Notas Taquigráficas
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| R | O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Declaro aberta a 58ª Reunião, Extraordinária, da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura. A audiência pública será realizada, nos termos do Requerimento nº 12, de 2016, desta Comissão, de autoria da Senadora Regina Sousa, para debater o tema: "A criação do Plano Nacional de Ação da política para a população em situação de rua." Esta audiência pública será realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. Por isso, as pessoas que tenham interesse em participar com comentários ou perguntas poderão fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania, link www.senado.leg.br/ecidadania, ou pelo Alô Senado, através do número 0800-612211. Nossos convidados estão chegando, os painelistas e aqueles que vão acompanhar do plenário. Quem vai presidir esta reunião, como é de praxe na Comissão de Direitos Humanos, é a autora do requerimento, Senadora Regina Sousa. Farei uma saudação de abertura, Senadora Regina, se V. Exª permitir, mas quero convidá-la já para sentar-se ao meu lado. Em seguida, vou passar a Presidência a V. Exª, porque acho que, de fato, esta audiência pública é de suma importância para todo o nosso povo, para toda a nossa gente, no caso, principalmente para aqueles que mais necessitam, que é a população em situação de rua. Então, para situar todos aqueles que vão assistir à nossa audiência pública, seja pela TV Senado ou pelo sistema de comunicação da Casa, vou fazer aqui uma pequena apresentação desta iniciativa da nossa querida Senadora Regina Sousa. |
| R | Senhoras e senhores, estamos aqui, por iniciativa da Senadora Regina Sousa, para, mais uma vez, esta Comissão de Direitos Humanos debater situações graves no contexto em que vive o nosso País. Nesse caso, é sobre a população de rua e as soluções cabíveis a tão grave problema social. É nosso dever, em verdade, entabular o debate sobre a criação do Plano Nacional de Ação da política especialmente voltada para a população em situação de rua. Aludimos, de caso pensado, à dita população de rua - aqui o termo usado é "dita", entre aspas -, porque, na realidade, os grandes números, as frias estatísticas, as análises macroestruturais pasteurizadas em nossa sociedade tendem a privar de rosto quem tem rosto e de voz quem merece ter voz. Eis por que a expressão consagrada: "população de rua" abarca, na frieza do mármore e na indiferença das marquises, um sem-número de crianças, de mulheres e de homens de todas as idades e graus de instrução de todos os rincões do nosso País. A expressão "população de rua" quer alcançar toda uma miríade de indivíduos em sofrimento, muitos deles portadores de doenças mentais, perdidos em suas aporias, aprisionados pelos vícios ou acossados pela violência e pela barbárie de toda sorte que imperam em nossos dias. Esses seres humanos tão maltratados, esses emudecidos, anônimos integrantes da classe baixa na pirâmide social brasileira, esses marginalizados e perseguidos são os que catam latas e lixo para sua mera subsistência, desprovidos de sonhos. São os que não contam com o abrigo seguro de um lar nos dias de chuva ou de frio. São os que, em meio à indiferença de tantos, encontram o afago, o carinho e o afeto de pequenos cães que muitos chamam de vira-lata, sempre ao lado da carroça. São os que, em suma, experimentam situação de gigantesca insegurança econômica. É para esse brasileiro sofrido, senhoras e senhores, que a nobre Senadora Regina Sousa levantou a sua voz e eu fiz questão de estar aqui na abertura. É para esses brasileiros que nós queremos voltar nosso pensamento não só no dia de hoje, mas de forma permanente. É a essa mulher e a esse homem amargurados no vertiginoso ritmo da cidade mutante que tensionamos acolher. Sim, queremos acolher, por meio de políticas públicas capazes de virtualmente zerar o número de indivíduos em situação de rua assim: a partir das melhores ideias de gestões aplicáveis a este preocupante quadro social que pode, sim, ser mudado. O que buscamos todos nós, liderados aqui pela Senadora Regina Sousa, em suma, é inviabilizar o espanto do poeta Manuel Bandeira, que fez jorrar de sua pena tão sensível a amarga poesia "O Bicho", em 1947, por certo, a partir de uma cena urbana que infelizmente se tornou excessivamente familiar para todos nós. |
| R | Diz o poeta na sua poesia "O Bicho": O Bicho Vi ontem um bicho Na imundície do pátio Catando comida entre os detritos. Quando achava alguma coisa, Não examinava nem cheirava: Engolia com voracidade. O bicho não era um cão, Não era um gato, Não era um rato. O bicho, meu Deus, era um homem. Essa é a poesia do Manuel Bandeira. Peço uma salva de palmas para essa poesia. (Palmas.) O bicho, meu Deus, não era um rato, não era nada; era um homem. Há um pensamento conservador na sociedade que ganha terreno, espaço no Brasil do presente e que tende a atribuir à penúria dos estratos sociais mais simples a sua própria incapacidade de prosperar, de vencer e de mudar. A despeito do que possa haver de razoável no argumento de todos e de cada um, preferimos acreditar que, privados de condição e de possibilidades assemelhadas, as mulheres e os homens não têm como se firmar em um ambiente social competitivo, eis por que, por detrás de cada aparente derrocada individual que as ruas nos apresentam, é imperioso ter em mente que a grande derrotada pela pobreza extrema de alguns não são só eles. É, sim, a própria sociedade civil como um todo. É esse estado de coisas que desejamos mudar. Que Deus ajude a todos! A partir deste momento eu queria, de imediato, convidar a Senadora Regina Sousa para assumir a presidência e já formatar a Mesa. Eu ficarei, dentro do possível, aqui no plenário para acompanhar o debate. Uma salva de palmas à autora do requerimento, que me deu a oportunidade de fazer a abertura. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Bom dia a todas e a todos. Cumprimento o Senador Paulo Paim e agradeço pela abertura bonita, poética, como ele sempre faz, apesar de o assunto não ser bonito. Mas ele o aborda de uma forma muito bonita. Queria registrar a presença da minha querida Vereadora de Teresina, Cida Santiago, também uma militante desta causa lá em Teresina. Bem-vinda, Cida! (Palmas.) |
| R | Quero agradecer a presença dos movimentos, das pessoas que militam, dos voluntários. Convidamos muita gente porque é um assunto... Quando eu decidi me dedicar a este assunto este ano... Cada ano eu escolho algum assunto que eu chamo de tema da população invisível. Ano passado eu foquei muito a questão da mulher, seus problemas. E a gente continuou vivendo todos os problemas. O estupro é o assunto do momento, agora com a nova modalidade: o estupro coletivo. E este ano eu disse que ia focar na população de rua, porque é uma população invisível, talvez a mais invisível de todas, que só é enxergada na hora de exterminá-la, quando passam para metralhá-la, principalmente nos grandes centros. E a gente vê que são pessoas, homens e mulheres, de todas as idades, de todas as cores, de todas as origens e que demandam políticas públicas. A gente percebe pelo que existe, pelo pouco que já se tem, que já avançou, apesar do decreto que estabelece a política nacional, que ainda é muito assistencial o voluntariado, quem está fazendo esse trabalho, quem está enxergando essas pessoas. Então, a gente precisa avançar para que isso seja da conta do Estado, porque o Estado tem responsabilidade sobre essas pessoas, como têm também todos os cidadãos. É preciso apresentar saídas. As pessoas não estão na rua porque querem. Pode até haver alguém que está na rua porque quer. Mas esse alguém que está na rua porque quer também tem direito às políticas públicas de Estado. Então, é nesse sentido que a gente está fazendo esta audiência, para dar esse pontapé, ver o que a gente já tem e em quê a gente pode avançar. E para fazer propostas, como Senadora, com os outros companheiros Senadores que também são militantes da causa. A Comissão de Direitos Humanos é este espaço acolhedor, o espaço que acolhe quem sofre. Quem está sentindo alguma dor vem para a Comissão de Direitos Humanos. (Palmas.) Por isso eu me identifiquei tanto, por isso eu escolhi vir a esta Comissão na hora da escolha das Comissões, porque é aqui o acolhimento. Todo mundo que está sentindo alguma dor vem para cá. Felizmente as portas estão sempre abertas... O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Permita-me, Senadora. Permita-me dizer uma frase. Eu não queria falar disso, mas vou dizer só uma frase. Por isto muitos atacam V. Exª e também a mim: porque nós dois estamos permanentemente aqui. Fui solidário a V. Exª e vou ser sempre. Podem continuar me atacando, mas eu serei sempre solidário a V. Exª e a esse público que aqui a senhora lidera com muita competência. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Eu sei com quem eu posso contar. A gente tem que enfrentar os temas mais difíceis. É muito fácil abordar temas fáceis, que abrem portas. A gente tem que abordar temas para os quais as portas estão fechadas. Se as portas já estão abertas, não precisam mais de ajuda. Agora, temos de ajudar a abrir as portas que estão fechadas. Então, a gente precisa ver as causas. Nesse meio da população de rua há um grupo chamado Andarilho, Caminheiro. Tem um monte de gente nas estradas. Um dia desses passou uma reportagem sobre isso e eu fiquei impressionada com a característica dessas pessoas: gente formada, havia jornalista, diziam a razão de estarem nessa vida. Parece-me que ninguém os vê. Passa carro, todo mundo passa por eles, e ninguém os vê. Por isso eu os chamo de população invisível. |
| R | Por isso eu os chamo de população invisível. Quero começar, porque nós temos muitos convidados. Sabemos que é uma característica, principalmente dos grandes centros, no meio deles também, haver pessoas desaparecidas. Às vezes, desaparecem em um Estado e estão morando na rua em outro. Quer dizer, somem. Então, têm que se juntar esses grupos para poder fazer a identidade. No meu Piauí, na minha Teresina, na minha capital, a Cida estava me dizendo que há mil pessoas identificadas. São Paulo é uma imensidão. Os grandes centros, cada dia, têm mais pessoas morando na rua. Quero começar esta audiência chamando o primeiro grupo à mesa. São pessoas que convivem, pessoas que trabalham, pessoas que acolhem, que lutam por essa população. Padre João Paulo Carvalho e Silva, Coordenador da Pastoral do Povo de Rua da Arquidiocese de Teresina. (Palmas.) Bem-vindo, Padre! É uma das pessoas que me inspirou também a propor esta audiência. Fique aqui, Padre João Paulo. Alderon da Costa já está aqui já? É o Ouvidor da Defensoria Pública do Estado de São Paulo. (Palmas.) José Ivan Mayer de Aquino, da Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida, do Ministério dos Esportes. (Palmas.) Olávio Dotto, assessor das Pastorais Sociais da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. (Palmas.) Carlos Ricardo, Coordenador-Geral dos Direitos da População em Situação de Rua da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. (Palmas.) Anderson Lopes Miranda, Coordenador do Movimento Nacional da População em Situação de Rua do Estado de São Paulo. (Palmas.) Acho que quem já assistiu - alguns podem até já ter participado - sabe que tem direto a fala por 15 minutos iniciais. Se precisarem utilizar o data show, podem fazê-lo. Vamos ter outras mesas. Vamos aproveitar, porque convidamos mais pessoas para ouvir. Se houver tempo, também abrimos às pessoas que vieram para assistir. É nosso hábito. Parece que hoje está mais calmo. A que horas começará a Comissão do Impeachment? Aí começa a confusão. Acho que é só à tarde hoje. O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - É muito bom ter uma iniciativa como a sua, porque o País não pode parar: impeachment, não; impeachment, sim. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Claro, claro. Por isso a gente está fazendo... O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - O povo está aqui. O País continua. Parabéns, mais uma vez, a V. Exª. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Nós ocupamos os espaços, inclusive, fazendo movimentação pela democracia. Criamos um movimento aqui. Enquanto estava rolando lá, estávamos fazendo os nossos aqui. Como falaram aqui da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, estou até curiosa. A gente nem sabe onde é que estão funcionando mesmo os direitos humanos neste Estado, neste País depois desse golpe que aconteceu com a Presidenta Dilma. Primeiro, o desmantelo. Quer dizer, a gente dá um passo à frente, depois, vêm os passos atrás, porque a gente tinha uma Secretaria, um Ministério que cuidava dos direitos humanos, então todas as populações, todos os segmentos se viam naquele Ministério. Agora ele foi desfeito, ele foi desmantelado, e há uns pedaços que a gente ainda não identificou onde estão. Sei que há coisas no Ministério da Justiça, criaram agora a Secretaria Especial da Mulher, parece que vai ser ligada à Presidência da República. |
| R | Então, é mais um desafio, um enfrentamento que a gente tem, porque, neste momento de instabilidade política, de interinidade de um Presidente, ele acabou desmantelando o Estado como um todo, e a gente está sem se identificar nesse Estado. É mais um desafio que se coloca para a gente. O SR. CARLOS ALBERTO RICARDO JUNIOR (Fora do microfone.) - Senadora, a gente está, por enquanto, no Ministério da Justiça. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Ministério da Justiça, que não é bem o lugar apropriado, principalmente porque lá se colocou um Ministro que está mais para xerife do que para direitos humanos. Mas a gente vai lutar; luta é a cara da gente. Então, vamos lá. O Padre João Paulo que falar primeiro? Foi o primeiro que eu chamei. Padre João Paulo, por 15 minutos. Temos um reloginho ali, se a pessoa quiser seguir. O SR. JOÃO PAULO CARVALHO E SILVA - Exmo Senador Paulo, Senadora Regina Sousa, demais pessoas aqui presentes, bom dia. É com satisfação que eu estou aqui para falar a vocês e a todos os que nos assistem pela TV Senado sobre o nosso trabalho com as pessoas em situação de rua na capital do Estado do Piauí, que é Teresina. Nosso trabalho com os moradores de rua da capital Teresina surgiu da sensibilização com o sofrimento de pessoas que, por problemas vários, como não terem teto para morar, terem sido despojados de suas casas, de aluguel, terem perdido suas famílias, terem perdido seus empregos, por problemas mentais e psicológicos, sobretudo por conta da dependência química e sem nenhuma perspectiva de vida, chegaram ao ápice de sua descrença em relação a si próprio, à sociedade, ao mundo, fazendo das ruas, praças e grandes centros não somente sua moradia, mas o refúgio da realidade que os aprisiona. Desse modo, sem teto, sem alimentação digna, sem higiene pessoal adequada, sem os cuidados com a saúde, sem segurança, ou seja, sem acesso aos direitos básicos de sobrevivência, recai sobre si um estado de vulnerabilidade social seriíssimo, que os expõe, de igual modo, a riscos sociais gravíssimos, como violência, crimes, exploração sexual e contágio com doenças de toda sorte, como a aids. Pensando numa forma de atenuar as dificuldades por eles enfrentadas, pensou-se numa maneira de garantir o mínimo, com arrecadações de doações, como alimentos e roupas, distribuídos nas próprias ruas e praças. Aliada à atenção, escuta e palavra de estímulo de muitos voluntários, o pouco se transformava em muito. Desde o início - a Pastoral do Povo de Rua teve o primeiro encontro, o trabalho e distribuição de alimento nas ruas no dia 24 setembro de 2011, na cidade de Teresina -, até os dias atuais, esse trabalho vem crescendo, e muitas graças sendo alcançadas. |
| R | Hoje, fazemos um trabalho de abordagem aos moradores de rua por nossos orientadores sociais, que, em sua maioria, são ex-dependentes químicos recuperados, em que identificamos o morador, reconhecemos sua história de vida, os fatos que o levam a morar na rua, averiguamos sua situação civil, questionamos sobre o desejo de sair das ruas e lançamos o convite para aceitar nossa ajuda. Para essa ajuda, temos uma casa de passagem, casa cedida pela Arquidiocese de Teresina, Piauí, na qual realizamos a acolhida do morador de rua, oferecemos refeição, higiene pessoal, troca de roupas e calçados, medicamentos, comida e dormida. Ressaltamos que a casa acolhe somente pessoas do sexo masculino maiores de 18 anos. Proporcionamos a retirada de seus documentos para a regularização de sua situação civil. Propiciamos a realização de exames fundamentais de saúde, como aids, sífilis, hepatite, tuberculose, etc. Contactamos comunidades terapêuticas com disponibilidade de vagas, realizamos o encaminhamento para o tratamento de dependência química, ou, quando não são dependentes químicos, contactamos suas famílias para providenciarmos seu retorno a elas, enviamos para seus Estados de origem, sua cidade de origem, e os ajudamos a encontrar emprego quando são da capital. Oferecemos também orientação espiritual, psicológica e, em breve, viabilizaremos cursos técnicos e profissionalizantes, em parceria com os órgãos competentes. Além disso, estamos providenciando uma nova casa de acolhimento, também masculina, em que serão acolhidos os moradores de rua recém recuperados que saíram das comunidades terapêuticas e não têm para onde ir, onde morar. Nessa casa, será dada continuidade ao atendimento de reinserção social, como busca por emprego, aquisição de moradia digna, através também daquele programa de casa para todos do Governo Federal, Minha Casa, Minha Vida, e restabelecimento de vínculos familiares. Foi-nos cedida ainda uma chácara, de área bem ampla, toda equipada, próxima da capital, que será utilizada em expansão futura de nossos trabalhos, tudo isso graças à colaboração, ao apoio e à parceria espontânea de muitas pessoas, instituições públicas e privadas, empresariais, assim como também religiosas. Contamos com a colaboração de voluntários, diretos e indiretos, que vão desde pessoas simples, sem nenhum grau de instrução, mas de bom coração, a ex-dependentes químicos, estudantes de serviço social, pedagogos, advogados, contadores, empresários, vereadores, como a Vereadora Cida, que é nossa parceira, grupos de evangelização e de ação social, com o apoio da Arquidiocese de Teresina e também da Casa Santo André, que está aqui representada, e faz um belíssimo trabalho aqui em Brasília há mais de dez anos. |
| R | Contamos também com parceria de órgãos de assistência social local, como o Centro POP, especializado na população de rua, vinculado à SEMTCAS da Prefeitura de Teresina. Também temos parceria com o CENDrogas (Coordenadoria de Enfrentamento às Drogas do Estado do Piauí), com as unidades de saúde, para coleta e realização de exames e desintoxicação, bem como somos parceiros das comunidades terapêuticas diversas que existem lá em nossa cidade, tanto católicas como evangélicas. Contamos também com apoio do Núcleo de Direitos Humanos da Defensoria Pública, principalmente para conseguir a documentação desses irmãos de rua, e também um grande apoio e colaboração da Capela do Hospital Getúlio Vargas. Atualmente estou responsável por essa capela. Já conseguimos retirar das ruas cerca de 200 pessoas em 12 meses. Conseguimos retirar seus documentos, dar-lhes comida e roupa digna, prestar-lhes as orientações necessárias, encaminhá-las para unidade de tratamento e ajudá-las no restabelecimento de vínculos com seus familiares e em sua reinserção social, como falado ainda há pouco. Além disso, oferecemos refeições, almoço e janta, aos irmãos que ainda moram na rua, que ainda estão na rua e nos procuram, principalmente nos finais de semana, quando o restaurante popular não está aberto. Durante a semana, eles recebem 50 senhas para se alimentarem nesse restaurante popular da Prefeitura, que, no final de semana, não funciona, e eles procuram a nossa casa da Pastoral de Rua. Sabemos que nem todos conseguem se recuperar em uma única tentativa. O trabalho nesse campo é árduo e contínuo. O pouco que fazemos, os poucos que conseguimos ajudar e recuperar é muito distante dos resultados positivos que gostaríamos de obter, contudo, para que possamos fazer cada vez mais por eles, encontram-se em andamento muitas providências, como a organização estrutural e documental necessárias para a firmação de convênios com os órgãos da Administração Federal, estadual e municipal. Não há o que pague a satisfação de ver um homem de bem sair da condição extrema de vulnerabilidade social, retornar ao seio familiar e voltar a trabalhar e recuperar sua dignidade humana. Esse trabalho é árduo, mas é gratificante e deve continuar, mesmo porque este é o ano em que a Igreja Católica foi convidada pelo nosso Papa Francisco a praticarmos obra de misericórdia, dar pão a quem tem fome, água a quem tem sede, vestir quem não roupa, acolher os desabrigados, visitar os doentes e os presos. |
| R | Que Deus abençoe a todos nas decisões que vocês, aqui no Senado, irão tomar após esta audiência pública a favor de nossos irmãos e irmãs que moram nas ruas. E agora eu queria só mais um minutinho para apresentar um vídeo que foi exibido lá em Teresina, nos meios de comunicação social, sobre a Pastoral de Rua. (Procede-se à exibição de vídeo.) (Palmas.) |
| R | A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Padre João Paulo, quer dizer alguma coisa para concluir? O SR. JOÃO PAULO CARVALHO E SILVA - Nós temos uma conta bancária, quem quiser colaborar, vai ser exposta aí. Nós não temos apoio financeiro de nenhum órgão do Poder Público. Quem puder ajudar nesse trabalho, nós agradecemos muito, porque os irmãos de rua estão muito desprezados, rejeitados pela sociedade. Por isso, ajudando nessa conta, nesse trabalho da Pastoral de Rua, você estará atendendo também o apelo de Jesus que diz: "O que fazeis a um desses pequeninos é a mim que fazeis." A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Obrigada, Padre João Paulo. Espero que tenha muitos colaboradores, porque o Brasil inteiro vai ver, está vendo, e depois será repetido. O bom dessas audiências é que elas são repetidas. Queria avisar, como ainda está chegando gente, que o Plenário 6 está disponível para vocês assistirem lá, quem não quiser ficar em pé - está chegando mais gente -, para que não fiquem parados aqui na entrada. Ronald, tome conta, por favor. O Plenário 6 está disponível. O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Acho que já está liberado. Presidenta, permita-me. Eu tenho que atender outro grupo, sobre outro tema, relacionado ao mundo do trabalho, envolvendo os trabalhadores do campo e da cidade, aposentados e discriminados. Eu vou atendê-los, depois eu volto para acompanhar o debate. Sua assessoria me deu um presente. Disseram: "Você não sabe, Senador, mas um dos eixos desse debate será o seu projeto que trata exatamente da população de rua." Então, muito obrigado. Foi o melhor presente que recebi esta semana saber que esse projeto vocês vão debater. Queira Deus se torne realidade. Retiro-me, depois volto aqui. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Está bem, Senador. Obrigada. Vamos ao segundo orador, Alderon Costa, Ouvidor da Defensora Pública do Estado de São Paulo. O SR. ALDERON COSTA - Bom dia a todos e a todas. Queria cumprimentar a Mesa na pessoa da Senadora Regina Sousa e dizer para a Senadora e para o Senador Paim da importância desta audiência pública. |
| R | A população de rua vem sofrendo muito e esse espaço aqui no Senado é simbólico. Para chegar até aqui, são mais de 30 anos que nós, vários companheiros, Anderson e outros colegas do Movimento Nacional, temos feito esse trajeto. Iniciou-se lá nas Câmaras de Vereadores, fazendo as leis municipais. Estamos numa luta para que também o Estado... É importante a senhora saber que o Estado, hoje, não tem assumido a política da população de rua. Se alguém souber de algum Estado que tenha assumido, eu peço que compartilhe isso conosco, porque nós não sabemos. Nenhum Estado... O Estado de São Paulo não investe em nenhuma política pública para a população de rua. É importante deixar registrado esse detalhe. Desde o Governo Dilma e o Governo Lula, nós temos avançado com a Política Nacional. A Política Nacional surge de um trabalho de base. Não foram os políticos nem os especialistas que fizeram a Política Nacional, foi a população em situação de rua, os trabalhadores sociais que estão ali, juntos, na rua, debaixo do viaduto, nas casas de acolhida. A Política Nacional é uma referência muito importante. Quero até destacar que aqui, no projeto, basicamente, há todo o trabalho feito pelos movimentos sociais, pelos moradores de rua, pelas organizações. Então, acho que o debate vai se dar quanto a detalhes, eu acredito muito nisso, e acho que vamos poder sair daqui com um avanço muito grande. Antes de entrar nos eslaides, eu queria dizer mais uma coisa: não basta lei, não basta lei. Se fosse por lei, São Paulo não teria morador de rua. Nós temos já portarias, temos uma lei municipal, mas isso não muda a realidade. O que vai mudar essa realidade é a nossa luta por uma sociedade nova, uma sociedade mais igualitária, uma sociedade diferente. Então, essa é uma luta maior, que nós não podemos perder de vista. Lógico, os companheiros que estão em situação de rua - não é, Padre? - não podem morrer de frio e, em São Paulo, há pessoas morrendo de frio. Ontem recebemos uma denúncia aqui, na 14 Bis, de que morreram 3 pessoas por conta do frio. Quem não é de São Paulo não sabe, mas eu vim com duas blusas hoje - só para vocês verem como está São Paulo - e, além do frio, há a chuva. Então, é difícil; morar na rua não é fácil. Se moram na rua, não é por opção, tenham certeza disso. E nós defendemos o direito de ficar na rua. Esse é um direito também, porque há muitos que já aprenderam a viver só na rua, aprenderam isso e não tem mais jeito. Nós temos de criar condições dignas para que morem na rua também, não só fazer projetos para que saiam. É importantíssimo isso. Eu começo ao contrário: falando do direito de ficar na rua, mas é muito importante criarmos programas que deem efetividade... E não se pode falar em programas se não falamos em moradia, se não falamos em trabalho, se não falamos em educação, se não falamos em saúde. Se não houver isso concretamente, é assistencialismo, é enganação. Eu queria só fazer esta introdução antes de apresentar alguns eslaides que preparei para sistematizar um pouco mais. Vamos ver se vai dar tempo. Passe por favor. |
| R | Esse tema está muito ligado ao trabalho que temos feito. O Movimento Nacional, há um bom tempo, há dois ou três anos, vem discutindo que a população de rua não sabe nem que tem direitos. Nós temos que começar a trabalhar isso. E nós começamos a fazer esse trabalho, que culminou num seminário que o Movimento Nacional fez com este lema: "O direito a ter direito". Vejam que absurdo! Nas Defensorias Públicas do País todo, na DPU também, a Defensoria Pública da União, e nas Defensorias Públicas dos Estados, estamos fazendo um trabalho intenso para ter uma política institucional de acesso à Justiça. E nós não queremos caridade do Poder Judiciário, nós não queremos caridade do Ministério Público, nós não queremos caridade das Defensorias Públicas. Nós queremos, sim, que eles façam o trabalho de fiscalização que eles têm de fazer, que eles façam o trabalho de defesa do direito que eles têm de fazer. Esse é um trabalho que nós, Ouvidores de 11 Estados - Ouvidores externos que são eleitos pela sociedade civil -, temos feito junto ao Conselho Nacional de Ouvidorias. Este tema é muito caro para nós: ter acesso aos direitos. Saber que eu tenho direito é o início de toda transformação. Pode passar por favor. O Padre já falou um pouco sobre essa invisibilidade. Eu trouxe estes números para mostrar para vocês do que exatamente estou falando. Estou falando de uma capital com 12 milhões de habitantes, e estamos falando mais ou menos de 20 mil pessoas morando em situação de rua, e numa crescente complexidade, porque hoje nós estamos falando não é só de um indivíduo, não é só masculino. Nós estamos falando de mulheres, estamos falando de crianças, estamos falando de famílias, famílias inteiras que estão em situação de rua. Uma das causas imediatas disso é a falta de programas de moradia. É simples, não têm dinheiro para pagar aluguel e vão morar na rua, não há outro lugar na cidade. Então, não precisamos ficar laborando muito não. Mas aí há uma coisa importante. Vocês estão vendo que, desde 2000, os números estão crescendo. Isso é para nós nos perguntarmos: o que está acontecendo? Não se está fazendo nada? Ou o que se está fazendo não está resolvendo? São essas as duas perguntas que deixo para refletirmos. Pode passar por favor. De acordo com o Censo, a idade média dos que estão em situação de rua é de 40 anos; cerca de 65% são pardos e negros e 93% sabem ler e escrever - 93% sabem ler e escrever, isso quebra um mito, não é? -; 70% são oriundos do Estado de São Paulo; 30% são moradores da própria cidade. Esses dados são de São Paulo, deixo claro. Por favor, o próximo. Aí são alguns dados: 50% das pessoas que moram em albergues declaram ter feito uso continuado de álcool, alguns, de droga, 24%, e sempre os jovens usam mais droga e os mais velhos... Salve, Marquinho! Que bom ter você aqui! O Marquinho é uma autoridade entre os meninos e meninas de rua, é um grande batalhador e, atualmente, é Conselheiro do Condep, deve tomar posse nos próximos dias. Então, são números importantes que refletem a realidade das pessoas em situação de rua. Eu vou correr um pouquinho por causa do tempo. Por favor, passe. Bem, vou continuar aqui. O Padre João falou muito disto, acho que a fala dele focou muito isto: nós não estamos lidando com objetos, não estamos lidando com os galos, com a sacola, estamos lidando com seres humanos. Isso é muito importante para nós, e essa mudança - o Anderson sabe disso - transforma todo o trabalho que fazemos. Se tivermos em mente que estamos lidando com gente, vamos aprender a ouvir, vamos dar sentido àquilo que a pessoa está falando, vamos respeitar o seu processo, enfim, muda completamente o tipo de trabalho. |
| R | Essas faixas que vocês vão ver agora, essa e uma outra, surgiram em 2004, ano que, todos sabem, é um marco para a população em situação de rua, para a organização dos moradores de rua, quando se percebeu que, se os moradores de rua não se juntassem, nada iria mudar, tudo permaneceria como sempre. Em 2004 começa o Movimento Nacional da População de Rua. Por quê? Nós tivemos um massacre em São Paulo, um massacre que matou, até onde sabemos, oito pessoas e deixou mais sete feridas. Foi uma barbaridade em dois dias - a Senadora deve ter acompanhado. Estamos feridos até hoje. Se passamos na Praça da Sé, vemos os companheiros que foram assassinados a paulada. Hoje há um marco na Praça da Sé, consequência de uma luta que foi feita. O prefeito colocou um marco, um símbolo, mas isso, claro, não vai diminuir a nossa dor. A nossa dor é diminuída nesses eventos que constroem e que dão esperança para nós. Por favor, o próximo. Aí são algumas faixas que as pessoas começaram a levar para as caminhadas que fazemos. "Mais oportunidade, reconhecimento e melhores condições para quem trabalha com reciclagem." Essa aí é uma lutadora. Atualmente ela está trabalhando como zeladora de praça. Ela batalha muito, tem oito filhos. É uma pessoa fantástica. Quem não a conhece olha para ela e pensa: "É doida!" Mas é uma pessoa de um coração e de uma inteligência fantásticos. Pode passar por favor. "Mais moradia." Pode passar por favor. "Queremos viver." Pode passar por favor. Rapidinho, o que nós sabemos. A existência de pessoas morando nas ruas... Só dando os créditos: vou falar agora sobre um trabalho coletivo. Isso não é meu, os eslaides não são meus, são públicos. Esse foi um trabalho que nós fizemos em conjunto na preparação da Política Nacional. A existência de pessoas morando nas ruas e em centros de acolhida é a expressão dramática da desigualdade existente em nosso País. Por favor. As desigualdades são produzidas, e a naturalização das relações sociais é que permite que se crie um imaginário social no qual a pobreza seja vista como falta de oportunidades ou fracasso pessoal. A aquisição de novos hábitos e práticas é a mola mestra para alcançar processos de mudança. Isso é importante para a gente fazer essa mudança. Pode passar por favor. Aí é um pouco a visão sobre a qual já iniciei falando: a rua não está separada do problema do País, do modelo de sociedade que nós temos. Se nós só trabalharmos com a população de rua, nada vai acontecer, porque você tira um, tira dois, tira três, caem 50, caem 100 e assim vai. Nós temos que fazer um trabalho conjunto. Ao mesmo tempo em que trabalhamos com a população de rua, nós temos de trabalhar para mudar essa nossa sociedade consumista, capitalista, concentradora. Pode passar por favor. Esse é um dado importante. Um dos fatores importantes para o aumento da população de rua é a urbanização. Nas décadas de 70, 80, nós invertemos: 70% antes viviam no meio rural e 30% viviam nas cidades; depois esses números se inverteram, e 70% passaram a morar na cidade e 30% no meio rural - isso grosso modo. |
| R | Pode passar por favor. São Paulo. Assusta, não é? Pode passar por favor. O que mais sabemos? As instituições e políticas públicas não funcionam como deveriam. O sistema prisional, por exemplo: ele não funciona, ele não atende o objetivo que foi pensado, assim como a saúde, as políticas para as crianças e jovens. E no sistema prisional nós temos um problema gravíssimo: nós nem sabemos quantas pessoas que estão em situação de rua passaram pelo sistema prisional. Nós, na Defensoria, temos uma grande dificuldade. Vocês sabem que, se as pessoas vão ao Poupa Tempo - eu não sei como é lá no Piauí -, em algum órgão público da Justiça principalmente, no fórum ou coisa assim, as pessoas são presas. Na Defensoria, elas podem ir que não são presas, porque lá está a defesa delas. Em São Paulo nós temos uma dificuldade, nós estamos quebrando um mito agora, depois de muito trabalho, de convencer as pessoas a irem à Defensoria, a entrarem no prédio da Defensoria. Foi feito um trabalho longo para se chegar nisso. Vejam o absurdo: o Poupa Tempo é um local que reúne vários trabalhos do Governo, inclusive de identificação, de identidade. A pessoa chega lá e, se ela, por exemplo, saiu e não foi lá assinar a carteirinha, vai ser presa. São coisas absurdas que acontecem! Eu vou ter que correr, senão o templo não vai dar. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Mais dois minutos. O SR. ALDERON COSTA - Obrigado. As pessoas que saem da situação de rua são poucas e ficam sempre numa situação de risco de retorno. Elas saem por um momento. Por favor, vou acelerar. Sabemos que as soluções não são simples e imediatas. Trata-se de um processo que exige ações complexas, que desafiam o conhecimento, a capacidade de construir respostas eficazes, o diálogo e a articulação permanente entre os atores de políticas públicas. Pode passar por favor. Estudos apontam que a população em situação de rua é composta por pessoas de faixas etárias diferentes, grupos diferentes, experiências, histórias diferentes, que apresentam demandas e necessidades complexas e específicas. Por favor. Os centros de acolhida são uma resposta. Porém, não podem ser a única. E quando falo "centro de acolhida" é para ser bonzinho e não falar "albergue", porque é a mesma coisa, só mudou o nome. É igual a você comprar um celular dizendo que paga caro e o celular não tem nem um chip, não funciona. E não funciona mesmo. Por favor, passe. Queria chamar atenção de novo para este grito: "Olhe nos meus olhos. Sou ser humano." Volto a dizer: gente, vamos mudar o nosso olhar para a população de rua, porque, a partir do momento em que enxergarmos nessa pessoa que está em situação de rua um ser humano, a nossa política vai mudar. (Palmas.) Bem, quando for preciso, eu paro, Senadora. Não há problema. O que queremos? Pode passar. Queremos que a política pública esteja referendada na diversidade de questões levantadas pelos estudos e experiências acumuladas pela sociedade. (Soa a campainha.) O SR. ALDERON COSTA - Pode passar. Vou ler rapidinho. Que a política pública leve em conta a complexidade dos processos sociais que levam as pessoas à situação de rua. Por exemplo, desemprego, perdas, rupturas familiares, falta de moradia acessível, conflitos familiares e a questão de álcool e drogas. Por favor. Bem, de leis, nós já falamos que há várias. Pode passar. Avaliação crítica da política pública de atendimento às pessoas em situação de rua com ampla participação. Hoje São Paulo, o Ministério Público... Eu até trouxe... Eu tenho uma pastinha com vários documentos e vou deixá-la depois com a Senadora. |
| R | O Ministério Público fez uma avaliação em todos os serviços que a cidade de São Paulo tem, e nenhum serviço foi aprovado. Nós estamos agora trabalhando, parece que vai ser proposta uma ação civil pública pelo Ministério Público em relação a alguns desses serviços. Por favor, pode passar. Participação ativa da sociedade. Não é um problema só do Governo, é um problema de todos nós. Pode passar. Desenvolvimento e monitoramento de programas de formação permanente. Isso é muito importante. Hoje as pessoas são contratadas para trabalhar com população de rua ao acaso. Está desempregado? Vai trabalhar com população de rua. Tudo bem, não há problema nenhum, só que nós temos que garantir formação para essa pessoa. Eu costumo dizer que, para trabalhar com população de rua, tem que ser especialista, doutor e tudo mais. Nós precisamos dos melhores para trabalhar com a população de rua. E, claro, os companheiros educadores têm vontade e garra, isso é muito importante, mas, com um pouco mais de formação, nós iríamos garantir qualidade no atendimento, na acolhida, no entendimento de todo esse processo. A questão das guardas, nem vou entrar nessa história, porque essa aí é uma história difícil, a violência que existe hoje em todas as cidades das guardas municipais. A lei tem que vir e tem que garantir que isso seja fiscalizado e que isso não aconteça mais. Nós temos aí vários casos, pelo menos nas cidades do interior de São Paulo, onde a GCM... Ontem foi São Vicente, uma denúncia de São Vicente segundo a qual a Guarda Civil estaria estourando os moradores de rua. E lá eles não usam arma - eles não podem usá-las ainda -, lá é pau mesmo. Então, temos que combater isso. Por favor, o próximo. Criar formas de participação da sociedade civil, controle. São os comitês, que são importantes. Os colegas, depois, vão poder falar mais sobre isso. Por favor, o próximo. Articulação com o Governo Federal na criação do programa de moradia. A questão da moradia, gente, é muito importante. Já estamos terminando um trabalho em São Paulo, e parece que o prefeito vai soltar um decreto agora para garantir moradia para a população de rua, pelo menos para uma parte, não para todos. Mas há uma discussão: não é simplesmente dar a casa, não é simplesmente dar a propriedade. Há toda uma discussão que precisa ser feita, porque a moradia está dentro do processo de recuperação da dignidade, não é, Padre? Acho que isso é importante, o senhor falou da dignidade humana. Por favor, passe para o final. Pode passar. Depois os colegas vão poder falar mais. Aí está bom. Bom, gente, eu queria só compartilhar isso e dizer aqui para a Senadora e para todos da importância de termos essa lei nacional, garantir toda a luta que fizemos pela Política Nacional. E agora, isso vindo para o Senado, a Senadora, o Senador Paim, todos aqui devemos nos juntar para garantir essa lei, para que tenhamos um respaldo no nosso Município e no nosso Estado para continuarmos essa luta. O que nós queremos é uma cidade sem pessoas em situação de rua, um Estado sem pessoas em situação de rua, onde a dignidade prevaleça, inclusive para aqueles que querem continuar na rua. Muito obrigado, Senadora. Vamos ficar aqui para o debate que virá depois. Agradeço. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Obrigada, Alderon. Vamos passar imediatamente a palavra para o José Ivan. (Palmas.) José Ivan é do Ministério do Esporte, Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida. |
| R | Gente, há uma outra sala que está recebendo as pessoas. Lá também vocês podem assistir pela TV. É o Plenário 6. Mas aqui na frente ainda há cadeiras. Se chegar algum Senador, claro, ele tem que se sentar. Mas só quem vai voltar para cá é o Senador Paim, se der tempo. Começa por aí a questão: a Comissão não é muito frequentada. Com a palavra o Sr. José Ivan. O SR. JOSÉ IVAN MAYER DE AQUINO - Muito obrigado por participar desta importante audiência pública. Em nome de V. Exª eu gostaria de cumprimentar todas as mulheres presentes e os demais membros da Mesa, e em nome do Samuel Rodrigues cumprimentar todos os homens presentes e a criança do sexo masculino que está aqui à minha frente. Esta audiência é revestida de uma importância que nós só vamos poder medir daqui a um ano, provavelmente. É um momento crucial da vida pública brasileira. Se o golpe se consumar com 54 votos, na audiência que vai definir se a Presidenta eleita com 54 milhões de votos continua ou não a dirigir o País, veremos o desmonte que o Governo interino e golpista está fazendo sobre as entidades públicas e privadas brasileiras é descomunal, a serviço da concentração de renda, que gera desigualdade e que gera, por sua vez, o acúmulo de pessoas nas ruas e em outros locais em que elas deveriam estar trabalhando ou vivendo. Eu trago, da minha experiência de vida, a militância na Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida, que é a campanha deixada entre nós pelo Betinho, que eu ajudo a coordenar desde que o Betinho assim propôs, em 1993. E nessa Ação da Cidadania nós desenvolvemos algumas atividades voltadas para diversos segmentos em desvantagem social. Entre essas atividades, um programa de microfinanças, com o apoio do Programa Providência de Elevação da Renda Familiar, que, em 2005, ofertou microcrédito para a população em situação de rua aqui no Distrito Federal, em grupos de fiança solidária, nos moldes do Grameen Bank, de Bangladesh. De lá para cá, eu também estou nesta audiência e nesta militância como empregado do povo brasileiro na condição de Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, uma carreira de Estado pela qual eu já trabalhei no Ministério do Meio Ambiente, no Ministério da Educação e, recentemente, no Ministério do Esporte, onde fui escolhido para representar o Ministério num importante instrumento criado com o Decreto nº 7.053, de 2009, que é o que regula a Política Nacional para População em Situação de Rua. Eu represento então o Ministério do Esporte - que não acabou com essa reforma feita pelo interino golpista - no Ciamp-Rua. |
| R | Estou aqui com duas entidades incorporadas: a um tempo, o espírito do Betinho; em outro tempo, o espírito do meu pai, que é o melhor funcionário público que eu pude conhecer. Então, se eu estou na rua, levo o espírito de ambos para dialogar com respeito a política pública. Acho que este momento é extremamente oportuno porque, com o copia e cola da fantástica equipe dos golpistas, várias estruturas caíram no caminhão de mudanças dessa covardia que está sendo perpetrada contra o povo brasileiro. A mudança de ministérios cujas estruturas foram construídas ao longo de 13 anos, 5 meses e 12 dias de política pública voltada para a construção e a oitiva das populações na construção de seus instrumentos deixou de fora instrumentos importantes como o Ciamp-Rua, que está, em tese, no Ministério da Justiça, liderado pelo advogado do PCC, da polícia que mata mais gente no Brasil, especialmente jovens, jovens negros de periferia, e a população de rua. É ele quem coordena o Ministério da Justiça do País neste momento. É absurdo isso. Se não bastasse a questão da política no controle dos cargos, a evidente manobra deixou de fora, por exemplo, o Conselho Nacional de Política Indigenista. Foram anos de construção e, de repente, o nome se apagou da estrutura. O Ciamp-Rua, em tese, está embaixo da Secretaria de Direitos Humanos, que está embaixo do Ministério da Justiça. Como vão se reunir ali dentro? Não sabemos ainda. E no aspecto econômico, o modelo concentrador que está dado vai apontar, em pouquíssimo tempo, que vai crescer o número de pessoas em situação de rua porque a perspectiva de tirar o Bolsa Família de 10 milhões de famílias brasileiras para financiar os juros para os bancos é um dado avassalador. Um outro dado importante é a questão da psicologia e da psiquiatria sobre a população brasileira, que coloca muita gente na rua. Com esse estado de coisas que vamos voltar a viver, com esse estado de agressão psicológica que está sendo feita, o cenário é devastador. Como nós somos resistentes e como nós somos agraciados neste momento pela presença de uma figura como a da Senadora Regina Sousa neste exato lugar, neste exato momento, nós temos que nos valer desta construção e trazer para cá os espaços que estamos perdendo a fim de construirmos a política na evolução de um decreto para uma lei e que gere o plano nacional de ação para essa população. Os dados que foram acumulados ao longo dessa história vão permitir ajudar. Nessa construção da política pública do Ministério do Esporte, minha presença no comitê Ciamp-Rua me permitiu conhecer uma senhora chamada Antônia, que é do brilhante Movimento Nacional da População em Situação de Rua, que tem que ser exaltado aqui neste momento como trincheira de resistência embaixo das marquises e nas repartições. |
| R | A Antônia, que é aqui de Brasília, provocou-me, como representante do Ministério do Esporte no Ciamp-Rua, a criar uma alternativa de esporte para essa população, que também quer esporte. E nós, a partir do diálogo, conseguimos chegar a um produto ainda pequeno para a necessidade, mas que é um projeto piloto realizado com o Movimento Nacional da População em Situação de Rua do Espírito Santo e com a Universidade Federal do Espírito Santo. Conseguimos, com R$360 mil do Ministério, desenvolver, durante um ano, a formação de mediadores do futebol callejero, que é uma estratégia de futebol que faz com que as pessoas possam mediar conflitos em área de risco social. Vamos formar, com a ajuda da Universidade Federal do Espírito Santo e o monitoramento ativo do Movimento Nacional da População em Situação de Rua do Espírito Santo, com a Rosângela e com o grupo de lá, o futebol callejero como alternativa de esporte para essa população. Durante um ano, as pessoas serão formadas, será disputado o Campeonato Capixaba de Futebol Callejero, será publicado um livro, registrada essa experiência, e vamos ter esporte e formação nesse contexto. Por último e mais profundamente, eu gostaria de contribuir com esta discussão - por favor - trazendo para a tela a minuta da contribuição feita a partir de um chamado do pessoal do Ciamp-Rua, que tem um grupo de trabalho que tenta transformar o decreto em lei. Provavelmente, eles vão falar aqui sobre isso ao longo do tempo. Eu fiz algumas observações em amarelo e em vermelho, a partir de uma discussão que o Samuel, a Cristina, que é de Belo Horizonte, e outra parte do grupo que estava discutindo isso no Ciamp-Rua solicitaram. Então, eu fiz algumas contribuições. No final do documento... Eu peço que vá para a p. 14, mais ou menos 14, por favor. Mais um pouco. Do que se trata isso? Pode ir levantando, por favor. Desce mais um pouquinho, por favor. Eu quero ir para a p. 14 aproximadamente. Ah, não. Deixe-me ver pelo artigo. (Pausa.) |
| R | Depois do art. 15. Pode ir mais um pouco, por favor. Não, desculpe, volte, por favor. Pode ir descendo. Está quase chegando. Isso, por favor. Então, o que nós fizemos aí? Havia um artigo do Senador Paulo Paim que estava sendo discutido e fizemos algumas sugestões. Eu contribuí com essa mistura de que falei no início da fala, da minha experiência na Ação da Cidadania contra Fome, a Miséria e pela Vida e como gestor governamental que pôde acompanhar a tramitação do Plano Nacional de Educação durante três anos e meio no Congresso Nacional. Fizemos uma sugestão de plano de ação. Levante um pouquinho, por favor, amigo, no sentido contrário. Então, o Plano Nacional de Educação é um pouquinho de artigos, vinte metas e duzentas estratégias para alcançar essas metas. Nós apresentamos a ideia de ter um plano de ação que tenha um artigo aprovando o plano, com a vigência dele, e algumas metas. Por exemplo: a meta número um seria realizar, até 2016, o Censo Nacional da População em Situação de Rua, com a estratégia. Pode levantar, por favor. (Soa a campainha.) O SR. JOSÉ IVAN MAYER DE AQUINO - A meta dois seria instituir o Centro de Defesa de Direitos Humanos da População em Situação de Rua em âmbito nacional, estadual e distrital até 2016 e municipal até 2017, em todos os Municípios com população superior a 100 mil habitantes. A meta três, lá embaixo, fala sobre os Estados, o Distrito Federal e os Municípios elaborarem e remeterem ao Poder Legislativo local seus correspondentes planos de ação. Pode subir, por favor. Meta quatro: realizar o IV Encontro Nacional da População em Situação de Rua e a estratégia para isso. Esse é só um exemplo de como organizar a discussão. Para encerrar de fato, a contribuição ao debate que há ali é apenas o resultado de uma experiência que veio de conferências nacionais. Eu já participei de umas vinte ou trinta, e quatro delas eu ajudei a organizar, como gestor governamental. E dessa experiência veio o projeto de lei para o Congresso Nacional. No caso do Plano Nacional de Educação, a matéria tramitou e chegou à peça final que aí está. |
| R | Então, é só uma contribuição, como cidadão e como gestor, para este debate. Deixo o meu agradecimento profundo pela oportunidade que nos está sendo dada de tentar reverter o vazio legislativo que existia nessa área, principalmente o espaço político para debatermos claramente o que está acontecendo em nosso País neste momento. (Soa a campainha.) O SR. JOSÉ IVAN MAYER DE AQUINO - Se alguém quiser cópias do projeto do esporte e do lazer para a população em situação de rua realizado no Espírito Santo, eu tenho no pen drive, posso deixar como contribuição a peça que o Ministério assinou com a Universidade Federal. Obrigado. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Obrigada, José Ivan. Eu pedi para pesquisar o andamento do projeto e tenho uma notícia que não é muito boa. A matéria está na Câmara, e a Relatora é a Deputada Tia Eron, que se tornou famosa esses dias. Temos que criar um grupo para acompanhar. Eu vou conversar com ela também. Também quero saber de vocês, gostaria que alguém me dissesse depois, se o projeto, da forma como saiu do Senado, satisfaz. Porque você está dando um formato, como o Plano Nacional de Educação. Não sei se quando ele saiu daqui foi com esse formato. O SR. JOSÉ IVAN MAYER DE AQUINO - Não, não foi. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - E alguém apresentou emendas? O SR. JOSÉ IVAN MAYER DE AQUINO - Não. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - É um projeto antigo, de 2009, não é? Podemos resgatar para ver se apresentamos um substitutivo e se ela aceita. Vocês podem redigir o substitutivo e nós vamos ver se ela aceita. Vamos para o quarto convidado, Olavio Dotto, Assessor das Pastorais Sociais da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). O SR. OLAVIO DOTTO - Uma saudação ao Senador Paulo Paim, à Senadora Regina Sousa, aos demais membros da Mesa, uma saudação a cada um e a cada uma dos presentes aqui. Trago também uma saudação toda especial de Dom Leonardo, que é o Secretário-Geral da CNBB. Ele deveria estar aqui, mas está em outra atividade. O Padre Paulo Renato, que é da Assessoria Política da CNBB, também está aqui. Esta temática é muito cara, é muito importante para a CNBB. Tudo que se refere ao acesso aos direitos das pessoas é importante, e a CNBB procura, de fato, acompanhar. E quando falamos de população em situação de rua, sabemos que é um tema muito complexo de ser abordado. Eu digo isso porque a CNBB, através de suas pastorais - Pastoral do Povo de Rua, Pastoral do Menor, Pastoral da Pessoa Idosa, Pastoral da Criança, Cáritas e tantas organizações -, atua nesse sentido e conhece a complexidade de lidar, no dia a dia, com essa temática. Eu quero ressaltar a nossa alegria com a proposta de se constituir esse programa e, agora, esse plano, com ações e com metas estipuladas. Isso é muito importante, porque nós estamos lidando com algo concreto. Não ficamos só no campo da teoria, das ideias, nós descemos um patamar a mais no sentido de tentar efetivar, de fazer acontecer. |
| R | Eu gostaria de fazer três ou quatro ponderações em nível de reflexão sobre essa temática, porque vejo que exige de nós todos uma reflexão bem ampla, porque nós percebemos aqui, só pelos dados de São Paulo, em nível de Brasil, uma imensa população vivendo em situação de rua. E ela vem crescendo, pelos seus diversos fatores. Quer dizer, o dado que mais, de fato, leva a população a viver na rua, sem dúvida, é essa sociedade desigual, sociedade excludente em que vivemos, que, de fato, nega esses direitos mais básicos para a pessoa, o direito à moradia, o direito ao trabalho e acaba não restando outra coisa, outra alternativa a não ser ir para as ruas mesmo, morar na rua. Por outro lado, também, já vimos aqui que temos de levar em consideração a história de vida de cada pessoa. Quer dizer, às vezes, pode ser também uma opção da pessoa, uma ruptura familiar, seja a droga, o álcool, doenças mentais, enfim, temos esse dado. O importante é termos muito presente também esse diagnóstico que já realizamos, quer dizer, são vítimas de violência. Todos os dias, a gente abre as capas de jornais, vê as notícias na TV, todos os dias temos situações de pessoas que estão vivendo nas ruas que sofrem violência. Inclusive, a gente pode dizer: aquela violência que a tira do higienismo. Temos de limpar as ruas, temos de limpar, temos de mostrar a cidade bonita. Então, a Senadora, já no início, trouxe um dado importante, porque são pessoas invisíveis para a sociedade. E é muito importante trazer presente, porque eu e o Padre Paulo Renato, ao chegarmos aqui, nós também tivemos um exemplo muito concreto dessa invisibilidade. Quando entramos aqui, para chegar até a esta audiência, nós percebemos também que a própria Casa mostra um certo despreparo para lidar com essa população de rua. Lá embaixo eles não puderam entrar porque não tinham documentos, não é verdade? Mas a gente pergunta assim: onde está o valor da pessoa? Onde está? (Palmas.) Quando a gente fala em recuperar, resgatar a dignidade de políticas públicas, resgate à cidadania, nós temos de começar olhando as nossas instituições, como nós lidamos com essas populações. Então, eu só queria deixar registrado isto: temos de começar por nós. Outro elemento importante, é isso que eu falava: nós temos esse diagnóstico. Agora, nós precisamos, de fato, rever formas de resolvermos esse problema. Então, aqui eu saúdo, de fato, essa iniciativa de termos esse plano de ação. Já foi falado aqui também, acho que pelo Alderon, que não basta ter só a lei, não basta só a lei. Porque é fácil apontar o problema, sabemos que está aumentando a população de rua, agora, só apontar não é caminho. |
| R | Então, eu quero frisar muito isto: nós, conjuntamente com a sociedade civil e o Poder Público, precisamos, de fato, buscar propostas humanizadoras - acho que essa é a palavra -, quer dizer, coisas bem concretas. E mais, com o próprio povo de rua sendo protagonista disso; que eles possam se sentir participantes desse processo - e aquela palavra que nem todos gostam de usar -, que eles se sintam também empoderados nesse processo de construção de políticas públicas. Para nós da Igreja Católica, das Pastorais, isso é muito importante. A nossa missão, de fato, é estarmos juntos nessas situações. Nós sempre falamos assim: são os mais pobres entre os pobres, por quê? Porque já foi tirado tudo deles; acesso ao trabalho, acesso à saúde, a todos os direitos. Então, nós devemos estar ali, ser essa presença solidária, porque nós temos claro que são pessoas com direitos que estão, sim, na rua por motivos diversos. É missão nossa como Igreja, nas ações das Pastorais, dar a eles esse suporte para que possam tomar posturas em relação a seus direitos fundamentais, no sentido de construirmos juntos, para que sejam protagonistas também. Eu não quero me estender muito aqui, eu só quero encerrar essa fala, dizendo que nós do CNBB, sim, somos parceiros na construção desse programa, somos parceiros mesmo. Mas eu não gostaria de encerrar sem deixar uma provocação naquilo que nos faz pensar o Papa Francisco. Eu acho que, assim como ele fala para dentro da Igreja, ele também está falando para toda a sociedade. Ele diz que estamos vivendo numa época da globalização da indiferença. Quer dizer, o que me importa o outro? Se alguém está na rua, se alguém está passando fome, não é problema meu. Quer dizer, o que me importa o outro? Importa defender o meu. O Papa chama muito a atenção para isto: nesse tempo da globalização da indiferença, cultura do descarte, descarte da criança, descarte da pessoa idosa, o jovem descartado quanto a trabalho que acaba não tendo alternativa, para onde vão? A grande maioria acaba indo, de fato, para a rua. E ele nos faz um chamado muito importante, ele faz um chamado para a solidariedade, mas a solidariedade bem entendida, que vai muito além de simplesmente gestos generosos esporádicos. É muito mais para a solidariedade do que isso. Quando ele nos convida à solidariedade, é para que nós juntos pensemos e ajamos em termos de comunidade, de sociedade, de prioridades da vida sobre esse sistema que está aí, sobre a apropriação dos bens por parte de alguns. Ele vai nos dizer que a solidariedade, de fato, é, juntos, lutarmos contra as causas estruturais da pobreza, porque se nós, conjuntamente, não lutarmos contra essas causas estruturais que geram pobreza, podemos ter bons planos de ação, bom programa, mas vamos continuar gerando pobreza e vamos continuar gerando mais pessoas que vão para a rua. Então, conjuntamente temos de lutar pelas causas estruturais da pobreza, da desigualdade, da falta de trabalho, de acesso à terra, de acesso à casa, enfim, lutar contra a negação dos direitos sociais e laborais, quer dizer, sermos capazes de, conjuntamente, fazer frente aos efeitos destruidores do império do dinheiro. |
| R | Nós estamos presenciando, nos meios de comunicação, essas deslocações forçadas que estão ocorrendo, as imigrações dolorosas que estão ocorrendo, tráfico de pessoas, a droga, a guerra, a violência e todos aquelas realidades que muitos de nós já não suportamos mais e que juntos somos chamados a transformar. Então, com essa palavra solidariedade, ele nos convoca a, juntos, assumirmos; eu diria, é uma forma de fazermos história. Não são simplesmente atos generosos, mas é uma forma de fazermos história, porque vamos transformar essa sociedade que está aí. Ele chama a atenção quanto aos três Ts - isso é muito importante -, quer dizer, toda pessoa, toda família deve ter acesso a: terra - seu cantinho -, teto - um local para morar - e trabalho. São direitos sagrados. É isso que dá dignidade ao ser humano, dignidade à pessoa, dignidade à família. Não gostaria de me estender mais, mas gostaria de parabenizar por essa iniciativa e dizer: sim, nós somos parceiros nessa construção de ações bem concretas. Obrigado. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Obrigado, Olavio Dotto, da CNBB. Vamos passar, imediatamente, a Carlos Ricardo, Coordenador-Geral dos Direitos da População em Situação de Rua da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. É bom, porque ele vai falar como está funcionando a Secretaria neste último mês. O SR. CARLOS RICARDO - Bom dia a todos e a todas. Quero cumprimentar, primeiramente, a Senadora Regina Sousa e o Senador Paulo Paim, já agradecendo pela acolhida desse tema, pela acolhida de um tema que é tão importante, e, no decorrer aqui, vou dizer um pouco por que é importante a gente ter a política nacional como lei, porque hoje é só um decreto. Mas agradeço muito a sensibilidade. Infelizmente, ainda são pouquíssimos Parlamentares nas três esferas de Governo que são sensíveis a esta causa. Então, eu destaco mesmo o nosso agradecimento e a importância desta acolhida aqui, Srª Senadora. Cumprimento meus colegas todos da Mesa, peço licença para agilizar o tempo e cumprimentar todos na figura do Anderson Miranda, que representa aqui a população em situação de rua, que é o público para o qual nós estamos aqui reunidos, para construirmos junto com essa população esse projeto, porque defendemos essa construção coletiva, como é proposta nossa. A Secretaria de Direitos Humanos já esteve na Presidência da República - só para fazer essa consideração aqui -; depois nós estivemos, como Secretaria Especial de Direitos Humanos, dentro do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos, e, atualmente, com essa última medida provisória, neste Governo interino, nós estamos no Ministério da Justiça e Cidadania, ainda sem a definição clara da estrutura, porque isso demanda ainda um outro ato normativo que organize isso, mas a Secretaria está, atualmente, no Ministério da Justiça e Cidadania. |
| R | É extremamente importante para nós o debate sobre uma lei que trate da política nacional para a população em situação de rua, porque essa política já vem sendo discutida há bastante tempo, desde a década de 80, porque o movimento social, à época, ainda não era constituído como movimento da população de rua, mas a própria CNBB, através da Pastoral de Rua... Creio que Alderon já participa dessa discussão há bastante tempo; a irmã Cristina Bove, que não está presente aqui, no momento, mas já, há mais de 30 anos, acompanha esse debate. Então, o pessoal já vem apontando para nós, para o Estado brasileiro, a necessidade de uma política que trate do tema da população em situação de rua, rompendo a lógica assistencialista, que era vigente, e mesmo assim um assistencialismo sem nenhum tipo de dignidade, um assistencialismo que considera que qualquer coisa vale para quem está numa situação de extrema degradação. Então, isso já vem sendo reconhecido e vem sendo reconhecido, inclusive, desde da década de 80, que é necessário que o tema seja tratado de forma intersetorial. Não basta apenas uma única política pública setorial trabalhar com a população em situação de rua. O que se está dizendo com isso? Que não adianta você ofertar o que na época ainda era chamado de albergue - que hoje mudou de nome, como o Alberon bem disse, mas a gente ainda precisa avançar muito na qualificação, para que ele realmente se torne a nomenclatura atual -, não basta ofertar um serviço de acolhimento institucional porque a pessoa continua em situação de rua, como a própria definição do termo nos diz. Não adianta a gente ofertar um atendimento de saúde - e mesmo que a gente esteja no ideal no atendimento de saúde, a pessoa pode ter um excelente atendimento, mas ela continua na rua. Ou seja, já vem sendo reconhecido que precisa do atendimento amplo, qualificado e funcionando de forma intersetorial, articulando as várias políticas públicas. Em 2003 - e eu não vou falar aqui o histórico todo para não ficar maçante, mas é importante a gente resgatar de forma bem breve -, houve a acolhida, pela primeira vez, no governo federal deste tema, e ali foi definido um processo de construção dessa política. E por que processo? Porque foi pressionado pela sociedade civil, foi acolhido pelo governo federal e foi construído em conjunto com a sociedade civil. E o governo federal precisou se apropriar de um tema do qual não tinha nenhum domínio. Então, em 2006, foi criado um grupo de trabalho, e, antes disso, houve algumas iniciativas como o primeiro encontro nacional, a primeira Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua realizada pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Eu estou aqui pulando alguns pontos, mas foi realmente um processo, com várias coisas acontecendo no meio desse caminho. E, em 2006, foi criado um grupo de trabalho composto por representantes da sociedade civil organizada, alguns deles estão aqui, nesta plenária, que ajudaram nesse processo de construção, e com representantes de vários Ministérios do Governo Federal, para poder construir. |
| R | Esse grupo de trabalho deveria durar três meses e durou três anos, dada a dificuldade de o governo se apropriar desse tema. E aí basta a gente ver aqui, nas escolas, seja em nível médio, nível superior, pós-graduação, que hoje já se tem alguma coisa, mas ainda é muito pouco, mas, até a pouquíssimo tempo atrás, a gente não tinha absolutamente nada sobre população em situação de rua. Então é um tema realmente em que as pessoas se baseavam apenas em preconceitos. A Pesquisa Nacional já desmistificou um monte de coisas. Então, por exemplo, a gente escuta muito ainda hoje dizerem que população em situação de rua é um público de vagabundos. Mentira! Isso é mentira! A Pesquisa já indica que 70% desenvolvem algum tipo de trabalho para obtenção de renda. Aquelas pessoas que pedem dinheiro como principal forma de obtenção de renda são apenas 15%, segundo a Pesquisa Nacional de 2008. E as pesquisas recentes municipais que vêm sendo feitas estão aí em percentuais parecidos com esse. Em 2009 então, após os três anos do GT, essa proposta foi apresentada no II Encontro Nacional sobre População em Situação de Rua, foi validada, e dali a gente criou o Decreto nº 7.053, que institui a Política Nacional para a População em Situação de Rua e o Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento, o órgão colegiado que discute a implementação dessa política e acompanha e monitora todo esse processo - uma grande conquista. Essa política foi um marco no que diz respeito a inclusão e a acesso a direitos da população em situação de rua. Não que esteja tudo bem e tudo resolvido, por isso nós estamos aqui, inclusive pleiteando a construção de uma lei que trate dessa política. Mas ela foi um marco, porque, a partir dali, a gente conseguiu, por exemplo, incluir a população em situação de rua no Cadastro Único. Então, se a gente for olhar na pesquisa de 2008, em torno de mil, mil e quinhentas pessoas, estavam incluídas no Cadastro Único. Hoje nós já temos mais de 51 mil pessoas, quase 52 mil pessoas, incluídas nesse cadastro. Mais de 46 mil recebendo Bolsa Família. Então, isso já identifica algumas coisas: serviço de saúde, já houve uma portaria que garante o acesso dessa população mesmo sem o comprovante de endereço; o Consultório na Rua; quatro serviços específicos para a população em situação de rua tipificados dentro do Sistema Único de Assistência Social; projetos de economia solidária para a população em situação de rua em sete capitais brasileiras. A gente tinha planos de expandi-los e agora a gente precisa renegociar isso. A possibilidade de priorização no Programa Minha Casa, Minha Vida, colocando a população em situação de rua como público prioritário. Bom, aí eu posso listar aqui Pronatec específico para a população em situação de rua, garantindo a qualificação técnico-profissional. São Paulo e Distrito Federal são os pioneiros no Pronatec Pop Rua. Eu posso citar várias coisas e, eu falando assim, parece que está bonito, mas não está. Por isso que nós estamos aqui. Por isso que estamos aqui com a proposta de criação de um projeto de lei. Por quê? Quando criamos o decreto, foi o possível naquele contexto, mas ele não cria a forma de efetivação de todos os direitos que a gente vem pleiteando ao longo desses anos. Então, quando a gente fala do acesso amplo, simplificado e cita lá as várias políticas setoriais - educação, habitação, saúde, assistência, previdência social e várias outras que estão no Decreto nº 7.053 - não diz como. E a gente vem discutindo isso no Ciamp. |
| R | Essa proposta que vem sendo apresentada aqui, trazida pelo José Ivan, ainda não é a proposta aprovada pelo Ciamp Rua. É uma proposta inicial do José Ivan, que, voluntariamente, se prontificou no nosso grupo de trabalho. Ele nos apresentou a proposta, mas entendemos que ainda precisamos avançar nesse tema. Ele abriu esse espaço para nós, junto com a Senadora Regina Sousa, e queremos aproveitar para colocar o projeto de lei que ainda vamos aprovar no nosso Ciamp. Algumas coisas ainda foram acrescentadas nesse processo. Na época, foi feita a escolha de tratar apenas do público adulto nessa política. Hoje, há discussões realizadas no âmbito do Conanda - e está aqui o Marquinhos, do Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua e outras pessoas aqui que também vieram desse movimento e hoje também atuam no movimento adulto. O nosso próprio Decreto nº 7.053, que instituiu a política nacional, não faz distinção de faixa etária. Então, todas as pessoas estão incluídas. Vimos numa parceria com os movimentos de crianças e adolescentes para discutir conjuntamente a política como um todo em órgãos colegiados, porque não como discutir separadamente. Está interligado. Há famílias em situação de rua. Os mesmos órgãos do Executivo que tratam de um público tratam do outro, em sua grande maioria. Então temos interseções, interfaces entre esses dois públicos, e isso vai ser considerado nessa proposta que pretendemos apresentar em breve, Senadora Regina, já um pouco mais discutida no Ciamp, acrescentando essas outras coisas que vimos compreendendo ao longo tempo, como por exemplo, que não dá para deixar de fora crianças e adolescentes. Eles não têm visibilidade no decreto como ele está hoje. A gente quer acrescentar outra contribuição importante que veio de um projeto chamado Diálogos Setoriais, em que fomos conhecer a experiência europeia no atendimento à população em situação de rua. O Samuel, que está aqui, esteve lá conosco, junto com a SDH. Ali rompemos uma lógica diferente de olhar para a situação de rua. Uma coisa que é óbvia: quem está em situação de rua está lá porque não tem moradia, não tem habitação. E qual é a lógica? Isso não é só no Brasil, em outros lugares também começou assim e, hoje, está em outra etapa. A primeira lógica era assistencialista. Assim foi a nossa e assim também foi na Europa, nos Estados Unidos, em outros lugares também. Depois migrou para o modelo integrado de prestação de serviço por etapa. E prestem atenção ao nome porque o nome já diz mais ou menos o que quer dizer. Ele já compreende que tem que ser intersetorial, que as várias políticas públicas precisam conversar, mas ele ainda é por etapa. A última etapa, que é o que marca definitivamente a saída da rua, é o acesso à habitação. Nós, aqui no Brasil, estamos na transição ainda entre modelo assistencialista e o modelo integrado, mas já percebemos que o modelo integrado não é o melhor modelo. O melhor modelo - e aí fazendo uma adaptação de linguagem - é o Casas Primeiro, é o chamado housing first na língua inglesa. Esse modelo lá adotado já identifica que, primeiro, acessa a habitação e com a proteção - e aí quem é da área da assistência conhece o termo "proteção integral" -, que pressupõe alimentação, espaço de moradia. Num ambiente protegido, onde a pessoa pode dormir e tem o seu espaço protegido... (Soa a campainha.) O SR. CARLOS ALBERTO RICARDO JUNIOR - ... é mais fácil ela acessar os demais serviços. Então, queremos incluir essa concepção na nossa proposta. |
| R | Se formos falar em termos de custo, é ótimo considerarmos isso. O Francisco, da coordenação de populações de rua, que está aqui conosco, fez um levantamento para nós. No Canadá foi feito um estudo do custo per capita mensal no modelo integrado, que dava em torno de €100,00 por pessoa e, no modelo housing first, €35,00 por pessoas. Claro que essa não é a realidade brasileira, precisamos desenvolver o nosso cálculo aqui. Nem estou dizendo também que precisamos copiar exatamente o modelo que é aplicado nos Estados Unidos ou na Europa. Nós precisamos fazer uma adaptação ao nosso formato. Mas já temos essas experiências que vamos incluir, que vamos somar à proposta que pretendemos construir, que vamos construir no Ciamp Rua. Já encerrou o meu tempo. Há várias coisas que eu gostaria ainda de trazer, mas o importante marcar aqui que é do nosso total interesse esse projeto de lei. Nós já temos algumas adaptações que vêm do acúmulo da discussão no nosso comitê, que tem representantes da sociedade civil de todo o Brasil e de vários ministérios do Executivo Federal. Nós Já temos um acúmulo e queremos incluir esse acúmulo na proposta que estamos elaborando e vamos trazer. O Ivan, corajosamente, trouxe essa primeira proposta que saiu do nosso grupo de trabalho, que ele apresentou ao grupo de trabalho desse mesmo comitê que estou citando aqui. Queremos incluir essas coisas. Achamos isso extremamente importante. Esperamos, numa próxima audiência, trazer a proposta pronta, pensando até num substitutivo, acrescentando. Esperamos poder trazer essa experiência. Há pessoas aqui, nesta plateia, que acompanham esse público de perto, que têm uma ação de ponta e que eu gostaria que, no debate, trouxessem as experiências, pois isso deixa mais rico o debate e não fica eu falando de coisas que vocês fazem. A Luana, do Centro Nacional de Defesa dos Direitos Humanos da População em Situação de Rua e de Catadores de Materiais Recicláveis - eu não vou ficar falando esse nomão mais - CNDDH, todos agora já sabem a sigla - poderia trazer alguns dados sobre a violência com a população em situação de rua, sobre esse projeto que foi desenvolvido com a SDH junto com o CNBB e, numa parte também, com o Ministério Público. Para fechar, esse instrumento nos é também solicitado por órgãos como, por exemplo, Defensoria Pública da União e defensorias públicas estaduais, que falam que precisam de um instrumento normativo no qual possam se embasar, para poder cobrar dos gestores estaduais e municipais a execução de determinadas ações que não estão previstas em nenhum outro local. Bom, já me estendi muito. Desculpem. Espero que ainda possamos debater bastante em outro momento. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Obrigada, Carlos Ricardo. (Palmas.) Vamos passar a palavra para o Anderson Lopes Miranda, Coordenador do Movimento Nacional de População em Situação de Rua do Estado de São Paulo. O SR. ANDERSON LOPES MIRANDA - Bom dia a todas e a todos. Eu gostaria de pedir, primeiro, que os nossos companheiros e companheiras em situação de rua aqui presentes ficassem de pé, por gentileza. |
| R | Por favor, não tenhamos vergonha não. Vamos ficar de pé aqui, no Senado, para mostrarmos nossa cara. Uma salva de palmas para nós. (Palmas.) É o empoderamento que nós queremos. Não falem por nós sem nós. Muito obrigado, companheiros. Podem se sentar. Obrigado. É para mostrarmos nossa cara mesmo e dizer para o Brasil: obrigado, Senadora Regina. Muito obrigado por trazer esta pauta ao Senado. Ontem, estivemos na Câmara dos Deputados porque estão querendo acabar com o Sistema Único de Assistência Social neste País. Estão querendo acabar com esses 13 anos de construção do Bolsa Família, do BPC, do Centro POP, do Serviço de Acolhimento. Estão querendo acabar, fazer um puxadinho e jogar para o INSS. E não é isso o que nós queremos. Eu acho que trazer esta audiência Pública hoje aqui, Senadora Regina, traz outro olhar: um olhar dos invisíveis que se tornam visíveis. Eu quero dizer que este movimento não tem um ano, ele tem onze anos. Nós conseguimos tudo isso através da Pastoral Nacional do Povo da Rua; através da OAF (Organização do Auxílio Fraterno); através da Rede Rua. A Pastoral do Povo da Rua não começa hoje, começou há mais de 30 anos em São Paulo, em Minas, a trabalhar com esse público. Nós começamos a criar autonomia através dessa organização, dando empoderamento à população de rua. Quem nos ajudou foi a CNBB Pastoral Nacional do Povo da Rua, criando esta camisa que é azul, que é vermelha, que é amarela, que é preta, que é roxa. Por que é preta? Porque morre muita gente ainda em situação de rua. Na semana passada, queimaram um companheiro da rua. Vocês podem ver aí no jornal. Ele saiu pegando fogo. Mais dois morreram. Nós tivemos, em Maceió, Alagoas, mais de 30 companheiros em situação de rua mortos. A gente retrata São Paulo, mas a gente retrata Maceió, Alagoas; a gente retrata Belo Horizonte, Minas Gerais. Quantos companheiros foram exterminados? A gente retrata o frio do Sul; a gente retrata aqui. O movimento começa no DF. Mataram o Galdino porque ele perdeu o ônibus de ir embora para casa e foi dormir na praça, ali perto da rodoviária do Plano Piloto. Botaram fogo no Galdino, como botam fogo na população em situação de rua, em nós. Não é isso mais que nós queremos. Quero aqui dizer da importância do olhar do Senador Paulo Paim, Presidente desta Comissão, Senadora Regina, que em 2006 criou um PL ouvindo a população de rua do Rio Grande do Sul. Esse PL não surgiu da noite para o dia. Foram moradores de rua lá no Rio Grande do Sul que pediram: "Senador, crie um projeto de lei para nós, lá no Senado." E aí o Senador Paim criou o projeto de lei. Nós chamamos o Senador Paim na criação do Ciamp Rua. O Senador Paim foi lá, no Ciamp Rua, discutir conosco e ele falou: "O projeto de lei é de vocês, do Ciamp Rua. Façam o substitutivo e apresentem na Câmara." Estava na Câmara dos Deputados na mão de um Deputado, foi para outro Deputado, como a Senadora falou, e está agora na mão de um outro Deputado. "Façam o substitutivo, podem apresentar o substitutivo que eu apoio vocês." E ele foi ao Ciamp Rua - não foi, Samuel? -, conversou conosco, discutiu conosco e entregou esse projeto de lei para nós, para o Ciamp Rua. É o como Carlos diz: a importância da discussão tem que vir do Ciamp Rua, tem que estar discutido na política nacional, é intersetorial. |
| R | São nove ministérios com nove representantes desse segmento discutindo. Eu acho que, quando a Senadora Regina fala o que nós precisamos fazer, o que nós precisamos aprovar, é isso que nós queremos. Nós queremos uma lei que tenha dotação orçamentária porque lei por lei, como o Alderon disse, nós já temos um monte. Mas que aprovem dotações orçamentárias, orçamento para essa população. Não adianta falar do Minha Casa, Minha Vida, chegar ao Município e ouvir: ah, não. Vocês não estão orçados aqui. E aí mandam para a assistência social, jogam na assistência social. Problema da assistência social. Mas não queremos mais ser problema da assistência social, mas do esporte, da cultura, da educação, dos direitos humanos, da saúde. Estou vendo companheiros e companheiras aqui. Hoje nós temos um projeto na Senaes - o Samuel vai falar disso depois - e estamos com medo. Em sete Estados, cidades em que o movimento está recebendo recursos, e parou agora. Estagnou-se o projeto. E está aí o grupo do DF, está aí o povo trabalhando no projeto da economia solidária como entidade e estão com medo de não receber as parcelas. É esta a política pública que queremos de fato: inclusão e não um puxadinho. Eu quero parabenizar aqui, sim, e não dizer do retrocesso, o quanto a Igreja nos ajudou a construir isso. É trazer as igrejas para esse olhar, mas a obrigatoriedade é do Poder Público. É obrigação do Poder Público garantir, de fato, políticas para a população em situação de rua. (Palmas.) Eu acho que este Senado está fazendo um grande papel, Senadora. Sabe por que não temos Senadores aqui, só a senhora e o Paim? Se houvesse um monte de empresários aqui, estava cheio de Senador discutindo, porque é dinheiro. Mas como tem um monte de movimento, direitos humanos não é prioridade para este Senado, é prioridade para alguns Senadores que estão aqui brigando, lutando para os invisíveis se tornarem visíveis. Eu parabenizo a senhora, parabenizo o Senador Paim. Estive no Piauí em 2008. O Carlos colocou sobre a contagem da população em situação de rua. No Piauí, era briga de gueto, de moradores em situação de rua. Nas malocas, um de uma maloca não podia entrar em outra porque morria. A fome era grande lá. Fomos fazer a contagem lá, sensibilizar. Quando eu fui para a discussão, havia uma delegada de Polícia dentro da discussão. Ela entendeu que eram todos bandidos, e aí fui explicar para ela: aqui não tem bandido não, doutora! Aqui tem cidadã e cidadão de direitos, que querem direitos nesta cidade, neste Estado, neste País. E aí ela virou minha amiga, entendeu o que estávamos dizendo. Quando se falou, ela foi lá. Essa é a realidade que nós temos que começar. Nós temos vários projetos acontecendo com a autonomia dessa população. Eu quero dizer aqui sobre a importância desse movimento que surgiu de 2004 para 2005. Eu tenho 28 anos de trajetória de rua. Faz oito anos que eu saí da rua, de fato. Hoje eu tenho trabalho, tenho casa, tenho família constituída, tenho duas filhas. Moro hoje no bairro mais distante de São Paulo, a Cidade Tiradentes, mas hoje eu tenho, graças ao movimento, graças à luta. A minha casa é casa de programa, é do CDHU, mas foi uma briga para conquistar essa casa, foi uma luta. Em Belo Horizonte, tem o auxílio-aluguel. O Bolsa Família que eles recebem de R$500,00 é dado em dinheiro para pagar o auxílio-aluguel. Não é pago à imobiliária não, é dada na mão do cidadão. A prefeitura paga isso para eles. Se eles não pagarem o auxílio, é cortado. |
| R | É essa dignidade que nós queremos. É olho no olho, cara na cara, pele na pele. A gente está organizado como movimento, como situação. Temos parceiros importantíssimos nessa luta. Nós temos o CNDDH (Centro Nacional de Defesa dos Direitos Humanos da População em Situação de Rua e dos Catadores de Materiais Recicláveis), que não sabemos se vai ou não conveniar, se o dinheiro sai, se o dinheiro não sai. O Centro Nacional dos Direitos Humanos traz, como o Carlos disse, a importância não só das violações, mas também o que essa população conquistou em nível nacional. Foram contratadas lideranças e pessoas da rua para trabalharem na ponta, para irem para ponta sensibilizar o gestor, cobrar do Estado, para criminalizar a Polícia do sistema. Estamos assim com medo. Com esse golpe dado, quem vai sofrer é a população em situação de rua, como a Senadora acabou de colocar. Nós estamos passando por um processo agora que é puxadinho: pegam a Secretaria de Direitos Humanos, que tinha poder, e jogam no Ministério da Justiça. Criaram um puxadinho para os direitos humanos! Qualquer hora o puxadinho cai. Nós não sabemos se vai continuar. Não, não podemos mais nos tornar invisíveis. A nossa preocupação como movimento e como população de rua é esta: a população de rua vota! É bom dizer aqui no Senado para os Srs. Deputados, para os Srs. Senadores, Srs. Prefeitos, Srs. Governadores. Ela vota! O que é tirado dela são os documentos quando ela está em situação de rua. Roubam dela, como foi dito aqui pelo Alderon. Mobilizam guardas municipais para tirar o documento, numa ação higienista, fascista, e aí as pessoas não conseguem mais votar porque não têm o título de eleitor, porque não estão com os documentos. Mas ela é uma cidadã, ele é um cidadão, nós somos isso. Então, falar de população de rua sem ela é horrível! Aqui eu quero parabenizar o que está acontecendo. Nós estamos com duas salas lotadas. E temos que chamar mais audiência para esses temas, para sensibilizar para esses temas. Nós não somos bichos, nós não somos vagabundos. É o sistema que joga a gente nesse sentido. Quero dizer do projeto de futebol começado pela Ocas, em São Paulo, de rua, e depois virou Callejero. Em São Paulo, nós jogamos, várias vezes, futebol com a Guarda Municipal, para sensibilizar a Guarda Municipal a não agredir a população de rua. Em Belo Horizonte há outras ações. Neste Brasil, temos outras ações também acontecendo. Hoje, o Movimento Nacional da População de Rua está em quase 15 Estados deste País. Nós estamos no DF, em Alagoas, ainda não estamos no Piauí, em Sergipe, mas em quase todos os Estados do Nordeste, quase em todos os Estados do Sul, em todos os Estados do Sudeste, em dois Estados do Centro-Oeste. No Norte, ainda estamos chegando, porque há muita dificuldade no Norte. Então, o movimento vem fazendo um trabalho de sensibilização com os parceiros, com os apoiadores, para dizer da importância da melhoria do serviço para essa população. Que ele construa, que faça junto. O Alderon falou dos equipamentos. Nós não estamos falando dos equipamentos da Igreja, ouviu, Padre? Nós estamos falando dos equipamentos patrocinados pelo Poder Público, pelo recurso público, o que ainda é uma vergonha neste País. Ainda há muquiranas, bichos, a comida ainda é uma lavagem! Eles pegam o resto e dão para a população de rua comer. Nós não estamos falando da Casa Santo André. Nós estamos falando de outras instituições. Precisamos entrar com ações no Ministério Público e não podemos mais aceitar isso. Então, esse projeto de lei vem para dizer: cumpra-se, faça-se, recensie-se a população de rua. Nós estamos brigando, Senadora, para o IBGE contar a população de rua, mas como não temos domicílio, o IBGE não quer recensear essa população. |
| R | Fica uma briga entre Governo Federal e IBGE. Repassam-se recursos, e não se cumprem. Foi feita uma amostra no Rio de Janeiro para sensibilizar o IBGE. O MDS fez em 2008, nas 27 capitais, uma contagem censitária que deu quase 50 mil pessoas. E isso é importante para trazer a responsabilidade. Belo Horizonte faz contagem, São Paulo faz contagem, outros Estados fazem contagem. O que nós queremos não é contagem para expulsar, mas saber quantas pessoas estão em situação de rua e o que precisa melhorar. É essa a nossa importância aqui. Eu caí na rua com 11 anos de idade. Hoje eu tenho 40. E quantos companheiros têm 50, 60? E não é que ele não queira mais sair da rua. É a mesma coisa - quero dizer aqui, para encerrar, Senadora - de quando você vai mudar... (Soa a campainha.) O SR. ANDERSON LOPES MIRANDA - ...da sua casa para outra casa. Você não tem vínculo com o padeiro, com o jornaleiro? É a rua! Depois de 50 anos, se você tirar um cara da rua, como é que ele fica? Primeiro você precisa conquistar, ofertar, trazer para ele. Não é tirá-lo, não é expulsá-lo, não é chamar a Polícia, como aconteceu aqui em Brasília, nas ocupações. Que vergonha isso! Quantas pessoas estão morando na rua, em Brasília e em outros lugares? Vai lá a Polícia, tira e não oferta nada? Sai do sistema prisional. Vai para onde? Para a rua. Tudo é a rua. E nós não queremos ficar na rua. É mentira de quem diz que quer ficar na rua. A gente quer dignidade, oportunidade, endereço, chave, trabalho. Se não tiver carteira registrada, que as economias solidárias possam nos garantir. Esse projeto de lei traz a responsabilidade do Poder Público. Acabei de deixar o Conselho Nacional de Assistência Social. Fui Conselheiro durante quatro anos. Aprovamos, eu e o Samuel, várias resoluções no CNAS para a população em situação de rua. Estamos discutindo agora, tanto o CNAS quanto o Conanda, crianças e adolescentes em situação de rua. E se vê ainda um passo para a frente e três passos para trás. Isso não avança! Não avança! Governo retrógrado! Discussões retrógradas. Então quero dizer que não é de hoje para amanhã, mas pedimos, Senadora, que convoque mais uma audiência pública, que prepare isso para escutar, ouvir. Convoque mais uma para construirmos juntos. Para encerrar, o que o Alderon falou é fundamental. O Decreto nº 7.053, como o Carlos acabou de dizer, não foi construído pelo governo federal, mas pela sociedade civil. E foi entregue ao governo federal. Temos uma política, dentro do Ministério do Desenvolvimento Social, guardada, que nós construímos em 2009. O decreto está acontecendo, mas a política, ainda não. Está lá um calhamaço de documentos que nós construímos juntos, ouvindo o País. Então, queremos de novo essa escuta, que a Câmara dos Deputados e o Senado chamem para ouvir o País, que abram uma consulta pública de escuta para um projeto de lei para a população de rua. E que o Ciamp Rua apresente-o ao Senado para a aprovação e à Câmara Federal, mas uma escuta pública de novo, para melhorar essa política para a população em situação de rua. Obrigado, Senadora Regina. Obrigado ao Senador Paim. Muito obrigado. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Obrigada, Anderson. Nós temos ainda outra Mesa, e eu quero dar voz a alguém da plateia. Então peço que, na próxima Mesa, se tente falar em dez minutos, porque não pode funcionar a Comissão se abrir o plenário. |
| R | Por mim, eu ficaria aqui o dia todo, mas é uma regra. Nós temos que obedecer. Não dá para quebrar todas elas. Começamos a quebrar algumas, mas devagar. Quando abre o plenário, nós temos que encerrar as comissões. Então eu queria que os próximos a falarem tentassem fazê-lo em dez minutos. Antes de começar a próxima Mesa, vamos passar um vídeo da Casa Santo André. Veja se pode reduzir um pouco, colocar as principais partes, para ganharmos tempo. (Procede-se à exibição de vídeo.) |
| R | (Procede-se à exibição de vídeo.) |
| R | (Procede-se à exibição de vídeo.) |
| R | A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Só para esclarecer, a Casa Santo André faria parte da Mesa, mas seus representantes optaram por apresentar o vídeo, e acho que falou muito mais até do que o que eles poderiam dizer aqui. Muito obrigada. Vamos agora compor a segunda Mesa. Vocês sentam por aqui. A primeira Mesa já vai desocupando as cadeiras para ceder o lugar à segunda Mesa. Qualquer coisa, eu coloco a cadeira na lateral; e eu ficarei aqui. Passo, então, a chamar os nomes da segundo Mesa, pedindo-lhes que tentem falar em dez minutos a fim de que todos possam falar e que não se interrompa quando o plenário abrir: Samuel Rodrigues, Coordenador do Movimento Nacional para População em Situação de Rua, do Estado de Minas Gerais. Está aqui; Luana Ferreira Lima, Advogada, com atuação na promoção da defesa e dos direitos da população em situação de rua; Marco Antônio da Silva Souza, representante da Coordenação do Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua e Conselheiro do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente. Só para informar, fui voluntária no Movimento de Meninas e Meninos de Rua durante um tempo, nos anos 90; E Rogério Barba, que é representante da revista Traços. Antes de iniciarmos, peço que coloquem a marca de dez minutos, com uma tolerância de mais um minuto. As campainhas do Senado são assim mesmo, estridentes, e nos dão um susto. Nós nunca conseguimos mudá-las. Ela avisa que falta um minuto. Vamos ouvir, então, o Samuel, do Movimento da População em Situação de Rua, do Estado de Minas Gerais. Samuel. O SR. SAMUEL RODRIGUES - Só um minuto, porque o meu movimento está me pedindo que eu vista a camisa aqui. (Palmas.) O SR. SAMUEL RODRIGUES (Fora do microfone.) - Não tem uma vermelhinha, não? A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Pessoal do apoio, marque os dez minutos, por favor. O SR. SAMUEL RODRIGUES - Tem que ser esta azul mesmo? Mas vamos lá. Bom dia a todos e a todas! Vou tentar usar bem os meus dez minutos, dispensando as formalidades. Cumprimento muito carinhosamente a Senadora Regina Sousa; cumprimento os meus companheiros de Mesa, aqui, só monstros consagrados na discussão da política social para a população que vive em situação de rua. |
| R | Ouvi atentamente a primeira Mesa, ouvi os companheiros que por aqui passaram falarem bastante do fator político, das demandas. O Carlos traçou um pouco o histórico da construção dessa política. Está virando mestre no assunto. Parabéns! Buscou a recuperação dessa construção feita. O Anderson e o Alderon retrataram muito bem nas suas colocações o início dos estudos, as ações envolvidas no Estado de São Paulo e em outros locais. Eu queria sair desse cenário, para falar um pouco do sujeito da rua, da pessoa em situação de rua, porque acho que essa composição agora está bem farta, para entrarmos nesse hemisfério político, nas demandas apresentadas. A nossa primeira fala nesta segunda Mesa foi representada no vídeo da Casa Santo André, que, talvez, mostre bem a realidade do descontrole ou da diferença que a gente vai percebendo entre uma política pública estatal e uma política pública privada. Pensar na Casa Santo André é pensar numa política pública privada. O que a gente consegue identificar nesse vídeo? Fico muito tranquilo para falar da Casa Santo André, pois conheço a Casa Santo André antes de ela abrir as portas, quando havia uma árvore lá no meio. Tenho um carinho muito grande pelo Prof. Ribamar, independentemente do trabalho que ele faz com a população de rua. A gente percebe que a Casa Santo André apresenta na fala das pessoas a questão da saúde, a questão do encaminhamento para o trabalho, mas a gente percebe, Senadora, o Estado ainda muito fatiado. É um Estado que ainda trata muito por caixinha: assistência é aqui, saúde é acolá. Não há recurso para a população de rua. E sobre habitação não se conversa, porque casa, neste País, é tratada como mercadoria e não como política, como deveria ser tratada. Mas, voltando, para tentar focar no que eu queria dizer para vocês, falo um pouco sobre quem está em situação de rua, sobre a evolução desse indivíduo. A Senadora abriu a reunião falando das variantes com que a gente chamou e chama esse público, como andarilhos, trincheiros, peregrinos, maloqueiros e como tantos outros que a gente conhece por aí. Mas, neste momento, acho fundamental falar desse sujeito, porque esse sujeito está na ponta do desmonte. Quando você fala do desmonte hoje, quem está na ponta não só é a população de rua. Estou numa audiência para falar sobre a população de rua. Mas também esse público mais pobre, esse público vulnerável e fragilizado é que está na ponta do desmonte. Então, quando você fecha um Centro POP, perde quem está na rua; quando você fecha um programa de qualificação profissional, perde quem está na rua; quando você fecha uma cozinha comunitária, perde quem está na rua; quando você fecha um processo educativo, perde quem está na rua. Entende pouco de política a população que está na rua. O sujeito que está na rua entende muito pouco de política. Muitos não sabiam nem quem era Michel Temer. Isso se dá por causa da busca do sujeito, no seu dia a dia, pelo seu sustento. Quem está na rua está procurando viver, sobreviver mais um dia, comer, vestir-se, relacionar-se. Então, esse sujeito, esse indivíduo que está lá e que já foi taxado... Há pouco tempo, fizeram uma foto de um dependente químico, de um dependente de crack, nas campanhas de enfrentamento ao crack. |
| R | Fizeram uma foto de um sujeito que parecia uma foto de um filme de zumbi dos anos 60, para retratar esse sujeito no cenário do crack. Então, esse sujeito que está exposto a tudo isso e que está na rua perguntando-se "e, agora, o que é que faço?" é o grande perdedor desse processo, Senadora. Não gosto da palavra vítima, mas vou ter de usá-la. Ele é a grande vítima desse processo de desmonte que a gente encontra. Vou recorrer à fala de alguém da primeira Mesa. Estou dizendo que estava bom? Não, não estou dizendo que estava bom, mas havia diálogo, tanto que há aí uma proposta de um projeto de lei. Havia uma negociação com o Governo Federal, com alguns Governos de Estados e com Governos municipais. E esse sujeito era convidado a falar. Eu me lembro da Secretaria de Direitos Humanos, por dois anos seguidos, participando do Dia Nacional de Luta da População em Situação de Rua, na cidade de Belo Horizonte. A gente conseguiu colocar lá o Governo municipal, o Governo do Estado e o Governo Federal para ouvirem a população de rua. Não foram lá para falar para a população de rua, mas para ouvir a população de rua. Então, esse flagelo que se instaurou neste momento - mas o flagelo de vida desse sujeito, que já é tão derrotado pelo sistema de mercado que aí está posto - tende a aumentar, tende a se ampliar nesta crise tão imensa. Olhar para esse caboclo hoje - gosto de chamá-lo assim -, olhar para esse cidadão e para essa cidadã que estão na rua hoje, buscar uma perspectiva política para eles para daqui a um ou dois anos - o plano, se não me falha a memória, fala em seis anos -, hoje, talvez, seja, uma tarefa fundamental nossa. Acho que este País tinha de tomar vergonha na cara, para a gente parar com medidas de austeridade que pesam nas costas de quem nada tem! Cortar no social é cortar no prato de comida, doutor. Cortar no social é tirar a coberta do sujeito. Aqui não dá para cortar! Em tempos de crise, qualquer nação deveria ampliar seus investimentos no social! Em tempos de crise, qualquer conselho de política social deveria ser reforçado e ampliado, sem negar a eles os seus direitos! Acho que a gente que vive este momento devia voltar àquela época... O Marquinho deve se lembrar do filme Quanto Vale Ou é Por Quilo?. Que realidade é esta que a gente enfrenta em que, na hora de se cortar, corta-se de nós, Marquinho, na nossa coberta, na nossa comida, na nossa esperança de sermos contemplados com uma casa? Nós ficamos tão felizes quando, entre 50 mil companheiros, dois têm o nome sorteado no Minha Casa, Minha Vida. Você não tem noção! A gente faz uma festa para o sujeito: "Que bacana, companheiro! Tu estás indo para a tua casa!" A gente fica tão feliz quando a gente passa um projeto social lá na Senaes (Secretaria Nacional de Economia Solidária). Passamos sete projetos neste País e dissemos: "Os educadores sociais desses projetos serão contratados entre os que estão em situação de rua." Foi uma festa em Curitiba, em Belo Horizonte, em São Paulo, no DF. As meninas do projeto estão aí. E, depois, a gente vê o corte, a medida de austeridade cortando isso: "Olha, gente, lamento informar para vocês que não há mais SDH, ouviu? Mas a gente vai arrumar um jeito de tocar esse negócio! Lamento informar a vocês que não há mais Senaes também. A Secretaria que discutia a inclusão de vocês na economia solidária não existe mais, não, mas a gente vai dar um jeito. Fiquem tranquilos!" É isso que a gente escuta! |
| R | É isto que a gente ouve: "Lamento informar que um dos equipamentos municipais fecham a porta." "Não estão vindo mais recursos do Governo Federal, e nós vamos fechar o Centro POP". O sujeito não tem noção do que significa o Centro POP na vida de uma morador de rua. Depois de você andar o dia ou a noite toda e parar para tomar um café ou lavar suas tralhas, naquele lugar, a pessoa não tem noção. A pessoa quando fecha um equipamento desses, ele não tem noção do que é aquilo, do que é aquilo para mim. Aquilo é minha vida, como o é minha mochila. Aí você reforça as forças policias, que é o homem que toma a minha mochila. (Soa a campainha.) O SR. SAMUEL RODRIGUES - Eu fiquei ouvindo da Casa Santo André: seria tão bom se a política pública tivesse um carro à disposição - a política pública financiada com recurso público! Ela não tem, não! Ela tem muito mal um vale-transporte, quando tem - quando tinha, não é, gente? Não tem mais nada, não. Na verdade, eu conversei com a Luana. Eu disse: "Luana, eu preciso falar um pouco do povo, eu preciso falar um pouco de nós." Nós precisamos muito falar de política, construir política, mas é preciso falar para quem nós estamos falando na construção de política; para quem nós estamos discutindo o plano, a minuta do plano que o José Ivan trouxe para nós. É claro que nós queremos mexer muito nela. É claro! Na hora que eu li, eu pensei: sobre isso, cabe uma reunião. Senadora, para finalizar, para não atrapalhar a fala dos demais e de repente a intervenção de alguém que está neste plenário, para fazer controle social disto aqui, para acompanhar esta discussão - se estivesse com um Senador da linha dos direitos humanos, já precisava; estando com Senadores que têm outra visão, com uma Senadora que tenha outra visão, talvez precise mais ainda -, precisamos assegurar recursos públicos para que a sociedade civil possa acompanhar esses processos. Não dá para, na hora, nós mobilizarmos um grupinho aqui em Brasília e vir para cá. A sociedade civil precisa continuar pleiteando isso, e estou fazendo isso. Precisamos continuar assegurando a nossa participação na formulação, na elaboração e no controle social das políticas voltadas para esse segmento. Muito obrigado. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Obrigada, Samuel. Vou passar a palavra para Luana Ferreira Lima, Advogada, com atuação na promoção e defesa dos direitos da população em situação de rua. A SRª LUANA FERREIRA LIMA - Obrigada. Bom dia a todas e a todos. Agradeço especialmente à Mesa. Cumprimento o Samuel - estávamos aqui discutindo -; a Senadora Regina Sousa; o Senador Paulo Paim, por tratar dessa temática. Numa conjuntura tão difícil, teve a coragem de trazer um tema tão complexo, que é o tema da população em situação de rua, que sofre uma omissão histórica do Estado, da sociedade também com relação à discussão desse tema. Eu digo da discussão dentro de uma outra perspectiva, porque nós falamos da discussão em termos assistencialistas, que temos há muito tempo, mas, dentro de uma perspectiva, por exemplo, do direito, do empoderamento, temos espaço há pouco tempo. Eu queria também cumprimentar, em especial, as pessoas que representam a população em situação de rua. Também quero saber se existe alguma mulher em situação de rua aqui. (Intervenção fora do microfone.) |
| R | A SRª LUANA FERREIRA LIMA - Estão na outra sala. Que bom! Nós sabemos que a população em situação de rua é composta, em sua maioria, por homens, mas temos também mulheres. E se formos analisar quem sofre maior violência na rua, no âmbito da proporcionalidade, é a mulher que está em situação de rua, vítima principalmente da violência sexual. Então, meu cumprimento especial a essas mulheres, guerreiras, que se tornam mães nas ruas, que têm seus filhos retirados nas ruas. Começo também falando um pouco sobre esse histórico. Acho que o Carlos colocou muito bem, outras pessoas, o Anderson. Esta não é uma luta recente, esta não é uma discussão nova, a questão de uma política nacional para a população em situação de rua. Em 2011, nós tivemos o Decreto nº 7.053, de 2009, que trouxe, inclusive, um centro de defesa para a população em situação de rua. Existe o Ciamp, que graças a Deus está aí. (Intervenção fora do microfone.) A SRª LUANA FERREIRA LIMA - Mas ficamos felizes porque ainda temos sobreviventes que estão discutindo essa política. Nós tivemos, Senadora, a alegria de ter um projeto, uma proposta do Senador Paulo Paim, de pegarmos essa lei e de discutir um substitutivo. Em 2014, várias pessoas começaram a discutir: pessoas do movimento; advogados populares, dos quais eu faço parte; a Pastoral Nacional do Povo da Rua; o Ministério Público; o Conselho Nacional da Ministério Público também tem discutido muito essa temática. Portanto, não é algo novo. Se há uma coisa da qual nós nos orgulhamos é que não foi algo construído de cima para baixo. Esses movimentos têm feito sua luta, têm construído o Direito na rua. Não queremos mais esse Direito que está aí, que não é efetivado. Para a população em situação de rua e para quem está na rua, nós temos feito a tentativa de trazê-los para outros espaços, para dentro do sistema de Justiça, para discutir qual é a lei, qual é a norma. Essa é uma aplicabilidade válida para quem está em situação de rua ou não? Estamos discutindo com Defensorias Públicas, com o Ministério Público, com o Conselho Nacional do Ministério Público, com Tribunais de Justiça. Por exemplo, em Minas Gerais, nós tivemos uma normativa falando da questão da prioridade dos processos para quem está em situação de rua. Nós tivemos uma conquista. Agora, efetividade é um outro passo. Nós temos a política nacional, que é um decreto, Senadora; nós temos esse substitutivo que, com certeza, como o Carlos colocou aqui, tem que passar, sim, pelo Ciamp, por essa aprovação, porque está lá. Mas já adianto que foi algo construído com o movimento, com a sociedade civil organizada e com diversas pessoas que estão, há muito tempo, trabalhando essa temática. Dentro dessa política - e vocês vão ver, dentro do substitutivo também -, nós temos a constituição do Centro Nacional de Defesa dos Direitos Humanos da População em Situação de Rua, que, na verdade, foi implementado em abril de 2011. Então, vejam bem: nós temos um centro de defesa de direitos humanos da população em situação de rua e também catadores de materiais recicláveis. A população em situação de rua está ligada fortemente com os catadores de materiais recicláveis. Aí começou-se um trabalho diferente, como foi falado aqui. Nós não tínhamos tantas pesquisas normativas, pouquíssimas, sobre a população em situação de rua; estudos também pouquíssimos. |
| R | Então, dentro do Centro, nós começamos a trabalhar eminentemente a perspectiva de direito: como essa população vai se inserir, como nós vamos colocar as discussões, as necessidades, a questão do direito dentro do sistema de Justiça. Nós começamos a fazer esse trabalho. E aí também a coleta de informações sobre a violência. É assustador o que nós conseguimos receber de informações. Recebíamos informações por meio do Disque 100 e por parcerias, por exemplo, com o Ministério Público e com a Polícia Civil de alguns locais. Vejam, nós temos um registro de quatro anos de atuação do Centro de Defesa. Infelizmente não conseguimos dar continuidade a um Centro de Defesa Nacional, com atuação nacional, depois de dezembro de 2014, mas conseguimos registrar 2.743 casos de violência contra pessoas em situação de rua, que foram registrados em 536 Municípios brasileiros. Desses casos, 957 homicídios, sabendo que vários casos são sub-notificados sobre a população em situação de rua, porque, na hora do registro, do REDS, do boletim de ocorrência, nem sempre consta que são pessoas em situação de rua. Como foi bem falado aqui pelo Anderson - e eu ia citar também o líder indígena Galdino, que morreu -, as pessoas que atearam fogo nele falaram: "Nós pensávamos que era um mendigo." Então, essa continua sendo a realidade da população em situação de rua. Continuamos perpetuando algo que aconteceu lá nos anos 90, porque os casos que nós recebíamos, gente, não eram de qualquer tipo de violência. Pessoas que realmente morriam queimadas, apedrejadas e também por armas de fogo. Nós vivenciamos e vemos uma situação que não pode continuar no Brasil. A população em situação de rua está morrendo nas ruas, vítima da violência, vítima da fome, da falta de assistência à saúde. Então, no que nós temos de conquista, não podemos retroceder; ainda que sejam tão incipientes, não podemos retroceder. Aí, cabe ao Estado - e a gente coloca aqui - o enfrentamento dessa questão social e da promoção de políticas e de cidadania. Se pegarmos o substitutivo e analisarmos quais são os objetivos, está algo assim... Nós sabemos de toda a dificuldade, mas, dentro de uma perspectiva da construção de um projeto de lei, ele coloca aqui a questão desse enfrentamento das políticas e a questão da cidadania, entre eles: assegurar à população em situação de rua o direito ao acesso à Justiça, uma mudança de perspectiva. Nós temos trabalhado, Senador... Existe uma atuação muito forte da Pastoral Nacional do Povo da Rua, juntamente com o Conselho Nacional do Ministério Público. Para vocês terem uma ideia, na época dos grandes eventos - tivemos Copa, Copa das Confederações - nós conseguimos ter procuradores e promotores de Justiça construindo instrumentos para a proteção da população. Então, isso é algo que tem avançado. Defensorias públicas que, nos seus núcleos de direitos humanos, têm acolhido a população em situação de rua... (Soa a campainha.) A SRª LUANA FERREIRA LIMA - ... e a sua temática. Isso ainda é muito pouco, quando nós falamos de tudo que está aqui na política. Isso ainda é muito pouco. |
| R | Mas nós começamos a quebrar alguns paradigmas, nós começamos a entrar num campo em que a população em situação de rua nunca foi reconhecida. Como nós estamos aqui hoje discutindo, dentro de outra perspectiva. Então, existe muito forte, no nosso País, a questão da discriminação social, que tem de ser vencida, e a questão de direitos humanos. Quando nós falamos em direitos humanos e ainda falamos de população em situação de rua, gente, acabou. As portas se fecham, as pessoas se fecham. Mas o movimento, essa luta que existe há mais de uma década não vai parar. Mesmo com esse contexto tão difícil no nosso País, de segregação de vários grupos e populações, nós não vamos desistir. Nós agradecemos por poder discutir aqui hoje, no Senado, uma política nacional para o nosso País. Com certeza, vai passar pelo Ciamp, vai passar pelos outros grupos que ajudaram na formulação. Agradeço. Obrigada. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Obrigada, Luana. Vou passar a palavra ao Marco Antônio da Silva Souza, do Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua, e conselheiro do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente. A SRª LUANA FERREIRA LIMA - Antes, Senadora, eu queria passar à senhora o nosso relatório de atividades, do Centro de Defesa, e também o nosso relatório de violações contra a população em situação de rua, que acredito possam contribuir também para a construção. (Intervenção fora do microfone.) A SRª LUANA FERREIRA LIMA - Exatamente, os dados que citei sobre os homicídios, sobre a violência institucional, que também é muito forte, estão nesse relatório do Centro de Defesa. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Marco Antônio com a palavra. O SR. MARCO ANTÔNIO DA SILVA SOUZA - Bom dia a todas e a todos, bom dia à Mesa, bom dia à Senadora Regina Sousa. Quero agradecer a oportunidade de poder trazer algumas humildes palavras aqui, do ponto de vista da nossa organização, do ponto de vista do espaço que ocupamos no Conanda. Trago um abraço fraterno dos meninos e meninas de rua, que também estão nas praças, nas feiras, embaixo dos viadutos, estão com suas famílias nas ruas, estão no trabalho infantil, estão na exploração sexual. Trago um abraço deles para este momento, porque a contradição se coloca no nosso País, onde entendemos que há dois projetos de sociedade colocados: um que quer um Estado forte, presente nas políticas, presente na economia, presente na vida das pessoas; outro que quer um Estado mínimo, ligado ao capital, aos interesses do mercado e não ao interesse do ser humano. Essa é a grande disputa na sociedade. Nós acreditamos nas políticas públicas, no Estado forte, que valoriza seu povo, sua cultura, toda a diversidade cultural, as forças sociais da nossa sociedade. Então, é com essa iniciação que nós pensamos... Quanto ao tema das crianças de rua, eu queria trazer alguns aspectos importantes e dialogar um pouco sobre a proposta da política que está no PL, que entendemos importante. O primeiro é que não podemos esquecer, nos anos 80, o papel de luta pela democracia que os meninos e as meninas de rua tiveram. |
| R | Eles estiveram nas principais caminhadas em defesa da democracia, contra aquele período que ainda era de Estado totalitário. Também não devemos esquecer a importância da luta dos meninos e meninas de rua na mobilização pela Constituição Federal, em várias partes, em todo o País. É um marco importante em 1989 na luta pelos direitos humanos de crianças e adolescentes a presença de meninos e meninas de rua aqui, no Congresso Nacional, em Brasília, entrando onde estavam os Deputados e dizendo que tinha que haver o Estatuto da Criança e do Adolescente. Por que estou dizendo? Porque os meninos e meninas de rua estiveram na agenda política nesse período, deixando, inclusive, sua agenda específica para lutar por democracia, deixando sua agenda específica para fortalecer a sociedade civil brasileira na luta por um Estado democrático de direito. Os meninos e meninas saíram da agenda política, mas não saíram das ruas e estão invisíveis. Eu acho que esse é um ponto importante na discussão de um projeto que trata de população em situação de rua. E nós entendemos, junto com os nossos parceiros, que população em situação de rua são crianças, adolescentes e adultos. Então, para nós, é extremamente importante, neste momento, poder nos fortalecer. E entendemos que um local privilegiado, um local estratégico de se fazer neste momento, em função do desmonte que começa a dar os seus sinais, é fortalecer a democracia participativa, é fortalecer os espaços de controle social. Então, não podemos esvaziar... Aliás, é o contrário: temos que fortalecer os espaços onde se sentam sociedade civil e Governo no diálogo de construção de políticas públicas, com olhar crítico. Nós estamos lá, porque nós somos escolhidos, porque nós somos eleitos pelos nossos segmentos. Então, este é um espaço que nós entendemos que nós temos que lutar por ele, ali deve ser o local em que se discute essa política, e esse local tem que ter a capacidade de fazer esse diálogo com o Parlamento, que é Casa do Povo, a Casa das Leis. Eu acho, então, que isso para nós é importante. Eu traria como contribuição, Senadoras e demais, que nós temos um GT no Conanda que está discutindo, já há dois anos, tendo feito uma escuta no Brasil inteiro, sobre a questão de um subsídio para a política para a criança e adolescente em situação de rua. Então, eu acho que aí nós temos um diálogo para fazer, porque não dá... Por exemplo, internacionalmente, nos últimos sete anos, três audiências da ONU do Alto Comissariado de Direitos Humanos trataram do tema de criança de rua, e a pergunta que fez para o Estado brasileiro era: "Como estão os meninos de rua no Brasil?" E a resposta só de Bolsa Família, ProUni, ação nas comunidades já não dá conta de resolver, porque os meninos ainda continuam nas ruas. Então, nos mostrou que tem uma dificuldade no avanço de colocar... No enfrentamento ao trabalho infantil, atendeu muitos, mas uma parcela significativa dos que não saem do trabalho infantil são os meninos que estão em situação de rua e trabalham. Somos contrários às medidas provisórias de internação compulsória. Qualquer lei que visa tirar direito dos trabalhadores e dos filhos dos trabalhadores, nós, por princípios, devemos combater, porque, se a lei é injusta, nós não devemos defendê-la, devemos combatê-la. Eu pediria, pela importância do Conanda, que ele pudesse participar neste momento, através do seu GT, e pudesse trazer todo esse subsídio que foi construído que trata da população de crianças e adolescentes em situação de rua. |
| R | Nós entendemos que estamos na mesma fita. Quando a polícia chega - se é guarda ou se é polícia - e estamos na rua, a borrachada é igual para todo mundo. Quando nós estamos com as crianças ou os meninos vão chegar ao albergue, é muito difícil quando ele tem um parceiro da rua e um tem que ir para um albergue e um tem que ir para outro. É muito difícil quando chega a mãe com a criança que está na rua também e, muitas vezes, a mãe tem que ir para um albergue, o marido para outro e a criança para outro. Aí o bagulho fica mais louco, porque quando vai tirar o moleque aí falam: "Agora você tem que ir para a Justiça." O cara só é conhecido lamentavelmente... Vimos o caso das duas crianças de São Paulo em que um deles foi assassinado e está sendo acompanhado. Quero trazer aqui a nossa saudação ao Condepe. Nós também somos conselheiros no Conselho Estadual e isso está sendo acompanhado. Cada vez mais, a reviravolta vai dizendo que não é bem aquilo que as primeiras imagens apontaram. Lógico que está em investigação ainda, mas o que há por trás disso? Esses meninos são filhos de encarcerados, mano. Quem está discutindo o impacto da política pública de encarceramento e de guerra a drogas que tem como efeito crianças nas ruas? Nós não estamos discutindo isso. É pensado pela macro, mas o impacto na vida dessas crianças... Aí foram ver e o pai dele está lá no sistema e a mãe tinha saído do sistema. Esse menino foi para dentro de um acolhimento institucional, e quem é dessas caminhadas sabe que ele foi e, quando saiu, arrastou mais um moleque, que é o outro menino que estava junto com ele. Nós queremos fazer esse enfrentamento. Achamos que temos que dialogar, fortalecer. Estamos na mesma trincheira há muitos anos. Nós entendemos que essa política deve contemplar as crianças e os adolescentes em situação de rua. Por exemplo, o maior dado que a ONU perguntou para o País, para o Brasil, foi quantos são os meninos de rua no Brasil. E a maior resposta do Estado brasileiro: ele não tem dados. Nós temos dados hoje, por exemplo, dos adultos de rua, mas das crianças de rua nós não temos. Ainda foi feito um levantamento, mas das crianças de rua nós não temos. Então, isso mostra a invisibilidade que está dada para esse segmento. Cumprindo o tempo, nós achamos que estamos tratando de populações invisíveis, visíveis diante do olhar da inclusão nas políticas públicas, de sair da marginalidade do sistema, mas, para algumas políticas públicas, são extremamente eficientes. Então, nós percebemos, por exemplo, ação de higienização, internação compulsória, alguns com laudos médicos, mas extremamente frágeis. Quando nós vemos por trás o que está colocado, é a limpeza e a higienização das ruas. E nisso não se inclui só crianças, isso inclui toda a população de rua. De madrugada, o pessoal dormindo nas praças, dormindo nos mocós... (Soa a campainha.) O SR. MARCO ANTÔNIO DA SILVA SOUZA - ... as pessoas chegam com carro-pipa e, no desbaratino de que estão limpando a praça, ficam metendo água na gente, sujando a roupa do pessoal, molhando todo mundo, colocando para correr. Então, muitas vezes, o que sobra para nós é a violência do Estado, é a violência da sociedade. E aí nós temos que ficar quietos. Quando você está no quadradinho, tudo bem. Quando você começa a se manifestar e querer sair de forma organizada para dizer dos seus direitos, você começa a criar problemas. Então, é isso. Obrigado pela oportunidade. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Obrigada, Marco Antônio. Agora o Rogério Barba - chamei Borba naquela hora? Acho que eu chamei foi Borba naquela hora -, representante da revista Traços, por dez minutos. O SR. ROGÉRIO BARBA - Bom dia a todos. Bom dia, Senadora, Samuel. Está ligado aqui? Alô. |
| R | Bom dia a todos que estão aqui presentes. Eu queria agradecer a oportunidade de mostrar o projeto da revista Traços, feita aqui em Brasília com os moradores de rua. Queria agradecer a presença do Samuel, um guerreiro, que admiro muito, está sempre aí na luta; Senador, Senadora, muito obrigado. Antes de passar um filme, eu queria agradecer a algumas pessoas: Drª Aline, da OAB, que tem nos apoiado muito nesse trabalho, e à Danielle, do Pop da Rua, que é uma parceira da revista Traços. Através da parceria do POP Rua, a revista Traços já chegou a Taguatinga e já é uma realidade lá. Já estamos trabalhando com 20 moradores de rua. Há uma semana o meu irmão Barba estava vendendo as revistas e já saiu das ruas. Vamos ver um pequeno filme e já, já vamos falar do nosso trabalho. (Procede-se à exibição de vídeo.) (Palmas.) O SR. ROGÉRIO BARBA - Esse é o projeto da revista Traços, aqui em Brasília. Eu morei na rua durante 20 anos. Sou de São Paulo. Fui abandonado assim que minha mãe me teve e vim parar em Brasília. Não conheço parente nenhum. Fui morar na rua e conheci um projeto chamado Cristolândia, onde me tratei, e através de lá eu conheci a revista Traços. Na realidade, são 50 moradores de rua vendendo essa revista, mas 120 pessoas já passaram pela revista. Há um cadastro em que acompanhamos. Esse trabalho é interessante. |
| R | Eu tenho o costume de falar para as pessoas que nós vimos a briga que houve aí, Senadora, para acabar com o Ministério da Cultura. Isso é cultura. Eu tenho falado para todos que cultura, aqui em Brasília, tem sido diferente, uma cultura que dá dignidade às pessoas, respeito ao cidadão, tira as pessoas da rua. É um trabalho, hoje, com 30 porta-vozes. Nós não chamamos mais moradores de rua, mas, sim, de porta-vozes da cultura. Trinta deles já saíram da rua através do trabalho da revista. Conseguimos tirar essas pessoas da rua. Hoje eu tenho a minha casa. Não é mil maravilhas não. Nós pagamos o nosso aluguel. Não é assim o projeto ideal. O certo é cada um... Nós estamos brigando agora pelas moradias, mas é mais um projeto que vem para somar com a população de rua. Fizemos uma parceria com a Danielle, com o pessoal do Pop de Rua em Taguatinga. Ali o trabalho começou durante uma semana, um senhor já saiu das ruas através da venda das revistas, falando sobre a cultura de Brasília. Vemos que é um projeto que vem para crescer junto com a cultura. O que temos visto aí nas ruas é uma coisa... Para a gente que morou na rua, eu que comi do lixo, que bebi álcool do posto, convivo com eles na rua, hoje eu tenho uma liderança com eles porque eu saí do caminho. Então, eles me veem com outros olhos. O que me entristece hoje é ver a situação de rua, é saber que aqui em Brasília nós temos uma polícia que vem espancando os moradores de rua. Eu tenho exemplos. No Setor Comercial Sul, eu não concordo com isso. O nosso Governador fala que está revitalizando o Setor Comercial Sul. Legal! Eu acho bonita essa revitalização. Só que, por trás disso, as polícias espancam os moradores de rua para que eles saiam daquele lugar. Isso a imprensa não mostra, isso a imprensa não põe na mídia. E eles trazem para nós, e quando a gente quer expor essas coisas, fica muito difícil porque eles sabem o perigo que eles correm. Eles sabem o que eles passam na pele se falarem alguma coisa. Quer dizer, é uma política que a Traços está tentando trabalhar. Não é fácil lidar com essa política de espancamento de morador de rua. A polícia não quer saber. De madrugada, ninguém vê. Quantas vezes eu não fui espancado? Hoje eu não tenho medo porque hoje eu não sou um morador de rua. Hoje, graças a Deus, eu tenho uma voz, eu tenho uma liderança sobre eles. Eu não tenho medo do que pode acontecer comigo, porque se acontecer alguma coisa comigo, hoje, amanhã ou depois, é para o bem deles mesmo, entendeu? Mas é uma coisa pelo que a gente vem lutando. Eu não concordo a gente vir aí... Eu estava brigando, lutando com a mídia, que coloca na televisão que morador de rua estava invadindo um prédio. Isso é mentira, gente! Morador de rua não faz isso. Onde é que morador de rua enfrenta a polícia? Quer dizer, eram movimentos e movimentos usando moradores de rua, uns coitados que estavam ali sendo usados por certas pessoas de certos movimentos. Quer dizer, prometendo coisas para as pessoas que não tinham nada a ver, e no final a imprensa joga em cima dos moradores de rua. Os moradores de rua não são aquela boniteza. Eu também eu acho que, com alguns projetos que a gente vem desenvolvendo através da revista Traços, a gente vem conseguindo resgatar essa dignidade. Quando a gente fala em morador de rua, quando a gente passa na rua e vê um morador de rua, a gente às vezes despreza aquela pessoa, mas não sabe que atrás daquela pessoa existe uma história. A revista Traços, hoje, vem contando essas histórias dessas pessoas, assim como contou a minha. A revista Traços nº 5 vem contando a história de uma menina que morou durante 30 anos na rua. Agora, por que ela morou na rua? Alguém sabe por que essa mulher está na rua? |
| R | A vida de Maria nas ruas começou quando ela era criança, aos quatro anos, ou pior, a vida de Maria nas ruas começou ainda dentro da casa, um ano antes de ir para a rua. "Meu pai me estuprava quando eu tinha três anos e a minha mãe preferiu ficar do lado dele." Então, existe uma história para essa pessoa ir para a rua. E para você tirar essa pessoa da rua, existe um trabalho que a Traços hoje está desenvolvendo junto com psicólogos, com assistentes sociais, quando essa pessoa sai da rua, que é tentar orientar essa pessoa. Porque é uma família que está lá, quatro filhos, hoje já saiu da rua, está na sua casa, pagando o seu aluguel. Costumo falar que a Traços não é a porta da esperança, mas a Traços tem nos ajudado, Senador e Senadora, a brigar pelos nossos direitos. Hoje, a gente tem aprendido ali dentro da Traços a discutir política. Hoje a gente já conseguiu se reunir e conseguiu 30 auxílios aluguel do Governo. Por quê? Por causa das nossas lutas. Nós nos organizamos. Nós estamos, com a sociedade, brigando por aquilo que é direito nosso. Então a revista Traços vem, através da cultura... Quando a gente fala em fechar um Ministério da Cultura, a gente fala em acabar com certos tipos de projetos que existem. As pessoas não veem isso, a pessoas só veem o outro lado. As pessoas deveriam conhecer a cultura, porque a cultura, em Brasília, tem sido diferenciada. Nós chegamos a Taguatinga, estamos indo a Belo Horizonte, vamos chegar lá com a revista Traços. Não vamos resolver. A revista Traços não vai mudar o mundo, mas vai mudar algumas histórias tristes, que vão se transformar em histórias felizes. Eu agradeço a oportunidade. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Obrigada, Rogério. E assim finalizamos esta Mesa. Há pessoas do plenário inscritas. Abrimos cinco inscrições, por causa da hora. Havia outros convidados, não sei eles se apresentaram. Se estiverem presentes - vou dizer os nomes -, eles falam nesta rodada, de onde estão mesmo, por cinco minutos, porque vamos abrir para a plenária. Há inclusive um médico que foi até indicado pelo Pe. Lancelotti e ele não se apresentou: David, do Médicos sem Fronteira. Ele está aqui? (Pausa.) Não está presente. O Padre Júlio Lancelotti havia indicado o seu nome para vir. Leonildo José Monteiro Filho. (Pausa.) Maria Lúcia Santos Pereira da Silva, do Movimento da Bahia. (Pausa.) Josefa Laurinda da Silva, do Fórum. (Pausa.) Esses também haviam sido convidados para vir. Então, vamos passar para a intervenção da plenária. Não sei se o Senador Paim quer dizer alguma coisa, ou vai ouvir. Vamos deixar que eles falem e, no final, fechamos. Vamos começar com a Vereadora Cida, por cinco minutos. A SRª CIDA SANTIAGO - Obrigada, Senadora. Gostaria de cumprimentar o nosso Senador Paulo Paim, presente nesta Comissão; cumprimentar todas as mulheres, em nome da Senadora Regina Sousa, que é um orgulho do nosso Estado, uma mulher de luta que tem, realmente, contribuído muito com o nosso Estado, com o País, através de seus projetos e de suas defesas nesta Casa. |
| R | Agradeço também ao Pe. João Paulo. Estou aqui para acompanhá-lo nesta audiência, dizer que Teresina, hoje, tem um olhar focado na pessoa que está na situação de rua através do Pe. João Paulo. E nós acompanhamos, como Parlamentar daquele Município, com essa contribuição. Primeiro, gostaria também de lamentar que, há dez anos, o nosso Senador Paulo Paim apresenta um projeto de lei em benefício à pessoa em situação de rua. E, infelizmente, até hoje, nós temos de discutir algo que, há dez anos, já deveria ter tido um avanço muito grande nos dias de hoje. Quando o Frei Olavio Dotto falou, colocou que algumas pessoas tiveram inviabilizada a sua entrada nesta Casa por conta de não terem documentação. Se não têm documentação, não são sujeito de fato. Acredito que se esse projeto de lei, há dez anos, já tivesse sido aprovado, a situação hoje seria completamente diferente. Quero dizer que nós trabalhamos em Teresina, na nossa capital, com comunidade terapêutica. A nossa comunidade terapêutica tem uma parceria muito grande com a Pastoral de Rua, porque a maioria dos nossos residentes advêm da Pastoral de Rua, é uma parceria que nós temos. E nós, Senadora, vemos uma diferença muito grande entre aqueles que adentram as comunidades terapêuticas que provêm da situação de rua. Ouvi um testemunho de um dos nossos residentes que veio da rua. Ele colocava que agradecia a acolhida na comunidade, porque, naquele dia, que estava chuvoso, quando ele estava dando o testemunho, naquele momento, ele refletia muito sobre sua vida na rua. Ele disse que, em um dia chuvoso também, procurava alguma coisa para se proteger, para se cobrir e a única coisa que ele encontrou foi um papelão todo cheio de fezes. Foi esse papelão que deu abrigo a ele. E naquele momento ele estava tendo o abrigo de uma casa terapêutica, estava tendo uma família e agradecia muito aquela acolhida. A diferença é muito grande. Nós temos também outros residentes que não provêm da rua, que têm sua mãe, têm seu pai, têm sua família e têm esse abrigo, têm um teto. Quando eles saem daquela situação, têm para onde ir, diferentemente da população de rua. Eles valorizam muito mais essa acolhida na comunidade terapêutica justamente por conta dessa fase que vivem, em que eles têm a oportunidade de dizer: "Agora eu tenho uma família, agora eu tenho com quem contar." Então, fica muito mais difícil retornar para a rua, justamente porque encontraram ali uma acolhida que nunca mais haviam tido a oportunidade de ter. Então, eu gostaria de deixar aqui o meu abraço, de parabenizar a Senadora Regina Sousa por esta proposição e de dizer que nós estaremos levando também essa audiência pública para a Câmara Municipal de Teresina. E V. Exª já está convidada para fazer parte. Obrigada. (Palmas.) |
| R | A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Obrigada, Cida. (Palmas.) Vamos ouvir a Mairla Feitosa. Cadê Mairla? (Intervenção fora do microfone.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Vou passar para outro, quando ela voltar... Iara dos Anjos. (Intervenção fora do microfone.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Passa? Então, vamos ouvir o Júnior Lopes. O SR. RAFAEL MACHADO (Fora do microfone.) - A senhora bota o meu nome aí. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Tínhamos aberto para cinco, a assessoria andou, mas como alguém foi embora, vou botar o senhor. O Rafael, não é? O SR. JÚNIOR LOPES - Bom dia para todos da Mesa, quero agradecer, esta audiência pública é muito representativa para a gente que é da rua, para a gente que teve essa trajetória. Morei vários anos na rua, seis anos da minha vida, passei na rua e, hoje, posso ver que a melhoria foi, vamos dizer, significativa de um tempo, mas, aí, de repente, a gente começa a ver a estagnação da política, o seu cenário, tudo o que está acontecendo, e vemos que os projetos estão sendo embarreirados, alguns estão até acabando, e venho trazer aqui a necessidade do morador de rua. Vemos aí, tenho trabalhado na ponta, através de um projeto chamado Pop de Rua, que traz renda para as pessoas em situação de rua, estamos juntos aí com a Traços também, fazendo esse projeto aí, e a gente tem que valorizar esses projetos que, realmente, fazem não como já é de costume, aquele enxugar de gelo, porque não adianta, a pessoa sai da rua, fica um tempo naquela casa, depois, volta para a rua de novo, é o que mais vemos na rua. Então, a gente deve colocar em pauta, e eu queria pedir até para a Senadora, para o Senador, para fazer mais audiências públicas como esta, para que o povo venha realmente falar, a pessoa em situação de rua venha realmente ter voz. E creio que a necessidade que mais vemos ali, eu, que estou na ponta ali fazendo um trabalho, é de documentação, as pessoas não têm documentação. As pessoas passam para o projeto, entra projeto, sai projeto, e as pessoas ainda não têm uma documentação, a gente não tem como falar que é um cidadão, como foi falado aqui, não é contado pelo IBGE, não é contado por nada, somente é um número, às vezes, uma ficha, alguma coisa assim, para o Governo. E o que vemos aqui é como o Barba, a borracha canta na madrugada para todo mundo, porque, quando a polícia chega, eles não querem saber, é vagabundo todo mundo, todo mundo é pilantra e, realmente, é o que acontece, nas madrugadas de Brasília, nas madrugadas da rodoviária, de Taguatinga, ali, no campão, então, é o que acontece, a realidade da população de rua é essa, e eles não conhecem a política, eles não conhecem a política. Creio que, através de alguns projetos que realmente tenham compromisso com a pessoa em situação de rua, esses projetos abrem a mente da pessoa, como abriu a minha, como abriu a de vários que estão aí, lutando. Faço parte de um movimento aqui, do DF, e creio que é através do diálogo, da conversa e realmente do que estamos fazendo aqui, hoje. Acho que é um pontapé inicial, e creio que já está tudo preparado, temos um PL. Então, vamos colocar em prática aí porque sei que, se colocarmos esse projeto de lei para a frente, tudo vai dar certo. Agradeço a oportunidade. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Obrigada, Júnior. (Palmas.) |
| R | Eu queria convidar o Senador Paim para presidir por um momento, porque a TV quer fechar uma matéria sobre esse assunto e está me chamando. Enquanto isso, o senhor preside a reunião. A Mairla voltou? (Pausa.) A Mairla não voltou. (Intervenção fora do microfone.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Como o Rafael está aqui, vai ser o Rafael agora, Senador. O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Deixe-o tirar uma foto conosco. Faço questão de tirar a foto. Pegue toda a Mesa. Quem fala agora? A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Rafael. O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Rafael Machado, com a palavra, por cinco minutos. O SR. RAFAEL MACHADO - Bom dia a todos. Eu também quero cumprimentar a Mesa na pessoa do Senador Paulo Paim e falar um pouco sobre o meu Estado, Alagoas. O Estado de Alagoas era o Estado onde mais se matava a população em situação de rua. Há pouco tempo, há oito meses, nós soubemos do caso da adolescente Rubiana, que vivia junto com sua mãe em situação de rua, dormindo na rua. Um agressor chegou, agrediu a mãe, apagou a mãe, estuprou menina e a matou. São casos que não podem ficar apagados. A gente precisa trazer esses casos para as realidades de hoje. Eu vejo que, no meu Estado, a política pública só acontece na parte da assistência e da saúde, e a nossa população em situação de rua não é um público para esses dois serviços apenas. Nós temos uma casa de passagem, um albergue, que acolhe 50 moradores. E o restante que fica no centro de Maceió? Eu estive nove anos entre a população em situação de rua, vivendo na rua. Cada cicatriz que eu tenho no meu corpo de tiro e facada é uma história que eu tenho de rua. Hoje, eu trabalho com crianças na própria Secretaria de Assistência Social no Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos. Sou facilitador de arte e cultura porque a própria política me propôs esse objetivo. Também quero trazer para esta audiência a importância de uma fiscalização nessas comunidades terapêuticas do meu Estado. As comunidades acolhem os usuários por seis meses. E depois? Eles voltam para onde? Para a rua. Às vezes, muitos padrinhos dessas comunidades, donos dessas comunidades se dão bem nas costas dos moradores de rua, dos usuários de drogas. Se você for olhar, muitos deles têm fazenda, têm carro, têm isso. E quem vai entrando vai saindo e voltando para a rua. Eu mesmo passei por nove internações - nove internações - nas comunidades, e duas involuntárias. Chegou uma hora em que eu disse: "Não. Vou agarrar essa oportunidade, vou agarrar esse serviço que a assistência está me dando, lutando por mim, pelo meu potencial." Hoje, tenho quatro participações nacionais representando o meu Estado e também faço parte da Coordenação do Movimento de População em Situação de Rua. Quero dizer que percebo que deve haver mais serviço público para atender essa população, porque há recursos para isso. Mas o que estão fazendo com esses recursos? Estão indo para o meu bolso? Não estão. Então, a gente precisa provocar mais reuniões, mais audiências para que eles venham dizer o que realmente se vai fazer com o povo, porque nós moradores de rua não somos vagabundos. Nós somos cidadãos e merecemos respeito. Respeito é bom e eu gosto. A Secretaria de Habitação é uma secretaria, vamos dizer, que só faz política partidária, porque quem faz o arrumadinho para o Vereador ou para o Prefeito ganha a sua casa. |
| R | No meu Município, eu briguei e consegui levantar o Comitê de População em Situação de Rua na Habitação e garantir, disse ao secretário que: "Se o senhor não der neste ano as casas dos moradores de rua de Maceió eu vou invadir a secretaria com eles e vou ficar hospedado lá, porque isso é militância." A gente precisa ser reconhecido como cidadão e não como vagabundo, não como zé-ninguém. A gente precisa ter visibilidade dentro do serviço. Então, eu fiquei muito constrangido com essa situação da Rubiana agora há pouco. Um adolescente que mal viveu a vida foi estuprada, foi morta e ficou por isso mesmo! Pergunto: Cadê o Poder Público? Onde está neste momento? Quer dizer que justiça só existe para rico, para pobre não? Então, estou aqui expressando um pouco. O Bolsa Família tem nos ajudado muito. (Soa a campainha.) O SR. RAFAEL MACHADO - Eu recebi o Bolsa. Hoje, como eu trabalho na área de assistência, eu abri mão do benefício para que outra pessoa que precise mais do que eu venha a se beneficiar, mas dos meus colegas de população em situação de rua, muitos saíram da situação de rua com o Programa Bolsa Família, com o CadÚnico. Quero dizer e também reforçar a palavra do nosso companheiro Anderson, que nós não só somos problema da saúde nem da assistência, porque, mesmo com a atuação dessas duas políticas, elas são muito precárias para o povo, são insuficientes, Senadora Regina. Então, precisamos de mais atenção, de mais reconhecimento. Também quero falar, em nome do movimento, que a gente não está besta mais não, que estamos muito espertos. Do mesmo jeito que os políticos têm suas estratégias, a gente tem a nossa e a gente vai à luta e com um empurrãozinho o Temer vai cair. (Palmas.) Porque o direito é nosso, direito é nosso e a gente vai lutar sempre, porque a gente tem que lutar sempre e vencer com as conquistas e desistir nunca mais. Eu visitei a ocupação do Noroeste e fiquei muito revoltado com o que fizeram com o pessoal do Noroeste. A Polícia chegou lá derrubando aquela ocupação e o povo reagiu. Quero dizer ao pessoal do Noroeste que estão de parabéns. Continuem e só saiam de lá com as suas casas, porque não vamos mais permitir política partidária dentro da política pública. Política pública é política pública; política partidária é política partidária. Eu sou política pública. Nem sou da direita nem sou da esquerda, sou política. Então, estou aqui por política pública. Também, futuramente, pretendo estar na Câmara dos Vereadores como vereador do meu Município para defender propostas que venham para população em situação de rua também. Muito obrigado a todos. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Obrigada, Rafael. A Mairla voltou? Fala Mairla. Você é a última para podermos fechar. A SRª MAIRLA FEITOSA (Fora do microfone.) - Posso falar daqui mesmo? A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Pode. Pode ligar o microfone daí. A SRª MAIRLA FEITOSA - Bom-dia, companheiros e companheiras. Sou Mairla Feitosa, sou do Movimento População de Rua do Distrito Federal, sou liderança de ocupação do Noroeste, de que ele acabou de falar agora. Não vou falar da minha vida, não, porque a minha vida já está muito falada. Vou falar do que estamos vivendo agora, neste momento, no Distrito Federal, sobre as violações, as violências que estão acontecendo com as famílias, as derrubadas que estão acontecendo neste momento no Distrito Federal. Ontem, na Samambaia houve uma, começaram por outras que já houve antes. Já foi discutido sobre essas famílias e o que vão fazer com elas. Eu mesmo sou vítima dessas derrubadas que aconteceram no Noroeste, barbarizaram lá dentro e começaram derrubando tudo lá dentro e tivemos que acionar o pessoal para ver o que seria feito e estamos até agora nessa negociação para ver o que se dá na ocupação do Noroeste. Estamos em contagem regressiva lá dentro e não sei o que vai se dar lá dentro. Há 14 anos que moro na ocupação do Noroeste, criei os meus três filhos nessa situação de rua, vivendo em semáforos e tenho até neto em situação de rua hoje. Vou falar para vocês que tem horas em que fico muito revoltada, porque vejo pessoas faltando de abrigo, acolhimento e essas coisas, mas isso não é tudo que a população quer não, gente. Que abrigo? Abrigo acaba. Está entendendo? |
| R | Projetos vão e o que é que fica desses projetos? Tem que saber trabalhar com a população de rua. A população de rua não quer esmolas. A população de rua quer políticas públicas. A população de rua não quer assistencialismo. Eu vou levar... Ajuda, ajuda, eu não vou falar que não ajuda chegar com cobertores na hora do frio. Mas isso não acontece todos os dias, não. Tem que dar continuidade, tem que prosperar, tem que fluir o serviço. (Palmas.) Por quem? Eu acompanho, sim. Hoje eu sou agente social e trabalho com população em situação de rua. Nós temos seis agentes dentro do Projeto POP de Rua e é através desse projeto que eu tenho estrutura para trabalhar com a população de rua. A gente acompanha, a gente encaminha. Mas não é só dizer: "pega o papel, vá fazer a sua identidade". Não, isso não funciona. A gente acompanha até o final - a certidão de nascimento, para a moradia, para o trabalho, para o que precisar, para o que demandar. É só assim que funciona o trabalho com a população de rua. Chega de abrigos. Nós queremos políticas públicas, nós queremos habitação, nós queremos trabalho. Eu não vou me alongar muito, não, gente. É só isso. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Obrigada, Mairla. A gente encerra agora a participação do plenário. Eu passo a palavra para o Senador Paim. O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Senadora Regina Sousa, eu sempre digo que V. Exª me representa e me representa muito, muito bem. Esta é uma bela audiência pública. Eu estive lá na outra sala também e todos estavam acompanhando, sendo o sujeito da sua própria história. É disso que, infelizmente, grande parte deste País não gosta, ou seja, ver o nosso povo se mobilizado, agindo, tendo posições claras e sabendo o que quer. Durante o tempo em que lá estive, foi isso que eu vi. Eu só posso dizer que para mim, como Presidente desta Comissão, provisoriamente, embora eleito diretamente, não fui eleito pela via indireta nem vim pela porta dos fundos, porque são dois anos de mandato... Meu mandato termina no fim do ano, mas tive a alegria de conviver nesse período, quando realizamos, só para a informação de alguns aqui, em matéria de audiência pública, só no ano passado, 150 audiências públicas. E quem realizou mais audiências, além desta Comissão, realizou 50. Este ano já estamos com 70. Aqui o povo fala, seja negro, seja índio, seja cigano, seja branco, seja pobre, seja classe média, seja sem-terra, seja sem-teto, sejam mulheres, tão afastadas agora, do outro lado da rua, mas aqui todos falam. E é uma alegria enorme ver vocês hoje, moradores de rua, apontando o caminho, exigindo aprovação, como foi lembrado aqui, do projeto, aprimorado com rapidez. Eu diria, para encerrar, palmas, palmas, não para nós que somos Parlamentares, mas palmas, palmas para vocês, moradores de rua, que estão escrevendo a sua própria história. Muito obrigado a todos. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Senador Paim. Vou caminhar para o encerramento, dizendo para vocês, primeiro, que esta audiência pública para mim já valeu só pelo muito que aprendi aqui. Mas às vezes as pessoas dizem assim: "Audiência pública para quê?" A audiência pública é para sensibilizar. Vocês foram vistos pelo Brasil e vão ser vistos de novo porque ela se repete. Nós vamos acompanhar e verificar a data da repetição da audiência e avisar vocês para assistirem também, para juntarem a população para assistir. Há sempre uma repetição, à noite geralmente. Há algumas coisas para encaminhar, é claro. |
| R | O projeto de lei, por exemplo, nós já descobrimos quem é a Relatora. Nós precisamos apressar a votação. E aí a gente vai discutir com vocês, que são representantes, se é melhor aprovar como está - não sei como está lá, se ela está apresentando emendas. Porque vocês viram aqui como o processo legislativo é rápido: em 2006, e estamos aqui ainda. Quer dizer, ele lá... Se ela mexer nele, ele volta para cá. Ele tem que de novo buscar pauta, ser pautado. É claro que nós vamos estar atentos aqui também. Então, a gente vai discutir com vocês e com as lideranças para saber se é melhor deixar aprovar como está, independente de... Não mexer mais, e depois a gente faz emendas, a gente apresenta como emenda aquilo que vocês trouxerem de novidade. Vamos discutir isso. Então, o primeiro compromisso é apressar o projeto de lei, porque o decreto já não dá conta do... Queria também dar uma sugestão para vocês, porque é ano eleitoral. Que tal uma carta da população em situação de rua para os candidatos e as candidatas? (Palmas.) E não precisa ser uma carta grande, cheia de letras, porque eles não vão ler. Vocês botam lá: "Somos população em situação de rua, somos eleitores, queremos nos enxergar no seu programa de governo - ponto. A gente quer se ver no seu programa de governo". Porque o que não está no programa de governo, não vai para o Orçamento - e acabou. Então, uma cartinha simples... (Intervenção fora do microfone.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Exato. Então, é uma sugestão que eu deixo para os movimentos. Claro que há toda uma questão de mentalidade de gestor. Alguém falou aqui da delegada lá do Piauí, não foi, Anderson? Quer dizer, a gente precisa trabalhar também a mentalidade. Lá no Piauí eu era Secretária de Administração de governo, mas eu trabalhava muito com os movimentos. Nós temos um movimento chamado MP3, que trabalha exatamente com essa população excluída, chamada de gangues - aquele pessoal que briga muito entre si, que se junta em grupo e faz o combate, às vezes, até armado. Mas há esse movimento lá, que consegue juntar esse pessoal para assistir a um filme. Eles têm o Cine Periferia, que aliás está precisando de ajuda, agora que o carro está... No meu tempo, como Secretária de Administração, fui eu que comprei o carro para o movimento MP3, que é Movimento pela Paz na Periferia. Ele juntava gangues rivais, ali, assistindo a um filme. Depois o coordenador fazia um belo debate com eles. Eu ficava encantada com o que eles faziam. Há outros trabalhos lá. Eles fazem um trabalho de... Eles têm uma casa que tem movimento o dia inteiro, cursos de todo tipo. Lá temos meninos que vêm da rua e saem formados em robótica. Então, é uma coisa muito boa também o que acontece lá. Então, a intenção desta audiência era exatamente ouvir as experiências, o que acontece de bom. Porque eu tive uma grata satisfação de, na discussão da Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, apresentar um projeto de lei - que já foi aprovado nesta Casa - a partir das experiências - parece que é de Mato Grosso - sobre a reeducação do agressor das mulheres. Há experiências fantásticas acontecendo, iniciativa de entidade, de Ministério Público, em que a pessoa - o agressor - saiu da cadeia, passou pelo processo de reeducação e refez a vida, os laços afetivos com outra mulher e está há cinco anos sem nenhuma ação agressiva. Essa pessoa... Estou dando só um exemplo, mas são 400 homens agressores com quem eles trabalham lá. Há cinco anos não há nenhuma reincidência. Então, significa que é possível. E a tarefa da gente aqui é isto: mostrar que é possível. Porque às vezes as pessoas... Por exemplo, este governo que está aí não é vocacionado ao diálogo, a ouvir, a receber as organizações populares. Eles acham que sabem tudo. |
| R | "Nós vamos fazer melhor" - é isso que eles dizem. "Nós vamos fazer melhor." Por isso, não precisam de secretaria disso ou daquilo. Não; "nós vamos fazer". Porque eles não são vocacionados a esse diálogo; não têm essa paciência histórica que nós temos, de ouvir, de construir junto. Então, acho que nós estamos caminhando para um retrocesso muito grave, e temos que estar atentos para resistir, porque nossa marca é a resistência. Eu vim de um movimento social, então, aqui nesta Casa, sou caloura. Nunca fui Parlamentar. Fui secretária, fui do Executivo. Então, estou aqui também aprendendo - Paulo Paim me ensinou muito. E estou colocando o gabinete à disposição. O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Você aprendeu muito, e muito rápido. Isso é bom! A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - A intenção inicial era essa. Vocês pediram outra; quem sabe faremos, ao longo do caminho? Vamos fazendo, construindo juntos e fazendo outras audiências, outras conversas. Porque a intenção inicial era essa visibilidade que vocês tiveram agora, pela TV Senado - que, não subestimem, é bem assistida, e o programa vai ser repetido -, e sensibilizar, mostrar a cara. Foi bom trazer as pessoas que fazem parte, que estão na situação de rua para serem vistas. Porque a questão é realmente a invisibilidade. É uma população invisível. Então, é aquela história de uma música popular que diz assim: "Tenho andado tão só. Quem me olha nem me vê." Então, olhar só não basta. Você olha, mas não vê. Então, tem que olhar, mas tem que ver, tem que enxergar, tem que reparar. Há um poeta - e vou finalizar com a frase -, acho que é Fernando Pessoa, não lembro, que diz assim: "Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara." Quer dizer, reparar é um estágio bem além do olhar. Então, é disso que estamos precisando: ser reparados. Há que se reparar na população em situação de rua. Muito obrigada pela presença de vocês, e saibam que me ensinaram muito. Obrigada. (Palmas.) Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada esta reunião. (Iniciada às 9 horas e 10 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 39 minutos.) |
