25/09/2019 - 2ª - Subcomissão Temporária sobre a Qualidade dos Gastos Públicos e Combate à Corrupção

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Texto com revisão

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A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - SP) - Boa tarde a todos!
Declaro aberta a 2ª Reunião da Subcomissão Temporária sobre a Qualidade dos Gastos Públicos e Combate à Corrupção da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 56ª Legislatura.
Submeto aos Srs. Senadores a dispensa da leitura e aprovação da ata da reunião anterior. (Pausa.)
A ata está aprovada.
Passamos para a primeira parte da reunião destinada à apresentação e votação do plano de trabalho da Subcomissão.
Passo a palavra à Relatora, Senadora Eliziane Gama.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA. Como Relatora.) - Sra. Presidente, Mara Gabrilli, vou proceder aqui à leitura do plano de trabalho.
A partir da aprovação do Requerimento da Comissão de Transparência, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor nº 4, ficou criada a presente Subcomissão Temporária sobre a Qualidade dos Gastos Públicos e Combate à Corrupção, cujo funcionamento dar-se-á durante 365 dias. A Subcomissão foi instalada em 3 de dezembro. Este plano de trabalho oferece uma proposta de organização das atividades a serem desenvolvidas pela Subcomissão ao longo do segundo semestre de 2019.
Conforme se demonstra na justificação do requerimento, compete à Comissão a avaliação da qualidade do gasto público, bem como a manifestação de opiniões sobre as políticas de prevenção à corrupção e de modernização de práticas gerenciais da Administração Pública.
Adicionalmente, o escopo da Subcomissão Temporária se alinha ao disposto no art. 96-B do Risf, já que a qualidade do gasto público, as práticas de governança e o combate à corrupção são relevantes aspectos da avaliação de políticas públicas e também para as avaliações de impacto legislativo. Ainda, os objetos da Subcomissão perpassam as atividades desenvolvidas pela Instituição Fiscal Independente e ao longo do processo legislativo orçamentário.
Os gastos públicos permitem a realização das políticas públicas e, assim, são instrumentos governamentais. O Ministério da Economia, por meio da Secretaria do Tesouro Nacional, em alinhamento com as práticas adotadas pelo Banco Mundial, define que a "qualidade do gasto público compreende a racionalização e a priorização da eficiência, da equidade e da sustentabilidade das políticas públicas".
Diversas instituições internacionais como a OCDE e o FMI vêm se engajando na difusão de técnicas e de instrumentos de avaliação da qualidade do gasto público nos países, quer seja na ótica da geração de receitas públicas, quer seja mediante mecanismos de controle e de avaliação das despesas realizadas.
No caso da Organização das Nações Unidas no Brasil, tanto o Escritório de Serviços para Projetos quanto o Escritório sobre Drogas e Crime promovem eventos e práticas de incentivo ao monitoramento e à avaliação de políticas públicas, com especial atenção ao combate à corrupção e à adoção de melhores práticas de governança no setor público.
Academicamente, estudos de monitoramento e avaliação de políticas públicas com ênfase nos gastos públicos apontam como referências internacionais as experiências conduzidas pelo Reino Unido, pelo México e pelo Chile. Quanto à governança e o combate à corrupção, reportam-se práticas bem-sucedidas nos Estados Unidos e, uma vez mais, no Reino Unido. Quanto à governança e o combate à corrupção, reportam-se práticas bem-sucedidas nos Estados Unidos e, uma vez mais, no Reino Unido.
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No Poder Executivo federal, a gestão da temática é descentralizada. O Comitê Interministerial de Governança é coordenado pelo Ministro Chefe da Casa Civil da Presidência da República e os demais membros são o Ministro de Estado da Economia e o Ministro de Estado da Controladoria-Geral da União.
A Secretaria da Fazenda e a Secretaria da Receita Federal do Brasil, ambas do Ministério da Economia, operacionalizam a política fiscal. Por sua vez, a Escola Nacional de Administração Pública e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) promovem estudos e outras reflexões acerca da gestão pública e dos recursos públicos no País, em vínculo com o Ministério acima citado.
Especificamente no combate à corrupção e à lavagem de dinheiro, destacam-se ainda as competências do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional, da Secretaria Nacional de Justiça, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, e do Conselho de Controle das Atividades Financeiras, que tem como missão "produzir inteligência financeira e promover a proteção dos setores econômicos contra a lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo".
Para o bom cumprimento da desafiadora tarefa a que se propõe, a Subcomissão pode realizar, inicialmente, as seguintes atividades: detalhamento, ajustes e aceite deste plano de trabalho; análise da legislação, regulamentos e normas correlacionadas ao tema, dividida inicialmente em três eixos, qualidade do gasto público, governança e combate à corrupção; análise de proposições em tramitação no Senado Federal e na Câmara dos Deputados correlacionadas ao tema, dividida inicialmente em três eixos, qualidade do gasto público, governança e combate à corrupção; levantamento de contribuições acadêmicas e de bibliografia sobre o tema; requisição de informações aos órgãos e entidades públicas competentes, em especial o Tribunal de Contas da União e o Ministério da Economia; identificação de partes interessadas no tema, dentro e fora da Administração Pública federal; realização de audiências públicas; realização de ciclos de palestras e debates; realização de visita técnica a projeto de referência internacional; e ações pelo e-Cidadania, com opiniões espontâneas e pesquisa de opinião por meio do Data Senado.
Ao fim de 2019, sugere-se a apresentação de relatório preliminar ao Plenário da Comissão reportando as primeiras atividades, ao passo que o relatório final deverá ser apreciado e votado pela Comissão até agosto de 2020.
Inicialmente, propomos uma programação. No entanto, outras contribuições, por exemplo, de audiências públicas e mesmo de diligências, poderão ser avaliadas no âmbito da Subcomissão, ensejando ajustes na programação.
Aqui nós temos um quadro, Presidente Mara, em que nós fizemos uma organização em que constam, por exemplo: em julho, nós teremos detalhamento e alterações da minuta do plano de trabalho.
No mês de agosto, nós teremos a divulgação e apresentação da minuta do plano de trabalho entre as assessorias.
Em setembro, teremos a instalação e eleição do Presidente, Vice-Presidente e Relator. Portanto, já foram executadas. Ainda em setembro nós teremos a aprovação do plano de trabalho, a reunião interna, discussão e estabelecimento de estratégia para execução do plano de trabalho, e o panorama do Estado sobre a qualidade do gasto público e práticas de governança, histórico e diagnóstico de situação e perspectivas da atuação federal no novo Governo.
Em outubro, panorama sobre ações de fiscalização e controle sobre a qualidade do gasto público e práticas de governança, histórico e diagnóstico da situação. Ainda no mês de outubro, nós teremos reuniões internas e solicitação de dados acerca da execução dos programas relacionados à temática.
No mês de novembro, nós teremos a análise de todas as informações, reuniões internas e também uma visão acadêmica sobre a temática com representantes de universidades federais e outros centros de pesquisa.
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No mês de dezembro, teremos a compilação de proposições em tramitação e de ações legislativas já identificadas ao longo dos eventos anteriores, reuniões internas e também apresentação dos principais achados de trabalho, uma discussão do que já foi feito, encaminhamento de propostas e aprimoramento do plano de trabalho para 2020.
Por fim pretende-se, no primeiro semestre de 2020, realizar um seminário internacional sobre qualidade do gasto, governança e combate à corrupção, com representantes do Governo britânico, por intermédio da Embaixada Britânica no Brasil, e se possível do Parlamento britânico, para que seja apresentada a experiência do país na temática. Pretende-se ainda que seja realizada uma comissão técnica, com visita in loco ao Reino Unido para que os Senadores, Presidente, Vice-Presidente e Relator da Subcomissão conheçam as práticas adotadas naquele país.
Este relatório, Presidente, eu peço que seja consignado em ata, porque é um detalhamento bem pormenorizado, mas encaminho para que possa ser dado como lido esse detalhe, esse pormenor. Eu acabei não entrando em cada um deles, mas está aqui.
Muito obrigada, Presidente.
A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - SP) - Em discussão o plano de trabalho. (Pausa.)
Em votação.
Aqueles que aprovam o plano de trabalho permaneçam como estão. (Pausa.)
Aprovado.
Segunda parte.
Antes de passarmos à audiência pública, submeto aos Srs. Senadores a aprovação do Requerimento nº 1 da Subcomissão.
ITEM 1
REQUERIMENTO Nº 1, DE 2019
Requer a realização de audiência pública com o objetivo de discutir o panorama do Estado sobre a qualidade do gasto público e práticas de governança, com enfoque no histórico e diagnóstico da situação, bem como nas perspectivas da atuação federal no novo Governo.
Autoria: Senadora Mara Gabrilli
Aqueles que concordam com a aprovação permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovado.
Convido para compor a mesa da audiência pública: Sr. Pedro Jucá Maciel, Subsecretário de Planejamento Estratégico da Política Fiscal da Secretaria do Tesouro Nacional, do Ministério da Economia; Sra. Diana Coutinho, Diretora de Seleção e Formação de Carreiras da Escola Nacional de Administração Pública (Enap); e o Sr. Pedro Luiz Costa Cavalcante, Chefe de Serviço de Apoio Metodológico e Estatístico da Diretoria de Estudos e Políticas de Estado do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
A Secretaria Especial da Receita Federal e a Secretaria de Orçamento Federal não indicaram representantes.
Vou conceder o prazo de 15 minutos para cada convidado.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA) - Presidente, com a sua permissão. V. Exa. sabe que esta Casa é uma Casa muito dinâmica, então nós temos várias comissões funcionando hoje, inclusive com algumas sabatinas e também com entrega de alguns relatórios. Então, a gente se transforma aqui em dez ao mesmo tempo. Às vezes, parece até um pouco deselegante, mas não é.
A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - SP) - De forma alguma.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA) - Eu vou retornar, mas eu precisarei ir a uma outra Comissão e retorno daqui a pouco.
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - SP) - Obrigada, Senadora. A gente já sabia que iria ser assim.
O SR. PEDRO JUCÁ MACIEL (Para exposição de convidado.) - Boa tarde a todos!
Queria agradecer a Senadora Mara Gabrilli pelo requerimento de audiência pública que ela publicou. É um tema muito relevante.
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Eu estou aqui feliz, como representante do Tesouro Nacional e também do ponto de vista pessoal, porque a qualidade do gasto público é muito pouco discutida no Brasil. É algo em que os demais países os quais a gente pode seguir como referência têm rotinas permanentes de discussão. No Brasil, o tema é muito aquém da importância dele para a política fiscal, para a gestão das finanças públicas.
A minha apresentação está dividida em cinco partes. Na primeira parte, eu vou fazer um diagnóstico da situação fiscal do Brasil, porque o Brasil está num momento de transição, ou seja, a gente precisa ainda fazer um processo de consolidação fiscal para conseguir estabilizar a dívida pública. Então, toda a discussão sobre políticas públicas tem que estar compatibilizada com esse processo que a gente está tendo agora de tornar as finanças públicas do Brasil ainda sustentáveis. Por enquanto, a gente tem uma trajetória de endividamento crescente e a gente precisa adotar medidas para estabilizar essa trajetória.
Em seguida, eu vou falar sobre as estratégias do Governo Federal para a consolidação fiscal, para tratar do problema fiscal; depois, experiências internacionais de avaliação de políticas públicas; qualidade do gasto público no Brasil; as medidas que o Governo tem tomado para tratar do tema; e o reforço ao marco regulatório existente atualmente. Estando nesta Casa, no Senado Federal, achei que seria importante trazer também quais são as medidas legislativas que tratam do tema e que são importantes de serem aprovadas para o reforço da temática.
Do ponto de vista do nosso problema fiscal, esse gráfico representa a dinâmica de receitas e despesas do Governo central. A linha azul representa as receitas e a linha laranja representa as despesas. Então, observem que, desde 1997, a gente tem... Se for retroceder esse gráfico desde 1988, a gente tem uma tendência de ter despesas crescendo como proporção da economia. Enquanto as receitas conseguiam também crescer como proporção da economia, como percentual do PIB, nós ainda conseguíamos fechar, digamos, o déficit. Mas, a partir da crise de 2014, a receitas estão perdendo dinamismo e, ao mesmo tempo, as despesas mantiveram trajetória ascendente. Essa trajetória ocorreu até 2016, quando foi aprovada e implantada a Emenda Constitucional 95 e a despesa como proporção do PIB se estabilizou. No entanto, essa estabilidade das despesas como proporção do PIB como um todo não revela um problema que está havendo nas nossas finanças públicas, que é a trajetória das despesas discricionárias comprimindo as despesas discricionárias do Governo.
Então, se o senhor pegar a linha azul, que são as despesas obrigatórias, que têm um eixo diferente, estão no eixo da esquerda e representam 93% das despesas públicas no Brasil no nível federal, ela manteve uma trajetória crescente, enquanto as despesas discricionárias que envolvem vários programas sociais, como o Farmácia Popular, e investimentos têm caído. Isso aqui tudo em termos reais, ou seja, na dinâmica em que a gente tem que tratar o teto que realmente limitou o crescimento das despesas de acordo com a inflação, a gente tem que manter a aprovação de reformas estruturais para justamente conseguir manter a trajetória de despesas obrigatórias mais comportada, mais estável para evitar essa compressão muito forte nas despesas discricionárias.
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O problema fiscal do Brasil pode ser resolvido. Todo problema fiscal pode ser resolvido tanto por meio de controle de despesa, como por meio de aumento de receita. Não existe fórmula mágica. No aumento de receita, se você pegar dados de carga tributária - e aqui eu peguei amostras só de países emergentes -, a gente vê que o Brasil já possui uma carga tributária elevada se comparado com outros países emergentes. A maior parte dos países está acima do Brasil: na América Latina, temos dois, Argentina e Equador; e os demais países são da ex-União Soviética. Se você pegar a média da América Latina, a carga tributária é de 23% do PIB. O Brasil, no conceito de carga tributária, está em 32%, ou seja, a gente está quase dez pontos percentuais acima da carga tributária da América Latina.
É uma possibilidade resolver o problema fiscal do Brasil via aumento de carga tributária? É uma possibilidade. Agora essa possibilidade está trazendo cada vez mais distorções do ponto de vista econômico para o País. Caso não se faça o ajuste fiscal pelo lado nem de receita nem de despesa, a gente vai ter uma consequência sobre a dívida pública.
Aqui eu peguei também dados de comparativos de dívida bruta - isso consta no FMI - dos países emergentes. Então, observem que, pela metodologia do FMI, a dívida bruta brasileira é a terceira maior do mundo em emergentes, ou seja, só a Venezuela e a Angola possuem uma dívida bruta maior que a brasileira. No conceito do Banco Central, a gente ainda estaria com uma dívida, enfim, de quinto lugar maior do mundo em países emergentes.
Empurrar o problema com a barriga e não resolver o problema fiscal vai cada vez expandir a dívida pública. E quais são as consequências de se expandir a dívida pública? Você, primeiro, vai pagar uma conta de juros maior, ou seja, basicamente você paga uma conta para quem é o grande poupador do País, os grandes capitalistas são quem detêm poupança e investem nos títulos públicos do Brasil. Então, parte vai aumentar a conta de juros e também vai aumentar a conta que a gente vai passar para os nossos filhos e netos, ou seja, a próxima geração vai pagar pelo desajuste da nossa geração. A próxima geração não está nem aqui no Congresso para conseguir se defender e propor que a nossa geração consiga fazer um ajuste fiscal.
Então, sobre dívida, a maioria dos países no mundo estabelece limites por justamente ter essa percepção de uma justiça intertemporal entre gerações. Você não pode expandir muito a sua dívida para não deixar a conta para as próximas gerações. A Suécia, os países mais desenvolvidos do mundo, a Escandinávia... A Suécia, por exemplo, tem um limite de dívida de 35% do PIB, e hoje está em 30% do PIB. No Brasil, a gente está com 80% do PIB em dívida bruta. Como eu já mencionei, ela está com trajetória crescente ainda.
Um outro comparativo internacional importante é sobre como é o nosso perfil de despesas entre despesas correntes, aquelas para manutenção da máquina pública, como pessoal e custeio, e despesas de capital, que são os investimentos. O eixo horizontal traz a proporção do PIB em despesas correntes. Observem que apenas Barbados, na América Latina, tem o nível de despesa corrente como proporção do PIB maior do que a do Brasil. E o Brasil possui uma das menores taxas de investimento de despesas de capital em relação aos demais países da América Latina. Diante desse diagnóstico da situação fiscal, qual é a estratégia que o Governo tem adotado? Primeiro, a gente assume o compromisso em resgatar o resultado primário positivo, ter um superávit primário positivo no médio prazo, ou seja, é muito difícil, dada a rigidez que existe no lado das despesas, conseguir apurar, alcançar um resultado positivo no curto prazo. Então, o nosso compromisso é muito claro de alcançar um resultado primário positivo para justamente não comprometer o custo de endividamento do País. Por sinal, o custo de endividamento do Brasil está no nível mais baixo da sua história. A gente está conseguindo emitir títulos da dívida com taxas muito baixas.
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Ao mesmo tempo, existe o pilar que é de justamente fazer uma otimização de despesas, subsídios e gasto tributário, ou seja, a gente tem que repensar como o Brasil está gastando, está fazendo suas despesas e também subsídios - e muitos deles não entram no orçamento, mas está se gastando. Por exemplo, toda a transferência que o Tesouro faz para o BNDES ele empresta a uma taxa subsidiada para alguém e existe um custo em termos de desenvolvimento da sociedade brasileira sob essa política. Então, estamos também engajados em revisar subsídios e gastos tributários, que são as desonerações tributárias, que também não passam pelo orçamento, são aprovadas pelo Congresso. Enfim, isso reduz a arrecadação pública. Então, é uma agenda também que faz parte desse pilar, digamos, de otimização dessas variáveis de fluxo da política fiscal.
O outro pilar se refere às variáveis de estoque, ou seja, vamos começar a olhar para o balanço patrimonial da União, que são os ativos e os passivos. Como eu posso reduzir o custo do meu passivo? E como eu posso aumentar o retorno dos meus ativos? A dívida pública é o nosso maior passivo. E aí, enfim, existe toda uma estratégia de gestão de dívida para a gente conseguir reduzir o custo dela. E, ao mesmo tempo, nos ativos, a gente também tem uma estratégia de gestão de ativos para justamente buscar mais retorno deles.
E aí vamos ao caso, por exemplo, das empresas estatais, que, enfim, é algo muito polemizado no Brasil. Sobre privatizações, o tema privatizações é discutido em todo o mundo de uma forma muito objetiva. No mundo, você avalia que toda empresa estatal tem que ter uma função social, ou seja, se ela não tem uma função social não tem por que ser estatal. Inclusive, a Lei das Estatais prevê que toda empresa pública tem que deixar muito transparente qual é a sua função social.
E aí vem a pergunta: quanto custa a função social dessa empresa? Custa "x". Essa mesma função social dessa empresa poderia ser feita de gasto direto, de subsídio ou de uma alguma outra forma mais barata e mais efetiva? É uma pergunta. Sim. Vale a pena privatizar? Não, a empresa estatal tem uma função social relevante, de fato a gente cumpre essa função social de uma forma eficiente com ela. Então, mantém-se a empresa, ou seja, tem que se avaliar. O ponto é este: a gente tem que avaliar tudo; tem que avaliar não só despesa, subsídios, gastos tributários; tem que avaliar nossos passivos e também avaliar nossos ativos, quais são os ativos que a gente tem e qual retorno está se dando para a sociedade para a gente adotar a política adequada.
Da mesma forma, existe uma agenda de reforço do marco regulatório das finanças públicas que eu vou trazer mais para o final da apresentação e transparências, ou seja, como a gente não consegue fazer esse ajuste fiscal num curto espaço de tempo, envolve um médio prazo.
O Brasil, desde 2014, está com déficit primário e vai estar, de acordo com a previsão da LDO, até 2022 com déficit. Serão nove anos de déficit com dívida crescendo. A gente tem que trabalhar de forma muito transparente para que não cause nenhum ruído de mercado de que a gente está com as finanças públicas insustentáveis, porque isso vai trazer estresse financeiro, que é o que a Argentina está passando agora. Enfim, tudo com transparência, com as medidas anunciadas, essa é a agenda da política fiscal no âmbito do Tesouro Nacional. Entrando na parte de experiências internacionais, Senadora, eu trouxe esse paper da OCDE - e vou deixar a referência para sua equipe e para os consultores - que justamente trata de como a gente consegue mensurar produtividade e melhorar a produtividade do setor público. Do ponto de vista de eficiência, a economia trata a eficiência de dois pontos de vista: eficiência técnica e eficiência locativa. Eficiência técnica é como você estabelece métodos de gestão na Administração Pública que realmente reduzam o custo das políticas públicas e mantenham o seu objetivo original. Eficiência locativa é como eu faço remanejamentos orçamentários de forma que eu financie realmente as políticas que tragam maior retorno social. Então, as duas eficiências eu vou mostrar aqui e vou tratar delas.
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No caso da eficiência técnica, eu trouxe esse texto da OCDE que é muito interessante. O que traz aumento de produtividade entre os países da OCDE? O que foi pesquisado por eles?
(Soa a campainha.)
O SR. PEDRO JUCÁ MACIEL - Então, a primeira coisa é você ter regras fiscais que mantenham o setor público funcionando adequadamente. O que é isso? O gestor público em país desenvolvido não se preocupa se vai faltar recurso ou não, ele já sabe que, da forma como é feita a gestão fiscal do país, ele vai ter aquele recurso, naquele montante, naquele momento apropriado, ou seja, o gestor público de país desenvolvido foca 100% em atender ao cidadão. É uma diferença nossa. O nosso gestor público se preocupa como está sendo a política fiscal do Governo e se ele vai receber aquele recurso ou não. Então, a primeira coisa é que a gente tem que revisar o nosso marco regulatório de finanças públicas para justamente dar essa estabilidade para a Administração Pública funcionar de forma adequada.
A segunda tendência de país da OCDE é o que se chama de revisão de regulação dentro do Governo. Os países estão fazendo avaliações de como a burocracia gera custos dentro da Administração Pública. E aí você tem uma agenda de simplificação administrativa, com avaliação de guilhotina, que é você ver se essa regulação faz sentido ou não, se ela está trazendo algum resultado. Então, se não está trazendo resultado, acaba-se com ela. E você vê que vários países europeus têm uma meta de reduzir 25% dos seus custos administrativos. Isso geraria uma economia entre 1% e 1,7% do PIB caso se reduzisse esses custos. Então, é a agenda que a gente precisa tratar ao País. Existe uma secretaria de desburocratização no Governo Federal que vai, em breve, também soltar medidas para racionalizar a Administração Pública no Brasil.
Gerência de recursos humanos é também como a gente faz para os servidores públicos estarem mais engajados, com novos métodos de gestão dos servidores públicos. E 45% dos custos de produção do Governo nos países da OCDE são de servidores públicos. Então, é uma agenda que é importante ser também tocada.
Licitações. Como a gente também inova nossos processos licitatórios para em vez... Enfim, isso é uma inovação que a OCDE trouxe, value for money, que é, em vez de você fazer licitação pelo menor preço, você faz a licitação pelo maior valor. O que é isso? Numa licitação de uma estrada, eu vou considerar não apenas o custo de você fazer o recapeamento, mas o custo de manutenção posterior dessa estrada. E, com isso, fazendo uma estrada com a qualidade melhor, o seu custo de manutenção se reduz. É uma forma de olhar as licitações pelo maior valor e não pelo menor preço. A OCDE e também a Inglaterra aplicam. É uma prática muito bem recomendada pelos países.
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Governos digitais. O quanto a gente pode economizar digitalizando documentos, burocracia? Imaginem um sistema de saúde pública totalmente digital, no qual todos os seus históricos de exame estivessem no computador e qualquer médico, a qualquer momento, pudesse acessá-los. A Estônia tem um sistema parecido com esse. Na Estônia, você vai para um médico e todos os seus relatórios e exames estão no computador. Se você teve que faltar o trabalho, o próprio sistema do Governo já manda um comunicado para a empresa falando que você teve que ir ao médico naquela data e fazer aquele exame. Inclusive, por mais de cinco dias de falta do trabalho, o Governo ressarce a empresa pelo pagamento do seu salário. É a regra da Estônia. Há referências, existe isso. Basicamente a gente tem que justamente trazer ao debate aqui como é que a gente consegue evoluir nesse tema.
E também, Senadora, em relação à gestão de finanças públicas, uma prática comum que a gente vê que é uma oportunidade para o Brasil também aprimorar é o que se chama de arcabouços fiscais de médio prazo, é a gente sair da política fiscal pensando apenas no ano e começar a trabalhar a política fiscal pelos próximos quatros anos. A gente estima receitas e despesas pelos próximos quatro anos e sai dessa miopia de fazer uma gestão puramente pensando no orçamento do próximo ano ou deste ano.
E aí o grande reforço e benefício de você trabalhar com médio prazo na gestão pública fiscal é você garantir a sustentabilidade fiscal; relacionar despesas com as prioridades - muitas vezes, no orçamento anual, você aprova compromissos de longo prazo e não sabe se, no longo prazo, você vai ter espaço fiscal para assumir aquele compromisso que você está assumindo hoje -; discutir as prioridades de uma forma mais transparente; ver o espaço fiscal que tem para as prioridades; escolher prioridades; definir algumas ações; também escolher o que não é prioritário e deixar clara essa agenda; ajudar os gestores públicos a ampliar a capacidade de planejamento, de quanto vai ter de recurso pelos próximos anos; ampliar a capacidade de se fazer gestão pública; melhorar o vínculo entre planejamento e financiamento de despesas com investimento, novos programas, reestruturação organizacional; e permitir desenho de mecanismo para incentivar os Ministérios a economizarem recursos.
Muitas vezes, nessa miopia do orçamento anual, se o Ministério não executar determinada despesa, ele perde o orçamento no ano seguinte. E, ao criar uma estrutura de médio prazo, você pode criar mecanismos - "Olhe, se você economizar dinheiro, você vai poder ampliar seu investimento no próximo ano" -, criar mecanismos de incentivos...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PEDRO JUCÁ MACIEL - Pois é. Economizar gera ganhos e não perdas.
Em termos, Senadora, de qualidade do gasto público, nas grandes agendas e termos que se usam na literatura internacional para tratar do tema, há, primeiro, spending review, que é você identificar áreas de economias ou realocação de recursos; orçamento de performance e avaliação de programas. Então, o spending review é justamente você olhar despesa pública pensando nas economias de realocação. O orçamento de performance é você fazer as vinculações do seu orçamento com indicadores de resultado, que é algo mais complexo. Nem todo país aplica no mundo, só realmente os países mais avançados na fronteira da gestão fiscal. E há a avaliação de programas, que é você fazer avaliações sem compromisso. Você fala: "Vou estudar o programa Bolsa Família, como está a efetividade dele, como está a focalização, se é um programa que está cumprindo com seu objetivo original". E aí você tem a avaliação de programa. São avaliações mais longas, que envolvem mais tempo e são mais rigorosas.
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No caso do spending review, a maioria dos países da OCDE faz de forma periódica e num exercício anual. Todo ano, eles fazem uma reavaliação de todas as suas despesas. Alguns países fazem de forma periódica, sem ser anual, e pouquíssimos países da OCDE não fazem spending review. Então, é uma prática que a gente está querendo implementar no Brasil.
Avaliação de programas é uma tática também muito divulgada em vários países no mundo. No relatório de vocês, citaram Inglaterra, Chile. Estão aqui as duas instituições que tratam do tema de avaliação de políticas públicas. No Brasil, o Tesouro, o Ipea, a CGU e a Casa Civil fizeram um guia de avaliação de políticas públicas ex ante, com todo o roteiro para os gestores públicos setoriais conseguirem fazer a avaliação - ex post e ex ante. Ex ante é, antes de você começar qualquer política pública, já estabelecer um check list para você criar uma política pública. O ex post, uma vez que a política pública já existe, como é que você faz a avaliação de fim da qualidade dela, da eficácia dela.
No âmbito do Governo, a gente criou o Conselho de Monitoramento de Políticas Públicas, chamado Cmap. Desde 2016, a gente está aprimorando a institucionalidade desse comitê de avaliação de políticas públicas e, hoje em dia, ele está em nível de decreto presidencial. Inclusive, nós gostaríamos que houvesse uma lei complementar para, digamos, dar uma maior força para instituir a prática de avaliação de políticas públicas de forma permanente no setor público.
No âmbito de reformulação do Ministério da Economia, foi criada a Secretaria de Avaliação de Políticas Públicas do Ministério da Economia. Essa secretaria justamente faz a coordenação desse comitê de monitoramento e avaliação, que é formado pelo Secretário-Executivo do Ministério da Economia, o Secretário-Executivo da Casa Civil e o Secretário-Executivo da CGU. Então, envolve controle justamente com as áreas finalísticas para fazer a avaliação de políticas públicas.
Desse comitê do Cmap, que é o dos secretários-executivos, existem dois subcomitês, que é o Cmag, que trata de gastos diretos, e o Cmas, que é o subcomitê que trata dos subsídios. Aí está a composição de cada um desses subcomitês. Até sugiro que, se vocês tiverem oportunidade, também convidem a Secretaria de Avaliação de Políticas Públicas para tratar do tema - considero supervaliosa e agregará muito valor a esta Subcomissão.
Em termos de avaliação de política públicas, há claros sinais de que o Brasil realmente não é eficiente na sua gestão de políticas públicas. Esse gráfico, Senadora, trata como o setor público é capaz de reduzir desigualdades. E aqui se faz o comparativo de vários países no mundo. A barra azul é Índice de Gini pela renda de mercado, que a gente chama de renda inicial. Uma vez que o mercado... Você não considera na sua renda qualquer transferência do Governo ou qualquer imposto que você paga, simplesmente é só renda de mercado. E a barra laranja é como está a desigualdade pelo Índice de Gini após você pagar impostos e receber transferências do Governo.
Então, observe que, na desigualdade inicial, os países da Europa têm um nível de desigualdade um pouco inferior ao Brasil, ou seja, todo mundo é muito desigual se for apenas pelo mercado, mas o que diferencia os países desenvolvidos dos países em desenvolvimento é justamente a capacidade do Governo de fazer políticas progressivas, tributar os mais ricos e distribuir para os mais pobres. E, após essa distribuição e tributação, a desigualdade cai drasticamente nos países desenvolvidos; já no Brasil, essa queda é muito baixa. No Brasil, a queda é de 17%; na Europa, em média, na OCDE, a queda da desigualdade fruto das ações do Governo, é de 37%, é 20 pontos percentuais acima do que o Governo consegue reduzir de desigualdade social. Um dos aspectos de você reduzir desigualdade pela atuação do Governo é você fazer uma tributação progressiva, tributar proporcionalmente os mais ricos e menos os pobres, e também distribuir, fazer transferências dos programas sociais para os mais pobres e menos para os mais ricos.
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Esse gráfico mostra como é que está o percentual de recebimento das transferências públicas dos 10% mais pobres em relação aos 10% mais ricos da população de cada país. Observe que, na Dinamarca, no Reino Unido, eles conseguem transferir, fazer chegar 90% dos programas públicos aos 10% mais pobres do país; no Brasil, essa focalização é de apenas 30%, ou seja, no Brasil, os 10% mais ricos ainda ficam com 20% de todas as transferências públicas do Governo. Então, é por isso que o Governo não consegue cumprir o seu papel distributivo, que é uma das funções básicas de qualquer setor público.
O outro ponto é a questão do senso comum que existe aqui no Parlamento e na sociedade também de que, para melhorar qualquer coisa, é preciso mais dinheiro. Enfim, você vê que, com o mesmo gasto anual que o Brasil tem hoje em dia, por exemplo, na educação, você conseguiria, se comparar com a média dos outros países em desenvolvimento, ter uma nota, um nível de aprendizado 16% superior. E o exemplo que ressalta esse ponto é quando você pega os dados do Ideb das séries iniciais, séries finais do ensino médio, do ensino básico. Esses pontos referem-se a cada rede municipal do Brasil. E a nossa querida Diana Coutinho aqui foi uma das coautoras desse estudo liderado por Paes de Barros, pelo Instituto Ayrton Senna, em que eles mapearam quanto custa cada aluno, em cada rede municipal do País, e viram qual é a nota do Ideb. Viram que, por exemplo, Sobral e Brejo Santo têm uma das maiores notas do Brasil e gastam entre R$3 mil e R$4 mil, em média, por aluno, enquanto escolas de São Paulo, do Sul do Brasil gastam R$12 mil, por aluno, e não conseguem ter nem a metade do desempenho dessas escolas do Ceará.
No estudo de Paes de Barros e Diana, que está aqui, também é interessante comparar como é que está cada escola do Brasil. Ele pegou a nota já do Pisa, que é o desempenho em matemática das escolas, e comparou com a dos demais países do mundo. Essa aqui é uma distribuição dos países que fazem o Pisa, em que a média, em que 50% tiram uma nota de matemática de 475 pontos. Há uma escola em São Paulo, Clovis Rene Calabrez, que tem um desempenho de 325, nessa nota do Pisa, ou seja, é uma nota, inclusive, inferior à da República Dominicana. E existe uma escola em Cocal dos Alves, no Piauí, cuja nota do Pisa é superior à média da Alemanha, ou seja, os bons casos de sucesso estão aqui dentro, no próprio Brasil; a gente não precisa ir à Finlândia, enfim, na fronteira da educação. Há muita coisa boa que a gente consegue aprender aqui mesmo, e isso tem que ser ressaltado, publicado - estudados esses casos -, para saber, enfim, como a gente pode aprender com isso.
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Outro dado interessante é o impacto da escolaridade média da população na produtividade do País. Se você pegar aí também o Instituto Ayrton Senna, verá que, em média, quando você aumenta um ano de escolaridade da população, a produtividade da sua economia cresce US$3 mil. Essa é a média; no Chile são US$3 mil. Se você pegar a maioria dos países e fizer esta divisão de quanto cresce a produtividade do país com o aumento de um ano de escolaridade, você vai ver que vários países do mundo crescem US$3 mil na sua produtividade, com o aumento de um ano de escolaridade. Existem países que são mais eficientes; há países que conseguem crescer US$4 mil de produtividade por ano adicional de escolaridade. Existem países tão tops, que são Japão e Coreia, que, para cada ano de escolaridade, isso é traduzido por US$7 mil a mais na produtividade. E existe o caso do Brasil, no qual a gente expandiu a escolaridade em mais de quatro anos e teve zero impacto na produtividade. E isso vem justamente trazer a pergunta sobre se o que a gente está estudando nas escolas, de fato, é algo aplicável no mercado, é algo de que a sociedade estará precisando quando esses alunos saírem da escola. Há toda uma agenda de currículo, de gestão que está por trás desse problema que a gente tem que justamente endereçar.
Da mesma forma, dados sobre a eficiência de hospitais. Olhando o quadro da direita, você vê um método chamado DEA (Data Envelopment Analysis), que basicamente pega tudo o que o hospital produz de serviço versus o que ele recebeu de recursos, faz uma divisão e vê a eficiência, sendo que o mais eficiente recebe nota um, padroniza-se como o mais eficiente, que é, por sinal, uma organização social de São Paulo, e o menos eficiente recebe nota zero. E aí você classifica os demais hospitais com base nessa meta de zero a um.
Se você for ver a média de eficiência em hospitais, por leito - observe que, quanto menor o hospital, menor a eficiência dele, ou seja, ele recebe recurso e não consegue prestar o serviço da forma mais apropriada possível -, observará que está em torno de 0,3, ou seja, para produzir o que a gente produz na área de saúde, a gente só precisaria de um terço do que a gente recebe, grosso modo falando, quer dizer, desculpe-me, a média geral é 28, grosso modo falando. Então, temos muito o que aprimorar em termos de qualidade na saúde pública. E justamente esse mesmo estudo do Banco Mundial viu que os hospitais menores também têm uma maior taxa de mortalidade, ou seja, caso você tenha, por exemplo, que fazer alguma cirurgia, a taxa de mortalidade nos hospitais menores é três vezes maior do que a de um hospital maior. Então, tudo isso tem que ser planejado, discutido para a gente conseguir justamente prestar serviço para a sociedade de uma forma mais eficaz e efetiva.
Bom, por fim, Senadora, eu trouxe aqui alguns normativos que tratam de finanças públicas, que têm essa preocupação justamente de manter a nossa sustentabilidade fiscal, aprimorar a gestão das finanças públicas e também trazem uma agenda de avaliação de programas. A gente viu que existe um termo de regras fiscais cujas regras a gente precisa compatibilizar. Hoje em dia existe a Regra do Teto dos gastos, existe a Regra do Resultado Primário, existe a Regra de Ouro, e a gente precisa fazer uma harmonização entre essas regras.
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A Nova Lei das Finanças Públicas traz a atualização da 4.320, que está na Câmara dos Deputados, que é o PLP 295, que institui o Banco de Projetos, que é algo interessante. Antes de qualquer obra entrar no orçamento, existem critérios a serem obedecidos. E estão aqui obras nas quais não foi feita uma avaliação mínima de projeto: você vê obras inacabadas, obras que começam a ser executadas, mas há um sobrecusto, um sobreprazo. Então, a instituição do Banco de Projetos, a exemplo do que aconteceu no Chile, é uma boa prática internacional.
A gente também traz, nessa Nova Lei de Finanças Públicas, a questão de se melhorar o planejamento de médio prazo das finanças públicas bem como o estabelecimento de critérios de avaliação de programas de Governo ex ante ex post em nível de lei complementar como uma prática a ser observada no setor público.
Da mesma forma, existe uma agenda de redução da rigidez orçamentária. Quando você tem um excesso de rigidez, qualquer avaliação que você faça de eficiência alocativa, você não consegue mexer no orçamento, porque está tudo determinado por leis, e aí você tem que envolver aqui o Parlamento. Então, há essa agenda de rigidez orçamentária, que precisa ser tratada no Brasil, e que o Governo sinalizou que vai mandar para cá, para o Senado, no próximo mês.
Temos o fortalecimento da LRF, ou seja, a gente viu que a LRF não conseguiu coibir as distorções que alguns entes fizeram nos seus mandamentos, e aí é preciso reforçá-la com mudanças - e eu posso entrar em detalhes depois, nas perguntas.
Temos também o estabelecimento do Conselho de Gestão Fiscal para justamente harmonizar a forma de contabilização, a contabilidade, evitar a contabilidade criativa entre os diversos entes da Federação que visam burlar os limites da LRF.
E temos a reforma da previdência, que é uma pauta sine qua non para o Brasil, sem a qual não existirá sustentabilidade fiscal, nem no nível federal nem no nível de Estados e Municípios. Então, também é uma condição necessária para se pensar em melhoria de políticas públicas no Brasil como um todo.
Senadora, seria isso. Desculpe-me se passei um pouco do tempo, mas essas seriam as principais mensagens que eu queria trazer aqui para a Comissão.
Obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - SP) - Nossa, Pedro Jucá, muito, muito obrigada pela explanação.
Vou passar a palavra agora para Diana Coutinho, que é Diretora do Enap. Você tem 15 minutos, mas pode ficar à vontade.
A SRA. DIANA COUTINHO (Para exposição de convidado.) - Obrigada, Senadora. Obrigada a todos os presentes. É uma honra para a Escola Nacional poder contribuir com essa discussão.
Parabéns, Pedro, pela exposição muito boa. Obrigada pela referência ao nosso trabalho, pelos créditos. E aqui também tenho que dar os créditos ao Ricardo Paes de Barros e à Camila Soares, que são meus coautores nessas discussões sobre o uso de evidências para melhorar a qualidade das políticas públicas e do gasto público.
Bem, aqui tentei pensar de uma forma bem resumida - se eu pudesse definir de uma forma muito resumida - o que significa qualidade do gasto. Nesse caso, qualidade do gasto, de uma forma bem resumida, seria a melhor escolha de investimento social. São muitos problemas, nós sabemos que existem muitos desafios sociais, muitos problemas que nós temos que enfrentar e sabemos também que os recursos são escassos, como bem mostrou o Pedro. É uma trajetória aí, que também não está muito animadora, de que a gente vai contar com muito mais recursos para resolver nossos desafios. Então, qualidade do gasto significa que a gente está gastando o recurso escasso que nós temos da melhor forma, ou seja, que nós estamos fazendo os investimentos que têm mais retorno para a sociedade.
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Ali, abrindo um pouquinho para o que seria essa melhor escolha do investimento social, seria o que traz o maior impacto nos resultados mais importantes para a sociedade. Já que a gente vive numa democracia, não basta ter uma visão tecnocrática daquilo que é o melhor investimento social, que traz maior impacto, mas a gente também tem que entender o que a sociedade valoriza e qual o valor que a sociedade dá para aqueles resultados que a gente está buscando alcançar.
Bom, vou entrar um pouquinho agora numa discussão que é muito falada, cada vez mais. Hoje de manhã eu coloquei no Google "evidence-based policy", e aparecem mais de 500 milhões de resultados no Google. Então, é uma coisa de que todo mundo fala e que está na ordem do dia: essa tal de política pública com base em evidência para melhorar a qualidade da política pública, para melhorar a qualidade do gasto.
Está todo mundo falando, todo mundo em certa medida fazendo, mas por que afinal a gente acha que a evidência melhora a qualidade do gasto? A gente sabe que o recurso é escasso e que gerar evidência também consome recurso. E a gente tem sempre que fazer uma escolha entre fazer alguma coisa e buscar evidência; resolver o problema e buscar a evidência de qual problema que a gente tem que resolver, qual a melhor forma, enfim. Então, há uma disputa de recursos para a solução de problemas em si e para a geração de evidências acerca dos problemas.
Nesse ambiente de recursos escassos, por que vale a pena olhar para as evidências? Então, aqui, a gente tenta organizar um pouco seis dimensões relacionadas às decisões de política pública em que a evidência é central. A primeira delas é identificar e dimensionar os desafios, o que, às vezes, parece meio bobo: "Ah, tá bom, então identificar o problema..." - poxa, é meio óbvio, não é? Mas às vezes não é óbvio; muitas ações às vezes são decididas sem se saber exatamente que problema estava tentando se resolver; decide-se a solução antes de pensar em qual era o problema; a solução vem atrás, vem antes do problema.
Então, aqui, este primeiro ponto é: vamos identificar aqui, vamos fazer um diagnóstico, identificar os problemas sociais, identificar os desafios - como o Pedro aqui apontou, na área de educação, em que a gente tem enormes desafios, e às vezes a discussão parece que é só uma questão de quantidade de gasto. Então, se a gente aumentar a quantidade de gastos, todos os nossos problemas vão ser resolvidos, mas, se a gente olhar para o diagnóstico, a gente até consegue ver que não existe essa relação tão direta entre aumentar o gasto e solucionar o problema educacional. Então, aqui, neste primeiro item de identificar e dimensionar os problemas é aquele em que a gente vai delimitar claramente qual o problema que a gente tem, como esse problema está avançando, como ele vem avançando ao longo dos anos, como é o Brasil em relação a outros países, quais são as consequências de não se resolver aquele problema e também quais são as causas daquele problema.
Então...
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A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - SP) - Diana, só quero lhe pedir licença um minuto, pois vou passar a Presidência para a Senadora Eliziane. Eu vou votar e já volto.
A SRA. DIANA COUTINHO - Tem a minha licença.
Então, voltando aqui, nessa parte de identificação do problema, é delimitar claramente o problema, a magnitude, a evolução, as consequências, as causas e as evidências, evidentemente, pois sem elas a gente não consegue fazer nada disso, a gente não consegue saber onde que a gente estava, como que a gente evoluiu; a gente não consegue saber quais as consequências; a gente não consegue saber quais as causas. Então, a evidência é fundamental para essa identificação e dimensionamento dos desafios.
A segunda função da evidência é ampliar o leque de alternativas que nós temos para enfrentamento dos desafios. As evidências ajudam a gerar novas soluções. Todo progresso científico-tecnológico ajuda a trazer novas possíveis soluções para velhos problemas. Então, a evidência também tem o papel de gerar essas inovações, expandir o leque de possíveis alternativas para enfrentamento dos desafios.
Em terceiro lugar, a evidência serve para comparar: bom, dado esse leque de alternativas, certamente que um problema tem muitas causas, um mesmo problema tem muitas causas e muitas maneiras de atacar as diferentes causas e às vezes muitas maneiras de atacar as mesmas causas. Então, a evidência nos ajuda a decidir, a escolher, a ponderar qual das alternativas é mais eficaz para superar os desafios que estão colocados.
A evidência também serve para facilitar acordos, porque grande parte das controvérsias existentes ocorrem por falta de informação ou por assimetria de informação: existem pessoas que têm acesso a um tipo de informação, outras que não têm, e essa diferença de informação pode gerar controvérsia acerca dos problemas, acerca das soluções. Então, toda evidência deveria ser expandida e acessível ao maior número de pessoas de forma a diminuir as controvérsias por assimetria de informação. Claro que as pessoas vão continuar discordando, porque às vezes elas podem ter acesso às mesmas informações e terem valores diferentes, terem interpretações dos fatos e das evidências diferentes, mas, em relação àquilo que se deve a um ter informação e outro não ter, quanto mais evidência existir e estiver acessível, mais fácil vai ser de se chegar a acordos.
Identificado o problema, identificadas as alternativas, comparadas, escolhida finalmente qual alternativa se resolveu adotar - e com acordo, não é?, pois a gente está numa democracia e a gente espera que as alternativas escolhidas pelo Governo respondam aos anseios da sociedade -, resta saber: afinal de contas, aquilo que nós achamos que seria uma boa escolha, que nós assumimos que seria uma boa escolha, para cujas evidências ex ante do problema nós olhamos, de fato, se revelou uma boa escolha? De fato, solucionou o problema como nós esperávamos? Qual era o impacto que se esperava com essa decisão, com essa ação pública? Então, essa é a hora em que a evidência ajuda a checar se aquela escolha, de fato, agiu como esperado. Então, esta quinta é de validação das escolhas.
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Por fim, de novo, como estamos numa democracia representativa, temos que responder para a sociedade, temos que contar para a sociedade, prestar conta se aquilo que os representantes escolheram para responder aos desafios sociais, de fato, se comportou como o esperado. Tem que prestar contas para a sociedade para o bem ou para o mal. Às vezes, a gente vê muito de prestação de contas, quando dá tudo certo, e, quando não dá certo, que tem uma coisa: "Ah, não, não deu certo!", e muda de assunto, não fala... Então, aqui, a gente reforça a necessidade de prestação de contas quer quando a escolha se revelou acertada, quer quando a escolha se revelou não tão acertada.
Aqui, como eu disse, essa questão de usar a evidência para as escolhas da ação pública é importante em muitos países. E aqui está esse discurso do Barack Obama, em 2009, em que ele diz:
Bom, a pergunta que a gente tem que se fazer não é sobre se o governo é muito grande ou muito pequeno [e essa, aliás, é uma discussão que a gente ouve muito: "Ah, o tamanho do Estado brasileiro é muito grande, é muito pequeno. Não, não é tão grande assim"... E o Obama continua], esta não é a discussão central: se ele é grande, se ele é pequeno. A gente tem que perguntar se funciona...
(Soa a campainha.)
A SRA. DIANA COUTINHO -
... e onde funciona. Onde as nossas ações funcionam, a gente intenciona avançar, e onde não funcionam, os programas têm que acabar. E os gestores que lidam com os recursos, os caros e escassos recursos da sociedade, têm que prestar contas e ser responsabilizados pela decisão de como se alocou o gasto.
Então, para isso, reforçamos que, para conseguir realmente olhar o que funciona e o que não funciona, prestar contas e ser responsabilizado pelas decisões com relação ao gasto, a evidência central - e aqui de novo, mais uma afirmação do Presidente Obama do compromisso de usar a evidência e a avaliação para garantir que estão fazendo smart investments, que estão fazendo os melhores investimentos sociais, os melhores investimentos públicos.
E isso não acontece só nos Estados Unidos: também aqui já foi mencionado o Chile, o México, e eu trouxe o exemplo da Comunidade Europeia. A Comunidade Europeia tem um grupo de assessores científicos, um conselho científico. Primeiro, eles tinham uma assessora científica só, que era a cientista-chefe da Comunidade Europeia, mas depois eles chegaram à conclusão de que ter um cientista-chefe só era meio arriscado, porque, dificilmente, as conclusões da ciência são absolutas. Na verdade, elas dependem, são condicionadas a muitas hipóteses. Houve uma controvérsia com a pessoa que era a cientista-chefe, que afirmou que tinha um certo consenso na comunidade científica. A comunidade científica se rebelou, dizendo que não existia esse consenso.
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(Soa a campainha.)
A SRA. DIANA COUTINHO - Então, decidiu-se que, na verdade, era melhor ter um conselho científico, de forma a valorizar e a reconhecer a pluralidade de visões e interpretações das evidências.
Então, está aí o esquema de como funcionada esse conselho científico, que dá assessoria para a comissão. Com essa assessoria científica, a comissão elabora propostas de políticas, de legislação. Com isso eles esperam ter melhores políticas públicas, legislação e, portanto, melhores resultados para os cidadãos.
Ali naquele quadrinho aqui embaixo, são os países. Tem esse estudo aqui, da Comunidade Europeia também, que traz uma série de países onde existe essa figura de conselho científico e, inclusive, o cientista-chefe. No caso do Reino Unido, por exemplo, ele tem um cientista-chefe em cada área temática. Então, por exemplo, a educação tem um assessor científico que ajuda a fazer a conexão entre a política pública e a ciência.
Bom, o Brasil também avançou. O Pedro já comentou aqui a criação do Cmap, que é o Conselho de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas. A Senadora Eliziane não estava aqui no momento, então, vou repetir aí. O Decreto 9.834 deste ano, de 2019, criou o Conselho de Monitoramento e Avaliação de Política Públicas para selecionar uma série de políticas, de acordo com alguns critérios. Então, o conselho estabelece critérios para a priorização de que políticas têm que ser avaliadas de qualquer maneira.
É claro que o Governo Federal avalia muitas outras políticas, além das que foram priorizadas pelo Cmap, mas as que estão no Cmap são aquelas que é imperativo que sejam avaliadas. Depois, também, o Cmap procura ter uma resolutividade. Também não adianta gerar um monte de evidência e essa evidência ir parar lá no pré-sal, lá num lugar onde ninguém resgata. Então, tem uma intenção e uma ação do Cmap de monitorar a implementação das propostas de alteração das políticas resultantes da avaliação. O comitê é divido em dois. Tem uma parte de gastos diretos e uma parte dos subsídios da União.
Também, já foi comentado pelo Pedro, mas vou reforçar de novo, há outras iniciativas do Governo Federal para a institucionalização das práticas de uso de evidência na política pública: foi a publicação de uma série de manuais para uso de evidência. Então, tem o de avaliação ex ante, que é aquela, enquanto a política está sendo desenhada, feita antes de ser implementada, sobre qual é o impacto que se espera com aquela política; tem o de avaliação ex post, que é, bom, agora a política foi feita, vamos avaliar qual foi o efetivo impacto alcançado pela política.
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Tem também o Guia de Análise de Impacto Regulatório. Às vezes, essas discussões são separadas, a avaliação de política pública e a análise de impacto regulatório, mas são muito parecidas. A análise de impacto regulatório é muito semelhante a uma avaliação ex ante, a diferença é que ela está querendo ver qual o impacto da mudança de uma regra, de uma regulação, de uma norma. Mas toda norma está querendo atender algum objetivo, está querendo resolver também algum problema. Então, a análise de impacto regulatório é muito semelhante à análise ex ante. E, para a análise de impacto regulatório nós temos até uma compulsoriedade maior, eu diria. Tem na lei das agências e também entrou na MP da liberdade econômica como um requisito à realização de análise de impacto regulatório.
As avaliações ainda não têm esse mesmo caráter compulsório. Tem o Cmap, que define para algumas um conjunto de políticas que devem ser avaliadas, mas não tem assim, de forma geral, uma regra que determine que toda proposta de novo programa, de nova política, tenha que vir acompanhada de uma avaliação ex ante. Então, acaba ficando muito na vontade, na decisão, no conhecimento, de cada pasta. Acho até que esse seria um avanço se a gente conseguisse uma institucionalidade maior para a realização de avaliações.
Talvez o Pedro Cavalcante vá falar sobre governança. Não sei se poderia ter algum mecanismo de governança que facilitasse para que essa prática de avaliação se tornasse mais sistematizada e que os resultados das avaliações fossem mais utilizados para as decisões de ajuste de política ou de corte em algum programa, ou de expansão, enfim, a qualquer decisão relacionada ao programa que tivesse um caráter mais compulsório de uso de avaliação de evidência.
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Ali no cantinho está o guia da Anvisa, Guia de Análise de Impacto Regulatório da Anvisa. A Anvisa achou por bem fazer um guia para padronizar seus próprios procedimentos de análise de impacto regulatório. Ficou muito legal. Convido todos a conhecê-lo.
Finalmente, na Enap (Escola Nacional de Administração Pública), nós também estamos promovendo algumas ações para fortalecer essa agenda de uso de evidências nas políticas públicas. A primeira delas, que está ali, inclui uma série de ações de capacitação executiva em avaliação na utilização dos guias de avaliação ex ante e avaliação ex post. Então, convido todos para conhecerem os guias. Quem ainda estiver com dificuldades para entender os guias procure a Enap para conhecer as iniciativas de capacitação em avaliação ex ante e ex post. É uma aula para entender o guia e como usá-lo.
A gente está muito feliz lá na escola porque esse é um curso que a gente tem ofertado com bastante regularidade e está sempre cheio não só de servidores do Governo Federal. Na última turma que tivemos há duas semanas, que era de avaliação ex post, nós tínhamos a presença, além da CGU, da Casa Civil, do Ministério da Economia e de pastas setoriais, de servidores do TCU (Tribunal de Contas da União) e do Ministério Público Federal, que também está interessado em avaliação, em uso de evidência de política pública e está querendo aprender como fazer isso. Então, além de ser um espaço de aprendizado, é um espaço de troca, de rede de atores que estão preocupados em promover essa agenda. Acho que é muito bom ver todo mundo lá, mas acho que realmente a nossa governança ainda não está muito bem resolvida, talvez, sobre qual é exatamente o papel de cada um desses atores, para que atuem de forma complementar e que também o uso de evidência em política pública seja o mais eficiente possível.
Além das capacitações, temos o Enap Cátedras, que consiste na concessão de bolsas em áreas prioritárias para a avaliação. Então, nesse caso, a gente conversou com o CMAP para que ele nos indicasse quais seriam as áreas prioritárias para a avaliação no Governo. A Enap, então, concede bolsas a pesquisadores para a realização de avaliação.
Nós temos o que a gente chama de uma conexão direta entre ciência e política pública, que é um mestrado profissional em avaliação e monitoramento de políticas públicas que foi inaugurado este ano, em 2019, para servidores públicos. A gente chama de conexão direta porque, nesse caso, o próprio servidor público é um cientista, ele está fazendo o mestrado, está fazendo um trabalho acadêmico com uma conexão direta entre ciência e política pública.
Além disso, a Enap oferece uma série de serviços de diferentes naturezas que também apoiam essa agenda de uso de evidências na gestão de políticas públicas. Então, cito como exemplo uma série de oficinas que nós realizamos para desenho do modelo lógico das políticas e programas. Modelo lógico, para quem não sabe, é uma representação que mostra qual é o problema que se está tentando resolver, quais as causas do problema e quais os meios por que a ação pública está tentando resolver aquele problema. Então, tem causa, ações, problema e o resultado que se pretende alcançar. Isso é explícito.
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A Enap fez uma série de oficinas para o desenho de modelo lógico de programas. Atualmente, às vezes, tudo isso parece meio óbvio: "Poxa, mas não é meio óbvio o que se estava querendo resolver, quais eram as causas e quais foram as escolhas de ações?". Não, nem sempre é óbvio. Muitas vezes, para a gente entender qual era o problema e quais eram as ações, a gente tem que ler uma série de leis, decretos, portarias, resoluções, para entender qual era a intenção da política e qual era o meio que se estava usando para alcançar os objetivos.
Além das oficinas de modelo lógico, nós também temos aqui o que nós chamamos ciência sob demanda. Na nossa área de pesquisa e pós-graduação, nós temos uma coordenação de pesquisa e uma coordenação de ciência de dados e as duas produzem pesquisas ou produzem análises ou ferramentas de gestão para o Governo Federal sob demanda. Então, a pasta traz para a Enap qual é o problema. A Enap ajuda a entender qual é o problema que aquele gestor público está tentando resolver e ajuda a dar uma solução científica, a dar um apoio, um suporte, seja pesquisa, seja ciência de dados ou uma combinação das duas para atender a necessidade do gestor de política pública.
Então, resumidamente, era o que trouxe para hoje. Qualquer esclarecimento ou dúvida procurem a Enap. Serão muito bem-vindos.
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA) - Muito obrigada, Dra. Diana, que é Diretora de Seleção e Formação de Carreiras da Escola Nacional de Administração Pública.
Nós vamos passar agora a palavra a Pedro Luiz Costa Cavalcante, que é Chefe de Serviço de Apoio Metodológico e Estatístico da Diretoria de Estudos e Políticas do Estado do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea).
O SR. PEDRO LUIZ COSTA CAVALCANTE (Para exposição de convidado.) - Boa tarde a todos! É um prazer estar aqui.
Quero parabenizar a iniciativa do Senado e desta Comissão de estudar e propor instrumentos e relatórios acerca desse tema.
Particularmente, quando a gente foi convidado lá no Ipea - nessa diretoria a gente estuda instituições, Estado e democracia, então a gente estuda coisas muito genéricas, de fato; a subcomissão também trata de temas muito complexos e genéricos -, a gente ficou um pouco curioso para saber quais seriam as abordagens aqui na Subcomissão.
A minha abordagem é bastante diferente daquela da Diana e do Pedro. O que procuro trazer é uma visão um pouco mais analítica e de pesquisa sobre governança e capacidade estatal. Independente do foco, qualidade de gasto, combate à corrupção, transparência, accountability, etc., estão sempre relacionados ao debate de governança. Nesse debate - Diana trouxe algumas percepções sobre governança -, a governança tem várias visões. Minha ideia aqui é trazer um panorama, um diagnóstico dessa situação no âmbito do Governo Federal, alguns limites da ação do Estado em relação a essa temática, limites conceituais e metodológicos, e, por fim, alguns pontos de reflexão, uma vez que a gente acredita que todo esse debate - e vai haver outras reuniões que vão tocar em temas amplos - é importante à luz da literatura de Administração Pública e Estado, literatura internacional e nacional.
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Lá no Ipea a gente, há alguns anos, tem desenvolvido uma série de estudos sobre diferentes perspectivas, diferentes visões acerca do funcionamento do Estado brasileiro, seja sob a ótica da burocracia, seja sob a ótica da capacidade estatal, da democracia. Recentemente, no fim do ano passado, a gente lançou esse boletim de análise política e institucional, que é uma coletânea de artigos voltados justamente para problematizar a visão sobre governança. Então, há todo um debate sobre o que é governança e quais seriam os caminhos para alcançar a boa governança. Então, o que a gente faz nessa publicação é trazer mais problemas do que, na verdade, solução, porque acho que o nosso objetivo lá no Ipea é criticar e apresentar visões distintas, justamente para qualificar esse debate.
Em linhas gerais, a nossa premissa é a de que o funcionamento das políticas públicas parte dessa lente de governança. E o que seria essa lente? Vamos usar o caso, aqui, da educação básica, que foi um exemplo que o Pedro trouxe, de Sobral. O objetivo é melhorar a qualidade da educação básica. Para isso, há diversas formas de atuação do Estado, que a gente entende como arranjos de governança, em que esses pontos são os atores - Município, Estado, setor privado, sociedade civil - e os pontinhos são os instrumentos, pode ser a provisão direta da educação, pode ser financiamento, pode ser subsídio etc. Para qualquer um desses instrumentos de política pública um elemento é central para gerar os resultados, sejam eles qualidade do gasto, efetividade e eficácia, combate à corrupção, transparência, accountability, que é a necessidade de capacidade, seja ela técnica ou política. Então, quando a gente lembra do caso de Sobral, capacidade técnica é o quê? São professores bem qualificados, são servidores bem qualificados que implementam uma política educacional que gera os resultados esperados lá como referência nacional e internacional, capacidade política e capacidade de viabilidade de projetos, capacidade de articulação dos secretários e assim por diante.
Então, para pensar em boas políticas públicas, em boas práticas, é importante entender quais são os instrumentos e, principalmente, quais são as capacidades que fazem com que esses instrumentos gerem esses resultados.
No caso bem mencionado aqui pela Diana, para avaliar resultado, você precisa também de capacidade, não só de conhecimento técnico, mas também de capacidade avaliativa. Então, essa é uma dimensão também central para a discussão de qualidade de gasto e de desempenho na Administração Pública.
Por que o tema governança entra no debate, sobretudo a partir da década de 1990? Há uma superação de soluções restritas sobre o modelo de administração pública muito vivenciado pelas reformas administrativas. Cada vez mais há o entendimento de que os problemas são muito complexos, transversais e incertos, ou seja, demandam não apenas uma ação estatal, mas uma diversidade, um alargamento da atuação estatal que incorpore Estado, sociedade e mercado ou um mix entre esses atores na provisão de políticas públicas, na regulação ou na concessão de política pública.
Mas o grande objetivo é chegar àquilo que todo mundo venera, que é a boa governança. Só que transferir, sair de bandido para ser mocinho na Administração Pública parece simples quando a gente olha para os objetivos de transparência, de participação e accountability, mas, quando a gente analisa o caminho para alcançar a boa governança, é que a gente se depara com o grande desafio, já mencionado pelo Pedro em alguns casos e também pela Diana, ou seja, o próprio entendimento do que é governança a gente chama de conceito mágico, um fetiche ou um modismo, digamos assim, na Administração Pública, porque ele é muito complexo, complicado.
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Chegar ao que a gente considera como governança é também um desafio. A Diana estava comentando que se está criando um prêmio de boas práticas e um dos elementos é a governança, mas há um debate muito amplo para saber quais critérios de governança a gente vai usar para premiar ou não determinadas iniciativas.
No caso do Governo Federal, esse tema foi incorporado e liderado recentemente, sobretudo pelo Tribunal de Contas da União, e vem se propagando sob diferentes abordagens, mas, em nossa visão lá no Ipea, há um certo grau de confusão conceitual e metodológica, o que faz com que as recomendações acerca da boa governança ou do caminho para chegar a essa governança gerem comportamentos, digamos, com externalidades derivadas negativas, ou seja, comportamentos que vêm do esforço valoroso, prescritivo de comparar e de reproduzir boas práticas, mas acabam gerando efeitos não tão positivos assim. Duas são iniciativas normativas: um decreto aprovado já em 2017, o chamado decreto de governança, e outro é o PL que está em trâmite na Comissão de Serviço Público da Câmara e provavelmente daqui a algum tempo deve chegar ao Senado, por isso achei importante trazer. Esse decreto, assim como o PL, traz algumas recomendações de algumas visões sobre o que é e o que deve ser a governança na Administração Pública.
Uma segunda dimensão interessante para entender esse fenômeno governança pública é a proliferação de índices de governança - índices de governança em diversas áreas da Administração Pública, vou detalhar um pouco mais isso.
Em relação ao decreto, ele é fruto da Comissão Interministerial de Governança, o que foi mencionado já aqui, ou seja, ele foi aprovado.
À direita, um guia de política pública que foi lançado junto com o nosso BAP no fim do ano passado, que traz informações e orientações de como os órgãos da Administração Pública devem proceder, ou seja, quais são os princípios e estruturas para uma boa implementação do que se chamaria uma política de governança.
A grande novidade do decreto foi a inclusão do Endes. O que é o Endes? É a Estratégia Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, um planejamento de longo prazo, de 12 anos, para o País. O que é interessante é que essa Endes é mais um instrumento de planejamento do Governo. Então, o Governo já tem seus planos nacionais, planos setoriais, planos regionais além dos instrumentos orçamentários constitucionais: LOA, LDO e PPA.
Só a título de curiosidade, em 2016 ou 2017, a Seplan, do antigo Ministério do Planejamento, fez um levantamento, Senadora, e sabe quantos planos regionais, nacionais e setoriais existiam no Governo Federal em andamento para além do PPA? Setenta e cinco. Só que existiam somente 23 Ministérios, então, cada Ministério tinha seus três planos nacionais e regionais, ou seja, não falta planejamento, a gente tem muito instrumento. Esse é um ponto importante da minha fala.
A segunda tendência nesse debate de governança é justamente essa proliferação de índices de governança. Isso nasce, sobretudo, a partir de uma forte influência de organismos multilaterais, e o Banco Mundial é repleto dos seus índices, mas eles têm inclusive um índice de boa governança, em que se avaliam os governos a partir de boas práticas em regulação, estabilidade econômica, estabilidade política e assim por diante.
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No Brasil, a gente vem incorporando isso em diferentes áreas. Então, a gente tem o IGSEST, que é um índice de governança das estatais; a gente tem um índice da Justiça Federal; a gente tem um IGG que é um Índice de Gestão e Governança do TCU, que é esse último aí - e a melhor avaliação é a do próprio TCU, que é o azulzinho, isso é interessante. O foco desses índices, apesar de se basearem em referenciais teóricos distintos, é justamente quantificar e comparar procedimentos e processos dentro das organizações públicas. Então, essa é uma segunda tendência.
Quais seriam as limitações desses esforços - e, aqui, esse é um ponto principal da minha explanação? Eu só tenho cinco minutos. Fiquei aqui olhando, achando que estava com muito tempo, mas, na verdade, quinze minutos são nada mesmo, deixem-me acelerar. Do ponto de vista conceitual, tanto do decreto quando do PL em muitos dos índices, eles reforçam dimensões e princípios que já são existentes dentro da Administração Pública e tem um conjunto, dentro do nosso arcabouço legal, que já reforça isso, seja na Constituição ou nos instrumentos infralegais: integridade, transparência, accountability. Se fizerem um levantamento dos instrumentos legais que há na Administração Pública Federal que tratam desse assunto, são dezenas, centenas talvez.
O segundo aspecto que chama a atenção é que o TCU, e acabou sendo propagado por outros - nada contra o TCU, mas o TCU é um precursor desse debate, e é importante que a gente dialogue sempre com eles, lá no Ipea a gente sempre é convidado a conversar com eles -, o TCU define governança como mecanismo de liderança, estratégia e controle. Isso foi incorporado pelo Governo Federal no seu decreto e está incorporado no projeto de lei. E por que isso é relativamente problemático? É problemático porque ele não acompanha a evolução do debate e pressupõe que essas dimensões são altamente técnicas e que os gestores têm que responder por essas três dimensões. E a governança é muito mais do que isso. Há diversas conceituações de governança e, por trás dessas três, desses três princípios, um pressuposto de que o processo de governança é algo técnico, e não é necessariamente técnico. Na verdade, política pública é um processo político, sobretudo dentro da democracia. Então, é natural que a própria estratégia e a própria liderança variem de acordo com o processo político. Então, não tem necessariamente que seguir esses três princípios.
Por fim, do ponto de vista conceitual, nenhum desses índices, nem mesmo o decreto, consegue mostrar cientificamente que, obedecendo a esses requisitos ou seguindo essas normas ou instituindo tais procedimentos que vão aumentar sua pontuação nos índices, isso vai gerar melhor desempenho na instituição ou, principalmente, vai gerar valor à sociedade. Então, parte de um pressuposto normativo que impõe às organizações seguir determinados padrões, mas não é necessariamente comprovado que vai melhorar ou não o desempenho. Então, isso é um problema do ponto de vista conceitual.
Mas é na questão metodológica que moram os principais perigos, sobretudo desses índices. Os índices, assim como as orientações, não valorizam, não reconhecem que analisar o grau de governança num Banco do Brasil é muito diferente de avaliar a governança numa unidade de prestação de saúde básica ou na Funai ou na AGU. São características de políticas públicas diferentes.
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Então, criar um único índice para comparar subsistemas de políticas públicas diferentes, completamente distintos, vai gerar problemas do ponto de vista de classificação desses índices. O IGG, por exemplo, do TCU, avalia 500 instituições, 500 organizações, desde a Petrobras até uma Câmara de Vereadores, uma Assembleia Legislativa. São características muito distintas para seguir a mesma regra. Há uma dimensão, que é desempenho - eu tenho uma nota técnica do Ipea sobre isso, a gente foi esmiuçar -, e o desempenho é transparência digital. A transparência digital pode ser muito importante para a CGU, mas não tão importante para uma UPA, por exemplo, que está mais preocupada em atender aquela pessoa em uma emergência. Então, a gente precisa classificar ou qualificar um pouco mais essa discussão.
Há muito pouca ênfase em monitoramento e avaliação e muito mais foco no controle, sobretudo ex ante, o que é contraditório. Com todo o avanço da literatura e principalmente de movimentos gerencialistas, a gente quer mensurar muito mais resultado e desempenho.
Por fim, ele não reconhece, o que é o nosso problema principal, a heterogeneidade e a assimetria das capacidades e dos recursos das organizações...
(Soa a campainha.)
O SR. PEDRO LUIZ COSTA CAVALCANTE - ... públicas.
Estava morrendo de medo desse barulho, mas não tive como evitar.
Então, o IGSEST, por exemplo, das estatais - foi apresentado no Ipea, a gente teve várias discussões lá -, cria os mesmos critérios para comparar grandes estatais e hospitais estatais, que são empresas estatais que temos em alguns hospitais. E qual foi o resultado final desse índice? Os melhores desempenhos em termos de governança, no Governo Federal, das estatais foram: Petrobras, Eletrobras, Banco do Brasil, Caixa e BNDES. Por quê? Porque eles têm mais capacidade. Quais são os piores resultados? Os hospitais públicos. Por quê? Porque há critérios dentro desse índice que pressupõem que os acionistas estão participando das deliberações, e um hospital público não tem acionista, gente. Então, qual o problema que isso gera? Isso gera diversos estigmas, diversas visões de que o hospital é inoperante porque ele vai mal no índice.
Então, esse risco é muito grande quando a gente não considera a dinâmica e os múltiplos fenômenos relacionados à governança sobre suas diferentes perspectivas. A Petrobras segue todo um padrão de governança corporativa, porque ela tem acionista, shareholders e assim por diante. A EPL, que é uma empresa de planejamento logístico, tem outra lógica, ela faz planejamento, não tem acionista, então, ela tem que ter outra lógica de mensuração.
É ingênuo e simplista também pensarmos que soluções que dão certo na nossa organização vão ser motivo de orgulho ou de sucesso em determinadas outras organizações. Então, não vou falar mais do TCU aqui para não parecer que eu estou implicando com o TCU, mas a gente tem na Casa Civil, por exemplo, um quadro funcional maravilhoso, nos órgãos jurídicos do Governo Federal e econômicos também e aquilo dá certo. O melhor índice de governança dos Ministérios é o Ministério da Economia, mas é lógico, é óbvio, tem a melhor qualificação dos servidores, tem as melhores carreiras, e assim por diante. Agora, imaginar que porque deu certo no nosso órgão vai dar certo numa Funai da vida, que tem vários problemas de capacidade e, sobretudo, de especificidade e complexidade em seu objeto, é ingênuo e completamente fora da realidade de qualquer análise da Administração Pública.
Por fim, esse enfoque no controle precisa ser melhor equilibrado com enfoque em desempenho, incentivo a práticas inovadoras... O Pedro trouxe aqui o caso da Estônia. A Estônia é uma referência do ponto de vista de inovação e transformação digital, mas, com certeza, lá há um espaço muito maior para tentativa e erro e principalmente para a construção de capacidade.
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Então, para finalizar, já que eu passei do meu tempo mesmo, mas vou aproveitar o meu pouco tempo, como recomendação ou não recomendação, mas ponto para reflexão no debate sobretudo da continuidade das discussões daqui da Comissão, a governança pressupõe regras e instrumentos, mas pressupõe, principalmente, a boa governança, digamos, capacidade, seja nas organizações ou na burocracia e no seu corpo dirigente. Então, quando pensarmos em soluções ou alternativas ou recomendações para melhorar a qualidade do gasto, combate à corrupção ou a eficácia das políticas públicas, alguns pontos são centrais: o primeiro é que prescrições e visões normativas com pouca validade científica e sem consenso tendem a gerar normalmente soluções inócuas.
A Diana trouxe aqui imagens dos guias de avaliação. Do ponto de vista de governança, tivemos o guia de governança pública. Eu estava na Casa Civil mês passado, discutindo um excelente guia em que o Ipea contribuiu e em que todos os órgãos do comitê também contribuíram. Lá há diversas orientações de como construir estruturas e políticas de governança, mas a minha pergunta, nove ou dez meses após o lançamento do guia, era: quanto isso foi aprimorado para a Administração Pública ou apropriado pela Administração Pública? Foram feitos cursos para que o órgão que está lidando com uma reformulação na sua estrutura ou que tenha um ministro novo, o que é natural na democracia... Ele conhece essa estrutura? Não, a maioria não sabe o que a gente está produzindo. Então, o Governo Federal tem muitos planos, tem muitas iniciativas, mas há muito pouca coordenação. Então, criar novas ferramentas, novos relatórios, novos pareceres tende a cair nessa mesma armadilha.
Se a gente pensar, por exemplo, em avaliação e monitoramento, além do CIG, do Cemap, a gente tem diversos instrumentos constitucionais: PPA, balanço do governo, avaliações ad hoc, que cada ministério faz, mensagem presidencial. A gente tem, Senador, estava comentando, 75 planos regionais e nacionais em andamento no Governo, mas a gente não os avalia. Então, em vez de pensar em mais um novo decreto ou lei que vai criar mais instrumentos, mas não vai fazer com que esses instrumentos sejam institucionalizados ou perenes, talvez a gente devesse olhar um pouco mais para o que existe e torná-los mais efetivos e menos inócuos. Eu acho que esse pode ser um caminho importante.
É muito interessante que nossos estudos lá no Ipea e também na Enap têm mostrado que, dada a importância dessa agenda de governança dentro do Governo Federal, os nossos surveys de capacidade da burocracia mostram que os melhores servidores, os mais capacitados, os que têm melhores formações estão sendo designados à função muito importante de - muito importante, mas não a única - responder ao TCU. Então, na Justiça, todo Tribunal de Justiça está criando uma secretaria de governança. Qual o objetivo dessa secretaria de governança? Melhorar o índice de governança, mesmo que não haja uma discussão sobre o efeito disso sobre o desempenho dos tribunais em termos de resultado do Judiciário. Então, no Governo Federal, aqueles órgãos menos capazes do ponto de vista de estrutura estão destinando os seus servidores para cuidar da própria burocracia, para responder internamente ao accountability interno, e não olhar para fora ou criar novas políticas públicas que precisam melhorar ou inovar do ponto de vista de política pública.
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O quinto ponto de reflexão é que não adianta criarmos as melhores práticas, best practices, se a gente não reconhecer a heterogeneidade das capacidades dentro do Governo. Então, no Governo Federal, a gente tem o que a gente brinca que é o sangue azul da Administração Pública Federal: a área econômica e a área judiciária. Provavelmente, qualquer recomendação do ponto de vista de boa prática de governança vai dar certo nesses órgãos, porque eles têm capacidade, mas provavelmente não vai dar certo na área social. Não é porque a área social é menos capacitada, é porque a área social, principalmente nas políticas brasileiras, lida com Governos estaduais e municipais, que têm baixa capacidade. Então, não adianta reproduzir boas práticas se eles têm que lidar com setores que têm baixa capacidade. Isso tem que ser reconhecido porque senão há uma tendência de baixa exequibilidade dessas iniciativas.
O processo de capacitação da burocracia e também da liderança, reconhecendo que, para qualquer processo e resultado em termos de política pública, competência técnica e política é central. Então, não necessariamente novas atividades de planejamento, mas, principalmente, criar ou construir capacidade burocrática e de liderança mais responsiva e interativa com a sociedade, essa é a tendência internacional.
Então, como alternativa para medidas ou para vocês pensarem em medidas, em vez de pensarmos em novos instrumentos, vamos, sim, fortalecer a coordenação desses instrumentos existentes. Acho que o caminho é muito mais por aí.
O Banco Mundial lançou em dezembro do ano passado um relatório sobre improvement performance in emerging countries em países desenvolvidos e ele reforça... Também parou de recomendar boas práticas, porque eles descobriram que aquilo que dá certo na Dinamarca não dá certo em Moçambique, chegaram a essa conclusão, demoraram um pouquinho, mas chegaram a essa conclusão, e eles fazem alguns insights interessantes. Um deles é o seguinte: não comecem do zero, partam daquilo que está existindo e pensem em como você coordenaria essas estratégias. O Cemap é um caso clássico disso para avaliação e a gente já tem resultados bastante efetivos nesse sentido.
Por fim, pensar em accountability, em prestação de contas do gasto ou do combate à corrupção, etc., para além desse viés burocrático interno de gerar relatório e esse relatório ser digerido pela própria máquina estatal. Existem diversas plataformas e estratégias de inovação que possibilitam que a gente aumente a nossa capacidade de interação com a sociedade, tornando-os atores muito mais participativos, e government é uma estratégia interessante do processo de política pública, gerando muito mais legitimidade e confiança na ação estatal.
Muito obrigado.
Desculpem-me também por ter passado do tempo.
A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - SP) - Obrigada.
Temos algumas perguntas, mas, na verdade, à pergunta da Diana você respondeu. A pergunta para você foi a sua explanação. Então, vou fazer uma pergunta para cada Pedro.
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Ao Sr. Pedro Jucá Maciel, representante da Secretaria do Tesouro Nacional: Pedro, nós sabemos que, durante a última década, a STN se empenhou na publicação de estudos relativos à qualidade do gasto público. Mas, recentemente, com especial atenção à avaliação de políticas públicas e à mensuração da eficiência dos gastos públicos, V. Sa. pode nos explicar se, dadas as novas diretrizes econômicas implantadas desde o início deste ano, houve continuidade nesses trabalhos? E o que a STN vem trabalhando acerca da qualidade e da eficiência dos gastos públicos diante do novo arranjo organizacional do Ministério da Economia?
O SR. PEDRO JUCÁ MACIEL - Obrigado, Senadora, pela oportunidade e pela pergunta...
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA. Para interpelar convidado.) - Tenho uma pergunta para eles responderem juntos, até para a gente poder ganhar tempo, porque vai começar uma outra votação e eu vou ter que ir lá votar agora, está bom, Doutor?
Na verdade, o meu direcionamento é uma pergunta para o Dr. Pedro, mas os colegas também podem comentar. Quando a gente fala de modelo de governança, a gente tem visto, sobre a questão pública, especificamente em relação a este Governo, que ele sempre coloca a questão do processo burocrático e tenta, pelo menos nas apresentações dos discursos, dizer que vai desburocratizar. Nós tivemos, eu confirmava agora há pouco aqui com a nossa consultoria, um decreto presidencial em que ele acabou apresentando a extinção de dezenas de conselhos que não tivessem origem em lei. E aí a gente resvala, quando a gente vê a argumentação dos membros de conselhos em todo o Brasil, em que a gente está perdendo, deixando de lado um forte instrumento de fiscalização e controle e de participação da sociedade civil na aplicação do recurso público.
Você colocou, Dr. Pedro, essa questão da burocracia, quando falava de modelo de governança. Como fazer essa questão dessa relação da questão burocrática e, ao mesmo tempo, um sistema de fiscalização e controle? Nós recebemos aqui uma representação do banco... Na verdade, a vice-presidente da Caixa Econômica Federal... Eu falava sobre a questão do emperramento da máquina, dos diversos dispositivos e de todo o arcabouço legal especificamente em relação à liberação de recursos. Nós tivemos um aumento, nos últimos quatro ou cinco anos, se não me foge a memória, de 400% nos dispositivos para liberação de recursos para os Estados brasileiros da Caixa Econômica Federal - estou falando apenas de um órgão: do banco Caixa Econômica Federal - ou seja, chegando a quase 200 dispositivos, entre normas, resoluções e leis, para que um recurso pudesse ser direcionado a um determinado Município. O que resultou disso? Resultou que, por exemplo, o Nordeste brasileiro participou com apenas 3% de todo o universo de direcionamento orçamentário para os Estados brasileiros nos primeiros meses deste ano. Ou seja, aí se colocava: "Não, nós temos que ter mais dispositivos, porque a gente precisa ter mais um elemento limitador para que o recurso possa ser aplicado direitinho, para que não haja desvio de recurso público, enfim". E acabou chegando a um outro problema, que foi não chegar o recurso lá.
Quando você faz toda uma avaliação nacional, eu via que hoje o Brasil perde mais de R$60 bilhões ao ano pela não efetividade, digamos assim, da aplicação do recurso público. Então, onde é que, de fato, está o nosso problema? Está numa responsabilidade pública melhor ou a gente precisa reduzir mais essa carga burocrática? Como reduzir essa carga burocrática sem prejudicar essa fiscalização, sem prejudicar esse controle, sem trazer mais prejuízo em relação nem falo a Estados e Municípios, mas ao um todo? Você citou a UPA, você citou o hospital. Às vezes, para uma atividade, o recurso nem é tanto, mas você acaba não fazendo essa aplicação correta.
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Então, a gente sente isso na pele mesmo quando faz comparativo orçamentário, quando pega, por exemplo, a peça orçamentária. A gente está acompanhando aqui, agora, os cortes, que são exorbitantes numa área e acabam sendo muito pequenos em outras, e isso acaba trazendo prejuízos realmente muito grandes. Por exemplo, nada contra as Forças Armadas, mas agora mesmo nós estamos com o PLN 18, a gente vai discuti-lo daqui a pouquinho, está na Ordem do Dia do Congresso Nacional inclusive, que tira recursos das universidades para direcionar, por exemplo, aos submarinos, tira recursos da ciência e tecnologia para direcionar ao Exército. Eles são importantes, mas, do ponto de vista da urgência, da emergência, é disso que a gente precisa agora?
Então, como diminuir essa burocracia sem impedir a fiscalização e o controle? Onde é que está o problema? O problema está na lei ou o problema está na decisão política, na efetividade desses órgãos de fiscalização e controle?
Então, eu queria ouvir dos senhores isso, mas não sei se vou conseguir, porque acho que, daqui a uns dez minutos, vou ter que ir lá no Plenário.
Mais uma coisa que eu queria também destacar para os senhores que estão aqui presentes, estamos eu e a Senadora Mara Gabrilli... Às vezes, a gente diz: nossa, a gente queria mais Senadores. A gente queria sim mais Senadores, mas estamos aqui acompanhando uma transmissão ao vivo pelo canal da TV Senado e isso acaba chegando a milhares de famílias Brasil afora, que estão acompanhando aqui esta riquíssima exposição de vocês, que são extremamente competentes na área.
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - SP) - Até complementando, para os três, uma coisa que me impressionou na exposição do Pedro Jucá foi o que ele falou, por exemplo, da escola em São Paulo e da escola no Piauí. E foi um dos exemplos que a gente usou até para criar a subcomissão, porque a gente vem reparando: por que uma escola faz tanto mais com o mesmo recurso que outra? Essa é a diferença. E aí eu fico pensando no Governo, no nosso, tendo o exemplo: além da burocracia, como a gente pode perpassar todas as decisões? Tudo bem, a gente sabe que há decisões políticas, mas muitas vezes elas se parecem tão impetuosas que chega a um ponto que vai ficar muito mais caro para o Brasil.
Além desse exemplo que a Senadora deu, dos conselhos, eu quero dar o exemplo da MP do zika vírus. Essa MP foi editada. Ela foi feita num formato que, na verdade, se você pegar aquelas mães, as escolhidas... Porque não foi uma MP justa, que está cumprindo um papel de impulsionar a vida dessas famílias que tiveram seus filhos com síndrome de zika vírus, que decorreu do que a gente sabe que foi um problema de saneamento básico. A gente até propôs, num projeto de lei, uma indenização, baseado no que aconteceu, para as vítimas de Talidomida, por exemplo. Por quê? Porque a gente imaginou que, com essa ajuda, se essas pessoas tiverem uma pensão, se elas puderem produzir, trabalhar sem perder o Benefício de Prestação Continuada - há mães que não têm o benefício -, a gente poderia dar um up, melhorar a qualidade de vida dessas pessoas. Mas com a MP, do jeito que foi editada - para mim, não houve um estudo aprofundado -, vai ficar mais caro para o Brasil mais tarde.
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A mesma coisa estava sendo feita na reforma da previdência, que é mexer no benefício de prestação continuada ou mesmo constitucionalizar esse benefício, fazendo com que a gente tornasse constitucional que a soma per capita não possa ultrapassar um quarto de salário mínimo, sendo esse o critério de elegibilidade para o BPC - havia esse movimento para constitucionalizar isso. Não fica mais caro para o Brasil depois? E se a gente fizer uma avaliação da qualidade desse gasto? E é isto que eu estou falando: existe essa consciência na tomada de decisão? São decisões que, para nós, parecem muitas vezes injustas e impetuosas, que não aprofundam, e vai ficar mais caro.
O SR. PEDRO LUIZ COSTA CAVALCANTE (Para exposição de convidado.) - Primeiro, quero agradecer as perguntas. Eu acho que elas são bastante interessantes, complexas também, bem complexas.
Eu vou só reforçar um ponto da minha explanação, porque acho que ele encaixa um pouco nesse dilema entre excessiva burocratização, mas, na verdade, essa burocratização está muito relacionada à necessidade de controlar gastos - controlar no sentido de qualidade do gasto e de liberação de gastos - e, de outro lado, uma certa flexibilidade de gestão. Então, é um dilema que aqueles que liberam o gasto têm que se preocupar em melhorar. Isto é um ponto central, que é muito cobrado, a sociedade cobra: como liberar o gasto, com muitas exigências que acabam gerando burocracia, mas são exigências? E muitas vezes essas exigências não são adequadas a diferentes realidades da Administração Pública brasileira.
Aquilo que eu estava comentando sobre heterogeneidade na Administração Federal serve muito para a heterogeneidade regional no Brasil. Tive a oportunidade de trabalhar em política social e também em política de desenvolvimento regional durante bastante tempo e era muito claro aquilo que a gente imaginava como a melhor solução para resolver problemas, por exemplo, no Bolsa Família, em que eu trabalhei muitos anos. Quando eu chegava na ponta, eu fiz várias viagens ao Piauí e ao Maranhão, por exemplo, a gente chegava: "Nossa, e aquela ideia genial que a gente teve na Esplanada? Aqui os caras não têm nem computador". Então, era completamente adequada a realidade da Esplanada a São Paulo, Porto Alegre ou Santa Catarina, mas à grande maioria do Brasil que era beneficiária não conseguia se adequar.
Eu não sou especialista em liberação de verba, mas, no Ministério da Integração, a gente tinha muita dificuldade com Estados do Norte e Nordeste. Por quê? Porque a gente criava a regra para todo o Brasil, assim como a Caixa cria regra para todo o Brasil. Mas Estados do Norte e Nordeste têm mais dificuldades de capacidade. Não tinha gente para fazer projeto, não tem gente para fazer projeto.
Então, um caminho para lidar com esse equilíbrio é reconhecer essa heterogeneidade e desenhar políticas públicas e estratégias adequadas à realidade de cada Região, adequadas à realidade de um Município. Não é possível criar uma mesma estratégia de liberação de recurso para Blumenau e para Piripiri, no Piauí, porque eles não têm o mesmo nível de capacidade. O que ocorre nesses lugares é uma captação muito grande de recursos ou das capitais ou de cidades com capacidade. Então, acho que o caminho é reconhecer um pouco essa assimetria e desenhar política pública que faça com que aqueles menos capazes se capacitem e tenham condições de acessar os recursos.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA) - Muito bem.
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O SR. PEDRO JUCÁ MACIEL (Para exposição de convidado.) - Obrigado.
Para mim, esta audiência, Senadora, foi muito enriquecedora. Veja que o assunto qualidade do gasto público envolve várias áreas e várias óticas para se fazer uma avaliação. Existe a ótica da governança, de como você trata a governança de certas instituições já na formulação da política pública para adequá-las a esse nível de governança, seja mais alto ou mais baixo. E o ideal, de fato, é que... E aí, eu reforço a importância da avaliação ex ante, que é justamente...
A avaliação das políticas públicas, como eu falei, a gente trata de duas formas: uma ex ante, outra ex post. E a gente começa muita política pública sem fazer uma avaliação ex ante, ou seja, sem pensar direito qual a proposta dessa política, qual o problema que eu quero resolver, qual o meu público-alvo, quais são as minhas metas, qual a fonte de dados para checar depois se essa política tem uma alta eficácia e efetividade na população, enfim, qual o nível de governança dos atores envolvidos. Tudo isso faz parte de uma boa avaliação ex ante.
O ideal seria que o Governo tivesse um rito para a gente só poder fazer qualquer nova política pública passando por uma avaliação ex ante. Esse seria o mundo ideal. Eu sei que no mundo real às vezes são tomadas decisões de uma forma muito rápida e esse rito de avaliação ex ante não é seguido à risca. Mas, enfim, como a gente constrói esse meio termo é que é a riqueza do debate e da discussão. Precisa, por vezes, uma política pública passar por todas essas etapas, e isso envolve tempo, envolve pessoas. Ao mesmo tempo, às vezes, a política pública surge de forma urgente e precisa ser implementada de uma forma rápida. Então, tem que chegar ao meio termo. O ideal realmente é que a gente estabelecesse um processo. Eu não gosto muito de burocratizar as coisas, mas o ideal é que toda nova política pública tivesse rito predefinido e seguisse todas essas avaliações antes de serem implementadas.
Quer que eu já responda à pergunta que a senhora fez?
Em relação à STN, de fato, a gente tem uma coordenação no Tesouro Nacional que justamente tem esse objetivo de fazer estudos, como fiscais. A avaliação de políticas públicas faz parte do DNA da STN porque a STN tem justamente esse papel de prezar pelo cidadão contribuinte, ou seja, como é que a gente gasta o recurso da melhor forma possível.
Quanto à agenda de avaliação de políticas públicas, sou subsecretário do Tesouro, mas também sou analista de finanças do Tesouro. Eu sou um servidor do Estado, comecei em 2003, enfim, estou lá no Tesouro. E, para mim, a gente encara a avaliação de políticas públicas como algo permanente, algo do Estado. Não é algo de governo. Temos tratado esse tema de uma forma perene e pretendemos sim continuar com isso, inclusive, até aprimorar ainda mais e aprofundar essa institucionalização para a avaliação de políticas públicas.
Em relação ao tema burocratização, eu acho interessante esse tema e vou trazer um caso. Eu participei de um seminário no qual eu vi um consultor português que estava justamente tratando desse dilema de burocratização versus avaliação de desempenho. E ele citou o caso da diferença dos órgãos de controle de Portugal e do Reino Unido - ele não falou do Brasil, falou de Portugal e do Reino Unido. Ele falou que, em Portugal, os órgãos de controle focam justamente em seguir todos os regulamentos. Por exemplo, se ele vai fazer uma auditoria numa escola, então, ele chega na escola e diz: "Tudo bem, você gastou R$10 milhões. O.k. Me dê todos os seus processos licitatórios para ver se você seguiu à risca a lei de licitações portuguesa". Então, está lá um monte de processo, ele vê processo a processo. Se, por acaso, o gestor passou por uma etapa, e não seguiu aquela etapa, será penalizado, enfim, vai responder processo de contas especiais etc.
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No Reino Unido, ele falou que os órgãos de controle têm foco completamente diferente. O que eles fazem? Eles vão à escola e falam: "Eu quero saber quanto você gastou, quantos alunos você passou e quais foram as notas desses alunos". "Está aqui, eu gastei 10 milhões, aprovei 100 alunos e as notas foram 8. Precisa de mais coisa aqui?" "Não precisa de mais nada, só preciso saber essas três informações". Aí vão a uma segunda escola: "Quanto você gastou, quantos alunos você aprovou e quais foram as notas". Vão à terceira, quarta, quinta escola. Na quinta escola, eles já têm uma métrica de quanto as escolas estão gastando por aluno, como está sendo o desempenho de cada escola. Aí, eles vão à escola que teve o pior desempenho: "O que está acontecendo com você, por que você teve o pior desempenho?". Enfim, é uma aproximação com mais foco no resultado, com foco também em assessorar o gestor para saber qual é o problema que ele está passando para a escola dele estar com baixo desempenho. Pode ser por corrupção, pode ser, de fato, por todo o regulamento, pela realidade local, porque está com problema. Enfim, tem que avaliar justamente de forma multidisciplinar a qualidade...
A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - SP) - E essa avaliação pode trazer conhecimento até para melhorar todas.
O SR. PEDRO JUCÁ MACIEL - Exatamente. Pode estabelecer recomendações gerais.
Enfim, essa cultura de a gente buscar, para além de saber quanto se gasta, saber como está gastando, o que a gente está produzindo com esse gasto e a qualidade dessa política pública é fundamental para conseguir melhorar a realidade do País.
Então, esse é o principal recado que eu queria trazer.
A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - SP) - Obrigada, Pedro.
Só mais uma pergunta. Então vamos às perguntas que chegam dos...
Diego Salerno, do Rio Grande do Sul: "O que o Governo está fazendo de fato para aumentar a qualidade dos gastos públicos? Por que não cortar as regalias?".
Matheus Jasper, do Distrito Federal: "Por que o Brasil não pode planejar um sistema mais harmônico, de forma que crimes [de corrupção] como esse sejam de fato apurados de forma mais célere?".
E Adelson Alves, de Santa Catarina: "A situação das obras executadas pelos Municípios sob convênio com o Governo Federal, que sempre atrasam, pode ser revista e aperfeiçoada?".
Vocês se voluntariam para responder?
A SRA. DIANA COUTINHO (Para exposição de convidado.) - Bom, são perguntas para que eu talvez tenha menos evidências relacionadas à atuação da escola. Vou responder aqui um pouco pela minha percepção.
Vou responder a esta primeira: o que o Governo está fazendo de fato para aumentar a qualidade dos gastos públicos? Por que não corta as regalias? Bom, tem uma parte aqui que eu acho que me diz respeito, que é a parte do que está fazendo de fato para aumentar a qualidade dos gastos públicos. Certamente, toda essa iniciativa de institucionalizar o uso de evidência, promover a realização de avaliações, como lá na Enap, melhorar as capacidades dos servidores, tudo isso é voltado para melhorar o gasto público e é feito com muita seriedade e muito compromisso.
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Na questão de não cortar regalias, eu acho até que o Poder Executivo e o Governo Federal estão andando na frente, no sentido de cortar regalias. Os salários não estão aumentando; há a portaria recente do Ministério da Economia, chamada de portaria do cafezinho, que cortou o nosso café; também há o blackout, fazer as jornadas num dia menor, mais curto, para economizar energia, quer dizer, eu acho que o Governo Federal está, sim, nessa direção de cortar regalias, mas não é também uma decisão do Governo Federal. Quer dizer, o Governo Federal não chega e fala: "Agora pronto, acabou tudo que estava previsto para servidores do Executivo e de outros Poderes". O Governo Federal não tem essa capacidade de mudar as regras. Isso passa muito por esta Casa, pelo Congresso.
A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - SP) - Se cortar o café, não vai dar sono, sem contar a produtividade menor?
A SRA. DIANA COUTINHO - Certamente. Eu acho que a Senadora trouxe até algumas visões de que certas iniciativas do Governo Federal não vieram acompanhadas da devida análise de valor. E como eu ressaltei na minha exposição, o que é o valor? Valor é: qual investimento traz maior impacto naqueles resultados que são os mais importantes para a sociedade. Então, acho que realmente, embora a gente esteja avançando... Eu mesma passei quatro anos, sou servidora de carreira, de licença no setor privado e, quando voltei, eu me surpreendi bastante com o avanço. Eu achei que a gente avançou bastante em termos de ter uma institucionalidade maior e de valorizar mais essa agenda, de falar mais e fazer mais essa agenda de realmente avaliar as nossas propostas. Mas acho que ainda precisa muito e vai ganhar muito se o Congresso também exigir isto do Poder Executivo quando encaminha as suas propostas: "Olha só, vocês encaminharam uma proposta sem dizer qual é o valor que se está esperando...". E não só o valor mais imediato, mas o valor no longo prazo. Como você estava falando, às vezes, uma decisão resolve o problema do orçamento hoje, mas pode ser que crie um problema lá na frente. Então, uma exigência dessa análise do impacto de uma decisão no curto, médio e longo prazo certamente vai nos permitir fazer ainda mais e avançar ainda mais.
A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - SP) - Obrigada, Diana.
A SRA. DIANA COUTINHO (Fora do microfone.) - Obrigada pela pergunta.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA. Para interpelar convidado.) - Mara, enquanto você vê com a consultora, eu queria só reforçar, em cima do que o Dr. Pedro colocou, que eu estava fazendo um levantamento sobre a situação dos Municípios brasileiros. Dos 5 mil Municípios brasileiros, quase 90 têm problema em alguma área com questões fiscais. Isso me preocupou muito, porque agora, na reforma da previdência, vai se constitucionalizar o repasse de recursos a partir do equilíbrio fiscal. Nós temos a Lei de Responsabilidade Fiscal, que é muito importante, evoluiu muito, nós a defendermos de forma incondicional, mas, ao mesmo tempo, ela abre alguns precedentes para que esses Municípios e Estados recorram, por exemplo, à Justiça e possam assegurar o repasse desses recursos. Então, como você colocou muito bem, existem Municípios no Brasil que não têm condição de pagar um contador, um auditor para poder trabalhar o equilíbrio de suas contas porque o dinheiro não dá para nada, e aí a gente age em detrimento de outros Municípios brasileiros.
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Então, eu acho que esta Subcomissão tem um papel muito importante e preponderante de como trabalhar isso. Eu acho que nós precisamos sair daqui com um encaminhamento muito mais preciso de como nós não impedirmos... Claro, nós vamos trabalhar sempre - e aí é o desafio o combate à corrupção - o gasto público; como combater a corrupção, como encontrar mecanismos para que isso possa ser assegurado sem travar, sem prejudicar que esses recursos cheguem aos Estados e Municípios.
Ao mesmo tempo também, por exemplo, quando a gente vê o pagamento de recursos do SUS... Estou dando o exemplo do meu Estado, que é o Estado do Maranhão. Você inclusive citou, por exemplo, que uma doença no Estado do Maranhão tem preço diferente do de uma doença no Estado de São Paulo. Claro que nós temos uma série de elementos. Fizemos um debate, inclusive com a Mara, sobre o que é pobreza, porque nem sempre alguém que ganha um valor "x" está nas mesmas condições econômicas de quem ganha o mesmo valor "x", porque, às vezes, a cidade é diferente, a casa em que ele mora é diferente, a rua tem saneamento, e a outra não tem.
Então, é uma avaliação que a gente precisa fazer com muita inteligência e que resvala na representação pública. Qual é o tipo de comprometimento que o representante público vai ter com a sociedade? Qual é o tipo de responsabilidade que ele vai ter quando está de posse de um recurso e tem que fazer juízo de valor de como vai aplicar isso? E aí passa pelo processo eleitoral, passa pela escolha da representação pública e, naturalmente, posteriormente, por essa montagem técnica para fazer a execução da peça orçamentária, para fazer a execução do recurso público.
O SR. PEDRO LUIZ COSTA CAVALCANTE (Para exposição de convidado.) - Só para complementar, eu acho que esse tema é muito interessante. Eu sou cientista político de formação. Então, tudo me interessa. Falar de representatividade me interessa bastante.
Hoje em dia - e há um estudo muito interessante da Diretoria de Orçamento da Câmara que toca nesse assunto -, com a redução do percentual de investimento - acho que R$19 bilhões no próximo ano na PLOA -, as emendas vão ter um papel muito importante. E as emendas, por mais que reflitam a representatividade democrática, etc., há vários estudos que mostram também que elas concentram e reforçam a desigualdade tanto dentro do Governo... Então, quando vocês olharem para propostas e alternativas, seria interessante olhar não só o que o Governo Federal vai fazer, tem que fazer ou tem que pensar em como lidar com esse dilema entre controle e gestão e, sobretudo, como reduzir desigualdade, mas também numa alternativa.
Dado esse cenário de austeridade e de importância das emendas constitucionais, talvez seria interessante olhar como as emendas poderiam amenizar um pouco essa desigualdade em termos de investimento. Eu acho que, por esse último estudo que eu vi, 90% dos Municípios brasileiros não recebiam emenda. Por quê? Por uma questão de representatividade. Normalmente, os representantes saem de grandes centros.
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Então, estou até fazendo uma provocação para os Senadores, se me permitem: talvez seria interessante olhar para os gastos públicos também dentro das Casas Legislativas porque são fundamentais para o desenvolvimento, sobretudo regional, mas, agora, ainda mais, dado esse cenário de contingenciamento e restrição.
A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - SP) - Muito bom. Inclusive, por conta das emendas impositivas na área da saúde, um dos nossos critérios... A gente pensou: o que a gente faz? A gente pegou os Municípios mais pobres, que estavam com muito problema em santa casa. Por quê? Porque eu acho que é uma forma de tentar amenizar o problema. É isto que a Senadora estava falando: conseguir entender a vulnerabilidade das famílias. E, claro, isso vai mudar do Maranhão para São Paulo por conta do ambiente em que aquela pessoa está inserida. Porque a gente não consegue ver a vulnerabilidade na pessoa. Isso é até fácil de enxergar quando a gente avalia uma pessoa com deficiência, porque, teoricamente, quando se faz uma avaliação, pode-se falar assim: se você avaliar pelo CID (Código Internacional de Doença), uma lesão, por exemplo, como a minha pode ser devastadora e deixar a pessoa totalmente fora de produzir e de exercer cidadania, mas essa mesma lesão em outra pessoa pode fazer uma diferença brutal. Aliás, uma pessoa que quebra o pé num lugar cuja topografia é ruim, não tem quem a ajude e não tem como sair de lá tem muito mais deficiência do que eu, que, teoricamente, tenho um quadro muito mais grave, porém, há o quanto eu estudei, o meio em que eu vivo, a rua da minha casa, os acessos que eu tenho. Então, avaliar profundamente a vulnerabilidade eu acho que também pode nos ajudar muito nessa questão.
Eu quero agradecer muito a vocês pela qualidade. Com certeza, vou assistir àquilo que eu não consegui.
A gente quer vocês muito próximos.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA) - Com certeza.
O SR. PEDRO LUIZ COSTA CAVALCANTE - Conte com a gente.
A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - SP) - Então, podemos encerrar, Senadora?
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA) - Podemos, com certeza.
A SRA. PRESIDENTE (Mara Gabrilli. Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - SP) - Nada mais havendo a tratar, agradeço a presença de todos e declaro encerrada a presente reunião.
(Iniciada às 15 horas e 17 minutos, a reunião é encerrada às 17 horas e 26 minutos.)