20/11/2018 - 38ª - Comissão de Assuntos Econômicos

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Declaro aberta a 38ª Reunião da Comissão de Assuntos Econômicos.
Aprovação da ata. Antes de iniciar os trabalhos, proponho a dispensa da leitura e a aprovação das Atas das 36ª e 37ª Reuniões.
As Sras. Senadoras e os Srs. Senadores que concordam queiram permanecer como se encontram. (Pausa.)
As atas estão aprovadas e serão publicadas no Diário do Senado Federal.
Comunico o recebimento do seguinte documento, para conhecimento: Ofício "S" nº 72, de 2018, de 31 de outubro, da Caixa Econômica Federal.
O expediente será encaminhado aos membros da Comissão por meio de ofício circular.
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A reunião de hoje será dividida em duas partes: a primeira é uma audiência pública interativa, com a presença do Dr. Felipe Salto e do Dr. Gabriel Leal de Barros, Diretores da Instituição Fiscal Independente, que farão uma explanação sobre a situação fiscal brasileira. A segunda parte, com alguns itens para discussão e votação.
Convido, para iniciarmos a primeira parte desta sessão, o Sr. Felipe Salto e o Sr. Gabriel Leal de Barros para a Mesa. (Pausa.)
Convido os Srs. Senadores que estão em outras dependências desta Casa a comparecerem à nossa reunião para esta importante e relevante explanação do Mestre Felipe Salto, um dos maiores especialistas em contas públicas neste País, que vai ser bastante importante para todos se inteirarem dos problemas e das enormes dificuldades em relação à questão fiscal que este País vai enfrentar durante o próximo ano e com a perspectiva de um novo governo.
Passo a palavra, então, ao Mestre Felipe Salto para começar a sua explanação.
O SR. FELIPE SALTO - Bom dia a todos!
Em primeiro lugar quero cumprimentar o nosso Presidente, Senador Tasso Jereissati, agradecer pelas palavras elogiosas e dizer que o Senador Tasso é, se não o principal, um dos nossos principais apoiadores e sustentadores desde o início dos trabalhos da Instituição Fiscal Independente, já completando dois anos agora, desde novembro de 2016. É um apoio inestimável para o nosso trabalho, que costuma ser um trabalho, digamos assim, bastante impopular: mostrar os problemas das contas públicas, alertar para a necessidade de melhorar a eficiência da máquina pública, aumentar receitas, enfim, uma discussão que, apesar de difícil, vai ser essencial neste processo de recuperação, que ainda é muito gradual e muito lento.
Nós dividimos a apresentação em duas partes. A primeira é um pouco prestando contas do que a instituição já fez até agora - está aqui comigo o Gabriel, que também compõe o nosso Conselho Diretor. A ideia é apresentar aqui para o Presidente e para os Senadores desta Comissão um pouco do que nós temos feito lá nesses dois anos, as publicações, as reuniões realizadas, seminários. E, na segunda parte, que é a principal, trazer os números fiscais e econômicos e os cenários que nós estamos prevendo para os próximos anos, até 2030, considerando também os riscos, o que tem a ver com a seara política, e que afetam as contas públicas e a economia.
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Passe o eslaide, por favor, porque não está funcionando aqui o controle.
O primeiro ponto é que a nossa instituição foi criada em novembro de 2016 inspirada em duas grandes instituições, o Congressional Budget Office, nos Estados Unidos, o CBO, e o Office for Budget Responsibility (OBR), no Reino Unido. Há outros 40 países que têm instituições como essa, como a Instituição Fiscal Independente. A OCDE faz uma compilação e uma organização dessas instituições realizando reuniões anuais. Nós fomos incluídos nessas reuniões neste ano: o Gabriel e eu estivemos lá em Seul, na Coreia, representando a IFI e o Senado, levando um pouco dos resultados.
Então, nestes dois anos, nós temos tentado focar, dentre os quatro objetivos da instituição, naquele que é considerado o mais primordial neste momento, que é traçar cenários e apontar os riscos fiscais, fazendo um contraponto com os números oficiais, os números do Governo.
No início deste ano, a OCDE publicou um relatório sobre a economia brasileira, no qual eu gostaria aqui de registrar, na página 33, o destaque dado à elevada qualidade dos relatórios mensais da Instituição Fiscal Independente. Ao lado do teto de gastos, da regra de gastos, foi considerada pela OCDE um dos avanços no arcabouço institucional de contas públicas do Brasil. Muito nos honra contar com esse reconhecimento da OCDE, que é um reconhecimento externo.
Os nossos quatro objetivos são: estimar parâmetros orçamentários, que é PIB, inflação, juros, taxa de câmbio, inclusive para longo prazo.
A partir disso, traçar os cenários fiscais, sobretudo com vistas ao equilíbrio de longo prazo, que é um termo importante que está lá na resolução que cria a Instituição Fiscal Independente, a Resolução nº 42, do Senado.
O terceiro objetivo é mensurar o impacto de medidas que tenham efeito fiscal relevante positivo ou negativo. Então, logo no começo da IFI, nós publicamos um relatório sobre previdência, que é algo que pode gerar, se feita a reforma da previdência, um ganho fiscal importante de médio e longo prazo. Trata-se também de olhar para os custos e riscos fiscais, decisões dos três Poderes que tenham impacto sobre as contas públicas.
Em maio, quando estivemos aqui, por exemplo, foi feita uma análise sobre o gasto tributário, que se aproxima de R$300 bilhões, segundo os cálculos da Receita, e é algo que preocupa bastante a Comissão de Assuntos Econômicos, o Senador Tasso e também a Instituição Fiscal Independente.
O último é fazer a projeção propriamente dita para as variáveis fiscais, promovendo também o acompanhamento das metas, como o teto de gastos, o resultado primário e outras regras fiscais.
Eu costumo dizer que o Brasil é pródigo em criar regras fiscais, mas não necessariamente tão pródigo em cumprir essas regras fiscais. O espírito da responsabilidade fiscal ainda não é algo partilhado pela sociedade, e a importância disso para gerar crescimento econômico também não é algo tão óbvio assim. Nós esperamos dar uma pequena contribuição nessa direção.
A IFI é dirigida por um Conselho Diretor. Os três diretores são indicados politicamente por Comissão ou pela Presidência do Senado, sabatinados e aprovados pelos Plenários das Comissões e pelo Plenário da Casa. O que garante a independência, apesar de nós sermos um órgão do Senado Federal, é justamente o mandato fixo dos diretores. Então, isso permite que o Conselho Diretor defina os temas que serão tratados tecnicamente e possa publicar os seus relatórios, notas técnicas e estudos, garantindo a questão da independência.
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Além do Conselho Diretor, quero destacar que a Resolução 42 ainda prevê um Conselho de Assessoramento Técnico, que ainda não foi instalado, mas é algo que nós esperamos que possa acontecer, com o apoio dos Srs. Senadores, do Senador Tasso, da Comissão de Assuntos Econômicos, para que a IFI possa se fortalecer.
O Conselho de Assessoramento é um conselho não remunerado, composto por até cinco brasileiros de reputação ilibada que vão dar palpites, opiniões sobre aquilo que estamos publicando, fortalecendo e dando uma avaliação externa sobre os trabalhos da instituição.
Temos alimentado o site, criamos agora nos últimos meses um repositório de dados com todas as séries, estatísticas que a IFI calcula, inclusive projeções para três cenários. Então, qualquer cidadão pode acessar este site, vinculado ao site do Senado e acessar todas as séries. E redes sociais também, para fazer com que o trabalho se espalhe mais. E temos feito uma série de reuniões com economistas de mercado, coletivas à imprensa com os nossos técnicos, reuniões com as lideranças políticas do Senado, recebemos em maio a missão do FMI apresentando os nossos números. A missão do FMI costuma visitar os órgãos da área econômica e nos incluiu nesse périplo de visitas que eles costumam fazer semestralmente. Também seminários acadêmicos; participamos do Wilson Center, em Washington, com o Prof. Allen Schick, que talvez seja o maior conhecedor de orçamento público do mundo. Isso, então, tem nos deixado muito felizes, essa oportunidade de poder espalhar a ideia da instituição e da responsabilidade fiscal.
O primeiro seminário foi organizado também aqui no Interlegis, pela IFI, em parceria com o Prof. Fernando Rezende, que é um entendedor de federalismo fiscal, tema que é muito caro a esta Casa, ao Senado Federal. Gabriel e eu estivemos na Coreia também, firmando uma parceria com a IFI coreana, que hoje é uma das maiores IFIs do mundo, ao lado do CBO (Congressional Budget Office). Então temos tido essa possibilidade de trocar experiências, informações.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. FELIPE SALTO - Do Sul. Eles lá são bastante pródigos nessa parte de equilíbrio fiscal, orçamento.
Estivemos, em novembro, no Tribunal de Contas do Ceará apresentando a IFI a convite do Edilberto, que é o Presidente do Tribunal de Contas - ele tem feito esse TCE Debate -, e também em São Paulo, na Fiesp, a convite do Prof. Delfim Netto.
Temos tentado divulgar esse órgão do Senado e mostrar a importância dessas publicações que temos feito.
Aqui, um pouco das organizações com as quais já tivemos contato ou fizemos algum tipo de parceria.
A OCDE costuma dizer que a imprensa é uma das coisas que mais fortalece ou prejudica as instituições - as IFIs, os Escritórios de Orçamento Parlamentar, como também são chamados -, que é de lá que vem o fortalecimento. Quanto mais a imprensa observar e utilizar os dados da IFI de maneira fidedigna, observar que aquilo é uma fonte de informações fidedignas, tanto maior será a força do órgão. Então, nós fazemos essa contabilização diária. Já são 761 citações em dois anos, ou seja, mais de uma citação por dia. Conseguimos já, mais de uma vez, a manchete da Folha de S.Paulo, que é o jornal de maior circulação do País.
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A nossa equipe - presto contas aqui com números - produziu já: 22 relatórios de acompanhamento fiscal, 7 estudos especiais, 24 notas técnicas, sendo 53 trabalhos publicados, 1.894 páginas, 761 citações na imprensa, e isso com sete pessoas praticamente na equipe, incluindo os três diretores, que funcionam também como economistas e analistas. Todos têm mestrado ou doutorado. Metade da equipe vem do próprio Senado: o Josué Pellegrini, que está aqui, Consultor da Casa; o Daniel Couri também, Consultor de Orçamento; e dois economistas que eu trouxe de fora. A ideia é que a IFI possa mesclar um quadro de dentro e de fora justamente para conseguir ter eficácia nos seus trabalhos. E também há a parte administrativa, que se resume basicamente a uma secretária que também faz as funções administrativas.
Passando, então, para a segunda parte, eu vou apresentar primeiro os cenários macrofiscais, as premissas, depois mostrar de que forma isso vai impactar a trajetória das variáveis fiscais, principalmente a dívida pública e o resultado primário e, por fim, me parece interessante colocar a agenda que está posta na mesa e como o próximo Governo talvez vai precisar tratar essa agenda para conseguir recuperar mais rapidamente o equilíbrio fiscal.
Nós temos três cenários: base, otimista e pessimista. A ideia é que esses cenários têm probabilidades diferentes. O cenário base é o cenário mais provável. Eu destaquei em vermelho as variáveis mais importantes para a questão fiscal, que é o PIB e a taxa de juros. Então, diferentes combinações de PIB e taxa de juros produzem trajetórias de dívida completamente distintas.
O crescimento real, por exemplo, do PIB de 2,2% com juro real de 4% ou 4,5%, que é o nosso cenário base, permite estabilizar a dívida, que está na casa de 80, em 4 ou 5 anos, desde que o superávit primário volte para a casa de 2%, ao redor de 2% do PIB. Hoje nós temos um déficit de cerca de 1,5%, quer dizer, há um longo desafio aí, de cerca de 3% a 3,5% do PIB, mesmo no cenário base, que é o mais provável, que considera o avanço de reformas estruturais como a reforma da previdência. O cenário otimista é o menos provável. O crescimento é bem maior, 3,5% ou 3,4% com juro real de 3,2%. E o pessimista, que nós classificamos como segundo mais provável dados os riscos fiscais, é um crescimento de cerca de 1,5% com juro real batendo quase em 6%, quer dizer, um juro real voltando ali à casa de 5,5% ou 6%, o que prejudicaria bastante a trajetória da dívida.
Além da questão dos juros - quero cumprimentar o Senador Pimentel -, nós temos aqui o hiato do produto. O hiato do produto é uma espécie de termômetro para medir a temperatura da economia. Hoje nós estamos abaixo de zero - aquela linha preta do gráfico é o zero. Então, vejam como nós estamos ali: bem abaixo, em 7% negativos. Quer dizer, a economia está se recuperando muito lentamente, o desemprego ainda é elevado e a recuperação que se observa na ocupação no mercado de trabalho ainda está muito concentrada no setor informal, o que esconde uma certa precariedade, porque o pai de família perde o emprego formal com carteira assinada e vai procurar um emprego, um subemprego, uma coisa informal, entrando na estatística e fazendo aumentar a parte chamada informal. Então, eu gosto desse gráfico porque ele resume um pouco a ópera: a temperatura ainda é muito baixa e, para gerar um dinamismo maior na atividade econômica, como a gente vai mostrar, é preciso avançar no ajuste fiscal.
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Em termos de comparação com países avançados, ali no quadrinho abaixo, é possível observar que o Brasil ainda tem uma renda per capita de 14 em relação a 44 dos avançados. Quer dizer, a nossa renda per capita é cerca de um terço a um quarto da renda dos desenvolvidos. O nosso objetivo maior ainda é expandir o crescimento econômico.
Um lado positivo da história é que nós tivemos um ganho importante nos juros reais. Essa é a curva chamada Curva Termo de Juros. Então, no eixo X, no eixo horizontal, cada um dos pontos representa um prazo; por exemplo, um ano, um ano e meio, dois anos, dois anos e meio. Quanto maior o prazo, maior tende a ser a taxa de juros.
A ideia dessas curvas é comparar momentos diferentes no tempo. A curva azul é de setembro, a curva azul clara é de outubro. Observa-se que o processo eleitoral gerou uma redução para todos os prazos nos juros precificados pelo mercado para todos os prazos, mas, ainda assim, na curva azul clara, nós estamos vendo aí um juro real bastante elevado, acima de 4,5% nos prazos mais longos.
Como é que se reduz esse juro para facilitar o equilíbrio e a sustentabilidade da dívida pública? Promovendo a agenda do ajuste fiscal. A redução da Selic, por exemplo, afeta o prazo mais curto, mas ela pode até prejudicar os prazos mais longos se não for feita num cenário de expectativas de inflação sob controle. Por isso, foi acertado esse ciclo de expansão monetária, redução dos juros que se observou desde outubro de 2016 para cá. Agora, para que os prazos mais longos se reduzam, nós vamos precisar fazer mais.
Uma forma de precificar esse objetivo, que precisa ser alcançado, é o que os economistas chamam de equação de sustentabilidade da dívida. Então, para cada nível de dívida - 60, 70, 80, 90, 100, 110 -, nós consideramos duas informações: o juro real e o crescimento econômico. Então, por exemplo, na primeira linha, 3,5% de juro real e 3% de crescimento econômico; na segunda linha, 4% de juro real e 2% de crescimento econômico. Circulado em vermelho é o valor do resultado primário que seria necessário para estabilizar a relação dívida sobre PIB num patamar de 80%, porque esse é o cenário que a gente acha mais provável, de 80% com 4% de juro e 2% de crescimento. Então, 1,7%... Nós estamos com 1,3% negativo, quer dizer, tem que se comer todo esse 1,3% negativo e gerar mais 1,7 ponto percentual do PIB de superávit, 3 pontos percentuais do PIB de esforço fiscal, o que significa, em bilhões de reais, algo em torno de 250 a 300 bilhões de reais de esforço fiscal. Nós estamos falando de dez orçamentos anuais do Bolsa Família, para que se tenha ideia da dimensão do ajuste fiscal que há pela frente se o objetivo for estabilizar a relação dívida-PIB, que tende a ser, ou que deveria ser, o principal objetivo da política fiscal.
No lado do mercado de trabalho, como eu já destaquei em vermelho ali, há a parte formal e a informal. O formal, em 12 meses, está caindo um 1,5%, enquanto o informal sobe 5%; e o conta própria, que também é uma forma de medir - ou não carteira assinada -, também crescendo 3,4%. Então, o mercado de trabalho ainda é muito negativo, e isso impacta as receitas fiscais, porque a massa salarial depende muito das estatísticas do mercado de trabalho, obviamente, e ela afeta fortemente a receita da previdência, por exemplo, a arrecadação da previdência. Então, é importante a gente olhar não só para indústria e serviços, mas também para mercado de trabalho, e elaborar essas projeções no sentido de embasar bem o nosso cenário fiscal.
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Do lado da indústria, o que se observa ainda é que a indústria está andando de lado. A indústria de transformação, que é a curva cinza ali, aquela mais alargada, apresenta quedas nos últimos resultados. Se olharmos um período um pouco maior, veremos que nós estamos praticamente estacionados, o que é bastante preocupante, porque esse é um setor que gera empregos com salários mais elevados, e não há ainda um horizonte de recuperação nessa matéria.
Passo para a questão fiscal. Nós temos aí a carga tributária. Um lado do ajuste que vem sendo discutido é a chamada reforma tributária, com possibilidade de tributação de lucros e dividendos e outras questões que vêm sendo debatidas.
Antes de discutir as propostas, eu preciso ver os dados. Na verdade, nós estamos com a carga tributária estacionada desde meados dos anos 2000. É claro que é um patamar elevado, de 33%; 33,5% - em 2017 fechou em 32,3% -, mas a verdade é que ela está estacionada nesse nível em razão de dois problemas. O primeiro foi o desmonte do modelo de crescimento. Nós apostamos muito, enquanto País, na estratégia do crescimento com poupança externa. O aumento do preço de commodities fez com que a economia crescesse muito rápido, e os nossos problemas pareciam resolvidos. Quando essa maré alta passou, o que aconteceu foi que as nossas debilidades estruturais voltaram a aparecer, e isso prejudicou fortemente a geração de receitas, ao lado da política de desonerações tributárias. Então, esses dois fatores - um mais estrutural e outro que tem a ver com políticas de desoneração - fizeram a carga praticamente estacionar. Isso não necessariamente implica recomendar aumento da carga, mas é um dado estilizado, um fato estilizado, que precisava ser considerado no debate.
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - Quanto dessa carga tributária é federal, estadual?
O SR. FELIPE SALTO - Sim, temos essa abertura também, dá para observar.
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - Mas você tem esse dado aí?
O SR. FELIPE SALTO - Eu acho que eu não trouxe aqui, mas a gente pode coletar isso e depois trazer para o senhor.
Em termos de dívida, comparando com o resto do mundo, o Brasil já vem se aproximando rapidamente do nível dos países avançados. O nível dos avançados é um pouco acima de 100% do PIB, e o do Brasil já está acima de 80%, na estatística do FMI. Há uma diferença metodológica com a estatística do Banco Central, mas as duas séries apresentam essa mesma trajetória de crescimento que a curva azul tracejada no gráfico mostra. E a gente vai se distanciando cada vez mais da média dos emergentes. Então, há algo de errado com a economia brasileira. Nós precisamos atacar esse problema da dívida pública crescente, sob pena de os juros aumentarem novamente, o custo da dívida aumentar mais uma vez e isso dificultar ainda mais a realização do ajuste fiscal.
O que está por trás dessa dinâmica da dívida? São os fluxos. É o que a gente chama de resultado nominal e resultado primário.
Aqui está o resultado primário; em seguida, em vermelho, o pagamento de juros; e por último o resultado nominal, que é a soma das duas curvas. Nós chegamos a ter um déficit nominal de quase 10,5%, 11% do PIB. Lá no final de 2015 e início de 2016, com a redução dos juros, o pagamento de juros diminuiu bastante, de cerca de 8,5% para os atuais 5,9% - sempre em porcentagem do PIB - e isso levou o resultado nominal hoje para casa de 7, que ainda é um número elevado. Se nós compararmos com os outros países em mesmo estágio de desenvolvimento, o Brasil está entre os três primeiros em termos de déficit nominal e, no resultado primário - é preciso fazer justiça -, nos últimos dois anos houve uma melhora do resultado primário, que bateu a casa de 2%, 2,5% do PIB e agora está na casa de 1,3%.
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O problema é que o diabo mora nos detalhes. Quando a gente abre esse resultado primário, vê que o corte que foi feito para gerar essa contenção de primário foi nos investimentos, basicamente nas despesas discricionárias. Claro que houve também uma mudança importante na política de subsídios, que deve ser destacada; agora, para frente, os dados mostram que vai ser preciso atacar o problema mais estrutural, que é o gasto obrigatório - pessoal, previdência e benefícios sociais -, rediscutir esse conjunto de gastos para que se possa reequilibrar o resultado primário.
Abrindo em governos regionais, governo central e estatais, o principal problema, claro, está concentrado no governo central na fotografia que a gente tem hoje, mas é preciso destacar que os governos regionais, que já chegaram a apresentar, em meados de 2007 mais ou menos, 2008, um primário de 1% do PIB, hoje estão próximos de zero. Até o final do ano, deve haver alguma contribuição de Municípios, Estados e estatais, mas é algo muito pontual. Nós até revisamos a projeção de primário deste ano, de R$148,8 bilhões para R$128,9 bilhões, um dos motivos sendo essa dinâmica de curtíssimo prazo dos Estados e Municípios.
Eu costumo dizer que o problema dos Estados e Municípios é mais grave do que o problema da União, porque eles têm menos instrumentos para enfrentar a crise fiscal e econômica e sofrem com as políticas que a União adota aqui em cima porque eles pagam metade do pato, do preço.
O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO) - E já está chegando a R$1 trilhão a dívida dos Estados e Municípios, não é?
O SR. FELIPE SALTO - Um dado importante é o aumento da dívida em vários Estados, a participação das despesas com previdência nos Estados mais velhos, o que vai requerer também um debate importante sobre o financiamento desses gastos ou a contenção do crescimento dessas despesas.
Esse gráfico de receitas e despesas, que nós fazemos na IFI, é separado por períodos. O que a gente observa é que, de 1997 até 2008, não havia problema fiscal, porque a receita, que é a curva azul, além de estar num nível bem mais alto do que o gasto, que é a curva vermelha, crescia em alguns momentos até mais do que a despesa crescia. A partir de 2008, houve mudanças nessa política. A meta fiscal passou a ser descontada dos investimentos, o que em princípio era uma ideia positiva, mas depois esses descontos foram se ampliando rapidamente e, aí, o que nós observamos foi a receita estacionando - a curva azul, claramente, dá para ver que estaciona em porcentagem do PIB -, só que a despesa acelerou em porcentagem do PIB também, porque o PIB diminuiu muito e porque a rigidez do gasto impede mudanças muito bruscas e muito rápidas num curto período de tempo. Até que aconteceu o X, aquela inversão, aproximadamente em 2014, quando a despesa ultrapassa as receitas, e nós estamos até hoje nesse quadro. É um quadro de déficit primário bastante significativo que não vai ser resolvido em um ano, não dá para resolver da noite para o dia, não é um problema que se resolve com uma medida, com uma bala de prata, digamos assim; vai ser preciso um conjunto de ações para atacar o problema fiscal e resolver isso de maneira mais consistente.
Esse é um quadro resumo da composição das despesas. Três quartos da despesa correspondem a cinco gastos: INSS, pessoal ativo, pessoal inativo, seguro-desemprego, BPC. Quer dizer, você soma todos os benefícios sociais principais, previdência do INSS e pessoal ativo e inativo, e nós temos 3/4 do Orçamento: 14,4 pontos de percentagem do PIB numa despesa de 19,5. Esse grau de rigidez é que impede que apenas, por exemplo, por corte de custeio ou aumento da eficiência se resolva o ajuste fiscal. Claro que essas medidas devem ser buscadas, mas elas não resolvem, por si só, o problema fiscal brasileiro.
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O que está por trás desse aumento da despesa obrigatória e dessa rigidez é algo positivo: o envelhecimento da população. Se nós somamos as crianças de zero a 15 anos e os idosos - chamamos isso de grupo de dependência, aquele grupo que depende das ações do Estado e que vai gerar mais despesa do que receita para o Estado - e dividimos pelo resto, observamos que esse percentual foi caindo - é o que se chamou de bônus demográfico por vários anos. Só que nós perdemos o bônus demográfico: aquela circunferência azul mostra que essa razão já parou de cair e vai começar a aumentar, ou seja, a demanda da sociedade por gastos de saúde, de educação no caso das crianças, e o gasto com os idosos, incluindo a Previdência, vai ser crescente. Se a gente acredita nos demógrafos do IBGE, essa é uma tendência que vai afetar fortemente o gasto público. A questão é: como o Estado vai responder a esse fato, a esse fato da realidade?
A previdência cresceu nos últimos anos... Esse é um quadro que a gente constrói com base nos dados do Siga Brasil, que é um sistema mantido pelo Senado Federal que torna os dados do Siafi, que são os dados orçamentários, mais palatáveis.
Esse quadro resumo mostra que a previdência aumentou 2,2 pontos percentuais do PIB nos últimos 10 anos, de um aumento total de 3,6 pontos percentuais do PIB. Segurança, por exemplo, ficou praticamente estacionada em 10 anos: 0,0; educação: aumentou 0,8; saúde: aumentou 0,1 - sempre em pontos de percentagem do PIB. Então esse quadro ajuda a observar que a previdência não só vem ocupando um espaço grande, pelas razões demográficas, como isso vai se intensificar nos próximos 10, 20, 30 anos. É preciso, então, que o Governo, o Congresso, se prepare para dar conta de financiar essa evolução e gerar um sistema que seja sustentável.
Mas, aí, os senhores podem perguntar: por que não fazer, então, o ajuste em cima dos excessos, dos desperdícios, do custeio? É evidente que tem que ser feito, mas esse quadro ajuda a observar que essa é a menor parte do gasto em termos relativos.
O primeiro gráfico de setores mostra que, em 2017, o orçamento no Brasil - o primário, sem contar os juros - foi de R$1,176 trilhão. Desse total, só 110 ou 115 bilhões correspondem à chamada despesa discricionária. Nós estamos chamando aquele pedacinho vermelho de margem fiscal, que é o quanto poderia ser cortado para produzir ajuste fiscal.
Abrindo esse vermelho, no gráfico do meio, o que está dentro dessa margem fiscal? Então 1,2 trilhão, 100 e, dentro dos 100, 21 bilhões - só a parte cinza é custeio administrativo. Claro que, em termos absolutos, isso é uma montanha de dinheiro, R$21 bilhões.
Vamos supor, apenas por hipótese, que houvesse um desperdício de 30% em razão de contratos malfeitos ou da falta de revisão desses contratos. Trinta por cento de 21 bilhões são 7 bilhões. Claro que isso ajuda, mas não resolve o nosso déficit de 130, 140. Então esse quadro ajuda a mostrar que a margem fiscal tem coisas a melhorar, mas ela não vai resolver o problema, e, sob a regra do teto de gastos, essa margem vai se reduzir rapidamente.
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Essa projeção para a margem fiscal mostra que nós vamos reduzir de 113 para 104, 88, até que, em 2021, a margem fiscal para cumprir o teto de gastos, sem mudança na despesa obrigatória, vai chegar a 70 bilhões. O problema é que o funcionamento da máquina exige, pelo que a gente observa das estatísticas passadas, pelo menos 75 bilhões. Quer dizer que, em 2021, certamente o teto de gastos seria rompido. Se o teto for rompido, em 2022 os gatilhos previstos na Emenda do Teto, que é a Emenda 95, seriam acionados. E, se os gatilhos forem acionados, o que acontece é justamente um cenário de redução de despesas, mas muito menor do que a redução na presença do teto de gastos públicos.
A curva azul mostra qual seria a redução, que tem a ver com a aplicação dos gatilhos. Então, nós passaríamos de 18% do PIB, lá em 2022, para 16% em 2030, um ajuste de dois pontos. No caso do cumprimento integral do teto de gastos, passaria de 18% para 14%, 14,5%, que é um ajuste bem mais expressivo.
A Emenda do Gasto é inteligente nesse sentido, porque prevê os gatilhos, mas é preciso observar que mesmo os ajustes decorrentes da aplicação desses gatilhos - que, em resumo, são proibições para o aumento real da despesa - não seriam suficientes para produzir o ajuste necessário para estabilizar a dívida pública.
Qual é a consequência de fazer o ajuste fiscal sem avançar nas despesas obrigatórias? É uma queda do investimento como nunca antes vista.
Nos anos 70, o investimento público chegou a quase 11% do PIB e, hoje, o investimento público está em 1,8% do PIB. Se nós pegarmos só o Governo Federal dentro disso, é 0,4% do PIB dentro de 1,8%; o resto é Estados, Municípios e suas estatais.
Então, é um quadro em que, se nada for feito no gasto obrigatório, o investimento tende a zerar. Basicamente é o que vai acontecer, porque você vai espremendo a despesa discricionária... E o custeio mínimo precisa ser mantido, senão tem que apagar a luz dos ministérios, mandar o pessoal da limpeza embora. O custeio mínimo tem que existir. Então, o investimento é sempre o candidato natural, aí pagando o preço de um ajuste fiscal não planejado.
Nosso cenário, sob a hipótese de cumprimento do teto, mostra que o resultado primário só volta a ser positivo em 2023. Isso, se o teto for cumprido, se as nossas projeções de crescimento se confirmarem. Há uma série de premissas, então, e de condicionantes.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. FELIPE SALTO - E se a reforma da previdência for aprovada, basicamente uma regra de idade mínima e mais alguma coisa que permita também afetar a parte pública dos regimes próprios.
No curtíssimo prazo, o que é que nós temos?
Acho que o quadro geral ficou bem claro: a IFI entende que há uma preocupação muito grande na discussão das despesas obrigatórias, sem a qual não vai haver a possibilidade de executar um ajuste fiscal perene. Por dois ou três anos é possível fazer alguma coisa, mas com um sacrifício grande do investimento e cada vez menos espaço para cortar essa chamada margem fiscal.
Em 2018 há notícia positiva: a meta de resultado primário, que é um déficit de 161,3 bilhões no caso do setor público consolidado, e de 159 bilhões no caso do governo central, vai ser cumprida com facilidade, porque o Governo conseguiu, através de uma estratégia do chamado empoçamento, segurar algumas despesas, o que tem produzido um resultado fiscal melhor do que a meta fiscal. Agora, isso é uma coisa pontual, não é algo que dá para fazer todo ano. Inclusive, recursos de emendas parlamentares foram segurados. No gráfico da direita, dá para ver que 30% estão represados. O Governo explica que há liberação de recursos, mas, por várias razões, esses recursos não estão chegando à ponta. Então, na prática, isso representa, pelas nossas contas, até outubro, R$14,1 bilhões de ajustes sendo feitos, vamos chamar assim, de controle na boca do caixa, de recursos que estão sendo segurados.
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Isso não resolve, nem de longe, o problema, porque, no ano passado, o déficit foi de R$110,6 bilhões e, neste ano, com todo esse estratagema, vai ser de R$128,9 bilhões, o que é um resultado até um pouco pior, ainda que abaixo da meta fiscal. A meta fiscal perdeu um pouco a lógica, porque, como não temos um limite para a dívida pública, que é constitucional, mas que até agora não foi aprovado, então, não há uma referência de qual nível de dívida o País quer ter e, sem essa referência, a meta fiscal acaba sendo fixada de maneira arbitrária, ano a ano se vai fixando uma meta fiscal de acordo com aquilo que é possível fazer pelas projeções de receita e de despesa.
O gráfico resumo é a projeção de dívida. A dívida ainda cresce até 82,7% do PIB no cenário base, que é o cenário do meio, estabiliza e começa a cair lentamente em 2023, em 2024. No caso da curva vermelha, que é o cenário pessimista, a dívida ainda cresce e pode atingir 100% do PIB até 2030, o que não seria um quadro de insolvência, porque nós vamos continuar pagando a dívida, mas seria um quadro de grave crise fiscal e, certamente, de inflação, de preocupações macroeconômicas...
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - E de investimento zero.
O SR. FELIPE SALTO - ... e de investimento muito próximo de zero, porque os juros vão ocupando cada vez mais espaço no orçamento público, deixando menos recursos para despesas com investimentos, que são despesas discricionárias.
Então, esse quadro vermelho é o segundo mais provável - é importante frisar - e concretiza os riscos a que nós estamos sujeitos se as reformas não forem aprovadas, principalmente a reforma da previdência - é claro que há vários tipos de reformas que podem ser discutidos - e mudanças no gasto com pessoal e em outras despesas obrigatórias.
Por fim, dou uma palavra sobre o perfil da dívida e sobre a regra de ouro e aí encerro, porque, certamente, já passei um pouco do tempo.
O perfil da dívida no Brasil ainda é algo que preocupa bastante. Esse gráfico calculado pela IFI mostra o percentual da dívida vinculado à própria taxa Selic. Metade da dívida, que é a curva azul, está ligada à própria taxa Selic. Toda vez em que aumenta a taxa de juros, aumenta o custo de financiamento, porque as LFTs (Letras Financeiras do Tesouro) e as chamadas operações compromissadas do Banco Central ocupam hoje um volume enorme na dívida. Para mudar isso, para melhorar esse perfil da dívida, para alongar esse perfil e desindexar da Selic, vai ser necessário criar expectativas, criar uma perspectiva de longo prazo em que o ajuste fiscal passe a fazer parte dele.
A regra de ouro, que é outra regra importante, foi esquecida por 30 anos. Ela foi fixada na Constituição e nunca foi um problema, por uma razão simples: a regra de ouro diz que só se pode fazer dívida se for para investir. Então, cada real de dívida tem de representar R$1 de investimento. Mas, no caso da nossa Constituição, essa regra sofreu algumas mudanças na hora de ser colocada no texto da Constituição. Basicamente, do lado da dívida, a gente soma receitas financeiras, como, por exemplo, as receitas que vêm do Banco Central com o lucro das reservas internacionais, e, do lado do investimento, não é só o investimento puro que está ali, mas também despesas de capital, como, por exemplo, as inversões financeiras, incluindo o financiamento estudantil, que é o caso do Fies.
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Qual é o resultado dessa regra diferente que nós temos no caso brasileiro? É a curva azul, ali em cima. A regra de ouro vem sendo cumprida sistematicamente, ao mesmo tempo em que o Brasil gera déficits já há pelo menos cinco ou seis anos. Quando nós fazemos a limpeza da regra, tirando as receitas do Banco Central, tirando as receitas do BNDES, fazendo a limpeza dos investimentos e deixando só aquilo que é investimento puro, a curva azul cai lá para a curva amarela. Nós teríamos descumprido a regra de ouro já desde pelo menos 2005, se não fossem essas distorções.
Então, esse é um alerta que a instituição também faz - há um estudo nosso publicado sobre esse assunto -, para que o País possa rediscutir essa regra. Se nós queremos ter uma regra de controle da dívida e de privilégio de investimento, é preciso repensar a fórmula dessa regra, a equação dessa regra, e colocar um período de transição. Se, de repente, a regra à moda brasileira fosse transformada na regra de livro texto, o rombo que apareceria seria de sete pontos percentuais do PIB, o que é impossível cumprir em um ano. Então, qualquer mudança nessa matéria deveria considerar um período de transição, para que a regra fosse adequadamente executada.
Esse é o último eslaide.
A agenda fiscal é bastante difícil, como já deu para notar pelos dados que foram expostos, mas me parece que é importante discutir pelo menos cinco pontos, e a IFI quer contribuir nesses assuntos. O primeiro ponto é melhorar a gestão e combater desperdícios. Isso pode legitimar os pontos 2 e 3, que são os mais importantes, que é rediscutir a política de pessoal e rediscutir e reformar a previdência social. Medidas do lado da receita não devem ser descartadas e devem ser combinadas, possivelmente, com as medidas do lado do gasto público.
Essas medidas do lado da receita incluem também a revisão do gasto tributário. A Lei de Diretrizes Orçamentárias deste ano inclui um dispositivo para que se reduza paulatinamente o gasto tributário, mas a gente sabe que é difícil fazer isso, porque esse gasto tributário, a renúncia fiscal, é composta de uma série de programas que já existem há muito tempo e que vão ter de ser discutidos ponto a ponto, inclusive a partir de uma avaliação. É que, no Brasil, a gente cria determinadas despesas, gastos tributários, mas depois não avalia se aquilo está gerando o resultado que foi prometido. Então, uma desoneração, ou um subsídio, é importante. Países desenvolvidos também fazem isso. A diferença é que há começo, meio e fim e um objetivo específico, que, depois, é mensurado também: geração de emprego, melhoria da produtividade de um setor específico ou outro. Então, o nosso alerta é para a transparência e para a avaliação que eventualmente possa contribuir com o ganho fiscal.
E, finalmente, devem ser harmonizadas as regras fiscais. Eu termino como comecei: o Brasil é pródigo em criar regras fiscais, mas não tão pródigo em cumprir essas regras fiscais. O espírito da responsabilidade fiscal precisa ser mais bem divulgado, espalhado na sociedade, no Congresso, porque, sem fazer o ajuste e sem avançar nas reformas, nós não vamos chegar a lugar nenhum.
Muito obrigado mais uma vez.
Cumprimento o Senador Tasso, o Senador Garibaldi e todos os Senadores desta Comissão. É sempre um prazer poder estar aqui.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, Felipe Salto, pela sua abrangente, clara e bastante didática explanação sobre o problema fiscal brasileiro.
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Eu queria aproveitar a oportunidade da presença do Felipe e do Gabriel aqui para ressaltar a importância da IFI hoje no quadro econômico brasileiro, instituição criada por inspiração ainda do Senador José Serra há dois anos e que hoje já é usada como referência em qualquer avaliação de estudos da economia brasileira, não só da situação fiscal. Hoje é uma das instituições no Brasil com maior credibilidade na divulgação de seus dados e de seus números. Se há alguma coisa de que o Senado pode se orgulhar nestes últimos dois ou três anos, com certeza uma delas é a IFI, instituição que honra o Senado Federal e deve muito ao trabalho e à dedicação destes dois rapazes aqui ao nosso lado.
Vamos iniciar, então, os nossos debates.
O primeiro inscrito é o Senador Pedro Chaves, a quem concedo a palavra para a interpelação.
O SR. PEDRO CHAVES (Bloco Moderador/PRB - MS) - Bem, queria parabenizar o nosso convidado pela palestra extremamente didática. Temos, porém, algumas dúvidas aqui.
Primeira: de acordo com as projeções divulgadas pela IFI, o déficit primário do setor público consolidado ficará 32,4 bilhões abaixo da meta de 161,3 bilhões deste ano. Para tal resultado, contribuíram: um déficit do governo central 20,5 bilhões menor do que a meta, que foi fixada em 159 bilhões; um superávit de 8,5 bilhões dos Estados e Municípios, quando a meta era 1,2 bilhão; e um superávit de 1,5 bilhão das estatais federais, que tinham como meta um déficit de 3,5 bilhões. Adicionalmente, a dívida pública deu sinais de estabilização no período mais recente. Tal cenário afigura-se positivo diante das expectativas que prevaleciam no início do ano, mas chama atenção o fato de que, sobretudo no governo central, a melhora se deve a eventos atípicos, como receitas não recorrentes, caso das devoluções de crédito do Tesouro pelo BNDES, e o chamado empoçamento de recursos, ou seja, despesas previstas e com dotação orçamentária aprovada, porém não executadas.
Diante disso, sucedeu o seguinte. Entre 2008 e 2014, o Tesouro cedeu títulos públicos ao BNDES, que os vendia e utilizava os recursos fiscais na concessão de financiamentos. A devolução desses créditos em montantes expressivos possibilitou resgates da dívida pública - em 2018, esse pagamento atingiu 130 bilhões. Ao mesmo tempo, observou-se uma expressiva diminuição da participação do BNDES nas concessões de crédito, fato ilustrado pela redução de 15,5% das novas concessões de crédito com recursos direcionados a pessoas jurídicas nos últimos 12 meses até setembro. Na opinião do senhor, quais devem ser o papel e o tamanho do BNDES na economia brasileira de agora em diante?
A segunda pergunta agora.
O empoçamento de recursos orçamentários está sendo responsável até agora por aproximadamente 15 bilhões de melhora no resultado primário em face da meta estabelecida. Tal fenômeno pode ser atribuído à existência de certa rigidez no gasto, como vinculações de receitas e despesas, bem como evoluções mais lentas de certos projetos, limitando a despesa já prevista. Entretanto, algumas despesas não poderão ser canceladas ou remanejadas, apenas adiando o problema. Qual é o montante estimado desse empoçamento que se transformará em restos a pagar e pressionará ainda mais as contas públicas nos próximos exercícios?
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Era isso, Sr. Presidente. Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Consulto o Plenário se devemos fazer isoladamente... São perguntas pesadas, vamos dizer assim, então talvez devêssemos fazê-las isoladamente, não é?
Felipe.
O SR. FELIPE SALTO - Senador Pedro Chaves, obrigado pelo questionamento.
São duas questões.
Sobre o BNDES: houve uma mudança importante nos últimos dois anos. O Secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, foi um dos principais críticos da política que o senhor mencionou e me parece que há uma mudança de direção. É claro que não se deve jogar o bebê junto com a água suja do banho: o BNDES tem um papel importante numa economia que ainda é muito desigual e requer instrumentos. Até o mais liberal dos economistas vai dizer que, nas falhas de mercado, deve haver a intervenção do Estado, como, por exemplo, a oferta de crédito subsidiado.
Há um cronograma divulgado em recente trabalho do BNDES mostrando já uma sistemática de devoluções. Este ano foram 130 bilhões devolvidos; para o ano que vem, 26,6 bilhões; depois, em média, até 2040, 25 bilhões por ano sendo devolvidos, o que parece algo bastante adequado para colocar o banco de fomento de novo numa situação que lhe permita continuar desenvolvendo os seus objetivos, mas sem um peso fiscal tão grande quanto teve, afetando, inclusive, a dívida pública bruta nos últimos anos, principalmente de 2008 a 2014.
A questão do empoçamento é uma questão mais de curtíssimo prazo. Nosso número, até outubro, é 14,1 bilhões. Essa estratégia do Governo de segurar, ou de empoçar, os recursos às vezes ocorre nem por culpa dele próprio, mas o fato é que há lá 14,1 bilhões que devem, sim, contribuir para o fechamento do resultado primário abaixo da meta fiscal deste ano, que é uma meta de 161,3 - o resultado deve ficar em 128,9.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - O segundo interpelante é o Senador Ataídes.
O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO) - Obrigado, Sr. Presidente.
Conforme V. Exa. colocou, Presidente Tasso, um dos grandes avanços que o Senado Federal teve nestes últimos anos foi realmente a criação da IFI, que passou a ser referência não só no Brasil, mas mundo afora. Hoje, os famosos grandes economistas do nosso País - não é, Dr. Felipe, jovem competente? - se atêm às informações do nosso instituto para as suas conclusões. Então, isso engrandece, evidentemente, esta Casa. Quero parabenizar o Dr. Felipe pelo trabalho que ele vem desenvolvendo, assim como o Gabriel.
A sua explanação foi extremamente dinâmica, objetiva e sintética, tornou muito fácil para qualquer um poder tirar as suas conclusões, não precisa ser contador nem economista, mas há duas coisas que me preocupam muito, Dr. Felipe.
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Outro avanço - volto atrás - que também passou por esta transição e por este Senado Federal, aprovado por estas duas Casas, foi o controle de gastos. Nós precisávamos colocar um freio de arrumação nesses gastos descontrolados desses governos todos que se passaram. Não se pode gastar mais do que se arrecada. Então, foi mais um passo enorme que este Congresso deu. Também, a respeito das estatais, de relatoria do nosso Presidente Tasso Jereissati, houve outro avanço enorme, não é?
Mas aqui eu quero me ater a dois pontos. Um deles é a dívida pública bruta do governo geral. Essa dívida, V. Sa. colocou, pode chegar - ou já chegou - aos 80% do PIB, mas, nos países de Primeiro Mundo... No caso dos Estados Unidos, por exemplo, a dívida bruta deles ultrapassa o PIB. A nossa ainda não ultrapassou o PIB, está na casa dos 80%, mas são duas coisas extremamente distintas no meu entendimento. Os Estados Unidos têm condições, capacidade de pagamento; o Brasil não tem capacidade de pagamento. E essa dívida vai, com certeza, ultrapassar os 100% do PIB a curto prazo, eu diria que até antes do prazo que V. Sa. colocou, porque nós não estamos pagando a nossa dívida. Para este ano, a parte da dívida que teríamos que pagar mais os juros, mesmo com essa redução enorme que houve de juros devido à queda da taxa Selic... É bom que se diga: em 2015, foram R$510 bilhões de juros; agora, caíram para trezentos e poucos bilhões, parece-me que é algo em torno de R$340 bilhões. Mas isso é consequência da queda de juros. Então, para este ano, foi colocado no relatório, parece-me, R$1,013 trilhão, pagamento de juros mais parte da dívida, que não será paga. Nós já ultrapassamos os R$5 trilhões. Então, essa é uma preocupação enorme.
E aí eu faço a primeira pergunta. Temos uma reserva cambial de US$380 bilhões lá fora, reserva essa que foi adquirida, no meu entendimento, com muita irresponsabilidade pelo Governo petista. Nós não precisaríamos desse colchão, desse volume de reserva cambial. Posso estar enganado, peço vênia a quem pensa de forma contrária. Primeira pergunta: o Brasil não deveria pegar US$200 bilhões dessa reserva e abater a dívida pública? Eu gostaria de saber desse jovem Dr. Felipe o que ele pensa em relação a essa pergunta.
Segundo, o problema do Brasil... Depois dessa magnífica PEC 95, de controle de gastos, da Lei de Responsabilidade Fiscal, eu me sinto muito, muito tranquilo em relação ao futuro do nosso País em termos fiscais, mas o que me deixa incomodado, inquieto é a previdência social. Neste ano, nós devemos arrecadar algo em torno de R$395 bilhões e devemos pagar algo em torno de R$620 bilhões. Devo estar muito aproximado, não é, Dr. Felipe? Devo estar muito aproximado com esses números. Eu gosto muito de números. Isso causa um déficit, algo em torno de R$220 bilhões, R$230 bilhões da nossa previdência social.
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E há várias causas. Primeiro, a ineficiência e a deficiência do Congresso Nacional, que, ao longo dos anos, viu isso acontecendo e nada fez. Nada fez! Também os governos federais. Com toda a vênia ao nosso ex-Presidente da Previdência Social, que está aqui, ao meu lado, por quem eu tenho uma admiração enorme, o Senador Pimentel, a previdência social foi pautada pela corrupção e pela fraude. Há também o nosso Garibaldi, o nosso querido Garibaldi. A fraude dentro da previdência social foi uma coisa extraordinária ao longo dos anos! Por exemplo, o Funrural: de cada dez aposentados na época, oito nunca pegaram no cabo de uma enxada e de uma foice; eram urbanos. E daí por diante: auxílio-doença etc. etc. E chegou-se a esse ponto, mas a culpa não é só do Governo Federal; é também deste Congresso Nacional.
Portanto, eu vejo que, se esse novo Governo, até junho de 2019, não fizer a reforma da previdência social, o Brasil vai cair em uma insolvência absoluta e total.
Aí eu faço a segunda pergunta para o Dr. Felipe. Nós sabemos que o Sistema S recebe de contribuição social R$24 bilhões por ano para qualificar a mão de obra do trabalhador, levar lazer e saúde, e nada disso está fazendo. Eu pergunto, Dr. Felipe: não deveríamos pegar esses R$24 bilhões e levar para a previdência social?
Agradeço ao nosso Presidente Tasso e agradeço pela participação.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, Senador Ataídes.
Dr. Felipe Salto.
O SR. FELIPE SALTO - Senador Ataídes, obrigado pelas palavras.
Sobre as duas perguntas. Reservas internacionais. Nós até, no início da IFI, tivemos uma reunião importante com o Senador Fernando Bezerra Coelho a respeito desse tema e transformamos a sugestão dele num estudo especial, que foi o primeiro estudo especial da IFI, escrito e coordenado pelo Josué Pellegrini. E ali nós mostramos o seguinte: quais são as métricas internacionais para o cálculo do chamado nível ótimo, o nível adequado de reservas.
De fato, quando calculadas essas métricas, o Brasil tem um excedente de reservas internacionais, que pode variar, dependendo da métrica utilizada, mas pode chegar a cerca de US$150 bilhões. Isso significa que, dos 380, então, haveria um excedente de cerca de 150. O problema é que a venda de reservas a partir desse cálculo não é algo trivial ou recomendável em qualquer conjuntura, porque, em primeiro lugar, a venda das reservas geraria um efeito sobre a taxa cambial, sobre o dólar, bastante significativo e poderia até prejudicar os setores manufatureiros exportadores, porque a tendência de jogar uma montanha de dólares em uma economia é apreciar a moeda. Então, essa apreciação poderia produzir, ainda que temporariamente, um efeito sobre a taxa de câmbio que seria, além de difícil de prever, também bastante difícil de controlar.
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O segundo ponto é que, no caso de uma venda de reservas, o único destino possível seria, de fato, aquele que o senhor mencionou, que é abater a dívida pública, de preferência as LFTs ou as operações compromissadas. Da dívida curta do Governo, que hoje atinge 50% da dívida total mobiliária, os títulos públicos, metade é dívida indexada à Selic. Então, no mundo teórico, no mundo ideal, podia fazer-se isto, que é vender esses valores e abater uma parte da dívida, mas o problema é que a conjuntura importa muito - os efeitos sobre o risco país, os efeitos sobre a taxa de câmbio, o efeito geral sobre a macroeconomia. Então, algo que é preciso considerar é o conjunto desses efeitos.
O nosso estudo vai só até parte do diagnóstico, de mostrar o cálculo do nível adequado e de mostrar que, de fato, há um excedente. Agora, é importante registrar que, nos nossos objetivos, na Resolução 42, não há a prerrogativa de a IFI dar recomendações de política. Então, a gente evita ao máximo dizer que deve ser feito isso ou que deve ser feito aquilo. Nossa contribuição vai até a parte do diagnóstico.
A segunda questão é previdência social e Sistema S. De fato, nós vamos precisar de um ajuste na previdência social, e o ajuste não significa só benefícios, é despesa e receita. O Senador Pimentel e o Senador Garibaldi estão aqui e podem me corrigir, mas o que nós precisamos é ter o equilíbrio dessas duas variáveis, receitas e despesas, dadas as expectativas e as projeções demográficas, que são aquelas que eu apresentei no gráfico da razão de dependência. O Sistema S, de fato, ocupa um orçamento importante. Nós fizemos um trabalho também sobre o Sistema S. Sabemos que o senhor tem um livro também sobre esse assunto que traz bastante informação relevante. Inclusive, quando nós publicamos essa nota no ano passado, a CNI nos procurou para querer vir explicar quais são os projetos que são financiados com esses recursos. De fato, há muita coisa importante sendo feita. O nosso alerta ali nessa nota foi apenas dar transparência a esses recursos, porque, como o senhor sempre alerta, são recursos que passam ao largo do Orçamento, do processo orçamentário. Então, é uma discussão importante que precisa ser feita, sim. Agora, ela não resolveria o problema da previdência, porque o problema da previdência é mais estrutural. Há medidas pontuais que podem ajudar. Por exemplo, muito se diz sobre a arrecadação dos grandes devedores, de que seria preciso buscar arrecadar essa dívida, que os devedores privados pagassem essa dívida para ajudar a arrecadar. Isso ajudaria em um ano ou dois, mas não resolveria o problema estruturalmente. Para resolver estruturalmente, há que se recuperar a geração de receitas da previdência e conter o crescimento das despesas da previdência, de modo que haja um regime sustentável.
O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO) - Só um minuto, Sr. Presidente. Só um minuto, a respeito das reservas, V. Exa. me permite?
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE. Fora do microfone.) - Pois não. Bem rápido, porque há outros Senadores inscritos.
O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO) - É rápido.
Dr. Felipe, ficou claro que há um excesso significativo desse colchão chamado reserva cambial. Não é isso? V. Sa. colocou aí os efeitos que isso pode causar, se a gente, então, se desfizer de parte dessas reservas, e inclusive o impacto também na inflação. Agora, resta saber se esses efeitos danosos são piores do que a gente ficar pagando para ter essas reservas lá fora. Esta é a minha indagação: é pior?
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Eu como Presidente da República, o que eu não pretendo, mexeria imediatamente...
O SR. JOSÉ PIMENTEL (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE. Fora do microfone.) - Mas é possível! (Risos.)
O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO) - Não, mas eu não tenho pretensões. Eu tenho pretensões de tomar conta dos meus negócios.
O SR. ARMANDO MONTEIRO (Bloco Moderador/PTB - PE) - Você não deve se excluir, não... (Risos.)
O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO) - Com o apoio do meu querido Senador Monteiro e do Pimentel, aí eu começo até a rever a ideia.
Eu como Presidente da República não pensaria duas vezes, correria todos esses riscos que V. Exa. colocou e pegaria US$200 bilhões para, com certeza, quitar parte dessa dívida bruta do Governo.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, Senador.
Senador Armando Monteiro.
O SR. ARMANDO MONTEIRO (Bloco Moderador/PTB - PE) - Sr. Presidente, eu queria também aqui manifestar o respeito que tenho ao trabalho que vem sendo realizado pelo IFI, que hoje representa no debate econômico do Brasil uma boa referência. A isenção, a forma, vamos dizer, rigorosamente técnica como tem se pautado é algo que valoriza o Congresso Nacional, especialmente o Senado. Então, eu queria fazer esse reconhecimento.
Sobre a questão fiscal que nós aqui estamos discutindo, a questão fiscal no Brasil tem um nome, que é previdência. Em toda a evolução do gasto primário no Brasil medida sobre o PIB, mais de dois terços do crescimento do gasto decorrem dos gastos previdenciários. Então, o problema fiscal do Brasil tem uma tradução: a questão previdenciária.
Dessa forma, eu queria colocar aqui uma questão que é a de considerar, segundo todas as análises, que esse projeto, o projeto Temer, que veio a ser desidratado, é um projeto cujo impacto em dez anos é inferior a R$500 bilhões. Portanto, é um impacto pequeno tendo em vista a dimensão do ajuste fiscal que precisamos promover e o risco de algumas variáveis que são incontroláveis. Por exemplo, quando a gente faz uma avaliação da trajetória da dívida pública, a gente o faz considerando tal taxa de crescimento, considerando tal taxa de juros. Ora, essas variáveis estão muito atreladas ao desempenho da economia internacional, a tudo que hoje ocorre no mundo, que é cada vez mais incerto e sujeito ao imponderável. Então, eu acho que todos entendem que, já que a aprovação da reforma foi adiada, é necessário que se reavalie amplamente o calibre dessa reforma.
E hoje há uma contribuição que foi oferecida pelo economista Armínio Fraga, com a participação do talvez mais renomado especialista nessa área de previdência, que é o Paulo Tafner. Segundo análises preliminares, o impacto dessa proposta do Armínio teria um efeito muito importante, algo como R$1,3 trilhão ao longo dos dez anos, o que representaria uma garantia de que, mesmo considerando algumas variáveis que pudessem conspirar contra o País, nós poderíamos ter aí uma âncora mais segura para oferecer, nos próximos anos, uma trajetória mais firme ao País. Então, eu queria, primeiro, uma avaliação dessa consideração.
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A segunda questão é saber se a IFI avaliou o efeito da privatização de ativos e de outorgas de concessão na área de infraestrutura como algo também importante. É claro que isso não resolve a questão de fluxo, mas dá um espaço em relação ao tempo que teremos para retomar os superávits primários. Nós teremos aí dez anos, corremos o risco de ter dez anos de déficits primários. Uma avaliação mais realista nos aponta que só em 2023 o Brasil voltaria a ter superávit primário. Então, nós precisamos construir um espaço, e essa questão da privatização e das outorgas poderia contribuir para isso. Acoplo a questão das reservas internacionais, mas compartilho as preocupações que foram trazidas, especialmente essa do efeito que isso traria na apreciação do câmbio, com um imenso prejuízo ao setor exportador brasileiro.
Finalmente, queria também introduzir um tema que nos preocupa imensamente, que é a crise fiscal dos Estados, lembrando que a Lei de Responsabilidade Fiscal foi um marco muito importante, mas que, a despeito dela, os Estados estão vivendo um processo também crescente de desequilíbrio. Sei que, em grande parte, isso decorre também da questão da previdência, dos Regimes Próprios de Previdência. No meu Estado, Senador Tasso, o Tesouro estadual terá que aportar este ano algo equivalente a R$3 bilhões para cobrir o déficit da previdência própria; um Estado que investe pouco mais de R$1 bilhão e que vai gastar R$3 bilhões para cobrir o déficit do Regime Próprio de Previdência.
Então...
O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO) - Permite-me só um pequeno aparte, Senador.
A União, de acordo com a lei que criou os RPPs, não tem a obrigação de fazer esse aporte. A responsabilidade é dos Municípios...
O SR. ARMANDO MONTEIRO (Bloco Moderador/PTB - PE) - Esse aporte é do Estado, Senador.
O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO) - ... não da União.
O SR. ARMANDO MONTEIRO (Bloco Moderador/PTB - PE) - Eu estou falando do aporte que o meu Estado faz, o Tesouro estadual. Não estou falando da União.
O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO) - Ah, não é federal. Perdão.
O SR. ARMANDO MONTEIRO (Bloco Moderador/PTB - PE) - Não estou falando da União.
O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO) - Perdão!
O SR. ARMANDO MONTEIRO (Bloco Moderador/PTB - PE) - Como é que no regime próprio a União ia cobrir? Estou falando do Estado.
E aí pergunto ao Felipe que tipo de disciplina, de nova disciplina, que mudanças seria necessário introduzir na Lei de Responsabilidade Fiscal para evitar exatamente o risco de que possamos ter vazamentos e... Temos problemas ainda associados ao padrão de informação dos Estados. Há gastos de pessoal que são contabilizados de maneira não uniforme. Não temos sequer um padrão ainda de informação. Então, que mudanças poderiam ser feitas?
E, na perspectiva agora também da participação de Estados e Municípios no produto da cessão onerosa, que contrapartidas deveriam ser exigidas do Estado, Senador Tasso? Senão, nós vamos ter novamente uma receita extraordinária dos Estados e Municípios sem a necessária contrapartida de ajustes e de uma disciplina que não termine por...
(Interrupção do som.)
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE. Fora do microfone.) - Felipe.
O SR. FELIPE SALTO - São questões muito relevantes as que o Senador Armando Monteiro coloca.
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Agradeço-lhe também pelas palavras a respeito do trabalho que a IFI vem desenvolvendo.
Sobre a previdência social, há uma série de propostas na mesa, e acho que o senhor deu o tom do que deveria ser feito, que é o diálogo, ampliar o debate a respeito dessas alternativas. Uma delas, que está na imprensa praticamente todo dia, é essa do Tafner e do Armínio Fraga, que basicamente tem três pilares, envolvendo a ideia da capitalização, mas sem deixar de lado o importante reequilíbrio de curto prazo, porque, como se sabe, a ideia da capitalização vai significar retirar receitas, no curto e médio prazo, que iriam para financiar despesas que já estão acontecendo. Então, precisaria haver aí uma boa regra de transição, o que parece que a proposta da dupla Paulo Tafner e Armínio Fraga contempla. O problema é que isso precisa ser articulado, debatido aqui no Congresso, como nós estamos fazendo.
De fato, a previdência social praticamente se iguala ao problema fiscal hoje, acrescentando a questão que a Ana Carla Costa, ex-Secretária da Fazenda de Goiás, chama de problema do RH do Estado, que precisa também ser debatido. Não é uma questão de demonizar o serviço público; ao contrário. Há áreas que precisam ser fortalecidos e há áreas que precisam de ajustes. Então, esses dois temas, da previdência e do gasto com pessoal, e um terceiro, que é o dos gastos sociais têm que ser debatidos. Chegou a hora de pôr o dedo na ferida, de uma maneira, claro, partindo de um diagnóstico amplo, plural, com opiniões divergentes, para que se possa chegar a um denominador comum.
A privatização, concessões e receitas extraordinárias são, sim, alternativas que podem ajudar no curtíssimo prazo, um ano ou outro. Neste ano, por exemplo, as receitas extraordinárias contribuíram fortemente com a recuperação do resultado primário ou, melhor dizendo, com a diminuição do déficit primário. A questão é que elas têm um caráter pontual, temporário e não resolvem estruturalmente o problema. Elas podem ajudar numa outra dimensão, que é aumentar a produtividade, a eficiência dos setores entregues ao setor privado. Por isso, é preciso ver caso a caso os efeitos líquidos dessas medidas.
No caso das reservas, acho que já comentei a nossa avaliação, mas reforço que seria algo muito delicado. E o balanço dos efeitos gerados não é muito fácil de prever. É muito difícil prever o efeito líquido do câmbio ou o que resvala na indústria, no setor exportador; o efeito fiscal, que seria, em tese, positivo; o efeito sobre a taxa de juros de equilíbrio, etc.
Quanto à crise fiscal dos Estados - eu vou pedir para o Gabriel comentar um pouco também -, nós estamos justamente, neste momento, desenvolvendo um estudo especial, que temos chamado de Observatório dos Estados, até respondendo a um ofício recebido da CAE para que aprofundemos essa temática dos Estados. Isso está demorando um pouco para sair porque justamente há uma discrepância grande das bases de dados sobre Estados, mas eu entendo que a gente vai conseguir dar uma contribuição nisso e até trazer aqui, se o Senador Presidente assim quiser, para expor aos Senadores e Senadoras.
Sobre a LRF e as contrapartidas em eventuais renegociações com os Estados, a meu ver a LRF já está ótima do jeito que está. Nós temos essa mania de criar coisas novas quando surge um problema, mas a verdade é que é preciso enfrentar o ajuste fiscal. Há que se fazer ou aumento de receita ou corte de despesa ou uma combinação das duas coisas. Esse arroz com feijão é que nós precisamos voltar a cozinhar bem, o que não estamos fazendo. Às vezes a gente fica querendo fazer coisas mais elaborados, mas, a meu ver, a LRF já é um arcabouço bastante completo. Há coisas ali que ainda não foram regulamentadas, como o Conselho de Gestão Fiscal.
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O Senador José Serra tem uma iniciativa nessa matéria do Conselho de Gestão Fiscal. Ele serviria para harmonizar as regras, apontar o dedo para o Estado X ou Y: "Olha, você está contabilizando errado essa despesa de pessoal. Não pode colocar aqui nessa rubrica tal despesa". Isso evitaria a contabilidade criativa, evitaria uma boa parte de todo o desastre fiscal que nós estamos vivendo hoje e que, na nossa avaliação, é até mais sério no âmbito dos governos regionais. Qualquer renegociação e alívio que se dê, concordo plenamente, tem que ter contrapartida clara, e, caso se descumpram as contrapartidas, tem que haver alguma sanção, porque, senão, acontece o que nós estamos vendo hoje: os Estados que aderiram à renegociação, ao regime de recuperação não estão cumprindo as contrapartidas e já estão de novo batendo à porta do Executivo federal.
Isso envolve, evidentemente, uma discussão de federalismo fiscal. O federalismo no Brasil é bastante particular, e é o pano de fundo dessa situação toda. Há uma centralização grande, na verdade. Houve descentralização de atribuições, mas não descentralização adequada de recursos etc. Então, me parece que é um tema que se pode desenvolver, inclusive, em outros debates e seminários.
Acho que o Gabriel pode complementar nessa questão dos Estados.
O SR. GABRIEL LEAL DE BARROS - É bem rapidinho.
Sobre LRF, eu entendo que não é que a LRF não tenha um bom arcabouço fiscal; o problema foi que alguns Tribunais de Contas dos Estados foram fazendo interpretações diversas do que rege a LRF, e essas interpretações diversas sancionaram uma série de reports por parte dos Estados que fizeram com que os gatilhos previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal não fossem acionados. Então, a LRF tem gatilho para dívida, tem limite para gasto de pessoal por Poder, tem limite de garantia, de operação de crédito, tem uma série de limites, mas, em muitos casos, o limite e os gatilhos não foram acionados justamente em função de um entendimento particular de alguns Tribunais de Contas, diferente do que prevê a LRF. Então, eu entendo que a LRF não foi suficiente para que a gente evitasse esse problema fiscal subnacional, em parte por conta desse problema de contabilização que aconteceu em alguns Estados, sancionados por alguns Tribunais de Contas.
Eu acho que o caminho para resolver isso, seja qual for a solução, passa necessariamente por harmonizar, como o Felipe comentou, o entendimento contábil de o que vai ser considerado para a despesa de pessoal e o que vai ser considerado para a receita corrente líquida, por exemplo, para que os gatilhos da LRF possam efetivamente funcionar. Eles praticamente não funcionaram em função dessa falta de harmonia contábil.
Para isso, um desenho como, por exemplo, o do Conselho de Gestão Fiscal é algo que pode ser estudado. A ideia do Conselho de Gestão Fiscal é justamente harmonizar e definir quais são os critérios para que as despesas e as receitas sejam contabilizadas. Então, eu entendo que qualquer mecanismo, qualquer medida que ajude os Estados a reequilibrarem suas contas passa necessariamente por uma harmonização da contabilidade do setor público. E aí o papel do Tesouro Nacional, do Tribunal de Contas da União e dos Tribunais de Contas dos Estados é fundamental para se chegar a esse acordo, a esse consenso sobre qual é entendimento, e aplicá-lo para todos os 27 Estados.
Ainda sobre o desequilíbrio fiscal subnacional, eu acho que vale a pena lembrar - no nosso estudo a gente está chamando atenção para isso - que alguns Estados são muito idosos, são muito velhos. E hoje a gente tem vinculações constitucionais para gastos em saúde e educação. Os Estados têm que gastar 25% da receita com educação e 12% da receita com saúde. Em alguns Estados - por exemplo, vou pegar o Estado mais... De acordo com as projeções populacionais do IBGE, as variações demográficas, o Rio Grande do Sul é o Estado mais velho do Brasil. Quando a gente olha a razão de dependência, aquele dado que o Felipe mostrou que era para o Brasil, quando a gente quebra aquele dado por Estado, o Rio Grande do Sul é o Estado mais velho.
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O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE. Fora do microfone.) - Em situação mais idosa - é o politicamente correto.
O SR. GABRIEL LEAL DE BARROS - Está bem. Desculpa.
O Rio Grande do Sul tem a população mais idosa do Brasil. Então, nesse caso, por exemplo, isso gera uma dicotomia, porque ele é um Estado já mais velho, no entanto tem que gastar boa parte da sua receita - 25% da receita - em educação para cumprir o requisito constitucional. Então, esse tipo de coisa precisa também entrar no debate, a rediscussão dessas vinculações constitucionais, que podem ser contraproducentes para o equilíbrio fiscal dos Estados e até ineficientes, do ponto de vista do gasto público mesmo, uma vez que, por exemplo, em educação, especificamente, o País vai envelhecer, e o gasto per capita, o gasto por aluno, tende a aumentar automaticamente. Então, esse tipo de vinculação constitucional acaba reforçando um aumento duplo de gasto diante dessa vinculação com a arrecadação e com o processo de envelhecimento populacional pelo qual o País vai passar.
Então, eu acho que essas questões, tanto a da harmonização contábil, que é muito importante... Acho que é a discussão importante para dar enforcement para qualquer caminho que a gente vá tomar para equilibrar a situação fiscal dos Estados. Isso mais a rediscussão das vinculações em saúde e educação, porque pode ser pouco produtivo vincular, por exemplo, o gasto em determinadas áreas em que o Estado não tem demanda, vamos chamar assim, e que não são um problema do dia a dia, não são um problema local.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Obrigado, Gabriel.
Armando.
O SR. ARMANDO MONTEIRO (Bloco Moderador/PTB - PE) - Nós reconhecemos que a Lei de Responsabilidade Fiscal é um marco importante e que é um arcabouço muito importante, mas ela é susceptível, como toda construção, a ajustes. Por exemplo, a questão da demografia também se aplica quando se vincula despesa na área de educação. A demografia nos aponta uma menor pressão sobre os gastos de educação e uma maior pressão sobre os gastos de saúde, por exemplo. Então, há ajustes que precisam ser feitos.
Outra coisa é a seguinte: os Tribunais de Contas dos Estados - eu tenho muito apreço aos Tribunais de Contas e reconheço, por exemplo, que o do meu Estado tem muita qualificação -, via de regra, estão muito submetidos ali, vamos dizer, à força política dos governos estaduais. O processo de indicação, de provimento dessas posições passa muito pela política do plano estadual. Então, talvez fosse...
(Soa a campainha.)
O SR. ARMANDO MONTEIRO (Bloco Moderador/PTB - PE) - Eu não sei se seria próprio considerar que o Tribunal de Contas da União pudesse ter, em algumas questões, uma posição no sentido de garantir um caráter mais vinculante e, de certo modo, uma posição que definisse, de forma mais vertical, essa disciplina e parâmetros e critérios para a harmonização dessa posição. Acho que isso é necessário.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Senador Ferraço.
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O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - Sr. Presidente, fazendo coro aos colegas que me antecederam e cumprimentando o Dr. Felipe Salto, o Dr. Gabriel e toda a equipe, que mostra uma extraordinária evolução e um avanço nessa iniciativa que incorpora elementos muito importantes não apenas ao Senado, mas ao País de uma forma geral, quero dizer que os trabalhos do IFI justificam por certo essa boa iniciativa.
Eu chamo a atenção para a necessidade - isso foi medianamente respondido agora - de nós ampliarmos a nossa lente para os entes subnacionais. Nós estamos muito concentrados em torno dos números e da deterioração do Governo Federal, mas eu acho que nós precisamos olhar com mais precisão para os entes subnacionais. A Secretaria do Tesouro, recentemente, tem feito também, tem emitido boletins interessantes que têm chamado a atenção do País em relação a isso. Por quê? Porque tudo isso pressiona muito os debates que são feitos aqui no Senado, aqui na Comissão e pressiona muito também as questões fiscais em nosso País.
E não apenas os entes subnacionais. Eu quero chamar a atenção para este Poder e outros Poderes também, porque o que se faz aqui impacta outros Poderes e o que se faz em outros Poderes impacta os entes subnacionais. Recentemente nós tivemos uma votação aqui que chama bastante atenção para a capacidade de ajudarmos a desorganizar aquilo que está acontecendo já nas contas subnacionais, que estão muito desorganizadas.
De igual forma, as nossas empresas estatais. Eu acho também que nós precisamos colocar um olhar no IFI para as nossas empresas estatais, que também pressionam fortemente as contas fiscais do nosso País, na medida em que há um conjunto cada vez mais relevante de estatais que não são autossustentáveis e que, na verdade, custam muito não ao Governo - porque essa coisa de governo é uma coisa muito subjetiva -, mas ao contribuinte brasileiro, ao empreendedor, ao trabalhador, que são geradores de riqueza.
Então, eu quero chamar a atenção para isso e sugerir que nós possamos aprofundar o nosso olhar sobre os entes subnacionais, sobre as nossas estatais e sobre outros Poderes, porque, na prática, a fonte que financia o Estado brasileiro é uma só.
Eu queria também, Sr. Presidente, ao largo dessa boa ideia que foi o IFI, chamar a atenção para uma iniciativa que nós adotamos aqui na Comissão de Assuntos Econômicos. E aí eu acho que vai ser importante o prestígio de V. Exa. com o Presidente do Senado e o prestígio de V. Exa. como Presidente da Comissão de Assuntos Econômicos.
O art. 52 da Constituição Federal consagra o que compete privativamente ao Senado Federal, e no inciso XV nós temos aqui uma determinação muito importante, que é "avaliar periodicamente a funcionalidade do Sistema Tributário Nacional, em sua estrutura e seus componentes, e o [seu] desempenho[...]". Nós aprovamos aqui uma resolução - dando conta, inclusive, daquilo que está consagrado no Regimento Interno - que reserva à Comissão de Assuntos Econômicos, anualmente, cumprir esse papel. Nós fizemos isso em 2017 em relação a 2016. Não fizemos em 2017 e não fizemos em 2018.
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Nós aprovamos aqui - isso foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça, relatado pelo eminente Senador Pimentel - a criação de uma comissão, mais ou menos nos mesmos moldes do IFI, só que sem qualquer ônus para o Senado, porque é composta por um representante da Secretaria da Receita, do Conselho Nacional de Política Fazendária, da Confederação Nacional dos Municípios, dois representantes do setor produtivo e três cidadãos com notório conhecimento em áreas afetas à atuação do Conselho, para que anualmente nós tenhamos uma avaliação do sistema tributário. Isso está na Mesa do Senado há meses, e eu já conversei com o Presidente Eunício infinitas vezes, solicitando que ele coloque isso em votação, e ele não coloca em votação. Então, eu quero chamar a atenção para que, quem sabe, os Senadores da Comissão de Assuntos Econômicos que votaram essa matéria possam tentar sensibilizá-lo - quem sabe o Senador Eduardo Braga, que tem muito prestígio com o Presidente Eunício Oliveira. Eu confesso o meu desprestígio com o Presidente, porque já falei com ele infinitas vezes que isso seria um avanço muito grande, porque o Senado, anualmente, estaria sendo protagonista de uma avaliação do fatigado sistema tributário do nosso País.
Eu quero chamar a atenção de V. Exa. e pedir o apoio para que, de fato, o Presidente Eunício Oliveira, ainda em 2018, possa colocar em votação essa matéria, que eu acho que vai trazer ainda um maior e melhor protagonismo para a Comissão de Assuntos Econômicos. Isso foi aprovado em abril, e nós estamos encerrando o ano. É um tema que vai robustecer aqui o papel e o protagonismo da Comissão e, portanto, está carente de enfrentamento em Plenário.
Obrigado, Presidente.
O SR. FELIPE SALTO (Fora do microfone.) - Posso falar?
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Pode.
O SR. FELIPE SALTO - Senador Ricardo Ferraço, agradeço as colocações.
Um comentário sobre a questão do custo dos Poderes e do sistema tributário. Lá na Instituição Fiscal Independente, o nosso terceiro Diretor, que não está aqui, o Rodrigo Orair, é especialista nessa matéria tributária. Nós estamos preparando também um estudo especial em que nós tentamos alocar esses sistemas mais espinhosos, que demandam mais tempo, e esse estudo deve sair ainda este ano. Nós vamos submetê-lo também ao gabinete de V. Exa. para avaliação. A ideia é trazer um diagnóstico, um apanhado dos números, mas também avaliações dessas reformas que estão sendo propostas, comparar as diferentes propostas. Da mesma forma como nós vamos fazer com o tema dos Estados, dos entes subnacionais, esse estudo também pretende ser um pontapé inicial nesse tema da questão tributária, que, de fato, é bastante complexo.
Sobre o custo dos Poderes, está na Resolução da IFI essa obrigação de nós acompanharmos e avaliarmos esse custo de todas as decisões dos três Poderes. Nós não temos braços suficientes para fazer todas as decisões, mas nós começamos a fazer escolhendo pontualmente. Então, por exemplo, o STJ decidiu recentemente que aquele aposentado que comprovar a necessidade de ter um cuidador pode ter 25% a mais de benefício de aposentadoria. Independentemente de ser positivo ou negativo, há um custo. Nós fizemos uma nota técnica mostrando o custo dessa decisão. A ideia é fazer a mesma coisa com outras decisões importantes, não só do Legislativo, mas também do Judiciário, e com as iniciativas do Poder Executivo.
A questão salarial também preocupa bastante. O teto de gastos incide por Poder e, dentro do Poder, é por órgão. O que nós estamos vendo nas nossas projeções, e vamos publicar isso em breve, é que, rapidamente, em um ou dois anos, depois dos reajustes e das mudanças que estão sendo feitas, vai ficar quase impossível para determinados órgãos cumprir o teto de gastos, mesmo com a compensação que o Executivo pode fazer.
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(Intervenção fora do microfone.)
O SR. FELIPE SALTO - Isso.
Então, é um problema que já é atual, quer dizer, nós vamos ter que enfrentar essa questão, porque o teto de gastos está na Constituição e, com o risco de ele ser descumprido sem mudanças que ajudem o Governo a tirar o pé do acelerador da despesa, certamente vai ter vida curta.
Quanto às estatais, esse também é um tema que nós estamos estudando. Há uma nota técnica que foi produzida pela nossa equipe, um balanço: a partir do Dest, atual Sest, que é a Secretaria de Estatais do Governo, são publicados anuários e até relatórios com maior frequência, e nós consolidamos essas informações - foi até alvo de matéria jornalística. No entanto, eu concordo com o senhor em que é um tema essencial, até para sabermos qual é o valor que está em jogo, quais as empresas que geram mais prejuízos, as empresas dependentes também, como é a relação e qual o custo fiscal disso tudo. Já está anotada aqui a sugestão para aprofundar também essa questão.
Acho que o Gabriel quer fazer um comentário também.
O SR. GABRIEL LEAL DE BARROS - É um comentário muito breve, especificamente sobre a questão das decisões que impactam as outras esferas. Eu acho que vale a pena lembrar. A LDO de 2019 traz uma inovação muito relevante. Ela prevê, no art. 21, que seja feita uma reavaliação do volume de renúncias fiscais, que hoje está em 4% do PIB, para que esse volume de renúncias fiscais caia para 2% do PIB. É uma inovação muito relevante da LDO de 2019, que prevê essa revisão, não só de renúncia, mas também de gastos. É o chamado spending review. Está ali uma oportunidade para que se faça essa reavaliação não só de gastos, mas também de renúncias que tenham um efeito importante nas outras esferas.
Só para dar uma ideia de números, o volume de renúncias fiscais em 2017 foi de 270 bilhões. Esse valor vai crescendo ano a ano: este ano, a expectativa é de 288 bilhões; ano que vem, 303 bilhões; 2020, 325 bilhões; 2021, 342 bilhões. Quando a gente olha a composição desse volume, que é crescente, de renúncias, há uma parte significativa de renúncias que incidem sobre tributos compartilhados com os Estados e Municípios, que são o IPI e o Imposto de Renda. Quando a gente considera só esse grupo de tributos, que são compartilháveis, a gente está falando de algo em torno de R$133 bilhões.
Então, eu acho que trazer essa discussão da revisão... Em linha com o que Felipe falou, avalia-se muito pouco o volume, o benefício dessas renúncias fiscais. A gente sabe o custo, mas não sabe qual é o benefício. Então, acho que tem de haver um avanço em torno de qual que é o custo-benefício desse volume gigantesco de renúncias fiscais.
E essa agenda, além de ajudar no processo de consolidação fiscal do Governo Federal, vai também ajudar os Estados e Municípios, porque boa parte dessas renúncias fiscais são feitas em cima de tributos que são compartilhados com os Estados e Municípios.
Então, acho que é uma agenda extremamente importante, que tem tido pouco avanço até o momento, mas que eu acho que vai chamar a atenção, lembrando que a LDO de 2019 abriu essa janela de oportunidade para que se faça essa reavaliação.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Senador Eduardo Braga, com o seu new look para o ano de 2019. (Risos.)
O SR. EDUARDO BRAGA (Bloco Maioria/MDB - AM) - Não, seguramente não, meu querido Presidente Tasso Jereissati. Isso é apenas o reflexo desse longo final de semana, graças ao feriado que tivemos, em comemoração ao Dia da República, que me levou ao interior do Amazonas, a estar desfrutando da beleza da Floresta Amazônica e também da beleza da nossa fauna e flora, principalmente dos nossos peixes do interior. Então, ao chegar ontem tarde a Brasília - e hoje cedo estava na Comissão de Infraestrutura -, dei-me esse direito de vir hoje ao Senado, ainda sem poder voltar ao traje oficial de sempre.
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É sempre uma alegria estar aqui, com V. Exa. na Presidência da Comissão de economia e finanças do Senado e com os colegas Senadores e Senadoras, em especial em um dia de audiência pública com a nossa IFI. Sem dúvida nenhuma, eu quero aqui cumprimentá-los e, em nome dos dois, cumprimentar todo o instituto, porque foi um acerto do Senado da República. Em boa hora, o Senador Serra inspirou essa ideia, o Senador Renan abraçou-a e criou esse instituto independente, extremamente profissional, competente, ousado, que não tem nada de chapa branca, que não tem nada de querer chancelar os números oficiais, e, sim, de prestar um serviço aos brasileiros e à Nação como um todo. Portanto, eu quero aqui registrar esse elogio ao instituto e à instituição.
Eu queria trazer um pouco, Felipe, o enfoque dessa discussão por um outro ângulo do prisma, porque todos sabemos que há fundamentos na economia sem os quais ela não dá certo, e, não dando certo, ela não cresce, ela não gera emprego, ela não aumenta o PIB. Lá, na minha terra, de onde eu estou vindo desse final de semana, se eu falar PIB, meu caro Senador Tasso, o pessoal vai me perguntar: "Vem cá, esse PIB tem o quê a ver comigo mesmo? Isso faz barulho?". Agora, o povo está sentindo o arrocho, Presidente, do desemprego... Aqui, a gente passa muito tempo falando no economês e no tecnicismo de como é que nós vamos fazer o nosso ajuste fiscal, como é que nós vamos fazer a reforma da previdência, como é que nós vamos isso, como é que vamos aquilo, só que, quando a gente chega à base, o povo pergunta: "Como é que vai a minha vida melhorar? Como é que eu vou poder ter emprego? Como é que o Brasil volta a crescer? Como é que o Brasil volta a dar condições para que a gente possa ter uma vida melhor?".
Então, eu creio que tudo o que nós discutimos hoje aqui tem esse objetivo, mas eu não consigo entender - e aí eu queria ouvir a opinião do IFI, que é um instituto independente - como é que o Brasil, com uma taxa Selic de 6,5, tem juros por mês, para quem tem crédito, de mais de 16% ao mês; para quem tem nível de Del Cred baixo, é mais de 25%, 30% ao mês; e, se você cair no crediário dessas empresas que vendem nos juros embutidos, é o que o Pimentel acabou de dizer: 350% de juros ao ano. Ora, o ajuste fiscal, a questão da previdência, a questão da dívida pública, tudo isso são fundamentos, mas, na minha opinião, nós estamos com um x dessa equação que nós precisamos dizer com coragem para o povo brasileiro: o que justifica nós estarmos com o nosso setor produtivo todo comprometido e os bancos anunciando quebra de recorde de lucros a cada trimestre? Ora, há algo estranho nessa equação, porque, se o custo do dinheiro para o banco é de 6,5%, o que pode justificar esse banco cobrar 300% ao ano para o consumidor? Eu queria ouvir a opinião da IFI, porque, na minha opinião, há na realidade um monopólio de bancos no Brasil: dois bancos estatais - Banco do Brasil e Caixa Econômica - e três bancos privados - Itaú, Bradesco e Santander. Esses são os cinco grandes bancos no Brasil. No entanto, nós não conseguimos financiar a economia, e, sem crédito, nós não voltaremos a gerar emprego, não voltaremos a gerar atividade econômica.
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Portanto, será que esse monopólio não deveria ser uma das prioridades a serem enfrentadas também pelo próximo Governo? Será que esse não deveria ser um alerta a ser colocado por um instituto com a independência da IFI para dizer: "Olha, há algo desajustado nisso". E há uma folga aqui para a economia brasileira - sem colocar em risco a estabilidade dos bancos nem do sistema financeiro - para colocar grandes bancos de varejo, grandes bancos de microcrédito etc., para que nós possamos voltar a ter uma perspectiva de financiamento para a economia. Está provado que hoje quem mais gera emprego no Brasil é a micro e pequena empresa, que têm graves e sérias condições para serem financiadas, com muito pouco acesso ao crédito.
Será que não estamos na hora - e passando da hora - de responder uma questão que vai impactar definitivamente no crescimento do PIB brasileiro, que é aproveitando... Não adianta nada, Senador Tasso, nós estarmos hoje com uma taxa Selic de 6,5% só para financiar a dívida pública, porque o consumidor não toma dinheiro emprestado no nível da taxa Selic. E mais: além de não tomar empréstimo no nível de taxa Selic, ele não tem acesso a volume de crédito. Os bancos estão ganhando dinheiro sem emprestar dinheiro.
O SR. JOSÉ PIMENTEL (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE. Fora do microfone.) - Nem o consignado pratica a taxa Selic.
O SR. EDUARDO BRAGA (Bloco Maioria/MDB - AM) - Nem o consignado - lembra aqui o Pimentel - pratica a taxa Selic.
Portanto, eu queria ouvir um pouco do Felipe sobre a questão do sistema financeiro e do sistema bancário brasileiro dentro desse contexto.
A outra questão que eu queria colocar tem a ver com a questão fiscal e com a questão da reforma da previdência. Na minha opinião, nós temos um problema, que é um problema atuarial, e nós temos um outro problema, que é o curto prazo em que nós temos um crescimento acelerado do nosso déficit público em função até das permanentes propostas ou anúncios de propostas de reforma da previdência.
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A reforma da previdência hoje está que nem futebol: todo mundo discute em qualquer esquina, e cada um tem a sua proposta, só que quem está ouvindo e tem direito à aposentadoria fica pensando: "Será que eu antecipo a minha aposentadoria?". E, cada vez que a pessoa toma a decisão de antecipar a sua aposentadoria, ela gera um problema de caixa negativo para a previdência.
Então, a minha pergunta é: se o problema é atuarial, de um lado, e de déficit de caixa, de outro lado, por que nós não usamos esses recursos todos que já foram mencionados aqui - seja o excesso de reserva cambial, seja os recursos das futuras privatizações -; por que não usamos isso como um hedge fund que possa neutralizar o efeito atuarial dos atuais beneficiários, para que nós possamos ter um wave necessário para fazer a reforma que precisamos fazer, sem que isso signifique pressão de despesa para o Tesouro? Teríamos um fundo que "hedgearia" isso e que, portanto, não impactaria a moeda, não impactaria o câmbio, não daria nenhum efeito holandês sobre a nossa economia. Nós teríamos condições, a meu juízo, de fazer uma reforma para migrar de um sistema para outro, seja de capitalização, seja estabelecendo uma idade mínima, com um wave, com uma transição que possa ser suportável pela população, seja aumentando progressivamente a taxa de contribuição para que a população possa ter essa taxa de progressão concomitantemente com uma taxa de crescimento do PIB, etc. Eu pergunto ao Dr. Felipe e ao Dr. Gabriel se isso faria algum sentido do ponto de vista da reforma da previdência.
Eu queria, por fim, fazer uma última pergunta. Eu acho que a reforma fiscal, a reforma do sistema financeiro e a reforma tributária são três das fundamentais e prioritárias reformas, além da reforma política, além da reforma partidária, de que já estamos cansados de falar - e aqui não é o fórum. Quanto à reforma tributária, eu tenho a impressão de que o Brasil precisa criar um mecanismo que possa tributar renda e não tributar produção e salário. Eu acho extremamente injusto o mecanismo que financia hoje o Brasil, porque o Imposto de Renda basicamente hoje é sobre salário. Dividendos e lucro - a distribuição de dividendos a partir de lucro para os acionistas ou para os detentores de debêntures etc. -, esses são isentos. Os próprios bancos estão com uma taxação, a meu modo de ver, muito baixa para o volume que eles têm de lucro sobre capital próprio. Ora, a minha pergunta é: qual o modelo de reforma tributária que a IFI entende importante para estimular o crescimento econômico brasileiro?
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E, por fim, dentro dessa reforma tributária e dentro desse conceito, qual a proposta para a redução das desigualdades regionais que tornam o Brasil tão desigual? Um Estado como o Rio Grande do Sul tem população muito mais idosa do que determinadas regiões, por uma única razão, que é ter um IDH muito maior e a qualidade de vida muito melhor em função do desenvolvimento humano que é oferecido àquela população - assim como o Distrito Federal também tem o IDH muito alto em função da qualidade de vida -, em detrimento do Sertão do Nordeste, do interior da Amazônia, interior do Amazonas, que são regiões que não têm esse IDH e, portanto, não têm essa expectativa de vida. Portanto, qual a ideia, dentro desse contexto, para que nós possamos ter uma política nacional de redução das desigualdades regionais e das desigualdades sociais no Brasil?
Muito obrigado e, mais uma vez, parabenizo.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Obrigado, Senador Eduardo Braga.
Felipe.
O SR. FELIPE SALTO - Bem, a respeito da primeira questão, de fato o senhor falou a palavra-chave, que é fundamento para a economia. E é claro que, para haver crescimento, é preciso ter as coisas organizadas, contas públicas, etc., mas, dentro disso, as questões do sistema financeiro, de fato, preocupam muito, porque o spread bancário é algo realmente muito elevado. O Banco Central, que já esteve aqui, inclusive, discutindo esse tema, tem uma agenda agora, que é a chamada Bacen+, e outras iniciativas que vão nessa direção de investigar os problemas do spread elevado, mas é evidente que o peso da concorrência, da falta de concorrência nisso, é muito grande. A inadimplência também tem alguma explicação nisso, mas é preciso, sim, aprofundar esse tema.
Inclusive, a IFI tem, num dos quatro objetivos fixados na Resolução 42, a investigação das políticas sob responsabilidade do Banco Central: creditícia, cambial e monetária. Então, nessa parte de política creditícia - claro que sempre com foco nos efeitos fiscais -, nós podemos, sim, aqui adotar a sugestão de V. Exa. e incorporar isso num eventual trabalho que possa ajudar, inclusive, a Comissão a discutir mais esse assunto. De fato, é algo que afeta a vida, o cotidiano dos brasileiros: não adianta ter uma Selic de 6,5%, com juros na ponta que podem chegar a níveis estratosféricos. Isso é uma questão econômica muito importante; afeta o crescimento e vai afetar consequentemente as contas públicas.
O SR. EDUARDO BRAGA (Bloco Maioria/MDB - AM) - Talvez uma sugestão: se a gente pudesse nesse estudo dimensionar qual é o tamanho do espaço que o Brasil tem, para ter efetivamente uma concorrência proativa no sistema financeiro. Seria ter um grande banco de varejo? Seria ter um grande banco de fomentos? O que faria com que nós estabelecêssemos uma grande concorrência em que o cidadão pudesse ser o beneficiado pelo sistema?
O SR. FELIPE SALTO - A respeito das outras duas questões, elas também são essenciais.
Na questão da reforma da previdência, o Prof. Raul Velloso, que dispensa apresentações, tem uma proposta que deve ser discutida, precisa ser aprofundada, nessa linha de fundear o déficit atuarial, com ativos, por exemplo, a Dívida Ativa da União, e outras coisas. Vale também a proposta para os governos regionais. Parece-me que é uma alternativa não excludente à outra proposta ou às outras linhas de proposta que têm mais a ver com o fluxo, receitas e despesas. Eu acho que nesse tema a palavra do Senador Armando Monteiro foi muito importante, porque é preciso um diálogo e uma discussão. É um tema muito complexo, tem várias dimensões, e essa que V. Exa. traz, a respeito de criar um fundo que possa equilibrar o déficit atuarial, é uma das dimensões importantes, que precisa ser mais debatida, sim.
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Quanto à questão tributária, como eu disse, a IFI está produzindo um estudo especial, pelo Rodrigo Orair e outros analistas também estão participando, com a ideia de trazer diagnósticos e mostrar um pouco estes problemas: a regressividade, se o nosso sistema é dos mais regressivos ou não, ou seja, se pega mais pesado no andar debaixo, quando a gente diz mais regressivo; o que pode ser feito para mudar isso sem prejudicar a produtividade e a eficiência da economia; as propostas, por exemplo, de readequação da tributação de pessoa jurídica vêm sendo muito debatidas por economistas, de lado a lado; a questão da tributação de lucros e dividendos. No entanto, é preciso tomar cuidado porque, quando a gente faz uma comparação com países de OCDE ou mesmo nas bases da Cepal - a Comissão para a América Latina, da ONU, que tem dados para países mais comparáveis -, o que a gente vê é que o Brasil é um dos campeões na tributação de pessoa jurídica, mas não tributa a distribuição de dividendos. Então, possivelmente, um reequilíbrio disso, com ganhos arrecadatórios, poderia ser feito. Essa é uma coisa que precisa ser mais bem discutida e também mais aprofundada. Modestamente, a Instituição Fiscal Independente também deve colaborar com esse debate.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Aproveitando a palavra do Senador Eduardo Braga, eu queria só lembrar ou avisar que nós estamos convidando o Presidente do Banco Central, Dr. Ilan, que vai deixar o cargo até o final do ano, para vir aqui fazer uma apresentação, sob a sua visão, sobre o que foi feito, que trabalhos foram feitos, principalmente em relação à inflação e a essa questão dos juros, que foi tão debatida aqui nesta Comissão.
Alguma observação?
O SR. ARMANDO MONTEIRO (Bloco Moderador/PTB - PE) - Eu só queria registrar que as questões que o Senador Eduardo traz são sempre muito pertinentes e lamentar o fato de ele não poder estar ao longo do ano aqui na nossa Comissão, porque o Senador Tasso criou dois grupos de trabalho, sendo um deles voltado exatamente para a agenda microeconômica. E um ponto central na discussão - com um relatório concluído, com uma série de contribuições - é o tema dos spreads bancários. Há questões ligadas, por exemplo, ao tema do Cadastro Positivo, da duplicata eletrônica; há também o tema da defesa da concorrência, em que aprovamos um projeto importante que atribui aquela competência compartilhada de Cade e Banco Central para a defesa da concorrência; medidas de estímulos a que novos players estejam no sistema, como, por exemplo, as fintechs, que estão produzindo uma revolução nesse ambiente - e o Banco Central está estabelecendo um marco regulatório que estimula a presença desses novos players -; o estímulo ao cooperativismo de crédito, que poderia, no Brasil, ter um espaço muito maior do que tem. Em suma, é um conjunto de medidas, Senador Eduardo, porque essa é uma agenda complexa: não é algo que se resolve com voluntarismo; é algo que se faz de forma incremental, com um conjunto de medidas de estímulo.
Então, eu quero dizer que a CAE, sob a Presidência do Senador Tasso, discutiu intensamente o tema dos spreads, da falta de concorrência no sistema financeiro nacional, do grau de concentração do sistema financeiro nacional. Foi uma matéria que esteve muito presente ao longo do ano no debate desta Comissão.
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O SR. EDUARDO BRAGA (Bloco Maioria/MDB - AM) - Sr. Presidente, apenas para esclarecer. É óbvio que esse tema esteve presente aqui na Comissão, e, como V. Exa. sabe, eu sou primeiro suplente aqui não por acaso, porque sou Presidente da Comissão de Infraestrutura, que começa às 9h da manhã. Eu a presido, e muitas vezes ela se estende além do início do horário da CAE. Portanto, isso não me permite estar na CAE tão frequentemente quanto gostaria de estar.
No entanto, com toda a vênia que o meu querido Senador Armando Monteiro tem e merece, eu gostaria de dizer o seguinte: acho que há uma decisão política a ser tomada. O ingresso de novos bancos no País e de grandes bancos, para que possamos estabelecer uma concorrência de verdade no microcrédito, no financiamento de longo prazo, para que nós possamos ter novos players que façam com que esse spread possa ser reduzido... Não é apenas a questão do cadastro positivo, a que sou favorável e a que já votei favoravelmente várias vezes nesta Casa; não é apenas a questão da duplicata eletrônica, porque outros países que não têm duplicata eletrônica não sofrem o abuso do spread que o povo brasileiro paga todos os meses e todos os anos. Entra ano e sai ano, entra Governo e sai Governo, e esse monopólio não é quebrado.
Portanto, Sr. Presidente, eu quero aqui, nesta reunião, mais uma vez registrar a minha indignação, porque acho que não há razão financeira, tributária, econômica para que tenhamos uma taxa Selic de 6,5% e tenhamos juros reais de 330%! Isso é agiotagem oficial sobre o povo brasileiro, Sr. Presidente.
O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO) - Sr. Presidente, pela ordem.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Só para esclarecer. O nosso objetivo justamente, e é o papel desta Comissão, é fazer uma última - infelizmente última, porque acho que o Presidente Ilan fez um excelente trabalho, o esforço que podia dentro do Banco Central - explanação de todas as iniciativas que ele teve nesse sentido, principalmente aquelas que foram propostas aqui nas discussões e, para que nós possamos avaliar aqui e discutir, já pensando no próximo ano, aquilo que deu certo, aquilo que não deu certo, aquilo que funcionou, aquilo que deve gerar consequências mais à frente, para que façamos uma avaliação de fim de ano sobre essa questão da inflação e do spread bancário.
O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO) - Vou ser bem breve.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Mas muito breve, porque nós temos três Senadores ainda inscritos.
O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO. Pela ordem.) - Sr. Presidente, eu me sinto muito honrado neste Congresso Nacional, no Senado Federal, especialmente nesta douta Comissão, ao lado desses Senadores tão experientes. O Senador Braga trouxe um assunto de extrema relevância ao tema, que é o problema das nossas instituições financeiras. Eu presidi recentemente a CPI dos Cartões de Crédito, dos juros especiais, e aqui é um problema muito grave porque não é rápido! Isso inibe, inibe o consumo, inibe investimento das nossas empresas. Consequentemente, inibe o emprego, e isso então vai impactar na nossa previdência social, com uma menor arrecadação.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Sem dúvida.
O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO) - Então, quero parabenizar o Senador Braga por trazer este tema tão importante, que também o Senador Monteiro colocou, a respeito das fintechs, que chegaram aí para ver se conseguem acabar com esse cartel bancário no Brasil.
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O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - O.k.
Muito obrigado, Senador Ataídes.
Senador Pimentel e, em seguida, Senador José Serra.
O SR. JOSÉ PIMENTEL (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - Eu quero, também, Sr. Presidente, parabenizar a IFI pelo trabalho e registrar que, nessas audiências públicas que V. Exa. conduziu aqui, na CAE, um dos itens dos expositores sobre taxa de juros mostrava que a nossa taxa de juros é quatro ou cinco vezes maior que a taxa de juros praticada na Argentina, no México, no Chile, na Venezuela, na América Latina. Portanto, tem alguma coisa fora da ordem que não se justifica.
Eu aprendi também que os problemas existem para serem resolvidos, alguns com mais rapidez, outros com menos rapidez, e a previdência é exatamente uma delas.
Quando nós queremos vender uma imagem bastante desfavorável à previdência, nós pegamos todas as rubricas de despesas com a previdência e somamos como se fosse uma coisa única, e ainda temos a qualidade de somar também a parte de assistência, que não tem contribuição. Quando nós queremos proteger determinados segmentos, nós segmentamos item por item exatamente para jogar a conta nas costas dos menos favorecidos ou os que têm menos proteção organizacional e social. Querem ver um exemplo? A nossa previdência hoje é contabilizada em cinco grandes ramos, e o nosso Ministro Garibaldi Alves Filho nos ajudou a explicitar ainda mais essas questões na contabilidade.
Nós temos uma previdência dos militares, tanto dos militares das Forças Armadas, que repercute com as polícias militares e com os corpos de bombeiros. E como, no Brasil, surgiram primeiro as polícias militares, as brigadas, antes das Forças Armadas, aqueles Estados que organizaram as suas brigadas primeiro, a exemplo do Rio Grande do Sul, são aqueles que têm mais problemas: Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia, entre outros. E essa forma de condução... E, no caso das Forças Armadas, como todos nós sabemos, quando você vai discutir essa previdência, você joga no todo; quando você vai discutir a contabilidade disso, você joga dentro da Defesa, mas a fonte é uma única: os impostos que nós pagamos.
Esse setor não tem contribuição do trabalhador, do militar, e isso representa um déficit anual de cerca de 0,8% do PIB, mais ou menos R$50 bilhões. Quando é para discutir especificamente isso, quem deve pagar a conta está dentro da Defesa - portanto, não precisa ter contribuição -; quando é para discutir necessidade de financiamento, aí soma com o trabalhador rural, com o pescador artesanal, com a dona de casa, com o assalariado e com o servidor público. São coisas totalmente diferentes, que a gente precisa enfrentar. Esse jovem trabalhador militar, se é praça, se aposenta aos 47 anos de idade; se é oficial, aos 53 anos de idade. Alguns países têm isso, mas na maioria dos países do mundo esse trabalhador vai para outra atividade administrativa, após uma certa idade - ele é extremamente qualificado e é importante que seja -, e continua servindo à pátria, servindo ao seu país em outras atividades sobre as quais tenha muito conhecimento.
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Já tivemos excelentes Presidentes da República que vieram das Forças Armadas. Agora mesmo, o Brasil terminou de eleger um. Temos um Vice-Presidente da República, eleito agora, que vem das Forças Armadas. E temos um conjunto de pessoas que se aposentam aos 47 anos de idade, e não se discute isso. Tenho visto, em vários debates, que desse segmento não se pode tratar. Sou um daqueles que entendem que os problemas precisam ser enfrentados. Não estou dizendo que eles devem contribuir, não estou dizendo qual é a idade, o que estou dizendo é que 47 anos de idade é muito cedo para ir para a casa, como acontece hoje. E aí termina havendo um conjunto de distorções. Aqui nós estamos falando de R$50 bilhões/ano que jogamos na conta do pescador artesanal, na conta da dona de casa, do assalariado, do aposentado com um salário mínimo. E não é correto.
Nós temos um segundo ramo da previdência que é do Regime Próprio dos servidores públicos, principalmente estaduais e federais, porque os Municípios são mais recentes e essas contas... Ressalvados aqueles casos em que o Prefeito manda um projeto de lei para a Câmara, a Câmara autoriza, ele saca o dinheiro, gasta e deixa a conta nas costas do funcionalismo, porque acha que o papel dele no Município é apenas nos quatro ou nos oito anos em que está lá. Aqui há uma falha muito grande do Ministério Público daquele Estado ou do Ministério Público Federal, porque a conta vem de novo para as costas do trabalhador, mas dessas coisas não se falam.
Aqui mesmo, em Brasília, nós tivemos, no ano passado, a aprovação de uma lei, pela Câmara Distrital, autorizando o Governador a trocar R$3,2 bilhões em caixa, depositados no Regime Próprio dos servidores públicos de Brasília, por um patrimônio que pertence a essa empresa imobiliária. Aí você troca um ativo líquido por um outro ativo imobilizado. Nosso nobre Ataídes, que conhece bem esse setor, sabe que esse valor não é bem aferível, porque oscila muito, mas foram sacados mais de R$3 bilhões. A conta vai, de novo, para as costas do trabalhador.
Se nós observamos o Regime Próprio da União, nós tínhamos, até 1990, quando foi aprovado o Regime Jurídico Único, 80% desses trabalhadores como contribuintes do INPS, na época, com um teto que hoje é de R$5.640,00. Nós aprovamos o Regime Jurídico Único, em 1991, e eles passaram a se aposentar com o salário do mês, independentemente da contribuição. Além disso, nós tivemos, mais ou menos, 280 mil trabalhadores que passaram algumas vezes na porta de uma repartição, nos anos 70, e que foram todos reconhecidos com estabilidade no emprego, em 5 de outubro de 1983. Esse público todo passou a ser servidor público estadual ou federal e a se aposentar com o salário do mês. E essa conta estoura exatamente a partir de 1999, quando eles começaram a se aposentar.
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Quando nós chegamos a 2003, e fizemos todos esses levantamentos, isso representava algo em torno de R$350 bilhões, essas brincadeiras, o Regime Jurídico Único e o trem da alegria para salvar os que colaboraram com a ditadura militar. E quem é que está pagando essa conta? Cada um de nós.
Ali nós criamos um novo sistema de previdência, particularmente o regime próprio. Essa história de dizer que não há idade mínima é uma meia verdade. Ninguém... No serviço público municipal, estadual e federal, quem tomou posse de 2003 para cá só se aposenta por idade: 55 anos, a mulher, e 60 anos, o homem; com 30 anos de contribuição para a mulher e 35 anos de contribuição para o homem. Àqueles que vieram pelo trem da alegria, àqueles que tomaram posse até dezembro 2002, infelizmente, há uma regra de transição que foi aprovada com muita dificuldade. Essa conta é somada com a do pescador artesanal, da dona de casa, mas com um agravante, pois agora que nós aprovamos o novo teto remuneratório grande parte deles que estava com o extrateto vai ter um reajuste - aqui mesmo no Senado Federal em torno de 630 trabalhadores aposentados, pensionistas e ativos estavam no teto de R$33,7 mil. Terminamos de fazer o estudo para ver se impactava a Emenda Constitucional 95, felizmente ainda não impacta, dá para absorver, além dos 4,5% que foram aprovados aqui, em 2016, que serão pagos a partir de janeiro de 2019. Então, essas contas todas elevam.
Quando você vai para o regime especial do pescador artesanal, do extrativista, do quilombola e dos povos indígenas, eles só se aposentam por idade: 55 anos, a mulher, e 60 anos, o homem, e 99,9% deles recebem um salário mínimo - um salário mínimo! Se esse trabalhador vier para a área urbana, que é a tendência se ele for expulso da sua localidade, ele custa, em média, dois salários mínimos aos cofres públicos, com segurança, com infraestrutura, com o que a cidade oferece.
Portanto, esse esforço que a sociedade faz para assegurar àquele velhinho, àquela velhinha, que teve a vida plantando e colhendo para alimentar a sua família e nós na cidade, é uma grande economia para o próprio Estado ele ficando lá na sua localidade. Essa é a maior conta que nós apresentamos dentro do INSS. Precisamos discutir isso.
Temos a previdência contributiva urbana que, de 2009 a 2015, o que nós arrecadávamos pagava tudo que a gente tinha obrigação de pagar e ainda sobrava um bom dinheiro. Eu tive a felicidade de começar isso, o meu - posso chamar assim - Ministro Garibaldi Alves Filho conduziu e sobravam mais de R$30 bilhões todo ano.
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Tivemos um problema gravíssimo em 2016. O Ministério da Previdência foi extinto e o cofre foi para o Ministério da Fazenda. Esse saldo positivo desapareceu e fechou 2016 com um saldo negativo de R$46 bilhões. É preciso dizer que o maior devedor, em 2016, do INSS, era a JBS, não eram os bancos. Quem tiver essa curiosidade é só pegar o relatório da CPI da Previdência em que está tudo escrito. E quem era o presidente da holding da JBS? O Sr. Henrique Meirelles, que saiu de lá e foi ser Ministro da Fazenda. E aí eu e o Garibaldi, que acompanhamos isso, ficávamos indignados com essas coisas.
Portanto, a Previdência tem uma questão de gestão, e toda vez que queremos enganar ou jogar a conta nas costas de alguém, a gente pega tudo, joga num bolo só e, a partir daí, queremos que os mais pobres paguem a conta.
No INSS, só 7% dos benefícios concedidos até 2015 eram por tempo de contribuição; 93% dos 34 milhões de benefícios do INSS não são por tempo de contribuição, são por outras fontes, para compreendermos o que estamos tratando.
Por isso, peço humildemente a nossa IFI que nos ajude no levantamento que nos permita visualizar esses pontos para que a gente possa ter um debate transparente e que a gente construa uma saída sem ter que jogar contra esse ou aquele, mas focando e deixando claro para a sociedade que os problemas existem, que precisam ser resolvidos e são esses e quais são as saídas que podemos fazer.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, Senador Pimentel, bastante oportunas suas observações.
Gostaria de pedir a permissão do Senador Pimentel, já que tínhamos tido o critério de cada pergunta ser respondida, de colocar aqui o último interpelante, o Senador Serra, e fazermos duas perguntas ao mesmo tempo, para serem colocadas diante dos nossos convidados.
Senador José Serra.
O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - Obrigado, Sr. Presidente.
Vou aqui me dispensar de falar a respeito da boa coisa que foi termos criado a IFI e da forma como o trabalho vem se desenvolvendo.
Nesse sentido, cumprimento tanto o nosso Felipe, quanto o Gabriel, pelo trabalho de qualidade que vêm realizando à frente dessa instituição, que poderia dizer que, a essa altura, já se firmou no cenário econômico nacional, das análises da economia, especialmente dentro do Congresso Nacional.
Queria aqui pegar uns tópicos especiais e inclusive como plano de trabalho para a IFI. Uma questão fundamental, me parece, é a questão da privatização. Vira e mexe, quando se fala de conta pública, sempre vem a receita de privatizar, a meu ver até abusando-se da ideia, como se fosse uma espécie de panaceia. Privatiza que vai cobrir déficit, vai deixar tudo arrumado, acertado.
Pois bem, o que queria solicitar à IFI é que fizesse um estudo sobre o potencial fiscal da privatização no Brasil, ou seja: qual é o potencial fiscal de vender empresas e quais empresas? Desconfio que esse potencial fiscal está abaixo, bem abaixo daquele que seria necessário para o conserto do quadro fiscal no Brasil, mas creio que seria útil se pudéssemos ter números sobre isso.
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Uma segunda questão tem a ver com os Estados. A situação dentro da Federação é muito mais crítica para o nível estadual de governo. E basta lembrar apenas um número que eu aqui separei: se se prevalecer o ritmo lento de recuperação econômica que nós temos tido, em 2017 as despesas que não são incomprimíveis, que são determinadas por lei, passam de 100% das receitas líquidas de cinco Estados; ou seja, são despesas incomprimíveis que são superiores às receitas líquidas de cinco Estados e atingem quase 90% em quase todos os governos estaduais. Quer dizer, em cinco ultrapassam 100% e em quase todos chegam a 90%.
Portanto, é uma situação de insolvência dos Estados crítica, e a gente sabe qual é a consequência desses impasses. No final, acabam-se abrindo torneiras, acabam-se abrindo possibilidades de financiamento de fato que desajustam muito mais o quadro fiscal do que resolvem, quando se toma o médio e o longo prazo.
Um terceiro tópico é institucional - e aí talvez a Comissão possa ter um papel a esse respeito -, sobre a formação do Conselho de Assessoramento Técnico da IFI, que não foi até hoje empossado. São pessoas do padrão de Edmar Bacha, só para citar um nome, de Yoshiaki Nakano e que misteriosamente não tomaram posse.
Creio que a Comissão deve, neste momento, fixar a sua posição, e o nosso Presidente da Comissão de Economia fazer esse pleito junto à Presidência da Casa. Trata-se apenas de um passo... Esta Comissão pode até existir do ponto de vista informal, mas não tem cabimento, a ideia era ter profissionais seniores, formando um grupo de assessoramento, de crítica, de ideias, de propostas ao trabalho da IFI, com economistas que não nos faltam nesta matéria, o próprio Edmar Bacha é um exemplo. Então, seria o CAT (Conselho de Assessoramento Técnico).
Por outro lado, quando olhamos a Lei de Responsabilidade Fiscal, vemos duas tarefas para a IFI, ou que envolvem o trabalho da IFI, que são fundamentais. Uma é o Conselho de Gestão Fiscal. Está o projeto na Câmara, que vem da época do Governo Fernando Henrique. Esse conselho deveria ser o órgão supremo da questão fiscal no Brasil, fazendo o acompanhamento, sugestões, avaliações, e ter os números postos para que até o mercado possa se informar a respeito de cada unidade da Federação. Esse conselho de gestão fiscal é essencial e, de novo, está parado por motivos mais misteriosos ainda. Quando está parado no Senado, ainda tenho a minha interpretação de natureza psicológica, freudiana ou o que seja, mas no caso do Conselho de Gestão Fiscal parado na Câmara, é um mistério mesmo. Portanto, deveríamos fazer uma gestão nesse sentido.
Eu sei que o Governo Federal não tem nenhum entusiasmo por esse conselho na prática. Uma coisa é doutrina, falar da necessidade de controle, de acompanhamento; outra, é dividir poder, em tese, embora aqui não se trata de dividir poderes, e, sim, de aumentar o poder do controle público a respeito das contas na Federação.
Por último, uma coisa que falta - e aqui sou suspeito porque o projeto é da minha autoria - é o limite da dívida da União. Inclusive, o Governo se jogou contra, preferindo o teto de gastos, uma posição errada, porque é mais fácil você controlar o limite da dívida do que o teto de gastos, porque a administração é feita de outra maneira. Isso é um instrumento importante, executivo, digamos, da política de gastos no Brasil. Eu queria também que a IFI fizesse um balanço a esse respeito para ajudar a fundamentação.
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Nós temos - e inclusive pedi, Sr. Presidente, que se distribuísse - um artigo de minha autoria apenas tratando do Conselho de Gestão Fiscal, da importância que ele tem, e outro a respeito da importância de se estabelecerem limites para o crescimento da dívida, coisa a que até o Federal Governo se opôs. Por quê? Porque é um elemento de amarração e, a meu ver, muito mais eficaz do que o do teto de gastos.
Essas coisas podem parecer abstratas, mas têm uma implicação prática realmente significativa.
Eram essas as minhas colocações, Sr. Presidente e meu caro Felipe.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Felipe, então, respondendo às colocações feitas pelo Senador Pimentel e pelo Senador José Serra.
O SR. FELIPE SALTO - Senador Pimentel, agradeço também pelas palavras.
O senhor coloca os dados de quem conhece a fundo o tema. E, claro, nós podemos aprimorar...
O SR. JOSÉ PIMENTEL (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE. Fora do microfone.) - É minha obrigação.
O SR. FELIPE SALTO - Sim.
Nós podemos aprofundar o que nós temos feito, incorporar essa dimensão da análise, que é descer um pouco e desagregar os números, avaliar os regimes especiais. Na questão dos militares, o senhor coloca o dedo na ferida e, de fato, é inacreditável que se imagine deixar de fora essa questão numa reforma tão ampla quanto a que se está pretendendo elaborar.
Então, a minha palavra sobre isso... E creio que a Instituição Fiscal Independente tem todo o intuito e empenho de se aproximar do senhor, dos seus técnicos e desses estudos que foram feitos, desses levantamentos, para que a gente possa aprimorar o nosso trabalho e fazer um diagnóstico mais amplo.
Esse tema, ao longo de 2017, ficou um pouco como diálogo de surdos. De um lado, uma proposta sendo colocada, dada a urgência do ajuste fiscal; de outro, a falta de discussão. Eu acho que justamente a urgência dessa consolidação fiscal vai levar à possibilidade de haver um debate melhor, de melhor qualidade, e os dados que o senhor traz só reforçam essa possibilidade. Aqui fica o nosso compromisso de incorporar todas essas sugestões que foram trazidas.
A respeito das colocações do Senador José Serra, que é o idealizador da Instituição Fiscal Independente, nós podemos comentar o seguinte: sobre privatização, há um levantamento inicial que foi feito pela instituição, mas é preciso ainda de mais informações e também de uma metodologia para avaliar o que o senhor chamou de potencial fiscal da privatização. Quer dizer, quanto que dá para arrecadar. Isso resolve em parte o problema ou é apenas para apagar o incêndio do ano que vem? De fato, essa é uma questão que nós precisamos de responder. Já está aqui feito o compromisso de incluir isso...
O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - Queimar capital para pagar dívida é uma estratégia de desespero. Os nossos Senadores que também são empresários, como o nosso Presidente da CAE, sabem perfeitamente disso. Vender patrimônio para aliviar dívida é porque se está entrando em um caminho de morrer, do ponto de vista econômico.
O SR. FELIPE SALTO - É o que se diz: é vender a casa para pagar a janta se desfazer de patrimônio para resolver problema de fluxo.
O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - Botar incêndio na casa para assar o leitão. (Risos.)
O SR. FELIPE SALTO - Esse é um tema essencial. Então, está aqui o compromisso de fazer um estudo aprofundado, mostrando os números disso em contraposição ao ajuste estrutural que precisa ser feito e que, de fato, é mais difícil; ou seja, receita e despesa, temos de turbinar receitas e cortar despesas. Não há muito segredo quando a matéria é ajuste fiscal.
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Sobre Estados, esses dados, de fato, são impressionantes, de comprometimento das despesas em relação às receitas. Isso mostra que a rigidez é muito alta, e o espaço para fazer ajuste fiscal só com remanejamento de despesas discricionárias, como a gente mostrou no caso da União também, é cada vez menor.
Nesse estudo que o Gabriel está preparando lá na IFI, o Observatório dos Estados, certamente essa vai ser uma dimensão importante.
O Conselho de Assessoramento Técnico, de fato, ainda não foi implementado. Nós temos cinco pessoas que têm nos assessorado informalmente: Bernard Appy, Edmar Bacha, Yoshiaki Nakano, Gustavo Loyola e o José Roberto Afonso. Então, esses cinco são inquestionáveis em termos de conhecimento e de possibilidade de auxiliarem a IFI nos seus trabalhos. Tanto o é que todos eles informalmente, de graça, sem receber um centavo, têm nos ajudado, mesmo o conselho não estando instituído. Então, agradeço ao Senador José Serra por ter colocado essa questão, porque, de fato, para que IFI possa se consolidar, é preciso cumprir o que está na lei que cria a IFI, que é a Resolução 42, de 2016.
A Lei de Responsabilidade Fiscal prevê o Conselho de Gestão Fiscal. De fato, sem o Conselho de Gestão Fiscal, a própria LRF diz, a Lei Complementar 101, que fica na mão do Tesouro fazer a tarefa que o CGF não faz. Então, é urgente criar o Conselho de Gestão Fiscal, para que se possa haver harmonização dos números, das regras fiscais, observar o que o Estado x tem feito em relação ao y, mostrar que determinadas práticas de contabilização são equivocadas ou, então, que devem ser alteradas. Nós estamos de acordo também com que o CGF só viria a complementar a Instituição Fiscal.
O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - Na verdade, eu deixei de mencionar, espero que você concorde, a importância (Fora do microfone.) ... do spending review, ou seja, reuniões periódicas para revisar o orçamento, os gastos feitos. É um procedimento adotado na Inglaterra e que tem dado muito certo. Nós temos de implantar isso aqui. Também há o projeto de minha autoria prevendo o spending review.
Realmente é um mistério entender por que a oposição é resistente a isso. Um spending review, um processo de revisão de gastos é indispensável do ponto de vista de uma boa gestão do dinheiro público, porque é o que permite checar receita e despesa, que despesa se está fazendo, qual é a tendência e tudo o mais, fazendo isso periodicamente.
O SR. FELIPE SALTO - As spending reviews, as revisões periódicas de gastos são um avanço em relação à antiga ideia do orçamento base zero, que, em tese, é algo que seria positivo, mas que, na prática, é uma coisa difícil...
O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - É inteiramente utópico. Entramos no plano dos delírios. O sujeito diz que com o orçamento base zero está tudo resolvido, como se o orçamento base zero fosse possível.
O SR. FELIPE SALTO - Exato. Então, nessa literatura de orçamento público, regras fiscais e avanços institucionais, a recomendação de adotar o spending review é inclusive politicamente mais fácil, porque se escolhem grupos de despesas para avaliar e vai-se fazendo revisões periódicas ano após ano. Isso é muito mais palatável do que uma coisa mais radical.
E finalmente o limite da dívida. Temos até colocado no relatório a importância de haver o limite da dívida e a questão da revisão periódica orçamentária nesse avanço institucional que o Brasil pode começar a retomar desde a Lei de Responsabilidade Fiscal. Houve também o teto de gastos, mas o limite para a dívida, como mencionei anteriormente na fala inicial, seria uma referência maior, porque hoje a gente fixa as metas de resultado primário sem muita referência. Quer dizer, por que a meta é 128,9 e não é 160? Supostamente, o cálculo da fixação do primário tem em vista um limite de dívida dadas as condições macro, quer dizer, um crescimento econômico x, um parâmetro em termos de juros reais y, e isso, então, deveria balizar a fixação da meta de primário, como originalmente foi. Lá em 1999, a primeira vez que foi fixada a meta de resultado primário foi no bojo do acordo com o FMI, que exigiu que o País tivesse uma meta de resultado primário com vistas à estabilização da relação dívida/PIB. Então, o limite para a dívida, que está na Constituição, ajudaria de maneira significativa para que as contas públicas pudessem ser aprimoradas e para que um ajuste fiscal para valer saísse do papel, o que até agora não aconteceu.
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O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, Felipe Salto. Muito obrigado, Gabriel.
Gostaria, mais uma vez, aproveitando a presença do Senador José Serra, de salientar a importância do trabalho da IFI, que tem se tornado, cada vez mais, uma das referências de maior credibilidade junto ao mercado, junto aos bancos e até a instituições internacionais. Lembro que essa foi uma inspiração do Senador José Serra, aqui presente.
Agradecendo, então, fica encerrada a primeira parte desta discussão.
Passamos à reunião deliberativa.
Felipe, obrigado. Gabriel, obrigado.
Serei o Relator do item nº 1. Passo, portanto, a Presidência ao Senador Garibaldi Alves Filho.
O SR. PRESIDENTE (Garibaldi Alves Filho. Bloco Maioria/MDB - RN) - Srs. Senadores...
O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - Permita-me, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Garibaldi Alves Filho. Bloco Maioria/MDB - RN) - Com a palavra o Senador José Serra.
O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - Não é propriamente saindo, mas voltando ao tema. É que eu vejo aqui pela imprensa que, devido à pressão dos Governadores eleitos, foi incluído na pauta desta terça-feira na Câmara o requerimento de urgência dos Líderes para a votação do projeto de lei que trata da securitização das dívidas tributárias. Nesse sentido, é um caminho previsto no meu projeto de lei que vai ser votado. Essa securitização é para que os Estados possam remanejar sua situação a curto prazo. Portanto, vamos torcer para que a Câmara o aprove, porque o Senado já o aprovou. Se a Câmara o aprovar tal e qual, poderá ser sancionado pelo Presidente da República.
O SR. PRESIDENTE (Garibaldi Alves Filho. Bloco Maioria/MDB - RN) - Agradeço ao Senador José Serra a sua intervenção.
Vamos passar agora à apreciação do Projeto de Lei do Senado nº 232, de 2016, não terminativo.
ITEM 1
PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 232, de 2016
- Não terminativo -
Dispõe sobre o modelo comercial do setor elétrico, a portabilidade da conta de luz e as concessões de geração de energia elétrica, altera as Leis nº 9.427, de 26 de dezembro de 1996, nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, nº 9.648, de 27 de maio de 1998, nº 10.847, de 15 de março de 2004, nº 10.848, de 15 de março de 2004, e nº 12.783, de 11 de janeiro de 2013, e a Medida Provisória nº 2.227, de 4 de setembro de 2001, e dá outras providências.
Autoria: Senador Cássio Cunha Lima.
Relatoria: Senador Tasso Jereissati.
Relatório: Favorável ao projeto, nos termos do substitutivo apresentado.
Observações:
1. A matéria será apreciada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e, em decisão terminativa, pela Comissão de Serviços de Infraestrutura.
O projeto é de autoria do Senador Cássio Cunha Lima e tem como Relator o Presidente desta Comissão, o Senador Tasso Jereissati, a quem concedo a palavra.
O SR. TASSO JEREISSATI (Bloco Social Democrata/PSDB - CE. Para leitura de relatório.) - Sr. Presidente, tramita nesta Comissão o Projeto de Lei do Senado nº 232, de 2016, de autoria do Senador Cássio Cunha Lima, que propõe alterações na legislação do setor elétrico visando a portabilidade da conta de energia elétrica e a expandir o mercado livre de energia elétrica.
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A proposição tem por objetivo reduzir sistematicamente o limite de carga mínima para que o consumidor escolha o fornecedor com o qual contratará a compra de energia elétrica no mercado livre, atingindo a liberação total desse mercado a partir de 2020.
Ainda que meritório, o projeto de lei tem inadequações e insuficiências, em especial no que concerne às regras de tratamento para o excesso de energia contratada pelas distribuidoras em função de migrações de consumidores para o mercado livre e para o tratamento de subsídios cruzados existentes no setor elétrico.
Análise.
Para sanar essas inadequações e insuficiências, proponho o substitutivo, que atinge exatamente o mesmo objetivo do PLS 232, a implantação da portabilidade das contas dos consumidores de energia elétrica expandindo o mercado livre, mas o faz de maneira a preservar o equilíbrio do setor elétrico. O substitutivo está fundamentado em duas consultas públicas realizadas pelo Ministério de Minas e Energia.
As principais medidas do substitutivo que ora submeto à consideração de V. Exas. são as seguintes.
Redução gradual até o fim da exigência de carga mínima de tensão para a opção do consumidor pelo mercado livre, introduzindo, assim, ampla liberdade para a escolha do seu fornecedor. Primeiramente à ampliação do mercado livre, se dará no mercado de alta tensão, acima de 2,3kW, por meio da diminuição dos requisitos de carga. Após 90 meses de entrada em vigor da lei, não se aplicará qualquer requisito de carga para acesso ao mercado livre. Para a baixa tensão, inferior a 2,3kW, o fim do requisito de carga se dará após 114 meses de entrada em vigor da lei, depois de o Poder Executivo apresentar um plano para implantar essa medida. O plano deverá ser elaborado em 54 meses da entrada da lei em vigor.
Os consumidores que fizerem uso do direito de abandonar o mercado regulado, em que a venda de energia elétrica é feita pelas distribuidoras, deverão pagar os custos remanescentes de operações financeiras contratadas para reduzir a tarifa no mercado regulado entre os anos de 2013 e 2014, evitando que essa responsabilidade recaia sobre os consumidores cativos remanescentes, como tem ocorrido atualmente.
3. Os resultados positivos ou negativos das operações das distribuidoras em decorrência do excesso involuntário de energia contratada provocado pelas saídas de consumidores para o ambiente de contratação livre serão alocados a todos os consumidores, dos mercados regulado e livre, mediante encargo tarifário na proporção do consumo e da energia elétrica consumida. Essa medida tem por finalidade impedir que os consumidores do mercado regulado assumam sozinhos os custos dos empreendimentos, alguns com preços elevados, que, por força de lei ou de contratos, devem comercializar energia elétrica com as empresas de distribuição. Sem isso, haveria um incentivo artificial à migração para o mercado livre, gerando um processo insustentável. Para reduzir o possível custo das migrações e facilitar a expansão organizada do mercado livre, é concedida autorização para que as distribuidoras possam vender contratos de energia elétrica em mecanismos centralizados, com o objetivo de reduzir eventual excesso de energia contratada para atendimento à totalidade do mercado. Com vistas a diminuir a alocação compulsória de energia elétrica no mercado regulado, é determinada a licitação de todas as usinas amortizadas em regime de produção independente e sem percentual definido de comercialização de energia elétrica com as distribuidoras.
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4. Definição em lei da figura do autoprodutor, o consumidor que recebe a outorga em regime de produção independente para produzir energia elétrica para seu consumo por sua conta e risco.
Independentemente de o empreendimento ser novo ou existente, são considerados autoprodutores os consumidores que participem direta ou indiretamente do capital social da empresa titular da outorga com direito a voto ou que estejam sob controle comum.
Para fins de apuração de encargo, com o objetivo de pacificar disputas administrativas e judiciais, são especificadas as situações em que a autoprodução pagará encargos com base no consumo líquido definido como resultado de consumo total menos energia elétrica autoproduzida.
5. Estabelecimento também para pacificar o ambiente regulatório, tanto administrativamente como judicialmente, que a base para fixação de multas pela Aneel é o benefício econômico anual. Assim, são retiradas da base as receitas que não são próprias das empresas, como encargos cobrados por distribuidoras, que são repassados para órgãos ou fundos vinculados ao setor.
Permissão para que as tarifas de mercado regulado sejam diferenciadas por horário e para que seja instituído o pré-pagamento por adesão do consumidor ou por inadimplência recorrente. O pré-pagamento possibilitará às famílias controlar melhor o seu consumo e vai ao encontro da cultura do pré-pagamento, já amplamente aceita no Brasil, além de contribuir para a redução da inadimplência e para o equilíbrio e sustentação dos serviços públicos de energia elétrica.
7. Determinação para que a fatura de energia elétrica discrimine os valores referentes à compra de energia elétrica no mercado regulado. Trata-se de medida de transparência a que tem direito o consumidor de energia elétrica e que contribuirá para que o consumidor consiga avaliar os benefícios da migração para o mercado livre.
8. Substituição a partir dos empreendimentos outorgados, após 30 meses da entrada em vigor da lei, dos subsídios às fontes alternativas por instrumento de valorização dos benefícios ambientais dessas fontes a ser implantado pelo Poder Executivo. A implantação do instrumento será precedida de um plano que o Poder Executivo deverá apresentar em até 20 meses após a entrada em vigor da lei.
9. Previsão que, para parte substancial dos subsídios custeados pela conta de desenvolvimento energético, sejam exigidos critérios que considerem os aspectos ambientais e as condições sociais e econômicas do público beneficiado.
10. Obrigação de o Poder Executivo propor, em até 30 meses após a entrada em vigor da lei, aprimoramentos necessários aos arranjos do mercado de energia elétrica, com a finalidade de criar condições de desenvolvimento e de sustentação de bolsas de energia elétrica nacionais. Isso contribuirá para a expansão especialmente da oferta de energia elétrica para o ambiente livre, podendo os títulos, na forma de contratos futuros transacionáveis em Bolsa, servirem como garantia para o financiamento, mecanismo similar aos contratos firmados entre as geradoras e distribuidoras no ambiente regulado.
11. Separação entre a contratação de lastro, confiabilidade e adequabilidade do sistema, e a contratação de energia elétrica. No novo modelo, todos os consumidores do setor elétrico deverão pagar um encargo para financiar a contratação do lastro. O preço do lastro será definido por mecanismos concorrenciais e deverá valorar os atributos das fontes de geração. A valoração desses atributos permitirá a expansão sustentável das fontes alternativas. Além disso, a separação entre lastro e energia permitirá o crescimento e a maior liquidez do mercado livre; dará maior flexibilidade à contratação de energia pelas distribuidoras, mitigando problemas de sub ou sobrecontratação; permitirá maior participação do mercado livre na expansão do sistema; contribuirá para a modicidade tarifária, vez que contratos a termo com prazos menores podem trazer preços menores por aumento de previsibilidade.
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12. Obrigação para que o mercado de curto prazo adote preços horários e que o despacho de usinas pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico seja orientado pela lógica da oferta de preço e quantidade, permitindo o acoplamento entre a operação e a formação de preço.
Cabe ressaltar que a realização e a divulgação dos estudos prévios e um período de testes serão condições para a implantação desse tipo de despacho.
13. Obrigação de adoção de tarifa binômia, envolvendo a disponibilidade de rede e seu uso efetivo para a autoprodução por consumidores de baixa tensão, o que contribuirá para a separação entre os negócios de distribuição de energia elétrica e de comercialização regulada de energia elétrica, algo essencial para a expansão do mercado livre, e reduzirá as distorções distributivas que têm penalizado a população de menor poder aquisitivo e que não tem condições econômicas de optar por essa modalidade.
14. Destinação à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) de parte da renda hidráulica associada a empreendimentos hidrelétricos que receberem novas outorgas. Isso aumentará os recursos da CDE e reduzirá o ônus dos consumidores de energia elétrica no pagamento de subsídios que custeiam diversas políticas públicas, tais como o desenvolvimento de fontes alternativas.
15. Criação do mecanismo de descontratação voluntária e concorrencial de energia elétrica destinado ao mercado regulado, o que possibilitará a substituição de contratos firmados pelas distribuidoras de energia elétrica para atender ao mercado regulado com usinas caras e poluentes por outras mais baratas e ambientalmente mais limpas.
Voto.
Diante do exposto, voto pela aprovação do PLS nº 232, na forma da emenda substitutiva distribuída a V. Exa., Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Garibaldi Alves Filho. Bloco Maioria/MDB - RN) - Agradeço ao Senador Tasso Jereissati.
A matéria está em discussão. (Pausa.)
Não havendo mais quem queira discutir, está encerrada discussão.
O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - Sr. Presidente, só um comentário.
O SR. PRESIDENTE (Garibaldi Alves Filho. Bloco Maioria/MDB - RN) - Com a palavra o Senador José Serra.
O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Social Democrata/PSDB - SP. Para discutir.) - Hoje eu constatei, com felicidade, que o "energês" é muito pior do que o "economês". Estou com inveja do Senador Tasso, que virou um especialista em "energês".
Sou a favor do projeto porque ele incentiva, estimula a competição dentro do setor. Voto a favor.
Agora, fica a minha reverência aos colegas que já dominam esse "energês". Eu fico com o meu "economês", por enquanto.
O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Eu só queria fazer um comentário, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Garibaldi Alves Filho. Bloco Maioria/MDB - RN) - Com a palavra o Senador Jorge Viana.
O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC. Para discutir.) - Era só para comentar...
Além do belo comentário do Senador Serra, eu queria cumprimentar também o Senador Tasso pela relatoria. Eu estava conversando com o colega Pimentel, e nós até queríamos ajudar um pouquinho mais, mas acho que o projeto pode passar bem aqui. Ele ainda vai à CI, e teremos tempo de apreciar um detalhe ou outro.
Mas eu queria mais cumprimentar no sentido de que é uma tentativa de nós criarmos um ambiente mais competitivo. Por isso, acho importante apreciarmos esta matéria aqui.
Eu queria cumprimentar o Presidente da Comissão, o Senador Tasso.
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O SR. TASSO JEREISSATI (Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, Senador Jorge Viana.
Eu queria só, traduzindo o "energês" desse relatório, dizer que esse projeto é importante não só pelo aumento da competitividade, da competição, e pela redução dos preços ao consumidor, mas também por uma transformação - e nós não podemos estar atrás do mundo - da matriz energética, que passa de uma matriz suja para uma matriz limpa. Sem um mecanismo como esse, nós vamos ficar fora do mundo nesse andamento dessas transformações. Existem previsões de que, em poucos anos, até 2030, a matriz limpa será, no mundo inteiro, responsável por cerca de 80% a 90% da produção de energia.
O SR. PRESIDENTE (Garibaldi Alves Filho. Bloco Maioria/MDB - RN) - A matéria continua em discussão. (Pausa.)
Não havendo mais quem queira discutir, está encerrada a discussão.
Em votação o relatório do Senador Tasso Jereissati.
As Senadoras e os Senadores que concordam com o relatório permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovado o relatório, que passa a constituir o parecer da CAE, favorável ao projeto, nos termos da Emenda nº 1-CAE, Substitutivo.
A matéria vai à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, Senador Garibaldi, que é mais rápido do que eu.
O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (Bloco Maioria/MDB - RN) - Mas eu não sou bom no "energês", não.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Nós temos mais dois itens a serem votados. O Senador Garibaldi é o Relator de um deles. Em seguida, deliberaremos sobre aquele cujo Relator é o Senador Pimentel. O item 6 é da Relatoria do Senador Garibaldi. Vou colocá-los pela ordem. Há o item 5, cujo Relator é o Senador Pimentel.
Senador Pimentel, leio o item 5.
ITEM 5
PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 198, de 2015
- Não terminativo -
Altera a Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, para reduzir a alíquota da contribuição previdenciária a cargo dos segurados contribuinte individual e facultativo, no caso de opção pela exclusão do direito à aposentadoria por tempo de contribuição.
Autoria: Senador Magno Malta
Relatoria: Senador José Pimentel
Relatório: contrário ao projeto.
Observações:
1.Em 30/3/2016, a Comissão de Assuntos Sociais aprova parecer pela oitiva preliminar da Comissão de Assuntos Econômicos.
2.A matéria será apreciada pela Comissão de Assuntos Sociais, em decisão terminativa.
Com a palavra o Senador José Pimentel
O SR. JOSÉ PIMENTEL (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE. Para leitura de relatório.) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, vem ao exame desta Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) o Projeto de Lei do Senado nº 198, de 2015, do Senador Magno Malta, que reduz a alíquota da contribuição previdenciária dos contribuintes individuais e facultativos, quando optantes pela exclusão do direito à aposentadoria por tempo de contribuição.
Sr. Presidente, esse é um projeto muito simples. Ele reduz a contribuição para a previdência dos atuais 11% para 8%. Todos nós estamos fazendo um grande debate sobre a sustentabilidade e sobre a dificuldade da previdência social. É um projeto de 2015. Eu entendo que este não é o melhor momento para se aprovar matéria dessa magnitude, até porque ele não traz nenhum cálculo atuarial, e nenhum impacto isso teria. Isso fere a Lei de Responsabilidade Fiscal e, particularmente, a Emenda Constitucional 95.
Por isso, sou forçoso a rejeitar o projeto. Nosso voto é pela rejeição do projeto.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado pela síntese e pela objetividade ao ler o seu relatório, Senador Pimentel.
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A matéria está em discussão. (Pausa.)
Não havendo quem queira discutir, a discussão está encerrada.
A matéria está em votação.
O relatório do Senador Pimentel é contrário ao projeto.
Quem concorda com o relatório do Senador Pimentel permaneça como se encontra. (Pausa.)
Fica, portanto, aprovado o relatório. Fica, consequentemente, rejeitado o projeto.
A matéria se encerra aqui? (Pausa.)
Sou informado de que a matéria ainda vai à Comissão de Assuntos Sociais.
ITEM 6
PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 142, de 2016
- Não terminativo -
Altera a Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, para estabelecer que o pagamento do salário-maternidade, na hipótese de adoção ou obtenção de guarda judicial para fins de adoção de criança, seja realizado diretamente pelo empregador.
Autoria: Senador Telmário Mota
Relatoria: Senador Garibaldi Alves Filho
Relatório: favorável ao projeto, com uma emenda apresentada.
Observações:
1. A matéria será apreciada pela Comissão de Assuntos Sociais, em decisão terminativa.
Com a palavra o Senador Garibaldi Alves Filho.
O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (Bloco Maioria/MDB - RN. Para leitura de relatório.) - Sr. Presidente, vem ao exame da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) o Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 142, de 2016, do Senador Telmário Mota, que altera a Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, com o intuito de garantir o pagamento do salário-maternidade diretamente pelo empregador, no caso de adoção ou de obtenção de guarda judicial para fins de adoção de criança por parte do empregado.
O projeto estabelece também que esse pagamento poderá ser deduzido das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados aos trabalhadores que prestam serviço ao mesmo empregado.
Em sua justificação, a proposição lembra que o salário-maternidade é um benefício de natureza previdenciária, devendo o pagamento feito pelo empregador ser compensado posteriormente quando do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço. Além de não acarretar qualquer prejuízo para o empregador, a medida, consoante o preceito constitucional, Srs. Senadores e Sras. Senadoras, traria isonomia de tratamento para as mães biológicas e as seguradas ou os segurados que optarem pela adoção ou pela guarda judicial.
Sendo assim, Sr. Presidente, passo a expor meu voto, que é pela aprovação do Projeto de Lei do Senado n° 142, de 2016, com a emenda que se segue:
[...]
§1º O salário-maternidade de que trata este artigo será pago diretamente pela Previdência Social, exceto no caso das seguradas empregadas, que o receberão diretamente do empregador, efetivando-se a compensação, observado o disposto no art. 248 da Constituição Federal, quando do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço.
...................................................................................” (NR)
Sr. Presidente, é só.
O meu voto, o meu parecer é favorável.
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O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, Senador Garibaldi.
A matéria está em discussão. (Pausa.)
Não havendo quem queira discutir, coloco a matéria em votação.
Senadoras e Senadores que concordam com o relatório do Senador Garibaldi permaneçam como se encontram. (Pausa.)
A matéria está aprovada.
Aprovado o relatório, que passa a constituir o parecer da CAE, favorável ao projeto, com a Emenda nº 1 da CAE.
A matéria vai à Comissão de Assuntos Sociais.
Agradecendo aos Srs. Senadores, fica encerrada esta reunião.
(Iniciada às 10 horas e 27 minutos, a reunião é encerrada às 13 horas e 21 minutos.)