25/10/2017 - 33ª - Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação e Informática

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Bom dia a cada uma e a cada um.
Fico satisfeito em ver que os palestrantes já estão se aproximando.
Havendo número regimental, declaro aberta a 33ª Reunião da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática.
Iniciados os trabalhos desta reunião, informo que realizaremos audiência pública em atendimento ao Requerimento nº 28, de 2017, assinado por mim e pelo Senador Valdir Raupp, com o objetivo de debater a fuga de capital humano do Brasil e a oportunidade de circulação de cérebros ao mesmo tempo.
Não dá mais para haver cérebros prisioneiros de uma nação, mas também não dá mais para os países perderem seus cérebros.
Apresento o Sr. Tadao Takahashi, a quem eu devo agradecer por esta audiência, que partiu de uma conversa com ele, que me provocou para pedi-la.
O Mario Neto Borges, Presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), onde está o centro da reflexão sobre esse problema. É lá onde se sente essa falta.
A Srª Denise Neddermeyer, Assessora da Presidência da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial, que é um exemplo do que se pôde fazer no passado nesse sentido.
O Sr. Roberto Nicolsky, Diretor-Presidente da Sociedade Brasileira Pró-Inovação Tecnológica.
Comunico que esta reunião será realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. Assim, as pessoas que tenham interesse em participar com comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania no endereço www.senado.leg.br/ecidadania, e do Alô Senado, através do número 0800-612211.
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Durante o curso da audiência, eu também farei, se preciso e se conveniente, intervenções e questionários.
Antes de passar à exposição dos palestrantes, eu quero dizer o seguinte: ninguém imaginaria na história do Brasil que nós fecharíamos os olhos à fuga de ouro. E, em parte, foi isso que levou à independência, quando alguns brasileiros, ainda na colônia, decidiram enfrentar a fuga de ouro que Portugal forçava.
Se hoje se soubesse que estão levando metais, pedras preciosas e até petróleo para o exterior, haveria uma revolução no Brasil. Imagine se descobrissem uma pipeline daqui até Angola de uma empresa petrolífera. Imagine a revolta que isso geraria no País! Ou qualquer minério que estivesse saindo. Como se sabe, se vê e se lê, há uma reação quando se descobre que pedras preciosas estão sendo levadas. A Alfândega não deixa que saiam pedras preciosas; aliás, não deixa que saiam animais selvagens, mas deixa sair cérebros de cientistas, e é óbvio que a gente não vai impedir com força. Não é uma pipeline cuja torneira você fecha, nem são pedras que você tira da bagagem ou animais que você leva para um zoológico. São seres humanos, cientistas que vão em busca de desenvolver seu conhecimento fora do Brasil.
Por isso, a gente tem de pensar no que está acontecendo para eles irem embora e fazer com que eles queiram ficar aqui. Esta é a primeira pergunta: o que fazer para que os nossos cientistas fiquem aqui?
Antigamente, a Embrapa, de certa maneira, no seu início, resolveu isso. Os cientistas saíam contratados como funcionários, se eu não me engano, e voltavam com os seus laboratórios montados; ou seja, o período fora era apenas um interregno na formação, e eles não pensavam em ir embora.
Esta é uma coisa que a gente tem de fazer dentro da ciência e tecnologia: fazer com que quem saia já esteja comprometido não porque assinou em um papel que vai ficar aqui um ano ou dois - que também deve assinar -, mas porque já é parte.
Quando os alunos - supondo - do Rio Branco fossem estudar em uma academia de fora, eles já voltavam como diplomatas contratados, como aqui estão no nosso Instituto Rio Branco diplomatas de outros países já contratados. Eles voltam e, imediatamente, já são enquadrados nos seus empregos. É um ponto, a meu ver, a organização do sistema de bolsas de estudos que permita que o cientista exerça a sua função, que é o que eles desejam, e com um salário digno.
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Eu acho que essa é a parte mais fácil de resolver, apesar da crise fiscal. O que eu acho que hoje está ficando difícil são as condições do Brasil. Eu já vi alguns dizendo que vão embora porque não se sentem seguros aqui com suas famílias, vão embora em busca de uma cidade onde haja tranquilidade. E aí é enfrentar essa guerra civil que nós enfrentamos, aí vai demorar.
Outra coisa é a política fiscal do Brasil não fazer contingenciamentos: o cientista saber que a sua pesquisa vai em frente e não parará por falta de dinheiro; e que haja dinheiro suficiente.
O terceiro, em que tenho insistido, é uma espécie de pacto da comunidade científica e das universidades com a sociedade brasileira, em que a comunidade científica diz do que precisa, mas diz o que oferece. Hoje não se está dizendo o que oferece. E, quando digo o que oferece não é em termos de descobertas que ninguém pode prever, mas em termos, por exemplo, de número de greves. Poder-se-ia haver um pacto em que, se se cumprir isso aqui do lado do Governo, os professores universitários cumprem isso aqui, não fazendo greves. Cumpre isso aqui no número de formandos, na qualidade. Quantos anos a gente precisa para subir no ranking de classificação das universidades? Um compromisso neste sentido: nós vamos melhorar nossa posição no ranking mundial.
Então, nós temos de trabalhar e encontrar caminhos para superarmos essa tragédia do fluxo do conhecimento. Antes, era o fluxo do ouro; de vez em quando, a gente vê o fluxo de pedras preciosas; e há o fluxo de conhecimento que vai dentro da cabeça. E o mais grave, no fluxo do conhecimento, é que eles levam é um pedacinho do que eles vão produzir lá, porque lá fora vão produzir muito mais ainda ao invés de estarem aqui.
Diante disso aceitei a sugestão do Prof. Tadao, a quem darei primeiro a palavra, de fazer esta audiência.
Eu lembro apenas que o Prof. Simon Schwartzman, que é um grande estudioso, em 2013, fez um artigo dizendo que a nossa situação era muito melhor do que, por exemplo, da Índia, China, México e Argentina, porque nesses países os cérebros iam e não voltavam e no Brasil não havia essa migração, porque havia um sentimento de desejo de ficar aqui. Aparentemente isso mudou nos últimos anos. Houve um desencanto dos nossos cientistas.
Esta é a primeira pergunta: os quatro estão de acordo com que a situação hoje é mais grave do que há quatro anos, em termos de saída de cérebros, em relação ao estudo do Simon?
O que é necessário fazer para que possamos segurar aqui os nossos cérebros e até atrair a diáspora brasileira de cientistas que hoje é grande lá fora? Como segurar os que estão aqui e como atrair outros?
Que avaliação fazem do potencial impacto que deu o Programa Ciência sem Fronteiras? Até que ponto devemos continuar nos mesmos moldes, ajustar ou procurar outro?
Eu tenho outras perguntas, mas vou deixar para o processo. Por enquanto, eu gostaria de colocar essas, lembrando que não precisam responder às minhas perguntas. Fiquem à vontade e façam a fala que pensaram fazer. Essas perguntas surgirão ou eu terminarei pegando o que vocês falam e incorporando como respostas da Mesa, e não de cada um, porque a ideia é publicar isso o mais rápido possível como um pequeno texto para distribuir no Brasil inteiro.
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Então, Prof. Tadao com a palavra. Eu não quero limitar o tempo. Não vou tocar campainha, a não ser que se estenda demais, mas ali temos um relógio que marca o que a gente determina e toca sozinho. Quinze minutos seria bom?
O SR. TADAO TAKAHASHI - Quinze minutos está ótimo.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Quinze minutos. Mas não se preocupe porque, se passar, nós não vamos forçar sua emigração. (Risos.)
Professor.
O SR. TADAO TAKAHASHI - Bom dia! Na pessoa do Senador Cristovam, eu queria saudar os colegas de Mesa e mais a audiência. Vejo aqui pessoas com quem eu tenho trabalhado nos últimos 20 a 30 anos, como o Prof. Formiga, o Dr. Eratóstenes, os quais eu conheci na época do CNPq e do MCT, quando a gente estava envolvido em montar a internet no Brasil e o tema da diáspora, na verdade, era um tema lateral, embora sempre muito importante, porque, afinal de contas, o primeiro objetivo da internet era a comunicação, e só depois da comunicação é que você conseguia a informação e, a partir da informação, conseguia ancorar atividades que gerassem conhecimento. De tal forma que, desde a década de 90, o tema de circulação de recursos humanos, mais do que evasão, é um tema em que nós temos trabalhado.
E aí eu queria começar rapidamente explicando o que é aquele título estranho e o que é aquele português esquisito. As pessoas podem alegar: "Não, ele é japonês, o português dele não é tão bom quanto o domínio de computadores" ou algo assim, mas, na verdade, não é isso. É que aquilo ali é uma espécie de paráfrase de uma frase em inglês que os americanos usam, que é: my country is wherever my heart is. É o que os americanos vivem dizendo. E aí eu pensei: o grande problema do ser e estar aqui no Brasil é que ele é dividido, e você precisa se dividir entre você estar e ser em algum lugar. Aí eu decidi que o título, então, é: meu país é alguma coisa e é onde meu coração está, que, na verdade, é até para resumir o teor do que eu estou querendo falar.
Na verdade, o grande problema não é o cérebro, o grande problema é o coração. Se ele gosta daquilo ou do lugar onde ele está, independentemente de onde ele está, ele vai continuar ligado ao lugar onde o coração dele está. E o grande problema que eu acho que está ocorrendo nos últimos anos é que o coração está se divorciando do cérebro. A pessoa já não gosta de estar vivendo no Brasil, ela vive um monte de problemas que a família, na verdade, vive, e obviamente, por mais que o cientista, o engenheiro ou o especialista seja desligado do dia a dia mundano, o fato é que aquele dia a dia mundano retorna a ele à noite, e aí ele vê os problemas que ele tem se continuar no Brasil e as vantagens que eventualmente ele vai ter se migrar para trabalhar em outro lugar. Então, é isso que é aquele título. Provavelmente, vou ter de explicar isso no início do PowerPoint para salvar a honra da colônia japonesa quanto ao domínio de português.
A introdução é esse desenhinho que mostra o cérebro migrando de cidade, e vocês notam que a cidade é meio horrorosa ali atrás. Então, essa é uma síntese de por que a gente tem notado que o brasileiro começa a não gostar muito de viver no Brasil e começa a pensar seriamente em ir para o exterior, não só depois de se aposentar, mas antes, para decolar na carreira. Esse desenho mostra a origem do chamado brain drain, no qual vemos um branco à direita com um pacotinho de ajuda e aquele senhor à esquerda, um negro com a cara da África. Vocês notam que ele está entregando o cérebro ali. Na verdade, era a base do desafio da evasão de cérebros há 50 anos. Basicamente era assim que a coisa se configurava. Na realidade, na época, não era só o grupo de cientistas que era objeto disso, eram mais engenheiros e, na África, especialmente gente da área médica que era afetada pela ideia de se mandar do país e trabalhar na Europa ou nos Estados Unidos.
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Essa charge é americana, ela é interessante. Há aquele pessoal no carro que está indo para o aeroporto. Aí, lá em cima, está escrito "Terminal Doméstico" e, aqui, à direita, está escrito "Bando de ratos traidores que não merece um grande governo" - é o que está escrito naquele cartaz à direita. Essa é uma charge que evidencia que finalmente o governo dos Estados Unidos, nos diversos níveis, também começa a reconhecer a ameaça da evasão de cérebros. No caso deles, é mais interno do que para outros países. De qualquer forma, essa charge é ilustrativa do problema de que o grande desafio para evitar a evasão de cérebros é, basicamente, o que o governo faz, não é o que o a sociedade faz ou até o que o setor privado faz.
Essa é deste ano. Aquela senhora de Wisconsin está dizendo que os melhores e mais brilhantes estão se mandando de Wisconsin. Aí, o outro cara, ali à direita, fala que ele sabe e que, graças a isso, o Estado agora é solidamente republicano. Na verdade, isso é por causa da eleição presidencial na qual foi eleito o Trump. Wisconsin era um swing state que passou para o lado republicano, para espanto de todo mundo. Isso evidencia mais um pouco a ideia de que o problema de evasão de cérebros é um problema lançado em vários níveis, entre países e dentro de cada país.
Bem, olhando melhor o fenômeno, a primeira coisa que eu queria colocar é a seguinte: há contrapartida do brain drain, que é o brain gain. Isso significa o seguinte: alguém ganha quando há evasão de cérebros, e esse quem ganha é extremamente complicado. Esse desenho, é de um condado chamado Bucks, Bucks County, na Pensilvânia, onde eles têm toda uma ação para tentar impedir o brain drain deles, dentro dos Estados Unidos, porque o pessoal começa a se mandar da Pensilvânia para Nova York, para a costa oeste e assim por diante.
Para quem não se lembra, esse condado, dentro da Pensilvânia, fica perto daquelas comunidades amish. Então, na verdade, eles têm a ideia de uma comunidade tranquila que, de repente, é assolada pelos fenômenos positivos e negativos do mundo moderno e, em função disso, eles têm a evasão de cérebros também.
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Esse desenho mostra, olhando o ganho e olhando a perda, quem é que ganha e quem é que está perdendo no mundo. Aquele verde brilhante mostra quem está ganhando significativamente com a evasão de cérebros: basicamente, Estados Unidos, Canadá e Austrália, lá na outra ponta. O segundo bloco de quem está ganhando é aquele bloco em azul. Aí, a gente vê que, fundamentalmente, a Europa Ocidental, o Japão - lá na ponta direta - e a Nova Zelândia - aqui embaixo - são os países que moderadamente ganham com esse fluxo de cérebros no mundo. O Brasil está pintado de vermelho, como parte do bloco que moderadamente perde com a evasão de cérebros. E toda aquela parte em negro, que aqui no continente americano só tem o México, mas na África tem a África do Sul e - ali à direita, no chifre da África - a Etiópia, e todo o Leste Europeu, exceto os países islâmicos que estão envolvidos em guerra ou em algum conflito, esse é o pessoal que mais está perdendo com a evasão de cérebros, segundo esse desenho.
E eu vou voltar ao desenho, porque ele dá a entender - e eu acredito nisso também - que o Brasil não é um país que está perdendo enormemente com a evasão de cérebros. Está perdendo, agora é moderadamente, e há uma série de coisas que o Brasil ou está ganhando ou pode vir a ganhar, dependendo do que se faça, dependendo do tipo de ação que o Governo venha a efetivamente se comprometer a fazer, porque é um problema de médio e longo prazo; nada se resolve imediatamente.
Essa figura mostra a causa da evasão de cérebros. Aqueles dois primeiros itens têm a ver, primeiro, com perspectivas de carreira, e o segundo já é mais interessante, que é a injustiça social, segundo respondentes. Na verdade, essa é a segunda causa mais frequente para a evasão de cérebros dos respondentes. Então, ela mostra que, efetivamente, como o Senador ponderou, na verdade o problema do cientista, do engenheiro ou do médico que quer sair não é um problema só de carreira; é um problema do entorno social no qual ele vive, que vai ficando intolerável e vai fazendo com que ele comece a pensar que existe algum lugar melhor, onde ele pode conciliar a vida pessoal com a vida profissional.
Esse desenho aí mostra vários países: a China, lá na ponta, a Índia em segundo, o Canadá em terceiro, e o Brasil em penúltimo, aqui embaixo, só perdendo para a Tailândia. Esse desenho mostra quem se graduou em doutorado nos Estados Unidos em 2003 e quem continuava nos Estados Unidos em 2007. E aí os senhores notam que, no caso da China, a quantidade de gente que ficou é absurda. Depois vem a Índia, depois o Canadá, a Alemanha, Taiwan - que é um pedaço da China, mas são independentes -, a Turquia e - aqui embaixo - o Brasil, de que, na verdade, só 31% do pessoal que tirou doutorado em 2003 continuava nos Estados Unidos em 2007. E quando eu digo "só" é em comparação com os outros que estão lá em cima, porque na verdade é muito comparado com o que a gente tinha no Brasil há cerca de 15, 20 anos. Isso o Presidente do CNPq deve mencionar, porque os dados eram espantosos; era algo como: 5% a 10%, no máximo, dos bolsistas brasileiros pretendiam ficar no exterior. Então, isso aumentou enormemente.
Agora, a Tailândia continua com um número baixíssimo de gente que ficou - está ali -: 7%. E o fato é que, na Tailândia, existe uma política de retorno e uma política de valorização de quem vai para fora para voltar e ocupar posições de influência na sociedade e na construção do ambiente de ciência e tecnologia. Por causa disso, na Tailândia, o índice de gente que volta é muito alto segundo esse desenho aí.
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E há outros aspectos. Por exemplo, em Singapura, quem ia para o exterior com o dinheiro do Estado, com bolsa, assinava um termo de compromisso, mas quem assinava não era o bolsista, era a mãe ou o pai dele, ou a irmã, de tal forma que a probabilidade do bolsista de Singapura, com dinheiro federal, voltar era mais do que um - violava até a probabilidade. O fato é: não era ele o penalizado se não voltasse; era alguém da família, pela lei, não só ter que devolver o dinheiro, mas ser penalizado e assim por diante.
Então, parte do milagre de Singapura tem a ver com, para além de ser uma ditadura doce, por assim dizer, ser uma ditadura que exerceu e exerce uma série de pressões sobre a população, o que faz com que o esquema deles de retorno de bolsista seja tremendamente efetivo.
Esse desenho mostra, então, como, na realidade, no Brasil, a discussão desse assunto é complicada, não é tão simples assim.
Esse desenho que ninguém está enxergando, mas vou explicar, na realidade, é um índice de evasão de cérebros. Lá em cima, na verdade, estão colocados os países em ordem alfabética, e aí há aquela coluninha cor-de-rosa ou rosa-choque, que é a coluna que mostra, até 100%, quantas pessoas acabaram ficando nos Estados Unidos depois de terminarem o doutorado
E aí há aquelas colunas grandes que se aproximam de 100%, que são a China, a Índia, a Bulgária - que é outro país em que isso ocorreu. E, lá em cima, em cor-de-rosa, são os dez mais, são os dez países que mais tiveram gente que permaneceu nos Estados Unidos depois de concluir o doutorado.
E o Brasil, na realidade, é aquela coluninha menor; quando a gente olha, é a terceira da esquerda para a direita. E a gente nota que, na verdade, de acordo com esse desenho, algo como 40% dos brasileiros permaneceram depois do doutorado. E, quando a gente olha, o índice é relativamente baixo no conceito das nações que estão representadas aí. Obviamente, é um custo que o Brasil tem que tentar minorar, tem que fazer com que o pessoal volte mais ou que, outro ponto, a permanência dessas pessoas no exterior tenha que, de alguma forma, ser positiva para o País também. Está certo? Quer dizer, há a ideia do brain drain, mas o brain gain, de repente, pode se basear em algum tipo de ação que mantenha o pessoal no exterior, mas ligado a projetos aqui no Brasil.
Nesse quadro que vou passar rapidamente, à direita, é o ganho; à esquerda, é a perda. E a gente nota que, em muitos países, na realidade, existe um ganho comparável à perda. Então, a Alemanha, que está ali quase no meio, tem um ganho considerável e tem uma perda considerável também.
Essa última aqui embaixo é muito interessante porque é a Grã-Bretanha. Ela ganha um bocado, que é aquela parte ali à direita, mas ela perde um bocado também. E há vários países que perdem, consideravelmente, como, por exemplo, Portugal, Polônia. Há gente que diz que a Polônia basicamente hoje vive na Inglaterra e mostra, então, o efeito da evasão de cérebros deles. Por outro lado, em todo verão, o polonês volta à Polônia, levando uma pá de dinheiro e levando uma série de coisas, o que está fazendo com que a Polônia seja o País que esteja crescendo com os maiores índices na União Europeia. Então, esse desenho mostra como a coisa é realmente relativa e demanda uma análise cuidadosa.
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E há um monte de países, regiões e, inclusive, condados e cidades nos Estados Unidos que têm campanhas para, efetivamente, tentar minorar ou sustar a evasão de cérebros e manter os talentos locais. Esse é um.
A Europa está combatendo de volta a brain drain, o que parece um espanto, porque a Europa é um local para onde os brasileiros mais querem ir e, no entanto, olham para o Estados Unidos e consideram que a situação merece exame e merece algum tipo de medida.
Esse é da Malásia. A Malásia, na realidade valoriza imensamente os tigres que eles têm, e esse desenho fala do tigre global alguma coisa e, ali naquele desenho em que não dá para ler, ele chama a população para ter ideia sobre como manter o tigre na floresta, que é como manter o jovem guerreiro ou a jovem guerreira intelectual na Malásia através de uma série de medidas.
Para terminar rapidamente e, depois, deixar para comentar, primeiro, esse é o tipo do problema que, na realidade, não demanda intervenção; o que demanda é prevenção de forma que se minora a quantidade de gente que vai para fora, mas começa a haver medidas para aproveitar o pessoal que vai para fora e valorizar a permanência dele no exterior. Então, o primeiro ponto são medidas preventivas para não tentar fazer uma intervenção que, de qualquer forma, vai ser ineficaz.
Eu me lembro de que o Senador Cristovam, acho que há dez anos, propunha uma espécie de bolsa para tentar manter o pesquisador no Brasil à falta de uma política mais consistente, estruturada do Governo Federal. Eu não acho que seja o caso, porque isso pintaria mais a ter cara de intervenção. O problema é saber como prevenir esse tipo de situação, criar um sistema no qual o cientista ou estando no Brasil ou indo para o exterior faz parte do sistema de ciência e tecnologia, sem esse tipo de gap que pegar uma passagem de avião, na verdade, teoricamente provocaria. A internet está aí exatamente porque, com informação e comunicação horizontais entre países e entre pessoas, esse tipo de coisa não é ou não pode ser pintado como dramático. Eu tenho a impressão de que todo mundo aqui nesta sala tem um parente que está no exterior. Essa é a realidade do Brasil hoje.
E o segundo ponto é, estando no Brasil ou no exterior... Esse é outro comentário de uma outra propaganda para evitar evasão de cérebro, onde o cara fala: "Be a fountain, not a drain", no sentido de que, no Brasil ou no exterior, se você tem status de senioridade, você tem de ser alguma coisa que atrai e mantém, e não alguma coisa que vai ser parte da evasão.
Há um monte de detalhes e ideias que podem ser discutidas. Eu vou parar aqui. Depois, à medida em que o debate começar a se acelerar, eu vou poder comentar mais alguma coisa em cima, certamente, de propostas que os meus colegas de Mesa vão fazer.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Muito obrigado, Professor. Eu creio que o senhor deu um quadro muito interessante.
Eu vou deixar em aberto - não quero que responda agora -, mas me surpreende: como é possível que os dois países com maior percentagem de cérebros que ficam nos Estados Unidos - 92% da China e 81% da Índia - conseguem ser países tão dinâmicos cientificamente. Fica aberta a pergunta para depois.
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Agora, quero passar a palavra ao nosso grande professor e amigo Mario Neto Borges, quem, acho, tem muito a dar, sobretudo pela posição que ele ocupa, além de ser um pensador sobre o assunto. A posição que ele ocupa no CNPq lhe permite ter uma visão extremamente lúcida do problema que nós enfrentamos, tanto na tragédia que pode vir a ser quanto nas alternativas que podemos ter.
Por favor.
O SR. MARIO NETO BORGES - Muito obrigado, Senador Cristovam. Na sua pessoa, eu cumprimento todos os colegas da Mesa, todos aqui presentes. Queria, de maneira particular, cumprimentar o Senado Federal e a Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática por ter tido essa iniciativa. Queria saudar o Senador Pedro Chaves, que é meu vizinho, e a gente tem tido a oportunidade de conversar algumas vezes sobre a importância da ciência, tecnologia e inovação.
Este momento por que o País está passando, de crise e de discussão do Orçamento de 2018, é um momento muito oportuno para fazer essa reflexão. E temos a oportunidade de mostrar que o Brasil só será uma nação desenvolvida, com desenvolvimento sustentável que gere riqueza e que resolva os problemas nacionais, que é uma questão que o Senador Cristovam muito apropriadamente colocou na sua fala inicial, com investimentos sólidos em educação, mas principalmente em ciência, tecnologia e inovação, porque é através da ciência, tecnologia e inovação que nós temos instrumentos para resolver os problemas nacionais que nos afligem.
Então, eu queria também, antes de começar a apresentar meus eslaides, dizer que vou fazer um esforço brutal para ficar dentro do tempo. O Prof. Cristovam sabe que nós somos professores, e o professor fala muito, e nós somos ex-reitores, e aí somos intoleráveis no tempo de fala. Mas eu tenho dois minutos e trinta segundos de crédito do Eduardo, que não gastou os 15 minutos dele completos.
Mas eu queria, antes de começar, dizer que é muito importante que se caracterize a diferença entre mobilidade de pesquisador e fuga de cérebros. Nós defendemos fortemente a mobilidade do pesquisador e a internacionalização da ciência, tecnologia e inovação brasileiras, mas nós temos que ter cuidado realmente com a fuga de cérebros. E um pouco disso é que nós vamos tentar mostrar.
Foi muito boa a apresentação do Eduardo. Meus parabéns! Ela vai ajudar muito em alguns dados que eu vou mostrar e complementar de alguma forma os dados que nós estamos querendo trazer. Como engenheiro que sou, além de trazer a questão do problema a ser discutido, também estamos trazendo aqui uma solução para sairmos dessa situação. Então, se vocês observarem, o nosso cérebro lá, naquela figura, está voando.
Muito bem, eu queria, inicialmente, mostrar a importância do CNPq.
E aí tinha um som. Não sei se... Está sem o som aqui. Nós tínhamos testado ontem.
O SR. OMAR AZIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - AM. Fora do microfone.) - Essa é a nossa tecnologia.
(Procede-se à exibição de vídeo.)
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O SR. MARIO NETO BORGES - Podemos recomeçar o filme, Senador? O filme tem a função de demonstrar que a concepção...
(Procede-se a exibição de vídeo.)
O SR. MARIO NETO BORGES - Muito bem, aí fica demonstrado que, há 66 anos, numa visão de futuro estratégica do Almirante Álvaro Alberto, que é o patrono, já se pensava na importância de o Brasil ter uma agência que pudesse pensar a questão da ciência, tecnologia e inovação como elemento estratégico para a própria soberania nacional, por meio do conhecimento adquirido e desenvolvido.
Portanto, esse é o papel que o CNPq vem desempenhando e, junto com a Capes, há 66 anos, são as duas agências responsáveis pelo Brasil ter hoje uma posição confortável na produção científica (13º lugar). No entanto, na questão da inovação, nós lamentamos a 69ª posição e precisamos resolver isso, porque a inovação é um dos pilares da ciência, tecnologia e inovação e é responsável por transformar o conhecimento em riqueza, em desenvolvimento.
Então, nesse sentido, a missão do CNPq tem duas funções: fomentar ciência, tecnologia e inovação e trabalhar na formulação das políticas dessa área. Agora, o objetivo é que nós não só avancemos a fronteira do conhecimento, mas que possamos garantir o desenvolvimento sustentável e a soberania nacional. Essa é uma missão importantíssima, e o CNPq vem fazendo isso há 66 anos com muita competência, mas precisa revisitar essa missão no sentido de fortalecer mais a área da tecnologia e da inovação para promover a geração de riqueza e trazer uma solução para os problemas nacionais.
Dentro desse conceito - um pouco também do que foi dito pelo nosso palestrante anterior -, nesse gráfico, que também tem algumas dificuldades, nós podemos ver o Brasil nesse cantinho. Ali, no eixo horizontal, está a quantidade de estudantes - aí não são pesquisadores - que saem do País. No eixo vertical, estão aqueles que vêm estudar no Brasil. Então, nós estamos vendo que o Brasil tem uma situação muito... Saem em torno de 2% dos estudantes brasileiros ao exterior, o que ainda é muito pouco no sentido da mobilidade de estudantes e pesquisadores, mas, em compensação, nós não recebemos ninguém de fora para estudar no Brasil, quer dizer, muito pouco. Isso nós vamos mostrar. Uma das razões é a questão da língua, da dificuldade da língua. Como também foi mostrado, o maior destaque lá, nós podemos ver, é a Nova Zelândia, onde mais de 25% dos estudantes são estrangeiros, que vão lá estudar. Reino Unido logo abaixo, também foi mostrado pelo nosso antecessor, com 23% de estudantes que vão, do mundo inteiro, estudar na Inglaterra, ao passo que poucos saem da Inglaterra para estudar fora. Mas isso são estudantes.
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Então, esse é um dado importante, porque nós queremos diferenciar, como eu disse no início, a questão da mobilidade de estudantes e pesquisadores da fuga de cérebros.
Aqui está a Coreia, que é um país, frequentemente, comparado com o Brasil, onde há também uma saída significativa de estudantes, mas eles também recebem muita gente e a questão da língua também fica como sendo... Se a língua é um problema no Brasil, na Coreia também não é simples de se falar. Mas lá todo mundo fala inglês.
Onde estão os nossos brasileiros? Esse é um dado de 2016, quando a maioria dos grandes cérebros... Porque uma questão que também é importante, Senador Cristovam, Senadores, não é só a quantidade que nós estamos perdendo, mas a qualidade dos cérebros que estão saindo, que são aqueles que levam o ouro de hoje na cabeça. Essa é a importância que temos de considerar. Então, lá do Silicon Valley, um local que hoje é cosmopolita, há pessoas do mundo inteiro, ali estão os percentuais que mostram que, na verdade, o número de mexicanos e chineses... E aí eu queria completar a fala do Eduardo dizendo o seguinte: o dado dele, de 92% dos chineses que saem para os Estados Unidos, é até 2007. De 2006 para cá, estão fazendo um programa de repatriação dos cérebros, oferecendo um salário de US$3 mil, que, para a China, é uma coisa significativa, com todos os laboratórios montados e toda infraestrutura no campus para os pesquisadores retornarem à China. Por isso a produção científica, hoje, da China ultrapassa, sobe de forma exponencial. Então, existem políticas possíveis para trazer de volta os grandes cérebros que fazem a diferença no desenvolvimento do País.
Aqui eu queria falar, então, de alguns brasileiros que se encontram lá no Vale do Silício e hoje são importantes profissionais que estão exatamente na fronteira da tecnologia, da inovação e da ciência, desenvolvendo projetos e levando riqueza para os Estados Unidos e que poderiam estar aqui conosco se tivessem as condições necessárias para isso. Aqui um caso muito especial, que não está lá no Vale do Silício, mas está na Nasa, que é a Duília de Mello, uma das responsáveis por trabalhar desde 1998 no telescópio Hubble - que agora está desativado - e que foi uma das responsáveis pela descoberta das bolhas azuis e aglomerado de estrelas fora das galáxias. E ela descobriu uma supernova em 1997.
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O que eu quero mostrar nesse dado, Senador? O que nós estamos perdendo são aqueles cérebros que realmente têm condição de fazer a diferença na ciência, na tecnologia e na inovação com geração de grandes oportunidades.
E um exemplo bastante emblemático eu ainda vou mostrar aqui. Ela esteve aqui, no Brasil, agora em 2017, e falou esta frase que marcou demais a gente: "O sucesso no exterior ocorreu 'graças' a um corte de gastos no investimento em pesquisa, ainda em 1995". E nós estamos vivendo de novo o corte dos gastos na área de ciência, tecnologia e inovação. Então, aquele "graças" dela é um pouco irônico.
E ela falou isto lá também: que ela deixou o Brasil porque recebeu uma carta do CNPq - certamente não assinada por mim - de que naquele momento os investimentos para recém-doutores diminuiriam pela metade. Então, ela completou: "Eu investi a minha vida fazendo doutorado e não via uma sociedade que valorizava isso. Isso é uma pena porque o Brasil é um país que precisa de cientistas". Ela disse isso exatamente no Campus Party, onde milhares de meninos estão e vão receber essa mensagem, que não é uma mensagem positiva. Portanto, precisamos inverter essa questão. Isso foi agora, em fevereiro deste ano, lá em São Paulo.
Esse aqui é um exemplo também fundamental, porque foi o ganhador do primeiro Jovem Cientista, um programa, uma premiação que o CNPq faz há 29 edições. Ontem lançamos, no Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, a 29ª edição desse prêmio, cujo primeiro graduado é o famoso Henrique Malvar ou Rico Malvar, que é hoje um CEO da Microsoft e é o exemplo de que o investimento em ciência, tecnologia e inovação forma, descobre o talento... O prêmio descobre o talento desses jovens. E ele teve toda a sua carreira aqui pela Universidade de Brasília, sendo um exemplo também emblemático de Brasília - o nosso Senador Cristovam foi Reitor da Universidade de Brasília. Eu me encontrei com ele em São Paulo em junho, e ele me disse o seguinte: "Professor, eu devo toda a minha vida, toda a minha carreira ao CNPq", desde o Prêmio Jovem Cientista, que ele ganhou em 1981, até o mestrado e o doutorado, que o tornou capaz de ser hoje uma das pessoas mais importantes dentro do sistema Microsoft.
Aí estão os dados que ele produz: 119 patentes nos Estados Unidos; 160 artigos científicos; é membro da Academia Norte-Americana de Engenharia; responsável por 12 laboratórios. Ele fala: "Aplicar o conhecimento para melhorar a vida das pessoas é o que mais me motiva no trabalho". E ele está disposto a ajudar e, inclusive, a motivar a juventude brasileira a continuar estudando e investindo em ciência, tecnologia e inovação.
Esse foi o nosso encontro, lá em São Paulo, que foi bastante emocionante.
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Aqui, é só uma questão de mostrar que o que nós estamos discutindo não é a quantidade, mas a qualidade dos cientistas que nós estamos perdendo. Então, aí vem a ideia de fazer um pouco da análise, que o Eduardo fez também, de quem perde e quem ganha com essa brincadeira.
Então, ali é um pouco parecido. O Brasil está lá naquela posição. É onde entram poucos estudantes aqui. Ali não está dando para ver direitinho, mas o verdinho é o que entra, e o laranja é o que sai para estudar fora. Entram poucos demais - e é só da América Latina: Peru, Colômbia, Bolívia e tal - e saem poucos ainda para estudar fora. Se nós pegarmos a Índia, que está lá no meio, a maior saída é da Índia, que, come ele colocou, não estavam voltando. Os da Índia eu não sei, mas os da China, que não aparecem nesse gráfico, estão voltando. O primeiro é a Austrália, que está colocada de uma maneira...
(Soa a campainha.)
O SR. MARIO NETO BORGES - Esse é o sino? Mas a gente já está caminhando para o encerramento.
Então, mostra isso. E o Reino Unido, que foi mencionado aqui também, lá embaixo, que é o penúltimo, também recebe; muita gente vai estudar fora, mas muita gente vai estudar lá. Isso é questão da mobilidade.
Essa mobilidade deve ser parte da política. O Senador perguntou sobre o Ciência sem Fronteiras. Depois, na hora das perguntas, a gente quer explorar um pouquinho mais a questão do Ciência sem Fronteiras. Mas a questão da mobilidade dos pesquisadores é fundamental. O que nós temos que fazer é que a mobilidade do pesquisador seja associada a um plano para que, depois que ele fizer a sua experiência internacional, ele esteja motivado a voltar para o Brasil, aqui ficar e ter o que fazer aqui. Uma experiência que nós vamos mostrar é feita com a Embrapii, com a Profª Denise, que está aqui do nosso lado.
Então, aqui eu quero agora apresentar um pouco da solução para os Srs. Senadores e para a sociedade. O que nós precisamos fazer para não perder cérebros? Então, nós precisamos investir no CNPq. Eu não viria aqui sem fazer uma pequena propaganda para o nosso CNPq. Então, o importante é criar um ambiente para atração de talentos, mesmo que sejam aqueles nossos pesquisadores que vão se titular no exterior ou que vão fazer internacionalização, mas também de outros países, que poderiam vir trabalhar conosco. E, quando a gente fala que internacionalizar é importante, é porque também se criam redes de pesquisa internacionais, redes em que há pesquisadores de vários países do mundo, e eles, com certeza, ao fazerem isso, melhoram a qualidade da ciência produzida no próprio Brasil. Então, é avançar as fronteiras do conhecimento.
Aqui há também uma importância de fortalecer o conceito da inovação. Isso não sou eu que estou dizendo. É um autor que vai aparecer lá embaixo, mas eu separei a fala dele em quatro pontos. A evolução das redes de pesquisa entre países ou instituições é mais do que um interesse acadêmico. Então, não é só a questão da academia, de produção de artigo nem nada. Então, é importante também que, ao se fazer a ligação em rede, ela produza o melhor impacto da pesquisa produzida. E os grupos de pesquisa que hoje não fazem parte de redes correm o risco de serem deixados para trás, marginalizados e vão perder a corrida da ciência no mundo. E ele reforça, dizendo que é essencial para economias com pesquisas emergentes, que é o caso do Brasil, acessar as redes à medida que elas crescem. O John Adams que colocou em 2015 esse pensamento muito importante, e eu quero aqui reforçar que nós precisamos defender a mobilidade dos pesquisadores, e com programas que os fixem de volta ao Brasil assim que eles estiverem qualificados e tiverem criado as suas redes de pesquisa internacionais.
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Aqui é um mapa do mundo um pouco diferente. O tamanho aí é exatamente em função do ranking das universidades, o que o Senador Cristovam também colocou. Nós vemos que o nosso Brasil, que é um dos maiores países, geograficamente, no mundo, fica pequenininho perto de outros países que, em função da qualidade das suas universidades e, portanto, das pesquisas, têm destaque - isso fica à disposição, eu não quero expandir muito, porque eu já quebrei meu tempo.
Eu queria chamar a atenção aqui para esse gráfico, que está ligado com um pouco da questão do investimento em ciência, tecnologia e inovação para resolver o problema econômico de desenvolvimento de geração de riqueza. Então, nós temos ali o Brasil numa posição - a metade do eixo é zero; então, para lá, significa países altamente competitivos do ponto de vista de valor agregado aos seus produtos e competitividade com base em ciência, tecnologia e inovação. Para chamar ao destaque aqui, a Coreia do Sul está do lado de cá. E do meio para cima, é a qualidade dos empregos colocados. O Brasil, ali, tem um pouquinho mais de 20% da força de trabalho com atividades de complexidade elevada, ao passo que a Coreia, que é o nosso outro exemplo, ou Singapura - acima, lá, que foi citada aqui pelo Eduardo - também estão lá como países que têm um terço a mais da força de trabalho envolvida com atividades de alta complexidade que geram riqueza, que geram desenvolvimento sustentável de longo prazo. Então, nós precisamos avançar nisso.
Aqui, se nós olharmos o quadro das importações - isso é um big data tirado aí sobre as exportações brasileiras -, nós vemos que estão concentrados ali em alimentos, minérios, como sendo a maior parte dos produtos de exportação. E vale lembrar que, mesmo os alimentos, onde nós somos o grande produtor - porque na década de 70 éramos importadores de alimentos; a exportação de alimentos é resultado do investimento feito na Embrapa, na década de 70, que tornou o Brasil um celeiro mundial - há ciência, tecnologia e inovação por trás também da produção de alimentos. E quando nós olhamos a pauta da importação, nós certamente importamos muito mais produtos com alto valor agregado, como máquinas, produtos químicos, etc.
E quando a gente pergunta como que é o Brasil conhecido no exterior, dentro da mesma coisa, nós verificamos aí que o maior conhecimento sobre o Brasil é com base nos seus jogadores de futebol. E os cientistas, na verdade, não são muito conhecidos.
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Então, eu queria destacar aqui que em 2016 a Profª Celina Turchi foi considerada uma das dez pesquisadoras mais importantes do Planeta porque desenvolveu a solução para equacionar o problema do vírus da zika. Por quê? Porque, naquele momento, o vírus da zika era um problema nacional gravíssimo e se investiram R$65 milhões no projeto de pesquisa. E só houve a solução, porque, na verdade, a base científica já estava sendo formada há muitos anos e, portanto, o Brasil foi capaz de equacionar o problema do vírus da zika com apenas dois anos de pesquisa e investimento em cima disso.
E a Professora Celina Turchi, que é uma das coordenadoras desse projeto, da Fiocruz de Pernambuco, foi, então, destacada como uma das dez mais importantes pesquisadoras do mundo pela revista Nature, em 2016, e este ano, na revista Times, que fala das 100 pessoas mais influentes do mundo, nós temos dois brasileiros, o Neymar, obviamente, e a Profª Celina Turchi. Então, Srs. Senadores e pessoal, nós somos bons, no Brasil, em futebol e em ciência. Só que o futebol não precisa de dinheiro. Agora, a ciência precisa.
Então, isso aqui é o cardápio do CNPq de atividades que nós temos para fomentar a Ciência, Tecnologia e Inovação no Brasil.
Eu vou chamar a atenção só para aqueles dois aspectos lá, que estão focados na inovação, e mostrar mais um filme - rapidinho, Senador, estou concluindo -, para os senhores verem como que, quando nós fazemos o investimento e a política correta, a solução vem em seguida.
Esse é o Doutorado Acadêmico Industrial, uma experiência com a Universidade Federal do ABC e o resultado é este aí, olha.
(Procede-se à exibição de vídeo.)
O SR. MARIO NETO BORGES - Esse doutorado foi concluído há um mês e é um sucesso da possibilidade que nós temos de fazer investimentos em programas de doutorados que não sejam apenas aqueles doutorados acadêmicos. São importantes também, mas que tenhamos doutorados que possam buscar os problemas brasileiros e levá-los para a academia e buscar uma solução científica de alto nível.
Então, aqui, para encerrar, senhores, eu trago aí o orçamento do CNPq, o histórico do orçamento de 2002 até 2016. E os senhores podem observar que, realmente, nós precisamos de apoio aí para manter um crescimento que vinha ocorrendo ao longo do tempo e que foi, agora, interrompido.
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Nós queremos deixar registrado que entendemos a necessidade de fazer a restrição dos gastos públicos. Isso é fundamental para organizar a economia do País, mas nós entendemos também que, assim como saúde e educação, ciência é estratégico e deveria ficar fora desse teto de limite orçamentário e que deve, para o ano de 2018, ter um orçamento condizente pelo menos com o orçamento aprovado para 2017, com a respectiva inflação. E que o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico não seja contingenciado, porque esses são os dois maiores componentes do orçamento do CNPq.
Então, agradeço a atenção de todos e peço desculpas por ultrapassar o tempo.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Não tem que pedir desculpa nenhuma porque foi o tempo foi muito bem aproveitado.
Antes de passar a palavra ao Senador Aziz, eu queria deixar no ar duas perguntas, mas não precisam ser respondidas agora. A primeira tem a ver com o futebol. Por que é que a gente é tão bom em futebol lá fora, em todos os cantos? Nossas pernas são melhores do que as dos coreanos? E os cérebros dos coreanos são melhores do que os nossos? Não!
Senador Pedro, eu insisto que a gente tem tão bons futebolistas porque aqui nós não inibimos talentos futebolísticos. Isso porque a bola é redonda para todos. Todo mundo joga futebol com bola igual, em campo igual, apesar um ser de grama e outro de areia, com as mesmas regras. Então, os talentos chegam lá em cima. Garanto que o meu amigo Pedro, o Aziz jogaram futebol, mas nós não tivemos o talento deles. Não temos o que reclamar.
Isso aí me traz uma outra pergunta. Estamos discutindo muito, e obviamente estamos assustados, com a questão da fuga de cérebros, mas estamos falando pouco no afogamento de cérebros. Alguns milhares de doutores, poucos, vão para o exterior. Mas quantos milhões de cérebros nós não evaporamos por falta de um ensino médio de qualidade para todos? Qual é a perda cientifica que nós temos por não garantir uma escola boa, de qualidade para todos? Por isso é que a gente não tem muitos como o Neymar na ciência. Temos no futebol, porque a bola é redonda, mas a escola é redonda para uns e quadrada para outros.
Eu digo isso não para barrar a nossa preocupação com a chamada fuga de cérebros. Nunca! De jeito nenhum, porque isso é imediato. É para nós não esquecermos o afogamento dos cérebros também. Então, essa é uma pergunta, Professor.
Mas a outra, olhando lá no futuro, Senador Aziz, será que vai existir fuga de cérebros ou os cérebros do mundo farão uma grande nação dos cientistas, não importa o país onde eles vivam, como, aliás, era na Idade Média com os teólogos? Não importava a nacionalidade de um teólogo. Importava o fato de que falando a mesma língua, que era o latim, ele formulasse suas especulações teológicas ou até filosóficas. Será que não vai chegar o momento em que os cérebros todos se organizarão, graças até à internet, em uma grande nação à parte? Cada um torcerá pelo seu time na Copa do Mundo. Afora isso, eles serão nacionais da intelectualidade, do pensamento, da ciência. E essa ciência, aí sim, a gente tem que saber como se apropriar dela, como buscá-la aonde ela estiver, independentemente da nacionalidade.
Essas são as duas provocações para ao longo da manhã nós conversarmos a respeito.
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Mas agora, Prof. Aziz, com muito prazer, aliás dizendo aqui...
O SR. OMAR AZIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - AM. Fora do microfone.) - Quem dera eu fosse professor.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - É professor. Dizendo aqui, muitos talvez não saibam, que o Senador é muito preocupado com a ciência, especialmente no caso da ciência na Amazônia. Ele tem uma obsessão pelo desenvolvimento da ciência na Amazônia e, com isso, em todo o Brasil. Por isso, eu fico muito satisfeito de passar-lhe a palavra, Senador.
O SR. OMAR AZIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - AM) - Eu pedi a palavra, Senador Cristovam, pedindo até desculpas aos próximos oradores e ao nosso querido Reitor Pedro Chaves, porque eu tenho agora uma reunião na Comissão de Assuntos Econômicos. Infelizmente, a gente tem reuniões aqui em comissões ao mesmo. E, em algumas, você tem projeto até para defender e tem que estar presente.
O Senador Cristovam sabe muito bem o que é isso. Às vezes, estava aqui presidindo e tinha que sair correndo para uma outra comissão e voltar depois aqui. Peço até desculpa.
Mas, para dar a minha contribuição, eu ouvi atentamente. E eu, quando fui Governador, cada real que o Estado... Eu, como governador, investi muito no fundo de amparo à pesquisa. O Prof. Denildo foi secretário de Ciência e Tecnologia, e eu fiz o meu papel naquele momento e o cumpri bem.
Eu sou formado em Engenharia Civil e vou lhe fazer uma pergunta, Prof. Mario, e V. Exª é formado em Engenharia Elétrica. Quantos doutores tinham na sua universidade quando você se formou?
O SR. MARIO NETO BORGES (Fora do microfone.) - Dois.
O SR. OMAR AZIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - AM) - Dois. Na minha, tinha um.
Então, veja bem, a formação nossa começa aí. Hoje, se você for para dentro de uma universidade, você vai ter muitos doutores hoje. Mestrados, doutorados, pós-doutorados e mentes brilhantes, que estão ali tentando sair daquela mesmice, até porque virou muito cultural a mesmice, e o discurso de dizer que tudo é falta de dinheiro.
Se você vir o gráfico de 2013, nós tivemos um upgrade bastante grande. O que surgiu em 2013, o que foi isso? Foi simplesmente um projeto que foi relatado por mim e com a deferência do Presidente, à época, da Comissão de Ciência e Tecnologia, Prof. Cristovam Buarque, que é o Ciência sem Fronteiras, cujo custo que houve com o projeto o benefício foi zero para mim, absolutamente zero.
Eu não eu estou questionando por que nós temos que otimizar os recursos. Se nós temos poucos recursos, nós temos os que otimizar. Nós temos que parar com o discurso de que falta dinheiro, falta recurso, falta isso, falta aquilo, mas, no momento em que nós temos, a gente aplica mal. Correto?
Então, nós temos. No Estado do Amazonas 1% da sua arrecadação é para a ciência e tecnologia, 1%. É lei. E ainda mais, eu fazia com o CNPq, procurava recurso aqui dentro, corria atrás. E tive o prazer de ver muitas pessoas adquirir o mestrado, doutorado, fazer pesquisa. E eu dizia: "Olha, a pesquisa positiva é aquela que vai para a prateleira. Não adianta você fazer a pesquisa hoje para o seu íntimo".
Se você olhar bem os Estados Unidos, ele tem um grande crescimento tecnológico a partir da Primeira Guerra Mundial, quando ele traz mentes brilhantes que não eram formadas nos Estados Unidos. Einstein era alemão e foi para os Estados Unidos fazer a bomba atômica. A Rússia fez a mesma coisa, pegou ali naquela área todas as mentes e levou para lá. Os Estados Unidos também; eles conseguiram e não um país que tem 3 mil anos, não; é um país diferente da China, que tem tecnologia, invenções de há 4 mil anos. Quer dizer, já existia, a China tem uma cultura. Então, não é difícil uma população de 1 bilhão e poucos milhões ter poucos mais cientistas do que um país de 200 milhões. Nós não podemos é perder para o Peru e para a Bolívia, com a população que temos proporcional.
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E até discordo aí, Prof. Cristovam: nós já formamos mais craques no Brasil. Hoje nós temos jogadores de futebol; nós tínhamos, antigamente, craques, diferenciados, gênios; hoje nós temos jogadores de futebol que cumprem um papel em campo. É uma diferença muito grande entre um gênio... O Neymar é um gênio, mas é um entre... Antigamente, em um time de futebol, você tinha o Pelé, o Didi, o Zito e outros gênios mais. Você tinha ali gênio para jogar e vender. Na Copa de 70, havia seis, sete gênios. Hoje você não tem. Você pega a seleção brasileira, tem um gênio? Tem, Neymar, mas até agora ele tem que ganhar uma Copa do Mundo, ele tem que ser campeão mundial pelo Brasil para se tornar um Romário, que fez mais gols do que ele jogando futebol, ele sabe disso. O Romário disse que fez mil gols; não acredito nisso, eu fiz mais do que ele jogando, até porque em pelada em fiz muito mais do que ele, ele sabe.
Essa discussão me interessa muito. Infelizmente eu não posso ficar, Prof. Mario, Profª Denise, Prof. Roberto, Tadao. Eu vi aqui as personalidades que estão aqui são pessoas importantíssimas para a ciência no Brasil.
Eu tenho uma proposta objetiva. As indústrias, e no meu Estado isso acontece, pagam 4% de P&D, 4%, de recursos contingenciados, professor. No Amazonas é 5%, por causa da Zona Franca; nós pagamos 1% a mais. Nós estamos discutindo uma medida provisória em relação a isso. A minha proposta é muito objetiva. Eu estou conversando com os reitores das universidades brasileiras e eu quero a colaboração e a contribuição de V. Exª, Prof. Cristovam, para fazermos uma reunião com todos os leitores. Um por cento desses recursos do P&D, que são arrecadas no Brasil, seriam direcionados à pesquisa dentro das universidades brasileiras. Direcionados, é glicose na veia, direto, sem essa intermediação.
O que aconteceu na década de 90 é que esse P&D era direcionado a universidades particulares, que cresceram com esses recursos sem prestaram contas e sem terem dado nenhuma contribuição à ciência e tecnologia, nem à inovação nem a pesquisa, no Brasil.
Falar em pesquisas, na minha região é brincadeira. Eu não preciso ir longe para falarmos em pesquisa sustentável e aquilo que não conhecemos na Amazônia. A Embrapa, que V. Exª colocou agora, e colocou bem, ela fez uma pesquisa, e hoje já podemos produzir açaí, que é sazonal - você sabe que o açaí só dá na chuva, ele é sazonal; só dá três meses por ano.
Na Amazônia, infelizmente, todos os produtos da Amazônia são sazonais, não é o ano todo. O peixe é sazonal, a castanha é sazonal, a borracha é sazonal, o açaí é sazonal e qualquer outro tipo de fruta é sazonal. Então, é muito difícil você ter uma indústria para produzir, você gerar valor agregado a essa benesse que a natureza nos dá, porque nós os nossos produtos são sazonais.
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E agora, com uma pesquisa feita pela Embrapa em especial, você tem mudas de açaí que, com gotejamento, podem produzir o ano todo. Açaí é um produto que todos nós conhecemos, não preciso explicar sua importância para o paladar brasileiro e mundial hoje.
Mas eu quero aqui dar minha contribuição dizendo o seguinte: nós temos condições de melhorar, sim, mas nós tínhamos que focar. A gente diversifica muito. Quando a gente cresceu na produção, da década de 70 para cá, é porque nós tínhamos condições objetivas e subjetivas. Objetivamente, nós temos terras férteis, as melhores terras do mundo para produzir. Aí, você cresceu nisso num outro momento. Hoje, neste momento, nós não teríamos essa produção, por causa das leis ambientais. Dificilmente Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Tocantins e outros Estados na Região Centro-Oeste que produzem soja, milho, teriam condições hoje de fazê-lo, até porque haveria um milhão de dificuldades para abrir estradas novas. Hoje você não consegue abrir estrada. Eu não consigo, no Amazonas, a gente não consegue asfaltar uma estrada que foi asfaltada na década de 70, a gente não consegue reasfaltar a estrada, porque não deixam. Mas essa é outra discussão.
Em relação à ciência e tecnologia, pesquisa e desenvolvimento, infelizmente nós pecamos por falta de uma política brasileira realmente voltada, sem deixar de ter solução de continuidade. O problema é que muda governo, muda política; muda o dirigente, muda a política. Tem de haver algumas áreas que nós Senadores, e o Congresso Nacional teria de aprovar uma lei proibindo... Seja quem for o governante, seja quem for o Presidente, nós não podemos mudar uma meta estabelecida para 20, 30 anos. O governador chega, eu tinha um programa bom, o governador diz: "Esse programa não é meu, joga fora, eu quero um programa novo". Aí muda a pessoa, muda a cabeça, isso acontece. Acontece aqui, não é o governo do PT, do PSDB, do PMDB. Em todos os partidos a prática é a mesma, infelizmente. E você vê os projetos, o investimento que você faz em três, quatro anos... Três, quatro anos não é absolutamente nada para ciência e tecnologia, para pesquisa e desenvolvimento. O caso dessa senhora: nós não teríamos aqui um telescópio para descobrir nenhuma estrelinha no Brasil. Então, ela foi trabalhar num lugar em que ela teve oportunidade de se tornar conhecida, porque tinha equipamento para fazê-lo, senão não seria ninguém; seria mais um nesse meio em que há muitas pessoas competentes.
Em relação a isso, eu acho que nós temos que fazer, Senador Cristovam e Senador Pedro Chaves: não dá para mudar de política conforme a cabeça do governante de plantão. A política de ciência e tecnologia não é uma prioridade do governante de plantão. Ele acha que, porque foi eleito com mais de 50% dos votos, tem o direito de chegar e dizer: "Não, agora não quero". Só para o senhor ter uma ideia, no governo da Dilma, houve quatro ou cinco ministros de ciência e tecnologia, Senador Cristovam. Começou com o Mercadante, foi para não sei quem, acabou que ficou com ninguém no final. Agora está lá o Kassab, que é do meu Partido, num esforço muito grande, tem uma sensibilidade de gestão. É importante ter sensibilidade de gestão, não adianta você ser... Nem sempre o cientista é um bom gestor. Você tem que ter a sensibilidade, e o Kassab tem essa sensibilidade. E eu vejo o esforço dele.
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Agora mesmo nós estamos programando um evento na Amazônia, principalmente do Estado do Amazonas. Após se lançar o satélite, nós vamos ter internet no Estado todo. Veja bem, para nós, há três ou quatro anos, era um sonho isso. Nós vamos ter, na realidade, internet, que é o mínimo hoje. O que a gente pode dizer é: se você não tem acesso à informação, como é que você vai dizer...
Há uma frase que eu uso muito na minha região que não é minha, e não precisa ser minha para que você adote também. Quando você adota uma criança, ela não nasceu de você, mas passa a ser seu filho. Eu sempre digo em reuniões com jovens, em reunião com professores e em uma reunião aqui, com pessoas que estão dirigindo essa área tão importante, que é da pesquisa, desenvolvimento, ciência e tecnologia que sem conhecimento não há desenvolvimento.
Enquanto a gente não tiver o conhecimento da Amazônia, nós não vamos desenvolver a Amazônia. Com o conhecimento, nós iremos proteger a Amazônia; sem o conhecimento, ela não será protegida. A partir do momento em que a população da Amazônia tiver direito de viver dela, sustentavelmente, ela vai protegê-la, tenha certeza disso. Senão, os oportunistas chegarão ali para dizer: "Não, derruba essa árvore aqui, porque isso aqui te dá um trocado". E ele vai, por aquele trocado, derrubar aquela árvore. Ele vai entrar numa picada para trazer, arrastando em carro de boi ou trator, uma tora que tem 100 anos, 80 anos, pelo trocado que estão dando para ele.
Se ele tiver o conhecimento da sua região, que ele possa dizer: "Disso eu tenho como manter a minha família, disso eu tenho como manter os meus filhos"... Se ele tiver como sobreviver bem, ele não fará absolutamente... Só há uma forma de proteger a Amazônia: é conhecê-la. E não é conhecê-la visitando, é conhecê-la internamente, através de pesquisa, através de conhecimento científico, para você poder produzir dela a riqueza para aquele povo que vive ali.
Era isso que eu queria colocar. Infelizmente, eu não posso ficar para um debate, mas eu espero, Senador Cristovam, que a gente possa debater não aqui, mas em um seminário em Brasília para a gente trazer pessoas do Brasil todo para dar sua contribuição. Há muita gente boa querendo dar contribuição.
Contem comigo aqui no Senado. Naquilo que for necessário contribuir para que a gente possa alocar para pesquisa e desenvolvimento, eu estarei à disposição dos senhores e das senhoras também.
Muito obrigado, Senador Cristovam.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Senador, eu que agradeço. O senhor trouxe aqui, sem querer talvez, uma boa ideia: fazer uma daquelas sessões plenárias que nós fazemos - fizemos sobre violência - sobre ciência e tecnologia.
O SR. OMAR AZIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - AM) - Sabe por que, Senador Cristovam? Se a gente trouxer todos aqueles professores que estão nas universidades... Veja bem, as pessoas muitas vezes não têm oportunidade de dar sua opinião.
Eu aprendi uma coisa: é ouvindo que a gente aprende. Aquilo que é interessante, a gente absorve; aquilo que não é, a gente pelo menos deu atenção à pessoa, dizendo: "Olha, sua ideia é boa, mas hoje não dá para fazer".
Mas eu queria, Senador Cristovam, a sua colaboração para que a gente pudesse... O P&D hoje, que é arrecadado das indústrias - veja bem, isso é das indústrias -, é altíssimo e é contingenciado pelo Governo, e algumas indústrias hoje não têm nem como fazer investimento.
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Eu, por exemplo, pedi para a Samsung, que é coreana: "Não, vocês têm que montar um laboratório aqui em Manaus e trazer cientistas coreanos para cá." Porque a Samsung arrecada quase 400 milhões de P&D por ano, e ela é obrigada a fazer esse investimento, por lei. Agora mesmo existe uma lei... Muitas indústrias brasileiras irão fechar as suas portas, porque não estão pagando P&D. Não estão conseguindo - muitas delas não conseguem - um projeto para você aplicar esses recursos. Então, criaram-se muitas fundações, a torto e a direito, para adquirir esse recurso, mas nós não vemos nada de positivo. O que é que nós produzimos de tecnologia nossa? Não produzimos absolutamente nada.
Para nós produzirmos esse computador, no Brasil, que é produzido ou no Paraná ou no Amazonas - na Zona Franca -, não existe absolutamente... O máximo que há aqui é o plástico que é utilizado, é uma área termoplástica que você usa aqui. O resto tudo é trazido de fora. Chega aqui, o pessoal solda, com aquelas soldazinhas pequenas e tal, chipizinho dali e tal... Então, nada! O valor agregado, no Brasil, é praticamente nada. O número de empregos que nós geramos no Brasil é quase nada. Pelo contrário: hoje você pega uma televisão plana, da Samsung, de 70, 80, 100 polegadas. Há televisão da Samsung que custa cento e poucos mil reais, para vocês terem uma ideia. E toda a tecnologia trazida da Coreia.
O Japão, que há muitos anos foi um grande produtor de tecnologia, matéria-prima final, hoje só produz tecnologia, mas não produz... A Hitachi fechou, a Sharp fechou. As grandes indústrias japonesas fecharam, como as grandes indústrias americanas, na área de televisão, fecharam. Sobrou aí quem? Samsung, coreana; LG, coreana; Philips, holandesa; a Sony, japonesa; e acabou. Hoje, quem controla essa área são os coreanos. Só para você ter uma ideia, Samsung e Hyundai são quase 50% do PIB coreano. Só para nós termos uma ideia. Duas indústrias são 50% do PIB coreano. A Hyundai produz de parafuso a foguete. Tecnologia coreana.
Hoje, se nós quisermos montar uma indústria de semicondutores, Prof. Roberto, que é físico, para ter uma indústria de semicondutores aqui, que são utilizados em qualquer área de tecnologia, nós precisaríamos ter, no mínimo, mil engenheiros eletrônicos, e nós não temos isso no mercado. Sabe onde há isso hoje? Na Índia. Em quantidade suficiente para você ter... Nós não temos o número.
Então, muitas vezes nós temos recursos para montar uma indústria, mas não temos essa mente que está fugindo, esse capital humano que está fugindo do Brasil. E vai continuar fugindo, se nós não tomarmos essas providências de, primeiro, Senador Cristovam - e, aí, eu sou muito franco -: não dá para mudar governo, não dá para o presidente, o governador, o prefeito falarem: "Ah, muda tudo. Agora eu não quero mais isso. Isso não me interessa. Isso é do outro." Não! Isso é do Brasil!
Então, se nós não tivermos uma política dessas...
Por que é que as agências nacionais reguladoras são mandatos, independentemente do presidente? É para você ter, no mínimo, uma política de regulação, senão muda presidente e tal... Nós não temos isso na área de ciência, nós não temos isso na área de tecnologia. Todos que chegam ao Ministério da Ciência têm uma ideia nova e querem chegar para o Presidente de plantão e dizer: "Olha, isso aqui é bom. Vamos fazer isso? Isso é legal." É isso.
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Essa é a contribuição. Não sei se eu dei uma contribuição ou não, mas espero poder debater novamente com os senhores essa questão porque é muito interessante para a minha região. O Amazonas precisa muito do desenvolvimento de tecnologia, precisa muito de ciência porque nós somos dependentes da Zona Franca de Manaus e temos uma riqueza imensurável na Amazônia de que poderíamos estar usufruindo se tivéssemos feito isso lá atrás.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Obrigado ao senhor, Senador.
Vamos tentar fazer essa grande audiência no plenário. Eu vou levar a ideia ao Presidente.
Passo a palavra agora à Srª Denise Neddermeyer.
A SRª DENISE NEDDERMEYER - Obrigada, Senador.
Primeiro, eu queria agradecer o convite para participar desta reunião, cumprimentar meus colegas de Mesa e todos aqui presentes e dizer que é uma grande honra participar do debate sobre esse assunto, Senador.
Eu gostaria de começar a passar a mensagem da Embrapii, primeiro, trazendo aqui os cumprimentos do nosso Diretor-Presidente, Dr. Jorge Guimarães, que infelizmente não pôde estar aqui, mas que é um grande entusiasta desse assunto também.
Eu aproveito e já começo a tentar responder às três primeiras perguntas que o senhor fez, Senador, que achei que são muito pertinentes ao que a gente vai discutir, principalmente ao que eu gostaria de falar aqui para vocês hoje.
A primeira, então, seria se agora a situação é mais grave do que no passado em relação à tendência do brasileiro de permanecer no exterior ou de voltar para o Brasil. O que se percebe é que os estudos, os surveys que são feitos sempre indicam que o brasileiro, de um modo geral, esse talento qualificado que vai para o exterior, tem uma vontade enorme de voltar e geralmente ele volta. Porém, Senador, a dinâmica do recrutamento internacional mudou muito. É muito rápido o que está acontecendo no exterior hoje em dia, no cenário internacional.
Não só a questão da tecnologia da informação, mas também as redes sociais e a velocidade com que os processos de inovação acontecem servem de atrativo muito forte para essa mobilidade internacional, e isso faz com que os talentos brasileiros sejam expostos. Nós temos muitos talentos, como nós sabemos, e isso é, de fato, um atrativo grande para que o Brasil possa perder toda essa carga de talentos e de cientistas que estão preparados, principalmente em consequência do grande investimento que o Governo tem feito, em várias décadas, não só na Capes e no CNPq, mas também recentemente com o Ciência sem Fronteiras.
Então, eu acho que há uma preocupação, sim, há uma grande mudança em termos do tipo de disciplina e de foco que está atraindo esses talentos, como, por exemplo, a indústria 4.0, que é uma indústria de fronteira, de novos conhecimentos, que vai revolucionar muita coisa na nossa vida do dia a dia, como a Internet das Coisas, como smart cities, toda essa revolução que está acontecendo e que tem um potencial muito grande de atrair as melhores pessoas no mundo todo. Então, não é uma questão só do Brasil, mas o Brasil está inserido nesse contexto, e é preciso, sim, conversarmos e debatermos isso nesse ponto, como o senhor está fazendo, Senador.
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A outra questão que o senhor perguntou é o que é necessário fazer para segurar ou atrair esses talentos no Brasil. A questão é muito complexa, obviamente há a questão social pela qual o Brasil passa, a questão da segurança, a questão econômica, a questão das nossas universidades, mas algumas iniciativas demonstram que há algumas saídas, algumas esperanças, como, por exemplo, todo o esforço feito pelo CNPq, o esforço que a própria Embrapii está fazendo junto com o CNPq de lançar um programa de bolsa de estudos qualificado, num nível um pouco melhor do que mestrado e doutorado, são bolsas mais bem-remuneradas, para fixar pessoas, cientistas que voltaram do Ciência sem Fronteiras, ou que já se formaram mesmo no Brasil, nas unidades Embrapii, com bolsas do CNPq e da Capes, e o acompanhamento do IEL. Então, são três áreas muito experientes que estão se juntando para tentar criar uma cultura de aproveitamento e de inserção desses talentos no ambiente produtivo do Brasil. Isso é uma coisa importante. Não é necessário apenas inserir os nossos talentos nas nossas universidades; é necessário fazer com que se criem produtos, processos, inovação, para criar, de fato, um ambiente de competitividade no Brasil.
A participação de um órgão como o CNPq, governamental; a participação de um órgão como a Embrapii, que é uma organização social sem fins lucrativos, privada; e a participação de um IEL, que é um instituto da CNI, traz três áreas que se complementam na tentativa de formar esse caldo necessário para manter o profissional qualificado trabalhando e contribuindo para que inovações e produtos sejam feitos e comercializados, que é o que todo mundo quer. Nós temos uma capacidade acadêmica instalada excelente, com grande produtividade acadêmica, com publicação acadêmica de alto nível, mas, na hora em que esse talento acadêmico precisa de fato se transformar em produto, há um hiato, um abismo enorme. E é justamente nesse abismo que a Embrapii veio para trabalhar.
O que pode ser dito sobre isso? A Embrapii é uma iniciativa muito nova, foi criada em 2013. Comparada com a nossa necessidade, ela é pequena, mas é uma iniciativa muito singular, porque se tem um orçamento de 1,5 bilhão para seis anos, e esse orçamento é distribuído da seguinte forma: a Embrapii credencia suas unidades de acordo com editais públicos, com muita competitividade, com muita análise. De fato, as unidades de pesquisa são capazes, estão prontas para se inserir no processo de P&D mesmo, prático, de ciências aplicadas, para que gerem produtos para a sociedade brasileira e para o setor produtivo brasileiro. Isto é uma coisa importante que não podemos esquecer: o envolvimento das nossas empresas para a solução de problemas locais no Brasil, para que os produtos, as inovações, as descobertas retornem para a sociedade brasileira, e não simplesmente inserir um cientista dentro de uma universidade, um emprego. É preciso que ele use a sua capacidade de talento e produza.
Então, Senador, eu acho que, neste ponto, embora pareça uma gota no oceano, Presidente, é uma iniciativa de mudança de cultura, de aproveitar o que nós temos no Brasil de muito bom e inserir isso no mercado de trabalho, apesar das dificuldades momentâneas que nós estamos atravessando. A segunda questão seria... Aliás, sobre atrair os talentos. Hoje em dia, no Brasil, nós temos várias redes de diásporas formadas, de pessoas de altíssimo nível, como a astrônoma Duilia e outros mais, que estão totalmente engajadas em ajudar, favorecer, trazer para o Brasil, complementar o que se faz aqui, usar o seu prestígio no exterior para que nós possamos também criar núcleos de pesquisa e núcleos de liderança aqui no Brasil.
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Isso é um potencial fantástico. Isso pode ser muito bem aproveitado; tem sido em alguns casos. Elas têm ajudado, têm feito muitas conexões, e são pessoas que estão comprometidas com o interesse do Brasil, embora esteja no exterior, mas, por conta do seu prestígio, por conta dos seus conhecimentos, de suas redes de conexões, elas têm ajudado muito e tentam ajudar muito o Brasil, nesse sentido de trazer para cá pessoas e no sentido de manter também os seus estudantes aqui.
Agora, a terceira questão, que é o Ciência sem Fronteiras, eu sou um pouco suspeita para falar sobre isso, Senador, porque eu tive o privilégio de dirigir a diretoria da Capes, na época em que o programa estava sendo implementado.
Bom, eu vou tentar abstrair um pouquinho de toda a experiência que eu tive, da complexidade que foi implementar o programa; um programa muito complexo e que envolveu a Capes e o CNPq, duas instituições diferentes, de culturas diferentes, embora tivessem experiências complementares, além da questão do tamanho do programa. Mas o que eu gostaria de passar aqui para vocês, de uma pessoa que vivenciou o dia a dia do programa Ciência sem Fronteiras - é claro que eu poderia falar de muitas coisas que poderiam ser melhoradas e podem, evidentemente - é que o programa despertou o Brasil para algumas questões muito importantes.
A primeira delas é que, até então, só uma elite muito privilegiada tinha oportunidade de ir ao exterior. Jamais, em tempo algum, um estudante de graduação do interior do Nordeste, ou do Amazonas, ou de Goiás, ou do Mato Grosso tinha a chance de botar o pé no exterior. Nunca.
A segunda coisa é que o programa tinha um foco muito determinado. Ele tinha um período x, quatro anos, o número de 100 mil e ele tinha o foco nas áreas tecnológicas específicas. Houve alguns desvirtuamentos por conta de questões políticas, mas o foco permaneceu: ciência, tecnologia e inovação. E esse foco é muito interessante porque permitiu se criar uma força de trabalho voltada para a necessidade do País naquelas áreas específicas: engenharia, sistema de computação, ambiente sustentável, energias, biologias, etc., etc., e se criou um despertar em vários sentidos. Primeiro, a questão da nossa necessidade de investir em melhor educação em ciências para os nossos jovens, para a formação deles; segundo, a questão da internacionalização das nossas universidades, que não estavam preparadas para ter o alcance do que se estava propondo naquele momento. Então, muitas universidades já tinham alguma experiência, saíram na frente; outras se retraíram, dizendo que não tinham condições; outras perceberam que não tinham como nem começar a favorecer os seus próprios estudantes e que tinham um grupo de estudantes muito propício para poder ir ao exterior. Então, ficou muito evidente o despreparo das nossas universidades em relação a esse contato com o exterior, tanto de mandar quanto de receber, e a falta de infraestrutura das nossas universidades nesse sentido. E, nesse ponto, o programa pecou, porque deixou as universidades um pouco de lado do que de toda a implementação, o que, no meu entendimento, poderia ter sido melhor aproveitado. Isso foi muito sugerido, mas infelizmente não foi aceito.
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E a outra grande questão, que eu acho que foi muito salutar, foi a questão da falta da capacidade do idioma estrangeiro dos nossos estudantes não só de graduação, mas de pós-graduação também. Nós somos ainda um país muito voltado para nós mesmos. Nós somos muito grandes, temos tudo aqui no nosso País e muito poucos tinham a ideia de que hoje falar uma língua estrangeira, principalmente inglês, é essencial no mundo em que a gente vive. Não há como nós sermos competitivos, não há como nós abrirmos o nosso espaço, recebemos outras pessoas, se nós não conseguirmos nos comunicar dessa forma.
Nós não temos um bilhão de pessoas como a China ou como a Índia, então nós precisamos, sim, trabalhar com o que nós podemos no sentido de aproveitar os 40, 50 milhões de jovens que nós temos e prepará-los para esse desafio do País que está à nossa frente.
Então, Senador, eu acho que o Ciência sem Fronteiras retrata bem o que o Senador Aziz falou aqui na questão da continuidade: foi um investimento maciço, foi um investimento que trouxe oportunidades inexplicáveis para o Brasil, em termos de expor o que nós temos de bom para o exterior. Nós recebemos inúmeras comissões de visitas de universidades estrangeiras, do mais alto nível, interessadas em receber nossos alunos.
Nossos alunos não fizeram feio no exterior, sejam eles de graduação ou de pós-graduação. Muito pelo contrário, eles fizeram muito bem. Apesar da dificuldade do idioma inglês, eles iam estudar inglês, depois iam para os seus cursos, mas se deram bem, fizeram muito bem. Então, não deixaram a desejar.
Nós temos muito o que aprender com essa experiência. Acho que é o caso de pensar em como melhorar, porque o investimento em educação é uma coisa de longo prazo. Nós não temos como medir de imediato, mas daqui a algumas décadas nós vamos sentir o efeito desse investimento, com certeza.
No dia a dia nós já conhecemos algumas histórias muito interessantes. Por exemplo, na própria Embrapii, onde eu trabalho, nós temos um estagiário que está se formando na UnB, que foi bolsista do Ciência sem Fronteiras e é da Ceilândia. Ele foi para Hungria. Ele falou para mim assim: "Minha mãe falava: 'Para que você vai estudar? Você tem que trabalhar para me ajudar em casa'."
E ele insistiu, passou na UnB, foi para o Ciência sem Fronteiras, foi para a Hungria, fala inglês perfeitamente, está trabalhando como estagiário lá na Embrapii e, muito provavelmente, vai ser aproveitado quando ele se formar.
Esses casos muito peculiares são uma fonte de esperança, porque a educação é muito redentora, Senador.
(Soa a campainha.)
A SRª DENISE NEDDERMEYER - Acabou o meu tempo.
A educação é muito redentora e há um setor do Brasil que é muito consciente disso e trabalha muito em prol disso.
Eu espero que possamos, muito em breve, com a estabilização econômica e política no nosso ambiente, retomar e de fato investir nisso, porque o brasileiro é muito voltado para o Brasil e ele quer ficar aqui. É uma pena que nós não consigamos mantê-lo com as condições necessárias. Nós precisamos ter as condições necessárias para que ele fique.
Bom, era só isso, gente, por enquanto.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Agradeço muito à professora. Eu quero dizer que chegou aqui, por telefone... Por isso eu atendi quando eu vi o nome, estava me chamando, um dos grandes cientistas que nós temos na UnB, que é o Prof. Isaac Roitman. Mas além disso, ele tem algo mais: ele é um dos raros - eu diria - cientistas que dá ênfase à ideia de educação de base, ou seja, não só contra a fuga de cérebros, mas contra o afogamento dos cérebros. Ele mandou fazer uma pergunta nessa linha, mas ao Prof. Borges, que é: por que o CNPq suspendeu o Ciência sem Fronteiras? É a pergunta dele, mas não quero que responda agora.
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Eu quero, entretanto, provocado pela senhora, dizer que eu fui um entusiasta, no início, do Ciência sem Fronteiras, mas aos poucos eu fui perdendo o entusiasmo, quando eu vi que a quantidade de alunos que estavam indo não ia trazer o impacto científico ao Brasil, inclusive nas diversas áreas, e que não ia trazer uma coisa pela qual eu luto muito, que é a visão da universidade não como escada, mas como alavanca. Passou-se a ter, no Brasil, a ideia de que a universidade é uma escada social para quem entra nela - e tem que ser -, mas abandonou-se a ideia de que ela tem que ser uma alavanca para o progresso do País. Eu creio que - minha opinião - o Ciência sem Fronteiras ficou muito no lado da escada social, e pouco no lado da alavanca, e além disso com custos que talvez tenham sido mais altos. Eu lembro que, uma vez, eu estava defendendo o Ciência sem Fronteiras em uma conversa e eu disse: "Olhe, o simples fato de um jovem brasileiro ir ao exterior e ver que o sistema público de transporte funciona, como o metrô de Paris, já o traz com uma cabeça melhor." E esse interlocutor meu perguntou: "Então por que não deixa o programa ser administrado pelo Ministério do Turismo? Porque aí a gente não tem que medir o resultado científico." Ou seja, é um programa cuja criação, ao meu ver, foi uma coisa boa, e eu fui um entusiasta; mas de fato eu gostaria de uma avaliação mais completa e complexa do impacto como alavanca do progresso, e não apenas com escada de ascensão.
E aí uma coisa que eu sei que não é fácil, mas que talvez tivesse tido um grande impacto, era, em vez de fazer o Ciência sem Fronteiras ir para lá com brasileiros, trazer cientistas estrangeiros para o Brasil. A USP não foi criada mandando paulistas para o exterior. Foi trazendo franceses aqui para dentro, e italianos também. Então, é com essa visão que talvez se precise fazer uma avaliação.
E, finalmente, eu, gostando de jogar com as palavras: a ideia não seria, em vez de uma ciência sem fronteiras, uma educação sem fracasso? Um programa de educação sem fracasso - e quando eu digo educação, estou falando de base -, que seria a plataforma para todo o mais.
Dito isso, a pergunta fica no ar, do Prof. Isaac.
Eu passo a palavra ao Prof. Roberto Nicolsky.
O SR. ROBERTO NICOLSKY - Não para dar essa resposta.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Para dizer o que o senhor quiser.
O SR. ROBERTO NICOLSKY - Pois bem. Antes de mais nada, quero agradecer imensamente esse convite do Professor e Senador Cristovam Buarque e, na pessoa dele, cumprimentar toda a Mesa e toda a plateia.
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Eu pretendo colocar para vocês uma outra visão, porque se criou, no Brasil, aquilo que se poderia chamar de um chavão: quando se fala em ciência, fala-se em ciência, tecnologia e inovação, mas ninguém parou para pensar quem faz ciência, quem faz tecnologia, quem faz inovação. Paradoxalmente, isso não é um conceito indivisível; não, ele é completamente dividido. Ciência quem faz é a universidade; e aquilo que ela chama de tecnologia, na verdade, não é uma tecnologia, é uma ciência da engenharia, é isso que ela faz. São novos conceitos, novas ideias, novos materiais na área de engenharia, na área de química, na área do que for. O que a universidade faz na farmácia são novos conceitos de farmácia, não é um medicamento. Eventualmente, ela pode colaborar em um medicamento, mas vamos ver em que condições.
Aqui, eu quero colocar a questão da diáspora. Por que a diáspora brasileira? Porque nós vemos o Brasil em 2016: está lá com 3% negativos, repetindo o ano de 2015, que também teve 3% negativos. Como vimos no inquérito que fizeram com aqueles que participaram da diáspora, a primeira questão é a questão profissional para eles. Qual a perspectiva profissional real num país que regride 3% a cada ano? Isso é uma queda de renda para uma imensa proporção da população que perdeu o emprego - são 13 milhões de famílias que estão nessa situação - e uma perda de salário para aqueles que mantiveram o emprego, mas que tiveram que trocar para um salário menor. Até eu próprio fui vítima, pois eu era pró-reitor da universidade e fui rebaixado a um assessor por exigência da secretaria, porque eu era extraquadro, reduzindo-se o salário a uma quarta parte. Ainda assim, eu colaborei com a Uezo até o ano passado, quando, então, todos os extraquadros foram excluídos.
Essa é a situação real do Brasil. E nós temos ciência disso. Temos, inclusive, essa experiência da diáspora de outros países, quando, nas décadas de 60 e 70, nós recebemos hindus em grande quantidade. Praticamente, não havia uma universidade federal do Brasil que não tivesse um ou mais doutores da Índia. Por que isso? Porque a Índia estava mal nas décadas de 60 e 70 e até 80. Quando ela começou a se levantar, a diáspora parou. Continuou ainda, para os Estados Unidos.
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Na década de 90, após a promulgação da Lei 40/1991, que criou o incentivo fiscal principalmente para trazer capital indiano para a Índia, dos indianos para Índia, a diáspora se reverteu. A Índia passou por uma diáspora reversa, em que os indianos que enriqueceram fora voltavam para Índia para montar empresas de software. E a Índia passou a multiplicar o seu software 20% a cada ano - quer dizer, 1,2; 1,44; 1,7 - e, em poucos anos, ela passou de 1 bilhão de exportação para mais de 100 bilhões de exportação de software.
Minha gente, o que é software? É pura inteligência, nada mais. É apertar um botão, e ela está no cliente. É pura inteligência indiana. Não faz buraco na serra, não devasta florestas, nem devasta a Caatinga, nem o Cerrado; não. Não devasta nada! É pura inteligência.
Como fizeram isso? Promulgaram uma lei em 1991, dando dez anos de isenção e de impunidade para quem trouxesse capital. Quer dizer, ninguém perguntaria qual era a origem do capital. Então, vieram bilhões para a Índia. Para aplicar em quê? Naquilo que os indianos aprenderam lá fora, em TI. E a Índia se tornou o maior exportador de software do mundo.
E veja que ela não tem software de marca. O software que ela exporta é o que está dentro do Pentium, da Intel americana, é o software que está lá na Microsoft, é o software que comanda os aviões da Embraer; esse é o software indiano.
Então, a questão da diáspora é fruto de uma situação econômica.
Da mesma maneira que, na década de 90, houve a diáspora russa. Por que a diáspora russa? Porque ela mudou tudo lá dentro, gerou uma incerteza em relação à economia; o país paralisou-se. O que fizeram os cientistas bons? Foram embora. Há universidades americanas que até criaram institutos para abrigar todos os russos que quisessem ir para lá. Hoje, há diáspora russa? Não há mais diáspora russa. Ao contrário, hoje a Rússia tem milhares de estudantes do exterior, que vão estudar lá. E a Rússia, apesar de ter passado por essa crise do petróleo, da queda do petróleo, já este ano está positiva.
Bom, vamos adiante, só para não ficar parado nesse ponto.
Eu quero colocar aqui algumas coisas que mostram o que aconteceu depois da Segunda Guerra Mundial. A Segunda Guerra Mundial foi um grande marco no desenvolvimento dos países em desenvolvimento, ou seja, os países não desenvolvidos. Por quê? Com a Segunda Guerra Mundial, foi demolido o sistema colonial.
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A Índia, em 1947, proclamou-se independente; a China, em 1949, proclamou-se independente, e, no final da década de 40, quase todos os países - Indonésia, Paquistão, todos eles - tornaram-se independentes. Bem, mas o que isso quer dizer? Quer dizer que eles passaram a ter a liberdade de comandar o desenvolvimento da sua economia. Então, o Japão, que não se tornou independente mas ganhou essa possibilidade, porque ele tinha só a Coreia como colônia, e portanto não tinha para quem vender - porque para vender para a China era preciso pedir aos ingleses; para vender para a Índia, a mesma coisa; e assim por diante. Então, o Japão entrou no mercado mundial com bugigangas imitando aquilo que o Ocidente fazia de menos tecnológico. Para quê? Para aprender tecnologia. Tecnologia se faz na indústria, porque tecnologia é o processo de fabricação - isto é que é tecnologia. Não é aquela tese de um engenheiro que está lá na prateleira da universidade. Não. Aquilo é ciência da engenharia. Tecnologia se faz no chão de fábrica; é lá que se gera tecnologia. E o Brasil não tem tecnologia suficiente para o seu crescimento porque ele importou essa tecnologia. Ele não é dono dela. Ele não domina o processo de desenvolvimento dessa tecnologia. E nós podemos dar uma olhada muito rápida aqui nas... Não sei se... Mas está aí uma comparação de patentes, só em patentes. A patente é o resultado da tecnologia; é a forma como ela se protege. Então, um país que gera muita tecnologia tem muitas patentes - como os Estados Unidos, líder em patentes. Mas o Japão, que era praticamente inexistente, vejam lá, tinha 400 patentes quando começou a estatística do USPTO, não é nada. Hoje tem 51 mil, o que quer dizer que ele, em 1915, produziu - só em 15 - 51 mil patentes. Isso é taxa anual.
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Dois mil e quinze.
O SR. ROBERTO NICOLSKY - Dois mil e quinze. O que foi que eu disse?
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF. Fora do microfone.) - Mil e quinze.
O SR. ROBERTO NICOLSKY - Não, acrescenta mil aí.
Em 2015, 51 mil patentes. Foi o segundo patenteador; o primeiro, os Estados Unidos, com cento e vinte e tantas mil. Era um país que não produzia nada de patentes, porque ele não tinha tecnologia, a não ser em alguns setores muito específicos.
Pois bem, Taiwan entrou também nesse processo. Quantas patentes ela tinha em 1963? Zero. Ou seja, ela começou depois que houve a separação da China. Quantas ela hoje tem? Quase 12 mil. É o quinto patenteador, Taiwan - 20 mil habitantes numa ilha.
Está lá a Coreia do Sul, que tinha zero; hoje tem 18 mil. É o terceiro patenteador. Terceiro quer dizer que ele patenteia mais por ano do que um país absolutamente tradicional, chamado Alemanha, que tem o dobro da sua população e séculos de tradição - não como Alemanha, porque a Alemanha mesmo só tem 170 anos, mas seus principados formadores da Alemanha.
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Pois bem, temos ainda China, que hoje é o quarto patenteador. Perdão, quinto patenteador. Não, nem quinto: sexto patenteador. Quinto é Taiwan. Está crescendo velozmente. Vejam quanto ela tinha em 63: tinha dez.
Índia. Está lá, a última que começou. Vejam a data lá: 1995. Em 1995, a Índia... Em 1991, ela descobriu que, trazendo capital, crescia o software. Mas não bastava o software: precisava da tecnologia industrial. Então, em 1995, ela promulgou uma nova lei. É a Lei 44, de 1995, que criou um incentivo direto.
O preâmbulo da lei diz o seguinte: cria-se o Conselho de Desenvolvimento Tecnológico para prover recursos de risco para as indústrias. Prover recursos de risco para as indústrias desenvolverem, comercializarem as tecnologias desenvolvidas e copiarem as tecnologias importadas.
Pois bem, vejam lá o Brasil: nós tínhamos 17. Éramos o segundo lugar em 1963. Vejam que absurdo: somos, hoje, o 27º ou 28º - por aí.
Está aí.
O segundo quadro nos mostra o seguinte: o PIB, o crescimento do PIB consequente disso.
Em 1995, foi quando a Índia promulgou... Eu só vou analisar o último país, a Índia, porque falar de Coreia já ficou pré-histórico. Já não faz mais sentido. Ela, hoje, é um país que tem US$30 mil per capita e está em outra faixa, bem como Taiwan. Estão todos eles em outra faixa.
E, sobre a China, há muito pouca informação. Ela não divulga informação.
Como a Índia...
(Soa a campainha.)
O SR. ROBERTO NICOLSKY - ... é uma democracia, isso está em aberto.
Bom... Eu, na verdade, tenho ainda alguma coisa a dizer que eu acho que é relevante...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. ROBERTO NICOLSKY - Então, vejam lá em PIB.
O PIB monetário, expresso em dólares - dólares constantes -, era de 0,5 trilhão, da Índia, e 1,2 trilhão do Brasil. Em PPP - em paridade de poder de compras - nós estávamos iguais, com 1,9 trilhão.
Pois bem, em 2016, a Índia está monetariamente com 2,3 trilhões - é o sexto país -, e nós estamos com 1,8 trilhão, entre nono e décimo, dependendo da Itália.
Então, em PPP, a Índia hoje já é a terceira economia do mundo. Vejam: é a terceira. Em 20 anos de investimento em inovação realmente, não a inovação da prateleira, mas a inovação do chão de fábrica, patente, medida pela patente.
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A Índia é a terceira economia e tem 8,7 trilhões. Para que tenham uma ideia, o segundo, que são os Estados Unidos, tem 16 trilhões aproximadamente, 16 ou 17 trilhões. Quer dizer, ela está no encalço de ultrapassar a economia americana. A primeira já é a China, com 22 trilhões.
Olhem a taxa de crescimento que isso representa: 7,33% para a Índia. Isso é média geométrica, gente, não é aritmética. É média geométrica durante 22 anos, de 95 a 22. Nós, nesse mesmo período: 2,49. Ali o computador arredondou para 2,50, mas eu me lembro de memória. Está aí.
O que isso representou em multiplicação do PIB? O nosso cresceu dois terços, quer dizer, passou de 1,2 trilhão para 1,8 trilhão, por aí. E a Índia cresceu 4,4 vezes o seu PIB. É isso o que quero dizer.
Estão aqui os crescimentos de patente lá do líder, que é a Coreia. Vejam que são exponenciais claramente. Vejam que a segunda... A Coreia, Taiwan, China e Índia... Vejam que a Índia engrenou uma exponencial depois de 1995. E vejam o Brasil e a Rússia, que são os dois do BRICS, observem que os dois, até 2010, flutuavam em torno de uma média: o Brasil em torno de 100, a Rússia em torno de 200, ridículos os valores. Hoje eles engrenaram, houve uma inflexão, em 2010, no Brasil, e outro tanto na Rússia. É interessante a do Brasil para nós. Ela triplicou, em seis anos, a nossa produção de patentes lá no USPTO. Mas o que a fez triplicar? Quem tem essa resposta? Um incentivo fiscal da Lei 11.196, de 2005, chamada Lei do Bem. Está lá no terceiro capítulo, art. 19. Isso foi feito porque ele passou a financiar, a subsidiar com a média da devolução, que não é grande, é só 17%, mas o país que, por exemplo, aplicasse em patentes no exterior poderia chegar até mais de 30%. Isso é que fará o Brasil crescer a acabar com a diáspora, porque, no momento em que se abrir o mercado, nós vamos ver diáspora reversa, como tem a Índia hoje e como tem talvez a Rússia, não tenho maior informação, mas a situação dela se reverteu completamente.
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Vamos comparar Brasil e Índia rapidamente. Aqui alguns dados eu já dei. Agora, quero mostrar o seguinte, o desempenho da Índia hoje, de 1995 para cá, não é diferente do desempenho do Japão, da Coreia, de Taiwan, da China, nos seus 20 primeiros anos. Então, isso é uma lógica, é a lógica do desenvolvimento tecnológico. Dá até para...
Olhem o resultado do crescimento da exportação de software da Índia! É um exponencial. Poucos fenômenos físicos têm um fit da exponencial tão bom quando esse daqui, e esse é um produto de economia, ou seja, é o crescimento exponencial da exportação de software. Hoje está em mais de 100 bilhões. Isso é o que o Brasil exporta de matérias-primas e produtos. Está em cerca de 140 bilhões.
Pois bem, esse é o panorama da Índia de hoje. A Índia cresceu 7,33%, mais que quadruplicou o seu PIB e hoje a exportação de software ultrapassa 100 bilhões, mas é interessante porque ela tem outras exportações inacreditáveis. Por exemplo, algum dos senhores sabia que a Índia é o maior destino de operações programáveis? Cirurgias programáveis?
Os planos de saúde americanos constroem um hospital, colocam do lado um hotel e mandam... Operação de vesícula? Vai lá na Índia. Operação de... Enfim, qualquer operação programável. Bariátrica? Vai lá na Índia. E assim por diante.
No ano de 2015, ela exportou 13 bilhões de cirurgias programáveis. Ora, nós fazemos isso também, reconhecidamente em plástica; mas é muito pouco, eles fazem em qualquer área! E são vários... Cada plano de saúde americano tem o seu hospital, o seu hotel, tudo organizado, porque nos Estados Unidos custaria três vezes mais caro. Então, não só paga a passagem como até leva a família, que fica no hotel para dar assistência: um acompanhante da família.
Veja, esse programa da Índia tem só 21 anos, mas não foi mudado por nenhum governo. Foi criado pelo governo da oposição que ganhou as eleições, depois o partido do Congresso recuperou o poder. Em ano recente, 2014, houve uma nova eleição e novamente ganhou o partido da oposição. E sabem por que ele ganhou? Porque o governo do partido do Congresso não conseguia fazer a Índia crescer 7%. Isso é considerado como minimum minimorum.
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Então se elegeu Narendra Modi, que prometeu o seguinte. Ele era governador do Estado de Gujarat, que há 12 anos crescia 9% ao ano. Então, ele prometeu o seguinte: "Vou fazer a Índia crescer 9% ao ano porque eu vou desamarrar os entraves para que as pessoas empreendam, para que o capital estrangeiro venha e também empreenda aqui." E foi o que ele fez. No ano em que ele assumiu, em 2014, a Índia já cresceu 7,3%, só com a perspectiva nova que se abriu.
Pois bem, continua crescendo, ela é o país que mais cresce no mundo hoje, cresce mais que a China, que "caiu" - entre aspas "caiu" - para seis vírgula alguma coisa.
Pois bem, por que não fizemos isso em 1995? Eu escrevi um artigo publicado no dia 5 de janeiro de 1995, na Folha de S.Paulo. O artigo diz o seguinte, é o título, aliás: "O que faz falta à [política de] ciência e tecnologia" no Brasil. O que fazia falta? O óbvio que eu coletei naquele Anuário da Unesco de 1993 - provavelmente, a mesma fonte que usou a Índia para criar uma lei em 1995 -, que o essencial, o necessário - e vou mostrar que também é suficiente, posso até elaborar o teorema -, a condição necessária e suficiente para que uma política pública de fomento à inovação tenha resultados positivos e promova um crescimento rápido da economia é se, e somente se, houver compartilhamento do risco tecnológico entre o Estado que representa a sociedade - que é a maior interessada no crescimento, é ela que quer crescer - e as empresas. Isso nós conseguimos introduzir, a Protec conseguiu introduzir na legislação. A Lei 10.973 tem no seu art. 19 a subvenção econômica, não o subsídio, porque o subsídio não faz parte da nomenclatura brasileira. Então, existe a subvenção, foi a subvenção. Por que não se aplica isso corretamente? Há verba para isso. Qual é a verba para isso? É o FNDCT, que retira esse recurso das empresas. Era um absurdo ele tirar das empresas e não devolver às empresas na forma de um compartilhamento de risco para o País crescer. Porque, vejam, se o País cresce, a arrecadação do FNDCT também cresce; se o País decresce, ela decresce. Então, não se está tirando dinheiro da universidade ao devolver à empresa isso na forma de um incentivo direto, de um compartilhamento do risco tecnológico, está-se fazendo uma transferência indireta. Quer dizer, cresce a economia, cresce a arrecadação, cresce a verba do Ministério da Ciência e Tecnologia, que não deveria ter tecnologia nem inovação. Deveria ser Ministério da Ciência e Educação, como é, aliás, na Alemanha, por exemplo: Bundesministerium für Bildung und Wissenschaft. Não há nada de tecnologia. A tecnologia está no Bundesministerium für Forschung und Technologie. O que é isso? Forschung é pesquisa no sentido não acadêmico, no sentido industrial, o P&I ou R&D. Ou seja, é a indústria para o seu crescimento. Ela tem que investir em pesquisa para crescer.
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Esse erro, diga-se de passagem, não é só brasileiro, é de todos os países que têm cultura latina. É da Argentina, é do México, é da Espanha, é de Portugal e é da Itália. Vocês têm dúvida?
A produção de patente francesa que tem a mesma população da Itália é de 6 mil por ano. Qual é a da Itália? Seria 5 mil, no mínimo, embora a população seja a mesma. Não, é de 2 mil. Por quê? Florença para baixo é o mezzogiorno, não tem nada a ver com o norte. Só o norte produz, só o norte patenteia. Então, o que ocorre é que ali há dois países. Um patenteia, aquela pequena população lá em cima, dois mil e pouco. O outro não patenteia nada, porque ele faz queijo e vinho - aliás muito bom, de boa qualidade - e azeite.
Na Espanha é a mesma coisa. Sabem quantas patentes tem a Espanha ali ao lado da França, no ano passado, em 2015, o último dado? Setecentas. Isso é nada, é zero. Porque é tudo da Catalunha, não tem mais nada de outro lugar, porque o resto planta laranja, melão, faz vinho, queijos, etc. Essa é uma coisa muito clara e objetiva, não sei por que não se entende.
O país cresce na proporção direta e cada uma das suas empresas compete no mercado mundial. E para competir ela tem que inovar, ela tem que estar continuamente inovando seus produtos. Mas não é a inovação que vai ser discutida em teses longas lá na universidade, não.
Eu trabalhei por 20 anos nessa área e não passei pela porta de nenhuma universidade. Na verdade, eu estou mentindo, eu passei pela USP para poder ir ao IPT, porque o IPT é dentro da USP. Mas nunca fui conversar com ninguém. O que eu fazia? Fazia o P&D de uma indústria de máquinas. Então, para mim, a opinião que interessava não era de um especialista em máquinas, mas era do usuário. Porque se ele não gostasse da minha máquina ele comprava a do concorrente. Então eu ia lá no usuário: comparem a minha máquina com a sua - aqueles que compravam a dos outros -, vamos ver se ela... E de fato muitas vezes eu encontrei situações em que a máquina concorrente, que era uma francesa, da Promeca, produzia mais, melhor e em menos tempo - cronometrava-se. Bom, então temos algum erro aqui, vamos ver o que é. O nosso castelo tem quatro ferramentas, o deles tem seis. Então só a troca de duas ferramentas já cobre a diferença. Vamos ter que trocar, porque se eu preciso de seis operações eu preciso de seis ferramentas. E eu só posso botar quatro na máquina, então me faltam condições de botar mais duas.
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Pois bem, assim nós fomos mudando, mudando, melhorando, melhorando, melhorando. A outra empresa fracassou, desistiu do mercado. E dali eu fui para uma indústria de ferramentas, em que eu fazia isso também. O que era a minha inovação? Lá eu fiz mais de 5 mil inovações, não porque eu seja um gênio, mas simplesmente porque eles tinham 5 mil produtos: ferramentas de aperto, chave de boca, chave estrela, chave Allen, todo tipo de chave, alicates, etc. O que acontecia? Fui auscultar o mercado. "A sua chave de boca não está cumprindo o mínimo de pressão que podemos exercer. Ela abre." Essa era a minha fonte de pesquisa. "Por que ela abre? Ela não está suficientemente resistente." Ela não machuca a boca, então, ela tem dureza suficiente. Ela foi devidamente tratada termicamente e está com dureza suficiente, mas, se ela abre, é porque internamente ela não está dúctil. Ela ficou toda dura, toda ela. Então, tem de reformular o processo de tratamento térmico. Ora, uma linha de chaves de boca tem dez chaves ou mais, desde a pequenininha até a de duas polegadas. Para cada uma delas, você tinha de fazer um tratamento térmico adequado. Tive de refazer todos os tratamentos térmicos e foi aí que o IPT me ajudou muito, porque ele tinha as bacias pequenas e dava para fazer algumas ferramentas, enquanto as nossas eram de produção. Ao se tentar fazer um teste numa bacia dessas, perdia-se uma quantidade imensa de óleo de energia. Então, graças à parceria com o IPT, durante os quatro anos que eu passei lá, nós fizemos mais de 5 mil mudanças de tratamento térmico. A empresa, que estava num buraco lá de Guarulhos e a ponto de fechar, mudou hoje para a Via Dutra. Se vocês passaram pela Via Dutra, está lá a Belzer, em grande estilo, porque isso a fez competir e a fez crescer. É disso que se precisa. Este é o problema: levar a empresa...
Na segunda-feira, eu almocei com um empresário em São Paulo da área farmacêutica, e ele me colocou: "Eu criei um laboratório de pesquisa no Canadá." Eu disse: "No Canadá?" "Sim, em Mississauga, porque eles me deram todas as condições..."
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Uma empresa brasileira?
O SR. ROBERTO NICOLSKY - Sim, uma empresa brasileira.
"Lá eu não tenho a complicação da Anvisa. Tudo lá é fácil para inovar." Então, eles abriram um novo laboratório. Ele tem cem pesquisadores.
Agora, quem são os pesquisadores? Esse é outro equívoco. Pesquisador de indústria não é doutor, não. Pesquisando numa indústria metalúrgica, eu era físico. Não fiz, por essa razão, nenhum doutorado, nem mestrado, nem coisa nenhuma. É uma questão de bom senso, de ter senso crítico e criatividade. Disso, sim, é que as nossas universidades precisavam.
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É nisso que a diáspora vai nos afetar porque, em princípio, o pesquisador de qualidade, o pesquisador com visão é aquele que é capaz de formar os profissionais com senso crítico e com criatividade para quando entrarem na indústria dizerem: "Não, esse processo aqui pode ser melhorado." Como melhorar? "Bem, vamos mudar aqui o layout, vamos pensar nisso, naquilo, facilitar o fluxo e assim..." Ou seja, aí está o grande segredo que o Brasil não sei por que razão ignora.
Eu poderia ir adiante. Aqui passei por todas elas. Eu voltei ao início, estranho.
Ah, sim, aqui está lei indiana, muito simples. Art. 6º, único artigo que trata da lei e o preâmbulo, que repete, aliás, esse artigo: "provide equity capital". Tão simples assim. E observem, não se interessa por processos de auxílio: "any other financial assistance" e acabou. E, outra coisa, olha lá o último parágrafo: "commercial application of indigenous technology or, adapting imported technology". O que quer dizer isso? O que é adapting imported technology? É um eufemismo para cópia. Ou seja, copiar aquela inovação que o concorrente tem.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Que o Japão fez.
O SR. ROBERTO NICOLSKY - Que o Japão fez, a Coreia fez, a China fez. Todos fizeram, mas nós temos essa dignidade, nós não fazemos. Já houve até um ministro que disse: cópia é coisa do passado.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Nós compramos para não copiar.
O SR. ROBERTO NICOLSKY - É. Está aí. Acho que acabou. Talvez haja mais alguma coisa. Isso aqui é uma comparação. Eu estou voltando, desculpem-me.
Ah, sim. Então, eu poderia elaborar um teorema: Teorema fundamental da Política Pública bem-sucedida de Desenvolvimento Tecnológico. A condição necessária e suficiente... Necessária porque todos os países utilizaram o compartilhamento do risco. Mas por que suficiente? Porque a lei indiana mostra que basta falar do capital de risco, não precisa se preocupar com o resto. Até empresa com recurso compra se precisar. Vai lá na Embrapii e contrata.
E nós temos uma experiência brasileira de sucesso com o compartilhamento de risco. Qual é ela? Em 40 anos, ela transformou esse setor do Brasil - hoje, o Brasil é até um grande exportador, graças a isso -, chama-se Embrapa. Por que o Brasil lidera a área agropecuária no mundo hoje? Porque ele é competitivo. E por que ele é competitivo? Porque a Embrapa, durante 40 anos, faz mudanças, melhorias e aperfeiçoamentos na indústria agrícola e pecuária - se é que se pode chamar de indústria -, na agropecuária.
Então, se temos um exemplo bem-sucedido, por que não aplicá-lo na indústria? A lei existe, é a lei da inovação. Está lá, art. 19; a fonte existe, é o FNDCT, não se aplica. Aplicou-se durante seis, sete, oito, nove, quatro anos de uma maneira equivocada, completamente errada, distorcida, acadêmica, e não se aplicou mais, porque o edital de 2010 foi pago aos trancos e barrancos, porque o Ministro que o sucedeu trancou o edital. Até 2013 ou 2014, ainda havia restos a pagar. Pois bem, e acabou. Não se faz mais subvenção. A subvenção é usada, equivocadamente, para reduzir a taxa de juros dos empréstimos, mas o empréstimo deixa o risco na mão do tomador exclusivamente; se ele é bem-sucedido, ótimo; se não é, quebra, mas tem de pagar o imposto de renda.
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E por que esse recurso público é necessário? Acho que eu tenho até aqui essa indagação. Está aí. Por uma razão muito simples: quando a empresa aumenta o seu faturamento, ela tem de remunerar os ativos; tem de pagar os fornecedores; pagar os salários; a previdência social; as tributações estadual e federal. E quanto sobra para o lucro presumido? Oito por cento? Mas quanto é a parcela dos tributos? A média da carga fiscal do Brasil é de 38%. Qual é o empresário de bom senso que vai apostar todo o seu capital de giro para desenvolver uma inovação em que ele não é o maior beneficiário, em que o maior beneficiário é o Estado? Não existe isso na empresa pequena e média. Só a grande é que tem recurso para isso. Por isso, só mil empresas participam...
(Soa a campainha.)
O SR. ROBERTO NICOLSKY - ... da Lei do Bem, só mil empresas. É ridículo.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Senador Jorge Viana.
O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - É que eu tenho muito interesse em pelo menos fazer um comentário, mas estou com um problema prático, como nós temos aqui. Não é falta de educação. Eu estou em duas comissões e vou entrar na terceira. Uma delas é a Comissão de Constituição e Justiça, com sabatina, em que eu tenho também responsabilidade.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - E, para nós aqui, Senador...
O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Só que eu não consigo sair daqui por causa desse tema, que é fundamental para o futuro do País.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - E é fundamental a sua presença.
Eu quero dizer a todos da Mesa que, pela sua fala, aliás, excelente, chego à conclusão de que o maior problema do desenvolvimento tecnológico não é a ignorância, mas a burocracia. E dentre os que aqui lutam para quebrar a burocracia está o Senador Jorge Viana, com o projeto de lei que ele coordenou, que ele relatou. Por isso, para mim, é muito importante a sua fala, Senador Jorge Viana. Eu peço que V. Exª deixe lá atrasar por cinco ou dez minutos, ou pelo tempo que o senhor quiser. Eu gostaria de incluir nessa audiência a sua posição antes de passar a palavra para os membros da Mesa, que o farei depois, quando o senhor estiver...
Por favor, com a palavra.
O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Eu peço, mais uma vez, desculpas, mas assinei embaixo desse requerimento do Senador Cristovam. Ele fez aqui uma fala, durante uma audiência de cujo requerimento para que ela acontecesse eu fui proponente, para discutirmos o corte de 44% no orçamento da ciência, tecnologia e inovação no Brasil.
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Veio aqui o Presidente da Academia Brasileira de Ciência, nós tivemos a Presidente da SBPC e cientistas que vieram aqui fazer um apelo final, mostrando, com dados, que tirar dinheiro da tecnologia e inovação neste momento não é parar o País, não é atrasar o País; é fazer o País ir para trás, andar para trás. E esta audiência acho que ela é complementar; ela trata das causas, mas trata também das consequências.
O Senador Cristovam identificou o problema gravíssimo de cérebros saindo do Brasil. Pessoas que acumularam conhecimento, voltaram a ter fé e confiança no País estão falando: "Bem, como as condições agora que o Brasil reúne já não permitem que eu possa dar minha contribuição..." Somos finitos, nós temos um tempo de passagem por esta vida. Ou colaboramos quando temos condição ou, depois, não vamos ter tempo para colaborar. Muita gente está indo embora do Brasil, está saindo. E são pessoas que fazem falta.
Então, estamos aqui na Comissão de Ciência, Tecnologia e Inovação do Senado Federal fazendo uma discussão na hora em que também estamos discutindo o Orçamento. Não há a menor hipótese de nós passarmos para os nossos convidados, para quem nos assiste e para aqueles que vão ler o relatório o mínimo de esperança sem que haja uma presença orçamentária do Estado no estágio em que o Brasil está. É evidente pelas falas que ouvimos.
Senador Cristovam, eu fiz debates esses dias no Acre, participei e fico pensando nos países que V. Sªs usam como referência quando falamos de inovação, de tecnologia, de inteligência. Vejam os convidados que nós temos. Estava aqui falando um convidado que tem uma vivência sobre pesquisa e desenvolvimento e a aplicação disso. Está aqui dando uma aula para todos nós, mas temos uma especialista em programa de cooperação que trabalhou no Ciência sem Fronteiras, uma especialista na área de como a gente faz para encurtar caminho no sentido de buscar conhecimento. O trabalho que a senhora fez foi nesse sentido. O Brasil tinha isso e, ao invés de corrigir as coisas, nós as destruímos, desmontamos. Eu acho isso terrível.
Temos aqui um especialista em inteligência artificial. Há algo mais necessário para discutirmos na hora em que o mundo está vivendo essa revolução, que não é mais tecnológica? Estamos vivendo a era dos dados; não é mais nem da internet, área em que temos aqui um dos maiores especialistas também. Já estamos saindo da internet e indo para dados. É o novo. Eu só sei que mais da metade das crianças que estão estudando hoje vai trabalhar em algo que nós não conhecemos, não sabemos o que será, em atividades que não existem hoje, profissões que não sabemos, e nós vamos discutir isso.
O Senador Cristovam está fazendo esta discussão aqui; como reitor, como professor, o senhor está fazendo esta discussão. Lamentavelmente a audiência não é muito grande, mas isso aqui é reproduzido pela Rádio Senado, pela TV Senado, fica nos Anais, serve de referência para pesquisa, para estudo quando a gente vai fazer um trabalho. O que os senhores estão falando vai fazer parte dos Anais do Senado agora e, certamente, será útil, porque esse é um tema que não vai diminuir de importância; vai aumentar.
Eu estava pegando outro aspecto, fazendo conexão com o Orçamento. Qual é o país que é referência para nós, hoje, do ponto de vista de crescimento econômico? São os Estados Unidos ou é a China? Que eu saiba é a China. E não estou menosprezando a potência que é e o que ainda serão os Estados Unidos, que é um país também muito importante, mas o que estou dizendo é que, quando se fala em crescimento da China em 6,5%, é em cima de que PIB? É maior do que 11% que crescia sobre um PIB pequeno, muito maior. E a tendência... Acabou de ser reeleito o Xi Jinping para mais cinco anos.
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Senador Cristovam, esse país chamado Taiwan, que eu fui visitar, a China, o próprio Japão, a Índia... É muito complexa a Índia, é até parecida conosco. Mas é um país que, mesmo na sua complexidade, na sua desigualdade, nos seus problemas... Tem mais problemas do que o Brasil, se bem que nós estamos trabalhando para aumentar os nossos, para agravar os nossos. Até o que nós não tínhamos, estamos agora construindo, trabalhando para ter. Parece um momento de todos contra todos. Estamos vivendo...
O SR. ROBERTO NICOLSKY (Fora do microfone.) - V. Exª me permite um pequeno aparte?
O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Por favor.
O SR. ROBERTO NICOLSKY - Nós não temos condições de reproduzir no Brasil as condições da economia chinesa, que é semiestatal. Mas nós temos condições perfeitas de reproduzir as da Índia, e a Índia hoje cresce mais do que a China.
O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Pois é. Mas o que eu estava querendo dizer é que nós nos espelhamos, e parece que pegamos um discurso de dizer o seguinte: aqui o que vale, e olha que o Senador Cristovam sabe, falou até, fez referência à burocracia... Eu fui governador oito anos, fui prefeito, nunca fui defensor de estatizar tudo, de botar o Estado para fazer tudo. Aquilo que alguém pode fazer melhor que o Estado que faça! Mas do ponto de vista de ação estratégica, vivo na Amazônia, o nosso País tem um potencial. Se não tiver uma presença do Estado, estratégica, em determinados setores, esqueçam, não vamos para lugar nenhum.
Nós estamos vivendo o momento do desmonte do Estado brasileiro, total, e dizendo que isso aí é que vai fazer com que o Brasil vá para a frente. Isso aí vai levar o Brasil para o buraco, sem solução. Sabem de quanto era o PIB brasileiro? Já que estamos falando de outros países, quero botar os números do nosso. O PIB brasileiro, quando o Presidente Fernando Henrique saiu, era de 1 trilhão. E ele consolidou. Eu sou do PT e estou falando do governo do PSDB, nunca deixo de pôr a verdade, os fatos. Ele deu uma estabilidade econômica para o País, criou condições. Então, o PIB, durante o governo dele, foi de 1 trilhão durante três anos, estável, mais ou menos, sem crescimento, mas estabilizou e criou. O governo do Presidente Lula pegou o PIB de 1,2 trilhão e passou para 6 trilhões. E nós ficamos com a imprensa, com a oposição esculhambando com o Pais, dizendo que o País estava fazendo tudo errado, o que não existe.
Sabem de quanto era a produção da ciência e tecnologia no Brasil antes de termos esse crescimento, ainda no governo do Presidente Lula? Era 1% do mundo, saía do Brasil. Passou a 2,5%. Isso é pouco? Sabem por quê? Porque nós tivemos um investimento na formação de mestrado, de doutores, de pós-doutores, de criação de universidade. Começamos a ter orçamento para trabalhar com ciência, tecnologia e inovação. E a economia cresceu também.
Aí, nós chegamos e, em vez de consertar o que estava errado, combater a gatunagem, combater os que tentaram se apropriar e se aproveitar desse crescimento que o Brasil teve... Petrobras valia US$15 bilhões quando o Lula assumiu. Passou a US$300. Não vai aparecer ladrão, não, para roubar e para tomar conta disso? Aí falaram: "Não, mas foi o Lula que destruiu a Petrobras." Como destruiu se ela valia US$15 bilhões, tinha zero de produção de pré-sal e produz agora 1,2 milhão de barris diários de pré-sal que não existiam, isso só com investimento, com ciência, tecnologia, inovação e política?
Agora, vão vender a Petrobras, porque dizem que o Brasil é muito ruim para ser patrão na Petrobras. E vão anunciar esta semana a venda da Eletrobras, sabem para quem? Para o Estado chinês vir comprar.
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Os indianos estão comprando... Compraram até a Land Rover as empresas indianas. Comparam a Land Rover. Compraram empresas dos ingleses, veja, Senador Cristovam. Os colonizados comprando as empresas criadas pelos colonizadores. Não é bonito isso? De alguma maneira, gente, é assim que íamos...
Então, acho gravíssimo porque, se nós vivemos a era rural, agrícola, depois entramos na era industrial, depois entramos na era da internet e agora estamos entrando na era de dados, onde vamos ficar nisso?
Sabe o que vai acontecer nos próximos anos? Desemprego em massa no mundo. Esse problema de migração vai aumentar muito. Por quê? Por causa de inovação e tecnologia. Sinto muito, eu penso assim, posso estar equivocado.
Outro dia fui conversar com o Nelson Piquet - qualquer dia quero ter uma reunião com o senhor e com ele -, tricampeão mundial, com três carros diferentes, com três motores diferentes, e ele falou: "Jorge, você já viu o carro da Tesla?" Eu falei: "Não, não vi." Ele disse: "Comprei um lá em casa." No dia do lançamento da Tesla, do carro elétrico, foram pedidos 400 mil carros, num dia, pela internet, sem nenhuma concessionária. Sabe o que significa não ter concessionária? Não ter gerado emprego.
Agora, o mais grave vou terminar de contar. Eu falei: "Não vi, queria ver." Ele me levou para ver o carro. É um sedã, grande, coisa de americano. Essa empresa Tesla, que não existia há dez anos, vale mais que a Ford e vai passar a GM agora.
Agora, ela não tem concessionária. Então, não tem um monte de gente que trabalha na venda e na manutenção do carro. Aí fui ver o carro. Vi o posto de gasolina, um fio, uma tomada para abastecer o carro, na casa, sem licença, sem nada. E sou relator de um projeto que trabalha essa questão de carro elétrico aqui. Aí pedi para abrir o capô do carro, Senador Cristovam, fui ver a inovação, a tecnologia. Zero de peça no capô, só espaço vazio. Abri, tinha uns tapetes, levantei, mexi, não achei um fio, nada, zero. Aí abri a traseira, pensei "deve ser motor de traseira, vou ver a inovação no motor elétrico". Não achei nada, só tinha um espaço e um porão mais embaixo. Eu perguntei: "O que tem aí?" Ele disse: "Tem mais um espaço aqui." A bateria está no solo do carro. Eu falei: "Nelson, cadê o motor? Cadê as peças?" Ele falou: "Não tem. Isso aqui é inovação. Mas se você quiser achar o motor está nas rodas." Aí fotografei as rodas do carro. "Quatro motores nas rodas. Motor elétrico, Senador." Tem 400km de autonomia, faz 100km em segundos, o que nenhum carro convencional faz. Agora, sabe qual é o agravante? Por isso estou falando que vai haver desemprego e se nós não nos atentarmos... Não é desemprego, vai haver mudanças, vamos usar esse termo. Mudança de tudo, de mente, de comportamento.
Ele perguntou: "Você tem noção de quantas peças há num carro convencional?" Eu disse: "Claro que não, não sou mecânico." O cara é bom de mecânica. Ele falou: "Perto de 6 mil, entre pequenos e médios componentes." Para 6 mil deve haver uma cadeia produtiva danada. O senhor trabalhou no ABC muito tempo. Aí eu começo a entender porque Detroit está às moscas. O centro da era industrial está às moscas, faliu, na principal economia do mundo.
Ele falou: "Jorge, tem mais de 6 mil peças. E sabe quantas nesse?" Eu falei: "Não tenho ideia." Porque tem um painel, tem software - certamente os indianos estão ganhando dinheiro -, um painel bem grande, maior que esse computador aqui, em que se resolve tudo, mexe-se em suspensão, conserta-se o carro, faz tudo ali. Ele falou: "Esse carro tem trezentas e poucas peças." Sabe o que significa sair de 6 mil para trezentas e poucas peças? Quem é que vai... Vai se desmontar um conjunto de cadeias produtivas vinculadas a esse negócio, e não estamos preparados para isso, não estamos discutindo estrategicamente isso.
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E, Senador, daqui a pouco o Estado vai ter que ser forte, e não fraco, para fazer a mediação, porque talvez nós teremos que discutir renda mínima mesmo. E aí nós estamos desmontando orçamento social, nós estamos na contramão, desmontando tudo e dizendo que o Dr. Meirelles ou um outro banqueiro que esteja lá no Banco Central vai resolver a vida nossa. Só quem está lucrando com esse negócio são os bancos, e nós deixamos de discutir a estratégia de país. Então eu queria discutir isso.
Agora, acho que começa com ciência, tecnologia e inovação. Não tem jeito, porque no mundo é isso. Todo ano estou indo ao Mobile Congress, em Barcelona. Eu estou impressionado com a chegada da Internet das Coisas. E graças a Deus eu estou indo, porque já estou ficando velho, tenho 58 anos, eu ia envelhecer mais. Mas sabe o que é que eu vejo crescer mais lá? Quando eu cheguei ao primeiro que eu fui, a Huawei chinesa tinha um stand lá. Huawei, uma empresa de telefonia, de telecomunicação, de equipamentos da China. Agora, a última vez que nós fomos visitar, é um mundo, por conta de Internet das Coisas, por conta de pôr tudo nas nuvens. E aí algumas profissões vão ter que desaparecer porque vão ficar meio sem sentido com o avanço que nós temos.
Então, acho que é muito oportuno V. Exª ter trazido, Senador Cristovam, o debate sobre a saída de cérebros. Para mim, o Brasil tem que ser o endereço dos cérebros. Sobre o tema que o senhor colocou, Dr. Roberto, da Índia abrir-se para isso, eu fui a Taiwan duas vezes, Taiwan tem um saldo de balança comercial com a China de 50 bilhões, e são inimigos mortais. Quem conhece a história sabe: Chiang Kai-shek foi para lá porque foi deposto e dizendo: "Olha, eu vou voltar e eu que sou o governo" e tal. Então, são inimigos. Os inimigos trabalham...
Mas, Senador Cristovam, o senhor, que tem um compromisso de vida com a educação, eu queria falar isto: eu visitei o Ministro da Educação de Taiwan também. "Como vocês fizeram tudo isso?" Claro que foi com essa determinação para o trabalho, com conhecimento, com educação, mas com determinação para o trabalho. Os componentes que a gente compra feitos na China... Os Estados Unidos fabricam na China e vendem, mas quem põe as coisinhas aqui dentro também são os taiwaneses, o pessoal de Taiwan, que trabalha e ganha, é assim que eles têm o saldo. São inimigos, mas negócios à parte. Taiwan tem 800 voos, avançou muito. Eu fui lá ao Ministério da Educação, o Senador Aloysio estava junto, Ferraço também estava junto. Nós estivemos com ele, e ele estava com um sério problema: estava sobrando dinheiro no orçamento dele. Estou falando sério. Por quê? Redução do número de crianças, redução do número de alunos. Taiwan é uma sociedade de 25 milhões de habitantes. São 25 milhões. Olhe onde está: no topo de produção de patentes. Oito mil, o número ali, é o terceiro... Doze mil, oito mil é a China, acho. Doze mil patentes. Nós temos 370, e boa parte vinculada à Petrobras e a Campinas, à Unicamp, eu acho.
Mas ele falou: "Estou com um problema, está havendo uma sobra orçamentária para o Ministério da Educação." Eu perguntei: "E agora, o que o senhor vai fazer?" Ele disse: "Aqui é escola integral, todo mundo estuda até... Reclamam que até demais." Pá, pá, pá, tudo está feito. Aí ele falou: "Mas não vou devolver o dinheiro do orçamento." Nós indagamos: "Mas por quê?" Estavam três Senadores lá, Aloysio Nunes, que é Chanceler, nosso colega, eu e Ferraço. "Mas como é que o senhor não vai devolver?" Ele disse: "Nós somos muito ruins em comunicação, nosso povo. Somos difíceis de nos comunicarmos com o outro. Orientais. Vamos pegar todo o dinheiro que está sobrando agora e trabalhar com as crianças, desde pequenos, para termos um melhor jeito de convivência com os outros, com os diferentes."
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Eu achei aquilo a evolução da evolução. Primeiro, ter um ministério com dinheiro suficiente e, em certas circunstâncias, sobrando e, depois, pegar e investir para melhorar a relação, para conviver melhor com o diferente. Eles falaram: "Nós, orientais, por timidez, por um motivo ou outro... Então vamos ver se a gente trabalha isso, porque o mundo está globalizado."
Eu, sinceramente, espero que essa fase que a gente está vivendo, Senador Cristovam - eu não quero ser pessimista -, seja uma fase de mal começo de século, mal começo de milênio. Se não fosse, não teríamos Trump como presidente dos Estados Unidos. Nós temos o nosso Temer, e os Estados Unidos têm o seu Trump, é tudo no 't", está tudo ruim. Mas na Europa também: a Alemanha acabou de dar quase 15% de seu Parlamento a um partido com fundamentação nazista.
Então, o mundo parece que teima em não começar o século XXI, o novo milênio. E, pior: caminha para... Porque essas brigas aí de gênero, de intolerância, para mim, são coisa do século VII. Daqui a pouco vamos chamar o Genghis Khan para resolver esse problema de tudo contra todos, porque Genghis Khan tem conexão com essa coisa do Estado Islâmico: pega os mortos, pessoas contaminadas com praga, e joga dentro da cidade para não ter que matar ninguém, já mata todo mundo de vez.
Eu não queria ficar num mundo assim, eu não quero conviver com um mundo desse jeito, eu não quero isso para a minha neta. Ninguém quer, mas nós estamos vivendo essa fase. Acho que a maneira de mudar é sermos mais tolerantes, ouvirmos uns aos outros, fazermos uma boa leitura do que está acontecendo, não só no Brasil, mas no mundo, nos Estados Unidos, na Ásia, na China.
Eu vou à China agora. O Brasil vai entrar no bambu, pela primeira vez vai ser parte do Inba, e eu ajudei bastante. Vou lá. Temos 18 milhões de hectares de floresta de bambu, mas zero de mercado, e é um mercado de US$60 bilhões. O Acre tem 4 milhões de hectares de bambu, e nós temos zero desse mercado. A China movimenta um mercado de 30 bilhões na China e de 60 bilhões no mundo. É bambu para a produção de roupas, de celulose, tudo. O que é isso? Tecnologia, inovação, conhecimento, ciência.
Zero! Aquele centro nosso de biotecnologia, que nós implantamos em Manaus, tentamos implantar: faz 25 anos que está lá, no meio de 20% da biodiversidade do planeta. Nenhum governo, e não importa se foi o Governo Lula, o Governo Dilma, Fernando Henrique, se é o atual ou outro: nada! A gente não quer estudar nossa biodiversidade, que é fundamental para a indústria de fármacos e de cosméticos. Se a Índia está desse jeito... Se estudarmos a nossa biodiversidade, podemos simplesmente ser as pecinhas, as engrenagens que os taiwaneses e os indianos são nessa máquina, mas na área de remédios e cosméticos, que são as indústrias que mais crescem no mundo. Nós temos biodiversidade, mas teimamos em não estudá-la, em não fazer isso. Mas, na hora em que houver uma virada, em que houver de novo um governo pensando estrategicamente e com lucidez, o País vai acontecer.
Concluo pedindo desculpas por ter me alongado.
Eu queria agradecer ao Senador Cristovam por ter promovido esta audiência e agradecer aos senhores por terem vindo. Os senhores não perderam tempo vindo aqui. Somos 81, mas basta que um ou dois comecem a pegar um termo e a repeti-lo para irmos adiante.
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Essa questão do corte, que vai se refletir nas bolsas que nós não vamos ter... Na Comissão Mista Permanente sobre Mudanças Climáticas, da qual sou Presidente, estamos botando dinheiro para os índios isolados, nós estamos tirando as doze frentes de índios isolados. Sabe o que eu vou fazer com o seu amigo e meu amigo Sebastião Salgado, Senador Cristovam, segunda-feira? Nós vamos lá no BNDES, na direção do Fundo Amazônia, fazer sabe o quê? Tentar garantir dinheiro para o Brasil cuidar melhor dos índios isolados.
Dá para ter uma noção do que é ter população originária não contactada que a gente nem conhece quantos são ao todo? A gente tem só ideia. Não sabemos nem que tipo de povos são, mas compõem umas 200 etnias brasileiras que nunca fizeram contato, não sabem dessas brigas que nós estamos fazendo aqui fora. Boa parte deles mora no Acre. Eu procurei cuidar deles quando era governador. Moram no Vale do Javari e em tantos outros lugares.
Nós vamos lá atrás porque estão desmontando o orçamento da Funai e queremos pelo menos que o de proteção dos índios isolados e o de fiscalização sejam mantidos. Nós estamos indo lá. O Sebastião Salgado é um dos maiores fotógrafos do mundo, amicíssimo do Senador Cristovam, amigo meu também. E vou com o Beto Marubo, com quem estarei reunido hoje. E nós vamos lá pedir por aqueles que não têm voz, que não têm nem representação, que não chegaram nem na cidade.
Fazendo uma contradição maluca, há um ano e meio atrás um grupo de 29 índios desses isolados fizeram contato no Acre. Eu fiquei apavorado, porque 70% morrem nos primeiros três anos depois do contato, porque eles não têm as imunidades que nós adquirimos. E isso é um patrimônio. Aí nós fomos cuidar. Um médico da USP que é especialista no assunto salvou das primeiras gripes os quatro rapazes que fizeram contato. Levamos o Governador Tião Viana lá, de helicóptero. Ele conseguiu salvar... Em uma semana estavam morrendo de gripe, uma primeira gripe.
Eu não gostei muito dessa coisa. Até um amigo meu, indigenista, filmou e mostrou para mim, no escritório. Eu queria ter ido lá porque quero me encontrar com eles, ainda. A gente os protegeu de longe. Esses rapazes e uma moça foram pela primeira vez numa cidade, depois de um ano desde que foram contactados - temos intérprete. Eles nunca tinham visto um mercado, nunca tinham visto banana daquele jeito e gente indo e vindo. E começaram a querer pegar as coisas. E pela primeira vez foram apresentados a uma coisa chamada dinheiro. Disseram a eles: "Não, para pegar esse negócio aí tem que ter este negócio aqui para pagar ali."
Então, nós estamos vivendo, lá no Acre, situações como essa, de apresentar dinheiro para algumas pessoas, alguns seres humanos como nós, que viveram até recentemente sem nada disso pelo que a gente briga e disputa, e, ao mesmo tempo, têm um conhecimento acumulado que é extraordinário e virou uma questão exponencial.
Para mim, é muito honroso termos aqui o Presidente do CNPq, termos pesquisadores. Eu fiz questão de ressaltar um pouquinho do que cada um está trazendo de colaboração. Fico honrado. Sabem por quê? Porque eu tenho mais um ano e dois meses de mandato. Ninguém sabe o que acontece depois de reeleição - provavelmente eu vou disputar a minha reeleição. Mas vou ficar melhor depois de ouvi-los, depois de os senhores terem vindo aqui, para defender esse um ano e dois meses de mandato, com essa audiência que estamos tendo.
Então, do fundo do coração, agradeço o privilégio, as palavras e a oportunidade que eu tive de também passar meu sentimento para cientistas e pesquisadores que estão sofrendo pela fase que o Brasil está vivendo, mas que sabem certamente que o Brasil não vai a lugar nenhum, ou irá para trás, sem a colaboração dos senhores.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Um pequeno detalhe, antes de passar a palavra. Quero dizer...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Eu quero agradecer muito, Senador. O senhor deu uma espécie de fecho aqui, um fecho muito positivo para o texto que vamos publicar com as falas de todos.
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Só quero provocar um debate para o futuro, não vai ser agora.
É que sobra dinheiro na educação até por três razões.
Uma é que eles se anteciparam, fizeram o dever de casa, aí a coisa vai e, depois, faz assim.
Dois: por causa da eficiência que eles construíram na economia. Nós não fizemos isso ao longo de décadas, e não foi um governo nem outro não. Nós fizemos uma economia do "jeitinho" aqui e ali. Se uma indústria não vai bem, a gente a protege para que ela não quebre. Não estou nem dizendo que não se deve fazer isso, mas nós não temos a palavra "eficiência" como propósito da economia, e muitos continuamos com a visão do século XIX, corretíssima, de fazer justiça por dentro da economia, e não fazer justiça com o que a eficiência permite, o que o Deng Xiaoping percebeu na China. A economia era subordinada ao social. Ele disse: "a economia vai ser eficiente, e com eficiência a gente faz o social". Duas coisas.
E a terceira é também a diminuição da população que necessita de educação, o que está permitindo que sobre dinheiro per capita, porque... Aliás, per capita continua, mas diminuiu o número de pessoas. A gente tem que fazer uma reflexão sobre o papel da economia eficiente na construção da justiça, e não a subordinação da busca da justiça, mesmo com uma economia ineficiente, o que prevaleceu na visão de nós - incluo-me -, socialistas, ao longo de muitas décadas. A justiça por dentro da economia, e não a justiça graças à eficiência da economia.
A sua fala trouxe um grande enriquecimento. Agradeço muito.
Passo a palavra ao Prof. Borges, já na conclusão de suas falas, respondendo às suas perguntas. Só que, para não dizerem que não levamos a sério a participação da cidadania, eu vou ler as cinco únicas perguntas que chegaram aqui bem rapidamente.
De Eric Bressan: "Basicamente, o Brasil tem de ser um país bom e rico, e não é o Estado [...] que cria riqueza, riqueza são bens e serviços [...]".
Dois, do Lucas Bressan - também Bressan, não sei o parentesco -: "Poucas oportunidades devido ao baixo empreendedorismo, consequência de uma alta burocracia e regularização do mercado [...]".
Lara Morais: "Com poucos investimentos para a área de desenvolvimento científico e tecnológico, não existe sentido em um profissional bom e interessado em avançar em seu ramo querer ficar no Brasil".
Murilo Gomes Teixeira: "Principalmente nas áreas de tecnologia e ciência da computação, muitos jovens ganham oportunidades profissionais valiosas no exterior, e infelizmente não [há] aqui em [...] [nosso] país [condições para que possam exercer seu talento]".
E Willy Cabral: "O País pode criar suas próprias políticas de atração de cérebros. Uma forma é através da imigração [receber cientistas]. Outra são programas de atração de pesquisadores e é claro gerar oportunidades (não apenas emprego) dentro do País".
Passo a palavra para o senhor comentar a fala do Senador Jorge e...
O SR. MARIO NETO BORGES - Já fazer o encerramento.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - ... fazer o encerramento e responder a pergunta do Isaac Roitman.
O SR. MARIO NETO BORGES - Responder a pergunta do Isaac Roitman vai ser um prazer, porque ele foi também diretor do CNPq e é um cientista realmente importante.
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Mas eu queria aproveitar a presença do Senador Jorge Viana e deixar um pedido aqui importante aos dois Senadores, porque tão importante quanto o investimento em ciência, tecnologia e inovação, que precisa crescer, é a burocracia dessa área, que precisa ser reduzida. Nós fizemos um bom trabalho, ao longo de muitos anos, com o novo marco legal que chegou: a Emenda Constitucional 85, de 2015, e a Lei 13.243, de 2016.
A lei, por um descuido ou uma inadvertência, veio com oito vetos, que tentaram derrubar aqui no Congresso. Foi derrubado na Câmara; não foi derrubado aqui no Senado.
Eu sei que os senhores estão trabalhando no sentido de derrubar esses vetos. Isso é fundamental, porque, se aqueles vetos não forem derrubados, a parceria e a interação entre a universidade, as empresas e o trabalho de inovação ficam altamente prejudicadas. Portanto, aumentar os recursos e diminuir a burocracia é essencial para salvarmos o Brasil em termos do seu futuro com base em ciência, tecnologia e inovação.
Eu queria, respondendo à pergunta do caríssimo Prof. Isaac Roitman, dizer que, na verdade, não foi o CNPq que suspendeu o Ciência sem Fronteiras. O Ciência sem Fronteiras merece um rápido comentário aqui: ele foi um programa - como disse a Profª Denise, que nele trabalhou com muita competência e dedicação - com um tempo marcado. Ele teve méritos, mas teve realmente alguns equívocos fundamentais que precisam ser corrigidos - e dentro daquela visão do Senador Omar Aziz de que as políticas não devem mudar a cada governo. É preciso fazer política de longo prazo para o Brasil. Política para educação, para ciência, tecnologia e inovação são políticas de longo prazo. Os países citados aqui - Coreia, Japão, China - fizeram programas de 20 anos, 30 anos, e isso é que vai trazer resultado.
Então, no caso do Ciência sem Fronteiras, um dos equívocos foi o fato de estabelecer uma meta numérica de cem mil alunos. Ciência e tecnologia vai pelo mérito, não pelo número. Então, deveríamos ter mandado aqueles que tivessem condições de usufruir adequadamente desse investimento.
Mas o Ciência sem Fronteiras teve qualidades também, assim como dois programas que nós estamos restabelecendo no CNPq, que é a Bolsa Jovens Talentos, para a atração de talentos de volta, repatriação e atração de outros países. O BJT agora está nesse programa que a Profª Denise citou, junto com a Embrapii. É para que os meninos que foram para os países altamente tecnológicos, como Alemanha, Japão, Estados Unidos, Coreia, tenham algum lugar para aplicar esses conhecimentos e dedicar o seu aprendizado em benefício do País e de geração de riquezas. E há também o Programa Pesquisador Visitante Especial, que era um programa que trazia grandes nomes da ciência mundial, padrão Prêmio Nobel, para passar três anos no Brasil, orientar doutores aqui no Brasil, orientar doutores no exterior e criar redes de pesquisa nessas áreas do conhecimento. Esse programa foi restabelecido agora nessa gestão do CNPq, em 2017, graças aos recursos que o Ministro Gilberto Kassab conseguiu dentro do descontingenciamento daquilo que foi contingenciado.
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Então, o Pesquisador Visitante Especial e o BJT são duas atividades que condizem com a finalidade do CNPq, com a missão do CNPq, porque não é missão nem da Capes nem do CNPq trabalhar com alunos de graduação sanduíche. Isso foge da nossa missão. A missão da Capes é a pós-graduação, a missão do CNPq é o pesquisador e a pesquisa, e a missão da Finep é a inovação. Como disse o Dr. Roberto, é cada macaco no seu galho, fazendo sua função, mas isso tem uma articulação entre si que é necessária ser construída.
Portanto, não foi o CNPq que suspendeu o Ciência sem Fronteiras. Ele já tinha tempo para acabar, mas o que havia de bom nele nós estamos restabelecendo.
Eu queria apenas, para concluir finalmente, Senador, perguntar o seguinte. Por que nós somos bons de futebol e não somos tão bons na ciência? Essa pergunta também mexeu muito comigo. Nós somos bons de futebol porque, como o senhor disse, a bola é redonda para todos e há um campinho de futebol em qualquer lugar que nós vamos no Brasil, mas não há um laboratório de ciência nem professor de qualidade no ensino fundamental para despertar os nossos jovens para a importância da ciência, da matemática.
Nós estamos, nesta semana, na Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, que tem 14 edições consecutivas. Esta semana tem como slogan "A Matemática está em tudo". E quem foi o homenageado? Foi o Prof. Jacob Palis Jr., que é um dos maiores cientistas que o Brasil tem, é um dos maiores matemáticos do planeta. Ele foi contemplado com os maiores prêmios internacionais da matemática, que não tem Prêmio Nobel, mas nós já temos a Medalha Fields com o Prof. Jacob Palis e com Artur Ávila, que a recebeu recentemente. Ou seja, mais uma vez, é a questão da oportunidade. E o senhor bate bem quando diz que nós temos que melhorar a educação básica e o ensino médio.
Nesse sentido, fica aqui a nossa articulação com o MEC no sentido de fazermos um projeto de pesquisa, um edital, uma chamada pelo CNPq, em parceria com o MEC, para que os nossos pesquisadores da área de educação possam fazer projetos de educação para intervenção na qualidade do ensino fundamental e do ensino médio, porque há muito bons pesquisadores.
A maior quantidade de bolsas de produtividade que o CNPq tem é na área de educação. No entanto, se eles são tão bons, por que a nossa educação básica vai tão mal? Nós somos bons engenheiros, temos bons pesquisadores na área de engenharia, e eles resolveram o problema de pesquisa de petróleo em água profunda, os aviões da Embraer... Nós somos muito bons pesquisadores nas áreas agrárias, e a Embrapa, a Universidade Federal de Viçosa, a ESALQ e a Federal de Lavras fizeram desenvolvimentos que hoje tornaram o Brasil a maior referência e o maior celeiro de produção de alimentos do mundo.
Se nós somos tão bons pesquisadores em educação, vamos, então, fazer um programa de projetos de pesquisa em educação, mas para intervenção na qualidade da educação básica. Isso está para sair.
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Eu queria deixar esta resposta: para que sejamos tão bons na ciência, é preciso haver oportunidade para os meninos desde a educação básica; como eles têm a bola e o campinho, que eles tenham o laboratório de ciência e bons professores na área de educação para que eles possam avançar.
Agradeço a oportunidade...
(Interrupção do som.)
O SR. MARIO NETO BORGES - Senador Jorge Viana, fica aí também o nosso pleito: vamos resolver a questão dos vetos do marco legal, por favor, porque isso é fundamental para avançarmos nessa área. Aguardamos a convocação dos senhores para esse grande seminário em que a ciência seria a discussão mais ampla.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - A ideia, Senador Jorge, que surgiu aqui é a gente fazer uma daquelas sessões de plenário sobre o problema da fuga de cérebros, ou, talvez, mais: como salvar a ciência, a tecnologia e a inovação?
O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - A ciência, a tecnologia, a inovação e a fuga, que está incluída aí. Eu acho que é muito importante.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Professor, eu gostaria de ver também se o CNPq pode agir - sem precisar de uma lei que eu tento aprovar aqui há anos, mas o bloqueio é muito grande, inclusive das associações de alunos, da UNE - no sentido de que todo jovem que voltar de um mestrado ou de um doutorado vá fazer uma palestra em alguma escola pública. Porque nossos jovens veem artistas, jogadores, mas não veem um cientista, não pegam num cientista. Essa ideia eu devo ao Gleiser, nosso grande cientista Gleiser; numa palestra eu vi ele sugerir isso. Eu peguei, escrevi um projeto de lei, mas está há anos aqui, e a pressão é muito grande, de lobby de alunos de pós-graduação, contra. Fazem lobby aqui dentro e conseguem impedir com audiências e mais audiências. De repente, o CNPq pode fazer isso sem precisar de lei.
Senador Jorge.
O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - É só para fazer um esclarecimento ao nosso professor que está aqui, Mario Borges.
Eu fui Relator do projeto que deu origem à Lei de Ciência, Tecnologia e Inovação, mas eu atuei também na emenda no ano anterior. Então, era um trabalho casado. E lamentavelmente nós tivemos os vetos - houve contradições, foi ainda no governo da Presidente Dilma. E o que nós fizemos? Qual foi o entendimento nosso? Não só derrubar os vetos, mas recompor o projeto de lei com iniciativa nossa, legislativa. Sem isso nós não vamos realmente - o senhor tem razão - andar.
Eu estive na Califórnia anos atrás, cinco anos, e fiz uma pergunta: "Como vocês transformaram um deserto num ativo, num PIB desse tamanho na Califórnia?" E aí eles falaram: "Foi tudo em volta de um centro de pesquisa, de conhecimento, das universidades". Fui à universidade de San Diego e, quando cheguei lá, vi que o reitor era indiano - o reitor era indiano!
Imaginem aqui no Brasil... Também nós temos muito problemas com corporações, o que é terrível, atrasa, isso é um modelo mental ultrapassado. Aí eu cheguei lá e havia um reitor indiano na universidade de San Diego. Por que isso? É como tudo que o Sr. Roberto estava falando: porque são bons em matemática. Aí eu falei: "Mas como é que vocês transformaram um deserto nesse PIB?" Claro que foi uma política de Estado, dos Estados Unidos, mas eles criaram universidades, centros de conhecimento e tiveram uma lei que facilitou isso. A lei, não sei se é a Bay Day, mas é dos anos 70. É uma lei que permite que um pesquisador que desenvolva algo possa fazer parte... E aí, de novo, sem burocracia. Imagine um pesquisador nosso da Embrapa... Lá no Acre existe um muito bom chamado Judson Valentim. Lá a lei permite que você dê aula numa universidade, seja chefe de pesquisa, seja um cientista, e, caso você descubra algo e esse algo vire um ativo econômico ou vire o resultado de uma empresa que vai ser criada, o pesquisador, o cientista pode ser parte desse negócio que aconteceu lá fora. Então, os professores todos são milionários. Só que eles seguem dando aulas, eles seguem sendo cientistas, porque eles gostam de ser cientistas. Aqui no Brasil se coloca o cientista dentro de uma caixa, a burocracia estabelece o que ele pode e o que ele não pode fazer, o que ele deve fazer. Isso é terrível! É uma situação de insegurança para ele e para a sua família.
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Então, a coordenadora de programa de cooperação internacional lá, uma senhora, professora, falou assim: "Quando meu marido falou, na minha casa, que nós íamos mudar para San Diego, eu chorei, porque aquilo era o lugar da violência, era o lugar do caos, e ele estava querendo levar a minha família para aquele lugar terrível." Estou falando em uma situação de trinta e poucos anos atrás, quarenta anos atrás. Só que agora San Diego tem uma das melhores qualidades de vida do mundo, tem tudo que se sonha que o mundo compartilhe com outros lugares, porque eles criaram uma universidade, empoderaram essa universidade, desburocratizaram, fizeram com que a universidade estivesse presente no mundo econômico, o mundo econômico dentro da universidade.
Imaginem se nós tivéssemos feito isso. Hoje o Brasil teria as maiores empresas ligadas ao agronegócio, ao desenvolvimento da tecnologia de sementes. Nós temos isso? Não temos nem vamos ter. Nós resolvemos ser subordinados nesse aspecto aos americanos e às grandes multinacionais e engessamos os pesquisadores da Embrapa, do Cenargen e de outros lugares fundamentais. Isso é terrível!
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - E outra coisa: não investimos com recursos privados.
Eu tenho insistido muito com o agronegócio. Eu lembro muito, como professor de História Econômica do Brasil, a frustração que a gente tem quando sabe que na Amazônia, no Acre, no Amazonas, algumas cidades eram as mais ricas do mundo no tempo da borracha. A borracha foi para a Malásia e nós nos acabamos. O boom da soja...
O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC. Fora do microfone.) - O maior comércio de diamantes, no início do século passado, era em Manaus..
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Em Manaus.
A soja vai ser levada para a África, na metade do caminho para a China. Se a temperatura subir um pouquinho mais no Planeta, vai ser produzida na Sibéria, vai chegar lá de trem e não nesses barcos que viram o mundo. Então, a saída é eles pegarem o dinheiro que têm hoje e começarem a investir para transformar aquilo em uma San Diego, num Silicon Valley. Mas é difícil convencê-los. Eles têm condições, mas ficam esperando o Estado, e o Estado não vai ter dinheiro nesse momento.
O SR. ROBERTO NICOLSKY - É melhor a gente transformar o Brasil numa Bangalore.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Numa Bangalore, por exemplo, que o senhor conhece.
O SR. ROBERTO NICOLSKY - Num Silicon Valley indiano, que exporta mais de US$100 bilhões...
O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Prof. Roberto, eu vou pedir licença porque eu tenho que votar na CCJ.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Muito obrigado por sua contribuição.
Prof. Roberto.
O SR. ROBERTO NICOLSKY - Eles fazem isso sem energia, sem nada do que nós temos aqui de infraestrutura.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Aliás, falar em não ter nada aqui, eu não vi nos quadros de vocês - talvez tenha passado desapercebido - aquele que para mim talvez represente o melhor sucesso, que é Israel. Eu não vi Israel aparecer com suas startups, com suas patentes.
Dito isso..
O SR. MARIO NETO BORGES - É porque o foco era a fuga e o movimento de cérebros, mas lá isso não é tão expressivo.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Ah, entendi.
O SR. MARIO NETO BORGES - Se fosse inovação ...
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Se fosse inovação eles estariam aqui. Quem está falando em fuga de cérebros ...
O SR. ROBERTO NICOLSKY - Mas Israel tem uma situação... É o mesmo que comparar com os Estados Unidos ou com a Alemanha. Não é essa a nossa comparação. Nós não podemos dar um salto na indústria, de onde estamos, para a indústria alemã, de 4.0, nem para a americana nem para a israelense.
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Então, temos de olhar aqueles que têm as contradições que nós temos, que têm as deficiências que nós temos, mas estão alcançando sucesso, estão crescendo, e esse país se chama Índia. Não podemos olhar para a China, porque nós não vamos implantar aqui um governo estilo China, com partido único. Então, é inútil nós olharmos para a China, porque nós não a poderemos copiar. Mas, a Índia, podemos, porque é uma democracia, e eles conseguem tudo no Parlamento. E esse governo que assumiu destronou o Partido do Congresso, que tinha 300 e tantos Deputados em 500 - e observem que a Índia é seis vezes mais populosa, mas tem 500 Deputados.
Pois bem, esse partido...
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - E gastam menos com eles.
O SR. ROBERTO NICOLSKY - ... que é o partido de oposição ao Partido do Congresso, da família Gandhi, elegeu 300 e tantos Deputados e reduziu o Partido do Congresso a 30. Então, hoje é ele quem manda. O que ele prometeu? Continuar crescendo, ou seja, uma lei que não é dele.
Isso é o que nos falta. A Índia tem esse sucesso, multiplicou por quatro seu PIB e vai multiplicar nos próximos 20 anos por outros quatro, porque ela tem continuidade na política pública de compartilhamento do risco entre Estado e empresa. A universidade já é pública lá. A universidade vive do recurso público. E aqui também é assim. Então, não é essa a novidade.
A diferença fundamental é fazer a parceria entre Estado e empresa, para que a empresa tenha condições de contratar profissionais para trabalhar nos seus P&Ds. A empresa não vai contratar enquanto ela tiver que arriscar tudo para pagar 38% ao Estado e, eventualmente, ficar no prejuízo. Ela não vai contratar, somente se o Estado...
Basta ver o que aconteceu nos poucos editais de inovação que ocorreram entre 2006 e 2010: o número de candidatos e empresas, mesmo com aquela coisa absolutamente acadêmica, cartesiana, de impor uma condição, como aconteceu com o edital de 2006 na área da saúde. Queriam uma molécula nova para combater a Aids, como se molécula nova fosse uma coisa que se encontrasse ali por qualquer dois mil réis. Queriam uma molécula nova para combater a Hepatite C e um processo de síntese novo para o AZT. É óbvio que não conseguiram nada e só jogaram dinheiro fora.
O resultado seria outro se tivessem perguntado para essas empresas: "Como vocês podem crescer?" "Eu sou especialista em doenças cardíacas, em medicamentos para isso, então eu vou melhorar os meus medicamentos." Isso custaria muito menos dinheiro do que tentar criar uma molécula nova, e ele resolveria isso em um, dois, três anos talvez e estaria faturando mais, recolhendo mais tributo, convergindo mais recurso para o FNDCT, ou seja, fechando o ciclo virtuoso.
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O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - E dando um exemplo.
O SR. ROBERTO NICOLSKY - E dando um exemplo.
A Lei do Bem teve esse papel. Todas as empresas cresceram. O Ipea agora está fazendo essa pesquisa, mas é evidente: multiplicaram seus...
O Senador falou que as patentes que cresceram foram da Petrobras e da Unicamp. Não foram. Foram as das empresas que investiram na Lei do Bem, que permitia que elas gastassem dezenas de milhares de dólares - é o que custa uma patente no USPTO - e se abatesse isso. Foram essas que fizeram. Por isso é que o Brasil, de repente, deu um salto. Por que deu um salto? Porque a Lei do Bem... A patente leva três, quatro anos para ser aprovada. Então, as primeiras, de 2006, não poderiam ser aprovadas antes de 2010, mesmo lá no USPTO. Pois bem, foi em 2010 que começou a alta, não foi antes.
Eu quero repetir o meu teorema: a condição necessária e suficiente para uma política pública de desenvolvimento tecnológico que promova o rápido crescimento do PIB é - poderíamos dizer como na matemática se diz -, se e somente se, houver compartilhamento de risco entre o Estado e as empresas médias e pequenas, porque com a grande já existe. A Lei do Bem é um compartilhamento de risco, mas só é alcançável por empresas que têm o regime fiscal de lucro real, que são as grandes.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Obrigado, Professor.
Eu passo a palavra à Profª Denise.
A SRª DENISE NEDDERMEYER - Obrigada, Senador.
Bom, eu gostaria de, primeiro, parabenizar o Senador pela iniciativa, dizer o quão rica e inspiradora foi a manhã e fazer um convite para que vocês venham conhecer a Embrapii mais de perto, principalmente por conta do compartilhamento de riscos, Dr. Roberto. Nós temos muito a dizer sobre isso. Eu gostaria que essa conversa continuasse.
O SR. ROBERTO NICOLSKY - Discuti muito com o Guimarães sobre isso quando ele estava na Capes.
A SRª DENISE NEDDERMEYER - Que bom!
Eu espero, Presidente, que essa conversa continue muito em breve, porque nós precisamos aprofundar o que se faz neste País em prol da nossa ciência e tecnologia. Eu fiquei animada com a determinação dos Srs. Senadores de discutir o assunto tão profundamente.
Portanto, Senador, eu gostaria de reforçar o convite para o senhor ir à Embrapii e nos conhecer mais de perto. Espero que essa conversa continue bem rapidamente e de forma mais consistente.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Pode contar com isso. Eu creio que uma das tarefas desta Casa hoje, além de todos os seus problemas imediatos, é salvar a ciência e a tecnologia brasileira. Acho que essa deve ser uma tarefa fundamental. Como falamos aqui, não podemos deixar o ouro ir embora, algo a que a gente se opunha, precisamos evitar que os cérebros vão embora ou que se afoguem aqui.
O SR. ROBERTO NICOLSKY - Senador, eu tenho que me retirar. Então, eu agradeço muito o convite. Adorei estar participando desta Mesa tão diversificada e tão expressiva.
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Quero dizer que estou à disposição desta audiência grande.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Grande, plenária, que a gente faz. E o senhor vai receber, mas demora um pouco, um texto que vamos publicar com a transcrição.
Muito obrigado, Professor.
Prof. Tadao, eu passo a palavra ao senhor, por último, com a sensação de que foi o senhor que começou tudo isso. Foi uma conversa no meu gabinete que provocou isso.
O SR. TADAO TAKAHASHI - Isso. E eu tenho a missão ingrata de estar entre os palestrantes e o almoço, que é a pior situação possível. Então, eu vou ser muito rápido para lhe dizer o seguinte.
Eu adorei o painel, mas a sensação que tenho é que a gente se desviou um pouco do título específico, embora, obviamente, tenha sido muito útil para a gente discutir as causas últimas ou primárias do problema que hoje a gente está discutindo, que é a evasão de capital humano. Então, eu queria voltar para o tema de capital humano, já pedindo ao Senador para permitir que a gente encaminhe alguma sugestão ou algum comentário adicional, que certamente não vai caber aqui.
Para o que cabe aqui, eu queria comentar o seguinte. Quando eu fico olhando a faixa etária de quem está aqui, vejo que não há ninguém do pessoal que está sendo primariamente afetado por esse tipo de desânimo geral que o Brasil vive, que é o jovem, que é o garoto ou a garota de graduação, mestrado ou algo assim.
Eu tenho convivido ultimamente com quatro ou cinco pessoas que estão em graduação e em mestrado e fico vendo o que elas falam e pensam. Uma delas está indo agora à Suécia para dar uma palestra e ver se fica por lá. A outra foi ao Chile para dar uma palestra numa conferência e voltou animada com a ideia de ir para lá. Outra está agora, na verdade, em São Paulo, mas é do Norte e está pensando em ir para lá. De tal forma que o desassossego desse pessoal com o que está acontecendo, com o que ele não vê como perspectiva é qualquer coisa muito tangível e que, na verdade, afeta o dia a dia dele, a conversa dele. E não necessariamente são pessoas que vão produzir resultado científico e tecnológico que possam passar por algum critério de meritocracia, mas a grande verdade é: eles são os lírios do vale, por assim dizer. Eles são boa parte da população brasileira jovem, que está na universidade e fica olhando esse negócio todo, essa pasmaceira, e não sabem em que direção ir.
Então, eu tenho a sensação de que existe uma certa urgência em sinalizar alguma coisa para que esse pessoal saiba que há gente pensando neles. Na verdade, não é só olhar no noticiário, ver o que está acontecendo - morte de não sei quem, Lava Jato e tototó - e não saber o que vai acontecer nos próximos anos.
Então, ao mesmo tempo em que estou plenamente consciente e apoio o que o Presidente do CNPq falou - o Nicolsky falou acerca de qual é a causa primária em que ciência, tecnologia e inovação podem atuar -, eu tenho a sensação de que é necessário fazer alguma coisa, mesmo que seja simbólica, para esse pessoal olhar e dizer: "Bom, nós estamos vendo que há gente discutindo e gente ajudando." É o primeiro ponto.
O segundo ponto é: seria preciso usar muito mais redes para colocar o jovem para discutir também. No mínimo, quando ele percebe que há alguém perguntando ou ouvindo, esse tipo de desabafo que a gente sente em restaurante de universidade começa a aparecer publicamente e começam aparecer ideias interessantes ou, no mínimo, o sentimento de que o Brasil tem futuro sim, que alguém anda pensando nisso e algumas coisas estão sendo feitas.
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Que coisa concreta? Se todo mundo acha que o Ciência sem Fronteiras foi uma boa ideia, ainda que tenha tido problemas, eu continuaria com o programa chamado Ciência sem Fronteiras. Ele teria um número de bolsas muito pequeno, critérios meritocráticos e o diabo, mas seria para sinalizar, exatamente, a ideia de que você está pensando em alguma coisa estável a médio e longo prazo e assim por diante, senão a gente está caindo outra vez na história de que muda o programa de nome ou vem um outro que vai substituir e, na verdade, não está substituindo exatamente. O grande mérito do Ciência sem Fronteiras era mandar o garoto ou garota, meio que sem compromisso, para uma universidade no exterior, meio que apostando que alguma coisa interessante ia rolar disso. E, obviamente, quando a gente está falando de um programa que solicita que alguém se aplique para retornar como jovem cientista, já está falando de dois degraus acima e não daquele garoto ou garota que passou num critério qualquer e foi fazer um sanduíche qualquer numa universidade inglesa, ou algo assim, e que, eventualmente, volta deslumbrado pela ideia do que é o mundo, mas volta também atento para aquilo que é o próprio país, o que ela está fazendo na universidade e o que ela pode fazer.
Eu encontrei uma mocinha em Barra do Corda, interior do Maranhão, que havia acabado de voltar do Ciência sem Fronteiras. Como ela era toda bonitinha, eu peguei e falei: "Bom, agora você termina aqui e volta lá para o seu namorado na Inglaterra." Ela ficou toda vermelha, mas falou: "O senhor tem parte de razão, porque, na realidade, eu descobri que o meu lugar é aqui no Maranhão." Ela estava consciente de que ela podia produzir e ser muito mais útil no Maranhão do que em Manchester ou onde ela estava na universidade.
O que eu estou dizendo é: essa moça está em algum lugar lá no interior do Maranhão e não está vendo sinal nenhum de que alguém está pensando em ajudá-la a fazer alguma coisa lá em Barra do Corda.
O meu ponto é: na posição que o senhor ocupa e com a ajuda do CNPq, ajuda de outras entidades, há um conjunto de sinais muito claros, que dá para fazer com um custo baixíssimo, mas que, na verdade, faz a transição entre o falar e o pensar. Aí eu volto na minha história. Na verdade, o país da pessoa é onde o coração dela está, não o cérebro. Na verdade, a gente pode morar no Silicon Valley e trabalhar para o Brasil, desde que a pessoa olhe para o Brasil como o lugar de onde ela saiu, para onde ela vai voltar e, última análise, o lugar para o qual ela quer contribuir.
Senador, muito obrigado,
Eu vou mandar alguma coisa.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Muito obrigado ao senhor, muito obrigado a todos. Eu creio que tivemos uma excelente audiência, aliás, confesso, uma das melhores realmente.
Alguém está pedindo a palavra. Só se for muito rapidinho...
O SR. MILTON POMBO DA PAZ (Fora do microfone.) - É só uma pergunta.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Mas sempre é bom.
O SR. MILTON POMBO DA PAZ (Fora do microfone.) - É um canal que eu tenho para contribuir com a Comissão.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Boa. Deixe seu cartão conosco, e nós vamos fazer chegar, mas, uma das coisas é ficar atento à convocação dessa audiência no plenário do Senado -tem de haver o aval do Presidente obviamente -, e, quando tivermos a transcrição do áudio, receber e poder nos dar uma ajuda na revisão disso, para ver o que nós podemos colocar a mais. Não temos que ficar prisioneiros disso. Isso aqui é a provocação. Daqui a gente pode fazer muito mais. Mas é bom saber que há pessoas interessadas.
Ali está o Denis, que trabalha comigo. Passe para ele sua pista.
R
Eu quero agradecer a todos e lembrar o que eu falei no começo: se estivessem levando ouro do Brasil, todos reclamariam. Aliás, já vi reclamação de que estão levando nossos jogadores de futebol. Já ouvi mais de uma reclamação de que, quando chega a Copa do Mundo, os jogadores não estão morando aqui, então não estão treinando juntos. Mas as pessoas não estão reclamando de que estamos perdendo conhecimento, que é a grande riqueza do futuro, é o ouro do futuro.
E, finalmente, fiz questão de lembrar que, além de perdemos cérebros que vão embora depois de formados, nós perdemos cérebros por não terem tido a chance de terem a formação. O cérebro foi embora da mesma maneira. Um vai contribuir lá fora - é verdade, e o Brasil até se aproveita -, mas o outro nenhuma contribuição vai dar à ciência, vai dar a outras coisas. É preciso sempre pensar juntos: a educação de base com os setores superiores do conhecimento.
Muito obrigado a todos.
Está encerrada da sessão.
(Iniciada às 8 horas e 52 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 19 minutos.)