Notas Taquigráficas
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| R | A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Bom dia a todos e a todas. Primeiro, eu quero pedir desculpas pelo atraso. Não é uma questão de vontade, é que esta audiência foi pedida pelo Senador Paulo Paim. Normalmente, quem pede a audiência a preside. Então, eu fiquei tranquila. Se ele tivesse me avisado, eu teria até feito um esforço de chegar para começar no horário marcado. Esta reunião coincidiu com a CPI e com a sessão solene. Então, houve esses imprevistos. Eu peço desculpas principalmente aos convidados que chegaram cedo por começarmos meio tarde. |
| R | Vamos iniciar. Declaro aberta a 20ª Reunião, Extraordinária, da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura. A audiência pública será realizada nos termos do Requerimento nº 38, de 2017, da CDH, de autoria do Senador Paulo Paim, para debater a chacina ocorrida na gleba de Taquaraçu do Norte, localizada na zona rural do Município de Colniza, Mato Grosso. Esta audiência pública será realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. As pessoas que tenham interesse em participar com comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do portal e-Cidadania, no link www.senado.leg.br/e-cidadania, e do Alô Senado através do número 0800612211. Bom, esta reunião se destina a discutir - já foi dito o objetivo - a chacina acontecida em Mato Grosso, em que morreram nove pessoas, em que foram assassinadas nove pessoas. As duas Comissões, a da Câmara e a do Senado, têm feito um esforço no sentido de agilizar as investigações. Na semana passada, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara foi ao local. Eu ainda não tenho o resultado, porque estamos chegando todos hoje, depois de um feriado prolongado. Nós poderíamos inclusive ter convidado alguém - não participei da escolha dos representantes - da Comissão da Câmara, porque eles devem ter algumas informações importantes. O que eu vi na imprensa é que eles fizeram uma audiência pública, no Município de Colniza, da qual as pessoas participaram. Mas o que há lá é um clima de medo, de muito medo. As pessoas estão querendo abandonar tudo. Eles foram inclusive ao local do acampamento onde aconteceu o episódio. Instalou-se um clima de medo, de pânico no local, e nós precisamos - já combinei o Deputado Paulão - conversar sobre o assunto para ver os encaminhamentos práticos: os encaminhamentos ao Ministério da Justiça, à Polícia Federal. Nós queremos tentar federalizar, porque eles disseram que lá não há a mínima condição de investigação. É uma cidade muito pequena, e a polícia civil é muito desaparelhada. Como está lá, é provável que não dê em nada a investigação. Então, vamos tentar fazer com que o Ministério da Justiça se sensibilize para assumir as investigações através da Polícia Federal. Vimos mais um caso, ontem, com os indígenas no Maranhão, os gamelas. Ontem houve um conflito muito forte lá. Não há mortos, mas há muita gente ferida. Então, nós estamos vivendo tempos parecidos com os que já vivemos. Sem mais comentários, para minimizar o atraso que houve, quero chamar à Mesa os nossos convidados: Inácio Werner, representante do Fórum de Direitos Humanos e da Terra de Mato Grosso - Mato Grosso deve ter algumas boas histórias para nos contar. Bem-vindo! |
| R | Srª Deborah Macedo Duprat de Britto Pereira, Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão, parceira constante nas nossas audiências quando se trata de conflito de direitos violados; Sr. Rogério Papalardo Arantes, Diretor de Ordenamento da Estrutura Fundiária do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - Incra; e o Sr. Edson Silva, representante do movimento Resistência Popular. Haveria mais um convidado, mas não pôde comparecer. Boa parte já deve ter participado dessas audiências públicas e sabe que o tempo é de dez minutos. Aquele reloginho vai mostrar. Temos sempre uma tolerância que fica por conta da Mesa. Conforme a pessoa tiver necessidade, daremos mais algum tempo. Se alguém trouxe alguma coisa para apresentar, basta conversar com o pessoal da Secretaria. Começamos com Inácio Werner, que é da terra e pode nos contar mais alguns detalhes sobre o que acontece de conflito. Sabemos que esse é só mais um. O SR. INÁCIO WERNER - Bom dia a todos e a todas. Bom dia também à Senadora que preside esta reunião. Eu sou Inácio, trabalho no Fórum Estadual de Direitos Humanos e da Terra. Temos acompanhado, ao longo de décadas, os conflitos no campo de Mato Grosso. Quando cheguei lá, na década de 80, havia jogos de bingo. Quando tiravam 44, não diziam que era 44, diziam "justiça de Mato Grosso". Desde aquela época temos vivenciado a violência no campo. Antes de começar a minha fala, porque preparei um PowerPoint também, queria apresentar um vídeo que mostra justamente o que acontece com a violência no campo do Estado de Mato Grosso. É um vídeo de quatro minutos. (Procede-se à apresentação de vídeo.) |
| R | O SR. INÁCIO WERNER - Pode colocar o PowerPoint. Pena que há o horário. A primeira informação era de que eram 15 minutos. Qual é o tempo? (Intervenção fora do microfone.) O SR. INÁCIO WERNER - Mas eu vou tentar ver se eu consigo correr e pular um pouco. Essa imagem eu acho que chama muito a atenção, ela fala por si, não é? É a Janete, viúva do Edison, que agora, então, é uma das oito viúvas, porque, segundo a nossa informação, ficaram oito viúvas, e com filhos, como é o caso de Janete. Essa questão dos conflitos no campo a gente sempre tem acompanhado pela Comissão Pastoral da Terra. Aí, os números são muito altos, então, se a gente olhar no âmbito do Brasil. Mas como o tempo está tão curto, eu vou tentar até pular, para eu não ficar tanto tempo... Com relação especificamente, então, a Mato Grosso, se a gente olhar o Caderno de Conflitos de 1995 a 2016, são 162 mil famílias que, ano a ano, vão... Algumas até reincidentemente estão envolvidas em conflito. Mas são 55 assassinatos no campo, e, se a gente ampliar um pouco mais, se a gente olhar de 1985 a 2016, são 127 assassinatos no campo sem nenhum mandante condenado. Foram a julgamento dois casos, mas não houve nenhuma condenação. Houve ameaças de morte. Lá nós não temos um programa de proteção, mas já... |
| R | Trabalho escravo. Foram 8.547. Nenhum foi condenado por esse crime que cometeu. Então, nós temos expulsão de famílias em Mato Grosso nesse período. São 2.359, 21 mil despejadas. Aqui, então, tenho um mapa das principais chacinas que já ocorreram no Estado de Mato Grosso. Para entender Mato Grosso: nós temos três biomas - o Bioma da Amazônia, o Cerrado e o Pantanal. No Cerrado é onde o agronegócio se instalou desde a sua origem, é onde ele está mais forte e mais consolidado. Agora, ele está indo justamente para cima... Justamente os conflitos maiores acontecem na Região Amazônica. A maior parte é de terras devolutas, terras públicas. E também o agronegócio está entrando no Pantanal agora. Então, justamente onde o conflito aparece mais forte é na Região Amazônica. Se a gente olhar as mortes, novamente se pode ver. Nessa parte mais norte, no Bioma Amazônia é onde houve a maior parte das 55 mortes. Esse é um mapa feito por um jornal. Na verdade, ele não é de 90, mas de 95 a 2016. No caso de Mato Grosso, o que chama muito a atenção é a questão dos casos de pistolagem. Só no ano passado, foram 272 pessoas relacionadas a essa violência. Foram 775 famílias despejadas e mais 75 foram expulsas. Então, é uma situação bastante grave a que acontece em Mato Grosso. Um dos casos que foi mostrado, o despejo, foi o caso que houve lá em Novo Mundo. Lá a culpa, de certa forma, é porque a Justiça Federal está com processos conclusos há anos, há dois anos. Simplesmente o juiz não dá sentenças. Quando, no passado, houve aquela violência toda, houve uma pressão para cima do juiz. Daí, então, iam dar a sentença. O que aconteceu? A própria Secretária de Conflitos Agrários deu um depoimento de que o juiz ia ser a favor da União. Aí o juiz foi colocado sob suspeição. E isso continua desde o mês de março do ano passado até hoje, continua dessa forma. Então, naquela ocasião em que aconteceu aquele conflito, aquele despejo violento que vocês viram, poderia ter acontecido já uma nova chacina porque eles entraram para matar. Eles foram lá para procurar. Eles jogaram gasolina em cima dos barracos onde estavam crianças dormindo, de manhã cedo. Os homens fugiram para o mato e ficaram um dia escondidos, mas eles foram lá para pegar algumas pessoas concretamente. E aí, só por grande milagre é que não houve uma chacina igual àquela que aconteceu agora em Colniza. Outra questão que também aparece é a da União Recanto Cinco Estrelas, que também é uma área devoluta sobre a qual não se decide. No ano passado, no dia 18 de março, houve uma audiência em que estava representada a Ouvidoria Agrária, a Promotoria de Justiça, estava o Incra nacional representado. Naquela ocasião, o advogado dos fazendeiros falou assim: "Os fazendeiros estão tendo um prejuízo muito grande, porque cada um tem que pagar entre R$9 mil e R$12 mil por mês para garantir a segurança, para pagar jagunço". E o que aconteceu? Nós pedimos que fosse registrado isso, e aí falaram: "Não, isso vai estar no vídeo, a audiência está sendo gravada". Quando a gente pediu cópia da gravação, simplesmente: "Não, a pessoa se esqueceu de apertar o botão, então a audiência não foi gravada". Mas estavam lá todas as autoridades. O que se fez de 18 de março até agora com relação a essa confissão de que estão sendo pagos pistoleiros na região? Porque, para entrar naquelas regiões lá, há pessoal, os jagunços. Você tem que se identificar e dizer aonde vai, o que está levando, o que vai fazer lá. Então, realmente, não existe nenhuma forma de conter essa violência se não houver uma ação forte, porque, dentro do Estado, nós estamos vendo que não há. |
| R | Com relação ao lote 10, Gleba Gama, onde apareceram aquelas pessoas apanhando, também é uma área em que inclusive... Elas foram assentadas, foram colocadas lá naquela área, só que estão lá e eles já registraram 396 boletins de ocorrência. Não virou nada! Eles estão lá há anos registrando B.O. Há oito anos registram boletim de ocorrência para quê? Porque, na prática, não acontece nada. Jogam veneno de avião por cima das pessoas, queimam o que estão produzindo. Eles ficaram meses sem ter um alimento. Cortam a cerca para comer os alimentos que eles têm lá. Então, isso tem acontecido lá em Mato Grosso. Já na anterior, a de Novo Mundo, é o contrário, simplesmente o pessoal sequer... (Soa a campainha.) O SR. INÁCIO WERNER - ... consegue registrar os boletins de ocorrência. Simplesmente, não são aceitos os registros desses boletins de ocorrência. E quando são, quando a gente consegue, em Cuiabá, ver o B.O... Nós conseguimos ver, e o pessoal disse: "Mas, nesse boletim de ocorrência, vocês estão se condenando, se acusando de que vocês é que são responsáveis pelo que está acontecendo". Isso quando aceitam fazer os boletins de ocorrência. Então, é outra questão muito séria. |
| R | Em contato, também, para olhar concretamente o conflito de Novo Mundo, o que a gente tem percebido? Que, desde 2005, na verdade, o Ministério Público tem cobrado o Incra para dizer: olha, de quem são aqueles títulos? Existe clara a situação de que aqueles títulos são totalmente frágeis, para não dizer outra coisa. Mas só que até agora não se consegue. Então, ano a ano, 2005, vai 2006, 2007, 2008, cobrando, aí devolve uma partezinha, mas não é o que interessa. Então, dessa forma é que está Colniza. Por isso é que não se resolve. Então, o Complexo Guariba, que são 460 mil hectares, se não for feita realmente uma ação tanto da questão do Ministério Público... Porque o nosso receio é que está para ser arquivado esse processo. E se ele for arquivado, vai acontecer o quê? Em função, infelizmente, das mortes, talvez o processo não seja arquivado, mas precisaria haver uma ação muito rápida para ver, no Complexo Guariba, na mão de quem realmente são esses títulos totalmente frágeis. Também, nessa mesma linha, acho que precisamos saber o que na verdade está acontecendo. O Incra precisava dar uma resposta sobre esses relatórios circunstanciados lá da região onde houve a chacina, porque lembro que lá, em 2014, foi morto o Josias e a companheira dele. Eles estavam denunciando justamente que estavam sendo ameaçados de morte, e morreram. Numa audiência pública, onde também estava o ouvidor agrário do Incra, todas as autoridades do Estado, ele denunciou que estava sendo ameaçado; duas semanas depois, ele foi assassinado. Então, a nossa preocupação é até quantos têm que morrer. Porque, se a gente olhar, no ano passado, em novembro, na COP 22, em Marraquexe, o representante do Brasil, infelizmente, que também foi governador do Estado de Mato Grosso, Blairo Maggi, falou: "Uai, pensei que tinham morrido 150, foram só 50 que foram assassinados no ano anterior". E, coincidentemente, eu estive naqueles dias numa atividade no parlamento alemão. E o pessoal disse: "Como pode alguém representando o País dizer que morreram só 50?" Fui questionado. E eles sabiam que era o governador de Mato Grosso, porque eu fui falar justamente sobre os conflitos no campo de Mato Grosso lá no parlamento alemão, num seminário. Então, essa situação, infelizmente... Parece que não existe algo que possa mexer com o que na verdade está acontecendo dentro do Estado de Mato Grosso. Com relação ao Governo do Estado, nós temos também uma série de outras questões que precisavam ser encaminhadas, porque, desde 2015, quando acontece algum fato um pouco mais grave ou quando existe uma mobilização mais forte, fala-se que se vai criar uma comissão para dissipar os conflitos no campo. Esta é sempre a resposta: vai se criar uma comissão, um comitê, para dissipar os conflitos. |
| R | Aí aconteceu o conflito no ano passado, no dia 21, e novamente está se criando a comissão. Foi lançado o Caderno Conflitos, vai se criar a comissão. Já foram cinco vezes que, oficialmente, foi criada a comissão. Cria-se uma comissão para preparar: “Não, daqui a um mês, vai ser lançado”. Ou então: "Aquela comissão o Governador vai assinar". Até hoje nada! Com relação à implantação do Programa dos Defensores de Direitos Humanos, o Estado já foi condenado a implantar os programas de proteção. Até hoje não conseguimos implantar os programas de proteção, as pessoas estão ameaçadas de morte, e nós, como sociedade civil, temos que nos mobilizar para que as pessoas não sejam mortas. Em vários momentos, a gente tem que se mobilizar escondido, até à revelia do próprio Estado, porque a gente não pode confiar. Outra questão aconteceu no ano passado em relação à violência. Vai ser nomeado um delegado para tentar apurar. Nada de apuração acontece nesses casos. Com relação à própria reformulação do Comitê de Conflitos Agrários, não há participação do Conselho Estadual de Direitos Humanos nem da sociedade civil. Os despejos são feitos de uma forma em que não há a orientação nacional, ela simplesmente não existe para o Estado de Mato Grosso. Em Mato Grosso também nós estamos há dois anos esperando a aprovação do Plano Estadual de Direitos Humanos e da Terra, que foi feito em conferência, no mês de dezembro 2014, já com o Governador eleito. Esse plano está para ser assinado, nunca se assina, sempre falta alguma coisa, falta não sei quê. Falta, falta, falta, falta e não se assina o plano. Na última conferência, ano passado, nós falamos: "Ou o Estado assina o plano ou nós não participaremos mais de uma nova conferência de direitos humanos". O Governador ia assinar na abertura da conferência. Foi à abertura, mas não assinou o plano. Então, tudo isso vai acontecendo e aí dizem que o Governador não pode assumir porque são 500 propostas. Na última conferência, nós fizemos só 16 propostas - 16 propostas. Não precisava colocar as 500. Nós entendemos que um plano é de curto, médio e longo prazo também. Para curto prazo, nós só temos 16 propostas para implantar. Nada de assinar o plano! E, dentro disso, uma delas era justamente para haver uma ouvidoria estadual de direitos humanos e da terra, porque aonde é que nós vamos denunciar? (Soa a campainha.) O SR. INÁCIO WERNER - Estou concluindo. Nos governos anteriores, nós tínhamos justamente uma abertura diretamente com os Secretários de Segurança Pública. Nós podíamos a qualquer hora, fim de semana, ligar para o secretário. O atual Governo já trocou três secretários, e nós insistimos, através do Fórum e do Conselho Estadual de Direitos Humanos, perguntando quem é a pessoa com quem nós podemos dialogar quando há conflitos. Nós não recebemos essa resposta. Foram dados dois nomes, mas não foi possível realmente nós termos uma interlocução. A gente ouve, mas não sabe com quem dialogar. Eu fico por aqui. Infelizmente... |
| R | O que nós temos percebido, por exemplo, em Mato Grosso, é que temos 47 aldeias indígenas que estão sofrendo esses impactos. Nós temos... (Soa a campainha.) O SR. INÁCIO WERNER - ... cem comunidades quilombolas; temos 67 comunidades pantaneiras e 400 projetos de assentamento, mas parece que eles não existem no mapa oficial, porque o que tem se levado em conta praticamente é a demanda do agronegócio e das mineradoras. Mas os trabalhadores e essas populações são invisibilizadas no Estado de Mato Grosso. Então, paro por aqui. Realmente, gostaríamos que pudéssemos sair daqui, quem sabe, não com uma comissão para não resolver, mas dizendo qual é a responsabilidade do Governo do Estado e da União; dizendo o que o Ministério Público pode fazer, o que o Incra vai fazer para que realmente se saiba de quem são as terras. O que se vai fazer, de repente, porque já se diz que a titulação do Complexo Guariba é frágil. Então, que se faça um levantamento, que se anulem esses títulos e que os destinem para a reforma agrária. Obrigado. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Inácio Werner, representante do Fórum dos Direitos Humanos e da Terra de Mato Grosso. Estamos com o Senador Medeiros presente, do Estado de Mato Grosso. S. Exª usa da palavra quando quiser. Vamos ouvir a Dr. Déborah Duprat, Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão. A SRª DEBORAH MACEDO DUPRAT DE BRITTO PEREIRA - Bom dia, Senadora Regina! Bom dia a todas e a todos! Eu gostaria de dizer que eu também estou aqui representando o Conselho Nacional de Direitos Humanos. A PFDC tem assento neste Conselho e o assunto também chegou lá. Bom, a primeira vez que eu tive contato com a chacina ocorrida foi no próprio dia 20 de abril. Enfim, já com a notícia de nove mortes por homens encapuzados e com sinais de tortura nas vítimas. Isso, enfim, já me assustou bastante porque eu vinha, no ano passado, de uma visita a Rondônia, em conversa com trabalhadores rurais, integrantes do MST, do MAB, enfim, Via Campesina. E Rondônia, pelos dados da CPT, tinha se transformado no Estado de maior número de mortes no campo. Não só essa região é vizinha a Rondônia, como grande parte da população ali existente é proveniente desse Estado. Também no passado, há mais de quinze anos, acompanhei a rota, a trajetória de fuga dos indígenas, dos índios isolados Kawahivas do Rio Pardo, por conta do avanço madeireiro. Isso, na época, até resultou numa interdição de área e depois no reconhecimento de território em favor desse povo. Enfim, sei da violência da região e isso já me dava a dimensão e o quadro do que ali se passava. |
| R | O Deputado Paulão me liga, nesse mesmo dia - eu estava até num evento da morte do índio Galdino, naquela praça, na W3 -, querendo ir imediatamente para a região. Eu até ponderei com ele, na ocasião, que a região era de dificílimo acesso. Eu sabia que havia um trajeto que se faria inclusive pelo meio do rio. Enfim, nós tínhamos que ter alguma estrutura. Imediatamente, depois de falar com o Deputado Paulão, eu liguei também para o Procurador-Geral do da República, pedindo que ele fizesse contato com o Ministro da Justiça para ele encaminhar para a área a Polícia Federal. Por que a Polícia Federal? Por algumas razões. A primeira por essa que Inácio falou, ou seja, a questão da dominialidade do Complexo do Guariba. Gente, há esse procedimento já de longa data onde há dúvidas. Ali é uma região, como o resto do Brasil, como o Brasil profundo, digamos, de certa forma, em que há essa desorganização dos títulos dominiais, há a política e a cultura da grilagem, o absoluto desconhecimento do que é terra pública federal, do que é terra pública estadual ou do que é terra privada. Em segundo lugar, ainda que se tivesse absoluta certeza de que os fatos se deram numa terra privada, há uma lei que permite a federalização da investigação. Nós não estamos nem falando daquele incidente que leva crimes comuns para o âmbito da Justiça Federal, que tramita perante o Superior Tribunal de Justiça, que é dificílimo, mais da federalização da investigação. Imediatamente também entrei em contato com o Procurador da República em Juína, Dr. Vinícius, que instaurou essa notícia de fato criminal, enfim, pedindo uma série de informações, inclusive ao Incra, mais uma vez, a respeito da dominialidade ou não da terra. As primeiras notícias informavam que se tratava de um assentamento do Incra. Então, havia uma dúvida a respeito de ser ou não um assentamento do Incra. E nós tínhamos, casual e coincidentemente, um representante do Conselho Nacional de Direitos Humanos numa missão em Mato Grosso, o Leonardo. E ele também se reuniu com o Dr. Vinícius. Volto a insistir que a gente faça uma missão ali no local. Eu ligo então para o Governador Pedro Taques para pedir-lhe um apoio logístico. E ele me disse que teria condições de disponibilizar duas aeronaves, cada uma de quatro lugares, mas só a partir do dia 2 de maio, porque era preciso montar também toda uma operação para essa travessia, esses 18 quilômetros que iriam da fazenda onde nós pararíamos as aeronaves até o local dos fatos, travessia de rio, carregamento de barcos nas costas e escolta. Conversei com o Promotor de Juína também sobre a eficiência, a eficácia de uma operação de Parlamentares federais naquela região. Ele me disse o seguinte: "Olha, Deborah, eu acho que é sempre bom vir desde que se atente para as seguintes circunstâncias - primeiro, a ausência do Estado aqui é absoluta. Então, a sensação de que há o Estado presente em algum momento é muito boa. Agora, o Estado que chega e sai também gera uma insegurança ainda maior. Impera aqui, por conta da ausência do Estado, a lei do silêncio. Eu fico com muito receio [isso o promotor me dizia] de as pessoas serem induzidas a falar [haveria uma audiência pública]. Depois, o Estado sai dali, os Parlamentares saem dali e eles ficam à mercê da sua própria sorte." Então, eu ponderei isso com o Deputado Paulão. E, de qualquer maneira, o Deputado Paulão me falou que havia uma decisão, não sei ao certo se da comissão, e eles resolveram ir, inclusive antes dessa data, com uma outra logística, porque ficaria muito distante essa data de 2 de maio. |
| R | Bom, no âmbito do Conselho Nacional de Direitos Humanos, nós tivemos uma reunião também tratando desse assunto em que o ouvidor do Incra - na ocasião, ele ainda era substituto - estava lá e se comprometeu dizendo que o Incra estava indo para a área imediatamente e ia fazer os estudos. E, caso se comprovasse a dominialidade da União sobre as áreas, o Incra iria fazer a arrecadação de terras. Eu acho muito interessante - há um representante do Incra aqui -, agora, porque nós vimos, pelo relato do Inácio, que, desde 2005... Nós temos aí quase doze anos, porque, em setembro de 2005, se inaugura essa investigação a partir dessa representação da Associação de Pequenos e Médios Produtores Rurais sem Terra de Colniza e, desde então, o cenário é de absoluta ausência de resposta. Então, nós temos, desde 2005, um silêncio com esse conjunto, esse número expressivo de mortes que seguem sem investigação. Hoje de manhã, o secretário de Segurança Pública de Mato Grosso também me ligou - eu estava a caminho desta audiência -, informando que as investigações apontavam um mandante e três executores. Dois executores já tinham sido presos preventivamente, e o terceiro executor, assim como o mandante, estava foragido. Essas prisões foram feitas em Machadinho. Portanto, no Estado de Rondônia, para mostrar, enfim, como as coisas circulam ali. Lembro que há aí nessa execução muito do que acontece em Rondônia. Eu falei que estive lá. Há a contratação de milícia privada, esse painel que Inácio mostrou há pouco, "vamos nos defender", então contrata-se a polícia privada. Há certa promiscuidade do Estado, de pessoas egressas da polícia fazendo a defesa, digamos assim, dessas propriedades. (Soa a campainha.) A SRª DEBORAH MACEDO DUPRAT DE BRITTO PEREIRA - Enfim, para terminar, eu queria dizer que eu fico absolutamente preocupada com o momento atual. Nós temos uma origem, antes do Estado nacional, que é a colonização que se faz sobre territórios indígenas com expropriações, mortes e, depois, com a escravidão. Isso dá origem ao grande latifúndio e à apropriação do trabalho alheio e da ociosidade de uma classe burguesa. Isso chega até os nossos dias, infelizmente. Nós temos aí o trabalho escravo ainda não erradicado, com uma dificuldade enorme atualmente. Inácio mostrou no Estado de Mato Grosso. |
| R | Quero lembrar que nacionalmente o Ministro do Trabalho resistiu até onde pôde à publicação da lista suja do trabalho escravo, que foi o instrumento mais eficaz de combate a essa prática terrível que chega aos dias atuais. E nós temos aí sinais de que está rompido o pacto civilizatório. Eu acho que nós estamos vivendo o período da barbárie, o que me assusta enormemente. Nós temos essa notícia agora do Maranhão, do atentado contra índios gamelas, prática de decepar as mãos. Enfim, acho que estamos vivendo uma tragédia, mais uma vez, muito fortemente no campo, onde, na maioria das vezes, o Estado continua ausente, e com a lei do grande latifúndio. Eu acho que a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão está atenta, vigilante e, Inácio, com o compromisso aqui de que esse procedimento não seja arquivado. Muito obrigada. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada à Drª Deborah Duprat, Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão. Nós estamos com a presença da Senadora Fátima Bezerra. Pergunto aos Senadores se posso continuar com a Mesa. Só faltam dois. Vamos ouvir o Edson Silva, representante do Movimento de Resistência Popular. Depois, ouviremos o Incra. O SR. EDSON SILVA - Boa tarde a todos. Boa tarde, Senadora. Sou do Movimento de Resistência Popular (MRP), represento também a CSP-Conlutas - Central Sindical e Popular. Como temos pouco tempo, falando um pouco dessa tragédia, que na verdade era uma tragédia anunciada... O Estado... Os lutadores daquela região vivem denunciando isso, já há muitos anos, e as autoridades não fazem nada. Parece que as autoridades fazem vista grossa. Enquanto isso, os grileiros de terra - porque na verdade estão grilando terra - se armam, armam seus jagunços, seus capitães do mato modernos, para matar trabalhadores, matar sem-teto, matar famílias que não têm como se defender. Famílias que o Estado deveria proteger, mas o Estado prefere proteger a elite, prefere proteger os grileiros de terra e quem tem terra. Esses grupos que são feitos para investigar nós estamos vendo que não adiantam de nada. Se adiantassem, já haveria muitos presos, porque não é de hoje que morrem pessoas, não é de hoje que... Isso é o que aparece na mídia, quando acontece uma tragédia tão grande. Ninguém sabe o que acontece, só eles próprios sabem. As outras pessoas, o mundo não sabe o que acontece lá no Estado de Mato Grosso, dentro do mato. Ali somem muitas pessoas, muitos trabalhadores. Trabalhadores são torturados, e não se prende ninguém. Ninguém paga pelos crimes. Agora que nove lutadores perderam a vida é que deu essa repercussão toda, mas até agora a Drª Deborah deu uma informação de que o Secretário de Segurança prendeu já dois e há dois foragidos, e tal. Enfim, é uma notícia boa - em tese, porque talvez não sejam só quatro, talvez existam mais mandantes, talvez algum testa de ferro esteja assumindo isso. É assim que eles fazem: colocam alguém para matar e pagam a outros para assumirem seus crimes. Está ali o painel que o camarada colocou, fala muito bem. Os caras gastam de R$9 mil a R$12 mil com jagunço; é muita grana. Ou seja, é uma polícia paralela, é uma polícia bem treinada. Para entrar num acampamento, matar com requintes de crueldade, com facões e armas de fogo de grosso calibre tem que ser... São uns animais, para começar, e têm que ter um treinamento muito grande. |
| R | Ninguém vai fazer nada. Para falar a verdade, eu sinto muito falar para os companheiros, desculpem a palavra, mas quem luta neste País está lascado. Desculpem se estou sendo um pouco abusivo com a palavra, mas nós só vemos trabalhadores morrendo, sendo agredidos, sendo presos por lutar por um pedaço de terra, por não aceitar cabresto deste País. Sabemos como o País está; e não acontece nada. Nós vemos um País sendo sucateado, sendo saqueado por aqueles que deveriam proteger a sociedade, proteger as pessoas, os cidadãos, mas, em vez de fazer isso, eles roubam. Estamos vendo aí o que a Lava Jato está fazendo, com meio mundo de políticos presos; e depois os caras fazem uma delação premiada e está tudo certo, são soltos e vão viver em verdadeiros palácios numa prisão domiciliar. É muito grave o que aconteceu em Mato Grosso. Os companheiros, com certeza... As ameaças que estão havendo lá devem ser imensas, para ninguém falar nada, para ficar todo mundo calado. Isso vem acontecendo há muito tempo. Isso prova que quem luta no País, os movimentos... Todos os trabalhadores que estão lutando neste País estão sendo caçados, perseguidos e massacrados. Quando eles não conseguem prender, eles matam. Quando eles não conseguem colocar na cadeia, eles matam. O companheiro falou que existe um monte, que uns foram processados e não deu em nada, foram absolvidos, e outros nem foram a júri. Ninguém investiga nada. Agora, vê lá no Estado quantos lutadores estão lutando por um pedaço de terra para terem direito a plantar, terem direito a morar e não estão sendo processados, ou não já foram presos, ou não foram condenados - tem um monte. Eu duvido - o companheiro não colocou; eu duvido ele não falar que existe lá, porque em todos os Estados do Brasil existe. Estamos sendo caçados. Quem luta por terra aqui está sendo caçado. Olha aí a viúva, olha os filhos - quem vai criar? Eu duvido que o Estado dê alguma assistência para essa viúva, para os filhos. Duvido. Não dá. Pode dar no início porque a mídia está em cima, depois abandona. Sabemos muito bem como acontece, o que acontece. E estão sendo caçados. Recentemente - falando um pouco dessa questão urbana também, para vocês verem que está bem relacionado - nós tivemos uma invasão da polícia num prédio em que o MRP estava acampado aqui no centro de Brasília, o Torre Palace. A Drª Duprat acompanhou muito bem, deu uma assistência imensa, senão teria acontecido uma tragédia lá. Ali a polícia do Governador de Brasília, o Rollemberg, entrou para matar aquelas pessoas. Se vocês virem os vídeos na internet, eles usaram quase mil policiais para fazer a desocupação, com 17 pessoas dentro do prédio, inclusive crianças, mulheres e senhores. Um companheiro perdeu o olho com um tiro de borracha, colocado contra a parede e atingido covardemente. |
| R | Uma criança... Uma mulher grávida, que está aqui no plenário, apanhou na barriga até desmaiar. (Pausa.) Está ali, nasceu a criança... (Pausa.) Peço perdão por me emocionar assim. Para vocês verem como está sendo difícil. Lá no acampamento dos companheiros onde nós estávamos, a polícia entrou para matar. Muita gente apanhou; muita gente foi machucada. Uma companheira apanhou da polícia até desmaiar. Todo mundo falando "está grávida", e a polícia... Desculpem-me a palavra mais uma vez, eu sou sem teto, não tenho uma formação, tenho um vocabulário meio difícil. Os policiais falavam assim: "Que se fodam. Vai apanhar para aprender a respeitar o Estado". Essa é a ditadura que nós estamos vivendo. E, depois daquela tragédia toda lá, um monte de gente machucada, um monte de gente presa. Todo mundo foi preso. Três companheiros foram presos por sete tentativas de homicídio. Fomos acusados de tentar matar sete policiais que estavam no helicóptero, protegidos pela fuselagem do helicóptero, a metros e metros de altura, de colete, capacete, coturno, e fortemente armados. Nós não tínhamos nada para nos defender, e falaram que nós atentamos contra a vida desses sete policiais. Na verdade, a tentativa de homicídio foi contra nós. Fomos presos, passamos oito meses presos - eu fui um dos presos. Durante muito tempo, durante 23 dias, no presídio, numa ala de segurança máxima, nós passamos 23 dias sendo torturados, apanhando. Eu fiquei com um defeito no dedo apanhando dos agentes penitenciários. Segundo eles, era para nós aprendermos a respeitar o Estado e a polícia do Estado. Ou seja, para vocês verem que essa perseguição está vindo há muito tempo em cima dos movimentos. Quando eles não prendem um lutador, eles matam. Eu já sofri, em Brasília, várias tentativas de homicídio. Até agora, ouviu, companheiro, a polícia não deu nenhum resultado. Desde 2010 que eles estão investigando uma tentativa de homicídio em Brazlândia, onde me deram 18 tiros. Até agora, não tem resultado nenhum. Tivemos uma audiência pública aqui também sobre essa questão. Na época, era a campanha Sem Teto Com Vida - até agora, nada. Ou seja, estamos morrendo como moscas, estamos morrendo como animais, e as autoridades deste País não fazem nada. E a Justiça é conivente com isso, porque nós fomos absolvidos de sete tentativas de homicídio, doutora. Esta semana, dia 27, três desembargadores... (Soa a campainha.) O SR. EDSON SILVA - ...cassaram a liminar do juiz e voltamos para o tribunal do júri, voltamos a ser acusados de sete tentativa de homicídio de novo. A Desembargadora Sandra De Santis, a Ana Maria e o Carlos Pires resolveram nos acusar de sete tentativas de homicídio de novo. É um absurdo isso. Ou seja, temos vários processos, estamos sendo processados e ninguém faz nada. Estamos morrendo e ninguém faz nada. Eu espero que essa vinda dos companheiros, essa nossa vinda a esta Casa não seja em vão. Esta Casa, através do Senador Paulo Paim, através da Senadora Regina, sempre apoiou, sempre defendeu a classe dos mais desfavorecidos, dos excluídos. Eu não vejo esse empenho das outras autoridades, dos outros Senadores. Eu não vejo isso! Se todos se unissem, nós íamos parar de morrer, o campo ia parar de morrer, a cidade ia parar de morrer. Estão prendendo... Eu fiquei sabendo... (Soa a campainha.) O SR. EDSON SILVA - Só para concluir. |
| R | Fiquei sabendo que, recentemente, na greve do dia 28, um companheiro quase morreu, está na UTI, por uma paulada de um policial; seis companheiros do MTST foram presos na greve por estar lutando, acusados de crimes. Nós fomos acusados de vários crimes. Ou seja, companheiros, alguém tem que fazer alguma coisa, senão, mais uma vez, desculpe a palavra, o povo pobre, o povo trabalhador está lascado. Nós vamos ter que enterrar nossos amigos, nossos companheiros, vamos ter que ver filhos sendo criados sem a proteção do pai, só pela mãe, para passar necessidade. Ou o País faz alguma coisa ou o povo deste País está lascado, companheiros. Obrigado a todos. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Edson. Se alguém tem que pedir desculpas aqui, não é você, não. Este País deve desculpas a muita gente, desde que foi descoberto. Vamos ouvir agora o Sr. Rogério Papalardo Arantes, Diretor de Ordenamento da Estrutura Fundiária do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - Incra. O SR. ROGÉRIO PAPALARDO ARANTES - Bom dia a todos. Bom dia, Senadora, Senadores, senhores e senhoras. Eu gostaria primeiramente de justificar a ausência do nosso Presidente Leonardo, que ficou preso no aeroporto e não conseguiu chegar a tempo para esta audiência pública. O nosso Ouvidor Agrário, Dr. Jorge Tadeu, também está nessa mesma situação, e sobrou para mim a missão de vir a esta audiência pública tão importante dar a contribuição do Incra, do Instituto. Semana passada, na quinta-feira, eu e o Dr. Jorge Tadeu, sabendo do ocorrido lá em Colniza, nos deslocamos para Cuiabá, onde tivemos uma audiência pública com o Secretário de Segurança Pública logo na quinta-feira pela manhã. Ele nos relatou todas as ações tomadas logo após o ocorrido lá na gleba; contou que deslocou 50 policiais, toda a estrutura da Secretaria de Segurança Pública esteve no local em que se estavam levantando e apurando os fatos; relatou inclusive que estava próximo já de prender alguns executores. Foi também cobrado pelo nosso Ouvidor Agrário que se aprofundasse nessa investigação, porque a gente sabe que, atrás de quem executa, geralmente tem aquele que manda, que tem um interesse maior. Ele nos garantiu que vai se aprofundar e que vai fazer realmente desse evento, dessa situação horrorosa que ocorreu, exemplo para que outros pensem duas vezes antes de cometer qualquer tipo de atrocidade no campo. |
| R | O Incra se colocou à disposição, como parceiro da Secretaria de Estado para qualquer intervenção na região, para que leve realmente o braço do Governo, por se tratar de uma região onde o Estado está um tanto quanto ausente. Dessa reunião, extraiu-se a necessidade de um levantamento técnico. E, juntamente com o Intermat, que foi uma reunião a posteriori dessa com o Secretário de Segurança Pública, ficou acertada uma visita técnica para dirimir algumas dúvidas que ainda pairam até na localidade do evento. Nós recebemos algumas coordenadas aqui em Brasília que não se confirmaram. Plotamos na nossa Coordenação de Cartografia os mapas e não se confirmou como o local exato do ocorrido. Então, até nessa parte, nós nos colocamos à disposição. Ficou um representante da Ouvidoria na nossa Superintendência Regional de Mato Grosso para que, junto ao Intermat e junto à Segurança Pública, essa equipe de seis técnicos, três do Intermat e três do Incra, se desloque até o local para fazer essa plotagem, essa captura de coordenadas para que consigamos, aqui em Brasília ou na Regional mesmo, identificar com exatidão o local da chacina, e isso tecnicamente no mapa, plotado e com uma segurança de informação maior. Fora isso, o Incra... Nessas reuniões de que participamos, ficou bem claro que não é área de PA, de assentamento do Incra. No nosso mapa, nós conseguimos acessar, e os nossos assentamentos estão distantes, são em outras glebas e não na Gleba Roosevelt, em que ocorreu o fato. E também são áreas que já estão no domínio do Estado de Mato Grosso. Algumas já tituladas, algumas já georreferenciadas, algumas até com a matricula já de propriedade privada. Há, sim, algumas outras áreas que ainda estão em domínio do Estado, em que nós estamos lá elaborando relatórios, Senadora, para podermos indicar uma ação talvez parecida com a de Unaí, que era uma área privada e foi arrecadada para a finalidade de reforma agrária pela questão de não cumprimento das finalidades sociais, por conflito, por serviço escravo e tantos outros que determinam e que não são muito utilizados para essa arrecadação de áreas no Brasil. Então, o Incra está lá, Inácio. Não vamos criar comissão. Essa comissão é permanente. Onde há conflito agrário, o Incra tem de estar presente. Mesmo sendo terra estadual, terra particular, a Serfal, o Terra Legal deveria ter uma atuação maior. |
| R | Nós estaremos, porque entendemos que conflito agrário tem que ser cuidado pela Ouvidoria e trazido para o interesse da reforma agrária, para ser destinado para assentamento de famílias. Então, o Incra vai concluir esse trabalho dentro dos próximos dias e teremos, aí, sim, um relatório com coordenadas precisas, identificando definitivamente se são áreas do Estado e se são áreas privadas. Sendo do Estado, temos como criar uma situação em que podemos assentar famílias; e, sendo áreas privadas, também podemos arrecadar para fins de reforma agrária. São as ações que o Incra tomou a partir do dia em que tomou conhecimento da chacina e assim vamos tratar até o dia em que conseguirmos pacificar e colocar as famílias no assentamento de forma regular, porque lá não é uma área que está destinada ainda para reforma agrária. Então, eu queria trazer essa contribuição e dizer que o Incra está à disposição dos Senadores. Com esse trabalho sendo concluído, podemos trazer esse relatório também para conhecimento de todos. Obrigado. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Sr. Rogério Arantes, do Incra. É importante isso que o senhor falou de encaminhar relatórios, porque fazemos ofícios e mandamos para os órgãos. Seria interessante que, à medida que os órgãos fossem tomando providências de alguma coisa, mandassem para nós, até para informarmos também para as entidades que nos procuram. Então, acho que é uma recomendação, inclusive, para as outras entidades públicas, para os outros órgãos públicos a que mandamos ofícios pedindo providências: cada coisa que for feita é importante para irmos juntando num relatório só, para ver que ações realmente estão sendo feitas em defesa das famílias e para dirimir os conflitos. Eu tinha pedido à Comissão de Direitos Humanos da Câmara, porque foi lá, que mandasse alguém para fazer a narrativa aqui também. Não sei se ficou de vir o jornalista que acompanhou, ele não chegou ainda. Assim que ele chegar, abrimos, porque chegaram de lá sexta-feira e, aí, podemos ouvir o que aconteceu, o que eles viram, porque eles foram ao local. Agora, Senador Medeiros, depois a Senadora Fátima, se quiserem usar da palavra. O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Senadora Regina, Presidente da Comissão de Direitos Humanos, Dr. Rogério Papalardo, Diretor de Ordenamento de Estrutura Fundiária do Incra, Sr. Edson Silva, representante do MRP, Sr. Inácio Werner, representante do Fórum de Direitos Humanos, Drª Deborah Duprat, todos que nos assistem pela TV Senado e nos ouvem pela Rádio Senado, infelizmente estamos aqui, mais uma vez, para debater um tema que já virou uma certa rotina na nossa história: conflito agrário, conflito no campo, invariavelmente com mortes e, infelizmente, no meu Estado de Mato Grosso. Eu tenho viajado muito tanto pela região do Araguaia quanto pelo norte de Mato Grosso. Enfim, de Cuiabá para cima, nós temos uma dificuldade muito grande, Dr. Rogério, principalmente no que se refere à regularização fundiária. |
| R | Quando cheguei aqui, o Ministro do Desenvolvimento Agrário era Patrus Ananias, e eu me reuni com ele para falar justamente desse tema: "Nós precisamos fazer alguma coisa para que a regularização fundiária volte a andar." Nós temos problemas de toda sorte. Só para citar um caso, foi criado o programa Banco da Terra. As pessoas foram assentadas. Elas se formavam em associações. Compraram as terras e foram trabalhar. Acontece que a dívida foi feita no CPNJ dessa associação. Com o passar do tempo, quando chegou a época de as pessoas pagarem a dívida, elas iam ao banco, e o banco falava: "Não recebo, porque eu só recebo toda a dívida". Então, muita gente ficou sem pagar. Isso criou dívidas. Muita gente também abandonou as terras. Depois, outros vinham e invadiam. Quer dizer, o que era para ser um cenário de terra legal acabou virando também um conflito. Começamos, então, uma negociação via Banco do Brasil, junto com o Ministério do Desenvolvimento Agrário, para tentar desatar esse nó. Mas eu confesso que parece que é a mesma coisa que tocar vaca na chuva: enquanto você toca uma, a outra para comer; você vai lá, e a outra... Eu estou, há dois anos, quase todos os meses, tentando... Isso se refere apenas à questão do Banco da Terra. Há uma dificuldade imensa, mesmo no caso de pessoas já assentadas, legalizadas. Eu creio que o Incra tem bem conhecimento da situação dessas pessoas que querem se legalizar para trabalhar. Mas, nesse meio tempo, como estão endividadas, não têm acesso a crédito, não têm acesso a nada. Então, essa é uma das situações do campo, só para citar um exemplo. Há outro caso no Estado de Mato Grosso que é mais grave. Viajando, há pouco tempo - há pouco tempo, não -, no final do ano passado, por volta de setembro, cheguei a Matupá, no norte de Mato Grosso, e várias pessoas me abordaram e falaram: "Olha, Senador, o senhor esteve na associação tal, não sei o quê, jantou e se reuniu com... Nós estamos vendo no Facebook que o senhor tirou foto com essas pessoas aqui". Eu falei: "Olha, eu tirei foto com várias pessoas que estavam lá". E elas disseram: "Isso aqui é bandido. Esse povo aqui está não sei o quê". Enfim, aquela confusão. Disseram que essas pessoas entravam nas terras, matavam o gado e, logo em seguida, iam embora. Elas me solicitaram que ligasse para o Governador Pedro Taques para tentar manter a segurança ali. Na outra reunião que tive, já o pessoal contrário dizia: "Nós estamos sendo ameaçados aqui e tal". Enfim, eu vi que ali havia um barril de pólvora. Isso aconteceu no domingo. Cheguei aqui na segunda e, na terça-feira, quando eu estava na sessão no plenário, vi num site de lá que tinha havido um conflito, morrido um advogado e que teriam sido queimados os barracos. |
| R | Isso é meio que uma rotina ali no Norte. O que nós precisamos, a meu ver... É lógico, por esses nove que morreram, o que podemos fazer? Nada. Não se pode fazer praticamente nada. Devemos buscar os responsáveis por essas mortes para o Estado punir e tal. Mas e aí? Como fica a situação? A Drª Deborah há pouco falou... Eu passei pela mesma dificuldade. Falei com a minha assessoria: quero ir ao local. Disseram: "Só se você conseguir um helicóptero que tenha uma boa autonomia de voo, porque o rio está cheio, as estradas são praticamente intransitáveis. É um lugar muito difícil de ir. Tem que esperar que se monte toda uma estrutura, porque não dá para você chegar lá assim, de uma hora para outra." Em Mato Grosso, para quem está nos assistindo, temos, por exemplo, algumas comunidades que ficam a 1.300 quilômetros da capital, Cuiabá. Então se torna mais difícil ainda. Agora, vamos fazer o que diante disso? Vamos deixar que continuem acontecendo esses conflitos? A meu ver, nós precisamos - Governo Federal, governo estadual, todo mundo - nos unir para, de uma vez por todas, verificar o que temos que fazer. Lá, por exemplo, nós temos situações, Drª Deborah, em que os títulos já estão prontos. É só entregar os títulos. E eu não sei por que essa coisa não anda. Agora mesmo, nós nos reunimos na Bancada, antes dessas mortes, e fomos conversar com o pessoal do Estado: "O que está faltando?" "Faltam recursos". Destinamos R$80 milhões das nossas emendas para fazer regularização fundiária, para ver se se mitiga esse problema. Como foi falado aqui pelo Edson, realmente não é só um problema rural. É um problema urbano também. Nós temos muita dificuldade para fazer essas coisas andarem. A meu ver, nós precisamos fazer com que o Incra, que lá em Mato Grosso é chamado de "encravado"... Mas eu até entendo por que é chamado de encravado. É porque essas coisas são extremamente difíceis. E, num momento de crise como este, fica mais difícil ainda tratar do tema porque falta dinheiro. Fui lá para dentro, tentar entender por que demorava tanto. Vários técnicos me disseram: "Senador, eu tenho que me deslocar. Não tenho como ir daqui a quase dois mil quilômetros pagando a minha despesa". Ele me disse: "A última viagem que eu fiz com poucos colegas ficou em torno de R$9 mil, isso me hospedando em pensão". Não é hotel de luxo, não, até porque não tem no interior. Então há dificuldades imensas com que nós temos que lidar. Essa localidade mesmo, que fica quase na divisa com Rondônia... Eu até comentei: essas pessoas que estão lá... Acho que o Governo deveria fazer o seguinte: para os que escaparam, vamos arrumar um lugar que tenha terra, porque quem está naquele lugar quer um pedaço de terra mesmo para produzir. Senadora Regina, para se chegar lá é uma coisa terrível. Então nós temos todos esses desafios. E Mato Grosso herdou todas essas dificuldades. Nós temos comunidades quilombolas, a questão indígena... E não é falta de terra. A questão é que os índios estão morrendo de fome mesmo. E nós precisamos modernizar a legislação com relação aos indígenas, porque hoje eles têm terra, mas não podem fazer nada. O cacique até desabafou comigo. Achei interessante. Ele é da aldeia Umutina e me disse o seguinte: "Nós somos guardas patrimoniais, sem uniforme e desarmados, da União. Nós ficamos aqui para ser guardas patrimoniais das terras da União que tenham madeira nobre, que tenham mineração. Vivemos aqui". Ele falou: "os meus meninos estão morrendo de fome. Os que saem daqui e conseguem estudar vêm para cá para morrer de depressão, se suicidar, porque eles não veem uma perspectiva. Eles já têm acesso à tecnologia, já têm acesso a toda essa modernidade. Ele vem aqui para o mato. Vai fazer o que no mato? Não tem nada. E algumas pessoas no País ainda querem que a gente fique na beira do Teles Pires, do Rio Paraguai, nu, levando ferroada de pium", que é um mosquito que tem uma picada muito doída lá. |
| R | Esse é o cenário que nós temos lá para Mato Grosso. Vamos fazer o que para que essas mortes não tenham sido em vão? As pessoas que mexem com esse tema já estão cansadas de reuniões que se fazem após uma tragédia. Nós estamos sempre apagando o fogo ou tratando de forma pontual. A grande verdade é que os governos estaduais estão quebrados. Eles estão mal pagando folha. Hoje o indicador de sucesso de um governo estadual é mais ou menos assim: "Está pagando folha?" Está. Então, o governo está bom. A alternativa é: vamos jogar a culpa para o fulano ou para beltrano. Mas não resolve o problema. Podemos dizer que foi o PT que não fez um palmo de reforma agrária, não fez titulação. Mas resolve o problema? Não. Então, vamos jogar para o FHC. Não vai resolver o problema. Vamos jogar para os governos estaduais. Não resolve o problema. O certo é que nós estamos com uma animosidade no campo. É por isso que eu tenho feito aqui uma crítica de que o campo já é um barril de pólvora por si só. Ele não precisa de uns chamados iluminados irem às câmaras das TVs e falarem que vão incendiar o País, que nós vamos chamar o exército do Stédile. O campo, por si só, já pega fogo. Eu tenho muito cuidado de não politizar partidariamente o tema do campo, porque o que nós precisamos é resolver o problema. Nós não precisamos sapatear e nem tentar ganhar dividendos políticos em cima do sangue dessas pessoas. Muito obrigado, Senadora Regina. (Palmas.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Senador Medeiros. Senadora Fátima, o jornalista que foi à missão da Câmara chegou. Dá para ouvi-lo dez minutos? Fique à vontade se quiser falar antes dele. A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - É porque eu vou ter que ir daqui a pouco para a Comissão de Educação. Estava conversando inclusive com a Drª Deborah que nós temos outra missão lá, também muito importante. A cidadania do povo brasileiro também está sendo lá atacada em razão de um decreto publicado recentemente pelo Ministro da Educação, que traz consequências para todo o processo organizativo de uma das agendas mais importantes em defesa da educação brasileira, que é a Conferência Nacional de Educação. Se eu pudesse logo falar, Senadora Regina, depois eu escuto... A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Tudo bem, não tem problema. Senador fala sempre quando quer, quando precisa. Leonardo de Aragão é o jornalista da Câmara que acompanhou a Missão dos Deputados da CDH de lá, que foi a Colniza. Quando a senhora terminar, a gente passa para ele. Quando a senhora terminar, a gente passa para ele. |
| R | A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - O.k. Começo cumprimentando o Leonardo, cumprimentando a Drª Deborah, da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão; o Inácio, representante do Fórum dos Direitos Humanos e da Comissão Pastoral da Terra do Mato Grosso; o Edson, representante do Movimento Resistência Popular; e o Sr. Rogério, representante do Incra. Senadora Regina, primeiro, veja bem: as manchetes aqui são muito preocupantes, Drª Deborah. Começo aqui mostrando um artigo: "O pensamento raso que retroalimenta o ódio no Brasil. Ações violentas contra indígenas e movimentos populares revelam a fragilidade e a conivência do Estado com a escalada da extrema direita"; "Nove camponeses assassinados no Mato Grosso"; "Estudante agredido brutalmente por um oficial da PM goiana"; "Indígenas do Maranhão atacados por fazendeiros enlouquecidos"; "Militantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto presos sem acusação formal"; "Manifestações contra reformas reprimidas com bombas e violência desmedida"; "Desocupação de terras sem mandado judicial em Minas Gerais". Esses são alguns fatos sociais gravíssimos ocorridos nos últimos dias no Brasil. Temos aqui outra manchete: "Após chacina em Mato Grosso, Brasil já tem ao menos 19 mortes no campo em 2017"; "Laudo policial aponta tortura de Sem Terra em chacina no Mato Grosso"; "Guilherme Boulos, coordenador da Frente Povo Sem Medo e do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, denuncia: 'greve geral tem presos políticos. País vive regime de exceção'." Então, eu quero aqui inicialmente, não apenas em meu nome, mas em nome da Bancada do Partido dos Trabalhadores, trazer toda nossa solidariedade aos familiares, enfim, a todos e todas atingidos de forma brutal, covarde, com mais essa chacina ocorrida agora lá em Colniza, no Mato Grosso. Isso é muito grave. A Drª Deborah colocou aqui muito bem: isso não tem outra palavra, a não ser barbárie. Infelizmente, nós estamos assistindo, no País, a um aumento da violência. É disso que se trata. E acho, Drª Débora, que isso tem a ver com os tempos que nós estamos vivendo, mesmo - tempos de ataque à democracia, tempos de exceção. O golpe parlamentar vivido por este País fez exatamente ressurgir, infelizmente, todo esse clima de intolerância e de ódio que termina alimentando o que está acontecendo no País. Volto a dizer: não só aquilo, o assassinato de Colniza, de forma covarde, dos trabalhadores que lutavam por direitos, por cidadania; é o estudante espancado, que está chocando o País inteiro - o estudante, também lutando pelo direito à educação, foi covardemente espancado e está hospitalizado -; é o ataque, agora, à comunidade indígena também, lá no Maranhão; são trabalhadores sem teto, lutando legitimamente por seus direitos, presos de forma absurda. Então, eu quero aqui colocar, Senadora Regina, que é papel e dever desta Comissão fazer exatamente o que nós estamos fazendo neste momento: não só denunciar, como cobrar das autoridades. Se é verdade que nós tínhamos que encarar que esses problemas são complexos, e há uma série de fatores de natureza social que contribui para isso, é verdade também que a gente tem que olhar o presente de olho no futuro, ou seja, olhar o presente no sentido de cobrar medidas adequadas para que a gente possa ir superando essas dificuldades, para que a gente possa acabar com esse clima de violência e com esse clima de impunidade. Infelizmente, não é a isso que estamos assistindo neste momento. Isso é o que nos deixa mais preocupados. |
| R | Vejam bem: os dados do último senso agropecuário de 2016 são contundentes quando apontam que mais da metade da produção de alimentos no País é realizada pela agricultura familiar, e dentro dela está a significativa participação da reforma agrária. Apesar disso, a desapropriação de terras para fins da reforma agrária encontra-se praticamente estagnada, conforme pode ser confirmado nos próprios dados do Incra, que afirmam a existência de 180 milhões de hectares de grandes propriedades definidas como improdutivas. Na outra ponta, o MST indica que são 120 mil famílias acampadas à espera de um lugar - como dizia o poeta - "de mato verde para plantar e para colher". E qual tem sido a posição do Governo Federal? Isso tem que ser refletido aqui dentro. Qual tem sido a posição do Governo Federal? O que ele tem feito para lidar com essa situação - repito - no sentido de superar esses obstáculos? A posição do Governo Federal tem sido uma posição exatamente na contramão, hostil, de não reconhecer, inclusive, a importância que tem um tema como a luta pela terra num País como o Brasil - aliás, reforma agrária, desapropriação de terras, é um tema que já foi resolvido em vários países, inclusive países de perfil capitalista, por reconhecerem o quanto é estratégico o acesso à terra, a distribuição da terra do ponto de vista da promoção do desenvolvimento local, do desenvolvimento regional, do ponto de vista da promoção da questão da cidadania. Mas o que esse Governo ilegítimo faz? Faz exatamente o contrário! Ou seja, o problema existe - é fato - e o problema não é de hoje - é fato -, mas a que nós estamos assistindo neste exato momento? Repito: o Governo tomar iniciativas que vêm agravar o problema cada vez mais, Senador Humberto. Aqui dou um exemplo: extinguiu o Ministério do Desenvolvimento Agrário; a redução de investimentos para o Incra, para pagar o passivo e avançar nas desapropriações. |
| R | E mais: na contramão da reforma agrária, o que foi que o Governo ilegítimo fez? Baixou a Medida Provisória 759, no apagar das luzes, agora em 2016, que alterou profundamente a questão da legislação fundiária e os procedimentos para efetivação da reforma agrária, conflitando com o que está previsto na Constituição Federal de 1988. Entre os retrocessos que estão nessa MP criminosa, a Medida Provisória 759, que corretamente... Não somente os sem-terra, mas vários especialistas, sabe como estão chamando essa MP 759, Senador Humberto? De ato institucional da reforma agrária. Vejam de que ela trata, o que ela propõe: ela propõe municipalizar o processo de desconcentração de terras. Ou seja, agora a vistoria e a desapropriação de terras serão feitas pelas prefeituras, o que, na prática, estanca a reforma agrária, uma vez que os latifundiários geralmente detêm os poderes políticos municipais. Isso aqui dispensa comentários. Outro item da MP: a retirada dos movimentos sociais de todo o processo de efetivação do acesso à terra, o que implica a redução da participação e do controle social; a previsão de editais para composição dos novos assentamentos, o que significa desconsiderar as mais de cem mil famílias acampadas que aguardam há anos pelo direito de acesso à terra. Ora, querer que uma iniciativa dessa do Governo não contribua para aumentar o conflito no campo do setor agrário; que medidas como essas não contribuam, repito, para ampliar cada vez mais os conflitos já existentes? Então, eu quero, Senadora Regina, dizer que é inaceitável tudo isso. Repito: isso é barbárie. Isso é uma coisa que fere a questão da civilização. E repito: em poucos dias, é estudante espancado - está correndo, inclusive, risco de morte - porque estava lutando legitimamente pelo direito à educação; são os indígenas - segundo a imprensa, houve indígena que teve as mãos decepadas -; é o assassinado agora de Colniza, curiosamente após 20 anos daquele outro massacre que chocou o Brasil e o mundo, que foi o massacre de Eldorado dos Carajás; é a criminalização dos movimentos sociais. Sexta feira, o Brasil inteiro assistiu a mais um ato de resistência heroico, não só dos movimentos sociais, dos movimentos sindicais e populares, mas, para alegria nossa, terminou sendo um ato de resistência da sociedade brasileira, porque aquilo que se viu sexta-feira não foi só um ato dos sindicalistas nem dos partidos de oposição. Pela grandiosidade das manifestações populares, sexta-feira, o que se viu foi a população brasileira vindo às ruas para dizer que basta de violência. Até porque não existe violência maior do que termos um Governo ilegítimo, que entrou pela porta dos fundos da história; não existe uma violência maior do que ver esse Governo ilegítimo tomando medidas que ferem a dignidade do povo brasileiro, como a reforma trabalhista e como a reforma da previdência. |
| R | E concluo dizendo que não há violência maior do que aquela a que nós estamos assistindo neste exato momento: mais uma vez, repito, seres humanos tendo roubadas as suas vidas em atos de grande covardia. E reitero a nossa preocupação com estes tempos de exceção em que estamos vivendo, em que o próprio Estado brasileiro está na situação de ter a sua própria legitimidade, Drª Débora, questionada neste exato momento. Tudo isso nos leva, repito, a uma preocupação cada vez maior. Mas o que nós tínhamos de fazer é o que estamos fazendo aqui neste momento, no Congresso Nacional, no âmbito de uma Comissão de Direitos Humanos: trazer a denúncia; e, junto com a Procuradoria de Defesa dos Direitos do Cidadão - está aqui a Câmara, que vai falar agora -, que daqui, Senadora Regina, possamos sair com alternativas também concretas para que nós possamos dar a nossa contribuição como Congresso Nacional para dar um basta nesse tipo de situação. Que os responsáveis por isso sejam identificados, Edson, e que eles sejam punidos com todos os rigores da lei. Termino, Senadora Regina - permita-me - trazendo ao conhecimento desta Comissão e pedindo para que fique consignado nos Anais da nossa Comissão uma nota que a Bancada do PT acaba de divulgar com relação ao episódio dos ataques ao povo indígena Gamela, no Maranhão: A bancada do PT no Senado Federal manifesta sua indignação e seu repúdio ao violento ataque contra o povo indígena Gamela, ocorrido no povoado de Bahias, município de Viana (MA). Por milagre, não houve a morte de ninguém, pois os atacantes balearam cinco indígenas e feriram gravemente outros dois. Trata-se de violência anunciada, numa área em que há antigo conflito de terra. O povo Gamela já vinha denunciando às autoridades as ameaças de morte de suas lideranças para impedir a retomada de suas terras ancestrais. O próprio governador do Maranhão, Flávio Dino, enviou, ao final do ano passado, ofício pedindo a intervenção da Funai na região e a demarcação das terras do povo Gamela. Lamentavelmente, a Funai do governo golpista, sucateada por cortes extensos de verbas e entregue a um partido político, não conseguiu se mobilizar a tempo. Mais lamentável ainda foi atitude do Ministro da Justiça do governo ilegítimo, que definiu, em nota oficial, o povo Gamela como "supostos indígenas". Deve-se condenar também [diz aqui a nota] a atitude do deputado federal Aluísio Guimarães Mendes Filho [...], que desqualificou e agrediu o povo Gamela, incentivando, dessa forma, o ataque violento. Esse ataque bárbaro aos povos originários ocorre poucas semanas após o massacre de trabalhadores rurais de Colniza, a violência policial contra indígenas em Brasília e a grave agressão ao estudante Mateus Ferreira da Silva, que participava de manifestação pacífica em Goiânia. A violência extrema contra o povo tornou-se norma. Voltamos à barbárie. No entendimento da bancada [do PT], o golpe de 2016 criou um Estado de exceção dedicado a reprimir violentamente movimentos sociais, estudantes, professores, trabalhadores, indígenas e quaisquer outros grupos sociais que ousem se opor ao governo ilegítimo e sua agenda ultraneoliberal. A atual escalada de violência é nítido reflexo da ausência da democracia real e da total incapacidade das autoridades ilegítimas de mediar conflitos, pois estão inteiramente comprometidas com a defesa dos interesses dos poderosos. |
| R | Nesse contexto, os povos originários do Brasil estão em situação de extrema vulnerabilidade, uma vez que o governo golpista pretende liberar a venda de terras a estrangeiros e permitir a mineração na Amazônia, inclusive em terras ancestrais. A bancada] do PT no Senado tomará todas as medidas cabíveis para que esse ato bárbaro seja investigado a fundo e todos os responsáveis sejam punidos conforme a lei. Obrigada, Senadora Regina. Quero passar a nota aqui à Comissão, por favor, para que fique consignada. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Senadora Fátima. Na presença do Senador Humberto, eu perguntaria se podemos ouvir o jornalista que foi à missão na região, porque ele deve ter informações do que aconteceu. S. Sª tem dez minutos. Leonardo Aragão é jornalista da Câmara e acompanhou os Deputados, a comitiva que foi a Colniza semana passada. O SR. LEONARDO ARAGÃO - Bom dia a todas e a todos. Cumprimento a Senadora Regina Sousa, Presidenta da Comissão de Direitos Humanos do Senado; cumprimento o Senador Humberto Costa, a Senadora Fátima Bezerra, o Senador José Medeiros e, em nome deles, saúdo toda a Mesa e os presentes em plenário. É isso mesmo. Semana passada, eu tive essa oportunidade. Eu atuo na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados e, logo no dia em que ocorreu o massacre em Colniza... A região é de tão difícil acesso que o episódio ocorreu na quarta e só na quinta chegou ao conhecimento de todo o Brasil, para vermos a dificuldade. Esse é um ponto fundamental para compreender um pouco o que se passa por lá. Trata-se de região de muito difícil acesso de fato. Somente um dia depois conseguimos. De pronto, o Deputado Paulão, que é o Presidente da Comissão de Direitos Humanos, entrou em contato com alguns Parlamentares, principalmente com o Deputado Ságuas, que é do Estado também do Mato Grosso, para apurar também algumas informações; entrou em contato também com o Governo do Mato Grosso, com a Secretaria de Segurança e também com o Ministério da Justiça no sentido de tentar solicitar um auxílio especialmente da Polícia Federal para tentar ajudar no que se refere à logística de acesso a essa região. No fim das contas, conseguimos agendar, fazer uma diligência apenas na quinta-feira da semana passada. Essa missão contou com quatro Deputados Federais: o Deputado Paulão, na condição de Presidente da CDHM, e os Deputados Ságuas Moraes, do Mato Grosso, Nilto Tatto e João Daniel. Então, essa comitiva foi, acompanhada da assessoria técnica da Comissão, e já de antemão tivemos um problema. Nós queríamos, na verdade, Senadora Regina, visitar a comunidade de Taquaruçu, ir lá para Taquaruçu do Norte. Só que, em virtude dessa dificuldade de acesso à região... Para vocês terem uma ideia, tivemos de nos deslocar de avião. O aeroporto de Colniza é um aeroporto municipal, de terra batida. E para chegar de Colniza até a comunidade de Taquaruçu era preciso pegar um helicóptero. Um avião não conseguiria pousar na região. Infelizmente, não foi possível, porque, apesar das solicitações da Comissão e do Deputado Paulão ao Governador Pedro Taques para que nos fornecesse uma aeronave, um helicóptero, para que nós pudéssemos ir à comunidade, não tivemos retorno. Então, a agenda acabou sendo uma audiência pública na área urbana de Colniza, na quinta-feira à tarde, reunindo autoridades, Poder Judiciário, Defensoria Pública. Igrejas estavam presentes também, tanto a Igreja Católica como religiões evangélicas - inclusive, uma das vítimas era um pastor da Assembleia de Deus -, para tentar, em meu primeiro lugar, prestar uma solidariedade. Até foi curioso, porque uma das coisas que nós observamos lá é que a comunidade sequer esperava. Ela ficou surpreendida, de certa forma positivamente, tendo uma missão oficial da Câmara dos Deputados presente lá, porque é algo a que eles não estão acostumados. Eles manifestaram surpresa: "Poxa vida, a gente nem contava que poderia ter... Nunca ninguém vem aqui". Passada uma semana do episódio - já, porque era o oitavo dia quando nós chegamos lá -, não havia comparecido nenhum Deputado, nenhuma autoridade, nem o próprio Governador esteve lá. E a comunidade sentiu falta disso, inclusive. Eles manifestaram isso publicamente para nós. Então, a primeira coisa foi a surpresa. |
| R | Em segundo lugar, observamos também o medo da comunidade - obviamente, com uma chacina com nove vítimas e uma situação que está longe de ser resolvida -, o que se percebia na fisionomia das pessoas. A fisionomia das pessoas, mesmo aquelas que não tinham nenhum envolvimento direto com a situação, pessoas que viviam na área urbana da cidade manifestavam, nas suas feições, um medo do que pode vir a acontecer, porque é unânime entre a comunidade de Colniza que novas situações, como a que ocorreu na semana anterior, podem voltar a ocorrer. Novas mortes podem surgir. Portanto, de fato a gente percebeu que ainda há muita coisa em aberto. Muita coisa, até do próprio Poder Público, acho que falta ali. Faltou alguma atuação mais incisiva. Nos relatos fica muito claro também - acho que até já foi dito aqui, mas não peguei a audiência desde o início - que a questão agrária, o conflito pela terra é o cerne da questão. As pessoas sempre fazem questão de falar, os populares de Colniza, que, se não se resolver o problema da terra, do acesso à terra, de regularização fundiária e de programas que permitam a essas pessoas ter acesso à terra, isso vai continuar acontecendo. Então, até mais do que as próprias mortes em si e o pedido de apuração de investigação do que aconteceu, eles solicitam, mais do que nunca, isto: que se faça um esforço conjunto entre autoridades federais, estaduais e municipais, no caso, da própria cidade, para tentar achar soluções para esses conflitos. Isso ficou muito claro em todas as falas, praticamente: 90% delas deram esse indício de que a questão da terra precisa ser resolvida, é um elemento central. Sem resolver isso, podemos apenas focar em um crime, eventualmente solucionado, mas outros poderão acontecer. Nós também tivemos a oportunidade de dialogar com o próprio delegado, que é o responsável pelo caso, e com o promotor também. Ficam muito claras as dificuldades que a própria Polícia Civil tem de tentar solucionar o crime, já entrando no mérito dos crimes especificamente. Como já disse anteriormente, é uma área de difícil acesso. Colniza, segundo a gente apurou - o Senador José Medeiros me corrija se eu estiver errado -, é o Município de maior área do Mato Grosso. É o maior Município em área do Mato Grosso. Então, é uma área muito grande. O Deputado Paulão, que é de Alagoas, até como comparação, citou que o Município de Colniza é maior do que Alagoas; só o Município. Então, vejam só como é difícil! E o delegado manifestou uma dificuldade muito grande, porque ele conta - em um Município que tem uma área gigantesca, maior do que um Estado do Brasil - com apenas nove investigadores e, se não me engano, acho que uma viatura. Esses dados todos nós compilamos e vão ser fruto de um relatório, que será produzido pelo Deputado, pela assessoria técnica da Comissão. Com certeza, nós o enviaremos para conhecimento da Comissão Direitos Humanos do Senado quando estiver finalizado - deve ser nos próximos dias. Então, quer dizer, em todos os lados, há uma dificuldade muito grande, porque, do ponto de vista da regularização fundiária, há muito por fazer; do ponto de vista da investigação do crime em si, também há muito o que fazer. O delegado fala até no sentido de um apelo, porque ele não consegue... Realmente, por mais seriedade e boa vontade que o profissional da segurança tenha - no caso, o delegado -, é muito difícil, tendo em vista a dificuldade de acesso à região. Você tem que pedir um helicóptero para pousar no lugar ou, então, você tem que ter um meio de pegar uma balsa e, depois, caminhar muito quilômetros a pé. |
| R | Enfim, a agenda acabou se resumindo a essas atividades - eu acho que foi muito importante. E, depois da audiência pública concluída - até não é uma informação privada, é uma informação pública, que saiu na imprensa -, o próprio Deputado Paulão em conjunto com os demais Parlamentares que acompanharam a missão avaliam a possibilidade de, eventualmente, pedir uma federalização do caso, tendo em vista essa dificuldade de acesso e de investigação, porque a própria Polícia Civil está de mãos atadas. Então, é uma questão que está sendo aventada, os Parlamentares... É uma decisão que deve ser tomada nos próximos dias. O relatório que vai ser feito deve embasar essa iniciativa, se for tomada - e eu creio que o será. Portanto, eu acredito que talvez essa seja uma iniciativa de primeira ordem, que deverá tomada nos próximos dias. É claro que, de qualquer forma, nós nos colocamos à disposição também para receber contribuições de outros órgãos... (Soa a campainha.) O SR. LEONARDO ARAGÃO - ... aqui presentes e dos próprios Senadores no sentido de achar soluções. A Comissão não tem o poder de tomar decisões por si só, no sentido de regularização, mas pode contribuir cobrando as autoridades e tentando achar uma mediação para esse conflito - é o que nós pretendemos fazer. Bem, de minha parte, é isso, Senadora. Agradeço a oportunidade da palavra. Um bom dia a todos. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Nós agradecemos aqui a presença do Leonardo, que esteve lá com as pessoas que sofreram, as famílias, e com autoridades. Isso enriquece o debate e complementa as informações, para vermos depois que providências vamos tomar. Senador Humberto Costa. O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Bom dia a todos e a todas; à Senadora Regina Sousa, Presidente desta Comissão de Direitos Humanos; ao Sr. Edson Silva, que representa o Movimento Resistência Popular; ao representante do Incra, Dr. Rogério Arantes; ao Sr. Inácio Werner, que representa o Fórum de Direitos Humanos e da Terra do Mato Grosso do Sul; à Drª Deborah Duprat, Procuradora Federal do Mato Grosso, Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão; e ao jornalista Leonardo Aragão. Eu queria também registrar aqui a minha preocupação, porque, em um espaço de tempo muito curto, nós vivemos quatro episódios que eu reputo como muito graves, do ponto de vista da defesa dos direitos humanos, do ponto de vista da forma de enfrentar os problemas relativos à posse da terra no Brasil e, principalmente, do ponto de vista da imagem que o nosso País tem no exterior - eu não diria principalmente, mas de modo importante também. |
| R | Tivemos o episódio de Colniza, onde se observa claramente a ausência do Estado, a ausência do Poder Público - especialmente do Governo Federal, que tem o condão de resolver o problema de forma definitiva, porque é ele que lida com o problema da terra, é ele que tem os recursos para que isso aconteça -, onde uma das características principais foi a brutalidade e o sentimento de impunidade, e isso servindo de exemplo para que outros episódios de violência se repitam. Poucos dias depois, tivemos em Minas Gerais o assassinato de um integrante do Movimento dos Sem Terra. Aqui, na própria Capital federal, onde se supunha que se pudesse, inclusive, garantir o direito de livre manifestação de todos - não somente respeitar, mas garantir -, nós vimos a polícia do Distrito Federal agredir covardemente grupos indígenas que estavam aqui para reivindicar os seus direitos. E agora houve esse episódio de Viana, no Maranhão, em que, a serem verdadeiras as descrições que foram feitas, nós podemos dizer que estamos vivendo uma barbárie. Não sei se isso foi confirmado, mas, se houve amputação de membros, coisas assim, isso não é um conflito; isso é um massacre, e não uma disputa. E não é possível que o Governo Federal assista a isso de forma passiva. Esses crimes precisam ser, efetivamente, federalizados. Está claro que não há como as polícias estaduais fazerem os respectivos inquéritos, instruírem os respectivos processos para que possa haver decisões rápidas e que vão ao cerne do problema. Porque, se nós ficarmos também somente enfrentando o problema da violência - alguém mata, é preso, é punido -, mas não se resolver o foco do conflito, certamente isso vai se repetir. É lógico que, se não houver punição, muitos mais se sentirão a cavaleiro para promover esse tipo de violência na disputa pela terra. Já são quantos Estados envolvidos? Tivemos aí Minas, Maranhão, Pará, afora os lugares de terras indígenas onde isso já virou... E o grave é que esse Governo, em um espaço de tempo muito curto, sem ter legitimidade para fazer isso, vai retrocedendo em uma série de coisas, inclusive em políticas que dizem respeito à demarcação de terras indígenas, ao tratamento aos povos indígenas, algo construído com muita dificuldade ao longo do tempo, passando pela Constituição, passando por várias legislações, passando por vários conflitos. E o Governo quer, com algumas canetadas, pôr tudo isso abaixo, o que me parece temerário. Então, eu quero manifestar a minha solidariedade aos representantes de Colniza que estão aqui e quero defender também essa ideia de que deveríamos demandar a federalização da investigação desses crimes. Acho que nós aqui da CDH, a exemplo do caso da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, precisamos ter uma postura mais proativa, talvez indo agora juntamente com a Câmara conversar com o Ministro da Justiça, demandar essas coisas e nos fazermos presentes, se não numa área, na outra, mas demonstrar também que essas populações não estão totalmente desassistidas. Pelo menos que tenhamos a possibilidade de denunciar, de falar, de mostrar o que acontece. |
| R | Acho, inclusive, que é uma atitude obtusa a desse Governo. Porque, se há hoje um tema que mobiliza a comunidade internacional, é aquele relacionado aos direitos dos povos indígenas. E o Brasil fica dando exemplos de que isso não vale nada. Depois, querem perguntar por que a imprensa internacional trata o Brasil como trata hoje, como se fosse uma republiqueta, e o Presidente, a forma como é tratado também. Era isso que eu queria deixar aqui registrado. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Senador Humberto. Alguém da plenária quer se manifestar? Senador Medeiros. A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Senadora Regina, bem rapidinho. É que eu vou para a Comissão de Educação, em que vão ter início os trabalhos. Quero reforçar aqui o que já foi colocado, inclusive, agora, pelo Senador Humberto, sobre a federalização, associada a outras sugestões aqui apresentadas. Senadora Regina, esta não é uma reunião de caráter deliberativo, mas eu gostaria de propor a V. Exª que a Comissão de Direitos Humanos também pudesse designar uma representação - e eu inclusive me coloco à disposição - para que nós fizéssemos uma visita ao estudante Lucas, em Goiânia, que foi espancado nas manifestações de sexta-feira. Era isso. Eu queria propor que V. Exª designasse um grupo de Parlamentares, e eu inclusive me coloco à disposição para fazer parte desse grupo. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Senadora Fátima. Senador Medeiros, agora, com a palavra. O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Obrigado, Senadora Regina. Só lamento que o pêndulo dessa balança nem sempre é igual. Em diversas manifestações ocorridas aqui em Brasília, policial teve a cabeça quebrada, e eu nunca vi uma palavra de apreço aos policiais. Lamentamos que tenha acontecido isso com o estudante, mas eu vejo como são tratados esses servidores públicos. Dito isso, Senadora Regina, eu vim aqui para esta audiência realmente com o objetivo de tratarmos do tema e buscarmos saídas, até porque há a presença do Incra, dos representantes dos trabalhadores, dos representantes do Movimento Resistência Popular, representantes do Ministério Público, da imprensa. E, como eu disse na minha fala, que a gente não usasse o sangue dessas pessoas para fazer debate político. |
| R | Quando aconteceu, eu sabia que isso ia acontecer. E por que eu sabia disso? Porque o velório da D. Marisa deixou isso bem claro. Sapatearam até em cima do caixão da esposa do Lula, que é o maior líder - e isso feito por ele próprio -, imaginem se não iam fazer palanque político em cima desse tema. Eu pensei que nós fôssemos... E quero parabenizá-la, porque V. Exª até agora tem conduzido a audiência no sentido de a gente buscar saídas. Mas eu sinto... Ouvi os discursos aqui de Senadores do Partido dos Trabalhadores, muito mais a Senadora Fátima Bezerra, no sentido de tocar mais fogo. O circo está pegando fogo; vamos jogar mais gasolina. Querer misturar, ligar fatos que não têm nada a ver com a chacina de Colniza, jogar num bolo só e responsabilizar um Governo é de uma desfaçatez sem tamanho. Eu não vou usar outros termos em respeito aos nossos telespectadores. Não faz sentido. Essa luta, os conflitos pela terra no Brasil ocorrem desde sempre. Dizer que esse Governo não está dando a menor trela à questão agrária é uma doidice. Em 2015, a Presidente afastada, a Presidente que perdeu o cargo, a Presidente Dilma, não demarcou um palmo de terra, não entregou um título sequer. Está aqui o Incra, que me desminta se for verdade. O Incra faz das tripas coração para tentar fazer uma vistoria ou outra; não tem recurso, não tem carro, não tem funcionário, está sucateado. E aí vêm dizer que, de repente, em menos de um ano, o Brasil desabou? A única coisa que mudou é que, de repente, aqueles movimentos sociais que estavam quietos, que estavam com algo atravessado na garganta, porque o governo que estava ali tinha sido apoiado por eles; de repente essas pessoas são chamadas para tocar fogo. Como disse o Stédile: "Vamos tocar fogo neste País!" Dá para responsabilizar também esse chamamento que eles fizeram por essa chacina? Não dá. Não dá para responsabilizar. Porque esses são conflitos que ocorrem devido à situação que é grave no campo. Mas eu não entendo. É difícil debater com o Partido dos Trabalhadores pela falta de honestidade no discurso. Você ligar a cacetada que o policial deu na testa do estudante com os malucos que cortaram a mão do índio lá no Maranhão e com a chacina de Colniza, jogar num bolo só e falar "fulano é responsável"... Isso é maluquice. Nós precisamos começar a fazer um discurso para tentar resolver. Mas, não. Nesse momento, dá para anotar as palavras. O discurso começa da seguinte forma, com o mantra de sempre: "o Governo ilegítimo, que ataca os pobres e os trabalhadores". E nesses 13 anos? O que aconteceu nesses 13 anos em que eles passaram no poder? Por que não resolveram nada em questão de reforma agrária? Uma das áreas nesse governo, uma das mais pífias foi a da questão rural. Aí vêm com esse discurso agora de querer jogar inclusive chacina nas costas das pessoas. É o que eu disse, não adianta a gente jogar a culpa, fazer a teoria e a filosofia do Homer Simpson: "A culpa é minha; eu coloco em quem eu quiser." Se for para fazer esse debate aqui e desfiar o rosário de agressões, não vamos chegar a lugar nenhum. Temos que achar uma solução nessas discussões que não seja como ocorre todas as vezes em que acontece uma tragédia; que não seja simplesmente embarrigar o problema. Agora, se formos ficar nesse pacote de agressão partidária, não vamos chegar a lugar nenhum. Sem falar o tamanho do desrespeito que é com os que morreram. |
| R | Dizer "ah, o Governo é ilegítimo"... Isso aí é assunto que já passou. É o que eu falei: aceita, que dói menos. Eu não vejo... "Ah, a democracia está sendo ferida." Eu não vejo um pio neste momento sobre a Venezuela, que está se arrebentando. Se for para a gente fazer esse debate, a gente faz. Se for para fazer o debate sobre a questão das reformas que estão ocorrendo, que estão atacando os trabalhadores e os pobres, nós podemos fazer também. Reformas essas que tinham sido propostas pela ex-Presidente que saiu. Mas esse não é o tema. Eu insto a fazer este pedido novamente: vamos tentar aproveitar este momento e - alguém sugeriu aqui na Mesa, não sei quem foi - juntar governos estaduais, órgãos que são responsáveis por esse tema, debruçarmo-nos sobre o tema e falar: o que vamos fazer para que isso pelo menos aconteça menos? O Incra está com todas as condições de tratar do tema, tem os insumos, tem o que precisa, a estrutura necessária? Vamos discutir o Incra. O Estado está tendo uma boa conversa com o Governo Federal? Essas pessoas que estão tratando do tema, como o Inácio colocou aqui, estão sendo ouvidas? Não, não estão. Vamos diagnosticar os problemas, fazer um diagrama de Pareto aqui, e aí partimos para uma ação. Mas, se o negócio for só ficar aqui puxando o cabelo um do outro, eu nem venho mais a uma reunião desta. Muito obrigado. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Senador Medeiros. Eu agradeço o elogio que o senhor me fez, mas aí o senhor também acabou politizando. Então, acabou botando lenha na fogueira também, não é? Eu acho que realmente os conflitos não são de agora, mas que eles estão se agudizando agora, isso ninguém pode negar. Não acabou; eles deram uma abrandada, e agora parece que o pessoal está se sentindo muito à vontade para praticar, porque havia 20 anos que a gente não tinha um Eldorado do Carajás. Então, é só pegarmos os livros da CPT para vermos a mudança que foi do ano passado para cá, uma mudança muito grave, muito grande, e que tem que ter uma motivação. A gente precisa encontrar, saber a raiz disso e tentar agir realmente. Nós vamos aqui depois, no final, encaminhar as propostas que saíram aqui, mas acho que realmente a gente tem que cobrar. E aí, pelo menos da nossa parte, do Partido dos Trabalhadores - até porque o senhor já foi de lá -, sempre lutamos mesmo. Até porque eles não têm outro lado para defendê-los; fomos sempre nós que defendemos essas pessoas. A CPT, a Igreja Católica, as pessoas ligadas são quem faz essa defesa sempre. Então, eu sempre estive desse mesmo lado, nunca mudei e nunca deixei de defender, porque a gente sabe a necessidade que a gente tem de apoiar, porque são organizações frágeis, e a gente precisa ajudar. Há alguém do Plenário que quer fazer uma intervenção? Três minutos. Identifique-se e pode falar. Identifique-se, e aí tem três minutos. A SRª LÍDIA DE JESUS - Bom dia, Srs. Deputados e Deputadas presentes, companheiros do movimento. Sou Lídia, da direção da Fenasps (Federação Nacional de Sindicatos de Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social). Saudamos a importância desta audiência e nos solidarizamos com a família do estudante que foi tombado no movimento, defendendo as causas sociais, defendendo os direitos do povo brasileiro. A família está de luto, e nós, do movimento social, estamos de luto. |
| R | Lamentamos a forma como foi conduzida a ação aqui na manifestação dos índios, donos da terra brasileira. Lamentamos a criminalização dos movimentos sociais. Realmente, não é cantilena, não é falar de uma questão sem importância. Tem importância, sim. E, a cada dia mais, a gente vê que a situação fica mais difícil; agudiza-se, sim. Cada vez que um trabalhador vai à rua defender seus direitos, ele é recebido a pancada, a bala. Enfim, é lamentável que isso esteja acontecendo num Brasil que já atingiu um estado de democracia que a gente quer que seja plena. Por isso, a Fenasps, aqui presente, se solidariza, está junto nessa luta. É uma luta por moradia, a luta por terra, uma luta que não devia mais estar existindo, mas, infelizmente, cada dia mais, a gente vê nesse País afora pessoas sem teto, pessoas na rua. A situação cada dia mais piora. Então, é importante esta audiência, é importante falar desses problemas. (Soa a campainha.) A SRª LÍDIA DE JESUS - Então, estão de parabéns as Srªs Deputadas e os Srs. Deputados que abriram esta Casa para esta audiência. E é preciso dizer um basta. Não dá mais para continuar. Continuando assim, só nos resta denunciar isso aos organismos internacionais, porque não dá para continuar o Brasil do jeito que está. Muito obrigada. A SRª CLEIA ANICE DA MOTA PORTO - Eu sou Nicinha Porto, da assessoria da Contag. A Contag até tinha sido convidada para esta audiência, mas nós estávamos, na semana passada, envolvidos no processo da posse da nova diretoria e tal. Eu queria trazer questões bem rápidas, que, talvez, possam ajudar no debate. Eu acho que prestei bastante atenção, fiquei muito atenta às colocações feitas por vocês, especialmente às do Leonardo e às do Rogério, claro, sem prejuízo das demais, mas por algumas questões. Acho que há essa ligação, essa vinculação, e não é possível dissociar os crimes, as chacinas e a reincidência desses fatos com a questão da solução do problema da terra. E eu não senti, Rogério - desculpe dizer dessa forma -, uma firmeza no encaminhamento que vocês estão dando no sentido da solução. Por isso, Senadora, eu gostaria de sugerir que ficasse como encaminhamento que o Incra pudesse traduzir em números, em cronograma, em informações mais precisas, as providências, talvez já apontando, por exemplo: se está faltando recurso, que tipo de recurso; talvez, esta Comissão possa empenhar-se em liberar mais recursos para acrescentar a uma força-tarefa, a uma solução, não sei; talvez pudesse apontar o que de fato é necessário, neste momento, para se resolver especificamente aquele caso de Colniza. Porque o senhor disse que seria feita uma vistoria técnica, com três meses, tal, e que, provavelmente, nos próximos dias, poderia haver um relatório circunstanciado. Mas, aí, eu pergunto: se pelo menos nós acompanhamos o caso desde 2005, lá em Colniza, não existe ainda um relatório circunstanciado? O Inácio apresentou aqui que uma das solicitações feitas seria a apresentação desse relatório. Que providências, no passado, já foram tomadas que possam se somar a essa para dar mais consistência à operação que vocês estão fazendo? Eu acho que é muito pouco o que foi dito aqui. Talvez, seja isto: ajudar aqui no recurso, na estrutura, etc., no que for necessário, para concluir os processos. |
| R | Outra providência que eu gostaria de solicitar... (Soa a campainha.) A SRª CLEIA ANICE DA MOTA PORTO - Posso continuar? A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - A senhora tem 1 minuto. A SRª CLEIA ANICE DA MOTA PORTO - ... seria a retomada de uma Ouvidoria Agrária independente, com infraestrutura e com condições de atuar. A Ouvidoria Agrária do Incra hoje é vinculada à Presidência; não tem mais, pelo visto, nenhuma independência, não tem uma estrutura, parece-me que apenas algumas assessorias. Se já era difícil antes, pelo menos era um espaço importante que nós tínhamos de mediação, e nós estamos sentimos falta disso. Terceiro, acho que é empenhar-se pela conclusão dos processos criminais que estão em curso, como, por exemplo, o do assassinato do Josias, da companheira dele e dos demais, na área, que não foram concluídos. A impunidade é cúmplice da continuidade da violência. Então, é preciso somar a solução dos casos anteriores. E por fim - o Leonardo podia indicar um pouco melhor - é essa questão da federalização. Como é que ficou? Existe essa possibilidade? Foi solicitado, Drª Deborah? É uma federalização da investigação? É a federalização do processo como um todo? Como é que seria mais claro, mais evidente, que a gente pudesse reforçar essa solicitação? Por fim, solidarizo-me bastante, Inácio, especialmente com você, para que repasse essa solidariedade às famílias, aos povos que lutam, aos povos que morrem, ao companheiro Edson e demais dos movimentos de moradia. Essa é a solidariedade de classe que temos de ter, essa é a solidariedade como ser humano, na continuidade. Colocamo-nos como movimento social, com os limites que temos, mas naquilo que é possível ajudar, para tentar nos mobilizar, pressionar, para a gente tentar dar um fim nessas situações que, infelizmente, não podem ser só estatísticas; elas precisam ser, de fato, solucionadas. Obrigada. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Nicinha, da Contag, pela sua contribuição. Mais alguém? Então, vou retornar para a Mesa. Se não há ninguém do plenário, retorno a palavra à Mesa. O senhor está com o tempo apertado? Seria bom que o senhor escutasse e falasse por último, já respondendo algumas coisas. Então, retornando para a Mesa, começo com o Inácio Werner, representante do Fórum de Direitos Humanos e da Terra de Mato Grosso, por cinco minutos. O SR. INÁCIO WERNER - Primeiro, quero lembrar que há pessoas assistindo pela TV Senado e talvez não tenham tido acesso ao vídeo, porque estava sendo transmitido outro. Esses vídeos, tanto o que passei como um vídeo da Comissão Pastoral da Terra, que está no site da Comissão Pastoral da Terra, relatam o caso da chacina de Colniza. Então, é importante que quem queira ter acesso aos dois vídeos saiba que o primeiro está postado e o outro, que passei há pouco, será postado a partir de amanhã. Segundo, quero dizer que, realmente, a questão do medo no Mato Grosso é grande. Por um lado, as entidades estão sendo processadas em Mato Grosso por estarem justamente questionando a juíza da Vara Agrária. Então, estão recebendo processos. Segundo, o medo é muito grande, principalmente na região de Colniza, onde estive no final de 2015. As pessoas simplesmente não abrem, não conseguem abrir a boca porque sabem que vão ser as próximas a serem mortas. |
| R | Então, eu acho que não adianta fazer muitas missões para lá, achando que se vão conseguir grandes informações, porque este é o momento em que há que se dizer, primeiro, o que nós vamos fazer para, depois, contar com as pessoas do local. Ou, então, há que haver outros instrumentos que não sejam audiências públicas, porque, nessas, o povo não vai falar. Acho que também é o caso de se colocar fogo, porque as pessoas, coitadas, de Colniza agora ainda vão ser responsabilizadas pelo que aconteceu com elas, dizendo que elas que estão colocando fogo ou que, em todo crime que está acontecendo no norte do Estado de Mato de Grosso, agora são as pessoas que estão colocando fogo? Estão com a vida em risco e ainda são elas as responsáveis? Eu acho que não pode ser dessa forma também. Há que se também ampliar, pois os interesses de Colniza vão além da disputa da terra. Lá, existem grandes interesses das madeireiras e também dos garimpos. Se nós ampliarmos um pouco ou se olharmos aquele espaço onde está, existem garimpos, existem grandes interesses relacionados às madeiras que saem via Rondônia, como a Deborah já falou. Então, eu acho que não há somente uma disputa da terra pela questão da ocupação do território, mas há interesses pelos minerais e tudo o mais. Com relação às mortes, precisamos realmente apurar as mortes. Como eu falei, em Mato Grosso, foram 127 mortes. Se olharmos, de 1995 para cá, foram 50 mortes; com mais essas 9 agora, são 59 mortes. Há que se ter, de certa forma, uma apuração. No Estado de Mato Grosso, não podemos ter muita esperança, porque há anos não está se apurando nada com relação a essas mortes, tanto no que diz respeito às mais recentes, como àquelas que vêm acontecendo desde 2005. Então, precisamos ter uma ação. Nem sei a partir de quem vamos ainda apelar para que se faça isso. Também com relação ao que relatei sobre a Justiça Federal de Sinope. Eu acho que há que se ter uma ação, porque não é possível que um juiz simplesmente não decida. Estão lá as pessoas no campo, lutando, lutando, lutando; elas são despejadas de suas casas, estão sendo mortas, atingidas por tiros, e ninguém faz nada? É a próxima chacina já anunciada. Então, nesse sentido, nós precisamos ver realmente o que fazer em relação aos conflitos. Ampliar, sairmos. Primeiro - podemos até começar por Colniza -, que o Incra e o Intermat digam que aqueles títulos são frágeis. Eles têm realmente que se voltar para a União e, aí, decidir como se faz em uma reforma agrária. Mas não se pode somente esperar que Colniza se resolva, porque todo o norte de Mato Grosso tem uma chacina anunciada, que só não ocorreu no dia 21 de fevereiro do ano passado por muita sorte. (Soa a campainha.) O SR. INÁCIO WERNER - Nesse sentido, quero dizer que há responsabilidade também do Estado, porque, no momento em que se sabe que a polícia tem o cadeado da fazenda, é porque realmente o Estado tem tomado um lado muito claro. Tem ocorrido que a polícia não nega que ela tenha o cadeado da fazenda. Onde é que se viu isso? Isso para poderem prestar segurança para a fazenda. E a área é grilada, né? Por último, quero insistir que temos de ter uma comissão que defina responsabilidades, tanto responsabilidade do Incra, do Ministério Público Federal, do Intermat, do Governo do Estado do Mato Grosso, que deve dizer se vai ou não apurar os casos. |
| R | Se o Governo também não quiser apurar, que a gente diga que precisa de uma outra instância. Ou será que a gente precisa levar tudo isso para fora, como aconteceu no caso Henrique Trindade, em que o Estado, agora, para não pagar, para não ser condenado, então, vai, depois... É um crime que aconteceu em 1983. Será que temos que levar todos os 127 casos para Corte Interamericana para responsabilizar o Estado pela omissão de apuração? Eu acho que, então, nesse sentido, sugiro nós termos uma comissão que diga claramente o que cada um vai fazer, e cada um assumir um papel, e isso não ficar no papel; dizer a responsabilidade concreta de cada um, de cada uma. E nós, como sociedade civil... Eu faço parte também do Conselho Estadual de Direitos Humanos da Terra, e nós estamos de mãos atadas. A gente tem um recurso de R$16,5 mil para o Conselho, para o ano inteiro, o Conselho Estadual de Direitos Humanos. O que nós vamos fazer com 16,5 mil? Nós queremos contribuir, mas dessa forma a gente tem... Nós temos, podemos ter muito a contribuir, pela nossa atuação de décadas junto com os movimentos sociais, mas infelizmente nossa condição é pouca. Muito obrigado. O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Senadora Regina, só um parêntese. Só para fazer justiça, eu queria entender as palavras. O Dr. Inácio falou que não estamos fazendo nada, e me dá... Eu queria só esclarecer um pouco, porque as pessoas estão nos assistindo, e o Brasil cada vez mais precisa que as pessoas acreditem que as instituições funcionam. Nós temos, neste momento, no País, ocorrendo, uma das maiores operações do mundo de combate à corrupção. Eu nunca vi um promotor - nunca vi! -, diante de um crime, declinar da sua atuação. Tenho visto o Ministério Público extremamente atuante. Eu entendo a indignação, Sr. Inácio, mas eu não compactuo com isso de que "ninguém faz nada". Até porque, se eu não me engano, foi a Procuradora Drª Deborah que trouxe a informação de que já prenderam dois e que estão na busca disso. Eu vejo que são situações diferentes, compartimentadas. Pode haver indignação por não estar saindo a regularização, e aí é um poder, com um órgão, que é o Incra, com o Intermat, que é de lá. São situações separadas. Se ocorre um crime, quem mexe com isso? Polícia, Ministério Público e tal. Eu não gosto de demonizar e jogar tudo num balaio só. Às vezes, você é de uma corrente partidária, não gosta de um governador ou de outro, e já joga, como a Senadora Fátima fez aqui. Eu gosto de fazer justiça. Eu vejo o Ministério Público atuante, vejo a polícia, apesar de todas as suas dificuldades, buscando, e não vejo... Olha, com todo o respeito, eu não concordo que a polícia do Estado de Mato Grosso seja capitão do mato de ninguém. Não concordo. Eu estava em Mundo Novo, antes daquela tragédia que houve com os assentados, e havia uma propriedade com interdito, e a polícia tinha feito uma desobstrução. E eu conversei com o Comandante. Falei: "Comandante, já que há esse interdito aqui, não é melhor você já falar para não entrar nessa área, porque vai dar conflito?" Ele falou: "A gente não pode. Nós não vamos nos meter nessa confusão aí se já não houver um mandado específico." A polícia não é um bicho-papão. Eu queria que as pessoas pudessem humanizar um pouco o que é a polícia, o que é Ministério Público, o que é um juiz. São servidores públicos que têm um ordenamento. Olha, gente, talvez a coisa mais pesada... Se há uma coisa que funciona é o ordenamento jurídico contra servidor público. Funciona, e funciona bonito. Então, a atuação isolada de um ou outro, de um promotor, de um juiz ou de um policial, eu não creio que possa ser confundida assim, de repente, jogada em um balaio, e dizerem: "não faz nada". Eu vejo que esses servidores tentam fazer, tanto o é que já está a notícia aí de que prenderam. |
| R | Talvez isso sirva como discurso político, mas eu tenho que fazer justiça à polícia do Estado de Mato Grosso e aos servidores que ali trabalham. Muito obrigado. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Senador Medeiros. Eu queria inclusive dizer, porque o senhor falou que não viria mais, que venha. É importante o debate, é importante o contraditório. Mas é que as pessoas desacreditam, porque é tanta coisa acontecendo... Porque não é só prender. Daqui a pouco eles estão soltos! O pessoal quer é a solução do conflito. Então, eu acho que a gente tem que caminhar, focar é nisso. Temos que resolver a questão daquela terra e de outras tantas que há aí, como temos que resolver a questão dos indígenas. Porque, por exemplo, não interessa para quem foi à Funai quem é o dono da Funai. Isso é cultura política. Infelizmente, neste País, há os "donos" dos órgãos. Quero é que a Funai funcione. Estão desmontando a Funai. No meu Estado, acabou o escritoriozinho que havia. A maior parte dos índios ainda se sente muito segura junto à Funai, porque se sente amparada por um órgão do Governo, e ela está desmontando. Acabou um bocado de escritório. Então, nós não queremos saber quem é que está mandando lá; a gente quer é que a Funai funcione e tenha estrutura para pelo menos dialogar com os indígenas, porque a forma também... A gente não pode negar também: os indígenas fazem manifestações todo os anos aqui, e foi a primeira vez que eles foram recebidos daquela forma estúpida com que foram recebidos aqui terça-feira, com cavalaria, com policial com escudo... Parecia uma praça de guerra, como se estivessem esperando bandidos, o pessoal tocado como gado. Aquilo não é forma de receber os nossos antepassados. Então, é por isso que a gente reclama, mas queremos a Funai funcionando. Vamos passar para a Drª Deborah. A SRª DEBORAH MACEDO DUPRAT DE BRITTO PEREIRA - Eu, honestamente, acho que a essa altura a federalização da investigação é praticamente impossível, porque, como eu anunciei, o Secretário de Segurança Pública me disse que já houve a identificação dos responsáveis, com duas prisões e dois foragidos. Nós precisaríamos ter algum elemento que evidenciasse que há alguma fragilidade nessa investigação para, aí, sim, pedir a federalização. Agora, eu acho que Colniza, o Município de Colniza tem aquilo que eu falei: um déficit de estatalidade. Eu conversei com o promotor, e ele me disse que é o único promotor para essa extensão de terras. Há um único juiz. A polícia com essa dificuldade de chegar lá. Então, eu acho que isso tem que ser pensado seriamente, de haver um fortalecimento do Estado na região. Isso eu acho que é o primeiro ponto indispensável. A outra coisa que eu acho é que, a despeito de não haver federalização da investigação, eu acho que a Polícia Federal tem um papel sim na região, porque há denúncia de milícia armada. A questão da segurança privada é tão séria que existe uma lei absolutamente rigorosa sobre porte de armamento, declaração de armamento, onde estão alocados esses armamentos; isso tudo sob responsabilidade da Polícia Federal. Se alguma coisa está sendo montada à margem desse sistema legal, é preciso ser investigada. E aí eu acho que, sim, é uma investigação da Polícia Federal. Eu venho da questão indígena, trabalhei com vários grupos indígenas no Mato Grosso, inclusive nas margens do Teles Pires ali, com mundurukú, apiaká, kaiabi. E, fazendo a defesa desses territórios, enfim, eu pude verificar que a estrutura agrária do Mato Grosso é absolutamente caótica. Ela é inaugurada, enfim, quando o Império passa para os recém-inaugurados Estados as terras devolutas. Então, surge uma determinação de que essas terras sejam discriminadas e demarcadas. No Mato Grosso, isso nunca foi feito. |
| R | Mato Grosso não é único Estado que vive essa situação. No Brasil, Bahia... Nós temos vários. Mas o fato é que o que é público, o que é privado, o que é federal e o que é estadual está sempre em uma zona de incerteza. Então, seria fundamental que o Incra, que não fez nesses 12 anos o trabalho, começasse a fazer, porque tem expertise, tem a capacidade - e presumo que capacidade técnica, porque foi formando essa capacidade técnica ao longo do tempo. Que faça esse levantamento! Eu lembro que, na década de 80, no Pará, foi feita a arrecadação de terras públicas que estavam sendo ilegitimamente tituladas. É hora de investir contra isso, porque essa cultura, como eu digo, da grilagem - de que você se apossa de bens públicos e que isso fica assim mesmo - é um estímulo a esse tipo de violência no campo. Foi como a Nicinha falou: é isso junto com a impunidade. Então, nós temos, sim, que reforçar a presença do Estado e temos que resolver essa grave questão agrária no País, e em Mato Grosso especificamente. Também acho que a ausência de uma Ouvidoria Agrária independente é seríssimo. Nós temos, como foi observado aqui, um país que nunca realizou a reforma agrária. Reforma agrária é uma questão de segurança no campo, mas também na cidade. Há uma relação cidade-campo que fica muito mal resolvida quando nós temos esse contingente absurdo... (Soa a campainha.) A SRª DEBORAH MACEDO DUPRAT DE BRITTO PEREIRA - ... de trabalhadores rurais sem terra. Enfim, eu acho que nós temos problemas estruturais muito graves no Brasil, mas em Colniza eles estão acentuados. Eles estão em uma região de invisibilidade estatal, estão numa região de extrema violência e em uma região em que quem tem poder tem a posse da arma e da segurança. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Drª Deborah Vamos ouvir Edson Silva, do MRP (Movimento de Resistência Popular). O SR. EDSON SILVA - Os problemas estão colocados desde há muito tempo. O que está acontecendo é isto: para muito na dificuldade. Eu vi colocadas várias coisas aqui, várias vezes, falando-se sobre a dificuldade do acesso. Há dificuldade do acesso, sim, mas há o Estado. O Estado é que tem recurso público. Esse papo de falar que estão sucateados os Estados, isso é conversa. Nós sabemos que não estão tão sucateados assim, senão não haveria tanto dinheiro sendo preso na Lava Jato. Ou seja, se toda vez que nós tivermos um problema colocarmos os empecilhos, as dificuldades, não será resolvido nada. Temos que ter é solução, temos que partir para a solução. Se é o Incra que está sucateado - isso foi colocado aqui -, esta Casa vai atrás de recursos para ver isso. Esse papo realmente... Eu não me lembro de os indígenas terem vindo a Brasília e terem apanhado do jeito que apanharam. A gente tem que tratar os donos da terra com mais respeito, porque eles são os donos da terra. Esses conflitos que estão acontecendo são tão ridículos, porque é gente que tem mais, que tem muita terra - e cada vez tem mais - e que quer mais terra. E quem quer só um pedacinho de terra para plantar ou para morar não tem direito. É tirado a bala, é tirado a força. Ou seja, tem que haver solução. Há anos isso vem sem solução. Tem que haver solução. |
| R | E ultimamente - viu, Senador? -, realmente, nesses últimos tempos, a polícia está muito violenta. Você não abre uma rede social, você não vê uma semana sem uma notícia de que a polícia de tal Estado - não estou falando só do Mato Grosso, não; todos os Estados - bateu em sicrano, bateu em fulano. Você não vê, nas redes sociais, o policial tratando bem o preto da periferia. O tratamento é diferente. Ou seja, está havendo, sim, uma violência descabida por parte da polícia. Nós vemos que, nas ocupações de terras griladas ou de espaços que não cumprem função social nenhuma, que os movimentos ocupam, a polícia está tirando, os governadores estão tirando sem reintegração de posse nenhuma. Simplesmente chegam e mandam a polícia pôr para fora, para tirar. As pessoas são humildes, as pessoas não têm onde cair mortas, porque estão procurando pela terra para morar ou para plantar, para não morrer de fome. As pessoas têm direito! A Constituição deste País tem que valer para todos; não serve para um grupinho, não. É para todos, para toda classe social. E o que nós estamos vendo no País é a classe mais desfavorecida sendo massacrada; massacrada pelo Poder Público, massacrada pela polícia e massacrada por esses capitães do mato que são contratados por grileiros de terra para dar tiro em trabalhadores. Isso é um absurdo! A gente vê uma notícia de que deceparam as mãos de índios. Isso leva à história lá de "O Diamante de Sangue": com manga ou sem manga? Sem manga era tirar o braço todo; com manga era só a mão. Ou seja, é isso que o nosso País que passar para nossa futura geração? São as crianças nascendo, nascendo, nascendo, ficam adultas, e não muda nada. E as autoridades? É um país que tem muitas autoridades, é um país que gasta muita grana com servidores públicos, e eu acho que é necessário haver servidores públicos, mas nós sabemos que há muitos servidores públicos que não servem para nada. Em Brasília, nós temos o caso aqui de uma Agefis que não serve para nada; serve só para perseguir trabalhadores... (Soa a campainha.) O SR. EDSON SILVA - ... ambulantes. Para que serve a Agefis? Vocês saem aqui, no Plano Piloto, vocês veem um Agefis parado, sem fazer nada, e, do lado dele, viaturas, policiais. Ou seja, para você ter segurança, principalmente em Brasília, você tem que ser da Agefis. Se você for da Agefis, você tem um camburão de polícia atrás, fazendo sua segurança. Ou seja, o debate aqui não é debate político. Eu não estou nem aí para debate político, não sou partidário de coisa nenhuma. Aí vêm Deputados, vêm Senadores, ficam se engalfinhando, ficam falando, ficam um acusando o outro. Senador, eu acho que esse não é o caminho; o caminho é resolver o problema que está aí. Essa questão de prender foi colocada muito. Vai prender? Vai. Talvez prenda, mas vai ser solto, porque no País, infelizmente, quem comete uma barbárie dessas é bem visto por alguns setores. E não é todo o Judiciário que falha, não. Sim, há muitos bons, mas há uns que falham, sim. Há uns que... (Soa a campainha.) O SR. EDSON SILVA - Concluo. Há uns que tomam decisões baseados em mídia fascista, baseados em debates de políticos, baseados em partidos políticos, baseados no debate político. Existe, sim, Judiciário que toma decisão sobre isso, é pressionado para fazer isso. |
| R | Então, eu acho que chega. Está na hora de seguir em frente. Está na hora de resolver os problemas: os conflitos fundiários, os conflitos urbanos, a estrutura - dar mais estrutura para o povo. É isso. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Edson. O Leonardo vai querer falar? O SR. LEONARDO ARAGÃO - Quero só reiterar aqui que, como disse na minha primeira fala, nós pretendemos produzir um material, um documento, com base na nossa visita lá, e que vamos socializá-lo com o conjunto da Comissão, quando ele ficar pronto. Obrigado. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Vamos passar, então, ao Dr. Rogério Arantes, Diretor de Ordenamento da Estrutura Fundiária do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). O SR. ROGÉRIO PAPALARDO ARANTES - Eu fico bem a cavaleiro de dizer que, quando se faz mal, faz-se duas vezes. Na verdade, nós do Incra estamos efetivamente indo até a área e buscando apoio - quero até agradecer ao Secretário de Segurança Pública do Mato Grosso, Rogers Elizandro Jarbas, e ao Presidente do Intermat, Candido Teles, que estão dando todo o apoio - para que se elabore realmente um trabalho técnico, em que, muito mais do que se identificar apenas o problema que está posto, se apresente solução - solução essa que deveria ter sido efetivada em 2007, quando foi tirada a costela do Incra para criar-se um órgão de terras que cuida da Amazônia Legal. Infelizmente, isso não ocorreu de lá pra cá. A gente tem trabalhado, de seis meses pra cá, essa união, essa integração, para que se trate realmente das questões de terra com a devida forma, não se politizando, não se buscando utilizar de formas que não a de atender as pessoas que realmente estão lá na terra. Os movimentos sociais sempre ajudando, sempre colaborando. E isso é muito importante e salutar. Eu gostaria de dizer que o Incra não vai sair de lá da região do conflito e de Colniza enquanto não houver um diagnóstico preciso. Por isso, eu não posso apresentar aqui cronograma, nem fórmula mágica. Nós estamos lá, fazendo um estudo preciso de como solucionar aquele conflito, assim como estamos também nas outras regiões do Mato Grosso e de todo o Brasil, enfrentando as ações que, há muito, se vêm arrastando sem nenhum tipo de encaminhamento, sem nenhum tipo de solução. Então, eu quero colocar aqui que a nossa Ouvidoria Agrária, o nosso Presidente Leonardo Góes, todos os diretores estão diuturnamente trabalhando para que a gente consiga resolver esses conflitos e essas demandas que existem em todo o Brasil. |
| R | O Senador bem colocou que a questão da titulação é extremamente importante, e por isso a construção e do empenho de todos os nossos técnicos na confecção da MP 759, que a gente julga ser uma ferramenta extremamente importante para que a gente vença algumas etapas que estão se arrastando aí ao longo dos anos. Eu gostaria de dizer - e fico a cavaleiro em dizê-lo - que o Incra é, sim, o órgão de terra, é, sim, o órgão que tem a gestão da governança fundiária no nosso País. Tanto o é que, no nosso site, está à disposição de todos que quiserem conhecer a malha fundiária do nosso País. O Incra é o detentor hoje de mais de 60% da malha fundiária no Brasil... (Soa a campainha.) O SR. ROGÉRIO PAPALARDO ARANTES - ... georreferenciada e registrada no nosso País. Queremos só concluir, Senadora, dizendo que toda ajuda é bem-vinda; toda ajuda é importante. O Incra vem se deteriorando, ao longo dos anos, por conta de falta de concursos, salários deficitários dos nossos técnicos, dos nossos funcionários, mas nenhum se omite em momento algum, nem em momento de crise, nem no trabalho do dia a dia, em realizar da melhor forma as ações de regularização, de reconhecimento e de destinação de terras para a agricultura familiar. Então, o Incra está lá. Acabei de receber um WhatsApp aqui, dizendo que o nosso técnico Valdir e o nosso superintendente Bosco estão na tratativa final com a equipe do Intermat e de segurança pública do Ibama para que se acesse o local onde realmente foi ocorrida a chacina e para que, dessa visita, se elabore um plano de trabalho e uma ação conjunta para que a gente consiga levar para aquelas famílias um alento, uma situação que possa, realmente, efetivamente, contribuir na melhoria da vida dessas famílias. Colocamo-nos às ordens. E o Incra está de portas abertas para o Senado e para a Câmara Federal, para que a gente, em conjunto, possa conduzir essa situação da melhor forma possível. Muito obrigado. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Sr. Rogério Arantes. Então, concluindo a nossa audiência pública, quero dizer que a gente sabe que a audiência pública não é fórum para deliberar, mas a gente pode buscar encaminhamentos conjuntos, e é o que a gente vai tentar aqui na Comissão. Por exemplo: a questão da federalização já foi dita aqui pela Drª Deborah, mas há a questão das milícias da polícia paralela, que pode ser demandada junto ao Ministro da Justiça. Então, a gente vai ao Ministro da Justiça. De preferência, a gente vai tentar juntar um grupo, a partir deste grupo que veio aqui e dos Senadores que quiserem ir quando a gente estiver com o documento. A gente tem que fazer um documento único, porque também o Ministério recebe um monte de documentos. Vamos tentar fazer um documento único, com dados, com aquilo que possa ser encaminhado imediatamente por ele, pelo Ministério, pela Polícia Federal. Sobre a visita, eu reconheço que só tem sentido voltar lá outra comissão se ela tiver alguma coisa concreta para levar, porque já foi uma comissão, já se fez presente. Se a gente conseguir alguma coisa, a gente marca uma ida lá de novo, mas eu acho que a gente pode visitar também, como a sugestão do Senador Humberto, o Maranhão, porque a questão indígena também está preocupando muito. |
| R | Eu acho que a gente precisa ver, inclusive, junto ao Governador o que está acontecendo, para levantar exatamente o que acontece lá, qual é o conflito, onde está o processo, porque isso é eterno neste País - ninguém está culpando ninguém -, mas a burocracia... Quando você faz um extrato de um processo, você vê por quantas mãos ele já passou, e ele não saiu do lugar. É uma loucura. Então, a gente precisa fazer esses levantamentos e ver aqueles que têm que ir para outra mão e buscar a solução. Acho que a gente pode também buscar fazer isso junto com as duas comissões e com as entidades que estão aqui - a Contag pode entrar -, para a gente fazer uma coisa única, para a gente acompanhar, pelo menos, passar um ano, dois anos, acompanhando, para ver se alguns passos foram dados. A SRª DEBORAH MACEDO DUPRAT DE BRITTO PEREIRA - Senadora, me permite só uma observação muito rápida? A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Drª Deborah. A SRª DEBORAH MACEDO DUPRAT DE BRITTO PEREIRA - Essa área é uma área também de índios isolados. E a Funai desativou, até onde eu tenho notícia - ou, então, pelo menos, desestruturou completamente -, a frente etnoambiental que havia ali. Então, talvez seja importante também levar essa notícia ao Ministro da Justiça. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Isso. Então, a senhora me passa isso depois por escrito? A SRª DEBORAH MACEDO DUPRAT DE BRITTO PEREIRA (Fora do microfone.) - Claro. A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Que a gente vai incluindo. Eu vou sentar com a comissão da Câmara para a gente tentar ir fazendo, com tudo o que vocês falaram aqui. A gente vai pegar essas falas e tentar montar esse documento. E o Incra certamente vai ser demandado, inclusive, a participar com a gente, para ver se as coisas andam. Se dermos alguns passos, o pessoal começa a acreditar. Agora, só fazer audiência e realmente depois não haver nada de concreto - no ano que vem, os mesmos problemas -, aí fica inócuo o nosso trabalho. Mas vamos tentar fazer acontecerem pelo menos esses passos que a gente colocou aqui. Inclusive, a questão da Ouvidoria Agrária independente também é uma demanda que a gente pode mandar incluir no documento; para haver também essa ouvidoria. (Intervenção fora do microfone.) A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Exatamente. A responsabilidade do Estado. Então, nada mais havendo a tratar, declaro encerrada esta reunião da Comissão de Direitos Humanos do Senado. Muito obrigada. (Iniciada às 09 horas e 23 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas.) |
