11/09/2017 - 4ª - Subcomissão Temporária do Estatuto do Trabalho

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Declaro aberta a 4ª Reunião da Subcomissão Temporária do Estatuto do Trabalho da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura.
A audiência pública de hoje será realizada nos termos do Requerimento nº 90, de 2017, desta Comissão, de nossa autoria e outros, para debater “Princípios da OIT e da Constituição para o trabalho”.
Esta audiência pública será realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. As pessoas que têm interesse em participar com comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania, link www.senado.leg.br/ecidadania, e do Alô Senado, através do número 0800-612211.
Eu já convido para a Mesa: o Dr. Helder Amorim, Procurador do Trabalho. Seja bem-vindo, Dr. Helder; e Maximiliano Garcez, Diretor para Assuntos Legislativos da Associação Latino-Americana de Advogados Laboralistas (Alal).
Ficou de vir a Drª Gabriela, professora na UnB; Luís Carlos Moro, advogado trabalhista; e Delaíde Arantes. Por problemas de tráfego, estão vindo ainda.
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Vou iniciar os nossos trabalhos - e não poderia ser diferente - falando sobre o que aconteceu mais uma vez com a nação indígena.
A manchete é esta: "Índios flecheiros morrem em massacre maior que o dos Ianomâmis". Tem uma foto aqui da área, feita pela Funai. São índios que viviam isolados nessa região, e houve um massacre.
Vamos ler a nota como uma forma de denunciar nesta Comissão mais esse crime feito contra a nação indígena, numa época em que o Presidente Temer resolve entregar parte da Amazônia para as mineradoras, caso que já foi denunciado não só no Brasil, mas no mundo todo. Ele deu uma recuada agora, fazendo outro decreto, dizendo que vai, por 180 dias, fazer uma discussão. O primeiro decreto que ele havia editado atingia inclusive a terra dos indígenas.
O Ministério Público Federal do Amazonas confirmou nessa sexta-feira, dia 8 passado, à Agência Amazônia Real, um dos dois massacres em investigação pela Polícia Federal contra índios isolados na terra indígena Vale do Javari, extremo oeste do Amazonas. As mortes, por garimpeiros, dos índios conhecidos como "flecheiros" aconteceu no mês de agosto, no Rio Jandiatuba, afluente do Rio Solimões, no Município de São Paulo de Olivença, na fronteira com Peru e Colômbia.
A outra investigação é sobre a morte dos índios isolados Warikama Djapar, mas não confirmada ainda pelo Ministério Público Federal. O caso, que aconteceu também na TI Vale do Javari, entre os Rios Jutaí e Jutaizinho, no mês de maio, foi denunciado por índios da etnia Kanamari. O suspeito de mandante seria um produtor agrícola, como publicou Amazônia Real nesta reportagem.
Para não prejudicar as investigações sobre as mortes dos índios "flecheiros", tanto o Ministério Público Federal quanto a Polícia Federal não informaram à reportagem dados importantes para o entendimento do caso, como: quantos índios efetivamente foram assassinados no ataque e por quais armas, além de quantos garimpeiros estão envolvidos no crime, que pode ser tipificado como genocídio contra uma etnia indígena. Mas objetos dos índios foram encontrados com garimpeiros por agentes federais. Em um áudio de celular, apreendido, a polícia encontrou relatos de garimpeiros sobre o massacre.
"Confirmamos que houve as mortes dos índios isolados e o MPF e a PF estão investigando", disse comunicado da assessoria de imprensa do MPF à reportagem da Amazônia Real.
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Em entrevista, o Procurador da República Pablo Beltrand, autor do pedido de abertura de inquérito à Polícia Federal, disse que "algumas pessoas (garimpeiros) estão sendo ouvidas e há diligências em curso. Não temos como dar detalhes sobre elas, no atual momento, para não atrapalhar a investigação", afirmou.
A denúncia da morte dos índios isolados "flecheiros" por garimpeiros aconteceu no mês de agosto e foi realizada pela Coordenação Regional da Funai em Tabatinga. Índios ouvidos pela reportagem disseram que o número de mortos ultrapassa 20 pessoas [20 índios assassinados ainda no mês de agosto e só veio à tona agora, no início de setembro].
Com a confirmação do massacre dos índios "flecheiros" pelo Ministério Público Federal do Amazonas, o caso passa a ser considerado a maior tragédia contra indígenas que vivem sem contato com a sociedade nacional da Amazônia brasileira após os assassinatos de 16 índios Ianomâmi da aldeia Haximu, em Roraima, por garimpeiros que invadiram a reserva para exploração ilegal de ouro, em 1993. [De lá para cá, esse foi o maior; naquele foram 16 assassinados]. Na ocasião, a Funai demorou para confirmar o número de mortes do massacre, que teve repercussão internacional [como está tendo, agora, este].
Até o momento a Presidência da Fundação Nacional do Índio (Funai), em Brasília, não confirma [não consegue dar dados sobre] o massacre de índios isolados "flecheiros" na TI Vale do Javari. O Ministério da Justiça, que também foi procurado pela reportagem, não se pronunciou ainda. Também não há informação se o Exército brasileiro irá apoiar as investigações, que acontecem em uma região de difícil acesso. Só helicópteros podem pousar e decolar nessa região de floresta densa da Amazônia.
Como vemos, é mais uma denúncia da maior gravidade, de índios covardemente assassinados. Foram citados pela reportagem três casos; com mais este, seriam 20 índios chamados flecheiros, que viviam isolados nessa área da Amazônia e que foram assassinados. E, segundo informações que nos chegaram, inclusive corpos foram esquartejados.
Drª Gabriela, por favor. Nós já a tínhamos chamado para a Mesa.
Drª Gabriela Neves Delgado, professora da UnB, seja bem-vinda. (Palmas.)
Nós queremos aqui, em nome da Comissão de Direitos Humanos, exigir a apuração dos fatos pela Polícia Federal, pelo Ministério Público Federal. Que o Ministério da Justiça se pronuncie e que o Governo se pronuncie.
A Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, até o momento, não disse nada; o Ministério da Justiça não disse nada. O fato é real. Os índios foram assassinados ainda no fim de agosto e somente agora, no dia 8, é que a notícia começou efetivamente a ser dada, informada ao mundo e ao Brasil.
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Nós temos outro caso que me trouxeram aqui também de um casal de camponeses, Urbano. Você talvez até conheça o caso.
Casal de camponeses é assassinado em Mato Grosso.
Teresinha Rios Pedroza e seu companheiro, Aluísio da Silva Lara, foram assassinados a tiros no sítio em que moravam na cidade de Nossa Senhora do Livramento.
Os corpos foram encontrados nessa quinta-feira [dia] (7) por um dos filhos do casal, na região conhecida como Mata Cavalo.
Um vizinho dos agricultores que mora a cerca de 500m relatou aos policiais que ouviu disparos de arma de fogo no dia anterior.
Ao chegar à cena do crime, os policiais encontraram também diversos animais mortos.
Os assassinos mataram porcos e galinhas do casal. Outros animais, como vacas [por exemplo, e cavalo] desapareceram. Teresinha era a atual presidente da União Nacional das Cooperativas de Agricultura Familiar e Economia Solidária de Mato Grosso.
A liderança tinha 55 anos e era filiada ao PT.
Nas últimas eleições, foi candidata a vice-prefeita.
Em nota, o Governo do Mato Grosso repudiou os assassinatos.
Como vemos, a violência... Não sei se o Urbano quer comentar alguma coisa. O Urbano poderia agora, inclusive, antes de iniciarmos os nossos painéis sobre esse caso... Talvez você acompanhou mais de perto, mas matança de índio e agricultor parece que virou coisa comum, normal, e ninguém se choca. Matam 20 índios, assassinam um casal de líderes da área rural e, a não ser a Comissão de Direitos Humanos, há alguma notinha no canto de página de algum jornal.
Por favor, Urbano, que é líder da Contag.
O SR. FRANCISCO URBANO - Presidente e outros membros, agradeço a oportunidade.
Conheci pessoalmente a companheira. Era uma grande lutadora, uma companheira firme, determinada, com uma capacidade de articulação enorme como cidadã, e tinha uma inteligência impressionante. Há muito pouco tempo, ela esteve na reunião da Contag junto com as cooperativas da agricultura familiar. O marido dela eu não conheci. Eu a conheci efetivamente.
Como você disse, Senador, está virando uma brincadeira matar camponeses, matar lideranças, matar índios. Virou uma coisa comum...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Quilombola também.
O SR. FRANCISCO URBANO - Quilombola.
Sem nenhuma reação... Por muito menos que isso, eu já vi reação muito maior neste País. Com o que está acontecendo com a nossa sociedade? Os próprios movimentos como um todo não conseguem, de imediato, ir lá, por exemplo, de forma organizada, criar mais um fato político e denunciar.
Eu não sei se... Realmente fica difícil de a gente compreender isso. Infelizmente eu não sou mais dirigente, eu sou só sindicalista de coração. Eu faço assessoria na Contag, aqui no Congresso, acompanhando os projetos.
A Contag tem tentado se mexer com isso, mas é preciso a base também lá. A base precisa criar uma reação para obrigar as suas lideranças a também tomar suas decisões. Se a liderança vizinha dos trabalhadores na vizinhança aceita isso pacificamente, porque a gente não consegue uma informação de qual foi a razão... Tudo leva a crer que é um crime da luta. Não é um crime de problemas. Ela não tinha problema nenhum com ninguém.
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Não foi um assalto.
O SR. FRANCISCO URBANO - Não, não foi assalto. O assalto se deu depois levando os animais dela. O porco era mais difícil de levar, talvez a galinha, mas a vaca levaram muito fácil.
O Governador simplesmente se congratula com as pessoas e diz: "Não, ela era minha amiga. Eu gostava muito dela. Era uma amiga de tantos..." Você imagina como era uma líder ativa de o próprio Governador dizer que tinha uma relação de amizade muito grande com ela, porque a conhecia das lutas. Então, ela era uma líder efetiva. Não era uma pessoa desconhecida. O assassinato dela tem a ver com a política mesmo que ela exercia.
A Diretoria da Contag está reunida agora para ver que medida toma do ponto de vista de mobilizar com a federação, com os sindicatos vizinhos para ver que medida pode ser tomada, tomando como base outros elementos do próprio Mato Grosso. Nós temos hoje... É assustadora a quantidade de assassinatos. Nesse caso dos índios, já vem sendo anunciado há tempos que esses índios que não são adestrados já estavam sendo perseguidos pelos garimpeiros, mas também ficou quieto. Agora há um assassinato brutal e você não tem uma reação. O Ministério da Justiça parece que virou um reconhecedor do assassinato porque era bom que matasse. É um pouco o que acontece com este Governo de hoje.
Eu acredito que nós vamos ter, em algum momento, uma reação da sociedade quanto a essa barbárie que está sendo feita ou no direito ou na vida das pessoas.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Urbano.
Eu vou propor - as notícias estão chegando truncadas agora ainda - que a gente faça um minuto de silêncio, com palmas no final para a luta da nossa gente, dos índios, dos quilombolas, desse casal assassinado. A luta continua.
Eu estou que nem você, eu estou com a voz deste jeito. Eu viajo de segunda a segunda e sinto o povo meio desanimado, mesmo aqueles que sinceramente torciam pelo afastamento da Dilma, como aqueles que eram contra o afastamento, ambos estão desanimados. Aqueles que torciam chegaram à conclusão de que piorou muito mais em relação àquilo que era antes. Programas sociais estão desaparecendo, criminalizar movimento social virou agora moda.
Para se ter uma ideia, eu fui ao Grito da Terra, em Porto Alegre. De políticos que subiram ao palanque, só havia eu e o Presidente da Assembleia. Não estou dizendo que outros podiam estar fazendo outras agendas. Quando nós vimos, era em torno de um mil, 1,5 mil pessoas que estavam cercadas. O Grito da Terra normalmente faz o ato e depois sai em caminhada. Muitos trabalhadores rurais estavam cercados por cavalaria. Havia até tanque em volta. Nós ficamos numa praça totalmente cercada pelas forças da repressão, dizendo: "Daqui vocês não podem sair, só podem ficar aqui." Eu nunca vi isso, nunca vi nem na época da ditadura, sinceramente eu sou obrigado a dizer isso.
Eu disse que, na época da ditadura, saí de Canoas com três mil homens, entrei pela BR, entrei pela avenida principal, cheguei em frente ao palácio e havia em torno de 20 mil homens. Isso em plena ditadura, exigindo o fim da ditadura, a democracia, emprego, renda - e o povo passando fome. E não aconteceu nada. Nós ali com 1,5 mil pessoas não podíamos nos mexer dali. Não podíamos mesmo, tanto é que eu tive de ir para o Parque da Harmonia visitar depois as cabanas lá. Mas não houve caminhada, não houve nada.
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É uma ditadura disfarçada, digamos; ou, como dizem - eu não gosto do termo porque é pejorativo pela cor -, uma ditadura branca; outros dizem ditadura preta. Nada disso. É uma ditadura disfarçada mesmo, que começou aqui com um golpe parlamentar, que não aceita reação nenhuma. E parte do nosso povo está imobilizado mesmo, como você falou.
Eu falava agora mesmo com o Presidente da Anfip: neste momento, mais do que nunca, nós devíamos estar mobilizados. Assuntos como esse que vamos tratar aqui hoje e a reforma da previdência... Porque eles ficam toda hora ameaçando também tirar os direitos dos aposentados e daqueles que sonham em se aposentar, quando deviam cobrar dos grandes devedores e não cobram. E ainda isto agora: por qualquer coisa, eles matam, e fica tudo por isso mesmo. E o tal de Presidente não é nem julgado pelo Supremo, com três processos crime, porque a Câmara não autoriza.
Isso criou uma paralisia praticamente nos movimentos, que têm que reagir. Eu estou apostando muito, Maximiliano, nesse evento lá de São Paulo, que vão fazer quinta-feira. Vai ser na assembleia, vamos fazer um evento da CPI da Previdência, em que a pedra de toque, como dizem, são os grandes devedores. É para discutir por que.... Segundo aquele Procurador de São Paulo, Paulo Penteado, ele diz que, se nós pegarmos um prazo de 20 anos e se tivessem cobrado corretamente, nós teríamos aproximadamente R$7 trilhões. Ele me mandou um documento esse fim de semana e ele vai falar lá - não vou dar mais detalhes porque ele vai mostrar lá. Eu trabalhava sempre com R$50 bi, em média, de superávit por ano, mas ele disse que não: se não tivessem dado o Refis, ou tantos Refis, dado anistia, retirado a contribuição do empregador - e não recolheram aquela parte que a Constituição manda, faturamento, lucro, PIS/Pasep, loteria, empregado-empregador, enfim, toda a operação de compra e venda que a gente faz - eu pelo menos quando eu comprei a minha casinha lá eu tive que pagar a previdência -, diz ele que se acumular tudo e fosse uma dívida real, dívida real que eu digo é o cálculo real que tivesse sido feito, daria em torno de R$7 trilhões. Ele vai documentar lá em São Paulo e vai divulgar isso.
E não acontece nada. E eu pergunto para os procuradores da fazenda com quem estive aqui e eles dizem que parece que há um processo articulado de sabotagem para não haver a grande cobrança. Eles falaram isso, mas eles não usaram o termo sabotagem. Eles dizem que desestruturam a capacidade de eles fazerem a cobrança dos grandes devedores.
O SR. FRANCISCO URBANO (Fora do microfone.) - Basta ver a reação disso com relação ao...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - É, não avançam uma linha e só retiram, só retiram, só retiram, só retiram... Por isso que agora nós, nessa de São Paulo, vamos tentar fazer então uma atividade de peso lá e começar a mobilizar de novo em todo o País.
Vamos fazer um minuto de silêncio em respeito à luta... (Falha na gravação.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - ... em Mato Grosso, e dos 20 índios assassinados também lá na Amazônia.
(Faz-se um minuto de silêncio.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - As palmas para aqueles que continuam lutando, peleando, buscando, investigando, indo para cima; e que eles lá no alto estejam olhando, pois os estamos homenageando aqui.
Queria registrar a presença do Procurador do Trabalho, Dr. Carlos Eduardo de Azevedo Lima, da Secretaria de Relações Institucionais. Outros que quiserem a citação é só mandarem para a Mesa que a gente faz o registro.
Vamos começar pela lista que temos aqui. Então, iniciamos com o Dr. Helder Amorim, Procurador do Trabalho, para falar...
(Intervenções fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Pois não, meu amigo. Você foi contemplado para ser o primeiro.
O SR. HELDER AMORIM - Exmo Sr. Senador Paulo Paim, Presidente desta Comissão de Direitos Humanos e também da Subcomissão Temporária do Estatuto do Trabalho, da Comissão permanente, para elaboração do Estatuto do Trabalho; querida colega Gabriela Neves Delgado, amiga, professora; Maximiliano, que é o nosso companheiro também de reflexões sobre o mundo e o Direito do Trabalho; senhores presentes; senhoras presentes; é uma satisfação imensa.
O Ministério Público do Trabalho se faz presente então e agradece, Senador, o convite para dialogar e refletir sobre o tema relativo aos princípios da OIT e também relativo aos princípios constitucionais que devem orientar a elaboração de um Estatuto do Trabalho.
É a ideia de pensar o futuro num momento de crise, e é por isso que é desafiador, profundamente desafiador, no momento em que o Direito do Trabalho sofre, na história brasileira, seu mais pungente ataque. A reforma trabalhista certamente, veiculada por meio da Lei 13.467, representa um ataque profundo à matriz filosófica do Direito do Trabalho.
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Não é nosso papel, neste momento, fazer a análise da reforma, mas, certamente, a posição do Ministério Público do Trabalho, veiculado por meio de suas notas técnicas, já deixa evidente a nossa discordância, profunda discordância com os princípios da reforma trabalhista, porque tem por objetivo certamente enfraquecer a matriz filosófica do Direito do Trabalho e, principalmente, enfraquecer a eficácia dos direitos fundamentais dos trabalhadores.
Estamos, portanto, diante de um grande desafio, que é pensar os direitos fundamentais sociais dos trabalhadores na perspectiva de futuro, de resistência e, principalmente, de afirmação num momento de profundo ataque. Pelo Ministério Público do Trabalho, eu digo com base nas premissas que temos firmado nas nossas discussões e nos documentos veiculados pelo Procurador-Geral do Trabalho, eu falo com absoluta tranquilidade, na linha de raciocínio, então, já desenvolvida pelos colegas do MPT, no sentido de que o grande desafio do Direito do Trabalho nos próximos tempos será retomar a sua matriz filosófica, portanto, o sentido de existência de um direito que se apartou historicamente de um ramo da ciência jurídica, que se desvencilhou do Direito Civil...
Eu faço uma pausa para que o Senador possa convidar a Ministra...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Com enorme satisfação, convidamos para a Mesa a Ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Drª Delaíde Arantes. Por favor, Ministra, seja bem-vinda. (Palmas.)
Volto a palavra para o Dr. Helder Amorim, Procurador do Trabalho. Já na Mesa agora a Ministra Delaíde Arantes, do Tribunal Superior do Trabalho.
O SR. HELDER AMORIM - Cumprimento a Ministra Delaíde.
Dando continuidade à nossa fala, Ministra, sobre a importância da reflexão sobre os princípios que norteiam os direitos fundamentais dos trabalhadores na Constituição de 1988, aos quais nós operadores do Direito, a legislação ordinária infraconstitucional deve absoluto respeito. Inspirado nesse sentimento, então, eu trago aqui algumas reflexões.
Os princípios, como eu disse, são o fundamento, o espírito dessa disciplina jurídica, o Direito do Trabalho, que nasce da necessidade de distinção, no conjunto do Direito, de um conjunto de medidas legislativas voltadas à proteção do trabalhador hipossuficiente, porque, historicamente, o Direito Civil se tornou insuficiente para regular essa específica relação de trabalho marcada pela desigualdade socioeconômica.
Veja, o Direito tem, a partir da concepção do Estado moderno, como sua grande ambição a afirmação da liberdade. Não é à toa que o art. 1º da Convenção dos Direitos do Homem e do Cidadão, que nasce da Revolução Francesa, tem lá em seu art. 1º a proclamação do direito à liberdade.
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Todos os homens nascem e são livres em direitos. Já nascem livres e são livres por direito natural. Essa liberdade, traduzida nas relações de trabalho, se tornou impossível a partir de determinada quadra da história em que, na Revolução Industrial, a partir, principalmente, do processo de massificação das relações de trabalho, o homem trabalhador não conseguiu se afirmar nas relações individuais como empregador, porque lhe faltava a condição material, socioeconômica para negociar as condições do seu trabalho.
A partir desse momento, vem a ideia de que essa liberdade entre o pobre e o rico, entre o fraco e o pobre, escraviza e somente a lei e o direito é capaz de garantir a efetiva liberdade. O Direito do Trabalho nasce dessa perspectiva de que era preciso romper com os princípios, ou, pelo menos, com o princípio da igualdade formal em que se fundam as relações de trabalho no âmbito civil e instituir uma nova ordem de princípios fundados na necessidade de proteção jurídica ao trabalhador, ao hipossuficiente, para que se restabeleça no plano jurídico a igualdade e a liberdade que, no plano fático, careciam.
É nesse sentido que o Direito do Trabalho nasce comprometido com a proteção do hipossuficiente. Na gênese do Direito do Trabalho há uma cláusula de proteção sem a qual esse ramo jurídico sequer se justifica.
E os princípios do Direito do Trabalho como disciplina jurídica autônoma estão todos fundados nessa noção da necessidade de proteção especial ao hipossuficiente como instrumento de afirmação da sua liberdade, principalmente porque, a partir da afirmação dos direitos sociais, econômicos e culturais como direitos humanos, a civilização ocidental passa a reconhecer que sem uma condição material mínima para o exercício de suas liberdades políticas individuais, não há possibilidade de se assegurar efetiva liberdade ao cidadão. Então, o Direito do Trabalho tem compromisso com a liberdade no plano fático e, portanto, no plano da execução das relações de trabalho.
Bem, o Direito do Trabalho, então, se desvencilhando do Direito Civil, se afirma com base em princípios que foram muito bem identificados pelo uruguaio doutrinador Americo Pla Rodriguez, que podemos rememorar rapidamente. Num determinado momento, no curso do início, meados do século XX, Senador, em que o Direito do Trabalho estava se afirmando a partir de princípios que tinham uma finalidade - aqui eu chamo a atenção, era um primeiro momento de descrição dos princípios do Direito do Trabalho -, eles tinham muito mais a finalidade de descrever o espírito das normas ordinárias protetivas do trabalhador do que mesmo se afirmar como normas jurídicas.
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Naquele momento os princípios tinham uma finalidade muito particular. E quais eram essas finalidades dos princípios do Direito do Trabalho? Primeiro, uma finalidade inspiradora do legislador, o princípio de proteção e todos os outros subprincípios que dele se originavam tinham, então...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Só para convocar para a Mesa já Luís Carlos Moro, advogado trabalhista, para ficar a nossa Mesa completa. Seja bem-vindo.
Pode continuar tranquilo.
O SR. HELDER AMORIM - Então, neste primeiro momento, Senador, os princípios tinham uma finalidade orientadora do legislador, uma finalidade também integradora da norma jurídica. Esse princípio de proteção orientava o aplicador do Direito, especialmente do Direito do Trabalho, nas situações em que não houvesse normas específicas disciplinando determinada situação ou determinada relação jurídica. Então, a legislação e a nossa CLT, inclusive, prevê, no art. 8º, que os princípios gerais de direito podem ser utilizados para integrar a norma jurídica, no sentido de colmatar determinadas lacunas do ordenamento jurídico trabalhista. Então, o sentido de proteção deve orientar o aplicador, inclusive quando não houver norma específica para determinadas situações.
Por fim, uma terceira função importantíssima é a função interpretativa. Ou seja, diante das várias possibilidades de que uma norma jurídica possa suscitar, o princípio tem a finalidade de orientar o aplicador, na norma jurídica, a adotar a posição, a solução jurídica que seja mais condizente com o princípio da proteção.
Como antes eu estava comentando, o doutrinador Américo Plá Rodriguez identificou princípios que, de certa forma, se cristalizaram...
(Soa a campainha.)
O SR. HELDER AMORIM - ...no Direito do Trabalho. Do princípio da proteção nasce o princípio do in dubio pro operario, situação em que, havendo dúvida sobre a norma aplicável ou sobre a situação jurídica a ser adotada, deve-se prestigiar aquela que proteja o trabalhador; o princípio da norma mais favorável, havendo variedade de normas aplicáveis à mesma situação, deve-se prestigiar a norma que favoreça a matriz filosófica do Direito do Trabalho, que é a proteção do trabalhador; também o princípio da condição mais benéfica, diante de situações concretas em que condições de trabalho sejam disciplinadas para uma mesma situação deve se prestigiar aquela condição mais benéfica; princípio como o da irrenunciabilidade dos direitos dos trabalhadores, fruto da premissa de que os direitos legais dos trabalhadores se fundam em normas imperativas, porque o Direito do Trabalho, para se afirmar do ponto de vista principiológico, teve também que se construir sobre normas imperativas, que substituíam a vontade das partes pela vontade da lei, exatamente para afirmar a liberdade do trabalhador, que, individualmente, não tinha condição de negociar suas condições de trabalho num patamar mínimo de dignidade; o princípio da irrenunciabilidade dos direitos, ou, como diz o Ministro Godinho, com muita percuciência, o princípio da indisponibilidade dos direitos, um princípio que impede a renúncia unilateral de direitos pelo trabalhador, coagido pela pressão econômica própria da relação de desigualdade fática no trabalho, que impede o trabalhador de promover transações, acordos que lhe sejam prejudiciais, se esses acordos estiverem contaminados por vício de manifestação de vontade.
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Princípio também importantíssimo é o princípio, que decorre da proteção, da continuidade, a premissa da continuidade do vínculo, porque a proteção do trabalhador pressupõe um vínculo com o empreendedor que seja estável no tempo e também integrador desse trabalhador à vida comunitária da empresa.
Premissa que é muito, muito importante para a construção do Direito do Trabalho, do trabalho livre, o Direito que disciplina o trabalho livre e que confere dignidade ao trabalhador, é também, Senador, o princípio da inseparabilidade entre a pessoa do trabalhador e o resultado do seu trabalho, porque nesse princípio reside outro fundamento que, desde a Declaração da Filadélfia, na constituição da OIT, deve orientar toda a construção do Direito do Trabalho: o princípio de que o trabalho não é mercadoria.
Foi exatamente para retirar o trabalho do mundo do comércio, como objeto do comércio, como coisa passível de comercialização que o Direito do Trabalho se aparta do Direito Civil, para conferir liberdade a um trabalhador hipossuficiente, conferindo-lhe direitos que são de plano irrenunciáveis, porque indispensáveis à proteção de sua dignidade.
Se trabalho não é mercadoria, o trabalhador deve ser inserido na empresa, no empreendimento, não como um objeto ou como uma coisa, mas deve ser inserido como pessoa, cuja dignidade deve ser protegida pela lei, pela legislação, pelo Direito, e, para isso, deve o empreendedor acolher esse trabalhador em sua dimensão humana.
Essa presença, portanto, do trabalhador deve ser minimamente estável no tempo e deve ser integradora no sentido comunitário de que a empresa deve ser o espaço também de promoção das potencialidades desse sujeito que trabalha, que contribui para o crescimento da empresa, para a produção do lucro legítimo, o lucro como resultado da livre iniciativa, mas que deve ter, portanto, a sua dignidade preservada por meio de direitos que assegurem seu patamar mínimo econômico digno, portanto como sujeito de direitos.
Então, essas são as premissas sobre as quais o Direito do Trabalho foi construído e sem as quais não se pode pensar uma disciplina jurídica voltada a proteger a figura do trabalhador.
Esses são os elementos básicos, que estão agora, neste momento, em profundo risco diante da reforma trabalhista, porque não se trata de uma reforma simplesmente redutora de direitos.
(Soa a campainha.)
O SR. HELDER AMORIM - Trata-se de uma reforma que ameaça profundamente esse sentido filosófico do Direito do Trabalho. Por quê? Ela ameaça, essa reforma? Ameaça: a imperatividade dos direitos dos trabalhadores, tornando as normas ou pelo menos tentando tornar as normas trabalhistas normas negociáveis. Ela retira o trabalhador do espaço comunitário da empresa por meio das terceirizações e dos contratos flexíveis, ultraflexíveis, tratando e dispensando ao trabalhador um tratamento que coisifica o trabalho e que, portanto, descarta a sua importância como sujeito de direitos.
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Essas ameaças é que conduzem a nossa profunda preocupação com o futuro não apenas do Direito do Trabalho como disciplina jurídica, mas com o futuro das relações de trabalho pautadas em critérios mínimos de humanidade, como destacado, como garantido pela Constituição de 1988.
Então, num primeiro momento, esses princípios eram muito mais descritivos de um modo de ser do Direito do Trabalho do que mesmo normas jurídicas vinculativas do comportamento humano. O que aconteceu, a partir da Constituição de 1988, foi que esses princípios foram alçados, elevados à condição de normas jurídicas.
E como isso ocorreu? Ocorreu que a Constituição de 1988 inaugura um processo que, desde as Constituições anteriores à de 1934, já se havia iniciado. As Constituições anteriores previram direitos dos trabalhadores no capítulo da ordem econômica ou da ordem econômica e social, mas somente a Constituição de 1988 fundamentalizou o direito dos trabalhadores, trazendo esses direitos para o capítulo das garantias individuais e coletivas, dos direitos fundamentais.
Portanto, o direito dos trabalhadores, hoje previstos nos arts. 7º a 11 da Constituição, passaram, então, a ostentar status de direitos fundamentais e, portanto, como fundamentais, indispensáveis ao próprio Estado democrático de direito, premissas de existência do Estado democrático.
Pois bem, com isso, a Constituição eleva esses direitos à categoria, portanto, de balizas mínimas indispensáveis à manutenção da condição digna, material, de vida do homem que vive do trabalho, destituído de riquezas e que tem apenas o trabalho como seu sustento, como fonte de sua sobrevivência e de sua família.
E, na Constituição, nós encontramos todas aquelas diretrizes que orientaram a construção do Direito do Trabalho, a que me referi, todas aquelas diretrizes agora alçadas à condição de normas jurídicas.
Bem, aí inicio, falando do princípio da proteção do hipossuficiente. Esse princípio está expresso no art. 7º, inciso I, da Constituição, que trata como direitos dos trabalhadores urbanos e rurais o direito à relação de emprego protegida contra a despedida arbitrária.
Ao tratar de relação de emprego, a norma constitucional se apropria de um conceito que é um conceito-chave, é o conceito fundamental do Direito do Trabalho, porque é a partir da concepção da relação de emprego que o Direito do Trabalho constrói todo o seu edifício normativo, partindo do princípio de que essa relação se configura no mundo dos fatos, independentemente da vontade das partes, sempre que presentes determinados requisitos. E o fundamental qual deles é? A subordinação jurídica.
A subordinação jurídica é um elemento que está presente na configuração da relação de emprego em diversos países, reconhecido pelo Direito Internacional como um critério definidor de uma específica relação de trabalho, protegida pelas normas internacionais da OIT, protegida pelas normas de direitos humanos, inclusive, da ONU e pelas legislações nacionais.
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Portanto, quando a Constituição se apropria de um conceito construído num longo processo histórico, inclusive um processo histórico internacional, já confere a esse conceito um conteúdo de sentido. Não é, portanto, uma noção aberta à manipulação grosseira do legislador infraconstitucional.
(Soa a campainha.)
O SR. HELDER AMORIM - É um conceito que está conformado historicamente e que, portanto, deve ser tomado pelo legislador infraconstitucional como um conteúdo de sentido predeterminado.
E parte esse conceito do princípio de que é necessário preservar as condições fáticas da relação de trabalho e prestigiá-las em detrimento das declarações de vontade das partes, porque a mera celebração de um instrumento formal não é suficiente para afastar a relação de emprego e, afastando, portanto, a relação de emprego, afastar todos os direitos que estão previstos na Constituição e nas leis.
Isso é matéria elementar, que nós aprendemos nos bancos da escola do Direito do Trabalho e que infelizmente temos que rememorar aqui, numa audiência pública, num momento de profunda ameaça aos elementos essenciais, eu diria, não só ao Direito do Trabalho, já disse, mas aos direitos fundamentais.
Veja em que momento, em que encruzilhada nos encontramos.
Então, uma legislação que se preste a preservar a constituição da República, no sentido de garantir eficácia aos direitos fundamentais dos trabalhadores deve primar por esses princípios, o princípio de que a relação de trabalho é uma relação entre desiguais, porque, se não fosse uma relação entre desiguais, não haveria necessidade de um art. 7º garantir direitos aos trabalhadores. Bastaria, então, reservar esses direitos, por exemplo, à regulação do Direito Civil.
Qual a necessidade de direitos dos trabalhadores previstos numa Constituição, se não fosse essa finalidade, a de preservar a igualdade das partes numa relação de desiguais, entre um hipossuficiente e um empreendedor econômico, por meio de normas interventivas, inclusive...
(Soa a campainha.)
O SR. HELDER AMORIM - ...na sua autonomia de vontade.
Portanto, esse é um elemento que a reforma trabalhista ameaça profundamente, quando tenta instituir a prevalência das negociações, inclusive individuais, como instrumento de derrogação de direitos fundamentais.
Nós estamos diante de ameaça do legislador ordinário, que está subvertendo a ordem hierárquica das normas na reconhecida pirâmide normativa kelseniana, em que a Constituição figura no ápice como fonte de validade das normas jurídicas.
Estamos diante de um momento de uma encruzilhada, Senador, dificílima, porque a interpretação dessas normas, que certamente se dará pela Justiça do Trabalho, quando houver de fazê-la, pelos atores sociais e pelo Supremo Tribunal Federal, se não for feita com absoluto rigor e com absoluta fidelidade a essa matriz filosófica dos direitos fundamentais, poderá certamente subverter todos os elementos principiológicos que justificaram, iluminaram o legislador constituinte de 1988. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Mutila a própria Constituição. Muito bem.
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O SR. HELDER AMORIM - Mutila a Constituição profundamente, porque não se trata, então, de uma reforma que ameaça a redução de direitos, mas de uma reforma que pode, sim, ser exterminadora dos direitos
pode, sim, ser exterminadora dos direitos fundamentais dos trabalhadores e que não são direitos que foram alçados como uma concessão do Estado, mas que são direitos que foram conquistados num longo processo histórico de afirmação dos direitos dos trabalhadores, inclusive um processo de afirmação dos direitos coletivos. É sobre isso que o Ministério Público do Trabalho tem falado...
(Soa a campainha.)
O SR. HELDER AMORIM - ...em todas as oportunidades.
Fale-me do tempo, por favor, Senador, para finalizar.
Em todas as oportunidades em que podemos falar a respeito do tema, nós temos dito que basta nós olharmos para 1988; a inspiração do legislador constituinte; as normas constitucionais que garantem os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, art. 1º, inciso IV; a dignidade da pessoa humana como uma matriz axiológica, valorativa de toda a construção constitucional, art. 1º; os objetivos da República Federativa do Brasil, que instituem um princípio de justiça social, finalidades de erradicar a pobreza, a marginalização, de reduzir as desigualdades sociais; o princípio da valorização do trabalho como base da ordem econômica; a busca do pleno emprego, no inciso VIII do art. 170 da Constituição; o primado do trabalho como base de uma ordem social justa. São princípios que orientam, portanto, a interpretação dos direitos fundamentais dos trabalhadores e que, a partir da Constituição de 1988 e movidos por um processo de afirmação dos princípios como normas jurídicas, o que acontece também na segunda metade do século XX, como uma, digamos, guinada doutrinária hermenêutica no sentido da afirmação dos princípios jurídicos como normas, trazem-nos a certeza de que a Constituição Federal de 1988, Senador, foi, sim, concebida como uma trincheira de resistência à vontade do legislador ordinário e das maiorias que são democráticas, mas uma trincheira de resistência à superflexibilização ou desregulação dos direitos sociais.
Então, o que desejamos - e o Ministério Público do Trabalho se coloca hoje como um instrumento de afirmação desses direitos e de luta pela afirmação desses direitos - é que o novo estatuto...
(Soa a campainha.)
O SR. HELDER AMORIM - ...que aqui se sonha seja, sim, instrumento de resgate desses princípios e de afirmação da nossa Constituição cidadã.
Eu agradeço profundamento e me ponho à disposição para esse debate. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Procurador do Trabalho Dr. Helder Amorim, meus cumprimentos pela bela exposição.
Passamos agora para a Professora da UnB, Drª Gabriela Neves Delgado.
O SR. GABRIELA NEVES DELGADO - Bom dia a todos e a todas.
Cumprimento o Senador Paulo Paim pelo convite. Obrigada, Senador, pela oportunidade de dialogar neste momento. Estendo os cumprimentos aos demais presentes.
Sem mais delongas, eu já queria dar início à avaliação do que foi esse trajeto, no Direito do Trabalho, de construção de um sistema de Direito do Trabalho que protege o sujeito trabalhador a partir do vetor, do valor fonte da dignidade do ser humano. É claro que esse trajeto de institucionalização de um sistema constitucional de proteção ao trabalho humano foi permeado, na história brasileira, por fluxos e refluxos de proteção ao trabalho.
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Então, nesse sentido, nós podemos aqui rememorar, para não nos alongarmos e caminharmos para uma busca de uma memória mais antiga da construção do Direito do Trabalho, e devemos aqui partir da Constituição Federal de 1988, que institucionaliza, inclusive sob o ponto de vista topográfico, todo um sistema de proteção ao sujeito trabalhador a partir de uma complexidade principiológica absolutamente distinta daquela que se pôs nas Constituições anteriores.
Antes de nós adentramos na análise específica da Constituição de 1988 e do sistema internacional de direitos humanos trabalhistas, eu queria aqui destacar os refluxos que o Brasil sofreu no pós-1988 e qual é o papel nosso, como estudiosos e juristas do Direito do Trabalho, para promover uma recuperação desse mapa cognitivo do Direito do Trabalho, que, como dito aqui pelo Procurador Helder Amorim, é um mapa cognitivo fundado na dignidade da pessoa humana.
Lembro também que a positivação da norma não finaliza o processo de afirmação da norma. Se direito é luta e organização, a partir desse refluxo intenso e jamais visto na realidade brasileira, que foi a positivação da reforma trabalhista, dada pela Lei 13.467, de 2017, nós precisamos retomar e repensar como estabelecer novamente essa referência cognitiva do Direito do Trabalho, essa retomada da matriz principiológica e filosófica do Direito do Trabalho.
É interessante observar que, nos anos de 1990, nós tivemos, no Brasil, uma absorção do pensamento neoliberal, com políticas de flexibilização de direitos e de desregulamentação dos direitos sociais. A Constituição de 1988, diga-se de passagem, quando estabeleceu hipóteses flexibilizatórias, estabeleceu hipóteses flexibilizatórias pontuais, taxativas em três situações específicas, quais sejam redução do salário por instrumento coletivo negociado, incremento da jornada de trabalho em turnos ininterruptos de revezamento de seis para oito horas por instrumento coletivo negociado e a possibilidade do sistema de compensação, mas especificamente do banco de horas, por instrumento coletivo negociado.
Essa possibilidade flexibilizatória, portanto, na perspectiva constitucional brasileira, foi dada a partir da utilização dos instrumentos coletivos negociados em respeito ao princípio da adequação setorial negociada, o que significa que direitos de indisponibilidade absoluta não podem ser flexibilizados e que o parâmetro internacional de proteção aos direitos humanos, da progressividade social e da vedação do retrocesso são pilares para a instrumentalização dos instrumentos coletivos.
Nos anos de 2013 e 2014, nós tivemos uma retomada da generalização do Direito do Trabalho na economia e na sociedade, momento de efervescência dos princípios constitucionais de proteção ao trabalho, momento de maior inclusão social protegida dos sujeitos trabalhadores no mercado de trabalho brasileiro, mas novamente nós tivemos um momento de refluxo nesse sistema de proteção social, sobretudo nos anos de 2015 e 2016, com a afirmação do golpe institucional parlamentar, com a PEC 55, que consolida esse padrão neoliberal no Estado brasileiro finalmente com a reforma trabalhista.
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A reforma trabalhista foi construída a partir de uma figura de institucionalização dos mitos da modernização do Direito do Trabalho e do trabalho no Brasil como se a retomada de uma política de afirmação desproporcional da autonomia da vontade nos contratos individuais pudesse garantir uma posição de maior proteção ao sujeito trabalhador - grande falácia.
Na realidade, o que se estabelece com a reforma trabalhista é uma retomada da realidade jurídica dantesca da Primeira República brasileira, porque nós institucionalizamos uma servidão voluntária nos espaços dos contratos individuais de trabalho e também das negociações coletivas trabalhistas.
Eu sei que este não é o objetivo da fala, mas nós precisamos retomar...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Mas é, sim.
O SR. GABRIELA NEVES DELGADO - Então, ótimo, vou seguir adiante.
Nós precisamos, de toda sorte, retomar, diagnosticar esse período de refluxo para pensar quais são os caminhos de retomada desse mapa cognitivo de proteção do Direito do Trabalho. E, se o direito e o Direito do Trabalho devem ser compreendidos como espaços de luta e de organização, esses espaços de luta e de organização foram colocados, na realidade fática, através de alguns movimentos importantes que se estabeleceram nesse contexto de adversidade. Então, nós podemos aqui relembrar, por exemplo, a carta dos ministros do TST em homenagem à Ministra Delaíde, que é subscritora da carta, que foi uma carta que se posicionou de uma forma muito veemente, um mês após a aprovação da lei da reforma, no sentido de dizer dos riscos de...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Dezessete ministros.
O SR. GABRIELA NEVES DELGADO - Isso, 17 dos 27 ministros se posicionaram no sentido de demonstrar os riscos de absorção dessa reforma trabalhista que estabelece uma figura novamente de um capitalismo sem peias na realidade brasileira.
Na mesma linha de mobilização social, nós podemos fazer aqui uma referência importante à posição do Senador Paulo Paim, que, desde a discussão da terceirização trabalhista e dos riscos de uma construção desregulada de um sistema de terceirização trabalhista no Brasil, vem estabelecendo audiências públicas permanentes Brasil afora, com a participação do Max, para discutir quais devem ser os controles civilizatórios à terceirização trabalhista. Na mesma linha, as associações de classe, a ANPT, a Anamatra e a academia, que também se mobilizam em torno dessa retomada de um sistema de proteção concertado em torno do Direito do Trabalho.
Então, esse é o cenário no qual nós nos incluímos hoje, um cenário de refluxo no sistema de proteção ao trabalho. E aí a pergunta vem: como retomar a matriz filosófica do Direito do Trabalho e esse mapa cognitivo do Direito do Trabalho, que tem como referência o hipossuficiente, a partir de uma compreensão de direito fundamental ao trabalho digno? Quais seriam, portanto, as telas de proteção social do Direito do Trabalho que devem ser absorvidas pelo estatuto do trabalhador, pelo Estatuto do Trabalho?
Essas telas de proteção social estão afirmadas na Constituição de 1988 e no sistema internacional de proteção aos direitos humanos trabalhistas.
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A Constituição de 1988, inclusive topograficamente, como já disse o Procurador Helder, estabelece uma mudança, um giro hermenêutico no sistema de proteção à pessoa, porque estabelece, nos dois primeiros títulos, proteções fundamentais à pessoa que vive do trabalho, elegendo uma série de direitos fundamentais que anteriormente eram estabelecidos nos textos constitucionais somente depois da distribuição de competências pelos Estado, União, Distrito Federal e Municípios.
Então, na realidade, a Constituição de 1988 coloca a pessoa humana no centro convergente da sua produção normativa. Os pilares da matriz constitucional, estrutural da Constituição de 1988 vão além, porque a Constituição de 1988 arquiteta um Estado constitucional fundado no paradigma do Estado democrático de direito - lembrando que são características do Estado democrático de direito a consagração da matriz principiológica dessa nova Constituição; a institucionalização da natureza normativa dos princípios, que deixam de ser vistos como uma mera função programática não vinculante - então os princípios são normas postas que podem direcionar inclusive as decisões judiciais em casos concretos -; a estruturação de um rol de princípios humanísticos e sociais imperativos como reflexo após a Segunda Guerra Mundial, que vai exatamente aperfeiçoar essa figura de um Estado constitucional contemporâneo de matriz democrática de direito; e um aprofundamento e sofisticação dos mecanismos democráticos da sociedade política e civil.
Essa condensação fica muito bem visualiza com a concepção constitucional dos direitos fundamentais e com os instrumentos, os diversos instrumentos civilizatórios, que são postos pela Constituição de 1988. Nessa arquitetura principiológica da Constituição de 1988, nós podemos destacar, entre um rol extenso de princípios, alguns princípios que, sob o nosso ponto de vista, são fundamentais para a manutenção dessa carga cognitiva do Direito do Trabalho. Quais seriam eles? Primeiramente, o princípio da dignidade da pessoa humana. Quando nós falamos em princípio da dignidade da pessoa humana na perspectiva da afirmação do direito fundamental ao trabalho digno, isso significa assegurar para o sujeito trabalhador, na prática das relações de trabalho protegidas, todo o rol de direitos fundamentais elencados na Constituição - lembrando aqui, diga-se de passagem, que a Constituição de 1988, quando estabelece direitos fundamentais, se apresenta como uma Carta constitucional aberta porque ela permite, no decorrer do tempo histórico, a absorção de novos direitos fundamentais que não estão ali expressamente positivados.
Então isso significa que um trabalho será digno quando ele puder absorver, na prática do exercício da oferta da força de trabalho, a proteção aos direitos fundamentais. E esses direitos fundamentais estão previstos em três grandes eixos de sustentação: o eixo internacional, com sistema internacional dos direitos humanos - então aqui nós podemos destacar a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que transformou os direitos humanos num tema global e universal; nós podemos destacar nesse eixo internacional a OIT em seu papel de vanguarda, que vai desde a sua constituição em 1919 até o ano presente, 2017; e aí uma série de diplomas afirmadores desta dignidade, como por exemplo a Declaração de Filadélfia, de 1944, que vai estabelecer algumas referências importantíssimas que estão projetadas no texto da Constituição de 1988, como por exemplo: que o trabalho não é uma mercadoria. Então, todo trabalho humano deve ser protegido; a Constituição deve rejeitar mecanismos de trabalho que flexibilizem o sujeito trabalhador, que o insiram em condição análoga de escravo ou que rejeitem o outro - porque o que se estabelece no momento presente, sob o ponto de vista da psicanálise, é uma construção de um movimento de doença psíquica, porque é exatamente a rejeição do outro. Vamos lembrar que a rejeição do outro é uma das características imanentes dos psicopatas: eles desconhecem o outro sem nenhum constrangimento, rejeitam a figura do outro. Se a Constituição de 1988 colocou o sujeito no centro convergente, agora a gente rejeita outro, num sistema neoliberal de desregulamentação completa de direitos trabalhistas.
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Mas, voltando aos sistemas de proteção, na perspectiva internacional nós temos a Declaração Universal dos Direitos do Homem, a OIT, com a Declaração de Filadélfia, e com a Declaração sobre os Direitos e Princípios Fundamentais no Trabalho de 1998, que estabeleceu quatro referências de direitos humanos que, segundo corrente majoritária...
(Soa a campainha.)
O SR. GABRIELA NEVES DELGADO - ... não precisam ser ratificados pelos Estados-membros para serem incorporados aos Estados que são signatários da OIT.
Qual é essa referência? Proibição de trabalho infantil, proibição de trabalho escravo, proibição de políticas e dinâmicas discriminatórias, e a liberdade de expressão lato sensu. (Palmas.)
Esse eixo internacional é o eixo que vai assegurar a afirmação do direito fundamental ao trabalho digno.
Na perspectiva do eixo constitucional, nós temos a afirmação do direito fundamental ao trabalho digno pelo rol dos artigos constitucionais trabalhistas - basicamente: do art. 7º ao art. 11, lembrando aqui, o que já foi ressaltado, que essa Carta constitucional deve ser considerada um texto aberto, diferido no tempo.
E na perspectiva infraconstitucional, qualquer diploma infraconstitucional - no caso brasileiro, ainda é a CLT - que estabeleça direitos de indisponibilidade absoluta, que são direitos que vão assegurar o patamar civilizatório mínimo de proteção ao trabalho, como, por exemplo: direito à identificação profissional, com a assinatura da Carteira de Trabalho, que vai assegurar para o trabalhador, como um efeito consequencial, a inserção no sistema previdenciário protegido; direito à utilização de equipamentos de proteção individual em...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eles querem revogar até a NR 11, por isso... (Palmas.)
O SR. GABRIELA NEVES DELGADO - Verdade.
Senador, a reforma trabalhista é tão absurda na perspectiva dos direitos à saúde e à segurança que, por instrumento coletivo negociado, é possível aferir-se o grau de insalubridade e definir-se o grau de insalubre das relações de trabalho. Vamos lembrar aqui que grau de insalubridade - seja baixo, médio, alto - depende de técnica. Isso é uma ciência, porque afronta a condição de saúde, não pode ser vista intuitivamente ou em espaços de negociação. Nós, do Direito, não temos condição técnica de aferir se a afronta à fisiologia do trabalhador ela é máxima, média ou mínima; isso depende de perícia, isso depende de formação técnica, que é exatamente o espaço da interdisciplinaridade atingindo positivamente o Direito. Por isso a importância das portarias, das perícias, que subsidiam os intérpretes do Direito nos espaços decisórios.
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Voltando à questão principiológica do Direito do Trabalho, nós vimos aqui que a principal afirmação dessa arquitetura principiológica é o princípio da dignidade da pessoa humana. Outro princípio que precisa ser sempre reafirmado é o princípio dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa. Notem que a Constituição da República de 1988 identifica a livre iniciativa como um valor social, o que significa que o texto literal é: valores sociais do trabalho e da livre iniciativa. Isso significa dizer que a dinâmica do exercício da livre iniciativa deve se dar em respeito e em harmonia ao valor social do trabalho. Isso é uma referência importante para se evitar práticas flexibilizatórias e precarizadoras de direito.
Outros princípios importantes que devem estar presentes em qualquer arquitetura de principiologia de proteção ao trabalho são: princípio da inviolabilidade do direito à vida; princípio da justiça social; princípio da não discriminação; princípio da igualdade em sentido material, que foi exatamente a fala que me antecedeu; e princípio da vedação do retrocesso, que é uma inspiração que parte dos direitos humanos trabalhistas e que está presente de uma forma inequívoca no art. 7º, caput, da Constituição Federal quando o art. 7º, caput, da Constituição Federal elege como vetor o princípio da norma mais favorável sob a orientação dos princípios da vedação do retrocesso e da progressividade social, porque o art. 7º, caput, da Constituição da República prescreve que são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais - além de outros que visem à melhoria.
(Soa a campainha.)
O SR. GABRIELA NEVES DELGADO - Esta palavra "melhoria" indica qual é o sentido de produção dos instrumentos coletivos negociados. Instrumentos coletivos negociados não podem estabelecer espaços permanentes de flexibilização trabalhista. E, se o fizerem, é necessário que haja cláusula compensatória.
Tudo isso foi rejeitado pela lei da reforma trabalhista...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Muito bem!
O SR. GABRIELA NEVES DELGADO - ... seja porque a lei da reforma trabalhista estabelece possibilidade de ruptura de direitos...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eu disse muito bem, mas eu digo é: "Muito mal!"
O SR. GABRIELA NEVES DELGADO - Sim.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - "Muito bem" é para a exposição, que deixa claro o que acontece. Mas fizeram tudo que há mal que a gente possa imaginar.
O SR. GABRIELA NEVES DELGADO - É incrível o que os instrumentos coletivos negociados... É incrível a possibilidade dada pelos instrumentos coletivos negociados com a Lei 13.467, de 2017, a possibilidade de ruptura de direitos de indisponibilidade absoluta sem qualquer margem para se estabelecer um padrão civilizatório que agregue direitos num sistema de compensação, pensando na possibilidade que os instrumentos coletivos negociados têm de estabelecer cláusulas compensatórias.
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Bem, eu queria me ater, neste momento...
Acho que ainda tenho...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Dois minutos.
O SR. GABRIELA NEVES DELGADO - ... no sistema... (Pausa.)
Bem, o desafio, a pergunta que nos é colocada ao trabalhar exatamente os princípios da OIT e da Constituição para o trabalho é: quais são as telas de proteção social ao trabalho que devem vigorar no tempo presente para que os fluxos de proteção ao trabalho humano sejam retomados? Como nós podemos, sob o ponto de vista interpretativo e político, reconstruir o sistema constitucional de proteção aos direitos humanos trabalhistas e aos direitos constitucionais trabalhistas? Como permitir que a positivação da norma jurídica siga no processo de afirmação da norma jurídica, nesse sistema de proteção aos direitos humanos?
Eu não tenho dúvida de que o único caminho, Senador, é considerar a base política do Direito do Trabalho. Qual é a base de afirmação constitutiva/política do Direito do Trabalho? O Direito do Trabalho é luta e organização social. Este é o caminho. (Palmas.)
O SR. GABRIELA NEVES DELGADO - Então, nós precisamos seguir conscientes de que o caminho é um caminho de luta, mas luta organizada, luta consciente. Por isso, a importância de espaços qualificados como esses para que nós possamos, a todo tempo, reafirmar...
(Soa a campainha.)
O SR. GABRIELA NEVES DELGADO - ... as bases cognitivas protetivas do Direito do Trabalho que estão consolidadas no texto constitucional e é a partir das lentes do texto constitucional que nós devemos partir para pensar em qualquer produção legislativa em torno do trabalho humano.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Drª Gabriela Neves Delgado, Professora da UnB.
Os painelistas estão dando aqui uma aula tão importante de conhecimentos sobre esse tema que o normal é dar dez minutos, mas estou dando 25 para cada um porque não tenho coragem de cortar nem um, nem outro pela importância do tema e um tema que aprovaram do dia para a noite assim sem nenhum tipo de debate qualificado como este nosso.
Entre a reunião do grupo em que estão reunidos juízes, advogados, procuradores, promotores deve ser a sexta, já? A quinta? Não. Quantas reuniões já tivemos entre o grande grupo e audiências públicas? Seis. Estamos na sexta reunião semelhante a esta e, quanto a gente ouve, mais tem que ouvir ainda. É impressionante e eu me sinto contemplado com ambos porque eu fui Constituinte e essa preocupação que vocês colocaram aqui foi exatamente dos Constituintes. Eu estava até numa emissora - como estou viajando muito ao Rio Grande do Sul porque já fui a todos os Estados e, de vez em quando, temos que olhar para a base - daí uma rádio, quando eu falava, me dizia o seguinte: "não, tudo bem, Paim, você está elogiando, elogiando a Constituição, tal e tal, mas vocês não assinaram a Constituição" e foi um graduado que disse, não foi um menino, foi um senhor. Eu disse: "Grande engano. [Eu estava no debate]. Leia a Constituição lá na última página e veja se não está lá o Senador Paulo Paim. E caso se tu fores a Canoas, no meu escritório, vais encontrar, na minha sala, uma foto bem grande: eu assinando a Constituição com meu filho junto, esse filho que hoje está com quase 40 anos.
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Ele, moleque, foi a única vez que veio a Brasília, para me ver assinar." Então, nós assinamos, sim, a Constituição.
Nós todos assinamos, não houve ninguém que não assinou. Todos os Constituintes assinaram, ninguém se negou a assinar. O que houve foram votos contra, numa série de pontos, porque queríamos muito mais. Votos contra houve. Agora, assinar, assinamos. Assinamos porque reconhecemos que, assim mesmo, foi um avanço para a época. Só vocês falando tanto aqui que o eixo deste debate é o da Constituição já dá uma luz de que estávamos no caminho certo lá trás e o retrocesso que foi essa votação.
Eu confesso que aquele dia eu disse da tribuna que um pedaço de mim morreu ali junto mesmo porque rasgaram a Constituição, rasgaram a CLT e eu perguntava para os Senadores e Deputados que estavam ali assistindo também: "Não, mas o Temer vai vetar, vai vetar, vai vetar uma série de artigos." Não vetou um artigozinho, sancionou na íntegra absurdos que há ali como os senhores e senhoras estão relatando aqui.
Maximiliano Garcez, Diretor para Assuntos Legislativos da Associação Latino-Americana de Advogados Laboralistas, ALAL. O Dr. Maximiliano é Advogado e viajou conosco por quase todos os Estados naquele debate - já fomos aos 27 Estados - sobre terceirização, democracia, negociado sobre o legislado. Estávamos prevendo que ia acontecer o que eles fizeram infelizmente.
É com você e terá os mesmos 25 minutos dos outros.
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - Obrigado, Senador.
Cumprimento o Senador que eu já conhecia há alguns anos, mas nos últimos dois, três anos tive o prazer de conhecer mais a fundo e minha admiração só cresceu pelo seu destemor de realizar audiências públicas em todo o Brasil a custo inclusive de sua saúde. Estou contente que o senhor esteja revigorado e, em seu nome, cumprimento todos os Senadores e Senadoras da CDH, cumprimento a Ministra Delaíde em nome de quem cumprimento todas as mulheres que lutam por um Brasil mais justo e contra esses retrocessos todos, cumprimento meus queridos amigos Helder e Gabriela, por quem tenho muita admiração de várias lutas que fizemos em comum.
Na pessoa da companheira Graça, eu cumprimento todos os sindicalistas que têm resistido... (Palmas.)
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - ... a todo esse grotesco estado de coisas que nós vivemos. Mas como nós vamos tratar hoje da reforma trabalhista à luz...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Eu vou te dar mais cinco.
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - Ótimo.
Obrigado, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Para não achar que eu só dei dez para ele. Eu dei 20 e, depois, mais cinco. E, ao final, dou mais cinco.
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - Obrigado, Senador.
E, como nós vamos analisar a reforma trabalhista à luz das normas internacionais, eu quero fazer um comentário inicial que eu já havia feito na Câmara dos Deputados, na comissão de reforma trabalhista: essa reforma veio assinada - veio um projeto do Executivo - por alguém que ocupa ilegalmente a Presidência da República, fruto de um golpe indigno, Parlamentar, midiático, empresarial. Portanto, vou começar aqui com uma norma internacional que se aplica exatamente à reforma trabalhista que foi feita de maneira ilegítima que é o art. 21 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, item 3:
A vontade do povo é o fundamento da autoridade dos poderes públicos; e deve exprimir-se através de eleições honestas a realizar periodicamente por sufrágio universal e igual, com voto secreto ou segundo processo equivalente que salvaguarde a liberdade de voto.
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Nós não temos uma democracia no Brasil e a reforma trabalhista foi assinada por alguém que compõem um Governo ilegítimo e corrupto e que precisa ser retirado de imediato junto com a reforma trabalhista. Por isso, que acho que as normas internacionais exigem que o Brasil retome a democracia, que tenhamos eleições diretas em breve e... (Palmas.)
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - ... um referendo, um plebiscito a fim de revogar as excrescências todas que foram feitas inclusive a reforma trabalhista.
Nós não podemos considerar que isso é algo que pode ser naturalizado, tanto esse regime ilegítimo que temos, quanto as normas que foram produzidas nesse período e é fundamental que a reforma trabalhista volte para onde ela nunca deveria ter saído, que é o lixo da história, fruto de uma série de Deputados e Senadores, objeto de denúncia pelo Procurador-Geral da República.
Quando eu fiz a exposição na Câmara dos Deputados, foi feito amplo levantamento cruzando as empresas cujos donos eram os Deputados da comissão de reforma trabalhista e nós conseguimos verificar uma série de violações reiteradas aos direitos trabalhistas inclusive casos de trabalho escravo. Eu pude mencionar inclusive o nome das empresas na Câmara dos Deputados e fui agredido por vários Deputados.
Agradeço à Deputada Benedita da Silva, do PT e ao Deputado Daniel Almeida, do PCdoB que intervieram e garantiram que eu fizesse a minha exposição de maneira íntegra, mas, ao contrário desta CDH que debate democraticamente, o que houve na Câmara dos Deputados foi só uma pantomima, só um simulacro de debate. E aí há mais uma inconvencionalidade, já entrando para o tema específico, da reforma trabalhista que é a Convenção 144 que define que qualquer norma que um país adote que venha a violar convenções da OIT ou impactá-las devem ser objeto de amplo debate tripartite. Isso não houve, o que houve foi uma tramitação acelerada com violações inclusive do devido processo legislativo, objeto já de mandado de segurança que foi impetrado por Deputados ao Supremo Tribunal Federal.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Reforçando aqui: nós vamos chamar também os representantes dos empresários para ouvi-los, o que eles não fizeram lá, porque o relatório final foi feito só pelos empregadores e, todos nós sabemos, na sede da CNI aqui em Brasília.
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - Sim. É outro episódio lamentável. E lembrar que falo aqui em nome da Associação Latino-Americana de Advogados Laboralistas, que já fechou posição em relação à reforma trabalhista, diante todas as suas inconstitucionalidades e violações a normas internacionais.
Na verdade, não vou mais entrar nas minúcias dos dispositivos constitucionais violados, nas normas internacionais porque eu estou completamente contemplado e concordo integralmente com a brilhante exposição que foi pelos meus colegas Helder e Gabriela. Vou tentar tratar de alguns outros pontos.
Então, pediria para o companheiro Cleriston, se puder colocar uma charge na tela que eu acho que vai ilustrar a minha exposição: o que foi feito pela reforma trabalhista e as consequências dela, que é nefasta, a meu ver, não só aos trabalhadores, obviamente, mas também a toda a sociedade e também aos empresários.
Se puder fazer a gentileza de colocar a charge. E o que faz a reforma?
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Ela viola dispositivos constitucionais que têm impacto além da vida do trabalhador, que é a dignidade da pessoa humana, o valor social do trabalho e a própria posição do Brasil no mundo. O que a reforma trabalhista quer fazer é tornar o Brasil um país subalterno à Divisão Internacional do Trabalho. E fazer com que nós tenhamos apenas migalhas do capitalismo.
Eu não vou ler as primeiras duas palavras.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Pode ler.
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - "Puxa vida, cara! O mundo acabou!". "Mas foi lindo, não? Por um breve período tivemos lucros astronômicos." - isso sintetiza a reforma trabalhista: tentar fazer uma economiazinha de curto prazo, poupar alguns centavos retirando direitos, diminuindo os salários, aumentando o adoecimento, colocando a mais-valia em padrões inimagináveis, mas ao custo de destruir a capacidade produtiva brasileira, de tentar fazer um tipo de organização do mundo do trabalho que inviabiliza a produção de alto valor agregado, que inviabiliza que o Brasil concorra na produção de bens de consumo, de alta tecnologia. Porque é impossível você conseguir gerar um parque produtivo competitivo organizando a mão de obra dessa maneira: com trabalhadores que ficam completamente à mercê do capitalismo, dos empresários mais retrógrados, pessoas que vão ficar três meses trabalhando numa terceirizada, depois vão ficar alguns meses desempregadas, depois vão ser pejotizadas, depois vão ser quarteirizadas, depois vão ser autônomas, sem nenhum tipo de trajetória de vida que possa ser feita com um mínimo de previsibilidade, e também destruindo a capacidade de aumento da produtividade, de capacitação dos trabalhadores brasileiros - que é uma reclamação hipócrita dos empresários: que os trabalhadores brasileiros não têm a devida qualificação, e querem organizar o sistema produtivo brasileiro dessa maneira, dessa maneira caótica.
Então, é a lógica mais mesquinha do curto prazo, e de empresários que nem para ganhar dinheiro sabem. Por quê? Porque essa reforma trabalhista reduz o Brasil a uma mera colônia de produção agrícola ou de bens que demandam baixa tecnologia. Então, é uma decisão de um governo entreguista que quer abdicar de qualquer capacidade de o Brasil ocupar um cenário relevante do ponto de vista internacional, inclusive do ponto de vista de disputa de mercados, que é o que governos anteriores conseguiram avançar em relação à participação ativa do Brasil nos BRICS, de criar um mercado de consumo que teve toda uma repercussão para tornar o tecido social mais adequado, e agora a gente está vendo isso, exatamente esse tiro no pé dos setores mais atrasados da burguesia brasileira.
E a privatização da Eletrobras, do sistema elétrico brasileiro, o entreguismo em relação à mineração, isso vem na mesma lógica: um governo que tenta impedir o Brasil de se tornar uma nação soberana, inclusive no mundo do trabalho. E a reforma trabalhista tem esse condão de trazer tragédias inimagináveis para a sociedade brasileira. Não só no mundo do trabalho - que nós teríamos, se essa reforma persistir.
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E eu tenho muita admiração pelo movimento sindical, pela classe trabalhadora brasileira, pela sociedade, eu acho que em breve a gente vai conseguir colocar essa reforma nefasta no lixo da história, mas, caso ela viesse a persistir, nós teríamos um impacto enorme nos gastos do SUS, no adoecimento da população brasileira; impactos enormes no consumo - porque não é à toa que há uma série de empresários médios e pequenos que já se deram conta de que a reforma trabalhista vai ser prejudicial a eles; pequenos comerciantes que têm mercados no Nordeste estão sentindo, já, que uma legião de desempregados vai impactar diretamente no seu rendimento. O consumo diminuindo, a economia vai sofrer percalços, a gente vai ter problemas enormes de produtividade, e é isso que é essa reforma trabalhista: é querer matar a galinha dos ovos de ouro, querer ser a expressão do caráter mais retrógrado e autoritário do empresariado brasileiro. Não é à toa que nós somos o último país das Américas a abolir a escravidão - e agora voltamos a essa neoescravidão supostamente moderna - e a incapacidade de conseguir defender até os seus próprios anseios, e felizmente parte do empresariado vem se dando conta do absurdo que é a reforma trabalhista, inclusive para os seus interesses.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Permita-me só para aproveitar teu gancho: saiu uma pesquisa de que 84% do empresariado não sabe o que que é isso ainda. Só 16% é que têm noção do que que é a reforma. Está todo mundo perdido, pela complexidade e pela crueldade de algo que nem eles acreditavam que poderia acontecer.
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - E aqui eu volto à charge: dois capitalistas que promoveram o golpe, que promoveram a reforma trabalhista, que destruíram o meio ambiente e que colocaram o Brasil num cenário pós-apocalíptico, que é o que a gente pode viver daqui a cinco, dez anos se não for revogada essa reforma trabalhista, se a gente continuar nessa ditadura que acossa indígenas, acossa as mulheres, acossa os LGBT, os quilombolas, setores marginalizados da sociedade...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Tentam acabar com o movimento sindical, tentam.
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - Exatamente. E é uma reforma também que é política, porque tenta destruir a capacidade de organização da classe trabalhadora. Vou contar um episódio aqui: no final dos anos 70, início dos anos 80, havia um jovem sindicalista em Canoas que conseguiu enfrentar o patronato na metalurgia e conseguiu ter impactos enormes na organização dos trabalhadores e melhoria da condição de trabalho daqueles trabalhadores. Se nós tivéssemos a reforma trabalhista à época, que tenta inviabilizar a estrutura sindical, e a criminalização dos movimentos populares, nós não teríamos visto o que aconteceu: que aquele jovem sindicalista se tornou o Senador Paim, esse guerreiro da classe trabalhadora... (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Mas o que eu mais gostei foi do "jovem", porque com os cabelos brancos é bom de ouvir a palavra "jovem".
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - Continua jovem, porque nas nossas viagens, aí, ao Brasil inteiro, houve vários momentos em que o Senador tinha mais energia do que eu, aí continua jovem.
Mas a reforma também tem esse objetivo político de destruir a capacidade de organização da classe trabalhadora. E aí eu entro num dispositivo vergonhoso, que é o que cria o pelego sindical, que é desvirtuando uma bandeira histórica do sindicalismo autêntico brasileiro, que é do trabalhador organizado dentro da própria empresa, o representante dos trabalhadores na empresa, e desvirtua completamente o que teve avanços importantes nas comissões de fábrica do ABC, por exemplo.
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Cria alguém que fica subalterno ao empregador, sem participação do sindicato, sem representatividade, na verdade desvirtuando a Convenção 135, da OIT, da qual o Brasil é signatário. Então, mesmo aquilo que tem de suposto avanço na reforma, não é avanço, é um retrocesso enorme.
E aí eu faço uma crítica a alguns sindicalistas que apoiaram essa reforma direta ou indiretamente; um deles, inclusive, chegou a dizer que o Eduardo Cunha é a pessoa mais honesta que ele conhece - imagine o círculo de amizades que esse sindicalista tem! E uma série de outras violações: à Convenção 98, que trata da negociação coletiva - e o que a reforma trabalhista faz, na verdade, além de negociar sobre o legislado, não é tratar de negociação coletiva. Vou contar aqui um exemplo que foi dado pelo meu querido amigo Hugo Melo, que é o Presidente da Associação Latino-Americana de Juízes do Trabalho - e aqui eu faço um desagravo à perseguição absurda e injusta que ele tem sofrido, ele, a companheira Valdete e o companheiro Jorge Souto Maior; uma perseguição inaceitável do Presidente do TST, violando as prerrogativas que todos os magistrados têm, e isso é algo que interessa não só aos trabalhadores, mas a toda a sociedade: ter um Judiciário independente.
Mas vou dar o exemplo do Hugo: Senador, imagina que o senhor está andando na rua, chega um ladrão e coloca uma arma na sua cabeça e diz: "Senador, ou o senhor me dá a carteira ou eu o mato". O que ele fez? Ele propôs um contrato. Olha, o contrato tem uma cláusula: "Se o senhor me der a carteira, eu não o mato." O senhor aceitou o contrato porque quis. O senhor podia dizer: "Não, eu acho que o assaltante não tem coragem de dar tiro, talvez não tenha bala na agulha, talvez a polícia vai chegar." Foi um contrato: o senhor assinou, entregou a carteira, ele cumpriu a parte dele e foi cumprido o contrato.
Foi um contrato isso? Não, não foi um contrato. Porque a sua vontade estava viciada, o senhor não tinha...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Foi imposição.
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - ... capacidade de consentimento. Isso não foi um contrato.
E o que que é o negociado sobre o legislado? Chega o empregador para o sindicato e diz: "Olha, até recentemente eu ia seis vezes por ano para Miami para comprar porcaria. Agora, com essa crise toda, eu só consigo ir três vezes por ano. Então, eu preciso que você abra mão de direitos históricos, que conquistou com muita luta, muito sangue, porque senão eu vou fechar a minha empresa e vou abri-la lá numa cidade que tem um sindicato pelego - como desses sindicalistas que eu citei - que aceita retirar esses direitos. E demito todo mundo, e o pessoal fica ao léu. Ou eu fecho a empresa, crio uma outra na mesma cidade, coloco um CNAE que eu consigo terceirizar ou quarteirizar para um outro sindicato que eu mesmo criei, e acabou. Você aceita?"
É a mesma coisa: não houve um contrato, teve um assalto. Tem vício de consentimento. E é isso o negociado sobre o legislado. Isso é ilegalidade, é imoralidade, e aqui faço um gancho com a menção que a Drª Gabriela, com muita propriedade, fez ao art. 7º da Constituição Federal, que trata dos direitos constitucionais, que são o piso mínimo, além de outros, que vêm pela melhoria das condições de trabalho. Então, é inadmissível, é ilegal e é inconstitucional, pelo princípio do não retrocesso, qualquer norma que queira rebaixar o padrão já mínimo de civilidade que nós temos no Brasil, que é a CLT.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Deixe-me registrar a presença da Presidente da Comissão de Direitos Humanos, Regina Sousa... (Palmas.)
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... que veio prestigiar a nossa Subcomissão. (Palmas.)
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - Senadora Regina, é um prazer contar com a sua presença. Tenho admiração pela sua luta e pelo seu histórico. Quero também agradecer o espaço aqui da CDH.
E é exatamente essa a lógica do negociado sobre o legislado, ou seja, submeter os trabalhadores a esse achaque, a essa violação. E isso é algo que não pode ser aceito e naturalizado. E a gente tem viajado o Brasil inteiro para dizer, quando me pedem para falar da reforma trabalhista, para sempre ressaltar que essa reforma é ilegal, inconstitucional e não pode ser aceita. Se o empregador quiser, por exemplo, utilizar o negociado sobre o legislado, tem que ser feita a disputa não como alguém que está propondo um negócio jurídico, mas como alguém que está propondo algo ilegal, inconstitucional e que não pode ser aceito de forma alguma. A gente não naturalizar no dia a dia todo esse estado de coisas que vem acontecendo.
A reforma também viola normas internacionais e a Declaração dos Direitos Humanos ...
(Soa a campainha.)
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - ... que prevê que todo trabalhador tenha acesso ao Judiciário para postular qualquer tipo de violação. Quando você cria uma série de impedimentos ao acesso à Justiça do Trabalho, como, por exemplo, a questão de os trabalhadores terem de pagar honorários à empresa, mesmo sabendo da completa inexistência de paridade de armas no Brasil no processo de trabalho, pois o empregador detém a capacidade de trazer testemunhas que estão sob seu jugo, sob o jugo do desemprego, o medo do desemprego, e querer fazer com que sejam vistos como agentes que se equiparam, isso é completamente inadmissível. Isso é mais um exemplo de tudo que a reforma traz.
Em relação à terceirização, quero dizer que aqui eu tenho o prazer de representar também o Fórum Nacional em Defesa dos Trabalhadores Ameaçados pela Terceirização. Os companheiros mandam um grande abraço ao Senador, que teve um papel fundamental no sentido de resistir à aprovação do PL 4.330. Depois houve esse golpe da Câmara dos Deputados de ter aprovado a lei da terceirização, apesar de não ter havido uma violação do devido processo legislativo, porque não foi votada a mensagem presidencial do Presidente Lula, que mandava retirar esse projeto de lei que era do Executivo, vindo do governo Fernando Henrique, que tentou destruir a CLT, mas que, devido à luta da classe trabalhadora, não pôde, inclusive com a luta muita corajosa de um companheiro que está aqui na Mesa, o companheiro Luís Carlos Moro, que presidia a Abrat, e também com nessa luta com o Senador Paim. E agora a gente vê esse estado de coisas. Parece aqueles filmes de terror, de vampiro, em que você mata o vampiro, como nós matamos no PL que queria implementar o negociado sobre o legislado, que alterava o art. 618, e agora volta o vampiro, e nós temos agora que matá-lo com água benta e com uma cruz. A referência ao vampiro não tem a ver com alguém que trabalha no Palácio do Planalto.
E a terceirização aprovada não é a terceirização contida na reforma trabalhista e na lei. É outra coisa. Os empresários diziam que queriam implementar a terceirização para poder se dedicar à missão institucional da empresa e contratar uma outra empresa para fazer o acessório para o qual eles não tinham competência, mas não é disso que se trata a terceirização no Brasil hoje e nessa reforma.
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O Dieese calcula que 98% da terceirização no Brasil hoje é outra coisa, é intermediação de mão de obra. Na verdade, o que a reforma cria é a figura do aluguel de pessoas, o que é diferente da terceirização, é tornar o trabalhador uma mercadoria descartável, que se pode jogar fora quando não servir mais, e é tornar o trabalhador coisificado, algo que pode ser descartado a qualquer momento. A reforma trabalhista não é só um ataque aos direitos sociais, mas é também praticamente a revogação da dignidade da pessoa humana. E isso tem sido o mote de coisas estarrecedoras e inimagináveis que vêm acontecendo no Brasil por conta deste Governo golpista, coisas que nós nunca imaginaríamos. Nós imaginávamos que estávamos num processo civilizatório com um mínimo já garantido. E hoje pela manhã, eu tive o prazer de ter uma conversa muito agradável com o Procurador Carlos Eduardo, que presidiu a ANPT, com o Procurador Helder, sobre o nosso estarrecimento com relação a esse estado de coisas.
Mas eu quero passar para um outro eslaide, que trata, além dessa análise desse cenário lamentável, do que pode ser feito e deve ser feito. "
Aqui está uma frase do Martin Luther King:
O que me preocupa não é nem o grito dos corruptos [E corruptos nós temos, infelizmente, na Presidência da República, no Senado e na Câmara], dos violentos [E hoje nós temos, infelizmente, Polícia Militar e Civil, em vários Estados, atacando de maneira violenta e bárbara trabalhadores, cometendo massacres], dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética. O que me preocupa é o silêncio dos bons. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - É isso mesmo!
Martin Luther King é uma figura inesquecível mesmo. Essa frase entrou para a história.
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - Exatamente. E é isso que tem estarrecido quem milita no mundo do trabalho, nos movimentos populares, ou seja, é o silêncio de boa parte da população brasileira que se sente incapaz de resistir, que sabe que este Governo é ilegítimo ...
(Soa a campainha.)
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - ... que sabe que essas reformas são ilegais, são indignas. Há ampla maioria contra a reforma trabalhista e contra a reforma da previdência, que em breve pode voltar a ser votada.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - E o Senado se omitiu em 100%. Sabe o que é uma omissão de 100%? Não conseguiu mexer numa vírgula da reforma, em 117 artigos. Eu disse lá e repito, ou seja, os Senadores, parece que renunciaram ao seu direito de legislar. Eu falei com os Deputados e sabem o que um deles me disse? "Que havia um monte de bobagens ali, mas como eu achei que vocês iam limpar, eu até votei." É claro que eu xinguei o Deputado, mas não adiantou, pois já haviam votado.
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - E é um Governo que ludibria, em tese, até a sua própria Base. Nós ouvimos aqui, quando vínhamos aos corredores tentar lutar contra a reforma, vários Senadores dizendo: "Eu vou votar, mas não se preocupe porque eu não concordo com boa parte do que está aí. Há o compromisso de que vai haver o veto e uma parte ainda vai ser objeto de uma medida provisória que vai corrigir tudo isso. Então, eu não estou votando para aprovar essa excrescência", quando a gente sabia que eles próprios já sabiam de antemão que esse acordo não seria cumprido. É lamentável o fato de alguns sindicalistas terem supostamente participado desse acordo. Felizmente, foi uma minoria do sindicalismo brasileiro.
Mas a classe trabalhadora brasileira, a sociedade brasileira tem uma série de instrumentos que não são utilizados...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Dois minutos.
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - ... e que estão nas mãos da classe trabalhadora. Primeiro, o acesso à informação.
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O trabalho que nós fizemos de levantar irregularidades de Deputados que votaram a reforma trabalhista está disponível publicamente. As pessoas podem visitar o site do TRE e verificar a declaração de bens dos Deputados e Senadores e fiscalizar a sua atuação. Existe o instrumento da Lei de Acesso à Informação, que nós temos utilizado no meu escritório, acessando uma série de informações importantes para lutar contra as privatizações, ações populares que podem ser feitas em relação a políticos que agem de maneira inadequada e o protesto nas ruas. Apesar da criminalização dos movimentos populares, apesar de tudo isso, a classe trabalhadora e o povo em geral precisam retomar a disputa. Há muita gente de cabeça baixa, estarrecida com o que vem acontecendo. Mas há muito em jogo. As coisas podem ter um retrocesso maior ainda.
(Soa a campainha.)
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - E é fundamental também que no ano que vem, se não tivermos direta já, que é o nosso anseio, que as pessoas não esqueçam os Deputados e Senadores que de maneira vil e violando a Constituição Federal e normas institucionais aprovaram a reforma trabalhista.
Aqui eu vou encerrando e renovando a manifestação que eu fiz na Câmara dos Deputados. Aqui vai uma mensagem aos Deputados e Senadores que votaram a favor dessa reforma indigna e inconstitucional: meus votos de que vocês nunca mais tenham votos.
Obrigada, companheirada. E vamos à luta! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Maximiliano Garcez, Diretor para Assuntos Legislativos da Associação Latino-Americana de Advogados Laboralistas.
Parabéns pela sua exposição...
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - Obrigado, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - ... qualificada como as dos outros painelistas.
Agora teremos a nossa Ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Drª Delaíde Arantes.
Eu fui Constituinte com o Arantes, o Aldo Arantes, seu esposo, não é? Grande Constituinte!
O SR. DELAÍDE ARANTES - Bom dia a todos!
Quero pedir desculpas porque eu não pude trazer uma fala preparada para vocês nesta manhã. O Ministro Lelio Bentes, meu colega, Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, é que comporia a Mesa. E eu quero me justificar dizendo que eu não estou aqui substituindo o Ministro Lelio Bentes, até porque não tenho credencial para tanto. O Ministro Lélio é um dos peritos da OIT no âmbito de 178 países do mundo. Mas o Ministro Lelio teve um problema de saúde e pediu que eu justificasse ao Senador Paim.
Eu quero primeiramente cumprimentar todos os meus queridos colegas da Mesa, a minha Profª Gabriela Delgado. Eu tenho a honra de ser aluna da Profª Gabriela no Grupo de Pesquisa da UnB, Trabalho, Constituição e Cidadania; cumprimentar o Procurador Helder Amorim, o Luis Carlos Moro, meu amigo querido, advogado trabalhista. Ele gosta de assim ser chamado, mas o currículo do Luis Carlos levaria um bom tempo para discorrermos sobre ele; cumprimentar o Maximiliano Garcez, da Alal. E parabenizar o Senador Paim por essa iniciativa. V. Exª não tem ideia da importância deste foro para a resistência à reforma trabalhista. E também parabenizá-lo por todo o trabalho que tem feito juntamente com outros Parlamentares, com a Senadora Regina... (Palmas.)
... com a Senadora Vanessa Grazziotin, com o Senador Lindbergh, enfim, com todos os Parlamentares que ombreiam conosco este momento bastante difícil. Eu quero também fazer uma homenagem. Essa resistência à reforma já tem mártires. E sempre que falo de público, eu faço uma homenagem ao Juiz do Trabalho Jorge Souto Maior, à Juíza gaúcha Valdete Severo e também ao Hugo Melo, que é o presidente da Alal.
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Uma salva de palmas aos três. (Palmas.)
A SRª DELAÍDE ARANTES - E quero homenagear também o Luciano Frota, que foi indicado para a vaga do CNJ para representar o primeiro grau, à unanimidade, pelo Tribunal Superior do Trabalho. Ele está encontrando dificuldades no Senado Federal... (Palmas.)
... embora seja um juiz com todas as credenciais possíveis para representar o primeiro grau no CNJ. Minha homenagem também a Luciano Frota.
Eu pedi para deixar a imagem da charge, porque nós temos ali ao fundo a imagem da explosão das Torres Gêmeas, 11 de setembro - e hoje é 11 de setembro. Estamos aqui discutindo a tentativa de explosão da CLT e das garantias dos trabalhadores brasileiros, uma infeliz coincidência. A lei entra em vigor no dia 11 de novembro - 11 de novembro versus 11 de setembro não faz muita diferença.
Na condição de magistrada, eu me refiro primeiramente aos comentários que têm sido publicados na imprensa por alguns blogues, no sentido de que a magistratura trabalhista está sendo orientada a descumprir a lei. Eu digo que isso não é verdade, mas a magistratura está sendo alertada.
Está havendo uma ampla discussão sobre a importância e a necessidade de se interpretar a lei da reforma trabalhista à luz das normas internacionais. Como aqui foi bem dito pela Profª Gabriela, nós temos um número bastante relevante de normas internacionais de proteção do trabalho humano e de proteção da pessoa humana - de proteção do trabalho e do trabalhador, não é só do trabalho, é do trabalho e do trabalhador.
Eu li recentemente um artigo muito interessante, que foi publicado no Jota, fazendo um contraponto a essa tentativa de flexibilização dos direitos do trabalho no Brasil, enquanto em vários países do mundo o movimento é contrário - na Itália, na França... Na Inglaterra hoje, os próprios conservadores, a própria direita defende a proteção dos trabalhadores e defende um retorno da proteção aos trabalhadores, isto em benefício da sociedade, em benefício da economia, em benefício dos próprios empregadores. Porque não é desvalorizando o trabalhador, não é desqualificando o trabalhador, não é implodindo os seus direitos que a economia vai crescer. (Palmas.) Eu tenho dito, nas palestras que tenho feito - e a última que fiz foi em um grande evento do Instituto dos Advogados Brasileiros, em João Pessoa, onde falamos eu, César Brito e um procurador do trabalho, o Renato Saraiva, para um público de aproximadamente 2 mil pessoas -, que o que o Brasil precisa não é de reforma trabalhista, o Brasil precisa de uma reforma ampla, que começa por reforma tributária, por reforma política, por mudança de sistemas viciados, para que o Brasil possa crescer.
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Nós experimentamos, na última década, crescimento econômico, situação de pleno emprego. A Justiça do Trabalho era a mesma, o Direito do Trabalho era o mesmo, nós éramos os mesmos, não é Senador Paim? V. Exª, Deputado Constituinte Aldo Arantes... O Direito do Trabalho, a Justiça do Trabalho... E não foi necessária uma reforma trabalhista.
Então, o que nós estamos discutindo na magistratura é que a lei da reforma trabalhista não é a legislação trabalhista, ela é uma lei ordinária que se insere no contexto da legislação trabalhista. Desta forma ela deve ser interpretada: interpretação sistemática à luz das normas internacionais.
A Organização Internacional do Trabalho tem oito convenções, que são convenções fundamentais. Neste momento, é chamada a nossa atenção para as normas internacionais. Há as convenções e os tratados internacionais, a que a Profª Gabriela aqui se referiu e sobre o que o nosso Juiz Presidente da Corte Interamericana, Roberto Caldas, bem discorreu em um evento no Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região - atenção para as convenções e os tratados internacionais.
Eu quero aqui me referir a questões bem graves que nós enfrentamos no âmbito da reforma trabalhista - além de todas a que o Senador Paim já se referiu, o procurador Helder Amorim já se referiu, a Profª Gabriela já se referiu, o Maximiliano também já se referiu -: nós temos umas situações que são peculiares do Brasil.
Em outros países do mundo onde foram feitas reformas, o sistema jurídico-normativo contempla a garantia de emprego dos trabalhadores. E esse eu considero um dos maiores absurdos dessa reforma trabalhista, porque a reforma traz diversas hipóteses de pactuação individual e de pactuação coletiva, em que o trabalhador comparecerá numa situação de assalto, como aqui foi bem ilustrado pelo colega Maximiliano.
Ele não vai poder dizer não, porque em uma situação em que existem em torno de 14 milhões de desempregados, o empregado não poderá dizer não, porque o seu emprego não está protegido.
Então, eu gosto de ilustrar com uma questão bem simples do dia a dia. Um trabalhador, por exemplo, no intervalo de duas horas para almoço que tem, leva o seu filho de 7 anos à escola. Nós temos uma situação em que estatísticas demonstram que 71,9 dos trabalhadores brasileiros, dos 100 milhões de trabalhadores brasileiros, ganham até dois salários mínimos. Então, esse trabalhador que eu ilustro também ganha nesta faixa: até dois salários mínimos. E o seu empregador vai propor a redução para meia hora, 30 minutos. Isso pode ser feito por acordo escrito, sem assistência sindical, viu Graça? Assistência sindical agora ficou figura rara, se for analisada isoladamente a lei - se for analisada isoladamente. Ele tem duas alternativas: ou ele reduz para 30 minutos, como está sendo proposto... E para resolver a questão do seu filho de sete anos na escola, ele tem algumas alternativas: contratar uma condução, ganhando até dois salários mínimos, ou tirar o seu filho da escola. Então, eu digo isso para ilustrar.
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Temos outras situações também que são bastante complexas, que dizem respeito à conscientização dos trabalhadores a respeito dos efeitos da lei da reforma. Nós temos uma pesquisa de mídia que foi feita pela Secom, do Governo Federal, e publicada no início de 2017, segundo a qual 83% dos 207 milhões de brasileiros - agora 207, pelo último levantamento - se informam apenas através da TV. E desses, 71% através da TV Globo. Nós temos contra nós que a grande mídia defende as reformas - ela defende a reforma previdenciária, ela defende a reforma trabalhista e defende através de meias verdades.
O nosso público informado pela televisão não tem como formar consciência crítica, porque a informação que é passada é a informação do quadro defendido pela grande mídia. Por essa razão, nós não temos grandes insurgências.
Eu dizia lá no congresso do IAB, eu fiz a minha exposição por volta de 19 horas: olha, estamos aqui falando - eu, César Brito, Renato Saraiva - sobre a reforma, apresentando a nossa crítica à lei da reforma trabalhista, falando para 2 mil pessoas. Daqui a pouco entram em cena um bonito rapaz chamado Bonner e a Renata Vasconcellos, falando para 60 milhões de pessoas apenas sobre os pontos superficiais, favoráveis à reforma trabalhista. Então, nós convivemos com essa situação bastante complexa.
Quero fazer uma abordagem rápida também, antes de entrar na questão da importância das normas internacionais e da importância dos princípios - eu vou falar apenas da importância, então não vou tomar tanto tempo. Eu quero falar de um evento bastante ilustrativo da situação que nós estamos vivendo, que é aquele congresso, o 16º Congresso Agronegócio, que aconteceu em São Paulo, no dia 7 de agosto, logo após aprovação da lei da reforma trabalhista. E vou falar naquele congresso não pelo que foi dito ali contra a Justiça do Trabalho, contra os juízes do trabalho, contra os procuradores do trabalho, contra o Ministério do Trabalho, contra... Não é sobre esse aspecto.
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Em qualquer processo de resistência, nós temos que enfrentar essas questões mesmo, somos chamados de atropelos, de despreparados e tudo mais. Mas eu quero me referir às linhas daquelas discussões.
Ali tinha um ex-presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Almir Pazzianotto, tinha um jornalista da TV Globo, advogados e outros participantes naquele congresso de agronegócio. E eles, naquela discussão, diziam: "olha, a Lei da Reforma Trabalhista é muito tímida". Aí, o outro disse: "mas isso é o que conseguimos agora em Brasília". Aí, a resposta é a seguinte: "nós agora assumimos o poder, nós somos a elite e podemos conseguir o que a gente quiser".
Então, a afirmação de que a Lei da Reforma Trabalhista é apenas o começo dá uma noção da pretensão, porque a pretensão realmente é não deixar pedra sobre pedra, como dizem as escrituras sagradas, não é, Senador Paim? Mas eles falam, eles discutem ali alguns entraves que têm no caminho do desmanche que eles pretendem. Um dos entraves é o Ministério do Trabalho, que, segundo eles, é muito politizado. O outro entrave é o Ministério Público, o outro entrave é a Justiça do Trabalho e o último entrave é a Constituição Federal, classificada ali de a pior Constituição de toda a história do Brasil.
E os entraves ali são citados nominalmente, art. 7º e art. 8º principalmente. Dizia um dos participantes da mesa que, na vigência da proteção do art. 7º e do art. 8º, não tem como fazer uma reforma abrangente, como a pretendida. Então, o que foi publicado desse evento chamou muito a minha atenção, justamente para compreendermos que estamos na trincheira da resistência contra a reforma trabalhista.
E eu, na condição de magistrada, gosto de dizer que não é que sejamos contra qualquer reforma. Uma reforma discutida nos padrões de discussão, de alteração legislativa, de relevância, tanto a magistratura, quanto a advocacia, quanto a academia, quanto o Senado, o Congresso Nacional, os setores avançados do Congresso Nacional concordaríamos plenamente em discutir. Eu fiz um levantamento, pedi ao meu gabinete para fazer um levantamento aqui no próprio Congresso Nacional. O Código Civil de 2002 foi discutido durante 27 anos. E o Código de Processo Civil, que entrou em vigor em 2015, foi discutido durante cinco anos. Por que uma lei com tantas implicações teria que ser discutida de dezembro de 2016 a julho de 2017 e, mesmo assim, sem levar em conta as questões que foram levantadas por importantes segmentos do mundo do trabalho?
E eu quero aqui fazer uma referência às notas técnicas do Ministério Público do Trabalho, às notas que foram assinadas pelo ANPT, pela CNBB, pela OAB, pela Abrat...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Pela Anamatra.
A SRª DELAÍDE ARANTES - ... pela Anamatra
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Eu até não gosto de nominar porque é um elenco bem grande. A Frentas, é uma frente, pelos dezessete ministros do Tribunal Superior do Trabalho. E foram pontos muito relevantes, que, no entanto, não foram levados em conta.
E, para fechar, quero me referir aqui, Luis Carlos Moura, a um artigo que foi publicado na Revista do Advogado, da Associação dos Advogados de São Paulo, com um artigo muito importante de Roberto Caldas, que parece profético: "Direito Internacional do Trabalho e direitos humanos no Brasil: da internalização à aplicação". Essa revista tenho certeza de que depois, certamente estará na internet e pode ser acessada.
E Roberto Caldas fala, principalmente aqui em considerações finais, que não temos, nem a magistratura nem a advocacia, uma tradição de aplicação das normas internacionais do trabalho. E agora chamo atenção - e esse artigo muito bem traduz - para a necessidade que temos de buscar a proteção das normas internacionais e a sua aplicação. E, nesse primeiro momento, muito especialmente será a advocacia, que é quem vai postular perante a Justiça do Trabalho, iniciando ali pelo primeiro grau, as questões relacionadas à reforma trabalhista.
E me chamou muita atenção também um artigo recente de um advogado do Rio Grande do Sul, Antônio Escosteguy Castro, que fala sobre o direito dos princípios. E chama muito a minha atenção ele lembrar que, por um momento, o Direito Penal foi definido direito das nulidades e que, com tudo que está acontecendo, o Direito do Trabalho bem pode ser chamado de direito dos princípios.
(Soa a campainha.)
O SR. DELAÍDE ARANTES - E isso não é uma tentativa, como tem sido dito por alguns setores da imprensa, não é uma doutrinação aos juízes para que não apliquem a Lei da Reforma Trabalhista. Nós fizemos um juramento de julgar e vamos julgar e vamos aplicar a lei ordinária que aprovou a reforma trabalhista, mas vamos aplicar não isoladamente porque ela não é a legislação trabalhista. Ela é uma lei trabalhista que se insere no contexto da legislação trabalhista e será analisada, com certeza, à luz da proteção constitucional, à luz dos princípios constitucionais e à luz da legislação internacional, que integra a nossa legislação nacional por força, inclusive, da Constituição Federal.
Eu quero agradecer a oportunidade e dizer que recebi o convite muito honrosamente para participar desta Subcomissão, que veio em muito boa hora. No meu gabinete, sou muito vigiada em relação a assumir compromissos porque sempre assumo compromissos a mais do que consigo cumprir, e principalmente nesses momentos de exceção.
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Mas eu respondi sim ao Senador Paim, antes de passar pelo crivo da secretaria do meu gabinete. Portanto, eu, com muita honra, estou participando. Um grande abraço a todos.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem. Ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Delaíde Arantes. Muito obrigado pela contribuição. Para nós, é muito orgulho dizer que, neste grupo de trabalho, que se reúne e que está elaborando o estatuto, construindo com audiências como esta - também se reúne para o dia a dia, não é, Leandro -, temos profissionais do mais alto nível, e a sua palestra aqui só enriquece, nos dá mais contribuição, Vamos contar com a senhora para estar aqui de segunda a sexta. (Risos.)
Muito bem. O último dessa mesa - não sei a Presidenta quer falar nesse momento - porque só vai ter uma mesa, o Dr. Luis Carlos Moro, advogado trabalhista.
Pode chegar um pouquinho mais para cá.
O SR. LUIS CARLOS MORO - Estou confortável aqui, Senador. Muito obrigado a V. Exª. Agradeço a oportunidade de compartilhar esse momento com todos os presentes. E gostaria de, em primeiro lugar, ao cumprimentar todos os meus ilustres colegas de mesa, assentar aqui o meu lugar de fala.
Na condição de advogado trabalhista que gosto de me apresentar. Essa é a minha profissão, a minha historicidade de vida profissional poderia se resumir nessa expressão: sou substantivamente advogado e adjetivamente advogado trabalhista. Mas aqui tomo assento na condição de um convidado do Senado por indicação de uma entidade à qual sirvo há muitos anos, com muito orgulho, que é a Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas, a Abrat. Além delas, tenho um longo histórico associativo e de muita conexão com entidades que aqui também se fazem representar, como a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho, a Anpt, e a Anamatra, Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho.
V. Exª talvez não se lembre, mas já me salvou fisicamente de apanhar aqui da Polícia Legislativa no ano de 2001, quando lutávamos contra uma propositura de alteração do art. 618 da CLT. Nós, juízes, advogados e membros do Ministério Público, tivemos que obter da Suprema Corte um habeas corpus para podermos entrar e superar uma deliberação do então Presidente da Câmara dos Deputados, o então Deputado Aécio Neves.
V. Exª me salvou, literalmente e fisicamente, de ser agredido com instrumentos contundentes de borracha.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eu disse: olha, são todos advogados, nós mandamos prender vocês.
O SR. LUIS CARLOS MORO - E eu, tardiamente, aqui agradeço de público a sua intervenção salvadora da minha incolumidade física.
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É muito bom ter sido precedido de maneira tão luxuosa aqui com as exposições do Dr. Helder Amorim, da Profª Gabriela Neves Delgado, do meu querido companheiro de lutas, o Maximiliano Nagl Garcez, que hoje representa lá o que eu já tive a honra de presidir, e da minha querida amiga, a Ministra Delaíde Arantes.
Por que isso facilita demasiadamente a minha intervenção? Facilita, em primeiro lugar, porque eu posso, a todas as falas precedentes, aderir, e aderir com uma condição pessoal muito confortável, de um advogado que não é apenas advogado de trabalhadores, mas é principalmente, majoritariamente, advogado para defender o capital nas lides da relação capital e trabalho, mas alguém que tem noção da ideia de separação entre aquele que estuda o objeto do Direito e aquele que se presta a defender interesses específicos, os quais defendo com muito orgulho.
Mas o que sucede? Eu quero ter um olhar prospectivo, olhar para a frente. Nós estamos aqui no âmbito de um trabalho, de uma importantíssima subcomissão que se preordena a entregar para a sociedade brasileira, em primeiro de maio do ano que vem, um texto que corresponda ao Estatuto do Trabalho, um texto que exerça uma espécie de vis attractiva de todos os influxos da discussão da realidade do trabalho e do capital no Brasil.
E, nessa condição, tenho a impressão de que meus colegas de Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas viram em mim uma certa convergência, a convergência de ser um militante muito ativo em inúmeras entidades. Eu hoje também sou Secretário-Geral de uma instituição que é órgão consultivo da Organização das Nações Unidas, que é a Associação Americana de Juristas, da qual eu sou Secretário-Geral Continental, e também ativo militante na defesa principiológica do Direito do Trabalho.
Nós tivemos aqui já inúmeras anotações de circunstâncias que fizeram com que nós chegássemos ao ponto em que estamos, circunstâncias de ordem política, circunstâncias muito peculiares no Brasil. O Brasil vive hoje como se tivéssemos uma conjunção de astros a determinar uma péssima quadra no âmbito da produção legislativa e uma péssima quadra no âmbito das relações institucionais entre Executivo, Legislativo e Judiciário, inclusive nas relações interinstituições, ou relações internas no âmbito das próprias instituições.
O Judiciário Trabalhista, não tenho receio de dizer, embora não pertença, vive hoje tensões internas de enormes proporções, que se refletem no exercício de postos-chave por determinados integrantes do Poder Judiciário que não representam a média do conjunto de profissionais das instituições que hoje, por uma circunstância de determinadas tradições institucionais, alcançaram.
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Eu me refiro aqui, sem nenhum desrespeito, com muita tranquilidade, ao Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, que é Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, pela singela circunstância de ter alcançado a antiguidade necessária para tanto, e não porque represente o estrato médio da magistratura trabalhista. Há momentos em que nós precisamos ter coragem de dizer determinados aspectos, e dizer de uma maneira respeitosa, dizer de uma maneira sem nenhum traço de um sentimento que macule o raciocínio.
Eu quero prestar uma homenagem a um juiz de 1978, Juiz Márcio José de Moraes, que, em um período em que poderíamos dizer tranquilamente que democracia no Brasil não havia, teve a hombridade, a coragem de produzir um documento histórico, que era uma sentença que aclarava que Vladimir Herzog havia sido assassinado pelas forças do Estado de então. Ou seja, nós tínhamos, naquele momento, uma sentença judiciária de caráter extremamente democrático assentada em um momento de exceção do País. (Palmas.)
E hoje nós temos uma situação às avessas, inversamente proporcional. Nós temos deliberações legislativas, executivas e judiciárias de exceção sobre um extrato constitucional democrático, o que confunde demais o quadro e a possibilidade de analisarmos o quadro político no Brasil, porque, sobre uma base, um cimento democrático, nós temos inúmeros exemplos excepcionais.
Isso se dá no âmbito do Judiciário, que, por exemplo, se permite ceder magistrados para produção legislativa com o propósito de alcançar um resultado, que é anti-hermenêutico, do próprio Judiciário, ou seja, um Judiciário que se presta a ceder parcelas minoritárias da sua representação para atuar em colaboração com o Legislativo. Parece-me também juridicamente questionável essa cessão de um magistrado para atuar em atividade legislativa com o propósito de desconstrução de uma decantação hermenêutica que vinha sendo absolutamente progressiva e tranquila no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho.
Tudo o que ouvimos aqui, em termos de princípios, é de ser prontamente subscrito. Eu ousaria acrescer alguns não no sentido de colmatar lacunas das falas anteriores, mas de sublinhar aspectos que me parecem de extremo relevo no momento atual.
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Eu gostaria de que o Estatuto para o qual nós nos reunimos e em favor do qual trabalhamos viesse a considerar uma circunstância que é muito comum hoje, quando podemos fazer uma comparação com aquilo que sucede no campo da informação e da tecnologia de informação. É muito comum que tenhamos informações cujo acesso esteja absolutamente facilitado, porque elas constam das nuvens, e nós temos que simplesmente fazer o trabalho de baixar das nuvens até que os nossos aparelhos recebam essa informação.
Algo similar acontece com o Direito. Quando o Legislativo produz um texto, ele coloca nas nuvens da realidade uma plêiade de normas para que os cidadãos, a sociedade, os atores que vão trabalhar com aquelas informações que constam das nuvens, possam fazer o download ou fazer baixar das nuvens um substrato jurídico para alcançar a realidade.
O que estamos vendo hoje é o movimento contrário. Nós estamos vendo uma reação daquilo que já consta nas nuvens, no âmbito do Direito, e vemos uma espécie de contraprodução legislativa trabalhista, uma contrarreforma trabalhista, fazendo o upload de antiprincípios, fazendo com que, nas nuvens do Direito, pessoas que não se comprometam com os princípios naturais do Direito do Trabalho possam fazer o download da maldade específica.
E esse aspecto, parece-me, incumbe ao Estatuto do Trabalho tentar impedir. Tentar impedir de que forma? Relacionando princípios que pudéssemos fazer constar de modo explícito para que esse download dos princípios fosse imediato. Não, eu penso até que não. Eu penso até que não porque isso atenta contra uma natureza dos princípios que não devem ser positivados de uma maneira fechada, como um rol taxativo. Ao contrário, os princípios devem, inclusive, evoluir. Eles também têm um fluxo de evolução que o nosso Estatuto poderia e deveria assegurar, mas não há dúvida de que temos que assegurar um dos grandes princípios que hoje decorrem de um extrato mais democrático da legislação, que é o princípio da processualidade democrática na construção das normas trabalhistas.
O Max já se referiu à Convenção 144 da OIT, que não é se não expressão disso. Nós tivemos aqui exceções da exceção. Nós tivemos um projeto de lei que o Executivo nos encaminha com resumidos sete artigos. Esse projeto de lei é estendido ao máximo, segundo um estudo muito calculado daquilo em que era possível avançar ou recuar conforme o ponto de vista, em termos de proteção desse sujeito preferente de atenção do Direito do Trabalho, que é quem trabalha, quem provê o trabalho,
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Essa regressão alcançou - e na minha opinião foi além - os limites constitucionais vigentes. Mas foi até aquilo que se considerava possível em termos de regresso.
Agora, para que isso fosse possível, foi necessário, em primeiro lugar, uma iniciativa do Executivo seguida de um patchwork legislativo de busca de propostas que estavam nos escaninhos aqui do Legislativo desde a década de 90 como uma espécie de colcha de retalhos de maldades dormidas no Legislativo. Essa colcha de retalhos nos foi apresentada na Câmara dos Deputados, teve uma tramitação absolutamente desrespeitadora do princípio de processualidade democrática, passou, e tivemos, depois, a exceção da exceção.
Com todo o respeito, Senador, acompanhei a resistência linda das mulheres Senadoras, acompanhei a resistência linda das Ministras e acompanhei a belíssima atuação das mulheres como grandes resistentes...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Permita-me. O Dr. Helder vai ter de sair. Queria só oferecer uma salva de palmas a ele. (Palmas.)
Foi uma bela contribuição. Contamos com você.
O SR. LUIS CARLOS MORO - Faço o registro de que quem resistiu de maneira mais brava a esse processo foram as mulheres, tanto no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho quanto no âmbito do Legislativo. Dos homens, o que vimos foi a tentativa de levar ao extremo a negociação política, sem se darem conta de que havia aspectos que não eram negociáveis e que não poderiam ser objeto de negociação.
Precisamente porque é no campo do tema da audiência de hoje que houve uma invasão espoliativa do Direito no campo dos princípios. Foi na principiologia que se atacou em demasia o Direito do Trabalho. E de uma forma profundamente antidemocrática, em virtude de uma construção concertada entre frações do Judiciário com frações do Legislativo e com uma totalidade - e diria que essa totalidade é quase totalitária, para usar de uma expressão maldosa, mas real. O totalitarismo tomou conta do Poder Executivo do Brasil nessa circunstância, nessa conjunção astral que encontra o Tribunal Superior do Trabalho fragilizado em virtude dessa circunstancial Presidência; o Legislativo um pouco atônito. O Senado abdicou da condição de Casa revisora. Abdicou abertamente e agora, em boa hora, retoma o papel...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - O Senado não aceitou mexer numa vírgula, não abriu espaço para nenhum tipo de negociação. Pelo menos na Câmara, mal ou bem, fizeram o que bem entenderam. O Senado recebeu aquele pacote: "é isso aqui, não tem papo e votem".
O SR. LUIS CARLOS MORO - E há aqui uma violação clara. Nesse ponto, há uma violação clara de um princípio da construção democrática do Direito do Trabalho que me parece de consignação essencial em um estatuto do trabalho.
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Um projeto de lei de qualquer natureza que mexa em direitos tão fundamentais quanto os direitos trabalhistas não pode prescindir de um debate aprofundado, amplo e que envolva todos os interesses nele envolvidos, inclusive os patronais, inclusive os dos trabalhadores. Não é admissível que tenhamos um rito legislativo como o que tivemos nesta Casa.
Parece-me também essencial que do estatuto conste um capítulo específico da principiologia do Direito do Trabalho e um capítulo que assegure a evolução hermenêutica dos princípios. Nós não podemos legislar partindo do pressuposto de que os ocupantes de um determinado poder da república não tenham qualificação ou não tenham condição de fazer precisamente aquilo que a Constituição lhes outorgou, que é a tarefa hermenêutica do Direito, o que não decorre apenas de uma lei, de uma reforma ou de uma deformidade em todo um sistema. O Direito se compõe de normas e princípios que devem ser valorados como normas, que têm um conjunto, um substrato amplo de regras. O Direito do Trabalho dialoga com inúmeros outros ramos do Direito.
Nós precisamos ali contemplar, nesse eventual capítulo da principiologia do Direito do Trabalho, não apenas princípios de Direito material ou individual do trabalho. É preciso que haja a asseguração de determinados princípios processuais, de determinados princípios de Direito coletivo e de produção das normas de Direito do Trabalho para que não venhamos a ter, novamente, a traumática experiência que tivemos aqui em relação à Lei 13.467, que é a Lei da Reforma Trabalhista.
Então, parece-me que há uma lição a haurir dessa infeliz experiência legislativa que tivemos. E a lição, parece-me, é a necessidade de outorgar a proteção de uma processualidade democrática na constituição da legislação do trabalho muito mais ampla do que essa que tivemos e que formalmente nos confere a aparência de um processo legislativo lícito e democrático mas que, na essência, converteu as duas Casas do Legislativo em molas propulsoras de um determinado setor da sociedade, da sua concupiscência, do seu insaciável desejo de acumulação de riqueza mediante espoliação do trabalho humano e da classe trabalhadora.
Há aspectos que são absolutamente inadmissíveis, e tenho a segurança de que a Magistratura, com todas as suas vicissitudes, com todas as suas defecções - a advocacia também tem as delas, o Ministério Público também tem as dele, o Legislativo também tem as suas defecções e deficiências.... Mas nós precisamos aprender a confiar nas nossas instituições, confiar nas instituições desde a sua base até a sua cúpula, de modo que eventuais distorções tenham a possibilidade de ser corrigidas. Não incumbe ao Poder Legislativo, com todo o respeito que se nutre ao Poder Legislativo, atuar reativamente a uma determinada orientação hermenêutica do Judiciário. Isso, lamentavelmente, é um traço de disputa ideológica que se vê muito mais no campo das relações de trabalho.
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Não se vê esse mesmo olhar policialesco no Judiciário, no campo da jurisdição penal. Não se vê esse mesmo olhar policialesco do Judiciário no campo da jurisdição civil. O que se nota é que uma grande parcela dos detentores do poder - e nesse aspecto a forma de eleição no Brasil e de representação no Parlamento é algo que merece uma discussão não apenas quanto à reforma atual, mas também quanto às suas consequências, a forma como essa Legislatura se vê representada - faz com que nós tenhamos uma profunda dificuldade em enxergar, na legislação produzida no âmbito desta Legislatura, caráter e viés democrático de representação de toda a sociedade, e não apenas daquela fração que se fez representar pelos mecanismos de financiamento das campanhas políticas, já declarados incompatíveis com a ordem constitucional pelo Supremo Tribunal Federal. (Palmas.)
Basicamente, o que me parece, como proposta prática para a sequência de nossos trabalhos, é que nós devemos haurir as lições que tivemos aqui.
(Soa a campainha.)
O SR. LUIS CARLOS MORO - E, mais do que isso, condensar na proposta de um estatuto do trabalho que deveria ser inaugurado um capítulo principiológico - um capítulo não apenas de enunciação de princípios fundamentais, dos quais não se deve abrir mão, de modo algum, mas também um capítulo que proporcione a abertura, não apenas para que a lei se auto-oxigene, como que seja uma demonstração de confiança nos nossos intérpretes, nos nossos exegetas, e não uma lei de retirar a capacidade interpretativa, o poder interpretativo daqueles a quem a Constituição outorgou a missão de interpretar a legislação brasileira. É com essas considerações que eu gostaria de encerrar, fazendo um pequenino chamamento aqui aos colegas advogados que eventualmente estejam assistindo: acompanhem os trabalhos desta Comissão; acompanhem os trabalhos de desenvolvimento do Estatuto do Trabalho; acompanhem os trabalhos associativos que se desenvolvem no âmbito da Anamatra, com as suas importantes jornadas de discussão do Direito do Trabalho, do Direito Processual do Trabalho, do Direito Coletivo do Trabalho, que serão realizadas em breve; acompanhem o trabalho da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas e de seu Congresso Nacional dos Advogados Trabalhistas, que deverá ocorrer no mês que vem em Salvador, na Bahia.
(Soa a campainha.)
O SR. LUIS CARLOS MORO - Somente dessas discussões e com o decantar dessas ideias é que nós vamos poder ter com segurança...
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(Soa a campainha.)
O SR. LUIS CARLOS MORO - ... o desenvolvimento do Direito do Trabalho na direção correta porque é preciso rapidamente que nós façamos o retorno desse desvio que foi construído no Direito do Trabalho, que nos leva para uma retrocessão, nos leva cada vez mais distantes do objetivo de assentar um direito do trabalho que seja fonte de equilíbrio das relações entre capital e trabalho e que seja fonte de uma distribuição justa e equitativa da riqueza produzida pelo trabalho.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem. Dr. Luis Carlos Moro, advogado trabalhista, que, a exemplo de outros painelistas, deixou uma série de contribuições para o grupo, não é, Leandro? Porque você é o executivo desse grupo. O Leandro é advogado, trabalha comigo. Ele está mais na parte executiva. Já está em uma lista, deve ter umas trinta pessoas que estão colaborando com esse debate.
Eu queria muito agora passar a palavra para a nossa querida Presidenta desta Comissão, Senadora Regina Sousa.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Primeiro, eu quero mais uma vez parabenizar o Senador Paim pela ideia do Estatuto do Trabalho. É uma ideia que eu gostaria de ter tido.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Não, mas você sempre colaborou para isso acontecer.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Acho que é muito importante isso. A gente precisa valorizar muito, meus companheiros do movimento, essa ideia e contribuir porque, já foi dito aqui, o Senado abre mão de ser Casa revisora e até fortaleceu aquela ideia de muita gente, que diz que não precisa o Senado. Acabou fortalecendo essa ideia. Tem muita gente que diz: "ara que Senado?" Então, se ele abre mão de ser Casa revisora, para que Senado?
A mais agressiva atitude nesse sentido foi essa da reforma, mas há muita coisa que chega em regime de urgência e não temos oportunidade de debater, porque é regime de urgência. Eles combinam antes, chega e não derrubamos o regime de urgência e votamos um monte de coisas que são prejudiciais ao povo brasileiro.
Eu acho que tem uma coisa, Senador, que foi falada aqui: o Brasil assina tudo que é tratado, moderno, bonito, mas não cumpre. Então, acho que tem que ser um capítulo desse Estatuto. Assinou, é signatário, tem que cumprir. Vai ter que ter um jeito de cumprir porque é um descumprimento total de tudo. A gente fica lutando. Eu fui sindicalista, sei o que é isso também. Vai para a Justiça, demora.
Então, tem que haver mais seriedade nessas assinaturas: assinar se realmente for cumprir, porque, se você pegar os tratados, em quase todos, o Brasil está lá como signatário e não cumpre nada. Então, acho que é um capítulo que tem que obrigar que se cumpra porque ele vai sempre na contramão.
Ontem, foi ontem ou foi anteontem, a Folha de S.Paulo publicou... E foi falado aqui a questão da mídia e do papel da mídia nessa história toda. Acho que todo mundo viu a manchete da Folha, que causou revolta até na própria Paula, que é ombudsman da Folha, porque dizer que a terceirização não rebaixa salário é um absurdo muito grande. É o papel que a mídia está cumprindo. A mídia está cumprindo um papel, está entregando a mercadoria encomendada a ela, e isso tem preço. A publicidade que está aí, só olhar os gastos com publicidade, com esses órgãos. Então, eles estão cumprindo um papel, mas chega a ser ridículo publicar como principal manchete uma matéria dessa, baseada no estudo de duas pessoas que são militantes da reforma trabalhista. Claro que eles iam falar a favor.
Um meio de comunicação, para ser imparcial, tinha que ter publicado pelo menos duas opiniões. Assim, daria mais credibilidade ao órgão, mas acho que eles não estão preocupados com isso.
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Quero dizer também que me preocupa, já foi dito aqui, o silêncio dos bons porque realmente está faltando reação. Parece que as pessoas entregaram os pontos. E aí, tem também há motivação. Há um propósito e há ações de fragilização das entidades representativas de movimento popular, entidades populares. A começar pelo imposto sindical, que também vai fragilizar muitos, mas também vai tirar muita gente do mapa, que não serve para nada. Mas vai fragilizar por conta da pressa. Se fosse uma coisa mais gradativa, todos os sindicatos que realmente representam iriam arranjar formas de sobreviver. Então, muita gente vai ter um choque também, e isso fragiliza as lutas dos sindicatos.
Eu estava pensando nisso. Anteontem, fiz uma reunião em um Município pequeno e, em todo lugar que eu chego, é a mesma coisa: o Bolsa Família. Eles inventaram aquela história de que tinha dez mil empresários recebendo o Bolsa Família porque tinham CNPJ, onde eu chego tem essa reclamação. São pessoas simples, são presidentes de sindicato, presidentes de associação, principalmente o sindicato dos trabalhadores rurais, ou dirigente. Não é só o presidente, mas algum dirigente, o CNPJ vinculado a ele. Geralmente é o presidente, mas também pode ser o secretário-geral, dependendo da forma colegiada como o sindicato funciona.
Aí, o que que eles dizem? Alguns prefeitos de boa-fé vão mandar assistente social e ver que não é nada daquilo e retorna a pessoa com o Bolsa Família, mas a maioria está mandando dizer: vá na Receita Federal resolver seu problema. Ora, o que a Receita Federal vai dizer? Desista de ser presidente, renuncie para poder voltar. Então, isso está acontecendo no Brasil inteiro. No Nordeste, é mais gritante porque é onde é o maior público do Bolsa Família.
Então, isso também tem um propósito, fragilizar as entidades. As pessoas estão deixando de querer ser presidente de associação de moradores, de associação comunitária, para não perder o Bolsa Família. Então, isso é muito sério. Eu já fiz essa denúncia na tribuna. Até um Senador do Governo disse que ia verificar, mas parece que não viu nada.
E agora vem a pá de cal que querem passar na reforma política, que, aliás, nem merece esse nome, mas o tal "distritão". Se passa o "distritão", nunca mais representante de trabalhador vai ter vez, vai chegar, vai alçar a representação no Parlamento. "Distritão" é capitania hereditária, vai ser um pai que vai ser eleito e ele só vai sair dali quando o filho estiver pronto para assumir aquele lugar. Representante de entidade não vai ter vez. O mesmo para as mulheres, que já têm uma representação mínima, porque as mulheres hoje são eleitas, mas não são eleitas com grande votação. Elas sempre estão indo no conjunto da legenda do partido ou da coligação e, com certeza, vão ficar fora também. Vai diminuir a representação das mulheres.
Essa coisa está aí, é a única coisa que interessa à parte da maioria aí do Governo e talvez seja a única coisa que vai ser votada nessa história toda porque a resistência realmente é mínima, é pequena.
Então, quer dizer, é uma forma de enfraquecer sempre a resistência. A gente precisa prestar muita atenção a isso. Aí, vão dizer: "não, não vai votar" É bom, é bonita a palavra de ordem, mas eu tenho verificado também que por onde ondo faço essa pergunta, e ando muito e converso muito com o povo, com o sindicato principalmente. Eles não lembram em quem votaram porque ele vota no vereador ou no prefeito. É o prefeito que pede para ele votar no Deputado e é o vereador que pede ou manda ele votar no Deputado. Ele recebe a chapinha, ele nem olha o nome. Eu ouvi isto de pessoas: "ah, nem me lembro em quem eu votei, votei porque o vereador pediu." Já recebe pronta uma chapa para votar. Isso é muito sério no País, no século XXI, mas é verdade. Isso acontece.
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Então, é muito difícil dizer que essas pessoas não vão ser eleitas. Apesar da campanha que a gente faz, mas é muita gente também que a gente não alcança porque é pouca gente que está fazendo essa campanha. Então, acho que a gente tem que usar os instrumentos de que dispõe. Eu acho que o Parlamento aqui, esse espaço desta Comissão... Ainda bem que somos nós, eu e Paim aqui que dirigimos esta Comissão. O lado do Governo ainda não acordou talvez para a importância desta Comissão porque - o painel não está ali para mostrar, mas o Governo não preencheu as vagas dele no painel. Tudo vago, mas estamos funcionando porque tem maioria, tem metade mais um. Mas o Governo não se interessou sequer de indicar os membros da Comissão de Direitos Humanos.
Então, a gente precisa buscar mais espaço para agir. Eu acho que nossos movimentos estão precisando acordar um pouco mais. Eu sei há toda disposição de um grupo, mas ainda é pouco, diante do que nós estamos vivendo. Estamos fragilizados e não vamos poder... Está vendo aí, está ressurgindo tudo que achávamos que tinha acabado.
Massacre dos índios. Gente, aquilo é um absurdo muito grande. Foi há 24 anos o maior massacre Ianomâmi. Nunca mais tinha sido assim essa coisa tão grande, e houve na ditadura. E ainda tem quem queira que o marco temporal da terra indígena seja a Constituição. Como, se eles foram exterminados antes da Constituição?
Mas eu estou assim muito angustiada. Eu vim a esta audiência, quero assistir para ver se conseguimos achar uma luz, um caminho em que possamos ir. É bom saber que temos com quem contar lá fora ainda, com alguns dos senhores que estão aí fora resistindo como resistimos aqui.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Meus cumprimentos. Brilhante como sempre.
Pediram para eu não falar sobre isso, mas cada vez que lhe atacam, semelhante ao que fizeram com V. Exª, vou e defendo, daí eles batem em mim. Pelo menos divide um pouco, Regina, divide um pouco. Mas batem mais em você, aí eu vou e defendo. Daí, batem em mim também. A grande mídia, é uma covardia assim nunca vista. Mas mais uma salva de palmas para a nossa Presidenta.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI. Fora do microfone.) - Eles batem em quem incomoda.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Exato. E eu tenho orgulho. Deixa eles soltarem aqueles materiais deles ali, que eu fico satisfeito porque eu estou do lado certo.
Por favor, Graça Costa, secretária de Relações do Trabalho da CUT Nacional.
A SRª GRAÇA COSTA - Bom dia a todos e todas. Eita, ninguém responde. Como sempre, Senadora Regina...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eu só queria, me permita. A Ministra Delaíde vai ter que sair. E ela tem que sair, então eu queria dar uma salva de palmas para ela. A Dra Gabriela também vai ter que sair. Então, vamos dar uma salva de palmas para ambas aqui e o debate continua. (Palmas.)
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A SRª DELAÍDE ARANTES - Eu peço desculpas à Graça, minha querida amiga...
A SRª GRAÇA COSTA - Imagina, Ministra.
A SRª DELAÍDE ARANTES - ... representante sindical da mais alta envergadura.
Um abraço.
A SRª GRAÇA COSTA - Obrigada.
Senador Paim, quero iniciar parabenizando pelo trabalho, como sempre. Acho que a iniciativa que está em curso aqui é realmente uma trincheira de resistência.
Nós sabemos o que significa este momento; é um momento muito complicado, muito difícil para nós, para a classe trabalhadora, mas também para o povo brasileiro. O ataque é muito grande e o mais importante é a gente saber que ele não finalizou. Nós estamos num processo de golpe. Ele não finalizou, como já foi dito aqui, e precisamos estar atentos e atentas, porque, além dessas medidas que foram tomadas, há outras que estão em curso, como a privatização de todas as estatais. Nós tivemos um movimento de resistência significativo nos anos 90; conseguimos barrar muita coisa, mas agora existe um ataque muito feroz, muito difícil para nós, para o povo brasileiro.
Quero dizer à Senadora Regina que ela tem a nossa solidariedade. Sinta-se energizada. Acho que aqui, em alguns momentos, fica-se muito solitário, mas não significa que não estejamos sintonizados e sintonizadas com o que está acontecendo.
Nós passamos esse mês de agosto, Senador Paim, acompanhando os congressos estaduais da CUT, e, no final do mês, nós tivemos o congresso nacional. Tiramos muitas resoluções para enfrentar essa questão da reforma trabalhista, principalmente, mas também nos preparando para, se houver essa reforma da previdência, estarmos mobilizados e mobilizadas para essa questão.
E quero dizer que realmente é uma luta muito desigual. Como a Senadora Regina falou, na matéria que saiu na Folha de S.Paulo, por exemplo, a manchete diz que a terceirização não derruba os salários, mas o conteúdo da matéria diz que derruba, sim. A grande questão que está colocada na matéria é a de se contrapor ao estudo que nós fizemos, que a CUT fez com o Dieese. E eles querem derrubar isso, fazem crítica, inclusive chegando a ser antiéticos, porque a metodologia que você estuda, quando você faz um estudo, uma pesquisa, ela difere de um instituto para outro, de um órgão para outro. E isto é antiético, eles jogarem isto na imprensa: que a gente não fez o trabalho correto.
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Mas lá o estudo deles diz que é de 17% a diferença de salário de quem é terceirizado. No nosso, é de 27%, 26%. Aí depende da categoria; a média geral é esse valor. Mas eles são muito ruins, maldosos, porque eles põem uma manchete e levam todo mundo a achar que aquilo é verdadeiro.
E esse aspecto é uma das maiores dificuldades, um dos maiores desafios que nós temos nessa conjuntura tão complicada, porque, enquanto nós estamos fazer a discussão e conscientizar e trazer para os trabalhadores e para as trabalhadoras o que realmente é a reforma, a imprensa burguesa faz a festa. E é muito complicado.
Então, também quero dizer que nós tiramos uma decisão na CUT: nós não reconhecemos a reforma, assim como nós não reconhecemos o Governo Temer, que é ilegítimo, assim como nós nos posicionamos de não sentar para negociar com este Governo, porque nós não reconhecemos este Governo. Nós não reconhecemos essa reforma.
E, aí, vamos resistir; vamos resistir em todos os aspectos. Vamos resistir na negociação, na mesa de negociação. E o primeiro teste está sendo agora nas campanhas salariais das categorias, pois estão agora no segundo semestre e, mesmo a lei começando a valer no dia 11 de novembro, os patrões já querem implantá-la agora nos processos de negociação. É um absurdo o que está acontecendo, mas a gente vai resistir. Nós sabemos que precisamos de um processo de mobilização muito mais forte, greves muito mais fortes das categorias, para garantir o direito no negociado agora. E nós sabemos que é uma situação bastante delicada esse período; mas vamos resistir.
Nós temos também o processo de debate jurídico. Temos um coletivo jurídico; nós estamos discutindo, estamos trabalhando os itens que podemos trabalhar na primeira instancia, para enfrentar o que é ilegal, o que fere as normas, inclusive internacionais. E vamos continuar fazendo esse trabalho.
E, no processo de mobilização, nós tiramos uma decisão de fazer um projeto de lei de iniciativa popular, que é para se somar a este movimento, que há tanto na Câmara quanto aqui, do Estatuto do Trabalho. Nós lançamos essa campanha no dia 7 agora, no feriado, no Grito dos Excluídos, em todos os cantos do Brasil. Nós vamos colher assinaturas para solicitar revogação e nos somar ao projeto de lei que V. Exª já apresentou - o companheiro Paulo Paim - e também às iniciativas que há na Câmara dos Deputados.
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Mas nós entendemos que, além de uma proposta legislativa, a questão da nossa proposta é fazer o debate, é descer nos locais de trabalho, é discutir e fomentar o movimento de massa, de que nós necessitamos nesse momento no nosso País, porque realmente nós estamos numa situação muito delicada.
Várias centrais sindicais estão sentando com o Governo; nós não sentamos. Nós estamos passando por um momento muito delicado, porque essa unidade das centrais para nós, para a classe trabalhadora brasileira, era número um; era questão de honra nossa estarmos juntos nesse momento para poder debelar esse confronto que existe contra a população brasileira.
Das questões internacionais que foram colocadas, realmente nós temos um estudo. Nós também estamos fazendo uma denúncia internacional à OIT dessa questão da reforma trabalhista, também da terceirização e de outras questões que estão em curso. Ela fere, sim, várias convenções da OIT. O Governo brasileiro nesse momento e o Parlamento brasileiro passaram por cima de acordos internacionais firmados há várias décadas, como é o caso da Convenção 98, que trata do direito à negociação coletiva, enfim...
E o mais absurdo é que nada disso, como foi dito aqui, foi negociado ou discutido de forma bipartite ou tripartite. O povo brasileiro, o trabalhador brasileiro, homens e mulheres ficaram fora dessa discussão. Não houve... Eles ficam aí fazendo discurso de que houve um grande debate. Realmente, nós viemos aqui e debatemos e mostramos e apresentamos muitas propostas, mas nenhuma foi aceita. Nem uma vírgula foi mudada! Então, não houve realmente debate. Conforme o direito internacional, a Convenção 144, deveria ter sido feita uma consulta. Quando há uma transformação, uma mudança muito radical, deve haver uma consulta, e essa consulta não foi feita. E nós não fomos escutados.
Então, vamos continuar na resistência; vamos continuar nas denúncias. E fica aí a grande lição: há muita gente boba que ainda não compreendeu - inclusive do movimento sindical, do movimento popular - o que está acontecendo no nosso País. Eu chamo atenção sempre, aonde a gente vai, de que é necessário que as pessoas compreendam. Nós temos o dever de descer nos locais de trabalho e explicar para os trabalhadores e para as trabalhadoras o conteúdo da reforma; fazer com que as pessoas compreendam a necessidade da mobilização e que a gente fique indignado, todos e todas, com essas medidas. Que a gente tenha uma reação mais coletiva. Mas, infelizmente, há muita gente que está totalmente equivocada, com a leitura equivocada desse momento.
Agradeço, Senador.
E estamos à disposição, a CUT está à disposição para essa luta sempre.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Graça Costa, Secretária de Relações de Trabalho da CUT Nacional, que me deu a alegria de ter feito aquela parceria.
Nós fomos aos 27 Estados, denunciando o que iria acontecer. Muita gente também naquela época não entendeu. Fomos sempre às assembleias legislativas, chamando todos os setores para o debate. Fizemos a nossa parte, mas não é fácil.
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E, depois também, a Câmara... Eu sempre digo: o mais covarde foi o Senado, porque a Câmara, mal ou bem...
A SRª GRAÇA COSTA - Mas é reconhecido, Senador Paim e Senadora Regina. O trabalho de vocês aqui - dos poucos Senadores que nós temos - é muito reconhecido. Vocês não têm ideia do quanto as pessoas os parabenizam; não têm oportunidade de vê-los diretamente para dizer isso, mas a gente sabe. A gente sabe o quanto é importante essa resistência aqui de Parlamentares comprometidos conosco.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eu digo isso, porque a Câmara fez pro mal, mas fez alguma coisa. Eles pegaram sete artigos e transformaram 117. E o Senado não discutiu nada; não discutiu nem os sete, nem os 117, nada!
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Exatamente: mais de 800 emendas. E havia umas 300 deles, inclusive. Eles só diziam: "O chefe mandou."
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - É.
Uma vez eu disse para ele o seguinte: "Você concordaria que a sua esposa grávida ou a sua filha grávida trabalhasse em área insalubre?" "Ah, não. Claro que não, não é, Paim?" "Mas como é que você está votando isso, então?" "Porque o Temer vai vetar." Não vetou uma vírgula.
Não aceitaram. Não houve uma discussão.
Eu vou entregar depois o nosso voto em separado. Ganhamos em uma comissão só. Eu fui Relator na Comissão de Assuntos Sociais, e ali nós ganhamos; ganhamos do relatório deles.
Eu dizia: "Vocês leram isso aqui?" Eu li em 5 horas. Fiquei 5 horas lendo. "Não, não lemos e não vamos ler. Vamos votar como o chefe mandou." Esse era o clima aqui no Senado, por isso eu fiquei tão indignado.
Urbano, da Contag.
O SR. FRANCISCO URBANO - Bem, Senador, eu pedi a palavra agora mais para dizer que a gente não pode vir aqui e não deixar claro o nosso reconhecimento para a sociedade do seu trabalho e do da nossa Senadora aqui, nesta Casa.
O trabalho de vocês não repercute só na previdência, na legislação trabalhista; mas repercute também nesse processo que você está fazendo agora, no debate do Estatuto do Trabalhador, que vai puxar todo o debate.
Olha, eu não sou advogado; eu sou camponês. Faz tempo que eu não escuto algo que possa trazer para a gente com tanta clareza o desmonte, a destruição do cidadão, porque o direito está na proteção desse cidadão. Eu tenho a impressão... Não é possível que isso não consiga repercutir em nossos dirigentes sindicais, em uma parte deles que está meio dormindo. Boa parte dos nossos advogados trabalhistas não estão acompanhando isso de forma mais atenta.
Como nesta sala não está cheio de advogado trabalhista para ouvir vocês? Como a gente não tem uma informação de que nesta hora estejam lá reunidos, em seus sindicatos, grupos de advogados e lideranças assistindo a este debate, já que não puderam vir aqui? Para democratizar esse debate, para ele chegar às grandes massas.
Eu consegui gravar... Eu já pedi e vou vir aqui amanhã para tentar gravar, porque usando o link eu não estou conseguindo direito. Se vocês autorizarem, porque aqui a gente... Divulguem isso em CD, DVD, para as assembleias...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Vai ser autorizado tranquilamente.
Mas você lembra bem, Urbano, que nós estamos ao vivo para todo Brasil desde as 9h.
O SR. FRANCISCO URBANO - Pois é.
Qual é a minha angústia? É que, ao saber de uma reunião deste tipo, a gente comece a organizar lá nos nossos Estados... Há fórum sindical lá... Por que não se reúnem lá e não assistem, já que não podem vir aqui? Mas não é só para ouvir, não; pode gravar. Como é que eu transmito...
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Eu me lembro de que, alguns anos atrás, a gente não tinha esse tal de DVD, nem esse negócio aqui, não; mas a gente pegava um debate desse, transformava em chamada linguagem popular e, daqui, a gente mandava para delegacia sindical lá no interior. Não ia só para o sindicato, não.
Mas a gente hoje faz uns documentos - eu vou repetir - que parecem feitos para intelectual. Daquele intelectual, eu tenho que tirar, em linguagem popular, para a grande massa que não tem tempo de ler documento desse tamanho, dessa grossura, não. Não tem tempo ou, assim como eu, se tirar o rótulo nem lê.
Então, a gente tem que voltar a fazer estratégia sindical, comunicação de massa. Gente, comunicação de massa só faz a Globo... Não; nós já fizemos isso contra eles. Não é possível. Eu não acredito que a gente não consiga mobilizar novamente a nossa população, como a gente fez contra a ditadura militar, a gente fez pelas Diretas Já, a gente fez na Constituinte. Esta Constituição tem isso não porque foi feito pelos advogados da elite, como foram feitas as outras constituições. Foi feito junto com a população como um todo aqui. Por isso ela tem esse perfil.
E, agora, nós assistimos... É duro para um velhinho como eu chegar e ver algo que eu nunca vi. Olha, eu acompanhei a política desde 1961; desde 1960, porque acompanhei o final. E depois acompanho este Congresso faz muitos anos. E nunca vi nada igual à desqualificação, à falta de respeito ao papel que tem estas duas Casas.
E aí nosso Judiciário... Eu sempre disse e vou repetir - se tivesse um juiz aqui eu já teria dito: nós acreditamos demais no Judiciário como um órgão... O Judiciário nosso faz parte desse bloco da elite; ele tem banda e cor; ele tem lado. A vida inteira foi isso... E a gente acredita que justiça se faz pelo Judiciário? Não; o aparelho mais repressor das chamadas democracias burguesas contra o povo é o Judiciário. Democracia não é feita pelo Judiciário; justiça se faz por políticas públicas, que são interrompidas pela terceira ou quarta vez neste País, quando se começa a avançar em políticas públicas para a sociedade. E o Judiciário chega lá e faz...
Eu, certa vez, participei de um seminário internacional com todo o Judiciário. Desculpem, mas não posso deixar de dizer. Um juiz famoso, ministro, chamou-me para vir participar - e pediu uma audiência até, para ir lá para me convidar. Eu marquei a audiência e disse: "Eu pensei que o senhor fosse me prender aqui, porque Ministro da Justiça Federal pedir audiência com o Presidente da Contag..." "Não, eu o chamei porque eu quero que você diga tudo que você falou da Justiça." Eu falei: "Ah, então vai me prender lá no Congresso? Mas eu vou e digo." E eu disse lá que o Judiciário é uma casa de marimbondo - não sei se alguém conhece: mexeu com ele, sai um monte de lá, ataca tudo rapidinho, volta e se esconde, fica apenas olhando para dar ao outro de cá. É assim que esse Judiciário nosso funciona.
E agora ele mostrou a sua cara, ficou sujo de verdade para a sociedade, pelas bandalheiras. Não estou falando das pessoas; há muita gente boa dentro do Judiciário. Mas o modelo, o sistema não serve para a sociedade democrática progressista. Ou se muda... Na Constituinte, nós não mexemos no Judiciário, na estrutura e na organização partidária,...
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(Soa a campainha.)
O SR. FRANCISCO URBANO - ... e eu costumo dizer: nem nos militares, nem no terceiro, nem no quarto, nem na Igreja. Ficou tudo do mesmo jeito, por isso nós estamos vivendo pagando muito caro por não termos uma Constituinte exclusiva.
Eu queria só dar, de novo - para um velho sindicalista -, um desabafo, mas acreditando que nós vamos mudar com figuras como você, a senhora, provocando todos os dias ambiente para alertar todos nós para acordarmos de verdade em defesa de nós mesmos, de uma sociedade mais justa.
Mas eu aposto mesmo é em vocês, gente, quando eu vejo a juventude. Nós velhinhos podemos até contribuir com alguma experiência, mas quem vai mudar é a juventude. Não há mudança em lugar nenhum sem que a juventude possa participar efetivamente. Isso o Paim sabe muito bem.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem!
O SR. FRANCISCO URBANO - Desculpe-me pelo tempo.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Não, foi bem, foi bem, Urbano, da Contag. (Palmas.)
Você tem toda a razão, Urbano.
Sabe quando a gente vê essas malas e malas, apartamento com R$52 milhões ali... E quantos apartamentos não existem por aí com esses milhões e milhões de reais? Mala correndo de uma pizzaria para outra...
Aqui no Senado - não vou citar nome para não me incomodar mais aqui dentro porque eu já me incomodo - há Senador com 15 processos nas costas, denunciado em todas áreas, e são os bambambãs do Governo aqui dentro.
O SR. FRANCISCO URBANO (Fora do microfone.) - Toda a equipe do Governo.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - E todo mundo acha mais que bonito isso.
Se olharmos para o lado de lá, o Temer e os seus principais ministros, todos envolvidos. E o que eles dizem ainda? "Não, isso não interessa."
Como não interessa? Um ex-ministro dele, o Geddel, preso. E quando Geddel abrir a boca agora, sabe-se lá o que vai acontecer. Diz-se que o Cunha vai abrir também, sabe-se lá o que vai acontecer. Eles dizem:"Não, isso é assim mesmo. E nós vamos fazer a reforma política e vamos continuar tirando direitos dos trabalhadores".
Olhe, se fosse num outro país, para mim isso já teria dado uma convulsão, no mínimo, no mínimo, no mínimo. Mas eu também sou daqueles que estou no verbo "esperançar". Eu não canso, como eu sei que vocês também não cansam, e por isso estamos aqui.
Eu vou estar lá em São Paulo, agora na quinta-feira, dia 14, às 9h da manhã, com a CPI da Previdência. A grande imprensa não dá uma linha sobre a CPI da Previdência. Não dá por quê? Porque os grandes devedores são bancos e grandes empresários que são clientes deles.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI. Fora do microfone.) - Alguns Parlamentares.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Quem paga as propagandas? Quem paga a divulgação?
Quero só concluir com isso que ela disse aqui. Por exemplo, há 114 Parlamentares que devem para a Previdência e mais 14 Senadores. Vai dar isso? Não vai dar. Nós demos nomes lá na CPI - o Hélio José é o Relator. E aqui o Telmário Mota é o Presidente desta Comissão - na segunda é difícil para ele -, e nós somos o Relator. Nós demos os nomes de todos os bancos, um por um, e não acontece nada. "Devo, não nego, não pago, estou esperando um outro Refis".
O SR. FRANCISCO URBANO - Desculpe-me: é só uma coisa que esqueci e...
(Interrupção do som.)
O SR. FRANCISCO URBANO - .. não posso deixar de registrar nesta oportunidade. Além da reforma trabalhista, há um projeto de lei lá Câmara do Deputado Nilson Leitão que começa assim:... (Fora do microfone.)
1º Revoga-se a legislação trabalhista rural.
2º Não se aplica a CLT.
3º Remuneração não significa pagamento em dinheiro, pode ser em alimento, pode ser com moradia. E esse projeto está lá parado. Ninguém está conseguindo fazer um barulho com ele. E a gente se esquece de tratar dessa questão. Isso tem que ser denunciado, e eu estou insistindo para denunciar, para panfletar o nome desse cidadão, e se possível o nome dele e de parente, de aderente e até da quinta geração, porque se ele não for candidato, ele vai lançar como candidato a mulher ou a filha ou um sobrinho. Então, eu não posso deixar de registrar isso.
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Não; fez bem, fez bem, fez bem.
A Senadora Regina Sousa, com a palavra.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Não vou falar. Quero ouvir as pessoas que querem falar.
Vou falar somente uma coisa que você falou - que vai para São Paulo, com a CPI.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Com a CPI, dia 14, às 9h da manhã.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Na quinta-feira, nós teremos uma diligência em São Paulo sobre população em situação de rua. Eu e Gleisi - a Gleisi é a autora. Nós vamos ter o apoio lá do Suplicy, da comissão de direitos humanos de lá também.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Todo mundo junto.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Então, já avisando: quem estiver em São Paulo, nosso povo lá de São Paulo - ouviu, Graça? -, a gente vai estar lá quinta e sexta-feira, numa diligência da questão da população em situação de rua.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Há um local onde vocês vão estar, para eles se dirigirem?
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI. Fora do microfone.) - Eu tenho o endereço lá, mas não estou com ele aqui.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Mas se forem na assembleia, às 9h da manhã, quando se inicia a audiência pública, o pessoal pode dali se dirigir para esse outro evento, que é importantíssimo também.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Alessandra Camarano, Vice-Presidente da Abrat, presente aqui. Então, uma salva de palmas. (Palmas.)
Aquele cidadão ali, ele também foi um dos que viajou nos 27 Estados. Faça o registro aqui. Ele foi aos 27 Estados com a gente, naquele debate que fizemos.
O SR. EDIELSON SOUZA SANTOS - Primeiro, eu quero agradecer o convite.
E, ao mesmo tempo, Senador, eu gostaria de fazer um convite - não sei como está a sua agenda para outubro. Nós vamos fazer o 7º Encontro de Educadores Sociais, lá em Fortaleza. Depois eu mando o convite detalhado para a assessoria, para ver se há a possibilidade de o senhor comparecer, porque é também um tema que está na pauta também que é a questão da legalização dos educadores sociais, que não são legalizados até hoje, no País.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eu acho que eu sou Relator do projeto, inclusive.
O SR. EDIELSON SOUZA SANTOS - Sim, é.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - O Telmário Mota é o autor. É aquele, não é?
O SR. EDIELSON SOUZA SANTOS - Então, eu queria registrar aqui e dialogar com o que a Graça coloca, sobre essa questão de não haver consciência: não só os trabalhadores não têm consciência, como também muitos sindicalistas, e até o próprio patrão não tem consciência do mal que isso aqui faz. Por isso é que nós da CNQ - eu sou da CNQ, das relações de trabalho da CNQ - vamos realizar um seminário, debatido com os sindicalistas, para explicar para os trabalhadores. Porque a reação só vem se você tiver conhecimento do mal que fazem. Então nós faremos isso. E estamos tentando dialogar ao máximo com os trabalhadores para que tenham essa consciência para fazer a reação, porque a luta só vem se houver conhecimento do mal que fazem.
Era isso o que eu queria deixar.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem!
A CNQ é a Confederação Nacional dos Químicos. (Palmas.)
E a confederação é que permitia que você fosse em todos os Estados acompanhar o debate. E você participava como painelista, inclusive.
O SR. EDIELSON SOUZA SANTOS - Estarei lá, quinta-feira, dia 14, em São Paulo também.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eu queria terminar, se me permitem agora.... A não ser que tenham alguma coisa. O senhor tem alguma colocação a mais?
O SR. LUIS CARLOS MORO - Não.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eu queria... Quem puder leia, pois é interessante: Reforma trabalhista: prova de fogo para os trabalhadores brasileiros - voto em separado. Eu li todo este livro aqui, fiquei cinco horas lendo, mas eu li aqui, ao vivo. E os Senadores diziam: "Ah, mas vai ler tudo isso?" Lia e ilustrava, pois em cada folha eu falava um pouco de improviso. Mas este livro que tem a participação - quero valorizar aqui - da Anamatra, do Ministério Público do Trabalho, dos advogados trabalhistas - olha lá: ele ajudou na elaboração do meu relatório -, da Abrat, que ajudou também... Todos ajudaram a escrever este relatório aqui. O Sinad também. Vocês vão ver que eu fiz de tudo aqui. Se vocês pegarem as primeiras quatro páginas, vocês irão ver que eu tentei trabalhar com a emoção. Lá no final, ainda trabalhei com a emoção, que foi a minha versão final do pronunciamento de encerramento. E dentro dele, há todo um conteúdo técnico, jurídico, social, político, dizendo que é inconstitucional. Adiantou? Adiantou de nada. Mas eu recomendo: quem puder ler, vocês vão gostar de ler, tanto as primeiras páginas como as últimas, como toda a técnica dentro, construída por aqueles que nos assessoram e nos ajudaram muito. Aonde eu vou, eu estou deixando esta cópia, que é assinada por todos os ... Representou aqui o voto do campo da oposição.
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Então, eu termino dizendo que oxalá a gente possa um dia levantar, não um voto em separado que ganhamos numa comissão e foi derrotado em Plenário, mas um Estatuto do Trabalho! Porque esta é a versão que ficou: ficou o Estatuto do Empregador. E vejam: há quem dissesse que teria que fazer o do trabalhador. Não, a gente está fazendo o Estatuto do Trabalho. E aqui vão ser ouvidos também os empresários. E há muito empresário sério que discorda disso que eles fizeram aí, que vêm falar com a gente, como na CPI da Previdência também. Na CPI da Previdência, um cara chegou e me disse: "Paim, esse pessoal que não paga a previdência nunca, não paga a parte dele, não paga a parte do trabalhador que ele desconta, isso dá R$30 bilhões por ano de apropriação indébita. Isso é concorrência desleal: claro que o produto do cara vai chegar mais barato no mercado do que o meu" - disse ele. E o pessoal fica esperando Refis. Banco que deve quase R$4 bi. JBS, quase R$4 bi, por exemplo. Aí não dá, não é?
Então, vocês podem estar certos que, ainda no mês de outubro, nós vamos entregar o relatório final - já falamos com o Hélio José -, demonstrando que vão ser assustadores os dados. Se não tivessem metido a mão no dinheiro da previdência, sabe quanto nós teríamos em caixa? Eu vou dizer o meu número: R$2 tri. O Paulo Penteado, que é procurador ou promotor lá em São Paulo, vai entregar um documento, e sabem o que ele diz? "Não é R$2 tri, Paim: é R$7 tri". Ele vai entregar um documento mostrando isso. Nem eu sabia, eu só trabalhava com o superávit que a Anfip falava, que em média daria uns R$50 bi. Hoje eu já falo em R$2 trilhões a R$3 trilhões. E o Paulo Penteado mandou um documento por escrito para mim que ele vai entregar em São Paulo também. Ele mostra por A mais B que dá em torno de R$7 trilhões. E agora querem fazer a reforma da previdência para tirar de quem, de novo? Do trabalhador rural, por exemplo; do urbano; do servidor. Nós vamos fazer de tudo para que eles não tirem. Podem ter a certeza absoluta.
Muito obrigado a todos. Parabéns a todos que participam deste trabalho e que estão ajudando a elaborar, construindo o Estatuto do Trabalho!
Dr. Luis, no dia 1º de maio nós vamos entregar a primeira versão, e queremos que durante maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro ele esteja pronto. Porque eu sinceramente não acredito que este Congresso aprove. Nós estamos preparando uma peça para que o Congresso, eleito em 2018, com um novo Presidente da República eleito - um Congresso decente, e não esse, que é indecente, e um Presidente decente, porque esse é indecente - possam então aprovar e sancionar o Estatuto do Trabalho. Muito obrigado a todos.
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(Iniciada às 09 horas e 11 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 34 minutos.)