23/05/2018 - 20ª - Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Declaro aberta a 20ª Reunião da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado da República da 4ª Sessão Legislativa da 55ª Legislatura.
Iniciando a pauta agendada para o dia de hoje, item 1.
ITEM 1
MENSAGEM (SF) Nº 21, de 2018
- Não terminativo -
Submete à apreciação do Senado Federal, de conformidade com o art. 52, inciso IV, da Constituição, e com o art. 39, combinado com o art. 41 da Lei nº 11.440, de 2006, o nome do Senhor FERNANDO JOSÉ MARRONI DE ABREU, Ministro de Primeira Classe da Carreira de Diplomata do Ministério das Relações Exteriores, para exercer o cargo de Representante Permanente do Brasil junto à Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura - FAO e os Organismos Internacionais Conexos, em Roma.
Autoria: Presidência da República
Relatoria: Senador José Agripino
Relatório: Pronto para deliberação
Observações:
1 - Em 17/05/2018, foi lido o relatório e concedida vista coletiva, nos termos do art. 383 do Regimento Interno do Senado Federal.
2 - A arguição do indicado a Chefe de Missão Diplomática será realizada nesta Reunião.
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Item 2 da pauta.
ITEM 2
MENSAGEM (SF) Nº 34, de 2018
- Não terminativo -
Submete à apreciação do Senado Federal, de conformidade com o art. 52, inciso IV, da Constituição, e com os arts. 39 e 41 da Lei nº 11.440, de 2006, a escolha do Senhor ROBERTO JAGUARIBE GOMES DE MATTOS, Ministro de Primeira Classe do Quadro Especial da Carreira de Diplomata do Ministério das Relações Exteriores, para exercer o cargo de Embaixador do Brasil na República Federal da Alemanha.
Autoria: Presidência da República
Relatoria: Senador Lasier Martins
Relatório: Pronto para deliberação
Observações:
1 - Em 17/05/2018, foi lido o relatório e concedida vista coletiva, nos termos do art. 383 do Regimento Interno do Senado Federal.
2 - A arguição do indicado a Chefe de Missão Diplomática será realizada nesta Reunião.
Convido para que tomem assento à mesa S. Exªs os Srs. Embaixadores Fernando José Marroni de Abreu e Roberto Jaguaribe Gomes de Mattos, desejando a ambos as melhores boas-vindas a esta Comissão. (Pausa.)
Antes de passarmos a palavra aos nossos sabatinados do dia de hoje, eu indago a S. Exªs e às Srªs e aos Srs. Senadores se podemos dar início ao processo de votação.
As Srªs e os Srs. Senadores que aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovado.
Peço à Secretaria desta Comissão que abra o processo de votação dos Srs. Embaixadores ora sabatinados.
Agradecendo mais uma vez a presença dos Srs. Embaixadores, concedo a palavra ao Sr. Embaixador Fernando José Marroni de Abreu, indicado para o cargo de Representante Permanente do Brasil junto à Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) e Organismos Internacionais Conexos, em Roma.
O SR. FERNANDO JOSÉ MARRONI DE ABREU - Bom-dia, muito obrigado Exmo Sr. Presidente Fernando Collor de Mello, Sr. Senador Antonio Anastasia, caros colegas, minha mulher Ana Cristina, minha filha Bianca.
Queria inicialmente agradecer ao Presidente Michel Temer e ao Ministro Aloysio Nunes Ferreira a indicação para servir como representante do Brasil junto à FAO, FIDA e PMA, em Roma, caso mereça a aprovação desta Comissão e do Plenário do Senado Federal.
Inicio a minha apresentação recapitulando algumas informações já de conhecimento geral, principalmente dos Srs. Senadores, que seguem com atenção o tema da agricultura.
A agência especializada das Nações Unidas de caráter intergovernamental, a FAO tem um mandato de ajudar países a eliminar a fome, melhorar a nutrição, aumentar a produtividade agrícola, elevar o nível de vida da população rural e contribuir para o crescimento da economia mundial.
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Desde a sua fundação, em 1945, a FAO teve a sua sede inicialmente nos Estados Unidos, mudou posteriormente, em 1951, para Roma e se mantém como um dos principais organismos internacionais das Nações Unidas.
Nas suas duas primeiras décadas foi a principal fonte de informações e o principal foro de reconhecimento internacional para alimentação, nutrição e agricultura. Atualmente junto ao Programa Mundial de Alimentos, criado em 1963 e o Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA), criado em 1977, a FAO segue sendo referência internacional em assuntos ligados à agricultura, alimentação, nutrição, desenvolvimento rural, florestas, pesca e aquicultura, entre outros.
A estrutura da FAO contempla instâncias consultivas e deliberativas, de natureza tanto técnica quanto política. É composta de conferência, conselho, comitês e outros órgãos estatutários e o Diretor é o brasileiro José Graziano da Silva.
A Conferência se reúne a cada dois anos, em anos ímpares. O Conselho se reúne a cada ano e os principais comitês são o Comitê de Agricultura, o Comitê de Produtos de Base, o Comitê de Florestas e o Comitê de Pesca. Ainda é importante mencionar a Comissão de Recursos Genéticos para Agricultura e Alimentação e também a Comissão de Segurança Alimentar.
Entre as principais atribuições da FAO, estão: apoiar países em desenvolvimento mediante projetos de assistência técnica, numa visão que integre as dimensões da sustentabilidade - ambiental, social e econômica; informar sobre nutrição, alimentos, agricultura, floresta e pesca; aconselhar governos, com base no seu conhecimento especializado e experiência na formulação de estratégias nacionais o para desenvolvimento agrícola, segurança alimentar e combate à pobreza; servir como um fórum neutro para discutir e formular políticas nos principais assuntos relacionados à agricultura e alimentação; realizar conferências, encontros técnicos e consultas especializadas.
A atuação da FAO estende-se também a operações de assistência humanitária nas áreas de prevenção, mitigação, preparação e resposta a emergências e também possui programas de prevenção e controle de pestes.
Em outra frente, a FAO criou, em parceria com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o programa Codex Alimentarius, com o propósito de desenvolver padrões e diretrizes alimentares para proteção de consumidores, garantir o comércio justo e promoção da coordenação de todos os trabalhos de padronização alimentar levados por organizações internacionais. Também é importante saber que são os parâmetros utilizados pela OMC desde a sua criação.
Queria ainda mencionar que a FAO abriga o Tratado Internacional sobre Recursos Fitogenéticos para a Alimentação e Agricultura - bom dia, Senador! -, a Convenção Internacional para Proteção dos Vegetais e, em 2013, aprovou a revisão do Marco Estratégico, que estabeleceu cinco objetivos estratégicos.
O primeiro, ajudar e eliminar a fome, antes era reduzir a fome e passou a ser eliminar a fome, a segurança alimentar e a desnutrição; aumentar e melhorar a oferta de produtos e serviços agrícolas, florestais e pesqueiros de maneira sustentável; reduzir a pobreza rural; promover sistemas alimentares e agrícolas mais inclusivos e eficientes; e quinto, aumentar a resiliência dos meios de vida frente a catástrofes.
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Também está em fase de conclusão o processo de reforma da estrutura de governança da organização, voltado sobretudo a resultados concretos de gestão, redução de custos, desenvolvimento das capacidades institucionais e incentivo à cooperação Sul-Sul com maior participação da sociedade civil.
O orçamento da FAO previsto para o biênio 2018/2019 é de US$2,56 bilhões. Deste montante, 39% se referem às contribuições obrigatórias dos Estados-membros e 61% referentes a contribuições voluntárias, que devem ser fornecidas pelos Estados-membros e outros parceiros.
As contribuições são pagas anualmente, uma parcela em dólar e, outra, em euro, e corresponde à metade do valor devido no biênio. O Brasil é o décimo contribuinte no orçamento regular da FAO. A contribuição brasileira para o ano de 2018 é de cerca de US$10,4 milhões e 7,2 milhões de euros, com vencimento em 31 de dezembro de 2018. Além disso, o Brasil se encontra em dívida com pequeno valor residual de 2016 e com valor de 2017 de US$8 milhões e 5,6 milhões de euros. No total, portanto, devemos à Organização US$18,4 milhões e 12,8 milhões de euros.
O Brasil, como um dos mais importantes produtores e exportadores mundiais de alimentos, além de ser o primeiro país em biodiversidade e o segundo em extensão florestal, além de ter as maiores reservas de água doce, não poderia estar ausente dos principais fóruns internacionais sobre temas agrícolas, em especial, nas diversas instâncias da FAO, inquestionavelmente a principal Organização das Nações Unidas com mandato nessa área. Essa conclusão é reforça pela constatação da crescente complexidade a transversalidade dos temas, envolvendo simultaneamente comércio, energia, mudança de clima, segurança alimentar, biodiversidade, biotecnologia, inovação e pesquisa tecnológica.
Assim, os interesses nacionais em todas as suas dimensões, tanto as estritamente econômicas quanto àquelas relativas à cooperação e meio ambiente, por exemplo, podem vir a ser afetados de maneira positiva ou negativa dependendo das discussões nas instâncias da FAO.
O envolvimento de diferentes ministérios e instituições nacionais também é outro elemento que revela a importância das discussões na FAO e nas principais comissões que lá têm seus trabalhos.
Além das contribuições estatutárias à FAO, o Brasil tem contribuído voluntariamente para implementação de projetos de cooperação técnica Sul-Sul e trilateral em benefício próprio e de vários países. Há atualmente 25 projetos em andamento no âmbito da FAO, dos quais o Governo brasileiro apoia financeiramente com um orçamento aproximado de US$90 milhões no que tange às contribuições brasileiras.
Os projetos realizados em terceiros países refletem os esforços do Governo brasileiro em promover, por meio da cooperação Sul-Sul e trilateral, o compartilhamento de tecnologias e experiências brasileiras no desenvolvimento de políticas e aplicação de programas voltados sobretudo para o combate à pobreza e à fome.
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Além dos vinte e cinco projetos que contam com contribuições brasileiras, a FAO registra sete projetos com orçamento total de US$17 milhões, e o Brasil é apenas beneficiário da cooperação, não havendo, portanto, aporte financeiro ou em espécie nesses projetos.
Passo agora ao FIDA (Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola), que compõe, junto com a FAO, a tríade de organizações das Nações Unidas baseadas em Roma. Seu mandato é o de ajudar a erradicar a fome e a pobreza rural em países em desenvolvimento, por meio de assistência financeira e técnica a projetos desenvolvidos conjuntamente com os países recipiendários, e sempre com a participação de entidades cofinanciadoras.
O FIDA deve mobilizar recursos para oferecê-los em condições favoráveis e concessionais, em apoio ao desenvolvimento à agricultura de Estados-membros em desenvolvimento. O fundo financia principalmente projetos e programas especificamente concebidos para melhorar o sistema de produção de alimentos e fortalecer as políticas e instituições no âmbito das prioridades estratégicas e nacionais. Desde o início das operações, em 1978, o fundo investiu US$14,8 bilhões em mais de 900 projetos.
A parceria entre o FIDA e o Brasil iniciou-se em 1980, e envolve tanto o Governo Federal quanto os Governos estaduais. As atividades são desenvolvidas com propósito de apoiar os países em seus esforços para melhorar as condições econômicas e sociais de comunidades rurais de mais baixo nível de desenvolvimento humano.
Desde seu estabelecimento em 1977, o FIDA já financiou onze projetos no Brasil, que totalizam cerca de US$825 milhões, dos quais US$260 milhões foram financiados diretamente pelo Fundo, beneficiando 365 mil famílias.
Os projetos do FIDA no Brasil se concentram principalmente no Semiárido nordestino, mas se estendem também à Amazônia e ao Agreste, e estão dirigidos ao apoio e à promoção da agricultura familiar, buscando o aumento de renda, a capacitação e o acesso a serviços essenciais a grupos vulneráveis.
Atualmente, seis operações estão em andamento no Brasil, entre as quais: o Viva o Semiárido; o Procase, em Paraíba; o Negócio Rural para Pequenos Produtores; e o Gente de Valor. Este último, por exemplo, já beneficiou 34 Municípios e 282 comunidades desfavorecidas.
O Brasil tem tido atuação quase constante na junta executiva, e o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão é responsável pela designação de governador. Aliás, o Embaixador Roberto Jaguaribe já foi Governador do FIDA, e tivemos oportunidade de participar de algumas reuniões na década de 90.
As contribuições brasileiras para o FIDA estão em dia. Com relação à integralização do FIDA10, o Governo escalonou o pagamento de US$16,7 milhões acordados em cinco parcelas. O Brasil é um dos países que mais se beneficiaram dos financiamentos do FIDA e, ao mesmo tempo, é o terceiro maior contribuinte entre os países em desenvolvimento - o FIDA tem três listas: a Lista A, que é dos países desenvolvidos; a Lista B, que é dos países exportadores de petróleo; e a Lista C, que é dos países em desenvolvimento, nos quais devem ser aplicados os recursos em condições favoráveis e concessionais.
Passo agora ao Programa Mundial de Alimentos, que é o maior organismo de assistência humanitária das Nações Unidas. Atende, por ano, cerca de 90 milhões de pessoas, incluindo 58 milhões de crianças. De sua sede em Roma, de seus escritórios pelo mundo, as ações do PMA ajudam pessoas incapacitadas a produzir e a obter alimentos suficientes para si e suas famílias. O Brasil voltou a integrar a junta executiva no período de 2018 a 2020.
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A ajuda alimentar promovida pelo PMA é também direcionada à luta contra deficiências em micronutrientes, à redução da mortalidade infantil, a melhorias na saúde de gestantes e ao combate a doenças como a aids, por exemplo. Os programas de alimento por trabalho ajudam promover a produção agrícola e a estabilidade socioeconômica e ambiental. De acordo com a avaliação mais recente das atividades do Programa, das 798 milhões de pessoas que se encontram em situação de fome no mundo, 82,2 milhões já receberam ajuda do PMA, sendo financeira ou em espécie.
O Programa Mundial de Alimentos também possui vertente emergencial, na qual vem trabalhando ativamente em países que se encontram em situação de conflito, como a Síria, Iêmen, Iraque e Nigéria, por exemplo.
De modo geral, as ações do PMA se encontram alinhadas com as diretrizes e posições do Governo em cooperação humanitária. Nesse contexto, cumpre destacar a contribuição da parceria desenvolvida entre o Governo brasileiro e o PMA, com a criação, em 2011, do Centro de Excelência contra a Fome, sediado em Brasília, que recebe recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação e replica, usa como base, a experiência brasileira na alimentação escolar em mais de 23 projetos com países da América Latina e da África.
Entendo como objetivo à segurança alimentar e, além de garantir a merenda escolar, esse programa garante também recursos e incentiva a agricultura familiar, garante a produção de bens com os quais os alunos já estão familiarizados e, conforme eu disse, incrementa a renda das famílias produtoras. O Brasil já aportou atualmente US$21 milhões com projetos nessa área, com recursos, repito, oriundos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, da ABC (Agência Brasileira de Cooperação) e do Instituto Brasileiro do Algodão.
Relaciono a seguir algumas das ações que entendo serem parte de minha missão, caso mereça aprovação por V. Exªs e pelo Plenário do Senado Federal:
Defender os interesses nacionais, tanto os estritamente econômicos e comerciais quanto aqueles relativos à cooperação e ao meio ambiente, em todas as discussões, nas diversas instâncias das três organizações;
Manter e reafirmar a centralidade da FAO na governança mundial em alimentação e agricultura e elevar a participação de países em desenvolvimento, particularmente a brasileira, na governança de temas de interesse mundial;
Continuar a contribuir voluntariamente para a implementação de projetos de cooperação técnica ou emergencial, sobretudo na modalidade Sul-Sul e triangular, em benefício próprio e de outros países;
Manter a coordenação com diferentes ministérios e instituições nacionais nos debates e projetos da FAO;
Aprofundar o conhecimento nacional no governo, nas instituições de pesquisa, entre o empresariado e a sociedade civil sobre temas, produtos e processos das três organizações;
Incentivar a integração porque o tratamento dos temas de produção agrícola na FAO se encontrem alinhados com os objetivos de desenvolvimento sustentável da Agenda 2030 e com as políticas do Governo brasileiro. Nesse contexto, a produtividade agrícola vem sendo tratada pela FAO sob a ótica da sustentabilidade e da importância da agricultura para o alcance da segurança alimentar e nutricional;
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Participar ativamente de discussões do grupo de países da América Latina e Caribe e manter diálogo estreito com os demais países do BRICS e CPLP, além da ação coordenada com o G77, em Roma - o G77 é um grupo de 134 países em desenvolvimento e a China, que se reúne em todos os foros internacionais;
Manter atuação consistente nos diversos comitês técnicos, nos foros de discussão, nas áreas de agricultura, pecuária, pesca e silvicultura;
Divulgar a experiência brasileira no desenvolvimento de técnicas e na adoção de políticas e programas voltados à sustentabilidade e aumento da produção agropecuária e apoiar a FAO na promoção da sustentabilidade ao longo das cadeias produtivas, criando, com atenção às questões ambientais, condições necessárias para a prosperidade econômica, desenvolvimento social, de forma inclusiva e em bases duradouras;
Promover a continuidade e esforços do FIDA em países de renda média como o Brasil, tanto em relação a investimentos diretos para o desenvolvimento rural e redução da pobreza quanto no âmbito da cooperação Sul-Sul, diálogo político, gestão de conhecimento, parcerias estratégicas públicas e privadas, evitando que os recursos do fundo se limitem unicamente aos países de menor desenvolvimento relativo, como tem sido uma das propostas apresentadas com insistência pelos países da Lista A, os países desenvolvidos;
Apoiar a participação brasileira em atividade de cooperação humanitária com o PMA e promover a crescente interação com o Centro de Excelência contra a Fome, com base em Brasília, conforme já mencionei;
E, finalmente, incentivar a crescente participação de peritos brasileiros nas três organizações.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Muito obrigado ao Sr. Embaixador Fernando José Marroni de Abreu, pela sua exposição.
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Pela ordem.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Pela ordem, S. Exª Senadora Ana Amélia com a palavra.
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS. Pela ordem.) - Nós aqui temos que nos virar nos trinta nessa nossa agenda. A sala ao lado tem uma audiência pública para uma sabatina bem mais complicada e complexa do que esta que fazemos aqui na Comissão de Relações Exteriores, porque estamos diante de diplomatas de alta qualidade profissional. Basta não exatamente ler o currículo, mas acompanhar os desafios aos quais foram submetidos ao longo de suas carreiras, para saber que se trata de pessoas que nos honram muito na representação, nos desafios que terão agora: a Embaixada do Brasil na Alemanha e a representação brasileira junto à FAO, ambas em cidades maravilhosas: Berlim e Roma.
Eu quero apenas, Presidente Fernando Collor, e obrigada pela cedência da palavra, desejar aos dois diplomatas uma missão muito relevante. O Rio Grande do Sul, como o senhor sabe, Embaixador Jaguaribe, é um Estado com muito vínculo com a Alemanha. A nossa imigração alemã data dos séculos XVIII e XIX - mais XVIII; quero desejar, então, que tudo o que for possível na integração com o meu Estado possa ser feito.
E, com a sua licença, sendo um carioca da gema, eu quero saudar aqui a República de Piratini. Eu não poderia estar ausente aqui, meu caro Presidente Fernando Collor, também com desculpas a Alagoas, mas a República de Piratini, do meu Estado, está aqui presente: Embaixador Fernando José de Abreu, nascido lá na terra dos Presidentes, São Borja, de Getúlio e Jango. Então, é um prazer estar aqui, e já votei exatamente por conhecer a biografia dos dois sabatinandos. Quero desejar aos dois...
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E a FAO, claro, tem tudo a ver também com o nosso Estado, um celeiro agrícola que continua exportando, como se diz, a diáspora gaúcha espalhou-se pelo Brasil e CTGs estão espalhados, inclusive, em sua Alagoas ou no Rio de Janeiro. Aqui em Brasília há mais de um, são pelo menos quatro CTGs aqui na cidade, na Capital da República.
Então, parabéns e sucesso aos dois. Os temas são todos os relevantes.
Obrigada.
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF) - Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Muito obrigado a V. Exª, Senadora Ana Amélia.
Pela ordem, com a palavra S. Exª o Senador Cristovam Buarque.
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PPS - DF. Pela ordem.) - Presidente Collor, na mesma linha, aqui ao lado, daqui a pouco, ainda tenho um pouco de tempo, começa uma audiência na Comissão de Educação, que eu convoquei. E, pelo que eu estou sabendo, não há nenhum Senador presente, vou ter que ir presidir juntamente com os demais, com os que vão falar.
Então, eu também terei que me ausentar em algum momento, é óbvio que eu vou votar. Tenho algumas perguntas a fazer a cada um, tentarei vir, se algum Senador puder me substituir na Comissão de Educação, mas eu só queria avisar que em algum momento terei que sair, peço desculpas aos Embaixadores.
Conversei com eles antes, deixei claro o meu interesse em estar aqui. Confesso que eu não estava lembrando dessa audiência que será feita daqui a pouco na Comissão de Educação e que vou presidir.
Só para avisar isso e pedir desculpas.
Vou deixar algumas perguntas, de qualquer maneira, mesmo sem estar presente na hora da resposta.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Muito obrigado, Senador Cristovam Buarque, muito obrigado a V. Exª.
Dando continuidade à nossa pauta, passo a palavra ao Sr. Embaixador Roberto Jaguaribe Gomes de Mattos, indicado para o cargo de Embaixador do Brasil junto a República Federal da Alemanha.
O SR. ROBERTO JAGUARIBE GOMES DE MATTOS - Muito obrigado, Sr. Presidente, eu queria, em primeiro lugar, agradecer a V. Exª, como Presidente desta Comissão; ao Vice-Presidente, Senador Jorge Viana; e ao Relator da minha indicação, Senador Lasier Martins. Agradecer aos Senadores presentes e especialmente pelas condições peculiares deste ano e pela agilidade com que o senhor tem tratado essa temática ao nos disponibilizar, inclusive, uma reunião extraordinária da Comissão para que os nossos nomes possam ser considerados por esta Comissão e, posteriormente, se for o caso, pelo Plenário do Senado.
Eu queria, também, evidentemente, agradecer muito ao Senador e Ministro das Relações Exteriores - bom dia, Senador! -, Aloysio Nunes, pela confiança que depositou em submeter meu nome à apreciação do Senhor Presidente da República. E, ao Senhor Presidente da República, pela confiança que também depositou em mim para submeter o meu nome à apreciação deste colegiado, começando aqui por este órgão que o senhor preside com tanta competência.
Quero, também, deixar registrados os meus agradecimentos tempestivos pela coleta de informações que foi propiciada pela Afepa, pelos esforços que eles têm feito para mobilizar o apoio geral aqui desta Casa para as nossas nomeações. Agradecer aos meus colegas da Apex, do Itamaraty, pelas contribuições muito significativas para corrigir as minhas deficiências de informação a respeito do posto nessa brevidade de tempo. Em particular, quero agradecer à Ministra Cecilia Ishitani, que montou várias estratégias para que eu pudesse dispor de uma multiplicidade de informações que, eu espero, tenham sido úteis e que contribuam para me capacitar para exercer esse posto.
A Alemanha, é desnecessário dizer, Sr. Presidente, é um país de extraordinária trajetória, apesar de ser um País na verdade jovem. É uma nação muito antiga, mas um país que tem 50 anos menos que o Brasil.
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Ele se inicia, como país, apenas no final da Guerra Franco-Prussiana e, por sinal, um processo um pouco humilhante para a França. Foi criada no Salão dos Espelhos de Versalhes, em 1871, após a vitória esmagadora que a Prússia teve sobre a França na Guerra Franco-Prussiana.
Mas é um país de grande trajetória global, desde sempre, muito antes da sua configuração como Estado, porque a nação alemã teve um papel muito importante na formação do mundo ocidental.
A Alemanha fez parte de uma composição um pouco menos precisa de que um estado contemporâneo mesmo a essa composição, que é o império romano, Sacro Império Romano-Germânico, que foi presidido, e em uma multiplicidade de vezes, por príncipes alemães, mas era uma coligação mais solta de cidades e de estados em que havia os príncipes eleitores, que ganhou mais consistência quando a Casa de Habsburgo adquiriu uma predominância, uma proeminência maior no cenário europeu, mas que nunca se configurou como um estado real, comparável, por exemplo, ao que já era a França, ao que já era o Reino Unido, na Inglaterra, na mesma época.
Mas, então, essa trajetória alemã não é impedimento de que a Alemanha tenha contribuído, possivelmente de forma mais relevante do que outros, para a consolidação da civilização e da cultura ocidental.
Na minha casa, Excelência, aprendi com o meu pai, e ele dizia sempre: "Cultura é uma palavra que se escreve com K."
Em função da enorme relevância da Alemanha, não apenas nas ciências exatas, nas ciências sociais, nas ciências humanas, mas, também, nas artes. Então, a contribuição alemã, em geral, para o mundo ocidental é extraordinariamente significativa e muito maior do que a sua contribuição política, que só começa posteriormente e que criou até certos embaraços, como nós podemos constatar no decorrer da sua relativamente breve história.
Então, é uma nação que tem os seus primeiros registros na interface com o mundo clássico, particularmente com o mundo romano, nem sempre em uma luz muito favorável, inclusive dando margem aos diversos topônimos de identificação do país.
A gente mesmo, em português, identifica da Alemanha como alemães, ou como tedescos, ou como germânicos, o que dá margem a diversas designações do país. Em português e em francês, Alemanha; em alemão, é tedesco, Deutschland; nos Estados Unidos, em inglês, é Germany.
Então, essa configuração diversificada é um traço também importante. Evidentemente que esse império alemão termina em 1806 com Napoleão e a abdicação do imperador austro-húngaro, mas aí é um processo de emancipação da Prússia que conduz a uma reunificação alemã, que tem sucesso pleno a partir da Guerra Franco-Prussiana - como mencionei - sob a condução eminente de Bismarck, um homem com grande pragmatismo, uma lucidez e uma vocação, digamos, de implacabilidade, que o permitiu construir essa organização que, na verdade, tanto impacto teve, e muitas vezes não tão positivos, no quadro político europeu a partir desse momento.
Então, é uma relação extremamente densa. Um país com um significado muito relevante dentro do contexto europeu, mas, também, global, com uma contribuição fundamental para o conhecimento humano e, portanto, uma densidade de relação com o Brasil que eu pretendo listar a seguir, também altamente significativa.
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O quadro atual da Alemanha, em termos políticos, é relativamente conhecido. É um país que tem uma democracia parlamentar federativa, que tem, a partir da sua consolidação no pós-guerra, em 1949, com a criação do partido CDU, associado na Bavária, ao partido do local, uma estabilidade político-democrática significativa, um processo que hoje se consolida com a reeleição, mais uma vez, da Chanceler Angela Merkel, nas eleições realizadas no ano passado, mas com uma configuração parlamentar um pouco mais complexa, em que ela foi obrigada a desistir do seu empenho inicial, que era formar uma aliança com o Partido Liberal e se juntou novamente a uma aliança com o SPD, o partido mais antigo da Alemanha, com mais de 150 anos de existência, contrapondo-se a esse partido social cristão, que foi fundado junto com a superação da Segunda Guerra e a liberação da Alemanha da ocupação, por Adenauer, em 1949.
Essa consolidação reflete também uma perda relativa de votação dos dois principais partidos. A CDU obteve um percentual de 32,9% nas últimas eleições, tendo perdido 8,6% dos votos, bem como 65 cadeiras no Parlamento alemão. A SPD teve uma votação de 20,5%, perdendo 5,2% e 40 cadeiras no Parlamento alemão. Mas, mesmo assim, eles se configuram como uma maioria confiável no Parlamento alemão.
É interessante notar - eu acho que isso é de interesse também para esta Casa - que a democracia alemã tem um sistema que, muitas vezes, é citado no Brasil como um modelo possível a ser seguido, um modelo de eleição, de processo eleitoral baseado numa combinação de voto distrital com voto de lista.
Curiosamente, Excelência, Sr. Presidente, isso faz com que o número de integrantes do Parlamento alemão seja flexível, porque eles obedecem a uma regra de permanente proporcionalidade com voto de lista. Mas, como há o voto distrital e, muitas vezes, isso cria um desequilíbrio, em função do fato de que o primeiro que passa é que é eleito, é possível crescer a participação do Parlamento alemão, que está, em princípio, baseada no número 598.
Mas, nessa instância, por exemplo, existem hoje 709 membros do Parlamento alemão, porque o princípio formador central é respeito integral à proporcionalidade dos votos de lista, para fazer com que a representação parlamentar seja equivalente à proporcionalidade dos votos que foram dados aos partidos que integram. É também conhecido o fato de que o sistema alemão não permite representação parlamentar a partidos que não obtenham 5% dos votos nacionais. Isso faz com que haja uma representação partidária no Parlamento relativamente reduzida.
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No momento atual, nós estamos com o maior número de partidos no Parlamento, desde 1953, e são seis partidos: os dois já mencionados, que formam a maioria; um novo partido, criado já para as últimas eleições, mas que, nas últimas eleições, não obteve votos suficientes para ter representação parlamentar, que se chama Alternativa para a Alemanha, que, como todos os senhores e as senhoras sabem, é um partido com uma tendência mais restritiva em relação à abertura da Alemanha, tanto no que diz respeito à imigração, como no que diz respeito à sua integração plena no âmbito da União Europeia; há também uma representação da esquerda, que é um partido que se juntou com remanescentes do comunismo da Alemanha oriental, manteve uma votação relativa, teve um crescimento pequeno de 0,6% e mais cinco cadeiras nessa votação; há também uma outra característica, pela qual a Alemanha já vem sendo conhecida, que é a participação do Partido Verde, que, inclusive, já fez parte do governo numa coalizão com os social-democratas, a algum tempo atrás, no âmbito do governo do Schröder. O Partido Verde também cresceu marginalmente, com 0,5%, e ganhou 4 cadeiras adicionais no Parlamento atual.
Então, essa composição foi custosa, demorou cinco meses para ser concluída. Mas agora já está em curso e há uma expectativa de que ela possa trazer uma harmonia, uma estabilidade não apenas para a Alemanha, mas no âmbito das convulsões sob as quais a própria União Europeia se vê submetida nesse passado recente.
Há também especulações de que o Partido Social-Democrata tem muito a perder, do ponto de vista eleitoral, por ter passado a integrar essa coligação, uma vez que ele já perdeu votos significativamente, em função desse mesmo fenômeno, de uma eleição para outra, apesar de ter influenciado, de forma relevante, as políticas estabelecidas.
Evidentemente que ele cobrou um preço elevado para integrar essa nova coalizão, assumindo não apenas tradicionalmente a função do Ministério das Relações Exteriores, mas também uma que sempre foi reservada para a própria CDU, que é o Ministério das Finanças.
Do ponto de vista econômico, a Alemanha é um país com uma estabilidade muito significativa. É uma economia muito importante, a maior economia, por larga margem, da Europa. Hoje, com cerca de US$4,2 trilhões em PPC, ou seja, em paridade de poder de compra, e cerca de US$3,7 trilhões em economia nominal. Na paridade de poder de compra, a Alemanha é a quinta do mundo, porque a Índia, nessa classificação, supera até o próprio Japão. Na avaliação estritamente nominal, ela fica atrás de Estados Unidos, China e Japão, como quarta economia mundial.
Pontos salientes da economia alemã, ao longo de todo esse período do pós-guerra, tem sido, em primeiro lugar, a disciplina fiscal e uma aversão ao risco. Essa disciplina alemã fez com que, entre outros elementos, por exemplo, a Alemanha tenha sido possivelmente o menos afetado dos países europeus na recessão que afetou o mundo industrializado, sobretudo, mas o mundo todo, a partir de 2007/2008.
A Alemanha recuperou em um ano a sua capacidade. Ela teve declínio econômico apenas durante um ano, contrapondo-se, por exemplo, ao Reino Unido, que só veio a recuperar a sua capacidade econômica cinco anos depois do início da recessão; contrapondo-se, por exemplo, à Itália, que até hoje ainda não recuperou a sua condição econômica de produção prévia à crise que se abateu sobre a Europa e sobre o mundo industrializado, e mesmo a França, que teve uma recuperação um pouco mais rápida, mas que, ainda assim, não tão rápida como a Alemanha. A Alemanha teve um crescimento econômico de cerca de 2,5%, no ano passado, o que é muito acentuado para uma economia madura. Prevê-se que, neste ano, cresça 2,3%, novamente um indicador importante. Tem uma inflação reduzida de 1,8% e uma conta corrente altamente positiva, em função da relevância de seu comércio: 8,1%.
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É um país que possui uma característica - ou duas - para as quais eu também chamaria a atenção das Srªs Senadoras e dos Srs. Senadores e de V. Exª, Sr. Presidente. Em primeiro lugar, o fato de que a Alemanha é um país com um comércio muito intenso. O fluxo de comércio da Alemanha representa cerca de 70% do seu PIB, contrapondo-se, por exemplo, ao Brasil, em que esse fluxo de comércio é cerca de 24% da nossa economia. Outra característica surpreendente para uma economia tão madura e sofisticada é o fato de que, até hoje, o PIB industrial da Alemanha é muito significativo. Então, a indústria, na Alemanha, representa cerca de 30% do PIB do país. Essas características são importantes. Tem um comércio muito ativo. Apesar de mais de 50% do comércio da Alemanha se dar no âmbito da relação com a Europa, a China é o principal parceiro comercial da Alemanha nos últimos dois anos, ou seja, a incursão da China não é apenas aqui na América Latina, mas é muito importante também nessa parceria com a Europa e com a Alemanha, em particular.
Sobre a relação bilateral, eu vou falar brevemente, para depois me estender um pouco mais sobre a minha visão de como nós devemos prosseguir para dar ampliação a essa relação.
Em primeiro lugar, é preciso dizer que é uma relação de grande densidade há muito tempo. Mesmo antes da criação do Estado alemão, a influência alemã, seja através da Áustria, seja através de personagens alemãs, começa com o começo do Brasil, e o caso mais óbvio é o próprio Hans Staden, que escreve um livro fascinante e que ganha projeção no seu próprio país e na sua cidade de origem em função dessa estada aqui. Posteriormente, a Casa de Bragança tinha uma relação com a Casa Habsburgo e com os reinos alemães. Isso favoreceu, como lembrou muito bem a Senadora Ana Amélia, o processo de imigração, e a Alemanha passou a ser o primeiro país europeu - o Senador Lasier, que está aqui, vem do mesmo Estado onde a influência é muito grande - a ter oficialmente acesso à imigração para o Brasil. Apesar de o número de imigrantes alemães para o Brasil ter sido inferior ao de outras nacionalidades, como ela começou muito antes, a influência é muito significativa, e a herança é muito grande. Hoje, o IBGE estima, por autodeclaração nas suas pesquisas, que 12 milhões de brasileiros tenham ascendência alemã de alguma forma. Evidentemente, isso é concentrado nos Estados do Sul, mas é presente também em São Paulo, no Rio de Janeiro, no Espírito Santo e na Bahia.
Outra dimensão importante é baseada no fato de que, apesar de a Inglaterra ter o predomínio do Brasil colonial e mesmo do jovem Império no relacionamento comercial e financeiro, a Alemanha começa a fazer incursões importantes, já a partir do século XIX. E, também do ponto de vista cultural, apesar da preponderância da influência francesa - o Senador Cristovam não está mais aqui, mas ele saberá muito mais do que eu, certamente -, a partir de Recife, no Nordeste, no século XIX, buscou-se uma cultura alternativa ao positivismo francês como forma de influência do pensamento brasileiro. Está aqui o Senador Armando Monteiro, que também é conhecedor dessa matéria.
Então, a Alemanha tem uma influência importante na relação com o Brasil desde sempre. Nós temos essa presença populacional significativa e, concomitantemente, como sabem os senhores, uma imigração brasileira para vários países europeus, inclusive a própria Alemanha, onde hoje se encontram cerca de 90 mil brasileiros. Afora isso, nós temos uma densidade no relacionamento de cooperação técnica. A Alemanha é o principal parceiro histórico e presente de cooperação técnica com o Brasil, e mais de 2,8 bilhões de euros já foram empregues, de forma concessional, pela Alemanha nessa relação. A média anual ainda é relativamente importante, sobretudo dado ao fato de que o Brasil não é mais um país que necessite tanto disso - cerca de 22 milhões. Situa-se em muitas áreas, todas elas importantes. A Alemanha, sobretudo na questão de capacitação industrial... De novo, cito aqui o Senador Armando Monteiro, que, com seu conhecimento da matéria, sabe que nós fizemos muitas coisas no Brasil, inspiradas e com a cooperação da Alemanha, com base no modelo Fraunhofer de capacitação tecnológica.
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A Alemanha foi parceira fundamental para o PPG7 na questão ambiental, que o senhor conhece tão bem, Sr. Presidente, e continua sendo parceira fundamental. Inclusive, ajudou o Brasil a montar, nessa escassez de recursos fiscais, o Cadastro Ambiental Rural, fruto desta nobre obra que foi construída nesta Casa também, que é o novo Código Florestal. A Alemanha foi instrumental para permitir que isso se consolidasse. Ou seja, há uma relação muito densa na área de cooperação - não vou me estender muito sobre isso.
Vou falar agora sobre a questão política, que, evidentemente, é um dos aspectos fundamentais.
O Brasil e a Alemanha estabeleceram e elevaram, para o nível de parceria estratégica, o relacionamento tão tradicional entre nós a partir de 2002. E, em 2012, a Alemanha sugeriu a criação de um grupo de consultas políticas de alto nível, que realizou a sua primeira reunião em 2015, que resulta ser uma reunião muito ambiciosa, com a presença não apenas dos Líderes - no caso, a Primeira-Ministra da Alemanha e o Presidente do Brasil, ou a Presidenta -, mas também de diversos Ministros, em conversas que se realizam, teoricamente, a cada dois anos. Em função de dificuldades no processo eleitoral na Alemanha e na formação do novo governo, apesar de ter sido oferecida uma data, em 2017, para a segunda etapa desse processo, não foi possível realizá-la, e os alemães agora propõem que isso se realize no primeiro semestre de 2019.
A relação comercial é uma relação de grande densidade, assim como a relação de investimentos, mas, infelizmente, decaiu, significativamente, Sr. Presidente, nos últimos quatro, cinco anos: chegou a um pico de US$24 bilhões de comércio total e, hoje, se encontra em cerca de US$14 bilhões. Também a questão de investimentos é altamente significativa. O Brasil é o recipiendário principal dos investimentos alemães na América Latina. São Paulo, no seu momento, foi a maior cidade industrial alemã do mundo, incluindo as cidades alemãs, e, hoje, disputa com Xangai essa condição - é difícil saber qual das duas tem essa preponderância. Mas a Alemanha tem um investimento fundamental e reconhecido por todo o Brasil no processo de industrialização no Brasil a partir dos anos 50. Empresas como a Volkswagen, a Mercedes, a Thyssen, a Siemens têm uma participação extraordinariamente relevante e continuam empenhadas em fazer isso. Eu, como Presidente da Apex, tive, inclusive, a oportunidade de assinar com a Siemens um acordo de investimentos, em que eles pretendem colocar cerca de US$2 bilhões adicionais.
Finalmente, Sr. Presidente - desculpe-me, porque eu acabo de me dar conta de que me estiquei um pouco no horário -, eu queria dizer que é muito difícil fazer um programa de trabalho para uma projeção com a Alemanha em função da extraordinária densidade e multiplicidade de elementos de consequência. E, como dizia um Embaixador antigo, aquele que muito abraça pouco aperta. Mas a verdade é que é difícil não ser ambicioso nessa relação com a Alemanha.
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Eu queria aqui qualificar três dimensões que acho fundamentais. Primeiro, nós não podemos examinar a Alemanha apenas no contexto da sua já riquíssima relação bilateral com o Brasil. É importante reconhecer a Alemanha com um ator fundamental e crescente no ambiente global e multilateral, apesar do fato, devido às condições da guerra e à situação provocada pela própria Alemanha, de que a Alemanha só passou a integrar plenamente as Nações Unidas em 1973, e com muita timidez, porque havia uma certa inibição de participação em áreas onde a Alemanha achava ainda que tinha uma certa responsabilidade, particularmente, nessa questão de presença militar. Então, a Alemanha tinha enorme relutância de fazer suas forças de defesa participarem de atividades conjuntas das Nações Unidas. A primeira vez que isso se deu foi na Bósnia, em 1993, e, fora da região europeia, apenas em 2001, no Afeganistão. Mas a visão alemã do sistema multilateral é muito próxima da do Brasil. E nós temos ampliadas esferas de cooperação de forma significativa.
A outra dimensão extremamente importante é a Alemanha como carro-chefe condutora da União Europeia. Nós sabemos que a União Europeia passa por desafios significativos de fora e de dentro, mas a Alemanha tem sido o grande ator estabilizador desse processo e tem feito uma contribuição altamente significativa nesse percurso. Portanto, se me for dado o privilégio de vir a ocupar essa cadeira de Embaixador do Brasil na Alemanha, não há dúvida de que será necessário um destaque especial nessa dimensão da relevância da Alemanha no contexto ao União Europeia e nessa dimensão da relevância da Alemanha crescente no contexto multilateral.
Na parte específica da bilateralidade, é claro que tem que se dar um foco na recuperação dos investimentos e na recuperação do comércio, dar um foco especial também em algumas áreas de cooperação que têm sido muito proveitosas para o Brasil - como citei, essa área tecnológica industrial é muito importante, assim como a área do meio ambiente - e também reforçar a dimensão consular em função dessa presença relevante de população brasileira na Alemanha, que hoje, como mencionei, chega a cerca de 90 mil.
Finalmente, Sr. Presidente, eu quero dizer que - muito obrigado - essa cadeira que, possivelmente, com a aprovação desta Casa e do Plenário, posso vir a ocupar foi ocupada por figuras de muito destaque recentemente e no passado, mas, principalmente, quero fazer referência ao próprio Barão do Rio Branco, que ocupou essa função de 1901 a 1902, quando veio chamado para ser Chanceler do Brasil, um momento de grande significado. Então, é um orgulho muito significativo para mim estar sendo submetido à apreciação desta Casa e, posteriormente, espero eu, também do Plenário do Senado para poder ocupar essa função.
Muito obrigado, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Muito obrigado ao Sr. Embaixador Roberto Jaguaribe Gomes de Mattos pela sua exposição.
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Pelos oradores inscritos, passo a palavra a S. Exª o Senador Lasier Martins, Relator do indicado, o Embaixador Jaguaribe.
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Muito obrigado, Presidente, Collor.
Há certas pessoas, Presidente Collor, que nós somos levados a admirar por osmose. É o caso do nosso eminente Roberto Jaguaribe, que acaba de nos fazer uma belíssima exposição, mostrando já um profundo conhecimento do país onde ele vai nos representar. Fiquei sabendo ontem, inclusive, através da sua própria palavra, que já está adiantando seus conhecimentos do idioma alemão, que ele já sabe um pouco. E por ser filho de uma figura admirável, Helio Jaguaribe, que aprendemos a admirar muito como cientista político, como sociólogo, como jornalista, um homem de incontáveis virtudes e predicados e que - que pena - se acha agora recolhido à vida privada por uma questão de doença, aos 93 anos de idade. Mas me senti muito honrado, Embaixador Jaguaribe, por ter sido Relator da sua indicação e gostei muito da sua exposição.
Quanto ao meu prezado coestaduano de São Borja, Embaixador Fernando Marroni de Abreu, cujo prestígio e competência já conheço, foi aluno da Faculdade de Engenharia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, tem uma bela história. Conheço também o seu gremismo - eu, que sou Colorado - e respeito a brilhante fase que atravessa o seu clube, mas ele sabe muito bem que, no Rio Grande do Sul, caracteriza-se uma gangorra: quando um está no alto, o outro está no baixo, e isso se reverte seguidamente. Eu espero que a do meu clube, proximamente, esteja no alto.
Eu queria fazer uma pergunta a cada um dos nossos eminentes sabatinados.
O Embaixador Jaguaribe, praticamente, não deixou pedra sobre pedra. Ele fez uma exposição sobre os vários aspectos da Alemanha. Mas eu tenho a curiosidade de saber o seu pensamento com relação às tendências. A Chanceler Merkel está indo para o seu quarto mandato, mas num país que está cercado por tendências direitistas: a Áustria, a Polônia, e há insinuações já da Hungria. Pergunto se ele acha que não há o risco de, daqui a pouco, virar também uma Alemanha conservadorista e xenófoba, como já foi no passado.
Nós brasileiros temos uma relação enorme com a Alemanha, particularmente no meu Estado. Os alemães chegaram ao Rio Grande do Sul pelo Rio dos Sinos e se estabeleceram em São Leopoldo, que hoje é uma cidade grande, uma cidade tipicamente alemã, assim como Novo Hamburgo e toda aquela região de Gramado, de Parobé. Temos uma população de descendência alemã enorme no Rio Grande do Sul e uma relação comercial extraordinária. Então, interessa-nos tudo que acontece com a Alemanha. Só não queremos mais o 7 a 1. Queremos devolver alguma coisa nesta Copa do Mundo. E aquilo por que mais rezamos é para que a final seja entre o Brasil e a Alemanha, lá na Rússia. Nós ansiamos por essa revanche.
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Então, eu queria saber se há alguma tendência, sob esse ponto de vista ideológico, político da Alemanha. Como V. Exª interpreta isso, já que, com relação a algumas dificuldades econômicas e ao PIB, V. Exª já realçou bastante?
Com relação ao meu prezado Fernando Marroni de Abreu, do Rio Grande do Sul, que já tem uma boa experiência também como diplomata, eu queria fazer uma pergunta sobre o desperdício de alimentos. Aqui no Senado eu fui Relator dessa matéria há algum tempo, há uns dois anos mais ou menos, e fomos apurando, pouco a pouco, que o mundo desperdiça cerca de 1,3 bilhão de toneladas de comida por ano. Então, nós precisamos, já que o nosso embaixador gaúcho está indo para a FAO, para a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, se possível, contribuir para uma política que economize, quem sabe através de algumas tecnologias que direcionem comida para esse povão, principalmente africano. E nós também temos, na América Latina e particularmente no Brasil, muita gente que passa fome, e com tanto alimento desperdiçado. Pergunto se pensa em contribuir também nesse particular.
São as duas perguntas que queria formular, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Muito obrigado a V. Exª, Senador Lasier Martins.
Passo a palavra a S. Exª o Senador Armando Monteiro.
O SR. ARMANDO MONTEIRO (Bloco Moderador/PTB - PE) - Sr. Presidente, eu queria cumprimentar os dois Embaixadores.
Não pude assistir à exposição do Embaixador Fernando, mas fiquei aqui muito atento à exposição do Embaixador Roberto Jaguaribe, que tem uma trajetória muito densa e muito rica na sua vida diplomática, mas não apenas estritamente nas missões diplomáticas, pois pôde ter em diferentes momentos uma participação em estruturas importantes do Governo. Mais recentemente, o Embaixador Jaguaribe preside a Apex, que é uma agência de promoção de exportação muito importante. E ele vem realizando lá um trabalho, eu diria, extremamente bem sucedido, usando essa estrutura, essa plataforma tão interessante como a da Apex.
Eu queria me ater aqui a duas questões, que endereço, inicialmente, ao Senador Jaguaribe. A primeira é a questão do acordo Mercosul-União Europeia, que é algo muito importante. Talvez seja a frente mais importante de negociação do País e, mais do que isso, eu diria que é uma espécie de teste fundamental para a sobrevivência do próprio Mercosul. O Mercosul viveu tempos de certo imobilismo, e eu diria que o relançamento do Mercosul depende em grande medida do êxito desse acordo. E há indicações que nos levam a crer que é possível, sim, depois de muito tempo, imaginar que venhamos a fechar o acordo este ano.
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O Embaixador Jaguaribe, que acompanha este tema, sabe que a Alemanha exerceu um papel muito construtivo e muito pró-acordo ao longo de todo esse tempo. Nós contamos com muitas resistências, por exemplo, nos temas agrícolas, especialmente uma resistência muito forte da França, da Irlanda, mas, durante todo esse tempo, a Alemanha teve um papel muito forte, muito construtivo.
Então, eu queria ouvi-lo sob essa perspectiva, finalmente, da celebração do acordo. Há ainda alguns temas de regras de origem, algo ligado ao tema da indústria automotiva, que é um tema sensível nessa perspectiva. Eu queria ouvir, então, do Embaixador uma avaliação.
E quero dizer, Embaixador, que há um tema muito importante a que o Embaixador Jaguaribe se referiu, que é o tema da cooperação na área, sobretudo, da indústria com a Alemanha. Eu acho que o Brasil está desafiado como ainda a principal plataforma manufatureira da América Latina; o Brasil está desafiado nessa perspectiva da indústria 4.0, da manufatura avançada. A indústria brasileira tem muito a aprender com a experiência alemã, porque a Alemanha é, sim, uma potência industrial extraordinária. E eu diria que ela se caracteriza hoje pela produção de bens de alta densidade tecnológica, o que permitiu, inclusive, que ela pudesse fazer até com a própria China um arranjo interessante. Ou seja, a Alemanha é grande exportadora de manufaturados para a China.
Então, nessa perspectiva, revisitando aqui, Embaixador, aquela agenda do último encontro de alto nível em 2015 - eu tive oportunidade, na época, como Ministro, de participar dessa interlocução em que 14 Ministros da Alemanha estiveram aqui no Brasil -, destaco exatamente este ponto: foi assinado um acordo com a Câmara de Indústria e Comércio da Alemanha exatamente no tema da indústria 4.0 e na perspectiva de um diálogo com o Ministério de Economia e Energia.
Mas há outras áreas, em termos de desenvolvimento tecnológico, como, por exemplo: o tema da Internet das Coisas, smart grid para as cidades inteligentes, projetos de eficiência energética, que é algo, a meu ver, muito importante. Há os temas de conectividade e mobilidade urbana, sobre os quais eu acho que temos muito o que aprender com a Alemanha. O tema de energias renováveis também é um tema presente nessa agenda, e a Alemanha tem um papel importante.
Finalmente, destaco que essa parceria com a Sociedade Fraunhofer é muito importante para a indústria brasileira. É, sem dúvida nenhuma, a mais importante organização de pesquisa aplicada da Europa e se destinge pela excelência na construção de soluções inovadoras para o setor produtivo.
Então, eu gostaria, nessa perspectiva, também de ouvi-lo - lamentando que o segundo encontro não tenha acontecido, o de 2017 - sobre como ele vê sobre essa pauta para o encontro do próximo ano. Que temas deveriam ser priorizados nessa perspectiva?
Também me permito endereçar aqui ao Embaixador Fernando Marroni de Abreu um tema relacionado com o Semiárido. O Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola tem um projeto importante para capacitar agricultores e familiares e promover um incremento em técnicas produtivas no Semiárido brasileiro. Como V. Exª avalia essa iniciativa e quais Estados seriam beneficiados?
Eram essas, Sr. Presidente, as minhas questões.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Muito obrigado a V. Exª, Senador Armando Monteiro.
Eu passo a palavra, agora, a S. Exª o Senador Hélio José.
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O SR. HÉLIO JOSÉ (Bloco Maioria/PROS - DF) - Meus cumprimentos, Sr. Presidente Fernando Collor; meus cumprimentos ao nobre Fernando José Marroni de Abreu, indicado para a FAO, e ao Roberto Jaguaribe Gomes de Mattos, que esteve me visitando inclusive. Parabéns pelo trabalho!
Para o nosso nobre Dr. Jaguaribe. A produção de energia sustentável, sobretudo por meio de painéis solares e geradores eólicos, dá conta de algo próximo de 80% de toda a energia requerida pela Alemanha. Isso posto, indago: de que forma ambos os países poderiam ampliar a cooperação bilateral no sentido tanto de transferência de tecnologia quanto de desenvolvimento conjunto de novas fontes de energia sustentável? E o que foi feito até aqui sobre essas possibilidades?
Dr. Jaguaribe, no Brasil, nós tivemos uma posição um tanto quanto de retaguarda com relação à energia solar - lamentável, porque o Brasil tem um potencial gigante, de 28,5 mil gigawatts de energia solar, enquanto a matriz brasileira elétrica é de 172 gigas apenas - e um grande desenvolvimento da energia eólica, tornando o Brasil um dos maiores competidores na questão de geradores de energia eólica, de torres e de pás, hélices. Então, o Brasil hoje é um dos grandes players de mercado nesse setor e, lamentavelmente, está na idade da pedra com relação à energia solar, que temos de sobra aqui nesse País.
Então, seria interessante que o senhor, como Embaixador brasileiro num dos países onde ambas as energias estão bem desenvolvidas, ambas as tecnologias estão bem desenvolvidas, colaborasse, da melhor forma possível, para que o Brasil, sendo um dos maiores produtores de silício do mundo e de outras matérias-primas necessárias para o bom aproveitamento da energia solar, saísse da triste realidade que nós temos hoje, com um potencial enorme com dificuldades de ser explorado pelo nosso povo, porque os preços não são competitivos, porque a tecnologia brasileira ainda não aprimorou formas de melhor fazer os inversores e melhor fazer os captadores dos painéis de energia solar. Então, precisaríamos atuar bastante nessa linha, e tenho certeza de que a experiência internacional de V. Exª nos ajudará muito nessa área.
Estaremos aqui - sou o Presidente da Frente Parlamentar Mista da Infraestrutura e sou, exatamente, um concursado público federal da área de infraestrutura - para colaborar nesse importante setor para o povo brasileiro e também para abrir novos mercados para a nossa produção eólica.
Outra pergunta para V. Exª: quais os riscos de o desfecho das últimas eleições alemãs, com ascensão da extrema direita, contaminar as políticas migratórias da Chanceler Merkel? E a eventual mudança no tratamento dado aos migrantes na Alemanha pode atingir os brasileiros que lá se encontram? Em caso afirmativo, de que forma e o que podemos fazer para minorar esses efeitos?
O senhor, meu nobre Jaguaribe, além de diplomata, é engenheiro de sistemas, graduado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC), Presidente da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil) - é o atual Presidente -, e conhece muito bem a área de propriedade industrial e intelectual. Pois bem, dirigiu essa área no Governo brasileiro. Sua experiência nessas áreas lhe dará condição especial nas negociações comerciais e para a abertura de novas perspectivas ao comércio de bens com a inteligência incorporada. Em sua análise, quais as perspectivas brasileiras para melhorar a qualidade de nossas trocas comerciais com a Alemanha? E o que o Brasil precisa fazer ter uma presença maior naquele mercado?
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Finalizando, os alemães são uma das populações que mais fazem turismo no mundo. Eu sou o Vice-Presidente da Frente Parlamentar do Turismo, e sem dúvida o PIB brasileiro só vai mudar quando tiver um investimento mais preciso com relação à política de turismo. Como é que a experiência do senhor em várias áreas pode também colaborar para que nós tenhamos uma balança mais favorável com relação ao turismo Brasil-Alemanha?
Questões para o nosso nobre Dr. Fernando José Marroni de Abreu, nosso Embaixador indicado junto à FAO.
O ambicioso objetivo de erradicar a fome na África, até o ano de 2025, não está atualmente ao alcance, lamentavelmente. De acordo com relatório da FAO "O Estado da Segurança Alimentar e da Nutrição no Mundo 2017", a fome do mundo está aumentando novamente após um prolongado declínio. Este aumento está relacionado aos conflitos e às secas que afetaram muitos países, especialmente nas áreas rurais. A que se deve essa situação negativa, mesmo com o avanço fenomenal das tecnologias agrícolas e de logística de distribuição? Então, seria importante ouvir do senhor uma opinião sobre essa situação.
Em 2014, meu nobre Fernando Marroni, depois de reduzir 82,1% o número de pessoas subalimentadas, o Brasil finalmente deixou o vergonhoso Mapa da Fome da ONU. Menos de quatro anos depois, o regime que destituiu a Presidente Dilma impôs uma agenda perversa, que afetou, sobretudo, a população mais pobre. Cortes em benefícios e programas sociais excluíram do Bolsa Família 1,1 milhão de famílias, o que representa 4,3 milhões de pessoas, a maioria crianças. Com o aprofundamento da crise, pela política econômica, cresceu o desemprego, que hoje está por volta de 14 milhões, e vieram mais cortes em ações como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).
O Brasil é parceiro histórico da FAO e contribuinte para as suas políticas e diretrizes. Como V. Exª avalia deva se manter o relacionamento entre o Brasil e a organização, a FAO? Como os programas podem auxiliar para uma nova superação da situação de fome no Brasil?
Em 2017 - terceira pergunta - a capacidade instalada de geração de energia da biomassa chegou a 14.630MW, superando a geração de Itaipu, e o equivalente a 9% do parque elétrico brasileiro. A maior parte, 77% da bioeletricidade do País, tem como fonte geradora as usinas de açúcar e álcool, que aproveita o bagaço da cana. Por outro lado, as florestas plantadas, a indústria de carvão e celulose, responde por 22% da energia elétrica produzida pela biomassa. Esse imenso potencial da biomassa para a energia, importantíssimo para a nossa matriz energética, pode, entretanto, concorrer com a exploração agropecuária. Pergunto: como essas questões envolvendo a agricultura e a energia são tratadas no âmbito da FAO? Qual a posição do Brasil na FAO com respeito às fontes renováveis de energia derivadas da biomassa?
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Concluindo, o Brasil tem um potencial gigante em nível de agricultura familiar, em nível da segurança alimentar mundial. Assim, como o senhor, um Embaixador experiente, que está sendo indicado pelo FAO, pode colaborar para melhor aproveitar a nossa inclinação de fixar, via agricultura familiar, o homem no campo e poder propiciar uma maior produção? Isso porque a maioria da nossa alimentação vem da agricultura familiar. Como podemos colaborar de uma forma mais efetiva com essa política e até passar as experiências brasileiras para outros países que também estão com crises alimentares?
Muito obrigado, Excelência.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Muito obrigado a V. Exª, Senador Hélio José.
Antes de passar a palavra aos Srs. Embaixadores, gostaria de fazer um adendo de algumas perguntas que nos chegaram pelo e-Cidadania; é a participação dos nossos internautas.
De Fernanda Carvalho, do Rio de Janeiro: "O Brasil é o celeiro do mundo, porém não estamos aproveitando nosso potencial. Há muitas terras improdutivas. O que as Nações Unidas podem fazer para que o Brasil realmente faça uma reforma agrária para poder aumentar sua capacidade produtiva?"
Também dela, Fernanda Carvalho, do Rio de Janeiro: "O 7 a 1 foi só um exemplo de como a Alemanha é superior ao Brasil em vários aspectos." Há controvérsias. (Risos.) "Deveríamos enviar mais estudantes para a Alemanha para aprendermos mais com eles, sobretudo na área industrial?"
De Bruno Garcia, de São Paulo, também duas perguntas. A primeira: "Gostaria de saber qual a importância do Brasil para a FAO e para as cooperações internacionais de desenvolvimento que ela organiza em conjunto? Parabéns à Comissão e a todos os Senadores e convidados. Estou sempre acompanhando o trabalho de vocês."
Muito obrigado ao Bruno.
A outra pergunta dele: "Gostaria de saber qual a chance de o Brasil ter parcerias com a Alemanha na área de saúde pública, sanitária e tecnológica?"
Outra pergunta de Son Marinho, do Rio de Janeiro: "Sou nutricionista. Gostaria que o candidato [no caso, o Embaixador Fernando] comentasse sobre a realidade atual da alimentação no Brasil. Nosso País continua ainda fora do Mapa da Fome da FAO?"
Antes de passar às S. Exªs os Srs. Senadores, eu gostaria apenas de fazer um adendo ao que aqui foi dito sobre os descendentes de alemães. S. Exª o Senador Lasier Martins, gaúcho, falou sobre a imigração alemã e citou a cidade de São Leopoldo, no Vale dos Sinos, que faz parte da Grande Porto Alegre.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Exatamente.
Foi lá que nasceu meu avô, descendente de alemães, de pai e mãe alemães, Lindolfo Leopoldo Boeckel Collor - meus pais deixaram o nome Boeckel de fora, por isso que eu tenho somente o Collor, que é da minha mãe, filha de Lindolfo Collor, e o Mello, de meu pai, que é de Alagoas. Então, há também, Embaixador - o senhor chegou até à Bahia; podia chegar um pouco mais acima -, em Alagoas, descendentes de alemães.
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Eu fico muito honrado com isso, porque sou um admirador da capacidade de recuperação do povo alemão, da sua capacidade de se reintegrar depois de longos anos e de continuar sendo a maior potência da Europa. É claro que, como disse aqui um dos nossos internautas, temos muito a aprender com a Alemanha, como também temos algumas coisas a ensinar.
E também há um segundo ponto, que diz respeito à questão da indústria alemã. Houve uma oportunidade em que eu estava em Bonn, antes de tomar posse na Presidência, numa reunião com todos os presidentes mundiais das empresas e indústrias com filiais aqui no Brasil - Volkswagen, Siemens, enfim, todos com indústrias no Brasil estavam presentes na pessoa de seus presidentes mundiais. O Presidente mundial da Volkswagen naquela época, talvez um pouco mais relaxado pela presença do meu ex-sogro, que era detentor de 20% da Volkswagen no Brasil, acho que se sentiu muito à vontade para ganhar certa intimidade e fazer algumas perguntas que me pareceram impertinentes. Então, numa das respostas às perguntas que ele formulou, eu disse: "Antes de o senhor dizer o que está dizendo" - que era alguma impropriedade - "o senhor comece a fabricar no Brasil carros, porque o que o senhor fabrica são carroças". Foi daí que nasceu aquela questão das carroças. Ele falou: "Mas nós fabricamos carros!" Eu disse: "Não, os senhores não fabricam carros; fabricam carroças."
Então, naquela época, mesmo um parque industrial tão avançado quanto o alemão tinha aquele cacoete de país extremamente desenvolvido que mandava para economias menos desenvolvidas e extremamente fechadas, como era a brasileira naquele momento, o refugo do material que sobrava de carros inadequados para funcionamento da Europa naquele momento e na própria Alemanha. Então, depois da abertura comercial, a Volkswagen realmente começou a produzir carros de melhor qualidade.
Houve outro episódio também. Quando foi feita a abertura comercial, estabeleci um regime de redução das alíquotas para importação, dando certo tempo para uma adequação da nossa indústria - o que não foi naturalmente necessário, mas eu tinha que forçar um pouco a mão para acelerar esse processo. O Presidente da Volkswagen no Brasil, então, me procurou, logo depois da abertura, dizendo o seguinte: "Eu queria pedir ao senhor que estabelecesse um regime de cotas para a importação de carros, porque nós não temos condições de competir com os importados." Eu disse: "Não; não vou estabelecer regime de cotas, porque a decisão já está tomada, já está em pleno curso. Vamos seguir com essa redução das alíquotas, conforme estabelecido na medida provisória aprovada pelo Congresso Nacional." Aí ele disse: "Então, eu vou ter de fechar uma das fábricas que nós temos aqui no Brasil." Eu perguntei: "Só por curiosidade, qual delas o senhor pretende fechar?" Ele disse: "A de Taubaté", que era a mais nova e melhor fábrica que eles tinham na época. Eu falei: "Perfeitamente. Então, o senhor me faça um favor. O senhor saia do meu gabinete, vou pedir ao meu assessor de imprensa que o acompanhe para que o senhor dê uma coletiva à imprensa, e anuncie que vai fechar a fábrica de Taubaté, porque o Presidente da República não aceitou a sua solicitação de estabelecer um regime de cotas para importação de carros". Ele fez um assentimento de cabeça, eu pedi ao meu assessor de imprensa que o acompanhasse, mas, no meio do caminho, ele desviou e não falou mais nada sobre o assunto.
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Então, foram dois aspectos interessantes que dizem respeito à questão da Alemanha e à questão relacionada à sua indústria.
Agora, portanto, passo a palavra ao Sr. Embaixador Fernando José de Abreu, para responder as indagações que foram formuladas por S. Exªs os Srs. Senadores e as Srªs Senadoras e pelos nossos internautas.
O SR. FERNANDO JOSÉ MARRONI DE ABREU - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Eu queria inicialmente agradecer os comentários feitos pelo Senador Lasier Martins, do meu Estado, que tive o prazer de cumprimentar e com quem conversei ontem à tarde, e dizer que a questão do desperdício de alimentos é, efetivamente, um dos maiores desafios que a humanidade enfrenta.
Eu queria cumprimentá-lo pela iniciativa de propor esse evento no Senado. Conforme o senhor mencionou, 1,3 bilhão de toneladas são desperdiçados. Houve um evento, dois anos atrás na FAO, concentrado nisso e se verificou que, em alguns países, cerca de 30% dos alimentos produzidos são desperdiçados das mais diversas maneiras. A primeira de todas é que os alimentos são produzidos e não conseguem sair do local de produção. Há dificuldade de acesso aos mercados. A outra é a deficiência na infraestrutura de transporte. Más estradas refletem consequências sobre perdas de transporte de safras. Veículos com capacidade e com estrutura inadequada também ocasionam perda de alimentos. Outra questão e talvez a principal de todas é a questão cultural, o maior desafio. As pessoas têm que se acostumar a comer só o que realmente necessitam, e não se servirem inadequadamente. Isso parece um gesto menor, mas é muito importante. Também volta e meia vemos na imprensa notícias de restaurantes que têm que distribuir alimentos - e nem todos são adequadamente distribuídos para a população que necessita - que não são consumidos. Então, é necessário um planejamento adequado também de micro e pequenas empresas, mas também uma formulação de uma política de governo e de um programa de governo. Então, é importante que o Brasil, mas não só o Brasil, os países de todo o mundo, países desenvolvidos, países em desenvolvimento tenham maior consciência disso e procurem nos foros adequados - e a FAO, o PMA e o Fida são foros para isso - desenvolver essa consciência na população.
Basicamente, são esses os comentários que eu gostaria de fazer sobre a sua pergunta, a qual agradeço.
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Quanto ao Senador Armando Monteiro, eu gostaria de agradecer também os seus comentários e fazer referência ao dado que mencionei na minha apresentação de que o Fida tem, sim, projetos no Semiárido, e não só no Semiárido, mas na Amazônia e no Agreste, que se propõem basicamente a apoiar e promover a agricultura familiar, com o objetivo de maior capacitação, incremento de renda e serviços essenciais a grupos vulneráveis.
Eu mencionei quatro projetos: o Projeto Viva o Semiárido, o projeto Procase Paraíba, o Negócios Rurais para os Pequenos Produtores e o Gente de Valor. Eu tenho dados de que esse último beneficiou 34 Municípios e 282 comunidades desfavorecidas.
Eu só queria mencionar que o Fida deve repassar os recursos que ele obtém no mercado internacional e frutos de contribuições para projetos em países em desenvolvimento em condições concessionais e com esses objetivos. Eu também gostaria de mencionar que eu tive oportunidade, como Chefe de Gabinete do Ministério do Desenvolvimento Agrária, em 1999, de ser presidente de um comitê gestor de um projeto da Fida para assentamentos no Semiárido e produção sustentável. Então, são dados a que nós continuamos a dar atenção. O próprio Embaixador Jaguaribe, conforme mencionei, também foi governador do Fida, e naquela ocasião foi aprovado esse projeto no valor de US$25 milhões.
Senador Hélio José, eu queria agradecer, primeiro, os comentários e dizer que o PAA (Programa de Aquisição de Alimentos) do Brasil serviu de inspiração para um projeto de cooperação com a África, justamente feito pelo Brasil, chamado Compra de Africanos para Africanos (Purchase from Africans for Africa), que foi desenvolvido juntamente com a FAO em benefício de dez países africanos e se inspirou na nossa política de produção de alimentos pela agricultura familiar, que, conforme sabemos, além de gerar renda e incrementar o mercado local, tem o benefício de dar acesso a produtos e a bens a que as populações estão acostumados. Esse projeto se concluiu no ano passado, mas foi fruto de esforços brasileiros em que replicamos a nossa experiência, coordenados pela Agência Brasileira de Cooperação. E há ainda demandas. Eu sou Subsecretário da África e do Oriente Médio, recebo, com frequência, embaixadores, e sempre há demandas, nessa área de agricultura, dos programas sociais brasileiros e especialmente da Embrapa também, para replicar nossa experiência com os países africanos.
A questão da energia também tem sido foco de atenção da FAO - e não só da FAO, mas do PMA. É um desafio maior a questão do tratamento da transversalidade de todos os temas que devem ser considerados na produção e no transporte de uma alimentação de boa qualidade e no acesso a ela, e um dos fatores que se coadunam também é a energia, é a produção de biomassa, que pode ser um dos fatores que reduzem o custo e permitem maior acesso à alimentação.
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Quanto às perguntas de reforma agrária e da produtividade, eu queria mencionar alguns dados. O Brasil tem tido uma política consistente de reforma agrária, e o grande desafio da reforma agrária não é somente a distribuição de terras, que é um fator relativamente simples; o maior desafio é dar condições aos assentados, para que possam produzir, e produzir com qualidade e com recursos financeiros adequados, e para que possam também ter acesso ao mercado. Esse é o grande desafio. Nós temos alguma experiência para compartilhar. Já há alguns projetos nessa área com países africanos e da América Latina também.
Eu queria mencionar também a importância da agricultura familiar na produção agrícola, conforme o Senador Hélio José já mencionou. Cerca de 70% da produção de alimentos são feitos por pequenos agricultores. Isso é um elemento muito importante, complementar à grande agricultura brasileira, o agronegócio, que partiu de dados já relevantes. Em 2000, por exemplo, nós exportamos US$20 bilhões; nós passamos a exportar, em 2016, US$85 bilhões do agronegócio. Então, eu queria ressaltar isso.
Eu queria ressaltar também a disponibilidade de terras. Ainda o Brasil tem um grande potencial para incrementar não só a produção, mas a produtividade.
Eu quero mencionar que ainda temos também uma capacidade de preservação do meio ambiente muito grande. Cerca de 60% das terras brasileiras ainda estão com vegetação nativa. Daí a importância também das discussões na FAO e no PMA.
Finalmente, quanto à questão feita sobre o Mapa da Fome, felizmente, o Brasil continua fora do Mapa da Fome.
Eu gostaria de ressaltar também, da minha experiência como Diretor da Agência Brasileira de Cooperação e como Subsecretário da África, que nós temos compartilhado com vários países africanos toda a nossa experiência na produção de alimentos, no incremento da produtividade, no intercâmbio de experiências com a Embrapa e outras instituições científicas brasileiras. Está aqui o Embaixador Rodrigo Baena, Embaixador em Moçambique, país com o qual nós temos 15 projetos de cooperação, a maioria deles na área agrícola. Um deles, o mais ambicioso de todos, é o ProSavana, no norte do país, com excelentes resultados.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Muito obrigado ao Sr. Embaixador Fernando de Abreu pelas suas respostas.
Passo agora a palavra ao Embaixador Roberto Jaguaribe.
O SR. ROBERTO JAGUARIBE GOMES DE MATTOS - Muito obrigado, Presidente.
Eu queria agradecer a todos os Senadores as observações e indagações e também aos internautas que acompanham.
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O Senador Lasier indaga, com muita pertinência, sobre como é a perspectiva da política da Alemanha num contexto de crescente radicalização do eleitorado, dentro da União Europeia, em particular em países relevantes vizinhos da Alemanha, como é o caso da Polônia, da Áustria e da Hungria, e do próprio fortalecimento de alianças mais xenófobas dentro da Alemanha.
Confesso, Senador, que é uma questão que preocupa todos e eu não tenho uma condição de lhe dar uma resposta cabal a respeito de como vai se desenvolver esse quadro. Eu apenas acredito em alguns elementos mais tranquilizadores. Primeiro, a tradicional ponderação da Alemanha e a sua capacidade de dar respostas econômicas adequadas para os problemas que ela tem enfrentado ao longo dos últimos 50 anos. Inclusive, dentro do quadro atual europeu, como eu tive oportunidade de mencionar, a Alemanha está se destacando por um crescimento maior do que a média da Europa, mesmo enfrentando esse tipo de dificuldade. Evidentemente boa parte dos problemas que levam à inquietação de natureza de política tem uma origem de emprego e uma origem de crescimento econômico. A Alemanha encontrou soluções de equilíbrio de relação capital-trabalho que foram, a bem da verdade, ajustadas no período da social-democracia, mas que permitiram que o governo da Primeira-Ministra, da Chanceler Angela Merkel colhesse enormes benefícios.
E, também como mencionou o Senador Armando Monteiro, no próprio governo de Schröder, traçou-se um desenho de mudança da capacidade industrial da Alemanha para mantê-la na frente da liderança global desse processo. E essa nova competência industrial alemã, que eles classificam de indústria 4.0, como também mencionou o Senador Armando Monteiro, vai fazer uma mudança geográfica da manufatura, fazendo com que o custo barato da mão de obra tenha uma incidência menor na geografia da disposição da produção. Isso, de novo, vai trazer para a Alemanha condições econômicas que, a meu juízo, podem dar satisfação às inquietações que são de natureza eminentemente econômica e a algumas das inquietações que essas questões geram.
Infelizmente, elas não são todas de natureza econômica. É difícil para um país como o Brasil, que é criado na abertura, na tolerância, entender como é possível esse tipo de comportamento tão xenófobo que, muitas vezes, nós verificamos em outros países. Mas eles têm também uma raiz cultural importante, e esse é um elemento de difícil averiguação.
Em particular, nós temos que ter presente aquilo que eu mencionei anteriormente: como a Alemanha consegue ter essa unidade agregadora durante mil anos, sem ter um Estado por trás? Há um elemento, digamos, de aglutinação cultural e étnica, que permitiu que isso se desse dessa forma. Esses elementos se veem um pouco afetados pela intromissão, no caso, de um 1,5 milhão de imigrantes que já foram aceitos pela Chanceler Merkel. Mas, por outro lado, eu acho que, dentro de uma solução europeia, já há um limite que a Alemanha vai aceitar.
A Alemanha tradicionalmente tem apoiado políticas de fortalecimento dos países que são origem dessa imigração - em particular um país de transitoriedade dos imigrantes, que é a Turquia, que, aliás, já tem uma participação importante no contexto migratório da Alemanha e muito antiga também -, de modo que eu acredito que, dentro desse contexto econômico positivo da limitação do que tem sido possível agora e de um certo estancamento das causas fundamentais desse processo, seja possível criar condições de sustentabilidade. Isso também vai, em certa medida, Senador Hélio José - agradecendo a sua pergunta sobre a questão migratória -, um pouco nesse contexto.
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Com relação às perguntas tão importantes do Senador Armando Monteiro, eu acho, Senador, que efetivamente, apesar de a Apex não estar na linha de frente do processo de negociação... Quando eu assumi a Presidência da Apex, eu tive a oportunidade de fazer algumas sugestões sobre o decreto da Apex e incluí o fato que eu achava muito importante de que a Apex deveria ter uma participação mais ativa nas negociações comerciais; não na linha de frente - porque não é competência do Itamaraty, mas do MDIC -, mas na retaguarda, porque a Apex é a interface ampla com o setor exportador, que é quem sabe a demanda que eles têm de entrada nos mercados.
Então, em meus diálogos com os atores fundamentais desse processo, o que eu colho é o que o senhor conhece: há uma expectativa altamente positiva de que seja possível a conclusão do acordo neste ano. Como o senhor mencionou, a Alemanha, de fato, é uma das parceiras importantes nesse processo, na medida em que ela tem um interesse claro em que o acordo seja concretizado. Como eu mencionei, a Alemanha tem 30% do seu PIB derivado da indústria, de extraordinária competitividade global, como mencionou o Presidente, Senador Collor, inclusive vendendo proficuamente para a China. Quer dizer, a China é grande compradora de bens de capital da Alemanha. Portanto, ela tem enorme interesse em que o Mercosul passe a ter mais facilidade de acesso a isso. Por outro lado, a agricultura na Alemanha representa 0,6% do seu PIB e, portanto, tem uma capacidade relativamente reduzida de impacto comercial. Mas nós sabemos todos que o lobby agrícola europeu como um todo é forte, muito mais por razões de natureza política e social do que pelo seu peso relativo na economia.
De qualquer forma, a expectativa de todos é que seja possível realizar esse acordo - e aí já vou adiantando para outras perguntas que foram dirigidas. E esse acordo vai gerar oportunidades reais para uma ampliação do intercâmbio, inclusive de venda de indústria do Brasil para a Europa. Eu tenho a convicção, Senador, de que o Brasil tem a vantagem da maleabilidade, da flexibilidade, ou seja, é possível fazer uso, dos benefícios que vão ser concedidos no âmbito desse acordo, de estratégias específicas para a entrada muito mais acentuada de bens brasileiros, da sua indústria, na Alemanha. Aliás, no ano que findou, houve um crescimento da exportação do setor industrial e uma redução de exportação do Brasil para a Alemanha do setor agroexportador, de modo que eu vejo muitas possibilidades.
Não tenho dúvida, Senador, de que a questão do Fraunhofer é absolutamente fundamental. A experiência da Alemanha é a mais bem-sucedida de todos os países europeus não apenas pela competência científica, mas pela capacidade de inserção dentro do setor produtivo. Quer dizer, os mecanismos de permitir que o setor produtivo tenha acesso à tecnologia desenvolvida no âmbito desses institutos é um dos segredos evidentes da competência alemã. Podemos fazer um paralelo com o Brasil, infelizmente não no caso da indústria, mas no caso da agricultura. Um dos segredos do sucesso da capacitação produtiva brasileira foi o acesso à tecnologia propiciado não apenas pela Embrapa, mas por outros órgãos já tradicionais de competência nessa dimensão.
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Com relação às energias renováveis, de novo há uma dimensão extraordinária na Alemanha. É muito importante - e o Senador Hélio José fez uma pergunta a respeito disso - ter presente que há muitos elementos de mistificação. A Europa é extraordinária, é um continente fabuloso, mas a mistificação europeia é altamente significativa, assim como também - para falar com franqueza - o cinismo. Então, nós vemos, por exemplo, nessa área de energias renováveis, um discurso não compatível com a realidade. O Brasil é vastamente superior a qualquer país europeu na questão da sustentabilidade da sua matriz energética. A Alemanha, por exemplo - que faz um discurso muito relevante, e é um ator fundamental e contribui muito para o Brasil -, tem apenas 13% da sua matriz renovável; o Brasil tem 41%, e com o compromisso, na COP 21, de passar para 46%. Então, a gente precisa começar a desmistificar esse discurso, que afeta, inclusive, a área agrícola de forma muito severa.
Nesse contexto, por exemplo, das energias renováveis, a Alemanha olha com muita dificuldade a questão dos biocombustíveis, dificulta - como todo o resto da Europa - o acesso de etanol brasileiro na matriz energética lamentável da Europa e vem fazer críticas a respeito do desflorestamento. Como disse o Embaixador Fernando Abreu, o Brasil tem 65% da sua cobertura vegetal nativa; na Europa, a média é 0,3%. Que número é esse? É 0,3%! É claro que houve um processo de reflorestamento importante, e hoje a cobertura vegetal reflorestada na Europa chega a cerca de 30%, mas da mata nativa há 0,3%. Mesmo na região mais afetada pelo desmatamento no Brasil, que evidentemente é a Mata Atlântica - que, além de ser apenas 20% da área do Brasil, reúne 70% da população -, ainda assim, a nossa preservação da Mata Atlântica original é superior a 10%. Então, não há margem de comparação entre o que o Brasil faz e o que faz a Europa.
Mas, aí, Sr. Presidente - e o senhor estava falando das suas experiências de interface com alguns europeus -, algumas coisas ocorrem. Desde logo, não é possível passar impune por ficar 500 anos no topo do mundo. Isso gera certos preconceitos em situações complexas, e a gente tem de lidar com isso. E a Europa, evidentemente, é muito concentrada nessa dose de preconceito. Eu costumava dizer em Londres que o Brasil é um pouco ignorante, pobre e ignorante, mas que a ignorância é mais fácil de superar que o preconceito e é menos detrimental ao entendimento. Eu acredito nisto: eu acho que o preconceito é mais detrimental ao entendimento do que a ignorância e mais difícil de superar. Mas a verdade é que, paulatinamente, nós temos que fazer esse esforço, e tem que ser uma das coisas que nós temos que fazer lá para mudar a percepção, sobretudo, da agricultura, que é uma parte muito dinâmica da capacidade exportadora brasileira, mas que se vê afetada por uma série de informações ruins e também por uma enorme incapacidade de formatação da narrativa adequada que nós temos no próprio Brasil.
Então, nessa questão de energia renovável solar, o Brasil optou por uma estratégia de mercado e de não subsidiar energias renováveis. Por quê? Porque nós temos condições naturais de ter energias renováveis com competitividade, sobretudo o biocombustível e a energia hidrelétrica, além desse potencial - já uma realidade - na energia eólica, que hoje é a mais relevante de crescimento percentual no Brasil. A energia solar, como disse o Senador Hélio José, portanto, é menos competitiva, mas a verdade é que nós já temos muitos investimentos neste setor, não alemães, mas chineses. A China está investindo muito relevantemente no setor de energia solar, inclusive na produção de painéis solares e outras coisas no Brasil, com empresas importantes.
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Para não me alongar excessivamente, Presidente, e apenas fazendo menção às suas observações - como eu já mencionei -, nós precisamos ter presente, que quando nós vamos para países tão importantes e tão centrais há tantos anos, nós não podemos perder de vista a magnitude e a relevância do Brasil. O Brasil é um país de estatura no mínimo equivalente a todos esses países, inclusive pelas suas dimensões. Poucos países do mundo agregam esses atributos de relevância demográfica e geográfica de recursos naturais e mesmo de economia como o Brasil. Esses são ingredientes positivos que nós temos que fazer realçar nessa relação.
Portanto, esse reconhecimento de superioridade alemã não é algo que tenha me contaminado. Eu acho que a Alemanha é um país extraordinário, tem uma enorme contribuição a dar - já tem dado, e eu espero que possa continuar a dar ainda mais -, mas dentro de um sistema de uma paridade e um entendimento de que há vantagens recíprocas. É evidente que há uma certa gratuidade, um altruísmo na grande cooperação técnica alemã - e nós nos beneficiamos disso -, mas há também interesses muito próprios, que levam benefícios específicos em função do que vem sendo feito. Tudo isso são elementos que nós não podemos perder de vista. Eu sei que o Brasil é um país um pouco iconoclasta, e lá fora é muito fácil falar mal do País, porque basta reproduzir o que se fala aqui dentro, mas a verdade é que nós também temos conquistas altamente significativas e que temos que valorizar.
Respondo às duas perguntas de internautas.
A Fernanda fez menção à questão de estudantes na Alemanha. É evidente que há um número relativamente importante. A Alemanha tem uma competência muito importante na capacitação no ensino médio, que é uma das grandes virtudes do processo educacional alemão, e nós temos um intercâmbio importante para nos beneficiarmos também dessa dimensão.
Quanto à questão de tecnologia, eu já mencionei que há um intercâmbio enorme, que floresceu mais ainda a partir do intercâmbio científico e tecnológico que tivemos em 2010 e 2011 Brasil-Alemanha.
Na saúde pública, assim como no transporte e em outros elementos que foram trazidos à atenção aqui desta Comissão, a Alemanha é um país de destaque. O transporte público na Alemanha é excepcional em todas as cidades. É um dos países do mundo com menos problemas de congestionamento e com mais eficácia de transporte público. É evidente que isso é uma lição que o Brasil pode aproveitar e da qual pode se beneficiar.
É basicamente isso, Sr. Presidente.
Agradeço a oportunidade.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Grato ao Sr. Embaixador Roberto Jaguaribe pelas suas explanações e pelas suas respostas aos nossos internautas e às Srªs e aos Srs. Senadores.
Não havendo mais Senador ou Senadora inscrito para fazer perguntas aos Srs. Embaixadores ora sabatinados, eu indago ao Plenário se vamos manter a nossa reunião em sistema aberto.
As Srªs e os Srs. Senadores que aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
A reunião continua aberta.
Vamos, então, agora à apuração dos votos oferecidos às S. Exªs os Srs. Embaixadores hoje sabatinados. Eu peço à Secretaria da Comissão que abra o painel.
(Procede-se à apuração.)
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Quatorze votantes compareceram.
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Quatorze votantes compareceram.
S. Exª o Sr. Embaixador Fernando José Marroni de Abreu, indicado ao cargo de representante permanente do Brasil junto à Organização da Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e Organismos Internacionais Conexos, em Roma, foi aprovado por unanimidade deste Plenário.
Do mesmo modo, S. Exª o Sr. Embaixador Roberto Jaguaribe Gomes de Mattos, indicado para o cargo de Embaixador do Brasil na República Federal da Alemanha, também por unanimidade foi aprovado por este Plenário.
Agradecendo a presença dos indicados, manifesto os meus agradecimentos, desejando-lhes pleno êxito nas novas funções que exercerão após seus nomes serem escrutinados no plenário do Senado.
Muito obrigado pela presença de V. Exªs. (Palmas.)
Gostaria de agradecer a presença, na reunião de hoje, da Srª Embaixadora Gisela Padovan, Chefe da Assessoria de Assuntos Federativos e Parlamentares do Ministério das Relações Exteriores, bem como do Sr. Embaixador Rodrigo de Lima Baena Soares, indicado ao cargo de Embaixador do Brasil na República do Peru, e do Sr. Embaixador Antonio José Ferreira Simões, indicado ao cargo de Embaixador do Brasil na República Oriental do Uruguai, nossos próximos convidados a uma reunião para efeito de sabatina aqui na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional.
Antes de encerrar os nossos trabalhos, eu proponho a dispensa da leitura e a aprovação das atas das reuniões anteriores.
As Srªs e os Srs. Senadores que as aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovadas.
Encerrando agora os nossos trabalhos, convoco as Srªs e os Srs. Senadores membros desta Comissão para a nossa próxima reunião deliberativa, agendada para amanhã, dia 24 de maio de 2018, quinta-feira, às 9h, neste plenário.
Nada havendo mais a tratar, declaro encerrada a presente reunião, desejando um bom dia a todos.
(Iniciada às 10 horas, a reunião é encerrada às 11 horas e 51 minutos.)