08/05/2017 - 11ª - Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Declaro aberta a 11ª Reunião da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional.
Hoje, cumpriremos mais uma etapa do Ciclo de Debates denominado “O Brasil e a Ordem Internacional: Estender Pontes ou Erguer Barreiras?”, aprovado por esta Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, na forma do Requerimento nº 1, de 2017 - CRE, em 17/03/2017.
Trata-se do 4º Painel, intitulado: “Não me representam!”: populismo e crise de legitimidade política na Europa e nos Estados Unidos. Consequências das eleições presidenciais na França.
As eleições ocorreram, como todos nós estamos informados, no dia de ontem.
Comunicados.
Dando continuidade ao ciclo de audiências públicas denominado “O Brasil e a Ordem Internacional: Estender Pontes ou Erguer Barreiras”, a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional realizou, na segunda-feira, dia 24 de abril, o 3º Painel, abordando o tema “Sob o Cetro do Czar: o papel da Rússia na Geopolítica Global”, tendo como palestrantes o Cel. Marco Antônio de Freitas Coutinho, ex-Adido Militar em Moscou; a Profª Lenina Pomeranz, do Departamento de Economia da Universidade de São Paulo; o Prof. Dr. Gustavo Trompowsky Heck, Presidente da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra; e o Jornalista Carlos Fino, correspondente da Rádio e Televisão Portuguesa em Moscou durante os governos Brejnev e Gorbachev, até a queda da União Soviética.
A primeira palestrante, Profª Lenina Pomeranz, destacou que são as relações entre os Estados Unidos da América e a Rússia que, ao lado da China, de certa forma, delimitam o quadro geopolítico contemporâneo.
O foco da temática relativa à Rússia na mídia ocidental - segundo ela - demoniza Vladimir Putin, entendendo como agressiva sua política externa. Neste contexto, informou ela, para alguns analistas russos e americanos, nunca as relações entre os dois países estiveram num nível tão baixo.
No livro Should we fear Russia?, o autor Dmitri Trenin se propõe a discutir as questões relacionadas com a Rússia a partir do ponto de vista dos seus interesses nacionais e como ela os vê. Discutindo historicamente a política externa do país, Trenin mostra que os medos que o Ocidente tem da Rússia hoje não se justificam. O mundo é outro, a Rússia é outra. A Rússia pretende duas coisas - segundo ela: manter a integridade do país e eliminar as restrições que lhe são impostas pelo sistema pós-Guerra Fria, tornando-se indispensável nas questões relativas à guerra e à paz nas áreas por ela afetadas. Essa é a opinião do Trenin, resumiu a professora.
O apoio que o Ocidente dá aos países do Leste, especialmente Polônia, Hungria e República Checa, está vinculado à pressão militar sobre a Rússia.
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A segunda coisa que foi usada em relação à Rússia, especialmente depois da Ucrânia e da Crimeia, em 2014, foram as sanções econômicas. Esse tipo de sanção trouxe uma consequência a mais em relação ao apoio dado ao Presidente Putin: o nacionalismo cresceu, e Putin é hoje avaliado positivamente pela população em mais de 80%, porque é visto como defensor dos interesses nacionais da Rússia.
Na Rússia, não houve, aparentemente, ilusões a respeito de mudanças no precário relacionamento com os Estados Unidos, asseverou a palestrante. O porta-voz da Presidência, Dmitry Peskov, afirmou: “É ingenuidade supor que a crise nas relações com os EUA pode ser resolvida de um dia para o outro.” E o Ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, declarou que: “A Rússia vai julgar a nova administração americana por suas ações e tomar os passos apropriados em resposta”.
O segundo palestrante foi o Prof. Gustavo Trompowski. Diz ele que, exatamente como ocorreu no pós-Primeira Guerra Mundial em relação à Alemanha, com o fim da Guerra Fria houve um total abandono do Ocidente em relação à Rússia. O que aconteceu? A emergência de uma liderança populista, asseverou ele.
Tenho a convicção de que Putin assume um papel de destaque e tem uma posição muito clara em relação a uma tentativa de reorganizar ou reformatar o velho Império Russo ou, se quiserem, a formatação da antiga União Soviética. Esse projeto remete à tese geopolítica de Mackinder, segundo a qual quem dominasse a Eurásia dominaria o mundo, lembrou o Prof. Trompowski.
A reação do Ocidente, explicou o palestrante, se deu em torno daquilo que Spykman e Kennan colocaram como a “Teoria das Fímbrias”, com as estratégias de contenção da expansão do poder dessa Eurásia. Para estancar esse processo, se formou um grande bloco militar, a Otan, e os Estados Unidos saíram fazendo parcerias no mundo inteiro para conter essa expansão.
Havia um acordo, uma combinação não formal, de que a Otan não buscaria agregar os países do antigo Leste Europeu, e a Otan promoveu a mais absoluta adesão dos países fronteiros à Rússia. Para a Rússia é extremamente importante ter bases, principalmente navais, de acesso ao Mediterrâneo. As duas únicas bases de que dispõe são Sebastopol, na Crimeia; e Tartus, na Síria. Por isso, nesse jogo geopolítico, elas são absolutamente fundamentais, e Putin jamais abriria mão de Sebastopol, e muito do que acontece na Síria visa exatamente continuar tendo a base naval de Tartus, ressaltou o professor.
No caso da Ucrânia, o balanço entre o que esta ganharia aderindo à União Europeia e o que perderia abandonando a Rússia era extremamente favorável à segunda, pois a Rússia dava 70% de subsídio ao gás fornecido e comprava material das indústrias situadas na Ucrânia. Além disso, existe muito de cidadania russa na Ucrânia, pois na faixa sul-leste, justamente a mais industrializada, há predominância de população de língua russa, enquanto a predominância da língua ucraniana ocorre no centro e oeste do país, área mais agrícolas. O interesse estratégico da Rússia na parte industrial é evidente, enquanto a parte agrícola é grande fornecedora de alimentos para a União Europeia.
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Diz ele: estaria a Europa efetivamente interessada nesse confronto com a Rússia? A União Europeia A União Europeia tem uma dependência fortíssima em relação ao gás natural da Rússia, responde ele. Quando a Rússia ameaçou fechar a torneira, Merkel saiu correndo da Alemanha e foi à Rússia para negociar com Putin.
O Prof. Trompowski considera que o Oriente Médio é a questão do momento. “Todos nós estamos diante de um grande ponto de interrogação, nós não sabemos o que vai acontecer, mas o Putin está presente”, disse ele.
Finalizando, o Prof. Trompowski elencou alguns aspectos que conferem importância às relações do Brasil com a Rússia, enfatizando a capacidade tecnológica russa, a política de acordos bilaterais, os BRICS, e a teoria que diz que os únicos três países com recursos e capacidade para se tornarem efetivamente grandes nações são Estados Unidos, Brasil e Rússia.
O terceiro palestrante, Coronel Coutinho, iniciou sua exposição traçando um rápido retrospecto histórico da Federação Russa, enfatizando a capacidade de Putin de jogar com esse passado em sua atuação política.
O Presidente Putin está no poder desde 1999. É líder do partido chamado Rússia Unida, que advoga não ser nem de esquerda nem de direita, adotando uma postura chamada "centrismo político", mas que, sob a nossa ótica, poderia ser muito facilmente enquadrado como um partido de direita, resumiu o Coronel. Em 2014, com a anexação da Crimeia, a popularidade do Presidente Putin, que vinha beirando algo em torno de 60%, passou a superar os 80%, se mantendo nesse padrão até hoje.
Até 2008, o foco principal do Presidente Putin foi na estruturação do governo da Federação da Rússia, das estruturas de governo, das Forças Armadas da Federação da Rússia em substituição às estruturas antigas da União Soviética. Esse foi o principal foco também na parte econômica, ou seja, a mudança de uma economia comunista, centralizada, estatizada, para uma economia de mercado e também no fortalecimento da Comunidade dos Estados Independentes. No que diz respeito à política externa, também nesse período, o foco principal foi justamente na tentativa de aproximação maior com o Ocidente, quando até mesmo uma proposta de adesão à OTAN chegou a ser tocada pelo Presidente Putin, ressaltou o palestrante.
Em 1990, disse o Coronel, com o fim de reduzir a supremacia convencional do Pacto de Varsóvia na Europa, foi assinado o Tratado sobre Forças Convencionais na Europa. Já em 1999, quando o Pacto de Varsóvia acabou, o Tratado foi emendado, com foco na retirada das tropas e meios militares russos dos países do antigo Pacto de Varsóvia, e foi estabelecido que as tropas da Otan não entrariam naqueles países. A Rússia cumpriu a parte dela nesse tratado.
Diante da tentativa de seu isolamento na comunidade internacional, a Rússia passou a focar outras áreas para estabelecer suas parcerias internacionais. Assim, a Organização para Cooperação de Xangai é muito importante porque envolve a China, o Paquistão e a Índia. O fim da Aliança Transpacífica, decidido pelo Presidente Trump, beneficiou muito essa política da Rússia e da China, pois foi algo pensado pelo Presidente Obama, que confrontava essa questão da Organização de Xangai, em uma tentativa também de isolar a Rússia, analisou o palestrante.
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Segundo o Coronel, o Brasil vê os BRICS mais como um organismo econômico, mas a Rússia, além do aspecto econômico, vê os BRICS como uma ferramenta geopolítica importante na busca de fugir do isolamento internacional.
Para o palestrante, a questão da Ucrânia decorre de seu processo de formação. Uma iniciativa do Presidente Putin de reforçar a questão da União Eurasiática foi central na política ucraniana até 2014. O Presidente Yanukóvytch decidiu pela União Eurasiática em detrimento da União Europeia, o que deu origem aos conflitos da Praça Maidan. O Presidente Yanukóvytch foi derrubado do poder, num golpe de Estado com o apoio da União Europeia e dos Estados Unidos. A Ucrânia, logo a seguir, iria entrar para a Otan, e a Rússia perderia sua base da frota do Mar Negro. A população era de maioria russa. Houve um referendo que decidiu pela incorporação da Crimeia à Rússia.
Na questão Síria, disse o palestrante, os curdos, que representam 10%, e os turcos com 5% da população, trazem a Turquia diretamente para o conflito. No que diz respeito à religião, os xiitas, que são 13% da população, mas que dominam a política e as Forças Armadas, trazem para o centro do conflito os iranianos e os iraquianos. Provavelmente, a Síria nunca mais vai ser um só país, concluiu o Coronel Coutinho.
A partir de 2008, alertado pela guerra com a Geórgia, Putin decidiu investir pesadamente em defesa. O orçamento de defesa que, em 2005, era de US$5 bilhões, em 2014, atingiu US$40 bilhões e hoje, segundo dados de uma ONG que estuda o tema, está em torno de US$65 bilhões. A meta é, até 2025, a substituição, com ênfase em material russo, de 100% do material soviético. Nos últimos anos, foram incorporados e tornados operacionais mísseis de cruzeiro e mísseis balísticos intercontinentais de última geração, com os quais, a partir de três pontos diferentes da Rússia, é possível atingir qualquer ponto do globo terrestre, informou o palestrante.
Em sua conclusão, o Coronel relacionou a Europa Oriental, o Ártico, a região do Mar Negro, o Oriente Médio (banhado pelo Mar Mediterrâneo) e a região do Oceano Pacífico como principais áreas de interesse geopolítico da Rússia.
Citando fato ocorrido com a diplomacia lusa - agora estamos tratando do que disse o quarto palestrante -, ainda no século 18, o último palestrante, jornalista Carlos Fino, reiterou que, assim como é antiga a intervenção russa no cenário político europeu, é antigo este misto de fascínio e medo do ocidente em relação à Rússia.
O objetivo principal de toda a estratégia americana que tem sido aplicada até hoje, embora com o objetivo nobre de expandir a democracia, é impedir a Rússia de voltar a ser um império e, para isso, tirou-lhe a Ucrânia.
Afinal, o que querem os russos? O que quer a Rússia? Indaga o palestrante. E ele diz: Eu acho que a Rússia quer respeito. Putin quer respeito.
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O ex-presidente Boris Yeltsin falava que havia o perigo de estarmos entrando em uma “paz fria”, que é isso que estamos vivendo agora. E esse cenário tem naturalmente muitos perigos, porque a Rússia é uma potência nuclear e hoje está na situação em que esteve a Alemanha no fim da Primeira Guerra Mundial. E isso é perigoso, segundo ele.
Seria bom que essas grandes questões fossem reequacionadas, não em termos de guerra fria, de isolar o urso e de cutucá-lo, mas de tentar algum tipo de colaboração que diminuísse as tensões e nos afastasse do perigo de uma catástrofe nuclear, concluiu Carlos Fino.
Houve, depois, respostas às perguntas que foram formuladas. Foram várias, fundamentalmente dentro daquilo que já havia sido explicitado pelos palestrantes que aqui compareceram.
Determino, portanto, agora, à Secretaria desta Comissão de Relações Exteriores para dar como lido este relatório na sua íntegra.
Segundo comunicado.
O Marrocos saúda a adoção da Resolução nº 2.351 pelo Conselho de Segurança.
A resolução prorroga, por um ano, o mandato da Minurso, no âmbito estrito das suas atividades atuais, segundo o comunicado, observando que a resolução converge em vários pontos com as avaliações e recomendações do Secretário-Geral das Nações Unidas, contido no seu último relatório ao Conselho de Segurança datado deste ano de 2017, que tem o número S/2017/307.
Assim, o Conselho de Segurança reafirma, claramente, os parâmetros do processo político, tal como definidos desde 2007, nota ainda o Maeci. Este processo deve ser guiado pelo "realismo e espírito de compromisso", levar em conta os esforços feitos pelo Marrocos desde 2006, e considerar a primazia da iniciativa marroquina de autonomia, que o Conselho elogiou novamente pelos esforços "sérios e credíveis" na base de sua formulação.
Além disso, acrescentou o comunicado à resolução que reitera a dimensão regional do conflito sobre o Sahara marroquino e especifica a responsabilidade dos países vizinhos, particularmente da Argélia.
Assim, o Conselho de Segurança, apoiando a chamada do Secretário-Geral, sublinhou que "a Argélia e a Mauritânia podem e devem dar apoio significativo para este processo", salientou, ainda, o Ministério dos Negócios Estrangeiros e Cooperação Internacional.
E, para enfatizar que há responsabilidade da Argélia, também foi confirmada sua posição em relação ao censo da população nos campos de Tinduf. Na verdade, o Conselho, pelo sexto ano consecutivo, recorda a importância do censo e "insiste para que sejam feitos esforços nesse sentido".
O Marrocos tem toda a esperança de que as outras partes envolvidas, dentro destes parâmetros claramente definidos pelo Conselho de Segurança e à luz das suas responsabilidades bem definidas, se posicionarão ativamente e de forma construtiva para acabar com essa disputa regional.
O Marrocos espera, também, que sejam reunidas as condições para um processo de recuperação real, disse a fonte.
Neste contexto, o Reino do Marrocos reitera seu compromisso de trabalhar para alcançar uma solução definitiva no âmbito da iniciativa de autonomia, conclui o comunicado.
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Iniciando a pauta do dia de hoje, conforme já divulgado, lembro que no painel de hoje o tema é: “Não me representam!”: populismo e crise de legitimidade política na Europa e nos Estados Unidos.
Participam desse painel, como palestrantes: o Prof. Alex Canuto; o ex-Deputado Paulo Delgado; o Prof. Dr. Lucio Rennó; e o Prof. Dr. Mathias Alencastro, os quais tenho o prazer de cumprimentar. Inicialmente, cumprimento mais uma vez a Deputada Bruna Furlan, que é Presidente da Comissão de Relações e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados e, cumulativamente, Presidente da Comissão de Assuntos de Inteligência do Congresso Nacional.
Agradeço a V. Exª, Deputada Bruna Furlan, mais uma vez, pela honrosa presença de V. Exª nesses nossos painéis, desejando-lhe continuado êxito e sucesso nas suas atribuições.
Ao mesmo tempo, convido, portanto, os integrantes a que já me referi para que entrem no recinto e façam composição da Mesa. (Pausa.)
Mais uma vez, obrigado aos senhores pela participação.
Agradeço também às Srªs e aos Srs. Senadores, agradeço às autoridades pela presença.
Vamos passar a palavra aos nossos palestrantes.
Esclareço que cada palestrante disporá de 15 a 20 minutos para sua exposição inicial. Após o que serão abertos os debates e as perguntas das Srªs e dos Srs. Senadores, bem como dos internautas, que têm tido uma participação em nossos painéis de relevância, com perguntas muito pertinentes aos temas que vêm sendo tratados, mostrando a vontade com que vêm querendo participar mais ativamente do que se discute nas Casas do Congresso Nacional. Mais uma vez, obrigado a todos vocês, internautas, telespectadores e ouvintes da Rádio e da TV Senado, aqueles que nos vêm dando o prestígio da sua participação nas noites de segunda-feira, sempre a partir das 18h, neste plenário da Comissão de Relações Exteriores. Passo a palavra, portanto, para iniciar o nosso debate, ao professor, ao sociólogo e ao Deputado Federal que muito orgulhou este Congresso Nacional, especificamente a Casa da Câmara dos Deputados, no período em que teve oportunidade de, com seu brilhantismo, ajudar a construção de um Brasil justo e próspero.
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Com a palavra o Deputado Federal e Prof. Paulo Delgado.
O SR. PAULO DELGADO - Boa noite a todos, senhoras e senhores.
Presidente Collor, é um prazer atender ao seu convite, ao convite da sua equipe da Comissão de Relações Exteriores, do Senado Federal. Meus colegas debatedores, Deputada Furlan, Presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados, a sugestão que a Comissão de Relações Exteriores do Senado Federal nos faz é de discutir o seguinte tema: "Não me representam: populismo e crise de legitimidade política na Europa e nos Estados Unidos". Seria essa uma tendência firme ou apenas um movimento passageiro? É uma crise de legitimidade política e insatisfação com governos e com o estamento político? Qual o significado do momento político atual no mundo?
É extremamente relevante, Sr. Presidente, que esse debate ocorra no dia do armistício, porque 8 de maio. Foi o dia em que a Europa assinou a paz que terminou com a Segunda Guerra Mundial. E hoje sai também o resultado oficial das eleições na França, a mais esperada eleição na Europa nos últimos dois, três anos, em virtude talvez nem tanto da França, da gloriosa e charmosa, França, mas da irritante Inglaterra.
A Inglaterra se comporta como ilha em muitos momentos da história e não tem se dado mal. O comportamento da Grã-Bretanha, de reagir, às vezes, às chamadas ondas hegemônicas na Europa se revelou um comportamento ousado, mas de muita responsabilidade histórica, como ocorreu com a grande e isolada liderança do seu Primeiro-Ministro Winston Churchill durante mais de cinco anos na Europa, até conseguir convencer os Estados Unidos de que o risco do governo alemão daquela época era um risco que atingia o mundo todo.
Mesmo assim, quero me arriscar a dizer, Presidente e colegas, que o que fez os Estados Unidos entrarem na guerra não foi nenhuma questão humanitária; o que fez os Estados Unidos entrarem na Segunda Guerra Mundial não foi nenhuma preocupação com imigrantes exilados; foi o fato de terem sido provocados de maneira inesperada e ousada pelos japoneses. Acho que se o Japão não tivesse invadido os Estados Unidos, provavelmente o governo americano do Presidente Roosevelt, à época, teria dúvidas de oferecer a base industrial americana para a fabricação dos equipamentos que faltavam à Inglaterra e que levou ao fim da guerra na Europa.
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Da mesma maneira, a política de pacificação dos anos 30, levada a efeito pelo governo da Alemanha, governo nacional socialista da Alemanha, era uma política de largo apelo europeu. E só começou a ser contida quando atravessou fronteiras sem declaração de guerra. Um dos pontos altos do processo de civilização, por mais contraditório que seja, é o fato de um país declarar guerra ao outro, e não atravessar suas fronteiras de maneira intempestiva, voluntariosa e agressiva.
A nossa região é muito festejada no mundo porque, na nossa região, não se atravessa fronteira nacional há mais de cem anos. Exércitos não atravessam fronteiras na América Latina, e os últimos que atravessaram fomos nós, no século XIX.
O terrorismo atravessa fronteiras sem declaração de guerra, o terrorismo atravessa fronteiras por ar, por mar, por terra, por satélites, por meios eletrônicos e pela internet. Esse é um fenômeno completamente novo em relação àquele que ocorreu na Europa, e é esse fenômeno, para mim, que está por trás desses fatos que fizeram com que a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, aqui, do Senado Federal, de maneira muito vinculada à conjuntura internacional, convocasse esse tema “O Brasil e a Ordem Internacional: Estender Pontes ou Erguer Barreiras?”, que é uma dúvida que, muitas vezes, a diplomacia brasileira infelizmente tem.
Há a confirmação da vitória do Emmanuel Macron por dois terços dos votos - mas houve abstenção de 25% da França, um em cada quatro franceses não votou em ninguém, o candidato que a França precisava ter. E foi, mais ou menos, a forma pela qual foi escolhido candidato, ou seja, ele se tornou um candidato com essa característica de ser o de que a França precisava. Esse impulso francês para a integração da Europa veio em virtude especialmente do sinal negativo à integração que a Inglaterra deu com o plebiscito que tirou a Grã-Bretanha da Europa.
A França não se comporta diferente da maneira como se comportam os espanhóis, se comportam os italianos em relação a partidos políticos e representação social. Esse movimento que o nosso Macron fez já tinha sido tentado por Sarkosy, esse jeito novo de inventar um nome para esconder um partido, esse jeito de esconder ideias para poder ampliar o número de eleitores. Isso contaminou a Espanha, contaminou a Itália.
A Itália tem um palhaço como candidato a Presidente da República. É um homem engraçado, é um homem bom. Aqui, na América Latina, há um Presidente cuja maior virtude que se divulga é o fato de morar em um sítio e ter um fusca, por não haver tratores no sítio dele e por ser honesto. Veja se isso pode se tornar currículo para governar países relevantes, tendo em vista que essas são questões que deveriam fazer parte da rotina das pessoas! Mas esse mundo do vanity fair, que deu origem ao Emmanuel Macron, é muito interessante. Ele é muito rico. Ele é sócio do Rothschild, e isso para um francês é fantástico. A família é muito rica, perseguida pela Alemanha. Ficou rico nessa sociedade, é um progressista, mas é também um conservador, é jovem e é casado com a professora. Há coisa mais interessante no mundo?
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Em um mundo em que os velhos se casam com mulheres jovens, a França liberou as mulheres idosas para se casarem com os jovens. Essa é uma mudança de comportamento subjetivo, que teve uma influência espetacular no perfil desse senhor e enfraqueceu o perfil da Le Pen. Ela, muito austera, muito conservadora, estava na busca dos mais antigos valores franceses, contra a Europa, a favor do euro, querendo ressuscitar uma França que não existe mais. De repente, vem um garoto, que continua uma tradição.
Todo mundo se lembra de que o ex-Presidente do FMI, o Strauss-Kahn, não conseguiu ser candidato a presidente da França por um problema relacionado a essas relações indevidas, de candidatos em véspera de eleição. Ele promete regionalizar o desejo europeu e fazer voltar a França a ser adulta, apesar de dividia, homogênea e desigual.
A França terá muita dificuldade de ter uma influência internacional como teve. A França é pequena. Dentro da Europa, é um país grande, mas é pequena. A França não deixa a Turquia entrar na Europa, e um dos motivos subjetivos, que ela não declara, é que a Turquia é muito grande. Mas a Turquia é muito amiga da França. Aliás, é um absurdo, porque quem joga a Turquia para a ultradireita e joga a Turquia para o radicalismo é a indiferença da Europa em recebê-la em seu território. Quem veste a burca na Turquia é a Europa, é a vaidade da Europa. Istambul sempre foi uma capital europeia, a Turquia sempre foi um país admirado pelo mundo todo e pelos europeus.
Então, espero que ele agora abra o olho, olhe para o lado da Turquia, e a atraia para o lado da Europa, que ele a pacifique, que fortaleça o setor mais democrático da Turquia.
O enigma que parou Le Pen - e não acho que seja provisoriamente como a imprensa está dizendo; jornais como o El Pais e o Le Monde estão falando que pode ser provisório; aqui no Brasil O Globo fala isso, o Estadão fala isso - é que ninguém sabe a hora em que a pólvora se oferece ao fogo. E ela ofereceu um pouco de pólvora. O discurso dela é um discurso de pólvora, é um discurso que hoje já não tem mais força, nem em países divididos como a Argentina, como o Brasil, países onde a fricção e a irritação dentro do sistema político são muito grandes. Não fale em pólvora perto de um povo esquentado.
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Então, a saída do mundo é pelo centro, a saída do mundo é a moderação. E, do outro lado, um dos fenômenos que vem revelando isso para mim muito claramente é o deslumbramento do Donaldo Trump nos Estados Unidos. Por quê? Porque, queria ou não, os analistas políticos do mundo todo consideram que os Estados Unidos são o único Estado do mundo empenhados em transformar, de certo modo, o mundo à sua maneira. A China não faz isso mais ou não faz isso ainda, parou de fazer isso. Todos os outros Estados que querem transformar o mundo à sua maneira são Estados pequenos e são Estados altamente radicalizados, mas por razões doutrinárias de origens diversas do que a origem que faz os Estados Unidos imaginarem que são os líderes da história e imaginarem que são um país que tem uma estrutura moral - evidente, uma estrutura moral, com muita arma, muita tecnologia e muita capacidade de dissuasão e de enfrentamento. Mas é um país cuja força é baseada em um convencimento da nação. Há um Estado da nação Estados Unidos, e seja ele governado por um Obama, como foi bem governado, segundo meu ponto de vista, seja ele governado por um Clinton, pelos Bush ou governado agora pelo nosso Donald Trump.
Por que acho que ele é um deslumbrado que está surpreendendo os Estados Unidos e pode surpreender o mundo? Ele arrastou o Presidente chinês, por exemplo, para um resort de sua propriedade. Não foi para nenhum prédio da Casa Branca, do patrimônio do Estado americano. E ali ficou conversando com ele provavelmente sobre a Coreia do Norte, onde há um rapaz jovem, cheio de armas, que acha que pode fazer coisas que não vai conseguir fazer, mas atrapalha o raciocínio do mundo.
Ao que tudo indica, o líder da China, que é um homem preparado, 20 anos de preparo para chegar aonde chegou, foi fisgado pelo jeito de ser do Trump. E, aí, com paciência - e é uma regra da história que devemos levar sempre em conta, quem opera o sistema internacional, quem discute relações internacionais - e por etapas todas as feridas podem sarar. Nenhum país precisa ser inimigo a vida inteira, nenhum país precisa entrar em confronto com outro a vida inteira. Na Europa, por exemplo, nos Bálcãs, nunca se pacifica, porque são feridas que vêm lá da Primeira Guerra Mundial e que podem ser corrigidas.
Mas o que o nosso Trump disse ao Xi Jinping, pelo que pude ver, é que sua filha, Ivanka - não sei se vocês conhecem -, uma jovem publicitária, inteligente, sagaz, que teria dito nas redes sociais, porque hoje as campanhas são ocultas no mundo todo: "Podem votar no meu pai, deixem os exageros dele comigo". E muita gente deixou o Trump passar, pensando: "Nós falamos com essa menina". E ela provocou um fenômeno tão forte e psicológico na cabeça do Xi Jinping e da sua mulher que chamaram uma equipe de televisão da China para que ela fizesse uma saudação às mulheres da China. A The New Yorker, que é uma revista austera americana, de esquerda, moderna, ficou muito desconfortável e chegou a escrever que é perturbador que a jovem loira apareça como modelo de feminismo para toda uma geração de mulheres chinesas. Ou seja, a esquerda e os formadores de opinião estão perdidos com a retórica de brota do Twitter.
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Há um outro tipo de cidadão influenciando o mundo, há um outro tipo de pessoa incontrolável, atrevido, grosso. É uma pessoa grossa solta no mundo. Só que você não quer que essa pessoa grossa se torne o seu líder no seu país. É preciso processar os meios de comunicação, os facebooks, as internets, de maneira civilizada. E isso o Trump deixou para essa sua menina, como, às vezes, o Obama, em alguma dificuldade, entregava para Michelle. O Clinton entregou para a nossa Hillary, e a HIllary foi surpreendida com a presença do Trump nesse movimento que fez, com alguns confrontos que ninguém quer enfrentar hoje, que é o seguinte confronto - arrisco-me a dizer aos senhores e senhoras e peço desculpas ao Lúcio, que é professor formado na Alemanha, um homem muito culto nessa área, estudou Heidegger e todos os grandes alemães. Marx, Engels, toda aquela turma de lá: a ideologia serve para um jovem escolher, mas a ideologia não serve para um adulto compreender.
A esquerda do mundo não está conseguindo entender o que está ocorrendo na cabeça das pessoas. Será que as pessoas, Presidente Collor, querem ser partidárias? Será que as pessoas querem ser de sindicatos? Será que as pessoas querem ser de organizações seculares? A maior organização secular do mundo é o cemitério. Ali, você fica e não sai mais. Por que as pessoas não podem mudar?
E aí pego um terceiro caso: a França com esses partidos que não têm nome, com esses movimentos, esses candidatos que vão juntando características de uma peça que o povo está falando e de que está precisando. Constrói-se em dois anos um candidato para ser presidente de um país. Digo às senhoras e senhores: o Presidente do Brasil está sendo construído, mas não está sendo construído por nenhum dos candidatos que está aí. Não me perguntem, não tenho bola de cristal, sou um cientista político, vamos dizer assim, mas é visível que está sendo construído no inconsciente coletivo do Brasil e na alma do Brasil uma pessoa totalmente diferente da que esteve aí.
O Presidente Collor sabe, ele foi construtor de um grande personagem dos anos 90, que empolgou o País. O Presidente Lula empolgou o País por quase 30 anos. O Brizola, quantos anos empolgou o País?
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Esses movimentos que constroem líderes têm, hoje, um componente oculto que não existia e que começou a existir a partir dos anos 2000 de maneira muito forte: a internet, as redes sociais, o Facebook, o Twitter. O Brasil tem 160 milhões de pessoas com opinião, dos 200 milhões de habitantes, com opinião hoje, agora, neste momento, dando opinião sobre tudo.
O terceiro caso, para encerrar: George Soros. Ele é um bilionário interessante: xingado e consagrado tanto pela esquerda como pela direita, ganha dinheiro principalmente com aquilo que critica. Ele percebe que uma determinada coisa recebe uma crítica, ele processa essa crítica de maneira inteligente, manda sua equipe estudar aquele tipo de fenômeno inesperado no negócio dele ou em um determinado movimento que ele está fazendo em alguma direção, vai lá, aposta ao contrário e ganha.
Seu principal playground agora, experimental, é a Hungria, país em que nasceu. De tanto ajudar a Hungria, minou os propósitos do regime comunista da Hungria. Vocês sabem que comunistas repelem gestos de consolo. Eles não suportam que alguém pareça que está estendendo a mão para eles se aquilo significa reciprocidade, que é a coisa que muitos políticos não aceitam. Eles aceitam uma rua de mão única, mas não aceitam reciprocidade.
Aí, ocorreu a seguinte questão: ele deu uma bolsa para um rapaz chamado Viktor Orbán, nos anos 80, na universidade que ele criou, em Budapeste, a Universidade da Europa Central. É uma Harvard do Soros em Budapeste. Esse Viktor Orbán recebeu a bolsa, estudou, se formou e se tornou Primeiro-Ministro da Hungria. Seu primeiro ato foi fechar a universidade. Aí, o George Soros percebeu que ia aumentar o número de matriculas na sua universidade, mas ele não sabia que ia ter passeata a seu favor na Hungria. Olhem que coisa! É o único país do mundo em que um milionário criticado tem passeata a seu favor, pela esquerda, contra um governo de extrema esquerda, que é o mais reacionário e devorador de ideias novas do mundo, que é atualmente o governo da Hungria. É de considerar a Le Pen uma criança de colo o que esse rapaz pensa, o Viktor Orbán. Enfim, deixo três ideias e três personagens do mundo atual, que, acho, estão envolvidos em três situações.
A função prognóstica desapareceu da análise política e virou bola de cristal nas pesquisas de opinião pública. O interesse analítico sobre o que e como ocorreu foi suplantado pela curiosidade de descobrir o que vai acontecer. Vou dizer a vocês uma coisa: não há mais tempo ou interesse para a previsão do futuro no mundo, mas acho que continua em vigor o de sempre, os chamados ciclos longos de Kondratiev, um grande economista que dizia que depressão econômica e mudanças sociais andam juntas e que, de 15 em 15 anos, de 20 em 20 anos, as sociedades mudam.
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Ou seja, o que está havendo, hoje, na Europa e nos Estados Unidos não é o destino final nem da Europa nem dos Estados Unidos; é o fim de um ciclo, onde Estados centralizados diminuíam a tensão no mundo entre as pessoas comuns, porque criavam a tensão entre os líderes mundiais.
Hoje, com os Estados ultradescentralizados e o fim das grandes superpotências, o conflito está no mundo das pessoas comuns, tanto que, hoje, o maior subproduto dos problemas mundiais é o número de expatriados, de imigrantes exilados, que é muito maior do que depois da Segunda Guerra Mundial. Ou seja: um mundo centralizado, um mundo dominado por superpotências provoca menos migrações; um mundo de Estados nacionais fechados e pequenas fronteiras expulsa mais gente de casa.
Esta é a grande contradição, a meu ver, do mundo atual, e é essa contradição que está fazendo as pessoas comuns pensarem na própria vida e esquecerem os grandes formuladores.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Muito obrigado ao professor e sociólogo Paulo Delgado, ex-deputado federal que participou de trabalhos importantes nesta Casa do Congresso.
Muito obrigado, mais uma vez, pela sua lúcida explanação.
Passo, agora, a palavra ao Prof. Dr. Mathias Alencastro.
O SR. MATHIAS ALENCASTRO - Muito obrigado, Presidente Collor.
Agradeço o convite da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional. É um grande prazer estar aqui com vocês hoje.
Eu vou elaborar sobre onda populista, porque as eleições francesas marcam um momento muito importante nesse processo. Depois, na fase de perguntas e respostas, eu espero poder comentar os detalhes das eleições francesas.
A minha intervenção de hoje é bastante otimista na verdade - talvez mais do que deveria. O fato é que o argumento que eu quero elaborar aqui é que a vitória do Emmanuel Macron colocou fim a uma ameaça que parecia muito real no final do ano passado, qual seja, a instalação de um eixo de regimes, que eu chamaria de étnico-nacionalistas, entre os Estados Unidos, a França e Rússia, que colocaria em xeque sistema internacional, as Nações Unidas e a União Europeia em particular.
Esse desenlace é muito favorável, na minha opinião, para os países do sul e para o Brasil em particular.
A consequência, em termos analíticos, do fim dessa onda populista é que os resultados da França mostram que as dinâmicas nacionais continuam sendo muito mais relevantes do que as grandes narrativas de globalização. Na minha opinião, tanto a chegada ao poder de Trump como o Brexit são, antes de tudo, resultados de contingências políticas locais.
No caso dos Estados Unidos, a eleição de Trump se deve a uma tripla conjunção de fatores - e vou apresentar muito resumidamente a minha opinião: primeiro, o fracasso do Partido Republicano em controlar a sua própria base, que foi radicalizada pela estratégia de oposição constante ao governo Obama. Segundo, a fraqueza da candidatura de Hillary Clinton, que não oferecia nada além da continuidade do governo Obama, mas sem o carisma e a liderança; e, na minha opinião, não foi o Trump que venceu, mas a Hillary que foi incapaz de mobilizar o eleitorado que faz a diferença no Partido Democrata. O terceiro - e aí é mérito do Trump - foi buscar o voto das vítimas da crise financeira de 2008 em Estados historicamente aliados ao Partido Democrata, como Ohio, Pensilvânia e Michigan.
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Aqui, há um fator muito importante: 70% dos empregos criados pelo Obama, desde 2008, foram sem carteira assinada. Houve uma precarização muito grande durante o Governo Obama, e foram os votos desses novos precários que foram para o Partido Republicano.
A verdade é que um funcionário com 15 anos de General Motors ou de Ford se comporta, na urna, de forma muito diferente quando ele vira motorista da Uber. E acho que é uma coisa que nós vamos ver aqui, no Brasil, em 2018.
No caso do Brexit, eu também acho que foi um acidente da história. O Reino Unido não tem cultura referendária e o acordo com a União Europeia era bastante vantajoso, porque ele tinha acesso ao mercado comercial sem a necessidade de aderir a todas as regras. Além disso, para muitos europeus da União Europeia, a presença da Inglaterra era um entrave à construção europeia.
O referendo parte de uma disputa política interna do Partido Conservador entre o Primeiro-Ministro, àquela altura David Cameron, e o seu oponente, Boris Johnson. O referendo estava agendado... O Brexit, supostamente, não era para ter acontecido. O referendo deveria ter garantido a permanência do Reino Unido na Europa, só que a data coincidiu com a explosão da crise de refugiados, que foi aproveitada pelos populistas e pela extrema direita sobretudo. Por isso, a tentativa de resolução de uma disputa partidária resultou em uma das maiores sabotagens econômicas de um país na história.
Então, realmente, é uma contingência.
Por que eu estou sublinhando essas dinâmicas nacionais? Porque eu quero desconstruir a tentativa de uma narrativa global da onda populista. Eu a acho muito pouco convincente.
A insistência na narrativa da onda populista dá a ideia de que a globalização, o populismo e a crise de representatividade são fenômenos do século XXI, e acho que todos nós aqui sabemos que não é o caso.
Voltando ao caso do populismo, acelerando aqui um pouco e entrando no caso da França, para mim - e, creio, para os observadores brasileiros entenderem os fenômenos na Europa de forma pragmática -, a diferença entre um movimento populista e um movimento que não é populista é a sua capacidade de governar, de realmente chegar ao poder e não apenas estar em uma lógica de contestação. Essa é uma definição que estou usando aqui, pontualmente, para servir a este debate.
O populismo de Trump, o Brexit e Le Pen deram provas de que não sabem governar.
O Trump, que todos anunciavam como alguém que iria alterar profundamente a forma de fazer política nos Estados Unidos, está se transformando em um presidente republicano genérico. Ele afastou os seus conselheiros mais radicais no último trimestre e está abandonando, gradualmente, as ideias mais polêmicas. Talvez uma ou outra coisa aconteçam, mas muitas das medidas... A máquina dele já é uma máquina tradicional republicana.
O Brexit está sendo negociado por um líder do Partido Conservador genérico, Theresa May, que era Ministra do governo do Cameron; os líderes da campanha do Brexit, como o Deputado europeu Nigel Farage, foram excluídos de todo o processo; e, agora, nas eleições, eles têm poucas chances de materializar a vitória do Brexit numa vitória eleitoral; muito poucos entre eles serão eleitos deputados.
A Le Pen - não sei se vocês viram o debate da semana passada - mostrou que não tinha a mínima competência para governar o país; foi de um despreparo absoluto; e o partido dela fez uma campanha amadora, sem nenhuma dúvida. Então, a prova disso é que ela ganhou poucos votos em relação ao primeiro turno.
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O que assustava, realmente, nessa onda conservadora, no final do ano passado, era a capacidade de subversão das instituições de potências mundiais por uma elite que não partilhava valores universais, essa elite composta por Trump, pelo Brexit, pela Le Pen. Isso não aconteceu. Depois de um ano, nós podemos dizer que essa elite foi incapaz de transformar o ensaio e conquistar o poder a longo prazo. E é nesse contexto que a eleição do Emmanuel Macron é um marco e nos deixa otimistas.
Um ano atrás, quando o Brexit aconteceu, muita gente apostava no colapso da União Europeia, no fim da moeda do euro, na restauração das fronteiras, no regresso a uma Europa minimalista. A eleição do Macron, que ontem, no segundo discurso depois de ganhar a eleição, fez executar o hino da União Europeia em pleno comício - o que é um ato muito simbólico, porque, neste momento, defender a União Europeia é quase um ato subversivo, porque ela é muito impopular entre a população -, mostra ser o fim dessa tendência e, sobretudo, ser o relançamento do motor franco-alemão, que havia sido travado por disputas no começo do século XXI.
E, concluindo, o que significa a eleição do Macron para o Brasil? Significa mais abertura comercial, mais investimentos em ciência e tecnologia, mais política externa.
A exigência, para o Brasil, será a elevação do nosso padrão de cooperação internacional. A Europa vai estar mais exigente. E, aí, haverá dois caminhos: ou o Brasil pode tentar se alinhar em torno do governo Trump, que está apostando em uma regressão tecnológica e civilizatória dos Estados Unidos, retirando financiamento das agências de energia, de meio ambiente e de ciência; ou à União Europeia do Macron, que vai tentar fazer exatamente o contrário: elevar o padrão.
Então, o Brasil agora tem um panorama internacional mais claro e vai poder planejar estrategicamente em muito mais longo prazo, ao contrário do último ano.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Muito obrigado ao Prof. Dr. Mathias Alencastro, um jovem de 33 anos que já é professor doutor e que demonstrou, sobretudo, a sua celeridade em expor os seus pontos de vista. Naturalmente, quando estivermos no momento das perguntas, poderemos obter mais ainda do Prof. Mathias Alencastro.
Passo, agora, a palavra ao Prof. Dr. Lucio Rennó para a sua exposição.
O SR. LUCIO RENNÓ - Muito obrigado, Presidente Collor, pelo convite. É um prazer estar aqui.
Eu trouxe uma apresentação que, depois, posso disponibilizar para a Comissão.
Eu vou tentar tratar da pergunta central dessa proposta que nos foi feita para a discussão de hoje, que é pensar se o que nós estamos vivenciando no mundo, hoje, são novidades, são eventos que demarcam um novo momento da nossa história, ou se são fatos que já ocorreram antes e que têm um caráter muito mais cíclico, isto é, de recuperação de momentos históricos anteriores; ou ainda, como já disse, se se trata de uma nova tendência. Então, a minha pergunta inicial segue, muito claramente, aquela colocada na proposta deste encontro: vivemos, hoje, uma crise que impõe mudanças na prática política ou a recorrência de experiências anteriores?
E, aí, eu estou trabalhando, obviamente, com algumas ideias que são utilizadas na ciência política e na economia para pensar e para tentar explicar a passagem de fatos históricos. Uma delas, obviamente, está associada à ideia de ondas, de ciclos políticos que acompanham ciclos eleitorais.
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Então, você tem aí essa perspectiva de que ciclos econômicos que geram processos de retração ou de expansão econômica demarcam fatos da vida política e demarcam a política eleitoral. Então, você teria, com isso, a alternância de partidos no poder dadas as suas agendas econômicas. Eu expresso esse aspecto específico: quando a economia muda, quando uma crise é sucedida por outra, com características distintas, partidos políticos distintos se beneficiam desse momento porque mais se adequam àquela situação econômica colocada.
Então, você pensa, obviamente, em elementos históricos claros: alternância entre PSDB e PT no Brasil. O PSDB com uma agenda muito clara de ajuste fiscal, que fazia sentido nos anos 90; o PT, depois, em um cenário de economia estabilizada, com uma agenda de expansão dos direitos políticos... Políticos, não; mas com a expansão da rede de benefícios sociais para a população. Então, você vê isso claramente também entre democratas e republicanos, nos Estados Unidos; entre republicanos e socialistas na França; entre CDU e SPD na Alemanha; PSOE e PP na Espanha; e assim por diante. Ciclos. A ideia de agendas econômicas que sobrepõem dadas necessidades econômicas que os diferentes países enfrentam.
E aí, Trump não seria nada mais, nada menos do que parte desses ciclos. Dentro de uma perspectiva desse tipo, ele não traria nada de muito novo; ele traria, sim, uma rejeição de parte da população americana ao modelo de expansão de direitos sociais do Barack Obama e, ainda, um resquício da crise econômica que os Estados Unidos vivenciam, apesar de muito menor agora do que aquela encontrada por Obama.
Você pode pensar também outra forma de entender esses processos históricos como de realinhamentos ideológicos, e, aí sim, a gente conversaria sobre mudanças estruturais nas preferências do eleitorado. Então, você teria um fato novo que gera uma nova coalizão, um novo conjunto de apoiadores para uma causa específica. Um exemplo claro disso é o Partido Democrata no sul dos Estados Unidos quando do movimento pelos direitos civis. O Partido Democrata, no sul norte-americano, era extremamente conservador. Com a mudança da política nacional, esses representantes democratas migram para o Partido Republicano, e, com isso, você tem uma cristalização ideológica muito mais clara de democratas e republicanos. Nos Estados Unidos, isso é algo que a gente vivencia hoje. O diferenciamento ideológico entre democratas e republicanos, nos Estados Unidos, nunca esteve tão claro, e esses partidos nunca estiveram tão distantes quanto estão hoje, fruto de um processo de realinhamento ideológico que ocorreu no passado.
Colegas nossos falam de um realinhamento do New Deal, obviamente com o fortalecimento de uma agenda mais social nos Estados Unidos, e que isso teria se repetido no Brasil com o lulismo. Essa, a ideia que o André Singer vem defendendo, há algum tempo, de que essa adesão a Lula seria algo novo na política nacional. Não sei se é isso. Há trabalhos que discordam dessa perspectiva, porque remete muito mais a uma perspectiva de avaliação do governo. O que orienta aí o posicionamento da população é se o governo teve sucesso ou não teve na gestão da economia e em afetar as suas vidas diárias.
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Macron seria um realinhamento ideológico? Eu acho que essa é uma pergunta sobre a qual ainda precisamos debruçar-nos mais para entendermos melhor. Ele representa algo novo na política? Aparentemente, sim. Há um fato nessas eleições francesas que nós não podemos negar: nenhum dos dois partidos tradicionais chegou ao segundo turno. Eu acho que isso é emblemático.
Trump também é um outsider da política americana. Apesar de chegar pelo Partido Republicano, não era um homem da política americana. Então, representam - Macron mais claramente, porque talvez traga uma posição ideológica, de fato, possivelmente nova - algo novo; representam um realinhamento?
Coloco essa pergunta para debatermos.
Eu não estou ainda convencido disso. Os próximos momentos do Macron serão fundamentais, como a definição do governo. Nós temos eleições legislativas na França em um mês - não é isso? Corrijam-me se eu estiver errado. Temos a formação de um governo que, depois, pode ser reforçado ou renovado, dado o resultado eleitoral. Mas a construção do governo Macron vai ser, a meu ver, o grande indício dos caminhos que ele irá trilhar ideologicamente. Então, talvez, seja cedo para respondermos essa pergunta - ouviu, Presidente? -, talvez tenhamos de fazê-la novamente em momento posterior à eleição legislativa na França.
Contudo, há algumas ideias. Há uma perspectiva aqui no Brasil - entendo que a Senadora Marina Silva, talvez, tenha tentado defendê-la mais claramente nas eleições - que é essa ideia de uma nova política. Não sei bem o que é essa nova política. Eu acho que é algo que ainda está sendo construído, se é que está sendo construído de fato. Mas isso, talvez, representasse um realinhamento ideológico. Fica a pergunta.
A última questão é que, de fato, não estamos vivenciando nada de novo. Temos, sim, como a ideia de ciclos, essas idas e vindas de partidos, ora conservadores, ora mais progressistas, dependendo da situação política e das circunstâncias políticas e econômicas colocadas, mas temos um fato, que me parece marcante e para o qual vários estudos já apontaram, tanto na Europa, como nos Estados Unidos e no Brasil também, que é essa crise de representatividade das instituições políticas tradicionais. As pessoas já não se identificam, já não confiam no Parlamento, nos partidos políticos e nos políticos em geral. E isso vem sendo fartamente documentado por pesquisas há algum tempo.
Qual a implicação dessa crise de representatividade para a política eleitoral, para a alternância no poder de partidos e para a emergência, talvez, de lideranças populistas, entendendo aquelas como carismáticas, de fora do sistema, que trazem uma ruptura com o que havia anteriormente?
É possível que Macron possa representar algo nesse sentido. De fato, eu vou apresentar aqui alguns dados, depois, que mostram um grau considerável de insatisfação dos franceses com relação ao funcionamento do seu próprio sistema político, mais do que na Inglaterra, mais do que na Europa, mais do que nos Estados Unidos - e aí, obviamente, quando a gente compara com a América Latina, vemos que os patamares aqui são um pouco diferentes com relação a esse grau de insatisfação e de desconfiança das instituições, mas semelhante.
Nesse caso, a gente poderia, inclusive, incluir Trump dentro dessa agenda, porque ele conseguiu destruir dois partidos tradicionalíssimos. Se bem que, agora, como o colega Mathias dizia, eu acho que há uma certa retomada do Partido Republicano sobre o funcionamento do seu sistema, mas, no início, não; ele não foi eleito assim. Ele foi nomeado como uma surpresa desagradável dentro do Partido Republicano. As elites do Partido Republicano o repudiavam. Tiveram que engolir o Trump, e, depois, ele conseguiu destruir um processo de consolidação de uma liderança democrata que parecia inevitável com a vitória da Hillary. Isso derrubou o Partido Democrata, que, agora, sofreu uma derrota relevante na Câmara dos Deputados: as mudanças no Obama Care, o sistema de saúde que foi implementado pelo Presidente Barack Obama. Essa foi uma vitória relevante dos republicamos.
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Mas, talvez, Trump, naquele momento, tivesse representado uma consequência dessa crise de representatividade, buscando, aí, novidades. É óbvio que Macron e Trump são polos opostos, como foi bem salientado antes, representam coisas muito, muito diferentes, mas que podem ter surgido de fenômenos políticos, econômicos e sociais semelhantes, que é essa saturação com o funcionamento das instituições políticas tradicionais.
E aí, você tem os outros exemplos que eu mencionei aqui antes: o Podemos, na Espanha, e essa ideia de nova política, no Brasil, que trazem a ideia de um questionamento profundo dos sistemas, da ordem tradicional e do funcionamento dos partidos tradicionais.
Então, possivelmente, nós temos uma interligação entre um fenômeno que já se prolonga por muito tempo, que é essa crise de representatividade, mas, agora, com repercussões político-eleitorais tangíveis, palpáveis.
Pode passar, por favor.
Eu trouxe alguns dados. Eu não consigo trabalhar... Por isso que estou usando... Eu não consigo trabalhar sem números, sem apresentar alguns dados. Então, eu trouxe alguns dados para nós olharmos. É o início de um projeto. Eu ainda não tenho ideias muito cristalizadas sobre esses dados, mas a gente pode discuti-los aqui, o que eu acho que vai até ajudar na minha pesquisa.
São dados, neste momento, que eu colhi a partir de análises on-line, a partir de três sites muito interessantes, que eu recomendo a vocês que visitem, porque eles permitem que vocês olhem essas tendências, façam cruzamentos e assim por diante, tudo on-line. Você não precisa saber de análise estatística ou de gestão de banco de dados para obter os resultados que eu vou apresentar aqui.
Então, eu trouxe dados da Europa, do Eurobarômetro, dos Estados Unidos, do General Social Survey, e do Latinobarómetro, na América Latina, que são pesquisas de opinião pública com amostras representativas de todos esses países. Não são questionários idênticos, mas tratam de algumas questões que são semelhantes em todos esses casos.
Eu vou focar mais aqui na questão da Europa, até para eu não estender demais o meu tempo. De qualquer forma, eu deixo a apresentação disponível.
Então, se puder passar...
Tratei de alguns temas que são muito relevantes: a ideia de legitimidade do sistema político e de legitimidade da democracia, que é o apoio da população às regras do jogo, basicamente. Então, olhei para a avaliação da qualidade da democracia nesses países e olhei também para medidas de confiança em algumas instituições básicas do regime democrático - Parlamento, partidos políticos e Governo, ou seja, Poder Executivo, no caso de um regime presidencialista, mas Governo entendido de forma mais ampla para parlamentarismo e presidencialismo.
Então, começando com a avaliação da democracia, o próximo eslaide, se não me engano, traz resultados da França de 1973 a 2016.
Reparem que a linha amarela é aquela que indica nenhuma satisfação com o funcionamento da democracia no país. Reparem ainda como cresce aceleradamente na França, a partir de 2011, e remete a um pico que ocorreu em décadas anteriores, no começo dos anos 90 e no final dos anos 70.
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Então, você já percebe um crescimento dessa insatisfação com o funcionamento do regime na França, muito diferente, como podemos ver no próximo eslaide, do que ocorre na Inglaterra, no Reino Unido, na verdade, onde se vê uma diferença clara de satisfação, ou seja, há aí, na verdade, uma predominância, neste momento, de satisfação com o regime. Peguei só os extremos: os muito satisfeitos e os muito insatisfeitos. Deixei de fora as categorias intermediárias, para facilitar a nossa leitura aqui, porque quero ver justamente esses extremos. Então, a situação da Inglaterra hoje é muito diferente da situação da França de hoje.
O próximo eslaide traz dados da União Europeia como um todo. E aí a pergunta era sobre as instituições democráticas da União Europeia, se estavam satisfeitos com a forma como a democracia funcionava na União Europeia. Vê-se um pico de insatisfação também no começo dos anos 90 e no final de 2011, algo muito parecido com o que acontece na França. Ou seja, na França, a percepção do eleitor mediano francês é muito parecida, assemelha-se muito àquela do europeu, carregando muito aquela do europeu, diferente da percepção do britânico nesse caso.
O próximo ponto de que tratei foi a confiança no Parlamento. Aí, como vocês podem ver, vamos continuar com o mesmo esquema: França, Inglaterra e União Europeia.
O próximo eslaide traz os dados sobre confiança no Parlamento na França, que é baixíssima. O crescimento daqueles que não confiam é enorme, apresenta-se em índices bastantes elevados. Há um distanciamento muito grande entre aqueles que confiam e os que não confiam. Então, prevalece na França essa percepção de insatisfação com o funcionamento do seu próprio sistema. Na Inglaterra - é o próximo eslaide -, isso é bem diferente: há ainda, sim, pessoas insatisfeitas, mas numa tendência de queda, de forma contrária ao que ocorre na França. Na União Europeia, há algo que se assemelha um pouco mais ao que acontece na França. Então, vê-se que o papel da França é importantíssimo, refletindo o que ocorre na Europa, numa relação muito simbiótica com o que ocorre na Europa.
O próximo conjunto de eslaides mostra a confiança no Governo. Pode passar. A mesma coisa se dá na França, é o mesmo processo, mostrando uma crise clara de confiança nas instituições democráticas básicas, diferentemente do que ocorre na Inglaterra, como podemos ver no próximo eslaide, onde há uma tendência de queda nisso, com o aumento da confiança. E semelhante é o caso da União Europeia também, onde se percebe um questionamento, uma crise dessas instituições.
A próxima série de eslaides mostra a confiança nos partidos políticos. Aqui, a gente vê que, na verdade, França e América Latina estão muito parecidas. Há uma desconfiança gigantesca com relação aos partidos políticos. Apenas menos de 10% da população francesa, hoje, dizem confiar nos partidos políticos. Isso é muito parecido com o que ocorre no Brasil e na América Latina como um todo, como vamos ver posteriormente. Mas isso é diferente do que ocorre na Inglaterra, se bem que, nesse caso, nem tanto, não é? Também há uma desconfiança bastante grande, mas há uma margem de confiança um pouquinho maior de confiança na Inglaterra do que na França. Mas os partidos políticos não estão na agenda das preferências dos eleitores no mundo como um todo. Na União Europeia, como se vê no próximo eslaide, ocorre o mesmo tipo de situação.
No próximo conjunto de eslaides, os gráficos são um pouco mais difíceis, mas achei importante trazê-los, para a gente pautar aquilo que está preocupando mais os eleitores e os cidadãos nesses diferentes países.
Quais são os piores problemas enfrentados pelos países? Na França, está o desemprego, representado pela primeira linha lá em cima, seguido de imigração e de terrorismo crescente.
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Então, você percebe aí um conjunto de preocupações da população francesa que nos ajuda a entender os temas que foram importantes nessa eleição e que, de fato, auxiliaram, sem sombra de dúvida, o crescimento da votação de Marine Le Pen, do conservadorismo de direita bastante radical, que se beneficiou muito desse cenário de desconfiança nas instituições e de crescimento da preocupação com questões econômicas, como o desemprego, e do medo do terrorismo e de crimes - é interessante que este é um item importante colocado.
Então, a França vivenciou, nesses últimos anos - os atentados terroristas são a prova mais cabal disso -, uma situação de desconforto da população acerca do establishment, das instituições colocadas, e um crescimento impressionante da preocupação com questões econômicas, como o desemprego, mas, principalmente, com o terrorismo e com a imigração. Está aí a equação para explicar o que nós tivemos nessas eleições deste ano. Não há como fugir dessa explicação, na minha perspectiva.
Isso é muito diferente ou um pouco diferente do que acontece na Inglaterra - é o próximo eslaide -, onde há uma queda da preocupação com o terrorismo, que já foi maior - esta preocupação cai um pouco -, mas onde o desemprego não está entre esses elementos mais altos. Então, a questão econômica, como o desemprego, é muito importante como elemento de aprofundamento das preferências mais radicais e conservadoras da população. Esse é um sinal para 2018 também, já que estamos pensando nas eleições nacionais aqui no Brasil.
Na Europa como um todo, há um processo parecido com o da França, com essa questão também do desemprego, mas a situação econômica como um todo prevalece mais até do que elementos como terrorismo e imigração. Terrorismo, imigração e desemprego são a equação, penso, para explicar a França de hoje, conjugada com essa descrença em relação às instituições democráticas.
Pode seguir em frente, por favor. Aqui está o último eslaide que vou apresentar com relação à Europa. Vou parar aqui. Não vou apresentar os eslaides sobre os Estados Unidos e sobre o Brasil, a não ser que a gente tenha um pouquinho mais de tempo.
De qualquer forma, quanto ao apego à Europa, quanto à ideia de attachment à Europa - se você se sente europeu ou não. Se você olhar isso na França, é sempre maior a sensação de estar próximo da Europa do que a de não estar. Se você olhar para a Inglaterra, repare que ocorre o inverso, com uma alteração muito brusca recentemente. Então, isso ajuda a entender o Brexit um pouquinho, não é? Veja que a linha amarela representa aqueles que disseram: "Nunca me senti próximo da Europa ou apegado à Europa." É a Inglaterra falando isso, é o inglês ou o cidadão do Reino Unido falando isso. Predomina essa perspectiva. E aí, no final, há uma reversão. Talvez, com a aproximação da decisão sobre a saída, tenha havido a intensificação desse sentimento europeu na reta final desse processo, que acabou não se consolidando. Até por isso, talvez, tenha havido a ressaca que foi sentida na Inglaterra depois da decisão do Reino Unido de saída. E, na Europa como um todo, você vê uma aproximação das duas posições, mas, ainda assim, predomina uma percepção de proximidade.
Então, esse último conjunto de eslaides nos ajuda a entender um pouco, talvez, a situação da Inglaterra, a situação confusa que ela vivenciou nos últimos dois ou três anos.
Pode passar. Agora, entro um pouco na discussão sobre os Estados Unidos. Vou passar rapidamente sobre isso e sobre a questão da América Latina, porque a mensagem mais clara que eu queria deixar era essa sobre o caso francês.
Nos Estados Unidos - podemos passar os eslaides com maior rapidez, até porque a qualidade deles, infelizmente, não está muito boa, e peço desculpa -, foi abrangido o tema da confiança nos Poderes Executivo e Legislativo.
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O que quero deixar pontuado sobre o caso americano é a diferença entre democratas e republicanos. A grande divisão ideológica e de visão de mundo que se coloca nos Estados Unidos hoje, mais do que raça - fiz estes cruzamentos e verifiquei -, mais do que escolaridade, mais do que renda, é a divisão entre democratas e republicanos. Ela até está associada à raça, à renda e a outros elementos, mas a divisão partidária é um amálgama das visões diferentes de grupos nos Estados Unidos. No eslaide anterior, isso ficava muito claro na relação de confiança no governo: quando um democrata está no governo, a relação de confiança do republicano quanto àquele governo é baixíssima, e vice-versa. Mas isso não ocorre em outros países, porque, em outros países, essa divisão partidária não está tão marcada, como está nos Estados Unidos. Vejam que, no caso da confiança no Congresso, que é o próximo eslaide, isso já não ocorre: eles coincidem num crescimento da desconfiança em relação ao Congresso nos Estados Unidos também. É óbvio que há patamares inferiores àquele que a gente viu na Europa e àquele que a gente vai ver na América Latina.
Pode passar, por favor.
Visões com relação ao aborto, se a mulher pode fazer aborto por qualquer motivo, aí vocês veem que as respostas "não" são predominantes, mas com uma incidência muito maior entre republicanos do que entre democratas, de novo consolidando aí posições que são partidarizadas dentro dos Estados Unidos, posicionamentos ideológicos. A gente não está falando mais de um realinhamento ideológico nos Estados Unidos. A gente está falando de cristalização de posições entre os dois partidos.
Pode ir em frente.
Quanto ao Medicare, é perguntado se o governo deve subsidiar a universalização da saúde. De novo, democrata é a favor, e republicano, contra. Trata-se da consolidação, da cristalização da partidarização da política norte-americana.
Vamos para a frente.
Quanto ao auxílio aos afro-americanos - o termo usado no questionário é blacks -, de novo é mostrado que democratas e republicanos têm posições muito diferentes sobre o tratamento especial.
Pode ir em frente.
E quanto à América Latina, só para concluir, alguns resultados rápidos sobre democracia, confiança no Congresso e no governo.
Pode passar.
Aqui estão todos os países. O único ponto que quero ressaltar é que a satisfação com a democracia em 2016 está abaixo de 16% em todos os países. Nenhum país passa desse patamar. Então, o grau de crítica com relação ao funcionamento das nossas instituições é bastante grande.
Próximo eslaide: confiança no Congresso. Também é o mesmo cenário: é muito baixa. Quem oscila nos dois casos é a Venezuela. Depois, vou destacar isso rapidamente.
O próximo e último eslaide, se não me engano, trata da confiança no Governo. Aí há uma variação um pouco maior, mas não passa dos 20% da população em todos os países que se dizem confiantes no seu próprio Governo.
Vamos em frente, para concluir.
Confiança nos partidos políticos: malvistos por todos. Há um percentual abaixo de 15% de confiança nos partidos políticos, o que é semelhante ao que a gente viu na Europa também. Nos Estados Unidos, não é feita essa pergunta. Reparem! Que curioso! O próprio questionário não traz essa discussão. Mas, enfim, nos Estados Unidos, como eu disse, há uma divisão ideológica um pouco mais clara, e, talvez, essa pergunta nem faça sentido lá. Pode ser isso.
Vamos em frente.
Faço as minhas considerações. Peço desculpa, se me estendi um pouquinho.
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O que vejo, olhando esses dados, são poucos sinais de realinhamentos, de mudanças profundas no eleitorado que nos levem a afirmar que há uma ruptura com o que vinha ocorrendo no passado. Na verdade, há muitos padrões compartilhados e certa estabilidade no tempo de avaliações negativas, que não são positivas. Há uma estabilidade no tempo de avaliações negativas sobre as instituições políticas democráticas: partidos, Congresso, Governo. E há uma satisfação baixa com a democracia em geral. E aí há pouca variação disso no tempo. Então, há uma confirmação dessa continuidade, dessa persistência, dessa resiliência de uma crise de representatividade das instituições políticas tradicionais.
No caso, a Venezuela, na América Latina, foi um país que apresentou oscilações mais marcantes, o que tem a ver, penso, com a fragilidade das próprias instituições democráticas lá. Essa oscilação também é muito complicada.
Na Europa, como enfatizei, a França é diferente por conta da sua maior e crescente descrença e desconfiança com relação às instituições e por conta da crescente e maior insatisfação com a democracia, o que, conjugado às suas preocupações com os problemas de desemprego, de imigração e de terrorismo, ajuda muito a entender o processo eleitoral recente.
Nos Estados Unidos, não há evidência de mudanças estruturadas, de realinhamentos institucionais nos últimos anos. Na verdade, há o contrário, há a cristalização de diferenças entre dois partidos muito fortes.
São esses os pontos principais que trago para a nossa discussão de hoje, no sentido de estimular, obviamente, o debate e de baseá-lo em algumas informações atuais em série histórica de preferências da população medidas com pesquisa de opinião pública.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Muito bom!
Muito obrigado, Prof. Dr. Lucio Rennó, pela bela exposição com que nos brindou na noite de hoje, que será seguida pelo debate. Muito obrigado, Prof. Dr. Lucio Rennó.
Passo agora a palavra ao Prof. Alex Canuto.
O SR. ALEX CANUTO - Muito obrigado.
Cumprimento o Presidente da Comissão, Senador Fernando Collor, e, na pessoa dele, os demais componentes da Mesa.
Antes de começar, eu só queria fazer um esclarecimento. Fui convidado - e me honra muito este convite - para falar neste evento como professor, dando minha opinião pessoal, sem ter nada a ver com as entidades que represento, porque isso me dá até mais liberdade para falar. Foi colocado que é bom que haja polêmica. Então, por isso, preciso falar só a minha opinião pessoal como professor, sem envolver as entidades das quais participo. Por isso, venho para provocar o debate.
Numa Mesa sobre crise de legitimidade na representação política do mundo moderno, venho dizer que não há crise de legitimidade. O que há é uma ampliação da legitimidade e da democracia moderna no século XXI, com a inclusão de grupos sociais que, até o final do século XX, não tinham expressão, não tinham muita representatividade ou a tinham de forma limitada e que passam a ter representatividade em governos, ganhando eleições majoritárias ou proporcionais ou pelo menos sendo bem votados.
A legitimidade existe seja no caso do Presidente Donald Trump, que foi eleito pelo voto, seja no caso de outros presidentes ou de outros ocupantes de cargos públicos que foram eleitos pelo voto. Isso significa que a maioria deseja aquilo. Portanto, eles têm legitimidade, sim, para estar nos cargos em que estão. A queixa parte de grupos que antes ocupavam esses espaços políticos e que hoje passam a não os ocupar mais, tendo de dividir esse espaço com novos atores. É o caso das tradicionais oligarquias. No caso brasileiro, há o estamento burocrático, do qual falava Raymundo Faoro.
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Eles, é claro, sentem essa entrada de novos grupos. Então, daí surge o bordão "não me representam". Ora, quem é eleito para um cargo majoritário representa o grupo majoritário e o minoritário, representa ambos. A democracia pressupõe a alternância de poder, e um grupo que hoje é minoritário pode vir a ser, no futuro, majoritário. Portanto, todos são representados.
Desse processo de inclusão de novos grupos na representação política temos exemplos na nossa história, quando, no final da República Velha...
(Soa a campainha.)
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL. Fora do microfone.) - Desculpe-me. Era para o anterior. Pode continuar.
O SR. ALEX CANUTO - Sim, é claro!
No final da República Velha, nos anos 20, havia a famosa política do café com leite, em que grupos políticos de São Paulo e de Minas se alternavam no poder. A sociedade brasileira foi se desenvolvendo, novos grupos foram surgindo: as classes médias urbanas, o operariado, o Movimento Tenentista. Quando vem o estopim da crise em 1929, não a crise econômica, mas a crise política, em que São Paulo tenta monopolizar a representação nacional, excluindo o grupo de Minas, o grupo se alia a esses novos grupos políticos, os tenentistas, os operários, a classe média, cujo representante máximo era Getúlio Vargas, e acontece a Revolução de 30. Esses grupos entram à força na representação política. Possivelmente, não temos registro da época, mas, talvez, o PRP (Partido Republicano Paulista) estivesse dizendo "eles não nos representam". Não sabemos isso, mas sabemos que é possível traçar um paralelo com o cenário político mundial dos dias de hoje. Não há uma tomada de poder pela força, mas há, sim, novos grupos se organizando e tendo acesso à representação política por um fenômeno típico desta virada de milênio, que é a internet. A internet veio para quebrar o monopólio do discurso de grupos que tinham um projeto globalista, um projeto de poder revolucionário mundial totalitário, que objetivava a hegemonia - isto vem desde a época da Guerra Fria -, e, dentro da estratégia desses grupos, existia a ocupação de espaço gramsciana, já traçada na década de 30.
Portanto, houve, principalmente na segunda metade do século XX, essa política de ocupação de espaços, daqueles espaços típicos, do que se convencionou chamar de "classe falante", que são a mídia jornalística, o show business e o meio artístico, o movimento editorial, as universidades e escolas. Até o final do século XX, havia grupos de pessoas, seja o grupo que ocupou, vamos chamar assim, o chão de fábrica das redações de jornais, sejam os líderes dos jornais, da mídia audiovisual, e podíamos definir o que era notícia e o que não seria notícia. Hoje, com a internet, todo mundo pode ser produtor de conteúdo e repassador. Você até produz um conteúdo, uma notícia, que cai no WhatsApp. E se aquilo vai ser repassado ou não depende de cada um. Então, a produção e o repasse de conteúdo estão muito pulverizados. Há muito conteúdo sendo produzido, que, de forma pulverizada, não atinge mais tanta gente. Antigamente, pouco conteúdo atingia muita gente. Então, há uma mudança nessa dinâmica.
No show business, no meio artístico, antigamente, você definia quem ia virar ou não uma estrela de cinema ou da música. Havia o jabaculê nas rádios. Hoje, uma banda grava um vídeo no YouTube, e, se aquilo ali tiver muito clique, produz-se uma nova celebridade.
Quanto ao movimento editorial, antigamente uma pessoa sem muitos recursos escrevia um livro, e, se nenhum editor quisesse publicar, aquele assunto morria, aquilo não entrava no discurso, não entrava no debate político. Hoje, é muito barato montar um blogue, colocar ali suas ideias e participar do debate.
Então, houve uma quebra do monopólio, do discurso desse oligopólio. Só as universidades é que estão um pouco atrasadas. Ainda existe um aparelhamento muito forte. Ali ainda não houve essa quebra, mas essa quebra existe nesses outros ambientes. Portanto, esses novos grupos passam a ter representatividade e já estão elegendo representantes. Não vou colocar só o caso de Trump, que ocupa o cargo máximo nos Estados Unidos, um cargo de extrema relevância. Mas, em cargos menores também, isso acontece.
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Então, os antigos grupos estão perdendo espaço. Agora, eles têm que dividir espaço com esse pessoal que está entrando, com essas novas camadas sociais. E aí vem o bordão "não me representam". Mas a gente tem de se acostumar com a alternância de poder na democracia. Todos têm de estar representados de uma forma ou de outra, não no mesmo momento temporal ou no mesmo espaço político, mas a democracia pressupõe a representação de todos os grupos sociais.
Nós vemos reflexos desse fenômeno. Há três casos: Estados Unidos, França e Brasil, possivelmente. O dos Estados Unidos não é um caso muito bom, porque foi uma eleição polarizada. Pela dinâmica dos Estados Unidos - apesar de haver 33 partidos registrados, há dois partidos fortes, duas forças políticas concentradas -, lá havia um candidato outsider, Donald Trump, e uma candidata do establishment, que era a Hillary Clinton, apoiada por toda a mídia, por todo o show business americano, por tudo isso. Donald Trump, apesar de ser também uma personalidade de mídia, era um outsider, alguém de fora do establishment. Então, era uma questão de establishment contra outsider. Eram duas alternativas. Então, a eleição foi polarizada. Possivelmente, nem todos os americanos que apoiaram a candidatura de Trump eram necessariamente apoiadores de suas ideias. Há muito voto negativo ali, contra a Hillary, por n razões que não me cabe aqui detalhar.
Quanto à eleição na França, não é possível traçar um paralelo com a eleição americana, até porque eles têm um sistema semelhante ao nosso de dois turnos. No primeiro turno, entre as quatro principais candidaturas, havia três com ideias liberais e semelhantes às de Marine Le Pen, que seria a mais polêmica. Havia tanto o Emmanuel Macron quanto o François Fillon com ideias liberais, até mesmo aderindo, em algum sentido, de alguma forma, a propostas de se restringir a imigração, não tão radicais como as de Marine Le Pen. Não era um discurso antimuçulmano, mas era, de alguma forma, o de limitar a imigração, o de aumentar vagas em presídios. François Fillon falava também de redução da maioridade penal na França. Então, nesse ponto, considero que Marine Le Pen, por mais que ela tenha tido uma derrota eleitoral, do ponto de vista de vencer ou não, teve uma vitória na quantidade de votos, pois ela dobrou a quantidade de votos de 2002 para cá, e, mais do que isso, teve uma vitória de pauta, porque dois outros candidatos tiveram de se aproximar do discurso dela, até por uma estratégia eleitoral, para, vamos dizer assim, não parecerem tão radicais e para tirarem votos dela - essa costuma ser, às vezes, uma estratégia que rende votos. E o quarto candidato, o Jean-Luc Mélenchon, era um esquerdista, mas também falava em saída da União Europeia.
Não é possível traçar um paralelo entre a Le Pen e o Trump por outra razão. O discurso da Le Pen é calcado basicamente em anti-imigração e no fato de ela ser, de certa forma, uma outsider do establishment político francês, mas ela também defende o Estado laico, o laicismo, e o aborto, por exemplo. E Trump, hoje - vi notícias hoje -, assinou um ato, por exemplo, dando liberdade a religiosos de manifestação política durante cultos. O Trump não tem esse laicismo. Então, há certa diferença, e não é possível traçar esse paralelo tão marcante.
Emmanuel Macron - quero pontuar aqui -, apesar de ter feito parte do governo socialista de Hollande, é um burocrata, formado na École Nacionale d'Administration (ENA), na França. Então, ele é um burocrata e lançou uma plataforma com ideias muito discrepantes do que foi a plataforma de Hollande. Então, antes de tudo, ele é um burocrata, formado pela ENA. É o terceiro ou quarto, se não me engano - acho que é o quarto -, Presidente francês oriundo da ENA. Nós temos a equivalente aqui no Brasil a nossa Enap, que ainda não produziu nenhum Presidente, só um Ministro de Estado, o nosso Ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, também passou pela nossa Enap.
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Mas, então, nós tivemos três candidaturas que, de alguma forma, não compartilhavam das mesmas ideias, uma delas outsider do sistema político. E, quando houve o segundo turno, não foi o segundo turno polarizado, como nos Estados Unidos, em que havia uma proposta progressista, Barack Obama/Hillary Clinton versus Donald Trump. Havia um candidato que a mídia, por exemplo, chamava de centrista, que era, no segundo turno, o Emmanuel Macron. Então, não é possível traçar muito esse paralelo.
Saindo agora da França e já entrando no último tópico aqui, no Brasil, o nosso caso brasileiro, no Brasil, a gente nota, é claro, um cansaço da sociedade com o estamento burocrático do Raymundo Faoro. A gente sente isso. Já com o efeito da internet, ele estourou em 2013, com as manifestações começou de uma forma difusa. Começou lá com a questão do passe, dos 20 centavos, depois não era mais só pelos 20 centavos, e começou a ser contra tudo, sem se saber direito contra o que era. Era simplesmente, e as pessoas não conseguiam expressar, contra o estado de coisas em geral.
Veio num crescente. E se vê, mesmo nas manifestações que foram polarizadas no afastamento da Presidente, que não havia uma força política canalizando, as pessoas apoiando alguma coisa; quem era a favor do afastamento da Presidente não apoiava uma força política, no máximo a Lava Jato, mas era contra o establishment como um todo. E não havia: "Vamos tirar isso para colocar outra coisa." Era simplesmente uma negação do establishment, o que pode ter reflexo no ano que vem. Em 2018, talvez, haja uma expressão nas urnas - não sei o que pode acontecer -, como consequência desse processo que vem acontecendo.
Mas eu acho que há um empecilho para uma plena, vamos dizer assim, realização desse processo, porque o nosso sistema político, eleitoral e partidário, possui alguns filtros. Ele é um sistema, da forma como está construído hoje, que favorece a construção e consolidação de oligarquias partidárias. Você tem alguns instrumentos que facilitam isso, por exemplo, você não tem no Brasil o instituto da candidatura independente, como há nos Estados Unidos. Então, as pessoas têm que, se quiserem se candidatar, buscar um partido, e, muitas vezes, a gente vê a coisa se distorcendo para uma expressão que é usada muito na mídia: compras de partidos.
Se existisse candidatura independente, não seria necessário fazer isso, mas a gente tem essa reserva de mercado, vamos chamar assim, para partidos políticos, porque os partidos, não só as candidaturas, têm que sair de partidos políticos, como têm acesso a fundo partidário e tempo de TV. O tempo de TV, eu acredito que, mais uns 10, 20 anos, ele vai perder muito a importância com a internet, a substituição da internet. A internet já está substituindo a TV aberta, a TV a cabo. O tempo de TV gratuito tende a perder a sua importância relativa.
Mas nós temos ainda o fundo partidário. Então, hoje você tem uma tremenda burocracia no Brasil para se criarem novos partidos, porque você tem dinheiro público, tem tempo de TV. Você não pode simplesmente sair dando realmente registro de partido para qualquer um. Você tem lá que juntar hoje em torno de quase 500 mil assinaturas, em torno disso, entre outros requisitos, e isso cria essa reserva de mercado.
E o argumento usado é que temos que ter estabilidade no sistema. Mas, ora, os Estados Unidos não têm financiamento de campanha eleitoral, nem de partido. Lá não há horário eleitoral na televisão, as forças políticas compram o horário como se compra para vender qualquer produto.
Na França, o Emmanuel Macron fundou um partido no ano passado, o En Marche!, que significa "em marcha", essa seria a tradução.
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E nem por isso o sistema francês é um sistema, vamos dizer assim, politicamente instável, mas há esses mecanismos de flexibilidade do sistema político que permitem, de certa forma, essa ascensão de novas forças políticas. Ainda há restrição.
A Marine Le Pen, por exemplo, reclama da eleição, porque lá não há exatamente um voto distrital, mas o Parlamento na França é eleito de uma forma majoritária, e isso dificulta a Frente Nacional. Já no Parlamento europeu, em que a eleição é proporcional, a Frente Nacional elegeu oito Deputados na França. Por isso, ela consegue ter uma ascensão ao Parlamento europeu, mas não ao Parlamento francês. E lá também há as disfunções do sistema.
Mas a nossa disfunção aqui é essa reserva de mercado com que se acaba restringindo o debate político. Hoje em dia, fala-se, na minha opinião muito corretamente, em abolir o imposto sindical; diz-se que o trabalhador não tem que financiar os sindicatos, a contribuição tem que ser voluntária. E só fazendo aqui um parêntese, apesar de não estar falando pela minha entidade, o sindicato do qual sou membro da diretoria, nós não cobramos, o sindicato, a contribuição, o imposto sindical, e temos quase 90% de filiação voluntária, fechando parêntese.
Voltando para a palestra aqui propriamente dita, sim, discute-se muito corretamente. A Câmara dos Deputados aprovou, está chegando aqui ao Senado a reforma trabalhista, incluindo esse ponto. E eu questiono sobre o fundo partidário. Será que a sociedade tem que financiar os partidos, ou os partidos têm que se autofinanciarem?
Então, eu acho que temos esses instrumentos aqui no Brasil bloqueando essa ampliação da representatividade na nossa sociedade. Discute-se muito, na reforma política, voto distrital e lista fechada, mas não se discutem esses pontos. Então, eu queria, só para concluir aqui, como eu falei, provocar o debate, colocar ideias novas aqui. Eu sei que talvez seja bombardeado nas perguntas, tenho ideia de que são temas polêmicos, mas eu acho que a gente precisa debater para esclarecer isso, para aprofundar essa discussão e possivelmente buscar sempre a forma de aperfeiçoar a nossa democracia e a nossa representatividade.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Muito obrigado ao Prof. Alex Canuto pelas suas colocações muito úteis para o nosso debate na noite de hoje.
Antes de darmos continuidade, eu gostaria de agradecer a presença do Sr. Nabil Adghoghi, Embaixador do Marrocos no Brasil; do Sr. Milan Cigán, Embaixador da República da Eslováquia; do Embaixador José Kinn Franco, do Primeiro Secretário Faleg Valdez Cópas, do Segundo Secretário Fernando Crespo, todos da Embaixada do Estado Plurinacional da Bolívia; do Encarregado de Negócios Koffi Maxime Assah, da Embaixada do Togo; do Conselheiro Hendrik Roggen, da Embaixada do Reino da Bélgica; do Conselheiro Augusto Inácio, da Embaixada da República de Angola; do Primeiro Secretário Juan Pozo Alvarez, da Embaixada de Cuba; do Terceiro Secretário Ilya Lutski, da Embaixada República da Belarus; e do Sr. Stephen Saideman, Encarregado de Assuntos Internacionais da Carleton University do Canadá. Muito obrigado a V. Exªs pela honrosa presença com que nos brindam na noite de hoje.
Antes de passar a palavra aos oradores que estão inscritos para fazerem perguntas aos palestrantes, eu gostaria de fazer algumas observações. Nós temos notado, desde o início dos nossos painéis das segundas-feiras, que várias das perguntas que chegam pelos nossos internautas - a quem, mais uma vez, agradeço pela participação - trazem uma questão que talvez não tenha ficado bem explicada e que talvez por isso sejam, de alguma forma, recorrentes essas afirmações.
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O título do conjunto dos painéis "Estender pontes ou erguer barreiras" não está, como apontado em diversas dessas mensagens de internautas, relacionado tão específica e explicitamente à questão de erguer barreiras para migrantes, para imigrantes. "Estender pontes ou erguer barreiras" é no sentido mais amplo da palavra. Estender pontes, por exemplo, para a paz, e não para a guerra; para o diálogo, e não para a recusa ao diálogo; para o entendimento, e não para o desentendimento. Estender pontes é o que o Brasil, por exemplo, sempre fez ao longo da sua história, sempre procurou fazer e sempre procura fazer; é buscar o entendimento, o consenso entre as diversas nações, sempre ter uma participação ativa e altiva, no cenário internacional, no sentido de evitar conflitos. Isso significa, dentro do conceito que aqui estabelecemos e que é de uma amplitude maior do que aquela que venho observando pela participação dos internautas, o estender pontes.
Erguer barreiras não é erguer barreiras, como, por exemplo, o Sr. Trump está querendo fazer lá na fronteira do México, erguer barreiras em 3 mil quilômetros, ao custo de US$30 bilhões, separando os povos e, com isso, evitando - aí, talvez, seja essa a imagem que tenha ficado na memória de alguns - migração ou imigração ao território americano. No nosso caso aqui, quando nós colocamos o termo "erguer barreiras" é também no sentido do protecionismo comercial, porque foi um tema recorrente na campanha norte-americana do candidato vencedor ter colocado, de uma maneira muito clara, a sua vontade de fechar as barreiras, e aí as barreiras invisíveis, norte-americanas para o comércio internacional, para os parceiros tradicionais dos Estados Unidos, para isso que nós chamamos de um livre comércio entre todos os países do Planeta.
No nosso caso, por exemplo, o Brasil, até 1990, era cercado de barreiras invisíveis. Essas barreiras invisíveis é que nos impediam de ter telefone celular, quando o mundo todo já o tinha; de ter carros que não eram carroças, porque não nos permitiam importar carros modernos para beneficiar o nosso consumidor final; nós não tínhamos computadores devido a essas barreiras invisíveis. Enfim, nós não tínhamos acesso a diversos produtos, porque, já que o Brasil era cercado dessas barreiras invisíveis, impedia-se que eles nos chegassem por intermédio de um intercâmbio, de um livre comércio. Então, erguer barreiras é também nesse sentido, evocado que foi esse tema do isolacionismo, de se fechar em torno de si próprio, pela campanha presidencial, tema esse evocado pelo candidato eleito. Então, a nossa pergunta é a seguinte: o Brasil quer erguer barreiras também para o comércio internacional, quer ser novamente um mercado extremamente protegido, evitando com isso essa nossa inter-relação com as demais nações do mundo, num mundo que é hoje...
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O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL. Fazendo soar a campainha.) - Eu próprio já me alertei que estou falando um pouco demais. (Risos.)
Então, é esse ponto que nós gostaríamos de explicar e colocar para os nossos internautas, que é nesse sentido, no sentido mais amplo, e não no sentido da questão da imigração. Até porque o Brasil, como todos nós sabemos, é um país que é fruto da imigração; nós somos um país multirracial, nós somos um país onde há uma miscigenação que é algo que está na raiz da nossa cultura, da nossa vida; o Brasil sempre esteve de braços abertos a todos aqueles que quiseram vir para o Brasil. E aí estão os exemplos, todos nós brasileiros temos correndo nas veias o sangue de imigrantes.
Então, no Brasil, nessa questão de imigração, nós temos alguns países ao nosso redor e outros na América Central que procuraram o Brasil, e o Brasil os recebeu muito bem. E nem por isso causou transtorno no sentido do que dizem aqui algumas colocações dos internautas de que: "[...] para não abrir as fronteiras, isso é algo de se pensar em países que estão aptos a dar suporte total a sua população, coisa que não ocorre aqui [...]." E vai por aí. São coisas que não estão colocadas nesse sentido estrito da palavra.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Essa aqui, por exemplo: "Desde o primeiro ciclo de debates, percebo que os espectadores querem erguer barreiras sem sequer ouvir o debate." Então, é quanto à questão do sentido de erguer barreiras para evitar o processo de imigração.
Enfim, eu gostaria de, agradecendo, mais uma vez, essa enorme participação dos internautas, esclarecer - e, talvez, a culpa seja nossa. Eu peço desculpas a eles por não ter tornado mais claro, desde do início do nosso primeiro painel, que estender pontes e erguer barreiras é um sentido figurado e no sentido mais amplo da palavra. Não é erguer barreiras para evitar a imigração, mas erguer barreiras para evitar o protecionismo, para evitar que sejamos um país que, sem ter esse intercâmbio com o restante das nações do nosso Planeta, fique atrasado em termos de conquistas que a sociedade vem alcançando em função do avanço científico e tecnológico que experimentamos.
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Também gostaria de acrescentar aos nomes aqui já citados e que estão presentes entre nós a Conselheira Política Tamar San Miguel Garcia, da Embaixada da Espanha, e o Conselheiro Abbah Sidi Sidi, da Embaixada do Marrocos.
Eu gostaria, agora, de fazer apenas alguns comentários e com isso embutir algumas perguntas aos senhores palestrantes na noite de hoje. Em relação à questão colocada pelo Prof. Dr. Lúcio Rennó, ele apresentou aqui vários eslaides muito interessantes que vieram a calhar no debate de hoje.
Mais uma vez, meus parabéns ao senhor, professor.
Mas ficou claro nos eslaides que, na França - vamos ficar especificamente na França, em função das eleições de ontem -, a principal preocupação dos franceses é com o desemprego, com a migração e com o terrorismo. Desemprego, migração e terrorismo, desses três pontos, desemprego e migração foram dois itens que a candidata de extremíssima direita, a Marine Le Pen, tratou com muita força e com muita visibilidade - com muita força e com muita visibilidade!
Se esse é um sentimento que domina um percentual tão elevado de franceses, como é que se explica que ela não tenha conseguido ultrapassar os 35% dos votos, porque, na realidade, ela ficou na terceira colocação: o primeiro, o Emmanuel Macron; em segundo, abstenção mais votos nulos e votos em branco, 37%; e ela veio em terceiro. Então, é algo que talvez nós tenhamos que analisar sob o aspecto de uma - nós estamos falando em mondialisation; os franceses falam em mondialisation, em vez de em globalização - mondialisation dessa questão do descrédito que vem da insatisfação da população da América Latina, para citar apenas o que nos foi aqui trazido, da França, da Europa, da Inglaterra em relação a essas questões.
Há hoje uma falta de esperança, uma falta de expectativa. A juventude olha para o seu futuro e não vê como se colocar nesse futuro. É como se o mundo não estivesse preparado ainda para receber essa geração de jovens que estão procurando um lugar ao sol e que não estão vendo como alcançá-lo. E essa desesperança talvez traga essa insatisfação - vejamos que coisa séria e que foi aqui também mostrada nos eslaides do Prof. Rennó - com a democracia. Com a democracia!
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Então, o que nos resta sem democracia? Qual é a alternativa a um processo que não seja democrático? Um processo autoritário? Será que esses que manifestam insatisfação com a democracia e com um processo democrático estão buscando um processo autoritário como forma de solução dos problemas que estão vivendo e pelos quais estão passando? É algo que nos faz pensar.
E também na questão... Aí é mais em termos de uma pergunta. Seria interessante nós notarmos que, na França, desde o início da Quinta República, em 1958, os dois partidos principais, o republicano e o socialista, não chegaram a um segundo turno das eleições. Quer dizer, eles foram rejeitados logo no primeiro turno, e chega ao segundo turno um egresso... É um tecnocrata, uma pessoa com uma grande bagagem cultural, que é o vencedor, o Emmanuel Macron, que sai de um governo socialista como Ministro da Fazenda. Presidente este que não teve sequer condições, também pela primeira vez desde o início da Quinta República, de se candidatar à reeleição.
Então, esse candidato vem não pertencendo a nenhum partido. É outra coisa interessante que foi também observada aqui por todos os palestrantes: os partidos agora não têm mais nomes - o Partido do Macron, En Marche!; na Espanha, Ciudadanos, Podemos; aqui no Brasil, Avante, Rede, Novo.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Há agora o Podemos também, diz a Presidente Bruna Furlan.
Bom, então, está havendo uma movimentação muito estranha nesse processo de afastar nomes de partidos e colocar slogans para evocar a mobilização popular. En Marche! é uma coisa muito marselhesa. Não é? Muito do próprio hino francês. Não é? En Marche! evoca o hino francês, que é extremamente popular não somente entre os franceses, mas no mundo inteiro.
Mas, então, como irá o Sr. Macron - aí vai a pergunta - governar a França? Ele estará, agora em junho, participando de uma eleição em que as pesquisas mostram que o seu Partido, o En Marche!, não terá condições talvez de fazer 20 Deputados. Serão eleitos - é o que dizem as pesquisas - majoritariamente socialistas e republicanos de raiz gaullista.
Então, ele vem de um governo socialista. A extrema esquerda, com o Mélenchon, já fazendo manifestações de rua contra o eleito. Como é que ele vai fazer um acordo para poder governar? Ele não poderá fazer um governo de coalizão, juntando socialistas com republicanos, porque, na França, isso é a mesma coisa de querer, nos Estados Unidos, juntar democratas e republicanos, é água e azeite, óleo, não se misturam. Então, ele vai ter que optar: vou governar com os socialistas, e aí é a continuação de um governo que, infelizmente, não deu certo - o governo de Hollande -, ou vou governar com os republicanos.
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Que cenário os senhores que aqui estão - e agradeço, mais uma vez, a presença - preveem para a França diante desse possível impasse e como ele irá levar adiante todas as suas propostas numa França que reclama do desemprego, que reclama da migração e que reclama do terrorismo? O terrorismo é um tema que une todos os franceses, como une o mundo inteiro, mas sobretudo estes dois temas: desemprego e migração.
E há algum paralelo que possa ser feito entre a eleição francesa e a eleição americana? Porque ambos afastaram do espectro político os seus partidos principais: o Macron, com a sua eleição, afastando, como já disse aqui e todos sabemos, os republicanos e os socialistas; e o Trump ganhando dos democratas e afastando os próprios republicanos, que não estiveram com ele. A cúpula do Partido Republicano não esteve com ele, como também nós sabemos. Algum paralelo pode ser feito em relação a isso e o que podemos esperar das relações agora entre a França e os Estados Unidos? Estará a França mais centrada na Europa e mais objetivamente vinculada à Srª Merkel e à Alemanha, voltando a fazer uma boa, para eles, dobradinha, como foi feita anteriormente, ou estará também voltada com suas preocupações para os Estados Unidos?
Dizendo isso e daqui pouco passando a palavra a cada um dos senhores, eu passo a palavra ao Senador Jorge Viana, para as suas indagações.
O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Sr. Presidente, Senadora Ana Amélia, convidados, queria cumprimentar e pedir desculpas também à Deputada Bruna Furlan, porque, para o voo que eu tenho, eu saí de casa ao meio-dia e só consegui chegar agora, estava viajando de avião. O nosso País é desse tamanho, tem fuso horário, tem mais uma escala, e foi o tempo que deu para chegar aqui. Mas que bom que eu pude vir, porque esse é um tema muito importante. Eu parabenizo o Presidente da nossa Comissão, Senador Fernando Collor, pela iniciativa.
Principalmente o Sr. Alex fez do jeito que pensamos em fazer mesmo, que era debater esse tema, porque acho que não há nada mais contemporâneo do que discutir um tema como esse, o que fazemos aqui, na Comissão de Relações Exteriores.
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Queria cumprimentar os embaixadores, diplomatas aqui presentes, servidores do Senado e assessores.
Eu só pude ver duas intervenções: a do Sr. Lucio e a do Sr. Alex, mas cumprimento o meu querido amigo Paulo Delgado e o Sr. Mathias.
Bem, eu fiz algumas anotações e espero aqui colaborar e, ao mesmo tempo, ouvir a manifestação dos nossos convidados.
Estamos vivendo essencialmente, e acho que não há como debater isso sem levar em conta, uma revolução tecnológica. Tivemos uma profunda mudança na maneira de nos comunicarmos. Isso veio com a internet e outros recursos decorrentes dela. Isso é um fato. Leva à quase extinção de veículos de comunicação que eram referência na sociedade - jornal escrito, por exemplo - e muda-se completamente, cada um tendo, como foi dito aqui, o seu próprio veículo de comunicação, o que põe em xeque uma série de instrumentos que fazia a sociedade se comunicar e se informar.
Nesta semana, nas páginas amarelas da Veja, você tem a entrevista com o Presidente da Telefônica, o Sr. José María Álvarez-Pallete. É muito interessante a entrevista, porque ele fala da tendência das coisas, do que vai acontecer neste mundo nosso do ponto de vista da comunicação. Ele fala, por exemplo, que o telefone, quando foi criado, demorou 75 anos para atingir 100 milhões de pessoas no mundo, e o joguinho Pokémon demorou menos de um mês para passar de 100 milhões de pessoas fazendo uso de um recurso. Então, é algo muito poderoso. Ele fala também que o telefone, um instrumento de que somos dependentes, vai desaparecer e vamos ter voz, a inteligência artificial, a internet das coisas, estabelecendo, enfim, uma nova relação.
Eu estou falando isso porque deve haver, sim, uma conexão muito grande sobre essa crise que estamos vivendo. Eu faço aqui um paralelo que podemos pegar no pretérito: primavera árabe, por exemplo, como se deu? Certamente, os meios de comunicação... É claro que nos perguntamos e tentamos nos informar, mas, nas monarquias, por exemplo, ela foi contornada, e, aí, entra uma questão religiosa, outros valores, mas aconteceu algo em países que pareciam impenetráveis. Então, temos o exemplo claro: a própria formação de grupos extremistas - Al-Qaeda e, agora, Estado Islâmico - que usam fortemente veículo de comunicação para chamar atenção do mundo para se impor. E rapidamente, de 2014 para cá, o Estado Islâmico já é hoje algo que está presente nos nossos pensamentos, nas nossas preocupações.
Eu não deixo de incluir nessas mudanças que estamos tendo... Por exemplo, aqui se está falando muito na França - não vou me aprofundar, nem é minha intenção -, mas, no próprio Reino Unido, agora vale o registro neste debate do movimento que está sendo feito, porque lá se estão antecipando eleições em três anos por conta de uma mudança que está ocorrendo na União Europeia. Está-se buscando o caminho de mais democracia para que se possa ver se pacifica um pouco o enfrentamento de um tema muito delicado, que é a saída deles da União Europeia.
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Eu acho que não podemos passar ao largo também das eleições dos Estados Unidos, não. Não, não chegou lá. Eu vi o Sr. Alex expondo. Acho que chegou fortemente. Fala-se muito por lá, com quem se conversa, que o Presidente Trump usou muito essa ferramenta para vencer as primárias no próprio Partido Republicano, usando máquina e fazendo com que pessoas que nunca foram votar - aí, é o sentido contrário; não é de repulsa, mas é um instrumento- foram lá participar das prévias do Partido Republicano, votaram pela primeira vez e garantiram um pensamento, um ideário que ele queria pôr em prática nos Estados Unidos.
Mas, nessa semana, nós ouvimos grupos parlamentares fazendo um movimento para tirá-lo do poder. A imprensa internacional começa a falar disso. Eu li a respeito nesta semana. Mas não tenho nenhuma dúvida de que, conversando lá e observando, há também algo que está em gestação. É visível a formação de castas, o que se pode ver em Nova York e em outros lugares: migrantes latinos fazendo determinado serviço, negros fazendo outro serviço, migrantes de outras regiões fazendo determinado serviço, e o operariado americano num descontentamento que pode explodir a qualquer tempo. Isso é dito por analistas de lá, de universidades, e pesquisadores, que colocam o que vivem.
Então, isso está contaminando todo o mundo. Temos casos como a China, que segue crescendo, com um regime mais fechado.
Mas, trazendo aqui para este nosso debate, é óbvio que eu gostaria de ouvi-los um pouco mais para saber qual é a tendência que estamos seguindo agora. O que pode acontecer no nosso País?
Sr. Presidente Collor, nós temos aqui um portal no Senado que analisa as propostas apresentadas e abre a votação para saber quantos são a favor e quantos são contrários. Estou trazendo isso porque a campeã aqui - e eu nunca fiz nenhum discurso sobre isso no plenário, nem dei entrevistas; talvez seja a segunda ou terceira vez que falo disso - é uma proposta minha. Acabei de confirmar aqui que ela tem uma votação, uma manifestação voluntária, de pessoas que foram lá e clicaram num botãozinho, no ranking de projetos do Senado, de 1.235.000 pessoas, que se manifestaram sobre a proposta que eu apresentei em 2015, a PEC 106, que está sem Relator na Comissão de Constituição e Justiça do Senado.
Minha proposta é de redução do número de Senadores, dois por Estado, em vez de três, como nos Estados Unidos que só têm dois por Estado. Eu tenho essa proposta há muito tempo, desde que eu era prefeito ainda. Por que nós não temos um numa eleição e outro numa outra eleição? Eu não fiz discurso e apresentei isso. Não tem Relator, não saiu de uma comissão e recebeu 1.235.000 manifestações, das quais 1.228.000 são favoráveis e 7 mil contrárias. Isso mostra bem o debate que alguém está fazendo, que a sociedade está fazendo.
A próxima manifestação é uma proposta sobre aborto, Senadora Ana Amélia: que o SUS deva cobrir abortos em determinadas situações. Há 400 mil manifestações, divididas metade/metade. Então, veja que se discutiram muitas propostas de 2 milhões de assinaturas, disso e daquilo. Sobre a minha, não foi feito nenhum discurso, eu apresentei e estou propondo uma redução do número de representantes aqui no Senado e na Câmara, também 25%; seriam 386 Deputados, com consequência nas assembleias e câmaras de vereadores.
E o apelo que vem da sociedade vem com força enorme. Certamente, por uma razão ou por outra, mas o meu propósito não é enfraquecer o Parlamento; é valorizar mais. Pelo menos é a minha intenção. Fica mais difícil ser Senador, fica mais difícil ser Deputado, fica mais difícil ser Deputado Estadual, fica mais difícil ser Vereador, e a minha intenção não é diminuir o papel da democracia representativa, é fortalecê-la, diminuindo custos e criando mais dificuldades para que se entre.
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Eu estou pondo essa situação porque eu acho que nós estamos vivendo uma fragilidade dos partidos, que me preocupa - todos! O que está ocorrendo com o meu Partido, o PT, com o PSDB, com o PMDB, com outras forças políticas tradicionais e que têm aí um certo pretérito é impressionante. E também tivemos as manifestações de 2013. Mas essencialmente nós estamos vivendo uma crise política tremenda, com consequências na economia e vice-versa.
E qual é a tendência do que nós vamos fazer? Ou quem vai se sobrepor ao quê? Nós estamos vivendo o fim da democracia representativa? Esse é um questionamento. Vamos ter democracia direta, substituindo? Os partidos vão ter que... O nosso Presidente falou muito bem até a respeito dos nomes, mas não são só os nomes, há uma mudança cultural nos partidos. E aqui eu não vejo nenhum movimento em nenhum partido propondo fazer essas mudanças, principalmente dos...
Eu conversei esta semana com o Presidente Lula lá em São Paulo, e eu propus isso, eu falei: "Presidente, eu acho que o PT, que está se renovando agora, tem que criar um grupo para pensar todas as mudanças e transformações, para que o PT possa ser um partido do século XXI, com todo o respeito ao histórico que tem". Mas eu não vejo os partidos trabalhando juventude, eu não vejo os partidos trabalhando esses recursos da revolução tecnológica, e não vejo também preocupações no sentido de serem outros partidos mais atuais para poderem seguir fortalecendo a democracia.
Eu gostaria de comentários nesse sentido aqui no Brasil. Eu sei que é difícil. Mas qual é a tendência? O que pode vir diante dessa situação que nós temos, de baixíssima credibilidade dos partidos, uma demonização da política, que, para mim, é muito perigoso, feito por veículos de comunicação poderosos, por setores da sociedade? Isso é muito perigoso. O que pode vir no lugar? Ou nós entendemos que esse modelo de arranjo partidário e político venceu a validade e temos que, enfim, encontrar mecanismo de trazer, como proposta de fortalecer a democracia, a modernização dos partidos, da nossa legislação, do nosso sistema político, por exemplo. Mas eu vejo que não há consenso. Nós não sabemos nem como vamos financiar as eleições do ano que vem, mas sabemos que uma série de alternativas são nulas, porque não cabem mais diante da situação que vivemos.
Então, são muitas variáveis postas e todos nós apreensivos. E se o povo for à rua novamente, como foi em 2013? Como é que fica? Então, eu gostaria de um comentário mais focado agora no Brasil, se fosse possível, quando do retorno à palavra para V. Sªs, que são ilustres convidados aqui desta sessão de debates.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Muito obrigado a S. Exª o Senador Jorge Viana.
Passo a palavra a S. Exª a Senadora Ana Amélia.
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Caro Presidente, Senador Fernando Collor, quero, antes, cumprimentá-lo por mais uma iniciativa que dá um enriquecimento muito grande no grau de informação pelos convidados que V. Exª tem trazido aqui. E quero agradecer a presença da ilustre Presidente da Comissão de Relações Exteriores, que enfeita a Mesa, não há dúvida.
Eu queria cumprimentar os embaixadores, que estão dando prestígio a esta audiência aqui, em um tema tão cadente, que não é apenas da França, da eleição americana, da eleição no Brasil ano que vem; certamente, nos países que aqui estão representados pelos seus embaixadores, os dilemas são os mesmos.
Eu só faço um corte para o Senador Jorge Viana: não será com lista fechada que a gente vai melhorar o conceito do eleitor sobre o sistema político.
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O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC. Fora do microfone.) - Não estou defendendo...
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Não, eu estou só falando...
O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC. Fora do microfone.) - Igualmente sou contra.
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - É só para...
Mas eu queria... Presidente, aproveitando para cumprimentá-lo, porque as perguntas que V. Exª fez, relacionadas ao resultado da eleição na França, abordaram três pontos: o desemprego, a imigração e o terrorismo.
Eu faço este corte agora, porque queria... A pergunta é para os convidados, até com base no título deste ciclo: estender pontes ou erguer barreiras?
Houve uma reação, para mim surpreendente, nas redes sociais, contra a aprovação pelo Congresso Nacional da Lei de Migração.
Então, queria aproveitar, porque está dentro desse sistema: por que, na visão do Lúcio, do Paulo Delgado, do Alex e também do nosso Mathias, essa reação num País que tem, digamos, uma generosidade muito grande na acolhida.
Sou de um Estado, o Rio Grande do Sul, que tem fronteira com a Argentina, com o Uruguai. Temos a convivência extraordinariamente construtiva e pacífica de árabes, judeus, palestinos, todos, sem falar na história da construção do nosso Estado em relação à imigração italiana, alemã, portuguesa, espanhola, polonesa, húngara.
Então, queria uma palavrinha de cada um sobre por que essa reação, hoje, na sociedade brasileira, a essa lei.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Muito obrigado a S. Exª a Senadora Ana Amélia.
Passo agora às respostas a todas as indagações feitas, começando pelo professor e sociólogo, ex-Deputado Federal Paulo Delgado.
O SR. PAULO DELGADO - Presidente, muito obrigado.
Senador Jorge Viana, Senadora Ana Amélia, amigos de longa data, muito obrigado pela presença.
Senhoras e senhores, acho que não há nenhum senhor do destino do mundo. Esse é um dado importante que a eleição francesa só confirma.
Quem insistir no papel de líderes tradicionais para o debate com a sociedade vai fracassar. Isso está ocorrendo em praticamente todas as instituições. Não há o poder de forjar a realidade. Você não forja a realidade com discurso político.
Quando se fala "mas Churchill conseguiu segurar o sentimento mundial de luta contra a opressão e contra o nazifacismo numa rádio, na BBC", mas ali havia um componente de solidão da Inglaterra, do Reino Unido, da Grã-Bretanha, que não tem a ver hoje com o Brexit. Aquilo é um anti-Churchill. Se Churchill estivesse vivo, provavelmente não deixaria ocorrer aquilo, porque o que houve na Inglaterra foi uma covardia do Primeiro-Ministro, porque não se pergunta ao povo tudo. A autoridade não pergunta ao povo tudo. Ela é eleita para responder. Ela tem que ter coragem de dizer: "É esse o caminho. Fui eleito, porque é esse o caminho". Mas, não, quis fazer uma demagogia de achar que é mais popular consultar as pessoas sobre os seus sofrimentos, as suas angústias, as suas dúvidas. Por isso existe a intermediação política, ou seja, porque as pessoas não têm força para sozinhas pensarem em todos os fatores que estão por trás da decisão de um governante.
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Esse é o grande problema. A pessoa está lá na casa dela vendo televisão, agora está com a Internet, está no celular, está num congestionamento vendo televisão, está lendo um livro, está fazendo tudo hoje, congestionado na Marginal, em São Paulo, ou aqui na Epia, na nossa querida capital. Em todo lugar há alguém em um congestionamento agora conectado com o mundo todo, mas ele não sabe por que não se declara guerra. Mas ele quer que declare! Mas ele não sabe por que um Governo é obrigado a fazer uma determinada lei aparentemente impopular. Esse é o grande problema que fez o Hollande, um governo de esperança, não conseguir nem ser candidato; que fez os gaullistas, que tiveram importância grande na França, irem perdendo apoio na França; e vai fazendo os partidos tradicionais desaparecerem do universo. Ou seja, há uma crise na obediência voluntária ao Estado.
Ninguém foi chamado para ser cidadão, em nenhum dos nossos países, nem no nosso Brasil, nem nos países dos senhores do corpo diplomático que estão aqui, ninguém nos nossos países foi chamado para ser compulsoriamente patriota. Nós só somos patriotas voluntariamente. Todo governo que quis fazer um povo, em ordem unida, ser nacional, fracassou. Felizmente fracassou.
Então, menos confiança no discurso político, esse é um bom sinal, e mais confiança na sinceridade política, na maneira como uma pessoa colhe flores e dissabores na vida pública. Quem consegue ver isso...
Por isso que, como eu falei, o fato de esse jovem de 39 anos ser casado com uma professora de 64 anos é o mais importante da eleição francesa. Não há outro fato mais importante, porque o sentimento mais forte que existe hoje no mundo é o despertencimento, é o desamparo na velhice.
A ONU, por exemplo, atrapalha a reforma da previdência no Brasil porque insiste que terceira idade começa com 60 anos. É preciso que a diplomacia, o Itamaraty vá lá e mande a ONU parar com isso. Como é que uma pessoa de 60 anos é um velho? Isso não deixa as pessoas em casa raciocinarem com a reforma da previdência.
Ninguém no Brasil está propondo que as pessoas não se aposentem, está propondo que as pessoas não se achem inválidos novos. Não é possível uma pessoa ter medo de uma reforma que diz: você vai entrar, sim, mas vai entrar melhor com um pouco mais de idade, você não precisa entrar tão novo na aposentadoria. Não é possível que não se consiga fazer esse debate sensato com a sociedade brasileira.
Então, eu acho que as pessoas estão em dúvida, Presidente, se querem ser governadas pelos governos. Elas querem ter pai, mas elas não querem ter qualquer pai. Elas querem ter marido, querem ter mulher, querem ter filho, mas não querem ter qualquer filho, ainda que você não possa abandonar seus filhos. As pessoas estão querendo outra coisa, e a política não está conseguindo responder ao que as pessoas querem. Por que eu acho isso? Porque a política transformou o Estado numa entidade de sacrifício. A Igreja é uma entidade de sacrifício em muitas religiões, aí as pessoas abandonaram a Igreja, porque eu vou lá para ouvir uma prece que pegue a minha alma, a minha subjetividade e me faça falar com Deus e vem um padre e solta uma nota política falando do governo. Ora, ele que procure outro lugar para fazer isso. Não estamos em guerra, ninguém está sendo recrutado para defender alguma coisa, estamos em paz, estamos na democracia.
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Então, é preciso distensionar o sistema mundial para que as pessoas possam separar bem quais são hoje os inimigos do mundo. Quem hoje realmente atrapalha o avanço da democracia? Aí, a primeira coisa que eu vejo é que a França mostrou esse caminho e que a Inglaterra não mostrou. Existem dois sistemas coexistentes no mundo: um é a política; o outro é a economia. Nenhum dos dois tem uma autoridade global com capacidade de dar conta, calar a boca do mundo e dizer: "É isso que você tem que falar". Só que o sistema econômico está mais justo do que o político, porque ninguém precisa de pedir a uma empresa de celular que ela evolua, não há necessidade de elogiarmos o avião - temos que criticar a Infraero, porque o avião voa, ele melhora, ele avança, o que não funciona é o Estado, na hora de ele pousar. Ou seja, os telefones vão evoluir; se o Governo entrar, param de evoluir. A vacina vai avançar; se o Governo entrar, não sai vacina.
Esse é um fenômeno mundial, gente, não é só aqui não. Todos os países do mundo estão cansados de governo e estão cansados de governo caro, estão cansados de políticos caros. Por que esse menino do Uruguai é tão popular? Porque é um Presidente barato. Eles ficam passeando com ele aí pelo mundo todo, porque é um Presidente barato. Ninguém passeia com um Presidente rico. Agora a França pegou um menino rico, Rothschild, associado com o grupo financeiro mais sofisticado do mundo, importante e sério, um grupo perseguido. Ele faz tudo que ele tem que fazer, provavelmente olhando pesquisa de opinião, para se tornar um Presidente palatável; ele arruma um partido que não tem nome, chama isso... E o Presidente identificou bem, é um "Allons enfants de la Patrie", é um negócio "vamos lá, moçada". O hino francês é um perigo: é bom de ouvir, mas não é bom de ler, porque não tem nada daquela situação mais, aquela menina com aquelas bandeiras, em cima, o Delacroix na revolução de 1830, que é até 40 anos depois da Francesa, mas é um ambiente mais ou menos semelhante.
Ou seja, hoje três quartos da população mundial vivem em 25 países, esse é um dado para raciocinar para ver a situação que está no mundo. Esses 25 países têm mais de 50 milhões de habitantes. Nesses 25 países, estão ocorrendo as grandes transformações do mundo. E as grandes transformações do mundo têm hoje um grande e principal inimigo, e esse grande inimigo é o terrorismo. Por quê? O terrorismo não permite restaurar distinção entre combatentes e não combatentes. O terrorismo transforma a sociedade em uma sociedade militar. O terrorismo transforma a sociedade em soldados: todos morrem. O recrutamento civil que o terrorismo faz é o mais covarde do mundo. É diferente do recrutamento militar obrigatório; no voluntário, a pessoa decide ser soldado. A maioria decide pagar impostos e ser civil, mas confia nas Forças Armadas de seu país. Aí, vem um movimento internacional, por motivos os mais difíceis de entender, porque são os mais fáceis de compreender. Os motivos mais difíceis de entender são aqueles que você só entende na hora. As pessoas mais difíceis de entender são as simplórias, são as ingênuas, são as que parecem não ter maldade, porque toda pessoa é sofisticada. Deus deu a todas as pessoas um grau de sofisticação, e você é capaz de respeitá-las e é capaz de entendê-las. O terrorista, não. O terrorista é simples. O raciocínio dele é muito simples: isso aqui está de um jeito, eu não quero isso aqui, vou fazer isso e acabar com isso aqui.
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Esse movimento terrorista criou um grau de indefinição no mundo e ele detém a globalização. Ele é que está dando um grau de periculosidade excessiva ao progresso econômico. Quanto mais o progresso econômico avança, mais o terrorismo se apropria do avanço econômico. E, quanto mais a democracia abre, mais o terrorismo fecha.
Os Estados Unidos foram vítima da democracia americana. O 11 de Setembro foi uma covardia do terrorismo internacional contra um país aberto. Qual foi a consequência? Câmeras de vigilância no mundo todo. Então, não é possível as pessoas terem boa vontade com isso. Hoje, nós estamos num mundo dominado por câmeras de vigilância em todos os lugares, porque uns grupos minoritários de diversos países não aceitam o mundo sem superpotência. Os terroristas são reacionários: eles querem, de novo, União Soviética e Estados Unidos. Eles querem guerra fria, e nós, não; nós queremos mundo morno, democrático, estável, previsível.
Então, eu tenho muita esperança no governo francês. Por quê? Porque eu não tenho esperança nenhuma. Porque é um governo normal; é um homem normal, um jovem que estudou, esperto, capaz de captar como a França está pensando.
A mesma coisa: a incompreensão em relação ao Trump, qual é o motivo? Zombaria. A zombaria transforma uma pessoa em violenta, seja ela rica, seja pobre. A zombaria não pode ser uma forma de relação política. E zombaram do Trump. Aí, ele: "Ah, estão rindo de mim?". E foi lá para a roça um jeca-tatu americano, rico e esnobou a Nova York erudita. A outra, a Hillary, excelente pessoa. A Hillary é uma pessoa formada, capaz. O Clinton, com experiência de governo, esnobe, esnobou os Estados Unidos. Não gostava de falar com os descamisados, os abandonados da América, os imigrantes.
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Então, eu acho que hoje o que está faltando é restaurar a distinção entre valores universais fundamentais, que a eleição francesa mostrou que quer restaurar, de unidade da Europa, e enfrentar as minorias que não aceitam o sistema democrático global.
Eu acho que aí é que se pode explicar um pouco isso de os brasileiros não entenderem que nós temos, sim, que abrir as portas para estrangeiros outra vez. Só que devemos abrir talvez como Dom Pedro fez, no século XIX, escolhendo áreas da economia brasileira onde as pessoas poderiam vir trabalhar no Brasil, qualquer que seja a origem dos países deles: "Aqui nós temos essa região brasileira, temos essa outra região. Você quer vir para cá com a sua família trabalhar? Nós vamos ajudar você a vir para cá". É uma migração qualificada, e não a portas abertas, em que o Brasil vire um tipo de hospital do mundo ou uma Cruz Vermelha mundial - o que também pode ser uma posição em períodos de guerra, mas, no momento, nós estamos em período de paz.
Vamos botar isto na cabeça: o mundo está em paz. Nós temos guerras regionais, nós temos guerras tribais, nós temos guerras étnicas, nós temos confrontos. Por quê? Porque nós temos armas de graça no mundo distribuídas. É preciso fazer um controle do armamento mundial, diminuir um pouco da produção. Mas o problema é uma contradição: a tecnologia de segurança e defesa produz mais avanço na tecnologia mundial do que qualquer outra tecnologia. Essa contradição não se resolve. Desde Caim e Abel que essa contradição não se resolve. O desejo de combate e de confronto no homem é maior que o desejo de paz. É uma característica do ser humano. Os governos estão aí para impedir que isso seja uma regra. É uma característica, mas não devia ser uma regra.
Então, Presidente, na minha fala, assim, embora meio a contra-apelo... Porque eu acho que o Brasil vai viver um momento muito bom em 2018, daqui até 2018, porque não existem estruturas permanentes onde se possa encaixar a história das sociedades. Não há estrutura permanente, não está nada pronto e acabado. E é evidente que eu gostaria de viver num país que ficasse pronto, mas o Brasil é igual a obra de igreja: nunca fica pronto. Então, como o Brasil nunca fica pronto, nós podemos ajudar o Brasil a arrumar melhores pedreiros, a arrumar melhores engenheiros, a arrumar melhores construtores, que respeitem a vizinhança, que respeitem o direito dos outros, a lei do silêncio, há a violência.
Há vários caminhos que o Brasil pode adotar, que eu acho que a França procurou: "Vou por aqui. Se o seu caminho que você me dá é esse aqui - é como uma poesia portuguesa -, não vou por aqui; eu vou aqui. Sigo por onde manda meu coração, que é o meio". Eu acho que o caminho é o meio. É pelo meio que as sociedades vão avançar.
Em relação à internet...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PAULO DELGADO - Eu acho que é isso, Senador Jorge Viana. Os partidos perderam muito da influência na sociedade porque eles têm uma característica muito forte de hierarquia, burocracia e lideranças estáticas. Isso acabou.
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Eu fiz até uma seleção aqui, porque eu fiquei impressionado com o número de nomes. Olha aqui: Aliança 90, Esquerda Verde - eu não sabia que existia; eu sabia que a esquerda era vermelha, mas apareceu uma esquerda verde agora na Itália -, Podemos e Ciudadanos, Movimento pela França, Frente Nacional, Republicanos em Marcha, Casa da Liberdade - vocês sabem o que era antigamente no Brasil a Casa das Liberdades fáceis -, Escolha Cívicas, Itália de Valores, Liga do Norte, Movimento Cinco Estrelas, Fiador das Listas Cívicas. O que fez o Movimento Cinco Estrelas se tornar um movimento forte na Itália? Ele nasceu com uma pessoa que passou a chancelar uma lista, em que ele dizia que ali estavam os bons da Itália. Ele chancelava a lista cívica. Imaginem se aparecer um cara desse no Brasil! Há vários que tentam: "Vou fazer um movimento e eu vou dizer quem é bom, quem é ruim", as listas cívicas. Isso são caminhos de raciocínio de enquadramento.
Então, eu acho que o Brasil vai ter que dar uma freada de arrumação na questão partidária brasileira e fazer um acordo entre os partidos talvez, um fórum de partidos. E sabe uma coisa que eu acho que o Brasil deveria fazer? Pedir ao TSE que interfira menos. Criar um fórum de partidos políticos tripartite: um pouquinho de TSE, um pouquinho de partidos políticos e um partido de organizações civis, para que se análise fundo partidário, campanha, se vai haver televisão, se não vai haver. "Não; não vai ter televisão este ano. Vamos fazer uma experiência de uma eleição sem televisão, só com debates." Como na França, tem que haver três, quatro debates, ou nos Estados Unidos, dois, quatro debates. Está faltando criatividade entre os próprios partidos políticos para analisarem o seu conteúdo.
E, é evidente, eu não vejo outra saída: tem que haver cláusula de barreira. Não se pode chamar cláusula de desempenho; é cláusula de barreira. Nós podemos ser multipartidários, nós podemos ter mais de cem partidos no Brasil, não sou contra, mas nós não podemos deixar que todos entrem no sistema nacional. Só pode entrar no sistema nacional quem tem voto. Então, é ampla a liberdade partidária no Município. Quem tiver um determinado número de votos no Município entra no sistema estadual, disputa a eleição estadual. Quem tiver um determinado número de votos no Estado disputa o sistema nacional. E, com isso, dos cem partidos, haverá sete ou oito. Isso é o sucesso do sistema eleitoral alemão. Foi isso. De certa forma, o inglês, por causa do voto distrital, o que eu não acho que sirva para o sistema nacional brasileiro.
E aí eu defendo que, nessa eleição de 2018, por causa dessas características de partidos, eleitorado e essa fragmentação doentia do sistema partidário brasileiro, que as Srªs e os Srs. Deputados e Senadores brasileiros autorizem o Deputado avulso. Vinte por cento dos Deputados poderiam ser avulsos. E os partidos políticos comunicariam à sociedade: "Eu aceito um Deputado avulso". E o que seria um Deputado avulso, um político avulso? Um político barato: "Eu aceito ser Deputado para cuidar de temas específicos". E acho que aí, se os partidos aceitassem ter avulsos, personalidades, pessoas chanceladas pelo sistema partidário - porque eu acho também que nós não encontramos ainda outra forma que não seja a partidária, e não dá tempo de fazer essa outra lei, mas pessoas chanceladas pelo sistema partidário -, uma parte da sociedade pode ser avulsa, inclusive o Presidente da República, como foi na França. Ele é um candidato avulso. Embora tenha sido Ministro da Economia, embora tenha vindo do mundo político, ele é um presidente avulso. O Presidente francês é avulso, com o charme do Presidente avulso.
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Então, sou um otimista também, mas eu acho que nós estamos numa situação de mudança assustadora no sentimento mundial. E essa mudança assustadora no sentimento mundial é porque o povo está percebendo que é cada vez maior o número de regiões não operacionais do Estado e é cada vez maior o número de situações num país que não têm o controle do Estado nacional. Ou seja, há uma agenda delinquencial nos países que está saindo do controle. O terrorismo é muito bem identificado, mas há muitas outras agendas que não estão no controle.
No caso do Brasil, é só observar o sistema prisional brasileiro. Quem controla o sistema prisional brasileiro? Ninguém; os presos controlam, os encarcerados, os que estão lá dentro é que estão controlando o sistema prisional. Isso é um risco para a democracia brasileira. Em vários países, os grupos armados, a venda de armas, o tráfico de drogas, tudo isso está sem o controle do sistema nacional, na maioria dos países do mundo, criando riscos, vigilância... O excesso de vigilância privada está substituindo a vigilância pública em várias sociedades, e mesmo no Brasil, um país estruturado, organizado, um dos mais estruturados da América Latina. Hoje, a vigilância privada no Brasil já compete com a vigilância pública.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Muito obrigado ao professor e sociólogo Deputado Paulo Delgado pelas suas respostas.
Passo agora a palavra ao Prof. Dr. Mathias Alencastro.
O SR. MATHIAS ALENCASTRO - Obrigado, Presidente.
Só um comentário em relação à fala do Deputado: acho que vale a pena esclarecer que, ao contrário dos Estados Unidos, onde a primeira-dama tem estatuto jurídico e os eleitores elegem um casal, como a Hillary e o Bill Clinton, o casal Obama, e têm uma visibilidade pública sempre como casal, a primeira-dama francesa não tem estatuto jurídico. Portanto, ela é uma pessoa privada. A relevância política dela é nula. Depois, pode-se falar longamente sobre o papel dela, mas é tudo do fórum da vida privada, e não da vida pública, ao contrário dos Estados Unidos.
Em relação às perguntas que foram feitas, acho que já podemos antecipar que o governo Macron vai ser uma síntese dos candidatos, dos deputados republicanos, de centro-direita, e os deputados socialistas, de centro-esquerda liberais. Já existe um racha em curso dentro desses partidos entre aqueles que defendem uma reforma mais profunda do Estado e aqueles talvez mais nacionalistas à direita ou mais estadistas à esquerda. Essas dissidências internas estão se concentrando agora, e já começamos a ver um movimento de muitas lideranças desses partidos que estão batendo na porta do Emmanuel Macron, que teve a visão tática de fazer uma obstrução, de montar, digamos, um cordão sanitário entre o movimento dele e os partidos tradicionais até a sua eleição, mas obviamente ele agora é obrigado a compor, e as negociações vão começar.
O que nós vemos agora é uma tendência para uma reestruturação do sistema político francês entre uma esquerda muito mais ligada ao Mélenchon do que ao Partido Socialista.
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O grande feito das eleições é que o Partido Socialista fez 8%, o candidato à presidência do Partido Socialista, enquanto o Mélenchon fez 20%. Então, há exatamente uma inversão dos resultados entre a extrema-esquerda e a social-democracia tradicionalmente. Normalmente, a extrema esquerda faz 6% e os socialistas fazem 20%. Agora, é exatamente o contrário. Então, vai haver uma tendência de cooptação da esquerda que não vai se alinhar com o Macron pelo Mélenchon, e a direita, a centro-direita vai ficar esmagada entre o Macron e a extrema-direita.
Então, existe o risco, digamos de "lepenização" da direita francesa, que vai recusar participar do governo Macron. Aí, a paisagem política seria uma esquerda mais radical do que a social-democracia francesa em torno do Mélenchon, um centro em torno do Macron, e uma direita em torno da Le Pen. Essa é a tendência. Nós vamos ver se ela vai se confirmar ou não nas eleições legislativas.
Em relação ao paralelo Trump-Macron, eu o acho muito interessante, porque as diferenças são muito maiores do que as semelhanças. O Trump é um não-político com partido; o Macron é um político sem partido. Então, na verdade, eles são exatamente o contrário.
O Trump, digamos, é uma síntese do que podemos chamar de candidatos hollywoodianos à política americana - tanto o Reagan quanto o Schwarzenegger, que foi duas vezes governador na Califórnia - e da extrema-direita americana, que criou um elo com ele, um elo até surpreendente no começo, para montar uma plataforma eleitoral e ganhar as prévias dos republicanos. O Trump presidente está se revelando muito diferente. Ele já está se afastando bastante dessa extrema-direita conspiracionista que o apoiou durante as eleições.
No caso do Macron, ele é exatamente o contrário. Ele é um puro produto da administração pública francesa, galgou todos os andares da meritocracia republicana e, ao mesmo tempo, criou um elo muito forte com o setor privado, porque trabalhou no banco Rothschild. Foi uma passagem de cinco anos na vida dele, quer dizer, muito menos relevante do que a vida dele na administração pública, mas que foi essencial para ele se apresentar como uma correia de transmissão entre o Estado e o setor privado. E foi isso que atraiu, que permitiu a ascensão muito rápida dele.
Vale a pena reiterar que a França já teve um presidente centrista nos anos 70, o Valéry Giscard d'Estaing. E o François Bayrou, que quase chegou ao segundo turno por duas vezes, hoje é uma figura chave do futuro governo Macron. Então, as novidades têm todas raízes históricas, a gente pode dizer.
Em relação à pergunta do Senador sobre o foco no Brasil. Eu não conheço quase nada de política eleitoral, mas eu acho que o que aconteceu no Brexit, com o Trump e agora na França também mostra que, apesar de as redes digitais desempenharem um papel cada vez mais importante, os instrumentos tradicionais continuam indispensáveis. O En Marche, movimento do Macron, foi muito bom para mobilizar os jovens com as redes sociais, mas os jovens, depois, fizeram política tradicional: fizeram porta a porta, organizaram eventos em pequenas cidades, discussões particulares. Foi uma política, foi uma campanha muito tradicional. No caso do Trump, foram as rádios que fizeram a diferença. Nas redes sociais, a Hillary estava liderando, porque a máquina do Obama era muito sofisticada nessa área, mas foram as rádios que fizeram realmente o trabalho de fundo de difusão das ideias do Trump. No caso do Brexit, como é sabido, foram os tabloides ingleses tradicionais, muito lidos pelos aposentados, que fizeram uma campanha constante a favor do Brexit e que fizeram a diferença no voto final. Então, inovação, sim, mas a tradição persiste ainda muito na política a meu ver.
Obrigado.
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O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Muito obrigado ao Prof. Dr. Mathias Alencastro.
Passo a palavra agora ao Prof. Alex Canuto.
O SR. ALEX CANUTO - Muito obrigado.
Eu queria começar com os questionamentos do Senador Jorge Viana. Realmente temos talvez o que se dê para chamar de crise de representatividade, que seria a nossa sociedade não se sentindo representada pelos partidos políticos, que deveriam ser os focos de debates, de ideias, de produção de novos conceitos, de inovação de políticas públicas... Nós não temos isso hoje.
Tivemos no Brasil, talvez em caráter de exceção, não sei, talvez me fuja aqui à memória outro exemplo histórico, mas nos anos 80 até o partido de V. Exª cumpriu muito esse papel de ser um catalisador, primeiro, de voluntariado. V. Exª estava lá, com certeza viu o que era - eu fazia movimento estudantil nos anos 90 e senti um pouquinho disso aí também -, viu como catalizar voluntariado. As pessoas iam porque acreditavam nas causas, discutiam políticas públicas, e dali surgiram ideias, certas ou erradas, boas ou ruins, aí vai do critério de cada um, mas o partido cumpria esse papel.
Hoje, a gente tem que reconhecer, não é mais inovador, esse partido perdeu essa função, e nenhum outro partido ocupou esse lugar. Não é que surgiu uma ideia nova que superou. Simplesmente houve uma estagnação. E hoje quem quer discutir às vezes a política pública não procura um partido; procura ou uma organização não governamental ou quiçá alguma outra entidade da sociedade civil, movimentos que vêm surgindo, mas não está buscando... O que fazer para isso?
O único ponto que eu vejo é o seguinte: você tem hoje partidos mantidos artificialmente. Eu citei aqui na minha fala - posso estar enganado, não sou dono da verdade - que uma das coisas que sustentam partidos artificiais é o fundo partidário. Há um recurso aí para o partido se manter, há um tempo cativo na televisão para ele falar, sem ter a representatividade. Chega na hora do voto, como o voto no Brasil é obrigatório, o eleitor tem que votar aqui ou ali e acaba tendo que escolher alguma opção. Aquele partido tem uma quantidade "x" de votos, mas o quanto que ele mobiliza de militância e de voluntariado? Isso ele não tem.
Na minha modesta opinião, se não houvesse isso, os partidos só sobreviveriam se eles tivessem voluntariado. E aí, quando a gente coloca a pirâmide da representação, eu me refiro ao meio da pirâmide. Talvez o termo elite política não seja bom, mas a gente tem, vamos dizer assim, os representantes populares, a militância e a sociedade engajada no meio, e o povo embaixo. Às vezes você tem um partido artificial. Ele tem algum representante direto e depois tem votos - de alguma forma ele consegue votos, por dinheiro ou porque na eleição a população não tem opção -, mas não tem o miolo, não tem a militância.
Para ter isso, o partido precisa ser um campo que atraia, que atraia pessoas. E para isso nós precisamos que haja um decantamento na política brasileira e que só sobrevivam partidos que tenham essa característica. É a minha modesta opinião, mas eu acho que ainda há muito a se discutir, a amadurecer em propostas sobre o que fazer nesse sentido.
Comentando também brevemente as colocações da Senadora Ana Amélia, quanto à imigração, eu acho até que o ex-Deputado aqui, Paulo Delgado, colocou muito bem quando citou o exemplo...
(Intervenção fora do microfone.)
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O SR. ALEX CANUTO - A questão que o Deputado Paulo Delgado colocou sobre D. Pedro I, que fez a imigração... D. Pedro II, perdão. Acho que a palavra é organização; era uma migração organizada. Precisamos de gente, queremos gente para trabalhar aqui. Estamos precisando para trabalhar, aqui e ali, e queremos contar com pessoas. O Brasil é formado por imigrantes, então queremos contar...
O que acho que as pessoas estão reclamando - suponho, não conheço detalhes desse movimento que aconteceu em São Paulo e, confesso, também que não li todo o projeto de lei, então falo mais de forma abstrata, mas imagino que o descontentamento seja porque a impressão que se passou é a de estar virando a casa da mãe joana, do tipo em que entra qualquer um.
Eu acredito, até de forma otimista, talvez - não sei se exageradamente otimista -, que a migração, a imigração organizada... A nossa sociedade tem a tradição de ser aberta a isso, até porque muitos brasileiros imigram para outros países. Miami hoje é o que está na moda, mas existem outros países para os quais brasileiros imigram. E são bem recebidos nesses locais, porque vão lá para contribuir, para absorver a cultura local. Acho que qualquer imigrante que venha para colaborar, que não venha...
O problema é que a crise econômica também sempre passa aquela sensação de que vão tomar os empregos dos brasileiros, de que vai cair o salário por oferta excessiva de mão de obra. Mas acho que, trazendo de forma organizada...
Nós temos, por exemplo, uma estratégia de ocupação da Amazônia para defesa das fronteiras. Por que não trazer imigrantes, assim como foi trazido no passado para ocupar a fronteira sul? Na época ainda colonial, o Brasil tinha Portugal com Espanha, e depois o Brasil herdou essas disputas com a Argentina e outros países. Hoje temos que ocupar a Amazônia. Isso é uma diretriz de defesa nacional. Por que não trazer imigrantes para o Brasil, para cumprir esse papel, por exemplo?
Acho que há o que se discutir em relação a isso, e há que se esclarecerem mal-entendidos, no sentido de achar que o Brasil está virando a casa da mãe joana. Pelo que pouco que vi na imprensa, também há um certo controle. Não se aceitam, por exemplo, estrangeiros que foram expulsos do Brasil. A lei não permite que se aceite de volta. Há um certo controle. E tem que haver organização. Acho que ninguém quer fazer uma festa na sua casa, para, tendo programado para 100 pessoas, virem 300, e não haver comida para todo mundo. Acho que o temor é mais por aí, na minha modesta opinião.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Grato ao Prof. Alex Canuto pela sua participação.
Passo a palavra agora ao Prof. Dr. Lucio Rennó.
O SR. LUCIO RENNÓ - Muito obrigado, Presidente.
Vou tentar me ater aqui às perguntas feitas pelo senhor e pelos Senadores aqui presentes. Agradeço as perguntas.
O senhor começou sua fala com uma provocação, no sentido de arguir por que Le Pen não teve mais votos do que teve de fato, dadas as circunstâncias. Eu diria que ela nunca teve tantos votos antes assim. Se olharmos historicamente, houve sim um crescimento do apoio eleitoral a essa alternativa mais radical que se coloca na França. Ela chegou a quantos? A 23%, 24% no primeiro turno, se não me engano, algo assim, comparados com os 17% que havia tido nas eleições anteriores. Há um aumento disso e, depois, um ganho residual, mas significativo, chegando-se à casa de quase 35%.
Então, é relevante. Eu não diria que não é. Isso sinaliza que é uma força que estará presente nas disputas eleitorais francesas daqui para frente e, em se dando as circunstâncias, o conjunto de fatores combinados, ela se torna um potencial, uma força eleitoral com bastante potencial dentro do cenário eleitoral francês. Então, eu inverteria um pouco a lógica do argumento. Acho que ela teve muitos votos, muito mais do que normalmente tem, dadas as circunstâncias.
A questão do abstencionismo eleitoral - não só a não presença, o não comparecimento, mas também os nulos e brancos inseridos - aumentou significativamente na França. De fato, na França, eu não conheço o histórico disso, não sei se foi muito superior ao que normalmente já é. Então, esse é outro sinal, na verdade, de que, no caso, nenhuma das duas alternativas representava os interesses daquela parcela bastante relevante da população.
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Já nos Estados Unidos, o abstencionismo é muito alto historicamente. Ele não foi um fato novo, com o Trump, apesar de ele ter sido mais alto nessas últimas eleições do que em anteriores. Então, nos Estados Unidos, há uma parcela da população que não participa do processo eleitoral em torno de 35% a 45% da população. Isso não é novo nos Estados Unidos.
Por isso, eu volto a insistir, Senador, que o quadro nos Estados Unidos é de uma grande estabilidade de domínio dos dois partidos principais, os republicanos e os democratas, que se cristalizam cada vez mais. E há uma parcela significativa da população que não se vê representada por nenhum desses e que, até onde eu sei, não encontrou outra alternativa.
O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Sr. Presidente, só para enriquecer.
Nesse contexto, nós tivemos o caso Sanders lá, que foi uma novidade, com um discurso completamente diferente dos dois polos que sempre se colocam. E dizem... Eu estive lá e ouvi muitos comentários de jovens, pessoas que conhecem bem falando que, se fosse ele, talvez o resultado fosse outro.
Eu queria que você comentasse um pouco como é que fica lá nos Estados Unidos um discurso completamente diferente do que a gente vê no processo eleitoral, com dois polos bem definidos, representando bem os republicanos e os democratas. Vem o Sanders, com um discurso diferente, novo e que mexeu na política dos Estados Unidos, e alguns chegam ao ponto de dizer que, se ele passa...
E ele estava pendurado nas redes sociais. Ele fez um movimento fora dos veículos convencionais - e aí vale a pena também considerar isso -, lá nos Estados Unidos, que tem tudo isso que você está pondo.
O SR. LUCIO RENNÓ - A questão do Sanders é de fato interessante, como essas eleições foram de fato interessantes, porque Trump também representa a mesma coisa. Ele não é um republicano convencional.
Então, sim, denota um grau de saturação, de insatisfação da população com o mainstream, o que a gente está vendo em todos os países que nós estamos analisando. Ainda assim, ambos competiram por dentro da institucionalidade partidária - isso não podemos negar -, um mais à esquerda do que é a média do partido democrata, e um mais à direita talvez do que fosse a média do partido republicano, mas ainda assim buscaram o caminho institucional. Acho que essa é uma marca que nós não podemos negar no caso norte-americano.
E aí o ponto, Senador, é que os mecanismos de intermediação de interesses nos Estados Unidos, através dos partidos políticos, são mais consolidados do que na França ou no Brasil. Então, a crise, essa dita crise de representatividade dessas instituições, é mais aguda em outras partes, eu diria, do que nos Estados Unidos, sem negar a importância da emergência de novas tecnologias de informação, de comunicação, de novos mecanismos, que são apropriados inclusive por esses partidos. De novo, partidos políticos nos Estados Unidos, como no mundo todo, têm se apropriado dessas novas tecnologias para fazer avançarem as suas agendas econômicas, sociais ou o que quer que seja.
Então, é importante mencionar. Acho que esse abstencionismo - este era o ponto que eu ia enfatizar - representa, sim, um desvinculamento da população, de uma parcela relevante da população com os mecanismos tradicionais de política. E aqui eu estou falando de uma crise de legitimidade das instituições tradicionais da política. Isso não quer dizer que não haja outros mecanismos de intermediação de interesses que possam emergir e que se voltam para uma questão muito mais de uma atuação mais direta da população, sem tantas intermediações.
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O último ponto da sua fala que quero tocar é a questão, Presidente, do acordo para governar, do que será o Governo daqui para frente.
Vamos olhar de novo para o caso do Trump. Ele não consegue governar sem os republicanos. As suas posições serão necessariamente moderadas. A sua agenda será necessariamente controlada pelo mainstream do Partido Republicano. Foi assim na votação agora do Obamacare, em que ele ganhou por um voto. E ainda houve 20 Deputados republicanos que votaram contra - Deputados ou Senadores? Foi junto? Não. Foi na Câmara agora. A partir da intervenção direta do Partido Republicano, inclusive moldando a própria agenda de discussão, a pauta do debate sobre o sistema de saúde americano, ele conseguiu avançar algo. Não vai ser diferente para todas as demais votações, como é em qualquer regime democrático: você tem que negociar, tem que construir a sua maioria. E Macron vai ter um grande desafio na construção dessa maioria, que vai contar - eu concordo com o Mathias - com elementos da esquerda e da direita moderados. Ele vai buscar um caminho centrista óbvio. Não vejo muito como fugir disso.
Com relação à pergunta da Senadora... E não sei se respondi sua pergunta integralmente, Senador. Se não, a gente pode voltar a ela, porque o senhor fala também em revolução tecnológica, enfim...
O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - E também democracia representativa versus democracia direta, talvez algum comentário.
O SR. LUCIO RENNÓ - Claro. Eu vou tomar só mais um minuto para fazer isso.
Eu acho que, sim, de fato, esses novos mecanismos de intermediação da política, que era o que eu estava mencionando, ou seja, essas novas instituições que entram entre o cidadão e o processo final de tomada de decisão tendem a ser cada vez mais superadas por mecanismos diretos de participação democrática. Eu não vejo de outra forma. O senhor cita, por exemplo, o DataSenado, que tem instrumentos interessantes de consulta, de enquetes, de consulta popular sobre votações que estão em curso.
Ora, com o aumento da facilidade de acesso à internet, por exemplo, que para mim tinha que ser livre, gratuita, rápida. O Primeiro-Ministro inglês das frases boas, Churchill, dizia que champagne tinha que ser seco, gelado e de graça. Eu acho que a internet tem que ser rápida, eficiente, estável e de graça, com mecanismos que permitem certificação digital. Você pode caminhar, obviamente, cada vez mais para um estreitamento do processo decisório, com a participação do cidadão. O PT mesmo teve histórias muito bonitas nesse sentido, com o orçamento participativo e outros mecanismos de participação popular de consulta direta, que se multiplicaram pelo País.
Então, é claro que isso está associado a uma crise de legitimidade das instituições políticas tradicionais. Não sei o quanto isso avança e com quanta rapidez. Aí eu não consigo dizer, mas certamente isso se coloca como um caminho.
Por último, Senadora, a minha percepção é de que a reação à Lei de Migração... Confesso que não acompanhei tão detalhadamente esse debate, mas vou lhe dar uma resposta a partir dos estudos que faço sobre cultura política e valores políticos no Brasil. Primeiro, eu não acho que nós somos tão abertos assim como pensamos que somos. Há estudos muito interessantes sobre discriminação baseada em região de nascimento, como nordestinos discriminados em São Paulo, por exemplo. Há estudos tradicionais sobre isso, que são interessantes de levarmos em consideração. Então, eu parto de um princípio um pouco diferente: talvez não sejamos tão abertos.
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(Intervenção fora do microfone.)
O SR. LUCIO RENNÓ - Isso. Há estudos claramente antropológicos que investigaram esses elementos, por exemplo, na periferia de São Paulo, e percebem uma rejeição muito grande, por exemplo, ao baiano, ao nordestino que vem para São Paulo.
Então, eu não exageraria muito a nossa propensão, como cultura, como sociedade, à abertura para os imigrantes. Eu partiria de um pressuposto um pouco mais conservador, infelizmente.
O SR. PAULO DELGADO - Mas, Lúcio - permita-me -, como nós fazemos com as nossas avós? Como fazemos com os nossos avós?
O SR. LUCIO RENNÓ - Como fazemos com os nossos avós? Não, eu não estou indo nesse sentido.
O SR. PAULO DELGADO - São todos imigrantes! De 80 anos para trás, todos são.
O SR. LUCIO RENNÓ - Muito bem. Mas, quando a pessoa chega a um local que não é o seu local de nascença - só estou dizendo isso -, há estudos que demonstram, no Brasil, um certo grau de intolerância a ela. Então, acho que não partiríamos de um pressuposto de que a nossa sociedade está livre desses elementos.
Nesse sentido... Eu não vou entrar no mérito da questão. Ele está me provocando para fazer isso, mas eu não vou entrar no mérito da questão.
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Eu já ia fazer uma brincadeira.
O SR. LUCIO RENNÓ - Não é um julgamento de valor; é uma constatação a partir do que eu vejo, e espero que seja...
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Na academia... Há estudos acadêmicos na Antropologia... Acho que existe isso.
O SR. LUCIO RENNÓ - Exato.
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Eu ia fazer uma brincadeira, porque eu sou da República de Piratini, e a gente acolhe todo mundo bem quando chega ao Rio Grande. (Risos.)
O SR. LUCIO RENNÓ - Eu não estou defendendo uma posição. Quero que isso fique muito claro. Estou relatando aqui o que estudos anteriores demonstram sobre nossa propensão à tolerância ao estranho, ao estrangeiro, que não é das mais altas.
Além disso, nós vivemos um momento hoje de crise econômica grave, e o desemprego é um problema grave, que está muito associado a reações conservadoras. Eu quero me proteger. Então, quanto mais competição eu tiver na busca do emprego, mais conservador eu vou me tornar e menos aberto a essas alternativas de inclusão.
Então, eu explicaria por aí, de novo baseado só em estudos anteriores e nessa percepção de que o desemprego leva ao fortalecimento de posições conservadoras políticas - uma mensagem clara para 2018, ouviu, Senadora?
Só isso, gente. Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Muito obrigado ao Prof. Dr. Lucio Rennó.
Sobre essa questão dessa intolerância ou desse incômodo causado pelos nordestinos, que construíram, na realidade, sobretudo o Sudeste do País, o Norte e o Centro-Oeste, aconteceu comigo um episódio muito interessante. Eu era Governador do Estado de Alagoas e estive em São Paulo para participar de um debate na Associação Comercial de São Paulo. E eu estava já como candidato, não declaradamente, mas já com a formatação de ser candidato a Presidente da República.
Participamos desse debate, que foi muito bom, muito acalorado, muito cheio de perguntas e tal, e depois o então Presidente da Associação Comercial de São Paulo recebeu-nos na casa dele, em São Paulo; os empresários presentes e eu. Formaram-se rodinhas de conversa numa sala ampla da casa, e eu estava participando de uma conversa aqui, num círculo, e atrás um outro círculo havia se formado. Eu conversando aqui, mas prestando atenção no que eles estavam falando - eu querendo, naturalmente, captar algum tipo de elogio. (Risos.)
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O interessante é que, em determinado momento, eu ouvi um elogio: "Puxa, mas foi ótimo o debate! É bom esse Governador. Foi muito bom!" Aí ouço outro dizer o seguinte: "Pois é, foi muito bem. Mas é uma pena que seja nordestino."
E o interessante é que, nas primeiras eleições diretas para Presidente da República, depois de quase 30 anos, os dois candidatos que chegaram ao segundo turno, os dois éramos nordestinos: o Lula e eu. Vejam que coisa!
Então, essa questão dessa intolerância, desse incômodo, ele realmente existe, é palpável - lamentavelmente, ainda é. Eu espero que, no decorrer dos anos, isso vá amainando, sobretudo pelo reconhecimento da participação do povo nordestino no crescimento e no engrandecimento do nosso País.
Eu gostaria de agradecer, mais uma vez, a todos os Srs. Embaixadores e representantes de missões diplomáticas que estiveram aqui presentes: Embaixador Nabil Adghoghi, do Marrocos; Embaixador Milan Cigán, da República da Eslováquia; Embaixador José Kinn Franco, Primeiro-Secretário Faleg Valdez Cópas e Segundo-Secretário Fernando Crespo, da Embaixada do Estado Plurinacional da Bolívia; Encarregado de Negócios Koffi Maxime Assah, da Embaixada do Togo; Conselheiro Hendrik Roggen, da Embaixada do Reino da Bélgica; Conselheiro Augusto Inácio, da Embaixada da República de Angola; Primeiro-Secretário Juan Pozo Alvarez, da Embaixada de Cuba; Primeiro-Secretário Ilya Lutski, da Embaixada da República da Belarus; Sr. Stephen Saideman, Encarregado de Assuntos Internacionais da Carleton University do Canadá; Conselheira Política Tamar San Miguel Garcia, da Embaixada da Espanha; e Conselheiro Abbah Sidi Sidi, da Embaixada do Marrocos.
Agradeço muito especialmente aos nossos debatedores e palestrantes da noite de hoje: Prof. Alex Canuto, Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental; professor, sociólogo e ex-Deputado Paulo Delgado, pós-graduado em Ciência Política; Sr. Lucio Rennó, Mestre em Ciência Política na UnB (Universidade de Brasília), Doutor em Ciência Política (University of Pittsburgh) e pós-doutorado no Latin American and Caribbean Studies Center, da Stony Brook, e no German Institute for Global and Area Studies, em Hamburgo, Alemanha; e Sr. Mathias Alencastro, Doutor em Ciência Política pela Universidade de Oxford e Especialista em Política Europeia e também em Política Africana.
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Teremos alguns debates aqui em que vamos tratar de temas relacionados ao nosso continente irmão, que é a África, e gostaríamos muito de poder contar novamente com sua presença aqui.
Acrescento que o assessor e o professor Dr. Matias Albuquerque foi Assessor Internacional da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República e Diretor de Relações Internacionais do Ipea (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas), que é um dos institutos mais respeitados do Brasil.
Agradeço a presença das Srªs e dos Srs. Senadores, muito especialmente de S. Exª a Senadora Ana Amélia e de S. Exª o Senador Jorge Viana, pela honrosa presença na noite de hoje; agradeço a todos aqueles que participaram conosco via Internet, via TV Senado, via Rádio Senado; agradeço também, e por fim, por ser a presença que mais engrandece a nossa reunião de hoje, a Presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados, Deputada Bruna Furlan, pela sua presença sempre prestigiosa e sempre nos dando muito incentivo para que continuemos com esta série de debates que estamos promovendo no âmbito da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado da República.
Encerradas esta reunião, eu gostaria de convidar a todos para a nossa próxima reunião, que se dará no dia 22 de maio - será o nosso V Painel -, segunda-feira, às 18h, neste plenário, quando será abordado o tema "Navegando na turbulência: uma discussão sobre relações econômicas internacionais, entre o protecionismo e o livre comércio".
Para expor e debater o tema, teremos como convidados o Ministro Marcílio Marques Moreira, o Prof. Carlos Roberto Pio da Costa e o Prof. Samuel de Abreu Pessoa.
Antes de encerrarmos os trabalhos de hoje, convoco as Srªs e os Srs. Senadores para a nossa próxima reunião deliberativa, a se realizar no dia 11 de maio, quinta-feira, às 9h, neste plenário.
Mais uma vez agradecendo a todos, dou por encerrada a presente reunião.
Boa noite.
(Iniciada às 18 horas, a reunião é encerrada às 21 horas e 14 minutos.)