Notas Taquigráficas
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| R | O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Declaro aberta a 23ª Reunião conjunta das Comissões Permanentes do Senado Federal, composta pela 56ª Reunião da Comissão de Meio Ambiente e Defesa do Consumidor, Fiscalização e Controle e pela 42ª Reunião da Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania, da 1ª Sessão Legislativa da 55ª Legislatura. A presente reunião destina-se a avaliar os 15 anos da Agência Nacional de Águas (ANA) e a Política de Recursos Hídricos, além do comparecimento anual do Diretor-Presidente da ANA para prestar contas sobre o exercício de suas atribuições e o desempenho da agência, bem como para apresentar a avaliação das políticas públicas no âmbito de suas competências, em cumprimento ao disposto no art. 96-A do Regimento Interno do Senado Federal. A reunião será realizada em caráter interativo, ou seja, com a possibilidade de participação popular. Dessa forma, os cidadãos que queiram encaminhar comentários e/ou perguntas podem fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania, no endereço www.senado.leg.br/ecidadania, ou ligando para o número 0800-612211. Convido, então, para tomar assento à mesa o Sr. Vicente Guillo, Diretor-Presidente da Agência Nacional de Águas. É com prazer que eu recebo V. Sª aqui. Convido ainda o Sr. Paulo Lopes Varella Neto, Diretor da Área de Gestão da Agência Nacional de Águas. o Sr. Ney Maranhão, Diretor da Área de Hidrologia da Agência Nacional de Águas; a Srª Gisela Forattini, Diretora da Área de Planejamento da Agência Nacional de Águas; e o Sr. João Gilberto Conejo, Diretor da Área de Regulação da Agência Nacional de Águas. Antes de conceder a palavra aos nossos convidados, eu gostaria de dar uma informação que me pede o Senado Federal, qual seja, o de que, nesta audiência pública em que trataremos dos 15 anos da Agência Nacional de Águas, temos o privilégio de entregar a todos os Senadores e Senadoras o Plano de Gestão de Logística Sustentável do Senado Federal, um documento que consolida o compromisso desta Casa Legislativa com a sustentabilidade e procura implementar ações mais efetivas para contribuir em sua esfera de atuação com a racionalização dos gastos funcionais e com uma gestão eficiente para todos, capaz de estabelecer um marco na mudança de comportamento e no comprometimento com as gestões ambientais. |
| R | Gostaria de me dirigir ao Presidente, Dr. Vicente, a fim de saber, pelo rito, quem será o primeiro convidado a falar. (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Então, passo a palavra ao Dr. Vicente Andreu Guillo para que faça a sua explanação. Comunico aos Senadores que queiram fazer alguma observação ou pergunta que se sintam à vontade. Senador Walter Pinheiro, Senador Blairo Maggi... O SR. BLAIRO MAGGI (Bloco União e Força/PR - MT) - Presidente, V. Exª§ me permite. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Pois não. O SR. BLAIRO MAGGI (Bloco União e Força/PR - MT) - Sr. Presidente, queria aproveitar a oportunidade para cumprimentar V. Exª e também todos os convidados para esta audiência pública, em que se fará um relatório do que está acontecendo e o que aconteceu na Agência Nacional de Águas. E, para comemorar os 15 anos, temos que olhar os próximos 15 anos. A ANA é muito novinha, vai deputar agora e tem uma vida inteira pela frente. E a importância das questões relacionadas à água, não só para o Brasil como para o mundo, é vital. E é importante que a agência tenha condições de fazer as discussões, os enfrentamentos e também dar as orientações, porque temos ouvido muitas coisas a respeito de água, e a impressão que se tem é de que ela não existirá mais amanhã. Eu não acho que seja assim. Penso que é um bem que temos que conservar, tem um ciclo que vai acontecer naturalmente. E vejo muitas coisas colocadas por algumas pessoas que nem têm qualificação suficiente ou conhecimento suficiente para falar sobre essa questão. Então, penso que a agência, uma agência reguladora de tudo isso, tem até a obrigação de, muitas vezes, quando publicações ou opiniões que sejam muito contra o que é a lógica da coisa, se manifestar, porque, senão, vamos criando as lendas urbanas. E, hoje, com os meios de comunicação, à medida em que chega uma informação para alguém, essa informação não nem é analisada e, simplesmente, passa para frente, e assim sucessivamente, criando-se a tal da lenda urbana não só sobre esse assunto, mas sobre todos os demais passíveis de estarem na comunicação. Quero dizer que a questão da água é preocupante, nós não estamos dizendo que não. Ela regula todo o ciclo da vida. É chover no molhado dizer que ela é importante e, de fato, ela é muito importante. Pequenas modificações, pequenas variações nos volumes de chuva ou nos volumes dos rios têm influenciado, e muito, a economia. Você perde volume de água nos rios, como nos amazônicos, e já não se consegue mais fazer determinado tipo de transporte de cargas. E, em determinados lugares da Amazônia, só o rio é o acesso de chegada àquelas comunidades. Então, prever isso, saber como isso vai acontecer no futuro... Eu já ouvi, por exemplo, dizerem que teremos uma diminuição de 30% nos volumes de água nas próximas décadas na Amazônia. Isso é um estudo, uma conversa, uma sugestão? Porque os governos, as entidades sinalizam para o futuro. E pessoas tomam decisões empresariais ou nas suas vidas a partir daquilo que ouvem sobre o futuro. Então, eu sempre tive muita preocupação - e fui governador do meu Estado - de, como tal, não dar informações sobre coisas que eu não poderia cumprir no meu mandato, porque sabia que aquilo iria influenciar pessoas, elas fariam mudanças em suas vidas, e, depois, isso iria não acontecer. Então, penso que a Agência tem esse papel, um importante papel na sociedade brasileira, pelo que quero cumprimentar o Dr. Vicente, que está aqui conosco, que é o Presidente da Agência, bem como a todos os demais diretores aqui presentes. |
| R | Vamos ouvi-los e, com certeza, esta audiência pública será acompanhada pela TV Senado, pela Rádio Senado e será repetida, com certeza. Então, o público aqui nas nossas Comissões é pequeno, mas o público no Brasil inteiro acompanha e sabe o que acontece aqui. Muito obrigado e parabéns à Agência também. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Muito obrigado. O SR. WALTER PINHEIRO (Bloco Apoio Governo/PT - BA) - Senador Otto Alencar, se V. Exª me permite, eu passei aqui para trazer não só o nosso apoio, acho que V. Exª faz um trabalho belíssimo nesse rigoroso debate sobre a questão das águas. Obviamente que o tema central que V. Exª coloca nesse aspecto é, senão o mais famoso, um dos principais veios d'água do nosso País: o nosso Velho Chico. Ao mesmo tempo, também quero trazer dizer, como bem lembrou o Senador Blairo Maggi, nesses quinze anos de ANA, que tive a oportunidade de participar do seu nascedouro, Senador Otto, Diretor-Presidente da Agência, Vicente. Na época, nós fazíamos um debate caloroso no Congresso Nacional sobre o surgimento das agências e a ANA veio em um processo dos mais bem conduzidos do ponto de vista do debate, da necessidade, ainda que com alguns desvios da época. A gente sempre reclamava dizendo que a ANA não podia ser uma agência com o mesmo perfil das agências que já estavam criadas, dentre elas a Aneel, que foi a primeira agência criada -, aliás, amanhã, a Aneel completa 18 anos, se não me falhe a memória, 9 de dezembro de 1996, o surgimento da Agência Nacional de Energia Elétrica, que foi a nossa primeira agência. A gente participou, de uma forma muito calorosa, de um debate que resultou numa experiência importante, não só na composição dos quadros da agência, como também numa qualificação desse debate das agências. E acho que a ANA tem dado uma contribuição importante, conseguiu, ainda que o seu perfil institucional tenha sido quase que um perfil muito parecido com as outras agências. Naquela época, Senador Otto Alencar, a gente travava muito um debate sobre agência reguladora, agências executivas, enfim, qual o modelo a se adotar, ainda muito incipiente. Se hoje nós estamos aqui comemorando 15 anos, ainda é um tempo curto, imagine naquele período em que a gente se deparava, inclusive, com processos já avançados de algumas reestruturações em Estados, experiências em São Paulo, início de um debate caloroso na Bahia, em Manaus, sobre essa coisa do manejo das águas e o intenso debate no Brasil inteiro sobre a integração de bacias, portanto, um rico debate. E, nessa época, Senador Otto Alencar, aí já no período de 1996/1997, basicamente, eu até trouxe esse material para entregar a V. Exª, um material que compõe, inclusive, um estudo feito por mim na época, já que minha área de atuação não é muito nas águas, é muito mais na infraestrutura. Eu fazia uma crítica contumaz à questão da transposição do São Francisco e não fazia crítica meramente no contexto da política, muito menos, como muita gente acusava os baianos, dizendo que a gente não queria deixar que a água chegasse ao Nordeste setentrional. E, desde aquela época, eu repetia muito uma frase do Bispo Dom Luís, da Barra, que dizia que "anêmico não doa sangue". Portanto, em 1997 o bispo já cravava a anemia do Velho Chico. E esse material eu fiz muito mais sob a ótica do que significaria, do ponto de vista de ganho, o que nós teríamos de perda. Qual, inclusive, o consumo de energia que nós teríamos no primeiro projeto, que era Estrutura e Bombeamento. Lembro bem que eu fiz uma comparação entre o consumo de energia no Estado de Alagoas, para chegar e dizer que, em um dos pontos de bombeamento, Senador Blairo, nós gastaríamos mais energia do que o Estado de Alagoas iluminado o ano inteiro para fazer a água subir. |
| R | Portanto, isso mostra os desvios, os erros, o custo daquela obra e o custo/benefício. Ou melhor, não dá para falar em custo/benefício, mas em prejuízo para as populações. Assim, acho que nada melhor do que fazer esse debate agora, num momento crucial. Em 2012, nós enfrentamos um período muito crítico. Nós estivemos com a ANA, até com a presença, na época, do Governador Jaques Wagner, no início do ano de 2012, em janeiro de 2012, Senador. Pelo dia 5 ou 6, nós viemos a Brasília, já tratando da questão daquilo que seria um dos piores períodos de estiagem para a Bahia. Portanto, a ANA já havia feito esse alerta. E hoje, coincidentemente, o Governador Rui Costa está aqui, em Brasília, discutindo exatamente a mesma coisa, três anos e algumas canelas secas depois, como dizem os baianos. Então, quero aqui trazer a V. Exª o meu apoio. Lamentavelmente, não vou poder ficar, pois estamos também com a Comissão de Ciência e Tecnologia fazendo um debate no Interlegis e sou um dos participantes do painel que deve começar agora, às 10h, e que trata exatamente do financiamento e das formas de financiamento para a pesquisa, para o desenvolvimento e o acompanhamento dessas áreas. E essa é uma das áreas em que investimos muito pouco em pesquisa no Brasil. Essa talvez seja a pior área de investimento no que diz respeito à pesquisa e ao desenvolvimento. E é a área cara - dito por todo mundo como sendo a essencial. Mas, na hora em que colocamos no Orçamento, no Congresso Nacional, essas prioridades, vemos a água ir para o ralo, Senador Otto. Isso é extremamente duro dizer e difícil de aceitar, mas é preciso falarmos essas coisas, como V. Exª tem falado de forma veemente, que é para podermos virar o quadro, senão vamos ficando o tempo inteiro só na estatística, na estatística, nos anúncios das notícias, e, efetivamente, não temos a transformação necessária para que possamos solucionar esse grave problema. Aliás, tem uma turma vindo aí da COP. A minha sensação é a de que aquele é um copo meio esvaziado do ponto de vista da água. Discutimos, discutimos, e vemos alguém comemorar que agora as exigências que antes eram 1,2 mil baixaram para 700, quando, na realidade, elas deveriam chegar ao patamar zero para podermos dizer que não há nenhum senão, nem tampouco, nem amarras para esse processo avançar. Então, parabéns a V. Exª, sempre aqui em apoio ao que V. Exª tem apontado, porque o faz não só com qualidade, com conhecimento, mas, principalmente, com o coração. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Obrigado, Senador Walter Pinheiro. Eu agradeço as palavras de V. Exª, que conhece muito bem essa questão do Nordeste, sobretudo da Bahia. O problema do Rio São Francisco tem sido tema aqui da Comissão de Meio Ambiente. Nós fizemos agora três visitas - Juazeiro, Guanambi e Bom Jesus da Lapa -, e a constatação é a pior possível em termos de erosão, assoreamento e desmatamento. Eu corri agora o trecho de Lapa até perto da foz do Rio Corrente e não há chance nenhuma para o rio daqui a dez anos, se não... O SR. WALTER PINHEIRO (Bloco Apoio Governo/PT - BA. Fora do microfone.) - Já deve ter chegado na foz. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Não chega na foz, não. Estive próximo. Mas não há a menor chance para o Governo. Se ele não tomar a providência de investir em torno de 600 milhões por ano, durante dez anos, o rio realmente vai terminar sendo apenas uma lembrança e vai interromper, como quase interrompe agora. Quando estive em Juazeiro agora, na semana passada, na sexta-feira, Sobradinho estava com 1% do volume útil - estava chegando um pouco de água -, com afluência de 783m³/se e com defluência de 938m³ para poder manter Itaparica, enfim, os perímetros irrigados. |
| R | Agora começou a chover na região oeste. Pode ser que melhore alguma coisa, mas não para ter solução, porque nós já estamos em dezembro, houve uma diminuição muito grande das chuvas em outubro e novembro, dezembro tem poucas chuvas também nas cabeceiras dos afluentes principais. Então a situação... Vou passar a palavra a Dr. Vicente, para que ele tenha condições de fazer a sua explanação. O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - Senhoras e senhores, bom dia. Um agradecimento especial à Comissão de Meio Ambiente, Fiscalização e Controle e à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania pela oportunidade de apresentarmos um balanço sobre os 15 anos da Agência Nacional de Águas, em particular sobre este ano de 2015, uma prestação de contas, uma exigência do Senado com relação às agências brasileiras. Quero dizer que é uma grande satisfação fazer isso não só nas Comissões do Senado, mas diante do Sr. Presidente Otto Alencar, com quem temos aprendido muito a partir do seu libelo em defesa do São Francisco. Destaco, Senador, que o senhor tem sempre feito a abordagem de que a revitalização do São Francisco passa necessariamente pelo plantio de árvores e a recuperação das suas margens, como o senhor mencionou aqui, evitando o assoreamento desse rio já tão machucado pelas diversas intervenções feitas. Esse é um tema de muita relevância junto aos recursos hídricos, sobre o papel das áreas de preservação permanente e do próprio órgão gestor de recursos hídricos - ANA e órgãos estaduais - tratem adequadamente dessa faceta ambiental dos recursos hídricos, incorporando-a como uma das suas atribuições fundamentais. Então, nossa profunda admiração por elencar o tema do São Francisco e a sua revitalização, em particular por enfatizar que a sua revitalização passa necessariamente pela recuperação das suas áreas de preservação permanente, das suas APPs. Também lembro que o senhor foi o Relator da indicação do Dr. Ney Maranhão à Diretoria da Agência Nacional de Águas, que se encontra, desde o início deste ano, com o seu quadro de diretores completo, cinco diretores, o que, sem dúvida nenhuma, fortalece muito o nosso funcionamento. Cumprimento também o Senador Walter Pinheiro. Além das palavras que ele mencionou, eu me recordava, na década de 1990, lá na Bahia, numa época de discussão sobre o movimento sindical e a nossa participação na temática de energia e água, uma reunião que nós fazíamos com a presença de vários companheiros do Estado da Bahia. Portanto já é um tema de que o Senador vem tratando cotidianamente. E também um agradecimento especial ao Senador Blairo Maggi, não só por ser o Relator da indicação da Drª Gisela Forattini para a Agência Nacional de Águas, como primeira servidora de carreira da Agência Nacional de Águas que compõe a sua diretoria de cinco pessoas, mas também pelo aprendizado e o apoio que o senhor sempre tem manifestado à Agência, em particular na temática da irrigação, da agricultura e na navegação, como o senhor mencionou há pouco. Agradeço a esta Casa o apoio que reiteradamente tem prestado a nossa Agência. Neste momento, Senadores, pensamos sobre a oportunidade de fazer uma leitura de prestação de contas, mas pensei numa abordagem mais política, por ser esta uma Casa política, para ser mais rápido também nessa abordagem, trazendo à luz alguns temas importantes, mas também para abrir espaço para uma interação maior dos Senadores, inclusive motivado pela sua indagação, Senador Blairo Maggi, a respeito do conhecimento e de um maior aprofundamento científico a respeito das questões climáticas, em particular do ciclo hidrológico dentro dessas profundas transformações. |
| R | Então, peço licença a meus colegas, Dr. Paulo Varella e Dr. João Gilberto Lotufo, para fazer uma abordagem mais direta. Depois, se vocês desejarem, muito embora tenhamos pensado de início numa fala exclusivamente minha, que possam complementá-la com o conhecimento que vocês têm. Eu procurei, a partir de sua fala, Senador Blairo, fazer uma abordagem a respeito de algumas atribuições relevantes nesses últimos 15 anos. Quero, a propósito, fazer um agradecimento a todos os dirigentes da ANA, ao excelente corpo técnico que a Agência possui, e fazer um agradecimento especial à Drª Mayui, que é nossa Secretária-Geral. Na nossa Agência - não sei se é a primeira ou não - a partir de janeiro deste ano, a duras penas, a Drª Mayui convenceu todos da importância de implantar o projeto Papel Zero. A Agência, em nenhum dos seus procedimentos, utiliza papel, são todos feitos através de meio eletrônico, também um avanço bastante importante. Cumprimento todos por isso. Vou fazer uma abordagem muito rápida sobre contribuições que a Agência Nacional de Águas tem dado do ponto de vista da produção do conhecimento a respeito dessa temática. Abordarei um segundo aspecto, falarei do fortalecimento da relação institucional da Agência Nacional de Águas com os Estados e com os comitês. Depois vou entrar nas crises que nós estamos enfrentando do ponto de vista hídrico e qual o aprendizado trazido por essas crises, numa sinalização de que a legislação de 1997, que criou a Lei das Águas, e a de 2000, que criou a Agência Nacional de Águas, acertou e se mantém absolutamente atualizada, mas há algumas questões sobre as quais gostaria de propor uma rápida reflexão e, eventualmente, a necessidade de melhorias. Acredito que, passados esses 15 anos e a partir dos sucessivos eventos, inclusive os que o Brasil tem enfrentado mais recentemente, algumas lições e alguns aprendizados são fundamentais. Nesse sentido, é muito importante a colaboração desta Casa no sentido do aperfeiçoamento dessa legislação - nosso ponto de vista ela é insubstituível. Com relação às questões de produção de conhecimento, e aqui trazendo também à luz uma fala do Senador Walter Pinheiro, o próprio processo de construção das agências é um processo ainda em andamento e cada uma das agências guardam características muito próprias. No caso da Agência Nacional de Águas, mais ainda, porque diferentemente de outras agências, que regulam mercado, que regulam competição, têm regulação econômica, a Agência Nacional de Águas foi inicialmente concebida como uma agência que regula o acesso a um bem público, e esse bem público é a água, tendo sido atribuída a ela também a responsabilidade de coordenar o sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos. E nesse processo de coordenação, há a interação com diversos atores que atuam nessa questão da temática da água, mas principalmente na produção de conhecimento, de estudos e de parcerias que são altamente relevantes - gostaria aqui de passar por esses aspectos muito brevemente. Do ponto de vista histórico, queria destacar dois estudos que a Agência Nacional de Águas apresentou, em 2010 e em 2013. Um é o Atlas Brasil de Abastecimento Urbano, que é um atlas que detalhou 5.565 Municípios, à época definindo todas as condições dos sistemas de tratamento de água, mas principalmente dos seus mananciais, subterrâneos ou superficiais. Esse atlas, inclusive, hoje é mais valorizado do que naquele momento em que foi constituído, em função até das severas crises pelas quais temos passado. Assim, esse atlas passa a ser uma referência que tem sido muito utilizada na construção de alternativas que possam garantir o suprimento da água nas regiões que foram impactadas pela seca, principalmente a Região Nordeste e a Região Sudeste do Brasil. |
| R | Um segundo estudo também muito importante foi o Atlas de Vulnerabilidade. Esse atlas foi desenvolvido em parceria com todos os Estados e identifica não as bacias na sua integridade, apenas, mas identifica quais são os trechos críticos de cada uma dessas bacias suscetíveis à inundação. E tanto o Atlas de Abastecimento como o Atlas de Vulnerabilidade são instrumentos fundamentais para a formulação de políticas públicas, quer sejam de prevenir inundação, quer sejam de prevenir secas, instrumentos absolutamente atualizados e que têm, inclusive, reconhecimento nacional e internacional. Também agora estamos construindo um trabalho, liderado pela Drª Gisela, juntamente com o Dr. Sérgio, que vi acabando de chegar aqui, da Agência Nacional de Águas, nosso Superintendente, que é o Atlas de Despoluição de Bacias Hidrográficas. Então, em complementação à questão do abastecimento de água, nós estamos produzindo um atlas que visa identificar quais são as necessidades e as melhores alternativas para a construção das estações de tratamento de esgoto, com a finalidade de buscar despoluir as bacias hidrográficas brasileiras. E todos nós sabemos que o grande problema, do ponto de vista urbano, dos recursos hídricos brasileiros, ainda é a poluição dos seus rios. Basta olhar para as grandes cidades brasileiras, como São Paulo, por exemplo, e imaginar que São Paulo atravessa, atravessou e ainda atravessa, uma crise hídrica quando dispõe, dentro da cidade de São Paulo, de mananciais como a Billings, não totalmente aproveitada por conta da poluição, ou dos seus rios, o Pinheiros e o Tietê, que não podem ser utilizados em função da qualidade de água. Nem falo aqui no Tamanduateí. Eu sou natural de São Paulo, e o Tamanduateí acabou de ser canalizado, as pessoas já nem mais o reconhecem na hidrografia da cidade de São Paulo. Então, esse Atlas de Despoluição tem a finalidade de, inclusive, sugerir quais são os empreendimentos prioritários a serem desenvolvidos pelo Poder Público - municipal, estadual e federal. Porque há, de uma maneira geral, recursos para a construção de estações de tratamento de esgoto, mas, muitas vezes, a sinergia entre essas estações de tratamento acabam não produzindo o benefício que é desejado por todos. Então, esse Atlas de Despoluição de Bacias Hidrográficas deverá ser concluído também no ano de 2016 e é uma contribuição fundamental para o planejamento e produção de conhecimento no nosso País. Outro estudo, também coordenado pela Drª Gisela, Diretora de Planejamento, e aí feito em parceria com o Ministério da Integração, é o Plano Nacional de Segurança Hídrica, que já tem alguns produtos regionais. Começamos pelo Nordeste, inclusive por conta da situação da crise atual, mas nós pretendemos oferecer, juntamente com o Ministério da Integração, um plano que estabeleça parâmetros para uma maior segurança hídrica. Eu vou falar um pouco sobre o aprendizado que essas crises têm propiciado. Nós convivíamos com uma ideia de que, pela disponibilidade de água no Brasil - 12% ou 18% da água superficial do mundo -, nós estaríamos com uma segurança garantida para nossa população e para seu uso econômico, mas, sem dúvida nenhuma, hoje nós identificamos que são necessárias ainda grandes obras de infraestrutura hídrica que possam propiciar segurança à população brasileira, em particular, a construção de novos reservatórios, adutoras, grandes adutoras, e reservatórios novos e grandes reservatórios voltados para água para uso múltiplo. Eu já tive oportunidade de dizer aqui a partir de um estudo do Dr. Francisco Gomide, ex-Ministro de Minas e Energia e Presidente da Eletrobras: o Brasil tem, quando computada a água reservada nos reservatórios destinados à geração de energia elétrica, padrões dos Estados Unidos, pela grande quantidade de água sobre o seu território. Mas a grande maioria desses reservatórios não tem, associado a eles, abastecimento urbano significativo, eles se encontram ainda distantes das grandes cidades. Se nós retirarmos, no cômputo da água, a água destinada, reservada para geração de energia elétrica, os parâmetros brasileiros são parâmetros quase de países africanos. |
| R | Nós deixamos de ter água suficiente no território para dois anos consecutivos de seca para termos água no nosso território, que não chegam a 50 dias de segurança hídrica. Ou seja, é absolutamente necessário retomar a construção de reservatórios para usos múltiplos no nosso País. O SR. BLAIRO MAGGI (Bloco União e Força/PR - MT) - V. Exª me permite? Enquanto o senhor respira um pouco! Esse assunto da reservação de água é muito importante, que V. Sª está colocando. Nós fizemos uma discussão no Código Florestal naquele momento, e praticamente ficou de fora, ficou alijada essa questão da reservação de água. Eu nunca me conformei muito com isso, porque você tem uma chuva de 40mm, 50mm, 100mm, como é normal acontecer no Centro-Oeste, e aquilo, em poucas horas, em poucos minutos, foi embora. Não existe mais. É só a capacidade que o solo tem de reter a água, e, uma vez que ele está encharcado, acabou. Tudo o que chover naquele momento, toda a água que vier vai embora para os rios. A nossa legislação hoje complica um pouco isso. Talvez fosse um assunto que a ANA, junto com o Ministério do Meio Ambiente, pudesse tratar; flexibilizar a possibilidade de o produtor rural ou, enfim, quem maneja a terra ter a possibilidade de fazer essa reservação de água sem grandes problemas, como temos hoje. Hoje, se um produtor rural quiser fazer alguma reservação de água na fazenda dele, há n licenças a fazer, e, com certeza, ele sofrerá multas, embargos, discussões judiciais, porque a legislação não é clara, não permite isso. Penso que nós temos que fazer a reservação de água. Uma vez que você tem esses reservatórios, quer sejam eles nos pequenos rios, quer sejam fora dos rios, com o passar dos dias, dos meses, essa água vai para o lençol freático, ou vai haver evapotranspiração. Ela não vai sumir; ela vai para um ciclo natural e normal: ou vai para a atmosfera, ou vai para o solo. Eu gostaria deixar esta sugestão à ANA: que se debruçasse sobre esse assunto, ver o que está a legislação ambiental está impedindo e até onde podemos flexibilizar e facilitar a vida daqueles que podem fazer esse tipo de reservação de água nas propriedades. Obrigado. O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - Agradeço a contribuição. Apenas uma lembrança: a Agência foi convocada a participar da discussão do Código Florestal, e nós discutimos a defesa das Áreas de Preservação Permanente. Naquele momento, a proposta apareceu da construção da reservação nas Áreas de Preservação Permanente. E, do nosso ponto de vista, isso acabou contaminando, por conta da polarização em torno do tema, uma solução, que precisa ser revista, como o senhor mencionou, seja no âmbito da propriedade, seja no âmbito mais amplo do território, de que o Brasil precisa, para segurança hídrica, voltar a construir reservatórios. É evidente que esses reservatórios podem ter impacto ambiental; com certeza tem impacto social, quando falarmos de grandes reservatórios, e são os melhores, inclusive, por conta de que eles são os mais adequados a enfrentar processos longos de estiagem, mas nós precisamos começar a colocar na contabilidade o lado positivo da reservação. (Intervenção fora do microfone.) O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - Mas não só colocar na contabilidade o lado negativo, que são esses reconhecidos dos impactos que esses reservatórios trazem. Mas muito oportuno. Nós, inclusive, estamos nos empenhando. Levamos esse tema para fóruns internacionais. Temos levantado, em todos os aspectos, em todos os fóruns em que temos discutido, a necessidade de o Brasil trazer esse tema, à luz de construir novos reservatórios no nosso País. Agradeço até a sugestão da liderança da Agência Nacional de Águas. Hoje, ela acaba entrando no cômputo da infraestrutura hídrica, e um dos aspectos também do nosso diagnóstico é como fazer com que os diversos planejamentos setoriais sejam integrados sob a ótica de água. Muitas vezes isso acaba não acontecendo. Essa é uma responsabilidade que posso assegurar aos senhores que será muito bem-vinda e que encontra, inclusive, ressonância na nossa capacidade técnica. Outro aspecto fundamental, também passando bastante rapidamente sobre essa parte de produção de conhecimento, nós temos fortalecido parcerias importantes... (Falha na gravação.) ... no âmbito nacional, mas aqui eu queria destacar... (Falha na gravação.) ... uma produção de conhecimento e de informações em eventos críticos, como foi agora o desastre de Mariana, junto com o Corpo de Bombeiros de Mariana, com o serviço geológico dos Estados Unidos, o que tem propiciado uma grande capacitação dos nossos servidores, com a OCDE, também para um diagnóstico profundo sobre os avanços da nossa legislação, e produzir um relatório acerca de 60 dias, 90 dias no máximo, que ouviu praticamente todos os atores relevantes dentro do sistema de recursos hídricos, produzindo um diagnóstico absolutamente atual e bastante sugestivo de mecanismos que podem ser aprofundados. |
| R | E também no âmbito das Nações Unidas, com a produção e o trabalho de indicadores importantes no consumo de água nos diversos processos produtivos. Nós temos também uma agência de cooperação internacional bastante intensa. Ontem mesmo, no Ministério das Relações Exteriores, junto com o TCA, entregamos prêmios para 18 estudantes de várias regiões do Brasil por trabalhos sobre a temática da Amazônia. Contamos também com organismos como a Codia (Conferência de Diretores-Gerais Ibero-Americanos da Água) e com parcerias internacionais que estamos estabelecendo com os países vizinhos. Temos também uma preocupação muito grande com a temática das mudanças climáticas. Temos uma contribuição, seja no Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima ou criando, dentro da Agência Nacional, uma área específica para trabalhar sobre o tema relacionado à água, para que não tenhamos que conviver, como o senhor também mencionou, com alguns estudos que acabam ganhando notoriedade, mas que depois não são consistentes do ponto de vista de seus prognósticos, apontando para desastres de 30%, 40% de impacto nessas regiões. Juntamente com a Funceme, no Ceará, e com a UnB, aqui em Brasília, devemos fazer um trabalho de adaptação desses modelos à realidade brasileira, às bacias brasileiras, a fim de oferecer, sem dúvida nenhuma, segurança para as pessoas, e não ficarmos trabalhando com esse nível total de indefinição ou com parâmetros absolutamente irrealistas, do nosso ponto de vista. Rapidamente, nesse primeiro elenco, quero tratar de uma questão fundamental e que nem é atribuição, como eu mencionei no início, das demais agências, mas particularmente da Agência Nacional de Águas, por conta de suas características, que é ser também um elemento importante na área de produção de conhecimento. Por último, nessa área, quero destacar não apenas os programas de capacitação de nossos servidores, mas programas de capacitação que temos realizado com diversos Estados, com diversas instituições. Vou destacar apenas três, que realizamos na última semana: um com a Capes, de mestrado profissional, de R$5 milhões, com nove universidades em rede, preparando profissionais de diversas áreas para o mestrado profissional na temática da água; o convênio realizado com a Prefeitura Municipal de São Paulo - 3 mil escolas, 85 mil professores e 1 milhão de estudantes -, em que, na grade curricular de educação básica, nós também vamos oferecer subsídio para os professores para capacitação na temática da água, o que é fundamental, no nosso ponto de vista; e outro, de mestrado profissional, cujo edital se encontra em aberto, para a capacitação de professores da rede fundamental e, portanto, de seus alunos. Então, a questão da produção do conhecimento é uma questão crítica e importante e na qual a Agência tem apostado muito de seus esforços e de seus recursos humanos e financeiros. Um segundo aspecto, vou também passar por ele rapidamente, é o do fortalecimento da nossa relação com os Estados. O Brasil, a partir da Constituição de 1988, definiu que o domínio da água superficial é compartilhado entre os Estados e a União e o das águas subterrâneas, que obviamente integram todo o ciclo hidrológico, dos Estados. No nosso ponto de vista, em um país de 8,5 milhões de quilômetros quadrados, não haverá gestão de recursos hídricos forte se os Estados não estiverem fortalecidos para a gestão de recursos hídricos. |
| R | Eu já citei aqui também o exemplo de que em alguns Estados, e Estados com grande dimensão territorial, não havia mais do que dois servidores tratando da gestão de recursos hídricos, e, em outros Estados, Senadores, não havia sido oferecida nenhuma outorga, ou seja, não havia registro nem cadastro dos usos relevantes no âmbito daqueles Estados. Então, criamos um programa nessa perspectiva - é também um dos pilares da atuação da diretoria o fortalecimento dos Estados -, que é o Pacto Nacional Pela Gestão de Recursos Hídricos. Dentro dele, há uma ferramenta chamada Progestão. Alocamos, nos últimos cinco anos, de 2013 a 2018, R$100 milhões voltados exclusivamente para a gestão de recursos hídricos. Os Estados se classificam e dizem, a partir de sua realidade - não há uma regra ou uma régua que pretende colocar todos os Estados com o mesmo padrão, porque os Estados têm características, naturezas e demandas totalmente diferentes -, quais são as demandas que pretendem. E, cumpridas as metas que eles próprios definem no âmbito de política de resultados, esses Estados recebem uma contribuição anual de R$750 mil, o que é muito significativo para a gestão de recursos hídricos. Esse recurso é voltado exclusivamente para a gestão de recursos hídricos. Isso tem ajudado a criar, no âmbito dos Estados, uma regularidade na gestão de recursos hídricos, e não uma estabilidade, que, infelizmente, tem caracterizado a gestão na grande maioria dos Estados brasileiros. Esse projeto, do nosso ponto de vista, é muito relevante e, acreditem, ganhou um destaque na análise da OCDE muito maior do que o obtido dentro do espaço territorial brasileiro. A OCDE, na sua análise, reconheceu como exemplo a ser levado para outras regiões, inclusive para a própria Europa, os critérios e os mecanismos de participação voluntária e de incentivo que foram introduzidos e que têm dado excelente resultado. Todos os 27 Estados aderiram voluntariamente a esse processo do Progestão. Para a adesão, inclusive, é necessário um decreto do Governador afirmando qual é a entidade que vai receber esses recursos e qual é a finalidade desses recursos para a gestão de recursos hídricos, e todos os 27 Governadores do País firmaram esse compromisso. Temos trabalhado também no sentido do fortalecimento dos Estados na sua capacitação para a solução de eventos de crise. Então, todas as ações - depois, vou tentar falar delas rapidamente - sobre a gestão das crises que estamos administrando têm sido feitas em parceria com os Estados, com a tomada de decisão conjunta, o que tem propiciado, mesmo no enfrentamento de crises tão severas, um grande apoio político, muitas vezes até mesmo do Ministério Público, para que possamos buscar soluções adequadas. Menciono como exemplo último uma resolução que será assinada pelos Estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro em relação à crise do Paraíba do Sul. Ela deverá ser assinada agora no dia 10. Como todos se recordam, isso é produto do início de uma crise federativa potencial entre São Paulo e Rio de Janeiro em relação à utilização das águas do Paraíba do Sul. Através de um processo de cooperação, nós estamos construindo uma nova resolução que é histórica, porque, numa bacia importante para a geração hidrelétrica, que é a bacia do Paraíba do Sul, nossa resolução define claramente, inclusive com o apoio do setor elétrico, que a bacia será gerenciada para os usos múltiplos da água, em particular para o abastecimento. Acreditamos que uma resolução com esse espírito poderá ser adotada em outras bacias. Fizemos a sugestão, Senador, de que um grupo com essa mesma finalidade seja constituído no âmbito dos Estados que compõem a bacia do Rio São Francisco e do Comitê de Bacia. Amanhã, vou estar numa reunião do Comitê de Bacia na Bahia, onde pretendemos também criar mecanismos que coloquem a operação do sistema hidrelétrico brasileiro e dos grandes reservatórios garantindo a segurança energética, que é absolutamente necessária, mas produzindo, a partir da operação desses reservatórios, o melhor benefício para a nossa sociedade, seja para o abastecimento, seja para a agricultura, seja para a navegação, rompendo com conflitos que, infelizmente, têm sido a tônica, como, por exemplo - cito um deles -, o conflito entre a geração de energia elétrica e a navegação na bacia do Paraná. |
| R | Então, nós pretendemos, a partir de resoluções como essas, inspiradas no Paraíba do Sul e num processo harmonioso - não há conflito ou preponderância de interesses -, criar um novo paradigma para a utilização dos recursos hídricos no Brasil com vista aos usos múltiplos, considerando, volto a dizer, usos que tradicionalmente não têm o peso político e econômico que tem a geração de hidroeletricidade, em particular a navegação e a própria irrigação. Temos atrelado também o fortalecimento dos comitês de bacia hidrográfica. A experiência brasileira mostra que a descentralização é uma proposta absolutamente correta e a gestão participativa dos recursos hídricos, principalmente através dos comitês de bacia hidrográfica também tem se mostrado um acerto. É evidente que os mais de 200 comitês de bacia hidrográfica do Brasil também precisam fazer uma atualização da sua natureza. Muitos dos comitês - e nós temos apresentado esta crítica nos fóruns apropriados dos comitês de bacia hidrográfica - às vezes acabam se constituindo uma reserva de domínio para alguns poucos usuários na constituição desses comitês ou às vezes os comitês têm uma visão de atuação exclusivamente como se fossem ONGs. Nós acreditamos que os comitês de bacia, pelo seu caráter paraestatal, porque eles são constituídos por decreto, seja do Executivo Federal, seja do Executivo Estadual, precisam dar uma contribuição mais efetiva no sentido de organizar e propor soluções na bacia hidrográfica, inclusive nos períodos de crise como este que nós estamos atravessando. Os comitês, infelizmente, pela sua natureza, pelo seu desenvolvimento, não puderam alcançar, na nossa avaliação, o potencial que tem a gestão participativa e descentralizada no caso brasileiro, com o fortalecimento dos comitês. Estamos destinando recursos aos comitês que já têm agências de bacias. E isso tem sido praticado ao longo dos anos, inclusive para que esses comitês fortaleçam as suas agências delegadas. E estamos também criando o Pró-Comitê, um programa destinado a apoio financeiro aos comitês, para que eles garantam as condições mínimas para realizar as suas reuniões. Nós precisamos do apoio desta Casa e da Câmara também, para que os recursos necessários para a manutenção dessas atividades sejam garantidos na votação do nosso Orçamento para o ano de 2016, que a Comissão Mista de Orçamento propiciou, em contraposição à proposta do Executivo, que, no nosso ponto de vista, infelizmente estava equivocado, a recuperação dessa condição. Esperamos que a votação no Plenário garanta a manutenção desses exercícios. Rapidamente, falamos um pouco sobre a produção do conhecimento e o fortalecimento da gestão dos recursos hídricos através dos Estados do Comitê. Depois nós temos as crises. E cada uma das diversas crises que nós temos enfrentado tem propiciado um aprendizado e um fortalecimento nessa direção, seja no Semiárido, onde estamos, como já foi muito bem dito aqui pelo Senador Otto Alencar, enfrentando o quinto ano de uma seca muito forte... E o fenômeno do El Niño tende a manter essa seca ainda durante uma parte do ano de 2016, o que fará com que todas as nossas medidas nessa região sejam... O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA. Fora do microfone.) - Deve ir até quando? O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - Há vários estudos. No Cemaden, que organiza os institutos nacionais, a previsão é por trimestre. E eles têm apontado a manutenção do El Niño ainda para o trimestre de dezembro, janeiro e fevereiro. Algumas matérias da imprensa internacional apontam que não só se trata de um El Niño muito forte, entre os quatro maiores, senão o maior El Niño em termos de elevação de temperatura registrada, com a perspectiva de que ele se prolongue até o mês de setembro de 2016, o que significa que nós precisaremos atuar numa perspectiva de, praticamente como é no Semiárido, zero de vazão/afluência e que a água contida nos principais reservatórios seja suficiente para que possamos chegar, no mínimo, até o próximo período chuvoso naquela região, que se inicia no mês de fevereiro e vai até abril. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Acha que esse período... Sempre acontece chuva nesse período. Sempre acontecem chuvas de fevereiro para março. Até abril não vai existir chuva então? |
| R | O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - A perspectiva é de que não aconteçam chuvas significativas, essa é a perspectiva. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - De fevereiro até abril? O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - Essa é a perspectiva em função do... O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - O El Niño vai se prolongar até setembro? O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - E com a perspectiva de manutenção de chuvas intensas na Região Sul, que são sinais característicos do El Niño, inclusive com o potencial agravamento da seca também na Região Amazônica brasileira. Esses são os diagnósticos que nós temos... O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Na Região Amazônica também? O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - Também, e uma parte dela com uma seca bastante severa. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Agora a gente houve um período de estiagem lá, não é? O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - E a tendência, pela manutenção... O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Com redução, inclusive, da vazão do Rio Negro... O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - Todas elas, e é uma manutenção. Uma parte dessa região com chuvas, mais voltadas para o Acre. No diagnóstico que nós recebemos, do Acre e Rondônia, mas com uma perspectiva de que na Região Norte... O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - No Nordeste também continua a mesma... O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - No Nordeste, seca. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Com diminuição da precipitação pluviométrica, com chuvas abaixo da média? O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - Com chuvas abaixo da média. Infelizmente, são essas as notícias que temos. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - É, são notícias muito ruins para toda a Bacia do Rio São Francisco. O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - O São Francisco, como é uma bacia que tem - o senhor sempre menciona isso - 70% ou mais dos seus efluentes conformados nas suas nascentes na Região Sudeste, em Minas Gerais, há uma indefinição sobre... O senhor tem acompanhado diariamente, e eu percebi também esta flutuação: nós tivemos momentos nos quais essas vazões subiram significativamente a montante de Três Marias e, agora, com um índice elevado até para esses padrões no Rio São Francisco - nós chegamos a cerca de mil metros cúbicos por segundo de vazão efluente. Porém, a vazão em Três Marias, que chegou a quase 600m³/s, já retornou para padrões de 200m³/s de vazão efluente em Três Marias. Então, a Bacia do São Francisco, na verdade, é uma bacia que tem um duplo impacto. Ela pode ter chuvas intensas na região de suas nascentes, de suas cabeceiras, mas para os dois terços restantes da Bacia do São Francisco a previsão é de seca bastante intensa. Então, como eu mencionava, nessa perspectiva de aprendizado na atuação, seja na seca do Semiárido, seja na Região Sudeste do Brasil, no Paraíba do Sul, em São Paulo em particular, e também agora, em relação ao desastre de Mariana, que acabou contaminando o rio desde a sua nascente, a foz do Rio Doce, e com todas as dimensões que já foram divulgadas - o maior impacto ambiental que o Brasil já registrou e com muita incerteza quanto à duração desse evento - eu gostaria de apresentar rapidamente, se os Senadores me permitirem - em vez de descrever, porque aí, eventualmente, podemos tratar de cada uma dessas secas com maior profundidade, os diretores aqui têm dividido essas tarefas - alguns aprendizados desse processo. O primeiro deles é um aprendizado relativamente óbvio, mas que é fundamental registrar, que é a mudança dos padrões de consumo de água no Brasil. Isso aconteceu na agricultura, através de mecanismos mais eficientes de utilização da água, na indústria, mas fundamentalmente nas cidades brasileiras. (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Dr. Vicente, uma indagação a respeito desse desastre lá de Mariana: essas empresas de mineração não teriam, pela legislação, a obrigação de dar um tratamento aos efluentes da mineração para impedir que os metais pesados chegassem à barragem de contenção? Faço essa indagação porque observei que os rejeitos são jogados na barragem de contenção sem nenhum tratamento, e eu não creio que custe tanto a uma empresa que fatura bilhões de reais estabelecer tratamento dos efluentes. Não existe uma regra que os obrigue a isso? O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - Eu posso responder essa questão, mas vou pedir a contribuição do Dr. Ney Maranhão, que é o diretor que está trabalhando diretamente com essa questão, em particular com a questão de qualidade de água, para que nos ajude nessa resposta. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - No nosso Estado da Bahia, lá no Polo Industrial de Camaçari, nós temos a Cetrel, a Central de Tratamento de Efluentes Líquidos e sólidos, que é uma empresa de alto nível. Inclusive, eu fui Presidente do seu conselho um tempo. Os cuidados para tratamento desses efluentes lá, no nosso polo industrial, são muito grandes. (Falha na gravação.) ... preservação, inclusive de todos os mananciais. Qualquer um daqueles rios próximos de Camaçari ali, Rio Jacuípe, Rio Ipojuca, o próprio Rio Camaçari, não tem nenhum tipo de contaminação pelos cuidados com tratamento dos efluentes líquidos e sólidos. O que me chamou a atenção é uma empresa dessa, que fatura bilhões e bilhões de reais, como a Vale, a Samarco, não ter o cuidado de ter uma estação de tratamento de efluentes. Eu acredito que deveria existir uma legislação para obrigar essas empresas a terem essas estações de tratamento de efluentes, para que, da água que fosse para as barragens de contenção, pudessem se excluir os metais pesados, para não causar um desastre ambiental como o que foi causado no Rio Doce. Isso que eu queria ver, se há alguma legislação nesse sentido. O SR. NEY MARANHÃO - Nós temos, hoje, a legislação de resíduos sólidos, que prevê, inclusive o reaproveitamento dos materiais de rejeito, principalmente de mineração, assim como rejeitos de construção civil. Os resíduos da construção civil são hoje reaproveitados, como madeira, o próprio emboço e o reboco, que são reciclados para poderem ser usados como areia. Também o material que é rejeitado pelo tratamento dos minérios na mineração agora passa por perspectivas de ser reaproveitado como outros produtos menos nobres que o metal, mas ainda reaproveitado, porque a ideia, hoje, é não ter mais essas barragens de rejeito em longo prazo. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Mas por que não as estações de tratamento de... O SR. NEY MARANHÃO - Também fazem parte, porque elas vão... O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - E por que nem a Samarco nem a Vale tinham essas estações de tratamento? A legislação não obriga a ter? O SR. NEY MARANHÃO - A legislação os obriga a ter um tratamento de rejeito, a não despejarem metal pesado nos rios. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Então eles estavam fora da... O SR. NEY MARANHÃO - Não, eles depositavam numa barragem de rejeitos que, supostamente, estaria ali... O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Eles estavam completamente fora da legislação. O SR. NEY MARANHÃO - É, existe um risco dessas barragens, elas têm um risco envolvido. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Então, deveria ter a estação. O SR. NEY MARANHÃO - Ã-hã. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - E não tinham. Na verdade, eles falharam nesse aspecto. O SR. NEY MARANHÃO - Eles estavam licenciados pelo órgão ambiental, estavam cumprindo a legislação do órgão ambiental. O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - Deixe-me tentar ajudar. Na deposição desses rejeitos nas suas barragens, de uma maneira geral, isso é feito com segurança. O que o evento de Mariana demonstrou foi que... O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Mas o que eu estou falando é que deveriam ter uma estação de tratamento para excluir os metais pesados. Se não houvesse os metais pesados na barragem de contenção, você não teria o desastre ambiental que houve, com a mortalidade dos peixes e tal. Enfim... O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - Aqui não se trata de nenhum juízo de valor, apenas de uma constatação: o laudo com relação aos rejeitos da mineração de Mariana não apresenta metais pesados. Alguns desses metais são até característicos do próprio Rio Doce, que é um rio que é suscetível a diversos tipos de mineração, inclusive ao garimpo. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA. Fora do microfone.) - E a morte dos peixes foi em função de quê? O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - A morte dos peixes foi identificada por asfixia pela quantidade de lama, e não pela... O metal pesado não levaria a esse falecimento tão rápido. Então, foi asfixia, seja pela quantidade lama, seja pela ausência de oxigênio, que levou ao falecimento dos peixes. E, no caso de Mariana, a última barragem, aquela que foi galgada, era uma barragem exclusivamente de água, para contenção da água do processo de mineração e para utilização na reciclagem. O problema fundamental é que o plano de emergência, obviamente, apresentou falhas e jamais com a perspectiva do impacto que aquele rompimento... O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA. Fora do microfone.) - A fiscalização por parte dos órgãos... O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - Quanto às fiscalizações de barragem, aproveitando a oportunidade, Senador, a Agência Nacional de Águas recebeu do Congresso a incumbência de coordenar a lei de segurança de barragens no Brasil, que significa, basicamente, receber, dos órgãos fiscalizadores, os seus relatórios específicos. Quem são os órgãos fiscalizadores? É a própria Agência Nacional de Águas quando se trata de barragens de água; é o Ibama quando se trata de rejeitos de natureza industrial. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Então, o Ibama teria que fiscalizar essa barragem. O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - Industrial, ali é mineração. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Mineração é DNPM. O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - Então a ANA, água; a ANEEL, com relação às barragens de hidroeletricidade; o Ibama, rejeitos industriais; e DNPM, mineração. Então, o órgão fiscalizador é o Departamento Nacional de Produção Mineral. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Que não deve ter estrutura para fiscalizar isso com acuidade, não é? O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - O DNPM tem sido exigido, questionado, e tem se manifestado a respeito de suas características. Eu não gostaria aqui, se o Senador me permite, de fazer uma abordagem em relação a um outro órgão do Governo Federal. Então, como eu mencionava, os aprendizados dessa crise. Muito rapidamente, o primeiro: a mudança dos padrões do consumo de água no Brasil e, particularmente, nas cidades. Nós temos, durante a crise, padrões de consumo que superam 250 litros/habitante/dia em crise, quando os padrões recomendados, em situação normal, seriam da ordem de 150 litros/habitante/dia. Nós temos, em crise, várias cidades com índice superior a 250 litros. Isso reflete, em grande parte, a perda que o sistema de distribuição de água no Brasil tem, perdas muito elevadas. E esse é um primeiro sinal da mudança de padrões de consumo. Um segundo sinal é com relação à nossa fragilidade diante de eventos climáticos extremos. Então, mesmo com todo esse potencial de recursos hídricos de que o Brasil dispõe, apesar da sua desigualdade de distribuição no Território, nós verificamos que a ocorrência desses eventos - que tendem a ser cada vez mais recorrentes e mais atuando em seus extremos, isso tem sido comprovado nos últimos anos -, nós precisamos buscar uma maior resiliência nesse processo, seja pela adoção de mecanismos de recuperação da vegetação, fundamental para o ciclo hidrológico, seja por conta de obras de infraestrutura. Um segundo aprendizado, como eu mencionei aqui, é essa nossa fragilidade diante desse sistema. Um outro aprendizado, passando rapidamente, é sobre essa dupla dominialidade entre as águas superficiais dos Estados da União. Acho que a Constituição acertou, definiu o duplo domínio. O Brasil não pode ser gerenciado, do ponto de vista de água, de maneira centralizada, essa é a nossa convicção. Mas é preciso encontrar, dentro do sistema de recursos hídricos, um mecanismo que, em situação de conflito, possa tomar uma decisão. Quando a calha é exclusivamente federal - porque, vejam, fazemos o planejamento por bacia mas, depois, o domínio é por calha de rio. Quando a calha é federal, isso está muito claro, que compete à Agência Nacional de Águas resolver o problema da calha. Vou usar o exemplo do Paraíba do Sul. A calha do Paraíba do Sul é Federal. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA. Fora do microfone.) - São Francisco também. O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - Também, a calha. Porém, os seus afluentes, em grande maioria, são estaduais. E, muitas vezes, o que é feito no afluente estadual impacta diretamente a calha do rio federal, total. Como no caso do São Francisco ou no Paraíba do Sul, vou usar esse exemplo, onde o Governo do Estado de São Paulo pretende - e vai realizar, inclusive com o nosso apoio - uma transposição de 5m³/s de um afluente que é estadual para um outro rio, para uma outra bacia, que também é estadual. Porém impacta os interesses de todos os Municípios que estão a jusante, inclusive do Rio de Janeiro. Então, a legislação brasileira precisa encontrar um mecanismo para... O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Eu tenho um projeto tramitando no Senado, que proíbe transposição de bacias - de qualquer bacia - sem antes se fazer completa revitalização do rio doador das águas. Eu acho que esse seria o caminho, até porque não creio que há um rio, algum afluente lá do Paraíba do Sul, que não tenha comprometimento. Acho que todos eles devem ter comprometimento. Então, esse é que é o grande problema, de fazer transposição sem revitalização, o que aconteceu no Rio São Francisco. Fez-se a transposição com investimento de R$8,5 bilhões e, neste ano, não se plantou uma árvore, nem na nascente, nem no afluente. Então, a situação é totalmente inversa. |
| R | O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - E o senhor produz uma análise correta sobre transposições, que a maioria da população brasileira nem imagina que existe. Quando falamos em transposição, vem muito à mente a transposição do São Francisco. Mas basta lembrar que o abastecimento de São Paulo pelo Cantareira é feito através de uma transposição. O abastecimento do Rio de Janeiro pelo Guandu é feito através de uma transposição de mais de 100m³/s, em condições normais. Então, esta questão é ao mesmo tempo uma opção que precisa ser verificada - acho que não podemos ter, a princípio, uma posição contrária - mas, obviamente não pode ser uma opção que seja tomada sem nenhum resguardo. E o aí o senhor menciona bem que haja condições da bacia doadora de suportar essa doação, sem comprometer sua bacia. O projeto do senhor vem nesta direção que estamos mencionando de que a dupla dominialidade é um avanço da legislação brasileira, mas ela, em situação de conflito, precisa de um mecanismo de solução, quando envolver a bacia hidrográfica e não exclusivamente a calha. No nosso ponto de vista, a Justiça é um mecanismo para solução? Sem dúvida nenhuma, mas ele não pode ser o primeiro mecanismo. O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - No caso do Rio São Francisco, nem o Estado de Minas - o Estado de Minas é considerado a caixa d'água do Brasil - nem o Estado da Bahia, meu Estado, durante nenhum período, cuidou da revitalização de nenhum afluente, inclusive vários já estão completamente mortos. Não sei se o senhor ouviu, mas pela primeira vez na história da bacia do Rio São Francisco o rio Jequitaí interrompeu, é um rio caudaloso da margem direita. Pela primeira vez, esse rio interrompeu, ficou lá um baita de um caminho de areia. Então, acho que devíamos tentar estudar uma mudança na legislação para que, no caso destes rios que são estratégicos para abastecimento humano, industrial, geração de energia, produção de alimentos por irrigação, o Governo Federal tenha alguma ascendência, alguma responsabilidade num termo de cooperação com os Estados, para resolver o problema. Os Estados, na situação em que se encontram, não têm nenhuma condição de fazer investimento nesse sentido. O SR. VICENTE ANDREU GUILLO - Nesta direção de que consigamos produzir um arranjo em situação de conflito, que seja um arranjo pré-acordado entre todos os atores, onde a dominialidade eventualmente de um afluente, que causa impacto... Porque quando esse afluente causa impacto só no Estado, evidentemente que é uma questão estadual, mas quando ele afluente de uma calha federal, ele, sem dúvida nenhuma, vai acabar causando impacto nos seus vizinhos. Isso fica aqui, independentemente da proposta, vamos dizer assim, de avanço e solução, o senhor mencionou uma muito produtiva, mas a ideia aqui foi apenas a de ressaltar que essas crises têm mostrado que esta é uma limitação da legislação existente. E o último, muito rapidamente, depois vou facultar aos meus colegas para uma complementação, se desejarem, é com relação aos usos múltiplos da água. Também tenho reafirmado que a legislação diz corretamente que a gestão da água deve priorizar os usos múltiplos e, depois, disse também corretamente que, em situação de escassez, o consumo prioritário é o consumo humano e a dessedentação de animais. Porém, neste vazio entre numa situação normal tudo pode e numa situação de crise só pode isto, encontramos aí um vazio que precisa ser melhor aprofundado, seja pelos comitês de bacia hidrográfica, seja pela própria legislação. Não podemos, em situação de crise, como muitas vezes tem acontecido nas áreas urbanas, por conta desta visão de que numa situação de escassez há prioridade do consumo humano, e aí o consumo urbano, que não é exatamente o consumo humano, porque você continua tendo atividades, piscina e tudo mais, mas isto é uma discussão mais sofisticada, é de não ter que o consumo humano venha em contraposição a outros usos que são fundamentais e que precisam ser reconhecidos também no processo de crise. E aí eu gostaria de dizer, em particular, a agricultura. |
| R | Não podemos ter uma visão como já aconteceu nessas crises, em particular no Semiárido e também no Sudeste, ou seja, havendo uma crise na cidade basta cortar a irrigação que o problema está totalmente resolvido. Ou então, que basta cortar a indústria e o problema está resolvido. Isso, na nossa opinião, vai muito em direção daquela ideia de que 70% da água é consumo da agricultura. Então, se eu cortar a agricultura numa situação de crise, vou ter 70% de água a mais na cidade. E 12%, em média, é consumo industrial. Então, se eu cortar o consumo industrial, vou ter água nas cidades. Só que assim as pessoas não vão ter alimentos, não vão ter empregos, e tudo o mais. E esses usos não podem ser vilanizados, ou seja, não podem ser considerados vilões pelo uso da água. Esse é um aprendizado. Além disso, precisamos criar processos intermediários em que em um primeiro momento está tudo normal e no ponto seguinte se tem o estabelecimento da crise. Temos, sim, que criar mecanismos intermediários, acordados entre todos os usuários relevantes, que propiciem uma gestão dos recursos hídricos com uma visão de que todos têm direito ao uso sustentável da água na bacia hidrográfica. São aspectos importantes sobre os quais nós estamos debruçados, buscando também alternativas seja do ponto de vista de políticas públicas, seja do ponto de vista de mudança da legislação, adequação da legislação para responder melhor a situações de crise como a que estamos vivenciando, que, como eu falei, tendem a ser cada vez mais recorrentes, infelizmente. Então, era isso inicialmente. Agradeço muito ao Senado e à Comissão de Meio Ambiente e, em particular, ao Senador Otto Alencar, pelo apoio que tem sempre prestado à Agência Nacional de Águas. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - BA) - Eu agradeço e parabenizo o Dr. Vicente e toda equipe da Agência Nacional de Águas, pois têm dado uma contribuição muito grande. Quero dizer que a qualquer momento que a Agência queira provocar a nossa Comissão de Meio Ambiente, nós estaremos à disposição para debater temas importantes... (Falha na gravação.) ... em São Paulo, no Rio, em Minas, inclusive, onde nunca aconteceu e chamou a atenção do Brasil. Acho que a crise hídrica em São Paulo chamou a atenção do Brasil para essa situação que já vive o Nordeste há muito tempo. Às vezes as pessoas dizem que o Nordeste é a indústria da seca. Falavam isso no Sul. Não é a indústria da seca. Pode se ver agora que de tanto o pessoal do Sul falar terminou o carro-pipa tendo que abastecer São Paulo. Eles não conhecem a nossa realidade. Não há nada de indústria da seca. O senhor deve conhecer, mas o Estado da Paraíba tem a metade do potencial hídrico de que precisa o povo da Paraíba. O Estado não tem nenhum manancial, nem de superfície e nem subaquático que possa dar sustentação. Assim é o Semiárido do Nordeste. No meu Estado mesmo, dois terços do meu Estado estão no Semiárido. É uma extensão de 328 mil quilômetros quadrados. É uma área duas vezes e meia maior do que o Estado do Ceará. E uma área de cristalino, porque não tem água de subsolo e nem de superfície. Portanto, é uma situação muito grave. Eu acho que com esta discussão que estamos tendo... E já levei esse problema ao Governo Federal em audiência com a Presidente da República a fim de que se pudesse fazer um trabalho, um estudo, um planejamento em longo prazo, porque, sem dúvida nenhuma, a continuar como vai, ou seja, aumentando o consumo e diminuindo a produção de água - e quando falo em diminuir a produção é porque estão morrendo as nascentes e os afluentes dos principais rios do Brasil -, vamos ter uma situação de completo desabastecimento em todos os sentidos, não só humano, como industrial e para geração de energia. Tenho me preocupado muito com isso e, nesse sentido, tenho apresentado projetos chamando a atenção do Governo Federal e dos governos estaduais. |
| R | No meu Estado, tenho visitado e conheço todo o potencial hídrico. Os governos anteriores, governos da década de 1990 até 2006, no meu Estado, aliás, antes um pouco... Nós temos lá o Rio Paraguaçu, que nasce na região do Semiárido, que é no Município da Barra da Estiva, região do Semiárido. Esse rio vem da serra e vai desaguar na Baía de Todos os Santos. É um mini São Francisco, que vem da Barra da Estiva e, por um projeto feito com muita técnica e executado como um projeto executivo, foram feitas três barragens: uma no Alto Paraguaçu, Barragem do Apertado; uma no Médio Paraguaçu, que é a Barragem de Bandeira de Melo, que foi um projeto que eu executei, deixei pronto, com recurso. O governador que me substituiu construiu essa barragem. E a de Pedra do Cavalo, que foi na década de 70 para 80, por aí. Então, esse rio que nasce no Semiárido, abastece na Bahia a toda região metropolitana, que é uma região chove permanentemente. Ou seja, é um contrassenso, num rio de uma região em que não chove foram feitas três barragens, com projetos executivos. Hoje, esse rio é responsável pelo abastecimento de 52% de toda a população do Estado da Bahia. Se forem feitos estudos com projetos executivos, levando-se em conta toda a vazão, a recuperação dos seus afluentes e a manutenção dos seus afluentes, eu não tenho dúvida de que nós teremos água. Mas, me causa estranheza e de, alguma forma, eu posso usar até um termo que é um pouco duro, mas vou dizer. Há uma negligência muito grande, tem havido uma negligência muito grande do Governo Federal com o Rio São Francisco. Negligência, falta de responsabilidade até, de todos os governantes. Não atribuo, agora, nem à Presidente Dilma e também ao Presidente Lula, porque o Rio São Francisco vem sendo destruído há mais de 50 anos. Então, é a responsabilidade seguida você ver um rio morrendo e nenhuma atitude sendo tomada. Pelo valor da água, não há nenhum outro elemento na natureza para substituir a água, eu acho que o Governo Federal, na sua estrutura, que tem alguns Ministérios que são perfeitamente dispensáveis... Extinguiram-se, agora, oito ou nove Ministérios, mas dos que ficaram, eu acredito que se extinguir mais 10 ou 12, nenhum brasileiro nem do campo nem da cidade vai sentir falta desses Ministérios. Mas falta um ministério de recursos hídricos, de preservação da água, de manutenção e de recuperação dos mananciais para dar tranquilidade às futuras gerações. Talvez eu não passe por esse momento difícil de brigar pela água, enfrentar uma guerra pela água, mas, eu creio que, se não houver uma ação nesse sentido, daqui a 20 anos, no máximo, de 10 a 20 anos, nós vamos ter dificuldade muito grande para abastecimento humano. Portanto, eu quero agradecer a todos os diretores da Agência Nacional de Águas, e dizer que me coloco à inteira disposição para contribuir, em qualquer momento, aqui na Comissão de Meio Ambiente. No caso do Dr. Ney Maranhão, eu tive oportunidades de ser relator. Ele foi aqui eleito por na unanimidade. Eu queria agradecer à Drª Gisela Damm Forattini, ao Dr. Paulo e o Dr. João Gilberto, que leva o nome do maior cantor da Bossa Nova, que é o João Gilberto, baiano lá de Juazeiro. Estive na terra dele há poucos dias, lá em Juazeiro. Foi uma alegria muito grande. Toda a equipe da ANA, que está aqui, também, da Agência Nacional de Águas, de todos os funcionários, do nível elementar até o nível superior. |
| R | É uma equipe que trabalha, é uma agência superimportante. Quero também qualificar todos eles pelo comportamento ético e correto que têm tido neste trabalho, que é muito importante. Parabéns a todos. Vamos, certamente, nos encontrar para discutir este tema importante, o tema da água. Muito obrigado. Está encerrada a reunião. (Palmas.) (Iniciada às 09 horas e 46 minutos, a reunião é encerrada às 11 horas e 09 minutos.) |
