Ordem dos Advogados do Brasil, posto que aqui falo em nome de cerca de um milhão de advogados, ou aproximadamente. E o Conselho Federal tem algumas questões que - para nós - são muito epidérmicas, são muito sensíveis, muito particularmente, quando se trata de alteração de matéria para legislar sobre processo.
Aqui quero individualizar as minhas e focar a manifestação que eu farei, as considerações que eu farei. Centralizá-las-ei especificamente neste tema: atribuir competência para os Estados legislarem sobre processo, antes de entender que esta cláusula, se é verdade, eminente Prof. Fernando, que é preciso se estabelecer a diferença entre aquilo que o Constituinte disse e previu como matéria privativa e matéria de exclusividade, é preciso, realmente, V. Exª distinguiu, fez a separação com muita sabedoria.
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Mas tenho que, quando esse dispositivo, art. 22, caput, inciso I, quando trata de Direito Civil, que está fora de qualquer comentário, sobre Direito Comercial também, Penal também, mas aqui vem Processual, tenho para mim que, ao alterar a competência, permitir que os Estados legislem sobre processo, amplamente, nesse clima em que vive a Nação brasileira, em que se faz de tudo para prender, na minha condição de velho criminalista, que milita na seara criminal há mais de quatro décadas - pode para algum parecer um fóssil andante, mas é um advogado atuante -, em mais de quatro décadas, aprendi com tantos juristas, Magalhães Noronha, para honrar, Frederico Marques, eu poderia rotular outros nomes ilustres, aprendi que, para prender, cautelarmente, só se pode fazê-lo pelas regras absolutamente estanques, privativas, previstas no art. 312 do Código de Processo Penal.
Não vou citar o processo em referência, ao qual faço alguma ilustração, indiretamente, mas não vou trazer à baila o nome do processo, mas ele está na imprensa todos os dias. Vejo hoje que, neste País, se quer aumentar as penas de artigos do Código Penal para combater a criminalidade, se quer instituir figuras de crime hediondo para combater a criminalidade, quando os nossos penalistas, os nossos criminólogos, há muito tempo, se convenceram de que prisão no Brasil, sobretudo no Brasil, são escolas de criminalidade. Quero me referir, em homenagem a este Senado e aos eminentes Senadores que estão aqui, a uma passagem há muito tempo proferida por um eminente gaúcho, que dignificou este Senado, Senador falecido há pouco, meu amigo Paulo Brossard, quando, ainda Ministro da Justiça - veja que faz tempo isso, estou falando de coisas bem antigas. Brossard dizia: "Neste País, não se constroem prisões, e as que estão aí são verdadeiras escolas de criminalidade".
Pois bem, hoje eu dizia: parece que tudo aquilo que aprendi com os velhos processualistas, que aprendi com Hélio Tornaghi, estudando seus livros, aprendi ainda com José Alencar - veja que falo de coisas antigas - que há de se prender apenas, cautelarmente, em circunstâncias muito específicas, diante de fatos concretos. Mas hoje se prende apenas invocando a gravidade genérica do delito. Pasmem! Hoje se prende por prisões desfundamentadas. Por que se prende tanto assim?
Ainda se criou, ultimamente, uma questão processual, que tem espantado todos os criminalistas. Hoje se prende quando uma corte aí, superior, sobretudo, está para julgar determinado processo, especialmente de habeas corpus, em que se vê que a prisão está absolutamente desfundamentada, com algum dos coacusados.
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Aí se resolve prender novamente pelos mesmos fatos investigados em ações anteriores, que evidentemente, a meu sentir, não teria nenhuma margem de fundamentação de uma prisão, mas se prende despreocupado com a fundamentação, despreocupado com os fatos concretos. Os penalistas, os processualistas ensinam a todos nós: só se pode prender diante de fatos concretos, não se pode prender diante da gravidade genérica da hipótese criminal. Mas, hoje, está-se prendendo também diante da gravidade, gravidade genérica, sobretudo. Então, faço essa distinção.
Vamos imaginar que o meu Estado, os gaúchos são muito afervorados, que amanhã, se aprovada essa emenda permitindo que o meu Estado legisle sobre Processo Penal, quem sabe, Processo Civil, mas vou particularizar em cima da possibilidade do meu Estado, que é um Estado considerado pela Nação de um certo modo evoluído, de um certo modo constituído por uma coletividade que é senhora de um determinado nível intelectual, mas que o governador, vamos imaginar, a Assembleia do meu Estado, os Poderes do Estado, resolva, se for aprovada essa proposta sobre possibilidade de competência para o Estado, que se pretenda o governador preocupado, "ah, mas os acidentes de trânsito estão muito graves, um volume muito grande no País", então, vamos prender por mais um motivo. Motorista que tem a carteira, quem sabe de número tal a tal, que são novos motoristas, ou os que já se envolveram num acidente, no terceiro acidente, vamos tocar na cadeia, vamos prender imediatamente, prisão cautelar, prisão cautelar para os motoristas que se envolveram em um ou dois acidentes. A terceira, vamos imaginar, cadeia para ele.
As cadeias estão aí abarrotadas. Cadeia não resolve, não ressocializa ninguém. Aquilo que os nossos criminólogos antigos entenderam que alguém que comete um delito seja preso, recolhido a uma masmorra saia de lá melhorado está absolutamente comprovado que não ocorre. Ele sai de lá muito pior.
Vamos imaginar que essa proposta seja aprovada e, amanhã, muitos, milhares e milhares, neste País estarão sendo presos porque um governador aqui ou acolá vai entender pôr em prática um novo requisito ao art. 313 do Código de Processo Penal. E aí vai se prender mais e mais e mais. Onde vamos parar?
Eu entendo que uma possibilidade, uma mudança desse modo para prender mais e mais, porque estou dando apenas um exemplo, que se pode enumerar com um elenco de exemplos infindáveis, isso eu indago a este Senado: isso não atinge, não está proibido pelo art. 60 da Constituição Federal, que trata das cláusulas pétreas, §4º, inciso IV, dos Direitos e Garantias Individuais?
Eu entendo que se permitir que os Estados legislem sobre processo irá implicar ofensa ao art. 60, §4º, inciso IV, da Constituição Federal, pois se trata de matéria de cláusula pétrea, que não pode ser alterada por emenda constitucional.
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Sr. Presidente, consulto se ainda tenho mais tempo ou se o meu tempo já se esgotou.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. Bloco Oposição/PSDB - MG. Fora do microfone.) - Eu já dei mais cinco minutos para V. Sª esgotar...
O SR. RENATO DA COSTA FIGUEIRA - V. Exª me perdoe. Empolgado com o tema, não me apercebi de que havia se esgotado o meu tempo, e eu sou um fetichista da lei, da obediência. Peço que me perdoe.
Aqui, quero concluir minhas modestas observações, sempre mantendo um respeito muito grande ao Senado, constituído por homens sérios, homens intelectualmente preparados, colocando este tema sob a sensibilidade, sob a reflexão de V. Exªs, para que, ao decidirem esta matéria - o que, na certa, V. Exªs farão do modo peculiar, habitual, com grandeza -, tenham presentes essas possibilidades que acabo de aventar.
Agradeço a todos. Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. Bloco Oposição/PSDB - MG) - Agradeço em demasia ao Dr. Renato da Costa Figueira, Conselheiro Federal da OAB do Rio Grande do Sul. Imagino, Dr. Renato - permita-me dizer -, V. Exª atuando em um tribunal do júri. Tenho pena do promotor, porque imagino que V. Exª, com o seu conhecimento, com sua erudição, com sua excelente locução...
O SR. RENATO DA COSTA FIGUEIRA - Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. Bloco Oposição/PSDB - MG) - ...e, em especial, com sua presença, certamente, deve ter um grande êxito, como, de fato, tem, nas lides forenses, não só gaúchas, mas de todo Brasil. É muito bem-vinda a contribuição que V. Sª traz à colação nesta audiência, que tem exatamente por objetivo, conforme requerimento do eminente Senador José Pimentel, trazer temas palpitantes, num assunto tão complexo como este. A contribuição de V. Exª é extremamente relevante.
O SR. RENATO DA COSTA FIGUEIRA - Muito obrigado pela generosidade de V. Exª.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. Bloco Oposição/PSDB - MG) - Passo a palavra agora, para sua exposição, à eminente Vice-Presidente da Unale, Deputada Estadual Ana Maria Cunha, do Estado do Pará, a quem também agradeço muito pela aceitação do convite que lhe foi formulado pela Comissão de Constituição e Justiça.
V. Exª dispõe de 15 minutos para sua exposição.
A SRª ANA MARIA DO SOCORRO MAGNO CUNHA - Obrigada, Senador.
Que minhas primeiras palavras neste momento sejam de agradecimento. Eu quero dizer a V. Exªs que sou Parlamentar pelo quarto mandato e que, pela primeira vez, desde o início do meu mandato, vejo a possibilidade de, efetivamente, sentir-me trabalhando pelo meu Estado.
É muito importante estarmos todos hoje aqui. Gostaria de cumprimentar o nosso Presidente, Senador Anastasia e, na sua pessoa, cumprimentar todos os homens e mulheres que acreditam que, por meio da lei, podemos, sim, fazer uma nação melhor.
Senador, nosso respeito, nosso carinho. Esse seu novo modificar desta PEC, foi construída por vários presidentes, que, inclusive, já a passaram pelas suas assembleias legislativas, nos remete à preocupação dos legisladores estaduais em poder colaborar mais com seu povo, em poder colaborar mais com seus Estados. Então, V. Exª, pela sua perfeita relatoria, de grande sensibilidade, pôde nos dar a oportunidade de estar hoje aqui, com todos os Senadores que hoje se fazem presentes.
Eu gostaria de agradecer a presença do nosso Senador Flexa, do Senador Pimentel, esse grande homem e líder, que, inclusive, solicitou esta audiência pública para que possamos fazer esta fala, para que possamos abrir este debate falando do que nos preocupa como legisladores estaduais, para que possamos estar aqui juntos brigando por melhores condições de trabalho, trabalho legislativo. É importante também cumprimentar os Senadores Randolfe e Ataídes. Quero cumprimentar o Senador Paulo Rocha, que já esteve aqui, para dizer o quanto é importante este debate para a Nação, o quanto é importante este debate para as assembleias legislativas dos Estados, e também cumprimentar o Senador Dário Berger.
Eu gostaria de cumprimentar os meus colegas deputados estaduais, aqui o meu Presidente...
(Intervenção fora do microfone.)
A SRª ANA MARIA DO SOCORRO MAGNO CUNHA - ... Deputado Presidente Márcio Miranda, a minha colega Deputada Cilene, o meu colega, Presidente da Assembleia do Amazonas, Deputado Josué e os demais Deputados aqui presentes, todos.
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É importante dizer que todas as assembleias legislativas aqui estão sendo representadas pelos seus Parlamentares, que não puderam hoje estar presentes em número maior. Estivemos, na semana passada, aqui, mais de 200 Parlamentares.
Minha fala será posterior à do nosso querido Presidente das Assembleias Legislativas, Presidente Capez. Após a fala do Estado de São Paulo, o Estado que tem a maior população, vem a do Estado do Pará, que tem a maior dimensão geográfica.
Sou a Deputada Ana Cunha. Não sou jurista; sou médica. Minha maior precisão é melhorar a questão da principal saúde, a saúde do bem-estar da população. Não podemos melhorar a situação da população no seu bem-estar se não pudermos fazer leis, principalmente nós, que estamos junto à população. É na nossa porta a primeira em que batem, Senador, é na do Deputado Estadual. Quem nos procura é o vereador, quem nos procura é o prefeito, que tem problemas ambientais fortíssimos, que tem problemas agrários fortíssimos.
Essa PEC vem, sim, com a possibilidade de nós legisladores estaduais podermos colaborar mais ainda com a nossa Nação. Em nenhum momento está sendo privativo, mas concorrendo principalmente nas nossas peculiaridades. O Estado do Pará tem uma peculiaridade, que é totalmente diferente da de São Paulo, que é totalmente diferente da de Minas. Apesar de termos minérios, Pará e Minas, temos diferenças muito grandes.
Então, a nossa fala vai muito ao encontro de conversar com os nobres Senadores e dizer o quanto é importante essa PEC. Sabemos que ela talvez precise ser um pouco mais apreciada, que ela precisa ter algumas elaborações que são sensíveis, mas também dizemos que, a partir da Constituição de 1988, se conseguirmos falar e fazer ecoar no Senado e na Câmara Federal que estaremos sendo colaboradores de uma melhoria de vários setores... Entre eles, eu não poderia deixar de citar o setor agrário, porque o Pará, por ter várias peculiaridades, sofre muito, Senador Anastasia.
Que a nossa fala, de todos nós, Deputados Estaduais, possa ecoar no trabalho de V. Exªs, Senadores, que, com certeza, caminham pelos seus Estados, que caminham pelos seus Municípios e, mais do que nunca, fazem da nossa Nação uma nação forte e brilhante. Mas nós não podemos nos esquecer de que nós Deputados Estaduais estamos na base e sentimos muito mais de perto os problemas.
Então, Senador, quero apenas agradecer a todos os Senadores, agradecer à OAB, agradecer ao Ministério da Justiça, agradecer a vocês que se fazem presentes e solicitar que olhem com carinho essa PEC, porque essa PEC nos dará a oportunidade de trabalharmos com muito mais propriedade, não tirando o mérito ou a atitude de qualquer ente federado, mas concorrendo principalmente com a situação das peculiaridades regionais.
Devolvo a fala, Senador. (Pausa.)
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. Bloco Oposição/PSDB - MG) - Muito obrigado, Deputada Ana Cunha, que demonstrou, com sua fala precisa e objetiva, eminente Senador Flexa, o valor da mulher política do Estado do Pará. De fato, está de parabéns o Estado por ter a Deputada médica tão jovem. Se ela não falasse que já está em seu quarto mandato, nós não acreditaríamos, porque ela é muito jovem. Receba, então, o nosso cumprimento. Agradecemos por sua participação.
Antes de abrir a palavra aos nossos eminentes Senadores para suas indagações, no saldo remanescente do tempo da Deputada Ana Cunha, que falou menos, propositalmente, eu peço ao Deputado Fernando Capez, que me solicitou dois minutos exatamente para um esclarecimento processual, tendo em vista que o debate, como nós percebemos, se centra muito na questão do direito processual. Sendo ele professor da matéria, é bom ouvi-lo.
O SR. FERNANDO CAPEZ - Estimado colega Dr. Renato da Costa Figueira, eu sou um entusiasta dessa PEC, um grande entusiasta, mas não fui eu quem a elaborou, nem ela é do Estado de São Paulo. Quinze Estados subscreveram essa proposta de emenda à Constituição.
Eu fui promotor por muitos anos, promotor do júri, e nunca tive o infortúnio de me deparar com V. Exª na tribuna, mas quis o destino que estivéssemos aqui neste momento.
Dr. Renato, se não fossem os advogados, eu não seria Deputado. Tenho grande apreço pelos advogados e pelas liberdades públicas. Só pedi a palavra para dizer que não há nenhum risco. Mas, se risco subsistir, nós podemos aclarar isso no texto. Acho que audiência pública é importante por causa disso. Não há nenhum risco de que Estados venham a legislar sobre prisão, a acrescentar requisitos sobre prisão cautelar.
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O texto original da Constituição, desde 1988, já permite aos Estados legislar sobre procedimento. A prisão temporária é puramente procedimental. Ela se decreta no procedimento, não no processo. A prisão em flagrante ocorre antes da instauração do processo. O processo judicialiforme está extinto já desde a Constituição, e a prisão preventiva pode ser decretada no curso também da investigação. Então, houvesse a possibilidade de Estados legislarem, ela teria sido autorizada quando se permite que se legisle sobre procedimento. Agora, é justa essa preocupação. Nós não queremos que os Estados legislem, como o Dr. Gabriel também colocou, sobre questões que venham a restringir direitos e garantias. Isso está fora de questão.
Aqui, o próprio texto diz, no § 1º, no que é competência concorrente, Dr. Renato. Quando vier a entrar processo, se vier a entrar processo, caso assim entenda o Senado, o Congresso Nacional, a competência vai ser concorrente. No art. 24, que trata da competência concorrente, o § 1º coloca que, no âmbito da legislação concorrente, é competência da União, não dos Estados. Competência concorrente? É competência da União legislar sobre normas gerais. E § 2º... O Senador Anastasia faz esse acréscimo, extirpando qualquer risco remanescente. O que são normas gerais? As normas gerais versam sobre princípios, diretrizes e institutos jurídicos. Então, não há possibilidade de que isso ocorra. Mas, se dúvida remanescer na redação... Acho que a grandeza desta audiência pública é justamente deixarmos claro que não venhamos a correr tal risco. O que se quer mesmo é uma conceituação, ilustre Senador José Pimentel, que fez o requerimento para realização desta audiência pública, Senador Flexa, Senador Dário, de Santa Catarina, Senador Randolfe Rodrigues, o que nós queremos realmente é que as assembleias possam legislar sobre esses temas ligados a procedimento e que rebordam, tangenciam o processo sem que haja essa dúvida... Eu havia mostrado aqui, Senador Dário, que nós temos 860 vetos de matérias só na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, que tentou legislar sobre temas ligados a procedimento e tudo esbarrava no processo.
Quero deixar claro que estamos... Se nós, que subscrevemos a PEC, o Estado do Pará... Eu trouxe o maior número de Deputados Estaduais para cá, não é, Presidente Márcio Miranda? Se nós, que subscrevemos a PEC, Senador Flexa, pudermos dar sugestões, quero deixar claro, nós não queremos que os Estados possam legislar sobre temas que restrinjam direitos e garantias individuais, Senador Sérgio Petecão, que está aqui também e graças a quem eu falei na semana passada.
Obrigado.
Era só um esclarecimento para não deixar dúvidas.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. Bloco Oposição/PSDB - MG) - Muito obrigado, eminente Deputado.
Eu vou passar a palavra aos Senadores, mas, com certeza, nessa oportunidade, o senhor voltará a falar e vai permitir também os esclarecimentos.
Antes de dar a palavra ao Senador José Pimentel, autor do requerimento, eu gostaria só de registrar que esta audiência está sendo acompanhada de modo interativo pela internet e que há manifestações de diversos internautas, a quem quero agradecer as ponderações encaminhadas, que serão consideradas nesta relatoria.
Com a palavra o eminente Senador José Pimentel, autor do requerimento para realização desta audiência pública.
O SR. JOSÉ PIMENTEL (Bloco Apoio Governo/PT - CE) - O Senador Antonio Anastasia, além de ser o Presidente desta reunião, é também o Relator desta importante matéria. Ele, no seu parecer, já permitiu esclarecer uma série de dúvidas e preocupações, limitando alguns temas que, inicialmente, estavam na PEC 47, ampliando, dando redação nova a outros itens, e propusemos esta audiência pública exatamente para dar oportunidade aos vários segmentos que trabalham com esse tema, seja no Legislativo estadual, seja no Ministério da Justiça, e aos operadores do Direito, à nossa OAB, para que pudéssemos enriquecer ainda mais.
Quero abraçar nossos convidados, quero saudar nossos Senadores e nossos Deputados aqui presentes e nossos convidados e começar registrando que esse tema não é um tema novo na República. Nós já tivemos, como a nossa OAB muito bem aqui expõe, essas competências mais amplas em determinados momentos do nosso mundo republicano, e a Constituição de 1988 deu um tratamento que, na nossa leitura, foi adequado para o momento. Tivemos ali um cuidado muito forte de fortalecer os Municípios, pois, com aquela clareza com que o Dr. Ulysses sempre dizia, as pessoas moram nos Municípios, é ali que elas precisam dos serviços públicos, da convivência, aquele conjunto de ações... E, efetivamente, elas estão se materializando. Se observarmos o papel que o Município tinha até 1988 e o que passou a ter de 1988 para cá, veremos que evoluiu bastante. E esse processo é um processo de aprimoramento. E os nossos vereadores reclamam muito quando aqui vêm ou quando estão conosco em reuniões. Eles dizem que eles são os que mais sofrem no Pacto Federativo e, principalmente, nas atividades legislativas. Por isso "vereador" termina em "dor".
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O Município é onde o cidadão procura primeiro, é onde há primeiro debate. Em seguida, isso evolui para as suas instituições, chegando às assembleias e, depois, ao Congresso Nacional.
Quero também registrar que, de 1988 para cá, o Congresso Nacional tem tomado uma série de medidas, seja na organização das relações do Pacto Federativo no mundo das responsabilidades, dos endividamentos e, consequentemente, da construção de um Pacto Federativo mais equilibrado. E nesse processo, inegavelmente, os Estados tiveram um esvaziamento.
Se nós voltarmos aos anos 90, observaremos que os Estados tinham os seus bancos públicos estaduais, tinham um conjunto de empresas estaduais e que as assembleias legislativas legislavam sobre essa matéria. Portanto, havia uma demanda muito maior. Por conta da necessidade de dar mais segurança jurídica a todos esses segmentos, nós tomamos, aqui, no Congresso Nacional, a decisão de reduzir o tamanho dos bancos públicos estaduais, principalmente retirando o controle deles do governo do Estado, em grande parte deles, e a incorporação em outros segmentos. O Banespa é o melhor exemplo disso. Em relação à Nossa Caixa, já nos anos 2000, também houve uma tratativa. Isso diminuiu muito o papel das assembleias legislativas. Isto é um fato.
A partir daí, vem a necessidade de se construir novos espaços. O papel das assembleias legislativas está limitado a legislações pontuais sobre as polícias... E, em relação ao item da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiro, nós precisamos ampliar a competências dos governos estaduais e do seu órgão legislativo, que é a assembleia. Lembro que nós temos um processo de prisões que acredito que bateu no teto. Temos mais de 607 mil presos. E, nos últimos dez anos, multiplicamos por três o número de presos no Brasil. Havia, mais ou menos, 250 mil presos há dez anos e hoje estamos com 607 mil.
Tivemos aqui uma audiência pública para discutir execução de sentenças em que aprofundamos bastante esse debate. E as estatísticas estão postas. Temos algo em torno de 200 mil pessoas condenadas com mandados de prisão expedidos e não cumpridos por não haver onde recolher esses presos.
Portanto, o problema é de outra natureza, é de presídio, para dar contas das decisões judiciais que há, e não de legislação. Se fosse de legislação, não teríamos, hoje, a terceira maior população carcerária do mundo. Ela foi multiplicada por três nos últimos dez anos e não demos conta da violência no Brasil. Muito pelo contrário, a violência está se expandindo.
Se nós vamos para o mundo do processo civil, nós temos, hoje, 105 milhões de processos tramitando nos vários fóruns, para uma população de duzentos e poucos milhões de habitantes. Ou seja, se nós fôssemos colocar aqui que todos os processos têm um autor e um réu, para cada brasileiro haveria um autor e um réu, porque é mais da metade da população brasileira. Isso tem um mérito, porque a sociedade acredita nas suas instituições e ajuízam os seus processos, mas tem um demérito muito forte: estamos construindo uma população intolerante, que não consegue se compor, não consegue fazer a mediação, não consegue aplicar a arbitragem, vai direto do Poder Judiciário. E isso tudo implica o fato de que, hoje, levamos, em média, 12 anos para conseguir a prestação jurisdicional.
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Então, esse processo não se dá por falta de legislação, mas por falta de estrutura, no nosso Estado, do Poder Judiciário para dar conta dessa avalanche de processos e, ao mesmo tempo, de um ambiente em que a sociedade não conseguiu evoluir para compor seus conflitos.
Fui Presidente da comissão especial que aprovou o Código de Processo Civil, que entra em vigor em 1º de janeiro de 2016. É verdade que, em 2012, o nosso Código de Processo Civil estava muito defasado, porque vínhamos da legislação anterior. Conseguimos concluir esse processo na legislatura passada e a Câmara o concluiu no início desta nova legislatura, e nós o aprovamos. Ele já foi sancionado, como todos sabemos, e entrará em vigor em janeiro de 2016.
Portanto, estamos aprovando uma matéria para tratar de um tema, esse Código de Processo Civil, sobre o qual o Congresso Nacional, a sociedade brasileira e as entidades operadoras desse setor se debruçaram e para o qual trouxeram dois fatos novos. O primeiro é a mediação, tema do qual o nosso Relator, Senador Antonio Anastasia, ex-governador, é um estudioso e para cujo debate nos ajuda muito.
Acerca da questão da mediação, precisamos alterar profundamente a grade curricular das nossas universidades, alterar a cultura do nosso Judiciário e da nossa sociedade para incorporá-la ao nosso convívio.
Sou daqueles que assistem a muitas ações em que, ao invés de as partes comporem, aumenta-se a distância e os litígios. Exemplo concreto: procedimentos de condomínio. Dois condôminos, ao invés de resolver uma pendência que surge entre eles, procura o Poder Judiciário, e obtém a decisão 12 anos depois, e essas famílias se tornam inconciliáveis, morando sob o mesmo teto do mesmo prédio, evidentemente em apartamentos diferenciados. Isso deixa claro que nosso problema não é tanto de processo, mas é muito mais de uma nova cultura, uma cultura de mediação, uma cultura que nos permita nos compor.
Se vamos para o mundo da arbitragem, já faz um pouco mais de tempo. Ela vem dos anos 90. Já evoluímos bastante, mas ainda apresentam uma parte significativa, principalmente no setor público, para que possamos ter prestação jurisdicional ou mediação de arbitragem com mais rapidez. Tanto a Lei de Mediação quanto a Lei de Arbitragem introduzem esse tema no serviço público.
Fui Ministro da Previdência Social por dois anos, de 2008 a 2010. Ao chegar ali, encontrei 5,4 milhões de processos tramitando só na Justiça Federal. Não tínhamos ali um banco de dados do que tramitava na Justiça Comum, como chamamos, que é onde não havia varas federais. Ao fazer esse estudo, esse levantamento, gastávamos, em 2009, em torno de R$10 mil na condução de um processo da Previdência Social, e o desembolso, ao final da decisão, 10 ou 12 anos depois, era de R$4,8 mil. Esse era o valor da indenização da decisão judicial.
Portanto, se o Estado resolvesse pagar os 5,4 milhões de processos, ele teria uma economia de 52% sobre o montante que ia desembolsar e atenderia ao público.
Ali, em 2009, conseguimos, com o apoio da Justiça Federal, do Conselho Nacional de Justiça e com os cinco tribunais regionais, fazer um processo de composição, de mediação e de acordos, que agora estão descendo para as varas especializadas da Justiça Federal.
Mas é um absurdo haver 5,4 milhões de processos. E não estou falando de governo, pois é uma política de Estado a que, ao longo do tempo, se procedeu. E quem mais sofre são os mais pobres nesse processo.
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Se nós vamos para o mundo penal, nós tivemos aqui quatro anos de discussão. O Senador Vital do Rêgo era o Presidente da comissão, e essa matéria teve como primeiro Relator o hoje Governador do Mato Grosso. Depois, nós invertemos: o Senador Vital do Rêgo passou a ser o Relator e eu fui ser Presidente da Comissão Especial do Código de Processo Penal.
Evoluímos, está na Câmara, mas houve alguns temas em relação aos quais nós não dávamos conta e, assim, entendemos que deveriam continuar em leis especiais, entre eles o ECA. E, a essa altura, nós tínhamos, na sociedade, duas visões: a de que, para resolver esse mundo, precisava-se diminuir a maioridade penal e levar esses garotos para dentro dos presídios, que já não têm mais vagas, e a visão, que se materializou no Senado, de que nós deveríamos alterar o ECA, alterar o tamanho do tempo de internação, para que essas crianças que cometeram crimes hediondos ou algumas especificidades de crimes não ficassem no mesmo ambiente socioeducativo, mas que fossem para um outro ambiente e, ao mesmo tempo, pudessem concluir o ensino fundamental e o ensino médio e, por fim, ter uma profissão, ou seja, que saíssem do sistema com uma profissão, dentro dos vários programas que, hoje, os governos estaduais, o Governo Federal, o Pacto Federativo e a sociedade oferecem. E para quê? Para ele não ficar dependendo de uma organização criminosa quando saísse do socioeducativo.
É por isso que se fixou em 10 anos. Havia a posição do Governo de que seriam oito anos para essa espécie, mas o Senado Federal, na sua mediação, fixou em dez anos. E aí há toda uma nova cultura de se entender que, por meio desse sistema, é possível recuperar a nossa juventude, particularmente para um país que tem uma taxa de natalidade muito baixa, de 1,86%. E todos sabemos que, para repor a população, precisa-se de uma taxa de 2,3 crianças por mulher. Assim, nós não estamos mais repondo a nossa população e caminhamos para um envelhecimento, para um aumento da longevidade. Logo, vamos precisar dessa juventude trabalhando e produzindo melhor do que nós para sustentar o Estado e a nossa terceira idade.
É com esse olhar que nós fizemos a alteração do ECA, em contraponto a uma visão de que iríamos resolver o problema simplesmente levando para dentro dos presídios essas crianças.
Foi com essas preocupações que eu achei por bem, na reunião passada, ter clareza de que é preciso fortalecer as nossas assembleias, mas fazer uma audiência pública para que nós possamos melhor aclarar essas questões.
No que diz respeito ao Direito Agrário, esse é um tema que já foi mais tenso e intenso. Com a Constituição de 88 e todo esse processo de desapropriação, de administração de conflitos... Eu sei que, no Pará, nós tivemos um conflito muito forte em face de um momento muito tenso, mas, hoje, o Brasil caminha em outro patamar no que diz respeito a assentamentos. Temos uma questão grave com relação às terras indígenas não tanto por terras novas, mas por saber como resolver os conflitos que foram construídos ao longo do tempo, particularmente no que diz respeito à indenização das terras nuas versus a reintegração de posse.
Este Senado se debruçou sobre isso. Aprovamos uma proposta de emenda à Constituição, que foi para a Câmara, pela qual nós vamos fazer a indenização da terra nua através da União, uma vez que Estados e Municípios não têm como, a partir de suas receitas próprias, fazer essas indenizações.
Como eu sou um daqueles que aprendeu que, se não houver recursos, pouca coisa o Estado pode fazer, sei que os Estados, em face dessa política de ajuste que nós fizemos nos anos 90 e continuamos fazendo agora, não têm margem para absorver esse tipo de indenização. Por isso é que continua na União. Contudo, também nós temos de entender que a agricultura familiar, a pequena propriedade, o agronegócio na agricultura familiar, esse mundo todo que trata da produção precisa ser descentralizado. Municípios e Estados precisam ajudar o Estado nacional nesta questão.
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Sou daqueles, Senador Antonio Anastasia, que caminham para dialogar com V. Exª, como sempre, para que aquelas propriedades de desapropriação em que o módulo mínimo ou os módulos mínimos permitem a desapropriação fiquem nas mãos da União, porque há um custo muito alto nisso aqui, na infraestrutura. Essas propriedades, normalmente, ficam distantes dos grandes e médios centros urbanos, ficam nos pequenos Municípios e têm grande extensão territorial e muita falta de infraestrutura. Ficariam com a União. Para aquelas propriedades abaixo do módulo nacional de desapropriação, que o Constituinte definiu em 1988, poderíamos, sim, nesse caso, ajudar o Estado nacional. Em toda essa parte da agricultura familiar, do escoamento da produção, das compras governamentais, principalmente para a educação, a saúde e os presídios, nesse conjunto de ações, para que os recursos circulem naquele território, naquela localidade, acho que dá para avançarmos muito.
Por último, Sr. Presidente, estamos alterando a Lei Geral da Micro e Pequena Empresa para incorporar algo em torno de 4 milhões de pequenos produtores rurais, de agricultores familiares que têm o seu agronegócio e, hoje, têm dificuldade de vender para o Poder Público porque não podem emitir nota fiscal. Eles compram a nota fiscal, normalmente, na Prefeitura para vender para o poder local. Em seguida, o Ministério Público discute se essa nota foi arranjada ou se ela é verdadeira. Superaria essa dificuldade a formalização do agricultor familiar como empreendedor individual, garantindo todos seus direitos previdenciários, como segurado especial que é. Podemos ajudar nisso.
Esse debate, nós o fizemos desde 2011. Agora, em 2015, por unanimidade, foi aprovado na Câmara Federal. Para ser mais justo, houve dois votos contrários. Foram 417 votos favoráveis e dois contrários. Está conosco aqui, no Senado. Acredito que deveríamos fazer um esforço grande, e não há divergência entre os vários partidos que têm assento aqui, para que, em 2015, pudéssemos aprovar para entrar em vigor em janeiro de 2016. Aqui, podemos ter uma parceria muito forte com as nossas assembleias legislativas, ajudando a dar conta dessas questões locais.
Era muito mais dúvida, muito mais preocupação do que, propriamente, nosso Relator, ter uma posição firmada. Esta audiência é muito importante para que possamos receber ideias novas e construir consenso. Sendo V. Exª o nosso Relator, fico muito tranquilo, primeiro, pela sua qualificação, pela sua capacidade de mediação e, acima de tudo, por ter sido também do Executivo e, hoje, contribuir com o nosso Parlamento.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. Bloco Oposição/PSDB - MG) - Agradeço as palavras sempre ponderadas, lúcidas e procedentes do eminente Senador José Pimentel, autor do requerimento para a realização desta audiência pública, que, como os nossos convidados puderam perceber, trouxe, de fato, temas muito relevantes para esse debate na questão relativa à competência dos Estados.
Agradeço as palavras sempre gentis e carinhosas do Senador Pimentel.
Já está inscrito o Senador Randolfe para as suas palavras. Depois, o Senador Flexa.
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - Senador Anastasia, Relator desta matéria, meus cumprimentos.
Reitero o que foi dito pelo Senador Pimentel. A matéria não poderia estar em melhores mãos do que nas mãos do nosso constitucionalista emérito desta Comissão, o Senador Antonio Anastasia.
Quero cumprimentar os demais membros desta Mesa: Dr. Renato Figueira, da Ordem dos Advogados do Brasil, Sr. Gabriel, representante do Ministério da Justiça, Deputada Ana Cunha, Vice-Presidente da Unale, meu caro Deputado Fernando Capez, por quem tenho profunda admiração.
Deputado Capez, sou seu aluno sem o senhor saber. Utilizei sua doutrina no curso de Direito e sou fã de sua doutrina de processo penal.
Em relação a esse tema, neste momento, tenho mais dúvidas do que certezas. Então, vou me inscrever na mesma linha do Dr. Renato Figueira aqui e me submeter às pedras a serem jogadas. Acho que é um tema pertinente - fui Deputado Estadual durante dois mandatos -, mas é um tema também sensível à nossa Constituição como Federação.
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O Senador Anastasia sabe muito bem que, das oito Constituições que tivemos na nossa história - o Deputado Fernando Capez também sabe disto -, nenhuma foi mais democrática que a de 1988, mesmo porque ela foi resultado de um processo traumático da sociedade brasileira, de um regime autoritário, e de um anseio de milhares por redemocratização. Saiu de uma estrutura de federação fechada e centralizada no período autoritário para um modelo de federação aberto. Foi essa, claramente, a intenção do Constituinte em redefinir o Pacto Federativo, como já foi dito pelo Senador Pimentel, dando, inclusive, aos Municípios prerrogativas maiores. O Constituinte, no afã de dar ao Poder local um poder maior, talvez tenha se esquecido do meio. Deu um poder maior aos Municípios, manteve as atribuições do Congresso Nacional e o centro, o Estado e o legislador estadual, ficou enrijecido nas suas atribuições.
Entretanto, Senador Anastasia e Deputado Capez, a Constituição, no famoso art. 22, que já foi tão citado aqui, no seu parágrafo único, diz, ipsis literis, o seguinte: "Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo." Veja que o legislador Constituinte dá, no corpo do art. 22, um feixe de atribuições ao Poder Legislativo federal, ao Congresso Nacional, mas delega, no parágrafo único do art. 22, a possibilidade de alguns dos temas que ali estão o Poder Legislativo Federal, o Congresso Nacional, delegar, Senador Flexa, para assembleias legislativas.
Aí eu me pergunto se esta não seria uma primeira questão: se não poderíamos delegar algumas disposições, iniciarmos a experiência de descentralização delegando algumas das atribuições para ser concorrente aos Estados por lei complementar, que é, inclusive, um processo legislativo mais simplificado do que a emenda constitucional. Emenda constitucional, nunca é demais lembrar, exige três quintos em dois turnos de cada um das Casas do Congresso Nacional, o que traz uma dificuldade maior para sua apreciação e aprovação. Para lei complementar basta a maioria absoluta dos membros de cada Casa do Congresso Nacional, 41 aqui no Senado e 257, salvo melhor juízo, na Câmara.
Então, a primeira provocação que faço é esta: não seria o caso de delegarmos por lei complementar alguma atribuição aqui, inclusive, para ser apreciada por um dispositivo, por um diploma legal, por uma proposta de iniciativa legislativa de tramitação mais fácil nas Casas?
A segunda preocupação, Sr. Presidente, é que a PEC 47, dentre as alterações que traz a Constituição, retira das matérias que são de competência legislativa da União o direito agrário e o transfere para os Estados e para o Distrito Federal. Está no art. 24, inciso XX, da PEC, inclusive, mantido no relatório de S. Exª o Senador Anastasia.
Aqui, eu vou citar, com a máxima vênia, aquela célebre frase do Pedro Aleixo no Ato Institucional nº 5: não estou preocupado aqui com a boa intenção dos legisladores e com a boa intenção da Unale. Não é isso. Estou preocupado com as consequências, pois os 27 Estados da Federação não são uniformes. Temos nobres composições de colegiados e assembleias legislativas, como no Pará, como em São Paulo, que tem colegiado de 94 Deputados estaduais, mas temos também...
Veja, a minha preocupação é: se delegarmos o direito agrário aos Estados... Vou ser direto aqui. No meu Estado, uma das matérias de orgulho nosso é ter 95% de nossos ecossistemas ainda mantidos em pé. Para ser exato, 92%. Isso é motivo de orgulho para nós.
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Aliás, com a alteração desse ecossistema, Gabriel, e dos ecossistemas da Amazônia, quem sofre a consequência, primeiro, não somos nós, mas vocês, aqui, em Brasília e no Centro-Sul, que já estão sofrendo. A temperatura média do Planeta este ano está 0,8 graus acima. Os verões aqui... Bom, basta ter saído de casa hoje para ver a secura de Brasília. As primaveras estão mais intensas. As enchentes estão mais intensas. Está comprovado cientificamente. Isso é resultado direto dos efeitos terríveis da ampliação do desmatamento na Amazônia.
Eu temo que, ao delegar direito agrário... No meu Estado, particularmente, delegar para a Assembleia Legislativa o direito agrário vai representar a perda de 90% desse ecossistema. Eu não tenho dúvida disto. Vai representar isto.
O poder econômico para devastar lá é enorme! Então, é isso que representará no meu Estado. E eu me preocupo com outros Estados onde o poder econômico do latifúndio pesa mais do que... Não é o caso de São Paulo. O Deputado Capez disse que são 96 Deputados. Há uma pluralidade. Há representação mais diversa na composição.
Bom, em relação a esse dispositivo, eu tenho a preocupação direta sobre as consequências, em especial em Estados onde existe forte conflito agrário, em especial no caso da Amazônia.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - Sim. Também, Senador Pimentel. Também.
A outra alteração proposta diz respeito à legislação de licitações e contratos públicos. A União deixaria de ter competência privativa. Eu trago aqui essa preocupação e a divido com os senhores.
Há uma proposta do Ministério Público Federal, que está tramitando no Congresso Nacional, de dez medidas de combate à corrupção. Vários partidos, inclusive o PSDB, já manifestaram apoio a essas propostas. Algumas dessas propostas tramitam aqui, nesta Casa, na CCJ, Senador Pimentel.
Vejamos: a flexibilização desse dispositivo, em alguns Estados em que não existem muitos rigores no combate à corrupção, a flexibilização de dispositivos relativos à lei de contratos e licitações... Eu me pergunto se isso não deixaria instituições estaduais mais vulneráveis.
Aí, como seria, então, por exemplo, a campanha do Ministério Público, que nós todos abraçamos, de dez medidas de combate, em uma circunstância dessa? Teriam de ser dez medidas para cada um dos Estados. Essa pulverização é algo que me traz também preocupação.
Outra modificação...
Bom, eu vou detalhar essas aqui. Há outras modificações, também, que eu gostaria de trazer aqui para o debate com os colegas.
Eu queria só concluir com duas questões, Senador Anastasia. O eminente colega do Deputado Capez e também do Senador Anastasia, o Prof. José Afonso da Silva, na sua célebre obra Curso de Direito Constitucional Positivo, diz o seguinte:
É claro que o texto não proíbe apenas emendas [referindo-se à Constituição] que expressamente declarem: 'Fica abolida a Federação ou a forma federativa de Estado; Fica abolido o voto direto. A vedação, [diz o prof. José Afonso], atinge a pretensão de modificar qualquer elemento conceitual da Federação ou do voto direto, ou indiretamente restringe a liberdade religiosa ou de comunicação, ou outro direito de garantia individual, basta que a proposta de emenda que se encaminhe, ainda que remotamente, seja tendente. Emendas tendentes [diz o texto] para sua abolição.
Trago essa preocupação do Prof. José Afonso porque, na verdade, a PEC altera a formatação atual do Pacto Federativo. Não há dúvidas sobre isso. Nós temos um Pacto Federativo à luz da Constituição de 1988. Nós temos uma cláusula pétrea no art. 60, que diz que são proibidas propostas tendentes a abolir o Pacto Federativo. Nós temos isso, claramente, no art. 60.
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O Prof. José Afonso esclarece o objetivo desse dispositivo. E, por conta disso, pergunto, insisto: não seria o caso de ampliarmos essa descentralização, conforme lei complementar, assim como está previsto no parágrafo único do art. 22?
Por fim e por último, vou trazer aqui outro dispositivo da Constituição. Das reuniões do Congresso Nacional. O art. 57, § 4º, Senador Anastasia, estabelece o seguinte:
§ 4º - Cada uma das Casas reunir-se-á em sessões preparatórias, a partir de 1º de fevereiro, no primeiro ano da legislatura, para a posse de seus membros e eleição das respectivas Mesas [...]
Veja que a Constituição Federal estabeleceu o seguinte: é no dia 1º de fevereiro que a Câmara dos Deputados e o Senado Federal se reúnem para eleger as suas respectivas Mesas e, consequentemente, o Presidente. Em analogia, as assembleias legislativas fizeram o mesmo.
Imagine, Senador Anastasia, se o Presidente Renan - Senador Davi, o senhor sabe do que eu vou falar - tivesse sido eleito Presidente do Senado Federal no dia 1º de fevereiro de 2015 e antecipasse sua segunda eleição no dia 3 de março de 2015, que era para ser dois anos depois.
Eu acho que isso soa absurdo, impensável, inimaginável. Não é possível isso acontecer. Não acredito que isso tenha acontecido em alguma assembleia legislativa também, porque é absurdo. Pois isto aconteceu na Assembleia Legislativa do meu Estado. Não acontece em todas as assembleias legislativas. Mas, como Ortega y Gasset diz, como o homem é o senhor do seu lugar e suas circunstâncias, eu quero falar aqui de uma realidade também do meu lugar.
Veja: esse dispositivo é uma faculdade, é disposto para as assembleias legislativas, mas no meu Estado aconteceu esse absurdo em relação à eleição da Mesa na Assembleia.
Eu trago esse tema inclusive para a nossa querida Unale se debruçar sobre ele. Tenho certeza de que a Unale, entidade da qual tenho a honra de já ter feito parte, comunga também dos princípios de defesa do Estado democrático de direito, das suas instituições, das liberdades individuais e dos princípios que estão conceituados na Constituição, de legalidade, moralidade e eficiência da Administração Pública. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. Bloco Oposição/PSDB - MG) - Agradeço ao Senador Randolfe Rodrigues, que, como os convidados também puderam perceber, com sua inteligência, é um Senador combativo...
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - É inferior a sua, Senador Anastasia.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. Bloco Oposição/PSDB - MG) - Jamais!
Ele é combativo, dedicado e veemente em seus argumentos, todos procedentes. Quero cumprimentá-lo e dizer que, certamente, vamos debater muito sobre esses temas aqui.
Agradecendo ao Senador Randolfe, chamo o próximo orador inscrito, o Senador Flexa Ribeiro, do Estado do Pará.
O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Sr. Presidente, Senador Antonio Anastasia, faço minhas as palavras do Senador José Pimentel a respeito de V. Exª.
A condução de V. Exª na Presidência desta reunião tem uma importância significativa, pela competência, pela experiência e pelo conhecimento que V. Exª detém e por ser V. Exª o Relator da medida provisória.
Quero também parabenizar o Senador José Pimentel por ser o autor do requerimento desta audiência pública, que vai, com certeza absoluta, auxiliar em muito e esclarecer as dúvidas que, porventura, possam ainda existir depois do relatório do Senador Anastasia, que, a meu juízo, conseguiu, com perfeição - como todos nós sabíamos que faria -, fazer os ajustes necessários à PEC que foi encaminhada ao Congresso Nacional. Acredito que, se ainda persistem dúvidas, como as que foram colocadas, elas já são passíveis de entendimento.
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Eu quero saudar os nossos convidados, a começar pela minha Deputada Ana Cunha, que é Vice-Presidente da Unale e representa o meu Estado do Pará nesta audiência, e, na sua pessoa, saudar o Presidente da Assembleia Legislativa do Pará, o Deputado Márcio Miranda, saudar os Deputados que o acompanham, a Deputada Ana Cunha, a Deputada Cilene Couto, o Deputado Raimundo Santos, o Deputado Iran Lima, e o Deputado Hélio Leite, que estava aqui ao lado.
Quero saudar também o Deputado Fernando Capez, de São Paulo, que é Presidente da Assembleia e Presidente do Colegiado dos Presidentes, saudar o Dr. Gabriel Sampaio, Secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, aqui representando o Ministro José Eduardo Cardozo, e saudar o Sr. Renato da Costa Figueira, Conselheiro Federal da OAB, que representa o Presidente da OAB, Dr. Marcus Vinícius Furtado Coêlho.
Deputados de todas as assembleias que prestigiam esta audiência, sejam bem-vindos ao Senado Federal.
Tivemos aqui, Senador Anastasia, na quarta-feira passada, uma afluência de Deputados na esperança de que a PEC fosse votada naquela reunião. Só do meu Estado do Pará havia 31 Deputados. Eles vieram comandados pelo Presidente, o Deputado Márcio Miranda, mas não puderam nem assistir à reunião, porque a sala estava lotada. Mas eu os encaminhei ao Auditório Petrônio Portella, de onde puderam assistir à reunião e ter conhecimento daquilo que é normal, o pedido de vista e a audiência para esclarecer essas dúvidas.
Minha formação não é jurídica. Então, eu vou...
O SR. SÉRGIO PETECÃO (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - AC) - V. Exª foi Deputado Estadual?
O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Não, não fui Deputado Estadual.
Mas aqui muito se falou em vereadores. Eu quero parabenizar as 15 assembleias legislativas que foram signatárias da PEC que, Senador Pimentel, trata daquilo que nós falamos aqui quase que semanalmente, com certeza, que é a necessidade da revisão do Pacto Federativo. Não há mais como o Congresso Nacional não se debruçar sobre esse tema.
O que nós estamos vendo aqui... O Senador Randolfe se preocupou em ir contra o Pacto Federativo como cláusula pétrea, mas não é a consequência. É apenas uma revisão necessária. Necessária. E o Senador Anastasia, no seu parecer, foi cirurgicamente competente quando transferiu alguns artigos que estavam na PEC, porque já estavam no art. 22 da Constituição, que V. Exª citou aqui. A própria Constituição já dava às assembleias o poder de legislar. Mas outros são necessários.
Como disse o Senador Anastasia, o Senado Federal e o Congresso Nacional já se debruçaram sobre a revisão do Código Civil, que entra em vigor agora, em 1º de janeiro de 2016. Talvez não seja o excelente, aquilo que todos nós gostaríamos que fosse, mas é o que foi possível, dentro da discussão e do consenso, estamos discutindo o Código de Processo Penal. Fizemos a discussão, e foi correto, Senador Pimentel, sobre a questão de mudar ou não a idade penal, a maioridade penal, e chegamos à conclusão de que seria mais correto nós alterarmos o estatuto, o ECA, para que nós pudéssemos fazer a adaptação, inclusive por uma sugestão do Senador Serra e do Governador Alckmin, que colocaram essa proposta, de que, se aumentasse realmente da forma como está, de três anos...
O SR. JOSÉ PIMENTEL (Bloco Apoio Governo/PT - CE. Fora do microfone.) - Não tem como educar.
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O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Quanto a esse problema de educar, Senador Pimentel, nós vamos, depois de alterar a coisa, ter que fazer um trabalho intenso através do Governo Federal, com a Pátria Educadora, para que a gente possa fazer esse trabalho de recuperação.
V. Exª tem toda razão quando diz que a pirâmide demográfica do nosso País já foi diferente, foi o contrário do que é hoje. Então, hoje nós caminhamos para um processo no qual a Europa já está. A Europa hoje está sofrendo isso. Estão vendo que, no futuro próximo, eles não vão ter a população economicamente ativa para sustentar aqueles que já chegaram à idade avançada. Então, eles estão... Até a questão da migração, problema que aflige o mundo todo, eles estão vendo que pode ser a solução que eles procuram.
Acredito, Senador Anastasia... O meu Estado, o Estado do Pará, como todos os Estados brasileiros, em especial neste momento pelo qual a nossa Nação passa, tem enormes dificuldades. Tem enormes dificuldades em todas as áreas. A questão de hoje não haver espaço no sistema penitenciário... E, pior do que não haver espaço, os que já estão no sistema penitenciário estão numa situação degradante. Quer dizer, não dá para colocar mais porque já não há dignidade no trato humano para com eles.
Mas, quanto à questão do direito agrário, Senador Pimentel, que o Senador Randolfe colocou, no meu entendimento, e o Senador Anastasia, no seu parecer, manteve o direito agrário como concorrente entre Estados e União, porque a grande maioria, eu diria, do conflito agrário no Estado do Pará é provocada pela União. A grande parte do desmatamento no Estado do Pará, a que o Senador Randolfe fez referência, e todos nós nos preocupamos com a questão ambiental, em especial nós amazônidas, porque nós sabemos que nós temos que preservar a Amazônia para as gerações que virão... Então, ninguém quer mais conservar. Eu não gosto de usar a palavra "preservar", porque preservar é como deixar intocável. Prefiro "conservar". Ou seja, você tem que fazer o meio ambiente estar em acordo, em consonância com a qualidade de vida do homem.
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Então, nesse aspecto, o Governo Federal precisa, sim, ter a ação do Estado, das assembleias legislativas, com relação ao Direito Agrário.
Eu tenho um projeto, que tramita aqui no Senado Federal, em relação às novas homologações de reservas, sejam indígenas, florestais, ambientais. Qualquer tipo de reserva, hoje, é feita por decreto. O Presidente da República, em seu gabinete, assina o decreto, e está criada a reserva, quando a Constituição diz que, para se criar uma reserva, é preciso, primeiro, fazer-se um levantamento do que existe no espaço - as pessoas que lá estão -, fazer a avaliação dos bens que lá foram constituídos, indenizá-los, para depois homologar. E a União faz exatamente o contrário: ela cria a reserva e, criando a reserva, ela cria o conflito!
Então eu acho, Senador Anastasia, que a criação dessas reservas deveria passar pelo Senado Federal, porque aqui nós representamos os Estados da Federação brasileira. Nós vamos poder opinar naquilo que é melhor para o Estado - de cada um dos Estados aqui representados.
Então, eu acho que essa concorrência na ação legislativa das assembleias com a União é importante. E o fato de as assembleias iniciarem a revisão do Pacto Federativo... Isso aqui não extingue o Pacto Federativo, não atinge cláusula pétrea; apenas faz uma revisão, pois temos que rever o Pacto Federativo na distribuição das receitas da sociedade brasileira, hoje concentradas na União em mais de 60%. E foi dito aqui que nós já transferimos deveres para os Estados e, em especial para os Municípios, mas, junto com a transferência das obrigações, não foram transferidos os meios para que essas obrigações fossem feitas. E é lá no Município que são cobradas essas obrigações, seja na questão da saúde, da educação, da segurança - no Município e no Estado, que é um ente mais diferenciado do que o Município. Porque, como foi dito, é no Município que todos nós nascemos, vivemos e morremos, e vamos cobrar. E o vereador, sem sombra de dúvida, é o para-choque, é aquele que sofre a primeira consequência.
Para concluir, Presidente, acho que foi o Senador Pimentel que fez uma referência aos vereadores e disse que terminava por "dor". Foi V. Exª? (Pausa.)
O governador também termina por "dor", Senador também termina por "dor".
O Sr. José Pimentel (Bloco Apoio Governo/PT - CE) - Alguns dizem que o Senador é "sem dor", viu? (Risos.)
O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Então, eu acho, Senador, que é importante todos nós dividirmos as dores.
O Sr. José Pimentel (Bloco Apoio Governo/PT - CE. Fora do microfone.) - E disseram que o Governador "governa a dor", viu? (Risos.)
O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Dividirmos as dores. Apesar de os deputados estaduais e federais não terminarem em "dor", eles também têm que dividir conosco as dores da sociedade brasileira, que, lamentavelmente, são muitas e intensas.
Mas nós vamos avançar nesse processo, com certeza absoluta. O Brasil é maior que a crise, nós vamos vencer essa crise e vamos caminhar, começando por essa PEC.
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Espero que ela sirva de estímulo, para que possamos dar continuidade efetiva à revisão do Pacto Federativo.
Parabéns a V. Exª, como Relator, e parabéns às assembleias legislativas por provocarem aquilo que é necessário para que este País se modernize. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. Bloco Oposição/PSDB - MG) - Muito obrigado ao Senador Flexa Ribeiro, que demonstra não só sua experiência, conhecimento e erudição, mas que traz do grande Norte conhecimento específico desses temas. Ele é uma liderança tão querida - respeitada, mas, sobretudo, querida. Agradeço as palavras carinhosas do Senador Flexa.
Passo a palavra, também por inscrição, ao querido amigo, eminente Senador Sérgio Petecão, do Estado do Acre.
O SR. SÉRGIO PETECÃO (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - AC) - Bom dia a todos! Na pessoa do nosso querido Senador Antonio Anastasia, queria saudar toda a Mesa, saudar os presidentes de assembleias, deputados estaduais, na pessoa do Deputado Chagas Romão, aqui presente, Deputado Estadual do PMDB. Quantos mandatos, Chaguinha? Cinco, seis?
O SR. CHAGAS ROMÃO - Estou no sexto.
O SR. SÉRGIO PETECÃO (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - AC) - Sexto mandato! É uma pessoa por quem eu tenho um carinho e uma estima muito grande.
Eu fui deputado estadual também por três mandatos. Fica até difícil dizer. Eu estava ouvindo ali no rádio a Deputada Ana Cunha; quando eu era deputado, já era deputada - quatro mandatos. E fui presidente da Assembleia do meu Estado por quatro mandatos. Esse tema que hoje nós...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. SÉRGIO PETECÃO (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - AC) - Não, não, era disputando na data da eleição. Não era comum no Amapá, não. Lá era no voto mesmo. Chagas Romão sabe disso. Ele votou muitas vezes em mim.
Esse tema que hoje nós debatemos aqui, nós já o estamos debatendo há quantos encontros da Unale? Eu sou do tempo da UPI (União Parlamentar Interestadual). O Presidente da UPI era um colega que nem era mais deputado, e era presidente da UPI. Nós tivemos que fazer uma intervenção. Não sei se os colegas aqui lembram. Na Paraíba. Destituímos o presidente da UPI e criamos a Unale.
O que eu vejo aqui é o seguinte. Não sou jurista, não sou da área. Eu penso que esse debate está nas melhores mãos que eu conheço aqui no Senado. Com todo respeito, nosso Líder Senador Antonio Anastasia, é o que nós temos de melhor aqui. Eu vejo aqui o Deputado Fernando Capez, uma pessoa muito preparada, assim como todo o time que está tratando deste tema, que é um tema palpitante.
Eu penso assim: as assembleias legislativas... O Randolfe levantou a situação aqui - ele já foi, não é? - sobre o Direito Agrário. Nós temos aqui vários representantes da Amazônia - está ali o Davi, que é do Amapá também -, Pará, Acre. Só não o Pimentel, que é do Ceará, mas é um amigo.
O SR. JOSÉ PIMENTEL (Bloco Apoio Governo/PT - CE) - Mas nós queremos as águas da Região Norte, porque o Ceará está muito seco. (Risos.)
O SR. SÉRGIO PETECÃO (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - AC) - Mas principalmente o Acre deve muito aos cearenses, que desbravaram nossa terra.
Aí eu vejo exatamente o contrário do colega. O Direito Agrário. Eu vejo exatamente o contrário do Randolfe, porque quando eu percebo essa vontade, essa sede do Parlamentar de dar a sua contribuição, porque ele vive o dia a dia... Nós não podemos pegar o problema do Amapá... É um problema, não pode ser referência. É um problema que tem de ser resolvido. Nós temos que encontrar os mecanismos de excluir, esses mecanismos, porque não é bom. Não é bom para o Parlamento, não é bom para a democracia, não é bom para nada. Isso não pode servir como referência. É uma preocupação.
Eu vou dar o exemplo lá do meu Estado. Lá no meu Estado, agora - o Deputado Chagas Romão deve estar sabendo disso -, está-se trabalhando muito com o manejo florestal. Isso é o maior engodo que existe no mundo. O colono, o seringueiro, não pode derrubar uma árvore, porque ele pode ser penalizado pelos órgãos fiscalizadores - Ibama, Imac, esses órgãos.
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Vem uma empresa de Portugal, não sei de onde, que compra uma área grande e vai fazer um manejo, o cara entra com 50 esquides dentro de uma área de 200, 300 hectares para retirar madeira. E o Governo Federal autorizou; não há nada ilegal, ele está lá certinho. Se o deputado estadual tivesse o poder de legislar, ele teria mais condições. Éramos nós ou eram eles que teriam mais condições de fiscalizar? Lógico que seriam eles.
Penso que deveremos - e vejo que essa audiência pública traz exatamente o que me preocupa - tratar esse tema com carinho que ele merece. Não podemos pegar alguns maus exemplos para tentar criar barreiras para não avançarmos nesse Pacto Federativo que tanto queremos.
Sinceramente - e falava aqui do Senador -, fui daqueles que, quando saí da assembleia legislativa, vim ser Deputado Federal, Senador Pimentel, e criei uma expectativa de que poderia resolver os problemas do Brasil todo. Disse: agora resolvo! E foi a maior decepção que tive, porque, ao estar no meio daqueles 513 ali, fiquei meio... E disseram que, quando eu chegasse ao Senado, seria o céu. Não há nada de céu, não há nada de céu.
Na semana passada aqui, cheguei a perder a cabeça. Venho do Acre. São três horas de voo, e, lá no Acre, temos o privilégio de sair na madrugada: você sai de lá uma hora da manhã para chegar aqui às seis horas por causa do fuso, que é de três horas. Então, é mortal.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. SÉRGIO PETECÃO (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - AC) - É um privilégio.
Só temos um voo. Aí, você chega aqui numa segunda-feira para trabalhar na terça-feira, não ter Ordem do Dia. Não tem Ordem do dia na terça, na quarta e nem na quinta, e os deputados estaduais querendo trabalhar, querendo legislar. Lá, os deputados estão querendo. Isso para mim é um exemplo claro de quem está querendo trabalhar, e nós aqui: "Ah, porque não saio o cargo do fulano, que não está andando...". Mas o Brasil precisa andar, e há um Parlamento que quer dar a sua contribuição.
Estou acompanhando esse processo há algum tempo já, e esse é um debate que a Unale já vem trazendo, porque a estrutura do Parlamento estadual é muito grande, e gasta-se muito dinheiro com isso. Lá no meu Estado, são 24 deputados estaduais; no Pará, não sei quanto, mas, no Acre, são 24. Gasta-se muito dinheiro e se produz pouco; produz-se muito pouco.
Vamos fazer uma homenagem, um título de cidadão ao governador, ao amigo do governador, e, de concreto mesmo, o que o Parlamento estadual está fazendo?
Estou aqui hoje, numa quinta-feira, que é difícil estar aqui, para demonstrar a minha preocupação e acho que vocês estão de parabéns. Foi um avanço grande sensibilizar alguns Senadores; estar aqui hoje discutindo com o nosso Senador Antonio Anastasia, que comprou essa briga, foi governador, sabe da importância do Parlamento estadual, sabe da importância desse grupo de Parlamentares de qualidade. Tem muita gente ruim, mas há muita gente boa, muita gente boa, muita. Conheço porque fui Presidente por quatro mandatos; há muita gente ruim, mas a maioria é gente boa, que queria produzir mais, quer produzir mais.
Acho que cabe a nós, aqui no Senado, também dar nossa contribuição para criar essa relação entre o Senado Federal e...
Não sei qual é o mecanismo, não sei, confesso a vocês que não sei, mas, quando vejo as pessoas que estão envolvidas, tenho certeza de que vamos encontrar os mecanismos necessários para que possamos tirar o Parlamento estadual dessa ineficiência.
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Não está produzindo. Temos de reconhecer que é preciso que os Parlamentos estaduais possam dar uma contribuição muito maior. O nosso País precisa disso. Eu tenho certeza de que nós vamos chegar, nós vamos avançar, nós vamos conseguir, porque há um grupo de Senadores e Deputados Federais - já conversei com alguns colegas Deputados Federais - que entendem a importância desse avanço nos Parlamentos estaduais.
Então, era isso.
Parabéns pela iniciativa! Parabéns, Presidente, Anastasia! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. Bloco Oposição/PSDB - MG) - Muito obrigado ao Senador Sérgio Petecão, a quem agradeço, inclusive, mais uma vez, Na semana passada, na audiência da CCJ - todos viram -, foi bastante combativo e também dedicado para o desfecho favorável, como está tendo, da tramitação desse projeto. Sua experiência como deputado estadual traz à tona também um valor muito importante, porque é testemunha, em razão do que experimentou como deputado estadual, da necessidade do aumento da competência e do leque de atribuições do corpo legislativo estadual. Muito obrigado pelas palavras do eminente e caro colega Senador Sérgio Petecão.
Indago ao Senador Davi Alcolumbre se gostaria de manifestar-se.
O SR. DAVI ALCOLUMBRE (Bloco Oposição/DEM - AP) - Não, Presidente. Só agradecer e parabenizar V. Exª pela audiência pública e pela condução da relatoria deste projeto importante para o Brasil.
Logicamente, em todos os projetos, há os favoráveis e os contrários. E esta Casa é o local apropriado para que as ideias e o convencimento possam prevalecer na tese da maioria, da aprovação ou da rejeição deste projeto. Este é o local apropriado. Este é o campo específico.
V. Exª, como um grande jurista, como foi citado por todos os Parlamentares aqui, tem larga experiência no processo e na causa. Então, nesse sentido, a minha participação aqui é apenas de participar do debate, ouvir as opiniões e poder, no momento oportuno, posicionar-me no sentido da votação.
Entendo também algumas preocupações apresentadas pelo Senador Randolfe no caso específico do nosso Estado, o Amapá, Senador Petecão. Entendo que isso não é a maioria também, porque existem, como V. Exª colocou, os bons e os maus, os ruins, o joio e o trigo, mas não pode ser o critério para o Brasil.
Também entendo que as assembleias têm que produzir, como V. Exª colocou, assim como as câmaras de vereadores também têm que produzir, porque são 5.570 câmaras de vereadores neste País e 27 assembleias.
V. Exª relatou o que aconteceu nesta semana aqui, que não é diferente de outras semanas que têm acontecido no Senado. Essa inércia, essa paralisação do Estado brasileiro está prejudicando o Brasil, e as assembleias, nos Estados, e as câmaras não têm competência para fazer o Brasil avançar por conta desse engessamento atribuído pela Constituição, o que está sendo debatido aqui no dia de hoje.
Então, eu queria cumprimentá-lo pela iniciativa. Quero continuar participando do debate. Quero ouvir os contrários para poder posicionar-me no momento oportuno. E fazer um registro também, porque foi dito ainda há pouco aqui do governador, não é isso, Senador Pimentel? Aí foi falado do "sem a dor". Só que tem a dor, que é o vereador. Só que tem gente, os Deputados que estão aqui - eu também fui Deputado Federal, assim como o Senador Petecão...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. DAVI ALCOLUMBRE (Bloco Oposição/DEM - AP) - Não tive essa felicidade de ser Deputado Estadual. Fui Deputado Federal. Mas há os Deputados Federais e Estaduais que conheço que falam que não é um privilégio só do governador ou do "sem a dor", que é o "decoitado" estadual e o "decoitado" federal. (Risos.)
Obrigado, Presidente José Maranhão. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Prosseguindo, com a palavra, o Dr. Renato, para as suas considerações finais.
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O SR. RENATO DA COSTA FIGUEIRA - Eminente Senador José Maranhão, que preside esta Comissão, volto a saudar os nobres integrantes desta Mesa, e o faço, para ser breve, saudando todos na pessoa do eminente Deputado, Presidente da Assembleia de São Paulo, Fernando Capez, eminente processualista.
Eminentes Senadores, doutíssima plateia, certa feita, respondendo a uma carta que se lhe fora enviada pelo eminente advogado do Rio de Janeiro, Evaristo de Morais, Rui Barbosa o aconselhou, mesmo quando a causa desfruta de antipatia popular, o acusado tem uma figura física assustadora, que isso não deve fazer o advogado recear da defesa de alguém.
Ouvi aqui manifestações de eminentes Senadores. Por exemplo, manifestou-se o eminente Senador José Pimentel, sem favor nenhum, essa glória do Nordeste, Senador pelo Ceará. Quero dizer a V. Exª que o admiro profundamente, como admiro os grandes advogados, os grandes juristas do Ceará. Lá tenho grandes amigos. Eu enumeraria, por exemplo, o eminente jurista, Professor Valmir Pontes, meu colega de Conselho Federal; Cândido Albuquerque, também colega de Conselho Federal; e esse constitucionalista que é a glória do Brasil, Paulo Bonavides. Então, quando ouvia V. Exª, era acometido de um temor reverencial. O que poderia dizer no sentido de reflexão, não no sentido de me confrontar com V. Exª. Sou um gaúcho lá do interior do Rio Grande, lá da região da fronteira, mas aprendi muito cedo que os monstros sagrados têm que ser respeitados. Então, o que direi, não tenho propósito, longe disso, não cometeria eu a estultice de pretender dizer nada aqui que me confrontasse com V. Exª ou com os demais eminentes Senadores.
V. Exª, eminente Senador Pimentel, com muita propriedade, tomou por exemplo as hipóteses de prisões. Existem milhares de mandados incumpridos por falta de prisões, é verdade. V. Exª afirmou também, com muita propriedade, que há milhões e milhões de processos tramitando no Poder Judiciário, e isso o levou a concluir que o problema não era de legislação; era de cultura. Nesse ponto, estamos raciocinando semelhantemente. A nossa diferença é do modo de olhar esta flor, é o modo de olhar para uma dama. Nós podemos os dois olhar para uma dama e dizer: "Admiro, encantadamente". Eu, mais velhinho, V. Exª, jovem ainda, e ficar olhando e admirando: "Mas que dama bonita". Mas alguém poderá dizer que o vestido da dama não está de acordo com a modernidade francesa. Alguém outro poderá olhar e dizer que a indumentária da dama destoa. Podemos discutir, mas estamos pensando igual, Senador.
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Há uma diferença. Penso que, se hoje há milhões de processos que abarrotam os tribunais, podemos discutir num outro momento, tratar e refletir sobre as causas verdadeiras. Se olharmos que há mandados aos milhares não cumpridos... Há falta de prisões? Sim, estamos de acordo.
Agora, vamos refletir olhando o outro lado dessa dama. O que será? Se V. Exªs entenderem de atribuir competência, ainda que concorrente aos Estados, às assembleias, aos governos estaduais, é preciso ter presente que nem todas as assembleias do Brasil têm a grandeza, a felicidade de serem presididas por um mestre do Direito como o Fernando Capez. Mas imaginem, por exemplo, que seja atribuído competência aos Estados para legislar sobre processo - aí eu novamente focalizo o ponto de vista que nos preocupa epidermicamente - e que lá se crie um motivo a mais para prenderem. Se hoje são milhões de mandados incumpridos, milhares de ações cautelares indevidamente... Pode-se dizer que cerca 50% dos presos no Brasil hoje são presos cautelares; não são presos com sentença condenatória definitiva. Não! São prisões cautelares.
Imaginem atribuir competência aos Estados para tratar de prisões. Amanhã, não vamos contar com 40%, 50%, 60% de prisões cautelares. Corre-se o risco de isso se propagar, de se aumentarem não aritmeticamente esses números, mas geograficamente. Isso é uma coisa a se mostrar para todos os Estados do Brasil. É preciso ter uma preocupação muito grave sobre isso aqui.
Imaginem tratar de prazo processual. Imaginem que, amanhã, os Estados possam tratar uma lei disciplinando prazo processual. Imaginem que alguém entenda: "Não, mas vamos dar um prazo, esses advogados têm muito tempo, em vez de 15 dias vamos dar dois dias, 48 horas, 24 horas para tratar de um prazo processual." São questões epidérmicas que estão na maneira de olhar. Amanhã, nós não diremos apenas: "Ah, faltam prisões..." Diremos: "Podem se edificar prisões, prisões e prisões, porque isso não dará vencimento".
Hoje já se prende, eminente Senador... V. Exª conhece muito melhor que eu sobre isso. V. Exª é uma figura de proa da vida jurídica nacional, deste Senado. Imaginem conferir poder para os Estados legislarem sobre processo penal. Isso fere uma garantia pétrea.
E eu queria prestar uma homenagem ao Senador Randolfe Rodrigues, que estava aqui há pouco. Eu queria fazer uma referência a S. Exª. Eu sou um observador do Senado. Certa feita, quando o Senador Randolfe se manifestava, pelo menos na minha visão aqui, me chamou logo a atenção. E me perdoem por fazer essa colocação, mas esse moço é brilhante, de uma coerência lógica no seu pensamento, de uma exuberância cultural nas suas observações. Não é uma questão de entender que apenas aqueles velhinhos possam ser senhores do saber, longe disso, mas me impressionaram vivamente as colocações do Senador Randolfe quanto as fez hoje aqui. E, um dia, falando com o meu amigo, ex-Senador Pedro Simon, eu lhe disse que o Senado tem um número formidável de ilustres Senadores. Perguntei-lhe: "O que você me diz desse jovem Senador Randolfe Rodrigues?".
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Eu não sabia de que Estado era, não tinha me fixado. O Simon me disse assim: "Renato, eu também, desde o primeiro dia em que esse moço aportou no Senado da República, fiquei vivamente impressionado, e a minha impressão positiva cada vez é maior, cada vez que eu tenho o prazer de ouvi-lo". Eu queria, nesta observação, Senador Randolfe - sei que V. Exª não precisa disso, mas é um dever de consciência de um velho advogado -, cumprimentá-lo em nome do ex-Senador Pedro Simon, com essas colocações.
Pois bem, eu concluo, antes que o eminente Presidente me casse não só a palavra, mas a possibilidade de eu permanecer aqui e mandar me expulsar daqui. Eu quero dizer que, para nós advogados, para o Conselho Federal da Ordem dos Advogados, para a Ordem dos Advogados do Brasil, a questão de permitir competência, atribuir competência aos Estados, para legislar, nessa PEC... Até se, um dia, em um sonho, eu pudesse dizer que sou um Senador, eu pensaria como o Senador Anastasia e o Senador Randolfe, para resumir. Como isso eu não posso fazer, nem em sonho, quero dizer que eu concluo as minhas manifestações, invocando o que foi lido há pouco aqui pelo Senador Randolfe, do ensinamento produzido pelo eminente jurista de São Paulo José Afonso da Silva, no seu livro Direito Constitucional Positivo: toda lei que, mesmo indiretamente, tenha a tendência de ferir, atingir direitos individuais, cláusula pétrea é!
E eu concluo, entendendo que essa emenda, na parte que trata de autorizar os Estados sobre matéria processual, ela - "datíssima máxima vênia"... Peço a todos os santos, a todas as santas, especialmente, e aos eminentes Senadores e Senadores que me perdoem. Não entendam que vim aqui trazer doutrinamento. Longe disto! Estou apenas manifestando um ponto de vista do Conselho Federal para a doutíssima consideração dos eminentes Senadores. E o Conselho Federal deposita, nas luzes do vosso saber, uma decisão que haverá de sair daqui, uma decisão lúcida, como habitual.
Com essas palavras, eu homenageio a cultura, a seriedade, o saber dos eminentes Senadores que compõem esta Casa. E peço permissão para me recolher à minha cadeira aqui, para continuar aprendendo.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Prosseguindo, tem a palavra o Deputado Fernando Capez, Presidente do Colegiado de Presidentes das Assembleias Legislativas, claro.
O SR. FERNANDO CAPEZ - Bom, querido Presidente Senador José Maranhão, da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, eu quero - acho que falo em nome de todos os deputados estaduais -, manifestar o meu entusiasmo com esta audiência pública que foi requerida pelo Senador José Pimentel, mui digno Líder do Governo.
Eu não quero aqui parecer coloquial, mas eu classifico como sensacional esta audiência pública. Uma audiência focada, objetiva, substanciosa, serena. Eu, que estou no meu terceiro mandato de deputado estadual, jamais vi, na assembleia legislativa, nesses três mandatos, uma audiência como esta. Quero, mais uma vez, agradecer aos Senadores, especialmente ao Senador José Maranhão, ao Senador José Pimentel, ao nosso querido Senador Antonio Anastasia, e ao Senador Sérgio Petecão, que abriu mão de seu tempo, na semana passada, para nos dar a palavra.
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Fiquei impressionado com o Senador Flexa Ribeiro. Se o senhor nunca fez Direito, pode dar aula para muitos de nós, pela lógica do seu raciocínio, sua persuasão racional. Realmente foi esplêndido.
Quero também cumprimentar o nosso eminente Senador Davi Alcolumbre e o nosso Senador Randolfe Rodrigues também, que faz um belíssimo trabalho.
A ideia da audiência é que vocês nos ouvissem, e vocês nos ouviram. E somos gratos por isso.
Meu querido Dr. Renato, eu estive terça-feira com o Presidente Nacional da OAB, meu amigo, irmão, Marcus Vinicius Furtado Coêlho. E claro que o senhor está aqui representando-o, mas não senti nele essa postura radical contra a nossa PEC - vou até conversar com ele. Fiquei assustado, porque dá a impressão de que 15 assembleias legislativas se reuniram para instituir uma inquisição em cada Estado. E sair prendendo todos os investigados.
Aqui, quero deixar claro mais uma vez, prisão, seja prisão processual, seja decorrente de sentença condenatória, prisão é núcleo constitucional intangível. É competência inarredável do Congresso Nacional. A prisão é algo tão caro ao Constituinte e tão cara à interpretação do Supremo Tribunal Federal, que as comissões parlamentares de inquérito, que têm poderes de investigação próprios de juízes, não podem decretar prisões no curso de sua investigação. Não há possibilidade de que essa PEC esteja autorizando leis estaduais a criarem prisões de caráter cautelar processual. E o parecer, o relatório do Senador Antonio Anastasia, eminente cultor do Direito Constitucional, esclarece ainda mais. Quando se fala que a competência concorrente para o direito processual vai ficar com União e Estados, §1º: "no âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais".
Mas o que são normas gerais?
O Senador esclarece, §2º: "As normas gerais versam sobre princípios". Eu quero lembrar aqui o princípio do art. 5º, inciso LV, da Constituição, princípio constitucional da ampla defesa. O art. 5º, inciso LIV, principio constitucional do contraditório. E o art. 5º, inciso LVII, principio do estado de inocência. Qualquer regra que venha a afetar esses princípios é norma geral. Norma geral pelo texto é de competência da União, não dos Estados. Mas se existe - e eu acho que essa é a beleza, a grandeza da audiência pública -, se existe por parte da OAB, aqui representada por um advogado criminalista de mais de 40 anos de experiência, por alguém que atuou no tribunal do júri durante tantos anos.... E o saudoso Waldir Troncoso Peres, um dos príncipes dos criminalistas, deixou em testamento: "Quando eu morrer, quero ser enterrado com a mesma beca com a qual eu defendi tantos dos acusados, porque, se numa intolerância, São Pedro fechar as portas do Paraíso para mim, eu poderei impetrar o último habeas corpus que será desta feita em causa própria, e ingressarei".
Nesse ponto, eu instituí na assembleia, como Deputado, o prêmio para os advogados criminalistas. Dei a Comenda Príncipe dos Advogados Criminalistas de São Paulo ao saudoso Ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. Se a Ordem dos Advogados do Brasil, através do Dr. Renato Figueira, manifesta essa preocupação, tenho certeza de que, da parte dos proponentes das assembleias, não há nenhum problema que seja aclarado isso, esclarecido, limitado e que não se deixe margem a nenhuma dúvida, embora nós não tenhamos dúvida. Conhecemos, como o Dr. Renato, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, nós podemos deixar isso mais claro: in claris cessat interpretatio, já dizia Carlos Maximiliano.
Então, esse é o primeiro ponto.
Questão de prazos. Qual o problema de os Estados definirem prazos diferentes nas investigações?
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Hoje, está aqui um delegado de polícia, Antonio Olim. Ficou muitos anos na Divisão Antissequestro do Deic de São Paulo. Hoje, praticamente em todos os Estados, 30 dias para o delegado fazer o inquérito policial. Vencidos os 30 dias, ele manda o inquérito para o juiz. O juiz ouve o promotor. O promotor pega uma pilha de inquéritos que está na sua frente, já com o carimbo "concordo com a dilação de prazo", "concordo com mais 30 dias", assina e usa os carimbos. Volta para o juiz e vai para o delegado de polícia.
Só aqui são 30 dias para investigar e 60 dias para a tramitação burocrática, para ir e voltar, e a Constituição Federal determina, no art. 37, a observância do princípio da eficiência.
Então, a questão do prazo pode ser discutida também.
Nós temos aqui o Senador José Pimentel, com sua experiência. Foi Ministro, Senador, político há vários anos. Estamos aqui, e eu estou no meu terceiro mandato. Estamos começando ainda essa difícil arte de exercitar a política, que demanda muita experiência e conhecimento. Concordo plenamente. A experiência dele não poderia levar a outro ponto. É evidente que a solução da Justiça não está na lei, em fazer mais e mais leis.
Nós precisamos de estrutura para o Poder Judiciário, processo eletrônico, simplificação de prazos, de procedimentos, diminuição de custos, mas há algumas coisas que as assembleias gostariam de poder discutir. Nós temos um custo. O Poder Judiciário paulista custa R$13 bilhões. São R$13 bilhões por ano, 24 milhões de processos. Desses 24 milhões de processos, 14 milhões são execuções fiscais. Uma lei estadual, ajustada às realidades do Estado, às necessidades peculiares, poderia estabelecer um procedimento prévio de cobrança consensual, administrativa, não judicial, desonerando o Poder Judiciário da carga excessiva.
São temas como este que gostaríamos de colocar.
Senador Randolfe Rodrigues. Dr. Renato, concordo com o senhor. Quero subscrever integralmente a sua petição de menção honrosa à atuação desse grande Senador. Ele coloca com muita propriedade - é um Senador que se está destacando, já há algum tempo - a questão de o Direito Agrário ser legislado pelos Estados. Claro que há risco, sim. As assembleias legislativas sofrem, sim, ainda. Estão tentando se libertar, mas há influência do Executivo sobre o Legislativo. Estamos procurando cada vez mais buscar essa libertação. Há o risco, sim, de que venham, eventualmente, em determinados Estados, até no meu, leis estaduais que possam levar a essa questão. Mas eu lembraria o seguinte: o Direito Ambiental já é de competência concorrente, já é de competência dos Estados concorrentemente com os Municípios. E até hoje não aconteceu. Levar o Direito Agrário também, como para o Direito Ambiental já existe para os Estados, a meu ver, não acrescentaria risco maior, mas podemos também, evidentemente - quando digo "podemos", refiro-me aos deputados estaduais que estão vindo aqui pedir -, fazer mais sugestões, já que os senhores estão sendo tão generosos, democráticos com o Parlamento estadual.
Os crimes ambientais são definidos pelo Congresso Nacional. As penas por crimes ambientais também, mas, claro, se há um risco de que isso ocorra, temos que tomar cuidado, temos que ter cautela.
A questão da lei complementar, que é correta. V. Exª se apercebe disso, com todo o direito que é. A lei complementar federal pode autorizar Estados a legislar sobre temas específicos da competência privativa. Mas faço um apelo: estamos, já, há 27 anos da Constituição Federal. Não veio essa lei. Foi tão difícil para as assembleias se unirem, formularem essa PEC; foi tão difícil mobilizarmos mil deputados, que se estão reunindo, sem personalismos, apenas com o objetivo de deixar um legado. Que V. Exª olhasse com bondade a possibilidade de que, eventualmente, por meio de uma PEC mesmo, eliminado qualquer risco, pudéssemos prosseguir nessa caminhada. Quero dizer que esta PEC procura ampliar o conceito de Federação, e não reduzi-lo.
Ademais, acho que a nossa gratidão. Realmente, não esperávamos que viéssemos a ser tratados assim, não esperávamos toda essa compreensão.
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Está de parabéns o Senado e a atual composição de Senadores. Que os senhores consigam se reeleger por muitos e muitos mandatos, porque a sociedade e os seus Estados precisam de representantes como os senhores.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. JOSÉ PIMENTEL (Bloco Apoio Governo/PT - CE) - Só há uma dificuldade: não abre espaço para os novos. (Risos.)
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - E nós queremos, eventualmente, o senhor aqui.
O SR. FERNANDO CAPEZ (Fora do microfone.) - O Serra, o Aloysio e a Marta não concordam. (Risos.)
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Concedo a palavra ao representante do Ministério da Justiça para aduzir algumas explicações sobre esta última fase da audiência pública.
O SR. GABRIEL SAMPAIO - Eu gostaria de agradecer, mais uma vez, pela participação neste tão importante debate e de agradecer ao Presidente, Senador José Maranhão.
Eu gostaria de dizer que, para o Ministério da Justiça, em especial, no posto que ocupo, estar em contato direto com o Senado Federal e com os Senadores - e, a cada dia, aprendo, cada vez mais, nessa labuta diária - é sempre um prazer.
Aqui, o nosso objetivo é reforçar o trabalho de contribuir com o processo legislativo. O Ministro teve oportunidade de receber, já algumas vezes, a visita do Deputado Fernando Capez. E, certamente, temos a avaliação de que o tema, de fato, é meritório e, sabemos, na sua essência, respeitador da Constituição. Então, muito claramente, temos essa avaliação.
Ressalto que, em tudo aquilo que o Ministério da Justiça puder contribuir, além das palavras que o Ministro já trouxe aos representantes das assembleias legislativas, também aqui, neste debate, nós também, por meio da nossa Secretaria, dispomos de uma linha de pesquisa que chamamos de Pensando Direito. Naquilo que for tratado aqui como elemento de insegurança ou naquilo em que haja necessidade de um aprofundamento do debate acadêmico, há a possibilidade de acionar a nossa equipe de consultores e de juristas que podem contribuir ainda mais para aquilo em que houver algum nível de necessidade de aprofundamento nesse debate acadêmico, e também há a possibilidade de, por meio do Ministério, contribuir a partir dessa linha de pesquisa.
Das considerações que foram feitas, eu acho que aqui as mais pulsantes dizem respeito tanto...
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Peço licença ao orador para fazer uma comunicação da parte do Dr. Capez. Ele vai pegar o seu avião agora, às 13h50, e está pedindo licença para se ausentar.
O SR. FERNANDO CAPEZ (Fora do microfone.) - Eu tenho de estar às 16h em São Paulo, pois temos uma sessão solene com o Roberto Kalil, médico do Sírio...
Perdão.
Desculpe, Gabriel.
O SR. RENATO DA COSTA FIGUEIRA - Gabriel, me permitiria um aparte, antes que o eminente professor daqui se retire?
Eu queria dizer, eminente Deputado Fernando Capez, que nós estamos em pleno acordo, na Ordem, de conversar e ver com os Senadores a possibilidade de se restringir... A minha preocupação é no sentido, como muito bem colocado, como sabiamente colocado, como é proverbial de V. Exª em suas manifestações, de delimitar esse campo. Nós estamos absolutamente abertos. Pode ter a convicção, pode retornar para São Paulo convicto de que não há nenhum radicalismo deste velho advogado e muito menos do Conselho Federal. O que pode ter ocorrido, muitas vezes, é a paixão. E advogado que não se apaixona pela causa, como V. Exª ensina sempre, é um advogado com a capitis diminutio. Então, quando defendo meus pontos de vista, sobretudo, em matéria epidérmica, pode parecer radicalismo, mas não é. É apenas uma questão de colocar. Eu estou em pleno acordo com V. Exª para conversarmos sobre isso. As luzes de V. Exª sempre são importantes, elas conduzem para um bom resultado.
Eu só pedi um aparte para colocar deste modo: estamos abertos, vamos conversar.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Dr. Gabriel, V. Exª pode continuar.
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O SR. GABRIEL SAMPAIO - Quero reforçar, então, os pontos que foram colocados.
O Senador Randolfe manifestou, em sua fala, preocupação em relação à alteração das normas de licitações de contratos públicos. Digo que a atual redação do art. 22, a própria redação do artigo trata de normas gerais de licitação. Portanto, nesse aspecto, com a alteração promovida por meio da PEC, ao colocar na legislação concorrente que à União também competem as normas gerais, o impacto seria dado nesse sentido. Até estamos aqui diante de um professor eminente da matéria, que é o Professor e Senador Antonio Anastasia. Então, nesse sentido, faço só esta observação: como, na competência privativa da União, ela trata de normas gerais, o impacto teria de ser visto a essa luz.
Em relação ao Direito Agrário, na minha fala inicial, eu trouxe um pouco das questões históricas do nosso federalismo e do nosso Direito. E, quando falamos do Direito Agrário, é importante lembrar a Lei de Terras, de 1850, que, talvez, tenha sido a maior responsável por grande parte das desigualdades diretamente ligadas à questão étnica do nosso País. Eu, que sou descendente de famílias escravizadas, de trabalhadores escravizados, tenho plena clareza da diferença existente entre o tratamento do Direito Agrário sob a ótica da nossa Constituição de 1988 e de brilhantes Parlamentares, como os que hoje estão debatendo essa matéria, e o que foi a edição da Lei de Terras, em 1850, certamente responsável pelas grandes desigualdades sociais e raciais que vivemos no nosso País hoje.
É, certamente, muito importante que esse tema seja debatido à exaustão. Não tenho dúvida de que, à luz da nossa Constituição e desse debate exaustivo, seremos capazes de avançar sempre mais no tratamento democrático dessa matéria. Neste momento, como os Senadores colocam, há uma preocupação especial diante da importância da discussão em torno dos conflitos agrários no nosso País e da própria imbricação desse tema com o Direito Ambiental e com outras matérias constitucionais.
Também foram mencionados aqui pelo Senador Pimentel alguns pontos. Apenas registro que nós, conjuntamente, temos construído um debate sobre a questão, que é muito bem tratada aqui, da penitenciária, da segurança pública e dos próprios direitos das crianças e dos adolescentes. No Ministério da Justiça, do ponto de vista normativo, naquilo que é fundamental na nossa atuação nas políticas públicas, temos buscado nos consorciar com os debates, para que possamos, de um lado, enfrentar o encarceramento em massa que vivemos no nosso País, efetivar do ponto de vista da criança e do adolescente seus direitos fundamentais e conseguir ter, na segurança pública, uma atuação que seja capaz de enfrentar os problemas que estão no nosso cotidiano de forma epidérmica, como bem tratou o nosso nobre advogado Renato Figueira.
Para encerrar, apenas menciono que, ao tratarmos do tema levantado pelo Senador Randolfe - o parágrafo único do art. 22 dispõe sobre a possibilidade de lei complementar autorizar os Estados a legislarem sobre questões específicas das matérias relacionadas ao artigo -, hoje, temos apenas uma lei complementar que trata dessa matéria, que é a mais conhecida, que é a Lei Complementar nº 103. Então, a experiência do Legislativo nesse ponto, como bem colocou o Senador, de fato, é muito curta, é de apenas uma lei. Então, este é um debate também a ser feito: o quanto mais pode ser avançado no âmbito das leis complementares autorizadas pelo art. 22.
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Então, na Lei Complementar nº 103, a autorização foi dada para instituir o piso salarial a que se refere o inciso V do art. 7º; piso salarial envolvendo servidores públicos municipais, empregados domésticos... Enfim, uma única legislação. Também é um tema que pode ser avançado do ponto de vista do debate legislativo aqui.
Então, encerro para dizer e colocar o Ministério da Justiça à inteira disposição. Dispomos de uma vasta equipe técnica, e há possibilidade de aprofundamento deste debate.
Agradeço imensamente a oportunidade de estar aqui.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Concedo a palavra ao Senador Antonio Anastasia.
O SR. ANTONIO ANASTASIA (Bloco Oposição/PSDB - MG) - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Na qualidade de Relator, eu gostaria de agradecer muito a V. Exª por ter convocado para esta data esta audiência; agradecer e cumprimentar a iniciativa do Senador José Pimentel e a presença dos nossos convidados; e dizer que acho que foi de grande aprendizagem para todos nós que participamos. Os Parlamentares bem como os convidados eminentes ficaram aqui pela manhã, nesta já longa audiência, mas, como eu disse, muito produtiva, auscultando diversas posições de um tema que não é singelo, mas extremamente relevante para a Federação brasileira. Ouvi, colhi, apreendi de fato diversas situações e ensinamentos, e naturalmente vamos travar debates agora com os Líderes dos diversos partidos, do Governo, no âmbito da CCJ, para que o relatório possa ser aperfeiçoado em razão, exatamente, das sugestões que foram aqui colhidas para avançarmos na votação da PEC.
Eu gostaria tão somente de fazer aqui rápidas observações.
O Senador Randolfe saiu, mas, de fato, ele tocou aqui em dois aspectos que não posso deixar de comentar. O primeiro deles - em que o Dr. Gabriel de maneira muito lúcida acaba também de se manifestar, como secretário nacional de Assuntos Legislativos - é que, quando se trata de direitos, as normas gerais de licitação em contratos administrativos, isso é matéria, por tradição, de autonomia dos Estados federados; contratação administrativa e licitação. Na verdade, a União passou a legislar sobre normas gerais e, de maneira equivocada, colocou isso no art. 22. Não deveria ser lá; são normas gerais. Tanto são normas gerais, que os Estados podem legislar hoje inclusive. Então, a PEC tão somente reposiciona aquilo que já existe, sem nenhuma novidade.
Da mesma forma, a lei complementar possível para esta edição é para assunto específico, como foi o caso da legislação para fixar o piso salarial de trabalhadores, de servidores. Ela tem que ser votada caso a caso para uma situação determinada e específica, e nós sabemos que isso, na prática, dificilmente ocorrerá para dar robustez às competências legislativas das nossas assembleias.
Por fim, também, um esclarecimento, Senador Pimentel. Houve uma dúvida levantada pelo Senador Randolfe, mas delicada, quando ele coloca que essa PEC poderia ferir cláusula pétrea. É o contrário, porque ferir cláusula pétrea é abolir a Federação; nós estamos é fortalecendo a Federação, jamais abolindo. Então, também é uma preocupação que não tem persistência.
Por fim, concluindo, eminente Presidente, parece-me que há dois temas que acabam sobrenadando como mais relevantes: o tema processual, que o Dr. Renato coloca, cuja discussão já havia ocorrido anteriormente - e o Prof. Fernando Capez, com o preparo que tem, demonstrou, de modo muito claro, a necessidade de nós distinguirmos processo e procedimento, já que procedimento hoje já é competência dos Estados. Então, vamos tentar melhorar o texto para garantir, em termos procedimentais, o que é o procedimento para que os Estados tenham competência verdadeira, e não fique aquele dispositivo como uma quimera, o que seria um efeito prático. E a questão de Direito Agrário, vis-à-vis ao Direito Ambiental, para colocar de fato uma competência em articulação, já que é direito concorrente, competência concorrente, com as determinações da União.
Não vejo dificuldades para que a redação possa compor nesses dois pontos, que foram aqueles mais acesos durante os debates nesta audiência.
São os comentários, eminente Presidente, que, na qualidade de Relator, eu gostaria de fazer aqui de modo geral.
Muito obrigado a V. Exª.
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O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. Bloco Maioria/PMDB - PB) - Eu quero, no momento em que chegamos ao final desta audiência pública, ressaltar a importância dela para o processo de aperfeiçoamento desta legislação nova, pioneira, corajosa, cuja tarefa de empreender o Senado da República tomou para si.
E como foi importante esta audiência pública! Eu até peço desculpas aos presentes porque há outros deveres. Aqui, temos de ter o dom da ubiquidade - embora não seja pretensão aquele dom que só Deus tem de estar simultaneamente em vários lugares diferentes -, porque nós somos convocados para reuniões das próprias comissões técnicas nos mesmos horários, e estavam hoje programadas duas reuniões pela manhã, uma extraordinária e outra ordinária, do Senado da República. e forma que peço vênia aos presentes que ainda estão aqui.
Neste momento, quero registrar a presença do meu Estado na pessoa do Deputado Raniery Paulino, um desses valores da política na Paraíba e que, certamente, estará, mais cedo ou mias tarde, aqui também representando a Paraíba, como outros paraibanos ilustres. É um jovem preparado, inteligente, Líder da Bancada do PMDB na Assembleia Legislativa do Estado e vem fazendo um trabalho extraordinário.
Quero agradecer aos Senadores pela presença, inclusive àqueles que estiveram quase até agora e que saíram por razões superiores, e felicitar, mais uma vez, o Senador Antonio Anastasia, como jurista, pelo trabalho que fez no seu relatório e, sobretudo, pela abertura, pela humildade, com que diz que, depois desta audiência pública, ainda terá muito que aperfeiçoar no seu relatório. E nós vamos aprender com Anastasia, que está aqui não por acaso, mas pelos seus méritos como jurista e como grande Parlamentar;
Muito obrigado a todos. (Palmas.)
(Iniciada às 10 horas e 24 minutos, a reunião é encerrada às 13 horas e 22 minutos.)