Notas Taquigráficas
03/09/2019 - 1ª - Subcomissão Permanente da Pessoa com Deficiência, Subcomissão Temporária sobre Doenças Raras
| Horário | Texto com revisão |
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| R | O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Havendo número regimental, declaro aberta a 1ª Reunião da Subcomissão Permanente da Pessoa com Deficiência, conjunta com a 1ª Reunião da Subcomissão Temporária sobre Doenças Raras, da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 56ª Legislatura. A presente reunião atende aos Requerimentos nºs 72 e 97, de 2019, desta CAS (Comissão de Assuntos Sociais), de minha autoria, para a realização de audiência pública destinada a debater questões relacionadas à síndrome de Tourette. Dando início à reunião, eu gostaria de apresentar os convidados para esta audiência pública. À minha direita, Aníbal Moreira Júnior, membro da Comissão das Pessoas com Síndrome de Tourette; também à direita, Ana Gabriela Hounie, médica especialista na síndrome de Tourette; Larissa Miranda, que está aqui à minha esquerda, no meio, Presidente da Associação Solidária do TOC e Síndrome de Tourette; Alexandro Cardoso, aqui à minha esquerda, portador da síndrome de Tourette; Regina Aparecida da Silva Amorim, à minha extrema direita - que bom! -, portadora da síndrome de Tourette; e Jaqueline Silva Misael, servidora do Departamento de Atenção Especializada do Ministério da Saúde. |
| R | Eu quero dizer a vocês que estão participando desta Mesa que sejam bem-vindos, bem-vindas; que esta audiência sirva como uma iniciativa importante para debater encaminhamentos, atendimentos, diagnósticos, celebração inclusive de um dia especial para a conscientização da síndrome de Tourette; e que todos os desafios que vocês enfrentam nessa área sejam colocados, para que a Comissão de Assuntos Sociais e as Subcomissões de Doenças Raras e de Pessoas com Deficiência possam agir em função daquilo que for colocado nesta audiência pública. Gostaria de combinar com vocês um tempo para a fala, se já não tiver sido combinado. Dez minutos está bom? A gente dará uma prorrogação, caso seja necessário. Mas em torno disso estaria bem? Tranquilo? A SRA. ANA GABRIELA HOUNIE (Fora do microfone.) - Eu preciso de um pouco mais, para falar da parte médica, das medicações... O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Isso. Então, na parte médica até a gente pode destinar um tempo um pouco maior. Podemos seguir a mesma ordem que eu mencionei agora há pouco? (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Posso? Tudo bem? (Pausa.) Então, está bom. Eu quero, além disso, dizer que esta audiência pública contará com os serviços de interatividade com o cidadão Alô Senado, através do telefone 0800-612211, e e-Cidadania, por meio do portal www.senado.leg.br/ecidadania - tudo junto -, que transmitirá ao vivo a presente reunião e possibilitará o recebimento de perguntas e comentários aos expositores, via internet. Inclusive, estimulamos bastante para que as pessoas façam comentários, façam perguntas, que serão endereçados, todos eles, perguntas e comentários, para os expositores. Muito bem. Então, em primeiro lugar, eu passo a palavra ao Aníbal Moreira Júnior, membro da Comissão das Pessoas com Síndrome de Tourette. O SR. ANÍBAL MOREIRA JÚNIOR (Para exposição de convidado.) - Muito obrigado, Senador. Nós, no início do ano, criamos uma comissão representativa dos portadores da síndrome de Tourette, para poder tentar atingir alguns objetivos de melhoria na qualidade de vida dessas pessoas. Então, eu tenho que deixar alguns agradecimentos, porque são muitos, e não posso deixar de fazê-los, não é? Eu queria agradecer especialmente ao Senador Flávio Arns e à magnífica equipe que nos atendeu. O Senador, desde o primeiro momento, foi um Parlamentar que abriu as portas para essa discussão desse tema tão importante e tão negligenciado. Então, Senador, na sua pessoa eu agradeço a toda a sua equipe pelo apoio que tem nos dado - a Ivanilde, o Aires, o Flávio e toda a sua equipe -, sem querer nos esquecer de ninguém, todos eles. E também gostaria de cumprimentar, na sua pessoa, os demais Senadores que são membros da CAS e que estão envolvidos na discussão desses problemas sociais que tanto afetam a nossa sociedade. |
| R | Também eu preciso agradecer ao Reitor da Universidade Federal de Lavras, que é o Prof. José Roberto Soares Scolforo, que teve importante participação na minha presença aqui. Além dele, à Dra. Joziana Muniz de Paiva, que também é da Reitoria da Universidade Federal de Lavras, que está sempre comigo, sempre me dando apoio, não só aqui, no nível nacional, mas também no nível local, e sempre me acompanhando nessa tarefa de divulgar a síndrome de Tourette e buscar melhoria da qualidade de vida dos portadores. Além também do Dr. Thales Augusto Barçante, que é Chefe de Departamento de Ciências da Saúde na UFLA, e vocês vão entender que nós estamos com alguns projetos na área de síndrome de Tourette muito importantes na UFLA, graças ao apoio dessas três pessoas. Também gostaria de agradecer aos demais presentes e palestrantes que estão aqui na nossa Mesa e presentes na nossa comissão, porque vocês é que viabilizaram todo esse trabalho. Eu, sozinho, não teria conseguido mobilizar o Brasil inteiro como o nosso grupo, na forma da comissão representativa, conseguiu mobilizar. Muito obrigado, Senador! Sem o senhor, nada disso estaria acontecendo. Esses são os membros da nossa comissão representativa. Essa comissão está sempre crescendo, está sempre entrando gente nova. Aí nós temos algumas pessoas que são portadores da síndrome; outras pessoas que são advogados; outros que são pais; outros que são pais e advogados. E temos também o apoio da Dra. Ana Hounie, que vem, ao meu lado aqui, que tem dado todo o apoio técnico para essa comissão também, e a Associação Solidária do TOC e ST, representada aqui pela Larissa Miranda, que também tem nos orientados muito, inclusive produzindo muito conteúdo para escolas e para terapia das pessoas que têm Tourette. O que que nós buscamos, Senador? Nós buscamos melhorar a vida das pessoas portadoras de síndrome de Tourette, que é uma causa justa e humana. Nós precisamos que essa síndrome seja mais divulgada e conhecida no Brasil, porque os nossos portadores têm uma prevalência bastante significativa. Existem várias estimativas, que variam de 1% a 2,9% da população, e são pessoas que estão sendo vítimas de bullying, vítimas de maus-tratos, vítimas de ignorância sobre o tema síndrome de Tourette. Qual a dificuldade que essas pessoas vivem? Eu costumo dizer que, se a vida é um oceano que a gente tem que atravessar... (Pausa.) ... os portadores de Tourette têm que fazer essa travessia a nado com um peso nas costas. É muito mais difícil para eles! Nós também buscamos, Senador, o reconhecimento dos direitos que os portadores de síndrome de Tourette têm e são negligenciados pelo Estado e pela sociedade também: o direito e o respeito. Num País onde se prega o Estado liberal, o que importa na verdade são as pessoas, não são as empresas, os bancos, não são os laboratórios; essas entidades têm condição de se sustentar e criar a sua própria riqueza, mas as pessoas não têm essa possibilidade. Há muita dificuldade de se conseguir as coisas no Brasil, e abandonados ainda é muito pior. Essa definição eu vou deixar para Dra. Ana Hounie fazer. Esse vídeo também não vou passar, porque a Dra. Hounie tem outros casos para apresentar. |
| R | A síndrome de Tourette é como se fosse um iceberg: você tem a parte de cima, que são as coisas que você consegue observar visualmente, que são os tiques motores e os tiques vocais, mas vem associadas a várias outras morbidades, como déficit de atenção, transtorno obsessivo compulsivo, sintoma obsessivo-compulsivo, muita ansiedade, depressão, fobia social... Tudo isso vem associado ao paciente, e normalmente as pessoas não sabem o que acontece dentro da família que tem um portador de síndrome de Tourette, porque a família é um alicerce para essas pessoas e, sem ela, realmente não seria possível... Sem a família dando suporte, não seria possível suportar essa dificuldade toda. E nós vemos que existem portadores que são completamente negligenciados, inclusive na própria família. Nós temos aí uma estatística do CDC dos Estados Unidos que diz que 86% dos portadores de síndrome de Tourette possuem algum problema mental, comportamental ou de desenvolvimento; 63% possuem Transtorno de Déficit de Atenção; 49% dos portadores, ansiedade; e um terço dos portadores possuem Transtorno Obsessivo-Compulsivo. O nosso trabalho, da comissão, é atuar na área legislativa, na área médica, educacional, na área de conscientização, na área de assistência social e junto ao Poder Executivo, e é muito difícil chegar ao Poder Executivo. Se a gente não tiver um apoio parlamentar, é muito difícil conseguir algum avanço nessa área. Na área legislativa, Senador, a nossa busca é fazer uma alteração no art. 2º da Lei 13.146, de 2015, uma lei que o senhor já conhece bem, porque o senhor acabou de relatar um projeto para alterar esse art. 2º, colocando aí, onde está escrito "motor e fônica", a palavra "comunicação", para atender aos gagos. E por que que nós estamos fazendo isso? A tabela de classificação internacional de funcionalidades e incapacidades, que é da OMS, já inclui todos os sintomas de síndrome de Tourette que nós temos aqui. Todos os tiques vocálicos, os tiques motores, a ecolalia, a coprolalia, está tudo definido nessa tabela. E nesses itens, no capítulo 7 dessa tabela, nós temos todas as definições da síndrome de Tourette da tabela da Organização Mundial da Saúde, que enquadra as deficiências físicas. Então, a síndrome de Tourette, por estar nessa tabela reconhecida mundialmente, ainda está fora da proteção da nossa legislação. A gente acredita que, colocando duas palavras nesse artigo, a gente pode incluir todos os portadores de Tourette nas proteções que os deficientes físicos já possuem no Brasil. Então, o artigo, Senador, ficaria redigido da seguinte forma: Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento, de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual [e aí as novas palavras], motora e fônica ou sensorial [que já é antiga], o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. Assim, a gente conseguiria ter cotas nas empresas, a gente poderia ter uma proteção na educação, atendimento personalizado na educação, garantia desse atendimento, a gente poderia ter vagas para servidores públicos em concursos públicos reservadas... E hoje, Senador, o paciente de Tourette não é visto como deficiente físico. Então, se ele participar de um concurso, ele vai concorrer contra todo mundo, e não somente com os que têm deficiência. Eles não são reconhecidos hoje como deficiente na nossa legislação e na nossa infrarregulamentação. Também nós procuramos o reconhecimento ao direito à aposentadoria. Não vou me alongar muito nesse tema, porque a reforma da previdência está em discussão aqui no Senado, e isso aí é um tema que vai gastar muito tempo e está sendo devidamente discutido aí. O que for para os deficientes físicos tem que ser aplicado também aos portadores de síndrome de Tourette. Essa é a nossa luta também. Também nós buscamos criar o mês e o dia de conscientização sobre a síndrome de Tourette no Brasil. |
| R | No mundo inteiro, o dia internacional é o dia 7 de junho, e o período do dia 15 de maio ao dia 15 de junho é o Mês internacional de Conscientização sobre a Síndrome de Tourette. Nós queremos, Senador, com o seu apoio, apresentar um projeto de lei para fazer a criação desse mesmo dia de consciência da síndrome de Tourette no Brasil. Por que isso? Porque isso daria a possibilidade de a gente começar a criar políticas públicas, em nível nacional, para os portadores de síndrome de Tourette - ou seja, um atendimento especificado - e também ajudaria muito na divulgação dessa síndrome. Assim como a síndrome de Down, o autismo, que ganharam uma relevância muito mais importante na nossa sociedade, muito mais reconhecimento, muito mais paciência, a síndrome de Tourette também precisa receber esse tratamento, e, com esse dia e mês da consciência, a gente vai conseguir isso. As cidades de Recife e Lavras já aprovaram leis nas suas Câmaras municipais. Estão aguardando agora a sanção dos Prefeitos. São as primeiras cidades no Brasil a instituir o Dia Municipal de Conscientização da Síndrome de Tourette, em 7 de junho, que é o Dia internacional da Síndrome de Tourette. Também nós buscamos, Senador, reconhecer a síndrome de Tourette como doença rara. Por que é que eu digo que é doença rara? Porque ninguém pode provar o contrário. Nós não temos estudos, não temos estatísticas, não temos estudos epidemiológicos, não temos notificações de casos pelo Ministério da Saúde ou ao Ministério da Saúde... Não temos nenhuma informação sobre os possíveis e os confirmados casos de síndrome de Tourette em nível nacional. Então, ninguém pode dizer para nós que nós temos 1%, 2% ou se nós temos 65 portadores por 100 mil habitantes, que é o limite para doenças raras. Então, nós gostaríamos, Senador, de trabalhar para reconhecer a síndrome de Tourette como doença rara e, aí sim, fazer os estudos que nós precisamos. Também, Senador, muito sério isto daí: garantia do fornecimento permanente de medicamentos pelo Ministério da Saúde. Nós não temos muitos medicamentos e, no caso da síndrome de Tourette, às vezes o medicamento serve para uma pessoa, mas não serve para outra. (Soa a campainha.) O SR. ANÍBAL MOREIRA JÚNIOR - Acabou já? Nós precisamos debater, no âmbito nacional, a síndrome de Tourette, precisamos de promover mais eventos e precisamos que o Ministério da Saúde, no cumprimento da sua missão, elabore políticas públicas para os portadores de síndrome de Tourette, garanta o atendimento multidisciplinar nos centros de apoio psicossocial e nas PSEs e comece a fazer estudos estatísticos e censitários para sabermos quantos pacientes de síndrome de Tourette nós temos no Brasil. Também... Isso aí eu vou ter que pular, porque isso aí é uma mensagem sobre o Orap. Nós temos o problema do Orap, que é o melhor remédio para o controle dos tiques, e que foi descontinuado pelo laboratório Janssen - não está mais sendo produzido no Brasil. Não temos nenhum outro laboratório produzindo aqui, e o motivo foi comercial, foi o motivo de volume de vendas. Então, nós não aceitamos isso. A Anvisa não podia ter autorizado o encerramento dessa produção. E a gente pede, Senador, que isso seja revisto, que talvez seja revogada a autorização pra cancelamento da produção, mas nós precisamos sentar à mesa com o laboratório Janssen, para poder voltar a produção do Orap em escala comercial e, se possível, inclui-lo nos remédios que são fornecidos pelo SUS. Nós precisamos entrar na pesquisa científica também: o Ministério pode apoiar as universidades públicas brasileiras para desenvolver pesquisa sobre a causa, sobre os tratamentos, sobre os ambulatórios, sobre os marcadores biológicos que podem determinar a adequação de um remédio ou de outro. Nós temos em andamento a elaboração de um convênio entre a Universidade Federal de Lavras e a Universidade da Flórida para isso, para esse fim, inclusive com a possibilidade de fazermos um ambulatório aqui no Brasil, com a tecnologia estrangeira. |
| R | (Soa a campainha.) O SR. ANÍBAL MOREIRA JÚNIOR - Precisamos também que, nos protocolos médicos, inclua-se, na anamnese dos profissionais de Pediatria, Psiquiatria, Neurologia e Neuropediatria, a anamnese sobre a síndrome de Tourette, ou seja, quando você analisar um paciente, verificar se ele tem aqueles sinais. Eu tenho muita coisa para falar, mas eu tenho que abrir mão. Eu também gostaria de pedir ao Conselho Federal de Medicina que se envolvesse mais no assunto da síndrome de Tourette e que pudesse divulgar mais, nos seus simpósios, nos seus congressos, a síndrome de Tourette, para que os profissionais de Medicina, daquelas áreas que eu falei, possam reconhecer um paciente. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Agradeço ao Aníbal Moreira Júnior. Essa apresentação já está disponível para todos do Brasil e para nós também. É claro que é importante estar documentado o que é necessário para a área, porque isso será objeto, depois, de desdobramentos e discussões. Passo então a palavra à medica especialista na síndrome de Tourette, Ana Gabriela Hounie. A SRA. ANA GABRIELA HOUNIE (Para exposição de convidado.) - Obrigada. Eu vou tentar acelerar, porque eu também tenho vários eslaides. Esse é Gilles de la Tourette, que foi o neurologista francês que descreveu os oito primeiros casos da síndrome no final do século XIX. A síndrome de Tourette está classificada no DSM-5, que é a classificação americana de doenças, dentro dos transtornos do neurodesenvolvimento, porque é um problema de desenvolvimento do sistema neurológico. Esse é o primeiro artigo. A gente diagnostica Tourette quando há presença de tiques motores e vocais por pelo menos um ano, que causem prejuízo nas atividades da vida cotidiana. Tiques são movimentos rápidos, súbitos e, em geral, incontroláveis ou controláveis por pouco período de tempo e que causam estresse, interrompem a pessoa, e eles podem ser simples ou complexos. Eu vou priorizar mostrar... Como é que eu faço aqui para tocar o... (Procede-se à exibição de vídeo.) A SRA. ANA GABRIELA HOUNIE - Isso aqui é um tique vocal... Acho que está sem som a apresentação. Seria bom colocar o som na apresentação. (Intervenção fora do microfone.) A SRA. ANA GABRIELA HOUNIE - Mas não deu para ouvir, não é? (Procede-se à exibição de vídeo.) A SRA. ANA GABRIELA HOUNIE - Então, isso é um tique vocal, é um tique simples, porque ele parece tossir, mas pode ser fungar, pigarrear, e a gente tem os tiques complexos. (Procede-se à exibição de vídeo.) A SRA. ANA GABRIELA HOUNIE - Então, esse é um vocal simples, mas, em seguida, vocês vão ver que ele tem problema com o caminhar, tem várias contrações musculares no corpo inteiro. Esses casos que eu estou mostrando são de pacientes do meu consultório que me deram autorização para mostrar aqui para vocês. Podem ser bastantes graves, ao ponto de atrapalhar até o caminhar de um paciente. Eu tenho pacientes que ficam totalmente incapacitados, e, quando eles são extremamente graves e não respondem a nenhuma das terapêuticas disponíveis, a gente chama esses casos de refratários. (Procede-se à exibição de vídeo.) A SRA. ANA GABRIELA HOUNIE - Aqui a gente tem um tique vocal complexo. |
| R | (Procede-se à exibição de vídeo.) A SRA. ANA GABRIELA HOUNIE - Aí são todas as palavras, frases, que ele fala de maneira involuntária. Ele repete a frase: "Alguma coisa assim, alguma coisa assim, alguma coisa assim...". Então, isso, numa sala de aula, pode ser extremamente perturbador. Pode prejudicar o aprendizado tanto da própria pessoa como o dos colegas que estão junto com ele. E esse caso, especificamente, foi um caso que não respondeu às medicações tradicionais, mas respondeu muito bem à Cannabis medicinal. A síndrome de Tourette é relativamente rara. Se você considerar os casos mais leves que estão presentes na população sem diagnóstico, por exemplo, numa escola aleatória, você vai encontrar 1%. Se você vai para os ambulatórios especializados, você vai ter uma prevalência maior. E os casos mais graves, os refratários, são em torno de 1 a cada 4 ou 5 mil ou até 1 para 10 mil, nos casos mais graves. As comorbidades são frequentes, como o Aníbal já falou. Começa na infância, em geral aos seis, sete anos de idade, mas pode acontecer de a criança no berço, com meses de idade, já apresentar tiques. Costuma piorar na adolescência. Um terço remite na idade adulta, um terço tem uma melhora parcial e um terço permanece com os sintomas na vida adulta. É de 1 para 10 mil esses casos refratários. Existem várias teorias para explicar sua origem: genéticas, ambientais, estresse, há teorias imunológicas... Então, existem vários tipos de Tourette, com várias causas diferentes. Por isso que o tratamento é único e individualizado: tem que ser avaliado caso a caso. Aqui são os gânglios da base, que são essas áreas do sistema nervoso central que controlam os movimentos. O apontador não está conseguindo mostrar muito bem. E, em relação ao tratamento, a gente indica tratar: aqueles tiques dolorosos, os que podem causar automutilação - existem pacientes que têm tique, por exemplo, de enfiar o dedo no olho e acabam perdendo o olho, ficando cegos -; quando você tem interferência no aprendizado, na concentração; quando você tem uma perturbação muito grande por conta de tiques vocais; quando os tiques são socialmente inaceitáveis, como a coprolalia ou a copropraxia, que é falar palavrões de maneira involuntária ou fazer gestos obscenos de maneira involuntária, que são situações que levam à depressão do paciente, à estigmatização, por conta dos colegas, e muitas vezes ao bullying. A psicoeducação é fundamental. A Larissa vai falar mais sobre isso. E, em relação ao tratamento farmacológico, ele é extremamente difícil, porque envolve todos os nossos sistemas de neurotransmissores, desde os mais conhecidos, como a adrenalina, a serotonina e a dopamina, mas também as vias do glutamato, do gaba, da histamina e do sistema endocanabinoide. Então, a gente tem no mercado uma série de medicações que podem ajudar no tratamento. Os mais eficazes são os antipsicóticos, que são os típicos e os atípicos, e existem também os depletores de dopamina, que a gente não tem no Brasil, como a tetrabenazina, a deutetrabenazina e a valbenazina. Entre os típicos, eles são os mais eficazes, mas, por outro lado, eles têm o risco de causar discinesia tardia em até 20% dos casos. Esse é um caso de discinesia tardia. As crianças são as mais vulneráveis, assim como os idosos, e é uma síndrome potencialmente reversível. Então, uma parte da minha luta tem sido ensinar aos médicos a tentar tratamentos alternativos, para evitar dar antipsicóticos para criança, para evitar que ela, depois, tenha uma síndrome neurológica, que é muito pior do que o tique em si. |
| R | Os antipsicóticos típicos, então, que são os mais eficazes e são baratos, estão atualmente de difícil acesso. No SUS, a gente tem o Haldol, que pode ser encontrado em comprimidos e em gotas, mas, por exemplo, o Orap saiu do mercado. Ele não estava no SUS, mas era uma medicação barata. Da flufenazina, a gente tem o Anatensol, mas que é muito difícil de se achar, assim como a trifluoperazina, que é o Stelazine. A sulpirida também saiu do SUS e é difícil de se achar. A tiaprida saiu do mercado, a amissulprida é cara, o penfluridol, que era o Semap, saiu do mercado, o piportil saiu do mercado e o zuclopentixol não tem no SUS. Então, entre as medicações que são eficazes e baratas, só temos uma atualmente no SUS. Os antipsicóticos típicos que existem no SUS mas não servem para Tourette são a clorpromazina e a tioridazina, sendo que não há a tioridazina no SUS. Entre os atípicos, que têm um perfil mais benéfico de efeitos colaterais, ou seja, são menos prejudiciais, embora eles causem maior risco de síndrome metabólica, que é aumento de peso, desenvolvimento de diabetes, aumento de colesterol, eles são preferíveis, mas são extremamente caros. Eles estão disponíveis no SUS apenas no Alto Custo e apenas para esquizofrenia e transtorno bipolar. Então, se um paciente não respondeu ao Haldol, e eu quero tentar, por exemplo, a olanzapina ou o aripripazol, eu não posso, porque, com o diagnóstico de Tourette, ele não tem direito a receber a medicação. E são medicações caras. Então, são de difícil acesso. Apenas uma parcela da população tem condição de comprar esse tipo de medicação. Aqui a gente tem disponível a risperidona, que está no SUS, mas é uma medicação que tem muitos efeitos colaterais, dá ganho de peso, prejudica o raciocínio. Então, mais uma vez, os pacientes carentes do SUS têm acesso às piores opções de tratamento. O aripripazol, que é uma medicação muito eficaz e que tem um bom perfil, não está disponível no SUS. Ele já esteve no Alto Custo, em São Paulo, mas agora também já saiu do Alto Custo. Há outras medicações que mexem com outras vias de neurotransmissores, como o topiramato, mas o topiramato só se encontra no Alto Custo e é só para epilepsia. E a gabapentina também é só para epilepsia ou dor crônica e só no Alto Custo. Das que mexem com o sistema da noradrenalina, a gente tem a clonidina, que há no SUS, mas se o paciente não tolera clonidina, por muita sonolência, a guanfacina, que seria uma boa opção, não está disponível no Brasil. A empresa Shire, que agora é a Takeda - porque a Takeda comprou a Shire -, está tentando, há vários anos, trazer a guanfacina, mas a Anvisa não tem liberado, porque eles querem colocar a receita amarela, que é a mesma que se usa para Ritalina, que são os estimulantes, mas a guanfacina, por ser um anti-hipertensivo, da mesma maneira que o atenolol, não deveria precisar de receita, não é? O atenolol, o propranolol são de venda livre. Então, a guanfacina não deveria ser também regulada, porque ela não é um estimulante. Então, eles ficam nessa disputa de que tipo de receita vai ser usada, e estamos já há cinco ou seis anos nessa luta, sem conseguir que a guanfacina chegue ao Brasil. A gente tem as medicações que atuam no sistema endocanabinóide, que são relegadas atualmente para os casos refratários, que são a Cannabis medicinal... No Brasil, a gente tem o Mevatyl, que está disponível nas farmácias, que é uma combinação de THC e CBD. A gente tem o canabidiol puro ou com pequenas doses de THC, que são os produtos importados, e temos os óleos artesanais da Abrace Esperança, que tem uma autorização judicial para o cultivo, a extração e a comercialização. Esses produtos têm sido extremamente eficazes naqueles casos refratários e com muito menos efeitos colaterais do que todas as medicações que a gente tem em conjunto. |
| R | A toxina botulínica é indicada também para tiques únicos e graves. O problema é que também é uma terapia muito cara, que dura pouco tempo, e é necessário um especialista que entenda muito bem de neuroanatomia para poder fazer as aplicações com segurança. Então, para resumir, a gente tem diversos problemas em relação ao tratamento da síndrome de Tourette. Um deles é que a Anvisa dificulta a liberação de determinadas medicações; outro é o alto custo dos remédios, prejudicando a população carente; o tabelamento de preços, que faz com que a indústria não possa baixar o preço para facilitar a concorrência, e eles acabam saindo do mercado; as licitações das instituições, que privilegiam o baixo custo, em vez da qualidade das medicações. Então, temos, muitas vezes, medicações genéricas que são compradas pelo SUS, mas, por serem de laboratórios de péssima qualidade, elas não funcionam, e você acaba ou desistindo da medicação ou tendo que usar doses muito altas. Há uma falha no sistema de controle dos genéricos. Os genéricos podem, dentro da lei, ter 20% de diferença em relação ao original. Isso leva a uma diferença significativa dos níveis plasmáticos da medicação. Então, a gente tem também dificuldade porque precisamos de doses maiores quando você tem uma diminuição na dose em comparação com o produto de referência. Os médicos têm falta de liberdade na prescrição de medicação, porque a gente tem que prescrever de acordo com o que está sendo liberado pelo Governo. Então, eu não tenho liberdade de prescrever a olanzapina para um paciente com Tourette, porque ela só é fornecida para um paciente bipolar ou com esquizofrenia. E as medicações de alto custo têm regulações estaduais. Então, você vai ter uma política em cada Estado e aí você não tem uma padronização do tratamento para Tourette ao longo do Brasil. Em cada Estado vai funcionar de uma maneira. Isto aqui é um fluxograma mostrando como é que se faz um tratamento na Europa e nos Estados Unidos. Não vou entrar em detalhes nisto aqui. A estimulação cerebral profunda é uma cirurgia que é feita para casos refratários. Atualmente, a gente tem uma pesquisa em curso na USP. Estamos operando pacientes com Tourette refratário. É implantado um eletrodo no cérebro, e esse marca-passo, que fica abaixo do tórax, emite ondas e regula os movimentos. Das psicoterapias eu vou deixar para a Larissa falar com mais propriedade. E, como mensagem final, eu queria deixar, então, que nós, médicos, quando fazemos o nosso juramento hipocrático, levamos em conta que o nosso papel é primeiro não fazer o mal, sempre buscar o melhor para o paciente. Então, para os casos que são leves, tentar evitar os antipsicóticos. Se a gente for usar um antipsicótico, usar os atípicos nas menores doses possíveis, e estabelecer sempre uma lista de prioridades em relação ao que deve ser tratado. A gente tem que enfrentar uma questão moral, que é muito grave, porque a nossa conduta no SUS acaba sendo uma conduta totalmente diferente da conduta a ser feita no consultório, porque a gente não tem acesso a todas as possibilidades de tratamento. |
| R | E falar também que a equipe de tratamento de uma criança, um adolescente com Tourette pode ser uma equipe extremamente dispendiosa. Muitas vezes, você precisa, além do psiquiatra, do psicólogo, do psicomotricista, terapeuta ocupacional, psicopedagogo, fonoaudiólogo... E no SUS a gente não tem como fornecer isso. Não existem essas equipes formadas e é extremamente difícil, então, oferecer o tratamento integral para a população carente. (Soa a campainha.) A SRA. ANA GABRIELA HOUNIE - Para concluir, a síndrome de Tourette é uma doença neuropsiquiátrica extremamente complexa, com sintomas motores e comportamentais, de etiologia ainda desconhecida. A fisiologia envolve vários circuitos de neurotransmissores. O tratamento eficaz depende da correta detecção desses mecanismos que estão envolvidos, daí precisamos de pesquisas na área. Há muito desconhecimento e muito preconceito em relação a esses pacientes e eles têm muita dificuldade de acesso a tratamento. Esse é o meu livro, que eu deixo aí para vocês terem a lembrança do livro. A associação de que a Larissa vai falar... Queria agradecer a todos e espero que essa iniciativa faça com que a gente consiga estabelecer o dia nacional da síndrome de Tourette e que inaugure uma nova era no estudo dessa síndrome e na facilitação de tratamento desses pacientes no Brasil. Muito obrigada. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Quero agradecer à Dra. Ana Gabriela, médica especialista na síndrome de Tourette. E, na sequência, eu passo a palavra à Larissa Miranda, que é Presidente da Associação Solidária do TOC e Síndrome de Tourette. A SRA. LARISSA MIRANDA (Para exposição de convidado.) - Oi, boa tarde. Para passar o vídeo é aqui? (Procede-se à apresentação de vídeo.) |
| R | Na verdade, eu quis trazer esse vídeo porque eu acho que aí há um pouco de vários tipos de casos de Tourette: tiques complexos, tiques vocálicos, tiques motores. Infelizmente, eu não consegui baixar o vídeo com a legenda, mas as crianças estão falando das dificuldades por que elas passam, das pessoas que pedem para que elas parem de fazer os tiques, de o quanto algumas pessoas se incomodam com os tiques. Eu vou passar rápido isso, porque a Dra. Ana já falou: 1% da população tem Tourette. Então, uma a cada dez pessoas tem Tourette e existe uma incidência maior em meninos. A Tourette piora nos momentos de maior ansiedade e maior estresse. Dos tiques simples e complexos a Dra. Ana já falou, os vocais, e também eu acredito que no filme vocês puderam ver um pouquinho. Existe um tique que é a coprolalia, que é o uso de palavras involuntárias e, muitas vezes, palavras com sentidos obscenos. Então, você imagina a pessoa começar a falar involuntariamente palavras, inclusive palavras obscenas. Ou então, existem também... Eu já atendi um pai que tinha um filho que fazia gestos obscenos, e aí ele relatou para mim que ele havia apanhado na rua porque uma outra pessoa falou para ele assim: "Seu filho está fazendo gestos obscenos para mim." Aí, ele falou: "Mas o meu filho tem Tourette". E aí o outro senhor falou para ele: "Ah, que Tourette! O seu filho é mal-educado!" E aí ele partiu para cima do pai do menino. Existe a ecolalia também, que é quando a pessoa com Tourette repete a última palavra que ela ou a outra pessoa com quem ela está conversando falou, ou repete a frase dela ou da outra pessoa com quem ela está conversando. Eu hoje presido a Astoc, que foi fundada em 1996 por quatro mães com filhos com TOC e síndrome de Tourette. O objetivo da Astoc: ela foi fundada para difundir informação. Então, essas mães se deram conta de que não havia informação sobre TOC e Tourette, e aí elas resolveram se unir e fundar a Astoc, para promover encontros educacionais, para difundir informação, para que as pessoas tivessem acesso ao que é o Tourette, às formas de tratamento de Tourette. |
| R | Em 2014, tornou-se Astoc ST, e eu passei a dirigir a Astoc. Hoje na Astoc nós temos sete grupos de apoio tanto para as pessoas com TOC e Tourette como para os seus familiares. Também promovemos, duas vezes por ano, encontros educacionais, respondemos a e-mails e WhatsApp de todo o Brasil, e a gente faz uma coisa que, para mim, é o mais interessante de tudo, que é a entrevista de orientação e triagem, que é aí onde eu recebo essas mães com os seus filhos com Tourette e é onde a gente vê o quanto falta informação sobre síndrome de Tourette: não existe informação sobre Tourette no SUS, nas escolas, as crianças sofrem muito preconceito. Nessas entrevistas, a gente acolhe, orienta, passa uma psicoeducação... E uma coisa também que é muito interessante é que essas crianças chegam para a gente com um sentimento de serem únicas. O que elas relatam é: "Eu nunca vi ninguém fazendo tiques como eu" ou "Eu nunca vi ninguém parecido comigo". E lá na Astoc elas têm a oportunidade de pertencer a um grupo em que existem outras pessoas com o mesmo problema que elas. E isso é fantástico - o Alexandre vai falar um pouquinho mais, a Regina vai falar um pouquinho mais -, pois poder estar com outras pessoas com o mesmo problema que você é muito bom. Crianças com síndrome de Tourette - principalmente crianças, mas adultos também - geralmente sofrem bullying. Bullying são todas as formas de atitudes agressivas, intencionais e repetitivas. A autoestima das crianças é formada no ambiente em que elas vivem, e os ambientes principais da criança são o ambiente familiar e o ambiente escolar. A escola e o ambiente familiar para a criança são muito importantes. Hoje é muito comum a gente perceber lá na Astoc que as escolas não estão preparadas para receber essas crianças com síndrome de Tourette. Uma criança com síndrome de Tourette precisa de atenção especial, precisa que o professor conscientize toda a classe do que ela tem, por que é que ela emite esses sons; ela precisa de cuidados especiais para fazer prova - muitas dessas crianças não conseguem fazer prova junto com uma turma, até porque elas podem atrapalhar a turma com os tiques, ou elas, muitas vezes, não conseguem terminar em tempo hábil. Então, é preciso dar mais tempo para essa criança. Muitas vezes, essa criança, devido aos tiques, não consegue copiar a lição. Então, também a gente sugere aos professores que permitam que esses alunos gravem a aula, ou que eles tenham um ajudante, ou que a escola forneça esse ajudante ou alguém da família para que copie a lição para essas crianças, pela dificuldade de copiar. Outra coisa que a gente também frisa para os professores é: algumas crianças com síndrome de Tourette conseguem suprimir os tiques por algum tempo. Só que, em algum momento, elas vão precisar sair da sala para colocar todos esses tiques para fora. Então, que a criança tenha um acordo com esse professor para que ela tenha um lugar, seja na sala da coordenação ou uma sala especial, para que, quando ela precisar sair para fazer os tiques, ela saia sem alarde. É muito importante a informação. Infelizmente, por falta de informação, as pessoas com Tourette sofrem discriminação, inclusive, dentro de casa. É comum também a gente atender lá na Astoc familiares que relatam para a gente: "Ah, várias vezes eu já pedi para o meu filho parar. Ele fica fazendo esses barulhos o tempo inteiro em casa". Cabe a nós, psicólogas, que conhecemos o assunto, orientar: "Olha, ele não faz os tiques porque ele quer. Os tiques são involuntários. Ele não consegue não fazê-los. Quanto mais você pedir para ele parar, mais ele vai fazer, mais ansioso ele vai ficar e mais ele vai fazer os tiques". Em muitos colégios, os professores... Acredito que na maioria dos colégios, os professores, os coordenadores não conhecem a síndrome de Tourette. |
| R | Eu venho aqui hoje pedir, eu gostaria muito de solicitar a emissão de cartilhas informativas com o intuito de esclarecer e informar professores e coordenadores sobre a síndrome de Tourette, sobre como conduzir um aluno com síndrome de Tourette na escola. Isso é muito importante. A gente tem o Alexandre e a Regina aqui que vão falar um pouquinho da experiência deles, e é terrível o quanto essas crianças do Tourette sofrem preconceito na escola. Eu já atendi a um menininho que foi convidado a se retirar da escola porque fazia tiques. Saúde pública: outro problema que a gente encontra lá na Astoc. Como eu falei, a gente responde e-mails, WhatsApp do Brasil inteiro. E é muito frequente chegarem mães, famílias dizendo que não encontram profissionais especializados em saúde, especializados em Tourette, é muito difícil mesmo. E eu sempre costumo dizer que, se você quer um tratamento de ponta, excelente, você tem que ir para São Paulo. Isso é muito triste, porque poucas cidades têm profissionais da saúde que conhecem a síndrome de Tourette. Então, se a gente pudesse também proporcionar, pelo menos para a rede pública, cartilhas com informativos, explicando o que é Tourette, por que acontece, formas de tratamento, maior disponibilidade e diversidade de medicação nos postos de saúde, talvez um maior acesso a tratamentos psicológicos... A psicologia pode ajudar. Quando a gente atende a uma criança com síndrome de Tourette, a gente tenta entender quais são os motivos que o deixam ansioso, quando ele tem maior frequência de tiques e menor frequência, por que isso ocorre, e também a gente tenta ensiná-lo a colocar comportamentos concorrentes no lugar do tique. Por exemplo, se ele faz um tique de jogar o braço para o lado... Algumas pessoas com síndrome de Tourette sentem esquentar, uma quentura antes de emitir o tique. Então, a gente consegue em alguns momentos colocar... Se você vai esticar o braço e você percebe, você pode tentar parar no meio e colocar no bolso, colocando comportamentos que concorrem com o tique. Outra coisa que seria muito interessante seria um projeto para incluir pessoas com síndrome de Tourette no mercado de trabalho, porque isso também é muito complicado. Eu tenho uma paciente que tem Tourette, ela trabalha numa empresa grande, hoje está num cargo bom e tem diversos apelidos por emitir os tiques, tanto vocálicos quanto motores. Solicitamos também uma data e/ou uma semana de conscientização da síndrome de Tourette para que a gente consiga divulgar a informação, para que as pessoas da área de saúde - eu vou bater muito nisso - e as escolas tenham informação sobre a síndrome de Tourette. Acontece de crianças não quererem frequentar a escola por estarem sofrendo bullying por terem tiques. E isso é muito triste. |
| R | Na Astoc, como eu falei, as crianças chegam e, na primeira entrevista de orientação e triagem, são só as psicólogas. É muito comum as crianças chegarem com os pais e se frustrarem, porque ela acham que lá elas vão encontrar um monte de outras crianças com Tourette. E a gente fala: "Não, elas não estão aqui. Há um dia específico em que você vai ter essas dinâmicas para encontrar outras crianças". A gente já está no terceiro encontro de vivências e confraternizações de jovens com tiques e síndrome de Tourette e desde então tem sido um sucesso. Todo mês a gente também tem grupos de apoio para pessoas com Tourette. Segue o site da Astoc. No ícone de Tourette a gente tem, rolando até lá embaixo, o Guia do Professor, com todas as informações de como proceder com um aluno com síndrome de Tourette. Há o meu e-mail também, se alguém quiser escrever para mim. Obrigada. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Agradeço também, Larissa, e quero dizer das boas explicações que estão sendo dadas para sensibilizar e conscientizar o Congresso Nacional e ao mesmo tempo a sociedade que nos acompanha pelos meios de comunicação. É impressionante mesmo! Quem não está no dia a dia, no cotidiano, se impressiona muito com a descrição que está sendo feita. Obviamente impressiona muito, mas exige atitudes na áreas da saúde, da educação, do trabalho, da legislação, como vem sendo sugerido. Antes de passar a palavra ao Alexandro, eu só quero dizer que a Yasmim da Silva, de Pernambuco, mandou também uma mensagem: "Qual é o plano para facilitar o convívio social da pessoa que possui a síndrome de Tourette?" É o que está sendo falado. "Há meios de prevenção? E o impacto econômico?" - que também foi abordado. O Lázaro Gomes, do Espírito Santo: "Quais as medidas atuais dos governos nesse quesito?" A gente estimula que mais pessoas também possam mandar as observações. Passo a palavra, então, ao nosso amigo, Alexandro Cardoso, com quem a gente já conversou várias vezes aqui no Senado. Com a palavra, Alexandro. O SR. ALEXANDRO CARDOSO (Para exposição de convidado.) - Boa tarde, Sr. Presidente, e todos aqui presentes, a Comissão representativa, todos os Parlamentares. Eu estou aqui em nome de todos dos portadores e também de todas as famílias que sofrem desse mal tão sério e que precisa realmente de muita atenção do Governo e das escolas, como a nossa amiga falou. |
| R | Meu nome é Alexandro Cardoso, tenho 38 anos, sou divorciado, tenho uma filha de 7 anos de idade. Hoje eu sou estudante de Psicopedagogia lá na minha cidade. Por que eu escolhi esse curso? Porque lá na minha infância, quando eu comecei os tiques, os sintomas, não tive professor, não tive orientador, não tive gente que fosse profissional na área e que me ajudasse a controlar as minhas emoções na escola e em casa. Então, hoje, o meu papel como estudante de Psicoeducação para futuramente atuar nessa área é justamente fazer aquilo que eu não tive no passado. Eu quero ser esse apoio para jovens e crianças que hoje iniciam com Tourette, os tiques, e não têm esse apoio nas escolas. Então, é muito sério, e eu quero muito deixar aqui claro que o Governo, as escolas precisam realmente sabe o que é a síndrome de Tourette. O Governo precisa investir dinheiro, investir também em ações públicas. As escolas precisam realmente entender como agir diante de uma criança com síndrome de Tourette. A Larissa falou muito bem. Lá na Astoc, no final do site, há o Guia para Professores. É importante que nós, psicoeducadores, possamos realmente ler esse tema. Os meus tiques começaram com oito anos de idade. Começou com um piscar de olhos, face, abrir boca, levantar os ombros, começou também a minha gagueira. Então, hoje, vocês vão me ver um pouco gago também devido talvez a um pouco de nervosismo, o que é normal, não é? Junto com os tiques motores e vocais, também começaram o TOC e o déficit de atenção com hiperatividade. Eu lembro que lá na minha infância, quando eu estava no meu 2º, 3º, 4º ano do ensino fundamental, os meus pais pediram para uma tia minha ir à escola e ficar me vigiando para ver se eu fazia ou não bagunça, se eu era hiperativo, se eu incomodava os colegas de escola. As próprias professoras - lembro até hoje -, todas elas, cobravam-me muito. Eu ficava de castigo no canto, naquele canto da parede. Eu ficava ali meia hora só porque incomodava os colegas. Tudo isso aconteceu comigo no passado. Em casa, também fui castigado pelo pai, pela mãe. Por quê? Porque não havia conscientização, não havia conhecimento sobre o caso em casa, na escola. Então, hoje, o que eu digo? Eu não condeno meus professores, não condeno os meus pais, porque não havia conhecimento. Eu jamais posso condenar alguém por fazer algo que não sabe que é errado. Isso é justo. Eu fui muito discriminado na família, na escola. Comecei o tratamento mesmo aos 14 anos, quando eu cheguei em casa depois de um curso, chorando, chorando muito. E os meus pais viram que aquilo que eu tinha era algo sério, não era nada de cacoetes normais ou que era vergonhoso ou que era coisa da minha cabeça. Muitos pais acham que os filhos tiram coisas da cabeça, que inventam coisa. Não é isso, não. Realmente, é uma doença, é uma doença que se agrava com o passar do tempo. Então, houve muita discriminação em toda a minha vida. Aos 14 anos, comecei o tratamento com o Tofranil; depois, passei para o Haloperidol. E ai foram outros medicamentos até eu chegar no Orap. Eu fui um dos usuários do Orap. Gente, eu usei por 15 anos o Orap, 15 anos! O meu primeiro médico que me orientou a usar Orap foi assim bem verdadeiro. Ele falou assim: "Esse vai funcionar". E, realmente, funcionou. Tomei Orap com a Fluoxetina na época. Depois, futuramente, troquei pelo Escitalopram. |
| R | O Orap, no ano passado, como sabemos, foi descontinuado pelo laboratório e, no ano passado, até este ano ainda, em fevereiro, janeiro, dezembro, eu passei muito aflito, fiquei muito aflito e desesperado. Por que o medicamento que é tão bom para mim, faz bem para saúde, me faz viver bem foi cancelado? Por quê? Não há motivo. Então, eu cheguei à consulta com o doutor lá, o meu psiquiatra, e disse assim: "Doutor, não pode isso. Como eu vou viver sem o Orap?" Eu tive que cortar bruscamente o Orap, cortar em questão de dois, três dias. Acabou a caixa e tive que já trocar para o outro. Ele me receitou o Respiridona e esse Respiridona, em mim, me levou para o hospital. Gente, é sério, me levou para o hospital. Eu fiquei com uma sensação de nódulo na garganta - estava escrito na bula, acontece isso mesmo -, fiquei com falta de ar, muita falta de ar. Eu fui para o hospital e aí, no dia seguinte, eu fui encaminhado novamente a uma consulta. Consegui, graças a Deus, uma consulta de emergência com o meu psiquiatra. Ele falou assim: "Não, então, agora, você vai tomar o Aripiprazol". Umas três, quatro caixas ele me deu de graça, ele tinha lá no consultório dele. Hoje, eu tenho que comprar com o meu dinheiro, e é caro, é muito caro. Então, o Orap, para mim, faz muita falta, muito falta mesmo. Se hoje o laboratório, graças a Deus, tomara que consiga, que tenha essa visão de voltar para o mercado, eu vou voltar a tomar o Orap, porque faz muito bem e muitos portadores que eu conheço, do Brasil inteiro, usam Orap. O meu próprio psiquiatra disse para mim que só ele tratava quatro, cinco pacientes com o Orap. Então, é muito, muito sério mesmo. Aí, eu pergunto assim: quantos pais hoje agem da mesma maneira que meus pais agiam, de cobrar o filho pelos tiques que estão fazendo? Não é culpa do filho. É culpa da doença. Então, é muito importante essa conscientização. Nós estamos aí brigando pelo Dia Nacional, o dia 7 de junho. É importantíssimo, porque esse dia vai ser de referência nacional, como é referência mundial também. Lá em Santa Catarina, eu já conversei com um Deputado Estadual na Alesc e já está sendo providenciado o dia também e o mês em Santa Catarina. Na minha cidade, em Joinville, eu também fui à Câmara de Vereadores, já está sendo criado também o projeto e está em tramitação. Então, é importante que esse dia seja realmente aprovado. Realmente, é muito importante, gente. Outra coisa: quantos professores castigam os seus alunos pelo simples fato de o aluno fazer barulho na sala? É um barulho vocal, é involuntário, não é culpa do aluno. É aquilo que a Larissa falou: é preciso que o professor saiba o que o aluno tem e o encaminhe para uma sala especial, às vezes, um atendimento especial, com psicopedagogo, um atendimento realmente de qualidade para aquele paciente, para aquela criança. É importante. Eu não tive isso e, agora, daqui para frente, eu vou começar a fazer isso como psicopedagogo. |
| R | Então, na minha cidade hoje, eu já criei um grupo no WhatsApp de portadores do Estado. Eu estou assim movimentando os portadores do meu Estado para a gente estar trabalhando nisso também nas escolas. Eu, pessoalmente, fui para a Alesc conversar com a Secretaria de Educação do Estado, eu pedi autorização, pessoalmente, junto com o Deputado, para a Secretaria de Educação, e eu fui autorizado por ela a ir nas escolas falar sobre o tema. Então, eu estou indo, eu estou realmente indo e fazendo a minha parte. Outra coisa... Aqui já falei, beleza, tudo bem. Eu tenho hoje tiques no pescoço também, tanto tique vocal, a gagueira, tiques no pescoço, que é contrair a musculatura, tenho no ombro, abdômen, joelho. Já fiz tratamento para joelho por causa das dores, já fiz tratamento para o ombro por causa das dores. Hoje eu estou com duas hérnias de disco na minha cervical e as dores são diárias, não para a dor. Então, eu estou em processo de ficar pelo INSS fora do trabalho, normal, por causa das dores. E o que acontece? Os tiques fazem doer o pescoço, uma dor crônica, realmente crônica, a dor e a ansiedade fazem aumentar os tiques. Então, é um ciclo de dor que não para, realmente não para. E agora estou assim, semana que vem, vou para o neurologista para ver o que se pode fazer em cima dessa dor. Então, gente, é preciso que o Governo e todo o Poder Público se conscientizem sobre a gente. Eu, como portador, peço e peço humildemente mesmo. Eu me sinto, às vezes, excluído um pouco da sociedade, porque, às vezes, lá na minha cidade eu não consigo participar, talvez, de um cinema ou ir a uma escola. Na minha escola mesmo, quando faço prova, prova escrita, discursiva, eu tenho aquela dificuldade de escrever, a disgrafia também tenho, um pouco de dificuldade. Então, às vezes, eu posso ser prejudicado na escola por causa disso, mas existem crianças também nas escolas públicas que também têm o mesmo problema, que não têm esse auxílio dos professores. Então, já falei sobre essa questão e agora eu vou resumir, terminar aqui a minha fala, dizendo o seguinte: nós estamos aqui como portadores, portadores, profissionais de saúde, psicólogas, então, nós precisamos nos unir, Governo Federal, Municipal, Estadual, associações, eu, como portador também, estou junto com isso, porque existem famílias de renda baixa, existem famílias com dificuldade de até mesmo conseguirem a própria alimentação diária e existem portadores nessa família. Eu conheço um jovem daqui de Brasília que, desde os 12 anos de idade, 12 anos, não frequenta a escola, porque lá, com 12 anos, sofreu bullying, só um bullying e saiu do contexto social. Hoje ele vive dentro de casa. Eu estive, no ano passado, em maio, visitando ele. Ele foi me receber na porta da casa dele. Só que, quando eu fui me despedir, esse jovem não foi no portão, porque ele não vai nem no portão de medo. Aquela fobia é tão forte, que ele tem, não vai nem no portão, porque tem medo que alguém veja ele com tique. Então, isso é muito grave, gente. É muito grave mesmo. |
| R | Não podemos aceitar que uma sociedade tenha esse poder de oprimir as pessoas. Temos que ter realmente liberdade de nós, portadores, sermos dignos: dignidade de viver na escola, dignidade de participar de um concurso, dignidade de fazer uma faculdade, de ter um emprego. Há portadores no Brasil que não conseguem emprego. Eu, graças a Deus, trabalho há 20 anos numa empresa particular, na verdade, privada. Então, eu já sou profissional na área, na área de mecânica, ferramentaria e usinagem. Então, eu sou referência nessa empresa naquilo que eu faço, só que eu, infelizmente, preciso me afastar, porque as dores tiram a minha atenção, as dores e os tiques tiram a minha qualidade de fazer o serviço bem feito e realmente preciso de auxílio do Governo, tanto que o INSS não deferiu os meus pedidos de encosto - a gente fala assim -, de afastamento e eu entrei com dois processos em cima do INSS, porque eu preciso ficar fora. Então, nós precisamos ter essa ajuda do Governo. Então, para terminar, eu gostaria de agradecer ao Senador e a todos da Mesa. Agradeço também ao Senador Romário e à Mara Gabrilli pela oportunidade e a todos que estão aqui presentes, que tiraram seu tempo para nos escutar. Eu gostaria de lançar aqui somente uma pergunta: quantas pessoas com as mesmas características minhas e da nossa amiga Regina hoje não podem ir nem à padaria comprar pão, porque se sentem excluídas da sociedade? Eu falo em nome delas. Eu, a Regina e todos estamos aqui falamos em nome dessas pessoas. Então, eu preciso estar aqui como voz dessas pessoas e, então, peço a Deus que realmente nos ilumine. Deus está aí iluminando todo mundo. Obrigado e tudo de bom. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Muito bem. Eu agradeço ao Alexandro Cardoso. Eu sempre digo: nada mais válido e mais importante do que as próprias pessoas, as suas famílias falarem sobre do que precisam, do que necessitam, o que é importante; é a autodefensoria, autoadvocacia. Eu acho que, Alexandro, isso é muito importante, com o apoio dos profissionais que atuam nessa área. Então, aí fica um círculo completo para que isto sensibilize os órgãos públicos, a sociedade e a comunidade sobre os desafios que vocês enfrentam. Muito bem. Eu passo, em seguida, a palavra para Regina Aparecida da Silva Amorim, que também já conheço. A SRA. REGINA APARECIDA DA SILVA AMORIM (Para exposição de convidado.) - Boa tarde, Sr. Presidente. Boa tarde a todos os portadores de Tourette que estão aqui presentes, aos familiares e amigos. Meu nome é Regina Aparecida da Silva Amorim, sou natural do Espírito Santo, tenho 48 anos, mas há 44 anos que eu já resido em Brasília. Eu quero começar diferente. Eu quero relatar três situações que aconteceram na minha vida, situações que me deixaram assim muito humilhada. Eu na época tinha um namorado que morava em Salvador e eu estava indo passar umas férias de Carnaval em 2008. A minha viagem foi supertranquila para Salvador, mas, na volta, eu tive muito tique, muita ecolalia, coprolalia - é porque há uns três - e gritava muito no aeroporto. E, nisso, eu cheguei a entrar até no avião. O piloto achou estranho e pediu que a aeromoça fosse falar comigo para saber o que é que estava acontecendo. E eu falei que eu tinha uma síndrome, que eu era portadora da síndrome de Tourette, estava tendo uma crise de ansiedade e não sabia por que aquelas palavras estavam vindo na minha boca. Eu gritava: "Socorro, o avião vai cair!". |
| R | Aí, imagina, você, dentro do avião em si, já fica nervoso, e uma pessoa desse jeito, gritando que o avião vai cair, que... Aí, todo mundo: "Gente, essa mulher está com problema! Eu estou com medo, eu não quero mais embarcar nesse avião". Aí me tiraram da poltrona e me levaram para a cabine do piloto. O piloto conversou comigo e foi muito educado. Perguntou o que eu tinha, o que era aquela síndrome. Eu fui explicar direitinho o que era que estava acontecendo, e ele falou que eu não iria embarcar naquele voo, porque iria haver conexão. E que eles iriam me colocar no próximo voo que vinha direto para Brasília. Aí, quando eu saí da cabine, havia uma médica dentro do avião. Ela pediu que ela me acompanhasse, que ela trocaria de lugar comigo. O pai dela viria no meu lugar e eu, no lugar dele. E eles não deixaram. Aí mentiram, dizendo que eu iria embarcar no próximo voo: me levaram para uma sala e me deixaram três horas nessa sala. Nisso, ligaram para o meu namorado. Ele foi me buscar. Chegou lá e percebeu que eu estava muito humilhada, de cabeça baixa, em cima da mala, chorando muito - até me emociono. E eles falaram que eu não ia poder embarcar, me tiraram de lá e me mandaram embora. Eu estou muito nervosa! Aí, nisso, eu voltei para a casa dele e tentei várias viagens de volta: de madrugada, uma da manhã, duas da manhã, três da manhã e nada. Isso foi na Gol, na Webjet e na Latam. E nenhuma dessas empresas aéreas me aceitou. Voltei, procurei um médico especialista, um neurologista, que me fez uma consulta - na época, foi muito cara essa consulta que paguei. Passou a medicação, tomei a medicação bastante forte - eu nem me lembro qual era essa medicação; eu sei que eu não podia tomar. E voltei de ônibus. O que eu iria gastar em duas horas de voo gastei 26 horas de ônibus. Então, vim numa viagem praticamente dopada, sem saber quem era eu ou o que eu estava fazendo. Meu namorado, na época, era fotógrafo, tinha compromisso e teve que pedir a alguém que fotografasse para ele. Ele me acompanhou até Brasília. Eu vim praticamente sem saber de nada: ele me acordava para comer, me dava água. Cheguei em Brasília e minha irmã já estava me esperando na rodoviária. Então, me levou para casa, eu não consegui tomar banho sozinha, tudo por ajuda. E, na época, eu trabalhava no Ministério das Comunicações. Eu trabalhava na consultoria jurídica, com uma advogada. E eu relatei tudo o que aconteceu, os acontecimentos a ela, e ela pediu que eu protocolasse todo aquele documento, porque daria um processo ganho. E foi isso que eu fiz. Aí, de 2008, durou nove anos! Eu consegui ganhar. Ganhei na Justiça. Eu briguei muito para ter meus direitos e consegui. Hoje... Eu passei cinco anos sem conseguir entrar dentro de um avião. Hoje eu já quebrei o trauma, superei meu trauma, mas, se eu precisar hoje viajar, na hora em que entro lá no check-in, na entrada, já é tudo passado. Já sabem o que é a síndrome de Tourette. Alguns ainda não sabem, mas muito já conhecem. E a segunda foi dentro de um ônibus. Eu, saindo do meu trabalho, peguei um ônibus na Rodoviária do Plano, aqui de Brasília. Quem conhece a Rodoviária sabe que lá não é um lugar agradável das 18h até as 20h. Eu comecei a ter crise de ansiedade de novo, porque a síndrome de Tourette se manifesta muito rápido. Você está bem e, de repente, você começa a gritar, vêm pensamentos que você não sabe por que vêm. Pensamentos suicidas eu nunca tive, mas pensamentos e palavras esquisitas, xingar nomes feios... Vou até citar os nomes, palavrões, nome do diabo, satanás. Quem me vê desse jeito pensa: "Essa mulher é maluca, é doida. Ela tem algum problema espiritual". Nisso, eu entrei no ônibus, sentei na frente, porque eu sempre gostei de sentar na frente, e já comecei a gritar outra vez, falando que iria ter um assalto no ônibus, que eu estava passando muito mal. Fiquei gritando, gritando, e as pessoas começaram a ficar apavoradas. O motorista me perguntou se eu estava bem, e eu falei que não, que eu estava tendo crise de ansiedade. Uma moça se levantou, perguntou se eu queria me sentar no lugar dela, porque o ônibus estava muito cheio, e ela foi conversando comigo. Ao conversar, eu fui me distraindo e consegui chegar até a minha casa. |
| R | Quando eu desci do ônibus, me acabei, desabei, chorei muito. Eu me senti a pior pessoa do mundo, porque... Eu não tive coragem de atravessar a roleta, eu tive de descer pela frente, porque todo mundo estava me olhando. Então, eu me senti péssima. Eu pedi que o motorista abrisse a porta da frente para eu descer, e ele foi bem compreensivo; abriu, eu desci. Eu parei no primeiro lugar que eu encontrei, encostei e chorei bastante mesmo, para tirar tudo aquilo que estava dentro de mim e fiquei dois dias sem ir ao meu trabalho com medo de andar de ônibus de novo. Eu sempre tive medo de ônibus, não por causa do ônibus; por causa das pessoas que você tem de enfrentar, por causa do preconceito, por causa da discriminação. As pessoas não compreendem, não sabem o que é. Muitas me veem e me perguntam: "Moça, o que você tem? Você está bem?". Aí eu vou explicar: "Eu tenho síndrome de Tourette. Você conhece?". "Ah, eu já assisti a um filme". E eu começo a explicar para a pessoa. Muitas se comovem e dizem que vão começar a escrever e a divulgar. A terceira situação foi no trabalho. Eu tinha feito um processo seletivo para trabalhar em um Ministério. Não vou nem citar o nome do Ministério. Eu passei nesse processo. Foi praticamente um dia todo de prova, e eu consegui passar na prova. Iria começar dois dias depois. Comecei a trabalhar e, em menos de uma hora e meia, eu fui retirada três vezes da sala de trabalho, eu ia passando de uma sala para outra, por causa do barulho. Eles falavam que estava atrapalhando, que estava tirando a concentração, que não havia como trabalhar com pessoas que gritavam o tempo todo, que não falava coisa com coisa. A moça que fez o contrato me chamou e falou que iria me levar para outro órgão. Chegando ao outro órgão, a mesma coisa aconteceu. Aí, eu falei que eu não queria mais, que que queria ir embora. Eu pedi e saí sala e, mais uma vez transtornada, sem saber o que se passava comigo. Chorava bastante, ansiosa, nervosa. Porque a síndrome, quanto mais ansiedade, mais nervosismo, mais ela vem, mais ela ataca. Então, quando se está em período mais tranquilo, mais feliz, a gente costuma ficar tranquilo. Mas, se estiver passando por problemas, por dificuldades, se alguma coisa estiver te atrapalhando, a tendência é ficar pior, cada vez mais pior. Tudo começou aos meus nove anos de idade. Eu comecei a ter muitos tiques. Na época, eu não tinha ecolalia nem coprolalia; eu tinha muitos tiques motores. Eu tinha necessidade de tocar nas coisas. Se houvesse uma poça de água no chão, eu tinha de bater a mão naquela água. |
| R | Na escola eu tinha apelido de quá-quá, de grilo falante, de maluca. Professores já chegaram, porque eu gostava de sentar na frente, a me colocar no fundo, porque eu estaria tirando a atenção das crianças, e elas não iriam aprender. Nessa época até de macaca essa professora me chamou. Então, para eu conseguir terminar o ensino fundamental foi bem difícil. Quando chegou o ensino médio, foi outro sacrifício; eu não queria mais estudar. De tanto sofrimento que eu passava em sala de aula, eu não queria mais estudar. Até que um belo dia eu resolvi: "Hoje eu vou estudar, eu vou enfrentar, porque, se eu não enfrentar, o que vou ser na vida um dia?". Aí me matriculei no Sesi de Taguatinga e consegui terminar meu ensino médio. Fui muito bem recebida pelos professores. Como a Larissa falou, para um portador de Tourette estudar, tem que fazer prova separada. Eu comecei assim: eu pedia para fazer prova na sala dos professores, porque eu sabia que iria atrapalhar o meu amigo e acabava atrapalhando a mim também, porque tirava a minha atenção. Eu ficava tão nervosa que eu não conseguia me concentrar, porque estava preocupada com o outro. Eu ia para as outras salas e fazia a prova. Em concurso é a mesma coisa. Eu faço concurso separada, tanto que, quando me ligam para saber por que eu quero sala reservada, acham que eu tenho alguma doença contagiante. Mas eu digo: "Não. Eu tenho síndrome de Tourette." E tenho de explicar o que é para eles, para entenderem por que eu necessito da sala só para mim. Quanto à família, no começo dos meus nove anos, eu não tenho o que culpar os meus pais nem minha família. Eu venho de uma família do Espírito Santo. Meus pais não sabiam praticamente ler e eles vieram para Brasília para a gente estudar. Então, na época... Imaginem o final da década de 70, em 1979! Se hoje a gente já sofre esse preconceito, essa discriminação, essa palavra feia, imaginem em 1979 o que sofria um portador da síndrome de Tourette. Então, eu não culpo meus pais, eu não culpo ninguém que esteve comigo. A minha mãe foi uma guerreira, me ajudou demais. Ela me acompanhou o tempo todo nos hospitais até descobrir. Mas, quando vim a descobrir a síndrome de Tourette, eu já estava com 24 anos e foi no Hospital das Clínicas, em São Paulo. Eu rodei esta Brasília toda, tantos os hospitais particulares como os hospitais públicos. Havia uma clínica na Asa Norte chamada Frei Albino - foram até uns parentes que pagaram para mim -, onde se fazia ioga, massoterapia para dar uma relaxada. Na época, eu conheci uma enfermeira no HRAN que estava em estágio final de câncer e ela pediu que a minha mãe a deixasse ir com ela para São Paulo que ela iria marcar uma consulta e ainda iria conseguir a passagem pelo SUS, porque eu não tinha condições uma passagem aérea. Eu fui com ela até o Hospital das Clínicas. Chegando lá, os médicos fizeram todos os exames e pediram que eu voltasse no hospital cinco dias depois. Aí, fui diagnosticada com a síndrome de Tourette. Então, era para ser o dia mais feliz, porque eu descobri o que eu tinha, porque eu tinha aquelas manifestações que me deixavam triste. Eu me sentia, às vezes, como se fosse um bichinho de outro planeta, ninguém tinha aquilo que eu tinha. Era tudo diferente. Eu não gostei da resposta do médico, porque ele falou que eu não iria morrer pela síndrome de Tourette, mas eu iria morrer com ela. Parece que um buraco abriu no chão, e eu fiquei dentro sem saber o que fazer. Eu chorava muito. Eu falei que não queria ficar daquele jeito, que eu não queria chegar à velhice daquele jeito, que eu tinha muita coisa para fazer na vida, e ele pediu que a enfermeira entrasse para fazer a medicação, porque eu fiquei transtornada. Ele me disse para ter calma, que ele iria explicar direitinho. |
| R | Então, estou querendo dizer para todos, em meu nome e em nome dos meus amigos com Tourette, que a luta não é pequena, é uma luta grande. Quem sofre com isso não somos só nós, mas também as pessoas que estão ao nosso lado, quem nos ama. Que tenhamos força, nós vamos vencer. Com esta oportunidade que vocês deram para a gente, esta oportunidade maravilhosa de chegar até aqui, as portas vão se abrir, sim, a gente confia muito nisso. Agradeço também a todos os médicos, que nos ajudaram bastante. Eu tive muitos médicos bons aqui em Brasília: Dr. Nasser Allam, neurologista do Hospital de Base que me acompanhou durante 15 anos; um Psiquiatra, Dr. Danilo Costa, que me dá todas as minhas medicações, como o Aristab, que custa muito caro - ele me dá, não me cobra nada; até das minhas medicações eu faço doação quando elas não me servem mais. Tive psicólogas também. É que eu estava trabalhando, mas a empresa estava passando por um momento muito difícil no ano passado e mandou muita gente embora e eu acabei indo junto. (Soa a campainha.) A SRA. REGINA APARECIDA DA SILVA AMORIM (Para exposição de convidado.) - Devido a esse período, eu fiz várias e várias entrevistas, mas até hoje não consegui nada. Mas eu não vou desistir, a gente está aqui para lutar! Agradeço a todos vocês. Posso falar só mais uma coisinha? (Intervenção fora do microfone.) A SRA. REGINA APARECIDA DA SILVA AMORIM - É sobre uma conquista. Para vocês aqui é uma coisa bem simples a conquista que vou mencionar, mas para mim foi importante: eu estive num cinema, consegui assistir a um filme de três horas de duração sem gritar, sem que ninguém mandasse eu sair da sala, sem ninguém falar comigo. Para mim foi uma grande superação ter assistido a um filme de três horas de duração. Para mim foi uma das maiores realizações que eu já tive. Eu queria assistir ao filme. Tive medo, mas encarei e consegui assistir. Quero agradecer também a todos os presentes por terem vindo de longe, alguns vieram de São Paulo, a minha família, aos meus amigos e ao Sr. Presidente. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Agradeço à Regina também. Vamos trabalhar juntos agora para ver como encaminhar os assuntos. Eu só quero destacar que a gente recebeu vários depoimentos aqui: da Kesia, mãe do Davi Chaves, de dez anos; da Keoma Cardoso, que também tem... Da Edilena, lá do Ceará, que tem um filho com oito anos de idade; da Ilane Siviero, que é mãe do Maurício. São depoimentos importantes. Do Bruno, que está com 34 anos, um depoimento importante, assim como foram os depoimentos do Alexandre e da Regina. Acho que tudo isso vai nos ajudar a pensar sobre o assunto, e com vocês, juntos, vamos construir em conjunto. Eu passo a palavra agora para Jaqueline Silva Misael, que é do Ministério da Saúde, do Departamento de Atenção Especializada. |
| R | Eu já antecipo, Jaqueline, que, depois da audiência, nos próximos dias, a gente pode se encontrar com calma, olhar o que foi projetado e o que foi escrito e conversar com o apoio da Ivanilde, que está aqui, do Aires também, dos demais Senadores destas subcomissões, para a gente pensar no caminho a ser percorrido. Está bem? Então, Jaqueline, você está com a palavra. A SRA. JAQUELINE SILVA MISAEL (Para exposição de convidado.) - Primeiramente, boa tarde a todos. Senador Flávio, muito obrigada pela oportunidade. Agradeço o convite em nome do Ministro, em nome do nosso Secretário e do nosso Diretor, que não puderam estar presentes, mas fizeram questão de que o Ministério da Saúde estivesse nesta Mesa. Eu já participei de várias outras audiências, e eu sempre digo que é uma oportunidade para nós, do Ministério da Saúde, poder discutir temas de tamanha relevância, conhecer os problemas que os pacientes enfrentam, escutá-los, entender seu dia a dia e o sofrimento pelo qual as famílias passam. Então, para nós, é uma oportunidade imensa. Muito obrigada, mais uma vez, pelo convite. Eu me chamo Jaqueline. Eu sou servidora, trabalho numa coordenação que se chama Coordenação-Geral de Atenção Especializada. É uma coordenação que é responsável por diversas políticas públicas, políticas públicas de cardiologia, oncologia, traumato-ortopedia, doenças raras, enfim, várias especialidades que estão presentes no meio da saúde. O nosso Sistema Único de Saúde é permeado por diversas políticas públicas. É um sistema muito complexo e um dos maiores do mundo. Dentro do nosso sistema, nós temos ações desde uma vacinação até procedimentos muito complexos, como, por exemplo, transplantes, cirurgias cardíacas e assim sucessivamente. Todos esses procedimentos são realizados por uma equipe multidisciplinar, isto é, médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, psicólogos, farmacêuticos, enfim, diversos profissionais de saúde que, de maneira conjunta, visam trabalhar para garantir o melhor atendimento para aquela população. Uma das coisas que eu mais escutei aqui, de todas as pessoas que puderam falar um pouquinho sobre o tema, tanto os pacientes como os especialistas, foi o desconhecimento a respeito da doença na sociedade de forma geral. Isso não acontece apenas com essa síndrome, acontece também com outras doenças, com outras síndromes e outras situações que acometem os pacientes. Isso é muito comum, porque os profissionais lidam de uma forma geral com as doenças que são mais corriqueiras. Cabe a nós, ao setor público, e também a organizações sociais e empresas privadas, tentar desmistificar isso e passar conhecimento para a população a respeito das diversas doenças, proporcionar conhecimento para a população. Eu ia justamente propor isso, Senador. Coloco-me à disposição, coloco à disposição a nossa Coordenação-Geral para que a gente possa pensar na melhor forma de atender os pleitos relacionados à Síndrome de Tourette, que foram expostos hoje aqui. Eu fiz anotação de uma forma geral dos pleitos, coloco a nossa Coordenação à disposição. E digo que a luta é uma luta conjunta. Eu e meus colegas de trabalho não só da minha Coordenação, mas o Ministério da Saúde como um todo - falo especificamente da saúde, que é o órgão onde trabalho -, nós trabalhamos diariamente com o compromisso de levar as ações necessárias, os tratamentos necessários, o acompanhamento necessário e em tempo oportuno para as famílias, para as pessoas que sofrem de determinada doença e para os seus familiares, para que essa peregrinação, esse estigma que essas pessoas sofrem seja, de certa forma, minimizado na sociedade como um todo. |
| R | Então, mais uma vez, obrigada. Eu acho que a gente pode evoluir nessa agenda conjunta para poder pensar nas melhores formas de atender. Obrigada, Senador. Obrigada a todos. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Muito bem, agradeço à Jaqueline, que também representa aqui, nesta audiência, o Ministério da Saúde. E quero dizer que sempre falo em conjunto, porque nós deveríamos, eu penso, junto com a Dra. Ana Gabriela, junto com o Aníbal, junto com os portadores, sem dúvida alguma, também ter uma espécie de cronograma de atividades, Larissa, olhar o que foi apresentado nesta audiência pública. Algumas coisas são mais imediatas. A apresentação de um projeto de lei para termos o dia nacional ou a semana nacional, isso é feito de imediato, então, não haveria problema. O acesso a questões como, por exemplo, estar incluído lá na definição a gente pode já estudar e ver o que é necessário. Quanto ao acesso a medicamentos, nisso a Dra. Ana Gabriela pode nos ajudar até para a gente ir lá - não é, Jaqueline? - no setor de tecnologia para ver a questão dos medicamentos... (Intervenção fora do microfone.) O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Como? Do Orap, que foi interrompido, mas a partir de uma orientação da Dra. Ana Gabriela. Foi bastante levantada a questão da falta de conhecimento que leva a dificuldades na área da educação. Então, a área da educação, que não está aqui presente hoje também pelo fato de a gente não ter se lembrado de convidá-la, mas, de qualquer forma, na sequência, tem que ser convidada a participar desses encaminhamentos por causa das crianças, adolescentes, adultos. E a área do trabalho, que foi mencionada na pelo Alexandro - eu o chamei de Alexandre, mas é Alexandro -, para fazemos um cronograma com os objetivos principais, datas, tudo, para dizer que valeu a pena. |
| R | Senão a gente discute uma coisa sobre medicamentos, por exemplo, e os portadores e as famílias podem perguntar: "Mas quando isso vai ser resolvido? Será que vai demorar um ano, dois anos, cinco anos?". Então, para ter lá o que é necessário, discutir com a saúde, para ver se a saúde concorda ou não concorda, enfim, para chegarmos a um denominador comum e estabelecermos uma data para que haja tranquilidade, para que a pessoa seja bem atendida. Eu me surpreendi positivamente em relação aos casos mais refratários ao saber que medicamentos decorrentes da Cannabis vêm tendo um efeito bastante positivo, porque acabamos de apresentar um projeto sobre produção, pesquisa, prescrição, acompanhamento da Cannabis no Brasil. O projeto de lei está em tramitação também para tornar o tratamento, entre outras coisas, mais acessível, menos burocrático, mais barato inclusive. Às vezes, diminui em três, quatro, cinco vezes o custo atual. E que sirva também como elemento de pesquisa para as instituições nossas de ensino superior. Enfim, vamos pensar juntos. Por isso eu digo à Larissa, ao Alexandro, à Jaqueline, ao Aníbal, à Ana Gabriela que nós nos sentamos aqui e, pelos meios de comunicação a gente vai... Talvez a Ana Gabriela tenha que, na sequência, falar um pouco mais, porque, afinal, essa área de medicamento é bem específica, também, por toda a experiência que já tem nessa área. E os outros, inclusive a Regina, que levantou aqui, de Brasília mesmo, também podem ajudar. Estaria bem assim? Vocês acham que foi bom? Alguém gostaria de dizer mais alguma coisa? Porque nós temos uma dificuldade de horário. Às 16h começa a sessão do Plenário no Senado Federal. Alguém gostaria de complementar? Está livre. Caso alguém queira falar... A SRA. ANA GABRIELA HOUNIE - Se eu puder falar... O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Ana Gabriela com a palavra. A SRA. ANA GABRIELA HOUNIE (Para exposição de convidado.) - Eu agradeço a oportunidade para falar mais um pouco. Eu tenho participado também da luta a favor da Cannabis medicinal, porque eu tenho já uma experiência de quatro anos de tratamento de várias patologias. Tenho um caso de reversão de paralisia supranuclear progressiva, uma doença que não tem tratamento. Tenho vários pacientes com demência de Alzheimer, demência frontotemporal, que já tinham perdido habilidade da fala, da deglutição e estão voltando a falar e a deglutir. Então, as doenças neurodegenerativas têm uma resposta fantástica à Cannabis medicinal. Ao canabidiol puro, não. Tem que ser a Cannabis completa, com o THC e todos os outros componentes. Então, acho que é muito importante que a Casa escute as pessoas que trabalham com essas patologias e esses produtos para tentar desmistificar um pouco do que se trata a Cannabis. Porque se faz muito auê, se fala muito mal, como se tivesse só malefício, mas não. É uma planta que tem propriedades muito interessantes, é muito segura, embora tenha, claro, efeitos colaterais. Até água em excesso tem efeito colateral. A gente está administrando para nossas crianças e adolescentes medicações que também têm muitos efeitos colaterais, como a Ritalina, os antipsicóticos. Isso ninguém questiona, já está no hábito, prescreve-se sem problema, sem ponderação. Mas, quando se fala em Cannabis, todo mundo fica apavorado. |
| R | Então, se eu tiver oportunidade de voltar aqui para poder falar da Cannabis, eu vou ficar muito grata. Obrigada. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - O.k.! Alexandro. O SR. ALEXANDRO CARDOSO (Para exposição de convidado.) - Quero dar só mais um recadinho para o Ministério da Educação. Existem bastantes professores e médicos sendo formados, e não há, no currículo do curso, uma ênfase mais profunda em cima do tema. Eu sei de alunos de Medicina, que eu conheço, que participaram apenas de duas palestras durante todo o curso. Então, é preciso realmente fazer um trabalho na educação dos profissionais da saúde, em que realmente se inclua esse tema com mais propriedade nos cursos de Pedagogia, de Medicina, de Psicologia. É preciso haver um conjunto total desse tema na saúde, na educação, em tudo. Então, beleza! Até mais! O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Muito bem! O SR. ANÍBAL MOREIRA JÚNIOR (Fora do microfone.) - Senador... O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Aníbal. O SR. ANÍBAL MOREIRA JÚNIOR (Para exposição de convidado.) - Falando de forma reduzida, eu gostaria também de solicitar o empenho do Governo Federal no sentido de desenvolver políticas públicas para o atendimento desse tipo de portador de síndrome de Tourette. Nós precisamos que as universidades se envolvam nos estudos, nas pesquisas, na criação de ambulatórios. Nós precisamos muito de identificar quantas pessoas com síndrome de Tourette existem no Brasil. Precisamos que o Ministério da Saúde dê início ao desenvolvimento de um sistema para receber notificações de casos tanto pelos médicos como pelos postos de atendimento de saúde familiar, para que as UPAs, as escolas, todas as pessoas possam informar ao Estado a situação de pessoas, crianças, adolescentes e adultos, que têm a síndrome de Tourette, seja ela confirmada ou suspeita. Nós precisamos que o Estado passe a agir proativamente em relação à síndrome de Tourette, porque já está muito atrasado. Nós estamos muito defasados, somos muito negligenciados. Nós precisamos recuperar o tempo e precisamos investir nas universidades federais, para elas nos ajudarem com esses estudos epidemiológicos e com pesquisa científica sobre o tratamento, o controle e o atendimento nos ambulatórios. Normalmente, as universidades têm convênios com as prefeituras municipais, e elas podem usar os recursos dos Municípios para o atendimento nos postos de saúde e nas escolas. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Muito bem! Agradeço... A SRA. LARISSA MIRANDA - Eu posso só falar uma última coisa? O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Sim, Larissa. A SRA. LARISSA MIRANDA (Para exposição de convidado.) - Na AstocSt, há um banco de dados de pessoas com Tourette. A gente tem todo o registro deles. Só que não temos condições de abranger o Brasil inteiro, até porque essas pessoas não conseguem chegar até nós. A nossa sede fica em São Paulo. Então, a gente acolhe São Paulo e proximidades que ficam a uma hora de São Paulo, de onde as pessoas vêm. O Alexandro chegou até a gente. Então, temos até um banco de dados, mas, para ampliarmos isso, nós precisamos de ajuda também. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Eu quero destacar a presença da Presidente da Subcomissão de Doenças Raras, a nossa Senadora por São Paulo Mara Gabrilli. |
| R | Quero dizer à Mara que as pessoas aqui presentes estão representando o Ministério da Saúde, a associação nacional dessa área, os portadores da síndrome de Tourette. Também aqui está uma comissão de pessoas com a síndrome e a Dra. Ana Gabriela, que é médica, que expuseram seus pontos de vista, destacaram alguns fatos importantes, como a proposta de haver um dia nacional ou uma semana nacional de sensibilização, o acesso a tratamentos e diagnóstico. A Jaqueline, do Ministério da Saúde, destacou muito bem aquela que é uma fala recorrente, no sentido de se difundir o que é a síndrome, os tratamentos, a identificação. Há falta de conhecimento sobre isso. Nós, inclusive, propusemos à Jaqueline... Vamos chamar também o Ministério da Educação, porque foi falado muito das dificuldades que crianças e adolescentes encontram em termos do processo educacional por causa dos tiques, dos comportamentos, das falas, atrapalhando, de acordo com o conceito que se tem pela falta de conhecimento. Então, é preciso fazermos um trabalho integrado, colocarmos no papel uma agenda com um cronograma, para que possamos acompanhar a associação, as pessoas, os profissionais. De maneira muito interessante, a Dra. Ana Gabriela colocou, de maneira clara, os efeitos bastante positivos, não só nesta área, mas em outras, na área da doença mental, do uso da Cannabis medicinal. Então, isso é importante. Eu gostaria... V. Exa. deveria estar aqui, na verdade. A SRA. MARA GABRILLI (Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - SP. Fora do microfone.) - Não, imagine, Senador! O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Mas se pudesse também dar uma mensagem para o pessoal... Então, com a palavra Mara Gabrilli. A SRA. MARA GABRILLI (Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - SP. Para discursar.) - Eu queria cumprimentá-los. Quero parabenizar o senhor, Senador, e cumprimentar a todos. A Deusilene estava me alimentando com informação. Desculpem-me por eu não ter conseguido chegar aqui antes. Curiosamente, muito antes de eu pensar em entrar para a política, veio parar na minha mão um livro de Oliver Sacks. Não lembro se era Um Antropólogo em Marte ou O Homem que Confundiu Sua Mulher com um Chapéu. Acho que ele próprio, o próprio Oliver Sacks tinha a síndrome de Tourette. Ouvi falar que ele tinha a síndrome. Inclusive, ele foi visto em um hotel em São Paulo. Eu lembro que, na época, eu fiquei muito curiosa. Senador, eu não conhecia a síndrome praticamente, porque eu não trabalhava nessa área, mas eu lembro que isso me chamou muito a atenção. Então, estou muito feliz por estar aqui e por saber que há todo um movimento. Estou mais feliz ainda por saber que existem caminhos pela Cannabis medicinal. E, como a gente tem encontrado muitos, eu até aproveito, Senador... Eu já vi que o senhor protocolou o Projeto 4.776, de 2019. Eu me coloco à disposição, se precisar de Relatora, porque eu sou usuária de Cannabis medicinal. Então, quero contribuir muito com essa área. Acho que a gente está com um movimento, o próprio Ministério está com um movimento, o mundo está com um movimento importante nessa área. Então, quanto mais... É muito oportuno o seu projeto de lei. Então, contem comigo naquilo em que eu puder ajudar. |
| R | Eu sei o quanto uma doença rara impacta a família inteira, não só aquela pessoa que tem a doença rara. E, além de todo o impacto na família, porque a gente sabe que o primeiro passo é a saúde, mas há todo o trabalho que a gente busca a fazer, e o próprio Senador, como Presidente da Subcomissão da Pessoa com Deficiência, aqui da CAS. A gente tem que trabalhar todo o entorno, tem que trabalhar a acessibilidade, tem que trabalhar a calçada, tem que trabalhar a educação, tem que trabalhar outras dimensões da vida das pessoas, porque podemos ter a síndrome que for, todos nós temos que viver apesar disso, e com qualidade. Então a gente tem que ter esse olhar do todo, de tudo o que diz respeito. E aqui, acho que, no caso, saúde e educação são muito importantes. E está aqui, reassumo aqui meu compromisso com os brasileiros que, tendo alguma síndrome ou não, se encontram em caminhos muito mais vulneráveis, porque, quando a gente não tem uma cura específica de determinadas questões, a gente tem que ir na busca. Então contem com o meu trabalho aqui e o da minha equipe para a gente ir construindo política juntos. Não se esqueça de mim, Senador. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Lembro que esta audiência pública está sendo realizada aqui na Comissão de Assuntos Sociais (CAS), cujo Presidente é o Senador Romário, através das duas Subcomissões: a Subcomissão Temporária sobre Doenças Raras, que é presidida pela Senadora Mara Gabrilli; e a Subcomissão Permanente da Pessoa com Deficiência, que é presidida por mim. Então, quando a gente fala nessa agenda e no cronograma, que se conte com o apoio das duas Subcomissões e da própria Comissão e dos Senadores. Eu acho que é um tema que sensibiliza todo mundo, independentemente de Comissão inclusive. A SRA. MARA GABRILLI (Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - SP. Pela ordem.) - Com o Senador Romário, nós conquistamos três Subcomissões dentro da CAS, de que ele é Presidente. Então ele está por trás de todas elas. A terceira é a Subcomissão Permanente de Proteção e Defesa da Pessoa Idosa, que também está ligada à CAS. Então, estamos todos nós aqui, soldados, trabalhando. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Muito bem. Eu agradeço bastante a vocês: Regina, Ana Gabriela, Aníbal, Alexandro - agora estou acertando o nome; antes o chamava de Alexandre -, Larissa e Jaqueline. Agradeço a todos e todas que estão aqui presentes, à Senadora Mara Gabrilli, a outros que estão em outras Comissões também e a todos que estão participando aqui com a gente e que estão nos acompanhando pelos meios de comunicação do Senado. Vamos em frente, porque a gente tem que transformar a vontade, o desejo em ações. Temos que ser pessoas de fé, que acreditamos, e de obras, porque a fé sem obras é morta em si mesma. Então temos que acreditar, ter fé no sentido acreditar, vamos fazer e vamos trabalhar. O povo costuma dizer que o inferno está cheio de gente de boas intenções - não é verdade? -, que não transforma as boas intenções. E nós não queremos ir para o inferno, não é, Alexandro? Então vamos trabalhar para mudarmos a realidade junto com todo mundo. |
| R | Agradeço a presença de todos, e nada mais havendo a tratar... Quer falar alguma coisa? Não? Se quiser pode falar também. (Pausa.) Não? Quer falar? (Pausa.) Não? Pode falar. (Pausa.) Não? É só um "alô". Diga, então, "acabou a reunião". O SR. MATHEUS SANTOS DE OLIVEIRA SILVA (Fora do microfone.) - Acabou a reunião. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Pronto, obrigado! (Palmas.) (Iniciada às 14 horas e 32 minutos, a reunião é encerrada às 16 horas e 23 minutos.) |

