19/04/2017 - 7ª - Comissão de Educação e Cultura

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Bom dia a cada um e a cada uma!
Havendo número regimental, declaro aberta a 7ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado Federal, da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura.
Esta reunião atende ao Requerimento nº 56, de 2015, desta Comissão, e aos Requerimentos nºs 8 e 14, de 2017, também desta Comissão, de autoria dos Senadores Paulo Paim, Lúcia Vânia e Cristovam Buarque, para a realização de audiência pública destinada a instruir o Projeto de Lei do Senado nº 168, de 2012, que institui o exercício social da profissão para garantir emprego e exigir prestação de serviço dos graduados em Medicina que obtiveram seus diplomas em cursos custeados com recursos públicos, em instituições públicas ou privadas.
Dando início à audiência, solicito ao Secretário da Comissão que acompanhe os convidados, para que tomem assento à mesa. (Pausa.)
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Informo que a audiência tem a cobertura da TV Senado, da Agência Senado, do Jornal do Senado e da Rádio Senado e contará com os serviços de interatividade com o cidadão no Alô Senado, através do telefone 0800-612211 - vou repetir: 0800-612211 -, e no e-Cidadania, por meio do portal www.senado.gov.br/ecidadania, que transmitirá ao vivo a presente reunião e que possibilitará o recebimento de perguntas e de comentários aos expositores via internet.
Aqui estão os nossos convidados. É muito bom tê-los aqui! (Pausa.)
Três deles vão fazer uma exposição sobre o assunto, para debatermos: o Dr. Lúcio Flávio Gonzaga Filho, que é Conselheiro do Conselho Federal de Medicina; o Dr. Ricardo Chaves de Rezende Martins, que é Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados; e o Dr. Geraldo Adão Santos, que é membro do Conselho Nacional de Saúde.
Inicialmente, quero falar que o projeto que deu razão a esta reunião é de minha autoria, o que não compromete nem os senhores nem as perguntas a estarem de acordo. Isto aqui serve para esclarecer melhor a ideia. Aqui, procuramos ouvir pessoas que sejam favoráveis ou não. O importante aqui nem é convencer os Senadores e, depois, os Deputados, se, sendo aprovado aqui, o projeto chegar à Câmara dos Deputados; o importante é esclarecer a população, os alunos de Medicina do Brasil e os que necessitam de médicos no interior, apesar de eu considerar um sucesso o Programa Mais Médicos. É preciso esclarecer a população sobre o papel mesmo da universidade, sobre como a universidade pode melhorar não apenas a formação dos seus alunos, mas também a relação com a sociedade.
Uma reportagem de uma revista de abril deste ano - é muito recente, portanto - dizia que o Mais Médicos trouxe à tona o quão desigual é a distribuição de médicos pelo País. As capitais concentram 25% da população e 55% dos médicos, ou seja, é mais do que duas vezes o número de médicos por pessoa. O interior, onde está o grosso da população, 75%, dispõe apenas, portanto, de 45% dos médicos. Quando aqui se diz do interior, estão sendo incluídas as grandes cidades do interior. Não se trata apenas do interior no sentido das cidades pequenas, mas as grandes cidades entram aqui. Nas Regiões Sudeste e Sul, a proporção de médicos por habitante é o dobro da observada no Norte e no Nordeste. Se a gente fosse considerar o número de médicos por cidade pequena do interior do Nordeste, aí a distribuição seria ainda pior.
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Diante desse alarmante quadro de distribuição de médicos no nosso País, veio o Programa Mais Médicos, que, temos que reconhecer - eu fico à vontade, porque, desde o primeiro momento eu o apoiei -, deu certo. Eu considero o grande programa do Governo Dilma o Programa Mais Médicos. Naquela época, havia uma grande discussão sobre como é que mandaríamos médicos sem equipamentos. Eu digo: o pior é deixar sem médicos nem equipamentos, ou com equipamentos sem médicos, como os prédios prontos para UPAs, mas sem médicos para atender.
Essa é uma das razões pelas quais me veio a ideia de colocar esse projeto em discussão, para fazer com que os nossos jovens recém-formados que receberam, ao longo dos anos, o apoio da sociedade brasileira, inclusive dos habitantes dessas cidades mais pobres, que também pagam imposto, para que os nossos médicos pudessem trabalhar lá. Mas não foi só essa razão a razão, não. Eu tenho uma razão de professor, eu tenho uma razão educadora: a de que esses jovens serão melhores médicos depois, serão melhores médicos e serão melhores cidadãos e cidadãs.
E não quer dizer que aqueles que não tenham passado por isso não sejam grandes médicos. Claro que a pessoa pode ser um grande médico sem nunca ter saído da cidade; claro que é um grande médico quem, ao invés de ir para o interior de uma cidade brasileira tenha ido para Harvard fazer uma pós-graduação. Mas, na média, o aluno - e aí eu nem falo só de Medicina - que teve esse contato, essa relação com a realidade do País vira um cidadão melhor, ele vira um médico melhor, especialmente.
Então, buscando melhorar a formação do médico e melhorar o atendimento médico à população, eu coloquei esse projeto, que eu, reconheço, merece audiências como essas e debates, para que as coisas fiquem bem esclarecidas, inclusive quanto ao fato de como seria realizado o projeto na prática.
Mas hoje nós viemos ouvir os três que eu vou chamar na ordem em que eu falei. Inicialmente o Dr. Lúcio Flávio Gonzaga Filho, Conselheiro do Conselho Federal de Medicina.
Por favor, Dr. Lúcio Flávio.
O SR. LÚCIO FLÁVIO GONZAGA FILHO - Bom dia a todos!
Represento aqui o Conselho Federal de Medicina. O meu nome é Lúcio Flávio Gonzaga Silva. Trago o abraço fraterno do Presidente do Conselho Federal de Medicina, Dr. Carlos Vital, de sua Diretoria, de todos quantos fazem aquela instituição e o meu próprio a todos os presentes.
Trago também, nobre Presidente da Mesa, o agradecimento do Conselho Federal de Medicina pelo convite para participar desta audiência pública, que discute o PLS 168/2012, do digno e nobre Senador da República, educador e professor Cristovam Buarque.
O PLS 168, de 2012, intenta instituir o exercício social da profissão para garantir emprego e exigir prestação de serviço de saúde dos graduados em Medicina que obtiveram seus diplomas em cursos custeados com recursos públicos.
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O Conselho Federal de Medicina, com todo o respeito e solicitando a máxima vênia ao seu proponente e aos defensores dessa ideia, posiciona-se, Sr. Presidente, contra a aprovação deste PLS. Faço, a seguir, as necessárias fundamentações. São dois pontos do PLS que merecem uma reflexão verticalizada neste momento: um deles diz respeito à assistência médica às nossas populações, e o outro ponto, à formação do médico brasileiro, principalmente do especialista brasileiro.
Primeiro ponto, a assistência médica no setor público à população brasileira. O atendimento às demandas de saúde nos chamados vazios assistenciais, ou seja, a periferia dos grandes centros urbanos, o interior dos Estados, o grande interior, compreendendo as zonas rurais recuadas dos Estados do Norte e Nordeste - tudo a ver com a má distribuição geográfica de médicos no Brasil, já identificada e analisada em todos os seus matizes, Sr. Presidente, e publicizada pelo CFM nas edições do nosso Demografia Médica. Nossos dados apontam - e o senhor já citou esse fato - uma razão nacional de 2,1 médicos por mil habitantes no Brasil, hoje. E isso é bem próximo dos Estados Unidos, que têm 2,5 por mil habitantes; Canadá, 2,4; e Japão, 2,2. Porém - e aí já enfatizado por V. Exª -, o Norte e o Nordeste brasileiros apresentam muito menor razão: 1,09 no Norte e 1,3 médicos por mil habitantes no Nordeste. A situação é pior nos interiores dessas duas regiões, Norte e Nordeste, onde a proporção de médicos por mil habitantes é, na sequência, Norte, 0,42 médicos por mil habitantes, e, Nordeste, 0,46 por mil habitantes, lá no interior dessas regiões.
Quanto a este ponto que estamos analisando, da assistência médica, já temos dois programas públicos em nosso País: o Provab e o Programa Mais Médicos, já citado. O Provab (Programa de Valorização dos Profissionais da Atenção Básica) foi criado pelo Governo Federal em 2011, com o objetivo de levar assistência médica aos locais afastados. O Provab está se encerrando neste final de 2018. Os médicos que ainda trabalham no Provab migrarão para o Mais Médicos a partir dessa data.
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O segundo é o Programa Mais Médicos, criado pela Lei 12.871, que tem a finalidade de formar recursos na área médica para o SUS. O Programa Mais Médicos objetiva diminuir a carência de médicos nas regiões prioritárias para o Sistema Único de Saúde, a fim de reduzir as desigualdades regionais na área da saúde. Assim está concebido. O Mais Médicos conta, de acordo com os dados Ministério da Saúde atualizados em 20/9/2016 - não temos dados de hoje com precisão -, em setembro de 2016, contava o Mais Médicos com 18.240 médicos trabalhando no programa. Destes, 29%, 5.274 são médicos formados no Brasil; 1.537, portanto, 8,4%, médicos brasileiros, mas formados no exterior; e 11.429, ou seja, 62,6%, com diplomas no exterior, por cooperação com a Opas.
O CFM, Sr. Presidente, entende que o PLS 168, de 2012, perdeu o seu objeto, e também entende que ele nada acrescenta a esse tópico da prestação de serviço de saúde aos vazios assistenciais. Sobre esse tópico da prestação de serviços aos vazios assistenciais, o Conselho Federal de Medicina defende, tem defendido a criação da carreira de Estado para profissionais de saúde para o SUS, ao mesmo tempo em que luta por seu maior financiamento, que haja maior aporte de recursos públicos, a fim de criar estruturas de trabalho minimamente adequadas para o serviço de saúde, unidades básicas de saúde, hospitais, laboratórios clínicos, bancos de sangue, clínicas de imagem.
Entende o Conselho Federal de Medicina que só uma carreira de Estado, com todos os direitos trabalhistas garantidos por lei e boas condições de trabalho, teria melhores possibilidades de fixar os profissionais de saúde nas recuadas regiões de nosso País. Enfatiza também que essas recuadas regiões, esses vazios assistenciais não só não têm médicos; essas regiões também não têm enfermeiros, não têm psicólogos, não têm dentistas, não têm engenheiros, arquitetos, educadores, filósofos, assistentes sociais. Há que haver também melhores condições de vida nesses locais, para que, ao lado de ter uma carreira segura e boas condições de trabalho, o profissional possa morar, criar sua família, educar seus filhos. Há, nesta Casa, para votação a PEC 454, de 2009, que trata desta matéria, carreira de Estado para serviço de saúde no SUS. Essa é a nossa luta.
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O outro ponto que suscita uma reflexão verticalizada do PL 168, de 2012, de V. Exª, diz respeito ao tempo de formação do médico brasileiro, principalmente para aquele que pretende fazer uma especialidade médica. A Lei 12.871, de 2013, a conhecida Lei do Mais Médicos, criou o Programa de Residência Médica em Medicina Geral de Família e Comunidade, com duração mínima de dois anos; introduziu a realização de um a dois anos desse programa na Medicina Geral de Família e Comunidade na Residência Médica da Medicina Interna (da Clínica Médica), da Pediatria, da Ginecologia e Obstetrícia, da Cirurgia Geral, da Psiquiatria, da Medicina Preventiva e Social. Ou seja, a lei citada já aumenta em um ou dois anos a formação de um especialista no Brasil nessas áreas.
Cito o exemplo da formação de um urologista. Eu sou urologista, e vou citar o exemplo da formação de um urologista no nosso País. Além de seis anos de faculdade de Medicina - seis anos! -, há mais um ano ou dois do programa criado pela Lei dos Mais Médicos, o Programa de Medicina Geral de Família e Comunidade; mais dois anos de Cirurgia Geral; mais três anos de Urologia. Com a aprovação deste projeto de lei, do PLS em questão, seriam mais dois anos de serviço social obrigatório, perfazendo um total de 14 anos para a formação de um urologista - tempo demasiado longo para a formação de um especialista para um país como o nosso, carente de profissionais especializados, extremamente necessários para tratar os agravos complexos da nossa população.
Em suma, Sr. Presidente, o Conselho Federal de Medicina se posiciona contra a aprovação do PLS 168, de 2012, por entender que ele não atenderia as necessidades da população no tocante à prestação de serviço de saúde e alongaria mais ainda um já longo período de formação de nossos especialistas, uma necessidade vital da sociedade brasileira. Contrapõe o Conselho Federal - e, aí, eu gostaria de enfatizar - a criação de uma carreira de Estado para profissionais de saúde a prestar assistência ao Sistema Único de Saúde e luta pelo aumento dos investimentos públicos na área da infraestrutura básica do setor como única forma de preencher os vazios assistenciais com prestação de serviço de qualidade à nossa popular e ao nosso País.
Muito obrigado, Sr. Presidente, pela oportunidade e pelo tempo.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Muito obrigado, Dr. Lúcio Flávio.
Eu quero dizer que não precisa pedir desculpas por ser contra. Nós chamamos exatamente por isso o Conselho Federal de Medicina. É preciso que a população ouça o que o conselho pensa, como ouviu como pensava, na hora do Mais Médicos, já que foi o grande combatente contra o Programa Mais Médicos. Então, o seu papel está correto. E eu vou guardar as perguntas para fazer a todos depois.
Antes disso, eu passo a palavra ao Dr. Ricardo Chaves de Rezende Martins.
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O SR. RICARDO CHAVES DE REZENDE MARTINS - Obrigado, Senador Cristovam, Presidente desta Comissão. Quero agradecer o convite para participar desta audiência pública. Eu credito o convite ao fato de que, em algum momento, lá na Câmara dos Deputados, andei estudando o tema não só na questão brasileira, mas procurando ter uma visão comparada do que acontece em outros países da América Latina. Então, espero que a minha contribuição hoje tenha alguma utilidade. Eu vou trazer um pouco dessa visão comparada e também como a matéria, que é apaixonante e ao mesmo tempo polêmica, ao longo do tempo, vem sendo discutida na Câmara dos Deputados, já que será decidida pelas duas Casas do Congresso, uma após a outra.
O projeto de lei, como o doutor que me antecedeu já colocou na leitura que fez em sua exposição, coloca-se no contexto do que se chama genericamente serviço social obrigatório. E é dentro dessa ótica que eu vou apresentar inicialmente o panorama na América Latina e, em seguida, as iniciativas e pareceres na Câmara dos Deputados. É uma matéria que vem sendo discutida há muito tempo e, portanto, tem argumentos que lhe são favoráveis e argumentos que lhe são contrários. É isso que vou buscar apresentar em relação a esse debate que vem acontecendo ao longo do tempo.
No México, existe uma previsão de serviço social obrigatório para aqueles que concluem a educação superior. Essa previsão é constitucional e consta também de uma lei que regulamenta a matéria, que nós chamaríamos de uma lei complementar. Só que ela obrigada a isso todos os formandos de instituições públicas e particulares de todas as profissões, não é específica a uma única área ou a uma única profissão. Essa obrigação é, geralmente, de um a dois anos, e a sua operacionalização eu vou comentar mais a seguir.
A Colômbia tem dois tipos de serviço social obrigatório previstos: um para os estudantes do ensino médio, que deve ocorrer durante o curso, e outro para aqueles que se formam em cursos superiores, tecnológicos ou universitários, como é a denominação deles, mas é o curso geral, que é o requisito para registro, emprego público e exercício profissional. Essa matéria não tem previsão constitucional como tem no México, no entanto ela foi debatida no âmbito da Supremo Corte colombiana e foi reconhecida a sua constitucionalidade em função de outros dispositivos da Constituição.
A Venezuela também prevê, na sua Constituição, o serviço comunitário para o estudante de educação superior. Só que, na Venezuela, esse serviço é dentro do curso de formação do médico, obrigatório para formandos, e não para formados; é para aqueles que estão fazendo o curso. É um serviço que varia de 120 horas a três meses, conforme o currículo, conforme a área, conforme o que estiver sendo colocado.
A Costa Rica tem um serviço obrigatório para profissionais só da área da saúde, com duração de um ano, como requisito para o exercício profissional.
A Bolívia tinha previsão, anteriormente, de um serviço para áreas mais distantes, o chamado Serviço Social de Saúde Rural Obrigatório, que tinha duração inicial de um ano. Já há algum tempo, desde 2001, eles transformaram essa obrigação em uma etapa dentro do próprio curso, na etapa do internato, com duração de três meses.
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E o Equador, que foi o que adotou providências mais recentes com relação a isso, possui o serviço social obrigatório, com duração de um ano, na área da saúde, no meio rural e periferias, como condição para habilitação ao exercício e registro profissionais.
Este é o quadro dos países que estão aqui no entorno do Brasil e que adotaram a medida. O Uruguai discutiu isso em 2011, mas não implementou, pela informação que eu tenho.
Na maioria dos países em que o serviço social obrigatório está instituído há dificuldades para a sua efetiva implementação - são os dados que temos -, sobretudo em função da discrepância entre o número de postos de trabalho abertos e o número de formando a cada ano. Então, naqueles que são mais sistemáticos e que divulgam informações a esse respeito - por exemplo, a Colômbia é um dos que divulgam -, ocorre sorteio entre os que estariam obrigados a prestar o serviço, para que possa haver algum tipo de aproveitamento. Não existem condições de alocar todos os formandos ao mesmo tempo.
Eu estudei o que há no Brasil e estou trazendo aquilo que está tramitando na Câmara.
Antes disso, deixe-me colocar uma questão que também vai ser relevante para a discussão no Brasil, que é a questão da gratuidade do ensino nesses países. Em todos os países, o ensino é gratuito. À exceção da Costa Rica, em que vai só até a educação básica, em todos os demais existe gratuidade em todos os níveis da educação pública, da educação oferecida pelo Estado pelo menos até o nível da graduação.
Na Câmara, existem cinco propostas de emenda constitucional tramitando, inclusive há longo tempo algumas - há uma que tramita desde 1995. O objetivo delas todas é colocar no texto da Constituição Federal a previsão da prestação de serviço social obrigatório remunerado como condição para a obtenção do diploma ou como contrapartida ao investimento público daqueles que fizeram seus cursos nas instituições públicas. Existem três que estão aguardando a instalação de comissão especial e duas que estão aguardando o parecer de admissibilidade na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Existem três ou quatro que são genéricas e existe uma apenas específica para a área da saúde ou para a área da Medicina, que é a PEC 253, de 2008.
Vinte e quatro projetos de lei sobre essa matéria tramitam na Câmara dos Deputados. Desses 24, os que estão sublinhados já foram apreciados em algumas comissões. Os demais são posteriores à época da apreciação, mas também estão apensados, portanto estão tramitando em conjunto. A primeira apreciação foi feita pela Comissão de Seguridade Social e Família, em 2013, embora o primeiro projeto - o projeto principal - seja o último da lista, de 2007. Ele foi aprovado pela Comissão de Seguridade Social na forma de substitutivo que obriga os estudantes de Medicina, Odontologia, Enfermagem e Farmácia que concluíram a graduação a prestarem serviço remunerado em comunidades carentes. A temática é mais ou menos a mesma. O teor do substitutivo aprovado é um pouco distinto do teor do projeto, mas vai na mesma direção.
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A Comissão de Educação aprovou esse substitutivo da Comissão de Seguridade, no entanto com uma subemenda, apenas para evitar que houvesse algum tipo de conflito com o Serviço Militar Obrigatório.
Nem a Comissão de Constituição e Justiça nem a Comissão de Finanças e Tributação chegou a apreciar os projetos, mas pareceres foram apresentados. Na Comissão de Constituição e Justiça, o parecer apresentado foi favorável, com o argumento da competência do Poder Público de regulamentar, fiscalizar e controlar as ações e políticas da área da saúde. Então, foi um parecer voltado para o papel do Poder Público no atendimento à saúde da população. E a Comissão de Finanças e Tributação também não votou, mas nela foi apresentado um parecer contrário, pela inadequação financeira e orçamentária, pelo fato de que o projeto criava despesa sem que houvesse previsão orçamentária. Portanto, haveria uma contrariedade aos dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Essa é a situação atual, mas existe uma situação pregressa. Na situação pregressa, três argumentos contrários foram apresentados a proposições dessa natureza. Este é o debate que se está colocando na Câmara.
Primeiro, a Constituição assegura o princípio da gratuidade para todo o ensino público. O princípio da gratuidade para todo o ensino público não supõe a cobrança de qualquer tipo de contraprestação, seja de natureza pecuniária, seja em forma de serviço social.
Com relação ao exercício profissional, diferentemente do que ocorre em outros países que mencionam o Poder Público definindo as condições para o exercício profissional, no Brasil a Constituição fala nas qualificações profissionais que a lei estabelecer, ao argumento de que essas expressões têm teor distinto e, portanto, não caberia estabelecer esse tipo de condição para o exercício profissional.
E o terceiro argumento colocado é que a instituição de serviço social obrigatório apenas para algumas profissões, como seria o caso para a área da Medicina ou apenas para as áreas da saúde, contraria o princípio constitucional da isonomia. Por que obrigar a isso alguns e não outros formados nas instituições públicas?
Com base nisso, por exemplo, proposições anteriormente examinadas na Câmara foram rejeitadas. Em 2007, houve parecer contrário com base nessa questão. Havia projetos que queriam instituir o serviço social remunerado para todas as áreas e outros que queriam apenas para a área médica ou para a área da saúde. A matéria recebeu rejeição na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público com base nos seguintes argumentos: custo da remuneração do serviço pelo Poder Público, dificuldade de absorver o número crescente de egressos, variedade de profissionais e tratamento desigual para os recém-formados, a quebra da isonomia. Já a Comissão de Educação e Cultura, em relação a essa mesma matéria, foi favorável, falando do significado da inserção em responsabilidade social da iniciativa e das possibilidades de atendimento e carência de profissionais em diferentes regiões do País.
A Comissão de Constituição e Justiça, naquela matéria, naquela época, pronunciou-se contrariamente - e isso determinou o arquivamento desses projetos -, pela inconstitucionalidade de estabelecer em lei ordinária o serviço civil profissional como...
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A Comissão de Constituição e Justiça, naquela matéria, naquela época, pronunciou-se contrariamente - e isso determinou o arquivamento desses projetos -, pela inconstitucionalidade de estabelecer em lei ordinária o serviço civil profissional como alternativa ao Serviço Militar Obrigatório, a injuridicidade de definir a prestação de serviço como requisito para o registro profissional e a inconstitucionalidade de um projeto que trata apenas da área da saúde, violando o princípio da isonomia. E, ainda, a inconstitucionalidade por colidir com o art. 205 da Constituição. Não é possível exigir do profissional formado o desempenho ou o suprimento de uma carência que compete ao Poder Público realizar ou suprir.
Outros projetos que tornavam obrigatório o serviço de professor do ensino público fundamental e médio tiveram conclusão semelhante. A prestação de serviço, em 2001, foi rejeitada na Comissão de Educação e Cultura, com base, digamos, em que retribuir o privilégio que tiveram seria inverter as prioridades. O PL nº 5.427, que dispunha sobre a prestação de serviços gratuitos como professor de ensino público, também foi arquivado pela mesma razão. Há outros projetos de lei também relativos a essa questão profissional civil obrigatória, outros para Medicina. Enfim, a questão, em geral, foi rejeitada na Comissão de Educação em função também da exigência da contrapartida do princípio constitucional.
Em resumo, o debate, ao longo do tempo, tem dois polos. O polo favorável defende a competência do Poder Público em estabelecer normas no escopo da regulamentação, da fiscalização e do controle das ações e políticas de saúde no Brasil. Aqueles que são contrários têm como argumento a questão de que, para que esse serviço social pudesse ser previsto, nesta área ou em qualquer outra, teria que haver uma previsão constitucional em função do princípio da gratuidade do ensino público, que está previsto no art. 206 da Constituição, e do exercício profissional, porque a forma como a Constituição prevê a competência do Poder Público, especialmente da União, não daria margem a isso.
Com relação ao tema propriamente dito, a amplidão geográfica com que o tema é tratado nos países da América Latina e o longo tempo em que vem sendo debatido no Brasil demonstram o seu significado social. A experiência colhida em outros países revela dificuldades de implementação, custos significativos para o Poder Público e reduzida capacidade de aproveitamento dos egressos das instituições.
Nos países onde ele é implementado de uma forma regular, ele cumpre o papel de inserção no mercado de trabalho, de alguma forma, para recém-formados, ainda que em número reduzido. Não há, porém, dados confiáveis - pelo menos eu não encontrei, é possível que alguém os tenha - que afirmem que esse instituto seja um eficaz instrumento de política pública para alocação de profissionais em regiões deles carentes em diferentes áreas de formação. Tanto assim que os diversos países que buscam aumentar a eficiência na alocação dessas pessoas criam programas próprios, específicos, como é o caso, por exemplo, dos programas brasileiros - o mais recente é o Mais Médicos.
Era esta a minha contribuição, que espero que seja útil, em termos de informação, para o debate, porque coloca os argumentos de um lado e do outro.
Obrigado pela atenção.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Muito obrigado. Agradeço muito ao senhor por trazer essa história toda.
Passo a palavra ao Dr. Geraldo Adão Santos.
Quero dizer que tivemos uma posição contrária e outra que analisa o assunto, dando os argumentos, a favor e contra, dos outros.
Dr. Geraldo, membro do Conselho Nacional de Saúde.
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O SR. GERALDO ADÃO SANTOS - Em primeiro lugar, a nossa saudação ao Senador Cristovam Buarque, coordenador desta Mesa, ao Dr. Ricardo Chaves e ao Dr. Lúcio Flávio.
Meu nome é Geraldo Adão Santos e eu sou membro do Conselho Municipal de Saúde da minha cidade, Nova Lima, sou membro do Conselho Nacional de Saúde e, neste conselho, no momento, sou representante da Confederação Brasileira dos Aposentados, Pensionistas e Idosos. Nós temos hoje a responsabilidade da coordenação de duas comissões de trabalho do Conselho Nacional: a Comissão de Saúde dos Ciclos de Vida e a Comissão de Saúde Bucal. E nós temos uma posição um pouco mais abrangente com relação a essa questão da formação profissional no Brasil, exatamente porque a nossa visão é a do lado do usuário; nós somos representantes dos usuários. E eu pediria a atenção de todos aqui presentes para esta proposta, que é a base deste debate - inclusive, o Senador Cristovam Buarque é autor de uma das propostas sobre o que nós vamos defender aqui -, que é realmente o serviço civil obrigatório.
Em primeiro lugar, fazendo esta apresentação, nós agradecemos a oportunidade de um representante do segmento dos usuários estar aqui participando desta honrosa Mesa.
Eu gostaria de dizer que nós promovemos, em 2012, uma Caravana da Saúde, percorrendo todas as capitais brasileiras, um trabalho integrado com os conselhos estaduais, com os conselhos municipais, e desse trabalho foram aprovadas sete propostas, todas elas muito importantes - vou lê-las todas aqui. Para nossa satisfação, o serviço civil obrigatório foi uma proposta nossa aprovada entre as sete dessa caravana, e essa nossa é a terceira. E muito nos honra ver três Senadores da República com projetos de lei relacionados a esse assunto - um é do senhor, outro é do ex-Senador Jayme Campos, e o outro é do Senador Humberto Costa. Dessas três propostas, duas são PLSs e uma é PEC - a do Senador Humberto Costa é uma PEC.
É claro que o Conselho Nacional, tendo aprovado essa proposta, designou-me para estar aqui, com muita honra, em defesa dessa proposta, que é o serviço civil obrigatório. Agora, na explicação que nós vamos dar aqui, eu gostaria de pedir muita atenção para vermos a compatibilidade dela com o nosso sistema de saúde. O Brasil tem o maior sistema público de saúde, que é o Sistema Único de Saúde, público e universal. Mas está nos capítulos da Constituição. Então, nós queremos debater essa questão da falta de profissionais. Aqui também nós não defendemos só a questão do médico, nós defendemos a questão das 14 profissões da saúde. É o que nós vamos dizer aqui. Porque não adianta haver só médico. Já não há o suficiente, mas não adianta haver só médico. E os outros profissionais da saúde? Então, nós temos que pensar na equipe completa que possa dar atenção a toda a assistência à saúde.
Então, eu pediria em primeiro lugar, se o Senador me permitir aqui... Eu já tenho uma militância no Conselho Municipal de Saúde - posso, Senador, fazer um pedido?
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF. Fora do microfone.) - Claro!
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O SR. GERALDO ADÃO SANTOS - Eu sou da cidade de Nova Lima, sou aposentado da Companhia Energética de Minas Gerais e, desde que me aposentei, a partir de 1992, eu me dediquei ao SUS. Eu sou formado em Administração de Empresas, sou formado em Ciências Sociais e, uma vez aposentado, tomei uma decisão, de comum acordo com a minha família, de que eu iria dedicar toda a minha capacidade, toda a minha vontade em defesa do SUS, porque nunca houve neste Brasil uma assistência à saúde tão abrangente como nós temos agora. Os sistemas anteriores eram exclusivos; esse é inclusivo. E não há brasileiro que vá dizer "eu não preciso do SUS". Todo mundo precisa do SUS e todo mundo usa o SUS. É bom refletir com essa dimensão de entendimento.
Então, eu comecei, aposentado, a trabalhar em Nova Lima, junto com o prefeito, junto com a Câmara, e nós conseguimos, em 10 de junho de 1993, constituir o nosso Conselho Municipal de Saúde e criar o SUS no nosso Município. A partir daí, em um período eu estou fora, em outro, participando, mas nós estamos trabalhando no Conselho Municipal de Saúde até hoje. Eu gostaria de deixar mencionado aqui que o trabalho que nós fizemos foi como se fosse uma iniciação nessa carreira do SUS, e nós temos Nova Lima como ponto de partida. Daí nós chegamos ao Conselho Nacional dos Direitos do Idoso, chegamos ao Conselho Nacional de Saúde, já fomos coordenadores de diversas outras comissões, sendo hoje destas duas: a dos Ciclos de Vida e a da Saúde Bucal.
Senador, agora, eu gostaria de mencionar que V. Exª, o ex-Senador Jayme Campos e o Senador Humberto Costa têm três projetos sobre esse assunto. Conversando com o Senador Paulo Paim - nós temos uma ligação muito grande com ele por causa da Cobap, dos aposentados, dos idosos - mais detalhadamente sobre essa proposta do serviço civil obrigatório, ele disse para mim o seguinte: "o que você está completando em função da proposta nós não conhecemos, então seria conveniente marcar uma audiência para a gente conversar sobre esses três projetos e, quem sabe até, trabalhar na unificação deles". Agora, um é diferente, porque é PLS, o outro é PEC. E trabalhar com PEC hoje, mudança por emenda à Constituição, é de uma dificuldade muito grande. Mas, com esses três - incluindo o do ex-Senador Jayme Campos e o do Senador Cristovam, a quem temos muita honra de ver com uma dessas proposições -, vamos pensar na possibilidade de trabalhar essa proposta.
Agora, vou fazer uma sequência aqui do que nós gostaríamos de refletir profundamente para chegar a reconhecer a importância dessa proposta que nós fazemos no sentido de realmente complementar o SUS. Vamos pelo histórico.
Primeiro, nós temos um histórico de ações relevantes relativas ao SUS, e, quando eu cheguei ao Conselho Nacional de Saúde, em 2010, a primeira delas foi a seguinte: o SUS já tem quase dez anos de existência, e esse sistema ainda não conseguiu o principal, que é fazer o acolhimento dos seus pacientes, que hoje são todas as pessoas deste País, inclusive estrangeiros que estejam aqui participando de algo ou em viagem. O SUS visa atender a todos os brasileiros e estrangeiros que estejam aqui, temporária ou definitivamente. Então, esse sistema não aprendeu o principal, o ponto número um: o acolhimento. É um sistema novo, é de acolhimento universal. Essa situação é nova para nós, mas o sistema exigia que se fizesse isso, e nós não sabíamos ainda fazer o acolhimento.
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O Dr. Nelson Rodrigues, Presidente do Conselho à época, disse: "Adão, você levantou uma questão importante, que é a do acolhimento; tudo começa pelo acolhimento". Então, foi constituído um GT para trabalhar uma política nacional de acolhimento e humanização no atendimento aos pacientes do SUS. Hoje essa é uma política com mais de dez anos de existência e que está implementada não só no âmbito do SUS, mas também no âmbito da assistência particular. Então, eu gostaria de mencionar isso para a gente começar a pensar sobre a grandeza do SUS e, ainda, o que está faltando no SUS.
Agora, nós fizemos também uma proposta, que é essa da Caravana, a de nº 3, que se chama - os nomes estão divergindo um pouco -, conforme a nossa proposta, Serviço Civil Obrigatório. Agora, esse serviço civil obrigatório é para ter a dimensão do SUS, afinal de contas as nossas universidades até hoje não cumprem o art. 200 da Constituição, em cujo inciso III está escrito que compete ao SUS "ordenar a formação de recursos humanos" para o sistema. O SUS está completando já 27 anos e não trabalhou a formação profissional para um sistema que é público e universal. E foi nessa linha que nós fizemos essa proposta.
Está escrito aqui:
Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei:
.......................................................
III - ordenar a formação de recursos humanos na área da saúde;
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Pelo menos em nível das universidades públicas e em nível das pessoas que estudam, mesmo que em universidades particulares, mas com bolsas do Governo, acho que o SUS tem que cumprir esse papel de ordenar a formação. E aí nós teríamos não só médicos, mas pessoas das 14 profissões de saúde. É uma equipe. Então, é preciso que todos eles tenham a oportunidade de acesso à formação adequada para um atendimento adequado, completo e de qualidade no SUS.
Qual é a proposta, Senador, que nós apresentamos? Infelizmente, a de V. Exª, como as demais, trata de uma base de proposta, mas essa proposta tem desdobramentos maiores, e é isso que eu gostaria de confirmar aqui.
A nossa proposta tem o seguinte formato: graduação normal concluída implicaria a obrigatoriedade de prestação de serviços no SUS para as 14 profissões da saúde. Item seguinte: será definido o tempo tecnicamente necessário para o curso dessa formação. Sugerimos que o curso seja enquadrado na categoria de pós-graduação em Saúde Pública na respectiva área de formação. O profissional será admitido no campo da sua formação, com prioridade para atuar no seu Município de origem ou no seu Estado. O curso proposto deverá remunerar o profissional formado com valores e critérios a serem estabelecidos.
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Não é uma extensão de curso obrigatória; é uma oportunidade de fazer um curso complementar - nós, naturalmente, vamos precisar do Ministério da Educação para nos dar a dimensão disso. É um curso de pós-graduação em Saúde Pública, promovido pelo Ministério da Educação, e, na prática, com a participação desse profissional, que já é profissional, fazendo um curso de pós-graduação.
O tempo, eu não tenho condição de estabelecer se seria conveniente um ano, um ano e meio. Eu acredito que entre um ano e um ano e meio seria suficiente, mas o Ministério da Educação certamente trabalhará essa questão. É o que nós esperamos.
Ao concluir o curso de pós-graduação, o profissional poderá ser admitido no SUS mediante concurso público. Para isso, na condição de pós-graduado, nas 14 profissões, ele já teria uma pontuação favorável de 10 pontos. Então, em termos de concurso, em termos de concorrência com outro, ele já teria 10 pontos positivos, porque já teve o curso de pós-graduação.
Enquanto estiver fazendo esse curso, ele não é um estagiário; é um profissional formado, fazendo um curso de pós-graduação e com salário. Não é o salário, talvez, do profissional concursado, porque cada prefeitura, de acordo com os seus recursos, tem um padrão de salário, tem um nível. Mas vamos supor que a média de salário seja de 10 mil. Ele - não como estagiário -, fazendo um curso de pós-graduação e trabalhando no SUS na sua profissão, poderia ser remunerado. Então, ele já sai da faculdade, da formação básica, e vai fazer um curso de pós-graduação, atuando no SUS, mas com salário, que seja de um ano ou um ano e meio. Uma parte é teórica, e outra parte é prática. Saindo do curso, ele tem uma graduação de 10 pontos para, depois, se for fazer um concurso para entrar no SUS... Imaginaram profissionais das 14 profissões de pós-graduação fazendo concurso para entrar no SUS?
Prossigo: ao concluir essa pós-graduação, o profissional poderá ser admitido no SUS, mediante concurso público, como pós-graduado, contando com 10 pontos nessa avaliação.
Os profissionais admitidos nessa possível modalidade poderão também optar por fazer o curso de pós-graduação. Ou seja, para aqueles que já trabalham no SUS, mediante concurso ou mesmo contratados, se quiserem fazer esse curso, seria aberta essa oportunidade. Porque, senão, seria criado um desequilíbrio entre os que já estão e, depois, os outros com nível de pós-graduação. Por que não dar para os que já são contratados hoje essa oportunidade também?
Para as áreas mais carentes - esse é o grande problema do Brasil, e não é só no interior remoto, não; é nas próprias periferias que está a maior dificuldade hoje de atendimento, inclusive nas UPAs, no serviço de urgência, porque os profissionais não têm segurança sequer de condições de trabalho. Então, para as áreas mais carentes serão, naturalmente, criados critérios específicos de condições de trabalho, de segurança e de incentivo.
No nosso entender, essa modalidade do curso preencherá as demandas de profissionais e especialidades no SUS, e o esforço conjunto viável entre o Ministério da Educação e o Ministério da Saúde dará ao SUS outro status, por ter um quadro de profissionais pós-graduados em Saúde Pública. Quer dizer, nada mais lógico do que o Ministério da Educação e o SUS se unindo e dando a esses profissionais da saúde a formação em nível de pós-graduação para todas as profissões. Naturalmente, nós teremos um SUS muito mais abrangente, muito mais competente, com pessoas formadas de acordo com a sua responsabilidade, que é o atendimento universal a todos os brasileiros e estrangeiros que aqui estejam.
Essa é uma proposta simplificada, naturalmente, mas a sua abrangência vai além dos três projetos.
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Qual seria nossa proposta, que ensejou que o Senador Paulo Paim pediu que realizasse esta reunião, colaborando com isso? A ideia, Senador, é que V. Exª, sendo um dos autores, pedimos também a compreensão de V. Exª, juntamente com os demais, e vamos trabalhar essa proposta, vamos completar esse SUS, que é o maior sistema do Brasil e, talvez, do mundo. Mas se completará realmente formando seus próprios profissionais e dando garantia de um atendimento qualificado a todos os brasileiros. Esse é o nosso sonho, essa é a nossa esperança, e acreditamos que isso é possível se quisermos.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Muito obrigado, Dr. Geraldo.
Eu vou fazer umas perguntas e algumas considerações, mas vou fazer logo aos três, embora eu tenha personalizado, mas qualquer um pode responder sobre o que eu falar para o outro, e, depois, todos responderão.
Ao Dr. Lúcio, quero agradecer muito a presença dele, acho que a opinião dele é fundamental, temos de ouvi-lo. Confesso até, Dr. Lúcio, que eu me pergunto se não vale a pena eu fazer uma consulta às pessoas aí fora, antes de decidir retirar o projeto, de certa maneira, a pedido do Conselho. Vou pensar se devo fazer essa consulta. No Senado, nós temos sistema de consulta pela internet, que às vezes chega a milhares. Eu vou pensar se há condições de fazer uma pergunta: "Devo retirar esse projeto em função de uma sugestão do Conselho Federal de Medicina, pelo qual eu tenho tanto respeito?"
Mas eu quero dizer que eu apresentei não só pensando na saúde; eu apresentei como professor. Porque eu imagino, e ouvi isso de um médico, que o doente é um professor do médico, muito pouquinho, mas o doente, quando ele diz que o remédio o ajudou a melhorar, está ensinando ao médico que o remédio é bom. Quando ele participa nessa interação, ele é também um pouco professor.
Então, expor o aluno, ex-aluno formado, a essa comunidade, não apenas vai beneficiar essa comunidade, vai também beneficiar o aluno, ex-aluno, o jovem médico. Sem falar que, a meu ver, ao ir para esses lugares, a cabeça deles muda completamente. Descobrem o Brasil, que muitos de nós, alunos universitários urbanos, não conhecemos. Daí aquele programa, com que eu tive a ver naquela época, ainda como estudante, chamado Projeto Rondon, que era uma tentativa de levar jovens universitários a verem a realidade.
Sobre as considerações de que perdeu o objeto devido ao Mais Médicos. Mas não seria bom substituir os médicos cubanos por brasileiros? Eu sempre ouvi dizer que essa deveria ser uma tendência por causa do idioma, até. Então, nós não vamos fechar o Mais Médicos, espero que não, seria uma tragédia neste momento, mas será uma tragédia se daqui a dez anos o Brasil ainda precisar de argentino, cubano, paraguaio. É como a Bolsa Família, acabar com ela é uma tragédia social, mas ela continuar sendo necessária daqui a dez anos é uma tragédia histórica, o Brasil continuar com sua população necessitando dessa ajuda.
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Então, minha pergunta: perdeu o objeto graças ao Mais Médicos? O Mais Médicos é temporário e seria uma maneira de ir substituindo. Segundo, o objeto... A minha pergunta é se prejudicam a formação ou beneficiam a formação esses estágios para já formados - remunerados, obviamente. Prejudicam ou beneficiam a formação? É uma pergunta.
Outra pergunta: na ideia de que, como o senhor disse, não faltam apenas médicos - isso daí é realmente verdade? O Dr. Geraldo também falou. Então, a pergunta não seria que esse projeto de lei deve ser para todas as profissões? Talvez até começando pelas profissões relacionadas à saúde? Mas será que... O senhor citou aí: por que médicos e não filósofos? Eu poderia responder: porque médico é mais urgente do que filósofo. Mas eu prefiro dizer: e se a gente botar filósofo também? O Conselho ficaria favorável? É uma pergunta que eu quero fazer.
Outra é que há falta de enfermeiros; então, não seria o caso de a gente colocar uma emenda, ampliando para as outras áreas da saúde, como o Dr. Geraldo sugeriu? E eu estou pronto para fazer essa emenda, no meu próprio projeto.
Então, essas são as perguntas ao Dr. Lúcio.
Ao Dr. Ricardo. Aqui tenho uma pergunta que é mais ampla, mas o senhor, como consultor, pode ajudar: por que, no Brasil, é tão difícil adotar a ideia de serviço social, enquanto em outros países, como o senhor mostrou, já existe? E aí eu não falo só para a saúde, não - eu falo para tudo.
Eu fui reitor - faz tanto tempo que muitos não sabem - e houve uma crise de inundações no Acre. Eu reuni a associação dos alunos e disse: "Eu quero mandar um grupo de estudantes para irem ajudar lá." E eles me perguntaram quanto iriam ganhar. Eu aí suspendi a minha preocupação, a minha intenção e fui para casa chorar um pouquinho com meu desânimo, porque, na minha época de estudante, se alguém oferecesse ir para o Acre para ajudar numa inundação, haveria fila de gente. Perguntariam quanto teriam de pagar, quem tivesse dinheiro. Então, é uma pergunta: o que faz com que, no Brasil, haja tanta resistência à ideia de que você tem de fazer alguma coisa, obrigatoriamente, para os outros? Mas é uma característica do Brasil; deve ser de outros países também, mas por que naqueles não é assim - México, Costa Rica, que o senhor citou? Por que existe mais aceitação do trabalho voluntário, que nem precisaria ser obrigatório?
E aí eu quero adiantar uma coisa que eu acho que tem a ver com o argumento constitucional: por que a Constituição do Brasil tem tantos direitos e não tem deveres? Vou arriscar uma explicação, o senhor analisa. Eu creio que a nossa Constituição de 1988 surge para enterrar o regime autoritário dos militares, e a melhor maneira de enterrar um regime autoritário é garantir direitos - e aí nos esquecemos dos deveres. Serviço militar, em qualquer lugar que tenha pretensões como o Brasil, é obrigatório mesmo, porque faz parte da formação de um jovem servir às Forças Armadas; faz parte. E o país cresce, melhora com isso. No Brasil não é.
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Aí eu vou avançar na ideia de que na Constituição todos têm direitos iguais, então não se pode exigir nada para uns que não se exija para os outros. Mas, na verdade, são formas diferentes, porque se exige diferentemente também. Para ser médico tem de ter feito seis anos de curso. Ninguém dá um diploma, com base na Constituição, a quem não estudou para ser médico; seria um caos. Além disso, eu pergunto ao senhor que tal uma emenda em que eu diga o seguinte: cria-se esse serviço; agora, quem quiser, pode não cumprir - basta pagar o dinheiro que recebeu, os R$400 mil que custa a formação de um médico. Pode ser uma solução, por causa da ideia de que é gratuito e, se é gratuito, não se pode exigir nada. Eu sei...
Às pessoas que estão assistindo, eu quero dizer o seguinte: eu não vou pagar nada para beber esta água. Mas vocês pensam que isto é gratuito? Você pagou para que esta água chegasse aqui! Inclusive o salário do nosso garçom, que a trouxe aqui. Isto aqui não é gratuito! Eu é que não vou pagar. É gratuito para nós, mas o povo paga. Não existe ensino gratuito, existe ensino em que o aluno não paga - mas alguém está pagando. Custa R$400 mil a formação de um médico, e é você que está pagando, e eu e nós aqui. Mesmo que não seja filho nosso. Por que a gente faz isso? Porque o Brasil precisa de médicos; não só os 220 milhões de brasileiros - a entidade Brasil também precisa. Mas é falsa essa ideia de gratuidade. É gratuito para quem recebe, não é gratuito para quem paga. E não é só água não, hein? Este frio que a gente está sentindo aqui por causa do ar-condicionado - é você que está pagando a conta da luz! Alguém limpou esta sala aqui - você pagou. É gratuito para nós que estamos aqui. Mas não são gratuitas para o povo a universidade e a educação de base. As pessoas se esquecem disso.
Eu já vi alguém defendendo que deveria ser pago o ensino, para as pessoas, o aluno e o pai, poderem descobrir a importância dele, da educação de base. Eu já ouvi alguém dizendo que se cada pai pagasse R$5 por mês ele trataria melhor a escola do que não pagando nada, porque, com o conceito de gratuidade, ele termina não dando valor àquilo. Eu prefiro tentar mudar a consciência para se dar valor do que usar o instrumento do pagamento para que as pessoas deem valor. Mas vale a pena a gente pensar: se cada pai neste País pagasse R$5 por mês pelo filho - o que seria um valor pequenininho, é possível que todos possam pagar; e ainda diria: desempregados não pagam -, será que ele não daria mais valor? Será que ele não iria ver que o professor é pago por ele? Que a limpeza é paga por ele, e por isso tem de puxar a orelha do menino se o menino suja? Hoje, não. Até se incentiva neste País a depredar as coisas do Estado, porque não é a gente que paga. Isso é um erro! Nós que pagamos!
Então, fica aqui a pergunta: e se a gente colocasse uma emenda dizendo: "Quem não quiser cumprir o serviço pague os R$400 mil que custou o seu curso"? E eu fiz as contas aqui. Pagando R$15 mil a um médico, daria para pagar 34 meses: 50% a mais do que o serviço que eu estou propondo, que é de dois anos apenas.
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É claro que aí a gente criaria uma desigualdade, mas, pelo visto, ela seria mais respeitada pela Constituição do que a igualdade. A Constituição respeita mais a desigualdade do que a igualdade - a desigualdade, ou seja, se eu pago e não preciso fazer o serviço para o meu País, a Constituição aceita, mas, se se diz "Você tem que prestar um serviço 'gratuito' (entre aspas) para o seu País", a Constituição não permite.
Então, fica aqui esta pergunta: poderíamos excluir quem pagasse o seu curso e, com isso, poderíamos fazer um fundo para o SUS, para pagar a médicos que fossem, com o dinheiro dos alunos que não quiseram ir.
Outra colocação é a ideia de colocar todas as profissões. Eu queria saber se, nesses países que o senhor citou, isso é concentrado apenas em saúde ou todas as profissões. Eu vi que, em alguns lugares, são todas e, em alguns, até no ensino médio. Mas gostaria de ver a sua resposta.
E, finalmente, Dr. Geraldo, quero dizer: estou de acordo - isto também o Dr. Lúcio falou -, não adianta só médico. São 14 profissões que o senhor citou. Eu confesso que nem lembrava. Eu vou trabalhar, ver como a gente amplia, então.
Além disso, o senhor me trouxe uma ideia boa. Vou ver como trabalho esse projeto como parte do SUS, e não como parte da educação, está entendendo?
Não sei como faço. Mas fica aqui esta pergunta para o senhor, fica a pergunta: como faço com que esse projeto se transforme em uma coisa parte do SUS?
Vou passar a palavra.
Primeiro, o Dr. Lúcio.
O SR. LÚCIO FLÁVIO GONZAGA FILHO - Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Agora vou tomar a minha água, que vocês que estão assistindo estão pagando para mim.
O SR. LÚCIO FLÁVIO GONZAGA FILHO - Muito obrigado, Sr. Senador Cristovam Buarque, Presidente da Mesa.
Em princípio, gostaria de parabenizar a todos, os dois apresentadores e o senhor também, pelas ideias, as inteligências que foram postas aqui e de dizer, Sr. Senador Cristovam, que temos o maior respeito e admiração.
Se formos fazer uma análise do foco de nossas atenções, como foi posto aqui, todos temos um interesse comum, que é uma assistência digna, de qualidade ao nosso povo, principalmente aquele mais distante, mais necessitado.
Penso e tenho a convicção de que esse foi o fulcro, esse foi o foco, a razão por que o senhor craniou esse projeto de lei, no sentido de atender àquela pessoa que está distante dos centros urbanos, que está distante, vamos supor, dos avanços da medicina, ao nosso brasileiro mais sofrido, que é o alvo de toda a nossa preocupação, da nossa atenção.
Então, é nesse sentido que acho que as ideias convergem. Podemos ter diferenças no entendimento de como operacionalizar essa assistência àquela pessoa mais carente, necessitada.
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Mas o pensamento é de benefício humanitário, é de fazer o bem, de levar saúde a essas pessoas. O senhor perguntou, Senador, e aí eu fiquei extremamente feliz em ouvir do senhor que o senhor entendeu a nossa ideia central, de que nós não somos absolutamente contra a ideia de levar médico para as pessoas. Não somos. Nós gostaríamos de levar médicos para as pessoas e levar também as condições de trabalho. E levar também compromisso, porque se o médico não tem uma segurança de seu trabalho, não tem uma boa condição de trabalho - e aí não é só o médico, é qualquer profissional. Se qualquer pessoa não tem uma boa condição de trabalho, se não tem a segurança de receber seu salário no fim do mês, de, se adoecer, ter seus direitos garantidos, se a médica engravidar, ter seus direitos garantidos, se tiver condição de trabalhar bem, de ter um laboratório para solicitar um exame, de ter raios X, quer dizer, de ter um local de trabalho adequado, ele terá, sem dúvida, um compromisso com aquela comunidade.
Diferentemente de você colocar um médico lá sozinho, sem outros profissionais, sem estrutura, sem condições de infraestrutura nenhuma, adequada para o seu trabalho, sem garantia de receber seu salário, sem garantia trabalhista nenhuma, e sem compromisso com a comunidade, porque ele está ali doido para ir embora. Ele não tem como se fixar.
Então, nobre Senador, gostaríamos e ficaríamos imensamente felizes se o senhor abraçasse a nossa causa pela luta por uma carreira de Estado para os profissionais de saúde, para o SUS. O Conselho Federal de Medicina tem lutado e tem levado essa ideia para as autoridades da saúde, mostrando que seria a forma mais adequada - estamos convictos disso - de fixar o profissional da saúde lá naquele interior, lá do Norte, lá do Nordeste, para atender bem a população, para ter compromisso com a comunidade, Sr. Senador.
Nós conhecemos essa realidade do nosso Sertão. Hoje o doutor está lá, o prefeito paga o salário dele hoje no mês, no segundo mês não paga, no terceiro, ele vai aos conselhos regionais pedir socorro, ao presidente do Conselho, à diretoria do Conselho, porque trabalhou três meses e não recebeu o seu salário. O presidente do Conselho, se o secretário de saúde for um médico, a gente conhece o médico lá, e ainda facilita um pouco pedir àquele secretário de saúde para pagar o salário do médico. Esse médico, eu perguntaria ao senhor, nessa situação, tem compromisso com a comunidade? Ele tem realmente essa vontade de ficar lá na comunidade assistindo esse povo, o nosso povo sofrido? Acreditamos que não.
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Então a nossa luta, Sr. Senador, o que eu gostaria é que o senhor abraçasse a nossa causa de defesa de uma substituição do projeto de lei que foi craniado no sentido de beneficiar a nossa população mais sofrida, que seja substituído por uma luta desta Casa, deste Congresso Nacional, das pessoas importantes da área e também das lideranças da saúde para substituir o seu projeto por uma luta por uma carreira de Estado para os profissionais de saúde no SUS. Nós não queremos carreira de Estado para a medicina privada, nós queremos carreira de Estado para os profissionais do SUS - o nosso SUS, que o Dr. Geraldo Adão aqui tanto defendeu na sua fala, que é universal e precisa de recurso, precisa de profissionais, precisa atender às pessoas na sua amplitude.
Se você fizer uma pesquisa com as pessoas que são atendidas pelo SUS, que conseguem ser atendidas, elas vão dizer que o SUS foi maravilhoso para elas. O problema do SUS é o acesso, Senador. As pessoas não conseguem chegar, porque a demanda é muito grande, mas aquele que é atendido pelo SUS, que é operado da sua neoplasia, que é operado da sua vesícula, que trata a sua pneumonia nos hospitais - essas pessoas saem satisfeitas. Então, a ideia que nós temos no Conselho Federal de Medicina é fortalecer o SUS e lutar por uma carreira de Estado, por mais financiamento para que ele tenha condições de atender bem à população.
Quanto à pergunta, nobre Senador Cristovam Buarque, sobre se levar o jovem médico para um estágio, para um trabalho, como propõe o seu projeto de lei, prejudicaria a sua formação: não prejudicaria a formação. Não prejudicaria. O que nós falamos é que levar o médico para um ou dois anos de serviço civil obrigatório, além dos pontos já colocados aqui, como a questão da isonomia e outras que foram colocadas aqui pelo Dr. Ricardo Chaves - muito bem, achei fantástica a sua apresentação; parabéns -, nós entendemos que não atende a esse princípio do compromisso do profissional lá no interior, onde mais precisa, porque ele precisa de condições de trabalho, de outros profissionais - o médico sozinho não consegue fazer uma prestação de serviço adequada.
Eu coloquei - o Sr. Senador me desculpe - o filósofo no meio da minha relação de pessoas, de profissionais, porque se diz assim: "Ah, temos de levar o médico para o interior." Eu me formei em 1977; desde essa época já diziam: "Temos de levar o médico para o interior." Eu dizia: "Precisamos levar a Medicina para o interior." Mas não só a Medicina: precisamos levar educação, precisamos levar avanços, precisamos levar estruturas, precisamos levar esgoto, precisamos levar saneamento básico. Precisamos levar tanta coisa, Sr. Senador! E aí, sim, poderíamos levar os profissionais - os médicos, os enfermeiros, os odontólogos, os psicólogos, os educadores, os filósofos, os arquitetos, os engenheiros - para o nosso interior, para que as pessoas pudessem ter uma condição de vida melhor.
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Aí eu coloquei: o profissional médico, o profissional de saúde com uma carreira de Estado e com seus direitos garantidos em lei, um profissional concursado, com todas as garantias trabalhistas, com boas condições de trabalho, lá no interior, ele vai se fixar. Ele se fixa lá. Vai melhorar a situação daquela comunidade, mas ele precisa também, Senador... É aí que chamo a atenção: precisamos levar, também, para as nossas comunidades distantes os benefícios sociais que nós temos nas cidades.
Então, é transformar o nosso País para que a gente possa levar não só o médico, o engenheiro, o odontólogo, o filósofo, o professor, mas boas condições para a população, para que o profissional, lá no interior, possa educar seu filho.
Quem de nós aqui gostaria de ir para uma cidade do interior que não tivesse uma escola para colocar seu filho para estudar, que não tivesse uma condição razoável de vida? Nenhum profissional, nenhuma pessoa gostaria de ir, não só o médico.
Sr. Senador, concluindo, gostaria de enfatizar, mais uma vez, que nós não somos contra... O Conselho Federal de Medicina não foi contra, em essência, o Mais Médico, não foi contra levar médico para a população. Nós não somos contra isso. Não somos contra levar saúde para a população. Nós achamos que o meio como foi feito é que não foi adequado - não foi adequado.
Obviamente, se você levar, com a carreira de Estado... O Conselho defendeu a carreira de Estado, é o que nós defendemos. Tem-se muito mais condição de levar o benefício de saúde para a população com isso do que com outras formas, como estão sendo colocadas, incluindo-se o Mais Médicos.
Finalmente, eu queria dizer, Sr. Senador, que há pesquisas feitas, pesquisas com bons institutos de pesquisa comprovando alguns dados, incluindo... Eu queria mostrar um.
Entre os médicos brasileiros, foi feita uma consulta sobre se ele aceitaria trabalhar para o SUS, se tivesse boas condições de trabalho, condições de garantia de trabalho e condições de trabalho. Sessenta por cento dos médicos brasileiros afirmaram que sim. Se tivessem um salário adequado, não só o salário, mas também segurança no seu trabalho, condições de trabalho para que pudessem oferecer saúde à população de uma forma mais segura, mais eficaz, mais eficiente, 60% dos médicos brasileiros disseram que gostariam de trabalhar para o SUS.
Muito obrigado, Sr. Senador. Estou às ordens para qualquer outra interrogação.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Eu que agradeço. Depois continuamos a conversa.
Agora passo a palavra ao Dr. Ricardo, que foi o segundo.
O SR. RICARDO CHAVES DE REZENDE MARTINS - Obrigado, Senador.
Primeiro, quero dizer que foi uma satisfação ouvir todos que fazem parte desta Mesa. Tenho o privilégio de estar junto aos senhores.
Por que a resistência à prestação de serviços comunitários, etc.?
Eu nunca estudei a história da educação brasileira sob essa perspectiva, mas, já que o senhor me leva a comentar essa questão, penso que é uma hipótese instigante, que tem a ver com a própria origem da educação superior brasileira, que sempre, desde lá do início do século XIX, foi criada e apropriada pelas camadas superiores da sociedade. E aí eu penso que isso tem uma origem, uma gênese histórica. Uma gênese histórica. E até pouco tempo atrás ela continuava sendo, a rede pública continuava sendo majoritariamente apropriada por aqueles egressos dessas camadas superiores. Então penso que isso deve estar na gênese dessa resistência.
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A questão dos seis países que eu comentei. Três países preveem serviço social para todas as profissões: México, Colômbia e Venezuela. E os outros três, a Costa Rica, a Bolívia e o Equador, preveem apenas para os profissionais da saúde, da área de saúde.
A questão da gratuidade da educação superior, me parece que o argumento é o óbice constitucional mais sério com relação a iniciativas nessa direção. Aos Parlamentares que têm, ao longo desse tempo, me consultado ou solicitado o meu pronunciamento a esse respeito, eu tenho dito que me parece que, para a instituição de serviço social comunitário, o caminho jurídico mais adequado seria fazer um ajuste no artigo da Constituição, prevendo a possibilidade ou prevendo a existência desse tipo de serviço social, e que não necessariamente precisaria implicar ressarcimento. Basta ser obrigatoriedade constitucional, e isso poderia ser inclusive colocado de forma que fosse adotado de acordo com as prioridades das políticas públicas e as necessidades da sociedade. Então, essa solução constitucional seria, me parece, aquela que daria o abrigo à iniciativa e possibilitaria ao Poder Público implementar esse tipo de iniciativa, sem nenhum tipo de questionamento.
No Brasil, por exemplo, nos Estados, nós temos dois Estados que estão caminhando nessa direção, mas onde a questão da constitucionalidade está sendo questionada. Em São Paulo, foi aprovada uma lei em 2015, instituindo o serviço obrigatório para os profissionais da Medicina formados nas universidades públicas paulistas. Essa lei foi aprovada. Não foi regulamentada, não tenho notícia da sua implementação, mas ela está lá. Eu até a tenho aqui.
E no Paraná existe um projeto de lei na mesma direção, que está na Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia Legislativa.
Depois eu posso passar a informação, mas ela está aqui, de 2015, em São Paulo. Está aqui. A Lei 15.660, de janeiro de 2015, que dispõe sobre o serviço comunitário obrigatório para os formandos em Medicina nas universidades públicas do Estado de São Paulo.
Enfim, na verdade, penso, sob o ponto de vista legislativo... Essa lei também não me parece que esteja sendo implementada, mas é uma evidência.
Me parece que a solução jurídica mais adequada seria, digamos, o ajuste do Texto Constitucional com relação a essa questão, sem, necessariamente... poderia ser, mas sem, necessariamente, cobrir a obrigatoriedade do ressarcimento, porque aí já teríamos um outro tipo de debate, que é o debate de o ensino superior público ser ou não pago, de acordo com a capacidade de pagamento de cada família, etc. e tal.
Bom, são essas as questões.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Dr. Geraldo.
O SR. GERALDO ADÃO SANTOS - Senador - e ao consultor também -, eu perguntaria ao senhor, porque aqui no art. 200 está escrito assim: "Ao [SUS] sistema único de saúde, além de outras atribuições", há esta aqui, inscrita aqui: "ordenar a formação dos recursos humanos" para o sistema.
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Isso depende de alguma lei complementar ou isso aqui é automaticamente cumprido, deve ser cumprido?
O SR. RICARDO CHAVES DE REZENDE MARTINS - Não sei se, Presidente... Não, na questão, veja bem: estamos tratando da formação. O serviço social obrigatório é para aquele que é egresso, ele já passou do período da formação, essa é a discussão que é colocada.
A ordenação da formação de recursos humanos da saúde, que faz a interação entre o Ministério da Saúde e Ministério da Educação na formação dos médicos, vai dentro de todas as etapas do que seria efetivamente a formação. Então, é o curso de graduação, a elaboração das diretrizes curriculares nacionais, autorização, reconhecimento dos cursos, credenciamento das instituições, e vai até os programas de formação, em última instância, a residência médica. O mestrado e o doutorado já estão fora porque já têm um outro tipo de caráter.
Então, o argumento constitucional que se coloca é este: a formação tem o cunho de obter graus e diplomas para o exercício profissional; o serviço social obrigatório já não seria mais uma etapa formativa, porque ele já estaria formado. Então, nesta questão, recairia naquele argumento constitucional da gratuidade do ensino público.
O SR. GERALDO ADÃO SANTOS - Mas sendo um curso novo, é um curso de pós-graduação em saúde pública. Criar esse curso...
O SR. RICARDO CHAVES DE REZENDE MARTINS - Sim, mas seria...
O SR. GERALDO ADÃO SANTOS - ... tem impedimento legal?
O SR. RICARDO CHAVES DE REZENDE MARTINS - Criar o curso, não. A questão é a compulsoriedade.
O SR. GERALDO ADÃO SANTOS - Certo, mas só para quem estuda em universidade pública ou com bolsa de estudos que o Governo custeou.
O SR. RICARDO CHAVES DE REZENDE MARTINS - Exatamente. Então, novamente, a discussão recai na questão da gratuidade, veja bem, porque, se para esses a formação desse curso de saúde é necessária, porque para aqueles que fizeram na instituição particular não é necessária, já que é uma etapa de formação obrigatória?
O SR. GERALDO ADÃO SANTOS - Mas ele pode fazer se ele quiser também. Não é obrigatório.
O SR. RICARDO CHAVES DE REZENDE MARTINS - Sim, mas para quem é público passa a ser compulsório e para quem é privado é alternativo. A discussão é essa.
Essa é uma questão que precisa ser dirimida. Parece-me que a solução mais fácil seria ajustar ali no art. 206, embora, obviamente, uma emenda constitucional a gente sabe que tem uma tramitação política complexa.
O SR. GERALDO ADÃO SANTOS - Agora, Senador, V. Exª, como é autor de um desses projetos, e se ele despertou a atenção de três Senadores da República, com projetos próprios, inclusive o do Senador Humberto Costa é PEC, é emenda constitucional, e o de V. Exª e do Jaime Campos é um projeto de lei normal. Bem, eu acredito na possibilidade, se três Senadores entenderam que existe o caminho para alcançar esse objetivo, eu faria aqui um apelo, como Conselheiro Nacional de Saúde, e em nome do povo brasileiro, que precisa do SUS, e o SUS é para atender a todos os brasileiros, o SUS deixou de cumprir um papel importante, que é ordenar a formação dos recursos humanos. Todo mundo fala: "Ah, médico, médicos estrangeiros..." Não. O SUS tem 14 profissões, e todas elas são importantes para o sistema. Acho que se tem que equacionar essa solução de demanda exatamente possibilitando a quem já é formado fazer um curso de pós-graduação. Ele vai ganhar um curso de pós-graduação, quer dizer, ele vai ampliar a capacidade de atendimento, ele vai receber durante o prazo que ele estiver fazendo. Nós não estamos fazendo obrigatoriedade, é mais uma oportunidade de sair da faculdade e já ter um emprego, que seja para um ano ou um ano e meio, e, nesse período, com essas pessoas, vai haver uma rotatividade possível, de modo que não vai faltar nenhum dos profissionais para o SUS em lugar nenhum.
Então, eu acho que isso é de uma importância do tamanho do Sistema Único de Saúde. Nós temos que pensar no SUS não como sistema feito para atender pobres; é sistema para atender a Nação brasileira, a todos os brasileiros.
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Então, pensando nessa linha, já que há três projetos de Senadores nessa linha, quem sabe, Senador, pudessem ser trabalhados juntos esses projetos, fazendo um projeto unificado, é claro, equacionando algumas barreiras que existem pela frente. Mas eu acho que o SUS tem condição para isso, o Ministério da Educação é o formador do profissional. E eu acho que um entendimento entre o Ministério da Saúde, um entendimento entre o Sistema Único de Saúde, Ministério da Saúde e o Ministério da Educação viabiliza a possibilidade disso, superando as dificuldades existentes.
E a nossa esperança é que o SUS realmente possa criar mais uma oportunidade de graduação, de pós-graduação em saúde pública. O maior sistema de saúde do mundo dando para os seus próprios profissionais a condição e a oportunidade de ter um curso de pós-graduação, e recebendo durante o tempo que ele estiver prestando esse serviço, eu acho que é um passo muito grande, muito importante e que o Brasil tem que fazer o esforço para dar esse passo.
Esse é o apelo que nós fazemos. Vamos ver se conseguimos... Na Câmara, há diversos projetos também. Os que forem coincidentes com essa proposta de formação de um curso de pós-graduação, vamos juntar esses projetos, Câmara e Senado trabalhando juntos, porque, se Câmara e Senado trabalharem juntos, podem ter certeza de que o SUS e o Ministério da Saúde vão ganhar com isso. E quem vai ganhar? É a população brasileira. E não é ganhar, é ter acesso a esse direito de ter todos os profissionais disponíveis no momento certo, na hora que ele precisa. E um curso de pós-graduação dará esse grau maior de confiabilidade, de assistência, e, para o profissional, é uma oportunidade também de ganhar um curso de pós-graduação.
É esse apelo que nós fazemos, esperando que realmente não desistam desses projetos, vamos tentar unificar esses projetos. Eu acredito que isso é viável. E, em nome de todos os brasileiros usuários do SUS, que esse esforço seja feito e essa meta seja alcançada.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Bem, eu quero agradecer muito a participação dos três e dizer ao Dr. Lúcio que eu abraço há muitos anos a causa da saúde de qualidade para todos, mas, quando não dá para ser uma saúde da máxima qualidade, eu quero uma saúde. Um dia desses eu estava saindo do Ceub, faz uns dois anos, e houve um acidente, eu fui jogado no chão. De repente, estavam três pessoas ali cuidando de mim. Eu não pedi diploma de médico para ver. Um botou álcool aqui na minha testa, outro me levantou. Naquela hora, era o melhor que eu tinha. Não tinha balão de oxigênio, não tinha nada.
Então, o Mais Médicos levou isso para onde se precisava. E, no Brasil de hoje, enquanto não houver o sistema ideal de saúde, vamos levar o que for possível, mas estou na sua causa. E, como governador, mostrei isso. A saúde funcionou aqui. E funcionou, sobretudo, com um programa chamado Saúde em Casa, em que a gente levou médico para onde estavam as pessoas, em pequenas casas, com estetoscópio, com um pequeno equipamento ali, e, aí, quando precisava, mandava para um hospital. Então, eu estou na causa e acho que a gente tem que fazer.
Eu fiquei preocupado quando o senhor falou que esses médicos estariam lá sem compromisso. Eu não imagino um médico se formando, jurando, fazendo juramento, e não ter compromisso. Ele pode até estar contando os dias para ir embora, como quem faz o serviço militar sem vocação de ser militar, você conta os dias - eu sei como é isso -, mas você está ali cumprindo as ordens que o sargento manda.
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Quanto ao Dr. Ricardo, o ensino superior ser pago ou não. Essa pergunta, a gente tem que mudar. O ensino superior é pago; a pergunta é por quem. A gente tem que discutir quem tem que pagar o curso superior, é quem estuda ou é o Estado? Essa é a pergunta. E eu respondo: todo curso de que a sociedade precisa, é o Estado. Por isso sou favorável ao ensino pago pelo Estado. Não usei a palavra "gratuito".
Agora, quando o Estado não precisa de certos profissionais, eu sinceramente não vejo por que tirar dinheiro, por exemplo, da educação de base, para colocar em certos ensinos, cursos superiores que não atendem a uma necessidade do País, mas, sim, da pessoa. Aí não vejo por quê. A gente tem que descobrir como é que se faz para que o curso de interesse apenas da pessoa - que é um direito que ela tem, e a democracia tem que respeitar -, a gente não tenha que tirar dinheiro de todo mundo para pagar.
E aí a ideia traz uma proposta. Por exemplo... Primeiro, chegou aqui uma sugestão de uma pessoa chamada Rafael Fulte Moreira, de Santa Catarina: "Por que só da medicina? Então todos os cursos [...] com recursos públicos devem receber o mesmo tratamento." Faz sentido. Eu gostei da sugestão dele.
E aí eu tenho uma ideia. Por que é que a gente não faz o seguinte: toda vez que um aluno termina um curso universitário, o Governo diz quantos precisa daqueles; e aí diz: "Cara, você fez esse curso, o Estado pagou. Você vai para tal lugar. Agora, se você não quiser ir, não há problema. Pague o curso." Você reembolsa o Governo. Pode até fazer em módicas prestações. Pode fazer um Fies ao contrário. Se você quiser ir para o setor público, você fica sem ter que pagar de volta; se você não vai, você paga de volta. Pode ser uma saída.
Quando um jovem termina a academia militar, que ele não paga, ele vai para onde o Estado manda. Ele não vai para onde ele quer. Ele vai para onde a Nação precisa.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - E nem pode desistir.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Como?
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT. Fora do microfone.) - E nem pode desistir por um período de cinco anos.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - E nem pode desistir por um período de cinco anos, é. Nem pode dar de volta o dinheiro.
Diplomata, também. O diplomata vai para a África, ou vai para a Ásia, ou vai para longe dos pais. Mas entrou ali, é a mesma coisa. Ou seja, são carreiras do Estado.
Eu não tenho a menor dúvida de que essas têm que ser pagas pelo Estado, porque vão servir ao Estado. Eu não tenho a menor dúvida de que médico tem que estudar sem ter que pagar. Agora, se depois ele já sai para uma clínica que nada tem a ver com as necessidades do País, mas só de alguns que podem pagar, que são brasileiros também, mas podem pagar, eu acho que eles deveriam ter uma alíquota no imposto de renda, para devolver, talvez, até dirigida diretamente para a universidade.
Então a pergunta não é ser pago ou não; é quem paga. Agora veja como...
Dr. Lúcio, o senhor talvez tenha razão. Eu disse que ia fazer uma pesquisa, porque o Senado faz pesquisas. O que a gente está discutindo aqui, Senador, é a ideia, é um projeto meu em que os alunos de Medicina ficariam, dois anos depois de formados, numa cidade pequena, dentro do sistema do SUS. E eu vi aqui, depois das colocações do Dr. Lúcio, que valeria a pena eu fazer uma pesquisa. O Senado faz isso muito bem. O que é que as pessoas pensam? Já temos uma prévia. Olha, a prévia é pegar o chapéu e ir embora. Só 18% dos que falaram estão a favor da minha proposta. Aí se diz: "Mas só foram 4.509." É muito 4.509. Desses, 834, a favor, e 3.675, não; não a esse negócio de ter que trabalhar dois anos, ganhando onde o povo precisa - não vamos cair na demagogia -, onde o Estado acha que o povo precisa, porque não se vai fazer um plebiscito. Ou seja, o desejo de voluntariedade - e não de gratuidade -, de querer colaborar é muito pequeno no Brasil. O Dr. Ricardo mostrou que, em diversos países, existe isso, até no ensino médio - no México, em Costa Rica, no Equador agora. E aí eu fiz uma pergunta: por que, no Brasil, há essa reação tão grande a ter que devolver à sociedade aquilo que a sociedade deu? Mas é uma coisa que está na mente brasileira. Algo aconteceu na formação do ente intelectual brasileiro, da mente, que nós não temos compromisso com a coletividade. Nós somos um país que tem duas deformações grandes em nossa mente: não temos compromisso com o coletivo, e, sim, com a corporação da qual pertencemos; e não olhamos o longo prazo, mas sempre o curto prazo.
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Por que todo mundo diz que a China está indo, fazendo, etc.? Eles têm duas coisas que nós não temos: coesão nacional e rumo de longo prazo - duas coisas que nós não temos. O País foi repartido nos indivíduos e nos grupos, cada um querendo o máximo para si. E não tem que acusar um grupo ou outro, não. Somos todos assim. Não vamos criticar os outros, não. Nós fazemos parte desse mundo de grupos e de imediatismo.
Para eu não pegar o chapéu e ir embora, porque minha ideia foi repudiada, talvez esses que responderam aqui são os que têm acesso à internet, são os que estão ligados no assunto - pode ser que sejam os estudantes de Medicina das universidades estatais. Então, eles talvez não representem a coletividade brasileira inteira. Agora, se for a coletividade, eu teria 40 milhões a favor e 160 milhões contra. É grave isso. Não vou fazer essa projeção, porque acho que, de fato, é um grupo diferente, mas é um grupo respeitável. Eu o respeito, pois, num universo mesmo pequeno de 4,5 mil - que também não é pequeno, porque se chegou a esse número em poucos minutos aqui -, é um grupo razoável. É forte a expressão contrária, só que eu acho que há momentos em que você não deve se submeter a isso. Você tem é que tentar convencê-los de que está certo. E, se não os convencer, aí pega o chapéu; aí tem que ter a lucidez de pegar o chapéu e dizer: "Não é o meu tempo."
Talvez não seja ainda o tempo de o Brasil ter um projeto desses, mas eu vou continuar insistindo. E essa insistência eu vou tentar fazer junto com os outros, sim; foi até uma falha não ter feito em conjunto com o Humberto Costa, porque é PEC. Eu disse: "O meu é projeto de lei." Mas vale a pena, sim, ter um diálogo com eles. Nesse diálogo, eu vou levar o que foi discutido aqui e vou levar a sugestão do Rafael Fulte Moreira, que também surgiu aqui: por que só a Medicina? O primeiro passo é: por que não todas as 14 áreas da saúde? E, depois, por que não todas as áreas? Acho que é bom ter um filósofo de plantão, como o senhor citou, em cada cidade - é bom. Melhora o papo no botequim. Então, eu acho que a gente tem que espalhar profissionais em todas as partes do Brasil, e não só médicos.
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Agora, como eu falei, médico é mais urgente. Esta é a diferença entre vocês, médicos, e nós, simples mortais: vocês são muito mais urgentes - eu não digo importantes. Para mim, o professor é ainda mais importante, porque foi quem fez o médico, mas o professor não é tão urgente, tanto que há meses de greve aqui, e não acontece nada neste País. Vai acontecer daqui a 20 anos, quando tivermos uma geração formada a partir de cursos intermitentes, que tem que começar a aprender as quatro operações, passar dois meses em casa e, depois, voltar no sábado, nesta coisa que se inventou, chamada reposição de aula. Daqui a 20 anos, a gente vai ver o efeito desses períodos de educação intermitente. Mas, no imediato, não. Agora, o médico não estando na hora, é uma vida que se perde. Daí, vocês são mais urgentes; daí, a gente não pode prescindir de vocês. Eu digo médico, mas também tem que ter as outras profissões. Mas é o médico, sobretudo; os outros são seus auxiliares.
Agradeço muito o debate. Acho que foi positivo. Vou trabalhar isso, vou procurar os outros que trabalham com isso e vou tentar me aprofundar - talvez eu o procure mais uma vez - sobre os outros países.
Convoco, para o dia 25 de abril, terça-feira, às 11h, reunião ordinária desta Comissão destinada à deliberação de proposições em geral.
Não havendo mais nada a tratar, declaro encerrada esta reunião, que, para mim, foi muito produtiva.
(Iniciada às 10 horas e 06 minutos, a reunião é encerrada às 11 horas e 49 minutos.)