Notas Taquigráficas
| Horário | Texto com revisão |
|---|---|
| R | O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco Moderador/PR - MT) - Bom dia a todos. Este é o Congresso do Futuro. Gostaria que fossem ousados e tomassem aqui os assentos à frente, porque este Congresso representa principalmente vocês, que são o futuro deste País. Não se intimidem. Nós os aguardamos aqui à frente para poder começar. Inclusive o som também. Para começar, quem está lá mais no fundo, tome a decisão e venha para frente. Queremos aqui a frente toda lotada. Inclusive,queremos avisar que temos tradução simultânea. Quem não pegou, que também pegue os seus fones. Olha, eu vou fazer de forma bastante impositiva: eu gostaria que quem está lá atrás viesse aqui para frente, até porque nós queremos também uma foto da abertura com todas as poltronas aqui tomadas. Vamos aguardar todos que estão mais atrás virem para cá, para a gente poder começar. Ainda avisando a que quem não pegou o seu fone: nós temos aqui a tradução simultânea. Podem levantar, podem vir para cá. Há muita poltrona aqui que vocês podem ocupar. Antes de convidar os palestrantes para tomar assento à mesa, gostaria de fazer um agradecimento especial aos nossos apoiadores do evento. Queremos agradecer à Confederação Nacional da Indústria (CNI), à Confederação Nacional do Comércio (CNC), à Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), à Associação Nacional de Jornais (ANJ), à Associação Nacional de Editores de Revistas (Aner), ao Instituto Palavra Aberta, ao Centro de Estudos Avançados de Governo e Administração Pública (Ceag/UnB), ao Centro Universitário IESB, à União Pioneira da Integração Social (Upis), à Faculdade Anhanguera e ainda ao Centro Universitário de Brasília (UniCEUB). Queremos convidar a Consultora Karin Kässmayer, que vai nos auxiliar aqui no trabalho. |
| R | Quero registrar também o Secretário da Comissão Senado do Futuro: Waldir, esse jovem que está à frente ajudando a organização. Quero registrar também o agradecimento a toda a minha assessoria, em nome da Roseane. Onde está a Roseane? Está aqui. Levanta, Rosane. A Roseane está dando assessoria. Em nome dela, agradeço a toda a equipe da assessoria legislativa do PR, bem como do meu gabinete. Dando início ao primeiro painel, convido nossos ilustres palestrantes para tomarem lugar à mesa. Convido Carlos Nobre, que é membro do Conselho Científico sobre Sustentabilidade Global do Secretário-Geral da ONU. (Palmas.) Rômulo Paes de Souza, Diretor do Centro Mundial do PNUD para o Desenvolvimento Sustentável (Centro RIO+). (Palmas.) Marcelo Behar, Diretor de Assuntos Corporativos da Natura. (Palmas.) Queremos convidar também o Sr. Carlos Oliveira, que é da União Europeia, para apresentar o vídeo do Comissário da União Europeia, Sr. Carlos Moedas. (Palmas.) Ressalto que conforme divulgado na pauta e nas redes sociais, a presente reunião será realizada em caráter interativo. Ou seja, há possibilidade de participação popular. Dessa forma, os cidadãos que queiram encaminhar comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do portal e-Cidadania, no endereço www.senado.leg.br/ecidadania ou ligando para o número 0800-612211. Quero repetir: todos que quiserem fazer perguntas podem encaminhar através do portal e-Cidadania, no endereço www.senado.leg.br/ecidadania ou ligando para o número 0800-612211. Quero, então... Vamos, então, dar início, com o filme que será apresentado pelo Carlos Oliveira. |
| R | O SR. CARLOS OLIVEIRA - Eu, Carlos Moedas, que tenho um pelouro pela investigação ou pesquisa, ciência e inovação, quis adereçar à organização, ao Senado brasileiro e a todos os organizadores deste importante evento uma mensagem para reforçar o interesse da União Europeia em acompanhar esta importante reflexão sobre o futuro e, de alguma forma, manifestar também o seu desejo de participar desta reflexão coletiva, porque muitos desafios que nós estamos a discutir não são desafios apenas no Brasil ou na América Latina, são desafios globais por que todos somos responsáveis. Eu vou pedir que seja passada a breve mensagem que foi gravada pelo Comissário Carlos Moedas, que vai naturalmente acompanhada por uma saudação especial ao Congresso brasileiro e a todos os participantes neste importante evento. (Procede-se à exibição de vídeo) (Palmas.) |
| R | O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco Moderador/PR - MT) - Gostaríamos de passar a palavra à nossa Consultora Karin, para que faça a apresentação do currículo dos nossos palestrantes e da programação. A SRª KARIN KÄSSMAYER - Bom dia a todos. Agradeço a presença de todos e, principalmente, dos palestrantes. Apenas uma informação: a temática dos painéis da manhã versará sobre o tema do desenvolvimento sustentável na América Latina, e a primeira mesa redonda, especificamente sobre a sustentabilidade e a Agenda 2030, visando a justamente trazer aqui a temática dos objetivos do desenvolvimento sustentável, elaborados pelas Nações Unidas, que preveem um plano de ações voltado à erradicação da pobreza; à transformação e proteção do meio ambiente; ao enfrentamento das mudanças climáticas; ao empoderamento das mulheres e à garantia dos direitos humanos, principalmente. De início, então, o currículo do Prof. Carlos Nobre, que será o primeiro palestrante. Ele é climatologista, graduado em engenharia eletrônica pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica, com doutorado em meteorologia pelo Massachusetts Institute of Technology. Foi assistente de pesquisa do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia e pesquisador do INPE. Exerceu funções de direção científica; chefe do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos do Inpe; criador do Centro de Ciência do Sistema Terrestre do Inpe, tendo sido seu primeiro chefe; cientista chefe do Programa de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia; criador do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden); Secretário Nacional de Políticas e Programas do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, entre 2011 e 2014; Presidente da Capes; e é membro da Academia Brasileira de Ciências, da Academia Mundial de Ciência e membro estrangeiro da Academia de Ciências dos Estados Unidos. É autor e coautor de mais de 180 publicações científicas, livros e capítulos de livros sobre clima, mudanças climáticas, meteorologia tropical e Amazônia. É membro do Conselho Científico sobre Sustentabilidade Global do Secretário-Geral da ONU. Obrigada, Prof. Carlos Nobre. Passo a palavra. O SR. CARLOS NOBRE - Bom dia a todos e a todas. Cumprimento o Senador Wellington Fagundes, a coordenadora Karin, os meus colegas aqui de Mesa. |
| R | Eu preparei uma apresentação... Para falar de futuro, principalmente o futuro do Brasil, eu achei que um tema que unificaria muito esses assuntos, até para complementar o que os meus colegas de Mesa vão falar, seria a Amazônia. A Amazônia é o principal tópico da minha pesquisa. E eu queria, então, colocar um pouco a minha visão, com esta pergunta: o futuro da Amazônia é sustentável? Eu tenho pensado muito nessa questão, não só do ponto de vista científico da minha pesquisa de relações da Amazônia com o clima do Planeta, dos riscos que Amazônia corre com as mudanças climáticas, com o desmatamento - eu vou mostrar muito pouquinho -, mas eu quero discutir no sentido mais geral e terminar em um tom de desafio: o que seria um modelo sustentável de desenvolvimento para a Amazônia? Eu quero também agradecer a todos que colaboraram com essa pesquisa e, principalmente, esses nomes que eu mencionei. Eu vou ficar em pé, porque acho que facilita muito a minha fala aqui. Eu, muito rapidamente, nesse tempo, vou cobrir quatro tópicos: a importância da Amazônia no Antropoceno; o risco que a floresta corre devido às mudanças climáticas; se é possível interromper o desmatamento e, por fim, a minha proposta para um novo paradigma de desenvolvimento econômico e social na Amazônia, que nós estamos chamando de terceira via. A importância da Amazônia no Antropoceno. Não sei se todos vocês já ouviram falar do Antropoceno: é o que nós estamos hoje chamando de uma nova época geológica. Nós vivemos, nos últimos 12 mil anos, no Holoceno, um período de muita instabilidade climática, que permitiu o desenvolvimento da agricultura, o desenvolvimento da civilização como nós a conhecemos. E nós agora nos tornamos uma força geológica. Por muito tempo fomos uma força biológica: modificamos a natureza, criamos agricultura, mas hoje nós somos uma força geológica, com capacidade de transformar a Terra de uma maneira que nunca nenhuma espécie viva teve, nos 3,5 bilhões de anos em que temos vida no Planeta. Então, nós estamos nessa nova época. E eu quero destacar um pouco a importância da Amazônia nessa época. É um belíssimo sistema natural, com seis milhões de quilômetros quadrados na Bacia Amazônica e com um pouco mais de florestas tropicais. Eu tive a chance de conhecer... Desculpem, também, porque muitos dos meus eslaides estão em inglês, porque eu não tive tempo - já peço desculpas. Mas eu estou falando em português. Eu tive a sorte de conhecer a Amazônia com 20 anos de idade, muito jovem. Então, eu vi essa Amazônia ainda muito pouco perturbada. Ela é um sistema belíssimo do sistema natural do nosso Planeta, mantendo o ciclo de carbono - é um sumidouro de carbono muito importante, possuindo o rio mais importante do Planeta, com 15% da água que chega de todos os rios do mundo no Oceano Atlântico. |
| R | Rica, com 10% de todas as espécies do Planeta. Ela estabiliza o clima e também mantém uma imensa diversidade sociocultural, étnica e linguística. Mas essa Amazônia está sendo ameaçada crescentemente, com o modelo de desenvolvimento que os países amazônicos e notadamente o Brasil escolheram para a Amazônia. Então, desmatamento, principalmente através do fogo, uma técnica agrícola muito ultrapassada, mas ainda plenamente utilizada nos Trópicos; também exploração insustentável de madeira, e isso tudo tem levado a uma pergunta: O que vai acontecer com a Amazônia no futuro? Os riscos que a floresta e os sistemas estão correndo; e a Amazônia é um elemento muito importante do sistema planetário. E também o que nós chamamos no Antropoceno, a característica principal do Antropoceno é a grande aceleração. Quer dizer, esse enorme uso dos recursos naturais de forma exponencial. E na Amazônia também - nós vemos essa grande aceleração em todos os indicadores -, vocês veem o crescimento exponencial, ele vem pequeno e depois tudo cresce: uso dos recursos naturais, população, área desmatada. Só que, na Amazônia, começou na década de 70. No mundo, começou no Pós 2ª Guerra Mundial. Então, a pergunta que fica é: A que isso vai levar? Para onde isso vai levar? Quando isso se tornou muito conhecido? Quando, a partir do final dos anos 80, minha instituição de origem, Inpe, começou a publicar os dados de desmatamento e mostrou um número muito alto de desmatamento. O primeiro levantamento, em 1988: 20 mil km2 desmatados em um ano. Isso se tornou um assunto mundial, foi até capa da revista Times, em 1989. Se nós olharmos, este é o mapa que vai colocando... Fiquem vendo aí o aumento do desmatamento junto com a progressão das estradas, e hoje nós já temos cerca de 20% do total da Bacia Amazônica desmatada e 20% também da parte brasileira da Bacia Amazônica. Então, essa é uma preocupação. Podemos olhar até essa fotografia de satélite de alta resolução em Rondônia, vendo esse padrão espinha do peixe, em que quase tudo se une. Quer dizer, esse processo foi muito abrupto, violento e muito pouco baseado em legalidade. Esse modelo da década de 70 até hoje é obviamente insustentável. Estou mostrando alguns números ali. Já levou a quase 800 mil km da Amazônia brasileira em quilômetros quadrados, baseado em pecuária, grãos e madeira. E ele, de fato, só representa 0,64% do PIB brasileiro. Então, do ponto de vista econômico, é um modelo muito pouco eficiente. O segundo ponto é o único ponto mais científico que eu quero discutir com vocês: Quais os riscos que a floresta está correndo? Vamos olhar quatro fatores de risco para a floresta. Três são de risco e um é um fator que até beneficia as florestas. Quando a concentração de gás carbônico aumenta, as plantas gostam. Então, esse é um fator positivo. Porém o aquecimento global já subiu 1,1º na Amazônia. Projetam-se de 3 a 4 graus até o final do século. O desmatamento - 20% da Bacia Amazônica - e também o enorme aumento dos incêndios florestais, esses são todos fatores que podem levar a um risco imenso da floresta. |
| R | Esta é a minha área principal de ciência. Eu podia falar horas no assunto, mas eu vou resumir tudo com um estudo recente que nós publicamos, que olha esses quatro fatores, todos juntos e de forma sinérgica. Se isso continuar no futuro, qual é o risco que a floresta corre? Este gráfico é muito complicado. Eu vou pular. Eu vou direto para este aqui, que é um sumário. O que este gráfico está mostrando? São modelos matemáticos do sistema climático global e aqui eu estou dando um recorte só para a Amazônia. Isto aqui é a Floresta sem perturbação. Aqui é o nosso Cerrado. Aqui são algumas florestas mais estacionais, mais secas. Isso seria o sistema natural. Não estou colocando aqui os desmatamentos presentes. E só como era o sistema natural. Se nós fizermos tudo isto - mudança climática, desmatamento de 20% da área, desmatamento atual mais o efeito do fogo na floresta, mais esse efeito positivo de mais gás carbônico de que as plantas gostam, esse é um efeito positivo -, em 2050, nós teríamos este padrão: o Cerrado todo invadindo a Amazônia com algumas matas mais secas e a floresta confinada lá no oeste da Amazônia, no oeste do Estado do Amazonas, na Colômbia e no Peru. Isso significa uma redução de aproximadamente 50% da Floresta Amazônica. Então, esse é um estudo muito recente, mas ele mostra o risco, quer dizer, enorme risco que nós temos e eu quantifico esse risco com este diagrama aqui: o sistema estável, aquele da esquerda é floresta em toda a Amazônia, mas pode passar para esse do meio, que é a floresta no oeste da Amazônia e Cerrado, Savana no leste da Amazônia e esse sistema pode ficar muito mais - vamos dizer assim - estável quando nós temos secas e incêndios florestais. Eles fazem essa Savana que poderia tomar conta de 30%, 40% da Amazônia fica muito resistente. É muito difícil voltar a ser floresta. Nós fizemos uma série de estudos. Quais são os pontos críticos? Eles estão aqui: 4 graus de aquecimento global. Não devemos passar desse ponto, que a Amazônia vai - tecnicamente nós usamos o termo savanização - virar grande parte de Savana ou 40% da área desmatada, um ou outro. Esses são os riscos hoje bem quantificados pela Ciência. Nós estamos com 1,1 grau, desmatamento de 20%, temos o efeito do fogo, do aumento da duração da estação seca, a frequência dos extremos e também - este dá para ver bem - a sequência de degradação na Amazônia, através do processo de extração de madeira. Começa lá, com os pátios de madeira, depois vai rareando, rareando até praticamente perder todo o dossel e isso muito vulnerável a fogo, e a Floresta vai desaparecendo. Também nós estamos observando na Amazônia extremos climáticos sucessivos: 2005, 2010, 2009 também, 2012, 2014, depois 2015 e 2016 tanto de um lado seco quanto do outro lado. Será que nós estamos num novo regime climático? Será que isso já é um efeito do aquecimento global? O sistema começou a oscilar entre extremos? Nós não sabemos. Mas é muito preocupante, pois isso apresenta riscos muito grandes para a continuidade da Floresta. Eu quero agora discutir um pouquinho. É possível interromper o desmatamento da Amazônia? Um desafio enorme para todos os países amazônicos, especialmente para o Brasil, onde fica a maior parte da Amazônia. Esses são os dados do Inpe de desmatamento. Havia a ideia de que quanto ao desmatamento era impossível, que ele seguia o preço das commodities, o preço da carne, o preço da soja, a demanda mundial crescendo, a China comprando muito, a Europa, e não tinha jeito. |
| R | Isso era o pensamento dominante há pouco tempo, há 10, 12 anos. Mas essa questão foi muito debatida e preocupou a Comunidade Internacional e a nós, e, a partir de 2004, o Brasil inverteu a sua política para a Amazônia com a criação dos programas. Para quem conhece as siglas, PPCDAm (Programa de Controle da Amazônia), que teve dois momentos críticos: 2004 e 2008. Essa política, fazendo um grande corte, foi muito bem-sucedida, porque olha o que aconteceu com o desmatamento, ele realmente diminuiu 80%, chegou a quase 30 mil quilômetros quadrados em 2004 e caiu para 5 mil quilômetros quadrados em 2012. Então, é uma política muito bem-sucedida. E parte dessa política, então, foi a criação de reservas. Vejam as áreas de reserva: vermelha, o desmatamento; verde são reservas indígenas, áreas protegidas e áreas da Reforma Agrária, reservas extrativistas e assentamentos da Reforma Agrária, 54% da Amazônia hoje é protegida, que é uma excelente estratégia de conter o desmatamento. Então, isso é de 2013, mostrando claramente essa política como bastante acertada. Aqui é um resumo dessas políticas, basicamente é política pública de comando e controle de aderência ao marco legal, restrições ao crédito para desmatamento e estabelecimento de áreas protegidas. Então, nós reduzimos e - vou falar um pouquinho mais - alguns mitos que existiam, de que o desmatamento na Amazônia seguia o preço das commodities. Isso não é verdade. Nós vemos aqui o aumento do rebanho bovino na Amazônia ao mesmo tempo em que o desmatamento despencava. O aumento do preço, em termos reais, da soja e da carne no mesmo tempo em que o desmatamento despencava. Isso mostra o desmatamento despencando e o produto da agricultura da Amazônia como um todo aumentando em todo esse período. Os sistemas econômicos são desacoplados. E a pergunta que nós temos que fazer agora então. Nós estamos vendo uma tendência de aumento do desmatamento muito preocupante. Então, nós temos dois futuros. Isto está na nossa mão. Como o representante da Comissão Europeia disse, o futuro nós inventamos, não é um fato da natureza. Nós podemos ir para o enfraquecimento das políticas e o modelo que vai significar muito desmatamento: 50% da Amazônia desmatada nas próximas décadas ou um modelo de sustentabilidade. A escolha é nossa. Quero - este é o último ponto - mostrar um pouco dessa nova proposta que nós estamos fazendo, que tem muito a ver com a temática deste Congresso do Futuro: terceira via para o desenvolvimento. O debate sempre ficou muito preso a dois modelos de desenvolvimento: o conservacionista, máxima quantidade de reservas versus o expansionista da agricultura. Eu acho que a gente precisa fugir desses dois. Então, a pergunta é se existe uma terceira via. Esse é o modelo conservacionista, já 54% da Amazônia é protegida, mas os vetores de desmatamento continuam muito presentes e muito fortes, como mostram os 8 mil quilômetros quadrados desmatados de 2015 para 2016, um dado divulgado na semana passada. |
| R | Também as áreas protegidas são muito vulneráveis. Veja aqui o que aconteceu na reserva indígena do Xingu, uma das maiores da Amazônia, em 2010-2012: 30% da reserva pegou fogo - toda em vermelho. Quer dizer, a reserva em si, com a mudança climática, com o desmatamento chegando muito próximo, ela se torna muito vulnerável. Então, ela sozinha como política de contenção de desmatamento pode não ser necessária. Ou, então, o modelo de uso intensivo dos recursos naturais, quer dizer, tornar a Amazônia uma grande fazenda para alimentar o mundo - será que é isso que nós queremos? -, ou um grande pasto para ter centenas de milhões de cabeças de gado e produzir carne. Essa é outra possibilidade também. A população brasileira não deseja esse caminho - 95% das pessoas são contra o desmatamento da Amazônia quando perguntadas. E, também, a rentabilidade das atividades econômicas na Amazônia é muito baixa. Vejam os números: US$20 a US$70 é a rentabilidade da pecuária, extração seletiva também é baixa porque não é sustentável e a soja é um pouquinho maior, mas quando a gente vê o potencial - aqui é o potencial -, quão longe nós estamos do potencial máximo de agricultura. Nós estamos em 50%, toda a agricultura brasileira ainda está a 50% do seu potencial, ou seja, tem um enorme espaço para isso. Eu fiz uma comparação aqui: 1% de produto agrícola da Amazônia usa 50 mil quilômetros quadrados, 1% do produto agrícola do Estado de São Paulo usa 17 mil quilômetros quadrados. A efetividade agrícola na Amazônia é um terço daquela do Estado de São Paulo. Se você pegar daquele número e tirar açaí, castanha - que não desmata - é um quarto, quer dizer, estão produzindo produtos agrícolas na Amazônia com um quarto de eficiência do Estado de São Paulo. É aí que temos que atuar. Deixa eu pular isso aqui. A primeira óbvia coisa é não fazer mais mal - do no harm, anymore! - a primeira política e, quanto a isso, o Brasil assinou esse acordo desse projeto muito importante, faz parte do nosso Desafio de Bonn, de recuperar 150 milhões de hectares, o Brasil entra com 12 milhões. É muito significativo, é parte do nosso compromisso com o Acordo de Paris das mudanças climáticas, recuperar 12 milhões de hectares. O Brasil tem muita água, muito solo, é muito fácil recuperar aqui as coisas. Vocês vejam a quantidade de carbono que cada hectare absorve de restauração e esse estudo mostra que nós temos 25 milhões de hectares com altíssimo potencial de recuperação, regeneração natural. Só quis mostrar esse número para vermos o nosso potencial. Deixa eu pular esse aqui. E também o gado agora, cada vez mais, se discutindo o gado neutro em carbono, o gado que não significa grandes emissões e muito aumento da produtividade da pecuária. Por fim, quero falar um pouco, nos últimos dos minutos, um pouco desse novo modelo. Esse novo modelo que estamos propondo tem que aproveitar essa oportunidade em que nós reduzimos o desmatamento, ainda que ele esteja crescendo, e vai radicalmente...É disruptivo o que estamos propondo, disruptivo, não é incremental, é uma revolução que é, em vez de olhar a Amazônia como produtora de grãos e carne, é olhar a Amazônia pelo seu potencial da biodiversidade. A Amazônia tem 10% da biodiversidade do Planeta. Nesse modelo, nós temos o exemplo do açaí que não existia como indústria há 15 anos e hoje deixa na Amazônia US$2 bilhões, é a terceira indústria de produtos naturais e tem um imenso potencial. |
| R | Esse é só um produto da biodiversidade da Amazônia, ela tem centenas, para não dizer milhares. Então, a ideia é aproveitar esse potencial da biodiversidade com a floresta em pé que tem um valor econômico imenso e criar um novo modelo com as ferramentas da quarta revolução industrial. E aqui eu retomo o tema principal deste evento: as novas tecnologias da quarta revolução industrial. Como é esse modelo, as técnicas da quarta revolução industrial? Biológicas, digitais, ciência dos materiais, nanotecnologia aplicada no tesouro biológico que é escondido na Amazônia e retirar essa riqueza através das técnicas e das tecnologias da 4ª revolução industrial num ciclo permanente. Esse conhecimento biológico - que é infinito - da Amazônia sempre vai gerar inovação. Inovação é central nesse modelo. Quanto a esse modelo, aqui não vou ter tempo de entrar - e o meu tempo já estourou - em todo detalhe de como as ferramentas modernas da biologia e da quarta revolução industrial com tecnologias digitais e também ciência dos materiais podem ser utilizadas para explorar totalmente esse potencial. O maior potencial nesse modelo, que é disruptivo. A Amazônia tem que ser vista como um enorme reservatório de conhecimento biológico e muito desse conhecimento pode gerar aplicações de uma forma contínua porque é inesgotável a capacidade de extrair esse conhecimento. Então, esse é um momento importante em que o desmatamento parece que deu sinais de retomada e a gente precisa atuar muito seriamente para implantar um novo modelo para a Amazônia. Eu finalizo só um pouco resumindo. Esse novo modelo é muito na valorização dos produtos da Floresta e, como a nossa querida Bertha Becker dizia, agregar valor ao coração da Floresta depende muito de ciência, tecnologia e de inovação e depende de criar uma indústria na Amazônia, uma bioindústria na Amazônia. Não é só a Amazônia exportando materiais para o Brasil e para o mundo, é criar uma indústria na Amazônia. Bons empregos, mesmo os empregos do futuro - o teletrabalho - estão associados com indústrias locais e isso só pode ser feito com o empoderamento das populações da Amazônia e também com educação de qualidade. Finalmente, a minha mensagem final é: o conhecimento científico respeitando o conhecimento tradicional como base da sustentabilidade futura da Amazônia. Muito obrigado a todos. (Palmas.) A SRª KARIN KÄSSMAYER - Muito obrigada, Dr. Carlos Nobre, pela sua explanação bem como pelo exato cumprimento do tempo. Antes de passar a palavra ao próximo palestrante, gostaria apenas de fazer um breve aviso. Todos vocês receberam nas pastas um formulário de perguntas e, caso alguém queira realizar alguma pergunta, pode já preencher esse formulário, levantar a mão que o pessoal de apoio vai buscar as perguntas e, ao final das três explanações, iremos fazer uma rodada de 20 minutos de perguntas e respostas. O próximo palestrante é o Dr. Rômulo Paes de Sousa, médico epidemiologista especializado em desigualdades em saúde, avaliação de políticas sociais com Ph.D. em Saúde Pública pela Universidade de Londres. Rômulo Paes de Sousa é Diretor do Centro Mundial para o Desenvolvimento Sustentável (Centro RIO+), foi Secretário-Executivo do Ministério do Desenvolvimento Social do Brasil e trabalhou como pesquisador em instituições relevantes como Institute of Development Studies at the University of Sussex, The London School of Hygiene & Tropical Medicine, Fiocruz, PUC - Minas Gerais e Universidade Federal de Minas Gerais. Passo então, de imediato, a palavra ao Dr. Rômulo. |
| R | O SR. RÔMULO PAES DE SOUSA - Bom dia a todos e eu queria, em primeiro lugar o convite que o Senador Wellington Fagundes nos fez para participar deste evento e queria também cumprimentar os outros participantes desse painel, o Marcelo Behar, o Sr. Carlos Nobre e também cumprimentar alguns professores desta plateia, a Sakiko Fukuda-Parr, da New School for Social Research, meu amigo Rafael Pérez-Escamilla, da Universidade de Yale e, desta forma, cumprimentar a todos aqui. É muito oportuno que estejamos discutindo uma agenda para o futuro aqui nesta Casa do Senado. É muito importante porque a trajetória de construção dessa agenda como uma resposta para o futuro das nossas necessidades buscando integrar a dimensão ambiental, social e econômica para dar respostas globais tem sido pouco debatida pelo Legislativo brasileiro. O Executivo brasileiro tem debatido muito, existe uma comissão hoje interministerial que trata desse tema envolvendo seis ministérios, mas esse é um tema que envolve toda a sociedade. Ele envolve todas as áreas, envolve a sociedade civil, envolve o setor privado e, de uma certa forma, esse debate tem ocorrido de uma forma muito intensa no Brasil e não é à toa porque o Brasil sediou a Rio+20, o Brasil foi profundamente influente na construção dessa agenda que vou apresentar a vocês e o Brasil, não apenas suas instâncias políticas, administrativas, mas também a sociedade civil teve uma intensa participação nesse debate internacional. É importante que o Congresso brasileiro também paute esse tema e seja um dos atores ativos e essenciais na construção dessa agenda, afinal em muitos casos nós vamos precisar mudar a legislação para que nós tenhamos uma agenda mais aderente às necessidades deste País, às necessidades do nosso Planeta. O que eu vou falar está presente em grande parte nesse artigo que é uma publicação da Flacso e, portanto, está disponível na internet e também estará disponível nos Anais deste encontro. Observem o seguinte: quando pensamos o Planeta no sentido global, podemos estimar quais são os riscos, a probabilidade de eles ocorrerem e também nós podemos imaginar o alcance, ou seja, o impacto desses riscos referentes ao Planeta e àqueles que aqui vivem. Observem, por exemplo - se vocês conseguissem ler, mas eu vou ler para vocês -, no topo, lá em cima, está justamente a questão das mudanças climáticas. Isso foi exatamente o que o Prof. Carlos Nobre acabou de falar. Isso também foi importante porque grande parte dessa agenda de desenvolvimento sustentável é profundamente influenciada pelas evidências já encontradas de que a alteração climática que está em curso no Planeta, em função inclusive das nossas escolhas no uso dos recursos naturais, tende a ter uma incidência brutal em relação a várias espécies inclusive a nossa própria. Então, portanto, ele se apresenta como um fenômeno com grande probabilidade de ocorrer - está em curso -, existem evidências para isso e também com efeitos devastadores sobre todas as espécies, o que foi demonstrado agora com muita competência pelo Prof. Carlos Nobre. |
| R | Mais embaixo, naquele pontinho vermelho quase saindo do eixo vertical, trata-se das migrações massivas que estão ocorrendo e que tendem a se acelerar caso inclusive alterações nas condições ambientais continuem ocorrendo. Observem que, se nós fôssemos fazer um balanço do que aconteceu nos últimos cem anos, é muito provável que disséssemos o seguinte: olha, a vida melhorou no sentido geral em várias dimensões, mas piorou em outras tantas. Com certeza, em relação à questão ambiental, estamos piores hoje do que estávamos há cem anos; em relação à desigualdade socioeconômica, também, ainda que a pobreza, em termos absolutos, tenha caído muito. Então, é preciso ver o seguinte: esses fatores são essenciais de serem combatidos com uma agenda que possa inclusive articular uma resposta consistente. Nesse relatório, vocês conseguiriam ver vários outros itens essenciais, como a questão da instabilidade social, o risco fiscal e outros aspectos muito presentes na nossa vida, no Planeta todo e, de forma particular, em cada país, inclusive, obviamente, no Brasil. Observem que uma questão importante à qual me referi como um dos dois grandes problemas mais evidentes, além obviamente do câmbio climático, alterações no meio ambiente, está a questão da hiperconcentração de riqueza. Hoje nós temos um mundo mais concentrado em relação à questão. Esse gráfico é interessante, desse já dá para ler alguma coisa, pelo menos o pessoal que está na frente. Eu diria a vocês o seguinte: não é um relatório da Oxfam, que é muito famoso em relação a esse tema, é um relatório do Credit Suisse que trata justamente da hiperconcentração, bem no topo, de um número muito pequeno de pessoas em relação a uma massa de recursos hoje e uma base da pirâmide com muito menos recursos. Então, esse desequilíbrio na concentração de riquezas é um problema em relação à questão do mercado, acesso a bens e serviços, é um problema em relação à estabilidade social, é um problema em relação à qualidade de vida das pessoas, é um problema em relação a um mundo desigual que não interessa a nenhum de nós. Essa que é a grande questão, embora, obviamente, existam determinações para que isso ocorra. Nós precisamos, portanto, dar conta de uma agenda e de uma plataforma de políticas públicas, mas que também têm incidência sobre como nós organizamos o mercado e, portanto, precisamos alterar não só a lógica de produção de políticas públicas, mas a própria lógica de produção e consumo de bens e serviços que possa dar conta dos problemas hoje ligados à questão ambiental, mas também obviamente das dimensões sociais e econômicas em relação a esses aspectos a que me referi e a outros a que vou me referir um pouco mais adiante. Vejam que nós temos um ponto de partida. Nós tivemos uma experiência recente em que os países construíram uma agenda dos objetivos do milênio que buscavam dar conta de algumas dessas dimensões. Ele foi importante porque estabeleceu um parâmetro o qual os países poderiam considerar, ele foi importante porque houve um acordo internacional em torno deles, ele foi importante porque estabeleceu uma referência, um patamar em que os países pudessem definir os níveis de bem-estar que a população desses países poderia experimentar, mas tinha aspectos limitantes nessa agenda. Em relação a algumas dimensões, a questão ambiental estava pouco representada. |
| R | Os meios de implementação não eram suficientemente descritos ou precariamente descritos, para ser mais objetivo em relação a esse tema. Houve, obviamente, sucesso em alguns dos indicadores, mas outros ainda permanecem com desafios para nós. Havia a necessidade, portanto, de fazer uma agenda que pudesse ser mais compreensiva, uma agenda que pudesse tratar dos vários temas, uma agenda que pudesse aprofundar a proposição em termos de políticas públicas, mas também em relação à própria lógica de produção e de consumo e que pudesse responder aos grandes desafios contemporâneos. E aí eles buscam responder àqueles riscos a que me referi há pouco. Observem que é uma agenda muito mais complexa. Ela trata de 17 objetivos, ela trata de 169 metas, ela trata de 230 indicadores, mas ela surge com muito mais legitimidade política porque seu próprio processo de construção foi muito mais democrático, muito mais inclusivo, muito mais diverso do que o da agenda anterior. Mas ela traz em si também um grande desafio técnico. Ou seja, como, na verdade, converter uma aspiração dessa ordem, com essa ambição de transformação, obviamente, em políticas públicas, em novas práticas de mercado, em processos mais inclusivos e mais racionais em relação ao uso dos recursos naturais? Então, vejam que há uma diferença entre a agenda anterior e essa agenda a que me estou referindo. Primeiro, ela busca, portanto, articular - vejam na coluna em azul - mais dimensões de forma mais plena. Ela busca também não abandonar o que ficou pendente em relação à agenda anterior, mas incorporar e enriquecer, trazendo mais aspectos. Vejam que também ela busca mais equilíbrio nessas dimensões, uma vez que, na outra, elas estavam desequilibradas. Então, ela tem essa cara como vocês conhecem e já têm visto por aí e busca expressar esses vários aspectos. Vejam que há três questões que são muito caras para essa agenda. A primeira é que ninguém deve ser deixado para trás. Esse é um aspecto importante, porque, muitas vezes, as políticas respondem a aspirações até mais amplas ou majoritárias numa sociedade - nem sempre isso é assim, é claro -, mas segmentos inteiros ficam excluídos, populações ficam escondidas, como chamamos. Minorias culturais, étnicas, de orientação sexual etc. desaparecem na força de agendas de maiorias. Então, é preciso ir além disso, é preciso incorporar todos, é preciso que ninguém fique para trás. A questão da integração é um aspecto muito importante. Nós sabemos da insuficiência das abordagens setoriais. O meio ambiente nos ensinou muito quanto a isso, ou seja, existem várias conexões das políticas, e, às vezes, ou muitas vezes, a separação administrativa dos temas bloqueia, na verdade, a interlocução, que é fundamental para a produção de políticas eficazes, e a articulação mesmo de iniciativas entre o público e o privado que produzam soluções efetivas. Então, a integração nesse sentido é vertical, mas também é horizontal e transcende o público, buscando articular iniciativas do privado. Então, vejam que essa agenda é um apelo a uma geração, não é apenas um apelo à institucionalidade presente. |
| R | É preciso que seja universal. Um dos aspectos que era muito criticado na agenda anterior é que ela estabelecia um patamar que os países em desenvolvimento deveriam buscar, acreditando que os países desenvolvidos já haviam cumprido a sua parte, o que não é verdade. Por exemplo, em relação à questão ambiental, à questão do uso de energia limpa, os países desenvolvidos, muitos deles, devem profundamente, devem até mais do que muitos países emergentes, não só pelo seu aspecto histórico, mas também, na verdade, pela lógica de produção no momento da utilização de vários recursos para a produção de energia. Portanto, para produzir uma agenda dessa natureza, há responsabilidade para todos no plano institucional e no plano individual, para países desenvolvidos e para países em desenvolvimento. É preciso que isso seja devidamente equacionado na construção dessa agenda e dessa estratégica. Obviamente, estamos falando, portanto, da integração dessas três dimensões. Esta expressão é muito forte, a de que a agenda é indivisível. É indivisível no sentido da produção conceitual da agenda, é indivisível no sentido de que não alcançaremos os resultados que pretendemos se, na verdade, não produzirmos uma integração de políticas no âmbito a que me referi. Para isso, para organizar, na verdade, essa oferta e essa comunicação também em termos de políticas públicas e de ações no sentido mais geral, uma forma é tentar entender quais são os grupos em que esses objetivos se articulam, esses clusters. Obviamente, nós estamos falando das pessoas, e aí nós nos referimos ao desenvolvimento social no sentido mais amplo. De outra forma, estamos falando também, na verdade, dos processos econômicos e da necessidade de modificá-los na sua construção, na sua produção. Falamos também da paz, falamos da parceria, falamos do Planeta e falamos do ambiente. Observem que essa questão da parceria implica, na verdade, não apenas os meios financeiros, mas também as institucionalidades necessárias para a produção dessa agenda. Para isso, obviamente - não sei se vocês conseguem ler, desconfio que terão dificuldades, mas explicarei -, observem que, no plano global, podemos ter uma agenda e temos, na verdade, uma institucionalidade global, tanto na questão das relações de mercado como também na relação entre países. Quando pensamos, portanto, numa pactuação de países e quando pretendemos converter isso em políticas públicas, precisamos fazer a tradução no nível de cada país, de cada Estado, no caso brasileiro, e de cada Município. É preciso, portanto, construir mecanismos para isso. Nesse sentido, é importante, portanto, que os marcos legais favoreçam isso. Vejam, por exemplo, que os marcos legais podem ser obstáculos à implementação de políticas ambientais, e o são. Marcos legais podem ser problemas em relação aos direitos humanos, e o são - podem não ser problema no Brasil, em alguns casos, mas o são, de fato, no mundo. Então, é preciso uma revisão, na verdade, dos modelos legais em muitos temas, para que se produza aderência a uma agenda tão ambiciosa como essa. |
| R | Outra questão são os mecanismos de planejamento, que é uma coisa importante. Portanto, o Congresso é muito importante, porque, numa Casa como esta, neste País e no mundo, são produzidas as leis. Em relação a isso também, nos mecanismos de planejamento o Legislativo tem uma importância muito grande. Eles fazem parte do ciclo do planejamento, eles não apenas aprovam como também participam intensamente, são atores decisivos nesse debate, precisam ter aderência a uma agenda dessa natureza. Por fim, chegamos à agenda, e a agenda, obviamente, é subordinada aos marcos legais, subordinada aos mecanismos de planejamento, subordinada a uma institucionalidade com que o País conta, onde ele é mais poroso ou onde ele recebe, acolhe a contribuição da sociedade civil ou não. No caso brasileiro, existe uma participação intensa da sociedade civil em relação a várias políticas públicas, sobretudo as sociais. Há espaço para mais, há mais necessidade. Sobretudo, nessa agenda, o Brasil tem tido um diálogo importante, mas também há um espaço de crescimento fundamental. Basicamente, então, indo rápido, para não estourar o meu tempo, é preciso, portanto, que nós mapeemos os efeitos de integração e, portanto, os investimentos que podem resultar, na verdade, naquilo que nós buscamos. Há aspectos importantes nesse efeito de multiplicação. Precisamos justamente compreender quais são os temas transversais, precisamos ver como eles atravessam os vários objetivos aos quais eu me referi - vocês veem um exemplo disso em relação à questão de gênero - e, obviamente, como nós convertemos isso na prática. Novamente, a legislação, os mecanismos de planejamento, a agenda e a institucionalidade, esses quatro componentes são essenciais nesse exercício. Nós observamos, portanto, que existem efeitos de aceleração, dependendo da lógica de financiamento, da lógica de organização do mercado e também, obviamente, de fatores políticos. A questão da liderança política é essencial. Eu dou o exemplo do Reino Unido, porque acho que vale a pena pensarmos um pouco, Senador Wellington Fagundes, sobre a lógica de funcionamento no Brasil. O Reino Unido constitui comissões para tratar de vários temas que envolvem as duas Casas, no caso a Câmara dos Lordes e a Câmara dos Comuns. Lá existem mecanismos que também existem no Brasil, mas lá eles trataram de uma comissão específica sobre o desenvolvimento sustentável - como Presidente, há alguém da Câmara dos Lordes; como Vice, alguém da Câmara dos Comuns. Lá foi pautada a agenda de desenvolvimento sustentável e a contribuição do Parlamento britânico para o país e também a contribuição para o mundo. Isso é curioso, porque, no Reino Unido, o Legislativo foi muito mais ativo nesse debate do que o Executivo. Lá, no Executivo, o debate ficou muito restrito ao gabinete do Primeiro-Ministro, ao Ministro das Relações Internacionais, e foi perguntado aos outros ministérios o que eles gostariam de ter nessa agenda para o mundo, não para o país, mas para o mundo, e se haveria interesse do país em influenciar, digamos assim, a agenda internacional. O Brasil, nesse sentido, teve outro caminho no Executivo, que olhou para o Brasil e, obviamente, para o mundo também. Então, penso que a liderança do Legislativo brasileiro em relação a esse tema é fundamental, até porque ele será um ator decisivo nesse processo. |
| R | O meu tempo já concluiu. Vou só dar um exemplo, para que a gente deixe uma ideia final para vocês. Nós fizemos uma revisão da experiência de proteção social no Brasil e promovemos um diálogo com 15 países da África, tentando ver como a experiência brasileira poderia ajudar os países da África, mas já dentro dessa nova agenda, olhando as conexões entre a política social, a política ambiental e também, obviamente, as políticas econômicas. Produzimos esse relatório que teve a felicidade de ser acolhido pela Plenária de ministros africanos da União Africana e, depois, pela Cúpula Presidencial, que aconteceu na África do Sul no ano passado. O Brasil tem muito a mostrar para o mundo sobre as suas políticas sociais e sobre as suas políticas ambientais, mas o Brasil tem muito a aprender. Esse é um diálogo fundamental. Estou contente de estar aqui com vocês, tendo a oportunidade de também aprender com vocês, com os colegas da Mesa e depois com vocês na plenária, para tratar de uma agenda que é desafiadora, mas que nos traz muita emoção. Muito obrigado. (Palmas.) A SRª KARIN KASSMAYER - Muito obrigada, Dr. Rômulo. Eu gostaria de avisar a todos que estamos recebendo também comentários e perguntas pelo Portal e-Cidadania. De imediato, passo a palavra ao Dr. Marcelo Bicalho Behar, que é sociólogo e advogado, graduado em Ciências Sociais e em Direito, ambos pela USP. Marcelo Bicalho Behar trabalhou como jornalista do caderno O Mundo, no jornal Folha de S.Paulo, foi assessor especial e chefe de gabinete do Ministro da Justiça entre os anos de 2003 e 2007 e Secretário Executivo da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República entre os anos de 2007 e 2009. Em 2009, exerceu a advocacia e, no mesmo ano, assumiu a Diretoria Corporativa de Relações Institucionais da Companhia Siderúrgica Nacional, posição que ocupou até outubro de 2013. Atualmente, é Diretor de Assuntos Corporativos da Natura. Obrigada. O SR. MARCELO BICALHO BEHAR - Srª Karin, muito obrigado. Faço um agradecimento muito sincero ao Senador Wellington Fagundes e ao Senado Federal. Em nome da Natura, quero dizer que é uma honra estar com vocês aqui. É muito bom falar, depois de duas autoridades como o Prof. Carlos Nobre e o Prof. Rômulo. Eu vim aqui para contar para vocês hoje três casos, sob três perspectivas. Acho que nós tivemos aqui uma... Está funcionando o microfone? Escutam lá no fundo? (Pausa.) |
| R | Bom dia a todos! Apresento os agradecimentos sinceros da Natura pelo convite ao Senador Wellington Fagundes e à CNI. A Natura participa ativamente da CNI por meio do Movimento Empresarial pela Inovação (MEI). O nosso Conselheiro, Presidente do Conselho de Administração da Natura, Pedro Passos, não pôde estar conosco hoje e pediu que eu o representasse. Para mim é uma honra estar de volta ao Senado, à Casa revisora da legislação brasileira. Vou contar hoje para vocês a perspectiva da Natura sobre o tema da sustentabilidade no cenário latino-americano. Eu pretendo fazer isso sob uma perspectiva empresarial. É uma honra ter ouvido o Prof. Carlos Nobre sobre uma perspectiva científica muito bem fundada. O Prof. Rômulo também apresentou uma perspectiva institucional internacional também de excelente contextualização. Minha fala vai abordar três aspectos. Vou contar um pouco para vocês a história da Natura, empresa em que estou há três anos, da qual tenho a honra de fazer parte e que tem uma trajetória de muita consistência em matéria de sustentabilidade. Vou tentar remontar um pouco os principais marcos que construíram essa trajetória e por onde a empresa construiu o seu modelo de negócio fundado dentro do tema da sustentabilidade, com práticas muito diferentes, buscando trilhar esse caminho que o Prof. Nobre apontou da quarta revolução industrial. Num segundo momento, vou contar para vocês como a Natura vê os próximos tempos, como marcamos o planejamento e o desenvolvimento da organização para 2020 e para 2050. A Natura elaborou uma visão de sustentabilidade em que ela põe marcos muito claros para esses dois períodos. Por fim, há um movimento empresarial global, liderado pelo World Business Council, que busca fazer com que as empresas tenham patamares conjuntos e um olhar integrado, para não tratar apenas de economia e não ter só perdas e ganhos no seu balanço, mas ter também uma perspectiva empresarial dentro do balanço integrado a seus modelos de negócio, processo que começa este ano. Trago aqui um caso para exemplificar como isso deve se desenvolver. Vamos à linha do tempo. Acho que estou com problemas tecnológicos hoje aqui. A tecnologia, às vezes, é um pouco incompatível com a sustentabilidade, mas a gente busca sempre corrigir isso. Pronto! Vou falar rapidamente, vou falar de pé, vou aproveitar que temos uma linha grande. A Natura é uma empresa brasileira fundada em 1969, numa pequena loja na Rua Oscar Freire, pelo nosso fundador, nosso representante no Conselho de Administração, Sr. Luiz Seabra. Em 1969 - é importante lembrar -, a indústria de cosméticos, a indústria no Brasil era voltada à indústria química. Haver dentro da cosmética um elemento químico era um diferencial do seu negócio, era algo que levava o seu negócio a ter maior valor. Então, o fato de a empresa nascer com o nome de Natura, trazendo ingredientes naturais para suas formulações, já deu uma marca de por onde a empresa seguiria. Vou mencionar alguns aspectos, não vou passar por todos, mas vejo que alguns marcos foram muito importantes para delimitar o caminho da sustentabilidade. O primeiro deles, foi a adoção do modelo de venda direta. |
| R | Como vocês sabem, a Natura trabalha por meio da venda por relações. A Natura revende, vende o seu produto a uma revendedora, que tem seus clientes. Há uma rede que permite uma logística muito mais fluida, mais leve, com custos logísticos menores e com uma capilaridade muito grande, com a possibilidade de ofertar e garantir ganhos para toda a sua rede de relações. Isso mudou muito o negócio. É um modelo de venda que é muito diferente do que o que era praticado nos Estados Unidos, onde surgiu esse modo de desenvolver negócio, e que garante um terreno social muito grande à Natura. Num segundo momento, nós tivemos o pioneirismo no uso do refil. Então, no Brasil, a gente ainda tem uma tradição pequena de comprar um produtor para ter uma embalagem, um frasco em que a gente acondicione o produto em casa, mas que a gente possa comprar algo com menor uso de plástico, com menor uso de materiais e com menores emissões também com o refil. A Natura foi a primeira empresa brasileira a usar refil. Até hoje, muito do seu portfólio, boa parte dos seus produtos é feita de refil. Inclusive, quando vocês olharem aqui o ano de 2010, verão que lançamos uma linha chamada SOU em que a própria linha já é o refil. Então, isso garantiu uma diminuição enorme no uso de ativos e de recursos da natureza. Voltando à nossa linha do tempo, há um marco histórico na empresa: ao final da década de 90, decidiu-se voltar toda a carteira e o portfólio para a criação de uma nova linha que fizesse com que o uso da biodiversidade brasileira fosse parte do modelo de negócio. Surgiu, então, a linha Ecos, que é uma linha que traz um modelo em que repartimos benefícios com as comunidades produtoras, sobretudo na Amazônia. Essa linha já tem agora mais de 15 sublinhas e produtos em seu portfólio e garante que haja uma economia que considere a floresta dentro da equação. Então, os frutos e as sementes valem muito mais para a venda e a produção da linha do que valeriam pela madeira que era cortada até então para diferentes finalidades econômicas. A Natura consegue, com isso, fazer com que as comunidades amazônicas possam proteger a floresta e obter ganhos com ela, na mesma linha do que o Prof. Carlos Nobre mencionou, que é uma linha para se buscar reverter o efeito do desmatamento no Brasil. Por fim, nós temos aqui a visão de sustentabilidade. Em 2014, a Natura lançou um documento em que ela se compromete com uma série de compromissos para 2020 e para 2050. Para 2020, a empresa colocou metas, colocou objetivos a serem alcançados, muito pontuais. Vamos passar rapidamente por eles. Para 2050, há uma grande ambição de ser uma empresa geradora de impacto positivo nas esferas econômica, social e ambiental. Para darmos um cenário - não sei o quanto estamos familiarizados com a Natura -, mostramos o tamanho da empresa hoje. Há 1,3 milhão de consultoras no Brasil e mais de 500 mil na América Latina. A empresa já está muito internacionalizada. Temos hoje cinco mil colaboradores no Brasil e 2,5 mil entre as operações da Natura e de outra marca, que é uma marca australiana que também faz parte do grupo Natura. Estamos operando em 30 comunidades de relacionamento da sociobiodiversidade. Essa marca australiana que se chama Aesop - em Brasília, ainda não temos uma loja, mas, em São Paulo, temos duas - opera em 18 países, na Europa, na Oceania, na Ásia e na América. Hoje, a receita bruta da empresa está girando em torno de R$7,8 bilhões. |
| R | A nossa visão de sustentabilidade, publicada em 2014, propõe três grandes marcos, que interagem, que trabalham de forma conjunta. Então, ela busca trazer inovações para marcas e produtos, para gestão e organização e para nossa rede de relações, que somam os nossos colaboradores, as nossas consultoras, nossos fornecedores e as comunidades com as quais nos relacionamos. Em marcas e produtos, o nosso compromisso é, até 2020, movimentar R$1 bilhão na comunidade da Amazônia. Hoje, nós já estamos movimentando R$350 milhões, e essa movimentação de recursos é feita, como lembrou o Prof. Carlos, não apenas com a compra de insumos, mas também agregando valor dentro da Região Amazônica. Então, nós desenvolvemos uma operação industrial dentro da cidade de Benevides, região de Belém, chamada Ecoparque. Mais do que uma atividade industrial relevante para a Natura em si, é uma atividade industrial que busca trazer outras empresas para fazerem o mesmo, aproveitarem os insumos da Região Amazônica dentro da região, agregando valor à região, produzindo itens finalizados, com um volume maior. Com essa iniciativa a gente pretende chegar a R$1 bilhão. Nós temos também a meta de chegar em um número crescente de comunidades. Falando um pouco de 2050, quando a gente olha o final da visão, nós pretendemos que todas as nossas marcas, não apenas Ekos, não apenas SOU, mas todas as 34 submarcas da Natura estimulem a emergência de novos valores e comportamentos necessários à construção de um mundo mais sustentável, ou seja, que elas também tenham causas, tal como a Ekos tem, e tenham práticas disseminadoras de impacto positivo em matéria ambiental. A Natura desenvolveu, em 2007, um programa chamado Programa Carbono Neutro, em que a gente se comprometeu a reduzir em um terço o número de emissões de carbono e em garantir também uma revisão de todo o processo produtivo para gerar menos carbono ao longo do processo. Isso foi obtido em 2013, nós chegamos a essa meta. Dentro de nossa rede, nós gostamos de pensar que vamos contribuir positivamente para o desenvolvimento humano e social favorecendo ações de empreendedorismo e educação. Então, uma das 34 linhas, que eu citei, da Natura é uma linha se chama Crer para Ver. O recurso que a Natura tem com essa linha, que é uma linha de produtos não cosméticos, o lucro é todo renunciado pela Natura e renunciado pela consultora em favor do desenvolvimento de projetos de melhoria da educação do ensino básico no Brasil. Com essa renúncia, nós conseguimos auferir, em média, R$15 milhões ano para projetos de desenvolvimento da educação. É bastante significativa a capacidade de melhoria que a gente tem, sobretudo com professores, diretores de escola e secretários de educação para a melhoria do sistema. Este ano a Natura deu início ao IDH da consultora, a gente chama de Índice de Desenvolvimento Humano da Consultora Natura (IDHCN). Com isso a gente sabe como o nosso corpo de consultoras está com relação à população nacional, como está o índice de educação, como está o índice de saúde, como elas vêm se desenvolvendo. Com isso a gente pode promover ações de melhoria para a sua vida no dia a dia. E a gente tem constatado que as consultoras Natura têm índice de desenvolvimento humano um pouco superior à média do Brasil. A gente quer fazer com que esse índice se torne consideravelmente superior até 2020. Nós temos agora também uma meta de gênero. A questão da equidade de gênero é uma questão muito séria, muito importante, acho que ela vem sendo levada, cada vez mais, em termos de métricas, dentro do mundo público e das empresas também. E nós temos uma meta de ter, pelo menos, 50% de mulheres em cargos de liderança, ou seja, diretoria e acima, até 2020, essa é uma meta muito objetiva. |
| R | As consultoras Natura têm também projetos próprios que elas desenvolvem em suas comunidades, isso é um aspecto importante da sustentabilidade, que é a fixação da pessoa no seu local, com projetos de engajamento coletivo. A Natura reconhece esses projetos e financia projetos de desenvolvimento comunitário. A gente chama essa ação de Prêmio Acolher. Esse é o caso que eu gostaria de falar com vocês com mais calma, meu tempo começa a chegar um pouco ao fim, e eu queria passar um vídeo rápido para a gente ter um tempo para discussão também. Essa é a grande mudança que eu vejo que nós temos, nos próximos anos, em gestão e organização. Como vocês sabem, hoje as empresas medem a sua atividade basicamente pelos ganhos e perdas econômicos que elas têm. Então, elas medem como foi o seu faturamento, elas medem os impactos no processo produtivo. E as empresas de capital aberto, como a Natura e muitas empresas no Brasil, relatam isso ao mercado. As empresas, em matéria ambiental, têm uma dificuldade maior de serem vistas, de serem lidas e de serem comparadas. Essa dificuldade faz com que o consumidor também não possa perceber qual é o ganho ambiental, a escolha ambiental que ele tem ao comprar determinado produto. A gente acredita que, nos próximos anos, a Natura vai fazer parte de um grupo de empresas que consegue relatar, de forma objetiva, ganhos e perdas ambientais. E que esses ganhos e perdas, em algum momento, comecem a se refletir dentro dos produtos e possam permitir às consumidoras e consumidores que eles escolham, que, quando forem decidir por um sabonete, eles possam dizer: "Este sabonete custa R$5, mas custou R$10 para o Planeta; ele custa R$5 em valor econômico, mas, em valor ambiental, custou R$10. Esse outro custa R$7, mas, em valores ambientais, ele custou apenas R$3." E que o consumidor que queira escolher por um produto que possa ser mais caro ou mais barato em termos econômicos, mas também mais caro ou mais barato em termos ambientais, ele tenha como fazer. Então, para começar esse processo, a gente está junto com muitas outras empresas, por enquanto, ainda fora do Brasil: a Puma e várias outras sob a liderança do World Business Council, com uma das quatro grandes auditorias, que é a Price, construindo a matriz de ganhos e perdas ambientais que acarretará, nesse novo cenário, o que eu chamo de contabilidade ambiental. Então, as empresas conseguirão saber quanto custa cada parte da sua cadeia, cada parte do seu processo produtivo para o meio ambiente e conseguirão traduzir isso aos consumidores. Para ilustrar melhor esse estudo, que é um estudo complexo, levou muito tempo, ainda há muitas variáveis em aberto e, para os próximos anos, tem que ser aperfeiçoado, tem que ser compartilhado e difundido, a gente fez um vídeo para tratar de um jeito mais leve de um tema que é complexo de ser explicado. Queria passar esse vídeo para vocês. (Procede-se à exibição de vídeo.) (Palmas.) |
| R | O SR. MARCELO BEHAR - Então, é isso. Acho que esse vídeo foi um vídeo de difusão institucional. Muito obrigado. Bom dia a todas e a todos. (Palmas.) A SRª KARIN KASSMAYER - Muito obrigada, Marcelo, pela sua exposição. Encerramos as primeiras três palestras e, antes de passar às perguntas, apenas um breve comentário. Houve uma intersecção, uma interface bastante interessante entre os três apresentadores sob o aspecto da ciência, o aspecto das políticas públicas, o aspecto de uma nova atuação pelo próprio ambiente privado. As perguntas estão direcionadas: algumas a um palestrante, algumas a todos os painelistas. Eu vou fazer um breve apanhado geral das perguntas, uma vez que nós já estamos com o tempo esgotado. Se eventualmente alguma pergunta ficar, eu peço desculpas. Inicialmente, perguntas direcionadas ao Prof. Carlos Nobre, em termos gerais, relacionadas a: como conciliar o desenvolvimento científico com as atuais burocracias, se a legislação pode eventualmente superar essas burocracias existentes; se atividades como as desenvolvidas por empresas como Monsanto podem se enquadrar ou, enfim, se classificar na terceira via que o senhor expôs; como coibir práticas criminosas na Amazônia?; haveria porventura, através de uma internacionalização dos crimes, uma solução? Essas seriam as perguntas principais para o Prof. Carlos Nobre. Eu peço a gentileza aos palestrantes de realizarem suas considerações em torno de dois a três minutos. E mais uma última pergunta, desculpe: a sua opinião a respeito dos potenciais da agricultura sintrópica. Passo, de imediato, a palavra ao Prof. Carlos Nobre para responder a essas questões. O SR. CARLOS NOBRE - Eu vou tentar ser muito breve, são amplas as perguntas. Eu acho que, sim, é muito importante o marco legal de combate ao crime, na questão da Amazônia, ser visto de modo internacional. |
| R | Mas, infelizmente, as cadeias do crime organizado, muito responsáveis pelo início do processo de desmatamento, que é a invasão da área pública, e aquele primeiro processo: tiram a madeira de lei, roubam a madeira de lei e depois começam a desmatar e levam o gado, quase todo esse processo, mais de 50%, é ilegal, é associado com cadeias criminosas que envolvem o narcotráfico, drogas, armas etc. É internacional e está em todo Brasil, apesar de estar acontecendo na Amazônia. Então, o marco de colaboração entre os países, como já existe, por exemplo, na área financeira, eu acho muito importante. Uma empresa muito voltada para o agronegócio - citaram uma na pergunta, e há várias - pode se interessar pela terceira via? Em princípio, sim. Essas empresas internacionais, multinacionais, gigantescas, têm investimentos em pesquisa de bilhões de dólares - em pesquisa. Só o que elas gastam por ano em pesquisa e desenvolvimento são bilhões de dólares. Elas sempre estão à frente, na fronteira do desenvolvimento inovador de seus produtos. Então, existe, sim, uma possibilidade de que, num grande movimento de ruptura com o modelo de desenvolvimento histórico da Amazônia, que é desmatar, empresas possam enxergar um nicho. O Marcelo mostrou muito bem que a Natura enxergou esse nicho, e não é de hoje. A Natura enxergou esse nicho décadas atrás, e o explora muito bem. O exemplo da ucuuba é fantástico: o valor da fruta é três vezes maior do que o valor do tronco para fazer vassoura. Então, esse é um pequeno exemplo. Esse é um potencial imenso. Agora, é lógico que não se deve contar só com isso. É mais provável, até porque esses gigantes do agronegócio são muito inerciais, que essa terceira via vá muito mais na direção de empresas inovadoras muito jovens. Essa revolução, que nós chamamos de quarta revolução industrial na Amazônia, é também uma revolução de empreendedorismo: convencer jovens empreendedores com ideias brilhantes a acreditar que o valor econômico da biodiversidade e do tesouro biológico é muito maior. Há muitos estudos que mostram isso. Não há nenhuma dúvida que o valor econômico é maior. Agora, precisa gerar uma indústria que depende, sim, de laboratório. Eu finalizo os meus dois minutos com a primeira pergunta. Eu acho que nós estamos aqui na Casa do Povo, no Senado, e é muito importante um refresco - vamos dizer assim - no marco legal. Eu, a minha vida inteira, fui cientista aqui no Brasil, e sei o que é sofrer com uma burocracia pesada. Melhorou. Nós temos um novo Código de Ciência e Tecnologia que ainda está em votação, pelos vetos que surgiram. Em 2015, foi aprovado. Ele é um refresco, mas ainda longe de ser um marco legal que favoreça totalmente as atividades de inovação. Então, há, sim, ainda uma necessidade de mexer no marco legal. Agora, mais do que mexer no marco legal, e essa é a minha última consideração, é o País considerar o investimento em ciência e tecnologia como um portador de futuro, porque o que nós vimos - desculpe, não é uma reclamação, cientistas tem essa fama de sempre reclamar - foi uma queda no gasto em ciência e tecnologia no Brasil, nos últimos três anos, gigantesco. O financiamento do CNPq e da Finep caiu 50% nos últimos três anos. O Brasil não terá futuro, se nós não recuperarmos os investimentos em ciência e tecnologia, a área pública, que é de onde sai grande parte da formação dos cientistas brasileiros. (Palmas.) |
| R | A SRª KARIN KASSMAYER - Obrigada, Prof. Carlos Nobre. Para o Dr. Marcelo, questões relacionadas principalmente à legislação sobre o acesso à biodiversidade. Primeiramente, uma pergunta relacionada à existência ou não, por parte do Estado brasileiro, de um trabalho voltado à conscientização da população amazônica acerca da garantia do desenvolvimento sustentável, do potencial de sustentabilidade da sua região. E se a legislação atual que regulamenta o acesso à biodiversidade pela comunidade científica, pela iniciativa privada, é adequada, se ela estimula essa forma de utilização mais eficiente. E, por fim, uma pergunta relacionada a um tema que não foi aqui exposto, mas é um tema da agenda atual do Congresso Nacional, que diz respeito à proteção aos animais, se a Natura faz teste em animais e qual o posicionamento da empresa quanto a isso. O SR. MARCELO BEHAR - Muito obrigado. Vamos então às três perguntas. A primeira é sobre a conscientização da população da Amazônia sobre desenvolvimento econômico sustentável. Eu vejo que a Natura percebe que, nos últimos anos, vem aumentando, e muito, a conscientização de que existem diferentes modos de se produzir na Amazônia de todas as partes, por parte das comunidades, por parte da população e por parte do Poder Público também. Esse caminho de fortalecimento institucional de uma via que garanta a floresta em pé e que possa permitir o desenvolvimento econômico passou já de um projeto para uma aplicação prática, para um desejo, e agora um desejo de que isso cresça, de que as populações que lá vivem possam se beneficiar da própria floresta para o desenvolvimento delas mesmas, da sociedade e do aparato também que reproduz a vida na Amazônia. Acho que estamos caminhando ainda, há muito a fazer. Outras regiões lidam melhor com isso. Temos um exemplo da Austrália, que tem uma legislação ambiental também muito criteriosa, mas que soube dimensionar os aspectos do desenvolvimento econômico com a questão ambiental. A legislação norte-americana é muito clara também nessa matéria. E vejo que, na Amazônia, a gente tem evoluído nesse sentido. Com relação ao marco de acesso à biodiversidade, é um tema muito controverso. Ele foi objeto de uma medida provisória em 2000, numa visão muito proibicionista, uma visão que via na biodiversidade algo a ser intocado, que gerou aquele modelo contraditório que o Prof. Carlos apresentou muito bem, que apresenta, de um lado, um desenvolvimento econômico que não leva em conta a floresta como parte da equação e, do outro lado, um conservacionismo que é muito importante, mas que não consegue ter efetividade se não der um rumo para a sociedade, para as mais de 30 milhões de pessoas que lá vivem. Essa legislação de 2000 durou muito tempo. Não foi fácil inovar em matéria de biodiversidade com uma legislação que buscava não permitir o uso da biodiversidade. No ano passado, o Senado Federal aprovou uma nova legislação que foi promulgada, que estabelece avanços importantes. Então, o uso da biodiversidade passa a ter a necessidade de ter um acesso público, uma repartição clara de benefícios. A Natura era praticamente a única empresa no Brasil que repartia benefícios com comunidades. Havia duas outras, a Embrapa e mais uma. Então, agora a gente tem a possibilidade de dar um ganho enorme para as comunidades de terem empresas que usam insumos da biodiversidade, sobretudo em cosméticos e fármacos, para que elas possam também fazer com que os investimentos voltem à região e que o uso da biodiversidade se perpetue de forma mais longeva e de forma mais justa. Então, esse eu acho que é um ponto importante. |
| R | A terceira pergunta é um posicionamento também fundamental. Temos a honra de ter conosco o Senador Cristovam Buarque, sentado aqui na plateia, que é autor, foi relator de um projeto de lei de testes em animais. A testagem alternativa é muito importante para a indústria. O consumidor toma cada vez mais consciência de que há coisas que não são necessárias, que não são justas e que é importante que sejam feitas de outra forma. Não, a Natura não testa em animais. Desde que surgiram as testagens alternativas na Europa, há dez anos, a Natura manda a testagem para lá. Incorporou métodos, trouxe métodos de testagem alternativa para cá. Eles ainda são um pouco mais caros do que a testagem em animais, mas a Natura escolhe pagar mais para ter produtos livres de testes em animais. Publicamos isso. Temos uma série de compromissos assumidos. Esse é um próximo capítulo importante para ser difundido para toda a indústria para que não fique restrito às companhias que têm um compromisso com responsabilidade socioambiental, mas que seja um compromisso geral de toda a indústria de cosméticos e de outros setores onde isso for possível. Obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco Moderador/PR - MT) - Eu gostaria de anunciar que, na nossa programação, está previsto, terminando este bloco, um coffee break. Nós não vamos parar para o coffee break. Vamos logo terminar este painel e já convidar os novos palestrantes. Está servido lá. Se alguém assim desejar, pode ir até lá. Se pararmos, podemos atrapalhar ainda muito mais. Então, Karin, há ainda uma pergunta a ser feita. Vamos devagar. Eu preferiria que o pessoal fosse com calma. A gente faz isso em rodízio. Vamos considerar que nós estamos numa churrascaria de rodízio, numa churrascaria bem brasileira. Enfim, para não movimentar todo mundo, vamos fazer isso bem calmamente. A SRª KARIN KASSMAYER - Obrigada, Senador. Então, de imediato, as últimas duas questões para o Dr. Rômulo. Primeiramente, se já existe uma política de reflorestamento da flora, como mogno, cerejeira e outros, e qual o órgão responsável. Por fim, uma pergunta de cunho mais teórico: se é possível relacionar desenvolvimento ambiental sustentável com democracia política e como é possível pensar uma agenda que promova o desenvolvimento ambiental sustentável em um país que se mostra refém dos interesses do mercado financeiro. Antes da resposta, eu gostaria de informar que as apresentações dos convidados já estão todas já disponíveis no site da Comissão Senado do Futuro. É só adentrar o site do Senado, em comissões, e lá vocês vão encontrar o link para a Comissão Senado do Futuro. Obrigada. O SR. RÔMULO PAES DE SOUSA - Eu vou responder à segunda pergunta. A primeira, que é mais específica sobre política do Brasil, eu não poderia contribuir quanto a este tema. Em relação à questão de democracia e sustentabilidade, eu diria o seguinte: é mais do que compatível, é mais necessário. O que pode fazer, na verdade, os governos mudarem a sua forma de fazer política pública, o mercado mudar a sua forma de produzir e consumir é o eleitor, o consumidor e a população em geral entenderem que sustentabilidade agrega valor ao produto, agrega valor à política, agrega valor às práticas sociais. Então, na verdade, para que nós tenhamos mudanças - e esta agenda é ambiciosa, a agenda do desenvolvimento sustentável é muito ambiciosa -, esses atores precisam, na verdade, pautar os seus governos, pautar aqueles que produzem bens e serviços, dizendo o seguinte: "Olha, eu quero isso." |
| R | Deixem-me dar um exemplo para vocês: a Alemanha submeteu a consulta popular se deveria banir o uso de energia nuclear como fonte alternativa de produção de energia do país. E ficou claro no processo de debate que haveria um incremento no preço da energia consumida na Alemanha se isso ocorresse, cerca de 20% na conta. E houve uma opção da população alemã, dos que participaram do processo, votaram e decidiram banir o uso da energia nuclear no país, optando inclusive por um incremento no preço da energia, mas fazem isso entendendo que estão fazendo uma escolha para o amanhã, que, aliás, é o tema deste congresso. Então, na verdade, existe um preço de escolher o amanhã. E isso deve ser assumido de uma forma responsável por todos nós. Portanto, para concluir, eu diria o seguinte: sem o devido engajamento do consumidor, do eleitor e da população em geral, as políticas públicas não mudam e os que produzem bens e serviços também não mudarão a sua lógica de produzir, porque estarão atentos, na verdade, aos concorrentes, etc., e isso sempre vai aparecer. Eu digo em maioria, porque existe a experiência da Natura, que é fabulosa, um motivo de orgulho para todos nós, mas existem outros, na grande maioria, que olham os custos da mudança de paradigma. Então, é preciso que todos nós, nos vários papeis que desempenhamos na vida, também façamos a nossa parte. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco Moderador/PR - MT) - Agradeço aos nossos três palestrantes, Carlos Nobre, Rômulo Paes de Sousa e Marcelo Behar. Nós já queremos convidar os outros três palestrantes, para imediatamente começarmos: Alvaro A. Salas, que é o fundador do Think Tank Democracy Lab; Alfredo Pena-Vega, Pesquisador do Centro Edgar Morin, e também Gilberto Peralta, Presidente da GE do Brasil. E a Karin continua conosco. Vai trocar? (Pausa.) Bom, eu vou passar aqui ao nosso consultor, Habib Neto, que vai também fazer apresentação do currículo dos palestrantes. |
| R | O SR. HABIB JORGE FRAXE NETO - Bom dia a todos. Vamos dar início ao segundo evento. O primeiro foi uma mesa de debates, esse será em forma de apresentação. Vamos seguir a mesma dinâmica do anterior, no sentido de que cada palestrante vai ter em torno de 20 minutos. E, ao final da fala deles, o público vai poder fazer perguntas tanto por meio dos cartõezinhos quanto por meio do Portal e-Cidadania. O primeiro conferencista é Alvaro Salas. Ele é fundador do Think Tank Democracy Lab, um centro de produção e difusão de conhecimento sobre engajamento cívico e uso da tecnologia nas democracias da América Latina. Ele é mestre em Administração Pública e Tecnologia da Universidade de Cornell, onde também prestou serviços como primeiro Presidente latino-americano da Sociedade de Relações Públicas de Cornell. Cursa Doutorado em Gestão Pública, Tecnologia e Governança Colaborativa, na Escola Maxwell de Cidadania e Relações Públicas. Ele é bacharel em Relações Exteriores e em Direito e possui um Mestrado em Administração de Empresas, um MBA, em desenvolvimento sustentável na Escola de Negócios Incae. Alvaro tem atuado como conselheiro especial para dois governos da América Central, também como pesquisador para o Banco Interamericano de Desenvolvimento, para a Divisão das Nações Unidas de e-Governo, para o Laboratório Criativo Grameen e atualmente é consultor para uma grande empresa latina de capital privado americano. Ele é Membro Presidente do Centro de Estudos de Presidência e Congresso em Washington e presta serviços como Assessor Especial do Programa de Cornell na Política de Infraestrutura. Seu trabalho foi publicado no Relatório sobre Parcerias Público-Privadas Inovadoras para o Desenvolvimento Inclusivo do Conselho da Agenda Global para a América Latina do Fórum Econômico Mundial e em diversos jornais. Ele é coautor de livros e artigos acadêmicos sobre a gestão e a política, e foi convidado para apresentar sua pesquisa no Congresso Nacional da Costa Rica, em conferências interativas da Incae Escola de Negócios e no Citibank, em Nova York. Finalmente, na sua apresentação de hoje, ele examina os desafios para o desenvolvimento sustentável, por meio de parcerias potenciais entre governos, empresas, grupos da sociedade civil e indivíduos, já que essa estrutura de colaboração se tornará cada vez mais importante em um mundo globalizado. Com fundamento na crescente interconectividade dos diferentes setores da sociedade, as tecnologias de informação e de comunicação podem desempenhar um papel crucial nas estratégias de desenvolvimento sustentável na América Latina. Com a palavra o Sr. Alvaro Salas. O SR. ALVARO A. SALAS (Tradução simultânea.) - Então, primeiro, eu quero agradecer ao Senador Wellington Fagundes por nos receber hoje no Congresso do Futuro. Eu sou Alvaro Salas, eu sou Diretor-Executivo do Democracy Lab, que tem parceria com várias universidades das Américas, a Escola de Administração de Harvard, a Universidade de Cornell, a Universidade de Syracuse. Esse laboratório da democracia trabalha para informar e engajar cidadãos com políticas importantes através de canais não tradicionais. |
| R | Como podemos envolver os cidadãos na formulação de políticas complexas? Nós usamos arte, moda, música, fóruns. Agora, nós estamos projetando um festival de moda na América Latina, a supermodelo Leonora Jiménez está participando. Essas são coisas que nós temos desconsiderado hoje. Então, através dos anos, nós desenvolvemos uma agenda de pesquisa em diferentes áreas de parcerias público-privadas, investimento em pactos, governo digital, governança colaborativa e igualdade de gênero. Então, hoje, como disse em minha apresentação, vamos falar dos desafios do desenvolvimento sustentável na América Latina. Eu quero agradecer à Rebecca Gilovich, uma das nossas fellows, que ajudou com essa pesquisa e apresentação. Hoje, vamos examinar esses desafios futuros, principalmente do ponto de vista das parcerias potenciais entre governos, o setor privado e a sociedade civil, através de um marco de colaboração, que será cada vez mais valioso neste mundo globalizado. A pergunta é: como lidar com os desafios do futuro na América Latina, com diferentes instituições, com diferentes penetrações de banda larga, com diferentes visões, que variam entre vários países? Alguns países têm mercados financeiros desenvolvidos, como Brasil e México; outros não têm, como Costa Rica, o meu país, ou a Nicarágua. Então, quais são os desafios que queremos tratar? Esses são os quatro principais desafios que vemos como os mais importantes de mitigar e atacar em nossa região. Esses desafios estão interligados, permitindo investimentos. Negligenciar esses desafios pode pôr em risco o nosso futuro. Então, tenham paciência aqui com o gráfico. Se tivermos as condições certas, o investimento na educação pode aumentar a mobilidade social, mas, para investir na educação, nós temos desafios de infraestrutura e comunicação, possibilidades de infraestrutura, em termos de acesso à internet, penetração da banda larga e acesso. O que pode, então, melhorar a situação de um país se os investidores... Por exemplo, vejamos o Brasil. Se o Brasil e região são vistos com bons olhos, que as instituições do local vão proteger os seus direitos de propriedade, nós podemos ver bons investimentos diretos e a criação de empregos muito bons. Mas o que está ameaçando esse marco? O crescimento mundial da população tem sido exponencial dos anos 1950 a 2000. Nós vemos que este é um desafio que nós temos que tratar: a superpopulação da sociedade. E eu quero mostrar um gráfico que vai mostrar a complexidade num cenário bem simples. Imaginem que as pessoas aqui - aqui nós temos um pouco mais de cem pessoas, talvez - representem o mundo. Apenas sete dos cem teriam acesso à educação; doze teriam acesso à internet. Isso põe em perspectiva os nossos desafios. A América Latina não é uma exceção. Essas questões são reais. Então, como podemos tentar entender isso de uma perspectiva diferente? |
| R | Nós temos, então, que mudar aqui para a lente do setor privado a questão do PIB. Nós vemos que a taxa de mercadorias do mundo está aumentando exponencialmente e a previsão para 2040 é ainda maior. Essa é uma oportunidade para a área, mas temos o desafio de melhorar nossas políticas, desenvolver o potencial humano nas universidades, e as nossas tradições, os nossos dogmas sociais. Por exemplo, a expansão do Canal do Panamá. Só essa expansão está afetando a indústria de caminhões, de logística, de exportação. Não impacta somente na passagem de navios maiores no canal, mas impacta o mundo em várias questões. Como as universidades, então, podem preparar melhor os alunos para lidar com essas questões e como o governo e o setor privado podem se juntar para serem mais eficientes em relação a isso? Os países latino-americanos, como a Costa Rica, o meu país, dependiam muito da agricultura antes, mas agora estão exportando microchips, estão exportando conhecimento. Isso é muito importante para entender que há empresas agora, como a Intel Boston Center, que têm a sua central nesses países, mas eles precisam de um capital científico aqui no Brasil, os melhores engenheiros, etc. E isso cria desafios potenciais para a nossa região. Outro desafio é a organização. Como vocês podem ver, isso afeta exponencialmente não apenas o nível de eficiência nos cidadãos cosmopolitas, mas também a pegada de carbono. E é imperativo investir em um transporte público confiável para termos um fazer valer da lei, um entendimento melhor dessa questão. Então, passemos para um contexto mais específico, para apresentar alguns casos sobre os quais eu quero que vocês pensem. A materialização das transações. O que eu quero dizer com isso? Nós temos uma tecnologia que se torna mais ubíqua. Então, nós podemos ter mais transações remotas, compras on-line, entretenimento on-line, até o trabalho on-line tem reduzido o espaço dos escritórios. Um dos meus colegas de 33 anos passa 60% de seu tempo trabalhando em um Starbucks, em Nova York, de pijamas. Nem vai para o escritório e desenvolve transações em toda a América Latina. Como isso pode impactar e mudar a dinâmica? E eu quero falar disso hoje, porque não são apenas as relações entre as diferentes instituições, mas também a necessidade de tecnologia para a qual podemos estar ou não preparados. Vamos voltar para os quatro desafios. Eu quero que vocês mantenham esse contexto em mente, a interconexão da lei, dos riscos da mobilidade social e da educação. Podemos perguntar por que esses desafios impedem que os atores regionais aproveitem esses desafios do crescimento. Em outras palavras, quais são os fatores cruciais para o desenvolvimento sustentável? Eu vou ser muito breve: nós somos uma das regiões mais desiguais do mundo, a América Latina. E nós temos que tratar dessa questão. A economia baseada no conhecimento está crescendo. Quantos de vocês já usaram o Uber para o transporte aqui? Um, dois, três, quatro, cinco, seis... Uau! Metade do público. E isso vai crescer. Um aumento de necessidade de trabalhadores que tenham a habilidade de lidar com essas tecnologias vai mudar a maneira de forma que a oferta e a procura determinam os recursos. |
| R | Agora estamos desenvolvendo não recursos agrícolas, mas de conhecimento, e há responsabilidade das instituições públicas e dos líderes visionários, como o Senador, que está tentando envolver diferentes partes interessadas para entender esses desafios. Temos que desenvolver essas práticas progressivas porque temos que desafiar essa cultura de que, na América Latina, na Costa Rica, produzíamos só café e bananas. Agora estamos exportando microchips porque os líderes sentaram com os acadêmicos, com os estudantes para entender essas questões e levar essa agenda adiante. Então, para concluir minha apresentação, porque eu quero ser breve, o problema principal com a mobilidade social é que não podemos lidar com isso sem investimento na educação, para não apenas aumentar o acesso, mas também responder às demandas do mercado atual de trabalho. Ensinamos o Dom Quixote para os alunos, é importante a Literatura, mas agora precisamos de mais cientistas, estatísticos e temos talvez que repensar as horas alocadas para cada coisa. Eu sou cientista social. Eu acho que as artes são muito importantes, mas o mercado também é muito importante entender. Então, particularmente, no nível universitário, nós temos que melhorar para alcançar as demandas dessa nova estrutura econômica. Os benefícios sociais e a educação não são nada de novo e há preocupações em relação a criar investimentos significativos na educação. Se houver uma limitação dos fundos governamentais, nós podemos usar parcerias público-privadas na América Latina para lidar com isso, talvez novas oportunidades de uma educação mais importante para as nossas crianças. Nós temos que explorar isso com transparência, responsabilização e um lado humano. Nos Estados Unidos, eu trabalhei para duas universidades, como eu disse, uma é a Cornell, a outra é Syracuse. Em determinado momento, esse país estava em 19º lugar no PIB per capita, mas não havia nenhum outro país com o número comparável de universidades das mais importantes do mundo. E o investimento em universidades é o que permite que as universidades americanas sejam muito superiores às outras. É importante pensar isso na América Latina porque os fundos geralmente vêm do PIB ou do setor público, mas isso não é sustentável a partir de certo ponto. Então, nós temos que pensar como alocar diferentes áreas e trazer os melhores alunos às nossas universidades. E, nos desafios, nós temos uma lacuna de infraestrutura, nós temos desafios semelhantes no Rio e na Costa Rica. O povo da Costa Rica diz que o turismo para em Guanacaste devido às dificuldades do trânsito. Isso é importante, isso pode ameaçar os investimentos estrangeiros que criam empregos com as empresas que vêm de fora. Então, é importante colaborar, mas isso requer imensos investimentos de capital, que a maioria dos governos não podem financiar. Para isso, temos que prover os canais adequados de interação, transparência e comunicação para envolver os cidadãos, para entender o que está acontecendo nessas transações e também servir como uma supervisão dele. |
| R | Voltando à questão da interconectividade e os desafios do desenvolvimento sustentável na região, os mercados estão mais voláteis. Por exemplo, para mim, as PPPs sem o ceticismo da supervisão dos cidadãos não poderão institucionalizar a transparência do governo e o fazer valer da lei. Então, nós temos que ter um investimento na infraestrutura da América Latina para manter esse ritmo. Estamos competindo hoje com um mercado globalizado, Vietnã, Coreia do Sul. Nós temos que tratar dessas questões, e esse é um desafio intersetorial envolvendo todas as pessoas que estamos vendo aqui hoje. Também precisamos de marcos legais adequados para proteger esses tipos de investimentos. Eu quero terminar com um lado positivo, que são algumas soluções propostas. Tecnologias de comunicação e informação, trazer a supervisão do cidadão. Para isso, aqui nós temos o Presidente da Nicarágua, Ortega, e a concessão do canal seco na Nicarágua. Isso foi feito sem uma supervisão do cidadão ou do setor privado, distorcendo o mercado, criando essa matriz de informação. Então, como lidar com essas questões? Como tornar os dados e as informações mais acessíveis para os cidadãos e como fazer os cidadãos entenderem esse tipo de questão? Não apenas melhorando a transparência, mas também o processo de pensamento criativo do cidadão para entender esse tipo de acordo. Está aí. Lembram desse marco no início? No meio, eu não tinha as TICs, as tecnologias de informação e comunicação, mas agora estão no centro porque a evidência de diferentes países em desenvolvimento mostra que as TICs podem interligar essas questões. Um exemplo claro é a Regulação Room, iniciativa do Presidente Obama, em que estão institucionalizando um Senado on-line e uma plataforma on-line, discutindo suas questões de políticas com acadêmicos e cidadãos, questões como igualdade de gênero, saúde, infraestrutura, educação. É uma plataforma on-line com moderadores profissionais, o que reduz muito o custo das decisões, além de ser divertido, eficiente e transparente e onde todas as partes podem ver o que está acontecendo na conversa. Outro exemplo de aplicativos inovadores e inovação na comunicação em aplicativos como o Uber é que eles aumentam a eficiência das forças do mercado e mantêm responsabilizáveis as partes interessadas. Então, você responsabiliza tanto o motorista como o passageiro com o sistema de notas, de estrelas que são dadas. Isso talvez possa ser aplicado em alocações de outras políticas da região. Então, essa responsabilização usando TICs talvez possa ser replicável em uma escala maior. Alguns casos do setor público: no Chile, por exemplo, nós temos o Ciudadano Inteligente, que é muito baseado no sistema da Coreia do Sul; no México, nós temos a Compranet, onde eles revelam suas ações, as compras do governo; o e-government, público, na Colômbia, com acesso aberto para cidadãos, que sabem onde vai o dinheiro do contribuinte ou quando os impostos vão para a segurança ou diferentes áreas. Então, os usuários têm essa informação e podem também prover sugestões, diferentes fontes para tratar os problemas. |
| R | E, finalmente, eu quero falar de uma PPP bem-sucedida na educação. Essa mulher é Michelle Mucheta, ela é minha amiga. Em 2012 eu fui aceito na Universidade Cornell para meu mestrado em Ciência e Tecnologia. Eu era estudante havia poucos anos, como muitos de vocês, e eu não tinha condições financeiras - eu não tenho U$100 mil na minha conta. A minha oportunidade surgiu do fato de eu ter uma banda de rock na Costa Rica, e nós, músicos, termos criado uma plataforma. Fizemos um crowdfunding, usamos a tecnologia para receber esse dinheiro. Basicamente, usamos a arte e a música para abrir portas para as partes interessadas e buscar a mídia local e internacional. Para resumir, em noventa dias nós levantamos U$100 mil. E a promessa era trazer uma política público-privada mais institucionalizada para trazer mais mulheres da América Latina para as universidades nos Estados Unidos, porque elas são a minoria nos nossos países, e os dados mostram que elas têm um desempenho maior que o dos homens e são melhores administradoras, especialmente nas finanças. Para tratar da lacuna na igualdade de gênero, nós temos que ter mais acesso para as mulheres estudarem e fundos para isso. Então, nós fizemos uma parceria com os governos do Panamá e da Costa Rica. Eles estão discutindo com os outros governos da América Latina para levar mulheres como a Michelle para estudarem no exterior e voltarem para o seu país para aplicarem o que aprenderam de tecnologias de informação e comunicação, desenvolvimento sustentável e fazer valer a legislação. Hoje a Michelle é responsável pela alocação de U$30 milhões nesses tipos de questões no Panamá e ela teve acesso através dessas parcerias. Então, como institucionalizar isso nas escalas maiores? Agora nós temos parceiros como o Google na Universidade Cornell e outros líderes do setor privado, porque são necessários burocratas de altas habilidades do outro lado também, gerenciando essas questões, para uma maior eficiência. Basicamente, essa foi a minha apresentação. Só quero encerrar com o comentário de que, se alguns de vocês estiverem interessados em fazer parte desse processo no Brasil, para retornar ao seu país e agregar valor ao conhecimento e diferentes processos, se vocês quiserem estudar no exterior com essa oportunidade das parcerias político-privadas, falem comigo, eu terei prazer em informá-los - talvez alguns de vocês estejam estudando na Cornell e voltem para a próxima conferência aqui no Brasil para explicar essas questões! Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco Moderador/PR - MT) - Agradecemos ao Alvaro pela apresentação e vamos passar agora a palavra para o próximo palestrante, que é o Alfredo Pena-Vega. Ele é Doutor em Sociologia pela Universidade de Paris, Pesquisador do Centro Edgar Morin, do Instituto Interdisciplinar de Antropologia Contemporânea, e leciona na Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais da Universidade de Nantes. |
| R | Ele tem realizado trabalhos em Socioecologia sobre a percepção de desastres e sobre os problemas ambientais resultantes de contaminação radioativa de Chernobyl em territórios contaminados na Bielorrússia, na Ucrânia e em Fukushima, no Japão. Alfredo é Diretor Científico do Pacto Global Youth Climate, acreditado pela 22ª Conferência das Partes da Conferência do Clima e está envolvido em um projeto de pesquisa sobre jovens insulares e a crise da Europa. Ele é colaborador de Edgar Morin desde o início dos anos 1990 em vários projetos europeus de pesquisa, incluindo sustentabilidade por meio da economia ecológica e aspectos econômicos e sociais do meio ambiente. Ele é responsável científico de várias universidades europeias pelo Instituto Internacional de Pesquisa, Política e Civilização. Recebeu, em 2016, o prêmio do Senado da República da França por seu trabalho sobre a mudança climática. Na sua reflexão de hoje, ele se baseia na observação dos limites das práticas atuais de desenvolvimento. Diante da crescente complexidade dos problemas ambientais, ele analisa a inadequação de ações que se baseiam em uma visão linear de desenvolvimento. Ele analisará a necessidade de superar o dilema simplificador desenvolvimento versus degradação ambiental e a necessidade de uma nova relação entre a humanidade e a biosfera. O SR. ALFREDO PENA-VEGA - Bom-dia a todas e a todos. Eu vou falar de pé e vou tentar trazer meu ponto de vista sobre o que está acontecendo no Planeta. Primeiro, quero agradecer o convite. Eu acho que este primeiro Congresso do Futuro no Brasil é de grande importância. Primeiro, porque ele está em um momento crucial, o País vive uma crise profunda e, normalmente, quando uma sociedade está em crise, a primeira coisa que se faz é tentar resolver a crise e não olhar para o futuro. Eu acho que esta oportunidade de poder falar sobre o futuro é uma grande opção para trazer não soluções, mas algumas ideias para pensar. Eu vou tentar demostrar qual é o meu ponto de vista sobre o que são os temas. E vou dizer, de entrada, que talvez esteja um pouco não em desacordo, mas vou dar outro ponto de vista em relação ao que se falou até agora. Eu acho que já está feito o diagnóstico mundial sobre a situação e sobre o que, desses trinta anos para cá, tem trazido o desenvolvimento sustentável. |
| R | Ou se não está feito, precisa ser feito. Acho que nós perdemos uma oportunidade muito grande quando o Brasil organizou a Rio+20. Quando o Brasil organizou a Rio+20, infelizmente não se fez o balanço dos vinte anos do desenvolvimento sustentável. E eu acho que há uma dificuldade para se representar e para tentar, justamente, elaborar, como se falou aqui de manhã e agora há pouco, políticas públicas em uma situação em que não se tenha feito esse diagnóstico. Então, o que eu vou propor a vocês? Eu vou propor uma linha de discussão para depois, na discussão que vamos ter agora, mas também pode ser pela internet. Eu vou apresentar a vocês a minha postura frente a essa falta de diagnóstico no que diz respeito ao desenvolvimento sustentável. E eu vou ter algumas dissonâncias com algumas ideias que já foram jogadas aqui pela manhã. Eu não falo bem português, mas vou tentar não massacrar a língua de João Pessoa. Vou tentar mostrar a vocês na língua de vocês, para que nos entendamos melhor. Aliás, eu peço desculpas, porque fiz uma tradução do português ontem à noite. Não tem revisão. Por isso, deve haver muitos erros, mas a ideia é que vocês também possam acompanhar. Depois vou corrigir se for feita uma publicação. Mas eu quis mostrar as ideias que eu quero compartilhar com vocês. Eu acho que nós temos seis ou sete grandes desafios para tentar ver o que pode ser, no futuro, o desenvolvimento sustentável. Podem ser mais do que sete, eu apontei os que eu acho que são importantes de discutir. Alguns já foram aqui apontados, mas eu vou dar meu ponto de vista. O primeiro desafio hoje, que é um desafio global, é a situação da crise. Nós estamos vivendo uma crise, mas não é uma crise: nós estamos vivendo uma "multicrise". E essa crise, com efeitos diferentes, com impactos diferentes, com consequências que vão ser diferentes, a gente pode observar não somente na América Latina. Por isso, minha fala não está focalizada unicamente na América Latina, mas em outras regiões do mundo. Nós não podemos desconectar a América Latina do resto do mundo, isso é impossível. Nós, na América Latina - estou aqui na América Latina -, vivemos uma crise. E não é uma crise de ontem, é uma crise que vem já de muito tempo. E essa crise se acrescenta a outras novas crises que têm surgido nesses últimos anos. A prova é que vocês estão em uma profunda crise, não uma profunda crise política, mas você está em uma profunda crise, uma "multicrise". |
| R | Então, o que nós sabemos? O diagnóstico já foi feito hoje de manhã, o Professor Nobre falou e outras pessoas também confirmaram, o diagnóstico mundial está feito sobre a maior crise que nós temos que enfrentar, que é a crise do clima. Então, nós sabemos perfeitamente bem qual é a situação. O Professor Nobre colocou a situação da Amazônia, mas podemos também ver a situação da Europa, de regiões da Europa, a situação da África, que é uma situação muito crítica. Nós temos esse diagnóstico, está feito. Agora, qual é a pergunta? E ele colocou perfeitamente bem, é aí que está a discussão entre nós: não tem, por enquanto, uma via aberta. Por enquanto, não tem uma via... Vamos dizer, vamos escolher entre o que ele falou, desenvolvimentista ou consumista, ou protecionista e vamos escolher a terceira via. Não se sabe. Por que não se sabe? Porque nós temos um elemento importante de que nós esquecemos de falar nesta perspectiva de pensar o futuro. Nós esquecemos de falar que nós estamos num processo de incertezas, e nós não temos, até agora, a possibilidade de integrar essas incertezas para poder pensar o futuro, porque nós, até agora, temos vivido só de certezas. Nós não queremos integrar e não queremos enxergar que nós temos hoje muitas incertezas, entendeu? Então, eu acho que esse primeiro desafio é um desafio de hoje, de poder ver como a gente enfrenta as crises. E as crises são de várias dimensões, elas são multidimensionais: crises ecológicas, que nós vivemos; crise social, que nós vivemos na Europa; crise institucional, que nós estamos vivendo na Itália, que estamos vivendo no Brasil; crise ética - podemos falar muito -; e, enfim, aí vão se acrescentando as crises. Então, um dos primeiros desafios, dentro do que a gente tem que tentar elaborar de saídas, vias diferentes, um dos primeiros desafios é o desafio de contextualizar e de analisar as crises. E, aí, vocês vejam a complexidade do sistema. Eu simplesmente coloquei uma imagem. O problema dessa dificuldade de poder enxergar essa "multicrise" está na maneira como nós temos compartimentado nossas visões, e essa compartimentação não se dá simplesmente no mundo da educação, no mundo da universidade, ela se dá também na cabeça dos decisores políticos. Os decisores políticos têm uma visão compartimentada, não têm, eu diria, uma atitude de inter-relacionar aquilo que eu coloquei nesse gráfico, que seriam os fatores globais da crise e as principais inter-relações desses fatores globais das crises. Aqui, o que eu coloco? Aqui coloco, simplesmente, que tudo está inter-relacionado: uma crise de saúde, uma crise política, uma crise econômica, uma crise ecológica. Tudo está inter-relacionado, e temos dificuldade - não somente o decisor político, mas também o próprio pesquisador - de inter-relacionar essas crises. |
| R | Então, a questão seria: diante desse primeiro desafio, como a gente pode garantir - trata-se de garantir - mais bem-estar, uma melhor situação para as nossas gerações futuras? E eu não esqueço, quando falo de gerações futuras, evidentemente, de nossas gerações presentes. Geralmente nós falamos só de nossas gerações futuras, mas nossas gerações presentes também não têm hoje... Atualmente, se vocês observam a situação de diferentes países da América Latina e a situação de diferentes países da Europa, percebem que hoje as gerações presentes não têm garantido o futuro, não têm um futuro garantido. Então, eles estão frente ao que chamo de um... (Ininteligível.) ... um futuro que é, por enquanto, sem futuro. Um futuro sem futuro. O primeiro desafio é repensar, analisar as crises. O segundo desafio é o desafio de pensar. Eu acho que as coisas não são assim de maneira linear como foi colocado hoje, aos poucos, de manhã. Nós precisamos saber pensar. Nosso modo de pensar tem que mudar e, nesse desafio, evidentemente, eu não vou esquecer que nós temos que fazer a interação entre aquilo que seriam as ciências e as tecnologias. Só que ciência e tecnologia, no novo modo de pensar, evidentemente, fazem emergir novas perguntas, e nós temos que ter, também para essas novas perguntas, novas soluções. Então, há o grande desafio de achar os mecanismos para poder ter uma nova forma de pensar, para tentar justamente integrar aquilo que é de uma grande complexidade. Mas não é complexa simplesmente porque é uma situação complicada. É complexa porque existe uma verdadeira complexidade no sistema. Nós temos que ter uma outra forma de pensar para enfrentar essa nova situação. Terceiro desafio. Eu diria que o terceiro desafio é um desafio ético. Aqui foram colocadas algumas ideias. É muito importante uma empresa ética - é muito importante uma empresa ética -, mas o que é importante é que na sociedade possa se desenvolver uma postura ética, uma visão ética, um pensamento ético e uma atuação ética, porque a sociedade precisa hoje da ética. Precisamos de novos valores, precisamos do respeito do outro, precisamos de liberdade, precisamos de fraternidade - não a temos -, precisamos de direito. |
| R | Precisamos, enfim, de uma maneira de poder viver esse tipo de desafio, que é o desafio ético. E esse desafio ético não é simplesmente um desafio ético na sociedade, é um desafio ético também nos decisores políticos, porque, se as decisões políticas se fazem de uma maneira antiética, como você vai querer que a sociedade possa ter um comportamento ético? Então, temos que ter, no terceiro desafio que eu coloco, um lugar importante para a questão ética. Pensar o futuro é pensar a ética e pensar a ética do futuro. Terceiro desafio. O terceiro desafio é o que eu chamo o desafio de uma política de governança mundial, global. E aqui há dois ou três pontos que são importantes. Nós não paramos de falar da globalização, nós não paramos de falar da mundialização. Do que nós necessitamos hoje? Nós necessitamos humanizar a globalização, nós precisamos humanizar a mundialização. E como a gente tem que humanizar a globalização e humanizar a mundialização? Bem, eu acho que a forma de poder humanizá-la é poder também pensar que a globalização se forja, se cria, se enriquece na ação local. Nós precisamos ter uma humanização da globalização não simplesmente em nível mundial, mas nós precisamos também humanizar a globalização em nível local. E, para isso, para humanizar a globalização em nível local, nós precisamos repensar a democracia, porque a democracia atua no local. Se nós não humanizarmos a globalização em nível global, nós não vamos conseguir poder humanizar em nível local a democracia. Eu acho que aí há um aspecto importante. Eu diria que uma das ações importantes para pensar o desafio da política global é abrir um caminho, aquilo que os senhores chamam abrir um caminho para uma democratização da democracia. A democracia hoje já não é mais aquela palavra que nós pensávamos, que era uma palavra que nos trazia verdadeiramente uma certa certeza. Hoje, a palavra democracia traz muitas incertezas. Você pode observar aquilo que está acontecendo, principalmente na Europa. |
| R | Nós somos países da democracia, mas, em cima dessa democracia, verdadeiramente há uma contestação importante da sociedade civil sobre a forma da democracia e há algumas tendências mais retrógradas que recuperaram esse mal-estar para impor uma outra forma de democracia, que não tem relação e não é compatível com a nossa sociedade de - eu diria - fraternidade e uma sociedade de liberdade. Então, eu acho que, para poder repensar também o desenvolvimento sustentável, é bom pensar no desafio da política e da governabilidade global. Quarto desafio. Aqui se falou bastante - e eu tenho uma dúvida sobre esse desafio, sobre o que se falou e o que eu acho na verdade - do social. Acho que há um pequeno problema para justamente caracterizar o que é o social. Nós precisamos, primeiro, entender perfeitamente bem que uma sociedade não se compõe pela soma de todos. A sociedade não é a soma de todos. A sociedade, o que é? A sociedade é feita por pessoas como eu e você, e nós precisamos, nesse desafio social, saber qual é nosso lugar hoje, como indivíduo na sociedade. Quando você pega alguns dados - eu não quis colocar, porque já se falou de dados aqui - e você vê, por exemplo, o caso da América Latina: 40% de jovens na América Latina não têm informação e não têm educação, 40%! Então, não é um desafio social de pensar em outra forma de desenvolvimento? O mito do desenvolvimento sustentável - porque, para mim, foi um mito - está sobre três pilares: o pilar meio ambiente, o pilar econômico e o pilar social. Ora, nós constatamos hoje, nós percebemos hoje que o pilar social fracassou. Quarenta por cento de jovens na América Latina sem informação, sem educação é enorme! E não vou falar do número de desempregados. A taxa de desemprego na América Latina é impressionante. Eu acho que aí há um ponto para se questionar e para saber como podemos reformular o desafio social para podermos ter uma sociedade - não uma sociedade de exclusão, mas uma sociedade de inclusão. Hoje de manhã, falou-se na diferença enorme que existe entre aqueles que ganham dois, três, dez salários com relação ao número dos que ganham só um salário. Há uma desigualdade que está em todos os relatórios de todos os economistas, dos mais inteligentes, há uma realidade que temos de enfrentar. Aqui vou voltar dois segundos, somente para lembrar que não somente na América Latina, mas também na Europa há uma tendência em quererem nos vender grandes tratados de livre comércio. O último aqui na América Latina é o Tradado de Livre Comércio do Pacífico. Pegue o Tratado de Livre Comércio, só para você ter a informação e para que você veja que a gente não fala por falar. É informação. No Tratado de Livre Comércio, você não tem em nenhum lugar uma nota, digamos, uma parte do Tratado que diz "o Tratado de Livre Comércio entre os países do Pacífico da América Latina e o Pacífico da Ásia vai proteger o meio ambiente, vai dar prioridade à inclusão social". Não há. Só há, dentro do Tratado, as relações comerciais. |
| R | Então, quando vem essa oportunidade, que pode ser uma boa oportunidade também para enfrentar essa crise, de poder ter uma economia aberta - eu não sou por uma economia fechada, não sou para fechar as fronteiras, mas tem de ser uma economia que tenha respeito pelo meio ambiente, que tenha respeito pelo aspecto social, que tenha respeito pelo aspecto ético e que tenha respeito pelas decisões democráticas de um país. Se um país não quer aceitar essa regra, simplesmente não aceita, e o país é soberano para não aceitar. O quarto desafio, que eu chamo de desafio ecológico - e aí eu falo sobre um ponto importante que é o despertar da consciência ecológica dos jovens principalmente. Aqui se falou, de manhã, e mostrou-se o diagnóstico. Fez-se uma prospectiva para o futuro no que diz respeito à Amazônia. Há uma consciência dos jovens do que vai acontecer se não há uma política pública em proteção dessa parte importante do nosso Planeta? Há uma tomada de consciência? Há uma possibilidade de explicar aos jovens nas escolas qual é o perigo se nós vamos em direção a uma solução, eu diria, de destruição dessa parte do Planeta? Há uma tomada de consciência do jovem? Eu acho que aí há, verdadeiramente, um aspecto importante para colocar nossos esforços e poder mostrar que dentro do desafio, o desafio da tomada de consciência ecológica é importante - e essa tomada de consciência da ecologia é um papel que os jovens devem ter, deve ser a bandeira das novas gerações. Aqui eu vou mostrar para que vocês vejam que o que eu falo tem sentido. Eu sou Coordenador Internacional de um projeto, o Pacto Mundial Jovens pelo Clima, em 20 países, inclusive no Brasil. Nós mobilizamos mais ou menos 12 mil jovens nos 20 países. Nós perguntamos aos jovens: qual é a percepção que vocês têm do futuro com relação ao problema da mudança climática? Vocês vejam, simplesmente que aqui há uma comparação entre jovens de língua francesa e jovens de língua inglesa. Eu poderia ter colocado também o jovem de língua hispânica. Infelizmente, por problema de orçamento, não pudemos fazer essa experiência, esse debate no Brasil, mas os jovens participaram. |
| R | Então, vejam: Qual é a visão que tem o jovem do futuro? Qual é a visão que tem o jovem da crise? Qual é a visão que tem o jovem, evidentemente, da questão ambiental, da questão econômica? Dentro da minha avaliação, do meu diagnóstico - que é ótimo/pessimista, eu diria -, há uma possibilidade e há uma via possível. Vou terminar dizendo que a via possível é a educação. Nós temos de ter hoje, dentro do desafio, uma... A educação deve ter um papel muito importante. E não é a educação simplesmente como se dá hoje. Eu acho que aí há também um desafio importante para se pensar outro tipo de educação. Acho que o modelo de educação em que você ouve o professor durante duas ou três horas está esgotado. Nós temos de pensar outra forma de educação, uma educação que eu chamo de educação criativa, em que os jovens seriam atores presentes daquilo que eles estão pensando do futuro. Eu vou concluir dizendo que, evidentemente, a via não é uma via aberta. A via hoje é uma via que não sabemos para onde vamos. O que quero dizer com o que eu coloquei aí é que o futuro é incerto, mas não é porque o futuro é incerto que nós temos de viver na angústia, no medo ou na negação das coisas. Nós temos de viver num futuro incerto com otimismo e dizer o que nós estamos pensando para tentarmos saber como vai ser o nosso futuro. Vou terminar, eu diria, com uma palavra, mas uma palavra que nós aplicamos em nossas pesquisas. Essa palavra que nós aplicamos em nossa pesquisa é a palavra "ação". Estamos aplicando essa ação numa sociedade que está também sem futuro, uma sociedade que já viveu uma profunda crise - profunda crise! - e que hoje quer enfrentar o futuro. Essa sociedade se chama a sociedade da Ilha de Páscoa. Estamos trabalhando com jovens na Ilha de Páscoa através dessa palavra. O desafio do amor. Eu coloquei em francês e vocês vão ver o porquê de estar mais em francês. Nós temos de trabalhar com amor, temos de fazer o amor em todo canto, em qualquer lugar, fazer o amor. E o que é o amor? O amor é a autodurabilidade do nosso sistema. Nosso sistema tem de ser, evidentemente, durável e tem de ter uma mobilização cidadã. O cidadão tem de se mobilizar, tem de participar. E não pode ser somente a retórica de dizer: "Ah, existe uma democracia participativa em todos." Não, tem de participar de fato. Então, mobilização cidadã. Temos de ter outra visão para reorganizar nossos recursos naturais - e aí temos de pensar se, verdadeiramente, o desenvolvimento sustentável é a via ou se existe outra possibilidade. Além disso, a utopia: nós temos de viver com utopia. Não podemos não ter utopia, senão nossa existência humana acaba. Se não tivermos mais utopia, como vamos poder nos projetar a fazer um futuro? Nós temos de ter utopia, e o problema é que hoje não temos utopia. Temos de ter utopia! |
| R | A finalidade do amor é a responsabilidade ética. E a questão da responsabilidade não é tão somente um slogan, mas é uma realidade. Se não nos damos responsabilidade ética, então simplesmente estamos em uma situação de impasse, uma situação, eu diria, de grande pessimismo, porque acho que, se nós não temos a possibilidade de dar uma responsabilidade aos outros, é melhor ir para casa. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. HABIB JORGE FRAXE NETO - Muito obrigado, Alfredo. Queria lembrar aos nossos ouvintes que nós teremos espaço para perguntas ao final da última apresentação. Então, queria incentivá-los a aproveitar a presença destas pessoas aqui. O Prof. Alfredo veio lá da França com uma apresentação que está nos chamando a pensar sobre temas que vão muito além do que estamos normalmente acostumados a ouvir. Nós tivemos também o primeiro palestrante, Alvaro, com informações muito interessantes de como podemos superar esse modelo de que a América Latina vai ser sempre produtora ou fornecedora de produtos agrícolas, e de como podemos fazer esse salto em relação a uma sociedade baseada em recursos do conhecimento. Vamos ouvir agora uma pessoa que praticamente fez a carreira numa empresa do setor de energia - quando a gente trata desses temas do desenvolvimento sustentável - do porte da General Electric. Eu vou ler o currículo do Sr. Gilberto Peralta. Mais uma vez, eu lembro que vocês podem encaminhar perguntas para que, ao final da fala do Gilberto, nós possamos passá-las aos palestrantes. Estou dizendo isso porque não recebemos nenhuma pergunta de vocês ainda. É uma oportunidade que vocês têm. Muitos aqui vêm de universidades e, por isso, gostaríamos de motivá-los a utilizar este espaço de debate. Temos alunos da Universidade de Brasília, do Centro Universitário IESB, da União Pioneira de Integração Social (Upis), das Faculdades Anhanguera, também do UniCEUB, além dos outros ouvintes que estão aqui de vários setores. Então, vamos aproveitar este momento. O Sr. Gilberto Peralta iniciou suas atividades na General Electric em 1980. Atuou em diversas posições, chegando à Vice-Presidência para o Programa Airbus. Em 2006, juntou-se ao time da GE Capital Aviation Services como Gerente-Geral para América Latina e Caribe. Desde agosto de 2013, acumula essa função de Presidente e de CEO da GE do Brasil, focado em iniciativas chaves estratégicas para o crescimento da empresa, além de ampliar a parceria histórica da GE com o País. Gilberto é o porta-voz e o representante da GE do Brasil em várias associações industriais e organizações setoriais, como a Confederação Nacional da Indústria, a Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústria de Base, a Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica, a Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos, o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável, o Movimento Brasil Competitivo, e o Grupo Mais Unidos. |
| R | Pela manhã, nós ouvimos o representante da Natura, que trouxe a experiência e a contribuição de uma empresa que tem forte ligação com os recursos da biodiversidade. E agora vamos ter a oportunidade de ouvir o presidente de uma empresa que vai nos trazer informações importantes sobre como a GE está trabalhando para também atender os objetivos do desenvolvimento sustentável traçados pela ONU e discutidos na primeira mesa-redonda desta manhã. Normalmente, imaginamos que isso é um tema de governo e de sociedade civil, mas a GE vai nos mostrar como o setor empresarial, que talvez seja o principal, atua nesses objetivos de desenvolvimento sustentável. Com a palavra o Sr. Gilberto Peralta. O SR. GILBERTO PERALTA - Boa tarde a todos. Antes de começar, eu queria agradecer ao Senador Wellington e à toda organização, em nome dele evidentemente, pelo convite. Fico honrado de estar presente e feliz de poder contribuir. Depois de você ler esse meu currículo, eu fico preocupado. Alguém que escutar lá na minha empresa pode pensar onde é que eu trabalho, afinal, com esse monte de coisas? Não, mas isso ocupa só um pedacinho do meu tempo. Quando me pediram para eu falar... A gente gosta de falar em seminários abertos como este, porque a GE é uma empresa que começou com um visionário, que olhava para o futuro. E o Alfredo, falando ali agora, citou duas ou três palavras que Thomas Edison - que criou a General Electric - adorava usar sobre desafio. Ele dizia que não existe nada que não seja possível de ser feito. Ele gostava de desafio e falava que a crise é o momento em que você cresce porque é o momento em que aparecem as oportunidades. Foi assim que a GE cresceu: com as crises e com as oportunidades que apareceram. Eu não concordo com o Alfredo no social. Acho que esse pilar não fracassou, ele só está mudando. Hoje há uma sociedade diferente do que era há cem anos, do que era há duzentos anos. Os valores são outros e estão mudando. Esta sociedade é diferente, ela não fracassou e está em processo de modificação. Acho que talvez eu gostaria de ver a sua palestra dizer que esta nossa sociedade agora muda muito mais rápido do que mudava no passado. Essa é a impressão que eu tenho. E, finalmente, só para pegar o gancho final do Alfredo e aproveitar a presença do Senador Cristovam - ah, já não está mais aqui -, acho que educação é a base de todo o crescimento social. Nós acreditamos nisso em qualquer lugar do mundo em que nós estamos. Eu acompanho a presença do Senador Cristovam na vida pública brasileira e ele é um grande defensor disso também. A educação é a base de qualquer sociedade equânime, melhorada e que dá oportunidade a todos. Só a educação faz isso, não existe nenhum outro meio. Podemos investir muito em infraestrutura - que é tudo aquilo que eu vendo, são equipamentos que eu vendo; e vou falar um pouco disso aqui agora -, mas só a educação faz com que as pessoas possam aproveitar aquilo, possam se desenvolver e possam se tornar seres úteis para a sociedade em que vivem. Então, eu concordo plenamente com o Alfredo nisso - discordei de umas, concordei com outras. Vou passar aqui, rapidamente, somente para dar a vocês um entendimento. O Brasil é o nosso terceiro maior mercado, depois dos Estados Unidos e, evidentemente, da China. Isso dá uma dimensão a vocês da importância que é o País para nós. |
| R | Somos uma empresa que está no Brasil há 96 anos. A nossa primeira operação fabricando alguma coisa fora dos Estados Unidos foi aqui no Brasil, embora tenhamos chegado ao México antes, mas era vendendo produtos. No Brasil também era vendendo produtos, mas fabricando alguma coisa foi aqui no Brasil, no Rio de Janeiro, com uma fábrica de lâmpadas em 1919. Todos os nossos negócios estão presentes no Brasil. E eu digo negócio porque trabalhamos na área de energia, mas a GE é o maior grupo industrial do Planeta com a maior operação na área de energia. Operamos em qualquer das possibilidades de se gerar energia que existem: renováveis, não renováveis e assim por diante; todas elas. E também, por exemplo, somos a maior fabricante de equipamentos médicos do mundo e inventores dos equipamentos médicos mais importantes que são utilizados hoje em dia. Quando se fala em ressonância magnética, isso é invenção da General Electric. Quando se fala em ultrassom de terceira dimensão, foi a GE que inventou isso em 3D. Na área de oil and gas e na área de transportes, em que nós trabalhamos fabricando locomotivas, a primeira e única fábrica de locomotivas da General Electric fora dos Estados Unidos está aqui no Brasil, em Minas Gerais. Então, o Brasil é muito importante, e eu só queria mostrar a vocês a importância que nós damos a isso. E a última coisa, a mais recente, é que, em 2014, nós abrimos o nosso quinto centro de pesquisa - o único centro de pesquisa no hemisfério sul - no Rio de Janeiro. Foi um investimento de US$500 milhões. Eu, hoje cedo, comentava com o Ministro da Ciência e Tecnologia, Gilberto Kassab, que nós patrocinamos um dos maiores programas de repatriação de cérebros da história do Brasil. Esse centro de pesquisa opera, hoje em dia, com 300 pessoas, das quais 120 ou 130 são pesquisadores de tempo integral. E, desses, 68 são brasileiros, sendo que alguns deles já moravam fora do Brasil há mais de 20 anos. Nós repatriamos essas pessoas para o Brasil. É uma mão de obra de altíssimo nível tecnológico, todos brasileiros, com uma tremenda saudade de casa e muito mais felizes de poderem estar no Brasil trabalhando aqui agora graças a uma multinacional. Isto aqui dá para vocês uma ideia de o que a GE fez no Brasil. Em 1919, a gente começa. A fábrica de lâmpadas começa a produzir em 1921. Em 1964, a gente começa a fabricar as primeiras locomotivas no Brasil. Em 1970, nós começamos a fazer alguma exportação. E aí está um timeline nosso. A nossa maior operação no Brasil hoje é essa operação que aparece na última fotografia: a GE Celma, uma fábrica que repara motores de avião. É a nossa maior oficina no mundo e é a segunda maior oficina de reparo de motor de avião do mundo; e vai se tornar, muito em breve - porque estamos fazendo um investimento muito grande lá -, a maior oficina de reparo de motor de avião do mundo. Isso será aqui no Rio de Janeiro, no Brasil. Para os nossos investimentos aqui no Brasil, nos últimos nove, dez anos, até 2020, vamos trabalhar com US$1,5 bilhão. Eu queria enfatizar a nossa dedicação ao País: não paramos nenhum investimento, a despeito de que o Brasil está na sua pior crise da história. Nós olhamos o Brasil com um pouquinho mais de visão histórica. Depois de 95 anos aqui, já passamos por algumas crises talvez um pouco piores do que esta - esta aqui é uma crise passageira. |
| R | Evidentemente, não cometemos nenhuma loucura, mas os nossos investimentos não foram, nenhum deles, cancelados. Estamos seguindo o nosso plano de investimentos até 2020, aqui no Brasil. Nós temos aqui no Brasil a operação com quase 15 mil funcionários - esse número aí é de 14,5 mil, mas talvez seja um pouquinho mais do que isso. E também o centro de pesquisa de que eu já falei para vocês anteriormente. Esse é o centro que, quando nós terminarmos a operação nele, ainda não terminou, vamos ter investido aqui US$500 milhões. É o maior investimento privado na área de pesquisa já feito no País, também. Uma das razões principais e importantes - antes que a pergunta venha, e ela sempre vem -, do porquê nós viemos ao Brasil, é porque o centro de excelência mundial hoje de petróleo em águas profundas é a Petrobras. A despeito de tudo o que aconteceu, é a Petrobras e é aqui no Brasil. Esse nosso centro aqui opera... Metade do que nós fazemos aqui é pesquisa em água profunda, é desenvolvimento de tecnologia - do futuro - de exploração de petróleo em água profunda. O que é sustentabilidade para a GE? Acho que esse é um dos temas que o pessoal pediu para falar. Nós temos um compromisso, há mais de 130 anos, com as soluções para os problemas normais nossos. Ou seja, é evidente que a nossa visão é sempre parte de uma estratégia de negócios, nós queremos olhar o que é que pode ser feito com aquilo. E juntam-se a isso o anseio e os interesses da sociedade. E eu acho que nós contribuímos muito para o progresso econômico, para o bem-estar da sociedade, das pessoas, e com respeito aos limites do Planeta. O nosso investimento em tecnologias limpas, em melhoria de eficiência dos equipamentos que operam e de toda a operação industrial em geral é muito grande. Nós investimos algo ao redor de US$5 bilhões por ano em desenvolvimento de novas tecnologias. Quando as pessoas olham o que você.... Aqui dentro, por exemplo: estas luzes LED consomem 10% do que consumia a luz anterior que operava aqui, e o LED é uma invenção da General Eletric. Quando você pega um avião A380, que carrega 600 pessoas e pode ser impulsionado por quatro turbinas General Eletric, esse mesmo avião, se comparado com o 707, de 1960, que transportava 150 e consumia o dobro, isso mostra para vocês o que foi investido em termos de eficiência e em melhoria dos produtos que operam. Isso aí é futuro. Nós estamos sempre investindo para melhorar ainda mais e para atender às necessidades do Planeta. Eu acho que nós contribuímos muito para melhorar a sociedade, para melhorar e eternizar o futuro, visando uma melhoria constante da nossa sociedade. O que a GE pode contribuir ou contribui nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, nas ODSs das Nações Unidas? A sociedade justa, inclusiva, moderna deve prestar serviços públicos efetivos. E, quando nós olhamos para o nosso portfólio de produtos, o que a gente fornece, nós buscamos: fornecer energia limpa, mais barata, mais eficiente, usando menos recursos naturais; oferecer água de melhor qualidade e sem usar a mais os recursos naturais; oferecer saúde, comunicação. Eu acho que tudo isso faz parte desses objetivos. Nós trabalhamos em alguns deles e vou citar alguns, à frente, aqui. |
| R | Os governos e as empresas, de qualquer maneira, são parte do social, eles têm que fazer a parte deles. As empresas, elas procuram negócios, e é o que nós fazemos no mundo inteiro. E os governos têm que fazer o trabalho de ajustar isso e empurrar as empresas para fazerem a melhor coisa para a sociedade. Rapidamente: dos ODSs da ONU, eu acho que, por exemplo, o três, que seria assegurar vida saudável, a gente trabalha nisso; assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da água, a gente trabalha nisso; assegurar o acesso confiável, sustentável - vou dar alguns exemplos para vocês na página seguinte; construir infraestruturas resilientes; promover a industrialização; tomar medidas urgentes para combater a mudança do clima, isso é muito importante, não adianta a empresa ganhar muito dinheiro se o que está para frente não é sustentável e não vai conseguir estar lá depois. Só para vocês terem uma ideia, no acesso à saúde, um dos ODSs, a GE tem tecnologias inovadoras. Eu já citei uma: a ressonância magnética, mais o ultrassom, raios X digitais, a tomografia, são todos equipamentos que alguns fomos nós que inventamos, outros fomos nós que melhoramos e transformamos num uso melhor. Aqui no Brasil, as Olimpíadas usaram um sistema para os atletas em que eles tinham uma pulseira dada na entrada, onde todos... Antes disso: os dois centros médicos das Olimpíadas do Rio de Janeiro eram nossos. Todos os equipamentos que estavam lá foram instalados por nós e eram equipamentos da General Electric, todo o treinamento dado pela gente. Os atletas todos usavam uma pulseira que, quando eles entravam no centro de atendimento médico, o sistema já reconhecia o atleta, e os médicos que fossem atender já sabiam se ele tinha problema anafilático, choque anafilático, se tinha tido cirurgia, se tinha problema de diabete, tudo automático. O sistema de fichas médicas virtuais na nuvem, tudo automático. Esse foi um negócio que a gente desenvolveu aqui no Rio de Janeiro. O desenvolvimento de talentos: eu acabei de falar do nosso centro de pesquisa no Rio de Janeiro. Nós, além de fazermos pesquisa, desenvolvemos talentos com o nosso centro de treinamento. Nós temos uma universidade própria, a Universidade General Eletric, que a gente chama Crotonville. No Rio de Janeiro a gente colocou uma sucursal dela, então, nós desenvolvemos. Isso aqui é para o desenvolvimento para nós, para a empresa, mas também para os nossos parceiros, os nossos clientes e todas as pessoas que possam ou queiram participar dentro de limites, é claro. E escassez de água: isso aqui é um negócio que preocupa a gente. A General Electric não atuava nessa área até dez anos atrás. Hoje nós somos a maior empresa de fornecimento de equipamentos de tratamento de água, qualidade de reciclagem 100%. Então, quando você olha países como Singapura, Dubai, Japão, a água é completamente reciclada, e nós produzimos isso, esses equipamentos de reciclagem de água, e desenvolvemos tecnologias mais modernas, que ocupem menos espaço e deem muito mais segurança na qualidade da água que está sendo reciclada. Eu acho que na energia, eu já comentei rapidamente, nós trabalhamos no vertical completo de energia. Então, nós produzimos equipamentos de energia nuclear, energia eólica, energia hidráulica, energia solar, energia de marés, energia térmica, qualquer energia; nós produzimos todos eles. |
| R | Eu acho que - um comentário que eu gostaria de fazer de futuro para o Brasil: o Brasil tem um potencial de se tornar o benchmark mundial da matriz energética. O Brasil tem um potencial, ele tem uma matriz energética diversificada, uma matriz energética distribuída, para aumentar a segurança energética. E, quanto a isso, o Brasil é um dos pouquíssimos países que podem se dar esse luxo, porque ele pode ter uma matriz renovável, quase em 100%, eu diria, se não em 100%, por causa do nosso potencial hidroelétrico e o nosso potencial eólico, além do solar também. Mas esses dois juntos dariam uma garantia para o Brasil de uma matriz completamente renovável e limpa, o que é uma das coisas que o Planeta vai agradecer muito no futuro, eu imagino. Nós trabalhamos aqui no Brasil muito nesse sentido. A nossa segunda maior operação, no mundo, de fabricação de equipamentos eólicos é aqui no Brasil, gerando emprego para brasileiro, porque 70% do que a gente produz compram-se no Brasil ou fazem-se aqui no Brasil. Somos o maior produtor de equipamentos eólicos do Brasil: quase 40% de toda a energia eólica gerada é gerada em equipamentos General Electric, e a carteira de produtos que nós temos disponível nos vai tornar com quase 50% nos próximos dois anos. E trabalhamos muito no desenvolvimento local. Eu acabei de falar dos geradores eólicos, nós desenvolvemos a cadeia produtiva local, para poder fixar as pessoas aqui. Nós não temos interesse de, única e exclusivamente, trazer importado o que quer que seja: se pode ser produzido no Brasil, nós produzimos. O que interessa é que o lucro líquido disso seja positivo e a empresa ganhe com isso. Não podemos ter dúvida disso. Eu acho que isso desenvolve - quando a gente fala em desenvolvimento local - tecnologias que permeiam na sociedade e tecnologias que seguram as pessoas nos seus locais de trabalho aqui. Quando a gente desenvolve parques - e eu vou citar eólico, porque muitos desses equipamentos sendo instalados, eólicos, estão sendo instalados em áreas muito pobres do Brasil, no Nordeste, principalmente -, nós estamos segurando as pessoas no local. Quando é necessário fazer treinamento de mão de obra, essa mão de obra vem ao Sul do País, é treinada e é devolvida. Então, eu acredito que nós estamos ajudando muito no desenvolvimento social de áreas como o interior da Bahia, na região de Caetité, como na Chapada do Araripe, com todo esse equipamento eólico que está sendo instalado, e ajudando o País a desenvolver a sociedade local e segurar as pessoas no seu local de existência, de vida. Eu só queria completar, Alfredo, nós adoramos crise. A crise é uma oportunidade para se reinventar. Eu acabo de lembrar que o Edison, Thomas Edison, falhou umas 500 vezes. O invento dele teve que se desenvolver umas 500 vezes para criar a primeira lâmpada comercialmente viável, que é o invento mais famoso dele. Não é o único invento: ele tinha mais de 1.600 patentes, mas esse é o invento mais famoso do Thomas Edison. E um repórter perguntou a ele se ele se sentia mal de ter falhado quase 500 vezes. Ele falou assim: "Não, eu me sinto bem de ter desenvolvido, melhorado meu produto quase 500 vezes, e entregado alguma coisa que a sociedade vai utilizar para o futuro, e vai ser uma mudança de paradigma da sociedade." Eu acho que, de uma maneira ou de outra, o Alfredo falou do amor aqui, acho que o Edson já pregava isso lá atrás. Porque tudo aquilo que você falou ali, Alfredo, ele levava em consideração na vida dele. Isso, 130 anos atrás. Senhores, era isso que eu tinha para falar, estou aberto a perguntas quaisquer que sejam. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. HABIB JORGE FRAXE NETO - Muito obrigado, Gilberto. |
| R | Nós vamos passar agora à sessão de perguntas, nós recebemos muitas perguntas. Foi bom que vocês responderam, mas vou tentar dar uma consolidada em algumas aqui, para a gente também não avançar muito, porque nós temos em torno de 20 minutos para as perguntas. Então, se o Gilberto me permitir, aproveitando já que ele estava falando, eu dirigiria primeiro as perguntas que chegaram para ele. Uma primeira: o que a GE está realizando para desenvolver uma mobilidade urbana mais sustentável? Vou fazer as três, pode ser? O SR. GILBERTO PERALTA - Pode. O SR. HABIB JORGE FRAXE NETO - Uma segunda pergunta: em relação à implementação dos objetivos de desenvolvimento sustentável, você acha que é possível avançar, em nível nacional, nessa implementação? Como a GE planeja suas ações de sustentabilidade para cumprir os ODSs apresentados aqui hoje? E, finalmente, considerando o peso da GE no mercado - eu vou dar uma resumida aqui, tá bom? O SR. GILBERTO PERALTA - Sim. O SR. HABIB JORGE FRAXE NETO - Se a GE teria uma perspectiva em, futuramente, abandonar o uso de recursos não renováveis. Eu imagino que seriam energias não renováveis. Não é? O SR. GILBERTO PERALTA - Sim. O SR. HABIB JORGE FRAXE NETO - Bom, aqui está "o uso de recursos não renováveis". Vou traduzir para energia não renovável? Eu não sei. O SR. GILBERTO PERALTA - Está ótimo. Eu acho que eu entendi a pergunta. Se eu não tiver entendido, a pessoa que fez a pergunta pode levantar a mão e me corrigir. Eu acho que o nosso grande desenvolvimento - eu vou começar pela última pergunta -, o nosso grande investimento hoje em tecnologia na área de energia tem sido no desenvolvimento de energia renovável. Eu acabei de citar para vocês a eólica; na hídrica, a GE é o maior produtor mundial de equipamentos hídricos. Aqui no Brasil, só para vocês terem uma ideia, 50% de toda a energia elétrica que nós utilizamos no Brasil é gerada em equipamento General Electric. As pessoas não têm ideia disso, mas eu estou dizendo para vocês agora. E vou dar um outro dado: quase 70% de toda a energia elétrica distribuída no Brasil é distribuída com equipamento General Electric. Ou seja, sistemas de distribuição, sistemas de transformadores, e assim por diante. É evidente que a energia renovável é o nosso foco. Nós não podemos perder de vista que existem locais onde a energia renovável não é possível. Então, a sociedade é que tem que decidir o que é que tem que ser feito. Então, vão existir lugares onde a energia térmica, por exemplo, ou a própria energia nuclear, é mais aplicável. E, mesmo nessas energias - eu vou citar um exemplo: a gente acaba de ganhar uma competição aqui no Brasil, no Estado de Sergipe, onde nós vamos instalar um equipamento para geração térmica de energia, vai usar gás natural. É o equipamento mais eficiente na geração de energia que existe hoje no mundo. Ganhou um prêmio no livro dos recordes lá, o equipamento mais eficiente é o equipamento produzido pela GE. Ele converte 63%, 64% de todo o gás que entra; converte aquilo em energia elétrica. Isso demonstra que... Esse equipamento, 20 anos atrás, não convertia 30%. Então, isso demonstra uma melhoria da eficiência do projeto. Então, isso aqui, a gente investe nisso também. Então, vende-se menos hoje isso; está-se vendendo mais eólica, vendendo mais solar, mas nós vendemos isso também. |
| R | E nós também acreditamos que existe uma demonização da energia nuclear, e a gente acha que a sociedade vai mudar a maneira de ver isso. Em países, como onde o Alfredo mora, a França, 70% da energia é toda gerada nuclear, e o país não está mais inseguro por causa disso. Você tem que criar sistemas para trabalhar com isso. Então, eu acho que a gente tem que ter um cuidado muito grande, não pode demonizar essa energia - eu acho que isso é na parte de energia. Na mobilidade urbana, nós participamos disso, mas um pouco como atores coadjuvantes. Já participamos muito mais, com sistemas de sinalização de trânsito, com sistemas de sinalização de trens - hoje nós não temos isso -, mas participamos indiretamente. Por exemplo, nós vendemos hoje sistemas que estamos tentando fazer aqui no Brasil, mas ainda não conseguimos: sistemas de iluminação. Você olha para uma luminária dessas que há na rua e há uma lâmpada lá em cima. Hoje nós oferecemos para as pessoas sistemas que têm mais do que uma lâmpada: até ilumina, mas, mais do que iluminar, pode controlar trânsito, pode dar sinal de celular. Quanto a esses postes, pode se manter o celular, que vai haver uma distribuição muito mais uniforme na cidade, muito menos concentrada, causando menos problema para a vida das pessoas, com as ondas eletromagnéticas que emite uma torre dessas, monstruosa, no centro da cidade; pode haver sensores de ruído, que podem analisar e escutar tiro, avisando a polícia no nano segundo onde o tiro aconteceu, porque faz a triangulação de três postes, e você sabe onde ele aconteceu. Isso já existe. Isso não é futuro. Isso é tecnologia. Isso já existe, e temos funcionando em várias cidades do mundo. Você pode ter uns postes desses que vê as pessoas atravessando a faixa, e fecha o sinal. Quando a pessoa chega na faixa, ela fecha o sinal para a pessoa ter preferência de passar a faixa. Isso já existe. É tecnologia que nós temos, e vendemos isso hoje. Aqui no Brasil a gente não tem. Mas ela já existe. Então, eu acho que isso ajuda na mobilidade urbana indiretamente. Diretamente, infelizmente a gente não tem nenhuma operação hoje no nosso portfólio que trabalha com isso. A segunda questão é em relação à sustentabilidade; se não me engano, era sustentabilidade a segunda questão. Eu acho que, quando a gente está desenvolvendo equipamentos de geração de energia elétrica renovável, quando a gente está desenvolvendo tecnologias que consumam menos a natureza, quando a gente desenvolve sistemas de tratamento de água que possam fazer o reuso de toda a água, 100%, menos aquela que evapora e se perde, eu acho que nós estamos trabalhando na sustentabilidade. Eu costumo dizer: a cidade de São Paulo passou por uma crise de água terrível dois anos atrás, e agora estamos indo buscar água a quase 100km de distância. E, numa reunião com o Vice-Governador, na época era ele que cuidava da Secretaria, eu falei assim: "Governador, a gente poderia oferecer à cidade de São Paulo um sistema de tratamento de água que recicle 100% de toda a água e com isso a gente poderia consumir 30% menos de água do Cantareira." Não seria necessário criar mais nenhum equipamento, e se consumiria menos 30% de água, porque você está usando a água. Como um efeito colateral disso, você ajudaria a saúde, porque a Organização Mundial de Saúde disse que, para cada dólar investido em tratamento de água, única e exclusivamente em tratamento de água, você economiza de US$2 a US$3 no gasto médico. Porque são as doenças que a água traz, de disenteria, aqui no Brasil iria ser um negócio pior do que acontece com países desenvolvidos, como a França e outros países. |
| R | Eu acho que isso traz uma melhoria da sociedade muito grande. Além de que, uma cidade como São Paulo, que é onde eu moro, você eliminaria aquele esgoto a céu aberto, que são os dois rios que estão no meio da cidade. Quer dizer, é claro que isso ajuda muito na sustentabilidade, nós participamos disso, e muito. Eu citei o exemplo do motor de avião aqui: a turbina de 1960 consumia dez vezes mais combustível que a turbina de 2010, hoje, para transportar o mesmo passageiro. Eu acho que eu respondi. Não sei, se respondi, estou à disposição. O SR. HABIB JORGE FRAXE NETO - Obrigado, Gilberto. Chegaram mais algumas perguntas para ele, mas vamos privilegiar os outros palestrantes. E, se a gente ainda tiver um tempinho no final... Vou dirigir agora as perguntas para o Alvaro Salas. Uma primeira pergunta: "Como as universidades americanas preparam seus alunos, futuros executivos de empresas e líderes, para contribuir com as soluções urgentes de desenvolvimento sustentável?" E outra pergunta que é dirigida a ele também à Mesa: Como democratizar a democracia para uma globalização que concentrou o poder de informação econômica, utilizando tecnologias de informação, tecnologia que, ao mesmo tempo, tem o potencial de desconcentrar renda, integrar políticas e tecnologias e compartilhar soluções inclusivas? O SR. ALVARO A. SALAS (Tradução simultânea.) - Obrigado. Eu acho que eu entendi, mais ou menos, algumas perguntas. Vou começar, falando sobre as universidades americana e como elas preparam os seus alunos. Depende da universidade. Existem várias faculdades que têm métodos de pensamento crítico, mas a maioria das universidades estão numa arena em que elas tratam seus alunos de uma forma diferente, para prepará-los de uma forma humanitária, para que eles possam entender as artes e as ciências, e também com uma perspectiva sobre o meio ambiente também. Em relação à Cornell, nossa universidade pode oferecer estudo a seus alunos de formas diferentes. Por exemplo, quando existem as políticas públicas, o estudo de políticas públicas, os estudantes estão muito curiosos para aprender coisas novas. Eles podem desenhar seus programas de acordo com suas paixões e os seus interesses. Eu gosto muito de democracia. Então, muitas das minhas aulas são em relação a isso, que foi uma fundação do Bill Gates. E eu uso muito dos meus alunos, falo muito com eles em relação a moldar os cidadãos em relação a Stanford, ao Instituto de Massachusetts também, depende muito do lugar. Outro ponto em relação a isso é que as parcerias que nós temos, o memorando de entendimento que é estabelecido entre as instituições americanas, são feitas para ajudar os alunos a melhorar os seus problemas em seus países. Um problema que nós temos na Costa Rica, por exemplo, é em relação ao dióxido de carbono, e estamos precisando de mais capital para buscar resolver esses problemas. E precisamos de coisas diferentes no Chile e no México, por exemplo. Então, precisamos de um memorando de entendimento diferente para cada país. Sobre a segunda pergunta, quanto a como democratizar os dados com o uso de TICs e se existe alguma lacuna em relação a essas tecnologias, em relação à democracia, essa é uma ótima pergunta. |
| R | Mas, em termos de TICs, o que elas trazem para a discussão são... Por exemplo, quando o nosso colega aqui da empresa Natura, no último painel, estava apresentando os modelos de sustentabilidade que estão fazendo, o meu dispositivo levou 20 segundos para eu descobrir onde eles estão alocando alguns desses recursos. Então, os dispositivos móveis e o acesso à banda larga hoje nos dão informação e conhecimento ilimitados. Podemos aprender de estatística à física quântica usando a internet hoje em dia. Quanto à segunda pergunta: o que é lacuna digital? Há áreas rurais, na América Latina, que não têm nem acesso à eletricidade. Às vezes, nós levamos essas bênçãos como coisa generalizadas, e não são para todos. A lacuna digital vai existir. A questão é como fechá-la, para que mais pessoas tenham acesso à tecnologia. Depende basicamente de quem vai defender essas políticas, o setor governamental ou o privado. Pessoalmente, eu acredito que esses setores podem resolver a maioria dos problemas mais graves do mundo, neste momento, em conjunto, colaborando com a sociedade civil. Finalmente, quanto à pergunta, outra coisa que nós latino-americanos tendemos a não fazer é aprender com os nossos erros e com os erros dos outros. É importante ver o que os outros países estão fazendo e fazer benchmarkings, como os que países como a Coreia do Sul, o Reino Unido e a Austrália estão fazendo. Eles já fracassaram implementando essas plataformas e podem compartilhar a sua curva de aprendizagem para que ela diminua para nós. Muito obrigada. Acho que cobri todas as questões. (Interrupção do som.) O SR. HABIB JORGE FRAXE NETO - "Quais são, do seu ponto de vista, os fundamentos da educação criativa? Como desenvolver concretamente essa educação? Entre desses fundamentos se encontra o uso de tecnologias digitais?" São várias perguntas dentro dessa. Em relação à educação criativa seria isso. Deixe-me passar para a próxima. É uma pergunta bem polêmica. "O senhor acredita que seja possível um desenvolvimento sustentável, no Brasil, após a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição nº 55, que congela gastos e investimentos? Qual seria a sua visão sobre isso?" "Em relação às turbulências que Brasil, Venezuela e outros países têm vivido em relação a seu sistema político e ao aumento da incerteza no futuro, alguns jovens, no Brasil, têm inclusive pedido a volta de uma ditadura militar que não viveram. Na sua opinião, a democracia está em colapso?" A última pergunta: "Na sua opinião, essa nova era da qual o senhor trata seria uma era de compartilhamento?" |
| R | O SR. ALFREDO PENA-VEGA - O.K. As perguntas são bastante importantes para responder em duas palavras, mas vou tentar ser mais curto. Acho que o pessoal está com fome e tem de ir almoçar para reativar os neurônios. Evidentemente, vocês vão entender perfeitamente que há uma pergunta que não posso responder. Sou convidado, não posso opinar sobre uma situação, sobre uma discussão, sobre um problema interno do País. Sou convidado de fora, não vou interferir nesse problema. Eu gostaria muito de falar, mas não posso. Tenho minha opinião. Talvez não gostem. Vou começar pela democracia criativa, pela educação criativa. Aliás, democracia criativa vai junto com educação criativa. Vou deixar de lado esse mito... Há muitos mitos que atravessam para este lado do continente. Há pessoas que pegam um mito, desenvolvem-no e acham que isso já existia. Então, por exemplo, eu vou deixar de lado - embora seja importante estudar outras realidades, mas é outra realidade que não tem a ver nem com a realidade latino americano, nem com a realidade europeia, embora seja um pais europeu, nem com a realidade da África, nem com a realidade da Ásia -, então, vou sair do mito da educação da Finlândia, que todo mundo fala que é uma educação moderna, nova. Acho que nós temos de reinventar essa nova educação criativa, nós temos de reinventá-la. O país, os países têm de se colocar no momento de dizer: bom, o que acontece que nós não conseguimos resultados no processo de educação de nossos filhos? O que acontece? O que acontece é que tem um mal-estar dentro da escola. O que acontece é que o menino que vai à escola se aborrece na escola. O que acontece é que nós continuamos a pensar o mundo de maneira compartilhada. Acho que esses são temas que a gente tem de colocar para pensar numa educação criativa. É o meu ponto de vista só, não estou querendo dar uma de especialista. Não sou nenhum especialista em educação; só quero dar o meu ponto de vista. |
| R | Quais são hoje as tendências? É muito simples. Por que nas escolas, por que na educação, não se dá mais ênfase à criatividade do professor? Por que o professor tem de receber, do primeiro mês até o fim do ano, um programa? E tem de se espelhar naquele programa, não há outra possibilidade? Lógico que há exceções e a gente pode enxergar e identificar muitas exceções. Mas acho que hoje a possibilidade de uma educação criativa está dentro da aula, está na relação entre o professor e o aluno, está entre o professor, o aluno e os pais, nos três. O Estado tem uma função de entregar a educação, de aportar as verbas para a educação, de ter uma política de educação. Mas o Estado, acho, deveria também deixar aos atores da educação a possibilidade de elaborar, de mostrar sua criatividade para ensinar. Hoje há bastante experiência fora, que a gente pode pegar e tentar ver se dar certo, experimentar. Por exemplo, vou dar três, e depois poderemos falar mais outra vez, que fazem parte da educação criativa. Uma é muito simples, muito simples. Por que se tem de ensinar por disciplina? Por que se tem de ensinar biologia, física, matemática? Por que ensinar disciplinas separadas? Por que não se ensina hoje por fenômeno? Quais são os fenômenos que nós temos no mundo? Temos um fenômeno que se chama mudança climática. E a mudança climática é um tema transversal em que entram todas as disciplinas: matemática, línguas, biologia, e aí você faz a lista, inclusive artes. Então, quando você tem um fenômeno global de que todos os países estão hoje falando, por que não integrar esse fenômeno como um processo de ensino? E você pode ensinar matemática, a questão da ecologia, a questão da política, a questão das energias. Enfim, você pode fazer desse fenômeno, ou melhor, digamos, de um problema, fazer desse problema um ensino. Tem o problema da mudança climática, tem o problema da alimentação. Hoje todos nós questionamos a questão da alimentação. Todos, em todos os países, queremos saber como nós vamos poder nos alimentar daqui a 30 anos. Temos o problema da tecnologia. Temos de ter cuidado, porque a tecnologia não é um determinismo, não se resolve tudo com tecnologia, há também outras possibilidades. Então, eu acho que aí está o que chamo de educação criativa, uma educação que tenha outra maneira de enxergar o mundo, outra maneira de poder construir uma visão do mundo. E quando eu ouço aqui, de manhã até agora, falar que nós estamos num processo de mudança paradigmática, acho que é uma palavra que é usada sem se saber o que se está dizendo. |
| R | Para nós termos uma mudança paradigmática vamos ter de mudar a nossa visão do mundo. Aí sim. A nossa visão de mundo vai ter de ser relacionada com aquilo que nós estamos observando: um processo importante de transição energética; um processo importante, grave e importante, de extinção de nossa biodiversidade. Aí a gente vai poder verdadeiramente saber se nós estamos num processo de mudança e de mutação importante do ponto de vista paradigmático. A segunda pergunta é sobre a questão do colapso da democracia. Vejam o que aconteceu. São só sinais para você poder pensar. É muito bom dizer que estamos numa sociedade de participação, etc., mas vejam o que aconteceu aqui perto, no vizinho de vocês, no Chile. Houve eleição municipal dois, três meses atrás, com 60% de abstenção; 70% de jovens que não acreditam mais na política. Porém - e continuo com o caso do Chile -, houve lutas fortes, mortes, desaparecidos, que resgataram a democracia, lutaram pela volta da democracia. Vinte anos depois, o pessoal não quer mais. Agora, felizmente, eles não chamam os militares, por enquanto, felizmente. Mas se os jovens, aqui no Brasil, chamam os militares para tomar o poder, é porque há um problema profundo no que diz respeito à educação. Há um problema profundo, há uma ignorância muito grande. E como combater a ignorância? Tem que se combater com mais educação. Você não pode ouvir desses meninos aquilo por que passaram nossos amigos, nossa família ou talvez alguém perto, aquilo que nós não queremos mais ver. E temos de ter uma resposta para isso. Não podemos dizer tampouco que são ignorantes e que não entendem nada. Temos de achar uma resposta. E a resposta, insisto, está onde o menino passa todos os dias, com o professor. Não é possível que um jovem tenha essa visão de seu país, uma visão totalmente errada. Então, acho que aí está o verdadeiro desafio para o futuro. Aí está o desafio para o futuro: como pensar uma democracia em que todos nós possamos ter um papel importante de participação. Daí, acho que também... Muitas vezes, se diz: agora, com as novas tecnologias, com o Twitter, com o Facebook, nós temos uma participação. Acho que é demais, é muito determinismo. Eu não quero uma política pelo Twitter, eu não quero que o político se expresse numa frase pelo Twitter. Hoje é tudo pelo Twitter, então você não sabe o que ele está pensando. Uma frase só. São 120 palavras, 120 palavras só. E você não sabe o resto. Acho que aí, verdadeiramente, temos de nos questionar sobre esse tema. |
| R | Vou terminar, desculpem - dois minutos só -, para responder. Já temos mais ou menos uma resposta, mas vou completar, sobre como democratizar a democracia. Nós fizemos, no meu projeto, uma experiência de colocar os jovens dialogando em tempo real. Eles dialogaram em tempo real. Não era uma pesquisa por "a", "b", "c", era sobre qual a opinião deles sobre o futuro. Acho que essa é uma forma de também poder contribuir. Não vou dizer que é a solução, mas pode contribuir para democratizar a democracia, porque os jovens, as pessoas, sentem que estão participando, que estão tendo a possibilidade de dar sua opinião sobre esse tema. E vou terminar dizendo que acho superimportante o que vocês estão assistindo hoje, este Congresso do Futuro. Parabéns, mais uma vez, Senador! Acho que vocês têm uma porta aberta que faz parte do processo de democratizar a democracia. Vocês abrem as portas desta Casa para os jovens e para as pessoas que acham que estão fechadas. Estão abertas para poder dialogar com elas. Acho que isso aí é muito importante para... É importante e é concreto, não é retórico. Eles entram, ouvem, formam uma opinião e amanhã vão e dão seu voto segundo o que acham. Então, acho que isso aí é perfeito. Isso aí é democratizar a democracia. Obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco Moderador/PR - MT) - Agradeço ao Alvaro, ao Alfredo e ao Gilberto. Queremos, então, convidá-los, às 15h30min, para a segunda etapa. Foi distribuída uma lista dos restaurantes disponíveis, próximos do Senado mesmo. Pela última palavra do Alfredo, este é o propósito da nossa Comissão Senado do Futuro: oportunizar que a população brasileira se aproxime mais do Senado da República, com sugestões, com críticas, fisicamente ou através dos nossos meios de comunicação disponíveis. Isso não pode ser apenas durante este encontro. Nós gostaríamos inclusive que pudéssemos nos aperfeiçoar, durante todo o ano que vem, até para que possamos fazer o próximo, o segundo Congresso do Futuro, com muito mais participação e sugestões de palestras por parte de vocês que estão aqui assistindo, não só para o Congresso, mas também para o processo legislativo, que a própria Comissão pode propor durante todo o ano. Agradeço imensamente a todos que aqui vieram pela manhã. À tarde, todos estaremos de volta. Muito obrigado. (Palmas.) (Iniciada às 10 horas, a reunião é encerrada às 13 horas e 31 minutos.) |
