30/11/2016 - 2ª - Comissão Mista da Medida Provisória nº 748, de 2016

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Julio Lopes. PP - RJ) - Boa tarde a todos.
Havendo número regimental, declaro aberta a 2ª Reunião da Comissão Mista destinada a examinar parecer sobre a Medida Provisória nº 748, de 2016.
A presente reunião destina-se à realização de audiência pública para debater a matéria.
Convido para assento à Mesa o Sr. Ivo Carlos Palmeira, Coordenador Jurídico da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos, para se pronunciar por dez minutos.
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Esta audiência pública será realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. As pessoas que tenham interesse em participar podem enviar comentários pelo senado.leg.br/ecidadania ou pelo 0800-612211.
De acordo com o art. 94, §§ 2º e 3º do Regimento Interno do Senado Federal, combinado com o art. 256 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, a Presidência adotará as seguintes normas: o convidado fará sua exposição por 15 minutos. Em seguida, abriremos a fase de interpelação pelos Srs. Parlamentares inscritos. A palavra aos Srs. Parlamentares será concedida na ordem de inscrição.
Concedo a palavra, então, ao Sr. Ivo Carlos Palmeira, pelo tempo de 10 minutos.
O SR. IVO CARLOS PALMEIRA - Boa tarde a todos. Boa tarde, Sr. Presidente.
Em nome da NTU quero agradecer o convite para estarmos aqui hoje à tarde para prestar alguns esclarecimentos e informações com relação a esta Medida Provisória nº 748, editada pelo Governo Federal.
A Medida Provisória nº 748 veio em boa hora, em que o País está enfrentando algumas mudanças, inclusive no cenário econômico, como estamos vendo em algumas cidades brasileiras.
Por ocasião da promulgação da Lei nº 12.587, em 2012, o Congresso Nacional aprovou uma redação em que lamentavelmente ocorreram vetos. E um dos vetos que ocorreu foi com relação à gratuidade. Havia dispositivos que estabeleciam que gratuidades a serem concedidas a beneficiários do transporte público de passageiros só poderiam ocorrer caso fossem indicadas fontes de custeio para elas. E era vedado que essa gratuidade fosse imposta aos usuários de serviço de transporte coletivo.
Na ocasião, as razões desse veto decorreram da possibilidade de se fazer uma revogação geral de todas as gratuidades - de idosos, de deficientes e de estudantes - que estivessem vigentes. Foi uma interpretação equivocada, porque nós sabemos que, quando se altera uma lei, a lei vai viger a partir daquele momento. Quer dizer, o direito adquirido pelos idosos, deficientes e estudantes estariam preservados. Mesmo assim, o veto foi colocado.
Com esse cenário econômico que estamos vendo hoje, com o custo da tarifa alto, um dos componentes que mais impacta na tarifa hoje é questão da gratuidade. Nós temos uma média de 20% em nível nacional. Há cidades com o absurdo de 30% a 35%.
Ao analisar as emendas que foram apresentadas a esta medida provisória, verificamos que uma emenda dá uma solução que considero harmônica no trato dessa questão. Trata-se da Emenda nº 19, que estabelece a vedação de concessão de novos benefícios tarifários. Quer dizer, ela praticamente esclarece o veto dado pela Presidente da República por ocasião da sanção. Então, estabelece que fica vedada a concessão de novos benefícios tarifários caso não existam fonte de custeio para tanto. E concede um prazo até 2022 para que a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal façam uma revisão de suas gratuidades.
Eu não sei se os senhores tomaram conhecimento de que, recentemente, o Governador Geraldo Alckmin, numa entrevista à Folha de S.Paulo, disse que o impacto da gratuidade, o custo da gratuidade nos serviços da região metropolitana, metrôs, trens no Estado de São Paulo estava com um volume muito alto e que eles pretendiam fazer uma revisão dessas gratuidades, primeiro, verificando quem, por direito, deveria receber o benefício; segundo, havia até a possibilidade de se reduzir a idade de 65 para 60 anos.
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Então, identificamos que essa emenda pode ser uma barreira para que, futuramente, as câmaras de vereadores não concedam novas gratuidades e, com isso, não venhamos a impactar mais a tarifa e consequentemente excluir o usuário do sistema de transporte coletivo.
Então, achamos que essa emenda apresentada pelo Deputado Mauro Lopes, de nº 19, é uma emenda que mereceria uma atenção por parte do Relator da matéria e dos membros desta Comissão.
Outro ponto que nos chama a atenção é que a Lei de Mobilidade Urbana, apesar de ser uma lei moderna, apesar de ter tramitado durante 15 anos nas duas Casas, possui uma falha: ela não tem uma definição clara com relação ao transporte público coletivo urbano.
O Senador Pastor Valadares identificou essa falha no trato dessa matéria e trouxe uma definição para transporte público coletivo urbano. Eu acho que essa emenda do Pastor Valadares poderá ajudar na interpretação, na definição do que é transporte público coletivo urbano, o que muitas vezes se confunde com transporte público coletivo metropolitano, suburbano e com outras definições que possam existir. Então, eu acho que ela é uma emenda didática. Essa emenda do Senador Pastor Valadares poderia contribuir com essa questão.
Outro ponto que acho que está sendo enfrentado em muitas cidades brasileiras é a questão do transporte ilegal de passageiros. Sabemos que toda vez que ocorre uma crise econômica no País, em que há um aumento desenfreado do desemprego, há um crescimento do transporte ilegal em algumas cidades do País. E nós identificamos aqui que há uma emenda que dá poderes ao Município, através da sua regulação local, para estabelecer sanções de retenção, apreensão e aplicação de multas com relação ao transporte ilegal. Isso quer dizer o seguinte: o que ocorrer de infração na legislação de trânsito, a prefeitura, no caso do regulamento de transportes, poderá criar sanções no seu compêndio jurídico e legislativo local para poder reprimir casos de transporte ilegal de passageiros. Vale lembrar que a própria Lei de Mobilidade Urbana estabelece ao poder público concedente o combate ao transporte ilegal de passageiros. Então, entendemos que essa seja uma emenda muito interessante e que mereceria essa questão.
Outro ponto que nós gostaríamos de tratar aqui são duas emendas que praticamente são parecidas, mas tratam de uma questão que hoje é vertente e que são as emendas do Deputado José Carlos Aleluia e uma do Deputado Mauro Lopes, em que eles falam da questão do subsídio tarifário. Se nós verificarmos a Lei de Mobilidade Urbana, ela define claramente a ocorrência do subsídio tarifário, mas não traz mecanismos de garantia da aplicabilidade desse subsídio, para que ele possa ter uma temporalidade de aplicação por um longo tempo no contrato de prestação de serviço.
O Deputado José Carlos Aleluia remete a questão do subsídio tarifário às garantias que estão hoje na Lei das PPPs, das Parcerias Público Privadas, que é a Lei nº 11.079. Então, são as garantias que podem ser dadas à questão do subsídio tarifário para evitar que não faltem recursos, para que o recurso não seja desviado com outro propósito. O Deputado Aleluia e o Deputado Mauro Lopes tratam dessa questão nas Emendas de nºs 15 e 16.
Outro ponto para o qual eu gostaria de chamar a atenção dos senhores e das senhoras é com relação ao fato de que a Câmara dos Deputados, tempos atrás, criou um grupo de trabalho para fazer um estudo sobre a revisão dos pontos que mereceriam uma certa revisão na Lei de Mobilidade Urbana.
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E essa emenda é até de autoria de V. Exª, Deputado. Foi uma emenda em que houve um estudo aprofundado dos consultores legislativos da Câmara do Deputados no sentido de verificar o que estava faltando na Lei de Mobilidade Urbana. E essa emenda que o senhor apresentou engloba, justamente, as propostas que aqueles consultores legislativos apresentaram aos Parlamentares da Câmara dos Deputados.
Então, temos várias emendas, entre as 37 apresentadas à medida provisória, que, se em um primeiro momento o Governo Federal se preocupou em rever o prazo para que os Municípios realizassem seus planos de mobilidade urbana, abriu a possibilidade para que se possam resolver outros problemas de mobilidade urbana que os Municípios enfrentam.
Então, entendo que as emendas que estão no corpo da medida provisória abrem à discussão outras questões que os Municípios estão enfrentando, principalmente nesse momento do cenário econômico, uo seja, questão da tarifa.
Ontem, estive presente na reunião dos prefeitos na cidade de Campinas, e o Prefeito João Dória defendeu uma fonte de recursos para subvencionar o transporte público. Chegou ao ponto de falar que havia uma PEC em tramitação na Câmara dos Deputados que está falando sobre a destinação de recursos da Cide. E ele defendeu que esses recursos sejam canalizados para o transporte público, como forma de suavizar os impactos da tarifa e, consequentemente, suavizar o bolso dos usuários do sistema de transporte público de passageiros.
Então, Sr. Presidente, era mais ou menos isso...
(Soa a campainha.)
O SR. IVO CARLOS PALMEIRA - ... que eu gostaria de chamar em relação a essas emendas que foram apresentadas.
O SR. PRESIDENTE (Julio Lopes. PP - RJ) - Obrigado Dr. Ivo Carlos. Certamente seus esclarecimentos e posicionamentos serão importantes para o aprofundamento da questão pelo nosso Relator, Senador Bezerra.
Passo a palavra aqui ao meu colega, Deputado ilustre da cidade de Santos, que teve a honra de governá-la por dois períodos, Deputado João Papa, para que possa fazer a interlocução com Vossa Senhoria.
O SR. JOÃO PAULO PAPA (PSDB - SP) - Cumprimento o Presidente Julio Lopes, o caro Ivo Palmeira, representando aqui a NTU; cumprimento também o Luiz Carlos, que está representando a ANTP.
Bom, fica claro, com a quantidade de emendas que foram apresentadas aqui e pela qualidade de muitas delas, Deputado Julio, o quanto este tema da mobilidade urbana merece, neste momento, aperfeiçoamento em vários vários pontos, alguns cruciais, que foram aqui apresentados e tocados pelo Ivo. Um exemplo é a questão tarifária; a questão das iniciativas, que se multiplicam pelo País, de aumento de isenções, iniciativas, muitas vezes, sem o devido lastro financeiro, que acabam comprometendo ou a qualidade do serviço ou próprio Erário, quando há a remuneração dessas isenções, ou a qualidade do serviço.
Enfim, esses são temas que estão hoje colocados e que afetam efetivamente a qualidade do transporte público no Brasil inteiro.
Veja que uma medida provisória tão simplória, com apenas dois artigos, que pretende apenas ajustar prazos em relação aos planos, já abre a possibilidade, dá ensejo a tantas iniciativas.
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Obviamente, essas iniciativas de Parlamentares que militam na área de transporte, são demandas reprimidas aqui. Muitas delas, inclusive, devem ser objeto de iniciativas de projetos de lei apresentados tanto aqui no Senado quanto na Câmara, o que é um bom indicador de que nós temos que fazer o aperfeiçoamento e a atualização da legislação vigente.
Enfim, acho importante a contribuição da ANTU. Tenho certeza de que também a ANTP trará contribuições importantes para o relatório final desta Comissão Especial que trata da medida provisória. Como eu disse, é uma medida simples, mas que abre caminho para ajustes e demandas reprimidas que estão se multiplicando pelo País inteiro.
Também apresentei aqui, Ivo, três emendas, mas focadas na questão do uso da bicicleta, do modal cicloviário no espaço urbano. Acho que é um modal importante, uma alternativa importante que precisa ser aperfeiçoada, que precisa ser valorizada.
Acho que é a oportunidade, Presidente, que nós temos agora de fazer que pelo menos pelo rito mais célere que uma medida provisória nos permite, fazer aqueles ajustes que são emergenciais. Pelo menos isso.
Enfim, vou continuar aqui ouvindo as contribuições para depois poder fazer uma manifestação final.
O SR. PRESIDENTE (Julio Lopes. PP - RJ) - Obrigado, Deputado João Paulo.
Queria chamar o Luiz Carlos Mantovani Néspoli, superintendente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP) para as suas palavras.
Sr. Luiz Carlos, o senhor tem dez minutos. Muito obrigado pela sua presença. É uma honra estar mais uma vez com V. Sª.
O SR. LUIZ CARLOS MANTOVANI NÉSPOLI - Nós que agradecemos. Muito obrigado, Deputado.
Gostaria de iniciar abordando o aspecto da finalidade do plano de mobilidade urbana e o quanto ele tem de importância para algumas coisas que estão nos afligindo nesse setor, algumas que Ivo Palmeira já apontou.
O plano de mobilidade urbana organiza os sistemas de transporte e os sistemas de modais de uma cidade. Por que isso é importante? Não apenas pelo fato de você suprir aquela cidade de uma política de transporte mais adequada e que favoreça os deslocamentos da população, reduza tempos, mas especialmente porque ele também tem o condão de ser racionalizador, ou seja, é necessário que as redes de transporte que sejam constituídas tenham qualidade e sejam mais baratas do ponto de vista do custo operacional. Por quê? Quanto menor o custo operacional, naturalmente menor é a pressão sobre a tarifa. Então, é fundamental que as cidades tenham esse plano de mobilidade.
Mais ainda, e agora ouvindo a palavra do Deputado, ex-Prefeito de Santos, os outros modais são muito importantes na articulação com os sistemas de transportes, não só a ciclovia, que é um modal sustentável, não poluente - para distâncias até 6km eles são perfeitamente exequíveis -, mas também as calçadas públicas. Em uma pesquisa que fizemos na ANTP e avaliamos os trechos das viagens dos usuários, o trecho pior avaliado é o trecho que vai da casa dele a um ponto de parada ou a uma estação de metrô, por conta das calçadas, por conta da iluminação da rua, por conta dos riscos de travessia, por conta da segurança pública e por conta da falta de um ponto de parada decente.
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Então, o nosso usuário de transporte começa, na verdade, na casa dele. O plano de mobilidade tem essa finalidade de reunir todas essas necessidades humanas dentro da cidade e de fazer isso de uma maneira ordenada e com pensamento de longo prazo. Portanto, é fundamental que você tenha isso.
O que acontece hoje no País? Nós temos 171 cidades, segundo o último levantamento do Ministério das Cidades, que fizeram o plano de mobilidade. Isso representa mais ou menos 12% do que seria obrigatório por lei, porque temos mais ou menos 1,6 mil cidades com mais de 20 mil habitantes no País. Portanto, nós estamos, três anos depois, quase quatro anos depois, com 10% ou 12% do que deveria ser feito.
Por que isso aconteceu? Aí a experiência da ANTP é importante. Por quê? Nós fazemos reuniões com Secretários Municipais de Transporte e Mobilidade Urbana. Nós temos um fórum nacional, temos um fórum paulista, temos um fórum mineiro, um fórum paranaense, e a essas reuniões comparecem 30, 40, 50 Municípios. No momento em que a lei foi promulgada, poucos reconheceram. O primeiro ano absolutamente foi um ano de desconhecimento total do que tinha acontecido. A partir do segundo ano, a coisa começou a chegar dos Municípios.
Nós da ANTP fizemos um curso de gestão de mobilidade urbana, do qual participaram 1,1 mil pessoas, 60% eram servidores públicos. A grande maioria desconhecia tudo isso. Então, foi o nosso investimento no sentido de contribuir para que essa informação, esses conhecimentos chegassem até os Municípios. Então, houve um delay, um início muito difícil. Depois, houve um apavoramento, e aí virou ao contrário. Como existia a possibilidade de você ter recursos do orçamento - o Ministério estava anunciando o recurso do PAC, do OGU -, então aconteceu um apavoramento, uma corrida. E essa corrida gerou distorções, porque, no afã de cumprir a data, nem todo plano foi benfeito.
Então, eu acho que é extremamente útil, necessário, dilatar essa possibilidade. Nós até discutimos muitas vezes lá, e eu sou de opinião pessoal que nem deveria haver prazo, ou seja, se ele não tiver o plano, não tem dinheiro. Mas eu sou engenheiro, então, do ponto de vista jurídico, não sei o que significa isso. Mas o plano tem que ser feito, porque a cidade merece um plano; é necessário que haja um plano. A segunda possibilidade de obter recurso é uma vantagem adicional, digamos, de você ter esse plano.
Para terminar, quero reforçar alguns pontos que o Ivo levanta. Vimos trabalhando nisso, junto com a NTU, há muito tempo.
Aliás, uma curiosidade, ouviu Ivo: como a ANTP fará 40 anos no ano que vem, nós estamos tentando escrever essa história da ANTP. Eu fui incumbido de ler tudo que aconteceu nos anos 90, enfim, a partir da Constituinte. É impressionante.
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Há dois artigos na revista da ANTP que tratam exclusivamente de financiamento de custeio, em que a Cide com outro nome está lá; em que a Versement Transport, que é o modelo francês, está lá; em que o vale-transporte está lá; uma porcentagem do IPTU, voltada para financiamento do transporte está lá. Então, nós no mundo técnico, sabemos, há muitos anos, que essa conta entre tarifa e custo operacional não fecha.
A Lei de Mobilidade trouxe uma coisa importante e interessante: ela separou essas duas coisas que eram confundidas no passado. No passado, um passageiro pagante tinha que cobrir o custo operacional. Hoje você separa custo operacional, que é o custo de realização do serviço, da tarifa, que é aquela que o prefeito define. E, se o prefeito define uma tarifa que não cobre o custo, necessariamente tem que ter subsídio.
Então, essa conta não fecha por uma razão simples: mesmo que racionalizemos o sistema de transporte - e isso é possível até um determinado limite, a partir desse limite não dá mais -, você pode "troncalizar", pode tirar superposição de linhas, criar redes mais inteligentes, mas, uma hora, esse custo operacional vai se tornar aquele custo operacional que vai ter insumos, mão de obra, tudo crescendo, conforme os dissídios trabalhistas, conforme a inflação, e esse custo vai aumentar. E a tarifa para não só porque você congela e, eventualmente, você não dá o aumento tarifário; ela para porque você cria gratuidades.
Na cidade de São Paulo, hoje, 32% das viagens são gratuitas. Não estou contando aqui as viagens que são produzidas com o uso do bilhete único, que está fora dessa conta. O bilhete único dá direito a você trocar duas vezes, pegar três conduções dentro de três horas de viagem, sem pagar um adicional tarifário. O bilhete único não está nessa conta, nessa conta está a gratuidade.
Então, o que acontece? Toda vez que eu aumento a gratuidade - como o Ivo disse - e não há uma receita vinculada a isso, quem é que paga? Quem usa a roleta. Há até uma brincadeira que aconteceu em Santos, quando um dos nossos conselheiros - um cara idoso como eu - estava no ônibus em Santos, e subiu um idoso, subiu um aposentado, subiu outro aposentado, daqui a pouco subiu um jovem, aquele está pagando para a gente.
(Soa a campainha.)
O SR. LUIZ CARLOS MANTOVANI NÉSPOLI - Então, é isso o que acontece. A buzina é para mim, não é? Então, terminando, nós precisamos encarar decididamente que não há salvação no sistema de transporte sem que você tenha receitas extratarifárias. Não tem salvação.
Em São Paulo, na década de 60, a divisão modal era 65% das viagens em ônibus e 35% em automóveis. Hoje é 51% em automóveis e 49% em ônibus. Então, nós estamos perdendo passageiro. Você perde passageiro, você perde receita e, se você dá gratuidade, você perde receita. Então, o sistema está indo para uma situação colapsante. Dessa forma, ou nós temos uma receita extratarifária ou o sistema entrará em colapso, seguramente, dentro de alguns anos.
Não sei como incluir isso na discussão da revisão da lei, mas eu acho que a medida exequível deu de saída, ou seja, se lá está escrito que gratuidade tem que ter a correspondente fonte de recurso, que ela seja gerada. E nós, assim como a NTU, somos favoráveis à somos favoráveis à Cide como um instrumento de cobertura de custo dos serviços de transporte.
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Então, era isso.
Muito obrigado pela atenção.
O SR. PRESIDENTE (Julio Lopes. PP - RJ) - Bem, Luiz Carlos, muito obrigado por suas palavras, por suas reflexões.
Estamos sendo chamados para votar, porque está em votação já lá na Câmara dos Deputados e vamos ter que encerrar. Mas, Papa, tivemos duas solicitações de dois internautas, assistindo aqui ao debate.
Clairton de Santana Neto pede para falar: "Como incentivar medidas sustentáveis, em meio a um conjunto de fatores [tão] desfavoráveis ao transporte público [neste momento]?"
Você tem alguma sugestão para o Clairton de Santana Neto?
O SR. JOÃO PAULO PAPA (PSDB - SP) - Bem, algumas delas foram mencionadas aqui.
Como bem colocou o Luiz Carlos, o conceito de mobilidade hoje é um conceito amplo - e o Ivo acho que também tocou nesse ponto. O passageiro começa a sua viagem no momento em que sai de casa. Então, as calçadas, o investimento que tem que ser feito pelos Municípios no aprimoramento, na qualidade e na acessibilidade, especialmente pensando nas pessoas que têm alguma dificuldade de mobilidade... Esse é um tema importante. Eu, pessoalmente, acredito muito.
Foi bem colocada aqui a questão do conflito, da concorrência do automóvel, do transporte individual em relação ao transporte público. Quanto ao transporte individual, o Júlio Lopes já foi Secretário de Transportes num dos Estados mais importantes e com tantos desafios nessa matéria e sabe bem o que é isto, quer dizer, o automóvel, o transporte individual ocupando cada vez mais espaço no sistema viário. O público fica com a menor parcela, quando se faz a conta da proporção de passageiros transportados, com a dificuldade que isso gera e a questão econômica, quer dizer, o transporte público acaba ficando cada vez menos eficiente, requerendo recursos extratarifários, como foi colocado aqui.
Diante de tudo isso, eu aposto muito, Deputado Júlio, numa maior participação da bicicleta, do modal cicloviário como um complemento, até como uma alternativa muito boa para distâncias mais curtas, daí por que estou defendendo aqui essas três emendas. Uma delas cria um capítulo só para bicicleta. Ela estabelece que o transporte cicloviário passa a ser uma modalidade de transporte regular, individual. Isso já é, mas fica obrigada a previsão de rede de ciclovias ou ciclofaixas em projetos e obras de construção, ampliação, adequação do sistema viário urbano, assim como implementação de infraestrutura de apoio, que são os bicicletários, enfim, e a sinalização adequada.
Eu tive o cuidado, Deputado Júlio, Luiz, Ivo, de colocar aqui, na sequência, num parágrafo específico: "Excetuam-se da obrigação prevista no caput", porque alguns poderão dizer: "Bom, e se não há condição? E quando é um sistema viário muito limitado? E uma região de parque histórico, um sítio histórico, por exemplo? E locais com topografia muito íngreme?" Eu previ essas situações e coloco aqui que excetua-se da obrigação prevista no caput o seguinte:
I - áreas de cidades com relevo acidentado, impróprias ao uso da bicicleta [esse é um ponto];
II - vias e obras de arte, cuja localização, característica histórica, função na hierarquia viária e dimensões impeçam obras para seu compartilhamento com os demais veículos.
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Os Municípios poderão definir, dentro da sua função hierárquica da via e das dimensões, onde não é possível colocar. Claro que não há necessidade, e o exemplo de Santos, minha cidade, é claro nesse ponto.
Hoje, Santos é uma cidade que tem cobertura plena, total, Júlio, na área urbana de ciclovias. Isso não significa que todas as vias do Município contam com ciclovias. Não há necessidade disso. Agora, há uma malha cuidadosamente planejada, que leva o passageiro e também o condutor da bicicleta a qualquer bairro da cidade, a qualquer área da cidade, no sistema viário principal, onde há espaço suficiente para isso. E com baixo investimento.
Então essa é uma emenda que eu acho que vai, de alguma maneira, forçar - eu diria até - os administradores locais, as prefeituras a se preocuparem com isso. O tempo todo as prefeituras estão realizando obras, e a implantação, a inclusão de uma ciclovia, muitas vezes, não tem custo nenhum, quando se está fazendo uma reforma.
E colocamos também aqui - já estou terminando -, incluímos, em itens que já existem nos planos e na lei de mobilidade, a ciclovia e a ciclofaixa, como estrutura viária; elas não existiam. E, no item de estacionamento, também os bicicletários e paraciclos, como itens relacionados a essa matéria de estacionamento.
Um caminho importante que já está em crescimento pelo mundo todo, e aqui no Brasil também com boas experiências, é a inclusão no art. 4º de um inciso que coloque o transporte, a bicicleta de uso compartilhado, a bicicleta pública, portanto, de uso compartilhado, como uma modalidade de transporte público que possa ser gratuito. Em muitos casos é gratuito, porque as prefeituras conseguem realizar parcerias e a viabilizam através de publicidade ou através de uma tarifa módica que a própria prefeitura pode propor como uma modalidade complementar, importante e sustentável para maior desenvolvimento do transporte público no País. Eu acho que esse é um tema que precisa ter maior peso. É possível, sim.
Volto a dizer, uma cidade com 430 mil habitantes, como é o caso de Santos - e a nossa região metropolitana tem 1,7 milhão de habitantes -, hoje aposta cada vez mais na integração do viário através de ciclovias e ciclofaixas. E vem dando certo. São mais de 600 mil viagens de bicicleta já cadastradas nessa região da Baixada Santista. É bastante coisa. Quando se observa nos horários de pico, pela manhã e no final da tarde, o deslocamento de bicicletas entre Municípios limítrofes, como Guarujá, Santos e São Vicente, a quantidade que se vê, Deputado Júlio, é impressionante. E aumentando cada vez mais. Eu acho que esse é um caminho.
O SR. PRESIDENTE (Julio Lopes. PP - RJ) - Essa certamente é uma das muitas razões pelas quais V. Exª terminou o seu mandato com 75% de aprovação, índice de ótimo e bom, naquela cidade.
Quero cumprimentar também e agradecer a participação da Kelly Cristina Cândido Barbosa, que é deficiente e que reclama aqui da condição do transporte público, na condição dela de cadeirante, dizendo que precisamos trabalhar para melhorar e contribuir.
Quero saudar o Deputado Domingos Sávio...
O SR. DOMINGOS SÁVIO (PSDB - MG) - Presidente, permita-me! Embora já esteja no finalzinho, eu fiz questão de estar aqui apenas para saudar V. Exª, o colega Deputado Papa e os nossos convidados, Dr. Ivo Carlos, Dr. Luiz Carlos. Eu tenho absoluta consciência da importância desse tema e, por isso, fiz questão de participar desta Comissão Especial e pedi ao meu Líder que aqui estivesse. E quero manifestar aos nossos convidados e aos colegas a minha disposição de, nas próximas oportunidades, participar de maneira mais intensa do debate para que possamos concluir esse trabalho.
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E eu não tenho dúvida de que isso ocorrerá pela Liderança do Deputado Júlio Lopes, oferecendo ao Plenário um bom relatório, a fim de que, o mais breve possível, tenhamos as medidas que possam contribuir para melhorar todo o atendimento à nossa população no que diz respeito a transporte público de um modo especial.
Obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Julio Lopes. PP - RJ) - Obrigado, Deputado Domingos Sávio. Encerro aqui esta audiência, uma vez que estamos em votação no plenário, lembrando que, semana que vem, teremos audiência às 14h30, de terça-feira, dia 6.
Eu queria terminar com um assunto que não diz respeito aqui à MP. Deputados Papa e Domingos Sávio, Srs. Ivo e Luiz Carlos, eu fiz uma proposição de uma emenda constitucional, uma PEC, no sentido de tornar imune o transporte público à incidência de impostos. E fiz isso porque entendo que as nações desenvolvidas têm conseguido subsidiar o transporte de forma direta, fazendo isso com desembolso e com desencaixe do Estado. E assim tem sido, com participação muito efetiva, na França e na União Europeia como um todo; nos Estados Unidos, inclusive - o maior país capitalista do mundo -, o transporte público é altamente subsidiado. Mas no Brasil temos enorme dificuldade de fazer isso, à exceção de São Paulo e do meu próprio Estado, onde temos programas grandes de subsídios. Mas nós precisamos encontrar fontes alternativas. Como o Luiz Carlos colocou aqui, temos que encontrar receitas extratarifárias. Mas, enquanto não as encontramos, que, pelo menos, tornemos imune o transporte público. E queria convidar V. Exªs para que nós pudéssemos fazer uma frente nesse sentido, porque acho que isso vai baratear muito.
O SR. DOMINGOS SÁVIO (PSDB - MG) - Perfeitamente, Deputado. Conte conosco.
O SR. PRESIDENTE (Julio Lopes. PP - RJ) - Inclusive o transporte aeroviário, Deputado Sávio, porque nós jamais teremos uma integração de aviação regional de grande intensidade, se não tivermos o querosene de aviação e os seus impostos flexibilizados.
E uma outra questão que acho preponderante é também a Cide municipal para que os prefeitos e os seus vereadores possam deliberar sobre a perspectiva, a necessidade e a incidência ou não de um imposto sobre a gasolina para melhorar a qualidade do transporte público. Eu acho que esse é um debate que já está instalado na Casa, para o qual já há uma comissão especial e que devemos aprofundar.
Então, eu deixo esses temas aqui...
O SR. DOMINGOS SÁVIO (PSDB - MG) - Presidente, só para contribuir com a sua proposta, dando um testemunho.
Nós conseguimos um regime especial do Governo de Minas, no final do governo Aécio e início do governo Anastasia, para reduzir o imposto sobre o combustível de aeronaves com a condicionante de que elas fizessem a aviação regional.
A minha cidade, Divinópolis, que lutava para ter uma linha aérea, tem hoje essa linha aérea com voo praticamente lotado a semana toda, Divinópolis--Campinas, justamente porque é óbvio que a empresa se interessou em ter o regime especial.
Então, é claro que essa é uma forma de o Governo ganhar mais, porque não havia esses voos, não havia fonte de receita; você cria uma cadeia de riqueza, reduz o imposto e ganha muito mais impostos, gera muito mais empregos. Hoje, transporte como o de aviação não é luxo, é necessidade para o desenvolvimento, para a mobilidade das pessoas, para a geração de emprego. E para o transporte coletivo, então, nem se fala. Esse aí é imprescindível. Nós estamos cheios de cidades de portes médio e pequeno, com precariedade no transporte coletivo, porque os impostos são pesados; e há lugares em que nem se viabiliza o transporte coletivo. Se você tivesse um projeto de lei como esse que V. Exª propõe, nós ampliaríamos o transporte coletivo para centenas, milhares de cidades pequenas que já precisam; e é óbvio que nem se fala o tanto que poderia melhorar a qualidade desse transporte para as metrópoles.
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Não é dar isenção para o dinheiro e para o bolso de A ou B; é dar isenção para ele ser convertido em qualidade, em investimento, em redução de tarifa para o cidadão. Isso é elementar. É só haver critério para isso para você fazer uma redução de imposto que beneficie o cidadão ou o usuário.
O SR. PRESIDENTE (Julio Lopes. PP - RJ) - Alguém mais quer se pronunciar ou não?
Não havendo, então, mais quem queira se pronunciar, uma boa tarde a todos. Muito obrigado!
(Iniciada às 16 horas e 50 minutos, a reunião é encerrada às 17 horas e 34 minutos.)