21/11/2016 - 38ª - Comissão de Assuntos Econômicos, Subcomissão Permanente de Avaliação do Sistema Tributário Nacional

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Declaro aberta a 9ª Reunião Conjunta das Comissões Permanentes, sendo a 38ª Reunião da Comissão de Assuntos Econômicos e a 1ª Reunião da Subcomissão Permanente de Avaliação do Sistema Tributário Nacional.
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Audiência pública interativa. Assunto: apresentar dados e indicadores sobre o procedimento de avaliação da política de equidade e progressividade do Sistema Tributário Nacional. Requerimentos nºs 33, 34 e 35, Senador Lindbergh Farias e outros. Reunião destinada a instruir seguintes matérias, com os convidados: Pedro Delarue, Diretor de Comunicação Social do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil - Sindifisco Nacional, a quem convido para assumir o lugar aqui na mesa; Junior Divino Fideles, Procurador-Chefe do Incra, também convido; Helder Rocha, Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil; Rozane Bezerra de Siqueira, Professora do Departamento de Economia da Universidade Federal de Pernambuco.
Esta reunião será realizada em caráter interativo, ou seja, com a possibilidade de participação popular. Dessa forma, os cidadãos que queiram encaminhar comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do portal e-Cidadania, no endereço www.senado.gov.leg.br/ecidadania, ou ligando para o número 0800-612211.
Os convidados já se encontram à mesa. De acordo com o art. 94, §§2º e 3º, do Regimento Interno do Senado Federal, a Presidência adotará as seguintes normas: cada convidado fará a sua exposição por 15 minutos, depois nós abriremos para questionamentos, e depois os convidados terão outra fala.
É importante situar aos senhores que nós estamos fazendo esse debate sobre nosso Sistema Tributário, que é extremamente regressivo, no momento da discussão de uma PEC, que é a PEC 55, antiga PEC 241, que está dominando os debates aqui no Senado Federal. Amanhã nós vamos ter uma audiência pública às 11 horas da manhã, o plenário do Senado vai virar uma comissão geral, vamos ter várias audiências públicas nesta semana.
Eu, sinceramente... A gente tem tentado aqui convencer os Senadores, porque essa PEC 55 é um plano de austeridade de longo prazo. No momento de uma recessão econômica como essa que a gente está enfrentando, você fazer uma política de austeridade de longo prazo, um ajuste fiscal violentíssimo, na minha avaliação, você vai piorar a situação da economia.
Aqui houve um debate no Senado, e muitos Senadores argumentam dizendo o seguinte: "Ah não, o problema foi a gastança. Nós estamos com um problema fiscal porque houve uma gastança do Governo." Olha, não houve gastança alguma. Vocês sabem que nós tivemos superávit até 2013, o ano de 2015 foi um ano de um grande ajuste fiscal, foi de 2,3% do PIB. O problema que nós tivemos em 2015 foi de frustração de receitas. E nós estamos fazendo uma coisa aqui, é um círculo vicioso, porque num momento de recessão como este você aprofunda os cortes, você piora a arrecadação, e a dívida acaba aumentando.
Na verdade, esses planos de austeridade falharam no mundo inteiro. Onde foram aplicados aconteceu isto: colocou a economia em recessão, piorou a arrecadação e acabou aumentando a dívida. Foi isso que a gente viu aqui. Eu tenho dito o seguinte: eu acho que nós estamos num debate errado.
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O centro do debate do País hoje devia ser como fazermos para alcançarmos o crescimento econômico e protegemos o emprego.
Quando o Presidente Lula assumiu, a dívida líquida em relação PIB era de 57%, caiu para 35%, por quê? Porque a economia cresceu.
Hoje fiz um discurso no plenário, nós estamos vivendo uma crise econômica, uma crise política, mas estamos descambando para uma crise social violentíssima.
Essa crise nos Estados aí, não é só o Rio de Janeiro. O Rio de Janeiro é a face mais avançada disso, mas existem 20 Estados com uma situação muito difícil. E, no caso do Rio de Janeiro, quem está pagando não são só os funcionários públicos, que estão recebendo atrasado, de quem estão tentando cortar com um desconto de 30% de aposentadoria e de salário. Mas lá no Rio, por exemplo, quando eu falo da crise social, de alguns programas como Restaurante Popular, fecharam os restaurantes populares; aluguel social, que é para quem foi desalojado de áreas de risco, que eram nove mil famílias, acabaram com o aluguel social; o Programa Renda Melhor, que é uma complementação ao Bolsa Família, que atingia 110 mil pessoas, foi cortado, são as pessoas mais vulneráveis, mais pobres ali.
Então, neste momento, a meu ver, o que nós tínhamos que ter era uma política para pensar como fazer o País crescer.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Claro, desenvolvimentista, como colocar o País para crescer. Nós já estamos há mais de seis meses no Governo Temer e eu não vi uma medida sequer para colocar a economia para crescer. Eles estão ainda nesta história: "Ah, não, se aprovar esta PEC vai aumentar a confiança dos empresários e os empresários vão investir." Foi o que falaram desde o começo deste processo do impeachment. Eles diziam: "Se afastar a Dilma, a confiança volta e a economia se recupera". Não é nada disso, na verdade o empresário, para investir, tem que ter gente para comprar do outro lado. E, neste momento, no momento em que nós temos uma recessão como essa, as famílias não estão investindo, as empresas não estão investindo, estão endividadas, está havendo queda de rendimento, o aumento do desemprego.
Então, se não for por parte do Estado neste momento para ampliar investimentos, ampliar gastos sociais... Eu sou da tese de que neste momento a gente tem que olhar para o crescimento econômico sabendo que nós vamos ter uma piora dos indicadores da dívida pelos próximos dois anos, mas, depois, quando a gente retomar o crescimento, os Estados podem ter uma saída para esta situação e o Governo Federal também.
Agora, eu queria já passar para os senhores dizendo o seguinte, vejam que para mim o grande problema do País não é o problema fiscal, é como o País crescer. Mas, vamos admitir, pela lógica de quem acha que o grande problema do País hoje é o problema fiscal, porque a dívida começou a crescer depois de 2014, 2015 e 2016. É claro que nós estamos em um padrão em relação à dívida, nós estamos com 42% da dívida líquida, não é nada de mais em um padrão internacional. Eles estão usando muito a dívida bruta, que chega a setenta e tantos por cento, mas na dívida bruta, no caso brasileiro, as pessoas têm que entender uma coisa, porque entram no cálculo da dívida bruta 25% que foram das reservas. Nós temos US$380 bilhões, isso protege a economia.
E quanto a gente foi comprar essas reservas, você tinha que lançar as operações compromissadas para enxugar a liquidez do mercado.
Então, você querer trabalhar com conceito de dívida bruta, na minha avaliação, é um equívoco. Você tem 25% do PIB relacionado às nossas reservas e 9% que estão lá no BNDES.
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Mas o que eu digo, para encerrar a minha introdução aqui, é que mesmo na lógica deles, de que o problema central do País é a questão fiscal, eu entro num tema que é o seguinte: mas estão fazendo uma proposta que não tem nada de equilibrada. É toda em cima do povo mais pobre. Porque eles podiam entrar neste debate em que os senhores vão entrar aqui, que é o do sistema tributário extremamente regressivo que nós temos.
Houve uma reforma, feita por Fernando Henrique Cardoso no final de 95, em que, por exemplo, o Brasil deixou de cobrar tributos sobre a distribuição de lucros e dividendos. Só dois países do mundo, Brasil e Estônia, não cobram, não taxam lucros e dividendos. E foi uma perda gigantesca. Na verdade, no Brasil, a classe média, os trabalhadores têm 50% de impostos indiretos, acabam pagando muito, e os muito ricos, num estudo feito pelos economistas Sérgio Gobetti e Rodrigo Orair, a partir do momento em que a Receita Federal divulgou os seus dados... Porque a Receita Federal brasileira não divulgava, foi preciso o Piketty ter vindo aqui ao Brasil, o Piketty que fez O Capital no Século XXI, reclamou e a partir dali a Receita Federal começou a disponibilizar os dados.
É o seguinte: os milionários, os 71 mais ricos do País, esses aí pagam apenas 6% do que recebem de Imposto de Renda. Então um funcionário público, os senhores aqui, pagam 27,5%, mas o empresário, que ganha R$300 mil, a título de distribuição de lucros e dividendos ele paga 0%.
Então o que eu falo é o seguinte: mesmo na lógica deles, de que eu discordo, se que a grande questão é o ajuste, eles podiam ter feito uma coisa mais equilibrada. Para construir um discurso: "Ah, não, é um ajuste, os banqueiros vão pagar, os mais ricos vão pagar, nós vamos corrigir distorções! Mas não, é um ajuste todo em cima do povo pobre. Os culpados agora são os trabalhadores, os aposentados que ganham um salário mínimo, porque a reforma da Previdência que eles querem fazer é isso: desvincular salário mínimo do benefício previdenciário.
O Temer, que se aposentou com 55, o Padilha, que se aposentou com 53, o Geddel, que se aposentou com 51, estão querendo agora aumentar a idade da aposentadoria de todo mundo para 65 anos.
E os cortes em saúde e educação. Porque você sabe que hoje a gente gasta 19,8% do PIB em despesas primárias. Na Europa é algo em torno de 40%. Lá há o Estado do bem-estar social construído.
Nós temos duas formas de combater desigualdade, que é na arrecadação, no sistema tributário. Com isso a gente não fez, inclusive nos nossos Governos não houve avanço nessa pauta. E a outra forma é quando você gasta. E de fato nós conseguimos diminuir a desigualdade neste País, porque nós aumentamos gastos sociais de 13 para 18% do PIB, a partir do Governo do Presidente Lula.
Eles querem desmontar isso. É de uma perversidade isso aqui. E eles querem cair em 10 anos, de 19,8% do PIB, para 14,8%. Querem cair 5%.
Só onze países no mundo, países muito pobres, gastam menos de 16% do PIB em despesas primárias. Isso só vai ser possível com um mix de maldades, porque quando você olha os 19,8% é o seguinte: 8%, Previdência, e vai ter um efeito demográfico e vai aumentar a conta da previdência; 4,2%, despesa de pessoal, despesa de pessoal eu desculpo informar aos servidores públicos que nos assistem aqui agora, que eu acho que o plano deles é voltar ao que foi Fernando Henrique Cardoso, oito anos sem reajuste de salário.
Aí você tem despesa obrigatória. Despesa obrigatória, quando você gasta mais, é abono, seguro desemprego e BPC, Benefício de Prestação Continuada. Quem recebe Benefício de Prestação continuada?
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É o idoso, acima de 65 anos, a pessoa com deficiência, que tem renda familiar inferior a 1/4 do salário mínimo, ou seja, aquelas pessoas muito pobres, em quem esse Benefício Prestação Continuada tem um peso gigantesco. E o resto, as despesas discricionárias dos Ministérios, como tudo, ou seja, é daí que eles querem cortar cinco pontos do PIB em dez anos.
Eu fiz questão de fazer essa fala até longa, peço desculpas, mas é importante a gente contextualizar esse debate sobre o nosso Sistema Tributário à luz dessa discussão da PEC 55, porque há alternativas. Se eles dizem que o problema é um problema fiscal - lucros e dividendos, os senhores podem apresentar alguns cálculos -, eu sou o autor do projeto, ao qual voltam os 15% que existiam lá atrás em 1995. Eu já vi outras formulações que também...
(Interrupção do som.)
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - ... da tabela progressiva e tal. No cálculo que a gente tinha feito, se voltassem os 15%, isso dá algo em torno de 50 milhões.
Eu também sou autor de outros projetos que coloca IPVA para jatinhos, iates, porque é um escândalo, quem compra um carro zero paga imposto,...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - ... quem compra um carro 1.0, você paga imposto, agora quem compra jatinho no Brasil não paga imposto.
Há outros projetos aqui, juros sobre capital próprio. Isso aqui é uma jabuticaba, só existe aqui no Brasil. É impressionante como é regressivo todo esse processo. Pouca gente sabe. Você sabe que no governo do João Goulart chegou a haver tabela de 65%, a tabela mais alta. É claro que isso teve uma reação grande.
Mas, senhores, vamos começar. Quem começa?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Pode. Pedro Delarue, com a palavra. Ele que é •Diretor de Comunicação Social do Sindifisco nacional.
O SR. PEDRO DELARUE TOLENTINO FILHO - Boa noite, Senador Lindbergh Farias. Obrigado pela oportunidade de vir aqui falar um pouco sobre a progressividade na tributação. Boa noite também à Drª Rozane, ao meu colega da Receita Federal, Auditor Fiscal Helder e ao Dr. Fideles, que é Procurador do Incra.
Nós viemos aqui falar sobre o Sistema Tributário e, como V. Exª falou, Senador, o nosso sistema é absolutamente regressivo, o Sistema Tributário Brasileiro. Nós temos impostos sobre o consumo que chega a uma faixa de 54% da arrecadação, de toda a arrecadação de todas as esferas de Governo. Isso significa o quê? Por que a gente diz que é regressivo? Porque isso encarece os produtos e os produtos ficam encarecidos igualmente para todos. Se você gasta R$1.000 em compras, por mês, e se nessas compras estão embutidos 20% de tributação sobre o consumo, não interessa se você é milionário ou se você é um mendigo, você vai pagar os mesmos 20% sobre aquilo que você consome. Enquanto que, na tributação sobre a renda e na tributação sobre o patrimônio, você pode exercer o critério da progressividade, que significa que o sujeito que ganha mais, paga mais, porque tem mais disponibilidade de renda; o sujeito que ganha menos, tem que pagar menos ou até ser isento de pagar, porque não tem disponibilidade para pagar.
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Agora, se você pega, Senador, e dá R$5 de esmola para um mendigo, esse mendigo vai lá comprar pão e leite para a sua alimentação e vai virar contribuinte, porque há uma tributação embutida de mais de 25% sobre o pão e sobre o leite. Então, ele passa a ser um grande contribuinte em relação à sua renda, que é a esmola, enquanto um detentor de uma grande fortuna vai pagar o mesmo imposto sobre aquele pão e sobre aquele leite, o que para ele vai representar, obviamente, muito menos. Portanto, o sistema tributário brasileiro é altamente regressivo.
Para que os senhores tenham uma ideia, impostos sobre patrimônio, que são os bens que uma pessoa possui, representam apenas 3,76% de tudo que se arrecada no País.
Dr. Fideles, que é do Incra, deve falar alguma coisa sobre ITR, que representa 0,04% da arrecadação. Quanta terra há no Brasil? Mas isso representa apenas 0,04% de tudo que se arrecada no País.
Enquanto o Imposto de Renda Retido na Fonte sobre o rendimento do trabalho representa 57,3% do total do que é retido na fonte, o Imposto de Renda sobre o Capital, que se refere aos investimentos dos ricos, representa apenas 25% daquilo que é retido na fonte no País. Quer dizer, é uma distorção tributária.
E aí nós vemos como é nos demais países do mundo. Aquela barra lilás representa o imposto sobre a renda. No Canadá e nos Estados Unidos, 50% da tributação incidem sobre a renda. No Brasil, vocês vão ver que é um pouco mais de 20% apenas. Já o imposto sobre o consumo, que é o último ali - o azul clarinho -, no Canadá e nos Estados Unidos, representa menos ainda, representa cerca de 15%, enquanto, no Brasil, o imposto sobre o consumo chega perto dos 50%.
O que nós temos que buscar fazer, Senador, é resgatar os princípios de justiça tributária. O Estado, como o senhor falou, tem a obrigação de intervir para retificar a ordem social e criar um sistema tributário que seja capaz de distribuir renda, fazendo com que as camadas mais ricas da população paguem mais tributos e a classe média e os mais pobres paguem menos tributos.
O sistema tributário deve favorecer o crescimento do PIB per capita, e não o do PIB simplesmente, analisando a quanto cada pessoa tem direito ou de quanto se apropria de parcela da riqueza nacional. O PIB per capita, no Brasil, é simplesmente sofrível.
Para que vocês tenham uma ideia, no ano de 2006, apenas 5.292 contribuintes, em todo o Brasil, apresentaram rendimentos tributáveis acima de R$1 milhão. Esse número de 5.292 não chega nem perto de uma Vieira Souto, no Rio de Janeiro, nossa terra. Há muito mais de 5.292 pessoas que moram de frente para o mar na Vieira Souto e, evidentemente, têm uma renda tributável acima de R$1 milhão.
Para vocês terem uma ideia, o Brasil tinha, naquele ano de 2006, 220 mil milionários sob a seguinte perspectiva: milionário, para efeito desse estudo, é aquele que tem mais de US$1 milhão aplicado no mercado financeiro.
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Não é US$1 milhão de patrimônio, é US$1 milhão aplicado no mercado.
Então, havia 220 mil milionários no Brasil em 2006 e apenas 5.292 declararam uma renda acima de um milhão. O que é isso? É sonegação? Não. Isso é uma concessão da legislação tributária. E o que é? É exatamente aquilo de que V. Exª estava falando antes, a tributação de lucros e dividendos.
Até 1995, os lucros e dividendos distribuídos eram tributados em 15%. A partir daí, por uma série de questões que aconteciam naquele momento, o Brasil tinha que captar recursos do exterior, foi oferecida a isenção de lucros e dividendos. Ou seja, o que é comum hoje? A pessoa é dona de um negócio, é sócia de um negócio, é proprietária ou acionista, declara um pró-labore, que seria o salário do sócio ou do acionista, abaixo do nível de isenção. Ele fala que ganha aí R$18 mil por ano e fica isento do Imposto de Renda da Pessoa Física. E como ele também é isento do Imposto de Renda da pessoa quando ele recebe como acionista, e às vezes recebe R$1 milhão, R$2 milhões, R$10 milhões, R$50 milhões totalmente isentos de Imposto de Renda, não paga nada de Imposto de Renda.
Na realidade, ele não paga nada de imposto. Nem do trabalho assalariado, que seria o pró-labore, o equivalente ao trabalho assalariado, e nem da distribuição de lucros a que ele tem direito. Isso explica porque o Imposto de Renda na fonte recolhido sobre o trabalho representa 57% do total retido na fonte e o Imposto de Renda sobre o capital, que é o investimento das pessoas que detêm a maior renda no País, representa apenas 25,1% de tudo que é recolhido na fonte sob a rubrica de Imposto de Renda.
Isso claramente demonstra uma distorção e claramente demonstra que lucros e dividendos devem ser tributados. E aí, como?
Vamos fazer uma comparação de como é, porque muitos economistas vão dizer que isso é bitributação. Primeiro não é bitributação porque a pessoa jurídica não se confunde com a pessoa física. A pessoa física é uma pessoa e a pessoa jurídica é outra pessoa. Não se pode confundir o dono da empresa com a empresa. A empresa paga impostos e o dono da empresa também paga impostos. E isso acontece em todo país do mundo, menos no Brasil e na Estônia, como V. Exª falou.
Então, existem algumas modalidades em outros países. Por exemplo, na Alemanha, são alíquotas diferenciadas, que é o sistema que a gente quer propor aqui para o Brasil, de pessoas que são sócias e acionistas das demais pessoas físicas. No Brasil, é isento. Nos Estados Unidos, o sujeito é tributado integralmente. É tributado na pessoa física e na pessoa jurídica, trinta e tantos por cento na pessoa jurídica e trinta e tantos por cento na pessoa física. Por isso que a tributação sobre a renda nos Estados Unidos é 50% de tudo que é arrecadado naquele país.
Você vai nos Estados Unidos e diz: "Mas aqui são 50% de tributação sobre o produto que eu estou comprado e lá nos Estados Unidos são 10%." São 10% porque eles cobram muito imposto sobre a renda e podem então cobrar menos imposto sobre consumo.
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(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PEDRO DELARUE TOLENTINO FILHO - E é assim na maioria dos países. Na França é o sistema de imputação, em que você tem um crédito para abater aquilo que você, como sócio, a sua empresa pagou, você vai pagar menos imposto. Vai pagar, no caso de Portugal, 3/5 do imposto que foi pago para a empresa, você tem como abatimento.
Outros economistas vão dizer - e dizem, não é? -: "Não, mas isso vai inibir o investimento", porque é justamente essa isenção que faz com que os empresários vão investir nas suas empresas, e se não houver esse incentivo, o empresário não investe." E aí, em 1996, o investimento total no Brasil era de 17,4%, quando começou a tributação sobre lucros e dividendos. E em 2012, era de 17,64%. O investimento no Brasil não aumentou nada em função da isenção da distribuição de lucros e dividendos. Continua exatamente a mesma coisa e muito abaixo de outros países, inclusive países emergentes. Então não é isso que vai deprimir o investimento no Brasil. Não é a tributação de lucros e dividendos e nem a isenção da tributação de lucros e dividendos que vai fazer ou que fez com que haja menos investimento privado ou público no País.
Então nós montamos essa tabela, Senador. É uma tabela com alíquotas diferenciadas, tipo uma tabela progressiva, como há para as pessoas físicas, em que o empresário que ganha até R$60 mil não vai pagar lucros e dividendos, vai continuar isento. De 60 a 120, ele paga 5%, e há uma parcela a deduzir; de 120 até 240, 10%; e acima de 240, aí é que ele vai pagar 15%. Com isso, o que acontece? O que vai acontecer é o seguinte: até 60 mil, no ano base de 2010, nós tivemos 732 mil declarações, que representam 65% do total, com um valor arrecadado que representa só 6% do total declarado de lucros e dividendos. E aqui você vê na última lá, acima de 240 mil são apenas 122 mil declarações, que representam 10% do total, mas representam 75% do valor arrecadado. Da forma como nós programamos, quem ganha acima de R$240 mil vai representar 94% do valor arrecadado. E os outros, praticamente todos, quem ganha abaixo de 240 mil por ano, e aí nós estamos falando de empresários que ganham abaixo de R$20 mil por mês, vão estar praticamente isentos ou totalmente isentos de pagar a distribuição de lucros e dividendos.
Por que nós fizemos isso, por que nós imaginamos isso? Para incentivar o micro e o pequeno empresário. Esse, sim, precisa de incentivo do Estado. O grande empresário, aquele que ganha mais de 240 mil por ano, às vezes milhões de reais por ano, não precisa de incentivo do Estado para sobreviver. Com isso a gente arrecadaria 17 bilhões, isso em 2010, num total de R$18 bilhões por ano, que hoje, corrigidos, dariam cerca de 30 bilhões por ano. Na sua conta, Senador, eram 50; com essa isenção, nós vamos arrecadar 30 bilhões dos ricos, e o pequeno e o médio empresário vão estar exonerados, liberados totalmente, ou quase totalmente, dessa tributação.
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O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - No meu projeto, na verdade, são 15, e eu tiro o Simples. O cálculo que foi feito é de que daria uma arrecadação de 50 bilhões. Mas eu acho muito válidas essas várias simulações que pode haver.
O SR. PEDRO DELARUE TOLENTINO FILHO - É porque há um outro aspecto, que é - e aí eu vou chegar nos seus 50 - a remessa de lucro ao exterior. E aí você vai chegar a outros 20 bilhões, porque o Brasil exporta tributo. O que acontece? Uma grande empresa multinacional que invista aqui no Brasil, na hora de ela distribuir o lucro, ela vai distribuir com total isenção. Ela vai ser tributada lá na Alemanha, na França. Aqui no Brasil ela não é tributada.
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Isso é um absurdo!
O SR. PEDRO DELARUE TOLENTINO FILHO - Então, o esforço do nosso trabalhador vai gerar riqueza onde? Lá na Alemanha, lá na França, e não aqui no Brasil, porque é lá que ele vai ser tributado, apesar de o fruto do trabalho ter sido desenvolvido aqui no Brasil. Então, é um absurdo que ainda hoje - isso foi criado lá em 1996, porque o País estava falido e precisava desesperadamente atrair capital do exterior, e criou-se a isenção -, injustificadamente, isso continue existindo. Depois de quase 20 anos - está fazendo 20 anos este ano - não se tomou... Porque a isenção é uma coisa que se faz em função de determinada situação econômica. Cessou aquela necessidade, você acaba com aquela isenção. E essa isenção continua, sem a menor necessidade de existir.
Já estou terminando, por causa do nosso tempo.
IPVA, que foi o que V. Exª falou, que já havia: os helicópteros não pagam Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores. Um helicóptero, uma lancha, um jatinho particular são veículos automotores - ou não? No entanto, não pagam IPVA. Aí, vem alguém, algum engraçadinho pode dizer, Senador, que não se asfalta o mar e nem se asfalta o céu. Mas o IPVA é um imposto; o imposto não tem destinação específica. Imposto pode servir, por exemplo, para pagar iluminação pública - não é para asfaltar rua; não é só para asfaltar rua. Então, não faz nenhum sentido e não tem nenhum cabimento alguém dizer que jatinho, helicóptero, lancha e iate particulares, de pessoas que possuem um alto excedente de renda, não vão pagar IPVA, porque eles não estariam pagando IPVA para asfaltar rua: estariam pagando IPVA para o Estado fazer qualquer coisa que necessite daqueles recursos, ou para investir. E isso representaria, miseravelmente, mais uns 2,7 bilhões, o que nem é muito dinheiro, Senador, mas é pelo exemplo que o Estado brasileiro tem de dar.
Já partindo para o encerramento, nós teríamos de aumentar o imposto sobre patrimônio de 3,76% para 12%, como é em todo país do mundo, instituindo o imposto sobre grandes fortunas; aumentando a progressividade do ITR - 0,04% é uma vergonha; instituindo a tributação do IPVA sobre veículos aéreos e aquáticos de luxo; adotando uma verdadeira progressividade para a transmissão, inter vivos ou por herança, de bens de grande valor.
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Você imagina, por exemplo, hoje, 4% de tributação sobre herança. Não interessa se vai deixar de herança 50 bilhões ou se vai...
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - No máximo 8%.
O SR. PEDRO DELARUE TOLENTINO FILHO - No máximo, são 8%; na maior parte dos Estados, são 4%.
E o que acontece é que não interessa se você tem cem mil de herança ou se tem 50 bilhões de herança, você vai pagar 4%. Não há menor progressividade. Isso é defender o patrimônio dos ricos e tributar injustamente o patrimônio dos pobres.
Então, Senador, com o fim da isenção, o aumento do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica, que no Brasil se paga muito pouco, representa 7% no total da arrecadação, tem que aumentar. E sem aumentar muito a carga tributária, nós podemos aumentar a eficiência da administração tributária, da máquina tributária. E parece que se joga em sentido contrário. Sempre se joga no sentido contrário, de diminuir a eficiência da máquina tributária, talvez para que, ela sendo menos eficiente, os ricos possam ter ainda mais válvulas de escape. Agora, nós, auditores fiscais, estamos, por exemplo, sofrendo com o PL 5.864, que tira a autoridade do auditor fiscal, dilui a autoridade fiscal, tira prerrogativas do auditor fiscal, e, em vez de fortalecer um projeto que veio do Governo, em vez de fortalecer a máquina pública, a máquina arrecadatória do Governo, está contribuindo para enfraquecê-la ainda mais.
Então, nós vamos ter, por esse viés, cada vez mais um País de mais ricos, de mais privilégios e de pobres sendo cada vez mais sacrificados.
Senador, vou ficar por aqui. Teria mais coisas para falar, mas já tomei boa parte do tempo da audiência. Gostaria de agradecer e de me colocar à disposição para o debate. E sempre que V. Exª precisar, estamos à disposição.
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Eu agradeço muito ao Pedro Delarue, representando do Sindifisco Nacional.
Há um tema que sei que ele explora muito, que é o da sonegação no País, que é outro assunto extremamente importante porque infelizmente grande parte das empresas brasileiras sonegam, têm instrumentos de sonegação.
Agora, quero chamar para usar a palavra a Profª Rozane Bezerra de Siqueira, professora do Departamento de Economia da Universidade Federal de Pernambuco.
A SRª ROZANE BEZERRA DE SIQUEIRA - Primeiramente, gostaria de agradecer o convite da Comissão de Assuntos Econômicos e de dizer que, ao ver o convite, eu considerei extremamente relevante o foco na questão de dados para mensuração da progressividade do sistema tributário brasileiro e dos procedimentos.
E com foco nisso é que nós organizamos a apresentação. E como vocês estão vendo no eslaide, a gente pergunta: o sistema tributário brasileiro é regressivo?
A visão comum é de que o sistema tributário brasileiro é regressivo ou extremamente regressivo, mas a gente chama a atenção, olhando para os dados disponíveis, que estão nas Pesquisas de Orçamento Familiares publicadas pelo IBGE, ocorre que há alguma limitação nesses dados que leva a essa conclusão de alta regressividade do sistema tributário brasileiro, e nós vamos concentrar nossa discussão nisso.
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Essencialmente, o problema ocorre, porque para você estimar a incidência dos tributos indiretos... O que a gente chama de tributos indiretos são os tributos sobre consumo, que são os tributos que representam 50% da carga tributária nacional, pelo menos 50%, e que são pagos por todos de forma indiscriminada, pelos pobres e ricos.
Então, para a gente estimar a carga tributária indireta, a gente precisa das alíquotas sobre bens e serviços e aplicar essas alíquotas sobre a cesta de consumo de famílias em diferentes estratos de renda. E, aí, então, você tem o valor pago do imposto por cada família. Depois de fazer isso, a gente vai dividir o imposto pago. Normalmente, o que se faz é dividir pela renda e, aí, você tem a carga tributária da família.
O que ocorre é que a renda, nessas pesquisas de orçamento familiar, a renda das famílias mais pobres, essencialmente no primeiro decil, ou seja, entre os 10% mais pobres da população e os 20% mais pobres da população, é altamente subestimada. Existe um déficit orçamentário, quer dizer, uma diferença entre renda e despesa nas famílias nesse estrato da população, 20% mais pobres, de 52%. Ou seja, a despesa é 52% maior do que a renda.
Isso faz com que, quando você divide o imposto que foi calculado sobre o consumo, porque tem quer ser sobre o consumo, pela renda, a carga tributária fique muito elevada, extremamente elevada para essas famílias. Algumas famílias aparecem com carga tributária acima de 100% e, quando você calcula a média então, a carga tributária dessa família vai ser superestimada.
Então, o que a gente faz é propor uma correção, um ajustamento na renda dessas famílias dos estratos mais baixos, as famílias mais pobres, e o ajuste que a gente faz é o seguinte: quando a renda está abaixo da despesa, ou seja, despesa maior do que a renda, a gente adota a despesa como uma proxy para a renda.
Esse fenômeno de subestimar a renda dos mais pobres não é uma questão só do Brasil, não ocorre só aqui. Mesmo nos países mais desenvolvidos, há problemas de captar adequadamente a renda das famílias nos estratos inferiores, por causa da informalidade, da irregularidade, tipo de atividades que exercem, enfim.
E, quando a gente faz essa correção, o que é que acontece com a distribuição da carga tributária indireta, dos tributos que incidem sobre consumo? Se a gente dividir o valor do imposto pago pelo consumo, a distribuição da carga tributária é proporcional. A gente vê ali, naquela coluna tem porcentagem da despesa de consumo, imposto como proporção da despesa de consumo. É cerca de 17%, aproximadamente. É proporcional a incidência sobre o consumo.
Ou seja, apesar de a gente ter inúmeras alíquotas, inúmeros regimes na tributação indireta, várias tentativas de desonerar os pobres com a desoneração de cesta básica etc., o sistema falha em tratar de forma diferenciada os mais pobres.
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Isso acontece por causa da complexidade do sistema, da cumulatividade, pois a gente trabalha com alíquotas efetivas. Então, por exemplo, combustível e transporte vão entrar como insumo na produção de alimentos. Isso faz com que a alíquota sobre alimentos também seja elevada, enfim, tem-se a incidência aproximadamente proporcional.
Quando você divide a carga tributária pela renda, que é o que normalmente se faz, aí, sim, o primeiro grupo, estrato, que são os 10% mais pobres da população, aparece com a carga tributária de 34% da renda. Essa é bem mais elevada do que a carga tributária sobre os 10% mais ricos, que são cerca de 12% da renda.
Então, aparece uma regressividade bastante expressiva quando você divide o imposto sobre consumo pela renda. Quando você faz o ajuste da renda, essa regressividade é significativamente diminuída. Você tem a carga sobre os 10% mais pobres, com 15,4% da renda, e essa carga cai até cerca de 11% da renda para os 10% mais ricos da população.
Então, a incidência dos tributos sobre consumo é regressiva, mas bem menos do que quando você utiliza a renda declarada nas pesquisas de orçamentos, que está subestimada para as famílias mais pobres.
Bom, aí a gente precisa calcular então a incidência da distribuição da carga dos tributos diretos. São os tributos sobre a renda. Aqui, nós consideramos o Imposto de Renda Pessoa Física e as contribuições previdenciárias.
O que a gente vê é que contribuição previdenciária é progressiva. Esses mais baixos pagam muito pouco. Por quê? Por causa da informalidade, porque as alíquotas da contribuição também são progressivas. Mas a progressividade não é alta. Ela aumenta pouco. Os 10% mais ricos pagam 4% da renda de contribuição previdenciária.
O Imposto de Renda Pessoa Física é um imposto progressivo. O Imposto de Renda Pessoa Física no Brasil é um dos mais progressivos no mundo. Ele é progressivo no sentido de que a carga tributária aumenta na medida em que a renda aumenta. Essa progressividade vem muito pelo fato de o nível de isenção ser elevado no Brasil.
Então, vemos ali, por exemplo, que até o sexto grupo de renda, que são os 60% mais pobres da população ou 70%, não paga Imposto de Renda. Na verdade, 90% da arrecadação do Imposto de Renda se concentra nos 10% mais ricos da população, no último grupo.
Então, quando a gente soma, você tem a carga total, que é progressiva do Imposto de Renda. A carga aumenta de 1% até 10% para os 10% mais ricos da população. Então, você tem uma incidência progressiva no caso do Imposto de Renda. Na incidência total da carga tributária, você soma diretos e indiretos. Quando você usa a renda ajustada para corrigir a subestimava da renda dos decis mais pobres, você tem uma incidência que eu avaliaria como aproximadamente proporcional, de que o sistema tributário brasileiro não é progressivo nem regressivo, mas aproximadamente neutro, do ponto de vista distributivo.
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A gente tem uma alíquota um pouco maior no último decil de renda, mas há também... Esse Imposto de Renda Pessoa Física capta essencialmente a tributação da renda do trabalho. Essas pesquisas também têm problema de captar a renda dos muito ricos, mas esse...
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Era isso, professora... Desculpe-me interromper.
A SRª ROZANE BEZERRA DE SIQUEIRA - O.k.
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Quando a gente pega os 10% mais ricos e essa tabela do Imposto de Renda, só há quatro faixas. A última faixa; 27,5%; é de quem recebe acima de R$5 mil. Quem recebe acima de R$5 mil e está nesses 10% mais ricos pode ser considerado uma pessoa rica.
Mas, se ele recebe R$50 mil ou R$5 mil, ele paga a mesma coisa. E o desvio aqui que eu falo... Eu estava falando de um estudo que eu vi aqui do Sérgio Gobetti e do Rodrigo Orair, em que eles dizem que o problema não está nos 10% mais ricos, problema está nos 0,05% muito ricos, os grandes milionários.
Eles fazem um estudo em que pegam, cruzam tudo e batem o seguinte: esses 71 mil acabam pagando de Imposto de Renda apenas 6%. Há muita isenção de tributação e distribuição de lucros e dividendos, e eles acabam pagando alguma coisa em ganhos de capital, quando eles vendem terrenos.
Eu queria só... Na verdade, nós já tivemos no Brasil 12 faixas. Então, eu concordo com esses números que a senhora levantou, mas acho que há um problema aí na divisão dos 10% mais ricos, na estratificação dos 10% mais ricos - aí é que há uma grande injustiça.
Seria bom abrir ali esses 10%, que a gente vai ver como é injusto.
A SRª ROZANE BEZERRA DE SIQUEIRA - É muito interessante, Senador, fazer essa desagregação no topo da distribuição de renda. Porque, na verdade, o que a gente entende como classe média no Brasil... Por exemplo, todo mundo que paga Imposto de Renda está aí nesse último decil. Praticamente todo mundo aí, nesse último decil, é a classe média, nos 10% mais ricos. O pessoal de baixo não paga Imposto de Renda. Mas aí há uma desigualdade muito grande, dentro do décimo, no topo da distribuição.
Eu só queria reafirmar que, se a gente fizer essa correção para tentar ver se a alíquota lá do topo começa a cair... Na verdade, os estudos do Orair falam que, a partir do último centésimo, em algum ponto entre os 20% mais, começa a aparecer uma regressividade.
Isso é interessante ver, mas isso não vai mudar, não é capaz de mudar a regressividade global dos sistemas, de impactar sobre o Gini de forma significativa.
O que é interessante a gente ver é que existe... É alinhar tributação da renda e do capital. Aí a gente tem espaço, sim, para este efeito: a renda de todas as fontes ser tributada de forma igual.
Então, se há uma subtributação do capital, em alguns casos, para fins não só de equidade - uma área que eu considero, principalmente em termos de moral tributária, a qual é, o que a gente diz, a disposição de as pessoas pagarem imposto -, isso teria um impacto muito positivo ver que todos que têm igual capacidade de pagamento pagam o mesmo imposto.
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Então, é o que chamamos de equidade horizontal. A gente tem um espaço aí para melhorar muito o sistema fazendo essa expansão, esse alinhamento de alíquota de trabalho e capital, inclusive, aí, lidando com um problema, minimizando o problema da "pejotização", das pessoas que declaram imposto ou se tornam pessoas jurídicas apenas para reduzir o imposto que pagam. Essa é uma questão que deve ser tratada.
Aí é outra tabela que mostra...
Outra forma de a gente avaliar progressividade e regressividade é olhando a participação, a contribuição de cada estrato de renda para a arrecadação total e comparando com a participação na renda total das famílias. Então, a gente pode se concentrar nas duas últimas linhas e ver que a participação na arrecadação e na renda são muito próximas, não tem...
(Soa a campainha.)
A SRª ROZANE BEZERRA DE SIQUEIRA - ... uma diferença grande, confirmando aí um fraco grau de regressividade ou progressividade, mas uma proporcionalidade no sistema tributário.
Isso não quer dizer que o sistema possa ser considerado justo. Na verdade, a maioria aqui deve concordar que o sistema é injusto. A gente queria só ressaltar, nessa tabela aí, que calcular a renda das famílias, a renda privada, quer dizer, antes de transferências de governo e depois das transferências, depois da tributação direta e indireta, que aquele primeiro grupo ali, o primeiro quintil, que representa os 20% mais pobres da população, paga mais imposto do que recebe de transferências do governo. Ou seja, o sistema da gente falha em tornar esse grupo dos 20% mais pobres beneficiários líquidos do sistema, como em outros países. O sistema onera... Inclusive, existe o fenômeno - e outros estudos mostram isso - de aumentar a pobreza para alguns indivíduos, que acabam ficando mais pobres depois de receber transferência e pagar imposto. Ou seja, os próprios pobres estão financiando parte dos gastos que vão para eles, uma parte, às vezes maior, do que recebe. Então, é uma correção a ser feita: os pobres pagam muito imposto, inclusive pagam mais do que recebem de transferências públicas monetárias.
Aqui, outra forma de a gente ver como estão distribuídos a renda, as transferências públicas e os tributos entre cinco estratos de renda que vão dos 20% mais pobres até os 20% mais ricos.
(Soa a campainha.)
A SRª ROZANE BEZERRA DE SIQUEIRA - Então, a gente vê que a distribuição das transferências e dos tributos imita a distribuição de renda. Não existe uma diferença muito grande. As barrinhas ali... As transferências aumentam, os 20% mais ricos se apropriam de 49% das transferências monetárias, de 56% da renda total do País e pagam 49% dos tributos também. Há uma proporcionalidade ali bem forte com a renda. É o caso do governo, que, no sistema arrecada com uma mão e dá com a outra para os mesmos indivíduos. Apenas um terço desse gasto público e transferência é redistribuído do mais rico para o mais pobre.
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Novamente, a gente confirma aí a proporcionalidade dos tributos e fraco poder redistributivo das transferências.
Ali, no primeiro grupo, há uma barra maior, dizendo que os pobres pagam mais impostos, mas, nesse caso, não há a correção, o ajuste que a gente fez no outro trabalho... Aí, se a gente corrigir a renda dos mais pobres, uma vez que ela é subestimada, as barrinhas ficam muito parecidas. Quando a gente olha outros países, da OCDE, da União Europeia, o que apareceria ali seria um V bem definido; ou seja, transferências caindo fortemente quando a renda aumenta, com proporção da renda, e impostos aumentando fortemente. A gente não tem um sistema fiscal progressivo redistributivo de forma significativa. E aí o impacto dos tributos e das transferências sobre a desigualdade de renda medida pelo Gini.
Vamos concentrar o comentário apenas nos anos mais recentes, como 2012. A gente vê que a desigualdade de renda medida pelo Gini antes do Governo... Vamos dizer que, antes de transferências e tributos, é de 0,58 o Coeficiente de Gini.
(Soa a campainha.)
A SRª ROZANE BEZERRA DE SIQUEIRA - Depois das transferências, a desigualdade cai para 0,52; ou seja, seis pontos percentuais do Gini. Depois dos tributos diretos, a desigualdade cai mais ainda, para 0,50, mas, quando a gente contabiliza os tributos sobre o consumo, a desigualdade aumenta novamente, de forma que o efeito líquido do sistema tributos e benefícios tem uma redução de cinco pontos percentuais no Gini, que é baixa, comparada com outros países que têm uma carga tributária no mesmo patamar do nosso.
A gente nota também que houve uma queda importante da desigualdade de 2003 para 2012, mas dois terços da queda da desigualdade não foram devidos ao sistema de gastos, nem de transferências, mas a algo que aconteceu com a renda privada; ou seja, mercado de trabalho, política de salário e de aumento de salário mínimo. E houve um aumento da progressividade das transferências que deve ser explicado ali, na maior parte, pelo Programa Bolsa Família.
A última transparência, comparando o impacto redistributivo do sistema fiscal no Brasil com o de outros países da União Europeia. A gente conseguiu esses dados e incluiu mais alguns, como o Uruguai.
A gente vê que o Brasil é um ponto bem fora da linha, com carga tributária de país rico, de 33%, que é uma carga tributária muito próxima da carga do Reino Unido, por exemplo, que é de 34% do PIB. E tem um impacto redistributivo.... A queda do Gini provocada pelo sistema fiscal no Reino Unido é mais de duas vezes maior. O Brasil reduz, como a gente já falou ali... Aí, é o efeito das transferências e dos tributos diretos. Isso reduz o Gini em seis pontos percentuais. A OCDE, em média, reduz em 14 pontos percentuais; a União Europeia, em 20 pontos percentuais.
Então, a gente tem um problema redistributivo, do fracasso de nosso sistema de tributos e transferências em reduzir a desigualdade de forma significativa.
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O que eu gostaria também de ressaltar é a necessidade de você ver os dois lados do Orçamento conjuntamente, para poder chegar em desenhos que possam conciliar os objetivos de equidade, eficiência, simplicidade, que muitas vezes são conflitantes.
Por enquanto eu gostaria de agradecer novamente.
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Muito obrigado. Eu agradeço muito a contribuição da Profª Rozane Bezerra, que é da Universidade Federal de Pernambuco.
Vou passar aqui imediatamente para o Junior Divino Fideles, que é Procurador-Geral do Incra.
O SR. JUNIOR DIVINO FIDELES - Boa noite, Senador Lindbergh. Boa noite, demais debatedores desta noite. Boa noite aos telespectadores da TV Senado. Quero dizer que é uma satisfação - agradeço o convite - ter essa oportunidade de vir aqui debater com o Senado, debater com a sociedade, neste momento tão crucial que a sociedade brasileira se volta para as finanças públicas e começa a olhar, pensar e debater onde e como devem ser feitos e estão sendo feitos os gastos públicos.
O tema central da noite é avaliação do Sistema Tributário Nacional com foco na progressividade de alguns tributos, mas trago aqui outra questão também muito pertinente ao debate maior, que é a perspectiva da qualidade do gasto público, a outra face da arrecadação, que é o momento em que o Estado executa suas políticas públicas por meio dos tributos arrecadados, e mais especificamente a política pública de reforma agrária.
Tenho certeza de que, junto com a reforma tributária, é extremamente necessária a realização de justiça social. A outra reforma necessária é, sem dúvida alguma, a reforma agrária, que tem também a natureza e a capacidade de promover desenvolvimento e geração de renda e emprego.
De modo mais específico, o tema que venho trazer aqui diz respeito à justa indenização nas desapropriações agrárias, e os juros compensatórios, que hoje significam o grande peso no custo das desapropriações agrárias. Uma vez que os juros compensatórios forem solucionados nos processos de desapropriação, nós teremos uma capacidade maior de realização da reforma agrária com o mesmo orçamento anualmente dispensado a essa política.
Antes de ver exatamente do que se tratam os juros compensatórios e a desapropriação, temos que lembrar - e trago aqui uma frase do atual Ministro Edson Fachin - que a história do direito é, em boa medida, a história da garantia proprietária. E é a garantia proprietária também em face da tributação. Sem dúvida alguma os colegas já demonstraram aqui que a propriedade ainda é muito pouco tributada ou é subtributada em comparação com a renda dos mais pobres e especialmente ao consumo.
A concepção atual de propriedade capitalista que nós temos na sociedade atual surge com o período do iluminismo, rompendo com os tipos proprietários do modelo feudal. Pela Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, na Revolução Francesa ainda, a propriedade foi declarada como um direito inviolável e sagrado da qual ninguém pode ser privado, a não ser quando a necessidade pública, legalmente comprovada, a exigir, e sob condição de justa e prévia indenização.
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Essa é a pedra central do nosso trabalho, discutir o que é justa e prévia indenização. No Código Civil francês de 1804 também foi assegurada a propriedade ou ao proprietário o direito de usar, gozar e dispor das coisas de maneira mais absoluta. E aí, sem dúvida alguma, desse absolutismo proprietário advém as dificuldades que nós temos de fazer a propriedade cumprir a sua função social e de fazer a propriedade ser tributada. Esses preceitos que foram incorporados ao nosso Código Civil de 1916 enaltecem e garantem a subjugação da propriedade ao interesse individual subjetivo e absoluto do proprietário, menosprezando, ignorando, o interesse social, o interesse coletivo. Acabamos por ver, em diversos momentos, a propriedade individual, o interesse individual da propriedade se sobrepor ao interesse social, coletivo.
A nossa Constituição de 1988 relativizou em parte esse absolutismo da propriedade permitindo que ela seja desapropriada, só que ressalvou que essa desapropriação deve ocorrer mediante prévia e justa indenização em dinheiro, ressalvados os casos legalmente previstos na Constituição. Um desses casos legalmente previstos na ressalva é a desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária, que deve ser indenizada mediante prévia e justa indenização, mas, nesse caso, em Títulos da Dívida Agrária, os TDAs.
Mas, afinal, o que é essa prévia e justa indenização? O que é a justa indenização? A Lei nº 8.629, de 1993, que regulamenta o processo de desapropriação, disse que a justa indenização deve ser o valor de mercado. E aqui abro um parêntese para dizer que o PL nº 11, de 1991, que foi a proposição legislativa que buscou regulamentar o que deve ser interpretado como justa indenização na desapropriação agrária, surgiu com a proposta inicial de que o expropriado deveria receber o valor venal declarado para fins de tributação. Aqui nós temos um fenômeno interessante, que é, para fins de tributação, o proprietário subestimar o valor do seu imóvel com a finalidade de pagar uma tributação menor, pagar um volume menor de tributos. E, no momento em que ele é desapropriado, ele superestima a sua propriedade para buscar uma indenização superior ao que ela, efetivamente, alcançaria numa negociação regular de mercado. Só que esse PL nº 11, de 1991, da forma como foi proposto, não foi aprovado. Acabou prevalecendo a ideia de que a desapropriação deve ocorrer pelo valor de mercado do imóvel. Ou seja, dispõe o art. 14 que considera-se justa a indenização que reflita o preço atual de mercado do imóvel em sua totalidade. Com isso, o que, em princípio, foi concebido como uma desapropriação sancionatória, pelo descumprimento da função social, nós percebemos que, na prática, não existe esse caráter sancionatório, porque no mínimo o seu expropriado vai receber pelo seu bem, que é incorporado a uma política pública, que é destinada ao Programa de Reforma Agrária, pelo menos o valor de mercado. Ou seja, há uma simples substituição do bem pelo seu correspondente monetário.
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Mas o problema vivenciado nem é este do pagamento pelo valor de mercado. Ainda que isso signifique uma ausência efetiva de sancionamento, já que foi o proprietário que não cumpriu com a função social, não a utilizou adequadamente, ou utilizou-a com infrações à legislação ambiental, à legislação trabalhista, o que nós verificamos na prática e na lida diária com os processos de desapropriação para fins de reforma agrária é que, na grande maioria das vezes, os processos de desapropriação se transformam em verdadeiras superindenizações. Nós temos a capacidade de multiplicar aquilo que era para ser uma justa indenização em superindenizações e em indenizações milionárias, o que revela uma má qualidade do gasto público da execução orçamentária.
As razões para essa superindenização são várias. Nós poderíamos destacar que, ao longo dos anos, em primeiro lugar está o pagamento de expurgos inflacionários entre o momento em que o Incra avalia o imóvel, o momento em que ele faz o depósito judicial inicial e o momento final em que ele efetivamente paga o valor definido pelo Poder Judiciário.
Em alguma medida, essa situação já está equilibrada pela estabilização monetária e incide apenas nos processos mais antigos, que até hoje, iniciados num período de inflação alta, não foram findados.
Nós tivemos também um fenômeno que foi o pagamento de coberturas florísticas, pagando em separado não só o valor do imóvel, mas também a cobertura florestal, o potencial madeireiro que existia ali, mesmo que essa floresta não fosse plantada, que não tivesse a interferência da ação humana. Então, o Incra por muito tempo pagou - e ainda paga, em alguns casos - cobertura florística, que gera verdadeiras fortunas.
Nós temos um caso, Senador, no Estado do Tocantins, de um imóvel com pouco mais de 5 mil hectares, desapropriado no início dos anos 80. As discussões hoje sobre o valor daquele imóvel alcançam a cifra de mais de R$1 bilhão. Grande parte desse valor é relativo à cobertura florística.
Outro fator que levou, e que leva ainda, a superindenizações foi o pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais entre 10% e 20% sobre o valor da condenação. Depois, nós tivemos uma evolução jurisprudencial e passamos a pagar sobre a diferença entre a oferta e a condenação. E, a partir de 2001, com a alteração do Decreto-Lei nº 3.365, de 1941, pela Medida Provisória nº 2.183, essa rubrica passou a ser limitada em até 5% sobre a diferença entre a oferta e a condenação.
Outra rubrica que elevou muito os valores das desapropriações foram os juros moratórios, que eram de 6% ao ano a partir da sentença. Também em 2001 essa questão foi atacada pela Medida Provisória nº 2.183, e passaram os juros moratórios também na ação de desapropriação a seguir a sistemática dos precatórios, passando a incidir a partir de 1º de janeiro do exercício seguinte àquele em que deveria ocorrer o pagamento, caso ele não tenha sido feito, nos termos do art. 100 da Constituição, e não mais a partir da sentença.
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Vejam vocês que os juros moratórios - ainda estou falando dos juros moratórios - eram de 6% ao ano a partir da sentença. Então, era um excelente negócio, como ainda continua a ser, por outras razões. Havia a interposição infinita de recursos, porque o valor da condenação estava sendo corrigido apenas a título de juros moratórios por 6% ao ano.
Por fim, nós temos ainda sem solução a grande questão que é a dos juros compensatórios. Os juros compensatórios são uma construção jurisprudencial, previstos inicialmente pela jurisprudência do STF na década de 1950, com o objetivo de promover a correção monetária das condenações impostas à Fazenda Pública, num momento em que as condenações impostas pela Fazenda Pública não eram corrigidas monetariamente. Elas eram pagas pelo valor nominal.
Tanto é assim que a Súmula nº 164 - vejam -, de 1963, previa que no processo de desapropriação são devidos juros compensatórios desde antecipada a emissão da posse, ordenada pelo juiz por motivo de urgência. Contudo, em 1965, foi editada a Lei nº 4.686, que passou a prever a correção monetária das condenações impostas à Fazenda Pública. E, mesmo assim, foi mantido o pagamento dos juros compensatórios, esses arbitrados em 12% ao ano, numa perspectiva de danos abstratos, sem verificar se o proprietário sofreu realmente, sofreu efetivamente algum tipo de dano decorrente dessa desapropriação.
Nós temos que, na verdade, a jurisprudência e o STF nunca fizeram efetivamente um verdadeiro debate após a edição da Súmula nº 164, em 1963, sobre a natureza, o caráter e a necessidade dos juros compensatórios. E se pagam juros compensatórios, desde então, meio que através de um raciocínio chicó: "Não sei; só sei que é assim." E, lamentavelmente, essa é a forma pela qual nós pagamos ainda hoje, de forma, no nosso entender, ilegal, inconstitucional, um percentual de 12% ao ano sobre o valor ou sobre a diferença entre a oferta feita pelo Incra e a condenação ao final do processo, desde a data da emissão na posse.
Em 1997, houve uma primeira tentativa de enfrentamento desse problema...
(Soa a campainha.)
O SR. JUNIOR DIVINO FIDELES - ...com a edição da Medida Provisória nº 1.577, alterando o art. 15-A do Decreto-Lei nº 3.365, limitando os juros compensatórios em até 6% ao ano. Então, foi o primeiro momento em que nós tivemos uma legislação tratando efetivamente desse tema. Contudo, foi ajuizada uma Ação Direta de Inconstitucionalidade pelo Conselho Federal da OAB, e foi deferida uma medida cautelar ainda no ano de 2001, ou seja, há 15 anos.
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E, se você for ler essa medida cautelar, você percebe que é da natureza das medidas cautelares, sem um aprofundamento maior, ainda assim, sobre a questão de mérito dos juros compensatórios, restabelecer o pagamento dos juros compensatórios no percentual de 12% ao ano, como tem sido feito ainda hoje.
E aqui eu apresento a contribuição que essa política pública pode dar ao ajuste fiscal, à necessidade de melhoria do gasto público, que é apresentar o quanto de juros compensatórios foram gastos nos últimos anos. Apenas em complementações de processos judiciais, o Incra, nos últimos seis anos, ou considerando o período de 2011 a 2015 e até a data de hoje - esse é um controle feito pela Procuradoria -, fez complementações em 472 processos judiciais. Nesses 472, o Incra promoveu uma complementação de R$1,6 bilhão. Desse R$1,6 bi, a coluna B ali na tabela identifica o percentual de juros compensatórios que foram pagos nesse período. Foram pagos nesse período R$929 milhões, apenas a título de juros compensatórios, Senador.
Ou seja, nesse período de pouco mais de cinco anos, nós pagamos R$1 bilhão por uma verba que não tem respaldo constitucional, por um dano em abstrato ou por uma remuneração de um capital de um proprietário que não cumpria com a sua função social. Aquela função social que foi almejada pelo constituinte de 1988 como uma sanção, em razão de mal usar a propriedade ou de não usar a propriedade, acabou se revelando, pelo regulamento da Lei nº 8.629 e o processo judicial, um excelente negócio.
Tanto é assim que do orçamento executado pelo Incra para essa ação de desapropriação para fins de reforma agrária no valor de R$3,4 bi, no mesmo período, 26% ou um quarto desse orçamento foi gasto exclusivamente com juros compensatórios. Significa dizer que o Incra poderia ter assentado 25% mais famílias caso não tivesse que gastar do seu orçamento com o pagamento de juros compensatórios.
Essa questão ganha tamanha proporção que hoje nós temos escritórios de advocacia, nós temos pessoas especializadas em comprar processos judiciais, porque sabem que se transformou em um excelente negócio litigar contra o Estado, contra o Incra, em processos de desapropriação, porque ele tem a certeza de que, apenas a título de juros compensatórios, ele vai receber o percentual de 1% ao ano. Isso é melhor que qualquer investimento no País.
Apenas a título de comparação, eu trago ali um recorte...
(Soa a campainha.)
O SR. JUNIOR DIVINO FIDELES - ...considerando um investimento de um trabalhador na caderneta de poupança, no dia 1º/10/2006, e qual rendimento seria. No período de dez anos, até 1º/10/2016, a rentabilidade dessa aplicação seria de 102%, e ele, entre o capital e a remuneração da caderneta de poupança, receberia, ao final, R$20.256,00.
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Esse mesmo valor, no contexto de um processo de desapropriação judicial, onde o Estado fosse condenado, significaria, entre 01 de outubro de 2006 e 01 de outubro de 2016, a correção pelo IPCA em 83%, e juros compensatórios de 120%. De modo que esse proprietário desapropriado, esse proprietário supostamente sancionado receberia R$40.329,00, nesse recorte de R$10 mil. Ou seja, não tem investimentos no País... Mesmo os rentistas não conseguem ter uma renda desse tamanho, como nós verificamos nos processos de desapropriação. Aí nós temos diversas situações de pequenas desapropriações/grandes negócios, de desapropriações para fins de reforma agrária que se transformaram em indenizações bilionárias.
Apenas aqui, de forma muito rápida, nós temos alternativas ao enfrentamento dessa questão e para a melhoria desse gasto. A primeira é o imediato julgamento da ADI 2.332, que já passou pela relatoria de diversos Ministros que iniciaram com o processo e se aposentaram. Hoje, ela se encontra sob a relatoria do Ministro Luís Roberto Barroso. Contudo, se julgada improcedente, ainda assim nós pagaríamos o percentual de até 6% ao ano, a depender do dano concreto que fosse verificado.
A outra alternativa que nós temos seria a alteração legislativa. E trago aqui para registro que no final de 2015, sensível a essa questão, o Governo editou a Medida Provisória 700, de 8 de dezembro de 2015, que alterava a legislação, mas que, contudo, perdeu vigência em maio deste ano, sem que fosse apreciada aqui pelo Congresso Nacional. Então, seria o caso de reedição ou de fazer tramitar um projeto de lei que desse conta dessa questão. Essa redação que constava da Medida Provisória 700, alterando o art. 15, "a", do Decreto-Lei 3.365, de 45, que é a Lei Geral de Desapropriações, daria conta dessa questão.
Então, apesar de não ser um tema diretamente ligado à avaliação do sistema tributário, da progressividade ou da regressividade de tributos, acho que é um tema, também, relevante e que dialoga muito bem com o momento vivido, na medida em que se tivermos um melhor gasto público, teremos menor necessidade de arrecadação e de realizaremos a mesma política pública ou mais políticas públicas com o mesmo recurso.
Muito obrigado, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Agradecemos muito ao Dr. Junior Divino Fideles, Procurador-Geral do Incra. Já estou falando aqui com a Eva para a gente preparar o texto da medida provisória para apresentar um projeto de lei. São, de fato, impressionantes os números que o senhor apresentou.
O SR. JUNIOR DIVINO FIDELES (Fora do microfone.) - Em época de restrição de recursos...
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Claro.
Vou passar agora para o nosso último orador, Dr. Helder Rocha, Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil.
O SR. HELDER ROCHA - Boa noite! Está ligado?
Muito obrigado, Senador Lindbergh, pela oportunidade. Quero parabenizar, mais uma vez, o Senado Federal, na sua pessoa, por permitir que a sociedade faça esse debate. Não podemos nos render à verdade imposta de que a PEC 55 é uma necessidade, precisamos fazer essa discussão.
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É um momento grave. Eu participei de um evento, em Fortaleza, e assisti ao Defensor Público antevendo que a vigorar essa PEC, daqui a pouco o Defensor público vai ter que lidar... A Justiça... Quando o cidadão for preterido no seu direito de educação e saúde e for procurar o Estado, o Estado talvez diga para ele: "Olha, o seu direito à vida, o seu direito à educação, o seu direito à saúde, isso aí está em menor monta do que o direito do Estado de limitar esse gasto". Isso, a meu ver, é rasgar a Constituição, a nossa Constituição social que o povo fez, a Constituição de 88, e nós não poderíamos nos furtar de estar nesse debate.
Então, eu quero agradecer, primeiro, ao Instituto Justiça Fiscal, que me convidou para participar, e também ao Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos), que são parceiros nessa luta.
Quero louvar as suas palavras. Acho que o senhor montou um panorama que mostra que não há legitimidade nessa PEC. Ela não tenha a lógica, não é um projeto desenvolvimentista, e é disso que o Brasil precisa. É um projeto que sequer tem válvula de escape que contemple eventuais aumentos de arrecadação, aumentos do Produto Interno Bruto. Não considera o avanço da população; não considera o envelhecimento da população como um fator positivo também. Não considera sequer os novos mecanismos, as novas demandas sociais que vão acontecer.
Então, quando vislumbramos esse cenário da PEC nº 55 e somamos isso à Lei de Responsabilidade Fiscal, que só veio para cortar direitos, quando você encara a Desvinculação de Receitas da União, que abocanha 30% do dinheiro que haveria de estar na Seguridade Social, garantindo o seu estado superavitário; quando você enxerga que as desonerações estão aí colocadas, desonerações tributárias que não produzem emprego, que não produzem renda, que não produzem investimentos; quando você vê o Governo pautando a reforma previdenciária olhando só o aspecto financeiro que ele mesmo causa, e você vê o Governo, mais uma vez, buscando inclusive a reforma trabalhista, e soma a esse cenário todo a PEC nº 55, o que nós vamos ter? Teremos um Estado minimizado, um Estado que tem alta dívida social. Então, parece que esqueceram de pagar essa dívida. Parece que o povo não tem direito a receber o que lhe é direito e a Constituição previu.
É nesse sentido que eu agradeço a participação. Quero aqui lembrar que a Constituição fala que é dever da República promover uma sociedade livre, justa e solidária; promover o desenvolvimento nacional e promover a redução das desigualdades sociais e regionais.
Então, nesse contexto, quero registrar a nossa preocupação como auditor fiscal, mas também como cidadão. Eu estou aqui, como disse, a convite dessas entidades, mas me dá satisfação ter o nosso sindicato dos auditores fiscais aqui também colaborando nesse processo.
Eu vim para acrescentar nessa discussão, mostrar que a PEC é ilógica porque não trabalha ao lado da receita, e para verificarmos que temos, sim, mecanismos para melhorar o quadro fiscal. E o lado da receita precisa muito ser trabalhado. A tributação está muito distante do que seria o ideal.
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Falando de justiça fiscal, a gente veio aqui traçar alguns elementos, eu não vou ser repetitivo. Os eslaides falam de aspectos que já foram tratados pelos nobres colegas aqui da Mesa, a quem agradeço a presença também aqui, honrando este momento. Então, vou tentar avançar sem ser repetitivo no que a gente já falou.
Por falar em olhar pelo lado da receita, a gente precisa enxergar o quadro do sistema tributário nacional, o arranjo tributário nacional. Muito já se falou aqui da concentração sobre o consumo, está aí, o quadro mostra, a renda ali ainda tímida, e sobre tributação de patrimônio, muito mais tímida ainda.
Nós temos aí uma comparação, que outros colegas já fizeram aqui também, onde a gente vê que a tributação no Brasil, quando a gente olha a primeira coluna, os dados do Brasil e a média dos países integrantes da OCDE, a gente começa a ver distorções. Então, a renda é de 20,5%, ao passo que a média na OCDE é de 37%, e há países que chegam a tributar 60%.
Nas contribuições previdenciárias, a média do Brasil é 24%, está em torno da média lá da OCDE. Na propriedade também 3,3%, abaixo dos 5,8% de média. E vejamos que há países que tributam em torno de 15%.
Sobre consumo, nós estamos lá nos estratosféricos 48%, já chegou a 51%, em 2013, e na média de 31,5%, na OCDE. Então, isso mostra essas distorções de que a gente já vem falando aqui.
Quando olhamos os países da OCDE juntos, a gente consegue vislumbrar qual é a carga sobre a renda. E confirma-se isso que a gente vem falando aqui da tributação na renda tímida, lá embaixo, 6,4%, ao passo que países que nós temos como desenvolvidos, países que alcançaram um bem-estar social, países que trabalharam pelo coletivo e enxergaram que esse é o ideal da sociedade estão tributando muito mais a renda, o lucro e o ganho de capital. Nós estamos lá embaixo nesse gráfico.
E aí, por outro lado, mostrando esse paradoxo que nós vínhamos falando aqui, da carga tributária sobre bens e serviços, nós estamos lá no alto, bem destacados como vencedores. A média está em 11,6% e o Brasil a quase 20%.
Na tributação de heranças, o colega Pedro Delarue também já destacou, nós temos uma alíquota média de 3,8%; o Senador já alertou que alguns Estados estão subindo por conta da crise fiscal. Mas há muito mais o que avançar, a alíquota é muito baixa. Vejam aqui, países como o Japão, 44%. Isso para falar só de herança, Senador, nem inclui as doações. É um olhar só sobre heranças, como nós estamos aquém do que esses países já viram como necessário para poder tributar as heranças.
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Mas só havia países comunistas ali: Inglaterra, Alemanha, Japão.
O SR. HELDER ROCHA - Pois é, exatamente.
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Estados Unidos.
O SR. HELDER ROCHA - E nós não enxergamos. Interessante.
Aqui um extrato dos rendimentos da pessoa física.
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Isentos e sujeitos a tributação exclusiva, nós temos aí em torno de 40% do valor total, não é? Isso mostra o escape da tributação padrão, pela isenção, que é significativa, é muito alta, e precisamos analisar a qualidade dessa isenção. E a questão da tributação exclusiva. A tributação exclusiva, talvez o telespectador não compreenda, mas é aquela tributação em que você paga o imposto e não há mais o que ajustar na declaração anual. Então, basicamente, de uma operação financeira, por exemplo, podemos ilustrar assim. Só que elas são notadamente e sob alíquotas efetivas menores. Isso traz um favorecimento.
Então, é o que a Profª Rozane alertou aqui, a questão da renda do capital é muito mais favorecida em relação à renda do trabalho, porque essa é muito mais fácil de ser controlada. Então, é esse o lamento, essa é a nossa... A proposta que o JF vem trazer vai falar muito disso.
Aqui são dados também ainda de tributação de Imposto de Renda. Eu vou pular para a gente poder privilegiar o tempo, mas fala dessa comparação entre países. Aqui tem um apanhado do extrato das declarações de Imposto de Renda, dados que são declarados, e aí suas deduções e tal. Mas eu acho interessante este gráfico aqui, Senador. Os gráficos sempre nos ajudam a enxergar melhor.
Então, a gente vê aqui que as colunas estão estratificando conforme a renda. Então, nós vemos ali a renda de até dois, de dois a cinco, de cinco a dez. E aí, na coluna lilás, bens e direitos. Então, observando a coluna bens e direitos, a gente vê onde está a alta concentração de bens e direitos. Ela está lá naquele 0,01, que o senhor falava. Ali corresponde a 0,27. Mas está lá a coluna de bens e direitos que eles concentram.
A quantidade de declarantes, a coluna azul, vejam como se concentra na baixa renda. Então, isso é outro dado preocupante. Nós precisamos alcançar essas obrigações tributárias que estão escondidas. O que a professora falou, concordo plenamente, profª Rozane, quando a senhora falou da subestimativa da renda, tanto na baixa renda quanto na alta renda. Isso é um dado que a sociedade brasileira precisa enfrentar para poder ter o diagnóstico. Mas nós sabemos, o que está declarado à Receita Federal é isso aí.
Então, a quantidade de declarantes está forçadamente ali, na baixa renda. A parte, quando se olha o imposto devido, o ápice é ali, de 20 a 40 salários mínimos, e aí ele vem baixando, observem, o percentual. E quando a gente olha a linha - aí já falando das linhas do gráfico - azul, fala da alíquota efetiva sobre rendimento tributável. A linha verde fala da alíquota efetiva sob base de cálculo.
Elas falam de uma tributação maior à medida que a renda sobe, mas a melhor avaliação é quando você pega a renda total e vê o resultado, e aí você está inserindo aquilo que foi colocado como exemplo, como não tributável, como de tributação exclusiva. Então, você consegue verificar qual é a alíquota efetiva do imposto e acontece aquela curva que o senhor falou agora há pouco, da redução. Quando a gente dobra ali, dos 20 a 40 salários mínimos, a linha vermelha começa a cair. Então, é esse privilegiado que está pagando menos imposto de alíquota efetiva, para a gente comparar em relação à alíquota efetiva.
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Aqui se fala um pouco do índice de Gini. Ele é interessante.
Nas primeiras colunas, a gente está vendo a renda obtida da iniciativa privada, a renda original da atividade privada. E aqui a gente vê, na linha azul, o índice de Gini em 2003; e, na linha azul mais escuro, a evolução do Gini em 2009. A gente pode perceber o seguinte: na primeira coluna é a renda da atividade privada. Na inicial, o estudo agrega, então, as transferências que vêm do Governo, como, por exemplo, pagamento de benefícios sociais e assistência social, benefícios previdenciários e por aí vai. Tudo que o Governo transfere para a população.
Se os dois gráficos azuis baixam, nós estamos diminuindo as desigualdades. O ideal é que esse índice de Gini chegue a zero. Seria um estado de maior igualdade, maior equidade no sistema tributário.
Essa queda do primeiro conjunto de colunas para o segundo mostra que essa política pública de transferência é tendente a diminuir as desigualdades.
Na terceira coluna, você vê a tributação do Imposto de Renda. Com a tributação do Imposto de Renda, você vê também que a desigualdade diminuiu, vai tendendo para baixo. Por quê? Tiramos a conclusão de que a tributação do Imposto de Renda é progressiva, é favorável. Alguém já disse que o Imposto de Renda é o imposto mais nobre que nós temos, porque ele consegue produzir esses efeitos, ele tem esse papel. Nós precisamos respeitá-lo nesse sentido.
Na pós-tributação, você vai ver a tributação indireta sobre consumo. Nessa hora, como ele é regressivo, você vai começar a ver a curva subir. E, no final da curva, quando o índice de Gini baixa tudo, é quando o Governo... Ali você inclui os gastos sociais, e isso também diminui as desigualdades. Então, a gente observa que em 2003 o Gini estava nessa evolução muito semelhante a de 2009, mas observamos que em 2009 está até mais abaixo. Isso é um sinal claro de que a política social nesse período foi mais favorável do que no início de 2003.
A grande mensagem que nós temos é de que a tributação do Imposto de Renda e os gastos sociais são favoráveis a equalizar, e não produzir distorções.
Como alternativas para a reforma tributária, eu quero trazer aqui - e entreguei ao nobre Senador um exemplar - um estudo chamado Projeto Isonomia, que é do Instituto Justiça Fiscal. E peço a V. Exª que analise com muito carinho, integrado, é claro, às contribuições que vêm de várias fontes, inclusive aqui as que o Sindifisco trouxe.
O estudo do Instituto Justiça Fiscal traz uma proposta de mudar a tributação, de evitar o privilégio do capital, da renda de capital, de evitar a tributação favorecida na tributação exclusiva e de assegura que tudo vá para a tabela progressiva.
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E também promove uma nova tabela, e traz umas 8 alíquotas. No ano passado já foram 12, hoje são quatro. Então, isso aumenta a progressividade. E a gente vai ver que, neste trabalho aqui, a estimativa do Instituto Justiça Fiscal é de que é em torno de cem bilhões por ano o efeito desses ajustes.
Então, se a população acha que nós merecemos a PEC 55, ela deve antes fazer esse debate aqui, porque quem tem que pagar a conta da carga tributária não está esclarecido. Então, vamos fazer a discussão: quem paga essa conta? Não apenas o tamanho da carga tributária, mas vamos ver quem a paga.
O projeto de isonomia traz, portanto, também aquela isenção de lucros e dividendos. Há um dado aqui, Senador, de que em 2013 foram declarados, só a título de lucros e dividendos - declarado! -, 230 bilhões. Só isso, se fosse tributado na alíquota, na tabela progressiva, como todos aqui pagamos, já resultaria em 58 bilhões adicionais. Então, como nós podemos, como a sociedade brasileira vai poder aceitar tanto prejuízo à educação e à saúde se há 58 bilhões para se tributar de lucros e dividendos?
Também acaba com a questão de juros sobre capital próprio e há uma revisão da tabela para que só comece a pagar o imposto de renda... Não é razoável que um cidadão que tenha R$2 mil já vá começar a pagar imposto de renda, em um país que é injusto, tributariamente, nesse sentido de que, além de pagarmos o imposto, ainda temos que pagar a previdência privada, a saúde privada, a educação privada.
Pois bem. A proposta do estudo é usar o salário mínimo que o Dieese projetaria como o adequado, redefinindo as alíquotas, a tabela progressiva como um todo.
Nesse arranjo aí, Senador, caros presentes aqui e população preocupada com esse assunto, ali nas primeiras faixas, até 40 salários mínimos, nós teríamos uma transferência de tributação. Essa tabela promove que se abra mão de cobrar 40 bilhões das faixas iniciais, até 40 salários mínimos, e aumente a tributação nas faixas maiores. E aí vamos pegar aquele 1%, 0,1, todos eles. Isso seria o ideal, porque há uma renda maior para atender à progressividade.
Pois bem. Ao reduzir 40 bilhões na faixa mais baixa e aumentar 114 na maior, nós temos um resultado final de 74 bilhões, só nessa questão da tabela progressiva, e jogar tudo para essa tributação, excluindo essa tributação exclusiva.
É claro que o estudo vai permitir alguns controles, porque, na tributação exclusiva, alguns fatos econômicos, alguns fatos financeiros não têm o controle afinado o bastante. Mas isso aí é um pequeno ajuste a esse número.
Aqui há uma simulação de resultados. É um pouco do que já falei.
Ali embaixo, a gente vê, na coluna: hoje, 144 bilhões, com o desenho da tabela progressiva, que só tem quatro camadas; com esse desenho aí, com oito camadas, chega a 221 bilhões.
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Outros aspectos que a gente deve trazer à discussão é aquilo que a gente já vinha falando da carga tributária. Não podemos aceitar que o País trate isso como uma verdade absoluta, que a carga tributária é alta, se você tem uma concentração dessa carga sobre quem ganha menos. Então, é preciso aumentar a tributação sobre renda, sobre renda do capital, sobre patrimônio e evitar a tributação do consumo, diminuir a níveis razoáveis, e também não onerar tanto a renda do trabalho.
Outro aspecto que entendemos relevante é acompanhar o Senado Federal. Nós temos a PEC 96, de 2015, que tramita no Senado, que cria um adicional de 8% ao imposto sobre heranças e doações e também um imposto sobre grandes fortunas, que está na Constituição desde 1988. Pelos nossos cálculos, usando o modelo francês, que é um pouquinho diferente, nós teríamos uma arrecadação de 12,6 bilhões a mais. Mas, usando os dados declarados à Receita Federal, com um arranjo que está nesse PLS 534, de 2011, que está em tramitação no Senado, isso resultaria em mais 25 bilhões. Então, só para falar disso, daqueles 74 bilhões, mais 25, já temos 100 bilhões para derrubar a ideia de PEC 55. Pelo menos, a gente deveria colocar isso na pauta. Resta só a sociedade decidir.
Na recuperação de passivos tributários, nós temos uma cobrança que não tem sido eficiente, lamentavelmente, nós temos um conjunto de débitos que ainda têm o privilégio de ser saneados através de uma figura preocupante, que é a compensação tributária. Esse não é o debate aqui, mas nós temos 800 bilhões confessados, identificados, que precisam ser resgatados. Nós temos necessidade de a sociedade combater fortemente a corrupção e a sonegação. Um dos caminhos que os auditores fiscais, o Instituto Justiça Fiscal e o Inesc também clamam é revogar... Isso daqui é uma vergonha, um estímulo à sonegação! Se o cidadão é autuado pelo fisco, além do baixo risco de ser autuado, ele depois poderá pagar e escapar de eventual representação penal pela sonegação, pelo ato doloso de esconder aquilo. Isso é um estímulo claro para a sonegação, afora os parcelamentos favorecidos.
Por último, que é uma vergonha, lamentavelmente, a Receita Federal patrocinou, aliás, ela não foi combativa, ela ajudou na formulação da repatriação, que é mais um escape. Nós vamos regularizar dinheiro sem ter clareza sobre sua legitimidade, sua origem lícita. Isso tudo...
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - E agora vai haver a segunda versão do projeto de repatriação. Veja bem, isso aqui é importante dizer, porque está sendo feito um convênio com várias instituições financeiras do mundo e, na verdade, quem tiver conta vai ficar descoberto. Estão dando uma chance para quem operou de forma criminosa, com lavagem de dinheiro, como forma de legalizar. Existe um discurso que é de arrecadação, mas há outras movimentações que não são apenas arrecadação. Isso é para salvar os caras que vão ficar descobertos. Esse debate vai haver amanhã, no Senado.
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O SR. HELDER ROCHA - Seria muito mais digno tributar o Imposto de Renda, como estávamos falando há pouco. Não é? São 58 bilhões só com lucros e dividendos, e estão aí comemorando que arrecadaram 50 bilhões com repatriação, de forma a estimular o crime.
Nesse sistema, o cidadão, aliás, o criminoso simplesmente declara que o dinheiro tem origem lícita, mas você não pode investigar isso; ele confessa isso, ele apenas declara. É claro que ali está muita gente que não tem vínculo com esse tipo de coisa, mas ali pode estar o dinheiro da droga, o dinheiro das armas, o dinheiro do terrorismo, e isso está sendo lavado.
Lamentavelmente, houve quem dissesse que a Receita Federal estava sendo a lavanderia fiscal do País. Então, isso é vergonhoso, e como auditor fiscal, eu tenho que reconhecer isso daqui, mas espero que o Senado, o Congresso Nacional não permita a renovação desse favor fiscal, que é vergonhoso. Essa era a PEC de que a gente precisava.
Aqui já é o final. (Pausa.)
Então, eu acho que falhou aqui alguma tela.
Permita-me aqui, Senador, só para fazer um registro sobre o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural, porque um dos papéis é estarmos aqui discutindo patrimônio e renda. E, quanto ao Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural, eu acompanhei a realidade deste imposto por algum tempo, e precisamos defender a tributação da terra como um instrumento de justiça fiscal também, até muito mais pelo caráter extrafiscal que esse imposto tem. E o ideal deste imposto não é exatamente arrecadar, e, sim, desestimular a terra improdutiva, como já foi falado aqui.
Então, o relato que a gente pode fazer é de que essa tributação da terra precisa ser enfrentada com mais seriedade, com mais respeito em relação ao papel desse imposto, porque da forma como está administrado hoje na Receita, ele tem sido apenas tributado de forma declaratória; não há fiscalização efetiva. Os convênios com os Municípios são tímidos, são frágeis.
O Procurador do Incra está aqui, e eu queria ressaltar que é lamentável o relato que ele fazia de que se tentou caminhar junto com a Receita Federal, e não se conseguiu. Então, é preciso integração efetiva entre os cadastros, é preciso que... Na verdade, a gente acredita muito na administração do ITR integrada entre Incra e Receita Federal.
O SR. JUNIOR DIVINO FIDELES - Se me permite, só uma consideração aqui, é que o ITR tem como base de cálculo o valor da terra nua, e a alíquota é progressiva conforme o grau de produtividade da terra, nessa medida que ele desestimula a terra improdutiva. Agora, o que nós verificamos, e o Incra também tem alguns estudos nesse sentido, junto com os seus peritos federais agrários, é que há uma subdeclaração do valor da terra nua, aquele valor que mencionei que é declarado num patamar muito inferior ao que é efetivamente indenizado caso a terra nua... caso o imóvel venha a ser desapropriado.
Estudos do Sindicato dos Peritos Federais Agrários, os agrônomos do Incra indicam que a arrecadação do ITR, que hoje é de aproximadamente R$800 milhões/ano, poderia, num curto espaço de tempo, em aproximadamente três a cinco anos, ser elevada a um patamar aproximado de R$8 bilhões/ano, apenas com pequenas medidas, para verificar se o valor declarado da terra nua efetivamente confere em campo, já que há uma constatação de uma subdeclaração muito grande, assim como o grau de produtividade desses imóveis, ou seja, o grau de utilização.
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Então, com pequenas medidas, numa parceria entre o Incra e a Receita Federal, apenas em relação a esse tributo também, nós teríamos condições de elevar a sua arrecadação em dez vezes, chegando ao patamar de R$8 bilhões/ano.
O SR. HELDER ROCHA - E esse, Procurador, era o mote para o ITR ter ido à Receita Federal, a fim de aumentar essa eficiência, e é o que nós não vemos aí desde 94.
Então, muito obrigado, Senador, pelo espaço. Desculpe ter passado do tempo, mas...
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Nada...
O SR. HELDER ROCHA - ... foi necessário.
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Foi ótimo, Dr. Helder.
Eu queria agradecer a todos os expositores.
Já são quase 22h30.
Nós começamos, hoje, com audiência pública na Comissão de Direitos Humanos, também falando da PEC 55 e da reforma da Previdência. Amanhã vamos ter uma reunião da CAE às 10 horas. Às 11 horas da manhã voltaremos ao debate numa audiência pública. O plenário do Senado Federal vai se tornar uma Comissão Geral, para discutir essa PEC 55.
Eu acho que esta audiência foi importante. Se o Governo está falando de problemas fiscais, há como transformar o nosso sistema tributário num sistema tributário mais justo, mais progressivo.
Aqui ficou claro, Professora. Eu entendi os números que a senhora apresentou, mas aqui há uma distorção não nos 10% mais ricos, não. Há uma distorção dentro disso, no "um centésimo" aqui, que começa. E, na verdade, vai se agravando, à medida que nós estamos chegando aos milionários, aos grandes milionários do País, que pagam pouco imposto, comparativamente com a classe média, a classe média alta e os trabalhadores, que pagam essa carga de imposto indireto de 50, 51%, que não existe em lugar nenhum do mundo. Nós temos só um terço de renda e propriedade, quando os países da OCDE têm dois terços disso aí. Então, há uma distorção muito grande.
Portanto, se o Governo estivesse pensando em fazer, dentro dessa lógica dele, um rearranjo fiscal equilibrado, ele estaria estudando isso, mas não é um rearranjo fiscal equilibrado o que eles estão fazendo. É um rearranjo em cima - volto a dizer - do povo, do trabalhador.
Há uma frase do Dr. Helder que diz: "Quem paga a conta?" E nós sabemos, aqui, que o Paulo Skaf colocou a estrutura da Fiesp para apoiar esse golpe, esse impeachment, e já disse aqui: "Não admitimos nada!" Não tem nada para os bancos, os bancos que lucram tanto... No meio de uma crise econômica como esta, você vai ver o lucro do Bradesco, o lucro do Itaú... Está lá em cima!
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - De 30 bilhões foi o lucro dos cinco maiores bancos nesse primeiro semestre, bancos que estão cobrando, nos juros de cartão de crédito, mais de 400%. De juros!
A Senadora Gleisi apresentou um projeto que eu vou relatar amanhã na CAE, que é um projeto importante, sobre isso. E aqui é interessante dizer que eles falam da PEC 55, que é um aperto em tudo que é gasto social, Previdência Social, saúde, educação, mas eles não falam do pagamento de juros. Despesa financeira? Aí não pode! E, quando você vai ver o déficit do País, em 2015, nós tivemos um déficit nominal de 6,7% do PIB. Destes, 6,1% foi pagamento de juros.
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Os gastos primários foram negativos em menos de 0,6. Eles só olham para isso. No ano de 2015, o déficit brasileiro foi de 10,38; 8,5 foi de pagamento de juros. Mas aí ninguém fala, porque há uma grande aliança do rentismo neste País. Não são só os bancos que ganham; são os bancos e as grandes empresas brasileiras também. Todas têm o seu departamento de planejamento financeiro e ficam ali vendo uma taxa Selic de 14%, quando a inflação está apontando para 7%. São juros reais de 7% ao ano.
O SR. HELDER ROCHA (Fora do microfone.) - Para que investir em produção?
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Para que investir em produção? Aí o Presidente do Banco Central Europeu, há 15 dias, se posicionou justamente dizendo isso, porque hoje na Europa há juros negativos. Ele disse: "mas se os juros não forem negativos, como vai haver investimento na produção?" É o Presidente do Banco Central europeu! Não estou falando de nenhum esquerdista. Então, é uma loucura o que existe neste País. Nenhum país tem uma taxa de juros como esta. Mas isso está fora do debate. Você não discute juros, você não discute tributação progressiva. Sobra o quê?
Vou repetir isso. Quando você vai na despesa primária, são poucas coisas que sobram. Quais são os grandes orçamentos? Previdência, R$500 bilhões; saúde, R$100 bilhões; educação, R$100 bilhões. O que tem mais aí? Tem despesa de pessoal, que corresponde a 4,2% do PIB. Volto a dizer: funcionário público vai ver o que vem por aí à frente. Vai ser reajuste zero. Previdência social, dos R$500 bilhões... Eles estão preparando um pacote de maldades. Eu volto a dizer que eles querem cair de 19,8% de gasto primário para 14,8%. É um corte muito violento. Vai ter que ser um mix de maldades. E eles dizem: "Não, o Congresso vai escolher, ou seja, não vai diminuir o recurso da educação". Eu digo: se não vai diminuir o recurso da educação, por que a PEC acaba com a vinculação constitucional de 18% para a educação? Porque está lá. Hoje a gente gasta 23%. Se eles acreditassem que de fato não gastariam menos em educação, por que tirar os 18% de piso, se nós estamos em 23%? É porque eles sabem que vão tirar. É um desastre social. As pessoas não estão tendo noção disso.
O SR. HELDER ROCHA - Senador.
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Fale no microfone.
O SR. HELDER ROCHA - Um dado de um estudo sobre a PEC estima, nos próximos dez anos, uma perda de R$345 bilhões na área de educação e saúde. Nós estamos falando aqui de R$100 bilhões ao ano de recuperação.
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Claro! Mas é porque mexe com o andar de cima. É um Governo que está pagando esse negócio do impeachment como se tivesse tido um acordo, de não mexer com os grandes empresários, com o sistema financeiro. Se essa PEC existisse de 2006 para cá, dez anos antes, o orçamento de 2015, que foi de R$103 bilhões da educação, teria sido de R$31 bilhões. O da saúde, que foi de R$102 bilhões, teria sido de R$65 bilhões. Então, não tem muito onde mexer.
O SR. HELDER ROCHA - O salário mínimo estaria abaixo de R$600.
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - O salário mínimo, se ela estivesse valendo há dez anos, era abaixo de R$600, não era R$880.
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Vale dizer que essa PEC acaba com a política de valorização do salário mínimo, porque se a gente conseguiu construir, nesse último período, um grande mercado de consumo de massa aqui no País, foi fundamentalmente pela política de valorização do salário mínimo e a influência na Previdência. Hoje, 70% dos aposentados recebem um salário mínimo, e esse dinheiro vai para a economia com tudo. Eu acho uma ignorância tudo isso que está acontecendo, até porque...
O SR. HELDER ROCHA (Fora do microfone.) - Desvincula com o valor mínimo do benefício.
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Claro, vai desvincular. Eles querem desvincular benefício de prestação continuada, desvincular a aposentadoria do salário mínimo. Na verdade, eles querem pagar menos do que o salário mínimo, e isso vai ter um efeito desastroso na economia.
Tenho repetido sempre que eles acreditavam desde o começo que, afastando a Dilma, os empresários retomariam a confiança e investiriam. Isso é uma balela. O empresário investe quando sabe que há gente para comprar, tanto é que tiraram a Dilma, e, de fato, a confiança dos empresários foi lá em cima, mas a realidade da economia - nós mostramos neste terceiro trimestre - é de queda novamente. Por quê? Porque temos desemprego, as famílias estão endividadas, há queda no rendimento.
O consumo das famílias representa 63% do PIB. O que eles farão com isso aqui? Vão deprimir ainda mais o consumo das famílias, porque vão tirar recursos da Previdência, dos mais pobres, retirar recurso de saúde e de educação pública. Saúde e educação pública é salário indireto do trabalhador. O que já está acontecendo na ponta é que estão fechando tudo. Claro que estou no Estado do Rio de Janeiro, que é o Estado com uma crise maior ainda. Ali houve um bando de isenção indiscriminada para as empresas, corrupção, mas o fato é que houve uma frustração na arrecadação do tamanho do mundo. E lá estão fechando, em todos os Municípios, postos de saúde, restaurantes populares. É uma...
O SR. PEDRO DELARUE - Senador, a Previdência, em muitos Municípios pequenos, é a principal fonte de consumo. Quer dizer, se as pessoas não estão consumindo, a economia não gira, não roda.
O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Claro, claro! É isso que está acontecendo. Sinceramente, eu tenho participado desse debate e acho uma loucura tão grande! Fico pensando em como essa turma de economistas neoliberais que organiza isso é pouco razoável, tem pouco equilíbrio. Eles estão pouco se preocupando com o desastre social que virá com esse negócio todo e continuam apostando na mesma coisa: "Ah, nós vamos fazer esse ajuste fiscal, e a confiança..." O Paul Krugman, que ganhou o Prêmio Nobel, falou sobre a fada da confiança dos empresários. Não é isso! Se não estimularmos a economia, sinceramente, como brasileiro, a minha angústia é ver tudo isso acontecendo e estarmos mergulhando numa recessão que, somada, nesses anos todos, chega a 8%.
Em um dia desses, perguntaram: "E é culpa de vocês do PT!". Eu disse: "Sabe qual foi o nosso erro?". E faço esse debate em todos os lugares. Nosso não, porque votei contra. Foi a virada. Dilma foi eleita com um programa e decidiu colocar o Levy com outro programa. Foi um ajuste fiscal violentíssimo de 2,3% do PIB, ou seja, não houve gastança, mas uma contração fiscal. Foi aquilo que derrubou a economia; foi aquilo que fez a receita cair.
E o que o Temer e essa turma estão propondo? Estão propondo aquilo que deu errado para os próximos 20 anos. Em 2015, eles diziam - não diziam? -, com o Levy: "Olha, nós vamos fazer esse ajuste para melhorar as contas públicas, melhorar a situação da dívida". Aí, o déficit, que tinha sido de 6,7% do PIB. foi para 10,38%. Por quê? Porque a arrecadação foi lá para baixo, e eles ainda aumentaram a taxa de juros.
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Então, eu lamento muito o que está acontecendo aqui. O que eles estão querendo aqui é o seguinte: é tirar esse avanço, essa ampliação de gastos sociais.
Eu acho que o sistema tributário... Infelizmente, se tenho uma autocrítica para fazer do passado, era para nós do governo de esquerda termos avançado muito mais nisso. Mas avançamos no gasto social, que aumentamos de 13% para 18% do PIB. E é isso que eles querem destruir.
Eu agradeço muito aqui a presença dos senhores. Agradeço a presença do Pedro Delarue, que eu já conheço há muito tempo, do Rio; da Profª Rozane Bezerra, que fez aqui uma apresentação muitíssimo interessante; do Junior Divino Fideles, que é Procurador-Geral do Incra; e do Helder Rocha, que é Auditor Fiscal da Receita Federal.
Essa é uma pauta que eu gosto de trabalhar. Se vocês tiverem sugestões, aqui nós estamos completamente abertos para entrar nesse debate. Nós apresentamos uma alternativa à PEC, que era o mix de um conjunto de proposições que alterava a Lei de Responsabilidade Fiscal no sentido de garantir a possibilidade de se fazer política anticíclica num momento de desaceleração econômica como este. Nós discutimos alternativas sobre tributação progressiva, em especial a apresentação do projeto sobre lucros e dividendos e também outro sobre o Banco Central, dando duplo mandato para o Banco Central, porque hoje o Banco Central brasileiro só tem compromisso com a estabilidade monetária, com o controle da inflação. O FED, o banco central norte-americano, tem dois compromissos: estabilidade monetária, crescimento econômico e geração de empregos. Aqui, com qualquer coisa, eles aumentam os juros com tudo. Se houvesse o compromisso de geração de emprego, nós não teríamos aumentado a taxa de juros do ano passado, quando o desemprego estava claramente subindo.
Eu agradeço muito a presença dos senhores. Vamos continuar nesse debate, pedindo à sociedade brasileira mobilização, porque, nessa PEC 55, o que estamos fazendo, na minha avaliação, é rasgar a Constituição de 1988. Nós não estamos rasgando só o legado do Lula, estamos rasgando o legado do Dr. Ulysses Guimarães. e, com a reforma trabalhista, estamos rasgando o legado de Getúlio Vargas, porque estão querendo rasgar a CLT. É uma onda conservadora de retirada de direitos impressionante, mas eu tenho certeza de que o povo brasileiro vai se levantar, vai perceber o que está em curso e vai se levantar para tentarmos impedir que todo esse retrocesso aconteça.
Muito obrigado a todos os senhores.
Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada esta reunião.
Obrigado.
(Iniciada às 20 horas e 36 minutos, a reunião é encerrada às 22 horas e 39 minutos.)