07/12/2016 - 111ª - Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa

Horário

Texto com revisão

R
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Declaro aberta a 111ª Reunião da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura.
Esta audiência pública será realizada nos termos do Requerimento nº 160, de 2016, da CDH, de minha autoria, para debater as religiões e as injustiças sociais.
A audiência será realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. Por isso as pessoas que têm interesse em participar com comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania, link www.senado.leg.br/ecidadania, e do Alô Senado, através do número 0800-612211.
Esta audiência de hoje foi uma solicitação das religiões, ou seja, é uma audiência que visa a que diversas religiões, conforme solicitado, pelo encontro que fizeram, discutam as injustiças sociais e as suas preocupações com uma série de questões e projetos que estão sendo apresentados aqui no Parlamento, por exemplo, a própria reforma da Previdência, o trabalho intermitente, que vai ser discutido hoje - inclusive, espero que não votem - em uma comissão, que é o trabalho por hora, o negociado sobre o legislado, as liberdades, a questão da terceirização, o trabalho escravo, a terra dos quilombolas, a terra dos indígenas, a própria democracia, a PEC nº 55. Todos esses temas, na questão de fundo, atingem diretamente os mais pobres, os que mais precisam.
Por isso, como não poderia ser diferente, atendi a essa solicitação em um dia, inclusive, muito polêmico, eu diria, muito delicado na conjuntura nacional e para a própria democracia. Vejam que nós estamos em uma situação em que, há praticamente oito meses, tivemos o afastamento da Presidenta da República, eleita democraticamente, com 54 milhões de votos. Queiramos ou não, eu não entro no mérito aqui, foi afastado o Presidente da Câmara dos Deputados. Agora, afastado o Presidente do Senado. Isso tudo gerou um conflito, dividiu a população, entre os três Poderes. Há uma verdadeira lambança entre o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. E isso não é bom para ninguém. Foi dada uma liminar. Hoje à tarde vai haver uma reunião do Pleno do Supremo para ver se mantém ou não essa liminar e para ver se o Presidente atual, Renan Calheiros, continua na Presidência ou se assume o Vice. Então, é um momento muito delicado e uma reunião como esta é importante para debater temas que têm tudo a ver com esta situação em que nos encontramos.
R
Enquanto os convidados estão chegando - atualmente só temos dois convidados -, eu farei aqui uma pequena introdução do tema que vamos debater e que a população vai assistir pela internet e pelo sistema de comunicação aqui do Senado. Enfim, vamos lá.
Por meio do requerimento que me foi apresentado, solicitei, em 23 de novembro passado, a realização desta audiência pública. Faço questão de frisar esse fato, mencionando um pronunciamento posterior que fiz no plenário, no dia 29 de novembro. Na ocasião, fiz questão de enfatizar que não há como não dar razão à população quanto à revolta em relação a tudo que vem acontecendo no País. Refiro-me, por exemplo, à votação em primeiro turno da Proposta de Emenda à Constituição 55. Como sabemos, ela limita por 20 anos o aumento de investimentos públicos, atrelando somente à variação da inflação. Ou seja, nem um centavo de investimento.
Citei na oportunidade, inclusive, uma pesquisa do DataSenado que avaliou a opinião dos internautas sobre essa PEC, revelando que 342 mil pessoas são contrárias à PEC 55 e apenas 23 mil são favoráveis. Ou seja, há uma diferença de 325 mil contra e somente 23 mil a favor, só para ver a diferença. Na verdade, são quase 350 mil a favor da derrubada da PEC e somente 23 mil querem manter a PEC do Governo atual. Números como esses revelam o abismo que está sendo cavado entre a classe política e o povo brasileiro. Em vez de se apresentar um projeto de nação, coloca-se o interesse de grupos privilegiados, nomeadamente, os anseios daqueles brasileiros com maior intensidade são impactados pela variação dos cenários econômicos. De fato, está sendo projetado um duto que vai tirar o dinheiro de setores importantes para canalizar recurso destinado a irrigar o jardim dos privilegiados, principalmente o sistema financeiro, prejudicando o investimento ao longo de um período que se estenderá além do mandato de quem o propõe.
Em artigo publicado em 1º de dezembro passado pelo jornal espanhol El País, Juana Kweitel, do Conectas Direitos Humanos; José Antônio Moroni, do Inesc; Ignacio Saiz, do Center for Economic and Social Rights; e Katia Maia, da Oxfam Brasil, afirmam:
Se aprovada, a PEC 55 certamente resultará em uma séria erosão dos direitos sociais como resultado de uma diminuição da despesa real per capita, à medida que a demanda por serviços vai aumentar e as receitas não, prejudicando o progresso de vários direitos sociais, especialmente para os mais vulneráveis que dependem mais da prestação de serviços públicos.
R
O Governo afirma que a PEC 55 não prejudica a saúde e a educação. Sustenta essa afirmação - tenta sustentar, na verdade - apregoando que seu único objetivo é promover um maior realismo orçamentário. Só que não aceita, em nenhum momento, as emendas que apresentamos para que ficasse claro que essa PEC não atingiria nem a saúde, nem a educação, nem a infraestrutura e nem a seguridade. Não aceitou nenhuma das emendas.
Segundo o raciocínio dos defensores dessa medida, ela não congela gastos reais com saúde e educação, apenas estabelece que, para aumentá-los, será uma condição absolutamente necessária a diminuição de gastos reais em outros itens do Orçamento. Ora, então, por que a PEC traz no seu bojo um artigo específico prevendo a redução dos atuais mínimos constitucionais de gastos com a saúde e educação? Eles não respondem. Na verdade, ela ataca, sim, a saúde e a educação. O silêncio do Governo quanto a esse questionamento é eloquente, e as tentativas de explicação para tal mostram incoerências bizarras, incoerências que fogem totalmente a qualquer argumento que possa provar que aquilo que nós estamos dizendo aqui não é a realidade.
Por tudo isso, as vozes dos movimentos sociais e das religiões precisam ser ouvidas urgentemente - e é o que faremos hoje aqui. Afinal, em nossa história, principalmente ao longo dos períodos mais tenebrosos, esses grupos sempre estiveram à frente da resistência aos mais variados e criativos golpes atestados no povo mais desfavorecido.
Hoje e agora, aqui na CDH, abrem-se, mais uma vez, espaços com a sociedade para dar voz aos que aqui estão representando a grande maioria do povo brasileiro, que não está silenciosa, pois está se manifestando em todas as cidades do País contra essa PEC 55. Para descobrir esse véu de hipocrisia é que está sendo desdobrado, está sendo discutida em todo o País a insídia, a tocaia, a emboscada, a cilada dominante na PEC 55.
Vamos, então, formatar a Mesa e o debate, já que a introdução para situar... Todos que estão nos assistindo pela TV Senado, ouvindo pela Rádio Senado e pela internet, nas redes sociais, já sabem o motivo desta audiência.
Convido de imediato: Ronald Ferreira, Presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Seja bem-vindo, Ronald! (Palmas.)
Convido Wilson Barboza da Silva, Pastor da Assembleia de Deus de Liberdade e Vida, Conselheiro Tutelar, representando a Aliança de Negros e Negras Evangélicas do Brasil no Distrito Federal. (Palmas.)
Convido Tatiane Duarte, representante da Rede Ecumênica da Juventude. (Palmas.) (Palmas.)
Convido Geniberto Paiva Campos, representante da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). (Palmas.)
Na segunda Mesa, só para situar todos, teremos a Mãe Baiana Adna Santos de Araújo, Presidente do Ilê Oya Bagan, comendadora representante das Religiões de Matriz Africana e coordenadora de Proteção de Patrimônio Afro-Brasileiro na Fundação Cultural Palmares.
R
Teremos, só para citar, agora, na segunda Mesa, o Monge Sato, representante das Religiões Orientais.
Teremos também na segunda Mesa Dom Mauricio Andrade, Bispo da Igreja Episcopal Anglicana de Brasília.
Teremos a Cacique Márcia, do Santuário de Pajés Tapuia - Etnia Guanabara da Reserva Indígena Bananal Noroeste.
E teremos também a Losangelis Gregório, representante da Federação Espírita do Distrito Federal e Diretora de Assistência e Promoção Social Espírita.
Queremos também registrar a presença conosco do líder Vagner, que terá direito também à palavra. É de Chapecó. Acho que neste momento não há como, Vagner, nós não falarmos aqui, nem que seja por um minuto, sobre esta situação. E digo situação porque eu não considero que aquilo tenha sido uma catástrofe, um mero acidente; aquilo, para mim, foi um crime coletivo, porque todos nós sabemos que a avareza do capital não tem limite. Todas as informações que chegaram, inclusive a esta Comissão, ao Brasil todo e ao mundo mostram que foi por economia de combustível. Simplesmente por causa de US$5 mil em combustível não fizeram a programação adequada. E não é a primeira vez, segundo as denúncias que chegaram, que esse avião cometeu esse tipo de crime contra a humanidade. Claro que os responsáveis terão que ser punidos.
Eu gosto de futebol, acompanho futebol, e vi aqueles jovens lutadores, vencedores, e toda a equipe, independentemente da idade, a equipe técnica, enfim, todo o comando, que tornaram um sonho realidade, de Chapecó para o mundo, de repente, terem os seus sonhos exterminados, eu diria que por um crime não hediondo, mas por um crime hediondo, pela gravidade do que aconteceu. Isso mostra o quanto, como eu chamo, os princípios humanitários começam a desaparecer na política e nas relações principalmente entre os detentores do poder.
Isso aconteceu lá e aconteceu no Rio Grande do Sul. Eu também vinculo a Boate Kiss, em que 252 jovens perderam a vida porque o dono daquele estabelecimento os colocou dentro de um forno onde só havia uma porta de entrada e saída. Quando houve o incêndio, os seguranças ainda queriam o comprovante do pagamento. Aí, criaram obstáculo na saída.
Poderíamos lembrar aqui o que aconteceu domingo mesmo, na Califórnia, onde, em evento semelhante a esse, 50 pessoas morreram queimadas; poderíamos lembrar o helicóptero em São Paulo. É demais, é muita coisa, tudo recentemente.
A tal prevenção, que tem que estar em primeiro lugar, não existe; existe somente o interesse de lucro pelo lucro. É só ver também, permitam-me, o número de projetos que existem aqui no Congresso. Eu estou presidindo aqui, e estou preocupado, porque, numa Comissão daqui, às 9h - eu iria às 9h, mas a minha assessoria estará lá e, se precisar, vou correr lá -, poderão votar um projeto que diz que o trabalho vai ser pago por hora, e acabou. Calcule: você ficar em casa esperando alguém chamar e lhe pagarem dez horas, ou três horas, ou cinco horas, e o mandarem embora de novo, trabalho intermitente - o nome é bonito. Está para ser aprovado aqui dentro.
R
E há outro que está para ser aprovado, hoje ainda, na CCJ que acaba com a NR-12. O que é a NR-12? Quando eu falo o nome, ninguém sabe o que é. Diz que as máquinas não precisarão mais ter proteção para evitar acidente no trabalho. Vejam bem! Quer dizer, perder braço, perder mão, perder perna, perder cabeça é natural; interessa é a produção, aumentar a produção de cada máquina, sem a exigência das normas que estão na NR-12. Vejam o absurdo a que nós chegamos neste País!
Por isso esta reunião tem tudo a ver, porque vamos falar sobre a situação dos movimentos sociais e tudo o que vem acontecendo, inclusive no aspecto da própria democracia. Estamos num país em que três Presidentes foram depostos, nestes - como eu dizia antes, na abertura, vocês não haviam chegado - oito meses: a Presidente da República, legitimamente eleita, queiramos ou não, sem entrar no mérito; o Presidente da Câmara dos Deputados, que foi deposto; o Presidente do Senado, deposto.
Perguntaram-me ontem: "Quem é o Presidente do Senado?" Eu disse: não sei; pergunte ao Supremo Tribunal Federal. Pode ser que ele saiba. Eu não sei. Havia uma liminar. Com a liminar, não foi encaminhada aqui a intimação para comunicar, até agora não foi; não houve entendimento e não foi. Então, o Supremo vai se reunir às pressas hoje à tarde para ver o que fazer.
Digo isso para vermos a lambança que virou este País. E falo tudo isso com a maior tranquilidade. Escrevi um artigo em março do ano passado, dizendo: frente ao impasse que está se criando, a saída não é um impeachment. Se querem, de fato, fazer uma mudança, então, vamos para as eleições diretas. E propunha que fosse no fim do ano. Seria o melhor caminho ainda. Não que eu gostasse daquilo, mas, se não havia jeito, o jeito era esse, para evitar tudo o que está acontecendo. Tentamos, apresentamos a PEC aqui, com assinatura de trinta e poucos Senadores. Não se viabilizou. Preferiram o caminho do impeachment, que, na verdade, foi um golpe parlamentar,... (Palmas.)
... e deu no que deu. Deram um golpe parlamentar.
Então, eles são culpados por tudo o que está acontecendo, quem deu esse golpe parlamentar. Todo mundo sabe quem é que está dirigindo o País. Não é de graça que cada dia há um ministro deposto, ou, no mínimo, um ministro denunciado, que vai ter que responder à Polícia Federal, principalmente do chamado Núcleo Central do Governo.
Nós estamos vivendo esta situação difícil, muito, muito complexa, muito delicada. Eu, que tenho um pouco mais de idade, e sinto que outros aqui também têm essa idade, sei como isso começa e onde termina; sabemos bem. Nós vivemos o golpe de 64, nós sabemos como começou, quais argumentos foram usados e no que terminou.
Então, nós estamos aqui hoje, e por isso cumprimento todos vocês, para defender a democracia, a liberdade, a igualdade, a justiça, os direitos humanos.
Por isso mesmo, agora, na abertura - vou passar a palavra de imediato aos convidados -, eu queria dar uma salva de palmas a vocês, porque esta audiência é iniciativa de vocês. Eu só estou aqui presidindo porque fui convocado por vocês pela importância do tema. Então, uma salva de palmas a vocês que estão aqui e foram os proponentes deste momento. (Palmas.)
De mediato, passo a palavra ao Dr. Ronaldo Ferreira, Presidente do Conselho Nacional de Saúde.
Cada um terá dez minutos, e serão duas Mesas.
O SR. RONALD FERREIRA - Obrigado, Senador.
Bom dia a todos!
Cumprimento o Geniberto, o Wilson, a Tatiane, todos os demais membros participantes desta audiência pública.
R
Para o Conselho Nacional de Saúde, estar aqui, diante da mais diversa representação das religiões no Brasil, não é um acaso, não é mera coincidência; é principalmente pelo objeto central deste espaço que a democracia do Brasil criou, que é o espaço da participação da comunidade, que tem como elemento central, como estrutura central a defesa vida. Em todas as civilizações, em todas as organizações sociais do Planeta, o que se aglutina em torno das mais diferentes crenças e fés é a defesa da vida, é a defesa do combate à morte, ao sofrimento. E não é à toa que o Conselho Nacional de Saúde vem aqui também, neste momento de discussão a respeito das injustiças e do papel dos diferentes atores sociais, diante do enfrentamento dessa construção, dessa construção humana que é o sofrimento, que é a injustiça.
Senador, queria dizer que também sou de Chapecó, meus pais estão lá, criei-me em Chapecó. E compartilhei com minha família e acredito que com todos os brasileiros uma dor indescritível - uma dor indescritível! -, que hoje pode configurar, pode ser desenhada, como o Senador trouxe aqui, nas opções possíveis de se tomar, de se contratar na sociedade. Qual é o resultado dessas opções? Acho que está mais didático para se apresentar para a sociedade o que significa essa PEC 55, o que significa o corte de gastos, de investimentos onde não pode e não há condições, porque, ao fim e ao cabo, o resultado é sofrimento, é morte, não só do ponto de vista orgânico, mas a morte da cultura, a morte da Nação brasileira, porque não é só a saúde que está sendo atacada; é o corpo da Nação brasileira que está sendo atacado, para colocar o conjunto dos recursos, fruto do trabalho do povo brasileiro, para servir à ganância, para servir à especulação financeira, para servir ao rentismo.
Então, estar aqui, hoje, representando o Conselho Nacional de Saúde, dialogando com as diferentes religiões, tem um significado muito grande, porque o que nós conquistamos, o que nós contratamos e está sendo sistematicamente rompido está atacando uma das principais conquistas do povo brasileiro.
A Constituição de 1988 trouxe importantes avanços civilizacionais para o Brasil, entre eles, o principal e o que mais está sendo atacado é a democracia, o Estado democrático de direito, mas não só o Estado democrático de direito.
R
Na Constituição de 1988, com um protagonismo importante das religiões, que foram fundamentais, nós contratamos a principal reforma do Estado brasileiro. Nós colocamos na Constituição talvez a única reforma do Estado brasileiro, que foi a reforma sanitária. A reforma urbana nós não conseguimos; a reforma tributária nós não conseguimos; a reforma agrária nós não conseguimos; a reforma da educação nós não contratamos; mas contratamos, na Constituição de 1988, graças à mobilização, uma lógica diferenciada para tratar da vida, para tratar da saúde, para tratar do sofrimento do povo brasileiro, elevando a saúde de uma mera mercadoria para um direito de cidadania. É isso que nós contratamos na Constituição, tendo como elemento central a potência, a força que a defesa da vida tem de mobilizar amplos setores da sociedade em torno de um programa, em torno de uma plataforma, que foi a plataforma que nós escrevemos e contratamos na Constituição de 1988. E a Constituição, justamente na questão central, na questão mais cara para os movimentos sociais, está sendo alterada, rasgada com a PEC 55, com a alteração do art. 198, que diz respeito a como vai ser garantido o financiamento desse direito.
Neste momento, é importante trazer o posicionamento das quase cem organizações nacionais que têm assento no Conselho Nacional de Saúde, que têm feito inúmeras manifestações. Inclusive, hoje, estamos concentrados, Senador, na Catedral, de onde vamos fazer uma marcha com esse conjunto de organizações na defesa da saúde, da democracia e da seguridade social. (Palmas.)
Inclusive, convido o Senador. Nós vamos nos concentrar aqui na frente do Congresso Nacional às 12h, 12h30, em marcha. Estamos trazendo 27 caixões com a bandeira dos 27 Estados, porque não temos dúvida de que esta mudança é a PEC da morte. O resultado objetivo e material já apresentado em inúmeros estudos - não temos nenhuma dúvida - é mais sofrimento, é menos assistência, é menos presença do Estado, o que pode ser traduzido em menos Samu, em menos Saúde da Família, em menos assistência farmacêutica, em menos programas de saúde mental, ou seja, uma série de conquistas que o povo brasileiro acumulou ao longo dos últimos anos está seriamente ameaçada.
Nós buscamos construir, no Conselho Nacional de Saúde, apostando na democracia, instrumentos para ocupar todos os espaços: este espaço do Legislativo, o espaço das ruas, mas também o espaço institucional que nós, ao criarmos esse sistema de saúde... Aí um convite a todas as organizações religiosas que fazem parte desta audiência pública e aos que nos ouvem para, além de ocupar esses espaços, fazer valer o que ainda está em vigor, que é a estrutura do Sistema Único de Saúde que nós contratamos, que, além da universalidade, da integralidade, dos princípios e diretrizes assistenciais, também colocou de forma legal princípios administrativos e gerenciais.
R
Dentre os aspectos administrativos e gerenciais, nós conquistamos a democracia participava, a possibilidade concreta de o povo participar com poder de deliberar, que são os espaços dos conselhos e das conferências, em que podemos mobilizar a sociedade. E foi, ao fim e ao cabo, quem conseguiu dar sustentação a essa reforma do Estado brasileiro. E, mesmo com esses jogadores que veem o lucro nas planilhas Excel da taxa de retorno aos seus investimentos, mesmo assim, conseguimos avançar, conseguimos ter...
(Soa a campainha.)
O SR. RONALD FERREIRA - ... com todas as dificuldades o maior sistema de saúde do Planeta.
Nesse sentido, o Conselho Nacional de Saúde convida todos para o processo de utilizar a possibilidade de participação da comunidade através de duas conferências que nós convocamos para este período até o final de 2017. É a II Conferência Nacional de Saúde das Mulheres, que, depois de 30 anos, vai buscar mobilizar a energia, a força das mulheres, da luta pelos direitos das mulheres. Sempre, em todos os cantos do Planeta, os direitos das mulheres estiveram associados ao avanço civilizatório. Foi exatamente essa contribuição que, há 30 anos, a I Conferência deu no processo de contratar na Constituição o Sistema Único de Saúde. Vamos fazer a II Conferência em agosto de 2017. E vamos realizar também, como o...
(Soa a campainha.)
O SR. RONALD FERREIRA - ... Senador - e concluindo - colocou aqui, a questão da necessidade da proteção, entendendo que proteção e promoção nós contratamos em 1988 como um elemento constituinte do direito à saúde. No entanto, está construída na sociedade a lógica de que o acesso à assistência é o direito; agora, com a proteção, não está incorporado no sentimento do povo que a proteção faz parte do direito à cidadania e à saúde. E não no sentido de proteção de segurança pública, policial; proteção no sentido de vigilância, vigilância aos riscos, aos possíveis agravos.
Por isso, convocamos também - e é importante a participação, pois podem jogar um papel decisivo as organizações religiosas nesta conferência - a I Conferência Nacional de Vigilância em Saúde, que vai acontecer em novembro de 2017, mas o processo da conferência já se iniciou através das ações dos Conselhos Municipais nos Municípios, das diferentes entidades. Esperamos que, para poder, de fato, discutir aquilo que impacta na vida de cada cidadão o processo das injustiças sociais, possamos enfrentar com proposição, com mobilização política e com formação de uma frente, a mais ampla possível, de agentes políticos e sociais, que possam não permitir que a escuridão se abata novamente ou que venham a trazer aqui longas décadas de escuridão.
R
O desafio que nós temos colocado em vários espaços para todos os brasileiros é o desafio que um poeta cearense falou a respeito de elogiar a juventude que está resistindo, ocupando as escolas. Ele apontou e adjetivou essa juventude como acendedores do amanhecer. E cito um grande brasileiro, baiano, Castro Alves, que dizia:
Toda noite - tem auroras,
Raios - toda escuridão,
Moços, creiamos, não tarda
A aurora da redenção.
Sejamos todos nós acendedores do amanhecer.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem.
Cumprimento Ronald Ferreira, Presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), pela sua fala aqui, que abriu este painel, com muito conteúdo e muito sentimento - percebi na sua voz e na forma como terminou, com a poesia do grande Castro Alves. Eu, que sou baiano por adoção, pois recebi o título de cidadão baiano, me senti contemplado. Casualmente, lá, eu encerrei a minha fala também citando um outro poema do grande Castro Alves, o Poeta dos Escravos, muito bem lembrado neste momento, porque, se bobear, este Congresso aqui é capaz de revogar a Lei Áurea, sendo que nós, muitas vezes, contestamos a forma como foi feita.
O SR. RONALD FERREIRA - Houve uns cidadãos no Rio de Janeiro que pediram indenização aos senhores que tiveram seus escravos libertos - agora!
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Sim. A que ponto chegamos.
Vamos lá. Primeiro, os cumprimentos pela sua fala. Permita só que eu diga isto que eu até usei no debate do plenário: segundo a ONU, nós seremos 21 milhões de brasileiros a mais nos próximos 14 anos - só 14, não pegou nem 20. Então, vamos só olhar a saúde, de que você falou. Como, com o mesmo orçamento, que já está ruim hoje, será daqui a 14 anos, com 20 milhões de pessoas a mais precisando de atendimento de saúde? E ainda há mais isto: considerando que a expectativa de vida nossa aumenta, então, seremos 30 milhões a mais com o mesmo orçamento, uma conta que não fecha.
O SR. RONALD FERREIRA (Fora do microfone.) - Fora a inflação da saúde que é muito superior...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Ele ainda lembra que a inflação da saúde é muito superior que a inflação anunciada pelo INPC.
Agora, registro a presença da Profª Pastora Wal, Coordenadora do Coletivo de Mulheres das Organizações Religiosas do DF. Seja bem-vinda. (Palmas.)
Passo a palavra para Wilson Barboza da Silva, Pastor da Assembleia de Deus Liberdade e Vida, Conselheiro Tutelar, representando também a Aliança de Negros e Negras Evangélicos do Brasil e do DF.
O SR. WILSON BARBOZA DA SILVA - Bom dia.
Cumprimento o Exmo Sr. Senador Paulo Paim, Presidente desta Comissão de tamanha importância para todos nós cidadãos - talvez seja a Comissão mais cidadã.
Eu me permito fazer só uma pequena correção. Eu não sou Conselheiro Tutelar, embora um título desse me honrasse bastante. Eu sou Conselheiro do Conselho de Defesa dos Direitos do Negro do Distrito Federal - também me honra o título.
No início da minha fala aqui, eu quero invocar...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eu quero só dizer que, como aqui veio "conselheiro tutelar", como é que fazemos? Eu vou submeter ao Plenário, pois eu não admito erro: vamos demitir ou não vamos demitir? (Risos.)
(Intervenções fora do microfone.)
Não. Foram salvos pela assembleia. Disseram que não, que isso acontece.
O SR. WILSON BARBOZA DA SILVA - Se me pagassem o salário, eu aceitaria o cargo. (Risos.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Só para descontrair. Vamos lá. A palavra está com você.
O SR. WILSON BARBOZA DA SILVA - Está certo.
R
Eu quero cumprimentar os demais companheiros de Mesa que me dão a honra de confabular com eles e também os que estão colocados aqui na plateia, estendendo ainda a minha saudação aos que estão a distância, conversando conosco e inclusive enviando perguntas - creio eu que isso acontecerá.
Eu quero invocar, primeiramente, o texto muito conhecido de Levíticos 19, versículo 18, que é reiterado ao longo da Bíblia, que diz: "Amarás o teu próximo como a ti mesmo", e, sobre esse versículo, sobre essa afirmação, tecer a seguinte consideração: esse versículo, que é praticamente uma proclamação da alteridade, ou seja, eu me colocar na posição da outra pessoa para poder formular os meus pensamentos, é alguma coisa que claramente está sendo negada nesse processo que estamos discutindo aqui. Eu diria até que, por exemplo, quando eu me regozijo porque uma taxa de mortalidade cai, porque qualquer índice negativo decresce, eu tenho que entender o seguinte: eu ainda não amei o meu próximo como a mim mesmo, na medida em que eu não me fraciono, eu não me vejo como fração de nada. Eu sou 100% de mim mesmo, e essa é a forma como, até para sobreviver, eu tenho que me enxergar. Eu não posso me contentar se o índice cai e o próximo que vai morrer sou eu, e, não, eu vou escapar, eu vou tentar escapar. Se eu penso assim, eu não posso olhar para o meu semelhante como fração de um grande número, mesmo que seja uma fração que eu queira ter como desprezível - porque aquela pessoa que está para morrer, ainda que outros vivam, é 100% de si mesma, e é dessa forma que eu devo enxergá-la. (Palmas.)
Obrigado.
Então, se eu tenho agora a vontade de exultar com a grande vontade do Governo de fazer um grande trabalho sobre alguma coisa - eu não estou, neste caso, mas, se eu fosse fazer isso, eu teria que primeiro olhar essas contas -, eu estou tratando, realmente, cada ser humano que compõe a Nação brasileira com essa alteridade? Eu estou me colocando realmente no lugar dessas pessoas? Creio que não.
Quando eu coloco um plano ortodoxo de 20 anos - um plano ortodoxo de 20 anos! - e eu raciocino da seguinte maneira: eu vou colocar isso na Constituição, nas disposições transitórias, e obrigar que os outros governantes sigam esses 20 anos aqui, se eu trabalhar assim, eu tenho que lembrar também que a justificativa para que o Fernando Henrique Cardoso fosse reeleito era que ninguém podia tocar o Plano Real, só ele. Era assim que se entendia, o argumento era esse. Ora, por que agora virou uma conveniência invertida: 20 anos e quem vier depois tem que fazer o que o Presidente Temer pensou? E, claro, quando terminarem esses 20 anos, ele nem lúcido deverá estar: ele estará com 90 anos ou mais que isso. Mas, tranquilo, vamos garantir que essa coisa se perpetue dessa maneira.
R
Eu vejo nessa questão dos 20 anos de congelamento que alguns estão se valendo da memória corrompida do brasileiro em relação à reposição de perdas pela inflação. Durante um bom tempo nós nos acostumamos com a inflação, a ponto de achar que correção era ganho. Nós levamos um tempo pensando isso. Quando a gente diz que se observará o exercício anterior, e aquela inflação corrigirá os valores a serem pensados para o exercício, a gente está dizendo o seguinte: crescimento nenhum, ganho nenhum, na verdade, houve apenas uma correção nominal da coisa.
Eu penso que - falando agora do ensino, que é a minha área - eu não estou vendo o crescimento populacional; eu não estou vendo, por exemplo, o crescimento inclusive com a vinda de pessoas de outros países na imigração, no refúgio; eu não estou percebendo isso. E é fato que até para não macular o pátrio poder, ou o poder familiar, como é o termo atual, eu devo entender que o pai não pode sequer pensar em não colocar o filho na escola. Ele tem uma responsabilidade, e eu penso que os conselhos tutelares são vigilantes com relação a isso. Entretanto, até isso, pelas minhas contas, fica limitado em relação ao investimento zero. O mundo pode crescer, o Brasil pode crescer, contanto que o gasto continue o mesmo. Um belo dia vai se justificar não colocar criança na escola. Um belo dia vai se justificar o Estado ou o Município não oferecer aquilo que a lei obriga que ele ofereça, ainda que, em algumas situações, em alguns níveis, não se obrigue que o pai mantenha o filho lá - no ensino médio, e tal -, mas o Estado tem que oferecer. Ele pode dizer: "Olha, não tenho mais condições. Fui limitado a esse valor aqui." Não entenderam que existe crescimento orgânico na população, na demografia, e também nos avanços tecnológicos. Nós agora vamos ficar parados na versão atual dos aplicativos. Ou seja, a tecnologia não pode avançar, a gente não pode seguir mais a tecnologia, porque implica aumentar gastos.
Eu penso que nós precisamos, pelo menos, enxergar que não foi nada benéfico, não foi benfazejo trabalhar apenas com correção. O investimento exige uma série... O investimento no ensino, como coisa que deve ser feita, exige uma série de preocupações, inclusive a questão dos direitos humanos mesmo. A gente não pode negar o crescimento ao povo, à pessoa, ao indivíduo, ao Município, nada disso. E é isso que vai acontecer. Toda vez que nós falamos em choque heterodoxo ou choque ortodoxo, toda vez que se fala em qualquer plano, o pensamento que vem depois é: não perder de vista o investimento na educação. Todo mundo sabe disso. Mas aqui vai... Nós realmente vamos decretar, se ninguém fizer nada, uma paralisação de 20 anos.
Eu penso que, quando nós tivemos, na Copa do Mundo de 1970, 90 milhões em ação - a gente cantava isso...
(Soa a campainha.)
O SR. WILSON BARBOZA DA SILVA - Em menos de 50 anos, quantos nós somos hoje? A gente tem que entender isso.
R
Então, as demandas do povo brasileiro não são só qualitativas, não. Essa questão é simples, simples: são quantitativas. As coisas crescem quantitativamente, mas nós estamos, então, condenados a não acompanhar nem quantidade nem qualidade de crescimento. Nós estamos condenados a isso. Eu penso que essa conta uma geração que não teve nenhuma culpa vai ter que pagar, a geração futura. E é o legado que eu, como cidadão, e também como formador de opinião, não gostaria de deixar para essa geração.
É o que nós tínhamos a considerar, acrescentando que é claro que qualquer um que tenha grande poder aquisitivo pode driblar tudo isso, todo esse problema. Realmente, mais uma vez, quem vai pagar a conta é quem não tem de onde sacar esse dinheiro.
(Soa a campainha.) (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Wilson Barboza da Silva, Pastor da Assembleia de Deus Liberdade e Vida.
Eu já registro a presença conosco da nossa querida Senadora Regina Sousa - essa, eu diria, tem lado e tem compromisso com o povo brasileiro. (Palmas.)
Informam-me aqui que há uma articulação na Casa, espero que dê certo, para que a Comissão de Assuntos Sociais não tenha quórum, para não deliberar. Vejam bem, se deliberar, é tudo contra nós. Estão também tentando fazer com que a CCJ não tenha quórum, porque, se for deliberar, poderá votar aquilo que eu expliquei, da NR-12, quer dizer, que máquinas não precisam mais ter proteção, e pode-se enfiar a mão, o braço ali, como bem se entender. E estamos também torcendo para que a audiência no Supremo se estenda, para que não haja sessão no plenário do Senado, porque, se houver votação, podem saber que entra a discussão da PEC 55, aqui tão discutida, com conhecimento de causa, pelo nosso painelista e por este plenário.
Então, vamos dar uma salva de palmas para que não haja quórum. Vejam a que ponto nós chegamos! (Palmas.)
Estou falando ao vivo, aqui, para todo o Brasil: quero mais é que não dê quórum em nenhuma comissão e nem no plenário.
Tatiane Duarte, representante da Rede Ecumênica da Juventude.
A Senadora Regina usa a palavra no momento que entender mais adequado, e, se houver alguma votação urgente, um de nós corre lá e um fica aqui. Combinado, minha Senadora?
A SRª TATIANE DUARTE - Primeiramente, eu saúdo a Mesa, em nome das juventudes que estão não só aqui presentes e nos ouvindo, mas das juventudes que foram bombardeadas no último dia 29 aqui, no campo da Esplanada dos Ministérios, pela polícia do Governador do Distrito Federal - juventudes essas... (Palmas.)
... que não estão sendo bombardeadas só aqui, nem só no meu Estado, o Rio de Janeiro, mas em todo o País, nas ocupações das escolas e das universidades; bombardeadas em nome de um Estado de violência policial, de um Estado que, a cada dia, criminaliza mais as juventudes. Anos atrás, essas juventudes eram o futuro da Nação; pelo visto, hoje, nós, juventudes, somos algum tipo de estorvo para esse Governo.
Eu falo hoje em nome da Rede Ecumênica da Juventude, mas também sempre falo como antropóloga doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Antropologia da Universidade de Brasília e como feminista convicta que sou.
R
A Reju tem um papel muito importante no campo religioso, especialmente porque ela nasce no bojo do movimento ecumênico brasileiro, movimento esse historicamente comprometido com os direitos humanos e com a laicidade do Estado no nosso País.
Então, a Reju nasce nessa perspectiva de que as juventudes devem ser não só objeto de políticas públicas, mas protagonistas das políticas públicas, protagonistas na reivindicação dos seus direitos e de um melhor país para viver. É nessa perspectiva que o Fórum Ecumênico constitui a Reju.
Nós nos movimentamos desde 2007, sobretudo nos últimos anos, não só a partir das redes sociais, mas também de incidências públicas nas diversas localidades em que atuamos. E atuamos, de forma muito contrassensual, no campo religioso, marcado não apenas pela maioria cristã, mas pelo avanço de ideias conservadoras. É contra esse avanço que fazemos, de forma muito contínua, debates sobre sexualidade, lutas femininistas, intolerância religiosa, que assola um país que se diz plural e democrático, a questão da justiça socioambiental e especialmente o nosso posicionamento contra uma democracia que continua a ser capitalista, na qual a dignidade e a vida humana de nada valem.
Uma das principais incidências que a Reju faz, de forma sistemática, todos os anos, é a campanha "Eu Visto Branco pelo Fim da Intolerância Religiosa" na semana contra a intolerância religiosa, quando vestimos branco nas redes sociais para fazer repúdio à instrumentalização da fé religiosa para atacar quem quer que seja por conta de suas crenças. Todavia, sabemos que apenas vestir-se de branco em determinada semana e fazer o nosso repúdio e a nossa manifestação política não é suficiente. E não é suficiente por quê? Porque parece que temos, nesta Casa, representantes, Bancadas religiosas que vivem politicamente para exterminar minorias, exterminar diversidades que compõem esta Nação. (Palmas.)
É claro que essas pessoas estão legitimamente eleitas - não vamos impitimá-las, não é isso -, mas precisamos ocupar, de forma mais incisiva, o campo religioso brasileiro, porque essas pessoas falam em nome de Deus, falam em nome das suas religiões, das suas comunidades de fé para atacar terreiros, para atacar populações LGBT, para atacar nós mulheres.
Não precisamos nem falar quais são as temeridades que virão com a PEC 55, com a reforma do ensino médio, com o que se alcunha Escola sem Partido para nós da juventude. Isso é uma ameaça ao nosso direito de existir de forma plural, é uma ameaça à laicidade do Estado e à democracia, tão frágeis, apesar, sim, da atuação de setores religiosos para a constituição desses dois conceitos, mas precisamos fazer mais.
R
Já que a mesa é sobre injustiças e religiões, é preciso que nós, pessoas que manifestam, de alguma forma, algum tipo de sagrado ou não, estejamos convictos quanto a de que forma nós queremos atuar nesse espaço público. Porque o que nós vemos essas bancadas religiosas fazerem aqui no Congresso e também na sociedade é uma recusa à pluralidade, e nós estamos sendo omissos e coniventes.
Por que eu digo isso? Como antropóloga e como estudiosa do campo da religião e da política, é preciso que a gente retome o nosso compromisso com a democracia, com os direitos humanos, que a gente repovoe essa democracia e a política que está posta aqui no Congresso Nacional, também por esse Governo, sobre o qual nós da Reju já nos manifestamos, como ilegítimo.
Eu gosto muito de seguir a proposta da teóloga feminista Nancy Cardoso, que deu entrevista ao site do Conic, dizendo que é preciso que a gente pense na religião como um não agente de colonialidade e subalternidade entre nós. Já que a nossa laicidade é apenas um verniz, e ela fala como cristã - é importante a gente nomear, porque o cristianismo é maioria neste País -, que não sejamos agentes de desigualdades, agentes de violência, agentes de violações de direitos. É preciso que nós, pessoas religiosas, não só respiremos diversidade e pluriversalidade, mas que estejamos empenhados e empenhadas em fazer com que liberdade de expressão e laicidade não sejam conteúdos vazios.
As bancadas religiosas falam de laicidade e liberdade de expressão todo o tempo aqui, então, não são conceitos vazios. Como vivemos liberdade religiosa e democracia neste País, como pessoas que possuem fé? E, claro, numa democracia, no próprio conceito de laicidade, em que sabemos que foram criadas por um padrão de modernidade ocidental branca, europeia, heterossexual e, sobretudo, capitalista, capitalismo esse que avança sobre nossos corpos, especialmente sobre nós mulheres todos os dias? Então, como que a gente quer agir? Lá na Reju a gente gosta de dançar. Então, a gente está propondo: com quem a gente quer dançar? Qual dança a gente quer dançar? Como a gente vai atuar de forma efetiva, no espaço público, como pessoas religiosas?
É nesse sentido que nós fizemos uma carta do nosso encontro nacional repudiando todas essas medidas dos últimos seis meses que têm a perspectiva do desmonte do Estado democrático de direito e nos colocando na forma de contrassensual nesse campo religioso.
O ecumenismo que a gente professa também não é palavra vazia. Nós queremos dialogar entre pessoas da mesma fé, pessoas de fé diferente, pessoas que não têm fé, movimentos sociais, escolas, igrejas. Nós estamos indo às ocupações, nós nos manifestamos a favor das ocupações, porque nós não podemos permitir, como juventude, que uma PEC 55 acabe com o nosso futuro, o nosso e o de outras pessoas que não vão ter oportunidade, por exemplo, como eu, de ser a primeira doutora dentro de uma família, fruto de políticas públicas que foram efetivadas nos últimos anos. Então, é em nome dessa nossa radicalidade subversiva que hoje é criminalizada não só no Congresso, mas também nas ruas, que a gente prima, como pessoas religiosas, contra as intolerâncias.
R
Não é em nosso nome que queimam terreiros. Não coloquem nossos nomes nas injustiças que também são patrocinadas pelas bancadas religiosas e por líderes religiosos neste País, porque nós queremos um Estado onde a laicidade não seja palavra vazia, seja conteúdo levado a sério pela sociedade.
Temos uma sociedade diversa, de todas as cores, de todas as identidades sexuais e de gênero, de todos os credos, de todas as etnias e é por isso que a gente também repudia essa instrumentalização da fé para dizer: "Eu tenho mais direito do que outra pessoa porque eu sou maioria religiosa dentro de uma sociedade." Então, em nome desse nosso desejo, expresso também que a nossa luta...
(Soa a campainha.)
A SRª TATIANE DUARTE - Não nos calarão. Podem jogar spray de pimenta, podem jogar bomba, podem ocupar, mandar a polícia invadir as nossas ocupações, porque a gente não vai se calar. (Palmas.)
As pessoas que foram mortas na ditadura militar e sumiram e seus corpos nunca foram encontrados não se calaram. A ditadura militar não calou a juventude, porque hoje eu estou aqui e várias pessoas que ocupam as ruas, as políticas e os diversos espaços - falamos também por essas pessoas. A gente sempre fala que, se a gente tombar nesse desmonte do Estado, outras pessoas falarão por nós. Isto é o que nos move: a certeza de que outras pessoas falarão com e por nós.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Tatiane Duarte. Muito bem. Ditadura nunca mais. Representante da Rede Ecumênica da Juventude.
De imediato, representante da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), companheiro de longa jornada já - acho que os nossos cabelos brancos nos aproximaram, além das grandes causas -, Dr. Geniberto Paiva Campos.
O SR. GENIBERTO PAIVA CAMPOS - Eu queria, primeiro, dizer da minha satisfação em estar aqui. Eu me sinto muito bem. Ontem, no consultório, um paciente me perguntou: "Mas, doutor, o senhor vai amanhã ao Senado? Vai naquela Casa?" Eu disse: vou, sim.
Eu acho que a gente tem que continuar fazendo política, Senador.
Eu queria saudar, então, essa sua teimosia, que eu acho que é fundamental, é coisa de gaúcho, coisa do pessoal do Sul.
Eu acho que fazer política agora é importante. A coisa que mais me dá satisfação aqui é ver que a gente não perdeu o bom humor. Eu acho que a gente tem que continuar acreditando, sorrindo, teimando para que a gente consiga voltar a fazer política. A coisa que, às vezes, mais me espanta quando eu ouço, por acaso, a TV Câmara e, às vezes, a TV Senado naquelas votações é uma voz em off que aparece: "Vamos votar, Sr. Presidente; vamos votar, Sr. Presidente." Quer dizer, não precisa de debate. Precisa, sim. A política - está certo - é o campo específico do debate. (Palmas.)
Eu fico realmente espantado com essa operação de desmonte, a maneira como ela foi feita, a maneira como esse grupo chegou ao poder sem um voto, sem nenhuma aprovação popular, sem nenhum escrutínio popular. E ele faz uma proposta que, na realidade, está tentando destruir o futuro - e não vai conseguir - para exatamente implantar aqui as coisas do passado. Isso a gente não pode aceitar.
R
Não precisa que nós nos tornemos também raivosos ou intolerantes, não se trata disso, mas o que me espanta, na realidade, é o seguinte: construções que levaram décadas, levaram séculos para serem feitas, isso querem desmontar porque eu tenho uma maioria dócil, uma maioria que vota em bloco na Câmara e no Senado, eu tenho o apoio da mídia, eu tenho o apoio do Judiciário, e, de repente, vai se construir um novo Brasil sem que o principal interessado, o povo brasileiro, possa ser ouvido.
Vou falar aqui muito rápido dizendo o seguinte: em relação à Igreja Católica e aos direitos sociais, eu acho que os católicos, nós todos cristãos, podemos nos orgulhar bastante de uma coisa, porque os direitos sociais são conquistas muito recentes, relativamente recentes, nas sociedades humanas. Após o estabelecimento da hegemonia do capitalismo, no final do século XIX - e talvez 1870 seja esse marco em que a hegemonia do capitalismo ficou mais evidente -, havia a necessidade de controlar, de definir melhor a relação capital e trabalho, e eu acho que é isso que a gente está tentando discutir hoje dessa maneira atabalhoada, dessa maneira questionável de se fazer.
Então, a Igreja Católica, através da Encíclica Rerum Novarum, do Papa Leão XIII, em 1891 - e é importante que a gente veja isso porque o livro O Capital, de Marx, entra mais ou menos no mesmo tempo -, foi sensível ao mostrar que essa relação capital e trabalho tem que ser uma coisa em que o Estado, que é uma construção muito importante dos humanos, traga equilíbrio, e o que eles estão querendo é exatamente destruir isso. Então, essa coisa vem de longe. A Rerum Novarum tem mais de século e foi ela que deu exatamente os fundamentos para que houvesse aqui a doutrina social da Igreja, porque não pode haver a predominância da lei do mercado sobre o trabalho humano. Isso é uma coisa que está clara. Vários países hoje estão procurando fazer isso. As necessidades humanas, há algumas delas que não podem ser atendidas pelo mercado. Então é aí que é importante o papel do Estado.
Repito: eu fico muito contente de estar aqui, de poder está discutindo com todas as pessoas. E uma coisa que é importante a gente lembrar é que no Brasil a relação entre capital e trabalho é uma coisa recente, não tem um século - não tem um século. Então, essas coisas, eu digo, foram construídas ao longo de um tempo. As leis sociais no Brasil aparecem mais ou menos nas décadas de 20 e 30, com a Lei Eloy Chaves. Quer dizer, é uma coisa que veio em um crescendo. E lembrar que nós chegamos na redemocratização na Constituição de 1988, com muita generosidade.
Como falou Ronald, que é o Presidente do Conselho Nacional de Saúde, talvez o programa social que mais tenha tido êxito seja exatamente o Sistema Único de Saúde. Não é fácil - e a gente sabe disso - a gente garantir saúde para todos em uma hora em que a medicina, a assistência social, a assistência à saúde e a assistência médica tiveram avanços tão significativos, porque a transferência do conhecimento científico, a transferência da tecnologia para a prática médica é hoje uma coisa que a gente praticamente não esperava. Então, é isso que eles querem destruir.
R
Eu lembro aqui o que eu chamei de o réquiem para o SUS. Um colega nosso, médico, em maio de 2016, falou isso. O Dr. Drauzio Varella disse o seguinte, já querendo criar uma ideologia antiSUS, talvez até sem perceber: "Políticas públicas destinadas exclusivamente aos mais pobres estão fadadas ao fracasso." É isso mesmo? Eu tenho dúvidas. "Está na hora" - continua ele - "de deixarmos de lado a hipocrisia utópica e o estrabismo ideológico de antigamente." Então, você coloca dois estigmas, para mim, chocantes. Quer dizer, é impossível cuidar dos pobres, porque você não pode dar tudo para todas as pessoas. Isso eu acho que é um sofisma. E como ele coloca: deixar de lado a hipocrisia utópica e o estrabismo ideológico de antigamente, como se cuidar de pobres, cuidar de necessitados fosse alguma coisa impossível de ser alcançada.
Eu queria lembrar também que, na construção do SUS, há uma coisa chamada de cientista de Manguinhos, e é importante que a gente possa perceber isso. Esse povo foi extremamente importante na consciência social da problemática da saúde. Você não pode fazer saúde hoje apenas em hospital. A saúde hoje não é direcionada apenas aos doentes. Ela é direcionada a todas as pessoas, desde o nascimento até a sua curva biológica normal. Então, a gente tem que entender, não pode aceitar isso.
Eu digo, Senador, que a coisa que mais me choca nessa situação é o seguinte: eu era estudante de Medicina, em 1964, fui preso, era um perigosíssimo agente da Igreja Católica para mudar o mundo - confesso que eu queria mudar o mundo para anteontem, se possível, para ontem, mas nunca pela violência, nunca para fazer isso. (Palmas.)
E eu paguei um preço muito alto e que nunca cobrei. Eu nunca fui à Comissão de Anistia cobrar isso, porque aquilo para mim não pode ser traduzido. É uma questão muito pessoal que eu coloco. Mas digo a vocês que tenho um orgulho muito grande porque acho que aqui nós somos incansáveis. Eu vejo na mesa a minha companheira, estudante de pós-graduação da UnB, um local onde eu fui professor durante muito tempo. E fico muito animado porque, na realidade, o que esses garotos fizeram agora, os estudantes secundaristas e universitários, foi uma lição para a gente. (Palmas.)
A gente ficou muito cheio de perplexidade, sem saber praticamente o que fazer. Realmente, eu confesso que não esperava nunca que este Governo, que assumiu de maneira ilegítima, tivesse a pressa - se vocês me permitem a expressão -, a cara de pau de propor uma reforma dessa intensidade sem nenhuma consulta popular, como se a gente estivesse prescindindo de eleição. (Palmas.)
R
E uma coisa que também me espanta, e aqui eu concluo, é que é como se a gente estivesse voltando ao auge da guerra fria, quando o pessoal dizia: "Não há fronteiras políticas, há fronteiras ideológicas". Isso não é verdade! Stalin errou nisso logo após as vitórias da Segunda Guerra, ocupando o país. E os Estados Unidos erram ao dizer: " Existe um mundo livre. Existe uma cortina de ferro." Tudo coisa midiática, como é aqui.
É bom lembrar que essa operação Lava Jato, que usa delação premiada... A delação premiada, se a gente procurar na história, está lá atrás, na União Soviética, na época do stalinismo, quando se fazia exatamente essa coisa. É só procurar nos livros da Hannah Arendt que está tudo lá. A gente está retomando uma coisa, e eu confesso a vocês que eu fico perplexo com isso.
Então, eu digo a vocês: "Há fronteiras políticas, sim". A gente não pode entregar. Não é só desmontar a área social. É entregar o País a um outro país, como se a gente dissesse: "Não, as fronteiras ideológicas predominam." Não é verdade. Eu digo a vocês, e não quero ser profeta, porque eu sou apenas um cardiologista, mas eu digo que os Estados Unidos estão mudando, vão mudar, porque todas as lambanças que eles fizeram desde a Segunda Guerra, invadindo o Irã, a Coreia - é uma festa! -, Cuba, eles não acertaram praticamente em nada. Esse país, os Estados Unidos, que a gente admira como nação, como país, está mudando e vai mudar, e não é só a eleição do Donald Trump.
Eu agradeço por poder estar aqui dialogando com vocês. É uma grande satisfação dizer: eles não vão fazer com que a gente perca o bom humor, a capacidade de enxergar as coisas. E vamos trabalhar pelo futuro.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dr. Geniberto Paiva Campos. Parabéns pela sua fala, encerrando esta Mesa. Fala com muita clareza sobre tudo que está acontecendo, lembrando um pouco da sua caminhada, sempre no combate ao arbítrio, à força, à truculência, aos ditadores, dizendo que este Governo lembra muito também uma postura ditatorial pela forma como está encaminhando os projetos para esta Casa, sem nenhum debate com a sociedade. Obrigado, Dr. Geniberto Paiva Campos, que falou em nome da CNBB.
Eu pediria aos meus convidados desta Mesa - a não ser a Senadora, que deve ficar aqui - que retornassem para a primeira fila para podermos depois suscitar o debate.
Vou convidar a segunda Mesa: Monge Sato, representante das religiões orientais... (Palmas.)
A Senadora, como sempre, na sua simplicidade, elegância e diplomacia, disse: "Olha, como somos cinco, eu volto para a primeira fila." Uma salva de palmas para a nossa Senadora Regina Sousa. (Palmas.)
Dom Maurício Andrade, Bispo da Igreja Episcopal Anglicana de Brasília.
Bem-vindo! (Palmas.)
Cacique Márcia, Santuário dos Pajés Tapuia - Etnia Guanabara da reserva indígena Bananal Noroeste. (Pausa.)
Não sei se encontra.
Não!
Losangelis Gregório, representante da Federação Espírita do DF, Diretora de Assistência e Promoção Social Espírita. (Palmas.)
R
Mãe Baiana Adna Santos de Araújo, Presidente do Ilê Oya Bagan, comendadora representante das religiões de matriz africana e coordenadora de Proteção de Patrimônio Afro-Brasileiro na Fundação Cultural Palmares.
Seja bem-vinda! (Palmas.)
Eu, mais uma vez, agradeço à Senadora Regina, que cedeu espaço aqui na mesa, mas poderia sempre ficar aqui na mesa - eu sou o Presidente, e você é a Presidenta. (Palmas.)
Conosco, aqui, a mulher sempre será lembrada com muita diplomacia. E, com a honraria que merece, a nossa Senadora.
Eu vou seguir a lista aqui. Pela lista, Mãe Baiana Adna Santos de Araújo. Você é a primeira convidada a usar a palavra. São dez minutos para cada convidado.
A SRª MÃE BAIANA ADNA SANTOS DE ARAÚJO - Em primeiro lugar, bom dia a todos, em nome do Ilê Axé Oya Bagan e em nome da Fundação Cultural Palmares, instituição em que eu ocupo um cargo.
Quero agradecer a esta Mesa, quero agradecer ao nosso Senador Paulo Paim por dar oportunidade para a gente estar se expressando e falando das dores - onde dói, onde está doendo, onde foi que apertaram - e da solução que a gente possa tomar.
Eu mudei: eu iria fazer uma fala, mas recebi uma denúncia agora de manhã, quando eu estava saindo para vir para cá. Então, eu resolvi colocar um videozinho que nós fizemos para denunciar também os maus-tratos à nossa religiosidade - às religiões das comunidades tradicionais de matriz africana -, a perseguição, a intolerância religiosa. Eu gostaria que nós pudéssemos prestar a atenção nesse vídeo que vamos passar agora, por favor.
(Procede-se à exibição de vídeo.)
R
(Procede-se à exibição de vídeo.) (Palmas.)
R
A SRª MÃE BAIANA ADNA SANTOS DE ARAÚJO - Gostaria, como vi que há representante da CNBB... Recebi agora de manhã documento em defesa do Pe. Bezerra. Esse padre está sofrendo perseguição na paróquia de Itaquera. Não sei onde é, não conheço o padre, mas me senti no direito e me sinto com essa responsabilidade, como religiosa que sou, de não deixar passar, porque tenho visto o que o nosso povo tem passado, o que as religiões de matrizes africanas têm passado. Acho que o vento que venta lá venta cá, o pau que dá em Chico dá em Francisco, e a dor que dá em você dá em mim, afinal de contas, nós somos irmãos. A frase que me chamou a atenção aqui, nesse documento, foi: amor ao próximo. Então, quero depois passar para o senhor dar uma olhada. É uma petição. Acho que temos que ver o que está acontecendo com o nosso padre.
Quero falar também sobre a saúde dos terreiros. As comunidades tradicionais de matriz africana têm um trabalho social muito grande dentro das suas casas. A gente, às vezes, fica olhando e não entende por que tanta perseguição, por que se persegue tanto uma comunidade que trabalha, um povo que está preocupado com os arredores de onde mora, com o povo - as crianças, os jovens, os adolescentes que estão ao redor dos terreiros -, que acolhe aquela comunidade, acolhe os pais, as mães, quando chegam correndo, quando chegam sofrendo porque há uma mãezinha na noite, parindo, porque há alguém, uma criança com a perna quebrada ou um braço quebrado porque caiu, que não tem um caderno, muitas vezes, para ir à escola, porque a mãe não pode dar. Esse povo todo bate na porta do terreiro. Às vezes não precisa ser da mesma religião, mas bate na porta do terreiro, sim. Por que tanta perseguição?
Precisamos, Senador, creio, de uma campanha. Creio que precisamos fazer uma campanha forte, todos nós juntos, movimentos sociais organizados. Na hora em que se precisa, esses movimentos estão lá, esses movimentos vão à luta, vão ajudar.
Nos terreiros, há tanta campanha bonita que se faz, tanto trabalho bonito, cursos de percussão gratuitos para os jovens, os adolescentes que estão na rua, que muitas vezes estudam de manhã e não têm o que fazer à tarde.
Vá a um terreiro. Aqui, nós temos próximo, por exemplo, o Terreiro da Mãe Dora. Ele fica no Jardim ABC, que não é Jardim ABC, é bem divisa com o DF. Lá tem um trabalho lindo. E ninguém vai à porta dela saber de que forma ela faz aquele trabalho. Como ela faz aquele trabalho? Quem o custeia? Ninguém. É incrível: ninguém.
R
Há uns meninos, um grupo aqui em Brasília chamado Os Filhos de Dona Maria - eu creio que todo mundo conhece, acabaram de ganhar um festival de samba -, que, com os instrumentos de percussão deles, colocam as crianças dos arredores, de igreja evangélica, de igreja católica, todas que eles acham lá no espaço do terreiro, ensinam a essas crianças percussão, tiram essas crianças da rua. As comunidades têm feito isso não só aqui, mas no Brasil inteiro, no Brasil todo: aula de corte e costura, manicure, cabeleireira. Os terreiros chamam as crianças, os jovens, os adolescentes, as mães, os pais e fazem algo que muitas vezes o Governo não dá conta, não alcança ou não sabe. Há projetos que colocam e, às vezes, até ganham, mas, quando um terreiro chega a ganhar um projeto para levar para dentro do espaço dele e fazer alguma coisa, é tanta exigência, é tanta coisa que muitas vezes nem quer mais, desiste. Outros, quando conseguem, demoram. Se se coloca um projeto hoje e ganha, só entra de novo daqui a cinco anos. Então, não há esse olhar, e é preciso ter, para as comunidades como um todo, para os direitos que os terreiros precisam ter, sem perseguição.
Dentro do DF hoje temos aproximadamente três mil casas de santo, e, às vezes, as pessoas falam: "Não, não sabemos se tem. Onde estão?" Estão, sim, escondidas porque têm medo: medo da perseguição, medo de colocarem fogo na sua casa, medo de toda essa transformação que têm sentido. No entorno, há aproximadamente cinco mil casas. A Fundação Cultural Palmares conseguiu fazer o mapeamento, vai começar agora o mapeamento das casas só do entorno, só do DF, porque, pela emenda que tem, não pode ir para o entorno, mas para a primeira, segunda, terceira e quarta etapa. Primeiro, será a cartografia, para começar a fazer as políticas públicas que as comunidades precisam. Então, tem muita casa escondida.
Muitos não dizem, mas quantos funcionários eu creio que estão aqui no Senado, são de terreiro e não têm coragem de se declarar, não têm coragem de dizer, porque têm medo da perseguição do chefe, têm medo da perseguição do diretor, têm medo da perseguição do colega que senta a seu lado na mesa, têm medo de tudo?
(Soa a campainha.)
A SRª MÃE BAIANA ADNA SANTOS DE ARAÚJO - Têm medo de botar uma roupa branca no dia de sexta-feira, e é o certo, porque representa a paz. Acabaram de ver esse pequeno vídeo que passou, no final, pedindo paz. As comunidades tradicionais de matrizes africanas estão pedindo paz, querem paz.
Estamos, neste momento, Senador, com uma polêmica sobre o abate de animal. As religiões milenares, há mais de mil anos, vêm com suas tradições. O culto Gelede é reconhecido e tombado pela Unesco. O Brasil conhece todo tombamento cultural. Por que persegue? O Iphan tem um inventário nacional de referências culturais de terreiros, e é do Distrito Federal. Quer dizer, o Brasil reconhece, mas, infelizmente, as pessoas se dão a esse prazer de perseguir.
R
(Soa a campainha.)
A SRª MÃE BAIANA ADNA SANTOS DE ARAÚJO - ... se dão a esse prazer de perseguição e de perseguir. Então, creio que precisamos de uma campanha muito forte para que as pessoas possam chegar no momento e dizer: "Não, chega. Vamos parar com essa perseguição."
Quero também, Senador, ver se conseguimos trazer essa pauta para cá para discutirmos sobre o abate porque é uma pauta que está no STF, e a problemática é muito séria. Então, essa é uma polêmica, e eu gostaria que o senhor pudesse dar atenção também a essa pauta e talvez trazer uma pauta para o Senado.
Muito obrigada a todos. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Mãe Baiana Adna Santos de Araújo que, além de Presidente do Ilê Oya Bagan, é também Coordenadora de Proteção de Patrimônio Afro-Brasileiro na Fundação Cultural Palmares.
Vamos todos nos somar a esta campanha contra esse tipo de preconceito que é contra o rito, a história, a caminhada das religiões de matriz africana, que, podem saber e ter certeza, o Rio Grande do Sul, segundo estudos que me passaram, é o Estado que tem mais centros de matriz africana, mais comunidades tradicionais.
Passamos a palavra, neste momento, ao representante das Religiões Orientais, Monge Sato.
O SR. MONGE SATO - Bom dia a todos e todas.
Muito obrigado pela oportunidade. Condenamos a intolerância e os preconceitos em todas as suas formas, denunciamos todo o ódio e rejeitamos fortemente a linguagem de exclusão e de segregação.
Antes de explicar sobre esse texto, queria prestar minha homenagem ao Senador Paulo Paim, que está aqui a meu lado. Eu o conheço há 30 anos. Acho que ele não me reconhece.
Reconhece?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Acompanho a distância, o seu nome é conhecido.
O SR. MONGE SATO - Não, eu o conheci na fundação do seu Partido, eu o conheci na fundação da CUT, e ele sempre foi assim. Ele podia estar neste momento nos conchavos, conchavos do seu próprio Partido, do PT; ele podia estar em algum outro espaço democrático, como ele disse no começo da palestra. Ele está aqui conosco, acompanhando as organizações da sociedade civil.
Eu quero agradecer pessoalmente ao Paulo Paim porque ele me inspira o que vou falar agora. Por quê? Porque quando retornei a São Paulo do meu exílio, exílio da ditadura... E, no meu caso, um exílio muito especial, porque passei na Bahia quase oito anos, depois de ter sido expulso do Chile, no segundo golpe que recebi. O primeiro golpe no Brasil e, depois, no Chile, e, aí, fiquei na Bahia durante um bom tempo.
R
Retornando a São Paulo, eu embarquei diretamente naquela movimentação toda que representava, pelo menos para todos nós na época, o novo Brasil. E lá estava, Paim, por quê? E numa discussão até mais específica, porque sou economista e fui do Dieese, eu retornei a São Paulo porque ajudei a fundar o Dieese em sessenta e poucos - 1965, 1966, refundação do Dieese -, depois retornei nos anos 80. E, desde então, Paim é um defensor, não um defensor ideológico dos trabalhadores, mas um defensor de fato, defensor das condições de vida e de trabalho dos trabalhadores.
Então, quando ele me fala hoje que ele está muito preocupado porque nesta caixa-preta que é o Congresso está-se discutindo cláusulas que prejudicam o trabalhador - por exemplo, coisas simples, eu nem sabia disto: tirar as grades que protegem as máquinas. Tirar as grades que protegem as máquinas? Para proteger as máquinas?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Tem um lá na CCJ hoje, esse debate.
O SR. MONGE SATO - Que absurdo, gente! Que absurdo! Proteger as máquinas para que os seres humanos percam os dedos, as mãos, os olhos, etc.? Como é que é possível isto? Mas ele está aqui conosco.
E o que eu li agora, gente, foi pronunciado pelo Donald Trump no dia 1º de dezembro deste ano. Primeira fala dele em comício: "Condenamos a intolerância e os preconceitos em todas as suas formas. Denunciamos todo o ódio e rejeitamos fortemente a linguagem de exclusão e de segregação" - Donald Trump, recém-eleito nos Estados Unidos. Ou seja, se ele diz isto, nós, que somos religiosos, temos mais obrigação ainda de levar em conta essas condições humanas. Mais do que nunca. Eu acho que esse encontro nosso é um encontro de fato, na forma e no espírito ecumênico. Porque estão várias religiões aqui, vários deuses: deuses brancos, deuses negros, deuses amarelos, deuses de toda cor... (Palmas.)
E como sou budista há 20 anos, eu, até por minha obrigação funcional, devia defender a paz, devia defender a justiça, devia defender a liberdade. Todos nós somos amantes e defensores, até por profissão, da paz, da liberdade e da justiça.
R
Mas o Paulo Paim me inspira para falar do espírito do capital. Eu vou falar sobre isto porque eu conheço a essência do capital, conheço o espírito do capital. Eu fui economista e marxista. Estudei profundamente o capital. Até a partir do ponto de vista da doutrina social da Igreja - não só através da análise admirável do Marx, mas a partir da doutrina social da Igreja. E capital é um mal. Capital é um mal. Se nós desenvolvemos o dinheiro como meio de troca, capital passou a ser o meio de acumulação. Acumulação de quê? Acumulação de riqueza, mas também de injustiça, mas também de diferença social. O dinheiro era meio de troca para facilitar a nossa vida, e capital passa a ser o mal, passa a ser o meio de acumulação. Acumulação de riquezas, mas também de desigualdades.
Isto tem que ser combatido. Isso tem que ser combatido, gente. Tudo bem, existem os capitalistas e os trabalhadores. Existem grandes capitalistas, existem meios capitalistas, os pequenos comerciantes, os grandes comerciantes. Mas o capital é o mal em si. O capital amplia seu espaço sempre. E ao que nós, pobres mortais sem poder, podemos recorrer é ao Estado. Esse Estado não pode ir na direção que está indo, que é a favor do capital. Temos que ser a favor dos direitos humanos, dos direitos sociais... (Palmas.)
E essa PEC, essa PEC, gente - PEC é até da linguagem de comércio internacional, significa especificação. PEC significa especificação. Ou seja, enquadrar todas as mercadorias numa medida que seja fácil empacotar. Isso que chama-se especificação no comércio internacional. E se usa PEC nisto que estamos combatendo: os tetos para saúde, para educação... e que mais?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Saúde, educação, assistência social, segurança, infraestrutura, tudo. Congela todos os investimentos.
O SR. MONGE SATO - Tudo o que se refere a direitos humanos.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Isto.
O SR. MONGE SATO - Tudo o que se refere a direitos sociais.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Isto.
O SR. MONGE SATO - Como é possível isto, gente? Temos que defender a democracia, para preservar o espaço do Estado a favor dos direitos humanos, não a favor do capital. Capital, desculpe usar essa expressão, é o espírito do mal. Acúmulo de riqueza, de desigualdade, de ódio, de raiva, e assim por diante.
R
Nós não podemos derrubar esse capitalismo do jeito que nós queríamos algum tempo atrás. Temos que mudar o espírito do capital e, para isso, o Estado é importante para defender o que é humano ainda hoje: direitos humanos, direitos sociais.
Eu quero terminar, prestando, mais uma vez, minha homenagem pessoal ao Paulo Paim, que é uma das poucas pessoas, digamos, com quem contamos nesta Casa, que ainda é uma caixa-preta para muitos de nós. Apesar da redemocratização...
(Soa a campainha.)
O SR. MONGE SATO - ... apesar do aumento da nossa consciência, o Congresso continua uma caixa-preta, e o Paulo Paim é muito importante dentro desta caixa-preta.
Muito obrigado a todos vocês e ao Paulo também. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, muito obrigado pelas considerações, Monge Sato, representante das religiões orientais.
Está aqui conosco a Senadora Regina Sousa, que, pode ter certeza, está na mesma trincheira que eu estou e que nós estamos. A Senadora Regina Sousa é uma referência também para todos nós.
Eu queria registrar a presença aqui do Artur Bueno de Camargo, Presidente da CNTA, que é um líder sindical também comprometido, a quem eu peço uma salva de palmas. (Palmas.)
Está assistindo esta reunião, veio participar, mas também, ao mesmo tempo, vai participar, à tarde, às 15h, de uma reunião com o Presidente do Senado.
Eu digo com o Presidente do Senado. Se será - como disse hoje, pela manhã, virou editorial de um jornal -, se vai ser o Senador Jorge Viana ou o Senador Renan Calheiros, eu também não sei. Não me pergunte. Parece que o editorial do jornal diz isso, exatamente do jeito que eu estou dizendo aqui.
Porque ontem, dia 10 de dezembro, Dia Internacional dos Direitos humanos, houve uma sessão de homenagem, aberta por mim, em que a gente ofertou um troféu a inúmeras pessoas que se destacaram nesta área. Todo ano a gente faz isso e, com certeza, pessoas que estão nesta sala, no próximo ano, provavelmente, estarão entre os homenageados.
Mas eu vejo com alegria a sua presença, Artur, e confirmo que hoje, às 15h, as centrais, as confederações estarão presentes para uma reunião com o Presidente do Senado, demonstrando todas as preocupações que estamos tendo aqui.
E quero aproveitar este momento. Eu sei que haverá hoje um grande ato aqui, mas uma comissão representando o ato poderia se fazer presente. Não muitos, porque senão vira uma assembleia, mas se puderem, duas, três lideranças, representando esse movimento que está aqui e que está fazendo ato hoje aqui na frente. Se puderem também estar às 15h com o Presidente do Senado, que é para falar sobre tudo isso que nós estamos falando aqui e também falar, Artur, sobre o que estão votando, desde a NR 12 - que você conhece muito bem, que é desmontar a máquina só para produzir e tirar toda a forma de proteção do trabalhador -, o negociado sobre o legislado, até praticamente acabar com o movimento sindical. Sabem também que estão com uma proposta aqui para que o movimento sindical não possa ter nenhuma contribuição. É isso o que estão propondo também. É querer desorganizar a organização dos trabalhadores de baixo para cima. Está aqui a PEC 55, enfim, e tudo isso nós vamos conversar com o Presidente do Senado às 15h.
R
Registro a presença também de Solange Vaz dos Santos, 1ª Vice-Presidente da Federação Espírita do DF; Monja Cris, do Templo Shin Budista Terra Pura de Brasília; Profª Pastora Val, que eu já havia citado, coordenadora do Coletivo de Mulheres das Organizações Religiosas do DF e também representantes da CNTTT (Confederação Nacional dos Trabalhadores de Transportes Terrestres). Eu peço uma salva de palmas a todos que aqui citei. (Palmas.)
E passamos a palavra, neste momento, a Dom Mauricio Andrade.
Lembrando à Senadora Regina que ela usa a palavra no momento em que entender adequado.
Dom Mauricio Andrade, Bispo da Igreja Episcopal Anglicana de Brasília.
O SR. DOM MAURICIO ANDRADE - Bom dia a todos, é uma alegria muito grande estar aqui hoje participando desta Mesa. Saúdo a Senadora Regina Sousa e o Senador Paulo Paim, dizendo, Senador Paulo Paim, que, no tempo em que morei no Rio Grande do Sul - eu sou pernambucano, a gente pode sair de Pernambuco, mas Pernambuco não sai de dentro da gente -, morei dez anos em Porto Alegre, entre 1994 e 2004, tive o prazer de votar no senhor.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Agradeço de público. Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. DOM MAURICIO ANDRADE - E nunca me decepcionei. Eu digo isso porque aqui em Brasília já votei em dois Senadores e estou totalmente arrependido. Uns cidadãos que falavam de... (Palmas.)
... trabalhadores, de projeto social, e hoje eu espero que não sejam mais eleitos nem para síndico de prédio, porque são traidores da classe trabalhadora, da classe estudantil e de todos os que lutam pela... Então, eu posso... Eu sou daqueles que não me esqueço em quem voto e já pude dizer isso umas vezes, encontrando ele no voo daqui para Porto Alegre, e digo, Senador, sempre me sinto orgulhoso de ter votado no senhor, lá em Porto Alegre.
Eu creio que este momento, este encontro aqui se envolve, se reveste de uma importante razão, e a moldura dele, a moldura deste encontro está envolvida por este período desta semana, que é a semana do Dia Internacional dos Direitos Humanos, da Declaração Internacional dos Direitos Humanos e também, dentro do contexto dos 16 Dias de Ativismo, de luta contra a violência doméstica, contra a violência contra as mulheres. E a gente precisa incluir aí todo o tipo de violência: violência contra terreiros, violência contra pessoas do LGBT, contra todo tipo de violência.
Então, creio que esta semana seja uma semana muito oportuna para estarmos refletindo e conversando sobre religiões, contra as injustiças sociais. E aqui eu digo que, representando a Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, a comunhão anglicana, eu também represento, com toda a participação que tenho no movimento ecumênico, eu trago aqui comigo a representação do FE ACT, que é o Fórum Ecumênico Brasil, representado por várias instituições, igrejas, movimentos e organismos ecumênicos e, para nós, especialmente na comunhão anglicana, a questão de lutar contra a injustiça não é uma questão transversal, é uma questão de eixo, da missão de ser da Igreja.
Porque a Igreja, evidentemente, qualquer movimento religioso, tem que dizer... A gente tem que proclamar o que a gente crê, a gente tem que buscar novos adeptos. Mas, para além disso, a gente tem que lutar por transformar as estruturas injustas da sociedade.
R
E esse é um dos eixos de missão da Igreja Anglicana, lutar pela transformação das estruturas injustas da nossa sociedade, de onde estamos inseridos. E aí, como reagir a essa proposta, a essa emenda que está aí? Porque isso não é uma coisa normal. Realmente, não é uma coisa tão normal um país, para mudar uma política orçamentária, mexer na sua Constituição.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Se me permite, nenhum país do mundo fez isso, congelar por 20 anos via Constituição.
O SR. DOM MAURICIO ANDRADE - Via Constituição! Quer dizer, nós estamos fazendo algo, presenciando algo que vai de encontro a, que impacta todas as lutas que tivemos na construção de uma Constituição social em 1988. Então, precisamos nos manter, aí não somente como Igreja Anglicana ou como Igreja Católica ou como religiões orientais, negros, nós precisamos estar unidos como povo, como povo que quer manter e lutar por transformações. (Palmas.)
E digo que a inclusividade... Enquanto estivermos defendendo evangelho de exclusividade, que é só quem acredita na minha verdade, a gente está fadado a se digladiar. Precisamos, cada vez mais, refletir que, para onde defendamos, é para um único ser que nos transforma, que nos move e que nos dá energia. Bom, a gente pode chamar de vários nomes, mas é isso que nos une, e a gente precisa ser mais inclusivo, incluindo os negros, as mulheres, as pessoas LGBT, todos e todas.
Estou aqui hoje junto com duas reverendas, Reverenda Magda e a Reverenda Tatiana, duas jovens reverendas. E a nossa igreja completou, o ano passado, 30 anos de ordenação feminina. E aí, quando eu falo isso, eu digo que a igreja não abriu espaço para as mulheres, as mulheres ocuparam o espaço. (Palmas.)
E nós precisamos ocupar junto com a juventude. Eu estava me lembrando aqui - me permita - de um versículo aqui do Profeta Joel, no capítulo 2 - meu filho, me ajude aqui -, que disse: "E há de ser que depois que derramarei o meu espírito sobre vocês, os filhos e as filhas profetizarão, os vossos velhos terão sonhos, mas os vossos jovens terão visões." E os jovens estão dando visão para a gente, os jovens não estão sonhando. (Palmas.)
Os jovens estão dando visão para a gente. A nossa igreja, a Igreja Episcopal, publicou, falou muito e tem nos defendido em muitas coisas, mas, uma declaração - e digo que foi a única declaração oficial que saiu - foi da juventude. Carta da juventude contra a PEC 55.
R
E os jovens começam dizendo assim: "Não se acomodeis por tudo nesse mundo, mas transformados pela renovação da vossa mente", conforme está em Romanos 12:2.
Quer dizer, precisamos sair dessa comodidade, da nossa acomodação, e lutar, assim como ocupar, junto com nossos jovens.
Agora, digo que nós, hoje, estamos vivendo uma realidade muito estranha. O que o Monge Sato acabou de ler, da declaração do Presidente Trump, é o que a Antropologia está chamando hoje - a Tati pode falar com muito mais propriedade do que eu - de pós-verdade. Não é verdade? Estão falando. E, há duas semanas, houve um encontro nacional sobre a pós-verdade, onde o que vale não é o que ele está dizendo para o público, porque ele falou tudo contra isso. E estamos vivendo isso aqui também no Brasil com esse Governo. Eles falam uma coisa num dia e, no outro dia, é outra totalmente diferente, acabam um ministério num dia, no outro dia, renovam o ministério. O ministro se demite, se coloca Roberto Freire e se diz que Roberto Freire vai transformar. Pelo amor de Deus! (Risos.)
Mas era o ministério que ia acabar. Estamos vivendo uma realidade, essa realidade da pós-verdade. A Tati pode, depois, fazer uma explicação para a gente dessa situação.
Mas é exatamente isso aqui: as circunstâncias e os fatos objetivos têm menos influência sobre o que a opinião pública pensa. E aí se muda. O Trump agora é o defensor contra toda forma de intolerância.
(Soa a campainha.)
O SR. DOM MAURICIO ANDRADE - Então, gente, trago aqui essa mensagem, essa palavra de que nós precisamos, primeiramente, buscar nos unir e ocupar, junto com essa nossa juventude, esses espaços que estão aí. Que a gente possa não somente defender uma bandeira nossa, própria, mas da inclusividade, incluindo todas as pessoas, na certeza de que, juntos... Quando a gente trabalha no movimento popular... Ontem eu estava lá no Pedregal, no Novo Gama, e temos um trabalho lá com crianças, com 130 crianças. Ninguém pergunta lá quem é da Assembleia de Deus, quem é do terreiro, quem é da igreja. Com certeza nenhuma daquelas crianças que atendo, que a gente atende lá, são anglicanas, com certeza. E provavelmente jamais serão. E eles não vão entrar na estatística da igreja, mas eles vão entrar na estatística da transformação. E é isso que a gente tem que fazer. (Palmas.)
(Soa a campainha.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Cumprimento Dom Maurício Andrade, Bispo da Igreja Episcopal Anglicana de Brasília.
Vocês viram que os assessores estão todos aqui no meu ouvido, não é? É que eles estão preocupados que, tanto na CAS, como na CCJ, podem entrar projetos que ferram com o trabalhador - nas duas, na pauta.
Eles estão me pedindo para que eu vá para lá rapidamente. Estou alertando-os para, no momento em que entrar o projeto, que me chamem, porque vou numa e na outra. Daí, eu e a Senadora Regina dividiremos aqui a Presidência.
Então, temos só mais um inscrito agora, a Losangelis Gregório, representante da Federação Espírita do DF e Diretora de Assistência e Promoção Social Espírita, a quem eu passo, de imediato, a palavra.
A SRª LOSANGELIS GREGÓRIO - Meu bom dia a todos. Que a paz do mestre Jesus esteja em nossos corações hoje e sempre.
R
Que consigamos compreender, na mensagem do mestre Jesus e de tantos outros mestres que nós temos acompanhado ao longo da nossa história e da nossa vida, esse sentido real da paz, dos valores morais e espirituais que precisamos defender efetivamente em nossos corações e na nossa vida pessoal, familiar, acadêmica, social, profissional.
Os senhores foram chamados aqui para falar e discutir sobre a situação do País, com tantas transformações necessárias. Mas nós precisamos organizar melhor a sociedade, as comunidades, a população, para aprender a pensar.
Nós, na qualidade de cristãos, de pessoas que fazem a diferença no processo democrático, precisamos observar que devemos conduzir a nossa população a reflexões importantes que realmente demonstrem os valores neste momento. Não devemos procurar impor religiosidade nenhuma, mas, sim, cidadania. Antes de qualquer situação, somos cidadãos de um país que necessita...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Desculpe-me por interrompê-la.
Vou convidar a Senadora Regina para assumir a Presidência. Sou Relator de alguns projetos que estão lá. Fiz um voto em separado para tentar derrubar o processo, e a assessoria está apavorada. Preciso correr até lá para tentar segurar nas duas comissões. Eu vou tentar colocar meio Paim na Comissão de Assuntos Sociais e meio Paim na CCJ.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Mas você tem que segurar aqui.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI. Fora do microfone.) - Você deve ter relatório, mas é tudo terminativo, precisa de quórum.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - É isto que eu vou fazer lá: vou pedir verificação.
Só falta uma. Daí ela encerra e vai para lá para votar comigo.
Um abraço a todos. Até a próxima. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Vamos recompor o tempo dela. Parou o tempo, porque nós a atrapalhamos. É preciso recompor o tempo.
A SRª LOSANGELIS GREGÓRIO - Em absoluto.
Estamos todos em luta neste momento. Acho que é importante observarmos a realidade e a prioridade de todas as situações. Estamos aqui todos unidos pelo mesmo ideal de trabalhar para um País melhor, mas necessitamos conclamar os nossos fiéis - se assim podemos chamá-los - para essa questão da cidadania. É preciso aprender a pensar política, a entender o que se passa. O que se passa com o voto? Quem são essas pessoas que hoje nos representam? Como nós colocamos essas pessoas no poder? Não podemos simplesmente acenar com bandeiras de agressões verbais, físicas, institucionais. Precisamos começar a fazer um trabalho diferenciado.
Fomos chamados para falar sobre a defesa da educação, da saúde, da assistência social. Como nós vamos fazer isso na prática? Temos toda a nossa história de 500 anos de luta contra a corrupção. O nosso País foi criado, montado em cima dessa realidade. Mas, hoje, nós já temos condição de trabalhar numa outra vertente, com outro viés.
R
Somos da assistência social. Eu, pessoalmente, sou uma assistente social que trabalha na área de assistência social. Vemos, nesse organismo que se instaurou neste momento, realmente o desmonte das políticas públicas como um todo. Mas nós precisamos, então, começar a trabalhar, porque esse desmonte não foi feito de ontem para hoje, não começou em um governo A ou B. Esse é um desmonte permanente do nosso País. Se nós não observamos quais são realmente os valores que nós precisamos postular, vai ser complicado, porque, quando se atira pedra em um, entra um e sai outro, como ele acabou de dizer ao meu lado. Nós estamos numa saia justa completa dentro do poder instituído.
Como nós vamos trabalhar? Qual é a nossa posição de cristãos, de religiosos para promover efetivamente a cidadania? Nós não podemos simplesmente ir para o jogo do ataque frontal de palavras, muito menos da violência física. Como nós vamos instituir, nas nossas igrejas, como um todo, a cidadania? Como nós vamos ajudar o nosso povo a pensar, a raciocinar, fazendo aquele movimento de paz de que efetivamente nós estamos falando? Estamos falando a palavra paz o tempo todo, mas, interiormente, nas nossas instituições, muitas vezes nós pregamos a violência e a guerra. Isso se reflete automaticamente no social, com vandalismos e com várias outras situações. Ninguém queima, apedreja instituição nenhuma, religiosa ou não, se teve berço, se teve como entender que o humano está acima de qualquer coisa.
O companheiro também disse que o capital é um mal, mas o mal somos nós, que não sabemos nos portar diante dos inúmeros recursos que a vida nos coloca para podermos progredir moral e espiritualmente. Nós não somos daqui. Todos nós nascemos e, um dia, partiremos. E não é nosso nem sequer o corpo físico, porque ele fica. Então, o que devemos fazer durante esse, entretanto, entre a vida que começa e a morte? Devemos pensar e instruir, de uma forma geral, as pessoas, os nossos ouvintes sobre como precisamos proceder. O que é importante para nós? São as pessoas? São os valores humanos? O ético? Ou é o capital? Ou é a acumulação de bens? Ou é o dinheiro sendo jogado no rio? Qual é a relação? Quando vamos nos colocar na posição de humano para estabelecer regras ético-morais, de uma forma geral? Caso contrário, não há como defendermos coisa alguma. Se queremos educação, saúde, assistência social, nós precisamos, primeiramente, privilegiar o ser humano, porque, quando pensarmos no humano, efetivamente, nós teremos todas essas coisas, por consequência natural.
Então, tudo que nós estamos vendo aqui hoje é um desmonte da família, do ser humano, o que culmina nessa dor que nós vemos lá na ponta, nas nossas casas. Essas pessoas nunca tiveram isso e, num momento como este, de transição, vão ter menos ainda, cada vez menos.
R
Vivem uma miséria social e econômica de toda ordem. Não há como a sociedade civil fazer o papel do Estado. Hoje, já existem políticas públicas consolidadas, políticas públicas de assistência, de saúde, de educação e tantas outras.
Não podemos também jogar a questão social na mão da polícia, na mão da segurança pública. Se a educação não existir, se o preventivo não existir, não há como a polícia, lá na frente, dar conta. Não existe essa transferência.
Nós vemos hoje a situação do País sendo tratada novamente quase como uma ditadura, trazendo para a lida a polícia, a segurança pública, todo o capital armado para que haja uma venda maciça de bens e de coisas e para que as pessoas se sintam seguras e em paz quando, no entanto, nós vemos, a todo tempo, nos jornais televisivos, o aumento gradativo de todo tipo de violência: roubo a residências, de carros, enfim, na rua. Tudo que nós temos em dinheiro, em posse não vai nos salvar dessa violência, mas, sim, os valores ético-morais que nós podemos passar para os nossos irmãos em nossas casas, em nossas famílias, para falar de política com mais propriedade.
É preciso gerenciar um Estado adulto, que transcorreu uma longa caminhada evolutiva. Hoje, poderíamos estar num patamar muito melhor, muito maior, mas os nossos índices só caem: índice de educação, índice econômico. Nada se estabiliza neste País, porque não é estável a população, com uma massa crítica, que precisa saber pensar, sair da acomodação, transferir para o outro a responsabilidade de si mesmo. Nós precisamos trabalhar nesse sentido.
Que este momento de reflexão possa ajudar os nossos governantes, neste momento, a pensar com valores ético-morais. Todas as religiões devem se unir nesse patamar de pensamento. Vamos trabalhar para que o nosso País possa crescer, com educação, com assistência social, e para que as políticas públicas que já estão postas sejam efetivamente consolidadas, a fim de que possamos vencer as barreiras que estão à nossa frente.
Muito obrigada. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Losangelis, representante da Federação Espírita do Distrito Federal e Diretora de Assistência e Promoção Social Espírita.
Nós encerramos a Mesa. Eu tenho o hábito de conceder a palavra para duas ou três pessoas do plenário e vou ver se faço isso. (Pausa.)
Já há mãos levantadas.
Vou ver se consigo fazer isso. Como o Paim falou, eu sou titular na comissão também, e podem precisar do meu voto lá. Então, vou dar uma apressada aqui e fazer uma fala rápida - eu estava inscrita para falar depois da Mesa -, a partir de algumas que eu ouvi.
Primeiro, a Casa está fechada para o povo. É a Casa do Povo, mas está fechada para o povo. Nós tentamos negociar. No dia da votação da PEC, fomos até o Presidente para negociar a entrada por entidade, duas pessoas por entidade. Não ia nem encher a galeria. Aí ele diz: "Vou pensar".
R
Aí, quando começa a manifestação e a polícia vai para cima dos manifestantes e eles revidam, naturalmente, é da natureza humana, ele diz: "Não dá. Não vou deixar ninguém. Você veja o que está acontecendo lá fora." Então, existe sempre uma desculpa para não ocupar. Faz muito tempo. Aliás, eu estou aqui e ainda não vi aquela galeria cheia, a não ser quando a votação é de interesse de uma categoria, que vai lá, deixam entrar algumas pessoas, e os visitantes. De vez em quando vêm para visitar esta Casa. Entram lá e olham, e se envergonham porque olham para o plenário, embaixo, estão dois, três Senadores, e um falando. Então, é realmente lamentável essa questão. Sem falar na dificuldade para entrar: querem revistar tudo. Até uma blusa que a pessoa traz para vestir, de militância, eles querem tomar. Eu e Paim já discutimos muito isso: para acabarem com essa revista muito rigorosa lá na frente.
Nunca, em tão pouco tempo, a gente teve um pacote de maldades tão grande. A gente está falando aqui da PEC, mas já leram a reforma da previdência que chegou aqui ontem? Até eu fiquei espantada. Ouvia falar do que vinha, comentários, mas não tinha visto o texto. O texto chegou ontem. Gente, para se aposentar com 65 anos já é um disparate, porque em muitas regiões do Brasil essa é a média de vida. Mas é com 65 anos e 25 de contribuição, e não é o salário integral! Se você tiver 25 anos de contribuição, você vai sair com 76% do seu salário. Quer dizer, se você quiser sair com o salário integral, você ainda vai trabalhar mais e mais anos, até 90. Então, a reforma da Previdência é mais maléfica até do que a PEC! Atinge uma população imensa deste País que está chegando à idade da aposentadoria e vai chegar em condições mais deterioradas. O que é isso?
Quer dizer, a mobilização tem de ser de tudo. Aí vai a medida provisória do ensino médio. É dizendo para os meninos do ensino médio: "Olha, você não precisa fazer faculdade não. Deixa de besteira. Faculdade é besteira, você tem de aprender uma profissão e ser empresário na vida." É esse o recado que estão passando para os meninos pobres.
No dia em que tivemos o debate sobre essa medida, eu perguntei ao Relator, do Senado, que é dono de rede de escola particular: se é tão bom assim, as escolas particulares vão adotar esse modelo de ensino médio? A gente sabe que não vão. É para os meninos pobres, da escola pública.
A Escola sem Partido. É um horror aquilo! E aquilo tem chance de passar porque esse Governo criou uma maioria cega, surda, muda aqui. Não dialoga, não debate. Para a PEC, nós aprovamos muitos debates. A gente usa esse espaço que se tem nas comissões e aprova debates. Rejeita lá, mas aprova aqui. A gente sempre colocava convite, não era convocação, convite aos membros do Governo para virem aqui explicar. Não aparece ninguém. No debate da Escola sem Partido foi um terror. Eles não vieram e, na hora, invadiram. Chegou um grupo, que entrou com a maior facilidade, e invadiu o plenário onde a gente estava fazendo o debate da Escola sem Partido. E depois foi para a Câmara, invadiu, quebrou. E isso não é vandalismo. A gente sabe quem são as pessoas lá.
E o Paim falou: é a terceirização, é jornada intermitente. A jornada de trabalho vai ser por hora. Então, é um monte de coisas que estão aí para ser votadas e, quando eles querem e a gente menos espera, é em regime de urgência. E aprovam. É que eu gosto de brincar: nós somos esmagadora minoria. Temos o direito ao jus esperniandi só. Eles aprovam o que querem e com tudo.
R
Aí a gente ainda vê na sociedade a questão da intolerância. Não é só intolerância com as religiões, é a intolerância mesmo das pessoas. As pessoas não têm mais paciência de ouvir. É contra a sua opinião, então já é o seu inimigo. O ódio está tomando conta deste País. É uma coisa séria! As pessoas estão odiando outras por conta das opiniões. O que é isso?
Aí, para finalizar, quero dizer. O Ministro disse que o SUS não cabe no Orçamento. O que é que cabe no Orçamento, então? Todas essas medidas são para caber no Orçamento. Vai caber quem? Os financistas, a banca, como diz o Requião. Mulher vai caber no Orçamento? Negro vai caber no Orçamento? LGBT cabe no Orçamento? Se o SUS não cabe no Orçamento, imaginem esses segmentos já tão discriminados? Então, é muito sério o que está acontecendo. Se a gente não se unir, a gente vai ser derrotado fragorosamente porque...
Tudo bem, por exemplo, a minha igreja, a Católica. A CNBB lançou uma nota, muito boa, contra a PEC, mas o que foi feito com aquela nota? Será que ela foi lida no sermão das missas? Eu pedi a alguns padres amigos meus: "Ô fulano, leia essa nota aí." Porque é a minha igreja. Se a minha igreja é contra a PEC, ela tem de ajudar a fazer a minha cabeça para eu também ser contra a PEC. Acho que é uma tarefa das igrejas. Você comanda. Há um poder de mobilização muito grande na Igreja Católica, que é a que eu frequento. Nós temos uma missa, às terças-feiras, lá em Teresina, em que não vão menos de 10 mil pessoas. É a novena de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, o dia todinho, de hora em hora. Então, pensem no que é você falar para aquela gente. Agora, às terças-feiras estou aqui, mas, quando eu frequentava lá, de vez em quando, eu pedia ao padre para falar alguma coisa e ele deixava, ler alguma coisa. Mas precisa haver gente para fazer isso. Não adianta só tirar uma nota, como desencargo de consciência. "Está aqui a minha nota."
A OAB tirou uma nota, mas fez o que com a nota dela? Se não houver um debate na sociedade... Este é o grande problema, nós estamos perdendo o debate na sociedade. Aí a gente vê o pessoal pedindo a volta da ditadura militar. A esse pessoal não está sendo ensinado o que foi a ditadura militar. Aí vem a conversa de tirar a História do currículo, de tirar Filosofia. Quer dizer, nós estamos indo por um caminho muito ruim. Não sei o que vai ser deste País daqui a cinco anos, se a gente sobreviver.
Então, junta tudo num pacote e vamos para a rua discutir. Fui discutir com os meninos da universidade, que a estão ocupando. Não adianta só ocupar. Eu acho que é a juventude que está fazendo alguma coisa. Até espero que de lá vá sair alguma coisa boa, que vá nascer alguma coisa boa dessa juventude de movimento. Eles estão bem independentes, não querem ser dirigidos, tutelados. Acho isso importantíssimo, mas também é preciso dar alguns recados, através de alguns deles. Um deles me chamou lá. Fui conversar com eles, num dia de sábado. "Gente, não basta dialogar só vocês aqui. Vocês estão aqui fazendo um debate comigo, mas não estão dialogando com aqueles meninos que estão passando lá fora." Toda hora passava gente lá fora para assistir aula, para ir jogar. Tem de dialogar com essa gente, senão a luta vai ser em vão. Dialogar só com a gente, ouvir só a nossa voz não vai resolver. Tem de ouvir a voz do outro, nem que ele venha para me xingar.
Em todo debate que vou eu digo: "Eu aceito o debate." Então, se alguém aqui tem opinião contra pode vir para a mesa que terá o mesmo tempo. Vamos debater para ver quem é que convence. Então, se a gente fica falando de um lado, e eles do outro, nunca vai haver convencimento. Eles já estão convencidos lá e a gente, aqui.
R
Então, por isso conclamo essas igrejas para se juntarem e para falarem para o povo, senão a gente vai ficar falando... É boa uma audiência pública? É, porque tem gente assistindo, porque vai ser repetida, mas não basta.
Obrigada. (Palmas.)
Eu disse que ia abrir para duas pessoas. Dois levantaram a mão aqui já.
Quero registrar a presença de Elianildo Nascimento, do Comitê Nacional de Diversidade Religiosa e representante da Uri Brasília - Iniciativa das Religiões Unidas. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Bem-vindo!
Então, como os dois da frente levantaram as mãos, vão ser eles dois. São três minutos.
A SRª PASTORA VALDICÉIA DE MORAES TEIXEIRA DA SILVA - Eu me autodeclaro mulher, negra, quilombola, favelada, professora, protestante e pastora.
Essa PEC 55 me preocupa, principalmente, no que diz respeito à educação. Todos esses pontos que foram colocados muito bem pelas nossas palestrantes e pelos nossos palestrantes nos preocupam como um todo. Mas a educação me preocupa particularmente porque se eu, hoje, posso me autodeclarar professora, protestante e pastora, é em função da educação. Foi a educação que mudou a minha história de vida. Hoje, quando eu volto à favela da Vila Kennedy, no Rio de Janeiro, onde fui criada dos 5 anos de idade até os 21 anos de idade, quando vim para Brasília, o que ouço das minhas amigas e amigos que estudaram comigo em todas as escolas da favela Vila Kennedy é: foi morto pela polícia na frente de casa; está em Bangu I; está fugindo pelo País, ninguém sabe por onde anda, fugindo da polícia; um traficante matou. São essas as histórias que ouço dos meus colegas de escolas públicas da Vila Kennedy, no Rio de Janeiro, da favela da Vila Kennedy. Se eu consegui burlar esse ciclo foi em função da educação.
Hoje, no Brasil, nós somos 53% de negras e negros. Se nós não tivermos a escola para oferecer, para que elas e eles possam mudar a história de vida deles, a nossa situação vai estar muito pior do que a situação que nós estamos enfrentando hoje. Então, utilizando algumas palavras da Losangelis, quando ela disse que, primeiro, nós, sacerdotisas e sacerdotes, nas organizações religiosas, precisamos sensibilizar, conscientizar e formar as nossas fiéis e nossos fiéis para que saibam pensar, para que tenham uma consciência crítica, para que saibam o que é ser cidadã, o que é ser cidadão, e para que se posicionem e se posicionem dessa forma na sociedade, para que nós tenhamos a implementação dos direitos sociais que já temos garantido na nossa Constituição.
R
Além dos direitos sociais, das políticas públicas que garantem esses direitos sociais que estão aí postos em todos os setores da sociedade.
Muito obrigada. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Por favor, a senhora pode se identificar para poder constar aqui.
A SRª PASTORA VALDICÉIA DE MORAES TEIXEIRA DA SILVA - Professora e Pastora Valdicéia de Moraes Teixeira da Silva. Sou mais conhecida como Pastora Val, tanto faz.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Companheiro, se identifica também, por favor.
O SR. ELIANILDO NASCIMENTO - Elianildo Nascimento. Estou com quatro bonés: membro do Comitê Nacional de Respeito à Diversidade Religiosa, o SDH Nacional; pela Coordenação da Uri Brasília, que é um organismo global com mais de 800 grupos em todo o mundo, inter-religioso, também pela Nova Consciência e como membro da Subsecretaria de Direitos Humanos aqui do GDF.
Na verdade, essa atividade hoje aqui, organizada não só pelo Conselho Nacional de Igrejas Cristãs, em conjunto com CNBB, Clai, entre tantos outros organismos, navega nessa necessidade de mostrar uma narrativa concreta do que está acontecendo: essa destruição total do Estado brasileiro não só com a PEC 55, que é extremamente imoral, não só com esse projeto, nem só com a questão da previdência, mas nós acompanhamos, por exemplo, um conjunto de projetos que estão tramitando e que, aí sim, nós identificamos quem são aqueles que propõem e defendem esses projetos. Nesse contexto, você não tem como discutir e ter um posicionamento político.
Você tem quase 50 projetos que mexem nos direitos trabalhistas, acabam com a CLT, voltando quase à situação do século XIX, inclusive com a questão de não regulamentação, por exemplo, da questão de horas de trabalho. Você tem, nesses projetos que atuam também nas questões dos trabalhadores, os servidores públicos, que acabam com a estabilidade, entre tantos outros projetos. Você tem os projetos, por exemplo, do Código de Mineração, que prevê a mineração em APPs, você tem a entrega da Petrobras e do pré-sal, que já está acontecendo, a serviço das petrolíferas internacionais. Então, você tem a implementação do mais perverso e nefasto neoliberalismo, pior ainda do que acontecia na década de 90, instituído agora. (Palmas.)
O SR. ELIANILDO NASCIMENTO - Aí nós temos: qual o papel das religiões? Nós temos, sim, o papel infelizmente extremamente nefasto também de segmentos religiosos que se dizem cristãos, que têm suas representações aqui no Congresso Nacional, dentro de uma bancada que se diz evangélica e que rasga os Evangelhos todos os dias, que são representantes, sim, de interesses pessoais, econômicos e de poder e que têm uma pauta que conjuga, além da questão do neoliberalismo, o desrespeito total a toda e qualquer fé, das mais de 150 religiões que existem aqui, comprovadas pelo IBGE, no Brasil.
Então, nós temos a PEC 99, que acaba com a laicidade, temos esse famigerado e execrado Escola sem Partido, uma porcaria - desculpe-me o termo -, nós temos os valores familiares, nós temos a cristofobia, o crime hediondo para cristofobia e outros tantos projetos que são extremamente atentatórios. O Estatuto da Família é horrível. Cria um comitê e um conselho da família, que vai intervir na escola, sem falar nos outros tantos projetos que acabam com a LDB, que é a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, os parâmetros curriculares e a Base Nacional Comum Curricular, entre outros tantos.
R
Então, temos um período nefasto. Temos, sim, que trazer essa narrativa, demonstrar essa narrativa e, claro, esse processo de construção, como bem se falou aqui, esse processo de difusão nas igrejas, nos espaços todos, é um processo de reconstrução. Não sei se conseguiremos sobreviver ao que está sendo posto agora.
Agradeço imensamente, Senadora Regina, a quem tanto admiro.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada. Para finalizar, temos o retorno para a Mesa, três minutos para considerações finais, para os que quiserem.
O SR. WILSON BARBOZA DA SILVA (Fora do microfone.) - Por gentileza, por uma questão de isonomia, quem participou do primeiro painel não teve direito a esses três minutos?
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Todo mundo tem. A primeira Mesa também vai ter. Pode falar daí, porque tem microfone. Então, todas as Mesas podem participar. É sempre no final isso. Nós fazemos duas Mesas, porque são muitas pessoas, e depois, no final, temos os três minutos.
Vamos começar pela Mesa que está aqui, porque se a outra Mesa quiser vir para cá...
Então, Mãe Baiana.
A SRª MÃE BAIANA ADNA SANTOS DE ARAÚJO - Eu quero agradecer esse tempo que passamos aqui e que pudemos falar, ouvir, e quero dizer para a nossa Presidente, neste momento, da Mesa que nós estamos à disposição.
Quero reforçar o pedido que aqui fiz sobre uma campanha forte contra a intolerância religiosa no Brasil. Acho que quando parte desta Casa também ajuda a pelo menos tentar acabar com a intolerância religiosa que o povo brasileiro vem sofrendo, que é em todos os segmentos. Acabei de mostrar sobre o padre, e também pedi e reforço, que os representantes da CNBB também tomem providências, porque é perseguição e intolerância, sim, que o padre está passando.
Também sobre o abate gostaria de uma pauta. Torno a reforçar nesta Casa, porque é uma questão de emergência, uma pauta que já está sendo julgada no STF e nós precisamos mesmo.
Mais uma vez, quero agradecer e dizer que estamos à disposição, as comunidades tradicionais de matriz africana, na hora que for preciso, Srª Senadora, para ajudar no que for necessário e melhor para o povo das religiões de matriz africana.
Muito obrigada. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Monge Sato.
O SR. MONGE SATO - Queria também agradecer, lembrando a nossa obrigação como religiosos, sacerdotes, sacerdotisas e o poder político.
Está aqui a Senadora Regina Sousa, substituindo o Senador Paulo Paim, que naturalmente está lutando para implementar políticas sociais para valer.
Quando se fala em política social, eu penso sobre o que chamamos de liberalismo. Liberalismo, gente, não é defender apenas o capital, não é isso.
R
O liberalismo surge para defender direitos humanos, direitos sociais, contra a dominação autoritária que existia na época, até disfarçada de preceitos religiosos. O liberalismo surge para isso, para defender direitos humanos, direitos sociais, a liberdade de crença inclusive; não para defender o capital.
Talvez, naquela época a gente achasse que capital não fizesse tanto mal. Era o capital, digamos, primitivo, comercial, etc. Hoje, não, o capital faz mal, tanto é que se muda a Constituição. Muda-se a Constituição, gente! O que é isto?! Não é? Eu nem sei.
Eu disse que sou economista; sou, mas sou também da área de Direito. Eu nem sei como anda Direito Internacional. Disseram-me que não valem mais as doutrinas; o que vale é a jurisprudência, ou seja, o que foi decidido antes.
(Soa a campainha.)
O SR. MONGE SATO - Não pode ser, gente. Aí a nossa responsabilidade, porque eu entendo a religião como constituinte da ética social. Independentemente das suas crenças, eu estou aqui, no meio de uma mãe de santo, de uma católica, que também é Presidente desta Mesa, de um bispo anglicano, de um representante da Federação Espírita. Este sim, é um encontro ecumênico. Este sim, junto com a Senadora, que é profissionalmente nossa representante política no Senado, estamos construindo a ética social. Somos, sim, constituintes da ética social, uma ética social em que entra a não violência, entra a liberdade e entra a justiça.
Então, queria cumprimentar todos nós, todos os meus irmãos religiosos, sacerdotes e sacerdotisas, mas também as pessoas que, de alguma forma, nos mantêm o respeito por este Poder, que é o Poder Legislativo. Que nós possamos manter esse respeito aos três Poderes. Os três Poderes também têm que demonstrar que cada Poder tem a sua ética. Não pode ser a ética do capital, do lucro, da ganância, da acumulação desnecessária.
Obrigado. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Monge Sato.
Agora, Dom Mauricio Andrade.
O SR. DOM MAURICIO ANDRADE - Agradeço a oportunidade mais uma vez, Senadora Regina Sousa.
Eu penso que nós estamos vivendo momentos de resgatar aquilo que defendemos em anos passados, nas décadas de 60, 70 e 80, que é voltar a enfatizar que precisamos manter nossas utopias. E, como dizia Dom Helder, utopia é a mola do mundo. Se perdemos o sentido das utopias, perdemos esse caminhar de transformar, de caminhar para lutar.
E outro detalhe, aproveitando a fala do Monge Sato, a PEC 55 não trata de limite de pagamento de juro de dívida pública. (Palmas.)
R
Ela não fala disso. No momento em que ela não toca nesse assunto, ela está dizendo e está referendando que quem vai sair ganhando novamente são os banqueiros. Quem está lascado, com todo o respeito, são os trabalhadores, e aí, de carreira, vem a reforma da previdência como a salvação da Pátria.
Então, nós precisamos manter, renovar essas utopias. E aí eu digo, repito as palavras da nossa poetisa deste Cerrado, Cora Coralina: desistir jamais, vamos adiante, renovando a esperança, vivendo a luz nesse tempo de advento. Vamos adiante. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Dom Mauricio.
Agora Losangelis, para as suas considerações finais.
A SRª LOSANGELIS GREGÓRIO - Obrigada, também, mais uma vez, pela oportunidade. Que nós possamos estar imbuídos desse pensamento e desse sentimento da utopia, mas procuremos novamente, eu reforço... Nós sozinhos aqui, entre meia dúzia de pessoas, não vamos conseguir fazer grandes mudanças. Nós temos, atrás de nós, cada um nas nossas igrejas, nos nossos postos de trabalho, sejam sociais, sejam cristãos, um contingente que precisa ser orientado, esclarecido, e nós temos esse poder.
Temos que ter esse olhar para orientar o nosso povo, sair da acomodação, para que, nos próximos pleitos, nós consigamos trazer para dentro desta Casa, para dentro deste Senado, desta Câmara, deste Governo, pessoas mais preparadas eticamente para trabalhar o social. Se continuarmos a deixar as pessoas dormindo, dormindo ficarão, na miséria.
Então, cabe a nós, que estamos aqui, conscientes do que está acontecendo, levar isso para o nosso público, com diz a Pastora Val e tantos outros aqui. Nós temos essa obrigação moral de orientar, de ajudar o povo a pensar o que é a política, como precisamos proceder daqui para a frente, fazendo, nas nossas bases, as discussões necessárias para a transformação efetiva, mas tomar cuidado para que nós também não levemos para esse nosso público um outro tipo de violência, um outro tipo de segregação.
Acima de tudo, o humano, lembrando da figura meiga e serena do mestre Jesus para aqueles que são cristãos, que nasceu, viveu e morreu, ensinando-nos...
(Soa a campainha.)
A SRª LOSANGELIS GREGÓRIO - ... quais eram realmente os valores que precisamos ter conosco, o que é realmente importante e como é que nós devemos agir no mundo, para o mundo, para que ele realmente seja melhor.
Muito obrigada. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Para ficar registrado, eu peço que a Mesa se desfaça, sente ali, para ouvirmos a primeira Mesa.
Obrigada pela presença, agradeço a presença de vocês todos e todas.
Acho que o Ronald teve que sair, do Conselho Nacional de Saúde. Chamo Wilson Barboza, o pastor da Assembleia de Deus; chamo Tatiane Duarte, representante da Rede Ecumênica da Juventude, e chamo Geniberto Paiva Campos, da CNBB.
R
Vamos, então, começar de lá para cá também. Não sei como foi a ordem na primeira Mesa.
Então, o Geniberto Paiva Campos, representante da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil, à qual eu fiz uma provocação aí.
O SR. GENIBERTO PAIVA CAMPOS - Eu queria somente agradecer e colocar uma mensagem de esperança. Eu diria que os democratas brasileiros estão desafiados profundamente, mas eu tenho uma crença, uma esperança muito grande de que a gente vai saber trabalhar esse desafio.
E eu diria que só há uma coisa que temos que perceber: que estamos condenados a ser inteligentes. Eu nunca vi um governo mais medíocre, e sabemos que a ditadura dos medíocres é perigosíssima. Então, nós estamos condenados, nós estamos obrigados a ser inteligentes, a procurar exatamente perceber o que está acontecendo, porque essa desagregação que está ocorrendo é um negócio que preocupa muito, essa desagregação desse grupo que se assenhoreou do poder de uma maneira ilegítima.
E a coisa que mais me espanta é saber que nesse domingo agora, passado, cerca de talvez 100 mil brasileiros em todo o Brasil foram às ruas só para mostrar suas camisas amarelas, para vociferar palavras de ordem completamente absurdas, porque eu pergunto: você faz política de uma maneira temática, e eu nunca vi as pessoas saírem às ruas só para destilar o seu ódio, mas nada que possa construir, que possa trazer alguma coisa para o País.
Então, a nossa responsabilidade é redobrada. Este aqui é um espaço democrático que eu acho que temos que preservar. Saúdo a Senadora Regina, o Senador Paim, pessoas em que acreditamos.
E eu termino dizendo uma expressão mineira. Eu não sou mineiro, eu saudei o pastor como pernambucano, porque meu pai era pernambucano...
(Soa a campainha.)
O SR. GENIBERTO PAIVA CAMPOS - ... e digo o seguinte: nenhum de nós vai "pular o corguinho". "Pular o corguinho", na expressão mineira, é quando você muda de lago. E há uma Senadora de São Paulo, eleita pelo PT, que fez isso, para minha profunda tristeza, porque eu também era um admirador daquela Senadora. Como aqui, em Brasília, temos também algumas situações com que ficamos surpresos.
E quero também dizer o seguinte: temos que estar unidos e construir esse espaço democrático para que possamos voltar ao tempo da democracia, como diz a canção.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Pastor Wilson Barboza Da Silva.
O SR. WILSON BARBOZA DA SILVA - Eu gostaria de, primeiramente, saudar a Senadora Regina Sousa, porque da outra vez não tive essa oportunidade, e muito me honra estar aqui, à sua esquerda, junto com os meus pares. E também saúdo o outro painel, também de nobres e excelentes debatedores.
R
Eu gostaria de fazer, como parte do povo, como elemento do povo, e o povo, numa democracia, é autoridade, uma advertência ao Estado brasileiro. Eu não vou comentar não; vou advertir o Estado brasileiro: o povo percebeu, estando o povo perdido, que o Estado está mais perdido que ele. (Risos.)
Então, nós já percebemos isso, e é bom que vocês saibam disso também. Eu estou falando para os três Poderes da República.
E gostaria de fazer uma advertência, agora como formador de opinião, para as pessoas que se dignam a me ouvir que nós não podemos, tendo delegado ao Leviatã parte na nossa liberdade para que o Estado exerça a tutela de certas coisas que como os cidadãos primitivos teríamos e não temos mais porque o Estado é o nosso tutor, nesse sentido nós não podemos simplesmente acreditar que instituições que estão perdidas e confusas hoje sejam detentoras de verdades inquestionáveis. Então, o povo precisa falar.
Eu não posso acreditar que só porque alguém detém o poder, seja ele político, econômico ou religioso, não pode ser contestado por nós, porque é isso que legitima, por...
(Soa a campainha.)
O SR. WILSON BARBOZA DA SILVA - ... exemplo, o assalto, o estupro, qualquer violência. Se a pessoa tem a força e está certa porque tem a força, e eu me calo diante disso, não questiono, essa barbárie fica até institucionalizada.
Eu preciso ter um olhar atento. O povo precisa ser vigilante sobre tudo aquilo que dizem que é do povo. Eu não posso entender que, na minha casa, o mordomo tem que ser mais atento do que o dono.
Então, alguém nos tutela? Amém, maravilha, beleza. Mas é preciso dizer ao povo que ele precisa estar atento sobre aquilo que pertence ao povo, ainda que organizado por instituições como nós conhecemos aqui.
Era essa a minha mensagem, era essa a minha advertência. O nome é advertência mesmo. E seria bom estarmos acordados.
Muito obrigado.
Deus abençoe vocês. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Tatiane, representante da Rede Ecumênica da Juventude.
A SRª TATIANE DUARTE - Eu quero agradecer a oportunidade, e, mais uma vez, reforçar o caráter ecumênico da Reju. Nós somos jovens - bom, algumas são menos jovens, como eu - que expressam diferentes formas do sagrado, pessoas que também não têm crença nenhuma, mas que, juntas, têm a certeza de que não é possível ser coniventes nem omissos com as injustiças que acometem a nossa sociedade.
E é por isso que continuamos nos indignando e fazendo o nosso repúdio a todo esse processo que nós temos vivido neste ano de 2016, e nos colocando inteiramente a favor das ocupações nas escolas e nas universidades, como manifestações democráticas e legítimas dos estudantes brasileiros e brasileiras, que estão, de forma muito livre, externando a sua indignação contra as medidas deste desgoverno, como eu gosto de chamar.
R
Quero, mais uma vez, agradecer e dizer que a Reju está aberta ao diálogo com pessoas que gostam de dançar a mesma música que a gente, que é pela igualdade, pela justiça e pelos direitos, e também pelas pessoas que, infelizmente, têm dançado outras músicas, as músicas das intolerâncias religiosas, da não escuta a nós, mulheres, de pessoas que se recusam a dialogar com o diferente, com a pluralidade de ideias, de pensamentos. A gente também quer dançar com essas pessoas, a gente quer mostrar que liberdade de expressão é importante, mas liberdade de expressão não dá direito a dizer que o outro não merece viver como ele bem entender.
A nossa Constituição - ainda temos uma Constituição, acredito eu - garante que eu tenho direito a ter Deus, deusas, ter deus nenhum, a amar quem eu quiser, a ter relação com quem eu desejar, que...
(Soa a campainha.)
A SRª TATIANE DUARTE - ... eu tenho direito a uma educação, sobretudo laica de direitos humanos, onde a gente possa pensar de forma contraditória, contrassensual e sem toda essa onda de intolerância e ódio que tem assolado as redes sociais, esse Parlamento, as ruas, a sociedade.
Então, a Reju não vai se calar nem se omitir diante dessa conjuntura. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Tatiane.
A Senadora Fátima acabou de chegar.
A gente já ia entrar no "nada mais havendo a tratar", mas, Senadora Fátima Bezerra, a gente sabe que hoje aqui é correria, cada um numa comissão. Aposto que V. Exª estava na Comissão de Educação, e eu não tive a chance de comparecer lá.
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Exatamente, Senadora Regina, estive na Comissão da Educação, também na Comissão de Assuntos Econômicos.
Mas eu quero aqui, muito rapidamente, cumprimentá-la e saudar aqui os nossos convidados, permitam-me, começando pelo Dr. Geniberto. É uma alegria revê-lo mais uma vez. O Dr. Geniberto é alguém, Senadora Regina, por quem o Rio Grande do Norte, o Estado que honrosamente represento aqui hoje no Senado, tem muito carinho, pela história, pela trajetória de vida, pela trajetória de militância que ele tem, sempre pautada pelo compromisso em defesa da ética, em defesa da justiça. O Dr. Geniberto está aqui representando, creio eu, a CNBB.
Igualmente, quero saudar aqui o Pastor Wilson, da Assembleia de Deus Liberdade e Vida, Conselheiro do Conselho de Defesa dos Direitos dos Negros do Distrito Federal, e Tatiane, aqui representando a Rede Ecumênica da Juventude, e saudar os demais presentes.
Mas, de forma muito breve, quero dizer o quanto é oportuno este debate, as religiões frente às injustiças, etc., pelo momento que nós estamos vivenciando. De fato, há seis meses, quando o Brasil e o mundo assistiram ao golpe parlamentar que foi perpetrado contra nossa democracia - golpe sim, porque cassa-se um mandato presidencial sem a existência de crime de responsabilidade -, a partir daquilo ali, infelizmente, o que nós estamos assistindo no Brasil é uma escalada, Dr. Geniberto, autoritária.
R
Aliás, já dizem os especialistas que, quando a democracia é violada, reina o caos, quando a soberania popular também é suprimida, começa a reinar o autoritarismo. É isso que está acontecendo no nosso País, porque não existe outra coisa para explicar a agenda de retrocessos que está em tramitação no Congresso Nacional neste exato momento. Um Governo que, infelizmente, padece de total legitimidade, porque chega ao Palácio por esse atalho, e envia ao Congresso Nacional, repito, agenda de retrocessos e mais retrocessos.
A PEC 55 é algo assim inimaginável, porque nós não esperávamos, de maneira nenhuma, que, em plena democracia, nós fôssemos assistir a uma proposta de tirar os pobres do Orçamento, como bem disse a CNBB, na nota que divulgou. Vai tirar os pobres do Orçamento sim. Por quê? Porque ela, ao congelar os gastos sociais pelos próximos 20 anos, está tirando a saúde do Orçamento, ela está tirando a educação do Orçamento, ela está tirando a assistência social do Orçamento. Por uma razão simples: congelam-se os gastos pelos próximos 20 anos na medida em que, daqui pra frente, o Orçamento sempre terá que ter sido o Orçamento do ano anterior, condicionado ao limite do patamar da inflação do ano anterior.
Ora, uma regra dessa é incompatível para dar conta das demandas de um país da dimensão do Brasil, para dar conta, inclusive, das demandas naturais, decorrentes, inclusive, do próprio crescimento da população.
Dr. Geniberto, eu quero dizer que o senhor não sabe a dor que me acomete sempre que eu constato que a PEC 55 simplesmente revogou uma das conquistas mais importantes da democracia, que foi a vinculação constitucional para a saúde e para a educação. Isso nos custou muita luta, as gerações anteriores à nossa batalharam muito. E essas vinculações são mais do que necessárias pelo quanto o País tinha e ainda tem de desigualdade social. Então, as vinculações constitucionais, na verdade, são ações protetivas, são ações afirmativas.
Por exemplo, a vinculação constitucional para a área da educação, para nós, foi algo muito valioso pelo quanto aquilo nos possibilitou de previsibilidade de recursos para essa área, de continuidade para recursos para essa área. E simplesmente ver, de uma hora para outra, o Governo ilegítimo que está aí, com a base golpista de sustentação que ele tem aqui no Congresso, tirar isso do Orçamento, com todas as consequências que isso advirá para uma das agendas mais importantes para um projeto de desenvolvimento de nação, que é educação. Nós vamos jogar o Plano Nacional da Educação na lata do lixo da história.
Mas eu quero concluir dizendo que, como se não bastasse a tragédia da PEC 55, chega mais um cálice amargo, que é a reforma da previdência. A reforma da previdência é de uma crueldade sem tamanho, na medida em que, por exemplo, admitir que, a partir de agora, para você ter direito à aposentadoria, você tem que ter, no mínimo, 65 anos e ter contribuído durante 49 anos - em um país, repito, marcado ainda por grandes contrastes, grandes desigualdades do ponto de vista social. A média de vida na minha região e na região da Senadora Regina, Região Nordeste, não chega a 65.
R
(Intervenção fora do microfone.)
Exatamente, entendeu? Não chega a isso.
Estão chamando, inclusive, essa reforma da previdência de reforma caixão, é a emenda caixão, porque muitas pessoas não vão conseguir se aposentar. Mas, muito brevemente... Não é só elevar a idade mínima de aposentadoria para 65 anos, com 49 de contribuição, que é o que a reforma exige. Na verdade, ela mexe frontalmente, ela ataca frontalmente o direito dos trabalhadores e trabalhadoras, seja na área rural ou na área urbana, na medida, inclusive, repito, em que ela desconhece as desigualdades sociais, desconhece as questões de gênero, de profissões, etc. e tal.
Os regimes diferenciados, ela acaba com tudo. Só preservou os militares. Mulheres, para esse Governo que está aí, não é necessário, de maneira nenhuma, olhar a especificidade que pauta a história de nós, mulheres, pela dupla, pela tripla jornada de trabalho. É por isso que é mais do que sensato que nós, mulheres - como é a Constituição hoje - tivéssemos direito a nos aposentar cinco anos antes dos homens.
Mas quer outra crueldade maior do que o que faz com o benefício de prestação continuada, que é dirigido a quem? À população de vulnerabilidade social. É dirigido aos idosos de baixa renda, não é, Dr. Geniberto? É dirigido às pessoas com deficiência. Ou seja, isso é uma cidadania muito importante. Sabe o que o Governo ilegítimo está fazendo? Primeiro: com o benefício de prestação continuada ele foi mais perverso ainda, porque, para o benefício de prestação continuada, a idade mínima para ter direito não é 65 anos, é 70 anos. E mais maldade ainda: ele desvincula o benefício de prestação continuada do reajuste do salário mínimo.
Eu quero encerrar, por fim, falando dos professores, outra grande perversidade, que revela o desprezo que o Governo ilegítimo tem pela educação do povo brasileiro. Isso se explica, inclusive, por meio da reforma autoritária do ensino médio, enfiada goela abaixo, sem debate com os professores, com os estudantes.
Mas, por exemplo, agora, na questão da reforma da previdência, mais uma vez, o desprezo do Governo ilegítimo com a educação se traduz quando ele acaba com a aposentadoria especial do magistério. E eu não estou falando aqui não é nem do magistério de nível superior, eu estou falando aqui é do magistério da educação básica, da creche até o ensino médio. Eu estou falando de um professor - que é a minha categoria, que eu conheço muito bem - que pega salas de aula superlotadas; que fica em pé durante horas; aquele professor que pega jornadas exaustivas de trabalho; aquele professor que é submetido a um estresse violento. Talvez a profissão, Senadora Regina, que é submetida ao maior estresse do mundo seja a profissão do professor. Inclusive, pelo esforço intelectual que é exigido, pelo esforço emocional.
R
Por isso, nada mais justo do que, até hoje, nós termos conseguido essa proteção na nossa Constituição, que é a aposentadoria, um regime diferenciado de aposentadoria para os professores e professoras do Brasil.
Pois bem, pois o Governo ilegítimo que está aí, por meio da reforma da previdência, em uma canetada, acaba com a aposentadoria especial do magistério - para quem ingressar, evidentemente no magistério, a partir dessa reforma da previdência. Os que estão também serão penalizados, porque ele estabelece uma regra de transição.
Então, eu quero, mais uma vez, saudar aqui as religiões, que, mais do que nunca, eu diria que, em comunhão, se somam a esse mutirão cívico, político, necessário em nosso País, em defesa da democracia, para lutar contra a agenda de retirada de direitos que está colocada.
Permita-me saudar a todos e a todas vocês, a todas as religiões aqui presentes, mais uma vez dizendo do seu papel importante, parabenizando, mais uma vez, a nota que a CNBB divulgou contra a PEC 55, quando ela dizia exatamente o seguinte, que a CNBB é contra a PEC 55 pelo caráter injusto e seletivo que ela tem, na medida em que ela escolheu "para pagar a conta do descontrole dos gastos, os trabalhadores e os pobres".
Mas estamos aqui resistindo e vamos resistir até o fim, para barrar essa agenda de retirada de direitos e, se Deus quiser, Dr. Geniberto, a gente devolver o voto ao povo brasileiro, por meio de eleições diretas já. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Senadora Fátima.
E, agora sim, embalada pelo aumento do diesel - de 8,1% -, da gasolina - de 9,5% -, do gás de cozinha - de 12,5% -, declaro encerrada esta reunião. (Palmas.)
(Iniciada às 9 horas e 01 minuto, a reunião é encerrada às 11 horas e 59 minutos.)