Notas Taquigráficas
| Horário | Texto com revisão |
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| R | A SRª PRESIDENTE (Simone Tebet. PMDB - MS) - Boa tarde a todas e a todos. Havendo número regimental, declaro aberta a 16ª Reunião da Comissão Mista de Combate à Violência contra a Mulher. Esta reunião está sendo realizada em parceria com a Procuradoria Especial da Mulher da Câmara e com a Procuradoria Especial da Mulher do Senado e integra nossas Pautas Femininas nesses 16 Dias de Ativismo - na realidade, no Brasil, são 20 dias - pelo Fim da Violência contra as Mulheres. Como eu disse, este projeto é uma iniciativa das Procuradorias da Câmara e do Senado em conjunto com a Bancada feminina do Congresso Nacional e conta ainda com o apoio do Núcleo de Estudos e Pesquisa sobre a Mulher da Universidade de Brasília, da Secretaria de Políticas para as Mulheres, da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, da ONU Mulheres e do Banco Mundial. Eu aproveito, neste momento, para registrar e agradecer a presença da representante da ONU Mulheres - já estivemos juntas semana passada, num evento na Câmara Federal -, Nadine Gasman. Inclusive, convido-a neste momento para participar e compor a Mesa conosco aqui. Eu quero agradecer imensamente a participação da nossa Deputada Moema Gramacho, que vai também nos auxiliar nos trabalhos. E eu gostaria de dizer que não vou poder ficar todo o tempo, porque nós estamos abrindo agora o Conselho Bertha Lutz, do qual sou Presidente também, e estaremos hoje escolhendo as nossas homenageadas. Pela primeira vez, Deputada Moema, nós vamos ter a oportunidade de escolher um homem que tenha contribuído para a causa da mulher brasileira, somente no que se refere à questão da violência contra mulher e em relação ao empoderamento de mais mulheres na política. E só temos um indicado, que é o Ministro Marco Aurélio Mello, que foi um grande incentivador e, durante um tempo, buscou fazer campanha no que se refere ao fortalecimento da mulher na política brasileira. O projeto hoje em questão compreende palestras voltadas para o público em geral com o intuito de despertar o interesse da sociedade para os principais problemas que permeiam a vida das mulheres e são de relevância para a pauta legislativa, como saúde, trabalho, educação, mobilidade urbana, direitos sexuais, direitos reprodutivos, violência doméstica, acesso aos espaços de poder e decisão, direitos humanos, violência obstétrica, igualdade e desigualdade racial, entre outros. A presente reunião destina-se à realização de audiência pública para debater medidas em favor das mulheres vítimas de violência doméstica, especialmente aquelas portadoras de necessidades especiais, e o impacto social e financeiro causado por essa violência. Esta audiência pública, como gostamos sempre de enfatizar, é realizada em caráter interativo. Portanto, nós podemos ter a participação popular neste momento. As pessoas que tenham interesse em participar com comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania no endereço www.senado.leg.br/ecidadania e do Alô Senado, através do número 0800-612211. Antes de convidar as palestrantes, as pessoas que colaborarão conosco nesta audiência pública, eu quero informar que esta audiência pública foi solicitada pela Senadora Rose de Freitas, que está envolvida na Comissão Mista de Orçamento. Ela tem um protagonismo muito grande nessa comissão, por ser a primeira mulher à frente da Comissão Mista de Orçamento - é importante que se diga isso. E as reuniões coincidiram. Por isso, ela não está presidindo os trabalhos. Esta também é uma audiência pública proposta pela Senadora Vanessa Grazziotin, que, neste momento, está representando o Senado na COP 21 na França. |
| R | Eu gostaria de convidar para compor a Mesa e poder nos auxiliar nesta audiência pública, nos brindando com a sua fala e com as suas experiências, a Srª Beatriz Cruz da Silva, Assessora da Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça. Seja bem-vinda. Também convido Liliane Bernardes, Coordenadora de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência da Secretaria Especial de Direitos Humanos do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos; e, por fim, Elisa Maria Correa Silva, Procuradora Federal junto ao Instituto Nacional do Seguro Social. Também fomos informados de que já chegou Vera Lúcia Ferreira Mendes, Coordenadora-Geral de Saúde da Pessoa com Deficiência do Ministério da Saúde. Sejam todas muito bem-vindas. Eu vou rapidamente explicar como serão realizados os trabalhos desta audiência pública. O tempo, num primeiro momento, é fixo, mas depois o tempo pode ser estendido. Para que a audiência possa ser dinâmica e todos possam participar, de acordo com o Regimento Interno do Senado e da Câmara, nós adotaremos as seguintes providências: os convidados farão a sua exposição por um período de cinco a dez minutos; e, em seguida, abriremos a fase de interpelação pelos Srs. Parlamentares inscritos - a palavra aos Srs. Parlamentares será concedida na ordem de inscrição. Antes de conceder a palavra à nossa primeira palestrante, eu gostaria apenas de enaltecer as nobres Senadoras proponentes desta audiência, Deputada Moema. Esse é um tema que poucos gostam de levantar e de que temos muito pouca informação a respeito. Se nós formos buscar nos bancos de dados, dificilmente saberemos qual é o impacto financeiro e econômico, para o País e para o mundo, dessa atrocidade que é a violência contra a mulher. Se não pelo lado humano e social, quem sabe possamos convencer os grandes governantes do País e do mundo de que a violência doméstica e a violência contra a mulher têm impacto financeiro brutal. Alguns dados muito rasos - não são oficiais e dependeriam de uma série de estudos - mostram que, só na América Latina, nós estamos falando de mulheres que deixam de receber iguais salários aos de outras mulheres quando elas são vítimas de violência. Há o tempo de ausência do trabalho, a demissão, o gasto com o sistema de saúde pública, o tratamento psicológico, sem falar o que é mais importante, ou seja, isso se reflete nas futuras gerações. Filhos que presenciam essa violência carregam, nos ombros, a mesma dor e, no olhar, a mesma tristeza. Esse é um tema relevante. Acho que esta Comissão vai ter que, no ano que vem, debruçar-se sobre ele e quem sabe conseguir mais parceiros em prol desta campanha para convencer o País e o mundo de que o impacto financeiro causado pela mulher vítima de violência é muito grande. A Organização Mundial de Saúde, já tive oportunidade de dizer aqui, tem um estudo que diz que uma em cada três mulheres, no mundo, é vítima de violência doméstica. Há estudo em Chicago, nos Estados Unidos, que concluiu que a mulher vítima com histórico de violência de gênero tem uma maior probabilidade de haver passado por períodos de desemprego mais longos, de ter mais rotatividade no emprego. Um dado que me chocou, quando a nossa assessoria nos passou, é que cerca de 40% das mulheres com algum tipo de deficiência já sofreram violência doméstica no mundo. Então, é uma estatística acima da média da violência contra a mulher no geral, que gira em torno de 25%, uma em cada quatro ou, em alguns lugares do mundo, uma em cada três mulheres já sofreu violência doméstica ou mesmo fora de casa. No caso, quando a mulher tem algum tipo de deficiência física ou psíquica, os índices aumentam. |
| R | Uma última informação é que as mulheres com deficiência correm um risco três vezes maior de sofrer estupro. Este dado realmente é chocante: 70% das jovens com deficiência intelectual - eu consegui testemunhar isso como Prefeita do meu Município e, depois, como Vice-Governadora do Estado, ajudando na coordenadoria que enfrenta a violência contra a mulher - sofreram algum tipo de abuso, normalmente sexual. Estamos falando de 70% das nossas jovens: é um número altíssimo! Do preconceito ao bullying, do abuso físico passando pelo sexual ou mesmo psíquico, não importa, nós temos que encarar de frente essa triste realidade, e tenho certeza de que, a partir do ano que vem, esta Comissão estará dando mais frutos em relação a essa questão. Sem mais delongas, eu quero aqui, neste momento, passar a presidência à nossa Deputada Federal Moema Gramacho. Vou agora abrir o Conselho Bertha Lutz, vamos fazer lá as nossas indicações para no ano que vem podermos agraciar quatro mulheres que carregaram e carregam a bandeira e a causa da mulher brasileira e, pela primeira vez, um homem. Então, passo neste momento a presidência à Deputada Moema Gramacho, que vai dar continuidade aos trabalhos. Voltarei para finalizá-los. Desde já, agradeço à Deputada por me permitir estar no Conselho. Voltarei o mais rápido possível. Muito obrigada. A SRª PRESIDENTE (Moema Gramacho. PT - BA) - Boa tarde a todas e a todos. Inicialmente, eu gostaria de cumprimentar todas as companheiras que foram convidadas a fazer parte da Mesa. Para ganhar tempo, não vou repetir seus nomes, mas eu queria dizer que vamos tratar de um tema extremamente importante, um tema que, por muito tempo, ficou no silêncio. Só a partir dos gritos de Maria da Penha e dos gritos de muitas outras mulheres, houve oportunidade de trazer à baila esta discussão que é a discussão da violência contra a mulher, da violência doméstica. Nesta Comissão, já houve várias oportunidades de fazer audiências para discutir essas questões e agora há oportunidade de fazê-lo com o viés destes impactos, os impactos do ponto de vista econômico, do ponto de vista da sociedade como um todo no que se refere, inclusive, à saúde, no que se refere a essa violência contra a mulher. Há aqui cinco convidadas - que bom, todas mulheres! Nós vamos precisar ser ágeis no tempo em função do horário, porque hoje estamos com questões extremamente importantes também na Casa e precisaremos nos deslocar para a votação que vai acontecer. Vamos fazer uma proposta aqui de dez minutos para cada, no máximo, em que pese entendermos que o tema requereria muito mais tempo para sua discussão. A nossa ideia é que possamos também enriquecê-lo com o debate, e as pessoas que estão presentes aqui no plenário vão ter oportunidade de fazer também seus questionamentos e suas ponderações e de dar suas opiniões. Depois disso, faremos um retorno para a Mesa. Eu queria dizer que as nossas Deputadas e Senadoras, em sua grande maioria, não estão presentes aqui agora, porque, na Câmara e no Senado, acontece tudo ao mesmo tempo agora, e temos que nos dividir em várias para conseguir dar conta de tudo. Daqui a pouco, também vou precisar me ausentar, mas a nossa Presidenta, Senadora Simone Tebet, com certeza, vai chegar a tempo de finalizar esta reunião. À medida que outras Deputadas e Senadoras tenham também condições de vir até aqui, vamos fazer um revezamento. Eu quero desejar, inicialmente, sucesso neste debate. E vamos começar com a Srª Vera Lúcia Mendes, Coordenadora-Geral de Saúde da Pessoa com Deficiência do Ministério da Saúde. É muito importante poder tratar dessa questão da pessoa com deficiência, porque sabemos que, se as mulheres são vítimas de violência, as mulheres com deficiência são duplamente vítimas dessa violência, com muito mais dificuldade de reagir. Por isso, para nós, é muito importante poder tratar dessa questão com a atenção que ela merece. Portanto, Drª Vera. |
| R | A SRª VERA LÚCIA FERREIRA MENDES - Em primeiro lugar, eu queria agradecer, em nome do Ministério da Saúde, por estarmos aqui, de novo, discutindo um tema superimportante para a agenda das mulheres, especificamente nesse recorte, pensando nas mulheres com deficiência, uma questão em que se vão somando vulnerabilidades e em que a situação vai ficando bastante complicada e muito grave, em termos de dados. Eu serei muito rápida. Eu tinha preparado uma breve apresentação, que depois, inclusive, eu posso deixar para consulta, mas eu achei melhor não usá-la, porque fica mais rápido, para economizarmos tempo. Já tendo agradecido o convite, eu quero dizer que, no Ministério, eu coordeno a área de saúde da pessoa com deficiência. Trabalhamos muito coordenadamente essa agenda com a área de saúde da mulher, que discute todas essas dimensões, e junto, também, com a Secretaria de Políticas para as Mulheres e a Secretaria de Direitos Humanos, que são áreas correlatas, em torno da organização e formulação de políticas públicas que possam identificar, melhorar e qualificar esse trabalho. Eu vou começar pelos dados e indicadores. Há vários números que apontam para números mundiais, mas eu vou falar especificamente do Brasil e do Ministério da Saúde. O Ministério da Saúde, de certa maneira, avança na medida em que, há algum tempo, os casos de violência são de notificação obrigatória. Então, na SVS, há dois sistemas, sendo que um deles é o Sinan (Sistema de Informação de Agravos de Notificação), de notificação, de informação em saúde, que agrega as informações de violência. Então, são dados de notificação compulsória, obrigatória, e há esse banco de dados. Lá, nesse banco de dados, é possível selecionar uma série de informações desse caso. Entre elas, é possível, claro, selecionar a questão de gênero e selecionar mulheres que sofrem violência, sendo que depois também é possível desagregar se essa mulher tem alguma deficiência e qual o tipo de deficiência. Também é possível fazer o extrato do tipo de violência: se é uma violência sexual, se é agressão, enfim, vários tipos de violência. Também no banco de dados, consegue-se mapear, do que é notificado, quem foi o agressor. E, para nossa tristeza, a maior parte dos agressores é de conhecidos, inclusive companheiros ou parentes, das mulheres que sofrem essas violências. Esse banco de dados é um banco de dados da saúde, específico da vigilância. Sabemos que existem outros. A Secretaria de Mulheres também busca esses dados. Não é querer falar de uma situação meramente epidemiológica, mas é superimportante a notificação. E sabemos também - mas é importante dizer - que, pelos dados que são notificados, pode-se afirmar, com certeza, que esses dados são subnotificados. E há dois problemas a enfrentar em relação aos dados, que podem ajudar a organizar melhor as políticas públicas, que podem fazer pensar no tamanho do problema e onde está a maior parte do problema. Um é que eles são subnotificados. A nossa hipótese é que, apesar de essa brutal e violenta realidade, apesar de essa brutal agressão à mulher ser um problema superimportante, ainda, por questões culturais e variadas, a maior parte dos casos sequer é denunciada ou chega aos serviços de saúde e, portanto, não é notificada. É nesse sentido que falamos da subnotificação. Então, tem que haver um trabalho importante de sensibilização da sociedade e de luta dos movimentos das próprias mulheres para que isso seja mais notificado. |
| R | Outra coisa que também discutimos brevemente - e é um desafio para formuladores de políticas não só do Executivo, mas também do Legislativo, que tem sido um parceiro importante nessas agendas - é que possamos também criar algum mecanismo de unificação desses vários bancos de dados que notificam violência no País. Há os dados da saúde, dos direitos humanos, do sistema de justiça. Às vezes, dá um trabalho danado a análise dos dados, porque esses sistemas não necessariamente estão integrados. Cada um pergunta de um modo, de um jeito, e é muito difícil cruzar esses dados. Quando fazemos essas pesquisas no Brasil, ainda temos que ir atrás de vários bancos de dados. Então, talvez seja legal um esforço para qualificarmos melhor esses dados. Em relação especificamente à saúde, no Dapes (Departamento de Ações Programáticas Estratégicas), o departamento em que trabalho, existe um grupo muito forte, há algum tempo já, com a participação de várias áreas, para tratar especificamente o tema da violência - e um recorte é o tema da violência contra a mulher. Acho que é importante pensarmos essa dimensão da dupla vulnerabilidade. Eu sei que esse termo, para os mais teóricos do campo, não é o correto, porque não é uma questão de dupla ou de duas vulnerabilidades e, sim, uma questão lá da interseccionalidade, que gera um fator de risco ainda maior para certos grupos, mas esse termo é mais claro. É muito difícil o termo técnico, e eu acho que é importante comunicar para os movimentos, paras as mulheres. A questão da dupla vulnerabilidade é no sentido de que é vulnerável por ser mulher e de que ela pode também estar em outros grupos: ela pode ser mulher, mulher negra, mulher camponesa, mulher quilombola, mulher com deficiência. Então, vai-se agregando uma série de situações que, de fato, colocam certos grupos de mulheres numa situação de risco muito grande. As políticas públicas têm que ser capazes de lidar com as essas perspectivas, sob o risco de não trabalharmos adequadamente. No caso do Ministério da Saúde, temos criado, na área da saúde da mulher, uma série de normativas e portarias e avanços que visam conhecer melhor esse fenômeno e criar centros de referência para a integração integral da mulher em situação de violência. Esse serviço tem atendimento ininterrupto, 24 horas por dia, 7 dias da semana, e promove atenção integral à mulher, em geral, para tratamento e apoio a situações de violência sexual contra mulheres e adolescentes. Ele tem uma equipe de referência. Nós tentamos colocar esses serviços em rede no Território, pois não adianta criar só um centro que não esteja conectado e toda a rede SUS não esteja alerta a esse problema, porque muitas dessas mulheres chegam a uma unidade hospitalar de emergência, a uma unidade de pronto-atendimento, a uma UPA. Enfim, quando há esse caso, é preciso que, na rede SUS, os vários serviços sejam acionados, para poder, de fato, promover esse atendimento integral. Há também uma referência de atenção nos casos de interrupção à gravidez, previstos por lei... (Soa a campainha.) A SRª VERA LÚCIA FERREIRA MENDES - Eu já vou terminar. São atendimentos que precisam ser feitos e apoiados. Uma atenção ambulatorial também é importante, no caso de cuidar dessas situações de violência. O que há especificamente em relação a este recorte mulheres com deficiência precisa avançar muito. Por quê? Além desses tipos de violência sexual, de agressão física etc, na rede SUS, as mulheres com deficiência nessa situação de dupla vulnerabilidade - e montamos um grupo de trabalho para criar as diretrizes de atenção à mulher com deficiência - sofrem cotidianamente uma violência que eu vou chamar de violência institucional. Infelizmente, isso acontece, e é importante que sejamos críticos. As unidades dificilmente estão equipadas para atender a essas necessidades específicas das mulheres com deficiência. Por exemplo, as mesas ginecológicas não são acessíveis, colocando essa mulher em situação de absoluto constrangimento, para fazer um exame básico. |
| R | E sabemos disto: as mulheres com deficiência fazem menos controle de Papanicolau, fazem menos planejamento familiar, fazem menos controle de câncer de mama do que as mulheres que não têm alguma deficiência. Isso ocorre, porque há uma barreira não só de equipamentos e de acesso às unidades de saúde - elas não são acessíveis -, mas também por ser uma cultura - e esta é a pior razão - atitudinal em relação à mulher com deficiência, o que é uma agressão profunda. Para uma cadeirante, é comum ela entrar numa unidade básica de saúde e ser olhada, quando dizem para ela: "Você entrou pela porta errada" ou "O que está fazendo aqui?" ou "O centro de reabilitação é ali do lado" ou "Eu acho que você estava procurando uma entidade..." E ela é simplesmente expulsa. Negam um atendimento, como se a mulher com deficiência - e isto é uma questão de barreira atitudinal - não fosse mulher, não tivesse vida sexual, não tivesse vida familiar e opção da maternidade. Então, está nas nossas cabeças, nas nossas mentes e corações esse grau de preconceito de que a pessoa com deficiência, em geral, é uma vida menos válida. Portanto, sequer se supõe que as mulheres com deficiência façam sexo. Isso é uma violência profunda no cotidiano dessas mulheres. Nós criamos esse grupo de trabalho justamente na pauta do Viver sem Limite, que a Presidente Dilma lançou em 2011. Nós criamos um grupo de trabalho, fizemos vários estudos junto com as mulheres, com a SPM, com a Secretaria de Direitos Humanos. O que nós vamos fazer? Está previsto, no nosso próximo PPA, equipar pelo menos uma unidade básica de saúde para ela ser totalmente acessível. Isso já foi colocado no nosso PPA, que é o nosso instrumento de gestão, já com reserva orçamentária, para ir mudando essa cultura, provocando esse processo. Vamos fazer uma diretriz de cuidado, que é uma orientação para todos os profissionais da rede SUS quanto ao manejo clínico das mulheres com deficiência e também quanto às especificidades, porque a mulher com deficiência tem que ter o mesmo direito do acompanhamento à saúde que a mulher sem deficiência, mas o profissional de saúde também tem que saber quais são as especificidades que cada tipo de deficiência gera na mulher, como um agravo sobressalente. Uma cadeirante, por exemplo, tem mais risco de sofrer problemas vasculares. Então, ela tem que ser cuidada naquilo tudo em que a mulher já é cuidada e, além disso, tem que ter uma atenção especial em algum aspecto específico, que depende um pouco do quadro clínico de cada uma. Isso são coisas que parecem muito óbvias, mas elas não são feitas no cotidiano. E nós vamos ter que fazer uma grande força-tarefa de capacitação, de educação permanente, com diretrizes nacionais mais fortes, que sejam orientadoras da rede SUS. Também temos de injetar recursos para Estados e Municípios poderem se adequar, para, finalmente, quem sabe, nós consigamos sair de uma situação hoje muito precária da mulher com deficiência na rede SUS, eliminando esse conjunto de constrangimentos que elas passam cotidianamente. Eu tive que falar muito rápido. Há uma série de coisas que estamos falando nessa direção. Não preciso falar também das reformas. A rede SUS faz um monte de reformas de unidades etc. É incrível como as pessoas fazem reformas em ambientes quaisquer, e vemos que os responsáveis por prédios recém-reformados não pensaram em básicas questões de deficiência. Então, se vai reformar uma porta, isto pode ser muito simples: a porta tem que ter uma determinada largura, porque você tem que pensar que por aquela porta vai passar qualquer um, incluindo uma cadeira de rodas. Não sei por que os banheiros têm aquela porta minúscula, com vão de 70cm. Nesse espaço, não passa uma cadeira de rodas. Há o tipo de maçaneta que se usa etc. Eu sei que são situações muito graves, mas é cotidianamente dito a essas mulheres e para pessoas com deficiência em geral que, de fato, esta sociedade estranhamente ainda teima em fazer um pactuação social e pensar uma Nação para alguns e não para a parcela total. Há hoje 25% da população com alguma deficiência no Brasil. Isso inclui não só o estereótipo da deficiência - o cadeirante, o cego, o surdo -, mas inclui também idosos com mobilidade reduzida e pessoas com problemas funcionais temporários. E nós insistimos em criar sistemas, ambiências e circulações públicas desconsiderando 25% da população brasileira. |
| R | Eu queria fazer um apelo. Eu sei que o assunto não é este, mas, mulheres, nós estamos agora, neste momento, vivendo uma situação de emergência com o zika vírus. Há uma força-tarefa importante também de cuidado a essas mulheres gestantes, que podem ter pegado zika, que estão tendo crianças com microcefalia. Nós temos que cuidar tanto dessas mulheres, desse planejamento familiar, quanto dessas crianças que estão nascendo. Então, essa mulher é uma pessoa, em geral, forte, que segura a onda. Desculpem-me os homens presentes - eu não tenho nada contra eles, aliás, sou casada com um ótimo -, mas, em geral, a estatística diz que essas mulheres guerreiras que têm crianças com deficiência frequentemente são abandonadas pelos maridos e seguram a onda de seus filhos, das casas e de cuidar dessas crianças. Então, nós temos que olhar com bastante carinho e com bastante cuidado tanto para essas agendas gerais, que são importantes, como para essas dobras e essas especificidades no meio. Desculpem-me. É isso. Nós estamos fazendo muito esforço, e eu adoro essas agendas. Eu queria agradecer de novo, porque nós não fazemos isso sozinhos, nós fazemos isso só com muita ajuda de vários ministérios, de várias organizações sociais de movimento das mulheres e do Legislativo, a que eu queria agradecer, porque tem sido um grande parceiro em várias agendas nossas da pessoa com deficiência. Muito obrigada. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Moema Gramacho. PT - BA) - Vera, na realidade, nós é que agradecemos e pedimos desculpas a você pelo tempo, principalmente considerando que esse é um assunto que nos preocupa muito. Se nós formos levar em consideração que 45 milhões de pessoas no Brasil têm algum tipo de deficiência, o que significa 24% da população com deficiência, e se nós fizermos também uma correlação com o fato de que nós as mulheres somos 52% da população, há mais de 12% da população feminina do Brasil que têm uma deficiência. Imaginem o quanto isso nos preocupa em relação à questão da violência contra esse público, que é um público duplamente vulnerável. Portanto, o tempo seu foi curto demais para o tamanho do problema que nós temos. E você coloca mais um desafio, que é desafio que nós estamos vivendo no momento, somado a tantos outros, que é a questão do zika. Para nós, é uma coisa que é de saúde pública, mas é também uma responsabilidade coletiva de todos nós de buscarmos nos engajar nessa luta contra toda e qualquer possibilidade de alguém ser picado por esse mosquito. Muito obrigada pela sua participação. Antes de eu passar para a próxima oradora, eu queria passar para uma breve fala daquela que tem sido também uma grande parceira nossa, que é a Nadine Gasman, que é representante da ONU Mulheres no Brasil, que tem sido grande parceira e que tem dado muitas contribuições principalmente a este Legislativo e a esta Comissão Mista, da Câmara e do Senado. Pois não, Nadine. A SRª NADINE GASMAN - Muito obrigada, Deputada Moema. Realmente, para mim, é um prazer estar aqui. Eu faço questão de estar, mesmo por pouco tempo, porque o tema é um tema importante. Eu quero parabenizar a Comissão pelo ativismo nos 20 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres. Eu acho que o Legislativo tem sido um exemplo, mesmo nestes tempos complexos. Eu quero parabenizá-las pelos 16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres, pela agenda tão importante e por ter posto esse tema na agenda desses 16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres. Reconhecer os direitos das mulheres com deficiência tem sido um tema muito importante para o movimento de mulheres e para as Nações Unidas e tem sido não uma questão de consciência, mas uma questão das mulheres com deficiência que têm chegado, com toda a sua força, para a sociedade, demandando ser ouvidas e ser reconhecidas. É muito importante falar de violência contra as mulheres com deficiência, porque, como você falou, a intersecção, com a dupla, a tripla e a quádrupla vulnerabilidade das mulheres com deficiência, é muito evidente. Eu fico esperando os números - espero que você nos dê a apresentação. Em geral, são gritantes. Sabemos que uma de cada três mulheres sofre violência - os números que a Deputada deu: 70%. E isso acontece em todos os lugares. |
| R | Eu acho que é muito importante criar essa consciência na sociedade, é muito importante criar na sociedade o alerta de criar medidas de proteção social, de responsabilidade de toda a sociedade para a segurança das mulheres em geral e a segurança das mulheres com deficiência em particular e da importância de reconhecer as especificidades que temos no desafio de garantir para as mulheres com deficiência o direito de viver uma vida livre de violência. Ao final das contas, o que nós mulheres todas, mulheres e meninas, jovens, brancas, negras, com deficiência e sem deficiência, queremos é viver uma vida livre de violência. E isso tem que ser uma responsabilidade de todos e de todas. E quero só recordar que nós como humanidade temos nos engajado para, nos próximos 15 anos, mudar a humanidade, atingindo os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. E estamos na contagem regressiva até 2030. Temos 15 anos para atingir esses objetivos. O que nós temos falado é que não vamos deixar ninguém para trás e, quando falamos disso, estamos falando que não vamos deixar as mulheres com deficiência para trás. Temos que ter políticas públicas que tenham em conta as mulheres, as meninas com deficiência. Então, esses esforços extras em se pensar nas mulheres brancas, negras, jovens, idosas, com deficiência e sem deficiência precisam de políticas públicas específicas, de orçamentos específicos, de tecnologia e de pensamento específico. Deputada, acho que é uma boa coisa terminar este ano e começar o ano próximo pensando como é que o Brasil vai dar uma resposta afirmativa, boa, para todas as mulheres brasileiras. O Brasil tem dado um exemplo com as leis - a Lei Maria da Penha, a Lei do Feminicídio -, com o programa Mulher: Viver sem Violência, com uma Presidente que tem dado zero tolerância à violência contra as mulheres. O Congresso tem que fazer sua parte. Parabenizo a Comissão. E acho que isso é um exemplo muito importante de pôr uma ênfase e de ter um momento para os experts falarem e darem um recado do que pode ser feito para que as mulheres todas, incluindo as mulheres com deficiência, possam viver uma vida livre de violência. Muito obrigada. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Moema Gramacho. PT - BA) - Nós que agradecemos à companheira Nadine, que precisará se retirar. Antes disso, Nadine, eu queria dizer que precisamos disso, sim. Nesta Casa, há um projeto que cria um fundo nacional de prevenção à violência contra a mulher, que precisa ser aprovado por esta Casa. Esse projeto está na Câmara, e, infelizmente, há uma emenda de um Deputado - é o próprio Relator - que só aprova o fundo se estiver embutida a emenda dele. A emenda diz que não pode usar recursos do SUS para tratar de mulheres vítimas de aborto, mesmo que seja por estupro, mesmo que seja aborto a partir do Código Penal de 1940. O Código Penal, lá em 1940, já previa isso, mas ele quer condicionar que o fundo não pode ser usado para esse tipo de atenção de socorro a mulheres que tenham sofrido esse tipo de aborto. Acho que é um absurdo isso. Nós precisamos reagir e precisamos votar esse fundo, porque, se estamos tratando aqui da questão financeira também, que é tão importante para garantirmos a assistência e a prevenção, é preciso que esse fundo seja votado, e não pode haver esse tipo de posicionamento. Portanto, nós queríamos agradecer a sua presença e dizer que essa parceria continua cada vez mais estreita. Muito obrigada. (Intervenção fora do microfone.) A SRª PRESIDENTE (Moema Gramacho. PT - BA) - Ela está pedindo desculpas, porque vai precisar se retirar. |
| R | Antes de convidar a próxima oradora, eu queria convidar a pesquisadora e consultora do McKinsey Global Institute - ela é mais uma palestrante, que chegou logo depois de a Mesa estar formada - para vir compor a mesa e, daqui a pouco, já fazer uso da palavra. Por favor, Drª Tracy Francis. (Palmas.) Seja bem-vinda. E, agora, vamos ouvir a Drª Beatriz Cruz da Silva, Assessora da Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça, representando, aqui, o nosso Ministro Eduardo Cardozo. A SRª BEATRIZ CRUZ DA SILVA - Uma boa tarde a todas e a todos. Eu quero começar, em nome do Ministro e da Secretária Nacional de Segurança Pública, Regina Miki, agradecendo o convite e a oportunidade para que o Ministério possa vir discutir esse tema que nos é tão caro. Agradeço e cumprimento todas as minhas colegas da mesa no nome da Deputada Moema Gramacho. Mais uma vez, muito obrigada pelo convite e pela oportunidade. O tempo é bastante curto, Deputada. Então, vou procurar pincelar algumas questões que nós consideramos mais importantes e mais pertinentes relacionadas a esse tema. O Ministério da Justiça vem desenvolvendo, no enfrentamento à violência contra a mulher, um conjunto de ações bastante significativo, muito pautado pelo compromisso da nossa Presidenta de tolerância zero, como disse a Nadine, que me antecedeu, em relação à violência contra as mulheres, mas também porque nós temos no âmbito do Ministério da Justiça uma política que é voltada para o trabalho com os grupos que são mais vulneráveis à violência no País. E um desses grupos, por óbvio, infelizmente, é o de nossas mulheres, em especial as nossas mulheres com deficiência. Nesse sentido, a Senasp (Secretaria Nacional de Segurança Pública) é o local de onde eu falo, mas o Ministério da Justiça como um todo tem desenvolvido um conjunto de ações junto à Secretaria de Políticas para as Mulheres, em conjunto com o Ministério da Saúde, para tentar enfrentar a questão da violência contra as mulheres na perspectiva de responsabilizar os agressores, mas principalmente de prevenir essas violências e de minimizar os seus efeitos na vida dessas mulheres, que, infelizmente, ainda são a maioria das nossas mulheres no Brasil. Para isso, nós estamos desenvolvendo, no âmbito do projeto Mulher: Viver sem Violência, um conjunto de ações de enfrentamento à violência sexual, de fortalecimento das delegacias especializadas de atendimento às mulheres e de capacitação e sensibilização dos profissionais da segurança pública para atuarem nesse tema. Nós temos percebido no Brasil, em especial a partir dos governos Lula e do Governo da Presidenta Dilma, uma prioridade em relação a esse tema. Há iniciativas em todos os ministérios, em todas as políticas do Governo Federal relacionadas ao enfrentamento à violência contra a mulher. Isso se reproduz nos Estados e nos Municípios, mas temos percebido, Deputada, uma grande necessidade de integração dessas políticas e de integração dos serviços disponíveis na rede de atendimento às mulheres, porque, por vezes, na perspectiva de mais bem atender, especializamos os nossos serviços, mas acabam revitimizando as mulheres na medida em que, para citar um exemplo, no caso da violência sexual, uma mulher é ouvida, em média, de seis a oito vezes na rede de atendimento, dependendo da porta de entrada em que ela estiver, até a conclusão do processo judicial. Isso, por óbvio, revitimiza e acaba significando uma violação por parte do Estado e dos serviços que estão ali estruturados na perspectiva de proteção. E, para continuar nesse exemplo, nós percebemos a necessidade de integrar a atuação da saúde com a atuação da segurança pública. No caso específico da violência sexual, por vezes, as mulheres entram na rede pública de saúde ou mesmo na rede privada, recebem um atendimento, tendo os vestígios daquela violência sexual coletados pela rede de saúde, e, depois, precisam reproduzir todos esses procedimentos, que são invasivos, num momento de grande dificuldade dessa mulher, no sistema de segurança pública para atender a uma necessidade de uma perícia no IML para produzir as provas. |
| R | Nesse sentido, no último ano, para tentar minimizar isso, para tentar solucionar essa questão, nós temos realizado capacitações conjuntas de médicos do SUS e outros profissionais da área de saúde com peritos médicos legistas e profissionais da área de segurança pública, a fim de capacitar os médicos que atuam no SUS a terem um olhar também da segurança pública. Desse modo, por vezes, não seria necessário repetir o exame no âmbito do Instituto Médico Legal, sendo utilizadas a coleta que foi feita pelo SUS e a coleta de informações que foram realizadas por médicos durante a anamnese. E, ao contrário do que por vezes o senso comum acredita, na maioria das vezes, a violência não deixa vestígios, o que não significa que ela não ocorra. Então, toda a rede precisa estar muito preparada e atenta a essa questão para que não reproduzir por vezes, ainda em nossos sistemas de proteção, uma perspectiva machista e uma perspectiva de responsabilização em alguma medida da vítima, de dúvida da palavra da vítima e de revitimização dessa mulher. No que diz respeito à especificidade - e aí para finalizar esse ponto -, nesse ano de 2015, nós capacitamos mais de 600 profissionais em seis edições desses cursos conjuntos, o que é um imenso desafio, porque há áreas de conhecimento muito distintas, discutindo, trabalhando sobre o mesmo tema e pensando como é que se integram os serviços. Nós já capacitamos, entre 2011 e 2014, mais de 40 mil profissionais da segurança pública para o atendimento às mulheres em situação de violência. Várias pesquisas demonstram que existe, sim, uma violência institucional - já citada pela minha colega da área da saúde -, e as nossas instituições, em geral, acabam causando à mulher que já sofreu algum tipo de violência muita dificuldade de enfrentar esse problema por um despreparo, por uma falta de sensibilização da nossa rede. Na área da segurança pública, por óbvio, isso não é diferente, até porque a segurança pública é uma área muito permeada pelo etos masculino. Portanto, entendemos a necessidade de se trabalhar junto aos profissionais de segurança pública para tentar melhorar a forma como esses profissionais atendem as mulheres, em especial para que não se duvide da palavra da vítima, para que não se coloque em xeque a sua versão dos acontecimentos e para que não a revitimize. No que diz respeito à violência contra as mulheres e das mulheres com deficiência, no final de 2013, início de 2014, o Ministério da Justiça e a Senasp elaboraram um projeto que tem como foco tornar os serviços de segurança pública mais acessíveis às pessoas com deficiência. Há coisas bastante simples, para que, na maioria das vezes, nem as políticas públicas muito menos os indivíduos atentam. E eu vou citar um exemplo: como uma pessoa com deficiência auditiva ou com uma deficiência visual ou com alguns tipos de deficiência aciona a polícia no Brasil? Como ela aciona o 190? Como tornar acessível esse serviço para as pessoas que também têm determinados tipos de deficiência e que acabam tendo um pouco mais dificuldade de acessar serviço? Então, um pouco do foco do projeto é tentar pensar alternativas. Primeiro, capacitar os profissionais de segurança pública e sensibilizá-los para esse tema, mas também pensar alternativas para responder essas questões, criar aplicativos, hoje a gente tem a tecnologia que pode muito auxiliar nesse processo. Outra questão: se uma pessoa com uma deficiência visual recebeu atendimento numa delegacia, como ela tem certeza do registro da ocorrência e que esse registro da ocorrência aconteceu nos moldes em que ela relatou, se ela, ao receber o que todo mundo recebe ao registrar uma ocorrência na delegacia, não tem essa capacidade de ler? Então, nós voltamos também o projeto para pensar em como tornar as delegacias de polícia mais... (Soa a campainha.) |
| R | Eu já estou finalizando. Assim, nós voltamos também o projeto para pensar em como tornar a delegacia de polícia mais acessíveis às pessoas com deficiência, dotando essas delegacias - ou pelo menos algumas delegacias mais centrais, porque realmente no sistema como um todo isso ainda não é possível - de impressoras em braile, de equipamentos e tecnologias que facilitem esse atendimento e que garantam um atendimento mais resolutivo. Para elaborar esse projeto, nós contratamos uma consultoria no âmbito das Nações Unidas, pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). A primeira constatação que nós no Ministério da Justiça fizemos, junto à consultora contratada, é que o tema da pessoa com deficiência é tão invisível para a segurança pública que não havia como começar a pensar quais eram as questões que precisavam ser discutidas e que precisavam ser colocadas em uma perspectiva de um projeto voltado para o acesso das pessoas com deficiência à segurança pública. Por conta disso, nós realizamos uma pequena pesquisa. Foi uma pesquisa que ficou disponível no site do PNUD, em uma plataforma aberta, em que a consultora, contando com o apoio da Secretaria de Direitos Humanos, junto com Conselho da Pessoa com Deficiência, mobilizou um conjunto de atores da sociedade - pessoas com deficiência, cuidadores, familiares e profissionais que atuam com pessoas com deficiência - para responderem essas questões dessa pesquisa. Aproximadamente 450 pessoas responderam a pesquisa. Foi uma pesquisa que ficou aberta por 15 dias. O objetivo não era, de forma alguma, encerrar o tema ou trabalhar do ponto de vista científico essas questões, mas era levantar subsídios para poder dar esse pontapé inicial, haja vista essa constatação de que não havia nenhum ponto de partida para esse tema e para a discussão desse tema dentro da segurança pública. Os dados que essa pesquisa nos trouxe foram bastante significativos. Primeiro: mais de 78% das pessoas com deficiência que responderam a pesquisa afirmaram que já foram vítimas de algum tipo de violência. A principal violência que apareceu nessa pesquisa foi a violência psicológica ou violência moral. A segunda violência - e isto nos chamou muito a atenção, mas também nos fez crer que nós estávamos realmente trabalhando em uma perspectiva correta - que mais apareceu, antes da violência física, foi a violência institucional: a falta de acesso que as pessoas com deficiência têm a todos os serviços da rede pública, sejam serviços de segurança pública, sejam serviços da assistência social, da saúde, da educação, a falta de acesso à cidadania da pessoa com deficiência. Isso foi apontado como a segunda maior violência e está muito associado. inclusive, com a primeira - com a violência psicológica ou moral. Nessa pesquisa, havia um campo que era aberto para a pessoa relatar algo que ela considerasse importante. E apareceram muitos relatos, as pessoas narrando situações em que elas sofreram violência psicológica ao procurar ajuda para solucionar uma violência sofrida ou por parte de um cuidador ou em casa ou na família ou na escola, ou seja, a dupla vitimização, a revitimização, na verdade, dessas pessoas. Então, nós temos trabalhado nessa perspectiva. Outro ponto bastante fundamental é que a primeira parte da pesquisa era relacionada com dados pessoais, idade, sexo, orientação sexual... E a grande maioria das vítimas são as mulheres. Do ponto de vista percentual, as mulheres com deficiência são mais vulneráveis à violência do que os homens com deficiência, as outras pessoas, o que comprova que, realmente, nós precisamos voltar o olhar não só da segurança pública, mas de todas as políticas públicas para trabalhar com essas mulheres, na perspectiva de garantir a cidadania e garantir uma vida mais digna. |
| R | Para isso, na segurança pública, nós temos trabalhado muito também com a necessidade de criar estatísticas criminais que atestem e que possam pautar as políticas públicas no campo da segurança. E, com isso, temos, no Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública (Sinesp), criado campos que permitem, a partir do cruzamento de dados, identificar quem são as pessoas que são vítimas de crimes no Brasil, de qualquer crime, mas também cruzar dados de gênero, de raça, de orientação sexual também, pensando um pouco na perspectiva da violência relacionada à homofobia, mas também a pessoas com deficiência. Já há campos no Sinesp que permitem que, ao registrar a ocorrência, o profissional de segurança pública seja obrigado a inserir esse dado, para que depois possamos gerar estatísticas e pautar nossas políticas públicas. Eu tinha algumas outras questões para colocar, mas vou deixar para um segundo momento, porque o tempo foi curto. Mais uma vez, muito obrigada e desculpe ter me estendido. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Moema Gramacho. PT - BA) - Nós também agradecemos à Drª Beatriz. Eu quero dizer que já há também um projeto, aqui, nesta Comissão, que trata da Ronda Maria da Penha, que é uma parceria entre a Secretaria de Segurança Pública e a Secretaria de Mulheres na Bahia, para fazer a ronda nos bairros onde há maior incidência de violência, fazendo um trabalho, então, de polícia cidadã, de polícia comunitária, que é trabalhar preventivamente quanto às agressões contra as mulheres. Eu queria registrar as presenças aqui. Eu já ia passar a palavra para elas, se elas quiserem usar a palavra, porque sei que estão correndo também - eu já tinha falado antes que as Deputadas ficam aqui se revezando. Eu queria anunciar a presença da Deputada Christiane Yared e da Deputada Conceição Sampaio, duas guerreiras, batalhadoras, membros também da nossa Bancada feminina e da Comissão Mista de Combate à Violência contra a Mulher. Eu vou passar para a Deputada Christiane Yared, pelo menos para uma palavrinha antes de sair. Pois não, Deputada. A SRª CHRISTIANE DE SOUZA YARED (Bloco/PTN - PR) - Obrigada, Presidente. Perdoem-nos. Esta Casa é muito intensa, e nós temos de estar um pouquinho em cada lugar. Gostaríamos imensamente de poder ficar e ouvir. Eu só quero deixar registrado que sei da dificuldade que este País enfrenta quanto à questão da pessoa com deficiência, mas principalmente quando é a mulher com deficiência. É algo realmente de chorar. Eu atendo a famílias que perdem filhos no trânsito, e também acaba havendo um preço alto para essas famílias, quando elas ficam com as meninas, às vezes, com a mãe numa cadeira de rodas ou numa cama. Vemos a desestrutura que acontece dentro desses lares e não temos capacidade de enfrentamento. É algo desesperador, terrível, triste. É de chorar mesmo. Então, eu até gostaria de deixar uma sugestão: que nós pudéssemos trazer até a Casa pessoas que tenham ideias que nos ajudem e que ajudem o próprio Governo, mostrando o que podemos fazer, como podemos trabalhar juntos, para ajudar essas famílias, que realmente ficam desestruturadas. A mãe numa cadeira de rodas é uma desgraça. Quando o filho está numa cadeira de rodas, ainda há a mãe para cuidar, mas, quando a mãe está deficiente ou quando a mãe fica deficiente por uma sequela de uma violência, é terrível, porque a casa toda vem abaixo. E sabemos que essa mulher enfrenta não só a sua deficiência, mas uma culpa terrível pelo fato de não poder ajudar na casa, por ver os filhos e a desestruturação toda da casa. Eu queria só deixar registrado que estamos atentas. As mulheres deste Parlamento têm se importado. Nós queremos fazer a diferença, queremos deixar um legado, porque todas nós sabemos que não somos Parlamentares, nós estamos Parlamentares. E queremos deixar um legado para este País. Então, essa luta é a luta de todas nós, de toda brasileira, que acaba sendo representada por nós que estamos aqui. Muito obrigada, Srª Presidente. Eu preciso sair, não há como. Meninas, obrigada por estarem presentes. É de grande valia a presença de vocês, o que nos vocês trazem. Muito obrigada. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Moema Gramacho. PT - BA) - Obrigada, Deputada Christiane. Está liberada. Deputada Conceição, pois não. |
| R | A SRª CONCEIÇÃO SAMPAIO (Bloco/PP - AM) - Minha querida Deputada Moema, primeiro, eu quero cumprimentar V. Exª por mais uma iniciativa, todas as nossas companheiras presentes à mesa e a nossa Plenária. Lembro que nós estamos debatendo, nesses 16 dias de Ativismo, vários temas em que a mulher certamente é a protagonista da transformação. E não poderia ser diferente, Deputada Moema, discutir hoje a mulher que sofre a violência institucional por ter uma deficiência. E isso para nós é justamente o empoderamento que nós precisamos ter para lembrar que essa mulher tem, sim, a sua dignidade humana que tem de ser respeitada. Esse é o resgate que nós precisamos fazer. A Deputada Moema falava, agora há pouco, que nós da Bancada feminina precisamos certamente nos desdobrar, muitas vezes, como fazemos no mercado de trabalho e quando voltamos para casa e assumimos a casa, porque nós mulheres brasileiras temos, sim, não só uma dupla jornada mas, muitas vezes, uma tripla jornada. Estamos no mercado de trabalho, estamos aqui, defendendo o nosso País, como Parlamentares, mas, ao voltarmos para casa, somos mãe, esposa, a dona da casa. E é essa jornada que, muitas vezes, certamente Deputada Moema, afasta as mulheres de também ocuparem esse espaço de poder. Assim, trazemos para a pauta política desta Casa um tema tão importante como este. Certamente, todos os temas são importantes, mas é uma pena que, em muitos momentos, parece que aquilo que nos importa, nos interessa, é menor ou se torna menor aos olhos de muitos desta Casa. Então, precisamos ainda de unidade, de nos fortalecer, de colocar, sim, a nossa boca, a nossa voz para ser ouvida, e lembrar que país justo é aquele onde homens e mulheres compartilham das oportunidades, seja uma mulher de cor branca, seja uma mulher de cor negra, seja uma mulher deficiente. O que importa? Importa é que somos mulheres e queremos, merecemos e precisamos ter o nosso espaço respeitado. Eu quero fazer essa saudação a você, minha querida amiga - permita-me chamá-la dessa forma -, a todas que aqui estão e a todos também, porque nós precisamos dos nossos companheiros para a transformação da sociedade em que vivemos. E que bom que colocamos na pauta importante desta Casa a mulher com deficiência, pois ela precisa não só ser lembrada, mas ser respeitada na sua dignidade humana. Obrigada, minha querida. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Moema Gramacho. PT - BA) - Deputada Conceição, muito obrigada também. A senhora está sempre presente. Eu queria só fazer um registro para consertar, pois, na realidade, a iniciativa é de duas Senadoras - a Senadora Vanessa Grazziotin e a Senadora Rose de Freitas. Infelizmente, nenhuma das duas pôde estar presente, porque estão em outras atividades. Então, eu estou assumindo a maternidade. A SRª CONCEIÇÃO SAMPAIO (Bloco/PP - AM) - Isso pode ser o prenúncio importante de uma futura Senadora. A SRª PRESIDENTE (Moema Gramacho. PT - BA) - Obrigada. Muito obrigada pela sua presença. Pode ficar à vontade. Eu sei que, se a senhora pudesse, continuaria aqui conosco. Vamos dar sequência, então. Convidamos, para fazer uso da palavra, a Srª Liliane Bernardes, Coordenadora de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência da Secretaria Especial de Direitos Humanos do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos. Por favor. A SRª LILIANE BERNARDES - Obrigada. Boa tarde a todos e a todas que estão presentes. Eu agradeço o convite, em nome do Secretário Especial de Direitos Humanos, Rogério Sottili, em nome do Secretário Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência, Secretário Antonio Jose, que não pôde estar presente, mas que, com certeza, gostaria de estar aqui para falar pessoalmente dessas questões que envolvem a violência contra as mulheres com deficiência. Várias das questões que vou falar na minha apresentação já foram mencionadas aqui. Então, será uma fala breve. Eu gostaria muito de contar com a participação de todas que estão aqui para nos ajudar na construção de políticas públicas voltadas principalmente para o segmento de mulheres com deficiência, que é um segmento invisível e que sofre muito com a violência, sendo que essa violência é subnotificada ou mesmo não notificada. Eu vou trazer o conceito de pessoa com deficiência da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU, que foi internalizada no Brasil com equivalência de emenda constitucional. Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimento de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. |
| R | Por que é importante trazer esse conceito de pessoa com deficiência? Porque a partir da Convenção, o paradigma que rege o que é a definição da deficiência é alterado, passando de um entendimento de que a deficiência esteja no corpo da pessoa para o entendimento de que a deficiência se localiza na interação do corpo com as barreiras. Então, é importante termos isso em mente quando falamos de pessoa com deficiência, porque essa pessoa só tem deficiência por o ambiente a desabilitar. São as atitudes dos outros que a desabilitam, e é por isso que essa pessoa é considerada com deficiência. Pode passar, por favor. A Convenção já fala muito sobre a questão das mulheres e meninas com deficiência e, ainda no preâmbulo, já reconhece que essas mulheres e meninas estão frequentemente expostas a maiores riscos, tanto no lar quanto fora dele, de sofrer violência, lesões ou abusos, descaso, tratamento negligente, maus-tratos ou exploração. Como princípio também da Convenção, no art. 3º, está estabelecida a igualdade entre o homem e a mulher. Pode passar, por favor. O art. 6º, que fala especificamente de mulheres com deficiência, fala também que as mulheres e meninas com deficiência estão sujeitas a múltiplas formas de discriminação, por serem mulheres, por terem deficiência e, muitas vezes, por questão de etnia. E ele também faz referência à necessidade de os Estados-parte tomarem medidas apropriadas para assegurar o pleno desenvolvimento, o avanço, o empoderamento das mulheres, para que elas possam gozar os seus direitos humanos e as liberdades fundamentais. Pode passar, por favor. O art. 16 fala que os Estados-parte devem adotar leis e políticas efetivas, inclusive legislação e políticas voltadas para mulheres e crianças, para assegurar que os casos de exploração, violência e abuso contra pessoas com deficiência sejam identificados, investigados e, caso necessário, julgados. Já o art. 28, quando fala de proteção social e padrão de vida adequados, faz referência ao acesso das pessoas com deficiência, particularmente de mulheres, crianças e idosos, a programas de proteção social e de redução da pobreza. Pode passar, por favor. Aí há a Lei Brasileira de Inclusão, que foi sancionada, depois de amplo debate aqui, nas duas Casas do Congresso. Ela foi sancionada este ano e também faz referência à questão da mulher e à proteção que o Estado deve garantir a essas mulheres, principalmente por sua situação de vulnerabilidade. Pode passar, por favor. Neste ano, o Brasil apresentou seu primeiro relatório sobre o cumprimento da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Refiro-me a essa Convenção que foi internalizada no ordenamento jurídico com equivalência à emenda constitucional em 2008 e 2009. O Comitê fez algumas observações sobre o relatório inicial que o Brasil apresentou, especificamente sobre a questão das mulheres com deficiência. Nesse relatório, o Comitê fala que se preocupa com as medidas tomadas pelo Brasil para prevenir a violência contra mulheres e meninas, como a Lei Maria da Penha, e essa preocupação vem em razão de, talvez, essa legislação e esse serviço não estarem sendo eficazes no combate à violência contra as mulheres e meninas com deficiência, por questões de acessibilidade e também por questões outras da própria invisibilidade desse segmento. Pode passar, por favor. Aí uma recomendação que o Comitê faz ao Brasil foi a de tomar medidas imediatas e adotar medidas concretas para que as leis, as políticas e os programas, especificamente destinados à violência contra as mulheres - incluindo as mulheres institucionalizadas, que é um público mais invisível ainda dentro desse público invisível de mulheres com deficiência -, sejam eficazes e acessíveis, para prevenir e reparar a violência contra essas mulheres. Incluem-se nesse rol medidas específicas, metas e indicadores. Pode passar, por favor. Vou falar um pouco da questão da esterilização de meninas e mulheres com deficiência, que, infelizmente, ainda acontece muito no Brasil. A Lei nº 9.263, que trata do planejamento familiar, no art. 10, estabelece que a esterilização cirúrgica em pessoas absolutamente incapazes somente poderá ocorrer mediante autorização judicial, regulamentada na forma da lei. Esse artigo, apesar de parecer, à primeira vista, que protege as pessoas tidas como absolutamente incapazes, na verdade, pode gerar uma violação de direitos na questão dos direitos sexuais e reprodutivos dessas meninas e mulheres com deficiência. Pode passar, por favor. A prática da esterilização continua sendo justificada, tanto por governo quanto por profissionais de saúde e familiares, no sentido de atender aos interesses da pessoa com deficiência, mas, quando você vai olhar a fundo, na verdade, não se está buscando o interesse da pessoa com deficiência. Na verdade, esses interesses são muito mais relacionados a evitar um transtorno para o cuidador dessa menina ou dessa mulher com deficiência, especialmente a deficiência intelectual e mental; também à inexistência de medidas de proteção contra estupro e exploração sexual dessas pessoas, que estão em situação de vulnerabilidade; e também à carência nos serviços de saúde para apoiar essa pessoa nessa decisão de ser pai ou de ser mãe. |
| R | Pode passar, por favor. O próprio Comitê da ONU, nessa avaliação que fez do relatório do Brasil, coloca a sua preocupação em relação a essa legislação, que eu acho que poderia ser uma matéria a ser discutida, não especificamente aqui na audiência, mas é uma das matérias que poderiam ser discutidas aqui no Congresso, juntamente com o Executivo, para que pudéssemos chegar a uma nova legislação, que estivesse mais harmonizada com a Convenção, para que que essas meninas e essas mulheres não tivessem a esterilização acontecendo como vem acontecendo no País, porque isso é uma grave violação de direitos e, inclusive, da integridade dessas pessoas e dos direitos sexuais reprodutivos. Pode passar, por favor. O Comitê também sugere que o Brasil reveja essa legislação, para proibir a esterilização de pessoas com deficiência sem o seu consentimento prévio, livre e esclarecido e também para assegurar que as pessoas com deficiência possam ter essa decisão apoiada em relação a procedimentos médicos e à própria decisão de ser pai ou mãe, a fim de que possamos cumprir a Convenção e garantir os direitos dessas pessoas. Pode passar, por favor. Há alguns desafios para as políticas públicas em relação ao tema que está sendo discutido aqui hoje. Há uma carência de informações sobre violência contra mulheres com deficiência. Fiquei muito feliz de a Vera trazer a informação de que os dados dessas notificações no SUS já estão disponíveis, porque dados e estatísticas são fundamentais para que possamos desenhar políticas públicas que sejam adequadas aos problemas que estão na realidade. Então, podemos trabalhar com esses dados para aprimorar o desenho das políticas públicas e, na verdade, iniciar desenhar políticas públicas para esse segmento, que sofre violência, que é invisível e que não tem a sua voz ouvida. (Soa a campainha.) A SRª LILIANE BERNARDES - E é importante destacar que esses dados devem ser coletados e analisados periodicamente. Como já falei, há uma necessidade de aprimoramento das políticas e serviços para prevenir e combater a violência contra a mulher, atendendo, ao mesmo tempo, às especificidades das mulheres com deficiência, incluindo metas e indicadores dessas ações. Pode passar, por favor. Algumas ações estão em andamento. A Vera, que é a representante do Ministério da Saúde, já falou de um Grupo de Trabalho Interministerial da Saúde da Mulher com Deficiência e Mobilidade Reduzida, que foi instalado em julho de 2015, para elaborar e acompanhar ações estratégicas para qualificar esse cuidado com as mulheres com deficiência de ter atenção integral à saúde no SUS. Também temos realizado alguns seminários sobre políticas públicas e mulheres com deficiência com o objetivo de ouvir essas mulheres e de oportunizar essa participação, porque um dos princípios da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência é a participação das pessoas com deficiência na construção das políticas que lhe dizem respeito. Pode passar, por favor. Estamos buscando também adequar os mecanismos de denúncia para considerar essas especificidades das pessoas com deficiência, garantindo acessibilidade - há o Disque 100, que é dos direitos humanos, e o Ligue 180 também, que é da mulher -, para que mulheres surdas, mulheres com deficiência visual e com diversos tipos de especificidades possam ser atendidas nesses serviços. Temos por vir a instituição do Cadastro Inclusão, que foi estabelecido pela Lei Brasileira de Inclusão. Ele será instituído agora em 2016. Então, vamos inserir dados e informações sobre deficiência e queremos incluir dados específicos de violência contra mulheres com deficiência, porque um dos objetivos do Cadastro Inclusão, que está definido na legislação, é o aprimoramento das políticas públicas, para que se também possa fazer um acompanhamento dessas situações. Também temos desenvolvido ações em conjunto com a Secretaria de Políticas para as Mulheres e outras pastas - Ministério da Saúde, Ministério do Desenvolvimento Social, Ministério do Trabalho e outras - e também temos apoiado o desenvolvimento de estudos sobre o tema, porque vemos que há uma carência de estudos mais específicos sobre essas questões de políticas públicas e violência contra mulheres com deficiência. Pode passar, por favor. Aí estão os meus contatos. Eu agradeço a atenção de todos e estou aberta para discutir e aprofundar um pouco mais sobre esse tema, contando com a colaboração de todos e de todas para que possamos construir políticas mais efetivas para a proteção das mulheres com deficiência. Obrigada. (Palmas.) |
| R | A SRª PRESIDENTE (Moema Gramacho. PT - BA) - Nós agradecemos à Drª Liliane. E peço que estenda os nossos agradecimentos à Ministra Nilma. Eu quero dizer que é uma honra enorme por ter a nossa Ministra já participado também de algumas audiências que fizemos e dizer que esse assunto também nos remete à mulher. Sendo mulher, negra e com deficiência, ela sofre triplamente o preconceito e a discriminação. Portanto, é para nós motivo de um desafio enorme. Então, transmita, por favor, os nossos agradecimentos à nossa Ministra Nilma. Eu queria passar a palavra, agora, à Drª Elisa Maria Correa Silva, Procuradora Federal junto ao Instituto Nacional de Seguro Social. A SRª ELISA MARIA CORREA SILVA - Boa tarde a todos. Quero aqui agradecer, em nome da nossa Presidente do INSS - que, por sinal, é uma mulher -, Drª Elisete Iwai, e em nome também do Procurador Chefe da Procuradoria Federal Especializada junto ao INSS, que é um grande apoiador e defensor de todas as ações que visam coibir a violência contra a mulher e de promoção da mulher também, Dr. Alessandro Stefanutto. Então, em nome dessas autoridades, eu quero agradecer à Exma Srª Deputada Moema Gramacho, em nome de quem cumprimento todos os componentes da Mesa, os Parlamentares e os demais presentes. Primeiro, eu quero me apresentar. Eu sou Elisa, sou Procuradora Federal há nove anos. Eu sempre atuei no INSS, então, tenho um certo carinho pela nossa autarquia. Atualmente, eu estou na direção central do órgão, onde já exerci diversas posições. Eu já trabalhei com benefícios e hoje estou trabalhando com patrimônio imobiliário. Nas duas posições, eu tive oportunidade de atuar nessa questão relativa à violência contra as mulheres, seja em relação aos benefícios - o INSS tem uma série de atividades, a Procuradoria também, vou relatar para vocês -, seja na questão do patrimônio. Ano passado, nós participamos muito, junto com a Secretaria de Políticas para as Mulheres, das discussões para a implantação da Casa da Mulher Brasileira, tendo em vista que foram adquiridos alguns terrenos do INSS para essa implantação. Então, é uma discussão que venho acompanhando há um tempo. Eu trouxe uma apresentação, mas vou pedir licença para não utilizá-la, porque eu fiz uma apresentação um pouco abrangente e, até pelo tempo e por outras autoridades já terem tocado no assunto, acho melhor resumir. Foi-me pedido para falar do impacto que a violência contra mulher causaria, e aqui vou me restringir à Previdência. Não há na Previdência, infelizmente, uma diferenciação da mulher portadora de deficiência que sofre violência, porque a legislação previdenciária trabalha mais com o conceito de incapacidade para o trabalho, independentemente de serem portadoras de deficiência ou não. O INSS, por outro lado, também é responsável pela gestão, pelo pagamento dos benefícios assistenciais. Nesse caso, sim, faz diferença a pessoa portadora de deficiência, porque o benefício assistencial tem como requisito a pessoa ser portadora de deficiência. Quais são as diferenças entre os dois benefícios? No primeiro caso, que são os benefícios por incapacidade - auxílio-doença, aposentadoria por invalidez -, a pessoa tem de ser filiada à Previdência, tem de contribuir, tem de trabalhar e tem que contribuir - como dona de casa, como contribuinte individual, de alguma forma. E o segundo tem requisitos em relação à renda. Fora desse panorama, não há dados. Entretanto, eu acho que posso contribuir aqui falando para vocês de algumas iniciativas que o INSS tem tomado não direcionadas exatamente à mulher portadora de deficiência, mas que, de modo geral, acabam atuando dessa forma. O INSS tem por objetivo pagar benefício para aqueles que precisam. Esses benefícios, de acordo com os princípios constitucionais, são custeados por toda a sociedade. E esses benefícios são pagos quando aquela pessoa que vai receber sofreu um risco que é denominado pela nossa legislação de risco social - o trabalhador ficou doente, o trabalhador está muito idoso - e não pode mais trabalhar. Estou focando mais no benefício previdenciário do que no assistencial. Enfim, ocorre que esse benefício é custeado por toda a sociedade. |
| R | Agora, imaginem quando esse risco é causado por alguém. Não foi uma doença, não foi um acidente. Alguém causou o risco. Alguém foi lá e cometeu uma violência que tornou essa mulher incapaz. Alguém dirigindo bêbado atingiu a pessoa, que sofreu um acidente de trânsito e ficou incapaz. Houve um caso recente aqui em Brasília de um ciclista que perdeu um dos braços por causa de acidente de trânsito. Pois bem. A legislação não estabelece nada expressamente a respeito. A legislação estabelece apenas em relação a acidente de trabalho, responsabilizando aquele empregador que não cumpre as normas regulamentares e, com isso, causa um dano ao trabalhador. Então, a legislação diz que, nesse caso, o INSS tem obrigação de buscar a reparação do dano, ou seja, de buscar que aquele empregador ressarça o INSS. Isso não quer dizer, porém, que o INSS não possa buscar o ressarcimento naqueles outros casos em que outras pessoas causaram danos - por exemplo, o motorista embriagado, o agressor que agrediu a mulher e causou sua incapacidade. E é o que o INSS tem feito com as chamadas ações regressivas. Então, o INSS, sem perder o seu objetivo, que é o de concessão de benefício, tem atuado de uma forma complementar na rede de proteção à mulher em duas frentes: com as ações regressivas e com as informações. Quanto às informações, eu trouxe até um exemplar. Foi feita esta cartilha em parceria com o Instituto Maria da Penha, Secretaria de Políticas para as Mulheres. E o INSS se utiliza de toda a sua rede de atendimento para distribuir informações, prestar informações à mulher que vai requerer benefício. Em relação às ações regressivas, nós temos tido êxito. Foram propostas poucas ações para verificar se haveria êxito judicial. Temos tido êxito. Houve uma improcedência - pasmem: foi a sentença que foi proferida pela primeira juíza -, mas nós recorremos e obtivemos provimento. A questão agora está pendente de julgamento no STJ. Inclusive, semana passada, houve uma sessão, e o julgamento ainda está em andamento. Temos tido votos favoráveis e acreditamos que a tese vá vingar. Apesar de alguns defenderem que é necessário alteração legislativa, eu não vejo essa necessidade. Entretanto, eu dei uma olhada nos projetos de lei que estão tramitando aqui na nossa Casa legislativa e verifiquei que há muitos projetos que, apesar de não serem imprescindíveis, talvez auxiliem. Há projetos colocando a indenização como efeito da sentença penal condenatória, há projetos criando benefícios, há vários projetos que teriam um impacto sobre a Previdência Social. Enfim, só para não correr o risco de ultrapassar o tempo, o que eu queria destacar é essa possibilidade que o INSS vem encampando, sem querer entrar na atribuição de outros órgãos, sem querer esgotar, mas oferecendo a sua capilaridade para os demais órgãos, oferecendo seu apoio. Maria da Penha sempre nos visita, sempre está presente nos nossos eventos, gravou informações sobre o Disque Denúncia, o Disque 180, que nós passamos na esfera do 135, que é o número que se liga para agendar benefícios. Então, é sempre essa busca de trabalho para informação da segurada. Houve capacitação de servidores, eventos para a sociedade. E há a questão das ações regressivas nessa tentativa mesmo de ressarcir a sociedade daquilo que ela gasta em razão do risco social que foi causado - eu digo aqui risco social no sentido técnico. Na verdade, legalmente, nós não podemos dizer dano que foi causado à mulher, independentemente da sua condição, da sua cor, da sua profissão e da violência que foi perpetrada. Para finalizar, eu queria, se me permitem aqui, acrescentar à fala da Deputada Christiane e da Deputada Conceição uma observação que a Maria da Penha sempre coloca e que o Dr. Alessandro Stefanutto sempre gosta de repetir: a luta também é dos homens. Nós mulheres temos que estar empenhadas, mas a luta também é dos homens, porque ninguém nasce agressor. |
| R | Há até um vídeo que estava na minha apresentação, que decidi por não passar por causa do tempo, que deve ser conhecido de muita gente - e a apresentação vai ser disponibilizada. Trata-se de uns garotinhos italianos. No vídeo, mostram uma garotinha e falam: "Faça um carinho, faça uma careta". E depois falam: "Dê um tapa nela". E eles falam: "Não, não vou dar um tapa". E o garotinho fala: "Porque eu sou homem". Então, esse é o nosso recado. Eu agradeço e estou à disposição. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Moema Gramacho. PT - BA) - Nós queríamos agradecer à Drª Elisa e parabenizá-los por esta cartilha Quanto custa o machismo? Isso é muito importante. Essa interrogação fica aí para que possamos fazer uma grande reflexão. Eu queria registrar a presença aqui da nossa Deputada Flávia. Daqui a pouco, eu vou convidá-la para me substituir, porque vou também precisar me retirar agora. E, Drª Flávia, só há mais uma oradora, uma palestrante, que é a Drª Tracy Francis. Eu vou pedir que você venha me substituir e que possa dar sequência ao trabalho. Antes de sair, eu queria agradecer mais uma vez a todas as palestrantes e dizer que as falas das senhoras foram muito enriquecedoras para todas nós aqui. Acho que, cada vez que passamos por uma audiência pública desta, saímos mais enriquecidas, mais fortes, mais empoderadas, com todas as informações que aqui são trazidas. E que essas informações sirvam para nossas reflexões e para que nós possamos, cada vez mais, continuar trabalhando para esta Comissão e todas as demais que tratam da questão da mulher nesta Casa e em outras casas legislativas possam contribuir, de fato, para a melhoria dessa condição e diminuir ao máximo ou acabar com a violência contra a mulher. Eu não posso deixar, já que estamos aqui com mulheres e homens - são poucos, mas há alguns - que formam opinião, de também emitir a minha opinião em relação ao momento que estamos vivendo. Temos que aproveitar todas as oportunidades. Sei que muitos podem não pensar igual a mim, mas quero ter o direito de externar a minha posição. Nós falamos aqui de violência contra a mulher. Nós não podemos deixar de levar em consideração o que tem sido feito para que possa haver uma sociedade mais justa, menos desigual e que cada vez mais combata a violência contra a mulher. Podíamos falar aqui da Lei Maria da Penha, que Lula sancionou, e da Lei do Feminicídio, que Dilma sancionou. Podíamos falar aqui do Bolsa Família. Eu estava no ferry boat, no fim de semana, quando eu encontrei uma mulher que dizia assim: "Eu sou contra o Bolsa Família, as mulheres estão parindo mais e não querem trabalhar por causa do Bolsa Família". Vocês podem não acreditar, mas eu passei uma hora conversando com essa mulher, porque eu precisava colocar para reflexão dela o que significou o Bolsa Família no empoderamento das mulheres. E comecei dizendo a ela: não estou generalizando, mas, principalmente na camada mais carente, numa casa, o homem pega o dinheiro do próprio salário e gasta todo em cachaça. É diferente, pois a mulher que recebe o Bolsa Família usa o recurso para alimentação da família, usa o recurso para garantir a sobrevivência das suas famílias. As estatísticas estão comprovando que ninguém está parindo mais, como diz o termo vulgarmente falando, por conta do Bolsa Família. As mulheres não estão engravidando por conta do Bolsa Família. E as mulheres e os homens não deixam de trabalhar por conta do Bolsa Família; eles continuam fazendo bicos, se virando, porque é da índole das pessoas quererem mais. E o Bolsa Família é um complemento para garantir a sobrevivência. E mais que isso: é geração de economia local, é menos desemprego, porque é o dinheiro que movimenta a economia local naquele Município diminui o desemprego. E eu dizia assim para ela: uma mulher não pode ser contra o Bolsa Família, uma mulher que conhece a realidade da população brasileira não pode se colocar contra o Bolsa Família. Portanto, podíamos dizer aqui que o Bolsa Família é também o empoderamento das mulheres. As mulheres começaram a poder reagir mais em relação aos homens que as agridem. Porque antes uma das coisas que mais amarravam mulher ao homem, além da questão afetiva, era a dependência econômica. E as mulheres apanham, apanham, às vezes, chegam a morrer, porque não sabem o que fazer para cuidarem de seus filhos sem se separar daquele agressor. Então, Bolsa Família é empoderamento para as mulheres. Além disso, podíamos falar aqui do acesso à universidade, que permitiu que mulheres negras, principalmente, pudessem ter acesso a universidades, seja por mais universidades públicas, seja pelas cotas para os negros e negras, seja pelo Fies, seja pelo Prouni. Podíamos falar aqui de uma série de outras políticas que ajudam nesse empoderamento das mulheres e que podem, com isso, ajudar também a diminuir a violência. |
| R | E queria também dar um outro detalhe que é importante, que é o Minha Casa, Minha Vida, pois as prioridades são idosos e acessibilidade para pessoas com deficiência. Quando fui prefeita, entreguei 5 mil unidades do Minha Casa, Minha Vida em nosso Município e priorizei todos os andares térreos para as pessoas portadoras de deficiência, por conta de uma política que foi desenvolvida para garantir que os deficientes tivessem mais acesso. E muitas mulheres se libertaram do agressor, porque tiveram uma casa para morar a partir do Minha Casa, Minha Vida. Gente, por tudo isso, eu queria pedir aqui uma reflexão. Nós não podemos apoiar um golpe que está se perpetrando contra a mulher, a primeira mulher Presidenta eleita e reeleita no Brasil para presidir a República do Brasil. Se tivesse algo que pesasse sobre a sua conduta, que, de fato, tivesse desabonando o seu perfil como gestora, como mulher, como pessoa pública, aí sim. Nós não vamos compactuar com crimes. Agora, não há nada que desabone a sua conduta. E é um golpe que se perpetra contra a Presidente da República e contra a democracia. E eu estou fazendo esse alerta. Desculpem-me os que não concordam com a minha posição, mas eu não posso me furtar a emitir a minha opinião com mulheres aqui que são formadoras de opinião e que, com certeza, podem fazer essa reflexão junto conosco. Eu quero dizer que a democracia é feminina e que nós precisamos defender a democracia. Não ao golpe. (Palmas.) Chegou aqui a nossa Senadora Fátima Bezerra, mas eu queria convidar a nossa Deputada Flávia para assumir a Presidência em nosso lugar, agradecendo, também, a presença de todos aqui. Se a Senadora Fátima, depois, quiser revezar com a Deputada Flávia, fica à disposição. Mais uma vez, obrigada a todos. A SRª PRESIDENTE (Flávia Morais. PDT - GO) - Boa tarde a todas, boa tarde a todos. Eu queria agradecer a participação de todas as expositoras, que vêm engrandecer esta pauta feminina que é muito importante para o nosso Parlamento. Cumprimento a Senadora Fátima que está aqui - se, a qualquer momento, quiser presidir, é só sinalizar, Senadora - e a nossa Deputada Moema, que agora vai para os seus compromissos. Todos sabem que a Casa é muito corrida durante a semana, são várias agendas ao mesmo tempo. Por isso, nós nos dividimos para que possamos manter as nossas discussões e os nossos debates em relação à questão da violência contra a mulher. Eu queria dizer que a nossa preocupação é muito grande. Nós acreditamos que o aumento da violência contra a mulher é diretamente proporcional à independência da mulher de hoje: quanto mais independente ela é, mais existe a intenção de controlar. Aqueles que são controladores querem controlar e se sentem mais inseguros. E aí aumenta esse índice de violência. Então, é um trabalho a longo prazo. Nós temos que fazer uma mudança cultural em relação a esse sentimento de dominância que existe ainda entre os homens em relação às mulheres. É uma coisa que a mãe tem que ensinar para o filho e a avó para o neto para que ele já cresça em condições de igualdade, de responsabilidades iguais, de espaços iguais. Muitas vezes, ele cresce pensando diferente e, quando ele não tem o controle, passa a se tornar uma pessoa violenta. Eu queria, aqui, passar a palavra para a próxima expositora, que é a última expositora - depois, nós abriremos para alguma colocação final. Então, agora, com a palavra, Tracy Francis, pesquisadora e consultora do McKinsey Global Institute. A SRª TRACY FRANCIS - Obrigada, Deputada. Boa tarde a todos, boa tarde para todas as palestrantes. Estou muito feliz de estar aqui, nós somos muito interessados neste tema. A Mckinsey é uma consultoria global, que tem uma divisão que se chama McKinsey Global Institute, que é um think tank, uma parte da organização que pesquisa sobre tendências. E o nosso interesse é, principalmente, na questão de como tendências sociais influenciam o que acontece na economia. Faz uma década que estamos bastante focados na questão de mulheres e acabamos de lançar uma pesquisa, nossa última pesquisa, que foca na questão de paridade entre os gêneros, em que queríamos quantificar quanto seria o impacto na economia global se houvesse paridade entre homem e mulher, igualdade, e também entender quais são as condições que têm que existir na sociedade para chegar a essa paridade. Então, dentro dessa questão, abordamos a questão de violência. |
| R | Eu vou mostrar os dados, que eu acho que servem como pano de fundo para o que esta Comissão está tentando fazer, que é, de alguma forma, entender o impacto da violência doméstica, os impactos econômicos desse fenômeno. Pode passar a página, por favor. Não vou passar muito tempo nesta página, mas é só para dizer que uma das razões por que queríamos fazer essa pesquisa é a questão da falta de dados. Muito foi falado hoje sobre a falta de dados sobre violência doméstica, e isso é a verdade quando se olha para todas as questões que têm a ver com a igualdade dos gêneros. Apesar de nosso relacionamento com a ONU, apesar de nosso relacionamento com vários governos, não conseguimos achar as bases de dados que entendessem a questão do impacto da igualdade na economia. Por isso, fizemos a pesquisa. O que a gente mostra nessa página é que o impacto para a economia global, se houvesse igualdade dos gêneros, seria por volta de US$28 trilhões. Se fôssemos um pouquinho mais conservador e só olhássemos para qual seria o resultado, olhando os países pelo melhor desempenho dentro da região, o impacto seria de US$12 trilhões, o que obviamente é um número extremamente grande. Pode passar para a próxima página. Quando olhamos para o Brasil e fizemos o mesmo exercício, o que vimos? Se houvesse paridade mesmo no setor econômico, haveria um impacto de US$850 bilhões. E, de novo, se fôssemos para um cenário que é mais factível, dentro do período de dez anos, que seria só chegar ao melhor desempenho de países dentro da América Latina, estaríamos falando em US$400 bilhões. Para contextualizar esses números - esses números são muito grandes, é difícil entender o que quer dizer US$410 bilhões -, isso seria agregar ao nosso PIB o Nordeste inteiro. Então, neste momento em que se fala muito sobre PIB, como fazer o PIB voltar a crescer etc., acreditamos que uma mudança do PIB do tamanho da Região Nordeste é bastante significativa. Pode passar. Aí queríamos entender de onde vem essa mudança. E o que vimos é que 50% de nossa população é mulher, 55% dos estudantes universitários são mulheres, só que 44% da força de trabalho é mulher e 35% de nosso PIB são gerados por mulheres. Então, vivemos numa situação na qual há igualdade na população, somos mais representadas nas faculdades, porém, geramos um terço da economia. E a diferença aqui vem de três fatores. A primeira questão realmente é a questão de participação na força de trabalho. Participamos menos por questões de dupla jornada, por questões várias; mas o fato é que a maior diferença é que participamos muito menos na força de trabalho. Quando participamos, trabalhamos menos horas e trabalhamos em setores que são menos produtivos. Então, esses são os três fatores que criam essa diferença. Com esse impacto econômico em mente, queríamos entender o que seria necessário, em sociedades, para permitir às mulheres participarem de uma forma igual. Obviamente, há todas as questões de infraestrutura etc, mas, de novo, queríamos ir a fundo e entender como é a experiência em vários países e quais são os fatores que causam isso. Então, criamos uma forma de medir isso, ao criar o que chamamos de gender parity score, a paridade entre os gêneros, essa métrica. E aí o que se vê aqui é que o número um quer dizer igualdade, o número zero quer dizer desigualdade total. E a primeira coisa que percebemos é que não há - o verde seria a questão da igualdade - nada nem parecido com o verde nesta página. Quando olhamos para o mundo inteiro, ou vemos desigualdade alta ou vemos desigualdade extremamente alta. O Brasil, quando se compara com a região, está no mesmo nível que a América Latina, que é uma alta desigualdade, e está melhor do que vários países do Oriente Médio e da Ásia, porém atrás de países como os da América do Norte, da Oceania, a Nova Zelândia etc. |
| R | Queríamos decompor essa métrica e entender o que contribuiu para a igualdade. Pode ir para a próxima página. Olhamos para 15 métricas. E, como falei, esses dados não existem num único lugar. Foi uma coleção de dados de várias fontes, de vários convênios, de várias ONGs do mundo inteiro para se tentar entender. O que é mais importante aqui é que nenhum país que consegue ter uma igualdade razoavelmente positiva na questão de participação econômica tem uma taxa que seja ruim no lado social. Então, pela primeira vez, há dados que mostram que, se a parte social não funciona, a parte econômica não vai funcionar. E, dentro dessa parte de igualdade de gênero na sociedade, olhamos três tipos de indicadores: a questão de serviços essenciais; a questão de proteção legal e expressão política; e a questão de segurança física e autonomia. Isso contém, por exemplo, um indicador que é a violência contra mulheres, no qual vimos que o Brasil, de novo, tem um nível alto de desigualdade. Nós não somos os piores, mas estamos longe de ser verdes aqui. Então, aqui há uma taxa de 31% de mulheres que reportaram ter sofrido violência íntima durante a vida. O que isso mostra de novo? Essa questão de violência, a questão que esta Comissão aborda, está intimamente ligada com a questão de como a mulher consegue participar na economia e, portanto, com a forma como nossas economias conseguem crescer. Mapeamos várias intervenções que são possíveis, olhando para essas métricas, inclusive para a violência doméstica. A questão da Lei Maria da Penha foi um dos exemplos que mapeamos e compartilhamos com outros países do mundo, até para eles se inspirarem um pouco. Na próxima página, basicamente, há o resumo de quais são os seis pilares que teriam que acontecer para conseguir mudar o que foi mostrado antes e, de fato, conseguir fazer nossas economias crescerem, com a participação de mais mulheres. E o que percebemos aqui, obviamente, é o que vocês estão fazendo aqui: é o conjunto do Governo, que tem que atuar, de ONGs, que conseguem e precisam atuar, e também do setor privado, porque sem eles também nada vai acontecer, não vai haver confluência de todos os setores de todas as partes do nosso País. Então, há seis pilares importantes: incentivos e apoio financeiro; capacitação... (Soa a campainha.) A SRª TRACY FRANCIS - ... na educação das mulheres; tecnologia e infraestrutura -será que se está oferecendo para as mulheres tudo o que elas precisam, como transporte seguro, creches e asilos? -; defesa e atitude exemplares - como fazer para educar nossa sociedade inteira, nossas mulheres e homens também, sobre como se comportar -; geração de oportunidades econômicas, olhando para a forma como o nosso local de trabalho funciona; e, finalmente, leis, políticas e regulamentos para proteger nossas mulheres. Muito obrigada. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Flávia Morais. PDT - GO) - Obrigada, Srª Tracy Francis. Passo a palavra agora à Senadora Fátima para que possa fazer suas colocações. A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco/PT - RN) - Deputada Flávia, que ora preside a Comissão e é membro desta Comissão, com quem tive também a alegria de compartilhar muitas lutas, entre elas exatamente a luta que diz respeito à agenda da igualdade de gênero - eu falo isso, porque fui sua colega na Câmara dos Deputados -, eu quero saudar aqui as nossas convidadas: Tracy, que acabou de falar; Vera Lúcia, Coordenadora-Geral de Saúde da Pessoa com Deficiência do Ministério da Saúde; Liliane, Coordenadora de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência da Secretaria Especial do Ministério da Cidadania - agora, Secretaria Especial dos Direitos Humanos do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos; e Elisa, Procuradora Federal junto ao Instituto Nacional. |
| R | Primeiro, de forma breve, eu quero dizer da importância, claro, de fazermos o debate hoje, tendo como foco exatamente a situação das mulheres vítimas de violência doméstica, especialmente aquelas com deficiência - é evidente que a violência doméstica afeta duramente as mulheres como um todo, e, para as mulheres com deficiência, deve haver um olhar mais especial ainda -, e o relacionamento que isso tem do ponto de vista do impacto social e do impacto financeiro. Deputada Flávia, é a nossa Comissão Permanente cumprindo exatamente o nosso papel no que diz respeito ao tema do combate à violência contra a mulher, que não é um tema de hoje. É um tema recorrente que está sempre a merecer a devida atenção de todos os setores da sociedade civil, do Poder Público em geral, inclusive do Congresso Nacional. Daí a iniciativa de retomar esse tema do combate à violência contra a mulher através de várias iniciativas. E uma delas é exatamente a Comissão Permanente. Eu quero aproveitar a ocasião, Deputada Flávia, para fazer um registro aqui na nossa Comissão, porque, agora, já no finalzinho de novembro, nós realizamos uma audiência pública desta Comissão Mista de Combate à Violência contra a Mulher em Natal, que é a capital do nosso Estado. Eu quero dizer para vocês que foi muito importante, pelo grau de envolvimento e pelo grau de participação que houve. Foi uma audiência muito representativa. Lá, nós tivemos a presença não só das deputadas estaduais, como a Deputada Márcia Maia, da Assembleia Legislativa do meu Estado, de vereadoras, como a Vereadora Júlia Arruda, da capital, bem como de vereadores de outros Municípios e da Secretária Estadual de Políticas Públicas para as Mulheres, Teresa Freire, que foi muito parceira na realização dessa audiência pública. Também estavam presentes a Secretária de Políticas para as Mulheres de Natal, Aparecida França; representantes da Marcha Mundial de Mulheres; representantes do Fórum Estadual de Mulheres; representantes do movimento estudantil, representantes da igreja, representantes da segurança pública. Foi uma audiência com um grau de participação muito bom. E foi uma audiência em que, mais uma vez, atualizamos o mapa da violência não só no Brasil, mas no Rio Grande do Norte. E, infelizmente, Rio Grande do Norte, Natal, não foge à regra do cenário nacional. Para se ter uma ideia, o aumento da violência lá no meu Estado, nesta última década, foi da ordem de 178,1%. Esse é o cenário vivido pelas mulheres potiguares. Em 10 anos, 178,1%. Daí por que nós termos colocado lá na audiência pública o quanto é necessário avançar no que diz respeito a mais iniciativas, a mais medidas de promoção e defesa dos interesses das mulheres. |
| R | Essas estatísticas não são apenas para servir de constatação e não podem levar a sociedade a chegar a um estágio de banalização, como se fosse tão grave esse quadro da violência doméstica contra as mulheres que está se tornando uma coisa banal o retrato das mulheres espancadas pelo País afora, que, infelizmente não é um problema apenas local, mas também mundial. É claro que conquistas que tivemos, como a própria Lei Maria da Penha e o uso do telefone, contribuíram para que as denúncias venham à tona, sem deixarmos aqui de considerar a subnotificação. Imaginem que, se não houvesse a subnotificação, esses índices seriam bem maiores ainda. Tracy, na ocasião, em que estava presente o Vereador Hugo Manso, eu disse que este é o momento de nos perguntarmos como andam as iniciativas no âmbito do Poder Público, no âmbito do Governo Federal, no âmbito dos governos estaduais e no âmbito dos governos municipais. Como estão? Essas secretarias de mulheres existem mesmo, de fato, ou só são mais propaganda? Qual a estrutura que essas secretarias dispõem para levar a efeito as políticas públicas direcionadas para esse tema? Qual o orçamento que é destinado? Como é o envolvimento da própria sociedade e o envolvimento do próprio Parlamento? Na audiência pública de Natal, eu achei interessante o que colocou a Deputada Estadual Márcia Maia. Ela deu conhecimento - e eu, inclusive, Deputada Flávia, estou apresentando no âmbito do Congresso Nacional - de que ela aprovou um projeto de lei onde é proposto que haja um percentual mínimo a ser reservado no que diz respeito à questão do emprego para as mulheres vítimas da violência doméstica. Essa é uma afirmativa interessante, seja pela via do concurso ou por outras vias. Então, se elas fizeram o concurso, por que as mulheres que são vítimas da violência doméstica não podem ter uma medida protetiva? É oportuna. É legal. É adequado esse tipo de iniciativa. Eu quero fazer constar nos Anais da nossa Comissão que, como integrante desta Comissão, estou cumprindo o meu papel. Eu já levei a Comissão ao Rio Grande do Norte, para ouvir a sociedade e para dialogar e cobrar do Poder Público, inserindo o meu Estado dentro desse tema da violência doméstica, que é um tema que aflige muito o nosso País. Fizemos oitivas no dia anterior, Deputada Flávia, com os casos de violência já constatados, casos gravíssimos de violência contra as mulheres, seja contra adolescentes, seja contra as pessoas adultas. E de lá saímos com um relatório atualizado sobre o mapa da violência contra as mulheres no Rio Grande do Norte e, ao mesmo tempo, elencamos mais uma vez uma série de propostas, uma série de encaminhamentos, uma série de reivindicações a serem encaminhados aos diversos órgãos competentes para que venham na direção de combate à violência doméstica por meio de uma rede de proteção e de promoção de defesa dos interesses das mulheres. |
| R | Por fim, eu quero também dar conhecimento às nossas convidadas e aos que estão nos escutando que, há 15 dias, a convite da ONU Mulheres, eu estive no Nepal, mais precisamente em Katmandu. Eu fui a única aqui representando o Congresso Nacional e, na verdade, o Brasil. Eu quero dizer a vocês que foi muito proveitoso o encontro. Foram três dias de um encontro muito intenso, com agenda muito puxada, mas foi muito bom. Havia lá cerca de 55 países. Havia, portanto, representação de todos os continentes do mundo, de todas as regiões. Qual era o tema do encontro lá que a ONU Mulheres promoveu, em parceria com outras entidades? O tema era a avaliação das políticas públicas, ou seja, a ONU e essas entidades estão dando a sua contribuição, inclusive no âmbito do Parlamento, para que o Parlamento se volte também para o tema da avaliação das políticas públicas. Não basta aprovar ou haver a política pública. E qual é o monitoramento que há sobre ela? Qual é a avaliação que está havendo sobre essa política pública, para que haja dados concretos de qual é o alcance dessa política? Ela precisa ser corrigida? Não precisa? Ela está dando certo ou não está dando certo? Afinal de contas, isso é recurso público. Então, foi muito interessante. De lá, foi criado um fórum de Parlamentares, com o tema da questão da avaliação das políticas públicas. E esse tema, diga-se de passagem, tem que ser ancorado principalmente na questão de gênero. Eu achei isso muito interessante. Na hora em que formos avaliar as políticas públicas, temos que olhar a questão da inclusão das mulheres, como é que essas mulheres estão no contexto daquela determinada política pública. Eu, inclusive, dei lá o exemplo do Bolsa Família. E eu dei o exemplo do Bolsa Família, primeiro, pelo êxito que é o programa Bolsa Família do ponto de vista do caráter social que ele tem - e é um êxito mesmo, do ponto de vista, inclusive, de implementação. As pessoas, às vezes, duvidam que o Bolsa Família tenha acompanhamento. Ele tem, e, inclusive, quem faz são as universidades brasileiras. São as universidades brasileiras que fazem o acompanhamento do Bolsa Família - e isso tem que ser feito. O Bolsa Família já chegou a um estágio muito importante, que é o chamado busca ativa. Não é só construir uma política e esperar que o pessoal venha. Não, aquela política tem que ir atrás, tem que identificar e ir em busca exatamente dessas pessoas, porque a política foi criada para isso. Então, eu dei o exemplo lá da questão do Bolsa Família. E disse que o Bolsa Família, por exemplo, tem também, dentro do seu conteúdo, dentro da sua concepção, um olhar voltado para a questão de gênero, para a questão exatamente das mulheres. Também eu dei outro exemplo lá que foi o Plano Nacional de Educação, inclusive suas metas que têm um impacto muito direto na vida das mulheres, que são as metas, por exemplo, das creches, da educação em tempo integral etc. Enfim, o fórum com o tema avaliação das políticas públicas teve como recomendação olhar a questão da inclusão de gênero, depois a questão da educação e a questão do desenvolvimento sustentável. Nós já terminamos a agenda dos Objetivos do Milênio e, agora, nós estamos na agenda dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Então, foi muito boa a troca de experiências. E o melhor: foi formado esse fórum. Eu quero, inclusive, contar com a participação da sociedade civil, das entidades, dos movimentos de mulheres, do Ministério Público. Nós vamos formar esse fórum de Parlamentares - eu fiquei com a tarefa de formar, Flávia, o fórum aqui no Congresso Nacional - para que esse fórum dialogue exatamente com a sociedade civil e com o Poder Executivo. A ONU veio me consultar sobre a possibilidade de, daqui a dois anos, o próximo fórum ser aqui no Brasil. E eu disse que víamos a proposta com bastante simpatia. É isso, Deputada Flávia. Eu quero agradecer aqui a participação também aqui das nossas convidadas. Sabemos do zelo e da dedicação com que elas têm tratado esse tema da violência doméstica contra as mulheres, se dedicando a ele. |
| R | A SRª PRESIDENTE (Flávia Morais. PDT - GO) - Obrigada, Senadora. Nós é que agradecemos a sua participação tão importante. Sabemos da importância do seu trabalho como uma Parlamentar reconhecidamente guerreira, principalmente, pela educação, e sabemos da importância da educação no processo do enfrentamento da violência contra as mulheres. Há essa interligação entre essa luta contra a violência contra a mulher e o seu mandato, que representa e, efetivamente, atua fortemente nas políticas de educação. Sabemos da importância do seu mandato. Hoje, em tudo que vamos votar com relação à grade curricular e à educação, temos enfrentado a questão de alguns grupos de políticos, pois, quando se trata de gênero, logo somos boicotadas e impedidas, por causa de alguns grupos que não querem aceitar esse termo nos nossos projetos atuais. Contudo, nós precisamos lutar, vencer e superar isso, para que possamos avançar. Eu falo que, nessa geração, ainda temos que tratar o agressor e que lutar, mas que, nas próximas gerações, temos que trabalhar para que os jovens, as crianças - nossos filhos - não sejam agressores. Que eles possam crescer tendo uma visão diferente de mundo, uma visão diferente da relação homem/mulher. A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco/PT - RN) - Deputada Flávia, quero também dizer que lá aproveitei para dizer da nossa apreensão - não é só desconforto - e revolta com o contexto, no País, no âmbito do Congresso Nacional, no que diz respeito à ofensiva de uma agenda conservadora em debate, com consequências muito diretas com relação à luta das mulheres. Eu citei lá, claramente, a questão do Estatuto da Família. Eu citei a questão da redução da maioridade penal. Eu citei, por exemplo, esse último embate que foi o Projeto de Lei nº 59/2015, de autoria do atual Presidente da Câmara, que quer revogar aquilo que a lei já estabelece: a garantia de atendimento às mulheres em situação de vulnerabilidade, de violência, nos casos de estupro. O projeto do Presidente da Câmara visa o quê? Revogar tudo isso que está previsto em lei. Esse é um ato brutal do ponto de vista da vida das mulheres, é um ato de criminalização mesmo no que diz respeito aos direitos das mulheres. Eu também fiz esse retrato lá, dizendo o quanto nós, bravamente, aqui estávamos resistindo, do quanto estávamos lutando. Eu aproveito para dizer também, neste momento, da nossa indignação ao ver um Presidente da Câmara dos Deputados na situação em que se encontra, respondendo por acusações gravíssimas de ocultação de bens, de lavagem de dinheiro, de desvio de recursos para o exterior, tanto é que está respondendo a processo disciplinar no Conselho de Ética da Câmara. As denúncias contra ele que vêm da Procuradoria Geral da República são muito graves. Que lamentável ver este homem se atrever a autorizar o pedido de impeachment contra uma Presidenta - inclusive, é uma mulher - sobre quem não paira absolutamente nada, do ponto de vista da sua conduta pessoal! Eu disse, agora há pouco, na tribuna do Senado, que ninguém está aqui questionando o instrumento do impeachment. Não. O impeachment está nesta Constituição e estava nas Constituições anteriores. Pedidos de impeachment até já foram feitos em outras ocasiões. Não estamos questionando isso. O que nós estamos questionando é pedido de impeachment sem embasamento legal, sem embasamento jurídico! É isso o que nós estamos questionando, porque é disso que se trata o pedido de impeachment da Presidenta Dilma. É por isso que nós estamos dizendo que é golpe. É golpe por quê? Porque não há embasamento legal, não há embasamento jurídico absolutamente nenhum, de maneira nenhuma. Então, todo mundo sabe: é um homem que age movido por vingança, que tomou aquela decisão exatamente no dia em que, por exemplo, meu Partido se negou a livrar a cara dele no Conselho de Ética. Ora, que ele vá ao Conselho de Ética e se defenda. |
| R | Ainda ontem, o vimos patrocinar mais outro movimento grotesco, quando atropelou o Regimento da Câmara dos Deputados e não aceitou os procedimentos que os Líderes haviam pactuado, inclusive com ele. Não foi isso, Deputada Flávia? A SRª PRESIDENTE (Flávia Morais. PDT - GO) - É. Inclusive, hoje vai haver eleição para escolher a chapa dos membros da comissão do impeachment. A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco/PT - RN) - Pois é. É um escárnio o que esse homem está fazendo. É de se perguntar o que é que a Justiça também vai fazer, porque isso tem que ter um limite. E nós só podemos lamentar que, infelizmente, setores da oposição, no jogo do vale-tudo, obcecados pela ideia do poder pelo poder, se prestem a se aliar a um homem como o Sr. Eduardo Cunha, para promover os ataques que estão promovendo. Eu tenho muita esperança de que isso não prosperará. Não é possível que, depois de 50 anos, em plena democracia, nossa geração vá viver um momento de ruptura democrática. Então, a sociedade está reagindo - inclusive, a mulherada, se Deus quiser. A SRª PRESIDENTE (Flávia Morais. PDT - GO) - Obrigada, Senadora. Nós vamos encerrar. Antes, eu queria registrar duas perguntas que chegaram pela web, que nós não vamos responder agora. Peço às expositoras que respondam depois, via web, até porque nós vamos ter que concluir esta reunião. A primeira pergunta: "Vocês conhecem o aplicativo Ipenha?" Essa pergunta é da Paula Bento. A assessoria vai assegurar que vocês deem a resposta. A outra pergunta é para a Elisa Silva: "Quais os dados de mulheres que ficaram deficientes e que ganharam a ação regressiva no INSS?" Se for possível, Elisa, depois, você pega o contato e responde, também por e-mail. Antes de encerrarmos os trabalhos, eu proponho a aprovação das atas desta reunião e da reunião anterior. As Srªs Deputadas, os Srs. Deputados, os Senadores e as Senadoras que concordam permaneçam como se encontram. (Pausa.) Aprovadas. As Atas serão encaminhadas à publicação. Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada a presente reunião. Agradeço a presença de todos. (Iniciada às 14 horas e 30 minutos, a reunião é encerrada às 16 horas e 37 minutos.) |
