08/05/2018 - 6ª - Subcomissão Temporária do Estatuto do Trabalho

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Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Declaro aberta a 23ª reunião da Subcomissão Temporária do Estatuto do Trabalho - foram 17 reuniões até o fim do ano e mais 6 durante este ano - da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal, 4ª Sessão Legislativa Ordinária, 55ª Legislatura.
A audiência pública será realizada nos termos do Requerimento nº 26, de nossa autoria e de outros, para debater hoje o Direito Processual do Trabalho.
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Esta audiência pública será realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. Por isso, as pessoas que têm interesse em participar com comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do portal e-Cidadania, no endereço www.senado.leg.br/ecidadania, e do Alô Senado, pelo número 0800612211.
Antes de iniciarmos a reunião, informo a todos que, em função da relevância e da qualidade do debate realizado nesta Subcomissão nas audiências públicas sobre o mundo do trabalho, as palestras serão organizadas para publicação ao final de cada semestre com base nas notas produzidas pelo Serviço de Taquigrafia do Senado, que desde já ficam solicitadas conforme encaminhamento aprovado em sessão anterior.
Enquanto os convidados estão chegando - falta uma série de convidados ainda -, eu farei uma pequena introdução sobre o tema para atualizar todos aqueles que estão nos assistindo pela TV Senado e pela internet.
Declaro aberta mais uma reunião da Subcomissão Temporária do Estatuto do Trabalho.
Esta audiência pública foi solicitada por meio do Requerimento nº 26, de 2018, de nossa autoria.
Nosso debate, como sempre, será interativo com a possibilidade de participação popular.
Esta audiência pública faz parte de um ciclo de debates que pretendemos finalizar com a apresentação do projeto de um novo Estatuto do Trabalho, a nova CLT. O objetivo é retomar a trajetória social definida pela Constituição de 88 de modo a promover o encontro da legislação trabalhista com o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, restaurando o equilíbrio, hoje desfeito, entre os fundamentos republicanos do trabalho e da livre iniciativa.
Senhoras e senhores, na última eleição presidencial o povo brasileiro sagrou vitorioso o programa social que foi desfeito a partir, principalmente, da aprovação da PEC nº 95, que congelou todos os investimentos, e, depois, com aprovação de uma reforma que retirou praticamente todo o direito dos trabalhadores.
Quero também, rapidamente, aproveitar para informar a todos que este é um trabalho permanente de muita, muita gente. As centrais participaram, federações, confederações, todas as entidades ligadas ao serviço público - não vou citar todas aqui, mas vou citá-las no nosso relatório - os partidos políticos na Casa, via Comissão Especial. Todos estão representados. Enfim, é um trabalho de fôlego, vai ter em torno de 900 artigos, e a audiência pública de hoje vai aprofundar o debate sobre os efeitos da reforma no Direito Processual do Trabalho.
Estão aqui inúmeros convidados.
A magistrada do trabalho e Vice-Presidente da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho, Noemia Aparecida Garcia Porto, sintetizou muito bem o que está em jogo neste debate. Segundo a magistrada do trabalho - abro aspas porque a citação é dela -, "a reforma inibe, intimida e amedronta no acesso ao Poder Judiciário Trabalhista; estamos vivendo aquilo que já se previa durante o processo legislativo, um imenso problema de acesso ao Judiciário do Trabalho" - fecho aspas. Inibição, intimidação e medo: essas são as táticas neoliberais apresentadas por este Governo.
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Enfim, o trabalhador brasileiro está indignado com tudo o que vem acontecendo, inclusive com a dificuldade de ele entrar na Justiça. E eu vejo a grande mídia alardeando que diminuiu o número de ações na Justiça. Mas, é claro: planta-se um terrorismo, diz-se que, se você perder, você vai ter que pagar praticamente a metade daquilo a que teria de direito de receber! O cara tem para receber dez e, de repente, vai ter que pagar cinco: claro que intimida. Isso é uma intimidação covarde contra a parte mais fraca. Nós alteramos isso e, de uma vez por todas, garantimos o livre acesso dos trabalhadores à Justiça do Trabalho.
Uns dizem que a Justiça do Trabalho está sobrecarregada, lenta, que os magistrados têm processos demais e que os trabalhadores ajuízam demanda. Ora, ajuízam porque não recebem, são obrigados a ajuizar. Eu ajuizaria também se tivesse algo a receber e não me pagassem.
Bom, vamos adiante, porque falarei mais sobre isso tudo no relatório que vamos apresentar.
De pronto, estamos convidando todos para, no dia 10, se fazerem presentes aqui, a partir das 9 horas, quando nós faremos a leitura do relatório. Não é o relatório final, porque nós vamos encaminhar da seguinte da seguinte forma. No dia 10 eu faço a leitura do relatório e, a partir daí, a gente abre espaço para a sociedade toda, via sistema de comunicação do Senado, poder participar com novas ideias e propostas que possam melhorar a redação. Segundo a ideia que eu propus, as entidades que estão junto com a gente serão também signatárias aqui - já acertamos com a Senadora Regina. Esse projeto vem novamente para a Comissão, com a nossa relatoria, e, a partir desse debate, vamos viajar o País debatendo essa proposta cujo embrião foi esta Comissão Especial, com a participação de todas as entidades.
Eu só faço um apelo - eu sei que isso existe muito, é mais um alerta que eu quero dar. Eu fui autor de cinco estatutos - cinco! Não façam, pelo amor de Deus, a burrice de querer apresentar quatro ou cinco estatutos. Isso é uma burrice. Não dará certo, porque, quando ele for derrotado numa comissão, vão ser considerados prejudicados todos os outros.
Então eu peço que ninguém tenha visão eleitoreira nem oportunista. Isso aqui não tem dono, pessoal - eu só sou o Relator -, a sociedade é que construiu a proposta. Mas, às vezes, em ano eleitoral, numa visão oportunista, ludibriam alguém para cá e para lá e começam a apresentar um projeto, dois projetos, três projetos, e com o mesmo teor!
O que a direita vai fazer? Eu estou falando aqui ao vivo: vai pegar o projeto e vai derrotá-lo. E, quando o verdadeiro projeto que nós estamos elaborando, debatendo com a sociedade e que vamos viajar no ano que vem... Eleito ou não eleito, não interessa, eu tenho compromisso é com a nova CLT. Eu vou viajar no ano que vem. "Ah, mas você não sabe nem se vai estar aqui!" Não importa. Eu posso muito bem viajar o País. Ou vão me proibir agora de viajar o País para chegar numa redação final? Então eu quero deixar muito claro...
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Lembro que, no Estatuto do Idoso - vou dar o nome inclusive, e ele tem problemas hoje, mas não importa -, o então Senador Sérgio Cabral... Alguém o inflamou, e ele apresentou outro estatuto. Eu conversei com ele, expliquei, e ele teve a grandeza de retirar o estatuto: "Paim, o seu já veio da Câmara, de um debate amplo" - já tinha sido Deputado. E ele se somou a nós para aprovar o estatuto.
Então, eu só peço o seguinte. Ninguém vai ganhar mais voto ou menos voto por copiar um projeto que foi debatido com todas as entidades, com todas as centrais, com todo o País, durante um longo período. A Comissão não encerra os trabalhos aqui; a Comissão recebe todas as contribuições que virão da sociedade. E vamos continuar o debate. Houve estatuto que demorou cinco anos para ser aprovado. O que não pode é deixarmos que eles rejeitem o estatuto! Calculem se votam esse estatuto este ano: qual vai ser o resultado? Zero. Porque este Congresso, que aprovou aquela reforma, não vai aprovar um estatuto com a grandeza que este tem, que atende todo o povo brasileiro.
Então, fica aqui este apelo que quero fazer hoje para não ter que fazer no dia 10.
Vamos ao debate de hoje.
Primeira Mesa: Anjuli Tostes Faria, membro da Comissão de Direito do Trabalho da OAB e representante da Intersindical - Central da Classe Trabalhadora, que já esteve contribuindo conosco; Afonso de Paula Pinheiro Rocha, Procurador do Trabalho, Vice-Coordenador Nacional de Combate às Irregularidades Trabalhistas na Administração Pública (Conap) do Ministério Público do Trabalho (MPT), outro parceiro de diversos debates; Alex Myller, Auditor Fiscal do Trabalho, Delegado Sindical no Piauí, representante do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), parceiro de todas as horas; Mauricio de Figueiredo Correa da Veiga, representante do Conselho Federal da OAB, que já se encontra aqui.
Segunda Mesa: Juíza do Trabalho Titular Srª Ana Paula Alvarenga Martins, Tribunal Regional do Trabalho 15ª Região; Ana Cláudia Bandeira Monteiro, Vice-Presidente da ANPT (Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho); Guilherme Guimarães Feliciano, Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho.
Eu quero também já aproveitar para convocá-los: todos estão convocados para, no dia 28 deste mês, participarem, no plenário do Senado, do primeiro debate temático sobre esse assunto. Todos poderão usar da palavra. Eu quis fazer durante o mês de maio, porque é o mês do trabalhador. Teremos um debate direto - vai ser numa segunda-feira, se inicia às 9h da manhã e deve se estender até as 14h -, e haverá a possibilidade de interação pelo sistema de comunicação do Congresso e do Senado. Convido também Deputados e Senadores para estarem presentes nesse primeiro debate nacional.
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A partir dali, vamos iniciar as viagens pelo País. É claro que, sendo um ano eleitoral, não poderemos fazer essas viagens, mas, no ano que vem, nós vamos viajar todos os Estados para apresentar a proposta da nova CLT e ouvir a realidade de todos os setores. Alguém me pergunta e vou responder aqui agora: "Tu vais ouvir também os empresários? Eles não nos ouviram quando apresentaram aquela reforma." Nós somos diferentes. Nós aqui somos homens e mulheres que têm visão ampla. Vamos ouvir todos. Eles não ouviram, montaram aquela "CLE", como eu chamo, somente na visão do empregador, reunidos na sede da CNI, todo mundo sabe, entregaram um formulário para o Relator, o Relator assinou, botou no plenário, foi votado na íntegra, veio para o Senado, o Senado não leu, aprovou. Eu li porque fui Relator numa Comissão, fiquei cinco horas lendo, ao vivo, aqui, e ganhamos por um voto, mas depois perdemos no plenário. Então, nós vamos ouvir sim. Alguém pode não gostar, mas vamos ouvir todo mundo, empresário, trabalhador, ministros do Tribunal Superior do Trabalho, do Supremo Tribunal Federal. Enfim, não vai ficar ninguém fora, o trabalhador do campo e das cidades, os servidores públicos, todos serão ouvidos, porque assim é a democracia: saber ouvir o contraditório, saber ouvir e respeitar, inclusive, os que pensam de forma diferente. E o relatório final, pelo menos no período em que ficar nas minhas mãos, vocês sabem que vai na linha da justiça, podem ter certeza, negando aqueles absurdos, claro, que eles apresentaram naquela proposta que, infelizmente, virou lei.
Já falei demais, alguém tem de controlar meu tempo!
Anjuli Tostes Faria, membro da Comissão de Direito do Trabalho da OAB e representante da Intersindical - Central da Classe Trabalhadora, que esteve durante esse período participando de inúmeros debates.
O tempo vai ser de dez minutos com mais cinco para cada um, para que a gente possa ouvir as duas Mesas.
A SRª ANJULI TOSTES FARIA - Muito obrigada, Senador.
Obrigada a todos os presentes e a quem está nos assistindo pela TV Senado, ao vivo no Facebook, pela Rádio Senado.
Quero dizer que estou muito feliz de estar aqui uma vez mais, Senador, contribuindo para a construção da nova CLT, do Estatuto do Trabalho. Acho que é essa a busca que a gente tem de ter mesmo: de reverter os malefícios gerados pela reforma trabalhista, uma reforma feita de maneira absolutamente autoritária, sem consultar os próprios trabalhadores, muitas vezes sem consultar até os próprios empregadores.
Essa reforma diz respeito a uma fatia muito pequena da sociedade, que são aqueles que sempre ganharam e continuam ganhando. A gente tem uma situação hoje, Senador, em que seis famílias do País têm a mesma renda de cem milhões de pessoas, ou seja, da metade da população brasileira. Então, nós temos uma situação de hiperconcentração de renda. Não sei que país vai para frente com esse tipo de situação. A reforma trabalhista nada mais foi do que isto: uma transferência direta de renda dos mais pobres, das pessoas que vivem de salário, dos 99% da população que vivem de salário, para os mais ricos.
Eu começo falando aqui - é o tema desta reunião específica de hoje - sobre o processo trabalhista, o Direito Processual do Trabalho. Nós tivemos, na reforma trabalhista, sérios retrocessos, que vou abordar aqui. Com a nova CLT, com o Estatuto do Trabalho, é imperioso que nós possamos mitigar esses efeitos, anular esses efeitos gerados.
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Vou começar falando sobre os arts. 790-B, 791-A e 844, §2º, da Lei 13.467, de 2017, que é a lei que criou a reforma trabalhista, que impacta de forma muito negativa do ponto de vista da inibição do acesso à Justiça do Trabalho pelos trabalhadores.
A gente sabe que a Justiça do Trabalho, historicamente, era a única Justiça que funcionava para pobres neste País. Para ir à vara cível há uma série de dificuldades, para acessar qualquer outro tipo de Justiça sempre foi uma coisa muito difícil - Justiça Federal, então, nem se fala. E, na Justiça do Trabalho, existe um princípio segundo o qual o trabalhador está numa condição de hipossuficiência. Como o trabalhador, em geral, tem essa condição de hipossuficiência em relação ao empregador, que em geral é o dono do capital, existe esse princípio da proteção ao trabalhador. E isso foi quebrado neste momento, porque a reforma trabalhista utilizou vários artifícios para distanciar cada vez mais, já era difícil, para tornar mais difícil ainda o acesso à Justiça do Trabalho.
Vou começar falando aqui sobre a justiça gratuita. O que diz a Constituição? A Constituição diz que o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. Isso vale para a vara cível, para a vara do trabalho, para a Justiça Federal. Sempre que se comprove insuficiência de recursos, ou seja, estado de pobreza, é imperioso que se faça prevalecer o princípio da justiça gratuita previsto no inciso LXXIV do art. 5º da Constituição.
O que fez a reforma trabalhista? A reforma trabalhista obriga que, mesmo nos casos em que o trabalhador seja comprovadamente pobre, ele tenha de arcar com as custas, com os honorários periciais e com os honorários advocatícios se ele sucumbir. Ou seja, se ele perde, tem de arcar com tudo isso.
E como isso funciona? Olhem como é absurdo: se o trabalhador - a gente chama de sucumbência parcial ou sucumbência recíproca - perde numa parte e ganha na outra... Se ele pediu duas coisas - por exemplo, o reconhecimento de horas extras e o pagamento de valores que não foram pagos no momento da rescisão do contrato de trabalho - e, se um pedido ele ganha e outro perde, esse valor de custas, honorários periciais e honorários advocatícios é descontado diretamente do valor que ele ganhou. Então, nós temos uma situação em que a pessoa faz jus à justiça gratuita, é reconhecidamente pobre e, se ganha parcialmente aquela verba de caráter alimentar, que é o salário, ela é descontada - muitas vezes é o próprio salário que está em questão - para pagar honorários advocatícios e custas.
A gente teve até um caso, Senador, logo no primeiro dia da reforma trabalhista, em que o juiz aplicou esse dispositivo, e o trabalhador teve de pagar R$8,3 mil, trabalhador que fazia jus à justiça gratuita. E tivemos outros casos também. A gente vê como é sério isso.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Teve de pagar R$8,3 mil?
A SRª ANJULI TOSTES FARIA - Sim, R$8,3 mil de custas e honorários advocatícios, mesmo tendo ganhado parcialmente. Ele ganhou R$10 mil e teve de pagar R$8,3 mil.
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Houve outro caso também: um funcionário de uma concessionária em Mato Grosso foi condenado a pagar R$750 mil em honorários para o advogado do ex-empregador, também numa situação de sucumbência parcial. Ele ganhou parcialmente e perdeu parcialmente e, então, teve de pagar R$750 mil. Ainda está recorrendo, Senador, mas está numa situação muito séria.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - São R$750 mil mesmo?
A SRª ANJULI TOSTES FARIA - Sim, R$750 mil - vendedor, Senador, vendedor!
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Ele vai trabalhar a vida toda e não vai conseguir pagar isso.
A SRª ANJULI TOSTES FARIA - É o que a gente presume, não é?
Então, para que serve esse dispositivo? Existe uma coisa que já virou senso comum, já caiu no lugar-comum: dizer que existe um grande número de ações trabalhistas no Brasil. No ano retrasado, 2016 - ano anterior à reforma trabalhista -, foram apresentadas 3,9 milhões de reclamações trabalhistas no Brasil. Mas eu queria colocar aqui que esse dispositivo que visa diminuir a quantidade de ações trabalhistas não vai diminuir com o passar do tempo, corre até o risco de aumentar. Por quê? Desses 3,9 milhões de reclamações trabalhistas, apenas 7% são julgadas totalmente improcedentes. Ou seja, em apenas 7% das vezes se decidiu que o trabalhador não tinha nenhuma razão em seu pleito. Então, o que está acontecendo não é que o trabalhador está apresentando reclamações sem motivo, imotivadas; o que está acontecendo, na verdade, é que estão desrespeitando muito os direitos trabalhistas no Brasil. A legislação vigente tem sido desrespeitada, o trabalhador tem sido muito desrespeitado, e por isso há grande volume de ações trabalhistas. Para que a gente diminua esse volume, a gente tem de fazer com que haja mais controle sobre as relações de trabalho, para que as relações de trabalho sejam de fato regradas pelo Direito do Trabalho. É para isto que ele serve: para ser aplicado no caso concreto para proteger o trabalhador.
Na verdade, essa negação do acesso à Justiça - é isso que nós temos -, além de repercutir gravemente no número de ações trabalhistas no primeiro momento, vai incentivar ainda mais o descumprimento da legislação, porque o empregador vai pensar que nem é preciso se preocupar, pois há toda uma condição para que o trabalhador não ingresse com ação trabalhista, nessa política do terror e do medo sobre o trabalhador.
Há outro ponto sobre essas alterações geradas pela reforma trabalhista no processo do trabalho que a gente precisa reverter, Senador - e nós estaremos aqui, neste Congresso Nacional, no Senado, na Câmara, no Salão Verde, onde a gente vai sempre, brigando para que seja revertido -, que é o pagamento de custas caso o trabalhador seja declarado ausente numa audiência trabalhista. Ocorre que, muitas vezes, o trabalhador chega atrasado, tem de pegar ônibus cedo. Quem anda de ônibus, quem mora na periferia sabe que, às vezes, precisa pegar dois ou três ônibus para chegar ao local de trabalho. Quando ele tem de ir para uma audiência trabalhista, há um complicador a mais: além de pegar dois ou três ônibus, ainda tem de se informar exatamente em que lugar é, onde fica a vara, em que sala é a audiência. Então, não é uma coisa fácil. Vamos pensar na quantidade de analfabetos e analfabetos funcionais que existem no Brasil. Na prática, para quem a gente está restringindo isso? Para a camada mais pobre da população.
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E, hoje, o §2º do art. 844 da lei que determinou a reforma trabalhista prevê, no caso de o trabalhador ser declarado ausente, que ele tem de pagar custas, honorários de sucumbência, ele tem de arcar com todos os ônus de sucumbência, mesmo que faça jus à justiça gratuita. Então, essa reforma trabalhista, do ponto de vista do Direito Processual do Trabalho, é uma total aberração. Nós precisamos, de fato - estou aqui falando como membro da Comissão de Direito do Trabalho da OAB, mas também como representante da Intersindical - Central da Classe Trabalhadora -, unificar o povo trabalhador contra os efeitos nefastos dessa reforma e temos de apresentar uma resposta nas ruas, nas urnas, para reverter todos esses malefícios gerados para atingir o povo trabalhador.
O que nós temos aqui, repito, é um processo de transferência de renda dos mais pobres para os mais ricos, dos trabalhadores para os muito ricos, para os super-ricos da nossa sociedade.
O que nós tivemos como resultado da reforma trabalhista? Na verdade, não foi o aumento da empregabilidade. Nós tivemos uma notícia que saiu recentemente, no dia 27 de abril, mostrando que houve uma alta de 11,2% no desemprego com relação ao 4º trimestre do ano passado. Então, o desemprego aumentou; não diminuiu, aumentou. Isso significa 13,7 milhões de desempregados no primeiro trimestre de 2018. É muita gente! São postos de trabalho retirados da indústria, da construção civil, do comércio. Nós estamos falando de algo muito sério, de algo que impacta não apenas o trabalhador diretamente, mas a própria economia da sociedade. É claro que nós teremos uma retração econômica se postos de trabalho forem tirados de setores estratégicos para o País, e é claro que nós teremos uma retração econômica, no curto, no médio e no longo prazo, se esses trabalhadores também tiverem reduzido o seu poder de compra: eles terão menos condições de consumir e, portanto, haverá um desaquecimento na economia.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Ou seja - permita-me -, eles também deram um tiro no pé. Pode ser que tenham dado tiro nos nossos dois pés, mas no deles também: se o mercado interno não compra, quero ver como vão manter o lucro deles.
A SRª ANJULI TOSTES FARIA - Nós tivemos, alguns anos atrás, até 2012 mais ou menos, uma taxa de crescimento muito alta para os padrões brasileiros, para os padrões da América Latina, inclusive, e mundiais, principalmente mundiais, porque o mundo inteiro estava numa crise e aqui a gente estava crescendo. Por que isso? Porque se incentivou a economia a partir do consumo das famílias. O PIB tem vários componentes, entre eles o consumo das famílias. Então, a partir do incentivo, da alavancagem do consumo das famílias, a gente conseguiu aumentar a renda geral da economia.
Aliás, não há país que vá para frente sem se preocupar com todos, sem se preocupar com a D. Maria, que lava roupa todo dia e agora está sendo impactada também com a reforma trabalhista; sem se preocupar com o vendedor de carro, como esse que foi condenado a pagar 750 mil porque ajuizou uma ação trabalhista; sem se preocupar com o frentista, sem se preocupar com a senhora que serve cafezinho aqui no Senado; sem se preocupar com os terceirizados e com os fotógrafos.
A gente tem uma situação, inclusive, de precarização do trabalho, porque hoje os poucos postos de trabalho que foram gerados - a gente perdeu muitos postos de trabalho, mas, nesse contexto, alguns poucos foram gerados - estão numa faixa de até dois salários mínimos. Nós temos redução de emprego tanto no mercado formal quanto no informal.
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Então, a situação que nós temos hoje no Brasil é muito grave, e ela vai justamente no sentido contrário daquilo que se afirmava: de que era necessário fazer a reforma trabalhista para gerar mais empregos, gerar mais empregabilidade e a economia crescer. Nós estamos vendo o contrário: nós estamos vendo o aumento da concentração de renda - esses são dados do PNAD do IBGE -, nós estamos vendo o aumento do desemprego, uma redução dos trabalhadores com carteira assinada - a gente teve uma redução forte aí dos trabalhadores com carteira assinada.
Quando disseram que iniciariam o trabalho intermitente, era para aumentar a quantidade de trabalhadores com carteira assinada, para diminuir a informalidade. Foi isso que aconteceu?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Foi o contrário.
A SRª ANJULI TOSTES FARIA - Ao contrário, ao contrário: além de diminuir a quantidade de trabalhadores com carteira assinada, hoje o trabalhador tem de tirar dinheiro do bolso para contribuir para a Previdência. Muitas vezes o trabalhador que está no trabalho intermitente não ganha nem um salário mínimo, e a cota de contribuição para a Previdência é sobre um salário mínimo - no mínimo! Então, ele tem de tirar dinheiro do bolso para complementar a contribuição para a Previdência.
(Soa a campainha.)
A SRª ANJULI TOSTES FARIA - Então, temos uma situação aí, de fato, em que existem os que ganham e existem os que perdem. Como em toda política pública, existem os que ganham, existem os que perdem, e quem está perdendo é o povo trabalhador.
Quando se fala de reforma, Senador, a gente pensa que é uma coisa boa: "Olhem só, vamos fazer uma reforma!" Quando se faz reforma lá em casa... Lá em casa, inclusive, a gente está construindo um banheiro, porque eu moro em São Sebastião e a minha casa é uma casa de cultura, um centro de direitos humanos e cultura, eu moro em um quartinho; Tiago, que está ali filmando, mora no outro quarto; há outra pessoa que mora no outro quarto, e o banheiro é comum, para toda a comunidade, para mim também. Agora eu casei com o Hugo... O senhor o conhece, não é?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Conheço. O Hugo é dos principais, poderia dizer, articuladores e mentores dessa proposta que todos vocês estão contribuindo com a gente, da nova CLT. Tu falaste do Hugo, e eu me lembrei: ele foi punido uma época porque ele defendia os direitos dos trabalhadores lá no Estado dele, que é...
A SRª ANJULI TOSTES FARIA - Pernambuco.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Pernambuco. Aí nós fizemos aqui uma moção de solidariedade.
A SRª ANJULI TOSTES FARIA - Que é o que alguns juízes do trabalho estão fazendo neste momento: não aplicam - assim como ele, que é juiz do trabalho - a reforma trabalhista em vários pontos, porque a lei tem uma validade, mas há algo que tem uma validade ainda maior, que é a Constituição Federal. Então, as normas infraconstitucionais se amoldam nesse sistema normativo no qual a Constituição está no topo.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Tem mais um minuto agora.
A SRª ANJULI TOSTES FARIA - E, aí, esses juízes também estão sendo duramente criticados, estão sendo punidos em diversos momentos. É uma situação muito séria, porque, hoje, quem segue a Constituição está sendo punido. Hoje quem segue a Constituição foi colocado como criminoso praticamente. É essa a situação que temos hoje no País.
Mas eu falava da minha casa. A gente está fazendo...
(Soa a campainha.)
A SRª ANJULI TOSTES FARIA - ...um banheirinho para nós dois, no quarto, para ter um pouco mais de conforto. Então, quando a gente pensa em reforma, é para uma coisa boa. O que eles fazem aqui é o contrário: eles chamam de reforma uma coisa que é retirada de direitos; direitos que foram duramente conquistados, com muito sangue, com muito suor, pelos nossos antepassados, pelos nossos pais, pelos nossos avós. Foi com muita luta que eles foram conquistados, e eles foram retirados em um processo absolutamente autoritário, antidemocrático, de costas para os trabalhadores.
A gente tinha aí um percentual...
(Soa a campainha.)
A SRª ANJULI TOSTES FARIA - ... de rejeição da reforma trabalhista de mais de 70% da população, e tivemos 50 Senadores aqui que decidiram de costas para o povo, sem considerar o que o povo dizia.
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Espero que, neste momento, quem estiver do outro lado também se lembre de quem votou contra o povo, faça esse controle de quem está querendo aprovar a reforma da previdência.
Encerrando, Senador, eu quero fazer este chamado geral, um chamado para todos nós, um chamado de unidade a favor dos direitos do trabalhador, da trabalhadora.
Nós sabemos que, do lado de lá, há gente muito poderosa, gente que, no Brasil, não corresponde nem a 1% da população - corresponde a 0,03%. São pessoas muito poderosas, são os banqueiros, são os megaempresários, pessoas que não pagam imposto - no Brasil não pagam imposto, mas pagam no resto do mundo. São pessoas que sempre têm se beneficiado de todas as reformas, de todas as políticas que existem no País.
Então, este é o momento de a gente se unir, porque nós somos muito mais, o povo brasileiro é muito maior do que eles. Neste momento, nós precisamos é nos conscientizar de que, de fato, todo poder emana do povo e devemos exercer esse poder, porque ele está em nossas mãos.
É isso.
Vamos aprovar essa nova CLT, vamos aprovar o Estatuto do Trabalho, porque é nisso que nós acreditamos. Só há saída se a gente se engajar e fazer com que a lei seja aplicada, de fato, a favor do povo. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, muito bem!
A Anjuli Tostes Faria é membro da Comissão de Direito do Trabalho da OAB e representou aqui, também, a Intersindical - Central da Classe Trabalhadora, e lembrou o nome do Hugo, que é um juiz pelo qual a gente tem o maior carinho, o maior respeito.
Eu vou, de imediato, falar para lembrar que o número de trabalhadores em miséria absoluta também aumentou: são milhões a mais a partir dessa reforma. E, ontem mesmo, eu li aqui um documento que eu recebi de uma senhora que diz que vive com R$47,00. Primeiro eu pensei que fossem por hora; depois, eu pensei que fossem por dia; depois eu pensei que fossem por semana, mas daí eu fiquei sabendo que são por mês. Li toda a matéria: ela recebe isso por mês! Como é que alguém vai viver com R$47,00, em torno de R$50,00, por mês? É uma matéria grande até que saiu em um dos jornais do País - R$50,00 por mês. E, na matéria, subtendia-se claramente que era a partir desse movimento, dessa reforma trabalhista.
Por isto é que eu digo também que eles deram um tiro no pé: se a população não tem poder de compra, para quem eles vão vender?
Vamos em frente.
Afonso de Paula Pinheiro Rocha, Procurador do Trabalho, Vice-Coordenador Nacional do Combate às Irregularidades Trabalhistas na Administração Pública - Conap, Ministério Público do Trabalho (MPT), representante da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT)
Lembro a todos que são dez minutos, com mais cinco.
O SR. AFONSO DE PAULA PINHEIRO ROCHA - Bom dia a todos.
Peço vênia para cumprimentar todas e todos que estão assistindo e que estão aqui presentes na pessoa do Senador.
De plano, quero ressaltar a grande satisfação que o Ministério Público do Trabalho e a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho têm de vir aqui para participar do debate e apresentar suas contribuições. Então, é uma tripla honra hoje aqui estar com V. Exª, representar o MPT e representar a ANPT.
Esse tema é de extrema relevância. Cito um professor da minha antiga faculdade que dizia o seguinte: "Só há dois tipos de manifestação: as breves e as que serão esquecidas." Esse tema hoje aqui tem de ser levado à mente e, principalmente, ao coração de todos, porque nós estamos lidando com vidas humanas, com o trabalho, que é aquilo que consome a maior parte do dia a dia das pessoas. Então, esse tema tem de ser tratado com o máximo de cautela e com o máximo de participação social.
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Também já inicio a minha manifestação mais técnica evocando um dos grandes constitucionalistas deste País, Paulo Bonavides, que fala que o Ministério Público não é nem governo, nem oposição. Ele é a Constituição em ação em defesa dos interesses sociais individuais indisponíveis. Então, o Ministério Público do Trabalho tem esse perfil, e a Associação dos Procuradores do Trabalho também.
Nosso primeiro ponto é destacar que o Ministério Público, ao longo de todo o debate do que foi a reforma trabalhista, vem editando notas técnicas que estão disponíveis no site da instituição, levantando pontos que devem ser discutidos durante todo o processo, uma vez que houve a aprovação. E um dos pontos que tem maior destaque é exatamente o déficit democrático que entendemos que o projeto teve, de tal magnitude que ele tinha. Entendemos que ele deveria ser mais maturado e exortamos nessa ampla discussão. O Ministério Público jamais se furtaria a prestar as suas colaborações.
Adicionalmente a isso, vemos com preocupação o acesso à Justiça. Por quê? Porque não se garantem direitos sociais, não se vão garantir os direitos individuais indisponíveis se você não tiver um amplo acesso à Justiça. E, nesse ponto, é importante que o debate seja técnico.
Nós temos hoje, com a revolução da informação, dados que podemos apreciar para fazer um design, ou seja, você fazer uma legislação eventualmente por jargões, como tem reclamação demais, existem aventuras jurídicas demais, isso é atécnico. Hoje, nós temos dados claros que nos mostram como é o perfil das demandas.
Eu evoco todos a buscarem o Justiça em Números, editado pelo CNJ. A Justiça do Trabalho tem um percentual prevalente de demandas sobre verbas decisórias. Que aventura é essa que é discutir se foi paga ou não uma verba rescisória? Isso é aventura? Não é.
Outro jargão muito comum: os juízes do Trabalho - e aí é uma crítica totalmente injusta - dão indenizações abstratas e incompatíveis com a realidade. Dos dados que nós temos, isso é patentemente falso. Os juízes do Trabalho - você faz até comparativos, várias universidades têm programas, se não me engano a própria Getúlio Vargas tem programa de jurimetria para medir - são extremamente moderados, seja nas indenizações, seja nas condenações. Isso pode ser comparado a outros ramos do Judiciário. Então, isso é inverídico. Os juízes do Trabalho têm plena temperança.
Ainda sobre essa dinâmica. Nós acreditamos, por ter participado do Estatuto do Trabalho, da discussão desse pré-projeto, que ele vai ao âmago do que é necessário na visão do Ministério Público. É preciso fortalecer a tutela coletiva, instrumentos de tutela coletiva, não só para o Ministério Público, mas um protagonismo dos trabalhadores na sua auto-organização. Sindicatos, organizações sindicais e organizações representativas de trabalhadores precisam ter mecanismos processuais para a tutela dos trabalhadores.
Aí eu já evoco o seguinte, o design é muito melhor: se você está preocupado com o custo das reclamações trabalhistas, com o custo da Justiça do Trabalho, fortaleça a tutela coletiva. Você expõe menos o trabalhador, você tem ganhos de escala.
Se hoje o Ministério Público pode afirmar que nós combatemos irregularidades em escalas, efeitos telescópicos, irregularidades sistêmicas, patentes, deliberadas em vários segmentos econômicos, nós precisamos ter mecanismos de tutela com anhos de escala também. Nesse particular, entendemos que o projeto anda bem, ampliando esse espaço. Deve ser progressivamente ampliado esse espaço da tutela coletiva e, ainda sobre essa questão do custo da Justiça do Trabalho, é necessário pontuar, e o Ministério Público do Trabalho tem tentado pontuar isso em todas as suas manifestações, em todas as suas participações, que existe aí um custo não contabilizado e que está sendo esquecido. Qual é o custo e o impacto social de um acidente prevenido? Aquele número que não aconteceu? Aquela morte que não aconteceu? Aquela invalidez que não aconteceu? Quando a estrutura de fiscalização do trabalho e toda essa rede protetiva, que é a fiscalização do Trabalho, o Ministério do Trabalho, a advocacia, que exerce um papel espetacular e, com o Estatuto, ganha espaço para ações promocionais, você tem os magistrados que estão lá na frente, fazendo essa efetivação, quando você tem um ganho de tutela inibitória, de práticas, cadê esse custo não contabilizado do ônus social que está sendo esquecido?
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Então, essa contabilidade desse jargão de que a Justiça do Trabalho custa muito já é errado de plano. Poderíamos discutir horas sobre a mensuração ou os critérios de mensuração, mas ele não está levando em consideração toda esta gama: qual é a essa efetividade? Qual é esse marco de dignidade humana que hoje a Justiça do Trabalho tem efetuado?
Nesse ponto, eu exorto, são posicionamentos que devem ser respeitados até porque são de múltiplas fontes. A Anamatra conduziu uma bela jornada, onde foram editados vários enunciados, e o Ministério Público do Trabalho corrobora. Não se pode retirar de um magistrado, seja ele qual for, o potencial de analisar uma norma à luz da Constituição. Isso, sim, é um retrocesso contra o regime democrático, porque a Constituição que traz... A última linha de defesa, a última linha de proteção da dignidade humana é a própria Constituição.
Então, entendemos que todo e qualquer magistrado tem de analisar isso. O Ministério Público do Trabalho não está aqui defendendo, de forma alguma, o desrespeito à lei, mas ele está defendendo o respeito à Constituição. Existe todo um processo institucional, os tribunais, nos quais eles vão afirmar ou não a constitucionalidade de determinados dispositivos, mas peremptoriamente negar essa possibilidade, isso, sim, é um retrocesso social.
O Ministério Público do Trabalho tem como manifestação, e a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho, que as questões de constitucionalidade têm de ser levadas, têm de ser dirimidas e dirimidas em todos os fóruns. Para isso, nós precisamos dialogar com a advocacia, precisamos dialogar com a própria magistratura, com o Congresso e com a própria sociedade. É esse espírito social que anima a Constituição que precisa ser vislumbrado.
Em particular, o Ministério Público do Trabalho analisa que nós precisamos de que esse debate seja amplo, participativo, englobe todos os segmentos sociais por conta do necessário design de que nós precisamos.
Outro jargão: a CLT está obsoleta. Esquecem-se de que ela foi constantemente reformulada; a magistratura fez interpretações, tem atuado no seu papel de uniformização dos entendimentos e das discussões; eu sou testemunha de que levou em consideração todos esses posicionamentos da jurisprudência.
Então, essa proposta já está sendo um ótimo ponto de partida pela sua legitimidade inicial. E ela deve ser constantemente aprimorada e discutida. Então, como última mensagem, Senador, o Ministério Público do Trabalho vai se pautar sempre por uma defesa intransigente dos direitos sociais e individuais indisponíveis. Para isso, é necessário que o Ministério Público vá...
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(Soa a campainha.)
O SR. AFONSO DE PAULA PINHEIRO ROCHA - ... dialogue, tenha interlocução com as instâncias legislativas, um papel democrático, sempre pautado pelo respeito, pelo acatamento recíproco, e que toda essa discussão seja pautada por dados objetivos.
Hoje nós precisamos verticalizar as análises, fugir de jargões e fazer o melhor design legislativo. Por quê? Porque nós estamos tratando da vida de pessoas. Nós estamos tratando do dia a dia de um sem número de trabalhadores que vão ter de ter acesso à jurisdição e, principalmente, no final do dia, eles só querem ver assegurados o seu direito, só querem saber que o seu trabalho tem dignidade, só querem poder olhar no espelho e se identificar como trabalhador.
O Ministério Público trabalha para que esse conceito de trabalho decente se torne difuso, torne-se prevalente na sociedade. É preciso que o trabalhador possa se olhar no espelho e resgate a noção de dignidade do trabalho. Eu sou um trabalhador, eu sou um empregado, eu tenho direitos. E, nessa postura, o Ministério Público adotará sempre essa posição intransigente de defesa desses direitos, de diálogo com as instituições e de busca do aprimoramento do design, seja da fiscalização, seja da identificação de ilícitos, seja na repressão.
Então, existem múltiplas questões processuais bem técnicas que poderíamos discutir, mas, neste momento inicial, o que nós precisamos é - talvez a principal mensagem do Ministério Público seja esta: afastar jargões, decidir com base em dados, descer a fundo no estudo desses dados, buscar métodos de contabilizar efetivamente todo esse ganho, todo esse efeito social positivo que a jurisdição trabalhista tem e a atuação das diversas instâncias na prevenção de ilícito e prevenção de irregularidades, seja prevenindo ilícitos fiscais, seja prevenindo sonegação de direitos posteriores ao contrato de trabalho...
É preciso uma discussão isenta, séria, livre de paixões e que será pautada por toda a sociedade. É desse consenso que nós entendemos que irá sair uma melhor proposta e um melhor design para toda a sociedade brasileira.
Eu agradeço muito.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, muito bem. Meus cumprimentos ao Dr. Afonso de Paula Pinheiro Rocha... (Palmas.)
Procurador do Trabalho, repito, Vice-Coordenador Nacional do Combate às Irregularidades Trabalhistas na Administração Pública - Conap, Ministério Público do Trabalho (MPT), representante da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), que faz uma fala equilibrada e na linha daquilo que eu defendo.
Tem de ser um projeto profundo, responsável, corajoso, mas que, efetivamente, faça justiça a isso que todos nós defendemos.
A Anjuli vai ter de se retirar. Então, a gente agradece muito a presença dela.
A SRª ANJULI TOSTES FARIA - Obrigada, Senador.
Permita-me só fazer um comentário breve. Amanhã está prevista para ser votada a Ação Direta de Inconstitucionalidade 5766, proposta pela PGR, que visa justamente atacar esses três dispositivos que eu falei, que dificultam o acesso do trabalhador à Justiça do Trabalho, que é o art. 790-B, 791-A e o art. 844, §2º.
Então, é muito importante que nós estejamos, como sociedade, atentos a esse julgamento e que façamos a pressão necessária para que os nossos ministros consigam enxergar, de fato, que o povo trabalhador, que o cidadão brasileiro está contra essas normas, que são absolutamente inconstitucionais.
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Obrigada a todos. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Anjuli. Obrigado pela colaboração.
Vamos esperar ter uma primeira vitória no Supremo amanhã, se a decisão for favorável, claro, ao povo, aos trabalhadores. Eu espero que seja.
Convidamos já para a Mesa também a Juíza Titular do Trabalho Ana Paula Alvarenga Martins, do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, que já se encontra aqui. E a Anjuli sai...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Integrante do Cesit.
Passamos a palavra agora ao Alex Myller, Auditor Fiscal do Trabalho, Delegado Sindical no Piauí, representante do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), que participou aqui... Tivemos 24 reuniões, com esta; ele participou acho que de 20.
O SR. ALEX MYLLER (Fora do microfone.) - Pelo menos...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Sempre presente aqui, colaborando com essa redação que nós queremos construir.
A primeira versão, Procurador, como V. Exª disse muito bem, vai ser apresentada na quinta. Aí a sociedade, no seu todo, vai continuar o debate, porque esta Subcomissão não encerra os trabalhos. Mas tínhamos que ter uma versão para apresentar para o debate na sociedade.
O SR. ALEX MYLLER - Primeiro, bom dia. Bom dia, Senador, que está aqui sempre nessa luta, como ele falou, de tantas reuniões. Já até cansou de me ver aqui. Bom dia, colegas de Mesa, Ana - que está aqui substituindo a Anjuli -, embelezando esta Mesa e também com a sabedoria própria das mulheres, que foi durante tanto tempo negada, tanto tempo colocada em lugares restritos, na obscuridade, e que finalmente pôde, no século XX, eclodir para que a gente pudesse ouvir isso de forma mais ampla, mais plena.
O que um auditor fiscal do trabalho, representante do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho, aqui pode falar sobre Direito Processual? A prática do auditor fiscal do trabalho é uma prática eminentemente do direito material do trabalho. Mas é importante que a gente entenda e perceba, talvez por essa prática ser eminentemente voltada para o direito material, os discursos que foram construídos ao longo de todo processo legislativo da reforma trabalhista - afinal de contas foi do Ministério do Trabalho que veio o projeto original, para a minha infelicidade -, que se transformou nessa Babilônia, nessa Torre de Babel, que é a reforma trabalhista, cheia de atecnias, cheia de contradições e, principalmente, de violações aos princípios básicos do Direito do Trabalho e, ao mesmo tempo, aos princípios constitucionais do Estado democrático de direito - a Anjuli citou alguns aqui.
Mas o principal móvel dela nesse campo processual foi sempre de que existiam muitas ações trabalhistas. Esse era o discurso. Foi isso que motivou construir um conjunto imenso de mecanismos na reforma para alterar o acesso ao Judiciário. A gente vai comentar rapidamente isso.
O que é importante lembrar é que, primeiro, é uma falácia dizer que a maior parte das ações judiciais no Brasil são trabalhistas. A maior parte das ações no Brasil não são trabalhistas; são, na verdade, no campo da Justiça estadual comum. A Justiça trabalhista não é responsável pela maior parte das ações. Em segundo lugar, boa parte das ações trabalhistas diz respeito a verbas salariais ou rescisórias - pelo menos metade aí; de tribunal para tribunal talvez varie um pouco, mas entre 40% e 65%.
Então, significa aquilo que já foi comentado aqui, ou seja, trata-se, na verdade, do debate judicial posterior aos vínculos, porque, como no Brasil a gente nunca conseguiu direito ao trabalho... A gente tem, como dizia às vezes aquela pessoa simples do interior, o direito de trabalhar; na verdade, ele quer dizer o dever de trabalhar, para não morrer de fome.
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Como a gente nunca teve direito ao trabalho e continua sem ter no Brasil, a gente não pode debater com o empregador. O empregado não pode debater com o seu empregador no curso da relação, porque fatalmente ele é dispensado. Então, é algo também que precisa o Estatuto trabalhar. E há uma fala no Estatuto sobre isso também.
Mas o que eu queria comentar sobre isso é que a estratégia foi dupla. Então, de um lado, você rebaixa o patamar civilizatório no direito material e, do pouco que sobrar desse patamar civilizatório - que já é o mínimo -, você impede que a pessoa faça a persecução judicial. Então, a reforma trabalhista tem esta dupla face: de um lado, ela tira seu direito como trabalhador; e, de outro, impede que você, do pouco que restou, possa cobrar esses direitos caso eles sejam desrespeitados. Como eu comentei, raramente esses direitos são perseguidos judicialmente durante a relação de trabalho. Frequentemente, só após o término da relação de emprego, o trabalhador vai discutir isso - salvo raras exceções.
Então, o intento claro no campo processual, como se pode ver e já foi até comentado aqui, foi, de um lado, coibir o acesso dos trabalhadores ao Judiciário - e aí já foi comentado pela Noêmia, numa fala muito inspirada mesmo, que é para amedrontar mesmo, é para inibir - e, por outro lado, limitar a própria atuação do Judiciário trabalhista, obviamente de modo inconstitucional, querendo, inclusive, dizer como tem que ser feita a interpretação, que ele não pode interpretar assim e assado, que ele tem que respeitar tais e tais princípios tirados da cartola lá pelo legislador, como o da autonomia privada coletiva, não sei nem o que ele quis dizer ali com esse princípio da forma como foi colocado.
Então, basicamente é este conjunto, ou seja, a reforma trabalhista no campo processual é um conjunto de maldades que, se no direito material são flagrantes, no direito processual foram feitas com requintes de crueldade. Então, é aquela situação que foi dita aqui de o trabalhador, ao ingressar com uma ação para demandar muitas vezes só suas verbas que são negadas ao longo do contrato, ao final, ter ainda que pagar ou ter descontado desses valores, que frequentemente são quase sempre reduzidos na Justiça por conta da questão dos acordos - porque ele acaba se sentindo obrigado a fazer o acordo pela necessidade mesmo. Como nós estamos falando de trabalho, nós estamos falando de salário, de verbas que são de caráter alimentar. E a fome não espera. Então, frequentemente o trabalhador já é obrigado muitas vezes a, daquele conjunto de verbas que ele demandava, ter que abdicar de uma parte, obviamente assistido pela autoridade judicial, pelo juiz, e, portanto, dentro do razoável. Mas, de alguma forma, imagine agora ter que pagar, ter que compensar o pouco que ele já ganharia naquilo ali!
Então, a primeira questão é esta: pensar que a reforma trabalhista teve essa dupla face. No campo processual, poderíamos até dizer que conceder o direito e a gente não ter como perseguir esse direito judicialmente é quase o mesmo que não ser concedido, porque essa é basicamente a forma de se buscar isso na civilização atual ocidental.
Claro, a gente atua na inspeção do trabalho no campo material, mas, hoje, os auditores fiscais do trabalho, como a gente já comentou, são dois mil duzentos e alguma coisa e, a cada mês, diminui. Então, nós somos menos de dois terços do quadro global, que é menos do que talvez seja metade da necessidade do País - esse quadro de 3,6 mil, que só são 2,2 mil na ativa. Então, se você não tem como atacar isso no coletivo, no grupal ou da forma como a fiscalização interage nas empresas, você vai para o campo judicial; e o objetivo, portanto, era realmente coibir essa atuação.
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Portanto, nós auditores fiscais do trabalho podemos apenas fazer algumas reflexões do ponto de vista geral e algumas bem particulares acerca do que seria importante para um novo Estatuto do Trabalho, diante do grotesco que se tornou o processo do trabalho como está na reforma trabalhista.
Uma primeira questão, de forma geral - e aí eu acho que vale para uma reflexão como um todo para os que trabalham com Direito, eu nem gosto da expressão operadores, mas que trabalham com Direito, os profissionais do Direito -, é que o Direito Processual do Trabalho permaneça, como sabiamente foi pensado na CLT, instrumental, privilegiando a efetiva realização do direito material, e não como um fim em si mesmo.
E eu acho que é sábio, quando você coloca o código processual junto do código material, como foi feito na CLT, porque você coloca a serviço daqueles direitos que são efetivamente o conteúdo real das relações, todo procedimento técnico, que realmente vai ser do jargão dos profissionais do Direito, vai ser toda aquela parte organizacional dessa estrutura pela qual eu busco aquela realização em última razão, que é o Judiciário, porque é quem vai dar a palavra final.
Então, que ele permaneça assim: instrumental, porque o que a gente tem observado é que muitas vezes as pessoas deixam de gozar seus direitos, em qualquer que seja o campo, por conta de questões meramente processuais e formais que obviamente são importantes; o Direito Processual do Trabalho já tem uma riqueza nisso. Eu acho que essa riqueza do Direito Processual do Trabalho, que é essa informalidade, esse privilégio do direito material, acabou sendo levado para outro tipo de Direito, o Direito Processual Civil, porque é justamente nesse sentido que tem de caminhar o processo. Por outro lado, que ele permaneça dinâmico e célere - e a gente sabe que a Justiça do Trabalho é a Justiça mais célere do nosso País. Que ele permaneça dinâmico e célere, com a integração definitiva dos avanços informatizados ao cotidiano processual, que é algo que já tinha acontecido, principalmente na Justiça do Trabalho. Que permaneça assim, que avance e aponte no sentido de permanecer assim.
Algo em que o Direito Administrativo, por exemplo, a parte processual administrativa, precisa também avançar, inclusive para permitir o que eu também sugeriria aqui: uma integração, uma aproximação maior entre a questão administrativa, o procedimento administrativo, que se chama processo administrativo, e o próprio processo judicial, inclusive com a possibilidade de que esses elementos eletrônicos sejam migrados de um para outro livremente.
Eu teria duas considerações mais específicas: basicamente, a partir da ampliação das competências da Justiça do Trabalho na Emenda Constitucional 45, houve obviamente a migração dos processos que tratavam de ações judiciais contra atos da inspeção do trabalho. E a Justiça do Trabalho, ainda bem, porque é quem tem condições realmente de julgar isso, pode julgar esses atos administrativos em última e definitiva análise. Penso que, como foi trazido e como não foi repensada, não foi modificada a CLT para isso, talvez fosse necessária a constituição de um rito próprio para essas ações, pelo menos, bem simplificado, de modo que pudesse levar em conta as peculiaridades da atividade de inspeção.
Por exemplo, nas ações contra autos de infração, muitas vezes os colegas têm que estar presentes, ou os chefes dos setores de multas e recursos, ou os próprios auditores e, por conta da estrutura atual do processo do trabalho, às vezes se propõe um acordo entre as partes, o que é impossível para gente. Então, aquela audiência inaugural ali, que de certo modo tenta uma conciliação, sequer é possível para a inspeção do trabalho. Então, não tem sentido e, às vezes, só se perde tempo com isso. É preciso pensar um rito que ultrapasse esse tipo de aporia e que avance para levar em conta essa especificidade.
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Outra coisa que acho importante também relembrar é quando há os embargos e as interdições, quando os auditores fiscais do trabalho fazem embargos e interdições e frequentemente essas questões são levadas para o Judiciário. De fato, é o juiz que vai dar a palavra final sempre, mas é importante lembrar - e talvez o processo judicial do trabalho possa espelhar isto - que os embargos e as interdições são feitos com base técnica, numa verificação in loco de condições que geraram, naquele momento do flagrante, grave e iminente risco para a saúde e a segurança dos trabalhadores. Então, o levantamento de um embargo de interdição, por qualquer que seja a autoridade, inclusive pelo próprio auditor que o realizou, e também pela autoridade judicial, tem que ser muito cauteloso, porque a autoridade judicial muitas vezes não está presente no momento em que a situação de grave e iminente risco acontece.
Então, é importante que, tendo inclusive essa possibilidade, que até está prevista no Estatuto - a gente fez lá, colocamos isso na redação -, a autoridade judicial e o processo do trabalho lembre isso, seja capaz de espelhar isso, lembre essa questão técnica muito particular dos embargos e interdições.
Basicamente são essas as contribuições em que a gente precisaria talvez pensar para aperfeiçoar um novo Estatuto do Trabalho. E, principalmente, obviamente, que o processo do trabalho sirva para a realização daquela promessa que está no art. 7º da Constituição, que aqueles direitos possam realmente ser, se não respeitados no âmbito das próprias relações, do contrato, durante e posteriormente a essas relações, devidamente perseguidos judicialmente.
Eu queria, para terminar a minha fala, dizer que todos nós que estamos convidados para uma cerimônia de abertura de uma exposição que o Sinait está montando aqui, no próprio Senado, às 12h30, ali no Espaço Cultural Evandro Cunha Lima, no corredor de acesso ao Anexo 1, que é a exposição fotográfica: "Sobre o peso das correntes nos teus ombros", que a gente já imagina sobre o que fala. Então, que a gente possa ver o que realmente é o desrespeito pleno ao direito material do trabalho, que marca as vidas dos trabalhadores brasileiros em muitas situações, às vezes até o limite da escravização.
É isso que eu queria falar.
Agradeço a oportunidade. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - O Alex Myller, Auditor Fiscal do Trabalho, Delegado Sindical no Piauí e representante do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), sempre esteve, de forma permanente aqui, colaborando com essa elaboração.
Eu estava aqui no celular infelizmente, porque as pessoas todas estão perguntando como é que se participa no dia 10. Eu estou dizendo que venham... Alguns dizem que precisam - é o caso agora de um - voltar no mesmo dia. Claro. A gente vai iniciar às 9h da manhã, mas até as 6h da tarde vai estar todo mundo liberado. É a apresentação de uma nova CLT, são cerca de 900 artigos. Então, nós vamos fazer o dia todo de debate aqui. Assim, o País vai ficar sabendo como está essa formulação. Então, para aqueles que estão nos assistindo: podem marcar o último voo da noite. Tem um companheiro meu, o Toni, estamos, então, projetando... Já informamos que, para o Rio Grande do Sul, tem um voo às 20h45. O.k.?
Há de tudo aqui no meio, viu?
Agora, passamos a palavra para o Dr. Maurício de Figueiredo Correa da Veiga, representante do Conselho Federal da OAB.
O SR. MAURÍCIO DE FIGUEIREDO CORREA DA VEIGA - Exmo Sr. Senador Paulo Paim, Presidente desta Comissão de Direitos Humanos e Legislação participativa, em nome de quem cumprimento todas as autoridades aqui presentes, é uma alegria e uma honra muito grande poder participar desse debate, Senador.
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O momento é de reflexão. Atravessamos uma quadra diferente da nossa sociedade. Falo aqui em nome do Conselho Federal da OAB e trago algumas palavras iniciais no sentido de que o Conselho Federal da Ordem ainda não tem um posicionamento definido acerca desta questão do debate sobre o Direito Processual do Trabalho, que é a finalidade desta audiência pública.
É bem verdade que, pessoalmente, creio que um Código de Processo do Trabalho seria algo muito salutar, tendo em vista que hoje nossas regras processuais do Direito do Trabalho são mais ou menos um remendo, algo emprestado do Código de Processo Civil, com algumas técnicas relacionadas...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Se me permite, a nossa intenção, depois dessa primeira versão, é ter um encontro na OAB, quem sabe uma audiência pública lá na OAB.
O SR. MAURÍCIO DE FIGUEIREDO CORREA DA VEIGA - Perfeito; exatamente onde poderíamos discutir essas questões.
Hoje nós temos, na Justiça do Trabalho, a contagem dos prazos processuais em dias úteis, que foi algo emprestado da Justiça Comum, porque a Justiça do Trabalho sempre se notabilizou por sua celeridade, ou seja, os prazos eram contínuos ali, sem nenhum tipo de interrupção ou suspensão.
Temos também a própria questão do recurso de revista - e, aqui, sim, falando como advogado, militante na Justiça do Trabalho desde que me formei, no ano 2000. O recurso de revista hoje exige uma técnica muito mais apurada para sua interposição. E essa técnica, ou seja, essa transformação já é algo que vem desde a Lei 13.015, de 2014, quando se exigiu o cotejo analítico de tese com violação ou divergência jurisprudencial como requisito intrínseco de admissibilidade do apelo. E hoje nós temos que observar o princípio da transcendência, ou seja, demonstrar a transcendência política, jurídica, econômica e social. Ou seja, é algo que exige ali uma técnica muito maior, muito mais apurada, sem dúvida nenhuma, e isso merece um debate dentro dessa linha do Direito Processual do Trabalho.
Gostaria também, tendo em vista que a maioria dos debates aqui foi em relação à própria reforma trabalhista, de trazer alguns casos, Sr. Senador, e também algumas considerações.
Evidentemente que a OAB sempre vai defender uma interpretação de qualquer lei à luz da Constituição Federal. Há muito tempo já está ultrapassado aquele brocardo, aquele princípio de que o juiz é a boca da lei. Ele tem autonomia e liberdade para fazer sua interpretação. Agora, é muito preocupante quando há um argumento ad terrorem no sentido de que a lei não vai ser cumprida de forma alguma. Isso, inclusive, prejudica o próprio aumento do emprego, porque o próprio empresariado vai ficar com uma dúvida.
Hoje existe uma dúvida, uma insegurança muito grande. E por que uma insegurança? Porque nós temos, pelo menos, quatro ou cinco tipos de trabalhadores: aquele que foi contratado sob a égide da CLT antiga; aquele que foi contratado sob a égide da Lei 13.467, de 2017, que durou quatro dias, até a vigência da medida provisória 808, porque daí é outro tipo de trabalhador que está submetido a essa regra; e temos agora, desde o dia 23 de abril, aquele trabalhador que está contratado sob a égide da Lei 13.467 sem a MP, que caducou.
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Ou seja, houve também essa letargia do próprio Congresso em processar e cumprir aquele acordo que tinha sido feito inicialmente, porque a MP trouxe alguns balizamentos, inclusive no tocante ao trabalho intermitente.
Então, eu gostaria de trazer aqui alguns pontos, porque acho que todo debate, para ser rico, merece ponto e contraponto, porque, senão, não é um debate; é só um mero palanque, porque todos vão falar a mesma questão. Gostaria de trazer, inclusive - fruto da experiência de uma advocacia militante na Justiça do Trabalho -, que a reforma trabalhista, cujas várias críticas aqui são absolutamente pertinentes, inclusive, pela forma como foi conduzida, tem aspectos positivos. Dentre eles se pode destacar, por exemplo, uma maior autoridade ou conhecimento da autoridade da entidade sindical. O princípio da autonomia negocial coletiva está na própria Constituição.
E aqui eu trago um exemplo no sentido de que o próprio Supremo Tribunal Federal tem reconhecido a validade dos acordos e convenções coletivas, mesmo antes da reforma trabalhista. Eu ousaria dizer, inclusive, que foi o Supremo Tribunal Federal que começou a efetiva reforma trabalhista, a mudar um paradigma, quando, no julgamento do processo, naquele leading case do PDV do Besc e depois no processo da Usina Central Olho d'Água, disse que, quando se trata do direito coletivo, essa hipossuficiência do trabalhador deve ser mitigada, porque você está em pé de igualdade; é entidade sindical que vai negociar com o empregador. E é por isso que a reforma trabalhista vem nesse sentido, inclusive ela vem até frear a decisão do Supremo, porque o próprio art. 611-B disciplina quais são as rubricas que não podem ser objeto de negociação coletiva, e para o Supremo Tribunal Federal não havia esse balizamento.
Portanto, gostaria de trazer esses destaques para que a reforma não seja tratada apenas como algo que só retira direito, que seja um verdadeiro retrocesso. Não estou dizendo que não há, mas gostaria de enfatizar esses pontos, tendo em vista que todos os pontos negativos já foram enfatizados. Lamento muito que um membro do Ministério Público do Trabalho e advogadas que estiveram aqui presentes, que falaram com muita propriedade, não estejam aqui, justamente para que este debate pudesse ser travado, e um debate desarmado, sem ideologia, ou seja, apenas com questões técnicas, com práticas de experiência de vida.
É claro que se houver um abuso, ou seja, aquele trabalhador humilde, hipossuficiente, vai ter acesso ao Judiciário. E sabe por que vai, Sr. Senador? Porque eu confio nos juízes do trabalho do meu País, tenho uma grande confiança nesta instituição, que é a Justiça do Trabalho, tenho uma grande confiança no Ministério Público do Trabalho, que tem que fazer mesmo valer as ações coletivas.
Agora, claro que toda ação provoca uma reação. Estamos diante de uma reação que pode ser exacerbada. Então, o ideal é que haja equilíbrio, é que haja bom senso para que essa maturidade, esse equilíbrio seja atingido. Se você puxa o pêndulo para um extremo, quando você solta, ele vai para o outro.
Então, quando você diz que as custas processuais, ou seja, que você não vai ter o acesso, vai ter que pagar as custas quando...
(Soa a campainha.)
O SR. MAURÍCIO DE FIGUEIREDO CORREA DA VEIGA - ... houver uma sucumbência parcial, é justamente para evitar casos como já aconteceram, que o TST já decidiu, de um empregado que ganhou mais de R$1 milhão numa causa e teve o benefício de gratuidade de Justiça na outra. Ou seja, é para evitar esses abusos. Isso precisa ser trazido ao conhecimento para que haja este debate, para que possamos chegar a um ponto de equilíbrio. Isso é o fundamental.
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Sobre ações de indenização por dano moral, eu fiz um levantamento a pedido do site Consultor Jurídico, no final do ano de 2016, com decisões da Justiça do Trabalho acerca de valores de indenização, e o TST teve um papel fundamental para podar, para diminuir os excessos. Agora, chegar até ao TST é difícil, porque é uma instância extraordinária. Não é simplesmente uma corte revisora, uma corte recursal pura e simples; é uma instância extraordinária. Há exemplos, inclusive, que eu posso mencionar alguns aqui - é algo público, tendo em vista que foi um trabalho acadêmico. Houve um empregado, por exemplo, que teve o seu armário arrombado no trabalho, e o TRT deferiu uma indenização de R$1 milhão para ele. Como aquele recurso reunia condições de admissibilidade, de conhecimento e provimento, o TST deu provimento ao recurso para reduzir muito essa decisão. Isso é fundamental, justamente para que a Justiça do Trabalho possa ter a sua credibilidade, para que não seja desacreditada. Não adianta haver aquele juiz Robin Hood, porque isso não vai dar certo. O Supremo Tribunal não vai deixar. Precisamos ter maturidade e equilíbrio para enfrentar todas essas questões.
Hoje, por exemplo, eu estou com um caso de uma empresa de consórcios que teve seus bens bloqueados antes mesmo de a sentença ser proferida, tendo em vista que o juiz de primeiro grau entendeu ali que havia um grupo econômico, ou seja, ignorou o próprio incidente de desconstituição da personalidade jurídica, e provoca um verdadeiro abuso. Portanto, é justamente para coibir esses abusos. Claro: são regra? Evidentemente que não. São casos isolados. É por isso que vem uma legislação nesse sentido.
Portanto, o que se espera é que haja o equilíbrio, que haja maturidade para que possamos chegar ao meio-termo, em que todos esses conflitos sociais possam ser harmonizados, possam ser afastados. Eu gostaria de dizer aqui que confio, acredito muito na Justiça do Trabalho do meu País. Os exemplos que eu trouxe são casos isolados, que justificam uma medida enérgica sinceramente talvez para poder fazer um contraponto, mas a ideia é que se chegue a um momento de equilíbrio. Eu gostaria só de dizer aqui - talvez até como voz dissonante - que, apesar de todas as mazelas que foram reiteradas aqui, existem pontos positivos na reforma trabalhista.
Outro ponto também que eu destaco é o trabalhador intermitente. O trabalhador intermitente já é uma realidade, já existe no nosso País, só que, até a vigência da Lei 13.467, ficava escondido, ou seja, não tinha direito absolutamente algum. Vamos trazer o exemplo aqui de um trabalhador de hotel, por exemplo daqueles hotéis que só funcionam final de semana. Ele presta os seus serviços em determinados momentos, de acordo com o aumento da demanda. Até a vigência da lei, esse trabalhador era inexistente, não tinha carteira assinada, não contribuía, não tinha nenhum direito. Hoje, ele passa a ter.
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Evidentemente, a própria medida provisória trazia elementos que regulamentavam as atividades, ou seja, o próprio pagamento de multa, etc, e a MP caiu. Nós precisamos acabar com essa hipocrisia que existe no Brasil e tirar a venda dos olhos para reconhecer relações que efetivamente já existem, para trazer, então, para a formalidade esse tipo de trabalhadores.
Portanto, Sr. Presidente, eu agradeço muito a oportunidade de estar aqui, enaltecendo o trabalho de V. Exª, que tem conduzido com maestria esta Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Obrigado, Dr. Maurício de Figueiredo Correa da Veiga, representante do Conselho Federal da OAB.
Vou passar a palavra, em seguida, para o nosso próximo convidado.
É claro que existem algumas discordâncias, o que é natural. Por isso, eu defendo tanto a democracia.
V. Exª falou uma frase, e eu vou pegar só ela: o pêndulo. O pêndulo só foi para o lado do empregador. Sabe como é que eu chamo essa proposta? Não mais CLT, mas CLE, Consolidação das Leis do Empregador. Sabe onde ela foi feita, a última versão? Na sede da CNI aqui em Brasília. Eu tenho os documentos que provam isso, que mostram quem estava lá. Passaram-na para o relator na Câmara, ele assinou embaixo e a mandou para a Câmara. Na Câmara, eles a aprovaram, e ela veio para o Senado. No Senado, não mexeram em uma vírgula. V. Exª também sabe que existe uma série de contradições aí. Como é que o Senado da República aprova um projeto com 117 artigos sem mexer numa vírgula? Isso é tão grave, que o próprio Governo reconheceu - assim eles falaram no plenário - que tinha de vetar oito artigos. Isso o alto aparato do Governo disse, e disse até para os empresários, eu acho. Não vetou nenhum! Depois, disseram: "Vamos fazer uma medida provisória para resolver." Baixaram a medida provisória e não a instalaram - eu fazia parte -, nem presidente, nem relator, e ficou por isso mesmo.
Então, o pêndulo só foi para um lado. V. Exª fez algumas considerações. É claro que a gente vai aprofundar o debate. Essa é a intenção. A leitura será feita amanhã, e nós vamos, inclusive, à OAB fazer o bom debate lá, vamos ao Ministério Público. O erro para mim dos empresários... Eu respeito os empresários; eles sabem que eu os respeito. Pergunte para mim com quantas ações eu entrei na Justiça, em todo o meu período em que eu estive nas fábricas. Nenhuma, nenhuma! Por que nenhuma? Porque, naturalmente, como eu presidia a Cipa, como eu presidi comissão de fábrica, comigo não tinha muito papo, não! Eu tinha de acertar e acertar. E acertei tudo. Mas é um caso diferenciado.
A parte mais vulnerável - e o princípio é o do Direito, só estou dando uma introdução - é a parte do trabalhador. Como é que se faz uma livre negociação num país onde a concentração de renda é praticamente a maior do mundo, onde seis famílias têm o controle de 51% de tudo que aqui é produzido? Eu dei os dados aqui, antes da miséria absoluta que impera. Numa negociação, quem tem força? E eu venho dessa área sindical. Não vamos dizer que é o trabalhador. Quem tem a caneta na mão para demitir e admitir é quem tem força. Nós sabemos disso. Queiramos ou não, é a lei quase de quem tem a força de admitir e demitir.
Eu sempre dou o exemplo, só para refletir um pouquinho - esta é uma reflexão aqui -, do Fundo de Garantia. Eu fui do tempo do Fundo de Garantia. O que diz ali? Você poderá optar pelo Fundo de Garantia ou não. Eu tinha estabilidade. O que eu tive de fazer? Tive de optar, senão eu estava demitido. Você tem uma opção, você vai "optar" - entre aspas - ou vai ser demitido. E assim foram todos.
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No debate aqui, eu cheguei a dizer: "Se me apresentarem um trabalhador neste País que não teve de optar pelo Fundo de Garantia, eu mudo o discurso." Não achei nenhum. O desafio ficou aqui com todo o Plenário.
Então, a livre negociação no Brasil é uma farsa. Sou obrigado a dizer isso, assumo essa responsabilidade.
O Dr. Guilherme está chegando aqui. Isso é muito bom.
É um debate que vamos fazer no momento certo, e não cabia nem a mim fazer essa análise aqui agora.
Vou, de imediato, passar a palavra para a Juíza do Trabalho, titular, Ana Paula Alvarenga Martins, do Tribunal Regional Trabalho da 15ª Região e integrante do Cesit.
Eu queria já convidar o Dr. Guilherme para que passasse para a Mesa, Guilherme Guimarães Feliciano, Presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), que foi um colaborador intenso aqui, em todas essas mais de 20 reuniões que tivemos para poder apresentar o trabalho a vocês. Peço uma salva de palmas ao Dr. Guilherme. (Palmas.)
De imediato, a palavra está com a senhora.
A SRª ANA PAULA ALVARENGA MARTINS - Bom dia a todas e todos!
É uma imensa honra estar aqui a convite do Senador Paulo Paim, em nome de quem cumprimento todos os presentes.
A audiência pública é feita para a discussão do processo do trabalho, mas me coube falar após o Dr. Maurício de Figueiredo, e, como ele convidou para o debate, eu vou aceitar o convite. Vou começar dizendo, Senador, que o senhor chama a reforma trabalhista de CLE, e eu costumo chamar de "deforma trabalhista". Ao contrário do Dr. Maurício, eu não vejo nada na reforma trabalhista que possa representar um avanço, tanto em termos de direito material do trabalho, de direito dos trabalhadores, quanto também em termos de direito processual.
Não vou entrar agora no debate sobre contrato intermitente, até para não fugir do tema da nossa audiência pública. Vou procurar me ater ao tema da audiência, que é uma audiência para debater o processo do trabalho.
Alguns que me precederam aqui já fizeram referência aos argumentos dos defensores da reforma ou dos defensores da Lei 13.467 e, dentre esses argumentos, fizeram referência ao excesso de demandas judiciais tramitando no Judiciário trabalhista. Realmente, o Judiciário trabalhista está assoberbado de demandas. Não há como negar a quantidade excessiva de ações judiciais que são distribuídas anualmente. Entretanto, não basta afirmar que há um número excessivo de demandas, é muito importante perquirir qual a razão desse excesso de demanda. E, quando nós buscamos dados oficiais, produzidos pelo Conselho Nacional de Justiça, Senador, nós verificamos que quase 50% das reclamações trabalhistas debatem o não pagamento de verbas rescisórias.
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Portanto, o que conduz a esse excesso de demandas na Justiça do Trabalho é o descumprimento sistemático da legislação do trabalho, é o descumprimento sistemático dos mais basilares direitos dos trabalhadores brasileiros, é o não pagamento de verbas decorrentes da extinção do contrato de trabalho. Então, nós temos de olhar para essa realidade, não apenas para a quantidade de demandas, mas, sim, para que tipo de demanda o Judiciário trabalhista está julgando no seu dia a dia.
Isto é muito preocupante: nós temos quase 50% de demandas para que o Judiciário possa determinar o pagamento de verbas rescisórias ao trabalhador brasileiro. Esses são dados oficiais. Isso demonstra a falácia do argumento de que há uma excessiva judicialização. Na verdade, há um excessivo descumprimento da legislação do trabalho. Essa é a realidade. Esse é o primeiro aspecto que eu gostaria de pontuar.
Segundo aspecto: eu fui convidada para falar sobre o direito processual, e, para falar de direito processual, nós precisamos entender qual a razão de termos normas de caráter processual, qual a razão de termos normas que vão regulamentar os procedimentos perante o Judiciário, especificamente perante o Judiciário trabalhista. E aí nós temos de olhar para essas normas e pensar o seguinte: para que servem essas normas? Essas normas são instrumentos. Mas são instrumentos para alcançar qual finalidade? É um instrumento para atribuir efetividade a direitos que não foram observados espontaneamente por aqueles que teriam a obrigação legal de fazê-lo.
Então, as normas processuais são normas que visam a alcançar a efetividade de direitos. É nessa lógica que eu preciso pensar essas normas. O que nós vimos na Lei 13.467 é uma lógica inversa a essa. Todas as normas processuais que foram estabelecidas pela "deforma trabalhista" são normas processuais que denegam o acesso à Justiça, lembrando que o acesso à Justiça é uma garantia constitucional. Então...
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Eu fui Constituinte. Só fica amarrado ali se eu não quiser.
A SRª ANA PAULA ALVARENGA MARTINS - Sim, exatamente!
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Mas só que eu quero, não é?
A SRª ANA PAULA ALVARENGA MARTINS - Sim, exatamente!
Então, denegam o acesso à Justiça, dificultam o acesso à Justiça, dificultam o acesso a uma garantia constitucional. Quais normas levam a isso? As normas que tratam, por exemplo, da Justiça gratuita. Há uma limitação na lei atual ao deferimento de Justiça gratuita ou aos benefícios da Justiça gratuita que nós não encontramos em nenhuma outra norma processual do nosso País, nem mesmo no direito processual civil, que é a norma geral.
O processo do trabalho hoje traz normas que dificultam sobremaneira o acesso do trabalhador ao Judiciário. Isso já foi dito aqui também antes. Mas por que isso? Qual a razão para termos essas normas? O objetivo é muito claro. O objetivo do legislador foi o de inviabilizar a Justiça do Trabalho. E por qual razão ele quis inviabilizar a Justiça do Trabalho? Porque ela é a Justiça mais célere, a Justiça mais efetiva que nós temos no nosso País, é a Justiça que incomoda. A Justiça do Trabalho incomoda. Ela incomoda os poderosos: "Eu preciso acabar com essa Justiça do Trabalho." E há alguns mecanismos para isso. O primeiro mecanismo é fechar o acesso a essa Justiça, tornando o acesso a essa Justiça um acesso caro, dificultando ao trabalhador que possa apresentar, perante o Judiciário, as suas reclamações pela inobservância dos seus direitos. Mas o legislador, como disse o Alex, foi mais do que maldoso, a maldade foi extrema. Ele fecha o acesso por um lado e, por outro lado, limita a atuação dos juízes do trabalho.
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Então, há regras na atual lei que inviabilizam ou que procuram inviabilizar a autonomia de interpretação dos juízes trabalhistas.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Eu me lembro disso. Eu fui relator. E exatamente eu disse isso aqui.
A SRª ANA PAULA ALVARENGA MARTINS - Exatamente, exatamente!
Com isso, eu vou levar a Justiça do Trabalho ao fim, porque eu não tenho acesso e eu limito a atuação dos juízes. Então, esses são dois aspectos da lei atual, e me parece que nós temos de atuar na contramão desses dois aspectos.
O acesso à Justiça precisa ser amplificado, não apenas tornando a Justiça acessível sob o ponto de vista econômico e financeiro, sem cobrança de custas e honorários periciais para os trabalhadores brasileiros, que - chamo a atenção -, na sua grande maioria, são pobres. Os reclamantes que estão na Justiça do Trabalho não são os grandes diretores de multinacionais, não, mas são os trabalhadores, em sua maioria, desempregados! Esses trabalhadores não têm condições de arcar com as despesas de um processo judicial. É dever do Estado conceder a esses trabalhadores a gratuidade de Justiça. O acesso à Justiça passa pela gratuidade da Justiça. E não é só isso.
(Soa a campainha.)
A SRª ANA PAULA ALVARENGA MARTINS - O acesso à Justiça passa também pela capilaridade da Justiça do Trabalho. Quanto mais Varas do Trabalho nós tivermos em todos os rincões deste País, mais acesso nós teremos garantido a esses trabalhadores.
Então, esse é um aspecto que tem de ser observado com muito cuidado nesse projeto de uma nova CLT. Nós precisamos de normas processuais que atribuam acesso à Justiça, que garantam efetivamente o acesso à Justiça, que não tragam restrições a esse acesso à Justiça.
Eu gostaria apenas de mencionar também um dado recente com relação às regras...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - A senhora tem mais seis minutos ainda.
A SRª ANA PAULA ALVARENGA MARTINS - O.k.!
Quero trazer um dado com relação às regras que foram já impostas. Nós já vimos, neste primeiro quadrimestre de 2017, uma redução de demandas trabalhistas. Há uma variação de uma Vara do Trabalho para outra e também entre Tribunais Regionais do Trabalho, mas houve uma redução de 30% a 50% das ações que foram ajuizadas neste primeiro quadrimestre. Essa redução não ocorreu por que as obrigações trabalhistas passaram a ser cumpridas espontaneamente, como que por um milagre, neste ano de 2018. Na verdade, essa redução ocorreu porque os trabalhadores hoje têm receio de buscar a Justiça. Precisamos pensar nisso, pensar que o Judiciário não é mais acessível, pensar que o trabalhador tem medo de buscar a Justiça.
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Apenas quero continuar aqui no debate com o Dr. Maurício.
Dr. Maurício, usando as palavras do senhor, os casos que o senhor mencionou, a casuística, sempre haverá algum exemplo para ser mencionado. Entretanto, a regra não pode ser feita para atender a exemplos específicos, que, como o senhor mesmo disse, são absolutamente minoritários. A regra precisa ser feita para atender de forma geral. Portanto, eu não posso sonegar o acesso porque, em um ou outro caso, um trabalhador, por alguma razão, acessou irresponsavelmente o Judiciário. Então, a casuística não pode ser parâmetro para o estabelecimento de regras de caráter geral.
Outro aspecto que me parece muito importante e que ainda não foi mencionado nesta audiência pública se refere ao cumprimento da decisão judicial. Infelizmente, no Brasil, nós temos uma característica que nem sempre é mencionada e que não é uma característica de outros países: as decisões judiciais, as decisões proferidas pelo Judiciário brasileiro são costumeiramente descumpridas. Não há um cumprimento espontâneo. Quando a Justiça do Trabalho condena o empregador ao pagamento de verbas trabalhistas, quaisquer que sejam essas verbas trabalhistas, espera-se que, após decorridos todos os recursos cabíveis contra aquela decisão, esse empregador vá cumprir essa decisão. Mas não é isso o que nós verificamos. As decisões do Judiciário trabalhista são sistematicamente descumpridas. E o fato de elas serem descumpridas exige que o Judiciário adote medidas para que esse cumprimento ocorra de forma coercitiva.
Portanto, a fase do processo que nós chamamos de cumprimento da decisão judicial se torna extremamente importante, porque o processo somente será um instrumento de efetividade do direito se a decisão judicial for cumprida, for efetivada. De nada adianta uma decisão judicial para ser emoldurada num quadro e colocada na parede; ela precisa ser cumprida.
Então, é muito importante termos um olhar, na elaboração dessa norma processual, para esta fase do processo, a fase do cumprimento da decisão judicial, a chamada fase de execução. E a atual Lei 13.467 regrediu anos nesse aspecto, não trouxe nenhuma melhoria para essa fase do processo trabalhista, pelo contrário.
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Hoje, o Código de Processo Civil brasileiro tem normas muito modernas sobre o cumprimento da decisão judicial, que, inclusive, Dr. Maurício, respaldam o bloqueio antes mesmo da sentença. Muitas vezes, é necessário o bloqueio de bens antes mesmo de ser proferida uma sentença judicial. Por que é necessário? Porque, muitas vezes, se verifica a dilapidação de um patrimônio. E essa é uma medida acautelatória, porque, se ela não for adotada, mais na frente, quando essa decisão judicial for tomada, ela não será efetiva, porque ela não se cumprirá espontaneamente, e aquele devedor não terá mais bens para que o Estado possa buscar nestes bens a efetividade da decisão judicial.
Então, há as tutelas de urgência, as tutelas de evidência, as tutelas de natureza cautelar, o cumprimento provisório de decisões judiciais, sobretudo porque nós estamos falando de créditos de natureza alimentar. O crédito trabalhista é de natureza alimentar, e o trabalhador não pode esperar anos a fio até o término dos recursos judiciais.
(Soa a campainha.)
A SRª ANA PAULA ALVARENGA MARTINS - O trabalhador precisa receber os seus créditos porque ele precisa se alimentar, e esse crédito representa o seu alimento.
Então, essas medidas são absolutamente necessárias. O Código de Processo Civil brasileiro prevê todas essas possibilidades, mas a Lei 13.467 as esqueceu. Nós não podemos nos esquecer, no projeto de uma nova CLT, de dar ao Judiciário esse poder de medidas cautelares, tutelas de evidência, tutelas de urgência e a execução das decisões judiciais antes do trânsito em julgado, porque o crédito é de natureza alimentar, e o trabalhador não pode esperar.
Essas são as minhas considerações.
Eu agradeço mais uma vez a participação aqui. É uma honra para mim estar aqui para contribuir com uma legislação que virá, certamente, para fortalecer o Judiciário trabalhista como instituição pública necessária à efetividade do direito do trabalho, do direito dos trabalhadores brasileiros. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Juíza do Trabalho Titular Ana Paula Alvarenga Martins, do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, integrante do Cesit! V. Exª deu aqui uma aula para o Brasil.
A SRª ANA PAULA ALVARENGA MARTINS - Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - E é bom, porque isso vai ser reproduzido novamente.
Eu confesso que nem eu sabia - soube disto pelo depoimento brilhante da senhora - que as decisões não são sequer cumpridas! É lamentável!
Muito obrigado por essa importante contribuição.
Vamos passar a palavra agora para o Dr. Paulo da Cunha Boal, que é Diretor da Anamatra e que tem participado seguidamente com a gente aqui, contribuindo para este debate.
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Eu só quero avisar que todos os que usaram a palavra vão ter direito às considerações finais, o que é justo, inclusive com V. Exª, que aqui foi minoria, mas que, democraticamente, expressou seu ponto de vista.
Por favor, Paulo da Cunha Boal!
O SR. PAULO DA CUNHA BOAL - Bom dia, Senador Paulo Paim! Bom dia a todos!
Pretendo ser rápido. A Mesa é uma Mesa um pouco mais ampla.
O tema é processo. E, como bem disse a Drª Ana Paula, processo é instrumento e deve ser efetivo. Não basta simplesmente que tenhamos um instrumental se não conseguirmos torná-lo depois em algo sólido.
Dentro do que o Dr. Maurício comentou sobre as ações, sobre os excessos, eu acho que nós cometemos... A reforma ressalta muito isto: ela parte do equívoco, da ideia equivocada de que as ações, ou melhor, o excesso de ações deve ser imputado aos trabalhadores, como também bem ressaltou a Drª Ana Paula. O que nós temos - e os excessos acontecem em qualquer atividade, em qualquer setor da vida - são pequenos desvios dentro de uma realidade muito grande.
Eu me lembro - até fui buscar aqui a informação - de que, em 1995, quando ainda vivíamos uma fase meio jurássica na questão de informática, um trabalhador ingressou com uma ação em Belo Horizonte. Ele era funcionário da Arapuã. Nem sei mais se existe essa rede varejista.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Essa era do meu tempo.
O SR. PAULO DA CUNHA BOAL - Sim, é do meu tempo também, mas acho que saiu do mercado. (Risos.)
Esse trabalhador entrou com uma reclamação em Belo Horizonte pedindo adicional de periculosidade pelo transporte de computadores, alegando que o computador poderia ter vírus e que ele poderia, então, ser contaminado. É um daqueles exemplos que nós utilizamos, até com um tom meio jocoso, meio satírico, para demonstrar como o Judiciário pode receber demandas sem sentido.
Mas aqui eu acho que nós temos de levar em conta também... Um grande professor que eu tive na faculdade sempre me dizia que o advogado é o primeiro juiz da causa. Eu aceito bem a ideia de que um trabalhador com pouco conhecimento ou com uma limitação cultural possa confundir vírus maligno com vírus de computador. Não aceito bem que o advogado tenha comprado essa ideia. Então, eu acho que também nós temos de dividir essa responsabilidade. Os advogados também deveriam filtrar melhor as ações.
Eu já recebi demandas, principalmente envolvendo doenças profissionais. Em uma ação, apareceu-me uma reclamante alegando que tinha diverticulite. Perdão, não era diverticulite, mas era uma doença tipicamente masculina, uma inflamação nos testículos. Isso constava da petição inicial. Eu comentei e falei: "Doutor, eu acho impossível que a sua autora tenha essa doença."
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Então, eu acho que nós partimos dessa dificuldade inicial. Há excessos, evidentemente, que são por ignorância, por desconhecimento, mas a evolução que nós trouxemos... Esse ponto fora da curva não condiz com as centenas ou milhares de ações que entram em que o trabalhador efetivamente estava sujeito a algum agente periculoso ou insalubre. Nós demoramos, a jurisprudência da Justiça do Trabalho demorou anos para reconhecer que o trabalhador que trabalha a céu aberto, exposto a calor, exposto ao sol, tem direito a adicional de insalubridade. Isso foi um avanço da jurisprudência.
Limitados que estamos hoje em examinar novas situações, provavelmente jamais teremos uma evolução jurisprudencial nesse sentido. Hoje se discutem quais são os efeitos de se trabalhar perante uma tela de computador, se podemos ficar cegos, se podemos ficar surdos, se podemos ter ressecamento de retina. Inviabilizar o acesso, inviabilizar essa discussão levará simplesmente ao esquecimento de que as condições atuais de trabalho geram novos prejuízos. Se nós hoje já sacramentamos a ideia de que trabalhar sob um sol escaldante de 40ºC, dentro de um canavial, a 52ºC, naqueles bolsões de calor, é insalubre, essa foi uma evolução histórica demorada, até nós chegarmos a ela.
O que se pretende hoje? Ao imputar a responsabilidade pelo excesso de ações apenas ao trabalhador, parte-se da premissa extremamente equivocada de que todo trabalhador é um mentiroso em potencial e, se não for um mentiroso, é um exagerado em potencial.
Em 23 anos de carreira, eu não devo ter dado mais do que 20 ações, 20 sentenças de improcedência. Em algum momento, observei excessos. De dez pedidos que foram formulados, julguei procedentes três ou quatro e improcedentes os outros. Mas a ideia principal me parece sempre a mesma: quem deu motivo à existência da ação foi o empregador, que descumpriu um, dois, três, quatro ou cinco elementos do contrato de trabalho. Este foi um dado apresentado pela Drª Ana Paula: em 51% dos processos, há um pedido de pagamento de verbas rescisórias.
Eu quero encerrar com um exemplo que eu já dei em outras oportunidades, acho que não aqui.
Houve um processo na vara de Rolândia em que uma trabalhadora alegava assédio sexual do preposto, que era o gerente da indústria. Ela contava com detalhes como se dava o assédio, dizendo que ele a chamava numa sala ou sempre em cantos. Dificilmente, nós veremos um assédio sexual ou um assédio moral à luz do sol; normalmente, eles são feitos em... E a moça descrevia com detalhes como era processado todo o assédio, quais eram as propostas que eram efetivadas. Eu a ouvi em depoimento, e ela me relatou novamente tudo aquilo que constava da petição inicial. Ouvi o preposto da empresa, e o preposto da empresa falou: "Não, jamais, nunca admitimos esse tipo de situação." Ou seja, ele reconhece que o assédio sexual é uma prática ruim e nega a existência de qualquer ato que pudesse colocar a empresa numa situação ruim. Ouço a única testemunha da reclamante, uma moça que também passou pelos mesmos fatos, nas mesmas situações, dentro de uma sala ou no cantinho da empresa. Ouvi, na sequência, o próprio acusado, o assediador, e ele negou também qualquer ato que pudesse imputar a ele uma mácula. Chamou a reclamante de mentirosa, disse que aquilo era para prejudicar a empresa e a ele, que ele era um homem casado, era temente a Deus, era um bom cristão. Ele usou uma série de argumentos.
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Terminada a audiência, já levando para o final... Provavelmente, seria uma ação improcedente, porque a testemunha, em momento algum, disse: "Eu vi a reclamante sendo assediada, isso acontecia comigo numa sala fechada." Terminada a audiência, já caminhando para o final, a testemunha levanta o dedo e fala: "Mas, doutor, eu tenho uma gravação aqui no meu celular." E aquilo, imediatamente, reacendeu a audiência. Fomos ouvir as gravações. Era uma gravação de uma conversa que ela, testemunha, havia tido com o assediador dentro de uma sala. Todos os fatos apontados na inicial são provados à exaustão. A gravação repete exatamente as palavras e a forma com que o assediador se manifestava. Não fosse esse acaso - e foi um acaso realmente o fato de a testemunha, no final da audiência, ter se manifestado -, esse processo entraria na estatística como mais uma daquelas aventuras jurídicas em que se diria: "Ah, foi lá e denegriu a imagem da empresa!"
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO DA CUNHA BOAL - Eu temo que a dificuldade de acesso ao Judiciário implementada pela lei torne, a cada dia, mais difícil que esses casos vão ao Judiciário. "Eu não tenho como provar, a minha prova é difícil. Eu não apresentarei esse pedido simplesmente porque não quero ou porque corro o risco de ter de arcar com as custas." Então, nós punimos duas vezes essa pessoa: ela sofre o assédio e é impedida de ir ao Judiciário para tentar fazer prova do fato, da forma com que se passou. Sabemos dessa dificuldade. E aí se vai dar que valor? "Ah, para não ter de pagar honorários lá na frente ou custas, eu peço R$500 de indenização."
Então, o que se faz? Além de dificultar o acesso, nós deixaremos, caso a letra da lei seja observada em sua plenitude, de examinar casos que dizem respeito a direitos de personalidade, principalmente aos grupos mais fragilizados da nossa sociedade, incluindo as mulheres.
Senhores, obrigado. Agradeço. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem! Esse foi o Dr. Paulo da Cunha Boal, Diretor da Anamatra.
Agora, concluindo os trabalhos da Mesa, falará o Dr. Guilherme Guimarães Feliciano, Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra).
A Anamatra e todos, enfim, participaram aqui e me ajudaram, inclusive, na elaboração daquele relatório em que eu tive de dar o parecer. E daí é que nós migramos para essa ideia da nova CLT.
O SR. GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO - Bom dia, Senador Paim! Mais uma vez, em nome da Anamatra, da magistratura do trabalho, agradeço este convite e os das tantas Mesas nas quais a Anamatra teve ocasião de participar.
Saúdo os nossos colegas aqui de Mesa, os meus colegas juízes que aqui estão, os demais advogados, os dirigentes sindicais, os assessores, enfim, todos que estão aqui.
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Vou tentar, Senador Paim, no limite do tempo que me é dado, concentrar-me nas propostas que a Anamatra fez para o Estatuto do Trabalho e sobretudo na maneira como essas propostas contrastam com o que foi feito pela Lei 13.467, de 2017, a Lei da Reforma Trabalhista.
São vários pontos. Nós praticamente reescrevemos todos os capítulos processuais da CLT. Fizemos isso em várias passagens, resgatando o que havia no texto legal antes da Lei 13.467, e, em vários pontos - eu acho que este é que é de fato o mais interessante -, procuramos avançar. Então, sobretudo, eu vou me referir aos avanços e, em algum ponto específico, vou me referir aos resgates: onde é que nós tentamos aqui recompor aquilo que a reforma trabalhista golpeou.
Nesse contexto, inclusive, a nosso ver, as principais inconstitucionalidades que estão na Lei 13.467... Aliás, uma delas é objeto exatamente de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade que estava pautada para a quarta-feira passada e que voltou à pauta do Supremo Tribunal Federal nesta semana, também na quarta-feira. A Anamatra foi admitida como amiga da Corte. A ação é do Procurador-Geral da República, e nós vamos fazer lá a sustentação com a nossa advocacia.
Mas, dentro das propostas que nós fizemos, eu começo pelas competências. O Senador Paim já sabe de outros esforços, de outros trabalhos que Anamatra realizou neste Parlamento, da nossa preocupação no sentido de que, em primeiro lugar, a Justiça do Trabalho não seja esvaziada. O Ministro Dias Toffoli, futuro Presidente do Supremo Tribunal Federal, esteve no XIX Congresso Nacional dos Magistrados do Trabalho, em Belo Horizonte, na semana passada, e disse com todas as letras - nós até transformamos isto em um meme para as redes sociais - que, "enquanto houver desigualdade social, será necessária a Justiça do Trabalho". Desse modo, nós poderíamos ir um pouco além e, talvez, dizer que, enquanto houver modo capitalista de produção, será necessária a Justiça do Trabalho, pelo menos no contexto em que ela se estabeleceu no Brasil após 1988 e especialmente após as Emendas 24 e 45, ou seja, sem mais aquele cariz corporativo, sem mais aquele cariz classista e muito mais uma Justiça de perfil humanista, que, a partir dessa perspectiva, faz, então, a mediação entre o capital e o trabalho nos conflitos individuais e coletivos que se põem à sociedade.
Neste contexto de não esvaziamento, é preciso reconhecer também o papel que o juiz do trabalho tem e o que eles especialmente têm a oferecer à sociedade, que, do nosso ponto de vista, é a sua sensibilidade social. Aliás, nós vamos além disso, pois isso é o que se deve esperar de qualquer juiz. A partir do momento em que a tarefa intelectual do juiz se reduza a um mero raciocínio lógico de subsunção, de encaixe de situações fáticas a modelos legais, a figura humana do juiz, em algum momento, será desnecessária, pois bastará um software. Relações lógicas de identidade, um software será capaz de fazer muito melhor do que um ser humano. Portanto, do ponto de vista do futuro, o único predicamento que autoriza dizer que o Poder Judiciário deverá ser exercido por pessoas, por seres humanos é a sensibilidade, é a capacidade de perceber para além das subsunções lógicas, das meras congruências formais entre fato e molde legal. E é isso que nós achamos que deve ser estimulado, inclusive no campo da admissão dos novos magistrados, no campo da formação dos magistrados. Isso - vou dizer com todas as letras para não ser mal interpretado - nada tem a ver com opções ideológicas quanto à visão de mundo; tem a ver mesmo com o elemento humano que deve nortear o ato de julgar.
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Nesse contexto e nessa perspectiva de permitir que a Justiça do Trabalho lance esse seu olhar sobre as questões que mais de perto envolvem o trabalho humano, especialmente naquelas que exigem maior sensibilidade, nós estamos propondo, então, como autoriza o art. 114, inciso IX, da Constituição, que, para além das competências que a Justiça do Trabalho já detém, passem à sua competência, aliás, formalize-se, positive-se a sua competência para todas as ações relativas à inobservância das normas relativas ao meio ambiente do trabalho. Isso, na verdade, já é jurisprudência do Supremo Federal: Súmula 736. Nós estamos apenas positivando isso e, assim, estendendo - nesse caso, é de fato uma extensão - para dizer que essa competência será não apenas para as ações de natureza cível, mas também para as ações de natureza penal.
Quanto aos litígios relacionados ao trabalho infantojuvenil, inclusive as autorizações para o trabalho infantil artístico e desportivo, essa é uma questão que foi levada ao Supremo Tribunal Federal, porque a atuação da Justiça do Trabalho, especialmente em relação a atores e atrizes mirins, não foi bem recebida por algumas empresas de entretenimento. Isso, então, foi levado ao Supremo Tribunal Federal ao argumento de que essa atividade que atores e atrizes mirins realizam não é trabalho, é outra coisa e, portanto, não sendo trabalho, deveria ser da competência de juízes comuns, os juízes da infância e adolescência. E, a nosso sentir, é trabalho. Temos, inclusive, nos memoriais que apresentamos evidências claras de que é trabalho: fixação de horário, de remuneração, de responsabilidade; todos elementos próprios inclusive de trabalho subordinado.
Também estamos propondo, por fim, para não citar outras situações, que, naquelas ações que envolvam crimes ou contravenções em que o trabalho humano ou a administração da Justiça do Trabalho componham a elementar, ou seja, sejam fatos descritivos de identificação do delito, ou a própria objetividade jurídica, o valor jurídico protegido por aquele tipo penal, nesse caso, as competências seriam da Justiça do Trabalho, ressalvadas as competências da Justiça Federal, porque essas são Constitucionais, estão no art. 109, e qualquer alteração exigiria uma PEC, uma proposta de emenda à Constituição. Então, por exemplo, um crime de frustração de direitos trabalhistas mediante fraude que não tivesse uma dimensão difusa, que hoje estaria afeto aos juízes de direito, aos juízes estaduais, por essa redação passaria a ser julgado por juízes do trabalho. Também tivemos o cuidado de positivar os princípios que devem reger o processo do trabalho.
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(Soa a campainha.)
O SR. GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO - Vários deles são muitos são muito conhecidos. Eu refiro aqueles que talvez tenham uma presença mais marcadamente operativa, que, digamos, possam suscitar maiores efeitos no dia a dia dos processos perante a Justiça do Trabalho.
Refiro aqui o princípio da simplicidade. Praticamente toda a doutrina já diz que o processo do trabalho é mais informal. A lei da reforma trabalhista caminhou no sentido oposto ao exigir uma série de formalidades, inclusive a própria indicação de valores certos nos pedidos, mas, ainda assim, sempre se compreendeu - e me parece que ainda não há razão para se entender de outra maneira - que o processo do trabalho é mais simples, é menos formal que o processo civil. Alguns autores minoritários discutiam esse princípio, e nós estamos propondo a sua positividade.
Também há o princípio do ônus dinâmico da prova. Isso, diga-se por importante, a própria lei da reforma trabalhista terminou por fazer. Ela modificou o art. 818 da CLT e introduziu o que está no art. 373 do CPC, permitindo, portanto, que o juiz do trabalho, diante das circunstâncias do caso, fundamentadamente, inverta o ônus da prova e atribua concretamente ao empregador uma prova que originalmente seria do trabalhador, desde que ele dê ciência a isso para não gerar indefesa por um estado de surpresa. No entanto, há ali alguns problemas, como, por exemplo, o fato de que o juiz só poderia fazer isso até a audiência. Isso não parece adequado. Muitas vezes durante audiência surge essa necessidade. Portanto, o nosso texto mantém essa repartição dinâmica do ônus da prova, mas retira essas previsões que estavam, digamos, manietando a possibilidade de o juiz fazer a gestão do processo nesse particular.
Ainda muito importante é que estamos inserindo também, para determinados casos que o texto explica, o princípio da ultrapetição. Era um princípio muito polêmico no processo do trabalho, que já existe em outros ordenamentos - art. 74 do Código de Processo do Trabalho português, por exemplo. Se é feito um pedido, vamos imaginar, a respeito de horas extraordinárias em determinado valor, mas depois os documentos que vêm aos autos ou até as provas testemunhais demonstram que as horas extraordinárias eram inclusive superiores àquelas que foram reclamadas, nada impede, no modelo português, que o juiz defira as horas extras dentro do patamar comprovado nos autos. No Brasil, isso não é possível em princípio. Há uma dúvida quanto a isso. Nós estamos, dentro de parâmetros que sejam seguros, que sejam confiáveis, introduzindo também esse princípio.
Quanto à gratuidade, que foi aqui referida pela minha colega. De fato esse, para mim, é um dos pontos mais controvertidos, mais problemáticos, aliás - eu direi com mais clareza -, é o mais inconstitucional, se é que isso tem medição, ou o mais flagrantemente inconstitucional da reforma. A Constituição diz claramente que a pessoa pobre deve ter assistência judiciária integral e gratuita, e o que a reforma fez foi dizer que, embora pobre e assim declarado pelo juiz, o trabalhador, a despeito de tudo, terá de arcar com os honorários de sucumbência do advogado da empresa e com os honorários periciais naquilo em que for sucumbente.
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Eu tenho sempre dado um exemplo que, na verdade, foi retirado da prática. Um trabalhador formula dez pedidos. Ele foi demitido sem receber as verbas rescisórias. Como vimos aqui, 51% dos casos envolvem sempre verbas rescisórias. Então, ele pede o básico, aquilo que é quase um direito líquido e certo, que, poderíamos dizer, até a empresa admite: "demiti e não paguei as rescisórias". Aviso prévio indenizado, férias proporcionais, décimo terceiro proporcional, 40% sobre o fundo, e por aí vai. Recebia um salário mínimo. O total aqui, desses nove pedidos, vamos imaginar, deu R$1,5 mil.
Mas ele também ficou surdo. Como o ambiente de trabalho era ruidoso, ele imagina que a surdez deve-se ao trabalho, aos cinco anos em que ele ficou na empresa, e pede uma indenização por danos materiais e morais, devido à surdez. Pede lá R$100 mil - o que, a meu ver, para a surdez dos dois ouvidos, considerando os gastos com tratamento, com órteses etc. e, a par disso, o dano moral, não é nada fora de propósito. É feita a perícia médica, e o perito diz o seguinte: "Essa doença é degenerativa. Não tem a ver com o trabalho." Muito bem, ele ganha os nove primeiros pedidos e perde esse último.
Antes da reforma, ele receberia, então...
(Soa a campainha.)
O SR. GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO - ... os seus R$15 mil e ponto final. Agora, ele vai ter de pagar, sobre esses R$100 mil, mesmo sendo pobre, os honorários do advogado da empresa, que vão variar de 5% a 15%. Se o juiz fixar em 15% - 15% de R$100 mil são R$15 mil -, ele já não recebe mais nada. Mas ainda há o laudo pericial. Vamos dizer que o perito peça R$5 mil de honorários. O juiz defere. Vejam, esse trabalhador, pelas regras da reforma, ingressou com uma ação trabalhista, ganhou 90% da ação e saiu devendo R$5 mil. Isso é injustificável quando a Constituição diz que essa assistência deveria ser gratuita e integral. Ela não é gratuita, se ele está pagando com créditos, e muito menos integral. Então, isso é inconstitucional a mais não ver.
Nós estamos, evidentemente, retirando isso. Então, isso sai do texto, e voltamos aqui à redação original.
Para terminar - o meu tempo já se esgotou -, nós estamos propondo...
(Soa a campainha.)
O SR. GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO - Acho que isso é o que há de mais interessante nas outras coisas. Estamos propondo, Drª Ana Cláudia, também algumas alterações no campo das execuções, com toda a certeza, especialmente no caso de execuções plúrimas, situações nas quais, inclusive, às vezes o patrimônio da empresa não é bastante - é preciso regular isso. Temos tentado aqui, no texto, trazer maior efetividade a isso e estamos introduzindo um procedimento novo, que, à falta de denominação melhor, nós denominamos de ação promocional trabalhista, mas que, na verdade é a class action, do direito norte-americano, que nós estamos trazendo para o processo do trabalho.
Quem assistiu àquele filme Erin Brockovich - Uma Mulher de Talento sabe bem o que é isso. Ela identifica um contexto de poluição ambiental por uma fábrica e, pessoalmente, como cidadã, ingressa com uma ação - semelhante a uma ação civil pública, mas é ela, cidadã, que ingressa -, e isso vale para todos os afetados. É essa a ideia que é trazida. Então, o trabalhador, naquelas situações que envolvem lesão ou ameaça de lesão de direitos ou garantias fundamentais relacionadas à relação de emprego, fora da dimensão patrimonial, pode utilizar-se dessa ação promocional trabalhista e tem legitimidade extraordinária, o que significa que o que ele conseguir para si vale para todos os trabalhadores na mesma condição. Se ele estiver numa linha de produção ergonomicamente alterada que o prejudique, a decisão que ele consiga ou mesmo a medida liminar cautelar que ele consiga ali vale não só para ele, mas para todos os trabalhadores que estejam na mesma condição. E, é claro, o Ministério Público do Trabalho sempre vai acompanhar essas ações. É um instrumento muito interessante, muito importante.
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E, mais ainda, introduzimos aqui uma garantia processual que até hoje não havia na legislação brasileira.
(Soa a campainha.)
O SR. GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO - Esse trabalhador, durante a tramitação dessa ação promocional, não pode ser demitido, a não ser por falta grave. Então, ele tem também uma garantia processual de emprego que me parece muito interessante.
Essas são as propostas, talvez as principais delas.
A ideia final, Senador Paim - e aí eu termino dizendo isso -, é, talvez, repontuar ou até repactuar, via Parlamento, uma concepção que foi muito utilizada em outros contextos e que se atribui ao conhecido físico Pascal, que teria dito, em determinado momento, que muitas vezes, quando o justo não consegue ser forte, tenta-se fazer do forte algo justo. Acho que o nosso esforço aqui é esse. As relações sociais que se estabelecem diante de uma assimetria econômica natural que se dá nas relações de emprego geralmente não se desenvolvem com a justiça que a própria lei prevê. Então, nas relações do dia a dia, o justo não se faz forte. A ideia desses novos procedimentos e dessa nova perspectiva de processo é a de que, então, a ação judicial, o Estado-Juiz, que é forte, valha-se da sua força para fazer as relações mais justas. É essa a ideia.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dr. Guilherme Guimarães Feliciano, Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), que colaborou muito, como todos os que estão aqui, na construção do Estatuto do Trabalho, que será lido na próxima quinta-feira, às 9h.
Eu vejo que chegou ao plenário o Max Garcez, que representa os advogados laboralistas da América, se não me engano.
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ (Fora do microfone.) - Neste momento, da brasileira.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Da brasileira.
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ (Fora do microfone.) - Da Associação Brasileira de Advogados e Advogadas Sindicais.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - V. Sª tem cinco minutos para dar sua contribuição.
Daí a Mesa vai para as considerações finais.
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - Obrigado, Senador.
Eu o parabenizo pela iniciativa...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - O Max também viajou o Brasil debatendo o direito dos trabalhadores e a previdência.
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - Exatamente. Foi uma experiência memorável poder acompanhar o Senador Paim, à época representando o Fórum em Defesa dos Trabalhadores Ameaçados pela Terceirização. Aquela luta importante, sob sua condução, em conjunto com a sociedade civil, com o movimento sindical e vários movimentos populares, por meio do Fórum, permitiu pelo menos atrasar bastante a aprovação do Projeto 4.330. Infelizmente, depois, a Câmara dos Deputados, de uma maneira antirregimental, que foi objeto de um mandado de segurança ao Supremo Tribunal Federal, questionando a tramitação... O mandado de segurança foi distribuído ao Ministro Gilmar Mendes, que até agora não chegou a analisar nem o pedido...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eles arquivaram um projeto antigo...
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - Exatamente.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - ... porque não quiseram enfrentar o debate que nós estávamos fazendo sobre a terceirização.
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O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - O Deputado Molon apresentou o mandado de segurança, e o pedido de liminar não foi analisado até o momento.
Mas eu represento aqui a Associação Brasileira de Advogados e Advogadas Sindicais e quero parabenizar o Senador e a CDH pela discussão do Estatuto do Trabalho - vou ser breve aqui.
Eu cheguei e pude ouvir a intervenção do meu colega, brilhante e contundente, Presidente da Anamatra, Guilherme Feliciano. Da exposição que ele fez eu concordo integralmente com as propostas da Anamatra que aqui ouvi, tanto em relação à ampliação da competência da Justiça do Trabalho quanto, e especialmente, em relação à discussão da gratuidade da Justiça. Creio que essa reforma trabalhista inconstitucional é também indigna e imoral, especialmente nesse ponto. É de uma insensibilidade gigantesca. Em um País no qual o maior esporte não é o futebol, mas o descumprimento da legislação trabalhista, algo infelizmente comezinho, criar-se uma situação tão nefasta quanto a que foi descrita pelo Dr. Guilherme Feliciano é algo inadmissível, uma violação flagrante à dignidade da pessoa humana.
Nós, advogados na área sindical, temos sido cotidianamente ofendidos. Quando eu fiz uma exposição na Câmara dos Deputados, defendendo a inconstitucionalidade da reforma, fui ofendido por vários Deputados. Um deles me chamou de advogado de porta de fábrica - isso eu não considero uma ofensa, isso eu assumo com gosto. Mas, quanto a essas imputações de que os advogados seriam responsáveis pelo excessivo número de reclamatórias - e o Ministro Barroso, infelizmente, apresentou uma série de estatísticas incorretas em relação ao número de ações trabalhistas -, eu reputo como infundada essa ofensa. O problema do número de ações trabalhista é por conta do descumprimento. Se todos os trabalhadores que tivessem seus direitos cumpridos acessassem ao Judiciário, o número seria muito menor. A quantidade de trabalhadores que infelizmente tem acesso ao Judiciário é pequena, seja por conta da dificuldade de acesso, seja por medo de uma improcedência, seja pela ausência de paridade de armas entre trabalhador e empregador.
Quando dizem que há advogados oportunistas, eu digo que, sim, há advogados oportunistas, como há em qualquer tipo de atividade humana, como há nas igrejas...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Inclusive no Parlamento.
O SR. MAXIMILIANO NAGL GARCEZ - ... na sociedade civil, no empresariado.
Mas eu só queria dizer, parodiando uma entrevista que vi do companheiro Boulos, que, se há oportunistas na advocacia, eu garanto que há em um percentual muito menor do que o dos oportunistas que existem entre os Deputados que aprovaram a reforma trabalhista, os quais espero que nunca mais voltem ao Parlamento.
Acho que essa discussão é algo que transcende, inclusive, o debate ideológico de direita e esquerda. Garantir a dignidade da pessoa humana e um mínimo de patamar civilizatório é algo que transcende esse debate ideológico. Você pode ser um empresário conservador, mas compreender que essa reforma trabalhista e esses aspectos processuais que vão ser discutidos amanhã pelo Supremo... Esperamos que o Supremo tenha sensibilidade para extirpar essas limitações ao direito constitucional de ação. A gente fica contemplado pelo fato de a Anamatra ter sido aceita como amicus curiae. A Abras está plenamente contemplada na intervenção competente que, eu tenho certeza, a Anamatra vai fazer amanhã.
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Acho que é fundamental conseguir, neste ano, que essa reforma trabalhista seja extirpada do nosso ordenamento jurídico. Acho que é fundamental que qualquer candidato à Presidência que ganhe proponha a revogação. A reforma é prejudicial não apenas aos trabalhadores, mas também ao conjunto da sociedade. Isso eu tive a oportunidade de expor na Câmara dos Deputados. É prejudicial, inclusive, aos empresários, porque essa é uma reforma trabalhista que destrói a organização da mão de obra brasileira; cria pessoas completamente transitórias, que trabalham alguns meses como terceirizados e, depois, como pejotizados, como desempregados, como autônomos subordinados. Não se consegue criar uma indústria competente que vá conseguir produzir produtos com alto valor agregado, com ciência e tecnologia, organizando mão de obra dessa maneira, como se fosse uma fabriqueta de R$1,99. Os custos sociais são enormes, e o aumento da miséria e da capacidade de consumo da classe trabalhadora já têm efeitos nefastos no mercado interno, prejudicais aos empresários.
Então, o que separa o Brasil da barbárie é a previdência social e a CLT. Se a gente permitir que esse ataque à previdência e à CLT aconteça - o Senador Paim tem sido um grande guerreiro de resistência nesses dois frontes -, a gente vai voltar à barbárie, tornando o Brasil ainda mais desigual.
Parabenizo a CDH, a Anamatra, as várias entidades que têm participado do Estatuto.
Continuamos na luta e à disposição nas próximas batalhas.
Parabéns! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Max Garcez, que colaborou muito também com esse encaminhamento que culminará com o Estatuto do Trabalho e a nova CLT. Conclusão dos trabalhos, com apresentação.
Eu só queria informar, rapidamente, que a Drª Magda Biavaschi, gaúcha de quatro costados - eu a conheço há algumas décadas; serve para ela e para mim - e pesquisadora do Cesit da Unicamp, colaborou muito, muito com todo esse trabalho, inclusive naquelas viagens que fizemos pelo Brasil e também no debate aqui do Estatuto do Trabalho. Infelizmente, ela está hospitalizada e vai fazer uma cirurgia, se não me engano, amanhã. Então, amanhã, ela não vai estar aqui, mas a energia positiva de nós todos estará lá com ela. Que tudo saia bem na cirurgia e que ela se recupere rapidamente.
Vamos dar uma salva de palmas para a Drª Magda, uma guerreira do povo brasileiro! (Palmas.)
Eu queria também informar que o Presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho, Ângelo Fabiano, e a Vice-Presidenta, Ana Cláudia Bandeira, estariam nesta audiência de hoje também, mas não estão em razão da eleição da nova diretoria da entidade, que será no dia de hoje. Provavelmente, estarão aqui já eleitos amanhã - bah, não posso me posicionar! Mas tudo bem.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - É chapa única. Então, fiquei bem! Sem problema.
Eu queria, agora, dar cinco minutos aos debatedores para as considerações finais e começo com o Alex.
Alex Myller, do Sinait, por favor.
O SR. ALEX MYLLER - Rapidamente, quero agradecer mais uma vez e reforçar o convite que eu havia feito aqui para a exposição que o Sinait está fazendo novamente no Senado. Às 12h30, daqui a pouco, vai haver a cerimônia de abertura.
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Quanto ao tema, quero dizer que nós nos empenhamos muito na elaboração, no aperfeiçoamento, no debate público do Estatuto do Trabalho para que ele possa fazer frente ao que, infelizmente, aconteceu na Espanha, no México, com reformas semelhantes a essa; que a gente não passe, daqui a alguns anos, algo como o que a gente leu agora: sete anos depois da reforma espanhola e cinco, seis anos depois da reforma mexicana, no México 66% das pessoas estão na informalidade, e mais de 34% da população economicamente ativa da Espanha está recebendo menos do que o salário mínimo - da Espanha, obviamente. Então, espero que a gente não precise ler isso nos noticiários brasileiros daqui a cinco, seis ou sete anos porque um grupo de homens e mulheres, como o Senador falou, que tenham visão possam ter encabeçado um movimento contrário a essa degradação do mercado de trabalho brasileiro e do direito do trabalho como um todo.
É isto que espero: que a gente possa realmente colocar toda a nossa energia, porque este é só início. A elaboração, o anteprojeto é apenas o início de uma caminhada. E que a gente consiga efetivamente resgatar esses direitos que foram negados, para que a promessa constitucional de trabalho digno possa permanecer e prevalecer no Brasil. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem! Muito bem, Alex Myller, que falou pelo Sinait.
Passo, de imediato, a Paulo da Cunha Boal, Diretor da Anamatra.
O SR. PAULO DA CUNHA BOAL - Só para lançar alguns dados aqui, em respeito ao que se fala da Justiça do Trabalho e também para desmistificar a ideia de que não existe direito do trabalho ou Justiça do Trabalho nos Estados Unidos: a maior indenização de 2009 nos Estados Unidos foi a de cinco empregados da marca Guess. Eles receberam US$370 milhões por terem sido acusados de furtos dentro da empresa. Então, é essa a Justiça do Trabalho inexistente nos Estados Unidos, que fixa uma indenização de US$370 milhões para cinco empregados.
Uma outra observação - que eu até divido aqui com o Alex, porque nós estávamos comentando em paralelo - é que algumas coisas que existem, tal qual o trabalho intermitente, não é porque existem que devem ser regulamentadas; não é porque existe que deve ser bom. Se fosse assim, nós teríamos de regulamentar trabalho escravo, prostituição infantil... São coisas que existem. Talvez até seja o caso de pensar em alguma forma de regulamentar a figura do lobisomem, que talvez exista. Pelo menos existe a palavra.
Então, nós devíamos realmente nos preocupar é com o combate a essas formas irregulares de trabalho, a essas formas anômalas de prestação de serviço em sua natureza. E são estas as medidas, são estas as propostas básicas objeto desse novo estatuto, dessa nova proposta de regulamentação: eliminar as formas anômalas de trabalho e não simplesmente lhes dar uma configuração jurídica. Isso não nos basta.
Agradeço novamente a sempre forte presença do Senador Paim na luta pelos direitos sociais, pelos direitos humanos, e a todos os meus colegas de bancada, torcendo para que esse projeto se materialize de forma efetiva dentro do Congresso Nacional.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dr. Paulo da Cunha Boal, Diretor da Anamatra.
Por favor, agora, o Dr. Guilherme Guimarães Feliciano, Presidente da Anamatra.
O SR. GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO - Registro também, mais uma vez, os agradecimentos da Anamatra, Senador Paim.
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Nós temos sempre primado por uma discussão técnica, por uma discussão de conteúdo, que, porém, não esqueça o que de fato é o juízo do trabalho, qual é a sua função social, qual é o seu papel no contexto constitucional. Afinal, inclusive, temos trilhado caminhos que consideram, a nosso ver, qual Estado a Constituição da República de 1988 construiu.
Não há dúvidas de que a Constituição de 1988 respalda, como respaldou, inúmeros predicamentos do chamado modo capitalista de produção, mas também não há dúvidas de que a Constituição de 1988 estabeleceu contenções do ponto de vista humanista, do ponto de vista social para que essas relações não coisifiquem a pessoa, não tornem o trabalhador objeto em uma relação jurídica, não permitam que o trabalho seja mercadoria nas relações de mercado. Aliás, isso está dito pela própria Organização Internacional do Trabalho, desde as premissas do Tratado de Versalhes, ao final da Primeira Guerra.
São esses os valores nos quais acreditamos. Esse é o direito do trabalho e é o direito processual do trabalho que nós reconhecemos como constitucionalmente legítimo. E sempre que a Anamatra possa contribuir para isso, como é o que se dá no caso deste Estatuto do Trabalho, proposto tão oportunamente por V. Exª, a Anamatra aqui estará somando forças, oferecendo o que ela eventualmente tiver de expertise para contribuir, nesse sentido, para a construção de relações sociais mais humanas, de relações sociais que permitam divisar um futuro mais feliz, um futuro mais benfazejo, mais próspero para toda a Nação brasileira.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dr. Guilherme Guimarães Feliciano, Presidente da Anamatra.
Agora, Dr. Maurício de Figueiredo Correa da Veiga, que fala pelo Conselho Federal da OAB.
O SR. MAURÍCIO DE FIGUEIREDO CORREA DA VEIGA - Sr. Presidente, Senador Paulo Paim, reitero aqui os cumprimentos, os agradecimentos por poder representar o Conselho Federal da OAB. Agradeço ao Senado Federal na pessoa de V. Exª por esta oportunidade.
A OAB preza sempre pelo debate democrático, ou seja, para que todas as partes possam trazer todos os argumentos necessários. Evidentemente, está em uníssono a defesa da Justiça do Trabalho, que desempenha um papel fundamental e essencial, principalmente num país continental e com desigualdades sociais como o Brasil. É fundamental a existência da Justiça do Trabalho. A OAB é parceira justamente para diminuir, para acabar com essa desigualdade social. E tudo o que se fala da Justiça do Trabalho, que tenta impor um custo altíssimo de R$17 bilhões, que seria o que custa a Justiça do Trabalho, não é verdade. Nesses valores absolutos constam, inclusive, valores de previdência, que são repassados para a própria Previdência. Você não pode botar proventos como custo. Isso é injusto.
A OAB, evidentemente, está unida, imbuída nesse espírito para poder erradicar todas essas mazelas. Mas, reiterando o que foi dito, destaco alguns pontos que merecem uma reflexão maior.
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Evidentemente não se trata, absolutamente, de trazer para a formalidade um trabalho escravo. Absolutamente. O trabalho escravo tem que ser combatido. O Ministério Público tem um papel fundamental nesse sentido. Agora, reconhecer um trabalho intermitente, que, por exemplo, é algo que acontece em balneários, em hotéis, de forma sazonal, é trazer para a formalidade pessoas que estão esquecidas e, quem sabe, até demonstrar uma forma de acesso ao trabalho por contrato por prazo indeterminado. É uma chance, talvez, de um jovem demonstrar ali serviço. Portanto, não pode ser simplesmente ignorado.
São esses pontos que merecem uma reflexão maior nesse sentido.
Em relação aos honorários advocatícios também, sempre houve uma grita muito grande para que fosse reconhecida a Justiça do Trabalho. O TST tinha as Súmulas 219 e 329, que diziam que, em razão da Lei 5.584, de 1970, os honorários só são devidos quando cumpridos determinados requisitos, ou seja, não exceder o dobro do mínimo legal, estar assistido por sindicatos... E sempre se bateu: "Olha, os honorários são devidos." Agora os honorários estão na Lei 13.437, mas de forma bilateral.
Portanto, se a questão é justamente a proposição de um estatuto do trabalho, que todas as considerações sejam levadas em conta, e, principalmente, de forma desapaixonada. Mas que todos os atores possam ter a oportunidade de se manifestar.
Portanto, eu me reporto ao que já mencionei aqui e reitero o meu agradecimento por esta oportunidade.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dr. Maurício de Figueiredo Correa da Veiga, representante do Conselho Federal da OAB, que fez as suas considerações, sempre numa linha elegante, diplomática e num aspecto mais amplo. Eu sempre digo: com a democracia, tudo; sem a democracia, nada. Cada um tem o direito de expressar o seu ponto de vista, e nem por isso tem que ser como é hoje, porque virou uma política de ódio. Quem pensa de forma diferente já vira inimigo, é ódio, é intolerância. Por isso, meus cumprimentos a V. Exª pela participação aqui.
Para encerrar, eu passo a palavra à Juíza do Trabalho Titular Drª Ana Paula Alvarenga Martins, do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, integrante do Cesit.
A SRª ANA PAULA ALVARENGA MARTINS - Agradeço mais uma vez a oportunidade de poder participar desta Mesa e deste momento tão importante de início, de formação do Estatuto do Trabalho.
Eu gostaria só, como considerações finais, de afirmar que esse Estatuto do Trabalho, essa nova CLT seja uma norma que fortaleça cada vez mais o direito do trabalho como um mecanismo de progressividade social dos trabalhadores brasileiros. Nós não podemos esquecer que o direito do trabalho tem um papel muito importante a exercer na sociedade, e esse papel é garantir essa progressividade social. Ele será um mecanismo de redução da pobreza, um mecanismo de redução de desigualdades e um mecanismo garantidor de dignidade humana.
Por outro lado, e esse foi o tema principal desta nossa audiência pública, que essas propostas que estão já no anteprojeto do Estatuto do Trabalho fortaleçam também as instituições públicas responsáveis pela regulação do trabalho no Brasil: o Ministério do Trabalho, a fiscalização do trabalho, o Ministério Público do Trabalho e a Justiça do Trabalho. Essas três instituições públicas, agindo em conjunto, realmente são capazes de promover esse direito material e torná-lo cada vez mais efetivo.
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Com isso, eu termino e agradeço mais uma vez. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Juíza do Trabalho Titular Ana Paula Alvarenga Martins, do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, integrante do Cesit.
Eu só queria informar a todos que chegou aqui...
Primeiro, quero agradecer, claro, a todos aqueles que participaram da primeira Mesa, da segunda Mesa, enfim.
A questão do estatuto sempre é um bom debate. Eu sou autor também do Estatuto do Cigano. Os ciganos me apresentaram a proposta original, que eu naturalmente tinha que apresentar para o debate - o Senador Hélio José é o Relator -, e pediram que eu fizesse a seguinte leitura aqui, rapidamente.
A Câmara das Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais, do Ministério Público Federal, vai realizar uma ação que integra o calendário do projeto "Ministério Público Federal Cidadão 30 anos". Com isso, vai realizar um ciclo de audiências públicas nas unidades do Ministério Público Federal em todo Brasil. Como fruto dessa ação, expedirá recomendação em nota técnica a respeito do Estatuto do Cigano, projeto de sua autoria, que tramita no Senado [cujo Relator é o Senador Hélio José].
A previsão é realizar audiências nos Estados e cidades onde existem comunidades ciganas, com o objetivo de ouvir os ciganos sobre os principais problemas que enfrentam, apresentar demandas aos gestores dos Municípios e discutir encaminhamentos para as questões locais, tendo em vista as características e peculiaridades de cada região. Na Procuradoria-Geral da República também haverá audiência pública, que contará com a participação de representantes do Ministério Público Federal (Populações Tradicionais do Ministério Público Federal e outros vinculados à defesa dos povos ciganos), das populações ciganas e de representantes dos órgãos vinculados à implementação de seus direitos ou das políticas públicas das quais são destinatários.
É esse o resumo do documento que recebi, que vai na mesma linha da abertura que fiz aqui: que a gente não caia no erro - eles estão pedindo isto - de começar a apresentar meia dúzia de estatutos. Toda a história mostra isso. Eu fui autor de cinco estatutos - quatro - e Relator do da Juventude. Quando a Câmara iniciou o da Juventude, eles me alertaram: "Paim, fique aí, porque nós queremos que V. Exª relate." Veio para cá, relatamos e aprovamos. O que não dá é para começar... Porque na hora em que derrotarem um desses, está tudo derrotado; os outros estão prejudicados.
Então, eu pedi na abertura e vou lembrar aqui de novo que nós teremos o seguinte movimento aqui: vai entrar como SUG, mas vem para o Relator da Comissão, que vai dar o parecer. Como eu disse, vamos viajar o Brasil todo - porque não é bem assim para fazer uma CLT -, vamos ouvir todos os setores. Aí dizem: "Ah, mas e se você não estiver aqui no ano que vem?" Ninguém vai me proibir de viajar o País. Eu pego o dinheiro do meu bolso e vou viajar todos os Estados debatendo a nova CLT, o Estatuto do Trabalho.
Então, o apelo que faço é esse, porque às vezes, devido ao processo eleitoral... A gente vai registrar amanhã, para ter um número, porque tem de haver um número, para vir para a Comissão.
Aí o pessoal começa - isto existe muito aqui na Casa - a copiar projeto da Câmara e do Senado e, de repente, nós estamos com dez estatutos, e ninguém vai saber o que fazer. Vira uma anarquia, e o primeiro que for derrotado, porque eles vão derrotar... Não esqueçam que esse pessoal que está aí, essa maioria que está aí foi a que aprovou essa reforma.
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Então, qual é a tática? A tática é começar o debate e não deixar cair na mão deles, é verdade - eu estou falando aqui em frente à TV, não é segredo nenhum -, para que, com isso, a gente suscite o debate. E só vamos botar em votação quando a gente achar que haja um quórum que realmente garanta esse equilíbrio, doutor, uma redação equilibrada. Essa é a primeira versão.
Eu chego a dizer - disse na abertura e vou repetir aqui - que seria burrice se começassem a fazer esse tipo de procedimento. Não é um projetinho de lei; é um estatuto, com mais de 900 artigos. A grandeza da construção - que todos os senhores ajudaram, todas as entidades ajudaram - tem que, nesse momento, servir, eu diria, até de lição, como foi a terceirização.
Nós trabalhamos com um projeto único da terceirização, que veio da Câmara. Não apresentamos outros aqui. Recebemos aqui, começamos a fazer o debate em nível nacional. O que fez o Governo? Como ele sabia que não conseguiria derrotar esse, porque nós tínhamos carta já de todos os Estados contra aquela terceirização, por unanimidade - você acompanhou as viagens... O que o Governo fez? Desarquivou um projeto de, sei lá, 1998 - eu não estava aqui, pelo menos; passou 1998, eu cheguei em 2002. Desarquivou e aprovou. E daí? Todo trabalho que nós fizemos - e um belo trabalho, está aí o projeto da terceirização - foi por água abaixo.
Então, só peço que não façam isso nem com o Estatuto do Cigano e nem com a CLT.
Às vezes na ânsia eleitoral também, todo mundo diz: "Eu sou..." Não é isso, pessoal. O autor não sou nem eu; eu só sou Relator. Os autores são as entidades. Esse é o projeto que nós estamos encaminhando. O.k.?
Então, espero a presença de todos os senhores na próxima quinta-feira, às 9h, quando vamos fazer a leitura e o debate. E já estou convidando todos para, no dia 28, no plenário do Senado, o primeiro debate temático sobre a nova CLT, o Estatuto do mundo do Trabalho.
Uma salva de palmas a todos! (Palmas.)
Obrigado.
Está encerrada a audiência pública.
(Iniciada às 9 horas e 33 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 12 minutos.)