30/08/2017 - 62ª - Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa

Horário

Texto com revisão

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A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Bom dia a todos e a todas!
Já vamos começar a audiência. (Pausa.)
Declaro aberta a 62ª Reunião, Extraordinária, da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura. (Pausa.)
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Eu vou recomeçar para ficar gravado.
Declaro aberta 62ª Reunião, Extraordinária, da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura.
A audiência pública será realizada nos termos do Requerimento nº 50, de 2017, da Comissão de Direitos Humanos, de minha autoria, para debater sobre: "Direitos Humanos e Sistema de Justiça em Âmbito Mundial".
Esta Audiência Pública será realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. As pessoas que tenham interesse em participar com comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania, no link: www.senado.leg.br/ecidadania, e do Alô Senado, através do número 0800-612211.
A Mesa já está composta. O nosso convidado é Dr. Geoffrey Robertson, Conselheiro da Rainha da Grã-Bretanha - Fundador e Sócio do Escritório Doughty Street Chambers, principal banca especializada em Direitos Humanos do Reino Unido. Está conosco também o Deputado Federal Paulão, Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. E nós convidamos representante da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), Dr. Carlos Moura. (Palmas.)
Registro a presença do Sr. Senador Roberto Requião, Senador do Paraná; da Senadora Gleisi Hoffmann, também do Paraná; do Senador Paulo Rocha, do Pará; do Deputado Federal Paulo Teixeira, de São Paulo; e do ex-Senador João Pedro, do Amazonas.
Também temos já conosco Francisco Urbano, representando a Contag. O Dr. Carlos Moura já se encontra conosco aqui. À medida que forem se identificando, eu vou registrando as presenças dos senhores.
Vou fazer uma breve apresentação do nosso convidado. Desculpem, não há um oficial... Não chegou aqui. Então, temos a honra de receber, na Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal, o advogado, Dr. Geoffrey Ronald Robertson, filho da Austrália, erradicado no Reino Unido desde 1973.
Geoffrey Robertson é, sem dúvida, um cidadão do mundo. Ao abraçar várias causas sem temer o debate junto à opinião pública, imprensa e governos, construiu uma carreira profissional notável no Reino Unido e nas Nações Unidas. Ao conseguir a absolvição de dois jornalistas acusados de violar segredos oficiais, quando entrevistaram um oficial de inteligência, em 1978, obteve uma vitória histórica para a liberdade de imprensa. Foi responsável pela acusação de Pablo Escobar e do Cartel de Medellín, uma rede de tráfico de droga com sede na cidade colombiana e atuação em vários países.
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Dr. Geoffrey foi indicado como Conselheiro da Rainha no Reino Unido em 1988, que é uma deferência importantíssima. Só os advogados considerados mais competentes, mais famosos, mais... é que são convidados para esse Conselho.
Na década de 90, o foco se deslocaria para os direitos humanos e responsabilização dos governos. Ele defendeu os quatro diretores da fábrica de ferramentas Matrix Churchill, acusados de fornecer ilegalmente armas a Saddam Hussein. Ele provou que o governo britânico secretamente deu à empresa de armas permissão para fornecer peças para o programa de armas de Saddam Hussein.
O Dr. Geoffrey esteve no centro das atenções novamente quando defendeu o jornal The Guardian em um processo de difamação movido por Neil Hamilton, do Partido Conservador do Reino Unido.
Por fim, mais recente, o Dr. Geoffrey é advogado de Julian Assange, fundador do WikiLeaks, que foi acusado de estupro numa investigação judicial, que o levou a passar mais de cinco anos recluso na Embaixada do Equador, em Londres. A investigação foi encerrada este ano, em 19 de maio de 2017, pelo Ministério Público da Suécia. A defesa de Assange sempre alegou que acusação de estupro era um pretexto para extraditá-lo aos Estados Unidos, em virtude das divulgações que o WikiLeaks fez de um programa secreto de espionagem da CIA.
O Dr. Geoffrey Robertson é advogado do ex-Presidente Lula na Corte de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, e é considerado um dos três juristas mais conceituados na Corte da ONU.
A presença do Dr. Geoffrey e o compartilhamento de sua história e suas ideias é fundamental para resgatarmos a importância do debate sobre os direitos humanos e a atuação de seus defensores. Bem-vindo, Dr. Geoffrey.
Nós vamos passar palavra para Dr. Geoffrey, que falará - não vou marcar tempo. E depois a gente vai abrir para algumas intervenções, à medida que o tempo permitir.
O SR. GEOFFREY ROBERTSON (Tradução simultânea.) - Muito obrigada, Srª Presidente, por essa introdução tão carinhosa. É uma honra e um privilégio para mim falar com vocês hoje sobre o desenvolvimento das leis de direitos humanos internacionais e particularmente os direitos de um julgamento justo. Esses são os direitos que eu tenho defendido e questionado em relação ao Judiciário brasileiro nas Nações Unidas.
Eu vou falar um pouco sobre isso e vou explicar também. Responderei eventuais perguntas que vocês, deste País maravilhoso, terão e também eu vou sugerir que talvez existam alguns aspectos da sua lei que não estão em conformidade com os direitos humanos.
E quais são os padrões dos direitos humanos? Nós remetemos ao final da Segunda Guerra Mundial e da revelação dos barbarismos do Hitler, não apenas nos campos de concentração, mas na forma como a lei e a justiça foram manipuladas por pequenos juízes, por exemplo os juízes nazistas, que não garantiam julgamentos justos.
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E isso impediu as oposições a Hitler. Os julgamentos feitos pelos nazistas eram muito importantes porque, nessa época, a justiça certamente foi desfigurada.
Depois, tivemos a Declaração Universal dos Direitos Humanos feita por um grande advogado australiano, em dezembro de 1946, um dia antes da Convenção de Genocídio das Nações Unidas.
Finalmente, nessa época, tivemos um desenvolvimento dos direitos humanos. Depois tivemos uma convenção sobre os direitos civis e políticos que foi assinada, também, pelo Brasil junto com dezessete outros países, incluindo países como a Austrália, o Canadá. Nós temos esse Comitê dos Direitos Humanos, em Genebra, com juízes de diferentes partes do mundo que decidem se os países têm leis que estão em conformidade com os padrões e os direitos humanos. Isso não é algo ruim se nós tivermos uma lei, uma corte externa, observando o seu comportamento. A Inglaterra, de onde eu venho, é um dos quarenta e sete países europeus que se submetem ao escrutínio do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos. Se os nossos juízes fizerem algo errado - e algumas vezes isso acontece - eles são criticados por essa corte e, então, nos mudamos as nossas leis.
Os países mais autoconfiantes do mundo, com a França, a Itália, a Grã-Bretanha, Portugal, se submetem a esse escrutínio externo e objetivo. Primeiro porque é algo muito bom, porque dessa forma temos a ajuda de um escrutínio independente e também nos ajuda a nos ajustar e a estarmos em conformidade com os padrões fundamentais básicos. Temos, então, a Corte Europeia de Direitos Humanos e temos um conselho que ajuda os diferentes países que se submetem diretamente aos juízes desse conselho. Temos, também, a Corte Africana de Direitos Humanos, recentemente desenvolvida, e, claro, temos a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Vocês estão em conformidade com isso? Será que os seus juízes estão seguindo isso?
Houve um grande caso, há alguns anos, o caso Escher versus Brasil. No Brasil, tínhamos um juiz, em 1999, que ordenou a interceptação de diferentes chamadas telefônicas. Mas ele interceptou essas chamadas de diferentes grupos e as deu, simplesmente, para a mídia, dessa forma invadindo a privacidade. Nessa época, a Corte Interamericana de Direitos Humanos interveio. Nós estávamos falando de algumas interceptações que aconteceram. O mesmo está acontecendo agora. Aconteceu com o Juiz Moro, por exemplo, que invadiu a privacidade de Lula e de sua família, até mesmo de seu advogado.
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Eles grampearam o telefone e deram a transcrição para a mídia, para que pudessem demonizar o Lula. Essa foi realmente uma decisão muito grave. É para isso que serve a Corte Interamericana. Essas cortes devem ser compreendidas e suas decisões devem ser seguidas. Porque a lei internacional, o direito internacional, já evoluiu muito. Nós temos o que nós chamamos de Direito Internacional de Direitos Humanos. Isso é baseado na Declaração Universal, que aconteceu em 1946, na Convenção de Direitos Humanos, em 1976. E nós já avançamos muito.
Quando eu era um aluno, na universidade, em 1970, participava da Anistia Internacional. Nós tínhamos de escrever cartas para os ditadores, para os tiranos, dizendo "por favor, não façam isso, não façam aquilo". "Sr. Pinochet" - e eu escrevi isso em 1974 - , "por favor, pare de fazer torturas em seus campos". Mas isso não funcionou. Pinochet não leu as minhas cartas ou as cartas de centenas de milhares de pessoas. Mas vinte e cinco anos depois eu estava atuando na Inglaterra num caso que forçou a auditoria da tortura do General Pinochet. Isso demorou vinte e cinco anos. Demorou vinte e cinto anos para o movimento dos direitos humanos passar de um momento em que implorava por direitos para, sim, ser capaz de entrar com um processo contra ele. Então, sim, nós tivemos um progresso.
E quais são os padrões fundamentais dos direitos humanos? Claro, nós não podemos ter tortura. É por isso que nós estávamos perseguindo Pinochet naquela época. Nós temos de ter o direito à família, à vida. E desse é um padrão que quero falar hoje. Temos vários aspectos que envolvem o Brasil: o direito também a um julgamento justo. Em todas as convenções de direitos humanos vocês vão descobrir que existe um direito ao julgamento por juízes imparciais, independentes e imparciais. Você não deve permitir que nenhum cidadão seja julgado por um juiz que seja parcial.
Claro que no meu país...Eu tenho dois países. Eu nasci na Austrália e sou um cidadão australiano. Nos Estados Unidos os julgamentos são por jurados. Demorou muito tempo, nos Estados Unidos, para se ter certeza que os jurados sejam imparciais, que não tenham nenhum tipo de preconceito ou preconcepção. Esse é o nosso sistema, mas também há um outro sistema, em muitos países - incluindo o seu País - , que é chamado de sistema inquisitorial. Durante muitos anos, esse sistema investigava os juízes...Ou melhor, os juízes investigavam, nesse caso. Isso era baseado na França, no sistema da Itália. Eles separavam essas duas funções, mas na Dinamarca elas não tinham sido separadas ainda. Foi o chamado caso Hauschildt, em 1988, que modificou tudo. Decidiu que os juízes que agiam como investigadores na parte da investigação ou supervisionavam não poderiam, então, julgar sem um jurado como o juiz do processo, porque eles seriam parciais.
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Há uma percepção de parcialidade nessa frase. Isso não deve ser feito. Então, nos casos mais complicados em que eu representei o Sr. Hauschildt, em 1988, a Dinamarca tinha um sistema como o Brasil tem hoje em dia, onde os juízes supervisionavam a investigação, ordenavam gravações de conversas e não concediam a liberdade provisória, porque eles queriam, nesse sentido...
Então, eles também se tornavam os juízes dos processos e eles acabavam condenando no final das contas. Era uma profecia que acabava por acontecer por si só. E isso não podia mais acontecer. Então, depois de um período, um juiz envolvido na investigação e que ordena a gravação de conversações e outras ações de suspeitos, ele provavelmente vai julgar culpado. Isso não pode acontecer. Ele não pode ser o juiz do processo, porque ele já vai ter alguns preconceitos e algumas ideias formadas que vão afetar o julgamento.
Não há uma preocupação razoável em relação a esse procedimento. Em todos os países europeus, incluindo Portugal, do qual vocês herdaram esse tipo de sistema criminal, mudaram. Eles são bem diferentes agora, em relação ao estágio antes do julgamento, onde o juiz supervisiona. A força policial e os procuradores não têm nenhum tipo de problema, mas eles são completamente separados. Um novo juiz é trazido para lidar com o julgamento, e isso é considerado como algo fundamental.
A minha mensagem, se vocês quiserem entender melhor em relação à corrupção e à corrupção política, que é venenosa, é contagiosa para um país, é que não se deve processar de forma efetiva, a não ser que você processe de forma justa. Isso é relativo a todos os processos de corrupção nos quais eu estive envolvido na Grã-Bretanha, nos quais os políticos foram pagos por empresários; no Caribe; no Cartel de Medellín, que estavam também aceitando propinas para liberar valores.
A mensagem disso é que você não deve processar de forma efetiva a não ser que você processe de forma justa. Essa é a razão pela qual o caso do Lula foi levado para o Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, para lidar com esse aspecto da lei brasileira, que deve se adequar aos padrões internacionais de justiça e de um processo.
E isso é um problema sobre o qual o Comitê dos Direitos Humanos vai decidir. Por quê? Porque hoje o Juiz Moro é ou não parcial? É muito óbvio para qualquer advogado internacional ou da Europa que ele é parcial. Ele fez um julgamento atrás do outro, dizendo que as gravações dele devem ser interceptadas, as conversas da sua família também devem ser interceptadas, porque existe uma razão para ser culpado. Então, existe essa suspeita muito grande. E as buscas também, com certeza, à sua casa - houve busca na sua casa, por causa da probabilidade de culpa.
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Então, tendo tomado todas essas decisões e tendo ido além da lei brasileira, ou seja, feito ato ilegal ao liberar essas transcrições e essas fitas, especialmente aquela... Ele foi condenado também. Outros juízes condenaram Moro pela liberação dessas fitas, das transcrições dos áudios em relação à Dilma Rousseff e ao Lula, pois foi feito de forma a causar uma comoção política. Esse não é um papel nem mesmo de um juiz que trabalha com investigação, mas o fato de ele ter feito isso mostra uma animosidade, um desejo de demonizá-lo, de torná-lo não atraente e de criar uma expectativa de culpa.
O Juiz Moro é uma pessoa que luta contra a corrupção - nós todos estamos em concordância em relação a isso, nós concordamos com essas campanhas. Essas pessoas que lutam contra a corrupção são promotores? É disto que nós precisamos: promotores que tenham mentes inquisitivas, que não façam prejulgamentos, mas um juiz está completamente desqualificado para ser um juiz de um processo em se tratando disso.
Em qualquer mente, ficou claro que ele não deveria ter julgado o Lula; deveria ter ido para um juiz independente, que não tenha ligação com nenhum outro Partido ou com o PT e que não estivesse envolvido em nenhuma das decisões na parte do prejulgamento. Mas, apesar disso, isso aconteceu.
Vocês podem ver a forma como o Juiz Moro se comporta, ele parece estar tão ávido para a publicidade de si mesmo... Ontem, ele não era conhecido, e aí ele apareceu no jornal em relação ao lançamento do seu filme, e estava demonizando o Lula, e mostrando parte das filmagens da Polícia. Ele é bem audacioso.
Na verdade, houve um lançamento de um livro que também difamava o Lula, de um biógrafo do Juiz Moro, e ele apareceu no lançamento e assinou cópias para os seus fãs. Esse é um comportamento que nenhum juiz na Europa, nem nos Estados Unidos, ou na Austrália, simplesmente, sonharia em fazer. É um comportamento de um promotor, de uma pessoa que luta contra a corrupção, mas não o de um juiz independente, imparcial, e isso é algo que eu acho que torna questionável o Brasil em relação aos advogados de outros países que vêm a este País - e eles veem o Juiz Moro, o rosto dele, em livros, em jornais, como um lutador contra a corrupção. Então, os protestos com bonecos do Lula em roupa de presidiário e fotos do Lula em revistas vestido como um presidiário...
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E você liga a televisão e há o Dallagnol, um promotor também, que teve 19 minutos para difamar o Lula, antes mesmo de o julgamento do Lula ter começado. Que tipo de país é esse, onde o público é estimulado a presumir a culpa antes de o caso ser julgado? E há até um livro instigando esse ponto de dizer que ele é culpado. Isso é uma forma muito estranha de conduzir um julgamento justo, para instigar a culpa do réu.
E as pessoas gritam o nome dele, mas existe um perigo nessa autopromoção em promotores egocêntricos que se tornam juízes. Não pode ser dado um julgamento justo nesse sentido. Essa é uma das bases para os protestos.
E você pode até dizer: "Olha, o Moro condenou o Lula", mas a sua decisão está aberta para ser questionada, e você pode contestar ou apelar da decisão, e a 4ª Turma vai dar um escrutínio independente, sem nenhum tipo de preconceitos ou de... Por isso que foi tão estranho, na semana passada, o Thompson Flores, que é o ministro ou o desembargador dessa turma, que ouviu a apelação do Lula, descrever a decisão do Juiz Moro como impecável. Impecável, sem nenhum tipo de erro. Antes que ouvisse qualquer outro argumento, ele descreveu como algo impecável. Ele já estava convencido. Eles também são parciais em relação a isso. Talvez ele não sinta, ele não julgue o caso do Lula, mas a sua influência vai repercutir ao redor do tribunal. Como os outros juízes vão decidir isso, os outros ministros, se o presidente decidiu ou disse que a decisão é impecável? Como vocês, legisladores, cuja obrigação é dar um processo justo a todos os seus cidadãos, permitem que as pessoas passem por esse tipo de processo, que é tão parcial?
A lei não foi reformada, modificada. Está lá há muitos anos. Mas, a não ser que vocês modifiquem essa lei, para que se dê oportunidade a todo mundo de um julgamento justo, o mundo vai ver como estão lidando com o Lula, e talvez a única resposta seja levar para o Supremo Tribunal Federal. Mas, neste momento, nós estamos levando para o Comitê dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas.
Há outras perguntas, no caso, em relação à presunção de inocência. A presunção de inocência é fundamental para um julgamento justo, o processo criminal e todas as convenções de direitos humanos das quais o Brasil é signatário. Mas que tipo de presunção de inocência pode haver num País onde os protestos mostram balões, e a mídia diz que o Lula é culpado, e o promotor fica 19 minutos na televisão nacional, antes do julgamento, para afirmar que ele é culpado? E escreve um livro sobre isso.
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Isso não está de acordo com a presunção de inocência.
A maioria dos países tem um tipo de lei que é chamada de desacato de autoridade no tribunal, é um tipo de lei que é permitida para adiar até que o processo termine, permite que o promotor indique que ele não deve lutar em público. Esse processo não influenciará a mídia, como o Sr. Dallagnol faz. É necessário que ele não faça isso - senão, ele é expulso do caso - para ser justo, escrupuloso, para não fazer nenhum tipo de comentário parcial antes do julgamento. Mas essa lei não tem muito impacto aqui no Brasil. Parece que não há uma lei que impeça as demonstrações, os protestos ou os promotores ou juízes dizerem que um réu é culpado antes do julgamento. Esse é outro assunto em que nós esperamos que possamos receber algum tipo de orientação do Comitê dos Direitos Humanos.
Deixem-me dar uma palavra em relação... E outro problema que nós estamos comentando - e eu sei que é importante aqui no Brasil - é a metodologia desse juiz específico como inquisidor. O que ele faz? Ele prende suspeitos durante cem dias, às vezes por um ano, até que eles confessem o que ele acha que deva ser verdade, e o que talvez não seja verdade nesse caso. Uma confissão é uma confissão forçada. Elas são um problema constante, porque é claro que as pessoas vão confessar para sair da prisão. Eles dizem ao promotor e ao juiz o que eles querem ouvir para que eles façam a delação premiada para reduzir... Há uma redução enorme de sentenças que ocorre de dez anos para dois anos e coisas parecidas. Isso pode facilmente encorajar um testemunho falso, a palavra de criminosos que já são conhecidos como criminosos e que é levada em consideração nesse processo como verdade, porque eles fizeram uma delação premiada com a promotoria.
Isso é algo extremamente questionável. E a utilização exagerada disso é outro aspecto da petição de que eu estou falando, mas isso remonta - e nós vamos voltar a isso em um minuto - a julgar justamente os acusados. O Lula foi condenado, e eu creio que a maioria de vocês leu aqui o julgamento, são 964 parágrafos. Eu li alguns deles. Eu sou um juiz de apelação há 17 anos, na Inglaterra. E eu fiquei perplexo porque o Comitê dos Direitos Humanos... Os assuntos não tratam de quem é culpado, não. Eles tratam da justiça do processo.
Mas até onde a culpa dele é importante? É impressionante porque não há tipo de evidência ou intenção de corrupção. O caso é muito simples, a sua esposa se qualificou para um apartamento em um prédio e ela pagou à cooperativa a maior parte da contribuição necessária para manter esse apartamento.
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O Lula, na abertura de evidências, em dois mil e... Ele revelou esses fatos, e não tinha nenhum problema no fato de ela estar interessada e ele também. Então, em 2009 e 2010, a cooperativa vai à falência ou, pelo menos, virtualmente. E aí entra...
Então, a OAS... E diz que duas coisas são afirmadas: que você pode receber o seu dinheiro de volta para ele, e a esposa do Lula, que não era uma mulher negociante. O Lula estava tratando com quimioterapia por causa do câncer que ele tinha no momento, e talvez a sua mente não estivesse muito bem, e ele deixou escapar. E, depois, ele visitou o apartamento. E a evidência sugeriu que ele não queria isso. Mas, se essa evidência é correta ou não, não importa, porque o que a OAS disse foi que ela ofereceria um apartamento melhor, com um preço maior, mais valioso, e iria reformá-lo.
Tudo bem, ótimo. Isso é muito bom para os empresários. É permitido que os empresários entreguem algo para os Clinton, para a família Clinton, não tem problema, mas não é ato corrupto, a não ser que haja um acordo para fazer algo para favorecer a OAS. Tem que haver o que nós advogados chamamos de quid pro quo, o que significa um termo latino para "se você fizer um favor para mim, eu faço um favor para você". Em outras palavras, uma conduta corrupta de ter propina, para haver propina, não é só pagar dinheiro. Tem que haver pagamento para que haja uma recompensa no acordo entre as duas partes, para que o político faça alguma coisa em troca.
O Juiz Moro, apesar de todas as delações premiadas e todos os seus esforços para conseguir incriminar o Lula, não conseguiu achar nenhuma, e ninguém poderia dizer que ele ou ela tinham oferecido um acordo entre a OAS e o Lula, entre o Presidente, para que ele pudesse receber um apartamento melhor, se ele fizesse algo pela OAS. Ou nenhum acordo entre a OAS e o Lula. "Nós vamos dar uma propina para você com essa reforma, vamos dar uma piscina maior se você for eleito como Presidente no ano que vem, e você fizer algo em troca." Essa é uma falta completa, e qualquer outro advogado criminal que consiga ler essas 240 páginas que foram impressas diria "onde está a evidência de corrupção?".
O Juiz Moro diz que tem uma teoria estranha, chamada domínio do fato, que veio da Itália e que lá foi rejeitada recentemente, de que alguém que está em todas essas acusações provavelmente... É absurdo isto: que o Lula concordasse com isso. A única evidência que o Juiz Moro obteve foi que ele descobriu dinheiro para reforma do apartamento em um fundo que foi utilizado para pagar políticos, mas isso não indica que há evidências de que o Lula sabia disso. Nenhum tipo de evidência indica, conectando-o diretamente.
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A completa falta de evidência fica óbvia, patente se você for nesses 964 parágrafos. Então, é por isso que o Juiz Moro, parcial, que organizou toda a investigação extremamente parcial, deva ter a sua observação... A sua análise deve ser observada de forma justa. É necessário que haja um juiz imparcial para julgar o processo. Para a necessidade de presunção de inocência deve haver um escrutínio, um julgamento justo e uma apelação justa - como ele pode receber uma apelação justa nessa 4ª Turma, cujo Presidente da Turma já disse que a decisão do Juiz Moro é impecável, histórica. Isso é impressionante, de forma negativa.
Eu creio que o Brasil, como nação, deve estar ciente, ainda que você não goste do Lula ou que você goste, de que ele tem uma reputação enorme no exterior. Ele é muito respeitado na ONU pelos seus programas de retirada das pessoas da pobreza. E assim, como ele é tratado nesse seu próprio país com uma falta de padrões de direitos humanos, esse é o problema - alguns dos problemas que nós decidimos levantar aqui.
Vou falar finalmente de como se julga a corrupção de forma eficiente. Outros países encontraram o sistema correto. Nos Estados Unidos, eles usam promotores especiais, mas, em Hong Kong, em Sidney, em Cingapura e até mesmo na Tanzânia, eles usam um órgão chamado Icac, uma comissão independente contra a corrupção.
E o que tem nesse órgão? Em primeiro lugar, eles têm diferentes partes - sonhadas pelo Juiz Moro -: eles podem observar os políticos, os servidores públicos, podem examinar suas contas de banco, podem fazer busca em suas casas, podem grampear telefones e também podem ter audiências públicas nas quais essas pessoas podem ser representadas. Mas o que é crucial para o sucesso e o que é fundamental para a sua constituição? É que ele não vai processar, não vai julgar, não vai misturar dessa forma a investigação e a parte do processo; vai apenas apresentar as evidências em um relatório para um promotor que vai levar o caso para o tribunal antes de qualquer juiz ter qualquer conexão com a investigação.
E a Icac em Hong Kong, em Cingapura e na Tanzânia teve resultados maravilhosos: a maioria de seus casos são aceitos, a maioria dos suspeitos são condenados, e as condenações são respeitadas porque os julgamentos são independentes e imparciais. É dessa forma que a lei, é dessa forma que as decisões legais são respeitadas.
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Agora, o Juiz Moro é um grande admirador das operações feitas contra as máfias conectadas a políticos na Itália, mas, se você falar com os criminosos italianos, você vai que essas operações estavam demonizando os políticos. Por isso, ele fez um discurso a favor dessas operações que estavam demonizando políticos. Ele estava encorajando as multidões a jogarem pedras nas casas dessas pessoas. Então, se vocês falarem com os advogados criminais italianos hoje em dia, eles vão falar que o Juiz Moro está vivendo numa terra da fantasia.
A operação que aconteceu na Itália era tão injusta que não foi considerada, não foi respeitada. Dessa forma, o Silvio Berlusconi foi simplesmente liberado e depois se tornou o líder do país.
Logo, vocês têm de prestar atenção às operações que não são justas, porque elas simplesmente não vão funcionar. Durante a história, elas não terão crédito. Ninguém vai acreditar que o Lula é culpado se o juiz for alguém parcial. Vocês têm de ter juízes independentes e imparciais, para que, dessa forma, os historiadores do Brasil possam olhar para este momento e não precisem se perguntar onde estava a evidência que mostrava que havia corrupção.
Na minha experiência, e eu já passei por muitos casos de corrupção, sei que é essencial que a corrupção seja processada de forma justa, senão os julgamentos não vão durar e o público não vai ser persuadido.
Muitas vezes, existe, sim, culpa, mas as pessoas precisam que essa culpa seja estabelecida de forma clara.
Eu acredito que o Lula tinha direito a uma posição especial, porque ele era Presidente. Obviamente, se nós encontrarmos evidências, nós precisaremos fazer um processo, e ele vai precisar responder a esse processo, mas o que é crucial é garantir que o processo seja justo. Eu não acho que no Brasil, neste momento, esse processo esteja sendo justo, mas estou aberto a responder quaisquer perguntas que vocês tenham sobre o que eu falei ou sobre o caso que foi levado a Genebra. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Eu peço desculpas aqui, eu deixei de citar presenças importantíssimas dos advogados do nosso Presidente Lula, advogado e advogada, Dr. Cristiano Zanin e Drª Valeska Teixeira, que estão aqui neste debate também. Há ainda as presenças do Deputado Federal Décio Lima, Deputado Federal Wadih Damous, Deputado Federal Paulo Pimenta, do ex-Senador Donizeti Nogueira, também do Senador Lindbergh. À medida que forem chegando os registros, eu vou... Senador Humberto Costa também acabou de chegar.
Esta audiência foi requerida conjuntamente com o nosso Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara.
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O Deputado Paulão quer fazer a sua saudação aqui. Depois o Deputado Paulo Teixeira, que tem um compromisso, quer fazer a sua intervenção. Agora tem o tempo marcado de cinco minutos. Depois a gente vê quem ainda quer...
Eu gostaria de perguntar ao Dr. Geoffrey se vai responder um a um ou prefere em bloco?
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Eu sugiro que seja um a um, Senadora Regina. É bom que a gente faz um debate mais qualificado aqui.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - O.k. Então, Deputado Paulão, depois o Deputado Paulo Teixeira.
Alguém faz as inscrições para mim.
O SR. PAULÃO (PT - AL) - Bom dia a todos e a todas.
Eu queria cumprimentar a Senadora Regina em nome da Comissão de Direitos Humanos e Participação Legislativa do Senado e dizer que é uma grande honra fazer esta reunião conjunta; cumprimentar o Sr. Carlos Moura, representante da CNBB, em nome de todos os Parlamentares, Senadores e Deputados Federais, em nome da Senadora Gleisi Hoffmann. Eu queria cumprimentar também os advogados do ex-Presidente Lula, Valeska Teixeira e Cristiano Zanin.
É com satisfação que saudamos a presença do Dr. Geoffrey Robertson, jurista renomado, professor e autor de obras importantes, fundador e sócio do principal escritório especializado em direitos humanos do Reino Unido, um defensor dos direitos humanos acreditado e de grande prestígio junto à Organização das Nações Unidas.
Um dos princípios basilares dos direitos humanos é o seu valor universal historicamente construído. Onde quer que esses direitos sejam violados, a violação ofende e agride toda a humanidade. Não é possível falar em defesa dos direitos humanos num país e ignorá-los em outros; proclamar o compromisso com eles num lugar e negá-los em outros lugares.
Recordo que o primeiro pacto internacional de direitos humanos editado pela Organização das Nações Unidas e firmado por quase todas as nações, inclusive pelo Brasil, é o que trata dos direitos humanos civis e políticos.
Em outras palavras, não há direitos humanos sem justiça equânime, sem a plenitude dos direitos políticos civis. O Brasil, após uma contínua incorporação de valores e práticas democráticas, vive agora um momento de instabilidade em que tais valores e práticas sofrem um duro revés político, num cenário a que o atual Governo ascendeu sem a necessária legitimidade.
Nesse cenário, é importante para todos nós ouvirmos opiniões balizadas, sejam elas iguais ou diferentes das nossas, opiniões de especialistas de notório saber na questão da democracia e dos direitos humanos, análises como a do Dr. Geoffrey Robertson, que venham a aportar sua visão sobre o sistema de justiça e direitos humanos em nível global, uma visão qualificada pelas numerosas credenciais conquistadas por vasta experiência como jurista. Dessa forma, saudamos o Dr. Geoffrey Robertson, agradecendo pela sua presença honrosa no Congresso Nacional brasileiro.
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Muito obrigado. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Deputado Paulão. A gente entende que foi uma fala introdutória, não teve uma pergunta, então passamos para o Deputado Paulo Teixeira.
O SR. PAULO TEIXEIRA (PT - SP) - Bom eu quero, inicialmente, cumprimentar o Senado brasileiro, a Câmara Federal nas pessoas da Senadora Regina Sousa, Presidente da Comissão de Direitos Humanos; do Deputado Paulão, Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados; cumprimentar o Sr. Carlos Moura; o Sr. Geoffrey Robertson; também os advogados do Presidente Lula, Cristiano Zanin Martins, Valeska Teixeira Martins, e homenagear a ambos pela aguerrida advocacia que têm feito na defesa do Presidente Lula.
Eu quero comentar a fala do Dr. Geoffrey em duas direções. Primeiro, ele fala sobre o sistema legal brasileiro, e, quanto ao sistema legal brasileiro, nós estamos num processo de aperfeiçoamento. Muitas das medidas que hoje a Lava Jato está executando não poderão ser executadas depois dessa revisão. Por exemplo, nós estamos criando juízo de garantias, que não é o juiz que vai definir o mérito. Nós também estamos estabelecendo prazos para a prisão. Nós estamos retomando a presunção de inocência. Portanto, nós estamos fazendo mudanças no Código de Processo Penal.
Agora, o Juiz Moro, na lei brasileira atual, é um juiz que age fora da lei; é um juiz fora da lei. Por que ele é um juiz fora da lei? Porque ele quer condenar o Presidente Lula no tribunal da opinião pública, ainda que nos autos não haja qualquer evidência de crime praticado pelo Presidente Lula. Portanto, a condenação dele é uma condenação mais de opinião pública do que uma condenação jurídica, como juiz. Ele não é um juiz imparcial. Por que ele não é juiz imparcial? Porque ele já se pronunciou antes da sentença.
Nesse livro de que ele participou de lançamento, ele agiu parcialmente quando agiu ilegalmente fazendo a escuta telefônica de um Presidente da República, que tem foro privilegiado como ex-Presidente da República; divulgou essa gravação; ontem participou de um filme que é um filme, inclusive, que não se tem conhecimento de quem o financiou, e ele é um juiz que age fora da lei. Ele é um juiz que não obedece à lei.
Na minha opinião, ele não pode ser nem juiz do caso Lula, mas, depois desse final de semana, quando um advogado denunciou que foi procurado por um outro advogado para obter vantagens, para dar vantagens na Lava Jato para o outro advogado, e esse advogado que ofereceu vantagens é padrinho de casamento do Moro, ao mesmo tempo é sócio da ex-mulher do Moro e, por sua vez, advogado do procurador que acusa o Presidente Lula, o chefe da Lava Jato, na minha opinião, ele deveria ter sido afastado desse julgamento.
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Que tem de haver um julgamento sobre corrupção no Brasil, tem de haver; que tem de julgar os culpados, tem de julgar, mas acho que o Moro não tem mais condição nem de ser o juiz da causa do Presidente Lula nem mais de ser juiz da chamada Operação Lava Jato. Ele hoje, na minha opinião, tem de ser investigado por essa denúncia que foi feita por um advogado.
E, pasme, Dr. Geoffrey, ele fez uma nota defendendo o advogado que fora denunciado. Ele fez uma nota em que diz que o advogado é pessoa honesta. Ora, o Ministério Público deveria abrir uma investigação sobre essa denúncia e afastar o Juiz Moro desse julgamento.
Portanto, o que nós estamos vivendo hoje é um estado de exceção. Um estado em que nós temos de exigir do Supremo Tribunal Federal e das cortes superiores um posicionamento diante de um juiz de exceção, diante de uma justiça que não está de acordo com o direito brasileiro existente.
Por fim, eu faço uma pergunta a V. Sª: qual é o tempo de duração desse processo que tramita na ONU, nas Nações Unidas?
O SR. GEOFFREY ROBERTSON (Tradução simultânea.) - Muito obrigado. Obviamente, eu não mencionei as alegações contra o Juiz Moro que surgiram recentemente. Eu não vou julgar essas alegações, porque não sei se elas são bem fundadas ou não. Tudo o que direi é que acredito que o Congresso deve estabelecer, sim, uma investigação sobre essas alegações.
Em relação ao Juiz Moro e às suas críticas em relação a ele, tudo o que eu diria é que, se qualquer juiz na Europa, na Inglaterra ou em Portugal se comportasse dessa forma, certamente, ele seria desqualificado, seria afastado do caso, porque tem pré-conceitos, já lidou com algumas áreas que foram utilizadas apenas para demonizar o Presidente. Logo, ele seria definitivamente afastado do caso.
E o que vai acontecer? Deixe-me explicar para vocês. Nós entramos com uma denúncia, como eu já mencionei, o Brasil respondeu a essa denúncia, porque tem de fazê-lo. É interessante dizer que a resposta do Brasil foi escrita pelo Juiz Moro. Ele foi o responsável pela escrita dessa resposta. Ele está representando, então, o Estado do Brasil.
E a resposta foi bastante interessante. Simplesmente falaram que o Lula não poderia reclamar da forma como ele havia sido tratado, porque ele havia nomeado os juízes. Você não pode reclamar se você for o responsável pelos juízes sobre os quais você está reclamando. Isso, dessa forma, cria um mal-entendido completo sobre o juiz independente e uma democracia.
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Assumindo que o papel do juiz é fazer, é ser responsável pela pessoa que o nomeou... Sim, é verdade; nós sabemos que ele nomeou muito desses juízes, mas ele não investigou esses juízes; ele não sabia se eles eram leais ao Partido dos Trabalhadores. Isso seria errado, claro. Eu seria o primeiro a criticar isso. Ele não faz isso, claro. Ele nomeia os juízes e os promotores baseado em recomendações de diferentes órgãos profissionais.
O ponto principal que o Brasil, o Estado do Brasil apresentou é que vocês não podem reclamar dos juízes que foram nomeados por vocês. Mas claro que isso é um mal-entendido sobre a independência judiciária. Além disso, ele falava mais: ele falava que não estava lidando com as questões. Ele falou que o nosso caso era tecnicamente inadmissível, porque nós não tínhamos investigado todos os diferentes aspectos.
Também argumentaram que o Lula poderia entrar com recursos através de diferentes meios e que, na verdade, ele estava entrando com recursos de formas obscuras. Isso é bastante irônico, porque o Juiz Moro e outros juízes estão sempre criticando a forma com que os juízes do Lula estão tomando diferentes atitudes o tempo todo.
Mas o que o Estado do Brasil está argumentando é que nós ainda podemos fazer mais ações aqui, baseadas em partes técnicas, e, por isso, esse caso não deve prosseguir na ONU.
Mas nós criamos uma resposta; esses são documentos públicos. E vocês podem ler esses documentos, porque nós estamos dizendo que o Estado do Brasil não está entendendo o papel dos juízes. Esse é um documento que pode ser encontrado por todos. Se qualquer um quiser, pode ler. Realmente é uma pena que tenhamos esse envolvimento das cortes internacionais.
E é uma pena também que o português não seja aceito como uma língua oficial. É muito frustrante, porque temos o inglês britânico, claro, que é aceito, o francês, o espanhol, o italiano, mas infelizmente nós temos ainda essa lacuna com o português. Tudo, então, tem que ser traduzido do inglês; mas já temos as traduções, para o português, de todos os documentos.
Dessa forma, vocês podem ler e julgar e entender que o Estado do Brasil está tentando demorar, está tentando atrasar esse processo através de diferentes reivindicações. Dessa vez, o Estado do Brasil é que está tentando atrasar o julgamento. E esse é o processo que nós temos agora.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Eu coloquei o Deputado Paulo Teixeira para falar, porque pediu a palavra por conta de compromisso. Agora, a palavra volta à Mesa, com o Dr. Carlos Moura, representante da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. Depois, há uma lista de inscritos.
Eu vou atender a um pedido de não marcar tempo, mas peço também a compreensão, pois são muitos inscritos. Então, que todo mundo use o tempo razoavelmente.
Dr. Carlos Moura, representante da CNBB.
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O SR. CARLOS MOURA - Obrigado, Senadora Presidente da Comissão de Direitos Humanos, Senadora Regina, que preside esta reunião.
Cumprimentos ao Dr. Robertson, que vem aqui nos dar uma aula do Direito. Cumprimentos ao Deputado Paulão, Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados. Cumprimentos ao Srs. Senadores, às Srªs Senadoras, ao Dr. Cristiano, à Drª Valeska, aos senhores e às senhoras neste plenário e também àqueles que participam desta reunião por intermédio dos meios de comunicação do Senado da República.
Eu trago também os cumprimentos da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e, neste cumprimento, a certeza de que nós no Brasil não continuaremos a espancar o Estado democrático de direito; a certeza de que no Brasil os direitos humanos não continuarão a ser espancados; a certeza de que no Brasil a Constituição será respeitada.
Eu me dispenso, Dr. Robertson, de lhe fazer perguntas, porque V. Sª já lecionou acerca da nossa legislação penal e nos informou a respeito do Direito, sobretudo do Direito Penal, do ponto de vista internacional.
Mas eu me permitiria lembrar, nessa situação por que o País passa - e tendo como personagem, no caso desta reunião, o ex-Presidente Lula -, das lições de Beccaria, Dos Delitos e das Penas, da responsabilidade que o Estado tem para com a pessoa e a dignidade da pessoa quando ela chega às barras dos tribunais.
Mas, falando em direitos humanos, eu também me permitiria lembrar de Antígona, que enfrentou Sófocles no seu direito humano, no seu direito de pessoa, para enterrar o seu irmão - o mais lídimo direito. E perseguir a Justiça, perseguir a liberdade constitui lídimo direito da pessoa.
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E, ao que sabemos, não só pelo testemunho dos causídicos aqui presentes, como também pelo testemunho da imprensa, embora a maioria dela distorça a verdade, como também pelo testemunho de grande parte da sociedade brasileira, o que está acontecendo, no julgamento, no processado do ex-presidente Lula é uma distorção com a nossa legislação. E o que é grave, e que já foi trazido à colação várias vezes pelo Dr. Robertson, é a parcialidade do julgador. Não podemos conviver silenciosamente e nem tranquilamente com a parcialidade de um julgador. É tisnar ajustiça, é conspurcar o Direito, o Direito deixa de ser direito quando um magistrado é parcial.
E aqui permitam-me lembrar de Evandro Lins e Silva, de Sobral Pinto, de Teotônio Vilela, de D. Hélder Câmara, que, em nosso País, lutaram, batalharam, pelos direitos humanos, pela justiça, pelo respeito à pessoa, pela cidadania.
O Dr. Robson falou em tortura. Dr. Robson, somos um povo que tem, na sua base, 400 anos de escravidão, escravidão de um povo que veio para cá contra a sua vontade, homens e mulheres, e muitos vieram de reinos que conheciam a técnica da mineração, da agricultura, que trouxeram muito da religiosidade e se expressavam, porque nem todos eram analfabetos. Mas tenho certeza de que o ranço dessa tortura, o ranço da tortura, o desprezo pelos direitos humanos, pela dignidade da pessoa tem em comum, das suas estacas com os seus alicerces, a escravidão pela qual os nossos antepassados passaram, aqui no País. Mas deixaram valores que até hoje persistem e encharcam a nacionalidade brasileira.
A injustiça, Dr. Robson, é cometida pelo Estado brasileiro e por seus representantes muito mais contra negros, negras e pobres.
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Falando em tortura - e o senhor já se referiu a isso -, é a privação da liberdade até conseguir confissão. Não se compreende, não se entende, num panorama de garantias de direito e no respeito aos direitos humanos, a privação da liberdade para se arrancarem confissões.
Eu me permitiria, Dr. Robertson, fazer-lhe uma sugestão para que procure verificar o que nós aqui temos como auto de resistência e quais são as vítimas dos autos de resistência do nosso País.
Para concluir, eu peço licença para trazer uma realizada em outubro de 2014. Assim se expressou Sua Santidade à Delegação da Associação Internacional de Direito Penal:
A vida em comum, estruturada em volta de comunidades organizadas, precisa de regras de convivência cuja livre violação exige uma resposta adequada. Contudo, vivemos em tempos nos quais, tanto por parte de alguns setores da política como de certos meios de comunicação, por vezes se incita à violência e à vingança, pública e privada, não só contra quantos são responsáveis por ter cometido delitos, mas também contra aqueles sobre os quais recai a suspeita, fundada ou não, de ter infringido a lei.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada ao Dr. Carlos Moura representando a CNBB.
Eu quero registrar a presença do ex-Deputado Federal Cláudio Vignatti, do ex-Deputado Federal José Fritsch, do Deputado Federal José Mentor.
Vamos, então, agora... Eu pergunto ao Dr. Geoffrey se quer comentar a fala do doutor?
O SR. GEOFFREY ROBERTSON (Tradução simultânea.) - É muito útil lembrar Antígona, como você nos lembrou.
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Antígona era uma mulher fantástica; e Sófocles desafiou a lei que o impedia de enterrar o corpo do seu irmão. E também há, lembramos hoje, tantos outros países nos quais as pessoas foram mortas por esquadrões da morte. A essas famílias não foi permitido enterrar seus corpos. O Irã, por exemplo, é um dos piores exemplos. Em 1988, ele assassinou, matou todos os prisioneiros que eram ateus e todos os prisioneiros que não concordavam com Aiatolá Khomeini Foram para suas prisões e os mataram, só por serem ateus, por não aceitarem a religião do Aiatolá Khomeini.
Parte desse massacre foi responsabilidade do líder supremo do Irã, na época, e do Ministro da Justiça, que era um componente dos esquadrões da morte, que ordenou os assassinatos. Eles foram em covas comuns, e o Estado, ainda assim, não permitiu que os parentes descobrissem onde eles estavam e, agora, seus netos, e não permitem, até hoje, que seus netos saibam onde eles estejam para que eles possam passar pela fase de luto. E, assim, essa peça da Antígona estabelecia o direito de luto das pessoas.
Esse é um dos problemas dos esquadrões da morte com a Operação Condor, na América Latina:o assassinato secreto, especialmente de jovens, para que seus pais não pudessem passar pelo luto.
Então, parabenizo esse lembrete porque esse é um dos grandes problemas com que os direitos fundamentais humanos estão tentando lidar. Então, nosso futuro, como mundo, depende de pessoas bondosas, em países diferentes, trabalhando em direção a estabelecerem esses padrões fundamentais de decência. Não é tão difícil, e um desses padrões fundamentais, como o senhor mesmo disse, é hoje o direito a um julgamento justo por um juiz que seja imparcial.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Dr. Geoffrey.
Temos inscritos, vou ler: Deputado Federal Décio Lima, Senador Humberto Costa, Senadora Gleisi Hoffmann, Senador Lindbergh Farias, Deputado Federal José Mentor.
Vamos ouvir esses inscritos e depois avaliamos se ainda há tempo para uma nova rodada. Acaba de Pode chegar nosso Senador Paulo Paim, Vice-Presidente desta Comissão.
Então, Deputado Federal Décio Lima com a palavra.
O SR. DÉCIO LIMA (PT - SC) - Obrigado Presidenta, a quem saúdo, Senadora Regina Sousa e a louvo pela brilhante iniciativa desta audiência pública. Realmente acredito num grande acontecimento para todos nós. Talvez aqui se instrumentalize um marco para que o Brasil possa construir um salto de qualidade, fundamental na busca da garantia das relações humanistas, principalmente na aplicação da justiça.
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Quero saudá-la. Saúdo igualmente o Presidente da minha Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados. Quero saudar a presença e a biografia rica aqui representada pelo Dr. Carlos Moura, que representa a nossa CNBB.
Quero manifestar a honra e o orgulho de estar ladeado pela Dr. Valeska Teixeira e pelo Dr. Cristiano Zanin, uma das expressões que se transformaram em sujeitos da história contemporânea do nosso País, na defesa não apenas do presidente Lula, mas na defesa da construção de avanços que sonhamos que o Brasil possa alcançar.
Queria dizer ao Dr. Geoffrey, neste momento, da alegria do País em recebê-lo, pela sua expressão na condução dos direitos humanos no mundo. E quero dizer, ao mesmo tempo, que este episódio, que se representa na figura do ex-presidente Lula, na verdade, deixa transparente aquilo que os brasileiros já sabem e que viveram, ao longo da sua existência aqui, como na narrativa expressa do Dr. Carlos Moura, de 400 anos - eu diria até 517 anos - de escravidão. Os requintes ainda estão presentes nas estruturas de poder e nas relações com a grande maioria do povo brasileiro. O Presidente Lula, nesses acontecimentos, nos permite, entre tantas coisas que permitiu ao Brasil, trazer ao mundo a transparência de um conjunto de acontecimentos que não se limita a ele, mas que se pulverizam em toda a sociedade brasileira.
Dr. Geoffrey, somos o País em que temos a presença de um Judiciário que se serve a incriminação de negros, pobres e, agora recentemente, petistas, que, na verdade, são a expressão dessas duas primeiras afirmações.
O Presidente Lula merece ser abraçado, não só pelo povo brasileiro. Ele está, nesse momento, nas caravanas pelo Nordeste do Brasil, embora escondido pela mídia, pelos conservadores, pelas elites, que, tenho certeza, envergonham até o neoliberalismo moderno porque as expressões das elites brasileiras têm requintes medievais.
O Presidente Lula, nesse momento, merece ser abraçado, portanto, pelo mundo, assim como foi Gandhi, num dado momento da história da humanidade, pelo que ele representou; Mandela, mais recentemente, porque ele é o desaforamento das contradições que agridem profundamente os valores que alcançamos do ponto de vista do humanismo na sua extensão e que tem como centralidade, foco, os direitos humanos.
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O Presidente Lula desaforou não só o Brasil, mas o mundo, porque em nenhum lugar do mundo se elegeu um operário à Presidência da República com as características do Presidente Lula, de retirante nordestino, condenado já na sua existência na infância, como milhões de brasileiros, a morrer de sede. Venceu as adversidades da crueldade das relações a que o Brasil ainda está submetido. E desaforou de forma extraordinária que se traduziu em sonho, mas um sonho que nós mesmos, em dado momento da história, não acreditávamos que poderia acontecer. Era o sonho de levar para uma cadeira da Presidência da República as feridas e as dores do povo brasileiro, na expressão daquilo que há de mais repugnante na vida da humanidade contemporânea, que eram as condições em que o Brasil se encontrava.
Era um Brasil conhecido por V. Exªs lá fora, no mundo desenvolvido, como um país apenas do futebol e do carnaval e que, de repente, passou a reduzir drasticamente, aos olhares do mundo, os requintes da crueldade do sistema como o País que se elevou na condição econômica do mundo e um País que, sobretudo, tratou, numa rapidez única na História, de feridas humanas com que aqui convivíamos, como o flagelo do desemprego, a falta de casa para o seu povo, a divisão da riqueza. Houve processos de inclusão, que permitiram que o País, em três anos e meio, tivesse a possibilidade de sair do mapa da fome, monitorado pela ONU.
Portanto, trago aqui para V. Exª, além de indagações, que ontem já tive a honra de fazê-las, um pedido a V. Exª: saia do Brasil abraçado não com uma ação apenas que se limite às decisões de um Judiciário visivelmente comprometido, mas saia com uma causa de valores que os direitos humanos precisam pautar no mundo e com a defesa incontestável de que isso dará exemplo para as gerações futuras, do ponto de vista dos direitos humanos e do humanismo.
Os acontecimentos em foco referem-se ao processo que tem o Dr. Zanin e a Drª Valeska sobretudo como grandes protagonistas. É uma luta marcada até pela crueldade, porque o ringue é imparcial. O Judiciário brasileiro não é apenas a figura que expressa a maioria do Judiciário, do Juiz Sérgio Moro, mas é contexto do Poder Judiciário. Ou seja, precisamos aqui, nestes acontecimentos, com as forças dos direitos humanos no mundo, tratar nesse episódio, de estabelecermos um marco regulatório. Ou o Brasil vai se corrigir ou vai continuar na saga, infelizmente, dos erros que têm acontecido.
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Nós precisamos fazer reformulações rápidas, porque o Lula ainda tem o segundo grau, ainda tem a empatia do povo, tem as mãos carinhosas internacionais, como aqui V. Exª traz, mas a maioria do povo brasileiro submetido a essas regras não tem absolutamente esses valores na sua defesa. Ele tem o grilhão de uma espada que não é de Minerva, e tem ali uma seta mortal naquilo que há de mais elementar na vida humana, que é o seu direito de defesa, que praticamente inexiste na grande maioria dos procedimentos penais do Brasil.
Eu aqui faço também um apelo a V. Exª para que essa denúncia possa, portanto, se extravasar. Os acontecimentos que se reúnem em torno do Juiz Sérgio Moro... Ontem V. Exª nos dizia, quando aqui pisou no Brasil, aqui no Senado Federal, que um juiz dessa natureza não só poderia estar na suspeição do processo, afastado do processo, mas como, no Reino Unido, praticamente estaria respondendo a ações penais em decorrência disso. E aqui, no Brasil, o que vimos é uma impunidade acobertada pela institucionalidade de todos os Poderes, inclusive, lamentavelmente por este Poder em que aqui estamos, porque os seus representantes estão naquilo que há de mais obscuro na política brasileira, submetidos ao fisiologismo e às políticas que contaminam os interesses públicos com os interesses do mercado.
Portanto, Geoffrey, tenho certeza de que sua presença aqui no contexto desta audiência nos traz também um otimismo que precisamos ter. Nós podemos perder, às vezes, os sorrisos, mas não vamos perder o otimismo que nos impulsiona nessa causa de valores porque sabemos claramente que, se a história não nos reservar essa condição de protagonizarmos esses valores, a sociedade brasileira, o humanismo no mundo, não encontrarão horizontes numa perspectiva daquilo que temos sonhado ao longo da nossa existência.
Deixo, portanto, essas últimas indagações aqui para que V. Exª possa explicitar ao Brasil, aqui nesta audiência, que tenho certeza terá esse alcance, para que pelo menos a intelectualidade mediana possa ter compreensão. Peço que V. Exª descreva claramente a condição deste processo, que, na verdade, é a síntese de nossos problemas.
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Como nós poderíamos comparar esse Judiciário na história da humanidade e, principalmente, na história contemporânea? Quais são os requintes que esse Judiciário de perversidade aponta do ponto de vista da agressão aos direitos humanos? E, sobretudo, a figura do Dr. Sérgio nessa condição de país de Primeiro Mundo?
Muito obrigado.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Deputado Décio.
O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Senadora Regina.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Eu gostaria só de...
O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Como eu tenho que...
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Eu vou passar.
Eu gostaria só de pedir prudência. Eu deixei de marcar tempo, mas gostaria de pedir prudência aos companheiros, Senadores, Deputados, para que usemos o tempo dentro de uma razoabilidade, para dar tempo a todo mundo falar.
O Senador Humberto Costa tem um compromisso também, então, ele gostaria de falar. E depois eu passaria para o Dr. Geoffrey.
Com a palavra o Senador Humberto Costa.
Registro a presença de José Francisco, que representa o Sindicato dos Professores do Distrito Federal.
O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Senadora, obrigado por me conceder essa oportunidade, porque na verdade estou pretendendo participar do evento que está acontecendo na Câmara, que trata do decreto que vai colocar a possibilidade de exploração mineral em terras da Amazônia. Entendo que é um evento importante para nós acompanharmos.
Eu queria só fazer uma pergunta ao Dr. Robertson: como o senhor analisa esse instrumento da delação premiada, como é feito aqui no Brasil e na Lava Jato? O senhor acredita nos acordos feitos por réus presos e a validade das informações como prova para condenar outros em troca de liberdade?
Isso é condizente com a legislação internacional ou com legislações internacionais de defesa?
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Pronto?
Dr. Geoffrey com a palavra.
O SR. GEOFFREY ROBERTSON (Tradução simultânea.) - Nós vimos, na nossa denúncia, a forma como as pessoas estão sendo levadas para a prisão, até que elas sejam forçadas a confessar. Esse é um problema, porque todo advogado criminal, todo mundo no sistema penal de qualquer país sabe das pressões sobre uma pessoa encarcerada para confessar são profundas.
O que aparece frequentemente, mesmo apenas depois de dois dias na prisão, são confissões falsas. E dessa forma a pessoa responsável pela prisão fala para as autoridades o que elas querem ouvir, para que o prisioneiro seja liberado. E isso não é considerado necessário em Hong Kong, em Singapura, em Sidney, nos Estados Unidos. Isso é simplesmente uma forma de extrair confissões, que precisam ser verificadas antes de serem levadas em conta. Em alguns aspectos, uma confissão que fala onde uma bomba foi escondida pode ser verificada. A polícia pode até lá para tentar encontrar o corpo, a bomba, seja lá o que for.
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Mas o problema com muitas dessas confissões orquestradas é que existe um sistema que está acontecendo, no qual os promotores tentam construir um caso. Eles têm suas próprias ideias sobre o que aconteceu. Eles dizem para a pessoa encarcerada o que eles querem ouvir delas. E essas pessoas sabem que, para saírem dessa prisão, vão precisar dizer o que se espera. E é por isso que muitas confissões forçadas muitas vezes são erradas. E elas não são necessárias porque você pode utilizar outros instrumentos, interrogatório compulsório, para que não haja, por exemplo, pressões escondidas. Dessa forma, você vai conseguir conquistas muito maiores se comparadas ao que o Juiz Moro conseguiu ao prender as pessoas, porque acontecem delações premiadas questionáveis.
Essas delações também acontecem com grande redução das sentenças. Muitas vezes, as pessoas responsáveis pela criminalidade real, pela grande corrupção recebem apenas uma fração da sentença que deveriam receber. O que eu diria, então, é que concordo com você. Deter as pessoas nas prisões por cem dias ou por um ano até que elas confessem o que os promotores querem ouvir é uma forma primitiva de lidarmos com a coleta de evidência. É uma forma de tortura, vamos encarar dessa forma. Existem outras formas de lidarmos com isso.
Nós sabemos que existe tortura. Nos Estados Unidos aconteceu isso na época do George W. Bush. E essas práticas foram condenadas pelos direitos humanos. Você simplesmente tirar uma pessoa da convivência da sua família por cem dias ou por uma semana certamente é um tratamento não humano.
E temos que tomar muito cuidado com os resultados que saem dessas práticas, eles não são confiáveis. E a confiabilidade é uma medida muito importante na hora em que nós estamos buscando evidências criminais.
Não vou falar mais nada sobre isso, mas vou mencionar que o Brasil já foi criticado por diferentes grupos de direitos humanos e por diferentes grupos de pessoas, por manter muitas pessoas nas prisões.
Essa é uma questão diferente, mas vocês têm que observar os seus juízes, se eles não permitem a fiança. Esse é um problema que já foi reconhecido no Brasil, e nós acreditamos que o Brasil seja um dos países onde esse problema é mais grave na América Latina, pois eles negam a fiança às pessoas antes de seu julgamento. E, às vezes, isso demanda anos.
Em relação aos seus comentários, Senador, sou muito feliz e muito grato. Concordo com eles. E não tenho dúvidas de que o Brasil vai sair desses momentos tão difíceis, e vocês vão olhar para trás, observando essa condenação do Lula, e perceber que isso foi algo errado.
O Lula foi o Presidente que fez com que o País se tornasse uma grande potência mundial, participando dos BRICS, aquele grupo do Brasil, da Rússia, da Índia e da China, países que iriam concorrer com os Estados Unidos no futuro.
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Acredito então que na história vocês vão olhar para trás, talvez assim como os gregos olharam para trás para o julgamento de Sócrates, vendo que isso foi algo errado, mas que foi corrigido.
Existem grandes promotores na história. Temos Vyshinsky, que foi responsável por orquestrar o julgamento de Stalin, na década de 30. Ele fez com que as pessoas confessassem o que ele queria ouvir, senão, eles simplesmente torturariam as suas famílias.
Também temos o Tinville, na Revolução Francesa, um grande promotor que começou enviando os aristocratas à guilhotina e depois os jacobinos. E finalmente ele mesmo foi para a guilhotina. E ele falou, antes de ser morto, que estava apenas fazendo a sua tarefa.
Enfim, nós sabemos que os promotores têm um trabalho a fazer, têm que juntar todas as evidências contra as pessoas que eles acreditam estarem erradas, mas também têm uma diferente tarefa - todos os advogados recentes reconhecem isso: a tarefa de fornecer e garantir um julgamento justo.
Em países como a Eslováquia - vou usar isso como um exemplo -, depois da guerra, os comunistas começaram a liderar. E houve diferentes julgamentos terríveis, onde julgamentos que eram oficiais de partidos foram presos e executados. Foi um período terrível para o território que hoje em dia pertence à República Tcheca.
Temos também diferentes heróis dos direitos humanos que, muitas vezes, defenderam julgamentos justos. Muitos deles também foram presos. Nessa época, nós... Estou aqui apenas mencionando a República Tcheca que saiu de um período de julgamentos que não foram justos e que agora se tornou um dos líderes da área de direitos humanos.
Portanto, tenho certeza de que o Brasil certamente vai estar nessa posição no futuro.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Senadora Fátima Bezerra...
Vou compartilhar aqui a Presidência com o Deputado Paulão, Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, enquanto me ausento por algum tempo. O SR. PRESIDENTE (Paulão. PT - AL) - O próximo inscrito, Deputado Federal José Mentor.
O SR. JOSÉ MENTOR (PT - SP) - Senadora Regina, Deputado Paulão, quero cumprimentar os convidados, Dr. Geoffrey, Dom Carlos Moura, da CNBB, Deputados e Senadores. Quero pedir ao Cristiano e à Valeska que levem um abraço ao meu grande amigo titular Roberto Teixeira.
Eu tinha duas questões, mas uma delas o Senador Humberto já fez.
Eu gostaria, Dr. Geoffrey, de complementar um pouquinho a resposta que o senhor nos deu sobre a questão da delação premiada, com esse sentido que foi colocado pelo Senador Humberto de que ela tem conotação de transformar a prisão singular em preventiva e a preventiva em perpétua até que confesse.
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E há as manobras que são utilizadas nesse sentido, até chegar ao ponto de, em alguns casos, haver a fixação da fiança, que é uma fiança impagável, quando se estabelece um valor que é impossível de a pessoa obter, e isso permite ainda que continue preso e continue sob tortura nesse aspecto psicológico. O desdobramento disso, que também é um aspecto importante, não sei da comparação com o direito internacional, é a utilização da palavra do denunciante, do colaborador, como único aspecto da acusação.
Não sei se nos outros países não se exige primeiro a fala, a denúncia, a comprovação do que ele diz para haver o benefício. Aqui, não. Fala, assina o termo, homologa, resolveu, e aquele que é citado passa a ser denunciado, com a única prova da citação do delator.
Então, estou pegando dois outros aspectos da pergunta que fez o Senador Humberto. Esse é um aspecto mais questionável.
A minha outra consideração, Dr. Geoffrey, não vai ter o conhecimento e a erudição daqueles que me antecederam, mas eu queria fazer três ou quatro pequenas reflexões para chegar ao dia de hoje.
A mídia, no Brasil, tem, de muito tempo para cá, um papel preponderante. Ela utilizou vários momentos de se afirmar como tal. Não podemos nos esquecer aqui de que, em 1989, quando o Presidente Lula disputou a eleição, uma manobra, num debate assistido por todos naquela época, a primeira eleição direta, a edição do debate, a maneira como ele foi propagandeado nos dias seguintes levou a uma pequena margem, e o Presidente Lula perdeu a eleição, em 1989. É claro que houve alguns outros fatores, mas esse foi um fator determinante. O Presidente disputou várias outras eleições e veio a ganhar em 2002.
Em 2003, junho, seis meses depois de o Presidente tomar posse, instalaram aqui uma comissão mista chamada Comissão do Banestado, em que também existia uma articulação entre parte da elite, parte de alguns partidos de oposição e parte da mídia que transformou essa CPI num escândalo. E se tentou, por várias medidas, atingir o governo. Falo isso porque eu tive a oportunidade de ser Relator dessa CPI.
Naquela ocasião, Dr. Geoffrey, veja que coisa interessante, o juiz da vara em Curitiba era o Dr. Sérgio Moro; o procurador era o Carlos Eduardo Fernandes, era o mesmo procurador. E ali também se tentou, de várias maneiras, atingir o governo que acabara de se instalar, não tinha seis meses. Essa CPI durou um ano e pouco.
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Logo em seguida, Deputado Paulo, veio a questão dos Correios e o desenrolar, o desenvolvimento da Teoria do Domínio do Fato na CPI dos Correios - quer dizer, a extrapolação da Teoria do Domínio do Fato. O que aconteceu no Brasil? O advogado, o jurista que desenvolveu a teoria nega e aqui ela foi aplicada da maneira tupiniquim. Por que estou falando dessas coisas? Porque, de novo, a mídia teve um papel determinante. Eu não sei se é mesma coisa em outros países, mas aqui, no Brasil, já vi a mídia eleger Presidente, derrubar Presidente, eleger Senador, derrubar Senador, eleger Deputado, derrubar Senado. Agora eu nunca tinha visto a mídia constranger o Supremo Tribunal Federal. Nunca tinha visto! E nós vimos aqui.
Nós vamos nos recordar do Ministro Lewandowski num restaurante. No dia seguinte, a conversa do restaurante que ele teve estava todinha no jornal. Não vamos nos esquecer da troca de mensagens entre dois Ministros do Supremo numa audiência do Supremo. No dia seguinte, estava todinha no jornal. Quer dizer, eu estou dando um pouco mais de realce a esse aspecto, porque me parece que, de novo, aqui temos uma situação que foi se alastrando, ampliando desde quando o Presidente Lula assumiu em 2002. Ganhou a eleição e assumiu em 2003, com a CPI do Banestado, com a CPI dos Correios até chegar à situação de hoje.
Lá tínhamos uma parte de partido de oposição, uma parte da elite, uma parte da mídia que hoje se somam a uma parte das carreiras de Estado: parte do Ministério Público, parte do Judiciário. Isso sob a tutela e a batuta de um constrangimento diuturno que a mídia faz. Como eu disse, um constrangimento que leva o Supremo, em alguns momentos, a tomar decisões de olho na manchete do jornal, de olho no que, no dia seguinte, vai sair na televisão e no jornal. Eu não sei se isso ocorre em outros países dessa maneira.
Eu ouço dizer que, nos Estados Unidos, os democratas nomeiam democratas no Supremo. Os republicanos nomeiam republicanos no Supremo. Nem isso nós fizemos aqui. Lula nomeou nove Ministros do Supremo. E cada um deles tem uma cabeça. E a Teoria do Domínio do Fato apareceu na sua forma tupiniquim com esses Ministros do Supremo.
Por que digo isso? Porque de novo eu, lá em 2003, Dr. Gooffrey, participei da constituição de uma força-tarefa sui generis, que foi a CPI do Banestado, representando o Congresso, o Ministério Público, como uma instituição independente, e o Executivo através do Ministério da Justiça. Fizemos uma força-tarefa e fomos aos Estados Unidos. Conseguimos, pela primeira vez, o sigilo de contas de brasileiros no exterior de um dia para o outro numa força-tarefa que juntou esforços, mas o Congresso era o Congresso, o Ministério era o Ministério e o Executivo era o Executivo. Hoje a força-tarefa de Curitiba ninguém sabe o que é, porque o Delegado de Polícia que representa o Executivo, junto com a Polícia Federal, que é responsável pela investigação que é fiscalizado pelo Ministério Público e está subordinado ao juiz.
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Isto aqui virou um ilê: a independência dos Poderes Executivo e Judiciário inexiste. A independência do órgão Ministério Público inexiste. E todos eles estão subordinados ao Poder Judiciário, que acaba dizendo: "Vá buscar, vá prender, vá acusar que eu julgo". Quer dizer, é uma coisa inadmissível. O Judiciário não é Judiciário. O Executivo não é Executivo e o Ministério Público não é Ministério Público. Virou um angu, uma coisa só.
Estou lhe indagando dessa maneira porque acho que o esforço do Estado em juntar as suas instituições para obter um resultado de interesse da sociedade não apresenta problema algum. Mas, na hora em que isso se torna uma maneira de abstrair o direito do cidadão e da sociedade, isso vira outra coisa.
Então, a minha segunda indagação ao senhor é: de que maneira esse esforço das várias instituições do Estado nas experiências internacionais consegue preservar os direitos do cidadão e da sociedade. Muito obrigado.
O SR. GEOFFREY ROBERTSON (Tradução simultânea.) - Em resposta à sua primeira pergunta, Deputado, olhando a submissão que dissemos nesta petição, segundo a qual a Lei Internacional proíbe a detenção quando o propósito é, por pressão, fazer uma testemunha ou um réu confessar, nós citamos que um promotor da Operação Lava Jato disse de forma cruel: "Para o pássaro cantar, tem que estar enjaulado". Então, você tem que colocar esse pássaro numa detenção para que ele possa cantar. Isso é errado. O pássaro vai cantar de forma livre fora da detenção também. Mas essa é a forma cruel, a técnica do Juiz Moro para fazer com que as pessoas vão para a prisão por um longo período.
Refiro-me às pessoas que não foram julgadas, nem condenadas, pessoas que têm família, que talvez estejam sujeitas a ataques cardíacos, que estejam doentes. Então, colocá-las em prisões sem nenhum tipo de julgamento durante centenas de dias até que eles confessem ou até que eles envolvam mais alguma outra pessoa, segundo a Lei Internacional, é errado. A verdadeira razão para a política da Operação Lava Jato é extrair uma confissão. E não é necessário dizer, porque há uma experiência forense ao redor do mundo segundo a qual as confissões extraídas nessas circunstâncias tenham probabilidade de não ser confiáveis. Então, a estratégia do Juiz Moro quebra as leis em relação à autoincriminação. Então, eu volto para as leis do Brasil e convido vocês a prestarem atenção também nisso.
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O Juiz Moro justifica o seu comportamento em relação ao art. 312 do CPP (Código de Processo Penal), chamando isso de prisão preventiva para que impeça que outros crimes sejam cometidos. Para manter a ordem pública, tudo bem, se alguém for louco, estiver determinado a matar outras pessoas, é claro que você deve colocá-lo na prisão antes do julgamento.
Ordem econômica ou o que quer que isso queira dizer, isso é uma frase estranha para a conveniência de uma investigação criminal. A conveniência ou a necessidade... Que palavras estranhas, muitas confusas nas suas leis! É para a conveniência do Juiz Moro colocar as pessoas nas gaiolas para que elas cantem. Vocês devem ver o art. 123, que dá aos Promotores uma carta branca para: "Se você vai ficar durante um ano na prisão, é para minha conveniência. É para a conveniência da minha investigação". Isso é uma lei muito ruim que está nos seus códigos.
No meu ponto de vista, a Lei Internacional não permite isso. Então, vocês têm que ver o art. 312 e seguir os Tratados dos Direitos Humanos que o Brasil assinou em relação à detenção. Então, vou citá-los para vocês. Está estabelecido na Lei Internacional que você pode manter determinadas pessoas em custódia para impedir que elas pessoas escapem antes do julgamento, para que elas não fujam da justiça. Isso é permitido, tudo bem, como também é se há contas no exterior que estão conectadas em relação a isso, para que elas não desapareçam. Agora, não para que elas não confessem algo mais. Para que elas permaneçam até o julgamento, você pode impedir que elas não interfiram para impedir que cometam outros crimes. Se forem acusadas de estupro, por exemplo, vocês podem mantê-las na prisão até o julgamento.
Então, essas são as razões pelas quais você tem o direito de colocar as pessoas na prisão, mas não no que tange à conveniência para a Promotoria. Isso é uma palavra negativa, talvez necessária, mas não conveniente. Eu creio que há uma questão que deve ser observada em relação ao art. 312 da Convenção Internacional que garante o direito ao habeas corpus. Você não deve, como o Juiz Moro faz, deter pessoas para obter os testemunhos delas.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Geoffrey, combinamos que não íamos marcar tempo, que íamos usar a razoabilidade. Nós estamos com problema, mas eu não vou marcar para os últimos, para não ficar injusto. Mas pedimos também que as pessoas usem o tempo com razoabilidade para podermos contemplar todos.
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Com a palavra a Senadora Gleisi Hoffmann.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Obrigada, Senador Regina.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Eu quero registrar a presença da Senadora Vanessa Grazziotin.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Obrigada, Senadora Regina, eu vou ser breve.
Quero cumprimentar V. Exª, cumprimentar também o Deputado Paulão, cumprimentar o Dr. Carlos Moura e cumprimentar muito especialmente o Dr. Geoffrey. Agradeço muito a sua presença aqui. Cumprimento também a Dr. Valeska, o Dr. Cristiano. E quero agradecê-los por viabilizar que o senhor possa estar hoje no Senado da República do Brasil, na Comissão de Direitos Humanos, numa reunião feita em conjunto com a Comissão de Direitos Humanos da Câmara, falando coisas tão importantes e esclarecedoras para nós.
Uma das coisas que o senhor falou e que acho que precisamos repetir aqui à exaustão é que, na Europa, juízes que se comportasse assim como se comporta Sérgio Moro seriam terminantemente afastados dos casos em que estivessem com o poder de julgar. Isso não acontece no Brasil.
Desde o início da Operação Lava Jato e das investigações, inclusive da atuação do juiz Sérgio Moro, nós estamos denunciando a forma como esse processo vem sendo conduzido, que não tem imparcialidade e que tem perseguição clara ao Partido dos Trabalhadores e ao Presidente Lula. É muito claro isso. E nós tivemos, durante todo esse tempo, um contraponto de setores da sociedade dizendo que não se tratava disso.
Então, quando alguém de fora com a sua referência e a sua importância nos diz isso e vem aqui para o Brasil dizer, porque o senhor já tinha se manifestado na imprensa e também no Comitê de Direitos Humanos da ONU, é de grande relevância e de grande importância. Eu acho que chama atenção deste Senado da República e da Câmara dos Deputados para a necessidade de uma investigação legislativa sobre esse processo da Lava Jato. Acho que é uma obrigação do Congresso Nacional, porque isso fere a nossa democracia e é um atentado aos direitos humanos. E é um atentado ao Estado democrático de direito, porque isso não atinge apenas o Presidente Lula, isso tem atingido milhares, milhões de brasileiros, o sistema judiciário se comportando dessa forma. Acho que, quando chegou ao Lula, isso ficou mais evidenciado.
Nós tivemos um caso, recentemente - eu inclusive usei-o para um pronunciamento -, que foi o filho de uma desembargadora pego com quilos de droga dentro do carro. Ele não ficou preso nem uma hora, foi solto. Há outro rapaz que participou das manifestações políticas de 2013 e foi pego com dois vidros de desinfetante. Foi alegado contra ele que ele estaria fazendo um atentado à segurança, porque aquilo poderia ser algo que colocaria em risco a vida das pessoas. Ele está preso até agora. A diferença é que ele é negro e pobre, o filho da desembargadora é branco e rico.
Parece-me que, com o Presidente Lula, as coisas estão se dando da mesma. O que acontece na Lava Jato chega a ser escandaloso. Os delatores, a maioria gente afortunada, com contas no exterior, altos escalões do serviço público, da Petrobras, empresários com muito dinheiro, têm feito delações e se safado das suas penas. Estão cumprindo prisão domiciliar e não têm pagado grandes multas. Nós estamos com uma inversão dos fatos aqui no Brasil, o que é muito ruim para a Justiça brasileira.
Então, eu queria agradecer muito a sua passagem aqui no Brasil. Tenho certeza de que ela é um divisor de águas.
E convido este Congresso a fazer uma investigação. Nós temos que saber por que o juiz Sérgio Moro, por exemplo, diz que não pode ouvir o Dr. Duran no processo do Presidente Lula, assim como pediram o Dr. Cristiano e a Drª Valeska, dizendo que se trata de um criminoso, de uma pessoa investigada.
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Ora, o que foi a Operação Lava Jato até agora senão montada em cima de falas de criminosos e investigados, que são os delatores? Então, nós temos dois pesos e duas medidas? O que vale para um não vale para outro? É sobre isso que estamos falando e nós não podemos deixar que essa fotografia do Brasil saia assim lá fora.
Ontem, quando nós conversávamos um pouco com o senhor, eu acho que uma das questões que o senhor colocou é muito ilustrativa disso. Como podem juízes da Operação Lava Jato ir para um cinema comer pipoca e assistir a um filme que faz elogios às suas atuações num caso que tem lado, que não é imparcial?
Como a gente assiste isso e acha que é natural? Não pode ser natural. Justiça não faz política; se juiz quer fazer política, que se candidate, venha para arena política, faça o debate. É do jogo da democracia. Agora, nós não podemos admitir esse conjunto de coisas.
Então, eu queria que a gente pensasse muito isso, Senadora Regina, Deputado Paulão. Que a gente pudesse abrir um processo investigatório no Congresso Nacional sobre a Lava Jato, sobre o olhar legislativo em relação às aberrações e abusos que estão acontecendo nessa operação.
E queria também fazer uma sugestão para que a Comissão de Direitos Humanos enviasse cópia das notas taquigráficas desta audiência para as comissões de direitos humanos das Assembleias Legislativas, das Câmaras Municipais, onde houver, para as Secretarias de Direitos Humanos dos Estados brasileiros e também para o Alto Comissariado da ONU e para os órgãos permanentes de direitos humanos da ONU, como é o caso do Comitê de Direitos Humanos da ONU, e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA.
Eu acho que esse é o grito que nós temos que fazer para o Brasil e para o mundo sobre as atrocidades que estão nesse processo, principalmente contra o Presidente Lula.
E gostaria, mais uma vez, de agradecer e parabenizar o Dr. Geoffrey.
Muito obrigada.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Muito obrigada, Senadora Gleisi.
Será encaminhado o que a senhora está sugerindo, porque não depende de requerimento. É apenas é um encaminhamento da audiência pública.
Dr. Geoffrey, posso passar para alguma outra...
O SR. GEOFFREY ROBERTSON (Tradução simultânea.) - Porque nós estamos com o tempo um pouco limitado, eu vou responder após todos eles falarem ao final.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Então, com a palavra jogadora Fátima Bezerra.
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN. Sem revisão da oradora.) - Senadora Regina, a quem quero cumprimentar, e Deputado Paulão - Presidentes das Comissões de Direitos Humanos do Senado e da Câmara dos Deputados -; Advogado Carlos Moura, representando aqui a CNBB.
Faço uma saudação muito especial ao Advogado Geoffrey e, igualmente, quero fazer minhas as palavras da Senadora Gleisi no sentido de ressaltar a importância da sua presença aqui no Brasil, pela sua trajetória, pelo seu currículo, um dos três juristas mais conceituados, hoje, em nível internacional, com uma carreira reconhecida, repito, pela trajetória de muita seriedade.
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Quero igualmente, aqui também, estender os meus cumprimentos ao Dr. Cristiano Zanin e a Drª Valeska.
Duas questões, Advogado Geoffrey: primeiro, com relação à questão dos direitos humanos. V. Sª se notabilizou também como advogado militante nessa área da defesa dos direitos humanos, e eu gostaria que o senhor pudesse discorrer um pouco sobre qual o seu olhar no sentido do papel que as instituições e os organismos têm na luta em defesa dos direitos humanos, considerando o momento que o mundo vive, com o crescimento do nacionalismo conservador, da xenofobia, da intolerância. Enfim, com o crescimento desses, como o senhor, portanto, avalia o papel dessas instituições? Ou seja, nós estamos em um momento de muita ameaça. Quais as saídas que se tem para afirmar a luta em defesa dos direitos humanos?
No caso do Presidente Lula, eu queria também aqui colocar duas questões. Primeiro, aqui lembrando uma frase que o Presidente Lula e seu brilhante e talentoso advogado gostam muito de dizer, que é aquela compreensão de que, evidentemente, ninguém está acima da lei, mas também ninguém pode estar abaixo da lei, no sentido de que o processo tem que se ater, no caso da Operação Lava Jato contra o Presidente Lula, ao devido processo legal.
E o que temos visto nesse episódio da Operação Lava Jato, essa condenação injusta contra o Presidente Lula, é uma inversão exatamente daquilo que a lei exige, que é o respeito ao de visto devido processo legal; e uma invenção, inclusive, daquilo que a lei exige que é o ônus da prova a quem acusa.
No caso do Presidente Lula, nós temos assistido exatamente o contrário. O Presidente Lula foi quem teve que apresentar provas e mais provas da sua inocência através do depoimento de dezenas de testemunhas, dezenas de testemunhas que, com muita clareza, apresentam as provas de inocência com relação ao Presidente Lula nos processos que o Juiz Sérgio Moro apresentou contra ele, agora, inclusive, em fase de condenação.
Ou seja, Dr. Geoffrey, para nós está muito claro que a acusação contra o Presidente Lula não se sustenta de pé do ponto de vista jurídico. Não há materialidade. Tanto o papel do Dr. Cristiano Zanin e, inclusive, o de V. Sª, com muita clareza e com muita consistência, mostram isso: não se sustenta do ponto de vista jurídico de maneira nenhuma.
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Na verdade, o que há por trás disso é, simplesmente, uma acusação de natureza política. Ou seja, para nós está muito claro que o que se quer é cassar os direitos políticos do cidadão.
E quanto mais, inclusive, cresce o sentimento da maioria do povo brasileiro no sentido, inclusive, de desejar que Luiz Inácio Lula da Silva, como cidadão - se assim o partido dele decidir, e ele também queira -, possa disponibilizar o nome dele para uma eventual disputa à Presidência em 2018, para nós do PT está muito claro, portanto, que essa acusação tem, sim, esse fim de natureza política: ou seja, inviabilizá-lo. Isso porque, segundo a legislação, uma eventual condenação em segunda instância o tiraria da disputa político-eleitoral.
Então, fiz essas considerações para no final deixar, Senadora Regina - e concluo - só duas indagações aqui ao Dr Geoffrey.
Primeiro, caso a ONU confirme que o ex-Presidente Lula sofreu perseguição de um juiz parcial, o que acontece? O que caberia ao Parlamento brasileiro, no caso a nós, fazer? Como tornar efetiva a decisão da ONU?
E a última indagação: como o senhor analisa as delações premiadas como são feitas na Operação Lava Jato? Como analisa acordos com réus presos e a validade de suas informações como provas para condenar outros em troca de sua liberdade? É isso condizente com legislações internacionais de defesa?
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Quero registrar a presença do Sr. José Bezerra da Silva, representante dos militares perseguidos políticos pelos próprios militares da ditadura de 64.
Com a palavra a Senadora Vanessa Grazziotin.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Muito obrigada, Senadora Regina. Quero cumprimentar V. Exª e, ao fazê-lo, cumprimento os demais Parlamentares que aqui estão; os convidados e, em especial, o Dr. Geoffrey. Ontem, tentei muito conversar com V. Sª, mas, quando cheguei, a conversa já havia sido concluída.
Quero também cumprimentar os advogados aqui presentes e publicamente parabenizá-los pelo belo trabalho que estão desenvolvendo.
A sua vinda aqui, para nós todos, tem um significado da maior importância. Talvez o senhor não tenha ideia do quanto a sua vinda aqui é importante, porque V. Sª é uma das principais figuras na área jurídica e acadêmica do mundo.
V. Sª é reconhecido pela defesa dos direitos humanos, e quem defende os direitos humanos defende, em primeiro lugar a justiça, justiça para quem quer que seja, para quem tem posses ou para quem não tem posses, para todo cidadão e cidadã, que têm de ter o direito à Justiça e ao tratamento respeitoso por parte da sociedade.
O Estado brasileiro, como todos os outros, se organiza para isso; os Poderes se organizam para isso, ou seja, para proteger, e não para investir contra as pessoas.
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Aqui, no Brasil, nós vivemos problemas históricos. Aliás, somos uma democracia muito jovem, somos uma democracia em construção, somos uma sociedade jovem em construção. Nós, se formos ver o tempo, o período em que o trabalhador brasileiro passou a ter algum direito, em nosso País, nós vamos ver que não chega a um século. Antes da década de 30 do século passado, o trabalhador brasileiro não tinha direito algum. Trabalhava mais de 12 horas por dia, não tinha direito a férias, não tinha direito ao descanso semanal remunerado.
Pois, Dr. Geoffrey, hoje, no Brasil, a gente vive tantas mudanças, e são mudanças que começam a acontecer a partir do ano de 2016, que é algo assim que, muitas vezes, nós próprios não estamos acreditando no que está acontecendo.
Em nome da modernidade, em nome do avanço tecnológico, eles estão aprovando leis, mudanças na Constituição, que simplesmente nos colocam na mesma situação em que estávamos antes da década de 30 do século passado: trabalhador sem nenhum direito. Isso porque a moda, agora, é dizer que não é o trabalhador. "Eu não tenho nenhum empregado. Existe, do meu lado, um outro cidadão ou uma cidadã que presta serviços, que é autônomo". Olha que bonito: é autônomo; é independente; é livre para escolher para quem trabalha, porque é autônomo, porque é independente. Mas é o mesmo empregado, prestando o mesmo serviço, mas que não vai ter direito a carteira, que não vai ter direito a férias, que não vai ter direito a décimo terceiro, a nada!
Nós temos uma situação, no campo, que é algo, assim, inacreditável. Não é, Eva? São milhares de mortes de trabalhadores rurais. E os mandantes dos assassinatos, assim como aqueles que assassinam, permanecem impunes. Quando muito, os assassinos diretos são punidos; os mandantes, não.
Enquanto a gente vê tudo isso acontecendo, o Governo exigindo sacrifício de todas as pessoas, a gente vê, por um outro lado, outros projetos tramitando, perdoando dívidas do grande latifundiário, perdoando dívidas do grande empresário, daqueles, enfim, que fraudaram, a vida inteira, o Fisco brasileiro, tirando recursos que deveriam ir para a educação, para a saúde. Esses estão sendo perdoados.
Agora, Dr. Geoffrey, eu estou falando isso, rapidamente, para dizer a V. Sª o seguinte: essa foi a verdadeira razão do golpe. O que nós vivemos, não no Brasil, mas no mundo, é uma grande mobilização - e que tem a ver uma com a outra - no sentido de tentar aumentar o ganho do capital, retirando o direito do mais humilde, do mais pobre, do povo trabalhador.
Então, quando tiraram a Presidenta Dilma, num processo de impeachment fajuto... Porque aquilo não foi impeachment; aquilo foi um golpe. E, infelizmente, para que um golpe seja vitorioso, além do Parlamento, é preciso ter o apoio da grande mídia, é preciso ter o apoio do Poder Judiciário. Infelizmente, tudo isso aconteceu no Brasil. Mas o objetivo não era tirar uma mulher, a primeira a presidir este País, não! O objetivo era fazer o que eles estão fazendo agora: acabando com reservas ambientais, tirando o direito de trabalhador, liquidando o Brasil... Nós não podemos nem dizer - não é, Senadora Regina? - "colocando o Brasil à venda". Não. É liquidando o Brasil. Liquidando o Brasil. Era esse o grande objetivo.
E, para que façam isso, eles têm que desmoralizar um projeto político. E qual é o alvo principal para desmoralizar o projeto político? O ex-Presidente Lula.
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Eu, Dr. Geoffrey, não sou do Partido dos Trabalhadores, não tenho filiação ao Partido do Presidente Lula. O meu Partido é o PCdoB. Eu sou do Partido Comunista do Brasil, mas defendo o Presidente Lula, primeiro, porque defendo a justiça; segundo, porque sei que ele é apenas o alvo porque ele é quem nos representa dentro de um projeto político de País diferente, que busca a justiça social, que busca o respeito aos direitos humanos. É isso que nós estamos vivendo no Brasil hoje.
Nós estamos aqui neste plenário. Aqui do lado, na reunião da Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal, estamos ouvindo dois candidatos a representar o Senado no Conselho Nacional do Ministério Público. E lá estamos travando um bom debate. Eu trago de lá as perguntas que fiz e vou repeti-las a V. Sª aqui. Eu as faço no seguinte sentido: que o senhor procure fazer um paralelo do que vem acontecendo no Brasil, e, se isso que vem acontecendo no Brasil acontecesse, por acaso, em qualquer país da Europa, o que aconteceria naquele país. O que aconteceria?
Nós estamos, desde já, porque... Nisso aqui, a tecnologia é muito boa, mas adora uma deturpação, tanto que eu saí de lá, Senadora Regina, e já me mostraram o WhatsApp, já me mandaram o Twitter de vários grupos de policiais, dizendo que é uma vergonha. Olha aqui, eu até vou ler o que eles disseram aqui: "Que vergonha a Senadora Vanessa aproveitar reunião da CCJ para, mais uma vez, denegrir nossas polícias." É isso. Agora, eu não denegri polícia nenhuma. Eu, aliás, defendi a polícia porque, quando eu cobro também o fim da impunidade na polícia, eu estou defendendo a polícia, porque a maioria dos policiais não é corrupta, a maioria dos policiais não tem acordo com os traficantes, a maioria dos policiais é gente correta, honesta, que corre risco de vida para proteger a população. Foi isso que eu disse lá, mas infelizmente as mídias sociais tratam dessa forma.
Eu quero deixar, em primeiro lugar, bem clara a minha posição em relação à Lava Jato. Eu, Dr. Geoffrey, apoio a Lava Jato como uma ação de combate à corrupção, o que é preciso. Infelizmente o modus operandi instalado no Brasil faz com que a corrupção seja um cancro danoso, mas eu não posso fechar os olhos à utilização política desse combate à corrupção, tanto que nós estamos vendo o seguinte procedimento - e esse é o grande problema -: existem casos com provas fartas, com provas eminentes, com provas incontestáveis, mala de dinheiro sendo carregada, mala vindo para cá, mala indo para lá, dinheiro que viaja para um Estado para depois ir para uma conta e chegar a outra conta, com provas. Esses casos estão ali meio parados enquanto outros casos em que não há uma prova, nada, denuncia-se, julga-se, incrimina-se, condena-se - nenhuma prova. E V. Sª deve saber que eu estou aqui me referindo ao caso do Presidente Lula.
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Agora, veja o resultado de um julgamento em primeira instância, ou seja, de um julgamento que é de uma pessoa só, um julgamento que é individual...
(Intervenção fora do microfone.)
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Sim, um juízo singular. Obrigada pela linguagem técnica. O resultado desse julgamento singular estava anunciado, como estava anunciada a posição do Ministério Público - e aí eu não generalizo, porque não é do Ministério Público, é de um membro do Ministério Público por ele mesmo - que chamou coletiva de imprensa, a imprensa toda, para botar um PowerPoint, e falar da convicção. Não tem prova, mas tem convicção. E a condenação veio pela convicção, e não pela prova.
O que aconteceria na Inglaterra - acho que é o seu país, não é? - se isso fosse feito? Enquanto, repito, que outros casos com provas fartas estão em banho maria. É lista que sai toda hora por delatores e que envolvem todos. Aí, eles misturam os casos muito graves, com muita prova, com casos em que nem indício têm. Isso leva a quê? Ao descrédito da própria investigação. Aí, eu questiono: será que esses estão querendo, de fato, combater a corrupção? Eu não estou aqui falando em causa própria, não. Até ontem estava numa lista, e fui tirada da lista. Fui tirada. Não estou aqui, mas são dezenas de pessoas, de Parlamentares nessa situação. Então, são esses que querem o combate à corrupção, ou querem um combate a um projeto político?
Então, a sua vinda, porque eu sei que não são os olhos do povo brasileiro que estão voltado para a sua pessoa, mas os olhos do mundo acadêmico e jurídico, esses estão voltados para si. Esses estão sendo voltados para si. Então, é muito importante a sua presença aqui, porque o momento em que nós vivemos é muito difícil. E aí eu quero repetir o que todos dizem e que, aliás, Ruy Barbosa, uma grande figura que o senhor conhece, dizia: a pior ditadura é a do Judiciário, porque não há a quem recorrer. E a gente vive um problema grave, um problema que coloca em risco a democracia, porque, se está ruim hoje, pode até ficar pior, tamanhas as dificuldades que nós vivemos. Então, falar isso para o mundo, quem tem só os microfones, porque não tem a televisão, não tem o grande meio de comunicação, é muito importante. É dessa forma que o senhor nos ajuda enormemente.
Muito obrigada.
E me desculpe, porque eu exagerei no tempo, Senadora Regina.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Só um instante, Senador Lindbergh.
Quero registrar a presença do Sr. Eduardo Brasil, diretor de relações públicas do Sindicato dos Acupunturistas e Terapeutas Orientais de São Paulo.
Eu quero só lembrar que o próprio Dr. Geoffrey já lembrou que o tempo está escasso. Então, vamos...
Agora, com a palavra, o Senador Lindbergh Farias.
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Olha, eu queria muito agradecer o senhor, por se envolver num tema tão importante para o Brasil, uma figura como Luiz Inácio Lula da Silva, que tem uma relação com o povo brasileiro de uma profundidade gigantesca. Ele está agora percorrendo o País, numa caravana pelo Nordeste brasileiro.
Eu tive oportunidade de estar em vários Estados com ele. O Deputado Federal Paulão também, a Senadora Fátima Bezerra, a Senadora Regina vai estar agora no Piauí. E é impressionante ver o reconhecimento das pessoas com tudo o que foi feito no País nesse período.
Geoffrey, amanhã, 31 de agosto, vai ser um ano do impeachment da Presidenta Dilma Rousseff. Eu participei da Comissão Especial que analisou todo o processo do impeachment da Presidenta Dilma Rousseff. E digo aqui em alto e bom som: foi um golpe. Era um processo em que as provas eram irrelevantes. Aqui todos já tinham uma posição antes de o debate acontecer em cima de provas. O processo era meramente formal. Vai fazer um ano desse golpe. Só que é um golpe continuado, porque eles querem afastar, de todo jeito, Luiz Inácio Lula da Silva do processo eleitoral.
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E aqui, quando eu falo da Lava Jato, é importante dizer que, desde o começo, eles atuaram em cima de um timing político. Eu me lembro do processo da condução coercitiva do Presidente Lula, da forma como foi feita. Todos aqui sabem que, para haver a condução coercitiva, a pessoa tem que ser intimada por duas vezes: o Presidente Lula não foi intimado por duas vezes. Depois, eu me lembro do dia em que a Presidenta Dilma Rousseff escolheu o Lula para ser Ministro da Casa Civil. Foi nesse dia, no mesmo dia, que eles divulgaram as gravações do Presidente Lula com a Presidenta Dilma - gravações ilegais porque o grampo, o monitoramento telefônico já tinha sido encerrado às onze horas e cinquenta e poucos minutos (uma coisa como essa), e aquela conversa do Presidente Lula com a Presidenta Dilma Rousseff aconteceu às 13h.
Seria ilegal de qualquer forma porque teria que haver autorização do Supremo Tribunal Federal, mas eles agiram ali em cima do timing político. Divulgaram no principal canal de televisão, na Rede Globo de Televisão, de forma que houvesse naquele dia manifestações. E aconteceu um absurdo: um Ministro do Supremo Tribunal Federal impediu, de forma unilateral - até hoje não foi julgado pelo Pleno -, a posse de Lula no Ministério da Casa Civil. Aqui no Brasil há uma Lei da Ficha Limpa para os servidores públicos, para alguém que vai ocupar alguma função pública: você tem que ser condenado em primeira e segunda instância. Lula não tinha nem denúncia. Mas o processo inteiro aconteceu em cima de timing político, para viabilizar o afastamento da Presidenta Dilma Rousseff.
E agora eles não escondem também que o objetivo também é tentar afastar o Lula da sua candidatura. A declaração do Presidente do TRF da 4ª Região, Thompson Flores, de fato choca o País, não é? Primeiro, ele elogiou a sentença do Moro e depois admitiu que não tinha lido. Mas o mais grave, para mim, é ele dizer que vai acontecer em tempo hábil, antes da inscrição das candidaturas presidenciais. Eles não escondem: o debate aqui no Brasil é feito de forma muito aberta.
Nesse último domingo, saiu uma matéria na Folha de S.Paulo - e alguns Parlamentares aqui já falaram do assunto - em que um advogado diz que foi procurado por outro advogado que vem a ser padrinho de casamento do Juiz Sergio Moro, que foi sócio da sua esposa, em que foi feita uma proposta de diminuição da multa - que era uma multa de US$15 milhões - para US$5 milhões desde que fosse paga uma outra quantia de US$5 milhões fora do País para ele. Eu estranhei, porque eu quero tratar aqui... Nós sempre defendemos a presunção da inocência para todos, e, no caso do Juiz Sergio Moro, eu não quero aqui fazer uma condenação antecipada - eu não sei se ele sabia ou não, se houve ou não o fato. Mas impressiona a resposta do Juiz Sergio Moro. Ele diz o seguinte, se referindo ao advogado Rodrigo Tacla Duran: "[...] [ser] lamentável que a palavra de um acusado foragido da Justiça brasileira seja utilizada para levantar suspeitas infundadas sobre a atuação da Justiça".
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Ora, o Juiz Sérgio Moro está utilizando palavras de criminosos em processo de delação para condenar sem provas! No caso dele, não. No caso dele, ele acha que é um criminoso, que não devia nem ter havido a matéria jornalística. Nós estamos falando aqui ao Juiz Sérgio Moro que é preciso ter coerência. Ele tem condenado pessoas só em cima de delações. Isso é gravíssimo.
Por isso, eu acho, sinceramente, Senadora Regina Sousa e Deputado Paulão, esta Comissão de Direitos Humanos tem, de alguma forma, de chamar o Juiz Sérgio Moro, o Advogado Carlos Zucolotto, porque é uma forma de eles se defenderem também, de falarem aqui nesta Comissão.
Agora, é interessante vermos esse processo, porque, no caso da condenação do Lula, é impressionante. Primeiro, em relação ao apartamento. Está claro que o apartamento não está em nome do Presidente Lula, está em nome da OAS e, na verdade, estava com a Caixa Econômica Federal. Qual argumento eles utilizam? Eles dizem o seguinte: que é lavagem de dinheiro justamente porque o apartamento não estava em nome do Lula, é inacreditável a argumentação.
O pior, para ter corrupção tem que ter o outro lado. Na peça do Ministério Público, eles dizem que alguns contratos da OAS foram feitos diretamente com a Petrobras. Na decisão do juiz, eu chamo atenção para isso, ele desconsidera isso. Ele reconhece que não tem essa vinculação e parte para o conjunto da obra, digamos assim. Isso, no direito brasileiro, não é permitido. Ele teria de ter outra denúncia, outra acusação por parte do Ministério Público, porque a defesa foi feita em cima daquele ponto da acusação do Ministério Público.
Eu não quero me alongar, mas me impressionou muito também a decisão do TRF da 4ª Região, em relação àquelas gravações telefônicas que, de fato, a gente sabe, não foi só a gravação do Presidente Lula com a Presidente Dilma. Há uma legislação sobre interceptação telefônica no Brasil que manda destruir qualquer gravação que não tenha a ver com os autos do processo. Aqui, Geoffrey, na verdade, teve conversa da ex-primeira dama, D. Marisa Letícia, com seus filhos, com a sua cunhada, conversas que nada tinham a ver com o processo que foram divulgadas na rede de televisão, na Rede Globo. O que me impressionou foi a decisão do TRF a partir da reclamação dos advogados do Presidente Lula, em especial a decisão do relator, o Desembargador Rômulo Pizzolatti. Ele citou, não sei se o senhor sabe, Agamben, que fez o livro Estado de Exceção, mas criticando aquilo. Ele cita Agamben e, na verdade, na sua decisão, diz que reconhece que, de fato, na Lava Jato há uma situação excepcional, trata como uma coisa excepcional, que estaria fora da legislação vigente, porque é algo excepcional. E cita, de forma completamente equivocada, o Agamben em outro contexto.
Eu acho que o que a gente vive aqui no País, e aí quero falar do Carl Schmitt, da lógica amigo-inimigo. É um processo de tentativa de eliminação de um adversário, de um lado, que representa um conjunto de políticas públicas.
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Eu falo - e falei muito na defesa da Presidente Dilma -, Dr. Geoffrey, que esse também foi um golpe de classe. Esse foi um golpe de classe; a motivação desse golpe foi mudar o programa que estava sendo implementado neste País.
E a gente vê hoje o que está acontecendo. A Senadora Vanessa falou muito sobre isto, e eu quero concluir falando sobre isto: sobre os ataques violentíssimos aos trabalhadores brasileiros, sobre o programa de privatizações... Estão querendo, agora, vender uma parte da Amazônia, abrir uma parte da Amazônia do tamanho da Dinamarca, que tem duas reservas indígenas, sete áreas de proteção ambiental. Estão vendendo, entregando a mineradoras estrangeiras.
Nós estamos num processo de destruição violentíssima. Essa elite brasileira... Nós vivemos aqui - e falou Moura - 300 anos de escravidão. Nós fomos o último país do mundo a acabar com a escravidão; mas, na cabeça das nossas elites, a escravidão é algo muito presente. E a gente está vivendo isso aqui. E essa reforma trabalhista no fundo é isto: é colocar os trabalhadores novamente numa situação de semiescravidão.
Eu queria, então, que o senhor soubesse - eu sei que o senhor acompanhar a situação brasileira - que é um golpe político e econômico que está em curso, porque, num momento de crise econômica, eles decidiram resolver os problemas das grandes empresas retirando direito de trabalhadores, reduzindo salários.
E aí o Luiz Inácio Lula da Silva é uma ameaça, porque, enquanto houver Lula neste Brasil, esse povo trabalhador, esse povo pobre, que está conquistando sua liberdade agora, têm uma defesa. Eles sabem que não podem massacrar os trabalhadores brasileiros enquanto houver Lula.
E o plano deles era este, e eu encerro dizendo isto: eles achavam que, depois de todo esse processo, nós estaríamos liquidados, e o Lula estaria desmoralizado. O plano deles era esse. Só que o que acontece? Felizmente, pela sabedoria do nosso povo, é justamente o contrário. Não sei se o senhor tem visto, mas, depois de todos esses ataques, depois da condenação do Juiz Sergio Moro, o Lula subiu cinco pontos nas pesquisas de opinião, porque o povo brasileiro está percebendo o que está por trás disso; que, na verdade, todo esse golpe é um golpe contra ele.
Então, eu queria muito agradecer ao senhor por estar se dedicando a uma causa, abrindo mão do seu tempo, das suas atividades, mas saiba que é uma causa justa. Saiba que o senhor está se dedicando a uma causa que é a defesa do povo mais pobre. O ataque ao Lula é o ataque à democracia, mas é fundamentalmente o ataque ao povo mais pobre deste País.
Agradeço muito ao senhor.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Senador Lindbergh.
O Deputado Paulão pediu para fazer uma pergunta de um minuto. Eu digo: o tempo agora, a pressa agora não é só minha; então, um minuto mesmo.
O SR. PAULÃO (PT - AL) - É verdade.
Primeiro, em relação ao encaminhamento da Senadora Gleisi e do Senador Lindbergh: sem dúvida nenhuma, a comissão irá fazer, em consonância com o Senado.
Mas eu queria - já foram feitas aqui algumas perguntas - que o professor pudesse aprofundar em relação à similaridade com a Operação Mãos Limpas, na Itália, que serve de paradigma para esse caso. E, no final, a principal... Primeiro, a demonização da classe política, que a gente está atravessando no Brasil. Isso, inclusive, fragiliza o Estado democrático de direito. E a principal figura investigada na Itália saiu ileso, que foi o Berlusconi, ficando mais de 20 anos no poder, e vários partidos democráticos foram destruídos. Então, com sua experiência, que o senhor pudesse falar sobre isso. E a outra questão, principalmente em relação à juventude: existe o processo de lawfare contra o Lula?
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Seria isso, Senadora Regina.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Deputado Paulão.
Não havendo mais inscritos, passo a palavra ao Dr. Geoffrey para responder as indagações.
O SR. GEOFFREY ROBERTSON (Tradução simultânea.) - Deixe-me responder a última pergunta primeiro.
O senhor perguntou sobre a Operação Mãos Limpas, e eu mencionei que os meus amigos que são advogados criminais italianos estão olhando para o passado e pensando: "É, foi um desastre!" Porque o alcance exagerado, a forma como a promotoria e o Juiz Moro, na sua palestra, congratulou os promotores italianos, isso encorajava as pessoas a apedrejar os políticos, a demonizar os políticos.
Deu errado. Por quê? Quando a evidência foi observada, o Andreotti... O principal político, o Berlusconi, saiu ileso. Em retrospectiva, o povo italiano não confiou à operação antimáfia, anticorrupção - esse foi o problema com os promotores. Eles se comportaram como o Juiz Moro. Ele não deveria ser um Juiz neste caso.
Quando eles se comportam dessa forma, seja pela obsessão em relação à cruzada contra a corrupção, ou seja, para autopublicidade e autopromoção também, de qualquer forma, eles causam um desrespeito público do processo judicial, e essa é a razão pela qual o Lula está se levantando nas opiniões de pesquisa, mesmo depois da condenação, porque o público, cada vez mais, está vendo esses motivos obscuros do Sr. Moro. Ou ele já se convenceu, ou as pessoas estão vendo uma pessoa que quer só se autopromover.
Isso, eu acho, que é o perigo, porque todos nós queremos que a corrupção seja retirada do Parlamento, do serviço público, da Polícia, e nós queremos uma forma adequada de fazer isso. A não ser que a gente ache essa forma adequada, a sociedade vai estar em apuros.
Como a minha amiga - espero que possa chamá-lo assim -, a Senadora de vermelho, me perguntou e disse... A senhora disse: "Nós somos uma democracia muito jovem." E isso é uma observação muito inteligente. O Brasil é jovem, é uma democracia jovem. A Grã-Bretanha tem 400 anos de democracia; os Estados Unidos têm 200 anos, e não conseguem acertar no financiamento de campanhas. Isso é uma luta. Conseguir um sistema jurídico estabilizado ou equilibrado... Eu uso a palavra "primitiva", que odeio usar, mas eu acho que a ideia dos juízes, do julgamento, depois do processo inquisitivo, ser o mesmo é simplesmente errada. Nós percebemos que, ao longo dos anos, em Portugal, na Europa, os países perceberam isso, e o sistema, que foi herdado de Portugal, não é adequado para os propósitos modernos, mas o progresso vem de forma lenta.
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Existe uma percepção. Acho que os historiadores no Brasil, no futuro, vão olhar para o passado, nesse período estranho no qual os juízes eram promotores e não havia distinção entre os juízes que são combativos e os juízes que estão no processo. Eu acho que isso é uma medida de esperança de que o Brasil é uma democracia jovem e está aprendendo de outros países, que são democracias mais antigas, em relação como as coisas são no sistema legal e como ele deve ser gerido.
O que acontece é que - vamos olhar cem anos atrás - o que era conhecida como lei do linchamento, ku Klux Klan, enforcamento e linchamento, a forma que o povo era encorajado aqui, como está acontecendo com o público aqui em roupas de presidiário, isso é algo do passado, nos Estados Unidos. Até agora o Donald Trump, apesar de ele ter uma parcialidade em relação à ku Klux Klan neste momento, mas, quando nós olhamos para o passado, nesses tempos de linchamento, nós olhamos com horror. Com certeza, o Brasil vai observar esse tempo dessa mesma forma.
Se um juiz se comportasse como o Juiz Moro na Inglaterra, ele seria desqualificado e seria demitido. Isso é porque nós temos um sistema bem diferente. Nós não queimamos mais as bruxas, como nós fizemos cem anos atrás. Eu acho que um país pode se acostumar a um sistema ruim, e todo país se acostuma às formas melhores de fazer algo. Há algumas coisas que estão de acordo com os padrões dos direitos humanos e há melhorias que devem ser feitas.
Então, eu creio que é um cenário otimista pensar que nós estamos aqui no começo, no estágio inicial da democracia, e que os senhores legisladores estão encarregados desse dever. Talvez haja vítimas ao longo do caminho em relação à justiça, mas depende de vocês progredir e nunca, no futuro, existirem pessoas visitando e falando: "Olha, que sociedade primitiva quando o promotor quase..." Não sei se vocês vão à ópera, se vocês já viram Tosca. No segundo ato de Tosca, há um personagem chamado Scarpia, que era o delegado, um juiz no estilo do Juiz Moro, e, no final, ele faz algo muito ruim e é esfaqueado pela soprano. Enquanto ele está no chão, no fim do ato 2, há uma soprano fantástica chamada Maria Callas, que diz: "Perante este homem, toda a Roma tremeu". E, às vezes, eu creio que o Brasil é, mais ou menos, deste jeito em relação ao Juiz Moro: todo o Brasil parece tremer perante o Juiz Moro. Vocês não podem aceitar isso.
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A Justiça deve ser imparcial, deve ser equilibrada. Há um lugar para combatentes contra a corrupção, mas não há lugares para pessoas que estão numa cruzada contra a corrupção e que sejam juízes e que percam a objetividade, a imparcialidade, que é necessária e é realmente importante e certo o que a Senadora diz. Ninguém está acima da lei, ninguém, seja rico ou pobre, poderoso ou não poderoso, deveria ser tratado de forma injusta.
Sim, há talvez uma sensação de que esse homem concorra à Presidência em 2018 e que ele deva ser impedido de concorrer no julgamento dessa apelação, por isso que chegou mais rápido do que qualquer outro caso na história dessa corte de apelações, desse tribunal. Eles estão desesperados para condenar o Lula na apelação, antes que ele concorra à Presidência e isso é um problema real para vocês, porque ser objetivo em relação a isso, ainda que você seja a favor ou contra o Lula... O mundo está observando, porque, dessa forma... O Lula é uma pessoa central e importante no mundo, em termos do que ele fez e em relação à retirada dos pobres e milhares, milhões de pessoas da pobreza.
Na ONU também, todos, o mundo, está assistindo de forma bem interessada para saber que esse tribunal, cujo Presidente da turma disse que a condenação é impecável, não tem nada de errado com isso. Está sendo apressado, está apressando essa apelação para que seja julgado mais rápido possível. Essa não é uma posição boa para o Brasil, francamente, e em 20 anos vocês talvez olhem com algum constrangimento e parece ser constrangedor também no momento.
Eu creio que as pessoas que lidaram com a delação premiada, o resultado em relação aos Direitos Humanos para o futuro é algo importante. Eu sei que vocês estão aqui, porque vocês estão interessados no futuro dos Direitos Humanos. Nós olhamos para o mundo hoje como perigos nucleares na Coreia do Norte...
Olhe para a Síria, 5 anos atrás, quando 800 pessoas foram assassinadas para demonstrantes pacíficos, eu escrevi um artigo falando sobre o al-Assad e enviei para o Tribunal de Haia.
Agora em 2017, o Conselho de Segurança com 400 mil pessoas estão mortas, 6 milhões de Sírios foram deslocados, imigrantes e 6 milhões são imigrantes agora. Isso é um fato horrível das decisões... Da falha do Centro de Comissão de Segurança da ONU com o veto russo, veto americano, veto chinês, está impedindo que o mundo tome uma ação contra as atrocidades. Não se desesperem, eu não me desespero, por causa disso. Eu creio que foi o Roosevelt que deu essa razão. Onde os Direitos Humanos começam? Eles começam em lugares pequenos, que não... E é fato! Se você observar nas comunidades em que se juntaram as pessoas jovens, especificamente o tipo de jovem que, na Grã-Bretanha, apoia o Jeremy Coben, que trabalham pelo idealismo. Ele nunca foi tão popular como agora. A Anistia Internacional nunca antes teve tantos membros. Há um aumento, ao redor do mundo, especialmente em meio aos jovens, em relação aos padrões em direitos humanos para o futuro.
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Então, eu creio que existe xenofobia, existe racismo, mas o que é importante é que há um acordo crescente em relação aos fundamentos de uma vida decente e civilizada. Então, é com a aceitação do desenvolvimento e da discussão do acordo do que significa a tortura, o tratamento desumano, que inclui manter as pessoas detidas durante 300 anos para conseguir delações premiadas. Essa é uma forma de tortura, forçando que as pessoas confessem. Elas não estão sendo detidas porque podem fugir ou porque podem cometer outros crimes, mas porque elas estão sendo forçadas a delatar. Nós estamos concordando com isso, mas isso é errado.
Nós estamos começando a concordar... Nós vimos na Europa, em Portugal, que isso é um fato e que não pode haver um juiz no processo que tenha sido envolvido no processo de investigação, supervisionando e direcionando esse processo. Isso foi aceito em 1988. Não acontece mais na Europa nem em Portugal.
Eu creio que eu posso, em muitos níveis, dizer que isso é decepcionante, que o Conselho de Segurança não resolveu essa questão do veto que tem a ver com Assad, com a Coreia do Norte. Essa é uma causa que eu penso ser de otimismo ponderado pelos defensores dos direitos humanos e que apoiam esses princípios, que estão sendo definidos, que estão sendo aceitos, que estão sendo compreendidos pelo público, e que esse é o nosso dever público em relação ao futuro.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Quero caminhar para o encerramento dizendo que a pauta dos direitos humanos, no Brasil, está em baixa, a começar olhando para aquele painel. Vejam a importância que alguns partidos dão à pauta dos direitos humanos e também ao que nós estamos vivendo, ou seja, de intolerância religiosa, de racismo, de ataque às chamadas minorias, como a população LGBT, as mulheres, de desrespeito aos direitos dos indígenas, de retirada de direitos dos trabalhadores através de reformas. Então, diante disso, o que eu posso fazer é contar um fato - e já se falou tanto em escravidão - ocorrido lá no meu Piauí, onde havia uma escrava, chamada Esperança Garcia, que aprendeu a ler... Se aprendeu a escrever, ninguém sabe, pois a história não conta, mas a carta dela apareceu depois: O fato é que, aproveitando a presença do Governador da província, ela colocou um bilhete no bolso dele narrando o tratamento dado aos escravos e exigindo que fosse juntada novamente à sua família, que havia sido vendida para uma outra fazenda fora da província.
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Então, depois de muito estudo por parte de historiadores, a carta de Esperança Garcia está tendo reconhecida pela OAB como a primeira petição do meu Estado, e ela vai receber o diploma de advogada, no dia 5 de setembro, lá no Piauí. (Palmas.)
Então, sejamos todos e todas Esperança Garcia! Denunciemos, exijamos que as coisas andem diferentes, que a Justiça seja para todos, porque ninguém está acima da lei, mas também ninguém está abaixo da lei.
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Muito bem, Senadora Regina.
Antes de a senhora encerrar, eu só queria... Há um requerimento aqui sobre o programa de privatizações, em especial a privatização da Eletrobras, e eu queria que V. Exª pudesse colocar em votação para realizar uma audiência pública com Ronaldo Bicalho, Professor e Pesquisador da UFRJ; com representante de funcionários da Eletrobras; representante da Chesf; e representante do Sindicato dos Eletricitários.
Se V. Exª puder colocar em votação, eu agradeço.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Senador, pelo o que a assessoria me encaminha, não vou poder, porque não houve convocação de segundo momento da Comissão. A Comissão era só esta audiência. Assim, não se pode colocar na...
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Mas não pode colocar extrapauta?
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Eu posso colocar... Tenho que ver com...
(Intervenção fora do microfone.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Mas eu posso votar na próxima reunião.
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Está bom. Muito obrigado.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Assim como o requerimento que o senhor sugeriu sobre a audiência pública com o Juiz Sergio Moro e o advogado Carlos Zucolotto.
Agora, este aqui pode ser feito: que é o encaminhamento desta audiência pública, que é a questão de enviar as cópias das notas taquigráficas - que a Senadora Gleisi encaminhou - para os vários segmentos aqui listados. E eu acrescentaria também à mídia: vamos mandar para a mídia também porque, de repente, algum jornalista curioso pode ler esse resultado aqui desta audiência.
Nós já estamos no limite...
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Senadora Regina, só para complementar também.
Já que V. Exª vai pautar o requerimento do Senador Lindbergh sobre a questão da privatização, tendo como foco a decisão do Governo de vender a Eletrobras, primeiro quero dizer que eu subscrevo. E também, só para dar conhecimento a V. Exª: nós aprovamos o requerimento também, de autoria do Senador Humberto Costa, subscrito por vários Parlamentares, inclusive eu também, na Comissão de Desenvolvimento Regional sobre a mesma temática, a questão da privatização.
Portanto, apenas para sugerir que possamos fazer essa atividade conjuntamente: Comissão de Desenvolvimento Regional com a de Direitos Humanos.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Com certeza, Senadora Fátima.
O SR. PAULÃO (PT - AL) - Senadora Regina, antes de encerrar, eu gostaria de convidar os Senadores - sei que têm outra pauta - para agora, às 14h, pois nós teremos uma audiência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara ouvindo a mãe do Rafael Braga e seus advogados...
(Interrupção do som.)
O SR. PAULÃO (PT - AL) - ... horas de hoje.
Obrigado.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Nada mais havendo a tratar, agradecendo ao Dr. Zanin, à Drª Valeska e ao Dr. Geoffrey, declaro encerrada esta audiência.
(Iniciada às 10 horas e 02 minutos, a reunião é encerrada às 13 horas.)