Notas Taquigráficas
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| R | A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Bom dia, pessoal. Vamos começar. (Fora do microfone.) Sejam todas e todos muito bem-vindos! Havendo número regimental, declaro aberta a 48ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Educação, Cultura e Esporte da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura. A presente reunião atende aos Requerimentos nºs 67, de 2016, de autoria do Senador Romário, e 32, de 2016, do Senador Edison Lobão e outros Senadores, para a realização de audiência pública destinada a debater o cuidado integral na primeira infância: cultura, desafios jurídico-sociais e em situações de deficiências. Dando início à audiência pública, solicito ao Secretário da Comissão que acompanhe os nossos ilustres convidados para tomarem assento à mesa. (Pausa.) |
| R | A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Bom, temos aqui, na nossa Mesa, o querido Prof. Vital Didonet, que vai discorrer sobre o tema "Cultura do cuidado Integral". Temos a Drª Ivone Ferreira Caetano - seja muito bem-vinda - desembargadora, que vai falar sobre o tema "Denegação dos direitos do acesso ao cuidado integral da criança - consequências jurídico-sociais". Temos também Drina Candilis - bem-vinda -, psicóloga, psicanalista e professora, que vai refletir sobre o tema "Uma população excluída dos sistemas de saúde e de prevenção: os pais em situação de deficiência". Temos, ainda, Dafne Herrero, doutoranda em Ciências da Saúde - seja muito bem-vinda -, com o tema "Estratégias para o desenvolvimento infantil pleno do lactente com deficiência em seus primeiros anos de vida". Bom, quero aqui, mais uma vez, saudar os demais presentes, por ocasião da 9ª Semana da Criança - cuidado integral com a criança. Antes de passar aos nossos expositores, faço algumas considerações iniciais. Primeiro, quero colocar que o tema da infância é talvez um dos que mais devem tomar o tempo de nossa reflexão, já que, todo sabemos, essa fase é essencial para a formação do ser humano em toda a sua plenitude. Quero aqui dizer para os senhores que tive a honra de relatar a primeira matéria aprovada pelo Senado Federal neste ano de 2016, que foi, inclusive, sancionada pela Presidenta Dilma em março. Refiro-me à Lei 13.257, que criou o Marco Legal da Primeira Infância. Essa nova Lei determina que os direitos das crianças nessa faixa etária sejam garantidos por políticas públicas especificamente voltadas à primeira infância, reunindo em uma mesma legislação as amplas proteções necessárias para o desenvolvimento integral das crianças nessa faixa etária. Estou certa de que o Marco Legal da Primeira Infância vai contribuir para que observemos com um novo olhar o desenvolvimento de nossos meninos e meninas de até seis anos de idade. Entre os inúmeros benefícios da lei, destaco a extensão da licença paternidade de cinco para 20 dias nas empresas que aderirem ao Programa Empresa Cidadã, um direito essencial para que o pai participe, desde o início, do desenvolvimento de seu filho. Os estudos da neurociência mostram que, quando nascemos, centenas de bilhões de neurônios já se encontram disponíveis para os processos cognitivos. Nos primeiros anos de vida, esses neurônios integram conexões conhecidas como sinapses que são responsáveis pela elevação da capacidade cognitiva por toda a vida. |
| R | A interação constante e correta com o mundo exterior é base para o pleno desenvolvimento de um cérebro sadio, também dependente da alimentação e das condições gerais de saúde. E é também na primeira infância que a criança está mais fortemente disposta aos agravos provocados por condições de vulnerabilidade social e econômica. Pesquisas demonstram que 13% dessa população encontra-se abaixo da linha da pobreza, ao passo em que a média nacional em todas as idades é de 7%. Portanto, investir no desenvolvimento da criança na primeira infância deve ser considerado prioridade. Segundo James Heckman, Prêmio Nobel de Economia, cada dólar investido na educação da primeira infância dará retorno de US$9 para a sociedade. Sobre o sistema educacional brasileiro, ele assim se manifestou, abre aspas: Colocar mais crianças na escola, como tem feito o Brasil, é bom. Melhorar a qualidade do ensino é ainda melhor. Mas essas duas iniciativas, por mais bem executadas, não chegarão a fazer muita diferença se não for tomado um cuidado extra: investir também nas crianças na primeira infância. Um programa de primeira infância de qualidade para a população carente é uma condição necessária para avançarmos em direção a uma sociedade mais educada, igualitária e, sobretudo, menos violenta. Eu quero aqui, mais uma vez, dizer que a Lei nº 13.257 criou o Marco Legal da Primeira Infância. Aqui, mais uma vez, homenageio todas as entidades e instituições que contribuíram decisivamente para a formulação desta proposta e para que também tivéssemos aqui no Congresso Nacional, à época, um ambiente político favorável à aprovação desta proposta. Permitam-me fazê-lo na pessoa do professor Vital Didonet. Através de você, Vital, mais uma vez, homenageio e, repito, toda a rede em defesa da primeira infância e instituições que tiveram um papel decisivo para que pudéssemos dar esse passo muito importante. Eu acho que o Marco Legal da Primeira Infância inova principalmente em matéria de quebrar paradigmas, romper tabus; inova quando chama a atenção para os cuidados que a criança efetivamente deve ter, inclusive quebrando paradigmas e etc. Mas concluo, chamando a atenção dos senhores para o fato de que todas essas iniciativas, essas políticas voltadas para a defesa e promoção da primeira infância, infelizmente, nesse exato momento encontram-se seriamente ameaçadas diante do contexto que estamos vivendo. Refiro-me, claramente, à Proposta de Emenda à Constituição nº 55, uma proposta que quer congelar os gastos nas áreas sociais pelos próximos 20 anos, na medida em que estabelece agora um teto para as áreas sociais. Que teto é esse? É um teto que diz que, daqui para frente, se a PEC for aprovada, os gastos sociais serão o orçamento do ano anterior corrigido apenas pela inflação do ano anterior. |
| R | Mais do que isso, essa PEC também anula por igual período a vinculação constitucional. Refiro-me ao dispositivo constitucional que a sociedade brasileira conquistou para que garantíssemos pisos mínimos para áreas essenciais, que são o eixo central da política de atenção à criança: educação e saúde. Eu costumo dizer que não foi pouca coisa termos conseguido consignar na Constituição de 1988 que a União, no mínimo, investisse 18% do seu orçamento na educação, e Estados e Municípios, 25%, assim como definiu-se o percentual mínimo da saúde. A PEC, repito, anula, rasga a Constituição quando revoga esses dois dispositivos. E não é por um ano nem dois; é por vinte anos. Os senhores sabem que, para avançarmos no direito à educação das nossas crianças, precisamos ampliar os investimentos. Tanto é que, nesses últimos doze, treze anos, apesar de o piso mínimo ser de 18%, nós conseguimos investir 23%. Nós conseguimos sair de 3,2% do PIB para 6,2%. Eu digo isso para explicar por que, por exemplo, criamos o Fundeb. Vital participou intensamente do Fundeb. O Fundeb - ouso ainda dizer aqui para os senhores e as senhoras - se constitui na política mais ousada voltada para a infância no Brasil. Por que ousada? Porque, até então, essa etapa tinha sido relegada ao abandono. Apesar de ela constar na Constituição e ser prerrogativa dos Municípios, a maioria dos Municípios não dispõe de orçamento suficiente para implementar uma política pública voltada para a primeira infância, que começasse inclusive com o acesso a creche. Essa política pública só começou a ter contornos mais nítidos a partir exatamente do Fundeb. Por quê? Porque o Fundeb, ao substituir o Fundef, corrigiu uma imensa falha do Fundef, que era um fundo voltado somente para o ensino fundamental. E a criança de zero a três anos? E a criança de quatro a cinco, da pré-escola? Então o Fundeb corrige quando estabelece uma política de financiamento que tem que olhar desde a creche até o ensino médio. Se os senhores e as senhoras prestarem atenção, antes do Fundeb não tínhamos sequer 10% das nossas crianças na creche. Eram precisamente 8,9%. Passado esse período do Fundeb - o Fundeb não completou dez anos ainda, vai completar agora em 2020 -, já saímos de 8,9% para 24% o percentual de crianças de zero a três que estão na creche. Mas ainda é muito pouco. Nós tínhamos 3,8 milhões de crianças sem acesso a creche no Brasil. O PNE coloca que até 2024 teríamos que garantir pelo menos 50% desse contingente. Veja, eu estou colocando isso porque infelizmente, repito, essas políticas voltadas para a primeira infância, tão decisivas, tão importantes, estão seriamente ameaçadas diante da PEC 55. |
| R | Não adianta aqui - vou concluir - dizer que a educação não será afetada. Não tem como, já que a PEC não só congela, como reduz drasticamente os recursos para a área da educação. Seja muito bem-vinda, Senadora Regina, professora, Senadora do Piauí. Então, veja bem, se a PEC, ao estabelecer teto para as áreas sociais - teto para as despesas financeiras não há, para pagamento de juros não existe teto, agora, para as políticas sociais, sim, inclusive no caso da primeira infância -, evidentemente serão reduzidos os recursos para a área da educação. Serão reduzidos de tal forma que as projeções que estão endo feitas pelas instituições, pelos técnicos, mostram que, nos próximos oito, dez anos, se essa regra vigorar, a regra Temer/Meirelles, o investimento mínimo na educação, percentual do PIB versus educação, deve cair para a marca de 13%. Então, meus amigos e minhas amigas, faço aqui essa reflexão, porque não podemos nos dissociar da realidade que estamos vivendo. Por isso, é preciso que lutemos para que pautas como essas, literalmente, de retirada de direitos, inclusive de direitos das nossas crianças terem uma infância com dignidade e com respeito, não prospere. Bom, passo a palavra imediatamente. Nós vamos começar por você, Prof. Vital. Podemos pactuar 15 minutos? O SR. VITAL DIDONET - Podemos. A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Pois não. Peço à Comissão que marque o tempo. Depois, eu gostaria que a Secretaria aqui da Mesa fizesse chegar até mim as entidades para que eu possa registrar-lhes a presença. Com a palavra o Prof. Vital. O SR. VITAL DIDONET - Muito obrigado, Senadora Fátima Bezerra. Saúdo V. Exª. Gostei muito das suas palavras de abertura desta audiência, porque também, aqui em nome da Rede Nacional Primeira Infância, temos expressado, manifestado a preocupação não só com a conjuntura atual de crise, mas com a perspectiva de maior dificuldade em atender os direitos das crianças. As suas palavras fecham completamente com a nossa posição, no sentido de que temos que preservar, pelo menos, a infância se queremos ter um País sadio, se queremos ter uma sociedade equilibrada, se queremos ter justiça social e equidade neste País. Há outras formas de obter recursos, de cortar despesas, que não sejam nos investimentos primários fundamentais da área social. Tanto que, ontem, o Secretário Executivo da Rede Nacional Primeira Infância mencionou, numa das mesas de que participamos, que a Rede Nacional Primeira Infância tem propostas de emenda, se o relator aceitar, de pelo menos preservar desse congelamento pelo menos investimentos da área social dirigidos à primeira infância. |
| R | E que a revisão também possa ser feita pelo menos coincidente com o período dos planos plurianuais. Saúdo também a Senadora Regina, nossa amiga lá do Piauí, os participantes dessa audiência pública aqui presentes e também os profissionais que nos acompanham pela TV Senado Brasil afora. Um bom dia a todos. A escolha desse tema para esta audiência pública e particularmente ao subtema que me compete, que é o cuidado integral da criança como cultura, tem uma razão. O Brasil avançou bastante, tem avançado nos últimos anos, sobretudo a partir da Constituinte, que culminou nessa bela Constituição brasileira de 1988. Avançou bastante na conceituação, na formulação do direito da criança como sujeito de direitos, como cidadã, pessoa integral e que deve ser olhada nessa perspectiva de um ser participante da sociedade. Avançou também nas políticas públicas. E temos, acho, um quadro de políticas bastante sensível às características da criança na primeira infância. No entanto, encontramos muitas deficiências, encontramos muitas falhas. Uma das coisas importantes que temos em mente hoje é o cuidado integral à criança. E o cuidado entendido em um sentido abrangente, não naquele sentido tradicional de proteção física, de evitar acidentes, de evitar mortes, cuidado da saúde, que a criança esteja protegida. Refiro-me ao cuidado no sentido de um olhar zeloso, de um olhar que enxerga a criança na sua inteireza de pessoa, que vive um período fundamental e decisivo da sua existência, que deve ser vivido plenamente como ser nesse momento, pleno enquanto está vivendo em cada uma das etapas e também na dinâmica da vida humana. E esse cuidado deve ser visto em uma perspectiva holística, que envolve todos os aspectos da existência da criança, na sua diversidade, nas suas individualidades e nas diversidades em relação às outras crianças e na diversidade das infâncias brasileiras. Podemos dizer assim que o Marco Legal da Primeira Infância, do qual a Senadora Fátima Bezerra foi Relatora aqui no Senado, no plenário, defensora intransigente da sua aprovação, é um avanço. E ela foi realmente fundamental e decisiva no sentido de conseguir que o projeto chegasse ao plenário, fosse aprovado, porque ele estava com dificuldade de tramitação. E esse marco legal é não só um avanço na conceituação e na legislação, mas é uma proposta de um cuidado integral à criança, o que podemos chamar de construção. Ele contribui para a construção de uma cultura do cuidado, o cuidado do ser humano. Nós somos o que somos porque fomos cuidados. O ser humano não sobrevive e não se desenvolve se não for cuidado. E o cuidado que nos trouxe até aqui, que cuidou da nossa infância é o mesmo que tece os nossos pensamentos, nossas atitudes, o nosso modo de e ser, o nosso estar e ser no mundo. Nós somos seres do cuidado. |
| R | A criança precisa, fundamentalmente, de um olhar zeloso, de um olhar atento, de um olhar que a enxergue no seu ser e no seu crescer. Se nós cuidamos, somos humanos, mas se descuidamos, abandonamos, omitimos, agredimos, destruímos, somos desumanos. O Marco Legal da Primeira Infância é como uma construção da cultura do cuidado que vai além de algumas políticas, de algumas ações, de certos atos de proteção da criança. Se dizemos que a cultura é o modo de ser, o modo de estar no mundo, de fazer, de pensar, de produzir, de criar, se isso é cultura, a cultura do cuidado vai muito além de proteção física; é uma corresponsabilidade, é um estar com a criança, é um crescer junto com a criança, cada um na sua dimensão, cada um na sua respectiva idade. Por isso é que ele tem de ser integral. O Marco Legal trabalha nessa direção. Se examinarem com esse filtro de buscar onde o Marco Legal está atento ao cuidado nesse conceito de zelo pelo bem dessa criança, vão perceber que da primeira à última palavra o Marco Legal existe uma sensibilidade para as infâncias brasileiras e para cada uma das crianças, como sujeito, como pessoa competente, capaz, mas com necessidade da mão solidária do adulto. Relacionei uma série - e é claro que não vamos falar aqui - de aspectos do quanto, para exemplificar, estão presentes no Marco Legal todos os aspectos da vida infantil. Vou mencionar rapidamente. O cuidado na gestação. Vários itens do projeto já começam falando da atenção à gestante, para que ela tenha uma gestação tranquila, segura, cuidadosa, protegida por meio das consultas pré-natais, de assistência hospitalar. O cuidado no parto, o direito de ela ter um acompanhante de sua escolha, no parto, no pós-parto, na UTI neonatal, também, o direito do bebê de ter a presença de alguém da sua ligação afetiva na UTI neonatal, nas consultas pediátricas, incluindo, a participação do pai ou do companheiro nas consultas pré-natais, no parto e nas consultas médicas, pediátricas, posteriormente. A Lei menciona as orientações para a gestante, durante o pré-natal, em vários aspectos: atenção odontológica já como orientação para a gestante e, depois, para o bebê, com possibilidade de órtese, de prótese a de atendimento odontológico no Sistema Único de Saúde. O cuidado com a formação do vínculo afetivo. Isso está presente na lei de forma bastante forte, tanto assim que, quanto à licença-paternidade, um dos argumentos a formação do vínculo com bebê. |
| R | Se Winnicott fala da díade, depois ele mostra também a tríade, que é fundamental. Então, o bebê precisa dessa relação com a mãe, com o pai ou com uma pessoa que é o cuidador masculino. O cuidado integral, o cuidado como cultura pega a pessoa inteira, inclusive o seu nome. Por que o bullying é um descuido do ser humano? Porque são que ofendem, que entristecem a pessoa ou que fazem com que ela seja ridicularizada. O cuidado com sobrenome. A lei determina o direito de colocar o sobrenome, o nome do pai no registro em qualquer tempo e de forma gratuita, porque esse é um direito da criança. A promoção da parentalidade corresponsável: preferência para o bebê, para a criança, em qualquer circunstância, ficar com a família. Evitar o máximo possível a separação, tanto por facilitação de adoção ou de retirada do pátrio poder quanto por preparação da família, ou a assistência família, para que ela esteja disposta, que ela esteja disposta e tenha condições de receber o retorno de um filho que passou um tempo numa instituição de acolhimento. A política de acolhimento familiar com família acolhedora: ontem comentamos no painel a razão, e uma participante do plenário fez um comentário muito bonito sobre a política de família acolhedora. O brincar. Hoje, tivemos uma excelente Mesa da Marilena, da Juliana, também com a participação da Cláudia Cabral sobre o brincar, sobre o significado importante, de como isso pervade o ser da criança. É a forma de ser criança, se é um brincar livre, espontâneo, não dirigido nem pedagógico e nem pressionado pela tecnologia. Então, há uma determinação no Marco Legal - e a Marilena fez referência a isto: de que o poder público, tanto o federal, quanto estadual, quanto o municipal, construa espaços lúdicos na cidade, lugares para que a criança possa interagir com seus pares, fazer interações intergeracionais, correr pular, saltar, brincar livremente com segurança. Outro item: a proteção contra a pressão consumista, contra a publicidade mercadológica que está causando tanto problema para o desenvolvimento infantil. Ainda: alimentação complementar, prevenção de acidentes, educação infantil em creches e pré-escolas, reforçando o que está no plano nacional de educação, que a Fátima muito bem mencionou agora. Há um risco de esse plano não conseguir ser executado, se congelamento da área social e os recursos da educação permanecerem assim como está previsto nesta fatídica Proposta de Emenda Constitucional nº 55. Outro item: acesso à produção cultural. A criança deve ser vista não apenas como consumidora de cultura, mas como produtora de cultura. Isso é uma novidade na legislação brasileira, e já existem experiências. |
| R | Dentro da Rede Nacional Primeira Infância, temos algumas organizações que trabalham na área da cultura com criança, e estamos aprendendo, no País todo, como ver a criança já como produtora de cultura. São dimensões do ser criança fundamentais nessa cultura da proteção integral. Então, são exemplos. Ambiência adequada para gestante. Uma mulher que for presa... (Soa a campainha.) O SR. VITAL DIDONET - ... isso significa o quê, Fátima? Que tenho um minuto? A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Você precisa de quanto ainda? O SR. VITAL DIDONET - Três ou dois minutos. A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Tranquilo. O SR. VITAL DIDONET - Que bom. A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Tranquilo. Nós seremos flexíveis aqui com a tempo necessário para os senhores concluírem. O SR. VITAL DIDONET - Obrigado, Fátima. Ao prender uma mulher gestante, ela pode receber uma decisão do juiz, se for prisão preventiva, de ser transformada em prisão domiciliar, como forma de garantir uma ambiência melhor para a criança. Mas as prisões femininas que tenham gestantes, que tenham crianças, mães com crianças pequenas, têm que ter ambiência adequada para o cuidado da criança, e que elas se relacionem com o sistema de educação para garantir a educação infantil dessas crianças. Veja como, em todo o Marco Legal, Fátima, está essa atenção à criança nos seus diferentes espaços de vida, para que ela seja respeitada como pessoa, como cidadão e possa se desenvolver integralmente. O respeito ao ritmo de desenvolvimento de cada criança individualmente, no seu modo de ser e aprender. Isto está muito presente na pedagogia da infância: a escuta da criança. Esse é um princípio que está definido para a formulação das políticas públicas. As crianças precisam ser ouvidas. Elas não são uma esponja para serem imbuídas do líquido que você derrama sobre elas. Elas são competentes, elas têm o que dizer, elas são antenadas a tudo que as cerca e elas têm formas de expressão por meio de diferentes linguagens. Nós, profissionais, ou pais, ou pessoas da sociedade é que temos de ter a sensibilidade para entender as diferentes formas de a criança expressar os seus sentimentos, os seus desejos, as suas frustrações, as suas emoções e os seus pensamentos. A nossa experiência na Rede Nacional Primeira Infância, de escuta de criança com metodologias adequadas - existem técnicas apropriadas para isso e profissionais capacitados - é de que a criança tem muito a dizer e ela diz coisas pertinentes. Dou exemplo aqui do Distrito Federal, que fez uma escuta de mais de mil crianças em todas as instituições de educação infantil públicas, urbanas e rurais, e a exposição dos trabalhos das maquetes que as crianças construíram da sua casa, da sua cidade, do seu bairro, do seu ambiente, dizendo como é e como elas gostariam que fosse, é admirável. A gente tem muito a aprender quando escuta a criança com sensibilidade, porque elas têm uma sensibilidade para perceber o que está bem e o que podia ser diferente. Outro aspecto: formação dos profissionais para que haja pessoas qualificadas em todos os ambientes em que se atende criança. |
| R | Na Omep, que é a Organização Mundial de Educação Pré-Escolar, há muitos anos, defendemos esse princípio de que o profissional mais bem qualificado, o professor mais bem formado deveria ser aquele que trabalha com a primeira infância, porque é esse o período em que ele tem uma influência maior, em que a criança é mais sensível às interações. Quando já é adulto, mais autônomo, mais independente, ele pode não se sentir tão influenciado por determinados comportamentos de quem com ele convive, mas na infância, sim. Então, é preciso que todos os profissionais, em todas as áreas, tenham uma formação adequada. E aqui há um item importante no Marco Legal, que não são apenas os profissionais tradicionais - pedagogo, professor, psicólogo, médico, pediatra, assistente social - que devem ter a formação qualificada para a infância, mas também outras formações não tradicionais, como arquiteto, engenheiro, urbanista, pessoal da área de comunicação, a sociologia. Um sociólogo que entende a sociologia da infância sabe interpretar muito mais os fenômenos sociais, os fenômenos das famílias, dos problemas que acontecem nas migrações, da urbanização. A pessoa formada em comunicação, que estudou um pouco de infância, de repente, sai um jornalista com capacidade de fazer uma reportagem mais adequada, ou um produtor de cinema, um diretor de cinema. Então, diferentes áreas de formação que têm a ver com a criança poderiam e deveriam ter uma formação adequada, mas pelo menos aqueles que estão com contato direto com a criança devem ter formação adequada e permanente. Então, concluindo, a pergunta é a seguinte: o que podemos fazer para instaurar a cultura de cuidar da primeira infância no Brasil? Eu diria que a primeira coisa é levar a sério o art. 227 da Constituição Federal, que diz que os direitos da criança e do adolescente devem ser assegurados com absoluta prioridade; o art. 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente, que define como essa absoluta prioridade se aplica na preferência de atenção às crianças, no orçamento público garantido para assegurar esses direitos; e o art. 3º da lei que cria, que define o Marco Legal, a Lei nº 13.257, diz que essa prioridade absoluta dos direitos da criança e do adolescente implica que o Poder Público formule políticas públicas para atender a criança conforme as suas necessidades. O segundo item eu já mencionei, que é a formação dos profissionais. Do terceiro item, mencionei apenas uma parte, é a escuta, a sabedoria dos pais. Vamos dizer, o programa Criança Feliz, que está por ser implantado, não pode ser definido de cima para baixo; ele não pode chegar na família com um visitador sem nunca ter ouvido, escutado as famílias. Um profissional não pode chegar em uma família, trazendo uma série de informações e ir embora. Ele tem que dialogar, ele tem que escutar, ele tem que reunir as famílias e ouvi-las, pelo menos ali no território. Então, achamos que a sabedoria dos pais é fundamental para conformar uma política pública voltada à primeira infância bem como a experiência dos profissionais dos mais diferentes campos de trabalho. |
| R | Na formulação do marco legal, Senadora, tivemos a chance de ouvir profissionais de diferentes áreas, e o conhecimento que eles têm - chamo de sabedoria, porque é um conhecimento aplicado e refletido - é fundamental para acertarmos uma determinação que deve se tornar genérica, universal: o conhecimento dos estudiosos da infância. E desse terceiro já falei: incluir as crianças como sujeitos capazes de informar, de dizer o que sentem, de que precisam, o que é mais adequado para elas. E, finalmente então, garantir políticas públicas. Vejam aqui um pai, na relação com a criança, e uma mãe. Vejam que a mãe se põe ao lado da criança, ela está observando, ela sente alegria de ver a criança trabalhando com esses brinquedinhos, e para a criança já é fundamental essa companhia, essa presença, esse estar com, de ser um brincante junto. Então, é um pouco na linha do sentido daquele olhar zeloso para que seu filho esteja bem, para que seu filho seja feliz e possa viver a sua infância com plenitude. Muito obrigado e obrigado também pela paciência do tempo. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Mais uma vez, vamos agradecer aqui a participação valiosa do professor Vital Didonet. Nós queremos informar que a presente audiência, repito, é fruto de um requerimento conjunto da Comissão de Educação, de autoria do Senador Romário e outros, e também da Comissão de Assuntos Sociais, de autoria do Senador Edison Lobão e outros. Informo ainda que a audiência tem a cobertura da TV Senado, da Agência Senado, do Jornal do Senado, da Rádio Senado, e contará com os serviços de interatividade com o cidadão: o Alô Senado, através do telefone 0800 61 2211, e o e-Cidadania, por meio do portal www.senado.gov.br/ecidadania, que está transmitindo ao vivo a presente audiência e possibilitará o recebimento de perguntas e comentários aos nossos expositores via internet. Quero ainda aqui registrar com muito prazer a presença do Dr. José Martins Filho, presidente da Academia Brasileira de Pediatria; Dr. Claudius Ceccom, Presidente da Rede Nacional Primeira Infância; a professora Cristina Werner, presidente do Instituto de Pesquisas Heloisa Marinho; a professora Marilena Flores, fundadora do IPA Brasil - Associação Brasileira pelo Direito de Brincar; a professora Jaqueline, psicóloga e professora titular da Universidade de Paris, e Lisle Lucena, presidente da Comissão de Valorização da Primeira Infância, do Senado Federal, responsável pela organização da 9ª Semana de Valorização da Primeira Infância. |
| R | Bom, quero convidar agora a Senadora Regina para compartilhar aqui da coordenação dos trabalhos. Nós gostaríamos, neste momento, de passar a palavra para a Dafne Herrero. Pode ser? A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI. Fora do microfone.) - Pode. A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - A Senadora Regina vai presidir os trabalhos neste exato momento. (Pausa.) A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Nós vamos ter que ir a outra Comissão, mas voltaremos. Vocês estão em boas mãos com a Senadora Regina, mas voltaremos daqui a pouco. (Pausa.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Com a palavra Dafne Herrero, doutoranda em Ciências da Saúde. A SRª DAFNE HERRERO - Bom dia. Eu havia preparado uma apresentação um pouquinho mais longa. Então, vou dar uma corrida com os eslaides, mas acho que o principal vai ser filtrado e vai ser comentado aqui hoje. O meu subtema seria "Estratégias para o desenvolvimento pleno do lactente em seus primeiros anos de vida". Aqui, a gente tem que o desenvolvimento infantil é compartilhado por todas as crianças, com e sem deficiência. Eu acho que é muito importante a gente deixar isso muito claro, principalmente quando os pais chegam com a criança com deficiência logo que ele recebeu o diagnóstico ou logo no pós-parto. É algo que parece que vai ser outra estratégia completamente diferente, e não é. Oliver Sacks, um neurologista que, infelizmente, faleceu no ano passado, traz para a gente a informação de que a deficiência é simplesmente uma nova forma de organização. Então, se, hoje, por exemplo, eu iria ser a quarta a apresentar e agora estou sendo a segunda a apresentar, tudo bem, a gente se organiza perante a condição que a gente tem. Então, é interessante que a gente veja a deficiência como uma nova forma de organização, e não como uma parte de limitação ou algo que limite essa criança. A gente leva muito em consideração as oportunidades que o ambiente oferece para essa criança. Minha formação é em fisioterapia. Então, a postura dessa criança perante o mundo é algo para o que volto meu olhar e é algo que vejo que, na prática, todo mundo também tem intrinsecamente. Então, por exemplo, uma criança de quatro anos... Eu faço adequadores de papelão, que seriam cadeiras ou parapódios, dispositivos para a criança ficar de pé, andador, e a usamos papelão, rodinha de esqueite, e conseguimos dar uma acessibilidade praticamente total. Eu entrei na sala de aula, e esse garotinho, que tinha quatro anos, estava num carrinho de bebê. Isso foi em fevereiro. Aí, a professora me falou assim: "Olha, ele tem uma deficiência. Ele não consegue ficar sentado nas cadeiras e, por isso, por isso que ele está num carrinho de bebê; acho que ele tem um atraso cognitivo importante". Eu falei "ah, beleza. Vou lá falar com ele". Eu falei "oi, cara. Tudo bem?" "Tudo certo, tia". Eu falei assim: "Olha, eu vim aqui para a gente tirar as medidas para construir uma cadeira para você, para você sentar ali, igual aos seus amigos". Ele virou para mim e perguntou: "Quanto isso vai me custar?" Com quatro anos. Eu falei "meu, passa esse cara de ano! Com quatro anos, olha a consciência que ele tem!. Ele não tem atraso cognitivo". Ele tinha falta de oportunidades. Ele está deitado num carrinho de bebê com uma placa de madeira colocada na barriga para ser a mesa. Se estivéssemos deitados ali, muito provavelmente nosso nível de atenção cairia e nosso sistema de alerta ficaria prejudicado. |
| R | E, aí, eu fiz assim: "Poxa, vai ser um presente meu, da tia". Ele disse: "Então, eu quero azul". Ele tinha a resposta, mas ele não se permitiu, talvez, sonhar com a possibilidade de ter uma cadeira, porque a condição social dele já tinha dado muitos "nãos" para ele, e ele só tinha quatro anos. Então, realmente, ele não tinha um atraso cognitivo. Um mês depois, a gente voltou e entregou essa cadeira para ele, e ele pôde se sentar naquelas mesinhas onde se sentam quatro crianças. A gente tirou ele do carrinho de bebê, colocou na cadeirinha e colocou ele sentado à mesa. O amiguinho do lado perguntou: "Qual é o seu nome?". E ele estava naquela sala há mais de um mês. Então, como a gente também enxerga o outro pela postura de ele estar sentado do nosso lado. "Eu, que sou uma criança média, de quatro anos, e esse garotinho que está ali num carrinho de bebê, será que ele pertence ao meu grupo? Se esse garoto está sentado do meu lado, sim, ele pertence ao meu grupo." E ele podia, talvez, ter uma dificuldade de mexer a perna, uma dificuldade de mexer a mão, mas, sentado do meu lado, ele se coloca em posição de igualdade. Além disso, aquela placa de madeira que estava em cima do carrinho de bebê não permitia que a gente pudesse posicionar uma apostila, um estojo. E, à medida que a gente posturou esse garoto em sala de aula, ele também teve um vazio aqui, e a gente falou: "E agora? Cadê o estojo? Cadê a apostila?". Então, de um jeito espontâneo, criou-se uma demanda perante uma postura que foi adequada para essa criança. Então, é simplesmente a gente dar uma oportunidade e criar uma estratégia para que, sim, ela esteja sentada. Então, é uma nova forma de organização. O brincar e o desenvolvimento infantil podem ser familiarizados e empoderados em todas as pessoas que estão nesse processo. Então, os pais, os professores, os terapeutas, os avós, todos os que estão ao redor dessa criança têm de ser empoderados e pertencer a esse processo. Uma referência que eu gosto bastante é do Brazelton. Ele traz para a gente aquela figura onde coloca todos da mesma cor, com o mesmo círculo; as mesmas flechinhas interligam todas as figuras, e isso dá um empoderamento. E ele fala também do quanto a gente antecipar esses pais, para dar conhecimento. Por exemplo, ele fala que tem 13 touchpoints. Então, como a gente pode tocar esses pais e prepará-los para uma situação? Por exemplo, aquela criança que está quase chegando aos dois anos e que não quer uma bolacha quebrada. "Mas, não, nossa, imagina, eu comia bolacha esmigalhada". Comia nada! É que a gente não lembra. A gente também não ia querer a bolacha quebrada. Se a gente vai pegar uma blusa hoje, se a gente vai comprar uma blusa hoje, a gente não quer uma blusa furada. Eu quero uma blusa. A criança também não quer a bolacha quebrada. Ela está formando conceitos na cabeça dela. Ela quer uma bolacha quadrada, porque ela está aprendendo o que é um quadrado; o que é um círculo; que força se faz para poder quebrar a bolacha; quanto é legal a gente raspar o recheio no dente. Então, todas essas experimentações são cessadas na criança e principalmente da criança com deficiência. A gente leva, por exemplo, as frutas para a criança com deficiência, na maioria das vezes, amassada, tudo picado. Às vezes, a gente mistura, e fica uma cor que a criança não sabe nem de que cor é a fruta direito. E tem uma demanda também, de três, quatro anos, em que a mãe fala assim;"Não, ele não está gostando mais de fruta". Se a gente dá para a criança sempre na mesma textura, sempre na mesma cor, é óbvio que aquilo não fica interessante. A criança precisa ser instigada. Ela é curiosa. Então, em determinado momento, a gente falou assim: "Beleza, então, na semana que vem, a gente vai fazer a atividade na feira. Tem aqui na rua de cima. A gente vai organizar." "Não, mas é difícil por conta da cadeira, por conta do...". "Não, a gente vai. Estou propondo isso. A gente vai fazer lá na feira." Chegando lá, as crianças escolheram duas ou três frutas cada uma. Na hora que a gente chegou ao atendimento, elas descascaram com uma faca sem ponta, mas a gente empoderou aquela criança, ela escolheu a fruta, ela descobriu, por exemplo, que não tem como comer a casca do abacaxi, mas tem como comer a casca da maçã. |
| R | Olha quantas informações. Daí chegou um garotinho e falou assim: "Tia, a melancia é grande e tem uns carocinhos bem pequenininhos, e o abacate é pequeno e o caroço é grande. Que enganação!" É uma enganação o abacate, se a gente pensar. Essas proporções de tamanho, de sabor, de consistência, de preço, tudo isso é levado em consideração na escola depois, em conceitos de matemática, em conceitos de proporção. Então, tudo isso a gente aprende na prática. As crianças com deficiência têm que ter vivência na rua, na feira, no mercado. Tudo isso para empoderar, para participar, para escolher a fruta que quero comer. Se vem tudo batido, se vem tudo amassado, se vem tudo com a mesma consistência e cor, aquilo realmente não me instiga, não é interessante comer aquilo. Então, não é porque elas não querem mais, mas é porque elas querem ser instigadas como qualquer outra criança. Eu acredito também no poder do olhar. Por exemplo, numa cena de amamentação, esse daqui é o Jorge, meu filho. A gente estava num momento... A gente fala que amamentação é questão nutricional, mas tem muito na amamentação. A criança com deficiência normalmente fica um tempo na UTI, fica um tempo com dificuldade, talvez, de coordenação, de sistema estomatognático. Aí a gente cessa um momento em que a gente está dando muita informação para essa criança. Ela toca na nossa pele, ela toca na nossa blusa e, com tudo isso, eu vou dando texturas, eu vou dando temperatura, tudo ajuda a abrir e fechar a mão, puxar, me puxar para o olhar dela. A gente sabe que a criança enxerga nos primeiros meses de vida de forma nítida, é justamente essa distância, que é a distância do colo. "Ah, mas não tenho como fazer a amamentação do meu filho." Tudo bem, mas só que o colo é muito importante, e ele vem intrínseco na amamentação. Se não há possibilidade de amamentação, vamos oferecer o colo em todas as possibilidades que ele tem. Eu fui ao oftalmo nessa época e fui trocar os meus óculos. "Parece que deu uma piorada e tal." A oftalmo falou assim: "Realmente, só que não vou trocar os seus óculos". Gente, eu vim aqui na boa, eu só queria trocar... "Não, eu não vou trocar, porque, nos primeiros seis meses de vida, a gente tem uma adaptação visual para que a gente enxergue melhor de perto, porque essa criança está perto da gente. Dos seis aos doze meses de vida, a gente tem uma adaptação visual para que a gente enxergue melhor de longe, porque é quando o nosso filho vai começar a se deslocar". Então, a gente tem uma adaptação visual. É interessante essa informação para que as pessoas saibam que há adaptação, e não é só a gente que oferece adaptação para a criança, mas esse bebê está me oferecendo também formas de me adaptar a esse momento e formas de fortalecer esse vínculo que é tão importante. O olhar é tão importante também nas aquisições motoras. Então, a criança, quando está andando e cai de bumbum, se ela olha para a gente e a gente fala: "Levanta para cair de novo", a criança levanta e sai andando. Agora, se a gente faz "hã", a criança senta e chora, porque ela pensa: "Se ela está assustada, eu tenho de estar muito assustado". Então, essa construção do vínculo e essa construção do olhar da criança com deficiência tem que ser muito vista. A gente teve a apresentação, principalmente das telas, hoje, no primeiro horário da manhã, e a gente viu o quanto isso está sendo deixado de lado nas crianças sem deficiência. Imaginem nas crianças com deficiência o quão esse olhar para as crianças é muito importante. Aqui é um exemplo típico da criança que vem com um diagnóstico. Da primeira foto até a terceira, são 15 dias de diferença. Na primeira foto, está claro que a criança não consegue se sustentar sentada. O discurso dos pais era: "Não sei o que ele tem, o diagnóstico é supercaro, um valor que a gente não tem. Estou um pouco aflito". Eu fiz assim: "Tudo bem, eu não sei também o que ele tem, mas posso brincar com ele?" |
| R | O que eu tenho aqui é ele, e eu vou brincar com ele - pode ser? A gente empodera esses pais, e eles veem que o peso do diagnóstico nessa hora é muito pequeno. Dali a 15 dias, esse garotinho estava sentando, e eu segurando só a mão. Foi a fisioterapia que fez? Com certeza, não: foi a sustentação de dentro para fora, porque esses pais também acreditaram nessa criança. Esses pais puderam olhar para essa criança, e essa criança teve novas oportunidades. Então, que peso o diagnóstico tem na criança com deficiência, e quanto nós temos de diminuir isso e dar vazão para o desenvolvimento infantil, que é pleno para qualquer criança? Aqui, acho que a prematuridade tem um peso muito forte, principalmente nas morbidades, como a gente fala - as crianças que têm algum tipo de acometimento depois. Sabemos quão importantes são esses limites, porque as crianças não ficam tanto dentro da barriga da mãe, e o quanto elas não criam de tensão - é essa tensão que vai deixá-las direcionadas para vencer a gravidade. Então, quanto a gente pode fazer de intervenção nesse período, que faz uma diferença enorme para essa criança - para essa criança conseguir organizar a mão com a mão, o pé com o pé. E é no colo. Então, a mãe fala assim: "Eu fiquei muito com ele no colo." A gente tem de valorizar, porque é muito importante ficar com ele no colo, já que ele não ficou todo esse tempo na barriga. Tudo bem, não tem problema, a gente vai fazer uma barriga extra aqui; a gente vai fazer um colo para ele. Então, isso é muito importante. Eu queria agora falar um pouquinho para vocês sobre uma experiência que eu tive em Recife. Esses são os adequadores de papelão, são os parapódios, a cadeirinha. A gente vê que a criança está olhando para o brinquedo, você dá a oportunidade de ela se posturar. "Ah, mas ela não segura o pescoço direito." Eu acho que todo mundo tem uma mesa aí na frente. Vamos fazer uma coisa? Coloquem as duas mãos a apertem. Vocês vão sentir uma tensão no pescoço. Sentiu a tensão no pescoço? Se a criança, mesmo que não tenha um controle de cabeça, um controle cervical, como a gente chama, se ela senta e faz uma força com a mão, isso ajuda o controle cervical. Então, a gente está dando a oportunidade no momento certo, no momento ótimo. A gente, às vezes, usa a palavra precoce, estimulação precoce - parece que a mãe está sempre atrasada, está sempre num destempo. Então, a gente fala estimulação essencial: na hora em que a criança chegar, a gente vai ter muito a oferecer. Na experiência em Recife, a gente fez uma oficina voluntária com 55 profissionais que tinham a possibilidade de replicar esses adequadores, e a gente conseguiu fazer 12 cadeirinhas e 12 parapódios para crianças que tiveram a síndrome congênita do zika vírus. Antes, a gente falava só acometimento pelo zika vírus; por uma série de acometimentos que acontecem, a gente colocou o nome de síndrome. Então, agora, é denominado síndrome do zika vírus. São crianças que estão completando um ano agora. Elas participaram do primeiro grupo em que foi diagnosticado, realmente, esse acometimento e o seu link com a microcefalia. São crianças que até ficam um pouco carequinhas aqui atrás, de tanto ficarem deitadas. A gente lê: "Nossa, elas são um pouco irritadas." Se a gente for pensar na nossa dinâmica, quando a gente deita numa cama, a gente alinha o nosso corpo de acordo com a cabeça, e a gente tem um volume de cabeça para dar isso. Essas crianças têm um volume de cabeça diminuído. Imaginem, então, elas deitadas e com a cabeça abaixo da linha do corpo. Não é uma situação confortável. Então, não é que elas estejam tão irritadas assim, mas a demanda que a gente tem de ouvir - e o professor falou bem nisso, de a gente escutar a demanda, caracterizar esse grupo e ver, por exemplo, que todas essas crianças, quando deitadas de barriga para cima... (Soa a campainha.) A SRª DAFNE HERRERO - ...precisam ter um apoio. Gente, eu tenho medo dessa campainha. (Risos.) |
| R | Mas eu acho que, se a gente olhar e conversar com essas mães, entender a dinâmica e a biomecânica das crianças, a gente tem muito mais chances de ter estratégias assertivas. Não adianta a gente achar que a estimulação é igual para todos. Eu tenho dois filhos e acredito que talvez tenha compartilhado de algumas estratégias, mas a gente sabe que a demanda dos dois é muito diferente. Então, a gente tem que olhar para qualquer criança. A gente vai ter algumas estratégias assertivas em mente, mas sempre olhando para as demandas dessas crianças. Depois, a gente fez a entrega. Então, a gente vê que as crianças conseguem juntar as mãos na linha média, conseguem pegar o brinquedo. Elas melhoraram realmente a postura cervical e dos braços e apoiaram os pés. A primeira vivência delas de pé foi com esse parapodium. E é todo um material de baixo custo e realmente acessível a todos. Aqui eu acho que é só uma visualização rápida. Eu gosto de falar para as mães para elas identificarem talvez um atraso de uma maneira rápida. O atraso motor vem com um indicativo muito forte se a criança tem alguma deficiência. Porque, se a gente vai rolar, a gente vai rolar porque escutou ou ouviu algo. Se a gente vai pegar algo e vai brincar, é porque a gente tem plena coordenação dos membros superiores. Então, a gente consegue, através do motor, fazer uma leitura de algumas deficiências sensoriais que vêm junto com o atraso motor. Aqui é só uma visualização rápida, por exemplo, de uma criança que tem três meses. É interessante que ela tenha a cabeça já vencendo a gravidade e que o bumbum fique para cima, porque ela ainda está com aquela tensão em que ficou ali dentro da barriga. Com seis meses, ela está pegando o pé. Então, forma exatamente o número seis. Estou pegando o meu pé, formei o número seis. Com nove, estou saindo para poder fazer um deslocamento. Então, estou aqui e o meu pé está lá na frente, eu formo o número nove. Com 12, estou segurando numa mesa e consigo tirar minha mão para pegar alguma coisa. Então, o número um e o número dois para fazer o laço. Aqui é a frase com a qual a gente começou, do Oliver Sacks. Aqui são algumas coisas que eu faço na vida. Mas acredito que ser uma mãe muito feliz é acreditar que o que é bom para os meus filhos é bom para os filhos dos outros. Eu acho que é o que me dá base para as outras atividades. Quando a gente fala de desenvolvimento infantil, acredito que todos aqui tenham alguma lembrança muito boa da infância. Então, quando eu converso com os alunos, eu digo: vocês não se lembram do bolo de fubá saindo do forno da sua avó; de uma brincadeira que vocês faziam com seus primos? Tudo isso é infância. Com a criança com deficiência, a gente participa ativamente da infância dela. Então, que a gente crie memórias legais, para elas virarem adultos que tenham que se sustentar e que se lembrem de momentos legais na infância. Muito obrigada. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Drª Dafne. Vamos para a Drª Ivone Ferreira Caetano, Desembargadora. O tema é denegação dos direitos de acesso ao cuidado integral da criança: consequências jurídico-sociais. A SRª IVONE FERREIRA CAETANO - Boa tarde a todos e a todas. Cumprimento a Mesa na pessoa da Senadora Regina. Eu gostaria de agradecer o convite para estar aqui neste momento. Eu fui convidada para falar sobre a denegação dos direitos de acesso ao cuidado integral da criança - consequências jurídicas e sociais. |
| R | Antes de começar, eu queria pontuar uma coisa: a minha experiência com criança é ao longo da minha vida, tem exatamente o tempo que eu tenho de vida. Estou falando aqui muito mais como uma cidadã que tem essa experiência que foi vivida de várias formas do que como uma profissional. Por outro lado, eu também sou Presidente do Fórum Permanente da Criança e do Adolescente do Tribunal do Rio de Janeiro. Para falar sobre a denegação de direitos de acesso ao cuidado integral da criança, eu tenho que primeiro cumprimentar a todos que me antecederam, a todas as falas que fizeram menção quase sempre à Lei nº 13.257, Marco Legal da Primeira Infância. É uma lei recente e ainda não sabemos como será o resultado dela. Então, para falar sobre esse tema, é preciso falar sobre um princípio que já é antigo, desde 1988, no nosso ordenamento jurídico, que é a doutrina da proteção integral. Essa doutrina reconhece, na seara da infância e da juventude, um princípio que concebe tratamento peculiar desse segmento da criança e do adolescente como um todo, notadamente quando se refere à primeira infância. Sendo assim, esse princípio, que ganha arrimo na Constituição Federal do Brasil, reconhece esse tratamento diferenciado à criança, de forma que atribui nominalmente figuras que são responsáveis pela obtenção dessa dita proteção, a qual se torna mecanismo da promoção da dignidade da criança. Ao fazer o meu eslaide, eu coloquei uma bolha - que ali não está aparecendo - que seria muito interessante, porque dentro dessa bolha o que está representando é... Essa bolha está representando exatamente a doutrina da proteção integral. Dentro dela, cabem todos os elementos constantes da doutrina, que é a vida, o direito da criança e do adolescente à vida, o direito à saúde, à liberdade, à educação, ao lazer, à cultura, sobretudo à dignidade, à convivência familiar e à profissionalização. Tudo isso está contido no art. 227 da Constituição: "Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde..." E seguem todos os elementos. |
| R | A redação da norma constitucional é clara quando estabelece um tratamento diverso para esse grupo, sobretudo no que diz respeito aos responsáveis pela tutela da vida e da saúde dessa parcela que nos é muito cara. No art. 227, ele fala: é dever da família, é dever da sociedade, do Estado, ou seja, do poder público assegurar todos esses direitos. A redação da norma constitucional é clara. Já falei isso. Cumpre lembrar que a doutrina da proteção integral consolidou em nosso ordenamento jurídico, por força de vários tratados e convenções internacionais. Não foi só uma visão nossa. Isso decorre dos tratados e convenções internacionais. Todos os tratados e convenções referentes a direitos de crianças e adolescentes foram assinados pelo Brasil. O Brasil, deles é signatário. Então temos a Declaração dos Direitos da Criança de 1924, a Declaração Universal dos Direitos da Criança, de 1959, e a Convenção dos Direitos da Criança, Resolução nº 44, da ONU, de 1989, tendo sido adotada a Doutrina de Proteção Integral fundada em três pilares: o reconhecimento da peculiar condição da criança e do jovem como pessoa em desenvolvimento titular da proteção especial; crianças e jovens têm direito à convivência familiar; as nações subscritoras obrigam-se a assegurar os direitos insculpidos na Convenção com absoluta prioridade. A referida Convenção foi subscrita pelo governo brasileiro em 26 de janeiro, no início do ano de 1990, o que dá a qualquer criança ou jovem que esteja neste solo os direitos ali elencados. A Doutrina da Proteção Integral, ao conceber essa tutela especial às crianças, o faz por entender que deve existir uma bolha, ou melhor, entender a existência de uma bolha envolvendo a criança, permitindo a sua completa proteção. Pois é, senhores. Essa bolha pode ser estourada. E, quando estoura, a dignidade, a cultura, a educação, o lazer, a liberdade, a vida, a saúde, tudo se dissipa. Basta um furinho. Ouvi aqui as falas. E todos falam em relação a uma generalidade de criança, mas nós temos muitos brasis, não é? E aí? Eu vejo as cabeças balançando. E aí? O que nós vamos fazer? |
| R | Eu atuei na Vara da Infância e Juventude durante 21 anos. E atuei exatamente para tentar devolver o que eu havia recebido. E é muito triste; é triste a trajetória e é triste chegar a um lugar, pensando, de início, estar habitando o Olimpo, onde nada é resolvido favoravelmente para a criança. Eu digo nada porque o acervo é enorme e as medidas são inócuas. Dá vontade de lembrar o que o Desembargador Alyrio Cavallieri, que foi meu professor, dizia: "Todos esquecem que debaixo do papel tem gente." O descumprimento de qualquer dos itens contidos no art. 227 acarreta o rompimento da bolha que envolve a criança, atingido todos os direitos que nelas existem, ensejando a denegação dos direitos de acesso ao cuidado integral da criança, colocando em perigo sua vida, sua saúde, sua liberdade, subtraindo-lhe a educação, o lazer, a cultura, interfere em sua convivência familiar e na sua profissionalização, mas, sobretudo, fere o princípio da dignidade da pessoa humana. Tal consequência ocorre para qualquer criança, independente da raça, cor, religião ou condição social. Vemos crianças de condições sociais maravilhosas que têm babás, folguistas, psicólogos, orientadores escolares, mas elas também podem ter os seus direitos feridos. A bolha pode arrebentar a qualquer momento, basta que não se tenham os cuidados que anteriormente foram apontados em todos aqueles que falaram anteriormente a mim, basta que se tenha conhecimento ou desconhecimento das ferramentas e instrumentos que podem ser usados agora. Vejam bem: a preocupação com a primeira infância, a preocupação com a formação do cérebro de uma criança é uma constatação que vem preocupando profissionais de diversas áreas, fomentando inúmeros estudos das causas e consequências dessa ocorrência, e aí nós passamos para uma coisa fantástica: a cegueira social. É impressionante, senhores! "Não é no meu quintal, está tudo bem. Não é no meu quintal." Observa-se, entretanto, que, na verdade, esse procedimento não atinge a todas as camadas dessa sociedade. Alijadas estão as crianças pobres e, principalmente, as negras, a que eu não ouvi, durante todo o tempo que eu estive ou presenciando ou assistindo, qualquer referência. Parece que nós temos uma relutância incrível em falar qual é. Não sorria, senhora. A senhora é uma das poucas que estão aqui me fazendo companhia. |
| R | Olha só: eu acho impressionante a postura do brasileiro. Há uma recusa de se falar no maior problema que nós temos como sociedade. Volto a dizer: não é no meu quintal; é fora do meu do meu portão. Esta sociedade devia perceber que a denegação dos direitos de acesso ao cuidado integral, especificamente da criança negra, ocorre desde a época da escravidão, onde eram até proibidos de estudar, e não pode esquecer outra coisa: tudo aquilo que foi passado para os descendentes dos escravos persiste até hoje. A formação do cérebro dessas crianças, a visão delas pela vida, persiste até hoje porque a omissão persiste até hoje, e não podemos acusar só o Poder Público, não. Nós temos que ter consciência do nosso papel, um papel que retira da nossa sociedade a condição de humanos porque volto a dizer: não é no meu portão; é além do meu portão. (Soa a campainha.) A SRª IVONE FERREIRA CAETANO - Desse segmento - eu falei para a senhora - a bola foi estourada, sendo-lhe negado saúde, liberdade, educação, lazer; enfim, tudo aquilo dentro da lei. Só não vê quem não quer, só não vê quem quer tornar e deixar invisível realmente esta questão em relação a esse segmento, esquecendo que esse esquecimento não prejudica só a esse segmento, não, prejudica toda a sociedade, até porque faz parte da maioria desta sociedade e, como há alguns índices que comprovam que todos os sangues se interagiram neste País, então, provavelmente, alguém... Aliás, eu conheço pessoas com os olhos azuizinhos - esses não podem entrar nessa contagem - que são descendentes ou têm alguém negro na sua família, mas, se isso não fosse suficiente, nós temos uma outra coisa: nós somos um País que pretendemos ser uma nação, mas, com a invisibilidade do apartheid que aqui existe e que incide diretamente em cima da criança, diretamente, sem o menor pudor... Os senhores me desculpem a forma incisiva pela qual estou falando, mas eu não estou falando só porque atuo em determinada especialidade ou porque sou uma juíza, não; eu estou falando desta forma porque eu tenho esse conhecimento vivencial. Se os senhores observassem todos os requisitos que os senhores ouviram até agora e que foram ditos não só aqui, mas em todas as outras reuniões em que eu estou, como é que uma família negra, da periferia ou de uma favela, cuja mãe sai para trabalhar, às vezes a semana toda, deixando o filho na ruela, entregue ao traficante, ao miliciano, que poderia estar com ela, amamentando, brincando... |
| R | É isso que realmente gostaria que fosse para todos. Não estou criticando a lei que foi feita agora. Estou querendo que esta lei seja efetivamente estendida a todos, porque, até agora, o Brasil não cumpriu satisfatória e integralmente nenhum dos ditames de qualquer lei que diga respeito à criança e ao adolescente negro. E aí? O que nós queremos? Redução da menoridade. A cada dia, vamos encher mais os presídios. É uma forma de se banir: esconder, botar embaixo do tapete, porque aqui não tem preconceito. Eu mesma, às vezes, fico abismada quando alguém diz que existe preconceito. Imagina! Pois é. Na verdade, precisamos ter consciência de que tudo começa de nós, que estamos aqui, no sentido de que todos são iguais e precisam de tratamento igual. Que esta lei, Srª Senadora, que está sendo colocado neste momento, realmente, seja integralmente cumprida e implantada para todos, porque isto é um benefício não só para aquelas crianças, mas para todos nós. Muito obrigada. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Drª Ivone. Queria registrar a presença do Dr. Laurista Corrêa Filho, pediatra e neonatologista, especialista em saúde da mulher e da criança, membro do Comitê Científico da Comissão da Primeira Infância, e da Profª Sandra Cabral, professora da Universidade Federal Fluminense, pesquisadora do grupo de trabalho Resiliência, Juventude e Vulnerabilidade, da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Psicologia. Vamos ouvir a Drª Drina Candilis, psicóloga, psicanalista e professora. O seu tema é: "Uma população excluída dos sistemas de saúde e de prevenção - os pais em situação de deficiência". Estou vendo que ela está com fone de ouvido. Vai falar português? A SRª DRINA CANDILIS (Tradução simultânea.) - En français. (Pausa.) |
| R | Em primeiro lugar, gostaria de agradecer pela honra de participar desta audiência e a todos os colegas da Associação Infância e Paz, que tiveram a gentileza de convidar-me aqui, em Brasília. Eu vou-me inscrever em uma certa continuidade com relação às falas que foram feitas hoje de manhã porque novamente vou falar de exclusão, mas de uma exclusão um pouco diferente, que é a exclusão dos pais em situação de deficiência, os pais deficientes. Quando é questão de parentalidade e de deficiência, trata-se do fato de ser pai de uma criança com deficiência. Inúmeras instituições, colóquios, publicações científicas, no mundo todo, inúmeros testemunhos são consagrados à deficiência da criança e às dificuldades encontradas pelos pais para enfrentar essa deficiência. Esquecemos que essas crianças vão crescer, que essas crianças vão querer também ser pais e que essa questão não é abordada pela literatura e que só recentemente a Medicina e o meio médico social se interrogam nas condutas a serem levadas quando uma mulher ou um homem em situação de deficiência físicas e/ou sensorial se torna pai, graças à abertura oferecida pelas técnicas médicas novas. Então, como responder à sua demanda? É preciso organizar estruturas perinatais específicas? Então, será o objeto da minha comunicação, baseada em uma experiência de cerca de 15 anos no acompanhamento da parentalidade das situações de deficiência. Vários pontos devem ser lembrados que nos distanciaram muito do quadro miserabilista da condição dos jovens deficientes. Eu coloquei algumas imagens aqui. Levando em conta que as pessoas em situação de deficiência constituem cerca de 10% da população mundial, a ONU promulgou, em 1975, uma declaração sobre os direitos das pessoas com deficiência, que é, só muito longamente e com demora, um prolongamento nos outros países. Para a França, a legislação e as leis sobre acessibilidade, a inserção escolar e profissional em meio comum data de 2005, mas inúmeros obstáculos subsistem. A sexualidade e a parentalidade fazem parte desses obstáculos, ainda que elas remetam à vida íntima de cada um e não a um direito público. No entanto, olhando para essas questões, medimos a necessidade de pensar medidas em instituições destinadas a criar meios ambientes mais favoráveis para a vida dessas pessoas e desses pais. Um primeiro ponto seria a não continuidade dos tratamentos da criança até o adulto deficiente. As autoridades de saúde são conscientes do fato de que o progresso da Medicina tornou possível um prolongamento da expectativa de vida das crianças portadoras de deficiência. Hoje, cerca de 90% das crianças afetadas de doenças crônicas ou debilitantes vão viver mais de 20 anos, quer se trate de doenças congênitas, como a síndrome de Down, ou de doenças crônicas e genéticas, ou ainda de consequências dos avanços da Medicina neonatal, na medida em que a taxa de sobrevida dos grandes prematuros aumentou bastante - nós sabemos disso -, mas também as sequelas que vêm dessa prematuridade. |
| R | Certas doenças genéticas modificam sua expressão com os anos. É o caso, por exemplo, da retinite pigmentária que, progressivamente, leva um jovem adulto até a cegueira completa ou, em outro plano, é o caso da esclerose múltipla. Então, o acesso à idade adulta se acompanha por dificuldades novas, tanto no plano fisiológico, embora as necessidades afetivas e os desejos de vida exerçam também suas pressões nas pessoas em situação de deficiência. Um segundo ponto importante diz respeito a encontro com o parceiro. As leis de 1975 e depois de 2005, depois da resolução internacional da OMS, insistem nas determinações necessárias para que a acessibilidade no sentido amplo favoreça a integração das pessoas em situação de deficiência no direito comum. Não sei como vocês chamam isso no Brasil a fim de lutar contra as antigas práticas de exclusão e de confinamento em instituições especializadas. As leis sobre o trabalho, sobre a integração dos alunos em situação de deficiência dentro do sistema escolar comum, o acesso a novas tecnologias, inclusive a Internet, modifica aos poucos os estigmas sociais que vão junto com a imagem da deficiência. Ainda que as organizações militantes coloquem em relevo as carências nesse campo, mas para além do direito e, seja qual for a idade, o corpo é limitado para pessoas em situação de deficiência e ter acesso naturalmente a relações de proximidade como aquelas que exigem os vínculos afetivos, amorosos ou até parentais isso solicita um trabalho pessoal que não se impõe só com a mesma evidência quando a gente tem um corpo que pode ser esquecido com um trabalho psíquico, esforços permanentes são necessários e que podem conduzir ao desânimo e, com ele, vários tipos de raiva, de reivindicação, de depressão e de isolamento. O peso da realidade transcende aqui os mecanismos comuns a todo mundo. Como se integrar sem pena aos lazeres, aos programas dos adolescentes de sua idade, quando temos pouca visão ou quando uma cadeira de rodas bloqueia os deslocamentos? Amizades na net, por exemplo, é romper um pouco esse isolamento; o recrutamento dos parceiros eventuais é por vezes questionável, a euforia do encontro virtual pode se deparar com a atração de condutas de risco; a deficiência afeta o adolescente. O outro válido se torna então a promessa de tudo o que o jovem não tem. Por parte daqueles que são ditos válidos pode haver uma compaixão ou perversão, ou real interesse que, do seu lado, a pessoa deficiente não está em medida de perceber nem sempre. Então, permanece que certas doenças exigem, por vezes, uma ajuda 24 horas por dia e que viver uma vida de casal nessa configuração não é simples. As coisas ainda são mais difíceis com a chegada de um bebê em casa. O terceiro ponto que eu gostaria de botar em relevo é a aventura da procriação e o desejo de uma criança. Vale ressaltar que os dados epidemiológicos são extremamente difíceis de se reunir nessa área em todos os países do mundo inclusive na medida em que a deficiência é um dado social que abrange uma grande disparidade de situação e de idade. |
| R | Se nós nos concentrarmos aqui nas deficiências sensoriais ou motoras, algumas são devidas a transmissões genéticas, outras de doenças crônicas estabilizadas ou evolutivas, outras ainda de acidentes neonatais ou que ocorreram em outros períodos da vida. Para uma população de cerca de 800 mil pessoas na França, que beneficiam de um reconhecimento administrativo e que têm entre 25 e 49 anos, a situação não é idêntica àquela da população geral, mas as especificidades e as necessidades permanecem amplamente negligenciadas e ignoradas. Uma publicação coreana de 2015 dedicou-se a estudar os casos e os prontuários obstétricos das mães em situação de deficiência motora, comparando com as mulheres válidas, eles encontram taxas de aborto muito altas, cesáreas altas, complicações obstétricas altas - eu não vou dar os números aqui - assim como riscos de depressão de pós-parto muito mais importante, três vezes mais importante do que na população válida. Então, frente a esses resultados muitos parciais, parece necessário que, tanto no plano científico quanto clínico, nós coloquemos mais atenção para essas jovens mulheres para que elas possam viver de forma mais segura a sua gravidez e o seu parto, e de forma mais autônoma a instauração dos primeiros vínculos pais e crianças, como na população geral. É o projeto que o nosso serviço implementou dedicando-se especificamente ao acompanhamento da parentalidade das pessoas em situação de deficiência sensorial e motora, desde o período de pré-concepção até a idade de sete anos da criança. Nós trabalhamos em rede, com a rede social e médico social que envolve essas famílias e a maternidade do Hospital La Salpêtrière, em Paris. Nós temos uma equipe mensal que se dedica ao acompanhamento desses pacientes, às vezes, é muito acrobático no plano médico, e o nosso recrutamento vem também de outras maternidades, de associações ou profissionais de campo. Esse trabalho de acompanhamento se organiza em duas direções intrinsecamente vinculadas: uma que nós qualificaremos de dimensão pública e social e a outra de dimensão íntima. Na primeira, trata-se, para a equipe médica, como para nossa equipe médico-social, de propor medidas de acompanhamento da gravidez, do parto e da parentalidade as mais adaptadas possíveis à situação física dos casais que vêm até nós. Nós não apoiamos o direito da criança, mas nós sabemos que ter o direito de ser mãe não pode ser objeto de um julgamento e deve ser acompanhado com muita tolerância, humanismo e precaução. Então, a revolução da assistência médica para a procriação suscitou um movimento de esperança nessas mulheres que até então não tinham esse direito. Todas as mulheres deficientes não têm acesso a essa assistência ou não precisam dessa assistência. Mas essa esperança se associa com a transformação dos percursos de vida dessas pessoas deficientes e faz com que essas pessoas decidam tentar essa aventura da procriação, longe da crítica social encontrada nas gerações anteriores. Homens que se tornaram paraplégicos depois de um acidente ou uma doença podem também se tornar pais com essa assistência médica à procriação. Algumas jovens mulheres que têm doenças raras querem engravidar, apesar dos riscos para a sua saúde e até para a da criança. |
| R | Então, nessas situações, a intervenção médica se dá em vários níveis: a preconcepção, o diagnóstico pré-implantatório pré-natal em casos de doenças geneticamente transmissíveis, se os pais quiserem, depois, a gravidez, o parto e eventualmente um acompanhamento pediátrico do recém-nascido, se ele for prematuro, o que acontece muito. Então, as equipes pluridisciplinares examinam o prontuário de cada paciente, para tentar avaliar os riscos e evitar principalmente a banalização dessas situações. O campo das doenças raras é um campo novo para a medicina e para nós também, do setor médico-social. Os pacientes têm necessidades específicas que precisam ser reconhecidas. É também com a ideia de identificar as necessidades específicas desses pais, que se construiu o protocolo de acompanhamento dos nossos serviços. Os serviços baseiam-se numa equipe pluridisciplinar, composta de puericultoras, pediatras, assistentes sociais, educadoras de jovens crianças e também psicólogos. Ele parte da observação que as práticas de puericultura comuns, em uso entre os profissionais e os pais, não são adaptadas às situações de deficiência. Vou mostrar agora, através de algumas imagens, o que nós fazemos. Aqui, por exemplo, imaginamos umas pranchas, para que mulheres cegas possam sentir o crescimento do feto dentro do útero. Elas podem fazer isso sozinhas, graças a essas pranchas, que entregamos a elas, ou podemos também, com a ecografia e o sistema de termoimpressão, desenhar o feto que elas não podem ver. Podemos também trabalhar com uma forma de carregar, seja com uma coleira de cachorro, seja com uma bengala. Quando se trata de uma cadeira de rodas, imaginamos um sistema para elevar a banheira, por exemplo, onde elas podem aprender a dar banho na criança dentro da cadeira de rodas ou, então, colocá-lo em sistemas de toalhas para carregá-los e secá-los ao mesmo tempo. Então, algumas mães, como essa, por exemplo, fazem tudo no chão, porque a sua deficiência é de enfermidade motora e cerebral, e ela não consegue ficar em pé. Essa mãe aqui tem uma miopatia muito grave e não pode utilizar outra coisa, que não sejam as mãos. Aqui, mais uma vez, os sistemas para carregar os bebês são adaptados a cada uma. Ela pode, aqui, carregar a criança bem perto dela, assim como também pode ter esse apoio nos braços para não sentir dor nas costas. Para essa mamãe, que não pode mexer nada, nenhum membro, há todo um dispositivo para se colocar a criança frente a ela, para que ela possa ter uma troca de olhar pelo menos. Aqui, gosto dessa imagem, porque podemos ver que há uma espécie de admiração. Na psicanálise, falamos de uma total admiração. Aqui, é uma boneca, é claro, mas essa mulher está muito surpresa de poder fazer algo, quando antes pensava que iria ser distanciada do bebê. Então, essas crianças que acompanhamos são "válidas" normalmente. Em alguns anos do nosso exercício, apenas cinco ou seis famílias tiveram uma criança com a mesma deficiência que os pais. O conselho genético é encorajado por nossa equipe, inclusive depois da concepção. Várias famílias tiveram recurso à interrupção médica de gravidez e, depois, ao diagnóstico pré-implantação. E aí que eu falo que a medicina mudou completamente o horizonte dessas famílias. |
| R | E finalmente, algumas famílias querem se dirigir para adoção para não transmitir a sua doença. Então, eu termino com essa imagem. Muito obrigada pela sua atenção. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Drª Drina. Comunico que hoje, às 16h, será realizado um encontro técnico com a delegação da Comissão da Educação, Saúde e Esporte do Comitê Permanente da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês, para tratar de assuntos referentes ao sistema brasileiro de administração em serviço à cultura. Essa convocação é para a Comissão? (Intervenção fora do microfone.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - É para o encerramento. Sim. Sempre, quando estou presidindo, costumo passar para alguém da plateia falar. Não sei qual é o tempo de vocês. Há tempo ainda para pelo menos duas pessoas falarem, para interagir, ou há gente com prazo esgotado? O SR. VITAL DIDONET (Fora do microfone.) - Há tempo. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - É à Mesa que tenho que perguntar, porque, se vocês... Então, há alguém que queira falar? Agora, não é o tempo dos palestrantes; são três minutos para fazer alguma manifestação. Identifique-se lá, por favor. (Intervenção fora do microfone.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - A Senadora Fátima está retornando. Eu vou aproveitar, Senadora Fátima - sente-se aí só um pouquinho -, antes de ele falar, eu quero só fazer alguns comentários. A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN. Fora do microfone.) - Com prazer. Acabei de aprovar um projeto de lei de sua autoria e um requerimento de sua autoria na CDH. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Ai que bom! Na CDH. Eu vou só fazer um comentário rápido sobre o que ouvi, e, depois, passo a palavra para vocês e, enquanto isso, a Senadora Fátima vem para o encerramento com os convidados e as convidadas. Desembargadora Ivone, eu entendo a sua indignação. Agora, não espere muito deste lugar aqui. Aqui o processo... (Intervenção fora do microfone.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Foi o que você disse: "Srs. Senadores, essa lei tem que sair do papel". A gente briga, luta, para haver a lei. Foram não sei quantos anos para esta lei. Agora a gente tem uma luta intensa para se fazer cumprir esta lei. É a sociedade, é a rua, são os pais e mães, movimentos organizados... Porque, aqui, o processo legislativo dura quatro, cinco, seis anos para sair uma lei. Então, gente, é lamentável, mas é a verdade brasileira. Dafne, eu aprendi tanta coisa que eu não sabia, só nesses seus 15 minutos de fala. Imagine se, em cada maternidade, houvesse um profissional da sua área, com o seu jeito, para falar para as mães antes de elas saírem da maternidade! (Palmas.) Então, acho que essa é uma luta que a gente pode encampar, porque as mães entram na maternidade e passam lá, pelo menos, 24 horas. Elas ganham o bebê, depois de 24 horas, vão para casa. Quer dizer, se, antes de irem para casa, houvesse uma palestrinha de 15 minutos para essas mães, certamente muitas coisas mudariam, em relação a todas as crianças, mas principalmente em relação às crianças com deficiência. Mas a sociedade brasileira ainda é muito cruel. Foi o que você falou: "Não é comigo". |
| R | Quando foi aprovada a lei de inclusão, teve dono de escola particular que entrou na Justiça contra a lei, para se desobrigar de dar condições na escola para receber as crianças com deficiência. Ele acha que não é papel da escola dele, que é papel só do Estado. A escola dele é uma concessão do Estado, ele funciona porque o Estado deixa, mas ele não sente que é responsável. Então, eles entraram na Justiça. Felizmente a Justiça negou, mas eles entraram - um grupo do Paraná, se não me engano, entrou na Justiça para que eles não fossem obrigados a cumprir esse requisito. Eu lidei muito com criança, porque sou a 5ª de 14, então os mais novos eu ajudei a criar. (Risos.) (Intervenção fora do microfone.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - A experiência. Eu sempre digo assim às mães mais novas, aos pais mais novos da minha família: a criança, da hora que nasce, precisa de assistência - e até foi dito aqui que, ainda no útero. Só não para ser dona do corpo da mulher, porque às vezes querem fazer leis para impedir a mulher de ser dona do seu corpo. Acho que temos que trabalhar a mulher para ela não querer abortar, mas o corpo é dela. Acho que desde o útero deve ser dado cuidado para a mãe, assistência para a mãe, para essa criança nascer bem. Tem também a questão do cuidado enquanto a criança é pequenininha. A gente pensa que ela não sabe nada e, portanto, pode fazer qualquer coisa na frente dela, como brigar. A criança com um ano já percebe que o tom de voz da mãe ou do pai mudou, porque não é normal eles conversarem, brigando na frente delas. Não é normal, então ela percebe que o tom de voz alterou. Desde a música que você canta para sua criança - mães cantam cada música, porque agora está na moda uma tal de "sofrência", e você canta para o bebê a música do Pablo, não é? Nada contra ele, mas a música dele não é para se cantar para uma criança. E a história que você conta para ele, que lê para ele, o brinquedo que você dá de presente, tudo isso influencia. E, às vezes, a pessoa não tem o menor cuidado, dá um revolverzinho de brinquedo, achando que é um brinquedo; mas é uma arma! Acho que precisamos trabalhar essas coisas. A casa da gente é o maior laboratório que a gente tem, porque a gente não tem esses programas ainda. Há algumas experiências boas, mas universalizar ainda está muito distante. Agora, essa questão do profissional na maternidade, eu vou lentar, até porque, no meu Estado, o Governo é do meu Partido, então vou conversar para ver se tenho essa experiência, não é? Tem coisas que a gente não faz ou que o governo não faz, porque ninguém deu um toque. Eu fui Secretária de Administração do Estado por dois governos e não via nada de saúde, mas, um dia, eu fui fazer uma visita a uma maternidade, porque me convidaram para visitar a UTI neonatal, que tinha sido ampliada. E eu percebi que as mães dão à luz e saem, no dia seguinte, na garupa de uma moto ou pegam ônibus, com a criança no braço e a sacolinha no outro, para ir para casa. E aí eu disse que deveríamos mudar isso. Todo dia tem que ter uma van do Estado, num horário certo, que vá deixar essas mães em casa. A despesa era mínima. Eu nem sei se continua, mas, durante o governo inteiro, coloquei lá, com uma despesa mínima, uma pequena van para, todo dia às 10h e às 16h, horários da alta - que os médicos liberam -, levar essas mães para casa. É uma coisa muito simples, mas ninguém havia pensado nisso. |
| R | Então, quem sabe a gente consegue colocar o profissional para conversar com as mães antes de elas saírem da maternidade? Muito obrigada. Quem é que está fazendo a pergunta? Senadora Fátima, venha ocupar seu lugar para encerrar aqui. Andréa Melo quer fazer uma pergunta. É Andréa? (Pausa.) Ele levantou a mão primeiro. Vamos lá; o senhor. Identifique-se, por favor, para ficar registrado. O SR. JOSÉ MARTINS FILHO - Eu sou José Martins Filho, professor de Pediatria da Unicamp, presidente da Academia Brasileira de Pediatria, trabalho com a área de pediatria e puericultura e pediatria social e comunitária, e quero só fazer um comentário muito rápido a todas as pessoas que falaram. Realmente, foram muito importantes as colocações. Eu queria cumprimentar a Senadora e o Senado, porque está em discussão no Senado - não sei se foi já foi aprovada - a ampliação da licença maternidade de quatro para seis meses. Parece que isso é algo que está em discussão e está saindo. Eu apenas gostaria de colocar que, para nós pediatras e para todas as pessoas que lidam com crianças e que conhecem a ciência, a neurofisiologia do desenvolvimento cerebral - ontem eu fiz uma palestra sobre isso -, é fundamental que, quanto àquilo que está escrito na lei, prioridade para a família na relação com a criança, seja lembrado que a prioridade também tem que ser a possibilidade de as mães que quiserem e puderem e tiverem condições ficarem mais tempo com as crianças. É por isso que muitos países do mundo inteiro têm licenças maternidade até de dois anos, e o pai, às vezes de um ano. Então, quero parabenizar, porque nós conseguimos ampliar para o pai, 20 dias, o que é muito pouco ainda; para as mães, estamos quase conseguindo ir para seis meses. Mas é evidente que, sem deixar nenhuma dúvida de que a creche é fundamental e soluciona o problema social e o problema das nossas famílias e a importância dela, há a possibilidade de que o Brasil caminhe em direção a outros países, inclusive latino-americanos, em que a licença maternidade é maior do que seis meses, alguns de um ano e meio, como aqui os nossos vizinhos. Seria importante que a gente pudesse continuar nessa discussão. E isso é muito importante porque hoje, pelo que se sabe de neurofisiologia, dos famosos primeiros mil dias, da importância desse período no desenvolvimento cerebral das crianças, na articulação neuronal das sinapses do cérebro, é fundamental que a criança viva o mais possível dentro da sua família. É óbvio que, na realidade, nem sempre isso é possível, e muitas vezes você tem que abrir mão dessa situação. Agora, se for opcional, para as mães que querem e podem, ficar com seus filhos mais tempo, seria maravilhoso se nós pudéssemos levar até um ano. Para as que não podem, as que não têm essa condição, sim, nós teremos que ter à disposição creches de alta qualidade, com plano de desenvolvimento, com trabalhos como da Dafne, com trabalhos como o que o Vital falou aqui tão bem, e as coisas que precisam ser discutidas. Então, eu queria... (Soa a campainha.) O SR. JOSÉ MARTINS FILHO - Eu só queria terminar dizendo que nós, pediatras, estamos muito preocupados, porque essa possibilidade de as crianças terem as suas famílias ajudando no desenvolvimento é fundamental para o resto da vida. Crianças que não têm essa chance têm mais dificuldade no desenvolvimento precoce e posterior na infância. Obrigado. A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Nós queremos agradecer a participação do Dr. José Martins e, agora, rapidamente, passar a palavra para Andréa. A SRª ANDRÉA - Boa tarde. Meu nome é Andréa, sou de Santo Antônio do Descoberto. Como não é todo dia que nós estamos perto de uma desembargadora, e lá nós atendemos 2.227 crianças de educação infantil, há algumas situações que nós vamos resolvendo no dia a dia, mas surgem muitas dúvidas sobre se está certo, se está errado. |
| R | Em uma situação de tirar a criança da família, pelo Conselho Tutelar, o momento da retirada pode ser feito quando a criança está na creche? O que queremos é que ela se sinta bem, acolhida e segura na creche e leve consigo, vida afora, esse sentimento. Como ela pode, depois de vivenciar essa situação, sentir-se em relação a essa instituição? Provavelmente, ela vai voltar. O conselho tutelar pode fazer dessa forma essa retirada, ela estando dentro da creche, mesmo que o caso não envolva violência física ou sexual? Nesse caso a gente compreende, tudo bem, tirar de dentro da creche já que ela não pode mesmo voltar para casa. Nesse caso, a gente compreende que essa prática é correta, mas não em outras situações, em que a gente entende que pode ser feito, mas não na creche; tirar da creche, onde está com as colegas, a professora. Enfim, esta é a nossa dúvida: essas práticas estão certas? Erradas? Obrigada. A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Só um momento. A senhora pode anotar? Há mais uma pessoa inscrita. Márcia Dias, por favor. A SRª MÁRCIA DIAS - Bom dia ou boa tarde - não sei. Sou servidora do Senado Federal e atuo como voluntária no Instituto Horizontes, de educação ambiental de crianças, jovens, adolescentes e adultos também. A minha pergunta é: o Congresso Nacional já fez a lei. Nós conseguimos, com muito trabalho, com muita dedicação, com muita atuação da comunidade, da sociedade e dos nossos Parlamentares, que saísse o marco legal. A minha pergunta é - não sei se a Mesa vai conseguir me responder isso, mas vou fazer a pergunta para ter uma resposta posterior talvez: existe um planejamento para ser colocado em ação para capacitação dos agentes públicos, professores, assistentes sociais, advogados, servidores e afins, que atuam nas áreas relacionadas à primeira infância, à infância e à adolescência para que realmente promovam a implantação do marco legal? Há uma previsão de um trabalho conjunto das áreas de saúde, educação e cultura e do Judiciário nesse sentido, para engajar toda a classe de servidores e também para que esses servidores sejam multiplicadores junto à sociedade, para que se engajem também nessa implantação do marco legal? Essa é a minha pergunta. Obrigada. A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Nós agradecemos à Márcia. Pedimos a compreensão de todos, porque nós vamos ter a oportunidade de um seminário com novos painéis - não é, Vital? - já agora a partir das 14h. Então, nós vamos encerrar os nossos trabalhos aqui da presente audiência pública. Vamos facultar a palavra à Desembargadora, Drª Ivone, para que ela possa responder as perguntas aqui formuladas. A Márcia fez uma pergunta agora muito importante. Lamento que não haja ninguém aqui do Poder Executivo para responder. (Intervenções fora do microfone.) A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Certo. Tudo bem, vamos facultar. Nós vamos passar agora a palavra, no encerramento dos trabalhos, para a Drª Ivone e, depois, para Vital e para as nossas duas outras convidadas, se quiserem fazer algumas considerações. Só gostaríamos de pedir brevidade em face do adiantado da hora. Com a palavra, Drª Ivone. A SRª IVONE FERREIRA CAETANO - Quem fez a pergunta, por favor? A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Foi a Andréa. |
| R | A SRª IVONE FERREIRA CAETANO - Andréa, você é Conselheira ou Comissária de Justiça? Você é Conselheira Tutelar? A SRª ANDRÉA - Não; eu trabalho na coordenação das instituições de educação infantil. A SRª IVONE FERREIRA CAETANO - Certo. Veja bem, para se retirar uma criança da mãe ou da convivência familiar, são necessárias três coisas: que haja violência, que haja abuso sexual ou que haja uma negligência extrema. Por exemplo - coisas que já vi na minha vida -, a criança que ficou sozinha dentro de casa num berço que não era berço misturada a fezes e comida. Isso leva, o resto não. Quanto ao resto, pelo menos na minha visão, tem que haver uma avaliação da real situação. E é muito comum, muito mais do que os senhores pensam, as crianças de famílias pobres, de mães pobres, serem retiradas exatamente porque são pobres. Pobreza não pode, de jeito nenhum, retirar uma criança de sua família. Outra coisa: tem que ser respeitado o direito da criança, porque a criança adora ficar com a sua mãe. Isso deveria ser levado em consideração, mas não é. Não é levado em consideração por vários operadores do Direito, não estou falando só pela juíza. Agora, se o Conselho foi lá, pode ser que tenha havido uma decisão do juiz nesse sentido, um mandado nesse sentido. Não havendo, não pode. Tomou conhecimento de alguma coisa? Leve para o Ministério Público, leve para a vara para que seja analisado. Agora, há violência? Há abuso sexual? Há um caso como o que eu mencionei? Alguns tipos de negligência, realmente, depõem contra a dignidade da criança. E, veja bem, eu constatei isso quando eu era criança, sequer sabia que um dia seria juíza, sequer sabia. Eu vi quando duas crianças foram abandonadas numa favela, porque a minha mãe foi chamada para ver se resgatava aquelas crianças, se ajudava aquelas crianças. As crianças estavam misturadas no berço - ou sei lá o que era aquilo -com comida, porque a mãe saía cedo - como já falei, a mãe era empregada doméstica - e deixava as duas filhas sozinhas dentro daquele cômodo com comida do lado para não sentirem fome. E as fezes? Eu falei aqui de forma muito pontual, mas eu já vi muita coisa na minha vida. Então, essa retirada da criança pode ter vários objetivos. Agora, se for favorável à proteção daquela criança, para respeitar o direito da criança, sobretudo considerando o que for melhor para aquela criança, pode. Se não, não, e só nesses três casos que mencionei. Tem que ser examinado, e o Ministério Público tem que se manifestar para que o juiz... E aí é outra coisa, cada um decide de um jeito. Mas não é assim, chegou levou, muito menos se for uma família pobre. (Palmas.) A SRª ANDRÉA - Muito obrigada. A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Drª Ivone, muito obrigada. Vital, por favor. A SRª IVONE FERREIRA CAETANO - Eu é que agradeço. O SR. VITAL DIDONET - Eu vou responder muito rapidamente. A Márcia está aí? (Intervenção fora do microfone.) |
| R | O SR. VITAL DIDONET - Você colocou uma questão decisiva e fundamental. No marco legal da primeira infância, nós temos três ou quatro incisos, artigos ou parágrafos que mencionam a necessidade da formação inicial e permanente de todos os profissionais que têm contato com as crianças. Esse é um ponto fundamental. Agora, em vários setores isso acontece. A formação inicial se dá ou na universidade - e é por isso que estamos fazendo uma tentativa no sentido de os cursos de formação superior incluírem disciplinas para os profissionais entenderem o desenvolvimento infantil e direito de criança -. ou naqueles de educação infantil, que já é praxe, já é normal. O que se está tentando fazer é que os programas, os planos de ação tenham a formação em serviço, oportunidades de os profissionais refletirem sobre a sua prática e terem debates e aprofundarem o seu conhecimento a partir das informações teóricas e da sua vivência cotidiana. Isso é uma coisa que alguns programas estão fazendo, podia citar alguns exemplos de programas que fazem isso, mas a maioria não. Abandonam o profissional e ele que se vire e tal. Esse é um grande defeito, porque a pessoa se cansa, aquilo passa a ser rotineiro... Veja, por exemplo, uma vez uma professora me disse: "Eu tenho 18 anos de experiência de educação infantil". Eu pensei: "Puxa, que bacana, 18 anos de experiência!". Daí, depois de cinco minutos de conversa eu percebi que ela tinha um ano de experiência e 17 de repetição, porque ela nunca teve oportunidade de questionar aquela experiência inicial de interagir com outros profissionais, de buscar a leitura de uma nova informação teórica, de sorte que ela pudesse aprofundar esse conhecimento. Então, acho que essa é uma falha, é uma irresponsabilidade da gestão dos programas não dar o direito dos profissionais que estão trabalhando na prática de aprofundarem os seus conhecimento. Você tem razão: a gente tem que batalhar muito para conseguir isso, como a Fátima disse, com o poder público que é o que gere os programas públicos. A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Obrigada, Dr. Vital. Drª Dafne, por favor. A SRª DAFNE HERRERO - Eu só queria dizer para vocês brincarem muito com os filhos de vocês. Brinquem muito. A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Drina... (Risos.) (Palmas.) A SRª DRINA CANDILIS (Tradução simultânea.) - Eu queria simplesmente dizer que as crianças se tornam adultos e, para ser bons pais, nós precisamos cuidar bem deles quando são crianças porque a gente não se improvisa pai tão facilmente assim. É isso que eu queria dizer e é o que nós vamos tentar fazer com essas pessoas que a Dafne viu pequenininhas e que eu vejo adultos. Muito obrigada. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Bom, nós queremos, mais uma vez, agradecer a presença aqui de todos e todas vocês e, mais uma vez aqui, saudar as entidades, as instituições. Enfim, a todos aqueles e aquelas que dedicam boa parte das suas vidas na luta em defesa da educação, na luta em defesa da primeira infância. Quero aqui, por ocasião do encerramento, mais uma vez dizer a vocês que eu tenho muita alegria de, ao longo da minha trajetória político-parlamentar, como professora que sou, ter tido a oportunidade de ter sido a Relatora do Fundeb. Eu fui a Relatora do Fundeb e, volto a dizer, é uma lei que nós temos que prestar muita atenção a ela pelo caráter universalizante que ela tem; pelo fato de que foi o Fundeb, sim, que propiciou nós começarmos a construir no Brasil uma política pública voltada para o acesso educacional à primeira infância. |
| R | O Professor Vital, que está aqui, concorda comigo porque ele, junto à Campanha Nacional pelo Direito à Educação, teve um papel muito importante como representante da sociedade civil para fazer com que nós pudéssemos avançar naquela legislação - não é verdade, Professor Vital? (Intervenção fora do microfone.) A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Incluindo a creche, porque lembremos que quando o Fundeb... Se o Fundef tratava só do Ensino Fundamental, enfim, quem tinha condições bota seu filho numa creche particular e, quem não tem, Drª Ivone? Que é a maioria da população. Como é que ficava? A SRª IVONE FERREIRA CAETANO - Fica numa creche que não tem condição nenhuma. A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - E a maioria dos Municípios - vamos aqui reconhecer -, sem uma forte parceria com o Governo Federal, não tem orçamento suficiente para atender a demanda de zero a três anos, passando pela pré-escola até o Ensino Fundamental. O Fundeb veio para corrigir mais do que uma lacuna, mas uma injustiça, mais do que injustiça. Aliás, é injustiça porque veio para corrigir algo que se chama negação de direitos, e nós estamos falando aqui de negação de direitos numa das fases - os senhores e as senhoras sabem melhor do que eu porque são especialistas - mais importante para o desenvolvimento da vida da criança que são exatamente os primeiros anos. O Fundeb veio nesse sentido, é o primeiro passo para que a gente pudesse constituir uma política de financiamento e uma política de Estado, e essa política de Estado dissesse agora: "Olha, há crianças de zero a três neste País que, para ter o direito à educação, precisa que seja pela via da escola pública". Ele veio exatamente para corrigir isso. Assim como, por exemplo, tive a oportunidade de ter sido a Relatora da presente lei que instituiu o marco legal da primeira infância. Eu quero aqui destacar para vocês um dos dispositivos desta lei muito importante que é a que prevê a extensão da licença-paternidade de cinco para 20 dias nas empresas que aderirem ao Programa Empresa Cidadã. É aquilo que eu dizia no início: isso tem um caráter paradigmático, porque é aquela coisa: não basta só ser pai, não basta só ser mãe. E mais: a gente também está trabalhando aqui com conceito universal da família, porque família é aquela que cuida, família é aquela que cuida com carinho, é aquela que batalha para que suas crianças, para que seus filhos tenham o direito a uma vida com dignidade. O Congresso Nacional já adotou esse dispositivo legal que é a extensão da licença-paternidade de cinco para 20 dias. Eu vou reproduzir aqui a fala do Rodrigo Brum, que é Diretor da Secretaria de Gestão de Pessoas, que foi pai, Drª Ivone, da sua primeira filha em janeiro deste ano e, portanto, já fala exatamente da importância da legislação do marco legal da primeira infância. |
| R | E ele coloca: "Nos primeiros dias de vida da criança, o pai precisa ficar com a mãe; é um momento muito importante para eles. Eles precisam estar juntos o máximo possível. E, com uma visão de gestor, se um pai não tiver esses dias, vai ficar deslocado, pois todos os pensamentos estarão voltados para aquele filho". Então, enfim, agradeço demais a colaboração aqui da Mesa pela formação, pelo preparo intelectual que tem, pela dedicação. Lembro aqui que o nosso seminário continua - não é, Vital?. Exatamente daqui a pouco, às 14h, nós teremos o terceiro painel, que é "Infância em famílias homoafetivas: questões afetivas, jurídicas e sociais". A coordenação é da Senadora Lídice da Mata. Portanto, um painel muito importante. A esse pretexto, eu quero inclusive rapidamente aqui dizer para os senhores e senhoras que, ontem, na Comissão de Direitos Humanos, nós realizamos uma audiência, ocasião em que foi apresentado o resultado de uma pesquisa realizada recentemente, em parceria Brasil com os demais países da América Latina, e o alvo dessa pesquisa é exatamente o ambiente educacional versus a questão do bullying homofóbico, ou seja, a pesquisa foi no sentido de tirarmos um retrato de como andam as nossas escolas, os nossos ambientes educacionais no que diz respeito à questão do respeito à diversidade, em sintonia com aquilo que diz a nossa própria Constituição que ninguém pode ser discriminado, seja por raça, por credo, gênero, peso, deficiência e orientação sexual. Isso está muito claro na nossa Constituição. Só para concluir: a pesquisa traz um dado que deve chamar a atenção de toda a sociedade, principalmente de nós professores, especialistas e agentes públicos. Qual foi o dado que a pesquisa trouxe? Trouxe o dado de que simplesmente mais nada menos do que 73% dos jovens pesquisados, foram eles próprios, afirmaram que sofrem bullying homofóbico nas escolas, ou seja, intolerância, desrespeito, insulto etc., o que não é concebível. Por isso, nós também temos que estar muito atentos a pautas aqui dentro porque, ao invés de virem para promover a educação inclusiva que nós tanto defendemos, há pautas aqui dentro que, se prosperarem, vêm na direção exatamente contrária, como o chamado projeto escola sem partido, apelidado de lei da mordaça. |
| R | Esse é um projeto desumano, porque é um projeto que quer caçar a liberdade de ensinar, caçar a liberdade de aprender, cercear o debate, caçar inclusive o debate com o senso crítico e plural que deve ter na escola, que deve pautar a educação, de acordo inclusive com a nossa própria Constituição e com a nossa própria LDB. Eu fico imaginando que futuro terão as nossas crianças e os nossos adolescentes se, de repente, forem reféns de legislações - repito - tão conservadoras e que remetem a barbáries como essas. Por isso, isso não pode prosperar. Ainda bem que o Ministério Público Federal deu um parecer muito consistente dizendo que esse projeto é inconstitucional. Um projeto como esse não faz bem inclusive à infância das nossas crianças de maneira nenhuma. Comunico que hoje, às 16h, será realizado um encontro técnico com a delegação da Comissão de Educação, Cultura, Saúde e Esporte, do Comitê Permanente da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês, para tratar de assuntos referentes ao sistema brasileiro de administração e serviço à cultura. Convoco também, para dia 29 de novembro, terça-feira, em caráter excepcional, às 11h45, reunião extraordinária desta Comissão, destinada à deliberação de proposições. Por fim, mais uma vez, parabenizo todos e todas que estão participando da 9ª edição do Seminário Cultura e Paz da Primeira Infância e deixo aqui uma mensagem de esperança, a mensagem de não desistirmos, muito pelo contrário, persistirmos sempre na luta em defesa dos direitos dos cidadãos e cidadãs como dever do Estado e, no caso específico aqui, que não percamos nunca a esperança e, portanto, a nossa capacidade de continuarmos lutando em defesa das nossas crianças. Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada a presente em reunião. (Palmas.) (Iniciada às 11 horas e 20 minutos, a reunião é encerrada às 13 horas e 33 minutos.) |
