30/08/2017 - 5ª - CPI do BNDES - 2017

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Davi Alcolumbre. Bloco Social Democrata/DEM - AP) - Havendo número regimental, declaro aberta a 5ª Reunião da Comissão Parlamentar de Inquérito criada pelo Senado Federal, através do Requerimento nº 375, de 2017, para investigar irregularidades nos empréstimos concedidos pelo BNDES no âmbito do Programa de Globalização das Companhias Nacionais, em especial linha de financiamento específica à internacionalização de empresas, a partir do ano de 1997.
Conforme convocação, a presente reunião destina-se à realização da segunda audiência pública desta Comissão, nos termos do Requerimento nº 2-CPIBNDES, de 2017, e do plano de trabalho.
Esta audiência pública será realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. Por isso, as pessoas que tenham interesse em participar com comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania, no endereço www.senado.leg.br/ecidadania, e através do Alô Senado, pelo número 0800 61 22 11.
Antes de iniciarmos a audiência, coloco em votação a Ata da 4ª Reunião, fazendo a solicitação da dispensa de sua leitura.
Os Senadores que a aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
A ata está aprovada.
Com base no art. 121 do Regimento Interno, incluo extrapauta os seguintes requerimentos para que possamos apreciá-los. Faço a leitura dos requerimentos.
ITEM 4
Requerimento Nº 4/2017
Convite à Srª. Luisa Marvelia Ortega Díaz, Procuradora-Geral da República Bolivariana da Venezuela.
Autoria: Senador Sérgio Petecão.
ITEM 3
Requerimento Nº 5/2017
Requerimento-convite para Audiência Pública do Diretor de Fiscalização do Banco Central do Brasil, Anthero de Moraes Meirelles.
Autoria: Senador Davi Alcolumbre.
ITEM 2
Requerimento Nº 6/2017
Requer realização de audiência pública com os convidados Vania Maria da Costa Borgerth, ocupante do cargo de Superintendente da Área de Controladoria do BNDES, e Ney Ottoni de Brito, Professor Doutor Titular da UFRJ e da FGV, especialista em Finanças.
Autoria: Senador Roberto Rocha.
ITEM 1
Requerimento Nº 7/2017
Requer a realização de audiência pública desta Comissão com Luiz Carlos Prado, Professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro e ex-assessor da Diretoria de Área de Indústria do BNDES.
Autoria: Senador Davi Alcolumbre.
Gostaria de propor, para maior celeridade dos nossos trabalhos na Comissão, que ouvíssemos o nosso convidado e que fossem votados todos os requerimentos em bloco.
O SR. SÉRGIO PETECÃO (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - AC) - O senhor me permite, Presidente?
O SR. PRESIDENTE (Davi Alcolumbre. Bloco Social Democrata/DEM - AP) - Claro, V. Exª é o Vice-Presidente desta Comissão e deveria estar aqui, do nosso lado.
O SR. SÉRGIO PETECÃO (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - AC) - Era exatamente nessa linha que eu ia pedir que V. Exª... Salvo engano, são quatro requerimentos. Nós faríamos aqui a votação do requerimento e partiríamos para audiência, até porque os nossos convidados já se encontram presentes. Pode ser?
O SR. PRESIDENTE (Davi Alcolumbre. Bloco Social Democrata/DEM - AP) - Claro, seguindo orientação de V. Exª, vamos colocar em votação.
Consulto o Plenário se há algum Senador que deseje se manifestar pela votação. (Pausa.)
Não havendo quem queira encaminhar os requerimentos, passamos agora para a votação dos requerimentos.
Os Senadores que concordam com os requerimentos em globo permaneçam como se encontram. (Pausa.)
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Aprovados os requerimentos que foram lidos ainda há pouco.
Esta Presidência fará agora alguns esclarecimentos com relação aos convidados para esta audiência pública.
O convidado Dr. Júlio Marcelo de Oliveira, Procurador do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União, havia confirmado sua presença no dia 24 de outubro por meio de sua chefia de gabinete. Hoje foi informado à Secretaria da Comissão que o Procurador não viria à audiência e foi indicado o convite ao Procurador Marinus Marsico, com mais atuação em processos relativos ao BNDES. O Dr. Ivan Marx, Procurador da República, agradeceu o convite feito por esta Comissão, mas reservou sua manifestação para os autos do processo oriundo da investigação conduzida na Operação Bullish. A Comissão de Valores Mobiliários nos informou que enviará, como representante, o Superintendente Fernando Soares Vieira, da Superintendência de Relações com Empresas, para a audiência pública desta Comissão a ser realizada na próxima semana.
Esclareço que, inicialmente, o convidado terá 20 minutos, prorrogáveis por mais 10 minutos ou pelo tempo que achar conveniente, para realizar a sua exposição. Após as apresentações iniciais, passamos a palavra aos Senadores. Aí, então, o convidado terá 10 minutos para responder às perguntas e realizar as suas considerações finais.
Convido, para compor a Mesa desta Comissão, o Sr. Carlos Thadeu de Freitas Gomes, Diretor Financeiro do BNDES, Economista formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e Mestre em Economia pela Fundação Getúlio Vargas.
Seja bem-vindo. (Pausa.)
Convido para fazer uso da palavra o Sr. Carlos Thadeu Gomes, como convidado desta Comissão Parlamentar de Inquérito.
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - Caro Senador Davi Alcolumbre, Presidente; Relator, Senador Roberto Rocha; Srs. Senadores presentes; Senador Sandoval e outros presentes; caros amigos que estão presentes, é um prazer estar aqui hoje, principalmente porque esta é a Ala Senador Alexandre. O Senador Alexandre foi meu contemporâneo na época em que fui Presidente do Banco da Amazônia. Foi um prazer enorme, àquela época, presidir um banco federal regional. Visitei todos os seus Estados, desde o Amapá, ao Acre e à Amazônia. Foi para mim enriquecedora essa experiência para, estando no BNDES agora - e estive no Banco Central antes -, entender as nossas culturas regionais, que são muito importantes. Por isso é um prazer estar aqui com os senhores todos.
Antes de mais nada, quero agradecer também o fato de terem dado a chance ao BNDES de estar aqui presente na minha pessoa. O BNDES é muito maior do que a minha pessoa, mas, em qualquer circunstância, é necessário que o BNDES esteja presente sempre, em qualquer CPI, audiência ou encontro que possa mostrar quem é o BNDES, o que ele faz, o que fez e o que vai continuar fazendo.
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Eu preparei um PowerPoint muito rápido, só para vocês terem uma ideia macro do BNDES. Como todos já a têm, eu vou passá-lo muito rápido.
O BNDES é uma instituição que hoje tem uma importância enorme nacional porque... Esse quadro mostra exatamente isso. O estoque de crédito do BNDES corresponde hoje a quase 20% do estoque total de crédito da economia. Já foi maior, mas como caiu o estoque de crédito no Brasil, também caiu um pouco o estoque de crédito do BNDES em relação ao crédito total. Isso mostra a importância do BNDES em termos de estoque na política creditícia do País.
Pode passar.
Ali se mostra também o estoque em relação ao PIB, que é bastante elevado - caiu recentemente devido à crise financeira internacional.
Pode passar.
Desembolso do BNDES, também em relação ao PIB, que tem caído e agora está mais estável e deve volta a subir.
O desembolso do BNDES: é muito importante nós olharmos para esse número, que mostra exatamente como a nossa economia teve um ponto de inflexão há dois ou três anos atrás. Os desembolsos caíram, como caiu o estoque de crédito do País. Isso mostra realmente a gravíssima crise pela qual o País passou e da qual está conseguindo sair lentamente.
Pode passar por favor.
Ali se mostra também evolução do spread do BNDES, que hoje está bem mais baixo do que estava dois meses atrás. Um e setenta... Nós achamos, na atual diretoria do BNDES, que estava muito alto e baixamos para faixa de 1,09.
Pode passar.
Aí se mostra também a participação das pequenas e médias empresas. Fala-se que o BNDES só empresta para grandes empresas. Não, ele empresta para pequenas e médias empresas: 60% das suas operações de crédito são para pequenas e médias empresas. Isso é a tendência do banco, o banco tem que pulverizar. Ele não pode ficar concentrado em poucos tomadores, é o que manda a boa prática bancária.
Pode passar por favor.
Desembolso por atividades. A indústria foi a principal anos atrás. Hoje, a indústria é bem menos, mas é muito importante ainda. Infraestrutura...
O que está crescendo? Comércio e serviços - óbvio ululante. O BNDES tem que dar atenção e tem dado atenção à área de comércio e serviço, que é a área que demanda hoje mais capital de giro e que cresce mais no País.
Pode passar.
Aí é o passivo do BNDES, que depende ainda de recursos do Tesouro, mas tem o FAT, como todos sabem, e outras fontes de recursos.
Pode passar por favor.
Há os desembolsos que foram feitos com recursos do Tesouro Nacional. Há um mito de que o Tesouro colocou recursos no banco e esses recursos não foram bem utilizados. É um mito, porque a maior parte desses recursos foi para a Finame, operação de bens de capital. Se o Tesouro colocou o dinheiro na época... Se foi um ato macroeconômico razoável ou não, é um problema do cenário macroeconômico da época, mas o BNDES utilizou esses recursos para bens de capital, o que é muito importante para nossa economia.
Por favor, pode passar.
Este ano a expectativa de desembolso será menor, evidentemente. Foi muito fraco o ano passado, mas, à medida em que a economia se recupera, o desembolso vai aumentar.
Pode passar por favor.
O banco tem o seu lucro líquido também. Transfere para o Tesouro grande parte dele, o que é muito importante, mas é um lucro que tem mais origem nas operações de crédito do banco.
Pode passar por favor.
A carteira ativa do banco, que é muito importante. É uma carteira maior do que a de outros bancos privados.
Passe por favor.
Esse quadro é muito importante, porque mostra a geração liquida de recursos pelo BNDESPar. O BNDESPar gera recursos. Há um mito também de que o BNDESPar participa de empresas com recursos do governo subsidiados. Não, ele gera recursos próprios, ele é rentável. Só nessa época do ano ali, em que houve uma queda muito forte da Bolsa, que a gente deixou de gerar recursos. Mesmo assim, há um saldo de recursos que no passado ele gerou. Então, o BNDESPar é uma entidade do BNDES que tem recursos próprios. É muito importante notar isso.
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Bem, é basicamente isso que eu tinha que falar sobre gráficos. Agora vamos mostrar a nossa prática.
O BNDES é uma instituição que hoje tem uma participação muito forte em termos de crédito. Agora, por sua uma vez também, é uma instituição que ajudou muito o Governo na política anticíclica.
Quando houve a crise financeira internacional em 2008/2007, o governo precisava expandir a demanda, via consumo e via investimentos. Utilizou seus bancos públicos, evidentemente, e o BNDES também foi muito utilizado pelo governo em suas políticas anticíclicas.
Isso durou mais do que o necessário, essa é a grande realidade. Em 2013/1014 ainda continuavam essas expansões de operações ativas com crédito oriundo do governo e, a partir daí, a economia começou a embicar. Mas o BNDES foi muito importante nessa fase anticíclica da nossa economia.
Hoje o BNDES está em uma situação muito confortável. Se não fosse o BNDES, os investimentos na economia teriam caído. Ele entrou, emprestando bastante, com recursos do Tesouro. Ele manteve ainda uma capacidade de investimento na economia, porque esses recursos foram usados para operações de Finame, e não para bens de consumo.
Também o banco tem uma participação muito importante na área internacional, que é um dos focos aqui do nosso encontro hoje. O banco sempre foi o braço do governo na área internacional, emprestou para a exportação de bens e serviços de engenharia, o que foi muito importante para o Brasil voltar a exportar.
Quanto a essa área internacional, que é um dos focos aqui da CPI, é bom notar o seguinte. Em 95/96, nessa época, nós não tínhamos uma política de longo prazo para financiar exportações. Havia uma conta no Banco Central, de que eu até já participei, com outros funcionários do Banco Central, muitas vezes: o CCR (Convênio de Pagamentos e Créditos Recíprocos). Era um convênio que era feito com outros bancos centrais para permitir descontar títulos entre os bancos centrais para incentivar as exportações dos países que faziam parte desse convênio.
A partir daí, o Brasil, naquela época - 99/98, crise cambial, dificuldades externas, FMI -, precisava incentivar nossas exportações. Então, foi criado o FGE (Fundo Garantidor de Exportação). O BNDES foi o principal agente desse fundo, que resolveu colocar o BNDES na área internacional para que o País pudesse exportar mais bens e serviços. Foi aí que o banco começou a usar realmente um selo internacional, que ele antes já tinha, mas para operações não longas necessariamente - passou a fazer a partir de 97. E há as operações pré-embarque, pós-embarque. O banco fazia muito pré-embarque, depois passou a fazer muito pós-embarque. E, consequentemente, alavancou o País no mercado internacional de bens e serviços e engenharia.
Hoje o banco vive uma fase em que tem que se reajustar, tem que se reinventar, devido ao fato de que, primeiramente, ele tem que focalizar mais em setores que demandam mais capital. Como eu falei aqui, a área industrial foi muito importante para o banco anos atrás, hoje essa participação é menor. Crescem comércio e serviços, e comércio e serviços são as pequenas e médias empresas, onde o banco tem que atuar mais fortemente. Ele tem que procurar não colocar todos os ovos numa cesta só, como já está fazendo. À medida que isso for feito, ele vai ficar menos vulnerável a riscos futuros de desequilíbrios de grandes empresas.
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A política do banco para a área internacional foi válida para o Brasil competir mais no exterior, e entrou na área de mercado de capitais, principalmente o BNDESPar.
Por que mercado de capitais? Porque nós temos... Hoje, o Banco opera na área de financiamentos e de mercado de capitais. A de financiamentos é a antiga do Banco, superantiga. A de financiamentos não têm segredo do ponto de vista de compliance, de governança, são operações discretas que podem ser feitas sem maiores problemas em relação aos seus sócios em empresas. Mas a área de financiamento, para competir no mundo lá fora, não era suficiente; tinha que entrar na área de mercado de capitais. Por que isso? Porque o funding no exterior, mais nos Estados Unidos, é um funding maior de mercado de capitais, não é um funding de financiamento. O Brasil tem muito financiamento ainda e tem pouco mercado de capitais. No exterior, só na Europa você tem mais financiamento. Nos Estados Unidos é mais funding de mercado de capitais.
Outro detalhe muito importante e que é vital para todo mundo entender: o Brasil não tem crédito de longo prazo. Há uma certa atrofia no nosso mercado de capitais que faz com que os bancos só queiram emprestar a curto, e o BNDES só empresta a longo. Oitenta e poucos por cento do banco são operações longas, com funding longo. E essa atrofia vai continuar.
Aí vamos ver qual é a origem dessa atrofia. A atrofia se chama política monetária, área de que já fui diretor no Banco Central duas vezes - portanto, conheço bem as contas do Banco Central. A problemática toda é que o acordo de recompra... Operações compromissadas fazem com que as instituições financeiras só queiram aplicar a curto. Por quê? Tem alto rendimento real, tem liquidez e não tem risco nenhum com papéis do governo. Consequentemente, essa atrofia expulsou o longo. O longo foi expulso pelas nossas atrofias e devido também ao processo hiperinflacionário e à indexação nos mercados de capitais. Com isso, ficou o BNDES sozinho no longo. Então, a função dele hoje é fundamental. Enquanto nós não tivermos uma menor vulnerabilidade do curto prazo...
O grande ponto é o seguinte. Hoje, os fundos de renda fixa aplicam a curto, os bancos querem emprestar a curto, não querem emprestar a longo, porque não querem correr risco de emprestar a longo se podem emprestar a curto com rendimento real muito elevado e sem risco nenhum. Então, raramente a carteira de um banco hoje é longa, ela é supercurta.
Para corrigir esse mercado de capitais, nós temos que fazer grandes mudanças que não foram feitas ainda. O Programa Real na época desindexou a economia, foi perfeito, mas não desindexou o sistema financeiro. Continuou a indexação financeira da TR na época e outros ativos financeiros. E hoje o mercado gira no CDI. Então, o País hoje é um país de curtíssimo prazo. A dívida longa... Muitos falam "estou alongando minha dívida pública mobiliária". Não é verdade. Essa dívida é rolada todo dia no CDI. Hoje, o estoque de operações compromissadas é de mais de R$1 trilhão, o que mostra que está todo mundo no curto prazo.
Então, a função do BNDES tem sido esta: compensar essa atrofia de curto prazo que nós temos, que só vai ser corrigida quando o País entrar em uma trajetória sustentável da dívida pública interna. Por quê? A partir daí, ele vai poder fazer os ajustes necessários, conviver com taxas de juros reais bem mais baixas, como já está quase acontecendo hoje, juros nominais mais baixos, e essa atrofia vai se corrigir naturalmente.
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Por exemplo, a Constituição de 1988 colocou que o Banco Central é o caixa único do Tesouro Nacional. E o Banco Central não pode financiar o Tesouro nem indiretamente nem diretamente. É válido em termos conceituais, mas, se o Banco Central é a único caixa do Tesouro Nacional, o dinheiro do Tesouro todo fica guardado no Banco Central - o caixa único do Tesouro é o Banco Central.
Por sua vez, no Brasil, nós temos o chamado desequilíbrio das reservas bancárias. O que quer dizer isso na prática? O dinheiro está todo dia circulando no mercado. Por que os mercados não se zeram sozinhos? Porque falta dinheiro. O Banco Central é que emite moeda e financia os mercados e toma dinheiro dos mercados.
Então, uma das coisas mais importantes a serem feitas em termos de ajuste monetário é tirar o Tesouro do Banco Central e deixá-lo nos bancos comerciais, como é nos Estados Unidos. Banco comercial recebe conta do Tesouro e vai ser um agente econômico para movimentar essas contas. Consequentemente, o dinheiro sai do Banco Central e vamos ter mais liquidez e vamos ter menos necessidade de o Banco Central intervir na economia, e vamos diminuir essas atrofias que nós temos hoje.
Então, só para dar uma certa orientação e mostrar o seguinte. O Brasil é escravo do curto prazo. Isso aí é que gera uma série de distorções na nossa economia e leva o BNDES a ter um papel fundamental. Sem ele, não há longo prazo hoje na economia. Agora, evidentemente que o banco tem práticas de governança, as mais modernas possíveis. Eu estou lá há pouco tempo, evidentemente, mas deu para notar que ele se adapta constantemente à prática de governança. Agora, na área de financiamento, a governança é tradicional, é antiga, não tem necessidade de você estar atualizando-a sempre porque são operações discretas.
No mercado de capitais, a governança é muito mais complicada, porque você é sócio de empresas, você não pode sair da sociedade rapidamente. Senão, você dá um tiro no pé. Se você resolver sair da sociedade de repente, as ações caem e você perde dinheiro. E, também, o banco tem uma preocupação enorme de mostrar eficiência junto à União. Afinal de contas, o FAT é um dos maiores financiadores do banco hoje, recurso constitucional. O Tesouro também é. O banco capta recursos externos. Agora ele vai voltar a captar mais, porque, à medida que saem um pouco os recursos do Tesouro do banco, que é natural que saiam, como já saíram R$100 bilhões no ano passado... Esse ano talvez saia um pouco mais, um pouco menos. Mas o Tesouro Nacional tem as suas necessidades orçamentárias e não pode deixar de, eventualmente, em momentos de déficits primários muito elevados, pedir ao banco que devolva parte desses recursos.
Então, o banco, que tem um funding externo muito bom, à medida que esses recursos do Tesouro comecem a ficar menos importantes... Ainda são muito importantes para o banco e vão continuar assim, mas não podemos contar com ele para sempre. E vamos, então, captar mais recursos externos, já que o banco sempre foi um captador no mercado de capitais internacional. Vai compensar um pouco essa saída gradual e lenta do Tesouro do funding do banco. Ele vai voltar para os mercados de capitais internacionais, que têm funding longo também. E hoje esses mercados estão muito sólidos. Uma das coisas que deram certo no Brasil... Vamos ser realistas: nós fizemos o ajuste externo, mas não fizemos o ajuste interno. Nós fizemos o externo, o Brasil hoje tem um déficit em conta corrente que é quase nenhum - era 4,5% há três anos, hoje não chega a 1% do PIB. O País tem reservas internacionais, investimentos diretos que cobrem o déficit em conta corrente. Então, nós estamos nadando na área internacional, estamos nadando no ajuste externo.
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Infelizmente, o que falta? O ajuste interno, que, por sua vez, é viável. Agora, o grande receio que nós temos que ter é que a falta do ajuste interno de forma contínua possa criar problemas para o ajuste externo, que já está lá feitinho e bem-comportado. Se não fizermos ajuste interno em certo prazo, a relação dívida/PIB vai crescer muito rapidamente. Não adianta só a PEC, também é importante a reforma da Previdência, porque, se essa relação crescer muito rapidamente, o que vai acontecer? O nosso risco volta a aumentar. Aumentando o risco, o que acontece? Aumenta a cotação do dólar. Aumentando o dólar, o que acontece? Aumenta a taxa de juros. Aí, o País entra de novo em processo de hipertrofia e, mesmo tendo feito o ajuste externo... Isso vai embora muito rápido.
Hoje temos um momento muito bom: no exterior os juros estão muito baixos, há liquidez internacional, mas esse não é um quadro permanente. Então, uma das coisas mais favoráveis que nós temos hoje é que já foi feito o ajuste externo. Foi um sacrifício brutal, todos nós aqui tivemos que pagar um preço muito alto por isso. Estamos importando menos, estamos num processo desinflacionário muito forte, temos juros reais muito elevados. Foi o preço que o País pagou para fazer o ajuste externo. Só falta fazer o ajuste fiscal interno, que é um processo que demanda as reformas que o Governo e o Congresso estão, juntos, tentando entregar.
Só para finalizar, para que não se perca muito tempo com minhas palavras - estou aberto a qualquer pergunta -, é o seguinte. Eu agradeço muito aos Senadores a possibilidade de o BNDES vir aqui e mostrar quem ele foi, quem ele é e quem ele pretende ser.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Davi Alcolumbre. Bloco Social Democrata/DEM - AP) - Com a palavra, o Senador Roberto Rocha, Relator desta Comissão.
O SR. ROBERTO ROCHA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - MA. Como Relator.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, senhoras e senhores, minhas primeiras palavras são de cumprimento ao Sr. Carlos Thadeu, Diretor Financeiro do BNDES, por ter atendido o convite desta Comissão e estar conosco trazendo mais informações para o melhor desempenho e resultado de nossos trabalhos.
Quero, objetivamente, Dr. Carlos Thadeu, formular-lhe alguns questionamentos.
Preliminarmente, gostaria de ressaltar o meu reconhecimento pessoal pelos esforços recentes do BNDES em promover ações de transparência efetiva. Nesse particular, destaco a recente publicação do Livro Verde em julho passado e a melhoria do site do banco, hoje muito mais acessível do que outrora. Claro, há muito mais a ser feito para o seu aperfeiçoamento, mas é preciso que desde já façamos este reconhecimento.
Então, objetivamente, eu queria lhe fazer as primeiras perguntas.
O processo de aprovação de empréstimos e aportes do BNDES de valores mais elevados têm diferencial em relação a outras operações? Quais instâncias participam do processo de avaliação da operação, aprovação e liberação dos recursos? A decisão é colegiada? Há mecanismos desenhados para tornar o processo mais transparente para protegê-lo de pressões externas indevidas, especialmente políticas, de outras instâncias do Poder Executivo ou da própria empresa beneficiária? Quais seriam? É possível que os pagamentos ilegais a agentes públicos confessados pelo controlador da JBS, Joesley Batista, tenham influenciado as decisões em relação à liberação de recursos pelo BNDES?
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Nesses termos, peço a V. Sª que descreva pormenorizadamente o processo de avaliação de risco e concessões de crédito e/ou aprovação dos investimentos de renda variável, considerando a habilitação do cadastro, a apreciação de viabilidade financeira do negócio e o enquadramento do processo.
Nesse mesmo sentido, requeiro a indicação das resoluções da diretoria e de instrumentos normativos correlatos que regulam os procedimentos aludidos e que se remetam cópias desses normativos para a secretaria desta Comissão Parlamentar de Inquérito.
Ainda a respeito do processo de apreciação dos pleitos, pergunto: quem detém alçada para aprovar as operações de internacionalização, quer seja apoiando a exportação de bens e serviços por intermédio de empréstimos soberanos, quer seja a aquisição de debêntures ou de participação direta no capital de empresas em vias de iniciar a exploração no mercado estrangeiro? É possível um diretor isoladamente aprovar ou vetar um aporte bilionário como os que contemplaram, por exemplo, o grupo JBS?
Quero dizer a V. Sª que vou passar-lhe em seguida, Dr. Carlos, este documento para que facilite as suas respostas.
Se as decisões forem colegiadas, qual a intermitência das reuniões de diretoria para tratar de pautas dessa natureza? E em quanto tempo, em média, um processo de grande porte tramita desde a protocolização do pedido até a efetiva liberação dos recursos?
Sobre essa questão anterior, o titular da Secretaria de Controle Externo do Tribunal de Contas da União esteve em audiência nesta Comissão na semana passada e aludiu a um prazo médio de 210 dias corridos, mas que, no grupo JBS, curiosamente, nunca chegou a 30 dias. Qual a participação percentual do grupo JBS no volume financeiro dos aportes realizados pelo BNDESPar, pelo menos desde 2003, a partir de quando foram intensificados os Investimentos Diretos no Exterior (IDE)?
No início do século, o mercado de proteína animal era dominado por cinco grandes companhias no Brasil, mas, em virtude da insolvência da Bertin e da Independência, o BNDES financiou a incorporação de ambas pela JBS por intermédio de aporte de capital à guisa de proteção da posição dos seus ativos naquelas companhias. Sem prejuízo da competente apuração do Cade, o BNDES não considerou que poderia estar estimulando a concentração no setor em desfavor dos interesses dos consumidores contribuintes que subsidiaram as operações?
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A propósito, a Minerva foi a única das cinco grandes do mercado de carnes da qual não se teve notícia a respeito de financiamento ou aporte de capital para apoiar o plano de operações ou de expansão daquela empresa. A Minerva não recorreu ao BNDES ou ao BNDESPar no período, mesmo dispondo o banco de fomento de tão boas condições para ofertar?
Auditorias do TCU encontraram indícios de irregularidades que teriam gerado grandes prejuízos, de centenas de milhões de reais, nos aportes feitos pelo BNDESPar ao Grupo JBS. Já houve apuração interna do banco em relação às irregularidades apontadas pela fiscalização do TCU? Se sim, quais foram os resultados das apurações?
Qual a argumentação do banco em defesa de pontos como o pagamento de ágio na subscrição de ações da JBS e indícios de tratamento privilegiado da JBS, tendo por base os curtos prazos de aprovação de operações de aporte ou de créditos bilionários e o não recebimento de bônus na conversão de debêntures em ação da empresa?
Ainda sobre os planos de negócios que proporcionaram a expansão do grupo: a instituição investiu na aquisição das gigantes Swift, Beef, Smithfield e Pilgrims, além de outras aquisições menores, bem como na ampliação de plantas industriais e construção de novas unidades, no total de R$8,1 bilhões. Há até quem aponte que o BNDESPar resgatou o mercado de carnes estadunidense, então em derrocada.
Por outro lado, o Livro Verde ilustra que o passivo do BNDES cresceu, de 112 bilhões no início de 2002, para mais de 900 bilhões no final de 2015, principalmente em razão das emissões diretas do Tesouro Nacional, intensificadas a partir de 2009. As emissões chegaram a 100 bilhões/ano, cerca de um terço superior à média dos investimentos públicos nos orçamentos fiscal e da seguridade social. Ou seja, a população financiou taxas mais atrativas para investimentos fora do País, enquanto se viu privada de benefícios diretos do sacrifício em que incorreu em um momento de grave crise econômica, e ainda terá de honrar, por várias décadas, os compromissos assumidos com a diferença das taxas de captação e de mútuo do Tesouro para o BNDES. A quem coube a decisão estratégica de prestigiar os investimentos externos em detrimento das cadeias produtivas locais?
O BNDES financiou e realizou obras de infraestrutura por grandes construtoras brasileiras, como Odebrecht, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, em países como Angola, Cuba e Venezuela. Desde o início, esse tipo de operação recebeu muitas críticas, seja por estar financiando países com governos não democráticos, seja por implicar a transferência para o exterior de recursos escassos no País. Mais recentemente, a delação premiada de executivos controladores da Odebrecht revelou que essas operações estiveram associadas a pagamentos ilegais para agentes públicos. Qual a opinião de V. Sª sobre esse tipo de operação? O senhor concorda, no mérito, com a ideia do financiamento da exportação de serviços por grandes construtoras do País? Como evitar os inerentes estímulos à corrupção nesse tipo de operação?
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Caminhando para o fim, Sr. Presidente, Srs. Senadores, eu pergunto ainda mais para o Dr. Carlos. No mesmo diapasão, esses empréstimos soberanos chegaram a US$14,4 bilhões, ou seja, cerca de R$50 bilhões, entre 2004 e 2015, conforme apuração do TCU por meio do processo Tomada de Contas 034.365/2014-1. Embora nesse caso as operações tenham sido remuneradas e presumivelmente amparadas por garantias reais, e os bens e serviços tenham sido produzidos em solo pátrio, prestigiando cadeias locais de produção, indago: as operações de crédito soberano obedecem ao mesmo fluxograma de procedimentos para aprovação utilizado para os demais créditos ou há uma determinação política por concedê-los? Há ingerência na gestão dos ativos do banco quando envolvem interesses de outros Estados nacionais? Qual a taxa de juros aplicada nessas operações? O banco se vê compelido a enfraquecer sua situação patrimonial nessas operações?
Por fim, eu consulto V. Sª se o senhor reconhece na legislação atual afeta ao BNDESPar algum lapso regulatório que poderia ser aperfeiçoado para robustecer a sua governança.
O SR. PRESIDENTE (Davi Alcolumbre. Bloco Social Democrata/DEM - AP) - Eu queria sugerir o seguinte. Nós temos inscritos aqui o Senador Airton Sandoval; em seguida, o Senador Lasier; e, em terceiro, o Senador Zeze Perrella. Eu queria sugerir que, em virtude do grande número de questionamentos feitos pelo Relator, o Sr. Carlos pudesse responder Senador a Senador, haja vista que nós temos todo o interesse do mundo em discutir, independentemente do tempo que ficaremos aqui nesta Comissão, e ter a oportunidade de ter os esclarecimentos por parte do nosso convidado para a Comissão.
Concordam com esse encaminhamento? (Pausa.)
Senador, V. Exª quer passar... Ele fez algumas anotações aqui...
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - Eu fiz anotações, mas...
Bem, Senador Roberto Rocha, primeiramente o senhor colocou realmente os pingos nos is. Isso é muito importante. Eu vou tentar mostrar que os pingos, às vezes, são grandes demais. Existem is, mas os pingos são grandes demais.
Vamos por etapas.
O processo de empréstimo no BNDES é um processo transparente, soberano, porque tomado por comitês. O BNDES não tem alçadas, tem comitês. Então, qualquer empréstimo de financiamento passa por várias assinaturas. É o que dá segurança à governança no BNDES, inclusive para a diretoria. Seria muito difícil tomar decisões se não houvesse esse tipo de governança. Eu já passei por muitos bancos federais e, quando eu chegava lá, eu perguntava "Há comitê de crédito? Há comitê de taxa? Se não há, vamos criar rápido." Ninguém pode ter alçada. Alçada é dos comitês. Nisso o banco é transparente, é efetivo e é ético.
A outra pergunta que o senhor fez diz respeito ao fluxo operacional do banco. Quando chega uma consulta ao banco, chega lá embaixo. Essa consulta é analisada para depois ir para uma outra fase, de enquadramento. Há a fase de consultas e a fase de enquadramentos antes de ser finalizada. Entre a consulta e o enquadramento, costuma haver mortalidade de 40%. Entre o enquadramento e o efetivo, a mortalidade varia na faixa de 20%. Veja que há mortalidade no meio do caminho. Ninguém chega lá, ao final, sem mortalidade. Então, isso mostra a eficiência do processo operacional do banco. E só vai para a diretoria depois de ter passado por vários comitês - comitês de crédito, de taxas -, com as suas ponderações, com seus ratings. Tudo lá é feito de maneira eficiente. O banco se protege com essa eficiência operacional.
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Obviamente, temos renda variável e temos financiamentos. Como já falei aqui no começo, em financiamentos a governança é tranquila, Senador, porque já vem de anos, e não há surpresas na governança de financiamentos. Devido a isso, não há muitos questionamentos em relação à governança de financiamentos. O que pode existir eventualmente, como V. Exª falou muito bem... Por que o banco resolver concentrar mais empréstimos em certos países, empréstimos longos, com o fundo garantidor de exportação? Aí eu volto a falar o seguinte: a decisão não foi do banco, a decisão foi do Governo. O Governo é que deu projetos com fundo garantidor de exportação, e o banco foi executor desses projetos, com as suas garantias todas. Que eu saiba, inadimplência nessa área quase não houve, ou foi muito pouca. Inadimplência soberana, o banco ainda não teve. Se tem algumas, que estão em processo de aparecer, são pequenas e têm garantias e contragarantias.
Outro ponto muito importante é que o processo decisório nessa área internacional não depende do banco. Eu trabalhei 30 anos no Banco Central e sei muito bem como são as coisas. Quando o governo fixa a meta de inflação em 3,5% ao ano, o Banco Central tem que entregá-la. O funcionário do Banco Central não está preocupado se os juros vão subir muito e se isso vai criar um problema para a economia real. A meta de inflação quem determina é o governo, e o Banco Central tem que segui-la. O funcionário não tem alternativa. Ele não pode errar nesse modelo que ele recebeu pronto. A mesma coisa é o BNDES. Chegaram ao BNDES modelos prontos de financiamento da exportação brasileira ao exterior devido à necessidade de o Brasil ficar mais conhecido.
E há também os acordos soberanos. Os acordos são soberanos, não são acordos empresariais. O país X, Y ou Z fez um acordo com o Brasil, soberano. A partir daí, várias instituições entram - Camex, Fundo de Exportação - para chegar ao BNDES na última linha, porque é o banco que toma a decisão de emprestar operações liquidadas em reais, aqui no Brasil, e o banco está colaborando para a entrada de dólares, que as exportações tragam para o País recursos externos. Então, o banco tem uma colaboração muito efetiva nessa área, e está cheio de salvaguardas, isto é, o banco não empresta só com fundo de garantia. Também há a CCR, que é curta hoje, mas existe; e há outras cauções que o banco também pega nessas operações internacionais. Então, quanto a isso, eu fico tranquilo. A inadimplência soberana é quase não existente e, quando existe, o banco é ressarcido pelo fundo garantidor. Esse dinheiro que o banco usa para financiar operações em moeda estrangeira chama-se FAT Cambial. O FAT Cambial nasceu em 1995, 1996, quando houve a decisão de usar o banco na área internacional - em 1997, em 1998 - para aumentar as nossas exportações. Então, foi autorizado o FAT Cambial. O que é o FAT Cambial? É um recurso constitucional que tem remuneração cambial. Cambial o que é? É uma cesta de moedas com mais um spread - assim o FAT Cambial é remunerado.
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Outro ponto de vista: o banco nunca usou 50% do FAT Cambial, como poderia ter usado. Só usou 11%, para exportações. É um mito dizer que o banco usou recurso constitucional do FAT subsidiado, do governo, para financiar exportações. Jamais faria isso porque ele tem um recurso chamado FAT Cambial. Não há subsídio nenhum no FAT Cambial, porque são operações longas, e, ao longo do tempo, as valorizações das moedas e as depreciações se compensam. Então, há certos momentos em que o FAT Cambial é muito bem remunerado pelo banco, em outros momentos, menos. Mas, no longo prazo, ele tem uma remuneração acima da Selic em termos de paridade cambial, que é o que importa em última instância. Então, quanto a isso, não vejo maiores problemas.
Evidentemente que, tendo em conta o que tem acontecido do ponto de vista de algumas empresas que foram usadas para fazer obras e vender serviços de engenharia e produtos lá fora... Essas empresas estão em acordo de leniência e, então, é esperar para ver se realmente essas operações vão continuar ou não. Em termos macro, elas foram úteis; em termos de...
Vou fazer uma pergunta: o Brasil precisava desse processo rápido para entrar em outros mercados? Precisava, em última instância, em parte, porque ele tem que competir. Ele só compete, nesses países, em condições favoráveis. Ele precisa exportar bens e serviços de engenharia. Agora, a magnitude, o tamanho, o momento, o risco... Quem assumiu o risco dessas operações não foi o banco; foi o governo com o seu fundo garantidor. Ele chega lá e fala: "Esse país tem o risco X. Pode emprestar para ele que eu garanto vocês." Não há problema nenhum; o banco vai dizer que não é risco X, Y, Z? Ele não tem essa autonomia de voo perante o governo, como não a tem o Banco Central para dizer que a meta de inflação não vai ser 10, mas 5, porque quem manda é o governo. Então, quanto a isso, eu não vejo maiores problemas por parte dos funcionários do BNDES.
Em relação à chamada governança, nós já falamos aqui do mercado de capitais. O BNDES está se aprimorando, a cada dia que passa, na sua governança em mercado de capitais. Agora, temos que entender o seguinte: o BNDESPar não tem funding do governo, não tem funding subsidiado; ele gera o funding dele em suas operações, ele é rentável porque ele tem uma carteira de títulos, ações, papéis privados que dão rentabilidade - as ações, principalmente, pela carteira enorme de ações. Então aí, quando ele empresta... Quando ele empresta, não, quando ele faz participações em empresas com fundos do BNDESPar, não há nenhum subsídio, não há FAT Cambial, não há nada, é recurso dele.
Evidentemente que a decisão de participar em capital de empresa é uma decisão também empresarial, sob certo ponto de vista. Devido a isso, Senador, é que é muito difícil nós colocarmos todos os pingos nos is, no processo decisório, em mercado de capitais. Por que é que demora uma operação de empréstimo três anos, um ano, dois anos? É óbvio que há uma série de componentes pelos quais, às vezes, se faz necessário passar. Agora, no mercado de capitais, há certos momentos em que um ato já possibilita sair aquela operação. É um dado de um cartório, de uma junta de comércio, para registrar a operação, que sai rápido ou não. Então, é um processo de governança que não só depende da estrutura do banco; também depende de outras estruturas governamentais e não governamentais.
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Foi certa a posição do banco em entrar pesado em mercado de capitais, em certos setores específicos, como, por exemplo, essa parte da carne? Foi certa sob um certo ponto de vista: para potencializar mais as nossas exportações e para facilitar a competição internacional, já que o mercado de capitais é uma área muito importante no mundo e, lá fora, essas instituições brasileiras não teriam tanto acesso a mercado de capitais, mas, sim, acesso bancário. Só que, lá fora, o banco não manda, lá é mercado de capitais. Então, o Brasil, via BNDESPar, entrou como sócio dessas empresas para dar funding a elas, para elas exportarem mais.
Pergunta que tem que ser feita: precisava ser feito nessa magnitude? Aí é um processo decisório complicado. Quando você entra no mercado de capitais, entra alavancando-se continuamente. É uma área que... A governança no banco está, cada dia mais, se aprimorando. Mas ele é rentável, isso é que importa. Não jogou dinheiro fora.
Outra: as operações externas longas do banco, apesar de serem importantes, representam 2% da carteira do banco nos últimos 15 anos, quando as operações começaram a nascer. Então, não têm uma participação muito forte, em percentual, da carteira total do banco. E o banco é um grande emprestador para a área doméstica. Ele foi colocado na área internacional de maneira residual. E agora, praticamente, as operações estão meio paradas. Não há desembolso mais na área internacional. Então, elas estão perdendo espaço, e esse número, de 2%, nos últimos dez anos vai cair para 0,5%. Então, não é o maior problema em termos de longo prazo.
A grande pergunta que tem que ser feita - não ao banco, sim aos governos - é "Por que vocês fizeram acordos soberanos e pediram para o banco financiar dando garantia e riscos que não necessariamente podem ser compatíveis com cada país?" Uma das coisas mais difíceis que existem é analisar rating. É muito difícil. É muito difícil ver rating. Essas agências de rating erram tanto... Você vê que, quanto à crise mundial de 2008, ninguém estava dizendo que haveria crise. E houve crise. É que ela só vem depois. Então, é um processo político por natureza. O banco está fora disso, ele foi agente do governo, mais nada além disso.
Bem, em termos de auditorias, o banco hoje está prestando todas as informações possíveis para o TCU, JBS e outras operações, continuamente. Ele não está deixando de atender em nada ao TCU. Evidentemente, ele está também se aprimorando em termos de governança. A cada pedido desses, ele se aprimora mais na área de mercado de capitais - na área de financiamentos, já tem algo consolidado.
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Essas incorporações no exterior - Minerva e outras - fazem parte de uma política empresarial que o banco, ao resolver entrar como sócio da empresa, essas políticas são naturais. Agora, o banco nunca indicou diretor para a empresa. Ele indica, às vezes - quase sempre -, para o conselho de administração. Então, as decisões operacionais da empresa não competem ao banco, competem à empresa em que ele entrou.
O processo de entrar em empresas é um processo complicado. Você entra, depois você quer sair e não consegue, porque se sair dá um tiro no pé, e vai atrapalhar as suas ações. Tem de saber a hora certa de entrar e sair. E é um processo per si muito difícil, devido às nossas instabilidades. Se há instabilidade em crédito - eu mostrei a vocês agora que o estoque de crédito caiu, no Brasil, de cinquenta e pouco por cento do PIB para 49% nos últimos três anos -, imaginem então o mercado de capitais, o que foi a renda variável nesses últimos anos, com a queda da bolsa. Isso aí gerou muitos prejuízos. Então, mercado de capitais é uma área muito complicada para a governança e tem de ser, a cada dia que passa, aperfeiçoada; e o banco está fazendo isso.
Bem, em relação ao que o Senador falou do nosso passivo, que chegou a 900 bilhões recentemente, óbvio que o Tesouro Nacional, como já falei aqui, aportou recursos, e com esses recursos o banco conseguiu emprestar para bens de capital. O Finame foi a principal fonte de empréstimo. Não jogou fora esse dinheiro do Tesouro; inclusive pagou rentabilidade, e paga boa rentabilidade. Então, não foi nada necessariamente mal feito. Foi uma operação cíclica, isto que importa. Por que o banco começou a emprestar PSI? Foi uma decisão dele? Não. O Governo, à época, precisava incentivar a economia; alguém falou: "Não, vamos usar o BNDES que... Ele não tem funding suficiente para alavancar a economia, então vamos colocar títulos públicos e ele vai emprestar para o setor real da economia." E deu para alavancar, realmente. Agora, a pergunta que tem de ser feita: é necessário ter um funding assim? É necessário fazer o que fez, para depois gerar essa problemática toda, fiscal, que o País hoje está vivendo? Era necessário? Senador, na época os dirigentes estavam na área macroeconômica. Os nossos formuladores macroeconômicos acharam que era importante, e o banco só executou. Não foi ele que tomou decisões. O grande problema é que o banco não é um policymaker: ele recebe as orientações e as executa, com a melhor governança possível. Então, não dá para dizer que o BNDES foi um mau gestor; ele foi um ótimo gestor, só que ele foi usado.
Eu acho que atendi grande parte das suas perguntas, Senador. As perguntas mais pontuais, quando o senhor me pede alguns números, eu vou mandar para o senhor por escrito. Mas as perguntas mais genéricas, até onde a minha memória permite, acho que tentei responder, Senador.
O SR. ROBERTO ROCHA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - MA) - Eu queria pedir a V. Sª, Dr. Carlos, que olhasse a questão nº 2, que eu faço aqui um requerimento.
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - Perfeito, Senador.
Eu vou mandar para o senhor o que o senhor está pedindo aqui: para descrever cada operação, como é feita a avaliação de risco, concessão de crédito, renda variável, como são ambas as governanças, renda fixa e renda não fixa, como nós temos lá vários processos de aprovação e também as operações que foram aprovadas pela diretoria. Tudo isso aí a gente manda para o senhor.
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O SR. ROBERTO ROCHA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - MA) - Certo.
Há na questão nº 7 sobre a empresa Minerva, que foi a única das grandes, das cinco grandes, que não teve financiamento do banco. O questionamento aqui foi se ela recorreu ao BNDES ou ao BNDESPar no período.
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - Senador, até onde a minha memória não está falha, a Minerva não recorreu ao BNDES e ao BNDESPAR no período. É uma decisão empresarial dela.
O SR. ROBERTO ROCHA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - MA) - O.k.. E a questão nº 10, que foi em relação às empresas brasileiras que investiram em países como Angola, Cuba e Venezuela. Se V. Sª... Qual a sua opinião sobre esse tipo de operação, considerando a dificuldade extrema no Brasil em obras de infraestrutura? Ou seja, o Brasil está carente de obras de infraestrutura de toda sorte - estrutura e infraestrutura, no que diz respeito a rodovias, ferrovias, hidrovias, portos e aeroportos.
O Brasil preferiu criar uma linha imaginária, impedindo o seu crescimento econômico, para fazer investimentos em infraestrutura fora do País. Eu quero dizer a V. Sª que eu, como Senador da República, represento um Estado... Vou dar o exemplo do Maranhão: o Maranhão tem o melhor porto das Américas em relação ao calado, mas o Brasil, o Governo, o banco ou os dois fizeram opção de fazer um investimento lá em Cuba.
Até hoje a gente não sabe se foram 800 bilhões, se foi 1 bilhão, se foi 1,2 bilhões, e a pergunta é: por que fazer em Cuba se podiam fazer no Brasil? Ah! Porque é próximo do Canal do Panamá. Logística boa, mas o Porto do Itaqui ainda é mais próximo. A diferença é que o Porto do Itaqui é no Brasil.
Então, é apenas uma questão conceitual que eu queria saber de V. Sª em relação a esse tipo de operação. Essas operações... A empresa, nesse caso do porto em Cuba, foi a Odebrecht. Eu já estive lá visitando esse porto, já estive lá visitando esse porto. O pagamento para a empresa era feito lá pelo governo venezuelano ou é feito aqui pelo Governo brasileiro, através do BNDES?
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - Bem, Senador, essas perguntas basicamente voltam ao que eu já falei aqui, mas vou falar de novo para o senhor. São decisões de Governo, que o BNDES simplesmente executou.
Em relação à infraestrutura no Brasil, óbvio que há uma demanda enorme. Mas essas obras no exterior também, se tudo funcionar bem, vão gerar empregos aqui, que, por sua vez, vão gerar renda e vão gerar mais obras de infraestrutura - se as coisas funcionarem bem. Essas empresas que financiam a exportação de serviços de engenharia e de bens também são operações domésticas, não são operações externas.
O senhor perguntou: e o custo de oportunidade disso? Por que não pegou esses recursos e investiu dentro do Brasil, em vez de investir lá fora, no exterior? É porque no Brasil você tem receita em reais; lá fora a receita é em moeda estrangeira. É válido, desde que o País... O País não emite dólar, emite reais. Reais não faltam aqui, mas faltam dólares, podem faltar. Hoje não faltam, mas podem faltar eventualmente.
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Agora, a magnitude das operações, a escolha dos países, eu realmente prefiro não opinar, porque não foi decisão do banco. Ele somente colocou isso em termos operacionais. E, pelo que eu saiba, a inadimplência aqui é não existente hoje. Hoje, mesmo que tenha alguma inadimplência, que tenha algumas a caminho, tem o fundo garantidor. Então, é importante pontuar o pingo no fundo garantidor, que foi o responsável final por dar os créditos de risco e por escolher esses países em termos soberanos.
O SR. ROBERTO ROCHA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - MA) - Por fim, Presidente, eu consultei o Dr. Carlos sobre se ele reconhece na legislação afeta ao BNDESPar algum lapso regulatório que possa ser aperfeiçoado na questão da governança.
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - Senador, muitos, muitos atos. Evidentemente, é uma área dinâmica por natureza. Não para o BNDESPar. Chega lá, fala "não faz isso"; ele para. Ele gira a carteira, hoje não está girando mais, girava a carteira, porque existe necessidade de mais governança. Por exemplo, o que quer dizer girar carteira? Se vende um papel privado, uma debênture que está cheia e compra outra. É um market maker, como chamam esses mercados financeiros.
Ele, hoje, diminuiu bastante isso, porque falta governança nessa área. Então, tem que gerar uma governança para continuar o banco a girar, porque não faz sentido você ter debêntures na sua carteira e não aproveitar o melhor momento para girá-la. A mesma coisa ações. A BNDESPar tem ações na carteira. Subiu de preço, tem que vender, realizar o lucro, e não esperar sentado, porque não fazer é a mesma coisa que fazer, está perdendo. Ou perde não fazendo ou perde fazendo. Então, tem que ter dinâmica por natureza.
Agora, com a necessidade de mais controle e mais governança, o banco está aprimorando-se no dia a dia. Agora, tentar também não parar a instituição, porque ela hoje está razoavelmente parada, devido à necessidade de ter mais cautela para aprovar as operações. É o que eu falo para o pessoal do banco: "Olha, se vocês não aprovarem, o País para." Os meus empréstimos estão continuando a aprovar, mas tem que ter aprovação. Não pode ter medo de aprovar. Se está tudo certo, as assinaturas estão todas lá, tem governança, tem que aprovar.
O SR. ROBERTO ROCHA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - MA) - Só para concluir, Presidente, eu comecei falando do Livro Verde. Aí, me veio um questionamento bem simples, em português bem claro, para que as pessoas que estão nos acompanhando pela TV Senado possam entender em português claro.
Se por acaso o Maduro, já que eu falei do Livro Verde, da Venezuela, decidir não pagar, aí não é problema do banco, é do governo, que tem um fundo garantidor. Como é que funciona isso na prática?
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - Senador, se a Venezuela não pagar, o banco tem as contragarantias, que são o fundo garantidor e também, às vezes, tem operações chamadas CCR (Crédito Recíproco), porque aqui na América Latina os bancos centrais fazem acordos de crédito recíproco. Então, por exemplo, o que quer dizer isso? Quem vai liquidar é o Banco da Venezuela, é o Banco Central venezuelano que vai liquidar essa caução junto ao BNDES. Então, o BNDES tem a garantia do Tesouro e tem a garantia do Banco Central da Venezuela, que tem que liquidar junto ao nosso Banco Central no mercado de compensação de reservas.
Voltamos ao assunto: na década de 90, não tinha fundo de garantia, só tinha CCR. A CCR costumava ser longa. Eu, no Banco Central, naquela época, dizia o seguinte: não faz sentido o Banco Central ter CCR longa. O que é CCR longa? Acordo para financiar obra no exterior com os bancos centrais envolvidos, porque o Banco Central virou, naquela época, um canteiro de empreiteiras.
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Lá era um canteiro de banqueiros. Então, resolveu não fazer CCR longa, e só curta, e passou para o fundo de garantia fazer a chamada CCR longa, que, por sua vez, tinha que ter muito mais prudência, mais governança do que teve.
O SR. PRESIDENTE (Davi Alcolumbre. Bloco Social Democrata/DEM - AP) - Senador Airton Sandoval, V. Exª tem a palavra.
O SR. AIRTON SANDOVAL (PMDB - SP) - Obrigado, Presidente.
Nosso Relator, Senador Roberto Rocha, com sua tradicional experiência, praticamente esgota a questão. Especialmente o nosso entrevistado, Dr. Carlos, também, com sua vasta experiência nessa área, acho que até extrapolou a reinquirição do nosso Relator. Mas, para minha compreensão, alguns pontos ainda ficam obscuros, e eu gostaria de que V. Sª se aprofundasse um pouco mais nisso aí.
Eu ouvi o nosso convidado do Tribunal de Contas afirmar aqui que havia, sim, uma ingerência do Ministério da Fazenda, através da Câmara de Comércio Exterior, a Camex, e da Secretaria de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda, a Sain/MF, e da Agência Brasileira Gestora de Fundos Garantidores e Garantias S.A., na concessão desses financiamentos. Dali saiu - eu entendi assim - uma autorização para o Comitê de Enquadramento de Crédito e Mercado de Capitais do BNDES. Isso, no meu ponto de vista, indica que esse comitê perde bastante da sua autonomia nessas decisões quando um órgão superior já direciona o que ele deve fazer.
Eu gostaria de que V. Sª se aprofundasse um pouco nessa questão para eu entender um pouquinho melhor. Eu acho até que isso cria uma dificuldade para gestores do próprio banco. Quando há uma ingerência dessa forma do Ministério, de um órgão ligado ao Ministério, e, no meu ponto de vista, isso pode até comprometer a atuação do banco. Essa é uma das questões que eu gostaria de ver esclarecida.
Uma outra questão. Eu gostaria... Se essa estratégia que leva a BNDESPar a atuar entrando no capital das empresas, se isso traz benefícios realmente para o nosso País, para o banco e para o País, porque o mercado de ações, como V. Sª sabe, é um mercado que flutua bastante, tem hora que ganha, tem hora que perde, e não sei o que acontece no que está aí.
E com relação aos financiamentos que foram feitos para a Construtora Norberto Odebrecht, para a Hidrelétrica de Laúca, em Angola, que somou... Foram dois empréstimos aqui, um de US$146 milhões, outro no valor de US$500 milhões, e parece que há uma diferença entre a taxa de um financiamento e de outro financiamento, que uma teria um determinado valor de juros - a primeira, uma taxa fixa de 3,81; e a segunda, uma taxa fixa de 3,70. Eu também não entendi por que uma diferença entre uma e outra. Se era para a mesma empresa, para o mesmo empreendimento, com certeza, os riscos seriam os mesmos. Eu gostaria que V. Exª também fizesse alguns comentários com relação a isso.
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Tem aqui também uma questão do Acórdão 3.011, de 2015, do Plenário do TCU, em que o Tribunal alegou que tanto uma conceituada agência de risco quanto a própria equipe de análise do BNDES apontaram a aquisição da Swift pela JBS como um negócio de elevado risco, em um contexto de crise no mercado de carnes estadunidense. A despeito disso, conforme apurado no aludido acórdão, não apenas a BNDESPar adquiriu ações da JBS para propiciar a incorporação da gigante americana, como também o fez pagando ágio de no mínimo 6,53%, considerando a série histórica mais favorável à precificação das ações do grupo. Teria sido a equipe técnica da sua diretoria que emitiu o alerta? E por que, mesmo com as avaliações indicando o risco elevado, foram as ações valorizadas na hora da compra?
Uma outra questão é que recentemente o banco se viu às voltas com operações que envolvem empresas que denotaram alto risco financeiro ou moral. Cito como exemplo disso o caso do Grupo JBS e do Grupo EBX, do empresário Eike Batista, detido em uma das fases da Lava Jato, por aparentemente ter pago propina para o ex-Governador do Rio Sérgio Cabral. Como é sabido, Joesley e Wesley não tiveram o mesmo fim em razão do acordo de colaboração que firmaram com o Parquet. Tem se levantado que os instrumentos de fomento têm sido parcialmente utilizados para gerar funding e reduzir o custo de transações para acessos não republicanos a instâncias decisórias. No caso da JBS, as ações e as debêntures, posteriormente convertidas, custaram à BNDESPar entre 7,4 e 8,1523 e, posteriormente, uma parcela da participação foi vendida pela BNDESPar por valor entre 567 e 604, com considerável prejuízo contábil. Dito isso, indago: o que justificaria a compra dos papeis na alta e a venda na baixa? O mesmo ocorreu com relação ao Grupo EBX?
Na oportunidade, requeiro o encaminhamento a esta CPI de relatório contendo valores individuais e globais das ações e debêntures compradas e vendidas, separadas por empresa e por data, referentes às operações que ensejaram internacionalizações de companhias nacionais objeto de apuração.
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E a última, Dr. Carlos. O senhor reconhece, nos regulamentos internos do BNDES, vedação à participação societária em empresa sediada no exterior, como foi o caso da JBS USA Pilgrim's? Nas mesmas operações teria sido repactuada cláusula contratual que previa fórmula de cálculo para a conversão de debêntures em ações para o BNDESPar em desfavor desse? A prática encontra esteio na livre manifestação de vontade que rege as relações contratuais ou pode ser considerada atentatória ao interesse público?
São essas as questões, Dr. Carlos, em que eu gostaria de ter os esclarecimentos de V. Sª. Muito obrigado.
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - Pois não, Senador. É um prazer falar com o senhor de novo.
Muito bem, Senador, vamos lá, por etapas. A ingerência da Camex no Fundo de Exportação (FGE) é óbvio e ululante que quem determina é o Governo, via Camex. E o fundo garantidor é que dá as diretrizes básicas para a operação externa.
É óbvio que tem ingerência, não tenha dúvida. Agora, o banco não tem nenhuma ingerência nessa área, porque já recebe o pacote fechado. É emprestar com garantias do FGE para tal país. Vocês peguem todas as garantias, cauções. O custo não é subsidiado, é o Fat Cambial mais o spread. É um custo que... O banco se remunera e remunera o Tesouro também.
Uma outra coisa muito importante de notar...
O SR. AIRTON SANDOVAL (PMDB - SP) - Isso vem por que tipo de expediente?
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - Senador, isso é uma decisão colegiada da Camex, que, por sua vez, é transmitida... Aliás, veja bem, quem são os membros da Camex? São os vários ministérios, que transmitem isso para o fundo garantidor.
O SR. AIRTON SANDOVAL (PMDB - SP) - É um documento formal?
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - É formal, tudo é formal. Não é de boca, é formal. E o banco, então, é um agente final, que procura maximizar o seu ganho nas exportações de bens, serviços e engenharia. E com isso ele tem feito muito bem, tem tido retorno, e transfere lucro para o Tesouro, além de pagar prêmios para o fundo garantidor. Hoje ele é um fundo que recebeu muito prêmio de seguro, ele é rico hoje, porque ninguém ainda teve sinistro. Não teve sinistro e espero que não tenha. Então, o fundo é rico. Quanto a isso, foi uma operação financeira bem realizada.
A pergunta a ser feita: por que tais países? Por que concentrar? Por que não diversificar? Aí é uma pergunta política que não podemos responder.
O banco só era senhor de si, nas operações externas, quando ele operava no convênio recíproco, porque aí é uma decisão do banco de financiar as exportações, e tinha a garantia do CCR. Não tinha Governo Federal, era uma garantia de acordo do Banco Central. Chegava lá uma empresa: "Quero financiar uma exportação para a Venezuela". Aí o banco dizia: "Não, vamos usar, então, o acordo de cooperação entre os bancos centrais, CCR, para nos dar garantia. A decisão era dele. E deu certo, enquanto tinha esse acordo. Depois o acordo ficou curto e voltou a ter o FGE.
Bem, o BNDESPar realmente é uma instituição que opera com risco. Mercado de capitais é risco. Mas é uma instituição que, ao longo de sua história, é rentável, tirou bastante proveito de valorização das ações e transfere lucro para o Tesouro Nacional. É isso que importa. Ele não transfere lucro para terceiros; transfere para o Tesouro.
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Eu acho que tem uma função muito importante, porque, no Brasil, nós ainda estamos, como falei logo no começo, sem mercado de capitais. Os bancos não querem emprestar a longo e nem querem ser sócios de empresas, como é hoje em muitos países.
Então, aqui, o BNDES resolveu incentivar o mercado de capitais via BNDESPar, o que é válido. O que não é válido é fazê-lo sem governança. Por isso é importante, porque ele aprimora sua governança ao longo do tempo.
Esse financiamento para Angola... Eu ainda não sei detalhes dessas taxas que o senhor me deu: 3,8 ou 3,7. Eu tenho que ver isso. Depois mando para o senhor. Mas eu tenho impressão de que essas taxas são taxas-padrão. Quer dizer, não é, necessariamente... O risco quem calcula é o próprio governo. Manda para o BNDES, que tem um FAT Cambial, que tem um custo padrão, e repassa isso para o exportador. Não há escolha. Nessa área é tudo padrão. Mas eu posso informar ao senhor quando tiver esses dados na mão.
O senhor também falou sobre esse Acórdão 3.011 do Plenário do TCU, que o BNDESPar estaria financiando gigantes americanos, e houve alguns pareceres internos do Banco dizendo que esse risco não era, necessariamente, o melhor risco.
Eu tenho certeza absoluta de que, como o Banco... Eu não participei dessa operação, eu nem estava lá. Mas, como no Banco a decisão é colegiada, dificilmente, é impossível que uma diretoria passe por cima da decisão do colegiado. Então, dificilmente o colegiado faz uma coisa e a diretoria faz outra. No Banco, as coisas funcionam assim.
Agora, há uma pergunta a ser feita: essa concentração excessiva em certas empresas no exterior... Apesar de ser muito válido incentivar os mercados de capitais, de ser válido o Brasil participar desse processo como um todo, a concentração ao longo do tempo é benéfica? Porque o mercado de capitais, como falei aqui, é muito instável por natureza. Quando você concentra financiamento, você tem a garantia. Por exemplo, o Brasil resolveu emprestar para Angola. Risco soberano, longo, mas tem a garantia. Não tem problema. Agora, o mercado de capitais não tem garantia. Capitais são decisões empresariais. Realmente, o processo de concentração é mais complicado. Talvez tenha que ter mais governança para evitar concentrações exageradas.
Empresas de alto risco moral: JBS e EBX. É óbvio que, quando o BNDES resolveu participar dessas empresas, ele não sabia que o risco moral era tão alto assim. Olhando para trás, ele hoje não teria feito isso. Tenho certeza absoluta disso. Mas, na época em que foi feita, não era, necessariamente, isso que estava acontecendo hoje. Volto a falar: entrar como sócio é uma coisa; emprestar é outra. É muito mais arriscado entrar como sócio em volumes altos que emprestar, porque tem garantia. Essa pergunta tem que ser feita realmente em termos de governança, e tem que se olhar agora para a frente. Governança em mercado de capitais é complicado por natureza. Senador, manda uma pergunta porque eu estou meio perdido aqui.
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O SR. AIRTON SANDOVAL (PMDB - SP) - Falta apenas uma explicação a respeito do valor entre a compra das ações e a venda das ações com prejuízo.
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - Senador, pelo que eu saiba... Eu estou acompanhando agora, porque eu estou há pouco tempo lá. Pelo que eu saiba, esse processo de ágio... Quando o BNDES resolve entrar numa empresa, a fixação do preço da ação é decisão empresarial. Ele faz um cálculo chamado de valuation. Ele usa o fluxo de caixa futuro e desconta.
Na valuation é que ele vê quanto vale a empresa. Não é aquele valor que dá o sócio da empresa, nem o que está cotado no mercado de capitais. É um cálculo matemático, estatístico, atuarial. E a valuation é que o Banco usa para determinar se vai vender ou se vai comprar.
Então, tenho certeza absoluta de que não houve nenhuma decisão puramente porque a ação está muito alta ou está muito baixa. Ele compara isso com a valuation da empresa e toma um processo decisório. Não tem nenhuma interferência de preço de mercado, e sim uma interferência técnica, que, inclusive, é de dados transparentes e abertos. Quem quiser...
O SR. AIRTON SANDOVAL (PMDB - SP) - Decisão exclusivamente interna?
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - Interna.
O SR. AIRTON SANDOVAL (PMDB - SP) - Sem ingerência...
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - Não, nenhuma ingerência. Primeiramente, porque passa por vários comitês, Senador. Não tem como ter ingerência.
O SR. AIRTON SANDOVAL (PMDB - SP) - Perfeito.
O SR. PRESIDENTE (Davi Alcolumbre. Bloco Social Democrata/DEM - AP) - Senador Lasier.
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Muito obrigado.
Presidente, Senador Davi Alcolumbre, Relator, Senador Roberto Rocha, meus colegas.
Sr. Carlos Thadeu, eu tenho certeza de que V. Sª comparece aqui para nos ajudar. O senhor sabe, por elementar que é, que uma CPI é proposta quando se suspeita gravemente de irregularidades. Uma empresa onde há a exação da sua diretoria, onde há a lisura da gestão não há por que ser investigada. E há um anseio no Brasil inteiro por se investigar o BNDES, porque, nos últimos anos, o Brasil vive a mais tormentosa crise de corrupção, coisa jamais vista, e não há corrupção sem dinheiro, e muito dinheiro. Então, há um sentimento e, mais do que um sentimento, mais do que uma presunção, há fatos de algumas fontes da corrupção. Uma das grandes fontes da corrupção é a Petrobras. Outra probabilíssima fonte de corrupção é o BNDES. Mas tem havido uma dificuldade tremenda para se entra na caixa-preta do BNDES.
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Eu mesmo estou lutando com um projeto há mais de um ano para acabar com o sigilo nas operações do BNDES, respeitando algumas circunstâncias em que o sigilo deve ser mantido. Mas tenho tido alguns colegas que não deixam. Na semana passada, inclusive, minha tentativa foi derrotada por 33 a 16. Tem gente que não quer mexer no BNDES. Fogem como o diabo da cruz, porque existe alguma coisa lá no BNDES. E por que se quer investigar o BNDES? Porque é preciso descobrir, Dr. Carlos Thadeu, de onde veio tanto dinheiro para a corrupção; por que compraram grandes partidos; por que corromperam tantos políticos.
O Sr. Joesley, na noite em que houve a reeleição da Dona Dilma, em uma festa na sua casa, ao redor da piscina, chegou a dizer: "Vocês têm que reconhecer o meu mérito, porque eu comprei 1.800 políticos". Isso foi objeto de uma reportagem de uma revista de grande circulação no Brasil, a IstoÉ. A Veja já fez reportagem; a Época já fez; a Folha de S.Paulo toca no assunto a todo momento; o Estadão toca no assunto; o Correio Braziliense; lá na minha terra, o Rio Grande do Sul, o Zero Hora trata do assunto. Quer dizer, houve corrupção, da grossa. É o que se investiga, e é o que se quer nesta Comissão, presidida pelo nosso correto Davi Alcolumbre, e pela argúcia que tem meu colega Roberto Rocha para investigar a fundo - e já demonstrou há pouco nas perguntas que ele fez. Nem todas foram respondidas - acho que, em parte, porque V. Sª não teve tempo ainda de descobrir o que houve. Pelo que eu sei, V. Sª está apenas há dois meses no BNDES.
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES (Fora do microfone.) - Duas semanas.
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Duas semanas! Então, a impressão que eu tenho é que o senhor comparece aqui por boa vontade, mas V. Sª tem poucas condições de responder às nossas perguntas.
Por exemplo, o BNDES foi fundado em 1952, para diminuir as desigualdades sociais do Brasil, para oferecer empregos e para construir infraestrutura. Por que, no ano de 2005 - ele era um banco nacional, banco brasileiro, para tratar do desenvolvimento do Brasil -, alguém inventou de abrir esse banco para financiamentos lá fora? Por quê? Isso é uma enorme contradição. Nós precisamos de infraestrutura é aqui! Nós não temos rodovias, nós não temos usinas, nós não temos aeroportos, nós não temos ferrovia. Não temos quase nada. É um País pobre de infraestrutura. Então, por que esse banco, que vive de verbas do Tesouro, que vive de verbas do FAT, inventou de ir lá para fora? E não foi pouca coisa! Ele foi lá para onde? Como disse há pouco, muito bem, o nosso Roberto Rocha: para países 90% não democráticos, ditatoriais, ou seja, Angola, Moçambique, Venezuela, Cuba, Bolívia, Equador, Nicarágua, República Dominicana; e alguns mais ou menos: Peru, e Argentina, que é um país democrático. Então, noventa e tantos por cento onde não há licitação verdadeira, há licitações frias, fajutas. Um dos países de maior investimento é o de um presidente que está lá há 38 anos, um ditador, Angola. Então, Dr. Carlos Thadeu, eu lhe pergunto em primeiro lugar: V. Sª concorda que veio do BNDES uma respeitável cifra de bilhões de reais para a corrupção, para propina? Essa é minha primeira pergunta. Se não, V. Sª vai ter que me dar um outro palpite - não, não veio dali, veio de outro lugar. Nós temos certeza de que veio da Petrobras e veio do BNDES. Mas gostaria de ouvir a sua opinião, porque afinal V. Sª é o diretor financeiro, deve estar investigando, deve ter tido uma enorme curiosidade: "Eu vou olhar para o passado desse banco para ver o tamanho da bandalheira e quem foram os responsáveis". Até porque tem um que está preso há três anos, que é o Sr. Marcelo Odebrecht.
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E quem é o Marcelo Odebrecht? É o responsável por obras. Vou citar algumas aqui, nem todas. Obras como o Porto de Mariel, em Cuba, US$682 milhões do BNDES; Hidrelétrica de San Francisco, no Equador, US$243 milhões, Odebrecht; Hidrelétrica Manduriacu, Equador, US$90 milhões, Odebrecht; Hidrelétrica de Chaglla, Peru, US$320 milhões, Odebrecht; metrô da Cidade do Panamá, US$1 bilhão, Odebrecht; autopista de Madden-Colón, no Panamá, US$ 152 milhões, Odebrecht; Aqueduto do Chaco, na Argentina, US$180 milhões, OAS; soterramento do Ferrocarril Sarmiento, na Argentina, US$1,5 bilhão, Odebrecht; linhas 3 e 4 de metrô de Caracas, Venezuela, US$732 milhões, Odebrecht; segunda ponte sobre o Rio Orinoco, na Venezuela, US$300 milhões, Odebrecht; Barragem de Moamba Major, Moçambique, US$350 milhões, Andrade Gutierrez; Aeroporto de Nacala, Moçambique, US$125 milhões, Odebrecht; BRT de Maputo, Moçambique, US$180 milhões, Odebrecht; Hidrelétrica de Tumarín, na Nicarágua, US$342 milhões, Queiroz Galvão; a Hacia el Norte - Rurrenabaque, na Bolívia, US$199 milhões, Queiroz Galvão.
Para não cansar a todos, eu citei apenas 15, há mais 15. Aqui dá em torno de US$9 bilhões. Isso dá, por baixo, R$35 bilhões, dinheiro que faz falta aqui para nossa infraestrutura. Por que levaram para lá, doutor? Por quê? Houve ou não houve superfaturamento? Não foi do superfaturamento dessas obras que se contemplou, que se premiou a corrupção dos partidos, dos políticos e sabe-se lá de quanta gente? É uma opinião que eu vou pedir. V. Sª deve estar interessado nisso, deve estar investigando isso.
Porque a situação, doutor, exige uma investigação. E o Brasil inteiro está esperando êxito desta CPI, que vai sofrer pressões, mas, pela qualidade dos nossos dirigentes da Comissão, temos certeza de que não vão se curvar a pressões. A Comissão haverá de identificar os ladrões do BNDES, assim como da Petrobras muitos já foram descobertos. No BNDES tem havido uma enorme dificuldade. Então, o meu objetivo é bem simples: o que V. Sª sabe de tudo isso? O que V. Sª já descobriu até agora? E V. Sª admite que uma das maiores fontes da corrupção veio do banco que agora o senhor dirige.
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São essas as minhas perguntas.
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - Senador, antes de mais nada, nós do BNDES aprovamos o seu grande projeto de sigilo bancário. Eu acho que não tem...
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - De quebra do sigilo.
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - É.
Para o BNDES, salvaguardas, alguns itens, como, por exemplo, rating de empresas, saldo devedor... Porque o BNDES não pode liberar um dado de que o seu competidor vai tirar proveito.
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Está previsto nas ressalvas.
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - Isso.
Quanto a isso, não dar esses dados é importante para não se perder receita no Banco. Agora, na medida em que ele é um banco transparente e público, os outros dados estão disponíveis, e concordamos com a sua proposta em gênero, número e grau. Inclusive, hoje, Senador, uma das maiores preocupações - eu fui do Banco Central e vivi muito essa área - é o problema de sigilo bancário. Hoje, com o dinheiro que tem aí das drogas e de outras coisas, há acertos entre os países para transparência total. Até, inclusive, o sigilo dos bancos comerciais está sendo colocado em questão. Por quê? Vou dar só um exemplo. Executivos da Alemanha no Deutsche Bank estão levando multas bilionárias por causa dos seus correspondentes bancários que abriram contas que não poderiam ter aberto, e quem está pagando o ônus é o Deutsche Bank. Então, ele agora está preocupado em escolher quais são os bancos com que vai operar.
E não pode abrir conta para qualquer um. Tem que ter qualidade. Os dados têm que ser transparentes. O dinheiro é transparente. Quando nós entrarmos na chamada era digital do dinheiro, aí que vai ser... Essas suas preocupações vão sumir daqui a alguns anos. Vai ser dinheiro digital. Mas, enquanto não é digital, concordo com o senhor em gênero, número e grau.
Em relação ao BNDES, eu digo o seguinte para o senhor: a instituição é brilhante. São concursados, como eu fui do Banco Central, com qualidade igual ou melhor que dos do Banco Central. Do mesmo nível. Agora, o Banco é um agente. Não é ele que toma decisões de risco. Como falei aqui, quando as decisões de exportação eram do Banco, ele não tinha aporte de FGE, as decisões eram deles, nunca teve problema nenhum. Ele nunca financiou governo da Venezuela, de Angola... Eram operações bancárias com risco de bancos centrais no CCR. Quando o governo, na época, tomou a decisão de fazer operações internacionais, com um fundo garantidor, quais países deveriam entrar... Concordo com o senhor exatamente nesse ponto. Quer dizer, risco político. Com a Venezuela o risco político sempre foi... Com a Angola, também foi. Por que, então, esse risco não foi bem mensurável na hora de dar o rating desses países? Mas não é o BNDES. Ele recebeu pronto. Ele só executou operações, ficou rentável, porque ele recebe em moeda forte e paga em reais. Essa é a vantagem. O País, quando faz operações lá fora, recebe em dólares, e não em reais. Aqui ele paga em reais.
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Agora, se houve alguma preponderância política na escolha dos países ou na escolha das empreiteiras, não é problema dele. Tanto é que não há nada lá dentro que eu tenha observado até hoje que possa me dizer nada em contrário disso.
Agora, em termos de corrupção, Senador, existe em todos os lugares. O BNDES é um órgão em que, pelo que eu saiba, as coisas caminham favoravelmente. Agora, como são decisões de colegiado, e que é o certo, o processo de corrupção é praticamente não existente.
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Mas então de onde veio esse recurso para a corrupção em obras que foram realizadas pela Odebrecht, por exemplo? Por que o Sr. Marcelo Odebrecht está preso? Porque houve superfaturamento, porque ele usou sobras, alegadas sobras.
Vou me permitir ler um trecho de um articulista da Folha de S.Paulo que é muito acatado, muito respeitado, o Demétrio Magnoli. No sábado passado, quatro dias atrás, ele escreveu sob o título "O comissário desaparece". A certa altura ele diz o seguinte:
[...] a Odebrecht expandiu seu império por terras da Venezuela, da República Dominicana, da Argentina, do Panamá, do Peru e de Cuba (em todos casos, à óbvia exceção de Cuba, onde dispensam-se marqueteiros, com auxílio do inefável João Santana). Mas Angola é só outra mosca preta, como atesta a confissão de Emilio Odebrecht.
Segundo seu depoimento, Emilio solicitou os bons ofícios de Lula para que a Odebrecht fosse favorecida em Angola. O patriarca também disse que, após a crise financeira de 2008/2009, quando desabaram as receitas petrolíferas angolanas, o BNDES tornou-se a única fonte significativa de recursos para a empresa no país africano.
De fato, em meados de 2010, o BNDES abriu nova linha de crédito destinada a obras em Angola, no valor de US$1 bilhão. As relações especiais entre Lula e José Eduardo dos Santos [que é o ditador de lá há 38 anos] prosseguiram durante o governo Dilma. Em 7 de maio de 2014, os dois se reuniram no palácio presidencial, em Luanda.
O encontro realizou-se durante seminário organizado pelo Instituto Lula e pela Fundação José Eduardo dos Santos, a engrenagem montada para converter rendas petrolíferas angolanas em bens patrimoniais da família Santos.
E por aí vai. Quer dizer, há conexões visíveis, palpáveis de que houve... O Presidente da República era o companheiro da Odebrecht, de Marcelo. Para cima e para baixo no jatinho do Marcelo Odebrecht, oferecendo obras nesses países, um sem-número de obras - exatamente Angola, Moçambique, Cuba, Venezuela. Então, será que o Sr. Lula fazia isso de graça? O que o senhor acha?
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - Senador, é uma pergunta que, da minha altura... Eu tenho 1,90m; minha altura não é de 2,50m. Eu não consigo, realmente, dar uma resposta precisa ao senhor, mas digo ao senhor o seguinte: o BNDES foi o mensageiro. Não é justo atirar no mensageiro. Tem que pegar quem resolveu, quem tomou a decisão de mandar aquela mensagem.
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O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Mas não havia ninguém para desconfiar lá dentro?
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - Não.
O BNDES é um órgão do Governo, Senador. Como é que ele vai dizer...
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Sim, mas um subordinado que suspeita do chefe, até por patriotismo, tem obrigação de dizer: "Espere aí, chefe, nisso aqui eu não entro. Nessa eu não entro."
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - Mas, Senador, as garantias eram excelentes. O Fundo Garantidor...
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - A tal ponto que Moçambique há três meses não paga as prestações.
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - O primeiro risco soberano foi Moçambique. E tem garantia do FGE. E também o BNDES é tão cauteloso, que pega garantias da CCR, conta-petróleo... Quer dizer, tem várias garantias.
Agora, evidentemente, a decisão política não foi dele. Eu não estou querendo dizer para o senhor que foi a decisão certa. Absolutamente. A decisão política não pertence a ele. Agora, ele, como um agente do Governo, não pode dizer não ao Governo facilmente. Não é fácil. Como no Banco Central, por exemplo. Se o Governo chegar lá e falar "vamos fixar a inflação em 3%", não é o chefe do departamento que vai dizer "não. Vamos fixar em 5%." Tem que pegar quem mandou fixar em 3%. Não é o funcionário do BNDES.
Eu acho que, aí... Se fizer auditorias, auditorias, auditorias numa instituição, nada vai mostrar má intenção dos funcionários, porque eles não têm nada a perder. Agora, existe má intenção política.
Eu acho o seguinte: é preciso, Senador, dar mais - aí eu concordo - governança política à instituição. Governança política! Aí é competência do Congresso.
O BNDES tem que ter uma menor ingerência política. Então, vamos ter o BNDES respondendo ao Congresso, como o Banco Central responde ao Congresso. Seus diretores são eleitos pelo Congresso.
Então, eu acho que a governança política centralizada no Presidente da República, apesar de ser uma governança executiva, não necessariamente é a melhor em termos democráticos.
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - É, eu agradeço, porque o Dr. Carlos está há pouco tempo... Ele não teve tempo ainda de investigar o que aconteceu lá no passado, e, a partir de agora, Presidente Alcolumbre, eu acho que viveríamos de opiniões, e nós precisamos de fatos.
Então, eu agradeço a oportunidade.
O SR. PRESIDENTE (Davi Alcolumbre. Bloco Social Democrata/DEM - AP) - Senador Roberto Rocha.
O SR. ROBERTO ROCHA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - MA) - Sr. Presidente, só para reiterar aqui a pergunta que foi feita pelo nosso colega Senador, porque me parece que não foi respondida, Dr. Carlos.
Quer dizer, parece que o BNDESPar tem participação em uma empresa sediada no exterior, que é o caso da JBS USA Pilgrim's. O regulamento... As regras do BNDES permitem isso?
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - Senador, deixe-me perguntar a quem está lá há mais tempo do que eu... (Fora do microfone.)
Veja bem, Senador: realmente, o BNDES não tem, em termos estatutários, participação em empresa no exterior, só empresas nacionais que estão lá fora. A JBS é do Brasil e está lá fora. Então, ele tem participações nela. Agora, participações em empresas não nacionais ele não tem, porque é proibido pelo seu estatuto.
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Agora, é uma boa pergunta a que o senhor me fez, Senador. É realmente... Foi um investimento com governança política? Esse é o ponto. Governança política é uma coisa; empresarial é outra.
O SR. ROBERTO ROCHA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - MA) - Agora, a JBS USA - o nome até está dizendo, JBS USA Pilgrim's - é uma empresa americana.
Mas eu compreendo, V. Sª chegou agora ao banco. E já deu a sua resposta.
Esperamos que, se eventualmente houver uma posição contrária ao que foi dito aqui, V. Sª possa nos encaminhar no mais breve espaço de tempo.
Estou satisfeito, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Davi Alcolumbre. Bloco Social Democrata/DEM - AP) - Gostaríamos de agradecer a participação do Senador Lasier, que, lógico, não faz parte desta Comissão Parlamentar de Inquérito, mas tem...
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Senador, estou entrando.
Houve uma desistência de um eminente Senador e foi oferecido o lugar, de modo que, provavelmente na próxima sessão, já estarei aqui. Não sei se como titular ou como suplente, mas estarei aqui.
O SR. PRESIDENTE (Davi Alcolumbre. Bloco Social Democrata/DEM - AP) - Mas nós gostaríamos de publicamente agradecer o interesse de V. Exª, que procurou esta Presidência e o Relator Roberto Rocha na semana passada, mostrando interesse em participar dessa discussão importante desta Comissão no Senado. E, com esta notícia que V. Exª traz ao Plenário desta Comissão, logicamente engrandecerá em muito os trabalhos desta Comissão Parlamentar de Inquérito.
Pergunto ao Sr. Carlos se ele gostaria ainda de tecer alguns comentários, logicamente com as suas considerações finais, e passar alguns informes desta Presidência.
O SR. CARLOS THADEU DE FREITAS GOMES - Bem, antes de mais nada, quero agradecer várias perguntas que foram muito úteis e importantes.
Agora, Srs. Senadores, há perguntas pontuais que o banco responde a qualquer momento. Ele é transparente. Qualquer pergunta pontual, podem nos endereçar, que vamos responder. Não temos nada a esconder. Agora, é impossível, num banco com 3 mil funcionários, um pobre diretor financeiro ter essa resposta pontual na mão.
Agora, o conceito, Senador, mais importante é o seguinte - e eu queria que a CPI tivesse isso em mente: a governança empresarial é importante. O banco tem. Não tem governança política. Então, se a decisão é dar ao banco governança política, que o tire da área executiva, presidencial, e o coloque, em parte, na área do Congresso, porque aqui os programas vão ser discutidos, deliberados, e vão ser também aprovados em última instância. Agora, enquanto houver uma deliberação única, executiva, política, falta governança. Ao faltar governança, realmente a ação empresarial é boa, mas não é a política.
Muito obrigado a vocês todos aí.
O SR. PRESIDENTE (Davi Alcolumbre. Bloco Social Democrata/DEM - AP) - Esta Presidência gostaria de passar um informe que é muito importante: já está disponível aos Senadores e Senadoras a possibilidade de se cadastrarem no sistema específico para ter o acesso aos documentos sigilosos recebidos pela Comissão.
Faço um ressalto de que o cadastramento é pessoal e exclusivo dos Senadores membros desta Comissão. E, ainda, cada Senador membro desta Comissão poderá indicar, em memorando encaminhado à Secretaria da Comissão, um assessor para obter acesso à documentação sigilosa. Este acesso será conferido aos assessores e aos Consultores Legislativos e de Orçamento do Senado Federal designados para assessorar a Comissão somente após a assinatura do termo de confidencialidade e sigilo. A Secretaria está à disposição para realizar o cadastramento nos gabinetes, de acordo com a disponibilidade de horário das Srªs e dos Srs. Senadores, ou aqui na Comissão durante as sessões.
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Outra informação: nós tínhamos encaminhado correspondência convidando algumas autoridades para que viessem participar da Comissão através de requerimentos aprovados pelo Plenário da Comissão. Na semana que vem... Conversando com os Parlamentares, como nós teremos uma semana curta, em virtude do feriado do dia 7, a Mesa Diretora desta Comissão achou por bem não convocar reunião da Comissão Parlamentar de Inquérito para a próxima semana. Portanto, fica convocada a reunião para o próximo dia 12/9, terça-feira, às 15 horas, com os seguintes convidados que já confirmaram participação: Sr. Andrea Calabi, economista com doutorado pela Universidade de Berkeley, confirmada; Sr. José Roberto Afonso, professor e pesquisador da Fundação Getúlio Vargas, confirmado; e Sr. Fernando Soares Vieira, Superintendente de Relações da Comissão de Valores Mobiliários, confirmado, para o dia 12, às 15 horas.
Nada mais havendo a tratar, agradeço a presença de todos os convidados e convocamos para a próxima reunião, com pauta a ser publicada oportunamente no dia 12.
Declaro encerrada a presente reunião.
(Iniciada às 15 horas e 35 minutos, a reunião é encerrada às 17 horas e 25 minutos.)