24/08/2017 - 36ª - Comissão de Assuntos Sociais

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Ronaldo Caiado. Bloco Social Democrata/DEM - GO) - Bom dia, senhores e senhoras.
Vamos dar início à audiência pública, 36ª Reunião Extraordinária, dia 24 de agosto.
Havendo número regimental, declaro aberta a 36ª Reunião da Comissão de Assuntos Sociais da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura do Senado Federal.
Antes de iniciar nossos trabalhos proponho a dispensa da leitura e a aprovação da ata da reunião anterior.
Os Srs. Senadores e as Srªs Senadoras que aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovada.
A presente reunião destina-se à realização de audiência pública em atendimento ao Requerimento nº 9, de 2017, de iniciativa da Senadora Ana Amélia, para instruir o Projeto de Lei do Senado nº 415, de 2015, de autoria do Senador Cássio Cunha Lima, que "altera a lei 8.080, de 19 de setembro de 1990, que 'dispõe sobre as condições para promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências', para tornar obrigatória a definição em regulamento e a divulgação do indicador ou parâmetro de custo-efetividade utilizado na análise das solicitações e incorporação de tecnologia e tornar obrigatório o respeito aos requisitos de aleatoriedade e publicidade na distribuição dos processos às instâncias responsáveis por essa análise".
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Convido para compor a Mesa os ilustres oradores: Sr. Thiago Rodrigues Santos, Coordenador-Geral de Equipamentos e Materiais de Uso em Saúde, representante do Secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Mistério da Saúde; Sr. Gustavo Laine Araújo de Oliveira, Técnico do Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias em Saúde da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, representante do Conitec, do Ministério da Saúde; Denizar Vianna Araújo, Professor Associado do Departamento de Clínica Médica da Universidade do Estado do Rio de Janeiro; Marcelo Antônio Cartaxo Queiroga Lopes, Diretor de Avaliação de Tecnologia em Saúde da Sociedade Brasileira de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista; Carísi Anne Polanczyk, Pesquisadora Coordenadora do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Avaliação em Tecnologias em Saúde - INCT-ATS.
Justifica ausência Áquilas Nogueira Mendes, Professor Associado do Departamento de Política, Gestão e Saúde da Universidade de São Paulo.
Antes de iniciar a nossa audiência pública, eu quero conceder a palavra à Senadora Ana Amélia, que é autora do requerimento da audiência. Logo a seguir, eu passo também a presidência da reunião extraordinária à nobre Senadora para que ela possa presidir tão importante audiência pública aprovada na CAS.
Passo a presidência, então, à Senadora Ana Amélia. (Pausa.)
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Bom dia a todos, Senadores, convidados.
Registro, especialmente, nossos agradecimentos pelo comparecimento.
O objetivo desta audiência pública, como foi mencionado pelo Senador Ronaldo Caiado, Vice-Presidente desta Comissão de Assuntos Sociais, é esclarecer pontos desse projeto, que suscitou um debate muito intenso pelas divergências de entendimento em relação ao tema de um projeto do Senador Cássio Cunha Lima que trata da questão relacionada à incorporação de novas tecnologias.
A audiência pública tem o propósito de trazer novos elementos para que a Relatora, no meu caso, possa ter mais clareza em relação a todos os aspectos e proferir um relatório adequado às necessidades do País e, especialmente, dos pacientes, que, em última análise, são grande preocupação que nós temos.
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Eu queria, por economia de tempo e de trabalho - temos outras comissões funcionando -, que a gente fosse direto ao ponto da questão que estamos tratando, do projeto e da questão relacionada à incorporação.
Quero agradecer não só ao Senador Caiado, por ter aberto esta reunião, mas também ao Senador Waldemir Moka, que é médico, é muito comprometido, presidiu já esta Comissão para examinar os nossos temas.
Então, vamos começar por quem opera o sistema: convido o Dr. Marcelo Queiroga. Vamos ouvir primeiro os operadores e, depois, os reguladores do sistema.
Com a palavra Dr. Marcelo Queiroga, por dez minutos, para sua exposição.
O SR. MARCELO ANTÔNIO CARTAXO QUEIROGA LOPES - Senadora Ana Amélia Lemos, Senador Ronaldo Caiado, Senador Waldemir Moka, minhas senhoras e meus senhores, é um prazer e uma honra estar novamente aqui na Comissão de Assuntos Sociais do Senado para tratar de um assunto de tão grande relevância porque, para quem lê o ementário desse projeto de lei, às vezes passa despercebido, mas trata da implementação do art.196 da Constituição Federal, e a nossa sociedade, que é a Sociedade Brasileira de Cardiologia Intervencionista, é uma sociedade que lida com a inovação.
Esse diapositivo mostra justamente isso. O Dr. Werner Forssmann, em 1929, introduziu um cateter em si próprio - naquela época era mais difícil incorporar tecnologia, e o indivíduo tinha que fazer o procedimento em si mesmo -, foi bastante questionado, mas, na década de 50, ganhou o Prêmio Nobel da Medicina.
O projeto de lei de S. Exª, o Senador Cássio Cunha Lima, quer mais transparência no processo de avaliação de tecnologia, quer que se defina um parâmetro de custo-efetividade no sistema de saúde do Brasil, tal qual determina a Lei 9.090, com a modificação que sofreu após a instituição da Conitec. Quer também S. Exª que o processo e que as demandas de avaliação de tecnologias em saúde sejam distribuídas de forma aleatória entre os núcleos de avaliação de tecnologia em saúde que compõem os parceiros da Conitec.
Quero crer que S. Exª, quando apresentou esse projeto, quis prestigiar todos aqueles cientistas, os pesquisadores, aquelas pessoas que lidam com economia e saúde, e mostrar ao País a importância dessa área da ciência, que é quem efetiva a justiça distributiva - a melhor é a de Deus; todos conhecemos as bodas de Caná, em que se transformou água em vinho. Os técnicos do Ministério da Saúde têm que operacionalizar essa justiça distributiva para ofertar equidade à população brasileira.
Eu passaria a fala do Senador Humberto Costa, que ilustra bem a importância dessas instâncias regulatórias, porque, Senador Caiado, como V. Exª sabe, hoje a forma mais comum de se implementar tecnologias no País é via judicialização, mas a judicialização tem suas vicissitudes. Isso se deve a essa pletora de dispositivos, de equipamentos e de materiais que encarecem sobremaneira a assistência médica, o que é diverso do que ocorria 30 anos atrás ou mesmo de quando a Constituição Federal de 1988 foi promulgada.
Todos sabemos do trabalho do Prof. Adib Jatene, da sua cruzada por mais verbas para o sistema de saúde - a Veja e a Época o colocam como "o homem do imposto". Eu prefiro vê-lo como o homem da justiça distributiva.
O resultado disso é um aumento crescente do orçamento do Ministério da Saúde, que hoje suplanta a casa dos R$100 bilhões. Nós achamos isso pouco, mas reconhecemos o grande esforço que a sociedade brasileira faz para alocar esses recursos no Ministério da Saúde. Ressalto, porém, segundo dados do próprio Congresso Nacional, que esse orçamento não é implementado na medida máxima do possível.
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E esse processo regulatório, como se dá? É um processo um pouco confuso. Nós temos o Conselho Federal de Medicina, que avalia o procedimento. Isso é fruto do Ato Médico, lei cuja aprovação teve no Senador Caiado um de seus baluartes. Temos a Anvisa, que avalia os produtos, que avalia os fármacos, os medicamentos. Temos a Agência Nacional de Saúde Suplementar, que inclui procedimentos no rol para cobertura obrigatória. E, por fim, a Conitec, que é uma comissão que apoia a decisão do senhor Secretário de Ciência e Tecnologia na incorporação de produtos e fármacos do SUS, bem como na elaboração de protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas.
Portanto, é uma comissão que não tem personalidade jurídica própria. Não é uma agência, mas dá apoio, opina para que a autoridade regulatória, a autoridade do Ministério da Saúde, emita um parecer pela incorporação ou não. Nós, da Sociedade Brasileira de Cardiologia Intervencionista, temos uma relação boa com a Conitec. Como prova disso, trago aqui essa fotografia, que mostra ocasião em que estivemos reunidos, em 2012, com a Conitec discutindo assuntos da nossa especialidade.
E o procedimento administrativo está bem definido: a demanda é feita, há 180 dias para avaliação, 90 dias para publicação da portaria de incorporação e, posteriormente, com mais 180 dias, esse tratamento tem que ser disponibilizado no SUS, quando for aprovado.
E aqui se observam os critérios de eficiência, de segurança e de custo-efetividade, que é o motivo da discussão desse projeto de lei de que tratamos hoje. Os senhores observem que esses pontos fazem parte da avaliação de tecnologia e saúde, os aspectos clínicos, os aspectos econômicos, a organização do sistema, a visão focada no paciente, que, para nós, médicos, é o principal. Mas, sobretudo, essa avaliação de tecnologia em saúde, Senadora Ana Amélia, tem que ter isto aqui: credibilidade. Porque, se a sociedade não acredita na avaliação de tecnologia em saúde, a gente já sabe o que vai acontecer: a judicialização.
A Conitec é um avanço para o sistema de saúde brasileiro, ampliou as incorporações. No entanto, persistem dificuldades que eu vou relatar aqui aos Srs. Senadores.
Veja só, Senador Caiado: no Brasil, 30% da mortalidade é cardiovascular, como sabemos, mas somente 7% das incorporações foi nessa área. Então, fica difícil reduzir mortalidade se a gente não tem os avanços tecnológicos e as condições materiais para tratar os nossos pacientes.
A rede de parceiros da Conitec são os núcleos de avaliação em tecnologia e saúde, a que eu já fiz menção. S. Exª, o Senador Cássio Cunha Lima, quer valorizá-los ao colocar um processo de distribuição aleatório, em sintonia com o que já existe no Poder Judiciário, para que esses núcleos fiquem cada vez mais fortes e tenham uma posição em que a sociedade brasileira possa acreditar.
Na nossa especialidade, o atraso nessas tecnologias, do registro da Anvisa à incorporação no sistema público, é de dez anos.
Vejam aqui o exemplo dos stents farmacológicos. Esses stents ficaram muito famosos no episódio da máfia da órtese e prótese. Esse farmacológico é um que reduz o processo de reestenose, torna mais eficaz essa terapêutica. Nós fizemos uma demanda à Conitec, e a Conitec aceitou essa demanda e incorporou.
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Vejam aqui os senhores o que é que se diz na incorporação - a despeito de ter incorporado, é uma incorporação incompleta. Diz-se que se incorpora desde que o preço seja de R$2.034. Aqui eu não estou reclamando o preço, eu estou apenas dizendo que esse preço de R$2.034, que é igual ao do dispositivo anterior, que é o stent metálico... O stent metálico é comprado nas licitações públicas, e aqui eu trago um documento oficial, a R$285. Então, um gradiente de R$285 para R$2.000. Está aí o substrato para acontecerem todas essas condutas, que não são aceitáveis, e ninguém aqui vai defender esse tipo de coisa.
Está aqui, olhem, uma série de tecnologias na cardiologia. Muitas delas já foram incorporadas.
Aqui, Senadora Ana Amélia, a cardiopatia congênita, uma área pela qual V. Exª se interessa muito. Esse dispositivo é capaz de fechar um defeito congênito, um buraco que há no coração chamado de comunicação interatrial. Nós demandamos à Conitec a análise. Está no site - aqui os senhores da Conitec podem ratificar o que eu digo. Está lá: demandante - Secretaria de Ciência e Tecnologia de Insumos Estratégicos.
Está aqui o parecer da Conitec favorável à incorporação. E esse parecer foi acostado nessa revista científica, foi publicado em uma das revistas de mais alto nível científico internacional - feito pelo Nats de Laranjeiras, Senador Caiado.
Agora, veja o que dizem aqui os pesquisadores. A cirurgia aberta traz danos intangíveis à criança e seus familiares e a incorporação do oclusor pode trazer benefícios importantes para o sistema de saúde. Esse foi o parecer do Nats.
No entanto, a portaria, que tem que ser publicada noventa dias após a consulta pública, até hoje não saiu, Senador Moka. E nós, que somos curiosos - nós da Paraíba somos curiosos -, fomos lá e encontramos essa ata lá na Conitec. E vejam motivos alegados para não incorporar esse tratamento importante para as crianças com cardiopatia congênita.
(Soa a campainha.)
O SR. MARCELO ANTÔNIO CARTAXO QUEIROGA LOPES - O primeiro, Senador Caiado, é que a judicialização é reduzida. O segundo é que o demandante, que é a Secretaria de Ciência e Tecnologia, desistiu da demanda. Não desistiu: o demandante é a Sociedade Brasileira de Hemodinâmica e nunca desistiu dessa demanda. Então, é preciso mais clareza.
Está aqui um protocolo do Ministério da Saúde mostrando quem é o demandante. O demandante somos nós, não é a Secretaria de Ciência e Tecnologia, e nós não desistimos disso. Nós trocamos e-mails aqui na consulta pública dos stents farmacológicos. Mostramos aqui os e-mails que trocamos com a diretoria da Conitec, onde está bem claro que nós somos o demandante e que a dificuldade é de apuração de preço, e essa dificuldade já dura desde 2010 - estamos em 2017 e ainda não se apurou preço! Como pode? Quando se apurou o preço do stent, era R$2.000. Na prática, é R$285. Precisa melhorar, precisa aprimorar, precisa criar critérios transparentes, critérios de custo-efetividade e distribuição aleatória nos Nats para que se reduzam os vieses próprios desse tipo de análise.
Outra análise: implante por cateter de válvula aórtica - Senador Moka, V. Exª foi Relator de um projeto de lei que trata do assunto. A Conitec diz que evidência científica não serve, mas a autoridade regulatória canadense disse que é de altíssima qualidade essa evidência científica. Como é que a gente resolve esse problema? Dizem lá que os idosos preferem morrer. Eu não sei de onde tiraram essa ideia de que idosos preferem morrer.
Aqui projetam um impacto orçamentário de R$1 bilhão, criando pautas bombas que não existem. Efetivamente, não vai se realizar esse número de procedimentos no País. O Senador Moka contestou isso no relatório que fez aqui na Comissão de Assuntos Sociais.
Vejam o processo de transsexualizador. Aqui eu não faço juízo de valor a respeito da incorporação desse processo - eu acho que atende até o art. 1º da Constituição Federal -, mas se prevê aqui um impacto de R$391 mil. Seguramente, isso aqui não foi calculado com base na população que frequenta aqueles dias de passeatas que ocorrem no Rio de Janeiro e em São Paulo que os senhores bem conhecem.
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E todas as recomendações da Conitec são referendadas pelo Ministro da Saúde. Ora, se o STJ, que já é um tribunal da mais alta especificidade, tem suas decisões reformadas, por que as decisões da Conitec não podem ser reformadas pela instância administrativa? É por isso que é necessário que se coloque o devido processo legal, como determina a Constituição Federal nesses aspectos, em relação à Conitec. O Ministério Público Federal está atento a isso, consulta a nossa sociedade sobre as dificuldades que nós temos.
Aqui os senhores veem: o Canadá incorpora 52% das demandas que são postas para avaliação, Senador Eduardo Amorim, que foi Relator desse projeto na Comissão de Ciência e Tecnologia do Senado. A média de incorporação desses seis países é de 71%, e o Brasil só incorpora 23%. O que isso acarreta, Senadora? Judicialização.
Então, são muitas coisas, mas fica o resto para os debates.
Eu agradeço à senhora a paciência.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Como a fundamentação maior está exatamente no que argumenta o Dr. Marcelo Cartaxo Queiroga, o tempo dele foi maior do que o esperado, até para que os órgãos reguladores que estão aqui presentes possam falar.
Eu passo agora a palavra ao Professor Associado do Departamento de Clínica Médica da Universidade do Rio de Janeiro (UERJ), Dr. Denizar Vianna Araújo.
O SR. DENIZAR VIANNA ARAÚJO - Bom dia a todos.
Muito obrigado Senadora Ana Amélia, Senador Moka...
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Agradeço a presença do Senador Eduardo Amorim, que também é médico. Aliás, os três que estão aqui são médicos.
O SR. DENIZAR VIANNA ARAÚJO - Estamos entre colegas, o Senador Moka, o Senador Caiado e o Senador Eduardo Amorim.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Um trata da dor, outro trata da ortopedia e outro da cardiologia.
O SR. DENIZAR VIANNA ARAÚJO - Estamos muito bem representados.
Agradeço o honroso convite para compartilhar este momento de debate.
Gostaria de dar o meu relato, como pesquisador da área de avaliação de tecnologia em saúde, dos avanços que o Brasil fez do ponto de vista regulatório, do ponto de vista da avaliação de tecnologia. Nós somos um exemplo, mas todo esse processo também exige melhorias contínuas, e é nesse sentido que eu gostaria de contribuir.
Vou trazer alguns aspectos metodológicos que serão importantes para a discussão a posteriori.
Quando nós falamos de avaliação de tecnologia em saúde, nós queremos saber exatamente, dentre as etapas do processo em um determinado momento, qual é o custo a mais para se proporcionar mais ganhos de saúde para a população - ganhos de saúde como aumento da sobrevida, redução de eventos como infarto, doenças cerebrovasculares. E essa relação entre o custo monetário e o ganho de saúde, expresso aqui em efetividade, pode ter como exemplo intervenções de baixo custo e grandes ganhos de saúde, como o uso da aspirina, por exemplo, para reduzir o infarto, a morte súbita.
Qual é o nosso desafio? Porque tomar decisão nesse cenário é fácil: baixo custo, grandes ganhos de saúde.
O nosso desafio está exatamente neste cenário aqui, quando nos deparamos com intervenções que têm um custo a mais, principalmente porque dizem respeito a inovações, a sua chegada ao mercado, e muitas vezes o ganho de saúde não é tão expressivo - por conta até da história natural da doença, das intervenções anteriores.
Nesse cenário, nós temos que tomar decisão e lançar mão de métricas para o nosso processo decisório. Dentro desse conjunto, nós tratamos de uma área do conhecimento chamada de Avaliação de Tecnologia em Saúde, que contempla, do ponto de vista formal, três grandes etapas do processo.
A primeira, que nós chamamos de Avaliação da Evidência Científica, quer dizer, os atributos de eficácia, de segurança e de efetividade em relação a essa tecnologia e as questões epidemiológicas da doença.
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Em uma segunda etapa, são as questões relacionadas a esse valor monetário que é necessário para proporcionar esse ganho a mais em saúde quando comparamos determinadas tecnologias. É a etapa da análise econômica e saúde, que é representada aqui pela análise de custo-efetividade, que vai ser um dos tópicos deste debate.
E, por fim, o impacto orçamentário. No momento em que se faz a opção de incorporar aquela tecnologia, o que, no caso, o Ministério da Saúde tem que provisionar de orçamento para cobrir isso ao longo dos anos subsequentes.
Então, a análise de custo-efetividade, que é um dos tópicos do debate aqui, nada mais é do que contemplar todos esses custos, o custo da tecnologia, o custo da hospitalização, dos eventos adversos, e comparar esses custos com o ganho de saúde, que pode ser expresso em uma métrica com o ganho de sobrevida, ganho de anos de vida ajustados para qualidade. E isso vai gerar um número, isso vai gerar um número que nada mais do que a razão entre dois indicadores que eu vou exemplificar aqui. Nós temos no numerador um custo incremental, que é a diferença entre o custo - vamos imaginar - dessa nova tecnologia e o da tecnologia existente - vai haver uma diferença - e, no denominador, esse ganho de efetividade, o que nós estamos proporcionando a mais com essa tecnologia em termos de sobrevida por exemplo. Nesse denominador nós vamos ter também uma subtração entre a efetividade dessa nova tecnologia e a efetividade da tecnologia existente. Isso gera um número que nós chamamos de razão de custo-efetividade incremental. Isso é um valor monetário calculado por uma métrica, normalmente uma métrica chamada de desfecho importante, desfecho duro, como o ano de vida salvo. É esse valor que nós vamos discutir aqui, é um dos tópicos, porque, de alguma forma, arbitrariamente, uma sociedade tem que definir qual é a sua disposição para pagar para proporcionar mais ganhos de vida para a população.
E esse gráfico aqui, apesar de relativamente confuso, nos dá uma comparação entre os custos. Vamos imaginar que, nesse eixo vertical para cima, o custo aumenta; para baixo, o custo diminui. No eixo horizontal: para a direita, nós ganhamos mais efetividade, quer dizer, temos mais ganhos de saúde para a população. E quando nós nos deparamos com uma comparação entre tecnologias em que uma nova tecnologia proporciona mais ganhos de saúde, está salvando mais vidas, mas está gerando mais custo, nós temos que definir até que ponto a sociedade está disposta a pagar por isso. E isso tem um nome: nós chamamos, na literatura inglesa, de threshold, que é esse limiar. Essa disposição a pagar é tópico de muita discussão hoje na academia, em vários modelos de saúde. Qual é o limite de uma sociedade, no que diz respeito a pagar, para se obter mais ganhos de saúde na população?
Essa discussão... E uma das métricas utilizadas, principalmente pelos modelos de saúde universal na Europa, é uma métrica chamada "anos de vida ajustados para a qualidade". Qual é o ponto positivo dessa métrica? De certa forma ela homogeniza as tomadas de decisão, porque ela traz tudo, não basta só ganhar anos de vida, mas nós temos que proporcionar qualidade de vida. Então, nós fazemos ajustes nisso.
Vamos imaginar um indivíduo que viva dez anos, mas ele tem uma métrica de medida de utility de 0,5. Nós fazemos um ajuste desses dez anos por qualidade de vida: são cinco anos, é a metade, de vida ajustados para a qualidade. Essa métrica é hoje muito utilizada, esse desfecho é muito utilizado pelos países de medicina socializada na Europa.
Voltando agora para esse valor monetário: muito países definiram isso.
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O Reino Unido, por exemplo, define como esse threshold, esse limiar, a disposição a pagar, no Reino Unido, como entre 20 mil e 30 mil libras esterlinas por cada ano de vida ajustado para a qualidade. Isso é uma forma de quê? De o sistema de saúde definir as suas prioridades e, na hora da escolha, poder organizar o seu orçamento, colocar os seus recursos naquilo que vai dar mais retorno para o seu sistema de saúde.
Essas análises de custo-efetividade lidam com uma eficiência alocativa. Onde é que nós colocamos os recursos monetários para que eles nos proporcionem mais ganhos de vida?
Existem formas de se medir isso, várias metodologias. Uma delas, que é muito utilizada e é uma recomendação da Organização Mundial de Saúde, foi gerada em um relatório do ano 2000, liderado pelo economista Jeffrey Sachs, que estabelecia o seguinte, os países deveriam utilizar até três vezes o PIB per capita por ano de vida ajustado para qualidade, ano de vida ajustado para incapacidade, como o teto, o limiar de custo-efetividade para se incorporar uma nova tecnologia. Até três vezes o PIB per capita, esse seria o limite desse custo-efetividade, que é de um a três. Até um seria muito custo efetivo para um sistema de saúde incorporar, um PIB per capita, em relação a esse desfecho de saúde que é obtido. Lembrando sempre que isso é uma comparação entre alternativas de tratamento. Esse é um dos métodos para fazer essa estimativa.
Uma outra forma de criar esse parâmetro é utilizar um procedimento já existente. Isso aqui é uma publicação clássica também do grupo da Harvard, mostrando que, se você já tem um parâmetro no seu sistema de saúde que pode ser utilizado como modelo, isso pode ser feito. O exemplo mais clássico disso foi o que os Estados Unidos utilizaram da terapia renal substitutiva, que é a diálise. Em um ano, mais ou menos, um indivíduo em diálise nos Estados Unidos custava na época, nos anos 80, US$50 mil. E o Congresso definiu o seguinte: até US$50 mil por ano de vida, ajustado para a qualidade, isso é custo efetivo para o sistema incorporar uma nova tecnologia. Foi uma tentativa de usar um parâmetro já existente para a sua tomada de decisão.
E, por último, existe uma metodologia chamada league table, que é ranquear todas essas métricas de custo-efetividade para se fazer uma escolha. Nós sabemos que o menor custo monetário pelo mesmo ganho de saúde vai mostrar que uma terapia é mais eficiente.
(Soa a campainha.)
O SR. DENIZAR VIANNA ARAÚJO - E, para seguir aqui, um tópico importante quando a gente fala de razão de custo-efetividade é o seguinte: não dá para ter um parâmetro único para tudo. Por exemplo, para doenças raras, tem que ser avaliada uma política própria. São questões muito específicas de doenças em que, se nós usarmos o parâmetro da doença prevalente, isso certamente não vai ser útil para esse processo decisório.
Vou pular isso aqui e vou colocar a minha sugestão. Hoje o Brasil conta com pesquisadores da área de avaliação de tecnologia em saúde que têm capacidade de propor um valor, uma forma, um método para lidar com isso. Então, em um tempo exequível nós temos hoje massa crítica de vários... É uma rede de universidades que compõem esse grupo de pesquisadores que pode oferecer isso para o processo decisório do Ministério da Saúde.
Muito obrigado pela atenção.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Não é uma coisa fácil, como se pode ver, porque aqui há uma visão do interesse social, médico, do paciente, da qualidade de vida, e o interesse econômico-financeiro. E é preciso fazer isso, porque senão desorganiza os países, a questão orçamentária, como estamos vendo agora. Mas a saúde tem que ter um olhar um pouco, digamos, distinto desse.
Eu agradeço ao Dr. Denizar.
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Eu passo a palavra à Drª Carísi, Pesquisadora Coordenadora do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Avaliação em Tecnologias em Saúde.
A SRª CARÍSI ANNE POLANCZYK - Exma Senadora Ana Amélia, prezados Senadores, colegas, demais participantes, bom dia.
Também é uma honra estar presente aqui e falar sobre um tema, como o Denizar falou, que é o nosso chão, é o nosso dia a dia, nos últimos anos, trabalhando na questão de avaliação de tecnologias em saúde.
Eu fui um pouco mais direta em relação ao que estava sendo proposto na mudança da lei. E, só para relembrar, dois pontos foram trazidos pelo Senador. Um era tornar obrigatória a definição em regulamento e a divulgação de indicador ou parâmetro de custo-efetividade, e o segundo ponto diz respeito ao quesito de aleatoriedade e publicidade da distribuição dos processos. Em relação a esses dois é que eu vou tecer comentários para depois podermos avançar.
Então, minhas três considerações, com os argumentos que seguem. Primeiro, um entendimento de que o processo de incorporação de tecnologia deve ser multinível. É difícil, quase impossível avaliarmos todas as tecnologias em saúde utilizando os mesmos parâmetros. E eu vou dar alguns exemplos nesse sentido.
Por outro lado, em alguns cenários, sim, normalmente tecnologias inovadoras, disruptivas, que mudam o curso natural às vezes das doenças, o cálculo da estimativa de custo-efetividade se torna relevante. Ele é imprescindível para manter um sistema de saúde sustentável, mas ele nunca deve ser usado como uma decisão exclusiva dentro de um processo de tomada de decisão, afinal estamos lidando, como a Senadora disse, com vidas de pessoas.
É importante, sim, a definição de limiares de custo-efetividade para esses cenários. E não gostaria de deixar a impressão de que essa análise pode ser feita aleatoriamente por algumas instituições onde se requer realmente uma expertise, uma qualificação.
Problemas no sistema de saúde nós temos muitos - esses são dados universais, não são só nossos aqui -, como mudança do perfil da população, mudança de estilo de vida. Nós sabemos que a prática médica, a prática de profissionais de saúde não está homogeneizada, existe muita variabilidade. Mas, dentro dos problemas do sistema de saúde, as inovações, o avanço, especialmente em relação à indústria de saúde, ele é muito grande. E em alguns sistemas se deram conta de que, se nós não formos mais inteligentes, eles podem realmente quebrar o sistema. Estamos frente a um cenário de contenção de recursos e precisamos pensar, sim, em sustentabilidade no modelo.
Inúmeras vezes, e o Dr. Marcelo trouxe isso, nós temos inovações. Nós gostaríamos de dar para todos os nossos pacientes todas as opções disponíveis. A maioria das tecnologias, como a gente chama, são quase frugais, elas não mudam muito a história. Elas acrescentam um pouco, mas não fazem um grande avanço, embora outras, sim, mudem.
A dificuldade é saber se a tecnologia que está sendo avaliada ou que se propõe realmente tem esse caráter inovador e disruptivo e se o preço que se quer pagar por ela é razoável. Nós fazemos escolhas na nossa vida, no nosso dia a dia, na hora que nós compramos um carro, na hora que nós escolhemos uma casa. Infelizmente, também aqui nós temos que fazer escolhas.
Eu gostaria só de destacar que a avaliação de tecnologia em saúde é uma das respostas para os problemas do sistema de saúde; temos inúmeros outros problemas no nosso SUS, em outros sistemas de saúde, mas que não vão ser resolvidos com essa etapa. Precisamos de melhorais de eficiência, precisamos de protocolos clínicos, uma saúde pública melhor, mas eu acho que não é o foco aqui. Então, eu gostaria só de reforçar que esse é um elemento, é um paradigma para responder ao aspecto de incorporação de tecnologias dentro de um sistema de saúde.
Essa é a definição tradicional. O que é esse processo? É um processo que avalia benefícios em saúde, consequências econômicas e sociais no emprego de tecnologias. Existem atributos da tecnologia que são avaliados sempre com maior cuidado: segurança, eficácia, efetividade e, por fim, custo-efetividade. Mas não são exclusivos.
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O meu ponto é que, quando falamos em tecnologia em saúde, estamos falando desde equipamentos, remédios, hospitais até coisas mais eventualmente distantes, como um hospital, uma unidade hospitalar. Isso também é uma tecnologia. E ali estão todos esses elementos.
Eu gostaria de trazer três exemplos aqui para mostrar que nós não podemos avaliar da mesma forma diferentes tecnologias. Se nós pegarmos incubadoras numa UTI, certamente será necessário avaliar qual é o custo, se elas vão funcionar, se elas são seguras. Saber qual é o impacto que essas incubadoras vão ter na vida das pessoas em relação a uma métrica, como o Prof. Denizar explicou, de anos de vida ganhos é impossível. Então, não há como colocar isso dentro dessa metodologia. Da mesma forma, em relação a uma cadeira de rodas que foi avaliada, há alguns anos, pela Conitec, é difícil nós termos uma dimensão do impacto em custo-efetividade. Por outro lado, há uma dimensão do impacto social. Na troca de equipamentos digitais por convencionais, eu não consigo avaliar o impacto de custo-efetividade, mas eu consigo avaliar o impacto ambiental, eventualmente, dessa substituição.
Mas, em muitos cenários - e talvez dentro de procedimentos -, entram, na prática clínica que o Marcelo comentou, medicamentos, dispositivos, órteses e próteses. Sim, eu talvez esteja diretamente mudando a história natural da doença de um indivíduo, e isso tem que ser avaliado com maior cuidado.
Eu trouxe um exemplo - e nós temos inúmeros exemplos. Essa é uma medicação que já existe há alguns anos no mercado, uma medicação que mudou um pouco o tratamento do melanoma, um câncer de pele extremamente agressivo. Esse medicamento está sendo avaliado agora no SUS, mas eu trouxe dados da Irlanda. O uso desse medicamento aumenta em dois, três meses a sobrevida em uma condição extremamente grave, pois o indivíduo vai falecer em um ano. Na Europa, o custo dessa medicação é em torno de 85 mil euros. No Brasil, a estimativa, hoje, é de R$850 mil para aumentar três meses de vida nessa condição clínica. O impacto, na Irlanda, era muito expressivo, e ali aparece o ICER.
Nesse cenário, sim, nós precisamos de algum elemento para balizar se as nossas escolhas vão fazer um uso racional dos nossos recursos para aumentar... Se houvesse recursos para todo mundo, não estaríamos aqui discutindo nenhum ICER. Acho que esse ponto é importante. Gostaríamos de dar tudo para todos, mas precisamos, infelizmente, fazer escolhas. Então, o processo de incorporação de tecnologia deve ser multinível. Eu gostaria de deixar a ideia de que uma Razão de Custo-Efetividade Incremental precisa ser calculada em todos os elementos.
O Denizar já colocou aqui como são calculados esses estudos de custo-efetividade, e eu não vou repetir. Sempre são nesta perspectiva de o quanto uma tecnologia tem um custo a mais em relação a uma alternativa e quanto eu ganho em saúde com essa alternativa.
Essa é a forma de nós interpretarmos. Nós temos tecnologias que são mais efetivas, mas que custam menos - essas são as fáceis de decidirmos que nós devemos incorporá-las - e temos aquelas que podemos descartar, porque não funcionam em relação a uma alternativa e custam mais. Mas a maioria das novas tecnologias se encontram naquele quadrante: elas trazem um benefício, mas também agregam um custo. É para essas que nós precisamos definir o chamado limiar.
O Denizar explicou que nós temos tecnologias cujo custo adicional é pequeno e o benefício muito grande. Programas antitabagismo são altamente custo-efetivos. Por outro lado, nós temos, às vezes, tecnologias que nos acrescentam muito pouco e vêm a um custo muito maior.
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A definição desse threshold ou desse limiar é motivo de debate, mas os países, nos últimos dez anos, têm evoluído de uma maneira impressionante e têm conseguido aplicar isso dentro de seus sistemas de saúde.
Vou trazer um exemplo da Irlanda. Publicaram recentemente a avaliação pelo sistema deles, com a aplicação desse ICER, mostrando só - eu destaco embaixo... Eles definiram o ICER, esse liminar, por 45 mil euros por QALY e facilmente conseguiram avaliar que medicamentos abaixo desse ICER deveriam ser incorporados, enquanto os acima ficavam num critério de discussão.
Não necessariamente - eu gostaria de colocar isto, Senadora - nós precisamos ter um ICER. Nós podemos ter uma variação de ICER; nós podemos ter - como eles chamam - uma range ou uma definição daquilo que é muito custo-efetivo e que deveria ser priorizado, que deveria ser discutido, certamente ponderando em relação ao impacto orçamentário. Esses são dados... É a forma como a Irlanda trabalha.
Alguns processos decisórios, com impacto orçamentário pequeno e um ICER baixo, são facilmente aprovados. Outros vão para outra instância superior para um processo de decisão.
Então, eu acho que dá para realmente usar essa informação para melhorar a gestão do sistema.
(Soa a campainha.)
A SRª CARÍSI ANNE POLANCZYK - E o ponto mais difícil talvez - quando nós falamos em ICER, nós falamos em relação a isto: o quanto estamos dispostos a pagar? Como sociedade, temos que parar e refletir, porque essa não é uma resposta fácil. O quanto nós estamos dispostos a pagar por um ano de vida de um indivíduo? Então, isso requer uma análise cuidadosa, como o Denizar mencionou.
Por último - eu talvez vá pular, e os colegas da Conitec devem comentar -, nós tivemos muitos avanços nos últimos anos. A Conitec conseguiu colocar esse paradigma, esse modelo em prática. Temos um caminho a percorrer, e mudanças devem feitas para que isso se torne mais transparente e útil para a sociedade.
Nós não temos, na definição da Conitec, um ICER explícito nem implícito no Brasil, em qualquer uma de suas decisões. Então, eu acho que isso que precisa ser trabalhado, sim. Quais são os critérios de priorização dentro do nosso sistema de saúde? Ele ainda apresenta muita subjetividade e pode ser mais objetivo, no meu entendimento.
Encerro dizendo que incorporação de tecnologia deve ser uma decisão técnica, científica, isenta e transparente e estabelecida por instituições e profissionais com o perfil. Eu não vejo espaço, e temos que ter muito cuidado, porque não pode ser usado como um ato político esse tipo de situação.
Concluo, então, os três pontos que eu havia comentado. A minha opinião é que a análise de tecnologias, a avaliação de custo-efetividade requer uma qualificação, uma expertise, e nós só temos que ter cuidado ao fazer isso para não destruirmos o modelo, o método e não conseguirmos o melhor benefício com ele.
Muito obrigada pela atenção.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Obrigada, Drª Carísi, que complementa o ponto de vista do Prof. Denizar com um detalhamento, eu diria, não mais objetivo, porque ele foi muito claro e objetivo, mas delineando já uma proposta e mostrando, comparativamente, um exemplo que existe na Irlanda em relação às incorporações das novas tecnologias.
Convido agora o Dr. Gustavo Laine Araújo de Oliveira, que é técnico do Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias em Saúde da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde e representante do Conitec e também do próprio Ministério da Saúde.
O SR. GUSTAVO LAINE ARAÚJO DE OLIVEIRA - Bom dia a todas e a todos presentes.
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Agradeço primeiramente à Senadora Ana Amélia pela Presidência e pelo convite para a nossa exposição, a todos os colegas expositores, a todos os Senadores presentes, a todos os presentes à Comissão.
Vou complementar a fala dos demais. Acho que todas as falas vão trazer subsídios muito importantes para o nosso entendimento.
Ressalto, bem rapidamente, o que foi a criação da Conitec. Desde 2012, a Conitec trabalha em substituição à Citec. E o objetivo primordial da Conitec é o estabelecimento de um processo transparente para tomada de decisões na incorporação de tecnologias em saúde no SUS. Então, é uma instituição que tem um marco legal claro, que define isso. Nós tivemos muitos ganhos com o estabelecimento da Conitec.
Trata-se a Conitec de uma comissão. Ela está ligada diretamente ao Ministério da Saúde, no mesmo nível do Conselho Nacional de Saúde. É composta por um plenário de 13 membros bem representativos. Tem as áreas técnicas do Ministério da Saúde, mas também tem o Conselho Federal de Medicina, representando os profissionais da saúde; o Conselho Nacional de Saúde, representando a sociedade civil como um todo; CONASS e Conasems, representando os gestores de saúde estaduais e municipais; a ANS e a Anvisa, que são as nossas agências reguladoras na área da saúde. E também conta com o nosso departamento, que é o Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias em Saúde, que faz o secretariado executivo da Conitec. Somos responsáveis pela organização da Conitec, por propor e organizar reuniões e também pela elaboração dos relatórios técnicos de recomendação sobre inclusão, exclusão e alteração de tecnologias do SUS.
Nós contamos com a nossa equipe de servidores do Ministério da Saúde, que é uma equipe multidisciplinar, é altamente capacitada, com nível de conhecimento metodológico da área de avaliação de tecnologia de saúde elevadíssimo, com que nós temos muito orgulho de contar, e também com instituições parceiras. Vai ser importante falar das instituições parceiras também para falar sobre uma das propostas do projeto de lei que é a aleatorização das demandas de análise da Conitec.
Nosso fluxo é claro. Nós recebemos o pedido e qualquer pessoa física ou jurídica pode fazer um pedido de incorporação, ou exclusão, ou alteração de tecnologias. Obviamente que requer um conhecimento metodológico específico, mas nós também estamos à disposição para auxiliar na construção dessas demandas.
A Conitec analisa esses estudos. Se necessário, ela vai solicitar estudos complementares. Submete à apreciação do plenário da Conitec, que vai dar o seu parecer inicial, sua recomendação inicial, e, posteriormente, vai ser submetida à consulta pública, o que vai dar completa transparência ao processo. Todas as pessoas, toda a sociedade civil, seja pessoa física, seja pessoa jurídica, tem oportunidade de contribuir. E, saibam, essas contribuições são consideradas de uma forma que eu desconheço internacionalmente. A gente tem um processo de consideração, damos retorno sobre essas considerações que vão compor o nosso relatório final, após a decisão de recomendação final da Conitec, que pode ser ou não acatada pelo Secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde.
Como consta também na matéria, todas as decisões, até hoje, desde a criação da Conitec, todas as recomendações da Conitec foram acatadas pelo secretário da SCTIE.
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Tivemos vários secretários da SCTIE, de três governos, então isso ultrapassa questões de governo. Mas acho que é uma questão de Estado o reconhecimento de que as recomendações da Conitec são de alta qualidade. E por isso que a SCTIE acata as recomendações, mas ela pode decidir pelo contrário. Então, a decisão é publicada no Diário Oficial da União.
Vou homenagear aqui o Dr. Marcelo Lopes, que utilizou alguns dos nossos eslaides. É uma homenagem. Agradeço. É prova de que estamos no caminho certo.
Quero ilustrar a vocês que a avaliação de tecnologias de saúde engloba uma série de questões, uma série de argumentos técnico-científicos muito importantes para tomada de decisão, como a Drª Carísi, que me antecedeu, ressaltou muito bem. E o custo-efetividade é um dos parâmetros dessa tomada de decisão. Um parâmetro muito importante, uma informação muito importante para quem vai tomar essa decisão, mas ela não é a única e não pode ser a soberana.
Contestando aqui a informação do Dr. Marcelo - e todas essas informações são publicadas no nosso portal, no nosso site, que é conitec.gov.br -, o percentual de incorporação da Conitec é de cerca de 60% e se aproxima de qualquer agência internacional de avaliação de incorporação de tecnologias. E há de se ressaltar que nós somos uma comissão que avalia incorporação de tecnologias no único sistema de saúde que oferece saúde universal para uma população maior que cem milhões de habitantes, e nós estamos próximos de 210 milhões de habitantes.
É um desafio muito grande. É clara e notória a nossa dificuldade financeira, principalmente pelo momento atual por que passamos, mas essa dificuldade nunca foi a dificultadora do processo de incorporação. É claro que devemos considerar, mas há uma série de outras questões, principalmente as evidências clínicas e científicas dessas tecnologias são consideradas e toda a análise disso é publicada nos nossos relatórios, que, da mesma forma, estão disponíveis de forma absolutamente transparente no nosso site.
Esse é o nosso relatório. E eu ressalto aqui para V. Exªs a composição da parte da argumentação técnico-científica que é composta pela evidência clínica, avaliação econômica e impacto orçamentário. Além de outros, também adotamos o monitoramento de horizonte tecnológico. Não basta olhar a tecnologia que há, a gente tem que saber o que vem por aí, antes mesmo de ser registrado em qualquer agência internacional ou de outros países.
Vou falar especificamente então do tópico do modelo econômico, a avaliação de custo- efetividade, que é objeto do projeto de lei do Senado.
Essa avaliação de custo-efetividade é baseada em um modelo. É o modelo econômico. E, como todo modelo - e eu desafio alguém a me provar o contrário -, é uma aproximação da realidade. Isso é fato, isso em qualquer livro básico de avaliação de tecnologia e saúde é descrito. É uma aproximação da realidade. Então, tomar decisões com base exclusivamente na avaliação de custo-efetividade significa abrir mão de quaisquer outras informações que são importantes e necessárias para o julgamento e para a melhor decisão em saúde. Então, nós temos quatro tipos de avaliação econômica, não é só custo-efetividade. E não é arbitrária a escolha do tipo de avaliação, depende de cada tipo de tecnologia e de cada tipo de tratamento. Então, nós temos o custo-minimização. O que difere entre elas é a forma de quantificar o benefício clínico. No custo-minimização, nós temos duas tecnologias equivalentes. Nós não vamos considerar esse valor da efetividade, não precisamos, ele é matematicamente igual. Então, a aplicação de um ICER aqui também é diferente em relação ao custo-efetividade.
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O custo-benefício é menos usado, mas também tem sua importância. Ele valora monetariamente benefícios clínicos, ou seja, não é possível estabelecer um ICER de custo por QALY para esse tipo de análise.
(Soa a campainha.)
O SR. GUSTAVO LAINE ARAÚJO DE OLIVEIRA - Custo-efetividade é a questão de nossa discussão. Ele quantifica benefícios clínicos e pode ser anos de vida, percentual de cura, enfim, uma cura, quantidade de recursos que é necessário investir para ter uma cura. E o custo-utilidade, que também é um tipo de análise que utiliza o parâmetro anos de vida ajustados por qualidade.
Então, como os senhores, as senhoras e V. Exªs podem verificar, a forma de quantificação do benefício clínico é variadíssima, há diversas formas, e isso vai depender da condição clínica que está sendo avaliada.
A gente não vai poder - e a gente não consegue - avaliar QALY para toda e qualquer condição clínica que exista. Vou citar só um exemplo: a gente tem medicamentos que são muito antigos, mas que ainda permanecem sendo os melhores medicamentos para o tratamento de diversas doenças. Esses medicamentos são da época que não existia estudo clínico publicado; a gente não tem isso e não vai conseguir. E como a gente vai estabelecer o QALY para esses pacientes se a gente não tem essa evidência científica publicada? Quando aparece uma inovação tecnológica, um medicamento novo, esses estudos são recentes e estão publicados. Então, como a gente vai comparar essas tecnologias? Há uma dificuldade nesse processo.
A métrica já foi exposta. Eu vou passar para o final, só citando os mais recentes estudos nessa área de definição de limiar de custo-efetividade.
Está na matéria citando que a OMS se baseia em um parâmetro - o Dr. Denizar também citou - de muito custo-efetivo, até um PIB per capita, e custo-efetivo entre um e três PIBs per capita. A própria OMS, autora dessa métrica, reconhece, com esse novo estudo de 2016, que os países não devem usar esse parâmetro como limiar de custo-efetividade. Não há consenso sobre isso. Não se deve considerar apenas o custo-efetividade, deve-se considerar a capacidade de fornecimento, o impacto orçamentário, a equidade, a viabilidade e os critérios importantes locais, e o nosso País tem critérios locais muito importantes para serem considerados nessa decisão.
Um outro estudo que nós incentivamos foi realizado pelo Instituto de Efectividad Clínica y Sanitaria da Argentina (IECS), que é internacionalmente reconhecido por sua excelência, e estimou limiares de custo-efetividade para 194 países, com base no gasto em saúde de cada país e na expectativa de vida de cada país. Vejam como difere em muito do estabelecido pela OMS.
O proposto, em termos de QALY, limiar de custo-efetividade, sendo efetividade QALY, para o Brasil, em uma situação de restrição orçamentária, varia entre 0,79 e 0,89 PIB. Então, é menos que um PIB. Ou seja, mais do que isso, em situações de restrição orçamentária, que parece ser o momento que estamos passando, não se recomendaria. Então, essa seria uma estimativa de um limiar de custo-efetividade que leva em conta o gasto em saúde do país e a expectativa de vida.
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E outro estudo, também citado na matéria, na justificação do projeto, considera que ter um limiar atrelado a gastos em saúde pode provocar a oscilação do próprio limiar, porque é variável, o gasto em saúde vai ser variável. E, ainda - as autoras acrescentam -, um aumento no gasto em saúde não necessariamente significa que o país está disposto a pagar mais por uma incorporação de tecnologia, pode estar disposto a pagar mais pela infraestrutura e pela melhoria de seus recursos humanos.
Para finalizar, tocando rapidamente na questão da aleatorização das demandas, a que nós somos contrários, e oficializamos nossa posição ao Senado, exemplo que a Drª Carísi abordou brilhantemente: hoje, a gente pode direcionar uma demanda sobre ortopedia para o Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia, que é um dos nossos parceiros e que tem corpo técnico capacitado para fazer. Se fosse aleatório, poderia cair para o Instituto Nacional de Cardiologia. Eles conseguem fazer isso? Conseguem, mas eles teriam que recorrer a mais profissionais, poderiam ter mais tempo para análise. Seria muito melhor agregar a análise de ortopedia para o Into.
E, sobre a transparência, eu acho que a Conitec é muito sensível às contribuições. A gente ouve; a gente atende tudo que a sociedade nos coloca para aperfeiçoamento. Nós temos um processo muito transparente. Todos os grupos técnicos que avaliam as demandas compõem os relatórios, e todos os relatórios estão expostos e são colocados para consulta pública. Na consulta pública, qualquer cidadão brasileiro sabe qual é o grupo que fez esse relatório. Então, a gente não entende e a gente acha que vai ocorrer uma inespecificidade, uma perda na qualidade e um descumprimento de prazos com a aleatorização das demandas.
Com isso, coloco-me à disposição e agradeço a atenção.
Muito obrigado pela oportunidade.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Obrigada, Dr. Gustavo.
Antes de passar a palavra ao Dr. Thiago Rodrigues Santos, eu queria convidar o Senador Cássio Cunha Lima, que é o autor desse projeto que nós estamos examinando - e por isso esta audiência pública foi convocada. O Dr. Thiago é o último expositor.
Eu preciso só ler um relatório de minha autoria na Comissão de Relações Exteriores - aqui nós temos que nos virar em trinta - e volto, em seguida, porque não devo demorar muito. Então, peço a V. Exª para encerrar.
Na sequência, Senador Cássio, eu penso que seria importante... Parece-me que há uma senhora que veio com uma criança e que quer fazer uma pergunta. Nós vamos abrir, democraticamente, para que se faça o questionamento. Antes disso, porém - há algumas questões para levantar -, o Dr. Marcelo poderia fazer um questionamento entre eles em função das dúvidas suscitadas sobre a matéria.
Então, se for possível, eu peço a V. Exª, muito agradecida, que me substitua por alguns minutos na Presidência desta audiência pública.
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O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Dando sequência, portanto, às exposições, concedo a palavra ao Dr. Thiago Rodrigues Santos, que fará a sua própria apresentação.
O SR. THIAGO RODRIGUES SANTOS - Bom dia, gente.
Gostaria de saudar o Senador Cássio Cunha Lima, a Senadora Ana Amélia e o Senador Caiado, que esteve aqui recentemente.
Na verdade, não tenho nenhuma apresentação. Vou apenas me apresentar. A apresentação em nome do Ministério o Gustavo já fez. Gostaria de parabenizar também a apresentação da Drª Carísi.
Sou servidor de carreira do Ministério da Saúde, estou lá desde 2008. Já passei por várias secretarias dentro do Ministério, estou há um ano na Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação (Secti). Se há um time de elite dentro do Ministério ele está dentro da Conitec. São as pessoas tecnicamente mais capacitadas e bem colocadas nos lugares para tomar decisões. A criação da Conitec foi justamente para dar mais transparência a esse processo.
Trabalhar com ciência e tecnologia no País realmente é muito complicado. Tenho participado de muita discussão, temos investido cada vez mais em pesquisas, em incorporações e em tecnologias, então estamos vendo que esse cenário vem melhorando.
O Brasil ainda investe muito pouco em pesquisa principalmente, 1% do PIB, enquanto alguns países mais desenvolvidos investem em torno de 3% a 4%. Então essas pesquisas certamente vão trazer benefícios para a saúde. E essas novas tecnologias precisam, sim, ser incorporadas. Discutir qualquer tipo de evolução normativa... A Lei nº 8.080 é de 1990, então realmente é bastante salutar fazermos algumas considerações e alterações na legislação.
Estamos debatendo com outros Ministérios, como o da Ciência e Tecnologia e o da Indústria e Comércio, um novo marco regulatório da ciência e tecnologia que vai dar mais segurança jurídica para conseguirmos investir em pesquisas, fomentar a indústria e ter mais produtos para a saúde. Então seria importante frisarmos esse ponto.
Especificamente sobre o projeto do Senador Cássio Cunha Lima, esses dois pontos, como o pessoal bem colocou, o critério custo-efetividade é um deles. A Conitec avalia outros critérios que têm peso diferente na sua decisão. E há a questão que o Gustavo colocou, que é bastante importante, a questão de aleatoriedade. Existem algumas situações em saúde que são específicas. Então, o risco de isso cair em alguma outra pasta que não tenha tecnicamente o arcabouço para fazer esse tipo de julgamento existe.
Agradeço o convite. Considero muito importante esse dia de trabalho e de discussão.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Agradeço ao Dr. Thiago.
A iniciativa desta audiência pública é exatamente o debate para a crítica e o aprimoramento da proposta, que, por coincidência, é de minha autoria. As audiências públicas têm esse intuito. O objetivo central é permitir que especialistas, pessoas envolvidas com o tema proposto, a sociedade de forma geral tenha a oportunidade de se manifestar sobre temas que interessam à realidade do País.
É inegável que temos um processo crônico de judicialização para atendimento em saúde no Brasil. Não é possível continuar com essa regra de judicialização sem que possamos aprimorar os tratamentos e as terapias que possam estar disponíveis para a população. É claro que fica sempre a discussão de caráter orçamentário, mas é uma discussão que pouco me sensibiliza num país onde tantos privilégios são vistos e secundarizada fica a vida, onde pessoas morrem por falta de uma oportunidade, por falta de assistência.
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Para aproveitar este nosso encontro, o que eu vou sugerir, seguindo a própria ideia que foi trazida pela Senadora Ana Amélia, que deverá voltar em poucos instantes, é que possamos fazer aqui, se os senhores e as senhoras se dispuserem, um debate sobre como aprimorar a proposta. Já que há um consenso, com exceção talvez de Dr. Marcelo Queiroga...
Eu não pude estar aqui no início da reunião, mas estava acompanhando do meu gabinete, pela TV, porque estava recebendo um Deputado paraibano e dois prefeitos do meu Estado e não poderia deixar de fazê-lo. Estava recebendo os prefeitos, mas também acompanhando a audiência e percebi que há um consenso, de certa forma, construído no que diz respeito a custo-efetividade não poder ser o único critério para o estabelecimento de novas terapias.
Então, a pergunta que faço à Mesa de forma geral - e fica facultado a quem desejar responder - é especificamente em relação a quais outros critérios nós poderíamos adotar na perspectiva de aprimoramento da proposta, o que poderíamos fazer no que diz respeito a esses outros parâmetros de avaliação. Creio que é uma contribuição importante que poderá ser dada. E um tema que tem sido uma preocupação constante de Dr. Marcelo Queiroga - concluo e já passo a Presidência à Senadora Ana Amélia - é em relação à introdução do TAV, por que efetivamente o TAV não foi ainda incorporado ao sistema SUS.
Então ficam essas duas indagações, essas duas provocações para que possamos levar adiante o nosso debate.
Passo a Presidência novamente à Senadora Ana Amélia.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Agradeço ao Senador Cássio Cunha Lima.
A pergunta foi dirigida à Mesa.
Já que foi citado o Dr. Marcelo, o senhor pode complementar por três minutos no máximo.
O SR. MARCELO ANTÔNIO CARTAXO QUEIROGA LOPES - Senador Cássio, quero me ater exatamente ao texto da lei, art. 19-O. O que está como parágrafo primeiro na realidade é o parágrafo único:
Parágrafo único. Em qualquer caso, os medicamentos ou produtos de que trata o caput deste artigo serão aqueles avaliados quanto à sua eficácia, segurança, efetividade, custo-efetividade para as diferentes fases evolutivas da doença ou do agravo à saúde de que trata o protocolo.
Então a lei não trata de custo e utilidade nem desses outros parâmetros que são importantes. Trata tão somente de eficácia, segurança, efetividade e custo-efetividade. E V. Exª, quando apresentou essa proposta legislativa, poderia ter proposto a fixação do ICER. V. Exª não o fez justamente para não invadir a competência do Poder Executivo. Então por que fixar os parâmetros de custo-efetividade? Porque a lei fala especificamente em custo-efetividade. A lei é explícita. Então, se a lei é explícita, é preciso dizer à sociedade brasileira qual é o parâmetro de custo-efetividade que será usado no sistema de saúde do Brasil. Não que seja o único, mas quando se utilizar esse parâmetro que se diga "vou utilizar esse parâmetro e o valor é esse". Então fica claro e transparente.
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O segundo ponto é a questão da aleatorização. Também não está regulamentado esse parágrafo. Compete ao Ministério da Saúde, por meio de decreto-lei, estabelecer como vai se dar essa questão da aleatorização, Dr. Gustavo. Pode até ser feito sob a forma de substitutivo. Já que a Senadora Ana Amélia e o Senador Cássio reconhecem que esta audiência é para aprimorar o projeto, colocar critérios de aptidão e aleatorização. Por óbvio não se vai demandar uma avaliação de cardiologia de um instituto de ortopedia, mas esses núcleos são especializados em avaliação de tecnologia em saúde. E no momento em que se coloca a aleatorização...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCELO ANTÔNIO CARTAXO QUEIROGA LOPES - ...vai se fazer com que esses núcleos cresçam, qualifiquem-se, pluralizando esse conhecimento para o benefício de toda a comunidade acadêmica. É essa a questão.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Agora passo para o Dr. Gustavo, para um comentário, depois para o Dr. Thiago, a Drª Carísi e o Dr. Denizar, também por três minutos, porque serão bastante coincidentes os pontos de vista.
O SR. GUSTAVO LAINE ARAÚJO DE OLIVEIRA - Perfeito, Senadora. Muito obrigado pela palavra.
Quais outros critérios poderiam ser acrescentados à matéria para a tomada de decisão? Foi a pergunta do Senador Cássio Cunha Lima.
Como foi exposto, nós temos, para o estabelecimento do limiar de custo-efetividade, uma complexidade intrínseca no estabelecimento de um único limiar, como a Drª Carísi bem colocou. Nós temos diversas formas ou diversas possibilidades e talvez diversas impossibilidades de ter um parâmetro de efetividade homogêneo como o QALY. O QALY seria o melhor dos mundos para nós, mas nem sempre é possível determinar esse QALY, principalmente porque ele depende de uma validação de dados para o contexto populacional brasileiro. Isso ainda é recente para nós. A definição desses critérios para a população brasileira ainda é recente.
Da mesma forma será a complexidade para o estabelecimento de parâmetros de impacto orçamentário, por exemplo, aproveitando a fala do Dr. Marcelo, que citou a legislação que se baseia em critérios de efetividade, de segurança e de custo-efetividade. Talvez possamos explicar isso de forma regulamentar, infralegal, mas custo-efetividade nós entendemos. Apesar de haver uma análise de custo-efetividade que é própria, denominada, a comunidade científica reconhece que custo-efetividade é a avaliação econômica em geral, seja custo-utilidade, custo-efetividade, enfim.
Da mesma forma, não temos critérios estabelecidos e não há uma demanda pelo estabelecimento de critério de eficácia ou de efetividade a ser considerado. E um grande desafio é este, termos dados de eficácia e de efetividade, principalmente de efetividade, que são os dados de vida real. Esses seriam os dados importantes para a nossa tomada de decisão e para compor...
(Soa a campainha.)
O SR. GUSTAVO LAINE ARAÚJO DE OLIVEIRA - ...o parâmetro de custo-efetividade.
Temos um campo de incertezas, Senador Cássio Cunha Lima, e a área ainda está evoluindo. Ela está evoluindo rápido. Temos diversos estudos sugerindo parâmetros.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Obrigada.
Dr. Thiago.
O SR. THIAGO RODRIGUES SANTOS - Senadora, creio que a minha fala se coaduna com a do Gustavo como Ministério. Apenas a questão do custo e efetividade é bastante importante dentro desse contexto, mas não deve ser ponderada só por aí. Existem, na questão da radioterapia, alguns procedimentos que ainda não estão incorporados, que estamos estudando no Ministério e devemos incorporar. Quando notamos o impacto orçamentário dessa nova tecnologia, vemos que realmente é significativo, mas alguns especialistas defendem que o ganho assistencial nessa área... É complicado falar em termos de vida, mas o ganho com essa nova tecnologia não é tão significativo, e não está consolidado e comprovado esse procedimento. Então competem mesmo essas análises à Conitec, mas tendo o cuidado justamente de analisar isso por outros aspectos que não sejam somente a questão do custo-efetividade.
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A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Drª Carísi e depois Dr. Denizar.
A SRª CARÍSI ANNE POLANCZYK - Todos estamos na mesma linha. Concordo com o Marcelo, o limiar é algo importante, precisa ser trabalhado.
Talvez o meu comentário, respondendo ao Senador Cássio sobre outros critérios, seja de que a Conitec poderia ser mais explícita em relação a quais critérios estão sendo utilizados, quando a tecnologia é incorporada ou não e por que ela foi explicitamente... Creio que isso pode ser mais bem elaborado, porque sentimos falta nas avaliações. Às vezes é por segurança, às vezes é por efetividade, às vezes é por custo, mas que isso venha explicitado. E, quando for o ICER, eu concordo, temos que ter um ICER para a tomada de decisão. Talvez a lei possa solicitar que isso seja feito. Hoje ainda não é feito dessa maneira tão explícita, quais são os parâmetros e como são feitas as escolhas.
Em relação ao segundo ponto, das instituições, também não são todas que podem trabalhar com isso, mas quais são os quesitos dessas instituições, quais qualificações elas deveriam ter para fazer parte do rol das instituições que teriam competência para trabalhar? Aí sim, com competências semelhantes, haver um processo de distribuição aleatória dos pareceres. Isso também pode ser mais explícito, definido e transparente.
Essa seria a minha sugestão.
O SR. DENIZAR VIANNA ARAÚJO - Eu gosto de uma frase de um autor importante na medicina, que diz que medicina é a ciência da incerteza e uma arte da probabilidade. Esse é o cenário da nossa prática e da nossa tomada de decisão. Nós não podemos, por conta de uma incerteza, deixar de definir parâmetros. E há métodos hoje para, de alguma forma, definir quanto é essa variação.
Por que trago isso? Porque essas mesmas incertezas acontecem em países que definem o seu ICER: Reino Unido, Canadá, e assim por diante. Nós temos hoje métodos para definir essa incerteza. Esse é um ponto importante só para reforçar a necessidade de um parâmetro para determinadas intervenções.
Queria trazer o que de alguma forma vem dando certo do ponto de vista de programas no Ministério da Saúde.
Olhamos o programa de hepatites virais e o programa de HIV/Aids. Por que isso dá certo? Existe uma priorização para determinadas áreas e isso é importante. Sabemos que os recursos são escassos. Não há recursos para tudo, mas definimos prioridades, o que é um ponto de partida importante num processo decisório, e fazemos a definição de alocação de recursos.
Hoje, programas como hepatite viral, que é um exemplo para o mundo inteiro... O Brasil tem um grande programa que alcança índices importantes de benefícios para a população que é tratada, há uma definição do orçamento que vai ser alocado, como vai ser a evolução desse orçamento nos anos subsequentes, o que acontece também com o Programa Nacional de Imunização, que é...
(Soa a campainha.)
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O SR. DENIZAR VIANNA ARAÚJO - ...um exemplo no País.
Então, define-se prioridade, faz-se uma perspectiva em termos de provisionamento orçamentário, para que haja algum fluxo mais certo nesse processo de avaliação.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Obrigada, Dr. Denizar.
Na exposição do Dr. Marcelo, foi mencionado o número de instituições que foram submetidas a novas incorporações. Então, passa pelo CFM, no caso da medicina, pela Anvisa e pela ANS, porque é plano de saúde complementar, tem que fornecer ao cliente. Essa é uma relação diferente. E a Conitec, que dá a última palavra.
Eu queria saber da Conitec: o fato de o CFM considerar uma inovação adequada do ponto de vista do paciente e da especialização qual é o peso que tem na hora da incorporação? É um peso médio, é um peso grande ou é apenas esse custo/benefício que aqui foi a pauta geral sobre a incorporação?
O SR. MARCELO ANTÔNIO CARTAXO QUEIROGA LOPES - É uma ótima pergunta, uma ótima oportunidade de se colocar.
A Conitec tem 13 membros. Obviamente, cada um deles vai ter o seu posicionamento, e os seus pares vão entendê-lo conforme o julgamento de cada um. No entanto, a participação efetiva do CFM tem qualificado muito as decisões da Conitec. Legalmente, o peso da posição do CFM é igual ao de qualquer um, mas moralmente quem acompanha, quem verifica atas, enfim, da nossa reunião vê que a posição do CFM é muito influente dentro da Conitec. O representante do CFM, Dr. Aníbal, tem completo domínio de todos os estudos que são submetidos à apreciação. Ele coloca o seu posicionamento de uma maneira clara e moralmente é muito reconhecido pelos seus pares pelo fato de ser um profissional médico representando a categoria médica em um Conselho que tem a prerrogativa exclusiva de julgar procedimentos médicos.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - O senhor falou, na fase final, sobre critérios locais.
Quais são esses critérios locais?
O SR. MARCELO ANTÔNIO CARTAXO QUEIROGA LOPES - Nosso sistema de saúde é único no mundo. Nós temos um sistema de saúde universal para uma população de 210 milhões de habitantes. Além disso, somos um país de média renda numa região tropical. Então esses desafios nos colocam questões e contextos locais. Cito um exemplo que comecei a detalhar na minha exposição: temos uma grande gama de doenças que deveriam ser eliminadas, de doenças que são negligenciadas pela ciência, pela comunidade acadêmica, pelos laboratórios farmacêuticos, que não se interessam em desenvolver medicamentos baratos. Os medicamentos para essas doenças geralmente são baratos e não dão retorno para eles. Então doenças que são negligenciadas, pacientes que são negligenciados.
(Soa a campainha.)
O SR. MARCELO ANTÔNIO CARTAXO QUEIROGA LOPES - Essa seria uma grande prioridade no País. Isso deve ser priorizado, como o Dr. Denizar disse. Essa deveria ser uma das prioridades, assim como o HIV, assim como hepatites virais.
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A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Agora uma pergunta mais polêmica.
Recentemente, o Ministério da Saúde deixou de importar um medicamento de uso massivo, importou da China, se não me engano, e houve uma discussão muito grande.
Drª Carísi, como a senhora conhece o assunto, imagino, eu queria uma posição sobre isso, porque a visão que a sociedade tem é que o aspecto econômico prevaleceu sobre o interesse da saúde. Não acredito que uma autoridade como o Ministro da Saúde tenha levado em conta apenas a questão financeira, mas também os critérios de avaliação técnica sobre a mudança na escolha desse medicamento.
A SRª CARÍSI ANNE POLANCZYK - Não tenho certeza, Senadora, se eu sou a pessoa mais indicada para falar, mas muito do que acompanhamos...
Isso não é da alçada da Conitec, por exemplo. Essa é uma decisão muito mais de operação do Ministério, do Departamento de Assistência Farmacêutica na escolha.
Na Conitec avalia-se o princípio ativo daquele medicamento, e não a marca A ou B. E essa avaliação em relação a se a marca A ou a marca B é igual compete a outra instância. Estou olhando para os colegas do Ministério.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Vou pedir que o Dr. Thiago responda a essa questão.
O SR. THIAGO RODRIGUES SANTOS - É uma questão que compete ao DAF (Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos) e ao DLOG (Departamento de Logística em Saúde) do Ministério.
Realmente eu acompanhei, mas não sou da área específica para discutir essa questão. Eu sei que é uma discussão que vem se aprimorando dentro do Ministério. Até promovemos alguns congressos e encontros para debater especificamente esse problema, mas realmente compete a essa área técnica que não é da Conitec.
O SR. GUSTAVO LAINE ARAÚJO DE OLIVEIRA - Senadora Ana Amélia, tive o privilégio de acompanhar também, sob a sua presidência, recentemente, uma audiência na CAS sobre medicamentos biológicos. Esse tema específico se ajusta bem àquela temática que foi discutida nessa reunião. A asparaginase é um medicamento biológico, e o Ministério da Saúde já o disponibiliza, ou seja, ele já está incorporado ao SUS.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Então não houve problema. Foi uma questão de incorporação.
Dr. Marcelo, uma pergunta para o senhor, que defende...
O Senador Cássio falou do TAV, dessa inovação, dessa incorporação na área cardiológica.
A massificação do uso disso o barateia para os agentes que pagam, seja o SUS, seja a ANS?
O SR. MARCELO ANTÔNIO CARTAXO QUEIROGA LOPES - Outro assunto interessante, Senadora, é o desenvolvimento do complexo industrial da saúde. Precisamos desenvolver o nosso complexo industrial, porque não está escrito em lugar algum que o Brasil vai ser só importador. O Brasil tem que produzir isso. E no Brasil nós já temos uma indústria que tem condições. Por exemplo, em válvulas cardíacas, a balança comercial do Brasil é positiva, o País exporta mais do que importa. No que tange a esse aspecto da válvula transcateter, que é uma nova tecnologia, apresentamos a nossa irresignação através de um recurso ao Ministério da Saúde, que até hoje não respondeu, e contestamos a avaliação da qualidade da evidência científica apresentada, contestamos a avaliação do impacto orçamentário projetado pelo Ministério da Saúde, porque aquilo está desproporcional, e defendemos que o Governo institua uma política pública - aliás, não só somos nós, o Conselho Nacional dos Direitos do Idoso já se manifestou e esta Casa também - através da aprovação de um projeto de lei.
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Creio que o desenvolvimento do Complexo Industrial da Saúde vai favorecer e ampliar as possibilidades de acesso a novas tecnologias. Não podemos aqui, usando um termo da nossa Paraíba, Senador, ficar sendo seduzidos só pelo canto da sereia da indústria estrangeira. Temos que inclusive chamar essa indústria para montar parques aqui, no Brasil, gerando emprego, renda, tributos para os brasileiros, como acontece em outras áreas.
No que concerne à válvula transcateter, por exemplo, há uma válvula que é produzida em Minas Gerais, numa parceria com a indústria suíça, que hoje foi comprada por uma americana, em que a parte de pericárdio... Dizem que a carne do Brasil é fraca, mas pelo menos a do pericárdio é forte, porque estão vindo montar essa válvula com pericárdio brasileiro, que é montado na indústria Labcor. Creio que este é um contexto muito favorável à incorporação de tecnologias...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCELO ANTÔNIO CARTAXO QUEIROGA LOPES - ... como, por exemplo, as celebrações de Parceria para o Desenvolvimento Produtivo.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Obrigada, Dr. Marcelo.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Pode, Thiago, por favor.
O SR. THIAGO RODRIGUES SANTOS - Para complementar.
Este microfone funciona?
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Funciona.
O SR. THIAGO RODRIGUES SANTOS - Está funcionando? Está.
Só para complementar a fala do Dr. Marcelo.
Nós, no Ministério, já vimos trabalhando nesse sentido de desenvolver o Complexo Industrial da Saúde. Temos um exemplo claro disso, que é na radioterapia, com o modelo de contratação que o Ministério fez das 80 soluções de radioterapia, com a vinda da fábrica da Varian para produzir os aceleradores lineares - a fábrica já está montada em Jundiaí. Precisamos discutir outras questões com relação a tributos e tal, mas existe um acordo de compensação tecnológica nesse contrato.
Estamos trabalhando na possibilidade de expandir e, a partir desse conhecimento que tivemos com esse contrato, na área de cirurgia robótica, desenvolver outros offsets...
(Soa a campainha.)
O SR. THIAGO RODRIGUES SANTOS - ... para que consigamos dar maior visibilidade e desenvolvimento ao Complexo Industrial da Saúde.
Então, já vimos trabalhando essas ações.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Obrigada, doutor.
Eu queria convidar a Janaína Souto. Ela está com dois bebês: um no colo e outro caminhando.
Então, Janaína, pode... Eu prefiro que você chegue. Pode ser nessa área onde está a assessoria, porque aqui é reservado aos Senadores.
Você pode usar o microfone, pode sentar-se aqui. Use o microfone e fale, por favor, porque a sua argumentação é um pouco genérica - eu imaginei que tivesse um caso específico a respeito dessas questões tratadas na incorporação de novas tecnologias. Você usa até o exemplo aqui da questão do custo-benefício do melanoma, que foi citado pela Drª Carísi: custa R$850 mil para um prolongamento da vida da pessoa por três meses, sem a garantia de uma qualidade de bem-estar, sem dor ou sem outras sequelas da doença.
Então, qual é o seu ponto de vista sobre isso?
A SRª JANAÍNA SOUTO - A minha pergunta realmente é genérica.
A questão é quanto às novas tecnologias.
Eu faço parte de uma associação que acompanha crianças cardiopatas. No exterior, por exemplo, já temos pesquisas de células-tronco com injeções para fortalecimento do músculo cardíaco. Até solicitei uma audiência para fazer uma apresentação para possíveis estudos posteriormente.
Como foi dito aqui, o Brasil faz pouco investimento em pesquisa. As novas tecnologias são novas lá fora e aqui elas só entram muito tempo depois.
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Esta é a minha pergunta: quando o País vai começar a se entender como um país grande, capaz? Nós temos material humano. Como foi dito aqui, temos um corpo de excelência, temos altos locais para pesquisa. No entanto, nós nos acanhamos e nos enxergamos miúdos, incapazes de encarar grandes problemas com grandes soluções. O Brasil é possível, o Brasil é capaz, mas, aí, vem com exemplo de R$850 mil por três meses, quando as novas tecnologias não são todas nesse nível de valor. Coisas muito menores estão sendo negligenciadas.
A ultrassonografia morfológica para rastrear várias más-formações teve parecer negativo da Conitec ultimamente - essa foi a minha informação -, muito provavelmente porque não vai ter condição de arcar para todo mundo. Mas pior é tratar o indivíduo depois. A despesa é muito maior do que arcar com o exame de ultrassonografia. Não é isso?
(Soa a campainha.)
A SRª JANAÍNA SOUTO - Então, a minha pergunta é: quando o País vai começar a se enxergar capaz de pesquisar, de avançar, sem esperar o além e, como patinho feito, só se descobrindo pronto para isso quando o mundo inteiro já faz?
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Muito obrigada, Janaína, pelo seu alerta. Você está sendo porta-voz sobretudo na questão das crianças.
De fato, não é só a área da Medicina que está com escassez de recursos. Eu sou autora de um projeto que criou os fundos patrimoniais, que são justamente para criar um novo agente privado de interesse público para, nas universidades públicas ou privadas ou em instituições de pesquisa, fomentar a pesquisa, como fazem Harvard, que foi citada pelo Prof. Denizar, Cambridge e todas as outras universidades não só dos Estados Unidos, mas também da Inglaterra, que usam esses fundos patrimoniais com um objetivo específico.
O nosso objetivo na lei foi gerar um aumento dos recursos para investir em pesquisa, ciência, tecnologia e inovação. Isso é que tem de se fazer. Não adianta o MEC querer botar isso no orçamento. Não é para custeio, é para fazer pesquisa. Então, será uma fonte de recursos.
Espero que a Câmara aprove isso brevemente e que o Senado conclua.
Eu penso que o que ficou claro aqui, Senador Cássio, foi exatamente que, para chegarmos a um meio termo de um país... E o debate desse tema chegou na hora mais aguda de uma crise fiscal que o País está vivendo. Por outro lado, há a dor do paciente que não pode esperar também, ele não tem o tempo da burocracia, o tempo dessas questões todas.
Mas eu queria que o Dr. Gustavo, que é do Ministério da Saúde... Foi uma pergunta genérica feita pela Janaína. Ela pontuou a questão da célula-tronco e também outro aspecto da especialidade. Como eu não sou médica, a minha linguagem é um pouco limitada.
O SR. CÁSSIO CUNHA LIMA (Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Ela indagou sobre o ultrassom morfológico.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Então, por favor, se puder responder a indagação dela... É mais um desabafo de uma mãe, falando por outras mães que também querem tratamento para os seus filhos.
O SR. GUSTAVO LAINE ARAÚJO DE OLIVEIRA - Perfeitamente. É uma indagação justa, que temos de acatar e considerar com muito cuidado.
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Como bem falou a Janaína, existem tecnologias que são ofertadas a um custo muito grande para oferecer uma pequena quantidade de sobrevida. E a nossa área é uma área que é delicada, temos de trabalhar com valor econômico e com benefício clínico e de estabelecer, por vezes, prioridades nacionais para o tratamento de determinada condição clínica, com a alocação de um orçamento para determinada situação e para outra menos. É delicado esse processo.
Nós temos de fazer isso - nós que somos do Poder Executivo e que estamos no Ministério da Saúde - sem perder a capacidade de comoção e de consideração com todos os pacientes, com todos os tratamentos de todas as condições clínicas, mas temos um dilema e temos de tratar isso com racionalidade - é o tema que estamos discutindo aqui hoje, que é o que propõe o Senador Cássio Cunha Lima, para melhorar o processo racional da tomada de decisão - e também com certa frieza.
Cabe a nós determinar se medicamentos ou tecnologias muito caras ou, por vezes, até maiores que um potencial limiar de custo-efetividade, se priorizados, se forem uma questão estratégica para o País, devem ser colocados à disposição. E temos de avaliar também, quanto a outros tratamentos que potencialmente não trariam qualquer impacto orçamentário comprometedor...
(Soa a campainha.)
O SR. GUSTAVO LAINE ARAÚJO DE OLIVEIRA - ...se deveríamos fornecer e não estamos fornecendo. Então, é uma avaliação de prioridades.
Eu acredito e coloco aqui também para discussão que há uma gama de tratamentos que está muito longe, muito abaixo de um potencial limiar de custo-efetividade. Deveríamos nos debruçar sobre eles para oferecer melhores condições principalmente à população que mais precisa.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Obrigada, Dr. Gustavo.
Consulto o Senador Cássio Cunha Lima, que agora falou quase como um médico, se está satisfeito, para que eu possa fazer os agradecimentos. E a Consultoria Legislativa do Senado também acompanha. Todas as exposições foram disponibilizadas no site da Comissão de Assuntos Sociais.
O SR. CÁSSIO CUNHA LIMA (Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Agradeço à Senadora Ana Amélia.
Eu tenho dúvida se seria possível, para objetivar este nosso encontro, o próprio Ministério, com a participação objetiva da Conitec, enviar-nos uma nota técnica, para que pudéssemos ter a posição formal do Ministério e para, quem sabe, evoluirmos na apresentação da proposta e na tramitação do projeto de lei, que tem o intuito de contribuir com o trabalho extremamente importante que o Ministério, através da Conitec, realiza, para que possamos ter, por exemplo, aquilo que a Janaína falou e que me parece que ficou um pouco sem resposta. É uma pergunta muito objetiva: se há um exame que está disponível, que é acessível, que não é uma tecnologia extremamente sofisticada, como, por exemplo, a ultrassonografia morfológica, por que não incorporar um exame como esse? São quantas as mães que podem dispor dessa possibilidade de exame na rede privada e nos convênios? Por que não o SUS disponibilizar? Então, em que ritmo a Conitec incorpora novas tecnologias? Neste ano, por exemplo - é uma pergunta de curiosidade -, o que foi incorporado no Sistema Único de Saúde?
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Então, a nossa intenção, tenham certeza, é naturalmente contribuir para o trabalho muito valioso, extremamente importante, que vem sendo realizado, mas também tentar aprimorar esse trabalho, garantindo-lhe maior transparência, critérios mais objetivos, para que possamos agir como Nação, como País, em solidariedade e em assistência à nossa população, que é o objetivo que nos une.
Então, quero agradecer a presença de todos os senhores e da senhora e quero me colocar, como autor do projeto, à disposição, para que possamos aprofundar e aprimorar essa discussão e esse debate.
Muito obrigado.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Obrigada, Senador Cássio Cunha Lima.
Eu lhe agradeço também a solicitação encaminhada ao Dr. Gustavo, pedindo essa nota técnica, porque ela vai ser uma boa referência na articulação. Como Relatora, nada farei sem fazer articulação com o autor, Senador Cássio Cunha Lima, que está aqui presente e que mostra também a responsabilidade, na proposta legislativa que ele apresentou, de melhorar a vida das pessoas. Essa foi a preocupação central do Senador.
Acredito também naquilo que a Janaína aqui apontou: o País é tão grande, e por que não ousa um pouco mais na introdução de tecnologias? Com isso, projetamos o País, para que essas tecnologias possam ser mostradas lá fora como genuinamente brasileiras, para que elas possam também servir de referência à qualidade da Medicina de nosso País, que é um tema sobre o qual deveríamos nos debruçar sempre mais.
Eu agradeço imensamente a participação nesta audiência pública, que foi requerida por mim, como Relatora, para instruir o Projeto de Lei do Senado nº 415, de 2015, de autoria do Senador Cássio Cunha Lima, aqui presente, que altera a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, que dispõe sobre as condições para promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências, para tornar obrigatória a definição em regulamento e a divulgação do indicador ou parâmetro de custo-efetividade utilizado na análise das solicitações de incorporação de tecnologia e tornar obrigatório o respeito aos requisitos de aleatoriedade e publicidade na distribuição dos processos às instâncias responsáveis por essas análises.
É o Requerimento nº 9, deste ano. E a Senadora Marta Suplicy agendou para a data de hoje.
Agradeço, portanto, a presença do Dr. Thiago Rodrigues dos Santos, Coordenador-Geral de Equipamentos e Materiais de Uso em Saúde, representante do Secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde; do Dr. Gustavo Laine Araújo de Oliveira, Técnico do Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias em Saúde, da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, representante aqui da Conitec, do Ministério da Saúde; do Prof. Dr. Denizar Vianna Araújo, do Departamento de Clínica Médica da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ); do Dr. Marcelo Cartaxo Queiroga, mais conhecido como Dr. Marcelo Queiroga - o seu nome completo é Marcelo Antônio Cartaxo Queiroga Lopes -, Diretor de Avaliação de Tecnologia em Saúde da Sociedade Brasileira de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista; e da Drª Carísi Anne Polanczyk, Pesquisadora Coordenadora do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia e Avaliação em Tecnologias em Saúde.
A todos, muito obrigada, especialmente a quem acompanhou esta audiência pública pelo sistema de comunicação da TV Senado, à Secretaria da Comissão de Assuntos Sociais e à Senadora Marta Suplicy.
Agradeço, especialmente, a presença dos Senadores que aqui estiveram, Senador Waldemir Moka, Senador Ronaldo Caiado e Senador Eduardo Amorim, e do autor do projeto, Senador Cássio Cunha Lima.
Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada a presente audiência pública.
O SR. MARCELO ANTÔNIO CARTAXO QUEIROGA LOPES (Fora do microfone.) - Permita-me falar por dois minutos.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Como? Dois minutos?
A reunião está encerrada. Agora, informalmente, o senhor pode falar, mas a sua fala estará fora da Ata.
Pode falar, Dr. Marcelo.
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O SR. MARCELO ANTÔNIO CARTAXO QUEIROGA LOPES - Senadora...
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Vamos inovar também. Já que a inovação na Medicina está muito difícil, vamos fazer a inovação regimental. Essa é uma inovação.
O SR. MARCELO ANTÔNIO CARTAXO QUEIROGA LOPES - Para parafrasear V. Exª, que diz que gosta de puxar a brasa para o seu assado...
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - É verdade.
O SR. MARCELO ANTÔNIO CARTAXO QUEIROGA LOPES - ...eu queria aqui puxar a brasa para o meu assado e homenagear o Senador Cássio Cunha Lima, que nos traz um assunto dessa relevância, que até torna a Conitec mais conhecida dos brasileiros. A Conitec pode convocar audiência pública. Desconheço que tenham convocado alguma para tratar de incorporação de tecnologia.
Então, Senador, segundo o art. 196 da Constituição Federal, a saúde é um direito de todos e um dever do Estado e deve ser implementada por políticas públicas. Eu me lembro de que aqui a gente discute os limites do investimento, e, às vezes, nós precisamos superar os limites, ficar sem limites.
Então, assim, recordo o nosso poeta Augusto dos Anjos, aplicando isso ao cenário da Constituição Federal:
Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro da tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!
Então, seria aí essa norma programática apenas uma quimera? O Estado brasileiro quer retribuir à sociedade com a ingratidão, apesar das advertências do Ministério da Saúde?
"Toma um fósforo. Acende teu cigarro. [...] A mão que afaga é a mesma que apedreja."
A mão que afaga é a Constituição? A que apedreja não pode ser a regulação.
"Se a alguém causa inda pena a tua chaga [aí vem a judicialização], apedreja essa mão vil que te afaga, escarra nessa boca que te beija!"
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Agora, falta o repentista também, o poeta, porque também é um poeta, e aqui ficaríamos muito bem.
Então, encerramos com chave de ouro, com poesia e com uma boa construção, citando os nossos grandes autores.
Encerrada a audiência, eu agradeço muito a oportunidade de conhecer muito mais a respeito desse tema tão candente para a sociedade brasileira, para todos, cientistas, pesquisadores, médicos, cirurgiões, cardiologistas, toda a área médica, a indústria, que produz os medicamentos.
Sobretudo, agradeço o esforço do Senador Cássio Cunha Lima, por também colaborar com a melhoria da qualidade de vida das pessoas.
Muito obrigada a todos. Que tenham um bom dia e um bom fim de semana!
(Iniciada às 9 horas e 11 minutos, a reunião é encerrada às 10 horas e 49 minutos.)