26/10/2015 - 5ª - Comissão Senado do Futuro

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Declaro aberta a 5ª Reunião da Comissão Senado do Futuro.
Audiência pública com a finalidade de debater o tema "futuro das cidades e as cidades sustentáveis".
Em função de um pequeno atraso do nosso voo, vou já convidar aqui todos aqueles presentes, iniciando pela Srª Gabriela Yamaguchi, que é Gerente de Comunicação e Campanhas do Instituto Akatu.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Ah, não chegou ainda.
Convido, então, o Sr. Mariano Francisco Laplane, que é Presidente do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. S. Sª já está presente.
Convido o Sr. Oscar de Morais Cordeiro Netto, Professor do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade de Brasília.
Seja bem-vindo!
Convido a Srª Nazaré Lima Soares, Gerente do Departamento de Zoneamento Territorial do Ministério do Meio Ambiente.
E, ainda, o Sr. Tom Rebello, que é o sócio da CIP/Intercon Consultoria Internacional, que, acredito, não chegou ainda.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Então, são dois que não chegaram: a Gabriela Yamaguchi e, também, o Tom Rebello. Creio que devem estar chegando.
Eu teria uma fala a fazer, conforme está aqui programado, mas, em função desse atraso e também como o nosso palestrante Mariano tem um compromisso - também questão de voo, espero que o voo dele não atrase para ele poder sair -, vamos tentar ser bem objetivos.
Nesse aspecto, conforme divulgado na pauta e nas redes sociais, informo que a presente reunião será realizada em caráter interativo, ou seja, com a possibilidade de participação popular. Dessa forma, os cidadãos que queiram encaminhar comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania, no endereço www.senado.leg.br/ecidadania. Quero repetir para os internautas: www.senado.leg.br/ecidadania, ou ligando para o número 0800-612211. Informo ainda que serão emitidas declarações de participação, tanto aos cidadãos aqui presentes quanto aos que participam pelo Portal.
Como os convidados já se encontram no plenário da Comissão e aqui à mesa também, de acordo com o art. 94, incisos II e III, do Regimento Interno do Senado Federal, a Presidência adotará as seguintes normas: o convidado fará a sua exposição por 15 ou 20 minutos - e teremos toda a tolerância possível - e, em seguida, abriremos a fase de interpelação, por três minutos, para os presentes e, também, para Consultores Legislativos e cidadãos que se inscreveram.
A palavra será concedida de forma intercalada entre aqueles que quiserem se manifestar, bem como aos participantes e aos Senadores que aqui estiverem. Lembro que já passaram por aqui o Senador Medeiros e o Senador Cristovam Buarque, que é o Vice-Presidente desta Comissão. Encontrei-me com ele ainda agora; ele tentou ficar mais um pouco, mas tem outra palestra neste momento.
Quero, então, passar inicialmente a palavra ao Sr. Mariano Francisco Laplane para fazer a sua exposição, ele que é Presidente do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.
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Antes, porém, de conceder a palavra a V. Sª , eu quero fazer apenas um esclarecimento: a Comissão Senado do Futuro é uma comissão nova no Senado; começou a funcionar dois anos atrás; houve um breve intervalo em função do ano eleitoral. O primeiro Presidente, Senador Henrique, acabou falecendo. Então, coube a nós estarmos agora, neste ano, na reorganização. Esta é a segunda reunião que a gente faz, na forma de audiência pública, e, diferentemente das outras comissões, esta não é uma comissão deliberativa. Portanto, de acordo com as possibilidades, estamos organizando os nossos trabalhos , fazendo uma parceria com a Casa.
Muitas pessoas, quando ouvem "Comissão Senado do Futuro", imaginam que, com esse nome, estaríamos aqui apenas para discutir o Senado do futuro. Mas, na verdade, a proposição desta Comissão, quando foi criada, é exatamente a de discutir o futuro da sociedade, e aí, claro, inclui-se o próprio Senado.
Queremos discutir hoje, como tema bem claro, a questão de como construirmos, de como convivermos, de como trabalharmos no sentido de fazer um ambiente bom de se viver. O Brasil, principalmente, é um país que teve, a partir da década 90, um êxodo rural muito grande. Hoje, de forma inversamente proporcional ao que tínhamos antes, mais de 80% da nossa população é urbana e, consequentemente, com os problemas decorrentes dessa situação. Por isso, nós entendemos que o tema de hoje é extremamente pertinente para a sociedade brasileira.
Como eu estava explicando, esta não é uma comissão deliberativa. Então, a gente não tem aqui a rigidez de que o debatedor tenha que falar e não possa ser interpelado. Na verdade, a gente quer construir, para o ano que vem, quem sabe, a possibilidade de a gente ter um auditório que não fosse um auditório tradicional, como o auditório do professor e o aluno. A gente gostaria de fazer, inclusive, com um formato diferenciado, exatamente para promover o debate.
Esclarecido isso, então, eu quero passar a palavra ao Sr. Mariano Francisco Laplane.
O SR. MARIANO FRANCISCO LAPLANE - Muito obrigado, Senador, pelo convite.
É uma honra poder representar aqui o CGE, trazendo, espero, contribuição relevante para o debate do tema das cidades sustentáveis.
Eu começo dizendo...
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Como é de praxe, eu também queria esclarecer que tudo isso aqui está sendo gravado. Não sei se está sendo transmitido ao vivo, pois há uma programação no Youtube, mas, provavelmente, a gente ainda tenha alguma transmissão ao vivo. Mas está no Youtube, nos meios de comunicação da Casa, e, obviamente, tudo isso aqui constitui um acervo, para que a gente possa discutir em outros momentos também.
Então, por que a gente fez na segunda? Exatamente porque, embora na segunda seja mais difícil de trazer os parlamentares, temos mais tempo suficiente, na Casa, para discutir os temas.
Muito obrigado.
O SR. MARIANO FRANCISCO LAPLANE - Muito obrigado, Senador.
Continuo, então: o ponto de partida da minha intervenção é a constatação de que vivemos num planeta urbano. Essa é uma imagem muito conhecida, que reflete a intensidade do uso da Internet no mundo, e obviamente o uso da internet espelha a concentração urbana nos diversos continentes. Então, acho que é pertinente dizer que vivemos num planeta urbano, que fazemos parte de uma civilização urbana.
Neste século XXI, pela primeira vez, a população do Planeta que mora em cidades ultrapassou a população das áreas rurais. Inclusive na América Latina. Em meados do século XX, em 1950, a América Latina tinha apenas 42%, para ser mais preciso, da sua população morando em cidades. Já nos anos de 2010, início do século XXI, nós já tínhamos 80% da população, ou seja, dobrou a proporção da população morando em cidades, na América Latina, nesse período tão curto. E se suspeita que, até 2030, essa porcentagem continue aumentando, até atingir 84%.
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O crescimento urbano não se dá de maneira homogênea. São as grandes cidades as que deverão continuar concentrando uma boa parte da população da nossa região. Vejam que a previsão para o ano de 2030 é de que haverá 49 cidades na América Latina com mais de um milhão de habitantes. Em 1950, existiam apenas sete. Destas 49 que terão mais de um milhão de habitantes em 2030, 16 estarão no Brasil. Ou seja, o Brasil concentrará uma proporção importante de cidades de um milhão ou mais de habitantes. As cidades de 50 a 500 mil habitantes são as que apresentam, desde os anos 90, um crescimento mais rápido.
Então vejam: as cidades são, merecidamente, o foco da atenção de todos aqueles que se preocupam com a qualidade de vida, com a qualidade do meio ambiente. E eu acho que, por isso, não poderíamos ter um tema mais relevante para discutir hoje, à tarde, aqui, nesta Comissão.
Quando a gente pensa nas cidades e na sua origem histórica, na Europa, na Ásia, imediatamente, a gente associa o surgimento desses aglomerados à importância dos centros mercantis, originalmente, e, depois da Revolução Industrial, grandes centros manufatureiros que concentram o emprego ofereciam também a possibilidade de concentrar, na medida em que a industrialização avançava, também a oferta de serviços mais sofisticados, de saúde, de educação, serviços financeiros.
E, efetivamente, essa é a realidade das cidades no mundo, incluindo aquelas da América Latina. Só que as nossas cidades conseguem sobrepor essa realidade a outra... Essa é a típica cidade industrial, pós-industrial. No nosso caso, essa realidade se superpõe, coincide com outra, não tão brilhante, não tão positiva, de diversas formas de precariedades: precariedade na habitação, precariedade na segurança, precariedade de modo geral na infraestrutura e também, também de degradação ambiental.
Então, nossas cidades têm essa característica de concentrar, ao longo da sua história, não apenas as virtudes, as qualidades boas do nosso desenvolvimento como sociedade, mas também as mazelas. Essa é uma herança que nossas cidades carregam.
Então, a pergunta é a seguinte: qual é o sentido da sustentabilidade das cidades no nosso caso, no caso da América Latina, em geral, no caso do Brasil, mais em particular? Como caracterizar, como definir uma cidade sustentável como meta, como projeto, como ambição, como alvo das nossas políticas, como alvo das nossas iniciativas públicas e privadas? Alguns termos aparecem e, imediatamente, intuições de que deve ser uma cidade inclusiva, a qualidade de vida e de moradia deve estar garantida, deve ser um espaço não de confronto, mas, sim, de reconciliação entre o habitante urbano e a natureza, deve ter uma distribuição equitativa, um acesso viável aos serviços essenciais, deve ter um impacto ecológico, uma pegada ecológica baixa, deve ser uma cidade resistente, por exemplo, a desastres naturais e também - por que não? - econômicos.
Todos nós ouvimos falar daquelas cidades que nascem e morrem com alguma atividade econômica que não se pereniza, mas também ouvimos falar dos desastres ambientais cada vez mais frequentes. Essa semana, os jornais do mundo inteiro noticiaram o furacão no México, ameaçando cidades no litoral mexicano do Pacífico.
Enfim, devemos ter cidades inseridas, de maneira sustentável, na sua região e assim por diante, onde os indivíduos e a comunidade possam prosperar. Mas toda essa imagem idílica, desejável, certamente ambiciosa, deve ser trazida a nossa realidade contemporânea.
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Não estamos partindo de zero; estamos partindo de menos alguma coisa. Nosso ponto de partida está abaixo de zero e, portanto, devemos trazer o conceito de cidade sustentável para o contexto de um país emergente, de um país em desenvolvimento, de um país que tem uma longa trajetória de evolução urbana, que tem grandes cidades e outras de porte médio e outras pequenas com história. E é em relação a este presente que nós devemos traçar uma trajetória rumo à sustentabilidade.
Por que eu faço essa introdução? Porque eu tenho visto, em algumas discussões sobre cidades sustentáveis, algumas aproximações um pouco dicotômicas. As cidades do futuro, as cidades desejáveis são cidades verdes. Eu entendo o sentido dessa colocação, mas eu quero dizer taxativamente: cidades sustentáveis, no nosso caso, são mais do que uma cidade verde. Não nego a importância, a relevância da agenda ambiental, mas devíamos perceber que ela está muito atrelada às cidades que amadureceram com uma outra trajetória e enfrentam, hoje, desafios, que, em alguma medida, nós também temos, mas ocorre que temos, além desses, alguns outros. Eu não gosto de uma apresentação bastante canônica do problema da abordagem ou da aproximação para uma cidade sustentável que nos coloca como agenda marrom a ser desenvolvida em paralelo uma agenda verde.
Entendo a lógica disso, porque a agenda marrom nos lembra de que temos problema de saneamento, de moradia, de que temos áreas degradadas - ambiental, econômica e socialmente degradadas que precisam ser recuperadas - e que nós temos, ainda, problemas gritantes associados à desigualdade de acesso aos recursos para desenvolver qualquer tipo de vida decente, inclusive a urbana.
Então, eu entendo a importância dessa agenda, assim como entendo, a importância da agenda verde. Nosso desafio é conjugar essas duas agendas numa agenda positiva muito calcada no conceito de desenvolvimento sustentável aprovado pelas Nações Unidas.
Uma cidade sustentável tem sustentabilidade ambiental, sim, como na "agenda verde”, mas ela precisa ter também sustentabilidade econômica e sustentabilidade social. Esse é um primeiro desafio.
O segundo desafio que temos é o de adequar essa agenda de sustentabilidade nas três dimensões - econômica, social e ambiental - a realidades diferentes. No caso das grandes cidades, das grandes metrópoles que nós já constituímos - e temos várias -, temos uma agenda de sustentabilidade associada à mitigação dos desastres urbanos que nós já produzimos. No caso das cidades médias e das cidades pequenas, termos uma agenda associada a introduzir a sustentabilidade agora, antes que seja demasiado tarde.
Então, vejam: os desafios não são poucos, mas não podemos ter a mesma agenda de sustentabilidade para os macro polos, que aparecem retratados nesse mapa a partir de um estudo que o CGE fez para o Ministério do Planejamento em 2008 - Estudo da Dimensão Territorial do Planejamento no Brasil -, que nos lembra apenas de que não podemos ter a mesma agenda de sustentabilidade para macro polos urbanos, como São Paulo, Rio, Belo Horizonte, Salvador, Recife, Fortaleza, Manaus, todos os que aparecem ressaltados em vermelho, e para os novos polos urbanos - Belém, São Luiz, Porto Velho, Cuiabá, Campo Grande -, ou para as cidades de porte médio em todos os Estados brasileiros.
As três dimensões, quando pensamos em sustentabilidade e percorremos a escala da rede urbana brasileira, tipificando seus problemas, são o melhor ponto de partida que nós podemos ter para pensar, refletir, planejar e executar uma agenda de sustentabilidade na rede urbana brasileira.
Nós estamos no CGE - e, com isso, eu concluo - desenvolvendo um estudo, encomendado pelo Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação, que focaliza apenas na dimensão ciência, tecnologia e inovação para a sustentabilidade.
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De que maneira a ciência, a tecnologia e a inovação podem nos ajudar a caminhar nessa matriz de três dimensões e de diversas escalas de problemas urbanos? O estudo, que deve ficar pronto no final do ano - e, assim que ficar pronto, encaminharemos aqui à Comissão e aos outros membros do painel - foca em temas interconectados que dão conta dos eixos do estudo: saúde, agricultura, resíduos sólidos, água, segurança, governança, edificações, energia, economia, resiliência, mobilidade, educação.
Nós, além de nos propormos a atingir determinados objetivos, explicitar os pressupostos com os quais imaginamos como avançar nessa agenda, como anteciparmos a trajetória, gerar desafios sobre a sustentabilidade, imaginar o futuro, criar conhecimento através da consulta ampla a todos os atores envolvidos, pretendemos estabelecer também alguns critérios para estruturar essa legenda, para priorizar as ações que possam surgir nessa agenda, como, por exemplo, priorizar aquilo que promove a participação social, aquilo que promove a inclusão social da cidadania, a reconciliação entre o homem e a natureza, o que é viável economicamente, o que promove o acesso a recursos e serviços, o que promove a redução do impacto ecológico, da pegada ecológica e o que promove maior resiliência e segurança para os habitantes das cidades.
Com isso concluo, Senador e outros membros do painel.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Temos várias perguntas de internautas que já começam a chegar aqui. Eu vou ler algumas, intercalando aqui com os expositores.
Há uma de um xará meu, Wellington Ferro de Souza, de São Paulo. Ele pergunta:
Cidades com populações próximas a 20 mil habitantes, para seguir o Estatuto das Cidades, contratam firmas para fazer seus planos diretores. Esses planos são feitos sem ouvir a população local.
Não seria o caso de fazer uma lei federal que coíbe essa prática antidemocrática?
Com relação a essas perguntas, aqueles que entendem que devam respondê-las, ainda porque elas não são dirigidas especificamente a um ou a outro, peço, por gentileza, que já as anotem, para que cada um, a seu tempo, possa respondê-las. Inclusive, talvez, até na própria fala vocês já poderiam também incluir essa resposta.
Ainda outra:
Além do Estatuto das Cidades, não são necessárias leis que balizem os inúmeros planos diretores Brasil afora?"
A Resolução do CONAMA nº 369, de 2006, protege as áreas verdes urbanas já existentes. Não seria o caso de criar leis obrigando o poder público municipal a criar novas áreas verdes urbanas?
O Greenpeace, ONG internacional, criou o movimento "Cadê o Plano de Mobilidade Urbana?", em que, através do mapa do Brasil, os internautas podem saber o andamento do PMU das principais capitais brasileiras e, através de e-mails, cobrar os prefeitos responsáveis.
Nesses aqui ele está mais fazendo um esclarecimento.
O Dia Mundial sem Carro, 22 de setembro, é uma data celebrada internacionalmente em cidades do mundo inteiro, com o objetivo de estimular uma reflexão nas pessoas sobre o uso excessivo dos automóveis e motos.
Ainda há mais algumas, depois aqui a gente vai na sequência.
Eu quero registrar também a presença conosco da Srª Gabriela Yamaguchi, Gerente de Comunicação e Campanha do Instituto Akatu.
Na sequência, concedo a palavra ao Sr. Oscar de Moraes Cordeiro Netto, que, repito, é Professor do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade de Brasília.
Com a palavra V. S ª.
O SR. OSCAR DE MORAES CORDEIRO NETTO - Boa tarde a todos.
Sr. Senador, agradeço o convite e saúdo a todos, em nome do Senador. É uma satisfação estar aqui discutindo esse assunto.
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Na verdade, eu até vou fazer um contraponto e discutir a questão de sustentabilidade a partir de um exemplo de insustentabilidade, que é justamente como a gente encontra boa parte das cidades brasileiras. E, um pouco assim pela minha formação na área de engenharia, vou citar um caso concreto, bem próximo de nós, aqui; vou falar um pouco do DF e do Entorno, especialmente de uma área de ação pública importante, que é a área de saneamento básico.
O futuro das cidades sustentáveis, pensando a insustentabilidade, tendo como base o saneamento básico na RIDE DF e Entorno. A gente está se inspirando num projeto que estamos fazendo com o Ministério das Cidades de pensar saneamento nas RIDEs, nessas Regiões Integradas de Desenvolvimento, justamente regiões onde existem conurbação entre unidades da Federação diferentes e vários conflitos interinstitucionais.
Saneamento, segundo a definição da própria OMS, é o controle de todos aqueles fatores do meio físico que podem ter impactos no ser humano. É por essência algo que foca na saúde do homem, foca na qualidade de vida e é um setor, na verdade, pleno, eu diria assim, encharcado de externalidades. É por isso que, muitas vezes, há problemas seriíssimos de gestão, ou seja, tanto as externalidades positivas não são levadas em conta quando se pensa e quando se gerencia o serviço de saneamento, quanto também as externalidades negativas que ele provoca são consideradas. Então, muitas vezes, fica quase como um serviço burocrático a responsabilidade da cidade, sem se levar em conta todas as interfaces que existem.
No caso do saneamento, para a gente refletir, a gente tem vários dados importantes. Falou-se da questão urbana, e a maior parte da população urbana tem abastecimento de água, e isso é importante, porque, no Brasil, definimos saneamento básico a partir da Lei nº 11.445, de 2007, como sendo assim a gestão de quatro serviços ligados à questão da saúde pública na cidade: abastecimento de água, esgotamento sanitário, a drenagem urbana, a questão das águas da chuva, e um problema seriíssimo que nós temos que é a questão da gestão dos resíduos sólidos, do lixo urbano.
Então, nós temos dados que dão conta de que estamos ainda bem distantes de atingir essa universalização, essa vontade que o Brasil tem de poder satisfazer 100% das necessidades dos seus cidadãos urbanos.
O melhor quadro é o quadro do abastecimento de água, mas, no esgoto, por exemplo, grosso modo, a gente tem - ali nós temos os percentuais mais exatos, mas eu faço uma conta rápida -, de chegada, que praticamente nós só coletamos 50% dos esgotos produzidos na cidade, ou seja, metade. Dessa metade que a gente coleta, a gente só trata metade; e dessa metade que a gente trata, a gente trata mal uma metade.
Então, a situação de fato, fazendo aí a continha, é que do bom atendimento em esgotamento sanitário nas cidades nós estamos em 12,5% dos lares brasileiros urbanos. É uma situação de total insustentabilidade, até em função dos enormes impactos negativos que se tem. Com a falta também de esgoto, a gente vê aí vários e vários casos de doenças, de degradação ambiental. Estão aí o Rio Tietê e a Baía de Guanabara a nos mostrarem casos bem concretos.
E, aí, há alguns dados também sobre custos que estariam associados a essa universalização.
A gente vai ver algumas dessas externalidades a que eu fiz menção. Por exemplo, aqui, eu cito o caso de imóveis em áreas com saneamento chegam a valer até 14% mais do que outros imóveis que estão em áreas não servidas por saneamento. Isso significa um ganho para o proprietário e, não necessariamente, isso vai reverter, como eu falei das externalidades positivas, em mais investimento em duas vezes para o saneamento.
Aqui há outros casos em outras áreas. Depois eu vou falar sobre essa figurinha que aparece aí do lado.
Nós temos que, no turismo, caso a gente tivesse, nas nossas cidades todas, litorâneas, interioranas com certo atrativo turístico, o pleno saneamento, a gente poderia conseguir até 500 mil postos de trabalhos com o pleno atendimento.
Quando os turistas estrangeiros chegam ao Brasil, o que mais os choca, o que mais lhes causa espécie é justamente lixo nas ruas, falta de saneamento adequado. E isso tem um enorme impacto econômico, não é?
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A probabilidade de uma pessoa com acesso à rede de esgotos faltar às suas atividades é menor - 20% - do que a de uma pessoa que não tem acesso. Então, imaginem, em termos de dias de trabalho, de produtividade, de faturamento, a diferença que faz a simples presença da rede de esgoto.
Aqui aparecem alguns dados também. Esse é um chavão, uma referência que sempre faz a OMS: para cada dólar investido em saneamento há R$4 de volta em economias no serviço público de novo.
Nós vivemos na paradoxal situação em relação à água, por exemplo. Aquele mapa esquematizado do Brasil ali mostra que temos enormes perdas nos sistemas, com serviços extremamente mal geridos. As perdas de faturamento na Região Norte são de 51%, ou seja, do que se coleta de água para uma cidade perdem-se 51%. Essas perdas são físicas. Como é um sistema pressurizado, existem vazamentos, problemas de operação. Mas também há perdas econômicas, como o gato, que existe também nas redes de água: pessoas furtam água e se servem dela. Nesse caso, essa água não é faturada.
De fato, esse percentual é enorme no Brasil inteiro. A média está em volta de 40%, eu diria - esse é um dado da Sabesp. Então, 40% do que se coleta de água são desperdiçados e não são faturados pelos prestadores de serviço. Só para se ter uma ideia de referência, o Japão tem uma média menor que 10%; Tóquio tem uma média de 4%, 5% de perda comparada com a média de 40%. O recorde mundial é de Singapura, que conseguiu ter uma gestão eficiente desse recurso, e a perda é da ordem de 3%.
Para refletirmos também, nós temos a questão da educação. De novo, se houver universalização do acesso, coleta de esgoto e água tratada, haverá uma redução de quase 7% no atraso escolar. Isso também foi medido por meio de estatísticas e análises em regiões em que o funcionamento, de fato, é a variável mais importante, preponderante. A diferença de aproveitamento escolar entre crianças que têm ou não têm acesso ao saneamento pode chegar à ordem de 18%, 20%.
Vejam quantas externalidades importantes existem e que não são levadas em conta.
Há alguns dados para refletirmos, mas o interessante é que, em vários Estados brasileiros, em 11 Estados brasileiros, nas casas há mais televisão, eletrodomésticos do que rede de esgoto e banheiros. Então, vemos que, de fato, talvez esteja havendo uma inversão de valores e de importância nas nossas habitações urbanas.
Eu falei aqui da pesquisa feita com a Universidade de Brasília. A partir de um termo de cooperação com o Ministério das Cidades, estamos estudando questões de saneamento básico nas RIDEs. Isso envolve as três RIDEs oficiais do Brasil: a nossa RIDE DF e Entorno - a RIDE em que vivemos - e mais duas outras RIDEs que são a de Juazeiro e Petrolina, Pernambuco e Bahia, e a de Grande Teresina, Maranhão e Piauí, que envolve Timon, Município maranhense. Nessas redes, temos problemas intermunicipais e interestaduais de saneamento, mas podemos pensar em soluções. Essa é uma atribuição do Ministério das Cidades.
Nós estamos justamente nessa fase do diagnóstico analítico, com algumas conclusões preliminares, que vamos trazer aqui, em relação ao caso da RIDE DF. Para mostrar algo mais concreto, próximo de nós, trago um exemplo aqui. A RIDE DF e Entorno foi criada por lei. Ela é constituída pelo DF, que é, na verdade, o coração econômico, populacional da RIDE. São 19 Municípios goianos e três Municípios mineiros. É um enorme território. Na verdade, é um território de 55 mil quilômetros quadrados, maior que Sergipe, Alagoas e o próprio Rio de Janeiro, com uma população de 3,7 milhões, que, em 2010, era uma população superior a 15 Estados brasileiros. De fato, é uma região sui generis, dadas todas as interfaces que temos aqui. Das três, é a RIDE mais rica, mais populosa, mais extensa e mais desigual. Há exemplos bem gritantes dessa desigualdade na nossa região.
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Aqui eu trago um mapa de ocupação dessa RIDE. Aqui há laser? Não sei se há. Vejam ali, claramente, o DF. Temos situações, de fato, de conurbação entre áreas do DF e áreas do Entorno - quem conhece, aqui, Valparaíso, no Sul; Águas Lindas; Formosa; Planaltina de Goiás. Então, de fato, existem aí soluções que interferem, de um Estado em outro, em saneamento, e temos também regiões em que até o crescimento urbano se dá no limite do DF. É o caso de Formosa, Planaltina. A gente vê que o que está impedindo a expansão da mancha urbana é simplesmente uma razão política: a presença do Distrito Federal aqui.
Há também outros casos de manchas urbanas mais distantes - a gente vê Unaí, a gente vê ali a própria Cristalina. Mas Cristalina tem distritos, encostados no DF, que têm característica urbana - aliás, uma característica dessa área é a presença de distritos que, muitas vezes, têm população maior até que a própria sede municipal, com todos os problemas urbanos. E, quando se fala em urbano, a gente pensa, tradicionalmente, nessa questão da sede municipal; às vezes, os dados do próprio IBGE estão concentrados na sede municipal, e, na realidade, a gente tem situações urbanas em vários distritos aqui.
Vou apresentar, então, rapidamente, aqui, alguns problemas e vou, depois - ouviu, Senador? -, não só falar de problemas, mas também pensar em soluções de sustentabilidade, pelo menos sugerir, mas a partir de um caso concreto, a partir de uma vivência. Como falou meu antecessor, nós partimos, de fato, de abaixo de zero. Quer dizer, temos um enorme passivo ambiental e sanitário em grandes cidades brasileiras e em outras aglomerações. Temos de resolver esse passivo sanitário e pensar além nessa questão da sustentabilidade.
No abastecimento de água, a gente tem vários tipos de gestão de serviço. Há empresas regionais, serviços autônomos... Temos isso em diferentes casos. Com relação à captação da água, temos uma situação em que... Normalmente, se aproveita a água de rios, mas, às vezes, há impacto, em termos de poluição, de outro Município, outra cidade. Tem se usado muito poço, mas de uma maneira desordenada, e, muitas vezes o poço entra para poder correr atrás da expansão urbana desordenada.
A gente tem situações como a de Águas Lindas de Goiás, aqui pertinho, onde existem 190 poços profundos e toda a cidade é abastecida por 112 poços. Vocês imaginem a dificuldade organizacional para organizar a distribuição de água, trabalhando com 112 fontes diferentes. Isso tudo se deu pela rapidez da urbanização da cidade de Águas Lindas. E não é só em Águas Lindas; eu também tenho isso em Valparaíso, tenho em Luziânia.
Outro problema: o rejeito desse tratamento de água, muitas vezes, polui os rios; então, temos vários problemas dessa natureza. Na época de chuvas, há estações que se paralisam em função da turbidez da água, da água barrenta que se forma. Há águas subterrâneas com ferro e manganês, algas que prejudicam, e o uso, às vezes, de poços, sem a necessária desinfecção da água. Chega-se a distribuir água sem a cloração, até desrespeitando uma norma legal, uma portaria do Ministério da Saúde que obriga que toda a água distribuída para a população tem de ser desinfetada, tem de ser clorada.
Então, vários outros casos. Eu coloquei em vermelho, ali, só para chamar a atenção de que, muitas vezes, falamos em cidade, mas temos de pensar nos distritos e aglomerados que existem em cada um desses Municípios. Para falar concretamente, a gente tem Cocalzinho de Goiás aqui perto; há um distrito chamado Girassol que já é maior do que a própria sede municipal.
No esgotamento sanitário, quando ele é assegurado - porque em várias cidades não há rede de esgoto alguma -, de novo é o mesmo prestador de serviço. Então, a gente já nota aí uma certa pulverização em prestação de serviços. A gente pensa em saneamento integrado, mas, na verdade, a gente vê que, dependendo do setor de saneamento, eu vou encontrar um prestador diferente, dentro do mesmo Município.
Tenho situações de lençol aflorante, de poluição. Vou até passar para um mapa, onde fica mais fácil a gente ver. Esse é o mapa da nossa região. Em amarelo, assim, mais amarelo, são os únicos dois Municípios em que as sedes urbanas têm mais de 90% de rede de esgoto cobrindo a área urbana. Então, de 23 Municípios, vamos chamar assim, só dois - Unaí, em Minas, e Mimoso - é que têm esse percentual.
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Num segundo nível assim, respeitável, aceitável, há mais três que têm mais de 50% de cobertura da área urbana, que são o Distrito Federal, Padre Bernardo e Abadiânia. Todos os outros têm menos de 50% de cobertura de rede nas áreas urbanas, ou seja, como falei, coletam-se menos de 50% do esgoto produzido. E este esgoto vai para onde? Vai poluir o lençol freático, outros rios e gerará um enorme impacto.
Outro problema seriíssimo na nossa região, até pela topografia - estamos aqui num planalto - é, quando saímos deste planalto, a questão da drenagem urbana. Em Brasília, uma cidade planejada, já vimos padecendo com problemas sérios com as enchentes urbanas, e não deveríamos, porque, se tivesse sido pensado, planejado, não deveríamos estar passando por isso. Mas são vários os problemas com drenagem urbana. E a maioria dos Municípios tem algum tipo de tubulação ou de sistema bem precário, mas, por exemplo, sistemas mais elaborados, com galerias maiores, com retenções, canais, só vamos encontrar aqui, no Distrito Federal. Algo que nos causa espécie e preocupação é que não existe nenhum cadastro disso. Na verdade, só o DF tem algum tipo de informação; em todos os outros Municípios, essa informação não existe. Então, teríamos até um trabalho importante para conhecer o que existe de cano que passa por debaixo das ruas. Vários Municípios têm problemas sérios de erosão, sabemos disso aqui, Planaltina de Goiás, Valparaíso, problemas seriíssimos, há erosões que engolem ruas inteiras, áreas inteiras, e várias com problemas de alagamento.
De novo, um mapinha aqui, que mostra problemas erosivos. Então, vê-se que praticamente toda a região tem problemas sérios de erosão. E, aqui, um mapinha sobre alagamentos, onde se vê que boa parte, inclusive o Distrito Federal, tem sérios problemas de alagamento.
Vamos, rapidinho, passar para o último componente, saneamento básico, o último, talvez o mais complexo, que é a gestão dos resíduos sólidos urbanos. Temos uma situação que beira já, eu diria, nesta região nossa, quase à insolvência. Não sei se os senhores sabem, mas temos aqui, no Distrito Federal, entre outros recordes nacionais, o maior lixão da América Latina, que fica aqui dentro do limite do Distrito Federal. Enquanto, nessa questão de resíduos sólidos, outras regiões do Brasil souberam avançar, aqui - e isso se reflete nas cidades do Entorno -, temos uma relação muito complexa com esta questão dos resíduos sólidos.
São vários e vários os problemas, como a ausência de informações e monitoramento. Não se conhece, na verdade, o que se produz de lixo, tudo é feito de forma muito empírica e através de dados indiretos. A maioria dos Municípios não têm cobrança de taxa de lixo; é como se fosse um serviço prestado via IPTU, pela Prefeitura. Então, dos 23, só quatro têm taxa de lixo, o DF incluso. Existem também modos de gestão bem diferenciados; não há modelos de gestão muito claros sobre isso - empresas privadas, empresas públicas, serviços públicos.
Só existem dois aterros na região que são licenciados ambientalmente; todos os outros não o são, funcionam como lixões ou como aterros, dito controlados, controlados porque são cercados e não se permite o acesso, mas não são executados como manda a engenharia, para evitar impactos ambientais.
Temos que pensar seriamente, aqui, em questões de aterros regionais e trabalhar com certas soluções que Estados como Santa Catarina e Rio Grande do Sul já conseguiram avançar. Aliás, a Região Sul merece um certo destaque, porque tem conseguido tratar essa questão dos resíduos sólidos urbanos de uma forma mais sustentável e mais organizada.
Aqui mostro os únicos dois aterros que existem. Inclusive, o aterro da Cidade Ocidental está chegando ao final de sua vida útil; daqui a dois, três, anos, não poderá mais receber. E temos só um aterro, que é o de Planaltina, que está agora, inclusive recebendo resíduos do Distrito Federal. Está sendo construído, hoje, o Aterro Oeste, que, entretanto, só ficará pronto no ano que vem. Então, é uma situação complicada.
Aqui, tenho a produção de lixo. Essas são esferas proporcionais à produção de lixo em cada Município. Vejam que, nessa parte do DF e nos Municípios ao sul - Valparaíso, Cidade Ocidental, Luziânia, Águas Lindas -, temos aí todo o interesse em buscar uma solução adequada, regional. Quer dizer, operar um aterro sanitário é complicado, é complexo, e aqui, certamente, temos que pensar em soluções mais sustentáveis.
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É importantíssimo o planejamento. Então, aí, eu vou até fazer um comentário: em termos de leis e regulamentos, eu acho que nós avançamos. Nós temos uma lei de saneamento, de 2007, que já prevê que, de certa maneira, haja um quadro normativo que permita que se possa fazer alguma coisa. Não vejo que o problema esteja nas leis, mas sim na prática. E nós tínhamos aqui uma determinação do decreto, que regulamentou a lei de 2007, pelo qual todos os Municípios brasileiros deveriam ter o seu Plano de Saneamento Básico municipal aprovado pela Câmara dos Vereadores até o final deste ano.
Nós estamos chegando a uma situação surrealista na qual praticamente apenas 10% dos Municípios do Brasil têm os seus planos aprovados.
Então, se nós pegarmos aqui a nossa RIDE DF, veremos que só um Município, dos 23, o Município de Cocalzinho de Goiás, aprovou o seu Plano Municipal de Saneamento. Então, existe aí toda uma falta de prioridade dada a isso pelos governantes, e eu acho que existe até a espera de que essa data limite, 31 de Dezembro, venha a ser alterada, como se alterou a data dos aterros sanitários. Então, joga-se para frente, para a próxima administração, a solução dos problemas.
Bom; eu falei em muitos problemas, mas também a gente pensa que existem propostas e ações de sustentabilidade. Então, eu faço, aqui, algumas proposições para a gente pensar, alimentar - e, de novo, estou pegando só uma dimensão da sustentabilidade, mais como um exercício para trabalhar com algo concreto, de pensar a cidade, de pensar o futuro. É de se pensar, primeiro, em um novo modelo de gestão do serviço de saneamento básico. Do jeito que está, a gente vê enormes disfunções que estão ligadas muito a gestão dos sistemas.
Essencial - e aqui se falou nisso até em uma pergunta de um internauta - é o controle social dos serviços. Quer dizer, não se vê sustentabilidade nesses serviços de saneamento se não houver o controle social, se a sociedade não estiver lá cobrando. Um aterro sanitário você pode até construir, mas, se ele for mal operado, ele vira lixão em um, dois, três meses. Então, é um dinheiro, é um recurso público totalmente desperdiçado e tem que haver o controle social. Esse é um pouco o espírito da lei. Pela lei de saneamento, em todo o processo, desde a construção de diagnóstico até a implementação do plano, é necessário que haja instâncias de audiências públicas, de aprovação, envolvendo o controle social.
Outra questão muito importante é o plano de metas. Algumas cidades, nessa perspectiva de sustentabilidade, já têm adotado, algumas cidades brasileiras maiores, mas não precisam ser planos de metas essencialmente, mas planos integrados de saneamento ou outros, os próprios planos diretores urbanos podem incorporar essa dimensão. A gente vê, na verdade, vários documentos técnicos urbanos totalmente dissociados uns dos outros, e a gente tem condições de trabalhar essa articulação.
E algo que tem sido, na minha avaliação, pouco utilizado é a utilização de instrumentos econômicos. Se você não cobra uma taxa de lixo pelo menos, como é que você vai dar sinalização para o cidadão de que aquele serviço é importante? Não se cobra por ele, é algo que se tem como gratuito, mas que, na verdade, tem uma enorme externalidade negativa.
Rapidinho, se eu for pensar em água, claramente trabalhar nesse princípio de redução de perdas, no uso eficiente das reservas de águas que estão disponíveis e em um uso mais parcimonioso dessas águas subterrâneas que são verdadeiros patrimônios do futuro. O uso que se faz, hoje, é uma verdadeira hipoteca que a gente está passando para as gerações futuras, de uma água de boa qualidade, em reservas que estão sendo utilizadas e desperdiçadas hoje em dia.
Se eu pensar em esgotos, tenho de pensar em soluções descentralizadas para tratamento de esgoto, que são, muitas vezes, eficientes. Aproveitamento energético! Não se entende porque, no Brasil, a gente, não aproveita a possibilidade de geração de energia pelos processos de tratamento com a produção de gás. Outra coisa também importante, é um incentivo maior ao reuso da água. Vejam: muitas vezes, não é uma questão de norma, é uma questão de você ter um incentivo fiscal. Assim, você consegue elevar a situação para determinado ponto.
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A drenagem urbana também é um desafio novo. Primeiro, a gente tem que conhecer o que existe de drenagem e trabalhar com a adoção das soluções compensatórias. Hoje já se pensa em drenagem de um modo totalmente diferente. Na verdade, quando eu me formei engenheiro, drenagem boa era aquela que você tinha boca de lobo e tubo (galeria) para afastar a água, o mais rápido possível, de lá onde ela caía. Então, se a água cai aqui, afasta-se essa água. Simplesmente a gente está exportando o problema para baixo. As pessoas que moram aqui na 202 Norte, aqui na Asa Norte, sabem disso. De alguns anos para cá, houve um enorme problema de enchentes simplesmente em função de mudanças no padrão de ocupação à montante. Então se exportaram problemas.
Na verdade, a nova doutrina, eu diria, o mais novo paradigma da drenagem é você reter a água o maior tempo possível lá onde ela cai, facilitando a infiltração e facilitando a retenção. É mudar! Aí, de fato, em uma visão sustentável, tem um enorme desafio aí para os nossos técnicos, para os nossos engenheiros e os nossos gestores públicos, porque eles continuam pensando - a caixinha deles funciona com tubo e boca de lobo. E o uso também de instrumentos econômicos. Já existem cidades no Brasil em que o IPTU é proporcional à área impermeabilizada no lote. Quanto mais você impermeabilizar o seu lote, mais drenagem de chuva você causa. Então, que você pague mais por isso, porque você vai gerar maior pressão sobre os equipamentos urbanos. E trabalhar com o que a gente chama de retrofit. Já existem os equipamentos e vamos tentar incluí-los dentro de uma visão moderna de gestão.
E, finalmente, para a questão dos resíduos sólidos - eu termino aqui, desculpando-me se eu avancei no meu tempo, Senador, mas é um assunto que me apaixona -, temos que pensar na gestão regional dos rejeitos urbanos. A gente tem que mudar também a nossa cabeça sobre o fato de que o lixo todo tem que ser mandado para um aterro ou para algum lugar. O que vai paro o aterro é aquilo que não tem mais jeito. Porque o que a gente puder aproveitar a gente aproveita, seja na reutilização seja na reciclagem. O nosso quadro normativo e fiscal com relação à reutilização e à reciclagem é um dos mais retrógrados do mundo. Não temos nenhum incentivo fiscal, e aí, por exemplo, eu vejo que esta Casa poderia ter um papel importante em repensar instrumentos fiscais para favorecer a questão da reciclagem, a questão também da reutilização. Fomentar esses mercados.
E aí há o papel importantíssimo, também, que é o papel da educação. O instrumento mais importante de todos é a educação e a mudança de valores. Não sei se os senhores sabem, mas, hoje, a gente produz mais lixo. Antigamente a gente tinha uma continha onde a produção per capita de um País ou de uma cidade era proporcional à renda. Hoje isso está bem diferente; não é mais assim. Até ao contrário, hoje países mais ricos têm produzido menos lixo por habitante do que países emergentes. Nós, brasilienses, produzimos mais lixo que os habitantes de Estocolmo. Brasileiros produzem, em média, mais lixo do que os suecos. E, às vezes, um lixo que tem um enorme valor, porque a gente está mandando para um aterro sanitário - nem para um aterro sanitário, mas para um lixão - aquilo que tem valor energético, tem valor mercantil. E por falta, às vezes, de organizar esse setor, por falta de um quadro normativo, por falta de incentivos fiscais, a gente está perdendo, na verdade, muito dinheiro. Gostei da sua imagem, nós estamos começando, na verdade, em negativo nessa luta pela sustentabilidade.
Muito obrigado e desculpe se eu me excedi no tempo.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Queremos registrar aqui a presença da Srª Bianca Torreão, do Centro de Estudos Estratégicos do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, bem como da Srª Maria Beatriz Pinto, do Sr. Cristiano Cagnin e da Srª Isabela Ribeiro, que é da Aspar, Ministério do Meio Ambiente. E, ainda, do Sr. Tiago Almeida, também da Aspar, do Ministério do Meio Ambiente.
Registro, ainda, a presença do Lucas Chaves de Moraes, estudante da UnB, bem como o Lucas Veiga, da P&D Brasil; Flávio Freitas, Área Empreendimentos; e Mauro César Bandeira de Oliveira, Professor.
Nós queremos também registrar que o Ministro das Cidades ligou agora há pouco - nós havíamos mandado o convite -, informando que gostaria de estar aqui, mas que, neste momento, ele foi convocado pela Presidente da República e, por isso, não pode aqui comparecer. No entanto, ele gostaria que fosse registrada essa sua intenção.
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Também uma inovação que nós da Comissão estamos fazendo é tentar criar uma fidelização também aqui com a própria Comissão. Então, nós entregaremos os certificados. Daqui a pouco, vamos fazer a entrega simbólica desses certificados a dois presentes: Mauro César Bandeira de Oliveira e Lucas Chaves de Moraes. Além disso, também uma declaração da Comissão do Senado do Futuro, que declara que o cidadão participou da audiência pública interativa sobre o futuro das cidades e as cidades sustentáveis, realizada no dia 26 de outubro de 2015, com duração de três horas. Brasília, 26 de outubro de 2015. Então, esses certificados serão entregues aos estudantes presentes e também serão enviados por e-mail a quem participou via internet, pelo Portal e-Cidadania. Isso é uma forma também de estimularmos que as pessoas possam participar presencialmente ou através dos mecanismos, dos meios sociais que o Senado coloca à disposição.
Não quero descumprir com o horário do Mariano, mas quero convidar aqui a Karin Kässmayer, consultora legislativa, que gostaria de fazer uma pergunta.
A SRª KARIN KÄSSMAYER - Sr. Mariano, boa tarde. Apenas uma curiosidade e uma informação adicional ao que o senhor expôs em sua apresentação a respeito do estudo que vocês estão elaborando e entregarão um relatório no final do ano: se o escopo desse estudo é trabalhar com as cidades sustentáveis mais em termos conceituais ou se há também a propositura de alguma política pública e análise da legislação vigente sobre o tema.
Obrigada.
O SR. MARIANO FRANCISCO LAPLANE (Fora do microfone.) - Obrigado pela pergunta. O objeto do estudo...
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Está ligado o som?
O SR. MARIANO FRANCISCO LAPLANE - Então, voltando à minha resposta, o objeto do estudo é contribuir para uma agenda de ciência, tecnologia e inovação vinculada ao tema sustentabilidade das cidades. Então, não é apenas um estudo conceitual. É propositivo, na dimensão ciência, tecnologia e inovação.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Luciano Martins Costa Póvoa, gostaria de fazer uma pergunta?
O SR. LUCIANO MARTINS COSTA PÓVOA - Eu gostaria de fazer uma pergunta para o Sr. Oscar. O senhor citou os exemplos de Tóquio, com uma taxa de eficiência de 4%, e Cingapura, com recorde mundial. O senhor poderia, depois, disponibilizar para a gente como eles fizeram para chegar a esse tipo de eficiência? Porque lá a água é bem escassa. Eles têm um problema. O terreno lá é escasso. A água é escassa. Então, eles são forçados, até como meio de sobrevivência. Então, ou seja, ou são eficientes ou têm vida curta.
Obrigado.
O SR. OSCAR DE MORAES CORDEIRO NETTO - É verdade. É uma questão cultural. Há um certo uso contencioso e eficiente dos recursos. A água é um deles. Eles têm lá toda uma tradição de minimizar as perdas de água o máximo possível. Há até casos do tipo: há um vazamento - a exemplo, fazendo uma analogia, de quando um SAMU vai atender uma pessoa que ligou -, e a mesma coisa também pode acontecer lá. Quer dizer, quando há um vazamento, algum cidadão liga para uma central e, rapidamente, em pouco tempo, uma equipe de emergência vai lá e tenta resolver o problema de vazamento. Também há toda uma preocupação em localizar até com tecnologia os vazamentos. Então, há toda uma preocupação, mas acho que, na origem dessa preocupação, existe esse valor cultural importante de ter um uso contencioso desse recurso.
Se pegarmos outro exemplo do saneamento nos resíduos claros, acho que ficou muito marcada em nós aquela boa imagem da Copa do Mundo em que, nas partidas do Japão, os próprios torcedores tinham a preocupação de deixar limpo. Ninguém os obrigava. Eles, por motivação própria, estavam frequentando a casa do outro e não queriam deixá-la suja. Então, eles próprios tinham essa preocupação. O Japão tem, na verdade, uma das maiores taxas de reciclagem de latinhas de alumínio sem nenhum incentivo econômico para isso, meramente por ação de cidadania.
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O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Bom, essas perguntas aqui ou apenas colocações dos internautas, nós vamos fazer. Também não há necessidade de resposta imediata, mas eu gostaria que os palestrantes fossem anotando.
O Vítor Carvalho Pinto:
A ocupação irregular do solo é o principal fator de risco, insalubridade e degradação do meio ambiente. Uma das causas desse fenômeno é a grilagem de terras atualmente dominada pelo crime organizado. Apesar disso, a Aneel obriga as concessionárias de energia a atender às invasões.
Também o Carlos Eduardo dos Santos Barros: "Para termos uma cidade autossustentável, teremos que investir mais em transporte público e incentivo às ciclovias".
O Rodrigo Gomes pergunta, ou faz um comentário: "Atores da sociedade civil têm um papel essencial a desempenhar no delineamento da agenda do desenvolvimento sustentável."
Ana Flávia Smith: "O futuro da cidade sustentável se constitui em um tripé: transporte público barato e abundante; hortas comunitárias, para que ninguém passe fome; e energia e água utilizadas racionalmente."
Taíse Costa Ferreira: "Um conjunto de tecnologias pensadas para tornar as cidades mais inteligentes ajuda as metrópoles a vencer problemas de trânsito, segurança e urbanismo."
O Gabriel Jerônimo Curti: "O Brasil deveria implantar linhas de modernos bondes elétricos em suas cidades, como meio de transporte mais limpo e eficiente. Na minha opinião, foi um retrocesso cidades como São Paulo terem desativado todas as linhas de bondes. Na cidade de Bogotá, Colômbia, o prefeito e urbanista fez uma reestruturação da mobilidade urbana, implantando uma transformação cultural da população, voltada para o uso da cidade sem carro. Uma pergunta: não está na hora de nossas cidades serem pensadas para pedestres?"
E até na mesma linha, "Uma cidade sem carros é um sonho hippie? É o que diz o ex-prefeito." Não, aqui, na verdade, foi uma afirmativa do ex-prefeito. Uma cidade sem carro é um sonho hippie - é um comentário dele.
Eu ainda quero, mais uma vez, insistir e dizer que nós vamos então entregar esses certificados também projeto e-mail, e aqui inclusive, já como simbologia, o meu xará, Wellington Ferro de Sousa, ele poderá acessar esse certificado, que já está inclusive disponível na internet.
Eu gostaria de saber, por parte do Mariano, se ele gostaria de fazer alguma consideração em função dessas colocações ou perguntas, porque não gostaria que o senhor se sentisse aqui pressionado pelo tempo depois, para ficar à vontade, como temos outros tantos ainda palestrantes.
O SR. MARIANO FRANCISCO LAPLANE - Senador, muito obrigado. Eu quero, em primeiro lugar, agradecer mais uma vez e dizer que lamento não poder assistir às outras apresentações. Se forem tão brilhantes como a do engenheiro aqui, realmente perderei uma sessão muito importante aqui da Casa.
Dos comentários ou perguntas que foram feitas, eu resgato três palavras que me parecem absolutamente chaves. Falou-se em planejamento, falou-se em controle social e em cidadania. As cidades podem melhorar muito com ajuda da tecnologia, mas a verdadeira força de transformação deve surgir de dentro da própria comunidade.
O exemplo de Bogotá não é o de um prefeito excêntrico, embora talvez seja um prefeito hippie. É de alguém que com visão, com carisma, soube mobilizar a comunidade.
Não há milagres nisto que a gente está aqui discutindo, é um esforço coletivo. Esforços coletivos, nestes tempos de individualismo exacerbado, podem parecer utópicos, mas são absolutamente indispensáveis. Eu mesmo falei de reconciliar o homem com a natureza. Acho que há uma outra face dessa moeda, que é a reconciliação do homem com o homem, que é a nossa capacidade de atuar, agir coletivamente. Sem isso, nossas cidades continuarão tendo a cara que têm hoje ou alguma coisa pior.
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Mais uma vez, Senador, agradeço, sinceramente, o convite. Desejo que esta Comissão possa abordar com a mesma lucidez e o mesmo senso de oportunidade outros temas tão importantes como este.
Muito obrigado. Infelizmente, vou ter que me retirar.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Esta Presidência agradece.
Vou tentar fazer a minha fala aqui rapidamente. É com muita satisfação que estamos aqui realizando esta audiência pública da Comissão do Senado do Futuro, que tem como objetivo e foi instituída para promover as discussões sobre os grandes temas e o futuro do País e aprimorar a atuação do Senado nessas questões.
Hoje, estamos tratando aqui de um tema dos mais atuais e relevantes não apenas para o Brasil, mas para o mundo, que é o futuro das cidades e cidades sustentáveis.
Nesse sentido, relembro as palavras do Presidente Renan Calheiros, proferidas quando da instalação deste Colegiado: "Tendo consciência da importância do nosso papel, a Comissão do Senado do Futuro terá a incumbência de criar metas para que, verdadeiramente, possamos enfrentar os desafios que hoje nos apresentam para que tenhamos todos um futuro melhor."
De fato, são muitos os desafios que enfrentamos atualmente. A vida do ser humano tem mudado muito nos últimos 300 anos, desde que foi deflagrada a Revolução Industrial. Até então, vivíamos predominantemente no meio rural. As cidades eram poucas e sua importância, restrita. Hoje, nosso estilo de vida é fundamentalmente urbano. As cidades geram impacto no meio ambiente e dependem totalmente do campo para sobreviver, o que representa uma condição de grande vulnerabilidade.
Entretanto, o modo como nossas cidades se organizam atualmente é - claro - pouco sustentável. A violência urbana, a carência de infraestrutura e o trânsito caótico são alguns exemplos de problemas que tornam a vida das grandes cidades insustentável a longo prazo.
Além disso, existem as questões ambientais, como o manejo de resíduos sólidos e as emissões de gases de efeito estufa, que nos levam a pensar em alternativas para tornar a vida nas cidades mais sustentável, alternativas que contemplem soluções de curto, médio e longo prazo.
A nós políticos cabe a tarefa de ouvir a sociedade, ouvir os especialistas no assunto e, a partir daí, discutir essas alternativas e propor mudanças legislativas que facilitem e estimulem soluções que respondam aos anseios da sociedade brasileira.
Não existe uma receita de bolo pronta. Trata-se de um problema mundial, que está sendo debatido em vários países, em vários fóruns diferentes, buscando encontrar soluções que sejam adaptadas à realidade de cada cidade. Precisamos criar a transição para um desenvolvimento sustentável, que integre as dimensões social, ambiental e ética, baseada em uma economia que seja includente, verde e responsável.
Com esse objetivo, realizamos agora esta audiência pública interativa, trazendo os especialistas na matéria para dialogar com a sociedade e o Congresso Nacional. Esse é um processo contínuo, dinâmico, que não se esgota em uma ou duas audiências. Pensar o futuro é pensar estrategicamente não apenas nas cidades que queremos, mas em como os diversos problemas urbanos se relacionam entre si.
Nessa linha de raciocínio, entre os muitos assuntos que certamente merecem a nossa atenção, entendo que uma das questões que mais angustiam o cidadão moderno é a mobilidade urbana. Falo isso com base em uma recente pesquisa realizada pela Firjan (Federação das Indústrias do Rio de Janeiro), mostrando que, em média, os trabalhadores brasileiros das grandes cidades gastam 114 minutos em seus deslocamentos diários. Além do desperdício de tempo e de perda de qualidade de vida, há um prejuízo anual de 111 bilhões para a economia brasileira. Inclusive, estávamos votando aqui, na semana passada, também autorizando para que as residências pudessem ser locais de microempresas no Brasil afora. Então, a mobilidade urbana não é sustentável. E não é sustentável apenas porque promove o desgaste físico e emocional do trabalhador em seu trajeto diário, mas porque possui um profundo impacto negativo no meio ambiente tanto no que diz respeito ao consumo de energia, quanto à qualidade do ar e à poluição sonora.
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Sem dúvida, no meu entender, essas são variáveis que devem ser contempladas no planejamento estratégico das nossas cidades. Para isso, precisamos reinventar as cidades. Nossas cidades não foram pensadas para uma estrutura de produção industrial que requeria a concentração dos fatores de produção em grandes empresas e escritórios. Mas hoje, de acordo com o pensador norte-americano Alvin Toffler, vivenciamos a chamada quarta onda da economia mundial, relacionada à sustentabilidade e ao meio ambiente. Isso significa que uma empresa só terá sucesso neste século se adotar práticas sustentáveis, preocupando-se com a sociedade e o meio ambiente.
Então, as cidades não podem mais continuar funcionando no século XXI como se ainda tivessem no século XX. Não faz qualquer sentido obrigar certos trabalhadores a se deslocarem de suas casas quando poderiam desempenhar suas funções perfeitamente a partir de um escritório doméstico, o chamado home office. Essa é uma realidade que se tornou possível graças aos avanços da informática e que, no meu entender, representa uma tendência mundial para a sustentabilidade das grandes cidades. Ao mesmo tempo em que estimulamos a redução do fluxo de ar e de pessoas, precisamos investir em tecnologias de transportes limpas e eficientes. Ou seja, de baixo consumo de energia, baixo ruído e zero emissão de gazes do efeito estufa.
Claro que isso aqui eu estou fazendo uma leitura também com a assessoria, porque eu acho que é impossível zero.
Deve ser uma tecnologia inteligente, viva, integrada, ao cotidiano das cidades, que privilegie o coletivo, mas sem esquecer o individual. Além disso, deve ser de baixo custo para permitir a inclusão social das grandes massas menos favorecidas do nosso País. Estou certo de que vivemos um dos momentos mais desafiadores da história da humanidade. E, para enfrentar esse momento, precisamos ousar, ser criativos e pensar as cidades do ponto de vista local, mas numa perspectiva global. Precisamos finalmente entender que todos estamos conectados e que o meio ambiente é um patrimônio de todos. Cidades sustentáveis são, sobretudo, cidades pensadas sob a perspectiva humana. Elas não podem ser vistas apenas como um local de produção de bens e riquezas. Mas um local onde pessoas vivem e sonham.
Nesse sentido, tornar uma cidade sustentável é torná-la mais humana, solidária, justa e acolhedora. É integrá-la ao meio ambiente para que ela passe a fazer parte dele. O Senado Federal, ao realizar hoje esta audiência pública interativa, convida toda sociedade brasileira a fazer parte desse projeto de pensar as nossas cidades do ponto de vista sustentável. Essa só pode ser uma tarefa coletiva. Por isso eu quero aqui mais uma vez cumprimentar os especialistas que aqui estão conosco e claro esperar que a gente possa fazer disso uma prática.
Eu quero só fazer um comentário. Eu diria dois. Um é sobre a cidade de Bonito, Mato Grosso do Sul. Eu me formei em Campo Grande, Mato Grosso do Sul. Conheci Bonito há muito tempo atrás com todo o seu potencial e tive oportunidade de voltar a Bonito há pouco tempo atrás. E, claro, aquela cidade de transformou num grande polo turístico. E eu fui indagar às pessoas por que ali aconteceu aquilo. E eles disseram que foi exatamente um líder da cidade, um padre, que começou a conversar com a comunidade sobre a necessidade de fazer daquilo uma geração de emprego, uma qualidade de vida, enfim uma oportunidade que ali existia da natureza e, claro, que Deus deu àquela comunidade. Com isso, depois esse padre se transformou em prefeito da cidade. Com isso, como prefeito, ele conseguiu colocar muito mais em prática aquilo que era o sonho de transformar todo aquele meio ambiente não em degradação, mas em oportunidade para a população que lá vive.
Da mesma forma, um comentário que eu gostaria de fazer aqui e que me traz uma preocupação muito essa questão, quando se discute a questão ambiental, o que pode e o que não pode. Mas há um aspecto importante também. Nós falamos aqui da mobilidade, do saneamento. Mas me traz muita preocupação aquilo que é imprescindível para a vida na terra. Não é possível ter vida sem água e, principalmente, para o ser humano, uma água de qualidade, uma água potável, em condições para a questão da saúde.
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Eu vejo muito essa questão das hidroelétricas, quando são construídas, e às vezes os ambientalistas questionando. Hoje, nós temos uma legislação. Por exemplo, as microgeradoras só podem ser de potencial até de 30MW. Às vezes, as empresas, os empresários, em um local que poderia ter potencial de 35MW, ou 40MW, fazem menor apenas para atender à legislação. Com isso, o País perde muitas oportunidades. Por exemplo, a maior usina que está sendo construída agora no Pará, que é a usina de Belo Monte. Também há um grande comentário. Ela diminuiu muito o seu potencial de geração em função da inundação. Aqui nós temos um exemplo, em Brasília. Quando se projetou Brasília, projetou-se um lago com aproveitamento também hidroelétrico. Com certeza, Brasília é uma cidade onde a questão ambiental, do clima... Nós passamos problemas sérios no mês de agosto, no mês de setembro.
Eu gostaria de comentar exatamente porque nós entendemos que será que ao analisar esse projeto se preocupa inclusive com reservatório de água necessário para a sobrevivência da vida aqui no País? Nessa linha, eu trago o exemplo da nossa capital Cuiabá. Em Cuiabá, há uns 40 anos, um engenheiro projetou a usina de Manso. Essa obra ficou parada por mais de 20 anos. Eu tive a oportunidade, inclusive, como Parlamentar, de fazer uma emenda ao orçamento ao Ministério do Meio Ambiente, exatamente para viabilizar, naquele momento, a equação econômico-financeira da justificativa pela qual construir a usina de Manso. E aí é que eu fui estudar, que eu fui entender, que eu fui orientado que a usina de Manso ficou paralisada muito tempo, porque se alegava que a usina de Manso não tinha viabilidade econômica de geração de energia, porque ela tinha uma baixa geração de energia e um impacto ambiental muito grande, porque é uma hidroelétrica que inundava 40 mil hectares. Com essa história do impacto ambiental, a usina ficou parada por mais de 20 anos. Exatamente aí eu tive a compreensão e encarei fazer a emenda e discutir, porque o projeto não era só a geração de energia. A usina de Manso tinha, na concepção de seu projeto, a geração de energia, o aproveitamento da geração de energia, o controle de enchentes do rio Cuiabá, o turismo e também a questão ambiental na irrigação, ou seja, geração de empregos. Foi exatamente depois que houve uma grande enchente no rio Cuiabá, que destruiu grande parte da cidade, que as pessoas foram entender - inclusive eu - que a usina de Manso tinha, na verdade, uma múltipla ação. Hoje, a usina de Manso não só gera energia - ela entrou exatamente no apagão -, passou a ser viável, mas também resolveu o problema da enchente no rio Cuiabá e hoje garante um reservatório de água por mais, no mínimo, 100 anos, mesmo com o crescimento vertiginoso que a cidade está tendo. Ao mesmo tempo, a gente vê uma cidade como Manaus, que é cercada de água e tem dificuldades de ter água potável para abastecer a população urbana.
Se for possível algum comentário nesse aspecto... Acredito que, às vezes, a questão ambiental, discutida na paixão, de repente deixa de ver o viés socioeconômico, ambiental e, principalmente, das pessoas, porque nem sempre foram construídas usinas que beneficiassem as pessoas que estivessem perto. Aí é outro contraponto também.
Aviso aqui à assessoria que nós estamos sendo transmitidos ao vivo pela TV Senado. Isso é importante também para a participação dos internautas.
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E eu quero aqui, aproveitando, mais uma vez, dizer que todos os nossos internautas poderão participar desta nossa audiência pública. É uma forma de também buscarmos a fidelização, a participação dos nossos internautas. Nós então entregaremos certificados a todos aqueles presentes, mas também aos internautas, com a sua participação através da internet ou então pelo portal e-Cidadania. E isto aqui será entregue via e-mail.
Então, agora, vamos fazer um acordo aqui, já que estamos em quatro palestrantes, quase uma das únicas vezes com questão de igualdade, nesta Mesa, entre as mulheres e os homens, o que não é muito normal nesta Casa, apesar de esta Casa ter procurado fazer justiça com a participação das mulheres, inclusive votando a reserva de vagas, mais um avanço que fizemos. Nas próximas eleições, já teremos a cota para as mulheres no Poder Legislativo. Ou seja, será a primeira eleição em que necessariamente as Câmaras de Vereadores de todos os Municípios terão a participação das mulheres, através da cota, que será também gradativa.
Claro, muitos até são contra a cota. Mas eu acho que, em um País onde ainda temos uma diferença muito grande na participação entre homens e mulheres... E pelo que temos de estatística, as mulheres demoraram quase cem anos para poder votar. Se continuarmos no mesmo ritmo, se não fizermos cota e outros estímulos à participação das mulheres - ainda hoje muitas ganham, para fazer o mesmo serviço, menos do que os homens -, nós demoraremos 500 anos para que as mulheres possam estar na condição de igualdade em relação aos homens em toda a nossa participação na sociedade. Por isso, nós ficamos felizes de ter aqui, agora, duas mulheres palestrantes e também dois homens.
Eu vou convidar agora a Nazaré Lima Soares, que é gerente do Departamento de Zoneamento Territorial do Ministério do Meio Ambiente.
Eu gostaria depois de assessoria aqui para nos avisar o tempo. Como são quatro, com dez minutos cada um...
O SR. OSCAR DE MORAES CORDEIRO NETTO - Eu já falei.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Sim; então, são três ainda, exatamente. Então, daria 30 minutos.
Então, vamos colocar aqui 10 minutos, mas teremos, se for necessário, a tolerância.
Muito obrigado.
A SRª NAZARÉ LIMA SOARES - Boa tarde. Quase boa noite já, não é? São 18h18min.
Eu gostaria de agradecer, Senador Wellington Fagundes, pelo convite e informar que a Ministra Izabella Teixeira não teve condições de agenda para participar, mas nos incumbiu desta tarefa.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Com certeza, a sua presença será brilhante.
A SRª NAZARÉ LIMA SOARES - Obrigada.
Eu queria então cumprimentar os meus colegas aqui da Mesa.
Eu trabalho na Secretaria de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano do Ministério, em um departamento que se chama Departamento de Zoneamento Territorial.
Eu não vou me deter muito no conceito sobre cidades sustentáveis, dada a enorme exploração deste conceito, para o bem ou para o mal.
Nós temos uma discussão hoje, no Ministério do Meio Ambiente, com relação ao processo de sustentabilidade nos ambientes urbanos, no sentido de entender que é necessário que esses elementos da sustentabilidade ocorram e avancem de forma integrada, mas, ao mesmo tempo, temos o entendimento de que precisamos construir os elementos ambientais que compõem esse processo de sustentabilidade.
Muitas vezes, o conceito de sustentabilidade é usado de forma vaga, ele é tudo e não é nada, pode ser tudo e pode não ser nada. Então, nesse sentido, é muito importante que nós, que trabalhamos com uma agenda temática, mesmo sendo uma agenda temática transversal... Nós precisamos construir... Do que nós estamos falando, do ponto de vista ambiental, que deverá compor essa sustentabilidade? Quais são os eixos prioritários, do ponto de vista ambiental, para ambiente urbano, que vão garantir essa sustentabilidade ou vão somar com essa tão sonhada sustentabilidade?
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Então, nesse contexto, resgatando os três tradicionais eixos do processo de sustentabilidade, que são os vieses econômicos, sociais e ambientais, nós estamos tentando explorar, no Ministério do Meio Ambiente, os elementos ambientais que estão incorporados, nesses três conceitos, no ambiente urbano.
Rapidamente, queria trazer alguns exemplos concretos. Quando nós falamos dos elementos ambientais que deverão conter a sustentabilidade, estamos falando de ampliação de áreas verdes; proteção de mananciais; melhoria da mobilidade urbana, redução da poluição sonora, da poluição atmosférica, do uso predatório do solo; fomento da reutilização, reciclagem e o correto descarte de resíduos sólidos; eficiência energética; economia da água; entre outros aspectos que são todos elementos ambientais que comporão ou contribuirão para o processo de sustentabilidade no ambiente urbano.
Queria resgatar, muito particularmente, um item que nós consideramos fundamental: as áreas protegidas urbanas ou as áreas de preservação permanente em área urbana. Deve haver, pelo menos, Senador, uns 20 projetos de lei, tramitando aqui no Congresso, para discutir APPs urbanas. Esse eu considero um dos problemas ambientais hoje mais complexos de se implementar nas áreas urbanas. Na área rural, estamos, relativamente, com uma agenda encaminhada, com relação às APPs e reservas legais. Nós temos um decreto, tanto para o Cadastramento Ambiental Rural, o CAR, como para o PRA, que estabelece um rito e um modus operandi de como nós pretendemos, a partir da implementação do novo Código Florestal, proteger essas áreas.
No entanto, para as áreas urbanas, isso ainda é um desafio que permanece. Mesmo com o advento do Código Florestal, nós não esgotamos esse assunto e temos ainda um conjunto de atores, particularmente os Municípios, que têm dificuldades de implementar essa agenda, no sentido de que nós temos, ao longo dos anos, um conjunto de APPs urbanas ocupadas, consideradas consolidadas, onde, em algumas delas, discute-se a perspectiva de essas áreas voltarem a cumprir suas funções ecológicas. O que se faz com essas áreas, dado o nível de ocupação?
Por outro lado, abrir um precedente de discussão sobre áreas de preservação permanente consolidadas, ou definir, ou deixar em aberto, por exemplo, para os Municípios legislarem sobre isso, o que hoje é uma demanda muito grande e, por outro, traz enormes riscos. Entendemos que também não é uma solução esse simples repasse de atribuição para os Municípios.
Então, estou levantando essa questão, porque eu considero hoje que as APPs urbanas são fundamentais para a proteção de mananciais, para a proteção de nascentes, para a qualidade da água. Eu acho que o que estamos vivendo, em diversas Regiões do País, com relação a - eu não diria escassez -, mas a uma dificuldade de gestão dos recursos hídricos, reflete, um pouco, o que nós estamos fazendo com as APPs e periurbanas, ou o que nós fizemos, ao longo desses anos.
Particularmente, queria resgatar... O Ministério do Meio Ambiente tem um longo histórico de trabalho na proteção de recursos naturais, muito fortemente focado na agenda florestal e rural. A agenda de meio ambiente urbano é uma agenda em que o Ministério ainda está em processo de consolidação e estruturação.
Em 2007, houve uma reestruturação do Ministério, e foi criada a Secretaria de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano, com várias competências na parte de gestão ambiental urbana; avaliação de mitigação e vulnerabilidade nas áreas urbanas; além do controle de mitigação de poluição em áreas urbanas. Nesse contexto, para o PPA 2016, em detrimento de algumas iniciativas que o Ministério executou, ao longo desses anos, nós estamos tentando focar a nossa atuação, no sentido de, finalmente, tentar identificar prioridades para o Ministério, de forma que consigamos dialogar melhor internamente e, principalmente, dialogar melhor com a sociedade brasileira, no sentido de que a sociedade conheça o que o Ministério faz, nessa agenda, ou o que esperar do Ministério do Meio Ambiente, nessa agenda, como o órgão central da política de meio ambiente, que deve ter uma estratégia para a área ambiental nas áreas urbanas.
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Então, nesse contexto, para o PPA 2016-2019, nós estruturamos uma meta de elaborar diretrizes ambientais no âmbito dos instrumentos de planejamento urbano e priorizamos trabalhar com os Municípios acima de 50 mil habitantes. Nós temos em média de 580 Municípios, o que corresponde a cerca de 11% a 12% dos Municípios brasileiros, e deveremos traçar a nossa estratégia. Não que não tenhamos estratégia para Municípios menores, mas o foco da nossa estratégia estará voltado para essas tipologias de Município.
Estamos neste momento reestruturando e reescrevendo a estratégia do Ministério do Meio Ambiente para a sua atuação nas áreas urbanas. E aí eu vou falar rapidamente de algumas dessas estratégias: a primeira delas é a promoção do saneamento ambiental em escala municipal. Nós temos este instrumento previsto no Estatuto da Cidade, que foi instituído desde 2001, e até hoje esse instrumento não foi suficientemente explorado, de forma que ele venha, de fato, a subsidiar o planejamento urbano, ou o planejamento municipal, no sentido de resgatar ou considerar os aspectos ambientais no planejamento urbano.
O Ministério das Cidades realizou em 2011 uma avaliação de cerca de 570, 600 planos diretores. Nessa avaliação, os aspectos ambientais foram aqueles que se apresentaram como de maior complexidade para serem implementados no âmbito do planejamento urbano, e isso na avaliação que foi feita com os gestores municipais, no âmbito desses planos diretores. Então, nesse contexto, o zoneamento ambiental em escala municipal é previsto no Estatuto da Cidade com um instrumento, inclusive, independente do plano diretor - você olha o Estatuto da Cidade e há os instrumentos de planejamento e vem o plano diretor, vem o zoneamento ambiental, escala municipal, e outros.
Tradicionalmente, o Ministério trabalhou, nos últimos anos, com o zoneamento ecológico econômico em escala estadual e em escala macrorregional. No entanto, nenhum desses instrumentos trabalha especificamente com planejamento urbano ou periurbano. O foco é para áreas rurais/florestais.
Nesse contexto, estamos compreendendo que boa parte da dificuldade de implementação dos planos diretores ou de eficiência, mais do que de implementação, de eficiência desses planos diretores está associada a algumas medidas prévias que os Municípios deveriam ter tomado - elas não foram tomadas ao longo do tempo - e a outros normativos infralegais que devem derivar dos planos diretores. Então nós vamos trabalhar.
E mais recentemente a Lei Complementar 140 finalmente condicionou a revisão ou a elaboração dos planos diretores ao zoneamento ambiental. Ao longo desses anos, esse instrumento já vinha ocorrendo, mas não existia uma obrigatoriedade mais clara sobre a sua utilização. Hoje, a Lei Complementar 140 traz essa condição, seja para a elaboração, seja para a revisão; está muito claro lá que os municípios precisam ouvir ou fazer o seu zoneamento ambiental.
Então, eu já coloquei aí rapidamente.
(Soa a campainha.)
A SRª NAZARÉ LIMA SOARES - Outro documento acerca do qual realizamos um estudo que deve ter uma base importante desse nosso trabalho com os Municípios é um conjunto de diretrizes e indicadores ambientais para as cidades. Queremos iniciar, para que, ao longo do tempo, a gente possa emitir relatórios periódicos sobre a qualidade ambiental nas cidades. Sabemos que os Municípios têm bastante dificuldade.
Estamos trabalhando com um conjunto de indicadores. E os Municípios podem iniciar a sua utilização a partir de... Por exemplo, o Município pode começar com dois indicadores, e outros Municípios podem começar com cinco, de acordo com a sua condição, de forma que a gente possa estruturar minimamente uma estatística nacional sobre a qualidade ambiental nos ambientes urbanos.
Nesse sentido, esse estudo ainda não foi publicado. Estamos no processo de revisão final dele. E esperamos que ela traga bastantes elementos e subsídios para os gestores municipais no sentido de melhor monitorar a qualidade ambiental nesses seus espaços.
Outro trabalho que nós estamos iniciando são as cartas de vulnerabilidade para regiões metropolitanas.
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Esse é um trabalho em que nós avançamos um pouco, do ponto de vista metodológico, mas tivemos uma rápida parada, porque gostaríamos de discutir melhor como ficarão os planos metropolitanos que ainda estão em discussão no âmbito do Ministério das Cidades. Então, nós queremos fazer essa discussão paralelamente à discussão dos planos metropolitanos para que não façamos instrumentos ou orientações conflitantes.
É importante também colocar que, nesse trabalho das regiões metropolitanas, nós fizemos uma longa discussão dentro do Plano Nacional de Adaptação - esse que está em consulta pública agora. Essa é uma agenda que vai dialogar diretamente com o cumprimento das metas brasileiras anunciadas recentemente para a redução de emissões, e é um trabalho que envolve diretamente a agenda da mobilidade. Hoje, se formos pensar no nosso inventário de emissões, nós temos aí um número muito alto de emissões pelo setor de transporte, pelo setor de energia. Enquanto antes nós tínhamos uma emissão grande pelo uso da terra - desmatamento, queimada -, hoje, nós conseguimos avançar na redução da taxa de desmatamento, mas nós não avançamos nas mesmas proporções na redução das emissões oriundas do setor de transporte e do setor de energia.
Nesse sentido, essa é uma agenda que deve dialogar e trazer insumos importantes para a redução das emissões, principalmente as oriundas do setor de transporte.
(Soa a campainha.)
A SRª NAZARÉ LIMA SOARES - Ainda nesse sentido, nós estamos, finalmente, estruturando uma agenda muito próxima com o Ministério das Cidades. É importante reconhecer que, ao longo dos anos, nós não tivemos essa agenda tão próxima, uma articulação no processo de planejamento, particularmente com a Secretaria de Acessibilidade e Programas Urbanos, que é a secretaria responsável tanto pelos planos diretores quanto pelos planos metropolitanos e que está trabalhando a Política Nacional de Desenvolvimento Urbano. E hoje, finalmente, nós estamos atuando de forma muito estreita com o Ministério das Cidades, de forma que os novos instrumentos que o Ministério das Cidades vai planejar e disponibilizar já incorporem esses elementos e esses aspectos ambientais.
Por último, eu queria também - aliás, ainda há outra coisa - compartilhar essa questão, esse desafio que é a cobertura vegetal em área urbana e periurbana. Nós estamos fazendo esse trabalho, esse mapeamento de cobertura vegetal e corpos d'água, em 732 Municípios brasileiros, distribuídos nas diversas regiões e biomas do País. E eu queria dizer que nós já sabíamos que esse não era um dado seguro, nós não tínhamos dados relevantes sobre isso, mas nos surpreendeu muito a falta de dados confiáveis. Nós não temos uma estatística nacional confiável sobre cobertura vegetal em área urbana e periurbana.
Eu acompanho um pouco a agenda dos outros países nessa área. E é um pouco chato para o Brasil, porque nós, com um país do tamanho do nosso, com um ativo florestal imenso - nós estamos, neste momento, fazendo um inventário florestal nas áreas rurais, que acho que vai ser o maior inventário florestal do mundo -, não temos uma estatística para as áreas urbanas nem periurbanas.
Nós começamos esse trabalho em uma parceria com a Universidade de Brasília. A universidade desenvolveu uma metodologia um pouco mais simples. Nós vamos compartilhar esse trabalho com os Municípios e vamos, agora, ampliar para os demais Municípios brasileiros, para conseguirmos ter uma linha de base mínima sobre como estamos com relação à cobertura vegetal na área urbana e periurbana, para sabermos o quanto estamos perdendo anualmente, o quanto estamos ganhando anualmente. Nós não temos essa estatística hoje. Ou seja, aquele dado de área verde por habitante, o tão sonhado número de área verde por habitante, particularmente no Brasil, não é um número confiável, porque nós não temos essa estatística nacional. É fato.
Por último, nós estamos discutindo, em uma parceria com a União Europeia, a identificação de algumas experiências...
(Soa a campainha.)
A SRª NAZARÉ LIMA SOARES - ... em gestão ambiental urbana, dentro da construção dessa estratégia brasileira, no sentido de entender. Algumas cidades médias europeias conseguiram avançar muito na sustentabilidade desses aspectos ambientais, na proteção de mananciais, inclusive com experiências bastante inovadoras.
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Nós vamos realizar um seminário em março do ano que vem, Senador, no qual eu gostaria muito de poder contar com a sua participação e a dos demais presentes aqui. Será um seminário em que vamos compartilhar essas boas experiências, para que elas possam nos inspirar no sentido de que construamos uma estratégia de gestão ambiental para as áreas urbanas do Brasil de forma mais robusta e eficiente.
É isso.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Antes de passar para o próximo, eu só gostaria de fazer um comentário a respeito da parte final de sua fala, Nazaré.
Eu acredito que o Brasil evoluiu muito, principalmente no controle do desmatamento da Amazônia, através de muitas discussões, mas, realmente, da questão urbana, praticamente, não ouvimos falar. Eu sou do Mato Grosso, e, por incrível que pareça, lá, as cidades, praticamente, não têm parques florestais urbanos ou suburbanos. Então, eu penso que é um assunto extremamente importante a ser discutido. Eu penso que isso é até cultural, porque, às vezes, se fala muito que o agricultor e o pecuarista são os que desmatam, mas a criança, na cidade, onde está a maioria da população, às vezes, nem sabe o que é um parque, uma árvore, um ambiente. E eu tenho discutido muito que, infelizmente, no Brasil, nós conseguimos crescer de costas para os rios. E, normalmente, as cidades se desenvolvem ou próximas de uma estrada ou próximas dos rios. E aí é onde há muito mais a questão do impacto ambiental.
Conforme eu havia dito antes, digo, mais uma vez, que todas as apresentações dos palestrantes também serão disponibilizadas no portal e-Cidadania e que os principais trechos da audiência, além de estarem no portal e-Cidadania, na íntegra, poderão ser solicitados à Secretaria da Comissão. Se alguém que estiver presente ou que estiver vendo pela internet precisar, também nós disponibilizaremos. É só pedir através da nossa Comissão.
Eu quero convidar o Mauro César Bandeira de Oliveira.
Eu gostaria que a Nazaré fizesse a entrega, junto conosco... Isso aqui é exatamente no intuito de estimular para que as pessoas possam estar na Comissão conosco. (Pausa.)
Venha aqui para ficar melhor para a foto.
Vocês são convidados para a foto.
O SR. MAURO CÉSAR BANDEIRA DE OLIVEIRA (Fora do microfone.) - Eu quero fazer uma pergunta.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Pois não. Pode usar o microfone. Já que você está aqui, você vai fazer até um improviso ao vivo.
O SR. MAURO CÉSAR BANDEIRA DE OLIVEIRA - (Mauro César Bandeira de Oliveira) Boa noite.
Eu queria saber sobre o desmatamento do Cerrado: por que a Amazônia tem proteção, o nosso Cerrado está acabando, e não há proteção adequada para o Cerrado? Ele é visto como um local que... Está se perdendo o nosso Cerrado. Temos de protegê-lo o quanto antes, até por causa da questão da água.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Muito bem. Vamos entregar.
(Procede-se à entrega do diploma.) (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT. Fora do microfone.) - Gostaríamos de entregar também ao Lucas Chaves de Morais.
(Procede-se à entrega do diploma. ) (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Vamos passar, então, ao próximo palestrante. (Falha na gravação.)
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A SRª NAZARÉ LIMA SOARES - ... Não sei se você sabe, assim como a Amazônia tem um Plano Nacional de Combate ao Desmatamento (PPCDAm), a partir de 2009, o Ministério passou a adotar essa estratégia também para os outros biomas brasileiros, e o próximo bioma, depois da Amazônia, a ter seu plano estruturado foi o Cerrado.
O Cerrado é um bioma que preocupa o Ministério do Meio Ambiente tanto quanto a Amazônia, dada a complexidade, a sua localização estratégica, principalmente para proteção de recursos hídricos e para a manutenção das nossas bacias. Nesse sentido, existe o PPCerrado - não sei se você tem conhecimento -, que é uma estratégia que tem um conjunto de ações de proteção do bioma Cerrado e de combate ao desmatamento no bioma Cerrado. Ele não é, eu diria, um plano tão conhecido como é o PPCDAm e a estratégia para Amazônia. Agora que está sendo estruturado o sistema de monitoramento desses outros biomas. Até, durante muitos anos, existia um sistema de monitoramento apenas para Amazônia, através do Prodes, que é um sistema de monitoramento por satélite, coordenado pelo Inpe, e, a partir do ano passado, o Ministério do Meio Ambiente já começou a soltar os relatórios de monitoramento também dos outros biomas brasileiros, inclusive do bioma Cerrado.
Você tem razão ao dizer que o Cerrado é um bioma ameaçado, é um bioma que já perdeu quase 50% da sua cobertura, é um bioma que se encontra sob forte pressão. No entanto, entendemos que as estratégias governamentais, particularmente do Governo Federal, estão traçadas, existem. Se você, depois, quiser ter maior conhecimento, eu posso enviar o plano para você. No entanto, eu queria dizer que a responsabilidade de proteção do bioma é realmente de todos os brasileiros. Esses recursos naturais comuns são bens do povo brasileiro e precisam ser defendidos por todos os brasileiros. É importante que você, como cidadão, se preocupe com o bioma Cerrado, é importante que os Estados tenham as suas estratégias, é importante que os Municípios tenham as suas estratégias de controle desses recursos naturais.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Vamos conceder a palavra ao Tom Rebello, sócio da CIP/Intercon Consultoria Internacional, que também é um especialista da área. É com satisfação que quero apresentá-lo, porque já temos muito tempo de conhecimento.
O SR. TOM REBELLO - Bom, eu queria começar agradecendo ao Senador Wellington Fagundes o convite para participar desta audiência e queria também cumprimentar os colegas da Mesa e os aqui presentes.
Eu sou urbanista e, como estou aqui no meio de ambientalistas, não vou me atrever muito a falar sobre a questão ambiental, embora deixe bem claro que concordo com tudo que foi colocado aqui, principalmente a situação dramática com que nós vivemos em algumas regiões e algumas cidades.
Como urbanista, eu procurei preparar uma apresentação em cima do nosso tema fundamental, que é a questão do futuro da cidade ou das cidades do futuro, de uma maneira que eu pudesse me valer das imagens e fazer uma coisa um pouco mais leve e simples, para que a gente pudesse, talvez, até uniformizar um pouco o raciocínio sobre essas questões que envolvem a realidade humana. Portanto, eu peço desculpas se for muito superficial em algumas coisas ou se for além do necessário em outras.
O que é importante começar colocando? As questões colocadas aqui inicialmente pelo Prof. Mariano, com relação ao problema da questão ambiental na cidade, no caso brasileiro é gravíssimo, e é tanto mais grave na medida em que uma mudança enorme está acontecendo na nova organização dos espaços urbanos no mundo, e eu teimo em dizer que, no Brasil, nós estamos muito atrasados em relação ao que vem acontecendo no resto do mundo, inclusive mais atrasados do que muitos países que, teoricamente, do ponto de vista do desenvolvimento econômico, ainda estão aquém do Brasil. É realmente uma corrida contra o tempo e a favor do futuro. Então, com base nisso é que eu procurei fazer essa minha abordagem.
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Também não vou me aprofundar, mas é necessário dizer que nós estamos vivendo um momento enorme de mudança de paradigmas no mundo inteiro, entre as sociedades do passado e a famosa nova economia, a sociedade do futuro, a nova matriz energética. Isso aí, evidentemente, expressa-se na cidade de uma maneira muito clara. As cidades respondem à importância do momento econômico em que elas se desenvolvem.
Por isso, fiz, de propósito, uma comparação entre as cidades da Revolução Industrial e as cidades da chamada Era da Informação. Nós estamos saindo, depois de longos séculos, daquele momento da cidade da Revolução Industrial, que se valia de uma população cada vez maior. As cidades tinham que ser grandes para gerar uma mão de obra excedente, e essa mão de obra excedente permitia salários mais baixos. E foi assim que as cidades se organizaram e evoluíram. Cidades como Nova York, Londres, Paris, São Paulo, de certa forma, lideravam o mundo em termos de conexões. Só que isso, a partir do final do século passado, começou a mudar. As cidades mais importantes já não são mais as cidades populosas. As cidades mais importantes são as cidades que começam a desenvolver inteligência, e a inteligência não está, necessariamente, ligada, ou melhor, não está nem um pouco ligada à questão de espaços conurbados, de pouca qualidade ambiental, com dificuldades de mobilidade.
As cidades tradicionais - é disso que estamos falando - são cidades altamente densas, que desperdiçam energia, que provocam trânsito com mobilidade extremamente difícil, pois as pessoas perdem de duas a três horas por dia do seu tempo livre, ou dentro do carro, ou, pior ainda, dentro de um transporte coletivo de pouca qualidade. Essa é a cidade que nós herdamos e em que, infelizmente, em alguns casos, brasileiros ainda continuam insistindo.
Eu até chamaria atenção para um caso que me toca muito de perto, que é a própria realidade de Brasília. O professor aqui colocou bem: Brasília foi uma cidade concebida para ser a cidade do futuro - eu cresci com essa impressão e com essa vontade de ver isso -, mas, no entanto, hoje nós estamos evoluindo exatamente na contramão da história. Nós estamos virando uma região metropolitana como essa que nós vemos aí. Então, isso realmente é um contrassenso.
Outro aspecto. A Revolução Industrial, posteriormente, levou às cidades dos automóveis. As pessoas passaram a trabalhar no centro, a viver na periferia, e haja viaduto, túnel, garagens elevadas, etc, para você poder sair de casa e ir para o trabalho. Isso também corresponde a um aumento da economia. No caso brasileiro, isso foi, inclusive, exacerbado, pois se copiou muito o modelo americano. As pessoas queriam morar o mais longe possível, gasolina barata, estacionamento farto, e as cidades recebendo cada vez mais veículos.
Com relação ao transporte de massa. Eu vou até vou aproveitar aqui, Senador, para abordar a questão dos bondes, de que falou um dos internautas. Eu sou favorável ao bonde desde que comecei a mexer com transporte urbano. Nós chamávamos de bonde moderno. Hoje em dia é o VLT. Eu não tenho a menor dúvida de que é o transporte do futuro, porque é um transporte que valoriza espaço, que cresce junto com a cidade e que, sobretudo hoje - nós vamos poder ver mais na frente -, convive de maneira agradável com o meio ambiente. Não é o caso dos metrôs, dos trens de subúrbio, como nós vemos ali, dos corredores de ônibus. Isso está ultrapassado. Nós não podemos mais pensar que as cidades vão evoluir para ter cada vez mais transporte de massa.
Eu quero só mostrar rapidamente uma foto muito interessante. Um corredor de ônibus sem fim, uma quantidade de carros e, no meio, um monte de motocicletas. Essa é a realidade que nós estamos vivendo. Isso está acabando no resto do mundo, isso não existe mais.
O terceiro aspecto é a cultura do desperdício, as cidades do desperdício. Não é só o lixo do ponto de vista da poluição, mas é o lixo do ponto de vista do consumismo excessivo. As pessoas, na realidade, por essa densidade enorme das cidades, se habituaram a consumir mais do que necessitam. A questão do lixo não é importante apenas pelo tratamento, o que o Prof. Oscar citou com toda propriedade, mas é importante pela própria questão da estruturação do espaço urbano. Se não partimos hoje para uma reciclagem mais profunda, as cidades vão ficar cada vez mais comprometidas.
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Bom, aí, para não ficar apenas numa visão crítica, o que há pela frente? A cidade do passado é isso aí que nós mostramos. Mas o que fazer e como fazer?
O que fazer já começa a aparecer. Dentro dessa realidade da nova economia, necessariamente, surge uma nova cidade. Então, existe essa dicotomia entre a cidade industrial, que, do nosso ponto de vista, está se exaurindo, está entrando em decadência, e a cidade inteligente. E aí cabe uma explicação interessante, porque, num primeiro momento - a gente vai ver a seguir -, as cidades inteligentes passaram a procurar lugares menores, com mais facilidade de mobilidade, com mais segurança, para instalar as suas empresas. Não se trata apenas de o indivíduo poder trabalhar em um laboratório melhor ou num centro hospitalar de pesquisa, ou, eventualmente, em uma área de desenvolvimento energético, mas se trata da capacidade que esse indivíduo tem que ter, do ponto de vista da criação, para se deslocar rapidamente e para ter segurança para exercer as suas funções.
E, por último, a questão dos ciclos dos parques e das áreas tecnológicas.
Isso aí é um movimento que tem uma primeira onda - e o Senador até citou aqui o Alvin Toffler, que fala da primeira, da segunda, da terceira e da quarta ondas -, que não tem, necessariamente, a ver com o que ele fala, porque ele pensa nisso de uma maneira mais abrangente, mas também isso aconteceu no espaço.
A primeira onda é a que todos conhecem; é a do Silicon Valley, que começa lá, ainda em meados do século passado, através do envolvimento da universidade com a pesquisa, o que faz surgir, então, todo o interesse em inovação, com empresas que começam a se utilizar dos recursos humanos da universidade para promover os primeiros parques tecnológicos. E hoje a gente vê, em uma região adjacente a San Francisco... E é interessante mostrar isso, que esse movimento não surge em Nova York, não surge em Paris, não surge em Londres, não surge em São Paulo, não surge nas grandes cidades, mas em universidades que tinham, eventualmente, até um convívio com cidades com mais qualidade de vida.
A partir daí vem a chamada segunda onda, que já é a incorporação - e isto é muito importante - do empresariado no negócio. Aqui, nós temos, por exemplo - não vou muito longe -, do nosso lado, Santiago do Chile. É uma cidade empresarial no meio de condomínios residenciais. Ou seja, passou a ser um negócio o setor privado também produzir parques tecnológicos. E isso foi um avanço, porque permitiu multiplicar, e muito, a implantação de áreas de alta tecnologia mundo afora.
Quero dar outro exemplo. Essa região aqui... É muito interessante, porque, ao contrário das indústrias da Revolução Industrial, que se organizavam em espaços quase contíguos, ocupando o máximo possível de área...
(Soa a campainha.)
O SR. TOM REBELLO - Vou demorar um pouquinho mais. Vou brigar um pouco com essa campainha. (Risos.)
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT. Fora do microfone.) - Mais 5 minutos.
O SR. TOM REBELLO - Está bem. Vou tentar correr.
Ao contrário, as indústrias de alta tecnologia, as empresas de alta tecnologia procuram se localizar em áreas de qualidade ambiental, como é o caso, aqui, dessa cidadezinha. Essa é uma cidade de pouco mais de 30 mil habitantes no Alabama, que não é o Estado mais desenvolvido dos Estados Unidos, e sim um dos Estados menos desenvolvidos. Como havia ali uma base da Nasa e começou a haver um movimento em torno de pesquisas aeroespaciais, essa cidade hoje tem o terceiro polo tecnológico dos Estados Unidos. Isto em uma cidade dom 30 mil pessoas, convivendo com um ambiente extremamente agradável, e unidades de produção pequenas cercadas de verde. Não é só pela qualidade, mas também pela segurança. Então, com relação à produção de informação... Enfim, esse é o conceito da famosa segunda onda.
Na terceira onda, a coisa já toma outra dimensão. Aí é que nós começamos a ficar para trás. Hoje, são as cidades tecnológicas. O melhor exemplo - e por isso eu coloquei essas imagens - é o de Toulouse, no sul da França. Toulouse, uma cidade histórica importante, capital de uma região, estava em depressão. O sul da França era uma região que perdia população em função da saída dos filhos dos agricultores, enfim. Contudo, a partir de determinado momento, tomou-se a iniciativa de se implantar ali um polo aeroespacial. Assim, hoje lá está o polo aeroespacial mais importante do mundo, onde está concentrado todo o grupo aeroespacial, e a região toda ganhou uma nova dimensão, inclusive, Senador, como o senhor citou, com pessoas que trabalham em outras comunidades , longe de Toulouse, que se relacionam com a sede à distância. Não há mais aquele deslocamento que estávamos acostumados a ver nas cidades tradicionais.
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Chamo a atenção e estou querendo mostrar tudo isso, infelizmente com certa rapidez, porque é isso que está surgindo no mundo. Essas são as cidades que estão crescendo cada vez mais e que estão organizando novo espaço.
A quarta onda é a das cidades inteligentes. Aí já é uma evolução grande porque não se trata apenas de alta tecnologia. Podemos entrar, inclusive, nesse conceito mais amplo de sustentabilidade. Sustentabilidade, como já foi muito bem colocado aqui por outros colegas, às vezes, as pessoas confundem com o verde. Não é só isso. Sustentabilidade é a geração de emprego limpo, de atividades econômicas que possam sustentar a população, geração de riquezas, enfim, qualidade do espaço, mobilidade urbana e o que hoje os ingleses, que, geralmente, são os pais do urbanismo, estão chamando de work, live and play, locais onde as pessoas podem viver, trabalhar e se divertir se deslocando o mínimo possível.
O que essa quarta onda traz em seu bojo? Primeiramente, ela associa o desenvolvimento econômico com o desenvolvimento espacial e com o equilíbrio ambiental. Ali, vemos uma coisa que está ocorrendo muito, inclusive no Brasil - isso é um projeto para São Paulo, para o Tietê -, que é a implantação de parques lineares.
Esse projeto aqui tem feito muito sucesso, interessante. Não sei se está dando para ver bem, em função da luz. Essa é a famosa High Line de Nova York, É uma via elevada, completamente deteriorada, no meio de edificações antigas. Hoje, ela virou um passeio público. Começa a haver uma renovação urbana importante. O espaço foi valorizado, as pessoas vão trabalhar a pé e vão se divertir, vão andar, vão passear nesse espaço. Enfim, é a revitalização do espaço urbano que está no contexto dessas novas cidades. E aí, então, entram esses conceitos de renovação, revitalização, descentralização das cidades. Isso é muito importante.
As cidades tradicionais eram organizadas em termos de polos. O centro era o lugar para onde convergiam todas as atividades e empregos. Temos polos que estão se afastando do centro da cidade. Os centros das cidades estão sendo recuperados para terem qualidade, para serem espaço de lazer e cultura. As pessoas estão se transferindo para polos especializados. E as cidades grandes é que estão começando a fazer isso, exatamente porque perderam, nessas ondas anteriores, a sua importância. E, para resgatar isso, o que está acontecendo? Estão criando cinturões onde há polos especializados em determinado tipo de produção, em determinado tipo de serviço, onde as pessoas moram, se deslocam, trabalham, e, aos fins de semana ou durante a semana, elas vão à cidade fazer suas compras, ver um filme, uma peça de teatro. Enfim, é o centro desempenhando uma função muito mais lúdica e muito mais agradável e preservando seu patrimônio histórico.
A requalificação dos bairros.
Aqui, chamo a atenção para uma coisa semelhante à que aconteceu nos Estados Unidos, mas aqui mostro Paris. Esses arcos davam suporte a antigos trilhos de trem que iam para a Gare de Lyon. Isso visou uma promenade, um passeio público. Aqui embaixo há bares, lojas, enfim. Essa é apropriação da, entre aspas, "herança maldita" que a cidade da Revolução Industrial deixou, mas são espaços importantíssimos para as cidades. No Brasil mesmo, devemos ter, em quase todas as grandes cidades, linhas de trem que foram desativadas ou que operam precariamente e que podem ser grandes espaços de revitalização, inclusive com impacto social muito importante, porque podem levar, através da implantação de sistemas de mais capacidade, de mais conforto, o transporte para a porta de indivíduos de renda menor.
A questão do que fazer com essa mobilidade.
Esta aqui talvez seja uma das partes que, digamos, mais está abrangendo a preocupação do cidadão de maneira geral. Talvez pelo fato termos chegado a um ponto de tamanha degradação, de tamanha exaustão, as pessoas passaram, realmente, a questionar a maneira como nos locomovemos nas cidades.
Faço uma colocação que me parece muito oportuna. Eu até gostaria de ver isso integrado aos discursos dos nossos Parlamentares. No Brasil, confunde-se sustentabilidade com área verde e confunde-se mobilidade urbana com uma oferta de sistemas de alta capacidade para as pessoas se locomoverem por maiores distâncias. Não é isso. Ao contrário: a pessoa tem mais mobilidade quanto menos ela precisa se locomover. Quanto menos ela precisar andar, mais mobilidade ela terá.
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Então, é óbvio que, no futuro, sistemas como o metrô e trens metropolitanos, e mesmo os nossos BRTs, vão ficar ultrapassados. As cidades vão organizar-se de maneira diferente, e as pessoas vão poder deslocar-se muito menos. Ou seja, isso, do ponto de vista do Estado, é muito importante, porque significa uma redução de custos e de investimentos públicos brutal.
O sistema do futuro, que já é presente - não estamos mais falando de coisas que ainda vão acontecer -, por incrível que pareça, é um sistema de transporte do passado: é exatamente o bonde, o VLT.
Esse aqui é um dos inaugurados mais recentemente. Fica em Hans, no interior da França. E para o que chamo a atenção? Isso aqui era uma via urbana larga. Lá atrás está a famosa Catedral de Hans. Portanto, ele convive com o patrimônio histórico de uma maneira muito inteligente. Passa sobre um tapete verde de grama, e as calçadas são alargadas. Ali, só uma via para os carros ou para os moradores. Não há mais estacionamento.
O que causa boa parte dos engarrafamentos? As pessoas pararem em locais proibidos. No momento em que se inibe isso, porque não há duas faixas - existe uma só, porque a pessoa tem de passar e não pode parar -, criam-se condições para que o pedestre seja priorizado. Olhem o tamanho dessa calçada! Aqui é o centro da cidade. As pessoas atravessam e convivem com o bonde.
Então, essa requalificação do espaço é muito importante porque, como vamos ver mais adiante, permite que esses sistemas sejam financiados com muito menos recursos, não só porque são mais baratos, mas porque, em qualificando a cidade, trazem para dentro dos seus financiadores os responsáveis pelo desenvolvimento imobiliário. Ou seja, a receita obtida com a valorização imobiliária pode financiar parte significativa das soluções de transporte urbano. Isso entra exatamente nessa linha do que fazer.
Outra coisa em relação à mobilidade: a nova matriz energética. As pessoas vão andar cada vez mais de bicicleta. Estão aqui as bicicletas alugadas. Aliás, isso está começando a existir aqui também. Elas andarão de carros elétricos, que já começam a ser carros de aluguel...
Esse é o futuro. Eu não estou pegando desenhos. Estamos mostrando fotos de coisas reais, que estão sendo implantadas em vários lugares, principalmente da Europa.
A outra coisa que citei no exemplo anterior e que vou reforçar aqui é exatamente essa questão de dar prioridade ao cidadão, alargar as calçadas. Ao contrário do que se fazia antigamente, quando se alargavam as ruas, agora, deve-se alargar as calçadas. Ou seja, cada vez mais, a cidade vai oferecer menos espaço ao usuário do veículo individual. Por quê? Porque esse camarada vai passar a trabalhar na periferia e porque o centro da cidade vira mais um local de conforto, de lazer e de prazer.
(Soa a campainha.)
O SR. TOM REBELLO - Bom, por último, colocamos mais adiante - já estou terminando, Senador - é o que os ingleses chamam de work, live and play. Aí, de uma maneira até exagerada, no meu modo de ver, eles estão chegando, inclusive, a fazer projetos verticais de lugares onde as pessoas moram, trabalham e têm o seu lazer, na parte inferior. Ou seja, é a mobilidade vertical.
Evidentemente, para países de muita densidade populacional, como Japão ou mesmo Cingapura, isso pode até fazer algum sentido, mas, num caso como o nosso, pode-se ter perfeitamente espaços horizontais, mais baratos e que permitem o mesmo tipo de realidade.
Bom, agora, então, entramos, rapidamente, só para finalizar, no como fazer.
Existem hoje vários instrumentos de gestão urbana a partir da Constituição de 1998, que permitem buscar uma participação muito mais efetiva do setor privado no financiamento dos investimentos de interesse público.
Por que isso é importante? Porque, ao mesmo tempo em que estamos vivendo essa mudança de paradigma do ponto de vista da organização do espaço e das necessidades das pessoas, enfim, nos seus deslocamentos diários, do ponto de vista do Estado, os recursos estão cada vez menores, e o Estado do futuro vai ter que ser muito forte em três setores fundamentais: educação, saúde e segurança. E, aí, não estamos falando de obras, de coisas suntuosas, mas de salário, e isso é muito dinheiro. Ou seja, os Estados, principalmente de países emergentes como o nosso, de países em desenvolvimento, vão ter cada vez menos dinheiro para utilizar em obras importantes.
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Por outro lado, o setor privado começa a perceber que lixo dá lucro, que água dá lucro, que transporte dá lucro, que energia dá lucro... E isso a Constituição de 1988, no que se refere à cidade, começa a viabilizar através do capítulo que permite a recuperação da mais-valia gerada em cima do aumento dos potenciais construtivos.
Eu estou sendo muito rápido. Essa coisa tem certa complexidade. Mas o que ocorre é que, hoje, na medida em que a Constituição Federal consagra o princípio da função social da propriedade, ela permite que o que se adicione ali a partir de uma legislação específica, naquela periferia onde vai ser feito o investimento de interesse público, seja algo como um terreno virtual criado. Ou seja, algo a mais que vai ser adquirido daquela mais-valia, que, antes, ia para o especulador, para aquele cara que comprava o terreno ali porque sabia que iria haver uma inovação ou mesmo para quem morava na região e era beneficiado com as intervenções, esse diferencial pode ser apropriado pelo Estado e transferido para a iniciativa privada em forma de investimento nesses sistemas.
Então, isso hoje é algo extremamente utilizado. O Porto Maravilha está sendo feito assim, a Avenida Faria Lima, em São Paulo, está sendo feita assim. É um instrumento novo que permite, então, ao Poder Público viabilizar essas novas ações. E aqui eu cito algumas delas, que são as operações urbanas consorciadas, que é o que está sendo feito no Porto Maravilha, no Rio de Janeiro, e já foi feito em outros locais também. É a ideia de juntar os interesses públicos e os interesses da iniciativa privada.
Há os Cepacs, que são esses certificados de potencial adicional construtivo, a partir de mudanças de uso, de aumento de gabarito, enfim, do que nós antigamente chamávamos de "solo criado", que permite emitir uma moeda chamada Cepac. Quanto mais a melhoria for sendo feita, mais essa moeda vai se valorizando. Ou seja, se o Estado for responsável e souber fazer isso em etapas, ele mesmo se beneficia da evolução e, com isso, pode financiar investimentos com mais segurança ao longo de mais tempo. Há as PPPs, de que não preciso mais falar, que serão cada vez mais necessárias.
E há um instrumento que está sendo muito usado mais recentemente, que são os famosos PMIs, Processos de Manifestação de Interesse. Ou seja, hoje, é lícito, é legal e está coberto pela Constituição que grupos de interesse formados pela comunidade, por empresas, pelo que for, possam manifestar o interesse de empreender uma obra de saneamento, empreender uma obra de transporte, empreender uma obra portuária, o que for, e, através de um decreto promulgado pelo Estado, receber o direito de desenvolver os projetos necessários, o que é um problema complicado hoje no País, em função da dificuldade de gestão, em função de legislações muito rígidas, como a Lei nº 8.666, que faz com que o nosso PAC ande lentamente, com que as coisas aconteçam com muito mais lentidão...
Enfim, o grupo de interesse pode desenvolver o projeto, pode desenvolver toda a engenharia financeira e jurídica até o modelo de edital que é repassado para o Estado, e aí, sim, o Poder Público tem todo o direito de mexer naquilo da maneira que melhor convier à sociedade. Com isso, ganha-se tempo e se permite trazer para dentro do debate a discussão do financiamento em parceria. Ou seja, vai ganhar a licitação aquele grupo que oferecer para o Estado a maior quantidade de investimento possível ou, melhor, que pedir do Estado a menor quantidade de investimento necessário. Isso é muito interessante porque, na medida em que você tem esses valores estudados, não adianta você querer supervalorizar, porque, se você faz isso, você está correndo o risco de perder aquilo tudo que você desenvolveu.
Então, esses instrumentos todos que surgiram a partir da Constituição e com o Estatuto da Cidade e todos esses instrumentos e ferramentas que estão sendo desenvolvidos na área jurídica...
E aí um aspecto muito importante: eu venho de uma geração em que a gente falava em urbanismo e se entendia desenho, mas hoje o urbanismo é uma ciência muito mais complexa, que envolve bom conhecimento de economia, bom conhecimento jurídico... Eu nem acredito mais em pessoas que fazem urbanismo na prancheta. Hoje, você tem que ter escritórios realmente que pensem essas questões urbanas envolvendo todos esses perfis de profissionais.
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Eu encerraria apenas dizendo que, embora o Brasil esteja muito atrasado, muito atrasado mesmo, em relação a essas inovações tecnológicas do ponto de vista do espaço urbano, os instrumentos brasileiros, do ponto de vista jurídico, existem, e isso nos permite recuperar o tempo perdido.
(Soa a campainha.)
O SR. TOM REBELLO - Para finalizar, aí, então, é um projeto do Porto Maravilha, que popularizou essa linguagem das novas ferramentas existentes para promover a requalificação de espaços públicos com recursos provenientes de diversas fontes.
Para responder ao colega que falou do bonde antigo, está aí, porque acho que o bonde moderno, o VLT, é o futuro de uma melhor qualidade urbana e de um transporte de mobilidade mais confortável.
Era o que eu tinha a falar.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Antes de passar, então, à nossa última palestrante, queremos aqui ler também ainda a participação dos internautas.
De Fernanda Scherer:
Olá, sou de Porto Alegre, e estamos vivendo um impasse na cidade sobre o projeto de Revitalização da Orla do Guaíba. Acontece que o projeto vencedor visa à construção à beira do rio de torres de hotéis e shopping centers!! Setor imobiliário privilegiado, ao invés das pessoas, natureza e cultura.
Eu até gostaria, aqui, depois do comentário que fosse feito, de dizer que também vivemos alguns dilemas sobre o que pode e não pode ser feito à beira dos rios.
Por exemplo, há algum tempo, saiu uma matéria em uma grande revista nacional, a revista Veja, mostrando Paris mais dentro do Sena. E vemos que, por exemplo, aquilo é utilizado turisticamente. Não sei que crítica ambiental poderia ser feita em relação àquele aspecto. Mas, por exemplo, vemos ali as concreteiras à margem do Sena no centro de Paris. Essas concreteiras recebem ali barcaças com areia, com concreto. Tive oportunidade de questionar como era possível, no centro de Paris, haver uma concreteira. Isso não é um crime ambiental? E me provaram lá, pelas explicações, que, ali, ambientalmente, está correto, porque não há nenhuma possibilidade de se jogar dejetos no rio. Ou seja, é feita toda a filtração.
Enfim, se alguém quiser fazer algum comentário... Porque aqui, na verdade, a preocupação é essa.
De Carlos Bomtempo:
Faz mais de 20 anos que, nós, ambientalistas estamos alertando sobre a questão hídrica no Brasil, e sempre fomos tratados como sonhadores, radicais e xiitas. Hoje o problema existe, e ainda ouvimos falar que nossa discussão é apaixonada e emotiva. A fonte vai secar, e aí é o fim.
Também de Carlos Bomtempo:
Os planos diretores dos Municípios são documentos que, no meu entender, deveriam ser elaborados logo após a emancipação do Município ou deveriam colocar "ordem" na "desordem já estabelecida". Os planos diretores existentes fizeram isso ou só existem para cumprir a legislação?
Vou permitir a pergunta de uma pessoa que está presente. Flávio Freitas, da área de empreendimentos.
O SR. FLÁVIO FREITAS - Boa noite, Senador!
Utilizando as palavras e as colocações do arquiteto Tom Rebello, eu gostaria de fazer uma pergunta à Nazaré. Pergunto se o caminho é esse, se ela acha que, dentro dessas possibilidades de bairro planejado, é realmente essa a vertente mais correta na visão do órgão ambiental e se essa distância entre os órgãos ambientais e as pessoas que planejam as cidades e os planos diretores não cria dificuldades para que isso se torne uma coisa consensual para quem utiliza as cidades.
Você acha que não existe como minimizar essa distância entre quem planeja e quem faz a licença ambiental?
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O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT. Fora do microfone.) - E ainda a Srª Tiok Abigail, assessora no Senado.
A SRª TIOK ABIGAIL SHIMADA LEITE - Boa noite a todos!
Há uma pergunta que faço há algum tempo, sobre sustentabilidade, cidades sustentáveis, meio ambiente e tudo.
Nos países desenvolvidos, o papel higiênico é biodegradável. Aqui, estamos falando em resíduos sólidos, da preocupação com lixões a céu aberto e tudo, mas a gente convive com o lixão diariamente em nossas casas. E a gente está falando em saúde pública. Quer dizer, como é que aquelas fezes e dejetos ficam 24 horas ou mais dentro da sua casa, com você aspirando aquilo, e não se consegue implementar no Brasil um sistema de políticas públicas com o papel biodegradável? Deu certo em outros países. O Japão, um país antigo, que tem tubulações antigas, usa o papel biodegradável. Você não vê lixo. Isso aí é saúde pública.
Aqui, não há preocupação dos governantes ou de quem quer que seja em fazer um planejamento nessa área, porque nos preocupamos com o resíduo sólido, mas não nos preocupamos com o resíduo dentro da nossa casa.
Era este o meu questionamento. Existe um estudo, um projeto? E o que fazer?
Esta a minha dúvida.
A SRª NAZARÉ LIMA SOARES - Com relação às soluções apresentadas pelo arquiteto, eu concordo. Acho que o conceito de cidades inteligentes ou cidades resilientes é um conceito que está aí como uma das premissas muito importantes para o processo de desenvolvimento urbano e para o processo de inovação.
Penso que, para as grandes cidades, para as regiões metropolitanas, as soluções apresentadas são muito relevantes, importantes e urgentes. Concordo que estamos bastante atrasados nessa discussão.
No entanto, preocupa-me o aspecto de que a maioria dos Municípios brasileiros... Se formos analisar, dos cinco mil e poucos Municípios brasileiros, veremos que somente 580 deles têm mais que 50 mil habitantes. Então, acho que nós precisamos também... Eu acho que as soluções do ponto de vista de melhorar o processo de mobilidade, de reduzir as emissões nas grandes cidades, de reduzir a quantidade de carros individuais, os transportes individuais, da melhoria da cobertura vegetal, do processo de renaturalização das cidades, que é um conceito hoje tão divulgado, principalmente nas cidades europeias, eu acho que esse conceito é totalmente aplicável e possível de ser aplicado no Brasil se tomadas as medidas e as decisões adequadas.
No entanto, preocupa-me muito, porque eu não vejo perspectivas de solução para os quase 4.500 Municípios brasileiros que tem menos que 50 mil habitantes e que talvez precisemos pensar em soluções mais simples que não permitam que esses Municípios avancem em um processo equivocado a ponto de chegar à situação em que esses 580 Municípios se encontram hoje. Mas eu entendo ainda que é um caminho que nós precisamos buscar. Eu não consigo, das experiências que eu tenho visto em outros países, perceber experiências similares. Pela realidade dos Municípios brasileiros, da maioria desses Municípios pequenos, que são Municípios muito rurais, com características muito rurais, não vejo solução para eles. Então, é um pouco a visão que temos.
Você falou do papel biodegradável.
Olha, eu até iria sugeria ao professor da UnB, quando da apresentação dele, um quarto desafio importante na parte de resíduos, que é a questão da logística reversa, para de, além daqueles três itens importantes que você colocou, acrescentar a logística reversa.
Essa discussão da questão dos resíduos... Hoje, iniciamos a implementação da Política Nacional de Resíduos Sólidos. Estamos partindo, inicialmente, de um planejamento para esse setor.
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Eu concordo plenamente com você. Você sabe que a agenda, hoje, que a implementação da política está dividida entre o Ministério do Meio Ambiente e o Ministério das Cidades, cabendo ao Ministério do Meio Ambiente trabalhar mais com a parte de planejamento, apoiando os planos municipais de resíduos, entre outros, e a questão da logística reversa.
Agora, eu diria que a gente está iniciando esse caminho. Concordo com você que isso que você coloca é um caminho a ser buscado. Acho que essa discussão com o setor privado em relação a resíduos é uma discussão que, no Brasil, iniciou-se agora e precisa avançar. Enquanto, na área rural, a gente via a questão do reúso, da reutilização dos materiais e de agrotóxicos, de todos os resíduos gerados na área rural... Essa é uma discussão antiga. Agora, a discussão do processo todo gerado pelo setor privado nas áreas urbanas, a questão da logística reversa é uma discussão que está começando, é uma discussão bastante difícil e complexa e é um desafio - concordo com você -, mas necessária.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Antes de passar para a Drª Gabriela, eu quero registrar a presença do nosso Líder no Senado, o Senador José Pimentel, que está acompanhado do nosso companheiro Wilmar Lacerda, que é o primeiro suplente do Vice-Presidente desta Comissão, o Senador Cristovam Buarque, que já esteve aqui conosco, mas teve que fazer uma palestra.
Senador Pimentel, se V. Exª quiser ficar aqui ao nosso lado, é nosso convidado.
O SR. JOSÉ PIMENTEL (Bloco Apoio Governo/PT - CE) - Não, estou bem aqui, até para observar melhor os expositores.
Quero registrar que, embora seja segunda-feira, a exemplo do Senador Wellington Fagundes, há um conjunto de Senadores que trabalha, e muito, aqui. Nós estávamos em outro grupo de trabalho discutindo a lei do terrorismo, que já foi votada pela Câmera e está aqui no Senado, na Ordem do Dia. Estamos aprimorando o texto e concluindo esse tema que também não é tão fácil de ser enfrentado.
Quero registrar a importância da pauta desta comissão especial que trata do futuro das nossas cidades, a Comissão Senado do Futuro, e registrar também que já temos 82% da população brasileira morando nas cidades. Se voltarmos aos anos 50, veremos que de 62% a 64% da população morava na área rural. Portanto, é um país que tem a quinta população do Planeta e que, num curto espaço de tempo, passa ser uma população eminentemente urbana. Há um agravante: nós não tivemos nenhum planejamento e concentramos a população em poucas cidades, como a Srª Nazaré aqui está expondo.
Estamos assistindo, do início do século XXI para cá, a um processo de descentralização dessas grandes cidades e construindo novas médias cidades. Se você for à Região Sul e à Região Sudeste, particularmente aos Estados de São Paulo e de Minas Gerais, vai constatar que esse é um processo muito forte. Na Região Nordeste, não é diferente. Na Centro-Oeste, também estamos assistindo ao surgimento de um conjunto de novas cidades com um fluxo migratório em processo de intensificação, pelo conhecimento de escolas profissionalizantes, de universidades públicas e da livre iniciativa, com a presença da União, através da Justiça Federal, o chamado kit da União, porque vão com esse setor, além do Ministério Público Federal, a Defensoria Pública Federal, a Receita Federal, a Previdência Social. Ou seja, há um conjunto de ações que está mudando um pouco este perfil da grande metrópole para metrópoles de porte médio, mas não tem a ver com a ida para a área rural.
Estamos assistindo a um processo exatamente contrário: a diminuição do tamanho da família, pela questão da quantidade filhos versus mulher, que já não repõe mais a população. Pelo último censo, como todos os expositores aqui sabem muito bem, nós estamos com 1,86 criança por mulher, e, para repor a população, seria preciso haver 2,3 crianças por mulher. Portanto, no Brasil, aumenta-se a longevidade, mas, ao mesmo tempo, diminui a quantidade de crianças, um cenário novo que vai ter repercussão nessa nova realidade.
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Também temos o grave problema da violência, que ocorria, basicamente, nas médias e grandes cidades, mas hoje está generalizada. No nosso Ceará, há 184 Municípios, e não há mais diferenciação. Nas pequenas cidades, cidades com até 10 mil, 12, mil, 15 mil habitantes, temos esse processo da violência, da criança dependente das drogas, como chamamos no dia a dia.
Então, há uma série de desafios novos. Se voltarmos à metade do século XX, ao final do século XX, neste século XXI, elas estão sendo sobrepostas por outras realidades.
Sou daqueles que entendem que esse processo vai diminuir a questão da mobilidade urbana nessas grandes metrópoles. De certa forma, tivemos uma aquisição de veículos muito forte nesse início do século XXI, mas os próprios gestores, a partir da produção acadêmica, sentiram a necessidade de diversificar a mobilidade urbana com respeito ao ciclista, ao pedestre, à necessidade de construção de transportes coletivos. Com isso e com a descentralização dessas populações, como está acontecendo, acredito que a questão da mobilidade urbana, que hoje é um dos temas mais presentes, tende, daqui a 20 anos, a não ter a mesma intensidade. E o que fazer com esses novos polos, com essas novas cidades para não repetirmos os erros que cometemos pela falta de planejamento dessas grandes metrópoles?
Ao lado disso, temos assistido também, na área rural, e o Wellington Fagundes conhece mais do que eu, ao aumento da produtividade no campo, ao sistema de deslocamento da produção com um processo de ferrovias muito intenso. A Norte-Sul, que é o grande eixo de transporte de cargas no Brasil, de Itaqui, no Maranhão, até o nosso Goiás, está pronta. Está sendo feita de Goiás a Três Corações, em Mato Grosso do Sul. E, depois, com a Transoceânica, na parceria com a China, que também está em um debate muito intenso, terá uma determinada estrutura.
Se observarmos, veremos que a política de portos e aeroportos, esses novos modais - antes, era só o rodoviário - também estão sofrendo alterações na política de investimentos.
Portanto, há uma série de fatores novos que precisamos pautar, Senador Wellington, nosso Presidente desta importante Comissão Senado do Futuro, para nos anteciparmos e produzirmos políticas públicas para enfrentar esses desafios. Por isso, a vinda das nossas duas companheiras e dos nossos dois companheiros é muito importante. Da nossa parte, com o Senador Wellington Fagundes, vamos pedir cada vez mais que a academia nos ajude na construção de políticas para enfrentar esse novo desafio.
Vou ter que sair, Wellington. Tenho, agora, às 19h30, aquela reunião, a que V. Exª também deverá ir.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Temos uma reunião no Palácio do Planalto agora. Como vou chegar um pouco atrasado, eu gostaria que V. Exª justificasse.
Terminando aqui, como estamos ao vivo pela TV Senado e queremos cumprir a nossa audiência, passo à última palestrante, Drª Gabriela Yamaguchi, Gerente de Comunicação e Campanhas do Instituto Akatu. (Pausa.)
Os últimos serão os primeiros. V. Srª não tem limitação do tempo.
A SRª GABRIELA YAMAGUCHI - Eu queria contribuir com três pontos para essa agenda. Não vou passar a pesquisa que o Instituto Akatu acabou de lançar, no dia 15 de outubro, dia do consumo consciente, justamente para responder à pergunta de por que é tão difícil para as pessoas, não as cidades, não os núcleos, mudarem o jeito como vivem, como se comportam, de por que elas escolhem alguns produtos e não outros, de por que elegem algo de um jeito e não de outro, de por que é difícil para as pessoas mudarem o jeito que elas vivem hoje.
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A gente acabou de lançar essa pesquisa. Eu iria destacar algumas barreiras, mas vou fazer só um resumo em relação... (Falha na gravação.)
A SRª GABRIELA YAMAGUCHI - ... agora. (Risos.)
Estou sendo pressionada por tudo.
Há um grande destaque nessa pesquisa, que é a maneira como a gente conversa e fala com as pessoas no dia a dia. O maior desafio da mudança de comportamento para um debate como esse - deveríamos ter uma audiência de 200 milhões de brasileiros falando desse tema - são as cidades sustentáveis e, mais do que as cidades sustentáveis, o jeito como a gente vive, uma agenda de estilos sustentáveis de vida. Só para vocês compreenderem o termo, estilos sustentáveis de vida é a agenda global da sustentabilidade, e o maior desafio da sustentabilidade é fazer toda e qualquer mudança e toda e qualquer produção de políticas públicas, de mudanças estruturais, sem falar a palavra sustentabilidade, sem falar esse termo.
A questão de o Japão conseguir combater tanto a perda de água na transmissão tem a ver com uma gestão e uma consciência da preservação. Antes de qualquer coisa, em relação ao combate ao desperdício, eles têm a consciência da preservação. Não temos produtos que sejam mais sustentáveis debatidos amplamente por todo mundo porque a agenda, o estímulo e a produção de consumos e serviços mais sustentáveis ainda carecem de um estímulo e de um engajamento de todo um setor empresarial que está devendo muito para essa agenda. E as instituições e as empresas que estão engajadas nesse sentido ainda estão muito, muito lentas. Elas estão muito sozinhas, mas muito lentas.
O mote, hoje, de toda a agenda de sustentabilidade global e nacional é o passo a passo com senso de urgência. O relógio está passando, e não estamos conseguindo fazer as coisas na velocidade que a gente precisa fazer. E deve haver um passo a passo, debates como este.
Então, para contribuir com este debate, que acredito ser extremamente importante, eu trouxe aqui três pontos para completar a minha fala.
O primeiro deles é o que a gente chama de equação da sustentabilidade, que foi uma sistematização que a gente, no Akatu, criou, com cinco pontos em todos os temas que podem ser debatidos, que precisam ser listados, estudados e documentados para cada um dos problemas.
O primeiro é o das mudanças tecnológicas com novos paradigmas, o que tem tudo a ver com o que o Tom estava falando agora. A tecnologia à disposição da mudança para a sustentabilidade, e não para nos trazer mais estresse, mais pânico, WhatsApp, um monte de tecnologia, um monte de coisa em que ficamos conectados o tempo todo.
O segundo: mudanças radicais em políticas públicas. Precisamos realmente poder esperar que, um dia, neste debate que estamos fazendo aqui hoje esteja engajada toda a população. E o jeito como fazemos política, o jeito como trabalhamos está num processo de transição. Estamos vivendo isso agora. Então, é essa transição que precisamos promover radicalmente e buscar promover da maneira mais rápida possível.
O terceiro: nova consciência dos consumidores voltada a estilos sustentáveis de vida. Nada, nenhuma política pública, nenhuma mudança estrutural vai adiantar sem que tenhamos educação dos consumidores, educação das pessoas. É cultura. Nessa pesquisa, falamos exatamente isto: não é sexo, não é idade, não é classe social que faz as pessoas mudarem de comportamento. Sabem o que faz? O bom e velho berço. Aquela educação que tivemos em casa. Uma família coesa. A educação. É, na escola, termos conexão com os nossos professores. É essa coesão completamente amorosa, afetiva, como temos falado, que tem promovido e estimulado a mudança das pessoas e o engajamento delas em causas como estas que estão sendo tratadas aqui.
O quarto: produtos e serviços radicalmente novos e que viabilizem estilos sustentáveis de vida. Se, do lado da educação e da formação do consumidor, temos um desafio gigante, temos, do outro lado, a questão da oferta e do desenvolvimento de produtos e serviços mais sustentáveis. O que mostramos nessa pesquisa é exatamente esse espiral exponencial de mudança da sociedade. É a oferta de produtos e serviços mais sustentáveis que vai promover a adoção de hábitos mais sustentáveis do lado do consumidor. Ter um papel higiênico biodegradável e a população sabendo usá-lo é que vai fazer, de fato, com que as pessoas também possam adotar práticas sustentáveis, porque a população educada vai exigir esses produtos e esses serviços.
Há outra questão essencial nessa agenda empresarial que é a cooperação para a sustentabilidade. São setores inteiros, são as giga e megacorporações, que detêm de 80% a 90%, muitas vezes, dos seus setores empresariais, dos seus setores de negócios, que, juntos, vão compartilhar o quê? Tecnologia de desenvolvimento com alteração de cadeia de produção de produtos. E essa mudança muda setor, muda para pequeno, médio e grande, muda para todo mundo. E a gente tem, por exemplo, no setor da construção civil, um desafio gigante de como isso vai ser adotado de uma maneira mais rápida.
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Quinto ponto: uma nova organização da sociedade que impulsione estilos sustentáveis de vida. Isso quer dizer o quê? O nosso tempo, o nosso precioso tempo, isso que a gente tem e que não é renovável, o tempo, precisa e deve ser distribuído ao longo de toda a nossa vida. A gente tem uma sinalização da nossa população. Assim como todos os outros países têm enfrentado esse cenário, a gente tem um desafio gigante de educação de uma população cada vez mais ampla de jovens que estão superconectados e, diante desses desafios, a gente tem que mudar o jeito como a gente educa. Não são só os urbanistas - não é, Tom? - que estão mudando completamente todos os seus repertórios de conhecimento para conseguir avançar, mas todas as profissões. Não há um estudante universitário hoje que não esteja com, no mínimo, de três a cinco áreas de conhecimento inter-relacionadas para as suas formas de atuação. E hoje, nas universidades, é essa a realidade da educação também que está sendo estruturada.
Se, do ponto de vista de cada um dos temas que a gente conversou, são esses cinco pontos que a gente, no Akatu, propõe que sejam falados, debatidos, do ponto de vista da agenda sustentável, da agenda da sustentabilidade... A gente fala em social, econômica e ambiental, mas falta um quarto item, em todos os debates, que tem tudo a ver com esta agenda aqui, que é o individual. Se o cidadão não se sente parte dessa história, ele não está junto com a gente. A gente pode colocar todos os benefícios aqui, ambientais, sociais e econômicos, mas, se eles não forem tangíveis e conectados com a vida deles, com o dia a dia deles, eles não estarão nem aí. Por que estão os especialistas aqui, com o Senador Wellington, conversando sobre isso hoje? É uma agenda superimportante. Tem a ver com o quê? Tem a ver com a sua vida, com o ar que você respira, com a saúde que você quer, com o bem-estar que você quer para a sua família, com a educação dos seus filhos. Se a conexão para o dia a dia das pessoas não for promovida, não for feita, a gente não vai conseguir promover a participação da sociedade que a gente tanto quer nessa agenda.
Para isso, eu queria fazer a seguinte proposta: no dia 26 de setembro foram lançados, pelas Nações Unidas, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. São 17 objetivos de desenvolvimento sustentável. Já virou jargão: ODS. Pronto, ninguém mais vai entender o que é isso. São 17 ODS. Esses 17 objetivos de desenvolvimento sustentável têm 169 indicadores que foram debatidos pelo mundo inteiro. Eles criaram uma matriz praticamente internacional que pode servir de baliza para o trabalho desta Comissão. São indicadores que serão adotados no mundo inteiro e que têm como primeiro objetivo o combate à pobreza. O Objetivo 12 é a produção e o consumo sustentáveis. Olhando a matriz desses objetivos, olhando a matriz desses indicadores, a gente tem uma estrutura praticamente pronta para o trabalho desta Comissão avançar.
Então, para cada um dos debates, dos temas que a gente conversou aqui - mobilidade, saúde, educação -, cada um desses debates... Gente, é uma comissão inteira! O melhor caminho seria a gente conseguir setorizar cada um desses temas, debater cada um deles com os objetivos relacionados.
Eu queria colocar à disposição o trabalho do Instituto Akatu...
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Mas, antes de você concluir, eu só gostaria de dizer aqui a todos que estão nos assistindo que a pesquisa já está na internet, já está em todos os meios de comunicação social. Alguém pode estar curioso ouvindo-a falar da pesquisa e achando que não pode ter acesso a ela. Então, fica registrado que ela já está disponível a todos.
A SRª GABRIELA YAMAGUCHI - Perfeito. Todo mundo pode entrar. Se alguém ou a Comissão tiver alguma dúvida em relação a isso, basta entrar em contato com o Instituto Akatu.
Ficam, então, essas minhas sugestões. Eu acredito muito nessa agenda. Essa agenda vai deixar de se chamar Cidades Sustentáveis e vai se chamar O Jeito como a Gente Vive. A gente vai usar termos também para que as pessoas consigam entender. A gente precisa mudar o jeito como a gente vive. Qual é o maior benefício disso tudo? Qualidade de vida, passar mais tempo com a família. Essas conexões precisam ser promovidas, e a gente se coloca à disposição para ajudar nessa agenda de conexões.
A palavra-chave do debate e de toda a discussão a respeito de cidades sustentáveis é "interdependência". Cada um de nós depende do outro. Nós estamos neste lugar hoje, nós chegamos aqui por conta da contribuição dos outros. Interdependência dos saberes, interdependência das tecnologias, interdependência econômica, social, ambiental. Então, acho que essa é a grande palavra para deixar para vocês.
Obrigada pelo convite.
Vou sair correndo agora.
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O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Mas você vai sair correndo não contrariando aquilo que você acaba de falar sobre qualidade de vida... Isso pode parecer contrassenso, pois você está aqui exatamente pregando o tempo para qualidade vida, mas está muito apressada. (Risos.)
A SRª GABRIELA YAMAGUCHI (Fora do microfone.) - É o senso de urgência para a mudança.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Mas você está sendo a promotora da urgência.
Vamos ao Francisco de Assis Farias da Silva, que diz aqui: "Eu acredito que a audiência pública O Futuro das Cidades e as Cidades Sustentáveis é importante, pois há a necessidade de mais reservatórios de água para preservar a população do Brasil." Ele quis dizer que, com esse tema, é extremamente importante que se pense dessa forma.
O Atair Lima diz:
Sr. Tom, interessante a questão da mais-valia citada pelo senhor [eu acredito que é a questão da mobilidade], mas isso no Brasil encontra dificuldades. Para que acontecesse, os governantes teriam que dar mais transparência aos gastos públicos, pois a sociedade iria fiscalizar mais. Por isso, a contribuição de melhoria [ainda] não vingou [por falta desses instrumentos].
Depois, cada um aqui terá a sua conclusão. A Yamaguchi já fez a fala dela com a conclusão, apesar do protesto da Presidência, dada a importância do tema. Inclusive, com a desenvoltura com que você apresentou aqui - eu acho que é importante -, realmente, eu acho que quase concluiu aqui o objetivo de todos nós na palestra. Mas fica convidada para um outro momento. A Comissão Senado do Futuro parabeniza o Instituto Akatu. Com certeza, temos muito o que trocar aqui em relação aos conhecimentos.
Eu também gostaria de aproveitar, Tom, pois você falou muito da questão da mobilidade urbana, da qualidade, não só com os meios tecnológicos... A Yamaguchi falou isto também: não adianta buscar a modernidade tecnológica se aquilo não traz o conforto para a população. É mais agitação, é mais rapidez, e, às vezes, não traz tranquilidade.
No Mato Grosso, especificamente em Cuiabá, também nós estamos lá com a obra do VLT. Isso foi muito discutido pela população quando da implantação do sistema. Discutiu-se se seria VLT ou BRT. A discussão foi muito grande. O fato é que, à época, o Governo do Estado decidiu construir o VLT. E foi tomada uma decisão pelo Governo. E eu acredito que aí houve uma falha, pois não houve uma forma de consultar a população. É claro que não é fácil consultar a população, por exemplo, num plebiscito, para uma obra como essa, porque, às vezes, as pessoas não sabem o resultado de como será essa obra. Às vezes, quem contratou o serviço público também não sabe como imaginar o tipo de obra ou o tipo de benefício que será gerado. Por exemplo, o VLT vai passar, mas está havendo o cuidado suficiente para fazer aquilo que você demonstrou na fotografia? Às vezes, o administrador público quer construir a obra, quer passar, quer alargar a rua, mas esquece o mais importante, que é exatamente o ser humano que ali convive.
Por isso, eu gostaria, aproveitando essa deixa, que você fizesse algum comentário, principalmente porque a obra está parada no Estado de Mato Grosso. Eu acredito que deve haver outros casos nessa situação. Muito investimento se fez. E eu acho que o planejamento da obra também foi outro problema, porque estão lá os trens, já comprados, os carros, e ainda não há linha pronta. E hoje a tecnologia é superada de forma muito rápida.
Eu gostaria de um comentário não só do caso de Mato Grosso, mas da mobilidade urbana como um todo.
Como é a última pergunta, pode ser daí para cá.
O SR. TOM REBELLO - Posso responder, então?
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Sim.
O SR. TOM REBELLO - Eu vou aproveitar, Senador, para responder rapidamente também a pergunta do colega...
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O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Todas elas para as quais vocês queiram fazer comentários.
E eu quero aqui também esclarecer aos telespectadores, aos internautas, que todas essas perguntas foram anotadas e que a Comissão vai mandá-las para todos os palestrantes para que, também, claro, todos recebam as respostas.
O SR. TOM REBELLO - Eu vou começar pela do colega de Porto Alegre, até porque é um projeto que me é muito caro, porque Porto Alegre talvez tenha uma das áreas portuárias mais interessantes para se fazer a revitalização.
Ouvi falar desse projeto pela primeira vez na década de 80, e os gaúchos até hoje estão discutindo se vão ou não fazer. Depois disso, Belém já fez um, maravilhoso - vale a pena conhecer o de Belém -, Rio de Janeiro está fazendo agora, Recife já fez...
A questão da revitalização portuária é uma decisão política e do cidadão, evidentemente. O que é interessante? É dar um uso para aquilo. O que eu imagino que seria possível? Essa decisão é da prefeitura, dos cidadãos de Porto Alegre, mas o que se faz, normalmente, no mundo é um concurso público, no qual se apresentam as melhores propostas, sabendo-se que, para funcionar, não adianta o Estado querer fazer, bancar e manter. Aquilo ali é um espaço para lojas, bares, restaurantes, um espaço que a cidade possa usar e, sobretudo, que ele se integre ao centro da cidade, não que seja uma barreira entre o rio e a cidade. Então, eu acho que o concurso público é alternativa. O bom é inimigo do ótimo, não é? Tem aquela historia. Então, tem de fazer alguma coisa.
Porto Alegre é uma das cidades que têm as melhores condições para se fazer uma bela revitalização portuária, mas, infelizmente, esse debate já acontece há 30 anos. Mas eu acho que o concurso pode ser a grande saída. E deve haver, evidentemente, um processo de licitação, através de uma concessão, para que o setor privado possa bancar os custos necessários, mas que não se perca o patrimônio público.
A solução é: patrimônio público com gestão da iniciativa privada. Depois de certo tempo, aquilo volta novamente para o Estado. Portanto, o cidadão não perde aquele patrimônio que ele tem.
Outra pergunta que o colega fez também, acho que pela internet, diz respeito a essa questão das mais-valias. Isso já vem sendo feito. Não me lembro do nome do colega, mas quero lhe dizer que isso já vem sendo feito em vários lugares. Não é uma questão de maior ou de menor transparência, é obrigação do Poder Público dar transparência às coisas que faz.
O que é importante nessa evolução jurídica do processo é que, a partir do Estatuto da Cidade e da Constituição de 88, se criou esse mecanismo, e isso faz com que benefícios anteriormente incorporados ou apropriados por outras pessoas estranhas ao empreendimento sejam permitidos através de um investimento bancado pelo Poder Público, portanto com dinheiro do cidadão.
Hoje, o Poder Público tem condições de buscar recursos privados para financiar parte desses empreendimentos de interesse público, e esse diferencial pode ser obtido a partir das mais-valias geradas pelo investimento que vai ser realizado. Ou seja, tudo que for diferencial em termos de uso, de gabaritos, de destinação nessa poligonal que compreende o eixo onde vai ser feita a intervenção, no caso de um projeto de transporte, por exemplo, é objeto de uma lei que a assembleia votará - portanto, o cidadão estará ali representado -, e é a partir dessas mudanças que se obtém, então, esses recursos para o patrimônio público, que vai usar isso para financiar essas obras.
O que é importante do nosso ponto de vista? É que esses recursos sejam otimizados. De que forma? Ao invés de o Estado simplesmente licitar um pacote em que 100% dessa mais-valia seja incorporada pelo concessionário, ele pode fazer isso em etapas. Para quê? Para que, à medida que as mudanças forem valorizando o espaço, esses Cepacs que são criados, que recuperam essa mais-valia, possam também se valorizar e o Estado, o Poder Público possa dispor, cada vez mais, de recursos para continuar investindo na região.
Agora, a questão da transparência é uma relação entre a sociedade e seus representantes. Isso é obrigação. Então, isso não se discute. Agora, o instrumento é legítimo, funciona e está sendo implantado.
Por último, Senador, quanto à questão de Cuiabá, eu acho que há dois aspectos: um é o da escolha da tecnologia. Eu compartilho, acho que o VLT, ou bonde, como alguns gostam de chamar, é a melhor tecnologia, porque ela associa uma boa qualidade de transporte com a valorização do espaço urbano, ao contrário de outras tecnologias que nem sempre proporcionam isso, que são mais agressivas em relação ao ambiente urbano. O VLT tem essa vantagem, inclusive, hoje, com a sofisticação do desenho, como, por exemplo, um piso de grama, que valoriza a área, com a pedestrianização das áreas centrais, onde só passa veículo, convive com o cidadão... Então, realmente, é a melhor solução, do ponto de vista tecnológico, pelo menos na minha opinião. Agora, evidentemente, da mesma forma que as mais-valias têm que ser fiscalizadas pela população, também esses projetos têm que ser fiscalizados e debatidos com a comunidade.
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Agora, mais do que outras tecnologias, o VLT, pela valorização do espaço, é, talvez, a tecnologia que permite a melhor recuperação dos recursos, em parceria com a iniciativa privada. Os outros todos dependem muito de investimento público.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Agora, Oscar de Moraes Cordeiro, para as suas conclusões e respostas às perguntas.
O SR. OSCAR DE MORAES CORDEIRO NETTO - Senador, o Tom tratou dessa questão de mobilidade, e eu vou tratar de uma outra dimensão. Foram avocadas aqui algumas perguntas sobre a parte em que trabalho mais, que é a questão dos recursos hídricos urbanos. Há algo que o próprio Senador evocou, a questão dos lagos, represas etc.
Também, de novo, há aqui um exemplo bem concreto nosso, no Lago Paranoá, de como podemos exercitar e praticar essa sustentabilidade. Quando o lago foi criado, nos idos de 60, o objetivo era fazer uma composição paisagística e a melhoria do microclima. Então, já havia uma preocupação, lá no início, com a própria criação de Brasília, com essas utilizações do lago. Mas o lago tem a sua vida, a sua dinâmica, assim como a própria cidade. Nesse ponto, foi instalada uma central hidrelétrica para produzir energia. Foi dado um uso importante para ele, maltratado, nos anos 70 e 80, com o lançamento de esgotos. Quem é antigo de Brasília sabe que esse lago, nos anos 80, foi condenado. Houve floração de algas, mau cheiro... Sou dessa época de Brasília, quando o lago foi totalmente condenado.
Então, tomou-se uma decisão. Como esse lago é patrimônio nosso, não podíamos conviver com essa situação aqui, em Brasília. Então, houve uma decisão política, que foi acatada pela população de Brasília, de salvar o lago. E começou-se um trabalho que tem 30 anos.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Nisso aí também está a questão das obras da orla?
O SR. OSCAR DE MORAES CORDEIRO NETTO - Esse já é outro ponto, de fazer com que o lago fique mais próximo ainda da população. Demorou um pouco para essa atitude se concretizar, em função de entraves jurídicos, de recursos etc, mas desde os anos 90 que se busca recuperar essas margens para população, para a natureza, porque, na verdade, são áreas de preservação permanente.
O lago - e aqui há um ponto bem interessante - começou, no fim dos anos 90, com uma série de projetos e decisões que passaram pelas administrações de Brasília. É algo que temos que visar a longo prazo. Houve o planejamento, houve comprometimento dos habitantes: "nós vamos salvar o lago". Gastou-se razoavelmente bem com estações de tratamento de esgoto modernas, criou-se uma política - o Tom deve concordar comigo - de uma certa restrição de ocupação e adensamento da Bacia do Lago Paranoá, para evitar que houvesse mais chegada de sedimentos e poluição.
Hoje, a cidade de Brasília é a terceira do Brasil em número de embarcações de lazer. No meio do Planalto Central, nós ocupamos a terceira posição em número de barcos desse tipo, em função do aproveitamento que ele tem, para lazer e recreação. Nesses dias de calor, todo mundo viu quantas pessoas usaram o lago para se banhar. Quer dizer, o lago melhorou de condições.
O aspecto mais interessante é que houve uma decisão, há três anos, de usar o Lago Paranoá para abastecimento público. Esse lago, que foi condenado, que foi poluído, agora, por uma decisão política, por uma vontade de ter sustentabilidade nas ações, vai ser usado para abastecimento. Vai-se captar água do lago para usar aqui, no Plano Piloto, no Lago Sul, em reforço aos sistemas. Esse lago, que foi criado com uma função, já incorporou várias outras. Acho que essa de abastecimento coroa um pouco essa visão. Então, é um bom exemplo.
Quanto a essa questão dos reservatórios urbanos, eu digo que a Lagoa da Pampulha está indo no mesmo caminho. Condenada que foi, está em processo de recuperação. E outros lagos e mananciais urbanos estão seguindo esse tipo de...
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Então, embora existam, de fato, eu diria, alguns exemplos positivos, algumas situações, a gente tem de estar muito vigilante, porque os riscos de adensamento da Bacia do Paranoá, aqui, ou de se abandonar esse projeto são muito grandes.
E, aí, vem aquele tripé: planejamento, cidadania e controle social. Se nós não ficarmos atentos - nós, habitantes - e não houver essa possibilidade, a tentação de outros atores no sentido de adensar a bacia a ponto de quase inviabilizar o aproveitamento do lago é muito grande.
Era isso, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Para as suas conclusões, representando o Ministério do Meio Ambiente, a Drª Nazaré.
A SRª NAZARÉ LIMA SOARES - Eu queria agradecer o convite, Senador. Foi um prazer estar aqui e poder compartilhar todos esses desafios que temos pela frente com relação a essa agenda.
Eu queria apenas fazer uma rápida observação com relação a uma das perguntas sobre o controle social nos planos diretores, ou ainda, sobre essa questão relacionada aos planos diretores de gaveta. Eu acho que esse é um desafio que permanece ainda. Eu acho que se buscou aprimorar os planos diretores nesses últimos anos no sentido de garantir uma maior participação da população nesse processo, e essa garantia da participação da população no processo de elaboração e de validação dos planos diretores, além do seu monitoramento, está previsto no Estatuto da Cidade. Então, não é que não existe lei para isso, porque existe. O fato é que as leis, particularmente nesse processo... A população precisa estar atenta também ao que haverá após o plano diretor.
Nós achamos que avançamos, porque elaboramos um plano diretor ótimo, com um processo ótimo de participação, mas a coisa meio que para por aí. Nós temos de criar mecanismos de monitoramento e acompanhamento dos planos diretores. Isso precisa ser conversado com os vereadores, no sentido de se criarem mecanismos de acompanhamento e de monitoramento dos planos diretores.
Esse é um desafio que ainda vai permanecer por certo tempo, mas eu acho que a população que se sentir cerceada nesse processo de participação precisa se organizar, ainda porque essa garantia de participação da população está garantida na legislação. Realmente, só precisamos encontrar mecanismos mais eficientes para essa participação se efetivar.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Nesta semana, eu, como muitos brasileiros, tive oportunidade de assistir a um programa, em rede nacional, em que o Procurador que comanda a Operação Lava Jato dava explicações, inclusive sobre a delação premiada. Ao final, ele perguntou aos presentes na plateia quem entendia que a Operação Lava Jato iria resolver ou iria mudar o Brasil em relação à questão da corrupção. Cerca de 10% levantaram a mão. Então, ele perguntou quantos entendiam que não iria. Uns 70% levantaram a mão, dizendo que não. E eu achei interessante ele reconhecer que a Operação Mãos Limpas, que aconteceu na Itália, acabou, por si, não mudando mesmo e levando o país à recessão, porque não houve a continuidade de um processo educacional sobre o tema.
Eu creio que, em qualquer aspecto, se não fizemos um trabalho que envolva a comunidade, Nazaré, inclusive nessa conscientização de que aquilo ali é importante para melhorar a qualidade de vida de todos, que não pode ser apenas de forma impositiva, mas também, pelo contrário...
E quero, aqui, fazer o comentário - até por isso fiz o gancho - de que também, por exemplo, como você comentou muito aqui, a questão da cobertura vegetal nas áreas urbanas e suburbanas... O País, hoje, praticamente não tem esse levantamento. A legislação está bastante divulgada e há fiscalização na zona rural. Inclusive, por outro lado, existe, a gente se depara, em muitas cidades, com situações em que alguém preservou uma área, principalmente os mais antigos de uma cidade, que ainda mantém a vegetação... Esse proprietário, às vezes, é extremamente penalizado. Hoje, por exemplo, na zona rural já se criou manejo sustentável, alternativas para que aquele que tenha a área preservada possa inclusive sobreviver. Hoje, há muitas matas em pé, até pela questão do CO2, enfim. O mundo moderno, o próprio Brasil já está começando a achar, encontrar alternativas que estimulem as pessoas a preservar, na área rural.
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Eu gostaria que você fizesse, para concluir, um comentário sobre se já há algo na legislação ou o que o Ministério está pensando nesse aspecto. Imaginem quem preserva ser penalizado porque não pode mais construir no seu terreno ou outras situações! O que fazer? Estamos falando em áreas urbanas ou suburbanas, porque existem muitas... Inclusive, ouvimos muitas pessoas que dizem: "olha, preservei o meu terreno aqui e agora não posso construir mais nada". E ainda têm que pagar o imposto sem ter benefício algum.
A SRª NAZARÉ LIMA SOARES - Sobre essa questão, acho que é muito difícil, Senador, responder ou fazer uma resposta como solução para todos os Municípios ou o que possa ser adotado por todos os Municípios.
Isso vai depender muito. Acreditamos que, com o zoneamento ambiental, o Município vai ter condição de olhar estrategicamente para suas áreas e tomar decisões sobre o que quer incentivar e onde quer desincentivar a ocupação. Acho que isso envolve diretamente... Acho que os mecanismos legais de hoje para os Municípios criarem incentivos para a ocupação e para a construção e, ao mesmo tempo, criarem incentivos para manter a cobertura vegetal e garantir a permeabilização do solo adequado - muitos Municípios já estão sofrendo com esse problema - fazem parte de uma decisão que envolve um processo de informação que o Município precisa ter sobre o seu território. Com base nessas informações, ele poderá ter condições de tomar decisões mais seguras sobre onde quer incentivar a permanência de cobertura vegetal e, com isso, criar incentivos para os proprietários e para as áreas que, para o poder municipal e para a situação ambiental do Município, é importante que permaneçam permeáveis, além de criar incentivos para áreas que podem ser adensadas por exemplo.
Então, acho que esses mecanismos legais para que os Municípios tomem essas decisões já existem. Elas existem. Então, é uma questão de os Municípios usarem esses instrumentos...
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Os incentivos?
A SRª NAZARÉ LIMA SOARES - Não, existem os mecanismos legais para que os Municípios possam criar os incentivos. Isso já existe. Agora, alguns Municípios têm bastante dificuldade para explorar todos os instrumentos legais existentes - é fato -, principalmente Municípios menores.
Com relação ao zoneamento ambiental, estamos elaborando um roteiro metodológico para ajudar os Municípios no processo de fazer o zoneamento para que esse zoneamento ambiental não se torne um documento burocrático, uma parafernália de mapas que, na maioria das vezes, são engavetados. Queremos propor um zoneamento ambiental que seja útil para o Município e que ele consiga, dadas suas condições, usar as diversas informações secundárias já existentes sobre si mesmo. Ou seja, acredito que essa decisão de usar, de incentivar áreas para que elas permaneçam permeáveis, com cobertura vegetal, ou incentivar áreas que podem e precisam, do ponto de vista estratégico da urbanização do Município, ser mais adensadas, esses instrumentos, do ponto de vista legal, já existem e podem, sim, fazer com que sejam criados maiores incentivos, desde que baseados muito em informações. Acho que essa é uma questão que o Município precisa compreender, que ele tem que tomar essas decisões baseado em informação.
O que acontece hoje em boa parte dos Municípios é que essa decisão de adensar mais uma área e deixar outras áreas mais permeáveis não é uma decisão baseada no planejamento e no interesse geral da população. Acaba acontecendo por pressão do setor imobiliário ou de um setor privado que se instalou ali e pressiona a prefeitura para gerar e criar instrumentos e serviços para aquele espaço, que, muitas vezes, nem é o espaço mais adequado para ter um adensamento urbano. Nós sabemos disso.
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Então, esses mecanismos e esses incentivos - os mecanismos legais já existem e os incentivos podem ser adotados pelos Municípios - precisam ser baseados em informações que venham, de fato, a beneficiar a maioria da população e garantir o equilíbrio ambiental do Município para que a gente não tenha cidades desmoronado, topos de morro desmoronando, nascentes secando, áreas de abastecimento, principalmente na área periurbana, secando. Esse é o retrato que esses adensamentos inadequados acabam gerando.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Ou seja, concluindo, nós temos que buscar realmente uma conscientização, e isso não é um processo de imposição, mas um processo de conquista que eu acho que todas as lideranças, principalmente os prefeitos e vereadores, têm que promover nas suas comunidades.
Inclusive, o Senador Pimentel colocou que hoje existe no Brasil, na verdade, um represamento na criação das cidades, porque a legislação impede a criação de cidades. As assembleias já não têm mais esse poder exatamente pela questão fiscal, porque hoje nós temos, no Brasil, a distribuição dos recursos feita através do FPM, o Fundo de Participação dos Municípios, onde há uma divisão de todo esse bolo. Isso ocasionou um maior represamento, em função das despesas a serem criadas.
Mas, por outro lado, nós temos, em alguns aspectos, comunidades que estão sendo criadas, e acredito que a gente vai ter que discutir muito isso, inclusive que tipo de novas cidades a gente precisa aprovar, para que elas possam... Inclusive, uma cidade, uma localidade que está começando a surgir, onde ela tenha... Inclusive, com um exemplo de sustentabilidade, ela poderia ter até uma facilidade maior inclusive para sua emancipação. É claro que a legislação praticamente proibiu, porque hoje se prevê a questão do plebiscito para a criação de uma cidade... Aliás, há previsão também de que uma cidade que é lindeira apenas pela divisa de um rio não pode nem ter a sua divisão.
Eu penso que temos que aperfeiçoar exatamente para que a gente não crie só metrópoles, metrópoles, metrópoles e metrópoles. Inclusive, esse programa habitacional brasileiro tem promovido a expansão das cidades às vezes com vazios muito grandes entre um conjunto e outro, em função exatamente da especulação imobiliária. Acredito que seja exatamente porque talvez falte uma fiscalização ou uma regulação melhor, inclusive nos programas federais a serem concedidos.
Mas eu quero aqui agradecer imensamente a todos os palestrantes, a todos aqueles que estiveram presentes e, mais uma vez, dizer também que todos, principalmente os estudantes, podem ter acesso à página desta reunião no portal e-Cidadania para terem, então, participação.
Eu quero aqui agradecer a todos os palestrantes, ao Tom, ao Oscar, à Nazaré, à Gabriela, à assessoria, a todos que aqui participaram.
Nada mais havendo a tratar, dou por encerrada mais esta audiência da Comissão Senado do Futuro.
Muito obrigado.
(Iniciada às 16 horas e 56 minutos, a reunião é encerrada às 20 horas e 9 minutos.)