Notas Taquigráficas
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| R | O SR. PRESIDENTE (Romário. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - RJ) - Bom dia a todos. Havendo número regimental, declaro aberta a 14ª reunião extraordinária da Comissão de Educação, Cultura e Esporte, da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura. A presente reunião atende aos Requerimentos nº 24, de 2015, da CE, de autoria do Senador Lasier Martins; 35, de 2015, da CE, de autoria dos Senadores Cristovam Buarque e Antonio Anastasia; 44, de 2015, da CE, de autoria da Senadora Lídice da Mata; 49, de 2015, da CE, de autoria do Senador Cristovam Buarque; 65, de 2015, desta Comissão, de autoria do Senador Paulo Paim; 73, de 2015, desta Comissão, de autoria dos Senadores Lasier Martins e Lídice da Mata; e 2, de 2016, desta Comissão, de autoria do Senador Lasier Martins, todos para a realização de audiência pública destinada à instruir o Projeto de Lei da Câmara nº 37, de 2013, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas e as condições de atenção aos usuários ou dependentes de drogas e para tratar do financiamento das políticas sobre drogas. Dando início à audiência pública, solicito ao Secretário da Comissão que acompanhe os convidados para tomarem assento à mesa. São eles o Sr. Luís Fernando Farah de Tófoli, Professor Doutor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp); o Sr. Ronaldo Laranjeira, Professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp); e o Sr. Sérgio de Paula Ramos, Médico Psiquiatra, especialista em álcool e drogas. Senhores, sejam todos bem-vindos! Informo que a audiência tem a cobertura da TV Senado, da Agência Senado, do Jornal do Senado e da Rádio Senado e contará com os serviços de interatividade com o cidadão, através do Alô Senado, pelo 0800-612211, e do Portal e-Cidadania, no endereço www.senado.gov.br/ecidadania, que transmitirá ao vivo a presente reunião e possibilitará o recebimento de perguntas e comentários aos expositores. Como nós fazemos de praxe nesta Comissão, quero passar a presidência desta audiência pública ao brilhante Senador Lasier Martins, um dos autores dos requerimentos. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Bom dia, Senhoras e Senhores, senhores telespectadores. Agradeço ao Senador Romário a indicação para presidir a reunião de hoje. Agradeço também a indicação para a relatoria deste Projeto de Lei nº 37/2013, da Câmara dos Deputados, onde passou por uma dezena de comissões, com vistas a alterar dispositivos da Lei nº 11.343, de 2006, e inúmeras outras leis menores que tratam do Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre a atenção aos usuários ou dependentes de drogas e tratar do financiamento de práticas e políticas sobre drogas. Como integrante da Comissão de Educação, presidida pelo Senador Romário, eu tive a iniciativa de requerer a realização desta audiência pública justamente para enriquecer o nosso relatório. Esta audiência será realizada em duas partes: a primeira, hoje, quando alguns ilustres convidados serão ouvidos dentro de instantes, e, na sequência, amanhã, quando teremos outro encontro também no mesmo horário, ou seja, às 10 horas. |
| R | Houve vários requerimentos para ouvida de especialistas. Nós não podemos atender todos os requerimentos, até por uma dificuldade financeira, pois há custos de passagens, estadias etc. Então, nós reduzimos a nove o número de convidados. Hoje deveríamos ouvir quatro, mas um dos nossos convidados, o Dr. Vladimir Stempliuk, ontem à noite mandou comunicar que estava impossibilitado de vir. Então, ouviremos os três convidados que já estão à Mesa e, amanhã, ouviremos mais cinco. Teremos também interatividade, isto é, nossos telespectadores, aqueles que acompanham pela Internet poderão nos enviar as suas perguntas. Na Câmara dos Deputados, este projeto começou em 14 de julho de 2010. De iniciativa do Deputado Osmar Terra, passou, como disse, por uma dezena de comissões na Câmara e foi votado e aprovado na Câmara em 28 de maio de 2013, entrando aqui no Senado em 4 de junho de 2013. Aqui, no Senado, já passou pela Comissão de Constituição e Justiça, onde foi relator o Senador Valadares, agora está aqui na Comissão de Educação e, daqui, sairá para mais três comissões: a de Assuntos Econômicos, a de Assuntos Sociais e a de Direitos Humanos. Portanto, pelo que se vê desse retrospecto, é uma das propostas de lei mais discutidas no Congresso Nacional nos últimos tempos, em razão do grande envolvimento social. Então, nós vamos propor aos nossos eminentes convidados um tempo de 20 minutos para a exposição de cada um. Depois, partiremos para as perguntas, que são inúmeras, tanto as que têm chegado aqui como aquelas que pretendemos formular, bem como aquelas que vão surgir no andamento das dissertações dos nossos convidados. Então, desde logo, agradeço muito a prestimosa colaboração desses ilustres professores e doutores, que vão nos ajudar muito na formulação desta lei que já vem da Câmara e que, se for o caso, aperfeiçoaremos aqui, no Senado. Pretendemos, com a colaboração de tanta gente bem preparada, apresentar ao País uma das melhores leis a respeito de drogas. Então, anuncio, com muito prazer, a primeira participação do Dr. Luís Fernando Farah de Tófoli, Professor da Universidade de Campinas, Faculdade de Ciências Médicas, Departamento de Psicologia Médica e Psiquiatria. O Dr. Luís Tófoli foi indicado pela Senadora baiana Lídice da Mata. Dr. Luís Tófoli, por favor, fique à vontade. O SR. LUÍS FERNANDO FARAH DE TÓFOLI - Em primeiro lugar, quero agradecer, cumprimentando o Senador Lasier, o Senador Romário, todos os presentes, todas as presentes também, por esta oportunidade de poder falar a vocês nesse contexto e trazer contribuições para o aperfeiçoamento ou a discussão desse projeto de lei que, como o Senador já falou, embora venha sendo bastante discutido, trata de um tema palpitante, um tema que está prestes a ser discutido, inclusive no contexto das Nações Unidas no mês que vem e tem suscitado diversas posições, posições que muitas vezes têm sido apaixonadas a respeito desse tema. Tenho tentado, sempre que o analiso, olhar o que consigo encontrar de literatura científica para poder justificar o que vou afirmar para vocês. Essa literatura científica que - é preciso frisar -, embora eu seja psiquiatra, é importante que seja eminentemente interdisciplinar. Ela deve ler da medicina, mas também deve aprender com o direito, com as ciências sociais, com a toxicologia, enfim, com diversos campos onde as drogas se envolvem. É nesse contexto que vou trazer a apresentação para vocês. |
| R | Gostaria de comentar, inicialmente, que é a primeira vez que sou traduzido em Libras na minha vida. Acho isso particularmente emocionante. O contexto da inclusão - e vamos ver que algumas questões sociais de inclusão também estão vinculadas ao contexto das drogas - me toca. E aí, nesse sentido, já faço uma pequena provocação e reclamação pela ausência de mulheres na mesa. Infelizmente, não tivemos aqui nenhuma mulher presente, mas, enfim, vou pelo menos tentar trazer aqui uma questão vinculada à política de drogas que toca o campo das políticas para as mulheres também. Bom; então, quero já começar essa fala a partir de um ponto de partida que é, no meu entendimento, indiscutível. Nós não precisamos discutir isso hoje, ou seja, o fato de que drogas causam danos - drogas lícitas e drogas ilícitas. Elas têm o potencial de causar malefícios às pessoas. Então, em nenhum momento, vocês vão me ouvir procurando minimizar o impacto negativo que as drogas podem ter nos indivíduos e na sociedade. Vou centrar a minha apresentação em um ponto específico, que é o que eu tenho estudado mais profundamente, e é onde eu entendo que eu posso contribuir mais para essa discussão. Mas gostaria de apresentar a vocês alguns dos elementos de propostas de transformação nas leis de drogas do mundo, no sentido de relaxar algumas das amarras que têm sido colocadas a respeito dessas leis. Então, a gente teria um primeiro princípio, esse já em vigência no Brasil, que é a despenalização, a ausência de pena de privação de liberdade para um delito, que é o caso do porte de drogas para uso. No Brasil, está despenalizado; em teoria, ninguém é preso por conta de porte de drogas. Vamos ver um pouquinho mais adiante que não é bem assim, mas é mantido como crime. Essa é a discussão, inclusive, que está em foco no Supremo Tribunal Federal, ou seja, a discussão sobre o art. 28, que é o que considera crime o porte de drogas para uso, mesmo que não tenha pena de reclusão de liberdade; há outros tipos de penas alternativas. Outra proposta é a da descriminalização, que é a ideia de que o porte de drogas para uso deixaria de ser crime. Porém, tráfico de drogas continuaria a ser considerado um crime. A descriminalização nada mais é do que considerar que o usuário de drogas não é um criminoso. Essa é a ideia básica por trás dessa discussão. Há propostas da regulamentação pela legalização. A ideia, advogada por um determinado grupo, inclusive do qual eu faço parte, é de que, para algumas drogas, possivelmente, a regulamentação pela legalização pode minimizar os danos maiores do que pela condição de criminalização como está agora, mas eu não vou discutir isso hoje. E a outra é a do uso medicinal de substâncias psicoativas. A que está em voga, que está maior discussão atualmente, é a maconha. Também não vou abordar esse tema, a menos no finalzinho e muito brevemente, apresentando alguns dados de uma pesquisa a respeito da opinião dos Parlamentares. Mas, depois, a gente pode discutir o assunto nas perguntas. Quando falamos de descriminalização, todo mundo que já estudou um pouco sobre o tema lembra de Portugal. Isso começou em Portugal. Pelo menos se discute isso quando se ouve falar que a descriminalização, ou seja, deixar de considerar o usuário um criminoso, começou em Portugal, a partir de 2001. Não é bem assim, porque, na verdade, algumas drogas já estavam descriminalizadas em alguns estados americanos, e o Uruguai nunca chegou a criminalizar o uso de drogas. Mas a verdade é que, atualmente, nós temos um grande número de países que já tomaram essa medida, seja por via parlamentar, seja por decisão das suas cortes supremas. Há um número grande de países, basicamente da Europa e da América Latina. Então, eu queria começar com uma pergunta, focando já na descriminalização: qual seria o impacto negativo? O que a gente poderia esperar de negativo a partir da descriminalização do porte das drogas para o uso? E é disso que eu estou falando. Aqui, a gente tem um dado do Relatório Europeu sobre Drogas, de 2011, onde se marca com essa barra vertical o ano em que se mudou o status legal ou aumentando a quantidade de penalização para o porte, ou reduzindo, em diversos países da Europa. Olhando a voo de pássaro, o que a gente pode perceber é que, aqui onde houve a redução de penas, como no Reino Unido, na Grécia, em Portugal, na Finlândia, a prevalência do uso, especificamente da maconha, quer dizer, as taxas do uso de maconha, no ano anterior à pesquisa, não variaram. |
| R | Então, no tocante, pelo menos, ao que a gente tem visto a respeito da maconha - e isso se sustenta em outros dados -, não parece haver uma influência nem no sentido de aumentar, nem no de diminuir. Então, quem disse que a descriminalização vai diminuir a frequência também não está correto. O que se observam são flutuações, que são previstas inclusive. E não encontramos nada que possa indicar, em termos de políticas e dados nacionais, algo que corrobore que o consumo aumentou. Nas Américas, se olharmos pontualmente, a média do uso de maconha e de cocaína no ano anterior... Nos países que criminalizaram ou descriminalizaram, não existe uma relação muito direta. Nos países que criminalizaram, há mais uso de maconha e um pouquinho menos de uso de cocaína no ano anterior; e, nos que descriminalizaram, há menos uso de maconha e um pouco mais de uso de cocaína. Isso serve para reforçar a ideia, que já mencionei para os senhores e as senhoras, de que não parece haver uma relação profunda nem no sentido de aumentar, nem no de diminuir. Se não diminui, já é uma tranquilidade sabermos que, até onde os dados estão disponíveis, ele não aumenta. Muito se fala de Portugal. Dependendo do ano que se analisa, pode-se dizer que aumentou ou que diminuiu. A minha interpretação, com o decorrer dos dados ao longo da série histórica, é de que não há justificativa para se dizer nem que aumentou, nem que diminuiu. Os acidentes de carro são outra preocupação também. A descriminalização poderia aumentar o consumo e, com isso, aumentar o risco de acidentes com veículos automotores. Os dados dos países próximos da América Latina são de que não parece haver vinculação. Essa barra corresponde ao ano em que houve a descriminalização na Argentina, na Colômbia e no Chile, e não se encontra relação direta entre aumento ou diminuição do número de mortes por 100 mil habitantes. O que se pode falar da descriminalização a respeito da segurança? E da criminalização também? Primeiramente, precisamos ter consciência de que somos um país em que o ato vinculado ao consumo de drogas está eivado de violência. Temos um dado do Global Drug Survey, que é uma pesquisa feita pela internet no mundo inteiro - e mesmo que haja uma certa crítica por ser uma pesquisa feita pela internet -, em que é muito gritante a diferença do percentual de usuários de cocaína que relataram ter sofrido violência no momento da compra: de 28%, para um segundo colocado, a Espanha, com algo próximo de 8%. Essa violência está vinculada não só aos traficantes, mas também à polícia. Então, o processo de criminalização é associado, pelo que se consegue perceber, à violência. Não fiquemos só em dados brasileiros. Nós temos esses dados mexicanos. Em 2006, houve a militarização da guerra às drogas no México. Foi tomada uma atitude no sentido de se combater mais fortemente o tráfico de drogas naquele país e o que aconteceu, ao contrário do que se esperava, foi que o número de crimes associados a drogas aumentou e o número de crimes não associados a drogas também aumentou. Política de drogas é cheia desses dados paradoxais. Quando se pensa que, pura e simplesmente, o aumento da repressão vai melhorar a situação, diversas vezes isso não acontece. E é preciso olhar esses dados com frieza, com calma. Temos uma tendência, na América Latina, de aumento de penas mínimas para o tráfico de drogas. Essa é uma tendência do nosso continente. Vimos a soma das penas crescer desde 1950 até 2013. E eu quero lembrar que o projeto de lei em tela aumenta ainda mais. Esses dados dizem respeito ao que já temos, não ao que teremos. É preciso refletir sobre se essa é a melhor saída para se resolver a questão. Embora ela pareça muito óbvia, cada vez mais experts têm criticado - é claro que há também os que apoiam - esse tipo de medida. Um fato bastante claro é o aumento da população prisional brasileira. Desde 1990, quando havia 90 mil presos, esse número subiu, conforme os dados que tenho aqui, de 2012, para algo próximo de 550 mil pessoas, ou seja, meio milhão de pessoas encarceradas. Houve um crescimento muito maior do que o aumento da população brasileira, evidentemente, e com uma peculiaridade: um quarto dos detentos brasileiros está preso por tráfico de drogas, sendo duas a cada três mulheres. |
| R | Essa é uma questão extremamente importante. É por isso que já friso por que fiz essa ressalva em relação à presença de mulheres à Mesa. Então, claramente, o aumento da penalização no campo das drogas tem trazido um impacto na população prisional brasileira. Cabe perguntar se a prisão brasileira é o melhor lugar para se reabilitar uma pessoa, inclusive na questão das drogas, sabendo que, nas prisões brasileiras - este é um padrão nas prisões do mundo inteiro -, usa-se muita droga. Dados do Instituto Sou da Paz indicam o seguinte a respeito de uma amostra de presos por tráfico no Brasil em 2014: 94,3% dessas pessoas não pertenciam a organizações criminosas; 97% delas não portavam qualquer tipo de arma; 68% dos presos por tráfico de maconha foram pegos com menos de 100 gramas. Há de se considerar seriamente se, de fato, estamos prendendo traficantes. Há um dado que pode aprofundar um pouco mais a nossa reflexão a respeito disso. Estes são dados do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania, da Universidade Cândido Mendes, são dados do ano passado referentes a 2013: 1.330 pessoas que foram acusadas de tráfico na cidade do Rio de Janeiro neste ano foram acompanhadas pelos pesquisadores do projeto ao longo do tempo, para verificar qual era o desfecho, e, dessas pessoas, metade não foi presa por tráfico, metade foi considerada usuária e recebeu penas alternativas. Desculpem-me! O composto dessa outra metade era dos que receberam penas alternativas. Houve pessoas que foram simplesmente absolvidas. Houve outros encaminhamentos, mas, principalmente, houve os absolvidos e os considerados como usuários. Acontece que essas pessoas ficaram, em média, 221 dias presas provisoriamente até que se definisse se elas eram usuárias ou não. Isso significa sete meses de prisão. O cálculo da prisão indevida dessas 631 pessoas dá um custo de R$8 milhões. A sociedade brasileira está disposta a pagar esse custo? Não é só o custo financeiro, porque o usuário que fica preso provisoriamente junto com as facções criminosas se profissionaliza. Esse é um elemento que a gente deve levar em consideração também. Esse é um elemento sobre o qual devemos pensar quando se diz que não devemos mudar no Brasil por que isso já está despenalizado. Mas, se você for pobre e preto, há uma grande chance de você ficar ali por meses, até você receber a sua sentença de despenalização. Você fica preso para se descobrir que você não precisava ficar preso. Você foi preso por que você foi pego em local em que circulam traficantes. Há um monte de discussões. Quando são dados esses flagrantes, quem são as testemunhas? Não vou entrar nessa discussão, porque não sou do campo do Direito. Mas vale a pena olhar esses dados também. Eu sou do campo da Saúde. Eu queria lembrar outro aspecto importante, quando a gente fala de encarceramento, que é o risco do encarceramento para a saúde mental. É fato bem delimitado o de que o uso de maconha precoce e intenso na adolescência é um fator de risco para a psicose. Não vou colocar isso em debate. Podemos colocar em debate se a melhor forma de controlar isso é pela proibição ou não, se, no processo da proibição, os moleques não vão à biqueira e compram o quanto querem. Mas tudo bem, nem vou trazer essa discussão. O ponto é que o risco de psicose na vida é três vezes maior se a pessoa tiver feito uso de maconha em grandes quantidades na adolescência. E o risco para quem é encarcerado? Não surpreendentemente, isso não é muito pesquisado. Mas fizeram uma pesquisa (Jarrett e colaboradores), ou seja, há um dado britânico indicando que, na primeira semana de encarceramento, 3% dos pesquisados, no levantamento que eles fizeram, desenvolveram sintomas psicóticos. Isso significa 300 pessoas em cem mil. Isso é dez vezes o risco de alguém desenvolver um sintoma psicótico no ano inteiro. Vejam que eles têm dez vezes o risco em uma semana de desenvolverem um sintoma que é desenvolvido na população em geral no ano inteiro. Então, não é qualquer coisa. Assim como qualquer psiquiatra atendeu alguém que ficou psicótico por que usou maconha, qualquer psiquiatra atendeu pessoas que ficaram psicóticas por que foram presas. A gente não pode ignorar isso também. Temos de pesar os dois riscos e ver qual a decisão que devemos tomar diante desses dois riscos. Como a descriminalização afeta a saúde pública? Aparentemente, pelos dados que temos, se ela não aumenta consumo, não parece aumentar o número de acidentes de trânsito, onde é que está o impacto? Aí eu queria falar do impacto virtuoso, porque aí seria uma justificativa para a gente considerar seriamente essa possibilidade. |
| R | Quando o indivíduo deixa de ser considerado um criminoso, um indivíduo que faz uso de drogas, a discussão é a de que aumenta a chance de essa pessoa procurar o sistema de saúde, porque ele não corre risco. Muitas vezes esse risco é fictício; os usuários pensam que vão ser denunciados. Isso não é prática dos serviços de saúde, mas a criminalização aumenta esse risco. Quando alguém é pego com uso de drogas e é usuário - é importante que se fale disto também -, não é por uma medida mágica de descriminalização. É preciso também reforçar como o sistema vai acolher essas pessoas que forem identificadas como usuárias. Isso é muito importante. Portugal fez um belo trabalho, inclusive a taxa de transmissão do vírus HIV, por via de uso de drogas, caiu incrivelmente, como também houve queda na transmissão sexual de heterossexuais. Portanto, o impacto da descriminalização em Portugal... Lembrando que a droga mais problemática para eles é o uso de opioides injetáveis. Portanto, um risco muito grande de transmissão. Aqui, não é o nosso caso com o crack. O número de usuários injetáveis é bem menor. Mas isso mostra que, mudando uma série de medidas, tirando o usuário do papel de criminoso e o colocando no papel de usuário do sistema de saúde, isso pode ter impactos positivos. Outro dado que vale a pena compararmos em termos de Europa é o número de mortes induzidas por drogas por um milhão de habitantes. Temos em Portugal aquele número pequenininho ali. Eu gostaria de comparar, de frisar para vocês uma diferença que existe em um país bastante rigoroso, inclusive criminaliza os usuários, que é a Suécia, que tem aproximadamente quase 23 vezes o maior número de mortes por uso de drogas do que Portugal. Não necessariamente nós precisamos entender que isso tenha sido única e exclusivamente pelo processo de descriminalização. Não quero vender essa ideia para vocês, mas o que eu quero dizer para vocês é que o fato da descriminalização ter acontecido em Portugal não fez o número de mortes aumentar, e é bem provável que tenha reduzido. Portanto, como nós nos preparamos para uma política de drogas no século XXI? Por que estou usando o termo "século XXI"? (Soa a campainha.) O SR. LUÍS FERNANDO FARAH DE TÓFOLI - Porque saiu recentemente, na revista The Lancet Lance Psychiatry, uma das grandes e respeitadas revistas psiquiátricas do Reino Unido, um editorial dizendo que chegou a hora de sairmos do século XX, no campo das políticas de drogas, e chegarmos ao século XXI. É com dados desse tipo que eu gostaria de fomentar a reflexão de vocês. Dados que estou anexando a alguns desses documentos que estou apresentando para vocês. Eles estarão disponíveis junto com a apresentação no site. Já confirmei aqui com o pessoal da assessoria. Eu queria trazer para vocês as sugestões trazidas por um artigo de 54 páginas, publicado há poucos dias na revista Lancet, que se chama "Saúde pública e política de drogas internacional", com um grupo formado a pedido da revista Lancet pela Universidade Johns Hopkins e que faz uma série de recomendações na mudança de política de drogas. Antes de fazer essas recomendações, eles dizem o seguinte: "Políticas destinadas a proibir ou a suprimir fortemente as drogas apresentam um aparente paradoxo. Os formuladores de políticas dizem que elas são necessárias para preservar a saúde e a segurança públicas. Ainda assim, elas fazem aumentar direta ou indiretamente a violência letal, a incidência de doenças, a discriminação, a migração forçada, a injustiça e o enfraquecimento do direito do povo à saúde." Não sou que estou dizendo isso, mas um painel de especialistas da Johns Hopkins, montado pela Johns Hopkins. Eles fazem uma série de recomendações, entre elas: descriminalizar delitos menores, não só consumo e posse, mas eles chegam a falar da descriminalização de pequenas vendas de drogas - eu não estou entrando nesse ponto, estou falando apenas de consumo e posse; redução da violência associada ao policiamento das drogas, que se aplica principalmente em indivíduos de pele escura no Brasil; trazer a redução de danos como um pilar central para o sistema de saúde das políticas de drogas; tratar HIV, Hepatite C, tuberculose em quem faz uso de drogas, entendendo que essa população é majoritária para se fazer a prevenção da transmissão e da incidência dessas drogas; formular políticas de drogas que não sejam danosas às mulheres; tomar cuidado com a cadeia produtiva, que está envolvida na produção de drogas, ou seja, como é que nós resolvemos a questão de quando as pessoas param de cultivar uma dada planta para fornecer droga ilegal, ou seja, como substituir essa por outra opção economicamente viável; e outras discussões. |
| R | Meu tempo está curto, vou ter que avançar, mas quero dizer que existe necessidade de mais pesquisas sobre políticas de drogas no mundo, e não apenas no Brasil, e necessidade de trabalharmos com abordagens científicas de experimentos de regulação, como, por exemplo, no Uruguai ou no Colorado, e incluir saúde, direitos humanos e desenvolvimento nas métricas para se julgar os processos de políticas de drogas, e não somente a abstinência de drogas. Para concluir, o que pensam os Parlamentares brasileiros sobre o assunto? Rapidamente, eu vou mostrar. Para 200 Deputados foi perguntado se o usuário de drogas deve ser criminalizado. Se somarmos os que disseram "depende da droga" com os que disseram "não", o número chega a 80%. No caso dos Senadores, o número é ainda maior. Os Parlamentares brasileiros que responderam a essa pesquisa recusam a ideia de que o usuário de drogas deve ser tratado como criminoso. Esse é o ponto fulcral da minha apresentação hoje. Temos um documento que discute alguns dos dados que apresentei para vocês e que ficará disponível também. Ele foi apresentado ao STF. E vou concluir a minha apresentação lendo o parágrafo final do documento. Antes disso, quero apenas mostrar para vocês o número de Deputados que consideram que a maconha ou seus elementos químicos pode ter algum potencial terapêutico: mais da metade dos que responderam. E esse número é ainda maior se considerarmos os Senadores: quase o total dos 20 Senadores entrevistados sobre a opinião deles a respeito da maconha medicinal. Mas esse é um assunto para conversarmos depois, no momento do debate. Concluindo, eu queria dizer que o aumento da repressão não tem sido associado a respostas mais eficientes na América Latina no campo das políticas de drogas; tratar o usuário de drogas como criminoso é iníquo e ineficaz; e o impacto da descriminalização, segundo as evidências interdisciplinares, se existe, é positivo. As pessoas perguntam: "O Brasil está preparado para descriminalizar?". Eu penso que a pergunta deveria ser: o Brasil está preparado para assumir o ônus de uma política de drogas do século passado? E concluo lendo o nosso texto. Por fim, é preciso entender que a reiterada afirmativa de que ‘o Brasil ainda não está preparado para a descriminalização do uso’ se traduz em dizer que estamos preparados para sermos um dos poucos países sul-americanos que mantém, oficialmente, sanções de natureza criminal para usuários de drogas. Significa, ainda, ratificar a mensagem de que o usuário problemático de drogas é antes um criminoso do que alguém que pode ter a necessidade de cuidados à sua saúde. Significa, também, adotar uma postura que tem o potencial de gerar distorções no sistema de justiça criminal e, com isso causar impacto negativo para a saúde física e mental de nossos cidadãos. É isso o que queremos para este país? Fica a pergunta. Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Muito obrigado, Dr. Luís Tófoli, pela bela preleção com que nos brinda e por nos trazer também o roteiro da sua palestra, que vai ajudar muito a Comissão. Registro, com muito prazer, a presença também na Comissão do médico e Deputado Federal Osmar Terra, autor do projeto de lei na Câmara dos Deputados. Muito obrigado, Dr. Osmar Terra. Passo a palavra ao Dr. Ronaldo Laranjeira, médico psiquiatra, Coordenador da Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas na Faculdade de Medicina da Universidade Federal de São Paulo. O Dr. Ronaldo é PhD em Dependência Química, na Inglaterra, e é professor na Universidade Federal de São Paulo. A indicação foi minha, após uma pesquisa da nossa Comissão junto a outras autoridades no assunto, e houve unanimidade com relação à qualificação e ao preparo do Dr. Ronaldo Laranjeira para contribuir com os nossos trabalhos. V. Sª tem a palavra. O SR. RONALDO LARANJEIRA - Muito obrigado. Obrigado pela confiança e pela oportunidade de estar aqui. |
| R | Antes de fazer a minha apresentação, eu gostaria de discordar claramente do Dr. Tófoli em três aspectos. Eu ocasionalmente estive, na semana passada, numa reunião no Instituto Nacional de Saúde Americano, em dois dias, só para discutir maconha. A preocupação dos americanos em relação aos estados que legalizaram a maconha é surpreendente, porque todos os estados que legalizaram a maconha nos Estados Unidos aumentaram o consumo. Em Denver, no Colorado, quase 20% dos adolescentes estão entre os usuários de maconha. Aquilo que diziam: "Vão legalizar a maconha, vai acabar o tráfico", o tráfico, no Estado do Colorado, aumentou devido à legalização da maconha. Você pode falar: "Se legalizou, não vai haver mais tráfico", mas o tráfico vai continuar vendendo para menores de idade, vendendo maconhas mais fortes. Então, é uma grande ilusão, no meu modo de ver, a legalização ou até formas de descriminalização para resolver o problema. Não é o que está acontecendo nos Estados Unidos. Para mim, foi muito importante ter passado dois dias inteiros discutindo o impacto, nos Estados Unidos, dessas descriminalizações, especialmente das legalizações que ocorreram em alguns estados. Segundo que, quando você faz um inquérito na população brasileira - tive a oportunidade de fazer um estudo populacional que pergunta para a população brasileira se quer a descriminalização -, 90% da população brasileira não quer a descriminalização. Acho que estamos numa Casa do povo, é importante saber se qualquer pesquisa - eu fiz essa pesquisa, a Folha de S. Paulo fez a pesquisa - que foi feita e perguntar para a pessoa na casa dela se quer a descriminalização, todo mundo vai falar "não". O terceiro aspecto que eu gostaria de comentar antes de fazer minha apresentação é que está acontecendo nos Estados Unidos atualmente, com a legalização, o surgimento de novos produtos. A gente pensa em maconha, pensa no cigarrinho de maconha, mas, atualmente, o que está produzindo mais danos é o chocolate feito de maconha, pirulito feito de maconha, toda uma série de produtos, inclusive o cigarro eletrônico de maconha. Esse produto já existe, custa US$40,00. Você compra o cigarro eletrônico que contenha maconha e pode fumar maconha forte através de um dispositivo em que você vai poder fumar maconha indefinidamente. Então, acho, sinceramente, uma grande temeridade tratar a maconha como se fosse uma droga leve, o que já está acontecendo, porque não é uma droga leve, na maioria dos países, exatamente porque os produtos que estão sendo desenvolvidos de maconha são muito mais diversificados, com uma capacidade de produzir dependência muito maior. Aqui no Brasil, no meu modo de ver, por isso sou um grande apoiador desse processo, porque acho que não é uma lei retrógrada, pelo contrário. Quando a Organização das Nações Unidas for discutir, em maio, a mudança legislativa das leis, o País vai estar entre os países mais avançados; não vai estar com os países mais retrógrados. Tenham certeza disso. A UNGASS vai discutir a nova política mundial de drogas e nós vamos estar, tenho certeza disso, já participei de várias reuniões preliminares a essa reunião internacional, que, a princípio, iria mudar as leis com relação às drogas, mas vai mudar muito pouco, porque os países têm muito medo de mudar. Esses dados apresentados são dados muito erráticos. Se você quiser defender que descriminalizar as drogas é uma maravilha, você mostra; se quiser mostrar que a descriminalização produz um grande problema social, você também mostra. Então, acho que os dados não nos direcionam rumo a uma opção política. Nós temos que fazer uma opção política por um debate que já se estende há quase dez anos, no País inteiro. |
| R | Acho que esse projeto de lei já foi discutido à exaustão em todos os Estados brasileiros. Ele não é produto, sinceramente, feito só por iluminados; pelo contrário, é um processo... E eu admiro muito o Deputado Osmar Terra, porque realmente eles foram em todos os Estados para discutir esse problema. Então, não foi tirado da minha cabeça. Eu gostaria que fosse, mas não. (Risos.) (Intervenção fora do microfone.) O SR. RONALDO LARANJEIRA - Sim, organizações científicas. Foi uma parceria com toda a sociedade brasileira, e eu vejo com muito orgulho esse projeto de lei. Sou um grande entusiasta dele. O que vou mostrar aqui é inspirado nesse projeto de lei, e o que o Estado de São Paulo faz, especialmente na parte de tratamento. Nós podemos fazer uma ideologia aqui, podemos ficar só escutando ideologias, mas eu quero saber o que a gente faz com os usuários de droga, especialmente de crack, no Estado de São Paulo. Eu sou o coordenador no Estado de São Paulo, com muita honra - o Governador Geraldo Alckmin me indicou -, e o que eu vou apresentar é isto: o que nós fazemos lá com o dependente químico. (Procede-se à exibição de vídeo.) O SR. RONALDO LARANJEIRA - Para cada usuário de drogas, há quatro familiares envolvidos. Isso é o que nossas pesquisas têm mostrado. Então, nós não podemos falar numa política de drogas sem falar numa política de envolvimento dos familiares. Perguntem a esses familiares o que eles querem com a política. Então, uma das pedras fundamentais do Programa Recomeço é dar um apoio à família do dependente químico. O que é o Programa Recomeço? É um programa criado pelo Governo do Estado de São Paulo para o tratamento, ações de prevenção, reinserção social. Como ele atua? Ele atua a partir de ações articuladas entre os serviços de saúde, serviços sociais, formando uma rede de proteção ao dependente químico. Ele destina-se a todos os dependentes químicos, mas, no Estado de São Paulo, infelizmente, nós temos um grande número de usuários de crack. No Brasil, nós temos um milhão de usuários de crack. Eu não conheço nenhum outro país que tenha um milhão de usuários de crack. Então, nós temos de tomar muito cuidado quando falamos em descriminalização de drogas no Brasil, porque estaremos falando também de descriminalização do crack, por exemplo. Pois bem, o Programa Recomeço é uma série de ações, e vou falar rapidamente delas. Uma das primeiras ações é o Programa Rua Recomeço. Infelizmente, há uma quantidade significativa de usuários de crack que estão na rua. Na cidade de São Paulo, eu acho que é uma chaga social que nós temos, há anos e anos, que está lá nas ruas de São Paulo. |
| R | O que estamos fazendo? Como ter acesso a essa população de rua que vemos em todos os filmes? Isso existe, está lá. Mas o que nós estamos fazendo? Nós estamos colocando conselheiros de rua, na rua, que estão fazendo exatamente o que estão fazendo nesse vídeo: dois conselheiros de rua tentando convencer o dependente químico a se tratar. Não existe nenhum ato de violência no dependente químico. É um programa absolutamente, predominantemente, voluntário, em que você convence a pessoa que está lá perdida. É uma população muito doente. Nós estamos vendo que 25% dessa população que estão na rua têm sífilis. Eu não lembro de ter visto sífilis, não lembro se o Osmar... Eu não lembro mais - já estou ficando velho - de ter visto sífilis, mas 25% dessa população têm sífilis, 10% têm HIV. Então, é uma população altamente doente. Como é que você pode deixar essa população na rua? O Governo do Estado, ou o Programa Recomeço está querendo tirar essas pessoas da rua. Há pessoas grávidas usuárias de crack. Como pode se permitir que, numa cidade como São Paulo, haja dependente de crack grávida? O Programa Recomeço tenta resgatar essas pessoas da rua e levar para algum sistema de saúde, sistema de interação social. Há uma tenda lá, que foi inicialmente improvisada, e há uma série de atividade que tentam congregar esses dependentes químicos, visando que eles façam algum tipo de tratamento. Não é uma atividade cultural, com fim na cultura. O objetivo é que essas pessoas sejam tiradas da rua e vão para um sistema de tratamento. Nós estamos criando um prédio, bem na Rua Helvétia, bem no meio da cracolândia, que vai fazer uma linha de cuidados, onde vai haver internação para desintoxicação, moradia assistida. Desde que começou, mais de 6 mil usuários já foram cadastrados. O que fazemos? Além de fazer essa assessoria, por exemplo, as pessoas fazem a barba, tomam banho, fazem o pé - as pessoas que ficam na rua ficam com o pé em estado de miséria -, há uma academia de ginástica, que mais de 400 pessoas usam por mês. Então, é uma série de atividades de baixo conteúdo de saúde, mas que visa que essa pessoa transforme essa ação no tratamento. Nós internamos de 30 a 40 pessoas todos os dias. Elas recebem comida e tudo mais. Então, o Programa Recomeço da Helvétia visa a dar um primeiro cuidado a essa população de rua, com esses 80 agentes comunitários de que eu falei. Depois que você consegue, de alguma forma, convencer a pessoa a sair da rua, você vai fazer um sistema de desintoxicação na comunidade terapêutica. Nós temos um setor que se chama Cratod, que fundamentalmente funciona 24 horas por dia, 7 dias por semana. Há médicos - faz-se observação de um, dois dias -, há atendimento ambulatorial intensivo, há um Caps III o tempo todo, há urgência psiquiátrica 24 horas e há uma coisa que se chama Sede de Plantão Judiciário - que eu vou mostrar um pouco depois -, há essa internação, fazemos capacitação de toda a rede - depois eu vou falar um pouco mais. Há um plantão judiciário, com um juiz, membros do Ministério Público e da Defensoria Pública. Em alguns casos limites, você tem que discutir junto com os juízes, junto com o Ministério Público e com a Defensoria qual a melhor solução a ser tomada. Então, nós temos 6%, 7% das pessoas que fazem internação compulsória ou involuntária, mas junto com o sistema judiciário. Só o setor saúde não faz uma internação involuntária. Nós desenvolvemos 3 mil leitos. |
| R | Eu vou insistir neste aspecto: todo esse sistema é pago com o dinheiro do Orçamento do Estado de São Paulo, não vem um tostão do Governo Federal. Nós temos três mil leitos espalhados pelo Estado de São Paulo, uma parte, leitos de desintoxicação e uma parte de comunidades terapêuticas. A clínica de desintoxicação é uma clínica médica. Há um grande componente médico em a pessoa ficar duas, três, quatro semanas para fazer a desintoxicação. Nossa melhor clínica é lá em Botucatu, com piscina, quadra, uma estrutura significativa. Na cidade de Aparecida, nós fizemos uma nova clínica de desintoxicação, com 20 leitos. São unidades pequenas. Quer dizer, é uma unidade simples, mas com uma boa estrutura. Não há nenhum luxo. (Procede-se à exibição de vídeo.) O SR. RONALDO LARANJEIRA - Nós temos uma série de parcerias com as comunidades terapêuticas. Eu sou muito orgulhoso de ter parceria com o Instituto Padre Haroldo, que talvez seja a melhor comunidade terapêutica que há no Brasil. Nós temos 100 leitos que o Estado de São Paulo financia dentro da comunidade do Padre Haroldo. Realmente eu não conheço nenhuma outra comunidade que tenha essa estrutura feita com parcerias, feita com dinheiro não do governo, mas da sociedade como um todo. Talvez seja a comunidade terapêutica mais antiga que temos no Brasil e que permanece com o seu vigor. Está passando agora por algumas dificuldades econômicas, como todas, mas a parte terapêutica está muito bem. Há outras comunidades que julgamos modelos, como essa comunidade terapêutica no Bairral, lá em Itapira, que é uma fazenda de 100 alqueires transformada em unidade para 100 dependentes químicos que vêm direto da cracolândia para o que chamamos de comunidade terapêutica rural. Quando chegamos, as pessoas estão como zumbis, elas estão magras, deterioradas mentalmente. É essa população que nós pegamos para levar para essa comunidade terapêutica rural. São pessoas que estão absolutamente degradadas, jogadas na rua. Só para dar uma ideia do dia a dia dessa comunidade terapêutica, são 100 leitos, as pessoas têm atividades. (Procede-se à exibição de vídeo.) O SR. RONALDO LARANJEIRA - É importante saber que é do SUS pago pelo Governo do Estado de São Paulo. É importante salientar esse aspecto. (Continua a exibição de vídeo.) O SR. RONALDO LARANJEIRA - Mais de 60% das pessoas quando chegam aqui não têm nenhum contato com a família. Uma das coisas importantes que a comunidade faz é reatar o contato com a família por parte dessas pessoas que estão lá, para recomeçarem as suas vidas. |
| R | Se as pessoas que estão na comunidade terapêutica precisarem de cuidados médicos, eles vão utilizar o setor médico do Instituto Bairral de Psiquiatria. Para coordenarmos esses três mil leitos espalhados pelo Brasil todo, criamos uma Central de Regulação, que se chama Cross, para tentar otimizar e fazer com que esses três mil leitos não fiquem vazios. Não é uma coisa tão simples de se fazer, para se preencher isso, porque essa população é uma população dinâmica: ela vai para lá, fica lá por um tempo, depois de lá sai. A gente tenta otimizar isso através de uma empresa que se chama Cross, que a gente criou. Uma das unidades importantes - já estou acabando - é o que chamamos de unidades do Recomeço Família. Como falei no começo, para nós, dar atenção à família é uma coisa muito importante. Então, criamos 13 unidades de orientação familiar, com duas pessoas só, ou com uma psicóloga, com uma assistente social e com mais uma pessoa. Tentamos fazer parcerias com os grupos de Amor Exigente. Nem sempre é possível fazer isso em todos. Então, há isso em vários locais da cidade de São Paulo. Acho que está funcionando muito bem, para que a família possa receber uma orientação inicial, até para orientar quanto ao tipo de tratamento que a pessoa realmente precisa. Temos o Programa de Reinserção e Integração Social. A gente pensava que a maioria dessas pessoas que são internadas, principalmente, em comunidade terapêutica precisaria de uma profissão. A maioria delas precisa reaprender a escrever, por incrível que pareça. Então, elas precisam ter uma coisa muito mais básica para poder aproveitar o que a gente tem a oferecer no sentido da reinserção. Temos cem cursos de profissionalizantes. O curso com maior destaque é o de Panificação. Já fizemos vários cursos. A última coisa que vamos fazer é intensificar especialmente... Esse vídeo leva um minuto e já acaba. (Procede-se à exibição de vídeo.) O SR. RONALDO LARANJEIRA - Obrigado pela atenção. Só queríamos dar uma mensagem final: é possível criar um sistema de saúde que proteja o dependente químico. Isso não é fácil, se não protege todos. Obviamente, não estou querendo passar a ideia de que isso seja fácil. |
| R | A cracolândia de São Paulo continua viva. Mas é possível - é isto que estamos tentando fazer no Estado de São Paulo - criar um sistema de proteção que possa dar à pessoa na rua o tratamento e a reabilitação psicossocial, a reabilitação profissional. Acho que esse sistema de tratamento tem que ser feito. No Brasil, vai ter que ser feito isso. Vai custar dinheiro, vai custar profissionalização. É isso que espero que, no futuro, possamos estar fazendo aqui. Agradeço a atenção de todos. Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Muito obrigado, Dr. Ronaldo Laranjeira. Cumprimentos pelo trabalho. Vamos fechar, então, esta nossa rodada de hoje com o Dr. Sérgio de Paula Ramos, que é médico psiquiatra e psicanalista, com 40 anos de experiência no tratamento de dependências químicas. Doutor em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo. Também teve a minha indicação, que não foi difícil, por ser gaúcho, radicado em Porto Alegre, e um conceito extraordinário pela qualificação, pela eficiência do seu tratamento. Portanto, Dr. Sérgio, agradecemos também sua colaboração preciosa. O senhor tem a palavra. O SR. SÉRGIO DE PAULA RAMOS - Bom dia, Senador Lasier. Eu queria gradecer a honrosa indicação do meu nome. Bom dia, Deputado Osmar Terra, prezado amigo, e demais participantes desta reunião. Eu queria dizer que para mim é motivo de orgulho estar aqui hoje, porque o Senador Lasier disse que há mais de 40 anos estou trabalhando nessa área da prevenção e do tratamento. Finalmente, chegamos a um momento muito singular, porque acabou de ser extinto o financiamento privado de campanha. E a Lava Jato pretende ou promete terminar com o caixa dois. Como isso, momentaneamente, a indústria do álcool perdeu força. Finalmente, nós vamos nos sentar em igualdade de condições para tentar corrigir essa distorção, que é histórica e imposta pela indústria do álcool no Brasil, porque toda vez que se fala de drogas, finge-se que álcool e tabaco não são drogas, e é por elas que tudo começa. A minha apresentação estará baseada em dados. Antes de mais nada, quero dizer que, na forma da lei vigente, não recebo, nem recebi em tempo algum qualquer tipo de remuneração ou mesmo gratificação da indústria farmacêutica, bebidas alcoólicas ou da fumageira. Por oportuno, declaro também não ter familiares que tenham recebido. Sou diretor técnico de uma comunidade terapêutica e trabalho voluntariamente pelas associações científicas aqui nominadas. Vocês vão ver que, em relação aos dados que vou mostrar, muitos são opostos ao do que o Dr. Tófoli mostrou, e ambos são dados sérios. Os cientistas, quando têm um oceano de dados à sua frente, o que fazem é ver quem produziu o dado, há quanto tempo, quem financiou o dado, para dar maior ou menor credibilidade a eles; onde o dado foi publicado é relevante. Daí nós entendemos que, nessa dança de dados, nós estamos no plano das drogas, e eu me lembro de um Senador americano que diz que, para todo problema complexo - e certamente a droga é um deles -, existe uma solução simples, elegante e completamente errada. Então, realmente, nós estamos em um território em que não há uma coisa fácil para ser dita e nem uma coisa que não desperte polêmicas. O que eu queria destacar aqui é que droga começa na adolescência, e a primeira droga que o brasileiro usa é álcool. E descoberta dos últimos dez anos sinaliza que o cérebro adolescente vai acabar de ser maturado aos 21, 22, 23 anos de idade; e a última parte maturada ou amadurecida é justamente a parte onde mora o bom senso. Então, toda vez que você vir um pai dizendo: "meu filho de 15 anos é muito maduro, tem bom senso, esse pai está querendo se eximir de responsabilidades, porque seu filho não tem nem cérebro para ser maduro ou para ter bom senso. |
| R | Ele é impulso simples, porque os impulsos vêm muito antes que o bom senso. Por isso que dependência química é uma doença que começa, quase 70%, na adolescência. Ou seja, quando nós formos fazer uma política de saúde pública para drogas, temos que visar sobretudo a proteção da criança e do adolescente. O que acontece depois de 23 anos de idade vai encontrar um cérebro mais amadurecido e capaz de decisões mais sensatas. E o que a Organização Mundial da Saúde, no ano de 2009, diz que vamos fazer no século XXI, vencido o grande problema de infecções no mundo - o Dr. Tófoli diz o que vamos fazer no século XXI -? A Organização Mundial da Saúde responde: nós temos que cuidar do uso de álcool, nós temos que cuidar do uso de tabaco e do sobrepeso e obesidade. Em países como o Brasil, de médio Produto Interno Bruto, estas são as prioridades em saúde: álcool, tabaco e sobrepeso. Então, se formos fazer uma política nacional sobre drogas, para começo de conversa, temos que priorizar álcool e tabaco. Se não fizermos isso, estaremos perdendo tempo. E nós temos que erradicar o consumo de bebida alcoólica por menores de idade no País. Quando eu tinha 17 anos, em São Paulo, tentei tomar um chope, e o garçom me pediu o documento de identidade. Isso foi nos anos 60. O Brasil, nesse sentido, nos últimos 60 anos, piorou muito. O que se pode aprender com o case do tabagismo no Brasil? O que fizemos? Nós demos informação séria para a sociedade, restringimos o acesso - não pode fumar aqui, não pode fumar lá, não pode fumar acolá - e proibimos a propaganda. O que aconteceu? Tomando Porto Alegre como exemplo, em Porto Alegre, tínhamos 48% de tabagistas na população adulta nos anos 60, e hoje temos 17%. Eu devo dizer para os senhores, que não são médicos e nem especialistas na matéria, que o case do tabagismo no Brasil é exemplar para o mundo. Ou seja, nós somos capazes de fazer algo que ajude a população. E desse processo eu destaco: restringiu-se o acesso e proibiu-se a propaganda. Isso aqui, minha gente, não é discurso de filósofo, de sociólogo que vai falar de uma tese que aprendeu na Sorbonne. Não, é dado brasileiro. Fez-se isso e, de 48%, despencou para 17%. Qual é o impacto do álcool na mortalidade mundial? Segundo dados da Organização Mundial da Saúde de 2011, o uso nocivo de álcool resulta em 2,5 milhões de mortes a cada ano. Os senhores terão acesso aos demais dados na apresentação que eu deixarei, o suficiente para verem que o impacto do álcool é tremendamente maior do que o impacto da maconha e da cocaína, inclusive no Brasil. Por isso, a Organização Mundial da Saúde, em uma reunião que o Dr. Ronaldo e eu tivemos o prazer de comparecer em Genebra, estabeleceu princípios éticos para uma política sobre álcool. Propõe a Organização Mundial da Saúde: 1) todas as pessoas têm o direito a uma vida familiar, comunitária e de trabalho protegida de acidentes, violência e outras consequências negativas advindas do consumo de álcool; 2) todas as pessoas têm o direito a informações imparciais e programas de educação, começando cedo na vida, sobre as consequências do consumo de álcool para a saúde, família e sociedade; 3) todas as crianças e adolescentes - atenção! - têm o direito de crescer num ambiente protegido das consequências negativas do consumo de álcool e, sempre que possível, da promoção de bebidas alcoólicas; 4) todas as pessoas com uso abusivo de álcool e os membros de suas famílias têm o direito ao acesso a tratamento e cuidados. Por fim, não podem ser oneradas pelo seu comportamento de abstinência. |
| R | Ao que nos interessa aqui, quero destacar que um dos cinco princípios éticos da Organização Mundial da Saúde para álcool é a proteção de crianças e adolescentes, inclusive através da proibição de propaganda. Aqui estão, desde 2011, as recomendações da Organização. O que funciona, isso é importante os políticos saberem, para não ficarem dando tiro em água. - regulação do mercado de bebidas, isso funciona; - regulação e restrição da disponibilidade de álcool, o Dr. Ronaldo mesmo trabalhou um tempo em Diadema, num projeto exemplar, mostrando redução de problemas a partir da redução da disponibilidade; - implementação de políticas apropriadas sobre beber e dirigir, o Rio de Janeiro nos mostra que lei seca funciona, diminui acidente de trânsito, poupa vidas; - redução da demanda através de taxação; - aumento da preocupação dos políticos para suportar as políticas; - oferta de tratamento; - implementação de diagnóstico precoce. Então, isso tudo aqui funciona. Eu peguei dados americanos, nos Estados Unidos, sobre a prevenção dos problemas de álcool relacionados em adolescentes. Esse é o maior organismo de pesquisa de adolescentes nos Estados Unidos, o Monitoring the Future. Se vocês quiserem ter dados sérios, consistentes, sobre adolescentes, esse é o organismo que produz dados padrão ouro. Eles estavam exultantes em 2012, porque, numa análise que vinha desde 1980, eles perceberam que os problemas de consumo de álcool na adolescência, nos Estados Unidos, estavam declinando. Apesar disso, o mesmo relatório conclui que mais de 50% dos adolescentes já tinham experimentado, pelo menos uma vez na vida, ficar bêbados. Para todas as drogas, tenho a impressão de que devemos considerar este gráfico. O que se percebe? Quanto maior for a percepção de risco, menor será o uso. Caso inverso, quanto menor for a percepção de risco, maior será o uso. Esse é o mesmo Monitoring the Future, num trabalho de 2014. Portanto, absolutamente recente. Acho até que foi o último relatório publicado. Não prestem atenção nessa tabela absolutamente indigesta. O que quero mostrar é uma política competente para problemas de álcool: você tinha 80%, em 1981, e agora tem pouco mais de 40%, em 2014. Quer dizer, fazer prevenção funciona. Mas, caindo a percepção de risco, e estamos com toda a discussão sobre maconha nos Estados Unidos, vejam o caso inverso que aconteceu com a maconha: era pouco mais de 20% e foi agora a 30%. Quer dizer, já aumentou, simplesmente com a queda da percepção de risco. Num país em que maconha é vendida com chocolate, obviamente, a percepção de risco com a maconha cai e o consumo aumenta. Na Europa, qual a tendência quanto ao consumo de álcool? Absolutamente declinante. Enquanto isso, no Brasil, álcool e violência, temos todos os dados nos autorizando a concluir o seguinte: vocês não tenham a menor dúvida de que, atrás de 50% de todo gesto violento no País, tem álcool. Nessa medida, temos uma concentração de violência nas noites de sexta e sábado no País, exatamente por conta disso. Aqui, autorregulamentação brasileira do Conar sobre promoção de bebidas alcoólicas. Quero destacar que, entre outras coisas, o próprio Conar disse que a publicidade não deve focar menores e deve evitar a exploração do erotismo. |
| R | Mas, em oposição a isso, nós temos a indústria do álcool, que, avaliando não mais conseguir aumentar o consumo entre os homens adultos, tem tentando ampliar o seu mercado investindo sobre três nichos principais: os adolescentes, as mulheres e os idosos. O mesmo Conar que proíbe a exploração do erotismo coloca aqui os jovens, contemplando... E aqui está o país que impede a exploração do erotismo com associação com bebidas alcoólicas. Até o Papai Noel está tomando cerveja. E isso aos nossos olhos. Num trabalho de equipe do Dr. Ronaldo, sim, os adolescentes mostraram que estão muito expostos à propaganda de bebida alcoólica. Qual o impacto comercial do consumo de álcool por menores de 18 anos? Seis por cento do mercado geral de bebidas. Ou seja, esperar que a indústria do álcool vá abrir mão dessa receita é ingenuidade atroz. Nós é que temos que fazer leis obrigando-os a abrir mão dessa receita. Aqui está o que está acontecendo no País: está se bebendo cada vez mais cedo. Agora, no último levantamento, de 2007, o início da bebida alcoólica já era aos 13 anos. Qual é a consequência disso? O Dr. Ralph Hingson já mostrava, em 2006, que, quanto mais precoce for a iniciação em álcool, maiores serão as taxas de alcoolismo no futuro, ou seja, num país em que as pessoas começam a beber aos 13 anos, na realidade nós estamos em meio a uma usina de alcoolistas. E aqui, mostrando que para uma política nacional sobre droga, realmente a droga de entrada no Brasil é o álcool. Concluindo o aspecto álcool, pensando-se na saúde pública, nosso dever é criar leis e a fiscalização do cumprimento das mesmas que baixe consumo global de bebidas alcoólicas. Claro que o interesse da indústria do álcool é o inverso. Que cada um se pergunte em que lado quer ficar. Vamos entrar no assunto da maconha agora. Eu publiquei um editorial no Zero Hora, no Estado do Rio Grande do Sul, com este título: "Ainda seremos sócios do George Soros". Nesse levantamento sobre drogas de 2013, no Organismo de Controle da UNODC, que é um dos organismos mais respeitados na área, nota-se que todas as drogas estão flutuando, como disse o Dr. Tófoli, em torno de um eixo de estabilidade. A única droga que está absurdamente ascendente é a maconha. E não é difícil creditar tal ascendência à diminuição da percepção de risco, com a discussão sobre legalização da maconha. A maconha é usada, no Brasil, por 7% da população. Aliás, 7% da população disse que já usou maconha, sendo que praticamente a metade disso no último ano. Então, estamos falando em uma população de, mais ou menos, 3% dos brasileiros que usam maconha - 3%. O que nos coloca numa situação não muito complicada, porque menos maconha que no Brasil só há no Japão. E vejam que os países onde se fala mais a favor da maconha ou que as leis são mais frouxas, mais tolerantes, são os países que mais usam maconha. Se os senhores têm filhos na adolescência que querem fazer intercâmbio para aprender inglês, por favor, Canadá e Nova Zelândia não são bons destinos. Eles talvez melhorem o inglês, mas certamente vão voltar experimentando maconha. (Soa a campainha.) O SR. SÉRGIO DE PAULA RAMOS - Aqui nós temos que a coisa grave, a experimentação de maconha no Brasil se faz, sobretudo, por adolescente, naquele cerebrozinho que eu mostrei para vocês. Cabe a pergunta: maconha é uma droga inocente? Quais são os efeitos da maconha? Prejuízo do desempenho escolar, dependência e... Maconha, minha gente, emburrece. O uso de maconha na adolescência emburrece, gera dependência, aumento de chance de se envolver com outras drogas. Então, depois do álcool e do tabaco, a maconha é outra porta de entrada para as demais drogas, sintomas psicóticos, esquizofrenia, depressão e aumento da chance de fracassar na vida, tudo isso com a nossa senhora Maria Joana. |
| R | Trinta e sete por cento dos usuários preenchiam critérios para a dependência. E aqui está o resumo da ópera, o quanto maconha impacta negativamente a saúde do adolescente. Esse trabalho de 2014 é o primeiro que mostra a relação dose e efeito, do Professor Ferguson, provando que quanto mais maconha a pessoa usa mais comportamento suicida, mais envolvimento com outras drogas e mais abandono escolar. Aqui está o mais preocupante para todos nós: maconha lesa a vida das pessoas, mas, se você perguntar para usuários o que eles acham, os maconheiros, os dependentes de maconha se acham mais felizes do que os demais, ou seja, estou numa situação de vida muito pior, com uma falsa sensação de felicidade. Aqui é aquilo que já antecipei: quanto menor a percepção de risco maior o uso. Consequência. Nos Estados Unidos, indo ao encontro do que o Dr. Ronaldo falou, nesse relatório de 2013, Monitoring the Future, em 93, o uso diário de maconha reportado por alunos do high school foi de 2.4, em 2012, 6.5. Resumo dos efeitos associados em adultos. Maconha segue emburrecendo, comprometimento do trabalho e acidentes de trânsito. Dr. Tófoli mostrava os países que já liberaram maconha. Nos Estados Unidos, onde foi liberada, vocês veem o dobro da danação em relação a onde não foi liberado. Estados americanos comparados entre si. É sempre o dobro do prejuízo para os Estados que já liberaram. E Portugal? O famoso Portugal? Está lá o relatório. Se você procurar os dados portugueses sobre a matéria, eles vão dizer, o partido que dá suporte para essa política, que é um grande sucesso. No entanto, se você procurar um instituto de pesquisa neutro, como o Observatório Europeu, no trabalho de 2012, ele mostra o uso na vida pela população em geral, o uso na vida por escolares e o uso no ano pela população em geral. Tudo cresceu. No Reino Unido, a mesma coisa. Então fica a pergunta. Se as evidências sinalizam que com a possível liberalização da maconha haverá aumento de consumo, aumento dos problemas decorrentes desse consumo e mero deslocamento do sistema judicial para o de saúde, a pergunta proposta não é apenas para que liberar, mas também quem está interessado na sua liberalização. Certamente, usuários descompromissados com a saúde pública; em segundo lugar, idealistas defensores do direito de se drogar; em terceiro lugar, operadores do Direito angustiados com a superlotação dos presídios; em quarto lugar, e mais importante, grupos de interesse econômico na exploração desse novo negócio. Quando o Dr. Osmar Terra e eu estivemos no Congresso uruguaio, no mesmo dia o Sr. George Soros estava prometendo para o Mujica mundos e fundos para liberar a maconha. E isso foi assunto da primeira página do principal jornal do Uruguai. Se vocês tiverem alguma desconfiança do poder econômico que está por trás da liberação da maconha estão aí as capas que foram dadas, todas elas liberalizantes. Aí um jornalista me disse: "Ué, é o assunto do momento. Nada mais natural do que capa para o assunto do momento". O outro assunto daquele momento era o ebola. E eu me dei ao trabalho de verificar na internet quantas capas haviam sido dadas para o ebola. É muita grana em jogo, gente! Nesse sentido, eu deixo para vocês a tarefa de responder qual indústria das atualmente instaladas tem vocação para explorar esse novo negócio. Será por acaso uma que nos últimos anos perdeu mais de 50% do seu mercado? |
| R | E aqui é um jornal de economia, em que a indústria do tabaco diz candidamente que, uma vez aprovada a legalização, ela já está prontinha para a comercialização do cigarrinho de maconha. Estratégias usadas pela indústria fumageira no passado: "Fumar faz bem para a garganta". Você, mulher, tem o direito de fumar e votar." "Até recomendado por alguns médicos." Gente, passaram-se cem anos dessas propagandas e o que dizem hoje? "Uso medicinal da maconha"; "Direito de usar". "É até recomendado por alguns médicos." Não se deram ao trabalho nem de mudar as peças publicitárias. Essa é a quantidade de dinheiro que está envolvida na liberação da maconha. Só nos Estados Unidos é perto de US$6 bilhões/ano. E aqui uma análise puramente econômica de quanto custa o negócio da maconha: US$142 bilhões/ano. As drogas todas estão, no nível de contribuição para o PIB mundial, na base da indústria bélica. Logo, alguns ganharão muito dinheiro com esse novo negócio. Lamentavelmente, com o aumento do número de pacientes, nós, médicos, também. Seremos sócios do George Soros. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Muito obrigado, Dr. Sérgio. Bom, agora nós vamos passar às perguntas. Eu proponho aos nossos eminentes convidados o seguinte: eu faço uma primeira pergunta; o Deputado Osmar Terra, sem seguida, fará uma pergunta. Depois, vou ler algumas das questões, que são muito parecidas, daquelas que estão nos acompanhando via internet. São dezenas de perguntas que estão chegando aqui. Dificilmente, vamos conseguir atender todas. Peço ao Dr. Luiz Tófoli e aos demais senhores que estão evidentemente livres para responder, pois é o que nos interessa, já que os senhores vão contribuir com a formulação do nosso relatório. Dr. Tófoli, o art. 28 da Lei, §2º é muito discutido. Ele é um dos pilares da atual Lei nº 11.343, de 2006, ao instituir que "para determinar se a droga destinava-se ao consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente." Esse é o dispositivo. Então, como ele é o mais focado nas correspondências que estamos recebendo às dezenas, há que se mexer nesse artigo? E já que estamos aqui, em uma reunião que vai tratar de alterações ou não da lei, no aprimoramento da lei, e por ser esse o artigo mais atacado, mais discutido, começamos por aí. Qual é o seu pensamento a respeito desse famoso §2º do art. 28, Dr. Tófoli? O SR. LUÍS FERNANDO FARAH DE TÓFOLI - É para responder agora? O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Sim. O SR. LUÍS FERNANDO FARAH DE TÓFOLI - Obrigado pela pergunta, Senador. Ele tem basicamente a ver com o tema que falei que é a descriminalização. Eu queria fazer um preâmbulo, lembrando que precisamos ter o cuidado com confusões que são feitas, às vezes, de forma não intencional, às vezes de forma intencional. Eu não falei de legalização de maconha e não falei de liberação de maconha. Eu comentei inicialmente as medidas liberalizantes, vamos dizer assim, e disse que eu ia focar em descriminalização; e descriminalização de todas as drogas, porque, para o acesso à saúde, inclusive, é mais importante que sejam descriminalizadas as drogas mais pesadas. Essa é a experiência que tem aparecido na Europa, claramente. Então, não estou falando de descriminalização de maconha. O foco da minha apresentação não era a maconha. Temos de tocar nisso uma vez ou outra porque se trata de uma droga importante no contexto. Então, na hora em que se fala que os americanos estão preocupados com o processo de legalização que se deu no Colorado, não é do que estou falando. É preciso que isso fique claro. Então, não há divergência nisso. A questão é como está se dando isso. Sou radicalmente contra a venda de comestíveis. Essa questão dos comestíveis, nos Estados Unidos, é muito preocupante. |
| R | O modelo que está se dando no Colorado, eu, pessoalmente, acho inadequado. Então, para deixar algumas coisas bem claras, para não parecer que estamos em polos diferentes quando, de fato, estamos concordando. Outro elemento em que concordo radicalmente é, por exemplo, a necessidade de controle da percepção de risco em relação ao álcool e como isso é importante para todas as drogas, fundamentalmente, sem a menor dúvida. O debate sobre a mudança do status legal de uma droga ou outra deve-se dar com dados claros de forma que os riscos sejam claros também. Mas também é importante que a gente não jogue no lixo dados, variáveis sociais. Em muitos desses estudos, por exemplo, sobre queda de QI, quando são colocadas variáveis sociais, esses efeitos desaparecem. Então, é preciso ter cuidado com isso também. Muitas vezes, nós, médicos, esquecemos disso, parece que isso é coisa de sociólogo, mas essa é questão da saúde pública e questão médica também. Então, é importante frisar em relação a isso. A pergunta do Lenad, é sobre legalização. Perguntava se as pessoas queriam, eram contrárias ou não, à legalização da maconha. Eu falei aqui de descriminalização do porte de drogas para uso. Não é a mesma coisa. Da mesma forma, é importante a gente ter clareza que a maneira que a pergunta é feita influencia a maneira que as pessoas respondem. Sendo assim, "Você é a favor da legalização da maconha?" é diferente de "Você é a favor de que o usuário de maconha", ou melhor, do ponto de vista da descriminalização: "Você é a favor da descriminalização da maconha?", "Você é a favor de que o usuário de maconha seja considerado um criminoso?" Nós estamos perguntando a mesma coisa com duas formulações diferentes. As próprias pesquisas precisam ser olhadas por esse contexto. Sobre o art. 28, uma sugestão que seria interessante de ser considerada é a proposta do próprio Ministro Gilmar Mendes, no STF. Ele sugeriu - e ele foi o único que propôs a descriminalização para todas as drogas, com esse viés de impacto na saúde pública, que, como eu já mencionei, tem sido trazido por uma série de experts no contexto do mundo - que fossem transformadas em medidas administrativas. Eu acho essa uma saída interessante para se resolver a questão, e friso a importância de não se tratar somente da maconha. A discussão precisa ser melhor qualificada no Brasil. O que estamos discutindo não é a diminuição do risco do uso de drogas. Não estamos relativizando isso. Isso não deve ser relativizado. Eu não vejo isso como uma coisa que deva ser relativizada. O que estamos discutindo é como o usuário deve ser visto pelo sistema de justiça criminal. Nesse sentido, eu, como médico, não como operador do Direito, me preocupo, sim, com o impacto nas prisões, porque, também é um espaço de saúde pública, um espaço que a saúde pública deve ser preocupar. (Soa a campainha.) O SR. LUÍS FERNANDO FARAH DE TÓFOLI - Em resumo, é isso. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Dr. Ronaldo, também sobre esse mesmo debatido artigo. O SR. RONALDO LARANJEIRA - Eu sou favorável ao art. 28. Eu acho que tem que ser aperfeiçoado. Eu acho que não cabe ao Supremo Tribunal Federal fazer leis. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Perfeito. O SR. RONALDO LARANJEIRA - Quem faz leis é esta Casa, tanto que o Luiz Barroso, no parecer dele, e vários outros Ministros, no meu modo de ver, fizeram um desserviço ao sistema judiciário - posso criticar porque não sou só médico - porque não é função do Supremo Tribunal Federal fazer leis. Eles estão lá para interpretar as leis desta Casa. Esta Casa fez, debateu todos esses artigos de forma bastante completa. Então, acho que atribuir ao juiz a questão se a pessoa é usuária e ela não vai receber a penalidade da lei, e se ela é traficante, acho que é um avanço no ponto de vista jurídico. Eu, portanto, não tenho a menor dúvida de que seria um bom teste fazermos isso. Acho que todas as leis, depois de alguns anos, a gente vai poder reavaliá-las. Mas acho que não tem mais sentido a gente ficar debatendo, depois de tantos anos, essa lei que já foi tão bem debatida. Eu gostaria só de salientar, além de apoiar ao art. 28, que discordo, mais uma vez do Dr. Tófoli: maconha diminui QI. Isso não tem nada a ver com a vida social, com a vida econômica. |
| R | A própria autora desse artigo, que o estava debatendo na semana passada no Instituto Nacional de Saúde em Washington comentou sobre isso, todas as análises estatísticas mostraram isso, que a maconha, por si só, vai ocasionar uma queda de 6% a 8% na inteligência do adolescente. O SR. SÉRGIO DE PAULA RAMOS - E perdura na vida adulta. O SR. RONALDO LARANJEIRA - E perdura na vida adulta. Então podemos discutir várias coisas, mas a pesquisa mostra muito bem, infelizmente, que a maconha produz esse dano cognitivo, não só de queda do QI, como a queda de atenção, a queda de memória, esse prejuízo global, as pesquisas. Não vi ninguém questionar isso em mais de mil pesquisadores que tinha nessa nossa reunião do Instituto Nacional de Saúde na semana passada em Washington, ninguém questionaria esse tipo de dados que as pesquisas mostraram em relação ao dano que a maconha produz. Infelizmente, não é? O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Obrigado. Aliás o processo sobre o qual discutimos está parado no Supremo, na gaveta do Ministro Teori, que também já declarou que entende que essa matéria tem que ser decidida pelo Legislativo. Talvez, por isso, permanece lá esse julgamento. Dr. Sérgio de Paula, também quero ouvir a sua opinião porque esse é um artigo que vai nos levar a muita discussão ainda nesta Comissão e que procura distinguir o usuário do traficante, o famoso art. 28, § 2º. O SR. SÉRGIO DE PAULA RAMOS - Das tentativas de objetivação que distinguem o usuário do traficante, a mais comum é a quantidade, o que é absolutamente equivocado. Quer dizer você pode pegar uma lei que diga o seguinte: até cinco pedras de crack no bolso é usuário, mais do que cinco é traficante. Você vai estar capilarizando a rede do tráfico e vai criar os que eles chamam de vapozeiros, quer dizer o pequeno traficante de esquina que, a cada cinco minutos, vai buscar mais cinco pedras. Então, partir do princípio de que um juiz não tenha o bom senso para distinguir o que é o usuário e o que é o traficante, esse mesmo juiz que está distinguindo o que é corrupção do que não é corrupção no País, é você realmente subestimar a inteligência e a integridade do juiz. Então, sim, o artigo acho que já está pronto, e as tentativas mundo afora de especificação, de objetivação, foram levadas a grandes equívocos. A mais frequente delas é a quantidade. Quantidade não é um bom parâmetro. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Deputado Osmar Terra, autor do projeto lá na Câmara. O SR. OSMAR TERRA (Bloco/PMDB - RS) - Bom, cumprimento o Senador Lasier pela iniciativa, o Senador Romário que estava aqui e teve que sair - deve voltar ainda. Cumprimento os palestrantes, o Dr Tófoli, meus amigos, companheiros de caminhada nessa questão, por tratar essa questão das drogas como um gravíssimo programa de saúde pública, não é Dr. Arnaldo Laranjeiras, Dr. Sérgio Paula Ramos? Como o Dr. Sérgio já falou, já estivemos inclusive no Uruguai, debatendo no Senado do Uruguai antes de a lei ser promulgada. Quero dizer que vejo muita manifestação quando as pessoas falam em legalizar a droga, começam a dizer: "é um problema de saúde pública, então tem que legalizar, porque não pode prender, não pode fazer isso, não pode fazer aquilo". Usuário no Brasil não é preso. Precisa ficar claro isso, senão a gente vê ali uma série de assertivas e parece que o usuário... Vocês querem descriminalizar o usuário? Não prender o usuário? O usuário não é preso no Brasil, o usuário responde, no máximo, alguma pena alternativa uma advertência, uma admoestação e uma pena alternativa, serviço comunitário, alguma coisa assim. Então, o usuário não é preso no Brasil. |
| R | Isso precisa ficar claro, tanto na lei que existe quanto na proposta de lei que estamos fazendo, que está sendo discutida aqui no Senado. O problema é que estamos vivendo uma epidemia. Eu insisto nessa questão da epidemia. Eu me lembro, lá no Rio Grande do Sul, fui secretário de Saúde oito anos e trabalhava com um programa de criança e adolescente no final da década de 1990. E comemorávamos que não tinha crack no final da década de 1990 no Rio Grande do Sul. E em 2007, período em que eu estava na secretaria... (Soa a campainha.) O SR. OSMAR TERRA (Bloco/PMDB - RS) - ...nós já tínhamos praticamente, vendo por Municípios que não têm pesquisa adequada... Essa pesquisa da Fiocruz é cheia de erros e de vieses. A Fiocruz fez agora e publicou porque sabíamos que ela tinha recebido R$8 milhões para fazer uma pesquisa em 2008, 2009, não sei. Ficou dois anos com esse negócio parado e, quando entramos com um pedido na Mesa da Câmara para cobrar da Senad a pesquisa, aí em um mês a Fiocruz apresentou uma pesquisa feita por um grupo totalmente favorável à liberação das drogas, com viés claro. Então, não existe pesquisa em grande escala, a não ser feitas lá pela equipe do Dr. Ronaldo Laranjeiras, lá pela Unifesp, que são pesquisas que dão uma ideia do tamanho do problema e da progressão. Para ter uma ideia, para quem está nos ouvindo e para o público que está aqui, até 2006 a maior causa de auxílio-doença do INSS era o álcool. Acho que o Dr. Sérgio de Paula Ramos colocou aqui o que é uma droga legal, o que uma droga legalizada causa de dano. É o álcool, o dano que ela causa. É a maior causa de violência. Essa história de dizer que, legalizando as drogas, vamos acabar com a violência é a maior piada que há hoje na discussão sobre drogas. O Colorado, Denver, tenho aqui as pesquisas que foram publicadas, inclusive da polícia do Colorado e do instituto de pesquisa lá do Uruguai, aumentou o número de homicídios em Montevidéu 10% desde o período em que foi anunciada a legalização da maconha. Aumentou 10% o número de homicídios. E, no Colorado, aumentou mais, quase dobrou em relação ao ano anterior. O ano em que foi anunciada a liberação da maconha no Colorado, em Denver, tem o dobro do número de homicídios que tinha no ano anterior. Então, não existe essa... Por que é assim? Porque a droga causa um transtorno mental. Ela diminui a consciência das pessoas. Ela causa distorção da percepção do mundo ao redor. É por isso que causa acidente de automóvel, é por isso que dá... Lá no Rio Grande do Sul, inclusive, em Porto Alegre a pesquisa do Hospital de Clínicas mostra que a maconha causa mais acidente com vítimas fatais do que o álcool, na grande Porto Alegre, no ano de 2008/2009. Causou mais acidentes com vítimas fatais, isso porque não é legal, que é uma droga ilícita. Se legalizar, vai ser muito mais. Aí estão as pesquisas mostrando. Quando só se descriminaliza o uso, já aumenta, como foi em Portugal. Dobrou, triplicou o número de pessoas usando maconha. Você acha que vai diminuir o número de acidentes? Você acha que vai diminuir a violência? Porque, atrás da maconha, o outro tráfico continua também. Não é só o tráfico para os jovens, para adolescentes porque o mercado alvo do traficante de droga, de qualquer droga, é a juventude e é essa fase de transição aí da puberdade, adolescência, quando o cérebro é mais vulnerável. E não é só pelo processo normal da evolução. Os transtornos mentais disruptivos, os transtornos mentais que aparecem com mais clareza na adolescência, como déficit de atenção, hiperatividade, transtorno bipolar, transtornos de conduta, todos eles predispõem, multiplicam muito a probabilidade de a pessoa ficar dependente da droga porque diminui o controle do impulso. |
| R | Esse assunto não é discutido. Eu vejo antropólogos falando sobre liberação de drogas, sociólogos falando sobre liberação de drogas, filósofos falando, vejo o papa da liberação de drogas, o - como é o nome do francês lá, me deu um branco aqui - dizendo que droga é uma coisa muito boa, a pessoa tem que saber aproveitar, saber sentir o prazer da droga. Ninguém está preocupado com o que que vai acontecer com esse ser humano. Outra questão mais grave, Senador Lasier Martins, é que a dependência química não tem cura. Essa história de dizer que há ex-drogado não é verdade. Não existe ex-alcoólatra, não existe ex-drogado. Existem pessoas com uma doença crônica. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - As comunidades terapêuticas ajudam até onde? O SR. OSMAR TERRA (Bloco/PMDB - RS) - Ajudam a ficar em abstinência e a voltar para uma vida normal, porque essa história de ser contra a abstinência é promover o transtorno mental, a incapacidade de a pessoa voltar para uma vida normal. "Ah, mas tem gente que fuma maconha e leva uma vida normal". Até tem. Acho que há pessoas que têm um rendimento muito menor do que poderiam ter na vida, mas tem uma outra parte que não consegue, que fica esquizofrênico, porque aumenta muito a possibilidade de ficar esquizofrênico. O juiz lá de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, que escreveu um artigo no Zero Hora, um juiz de Vara de Família, que não entende nada da... Ele disse: "Eu nunca assinei tanta interdição de jovem como eu estou assinando agora, todos usuários de maconha". O Instituto Nacional que estuda a droga nos Estados Unidos, o NIDA, mostra que 50% dos adolescentes que fumam pelo menos uma vez por semana ficam dependentes. "Ah, mas é 11% só". São 11% quando começam a fumar na idade adulta, mas isso é 5%, 6% dos usuários de droga. A grande maioria fica dependente mesmo. Sérgio mostrou ali, 37% no total. É muito grave isso. São pessoas que ficam com a vida destruída, e predispõe ao uso das outras drogas. Então, Senador Lasier, acho que estamos discutindo um assunto grave. Esse projeto de lei já foi emasculado aqui no Senado, foi destroçado pelos pareceres anteriores nas outras Comissões, e espero que o senhor considere a ciência, considere o dano, considere isso que o Dr. Ronaldo Laranjeira falou, que, para cada dependente químico, há quatro pessoas com a vida destruída junto. Se é só dizer: "Não, a pessoa tem que ter o direito de usar e de não usar droga". Não. Ele tem o direito se ele morar numa ilha sozinho e ele se sustentar, se não tiver ninguém para sustentá-lo. Agora, quando ele usa droga, não consegue mais trabalhar, não consegue mais cuidar da família, não consegue mais fazer nada, um grupo de familiares vai ter que perder a sua liberdade para cuidar dele, para mantê-lo vivo. E a sociedade vai ter que pagar o tratamento dele, o que também diminui a nossa liberdade como um todo. Liberdade é um conceito social. Não é um conceito individual que algumas áreas do Direito alternativo, dos filósofos, de que ficam falando aí - Foucault - que todo mundo tem que ser livre para fazer o que quiser. A liberdade de um vai até onde começa a do outro, e a liberdade de um pode destruir a dos outros. É isso que estamos discutindo aqui. Nós estamos discutindo uma coisa que afeta toda a sociedade, não é um problema individual. Como disse o Ministro Barroso, que eu respeito, o conceito que ele tem de liberdade, que o sujeito pode fumar se não fizer mal para ninguém. É claro que vai fazer mal, para uma parcela vai fazer mal. E aí? Como é que se faz com isso? Então, só para terminar, só quero me contrapor aqui a essa questão do art. 28, essa questão da quantidade é uma questão que libera a droga no Brasil. Se for anulada a capacidade de a Polícia, do promotor e do juiz avaliarem se é tráfico ou não, se for tirada deles a capacidade de avaliar a conjuntura em que ocorre a apreensão da droga, acabou, vai ser liberada a droga, não se vai prender mais ninguém. Como há uma epidemia - não quero prender ninguém -, se não tirar o traficante da rua, não vai diminuir o número de doentes. Pelo contrário: quanto menos gente for retirada da rua, gente que esteja vendendo droga, maior vai ser... É um momento de epidemia, isso que as pessoas às vezes não entendem. Nós podemos ter um outro tipo de política sobre drogas no momento em que não houver epidemia. |
| R | Mas quando há epidemias, têm que haver medidas fortes para controlar. Como temos que tomar com o zika vírus, como temos que tomar... E a lógica é a mesma. O que é uma epidemia? É um grupo de pessoas tendo um transtorno em um número muito acima do usual, num determinado momento, o mesmo transtorno. Nós estamos vivendo uma epidemia de drogas. A fronteira aberta da Bolívia, sugiro, Senador, que até fosse feita uma viagem para... Nós fizemos na Câmara, passamos quase três anos debatendo esse assunto, visitando todos os países que produzem cocaína. Fomos a Portugal e vimos a experiência daquele país. Fomos à Suécia. Os países no mundo que melhoraram a saúde pública e as condições de atendimento da população foram os países que agiram com rigor contra as drogas, não só rigor na lei, mas rigor na aplicação da lei. É o caso da Suécia, que agora está fechando presídio. É o caso da China, que tem um número de homicídios infinitamente menor do que o do Brasil com uma população que é sete vezes a do Brasil. É o Japão, que tem leis drásticas. Estão falando da execução na Indonésia, daquele traficante brasileiro. Eu sou contra a pena de morte, mas a Indonésia tem 1.240 homicídios por ano. O Brasil tem 60 mil. A população da Indonésia é de 50 milhões a mais do que o Brasil. Então, temos que falar. Vamos falar do conjunto. Essa história de dizer que na Europa está se fazendo não sei o quê. Na Europa onde? Com que dados? Onde está a pesquisa? É tudo assim: porque na Europa,. porque nos Estados Unidos... Estados Unidos aumentou a mendicância, os homicídios no Colorado e nos estados que liberaram e aumentou o número de dependentes químicos, inclusive com gotinhas de concentrado de THC que valem por uns 200 cigarros de maconha. E as crianças usando aquilo e estando à disposição de todo mundo. Ainda bem que o Dr. Tóffoli é contra também. Gostei de ouvi-lo em relação a isso. No Brasil, temos que ter rigor e política de fronteira, porque a Bolívia - a última coisa, Senador, porque estou falando demais - é tida como o único país que está dando certo com essa política ideológica, bolivariana, e tal, que está dando certo. Veja só, a Bolívia está aumentando o PIB, enquanto o Brasil está desabando. A Venezuela está acabando. Os países todos lá embaixo. Mas a Bolívia... E sabe por quê? Porque é o maior exportador de cocaína, e o Evo Morales, Presidente da Bolívia, é presidente da Federação dos Cocaleiros, dos produtores de coca. É o maior exportador do mundo hoje. Está perto do Peru. Mas para o Brasil, 90% do crack que está na rua lá em São Paulo, na cracolândia, é boliviano, é boliviano. Então, circula um dinheiro que nunca circulou na história da Bolívia, porque não temos controle de fronteira e nem impomos nada como País ao Sr. Evo Morales. Era isso. Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Obrigado, Deputado Osmar Terra. Amanhã, vamos continuar com a audiência pública e também haverá, como hoje, uma diversificação de pensamentos. E, por isso, vamos ampliar também para ouvir também o que estão nos mandando dizer os nossos ouvintes que estão utilizando o portal e-cidadania. Eu vou ler algumas das manifestações e os nossos palestrantes vão se pronunciar sobre o que pensam para aqueles que estão nos acompanhando. Por exemplo, a Srª Constância Baraona diz o seguinte à Comissão de Educação, Cultura e Esporte: "legalizem e acabem com a hipocrisia. Menos crime, menos jovens mortos, mais informação, mais respeito à cultura e impostos para investir na educação, porque ninguém morre no comércio de cerveja e cigarro porque ele é legal." Pensamento da D. Constância. Mateus Guedes, por que em vez de criar políticas públicas para o consumo de álcool e tabaco não criminalizam essas duas drogas assim como fazem com a Cannabis, alegando que o seu consumo é devastador e causador de muitas mortes, já que a criminalização é a solução para diminuir o consumo?" Diego Magno, sou a favor da descriminalização do uso medicinal da cannabis. A criminalização só traz preconceitos a pessoas que são negras e pobres; os verdadeiros bandidos que trazem diversas drogas, não os pobres e, sim, os que se dizem governo. |
| R | Outra - esse nome não está claro - "Em todas as cidades brasileiras estão vendendo Cannabis prensada com química. É preciso aprovar o cultivo caseiro, pois a que está tomando conta do Brasil vai dar muitos problemas de saúde e vai ser mais uma conta para a sociedade pagar". Jonária Franca da Silva: "Existe algum dado que comprove que a maconha causa dependência, ou isso é apenas invenção de alguns segmentos da sociedade que não querem ver seu uso liberado? O fato de haver uma grande discussão sobre o tema nos últimos tempos os senhores acreditam que o Brasil caminha para liberá-la?" Felipe: "Senador Lasier, como cidadão, solicito que o art. 28 da Lei 11.343, que resulta na criminalização do usuário de substâncias psicoativas ilícitas seja retirado do capítulo dos crimes e colocado em um novo capítulo, das medidas administrativas". Tiago Frazão: "A descriminalização, assim como visto em outros países, faria a economia saltar e a crise atual acabar. Sabendo que essa guerra está perdida e que foi um fracasso por que não adotar outros meios, já que esses que tomaram não teve nenhum impacto significativo e realmente bom? Fernando Fuc: "Os senhores entendem que a criminalização do usuário na prática é a criminalização da mera existência da pessoa? Se todos são iguais perante a lei, por que usuários e comerciantes de tabaco e álcool ou de maconha são tratados de maneira diferente? Um compra sua droga legalmente, em qualquer lugar, e é cidadão de bem, e o outro é vítima de criminalização?" Ana Flávia Schmidt: "Espero que haja tratamento igualitário para as pessoas que foram medicadas errado e hoje são viciadas em algum fármaco porque algum médico receitou o fármaco errado. É preciso criar atividades sociais para que os dependentes possam se sentir úteis para contribuírem para termos uma sociedade melhor, e não apenas serem usados para propagandear necessariamente o combate às drogas?" - é o exemplo do recomeço, lá em São Paulo. Dr. Sérgio, o que é que o senhor tem a dizer sobre o que estão se manifestando os nossos acompanhantes pela internet? O SR. SÉRGIO DE PAULA RAMOS - São muitas as manifestações, e eu não teria tempo suficiente, hábil, para enfrentar cada uma delas. Então, gostaria de pinçar esse assunto da maconha medicinal. Eu mostrei num eslaide que existem sólidos interesses econômicos que estão tentando lutar pela legalização, descriminalização, afrouxamento das leis sobre o consumo de maconha. E que esse poderio econômico se vale, muitas vezes, de manobras publicitárias já usadas pela indústria do tabaco no passado. Uma delas é essa balela da maconha medicinal. Eu fiz parte, agora recentemente, de um grupo de estudos que foi se debruçar sobre, ver o que é que tem de consistência nisso. A conclusão é muito singela: não existe maconha medicinal, ponto. Não existe. Isso aí é manobra de marketing. É para induzir uma boa vontade em relação à maconha. O que existe, sim, é: alguns poucos produtos da maconha, subprodutos da maconha, alguns canabinoides, produzem alguma ajuda controvertida até agora em raras doenças. Em raras doenças. Então, se você for pegar o que quase é um senso comum, muitas vezes patrocinado pelas redes de televisão nacionais, a criancinha lá teve uma convulsão, aquilo virou... Uma criança teve uma convulsão que foi medicada com maconha. Nada disso: foi medicada com um subproduto da maconha, e a Sociedade Brasileira de Neurologia não reconhece, no seu guideline sobre o assunto, que essa seria uma droga de uso prioritário, nem acha que os seus efeitos são incontestemente aprovados. |
| R | Até sugiro que paremos de usar essa expressão maconha medicinal. Não existe maconha medicinal. Existe, sim, uma substância, duas substâncias, encontradas na maconha que, se devidamente isoladas na forma de comprimido, despidos do THC, poderão causar algum bem em raras doenças. Então, em um artigo que publiquei na Zero Hora eu disse o seguinte: uma substância encontrada no veneno da jararaca é cardioprotetora. É até um produto que foi desenvolvido no Brasil: o captopril. Não vi ninguém defendendo que jararaca faz bem para a saúde. Quer dizer, maconha medicinal seria o equivalente a gente dizer jararaca medicinal. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Bem, como há alguns dos nossos convidados que precisam viajar, vou propor.... Registro também a presença aqui do nosso ex-Deputado Luiz Bassuma, da Bahia, agradeço-lhe a presença. Considerando que nas manifestações dos senhores já foram respondidas inúmeras perguntas das que tínhamos aqui, que V.Sªs façam suas considerações finais, na base de oito ou dez minutos cada um, para abordar aquilo que não foi abordado até agora e alguma crítica ao projeto de lei que é o motivo da nossa reunião de hoje, o que é bom e o que não é bom. Começando pelo Dr. Ronaldo Laranjeira. O SR. RONALDO LARANJEIRA - Quero aproveitar essa oportunidade para passar alguns dos produtos que já existem nos Estados Unidos e que, de alguma forma, poderia complementar o que o Dr. Sérgio de Paula Ramos falou. Esse produto, que é uma barra de cereais e maconha, já existe nos Estados Unidos; Marijuana Lemonade - a limonada que tem uma quantidade de marijuana, de maconha, suficiente para intoxicar as pessoas; pirulitos de maconha; chocolates de maconha; energético de maconha; caramelo de maconha. Não estou falando de algo que não existe. Isso já existe no mercado americano, vários tipos de chocolates, de bolos, de brownies de maconha, trufas com conteúdo significativo de maconha; pizza de maconha; muffins de maconha; balas sem açúcar e por aí vai. A gente poderia ficar falando aqui indefinidamente. Pretzels Preterível de maconha, Nuttela de maconha, Sucrilho de maconha. Então existe, como o Dr. Sérgio falou, todo um interesse.... Como o Dr. Sérgio falou, as ações dessas empresas que estão na bolsa americana foram as que mais subiram nesse último ano. Já é o terceiro produto, já é a terceira empresa, em termos de bilhões de dólares nos Estados Unidos. Então, repetindo de alguma forma o que o Sérgio falou é absolutamente correto. Nessa reunião que fui, na semana passada, uma pessoa muito experiente na área de tabaco falou exatamente o que o Sérgio falou. Estamos repetindo a história do cigarro em relação a maconha. Ao flexibilizarmos esse produto, vamos criar uma indústria que vai se beneficiar não do adulto que vai fumar uma maconha de vez em quando, mas dos adolescentes que vão usar regularmente. Então, acho que esse aspecto...Por isso é que sou um grande entusiasta dessa lei porque é uma lei que já está há mais de oito anos - não é Osmar? - sendo discutida pelo Brasil afora. Gostaria de reforçar, mais uma vez, aqui nesta Casa, que não foi um projeto de lei de poucas pessoas, mas houve discussões infindáveis em todo o Brasil. Visitamos inúmeros outros países fazendo comparação com outras leis. Então, acho que o Senado tem um poder, um papel, muito preponderante para a gente fechar esse projeto de lei. |
| R | Para mim, foi muito importante que o próprio Supremo Tribunal Federal não tenha legislado sobre um assunto para o qual eu acho que eles não têm competência. E não é para o Supremo fazer isso. Quem tem de fazer isso são as pessoas eleitas para tanto, ouvindo a sociedade. Eu não tenho os detalhes de como está esse projeto aqui no Senado, mas sou um grande entusiasta da ideia de fecharmos, de colocarmos para a sociedade, de fazermos um período de teste por cinco ou dez anos. As leis são dinâmicas, mas eu gostaria muito de ver essa lei sendo testada no Brasil. Por último, eu gostaria de deixar.... O cigarro eletrônico é uma das coisas mais perigosas do meu ponto de vista... (Soa a campainha.) O SR. RONALDO LARANJEIRA - ...deixar que uma pessoa pegue esse cigarro eletrônico, que custa US$40 dólares, onde você coloca uma quantidade de maconha e pode fumar o dia inteiro. Se houver não só a descriminalização... A descriminalização é um estágio da legalização. Nos Estados Unidos, você tem Estados que descriminalizaram e Estados que legalizaram. Mas existe uma tendência à legalização. Eu não gostaria de ver isso no Brasil. Eu gostaria que tivéssemos políticas públicas mais baseadas em evidências, mas restritas de modo a diminuir especialmente a possibilidade de que os adolescentes se exponham a essa substância cujo os efeitos nas pessoas nós já conhecemos. Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Obrigado, Dr. Ronaldo. Dr. Luís Tófoli. O SR. LUÍS FERNANDO FARAH DE TÓFOLI - Eu vou começar pela conclusão do Dr. Ronaldo, falando sobre as políticas baseadas em evidências. Olhem só: nós três estamos defendendo isso nesta Mesa. Como pode haver posições divergentes neste contexto? Esse é um campo muito minado, é um campo onde nós precisamos exacerbar a necessidade do diálogo. Muito já foi dito que a lei já bastante debatida, mas falo em sentido amplo. Quanto mais espaços e momentos para podermos nos encontrar e um contestar o dado do outro e aprender com isso, é importante. Inclusive, para ver como se colocam as próprias falas. Quando eu falei sobre o controle de dados sociais que reduzem o impacto do efeito no QI, eu não estava querendo dizer que não existe efeito. Eu acho importante isso. Maconha é algo que não deve ser utilizado por adolescentes. Isso é uma coisa bastante clara. Qual é a melhor maneira de nós chegarmos a isso? Quanto a isso não há dúvida alguma. Nós divergimos na melhor maneira de se chegar nesse ponto. Acho importante haver conexões para não parecer que esse é um debate em que um lado é o detentor absoluto da razão e o outro são pessoas execráveis. Eu acho que isso é uma coisa muito importante. Então, já nesse sentido houve a pergunta da participante sobre se a maconha causa dependência. Maconha causa dependência. Há um impacto maior na adolescência, como foi falado também, mas causa. Não podemos esconder esse fato. Então, eu acho que esse debate precisa ser franco e honesto. Ele não pode ser um olhar maquiado de dados. Mas é óbvio que, cada um de nós, quando olha dos dados, inconscientemente vai exacerbar um lado ou outro. Então, há alguns pontos que eu poderia depois discutir com o Dr. Sérgio e dizer: Mas o senhor pegou apenas até tal data! Mas eu não vou fazer isso publicamente, porque acho que o recado em relação a isso está dado. Mas é sobre a importância do cuidado de olhar esses dados. Então, eu vou pegar um ponto específico, porque o Deputado Osmar Terra falou de vários. Falou sobre a pesquisa do Professor Flávio Peschanky sobre a maconha ter aparecido como mais frequente em acidentes de vítimas fatais, no estudo que ele fez lá no Rio Grande do Sul. É o estudo do Peschanky, correto? (Intervenção fora do microfone.) O SR. LUÍS FERNANDO FARAH DE TÓFOLI - Então, a interpretação que o senhor faz do dado, até onde eu sei, não é correta, e até consultamos o Dr. Flávio a respeito disso. O estudo não foi com vítimas fatais, foi com vítimas vivas e, especificamente, no momento em que foi feito o exame das drogas não pegava mais o efeito do álcool. Quando as pessoas diziam se tinham bebido ou não, a frequência era muito mais do que o uso de maconha. Então, temos de tomar cuidado com isso. Não estou querendo minimizar a frequência do uso de maconha, mas também não quero maximizar. Então, o olhar no condado é extremamente importante e também as visões de mundo de cada um dos envolvidos. |
| R | Então, por exemplo, pessoas cujas vidas foram salvas por comunidades terapêuticas, têm que defender comunidades terapêuticas. E há pessoas cujas vidas foram salvas por comunidades terapêuticas, eu não tenho a menor dúvida disso. Porém, há situações em que as pessoas não vão, não ficam, saem, não se dispõem. Quais as alternativas pragmáticas que a gente vai ter para essas pessoas, se a gente não consegue atingir a abstinência? E essa é a discussão da redução de danos. Então, não podemos colocar como um único objetivo a abstinência, podemos colocar até como objetivo ideal. Mas o que é que a gente faz quando ele não pode ser alcançado? Esse é um ponto importante. E voltando à questão do impacto familiar dos usuários de drogas, é importante lembrar também do impacto familiar das pessoas que foram encarceradas. Isso também é um impacto. As pessoas vão ter sofrimento a respeito disso. A ideia de que não se prende usuários de drogas no Brasil, não é muito correta pelos melhores dados... (Soa a campainha.) O SR. LUÍS FERNANDO FARAH DE TÓFOLI - ... disponíveis pelo Direito. Como mostrei os dados, metade das pessoas que estavam em detenção provisória, no Rio de Janeiro, não foram presas como traficantes. Fora os magistrados, ainda há muito preconceito nesse campo. É preciso melhorar essa discussão com os magistrados também. Se a gente critica uma decisão do Supremo, é possível também a gente criticar e verificar se as decisões dos magistrados são as melhores possíveis? Por que a gente não pode se perguntar a respeito disso? E eu queria concluir lembrando que, de fato, há interesses econômicos, mas há interesses econômicos em todos os lados nessa questão. A indústria do álcool, esse vácuo aberto pela redução do consumo do tabaco, isso é fato, mas há também a indústria que ganha dinheiro com a dependência química. Nós não podemos esquecer disso. É preciso ficar claro que isso existe também. O que nós estamos sopesando aqui é uma decisão, uma escolha de Sofia, porque a gente tem que decidir o que causa menor dano. Nós divergimos aqui sobre o que causa o menor dano, mas nós não temos a menor dúvida de que o que nós queremos é que reduzam-se os danos, o máximo possível. Precisamos pensar: o mal que se faz, fazendo do jeito que se faz; e o mal que se faz, não fazendo desse jeito. E tomar decisões que sejam as mais sábias possíveis e, oxalá, esta Casa possa tomá-las. Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Obrigado. Dr. Sérgio. O SR. SÉRGIO DE PAULA RAMOS - Eu quero iniciar a minha fala final agradecendo e parabenizando o Senador Lasier pela montagem da Mesa, que foi capaz de produzir um debate respeitoso, em que foi possível botar lado a lado opiniões diferentes de uma forma séria, respeitosa - repito. Lembrei-me de um pensamento do Voltaire. O Voltaire disse uma vez que, quando a discussão é demasiadamente prolongada, é porque nenhuma das duas partes tem razão. Esse é um assunto em aberto, acho que existem consensos, eu faria um alerta para a Comissão do Senado, que lesse esse projeto de lei à luz do que propõe a Organização Mundial de Saúde. É a entidade máxima de saúde no mundo. Nós estamos falando um assunto de saúde. E posso já antecipar, porque fui uma das pessoas que tive a honra de ser instigado pelo Deputado Osmar Terra, no primeiro borrão que ele fez desse projeto de lei, contribui com sua elaboração, que esse projeto de lei se alimenta nas sugestões da Organização Mundial de Saúde. E eu me associo ao Ronaldo em sugerir que já passa da hora de ele ser aprovado. E me associo ao Dr. Tófoli quando propõe um debate respeitoso que considere não só o dado, mas quem gerou o dado e a credibilidade do dado. Vocês viram lá, na primeira página do El Pais, no Uruguai, o George Soros querendo gerar dados sobre o que vai acontecer no Uruguai. Então, realmente, se continuarmos conversando seriamente, respeitosamente, e, antes de começarmos a conversa, colocarmos uma hierarquização dos dados... Quer dizer, um dado forte é aquele gerado por um organismo internacional neutro, que não recebe subvenção seja de quem for, que foi publicado em uma revista de impacto A. |
| R | Portanto, existem critérios bem estabelecidos para qualificarmos um dado - esse dado é padrão ouro, esse dado é padrão prata, esse é bronze, esse não tem valor algum. E, aí, o debate fica mais consistente. Concluindo, eu também sou pela aprovação do projeto como está. Eu acho que discussão, e mais discussão, e mais discussão - então não são 8 anos, são 12 anos - só interessa a quem está ganhando muito dinheiro com o status quo. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Amanhã nós vamos completar essa audiência pública, trazendo a esta Comissão o Dr. Valencius Wurch Duarte Filho, Coordenador-Geral de Saúde Mental do Ministério da Saúde; Dr. Mauro Leno, membro da Coalizão Latino-Americana de Ativistas Canábicos; Leandro da Costa Fialho, Coordenador-Geral de Educação Integral do Ministério da Educação; Dr. Sérgio Vidal, Presidente da Associação Multidisciplinar de Estudos sobre Maconha Medicinal; e Dr. Emílio Figueiredo, advogado e coordenador do site Growroom, que discute a legalização da maconha. Drs. Ronaldo, Sérgio de Paula, Luís Tófoli, os senhores trouxeram uma contribuição muito prestimosa. O que os senhores disseram aqui está gravado. Nós vamos rever e a colaboração dos senhores será considerada no relatório que vamos fazer. Muito obrigado, os senhores prestaram um serviço não à Comissão, um serviço ao Brasil. No encerramento, eu quero comunicar ainda que a nossa Comissão de Educação terá logo mais, às 14h, uma audiência pública destinada a expor o processo de elaboração da base curricular na Austrália e analisar a elaboração da Base Nacional Comum Curricular do Brasil, em atendimento ao Requerimento nº 16, de autoria da Senadora Fátima Bezerra. Agradecendo também o Dr. Osmar Terra, Deputado Federal de tanta relevância na discussão desse projeto, e agradecendo a todos, dou por encerrada a presente reunião. (Iniciada às 10 horas e 05 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 22 minutos.) |
