30/03/2016 - 15ª - Comissão de Educação e Cultura

Horário

Texto com revisão

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A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Havendo número regimental, declaro aberta a 15ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Educação, Cultura e Esporte da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura.
A presente reunião atende ao Requerimento nº 16, de minha autoria, para a realização de audiência pública destinada a expor o processo de elaboração da base nacional na Austrália, bem como analisar a elaboração curricular do Brasil.
Convido... Cadê o nome aqui dos nossos convidados?
(Intervenção fora do microfone.)
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Dê-me aqui, por favor.
Convido, inicialmente, o Dr. Phil Lambert - por favor, dê-nos a honra -, Diretor-Geral da Australian Curriculum, Assessment and Reporting Authority.
Igualmente, convido também o Prof. Ricardo Cardozo, Coordenador-Geral de Ensino Médio da Secretaria de Educação Básica do MEC.
Aí é o tradutor.
O Ricardo chegou?
(Intervenção fora do microfone.)
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Ah, está aqui.
Ricardo, tudo bem?
(Intervenção fora do microfone.)
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Dr. Phil, muito obrigada.
O SR. PHIL LAMBERT - Obrigado.
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Muito obrigada.
Eu quero, antes de passar a palavra para o Dr. Phil, desde já, agradecer. E quero, aqui, fazer umas considerações e dizer que vamos realizar esta audiência pública de hoje com a participação do Prof. Dr. Phil Lambert, Diretor-Geral da Acara, entidade responsável pelo desenvolvimento e implementação do currículo nacional na Austrália. Também contamos com a participação do Coordenador-Geral de Ensino Médio da Secretaria de Educação Básica do Ministério de Educação, setor que vem coordenando o trabalho para definir as bases no sistema curricular nacional, Sr. Ricardo Cardozo.
Esta audiência tem por objetivo dar continuidade às discussões iniciadas por esta Comissão de Educação do Senado sobre a elaboração de uma base curricular comum para o ensino básico no Brasil.
O Dr. Lambert vai expor um pouco como se deu o processo de elaboração da base curricular na Austrália, para que possamos aprofundar o debate sobre o processo de elaboração da Base Nacional Comum Curricular aqui do Brasil.
Sugeri esta audiência para aproveitarmos a oportunidade de ouvirmos o Sr. Lambert, que já está no Brasil fazendo explanações sobre a experiência de criação de currículo nacional em seu país. E esperamos que a experiência desenvolvida na Austrália contribua para aperfeiçoarmos esse processo de elaboração que estamos desenvolvendo aqui.
Afinal, é a partir dessa Base Nacional Comum Curricular que deixaremos claro quais são os conhecimentos essenciais para que todos os estudantes brasileiros tenham o direito de ter acesso e de se apropriar durante sua trajetória na educação básica, narrando desde o ingresso na creche até o final do ensino médio. Com essa base curricular, os sistemas educacionais, as escolas e os professores terão importante instrumento de gestão pedagógica, e as famílias poderão participar e acompanhar mais de perto a vida escolar de seus filhos. É isso que desejamos e é para isso que trabalhamos aqui.
Bom, eu quero, só, rapidamente, dizer que esta é mais uma audiência pública que nós realizamos para tratar de um tema, sem dúvida nenhuma, muito estratégico no contexto do debate acerca da educação brasileira, que é a elaboração da Base Nacional Comum Curricular do Brasil. Essa Base Nacional Comum Curricular está ancorada em lei, está prevista, inclusive, no novo Plano Nacional de Educação, e, exatamente, por tudo que simboliza, pelo que representa, é que carece de um debate aprofundado, um debate plural e, portanto, um debate muito qualificado.
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Afinal de contas, a Base Nacional Comum Curricular será, exatamente, digamos assim, o farol, a bússola, do ponto de vista do acesso ao saber da população brasileira. Porque a população brasileira sabe o quanto a educação torna-se cada vez, e cada vez mais, um dos instrumentos mais importantes para o desenvolvimento da nossa Nação. A educação é o passaporte para a conquista da cidadania. E por isso que essa educação, repito, tem que estar ancorada numa Base Nacional Comum Curricular que reflita exatamente a realidade brasileira, com toda a dimensão continental que o Brasil tem, inclusive com as suas realidades do ponto de vista regional e com toda a diversidade que tem o nosso País.
Vamos passar agora a palavra ao professor Phil Lambert.
O SR. PHIL LAMBERT (Tradução consecutiva.) - Olá! Boa tarde. Desculpe, não falo português, então falarei em inglês. Gostaria de agradecer à Senadora Bezerra por me convidar aqui hoje. A Austrália tem muitas semelhanças com o Brasil. Nós somos um país complexo como o de vocês e somos uma federação, também como o Brasil.
Eu acho que eu poderia falar brevemente sobre o valor de desenvolver um padrão nacional, como vocês comentaram, alguns dos desafios de chegar a um consenso, ou a um acordo; a importância de flexibilidade e autonomia, equilibrada com definição de padrões; o processo de autorização, como as decisões são feitas; os benefícios para todos em um nível nacional e a importância da implementação monetária.
Eu gostaria de parabenizar o Brasil por essa atividade, porque é um marco enorme a definição de padrões educacionais para um país.
Um pouco do meu histórico: eu consegui ajudar a Austrália na elaboração do currículo nacional deles, eu também tenho ajudado a Arábia Saudita, o Japão, a Coreia e a China no desenvolvimento do currículo nacional deles.
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Isso é uma referência nacional no mundo todo e o Brasil não está sozinho nessa conquista.
Na Austrália, nós temos o mesmo processo para definir expectações claras para todos os jovens.
E, como vocês, podemos depender dos nossos melhores talentos, das nossas melhores instituições educacionais para desenvolver padrões rigorosos.
O que nós estamos fazendo é melhorar o desempenho e permitir que uma criança, não importa onde ela viva, possa ter uma performance adequada.
Assim como na Austrália, no Brasil e em outros países, há múltiplos esforços, mas também deficiências na elaboração de políticas nacionais de educação.
Aqui no Brasil, vocês têm uma base curricular nacional forte, vocês já têm um fundamento legal e vocês têm consistências no processo de elaboração de currículo.
O esforço precisa estar acima das preferências individuais e as decisões precisam ser feitas com base no que é melhor para o País. Vocês tiveram um bom processo que levou em conta 12 milhões de pessoas.
O meu conselho é que é sempre bom ter prioridades na hora de definir padrões, ter padrões diferentes em níveis estaduais, regionais, pode levar a problemas, não é?
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É importante ter um currículo, que é flexível, mas ainda inspirador. É importante que todas as crianças, independentemente de onde elas moram ou da sua situação econômica, tenham acesso e possam usufruir dessas possibilidades educacionais.
A abordagem educacional é muito importante, mas é também importante que não se deixe o método Laissez-faire - deixe que se faça. Deve haver uma guia do Estado.
Senadora, na minha opinião, é importante você distinguir entre quem desenvolve o currículo e quais são as agências reguladoras. É importante haver um processo que envolve todas as pessoas que tenham interesse na educação, e vocês fazem isso.
Em termos de autorização, na minha experiência, os desenvolvedores das políticas têm os princípios certos nos quais eles baseiam as decisões. É importante ressaltar que os nossos ministros de educação, as autoridades de educação têm aspectos importantes para consultar. Eles comparam leis de outros países para elaborar as decisões. E quando isso é feito, nós temos a elaboração de leis produtivas. Então, há muitos benefícios do esforço nacional que nós fizemos na Austrália e que vocês fazem aqui também.
De agências reguladoras e desenvolvedores de políticas, vocês têm diretrizes claras para o desenvolvimento da educação em seu país. Vocês estão fazendo testes para avaliar e assessorar as habilidades das pessoas jovens e também o que vai vir no futuro para elas e para suas famílias.
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Em termos das autoridades estaduais de ensino, é importante que sejam definidos objetivos claros para fazer melhoras na estrutura de desenvolvimento. Para os líderes educacionais isso é ótimo, porque permite que eles melhorem o desenvolvimento educacional. Para os professores a linguagem comum, o monitoramento e o desempenho do aluno em relação ao desempenho que eles esperam. E para os pais, independente de onde eles morem no País, oportunidades iguais para seus filhos. E para os alunos o acesso a um currículo de qualidade, independente de onde eles morem.
As universidades têm foco em programas de formação de professores e oportunidades de pesquisa. E assim no Brasil como na Austrália, devem existir regiões no País que são mais abastadas, que têm mais produção de recursos, e pode até haver uma desigualdade. Isso permite que todos os recursos sejam distribuídos igualmente. O monitoramento envolve pesquisas de referência frequentes em relação às expectativas de aprendizagem de outros países, os resultados das pesquisas, dados obtidos a partir de testes e avaliações evolutivas dos professores. Você pode conectar seus programas de avaliação para poder obter os dados e poder usá-los para a elaboração de novas políticas de desempenho. Alguns professores precisam de tempo para fazer a avaliação. Para outros professores isso já é mais fácil. Para alguns é mais desafiador, mas eles precisam de tempo para poder elaborar isso apropriadamente. E, pelo que sei, inicialmente alguns professores vão achar as expectativas desafiadoras. Por outro lado, aumentará o desempenho e os estudantes terão acesso a essas políticas educacionais.
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Senadora, nossa experiência é essencial para o desenvolvimento de políticas educacionais. O que fazemos é muito importante para que o futuro seja desenvolvido para as crianças.
Estou disponível para responder a qualquer pergunta sobre a experiência australiana.
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - Peço a palavra pela ordem, Srª Presidente, para discutir.
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Queremos registrar, com satisfação, a presença da Senadora Marta.
Tudo bem, Senadora! A senhora já quer fazer suas indagações? Vamos ouvir ainda o MEC.
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - Eu não sabia. Então, aguardo.
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Agradecemos ao Prof. Phil.
Terminou a sua apresentação? (Pausa.)
Queremos agradecer a contribuição do senhor.
Agora, imediatamente, vamos passar a palavra ao outro convidado.
Logo em seguida, vamos facultar a palavra aqui. A Senadora Marta já está inscrita.
Com a palavra, o Prof. Ricardo Cardozo, Coordenador-Geral da SEB-MEC.
O SR. RICARDO MAGALHÃES DIAS CARDOZO - Boa tarde a todos!
Eu queria iniciar, agradecendo o convite da Senadora, da Comissão de Educação e Cultura do Senado, para discutir uma temática que a gente julga ser tão importante, que é a construção participativa da Base Nacional Comum Curricular.
Aproveitando a oportunidade, quero dizer que é um prazer dividir este espaço com a senhora, Senadora, que desenvolve um trabalho tão efetivo na construção e na luta por uma educação pública gratuita de qualidade. É um prazer dividir este espaço com a senhora!
Quero parabenizar o Phil pela exposição. Quero dizer que as experiências internacionais, com certeza, contribuem na perspectiva de nos possibilitar análises acerca dessas experiências, para ressignificar essas experiências para o nosso País. É claro que não dá para dizer que podemos copiá-las, mas, com certeza, elas contribuem para nossas reflexões.
Eu tinha mandado uma apresentação. Vocês receberam a apresentação?
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Está aí a apresentação?
Queremos, Senadora Marta, monitorar bem o tempo aqui, para lhe darmos oportunidade.
O Prof. Phil tem de sair daqui às 15h45. Mas dará tempo. Serão 15 minutos destinados à apresentação dele. Em seguida, faculto a palavra à senhora.
O SR. RICARDO MAGALHÃES DIAS CARDOZO - Tudo bem! Para otimizar a utilização do tempo, enquanto o pessoal verifica se tem acesso à apresentação, eu já queria dar início à minha fala.
A primeira questão com relação à construção participativa da Base Nacional Comum que a gente gostaria de colocar é que a Base Nacional Comum Curricular não é um currículo e não fere a autonomia da escola e dos professores na construção e no respeito às diversidades. Ela é uma proposta de referência curricular que delimita direitos e objetivos de aprendizagem que são importantes e que todos os nossos estudantes da educação básica devem ter, mas que têm de ser ressignificados à luz das experiências do sistema de ensino e à luz das experiências das escolas. Então, esse é um ponto importante.
Outro aspecto que é importante elencar é que esse processo tem sido construído a partir de ampla participação dos diversos segmentos da sociedade que debatem e têm interesse acerca da discussão da educação pública.
Então, o que o MEC fez foi lançar uma versão preliminar, um protótipo, para que a sociedade brasileira, as associações científicas, os estudantes, os professores, as escolas, as universidades, as Casas legislativas pudessem se debruçar sobre uma proposta que é preliminar, necessariamente a partir do debate público que tem sido feito desde 15 de setembro, quando o MEC lançou essa proposta, com o intuito de melhorar, de aprimorar uma proposta de conhecimentos necessários que devem estar presentes desde a educação infantil até o ensino médio. Então, esse é um aspecto que é importante nós colocarmos.
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Nós sabemos que, para construção de um currículo, o entendimento que temos é o de uma proposta de ação educativa constituída por essa seleção de conhecimentos que são considerados relevantes e pertinentes e que partem da sociedade.
Neste momento, é necessário que nós, que estamos diretamente envolvidos com as questões educacionais, nos debrucemos sobre essa questão porque a seleção dos conteúdos passa por uma análise prévia e passa pelo entendimento que professores, estudantes e toda a sociedade brasileira têm sobre quais aspectos são fundamentais e que devem ser contemplados.
Na construção dos currículos, desde a educação infantil passando pelos anos iniciais e finais do ensino fundamental e do ensino médio, a Base Nacional Comum está ancorada nas Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação. Temos a Base Nacional Comum, que deve ser integrada a essa parte diversificada. A Base Nacional Comum entendida como esse conjunto de conhecimentos, saberes e valores produzidos pelas instituições produtoras de conhecimento, mas também pelas linguagens, pelas atividades esportivas e culturais, pela produção artística, pelas diversas formas do exercício de cidadania, pelos movimentos sociais. Então, toda essa gama de conhecimento se une para a construção de uma base nacional comum que delimite esses direitos e objetivos de aprendizagem dos nossos estudantes da educação básica.
Para complementar esse currículo, a gente tem uma parte diversificada, no qual cada sistema de ensino e cada estabelecimento escolar vão buscar a melhor maneira de articulação com a comunidade. A escola é um aparato que faz parte da sociedade, mas tem que se estar o tempo inteiro dialogando com ela.
Então, nesse sentido a gente compreende que a Base Nacional Comum tem que dialogar com a comunidade escolar para construir as aproximações, para construir uma aprendizagem significativa, para fazer com que esses conhecimentos estabelecidos na base possam dialogar numa perspectiva de formação integral do ser humano, numa perspectiva de uma cidade que educa, de um bairro que educa, na perspectiva de que a escola é um instrumento importante no processo de escolarização formal, mas que não é o único elemento da sociedade que tem esse papel.
Do ponto de vista da linha histórica, é importante a gente falar sobre os aspectos legais que ancoram a construção de uma base nacional comum. Desde a Constituição Federal de 88, a gente tem o apontamento da construção de conteúdos mínimos para o ensino fundamental.
Já na LDB, em 96, no art. 26, a gente fala que os currículos do ensino fundamental e médio devem ser contemplados por uma base nacional comum. A sociedade brasileira deveria construir uma base nacional comum. Esse é um apontamento que está presente na LDB. E foi modificada em 2009, acrescentando a educação infantil. Então, desde a etapa da educação infantil até o ensino médio, caberia ao Governo propor uma base nacional comum que necessariamente precisaria dialogar com a sociedade.
E a discussão acerca de diretrizes curriculares, de parâmetros para os currículos no País, não se dá início com a construção de uma base nacional comum. É importante a gente dizer isso. Tivemos os Parâmetros Curriculares Nacionais, construídos de 1997 a 2000, que foram importantes instrumentos para a construção dos currículos nos sistemas estaduais e municipais de educação.
Tivemos apontamentos, diretrizes curriculares nacionais desde a educação infantil, ensino fundamental de nove anos, diretrizes curriculares gerais da educação básica, diretrizes curriculares do ensino médio, diretrizes da diversidade, escolas do campo, educação quilombola, relações étnico-raciais na escola, e todas essas diretrizes vêm amadurecendo uma discussão pública no País de 2002 a 2012, que dão sustentação para que neste momento a gente possa propor essa construção da base.
Outro aspecto importante a elencar é que, já na 1ª Conferência Nacional da Educação, aparece a indicação de diretrizes epistemológicas para a construção de currículos. Essa indicação já aponta para a necessidade de uma base nacional comum, porque está unindo a perspectiva da legislação e de uma conferência que reúne estudantes, professores, movimentos sociais, gestores, legisladores, que certamente nos ajudaram na construção do PNE.
Ainda poderíamos dizer que, já no PNE, a Lei nº 13.005, de 2014, temos em diversas estratégias, desde a educação infantil ao ensino médio, o apontamento, a necessidade - eu não vou citar textualmente, mas temos na legislação a importância da construção dessa base nacional comum, que deveria ser feita a partir de uma proposta, construída a partir de articulação e colaboração do Ministério da Educação com entes federados, que seria levada para o diálogo e discussão com toda comunidade e, a partir dessa discussão, encaminhada para o Conselho Nacional de Educação, que é quem tem, segundo a legislação, o papel de aprovar essa proposta de Base Nacional Comum Curricular.
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Então todos esses aspectos nos levam a crer que a sociedade educacional brasileira foi amadurecendo para que hoje pudéssemos ter uma proposta sólida para construção da Base Nacional Comum Curricular.
Ainda com relação a esses aspectos, quero dizer que o que percebemos, a partir de análises que o Ministério da Educação fez, é que há vários Municípios que ainda não têm uma proposta de referência curricular. Então essa Base Nacional Comum Curricular, como próprio Prof. Phil disse anteriormente, contribui para que as escolas elaborem os seus currículos. Quer dizer, nós concordamos com autonomia das escolas. As escolas têm que ter autonomia, os professores têm que ter autonomia, mas é importante que tenhamos diretrizes, que tenhamos uma referência para contribuir na construção desses currículos.
No dia 17 de junho de 2015, o Ministério da Educação lançou uma portaria com 129 especialistas que contribuíram para a redação dessa proposta preliminar e que têm contribuído acatando as sugestões que vêm de todos os lados, do sistema de contribuições, das associações científicas, dos diálogos que o Ministério da Educação faz em todo País.
É importante elencar que, desde a concepção, o ministério já pensou em uma importante aliança; na aliança entre aqueles professores que estão na educação básica. Então 50% dos professores que compõem essa comissão de especialistas são professores da educação básica, indicados pelo Consed (Conselho Nacional de Secretários de Educação) e pela Undime (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação). Então, reforçando esse aspecto: nós precisávamos ouvir os professores que estão vivenciando o cotidiano escolar, mas também precisávamos ouvir os professores das instituições formadoras, das instituições de ensino superior. Então 50% desses professores são oriundos de escolas da educação básica e 50% de universidades, pensando em uma proposta que desse conta de unir essas duas perspectivas e de pensar em toda territorialidade do Brasil, nas particularidades e diversidades que nós temos.
Todos os Estados brasileiros estão representados nessa comissão de especialistas. É importante elencar isso, porque sabemos que o Brasil é um País de dimensões continentais e que nós necessariamente precisamos ouvir toda essa diversidade com o objetivo de formar, de construir uma melhor proposta.
Quando eu digo construir uma melhor proposta é na perspectiva de que essa proposta não é estanque, ela não é uma proposta que não se modifica, que, uma vez construída, permanece, perdura por muito tempo. Assim como a sociedade brasileira muda, a educação deve mudar, e os direitos e objetivos de aprendizagem têm que acompanhar essa sociedade. Queremos, sim, construir uma proposta que seja mais adequada para esse momento, mas sabemos que ela vai precisar ser ressignificada, que ela vai precisar ser revisitada ao longo do tempo, para que ela continue a contribuir como uma importante referência para a educação básica.
Outro aspecto que eu acredito que é importante elencar é que a Base Nacional Comum Curricular não tem uma perspectiva redentora. O papel dela é construir uma referência curricular, mas, certamente, uma proposta dessa natureza contribui para influenciar as demais políticas públicas que incidem na educação básica e que pretendem melhorar a qualidade da educação básica brasileira.
Do ponto de vista de organização desse processo de construção da Base Nacional Comum, eu acho que cabe aqui falar brevemente acerca de um cronograma.
Nós tivemos o início dessas reuniões com esses especialistas em 11 de fevereiro de 2015; a portaria ministerial no dia 17 de junho; nós tivemos apresentação de um texto preliminar no dia 15 de setembro; e lançamos um sistema de contribuições. Esse sistema de contribuições ficou aberto de 25 de setembro de 2015 a 15 de março de 2016, totalizando mais de 5 meses de consulta pública, na qual nós recebemos 12,2 milhões de contribuições, professora, dos mais diversos locais de todos os Estados da sociedade brasileira, de todos os segmentos. Foram contribuições muito importantes para uma escuta qualificada e para a perspectiva de entrega da segunda versão do documento que é no dia 15 abril.
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Então, os colegas que estudarem essa proposta da preliminar da Base Nacional Comum como todo ou em parte, vão perceber o quanto ela se qualifica a partir desse debate público, o quanto que, além de escutar essas contribuições, o Ministério tomou o cuidado de acatá-las de usá-las para a melhoria do documento.
A partir do lançamento da segunda versão, a gente tem a proposta de realização de seminários municipais, estaduais que estarão acontecendo no mês de maio em todo o País para, assim, realizarmos uma pactuação interfederativa e encaminharmos, como está previsto no PNE, o documento para o Conselho Nacional de Educação que é responsável pela emissão de um parecer.
Ainda pensando nos números dessa consulta pública, porque são números grandiosos, a gente teve mais de 250 mil indivíduos cadastrados - porque o cadastro poderia ser feito por indivíduo; por redes, que são as escolas de educação básica do País e por organizações, universidades, associações científicas, grupos de pesquisadores que gostariam de opinar, associações de pais e outros tipos de organização - 4.250 organizações, 45 mil escolas, totalizando mais de 12 milhões de contribuições.
Nesse momento, desde que o portal colocado no ar, a partir do mês de dezembro a gente conta com a UnB, Universidade de Brasília, uma universidade respeitada em nosso País, para colaborar conosco no tratamento estatístico e qualitativo dos dados. Outro aspecto que é importante: nós convidamos leitores críticos, especialistas nos diversos componentes, nas diversas áreas para contribuir e reuniões com associações científicas de todas as áreas, de todos os componentes, as mais importantes do País estão sendo convidadas para participar. Somado a isso, a publicidade das contribuições.
(Soa a campainha.)
O SR. RICARDO MAGALHÃES DIAS CARDOZO - Qualquer um dos colegas que aqui quiserem entrar no portal basenacionalcomum.mec.gov.br vai encontrar lá todos os pareceres dos leitores críticos, ele pode pesquisar a contribuição que as escolas, o que os indivíduos fizeram deixando claro que esse processo prima pela transparência, prima por um debate, por um diálogo.
E, com intuito de finalizar, de caminhar para a finalização da minha fala, eu queria elencar alguns efeitos: quando eu digo que a Base Nacional Comum não é redentora, mas tem um papel de contribuir na influência das demais políticas públicas, na política nacional de formação inicial e continuada de professores. Quer dizer, se tem uma base, ela tem que estar alinhada à formação inicial e continuada de professores, ela tem que estar alinhada à política de materiais e tecnologias educacionais, à política do livro didático e às demais políticas de materiais e tecnologias educacionais, ela tem que estar alinhada às avaliações de larga escala, às avaliações da educação básica, seja ela Prova Brasil, ANA ou Enem, ela tem que estar a essa proposta de Base Nacional Comum e aos parâmetros de qualidade de oferta.
Eu ainda queria reiterar que, quando nós falamos de avaliação da educação básica, não nos restringimos à avaliação de larga escala. A avaliação de larga escala é uma importante avaliação de desempenho. Nós estamos construindo, está previsto no PNE, um Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica que também complemente essas informações a partir da escuta da escola. Para uma temática tão abrangente, tão ampla e tão complexa, o tempo que temos aqui é curto, pretendemos fazer uma breve apreciação. E, para finalizar, eu queria trazer um texto do Fernando Pessoa que eu acho que é adequado para este momento.
Encontrei hoje em ruas, separadamente, dois amigos meus que se haviam zangado um com o outro. Cada um me contou a narrativa de por que se haviam zangado. Cada um me disse a verdade. Cada um me contou a suas razões. Ambos tinham razão. Ambos tinham toda a razão. Não era um que via uma coisa e outro outra, ou que um via um lado das coisas e outro um lado diferente. Não: cada um via as coisas exatamente como se haviam passado, cada um as via com um critério idêntico ao do outro, mas cada um via uma coisa diferente, e cada um, portanto, tinha razão.
Fiquei confuso desta dupla existência da verdade.
Nós sabemos que para construirmos um entendimento nacional acerca da construção de currículos, acerca de uma referência curricular, não é uma tarefa fácil, mas nós contamos com a sociedade educacional brasileira, porque sabemos que essa Base Nacional Comum vai ser um importante instrumento.
Reitero o agradecimento à Senadora pelo convite, dizemos que a Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação está à disposição e queremos agradecer também imensamente a participação da Senadora Marta Suplicy.
Muito obrigado e à disposição para o diálogo.
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A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Agradeço ao Prof. Ricardo, aqui representando a Secretaria de Educação Básica. Na estrutura do MEC, é a Secretaria que está mais à frente, que está coordenando o debate.
Em função do tempo, vamos passar, imediatamente, a palavra à Senadora Marta.
A SRª MARTA SUPLICY (Bloco Maioria/PMDB - SP) - Obrigada.
Primeiro, quero agradecer a presença do Sr. Ricardo Cardozo aqui e a sua contribuição e também a presença de Phil Lambert, que nos pode auxiliar, neste momento tão importante para nós brasileiros, no desenvolvimento de um currículo adequado.
Realmente, Sr. Coordenador-Geral da Secretaria de Educação Básica, isso não é fácil, as visões são subjetivas, são diferentes. Mas, primeiro, já ficou uma questão. É que a primeira fala do senhor foi a de que não é um currículo e a de que não fere a autonomia. Quanto a essa primeira questão, não sou especialista, mas acredito que é um currículo, sim, que tem de ser adaptado às idiossincrasias regionais. Quero saber se é isso que o senhor pensa. Ou, então, se não é um currículo, é o quê?
A outra questão eu a abordarei por último, quando falar sobre as questões do professor.
Primeiro, eu teria muito interesse em conhecer quais os critérios para a seleção das matérias. Por exemplo, vi que as matérias que são selecionadas na Austrália são somente Inglês, Matemática, Ciências e História. Acho muito interessante essa proposta. No Brasil, há mais ou menos 11. É outra proposta. Eu gostaria de saber se vocês já tiveram essa variedade de matérias. Por que focar em poucas?
Abordo outra questão. Tratarei de várias questões. Se ele quiser anotá-las, será bom.
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN. Fora do microfone.) - Você as está anotando para ele?
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - A não ser que ele tenha uma boa memória.
A outra questão trata do tipo de investimento. O seu país e o nosso têm coisas semelhantes: a extensão, a desigualdade e a diversidade. Então, eu gostaria de saber que tipo de investimento específico é destinado para as áreas menos desenvolvidas do país, principalmente em relação à formação de professor, mas também, talvez, em relação até à infraestrutura.
Outra questão: qual é a extensão de informatização nas escolas na Austrália? As escolas menos desenvolvidas e mais longínquas são informatizadas?
Outra questão: o que o senhor considera mais importante para um currículo do século XXI? Como atingir essa meta com escolas - não sei como é no seu país, mas aqui é assim - que usam ainda uma metodologia do século XIX? Mesmo quando elas possuem os gadgets todos, elas continuam com a mesma metodologia. É como se pusesse um piloto de Boeing deste século no século passado! Ele não saberia mexer em nada. O gap é tão grande, é tão discrepante!
Há duas coisas diferentes. Primeiro, o que seria um currículo ideal? Vocês têm a preocupação, numa sociedade que muda tanto, de criar nessas crianças essa possibilidade que é tão rápida? No meu entender, a única forma que pode garantir isso é o desenvolvimento de uma mente crítica e aberta, que saiba usar bem a internet.
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Outra questão: eu entendi, lendo um pouco o sumário que foi enviado, que, quando começaram a pensar nessa questão do currículo, houve um primeiro formato, que foi em 2009. Depois, passaram algumas modificações até chegar a esse formato de 2011. Acho que não temos que inventar a roda. Se pudéssemos já saber o que não funcionou bem e o que o senhor teria como acréscimo...
A última questão é para os dois, para o Dr. Ricardo e para o Dr. Phil.
Na minha avaliação, tão importante quanto acertar um currículo é depois ter professores com formação adequada para poder cumprir esse currículo.
Eu queria saber como foi esse processo, quão longe os professores do seu país estavam disso, que tipo de investimento, se foi um tour de force, o que foi feito para se conseguir ou se não conseguiram ainda ter uma meta. E, no Brasil, Prof. Ricardo, como está sendo pensada essa adequação, porque, se não, nós vamos continuar fazendo leis com muita dificuldade de implementação.
É isso, Senador.
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Senadora Marta, obrigada. Como o Prof. Phil tem problema de horário, já vou passar a palavra para ele.
Eu teria outras perguntas a fazer, mas não vou fazê-las. Quero apenas adicionar às indagações da Senadora Marta, todas elas, inclusive, muito pertinentes, o seguinte: ao final, o projeto passou pelo Congresso? Entendeu, Prof. Phil?
O SR. PHIL LAMBERT (Tradução consecutiva.) - Sim. Eu posso responder às perguntas, sim.
Nós temos oito matérias. Começamos com quatro, mas nós, agora, completamos todos os oito temas de conhecimento.
Eu gostaria de dizer que, apesar de termos um compromisso com os investimentos, em termos de equilíbrio na distribuição dos recursos, através de uma combinação de fundos estaduais e federais, independentemente de onde a escola está, existe um padrão comum de porção de professores e de distribuição de cursos com computadores.
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - Desculpe-me. Eu gostaria de fazer outra pergunta. (Fora do microfone.)
O SR. PHIL LAMBERT (Tradução consecutiva.) - São estaduais. O Governo Federal tem responsabilidade na política, mas o Governo Federal não opera escolas. Ele as opera através das autoridades estaduais.
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - Mas não as cidades, então. Não é municipalizado.
O SR. PHIL LAMBERT (Tradução consecutiva.) - Não.
Em termos de cursos de informática, sendo distribuídos, são muito significantes no nosso país todo. Incorporado ao nosso currículo, é o que nós chamamos de habilidades do século XXI, gostaria de mencionar isso.
Um dos comentários que fiz sobre a primeira versão dos padrões brasileiros, os princípios introdutórios eram muito claramente sobre as habilidades do século XXI. Uma das questões que identificamos para o Brasil no começo era a questão do alinhamento, o que era a visão e quais eram os objetivos de aprendizagem, no seu comentário sobre estudantes sendo passivos, não pensando criticamente.
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Não conseguiríamos ver o alinhamento dessa visão e os temas que eram perguntados dos alunos. Mas, pelo que eu vi, pelo conselho que nos demos, há um esforço significativo em andamento para mudar isso. Então, a demanda conceitual, a participação ativa dos alunos é muito mais nítida agora do que era antes, na primeira versão.
Em termos de treinamento, absolutamente. Quando você tem uma mudança significativa desse tipo, e quando você introduz novas formas de ensino, segmentos da universidade, da educação de professores, e autoridades educacionais precisam investir no desenvolvimento de novas técnicas de ensino, porque, para muitos alunos, essa foi uma nova abordagem ao ensino. Mas não se pode ter alunos sendo líderes críticos se os professores estão aplicando uma abordagem de ensino de um outro século, como você estava falando. Isso é muito certo.
A SRª MARTA SUPLICY (Bloco Maioria/PMDB - SP) - Desculpe, gostaria de mais uma pergunta. Como é acolhida a criança portadora de deficiência? Há alguma coisa especial? Qual é o limite? Há pessoas especiais para tratar? Como é que vocês lidam com isso?
O SR. PHIL LAMBERT (Tradução simultânea.) - Nós treinamos os nossos professores para fazer acomodações. Nós não queremos que as crianças com deficiência tenham um currículo separado, mas reconhecemos que precisamos acomodar as diferenças que as crianças têm. Esperamos que os professores possam se ajustar ao currículo, fazer isso em uma idade apropriada para a criança, para que as crianças possam acessar o mesmo currículo, mas as expectativas dos alunos podem ser ajustadas de acordo com as capacidades da criança.
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Minha pergunta é com relação ao processo. Aqui passou pelo Congresso, mas passou pelo Congresso na medida em que foram aprovados a orientação e os prazos, inclusive, via Plano Nacional de Educação. Ponto. Mas a partir daí o debate está sendo feito, e não será mais objeto de aprovação do Congresso Nacional. Pergunto: o processo lá também foi semelhante?
O SR. PHIL LAMBERT (Tradução consecutiva.) - Sim. Nós tínhamos nossas autoridades educacionais como o corpo que autorizou. O papel dos oficiais do governo, dos políticos, era confirmar que o processo foi seguido, mas não para ir aos detalhes, abordar os detalhes. O que tivemos no passado foram indivíduos que tinham influência, que prejudicavam o processo de consulta.
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Ou seja, não passou pelo Congresso.
A SRª MARTA SUPLICY (Bloco Maioria/PMDB - SP) - Posso também dar uma opinião sobre isso, Senadora? Ele disse que não passou porque não é a especialidade do Congresso, com o que eu concordo plenamente. Não é a nossa especialidade, nem estamos aqui para isso. Estamos aqui para seguir um processo, para que eles façam o processo correto. Quem entende são os especialistas. Com isso, eu estou plenamente de acordo. Tem que ser assim, porque as reuniões que eles devem ter são inúmeras. Nenhum Parlamentar poderia se afastar do seu trabalho aqui para seguir aquelas reuniões. Aliás, eu adoraria, mas não dá.
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A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Senadora Marta, eu fiz essa pergunta importante porque V. Exª já deve ter tomado conhecimento de que, infelizmente, há uma proposta em curso. Não sei se V. Exª já prestou atenção, está sendo apensada até a medida provisória da qual V. Exª é Presidente - refiro-me à medida provisória que trata do Brasil Carinhoso - e eu sou a Relatora-revisora no Senado.
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - Aquela medida, até onde eu sei... Tenho que olhar com lupa. Se estiver, nós vamos derrubar. Nós não temos nada a ver com isso.
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Primeiro que é um dispositivo estranho à medida provisória. Já há inclusive jurisprudência aqui no Congresso, V. Exª sabe, o que é muito saudável, que não se aceitam mais emendas que não sejam afetas diretamente ao tema. Ou seja, essa medida foi adotada tanto na Câmara quanto no Senado com o intuito de evitar os chamados "jabutis". A primeira questão é essa. Infelizmente, é o Relator, inclusive.
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - Acabei de ser informada de que é o Relator. Acho que temos que nos organizar para derrubar, porque acredito que o especialista que está nos visitando tem toda a razão. Você já imaginou o que iriam inventar nesse currículo?
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Minha Nossa Senhora! V. Exª tem experiência o suficiente para ter essa avaliação. No que poderia resultar uma proposta de base nacional quando passar pelo Congresso!
Foi bom até para deixar V. Exª alertada, porque a proposta foi apresentada.
Ricardo, a Senadora Marta fez umas perguntas a você. Eu queria só que você, ao responder, reforçasse o calendário final, por favor.
O SR. RICARDO MAGALHÃES DIAS CARDOZO - Senadora Marta, eu queria agradecer pelas questões. Com certeza, elas contribuem para o esclarecimento dessa importante temática. Com relação à Base Nacional Comum, não é currículo. A gente reitera essa posição. Mas em qual compreensão? Acho que a gente tem uma aproximação, uma interseção de percepções. A Base Nacional Comum é uma referência para a construção de currículos. Por quê? Porque o currículo é aquele que é adotado na escola, construído na escola, a partir de um projeto político-pedagógico, a partir do momento em que a escola estabelece relações com a sociedade, a partir do momento em que você leva em consideração a construção das identidades socioculturais dos educandos que lá estão. Então, se a gente diz que é currículo, a gente vai dizer que o mesmo currículo implantado no norte de Minas vai ser implantado em São Paulo capital?
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - Deixe-me, então, explicar o que eu quis dizer. Eu pensei nas cadeiras, nas matérias. O que vai ser dentro é claro que é adaptado. Agora, de repente, não sei em que cidade, resolvem colocar outra matéria que não está no currículo. Isso pode?
O SR. RICARDO MAGALHÃES DIAS CARDOZO - O que a Base Nacional Comum estabelece? Esses conhecimentos que estão sendo discutidos publicamente, que vão ser aprovados por um parecer do CNE, encaminhados para homologação do Ministério da Educação, eles são conteúdos, objetivos de aprendizagem a que todos os estudantes da educação básica do Brasil têm que ter direito. No entanto, a escola tem autonomia para fazer outros arranjos que atendam as peculiaridades, as diversidades, as regionalidades.
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - Ir além do currículo básico.
O SR. RICARDO MAGALHÃES DIAS CARDOZO - Isso. E além das questões propostas.
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - A gente vai ter que tomar também cuidado com isso, porque é bom, mas, ao mesmo tempo, já dá para ver o que vai acontecer.
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Se não me engano, na proposta, a sugestão é de 40% para a base curricular comum e 60% ficariam...
O SR. RICARDO MAGALHÃES DIAS CARDOZO - É o contrário, 60% para a Base Nacional Comum e 40% para essas...
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - Se eu tivesse tempo, eu gostaria de saber a opinião do especialista, que está aflito porque tem um voo. Acho muito, porque, matemática, português e outras duas matérias, mais três, quatro ou oito, como ele acabou falando, são muito importantes. Essa transversalidade pode estar dentro dessas matérias. Eu gostaria que vocês pensassem um pouco sobre isso.
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O SR. RICARDO MAGALHÃES DIAS CARDOZO - Veja: em qual prisma nós estamos analisando essa questão? Quando falamos de parte diversificada, ou seja, da interface que a escola faz com a comunidade para a construção do seu currículo, ela está assentada diretamente na Base Nacional Comum. Vamos pensar em sociologia, vamos pensar nos movimentos sociais, quando você está estudando a importância dos movimentos sociais para formação da cidadania. Em uma cidade do interior do Rio Grande do Sul, talvez seja interessante tratar dos movimentos rurais no campo, porque essas cidades desenvolvem uma correlação maior com essas questões, mas, em São Paulo, você pode tratar, por exemplo, do movimento do hip-hop ou dos movimentos sociais urbanos.
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - Ou das ocupações no centro da cidade.
O SR. RICARDO MAGALHÃES DIAS CARDOZO - Ou das ocupações no centro da cidade. Nós vamos ter, na verdade...
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - Eu não sei se isso é o melhor.
O SR. RICARDO MAGALHÃES DIAS CARDOZO - Na verdade, é uma interface. A parte diversificada faz uma interface com o que está proposto na Base Nacional Comum, não é nada que fuja daqueles aspectos que ali já estão elencados.
Com relação à seleção de componentes curriculares, a Base Nacional Comum está submetida a diretrizes curriculares nacionais. Então, as diretrizes estabelecem a organização dos componentes curriculares, tanto nos anos iniciais quanto nos anos finais do ensino médio. Uma vez as diretrizes mudando, uma vez a LDB se modificando, a Base Nacional Comum se modificaria. Então, ela não propõe. Não é ela que estabelece os componentes curriculares, ela organiza os componentes curriculares que já estão estabelecidos pelas diretrizes.
Por fim, a questão da formação de professores. Eu somaria essa preocupação à preocupação com materiais e tecnologias educacionais e com parâmetros de qualidade de oferta. O que percebemos, Senadora? É que nós temos ainda uma longa caminhada para qualificar a formação de professores no País. Eu posso dizer que, nos últimos anos, com a abertura de mais de 18 universidades federais, de 144 campi de institutos federais que oferecem licenciaturas também, para 562, temos buscado a melhoria dessa formação, mas eu acredito que a formação caminha junto com a valorização.
E é muito bom ter oportunidade de falar isso nesta Casa, porque nós precisamos unir esforços para que tenhamos um financiamento cada vez mais qualificado para a educação pública no País, para garantir parâmetros de qualidade de oferta, para que neles constem as condições necessárias para fazer com que o currículo funcione, a formação de professores e os materiais e tecnologias educacionais.
Poderíamos dialogar mais sobre isso, mas eu tentei pontuar as questões apresentadas.
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - E o prazo?
O SR. RICARDO MAGALHÃES DIAS CARDOZO - Com relação ao prazo, a proposta nossa é a de que, no dia 15 de abril, seja lançada a segunda versão da Base Nacional Comum, cotejada pelas contribuições, as mais de 12 milhões de contribuições.
No mês de maio, haveria a realização de seminários estaduais. Cada Estado, não como rede estadual, mas como território, organizaria seminários para apresentar qual a proposta dos Estados acerca dessa segunda versão de Base Nacional Comum.
No mês de junho, haveria a pactuação interfederativa a partir dessas propostas realizadas pelos Estados, com o Consed (Conselho Nacional de Secretários de Educação) e a Undime (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação), para que essa proposta seja encaminhada ao CNE. A partir do momento em que ela é encaminhada ao CNE, ele tem autonomia para dialogar acerca da proposta construída e encaminhar para homologação para o Ministério da Educação.
É isso.
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - Presidente, eu gostaria de fazer mais uma pergunta ao Prof. Ricardo.
O senhor comentou sobre formação e valorização, que caminham juntos. Agora, eu gostaria de saber da sua visão pessoal de como resolver essa questão em um País onde não há tanta condição financeira, apesar de que a educação é uma das áreas onde há mais recursos. Na medida em que se valoriza... E aí estamos falando basicamente de uma valorização salarial, porque hoje o piso do professor está muito baixo. O professor não tem estímulo. E nós estamos vendo que os que procuram a carreira não são as pessoas mais qualificadas das escolas. Não há mais aquela ideia de que ser professor é alguma coisa que a família valoriza, infelizmente, porque é isso, em todas as pesquisas que lemos... Inclusive, eu vi nos Estados Unidos algo que eu achei interessante: os melhores alunos das melhores universidades são incentivados a passarem alguns anos dando aula, o que acabou sendo uma grande disputa, porque é muito valorizado ter no currículo essa possibilidade. E volto à pergunta inicial - pode até ser uma opinião pessoal, porque não se aprofundou nisto, de também não se fala: como faria para haver uma valorização que fosse ligada à formação?
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A formação ensejaria um aumento salarial? E como isso seria recebido na categoria? Porque também há muita rebelião, na categoria, quando se fala isso - acho. Não sou tão... Mas acho que há, porque, como o salário é achatado, as pessoas querem já uma recuperação salarial. O que é correto, num certo sentido, só que não dá para fazer os dois. Como essa visão poderia conjuminar isso para sairmos dessa questão? A maioria das faculdades é fraca, os alunos que chegam vêm de comunidades mais carentes.
Agora está em análise aqui um projeto... Aliás, não está em análise. Eu vi que há um projeto no MEC - houve aqui uma audiência pública, houve milhões de assinaturas, porque queriam diminuir pela metade - que cortava a formação de professores, bolsa para professores de educação infantil. No final, parece que está sendo reconsiderado no MEC. Isso me parece fundamental, porque há crianças que nunca viram livro, nunca viram uma letra. Não dá para ter um professor que não tenha uma especialidade em alfabetização diferenciada fazer esse trabalho.
Então, projetos e programas como esse, que foram pensados em ser cortados pela metade, é que deveriam ser incentivados. E o próprio benefício para o professor já está em ele ter uma especialização, que, num segundo momento, tenho certeza de que este País vai passar a valorizar. Mas eu gostaria de saber os seus pensamentos sobre isso.
O SR. RICARDO MAGALHÃES DIAS CARDOZO - Senadora, essa é uma temática bem complexa, porque os dados oficiais apontam que infelizmente ainda não chegamos a essa condição de especialização. Por quê? Porque, em boa parte dos componentes curriculares, os professores que ministram esses componentes não têm a formação inicial neles. Então, a nossa tarefa ainda é anterior e mais árdua.
O que eu penso é que... Por isso, eu valorizo estes momentos em que temos Executivo e... Eu sou professor do Instituto Federal do Norte de Minas Gerais. Estou nessa tentativa de colaborar, no Ministério da Educação, durante algum período, mas volto lá para a formação de professores, que é a minha área. Eu sou da formação de professores, trabalho em formação de professores em Química, Física, Biologia e Matemática, nas matérias vinculadas à didática e fundamentos.
O que eu acredito é que a sociedade brasileira - quando eu falo sociedade, eu não estou restringindo aos educadores, eu não estou restringindo aos legisladores, eu estou dizendo a sociedade - tem que apontar que a educação, neste País, é prioridade absoluta. Precisamos dirimir as desigualdades nas oportunidades educacionais e na oferta qualificada da educação. Eu acho que, somada a essa discussão de formação, uma discussão que tem amadurecido no Ministério da Educação, mais do que na hora, são os parâmetros de qualidade de oferta, quais são as condições que a escola tem que ter para ofertar uma educação de qualidade.
Nós sabemos que há escolas que talvez estejam num nível adequado ou até acima de um nível básico, mas há outras que estão muito abaixo neles. Para essas escolas, normalmente localizadas nos rincões do País, nas periferias, nas franjas das grandes cidades, tem que haver um aporte maior, porque normalmente se une a baixa formação, porque é onde os professores... Os melhores professores não vão para essas escolas onde há menos qualidade de infraestrutura, onde há mais dificuldade de acesso, onde há dificuldade de gestão.
Todos os aspectos unidos precisam ser trabalhados principalmente nessas questões. Então, eu acho que isso não acontece se não houver um compromisso, por mais que o nosso País não tenha ainda condições orçamentárias as mais adequadas possíveis para oferecer uma destinação maior, precisamos de mais recursos para a educação, precisamos para essa valorização do professor. Para que o professor possa ter interesse de entrar na escola, é preciso valorização.
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - Eu tive uma ideia. Eu estou aproveitando, porque ele é do MEC e podemos conversar.
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Com certeza, Marta.
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - Por exemplo, nós temos o Fies, que é um programa interessante, que deu um monte de problema, mas acho que vai conseguir diminuir e acertar o rumo. Por exemplo, se um aluno do Fies, em pagamento, tivesse que dar aula numa escola dessas mais carentes e, para isso, tivesse um período antes de dar aula, uma especialização...
O SR. RICARDO MAGALHÃES DIAS CARDOZO - Uma residência.
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - ... uma residência para se qualificar, poderia ser uma solução razoável.
O SR. RICARDO MAGALHÃES DIAS CARDOZO - Eu concordo.
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - Então, nós temos que pensar coisas desse tipo para...
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Eu acho, inclusive, que houve uma época em que o MEC teria adotado uma proposta mais ou menos nessa linha que a Senadora Marta apresentou agora.
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O SR. RICARDO MAGALHÃES DIAS CARDOZO - Essa proposta está na Capes, na coordenação.
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - É, na Capes. Mas eu queria adicionar que, dentro da preocupação que diz respeito à formação, o Pibid, de acordo com as reformulações por que está passando... Uma dessas reformulações é exatamente fazer com que o Pibid preferencialmente se volte para as escolas que estão nas regiões mais vulneráveis, com o Ideb mais baixo, etc., até porque o atual Pibid não estava concentrado exatamente nessa área, não é?
O SR. RICARDO MAGALHÃES DIAS CARDOZO - Eu sou suspeito, como educador, para falar do Pibid. Eu fui coordenador do Pibid na minha instituição de 2011 a 2015, antes de vir para o Ministério da Educação. Para mim é um dos programas mais virtuosos que o Ministério desenvolveu nos últimos anos, porque ele unifica a qualificação da educação básica, ou seja, ele faz com que os estudantes de licenciatura vão para as escolas de educação básica na perspectiva de melhorar o rendimento daqueles alunos que lá estão e, ao mesmo tempo, propicia uma experiência do cotidiano escolar que é muito rica para a atuação desse futuro professor.
Então vejo que é um programa extremamente virtuoso. E parabenizo a Comissão do Senado, porque a gente sabe...
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Tivemos um papel na Comissão muito...
O SR. RICARDO MAGALHÃES DIAS CARDOZO - Um papel importante aqui, uma audiência pública que foi uma das maiores...
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - ...que deflagrou todo o processo que foi vitorioso. O programa está mantido. A Senadora Marta acompanhou.
Graças a Deus o programa está mantido. As reformulações que estão sendo feitas são para aperfeiçoar o programa.
De fato, esse debate, para nós que não tivemos a vivência como você teve como professor, nos possibilitou conhecer a grandiosidade e a beleza desse programa.
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - Pois é, mas agora temos que pensar em coisas novas, outros caminhos.
Nós tivemos ontem uma audiência pública sobre o Brasil Carinhoso, programa muito interessante. É nesse que o Relator está querendo aceitar o negócio do currículo, e nós teremos que ver o que fazer com isso.
O programa é excelente, e tinha um problema. Por isso acabou havendo uma audiência pública, porque está sendo cortado um pouco do recurso. E há muita gritaria de que se está cortando dinheiro para a educação. Não está. É que o programa leva dinheiro para os Municípios, que o ignoram. Quer dizer, ou eles desconhecem quem o dinheiro foi para lá ou usam para fazer superávit ou não se interessam, não sabem usar. Essa é uma questão.
Poderíamos pensar em alguma forma de ampliar esse programa que a Senadora Fátima mencionou, que foi matéria de discussão e que conseguimos reverter, para Municípios que fizessem demanda ao Ministério. Se há um Município que tem uma demanda por isso, propondo uma contrapartida para essa formação, esse é o caminho, porque é o Município que vai fazer no nosso País. Eu vi que lá na Austrália é diferente, mas no nosso País vai ser assim. Essa é uma possibilidade a ser estudada no Ministério.
O SR. RICARDO MAGALHÃES DIAS CARDOZO - Eu penso o seguinte: é o ideal. O único elemento dificultador...
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Eu queria só pedir a Ricardo para concluir, porque, enfim... Com a anuência da Senadora Marta. Nós temos outros compromissos também.
Ricardo, agradeço a sua presença.
Vamos para as suas considerações finais.
O SR. RICARDO MAGALHÃES DIAS CARDOZO - Eu entendo perfeitamente.
O Ministério da Educação agradece esta oportunidade.
Nós vemos que há um diálogo rico que pode ser construído a partir da interlocução entre o Executivo, o Legislativo e a sociedade.
Estamos à disposição.
Eu queria me colocar à disposição, inclusive como cidadão, como educador, além dessa ocupação provisória de um cargo público, para colaborar. Esse é um debate que realmente me motiva. Eu vejo que se nos debruçarmos detidamente sobre ele com certeza conseguiremos soluções que contribuam para a melhoria da educação básica no País.
Então, Senadora, pode contar comigo, tanto a senhora como a Senadora Marta e a própria Comissão de Educação e Cultura, como cidadão, como educador, para colaborar nesse debate.
Como Ministério, devo dizer que esses momentos são fundamentais para se amadurecerem importantes debates.
Muito obrigado e à disposição.
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A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Apoio Governo/PT - RN) - Comunico que amanhã, às 10h, será realizada a segunda Mesa da audiência pública destinada a instruir o Projeto de Lei da Câmara nº 37, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas e as condições de atenção aos usuários ou dependentes de drogas e para tratar do financiamento das políticas sobre drogas, em atendimento a requerimentos de autoria de Lasier, Cristovam, Anastasia, Senador Cristovam, Paulo Paim e Lídice da Mata. E dois também de autoria do Senador Lasier Martins.
Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada a presente reunião.
(Iniciada às 14 horas e 40 minutos, a reunião é encerrada às 16 horas e 01 minutos.)