Notas Taquigráficas
| Horário | Texto com revisão |
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| R | O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Bom dia, senhoras e senhores, Senadoras e Senadores, assessores, Parlamentares, imprensa, telespectadores! Havendo número regimental, declaro aberta a 34ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da 4ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura. A presente reunião destina-se à realização de audiência pública para debater o Projeto de Lei do Senado nº 272, de 2016, que altera a Lei nº 13.260, de 16 de março de 2016, a fim de disciplinar com mais precisão condutas consideradas como atos de terrorismo, conforme os seguintes requerimentos: Requerimentos nºs 41, de 2018 - CCJ, de iniciativa do Senador Lindbergh Farias; 42, de 2018 - CCJ, de autoria da Senadora Ana Amélia e outros; e 43, de 2018 - CCJ, da Senadora Gleisi Hoffmann e outros. Esta reunião será realizada em caráter interativo, ou seja, com a possibilidade de participação popular. Dessa forma, os cidadãos que queiram encaminhar comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do portal e-Cidadania, no endereço www.senado.leg.br/ecidadania, ou ligando para o número 0800-612211. Como o Presidente da Comissão, o Senador Edison Lobão, está em voo, portanto sem chance de estar aqui neste momento, como era desejável, e como também não está presente o Vice-Presidente, devo assumir a Presidência, na expectativa de que, no andamento da reunião, chegue aqui o Presidente Lobão. |
| R | Como há muitos depoentes, vou propor, primeiro, que haja uma manifestação de cada um deles, por ordem alternada das indicações, pelo espaço de cinco minutos, prorrogáveis impreterivelmente por mais dois minutos, no total de sete minutos, considerando que é grande o número de participantes. A SRA. GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Sr. Presidente... O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Sim, Senadora Gleisi. A SRA. GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Eu queria fazer uma consideração para V. Exa. em relação a esse tempo. Vários depoentes vieram de longe, pessoas que têm muito a contribuir. Eu queria que nós tivéssemos um pouquinho mais de flexibilidade, talvez chegando aos dez minutos, pelo menos. Poderia haver uma tolerância de até dez minutos. Quem quiser usar menos pode usar menos, mas alguns têm grande contribuição a dar. Eu queria fazer essa solicitação a V. Exa. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Eu acho ponderável, mas nós teríamos só de manifestações duas horas, sobrando depois um tempo para perguntas. Eu temo que se vá muito longe. Eu acho que, durante as perguntas, eles poderão voltar a se manifestar com mais precisão. Então, eu quero suplicar a sua compreensão, Senadora Gleisi, para começarmos assim. Já falei com alguns dos convidados, que vão procurar sintetizar ao máximo. E, depois, durante as perguntas, quem sabe, embora nós tenhamos também tempo para as perguntas... Como se sabe, tem sido um erro aqui, muitas vezes, não delimitar o tempo. Há perguntas, às vezes, intermináveis, e aí se toma o tempo que seria da resposta. Então, vamos ver como é que saímos com essa abertura e com o tempo de manifestação de cada um. Assim é que começo a chamar, então, para compor a Mesa... Temos oito lugares e vamos pedir que se coloquem mais três ali, à minha direita, no plenário. Chamo, para compor a Mesa, a convidada Nathalie Ferro, advogada representante de Janaína Homerin, Secretária Executiva da Rede Justiça Criminal; Kim Kataguiri, Líder Nacional do Movimento Brasil Livre; Cristiano Avila Maronna, Presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim); Jailton Almeida do Nascimento, servidor público e ex-líder do movimento Vem pra Rua; Eduardo Nunes de Queiroz, Defensor Público Nacional de Direitos Humanos; Rodrigo de Aquino, Diretor do Departamento de Contraterrorismo e Ilícitos Transnacionais da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), representante de Janér Tesch Hosken Alvarenga, Diretor-Geral da Agência Brasileira de Inteligência; Darci Frigo, Coordenador-Geral da Terra de Direitos; Juner Caldeira Barbosa, Delegado de Polícia Federal e Chefe Substituto da Divisão Antiterrorismo - DAT/DIP/PF, representante de Rogério Augusto Viana Galloro, Diretor-Geral do Departamento de Polícia Federal; Marcelo Semer, Juiz de Direito e representante da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia; Camila Marques, advogada e Coordenadora do Centro de Referência Legal em Liberdade de Expressão e Acesso à Informação da ARTIGO 19; Dom Guilherme Antonio Werlang, Bispo Diocesano de Lages/SC, Presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Ação Social Transformadora e membro do Conselho Episcopal Pastoral (Consep) e do Conselho Permanente da CNBB, representante de Dom Leonard Ulrich Steiner, Secretário-Geral da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil. |
| R | Justificou a ausência Deborah Macedo Duprat de Britto Pereira, Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão. Dito isso, vamos, então, às manifestações iniciais dos nossos convidados, começando pela Dra. Nathalie Ferro, advogada representante da Rede Justiça Criminal, para fazer sua exposição, por cinco minutos, prorrogáveis por mais dois minutos, evidentemente com foco na matéria já explanada. Bom dia, doutora! A SRA. NATHALIE FERRO - Muito bom dia a todas e a todos, às Sras. Senadoras e aos Srs. Senadores, ao Sr. Lasier Martins! Meu nome é Nathalie Ferro e sou doutoranda pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Sou estudante de LL.M. na Universidade Ludwig-Maximilians de Munique. Venho aqui representando a Rede Justiça Criminal, que é uma coalizão de oito organizações que produzem dados que incidem sobre o debate sobre justiça criminal no País. A coalizão, inclusive, acompanha esse tema já há alguns anos e teve a oportunidade de contribuir com os debates na época em que tramitava no Congresso Nacional o PL 2.016, de 2015, que foi designado como PLC 101, de 2015, no Senado Federal e que se transformou na Lei nº 13.260, de 2016. Essa mencionada lei promoveu a criminalização autônoma dos atos considerados terroristas e das condutas acessórias e tramitou em regime de urgência no Congresso. A minha fala, aqui, hoje, muito breve, para respeitar o tempo concedido, vai tratar, primeiramente, do conteúdo que vai ser apresentado a esta Comissão, da forma com que ele será apresentado para a apreciação desta Comissão, especialmente quanto às alterações no art. 2º, caput e incisos do §1º, e quanto às dificuldades de compatibilizar essas alterações com um dos princípios fundamentais e elementares do Direito Penal, que é o princípio da legalidade, previsto no art. 5º, inciso XXXIX, da Constituição Federal. Como coloquei inicialmente, o terrorismo já foi tipificado no ordenamento jurídico brasileiro, sob a justificativa de que, embora as ações que são consideradas terroristas já estejam previstas na legislação penal, haveria aí um injusto específico que mereceria uma criminalização autônoma associada a determinada finalidade. Assim, homicídio, lesão corporal, sequestro e uso de explosivos, em determinado contexto, mereceriam, então, por se constituírem um injusto especial, uma criminalização autônoma. Não se tratava, em 2014, em 2015, de uma situação de lacuna jurídica ou de lacuna de punibilidade. Tratava-se aqui da justificativa oferecida de que mereceria, então, o terrorismo uma criminalização autônoma. |
| R | Essa justificativa, portanto, da lacuna jurídica ou da possibilidade de restarem impunes atos supostamente terroristas não tem fundamento. Inclusive, há vários países que, por longo tempo, persistem ainda sem ter um tipo penal para o injusto do terrorismo, prevendo apenas o financiamento do terrorismo como conduta, que é o caso da Alemanha, por exemplo, em sintonia com as pressões internacionais, por exemplo, do Gafi (Grupo de Ação Financeira Internacional), que age contra a lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo. Então, há países, inclusive, que promoveram a tipificação apenas do financiamento do terrorismo por considerarem que as condutas supostamente terroristas já estariam alcançadas pela legislação penal comum. Quanto ao texto, como eu disse, eu vou me concentrar nas alterações promovidas no art. 2º da Lei 13.260. No caput, a primeira dessas alterações se refere à inserção, entre as motivações típicas, da expressão "por outra motivação política, ideológica ou social". Hoje em dia, há um conjunto de motivações típicas, motivações que caracterizam o ato terrorista, e a elas seria, então, somada qualquer motivação política, ideológica ou social. Entre as finalidades, é inserida a finalidade de coagir governo, autoridade, concessionário ou permissionário do Poder Público a fazer ou deixar de fazer alguma coisa por motivação política, ideológica ou social. Entre os atos de terrorismo, inserem-se no art. 6º as condutas de incendiar, depredar, saquear, destruir ou explodir meios de transporte ou qualquer bem público ou privado. No art. 7º, inserem-se as condutas de interferir, sabotar, danificar sistemas de informática ou banco de dados. A avaliação internacional é a de que há, de fato, uma grande dificuldade, para começar, de início, para definir aquilo que é terrorismo. Não há consenso internacional, mas há certa uniformidade, certa concordância quanto à estrutura do crime de terrorismo. Haveria uma estrutura dupla, que consiste basicamente num crime grave - este é o primeiro ponto - contra uma vítima direta para alcançar uma vítima indireta, por meio de ameaça, de intimidação, de coação. A estrutura está presente no projeto, mas os atos previstos nos incisos VI e VII, especialmente se não forem interpretados de maneira restritiva, mas ainda assim, alcançam condutas que não correspondem à gravidade e à especificidade do injusto do terrorismo. Normalmente, a gente está falando de ações principais, de condutas que alcançam a vítima direta, na forma de um crime doloso contra a vida, contra a integridade física ou contra a liberdade pessoal. No projeto, a gente fala de depredação de qualquer bem público ou privado, independentemente do seu valor material ou simbólico. Vários órgãos especialistas internacionais, nesse sentido, destacam a necessidade de que as tipificações e definições internas relativas ao terrorismo sejam formadas de maneira precisa, não permitam interpretações amplas e não sancionem condutas que não teriam a gravidade e a natureza desse tipo de delito que, normalmente, se associa como terrorismo. Na forma como esses incisos e como esses atos típicos... (Soa a campainha.) A SRA. NATHALIE FERRO - ... foram colocados no projeto, há uma clara violação do princípio da legalidade também. Além da falta de proporcionalidade, da não consonância com a gravidade que o injusto penal do terrorismo implica, há também a violação do princípio da legalidade, segundo o qual todos os tipos penais devem estar delimitados de maneira mais clara e precisa, de forma expressa, taxativa e prévia. |
| R | Eu destaco ainda a inserção da motivação típica do ato em questão, primeiro, como desnecessária. Como eu disse, essa estrutura básica das tipificações de terrorismo fala da ação que atinge uma vítima concreta, direta, e uma vítima indireta e que, normalmente, está associada à finalidade de promover o terror social. A motivação é absolutamente desnecessária, especialmente quando a gente está falando de motivação ideológica, política e social, que... (Interrupção do som.) A SRA. NATHALIE FERRO - Posso concluir? O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Sim, conclua. A SRA. NATHALIE FERRO - Obrigada. Isso abre espaço para interpretações absolutamente amplas e não garante aquilo para que o Direito Penal nasce, que é um mecanismo jurídico apto a salvaguardar cidadãos e cidadãs contra o arbítrio. Da forma como isso está posto - as considerações sobre a finalidade, certamente, aparecerão aqui, e espero ter oportunidade de tratar delas -, da forma como as alterações ao projeto estão postas, fere-se a principal função do Direito Penal numa sociedade democrática, que é garantir que os cidadãos e as cidadãs sejam protegidos contra o arbítrio estatal. Obrigada. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Obrigado, Dra. Nathalie. Com a palavra o Sr. Kim Kataguiri, Líder Nacional do Movimento Brasil Livre, para fazer sua exposição, por cinco minutos, prorrogáveis por mais dois minutos, num total de sete minutos. Bom dia, Sr. Kim! O SR. KIM KATAGUIRI - Bom dia, Presidente, todos os Srs. Senadores, Srs. Parlamentares, todos os presentes! Agradeço, antes de qualquer coisa, o convite para participar desta audiência, que, de fato, é de suma importância para as futuras legislações com as quais a gente vai lidar no nosso País. Acho que a minha principal função aqui, como líder de movimento social, é refutar a tese de que esse projeto de lei, ou mesmo o relatório que surgiu desse projeto de lei ou qualquer substituto que for apresentado dentro desta Comissão, criminalizaria os movimentos sociais. O fato é que isso não criminaliza movimento social nenhum. A partir do momento em que você define de maneira bastante específica - aqui, respeitosamente, eu discordo da doutora - que o terrorismo consiste na prática - isto já está previsto na legislação, não é mudança proposta por esta Comissão - por um ou mais indivíduos dos atos previstos no artigo que define, taxativamente, como exige o Direito Penal, "incendiar, depredar, saquear, destruir ou explodir meios de transporte ou qualquer bem público privado", isso não criminaliza, de maneira nenhuma, quem está fazendo manifestações pacíficas, quem de fato está promovendo manifestações para reivindicar uma pauta política legítima sem depredar ou danificar nenhum tipo de patrimônio público, sem prejudicar o funcionamento de nenhum serviço público essencial. Aliás, seria até uma contradição você falar sobre a inconstitucionalidade do projeto ao mesmo tempo em que você não protege serviços públicos essenciais, que, muitas vezes, são interrompidos por ações que, de fato, hoje não o são, mas que deveriam ser tipificadas como terrorismo pela nossa legislação. Eu queria, em outro ponto também, respeitosamente, discordar da doutora na questão da amplitude da conduta, porque a conduta está muito bem especificada no tipo, e o que, na verdade, ela colocou como geral é qualquer bem público ou privado, o que daria margem, no caso de o Estado exercer o seu jus puniendi, a uma interpretação extensiva. Mas fato é que a conduta em si... O Direito Penal, segundo a doutrina majoritária, define que a conduta deve ser específica, deve ser taxativa e não deve dar margem para interpretação extensiva, diferentemente de princípios constitucionais, mas que a questão do bem público ou privado não diz respeito à atitude do indivíduo em si. Mas, na minha opinião, ainda que assim dissesse - ela afirmou que a legislação hoje colocada, o relatório, não leva em consideração o valor material ou simbólico -, a partir do momento em que esse ato de depredação é feito com a intenção já prevista no caput do art. 2º, em razão de xenofobia, discriminação, preconceito de raça, cor, etnia ou religião, não interessa qual é o patrimônio público ou qual é o patrimônio privado que está sendo vilipendiado; o que interessa é a intenção de aterrorizar, é a intenção de, por motivos preconceituosos e discriminatórios, você perseguir determinado grupo religioso ou político ou tentar intimidar determinado governo por vias absolutamente não democráticas. Esse é o ponto. |
| R | Daí a gente definir quais patrimônios públicos ou privados podem ser depredados e aqueles que não podem ser depredados seria uma inconsistência, seria uma ilegalidade tremenda. Então, nós vamos definir na Lei Antiterrorismo quais os patrimônios públicos que a gente pode depredar sem que isso seja terrorismo e quais os patrimônios a gente não pode depredar porque vai ser terrorismo? Então, se a gente quebrar uma coisa, não vai ser terrorismo e, se a gente incendeia outra coisa, vai ser terrorismo? Isso é de uma incongruência que, absolutamente, aí sim, atentaria contra o nosso ordenamento jurídico, atentaria contra o princípio da legalidade. Há outro ponto: por mais que se tenha dito aqui que vários países apenas tipificaram o financiamento de terrorismo, a verdade é que a maior parte dos países desenvolvidos, a maior parte dos países da OCDE tem tipificado como terrorismo não só o financiamento, mas também diversas atitudes, como as próprias previstas aqui no relatório do Senador Magno Malta e mesmo no projeto original do Senador Lasier Martins, incluindo-se aí, por exemplo, dois países que têm governos e tradições bastante abertos e tolerantes, com visões até completamente conhecidas antidiscriminatórias, como o Canadá e a França, que têm legislações, inclusive, mais pesadas do que esta que a gente está discutindo aqui nesse relatório do Senador Magno Malta e que incluem diversos atos e diversos poderes que o Governo poderia ter em casos da prática desses atos, inclusive permissões sem autorização judicial. Ou seja, o nível de legislação que está sendo discutido, a exigência da legislação que tem sido discutida, a rigidez da legislação que tem sido discutida em países muito mais abertos do que o Brasil, como a França e como o Canadá, tem sido muito mais elevada do que a do próprio projeto que tem sido discutido aqui. Não é que eu ache que a gente deva adotar a mesma legislação desses países, porque a gente não sofre com o terrorismo internacional, como eles sofrem. Mas a gente sofre com o terrorismo doméstico, e é desse terrorismo que se trata principalmente esse artigo que está sendo levado em consideração aqui. Então, para resumir, não se trata de criminalização de movimentos sociais, apenas da criminalização do terrorismo, como ele deve ser criminalizado. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - O senhor ainda tem 1 minuto e 50 segundos, que é a prorrogação. O SR. KIM KATAGUIRI - Eu libero a prorrogação. Eu a dou para o Jailton. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Está bem! Então, com a palavra o Sr. Cristiano Avila Maronna, Presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, o ABCCrim. O SR. CRISTIANO AVILA MARONNA - IBCCrim. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Perdão! É IBCCrim. O SR. CRISTIANO AVILA MARONNA - Bom dia a todas e a todos! Eminente Senador Lasier Martins, eminentes Senadoras e Senadores, senhoras e senhores, eu me somo à manifestação da minha colega Nathalie Ferro no sentido de considerar tanto o projeto apresentado pelo eminente Senador Lasier Martins quanto, especialmente, o relatório apresentado pelo Senador Magno Malta propostas que devem ser rejeitadas porque criam mais problemas do que se propõem a resolver e porque contrariam a ideia de necessidade de revisão da Lei Antiterrorismo. Quando a Lei Antiterrorismo foi discutida e aprovada neste Congresso, a ideia era justamente tipificar condutas que, isoladamente, caracterizam crime, de acordo com a legislação ordinária, o Código Penal, mas que, por conta de circunstâncias que tornam essas violações especialmente graves, faz-se justificada a sua tipificação como terrorismo. Portanto, o terrorismo já traz em si a nota da excepcionalidade. Se nós compreendermos o Direito Penal não como unica ratio, ou como prima ratio, mas como ultima et extrema ratio, ou seja, como mecanismo de controle social que só pode ser aplicado quando os demais mecanismos de controle social menos gravosos se mostram ineficazes, nós compreenderemos que o papel do Direito Penal não é o de linha de frente do controle social. Ao contrário, o Direito Penal tem como características justamente a fragmentariedade, a subsidiariedade. Então, do ponto de vista da necessidade, o que se verifica é que a Lei Antiterrorismo atual já dá conta de resolver as situações que podem caracterizar essa especial gravidade que é tipificada como terrorismo. |
| R | Eu chamo atenção aqui para um trecho do relatório da Organização Artigo 19 - a Camila Marques representa a organização. Eles soltaram uma nota que diz o seguinte. (...) vale ressaltar que as novas condutas previstas somam-se a um extenso rol já definido na Lei Antiterrorismo aprovada, que não invoca nenhum tipo de diferenciação na gravidade das condutas tipificadas, cominando a todas essas penas elevadíssimas de reclusão de 12 a 30 anos. Dessa forma, a utilização [por exemplo] de armas químicas aptas a promover "destruição em massa" e a depredação de lixeiras ou orelhões públicos (ambas já tipificadas [pela legislação comum - o Código Penal tipifica o crime de dano ao patrimônio público] podem vir a ser consideradas atos terroristas de igual gravidade e com igual tratamento. Então, nós temos aqui a demonstração de que essas propostas de alteração são desnecessárias, porque a legislação atual já contempla a punição dessas condutas, além de criar um potencial para uma aplicação arbitrária dessa legislação, que, sim, será capaz de criminalizar lutas sociais legítimas, além de haver também esse problema da desproporcionalidade das penas. E, aí, o relatório da ARTIGO 19 continua dizendo: (...) [O segundo] ponto crítico que esteve presente no processo de tramitação da Lei nº 13.260/2016 e que o projeto em questão almeja retomar é a ideia de "apologia ao terrorismo", consubstanciada nos termos "recompensar ou louvar" do art. 3º-A. Em relação a esta proposição, as críticas centram-se em três aspectos, bastante semelhantes aos pontos levantados anteriormente: a desnecessidade, o potencial para a aplicação arbitrária e a desproporcionalidade das penas cominadas. Quanto ao primeiro ponto, conforme diversos outros dispositivos, a conduta que se pretende criminalizar já encontra tipificação no ordenamento jurídico brasileiro. Os arts. 286 e 287 do Código Penal punem, respectivamente, a incitação da prática de crime e a apologia de fato criminoso ou de autor de crime. Dessa forma, trata-se de nova norma penal incriminadora que visa coibir condutas já criminalizadas atualmente, e cuja única diferença em relação ao ordenamento jurídico atual é a elevação desproporcional das penas previstas. (...) porque as penas previstas para os crimes de incitação e apologia previstos no Código Penal são de detenção de três a seis meses, ou multa, o que os caracteriza como crimes de menor potencial ofensivo e sujeitos aos institutos despenalizadores da Lei 9.099/95, como a transação penal e a suspensão condicional do processo. |
| R | Eu gostaria, para finalizar, eminente Senador, Sras. Senadoras, Srs. Senadores, de dizer que, já desde a década de 90 pelo menos, a jurisprudência brasileira é assente no sentido de que lutar por direitos sociais, lutar por direitos previstos na Constituição, lutar pela concretização dos direitos faz parte da democracia. Era um acórdão que tratava de um caso em que membros do Movimento dos Trabalhadores sem Terra invadiram uma propriedade considerada improdutiva e foram processados pelo crime de esbulho possessório. E, no STJ, por decisão unânime da Turma, um acórdão relatado pelo então Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, decidiu que lutar por direitos sociais não se confunde com crime. Faz parte da democracia essa disputa, inclusive, muitas vezes, por meio da luta social. (Soa a campainha.) O SR. CRISTIANO AVILA MARONNA - Então, é preciso atentar para este aspecto para que essa criminalização não restrinja o espaço da luta democrática, que é característica de um Estado de direito. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Pois não, o senhor ainda tinha 45 segundos. Eu informo aos senhores que temos lá, ao fundo, o cronômetro e acho que aqui na frente também. Quer usar os 45 segundos? O SR. CRISTIANO AVILA MARONNA - Não, eu terminei. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Obrigado. Com a palavra o Sr. Jailton Almeida do Nascimento, servidor público e ex-líder do movimento Vem pra Rua, para sua exposição por cinco minutos prorrogável por mais dois minutos. Sr. Jailton. O SR. JAILTON ALMEIDA DO NASCIMENTO - Bom dia a todos! Bom dia, Presidente! Saúdo todos os Senadores, todos os presentes e todos que nos acompanham na transmissão. Eu fui líder do movimento Vem pra Rua, organizei várias manifestações aqui em Brasília, inclusive manifestações com bastante dificuldade, porque nós dividimos a Esplanada entre dois grupos antagônicos. Enchemos a Esplanada com milhares de pessoas e convivemos de uma forma até respeitosa, mesmo diante da gravidade do tema e de o quanto suscitava paixões nos grupos, mas chegamos ao final de uma forma cívica. O que me chama atenção nesta discussão e o que me chama atenção nas colocações é a preocupação com o civismo, com a atitude cidadã de se manifestar, de pleitear agendas públicas, de lutar por convicções. Eu não entendo em que momento a lei alcança esse tipo de conduta, eu não entendo em que momento a lei alcança as condutas de cidadania, de manifestação. Nós estivemos à frente dos movimentos. Em 2013, foi quando começou essa efervescência de cidadania nas ruas, que foi uma experiência um pouco diferente das que nós já tivemos no Brasil no passado, porque ela surgiu de um fenômeno virtual que foi para as ruas - isso não tinha acontecido até então. Agora, há um argumento categórico nesses anos de manifestação: nós reunimos, em um só dia, quase dez milhões de pessoas nas ruas, em um domingo, para não criar caos, para não criar desordem, e nenhuma vidraça foi quebrada em todo o Brasil. Foram anos de manifestação, anos de conquistas. E não foi só o impeachment: dez medidas contra abusos que eram cometidos aqui, no Congresso... Nunca usamos nenhuma forma violenta ou agressiva para conquistar nenhuma pauta e conquistamos várias. A forma de reconhecimento dessa cidadania ativa é que várias dessas pessoas estão aqui hoje representando a população como Deputados, Senadores e Deputados Estaduais, num reconhecimento da cidadania ativa dessas pessoas. |
| R | Agora, onde vai parar um grupo que quer se organizar, quer pleitear uma pauta pública, uma agenda pública, e usa como meios a violência e a agressão? Quer dizer que, agora, existe um espaço de isenção legal no qual, sob o pretexto de estar agindo de forma cidadã, cívica... "Estou defendendo um direito, então isso me dá um indulto de tal forma que posso quebrar, atear fogo, invadir, eu posso até agredir pessoas." Por quê? "Não, porque a minha escusa é cívica. Eu estou defendendo um direito, então isso me dá quase um habeas corpus de atuação de ilegalidade." Isso não existe, isso não é cidadania. Toda e qualquer sociedade que queira construir sua prosperidade e seu desenvolvimento não segue esse caminho. Nós temos vários grupos no mundo que saíram das ruas e viraram partidos políticos e defendem suas pautas, suas ideologias. Você tem, na Espanha, o Podemos, você tem o Cinco Estrelas, você tem vários grupos no mundo. Ao mesmo tempo, nós temos grupos que defendiam pautas ou direitos e se converteram em grupos terroristas: aí você tem o ETA, por exemplo, você tem as Farc, você tem vários grupos. Há um grupo... É óbvio que, hoje, quando se fala em terrorismo, pensa-se em terrorismo islâmico, mas há outros grupos separatistas no mundo, outros grupos que defendem pautas de direitos e que começaram com atitudes assim. Então, o que nós não podemos é criar uma escusa para atos desse gênero, não podemos. Mesmo que o pretexto seja "eu tenho meu direito a tal coisa, ele não está sendo atendido, então eu vou atrás do uso da violência para conquistá-lo, para obrigar o Estado a reagir". Nós estamos vivendo uma nova cidadania, que está brotando não só no Brasil, mas no mundo inteiro, cidadania que usa vários meios, como as redes sociais. A criatividade na ordem de atuação cidadã cresceu tanto que hoje existem várias formas de se conquistar uma agenda pública, e não há por que, e se torna até ineficaz, usar a violência, usar a agressão, a coação. Conquistar pessoas com ideais é, sim, um caminho da democracia; conquistar pessoas com a legalidade é, sim, um caminho da democracia. Agora, não há como defender uma atitude violenta sob o pretexto de que "esse é um direito meu, eu o quero agora, eu preciso disso". Eu acho, de forma clara, que a lei não alcança quem queira exercer cidadania, democracia, quem queira defender seus direitos. A lei não alcança ninguém que tenha boas intenções. Acho até que a desconstrução da lei com os vetos que foram feitos quando da sua aprovação aqui fez com que ela deixasse de alcançar grupos que, sim, podem ser uma ameaça para o Brasil, como o crime organizado, os grupos que se organizam no Brasil e que usam, sim, o tráfico, a violência e as drogas em várias regiões do Brasil. (Soa a campainha.) |
| R | O SR. JAILTON ALMEIDA DO NASCIMENTO - Acho até que nós perdemos a possibilidade de proteger esses grupos, para evitar que eles não evoluam para um estágio muito mais grave, muito pior do que nós temos. "Ah, hoje no Brasil nós não temos de nos preocupar com isso." O direito existe para agora e para o futuro, ele não existe só para... "Até então não tivemos problema com terrorista ou com terrorismo no Brasil de forma muito considerável, então calma, pega leve." Não, não existe isso! Se os operadores do Direito querem proteger o Brasil de uma conduta que pode, sim, culminar num grupo terrorista, num grupo que se organiza para cometer crimes sob o pretexto, sob a escusa que seja, a gente tem de evitar que isso aconteça, e esta lei com certeza evita esse tipo de conduta, esse tipo de desenvolvimento, esse tipo de evolução. Então, eu defendo, sim, que o projeto seja atualizado, resgatando, naturalmente, o que já foi discutido quando de sua aprovação aqui, nesta mesma Casa. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Muito obrigado, Sr. Jailton Nascimento. O Senador Magno Malta, que é o Relator desta matéria, informa que o seu voo foi cancelado, de Vitória do Espírito Santo para Brasília, mas ele está assistindo à nossa audiência on-line e talvez envie perguntas quando for aberto o espaço para tal. Com a palavra o Sr. Eduardo Nunes de Queiroz, Defensor Público Nacional de Direitos Humanos, para a sua exposição. O SR. EDUARDO NUNES DE QUEIROZ - Muito obrigado, Senador. Agradeço a oportunidade a V. Exa. e aos demais integrantes da Mesa, Senadoras e Senadores, de a Defensoria Pública também participar deste debate, até por se tratar de uma instituição de defesa de direitos individuais, de promoção de direitos humanos, de garantias da população brasileira, a oportunidade de poder trazer contribuições, de poder colaborar. Nesse sentido, acho que o ponto de toque da minha manifestação é muito do que já foi colocado aqui pela Nathalie e pelo Cristiano. O ponto realmente essencial é a questão da estrita legalidade. A luta contra o terrorismo lida, no Direito Penal, com temáticas muito sensíveis, ou seja, de relativização de garantias penais, ou seja, de se entender que se está lutando não contra um cidadão desviante, mas contra um inimigo do Estado, e o discurso que funda esse tipo de legislação é um discurso que abre espaço para todo tipo de relativização de garantias penais, como a garantia do devido processo e a garantia de acesso adequado a defesa técnica. Então, esse tipo de vulnerabilidade faz com que uma luta contra o terrorismo, que presume essa visão de um inimigo, precisa ter severa restrição na sua adoção por qualquer país verdadeiramente democrático. Nesse sentido, o Brasil se alinha à comunidade internacional na necessidade. Não quero dizer, quanto à luta contra o terrorismo, que não haja um compromisso do Brasil como membro da comunidade internacional, mas é que há parâmetros para isso. O Brasil aderiu à Convenção Interamericana de Combate ao Terrorismo, que coloca que qualquer legislação deve respeitar princípios de ação democrática, os direitos fundamentais e o próprio léxico de direitos humanos de que o Brasil faz parte. E essa convenção foi tratada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos ao lidar com uma luta do povo indígena mapuche, do Chile, que lutava por demarcação territorial e assistência e foi tratado como um movimento terrorista. E a Corte, nesse julgamento que ocorreu em 2014, entendeu que, em qualquer leitura que se faça do terrorismo, a legislação precisa ser certa, a legislação precisa ter definição clara sobre os limites da sua aplicação. Se não for assim, podemos correr riscos. |
| R | Senador, o senhor coloca na fundamentação do seu PL a legislação portuguesa, que foi uma das primeiras que foram instaladas depois dos atentados a Nova York. A legislação portuguesa, coincidência ou não, recentemente está sob discussão lá, porque o ex-Presidente do Clube Sporting, de Lisboa, está sendo acusado de 91 condutas tipificadas como crime de terrorismo por ter deixado a torcida organizada do Sporting entrar lá para coagir os jogadores. Então, vê-se aí os riscos que se colocam quando se dá uma definição muito vaga, ou seja, quando se abre a possibilidade de qualquer ato de intimidação poder ser qualificado como terrorismo. E, nesse sentido, a gente traz a própria experiência da DPU do primeiro grande teste da nossa legislação antiterrorista, que foi a Operação Hashtag, que aconteceu às vésperas da Olimpíada, em que a defensoria atualmente defende sete dos oito acusados, e se provou, em diversos pontos, ser extremamente danoso esse tratamento como terrorista, porque quando você etiqueta uma pessoa como terrorista abre todo um espaço de violência contra essa pessoa. Sendo que nesse caso a gente teve, entre os acusados: o indiciado, que sequer foi acusado, entrou num profundo estado de perturbação mental; outro que foi preso e encaminhado para uma penitenciária federal desenvolveu esquizofrenia; e um que acabou sendo liberado foi assassinado por ser identificado como terrorista. Então, vê-se qual o risco de ser muito consciencioso ao etiquetar pessoas, ao etiquetar pessoas que carregam, que levam opiniões como terroristas. É um risco que a gente precisa ter e de que se precisa ao pautar qualquer ação das Casas legislativas, avançar nessa legislação. Nesse sentido, preocupa muito a defensoria esse alastramento que esse PL traz, o alastramento de criminalizar opiniões, criminalizar uma noção de apoio que já está prevista na própria legislação penal, de participação, ou de favorecimento real, ou de pessoal, que já está prevista, mas abre uma questão de alastramento para criminalizar grupos inteiros, que não se sabe qual o fim do efetivo apoio, ou se é de uma manifestação de apoio da questão política, mas não da prática. Então, é realmente nesse contexto de incerteza que a gente precisa voltar, como já foi falado aqui, à própria essência do Direito Penal. O Direito Penal é contenção de excessos, é contenção da exposição indevida do cidadão a toda pecha, a toda perseguição que vem com a persecução criminal. E na questão de terrorismo, como envolve uma série de flexibilizações, uma série de vulnerabilidades aprofundadas... E nesse caso há uma proposta por exemplo de qualquer pessoa que é acusada já ter que ir para um presídio de segurança máxima, e agora estamos com uma nova lógica que já vem de 2006 das penitenciárias federais, que têm uma lógica que precisa ser discutida aqui, porque é uma lógica que a DPU entende que é intrinsecamente violadora de direitos humanos. Toda a legislação que abre espaço para isso precisa ser tratada com reserva, precisa realmente sofrer restrições e se avaliar. Porque não creio que no Brasil, como a legislação original esteve num contexto de emergência, ou seja, na iminência dos Jogos Olímpicos, não vejo aqui no País a necessidade de se trazer uma legislação tão pesada, uma legislação que envolve abrir mão de tantas proteções essenciais da Constituição brasileira para um contexto que não se verifica aqui. Há um contexto de busca por direitos. O Brasil é um país de exclusão, mas nesse sentido não se vislumbram movimentos que estão na noção de terrorismo e que desmereçam a organização sociopolítica brasileira. |
| R | Acho que os movimentos que lutam, as pautas que são levadas são muito ligadas à Constituição nacional, que é uma Constituição cidadã, é uma Constituição de políticas públicas, de reconhecimento de direitos intergeracionais e de populações historicamente excluídas. Então, nesse sentido, não consigo ver um contexto que reclame tal gravidade na proteção de bens jurídicos, ainda mais de bens jurídicos insuspeitos, como sistemas informáticos, bens privados. A gente corre o risco de criminalizar, por exemplo, taxistas que atacam motoristas de Uber porque não querem que avance uma questão; a situação dos caminhoneiros que ameaçaram colegas de depredação para fazer uma política pública. Vejo isso com muito risco e, nesse sentido, junto-me à proposição dos colegas aqui de que seja realmente rejeitado esse PL. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Obrigado, Dr. Eduardo de Queiroz. Com a palavra o Sr. Rodrigo de Aquino, Diretor do Departamento de Contraterrorismo e Ilícitos Transnacionais da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). O SR. RODRIGO DE AQUINO - Muito obrigado. Primeiramente eu gostaria de agradecer o convite para participar deste debate. Eu iniciaria fazendo algumas considerações sobre como vemos o fenômeno do terrorismo e a forma como a atividade de inteligência tem trabalhado contra essa ameaça. Em virtude das ações de prevenção à ameaça terrorista que foram implementadas na antecipação dos Jogos Olímpicos de Verão, em 2016, foi possível identificar a atuação de uma rede on-line com recrutador do Estado Islâmico de língua portuguesa e a sua relação com alguns simpatizantes radicalizados aqui no Brasil. O trabalho coordenado entre essa fase de prevenção de identificação, desenvolvida pela atividade de inteligência, e posteriormente atividade de repressão ao crime, desenvolvida pela Polícia Federal, permitiu então desarticulação desse grupo e também a condenação com base na Lei 13.260, que estamos aqui avaliando. Passado esse ciclo dos grandes eventos, o que nós observamos foi uma grande mudança no comportamento do fenômeno do terrorismo no Brasil. Houve uma sensível redução do número de simpatizantes ostensivos ao ideário do Estado Islâmico, mas esses menores grupos estão adotando bastante cautela no modo como atuam, como desenvolvem suas atividades nas redes sociais. Eles evitam menções a qualquer tipo de apoio a grupo terrorista reconhecido pelo Brasil ou comentários referentes a eventuais planos ou intenção de cometer algum ato violento. De todo modo, como a gente já vinha observando, o risco de ameaça interna, o risco de atentado terrorista no Brasil continua a ser baixo. De forma geral, a principal ameaça aos países ocidentais, e o Brasil se enquadra nesse cenário, continua sendo a atuação de pequenas células ou de indivíduos isolados que, inspirados pela causa jihadista, venham a cometer algum tipo de atentado em território nacional. Assim, propaganda e recrutamento continuam sendo a principal atividade dos terroristas nas redes. Existe um grande temor de todos os órgãos de inteligência no mundo inteiro de que esses grupos terroristas utilizem hackers que possam vir a atuar contra a estrutura de telecomunicações, comunicações do Estado e que possam cometer um ataque híbrido, ou seja, utilizar as redes para cometer um ato físico. Efetivamente não existe, não temos ainda evidências de que os grupos terroristas tenham acesso a tal capacidade. Ainda permanece um grande temor, mas não existem evidências de que eles consigam fazer esse ato. |
| R | Diante desse cenário de evolução da ameaça terrorista depois dos grandes eventos, embora o risco seja pequeno, o Estado brasileiro deve manter a sua capacidade de avaliar a ameaça. Nós temos de nos antecipar à capacidade de adaptação dessas organizações às regras e ao meio em que estão atuando. Para que isso seja feito, a experiência internacional mostra que a atividade de inteligência realmente contribui muito nessa atividade de prevenção ao terrorismo. Antes mesmo que a conduta tipificada possa ser levada a uma investigação pela polícia, é preciso que haja um trabalho de detecção daqueles grupos ou de pessoas que mantêm um diálogo ou estão suscetíveis ao extremismo radical. Evidentemente que a motivação política está, de certo modo, associado ao ato terrorista, uma vez que o autor, quando pretende cometer um ato, busca, na verdade, fazer com que uma autoridade ou um grupo dominante mude ou adote uma decisão que esteja de forma vinculada à agenda daquela organização, mas é preciso entender que, no contexto democrático, a livre manifestação de pensamento e a realização de atos de protestos são protegidos por lei e, portanto, legítimos, independentes do mérito das suas reivindicações, desde que não se promova uma agenda sistemática de violência contra as instituições e os valores da sociedade. Então, é preciso deixar bem claro que não se mobiliza o aparato de inteligência contra indivíduos por causa de suas orientações políticas, religiosas ou filosóficas. O alvo da inteligência são grupos e pessoas vinculadas ao extremismo radical, ou seja, aqueles que persistentemente mantêm um diálogo, um discurso contrário aos valores da sociedade, contrários à Constituição e que não se demonstram abertos ao diálogo e defendem uma pauta de violência difusa ou contra alvos específicos como maneira de defender suas ideias. Então, a função de prevenção a ser desempenhada pela atividade de inteligência é identificar esses indivíduos que estão vinculados a esse ciclo de radicalização, para que, identificados aqueles que possam estar sujeitos a passar desse ciclo de radicalização para o ciclo de ação, possam ser encaminhados à Polícia Federal e aí sim, neste momento sejam efetivamente identificados, respeitando o devido processo legal, se aquelas suspeitas ou indícios são condizentes com ameaça analisada em nível da atividade de inteligência. Essa é a contribuição que eu gostaria de dar para o trabalho. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Muito obrigado. O senhor entregou com um minuto e alguns segundos disponíveis. Obrigado, Sr. Rodrigo de Aquino. Com a palavra o Sr. Darci Frigo, Coordenador Geral da Terra de Direitos. O SR. DARCI FRIGO - Senador Lasier Martins, Senadores e Senadoras aqui presentes, defensores e defensoras de direitos humanos, ativistas, como o tempo é curto, vou me manifestar no sentido do manifesto do Conselho Nacional de Direitos Humanos, porque sou Vice-Presidente desse conselho, um colegiado paritário com 22 integrantes, sendo 11 do Estado e 4 do Parlamento, inclusive 2 do Senado. Esse conselho já se manifestou por ocasião da aprovação ou da proposta de projeto de lei que tramitava nas duas Casas, dizendo que a manutenção de um regime democrático, com respeito aos preceitos constitucionais, deve garantir a livre manifestação de ideia e de opinião, resguardadas as responsabilidades legais, e não recorrer a recursos notoriamente autoritários, características dessas proposições. Inclusive, há a nossa preocupação em relação a essas propostas que vêm adicionar, vamos dizer assim, novas condutas ou novas situações ao próprio projeto de lei. |
| R | E o conselho, falando sobre a questão, vamos dizer, do endereço de um projeto de lei como esse... Ouvimos agora o representante da inteligência, dizendo claramente que, neste momento, há baixo risco e tudo o mais em relação a essa questão do terrorismo, mas que o Estado precisa estar atento a essa questão. Só que precisa estar atento usando os meios que a inteligência tem, que os órgãos públicos têm. Nós não precisamos de uma legislação agravando ainda mais a possibilidade de liberdade de manifestação. A experiência histórica no Brasil, diz o conselho, comprova que retóricas sobre conceito do terrorismo justificam perseguições, ameaças, desaparecimentos forçados e assassinatos de pessoas e grupos políticos divergentes daqueles detentores do poder, poder estatal e poder privado. Essa é a conclusão da manifestação do Conselho Nacional de Direitos Humanos. Acompanho há muitos anos, como advogado e como defensor de direitos humanos, movimentos sociais e, por mais de 15 anos, lideranças dos movimentos sociais no Rio Grande do Sul foram, por exemplo, enquadradas na Lei de Segurança Nacional quando a gente entendia que essa lei havia sido revogada pela Constituição de 1988, mas - aí o Kim falou: "Como que nós temos algum receio em relação a essa questão?" e outras pessoas também falaram aqui - acontece o seguinte: quem é que vai aplicar essa legislação? As Casas fazem essa legislação, mas quem aplica são juízes, são promotores, são pessoas a quem, vamos dizer, não interessa se movimento social tem direito a livre manifestação ou não. Se elas decidem criminalizar esses movimentos, elas criminalizam e, ao final, esses processos se encerram. Recentemente, aqui também, no Congresso Nacional, se aprovou a legislação de organização criminosa, também com a informação, o debate de que não se aplicaria a movimentos sociais, e há uma liderança do movimento social em Goiás condenada com base na organização criminosa. Então, esta mesma legislação que agora está se discutindo aqui para, vamos dizer, incluir motivações políticas e ideológicas, poderá, sim, ser endereçada aos movimentos sociais. (Soa a campainha.) O SR. DARCI FRIGO - E, com isso, nós poderemos ter no País, vamos dizer, ilhas de democracia para poucos e a possibilidade de estado de exceção, de ditadura, para a maioria. E, nos 30 anos da Constituição e nos 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, nós podemos ferir de morte a essência da política da democracia, que é o pluralismo, que é a tolerância - o pluralismo político, a liberdade de pensamento, a liberdade de reunião, de manifestação e de protesto. Então, a minha preocupação é: qual é o endereço dessa legislação? Nós temos no Brasil cinco pessoas que detêm a mesma riqueza que os 50% mais pobres, Senador Lasier Martins; 104 milhões de pessoas têm a mesma riqueza que as cinco pessoas mais ricas. Como essas pessoas mais pobres vão ter a sua voz ouvida pelas autoridades se elas não puderem terem o direito de manifestação? Porque, se você já defende a redução do tipo penal de trabalho escravo para aqueles submetem trabalhadores ao trabalho escravo no País, agora, se você vai aqui dizendo que uma motivação ideológica poderá ser utilizada para criminalizar uma pessoa, então você está dizendo que, de agora em diante, a gente vai ter a possibilidade da escravidão, a cultura da escravidão se ampliar no nosso País e a impossibilidade de pensar. Isso é o fim da democracia; isso é a essência daquilo que nós temos no nosso País. E os movimentos sociais são a possibilidade real de nós termos uma democracia ampla e a possibilidade de que os conflitos sociais possam ser canalizados através justamente desses agrupamentos. |
| R | Eu pergunto se quem está modificando essa legislação, está propondo essa legislação está incluindo alguns grupos seletivamente, achando que eles serão os alvos dessa ação; se está considerando, por exemplo, a greve dos caminhoneiros, em que empresários se utilizaram justamente da sua posição forte para causar uma série de danos à sociedade. Está considerando a greve dos caminhoneiros? Está considerando a invasão dos policiais aqui dentro do Congresso Nacional? Está considerando os grileiros e latifundiários que, por razões de racismo, acham que indígenas que reivindicam terras públicas ou terras ancestrais a que eles têm direitos podem ser assassinados? Estão pensando nisso? Ou nós precisamos pensar em um país onde todas as pessoas sejam incluídas, onde todos possam ter direito ao desenvolvimento, onde todos possam ter inclusão social, onde nós não tratemos os irmãos e irmãs brasileiros como inimigos, mas sim como patriotas e como cidadãos? Ninguém neste País tem direito de impedir que as pessoas se manifestem. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Obrigado. O SR. DARCI FRIGO - Só para concluir, Senador, eu queria dizer que as propostas em modificação da lei de terrorismo a que o conselho já havia se manifestado em contrário, na verdade, não devem prosperar, porque nós já temos legislação suficiente no País para coibir essas condutas. O melhor caminho para a democracia é o respeito e a garantia da manifestação e da existência dos movimentos sociais. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Obrigado, Sr. Frigo. Concedo a palavra ao Sr. Juner Caldeira Barbosa, Delegado de Polícia Federal e Chefe Substituto da Divisão Antiterrorismo. O SR. JUNER CALDEIRA BARBOSA - Sras. e Srs. Parlamentares, bom dia! Demais autoridades presentes, senhores e senhoras presentes, eu venho aqui na condição de Chefe Substituto da Divisão Antiterrorismo fazer uma rápida contextualização, explanação dos pontos que foram colocados e colocar a posição da Polícia Federal neste assunto. Primeiramente gostaria de parabenizar o Senador Lasier Martins pelo presente projeto de lei. A Polícia Federal o apoia, porque, embora a nossa legislação, a Lei 13.260 tenha sido um marco legal importantíssimo para o País no combate ao terrorismo, nós tivemos algumas lacunas que não foram atendidas naquela lei que foi publicada. Para contextualizar, a nossa Lei 13.260, com o texto aprovado, tivemos as seguintes situações: definição de terrorismo e nova definição de organizações terroristas; a promoção, constituição e integração ou auxílio à organização terrorista; financiamento ao terrorismo; recrutamento e treinamento; atos preparatórios; a investigação criminal a cargo da Polícia Federal - acho que foi uma decisão muitíssimo acertada também pelo tipo do crime e que vai afetar todos no Território nacional ou fora dele também -; meios especiais de investigação e obtenção de provas, que estão na Lei 12.850; e a prisão temporária. Foi citada aqui a questão da Operação Hashtag, tão importante que faço uma mera consideração, porque a Operação Hashtag foi um sucesso. Ela foi desencadeada três meses após a publicação da nossa lei, e nós tivemos nove condenados, com penas que variam de 5, 6 anos a 15 anos e 10 meses de prisão. E foi citada pelo ilustre Defensor Público a questão de um dos condenados que havia sido morto pelo fato de ser terrorista. Não é essa a informação que nós temos. Essa pessoa que foi morta já havia sido condenada anteriormente por homicídio, e foi uma questão de briga de facção dentro da penitenciária. |
| R | Quanto à questão das alterações propostas, nós tivemos aqui algumas emendas do Relator, que foi fruto também de algumas considerações da Polícia Federal. O texto da redação proposta pelo Senador Lasier é adequado, mas entendemos que, com a emenda do Relator que coloca a questão da motivação político-ideológica no caput, fica mais adequada essa disposição legal. E fazemos uma breve consideração com relação à parte final, que é "ou para coagir Governo, autoridade, concessionário e permissionário do serviço público a fazer ou deixar de fazer alguma coisa por motivação política, ideológica ou social". A Polícia Federal entende que essa partícula pode ser aditiva, com a inclusão do "e", porque o importante no crime de terrorismo - e isso ainda não é não é muito falado - é que você tem que ter tanto a razão, que pode ser atualmente religiosa, ética, racial, mas você tem de ter a finalidade, a motivação de provocar o terror e que esse terror generalizado afete e exponha a perigo pessoa, patrimônio, paz pública, comunidade pública ou liberdade individual. Sem isso, não vai ser terrorismo. Se ocorrer qualquer tipo de crime que não tenha essa finalidade precípua estabelecida na lei e aferida no caso concreto pelo juiz federal, nós não teremos crime de terrorismo; teremos outro crime que será apurado pela legislação. A questão das emendas dos incisos VI e VII: são muito bem-vindas como atos de terrorismo. Entendemos que, com a adequação, a emenda do Relator fica mais adequada, porque a motivação foi para o caput. Na proposta é mantido o §2º do art. 2º, que mantém que O disposto no artigo não se aplica à conduta individual ou coletiva de pessoas e manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe ou de categoria profissional, direcionados por propósitos sociais ou reivindicatórios, visando a contestar, criticar, protestar ou apoiar com objetivo de defender direitos, garantias e liberdades constitucionais, sem prejuízo da tipificação penal contida na lei. Ou seja, quanto à questão dos movimentos sociais, eles permanecem sem serem atacados nessa questão quando ocorrer qualquer movimento e haja qualquer tipo de problema, qualquer tipo de crime. Não será, nesse caso, tipificado como crime de terrorismo. Dentro da definição legal - e aí voltamos a essa ênfase - é importante essa questão da finalidade. É ela que vai direcionar se o crime será de terrorismo ou não, e a finalidade é provocar o terror social ou generalizado. É muito importante que isso fique consignado. As excludentes então: manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, motivação consistente de propósitos sociais ou reivindicatórios não serão abarcados, objetivo geral de contestar, criticar, protestar ou apoiar, e a finalidade específica de defender direitos, garantias e liberdades constitucionais. |
| R | Nós sabemos que não temos uma definição única de terrorismo, e esse é o problema da legislação atual, mas, no terrorismo, se faz necessária - é centro, é ponto central - a questão da motivação política. Todos os grandes países do mundo têm essa questão da motivação política inserida na sua legislação, porque esse é o ponto que vai direcionar todas as ações. Ainda que, por exemplo... (Soa a campainha.) O SR. JUNER CALDEIRA BARBOSA - Eu queria citar aqui o exemplo do Estado Islâmico, que utiliza a questão religiosa como pano de fundo para poder caracterizar suas ações e a constituição do califado, que seria o Estado Islâmico. O próprio nome já diz que a finalidade precípua é a obtenção do poder, daí a questão de a inserção da motivação ideológica e da política ideológica ser importante para que possamos aferir essa situação num caso concreto, questão que não é abarcada hoje pela nossa Lei Antiterrorismo. Há algumas definições aqui. Do Departamento de Defesa Norte-Americano: uso ilegal da violência para semear o medo, intimidar governo e sociedade para implementar agendas políticas, religiosas ou ideológicas; do FBI: uso ilegal de violência contra pessoa ou propriedade para intimidar um governo ou uma população para implementar uma agenda política ou ideológica - a questão política sempre sendo citada; Act do Reino Unido: o terrorismo é uma ação ou ameaça destinada a influenciar o governo, intimidar o público com a finalidade de promover uma causa política, religiosa ou ideológica; Convenção Europeia para Prevenção do Terrorismo, de 2005: por sua natureza ou contexto, os atos terroristas visam intimidar gravemente uma população, obrigar indevidamente o governo ou uma organização internacional a praticar ou abster-se da prática de qualquer ato, de desestabilizar... O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Obrigado, Dr. Juner. Peço que conclua. O SR. JUNER CALDEIRA BARBOSA - Posso concluir? O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Por favor. O SR. JUNER CALDEIRA BARBOSA - Por último eu só queria mencionar que a nossa própria legislação também faz uma alusão apenas diferenciada quando o crime tem um potencial maior de gravidade, um potencial ofensivo maior. Eu gostaria de citar aqui, finalizando, o nosso art. 218 do Código Penal, 218-C, para fazer uma alusão à apologia: Art. 218-C. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio - inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia. Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o fato não constituir crime mais grave. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Muito obrigado ao senhor. Por falta de espaço à mesa, os três próximos e últimos depoentes nesta audiência pública - eu estou alertando a câmera... (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Doutor, o senhor prefere aí? Pode ser aí? A câmera vai apanhá-lo de qualquer maneira. (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Então vamos experimentar. Se pegar bem, não precisa. Então, com a palavra o Dr. Marcelo Semer, Juiz de Direito e representante da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia. O senhor tem a palavra. |
| R | Eu peço que colaborem para a fixação do microfone. O SR. MARCELO SEMER - Peço, se possível, a devolução do meu tempo. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Não, não começou a contar ainda. O SR. MARCELO SEMER - Em primeiro lugar, eu queria agradecer ao Senador Lasier Martins, agradecer ao Senado na pessoa do Senador, por este convite e agradecer à ABJD, Associação Brasileira de Juízes pela Democracia, pela indicação do meu nome. Quero registrar aqui também que sou membro e carrego as considerações da AJD, Associação dos Juízes pela Democracia. A AJD foi criada em 13 de maio de 1991 e, curiosamente, naquele tempo era o dia em que se homenageava a libertação dos escravos e, hoje, é o Dia da Consciência Negra. Então, de certa forma, é como se fosse um aniversário nosso. Fica aqui o registro. Este projeto aqui nasce - vejo pelas fundamentações - porque a Lei Antiterrorismo estaria inócua - vejo uma manifestação do Senador Lasier. O problema, parece-me, é que o vazio não está na lei: ela é inócua pela falta de terroristas. Já se falou aqui de outros países e de como esses países têm aplicado... Nos países em que a aplicação é mais intensa, exatamente porque o terrorismo é mais frequente, as questões mais relevantes da lei estão na esfera processual. Aqui a lei aproveita o arcabouço existente da Lei das Organizações Criminosas e, portanto, em praticamente nada inova. O que o projeto de lei em questão visa fazer, basicamente, é devolver aqueles excessos que foram vetados pela Presidenta em 2016, ele pretende reintroduzir a matéria que foi rejeitada. O Senador Lasier Martins coloca isso na sua fundamentação: que a Presidenta mutilou a lei e a tornou inócua. O Senador Magno Malta se bate pela restauração do projeto no formato original, e exatamente isso a Constituição Federal proíbe - segundo seu art. 67, matéria que foi rejeitada só pode voltar na mesma legislatura com proposta subscrita pela maioria absoluta dos membros da Casa. O parecer do Senador Magno Malta tangenciou essa questão ao afirmar rapidamente que matéria vetada não é rejeitada, mas a doutrina não entende isso. Não tenho muito tempo, só vou ler aqui o que fala Lenio Streck: a diferença reside na circunstância de que o Parlamento rejeita um projeto plenipontenciariamente, enquanto a rejeição pelo Chefe do Executivo depende de aprovação, de aceitação pelo Parlamento - diz isso quando comenta, justamente, esse art. 67. O fundamento é impedir que, com uma nova proposição, se possa driblar o quórum da derrubada do veto. Aliás, os vetos não só não foram derrubados: houve deliberação e foi rejeitada a proposta de derrubar o veto. Portanto, salvo melhor juízo, a matéria que foi votada e vetada, mesmo com algumas pequenas alterações, não poderia ser submetida novamente sem que tivesse sido proposta pela maioria absoluta dos membros. Vários dos itens do projeto - não vou lê-los - são aqueles que foram, exatamente, vetados. Eu parto aqui para falar a respeito dos vícios materiais. A questão do terrorismo não é uma questão isolada, ou seja, não é algo típico ou peculiar do Brasil. Então, talvez seja interessante acompanhar a discussão que se deu no âmbito da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que aqui foi citada pelo Defensor Público Eduardo. Analisando a legislação chilena pela condenação de índios mapuches, a Corte Interamericana de Direitos Humanos atentou para os seguintes problemas que podem envolver leis antiterrorismo - quando falo na Corte Interamericana é porque nós, formalmente, legalmente, reconhecemos a jurisprudência da Corte Interamericana. A questão da taxatividade: o Direito Internacional e a própria ONU reconhecem a necessidade de que as tipificações de legislações internas não devam ser formuladas de maneira imprecisa nem com interpretações amplas com as quais sancionam condutas que não têm a mesma gravidade. Há várias imprecisões na lei. E há as pessoas que não têm paralelo no Direito Penal, como, por forçar, louvar, dar guarida, misturam entre formas de ato, incendiar, explodir, com a própria ação, saquear ou destruir, sem contar o caráter nitidamente ampliativo, terrorismo ou atos dirigidos contra meios de transporte ou qualquer bem público ou privado. |
| R | Aqui, corrijo que a taxatividade inclui todos os elementos do tipo penal. Todos eles têm de ser taxativos, senão infringe o princípio da legalidade. O objetivo de intimidar certas pessoas não preciso dizer o quanto é impreciso. Na questão da informática, por exemplo, inclui dificultar o funcionamento, que pode ter uma avalanche de excessos ou um site, por exemplo, a confundir com um ato terrorista. Mas outra questão levantada pela Corte Interamericana é a proporcionalidade. Quer dizer: Por que é terrorismo? Entre aspas: "A corte destaca que os fatos pelos quais foram julgados e condenados os mapuches não implicam a afetação da integridade física, nem a vida de nenhuma pessoa." O dispositivo legal em questão contempla condutas que, quase exclusivamente, afetam a propriedade, o que contraria o consenso internacional de que essa violência específica, ou seja, o terrorismo, atinja principalmente a vida humana. A propriedade vai ficar sem tutela? A propriedade privada, no Brasil, nunca esteve sem tutela penal. O Direito Penal em grande medida é um ordenamento que se dirige essencialmente à tutela da propriedade. Às vezes, a integridade física tem uma tutela muito primária. A privacidade pode não ter tutela penal, mas isso não ocorre com a propriedade. Chamo a atenção aqui para o aspecto em que a Nathalie já tocou, que é a superposição de tipos penais. Na quase totalidade das hipóteses, nós estamos falando de fatos que já estão cobertos pelo Direito Penal. Incendiar é crime? Art. 250. Depredar ou destruir é crime? Art. 163 do Código Penal. Explodir é crime? Art. 251. Da mesma forma, favorecimento em licitação, apologia, etc. Criar um segundo tipo deve ser absolutamente excepcional. Por isso, o conceito internacional de que deve atingir preferencialmente a integridade física e colocar em risco vidas humanas. A superposição tem vários problemas. O primeiro é a seletividade. Alguns casos vão ser julgados pelo Código Penal; outros, pela Lei do Terrorista. Muita injustiça pelo caminho! Segundo, a insegurança jurídica, quando o promotor acha que um é um crime, e o juiz acha que é outro. Os resultados são sempre ruins, desde a demora, a prescrição, a anulação, etc. Eu falo isso como juiz. O conflito aparente de normas - é assim que se chama no Direito Penal - é um complicador. Um pensa uma coisa; outro pensa outra. Não há eficácia nisso quanto mais leis se sobreponham. Nesse sentido, imagino que a lei não vai combater o terrorismo. Ela vai, na verdade, criar, ou seja, nós vamos criar pessoas que vão ser chamadas de terroristas, para que a lei possa ser utilizada. É o inverso. O problema não está apenas na ânsia de completar a lei, o que seria um despropósito, mas de punir o ato contestatório, reivindicatório que a construção da lei expressamente previu deixar de fora: a questão das motivações políticas, ideológicas ou sociais. Primeiro que ela entra pela porta dos fundos, porque entra aí de contrabando, na figura do art. 2º, inciso VII, sem estar presente no caput. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Obrigado, Dr. Marcelo. Está concluindo? O SR. MARCELO SEMER - Posso? O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Conclua, por favor. O SR. MARCELO SEMER - É como se tivéssemos dois tipos de terrorismo. O Relatório do Senador Magno Malta até corrige isso, colocando "político, ideológico ou social" no caput. Porém, a ideia da inclusão do social revela claramente esse ato falho, a mudança que vise basicamente atingir o movimento social. Só queria dar atenção a esse ponto. O social, quando aparece na lei penal, é sinônimo de reconhecimento, de redução de pena. Relevante valor social é causa de diminuição de pena do homicídio. E, por incrível que pareça, o político também tem a mesma lógica do Direito Penal. O crime político não gera reincidência. Isso está no Código Penal de 1940, na Parte Geral de 1934. Nesses dois momentos, nós estávamos em Estados ditatoriais. É estranho que, na democracia, nós tenhamos que fazer isso. |
| R | Mas queria deixar um único ponto, se o senhor me permitir, porque me atrapalhei um pouco com este microfone, que é a questão do ato preparatório, que, a meu ver, é a mais importante e a mais perigosa dessa questão de incluir atos políticos e ideológicos. Art. 5º da Lei 13.260: aplicação do Código Penal, mesmo antes do início da execução. Aqui, a meu ver, reside o principal objetivo, a principal intimidação ao momento social. Que eles possam ser reprimidos antes de praticarem qualquer tipo de crime sob a alegação de que pretendem fazê-lo. Essa é uma forma inidônea de sufocar movimentos contestatórios. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Obrigado. Dra. Camila Marques, Advogada e Coordenadora do Centro de Referência Legal em Liberdade de Expressão e Acesso à Informação da Artigo 19. A SRA. CAMILA MARQUES - Bom dia a todos e a todas! Cumprimento todos os Parlamentares aqui presentes, todos da Mesa. Represento aqui a Artigo 19, que é uma organização de direitos humanos que trabalha especificamente pela defesa e pela garantia do direito à liberdade de expressão e do direito ao acesso à informação pública. É, a partir dessa ótica de uma organização que já, há 30 anos, trabalha no mundo, entendendo quais são os cenários de violação a esses direitos, e há dez anos no Brasil, que eu gostaria de fazer algumas contribuições. Primeiro, parece-me que seria impossível a gente falar desse PLS 272, sem antes entender o histórico e o contexto no qual esse projeto se insere. Para isso, a gente precisa voltar para junho de 2013, as grandes manifestações de junho de 2013. Lá, a partir de 2013, a gente contabilizou várias reações e respostas do Estado brasileiro, sempre no sentido de restringir e de criminalizar a atuação de movimentos sociais. Apenas em 2013, foram propostos, no Congresso Nacional, 28 projetos de lei nesse sentido. Ano passado, a gente refez esse levantamento, e a gente contabilizou mais de 60 projetos que visavam, de alguma forma, restringir a atuação de ativistas em movimentos sociais. Com isso, quero dizer que o Congresso Nacional vem sinalizando, de uma forma bastante negativa, esse momento de efervescência das ruas. O que vimos, de cinco anos para cá, é a formação de novos grupos políticos, a formação de novas formas de ativismo, a formação de novas formas de participação popular. O Congresso Nacional, ao propor um projeto desse, sinaliza de forma contrária ao próprio fortalecimento da sociedade civil organizada. Já foi muito falado aqui. A legislação de terrorismo foi aprovada em 2016. Nela, a partir dessa tramitação, tivemos grandes conquistas: a sociedade civil mobilizada, a comunidade jurídica, que trazia um olhar crítico a esse projeto, conseguiu vários avanços; avanços estes que estão ameaçados por conta desse projeto. Esse Projeto 272, na sua própria justificação, diz que visa reintroduzir pontos que foram conquistados pela sociedade civil organizada. Que pontos são esses? Todos aqui falaram, mas queria aqui sistematizar quatro desses pontos, que são muito perniciosos. O primeiro é a questão da reintrodução da motivação política ideológica; o segundo ponto diz respeito à expansão da finalidade do crime de terrorismo; o terceiro ponto é a criação de novas condutas que podem ser consideradas como atos terroristas; e o quarto é a criação do crime de apologia e de financiamento ao terrorismo. |
| R | Muito rapidamente sobre eles: sobre a motivação, parece-me absolutamente reprovável equipararmos a prática política e ideológica à xenofobia, ao preconceito de raça, cor, etnia e religião. Racismo e xenofobia são valores reprováveis no mundo todo. Já a prática política não. Absolutamente. São direitos constitucionais, são direitos fundamentais. Por fim, quando a gente fala, ainda, da motivação, para além de toda a carga criminalizatória que essa possibilidade traz, há outra questão, que ainda não foi falada aqui, que é o efeito da autocensura. As pessoas vão pensar duas, três, quatro vezes antes de sair às ruas, porque vão ter medo, vão se sentir inibidas de exercer o seu direito de liberdade de associação e de liberdade de expressão. Sobre a questão, ainda, da expansão da finalidade, atualmente a Lei Antiterrorismo prevê como finalidade provocar terror, pânico geral, social. Colocar como uma finalidade da Lei Antiterrorismo a coação de autoridades para que façam ou deixem de fazer algo me parece absolutamente uma violação por si própria, porque como a gente pode dizer que influenciar uma autoridade, que constranger... (Soa a campainha.) A SRA. CAMILA MARQUES - ... uma autoridade, que pressionar uma autoridade é fato típico da Lei Antiterrorismo? Absolutamente. O constrangimento, a influência faz parte, está no cerne do direito à liberdade de expressão. São absolutamente protegidos pela nossa normativa constitucional internacional. Ainda sobre esse ponto, os conceitos são muito vagos. O que é coagir? O que é constranger uma autoridade? A motivação política também é muito vaga. Isso dentro de uma Lei Antiterrorismo que já traz muitos aspectos vagos e ambíguos se torna ainda mais pernicioso. Aqui eu queria reforçar vários pontos que os colegas da Mesa já trouxeram, uns sobre tantos e tantos posicionamentos internacionais que já se manifestaram no sentido contrário desses termos ambíguos e genéricos. Foi falado aqui na Mesa sobre a lei do Canadá, se não me engano, uma lei até mais dura do que a do Brasil. Porém, eu gostaria de trazer aqui que, para além da condenação do Chile na Corte Interamericana, a ONU (Organização das Nações Unidas) já vem se manifestando sobre essas legislações de antiterrorismo e apontando que muitas vezes, na tentativa de coibir atos terroristas, esses países ultrapassam e violam os direitos humanos, e que um objeto analisado foi a legislação antiterrorismo do Canadá. Eu até separei aqui para ler que, nas palavras da própria ONU, a legislação antiterrorismo do Canadá parte de uma definição excessivamente ampla e a ONU recomendou que o Canadá, abre aspas, "deveria adotar uma definição mais precisa de atos terroristas, a fim de garantir que indivíduos não sejam alvos por questões políticas e ideológicas". Parece-me que o Brasil está indo no sentido contrário da tendência mundial. Nós temos uma tendência em que os países estão revisando a sua legislação de terrorismo, depois que foi observado que essas legislações estão violando o direito internacional. Parece-me que o Brasil está andando na contramão absolutamente dessa tendência. Por fim, quando a gente olha para a criação de novas condutas, para a proteção excessiva de bens não essenciais, parece-me, como já foi falado aqui, que existe um desrespeito frontal ao princípio da excepcionalidade. Como podemos equiparar a depredação de um orelhão ou uma barricada que incendia lixos na Avenida Paulista, por exemplo, com um ataque maciço, com armas químicas, a um hospital? É impossível equiparar e colocar no mesmo patamar de gravidade e proporcionalidade de penas. |
| R | Por fim, quando a gente olha para a apologia ao terrorismo, aí há um dos pontos mais graves desse projeto. Quando falamos em apologia, precisamos entender, como o Marcelo Semer já disse, que essa legislação já é prevista no nosso Código Penal. Segundo ponto. A gente precisa entender que essa legislação tem uma absoluta potencialidade de causar danos e aplicações injustas. Por quê? O projeto PLS 272 traz que a apologia é recompensar ou louvar. E eu gostaria de fazer uma pergunta muito sincera: o que é louvar ações terroristas? É um tipo penal muito aberto, passível de análises muito subjetivas. O terceiro ponto, para quando olhamos para a apologia, é a desproporcionalidade das penas. Para além de o Código Penal já prever essas condutas, o Código Penal prevê uma pena de três a seis meses. O projeto inicial prevê uma pena de quatro a oito anos. Mesmo o relatório prevê uma pena ainda desproporcional de um a dois anos. Com isso... O meu tempo já acabou? O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Acabou. A SRA. CAMILA MARQUES - Eu gostaria de encerrar dizendo apenas que é muito importante que o Senado Federal brasileiro esteja muito sensível a essa pauta, que possibilite debate sobre esse projeto e principalmente que entenda que, para combater o terrorismo, não é necessário violar direitos fundamentais. Obrigada. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Obrigada, Dra. Camila. Encerrando, ouviremos o 11º depoente, Dom Guilherme Antônio Werlang, Presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Ação Sócio-Transformadora e membro do Conselho Episcopal Pastoral. O senhor tem a palavra. O SR. GUILHERME ANTÔNIO WERLANG - Obrigado. Bom dia, Senador Lasier, todos os presentes e os demais que fazem parte da Mesa e já usaram a palavra! Eu gostaria de pontualizar, ainda que muito rapidamente, algumas questões. Não vou entrar na questão jurídica, porque não é o meu campo, não é o nosso campo específico de CNBB. Então, eu parto do princípio de que devemos olhar onde vivemos e estamos tratando essa questão a partir de uma República democrática. O Brasil não é uma ditadura. Não podemos comparar o Brasil com alguns Estados islâmicos ou coisa similar. Nós estamos num país de República e com a democracia reconquistada a duras penas. E, pela nossa Constituição, todos os cidadãos e cidadãs têm direitos iguais. Na teoria, na lei, na Constituição, mas não se vê isso na prática, pois somos um dos países de maior concentração de bens, de rendas, de capital, de direitos, enquanto há outros para os quais os direitos são negados. Em segundo, eu gostaria de colocar a minha visão e a nossa visão de CNBB. A maior riqueza, o maior patrimônio de uma nação não é o ferro, não é o ouro, não é o diamante, não é a produção agrícola ou seja lá o que for; o maior patrimônio, a maior riqueza de uma nação é o seu povo, são os cidadãos, as cidadãs. E o povo não pode ser visto e analisado a partir de números. Por isso, nós precisamos elaborar uma lei, no caso do terrorismo que em primeiro lugar faça a defesa do povo brasileiro, da Nação brasileira. Nação é o próprio povo. |
| R | E, quando nós vemos que, sempre que a Constituição garante direitos iguais, esses direitos efetivamente não estão sendo respeitados, então, é um direito da democracia, do povo se organizar em organizações sociais, em sindicatos, em organizações populares para buscar os direitos que lhe são negados. Não podemos criminalizar, não podemos colocar como atos terroristas quando os organizadores, os líderes chamam o povo a defender, quando aqueles que ouvem o grito, a dor, a voz dos que não têm voz e dos que não têm vez, quando estes se organizam e vão às ruas ou às praças se manifestar, esse é um ato legítimo da defesa da democracia e da defesa do povo brasileiro. Inclusive, o Papa Francisco - eu estive em dois desses momentos - reuniu movimentos populares sociais do mundo inteiro, porque no mundo inteiro nós estamos vivendo um momento muito crítico de miséria, de fome absoluta para bilhões, enquanto muito poucos retêm tudo para si. Então, não podemos, em hipótese alguma, equiparar movimentos populares ou sociais, como já foi amplamente aqui colocado, com organizações criminosas, com tráfico de drogas, tráfico humano e de órgãos humanos... (Soa a campainha.) O SR. GUILHERME ANTÔNIO WERLANG - ... ou, então, com armas, sonegação de impostos, corrupções, lavagem de dinheiro e outras coisas. A busca de garantir o acesso aos direitos fundamentais para a defesa da promoção da vida é um direito sagrado que nós não podemos, em hipótese alguma, admitir que não aconteça. Temos que lembrar sempre que se nós estamos hoje aqui, nesta audiência pública, deve-se especialmente às grandes manifestações de rua pela redemocratização nas Diretas Já. Se essa lei que está para ser votada estivesse em vigor, certamente, todos eles teriam sido classificados como terroristas, como atos terroristas, como criminosos, e nós não estaríamos aqui. Então, da luta contra o terrorismo, sim, precisamos. Mas, como já foi amplamente colocado, temos que tipificar melhor, está muito subjetivo, está muito a critério de quem vai dizer o que é e o que não é um ato terrorista. E, por fim, nós temos que lembrar sempre que nós precisamos lutar muito para que não, antecipadamente já foi colocado, agora, recentemente... Antes que o povo se manifeste, o povo já tem medo de ser classificado agora, e com promessas que estão por aí, no ar. Os movimentos sociais brasileiros são indispensáveis se nós quisermos garantir a democracia. Sem a presença dos movimentos sociais brasileiros... A CNBB sempre foi a favor disso, foi a favor na luta pela redemocratização do Brasil e sempre também coloca que as manifestações devem ser com respeito ao patrimônio público ou privado, sem o uso da violência. (Soa a campainha.) O SR. GUILHERME ANTÔNIO WERLANG - Até por nossa instituição mesmo e por nossa fé, nós não podemos jamais ser promotores da violência, evidente. Mas, simplesmente, colocá-los no mesmo bojo... E parece que está muito claro, muito evidente, o interesse é seletivo, como já foi dito por alguns que usaram a palavra. Essa lei é bastante seletiva: alguns podem se organizar e se manifestar, e os que nunca tiveram vez de novo ficarão sem. |
| R | Temos que continuar - permita-me a expressão - a olhar muito bem, porque a casa-grande e a senzala permanecem no Brasil. E, sempre que alguém da senzala tenta se manifestar, aí acontecem violências, aí acontecem assassinatos, aí acontecem criminalizações, aí acontecem prisões. E isso não é possível. Nós achamos que o povo brasileiro é o maior patrimônio que nós temos. E essa lei deve privilegiar a defesa da vida digna de todo cidadão e de toda cidadã. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Obrigado, Dom Guilherme. De acordo com o art. 94, §§2º e 3º do Regimento Interno do Senado, a Presidência adotará as seguintes normas: a palavra às Senadoras e Senadores será concedida na ordem de inscrição. Os Senadores interpelantes dispõem de três minutos, assegurando igual prazo para resposta do interpelado, sendo-lhe vedado interpelar os membros da Comissão. Primeira inscrita, Senadora Gleisi Hoffmann. A senhora dirige pergunta a quem, Senadora? A SRA. GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Obrigada, Sr. Presidente. Eu, primeiro, queria fazer uma saudação aqui a todos os nossos convidados e convidadas para esse debate, a disposição de os senhores estarem aqui. Quero também, Sr. Presidente, lembrar que hoje é o Dia Nacional da Consciência Negra no Brasil. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Bem lembrado. A SRA. GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - É extremamente importante nos lembrarmos disso. Quero externar aqui o meu respeito e a gratidão a quem por três séculos, ou mais de três séculos, construiu a riqueza deste País com sangue, suor e lágrimas e à população que mais conheceu a repressão policial quando se tratou de reivindicar direitos. Não vamos nunca nos esquecer de que a abolição da escravatura foi soerguida largando os nossos negros pelo caminho, e todas as reivindicações feitas por eles foram respondidas com o cacete da polícia. Talvez por isso, pela cultura que nós temos em relação a movimentos sociais reivindicatórios, que nós estejamos aqui discutindo a questão social como uma questão de terrorismo. Fico muito triste por isso estar na nossa pauta. E penso, Sr. Presidente, antes de formular a minha pergunta, que há, por parte de quem defende a alteração na lei, um equívoco em relação à tipificação de crime. Aliás, foi dito aqui largamente, nós já temos os crimes que estão sendo falados aqui tipificados na nossa legislação penal. Depredar, queimar, destruir, etc., etc., etc., tudo isso já é crime, tudo isso já tem uma penalização. Por que nós vamos aumentar a penalização para isso, se isso não está relacionado de fato a um crime de terrorismo? Então, é importante também lembrar que, por exemplo, para um homicídio qualificado, nós temos de 12 a 30 anos de pena; o outro homicídio, 6 a 20 anos; e para o terrorismo, de 12 a 30 anos; ou seja, equivale-se a homicídio qualificado. Queria também aqui registrar e cumprimentar o Dr. Rodrigo, que representa a Abin. Acho que a Abin tem uma visão completamente dentro da legislação que foi aprovada nesta Casa já sobre a questão do combate ao terrorismo, o uso da inteligência, saúdo isso. E fico preocupada com a visão de que nós temos que tipificar, colocar no caput, as razões políticas, ideológicas e sociais. São muito abertas, são muito subjetivas para que a gente possa colocar essas questões para que a gente possa colocar essas questões para poder tipificar o terrorismo. |
| R | Em razão disso que eu queria perguntar ao Doutor que representa aqui a Polícia Federal. Até agora a falta dessa tipificação, dessa mudança na legislação impediu, dificultou a atuação da Polícia Federal no combate ou na investigação de atos terroristas no Brasil? Vocês tiveram essa dificuldade? E também queria perguntar me referindo a uma fala do candidato eleito a Presidente da República, uma semana antes da eleição, que disse a uma população na Avenida Paulista: "Esses marginais vermelhos serão banidos da nossa Pátria. Será uma limpeza nunca vista na história do Brasil. Bandidos do MST, bandidos do MTST. As ações de vocês serão tipificadas como terrorismo". A Polícia Federal vai seguir, vai cumprir as determinações do Presidente nessa situação? Vai levar em conta como se fossem atos de terrorismo? E gostaria de perguntar ao Dr. Frigo, que está aqui, como também ao Dr. Eduardo e o nosso representante da ABJD... O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Se V. Exa. puder restringir, Senadora Gleisi Hoffmann... A SRA. GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - São três. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Exatamente, três minutos para pergunta, três minutos para... A SRA. GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Estou terminando, vou perguntar. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Se V. Exa. perguntar para todos... A SRA. GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Não, para três pessoas... O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Vai perguntar para três? A SRA. GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - ... da área do Direito. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Perfeito. A SRA. GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Eu acho importante exatamente quais são os riscos da tipificação do crime de terrorismo que eles trazem para as organizações da sociedade civil, que defendem os seus direitos, na forma como está proposta pelo Senador Magno Malta. Os senhores já falaram um pouco, mas acho importante aprofundar. E, no contexto da legislação penal e da sua aplicação no País, quais os riscos que trazem para a nossa democracia? É isso. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - A primeira pergunta, então, é para o... O SR. JUNER CALDEIRA BARBOSA - Bom dia, Senadora Gleisi Hoffmann! Primeiramente, há se de esclarecer que a Polícia Federal vai cumprir a lei, e a lei que for aprovada pelo nosso Congresso Nacional. Então, a lei que nós temos hoje é a Lei 13.260, e não há motivação política na lei. Então, os casos que chegam à Divisão de Antiterrorismos são aqueles fundamentados nas razões de xenofobia racial, questão religiosa. Essa questão não é questão motivadora. Então, em razão disso, nós não apuramos crimes que não tenham essa finalidade. Com relação a outra pergunta da senhora, como já disse inicialmente, a Polícia Federal vai cumprir a lei. E a lei tem que ser cumprida na sua estrita observância. Nós não temos qualquer viés político, ideológico, haja vista as operações que a Polícia Federal realiza, doa em quem doer, inclusive internamente com apuração de crimes cometidos até por colegas internamente. Então, a Polícia Federal é um patrimônio da sociedade e está para atender a sociedade. Então, o que for tipificado, o que for aprovado pelo Congresso Nacional nós vamos cumprir. Queria só deixar claro que a nossa preocupação é se, no caso concreto, como aconteceu pelo mundo afora, nós tivermos hoje um ataque a uma instituição pública, uma explosão de um prédio que vá causar inúmeros mortos, feridos, como ocorre pelo mundo afora, esse crime não seria tipificado como terrorista. E às vezes a intenção de provocar um terror, de gerar um pânico generalizado, esse é o ponto que move a questão também central do terrorismo. |
| R | De nossa parte, a Polícia Federal vai se ater ao que for aprovado, vai cumprir a legislação conforme preceituado. E o juiz no caso concreto, ao apurar as evidências apresentadas, é que vai decidir se aquele caso se enquadra ou não. E previamente o Ministério Público, no oferecimento da denúncia, já vai se manifestar se na investigação que foi feita há ou não elementos que apontam para a prática do crime de terrorismo. E o juiz vai decidir essa questão no caso concreto, mediante as provas e evidências apresentadas. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - E a próxima pergunta seria para... A SRA. GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Fora do microfone.) - Dr. Eduardo, Dr. Darci e Dr. Marcelo. O SR. EDUARDO NUNES DE QUEIROZ - Então, Senadora, vou tomar a frente. Senadora, vou realmente me restringir ao PL, ao substitutivo do Senador Magno Malta, para dizer que vejo com preocupação, porque acho que, retomando o que foi falado, a lógica de criação de crimes de terrorismo envolve a identificação do acusado não como um cidadão, mas um inimigo do Estado. Então, tende-se a desnaturar o conteúdo político que muitas vezes mobiliza coletividades. E a Defensoria Pública da União lida muito com lutas políticas no sentido de lutas por reforma agrária, lutas por demarcação de terras indígenas. Aqui mesmo no Distrito Federal, por exemplo, nos envolvemos com lutas com direitos de catadores e catadoras de material reciclado, que envolve na sua manifestação, às vezes - e isso eu notei logo quando comecei atuar em questões de reforma agrária - a luta, a questão de lutar pela terra envolve certas ações que não podem ser tratadas como terrorismo, porque senão desmerecem a própria luta pela terra, que é, como foi muito bem falado pelo Juiz Marcelo Semer, se contrapor a um bem jurídico que é excessivamente protegido. Na propriedade, sob a sua função social, há um forte desequilíbrio. E a forma colocada, a forma genérica colocada de motivação política coloca, como o Darci já falou, sobre o risco de quem vê, sob o risco de quem aplica a lei. E a lei aqui, no Distrito Federal, vista de um jeito; em Goiás, é vista de outro. Então, há configurações políticas que permeiam o Judiciário, permeiam o Ministério Público, e a Defensoria Pública não. E essa indecisão joga muito ao poder punitivo. E o poder punitivo, dentro da lógica do Direito Penal, precisa ser restringido para realmente não gerar a criminalização de movimentos legítimos de defesa de direitos, que são reconhecidos pela própria Constituição. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - A próxima pergunta é para... (Intervenção fora do microfone.) O SR. DARCI FRIGO - A nossa preocupação central em relação à atuação dos movimentos sociais é que Constituição garante a livre manifestação do pensamento, em seu art. 5º, inciso IV; a liberdade de reunião no art. 5º, inciso XVI; e o pluralismo político. E aí essas definições de motivação política, ideológica, que vão servir de base, vamos dizer assim, porque são totalmente abertas, vão servir de base para que a autoridade policial ou judicial aplique essa legislação, e possa justamente encontrar elementos que vão realmente da subjetividade de quem está aplicando a lei, e não critérios objetivos que estão inclusive na Constituição. Por isso não entendo, e a sociedade civil construiu uma nota técnica, Senador, queria inclusive deixar, justamente atacando ponto a ponto dessas questões, colocando que essas imprecisões põem em risco o direito das pessoas que estão lutando justamente por estarem excluídas da possibilidade de realização das promessas constitucionais, daquilo que o Brasil se propõe a garantir, inclusive do ponto de vista do cumprimento dos tratados internacionais de direitos humanos. O Brasil sairia completamente desse eixo na medida em que ele, vamos dizer assim, não respeitar nem aquilo que, do ponto de vista da democracia liberal, seria a essência, que é o direito de livre manifestação, o direito de reunião. |
| R | Eu, realmente, nesse sentido, não consigo entender o que está acontecendo no nosso País. É como se a gente estivesse dando um tiro no pé; porém, dar um tiro no pé aqui significa dar um tiro na maioria das pessoas que hoje estão excluídas, em nosso País, da possibilidade do gozo dos seis direitos. Eu sei que as pessoas poderiam dizer - e disseram aqui na Mesa - que... (Soa a campainha.) O SR. DARCI FRIGO - ... não entendem em que vai afetar as pessoas se se colocarem esses tipos aqui dentro dessa nova legislação. Só que, para isso, Senador Lasier, isso é possível a gente falar para quem está incluído, para quem já tem o gozo e a possibilidade de utilizar as faculdades do Estado, de utilizar todos os instrumentos do Estado. Para as pessoas que não têm essa possibilidade, elas só têm os seus corpos e as suas liberdades para poderem defender os seus direitos. E eu, aqui, não estou pensando só nos movimentos agrários; estou pensando em todas as pessoas que vivem nas periferias ou, então, nos indígenas isolados, que por nós, brancos, são assassinados para que sejam impedidos, quando ainda não foram, vamos dizer assim, reconhecidos os seus territórios, como acontece, por exemplo, na região de Colniza, onde, por nós, brancos, eles são eliminados para que não possam ter direito ao território que era deles ancestralmente. Então, nesse sentido é que é preciso que a gente volte à questão com que concluo a minha manifestação: a gente precisa de democracia, de pluralismo, e não da construção do ódio entre os brasileiros. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Obrigado. Por fim, concedo a palavra a Dom Guilherme... (Pausa.) Ah, sim; Dr. Marcelo Semer. O SR. MARCELO SEMER - Senadora Gleisi, o que pode acontecer com os movimentos sociais? Bom, em primeiro lugar, eu vou secundar aquilo que disse a Camila: a primeira das grandes sanções é calar o movimento social. As pessoas, na dúvida - e a lei gera inúmeras dúvidas sobre o que fazer e o que não fazer - falam: "É melhor não fazer". E calar movimento social é um tiro no pé, como disse o Frigo, da democracia. Eu vi que, aqui nesta Casa, fizeram-se várias celebrações pelos 30 anos da Constituição. Veio lá o Presidente eleito, o Presidente do Supremo etc. e tal, mas não adianta fazer uma celebração à Constituição e dar-lhe um tiro no mesmo mês. Então, vejam: há situações aqui sobre as quais não é possível a gente ter clareza do que, de fato, vai cair. A finalidade de provocar terror social. Bom, vai depender, obviamente, do delegado, do promotor e do juiz analisarem o que é provocar terror social, sendo que parte significativa do pânico é provocada pela mídia, quer dizer, ela traz e aumenta. Depois, explodir qualquer bem público ou privado, quer dizer, somando uma coisa com outra; explodir um bem privado. Qualquer um? Alguém falou aqui em uma lixeira. Pode ser isso. Terceiro, com a intenção de intimidar certas pessoas. Qualquer coisa pode intimidar certas pessoas. Você explodir uma lixeira pode fazer isso. "Ah, mas, então, há uma isenção?", como disse o Vem Pra Rua. Há uma isenção, todo mundo pode... "Explodir lixeira a gente pode". Explodir lixeira é crime! Explodir é crime. Então, já é crime. A questão é: estou subindo o nível e, ao subir o nível, eu subo a pena. E o que me parece mais grave - eu disse aqui na minha fala, mas foi muito rápido e, talvez, não tenham compreendido - é a questão dos atos preparatórios. O que diferencia o terrorismo dos outros crimes dentro do Direito Penal é a possibilidade de punir atos preparatórios, porque a nossa Lei Penal não o permite. |
| R | Eu só posso punir a partir do início da execução. Só posso punir ato preparatório que seja específico, que esteja na lei. E essa lei do terrorismo, por evidência, precisa punir o ato preparatório, porque, senão, não adianta; eu vou corrigir o terrorismo depois que ele é praticado. (Soa a campainha.) O SR. MARCELO SEMER - Então, a questão é: as pessoas vão ser processadas e criminalizadas muitas vezes pelo quê? Pelo ato preparatório, pela intenção de fazer. Se o fato, em si, já é plurívoco, ou seja, se é difícil de entender - e isso para quem é do Direito - qual é o ato, que dirá a intenção anterior! Se eu falar assim: "Ah, então, tira o ato preparatório". Então, eu não preciso da lei do terrorismo. Aí é só aumentar a pena no Código Penal. A grande diferença disso é poder punir o ato preparatório de todos os crimes aqui. E vejam: há umas palavras que são incompreensíveis para quem está no Direito. É lógico que são os senhores que fazem as leis. Se os senhores fizerem essas leis, nós vamos interpretá-las como os senhores as fizeram. São os senhores que mandam nessa fase. Eu não tenho alternativa. Mas, quando se fala em louvar uma pessoa ou uma associação pelo fato dos crimes previstos, o que é louvar uma associação? Nós não sabemos o que é isso. Pode ser andar com um boné do MST. Isso pode ser um crime? Ou pode ser dar um clique, porque aqui se fala também das redes sociais. Eu curti um post. Eu não sei se aquilo é um crime ou não é. Eu não tenho condição de saber se aquilo é crime. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS. Fora do microfone.) - Obrigado, Dr. Marcelo. O SR. MARCELO SEMER - Perdão! O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - A senhora também fez perguntas a Dom Guilherme? (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Não. Então, com a palavra, pela ordem de inscrição, o Senador Humberto Costa. A quem se dirige V. Exa.? O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Sr. Presidente, eu quero, antes de fazer a minha pergunta, tecer alguns comentários aqui. Quero, inicialmente, saudar todos os palestrantes, todas as palestrantes, os Senadores e as Senadoras. Em primeiro lugar, eu acho que nós temos de analisar aqui - acho que foi falado - que esse projeto nem deveria estar tramitando, porque ele já foi objeto de avaliação nesta Casa, ele já foi objeto da aposição de vetos presidenciais, e esses vetos foram mantidos. Portanto, nós estamos legislando sobre coisas que nós já avaliamos, já analisamos e sobre as quais já nos posicionamos. Então, esse é um vício grave. Segundo, eu concordo com as colocações que foram feitas aqui, ou seja, de que, da forma como essa proposição está apresentada, ela é muito aberta, ela permite uma ampla discricionariedade, que é algo muito negativo quando se trata de estabelecer a responsabilidade das pessoas. Eu me lembro muito bem de quando essa proposta veio aqui, porque, à época, ou eu era Líder do PT, ou era Líder do Governo, e nós recebemos várias representações - representação do próprio Governo, representação da Polícia Federal, representação da Abin -, e as principais questões que foram levantadas, especialmente, eram aquelas relativas à possibilidade de haver uma legislação que pudesse incluir os atos preparatórios como algo relevante dentro da legislação. Isso aconteceu. Quando se discutiu essa abrangência da motivação, nós conseguimos construir uma visão, que depois o Congresso Nacional ratificou... (Soa a campainha.) O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - ... de que isso não deveria compor. Eu peço um pouco da paciência de V. Exa. Eu fico me perguntando - e foi falado aqui - o que é esse terrorismo interno que foi falado. Quem são as verdadeiras vítimas, por exemplo, dos conflitos agrários no Brasil? Que eu saiba, não é nenhum proprietário de terra. Gente do MST, a gente vê aos montes assassinada, em emboscadas. Há tentativas ilegais de retomada da terra. Da mesma forma, ocorre com outros movimentos que estão aí colocados, no afã de se proteger a propriedade. Eu acho que o Dr. Semer foi muito feliz ao fazer esta colocação: o terrorismo deve estar fundamentalmente preocupado com os danos à vida humana. Com isto que está colocado aqui, um simples ato que, de alguma maneira, questiona a propriedade pode... |
| R | Eu queria só fazer uma última colocação: muito mais graves do que esses movimentos que estão aí - e, na verdade, o que se quer, ao final, é criminalizá-los -, com repercussão muito maior sobre a possibilidade de o Brasil se tornar alvo de terrorismo, são algumas posições que se emitem sobre política externa. Por exemplo, o Presidente da República eleito faz uma manifestação meramente emulativa dos interesses do Governo americano de que vai mudar a Embaixada do Brasil em Israel de Tel Aviv para Jerusalém. Isso tem um potencial de trazer a atenção de terroristas para o Brasil muito maior do que um movimento social, do que tudo que se coloca. Há outra coisa. Só para concluir, Sr. Presidente, eu pergunto: até hoje, alguém identificou quem eram aqueles Black Blocs? Tanto nas manifestações de 2013 quanto nas manifestações que nós fizemos, quem não lembra que quem incendiou os Ministérios aqui foram aqueles Black Blocs? Eles eram claramente agentes provocadores. Eram agentes provocadores, que fizeram esse tipo de coisa! Então, essa preocupação de identificar quem interessa também eu vejo como muito importante. Eu queria que o Dr. Semer falasse um pouco mais sobre os riscos que essa tipificação contida nessa proposta traz para a democracia no Brasil. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Dr. Semer, V. Exa. tem três minutos, por gentileza. O SR. MARCELO SEMER - Eu acho que é preciso entender - vou resgatar algo que a Camila Marques disse aqui -, primeiro, que nós estamos no contrafluxo. É verdade, vários países que sofrem terrorismo criaram leis antiterroristas, e essas leis estão sendo questionadas. Ela falou da lei do Canadá, e há também a da Alemanha, como agora a do Chile. Várias leis estão sendo questionadas. Então, há esta ideia de que nós vamos montar a lei, de que, feita a lei, a lei entra em vigor e de que, agora, vamos fazer uma readequação da lei e vamos aprender também. Se nós, para fazermos a lei, aprendemos com aqueles que fizeram lá fora, vamos tentar aprender com aqueles que estão readequando as suas leis antiterrorismo. E há uma questão sobre a qual a Corte Interamericana disse no art. 15 - a Camila falou também da Convenção Interamericana -, a de que não se constrói legislação antiterrorismo contra os direitos humanos. Eu acho que essa questão é uma questão central. E não podemos esquecer - acho que esse é um ponto que atinge diretamente a questão constitucional - a questão do pluralismo político, ou seja, nós estamos criando os tipos penais, especificamente em razão dessas contestações, porque todos os atos físicos já são punidos. Eu já puno a explosão e quero punir a explosão política. Então, na verdade, essa lei está punindo o político, não a explosão, com a questão do pluralismo político. Diz o art. 1º da Constituição: |
| R | Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - [...]; II - [...]; III - [...]; IV - [...]; V - o pluralismo político. Li num texto aqui: "Pluralismo político, enumerado em nossa Constituição como um dos fundamentos da República [...], é norma princípio, e não norma preceito (regra). Tem ampla envergadura sistêmica e tipifica um valor que é fim em si mesmo. Pluralismo significa tolerância (convivência pacífica) não só com as diversidades [...], mas também com as divergências." Isto aqui não é texto, nada que seria, digamos assim... (Soa a campainha.) O SR. MARCELO SEMER - ... censurado pela Escola sem Partido. Esse é um editorial do jornal O Estado de S.Paulo. A gente tem que ter a noção de que isso que a gente pode fazer pode vulgarizar - esse é o grande risco - o combate ao terrorismo. Isso nos expõe internacionalmente, porque vai expor o próprio combate ao terrorismo. Várias vezes, nós já vimos aqui, na política, as pessoas, Deputados ou Senadores, dizendo: "Nós precisamos mudar a Lei Antiterrorismo para punir o MST". Se nós fizermos isso, porque queremos punir o MST, o MTST, a CNBB, enfim todos os outros movimentos sociais, o que vamos fazer? Vamos nos vulgarizar. O Brasil vai ser novamente objeto de um folclore, de uma relação folclórica no Direito Internacional. Esse é o meu receio. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Obrigado. Em conclusão, está inscrita, por último, a Senadora Ana Amélia Lemos. Eu apenas vou pedir a V. Exa. que, após a formulação da sua pergunta, assuma o meu lugar, para que eu também vá para o plenário fazer uma pergunta. A SRA. ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Obrigada. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - E aí a senhora também fará as conclusões dos trabalhos. A SRA. ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Obrigada, Senadora Lasier Martins, autor do projeto que está polemizado pela natureza dele. V. Exa., como jornalista, e como eu também aqui, vê algumas manifestações de que o grande valor, o grande patrimônio que temos na democracia é a liberdade de expressão. E vi aqui manifestações dizendo que isso corre risco. Não, absolutamente a liberdade de expressão não está em jogo aqui, porque é um patrimônio que já conquistamos. É de outra coisa que nós estamos tratando. Então, não há isso. Recapitulando o que está no caput da lei, ela sintetiza isso e facilita também a eliminação desse contencioso que houve aqui neste processo, até pelo clima que o País está vivendo neste momento político, saído de uma eleição polarizada, uma eleição bastante radicalizada, eu diria. Então, acho que o senso comum, o senso médio que foi determinado até pelos vetos apostos e que tiveram 300 votos dos Deputados amenizou a questão para evitar qualquer indício de que isso fosse criminalizar movimentos sociais. Então, o fato de a Câmara ter derrubado com 300 votos até impediu que o Senado se manifestasse, porque houve uma consagração de que foram acertados os vetos apostos à Lei 13.260. Eu queria fazer uma observação ao representante da Polícia Federal, Dr. Juner Caldeira Barbosa, que trouxe à luz - e foi muito importante conhecermos também - o que países e democracias muito mais fortes que a nossa... A Constituição americana tem 231 anos, e, na lei americana, está lá expresso isso com clareza. Na lei do Reino Unido, da velha Inglaterra, isso também está posto, sem nenhum risco à liberdade de expressão, à democracia. (Soa a campainha.) A SRA. ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Até foi citado aqui que, em algum momento, a imprensa incita. |
| R | Então, seremos nós - eu sou jornalista, o Senador Lasier é jornalista, Kim Kataguiri é jornalista - também criminalizados? Não, a imprensa não! A imprensa divulga o que está acontecendo. Esta é a missão da imprensa: comentar, criticar. Quero também fazer o registro, embora não tenha procuração para isso - não sou advogada -, do trabalho republicano que instituições como a Polícia Federal, a começar por ela... Lei é para todos, delegados. Lei é para todos! E a responsabilidade nossa é fazer uma lei suficientemente clara para evitar dúvidas sobre a interpretação dela pelas instituições: Poder Judiciário; Ministério Público, na denúncia; Judiciário, para julgar; e Polícia Federal, para executar o que determina a lei. Então, ficou muito claro aqui, à luz disso, que o Brasil só poderá entrar na OCDE se tiver um dispositivo exatamente sobre esta matéria que estamos discutindo agora. Se ele não tiver essa garantia, não entra na OCDE, porque essa é condição sine qua non para isso. Sou autora até de um projeto que está na Comissão de Relações Exteriores que trata exatamente disso. A gente até o retirou agora para evitar qualquer contaminação, porque não é bom para isso, se nós quisermos ter acesso a um organismo como esse, que é muito importante. Nós não estamos na OCDE. Nós perdemos um foro internacional importante. Então, não se trata, de nenhuma maneira, de cercear liberdade de expressão, não se trata aqui também de criminalizar movimentos sociais. Acho, Senador Lasier Martins - V. Exa. tomou essa iniciativa -, que repor o texto original, como estava na lei, pacifica a questão; talvez, esse seja o melhor caminho nesta hora em que nós estamos convivendo com esses problemas. Sobre a responsabilização da lei, não estamos abrindo mão da tipificação do terrorismo. Está aqui expresso, está aqui escrito aqui o que é, na Lei 13.260, de 2016. Eu acho que isto aqui talvez seja o caminho mais adequado para evitarmos... Este País precisa, mais que tudo, ser pacificado. Nós estamos vivendo momentos de tensão, que, às vezes, é retroalimentada, alimentada, eu diria, artificialmente por alguns motivos que muitos podem saber, muitos sabem, outros ignoram ou, até por vontade política, não queiram aceitar o movimento que estamos vivendo. Então, é uma manifestação que eu faço. Eu apenas expresso esta minha modesta opinião dentro deste debate, agradecendo as exposições. Fui parte da introdução aqui de um debate de movimentos sociais, de MBL, de outros movimentos também, para abrir um pouco, não ficar só de um lado. Aqui a gente viu a predominância de determinado lado para essa matéria, mas acho que deu um equilíbrio muito adequado para o debate desse projeto. Então, Senador, essa é a minha posição. O SR. PRESIDENTE (Lasier Martins. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Não tem pergunta a fazer? A SRA. ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Eu não tenho perguntas a fazer porque penso que foram claros, e o meu posicionamento a respeito disso é renovar de novo a minha crença em relação à confiança nas instituições e no Estado democrático de direito brasileiro que nós vivemos. (Pausa.) A SRA. PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Dou a palavra ao Senador Lasier Martins, que é o autor do projeto de lei em discussão. O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Muito obrigado, Senadora Ana Amélia. Em primeiro lugar, eu agradeço as participações brilhantes como as que tivemos nas explanações a respeito desta matéria, que julgo muito importante, porque o Brasil está cansado de ver destruições, arruaças violentas e graves incêndios. |
| R | Eu queria dizer que a tão tocada tipificação está muito explícita no projeto. Ela fala na motivação, e, na motivação, há os excessos e os resultados. Então, são itens que se conjugam: motivação e resultado, excessos, proporcionalidade e o resultado alcançado. Eu trouxe para ilustrar e perguntar... Vou fazer uma única pergunta ao Delegado Juner. Se há uma divisão antiterrorismo na Polícia Federal, isso se dá porque a Polícia Federal se previne contra o ato antiterrorista. Eu pergunto... Mostro para a câmera isto que aqui ocorreu no dia 29 de novembro de 2016, aqui bem perto na Esplanada, durante o processo de impeachment: destruição de automóvel; destruição de ônibus, no dia 13/12/16; automóvel virado, no dia 30/11/16; e uma multidão fazendo destruições de toda ordem. Eu pergunto: isso é movimento social civilizado ou é um ato para causar terror social e para coagir autoridades a deixarem de fazer determinada coisa? É uma pergunta bem objetiva. A matéria é muito elementar. É o que nós estamos acostumados a ver, em toda parte deste Brasil, a todo instante. Foram lembrados aqui os Black Blocs. Aquilo que eles cometem também deve ser encarado como terrorismo ou não? O Brasil vai continuar convivendo com isso numa época em que se tem uma perspectiva de novos horizontes de um Brasil mais ordeiro, mais civilizado, mais preocupado com a construção, e não com a destruição, e não com a coação de autoridades? Então, eu pergunto: Delegado Juner, enquadra-se a motivação como terrorismo pelo resultado alcançado e pela razoabilidade? Essa foi a palavra que me fugiu há pouco. É um princípio adotado por qualquer magistrado a razoabilidade de interpretar o acontecimento, o fato. É movimento social ou é terrorismo? Um movimento social civilizado, como disse o Kim, é aquele que milhões de brasileiros nas ruas fizeram, na maior ordem, sem nenhuma vidraça quebrada, sem nenhum carro virado, sem nada. Isso é civilizado. Agora, isto aqui é ou não é terrorismo? É a pergunta. A SRA. PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Com a palavra o Delegado Juner. |
| R | O SR. JUNER CALDEIRA BARBOSA - Pois bem, pela nossa lei... Eu vou responder, primeiro, com relação ao enquadramento hoje da nossa Lei Antiterrorismo. Com relação à nossa lei, a previsão, a definição de terrorismo abrange aquelas questões que já foram muito faladas aqui, e atos como esses não seriam enquadrados. Apesar de potencialmente ferirem pessoas, levarem pessoas à morte, eles não seriam enquadrados pela definição legal que hoje temos na nossa Lei Antiterrorismo. É importante colocar que a análise do caso concreto, a investigação não é bate e pronto. Se você tem contato com uma situação como essa, há necessidade de a equipe policial, presidida pelo delegado de Polícia Federal, realizar uma série de diligências e de investigações, com a obtenção de provas, para, ao final, nós chegarmos à conclusão se aquela motivação, colocando em tese que poderia ser uma motivação política, teve a intenção, a finalidade de provocar o terror geral, generalizado, com o intuito de apavorar a sociedade. A Polícia Federal quer justamente focar ações que venham a ocasionar o terror para a sociedade, quer proteger a sociedade de eventos como esse de grande lesividade, com potenciais catastróficos. Hoje, a gente defende e apoia o projeto de lei porque essa questão da motivação política, por ter ficado fora da nossa lei, impede que nós façamos esse tipo de enquadramento. Então, o que aconteceu foi que... Na época, eu estava na chefia da divisão de passaporte, não integrava a divisão antiterrorismo. Não tenho elementos concretos para poder aduzir se seria ou não uma situação hipotética, mas o fato é que... (Soa a campainha.) O SR. JUNER CALDEIRA BARBOSA - ... a nossa função na divisão antiterrorismo é proteger a sociedade. E, para que nós possamos proteger a sociedade, temos de ter um arcabouço legal e jurídico que nos ampare a investigar ações que possam ser caracterizadas. Se a lei define hoje o que é terrorismo, como aquelas questões de xenofobia racial ou religiosa, nós só vamos investigar como terrorismo essa questão. Mas o fato é que, hoje, no mundo todo, como citei aqui, na Europa, na França - não tive tempo hábil de falar -, no Reino Unido, em Portugal, nos Estados Unidos, a questão política é essencial na caracterização da definição de terrorismo. Então, se nós não temos essa caracterização, nós estamos em descompasso com o mundo, inclusive aqui na América Latina. Então, nós necessitamos realmente dessa adequação para combatermos - a nossa vertente é esta - quem provocar esse terror generalizado. Não há qualquer outro tipo de atuação da Polícia Federal. E o que não for caracterizado como esse terror vai ser outro tipo de crime. Pode ser crime de dano, atentado à vida, homicídio, o que for, e não será capitulado como terrorismo. É isso que eu gostaria de colocar. O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Só quero concluir. V. Exa. deixou de considerar que é exatamente isto o que propõe o projeto: a motivação política ou ideológica. É o acréscimo que nós temos. O SR. JUNER CALDEIRA BARBOSA - Sim. O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Desse modo, mudam as coisas daqui por diante se essa lei for aprovada, se esse resgate for aprovado. A matéria não foi rejeitada. Ela se transformou em lei. O que nós estamos fazendo é um resgate de dois ou três artigos que foram rejeitados. O SR. JUNER CALDEIRA BARBOSA - Não, nesse ponto, a Polícia Federal expressa total apoio à questão da inclusão da motivação política e ideológica. Eu só não quis citar o caso concreto, porque sobre o caso concreto somente investigando e tendo elementos você poderia falar e, mesmo assim, no processo, em juízo. |
| R | A SRA. PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Eu queria saber se o Senador Lasier Martins está satisfeito. Eu queria renovar o agradecimento. Ouvi uma manifestação do Dr. Frigo quando V. Exa. deixou a Presidência. Eu queria consultá-lo sobre qual foi a sua... O SR. DARCI FRIGO (Fora do microfone.) - É uma pergunta para a Polícia Federal. A SRA. PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - É uma pergunta para a Polícia Federal. Para eu não ser acusada de praticar terrorismo aqui, por cercear a liberdade de expressão de um palestrante tão ilustre, então, passo a palavra ao Dr. Frigo para fazer essa pergunta. Acho que isso enriquece o debate sobre um tema tão importante. Também por três minutos será feita a pergunta, e, em três minutos, será dada a resposta do Dr. Juner. O SR. DARCI FRIGO - Eu gostaria justamente de saber o que a Abin e a Polícia Federal têm de elementos sobre o que aconteceu na greve dos caminhoneiros, se houve movimentos, vamos dizer assim, paramilitares, se houve grupos que se colocaram dentro desse movimento e se esses grupos foram identificados, se há alguma investigação em relação a essa ação. De acordo com o que a gente viu no País - e eu defendo o direito de livre manifestação -, muitas pessoas tiveram direitos prejudicados. Milhares, milhões de pessoas sofreram com a greve, embora ela tivesse um fundamento legítimo. Mas ficou patente que havia algo que não se explicava: como essa greve se organizou, como essa greve se disseminou e como realmente o País ficou de joelhos naquele processo. Eu não acredito que essa seria uma ação dos caminhoneiros autônomos, vamos dizer assim. Eu queria saber se há uma investigação sobre isso e como foi tratada essa investigação. O SR. CRISTIANO AVILA MARONNA - Sra. Presidente, permita que eu apenas faça um acréscimo à pergunta, que vai nesse mesmo sentido. Apenas quero acrescentar um episódio recente em que viaturas do Incra e a própria sede do Incra foram depredadas e incendiadas, ao que parece, por fazendeiros descontentes com ações de fiscalização ambiental. Então, somando-me ao questionamento do Dr. Darci Frigo, eu gostaria de saber o que a Abin e a Polícia Federal têm a dizer a respeito desses episódios. A SRA. PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Obrigada. Pergunto se o Dr. Juner ou o representante da Abin falarão sobre o questionamento acrescentado pelo Dr. Cristiano. O SR. JUNER CALDEIRA BARBOSA - Eu posso falar rapidamente e passo a palavra ao Dr. Rodrigo, porque ele pode ter mais informações. A SRA. PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - A Presidente é que passa a palavra. O SR. JUNER CALDEIRA BARBOSA - Perdão, perdão! A SRA. PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - É um dispositivo. Não é meu. Mas é o Regimento que faz isso. Com a palavra o delegado. O SR. JUNER CALDEIRA BARBOSA - Peço desculpas. A SRA. PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Não, não é preciso. O SR. JUNER CALDEIRA BARBOSA - Só quero esclarecer que, como a divisão antiterrorismo trata de crimes de terrorismo, esse assunto não foi tratado na divisão antiterrorismo. Então, não posso responder ao senhor sobre essa questão. A SRA. PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Com a palavra o representante da Abin, Dr. Rodrigo. O SR. RODRIGO DE AQUINO - A atividade de inteligência é uma atividade preventiva. O que nós fazemos é identificar algum movimento e se ele ameaça o Estado. Passando o evento, nós não fazemos uma investigação do caso, se houve algum tipo de crime, alguma ação criminosa. Quem faz essa investigação é a Polícia Federal. De todo modo, no que se refere ao contraterrorismo, essas atividades, no âmbito da atividade de inteligência, são tratadas com muita cautela. Então, no que se refere ao contraterrorismo, esse tema não está dentro do foco da atividade do nosso departamento. Eu não poderia responder sobre o que está acontecendo com relação a isso. |
| R | A SRA. PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Obrigada pelo seu questionamento. O SR. DARCI FRIGO (Fora do microfone.) - Obrigado, Senadora, pela oportunidade. A SRA. PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Obrigada, Frigo. O SR. KIM KATAGUIRI - Presidente, eu queria levantar um ponto. A SRA. PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Dentro do critério, porque nós abrimos uma excepcionalidade, vou dizer claramente que o Regimento trata, no seu art. 95, aliás, no artigo anterior: "Art. 94. Os depoimentos serão prestados [...]." Estamos aqui lidando só com advogados, ou melhor, só com advogados não, mas com os doutores da lei. Então, doutores da lei, diz o art. 94: "Art. 94. Os depoimentos serão prestados por escrito e de forma conclusiva [não foi o caso aqui]. §1º Na hipótese de haver defensores e opositores, relativamente à matéria objeto de exame, a comissão procederá de forma que possibilite a audiência de todas as partes interessadas." Esse é o primeiro parágrafo. Diz os §§2º e 3º: "§2º Os membros da Comissão poderão, terminada a leitura, interpelar o orador exclusivamente sobre a exposição lida, por prazo nunca superior a três minutos. §3º O orador terá o mesmo prazo para responder a cada Senador, sendo-lhe vedado interpelar os membros da comissão." Então, eu apenas abri o parêntese para ficar livre de qualquer coisa de cercear. E acho que é democrático. Passo a palavra a Kim Kataguiri para fazer sua indagação ou posicionamento que desejar. O SR. KIM KATAGUIRI - Presidente, conhecendo, sabendo que o Regimento veda a interpelação por parte de convidados da Mesa em relação a Parlamentares, eu gostaria de fazer uma observação, e não um questionamento, quanto a uma fala do Senador Humberto Costa, que colocou que até agora não houve investigações que dissessem ou que concluíssem sobre a autoria ou a responsabilidade pelos atos praticados pelos Black Blocs, que, nas palavras dele, ipsis litteris - abrem-se aspas -, "se infiltraram nas manifestações petistas" - fecham-se aspas. Eu só queria fazer um comentário: como foi bem colocado aqui pelo Jailton, que foi líder do Vem Pra Rua, nas manifestações que nós promovemos em favor do impeachment e de diversas outras pautas que já foram colocadas aqui, não houve nenhum caso de violência, não houve nenhum caso de depredação, não houve nenhum Black Bloc ou infiltrado ou o que quer que seja, em manifestações de magnitude de milhões de pessoas. Eu questiono a possibilidade de haver apenas em manifestações com viés mais à esquerda a existência desses ditos "infiltrados". Afinal de contas, como é que você pode dizer que pessoas que estão uniformizadas, ironicamente com uma camisa negra, escondendo o próprio rosto, tomando a linha de frente da manifestação com paus e pedras nas mãos, podem ser infiltrados de alguma coisa, se elas já estão caracterizadas para a ação que elas costumeiramente fazem nas manifestações, que curiosamente só são infiltradas de um lado? Então, eu acho curioso falar que a responsabilidade por esse tipo de agressão, por esse tipo de ataque ao patrimônio público seja de pessoas alheias à organização da manifestação, quando, única e exclusivamente, esse tipo de ocorrência só aparece, só figura em manifestações com o viés partidário defendido pelo Senador. A SRA. PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - O Senador Humberto Costa não está presente para eventualmente fazer um comentário. Em nome da Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal, presidida pelo Senador Edison Lobão, e em nome do Senador Lasier Martins, que presidiu esta audiência pública - ele é um dos requerentes, eu também fui requerente, como a Senadora Gleisi, o Senador Humberto Costa, o Senador Lindbergh Farias -, eu queria também agradecer ao Relator, o Senador Magno Malta. |
| R | Quero agradecer novamente, em nome da Comissão, a presença dos ilustres expositores, que deram uma valiosa contribuição ao debate de um tema tão relevante. Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada a presente reunião. Muito obrigada a todos. Está encerrada esta audiência pública. (Iniciada às 10 horas e 26 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 44 minutos.) |

