Notas Taquigráficas
| Horário | Texto com revisão |
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| R | A SRª PRESIDENTE (Simone Tebet. PMDB - MS) - Havendo número regimental, declaro aberta a 39ª Reunião, Extraordinária, da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura. A presente reunião destina-se à realização de uma audiência pública, conforme aprovamos na reunião deliberativa anterior desta Comissão, para instrução do PLS (Projeto de Lei do Senado) nº 345, de 2015, do ilustre, queridíssimo e competente Senador Anastasia, que inclui na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, conhecida ainda como Lei de Introdução ao Código Civil, disposições sobre segurança jurídica e eficiência na criação e aplicação do direito público, conforme Requerimento - como disse, aprovado - nº 35, de nossa autoria. Nós fizemos os convites e agradecemos aos convidados pela presença. Gostaria, neste momento, de convidar para compor a Mesa, para fazer parte desta audiência pública, o Sr. Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy, ex-Consultor-Geral da União e Procurador da Fazenda Nacional. O Sr. Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy é doutor e mestre em Filosofia do Direito e do Estado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - acredito que seja colega da ilustre Drª Maria Helena Diniz. Foram colegas? (Intervenção fora do microfone.) A SRª PRESIDENTE (Simone Tebet. PMDB - MS) - Aluno? Também fui. Tive o prazer de beber dessa fonte de sabedoria. Ele fez estudos e pós-doutorado na Universidade de Boston, é especialista em Direito Constitucional e em Direito Tributário e, como disse, Procurador da Fazenda Nacional. Foi assessor de Ministro do Supremo Tribunal Federal, e tenho certeza de que veio para contribuir, em muito, com esta audiência pública. Também solicito e convido para compor a Mesa, representando o nosso querido presidente da Confederação Nacional dos Municípios, Dr. Paulo Ziulkoski, o Sr. Alexandre Curvelo. Ele é consultor da Confederação Nacional dos Municípios. O Dr. Paulo pediu desculpas, Senador Anastasia. Ele gostaria muito de estar aqui, mas representa uma confederação que engloba mais de 5,6 mil Municípios e não consegue estar em todos ao mesmo tempo. Mas tenho certeza de que está muito bem representado. Por fim, convido para fazer parte também da Mesa, representando o Secretário-Executivo Adjunto do Ministério da Fazenda, Dr. Fabricio do Rozario Valle Dantas Leite, que teve um probleminha de saúde ontem e pediu para ser representado - e tenho certeza de que será muito bem representado -, o assessor jurídico da Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda, Dr. Danilo Takasaki Carvalho. Por favor. Seja bem-vindo. |
| R | O Dr. Danilo também é mestre em Direito, pós-graduado em Contratos de Responsabilidade Civil pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDF), bacharel em Direito pela Universidade de São Paulo (USP), procurador do Banco do Brasil desde 2006. Hoje, como assessor da Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda, tem larga experiência e tem muito a contribuir com informações, engrandecimento e aprimoramento desse projeto de lei, que, embora pareça ser muito complexo, Senador Anastasia, no médio e longo prazo, tenho certeza de que a população brasileira vai enaltecer a sua iniciativa. É importante lembrar que a antiga Lei de Introdução ao Código Civil, modernamente conhecida como Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, regula, basicamente, o direito privado. Nós precisamos fazer jus ao novo nome de introdução dessa lei. Por isso, o projeto de V. Exª, que traz mandamentos gerais de direito público, no escopo dessa introdução, e visa justamente, acredito, suprir essa lacuna, é o que faltava para que pudéssemos ter aquilo por que todos nós ansiamos. Desde 1988, todos sabem que se foi estendendo, cada vez mais, o controle interno e externo das atividades públicas, seja administrativa, legislativa ou mesmo judicial, com os conselhos nacionais. E esse controle, feito por diversos órgãos, muitas vezes concomitantemente, não só prévio ou posterior, muitas vezes gera interpretações diversas, causando o que é inadmissível no direito e nas relações modernas, que é a insegurança jurídica; insegurança para a sociedade, insegurança para os agentes públicos, insegurança para a iniciativa privada, que quer colaborar com o Poder Público. Diante dessa percepção, eu louvo já, de pronto, a iniciativa e a sensibilidade do Senador Anastasia de trazer para esta Casa, na realidade, um projeto que trata de uma proposição não só bem fundamentada, mas já também muito discutida e analisada por inúmeros mestres do direito brasileiro. Sei que é uma proposição que saiu da academia - o que é importante -, da faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas, tendo como nosso coordenador o Prof. Carlos Ari Sundfeld e também o Prof. Floriano de Azevedo Marques Neto como um colaborador no âmbito da Sociedade Brasileira de Direito Público. Portanto, uma vez bem compreendido pelos Srs. Senadores e pelas Srªs Senadoras, eu não tenho dúvida de que esse projeto passará, por unanimidade, nesta Comissão. E, para que ele seja mais bem esclarecido para a sociedade - é importante dizer que estamos aqui sendo assistidos pela TV Senado, ouvidos pela Rádio Senado -, nós trouxemos pessoas que poderão, através da sua capacidade, conhecimento e experiência, colaborar e contribuir ainda mais com o projeto. Eu sou Relatora, portanto, mera mediadora nesta audiência pública. Vamos ouvi-los aqui e, para que não nos percamos - já aproveito para pedir desculpas, porque, depois de um Congresso Nacional exaustivo de mais de 11 horas ontem, nós fomos convocados para, logo mais, às 11h30, votarmos uma medida provisória -, para que possamos aqui coordenar de forma eficiente e célere os trabalhos, se não houver nenhuma objeção dos meus colegas aqui, colaboradores - vou chamá-los assim -, eu darei um tempo de dez minutos para as colocações iniciais. Se houver a necessidade de complementação do tempo, ela será fornecida. Os Srs. Senadores que quiserem fazer alguma pergunta, terão três minutos para a pergunta, e os senhores terão cinco minutos para fazer as suas considerações. Sem mais delongas, passo a palavra, neste momento, ao Dr. Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy pelo prazo de dez minutos. O SR. ARNALDO SAMPAIO MORAES GODOY - Obrigado. Bom dia a todos que estamos aqui no Senado Federal; bom dia, Srª Senadora; bom dia, Senador Anastasia, a quem cumprimento pela passagem exuberante pelo Governo do Estado de Minas Gerais, no qual enfrentou, com muita coragem, um dos maiores problemas que há na Administração Pública brasileira e que esse projeto, de algum modo, também contempla e enfrenta, que é a litigância intragovernamental. Tanto quanto sei, no Estado de Minas Gerais, um órgão, um ente da Administração litiga contra outro somente quando há autorização do Advogado-Geral do Estado, razão pela qual se consegue, em Minas, evitar um dos maiores problemas que hoje temos a enfrentar. |
| R | Temos execuções fiscais da Fazenda Nacional, por exemplo, protocoladas contra o Ibama. Nós temos, por exemplo, uma litigância absoluta e esquizofrênica entre órgãos e entes da Administração que tem como pano de fundo, justamente, a impossibilidade que o Direito brasileiro até o momento tem no sentido de enfrentar um problema gravíssimo, que é a responsabilização do agente público - no caso, o advogado público ou o parecerista - pelas opiniões que eventualmente emite. Por essa razão, Senador, vou concentrar as minhas observações no art. 27 do projeto, que me parece ser o mais emblemático e o mais inovador. O art. 27 nos dá conta de que o agente público responderá pessoalmente por suas decisões ou opiniões técnicas em casos de dolo ou de erro grosseiro. Eu quero sintetizar que um dos maiores problemas que há hoje radica no fato de que não temos ainda essa regra no Direito brasileiro. Qualquer das pessoas que hoje, eventualmente, buscarmos na rua e às quais perguntarmos os problemas que há no Brasil, além daqueles que todos sabemos, com toda certeza, colocarão os problemas nas costas dos burocratas. O Brasil tem uma tradição muito agressiva para com o burocrata. O burocrata é aquele que é motejado nos contos, na literatura; é aquela figura que, via de regra, parece um freio de mão puxado; é aquela figura que não deixa que, eventualmente, as coisas andem. Mas eu gostaria de chamar atenção para o outro lado. O burocrata brasileiro hoje vive sob um sistemático e obsessivo modelo de controle, que é necessário, mas que, no entanto, faz com que cada um dos burocratas pense duzentas vezes antes de lançar a assinatura em qualquer documento. O burocrata - e eu me refiro ao servidor público federal - é fiscalizado pela Controladoria-Geral da União, é fiscalizado pelo Tribunal de Contas da União, é fiscalizado pelo Ministério Público Federal, responde a ações civis, é fiscalizado por suas próprias corregedorias; enfim, ele é fiscalizado por um sem número de órgãos, razão pela qual, para que, eventualmente, possa apor a sua assinatura em algum documento, ele precisa contar com uma zona de conforto absolutamente densa para que, enfim, possa assumir os seus próprios atos. Nós temos uma lista de colegas advogados públicos, a quem me refiro especialmente, que hoje são pessoas responsáveis pelo não andamento da máquina pública em uma série de circunstâncias. E muitas vezes há uma razão explicativa para isso. Nós não temos hoje uma paridade de armas entre aquele que fala pelo Poder Público, que fala pelo Poder Executivo, e os vários órgãos de controle que há. Eu insisto: não estou defendendo a percepção de que não tenhamos de ser controlados. Esse controle é necessário. Todavia, o servidor também precisa de um referencial normativo para que possa, com independência, para que possa, com objetividade, exprimir as suas opiniões. Eu sei de procuradores da Fazenda Nacional, meus colegas, que nos recusamos a dispensar um crédito, que é um crédito incobrável, porque efetivamente estamos precavidos com as nossas corregedorias. Eu conheço colegas advogados da União que pensam três vezes para autorizar uma determinada licitação por conta do fato de que uma interpretação distinta daquela interpretação que ele possa dar possa resultar, infelizmente e efetivamente, num nível gravíssimo de responsabilização, razão pela qual, então, é necessária a construção de um mecanismo normativo, de um arranjo institucional que, definitivamente, resolva essa questão. Daí, então, o elogio para o conteúdo do art. 27. Primeiro, o conceito de agente público, que é um conceito absolutamente amplo e que contempla todos os interessados nesse tipo de problema. A responsabilidade aquiliana, a responsabilidade pessoal, muito bem colocada aqui, por suas decisões ou opiniões técnicas, essa responsabilização se dá, nesse contexto, em dois momentos: no dolo ou no erro grosseiro. E aqui vem uma sugestão: por que não, no dolo - vírgula -, na fraude - porque, eventualmente, pode haver um mecanismo de aproximação com aquele que é o administrado, para usarmos uma expressão hoje fora de uso. |
| R | O erro grosseiro, em princípio, é algo que também suscita um volume muito grande de questionamentos. O que seria o erro grosseiro? O desconhecimento da jurisprudência, o desconhecimento de uma norma, o desconhecimento de uma norma de orientação - caso específico da Advocacia-Geral da União, do Advogado-Geral da União. De qualquer maneira, eu quero louvar a qualidade do art. 27, que, definitivamente, desenha para o agente público um escudo herético por meio do qual ele realmente terá certeza de que será responsabilizado quando age com dolo ou com erro grosseiro. O art. 27, Senadora, definitivamente, pode sepultar no Brasil o crime de opinião, que hoje estamos vivendo. Eu conheço colegas que são responsabilizados, junto ao Tribunal de Contas da União, junto às várias corregedorias, porque os pareceres ou opiniões que emitiram são pareceres ou opiniões que não passaram pelo escrutínio daquele que controla os atos da Administração, razão pela qual o art. 27 tem, nas suas entrelinhas, no seu sentido hermenêutico e interpretativo oculto, um recado absolutamente emblemático para a cultura jurídica dos nossos dias, na medida em que ele mitiga, diminui o crime de opinião, que é o que existe no mundo fático. O §1º também me parece absolutamente muito bem desenhado, porque ele enfrenta algo que a Administração Pública federal há muito tempo procura desenhar, que é o conceito de erro grosseiro, que não é um tipo aberto, não é um tipo generalizado; é algo muito objetivo e muito bem colocado aqui. Inclusive, em doutrina, ainda que não pacificada, isso é de uma grandeza conceitual sem precedentes. Quero enfatizar a qualidade desse parágrafo. Creio que, pelo menos no art. 27, estamos em face de um grande monumento de legística - legística é aquela ciência que estuda a qualidade das leis. O §2º também outorga e oferece ao servidor público a possibilidade de que seja defendido, efetivamente, pelo próprio órgão para o qual ele trabalha. Nós, na Advocacia-Geral da União - enquanto estive lá -, criamos um departamento de Defesa das Prerrogativas. Nós tínhamos advogados, Senador, que eram objeto de ordens judiciais de prisão porque não entregaram remédios do SUS, de uma determinada decisão de um magistrado do interior do Estado de Santa Catarina, em que ele não podia fazer absolutamente nada. Resumidamente, eu estou aqui nesta manhã absolutamente encantado com a qualidade do projeto, com a densidade conceitual dessa iniciativa. E, provavelmente, em nome dos colegas que tenho na advocacia pública federal, quero enaltecer a qualidade do art. 27, que, aliás, vem em consonância e simetria conceitual com o novo Código de Processo Civil, que também responsabiliza os advogados apenas por dolo. Eu apenas sugeriria que a redação fosse ampliada: dolo - vírgula -, fraude ou erro grosseiro. São essas as observações que eu gostaria de dividir com o auditório, mais uma vez cumprimentando o nobre Senador Anastasia e também a Senadora Simone pelo modo tão gentil e delicado como me recebeu. Muito obrigado. A SRª PRESIDENTE (Simone Tebet. Bloco Maioria/PMDB - MS) - Nós é que agradecemos ao Dr. Arnaldo pelas considerações, pela importância das colocações feitas. Quero dizer ao Dr. Arnaldo que nós levaremos em conta essa sugestão em relação à inclusão no dispositivo legal, no art. 37, na questão da fraude, lembrando realmente que esse artigo garante uma segurança jurídica muito grande a quem procura, como nós, atuar sempre a favor do interesse público. Hoje em dia, diante da insegurança que há, o agente público fica realmente muitas vezes tolhido em função do medo - a realidade é esta, a palavra é medo - de agir de acordo com a sua consciência, de acordo com o que acha que é correto, sabendo que há jurisprudências muitas vezes até desarrazoadas, interpretando de forma contrária e impedindo que possamos desempenhar bem a nossa função. Louvo, novamente, o Senador Anastasia pela coragem de colocar esse art. 37. Teremos algumas polêmicas em relação a ele. |
| R | Já escutei algumas pessoas, inclusive, talvez com uma mentalidade um pouco mais retrógrada, questionando a respeito: "Mas o agente público, o parecerista, como ele não vai ser responsabilizado pelo dano que causar?". Como se ele não fosse um cidadão e não tivesse de responder de forma subjetiva, havendo dolo, havendo culpa ou, no caso, a culpa no sentido do erro grosseiro, ou mesmo aqui, com a inclusão do termo "fraude". Agradeço as suas colocações e passo, neste momento, a palavra ao Dr. Danilo Takasaki Carvalho, que está aqui representando o Ministério da Fazenda. O SR. DANILO TAKASAKI CARVALHO - Bom dia a todos. Bom dia, Senadora Presidente e Senador Anastasia. Em nome do Ministério da Fazenda e do Dr. Fabricio Dantas, eu gostaria de agradecer o convite feito ao Ministério para podermos externar as opiniões que nos foi possível alcançar do estudo desse projeto. É um projeto, como disse o Dr. Arnaldo, bastante ambicioso e muito importante, na nossa visão, para a construção de estruturas mais sólidas, do ponto de vista jurídico; estruturas essas que vão capacitar o Estado brasileiro - e refiro-me a todos os níveis governamentais - a dar condições a que a sociedade, os agentes econômicos e a sociedade em geral tenham segurança, tenham certeza de realizar investimentos, de tomar decisões, seja de investimentos, seja de suas vidas, com mais tranquilidade, com mais perspectiva do que acontecerá no futuro. Nesse ponto, há alguns artigos relevantes aqui. Não é um nem outro, são vários artigos que vão possibilitar dar essa visão, essa tranquilidade para a sociedade. De maneira geral, nós temos, na Lei de Introdução ao Código Civil... Perdão; na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - novo nome que ela alcançou, ainda nesta década -, partes que se dedicam a, digamos, porções diferentes do Direito. Existe uma parte que se pode chamar de metajurídica ou de sobredireito, que fala de interpretação, aplicação da lei, normas bem gerais, e existe uma parte também de Direito Internacional Privado, que vai tratar de como se resolvem conflitos entre leis, de como se resolvem situações concretas em que há possibilidade de aplicação de mais de um ordenamento jurídico. Há uma parte mais final da lei que trata também de inserção de comandos ou de decisões judiciais estrangeiras no País e do confronto dessas decisões com o ordenamento jurídico nacional. É bem evidente que falta - olhando de fato para o projeto que se apresenta aqui - alguma dedicação dessa lei, que se propõe a ser uma lei de introdução às normas do Direito brasileiro, ao ordenamento brasileiro; falta uma parcela de dedicação ao Direito Público, às normas da Administração e à atuação da Administração. Então, vejo como muito louvável - e o Dr. Fabricio compartilha desta opinião - a iniciativa, e em nossa opinião, realmente, ela vem a engrandecer o ordenamento brasileiro, vem trazer um aspecto estruturante para a sociedade. E, do ponto de vista do Ministério da Fazenda, na nossa área de interesse, para a economia também, uma maior certeza, uma maior segurança jurídica do Estado e dos particulares sobre a aplicação do Direito é fundamental para a tomada de decisões, para se olhar para o futuro, enxergar algo previsível e poder, então, fazer os investimentos, fazer a poupança, que é tão necessária para o País e para o crescimento. Eu queria fazer um comentário breve, na linha do que o Dr. Arnaldo já expôs aqui, e que também é algo que vem povoando algumas discussões que ocorrem em diversos projetos de lei, de medidas provisórias, com os quais tenho trabalhado, nas equipes em que tenho trabalhado, e que se volta para essa questão da responsabilização do agente público. |
| R | De fato, existe uma cultura de olhar para o burocrata e achar que ele é culpado de tudo, seja porque agiu, seja porque se omitiu. E temos que pensar uma coisa: o burocrata, aquele que passou em um concurso público e passou a ocupar um cargo público, tende a ser alguém mais avesso ao risco. Ele não foi para a iniciativa privada buscar o risco de o negócio dele dar errado ou de ele ser demitido. Ele foi para uma carreira em que a demissão, a exoneração é mais difícil de acontecer; depende de um processo administrativo etc. Então, ele já tem esse perfil de aversão ao risco. No momento em que existe alguma possibilidade de ele tomar uma decisão que lhe vai gerar uma responsabilização no futuro, a tendência, obviamente, é de ele não tomar a decisão; tentar evitar, de toda maneira, sair dessa situação. O fato é que algumas pessoas, alguns servidores podem até ter uma disposição à assunção de algum risco, quer dizer, ele quer alcançar os objetivos daquela organização pública - posso falar um pouco do Banco Central do Brasil, de onde eu venho de carreira -, quer alcançar o objetivo da instituição, por exemplo, na supervisão da instituição financeira, quer fazer um melhor trabalho, mas ele tem receio de que uma decisão que ele tome vá causar um prejuízo para aquela instituição, para aquele agente econômico, e que ele então seja, depois, responsabilizado, porque a Administração Pública é responsável por seus atos objetivamente. Então, o particular vai facilmente tentar a responsabilização do Poder Público, e isso vai, de alguma forma, respingar na pessoa física desse servidor que está agindo. Ele fala: "vou preferir a omissão", porque, na omissão, a Administração Pública é responsabilizada por culpa, e provar a culpa da Administração é um pouco mais difícil. Então, ele se resguarda por conta disso. O resultado disso é que uma série de atuações dos órgãos públicos poderiam ser mais eficazes, atendendo ao interesse público dessa maneira, alcançando a missão desses órgãos públicos, caso houvesse mais certeza, mais segurança para a atuação desse agente. Então, na linha do que o Dr. Arnaldo bem falou, se isso já é verdade para o advogado público, que faz uma atividade de consultoria, de assessoramento, normalmente, dos tomadores de decisão, imagine-se para os tomadores de decisão, para aqueles agentes públicos que tomam decisão. Então, vejo isso também com muito bons olhos. Vejo que há uma grande utilidade em se inserirem esses textos na nossa legislação. Enfim, eu gostaria de agradecer, novamente, a oportunidade. Essas seriam as nossas considerações por agora. Obrigado. A SRª PRESIDENTE (Simone Tebet. Bloco Maioria/PMDB - MS) - Obrigada ao Dr. Danilo, lembrando que, nesta audiência pública, estamos tratando de um projeto de lei do Senado, de autoria do Senador Antonio Anastasia, e que os nossos internautas, aqueles que estão assistindo a esta reunião podem nos acompanhar e também fazer as suas perguntas pelo portal e-Cidadania. Lembro que é um projeto complexo, amplo. Estamos tratando e falamos agora aqui pelo lado do agente público, seja do parecerista, seja do agente público de modo geral, mas não podemos esquecer que esse projeto tem uma abrangência ímpar. Um dos artigos que eu louvo mais nessa proposta do Senador Anastasia é justamente o art. 22, combinado com o art. 25 também, que fala sob a ótica do cidadão, de garantir-se segurança jurídica ao cidadão, diante de interpretações diversas que acontecem - é natural, diante de normas, principalmente, principiológicas, e mesmo por conta do tempo, que muitas vezes as interpretações sejam variadas; que haja uma transição proporcional, equânime, garantindo essa segurança jurídica ao cidadão. É salutar, nessa relação jurídica, que o cidadão confie no Poder Público e que o Poder Público sempre olhe o cidadão pelo olhar da boa-fé, nessa relação, que tem que ser, acima de tudo, a mais saudável possível. Quanto ao art. 22, eu gostaria apenas de citá-lo. Ele diz: A decisão administrativa controladora ou judicial que, com base em norma indeterminada, impuser dever ou condicionamento novo de direito, ou fixar orientação ou interpretação nova, deverá prever um regime de transição, quando indispensável para que a submissão às exigências se opere de modo proporcional, equânime e eficiente, e sem prejuízo aos interesses gerais. |
| R | No parágrafo único, o projeto estabelece que: Se o regime de transição não estiver previamente estabelecido, o sujeito obrigado terá direito a negociá-lo com a autoridade, segundo as peculiaridades de seu caso e observadas as limitações legais, celebrando-se compromisso para o ajustamento [os conhecidos TACs], na esfera administrativa, controladora ou judicial, conforme o caso. Acho que esse é um grande avanço, Senador Anastasia. Se conseguirmos aprovar este projeto, não tenho dúvida de que a segurança do Direito vai agradecer. Sem mais delongas, passo agora a palavra ao último convidado, que vem representando a Confederação Nacional dos Municípios, o Dr. Alexandre, que dispõe de dez minutos. O SR. ALEXANDRE SCHUBERT CURVELO - Bom dia. Primeiramente, agradeço o convite e, desde já, parabenizo o Senador pelo projeto. O projeto é realmente muito relevante. Também cumprimento os Profs. Carlos Ari e Floriano Marques pelo substancioso projeto que elaboraram. De fato, como os outros dois convidados ressaltaram, a lei trata de dispositivos que teriam por objetivo dar um pouco mais de segurança jurídica. Por ora, percebe-se que em vários dispositivos há uma menção indireta à proporcionalidade, que é um dos grandes temas do Direito brasileiro. Portanto, meus cumprimentos ao projeto. No entanto, não só sob a ótica dos Municípios, mas também como advogado, mestre, doutor, pós-doutor em Direito Administrativo, posso também falar um pouco a respeito desses temas a partir de outro viés. Em primeiro lugar, a Lei de Introdução tem por objetivo - e cumpriu esse papel nessa trajetória muito bem - tratar da aplicação das normas. Então, ela é uma lei que vale tanto para o direito privado quanto para o direito público. Os critérios de hierarquia das normas, o modo de solução dos conflitos das leis, de fato, estão na Lei de Introdução, que é o lugar correto para isso. No entanto, o projeto trata de alguns dispositivos de matéria de cunho processual. O exemplo citado pelo Dr. Arnaldo, muito bem captado, do art. 27, parece-me que poderia fazer parte da Lei de Improbidade Administrativa, e não de uma Lei de Introdução. Isso porque a responsabilidade do agente é um tema que foge do espaço das leis que tratam de outras leis, que tratam do conflito das leis e do modo de aplicação do direito. É deveras importante tratar da responsabilidade do agente público, mas parece que o local para isso não é aqui. O local não seria nessa Lei de Introdução, conquanto, ressalto, tenhamos aqui uma boa redação e a preocupação com um tema que, efetivamente, é muito relevante. Eu também gostaria de chamar atenção para outro artigo, o art. 24, que foi ressaltado aqui pela Presidente dos trabalhos. Novamente, temos aqui uma questão relacionada a uma matéria processual. Diz o art. 24: "Quando necessário por razões de segurança jurídica de interesse geral, poderá ser proposta ação declaratória de validade de ato [...]". A Lei de Introdução, salvo melhor juízo, não deveria aqui lançar a ideia de uma ação declaratória ou enunciar uma ação declaratória, o que seria próprio de outra norma, de uma norma de natureza processual, mesmo voltada para a Administração Pública, e não no âmbito de normas de introdução ao Direito. |
| R | Nós temos aqui, novamente, uma matéria que seria própria, talvez, de outro instrumento normativo, que não a própria Lei de Introdução. De fato, temos aqui alguns dispositivos que, pela concretude com que visam tratar de temas processuais, poderiam integrar projetos para adequação de outras leis de natureza processual, que não poderiam fazer parte da Lei de Introdução, justamente porque o objetivo da Lei de Introdução é outro; não seria tratar de temas processuais, propriamente falando, temas concretos. O art. 25, que também foi referido, igualmente inova, de forma muito adequada, ao falar da questão de normas de transição, quando nós teríamos a revisão de algum ato. De fato, na esfera administrativa, da concessão de licenças e de outras atividades, a questão de um... Isso, no Direito norte-americano, na parte de agências reguladoras, já é tratado há muitos anos; a questão da regulamentação negociada ou até do modo, às vezes, de retirada de um ato administrativo com o estabelecimento de regras de transição e de adequação aos efeitos que isso pode gerar. O fato é que a enunciação disso na Lei de Introdução, de um lado, é muito boa, mas de outro pode causar um simples percalço, que é o seguinte: quando nós vamos aplicar isso? Para todos os tipos de procedimentos administrativos - por exemplo, de licença municipal -, para todos os procedimentos no âmbito do Direito Ambiental ou para alguns, as leis que tratam desses procedimentos terão que se adequar a esse dispositivo. De que modo vão se adequar? Teria que haver algum tipo de regulamentação para isso. Então, aqui, como um enunciado isolado, ele parece justamente adequado. No entanto, como ele trará problemas concretos, seria ideal que ele não estivesse na norma de introdução ou em uma lei de introdução. É perceptível no projeto que a tônica principal de vários dispositivos é, justamente, o princípio da proporcionalidade. De fato, a proporcionalidade é um problema teórico e também um problema de aplicação da lei no Brasil, e fora do Brasil também isso ocorre. O fato é que a adequação desses preceitos que foram trazidos aqui me parece já existente no Direito brasileiro, no regime estabelecido pela Lei nº 9.784/99, a Lei de Processo Administrativo, que trata de um conjunto de regras e princípios inafastáveis no Direito brasileiro, lá no seu art. 2º, que é o Regime Jurídico Administrativo. Então, hoje, isso que o projeto tenta colocar em debate, de certo modo, já existe no Regime Jurídico Administrativo, que é também hoje um modo de condução da Administração Pública pelos Municípios, pelas demais esferas da administração direta e indireta. Eu acredito que, talvez, um link com a Lei de Processo Administrativo, com aqueles preceitos de Regime Jurídico Administrativo, seria mais próprio da Lei de Introdução do que ela estabelecer, como de fato fez, alguns preceitos de modo um pouco mais concreto. Talvez trazer os princípios do Regime Jurídico Administrativo para esse texto, como o início do projeto, estivesse mais adequado à natureza da norma, que é uma lei de introdução. Agradeço, novamente, o convite e parabenizo os proponentes do projeto. A SRª PRESIDENTE (Simone Tebet. PMDB - MS) - Obrigada, Dr. Alexandre Curvelo, pelas considerações e pelas críticas construtivas. Nós as levaremos em consideração. |
| R | Acredito que o autor possa dizer melhor do que eu qual foi a ideia do projeto, mas, como disse, sem entrar muito no mérito, eu gostaria apenas de fazer uma defesa em relação a algumas colocações que V. Sª fez. É importante lembrar - eu comecei a minha fala dizendo isso - que a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro mudou apenas de nome, mas não no mérito. Os artigos continuaram os mesmos. E acredito que o propósito do legislador, ao mudar o nome de Lei de Introdução ao Código Civil - portanto, com uma atuação mais específica em normas gerais de direito privado - para Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, tenha sido exatamente este: mostrar que, no mundo de hoje, globalizado, por mais que haja dicotomia entre direito público e privado, está cada vez mais difícil fazer essa separação. O público se mistura no privado, no dia a dia, na vida do cidadão. Há momentos em que não dá nem para falar, por exemplo, que um instituto como o casamento é do direito privado. Quando, por exemplo, Dr. Arnaldo, nós estamos diante de uma briga de casal em que o marido espanca a mulher, isso passa a ser uma questão, sim, de ordem pública. Então, diante dessas situações do cotidiano, da vida, da modernidade, da agilidade, diante da realidade que temos no Brasil hoje, acredito que tenha sido esse o espírito do legislador, no sentido de transformar realmente a antiga Lei de Introdução ao Código Civil em algo maior, em uma norma de âmbito nacional que quer trazer diretrizes, como faz a própria Constituição. Talvez tenha sido esse o grande propósito e, a meu ver, até o grande mérito do projeto idealizado também pelo Senador Anastasia. Quando V. Sª fala da questão do art. 34, realmente nós estamos inovando aqui, se aprovarmos esse projeto, ao criar a Ação Declaratória de Validade dos Regulamentos - não é, Senador? -, inclusive com efeito erga omnes, o que é importante mencionar, em nome da segurança jurídica, da celeridade, para que tenhamos essa estabilidade, previsibilidade das relações. Mas concordo com V. Sª e vamos levar isso em consideração. Este é o começo; não é o fim. Quer dizer, não adianta colocarmos na Lei de Introdução a criação de mais um instituto processual, como a Ação Declaratória de Validade. Ele vai requerer, sim, que depois, ou no Código de Processo Civil ou em outro dispositivo, nós possamos colocar os pré-requisitos, as competências, as atribuições, dizendo a que se propõe esse instrumento. Acho que foi esse o espírito. Mas agradeço V. Sª. Em um primeiro momento, causa estranheza mesmo esse projeto. Quem olha, principalmente os estudiosos do Direito, que, como eu, estudaram sob a égide da Lei de Introdução ao Código Civil, pensa: "Espere aí; o que o direito público está fazendo dentro de um livro que é, eminentemente, uma bíblia do direito privado brasileiro?". Então, são normas que vão ser discutidas. E, se aprovadas e colocadas no escopo da Lei de Introdução, como eu disse, isso é um começo, e não um fim, porque vamos precisar regulamentar, disciplinar em outros dispositivos também. Mas eu concordo e agradeço, porque realmente essa é a primeira impressão que nós temos. Talvez, Senador, ele tenha dado uma grande contribuição para defendermos o projeto inclusive na Comissão, que é tentar, como preliminar, levantar esta questão: por que essas normas na Lei de Introdução ao Direito Brasileiro? Então, só tenho a agradecer pelas colocações. Estão nas notas taquigráficas, e nós vamos levar em consideração tudo que foi colocado aqui. Vou passar, imediatamente, a palavra - estamos com o tempo muito curto - ao autor da proposição, para fazer as suas considerações, mas não sem antes, de forma muito especial e carinhosa, agradecer a presença do Presidente da Comissão de Constituição e Justiça, José Maranhão, nosso Líder, nosso mestre, e dizer que o lugar dele é aqui, e o meu lugar é ao lado do Senador Anastasia. Então, eu gostaria de convidá-lo para que pudesse assumir esta Presidência enquanto o nosso autor, o autor da proposição, faz as suas considerações. Já estamos na fase final aqui da audiência pública, mas vai ser uma honra ter esta audiência pública finalizada por V. Exª, Senador José Maranhão. O SR. JOSÉ MARANHÃO (Bloco Maioria/PMDB - PB) - Eu vou declinar do convite honroso que está me fazendo para V. Exª continuar com o comando desta reunião, que está exercendo com tanta habilidade e, sobretudo, com proficiência, com conhecimento da matéria que está sendo tratada aqui. |
| R | Eu preferiria continuar aqui para ouvir as lições que V. Exª acabou de expender aí nas suas observações sobre o depoimento que acabou de fazer o Dr. Alexandre. A SRª PRESIDENTE (Simone Tebet. PMDB - MS) - Obrigada, Sr. Presidente. O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB) - Fico honrado com o convite para concluir e com as palavras generosas que proferiu ao meu respeito, mas eu preferiria ficar aqui como ouvinte atento às considerações que V. Exª vem fazendo ao longo do debate. A SRª PRESIDENTE (Simone Tebet. PMDB - MS) - Obrigada, Sr. Presidente. Nós é que nos sentimos honrados com a sua presença. Senador Antonio Anastasia, V. Exª tem a palavra. O SR. ANTONIO ANASTASIA (Bloco Oposição/PSDB - MG) - Muito obrigado, Srª Presidente, Senadora Simone Tebet. Estendo meus cumprimentos ao Senador José Maranhão, nosso querido e permanente Presidente da CCJ, Comissão que é o coração do Senado Federal. Quero saudar os eminentes convidados, agradecer a presença deles, cujas contribuições certamente serão de altíssima relevância à nossa digna Relatora, Senadora Simone, igualmente professora de Direito Administrativo e de Direito Público, e que conhece, como demonstrou aqui - no bom adjetivo do Senador Maranhão -, com excelente proficiência, a conduta dos trabalhos de sua relatoria e o objetivo, exatamente, de um projeto como este, por nós apresentado, pela sua dimensão, pelos seus contornos, exatamente até pelo desdobramento que ele traz, com grande repercussão na vida jurídica nacional, mormente na Administração Pública e, tratando de Administração Pública, também na vida cotidiana de cada um dos cidadãos. É evidente que a Senadora tem todas as precauções e cautelas necessárias para apresentar as alternativas. Eu ouvi, Srª Presidente, com muita atenção, todas as muito bem lançadas colocações dos nossos três convidados. Quero, igualmente, como V. Exª o fez, agradecer a cada qual pela sua colaboração e dizer que, em síntese, o projeto se inspirou, como V. Exª disse no início, em uma contribuição da academia, que é a nossa origem, através da palavra do Prof. Floriano Marques e, especialmente, do Prof. Carlos Ari Sundfeld, e da Sociedade Brasileira de Direito Público, que reúne a plêiade dos constitucionalistas e juspublicistas brasileiros, com o objetivo de suprimir a lacuna que aqui foi dita: exatamente a grande deficiência que hoje temos na Administração Pública brasileira, que é a segurança jurídica, quer para o gestor, quer para o cidadão. O cidadão, à mercê de alterações arbitrárias, unilaterais, de motu proprio de interpretações, fica, obviamente, na insegurança e na inquietude de saber se aquele ato de que, eventualmente, ele tenha sido objeto ou de que participe terá o seu reconhecimento no futuro em razão de mudança da interpretação. E, por outro lado, o gestor, como aqui foi muito bem dito também, fica extremamente cauteloso, temeroso. Na realidade, Presidente José Maranhão, V. Exª também presidiu com muito garbo o nosso querido, valente, heroico, Estado da Paraíba, como eu também tive a honra de governar Minas Gerais, e a Senadora Simone foi Vice-Governadora de Mato Grosso do Sul - só não foi governadora porque não o quis - e Prefeita do seu Município. Nós todos fomos gestores do Poder Executivo e sabemos o que é uma assinatura em uma decisão, da mais singela à mais complexa, nos dias de hoje, ou seja, quais serão as consequências, quais serão os desdobramentos daquela decisão, que você toma imbuído da melhor boa-fé, mas, muitas vezes, em uma interpretação que pode dar um desdobramento futuro, especialmente em razão dos fatos que nós conhecemos hoje do sistema de controle. Por que a Lei de Introdução? Exatamente pelo fato de que essa Lei de Introdução tem o seu caráter genérico, abrangente. Quando eu estudei isso, em priscas eras, Senador Maranhão, lembro que o meu professor de Direito Internacional Privado - cujas normas estão aí - dizia que o Direito Internacional Privado não é nem internacional nem privado; ele é, na verdade, um ramo do Direito Público que cuida da aplicação das normas. É o mesmo caso aqui: a Lei de Introdução ao Código Civil não era uma lei do Código Civil; era uma lei de introdução - e o nome agora é correto - ao Direito brasileiro. E, por isso mesmo, o locus escolhido para essas regras e esses preceitos fundamentais para robustecer a segurança jurídica no Brasil foi essa legislação, em caráter genérico e de aplicação também nas três esferas da Federação. Porque a Lei de Processo Administrativo, só para dar um exemplo, está restrita à esfera federal, e nós queremos que isso se desdobre para os Municípios e também para os Estados. |
| R | Por outro lado, quando falamos da questão da improbidade, temos de lembrar que improbidade é uma espécie de responsabilização, e aqui estamos dando o conceito genérico da questão da decisão técnica da opinião, se por dolo, fraude - muito bem lembrado - ou erro grosseiro. Acho também - tem razão o Dr. Alexandre, e eu já disse isso outro dia à Senadora Simone em uma conversa tête-à-tête - que nós temos de enfrentar aqui a Lei de Improbidade, porque o seu art. 10, a meu juízo, está causando também os mesmos distúrbios no dia a dia, porque o mero descumprimento da lei, Senador Maranhão, muitas vezes, nem por desconhecimento, mas por uma interpretação equivocada, tem gerado ações de improbidade contra os gestores, especialmente gestores municipais. Convênios mal aplicados, dificuldades de interpretação; isso tem dado azo a inúmeras ações e processos. E o objetivo da nova ação é, exatamente, instrumentalizar a confiança jurídica. Por isso, essa ação direta que foi aqui concebida, colocada, manifestada, exatamente para permitir ser o meio necessário à garantia e à efetividade da confiança jurídica. Mas eu queria, eminente Senadora - não me estendendo muito, em razão do nosso horário, e eu ainda tenho de votar os embaixadores na CRE -, agradecer muito a condução de V. Exª, que tem sido uma Relatora excepcional. Aliás, muito bem escolhida pelo nosso Presidente, Senador José Maranhão, que tem sido muito generoso com os projetos de minha autoria, só indicando relatores dedicados, como é o caso de V. Exª e de todos os nossos colegas. Muito obrigado a todos pela participação. Tenho certeza do proveito para a Relatora desta bela audiência. A SRª PRESIDENTE (Simone Tebet. PMDB - MS) - Obrigada, Senador Anastasia, pelas gentis palavras. Mas, também, com um projeto dessa magnitude e com essa qualidade, fica fácil relatar, Senador. Ainda mais tendo ao meu lado o autor, que vai não só ser o autor, mas também correlator. Ele vai estar ao meu lado, nos momentos difíceis da relatoria, para nos auxiliar, sempre sob a batuta e a tutela - quero aqui dizer aos convidados - do nosso querido, experiente Senador José Maranhão, de cujo currículo vou declinar de falar, porque já não sei quantas vezes foi Deputado Estadual - acredito que quatro -, foi três vezes Governador de seu queridíssimo Estado, Senador da República, fora o início da sua vida pública. Ele começou na vida pública, Senador Anastasia - ele estava me contando recentemente -, como Deputado Estadual aos 18 anos de idade. Na época, perguntei se a Constituição Federal permitia que, aos 18 anos, ele pudesse sê-lo, e ele me contou um episódio que acho que é preciso - se me permitir, Senador - compartilhar, não só com os cidadãos da nossa querida Paraíba, mas de todo o Brasil. Ele disse que, à época, para que ele pudesse ser candidato, o seu pai, comerciante, o emancipou. E aí foi à Justiça dizendo: "uma vez emancipado, sou maior de idade; consequentemente, não serão os 18 anos apenas de vida, mas a minha experiência que vai contar". E aí começou a sua vida pública. Acho que é uma bela história de vida. E, se está onde está até hoje, é pela integridade. Se o povo o reconduziu, diversas vezes, nos seus mandatos eletivos, foi pela capacidade, pela competência e pela integridade. De homens como ele nós estamos precisando no País. Eu estou me alongando em relação a isso, porque o projeto trata exatamente disso. Já que V. Exª iniciou, não vou aqui refutar e não vou me omitir com relação ao assunto. Quando disse que não quis ser candidata a governadora, eu não quis mesmo. Talvez, se houvesse uma lei como essa... Eu poderia até perder a eleição, mas não quis sequer ser candidata. Se tivéssemos a garantia desses dispositivos, eu, que já passei pela gestão municipal por duas vezes e sei o que é assinar um documento e depois ter que ser responsabilizada, mesmo sem dolo, sem culpa, sem erro grosseiro, e muitas vezes estar sob o jugo de interpretações divergentes e, muitas vezes, equivocadas, fora do tempo, fora do contexto, pensei duas vezes. Pensei, principalmente, nas minhas filhas. Acho que nós só temos duas coisas a deixar na vida, que é o nosso nome e aquilo que deixamos no coração das pessoas - sempre digo isso. Eu olhei bem para as minhas filhas e falei assim: por muito tempo, Executivo eu não quero mais na minha vida. É uma responsabilidade muito grande, e nós infelizmente não temos a segurança de fazer aquilo que devemos fazer. Ficamos, muitas vezes, amarrados a certas jurisprudências, a certas decisões, e com essa temeridade nós deixamos de fazer o que é certo, o que é bom para o País. Eu finalizo, agradecendo muito a presença dos convidados. |
| R | Se quiserem fazer algumas colocações, eu vou facultar a palavra por dois minutos, mas não sem antes dizer que eu tenho este projeto como um filho adotivo muito querido. E vou tratar com muito carinho o seu projeto, Senador Anastasia. Não tenho a competência nem a sua capacidade para relatá-lo, mas farei com gosto e com convicção. Se eu pudesse resumir o seu projeto numa única linha, este é um bom momento de nós termos um excelente equilíbrio. Creio que a palavra de que nós precisamos neste momento para o País, não só na esfera jurídica, mas no mundo fático, seria, no caso específico, o equilíbrio entre a legalidade, e somos todos escravos da Constituição e da nossa legislação, e a eficiência da gestão pública. Legalidade e eficiência são, neste projeto, sinônimos ou terão que ser daqui para a frente. Agradeço a todos que estão nos acompanhando e aos que estão nos presenteando com a sua presença. Pergunto se mais alguém quer fazer colocações. Peço desculpas pelo tempo. Nós vamos sair agora para fazer uma votação importante de uma medida provisória. Então, nada mais havendo a tratar e agradecendo mais uma vez a presença de todos, eu declaro encerrada a presente reunião. (Iniciada às 10 horas e 18 minutos, a reunião é encerrada às 11 horas e 12 minutos.) |
