12/09/2017 - 30ª - Comissão de Educação e Cultura

Horário

Texto com revisão

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A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Bom dia a todos e a todas aqui presentes.
Havendo número regimental, declaro aberta a 30ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Educação, Cultura e Esporte, da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura.
A presente reunião atende ao Requerimento nº 37, de 2017, da Comissão de Educação, de minha autoria, para a realização de audiência pública destinada a avaliar os indicadores referentes às metas do Plano Nacional de Educação (PNE) durante os três anos de sua vigência.
Dando início à audiência pública, solicito ao Secretário da Comissão que acompanhe os convidados para tomarem assento à mesa.
Convido a Srª Priscila Cruz, Presidente-Executiva do movimento Todos Pela Educação; Antonio Vieira de Paiva Neto, consultor do Instituto Ayrton Senna; Herton Ellery Araújo, técnico de planejamento e pesquisa da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.
Cumprimento e agradeço aos expositores. Quero dizer da satisfação da Comissão de Educação em recebê-los aqui para uma avaliação do Plano Nacional de Educação.
Esta Comissão conta aqui com o seu Vice-Presidente, especialista na área, Senador Pedro Chaves; conta também com o Senador Roberto, que também nos honra com sua presença; com a Senadora Maria do Carmo; com assessores dos diversos Senadores; com a imprensa. É com muita satisfação que os recebo aqui.
Eu quero iniciar as minhas palavras dizendo um pouquinho sobre o objetivo desta audiência pública.
A Comissão de Educação tem buscado se inteirar de todo o processo desenvolvido pelo Ministério da Educação. E o Plano Nacional de Educação, ao completar três anos, merece que esta Casa conheça, através dos especialistas, a evolução desse plano. Então o nosso objetivo é exatamente conhecer a avaliação que os especialistas estão fazendo em relação ao plano, a fim de saber onde estão as falhas, onde conseguimos avançar e onde precisamos melhorar.
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Todos sabemos a posição central que as políticas educacionais ocupam entre as políticas públicas em todos os países. A utilização do PNE como instrumento ganhou força com a Emenda Constitucional nº 59, de 2009, que tornou esse planejamento uma exigência constitucional, com periodicidade de dez anos. A Lei 13.005, de 25 de junho de 2014, representa o nosso primeiro esforço no sentido de atender a essa obrigação.
É necessário que o planejamento seja acompanhado por este Parlamento. A ocasião do terceiro aniversário da lei é uma excelente oportunidade não só para avaliarmos em que ponto estamos, como também para obtermos o retorno sobre os nossos processos de planejamento, que é muito mais do que simplesmente o estabelecimento de metas. É preciso verificar se a política pública vai na direção certa, se gera resultados eficientes, eficazes, efetivos e sustentáveis ao longo prazo.
Metas não realistas, metas não acompanhadas, planejamento não flexível, incapaz de atender mudanças conjeturais, metas sem indicadores confiáveis. Esses são alguns dos problemas típicos da precariedade do planejamento em nosso País. Se vamos avaliar uma das políticas públicas mais importantes para a Nação, nada melhor que se faça isso por meio de audiências públicas, como esta que agora se inicia, ouvindo não apenas os especialistas ligados aos órgãos públicos, mas também especialistas de entidades não governamentais afeitas ao tema de educação.
Também é fundamental facilitar a participação do cidadão, razão pela qual esta audiência pública será interativa, permitindo a apresentação de questionamentos e comentários por meio do Portal e-Cidadania, acessível pela internet, a partir do Portal do Senado Federal, www.senado.leg.br, e do serviço Alô Senado, fone 0800-612211.
Com os convidados de hoje, já mencionados aqui, esperamos ter uma audiência bastante produtiva, que nos faça avançar na compreensão do planejamento educacional do nosso País.
Portanto, passo, em primeiro lugar, a palavra à Srª Priscila Cruz, Presidente-Executiva do movimento Todos Pela Educação.
V. Sª terá 15 minutos.
A SRª PRISCILA CRUZ - Bom dia a todos e a todas.
É um prazer voltar a esta Casa novamente para falar do PNE - a gente que esteve aqui tantas vezes em audiências para construção do próprio Plano Nacional de Educação. Quero agradecer o convite da Senadora Lúcia Vânia, a presença de todos vocês. Espero contribuir aqui para o debate. Estou aqui ansiosa para fazer o debate com os meus dois colegas, porque a gente já se conhece bastante.
E acho que, agora, é muito mais; acho que a Senadora Lúcia Vânia falou um ponto importante: a gente tem que separar o que é um plano de metas e aquilo que é o planejamento e o plano de governo para a gente conseguir atingir esse plano de metas.
O Plano Nacional de Educação é muitas vezes atacado por ser uma lista de desejos, por ser um plano irrealista. Então, assim, muitas pessoas acabam criticando o plano, não entendendo o seu caráter e sua natureza, que não é a do planejamento. Cabe à gestão das secretarias estaduais e municipais, ao Ministério da Educação, todos os órgãos e todas as entidades que estão no entorno para garantir a qualidade da educação fazer esse planejamento e cumprir esse planejamento.
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A gente tem aqui o Neto, que já foi gestor no Rio de Janeiro, que sabe bem disso, que não adianta a gente criar situações de crítica ao Plano Nacional de Educação, como se ele fosse um planejamento. Acho que tem muita confusão, Senadora, em relação a essas duas naturezas, que são muito distintas.
Por conta disso, o plano precisa, sim, ser defendido. Por incrível que pareça, depois de tantos anos de debate aqui, depois de tanto ser discutido, refletido, o plano ainda precisa ser defendido. Ainda tem muita gente que critica o Plano Nacional de Educação, como se fosse um plano irrealista, um plano que a gente deveria agora colocar na gaveta, porque, afinal de contas, o Brasil está em crise, mais uma das suas crises, quando a gente deveria estar com o pensamento e o raciocínio oposto: o Brasil vive crises múltiplas, sobrepostas e cíclicas, porque nunca fez parte do nosso projeto de nação, se é que a gente um dia teve um projeto de nação claro, a educação como uma prioridade.
A gente nunca colocou a educação como o eixo central do nosso projeto de nação, porque, se isso tivesse sido feito, a gente não estaria vivendo no nível que a gente vive hoje, essas crises que a gente... Eu, que já passei por algumas dessas crises, a gente naturalizou o fato de que o Brasil é isso mesmo. O Brasil vive algumas crises de tempos em tempos, e crises muito profundas.
Então, se a gente quer romper, e eu acho que essa é uma tarefa... Acho que tem duas grandes tarefas educacionais: primeiro, realmente colocar a educação como eixo central do nosso projeto de nação, romper com essa tradição secular de descaso com a educação, acho que esse é um primeiro ponto; segundo, que é um tema que eu espero trazer com força nessa minha fala, na minha apresentação de hoje, é reduzir dramaticamente, drasticamente a desigualdade educacional que a gente tem no País, porque não só a gente tem uma média muito ruim, Senadora, pior do que isso, a gente tem uma desigualdade educacional gigantesca, abissal.
Então, se tem uma tarefa dessa nossa geração, de especialistas, legisladores, gestores públicos, pessoas preocupadas com a educação, se a gente quer realmente dar um passo em direção à modernidade, em direção ao rompimento de tradições que têm excluído o povo brasileiro dos seus direitos sociais, é com educação de mais qualidade, com muito menos desigualdade, buscando a equidade - equidade de oportunidades, para a gente depois começar a falar de outros temas, mas tem que equalizar essas oportunidades educacionais. Então, eu quero dar ênfase nesse tema aqui na minha apresentação.
Por conta dessa nossa obsessão pelo Plano Nacional de Educação, porque eu acho que a gente tem que ter mesmo, senão o plano vai para a gaveta, o Todos Pela Educação organizou, com várias instituições do Brasil todo, inclusive o próprio Ipea, inclusive o próprio Instituto Ayrton Senna, que está aqui, os dois representados, e várias outras organizações de governo, ligadas ao governo, da sociedade civil, Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, mais entidades que são ligadas às crianças com deficiência, FGV, Instituto Avisa Lá, Nova Escola, Fundação Lemann. Tem aí uma série de organizações que fazem parte desse Observatório do PNE.
Um ponto essencial, Senadora, é informação. Por que o Brasil, por que o brasileiro não debate educação? Porque a gente não tem acesso. A população brasileira não tem acesso às informações. Então, o Observatório tem esse caráter de dar acesso às informações, para criar monitoramento e consenso dos direitos não atingidos, porque, se a população brasileira não cobrar dos gestores públicos, dificilmente esse gestor público, que não tem muito incentivo político até para batalhar de verdade pela educação, ele nunca vai fazer isso.
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Eu tive a oportunidade de visitar muitos países e verificar suas políticas públicas, o que dá certo em um país e por que não está dando certo no Brasil. Enfim, se há uma coisa que é comum - e não se tem muita receita, cada país encontrou o seu caminho para melhorar a educação -, o ponto que todos eles têm em comum é uma população que quer educação de qualidade, cobra e tem mecanismos de transparência para poder ver.
Então, a gente construiu o Observatório do PNE com esse objetivo de dar transparência para tudo aquilo que está acontecendo, para ter um monitoramento não só episódico, mas um monitoramento constante, inclusive sendo instrumento para os gestores terem acesso às suas próprias informações, que muitas vezes eles não têm.
Eu não sei como é que coloca aqui no YouTube. É só clicar? Eu clico onde?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRISCILA CRUZ - Travou. Não?
Ah, voltou. Agora. E onde eu clico?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRISCILA CRUZ - Ele abre lá, está bom.
Isso aqui é só um vídeo rápido para vocês saberem que tipo de instrumento há lá dentro. (Pausa.)
Não deu certo.
Eu vou passando. A gente deixa isso aqui por último, para a gente não perder tempo.
Mas eu faço um convite para todos vocês entrarem no Observatório do PNE. A gente tem dados do Brasil inteiro, de todos os Estados, de todas as regiões, de todos os Municípios, com várias quebras, inclusive quebras de socioeconômico, raça, gênero, rural/urbana. Então, assim, para quem gosta de números, é uma delícia brincar nesse site porque ele traz a possibilidade de criar gráficos, de poder baixar tabelas. Então, assim, esse observatório é muito utilizado por pesquisadores para poder justamente ter acesso a esses dados todos.
Eu vou passar adiante.
O que eu estou passando não está...
Agora deu.
Bom; então, agora, o convite que a Senadora fez para a gente de fazer esse balanço dos três anos do PNE.
A gente tem, no PNE, oito metas que tinham prazos intermediários, já entendendo que algumas metas precisam ser atingidas antes de outras para que essas demais também possam ser atingidas. É importante esse conceito do sequenciamento das políticas educacionais. O aluno não vai aprender no ensino médio se ele não se alfabetizou até o 3º ano do ensino fundamental. Claro assim.
Então, a gente precisa mesmo ter uma força maior. Eu gosto da palavra obsessão porque eu acho que falta isso na educação. A gente precisa ser muito obcecado em garantir que toda criança esteja alfabetizada até os oito anos de idade para que, depois, a gente consiga atingir as metas seguintes de aprendizagem também.
E essas metas intermediárias são oito, mais a Emenda Constitucional nº 59, que está ligada à meta dois do ensino fundamental. Dessas metas todas, então, a gente tem, com esse vencimento 2015/2017, são dezessete estratégias e cinco artigos. E, no total, são 254 estratégias, catorze artigos.
Aqui eu não vou passar uma por uma porque eu acho que tem muita coisa, mas fica aqui o material para vocês.
Metas 1, 2 e 3.
O que a gente tem? A gente tem um atingimento até 2015, que é o último dado atualizado que existe. A gente tem, de quatro e cinco anos, temos 90% das crianças na escola, na pré-escola. Em creches, estamos com 30%. Fundamental, crianças de seis a catorze anos.
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Vai no fundamental porque tem criança que está para trás, mas, crianças de seis a quatorze anos, a gente tem 97.7%; e, de 15 a 17, 84%. Isso dá 2,5 milhões de crianças e jovens fora da escola. Esse é o grande dado, a grande informação dessas três primeiras metas.
Num país que já foi a sétima economia, passou para a oitava, a nona, mas, enfim, é um país que tem uma série de oportunidades de crescimento, uma população com uma cultura diversificada, rica, um povo que tem muito para dar, mas que tem 2,5 milhões de crianças e jovens fora da escola. E quem são essas crianças? São justamente as crianças mais pobres, as que mais precisam de educação para poder romper o seu ciclo de exclusão e pobreza, Senadora. Então, a gente está fazendo aqui um genocídio de crianças e jovens fora da escola, justamente as que mais precisam.
Quando a gente olha em creche, que é inclusive um serviço não só educacional, mas um serviço social importantíssimo para a mãe, para a família inteira, a criança estar na creche, e numa creche de qualidade. A gente tem um estudo que nem é tão recente, precisa ser atualizado, do BID, em que fizeram uma avaliação da qualidade das creches no Brasil. O que a gente mais tem no País são crianças presas numa cadeirinha olhando para um teto branco. Isso é pior do que qualquer coisa. Isso acaba com o desenvolvimento cognitivo, emocional, nutricional, físico dessas crianças, o que a gente sabe que é tão importante para o seu desenvolvimento.
No quartil mais rico de renda, você tem mais criança na creche; no quartil mais pobre, a gente tem menos. Olha como, numa política tão mais importante para as famílias pobres, são as famílias mais pobres que menos têm acesso a esse serviço. E esse padrão aparece durante todo o acompanhamento do PNE, infelizmente.
Aqui, desigualdade das matrículas em pré-escola.
Fora da escola: quatro vezes mais no quartil mais pobre. Então, a gente tem quatro vezes menos crianças do quartil mais pobre na pré-escola. Pré-escola que é obrigatória desde 2016, que é o prazo final da Emenda Constitucional nº 59, que é obrigatória, a gente ainda tem quatro vezes menos entre as crianças mais pobres.
No ensino médio ou na idade do ensino médio, que é de 15 a 17 anos de idade.
Metade dos jovens de 15 a 17 anos do quartil mais pobre está fora da escola. No mais rico, 14% está fora. Então, a gente tem que a metade dos jovens mais pobres está fora do ensino médio; no quartil mais alto de renda, 14%. Quando a gente fala em médias no Brasil, elas falam muito pouco. Por isso que focalização na educação... A gente fala muito em focalização em desenvolvimento social, com Bolsa Família e outras políticas que foram surgindo ao longo dos últimos anos, mas política focalizada em educação é a nova fronteira que a gente vai precisar enfrentar. E a gente vai precisar criar soluções para focalização de políticas. Não adianta ter políticas para todo mundo; a gente precisa focalizar nos alunos mais pobres.
Aqui é a porcentagem de matrículas de alunos com deficiência. A gente vem aumentando o número de alunos com deficiência e transtornos globais de desenvolvimento, altas habilidades em classes comuns, isso vem subindo no País. No entanto, eles são grande parte das crianças fora da escola. A gente não tem uma informação. A gente já tem conversas com o IBGE para poder melhorar a qualidade desse dado, para que a gente consiga encontrar onde estão essas crianças, quais são os Municípios e quais são as áreas onde a gente precisa ter essas políticas focalizadas, porque política focalizada depende de informação, para saber onde focar.
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O IBGE tem um grande trabalho... Fica até uma sugestão para todos vocês aqui no sentido de ajudar a gente nessa articulação junto ao IBGE, para melhorar a qualidade desse dado, para a gente poder encontrar onde estão essas crianças que estão muitas vezes - a maioria delas - presas em casa. Muitos pais e mães - mães, principalmente - e muitas avós, que hoje são grande parte de quem cuida dessas crianças, acham que a criança, porque tem algum tipo de deficiência, não precisa ir para a escola. Então, fazer a busca ativa dessas crianças, desses jovens, na casa, e levar para a escola, é fundamental; e dar condições para eles nas escolas também.
Aqui, ainda dentro de educação especial, basicamente quero dizer que a pior infraestrutura vai justamente para essa educação especial.
(Soa a campainha.)
A SRª PRISCILA CRUZ - As escolas que atendem mais essas crianças têm menos condições ainda.
Aqui é um dado que eu acho chocante. A gente tem aqui: terceiro ano do ensino fundamental. Está lá, é a meta nº 5 do PNE, que é a alfabetização das crianças até, no máximo, o terceiro ano do ensino fundamental. Muita gente - e eu até entendo - tem críticas fortes a essa meta, porque o terceiro ano é muito tarde. É tarde, mas no terceiro ano, que é tarde, a gente não está conseguindo fazer o nosso trabalho.
Esse é um dado - a gente já teve conversas no Inep - superestimado, porque a régua que o Inep colocou é uma régua muito baixa. Então, você coloca muito aluno acima dessa régua. Ela considera plenamente alfabetizada a criança que não está plenamente alfabetizada. A régua do Inep é muito baixa, é muito baixa mesmo, e mesmo assim a gente tem: das crianças com nível socioeconômico muito baixo, 45% estão alfabetizadas; com nível socioeconômico mais alto, é 98%. Então, olha o berço da desigualdade geral do País, social e econômica: começa logo quando a criança tem oito anos de idade. A gente separa. Das crianças do nível socioeconômico mais baixo, metade sabe ler; quase 100% do mais alto sabem ler. É essa fissura que a gente construiu no nosso País, em que umas vão aprender e as outras não vão aprender.
Em matemática, a diferença é maior ainda, porque do nível socioeconômico mais baixo, é 14%; e do nível socioeconômico mais alto, é 86%. Então, é uma diferença ainda mais gritante. Não é à toa que o ensino de matemática e ciências no Brasil é tão ruim no ensino superior, até. Acabou de sair o "Education at a Glance", que é o relatório da OCDE, mostrando exatamente isso. No nível superior, o Brasil em STEM (que é Ciências, Tecnologia e Matemática) está lá no final da fila. Como a gente consegue promover um desenvolvimento social e econômico do País, se a gente não tem pessoas que sabem, que aprenderam matemática logo no terceiro ano? Isso permanece.
Indo um pouco mais rápido, em infraestrutura, a gente bate muito nessa tecla, Senadora, porque para fazer com que as oportunidades educacionais sejam mais equivalentes, a gente precisa dar mais para quem tem menos. A gente vai precisar fazer isso. A gente tem que dar as melhores escolas, os melhores professores, os professores com mais experiência, e melhor infraestrutura também.
Aqui é infraestrutura... Desculpem, aqui é Ideb, vou chegar a infraestrutura. Ideb (Meta 7).
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A média brasileira é 4,8 do Ideb...
Desculpem; é infraestrutura. É isso mesmo. É isso que eu queria falar.
É o seguinte. Escolas que têm todos os itens de infraestrutura que estão previstos no PNE: 4,8% das escolas brasileiras. É uma média muito baixa. Aí você pega as escolas que atendem o nível socioeconômico mais alto: 70% dessas escolas têm todos os itens. Olhem a diferença de 5%, que é a média, para 70%, do nível socioeconômico mais baixo. E dos alunos que têm o nível socioeconômico mais baixo, são só 2% das escolas.
Então, se a gente tem que dar mais para quem tem menos, a gente está fazendo justamente o oposto. A gente está dando mais para quem já tem mais e menos para quem já tem menos. Isso se reflete em todos os resultados. Esses alunos mais pobres já têm menos condições de aprender fora da escola. Eles têm um entorno familiar, um entorno comunitário, com um repertório muito mais baixo. Eles têm um problema nutricional que acaba afetando muito o potencial de aprendizado deles. Eles têm uma série de outras dificuldades de violência, de saúde na família, de emprisionamento na família. Eles têm uma série de outras questões e, mesmo com isso tudo, a gente ainda dá menos para eles mesmos. Então, acho que se a gente não atuar fortemente e corajosamente para enfrentar essa situação, a gente vai manter essa situação indefinidamente.
Aqui ainda é a meta nº 7. É a mesma coisa. Vocês vejam a escadinha que a gente tem, tanto em quinto ano, que é o de cima, quanto em nono ano, que é o de baixo. Língua portuguesa está à esquerda, matemática à direita. Você tem essa escadinha sempre. Quanto menor o nível socioeconômico, você tem um resultado pior. E aqui eu quero usar também uma outra expressão importantíssima, um conceito importantíssimo. O nível socioeconômico ajuda a explicar, mas ele não pode justificar. Acho que o Wellington vai falar um pouco do caso de Sobral, que é um caso que conseguiu reverter essa tendência, porque se nada for feito, essa é a tendência. Mas há coisas para serem feitas. A gente consegue reverter esses quadros.
Meta nº 9. Taxa de alfabetização da população com 15 anos ou mais. Vem subindo, mas ainda é muito tímido. Quem são os analfabetos adultos? De novo. São os mais pobres, os negros, os que vivem nas áreas rurais.
Meta nº 15. Professores com ensino superior. Essa é uma meta que vem melhorando no País. Acho que a gente consegue chegar ao cumprimento dessa meta. Estamos caminhando para isso, mas ainda assim, de novo - eu vou ficar falando isso o tempo inteiro -, as escolas que atendem as crianças com nível socioeconômico mais baixo têm menos professores com formação na área que lecionam. Então, o que a gente mais tem no Brasil é professor de física formado em matemática. É o que mais tem. Não tem professor de física formado em física. O que mais tem é formado em matemática dando aula de física. Essa inversão acontece mais frequentemente nas escolas que atendem os alunos mais pobres. Depois a gente vai lá no Enem e fala: "poxa vida, esse aluno não aprendeu. Por que ele não teve uma nota boa? Porque ele não está conseguindo entrar na universidade? Por que ele não conseguiu uma nota para poder entrar?" Ele não teve condição de aprender. O professor de matemática não vai conseguir dar a aula de física que ele precisa para ter a nota do Enem para entrar na universidade. É por isso que só metade dos alunos do ensino público faz o Enem. Não é todo aluno que faz. Eles desistem. Eles acham que não é para eles, porque eles não aprenderam. Eles não tiveram professor para isso.
Meta nº 18. Porcentagem de Municípios com plano de carreira para o magistério.
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Isso também vem melhorando. Aqui não há uma avaliação qualitativa. Obviamente o plano de carreira tem planos e planos - tem planos excelentes e tem planos que, inclusive, podem estrangular a capacidade de lecionar dos professores, pode ser bem ruim. Aqui, de novo, temos menos Municípios no Norte do que no Sul com planos de carreira.
Meta 19, que é a forma de escolha. Isso aqui está estacionado, não conseguimos avançar na forma de escolha de professores no Brasil. Então, infelizmente o PNE não foi um bom indutor para essa meta, precisa dar mais luz para isso. Temos casos, como no seu Estado, Senadora, lá em Goiás, em que houve uma alteração na forma de seleção de diretores que rapidamente conseguiu dar uma resposta. É uma política. Sempre falamos: "Educação demora, há muita coisa que precisa ser feita, é uma política de longo prazo", mas algumas políticas conseguem dar resultados mais no curto prazo. Goiás foi um exemplo disso, Goiás é um Estado que saiu da 17ª posição e foi para a primeira posição do Enem, com algumas poucas políticas, mas políticas que conseguiram dar um grande avanço.
Uma delas aqui, no Brasil, na média, não tem avançado muito. Conselho Escolar também não avança muito. Enfim, vou passar aqui, porque aqui há muita coisa.
Termino fazendo o convite para que todos vocês, além do Observatório do PNE, que tem todos esses dados e mais um monte...
Também produzimos o Anuário Brasileiro da Educação Básica, que está em cima da mesa de vocês. Produzimos esse anuário todo ano, como o próprio nome diz. No anuário, reunimos as principais informações da educação. Acreditamos que as pessoas precisam ter informação para poder lutar melhor e ter mais argumentos para poder fazer com que a educação avance. E esse anuário tem um recorte específico em desigualdades. Não podemos olhar médias no Brasil. Média no Brasil, em educação, diz muito pouco.
Com isso, eu agradeço - acho que estourei um pouquinho o meu tempo - o convite e fico à disposição aqui das questões e do debate.
Muito obrigada.
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Agradeço a Priscila Cruz, Presidente-Executiva do movimento Todos Pela Educação, e passo a palavra agora ao Sr. Antonio José Vieira de Paiva Neto, Consultor do Instituto Ayrton Senna.
Bom; V. Sª dispõe de 15 minutos.
O SR. ANTONIO JOSÉ VIEIRA DE PAIVA NETO - Muito obrigado.
Quero agradecer o convite à Senadora Lúcia Vânia, à Comissão de Educação. Quero aqui também saudar os meus colegas Herton e Priscila, já nos conhecemos há bastante tempo.
Vou abordar um pouco daquilo que a Priscila colocou numa outra perspectiva que eu acho que é importante nesses três anos que o plano já alcançou: como é que podemos olhar pelo lado da gestão? Eu acho que existe sempre uma perspectiva de que o plano, por si só, vai induzir as políticas públicas a se realizarem. Chegamos a três anos e estamos constatando que não é bem assim. Então, eu acho que, do ponto de vista da gestão pública, é preciso também dar uma resposta. A Priscila colocou muito bem isto, da ideia de como a educação tem que se tornar uma agenda para o País.
Eu, hoje, apoio o Instituto Ayrton Senna, mas venho duma atuação na área educacional de muito tempo, de professor, diretor de escola, até chegar a Secretário de Educação. Esse percurso me deu condição de olhar as coisas de vários ângulos, das dificuldades que existem em todos os campos: dentro da escola, para gerir uma escola, para gerir uma rede de escolas, para poder atingir metas de planos. Isso é de uma dificuldade enorme no País, mas acho que tem perguntas que o plano nos obriga a fazer.
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Eu já havia feito uma relação e a ideia era pensar por que as metas não foram atingidas. Há inclusive no momento, no Brasil, eu escuto em alguns cantos, pessoas criticando o plano até discutindo que ele foi feito num momento, com uma composição de forças que definiu um desenho do plano, que as metas podem não ser atingidas a partir daquela perspectiva que aquele grupo tinha e acho isso uma argumentação muito perigosa porque, na verdade, os grupos foram legítimos e criaram um plano legítimo. O plano é legítimo e é o que temos para o País.
Eu acho que é plenamente possível focarmos e focalizarmos naquilo que é essencial para que o País consiga superar as suas dificuldades e alcançar uma educação de qualidade. Então, a primeira pergunta é: por que as metas não foram atingidas. Eu acho que tem algo que eu presenciei no Brasil, no próprio Estado do Rio de Janeiro e em outros Estados que é a dificuldade que se tem no Brasil hoje de se fazer planejamento.
A princípio não se tem metas estabelecidas nos Estados, mas o plano já estabelece metas, metas de educação infantil, metas de acesso à escola pública são metas que são cruciais, são basilares. A princípio, precisaríamos pensar que precisamos atingir aquilo que é um mínimo e eu acho que o plano que trata disso não é um plano tão ambicioso. Ele está falando de algo que é básico e que um País que, pelo menos, pretende chegar a um patamar de desenvolvimento e desenvolvimento social precisa atingir. Então, é inadmissível que hoje tenhamos 2,5 milhões de crianças e jovens fora da escola.
O que significa isso? Significa que gestores públicos não conseguiram executar seus financiamentos, seus recursos focados naquilo que seria fundamental: oferta de escola e infraestrutura. Infraestrutura requer financiamento, financiamento requer planejamento e algo que hoje no Brasil é fundamental é que o gestor público primeiro entenda que educação é talvez a área mais fundamental de um País. E no Brasil eu acho que se torna mais ainda num momento de crise como nós estamos passando ela se torna evidente. Aqueles mais pobres que não tiveram acesso a uma educação de qualidade são os que estão mais sofrendo neste momento. Então, o colchão de proteção se perde quando a educação é frágil para essa população e, é justamente a partir desses dados que foram apresentados pela Priscila, que se demonstra que justamente os mais pobres é que têm acesso aos piores recursos. São as escolas com pior infraestrutura, são os professores que não têm a formação adequada para aquela etapa de escolaridade, muitas vezes não têm acesso a merenda, muitas vezes não têm acesso a material didático.
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Não é possível pensar em educação sem que um mínimo seja garantido. Tem um artigo do Ricardo Henrique essa semana - acho que foi no Valor Econômico - em que ele coloca isso. Se o Brasil não investir na educação a desigualdade vai colocar o país na segunda divisão da economia mundial. Isto não é uma projeção fatalista, isso já é dado no brasil. Mesmo nos momentos de crescimento econômico mais intensos que o Brasil passou nos últimos dez anos chegou-se ao ponto de exportar mão de obra técnica de outros países porque o Brasil não tinha condição de dar conta. Isso aconteceu no Rio de Janeiro e isso significa que o Brasil tem uma lacuna para resolver. Ele precisa atingir isso. Então, o plano traz metas talvez ambiciosas para a realidade que nós temos, mas o que eu vejo como fundamental é focalizar aquilo que hoje seria algo extremamente urgente a ser realizado. É preciso construir escolas em alguns lugares. Eu vou dar um exemplo do Rio de Janeiro. O Rio de Janeiro não consegue atender aos jovens do ensino médio em horário diurno em toda a sua cidade. Existe uma região da Zona Oeste do Rio de Janeiro em que não existe escola pública de diurna, nem noturna. Como é que pode isso? Como é que se deixou fazer isso? Então, é preciso ter foco.
O que eu vou fazer primeiro? Eu vou construir isso ou aquilo, ou eu vou construir escola? Então, esse ponto é crucial na decisão do gestor e o gestor precisa olhar para a educação como algo que é a alma de uma Nação. A gente precisa ter um projeto de País e esse projeto de País passa pela educação. Isso é inevitável. O ponto que eu entendo que precisaríamos pensar em relação a plano é estabelecer exatamente alguns elementos que são estruturantes para se atingir metas. O que são questões estruturantes? É a ideia de que é preciso que cada região, Município gestor entenda que é preciso planejar, que é preciso fazer um diagnóstico, entender quais são seus maiores problemas, quais são seus maiores desafios e focalizar o seu planejamento numa política efetiva de superação dessas dificuldades. Só assim a gente vai, gradativamente, superando as desigualdades.
Eu conversava com o Herton aqui na sala ao lado quando comentei de um estudo do Ipea que utilizamos no Rio para fazer uma política pública. Qual? Nós identificamos que a partir de um estudo do Ipea que os jovens formados no ensino médio na favela ganhavam 10% a menos que os jovens que não eram da favela e eram formados no ensino médio. Então, essas crianças com baixa estima e num ambiente que não lhes estimula é convidada a sair da escola. A partir desse estudo, o que nós fizemos? Pegamos o CadÚnico, essas famílias do Bolsa Família e oferecemos uma poupança para essas crianças mais pobres não saírem da escola e isso reduziu a evasão nessas regiões em 40%.
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Quando se pensa, faz um diagnóstico, entende o problema e planeja com foco, o resultado é certo porque com o planejamento nós conseguimos superar os desafios. O plano estabelece metas, mas não diz como é o planejamento. Essa é a cultura que nós precisamos começar a desenvolver no País para que cada gestor, cada Estado, cada Município, para que o Brasil como um todo - do ponto de vista da união dos Estados membros - , tenha uma visão de planejamento e de continuidade.
Se eu pudesse elencar aqui algo que o próprio Observatório já identificou sobre uma postura de procurar atender às metas do plano seria, primeiro, fazer um diagnóstico, como falei, organizar um planejamento a partir desse diagnóstico, focalizando aquilo que impacta a maior desigualdade naquela região. Isso vai ser diferente em várias regiões do Brasil. São Paulo tem desigualdades. Mas São Paulo tem desigualdades, Alagoas também tem, o Rio, o Espírito Santo. Cada um com uma característica diferente. O planejamento, por isso, não pode ser igual para todo o mundo. Então, a ideia da identidade local é importante.
Um outro ponto que é importante é a intersetorialidade. A educação sozinha não vai resolver todos os problemas. Uma comunidade pobre que é atingida pela violência todo dia, se não houver um programa que junte saúde pública, segurança pública, assistência social e educação, não vai conseguir alavancar aquela população daquela situação de desigualdade. Então, existem outras dimensões que precisam ser pensadas para atingir-se uma determinada meta. Uma meta, por exemplo, de oferta de ensino diurno numa comunidade pobre do Rio de Janeiro. Construir a escola não significa que aquela criança vai ser acesso à escola, porque aquela escola pode estar num local onde uma facção não permite que outra entre e a escola fica vazia. Existe isso. Então, a segurança pública precisa ajudar no processo. A intersetorialidade é necessária para que você também consiga estabelecer um planejamento que atinja, realmente, a causa da desigualdade.
Vejo que esses são gargalos importantes a serem explorados no Brasil. Acho que há gargalos que hoje o plano aponta como aqueles que precisam ser enfrentados. São os gargalos da infraestrutura: a construção de escolas, a manutenção de escolas. Às vezes, as redes têm as escolas, mas as escolas estão caindo aos pedaços. Então, esse é um ponto importante.
Na perspectiva de expansão de educação integral e de tempo integral. Se não houver espaço, não haverá educação em tempo integral. Atender uma demanda em tempo integral significa multiplicar por duas aquela escola. Isso é infraestrutura também. Infraestrutura é também garantir material didático, é garantir acesso a novas tecnologias. São elementos que hoje são cruciais para o atingimento das metas do plano.
Carreira de professor, formação inicial, esse também é outro gargalo. Há Estados que têm dificuldades na organização de carreiras e de pagar o professor. Pagar um ótimo, um bom salário para o professor, dar garantias de a carreira ter progressão. Esses são problemas sérios de atratividade para a carreira.
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E financeiro. O financiamento, talvez, seja um dos maiores gargalos, agora no Brasil, diante do cenário de crise econômica que nós temos pela frente. Nós temos uma lei que limita a questão do teto de gastos. Não é que isso seja ruim. O teto de gastos, na verdade, vai estabelecer aquilo que é possível dentro do orçamento - vivi muito isso no Rio de Janeiro. Mas a questão é: qual é a decisão do gestor? Isso vai gerar uma posição de decisão do gestor. Você tem um teto, mas você tem um financiamento. Qual vai ser a prioridade da gestão? Aí entra a discussão sobre a educação. Educação é ou não é a prioridade? Essa decisão difícil é uma decisão crucial, secular, para o País hoje. Ou ele decide que a educação é fundamental - e nós hoje vivemos o término, já, talvez o fechamento de uma janela de oportunidades, onde nós estávamos num platô de juventude que vai se fechar e aí nós passaremos a ter a dificuldade de não ter formado os jovens do País, de não os ter qualificado para um País desenvolvido - ou chegaremos, daqui a 20, 30 anos, com uma população economicamente ativa de qualificação muito inferior ao padrão mundial e com uma população mais velha. Quem sustentará a economia e a Previdência? Esse é um ponto que, talvez, esteja se unindo a todos os problemas que o Brasil vai enfrentar daqui para a frente.
A educação, hoje, é a decisão talvez mais estratégica que o Brasil precisa assumir do ponto de vista do seu futuro. Termino exatamente colocando a minha perspectiva de que é preciso focalizar naquilo que é mais urgente hoje no plano, criar as condições para que essas metas sejam realizadas, alcançadas, estabelecer, junto aos gestores, a ideia de que tem de haver uma cultura de planejamento. Esse planejamento tem de ser focalizado nas metas e nas grandes desigualdades que a gente precisa enfrentar e, daí, criar os mecanismos necessários de financiamento para esse alcance.
Basicamente era isso.
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Agradeço ao Sr. Antonio José Vieira de Paiva Neto, Consultor do Instituto Ayrton Senna, e passo a palavra ao Herton Ellery Araújo, técnico de planejamento e pesquisa da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada - Ipea.
V. Sª dispõe de 15 minutos.
O SR. HERTON ELLERY ARAÚJO - Bom dia a todos!
Queria começar agradecendo ao convite da Comissão. Para mim é um prazer estar aqui para discutir esses três anos do PNE. Nos últimos três anos é a coisa que eu mais tenho feito.
O meu plano de apresentação vou começar com uma introdução, falar um pouco para vocês de como vejo a educação brasileira, vou falar um pouco do contexto em que o plano foi feito. Depois vou falar de alguns aspectos favoráveis que a gente tem à efetivação do plano e do que a gente está pensando, lá no Ipea, para poder melhorar na implementação desse plano. São três partes. Vou tentar fazer isso em 15 minutos, talvez até menos, vou ver. Eu havia me programado para vinte, mas acho que eu consigo fazer em quinze.
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A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO. Fora do microfone.) - Mas V. Sª tem toda a liberdade.
O SR. HERTON ELLERY ARAÚJO - Está bem.
Então, gente, primeira coisa: histórico: a sociedade brasileira negligenciou a educação básica de sua população. Isso é um fato histórico. O leite já está derramado. Se a gente pegar qualquer informação, por exemplo, taxa de analfabetismo, a nossa é muito maior do que dos nossos vizinhos até latino-americanos aqui. Então, só para vocês terem uma ideia, nós hoje estamos com uma taxa de analfabetismo de 9%, a Argentina tinha essa taxa de analfabetismo há 50 anos atrás. Então, nós negligenciamos a educação brasileira, está certo? Isso é um fato. Qualquer informação que a gente pegue a gente vai ver isso: a educação básica brasileira. Esse é o primeiro ponto.
Bom, aí o objetivo geral do PNE. Não é o nosso primeiro Plano Nacional, na verdade na Constituição de 88 a gente colocou que deveríamos ter planos decenais. O primeiro foi o de 2000 a 2010, depois passamos quatro anos discutindo, e fizemos de 2014 a 2024. Então, olha, o objetivo geral é prover educação de qualidade para todos os cidadãos, ou seja, resgate - um resgate, uma tentativa de resgate - da educação brasileira. É assim que eu vejo o PNE. O PNE não é ousado, não é nada; é uma tentativa de resgate da nossa negligência histórica com a educação brasileira.
É assim que eu acho que a gente deve ver o PNE e deve se colocar na construção de uma educação minimamente... Porque outros países conseguiram, com menor desenvolvimento do que a gente. Não tem justificativa para a gente ficar marcando passo ainda na educação. Dá para a gente dar um salto de qualidade. E o PNE vem exatamente mostrar para a gente que é possível fazer isso.
Bom, características do PNE que eu acho que são muito boas: primeiro, o plano possui metas claras e objetivas. Qualquer empreendimento, se você tiver metas claras e objetivas, você facilita a alavancagem desse empreendimento. Então, o PNE tem essa característica: tem metas claras e objetivas.
Segundo, já no Brasil, já temos um bom sistema de monitoramento. Temos instituições como o IBGE, que é uma instituição de excelência mundial, temos o Inep, que é outro... O Censo Escolar anual do Inep é um dos melhores do mundo. Agora nós tivemos dez anos que o Inep faz por aluno, é um dos... todos os pesquisadores veem que é um dos melhores censos escolares do mundo; e temos uma sociedade civil organizada, como o Todos Pela Educação, essas instituições que estão aqui, que conseguiram fazer o que a Priscila mostrou aqui para a gente: um site que acompanha cada uma das metas com informações. Óbvio, tudo isso que eu estou falando para vocês, você pode melhorar em todos eles. Então, temos essas coisas que são muito... essas duas características que são muito boas para a gente conseguir fazer um Plano bom.
O que que eu acho que a gente ainda precisa? A gente precisa aperfeiçoar o sistema de gestão do Plano. Que não é um Plano único: nós temos 5 mil Municípios, 5 mil sistemas de educação básica, e a gente precisa aprimorar isso, é isso que está faltando para a gente.
Bom, por que é que está faltando ainda isso? Primeiro, porque nós não temos uma tradição, é o nosso segundo Plano, só. E segundo: é que o PNE - esse, atual - foi aprovado no início da maior crise da sociedade brasileira. É como se viesse um Irma: assim que a gente aprovou o PNE, veio um furacão na nossa sociedade, um furacão de intensidade cinco.
Então, olha só, eu trouxe para vocês aqui algumas informações. Olha, é como se fosse: a gente estava lá em 2013, céu de brigadeiro; olha, a taxa de crescimento estava 3%, a nossa inflação, 5,9% - já estava subindo um pouquinho -, perto do teto da meta, mas estava dentro da nossa meta que a gente estipulou, que era 6,5%. Aí, em 2014, o redemoinho começa a crescer, e a gente já não cresceu quase nada: 0,1%.
Aqui tem aquele ponteiro laser?
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(Intervenção fora do microfone.)
O SR. HERTON ELLERY ARAÚJO - Não, esse não tem.
Bom; então, bem ali, em 2014 - esse gráfico azul é a taxa de crescimento real do PIB -, então, o Irma já tocou o solo ali. Ainda não era intensidade cinco, mas ele já tocou: a taxa de crescimento quase nada, e a inflação subindo.
Aí, ele tocou o solo com intensidade cinco foi em 2015. Olha só: menos 3,8% do PIB real, e a inflação foi para mais de 10%, mais de dois dígitos. Então, o Irma veio e... bum! Fez aquela bagunça.
O outro ano, em 2016, também tivemos uma taxa de crescimento muito ruim, real: menos 3,6%, e a inflação, ainda assim, continuou muito alta.
E aí, agora - esse que eu botei em amarelo aqui são... na verdade, esse 2,7% da inflação, ontem saiu boletim do Banco Central já dizendo que vai ficar em 3%, 3,05%, a inflação esse ano; esse aí é de agosto a julho; dezembro, como aumenta um pouquinho a inflação, vai ter um aumentozinho, e a nossa taxa de crescimento ainda está perto - e isso é perspectiva -, ainda está perto do zero. Ou seja, nós estamos parados em termos de PIB.
Bom, isso é o contexto no qual o PNE foi aprovado. Isso é o contexto macroeconômico. Agora, tivemos uma crise institucional também, que veio junto. Olha só: só para vocês terem uma ideia, nós passamos por seis ministros da educação desde quando o Plano foi aprovado. Em três anos. Se você pensar, é uma média de seis meses para cada ministro da educação. Um ministro da educação é como se fosse o timoneiro do barco. Não é que o federal vá fazer tudo, mas a União tem um poder de organização muito grande. Olha só, tinha um ministro lá, ficou de janeiro a dezembro, quando o Plano foi aprovado, depois um passou três meses - o Cid Gomes -, o outro passou um mês, o outro passou seis, o outro, sete, e agora nós temos um que está há um ano e quatro meses. Mas nosso céu não está de brigadeiro ainda, institucionalmente, todos nós aqui sabemos disso. Então, esse é o contexto do PNE, que a gente tem que trabalhar em cima dele.
Bom, apesar da crise, gente - aqui eu quis mostrar o contexto -, a principal fonte de financiamento da educação básica, que é o Fundeb, teve ganho real no primeiro triênio do PNE. Olha que maravilha: apesar daquilo tudo que eu mostrei para vocês, de um furacão na economia, um furacão institucional, o nosso fundo de financiamento, que é o Fundeb - ele não é o único, mas é um dos principais, é o nosso... -, ele não teve queda real; na verdade, ele teve ganho real. Olha só, o valor aluno/ano mínimo nacional, que é, quando o Fundeb é distribuído, é o mínimo do fundamental para todo mundo. Lá em 2013, naquele céu de brigadeiro, era R$2 mil. Subiu para R$2,285 mil, um crescimento real, já descontada a inflação de 6% - 6,7% -, depois cresceu em 2015 para R$2,576 mil, que foi para 13% em relação ao de 2013. Aí, depois caiu um pouquinho, mas ainda ficou 10% superior em termos reais. Aqui, descontada a inflação, ele ficou num patamar de 10% acima do que era em 2013.
Então, em termos de fluxo, o dinheiro não caiu para a educação básica. Acontece é o seguinte: é suficiente R$2 mil, R$2,875 mil? Essa é uma questão: a gente sabe que não é suficiente. Como é que a gente sabe que não é suficiente? O pessoal da Campanha pelo Direito à Educação fez em 2005 um trabalho, o chamado de CAQi, custo aluno ano, e eles estimaram lá. Na estimativa deles, esse valor - lá em 2015, esse valor que é de R$2,6 mil, para eles seria de R$3,7 mil; lá no Ipea a gente pegou, depois que saiu o PNE, a gente pegou essa ideia dele do CAQ e fez um CAQ mais bombado, dadas as metas do PNE. Que o maior custo da educação é mão de obra, é salário de professor, é o maior custo da educação.
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Como o PNE tem metas claras para o salário de professor, a gente fez uma estimativa, e o nosso custo, em vez de R$2,576 mil, em 2015, seria R$6,9 mil por ano por aluno - seriam 167% a mais. Esse seria um custo dado o CAQ, dada aquela qualidade. Bom, mesmo com isso, colocando todo mundo do PNE, o que a gente gasta em educação já está quase lá para atingir 6,9, e a gente deu 2,6, em 2015 - eu peguei o valor de 2015. Então, olha só: isso não é suficiente, mas não houve queda, apesar da crise. Essa é a primeira mensagem.
A segunda mensagem é a seguinte: esse comportamento de não queda não se deve ao comportamento da União não dando mais dinheiro para a educação básica, não. Deveu-se, exatamente, aos fundos, aos 27 fundos estaduais. Não houve uma queda tão grande da arrecadação dos Estados, como a gente viu - não estou falando em Município aqui, porque Município não contribui para o Fundeb. Então, já está havendo...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. HERTON ELLERY ARAÚJO - Só no Fundo de Participação dos Municípios, mas não contribui com seus próprios impostos. Mas já está havendo uma discussão aqui no Congresso sobre um novo Fundeb para a gente dar uma melhorada nele, e, no Ipea, a gente está discutindo isso também. Mas o contexto é esse.
Agora eu quero mostrar para vocês um aspecto favorável para o nosso PNE. Desde quando o Inep começou a fazer o censo, em 2017, por aluno, a gente está vendo o número de matrículas na escola pública cair. Por que está acontecendo isso? Por dois motivos: primeiro, porque a fecundidade no Brasil caiu - a cada ano, está nascendo menos criança no Brasil; isso é um fato. Demograficamente, a gente está saindo... Então, a demanda por escola pública está diminuindo no Brasil. Bom, com aquela crise toda, poderia haver uma migração das escolas privadas para as públicas, poderia explodir a matrícula pública, mas não foi isso que a gente viu. Eu botei em vermelho ali, porque, em 2017, não há o número de matrículas, pois não foi feito o censo escolar ainda; então, é quase a repetição de 2016. Mas, se vocês olharem, a demanda por matrícula pública, por escola pública está diminuindo. Essa é uma oportunidade ótima para a gente - com a infraestrutura que a gente tem e fazendo uma boa gestão - de melhorar a qualidade da educação brasileira. Para mim, esse é um fator positivo que a gente tem para conseguir atingir as metas do PNE.
Bom, há duas perguntas. Todo mundo que está na escola deveria estar na escola? Essa é a primeira pergunta que a gente deve fazer sobre educação em qualquer lugar. Segunda pergunta - como se fosse uma cebola, você vai abrindo: as pessoas que estão na escola estão aprendendo o que deveriam estar aprendendo? Há uma resposta a isso. Nós conseguimos criar um indicador chamado Ideb, que dá um pouco dessa resposta. Faz-se uma prova para saber se os alunos estão aprendendo o que é ensinado na escola - não é o que deveriam estar aprendendo, mas o que é ensinado na escola. O que deveriam estar aprendendo é outra discussão, é a discussão do currículo.
Então, olha só: o nosso Ideb tem melhorado desde 2005 - só no ensino médio ele está meio paradão. Por isso o Governo quis fazer essa reforma no ensino médio; nós estamos precisando dar uma chacoalhada no ensino médio. Mas, se você olhar aquele primeiro... Eu vou falar um pouco dos anos iniciais, que, para mim, são a base de tudo, quando as crianças aprendem a ler e a escrever e as noções básicas de matemática para que elas possam dar um salto de qualidade e, lá na frente, conseguir aprender mais. Tenho três minutos, mas vai dar tempo. Bom, gente, então eu vou falar dessa linha de cima, que demonstra que a gente atingiu a meta do PNE: são os anos iniciais, que, para mim, são muito importantes, porque essa é a base - a gente tem que começar pela base, na minha opinião.
Eu fiz um exercício. Essa é a média nacional que eu mostrei para vocês aqui, só que eu posso dizer para vocês que há experiências em redes de ensino regionais que demonstram que podemos fazer muito mais do que estamos conseguindo em nível agregado. A nossa meta é 5,3 - não é, Priscila? - no ensino fundamental, anos iniciais, e nós já estamos com 5,5. Mas há Município no Brasil que já conseguiu 8,8.
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Ou seja, experiências regionais estão mostrando que a gente pode ser mais ousado, que é possível fazer mais. Se a gente der um foco na gestão - como o Antonio falou aqui -, se a gente fizer isso, a gente consegue fazer mais.
Então, olha só: eu botei aqui, no mapa, o Ideb dos anos iniciais. É claro que os Estados mais ricos, como São Paulo, Minas e os dois do Sul, têm maior Ideb - esses que estão em verde têm os maiores. Olha uma ilhazinha lá. O Ceará tem um dos maiores - os de branco têm os menores. É uma ilha que está conseguindo romper essa coisa, no ensino fundamental, de as crianças aprenderem a ler e a escrever e as noções básicas de matemática, que é como o Ideb mede o aprendizado.
Então, olha só, eu vou mostrar para vocês um exercício que eu fiz - tenho um minuto e trinta; acho que dá. Eu não quero fazer coisa muito técnica, mas é fácil entender. Nos anos iniciais, como a Priscila falou, uma criança que é filha de um analfabeto, numa família de analfabetos, tem mais dificuldade de aprender na mesma escola do que uma criança cuja mãe, por exemplo, tem ensino superior, porque o repertório da mãe em casa e da criança tende a ser maior; o número de palavras que os pais usam com ela tende a ser maior. Então, o aprendizado das crianças de mãe analfabeta tende a ser menor.
(Soa a campainha.)
O SR. HERTON ELLERY ARAÚJO - Mas, olha aqui: eu fiz exatamente isso. Eu botei, nesse eixo debaixo, a taxa de analfabetismo por Estado brasileiro - e, acredite, eu fiz por Município, e dá a mesma coisa. Em cada Estado brasileiro, há a taxa de analfabetismo e o Ideb nos anos iniciais. Então, essa linha vermelha - eu fiz por mínimo quadrado - quer dizer o seguinte: me dá uma taxa de analfabetismo que eu lhe digo de quanto vai ser o aprendizado de suas crianças. É basicamente isso na média dos 27 Estados brasileiros.
Então, olha o Ceará e o Acre ali. O Ceará tem uma taxa de analfabetismo alta, perto de 20%. Olha onde está o Ideb dele: está próximo do de São Paulo, Santa Catarina, Paraná, que são os que têm taxa de analfabetismo baixa, onde era de se esperar que as crianças aprendessem mais mesmo. No Ceará e no Acre, há experiências que podem nos ensinar a romper esses ciclos de analfabetismo.
Eu botei essas duas linhas azulzinhas aí para vocês verem que... Há um errozinho no Ideb. Vamos supor que, no caso daqueles que estão dentro desse tubo, isso não faça sentido, mas olhem o Pará, que está lá embaixo; olhem Sergipe. Sergipe tem a mesma taxa de analfabetismo do Ceará, e o Ceará está conseguindo ensinar as crianças com Ideb próximo de 6, enquanto, no Sergipe, está próximo de 4. Será que a gente não poderia aprender com a experiência do Ceará e ver o que poderia levar para Sergipe para melhorar sua rede? Eu acho que é isto que a gente precisa ter: uma maior governança sobre isso, porque indicadores a gente já tem. Agora, uma vez que a gente identifica isso, como é que a gente age? Será que o Acre não podia ensinar um pouco para o Pará ou para o Amapá, que estão abaixo? Essa é a ideia que a gente tem na cabeça lá no Ipea.
Papel equalizador da União. Eu acho que a União tem que voltar a ser o timoneiro, identificar as razões de experiências exitosas no desempenho dos alunos e avaliar as possibilidades de reproduzi-las em outros entes federados. Ajudar! Isso já está acontecendo na prática, gente. Todo mundo já está indo conhecer o Ceará. Vários... Todo mundo está indo a Sobral para conhecer experiência de Sobral, mas a União podia entrar mais fortemente nisso para fazer essa troca de experiências.
Agora, como gerir melhor? Eu acho o seguinte: é preciso aumentar a colaboração federativa, tendo a União como timoneira e grande animadora desse processo. A União deve voltar a pegar o leme desse navio em dois pontos: avançando na assistência financeira, alavancando o Fundeb e melhorando seu caráter redistributivo - a gente tem condição de fazer isso, em vez de ficar...
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Agora mesmo está um monte de esqueleto saindo aí do armário do Fundef porque a União ficou economizando centavos. Não precisa ficar economizando tantos centavos assim. Claro, sei que estamos numa crise, mas a gente pode dar uma bombadinha no Fundeb, e outra coisa: compartilhar essas experiências exitosas, para motivar melhorias de gestão de sistemas municipais e estaduais. É isso que a gente está trabalhando no Ipea.
Obrigado.
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Agradeço ao Herton.
Agradecendo também ao Antonio e à Priscila, quero dizer que a exposição foi riquíssima. É uma pena que a Priscila tenha que sair. De qualquer forma, quero dizer que a exposição dos senhores me deixou realmente entusiasmada. São de falas como essas que precisamos aqui, para motivar, para estimular o Senado a ter uma participação mais ativa na área de educação.
Temos tido muita dificuldade para fazer com que esta Comissão seja realmente o centro das discussões. Não é fácil, uma vez que o Senado tem uma cultura voltada para a economia principalmente. Então a Comissão de Assuntos Econômicos sempre leva vantagem sobre a nossa, mas acredito que, com esse conjunto aqui, nós vamos fazer um trabalho no sentido de estimular esta Comissão para que ela possa ter um papel importante nessa discussão. Nós já temos análises e diagnósticos muito bons, basta agora colocarmos isso em prática.
Eu gostaria de colocar aqui a participação daqueles que nos acompanham pela televisão.
Pergunta do Dimas Márcio. Eu pediria aos senhores que pudessem responder: "Sou estudante do Distrito Federal, percebo que meus colegas não têm o mínimo de respeito pela escola nem pelos professores e não deixam os outros aprenderem, isso não é só na minha escola, isso é normal no Brasil todo. Se querem falar de educação, é melhor botarem ordem no ambiente."
Com a palavra o Antonio José Vieira de Paiva.
O SR. ANTONIO JOSÉ VIEIRA DE PAIVA NETO - Essa questão é recorrente no Brasil inteiro. A questão da violência dentro da escola, da indisciplina.
Eu poderia dizer que esse é um processo de corrosão da própria escola. Por quê? De duas décadas para cá, a escola vem perdendo a sua sintonia com o seu tempo. Nós temos hoje um processo em que a escola não consegue mais refletir a expectativa desse jovem.
Por outro lado, quem está na escola não tem instrumentos para lidar com essa nova dimensão comportamental do jovem. Essa é uma questão da juventude, não é um problema o jovem. O jovem não é problema, o jovem é solução. A gente está aqui numa Comissão de Educação exatamente para dizer que o jovem é solução. Por isso é preciso apostar em educação.
Quando a gente faz uma análise das metodologias que são utilizadas nas escolas, muitas vezes não há nenhuma.
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Se se pensar que o professor muitas vezes tem mais de um emprego, ele vai para a escola e fica pouco tempo, não consegue se relacionar com o seu colega professor, a escola não consegue estabelecer uma organização, um planejamento pedagógico, então, essa é a estrutura da escola real.
Essa escola real não consegue atender nem o aluno que tem interesse, que tem compromisso, muito mais aquele que está deslocado e se sentindo fora daquele ambiente.
A escola, se nós pensarmos, é um ambiente rígido, duro, áspero. Ela precisa ser muito mais maleável do que ela é hoje.
Então, é difícil responder para o jovem. Eu não tenho uma solução imediata, não consigo resolver isso agora, mas existem soluções. E a solução passa exatamente por criar soluções de organização escolar, com metodologias de ensino que priorizem a juventude, que deem protagonismo a esse jovem dentro do processo pedagógico, em que a gestão consiga ser muito mais flexível dentro desse ambiente escolar, ouvindo todos, os jovens, os professores, a comunidade de um modo geral.
Esse desenho de escola é um desenho que também está previsto no Plano Nacional de Educação, mas precisa ser conquistado, e não é fácil. É preciso ter também vontade política de querer mudar isso. Não é tão simples assim, mas é possível.
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Obrigada.
Outra pergunta da Kely Renata Sabia Monticeli: "Eu acho que a escola tem que ter autonomia para decidir o que fazer com seus alunos, que medida tomar em relação a eles, porque não adianta você perder tempo com aluno que não" tem interesse.
Passo para o Herton.
O SR. HERTON ELLERY ARAÚJO - Eu posso dar a minha opinião. Adianta você perder tempo com quem não tem interesse? Nenhum a menos. Por que ele está sem interesse? Temos que nos perguntar isso.
O ser humano... Outro dia eu dizia: se fosse para a gente educar macaco, ensinar macaco a ler e a escrever, realmente não daria. Agora, o ser humano é louco para aprender. Olha os olhinhos das crianças querendo aprender com os pais, imitando os pais.
Então, todos querem. Por que eles estão sem interesse? A pergunta é essa. Isso requer muita reunião, requer ouvir as pessoas. Por que você está sem interesse?
As pessoas querem dar o melhor de si. Claro que há um ou outro psicopata? Sim, vamos tratar isso também, mas não é o caso. Se muita gente está sem interesse e está acontecendo isso principalmente no nosso ensino médio é porque há alguma coisa errada. A gente não está ouvindo direito.
Vale a pena perder tempo com quem está sem interesse. Descobrir por que ele está sem interesse e tentar mudar essa realidade.
O SR. ANTONIO JOSÉ VIEIRA DE PAIVA NETO - Posso fazer uma complementação?
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Pode.
O SR. ANTONIO JOSÉ VIEIRA DE PAIVA NETO - Há uma questão que passa um pouco por isso que é a ideia de que a juventude tem o direito à educação. Mesmo que esse jovem apresente todos os sinais de que não tem vontade de ficar naquela escola, é necessário que a escola insista com ele.
Então, a educação hoje, que está muito voltada para um padrão de aprendizagem, precisa extrapolar esse padrão e considerar outras dimensões dentro do ambiente escolar, principalmente as dimensões socioemocionais, porque elas são verdadeiramente impactantes no comportamento do jovem e da criança dentro da escola. Esse é um ponto que a gente precisa abordar com mais frequência.
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O SR. HERTON ELLERY ARAÚJO (Fora do microfone.) - Senadora, só complementado uma coisa.
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Pois não, pois não.
O SR. HERTON ELLERY ARAÚJO - A afetividade é a chave do cognitivo. A gente precisa ser mais afetivo com as crianças, principalmente com as crianças e os jovens. É a chave do cognitivo. Não é só cognitivo, a afetividade é muito importante. E a gente precisa desenvolver isso melhor.
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Recentemente nós aprovamos aqui um projeto da Secretaria de Educação, da atual Secretária de Educação de Goiás, Raquel Teixeira, que permite a presença de um psicólogo na escola. Eu acredito que isso é também um avanço nessa direção. Ouvir, ouvir as pessoas e trabalhar essa criança ou esse jovem que vem com problemas de dentro de casa, desestruturação familiar. Não sei qual a opinião dos senhores.
O SR. ANTONIO JOSÉ VIEIRA DE PAIVA NETO - Eu tenho uma opinião divergente em relação a essa posição. Por quê? Porque há diferença do comportamento da juventude, do jovem, se é um comportamento clínico ou se é um comportamento educacional, de um processo.
É claro que, por ser a escola, vão explodir dentro da escola todos os conflitos que a sociedade tem. A escola reflete a sociedade. Então é possível, é factível que problemas que o jovem tem na sua família, na sua casa também cheguem à escola. Mas isso não pode ser um motivo de impedi-lo de conviver com os colegas e de aprender.
O que é preciso olhar em relação a esse jovem é que algumas competências precisam ser melhor exploradas na juventude. Existem competências que podem ser desenvolvidas durante a vida inteira, como resiliência, autogestão, amabilidade, o convívio com os outros, a colaboração. Então, essas são competências que, se desenvolvidas na escola, praticamente atenuarão esse processo, porque o processo de conflito vai acontecer na escola, fora dela e na vida desse jovem o tempo todo. Não é a escola que é o problema. Não é o jovem que é o problema. É a escola que não está conseguindo fazer a comunicação direta com esse jovem e ele se sentir acolhido por aquele ambiente.
Então a ideia do psicólogo tem um fim se o problema daquele jovem for um problema realmente clínico de psicologia. Mas às vezes não é. É um problema de convivência e de algumas habilidades que ele não conseguiu desenvolver na sua existência familiar. Então isso talvez seja um passo a mais.
E há um outro dado: se os Estados já têm dificuldade para manter carreiras de professor, imaginem também criar uma carreira de um psicólogo em cada escola. Talvez isso vai exigir mais financiamento ainda daquilo que a gente não conseguiu atender no básico, que seria o professor com a sua formação inicial adequada.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Presidente.
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Eu vou passar a palavra agora para os Senadores, porque eu sei que eles estão ávidos para perguntar.
Com a palavra a Senadora Regina, depois o Senador Roberto.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - O problema é que a gente tem n comissões funcionando ao mesmo tempo. Eu sou Relatora numa bem aqui, de outro projeto.
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Mas eu queria rapidamente abordar algumas coisinhas. Por exemplo, eu acho que há algumas coisas que entravam. Primeiro uma coisa que eu gosto de dizer: não é o aluno que desiste da escola, não; é a escola que desiste do aluno. Se a gente considerar isso, a gente vai mudar o pensamento, não é?
Como eu ouvi de uma mãe uma frase que eu adoro repetir, repeti muitas vezes e vou repetir aqui de novo. Uma mãe, numa conferência de educação, disse que os professores se acostumaram a dizer que os meninos têm problemas de aprendizagem, e o problema é de "ensinagem". Essa palavra eu só ouvi dela, e eu acho que a gente tem que incorporar essa palavra ao nosso vocabulário educacional. Há problema de "ensinagem" também.
Mas a burocracia atrapalha um bocado também. Acho que a educação teria que se livrar de algumas coisas, teria que ser livre de algumas amarras. Por exemplo, eu conheço escolas prontas, que ficaram prontas, escola modelo, aquela escola chamada ideal, parece, linda a escola, com tudo dentro. Passou seis anos fechada por energia, porque não havia energia, porque a distribuidora não conseguia levar energia, o Município lá distante, não conseguia levar energia de alta tensão que precisava lá. Então aí eu falei: por que não energia solar? Mas não, não está no projeto, o projeto não prevê. Olha a burocracia comandando, porque realmente, se botassem energia solar, quem sabe não iam responder a um processo porque botou energia solar em vez da energia hidrelétrica que estava prevista? Então, quer dizer, essas coisas precisam ser desamarradas. Esses nós têm que ser desamarrados, não é?
A formação dos professores também. Eu acho que são n programas que o MEC tem, mas a discussão que se dá mais é quem é que vai ser o coordenador, quem vai ser o subcoordenador, quem vai ser o supervisor. Discute-se pouco o projeto.
Então teria que haver uma reviravolta nessa história de formação, acho que na universidade. Acho que a gente teria que se voltar para... A universidade ensina conteúdos, mas não ensina a ensinar. E aí o professor sai formado, faz o concurso e passa, mas ele não sabe ensinar. Ele sabe o conteúdo.
Há muitas experiências bonitas por aí. No meu Estado mesmo, o Piauí, há muita coisa bonita acontecendo lá, como a questão da mediação tecnológica. Na falta de professores de Física e Matemática se está fazendo mediação com monitores, aulas ao vivo, o Estado inteiro, as escolas do Estado inteiro assistindo à aula ao vivo, e um monitor lá para dialogar com o professor ao vivo. É uma experiência muito interessante das disciplinas que não têm professor, que têm uma dificuldade danada.
E eu teria um monte de coisas para falar, mas devido ao tempo, eu terei que sair e eu quero ouvir vocês.
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Com a palavra o Senador Roberto.
Não sei se os senhores querem fazer um comentário primeiro.
(Intervenções fora do microfone.)
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Poderá fazer depois, para os dois, o comentário.
O SR. ROBERTO MUNIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - BA) - Presidente, primeiro eu queria parabenizar a senhora por esta iniciativa de podermos aqui fazer a avaliação do PNE, porque eu acho que um dos grandes propósitos do Senado deveria ser esse, fazer avaliações de políticas públicas. E a gente percebe que esse não é o foco principal. Também não é o foco principal não porque nós não queremos; é porque também é muito pouco visível para a população quando isso acontece. Isso deveria ser a manchete dos jornais de amanhã, a presença de vocês e o que vocês trazem de novo para o futuro do nosso País. Então esse enfoque novo na política é que pode levar a uma mudança de cultura, e a cultura chegar a uma educação diferenciada.
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Portanto, a gente precisa trabalhar em várias frentes no País, de forma simultânea. E a educação é o que mais se percebe, não é? Porque quando a gente fala de cultura, ela é a base para que possamos chegar à educação, mas ela é maltratada porque a gente não tem princípio, não tem cultura, não pode ter educação.
E aí ficamos correndo como um cachorro, como se diz lá no Nordeste, atrás do rabo. Ficamos rodando, buscando uma solução para a educação e percebemos que tivemos avanços muito grandes no País e também não conseguimos materializar esses avanços e fazer com que a sociedade perceba o quanto nós crescemos nos investimentos.
Eu fui Prefeito na cidade de Lauro de Freitas, e nós tínhamos um fato triste: nós tínhamos professores que não ganhavam um salário mínimo. Isso é da década de 90. Então, eu acho que nós tivemos alguns avanços. São suficientes? Não, mas chegou a hora de buscar as causas.
E aí eu quero parabenizar o Dr. Antonio Paiva Neto e o Herton Araújo porque eles trouxeram algumas questões muito importantes.
Eu queria fazer uma pergunta, se a senhora me permitir, só para iniciar. Quanto custaria implementar o PNE aos cofres públicos dos governos no Brasil? Com a palavra para o senhor dizer quanto seria necessário e o Dr. Herton, do Ipea. Você acha que existe esse número?
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Poderia antes fazer um comentário sobre a intervenção da Senadora Regina.
O SR. ROBERTO MUNIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - BA) - Não, pode...
O SR. ANTONIO JOSÉ VIEIRA DE PAIVA NETO - Eu vou responder a Senadora. A Senadora tem razão. Do ponto de vista da burocratização, eu acho, eu vejo que muitas das soluções que precisam ser dadas na educação carecem de processos que as viabilizem. Por exemplo, esse processo de energia é uma questão de que os setores, o setor da energia, de água e tal, possam criar a urgência para esses caminhos. Mas eu reafirmo para a Senadora que é necessário pensarmos em estruturas de financiamento de carreiras de professor para que consigamos zerar essa carência de professores que existe no Brasil. O Piauí tem dificuldade de ter professor. No Pará, na região do Pará com o Maranhão, é impressionante a dificuldade de ter professores formados naquelas disciplinas. Então, esse é o foco que acho que precisamos dar. E também esse olhar das formações iniciais, de como o processo, na formação de professores, tem que priorizar as técnicas de aprendizagem, que foram perdidas no Brasil, nos últimos anos.
O SR. HERTON ELLERY ARAÚJO - Com relação ao custo do PNE, eu, como... Vou falar primeiro à Senadora. Meu pai é do Piauí; eu estou indo para o Piauí agora, em outubro, em uma pesquisa em que eu vou comparar um pouco. Eu sei que tem experiências maravilhosas lá; eu estou indo conhecer. Então, acho que o Piauí é também um lugar que dá para aprendermos com ele.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI. Fora do microfone.) - Há um Município lá que tem um fenômeno de matemática.
O SR. HERTON ELLERY ARAÚJO - Eu estou indo...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. HERTON ELLERY ARAÚJO - Exatamente! Mas ali tem um professor muito dedicado, muito bom.
Mas quanto ao custo do PNE. Primeiro, eu sou economista, gente. Desculpa, mas nem tudo é perfeito. Então, a primeira coisa que eu fiz quando fui estudar o PNE, eu disse: "Quanto custa essa brincadeira?" É a primeira pergunta que o economista se faz. E nós fizemos isso. Aquele trabalho, lançamos um ano atrás.
O SR. ROBERTO MUNIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - BA) - Isso faz parte do plano, desde quando foi concebido?
O SR. HERTON ELLERY ARAÚJO - Não, não, foi... Faz parte do plano, quando foi concebido colocou-se o custo de 10% do PIB. Feito com...
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O SR. ROBERTO MUNIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - BA) - Sim, mas...
O SR. HERTON ELLERY ARAÚJO - Não, daquela época. Foi feito um trabalho chamado CAQi, da campanha Custo Aluno Qualidade Inicial. Depois, pegamos esse CAQi, depois que saiu o PNE... Porque o CAQi foi feito antes, isso depende, e foi antes do PNE. Quando o PNE entrou, ele tem meta para aumentar salário de professor, que é o maior custo. Então, o que fizemos? Pegamos a meta, pegamos todas as metas do PNE para dizer: se forem cumpridas essas metas, quantos professores deveria haver, para quantos alunos? Porque tem os parâmetros. Isso deu, na educação básica, 280 bilhões por ano, está certo? Isso lá em 2024, porque estamos diminuindo o número de crianças. Duzentos e oitenta bilhões por ano.
O SR. ROBERTO MUNIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - BA) - Qual é o orçamento hoje?
O SR. HERTON ELLERY ARAÚJO - Isso a preço de 2015. Em 2015, gastamos cerca de 260 bilhões na educação básica - na básica! Da superior fizemos também, eu não me lembro mais aqui o valor, mas isso está colocado na nota técnica do Ipea, a Nota Técnica nº 30, que tem esse valor.
O SR. ROBERTO MUNIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - BA) - Quero ter acesso.
O SR. HERTON ELLERY ARAÚJO - Agora, esse CAQi só existe para a educação básica, com parâmetros para a educação básica. Não tínhamos parâmetros para a educação superior. O que fizemos foi uma proxy, pegando o que se gasta na educação superior por aluno em relação a um aluno do fundamental, que, na época, em 2015, era 3,87. Multiplicamos esse custo por cada aluno na pública do ensino superior e achamos o valor, que eu não me lembro, mas acho que era 560 bilhões. Custa 560 bilhões por ano, você... Isso lá em 2024, com todo o PNE feito a preços de 2015.
Esses 600 bilhões por ano, já gastamos quase isso. Isso, lá em 2024, considerando o PIB, dá 6,2% do PIB, só para termos uma ideia.
O SR. ROBERTO MUNIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - BA) - Então, só aproveitando a presença do Herton, claro que isto aqui é uma proxy. O último estudo da OCDE diz que o Brasil gasta US$3.800 no que eles chamam de primeiro ciclo, de 1ª a 5ª série, certo? Então, isso é quase um terço da média dos 39 países que foram pesquisados. Ou seja, nós investimos nas crianças um terço do que os outros países pesquisados, é claro, gastam.
Já no ensino universitário, nós gastamos US$11.700, e a média dá US$16.100, ou seja, nós estamos muito próximos da média, já que alguns outros países, tipo a Coreia do Sul, gastam menos do que isso no ensino universitário. O que percebemos? Já gastamos 4,9% do PIB, é o número que foi colocado aqui. E a média dos países dá 5,2% do PIB. Se formos olhar esses números, estamos faltando um pouco mais... E é aí que eu queria que a doutora estivesse aqui, a Drª Priscila. Nós temos um bom nível de recurso, ainda insuficiente, mas com uma massa possível de, ao olharmos as melhores práticas, podermos melhorar, como foi colocado aqui pelos professores e pelo economista, melhorarmos essa média. O que está acontecendo é que trabalhamos muito na intenção, fazemos um plano de intenção, e esquecemos que meta precisa ter tempo, valores e qualidade.
Então, nós já tínhamos solicitado até a vinda aqui do pessoal do Ceará, principalmente Sobral.
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E a primeira pergunta que nós fazemos é: nós temos 2,5 milhões de crianças fora da escola. A gente precisa trazer essas crianças. Onde é mais fácil encontrá-las já que elas têm uma aderência com as famílias mais pobres? Primeiro, no CadÚnico, certo?
Então, quando a gente percebe que o Bolsa Família, ao se distanciar da visão da educação, traz um viés ruim para o processo de crescimento de autossustentabilidade das famílias brasileiras, a gente percebe aqui...
Não adianta a gente ir ao IBGE. É importante? É. O IBGE é importante, é fundamental? É. Mas na nossa base de cálculo do Governo Federal a gente tem condições de chegar lá, como foi feito. Foi colocado aí, o senhor disse que, no Rio de Janeiro, quando Secretário, o senhor foi lá, pegou as famílias mais pobres e foi buscar, fazer uma busca ativa dessas crianças.
A gente precisa fazer uma busca ativa, certo? E ainda criou, implementou uma poupança específica para isso.
Então, quanto à outra questão, quando a gente fala da educação especial, nós temos o Benefício de Prestação Continuada (BPC). Então, dá para a gente ampliar isso com busca ativa.
Então, em vez de a gente colocar os problemas... E aí eu acho que o PNE deveria dizer: "Olha, nós estamos solucionando essa questão através da implementação, sugerimos a implementação destas políticas públicas." Nós precisamos ter focalização em quais políticas públicas precisam estar a serviço dessa busca ativa de crianças e também de pessoas que são portadoras de deficiência, para que a gente melhore essas Metas 1, 2, 3 e 4.
Então, é essa sugestão que eu acho que deveria haver aqui. E ela dizia: "Olha, do BPC, das famílias que têm o BPC com crianças em idade escolar, tantos por cento já estão nas escolas." Aí sim, eu acho que a Estatística fica a serviço da educação. Eu acho que tem que ser objetivamente olhada a educação dessa forma.
Então, a pergunta que eu queria solicitar é a seguinte. Nós tivemos essa ampliação de investimento. Ainda não é o suficiente, mas eu gostaria de, com olhar e com a experiência de vocês, fazer uma pergunta: será que a gente precisa mesmo - e todos os Estados precisam - construir novas escolas? Essa é uma pergunta. Porque, se não precisa, isso é um mantra que fica na cabeça das pessoas.
Olha, professora, existem escolas que estão com 30%, 40% da sua capacidade usada, grande parte ociosa, certo? O que fazer com esses prédios públicos? Como melhorar isso?
A segunda questão que eu coloco: com o olhar de vocês, e o senhor já foi professor, diretor e secretário, e eu também já tive oportunidade de fazer uma escadinha dessa, não como professor: na qualidade do ensino na escola, qual é o impacto, em termos percentuais, da infraestrutura, da qualificação dos professores e da direção da escola? Essa é uma outra questão que eu quero colocar, porque a gente já tem como avaliar isso e a gente não consegue avaliar isso. Por que a gente não consegue avaliar isso? E aí a gente fica discutindo sempre no plano das ideias. Não é que ideia seja ruim, tudo surge de uma ideia, mas ideias têm consequências, principalmente quando viram leis. Elas geram obrigações e direitos.
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Então, nós precisamos ser mais específicos na educação, para que façamos essas escolhas para podermos avaliar claramente, já que temos um teto... E aqui foi muito bem colocado que sempre fica aquele fantasma: "Olhe, nós não estamos colocando os recursos na educação." Mas o que foi colocado é: dentro de toda a crise, dentro do furacão institucional e econômico pelo que nós passamos, os recursos da educação, em tese, foram preservados. Não sei se este ano ainda estão, mas o que estou falando é baseado no seu gráfico. Não estou aqui falando deste ano, porque ainda não fechou, e nós estamos em procedimento.
Mas o fato é: quando é que nós vamos olhar para dentro dos nossos custos? É o que eu digo sempre: se nós formos abrir os almoxarifados das secretarias de educação, nós vamos ver grande parte de recursos ali alocados em livros que não foram usados, em tecnologias que ficaram ultrapassadas e, com isso, nós estamos deixando esse orçamento ser mal usado.
Então é muito importante, com o olhar de vocês, que a gente veja essa questão.
E uma última questão que eu sempre falo: o uso melhor da intersetorialidade. Eu acho que isso que o senhor colocou é fundamental. Todas as vezes em que a gente pensa: "Olha, precisa de um psicólogo na escola." Existem psicólogos dentro da rede municipal, pública, estadual. Precisa-se, eventualmente, de uma política de doação de óculos. Existem esses recursos dentro da saúde pública.
O manejo do orçamento público com o objetivo da educação, não necessariamente dentro do orçamento da educação, deve ser um dos maiores desafios que o gestor público tem de ter; como fortalecer as práticas educacionais com o orçamento que está a serviço de outras secretarias. Essa é, objetivamente, uma coisa que eu entendo.
E, para finalizar, a questão do financiamento. O financiamento da educação precisa ser olhado. Eu acho que a gente vai precisar ter um debate muito grande sobre como melhorar a autofinanciabilidade da estrutura educacional; como partilhar com famílias que tenham condições de partilhar esse financiamento, para que a gente não estreite o olhar.
Existem vários países que possuem exemplo de financiamento advindo de empresas e de família; de pessoas físicas; docentes; PJs; de CPFs, que desejariam financiar a educação deste País, colaborar, até para que os próprios familiares pudessem fazer uso, porque entende que, dessa forma, qualificariam melhor socialmente a convivência dos seus filhos com a diversidade que a escola pública pode trazer.
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Então, eu acho que nós temos muito o que avançar, mas precisamos agora fazer uma autoanálise de autogestão da educação. Nós precisamos olhar para nós da educação, a educação precisa se ver com palavras como eficiência, eficácia, melhores práticas, para que possamos ter os melhores indicadores.
Não adianta, perdoe-me aqui a ausência... Dizer que não há dinheiro e que isso afeta principalmente as pessoas mais pobres, eu tenho certeza de que essa indignação acompanha a história no Brasil. Então, essa indignação não deve ser empecilho para que a gente se movimente. Ao contrário, isso tem que ser uma realidade que a gente já conhece.
É óbvio que as pessoas mais pobres não são as mais bem atendidas neste País, mas como quebrar esse ciclo? Esse ciclo só vai ser quebrado se a gente - não é produzir números - produzir fatos e uma melhor gestão dos recursos públicos. Eu acho que esse é o caminho que a gente precisa avançar neste País. E para isso, a gente precisa efetivamente, Presidente, a senhora que é uma pessoa que tem uma história, a Senadora Lúcia Vânia tem uma história na educação deste País... Eu tenho a convicção de que a gente precisa ter mais gestão, mais gestores para que a gente possa melhorar a qualidade dos nossos gastos, e a eficiência desses gastos tem que vir para dentro do Senado Federal e do Congresso Nacional para que a gente melhore o orçamento da educação. Melhorar não é só ampliar. A gente precisa ampliar e qualificar esses gastos.
Eram essas as perguntas que eu tinha para vocês.
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Com a palavra Antonio Paiva Neto.
O SR. ANTONIO JOSÉ VIEIRA DE PAIVA NETO - Eu listei aqui uns cinco temas dentro dessa pergunta que o senhor fez. Eu vou tentar abordá-los e juntá-los porque muitos deles se articulam muito.
O primeiro ponto foi a focalização dos problemas mais graves, das famílias mais pobres. Eu acho que um grande exercício que o País poderia fazer é mapear os instrumentos que já existem nas diversas áreas que possam contribuir com a superação da desigualdade, principalmente lincando com a educação. Aí vai para aquela questão da intersetorialidade.
Aquilo que foi feito lá no Rio só foi possível porque houve uma secretaria de assistência social que estava disposta a trabalhar de forma conjunta. E essa intersetorialidade tem uma delicadeza. Eu estou numa Casa política e vou tentar falar isso da forma mais suave possível. Eu vivi isso na pele como secretário. Uma das maiores dificuldades que um governo tem a enfrentar para criar políticas intersetoriais é exatamente superar a dimensão política individual de cada secretário, ministro, gestor, porque todos, de certa forma, trabalham dentro de uma composição política de Governo e cada um tem sua agenda própria. A questão que eu acho que é mais importante é: ótimo, todos têm agenda própria, mas existe uma agenda que tem de ser única para todos. Essa tem de convergir. Este, talvez, seja o salto mais importante do ponto de vista político que o Brasil pode apresentar para a sua população: a ideia da convergência em torno de um tema. O senhor pode ter a sua agenda, porque isso é legítimo, mas existe uma que está acima de todos nós, e essa precisa não porque ela é minha, mas é porque ela é para o País. Isso, talvez, seja o grande salto que o Brasil precise dar.
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Outra questão que o senhor colocou, da gestão, é, talvez, um dos pontos a serem mais explorados - e a gestão em todos os níveis. A gente fala da gestão escolar. Eu ouvi aí - e eu passei muito por isso no Rio - que a televisão ia a uma escola, mostrava uma sala cheia de livros; que a escola não distribuía livros didáticos. Aquilo parecia uma falta de gestão impressionante, mas, se você fosse analisar aquele processo, você ia olhar e perguntar: "Por que há esses livros aí?" O Programa do Livro Didático é superdimensionado em algumas regiões e pouco dimensionado em outras. Então, você acaba tendo livros a mais. E aí você tem uma cultura, muitas vezes, dentro de determinadas escolas, em que o professor não gosta de usar o livro didático, e aí o aluno cobra, e o professor não o utiliza.
Então, quando você olha para a política pública do PNLD, você diz: "Não, essa política precisa ser revisitada." Porque, como ela, muitas outras políticas de incremento, como a de tecnologia, a de distribuição de computadores, a de tablets, etc., são políticas caríssimas, enormemente dispendiosas, mas que precisam de um processo de gestão do início ao fim. E este é um desafio para o País inteiro: a gestão das secretarias até a gestão da escola. A escola fazer gestão também de determinados processos que chegam lá. Esse é um desafio, talvez, enorme, porque a gestão também é uma cultura. Você estabelecer uma cultura de gestão, de planejamento, de racionalização, isso não é simples, principalmente para quem é da área pedagógica. Quem é da área pedagógica dificilmente passa por um curso na universidade que ensine a fazer gestão. Então, isso é muito difícil.
A questão da infraestrutura. É preciso construir tantas escolas assim? Isso é relativo. Há regiões em que existe realmente déficit de oferta de educação básica; há outras em que estão sobrando. E há regiões, na própria cidade... Eu gosto de usar o exemplo das cidades do Rio de Janeiro, porque ele é bem ilustrativo. Ele foi Capital Federal, era um Estado, era um distrito federal. Quando ele passou a ser apenas uma cidade, passou por um processo de fusão com o Estado do Rio de Janeiro. Então, as escolas que eram do Estado da Guanabara passaram todas para o Município do Rio de Janeiro, e o Estado do Rio de Janeiro ficou com pouquíssimas escolas na cidade do Rio de Janeiro.
Esse processo é um processo que ainda não foi superado. Então, é possível haver locais, como na zona sul, em que você tem escola sobrando e, na zona oeste, onde não há escola. Isso também pode ser refletido no Brasil. Há regiões em que existem escolas com ociosidade e há outras em que não existem. O que é preciso fazer? Mapeamento, diagnóstico. É preciso haver diagnóstico claro das condições de infraestrutura em todas as regiões porque aí você pode pensar a ideia do financiamento focalizado.
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O plano tem uma dimensão de financiamento, mas ele tem dimensões que talvez ainda não foram exploradas, como, por exemplo, a expansão de educação em tempo integral - ela é impactante no custo de uma escola -, a educação técnica, que agora entrou na reforma. O Fundeb, em tese, não foi pensado para a educação técnica. Como é que ele... Esse cobertor vai dar? Ou seria a ideia agora de pensar em outro fundo só para a educação profissional com outro tipo de financiamento? Por que não de impostos que são relacionados ao setor produtivo? O ICMS alimenta o Fundeb, que é a educação básica, e a educação profissional pode ser alimentada por outro fundo. Então, isso são estratégias que nós precisamos pensar para o País até utilizando recursos existentes para a tecnologia, para a educação técnica.
A intersetorialidade é oportunidade de recurso para a educação uma vez que a gente volta àquela temática de que é preciso ter algo que faça a conversão, em que todo mundo pode convergir. E aí o recurso da assistência social, da saúde e da segurança pública pode também potencializar políticas públicas na educação.
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Eu lhe agradeço.
Eu gostaria apenas de fazer uma observação em relação ao que foi colocado aqui sobre as desigualdades. No governo Fernando Henrique, foi feito um trabalho na educação que se chamou, em primeiro lugar, Toda Criança na Escola. Foi quando houve o maior acesso de crianças à escola.
Ali a gente detectou que havia alguns grotões que não eram atingidos pelo programa, pela iniciativa que o Ministério da Educação fez naquela ocasião. Então, foi implantado pela assistência social o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, focado onde havia bolsões de pobreza muito grandes e onde as crianças estavam no trabalho e não na escola. Então, para se ter uma ideia, em Pernambuco havia 100 mil crianças trabalhando nos canaviais junto com os pais - em Pernambuco, Alagoas, naquela região da Zona da Mata. Havia cerca de 7 mil crianças nas carvoarias do Mato Grosso do Sul que nunca tinham ido à escola; havia o polo calçadista no Rio Grande do Sul, em que as crianças trabalhavam e não iam à escola; havia o sisal na Bahia, em que também as crianças ali estavam e não iam à escola.
Então, foi criado o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil com o objetivo de levar a criança para a escola, fazer com que ela ficasse na escola e tivesse sucesso na escola. Para isso, foi implementada uma bolsa para essa criança para compensar o trabalho que ela não faria mais em casa. Isso foi implantado no Brasil inteiro com um resultado excelente. Nós conseguimos levar um volume importante de crianças para a escola e tiramos as crianças do trabalho.
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Quando veio o Bolsa Família, ele absorveu o Peti (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil). Como o objetivo do Bolsa Família é mais a subsistência e como o outro objetivo era a educação - a centralidade estava na educação -, aquele programa se perdeu, e nós não continuamos trabalhando nos grotões. No meu Estado, os prefeitos mantiveram o programa, e temos resultados excelentes, com quase 100% das crianças na escola. Acho que esse projeto a gente precisa...
O Prêmio Nobel da Educação esteve aqui conosco e falou muito sobre a erradicação do trabalho infantil. E nós vemos a volta dessas crianças para o trabalho de forma expressiva. Isso não se dá apenas pela falta do projeto, mas também pelo momento de crise que nós vivemos. Esse projeto seria oportuno.
Então, estou propondo para o Presidente do Senado um lançamento bem amplo, para o Brasil inteiro, com a retomada desse projeto, para que a gente possa focar esses grotões onde estão localizadas essas 2,5 mil crianças. A gente conta aqui com a colaboração do Ipea e do IBGE, que têm levantamentos que nos levam a essas crianças. O que é preciso é um projeto que possa motivar essas famílias a colocarem essas crianças na escola. Tentou-se condicionar o Bolsa Família à matrícula, mas isso não é fiscalizado, não é acompanhado. É preciso que haja uma coisa muito específica.
Acredito que caminhos nós temos, o que é preciso é que haja a continuidade dos projetos. A primeira coisa que fizeram foi mudar o nome do projeto, que hoje é... Como se chama hoje? É Fortalecimento de Vínculos. O que significa isso para um prefeito, para um Município do interior, fortalecimento de vínculos? Do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil todo mundo sabia: tirar a criança do trabalho e colocá-la na escola era o objetivo principal.
Então, esse caminho seria o caminho correto. Esse projeto foi premiado pelo Unicef por cinco vezes. O Brasil apresentou na Bélgica esse trabalho. Fizemos a mesma coisa em Helsinque, apresentando o resultado do trabalho. Mas a continuidade... O programa, praticamente, não tem estímulo mais. E ele tem outros objetivos. A gente foi incapaz de mostrar ao Governo que os objetivos do Bolsa Família são muito diferentes dos objetivos do Peti. Ele não poderia ser absorvido pelo Bolsa Família porque ele era uma complementação da educação.
O Senador Cristovam, por exemplo, argumenta que deveria estar na educação esse projeto. Acontece que a gente tentou colocá-lo na educação, mas havia uma resistência muito grande das professoras de irem atrás disso. Esse é um trabalho de garimpo, de vontade política, de determinação. A assistência social é muito afeita a isso. Nós contamos com as primeiras-damas, que são mulheres que vão atrás, que trabalham, que batalham e que conseguem ajudar a tirar essas crianças do trabalho.
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A gente encontrou situações que o senhor nem imagina no sisal, crianças que tinham a mãozinha cortada ao desfiar o sisal na máquina. Carvoaria, 40 graus, aquelas crianças trabalhando sujinhas. Foi uma coisa espantosa o que a gente conseguiu detectar. E acredito que 2,5 milhões de crianças estejam nessa situação.
Com a palavra o Senador.
O SR. ROBERTO MUNIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - BA) - Senadora Lúcia Vânia, eu queria só dar o meu testemunho. À época - em 2001 - em que eu estava secretário de Estado, na Bahia, na área de ação social, em trabalho de ação social, tivemos oportunidade de ampliar o Peti (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil), que traz o que eu estava falando, que é uma política de busca ativa. Então a gente sai dos indicadores e chega nas pessoas. Isso é um trabalho de focalização. Por isso o sucesso, porque nós íamos com as organizações não governamentais, com a sociedade organizada, prefeituras, igrejas, a sociedade, em busca, ao encontro deste problema que a sociedade estava enfrentando, que eram as crianças em situação de risco de vida. Crianças trabalhando, como a senhora colocou, sujeitas a mutilações, a perdas irreparáveis na sua infância, que fariam com que toda essa diferença que estamos vendo nos indicadores de desempenho dos trabalhadores e das pessoas perpetuasse a pobreza no País. E é o que nós estamos vendo.
Então, quero dizer que essa focalização, juntamente com o que considero fundamental - sempre falava isso, Senadora -, e que é o mais importante, além da bolsa, que é conseguirmos dar uma educação em tempo integral. Isso passava despercebido. Além da bolsa que era efetivada pelo Governo Federal, os governos do Estado eram obrigados a manter uma atividade extracurricular para essas crianças. Aí, em vez de ser escola em tempo integral, era o que eu chamo de educação em tempo integral, ou seja, a escola não precisa estar funcionando em tempo integral, mas a educação deve estar à disposição dos jovens, das crianças, o tempo que ela puder, ampliando essa quantidade de horas em que ela está confrontada com esses novos saberes.
É importante a gente olhar isso, além do que a gente fala das questões formais da educação, mas a gente também se vê num momento em que essas atividades extracurriculares atingiam outras questões, tais como a autoestima da criança, a possibilidade de aprender a brincar, socializar-se. Então, tínhamos um ganho muito grande com a focalização do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, além de fazer os gestores públicos aprenderem.
Eu quero dar um testemunho, Senador Caiado, que foi das coisas mais emocionantes na minha vida pública, uma vez que eu fui para um encontro de mães, juntamente com as organizações não governamentais, em que eles fizeram o perfil do que era gasto com a bolsa. Se não me engano - posso até estar errado, porque já se vão quase 18 anos -, o valor do primeiro filho era R$27, à época, e não se multiplicava, ou seja, no segundo, não se ganhava o dobro. Então, ele chegava a três filhos com cinquenta e poucos reais.
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E uma mãe, Senadora Lúcia Vânia, foi apresentar o que ela fazia com esse dinheiro. É uma coisa assim, é uma aula de economia que poucas pessoas têm a possibilidade de ter. Eu tive uma aula de economia doméstica fantástica. Ela começou a dizer: "Olha, eu gasto tantos reais com alimentação; com tantos reais eu compro uma roupinha por mês; com tantos reais a gente paga a luz, e isso complementa para mim tantos reais para o bujão de gás." E ela chegou a um número, Senador Caiado, dizendo assim: "E R$2,23 eu guardo como a minha poupança."
E aí eu vejo que, para a gente, às vezes, falta o apego àquela moeda, e aquelas moedas somadas mudam a vida de tantas pessoas. Às vezes, a gente não se dá conta da importância dessa microeconomia, de como essa microeconomia fortalece as famílias, os laços familiares, a possibilidade de enxergar o seu filho de novo como alguém muito importante, e não simplesmente como um arrecadador financeiro.
Então, eu quero me juntar à sua fala, Senadora, e dizer que são políticas como essa que, somadas à educação, podem trazer ao plano educacional esses recursos necessários para que a gente alcance qualidade no ensino público brasileiro.
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Vou passar a palavra agora para os nossos expositores, mas eu quero antes cumprimentar e agradecer a presença do Prefeito de Teresina de Goiás, Josaquim, que nos honra com a sua presença. O Prefeito tem lá na sua cidade - uma cidade pequena aqui no nordeste goiano - 100% das crianças na escola e tem o Peti, que é a coisa mais linda, sobre o qual já fez a apresentação para mim lá na cidade.
Com a palavra os nossos expositores. O Antonio Paiva Neto pode fazer os seus comentários e posteriormente o Herton.
Não sei se a Senadora Ana Amélia quer fazer alguma pergunta.
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Srª Presidente, eu aprendi hoje com a senhora e com o Senador Roberto Muniz, e com os expositores. Fiquei ouvindo as exposições. Então, eu prefiro expressar-me quanto àquilo que ele contou aqui para a gente.
Quero dizer que eu sou filha de uma merendeira de escola pública, fiz estágio numa escola pública em Lagoa Vermelha, fui normalista. Então, para mim é muito caro. E minha irmã acabou de se aposentar como diretora de escola, eleita pela comunidade, uma comunidade de Lagoa Vermelha chamada Bairro da Gaúcha; e a filha dessa minha irmã, minha sobrinha, portanto, também eleita diretora da escola, na mesma escola em que a mãe foi diretora.
Há uma relação muito direta com a comunidade. O aluno, minha cara Senadora, no interior do Rio Grande do Sul - e imagino que seja assim no interior do seu Goiás também -, quando ficava satisfeito, me trazia de presente uma abóbora, uma caixa de ovos que tinha, porque no interior é a forma de retribuir. Então, era a forma que eu tinha de relacionamento com os alunos. E eu nunca fiquei dentro da sala de aula, nunca fiquei... No meu estágio, tirei a nota máxima. E isso era pelo carinho que tinha com os alunos. Eu também ia jogar futebol com eles, eu ia pescar com eles. Os alunos do terceiro ano, no início do ano letivo, eu os levava a uma agência bancária para saberem o que era uma agência bancária. Levei-os até ao prefeito municipal para que eles pudessem ter uma visão dessa relação. Eram alunos de um bairro muito simples, muito singelo, muito carente. Então, isso que eu estou ouvindo aqui é uma coisa que toca muito o meu coração.
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Parabéns pela iniciativa da Senadora Lúcia Vânia, que sempre teve, em todas as missões públicas que assumiu, uma grande preocupação com os aspectos sociais.
E o meu querido correligionário, Roberto Muniz, é um mestre aqui, porque foi prefeito e, então, sabe as dores por que passa um gestor público nos Municípios, os primos pobres da Federação.
Então, parabéns a todos, parabéns aos nossos convidados pela exposição.
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Antes de passar a palavra aos expositores, eu queria colocar aqui a participação das pessoas que nos acompanham.
Míriam Karla Machado diz o seguinte: "Acredito que tirar o aluno da escola só vai piorar o comportamento dos jovens. Penso que, para solucionar todos os conflitos que vêm acontecendo, principalmente, temos que mudar o comportamento pessoal, professor e pais, para que esses reflexos sejam absorvidos e impedir a violência".
André de Oliveira Carvalho diz o seguinte: "Melhorar a educação significa corrigir a falta de limites, regras e responsabilidades de alunos e familiares. A escola precisa ser um espaço respeitado, tal como os professores. Sugiro multa aos pais negligentes e expulsão do aluno da unidade após três advertências anuais."
Artur Alvim Cury diz o seguinte: "Valorizar a educação e o professor é fundamental para se ter uma sociedade mais justa, igualitária e saudável. Não podemos mais aceitar a marginalização dos professores e desse importantíssimo setor. Não existe nenhuma outra profissão sem um professor. Valorização da categoria!"
Com a palavra o Antonio José Vieira de Paiva Neto.
O SR. ANTONIO JOSÉ VIEIRA DE PAIVA NETO - Quando se fala de professor, eu já fico bem preocupado quando o assunto é valorizar o professor. Há uma certa dificuldade em atribuir a responsabilidade na escola. Eu ouvi várias opiniões no sentido de que o aluno é aquele que tem o problema, que é preciso disciplina, que é preciso expulsar da escola depois de três advertências, como se a escola fosse algo parecido com um quartel em que, se o aluno não se adequar, tem que sair dali, porque ele não foi feito para aquela escola. Mas é o contrário, ou seja, é a escola que talvez não esteja atendendo esses jovens.
Há uma imagem que eu gosto de colocar em relação ao professor, ou seja, muitas vezes o professor é responsabilizado pelas mazelas de uma escola. Mas a gente tem que pensar o seguinte. A senhora colocou um ponto que é importante ressalvar, ou seja, a universalização da nossa educação básica é recente, é muito recente. Eu diria que foi a partir do governo do Fernando Henrique Cardoso que as políticas se tornaram mais incisivas nesse processo. Os governos que vieram depois também ampliaram essa questão para outras dimensões, mas a gente não pode perder essa dimensão histórica. E, aí, é importante a gente fazer uma certa comparação.
É muito comum, numa conversa de pessoas que já estão na nossa idade ou um pouco acima, fazer referência à escola do passado, dizer que a escola do passado era melhor porque os alunos gostavam, ficavam e que era uma escola em que todo mundo aprendia etc. Mas, quando a gente olha para a escola do passado, percebe o seguinte: era uma escola para poucos alunos, só poucas famílias tinham acesso à escola pública. Daí, quando a gente faz a reflexão de que a Argentina já fez essa universalização no século XX e nós, só no final do século XX, começamos a pensar nisso, a gente vê que estamos num espaço de atualização perverso.
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O que é que nós sofremos nesse processo? Na medida em que nós não trouxemos esses jovens para a escola, as próprias famílias foram se transformando no Brasil. O Brasil dos anos 70 é muito diferente do Brasil dos anos 80 e 90. Então, a precarização da estrutura familiar, aquilo de que muitos falam, a questão dos valores, essas questões que explodem dentro da escola, elas vieram com a universalização para dentro da escola. E, aí, o que esses jovens encontraram? Uma escola lá de trás, uma escola com uma estrutura rígida, uma escola que não lhes oferecia os instrumentos necessários para superar as dificuldades, que eram novas. As dificuldades dos jovens do século XXI são dificuldades dos jovens do século XXI. Então, não podemos ter instrumentos dos séculos XIX e XX para atender esses jovens. Muito desse problema da indisciplina e da evasão ocorre exatamente por isso.
Aquela equipe que estava na escola na universalização nova não estava preparada para atender essa nova população que chegou à escola. Então, esse é um ponto que a gente precisa olhar com muito cuidado: a formação inicial do professor, as metodologias, os instrumentos de gestão de que eles precisam dentro da escola, tudo isso precisa ser adequado às expectativas desses jovens do século XXI. Então, esse é o passo que a gente precisa dar para poder fazer com que essa escola esteja próxima desse jovem e, aí, a gente consegue superar boa parte dessas dificuldades, que são dificuldades de relacionamento.
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Com a palavra o Herton Araújo.
O SR. HERTON ELLERY ARAÚJO - Eu gostaria de agradecer por ter participado deste encontro, foi muito ilustrativo. Gostei muito da fala do senhor, Senador.
Posso responder algumas coisinhas para ele?
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Pode.
O SR. HERTON ELLERY ARAÚJO - Se é preciso fazer mais escola? No agregado, não, porque nós estamos diminuindo a demanda. Agora, no varejo, é aquela história. Lá no seu Estado mesmo tem um Município da soja que é novo, Luís Eduardo Magalhães. Aquilo explodiu e, provavelmente, ali eu preciso de escola, e eu não tenho como pegar a escola lá de uma cidade mais antiga e levar num caminhão para lá. Então, posso vender lá e comprar aqui. Dá para fazer, transformar em dinheiro e fazer. Eu acho que, em alguns lugares, é preciso construir mais, em alguns bairros, mas isso é pontual. No agregado, não; no agregado, não.
Outra coisa: nesse trabalho de que lhe falei - a nota técnica -, que só tem dez páginas, a gente chega a esta conclusão: o lance é a gestão. A gente já aumentou muito o nosso gasto com educação, a gente precisa melhorar é a forma como a gente está gastando. É suficiente? Não. Sempre você pode gastar mais. Agora, não se gasta bem em educação no Brasil. Isso é um fato, é simples assim.
(Intervenções fora do microfone.)
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O SR. HERTON ELLERY ARAÚJO - Exatamente.
Então, eu acho isso, a gente já chegou a essa conclusão. O PNE é factível. Eu vejo pessoas falando que o PNE é ousado demais e não é factível. Não é verdade. Na minha concepção, é factível. É um resgate que a gente precisa fazer pela negligência que a gente teve com a educação básica no Brasil.
E, aí, eu gostei de ver o senhor falando que a gente pode também, em alguns lugares, ter uma forma de financiamento, até das famílias, principalmente no ensino superior, em que 75% das matrículas hoje já são privadas. Essas 25% públicas... Eu estudei em escola pública, estudei na UnB, passei seis anos recebendo bolsa do Estado, e meu pai tinha muita grana para pagar, mas eu não paguei, foram seis anos. Por que não fazer um sistema de solidariedade? Eu sei que, para isso, é preciso mudar a lei, é preciso mudar a Constituição. Só estou dizendo que a gente tem que pensar em formas para resgatar a educação básica. Meu ponto hoje é que a educação básica precisa de maior atenção da gente.
Muito obrigado. Foi um prazer participar.
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - O senhor deseja fazer alguma observação, Dr. Antonio?
O SR. ANTONIO JOSÉ VIEIRA DE PAIVA NETO - Eu queria agradecer por essa oportunidade de falar aqui, na Comissão do Senado. Sempre é uma oportunidade de trazer algumas discussões, algumas até muito sensíveis, em relação à educação. A educação é um tema sensível, mas eu acho que esta Comissão trouxe um tema de extrema relevância. Eu reafirmo a ideia de que a agenda da educação tem que ser a agenda prioritária do País e para onde todas as outras políticas têm que convergir, porque o Brasil vai passar por um processo agora muito difícil, de desenvolvimento econômico ainda muito retraído, mas num processo de envelhecimento de sua população. Então, é um momento difícil, em que o Brasil precisa fazer escolhas, escolhas políticas difíceis. Eu acho que uma reunião como esta é muito importante para refletir sobre esse desafio.
Muito obrigado.
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Deseja fazer alguma observação? (Pausa.)
Os Srs. Senadores desejam fazer alguma observação?
O SR. RONALDO CAIADO (Bloco Social Democrata/DEM - GO) - Só quero cumprimentá-la, Senadora. Quero cumprimentar a iniciativa da Comissão de Educação e também essa luta, que sempre foi uma característica muito forte da Senadora Lúcia Vânia, que traz aqui também alguns especialistas e profundos conhecedores da matéria. Todos os dias nós estamos aprendendo com nossos palestrantes, não só com o representante do Ipea, mas também com representantes de outros institutos que aqui vieram para trazer uma visão moderna e atual diante de um grande desafio que nós temos, que é essa área da educação.
Hoje nós vemos os nossos jovens tendo que disputar numa economia globalizada, e nós vemos que é alto ainda o grau de analfabetismo no Brasil. Nós vemos hoje os outros países avançando com maior celeridade, sendo que, como V. Sª colocou aqui, nós iniciamos só no final do século XX esse grande desafio de dar oportunidade a todos os jovens de terem acesso à educação, num trabalho em que a Senadora Lúcia Vânia teve muito reconhecimento à época do Governo Fernando Henrique, que teve a coragem de enfrentar esse tema, que era um tema árido àquela época, ou seja, combater o emprego de mão de obra de crianças e fazer com que elas tivessem acesso às escolas.
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Então, precisamos buscar resultados cada vez com maior intensidade, porque o que nos frustra às vezes é a falta de condição dos nossos jovens quando eles estão numa situação de disputa. Isso realmente ainda nos constrange. Mas estamos superando todas essas etapas e acreditamos que V. Sªs, com o conhecimento que têm, terão sempre o apoio não só da Comissão de Educação, mas também de todos nós, Senadores, que temos esse compromisso com a área da educação. Como médico que sou, como cirurgião que sou, também tive o meu período como professor-assistente da Universidade Federal do Rio de Janeiro e sei o quanto uma educação básica é fundamental para a formação de um cidadão amanhã, num curso superior. Quando falta esse alicerce, são impressionantes as limitações que o aluno tem no decorrer de um curso universitário.
Então, quero só cumprimentá-los e aplaudir mais uma vez a iniciativa da nossa Presidente, Senadora Lúcia Vânia.
Muito obrigado.
A SRª PRESIDENTE (Lúcia Vânia. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Bom, agradeço aos expositores. Quero agradecer à Priscila Cruz, que esteve aqui. Ela é Presidente Executiva do movimento Todos pela Educação. Quero agradecer também ao Antonio José Vieira de Paiva Neto, Consultor do Instituto Ayrton Senna; agradecer ao Herton Ellery Araújo, Técnico de Planejamento e Pesquisa da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, o Ipea.
Quero dizer a V. Sªs da nossa satisfação em recebê-los aqui e, principalmente, dizer que essa exposição dos senhores foi a que gerou maior interação com aqueles que nos acompanham aqui pelo e-Cidadania.
Agradeço aos senhores e em outra oportunidade queremos tê-los aqui para nova avaliação. Acredito que a avaliação do Plano Nacional de Educação foi exaustivamente debatida nesta audiência pública.
Agradeço também a todos os assessores que estão aqui. Agradeço ao Senador Roberto, à Senadora Ana Amélia, à Senadora Regina, que esteve aqui conosco, à Senadora Maria do Carmo, ao Senador Caiado, enfim, a todos aqueles que nos prestigiaram. E, de forma muito especial, agradeço ao Prefeito de Teresina, que nos honra com a sua presença.
Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada a presente audiência pública.
Convoco os Srs. Senadores para uma reunião ordinária desta Comissão na próxima terça-feira.
Muito obrigada.
(Iniciada às 9 horas e 25 minutos, a reunião é encerrada às 11 horas e 39 minutos.)