Notas Taquigráficas
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| R | O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) - Bom dia a todos! Havendo número regimental, declaro aberta a 7ª Reunião Extraordinária da Comissão de Educação, Cultura e Esporte da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura. A presente reunião atende ao Requerimento nº 11/2016, da CE, de autoria do Senador Fernando Bezerra Coelho, para realização de audiência pública destinada a debater a Base Nacional Comum Curricular. Dando início a nossa audiência pública, solicito à secretária da Comissão que acompanhe o convidado para tomar assento à mesa. O convidado de hoje é o Sr. João Batista Araujo e Oliveira, Presidente do Instituto Alfa e Beto (IAB). Por favor. Informo que a audiência pública tem a cobertura da TV Senado, da Agência Senado, do Jornal do Senado, do Diário do Senado e da Rádio Senado e contará com os serviços de interatividade com o cidadão Alô Senado, através do 0800-612211, e e-Cidadania, por meio do portal www.senado.gov.br/ecidadania, que transmitirá, ao vivo, a presente reunião e possibilitará o recebimento de perguntas e comentários aos expositores via internet. Como é de praxe aqui, nesta Comissão, convido o Senador Fernando Bezerra para presidir esta reunião. Antes de mais nada, quero dar as boas-vindas ao Presidente e dizer que tenho certeza de que esta audiência pública terá grande importância e relevância para o momento que estamos vivendo na educação do nosso País. Muito obrigado pela presença. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Fernando Bezerra Coelho. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - Sr. Presidente, Senador Romário, eu queria, mais uma vez, agradecer pela distinção e deferência de poder presidir esta audiência pública quando estamos recebendo aqui o Prof. João Batista Oliveira, profundo conhecedor da educação em nosso País que tem acompanhado esse debate em torno da Base Nacional Comum Curricular. Era para o Prof. João Batista ter estado presente na audiência pública que realizamos na semana passada, mas, em função de imprevistos de ordem pessoal, ele não pôde se fazer presente. Assim, combinamos, com o apoio desta Comissão, de remarcar a sua presença aqui, na Comissão de Educação do Senado Federal, para a manhã de hoje. Quero também agradecer a presença da Senadora Simone Tebet, que tem grande interesse sobre esse tema. Esta é a terceira vez que realizamos, no âmbito desta Comissão, audiência pública para tratar da Base Nacional Comum Curricular e ter, mais uma vez, a oportunidade de ouvir importantes especialistas, conhecedores e interessados no tema. Prof. João, só para o seu conhecimento, em 11 de novembro do ano passado, realizamos a primeira audiência pública para tratar de temas com integrantes do Movimento pela Base, um grupo não governamental de profissionais e pesquisadores da educação que, desde 2013, trabalham para facilitar na construção de uma base de qualidade realizando debates, estudos, pesquisas e investigando casos de sucesso de diversos países. Na semana passada, estiveram presentes representantes do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), do Conselho Nacional de Educação (CNE), do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) e da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), bem como o representante do Ministério da Educação (MEC). O texto inicial do que será a Base Nacional Comum Curricular foi apresentado em 16 de setembro do ano passado, pelo Ministério da Educação, e, desde então, está aberto a sugestões de qualquer cidadão que se interessar em contribuir na construção de nosso currículo. De acordo com a página do MEC, já foram recebidas mais de 10,3 milhões de contribuições à proposta inicial. Tenho certeza de que essa iniciativa irá contribuir de forma decisiva para a melhoria dos indicadores educacionais no nosso País. Sei que ainda há alguns ajustes a serem feitos, e, por isso, achei por bem realizarmos mais uma audiência pública e, se preciso, quantas mais forem necessárias para tratar desse tema. Temos hoje aqui a oportunidade de ouvir o Dr. João Batista Araújo e Oliveira, que é PhD em pesquisa educacional e Presidente do Instituto Alfa e Beto (IAB), que está engajado em contribuir com a construção do nosso currículo comum. Antes de passar a palavra ao Prof. João Batista, informo que a audiência tem a cobertura da TV Senado, da Agência Senado, do Jornal do Senado, da Rádio Senado e contará com os serviços de interatividade com o cidadão Alô Senado, através do telefone 0800612211, e através do e-Cidadania, por meio do portal www.senado.gov.br/ecidadania, que transmitirá, ao vivo, a presente reunião e possibilitará o recebimento de perguntas e comentários ao expositor via internet. Com a palavra o Prof. João Batista Oliveira. O SR. JOÃO BATISTA ARAUJO E OLIVEIRA - Muito obrigado. Sr. Presidente, Senador Romário, Senadora Simone, é com grande prazer que eu venho a esta Sala João Calmon, esse ilustre batalhado da educação que, pela primeira vez, há algumas décadas, me trouxe aqui para tratar desse assunto permanente. Vou falar pouco para dar mais tempo para a gente conversar e gostaria de começar por dois pontos. Primeiro, infelizmente, Senador Bezerra, não compartilho do seu otimismo em relação à contribuição que esse trabalho da base que vem sendo feito eleve realmente a melhoria da educação, e vou justificar isto. |
| R | Em segundo lugar, a razão disso é que nós, no Brasil, temos dado muita asa à semântica, ao uso das palavras. Palavras tão caras à educação, como currículo, não são usadas, e nós inventamos palavras para desconversar a respeito de coisas importantes. Uma das palavras mais maltratadas nesse processo, mas não apenas nesse, eu acho, é a palavra debate. Acho que, se há algo que não houve até hoje nessa base curricular, foi debate. O debate existe quando você confronta ideias com as pessoas que as defendem, e até hoje não sabemos sequer quem são os autores dessas ideias. Então, para mim, se algo não houve em relação à base, foi debate. E, sem debate, como V. Exªs, aqui, nesta Casa, bem sabem, as coisas não avançam. Basicamente, o tema que me parece importante para a consideração desta Casa e do País é a questão do processo, da legitimidade do processo. Nós hoje vivemos, no Brasil, várias outras circunstâncias em que, diante do debate de questões importantes da Presidência, do Presidente desta Casa e muitas outras, se discute o tema, sim, mas se discute o processo do tema. O processo, quando não é legítimo, invalida a substância. O meu questionamento é que o processo de encaminhamento da base curricular não é legítimo - ele é legal, mas não é legítimo - porque não segue os parâmetros, os ditames internacionalmente conhecidos e reconhecidos como parâmetros para se fazer um currículo, além de não seguir coisas óbvias, como dar nome às coisas, informar devidamente a sociedade, etc. Então, a ideia de que há dez milhões de opiniões assusta, muito mais do que ajuda. Não é assim que se faz um currículo. Isso não é um jogo de plateia. Isso é algo que tem fases, e, em alguma fase, sim, tem de se ouvir um grande público, mas estamos longe dessa fase. Então, espero convencer V. Exªs de que há um atropelo de legitimidade e, quem sabe, levar às instâncias devidas essa consideração, para que isso seja recomeçado de onde se deve começar. Obviamente, eu compartilho com todos da ideia de que o País precisa ter um currículo. Acho que a palavra usada no mundo inteiro é currículo ou programa de ensino, não há razão para neologismos, e há razões pelas quais as pessoas não gostam de usar essas palavras. Um programa de ensino estabelece o que a Nação espera de seus cidadãos no futuro, e um currículo se faz, também, em concerto com o País diante do mundo. Todo dia o conceito de estado ou nação é colocado em questão, a cada dia mais somos globais, e é impossível, hoje, se pensar num processo educacional, num projeto educacional e num currículo sem se levar em conta a inserção de qualquer país dentro do concerto internacional. Portanto, parâmetros internacionais, tanto para fazer currículo quanto para aferir a sua validade, que é o Pisa, têm de ser levados em conta quanto a gente trata dessas questões. E nada disso foi levado em conta. O currículo, obviamente, deve ser ensinado, deve dizer o que deve ser ensinado em cada nível, em cada série, deve ter uma definição dos níveis, tem uma estrutura e uma sequência, tem um tempo, tem uma realidade, que são as escolas e os professores, e tem que prever uma transição, que vai afetar na formação dos professores, no trato com os professores atuais, na produção de livros didáticos, nos processos de avaliação. Nada disso foi levado em consideração. Nada disso foi pensado. Depois, também faltou o ritual pelo qual essas coisas foram feitas e faltou, como falta até hoje, transparência. Vou entregar a V. Exª e a esta Comissão uma lista de quatro páginas de perguntas que não foram feitas e não foram respondidas. São perguntas básicas que me parecem importantes para dar transparência. Quais são as questões que, a meu ver, são fundamentais antes de se começar um currículo? A primeira coisa é levar em conta o sistema escolar. Este sistema escolar que temos, que hoje tem uma educação infantil, um ensino fundamental, um ensino médio e um ensino superior lá na frente, uma formação profissional, é assim mesmo ou precisa ser questionado? É para esse sistema, que não funciona, que nos coloca entre os piores lugares do Pisa, que expulsa do ensino médio 40% dos alunos, segundo o qual apenas 9% dos alunos das escolas públicas adquirem os níveis mínimos no ensino médio, que a gente quer montar um currículo? Ou antes de montar um currículo, a gente tem que pensar nesse sistema? |
| R | Essa pergunta não foi discutida, como se isso fosse irrelevante e como se, ao promulgar um novo currículo, a gente não estivesse engessando um passado que pune violentamente camadas expressivas das populações, especialmente os jovens que chegam até o ensino médio. Isso não foi discutido. Não é que não foi levantada a questão; não houve debate antes de se pensar no currículo. Não houve - e a própria forma do currículo mostra isso - uma orientação sobre a articulação entre os níveis. Qual articulação? Entre a educação infantil e o ensino fundamental, entre o ensino fundamental e o ensino médio, entre o ensino médio e o mundo do trabalho e a universidade. Nada disso foi pensado, nada disso foi debatido, e fazer um currículo sem debater é levar ao fracasso e ao desatino, como o caso dessa proposta que vem por aí. Outra coisa importante, já no nível mais técnico, mais fundamental: de que tempo estamos falando? Estamos falando de 800 horas por ano, estamos falando de 1.200 horas por ano, de tempo integral para que níveis? Sem falar nesse tempo, como alguém que vai fazer um currículo de português ou de matemática vai saber que carga alocar para se fazer qualquer coisa? Falou-se... Coloco o "se" porque essa frase não tem sujeito. Os documentos não são assinados, ninguém os assume... Ao entregar o documento à Nação, o então Ministro escreve que esse documento não é do MEC. Está escrito. Embora o site mude toda hora, falta transparência, falta documentação... Mas, quando não se diz o que é o tal dos 60% ou o que são os 40%, ou quando não se discute previamente o que é e por que é preciso, ou não, ter tempo opcional... E, depois, qual a relevância desse tempo opcional? É ter a opção para o aluno, é ter opção para a escola, é ter opção para o sistema de ensino, é ter opção para a região? Qual a razão de ser disso? Quer dizer, opção não é uma ideologia: temos que ter opções. Não é assim que se discute. Qual a razão de ser? Como é isso nos outros países? Como é isso no mundo globalizado? O que falta aqui é se entender o papel da escola e a articulação da escola entre o particular e o universal. Quer dizer, o particular é onde as pessoas vivem, é onde as pessoas estão; o universal é onde a educação pretende levar as pessoas. Se a educação não tem clareza da sua função e dessa dialética, dessa articulação, ela não sabe a que veio, como esse documento que se chama de base curricular não sabe a que veio. Ao não termos discutido antes e ao não ter o Ministério da Educação, que tem o poder legal de dirimir e de decidir sobre essas questões, nós demos, entregamos a um conjunto de pessoas, que não sei bem quem são bem quem são, a tarefa de fazer algo sem rumo. Então, o resultado que nós temos e que foi objeto de alguns comentários bastante rigorosos no pouco espaço que isso teve na imprensa mostra que chegamos a lugar nenhum. A outra questão é, parece-me, um caso de imperícia profissional, aquilo que os americanos chamam de malpractice. Um país que, há 40 anos, se recusa a discutir o assunto, de repente, quer fazer um currículo para todas as séries, todos os níveis, todos os graus. Quer dizer, no mínimo, é falta de humildade, mas, certamente, é falta de prudência. Nós não temos o hábito, a maioria das pessoas que participaram das comissões para fazer os currículos são pessoas que, até anteontem, falavam mal, falavam contra. Como é que, de um momento para outro, você adquire uma competência para fazer algo que, em sua vida histórica, no seu passado, no seu discurso, na sua prática, você disse que não funciona, que não serve para nada? |
| R | Há, aí, um caso, a meu ver, de imperícia por parte do Ministério da Educação na condução desse processo. E, mais, um processo açodado. Um currículo se faz durante muito tempo, durante muitos anos, requer muita discussão. Ele não se faz com prazo de dois meses. Quer dizer, acreditar que, realmente, a comissão foi nomeada no dia que está lá no Diário Oficial e entregou um documento dois meses depois é impossível. Dois meses não seria tempo suficiente para se fazer nem a revisão editorial. É impossível! Quer dizer, existe alguma mentira. Existe alguma história não contada por aí, algo que teria sido feito antes ou feito ao lado ou que não foi feito, porque não dá para acreditar. No entanto, ainda que tenhamos tido esse... Vamos imaginar que, de repente, o País ficou eficiente, que se conseguiu que inúmeros grupos coordenassem todo mundo e fizessem dentro da mesma orientação.... Não é assim que se faz! Ainda que houvesse uma explicação plausível, não se faz assim. Outra questão sobre a qual não houve debate, e aí não é culpa do Governo, mas da ausência da sociedade civil, da ausência da imprensa, da ausência da oposição, da ausência das elites do País, é a forma de se fazer. Quer dizer, a forma como foi feito o currículo é a forma como o País vem sendo governado, a forma de um Estado aparelhado. É exatamente igual. É a forma pela qual foi aprovado o PNE, esse PNE dos 10% impossíveis. Quer dizer, será que já não estamos cansados, será que a sociedade, ainda que com dificuldade, já não está dando sinais de que não é essa a forma como o Brasil quer ser governado, a forma de um Estado aparelhado, de um Estado em que só vale um lado? Quer dizer, se não fosse isso, não haveria nenhuma explicação para o currículo de História. O currículo de História, de que todo mundo fala, porque teve mais publicidade, reflete a total imersão ideológica como o ponto de partida. No entanto, isso ninguém discute e é igualzinho nas outras partes do currículo. Isso não foi debatido. Nem o Consed, que é um órgão um pouco mais esclarecido, onde há, pelo menos, um mínimo de espaço de oposição, onde há governadores que parece ser de oposição, nem discute essas questões. Então, a sociedade é que parou de debater, que renunciou a discutir. E, agora, aqui, esta voz de João Batista, que tem a cabeça pronta para ser cortada e colocada na bandeja, está trazendo à reflexão de V. Exªs. Quer dizer, o Brasil está cansado dessa forma de se conduzir as coisas, a sociedade passa por um momento difícil, em que, certamente, o tema não terá tido a importância que deveria ter na imprensa e tal, mas como é que se explica que nenhuma universidade do País tenha aberto um debate sobre o tema? Nenhuma! Como é que se explica isso? Como é que isso passa em branco? Como é que pode haver, em uma sociedade democrática, o processo do assunto mais polêmico do mundo, que é o caso do currículo de qualquer país, e ninguém questionar? Quer dizer, não se questiona porque há o aparelhamento dessa instituição para que não haja debate. Isso não pode ser ingênuo. Não se pode engolir isso a seco. Alguém tem que chamar o reitor e perguntar: "Escuta, reitor, não vai promover um debate?" Ninguém é contra? Ninguém tem opinião diferente? Todo mundo é como carneirinho? Todo mundo vai mandar a sua informação lá para o escaninho, para o e-mail do MEC, e ninguém vai saber o que se vai fazer com aquilo? Não é possível que ninguém esteja enxergando que há um processo total de aparelhamento, de manipulação, em que a sociedade, caladinha, só tem como espaço mandar um e-mail para algum lugar onde não sabe o que vai acontecer com as suas opiniões, não é? E, obviamente, temos aí, dos meus colegas da comunidade acadêmica, uma omissão culposa, com raríssimas exceções. Provocados, sobretudo, a partir daquele artigo que eu escrevi lá no Estado de São Paulo, um ou outro começou a dizer: "Ah, é mesmo! Quem sabe? Isso não pode!". Alguns falam com mais contundência, outros, com menos contundência. Então, Senador, eu quero caracterizar, com isso que eu disse até aqui, que esse processo pelo debate da Base Nacional não houve. Há um processo de imperícia, pois a forma como foi feita não é uma forma reconhecida na comunidade internacional para se fazer um currículo, e, portanto, essa questão deve ser recolocada na sua base, que é a base zero. O segundo ponto, e serei breve, é o debate. Quando eu digo que não houve debate, é porque não houve. Quer dizer, o debate teria havido se, primeiro, houvesse uma proposta geral e fossemos discutir os princípios dela, o que não houve isso, ou se, ainda, os autores de cada parte, que a gente não sabe quem são, nem quem é o responsável por tudo, se apresentassem: "Eu sou o autor e vim aqui debater. Quais são as opiniões?" Não houve isto, em nenhum lugar. Houve aqui uma conversa ou outra, informal, etc. A SRª MARTA SUPLICY (Bloco Maioria/PMDB - SP) - Pela ordem, Sr. Presidente. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Fernando Bezerra Coelho. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - Pois não, Senadora Marta Suplicy. A SRª MARTA SUPLICY (Bloco Maioria/PMDB - SP) - Eu gostaria de saber se eu já poderia ir intercalando algumas perguntas aqui. O SR. PRESIDENTE (Fernando Bezerra Coelho. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - Ele está dizendo que vai encerrar daqui a cinco minutos justamente para estimular o debate. A SRª MARTA SUPLICY (Bloco Maioria/PMDB - SP) - Então está bem, porque... (Falha na gravação.) O SR. PRESIDENTE (Fernando Bezerra Coelho. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - V. Exª será a primeira a indagar. O SR. JOÃO BATISTA ARAUJO E OLIVEIRA - Eu vou abreviar. Só para concluir, Sr. Presidente, quero dizer que debate é outra coisa. Debate é as pessoas se exporem, e se exporem com o fim de chegar à verdade. Não é para ninguém ganhar, para ninguém perder, nem para haver consenso. Isso é debate, e não houve isso. E a prova de que não houve avanço é que esse pessoal que se dedicou no Movimento pela Base apresentou uma proposta bem educada que, basicamente, está dizendo "isso que vocês fizeram é uma porcaria". Quer dizer, esse é o grupo que mais tentou influir e que não conseguiu sequer influência. Então, não houve confronto, não houve debate, e, certamente, essa não é a forma. Então, concluindo, eu acho que aquilo que cabe a V. Exªs fazer, se acatarem as minhas provocações aqui, é denunciar a imperícia desse processo como um processo inaceitável, um escárnio, uma ofensa à sociedade brasileira, à educação, e propor que se comece de novo, com base naquilo que nós sabemos a respeito de como se faz um currículo. Eu acho que o Brasil merece isso. Agradeço muito a V. Exª por esta oportunidade. O SR. PRESIDENTE (Fernando Bezerra Coelho. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - Muito obrigado, Prof. João Batista. Certamente, teria sido instigante se a audiência pública da semana passada tivesse podido contar com a presença de V. Exª, tendo em vista que nós ouvimos um lado dessa discussão - ouvimos os representantes do MEC e os representantes de algumas instituições, como a Undime e o Consed - que aponta numa direção contrária à que o Prof. João Batista aqui discorreu. Mas eu resumiria essa fala do Prof. João Batista dizendo que é uma provocação à Comissão de Educação do Senado para que nós possamos nos posicionar em relação a esse tema, que é tão importante para o futuro da educação brasileira. Com a palavra a Senadora Marta Suplicy. A SRª MARTA SUPLICY (Bloco Maioria/PMDB - SP) - Primeiramente, quero parabenizá-lo, Senador, por esta audiência. Infelizmente, não pude estar presente na do Governo, mas vou vê-la pela internet. Eu tinha três questões. A primeira é um pouco distante do assunto, mas eu tenho a curiosidade de saber a opinião do Sr. João Batista Oliveira sobre o seguinte: quando esteve aqui, na nossa Comissão, o ex-Ministro Mangabeira Unger, ele apresentou uma posição sobre currículos que eu achei interessante, porque era uma diminuição de currículos - pois ele achava que tudo ficava muito genérico, superficial - e era o contrário do que hoje se propõe. São menos assuntos e maior aprofundamento, mais liberdade para o aluno pesquisar e caminhar por outras direções. Eu gostaria de saber a sua opinião. Outra questão: aqui nos deram, por parte do Gabinete da Liderança do Bloco de Apoio ao Governo, uma... Eu estava vendo um documento que foi dado, distribuído agora, que não bate com o que V. Exª está falando, porque diz que a formulação da Base Nacional Comum Curricular tem como destaque a pluralidade das propostas. Esse documento que nos entregaram agora é do dia 31 de julho de 2015. Então, já é um documento de vários meses. Não é um documento de dois meses, que se publica no Diário Oficial e daí a dois meses sai uma proposta. E o documento diz que o portal da Base Nacional Comum, lançado na quinta-feira, dia 30 de julho de 2015, é um espaço virtual de participação para agregar ações e informações e permitir interação entre os interessados em elaborar um documento de referência para a educação básica. Quer dizer, coloca-se como um portal aberto. E aí diz que o Secretário de Educação Básica do Ministério, Manuel Palácios, destacou a pluralidade na formulação da proposta da Base Nacional Comum - isso foi o que me intrigou - que está sendo redigida por representantes de 35 universidades e dois institutos federais de educação, ciência e tecnologia e professores das redes públicas estaduais dos 26 Estados e do Distrito Federal indicados pelas secretarias estaduais de educação. Os gestores das redes públicas estaduais também estão indicados pelas secretarias, e, segundo o Secretário, é um grande pacto entre os entes federados. E diz que o portal é uma ferramenta para a construção democrática da Base Nacional Comum Curricular com ampla consulta à sociedade. Então, vai na direção oposta do que o senhor colocou. Eu queria saber o que significa isso. |
| R | Além disso, eu gostaria de fazer outra pergunta. Fui Prefeita de São Paulo e tomei muito cuidado para colocar nas nossas bibliotecas, principalmente nas 21 que foram criadas nos CEUs e nas outras também, uma bibliografia escrita por negros e sobre negritude, sobre África e tudo mais. De indígena, não. Foi uma pena não ter acoplado. Essa foi um pouco a nossa preocupação. Eu tinha a preocupação de como trazer mais esse contexto na formação do nosso aluno, porque, se nós fomos pensar - esse talvez seja o mergulho ideológico que foi dado -, mais da metade da população brasileira é afrodescendente. Eu gosto, o senhor provavelmente goste, a Senadora Simone, a Senadora Regina e o Senador Bezerra gostam de uma comida com muita influência afro, assim como a nossa música e a nossa dança. Portanto, nós somos um povo com uma marca afro extremamente forte. Isso é o que nos caracteriza, até internacionalmente, quando falamos do samba e tudo mais. Então, não é fora de propósito. O que é fora de propósito é o jeito com que está sendo proposto. Então, eu queria saber como o senhor faria essa inserção de uma forma que conversasse mais, porque pelo jeito isso não funcionou. Eu não o conheço, mas, como está aqui no Senado, a convite do Senador Bezerra, deve ser um grande especialista. Como faria a inserção disso tudo que estou falando de uma forma que não ignorasse que somos um povo também formado pelo ocidente? Nós temos que ter essa formação também na nossa juventude muito forte, visto que a outra metade da população brasileira também descende de ocidentais e de asiáticos. Por favor. O SR. JOÃO BATISTA ARAUJO E OLIVEIRA - Vou começar pelo mais fácil, que é a proposta do Ministro Mangabeira. Independentemente do mérito da proposta, de concordarmos ou não com ela, ali havia um processo honesto. O Ministro escreveu no jornal: "Vamos conversar." Ali havia o debate, e eu podia discordar dele. Ele convidou grupos heterogêneos de especialistas que não eram só das universidades federais ou do Pacto Federativo, mas também da sociedade, da comunidade, e que discordavam. Ele os chamou. Ali havia um processo, independentemente de eu gostar ou não das ideias dele ou dele. É assim que se faz. É necessário alguém que assuma uma ideia e proponha: "Vamos conversar. Vamos debater." Ali havia um processo. Obviamente, há um detalhe. A ideia de haver menos coisa e mais profundidade é muito melhor do que haver mais coisa em profundidade. É obvio. É um caminho, sim. Mas o que estamos discutindo, o ponto que eu levanto aqui é o do processo. Ali, sim, havia um processo. Talvez ele não tivesse a legalidade formal, a legitimidade formal, mas tinha - embora não tenha continuado - a capacidade de fazer, porque é um homem que vem de uma comunidade acadêmica realmente inserida no contexto real da vida acadêmica. O segundo ponto, sobre o qual vou me estender um pouco mais, refere-se àquilo que o MEC diz e àquilo que acontece. Quer dizer, se olharmos as datas, é muito estranho. Há várias maneiras de analisarmos isso. Vou dar só um exemplo para a senhora entender bem como a desconversa atrapalha a conversa. Quando o pessoal desse núcleo pela base fez uma proposta de sessenta nomes para o MEC para compor a comissão, o MEC só aceitou três. Mas, ao olhar as datas, é possível ver que essas três pessoas já estavam na comissão, que foi criada antes. Então, alguém tem que dizer ao País o que aconteceu de fato. Quando começou isso? Quando as pessoas foram convocadas? Quem escreveu os documentos? Como as pessoas foram convidadas? Outra questão: o fato de ser das universidades federais - permita-me dizer, se estiver alguém presente me ouvindo - não legitima nada. Eu vou dar apenas um exemplo. Há poucos meses, poucas semanas, fiz uma apresentação na Academia Brasileira de Ciências, em que examinei a questão da base curricular na área de ciências, e tenho o documento, que vai ser distribuído e apresentado a V. Exªs. |
| R | Ao assumir essa tarefa, eu fui aonde um pesquisador vai, que é nas referências publicadas, e identifiquei os 87 programas de pós-graduação em ensino de ciências no Brasil. Isso é um absurdo! Devia haver 5 ou 6, bons; nós temos 87. E fui pegar, nos últimos cinco anos, todas as publicações dos professores, dos alunos e as teses. Como se faz em um trabalho dessa natureza, você lê o resumo, o abstract, e aí vai se interessar por aqueles que têm mais peso e analisar. Eu peguei, desses militantes, os 500 que poderiam ter alguma promessa, fui ver cada um e, a partir daqueles, os que tinham alguma ideia que podia ser alguma coisa. Na fritada dos ovos, eu identifiquei seis artigos que podem ser considerados artigos científicos. Quer dizer, o fato de ser da comunidade acadêmica não significa que é científico ou que é acadêmico. O sujeito se vale de onde está, se vale de revistas que não têm qualquer critério para provar artigos e publica alguma coisa. Isso não é carreira científica, isso não é ciência. A ciência tem seus critérios, seus procedimentos. Então, o que temos aqui são pessoas pagas pelos cofres públicos, travestidas de pesquisadores, mas que não têm honrado o seu compromisso de fazer pesquisas sérias que avançam no conhecimento. Quando se veem as bibliografias citadas, citam uns aos outros. Quando citam livro estrangeiro, citam "apud fulano de tal". Quer dizer, são pessoas que estão totalmente fora. Eu apresentei na academia assim: aqui está o estudo do Prof. Dernie, que é o maior entendido no assunto tal; aqui estão as pessoas que ele cita; aqui está o estudo da professora tal, brasileira, e as pessoas que ela diz que são especialistas da área. Não havia nenhuma superposição entre os nomes. Quer dizer, como pode haver uma comunidade que se diz científica e que não é internacional? Então, o fato de ser das universidades federais não significa, infelizmente, que estamos em boas mãos. O fato de ser articulação do Pacto Federativo também não significa que é assim que se faz currículo. Nós temos oito ou nove Estados que fizeram currículo. Um horror! Quer dizer, nós tomamos isso como o estado da arte. Quando a gente faz benchmarking, quando faz parâmetros em qualquer área de atuação, vê o melhor que há no mundo. É assim que se compete na sociedade globalizada, Exª. Aqui, não; a gente pega o pior que há e parte daí como se isso fosse bom, porque é o que temos. Ora! O Brasil merece mais. Outra coisa: professor participa de currículo? Sim, mas lá na frente. O professor participa de um currículo, depois que um currículo está elaborado, para dizer o seguinte: isso aqui passa; isso aqui dá para engolir; isso aqui um menino de terceiro ano entende. É nessa hora que entra um professor. O professor não é formado, tipicamente, ele não tem a formação, a base para poder participar de uma coisa nesse momento. É lá num outro momento. Como a sociedade também. Então, o Brasil, a pretexto de que tudo é participativo, de que todo mundo vem, quer substituir isso pela verdadeira forma de diálogo e busca de liberdade na comunidade acadêmica, que é o debate científico. E este não houve. E não houve em nenhum momento. E as pessoas que estão lá, pelas críticas que vieram do próprio movimento da base, se foram incompetentes, não foram reconhecidas como tal. Deixe-me só, Senadora, dizer de uma área que lhe é cara, que é a da educação infantil. A área da educação infantil. O que fizeram na área de educação infantil é uma barbárie. Com o conhecimento científico que nós temos hoje sobre educação infantil, ler uma proposta daquelas, que não tem uma referência bibliográfica - é tudo apócrifo, é tudo psicografia -, é uma afronta às crianças brasileiras. Quer dizer, nós temos um avanço científico brutal e uma proposta assim: "ah, é preciso brincar com as crianças; o processo é lúdico", como se isso fosse um embasamento para a gente poder recolocar o Brasil nos trilhos na educação. Então, Senadora, em relação à segunda pergunta, eu digo: tudo que eles estão dizendo aí é uma grande verdade e é uma enorme mentira. O terceiro ponto - serei breve - é a questão da cultura. Qual é a função da educação? Serei breve. O assunto é longo, e eu serei breve. A função da educação é dar ao indivíduo a condição de recuperar aquilo que seus antepassados fizeram, entender criticamente aquilo e contribuir para avançar. É isso. Nem todo mundo vai contribuir com tudo, mas no mínimo vai contribuir como ser produtivo na sua sociedade. Então, ao negarmos, quer dizer, ao termos um currículo em que era possível, como foi, na história, negar de onde viemos, mostra-se que quem estava conduzindo o processo não é do ramo, não tem a mínima ideia de para que serve a educação. Acho que isso prova a minha tese. Muito obrigado. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Fernando Bezerra Coelho. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - Eu vou oferecer a palavra, nessa ordem, à Senadora Regina, à Senadora Simone Tebet e ao Senador Lasier, que farão as três intervenções em bloco, e, na sequência, ao Prof. João Batista, para fazer os comentários, para que possamos otimizar o tempo, já que muitos Senadores aqui têm outros compromissos. Senadora Regina. A SRª REGINA SOUSA (Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Sr. Presidente, cheguei depois e não peguei toda a fala. Primeiro, há prejudicialidade por não estarem aqui os dois lados para serem confrontados, porque ele questiona muita coisa, mas não há ninguém aqui do MEC para responder. Mas, pelo que vi aqui e pelas informações que tenho, quero dizer que valorizo muito aquilo que vem da base. Acho que é importante o "chão da escola" discutir, o professor discutir, independentemente de ele ter um conhecimento maior, porque é ele que está lá no "chão da escola". Então, eu valorizo muito o "chão da escola" porque fui do "chão da escola" e sei o que é receber um pacote pronto que vem não sei de quem para eu ministrar para as minhas crianças. Eu sempre era considerada rebelde porque nunca fazia isso. Eu recebia textos racistas e, naquela época, nos anos 70 - eu era professora de crianças -, não os dava porque os considerava racistas. Mas eu os recebia de alguém, de uma coordenação pedagógica... Então, acho que só a tentativa de fazer discutir no "chão da escola" já vale. Nascer debaixo, para mim, vale mais do que um grupo de cima fazer, porque, quando o grupo de cima faz, o pessoal do "chão da escola" já fica inibido para mexer naquilo, porque já veio de uma intelectualidade... Então, acho que tem que ser nascido da base mesmo para, depois, alguém, um grupo... E há. A gente sabe que há. Não é possível que esse pessoal todo.... Eu queria até saber se o seu instituto participa ou só está fazendo uma análise? Ele está participando da discussão também? O SR. JOÃO BATISTA ARAUJO E OLIVEIRA - Não houve discussão. Não houve interlocutor. A SRª REGINA SOUSA (Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Sempre há um espaço. Pergunto se mandou alguma contribuição, porque há um comitê, há o Fórum Nacional da Defesa da Escola Pública, há um comitê formado por universidades, por especialistas... Pelo menos, essa é a informação que tenho. O SR. JOÃO BATISTA ARAUJO E OLIVEIRA - Não houve nenhum fórum em nenhum momento para as pessoas sentarem e discutirem. Nenhum. Não houve. A SRª REGINA SOUSA (Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Mas, pelo menos mandar a contribuição já valia, não é? O SR. JOÃO BATISTA ARAUJO E OLIVEIRA - Mandar a contribuição significa aceitar as regras do jogo, e o que estou tentando dizer aqui, neste plenário é que as regras do jogo são falsas. Esse jogo não se joga assim. A SRª REGINA SOUSA (Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Bom, é a sua opinião, mas eu acho que o fato de abrir para uma base participar já está bom. Se a base não participa, é porque estamos numa geração de amordaçados. O pessoal não se interessa. "Não, está pronto. Deixa alguém fazer. Eu não faço." Isto eu vivi na escola, eu vivi como professora, eu vivi como militante. As pessoas gostam da coisa pronta. E estamos vivenciando, pela primeira vez, alguém dar a ideia, porque eu que sei que a minha criança precisa conhecer os arredores do bairro dela. Eu recebia uma orientação que dizia para estudar a cidade. E, aí, dava-se tudo da cidade sem o menino conhecer nada da cidade. Eu, não. Eu pegava meus meninos, com meu dinheirinho fraco de professora, eu os colocava no ônibus e ia andar na cidade com eles. Aí, eu estava ensinando sobre a cidade para eles. Então, é a experiência de "chão da escola" pública. Já valoriza só o fato de estar abrindo... Infelizmente, eu sei que muita gente não participa, não quer dar opinião, e há muitas opiniões maravilhosas para serem dadas. Temos uma escolinha, numa cidade de 4,5 mil habitantes, que leva 90 medalhas na Olimpíada de Matemática. Então, o "chão da escola" tem muito a oferecer. Embora esse professor não tenha artigos publicados, não tenha livros publicados, ele está lá, como professor ou diretor de uma escola pública, conseguindo fazer milagres. Então, tem muito a contribuir o "chão da escola", sim. E, pelo que vejo no calendário, o texto foi colocado em setembro e ainda vão acontecer seminários regionais, seminário nacional... Pelo menos, é o cronograma que eu tenho. Isto até chegar à redação final, para apresentar ao Conselho Nacional de Educação. |
| R | Acho que precisamos criticar, sim, mas precisamos também apresentar. Não adianta ficar de fora criticando. Mandem lá suas opiniões para ver o que é... A gente respeita a intelectualidade, os cientistas, mas também há de se respeitar o saber popular, os saberes locais. Quem sabe o que acontece lá nessa cidadezinha de Cocal dos Alves é o pessoal de Cocal dos Alves. Eu não sei! Então, eles têm uma contribuição a dar. Por que os meninos de lá aprendem matemática com facilidade? O que realmente eles ensinam de matemática para esses meninos? O que é tão interessante assim que os faz aprender? Lembro-me que o que eu, como professora, recebia para passar para os alunos não tinha nada a ver com a vida deles. E eu, na minha rebeldia, ia mudando. Eu até colocava lá na caderneta, para não ser chamada a atenção, que eu fazia, mas eu fazia aquilo que achava que era bom, que iria influenciar na vida deles. Acho que é isso que o professor, na sala de aula, tem que fazer, aquilo que serve para a vida das pessoas. O SR. PRESIDENTE (Fernando Bezerra Coelho. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - Muito obrigado, Senadora Regina. Com a palavra a Senadora Simone Tebet. A SRª SIMONE TEBET (Bloco Maioria/PMDB - MS) - Obrigada, Senador Fernando Bezerra, a quem, antes de mais nada, gostaria de parabenizar pela iniciativa. Fazendo um adendo e até tentando colaborar com a Senadora Regina, quero dizer que, na realidade, já tivemos uma audiência pública a que o MEC veio, por solicitação da Senadora Fátima Bezerra, para fazer os esclarecimentos em relação à questão da Base Curricular Comum. É uma honra estar na presença de V. Sª, Prof. João Batista. Levei em consideração e fui anotando todas as colocações expostas por V. Sª e começo dizendo que lamento não estar preparada para fazer o debate. Eu entro agora na questão da Base Comum Curricular, talvez até - e aí já vai a primeira crítica - por ter faltado - aí comungo do pensamento de V. Exª - um pouco mais - e nós somos da Comissão de Educação, Senador Bezerra - não de divulgação, mas de entrosamento. Talvez tenha faltado, por parte do MEC, chamar para participar desse processo todos os entes que, porventura, possam ou poderiam estar envolvidos. Não vou discutir em relação ao conteúdo daquilo que está sendo discutido. Vou deixar essa discussão para momento posterior, até porque quero crer que não tenha aí qualquer tendência ou objetivo que não seja o de melhorar a qualidade do ensino no Brasil. Mas, se houver, como, por exemplo, conteúdos ideológicos, eu serei a primeira a ocupar a tribuna do Senado para me posicionar radicalmente contra o projeto ou a nova base que venha. Então, não vou entrar no mérito. Mas eu realmente comungo do pensamento de V. Exª, tenho muita preocupação com o que está sendo construído. Começo pela questão temporal. Fala-se em dois anos para se construir. Parece muito tempo de um lado e muito pouco de outro. Desde a promulgação da lei do PNE, em junho ou julho de 2014 - portanto, temos até o meio do ano... Pergunto: quando foi aberto o portal para sugestões? Não acredito que tenha esse ano e meio. Começamos a debater com a sociedade há três ou quatro meses, por mais que o MEC tenha tido a preocupação de escolher aqueles que irão ajudar. Mas, de qualquer forma, dois pontos só a serem colocados. Sem dúvida nenhuma, o currículo é a base de tudo, porque é a partir dele que levamos o conhecimento ao aluno. Isto é indiscutível! Acho que isto é o ponto inicial, e contra fatos não há argumentos. Há um dado muito claro. Tenho duas adolescentes, uma já passou do Ensino Médio e a outra está no Ensino Médio. E os números me assustam muito em relação ao Ensino Médio. Embora a grande preocupação nossa seja com a alfabetização, as nossas crianças chegam ao Ensino Fundamental 2 sem saber ler e escrever ou conseguindo ler, mas não conseguindo interpretar aquilo que leram, alunos do 6º ou do 7º ano. Tenho preocupação, inclusive, com a questão curricular do Ensino Médio: 13 disciplinas? Se um aluno não consegue assimilar mais do que seis ou sete por ano, o que dirá dez, onze, doze ou treze! Então, realmente, esta é uma questão que precisa ser debatida. É isso que estamos fazendo, mas precisamos realmente de mais transparência, de mais envolvimento e de mais debate. Não sei nem se não é o caso, em um futuro muito próximo, de prorrogarmos esse tempo aí, porque me assustou uma fala por parte do Governo. Eu não estava presente na reunião, mas fiquei preocupada quando soube que estão tentando agilizar para apresentar, até dois meses antes do prazo final, para o Conselho Nacional de Educação, para que, na data de comemoração do PNE, que é junho de 2016, possa ser dado - não foi esse o termo utilizado, mas é o que eu utilizarei - esse presente para a educação do Brasil". Quer dizer, como se dois meses... Como se antecipar para tentar agendar data para que seja coincidente com uma data comemorativa pudesse superar qualquer exigência de qualidade dessa base curricular. |
| R | E o segundo e último ponto que eu gostaria de colocar, concluindo em relação à questão do ensino médio, fechando essa questão, é que me preocupo muito com o que virá. Hoje, o que temos é um fosso muito grande, um abismo muito grande entre o conteúdo do ensino médio e a realidade do jovem, principalmente o da periferia e o das grandes cidades brasileiras. Vamos ver o que vem por aí, e estaremos debatendo esse assunto. Ouvi algumas críticas que foram colocadas, de que há falta de clareza, de que há falta de objetividade da base. Isso tudo pode até ser resolvido, mas não o pode o debate democrático. Preocupa-me ouvir praticamente só um lado no que se refere ao aspecto técnico, não àquilo que vem de informações e de colaboração das ruas pelo portal, que, realmente, é uma forma democrática de se atuar. Mas fico com uma frase de V. Sª que diz que, antes do currículo, temos que pensar o sistema. Com base nisso, a pergunta que faço é justamente a seguinte: será que não é hora de suspendermos, que seja por seis meses, esta discussão e tentarmos buscar uma saída anterior, que seria a questão da formação dos nossos professores, inclusive daqueles que estão fazendo a Base Comum Curricular? Tenho essa grande preocupação. Vamos fazer um bom currículo, ainda que saia alguma coisa excepcional... Não vejo como sair em tão pouco tempo, mas suponhamos que saia... Como é que está a formação desse professor, o mesmo professor que ajudou? Como vai ser o material didático? Como essas questões preliminares são resolvidas? Então, esta é a dúvida. E, aproveitando o vasto conhecimento de V. Sª, pergunto se não teríamos que, paralelamente ou antes, preliminarmente, ter uma base comum de formação dos professores neste País. O SR. PRESIDENTE (Fernando Bezerra Coelho. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - Obrigado, Senadora Simone Tebet. Com a palavra o Senador Lasier Martins. O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Muito obrigado, Senador Fernando Bezerra, a quem cumprimento pelo tema que deve ter seguimento aqui, na Comissão de Educação. Não pude pegar toda a manifestação do Prof. João Batista, mas a minha colega da assessoria já fez um resumo para mim. Eu queria saber, Prof. João Batista, bem objetivamente, como é que vamos sair dessa enrascada. Estamos vivendo, no País, uma profunda crise econômica, com contingenciamento em tudo que é setor, destacadamente na educação, a Pátria Educadora não passa de um rótulo falso, temos visto os constrangedores resultados dos exames das escolas de ensino médio, básico e universitário, temos, no País, um índice de analfabetismo funcional muito alto, e aí vem esse programa da Base Comum Curricular, que teria sido feito com vários defeitos, sem transparência e merecendo críticas por todos os lados. São editoriais em jornais, são artigos, são manifestações a todo instante denotando que a proposta não é boa. Então, estamos metidos numa situação muito difícil quando precisamos, para alcançar, para retomar a prosperidade neste País, que vive momentos tão ruins, começar pela educação. E, finalmente, o Governo se deu conta de que tem que começar por baixo, pelo alicerce, pela base, pelo ensino básico, o que se ouve dizer há muitos anos, quando, durante muito tempo, se gastava muito com o ensino superior e se descuidava com o ensino básico. E aí o senhor comparece também com um depoimento fortemente crítico. Foi por isso que lhe perguntei como é que vamos sair dessa enrascada. E faço-lhe uma pergunta, no desespero de uma solução, nos seguintes termos: será que não era de nos mirarmos em um ou outro exemplo internacional que deu certo? Por exemplo: embora seja um país que tem um quarto da nossa população e ser, há 30 anos, um país economicamente inferior ao Brasil, a Coreia do Sul hoje está muito à frente de nós, sendo um dos países mais adiantados em tecnologia, em inovações, etc. Nossos professores são mal pagos, desestimulados... Então, procurando um atalho, porque não há tempo a perder, não seria prático buscarmos um bom exemplo de quem desempenhou e teve sucesso, não seria prático nos mirarmos em quem deu certo, para ganhar tempo? Aí invoco esse exemplo. Quem sabe poderíamos ir lá para ver como eles fizeram. |
| R | Outro dia, li um artigo de um jornalista gaúcho que foi à Coreia do Sul ver como eles fizeram e trouxe de lá três pontos destacados. Em primeiro lugar, a verba para a educação básica é muito alta. São 7% da arrecadação do país, que tem 50 milhões de habitantes, só para a educação básica. Lá, professores ganham, como salário mínimo, o equivalente a R$4.500, no começo de carreira, podendo a chegar a R$14 mil no topo. Em terceiro lugar... O SR. JOÃO BATISTA ARAUJO E OLIVEIRA - O senhor está falando dos orçamentos de Brasília. É o que os professores ganham aqui. O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Bom, cumprimento. Lá na minha região, o Rio Grande do Sul, é lamentável o que ganham. Por isso, estão em greve todos os dias. O ano letivo começou anteontem... O SR. JOÃO BATISTA ARAUJO E OLIVEIRA - Aqui também há greve. O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - ... com greve. E tem sido assim todos os anos, em um Estado, Prof. João Batista, que, nos anos 70, estava em primeiro lugar em educação no Brasil e hoje está em oitavo. Quer dizer, o descalabro é completo. Então, nessa reportagem que o jornalista gaúcho fez sobre quando foi lá, há um ano e pouco, ele falou, primeiro, na verba governamental para a educação básica, no salário dos professores e na intensa participação dos pais na comunidade escolar. Bom, são exemplos. Então, resumindo e pedindo perdão pelo alongamento da pergunta, não seria o caso de nós buscarmos um exemplo pronto, já que aqui está esse embaralho total? Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Fernando Bezerra Coelho. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - Muito obrigado, Senador Lasier Martins. Vou, agora, oferecer a palavra ao Prof. João Batista para fazer as considerações sobre as intervenções que aqui tivemos, mas também quero já deixar uma sugestão com o Prof. João Batista. Eu acho que a virtude está sempre no meio. Nós estamos, aqui, tendo a oportunidade de constatar que a Base Nacional Comum Curricular é um instrumento muito importante para que possamos aprimorar os nossos indicadores educacionais. O que se discute é a forma como está sendo construída essa Base Comum Curricular e o prazo que foi dado para podermos atender a essa demanda que está explicitada no Plano Nacional da Educação. Eu acho que fica bastante evidenciado que nós precisaríamos fazer o verdadeiro debate que o Prof. João Batista reclama que não ocorreu. Esta Comissão de Educação poderia promover mais uma audiência pública, dessa feita para um embate e um debate, em que tivéssemos, de um lado, a visão crítica de como a Base Comum Curricular está sendo implementada pelo lado do MEC... Poderíamos convidar o Ministro Aloizio Mercadante e um representante daqueles que apoiam a estratégia que o Governo escolheu para implementar a base e, de outro lado, chamar dois representantes daqueles que têm uma visão crítica em relação a essa base. E acho que, como fruto desse debate e desse embate, a Comissão de Educação poderia mediar uma proposta que pudesse merecer o apoiamento da Comissão, do Plenário do Senado e do Congresso Nacional. Parece-me que tudo está a indicar que é importante dar sequência ao trabalho iniciado, mas é importante não ter pressa e ter humildade para fazer as revisões de algumas posturas e de algumas atitudes. |
| R | Então, fico muito feliz que a gente tenha acumulado as informações que aqui recebemos das duas outras audiências públicas e fico animado para que a gente possa sugerir ao Presidente e aos membros da nossa Comissão que a gente vá para uma próxima audiência pública, para que a gente possa vivenciar esse embate democrático, esse debate construtivo, para que a gente possa, quem sabe, através desta Comissão, mediar um encaminhamento para que a gente possa construir uma proposta da Base Nacional Comum Curricular que possa, de fato, corresponder às nossas expectativas de ser um instrumento de construção de uma melhor educação para os nossos jovens. Com a palavra o Prof. João Batista. O SR. JOÃO BATISTA ARAUJO E OLIVEIRA - Muito obrigado. Eu vou começar pelo fim e volto ao fim. Eu acho que a virtude não está no meio, mas na ordenação entre meios e fins. Isso é que é virtude, não é qualquer coisa. Eu vou começar pela ordem das intervenções, pela questão do "chão da escola". É óbvio que tem que haver debate, agora um ordenamento no debate, o que é debatido com quem. Quando você pega um país como o Brasil... Em nenhum país do mundo se começa a fazer currículo discutindo com o professor. Não é isso. Essa ideia é equivocada. Agora, pega o caso do Brasil. Você acumulou, por essas várias razões que o Senador Martins falou... Quer dizer, há pessoas que estão na escola que não deveriam estar lá. Eu vou fazer protocolos médicos e ouvir o médico clínico que está no interior há 20 anos ou vou ouvir os melhores médicos? Como é essa história? É diferente na educação? Então, essas coisas têm que ser pensadas com muita seriedade, não com demagogia. Tem que haver, sim, consultas, as pessoas têm que ser, sim, ouvidas. A outra questão que ela menciona... Quer dizer eu recebi um artigo que era ofensivo, etc. A função do professor é mediar o mundo com a criança. O mundo é o que ele é, o mundo não é o que a gente gosta que seja. A criança saber se Machado de Assis era preto ou não era preto é bastante irrelevante para gostar de Machado de Assis ou deixar de gostar. Agora, se ela souber que era preto, ela vai valorizar muito mais uma cultura se souber que o primeiro presidente da Academia Brasileira de Letras era um negro. Então, tem que dosar essas questões. Não pode ser essa questão racial discutida com tanta leveza, sem ignorar o papel de cada um dentro dessa cadeia de transmissão da cultura, de análise da cultura. Quanto às observações da Senadora... Bom, aqui entramos no processo. Quer dizer, fazer currículo tem a ver com outras questões. Tem a ver com livro didático, tem a ver com a formação de professores, tem a ver com avaliação. Você não pode fazer uma coisa sem pensar nas outras, o que já foi levantado aqui. O próprio Senador levantou essa questão. Outra coisa: ela tem um ritual. É aí que eu questiono a legitimidade. O ritual de se fazer currículo é um ritual que é seguido nos vários países, e aqui não tem atalho. E quem faz currículo é quem entende do assunto. Você tem que ter quem entende de desenvolvimento de criança, tem que ter quem entende de desenvolvimento cognitivo, quem entende do conteúdo, quem entende da ciência, da estrutura da ciência... Tudo isso tem um processo de escolha. Quando eu leio os currículos feitos na Irlanda, na Inglaterra, na Austrália, eu conheço pelo menos a metade das pessoas. Nunca fui lá, mas conheço pela literatura. Não conheço ninguém daqui, e milito nessa área há 50 anos. Quer dizer, não é assim, não pode ser assim. Essas coisas têm rituais, e esses rituais têm um processo. Isso não é objeto de democratização. Isso é um objeto de fazer as coisas... Quer dizer, o governo eleito é democrático para tomar as decisões dentro de processos, não de fazer democracia direto o tempo todo com coisas que não são objeto de democracia direta, mesmo porque essa democracia direta no Brasil está absolutamente instrumentalizada. Então, só ingênuos acreditam que essas coisas se fazem de maneira aberta. Quanto às questões da Senadora Simone, não há como não concordar. Quer dizer, obviamente, tem que ter tempo, tem que ter transparência... Mas ela toca na questão do Ensino Médio, que é um dos gargalos cruciais. Quer dizer, obviamente, não se pode falar em discutir currículo sem discutir, antes, Ensino Médio. Quer dizer, vamos continuar a ter esse Ensino Médio suicida que nós temos no Brasil, que trucida a juventude, ou vamos fazer como o resto do mundo faz, que é diversificar o Ensino Médio, dar opções para as pessoas? Isso tem que ser discutido. A evidência está aí em todos os sentidos. Você olha a estrutura salarial. Quem termina o Ensino Fundamental ganha X, quem termina o Ensino Médio ganha Y e quem fica no meio do caminho ganha menos do que X. Quer dizer, nós estamos punindo as pessoas ao colocá-las num currículo errado no Ensino Médio. A sociedade está sendo punida. As pessoas estão sendo punidas. E estamos falando de legiões de pessoas. Isso tem de ser discutido. Não se pode fazer o currículo antes. |
| R | Então, essa é uma questão do ensino médio, sim; é uma questão que tem de anteceder a discussão curricular. Precisamos discutir formação de professores antes e depois. Quer dizer, as coisas têm de ser discutidas. O mundo é redondo. Se você mexer em qualquer uma dessas coisas, você vai ter de pensar nas outras. Tem-se de começar por alguma. Acho que currículo é tão bom quanto formação de professores. No fim, só interessa o professor, claro. Nenhum sistema de ensino vai ser melhor do que a qualidade dos professores que estão lá. Mas não importa, se o assunto é currículo, vamos começar por aí. Mas tem de se levar em conta. Quer dizer, vou fazer um currículo para amanhã, vai ter de haver uma transição com os professores de hoje, mas tenho de me preocupar em formar os professores de amanhã, que vão dar esse currículo, porque, eu fizer esse currículo de hoje, pensando nos professores de hoje, vamos dar para trás. Então, essas coisas têm de ser pensadas. Não é preciso parar para falar numa coisa, mas se tem de pensar junto. A SRª MARTA SUPLICY (Bloco Maioria/PMDB - SP) - Posso fazer uma pergunta? O SR. JOÃO BATISTA ARAUJO E OLIVEIRA - Pois não. A SRª MARTA SUPLICY (Bloco Maioria/PMDB - SP) - Eu me interessei muito pelo que V. Sª falou sobre a formação, porque o que percebo é que o mais complicado não é nem o currículo, mas a péssima formação do professor, que vem hoje das classes menos favorecidas, que cursa faculdades que deixam a desejar e que não tem um instrumento para dar uma boa aula. Então, eu queria sair um minutinho, porque percebo que V. Sª estudou muito essa área... Quando penso em quando começa a alfabetização, depois da creche... O SR. JOÃO BATISTA ARAUJO E OLIVEIRA - A pré-escola. A SRª MARTA SUPLICY (Bloco Maioria/PMDB - SP) - A pré-escola. Esse professor me parece que teria de ser aquele em que investiríamos mais, no sentido de que, pela própria condição hoje da criança brasileira, da creche de que ela vem ou não ou da sua família, em que muitas vezes não entrou nunca uma letra, porque não entrou um livro, uma revista ou um jornal, ele precisa ter uma formação muito mais cuidadosa do que o de qualquer outra série, porque ali é o começo, é a alfabetização. Nós sabemos que isso... Na semana passada, nós discutimos aqui que o Governo está acabando com metade das bolsas nessa formação, o que é um desastre. A Comissão está se posicionando contra. Vamos ver se conseguimos impedir. Mas é ínfimo, ínfimo, o que eles estão formando. Era uma coisa muito boa fazer esse investimento na formação desses professores, mas também me pergunto sobre a realidade: o que qualquer pessoa que esteja num posto executivo de uma secretaria hoje pode fazer para que esse professor tenha disposição? Como introduzir uma melhoria na sua didática, na sua formação cultural, na sua experiência? O senhor já viu como isso pode ser feito na metade do caminho? Isso, porque vamos pegar o bonde andando. Nós vamos pensar um currículo que vai ser imposto em algum momento, mas e os milhares que já estão cursando? E a evasão escolar do ensino médio hoje, que é estonteante? O SR. JOÃO BATISTA ARAUJO E OLIVEIRA - Tem de haver uma audiência pública só sobre esse assunto. Vou roubar três minutos do meu tempo, em consideração à importante pergunta da Senadora, e voltar aqui ao nosso tema. Obviamente, a senhora tocou na questão central. Quer dizer, nós vamos começar a ter uma força de trabalho de professores boa, quando conseguirmos atrair para a Faculdade de Educação pessoas de nível adequado. Hoje não fazemos isso. Oitenta por cento das pessoas que vão estudar Pedagogia e 70% das que vão estudar Licenciatura têm mães com quatro anos de escolaridade, e quase todas são bolsistas. Ou seja, são pessoas que não tiveram na vida oportunidade. Nada errado com as pessoas. O que há de errado é que essas pessoas não são as de que o Brasil precisa para poder formar. Então, ainda que tivéssemos o melhor currículo do mundo para formar o professor, ele não iria... Mas também não temos. E não temos, porque o Governo não quer que tenhamos. Quer dizer, os currículos... O exame de fim de curso de professores é um teste de ideologia pura. É isso que temos nas faculdades de educação no Brasil há várias décadas. Então, é algo, realmente, em que o Brasil tem de pensar. A questão prática do secretário: o que fazer? Aí é uma questão de método, não é uma questão de conteúdo. Qualquer que seja o currículo, o que se faz quando o professor não tem condição de exercitar plenamente a profissão de professor é ajudá-lo, é dar a ele materiais mais organizados, mais estruturados, é acompanhar melhor. Essa é a forma. Agora, o que ele consegue também é limitado. Depois deste fórum, a gente pode conversar sobre isso, desde que a senhora passe a me chamar de você, não de V. Sª. |
| R | Senador, voltando às suas perguntas aqui, como sair dessa? Não tem atalho. Não tem um modelo único, mas nós temos uma semelhança muito grande entre os percursos dos vários países. Ou seja, há um protocolo, há uma forma de fazer currículo que nós podemos imitar, sim. Quer dizer, para qualquer coisa se faça em qualquer área do mundo hoje tem que se rever qual é a literatura científica pertinente no tópico e qual é o estado da arte, ou seja, quais são as melhores práticas. É isso que se tem que olhar. "Ah, um especialista está falando..." Não importa o especialista. Vamos ver o conteúdo. Como é essa história? Como é que se faz? Então, pega-se este trabalho que fala de currículo de Ciências. O que acontece? Existe um teste internacional sobre ciências chamado TIMSS, igual ao Pisa, que se aplica a crianças de 5º ano e 9º ano. Aí os cientistas, em face do resultado, vão ver: por que em um país se aprende mais assunto que o outro? Por que esse sabe mais do que o outro? A partir daí, as pessoas vão vendo uma coisa óbvia: se ensinar, tem chance de aprender; se não ensinar, não tem chance de aprender. Agora, para ensinar, tem que estar no currículo. Então, quando você tem a ideia de como é que formula um currículo, aí você vai ver como é a estrutura dessa disciplina? Ela tem uma estrutura, tem sequência. Matemática tem mais. Ciências, como é que é? Quer dizer, essas questões têm respostas na Ciências. As pessoas que fizeram os parâmetros curriculares não têm a menor ideia disso. Nunca leram essa literatura. Pelo que elas publicam, elas nunca leram. Não tem como fazer o curto circuito. Tem que trazer pessoas que conhecem essa história. Então começa como? Revendo a literatura, revendo a experiência internacional, com pessoas competentes, que gramaram isso, convidando pessoas do ramo ou nacionais ou de fora, se não tiver, para fazer esse trabalho. E aí propõem à sociedade: escuta, nós pensamos que o caminho é por aqui. Antes de detalhar o currículo. Quais são os princípios, como é a ordenação, o que nós vamos ensinar na pré-escola, o que nós vamos ensinar aqui e ali. É por aqui o caminho? É. Tudo bem. Então, agora vamos chamar pessoas que podem nos ajudar a desenvolver o currículo de acordo. Tem o processo devido. E esse processo dura tempo. Não tem como. Vai concordar todo mundo? Não! De jeito nenhum! Vão discordar. Vai haver brigas. Em países envolvidos, em todo o lugar em que você vê o documento, tem lá: nota final. Fulano de tal e fulano de tal participaram entendem, mas discordam disso. Isso é natural, mesmo entre os cientistas. Não é para ter consenso absoluto. Mas o processo tem que ser respeitado. As dissenções devem estar registradas lá. Você não faz isso com 10 milhões de palpiteiros. Quer dizer, essa é a forma de criar poeira. Essa é a forma de não fazer. Como você vai discriminar um cara que é bom de um camarada qualquer? Há hierarquia, há respeito, como há nesta Casa. Há o Senador, há o Deputado, há isso, há aquilo. Não é "casa da mãe joana", em que todo voto é igual. Não. Todo voto não é igual. Aqui nós estamos falando de coisa que tem conhecimento de causa. O sujeito não pode falar de currículo ou de estrutura curricular se ele não tem credenciais para discutir estrutura curricular. Então, onde estão as credenciais? Isso é que falta. Não vamos morrer por falta de currículo. Nós estamos sem ele há 40 anos. A avaliação tem suprido isso, o livro didático. Então, é preferível, e eu acho que a única forma é começar de novo, começar do jeito certo. E a minha sugestão, acolhendo aqui a sugestão de V. Exª - aqui, sim, V. Exª - em relação a promover esse outro passo, seria, antes de convidar, cobrar do MEC respostas a essas perguntas que eu lhe passei, porque isso pode ajudar a Comissão a esclarecer muitos desses pontos que estão obscuros neste debate. E eu me intrigo e falo para os meus colegas jornalistas que não entendo como nenhum jornalista no Brasil faz essas perguntas óbvias. Mas não fazem. O Brasil está absolutamente tampado mentalmente a respeito de qualquer debate. Nós temos que concordar. Nós temos que ser democráticos. Não, nós temos que ser honestos, e honestos com essa população a que a Deputada se refere, que não tem uma família que vai lhe dar condição boa. E, se o Poder Público não agir de forma competente, eles não terão futuro. Muito obrigado, Senador. O SR. PRESIDENTE (Fernando Bezerra Coelho. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - Muito obrigado, Professor João Batista. Eu acolho a sugestão. Eu acho que as perguntas que o Professor João Batista deixou para serem encaminhadas ao MEC foram distribuídas para os Srs. Parlamentares aqui. Então, vamos submeter aos Srs. Parlamentares e vamos, portanto... O SR. JOÃO BATISTA ARAUJO E OLIVEIRA - Não. São muitas perguntas. O SR. PRESIDENTE (Fernando Bezerra Coelho. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - Vamos, então, acolher a sugestão. Mas estou entendendo que, após as respostas do MEC, o Professor João Batista também está disposto a que a gente faça o embate e o debate, para que a gente possa, quem sabe, intermediar um encaminhamento para essa questão da construção da Base Nacional Comum Curricular. Com a palavra o Senador Lasier Martins. |
| R | O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Senador Fernando, o senhor, então, não vai encaminhar pedido por enquanto para que alguém do MEC venha aqui, talvez o Ministro? O SR. PRESIDENTE (Fernando Bezerra Coelho. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - A sugestão que o Prof. João Batista... Porque já tivemos aqui, nas duas últimas audiências públicas, representantes do MEC. A minha proposta é, atendendo à sugestão do Sr. João Batista, de encaminhar essas perguntas que ele deixou aqui... O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Ah, encaminhar as perguntas! O SR. PRESIDENTE (Fernando Bezerra Coelho. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - Nós vamos encaminhar por meio de um requerimento, que vai ser submetido à apreciação da Comissão na próxima reunião. Eu farei o requerimento, que poderá ser subscrito pelos Srs. Senadores. Aprovamos o requerimento e, na sequência da aprovação do requerimento, aprovamos um outro requerimento, que é a realização desse embate... O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Perfeito. O SR. PRESIDENTE (Fernando Bezerra Coelho. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - ... com a presença do Ministro da Educação... O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Perfeito. O SR. PRESIDENTE (Fernando Bezerra Coelho. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - ... e mais um representante daqueles que concordam com a implementação que está sendo conduzida pelo MEC. O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Está bom. O SR. PRESIDENTE (Fernando Bezerra Coelho. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - ... e dois outros convidados que vão fazer uma visão crítica, mais próxima da fala do Prof. João Batista, da necessidade de recomeçar... O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Perfeito. O SR. PRESIDENTE (Fernando Bezerra Coelho. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - ..., para ver se desse embate, podemos tirar uma solução, que foi aqui já, digamos assim, criticada pelo Prof. João Batista... Mas eu alimento a esperança de que, desse embate e desse debate, possamos intermediar um encaminhamento que valorize as posições colocadas. O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Bom roteiro, Presidente. Esse é um tema fundamental que temos a debater aqui, nesta Comissão, porque é esse projeto que está na berlinda. O SR. PRESIDENTE (Fernando Bezerra Coelho. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - Muito obrigado. Convoco os Srs. Senadores para uma reunião desta Comissão na próxima terça-feira, dia 8 de março, em caráter excepcional, às 11h30, para tratarmos da deliberação de proposições. Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada a presente reunião. (Iniciada às 11 horas e 12 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 26 minutos.) |
