Notas Taquigráficas
| Horário | Texto com revisão |
|---|---|
| R | A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Bom dia a todos. Declaro aberta a 10ª Reunião da Comissão de Assuntos Econômicos. Convido a todos a tomarem os seus lugares. A pauta hoje tem por finalidade debater a crise financeira dos Estados brasileiros e as propostas do Plano de Auxílio aos Estados e ao Distrito Federal do Governo Federal. Os requerimentos para a realização desta audiência são de iniciativa do Senador Ricardo Ferraço e da Senadora Gleisi Hoffmann. Temos aqui como convidados o Dr. Dyogo Henrique de Oliveira, Secretário-Executivo do Ministério da Fazenda, que já se encontra à Mesa; a Srª Ana Carla Abrão Costa, Secretária de Estado da Fazenda de Goiás, a qual convidamos, também, a tomar assento à Mesa; o Sr. André Horta Melo, Secretário de Estado de Tributação do Rio Grande do Norte e Coordenador do Conselho Nacional de Política Fazendária, a quem também convidamos para tomar assento à Mesa; o Professor Doutor em Economia pela Universidade da Pensilvânia, Sr. Marcos Lisboa, a quem também convidamos; e também o Professor Doutor do Instituto de Economia da Universidade de Campinas (Unicamp), Pedro Linhares Rossi. (Soa a campainha.) A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Eu queria só pedir a todos que fizéssemos silêncio, principalmente a assessoria, para dar início. Esta é uma reunião que será realizada em caráter interativo, ou seja, com a possibilidade de participação popular. Dessa forma, os cidadãos que queiram encaminhar comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania, no endereço www.senado.leg.br/ecidadania, ou ligando para o número 0800 612211. |
| R | Os convidados que já se encontram à mesa farão uma exposição por quinze minutos, e, em seguida, abriremos a fase de interpelação pelos Senadores e Senadoras inscritos. A palavra aos Senadores e Senadoras será concedida na ordem de inscrição. Os interpelantes dispõem de até três minutos, assegurado igual prazo para a resposta dos interpelados. Eu queria dizer, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, que esta audiência é de suma importância. Esse é um dos temas de maior relevância para a Comissão de Assuntos Econômicos e para o Senado da República, pois trata das questões federativas e da crise financeira que os Estados passam e das propostas de negociação que temos das dívidas. Portanto, acho que um momento em que nós temos todos que centrar muita atenção nesse debate e ver de que forma o Senado da República e a CAE podem encaminhar esse assunto, para ajudar a solucionar esse problema. Eu concedo, pela ordem, a palavra ao Senador Aziz. O SR. OMAR AZIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - AM) - Senadora Gleisi, quero cumprimentar todos os membros da Mesa. Primeiro, quero dizer que o Prefeito Arthur Virgílio Neto, ex-Senador da República, está aqui conosco hoje, na expectativa de que o empréstimo para a cidade de Manaus, que já passou pelo Ministério da Fazenda, pela Secretaria do Tesouro e que se encontra hoje na Casa Civil tivesse sido encaminhado. Mas tive agora a notícia, dada pela Srª Senadora Gleisi e pela Senadora Vanessa tanto para mim quanto para o Prefeito Arthur, de que ele estará sendo encaminhado hoje. Quero agradecer o seu esforço nesse sentido, quero agradecer o esforço da Senadora Vanessa. Aliás, eu e a Senadora Vanessa não fazemos mais do que nossa obrigação. À senhora, que é de outro Estado, nosso agradecimento. O povo de Manaus e o Prefeito Arthur Virgílio ficam muito gratos pela sua interferência, para que se pudesse chegar aqui. Esperamos que, nos próximos dias, possamos, aqui, nesta Comissão, aprovar esse projeto. É a segunda semana seguida que o prefeito está aqui, na expectativa de que esse empréstimo viesse. Todos que estão aqui entendem muito bem a nossa aflição, até porque, se esses recursos chegam, com certeza, eles vão beneficiar e gerar oportunidade para muitas pessoas na cidade de Manaus. Por isso, antes de iniciar esta audiência pública, queria agradecer à Senadora Gleisi Hoffmann pela intervenção. Eu sei que a Senadora Vanessa esteve, por mais de uma vez, com o Ministro, e há o compromisso do Ministro de encaminhar. Se encaminhado, com certeza absoluta, os pares Senadores irão votar imediatamente esse empréstimo para a cidade de Manaus. Quero agradecer a sua intervenção nessa questão. O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Pela ordem, Presidente. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Senadora Vanessa, pela ordem. A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Senadora Gleisi, primeiro quero apenas assinar embaixo do que disse o Senador Omar. Esta foi uma semana intensa na busca da resolução dos problemas. Senador Omar, prefeito, quero aqui apenas agradecer publicamente o empenho da Senadora Gleisi, Presidente desta Comissão. Ontem eu a tirei de uma reunião, para que nós duas fôssemos ao Ministro Jaques Wagner, que nos disse que talvez estivesse com alguma questão ainda, no Ministério da Fazenda, Dr. Dyogo. Então, é bom contar com a presença também de V. Sª aqui, para que possa nos ajudar a resolver esses problemas, que são pequenos, e para que ele possa chegar aqui, quem sabe, já na semana que vem, Senador Omar, o mais tardar, para termos pronto o processo para votar nesta Comissão. Então, Senadora Gleisi, receba de nós, aqui, o reconhecimento e os agradecimentos pelo empenho que V. Exª tem tido em relação à nossa querida cidade de Manaus, que é a capital do nosso Estado. Muito obrigada. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Senador Flexa. O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Presidente, Senadora Gleisi Hoffmann, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, na mesma linha do Estado do Amazonas, primeiro quero me solidarizar aqui com o nosso Prefeito de Manaus, Senador Arthur Virgílio, e com os Senadores que representam o Estado do Amazonas, que aqui estão presentes, o Senador Omar Aziz e Senadora Vanessa. Sei que não depende de V. Exª, porque o problema do meu Estado, o Estado do Pará, já não depende da CAE, depende do Governo - sim, do Governo. É preciso alguém que esteja governando e que possa atender o Estado do Pará. |
| R | Costumo dizer - e vamos discutir hoje aqui exatamente o assunto - que todos os Estados estão em dificuldade em função da crise por que passa o País, mas o Estado do Pará é o menos pior. É o Estado que tem nota de risco B+ do Ipea, o único Estado com B e B+. É o Estado que tem a segunda menor relação dívida/receita corrente líquida. Em 2015, foi o único Estado do Brasil que não teve PIB negativo. Ou seja, ele se diferencia não por estar bem, mas por estar menos pior e por ter um governo sério, um governo competente do Governador Simão Jatene. Aí não dá para entender, Senadora Gleisi, que o Governo Federal não libere empréstimos já aprovados. De um deles - disse isso na semana passada -, nós tivemos que renovar o prazo de 540 dias, porque iria vencer. Tivemos que renovar no plenário do Senado Federal um empréstimo do BID. Há um empréstimo no BNDES de 600 milhões, e o BNDES só falta pedir o retrato do Garrincha jogando hoje com a camisa do Paysandu, que é lá do Pará. Então, é difícil conseguir. E pior que tudo isso, Senadora Gleisi - e queria pedir... (Pausa.) A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Pode continuar. O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Não. Fique à vontade. Eu preciso que V. Exª ouça. (Pausa.) |
| R | (Soa a campainha.) O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Posso continuar, Presidente? A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Sim, V. Exª pode continuar. Apenas peço desculpas, mas é que eu acho que é importante e relevante: o Ministro Jaques Wagner me retornou. De fato, está enviando. Então, deve chegar hoje aqui a operação de crédito, e assim que ela chegar, nós faremos o processamento e colocamos na sessão seguinte. (Intervenção fora do microfone.) A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Sim. Depois, quando terminarmos a sessão nós combinaremos. Pois não, Senador Flexa. Eu vou pedir para V. Exª concluir para podermos abrir a sessão. O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Concluindo, o que eu vou pedir V. Exª pode ajudar em tudo - não sei até quando, mas pode ajudar em tudo. Nessa questão, V. Exª pode ajudar imediatamente. É um absurdo! O Governo do Estado do Pará tem uma operação com o governo japonês de pouco mais de R$500 milhões, liberada, pagando taxa de permanência porque o dinheiro está à disposição do Estado, com uma contrapartida de R$120 milhões do Tesouro, sem um real do Governo Federal, com projeto executivo pronto, licença ambiental concedida, autorização da área técnica do DNIT, porque se trata do BRT na área metropolitana de Belém. Então, é numa rodovia federal, o Ministério do Transporte tem que conceder ao Estado. Então, há parecer pela concessão da área técnica... A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Eu conheço o processo, V. Exª já o explicou. Eu acho que nós podemos aproveitar, inclusive, a presença do Dr. Dyogo, que vai fazer a sua exposição e, depois, poderá também informar a V. Exª, e nós já solicitamos ao Dr. Dyogo, Secretário Executivo da Fazenda. O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Mas não está no Ministério da Fazenda esse BRT, está na Casa Civil, porque o problema é político. O Governo... A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Não. Na Casa Civil só estará se tiver de vir para cá. Se for para assinatura e liberação, é no Ministério da Fazenda. Eu queria só pedir, Senador Flexa, porque nós vamos aqui conversar... O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Mas V. Exª vai me permitir concluir. V. Exª ainda não entendeu o problema. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Eu entendi. Só gostaria que V. Exª pudesse agilizar. O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Não, não entendeu. O Governo Federal, para impedir que o Ministério dos Transportes concedesse a licença para a ação na BR, lançou uma PMI em cima do BRT, para que não houvesse a obra. Isso é um absurdo! No momento em que ele discursa que o Brasil precisa de investimentos, geração de emprego e renda, e isso pode ser feito imediatamente, o Governo Federal impede o Estado, porque não concede a delegação do Ministério dos Transporte para o Estado agir em uma BR - e nisso V. Exª e o Senador Pimentel podem ajudar. Eu estaria cobrando dele, porque vou fazê-lo todas as semanas e, acho, todos os dias lá no Plenário, até que o Governo Federal conceda a delegação que está pronta, só falta a Casa Civil liberar, porque o problema é político. |
| R | A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - O.k. Agradeço a V. Exª. Antes de passar a palavra aos nossos debatedores e expositores, eu queria situar um pouco essa questão da situação fiscal dos Estados. Nós tivemos um programa de reestruturação e ajuste fiscal dos Estados instituído pela Lei nº 9.496, de 11 de setembro de 1997. O programa proposto para os Estados constituiu-se basicamente na assunção e refinanciamento das dívidas desses entes da Federação. O valor total do refinanciamento, a preço das datas de assinaturas dos contratos, entre 1997 e 1998, foi da ordem de R$100,5 bilhões, dos quais R$50,4 bilhões foram do Estado de São Paulo; R$18,5 bilhões, do Rio de Janeiro; e R$11,8 bilhões do Estado de Minas Gerais. Cada Estado que aderiu ao programa aceitava as seguintes condições: assinatura de protocolo de intenção de comum acordo entre o Governo Federal e o Estado; assunção da dívida autorizada por resolução do Senado Federal e refinanciamento de 80% do total, sendo os 20% restantes pagos até 30 de novembro de 1998 com recursos de alienação de ativos; pagamento do refinanciamento no prazo de 30 anos, com juros de 6,17% ao ano e atualização monetária pelo IGP-DI, com comprometimento máximo de 13% da Receita Corrente Líquida. É importante ressaltar que a média de taxa de juros aqui daria em torno de 15%, e, à época, os Estados pagavam juros na faixa de 25% em média. Não eram todos os contratos, mas era essa a realidade. Após os 30 anos, o eventual saldo devedor resultado da diferença entre o cálculo da prestação e o limite máximo de 13% da Receita Líquida poderia ser refinanciado em mais dez anos. A assinatura de contrato entre a União e o ente da Federação, em que são estabelecidas todas as condições financeiras de negociação, bem como o oferecimento das garantias e condições de punição em caso de inadimplência e o estabelecimento de um programa de ajuste fiscal acordado entre os Estados e a União, com estabelecimento de metas quanto à redução do endividamento, relação dívida/Receita Corrente Líquida, trajetória de equilíbrio para o resultado primário, redução do comprometimento da Receita Corrente Líquida com despesa de pessoal, compromisso para o crescimento das receitas de arrecadação própria, geração de recursos por alienação de ativos, limites para despesa com investimento. Com o passar dos anos e a redução da taxa Selic, os juros pagos pelos Estados, que lhes eram amplamente favoráveis no início dos contratos, passaram a ser desfavoráveis e assim colaboraram para a ampliação das dívidas. Ao longo de todo esse tempo, ocorre uma grande campanha de governadores e parlamentares defendendo a revisão dos contratos de refinanciamento. No Governo da Presidenta Dilma, matérias nesse sentido avançaram, com a redefinição dos indexadores da dívida, que trouxe uma contribuição significativa às finanças estaduais. Agora, no momento em que os Estados enfrentam uma grande crise fiscal, o Governo anuncia um acordo com os governadores, que novamente refinancia suas dívidas. É esse programa que vai ser exposto e debatido aqui. Penso que há outro tema em que esta Comissão precisará debater, que é a decisão recente do Supremo Tribunal Federal alterando juros sobre as dívidas dos Estados, transformando de juros compostos para juros simples. Isso tem um impacto grande nas finanças da União, também na dos Estados, obviamente muito positiva. Essa decisão foi tomada em cima de um pedido do Estado de Santa Catarina, mas vai haver um impacto grande na sociedade brasileira. Então, penso que é um tema que nós também devemos discutir e debater hoje como foco. Antes de passar a palavra ao Dr. Dyogo Henrique de Oliveira, que iniciará as exposições, eu queria dizer que temos também participando desta Comissão representantes das centrais sindicais dos trabalhadores, que já estiveram na Câmara dos Deputados fazendo esse debate com os Deputados, em relação ao plano de ajuste apresentado pelo Governo Federal. Depois da explanação de todos que estão na Mesa, eu consultei o Senador Ricardo Ferraço, que é autor comigo do requerimento, e entendemos abrir por cinco minutos a palavra para um representante dessas centrais fazer rapidamente a exposição, como eles estão vendo esse processo, e depois abriríamos para o debate. Passo a palavra aqui ao Sr. Dyogo Henrique de Oliveira, Secretário Executivo do Ministério da Fazenda. V. Sª tem 15 minutos para a exposição. |
| R | O SR. DYOGO HENRIQUE DE OLIVEIRA - Muito bom dia a todas e a todos, Senadora Gleisi, Secretário André, Secretária Ana Carla, Marcos Lisboa, Pedro Linhares; Senador Blairo, Senador Tasso, Senador Flexa, Senador Fernando Bezerra, Senadora Lúcia Vânia - o Senador Ferraço estava aí agora há pouco. É uma satisfação e sempre um imenso prazer vir à CAE. O assunto hoje é da mais alta relevância, da mais alta importância, que é o plano de auxílio aos Estados e ao Distrito Federal que o Governo Federal lançou dentro de uma estratégia ampla de política econômica que o Ministério da Fazenda tem adotado recentemente, desde que assumimos o Ministério, de atuar no sentido de reequilibrar e dar sustentabilidade aos principais conjuntos de agentes econômicos da economia brasileira. E os Estados formam um grande conjunto de agentes e representam aproximadamente 15% do PIB do País. Então, é um grupo que merece atenção e merece apoio da política econômica. Assim também temos já atuado no sentido da retomada da expansão do crédito, no sentido principalmente do programa de refinanciamento de dívidas das empresas que fizeram investimentos com recursos do BNDES, e também outras linhas de crédito para micro e pequenas empresas, que foram lançadas no final do mês de janeiro pelo Ministro da Fazenda, totalizando uma iniciativa de R$83 bilhões em novas operações de crédito. Também vimos já, ao longo desses últimos meses, reduzindo as taxas de juros. Para os fundos constitucionais do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, em cerca de dois pontos percentuais para todas as faixas; reduzimos também as taxas de juros do BNDES para a área de infraestrutura, também em cerca de dois pontos percentuais; e temos adotado também uma série de outras ações no sentido de dar melhor uso e maior eficiência ao uso dos recursos do crédito direcionado. São recursos que hoje estão disponíveis no sistema financeiro e que, por uma série de circunstâncias, acabam não sendo utilizados de maneira mais efetiva. Assim também a Caixa Econômica melhorou as condições para o financiamento imobiliário. Também anunciamos e lançamos uma série de medidas na área fiscal, voltadas para garantir a sustentabilidade da economia brasileira, da política fiscal, em médio e longo prazo, ao passo que, no curto prazo, lançamos também uma solicitação de espaço fiscal ao Congresso Nacional para permitir exatamente que o Governo Federal atue, ele próprio, no sentido da estabilização da atividade econômica neste ano, permitindo, principalmente, o pagamento de despesas com investimento, essencialmente na área de infraestrutura. São investimentos que não só contribuem para a atividade no curto prazo, mas também contribuem para a produtividade da economia brasileira no médio e no longo prazo. Eu diria que esse plano de auxílio aos Estados está perfeitamente integrado a essa proposta de ação econômica que nós lançamos no início de janeiro e que temos propugnado e tentado implementar ao longo desses últimos dois ou três meses. Acho que vale a pena, um pouquinho, já passando ao assunto propriamente, contextualizar a evolução das dívidas dos Estados. Como disse a Senadora Gleisi, em 1999 foi feita uma grande renegociação das dívidas dos Estados. Neste gráfico, a barra azul mostra quanto representava essa dívida em termos das receitas dos Estados, em 1999, e quanto representa hoje. Então, observa-se muito claramente que há uma redução considerável, significativa da dívida dos Estados nesses dois períodos. Essa redução demonstra muito claramente que a dívida dos Estados será solucionada com o passar do tempo e que ela, na maior parte dos Estados, se encontra em um nível perfeitamente administrável. Sobressaem-se, ali, talvez cinco ou seis Estados que realmente continuam mantendo um nível de dívida semelhante - e em alguns casos, até um pouco acima - ao que tinham lá em 2019. |
| R | Quando olhamos isso em relação ao PIB dos Estados - acho que dá uma sensação um pouco melhor -, nós vemos que a média hoje da dívida dos Estados está em torno de 7,5% do PIB dos Estados. Isso claramente demonstra que não há uma insustentabilidade da dívida para 20 Estados. Nós temos ali, novamente, cinco ou seis Estados que realmente têm um nível de dívida que mantém o patamar que tinham lá em 1999, em torno de 17% do PIB, o que realmente é um problema. Ou seja, o nosso diagnóstico aponta que a dívida dos Estados tem diminuído ao longo dos anos, em termos reais, seja em relação à receita dos Estados, seja em relação ao PIB dos Estados, e que nós, em termos de dívidas, temos problemas isolados em alguns poucos Estados. A outra questão importante para contextualizar todo esse processo é a questão relativa ao custo dessa dívida. No lançamento das renegociações, a taxa adotada representava um grande subsídio para os Estados. Então, você vê a taxa Selic, que era o custo de mercado da dívida dos Estados, e também é o custo básico da dívida da União. Não é o custo médio. A bem da verdade, o custo médio da dívida da União é superior à Selic, e os Estados tiveram então um grande subsídio. A primeira vez em que essas taxas representaram uma perda para os Estados foi no ano de 2002 até 2003, por conta da desvalorização do câmbio e todos os efeitos que isso tem sobre os IGPs. Então, houve um período curto em que o IGP ficou acima da Selic. Posteriormente, até o final de 2007, novamente as taxas foram benéficas para os Estados. Até 2008, os Estados perdem um pouco. O fato é que, a partir de 2009, você percebe que a taxa Selic se manteve sistematicamente acima do IGP mais 6%, que é a taxa aplicada aos Estados. Portanto, é de se concluir que, em dois terços do período, os Estados tiveram um ganho em relação ao custo de mercado e em relação ao custo da dívida da União. Ou seja, a conclusão é de que a renegociação foi benéfica para os Estados ao longo de todo esse período, e quando nós observamos essas taxas acumuladas ao longo desse período, nós vemos claramente que elas ainda são benéficas para os Estados. É importante que os Senadores tenham essas informações para avaliar as discussões que nós teremos a respeito das dívidas. O que nós estamos propondo, que é um alongamento da dívida, também claramente é sustentável. As barras verdes representam o que será o novo fluxo de pagamento da dívida, e as barras azuis representam o que está contratado hoje em termos de pagamento da dívida. Vê-se muito claramente que você terá uma estabilidade do fluxo de pagamento das dívidas, em torno de R$25 bilhões. Hoje esse valor está em torno de quase R$35 bilhões. Então, ele vai representar um ganho para os Estados nos primeiros dez anos, e só posteriormente eles terão que continuar pagando essa dívida, mas, novamente, em um nível sustentável. A nossa previsão é que, até 2050, você terá todo o estoque da dívida amortizado. Qual é a característica da proposta do Governo Federal acordada com os Estados durante os últimos meses, após uma grande sequência de reuniões? As dívidas com a União, representada pelas renegociações feitas com base na Lei nº 9.496, serão alongadas em 20 anos para além do período atual dos contratos. Além disso, as dívidas junto ao BNDES terão um acréscimo de dez anos nos prazos contratados, sendo quatro anos de carência do principal, ou seja, nesses primeiros quatro anos, os Estados pagarão apenas os juros. |
| R | Além disso, a União prevê a possibilidade - não é uma imposição, é uma escola, é uma decisão dos Estados - de colocar ativos para alienação. Se desejarem, poderão fazê-lo. Seria, então, o valor dessa alienação abatido das prestações vincendas nos próximos anos. De modo que poderia haver um grande alívio nesse período mais restritivo pelo qual estamos passando. Quais seriam os efeitos disso para os Estados? Em 2016, considerando o ano cheio, seria uma redução de aproximadamente de R$10 bilhões na dívida com o Governo Federal e de aproximadamente R$2 bilhões na dívida com o BNDES, totalizando cerca de R$12 bilhões em 2016. Isso seria se a renegociação fosse feita tendo como base janeiro - mais adiante, eu farei a simulação do efeito esperado, dado que a negociação será feita ao longo do ano. Ao todo, haveria um apoio de cerca de 37 bilhões apenas com essas duas propostas principais. Para obter esse benefício, os Estados - e aqui eu preciso relatar, e há aqui secretários ao meu lado para confirmarem o que eu vou dizer - concordaram com a União a adoção de uma série de medidas que auxiliam os Estados a melhorarem a sua situação fiscal. Não é uma imposição da União para os Estados. Foi um processo acordado e discutido. As propostas que estão presentes no PL 257 não representam uma imposição da União aos Estados, mas um acordo feito com os Estados. Eu diria que grande parte das medidas que ali estão foi proposta pelos próprios Estados e acordada com a União. Como eu disse, os Estados, no geral, não têm um problema de dívida, eles têm um problema de despesas correntes, em participar despesas com pessoal. Este gráfico aqui mostra isso de maneira muito clara. Enquanto a União, entre 2009 e 2015, reduziu a sua despesa de pessoal em relação ao PIB de 4,6% para 4% do PIB, os Estados, no seu conjunto, ampliaram essa despesa de 4,85% para 5,38%, o que representa aproximadamente um crescimento de 0,5% do PIB. Para que se tenha ideia, 0,5% do PIB hoje representa R$30 bilhões, aproximadamente, que é exatamente o custo total do pagamento do fluxo das dívidas, simplesmente com o aumento real - e aqui eu estou falando de aumento real -, em relação ao PIB. Os senhores receberão - peço à nossa assessoria que distribua as notas - as notas em que detalhamos, para cada Estado, quanto foi a evolução nesse período e os senhores verão que alguns Estados tiveram aumentos anuais médios de 16% nesse período, representando um total de 150% de aumento de despesa com pessoal no período de 2009 a 2015. Então, o nosso diagnóstico - que eu ouso dizer que é compartilhado pelos próprios Estados - é o de que os Estados hoje enfrentam um grande problema pelo crescimento das despesas correntes dos Estados, em particular as despesas com pessoal. Quais foram essas contrapartidas? A primeira é que, nesses primeiros dois anos após a renegociação, os Estados não concedam aumentos exacerbados, reajustes exacerbados para servidores. Isso não quer dizer congelamento de salários. Isso foi um equívoco de interpretação e não é o que está escrito no projeto de lei. Está preservado, está mantido aquilo que a Constituição prevê que é o aumento regular anual. Então, todos os Estados poderão fazer, naturalmente, normalmente, a correção dos salários anualmente, sem nenhum prejuízo aos seus servidores. A única coisa que se está prevendo e que se quer evitar são aumentos abusivos, como alguns Estados adotaram, inclusive no período de 2015, de maneira a criar despesas para os anos subsequentes sem a devida previsão orçamentária. Então, é isso que se prevê evitar. E é isso que, a nosso ver, é perfeitamente justificado sem que isso represente nenhum prejuízo à correção normal dos salários dos servidores. |
| R | Limitar o crescimento das despesas correntes à variação da inflação, não conceder renúncias... E aqui eu abro um parêntese para dizer que os Estados, nos últimos 20 anos, praticaram um excesso de renúncias, através da chamada guerra fiscal, assunto que eu também já tive o prazer de vir aqui, na CAE, debater. Apenas a título de exemplo, dois números importantes: em 1988, foi concedido para os Estados a tributação da área de telecomunicações e energia, que hoje representa aproximadamente 40% da arrecadação do ICMS. Entretanto, a arrecadação total do ICMS em relação ao PIB se encontra hoje no mesmo patamar que estava antes da Constituição de 1988, o que, a meu ver, significa que esses 40% de adicional de arrecadação pelas receitas blue chips foram consumidos com a concessão de benefícios fiscais ao longo desse período. Vedação para nomeação de novos servidores, o que significa o líquido. Haverá, então, naturalmente a reposição decorrente de aposentadoria, falecimento, vacância, etc, em particular ressalvadas as áreas de educação, saúde e segurança. E reduzir em 10% as despesas com cargos de livre provimento, os famosos cargos, no Governo Federal, chamados DAS, os cargos de livre nomeação. Essas foram as contrapartidas ajustadas com os Estados. Além disso, deveria ser adotada pelos Estados uma lei de responsabilidade fiscal estadual que contemplasse, no mínimo, algumas medidas de gestão e a adoção do regime de previdência complementar para aqueles servidores que ganham acima do teto do INSS, hoje em torno de R$5 mil. Esses servidores teriam a criação do regime de previdência complementar. Assim também, a elevação da contribuição patronal e dos funcionários para os regimes de previdência próprios dos servidores dos Estados. Por fim e muito importante, a limitação da despesa orçamentária corrente a 90% da receita líquida total. É surpreendente dizer que hoje os Estados não reservam para investimento nem 10% das suas receitas. A proposta é que haja um processo de convergência de longo prazo, ao longo de dez anos, de modo que, ao final desse período, os Estados tenham condições de reservar para investimentos e amortizações pelo menos 10% da sua receita corrente líquida. Eu diria, portanto, que é um conjunto de ações, de medidas que não vêm ao auxílio da União, mas sim vêm ao auxílio da gestão dos próprios Estados. Além disso, nós também havíamos acertado alterações na própria LRF para definir melhor o conceito de despesas com pessoal, uma vez que hoje há bastante discrepância nas interpretações adotadas ao longo do País, em particular no que concerne ao princípio de terceirização. E aqui novamente eu acho que é importante deixar bastante claro o que é a proposta. (Soa a campainha.) O SR. DYOGO HENRIQUE DE OLIVEIRA - Não se trata de vedar a terceirização nem de proibir que os Estados façam terceirização. Apenas se propõe que aquilo que é terceirização que substitui postos de trabalho, que substitui servidores concursados, que substitui o servidor de carreira seja considerado como despesa de pessoal. Aquilo que é a terceirização normal, de prestação de serviços, de contratação de limpeza, de contratação de manutenção e outras terceirizações que eu diria que são normais continuaria sendo desconsiderado, mas aquilo que substitui o servidor, a nosso ver, deveria ser considerado como despesa de terceirização. |
| R | Também havia a previsão da criação de um plano plurianual de despesas com pessoal. Aqui o mais importante é que, para os Estados, seria adotada uma redução do que nós temos na LRF como limite prudencial para as despesas com pessoal. Todos sabem que a LRF prevê um limite de despesa com pessoal para os Estados de 60%. Quando essa despesa atinge 90%, começa o que se chama limite prudencial, quando atinge 95%, uma série de medidas de contenção das despesas dispara. O que nós estamos propondo é que esses valores sejam reduzidos para, respectivamente, 85% e 90% do limite. Ou seja, o limite prudencial passaria para ser, em vez de 60% da despesa, 90 de 60, que é 54, e assim sucessivamente. Haveria um período de transição de dez anos, para que os Estados não fossem penalizados por essa mudança. Então, na partida, muitos Estados, provavelmente, quase todos os Estados ficariam desenquadradas, mas eles teriam uma tolerância para a transição. Além dessa proposta básica, que seria o alongamento de 20 anos nas dívidas com a União e 10 anos nas dívidas com o BNDES, nós propusemos também uma medida adicional, opcional para os Estados, que preveria a redução das parcelas nos dois primeiros anos em 40%, limitada a 160 milhões por mês. Portanto, cada Estado poderia ter, no máximo, uma redução de 2 bilhões por ano. Essa redução de 40%, evidentemente, seria refinanciada e acrescida ao final dos contratos. Essa medida teria um impacto adicional de R$3,5 bilhões, em 2016, considerando apenas as parcelas vincendas do meio do ano para frente, que é quando nós prevemos que os contratos sejam assinados. Os Estados, então, adotariam ainda mais medidas adicionais: redução das despesas com cargos de livre nomeação, não de 10%, mas de 20%; despesas com publicidade e propaganda teriam uma redução de 50%; e os Estados abririam mão de realizar novas operações de crédito durante o período da vigência. O conjunto dessas medidas, considerando sua adoção já no decorrer do ano, a nosso ver, poderia ter um impacto total de R$9,6 bilhões em auxílio aos Estados, ainda em 2016, e R$45,5 bilhões no período 2016/2018. A nosso ver, trata-se de uma ajuda substancial, de valor considerável, de apoio da União para os Estados, ainda mais considerando que a própria União também passa por dificuldades nessa área. Mas sobreveio a essa discussão uma ação no Supremo Tribunal Federal, e eu não poderia me furtar a comentar sobre isso. O que propõe o Estado de Santa Catarina é que a dívida seja calculada não por juros compostos, mas por juros simples. Em primeiro lugar, eu gostaria de deixar claro aos Senadores que, como dissemos no início, já temos quase 20 anos na negociação dessas dívidas. Até hoje os juros sempre foram calculados com juros compostos, todos os Estados concordaram com isso e sempre foi feito dessa maneira. Mas, além disso, eu queria trazer aos senhores o texto da Lei Complementar nº 148, aprovado por todos os senhores aqui no Congresso Nacional. E o que ela diz? Ela diz que a União adotará, nos contratos de financiamento da dívida dos Estados, as seguintes condições: juros calculados debitados mensalmente, à taxa de 4% ao ano, e atualização monetária pelo IPCA, apurado pelo IBGE, ou outro índice que venha a substituí-lo. Mas a lei, no §1º, diz que esses encargos ficam limitados à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia, a famosa taxa Selic, para os títulos federais. |
| R | Ora, como é a taxa Selic para os títulos federais? A taxa Selic para os títulos federais é calculada com juros compostos, naturalmente como manda fazer toda a ciência econômica e toda a matemática financeira. Além disso, no §2º, ele diz que, para a implementação desse §1º, será comparada mensalmente a variação acumulada do IPCA com a variação acumulada da Selic. A variação acumulada do IPCA, pela própria natureza dos índices de preço, é uma composição de taxas, é uma taxa de juros compostos, uma vez que a variação da inflação é aplicada sobre o preço do produto do mês anterior. Então, você vai sempre capitalizando a variação do mês anterior e aplicando a variação do IPCA do mês seguinte. Então, o termo variação acumulada do IPCA naturalmente já é uma taxa de juros compostos, e a expressão variação acumulada da taxa Selic, no mesmo §2,º é o que Santa Catarina considera que signifique, portanto, juros simples, e não juros compostos. (Soa a campainha.) O SR. DYOGO HENRIQUE DE OLIVEIRA - Ora, nós teríamos que ter uma interpretação de que, no mesmo parágrafo, na mesma lei, no mesmo artigo, o termo Selic significa juros compostos no §1º, e juros simples no §2º. E que o termo variação acumulada, no mesmo §2º, significa juros compostos no IPCA, e juros simples na Selic. A meu ver, não há sustentação para essa interpretação, não há como se interpretar a lei dessa natureza. Estamos neste exato momento - o Ministro Nelson debate essa questão no Supremo Tribunal Federal - confiantes de que haverá uma decisão sensata e justa do Supremo Tribunal a esse respeito. Mas eu fiz questão de trazer para os Senadores para que vejam a clareza com que essa lei foi escrita e a impossibilidade de ser adotada a taxa de juros simples em relação às dívidas dos Estados. Mas, para além disso, seria um grave risco para a economia brasileira, porque todas as operações de crédito deste País são apuradas, são cobradas com taxa de juros compostos. Mas, mais do que isso, será uma grande injustiça com os Estados brasileiros. Nessa tabela, eu coloco qual seria o impacto da adoção desses juros simples para cada Estado. Em primeiro lugar, vê-se que alguns Estados já quitaram a sua dívida. Piauí, Tocantins nunca teve, não ganhariam evidentemente nada. Mas os Estados mais beneficiados seriam São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Apenas São Paulo ganharia R$140 bilhões com esse negócio; Minas Gerais, R$50 bilhões; e Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, R$33 bilhões cada um. Ou seja, é uma medida que beneficiará justamente os Estados mais ricos do País. Mas nós fizemos uma simulação interessante que seria, considerando que esse custo de R$300 bilhões será custeado por todos os contribuintes do País. Portanto, o contribuinte de São Paulo, de Minas, do Rio vai ter uma redução da sua carga, mas os demais contribuintes do País terão que pagar essa conta, e esse recurso sairá de todos. Então, eu comparei o que seria o ganho e a perda de cada Estado, de cada contribuinte estadual. E vejam o absurdo que seria: o contribuinte de Tocantins, do Piauí, do Rio Grande do Norte, do Amapá, do Pará vai ter um aumento de custo de R$1,5 mil por habitante, enquanto o contribuinte de São Paulo terá um alívio de R$1,5 mil, R$1,6 mil. Trata-se de uma medida completamente injusta do ponto de vista de redistribuição de renda no País, e absolutamente inconsistente e incoerente com as práticas financeiras adotadas no Brasil e no mundo. |
| R | Terá o Brasil o único sistema do mundo - salvo os países muçulmanos, porque aí há uma questão religiosa diferenciada -, o único país do mundo onde a calculadora HP 12c não poderá ser usada? Todos os economistas do País, todos os contadores usam a calculadora financeira. As calculadoras financeiras usadas no mundo não poderão ser usadas no Brasil, porque aqui a capitalização de juros será diferenciada. Então, só para finalizar esse ponto dizendo que nós não podemos concordar com isso. O Ministério da Fazenda tem adotado uma postura positiva propositiva, aberta ao diálogo. Propusemos um auxílio aos Estados de R$45 bilhões nos próximos três anos e consideramos que essa proposta é justa e adequada para o momento por que passamos tanto a União quanto os Estados. Muito obrigado. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Obrigada, Dr. Dyogo. Passo a palavra agora ao Sr. André Horta Melo, que é o Coordenador do Conselho Nacional de Política Fazendária. O SR. ANDRÉ HORTA MELO - Bom dia, Senadora Gleisi, Presidente desta CAE, na pessoa de quem cumprimento os demais Senadores presentes; Dr. Dyogo, Presidente do Confaz; Drª Ana Carla, Secretária de Goiás; Marcos Lisboa, professor da Universidade de Pensilvânia; Prof. Pedro, da Unicamp, aqui ao meu lado; jornalistas e interessados aqui presentes. Esses assuntos relativos à dívida e ao federalismo dos Estados possuem tamanha diversidade, tamanha riqueza de detalhes que sempre precisamos recuperar o contexto em que eles estão sendo discutidos. Em 2002, o Lopreato, um professor colega do Pedro, da Unicamp, lançava uma obra de discussão sobre federalismo brasileiro chamado O Colapso das Finanças Estaduais e a Crise da Federação. Esse estudo do colapso colocava o foco nas questões da década de 80, para procurar entender a década de 90 e as variáveis que nós estamos discutindo aqui até hoje. Jacques Attali, aquele economista que era assessor do Presidente François Mitterrand e hoje é presidente do Positive Planet, entidade assistencial de microfinanças, diz que crise, desde sempre, é um período de transição entre duas fases de transição. Nós sempre estamos discutindo crise, mais profunda ou mais plana. Essa crise da década de 80 determinou as vertentes da discussão atual, que foram a descentralização fiscal, a rolagem da dívida dos Estados, a reforma patrimonial do setor público, nos termos do autor, e a aprovação da LRF. Sexta-feira eu participava de um painel, junto com o Prof. Fernando Rezende, decano de discussões aqui neste Senado também, e o professor lembrava da sutileza que se herdou da Constituição de 1988, que se dispôs a melhor dividir a descentralização fiscal, mas, na verdade, o fez de forma bastante discreta. Em 1983, a União possuía 18% da carga tributária bruta nacional, de participação no PIB, os Estados possuíam 5,75%, e os Municípios, 2,4%, resultando numa carga tributária de 26,97%. |
| R | Em 2011, esses números mudaram: a União para 20%, os Estados para 8,8%, os Municípios para 6,5%, totalizando a carga tributária bruta de 35,82% em 2011. Essa carga caiu ano passado, a gente sabe, para 33,42%. Então, o que era 28,52 da União hoje está em torno de 28,6%. Houve uma melhoria de participação dos Estados, mas, de qualquer forma, esses entes federados têm uma desvantagem fiscal bastante pronunciada até hoje, em relação à União. Essa falta de aperfeiçoamento fiscal termina por trazer-nos a esta Mesa, termina por resultar numa crise financeira, porque a forma de os Estados sobreviverem tem sido constantemente por meio de empréstimos e dependência do auxílio da União. Enquanto a União está vivendo um clima mais ameno, os Estados vão tocando com essa ferramenta. Mas esta Comissão aqui já discutiu diversas vezes o problema da crise econômica mundial. O ano de 2008 teve efeito retardado nos BRICS, e o maior importador do mundo, a Europa, declinou de suas compras, na sequência, contaminando a China. Primeiro, a Índia que para de comprar tantas commodities, a China também. Então, foi ocorrendo o despencar do barril de petróleo, do preço do barril de petróleo. A China passou a não comprar tanto soja e ferro do Brasil. E foi se criando um contexto externo prejudicial. As commodities representam 60% das exportações brasileiras. Minério, ferro e soja correspondem a 30% das exportações brasileiras. Evidentemente que nós nos ressentimos com isso. Internamente tivemos problemas de decisões de curso, o que já foi muito discutido aqui, a questão das desonerações, dos swaps cambiais. E, sobre um assunto que debatemos sexta-feira, gostaria de voltar a ele rapidamente: o problema de corrupção e a discussão sobre corrupção, que é um elemento que tem se mostrado o elemento político de dificuldade, de aprofundamento da crise econômica. Pouca água mata de sede e muita água mata por afogamento. Despreocupar-se com corrupção vai criar evidentemente problemas institucionais dentro de qualquer país, e sobredimensioná-la também, porque isso causa crise de confiança. A Itália e a África do Sul, naquele índice mais aceito do Instituto de Transparência Internacional, estavam na posição número 61 no ranking de corrupção, ano passado, em 2015. O Brasil era o mais bem cotado entre os BRICS, e a África passou o Brasil e está mais bem cotada desde o ano passado, ficando no mesmo nível da Itália. O Brasil e a Índia ocupam posição 76; a China, 83; o México, 95; a Argentina, 107; e a Rússia, 119. Normalmente, no calor das discussões sobre esse tema, eles terminam valorizando por demais essa questão. E evidentemente que quem cuida de fazenda se preocupa com o problema da confiança, porque tudo o que afeta a confiança vai terminar repercutindo em emprego, repercutindo nas outras fases da cadeia econômica. O filósofo político hegueliano Slavoj Zizik chegou a afirmar, quanto a essa questão dos Panama Papers agora, que a corrupção, a evasão fiscal parece ser um elemento intrínseco do sistema econômico mundial, que hoje reclama mais do que nunca uma reforma estrutural profunda. |
| R | Então, voltando aos Estados, o problema da sobrevivência fiscal, tem sido usual os Estados recorrerem a empréstimos para a receita financeira. E, quando a União entrou em crise, os Estados tiveram que fazer uso de medidas excepcionais. Os Estados começaram a utilizar-se, por exemplo, de depósitos judiciais para poderem manter suas economias solventes ou de fundos previdenciários. Além de medidas heterodoxas como essas, medidas especiais, tomaram-se também medidas ortodoxas. O Consefaz se reuniu o ano passado e construiu uma pauta comum de ajuste fiscal dos Estados, onde se redimensionaram as alíquotas de seus impostos. Os impostos estaduais na partilha da Carta federativa brasileira reservam o imposto sobre o consumo, que, sozinho, é a maior arrecadação do Brasil, o ICMS, no maior poder de criar receitas do Estado. Então, quando os Estados querem reagir com receita, há o problema de interferir no próprio consumo. Então, os Estados não puderam, no ano passado, evidentemente, enfrentar seus déficits, só e unicamente, com o realinhamento, com o redimensionamento do ICMS. O que se pôde fazer foi uma ajuda, um auxílio para se colocar em um cardápio de medidas, que, ao fim, esperamos que tire os Estados dessa crise atual. O Dr. Henrique Meirelles, ontem, em jornal de grande circulação, estava dizendo que, além de racionalizar despesas, é preciso que o País tenha mais receita tributária, ainda que temporária. Os termos da discussão no jornal, ontem, eram os mesmos que nós discutíamos no ano passado. Os Estados precisam mostrar solvência ao mercado a médio e longo prazo, porque, sendo solventes, demonstrando poder de solvência, eles recuperam a confiança, recuperam o uso pleno da capacidade produtiva e há a retomada do emprego e a retomada do crédito privado. Então, é preciso esse alavancar. O Estado precisa intervir, neste momento, para que a economia ressurja. Esse termo, esse valor da solvência foi o que inspirou o PLP 257, de 2016, que é o Plano de Auxílio aos Estados que o Dr. Dyogo estava apresentando aqui. Esse plano começa com a discussão com os Estados, pelo menos, em fevereiro, com o Dr. Dyogo dizendo que é interessante que façamos um grupo mais restrito, porque discutir com 27 Estados fica mais complicado. Então, criou-se uma comissão inter-regional, com cinco secretários, um de cada região do País. Os secretários entraram em acordo com o Ministério da Fazenda e foi gestado, nessa discussão, nessas sugestões, nesses acordos, o Plano de Auxílio aos Estados. Os senhores sabem que há questões dos Estados que estão aqui há 15, 20 anos. O PRS 01 tem dois anos só, é de 2014, mas isso é uma discussão que tem, sem dúvida, uma década e meia, e continuaremos a discuti-lo por um pouco mais de tempo. Então, conseguir um acordo entre os 27 Estados é algo que sempre demandará esforço pessoal, porque todos têm suas legítimas demandas e têm situações heterogêneas para administrar. Lembrar que, nesse tempo, havia saído em janeiro a regulamentação da Lei Complementar nº 148, e a União estava renegociando com os Estados esse novo indexador da dívida, que o Dr. Dyogo apresentou. Nesse contexto, Santa Catarina apresentou um projeto de lei para não se utilizar o anatocismo na correção da dívida dos Estados. |
| R | O Governo Federal dialogou, primeiro, com os secretários e, depois, com o Deputado Esperidião Amin dialogou, primeiro, com os secretários e, depois, com o Deputado Esperidião Amin e com os governadores. Terminou-se for fechar um acordo em que a lei não seria naquele momento considerada, mas o Estado de Santa Catarina prosseguiria com a ação judicial. Então, assentado esse acordo, o Governo trouxe à baila e apresentou texto do PLP 257, que estamos aqui a discutir. Evidentemente que a divisão dos Estados iria requerer um acordo de uma ideia comum. Esse plano apresenta diversas contrapartidas. Há um grupo de Estados que deseja muito essas contrapartidas e um grupo de Estados que acha que essas contrapartidas são uma dificuldade para os Estados poderem se recuperar da crise e terem acesso a esse desconto e alongamento da dívida da União. Dia 7 de abril, em Manaus, tivemos a 11ª Reunião Ordinária do Consefaz, e discutimos longamente o assunto. Como disse, há assunto aqui que levamos década. Esse assunto teve uma transigência que julgo extremamente rápida, e os Estados resolveram encontrar e eleger um ponto comum que oficiaram tanto ao Ministério da Fazenda quanto ao Relator, Deputado Esperidião Amin. Esse ponto comum consistiu no seguinte: no aprimoramento da definição de despesa de pessoal, para evitar que se usem subterfúgios e que um Estado se distinga de outro e leve vantagem em relação a outro, como é a situação atual, na hora de apropriar sua despesa de pessoal, conter o crescimento das despesas correntes. Vamos falar aqui mormente das outras despesas correntes, que são basicamente custeio, pagamento de combustível, diária, etc., e um limitador para o crescimento da despesa de pessoal em específico por 24 meses. Claro que respeitando unicamente a revisão geral, prevista na Constituição, do repasse da inflação, o que não é grande problema para os Estados, porque nenhum Estado está tendo crescimento de arrecadação própria acompanhando inflação. Então, isso não será assim tão difícil de se cumprir. Então, ficou nesses termos essa agenda básica, esse entendimento comum, que os Estados elegeram há pouco tempo, agora há poucos dias, no Consefaz, e que estão apresentando ao Governo Federal e ao Relator do PLP 257, para decidirmos sobre isso. Na véspera do diálogo com o Governo Federal, no dia seguinte, quando ocorreu a reunião do Confaz, na sexta-feira, com o Presidente, Dr. Dyogo, saiu a liminar, dando à Santa Catarina a possibilidade de utilizar-se dos juros simples, de não se utilizar do anatocismo. Prosseguimos a reunião na sexta-feira, como se não tivesse acontecido esse fato e baseados nesses dois meses de discussão que estávamos a assentar esse entendimento. Neste momento, os governadores estão conversando com o Ministro da Fazenda, e sobre a mediação do Ministro Edson Fachin e do Presidente do Supremo, Ministro Lewandowski. E, pelo que estamos acompanhando pelos jornais, daí talvez saia um acordo em relação à essa ação judicial, tal e qual saiu em relação ao projeto de lei. Possivelmente, havendo isso - evidentemente que vamos aguardar os governadores conversarem, aguardar o fórum dos governadores provavelmente para a semana, uma decisão conjunta dos governadores -, dado o que os jornais estão repercutindo, imagino que, nessa solução que está sendo dificultosamente estudada nesses dois meses, nós poderemos dar prosseguimento, nesses termos aqui apresentados, ao plano de alongamento das dívidas, que é o Plano de Auxílio aos Estados. |
| R | Eu não posso deixar aqui de lembrar o mestre Celso Furtado: essa crise financeira deriva de nós não sempre estarmos voltando às vertentes das questões estruturais do País. O Brasil tem uma das maiores cargas tributárias do mundo, de tributos indiretos, e um dos menores patamares do mundo de tributo direto. A solução nos parece prosaica, é uma troca evidente. O Prof. Fernando Rezende lembrava na sexta-feira: em 87, eu estava lá na CAE propondo adicional de Imposto de Renda para os Estados. Naquela época, eu estava lembrando isto: o fato de tornar a carga tributária brasileira menos regressiva, uma possibilidade de mudar o perfil da carga tributária bruta sem aumentar a carga tributária, melhorando a eficiência, dando mais renda àqueles que possuem menos e provocando a solidariedade daqueles que ganham mais. Essa renda dos que possuem menos vai direto para venda da esquina, vai direto para a loja de eletrodomésticos, faz circular a economia brasileira sem precisar aumentar a carga tributária. Nós temos uma demanda reprimida que é fácil de se criar... (Soa a campainha.) O SR. ANDRÉ HORTA MELO - ...e é preciso vontade política para a gente dar prosseguimento. Obrigado, Presidenta. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Agradeço, Sr. André Horta. Agora, com a palavra, a Srª Ana Carla Abrão Costa, Secretária de Estado da Fazenda de Goiás. A SRª ANA CARLA ABRÃO COSTA - Bom dia, Presidente Senadora Gleisi Hoffmann, Senadores aqui presentes, demais membros da Mesa, é um prazer estar aqui e poder falar um pouquinho da experiência de Goiás, mas, mais do que isso, de toda essa discussão em relação às crises dos Estados, de como é que temos tentado enfrentar isso em Goiás. A minha ideia aqui é falar um pouco do contexto geral, ou seja, de como é que nós chegamos até aqui. Em particular, eu vim da iniciativa privada e cheguei a um Estado que cumpria a Lei de Responsabilidade Fiscal, cumpre o programa de ajuste fiscal definido pelo Governo Federal, mas tem dificuldades enormes de pagar a sua folha em dia. Então, acho que vale o retrospecto e tentar aqui compartilhar com os senhores e as senhoras como é que chegamos até aqui. Vou falar um pouquinho da experiência de Goiás, que fez um duro ajuste fiscal em 2015. E, aí, em particular, nós fizemos um ajuste fiscal ortodoxo, mas com corte de despesa. Ou seja, Goiás não teve aumento de tributos de forma a tentar fechar as suas contas e, por isso até, vamos mostrar aqui qual é a situação. Falo um pouco do PLP 257. Como o Secretário Dyogo já detalhou, eu vou ser muito rápida e falar basicamente nas ênfases que nós entendemos serem as corretas para se dar ao projeto e às contrapartidas que nós trabalhamos a quatro mãos com o Ministério da Fazenda. Em relação a como é que nós chegamos aqui, como é que nós chegamos a essa situação, eu vou compartilhar um pouco do que nós entendemos que foi o contexto, a combinação de fatores que nos levou a chegar a essa situação nos Estados. É claro que, como o Secretário Dyogo já também colocou aqui, a trajetória de gastos é uma trajetória absolutamente insustentável, mas ela veio dentro de um contexto que é um contexto maior. E aí eu vou colocar uns créditos na nova matriz econômica, que teve o seu impacto também nos Estados. Ouvimos muito falar da nova matriz econômica e de seus impactos do ponto de vista macroeconômico, as desonerações, mas ela teve a sua vertente também nos Estados e tem uma parcela nessa explicação de como é que nós chegamos até aqui. É claro que houve uma frustração de receitas, principalmente no que se refere às expectativas que todos nós tínhamos em relação à trajetória de receita. E, com o agravamento da crise econômica no País, isso também acabou por culminar na situação, gerar a situação que estamos vivendo hoje. |
| R | A rigidez de despesas faz com que tenhamos menos instrumentos para fazer o ajuste, e deve ser ressaltada a mudança drástica que houve no início do ano passado em relação à concessão de empréstimos para os Estados. Aqui não vai nenhum tom de crítica. Ao contrário, acho que essa mudança expôs uma situação que estava absolutamente clara e estabelecida, mas, sem dúvida alguma, ela também foi um fator que, combinado, trouxe os Estados a essa situação. Em relação à nova matriz econômica, a conta é muito simples de pensar. Os Estados vinham nos últimos anos - e aí vemos em particular a partir de 2011 - tendo acesso a um volume de empréstimos bastante considerável. Esse aumento de liquidez com receitas, que são receitas extraordinárias ou receitas financeiras, fez com que os Tesouros estaduais fossem liberados de fazer esforço de investimento, afinal de contas havia abundância de recursos para investimento, e os recursos, as receitas ordinárias dos Estados passaram, então, a estar liberadas para comprometimento com despesas obrigatórias, em particular com despesas de pessoal. Foi isso o que aconteceu. É muito difícil. Eu venho de um Estado que recebeu muitos empréstimos e fez ótimo uso deles, ou seja, houve um boom de investimentos em infraestrutura no Estado de Goiás. Goiás é um Estado produtor. Portanto, tivemos ganhos de produtividade muito grandes no Estado. Por outro lado, isso deu uma sensação de prosperidade, de liquidez, que se reverteu em pressões por gastos, em particular em pressões por aumento de despesa de pessoal e aumento de custeio. Quando olhamos 2012 e 2013 - aqui é um gráfico que mostra a quantidade de empréstimos que foram liberados de 2008 até 2013 -, a parte amarela é a parte referente às excepcionalizações à Lei de Responsabilidade Fiscal. Ou seja, são Estados que, em princípio, não teriam condições de assumir novos empréstimos, mas que tiveram uma excepcionalização do Governo Federal. Já estávamos ali em uma situação em que os Estados tinham claros sinais de insolvência fiscal, mas ainda assim esses Estados continuaram recebendo recursos e, portanto, foram adiando eventuais necessidades de ajuste. O desequilíbrio estrutural que estava definido desde o início de 2010, certamente até antes, foi se aprofundando. Eu costumo dizer que saímos de uma situação em que os Estados têm as despesas, que estão aqui, têm as receitas ordinárias, que estavam aqui, e têm as receitas com empréstimos. Esta linha aqui passou a ser a linha de restrição orçamentária. Ou seja, os Estados começaram a ver as receitas, que eram a soma das ordinárias com as receitas financeiras e as eventuais extraordinárias, como o seu orçamento. Com isso, as despesas foram crescendo e foram consumindo não só as receitas ordinárias, mas começaram a entrar nas receitas extraordinárias. No momento em que veio a crise e, junto com isso, a interrupção de novos empréstimos, as receitas caíram para baixo das despesas ordinárias. E essas despesas são rígidas. No caso, por exemplo, de Goiás, 76% delas dizem respeito à folha de pagamento. Então, no momento em que as receitas caíram abaixo da nossa linha de despesa, os Estados começaram a colapsar. Claro que - isso é claro para mim, que vim da iniciativa privada - a receita para resolver o problema, a solução, é simples: cortar despesas. Só que, no setor público, cortar despesas tem um limite. E batemos aqui numa situação em que todos os Estados começaram a olhar as suas contas e viram que, definitivamente, o que tinham de receita disponível não era suficiente para fazer frente às suas despesas mínimas - não estou nem falando de despesas gerais ou de manter o orçamento em dia. Então, basicamente, quando se tem folha de pagamento, dívidas, vinculações constitucionais, duodécimos, vinculações de saúde, educação, os Estados começaram a perceber muito rapidamente que as receitas não eram suficientes para cumprir isso. |
| R | O que aconteceu ao longo do ano? Procurou-se ajustar, tentar cortar o máximo, mas, pelos dados fiscais - o Pedro Jucá tem um trabalho fantástico em relação a isso -, vê-se que os Estados começaram a acumular dívidas com fornecedores, começaram a criar alguns subterfúgios para tentar fechar suas contas no final do mês e no final do ano. Aqui temos o gráfico da evolução do superávit primário desde a edição da Lei de Responsabilidade Fiscal. Vemos uma trajetória muito positiva. Nós tivemos a crise de 2008, e essa trajetória se reverte de uma forma muito pronunciada, com déficits fiscais acontecendo nos governos estaduais a partir de 2013 e se aprofundando nesses anos. Então, do ponto de vista da responsabilidade fiscal, houve uma clara deterioração do cenário, fruto também do acesso aos empréstimos, mas com a contrapartida de um crescimento exponencial dos gastos, em particular os gastos com folha de pessoal. E aí vemos uma equação que começa a preocupar. Ou seja, você tem a trajetória das despesas, crescente, e a trajetória das receitas, estagnada. E aí chegamos à situação que eu coloquei. Essas curvas já se cruzaram em 2013 e, num momento em que não há receitas extraordinárias, em que não há acesso a novos empréstimos, o desequilíbrio foi generalizado. Aqui, temos um gráfico: a linha azul de cima é a capacidade de investir com recursos próprios dos Estados, a linha de baixo é a capacidade de investir com operações de crédito. O que tivemos mais uma vez foi o fechamento dessa situação, justamente dessas duas linhas, justamente porque os tesouros estaduais foram sendo cada vez mais comprometidos com despesas com o custeio da máquina, e todo o investimento ficou por conta dos empréstimos que foram interrompidos no ano passado. Bom, e aí há, claro, toda a conjuntura econômica. Aqui é um gráfico que mostra a inflação subindo e a queda do PIB, que começou a acontecer. A recessão ou a desaceleração começou já em 2013, mas se acentuou significativamente em 2014 e, finalmente, chegamos ao fundo do poço em 2015 e 2016. Isso tem um impacto muito forte nos Estados. Os Estados têm como principal receita, principalmente os do Centro-Oeste para baixo, as receitas tributárias, em particular o ICMS, e isso significa uma queda substancial nas receitas dos Estados. E assim chegamos onde nós estamos, ou seja, os Estados hoje, invariavelmente, têm problemas de caixa. A solução exige um enfrentamento, mas tem um elevado custo político e, mais do que isso, pela experiência que nós temos, Estados que fizeram ajustes muito fortes do ponto de vista fiscal... Existem medidas, ferramentas, instrumentos que dependem do Congresso Nacional. De fato, precisamos dessas ferramentas para aprofundar o ajuste em nível regional, e é isso que nós estamos buscando. Boa parte dos Estados vem fazendo um ajuste, um ajuste forte, mas não foi suficiente. É o que eu digo para o Governador Marconi Perillo: eu entrei em janeiro do ano passado com dificuldade de fazer a folha, nós fizemos um ajuste que eu vou compartilhar com os senhores e as senhoras aqui, que foi um ajuste duro, mas eu continuo com dificuldade de pagar a folha. Então nós temos um problema que é um problema estrutural. Bom, aqui falamos um pouquinho de Goiás. As nossas receitas tributárias se frustraram em relação ao que era esperado no início do ano passado, da ordem de 3,5%. Quando eu pego as receitas totais, incluindo as transferências governamentais, FPE e outras transferências do Governo Federal, isso chega a 15% de frustração. E nós optamos, então, por um ajuste. Foi feito um ajuste ortodoxo, focado em corte de gastos. O corte de gastos foi da ordem de R$2,5 bilhões - esse foi o corte inicial no orçamento que foi feito no ano passado. Além disso, foi feito um adiamento de aumentos que já tinham sido aprovados pelo Governador Marconi Perillo no seu mandato anterior. Eles foram adiados no final do ano passado, porque nós sabíamos que não só romperíamos os limites da Lei de Responsabilidade Fiscal, mas nós não teríamos condições financeiras de honrar a folha de pagamento no mês seguinte. Então, adicionalmente a um corte muito forte, que chegou a R$1,5 bilhão na folha de pessoal, com redução de cargos comissionados, eliminação de gratificações, nós tivemos R$3 bilhões de frustração de receita. |
| R | Então, não foi uma equação fácil de fechar no ano passado, mas ainda assim trabalhamos e Goiás, ao contrário dos Estados que tiveram queda nominal de arrecadação, conseguiu fechar com alguma arrecadação positiva, da ordem de 6% de crescimento, fruto, inclusive, de uma intensificação da ação fiscal e de acordos em relação aos incentivos fiscais que vigoram em Goiás. No entanto, mais uma vez, como disse, eu continuo com dificuldade de pagar a folha todo final de mês, basicamente porque temos uma situação em que a receita cresceu 6%, mas as despesas de pessoal cresceram 11%. Ou seja, essa equação continua desbalanceada. Fizemos um exercício forte de corte de despesas e gastos com custeio, mas ficou claro também que, num primeiro momento, cortar custeio na gestão pública, cortar gastos na gestão pública... Existe uma única linha que é flexível: infelizmente é a linha de investimentos. O ajuste foi feito basicamente na linha de investimentos. Goiás ainda investiu R$1,5 bilhão no ano passado, mas a queda de investimentos em relação ao ano anterior foi na ordem de 60% no caso dos recursos do Tesouro. Então, o ajuste, do ponto de vista emergencial, funcionou muito bem, mas do ponto de vista estrutural é algo que não conseguimos fazer indefinidamente sob risco de colapsar a própria máquina. Vou puxar o gancho para falar do PLP 257 lá na frente. Sempre pensamos em ajustes nos Estados como sendo algo vinculado basicamente ao Executivo, ou seja, o governo do Estado, o governador do Estado, tem em suas mãos a capacidade de fazer o ajuste ou não. Na verdade, nós temos a independência entre os Poderes e nem sempre isso é possível, nem sempre o esforço que é empreendido pelo Executivo é acompanhado pelos demais Poderes. Então, nós estamos num trabalho no Estado de Goiás com os demais Poderes para conseguir que haja a conscientização, também por parte dos outros Poderes, de que essa equação em que as despesas crescem 10%, 11% e as receitas crescem 6%, definitivamente, é a receita do colapso. Naquele gráfico, basicamente o que temos é isto: despesas de custeio e folha crescendo duas vezes mais que a taxa de crescimento da receita e a redução de investimentos, que garantiu um resultado positivo, um fôlego financeiro. Não quero que ninguém leia todos esses números, vou só chamar atenção para essa seta vermelha ali na parte de baixo, que mostra que, no caso de Goiás, o aumento da despesa de pessoal de um ano para outro foi de R$1,185 bilhão e a redução no investimento foi de R$1 bilhão. Ou seja, foi feito à custa de redução de investimento. É claro que também cortamos custeio, mas, mesmo assim, cortamos muito do que estava orçado - a rigidez dos contratos de prestação de serviço dificulta esse processo. Há uma inércia, vamos colher muito mais em 2016 do que em 2015, mas definitivamente esta é a equação perversa do ajuste: ela é feita à custa da única linha que é flexível. Aqui é a reversão das nossas tendências. Vou passar para o PLP 257, vou me ater aos pontos referentes à negociação com os Estados, que o Secretário Dyogo liderou junto com essa comissão de Secretários e evoluiu de forma muito positiva. E vou repetir uma frase que o Secretário Dyogo falou aqui - na verdade, já estava escrito, e nós nem combinamos -, que é a seguinte: o problema dos Estados não é um problema de endividamento; o problema dos Estados é um problema de despesa não financeira. A trajetória hoje, que é de desequilíbrio, a trajetória que nos trouxe até aqui e que, se não for revertida, vai levar todos nós ao colapso que alguns Estados infelizmente já vivem, é a trajetória de gastos. Não existe como solucionar esse problema sem reverter essa trajetória. E é um problema estrutural. E isso foi trabalhado ao longo de toda a discussão com o Ministério da Fazenda. Falamos em criar uma possibilidade de alívio geral, uma possibilidade de alívio para os Estados do ponto de vista de fluxo. Isso, por um lado, se for feito, é muito bom, vamos conseguir pagar a folha no final do mês em todos os Estados, mas é um problema que - eu costumo repetir isso em todas as oportunidades que tenho - vai voltar, e vai voltar neste mandato, vai voltar até 2018. O desequilíbrio é de ordem tal que o alívio financeiro, se não vier acompanhado de medidas de ajuste estruturais, significará o colapso lá na frente. E não é muito lá na frente, é logo ali na esquina. |
| R | Então são três os pilares que nós defendemos, e de forma muito veemente, do PLP nº 257. De fato, o fôlego de curto prazo é importante, precisamos dele. Precisamos, inclusive, para aqueles Estados que estão fazendo o ajuste conseguirem respaldo e condições de normalidade para se aprofundarem e darem continuidade a esse ajuste. Se houver uma ruptura do ponto de vista financeiro, com desordenamento da prestação de serviços básicos à população, atrasos na folha de pagamento, perdem-se as condições políticas para continuar perseguindo esse ajuste. Então, o alongamento e o fôlego são absolutamente fundamentais. Segundo: é necessário expor a realidade. E aí há um pilar importante do PLP 257, que são as alterações na Lei de Responsabilidade Fiscal no que tange à despesa de pessoal. Hoje vários Estados estão batendo no limite de 60% de comprometimento com despesa de pessoal, mas essa não é a realidade. Esse número já é um número feio, mas, na prática, é muito pior do que isso. No caso de Goiás, nós estamos na trave, com 59% de comprometimento do ponto de vista da Lei de Responsabilidade Fiscal hoje, mas a realidade é que hoje o Estado compromete 76% das suas receitas com despesas de pessoal. E aí não estou nem usando a definição do PLP. Com a definição do PLP, em que se incluem também despesas de terceirizados, chegamos a 80%. Então essa não é uma equação sustentável, definitivamente. E aqui não estou falando de tirar direitos dos servidores públicos, não estou falando de tirar a possibilidade de aumento. Não é isso que o PLP defende, ao contrário. Eu costumo dizer que temos duas formas de ver o problema. Na verdade, essa é a forma... Se não atacarmos o problema, se não atacarmos essa trajetória, nós definitivamente teremos uma situação em que o servidor será o maior prejudicado: ele não só não vai ter o salário em dia, como não vai ter condições de trabalho. É o médico que vai chegar ao hospital e não vai encontrar remédios, seringas, leitos; é o professor que vai chegar a uma sala de aula caindo aos pedaços e sem condições de receber o seu salário. Então eu acho que é necessário expor a realidade - e o PLP faz isso ao mudar a definição de despesa de pessoal - para que nós ataquemos o problema. Enquanto fizermos de conta que o problema não existe, ninguém vai entender. Muitas vezes, em Goiás, eu tenho o questionamento por parte de sindicatos, de representações, que me dizem "Não, Secretária, há muito dinheiro. A arrecadação subiu. Não é possível que esteja faltando dinheiro". Está, está faltando dinheiro. Então, precisamos expor essa realidade para conseguir a conscientização de que todos nós aqui estamos em busca justamente de manter os direitos, que são direitos legítimos e que fazem sentido. Temos que buscar a sustentabilidade. Sem isso não existe direito que seja de fato concretizado. E o terceiro pilar que defendemos são as medidas de correção. Ou seja, sem esses três pilares... E essas medidas, de fato, vão limitar o crescimento da folha de pessoal. E quando falamos em limitar crescimento da folha de pessoal... (Soa a campainha.) A SRª ANA CARLA ABRÃO COSTA - ... mais uma vez, não significa tirar direitos, não dar a data base ou congelar o salário do servidor público. O que estamos dizendo aqui é que essa folha tem que parar de crescer de forma exponencial, independentemente do crescimento da receita. Deve haver alguma vinculação entre essas duas coisas. E o gestor público tem que ser capaz, inclusive, de fazer essa gestão. Então, quando falamos que é preciso limitar o crescimento da folha, estamos nos referindo à folha de pessoal, não é ao servidor. Deve haver uma possibilidade, como nas empresas privadas, de fazer gestão de recursos humanos: tirar pessoas de uma área e colocar em outra área; contratar aqui, mas não contratar ali. Deve haver a possibilidade de fazer uma gestão, mas que obedeça a uma restrição, que é uma restrição de receita e uma restrição financeira. E lembro que sempre o objetivo final é liberar os Estados e os Tesouros estaduais para terem recursos para investir. |
| R | O País não pode viver sem investimentos. E só há uma forma de nós, neste momento, conseguirmos investir de forma estrutural, que é justamente através dos investimentos por parte do Tesouro. Há a questão do aumento da contribuição previdenciária e, finalmente, os Poderes autônomos. Ou seja, esse esforço tem que ser um esforço pactuado entre todos os Poderes. Ele não pode estar restrito ao Executivo, senão o resultado final necessariamente vai ser menor do que seria em caso geral. O esforço do Executivo terá que ser maior se os outros Poderes não se juntarem ao Executivo com esse mesmo objetivo e com esse mesmo conceito. Finalmente, só para mostrar um pouco essa experiência que Goiás teve, o que Goiás fez. Vou reafirmar: sim, os Estados estão em colapso financeiro e, se esse desequilíbrio estrutural não for combatido, não há como o País sair da crise. Eu recebo prefeitos lá na Secretaria da Fazenda que dizem: "Secretária, nós estamos quebrando; como é que Estado vai sair da crise com as prefeituras todas quebradas?" Como o País vai sair da crise com os Estados todos em colapso financeiro? A reversão da crise passa pela solução dos Estados, mas ela tem que ser uma solução crível e, de fato, estruturada. Por isso, essas medidas, embora aparentem à primeira vista serem medidas duras, impopulares, politicamente custosas, certamente vão trazer de volta os Estados para os trilhos. Um Estado como Goiás ou Mato Grosso, uma região que tem todas as condições hoje de ser uma primeira alavanca de saída de crise, eles certamente vão responder a isso, e todos os outros, pelo menos, vão também trabalhar numa direção de recuperação. Basicamente é isso. Agradeço à Presidente, aos Senadores e aos demais participantes pela oportunidade. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Obrigada, Secretária. Passo a palavra agora ao Sr. Marcos Lisboa, Presidente do Insper e Doutor em Economia pela Universidade da Pensilvânia. O SR. MARCOS LISBOA - Obrigado, Senadora Gleisi Hoffmann, em nome de quem eu saúdo os demais Senadores e membros da Mesa. Preferiria que a razão do convite fosse outra. É difícil imaginar uma crise com tamanho e com a gravidade da que o Brasil está vivendo. Nós devemos ter uma perda de renda... Cada brasileiro deve terminar este ano 10% mais pobre do que terminou 2014. Uma perda de renda de 10% ocorre poucas vezes na história. E o pior, que eu temo, é que isso seja apenas o prólogo da crise. Essa crise pode se agravar, e acho que o tema em discussão hoje é um reflexo desse possível agravamento da crise. Essa crise é nossa, e esse é um ponto importante de ser destacado. Há uma crise lá fora, do mundo... A palavra crise é usada muito ligeiramente, ela transforma em iguais coisas muito diferentes. O mundo lá fora crescia 4%, agora cresce 2%, o Brasil, pelas melhores estimativas que vi, se fosse apenas a crise lá fora, estaria crescendo 2%. Uma coisa é crescer 2% em vez de 4%, outra coisa é uma recessão de 4% dois anos seguidos. A distância do 2% para o -4% é nossa responsabilidade, dois anos seguidos. O Brasil tem uma série de dificuldades que foram agravadas nos últimos anos, mas talvez o mais premente, o mais urgente, seja a fiscal. Nós temos uma trajetória de crescimento do gasto público acima do crescimento do PIB e da receita. Não é o problema de ter um déficit. Déficits ocorrem, os países têm déficits, faz parte da gestão da macroeconomia conviver com déficits, políticas fiscais expansionistas em alguns momentos. Isso é parte da política econômica. Vários países europeus enfrentaram a crise com políticas fiscais mais ativas. Dependendo das circunstâncias, é o remédio adequado. Não é esse o nosso problema; o nosso problema é diferente. O nosso problema é uma trajetória de despesas que cresce acima da receita. Se quisermos resolver o problema fiscal brasileiro com aumentos de receita, vamos nos preparar para aumentos de tributos ano sim, ano não. O caso em questão, o caso que estamos debatendo aqui hoje, exemplifica as dificuldades. É apenas um pequeno exemplo dos graves problemas que o País enfrenta. Poderíamos ir a outro: poderíamos utilizar o comportamento dos fundos de pensão nos últimos anos; utilizar todo o aparato parafiscal, que é uma contabilização cujo tamanho do comprometimento ainda não se conhece, do FI, FGTS, FAT. |
| R | Esse é um ponto importante, ao qual voltarei ao final, mas falta ainda uma contabilização adequada do total de passivos que nós, a sociedade, teremos que pagar nos próximos anos, até para que possamos dimensionar o esforço que teremos que fazer. A pior forma de tratar uma doença é não sabermos a extensão dela, e hoje nós não sabemos. Como disse a Secretária Ana Carla, o problema dos Estados, na sua imensa maioria, não é o endividamento. O endividamento é a consequência do problema, não a causa. A causa do problema é o crescimento da despesa. Para dar um exemplo com os números que a Fazenda está divulgando: o crescimento da folha salarial do Rio de Janeiro, que é um dos Estados mais comprometidos, foi de 16% ao ano em média de 2009 para cá - 16% ao ano em média! É um crescimento acima da inflação de 8,77%. Se a despesa com folha crescer acima da inflação em quase 9% todos os anos durante seis anos, teremos um problema. E esse é apenas um dos exemplos. Já passamos por isso. Eu não esperava, na minha geração, ter que voltar a discutir problemas nas dívidas estaduais. O Brasil passou por uma grave crise no fim dos anos 90 exatamente pelo profundo problema fiscal. Foi feita uma vasta renegociação das dívidas; o País teve uma crise complicada no começo de 1999, foi um ajuste duríssimo de três pontos do PIB, o que em valor de hoje quer dizer R$160 ou R$170 bilhões; fez-se a Lei de Responsabilidade Fiscal; introduziram-se limites para o crescimento dos gastos numa tentativa de garantir a consistência intertemporal das contas públicas. E como jogamos tudo isso fora? Como se deu o desmonte de toda a institucionalidade? Como os Estados chegaram onde chegaram? Para que servem as nossas instituições? Qual é o papel dos tribunais de conta estaduais? Como chegamos até aqui? Como se tem uma Lei de Responsabilidade Fiscal que estabelece limites para o gasto com pessoal e terceirizado não conta? Como se ter um limite para o gasto com pessoal e o pagamento do Imposto de Renda do funcionário não entrar na conta? A proposta da Fazenda, a meu ver, não significa uma contrapartida. Significa seguir o que a lei previa e que, através de vários mecanismos e subterfúgios, evitou-se cumprir. É impressionante crescimento de renúncias e benefícios para as empresas que foram concedidos! Devem sair agora os gastos federais. Estou esperando para ver qual foi o tamanho do crescimento dos subsídios e benefícios nos últimos anos na conta do Governo Federal e também como vai ser o número do primeiro trimestre. E os governos estaduais? Tivemos um momento bom da economia. Nesse momento bom da economia, adotamos várias medidas de estímulos fiscais, várias medidas foram adotadas: exonerações federais, estaduais, crédito subsidiado. Segundo a Fazenda, a conta do crédito subsidiado, só do BNDES, foi de R$323 bilhões. Esse é um dinheiro que sai e não volta, isso não é um empréstimo, isso é o que foi e não volta, isso é um subsídio. Além disso, além de todos os estímulos, a União foi avalista da expansão do endividamento dos Estados. Foram sendo concedidos aumentos reais na folha de pagamentos, expansão de programas, investimentos acima, muito acima da inflação, com base em receitas temporárias. Dívida tem que ser paga! Quando saiu a primeira proposta da renegociação dos Estados, eu particularmente fui crítico, publicamente. Achei que era uma proposta extremamente generosa, e generosa com o dinheiro dos outros, com o dinheiro do contribuinte, com o dinheiro da sociedade. Usaram o dinheiro da sociedade para beneficiar os Estados que não fizeram ajustes, que optaram por crescer a sua folha de pagamento usando recursos temporários, que optaram por financiar os seus gastos com royalties de petróleo. Isso foi injusto com alguns Estados que adotaram medidas duras, fizeram ajustes, pagaram as suas dívidas, que fizeram medidas de contenção, que adotaram programas de responsabilidade com o dinheiro público. |
| R | Confesso que eu não imaginava que o problema pudesse ficar tão pior, mas o que está acontecendo não deveria surpreender, porque ao que nós temos assistido nos últimos anos é, em vez de um enfrentamento do problema, o oportunismo da medida fácil cuja conta fica para depois. Já assistimos isso com os depósitos judiciais, entre partes privadas, que os Estados estão utilizando para se financiar. Como essa conta vai ser paga? Qual é o tamanho do endividamento dos Estados? Em vez de enfrentar o problema, faz-se um puxadinho, e esse puxadinho é uma dívida maior para o futuro. Depósito judiciário de partes privadas! Eu já era contra o depósito judicial que envolvia a parte pública, já achava um absurdo isso ser utilizado para financiar, agora, entre partes privadas? Isso foi utilizado, e está sendo utilizado, com tranquilidade. Qual é o próximo passo? E, agora, a liminar do caso da medida. Não existem juros simples na vida econômica, não existem. Pode-se tentar impor juros simples, mas isso causa uma confusão na economia, créditos de longo prazo desaparecem. Não existem juros simples. Você paga juros sobre o total da dívida, você não paga juros apenas sobre um pedaço da dívida. Peguei R$100 emprestados a 10% de juros: ao fim de um ano, devo R$110. Se eu quero pegar um novo empréstimo de R$110, eu tenho que pagar juros sobre R$110. Isso são juros compostos: você paga juros sobre a dívida original e sobre os juros que você devia e não pagou. Tão simples quanto isso. Você deve juros sobre tudo o que toma emprestado. Se você pagar juros todos os anos, você vai ficar com o equivalente a juros simples, mas você tem que pagar. Se você retém um dinheiro que é do outro, a dívida aumentou. Só isso. Como é que, a esta altura da vida, temos que discutir juros simples versus juros compostos? A União se endividou para financiar os Estados. Os Estados pagavam dívidas caríssimas, estavam vários à beira da insolvência, em particular os Estados ricos, como São Paulo, tinham dívidas imensas com o setor privado. A União fez uma dívida grande, se não me falha a memória 6 pontos do PIB, a União se endividou junto à sociedade para emprestar para os Estados. E a União paga juros compostos, aliás, como em todo lugar. Um imenso esforço feito pela União para viabilizar a recuperação dos Estados: 6 pontos do PIB. Período de bonança, a despesa primária sai de controle, os Estados não conseguem pagar suas obrigações, e começam agora os pedidos para que o outro pague a conta do ajuste daquele que não fez. É preocupante. Se juros simples valem para a dívida estadual, por que não para a federal? Por que Antônio de um jeito e João de outro? Se os Estados têm de pagar juros simples, porque a União paga juros compostos? Agora, a dívida federal é o lastro de todas as aplicações, ou de quase todas as aplicações, da sociedade brasileira. Por que os detentores de aplicações financeiras, como poupança, recebem juros compostos? Seu fundo de Previdência: juros compostos, e a base deles são os títulos da dívida pública. Esse é o lastro do desenvolvimento das instituições financeiras do crédito. Se valem juros simples para os Estados, porque não para a União? Mas, se vale para a União, o que acontece com as aplicações de todos nós? Quem propôs a medida aceita que as suas aplicações passem a pagar juros simples? Enfatizo: já achava a primeira proposta de acordo exageradamente benéfica com quem não teve a devida responsabilidade com as contas públicas. Vinte anos, alongamento: já previa problemas para a frente com a proposta original. O que houve, desde então, foi uma grave piora. |
| R | Termino com um comentário. O Brasil teve uma trajetória muito impressionante e construtiva, a que a minha geração assistiu. Assistimos àquele descontrole dos anos 80: plano heterodoxo para cá e para lá, o País sem controle das contas públicas, uma institucionalidade toda confusa, decisões discricionárias. Vivemos isso, tivemos isso. Minha geração viveu isso - há uma garotada ali que não sabe o que é isso. Tivemos um longo período de construção de instituições de Estado: como funciona o Banco Central, agência de Estado, acerto de contas públicas, responsabilidade fiscal, estabilidade, desenvolvimento de instrumentos privados de crédito para que não fique o setor privado sempre dependendo de subsídios públicos pagos com dinheiro do contribuinte. Não avançamos tanto quanto poderíamos, mas avançamos, e foi um avanço ao longo de vários governos. Foi uma conquista do País, uma conquista do Estado, uma conquista da sociedade. Transparência... E fomos avançando. A história é bonita porque esse avanço aconteceu ao longo de vários governos, inclusive do Governo Collor, com todo o desastre que foi na macro. Foi do Governo Itamar, com a estabilização, e do Governo Fernando Henrique, com o desenvolvimento das agências de Estado e fortalecimento do Banco Central - errou no fiscal no primeiro mandato, mas acertou no segundo; errou no modelo regulatório, mas acertou ao introduzir as políticas sociais, as políticas de transferência de renda começaram lá, universalização do ensino. Esses avanços continuaram no Governo Lula. Por que jogamos tudo isso fora, toda essa institucionalidade? Houve a perda de controle das contas públicas, a perda da transparência das contas públicas. Hoje é difícil saber os passivos que temos pela frente. Acho que um esforço importante, hoje, é sistematizar esse passivo. Quanto o País deve e não sabemos? Quais são as obrigações nos diversos fundos parafiscais? Quais são as obrigações nos diversos bancos públicos? Acho que é o momento de recomeçar a reconstrução do aparato institucional, que foi tão construtivo para o País e permitiu que o País vivesse um período de tantos avanços, com crescimento e redução da desigualdade. Retrocedemos. Acho que a opção agora é difícil. É extremamente caro fazer o ajuste agora, fazer esse acerto agora. Quanto mais se demora para fazer o ajuste e quanto mais medidas oportunistas, como essas que estão sendo discutidas hoje pelo Supremo, forem aprovadas, mais caro será fazer o ajuste daqui para frente. Obrigado. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Agradeço, Sr. Marcos Lisboa. Passo a palavra agora ao Prof. Pedro Linhares Rossi, do Instituto de Economia da Universidade de Campinas. O SR. PEDRO LINHARES ROSSI - Bom dia a todos. Queria cumprimentar os Senadores, os membros da Mesa, e agradecer à Senadora Gleisi Hoffmann o convite para discutir esse tema tão importante. Vou fazer aqui uma discussão um pouco mais ampla. Na verdade, vou me ater ao PLP 257, que faz intercessão com várias discussões importantes, a discussão de crise, a discussão do projeto social, inclusive discussões colocadas aqui já pelo Marcos Lisboa. Primeiro quero dizer que acho fundamental um esforço do Executivo para melhorar as finanças públicas, para tornar o Estado mais eficiente, para voltar a dirigir o Estado por suas prioridades, para eliminar os excessos que existem em todas as esferas do Estado e para portar a transparência. Também acho muito importante repensar o nosso regime fiscal, que, a meu ver, é extremamente pró-cíclico e penaliza o investimento e o planejamento público. Acho que esse PLP vai muito além disso. Anuncio já a minha leitura geral do PLP. Acho que, no fundo, ele propõe um conjunto excessivo de regras e de condições que, no fundo, engessam a política fiscal, reduzem autonomia e, de certa forma, automatizam o ajuste fiscal penalizando principalmente o servidor público. |
| R | Vai muito além de uma simples reforma fiscal. No fundo, trata-se de um arranjo institucional, de um novo arranjo institucional que permite reestruturar o setor público reduzindo a máquina pública e reduzindo o papel do Estado e, consequentemente, os serviços públicos. É assim que eu faço a leitura, tanto na negociação das dívidas dos Estados e do Distrito Federal, que está posta no capítulo I, quanto nas medidas de reforço à responsabilidade fiscal, que estão colocadas no capítulo II. No fundo, os dois capítulos funcionam, podem funcionar, como indutores da transformação do Estado e como um instrumento de condução de uma estratégia para reduzir a máquina pública. E aqui vou discutir primeiramente as medidas de reforço à responsabilidade fiscal, que estão postas no capítulo II. Aqui está proposto um limite para gasto público primário, o que, a meu ver, é um avanço no debate sobre regime fiscal. O gasto é mais interessante como meta fiscal porque se tem controle sobre ele, é uma questão muito simples. O Governo não tem controle sobre o resultado fiscal que vem ex post, o Governo sabe quanto vai gastar, mas não sabe quanto vai arrecadar. Então, o Governo mirar em um alvo móvel, que é o resultado fiscal, é problemático e torna o regime extremamente pró-cíclico. O Governo faz uma previsão do PIB. Se essa previsão não se conferir, se ficar abaixo do PIB, o Governo tem que correr para cortar gastos, o que, na verdade, aprofunda a recessão, uma vez que o gasto público é, sim, renda do setor privado e das famílias. Da mesma forma, quando você tem um crescimento maior do que o esperado, o Governo arrecada mais e o incentivo que esse regime fiscal dá ao Governo é de gastar mais - gastando mais aquece a demanda. Então, olhar para o gasto é, sim, um avanço no meu entender, mas o problema é o seguinte. A nova regra de gastos sobre o PIB não substitui o superávit primário. Sendo assim, ela se coloca como elemento adicional, como uma regra adicional. E o segundo problema, na verdade, é que, diferentemente do que está colocado na exposição de motivos do PLP, eu não vejo essa regra como uma regra acíclica, ou seja, que se comporta de forma neutra com relação ao ciclo econômico. Por quê? Primeiro porque esse limite anual de gastos está posto em função do PIB. Ou seja, uma redução do PIB implica na redução desse limite, e um aumento do PIB implica um aumento desse limite, funcionando, então, de forma pró-cíclica. Da mesma forma, o Estado tem gastos que funcionam como estabilizadores automáticos, que pressionam os gastos públicos nos momentos de crise, o que é mais um elemento pró-cíclico. No fundo, essa regra continua sendo pró-cíclica, não substitui, não resolve o problema do superávit primário e se coloca como mais uma restrição. Eu preferiria que fosse discutido o regime de bandas fiscais - como já foi proposto pelo próprio Ministro Nelson Barbosa antes de ser ministro -, bandas fiscais fixas ou bandas fiscais em função do nível de atividade. Há toda uma discussão sobre as chamadas novas regras fiscais, a nova geração de regras fiscais, terceira geração de regras fiscais, que está posta no FMI e que mostra como os países, em diversos lugares do mundo, estão flexibilizando as regras fiscais em cima de dois conceitos: flexibilidade e sustentabilidade. No Brasil, parece que não incorporamos corretamente essa discussão, apesar de eu ver nesse PLP alguns elementos que, na verdade, corroboram a incorporação da discussão. Mas o mais grave desse capítulo, a meu ver, são os chamados gatilhos, ou os mecanismos automáticos para ajustes de despesa primária, que propõem três estágios que estipulam gatilhos. Basicamente, miram custeio e previdência, o que parecer ser, na verdade, o problema na gestão fiscal. Qual é o problema aqui? São condições extremamente rigorosas, que implicam custos sociais muito importantes que não estão nas planilhas dos gestores públicos. Na prática, ele diz o seguinte: o primeiro a pagar a conta é o funcionário público e todos aqueles que fazem uso dos serviços públicos; o segundo a pagar a conta são todos aqueles milhões de brasileiros cujo rendimento está vinculado ao salário mínimo - esse é o segundo a pagar a conta. Eu não gosto de usar adjetivos, mas eu diria que, no mínimo, é impróprio esse tipo de condição - para não dizer inviável do ponto de vista político. |
| R | E esses gatilhos, na verdade, são instrumentos que automatizam, sim, um arrocho sobre o funcionalismo público e despolitizam a discussão sobre os reajustes - passam a ser um problema legal e não um problema da relação sindicato e Executivo. E mais grave: no caso do Governo Central, como foi mostrado aqui pelo Secretário Dyogo, o problema não é o gasto com pessoal, que cresceu - eu tenho o número aqui - 0,2% em termos reais entre 2011 e 2014. Então, você está apontando a culpa para alguém que, na verdade, não é culpado. No fundo, esses mecanismos, além de prejudicar o servidor público, afetam um dos principais mecanismos de melhora na distribuição brasileira nos últimos anos e de estímulo ao mercado consumidor doméstico, que é o salário mínimo. O salário não é apenas uma variável de oferta de custo, como costuma ser enxergado na análise, é também uma variável de demanda. Então, cortar salário ou reduzir aumentos salariais em momentos de crise aprofunda a crise. Isso funciona de forma pró-cíclica. E mais grave: esse tipo de regra pode funcionar - não estou dizendo que vá funcionar -, mas como um instrumento de permanente ajuste no funcionalismo e de redução do Estado e sucateamento da máquina pública. Para tanto, basta que se coloque uma meta ambiciosa no PPA e que se ativem esses estágios, esses gatilhos, e, depois de concluído o período de vigência do PPA, coloque-se outra meta ambiciosa. Então, entra-se num ciclo vicioso que, no fundo, desmancha o Estado. Sobre o plano de auxílio aos Estados e ao Distrito Federal, acho que as contrapartidas são muito problemáticas, apesar de haver muitas coisas que considero positivas. Por exemplo, o art. 3º, § 3º, limitar incentivos ou benefícios de natureza tributária; o art 3º, § 5º, reduzir despesas com cargos de livre provimento. Quanto a isso não há problema, acho que há muita coisa para ser discutida. Mas há outras medidas muito complicadas. Estamos falando, sim, de congelamento, de congelamento de salários reais do funcionalismo público. E abrem-se brechas aqui para a revisão do regime jurídico dos trabalhadores e para a precarização do serviço público de forma geral. Isso está posto, é a forma como eu entendo, é a forma como eu leio, é a forma como pode ser interpretado isso aqui. E, no fundo, tudo isso é incompatível com a expansão do gasto constitucional para saúde e educação, porque, quando crescem os recursos e gastos direcionados para esses serviços, que são intensivos em recursos humanos, é natural que cresça a contratação e que melhorem as condições de remuneração dos servidores públicos. Isso faz parte da qualidade do serviço público. Assim, no fundo, é incompatível com as aspirações da Constituição de 1988. E aqui há um ponto importante que diz respeito ao projeto de sociedade que nós queremos para o Brasil e que está sendo diretamente atingido pelo PLP 257. Nós podemos combinar aqui e escolher um projeto de sociedade com o Estado mais enxuto, onde a população busque no setor privado o acesso à maior parte dos serviços sociais. Podemos combinar de eliminar o caráter universal dos serviços públicos. Eu acho esse debate válido e penso que isso pode ser implementado se a sociedade brasileira quiser dessa maneira. Mas, para isso, é preciso um longo debate democrático. Desconfio, porém - posso estar enganado -, que a população brasileira não optaria por esse caminho. Se esse projeto de lei fosse posto para discussão em um cenário eleitoral, ele não seria bem aceito. Essa é a minha desconfiança, porque é inegável o impacto distributivo desse projeto de lei, tanto em termos de salário direto quanto em termos de salário indireto, que são os serviços públicos sociais. No debate público, esses ajustes parecem inevitáveis. Este é o discurso: não há alternativa. Esta é a narrativa dominante: estamos vivendo uma tragédia fiscal, um Governo gastador, de irresponsabilidade fiscal, colapso das contas públicas. Então, não há outra alternativa senão implementar essas medidas que implicam sacrifício para uma parte da população, escolhida. |
| R | Eu acho que esse discurso está montado em cima de mitos - aí eu vou abreviar a minha fala. O mito da tragédia fiscal é muito restrito circunstancialmente ao período que nós estamos vivendo, que é um período absolutamente excepcional, onde se tem uma queda excepcional das receitas. Se olharmos em termos de estoque, que é o que interessa - a sustentabilidade fiscal é necessariamente um problema de estoque e ela é necessariamente um problema de longo prazo -, vemos que não há tragédia fiscal. Os argumentos não resistem a uma comparação internacional. O Brasil teve, em 2015, uma dívida em torno de 66% do PIB - outros países tiveram maiores, outros tiveram menores proporções -, mas eu acho que ninguém nesta Mesa se arriscaria a colocar um patamar ótimo para a dívida brasileira ou para qualquer país, porque, do ponto de vista técnico, são muito questionáveis os argumentos que apontam nesse sentido. Da mesma forma, não há um inchaço da máquina pública tal como se fala. É também um mito dizer que é um Estado gastador. No fundo, o que os números mostram é que, de fato, o gasto cresceu acima do PIB, isso é inegável. Entre 2003 e 2006 cresceu 5,2%, real; entre 2007 e 2010, 4,9%, real; entre 2011 e 2014, 4,2%, real. Ou seja, às vezes igual ao PIB, às vezes um pouco acima do PIB, mas as receitas também cresceram em determinado momento, porque se ampliou a base arrecadatória, se formalizou, se empregou, e as receitas cresciam. Qual é o problema? No período recente, as receitas não estão crescendo por conta de um problema cíclico e por conta de um gasto público, que são benefícios sociais. Não são os gastos com o pessoal, são os benefícios sociais - aqui estou falando exclusivamente do Governo central -, que cresceram 5,2%. Aqui, de fato, há uma questão a se discutir. No fundo, o motor do gasto federal tem sido os benefícios sociais, aposentadoria, pensões, seguro desemprego, Bolsa Família etc. Então, aqui há um problema a equacionar, mas eu coloco a questão de uma forma diferente daquela como ela tem sido colocada no debate. No fundo, a questão é: como viabilizar os direitos sociais previstos na Constituição de 1988 com responsabilidade fiscal? Ou colocando de outra forma: como viabilizar o Estado de bem-estar social no Brasil? Essa é a pergunta, e é uma pergunta que não é feita no debate. A pergunta, no fundo do debate, é: como desmontar o Estado social? Na verdade, se nega essa possibilidade de responder à pergunta e se coloca como desmontar o Estado social, que, na verdade, é uma pergunta fácil de responder - e eu respondo: arrocho no funcionalismo, tal como está aqui; desvinculação de receitas; privatizar a previdência; reduzir benefícios. Isso está posto, isso é fácil de fazer, podemos fazer. Eu queria colocar - concluindo, Senadora Gleisi - que há alternativas, e esse é um ponto importante, porque, no fundo, a pergunta principal... Mais importante do que financiar, ou não, o Estado de bem-estar social é que tipo de sociedade a população quer. Se a população quiser uma sociedade onde haja serviços universais, temos que dar um jeito de mostrar como financiar isso. Eu acho que há espaço para melhorar a qualidade da tributação. Já foi colocado aqui pelo André Horta que, o caso brasileiro, há um problema claro na tributação, um excesso de impostos indiretos e uma escassez de impostos diretos. Eu acrescentaria uma coisa: no Brasil, rico não paga imposto, imposto de renda. Isso está colocado de maneira muito clara em um estudo do Rodrigo Orair e do Sérgio Gobetti, que diz o seguinte: 71 mil pessoas, ou seja, 0,3% dos contribuintes, concentram 14% da renda total declarada. Essas mesmas pessoas pagam apenas 6% de imposto sobre a renda total. Por quê? Porque elas não recebem renda do trabalho, elas recebem lucros e dividendos, que, no Brasil, são isentos, ao contrário do que acontece em todos os outros países da OCDE, à exceção da Estônia. Então, há alternativas? Estou colocando aqui uma delas, mas há várias outras: há espaço para combater a sonegação; há espaço para a formalização no mercado de trabalho; há espaço para a melhoria na qualidade do gasto público, que implica avaliação dos serviços públicos, metas de prestação de serviços, número de procedimentos etc. |
| R | Há também, nós temos que discutir isso, que se pensar o papel do gasto com juros no Brasil. Há uma enorme distorção fiscal no Brasil. Isso costuma ficar fora dos debates, porque não é gasto primário. Ano passado foram R$500 bilhões de gastos com juros. Isso dá para pagar todo o funcionalismo, e ainda sobra dinheiro. Não se trata aqui de propor contingenciamento de pagamento de juros, mas de discutir seriamente essa questão do gasto com os juros e o papel do Banco Central e sua relação com o mercado. Concluindo mesmo - sei que já extrapolei um pouco o meu tempo -, esse projeto, o PLP 257, elege vilões, e os vilões são os servidores públicos: o professor, o agente da vigilância sanitária, o bombeiro, o policial. Ele é demasiadamente tecnicista. Apresenta um excesso de regras que engessam o Estado e automatizam o ajuste fiscal. Com isso, despolitiza a relação entre sindicatos e Executivo, porque, no fundo, o governador vai cumprir uma lei, ele não estará fazendo uma opção. Esse projeto significa a perda de autonomia dos Estados da União, em função da imposição de condicionalidades e desses gatilhos postos pelo Governo central, ou seja, tira grau de liberdade da política fiscal. Esse projeto possibilita a reestruturação do Estado brasileiro, moldado para uma estratégia de, no fundo, sucateamento dos serviços públicos e desvalorização das carreiras públicas. Se os senhores quiserem - aos que não são avessos a conceitos e termos desse gênero -, no fundo, é uma estratégia liberal ou neoliberal que pode ser lida nesse projeto. Por fim mesmo, acho que esse projeto tem de ser discutido em um âmbito muito mais amplo do que o das finanças estaduais. No fundo, trata-se de um projeto de País. Desconfio que a maioria dos brasileiros não gostaria desse tipo de projeto ou da sociedade que está prevista nesse tipo de projeto. No mais, acho que precisamos fazer um grande diagnóstico do Estado brasileiro, reduzir distorções, melhorar a qualidade da arrecadação e do gasto e discutir que tipo de sociedade nós queremos, mas esse projeto não é o caminho para isso. Agradeço a atenção. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Obrigada, Prof. Pedro Linhares. Vamos passar agora ao debate com os Senadores. Depois também passaremos a palavra aos representantes das centrais. Senador Flexa Ribeiro, o primeiro inscrito. O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Cumprimento a Senadora Gleisi Hoffmann, os Srs. Senadores e os senhores palestrantes convidados. Fiz questão de participar. Há vários chamamentos pelo celular, mas estou me contendo aqui porque a audiência é importante, só a acho fora de época. Estamos chovendo no molhado, lamentavelmente, mas fiz questão de ficar do princípio ao fim. Ia me retirar há pouco, mas a Senadora Gleisi disse que me concederia a palavra para que eu pudesse fazer alguns comentários. Acho que esse é um projeto necessário, polêmico, mas fora de época, como disse. Isso deveria ter sido feito lá atrás para que o País não entrasse nesta crise lamentável em que se encontra. Como bem colocou o Dr. Marcos Lisboa, todos nós, os 202 ou 204 milhões de brasileiros, vamos pagar essa conta, e não sabemos o tamanho dela. Isso é que angustia todos nós. A cada dia surge um novo esqueleto, vamos chamar assim - era como se chamava antigamente. Ainda há alguns lá atrás para serem resolvidos, e surgem novos ao longo desse tempo. Então, lamentavelmente, dias difíceis, e bem difíceis, virão pela frente. Temos que estar conscientes disso, só que é preciso um governo ao qual a sociedade atribua credibilidade e confiança para fazer as alterações necessárias, as transformações necessárias. |
| R | (Soa a campainha.) O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - As reformas que tinham que ser continuadas não foram feitas, foram interrompidas. O momento de bonança que a economia mundial teve e deu ao Brasil não foi aproveitado da forma como teria que ter sido para que tivesse efeito positivo à frente, foi feito um uso populista dos recursos que estavam em excesso. Os senhores e senhoras, que são técnicos, vivem o dia a dia na área econômica, mas nós, que fazemos política, vivemos o dia a dia do contato com a população. Então, nós somos testemunhas da degradação dos serviços que são oferecidos à sociedade, na ponta, lá onde mora o cidadão, onde há dificuldades de atendimento à saúde, à educação, à segurança, à infraestrutura e por aí vai. A juízo meu, o Governo Federal é injusto quando trata os desiguais de forma igual. E continua fazendo isso quando encaminha esse projeto para cá. Quer dizer, quando legisla para o Brasil, o faz como se o Brasil fosse unitário. Ocorre que nós temos vários brasis. Aliás, na minha Região Amazônica, nós temos várias Amazônias, não é uma só. Eu vou dar um exemplo aqui só para mostrar como a legislação, quando é feita em nível de País, é difícil, um exemplo simples, simples. Hoje a telefonia fixa está em extinção, todos os brasileiros querem ter direito à telefonia móvel. Isso não ocorre só em São Paulo não; não ocorre apenas lá em Belém, na minha capital, não; não ocorre nas sedes dos Municípios. Vai lá para as vilas, para os distritos. Há um distrito no meu Estado que fica a 1100 quilômetros da sede do Município, tem 20 mil habitantes e não tem telefonia móvel. No leilão de telefonia móvel, a companhia vencedora fica obrigada a colocar telefonia móvel - agora, no 4G - a 30 quilômetros da sede - no 3G, era na sede do Município; no 4G, é a 30 quilômetros da sede do Município. Percorrendo 30 quilômetros a partir de São Paulo, você percorre quatro Municípios; 30 quilômetros na Amazônia é fundo de quintal. Eu estou me referindo, como exemplo, a um distrito em Altamira: da sede do Município, Altamira, ao distrito são 1,1 mil quilômetros. Então, nunca vai ter telefonia móvel se a regra for a mesma para atender o Brasil por inteiro. (Soa a campainha.) O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Da mesma forma, como foi colocado aqui nesse projeto... Ele não vai tramitar nesta crise política em que nós estamos, não vai tramitar nada, lamentavelmente, no Congresso Nacional. Não há o que discutir, nós temos que discutir com alguém que venha com uma proposta que seja factível, aplicável, em torno da qual haja consenso. O meu Estado do Pará, já disse no início, e digo isso repetidas vezes, é um Estado que se diferencia dos demais, mas não é tratado desigualmente. Pior: é tratado perversamente, perversamente. O Pará se enquadra em todos esses critérios porque fez o dever de casa, o Governador Simão Jatene, Dr. Dyogo, fez o dever de casa - e a Fazenda reconhece isso, o Governo Federal reconhece isso -, mas é penalizado. |
| R | (Soa a campainha.) O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Concordo com o Dr. Marcos na questão dos juros compostos e juros simples - está sendo discutido isso -, mas eu não concordo com o indexador. Por que a União empresta para determinados setores ou para determinadas empresas com juros subsidiados pagos... ORADOR NÃO IDENTIFICADO - Pelo Tesouro. O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Pela sociedade, não é pelo Tesouro. O Tesouro não paga ninguém. Quem paga somos nós. Não sei quem foi, se foi a Drª Ana Carla ou o Dr. Dyogo, que falou em R$329 bilhões só de subsídios, só de subsídios do BNDES! E quem vai pagar isso não é o Tesouro não, somos nós. Como é que a União pode emprestar a alguns com esses juros e não pode emprestar para os Estados, ou seja, não pode para a sociedade? Por que essa diferença? Por que tem que cobrar IGP-DI mais 9%, IGP-DI mais 7%, mais 6%? (Soa a campainha.) O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - No Pará, é IGP-DI mais 6%. O Pará consolidou a dívida, Dr. Dyogo, em 1999, em R$388 milhões, corrigida. Pagou até hoje R$1,285 milhão e tem um saldo devedor de R$978 milhões. Sabe o que me lembra isso? O antigo BNH: você pagava a vida inteira, morria e ainda estava devendo mais do que valia a unidade que você tinha comprado. É exatamente a mesma regra do BNH! Então, tinha que haver um fundo... Eu já estou fazendo uma palestra, Senadora. Eu estou fazendo uma palestra. Eu não tenho a competência, nem o conhecimento, mas eu tenho sabem o quê? O sentimento da população, dos paraenses, dos brasileiros, cujo sofrimento eu vejo. (Soa a campainha.) A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Mas eu ia pedir para V. Exª concluir. O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - O que eu vejo? A União é gananciosa, é egoísta. Ela quer ficar com 60% da receita e distribuir para os Estados e Municípios 40%. Não compartilha as contribuições e quer que os prefeitos e governadores venham com o pires na mão ao Executivo de plantão, qualquer que seja, independentemente de partido, e pedir. Se é aliado, ele leva; quando não é, leva um carão e volta para casa sem nada. O Dr. Marcos Lisboa foi objetivo e claro. Alguém falou aí que nós temos que aumentar a carga tributária porque temos que cobrir o nosso gasto. O que adianta? (Soa a campainha.) O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Nós vamos ficar nesse ciclo vicioso: aumenta carga, aumenta gasto, aumenta carga, aumenta gasto. Eu, particularmente, voto contra qualquer projeto que passe no Congresso - posso ser voto vencido - que venha a aumentar a carga tributária. O que nós temos que fazer é fazer as reformas, saber o tamanho do Estado que queremos para, depois de definir o tamanho do Estado, definir qual é a necessidade de receita da carga tributária, e começar a usar no serviço público a meritocracia. Você tem que medir e cobrar a qualidade do serviço que você entrega à população. Não adianta chegar aqui e fazer discurso ideológico, não adianta! (Soa a campainha.) O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Você tem que dizer a realidade, a realidade nua e crua. Todos nós vamos pagar, e vamos cortar fundo na carne para pode colocar este País de volta em seus trilhos. E vamos colocar, porque o Brasil é maior que a crise. A geração do Dr. André é diferente da minha, mas nós passamos por inflação de 83% ao mês. Ninguém acredita nisso, ninguém acredita nisso. Era fácil os Estados arrumarem as suas receitas naquela época: bastava eles pararem de pagar um mês ou dois meses os seus compromissos e tinham recursos para pagar adiante, sem corrigir, e ainda havia sobre de receita em caixa. |
| R | (Soa a campainha.) A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Senador, eu queria só pedir para V. Exª encerrar, porque ainda há mais três Senadores inscritos. O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco Oposição/PSDB - PA) - Eu vou encerrar e vou ter que me ausentar, porque tenho um compromisso. Gostaria muito de ouvir os comentários que serão feitos, mas não vou poder ficar, vou ler depois as respostas. Depósitos judiciais - falou-se sobre isso. O depósito judicial é usado uma vez só, não há o segundo depósito judicial. Usou, acabou, não há mais. Então, são as despesas extraordinárias. Endividamento resolve? Não resolve. Não resolve o problema. Você está doente, está com febre, toma uma aspirina, que tira a febre, mas continua doente, porque não acabou com a doença, com a causa. É o que está acontecendo com o Brasil. Nós precisamos fazer, realmente, um diagnóstico perfeito, ver quais os remédios que temos de tomar - no nível da doença, seria a quimioterapia, a radioterapia? O Brasil está na UTI. O Brasil está na UTI, e temos que tirá-lo de lá. Isso depende de nós. O Congresso tem parte importante nessa responsabilidade. Mas vamos juntos, vamos juntos, para salvar este País. Parabéns a todos vocês. Discordo de alguns pontos que aqui foram colocados, mas a maioria está condizente. Nós temos que buscar a receita para cumprir o tratamento da forma que é necessária para salvar o Brasil. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Obrigada, Senador Flexa Ribeiro. Passo a palavra para o Senador Waldemir Moka. O SR. WALDEMIR MOKA (PMDB - MS) - Srª Presidente, senhores convidados, por economia de tempo vou saudá-los em nome de quem conheço mais aqui, que é a Ana Carla. A primeira coisa é uma pergunta, para a qual gostaria só de um "sim" ou "não". Você está aqui na condição de Coordenador do Conselho Nacional do Consefaz. O que você traz aqui é o conjunto dos Secretários de Fazenda do Estado. É o que vocês conseguiram como consenso o que está contido nesse PLS? Sim ou não? O SR. ANDRÉ HORTA MELO - Não. O SR. WALDEMIR MOKA (PMDB - MS) - Não. O SR. ANDRÉ HORTA MELO - O PLP foi uma proposta do Governo Federal discutida com uma comissão de Secretários. O SR. WALDEMIR MOKA (PMDB - MS) - Sim. O SR. ANDRÉ HORTA MELO - Só que, assim que foi apresentado, outros Secretários se apresentaram dizendo que não concordavam com o total do projeto. Então, o que nós tentamos costurar no Consefaz foi justamente qual era o caminho do meio, qual era o caminho que a maioria dos Secretários poderia adotar como pauta comum. E a pauta comum foram esses três itens que eu estava elencando aqui, Senador. O SR. WALDEMIR MOKA (PMDB - MS) - Eu penso que é difícil o momento que vivemos. Sempre fui um grande crítico dessa questão tributária. Acho que não é possível... Ninguém mora na União, ninguém mora no Governo Federal. As pessoas moram nas cidades, nos Estados. O Governo é uma grande ficção, mas é quem fica com 66% do bolo arrecadado. Ou seja, de cada R$100 arrecadados nos Municípios -, na verdade, as pessoas trabalham e produzem nos Municípios -, 66% vêm para cá, sem falar que, como eles não querem compartilhar, inventaram a chamada contribuição. E, como não é imposto, não precisa ser dividido entre os Estados. Na verdade, de uns tempos para cá, o que vem acontecendo? Estão empobrecendo os Estados. |
| R | Houve uma época em que o Brasil discordou da política que os outros países vinham fazendo, e aí começou a chamada política anticíclica, que nos levou aonde nós chegamos. Em um primeiro momento ela deu certo, e em um segundo momento ela chegou ao estágio em que nós estamos. Eu acho que não se faz omelete sem quebrar ovos. Não adianta achar que nós não vamos passar por momentos difíceis. Não adianta isso. Seja quem for, vai ter que fazer um ajuste fiscal. Vai ter que fazer. E esse ajuste fiscal, na minha avaliação, tem que ser o mais equilibrado possível. Não pode, como disse o Pedro Linhares, só penalizar o servidor público. Parece-me que essa é a principal resistência, pelo menos no meu Estado, o Mato Grosso do Sul. (Soa a campainha.) O SR. WALDEMIR MOKA (PMDB - MS) - Não que ele esteja bem, mas perante os outros Estados, foi transmitido em condições melhores. Não tinha folha atrasada, décimo terceiro, diferentemente, por exemplo, do Distrito Federal. Goiás herdou do próprio Perillo, é diferente. Então, essas coisas terão que ser discutidas, mas alguém me disse aqui: "Neste momento, não é bom você iniciar o debate". Mas ele não será conclusivo. Eu não vejo clima político para que a gente vote isso aqui, mas ele precisa e deve ser discutido. Acho que aí vai caber ao Confaz chegar a um consenso, ou pelo menos o mais próximo possível, para que o Congresso possa votar isso aqui, porque, na verdade, é muito difícil. Eu sou médico. A linguagem de vocês é muito distante, e olha que eu estou há muito tempo nisso. Ela é distante. Eu fico imaginando para a população. Eu acho que se teria que fazer um esforço de penalizar menos... Aqui há uma casta. Quem está mais organizado pega o melhor naco, porque tem uma organização de mobilização, vem para cima do Congresso e tal. E aqueles menos organizados, que são os coitados, que ganham menos, esses são os mais penalizados. Os organizados vêm aqui, pressionam e ficam com o maior naco, a maior fatia do orçamento da União. Isso é uma realidade aqui. Pressionam e tal. Eu gostaria de ver essa discussão. (Soa a campainha.) O SR. WALDEMIR MOKA (PMDB - MS) - O Governo Federal não pôde fazer isso, não pôde fazer aquilo, mas no fundo acabou fazendo e eu tenho certeza de que na máxima boa-fé, Senadora Gleisi. Achei até que essa política cíclica... O mundo estava vivendo um desemprego, um troço assim, e nós não estávamos nisso. Mas depois veio a conta para nós, e aí nós estamos em uma situação pior. De uma maneira geral, o mundo, a economia mundial não está bem, mas me parece que nós ainda conseguimos estar pior do que a economia mundial. Eu não tenho pergunta, é apenas uma consideração. Eu venho muito mais para ouvir, para aprender, para tentar entender essa questão da economia, que, principalmente neste momento, não é tão simples, do que para questionar essa realidade. Muito obrigado a todos vocês. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Agradeço, Senador Moka. Até para informar, o projeto de lei que trata desse assunto está tramitando na Câmara ainda, se não me engano, até na comissão. Acredito que vá demorar. Nós fizemos a audiência pública muito por insistência de diversos Senadores, inclusive do Senador Ferraço. É uma pena que ele não esteja aqui, porque é uma matéria importante. Eu sei que hoje o Senado recebeu o pedido de impeachment da Câmara, tem uma reunião de Lideranças, mas poderia ter se dividido um pouco. Tem os Líderes partidários que tocariam lá. |
| R | Acho que é importante este debate, até porque, realmente, para termos uma solução, vamos necessitar de muita conversa. Isso não é algo que vamos resolver com uma audiência, com duas. Há muita conversa para ser feita para chegarmos a uma solução. Eu queria passar a palavra ao Senador Dalirio Beber. O SR. DALIRIO BEBER (Bloco Oposição/PSDB - SC) - Eu queria cumprimentar a Senadora Gleisi, que preside esta Comissão, cumprimentar os demais Senadores e, sobretudo, aqueles que estão nos brindando com um conjunto de informações que, com certeza, fortalecem o nosso conhecimento sobre a grave situação que vivem os Municípios brasileiros e os Estados. Aqui se falou pouco de Município. Falamos muito mais dos Estados do Brasil, que estão em um processo de negociação das dívidas, ou seja, com uma proposta de prorrogação por mais 20 anos e com a possibilidade de desfrutar de um desconto de até 40% nos dois primeiros anos. Para isso, eles têm que se comprometer com algumas ações. Todas as apresentações foram brilhantes. Não tive o privilégio de ouvir o Dyogo, mas, com certeza, por aquilo que ouvi de outros, foi também muito elucidativo. Eu incorporaria plenamente a apresentação da Secretária da Fazenda do Estado de Goiás, que, de fato, expressa esse sentimento, especialmente ela, que vem da iniciativa privada e que assumiu o desafio de passar a fazer a gestão das finanças públicas de um Estado. E, com certeza, guardadas as proporções, qualquer um que fosse assumir a gestão financeira de um Município vivenciaria o mesmo quadro de dificuldades. Depois, as palavras do Marcos Lisboa, que procurou trazer para a memória uma situação difícil que o País enfrentou e que impôs a toda a sociedade brasileira um sacrifício para que o País fosse organizado, ou seja, que nós conhecêssemos a exata condição que vivia o País, os Estados e os Municípios brasileiros naquele início da década de 1990. Algumas medidas que foram estabelecidas à época foram criticadas, consideradas meras iniciativas para promover os dirigentes, as autoridades da época. Mas não. Foram medidas que produziram resultados extremamente eficientes, eficazes, que permitiram que o Brasil pudesse começar a pensar realmente em um futuro promissor. Lamentavelmente, nós nos descuidamos. Quando começamos a vivenciar os resultados concretos de todo aquele conjunto de normas e medidas adotadas, e também já vivendo um momento favorável em nível externo, nós achamos que não teríamos mais tempestades e passamos a adotar práticas que nos levaram à situação em que estamos vivendo hoje. Portanto, acho bom que todos nós, inclusive aqueles que têm posições diversas com relação a algumas matérias aqui abordadas, que todos nós pensemos e nos remetamos à história do passado, porque não é nada diferente. Vai ter que haver sacrifício. Quando se fala em medidas estruturantes que dependem do Congresso, nós temos várias. A questão da terceirização deve ser debatida, encarada e decidida. Aqui se coloca a questão dos comissionados, quem vai fazer o corte dos comissionados. Os comissionados também devem estar em número somente do necessário, não mais que isso. (Soa a campainha.) O SR. DALIRIO BEBER (Bloco Oposição/PSDB - SC) - A estabilidade irrestrita no funcionalismo público também deve ser discutida. O corporativismo no serviço público não tem sido positivo. É importante que se respeite o direito de todos buscarem suas alternativas de fazer com que aqueles setores avancem, sim, mas, da forma como está hoje, não. Greve no serviço público nós temos que ter a coragem de disciplinar. O piso salarial de categorias funcionais. Nós atribuímos essa responsabilidade de fazer o seu enfrentamento aos prefeitos e aos governadores sem que se ofereça... Já foi discutido isso em nível de conversa, mas temos que ter posições claras, definidas sobre isso. A transferência de responsabilidade. Agora nós vemos o caso da saúde pública. Mais ou menos 60% de tudo o que se gastava no Brasil eram bancados pelo Governo Federal. Hoje, já está a menos de 45% aquilo por que a União responde. Os Municípios é que passaram a arcar. |
| R | A outra questão é a dos royalties, tanto de petróleo quanto de outras atividades. Eles não podem vir para bancar a folha de pagamento. Eles têm que vir para fazer com que haja desenvolvimento e, aí sim, com as receitas normais - aquelas que são gerenciadas pelos prefeitos, pelos governadores e pela União -, que possam ser adotados como regra para qualquer tipo de política de pessoal, tanto de remuneração quanto de ampliação do quadro de servidores. Então, acho que essas questões, se forem de fato enfrentadas em conjunto, entre o Poder Executivo, entre a União e o Congresso, elas podem produzir resultados que vão, aí sim, alcançar todos os 5.570 Municípios brasileiros. Eu vejo dessa forma. Então, parabenizo realmente aqueles que têm esta visão do quadro de dificuldades que vive o País neste instante. (Soa a campainha.) A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Obrigada, Senador Dalirio. Passo a palavra agora ao Senador Raimundo Lira, que é Vice-Presidente desta Comissão. O SR. RAIMUNDO LIRA (PMDB - PB) - Quero cumprimentar inicialmente a minha amiga, a Presidente, Senadora Gleisi Hoffmann. Quero dizer também que ouvi todos os conferencistas. Quanto ao Sr. Dyogo, eu o estava ouvindo pela Rádio Senado. São todos ilustres e profundamente conhecedores do assunto de que se dispuseram a falar aqui nesta Comissão. Mas vou me restringir a três assuntos que eu considero da maior importância. Primeiro, como falou o Prof. Marcos Lisboa, o Brasil abandonou o planejamento. E aí nós seremos o primeiro país do mundo a entrar na categoria de país plenamente desenvolvido sem planejamento. Acredito que não vá acontecer. Mas, se isso acontecer, nós seremos o primeiro. Nós sabemos que todos os países que hoje são considerados plenamente desenvolvidos o são através de três pontos básicos. Os dois primeiros são educação de qualidade e exportação, porque, para um país ter estabilidade econômica na exportação, ele tem que importar produtos industrializados com alta tecnologia e alto valor agregado. E o ensino de qualidade está ligado diretamente a essa atividade. Para que existam as duas, é preciso que haja planejamento. Então, nós abandonamos o planejamento e teremos grandes dificuldades de conseguir os dois pontos que são básicos na área econômica, para que possamos atingir o nível de país desenvolvido. Vou falar aqui do setor produtivo: hoje, as multinacionais que se dispõem a investir no Brasil procuram setores que tenham baixa competitividade ou quase nenhuma competitividade, porque o custo de produção no Brasil é tão elevado que somente o uso da tecnologia e o avanço na produção de produtos industrializados - do setor em que eles trabalham - não são suficientes para competir. É preciso também que haja baixa competitividade no mercado. Por quê? Porque hoje são poucas as empresas médias e grandes em que, se por acaso resolvessem fechar as suas portas, o custo trabalhista seria menor do que o patrimônio líquido da empresa. Por exemplo: a General Motors tem 18 mil ações trabalhistas. Se a General Motors resolvesse, hoje, fechar as suas atividades, encerrar as suas atividades no Brasil, o patrimônio líquido, o capital e os seus bens imóveis não pagariam o custo trabalhista da empresa. Então, é um assunto que precisa ser resolvido, porque no passado - nós sabemos - a Justiça trabalhista passou a ser uma Justiça paternalista. Ela saiu do parâmetro em que foi criada, ou seja, do seu ponto de equilíbrio entre a força da empresa e a fragilidade do funcionário. E, aí, para encontrar esse ponto de equilíbrio, com total imparcialidade, ela vem por anos e anos se transformando numa Justiça paternalista... (Soa a campainha.) |
| R | O SR. RAIMUNDO LIRA (PMDB - PB) - .... onerando de uma forma extraordinária as empresas. E veio também a judicialização da atividade econômica do País, ou seja, todo fabricante, todo distribuidor de produto, todo lojista que vende um produto hoje, quando o cliente sai da loja, ele já acha que aquele cliente vai entrar com uma ação na Justiça. Eu tinha um grupo de concessionárias, um dos maiores do País, e me desfiz dele e uma das razões foi essa. A concessionária entrega um veículo, o cliente chega ao edifício onde mora, um condomínio, feliz, satisfeito. Todo condomínio hoje tem um, dois, três, quatro, cinco advogados, que é um parente ou um cunhado ou um genro. Então, o consumidor, com muita alegria, mostra o carro novo que comprou, mas sempre há um advogado junto que diz: "Deu tudo certo? A operação foi correta?" "Foi, apenas eles entregaram com cinco dias de atraso". "Cinco dias? Então, vamos entrar com uma ação contra a empresa. Quanto é que você ganha por mês?" "Vinte mil reais". "Vamos cobrar R$500 mil, mostrando que nesses cinco dias, com a ausência do veículo, você deixou de fechar um negócio em que ia ganhar R$500 mil". E entra com uma ação de R$500 mil, e o juiz de primeira instância aceita aquela ação, o que não acontece nos Estados Unidos, onde as ações exóticas, absurdas, já são rejeitadas de pronto. Elas não são aceitas. Isso faz com que hoje o Brasil tenha 105 milhões de ações na Justiça, quase 3 milhões de ações trabalhistas. Os Estados Unidos têm uma média de 70 mil ações trabalhistas por ano. O Japão tem uma média de mil ações trabalhistas por ano. Então, veja o peso que as empresas no País, hoje, têm, afora a questão da segurança. As empresas hoje gastam um dinheiro enorme com segurança. Os PROCONs, que foram criados para defender os interesses dos consumidores, hoje são agressivamente contra as empresas. Eles demonstram isso com clareza. Eles não querem um acordo com o cliente. Eles querem cobrar uma multa do empresário. Eles não querem que haja um acordo entre o cliente e o empresário. Como é que podemos ser uma economia forte, como é que podemos crescer economicamente, gerar impostos se as nossas empresas estão sobrecarregadas com todos esses custos? Vamos agora para o Imposto de Renda pessoa física. Se eu pegar as estatísticas mundiais, as várias alíquotas dos países desenvolvidos... (Soa a campainha.) O SR. RAIMUNDO LIRA (PMDB - PB) - ... e dos países em desenvolvimento, posso fazer vinte ou trinta conceitos diferentes em relação a essa estatística, o que é justo, o que é injusto, o que é maior, o que é menor. A alíquota no Brasil, hoje, é de 27,5%, a alíquota máxima. Nos Estados Unidos, essa alíquota é de 35%, a alíquota máxima, sendo que lá você tem uma lista enorme de deduções a serem feitas na sua declaração de Imposto de Renda. Então, quem paga a alíquota máxima, por exemplo, se usar todas as deduções, vai pagar 22,5% de Imposto de Renda. Você paga 35% de Imposto de Renda a partir de uma renda de US$379.150, o que representa R$1.364.490,00. No Brasil, você paga uma alíquota máxima de 27,5% a partir de uma renda de R$44.918,00, ou seja, a renda máxima do americano, o patamar da renda máxima do americano para ser cobrada essa alíquota máxima é trinta vezes superior ao do Brasil. E mais ainda, a renda per capita dos Estados Unidos, em 2015, foi de US$ 55 mil. No Brasil, chegou a R$11 mil... (Soa a campainha.) O SR. RAIMUNDO LIRA (PMDB - PB) - ... e hoje está a menos de R$10 mil. Ou seja, os americanos têm uma renda per capita de seis vezes a renda do brasileiro. E mais, a nossa alíquota de 27,5% ainda sofre, ano a ano, o confisco da não atualização inflacionária da tabela. Nos últimos anos - não neste Governo, mas desde muitos anos -, o contribuinte brasileiro já foi confiscado em bilhões de reais por conta dessa não atualização. |
| R | O que existe são alguns artifícios, algumas gambiarras que são feitas, por exemplo, essa moda, no Brasil, de a pessoa física criar uma pessoa jurídica para pagar um Imposto de Renda baixo. Isso é um artifício, isso que tem que acabar, e não aumentar a alíquota máxima de Imposto de Renda no País. Portanto, é preciso um estudo bem detalhado para saber onde estão os furos. Com relação à distribuição de dividendos, o Brasil já teve uma alíquota de 8% na distribuição de dividendos. Depois acabou essa renda, essa tributação - o professor sabe muito bem disso. Mas vamos ver qual é o custo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica que, atualmente, é de 34%. A proporção, que era uma média de 25%, quando chegou a 34%, tiraram os 8%. É preciso baixar a renda da empresa, do lucro real, para poder criar um imposto da distribuição dos dividendos. Nada pode ser feito, analisado, de uma forma totalmente isolada. Dizemos que o brasileiro paga pouco imposto direto. Paga? O IPVA, no Brasil, a secretária que comprar uma Toyota lá em Goiânia e pagar o IPVA, se estivesse nos Estados Unidos pagava o IPVA de 60 Toyotas. Se for um carro mais caro, de US$100 mil, pode chegar até a 120 vezes o valor do IPVA nos Estados Unidos. O seguro total do carro no Brasil chega até dez vezes a mais que nos Estados Unidos porque o número de veículos roubados é muito elevado. Tudo isso é custo direto e tem que ser analisado por uma lente ampla, que o professor chama de planejamento, para que possamos dar soluções à situação do País e criar as bases para um crescimento econômico sustentável. (Soa a campainha.) O SR. RAIMUNDO LIRA (PMDB - PB) - Agora, ainda no planejamento, vou citar um exemplo prático. Em 2013 ou 2014, o BNDES começou a financiar caminhões com 2% de juros fixos a longo prazo. Só fez isso porque não tinha planejamento, porque, com 2%, quem precisava de dez caminhões comprou 50; quem precisava de cem comprou 500, porque qualquer criança de primeiro grau sabe que 2%, com a inflação de 10% no longo prazo, é praticamente uma doação, então o cara vai lá e compra o maior número possível de veículos sem precisar. O que acontece? A indústria contrata pessoal, faz três turnos de produção e, no ano seguinte, quando essa taxa cai, a indústria se acaba, terá uma queda de 40%, 50%. É importante financiar o caminhão porque o nosso transporte é basicamente rodoviário, temos uma frota antiga, portanto, vamos criar, negociar uma taxa de 6%, 7%, 8% já subsidiada, porque o empresário só vai comprar os veículos de que precisa já com a certeza de que, daqui a dois, três, quatro anos, quando quiser renovar a frota anualmente no seu planejamento, terá o mesmo financiamento. Você tem 2% de financiamento no ano e não tem mais nunca esse financiamento. É uma coisa totalmente desarrumada, porque falta o que professor Lisboa falou com relação ao País: planejamento. |
| R | A situação dos Estados brasileiros. O que foi o maior complicador para a atual crise dos Estados brasileiros? A distribuição da renda, do bolo da arrecadação para os Estados e Municípios é injusta? É, mas não foi isso. O que aconteceu foi que a reeleição arrombou financeiramente os Estados brasileiros. Um governador se elege, toma posse no dia 1º de janeiro, faz a festa, a comemoração, o coquetel, os shows, os bailes. No dia 2, ele reúne a sua equipe e diz: "O que precisamos fazer para a reeleição daqui a quatro anos? Precisamos criar mais quatro ou cinco secretarias para atender a demanda dos partidos políticos." Temos, hoje, quarenta e tantos, mas, no passado, tínhamos 25, 30, 32 partidos. Hoje, temos 28 partidos representados na Câmara dos Deputados e 16, aqui, no Senado. É por isso que também o Legislativo não anda, porque as soluções do Legislativo são feitas através do consenso. E como encontrar um consenso com 28 Líderes? Encontrar um consenso com 16 Líderes? É por isso que as coisas se arrastam aqui, no Congresso Nacional. Então, a reeleição criou esta situação: o governador, no segundo dia de mandato, já pensa na reeleição. Ele quer dois terços da Assembleia Legislativa a qualquer custo; ele quer, se possível, a totalidade de todos os meios de comunicação do Estado, da maior rede de televisão à menor rádio comunitária lá do interior do distrito; ele quer todos os prefeitos; ele quer todos os ex-prefeitos; ele quer todas as pessoas que têm votos no Estado e que têm voz. Aí, o custo do Estado passa a ser uma coisa absolutamente inadministrável. E quando você tem um período de prosperidade econômica,... (Soa a campainha.) O SR. RAIMUNDO LIRA (PMDB - PB) - ... como nós tivemos, isso tudo vai levando, mas, na hora em que vem para a realidade, você tem uma crise pequena, média ou grande, aí a situação começa a ficar complicada. Então, eu acho que é por aí o que está acontecendo no País, que está sem planejamento, sem que possamos encontrar soluções. Fala-se, hoje, que o Brasil precisa aumentar os impostos, mas de forma temporária. Nós sabemos que, quando João diz uma coisa, pode ser verdade e pode não ser; quando Maria diz uma coisa, pode ser verdade e pode não ser; mas, quando um governo diz uma coisa, nós já sabemos sempre que não é verdade, porque qualquer governo que diga que vai criar aquele imposto por um, dois ou três anos, já sabe que não vai, porque vai incorporar no engorduramento, seja do Estado, seja do Município, seja do Governo Federal. Então, eu gostaria de fazer essas breves colocações e ficar aqui à disposição, caso alguns dos ilustres entrevistadores e conferencistas queiram fazer algumas considerações. Encerro, dizendo o seguinte: participava eu de uma conferência, de um congresso de debates no Instituto Wilson, em Washington, e sempre me incomodou aquela história de os canadenses, europeus e americanos dizerem que nós, latinos - não com essas palavras, mas dando a entender -, somos especialistas em construir subdesenvolvimento. Aí, eu perguntei a um daqueles acadêmicos canadenses: de todas as variáveis que ele considerava, por que não existia um país desenvolvido no continente latino-americano? A Argentina chegou, no passado, a ter 50% do PIB latino e, depois, foi caindo, caindo, e hoje é a Argentina que nós conhecemos. Então, eu perguntava: qual é a variável mais importante, que o senhor considera, de todas essas? E ele me dizia: "Existem muitas, mas vou dizer uma aqui que considero importante: os saxônicos sempre adotam as ideias das pessoas pragmáticas. Então, se uma coisa está dando certo, vamos melhorar aquela coisa, vamos aperfeiçoar aquilo. Já para os latinos, prevalecem as ideias dos gênios. Tudo tem de ser mudado. Todas as coisas precisam ser reformadas. Então, nunca o país vai ter uma cultura do que se faz e do que se realiza, porque está sempre em modificação." |
| R | Aqui eu vou, por minha conta, dar um exemplo do que é a genialidade do brasileiro. O imposto mais estúpido da história econômica, criado no Brasil, a chamada CPMF, foi criado por um gênio, Adib Jatene, que era gênio de Medicina. Então, essa genialidade nossa, podemos até dizer que, em vez de nos beneficiar, ela termina sendo negativa, porque nós não criamos uma cultura em nenhuma das nossas atividades do nosso País. Eram essas as considerações. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Obrigada, Senador Raimundo. Pergunto à Senadora Lúcia Vânia se deseja usar a palavra. A SRª LÚCIA VÂNIA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Srª Presidente, em primeiro lugar, eu gostaria de pedir desculpas por ter me ausentado daqui durante a fala dos senhores expositores. Quero cumprimentar o Dr. André Horta, Coordenador do Conselho Nacional de Política Fazendária; cumprimentar o Dr. Pedro Linhares Rosa, professor da Unicamp; cumprimentar o Dr. Dyogo, Secretário-Executivo do Ministério da Fazenda; cumprimentar a Ana Carla, Secretária da Fazenda de Goiás; e cumprimentar, com muito carinho, o Dr. Marcos Lisboa, que nos honra novamente com a sua presença aqui, na CAE. É sempre um prazer ouvi-lo, Dr. Marcos, e é sempre bom relembrar a sua passagem pelo Ministério. Vou fazer apenas algumas considerações a respeito do projeto que está em discussão aqui. Eu acredito que o alongamento da dívida dos Estados será, sem dúvida nenhuma, um refresco, pelo menos momentâneo, para os Estados. Só entendo que as condicionantes teriam de vir, sim, junto ao projeto, senão seria premiar aqueles que não fizeram a lição de casa. Se eu disser o contrário aqui é capaz de eu apanhar da Secretária da Fazenda. Então, é melhor concordar logo em seguida com o projeto. Mas eu considero o projeto bom, uma vez que tenho acompanhado o processo de endividamento do Estado ao longo do tempo, tenho acompanhado o desempenho da Secretaria de Fazenda há mais de trinta anos e acredito que chegamos a um momento em que há a necessidade realmente de algumas medidas estruturais para que possamos ter recursos para investimento. O nosso Estado tem uma posição agressiva em relação aos incentivos fiscais. Eu sempre fui uma crítica em relação a esses incentivos, porque entendo que hoje eles são mais prejudiciais do que atraem realmente as empresas para o Estado, uma vez que não há nenhuma possibilidade de fazer alguns ajustes nesses incentivos, já que estão sendo praticados ao longo de muitos anos e necessitam hoje se adaptar às circunstâncias do Estado. Quero aqui concordar com o Senador Lira que a reeleição foi um grande prejuízo que nós tivemos para o planejamento e principalmente para a austeridade fiscal nos Estados. Por fim, quero perguntar ao Dr. Dyogo se continua na agenda do Ministério da Fazenda a discussão sobre a reforma do ICMS e se há alguma possibilidade de votarmos a convalidação dos benefícios, se também isso está na agenda do Ministério, pelo menos por esses meses. Deixo aqui os meus cumprimentos ao Dr. Dyogo. Quero aqui reconhecer, Dr. Dyogo, o seu esforço, no sentido de participar de várias reuniões conosco aqui e principalmente de apontar a necessidade de uma convergência no Confaz a respeito desses temas. No mais, quero cumprimentar todos os expositores e dizer da minha satisfação de poder recebê-los aqui, na CAE. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Obrigada, Senadora Lúcia Vânia. Antes de passar à Mesa para as considerações finais, como foi dito aqui no início, eu gostaria de passar a palavra, por cinco minutos, ao Sr. João Paulo Ribeiro, que é Secretário do Serviço Público e dos Trabalhadores Públicos da Central dos Trabalhadores do Brasil, e também fazer uma saudação ao Sr. Ogib Carvalho Filho, que é Vice-Presidente Executivo da Central do Servidor Público. Então, eu gostaria de passar a palavra ao Sr. João Paulo por cinco minutos. |
| R | O SR. JOÃO PAULO RIBEIRO - Agradeço à Senadora e a todos os palestrantes. Quero, na verdade, Senadora, agradecer a cessão da palavra. Estão aqui, neste momento, representantes de quatro centrais: o companheiro Ogib; o companheiro Lineu; o companheiro Toninho, da Intersindical; e eu, que sou da CTB. Além deles, estão aqui os companheiros Antônio e André, da Fasubra, que também é a minha federação, ligada às universidades públicas do País, e o Luiz Fernando, junto com o Eduardo, da Fenajud (Federação Nacional dos Servidores do Judiciário nos Estados). Falo aqui em nome das dez centrais sindicais. Nós constituímos um fórum de serviço público, composto por dez centrais sindicais, a saber: CUT, UGT, Força Sindical, Nova Central, CSB, CSP-Conlutas, CGTB, Pública, Intersindical e CTB. Algumas dessas dez centrais sindicais estão dentro da lei, e outras estão em trâmite no Ministério do Trabalho. Nós fizemos esse fórum junto com a Confederação dos Servidores Públicos, a CSPB, e com outras confederações, federações e com sindicatos. Nós fizemos esse fórum, que se constituiu de mais de 200 sindicatos, após a publicação, no dia 22 de março, do PLP 257. Saudações ao meu Senador que já é conhecido aqui, não é, Romero Jucá? Romero Jucá já é um velho conhecido Senador dos servidores públicos. Enfim, sobre esse PLP, Senadora, nós realizamos também uma audiência pública no Senado, promovida pelo Senador Paim, que apresentou, nesta Casa - eu queria saber a opinião dos palestrantes -, o PLS 561, que está tramitando aqui. Para nós, trabalhadores do serviço público, esse projeto está de bom tamanho, pois dialoga melhor e é um dos poucos projetos que não penaliza os trabalhadores do serviço público, como disse o economista e professor da Unicamp, meu companheiro de universidade, porque eu e o Toninho também somos da Unicamp, Pedro. O projeto não nos penaliza! E nós queríamos dialogar sobre esse projeto do Senador Paulo Paim, junto com a Ana Amélia e o Lasier. Então, é um projeto muito bom dos companheiros do Rio Grande do Sul, que salva os Estados, tirando, é lógico, a penalidade de alguém, no caso, os trabalhadores do serviço público. A outra questão é que precisamos aprender que, quando queremos discutir algo que envolva os servidores, esses servidores também têm representação. Os fóruns são constituídos no âmbito do gestor. Eu tenho 34 anos de serviço público. Antigamente, falava-se em recursos humanos, mas, agora, fala-se em gestor, ou seja, a máquina humana, a pessoa humana não é mais fundamental, não é importante. Então, nós precisamos resgatar a pessoa humana, porque há trabalhadores que pagam seus impostos em dia e que precisam ser valorizados, pelo menos para serem ouvidos em espaços democráticos como este. Esta é a casa dos trabalhadores. Nós precisamos ser ouvidos para saberem se não temos sugestões. Nós temos várias sugestões que poderiam contrariar ou, de repente, seguir outra lógica que não seja a de facilitar, por exemplo, a não execução de concurso público, a não execução de reajustes já feitos e negociados, como é o caso dos federais. Há órgãos que estabeleceram quatro anos para a negociação. A primeira a ser executada será em agosto, e nós nem sabemos como ficará diante da atual crise. Mas como ficará o caso, por exemplo, de quem assinou para 2019? Poderá não ocorrer - poderá. O Dyogo disse que não está condicionado, mas está explícito que os governadores e os gestores podem não aplicar e não concluir. (Soa a campainha.) O SR. JOÃO PAULO RIBEIRO - Finalizando, eu queria convidar o Senador Dalírio Beber para participar, no dia 25, às 14 horas, de uma audiência pública que realizaremos em Santa Catarina. Nós conversamos com o Deputado Esperidião Amin, que estará presente. Nós apresentaremos algumas indicações e solicitações para melhorar e aperfeiçoar o Projeto 257. Acho que será um espaço importante não só para o senhor, mas também para outros Senadores e para os próprios técnicos. Nós trabalhadores temos muito a dizer. Nós poderíamos usar outros mecanismos sobre os quais eu não ouvi vocês falarem. Por exemplo, a questão das sonegações bilionárias; a questão dos supersalários, que, na verdade, não foram causados por negociação salarial, mas por outros mecanismos; a questão da sonegação fiscal, a questão da eficiência e a cobrança, porque as pessoas não pagam, não se cobra, não há taxação. Cadê as taxações das grandes fortunas, de grandes latifúndios? Não se coloca isso no debate. |
| R | Então, estamos dispostos, com alguns exemplos que vocês já citaram - nós também estamos citando -, que de repente podem ser mecanismos que nós podemos negociar, trabalhando a eficácia, e salvar os Estados. Porque os Estados não estão conseguindo pagar salários por causa da dívida, mas também nós precisamos tentar concretizar que nós não somos o culpado; nós não podemos pagar essa dívida. E podemos, quem sabe, avançar na questão, por exemplo, como a Profª Ana Carla falou. Ela disse o seguinte: nós podemos talvez criar um mecanismo de ver onde foi aplicado todo o dinheiro que foi emprestado. A gente, por exemplo, tem dúvidas... (Soa a campainha.) O SR. JOÃO PAULO RIBEIRO - ... se todo o dinheiro emprestado foi aplicado com eficácia. Acho que, talvez, auditorias públicas nesse dinheiro seriam necessárias. Muito obrigado, Senadora Gleisi, mais uma vez, em nome de todas as centrais do serviço público do querido Brasil. A SRª LÚCIA VÂNIA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Pela ordem, Srª Presidente. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Agradeço ao João. Antes de lhe passar pela ordem, quero fazer também uma saudação ao Lineu Neves Mazano, que está aqui, que é da Confederação dos Servidores Públicos. Senadora Lúcia Vânia. A SRª LÚCIA VÂNIA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Dr. Dyogo, neste momento, há sete governadores no Supremo com o Ministro Fachin e o Ministro Nelson Barbosa para discutir a questão dos juros simples. Eu gostaria de perguntar a V. Sª, se houver uma decisão positiva em relação ao pleito dos governadores, quais seriam as consequências. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Vamos passar a palavra à Mesa. Queria agradecer, antes de mais nada, a todos que estão aqui, que se dispuseram a vir, e pedir desculpas já pelo adiantado da hora. Eu começaria passando a palavra ao Dr. Dyogo. E, se pudermos, em cinco, seis minutos, fazer as considerações finais... Esta não é a primeira nem será a última audiência pública. Nós com certeza teremos outras para discutir essa situação. Por favor, Dr. Dyogo. O SR. JOÃO PAULO RIBEIRO - Senadora, só uma informação. Nós tivemos uma audiência com o Ministro Ricardo Berzoini na semana passada, e o mesmo se mostrou disposto a negociar - por isso o Dyogo podia ajudar - a Emenda nº 119. do Deputado Florence, Afonso Florence. E aí nós ficamos na esperança de o Governo também se manifestar favorável. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - O.k. Dr. Dyogo. O SR. DYOGO HENRIQUE DE OLIVEIRA - Em primeiro lugar, eu queria fazer um comentário mais geral, embora na minha fala eu tenha sido bastante contido ao tema, mas várias exposições acabaram tratando também de questões mais gerais sobre política econômica, ajustes etc. Acho que a nossa sociedade é madura o suficiente para ter a compreensão de que o processo de desenvolvimento econômico exige ações equilibradas, exige a busca constante do equilíbrio entre as forças que formam essa economia. O processo de ajuste fiscal que nós estamos vivendo não é diferente disso. Nós teremos que fazer um processo de ajuste equilibrado entre as diversas parcelas da sociedade e as diversas forças econômicas. O que a gente sempre pode é partir para uma estratégia de polarização e fuga do verdadeiro debate. Então, a gente pode ir para um lado, de que o ajuste tem que ser todo cortando gastos, ou para o outro lado: o ajuste tem que ser todo aumentando receitas. Isso, a meu ver, desfoca a discussão das verdadeiras soluções que nós precisamos. O processo de ajustamento das contas públicas do Brasil, seja no nível estadual, seja no federal, seja no municipal, demandará esforço nas duas direções, e nós teremos que debater isso de maneira bastante madura e objetiva. Não há como lidar simplesmente cortando despesas quando nós enfrentamos, no caso da União, uma queda de receita de mais de R$100 bilhões. Não há nem espaço no Orçamento para se cortarem R$100 bilhões. E é assim também no caso dos Estados. Então, é evidente que a solução tem que ser uma solução equilibrada entre as diversas parcelas da sociedade. E neste projeto em particular, a meu ver, nós buscamos exatamente isto: construir uma solução equilibrada entre o que se concede de alívio no curto prazo e o que se exige de ação no médio, longo prazo, reequilibrando a equação dos Estados. |
| R | Acho que deixei bastante claro que os Estados não têm um problema de dívida. O problema dos Estados não é a dívida. E assim também não foi o aumento recente do endividamento dos Estados. O aumento recente de endividamento dos Estados, nos últimos seis, oito anos, foi um endividamento seletivo, direcionado para projetos de investimento. Esses recursos foram aplicados em infraestrutura, em melhoria da qualidade dos serviços públicos nos diversos Estados do País, na Nação. Eu não acredito que tenha havido um equívoco nessa estratégia, tanto não acreditamos nisso, que, neste ano, nós já anunciamos que estaremos colocando R$20 bilhões a mais em operações de crédito para os Estados e Municípios do Brasil, porque é necessário e os Estados têm capacidade para tomar essa dívida. Muitos Estados, a maioria deles eu diria, cerca de, talvez, quinze a vinte Estados têm plenas condições de se endividar porque têm espaço fiscal. O que nós estamos fazendo, e também respondendo um pouco ao Senador Moka, que falou da questão do tratamento igual com desigual, é priorizar as operações de crédito exatamente para os Estados que têm o menor benefício com a renegociação das dívidas, dessa maneira, contrabalançando os benefícios. O comentário geral sobre a questão do PL 257. Nós enfrentamos a questão, propusemos a questão... (Soa a campainha.) O SR. DYOGO HENRIQUE DE OLIVEIRA - ... do limite do gasto. Qual é o objetivo dessa medida? Nós estamos presenciando no Brasil, nos últimos vinte anos, a despeito do ciclo político, a despeito do ciclo econômico, um aumento consistente, continuado da despesa pública. É evidente que uma sociedade como a nossa não pode financiar indefinidamente os aumentos da despesa pública. Isso precisa ter algum limite, algum condicionante. Todavia, o projeto em si não traz esse condão de trazer esse limite. Ele diz apenas que, a cada ciclo, o Governo estabelecerá a trajetória de gasto que ele acha consistente com a sua política, com a sua Base, com a sua proposta econômica, com a sua proposta social. É trazer maturidade para o debate da despesa pública. Nós temos hoje um processo de debate sobre a despesa pública onde todas as forças se aliam, se apoiam mutuamente pela expansão da despesa pública. É preciso trazer para o debate da despesa pública a consciência de que existe um orçamento, que ele é limitado, e que as pessoas disputam esse orçamento, e não simplesmente que a gente pode expandir indefinidamente esse orçamento. A sociedade não tem condições de custear qualquer quantidade de despesa. Isso eu acho que é fácil de compreender. É preciso que haja uma discussão madura, democrática sobre qual é o tamanho dessa despesa que nós queremos e como é que nós a financiamos. Também sobre a questão dos servidores públicos, eu queria, mais uma vez insistir: não há nada no projeto que aponte no sentido de retirar qualquer direito, ou benefício, ou cancelar qualquer reajuste salarial que tenha sido... (Soa a campainha.) O SR. DYOGO HENRIQUE DE OLIVEIRA - ... concedido, ou reduzir qualquer nível de benefício de qualquer servidor em qualquer esfera. Pelo contrário, tomamos o cuidado de ser bastante precisos em dizer que os benefícios já concedidos estão preservados e que os novos aumentos, novos ajustes podem ser dados dentro daquilo que a Constituição prevê, que é a revisão geral. E aqui se diga: a revisão geral não quer dizer correção pela inflação. Pode ser mais, pode ser menos, isso vai depender da revisão que for feita e da negociação que for feita. A única coisa que se evita são aquelas discricionárias, individuais, que acabam gerando salários estratosféricos em áreas nem sempre justificáveis. A propósito disso, o colega da Central colocou, o Governo Federal também enviou para o Congresso Nacional um projeto tratando do limite do teto salarial dos servidores de todos os níveis e de todos os Poderes. Então, está posto o debate também sobre a questão dos supersalários. |
| R | Por fim, a Senadora Lúcia Vânia fez duas perguntas muito importantes, que eu acho que vale a pena comentar aqui na CAE. Primeiro, a reforma do ICMS. Nós não desistimos da reforma do ICMS, nós achamos que a reforma do ICMS pode e continuará sendo debatida. O que nós estamos apresentando como novidade, inclusive, na última reunião do Confaz, eu coloquei essa questão, é que, dada a dificuldade que nós teremos para implementar os fundos de compensação e custear todo o custo de transição da reforma do ICMS, nós deveríamos discutir a implementação da reforma em duas etapas. Em um primeiro momento, fazendo o reconhecimento dos benefícios já concedidos, porque hoje nós temos uma enorme insegurança jurídica sobre as empresas que impede o investimento, que impede a retomada da atividade econômica, porque as empresas,... (Soa a campainha.) O SR. DYOGO HENRIQUE DE OLIVEIRA - ... principalmente as grandes, não têm condição de adotar novos projetos de investimento tendo sobre si riscos elevadíssimos a respeito dos investimentos já feitos. Então, nós poderíamos eliminar essa insegurança jurídica, isso traria um ânimo novo para os investimentos das empresas. E a continuidade, a implementação da redução das alíquotas e da reforma propriamente dita do ICMS. Nós acreditamos que hoje, talvez, essa seja a melhor solução para a questão do ICMS. A questão dos juros simples eu também comentei, foi comentada amplamente. Seria, a meu ver, um enorme prejuízo para o País e, mais do que isso, uma grande injustiça entre os Estados. E ao final, pior do que entre os Estados, porque é um ente etéreo, que não se sabe bem quem é, mas para o contribuinte dos Estados. Eu mostrei aqui, Senador, que os contribuintes dos Estados mais pobres do Brasil vão pagar pelos contribuintes dos Estados mais ricos. Então, enquanto o contribuinte de São Paulo vai ter um ganho líquido de R$ 1,5 mil, o contribuinte do Rio Grande do Norte, do Piauí vai ter uma perda líquida de R$ 1,5 mil. Ou seja, é o piauiense pagando R$ 1,5 mil para refinanciar o custo da dívida do Estado de São Paulo. Não me parece que seja adequado. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Obrigado, Dr. Dyogo. Eu passo a palavra agora ao Secretário André Horta. O SR. ANDRÉ HORTA MELO - Agradeço, Senadora Gleisi, o convite. Aproveito para saudar aqui a Senadora Lúcia Vânia, que apresentou e expressou a vontade dos Estados, há dois anos, apresentando aquele projeto da convalidação dos benefícios fiscais, que terminou um pouco descaracterizado. A maioria dos Estados brasileiros gostava muito daquela forma original, Senadora, do projeto que a senhora apresentou. E vejo que ficamos animados com o Governo Federal querendo também, tendo essa vontade de discutir a convalidação. De fato, é preciso andar naquilo que dá para andar agora. Se a alíquota está envolvendo fundos e a gente está concentrando as finanças na questão do alongamento, evidentemente outras vertentes podem caminhar, como essa questão da convalidação, sobre a qual até já falamos um pouco nesse último Confaz e podemos aprofundar as negociações para ver qual é a possibilidade de encaminhamento dessa questão ali. O Senador Raimundo Lira, infelizmente, não está aqui. Eu queria elogiar o interesse nessa questão da regressividade tributária. E lembrar que no Brasil quem ganha acima de 30 salários mínimos tem uma carga tributária de 22%, segundo o IBGE, e quem ganha até dois salários mínimos tem uma carga tributária de 50%. Evidentemente isso precisa mudar, não só por uma questão social patente, mas porque isso é contraproducente do ponto de vista econômico, isso é ineficiente do ponto de vista econômico. Então, nós precisamos, sim, alterar essa questão progressividade. O Prof. Pedro aqui citou excelentes estudos sobre isso, citou o estudo do Rodrigo Orair e do Gobetti, que versa sobre o problema que o Senador Raimundo Lira falou, de quem se transforma em pessoa jurídica, ou seja, PJ, "pejotização", como eles tratam os trabalhos deles. E lembrar o Senador Raimundo Lira que pode convidar também o Marcelo Medeiros, que tem um estudo comparativo sobre progressividade do Imposto de Renda no mundo todo bastante interessante também, lá do Ipea, colega também do Pedro. No mais, agradeço a todos pelo debate. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Agradeço, Secretário André. Passo a palavra à Secretária Ana Carla, para suas considerações. |
| R | A SRª ANA CARLA ABRÃO COSTA - Em primeiro lugar, só quero esclarecer um ponto que o Senador Moka questionou em relação à posição dos secretários de fazenda do Confaz em relação ao PLP 257. O André bem colocou a posição. Ou seja, embora não haja consenso em relação a todos os dispositivos do projeto, certamente houve unanimidade, que é uma coisa bastante rara no Confaz em relação.... (Intervenção fora do microfone.) A SRª ANA CARLA ABRÃO COSTA - Até por isso é um problema. Exatamente. Mas nesse caso, especificamente, nós conseguimos unanimidade para defender três pontos principais das contrapartidas, sendo eles: a limitação no crescimento dos gastos, a redefinição do conceito de gastos de pessoal e também não só gastos com pessoal, mas gastos de custeio, de toda despesa não financeira. Então, é importante que se diga que há, sim, um consenso hoje não só em relação ao alívio, mas em relação às contrapartidas e à necessidade de algumas alterações, mudanças estruturais. Nas minhas considerações finais, vou puxar um gancho que o professor Pedro colocou. Ele fez uma pergunta que eu acho bastante pertinente: como compatibilizar o estado de bem-estar social, que foi definido pela nossa Constituição de 88, com responsabilidade fiscal? Acho que não tem como fugir, a resposta é muito simples: a gente tem de subir a carga tributária. Este País vai ter de chegar a 60% do PIB de carga tributária. É isso o que a sociedade quer? E não é subir carga tributária para dar conta de avanços sociais adicionais ou de direitos adicionais, mas para dar conta do que a gente já tem hoje contratado. É isso o que a gente quer? Essa é a pergunta que eu acho que tem de ser respondida de forma legítima. Se for isso, então vamos. Mas com a atual carga tributária nós não conseguiremos manter o estado de bem-estar social que nós temos hoje. E por estado de bem-estar social estou chamando uma série de meias-entradas. O Marcos Lisboa cunhou esse termo lá atrás e acho que ele traduz tudo o que a gente tem vivido hoje, que é o fato de que todos hoje têm a sua meia-entrada. No momento em que todos têm a meia-entrada, necessariamente, a equação não fecha. Então, temos todos de pagar um pouco mais para financiar a meia-entrada do nosso colega ou a nossa própria. Então, definitivamente, acho que essa é a discussão que temos de fazer. Sem dúvida nenhuma, esta é a Casa - por ser a grande representante dos Estados e da sociedade - onde esse debate tem de ser feito. Qual é o tipo de sociedade em que queremos viver? Com que custo? E que benefícios nós queremos conceder às pessoas e a cada um dos segmentos de nossa sociedade? Hoje, uma das coisas que vêm dificultando o avanço do debate ou o avanço do reequilíbrio é justamente o avanço de forças corporativas, corporativistas, que se organizam em defesa da sua meia-entrada. Infelizmente, se nós continuarmos dessa forma, ou teremos, sim, de subir carga tributária ou necessariamente todo mundo vai perder. Essa conta está crescendo. Ela está crescendo nos Estados, está crescendo nos Municípios, está crescendo na União. Esse custo recai - como toda solução mágica - sobre todos nós. Então, de nada adianta a gente conseguir novos avanços se lá na frente a gente vai ter de entregar esses avanços com um custo muito elevado para todos nós. Então, o ponto do projeto - e foi isso o que nós tentamos construir junto com o Ministério da Fazenda, foi a contribuição que trouxemos - foi justamente a necessidade de enfrentarmos esse desequilíbrio, de enfrentarmos essa dificuldade que nós temos hoje de mostrar, de expor para a sociedade que a conta está só crescendo. Ou a gente reequilibra essa equação ou todos nós teremos de abrir mão, aí, sim, de direitos adquiridos, de avanços em prol de um ajuste que será muito mais custoso e mais doloroso para todos nós. Obrigada. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Obrigada. Passo a palavra ao Dr. Marcos Lisboa. O SR. MARCOS LISBOA - Vamos lá. Acho que, às vezes, há uma polarização grande e as palavras servem mais para esconder o debate verdadeiro do que para iluminar o debate verdadeiro. Acho que usa-se o termo gasto social, estado de bem-estar como se isso estivesse em discussão. Não acho que é isso o que está em discussão. Acho que há um certo consenso na sociedade brasileira de saúde universal, de educação universal e de políticas sociais focalizadas nos 40% mais pobres. Mas, sob o nome "gasto social", se escondem vários benefícios para o andar de cima, e eu acho que isso tem que ser discutido. |
| R | O que mais cresceu nos últimos anos - e eu acho que os próximos números da Fazenda talvez mostrem isso - não foram gastos sociais, foram subsídios e benefícios para grupos selecionados. Então, vamos separar um pouco a discussão, porque fica uma discussão: você é contra o social, o avanço social? Você é liberal, neoliberal? E vem o jargão de plantão, que é um jargão que quer esconder a discussão cuidadosa: vamos dar um passo para trás? Qual é a proposta que faço aqui para vocês? Primeiro vou falar sobre essa questão, depois eu volto aos pontos levantados. Primeiro, acho que, se ficar na polarização, o debate não anda. Não é isso que vai ajudar. É fazer primeiro uma revisão. O Brasil expandiu enormemente suas políticas públicas nos últimos anos, enormemente. Vamos fazer uma avaliação de desempenho? O que funciona? O que não funciona? Eu não chamaria de auditoria, eu chamaria de avaliação de desempenho. Primeiro, a política funciona? Ela é eficaz? Ela tem o impacto esperado ou não? Segundo, a quem ela beneficia? Vamos deixar isso transparente. E a sociedade pode discutir: "Olha, de tudo o que se expandiu nos últimos anos, vamos preservar essas; essa aqui talvez não; essa aqui não funciona, vamos reformular". Primeiro ponto: acho que a gente não tem muita noção do que funciona e do que não funciona na nossa política pública. Nós não temos o hábito de avaliar as nossas políticas públicas com cuidado. Então, é preciso uma discussão mais cuidadosa sobre isso. Segundo ponto: nós temos um problema com gasto público. Essa proliferação de políticas, de reajustes, um certo descontrole e, infelizmente, o enfraquecimento das instituições que controlavam fizeram com que o gasto crescesse muito acima do PIB nos últimos anos. E o problema não é o nível da dívida. O problema aqui no Brasil não é a dívida, se ela está alta ou baixa, se o déficit está alto ou baixo. O déficit está alto, mas não é esse o principal problema. O principal problema é que a despesa cresce acima da receita e a dívida não para de aumentar. Ela está em -180 agora. Como ela vai estar daqui a dois anos? Acima de 85%? Essa trajetória da dívida pública não é sustentável. O problema não é discutir o gasto, cortar gasto. O problema é interromper a trajetória de crescimento do gasto, é ele crescer mais devagar para a dívida não sair de controle, porque isso coloca em risco a solvência das contas públicas. Daqui a alguns anos poderemos estar nesta Casa discutindo não o colapso dos governos estaduais, mas do Governo Federal. E não adianta transferir o problema para o Governo Federal. Essa conta será paga por todos nós, essa conta é nossa. O problema é o crescimento do gasto. Eu entendo as preocupações, entendo as ponderações, entendo os receios, mas o gasto com folha de pagamento no Rio de Janeiro cresceu quase 9% acima da inflação nos últimos seis anos. Com 9% acima da inflação, não há conta pública que dê jeito. E não adianta aumentar a carga tributária para isso. Temos que melhorar a eficiência do sistema tributário? Claro! Temos a questão de progressividade? Claro! Fico feliz que esse tema venha à baila. Há 12 anos tentamos fazer passar uma legislação para corrigir algumas dessas distorções. Infelizmente, não houve apoio nem de um lado nem de outro. Lá atrás, em 2004, tentamos corrigir algumas dessas distorções, mas não avançou. Esse é o debate que precisa ser enfrentado. O problema real é este: o crescimento da dívida, como interrompê-lo, e não há aumento de carga que dê conta de uma despesa crescendo nesse ritmo. Por fim, juros simples. Confesso, Senadora - primeiro, obrigado pelas palavras gentis -, que não esperava que voltássemos discutir isso. Juros simples não fazem o menor sentido. Juros simples são um calote. Uma parte da dívida não paga juros, é isso o que significa. O oportunismo tem gravidade. Eu entendo a situação dos Estados. Eu entendo que precisa haver um enfrentamento aqui. Por que deu tanto retrocesso? Por que alguns Estados andaram tanto para trás? O que houve com os órgãos de controle? O que não funcionou? Por que não deu certo? Acho que são perguntas legítimas para entender qual foi o descaminho que a gente tomou há uns seis ou sete anos que tirou do trilho, para que não aconteça de novo. Eu entendo a situação da Amagis, mas as medidas oportunistas estão ampliando o problema. Na hora em que se consente que os depósitos judiciais entre partes privadas sejam utilizados para financiar governos estaduais, você amplia o problema, apenas adia mais um ano tratar o problema, e não resolve o problema. (Soa a campainha.) O SR. MARCOS LISBOA - Na hora em que você usa juros simples, você está adiando mais uma vez e está transformando, levando o problema para o Governo Federal, para todos nós, não enfrenta a origem do problema, que é o crescimento do gasto. O problema vai continuar se ampliando, agora com o Governo Federal ainda mais fragilizado. |
| R | Pior do que isso, se essa regra vale para dívida estadual, por que ela não vale para dívida federal, que foi feita para financiá-la? Por que o governo estadual paga juros simples e a dívida federal paga juros acumulados, como quase o mundo inteiro faz? Mas dívida federal que paga juros acumulados é a dívida que financia os fundos de previdência, os depósitos das famílias, a poupança da sociedade. Todos recebem juros acumulados. Todo mundo que tem um fundo de previdência recebe juros cumulativos, todo mundo recebe, juros compostos. Todo mundo que tem um fundo de previdência, tem aplicação, caderneta de poupança recebe. Por isso, o Governo Federal também paga juros compostos, o mundo faz assim. Por que para os Estados vai ser diferente? Olhem a gravidade da solução oportunista! Agora, de novo, a minha preocupação é até anterior. Como é que soluções como essas podem ser até testadas, pensadas? Como é que as instituições, que garantem a solidez das contas, que garantem as boas regras, as boas práticas, o controle das contas públicas, a responsabilidade com o cidadão de hoje e das novas gerações...? O que vai acontecer nos próximos anos? Como as instituições se fragilizaram tanto? Como reconstruir um caminho que permita reconquistar aquilo que o Brasil, de novo, não quero atualização nem de um lado e nem do outro, que vários governos, das mais diversas matizes, construíram ao longo de 18 anos, um País que pareceria caminhar, finalmente, enfrentar a política social? Um debate que foi duro inclusive no começo do governo Lula é se deveria ter política social focalizada ou não. Felizmente venceu que deveria ter política social focalizada, e muitos foram contra. O País avançou na agenda de crédito, no fortalecimento das instituições; é um País que parecia ter achado uma rota de crescimento com justiça social. Agora, o que assistimos é ao retrocesso, à perda dessa conquista, perda da conquista na economia, perda na conquista na justiça social. Obrigado. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Obrigada, professor. Passo a palavra ao Professor Pedro Linhares. O SR. PEDRO LINHARES ROSSI - Obrigado. Queria agradecer novamente à Senadora Gleisi, agradecer a todos os presentes e dizer que achei o debate muito profícuo. Eu só queria colocar três questões, três pontos, três reações, na verdade. Primeiramente, de forma cordial, reagir um pouco ao que estava implícito em vários discursos, que é uma certa visão moral da questão fiscal, que se materializou na fala do Senador Dalirio, que temos que fazer um sacrifício. Eu discordo um pouco dessa visão. Eu tenho uma visão um pouco diferente sobre a questão fiscal. Acho que é da natureza do sistema capitalista o endividamento público, é o instrumento de financiamento dos Estados, assim como os impostos. Aliás, o dinheiro que está na nossa carteira é uma forma de dívida pública. Eu não coaduno com a visão de que as finanças públicas são como a economia da dona de casa por uma diferença muito simples: a dona de casa, quando gasta, o dinheiro não volta para ela de nenhuma forma. É muito diferente no Estado, que emite a sua moeda e que gasta. A política fiscal eu considero ser um instrumento muito importante de política econômica para sustentar emprego e renda. Isso é uma coisa que está fora de pauta. Não se fala mais nisso no Brasil. Acredito que não há possibilidade de ajuste fiscal sem crescimento, e não inverto essa relação. Não acho que o ajuste fiscal vá gerar crescimento. Não vejo nenhuma mediação possível entre essa relação, a não ser a mediação hipotética de que as expectativas vão gerar aumento de investimento, expectativas racionais. Não vejo isso. Vejo o gasto público como uma receita do setor privado na renda das famílias. Quando o setor público contrai a renda e todos os outros setores estão contraindo renda, eu tenho crise, eu aprofundo crise. Então, a contração fiscal, o ajuste de que estamos falando, sacrifícios, são contracionistas. Se estamos dispostos a pagar sacrifícios, no fundo, vamos ter mais anos de recessão; no fundo, é isso que estamos falando. O empresário não vai investir porque o Governo fez ajuste fiscal. O empresário vai investir porque ele está olhando, está vendo renda, está vendo lucro à frente, são as expectativas dele. No fundo, ele olha, vê demanda e diz: "Vou produzir, vou investir". Ele não está olhando para o governo, se ele fez ou não ajuste fiscal. |
| R | Então, discordo profundamente dessa análise da austeridade como uma solução para nossos problemas, o que não implica, de nenhuma maneira, irresponsabilidade ou sair dos problemas reais que são, no fundo, uma questão de longo prazo, que é a sustentabilidade da dívida. É um problema de longo prazo, não é um problema de curto prazo. E eu estou antecipando para vocês que, sem crescimento, não tem sustentabilidade da dívida. E com ajuste permanente não tem crescimento. Essa é a lógica que eu uso. O segundo ponto: eu queria reagir à pergunta que eu mesmo coloquei e que a secretária Ana Carla respondeu de uma forma muito coerente. No fundo, para compatibilizar expansão dos direitos sociais e responsabilidade fiscal, precisa subir a carga tributária. Essa é a resposta da Ana Carla. E já antecipando a resposta da resposta, o povo brasileiro não está disposto a isso. Logo, vamos cortar despesas; logo, conservamos a situação que a gente vive hoje, que é uma situação de enorme desigualdade social. É uma solução conservadora, a meu juízo. Evidentemente, cada um tem o seu juízo. E nós discutimos aqui, eu coloquei isso em discussão, o André colocou e outros, que há espaço para melhoria na qualidade da tributação. É bom lembrar a todos que, entre 2003 e 2006, nós não tínhamos problema fiscal... (Soa a campainha.) O SR. PEDRO LINHARES ROSSI - ...e o gasto crescia. A arrecadação cresceu 4,8% sem aumento de impostos. Entre 2007 e 2010, cresceu 3,6%. Cresceu menos, mas cresceu. Ou seja, o que a gente está vendo hoje é uma recessão enorme, que está abrindo espaço para uma reforma estrutural que, a meu ver, é despropositada. Eu acho que tem espaço para a gente fazer uma reforma tributária progressiva e para financiar, sim, os direitos sociais que a gente tanto quer. O terceiro ponto é só uma reação também cordial ao emprego do termo ideologia, que foi empregado aqui. Nada contra o termo ideologia, que carrega um conteúdo filosófico enorme. O André, que é filósofo, pode discutir esse tema. Eu não quero discutir isso aqui. Eu só estou reagindo ao uso do termo de forma pejorativa, como se a opinião discordante fosse técnica e opinião do outro fosse ideológica. E aqui eu recorro a um tema chato, que é a questão da metodologia da ciência econômica. De uma forma óbvia, os senhores já devem ter percebido, a economia não é uma ciência exata, o que permite opiniões diferentes, debates, discordância. No fundo, as opiniões dos economistas carregam, sim, pressupostos que são inerentes a uma determinada formação teórica. A formação teórica convencional, eu digo a formação teórica neoclássica, tem na sua origem a defesa do egoísmo como virtude social, tem na sua origem o pressuposto de que a desigualdade é uma virtude, ou seja, não é uma virtude, é um incentivo para a economia. E a economia é regida por leis naturais. O ativismo estatal perturba o bom funcionamento da economia. Esses são pressupostos. Eu parto de pressupostos diferentes. Veja que esses pressupostos também têm juízo de valor, também têm ideologia. Eu não estou dizendo que está certo ou que está errado. Eu só estou dizendo que há diferentes pressupostos, diferentes ferramentas ao olhar a economia. Eu olho para a economia como um sistema, digamos, a economia capitalista como uma economia inerentemente instável. O livre funcionamento do mercado, se não bem regulado, leva à desigualdade social, a crises recorrentes. (Soa a campainha.) O SR. PEDRO LINHARES ROSSI - E eu enxergo o papel do Estado de uma maneira fundamental, inclusive da política fiscal. Daí a importância deste nosso debate aqui. O Estado tem esse papel importante na política fiscal e na mediação dos conflitos da sociedade e das classes sociais. São opiniões que são diferentes. Eu parto de pressupostos diferentes. Muito obrigado. A SRª PRESIDENTE (Gleisi Hoffmann. Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Agradeço, professor. Eu queria agradecer muito a participação do nosso Secretário-Executivo do Ministério da Fazenda, Dyogo Henrique de Oliveira; da Secretária de Estado da Fazenda de Goiás, a Ana Clara; do nosso economista, Prof. Marcos Lisboa; também do André Horta, que é Coordenador do Conselho Nacional de Política Fazendária; do Prof. Pedro Linhares Rossi, professor da Unicamp; de todos os Senadores e Senadoras que estiveram aqui presentes e de quem nos acompanhou pela TV Senado. Nós tivemos aqui alguns comentários. Queria agradecer o Ewerton Ferreira Guimarães, que é do meu Estado, do Paraná, que sempre contribui aqui e mandou um abraço a todos. Tenho um comentário, Senador Dalírio, da Anna Flávia Baranski, de Santa Catarina. Ela quer que zere a dívida de Santa Catarina, viu? "Pelo amor de Deus!", diz ela. "O povo já está se endividando pra comer! E Santa Catarina já pagou e mais do que pagou a dívida!" Olha, ela apoia o STF. |
| R | E também o Marshall Rego diz que a crise financeira dos Estados brasileiros é uma realidade que deve ser vista partindo do princípio de que os mais carentes tenham prioridade. Muito obrigada a todos! Mais uma vez, obrigada pela paciência de todos! Também quero parabenizá-los pelo nível e pela qualidade das exposições e dos debates que nós tivemos. Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada a presente reunião. (Iniciada às 10 horas e 33 minutos, a reunião é encerrada às 14 horas e 21 minutos.) |
