Notas Taquigráficas
05/11/2019 - 2ª - Subcomissão Permanente da Pessoa com Deficiência, Subcomissão Temporária sobre Doenças Raras
| Horário | Texto com revisão |
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| R | O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Havendo número regimental, declaro aberta a 2ª Reunião da Subcomissão Permanente da Pessoa com Deficiência, conjunta com a 5ª Reunião da Subcomissão Temporária sobre Doenças Raras da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 56ª Legislatura. A presente reunião atende ao Requerimento nº 123, de 2019, da Comissão de Assuntos Sociais (CAS), de minha autoria, para realização de audiência pública destinada a debater questões relacionadas às glicogenoses. Quero destacar a importância desse tema para a saúde da criança, da pessoa, para tranquilidade da família e apoio da família, e, inclusive, como um elemento já divulgador do congresso nacional que vai acontecer no Rio Grande do Sul, na semana que vem, congresso também que trata do tema das glicogenoses. Eu informo a todos e a todas que a audiência contará com os serviços de interatividade com o cidadão Alô Senado, através do telefone 0800.612211, e também através do e-Cidadania, por meio do portal www.senado.leg.br/ecidadania, que transmitirá ao vivo a presente reunião e possibilitará o recebimento de perguntas e comentários aos expositores via internet. Então, realmente queremos que seja bastante divulgado o tema doenças raras. A incidência não é tão grande, mas há muitas doenças raras: se somarmos as pessoas, nós chegamos a alguns milhões de brasileiros que lidam com a situação de uma doença rara. |
| R | Temos que trabalhar muito em termos de sensibilização, conscientização, diagnóstico, tratamento, atendimento, apoio para a família, todo um conjunto de iniciativas. E hoje nós vamos abordar uma dessas situações, que são as glicogenoses. Já vai ser explicado direito o que isso significa. Quero agradecer a participação dos convidados. Aqui à minha direita, a Dra. Carolina Fischinger Moura de Souza, que é médica geneticista; também à minha direita, a Danila Vieira Rocha Mantovani, representante das pessoas com glicogenoses hepáticas e musculares. Eu quero dizer que é muito importante o ponto de vista médico e o ponto de vista da pessoa, autodefensoria, autoadvocacia. Aqui logo à minha esquerda, Leandro Rodrigues Pereira, que é membro fundador da Associação Brasileira de Glicogenoses Hepáticas e Musculares. Então, o ponto de vista da família e o ponto de vista da federação. Também à minha esquerda, Aníbal Gil Lopes, membro da Câmara Técnica de Doenças Raras do Conselho Federal de Medicina. Então, é muito importante que o conselho esteja aqui presente, e a gente incentiva que os conselhos regionais também procurem divulgar o debate que está acontecendo nesta tarde. À minha esquerda, o Renato Teixeira, representante da Coordenação-Geral de Atenção Especializada do Ministério da Saúde. Seja muito bem-vindo também, Renato, de novo. A gente já está se acostumando a vê-lo quase que semanalmente. Nós andamos combinando aqui e teremos, em primeiro lugar, o ponto de vista médico para dizer o que é a glicogenose. Depois, virá o ponto de vista da pessoa. Então, é a Danila que vai falar em seguida. Depois, a Federação Nacional, o Dr. Aníbal, que é médico também, falará depois de ouvir as duas iniciativas, da pessoa e da federação. E, finalmente, Renato, você escutando tudo isso, pode dizer para as pessoas o ponto de vista do Ministério da Saúde obviamente, porque agora é o ponto de vista genético, da família, da organização da sociedade, que eu diria que é o mais fundamental. Muito bem, eu quero dizer que esta Comissão de Assuntos Sociais está à disposição de todos os que militam nessa e em outras áreas. Podemos ter audiências públicas, outras audiências. O que a gente deseja é que o conhecimento exista na sociedade e que para esse conhecimento tenhamos as respostas para as pessoas e famílias serem apoiadas adequadamente. Tranquilos? (Pausa.) Tranquilos. Então, está bom. Eu passo, em primeiro lugar, a palavra à Dra. Carolina Fischinger de Souza. Vocês poderiam dizer onde trabalham, donde são, fazer essa apresentação, porque eu acho que isso ajuda nessa interação com os que nos acompanham pelo Brasil todo. |
| R | Apertando aquele botão lá... Não é melhor aquele microfone para você? (Pausa.) Esse é do Presidente. Estou usando o microfone errado. Esse é o seu. A SRA. CAROLINA FISCHINGER MOURA DE SOUZA - Microfone aberto? O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Sim. Está verdinho. A SRA. CAROLINA FISCHINGER MOURA DE SOUZA (Para expor.) - Então, gostaria de me apresentar: eu sou a Carolina Fischinger Moura de Souza, sou médica geneticista, trabalho com genética e doenças raras há mais de 20 anos. Trabalho no Hospital de Clínicas de Porto Alegre e estou à frente aqui para falar em nome dos pacientes com doenças raras e, especialmente neste momento, hoje, na tarde de hoje, sobre glicogenoses hepáticas e musculares. Gostaria muito de agradecer a oportunidade de estar aqui, a convite do Senador Flávio Arns, e a visibilidade dada a esse grupo de condição genética rara, com que a gente sempre está trabalhando, além da oportunidade para a gente explicar um pouquinho mais para a sociedade sobre do que a gente está falando, quais são as dificuldades enfrentadas no dia a dia, tanto médicas quanto do ponto vista dos pacientes, e tornar público, então, esse tema. No meu ponto de vista, a gente só vai conseguir progredir e evoluir no conhecimento, nas pesquisas e no melhor atendimento e cuidado dos pacientes quando a gente conseguir envolver todos, seja no âmbito político quanto no social, médico, de pesquisa, público, privado. O meu objetivo hoje aqui é falar um pouquinho sobre o marco teórico da condição de que a gente está falando, porque fica muito difícil a gente falar de um grupo de doenças que se chamam glicogenoses sem saber muito o que elas são, o que elas representam. Vou tentar ser o mais rápida - eu não consigo, eu sou uma pessoa bem explicativa - e o mais didática possível, considerando o público leigo. Então, o que são essas glicogenoses? São doenças hereditárias que afetam o metabolismo do glicogênio. O glicogênio, na realidade, é a nossa principal fonte energética. Eu sempre explico para os pacientes: tudo que a gente ingere de glicose, de alimentos é transformado, no fundo, em glicogênio. Ele se acumula, fica armazenado principalmente em dois grandes órgãos: no fígado e no músculo. E a sua principal função é ser a reserva de energia do nosso organismo e manter a concentração normal de glicose quando o indivíduo está em estado de jejum, ou seja, tudo o que nós comemos de carboidratos é transformado em glicogênio. É como se a gente estivesse colocando um dinheiro numa caderneta de poupança, guardando para quando precisar. Na realidade, a gente precisa a todo momento, a toda hora. Quando a gente não está ingerindo nenhum alimento, a gente acaba recrutando o glicogênio. Há mais de 14 doenças nesse grupo de doenças que afetam a síntese e a utilização do glicogênio. Então, há algumas condições que são puramente hepáticas, afetam o fígado; algumas condições que são tanto hepáticas quanto musculares, afetam o fígado e o músculo; e outras que ou podem ser hepáticas ou musculares. |
| R | Então, dependendo da classificação e do momento que foram descobertas, elas foram classificadas como tipo I, tipo II, tipo III, tipo IV, tipo V, tipo VI, tipo VII, e temos até o tipo XIV até o momento. Então, neste momento, eu vou me dedicar a falar um pouquinho mais sobre as glicogenoses que afetam o fígado. Aqui a gente tem - não vou detalhar cada subtipo; cada um tem a sua característica, mas para mostrar que são condições genéticas diferentes causadas por diferentes mutações genéticas - o tipo de glicogenose, qual enzima está deficiente, qual o gene, qual a herança - cada um tem um padrão de herança também distinto -, as características clínicas e as diferenças entre o tratamento. Na realidade, depois eu vou resumir um pouco toda a forma de tratar esse grupo de doenças. Então, a incidência desse grupo de doenças genéticas é um para 20 mil a um para 25 mil. Então, a mais frequente de todas é a glicogenose tipo I, 20% de todos os tipos de glicogenose. E não há dados nacionais, neste momento, para estimar quantos pacientes a gente tem no Brasil. Na verdade, a gente tem um cadastro que vai ser apresentado pela associação, mas a gente não tem a real incidência dessa condição no Brasil, porque a gente não tem dados epidemiológicos ainda suficientes para estimar, mas é considerada uma doença rara. No momento em que a doença tem uma frequência maior que um para cinco mil, ela já é considerada rara. Neste momento, nós temos aproximadamente 13 milhões de indivíduos no Brasil com doenças raras. E alguns, então, são portadores da glicogenose. Essas aqui são as questões de herança. A mãe pode ser portadora da alteração genética, passando para os seus filhos homens, ou a mãe e o pai podem ser portadores e passarem sem saber para os seus filhos. Eu não vou me detalhar muito para a gente chegar exatamente aonde a gente precisa. Só para a gente exemplificar a questão metabólica, o glicogênio é formado a partir da glicose. A glicose passa por várias transformações dentro da célula para não sair mais da célula. Ela precisa ser armazenada. E, para que isso aconteça, há um processo enzimático sucessivo que ocorre na célula até formar o que a gente tem, que é o glicogênio. E é desse elemento que nós estamos falando. Qualquer alteração genética que interfere tanto na formação do glicogênio quanto na degradação dele, qualquer uma dessas enzimas com nomes estranhos que estão aparecendo aqui na tela, a gente vai ter a glicogenose. Então, para cada subtipo de defeito da enzima, a gente vai ter um diferente tipo de glicogenose. O fato é que quando essa rota metabólica não funciona adequadamente, o organismo entra em estresse extremamente grande, porque a gente não consegue ter energia para a célula funcionar. A nossa principal razão energética, o nosso principal combustível energético é, realmente, o glicogênio. E, se a gente não consegue formar ou não consegue aproveitá-lo, nós vamos ter repercussões clínicas muito significativas. Então, basicamente, aqui eu tenho um fígado que transforma glicose em glicogênio, dependendo do período do paciente, se ele está em jejum ou se ele está se alimentando. E isso é utilizado como combustível energético para o músculo, para o cérebro e para todas as células do nosso organismo funcionarem adequadamente. Quando há algum defeito em alguma dessas rotas metabólicas, as células não vão ter energia e vão entrar em falência. |
| R | Então, quando a gente tem um defeito, a gente vai ter a baixa de glicose no sangue, causando enormes repercussões clínicas. Como se faz o diagnóstico dessas condições? Primeiro, pelas manifestações, pelos sintomas clínicos. O primeiro e principal sintoma dos pacientes é a hipoglicemia, o açúcar baixo no sangue, que é a tentativa de compensação do organismo, formando outros metabólitos. É como se o organismo não tivesse um combustível adequado, que é o glicogênio, e tentasse formar energia de combustíveis inadequados, como o ácido lático e o ácido úrico. E, com o passar do tempo, isso gera enormes danos para a célula. O diagnóstico da glicogenose, diferentemente de muitas outras condições genéticas, muitas vezes é só pela suspeita clínica e exames simples, como as enzimas do fígado, como a medida da glicose, como a medida do ácido lático, como a medida do ácido úrico, como a medida da CPK, que é a enzima muscular. Então, não requer exames tão especializados ou que tenham necessidade de extrema e alta tecnologia. Alguns pacientes antigamente faziam a biópsia do fígado para ver esse depósito de glicogênio. E a análise genética nos ajuda a definir o subtipo, a classificar melhor o tipo de glicogenose. Então, aqui eu tenho... A mais frequente é a glicogenose 1a e 1b, que interfere no funcionamento do fígado; do cérebro, porque os pacientes, quando não têm açúcar no sangue, vão ter danos cerebrais graves; dos rins, porque esse glicogênio se acumula nos rins, levando à perda de proteína, quase como se fosse uma lesão renal muito parecida com a lesão do diabetes; e alterações dos nervos. A forma 1b da doença, além de todas as alterações observadas no tipo 1a, leva ainda a alterações da imunidade. Os pacientes têm deficiências imunológicas graves e alterações intestinais, alterações de absorção intestinal. Os outros tipos de glicogenose interferem também no funcionamento do fígado e também fazem acumular glicogênio tanto no fígado quanto no músculo e nos rins. E a falta dessas enzimas, então, faz com que o indivíduo acabe usando as suas próprias proteínas para gerar energia. E isso vai levando, então, a uma falência muscular progressiva. Como é que a gente faz o diagnóstico? Isso aqui, por exemplo, é uma biópsia de fígado de um paciente, cheio de glicogênio, um fígado absolutamente abarrotado de glicogênio. É como se eu tivesse uma caderneta de poupança cheia de dinheiro e não conseguisse sacar R$1 dessa caderneta. Já aconteceu isso no passado, mas agora, falando em glicogenose... O fígado está cheio de glicogênio e o organismo não consegue utilizar absolutamente nada. Isso leva a uma falência do funcionamento de inúmeros órgãos. Então, a análise de mutação genética é importante para a gente definir esse diagnóstico. Como deve ser o tratamento das glicogenoses? Diferentemente também de outras condições genéticas em que a gente pode repor a enzima deficiente, nesse caso o que a gente tem disponível hoje são as condutas nutricionais e dietéticas, ou seja, o paciente que tem glicogenose não pode ingerir grandes quantidades de açúcar, nem de frutose, nem de maltose, nem de glicose. Por quê? Esse elemento vai se depositar dentro do fígado e ele nunca mais vai poder ser utilizado porque há uma deficiência enzimática que não consegue aproveitar. É como se eu estivesse colocando dinheiro na caderneta de poupança e nunca mais fosse conseguir utilizar esse dinheiro. Então, é melhor não depositar. |
| R | Os pacientes têm inúmeras restrições dietéticas. Há necessidade de controles rigorosos dos níveis de glicose no sangue continuamente. Esses controles devem ser feitos 24 horas por dia, 365 dias por ano, para o resto da vida. Deve-se picar o paciente incessantemente e inúmeras vezes no dia para ver se o paciente não está entrando em hipoglicemia. E isso acontece sábados, domingos e feriados, nos 365 dias do ano, à noite e durante o dia. Então, eu já posso mencionar a dimensão desse problema e a gravidade dessa doença. Há necessidade de evitar infecções. Cada vez que o paciente contrai uma infecção, ele deve ir para hospital, porque ele não tem reservas suficientes para conseguir superar essa infecção sem que ele receba um soro glicosado na veia, no momento da infecção. Muitos pacientes acabam tendo que usar uma sonda, porque precisam ser alimentados a cada 3 ou 4 horas, ou um botton de gastrostomia, que faz o papel da alimentação, dia e noite, ao paciente. Há necessidade do uso do amido cru. Eu vou explicar aqui para vocês qual é o papel do amido cru e a necessidade de reposição de proteínas quando o paciente faz uso das suas próprias proteínas como energia para célula. Então, como a gente deve proceder? Evitar a hipoglicemia usando a maisena. É estranho falar que o tratamento de uma doença é com maisena. Parece estranho, mas este é o tratamento atual da glicogenose: maisena. O tratamento está no supermercado, mas, às vezes, o consumo de maisena de um paciente ao dia é meio quilo. Por quê? Porque a maisena é um amido cru, de liberação lenta, que promove a estabilização da glicose no sangue e evita o acúmulo do glicogênio no fígado. A maisena deve ser utilizada pelos pacientes a cada 3, 4 horas, dependendo da dose, dependendo do peso do paciente. Isso faz com que o indivíduo não acumule metabólitos tóxicos, como ácido úrico, triglicerídeo, lactato e corpos cetônicos. Essa maisena é remédio, ela deve ser pesada. Todos os pacientes têm que ter uma balança e têm que carregar essa balança para onde forem. (Soa a campainha.) A SRA. CAROLINA FISCHINGER MOURA DE SOUZA - O horário do uso da maisena tem que ser exato, porque, se a gente perde dez minutos, o paciente pode entrar em hipoglicemia. Então, são 365 dias do ano cuidando e pesando a maisena, cuidando do horário de se administrar e sem trégua e sem possibilidade de tranquilidade. Esse alimento é frequente. Como eu mencionei, muitos pacientes não aceitam isso e a gente tem que utilizar a estratégia de colocar uma sonda que passa pela barriga. Alguns pacientes não tomam a maisena. Toda criança ou todo adulto às vezes não quer comer, às vezes não quer ingerir um alimento, mas ele tem que ser dado. Se ele não for dado, há risco de morte. Este é o risco: a hipoglicemia pode levar à morte, então é importante que o paciente receba essa dieta de forma constante e contínua. Então, o amido de milho, a dieta contínua por sonda ou muitas vezes pela própria gastrostomia e uma dieta muitas vezes normoproteica ou hiperproteica, a necessidade do controle da glicemia. |
| R | Aqui eu explico mais ou menos qual é o papel... Quando a gente dá açúcar para o paciente, essa glicemia sobe muito rapidamente e cai rapidamente. Por isso que o paciente não pode tomar glicose. Se ele toma glicose, essa glicose vai acumular no fígado, na forma de glicogênio, e vai causar danos no fígado e danos no músculo. Se o paciente toma o amido, essa glicemia se mantém estável por mais tempo. Esse é o tratamento disponível. A gente, lá no hospital, tem algumas orientações. A gente construiu alguns manuais para os pacientes: alimentos que são totalmente permitidos, alimentos que são totalmente proibidos - fruta, zero; bolachas, restritas; açúcares, zero; leite tem que ser sem lactose e, preferencialmente, também sem açúcares; sucos, somente alguns tipos. Então, há uma restrição nutricional bastante grande. Esse é o fôlder que a gente prepara. Há uma necessidade de os pais controlarem, constantemente, o que está escrito nos rótulos. No Brasil, nós temos sérios problemas de rotulagem de produtos. No Brasil, o carboidrato vem junto, e não está especificado que tipo de carboidrato é. Isso é um enorme problema para o paciente, porque ele não sabe quanto de açúcar existe, qual é a quantidade de açúcar de frutose e de maltose. Está apenas carboidrato. Muitas vezes, nem se conhece o tipo de carboidrato. Além disso, há necessidade de reposição de vitaminas, porque a dieta é extremamente restrita. Há alguns produtos que entram no mercado já bem estabelecidos na Europa e nos Estados Unidos. No Brasil, nós tivemos a entrada apenas no ano passado, que é um amido cru de liberação lenta, que se chama Tlycosade. Aqui embaixo, vocês podem observar, nas barrinhas em azul, o tempo que dura a glicemia do indivíduo com o uso da maisena e, nas barrinhas em laranja, o tempo que a gente consegue com o uso do Glycosade. Então, alguns pacientes conseguem, com o Glycosade, à noite, ficar até seis, sete, oito horas. Se eles usassem só a maisena, teria que ser reposto a cada três ou quatro horas. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR. Fora do microfone.) - Está disponível o Glycosade? A SRA. CAROLINA FISCHINGER MOURA DE SOUZA - O Glycosade está disponível somente para quem tem recursos financeiros. O custo do tratamento com o Glycosade, no Brasil, hoje, para um paciente usar diariamente, à noite, é em torno de R$3 mil. Então, não há acesso... O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR. Fora do microfone.) - Por mês? A SRA. CAROLINA FISCHINGER MOURA DE SOUZA - Por mês. O objetivo do tratamento das glicogenoses, então, é promover o crescimento e desenvolvimento normal; evitar danos cerebrais causados pela hipoglicemia; evitar danos hepáticos, como cirrose, fibrose, risco de tumor e câncer no fígado e transplantes de fígado; evitar danos físicos e emocionais; evitar danos renais; evitar danos cardíacos; evitar anemia; evitar obesidade; evitar deficiências nutricionais; preservar a qualidade de vida; promover a independência de um indivíduo que apresenta o diagnóstico de glicogenose; reduzir ansiedade dos pacientes e seus cuidadores; e promover a sobrevida. Esse é o exemplo de uma paciente com o fígado bastante distendido. Se essa paciente não fosse tratada a tempo, provavelmente não estaria viva. Com o tratamento, o seu desenvolvimento é absolutamente normal, o crescimento, a inteligência, frequenta escola normal e regular, sem qualquer dano cerebral. Esse é um paciente na mesma condição, absolutamente normal e desenvolvimento normal, no momento em que ele recebe o diagnóstico e o tratamento correto. |
| R | Temos inúmeros exemplos de pacientes bem tratados, do ponto de vista nutricional, com uma equipe que tem conhecimento sobre essas condições, apesar de saberem que o tratamento é difícil. São pacientes que têm vida normal, que podem ser esportistas, que podem ser atletas, quando conseguem seguir rigorosamente as recomendações prescritas. Para terminar, quais são as perspectivas futuras? Já temos: estudos de terapia gênica, ou seja, para modificar o gene defeituoso, buscando possivelmente a cura dessas doenças; novas alternativas dietéticas, como termos produtos que estão em testes - estamos usando, como alternativa ao amido, o polvilho. Poderia ser uma alternativa. Estamos fazendo testes com isso. Buscamos: melhorar o entendimento da necessidade do controle metabólico das complicações da doença inflamatória; melhorar o entendimento das deficiências imunológicas; termos um registro nacional de pacientes, para sabermos a nossa casuística; e melhorar a educação médica. A terapia gênica está em andamento para a glicogenose I-A. Provavelmente tipo III também, no próximo ano. Aqui, para vocês terem uma noção do histórico, em julho de 2018, o primeiro paciente recebeu a terapia genética nos Estados Unidos. Eles já estão com quatro pacientes testados, vai para o quinto paciente neste momento. O estudo está nessa fase, na fase do coorte dois, vai para o coorte três, com o teste dessa nova terapia, que visa a curar a doença. E o que que é necessário para o Brasil? Reconhecer o Centro de Referência Nacional. Hoje nós temos cadastrados em nosso serviço mais ou menos 110 pacientes com glicogenose. O Serviço de Genética Médica é pioneiro nos estudos e nas publicações científicas nesse grupo de doenças. Desenvolver um protocolo clínico de diretrizes terapêuticas para uniformizar o tratamento no Brasil. Facilitar o acesso dos pacientes com glicogenose ao Centro de Referência Nacional via regulação, via tratamento fora de domicílio e via regulação regional. Hoje, os pacientes afetados pela condição devem esperar na fila como qualquer outro indivíduo, e tempo, para eles, é uma situação que não há. Não há tempo para não tratar essa doença. Ela deve ser tratada imediatamente, deve ser diagnosticada rapidamente. Promover novos estudos no Brasil, com melhora de financiamentos de pesquisa. Há vários grupos trabalhando. Facilitar a entrada de novos estudos no Brasil. Regras de regulação e estímulo a estudos clínicos no Brasil. Atualmente, os laboratórios não vêm para o Brasil para fazer estudos de terapia gênica. Eles têm medo das regulações do Brasil, e a gente não consegue avançar e ofertar esse tipo de estudo aos pacientes brasileiros. E reconhecer a maisena como um produto nutricêutico. É um produto médico, não é? Então, é um produto alimentar, mas ele é um produto médico. Então, do meu ponto de vista, o entendimento de pacientes com desordens metabólicas é gratificante, pela possibilidade de haver bons resultados, desde que eles estejam no centro correto e sendo tratados por pessoas que tenham bastante conhecimento. Meus colegas vão falar, mas eu gostaria de divulgar que, na próxima semana, entre os dias 14 e 16 de novembro, de forma inédita, nós traremos o Congresso Internacional de Glicogenose ao Brasil, com mais de 15 convidados estrangeiros. Esse congresso nunca houve fora da Europa, é a primeira vez que ele está vindo para a América Latina. É um desafio enorme, e eu só consegui fazer esse desafio porque nós trabalhamos em equipe, uma equipe muito grande. E, sem a ajuda da Associação de Pacientes, esse evento seria inviável. Nós estamos trazendo um evento para o Brasil que vai congregar médicos, cientistas, familiares e pacientes no mesmo ambiente, para melhorar o conhecimento dessas condições genéticas. |
| R | Então, eu termino aqui. Eu teria algumas falas sobre doença de Pompe, mas eu acredito que a doença de Pompe... Só para terminar, eu venho do hospital público, é uma equipe grande de trabalho. Nós trabalhamos em equipe e não se faz nada sozinho. Muito obrigada. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Bem, quero agradecer a participação da Dra. Carolina Fischinger de Souza e dizer que sempre é bom, principalmente de vários pontos de vista, conforme esta Mesa está representada, deixar claro no que o Congresso Nacional, a partir da experiência e do trabalho de vocês, poderia ajudar nesse processo todo. Quer dizer, a questão do centro de referência, acesso - até anotei aqui - dos pacientes ao centro de referência, o acesso, por exemplo, ao Glycosade também... Então, do que a sociedade sempre se lembrar, é solicitar ao Congresso: "Olha, se houver isso, vai ajudar, vai encaminhar, vai ser feito..." E vocês conhecem e nos orientam, não é? Eu só quero, antes de passar a palavra à Danila, já apontar aqui, para vocês terem como referência, o que já veio pelos meios de comunicação. Rodrigo Alves, de São Paulo: "O que é necessário para termos um protocolo de atendimento em nível nacional? A falta de conhecimento reflete em tratamentos inadequados". Portanto, não é? Marcos Vinícius, de São Paulo: "É difícil fazer o diagnóstico desta doença?" Até o Dr. Aníbal vai falar depois, não é? Gustavo Romano, do Mato Grosso do Sul: "Sono e repouso são nossa maior dificuldade ultimamente. E o medicamento para que possamos dormir oito horas é caríssimo. Como o Governo pode ajudar?" Não sei se está relacionado... A SRA. CAROLINA FISCHINGER MOURA DE SOUZA (Fora do microfone.) - Ele está falando sobre o Glycosade, certamente... O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Pois é. A SRA. CAROLINA FISCHINGER MOURA DE SOUZA - ... e o diagnóstico... Eu acredito que a gente só faz diagnóstico de doença rara quando a gente conhece. Se a gente não conhece, a gente nunca pensa. O diagnóstico da glicogenose não é difícil, mas, se o médico não tiver conhecimento ou souber que pode existir uma doença rara, ele vai ter dificuldade de pensar nisso. Então, acho que ele tem que evoluir no conhecimento. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - A Fernanda Carolina, lá do meu Estado do Paraná: "Por se tratar de uma doença sem cura - porém, com uma perspectiva muito boa de vida, caso o atendimento seja adequado -, é importante debater esse assunto". Quer dizer, é o conhecimento a que você se referiu. Muito bem. Então, a gente continua orientando a todos que nos procuram pelo e-Cidadania ou pelo telefone Alô Senado a também continuarem mandando intervenções. Passo, em seguida, a palavra à Danila Vieira Rocha Mantovani. Parente da Orquestra Mantovani ou não? (Risos.) A SRA. DANILA VIEIRA ROCHA MANTOVANI (Fora do microfone.) - Não, é da família do marido mesmo. (Risos.) O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - É mesmo? A SRA. DANILA VIEIRA ROCHA MANTOVANI (Fora do microfone.) - É sim. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Mas é parente do... A SRA. DANILA VIEIRA ROCHA MANTOVANI (Fora do microfone.) - Não, não, não. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Não? A SRA. DANILA VIEIRA ROCHA MANTOVANI (Fora do microfone.) - É de origem italiana, mas não é não. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Ah, tá. Então... Senão, a gente já... Isso seria também uma coisa boa, bonita. Representando as pessoas com glicogenoses hepáticas e musculares. A SRA. DANILA VIEIRA ROCHA MANTOVANI - Isso. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Com a palavra então. |
| R | A SRA. DANILA VIEIRA ROCHA MANTOVANI (Para expor.) - Boa tarde a todos os que estão aqui presentes. Eu me chamo Danila. Primeiro, eu queria agradecer a oportunidade de estar aqui falando um pouquinho sobre os representantes de glicogenose. Agradeço ao Senador a oportunidade. Agradeço ao Leandro, que me fez o convite de estar aqui falando um pouquinho sobre isso; à Dra. Carolina, que desempenha esse trabalho fantástico, sempre com muito amor e muita dedicação. Eu sempre digo que ela é como se fosse um anjo nas nossas vidas, não é? Agradeço a todos que estão aqui presentes e os que estão nos ouvindo. Vou me apresentar. Eu sou Danila, sou advogada do metrô aqui de Brasília e sou mãe da Rafaela. A Rafaela é uma criança muito especial, muito alegre, que possui dois anos e oito meses, e vou falar um pouquinho da minha história, de como foi com relação à Rafa, de como foi o nosso mundo glicogenose. Eu tive uma gestação normal, e a Rafa já nasceu apresentando as primeiras características da doença, a hipoglicemia. Tivemos um pouco de medo, mas, logo em seguida, conseguimos ter alta e iniciamos uma vida normal. Logo após tivemos uma intercorrência, com dois meses, também com as mesmas características, com uma respiração ofegante, com a hipoglicemia. Houve um diagnóstico errado, e retornamos para casa. Com cinco meses, novamente as mesmas características da doença. Fomos novamente ao hospital. E o hospital, então, começou a verificar que havia alguma coisa errada. Ela estava internando com características recorrentes, e havia alguma coisa errada. Então, a própria equipe do hospital estudou o caso e chegou à possível glicogenose. Até então, ela tinha entre a 1A e a 1B. A partir daí, a gente começou uma luta, uma luta pela sobrevivência, na verdade, porque não é fácil. A gente passa a ter um mundo de informações novas, uma vida totalmente nova daquela que a gente tinha projetado. Eu digo que a gente vive até uma questão de um luto, porque a gente deixa de ter um filho normal e passa a ter um filho com algumas especificidades, que são muito diferentes daquilo que a gente imagina. Eu não me esqueço do dia em que a médica virou para mim e falou assim: "A sua filha vai ter de viver de maisena". Eu disse: Como assim, uma pessoa viver de maisena? Não existe isso. Uma pessoa viver de maisena? "Ela: "É, ela vai viver de maisena". Então, até aquilo tudo processar na minha cabeça foi bem difícil, não foi fácil. Contei até com a ajuda do Gustavo e da esposa dele. Eles foram ao hospital comigo e me passaram muitas informações. E, a partir daí, a gente começa a ter uma rede apoio. É impressionante como a gente tem, na verdade, uma família - eu digo que a gente tem a família glicogenose -, como a gente tem pessoas próximas, que querem nos ajudar. E foi a partir dessa rede que a gente conseguiu dar os primeiros passos. Assim que nós saímos do hospital, começamos a pesquisar sobre a doença, poucas informações, chegamos à Dra. Carolina e, aí, conseguimos, com muito esforço, no sentido de controle da Rafa, sairmos de Brasília e fomos para Porto Alegre. Lá, então, começamos essa jornada, com controles muito difíceis. Dizer que é fácil... Não é fácil. É muito difícil. Só que tudo vale a pena. E a Dra. Carolina dá um suporte muito bom. Eu falo que ela é como se fosse mãe, porque, quando ela tem que puxar a orelha, ela puxa a orelha. (Risos.) Então, realmente, não é uma vida tranquila, mas, ao mesmo tempo, é gratificante. Eu vou falar um pouquinho com relação às dificuldades que a gente verifica com relação a família, que eu, como mãe da Rafa, verifico. |
| R | Nós temos pouco conhecimento sobre a doença dos médicos e profissionais de saúde. Isso é uma coisa recorrente. Por exemplo: a Rafa costuma internar com uma certa frequência, e todas as vezes que a gente tem internação, a gente tem muita dificuldade de conhecimento da doença. As pessoas não dão a devida importância à doença que ela tem. Então, nós temos como dificuldades: ausência de artigos que falam sobre a doença, poucos ensinamentos nas faculdades com relação a isso, e há necessidade de um protocolo de atendimento. A Rafa recebe acompanhamento da Dra. Carolina e, logo na primeira consulta, ela já passou esse protocolo. O que que significa esse protocolo? O que é que tem que ser feito quando a Rafaela tem uma situação de necessidade. Então, a Rafa começou a vomitar, fomos ao hospital, cheguei lá com o protocolo e falei assim: "Doutor, tem que seguir esse protocolo aqui. Ela tem que fazer esse exame de sangue, ela tem que fazer esse soro nesse sentido...", enfim, tudo o que deve ser feito naquele primeiro atendimento. O que que acontece? A maioria das pessoas não têm acesso a esse protocolo de atendimento. Eles não têm. São poucas as pessoas que têm acesso a isso. Então, quando a gente verifica as famílias, no interior da Bahia, de Minas, eles ficam totalmente perdidos. Os médicos ficam absolutamente perdidos. Uma realidade que a gente verifica também, que eu já sofri enquanto mãe da Rafa, é que, mesmo tendo o protocolo, os médicos descumprem o que está escrito no protocolo. Já passei por situações assim. Então, eu brinco que a gente deve ter uma tríplice capacidade numa internação. A gente tem que ser mãe: dar o carinho; a gente tem que ser médica: tentar orientar no sentido de ter uma conduta; e a gente tem que ser vigia, porque a gente tem que vigiar para ver se o médico está fazendo a conduta certa, para ver se está sendo feito tudo de forma correta. Outra dificuldade é com relação ao elevado custo para controlar a doença. Há o exame genético que a Dra. Carolina falou, que é um exame particular de custo alto; a biópsia de fígado, que normalmente é pedida para a maioria, só que é mais invasivo; e a importância do diagnóstico certo, para fazer o tratamento correto. Outra dificuldade nossa é a rotina desgastante. Como a Dra. Carolina falou, temos que controlar a alimentação deles a cada três horas, seja de dia ou de noite, seja sábado, domingo, feriado... Isso implica uma privação de sono tanto da família quanto da criança. É uma ansiedade que a gente vive 24 horas no dia, para saber se aquela pessoa está com a glicemia boa e saber se ela não está tendo algum dano com relação a isso. Para se ter uma noção, essa é uma dieta da Rafa, logo que a gente chegou até a Dra. Carolina, quando ela tinha seis meses de idade. Se vocês verificarem, são 15 horários diferentes em que nós temos que controlar a alimentação dela. Então, durante 15 vezes ao dia, pelo menos, eu preciso estar manipulando-a de alguma forma, para que ela não caia em uma hipoglicemia. Então, aí vocês podem ter um pouquinho da dimensão de como é desgastante essa rotina. Realmente, ela é muito desgastante. Isso aqui eu até salvei, foi em dezembro de 2017. A Rafa estava com uns nove meses. Cada pontinho azul desses é o meu despertador que tocava, para eu ver se a Rafa estava bem. Então, olhem isso. Eu até me emociono, porque é muito difícil. Esse é um controle muito difícil. As pessoas não têm dimensão de como é essa jornada que a gente tem. Então, outra dificuldade são os elevados custos. Precisamos de um leite especial à base de soja; o amido de milho em grande quantidade, como a Dra. Carolina havia dito, que é alimento mas não é visto como medicação. Para algumas pessoas, ele realmente se torna de elevado custo, apesar de ser barato se você comprar uma caixinha, mas quando você usa em grande quantidade não é. Para que haja um bom controle, a gente precisa fazer o controle de glicemia, que é por meio das tiras de glicemia. |
| R | Suponhamos que nós fizéssemos o controle a cada três horas: quantas tiras de glicemia nós precisaríamos por dia? Cada caixinha de glicemia, da qualidade que é boa, custa uma média de R$100. Porque ainda há essa questão: às vezes, a gente até consegue pelo Governo algumas tiras, mas não são da que tem qualidade boa. Fazendo um paralelo com relação à imunidade, hoje há o Filgrastim, por exemplo, que é uma medicação para aumentar a imunidade, à qual também há dificuldades de acesso; ou às vezes as licitações verificam, concedem a medicação que não é a que seria realmente correta, a que seria realmente boa. Com relação à situação do Brasil, eu verifico assim: dentro do meu mundo, do mundo que a gente vive, dentro de grupos de glicogenose, a situação é muito diferente. Em Brasília, que é onde eu moro, a gente tem até uma situação relativamente favorável. A gente consegue ter acesso a muitas coisas, mas a gente não vê essa situação quando vai para o interior de Minas, na Bahia, enfim, no Norte... Digo isso porque a gente se comunica muito com as famílias, então a gente vê realmente a diferença. E esses tratamentos, a observação desses tratamentos de forma correta vai dar uma consequência benéfica lá no final. Outra dificuldade que a gente verifica muito com relação às pessoas que têm glicogenose é a recusa alimentar. Minha filha hoje tem dois anos e oito meses, e uma batalha que eu enfrento hoje é essa recusa alimentar. Ela não tem muita aceitação com relação a alimentos, não sei se é porque... Provavelmente é porque a gente teve uma supressão da fase oral dela: quando era o momento de ela estar comendo, a gente estava pensando em dar vida para ela. Então, na verdade, o nosso foco acabou sendo outro. A gente tem uma carência imensa de profissionais que sejam habilitados para tratar de recusa alimentar. Isso é uma coisa que eu verifico muito aqui em Brasília. Eu já fui para São Paulo, já fui para diversos lugares para tentar um tratamento bom para a minha filha, e realmente a gente tem muita carência com relação a isso. E, quando se encontra, é um tratamento caro e relativamente longo, estressante. Ainda com relação a algumas dificuldades, eu vou fazer um paralelo com relação à minha situação, para citar a ausência de benefícios para as mães trabalhadoras ou familiares. Na época em que eu tive a Rafa, eu era servidora do TRF, então eu tive um amparo muito bom lá e consegui ficar com a minha filha até ela completar um ano de idade. Eu consegui extensão lá no meu trabalho, consegui me afastar para cuidar dela, e eu vejo que isso foi extremamente importante. Se não tivessem me dado esse tempo, eu não teria voltado ao mercado de trabalho. Então, foi importante eu ter esse apoio. E, quando você faz um paralelo com o pessoal que é, de repente, empregado, não há essa preocupação. Então, eu acho que essa é uma coisa importante também, que deve ser observada. Então, a conclusão que eu faço é no sentido de dar atenção, de que se devem estabelecer políticas públicas voltadas para essas doenças raras, para trazer uma qualidade de vida para os pacientes, trazer uma qualidade de vida para as famílias. E é extremamente importante o estabelecimento de protocolos de atendimento, para que haja uma uniformidade de atenção a essas doenças. E é preciso chamar a atenção da sociedade para as dificuldades que as famílias enfrentam, que são muito grandes. Eu concluo aqui, mostrando algumas fotinhos de algumas crianças que me mandaram, para dizer que vale a pena. A minha filha é aquela que está com um porquinho ali. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR. Fora do microfone.) - Qual é a sua? A SRA. DANILA VIEIRA ROCHA MANTOVANI - É aquela que está ali com o porquinho, a Rafaela. (Pausa.) Então, essas são algumas crianças com cujas mães eu tenho contato. A gente tem esse contato, e são crianças que estão fazendo um tratamento legal e estão tendo um desenvolvimento legal. Essa aqui é a minha filha. Há como botar o vídeo? O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR. Fora do microfone.) - Sim. (Pausa.) A SRA. DANILA VIEIRA ROCHA MANTOVANI - Está sem o áudio! (Pausa.) Tem o áudio? |
| R | Tem o áudio? Não está? (Intervenção fora do microfone.) A SRA. DANILA VIEIRA ROCHA MANTOVANI - Como é que faz aqui? (Pausa.) (Procede-se à exibição de vídeo.) A SRA. DANILA VIEIRA ROCHA MANTOVANI - Eu concluo aqui deixando essa imagem da minha filha. E concluo dizendo que tudo vale a pena, apesar de ser uma rotina desgastante, um mundo diferente do de outras mães, de outras famílias; vale a pena todas as vezes em que eu vejo esse sorriso, que eu chego a casa e está ela lá pulando em cima de mim, querendo saber como foi o meu dia. Boa tarde. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Viu, Danila? Muito interessante e importante. E a gente vê que o papel da mãe, da família é fundamental. Temos que ajudar as famílias todas. Como você colocou, que as famílias das pessoas com glicogenoses sejam apoiadas. Mas tudo isso que você e a Dra. Carolina colocaram é o que a gente quer: vamos colocar o que é necessário ter na legislação, porque o alimento, nesse caso, é a medicação, não é o alimento; é alimento e medicação, como já foi colocado. Então, a gente deve fazer um documento - por último, vai falar o Renato - para o próprio Ministério da Saúde ser orientado. Mandamos isso, fazemos um documento. O Aires está aqui, a Ivanilde também. Vamos colocar isso num papel, como um documento desta audiência pública para nos articularmos com o Ministério da Saúde, porque eles vão retribuir multiplicadamente durante a vida: vão ter uma vida normal, vão ter menos gasto de hospital, de internação, vão trabalhar, quer dizer, vão gerar imposto, renda, independência. E a pesquisa continua no sentido de se achar outras formas de atendimento. Muito bem! Passamos, em seguida, a palavra ao Leandro... Mas, parabéns, viu? Parabéns! Fique firme! Tem que ficar firme e dizer para os outros: "Vamos em frente também". Leandro Rodrigues Pereira, membro fundador da Associação Brasileira de Glicogenoses Hepáticas e Musculares. O SR. LEANDRO RODRIGUES PEREIRA (Para expor.) - Boa tarde a todos. Agradeço-lhe o convite, Senador Flávio Arns, para participar desta importante audiência para todos os pacientes com glicogenose, para todas as famílias. Cumprimento a Dra. Carolina, que é uma das maiores especialistas do mundo no tema. Cumprimento toda a Mesa também. Cumprimento todos que estão nos escutando e todos os membros da Abglico (Associação Brasileira de Glicogenose). |
| R | Venho trazer um pouco da nossa fala, que é absolutamente alinhada ao que a Dra. Carolina trouxe já, que a Danila também apresentou para nós. Então, a glicogenose, sim, é uma doença que exige uma vida no relógio. Ela exige de todo paciente, de todas as famílias, de todo círculo familiar uma vida no relógio, com consumo de amido e aferindo sua glicemia. Ela exige também uma necessidade de uma dieta extremamente restrita, com proibição de ingestão de leite, proibição de ingestão de açúcar e de frutas também. Então, é algo bem difícil de se conviver. Mas a gente entende que, ainda que com suas restrições, com o tratamento adequado, a vida do paciente com glicogenose pode e deve ser plena. Então, a gente tem conhecimento aí de pacientes com glicogenose que levam vida quase que normal. Pacientes que se formam, que estão absolutamente inseridos no mercado de trabalho, estão contribuindo para o crescimento, pelo menos para busca o retorno do crescimento do nosso País, que é tão necessário, pacientes que são médicos, dentistas, advogados, enfim, tantos outros que estão aí para poder fazer o País voltar a crescer. Por outro lado, há outros pacientes que não reúnem essa condição, que estão dentro dos hospitais praticamente a vida inteira, porque não conseguem ter um tratamento minimamente adequado, pacientes sequelados e outros que vão a óbito também. Isso é um retrato de um País com poucos especialistas no tema; é um retrato de um País que tem uma inexistência de protocolo para atendimento desses pacientes no SUS; retrato de um País que não possui hospitais preparados para receber os pacientes; do baixo investimento em pesquisa; de tratamentos que não possuem o apoio, o subsídio necessário do Governo. Isso, no fim das contas, num País com tamanha desigualdade social, em que a base da pirâmide é de pacientes que têm pouco acesso a recursos financeiros e até a tratamento médico e ao próprio conhecimento resulta em uma grande ainda quantidade de óbitos e pacientes ainda com sequelas graves, sequelas importantes. Tenho certeza de que os senhores aí que acompanham toda essa questão das doenças raras sabem que isso é um quadro que é comum a outras doenças também e em que a gente precisa avançar. Então, dentro desse contexto de que é possível e é necessário ter uma vida plena para os pacientes com glicogenose, em outubro de 2017, um grupo de famílias e de pacientes com glicogenose se uniram para poder formar a Abglico, que tem como objetivo representar os pacientes com glicogenose. E o objetivo maior é o de trazer um tratamento adequado para esses pacientes. Então, a gente se juntou, reunindo esforços no sentido de mudar esse cenário. A gente precisa mudar esse cenário. A gente tem perdido ainda pacientes jovens com glicogenose. Isso não pode acontecer! Nessa semana agora, houve um óbito de um paciente com glicogenose, uma criança faleceu por glicogenose no Brasil. E a gente está fazendo o nosso melhor para mudar essa realidade. |
| R | Então, a Abglico é uma associação sem fins lucrativos. Ela tem o objetivo dar suporte e direcionamento ao correto tratamento da doença. Nossa missão maior é levar informação aos pacientes, familiares e profissionais de saúde. É uma doença rara, e a maior parte dos médicos do País pouco ou nada conhecem sobre a doença também. Então, disseminar o conhecimento é a nossa grande missão. A sede da nossa associação fica no Rio Grande do Sul. A gente tentou trazer a sede da associação para o mais próximo possível que a gente podia do principal centro que tem atendido os pacientes com glicogenose, que fica no Rio Grande do Sul. Então, uma das razões de ter essa sede lá no Estado também era de facilitar essa interação aí com o centro do Hospital das Clínicas de Porto Alegre. Hoje nós temos um cadastro total de 112 pacientes. Esse número precisa ser atualizado. Por conta desse óbito que houve, esse número não está atual. Então, 111 pacientes a gente tem. A divisão entre sexo é pouco relevante, então é uma divisão equilibrada em sexo masculino e sexo feminino. E a maior parte dos pacientes hoje vive na Região Sudeste: 60%, pelo menos dos que a gente tem conhecimento. Esse é um cadastro da associação, um cadastro recente. E, do que a gente tem conhecimento, 60% está na Região Sudeste, mas existem pacientes com glicogenose em todas as regiões do País. A glicogenose mais frequente no nosso cadastro, o que coincide com os estudos mundiais também, é a glicogenose tipo 1, no subtipos a e b. Então, essa é a mais frequente entre os associados. Está trazendo, quando se somam 1a e 1b, quase 80% dos cadastros que a gente tem hoje. Aqui, junto com a equipe de Porto Alegre, a gente assumiu o desafio de fazer um congresso internacional de glicogenose no País. Esse congresso é o 5º Congresso Mundial sobre o tema. E a gente está tendo esse privilégio, a gente conseguiu se organizar com campanhas para arrecadar os recursos necessários, para fazer, com o apoio de toda sociedade... É provável que alguns dos senhores já tenham recebido essa campanha nas mídias sociais. Nós arrecadamos os recursos necessários e estamos organizando aquele que vai ser o maior congresso da história do mundo de glicogenose. E ele vai ser no Brasil na semana que vem. Como a Dra. Carolina já trouxe, a gente tem especialistas do mundo inteiro, os maiores especialistas do mundo estarão no nosso congresso. Conseguimos também... Uma dificuldade grande era levar os pacientes para o congresso. Então, com a nossa campanha, a gente conseguiu arrecadar os fundos necessários para poder levar os pacientes mais carentes. A nossa associação conseguiu esse recurso e estamos fazendo o nosso melhor, para que todos tenham acesso ao conhecimento, ao melhor tratamento e tenham uma vida plena. |
| R | A gente tem trabalhado em grandes pilares, com pacientes, familiares, médicos e especialistas, hospitais e universidades e também com a indústria farmacêutica. Queremos conectar as instituições e temos um objetivo grande que é ter um grande centro de pesquisa e de tratamento especializado em glicogenose. Para isso, é fundamental o apoio do Poder Público. São necessárias verbas para pesquisa, são necessárias verbas para manutenção no centro de tratamento especializado, é necessário viabilizar que os pacientes consigam chegar a esses centros de tratamento. Moramos em um país continental, e os recursos necessários para o deslocamento de um paciente, por exemplo, do Pará até o Rio Grande do Sul, não são pequenos. A gente precisa do apoio para poder fazer com que isso aconteça. Da mesma forma, a gente está falando de uma doença rara e não faz o menor sentido haver centros de tratamento em todo o País. Isso seria desperdício de dinheiro público. Então, a gente precisa de poucos centros de tratamento, mas que os pacientes de todo o País consigam ter acesso a eles. Nesse sentido, eu trago aqui para os senhores que é muito importante a gente fazer uma discussão relevante, Renato, sobre a Portaria 199, de 2014, a portaria ministerial. A portaria traz as diretrizes para a atenção integral às pessoas com doenças raras. É justamente disto que a gente precisa: atenção integral para os pacientes com glicogenose. Um exemplo que trago, Renato, é que, no Distrito Federal, os pacientes com glicogenose não conseguem retirar tiras para glicemia nos postos de saúde, porque, para retirar uma tira para glicemia nos postos de saúde, a pessoa precisa estar inscrita no Hiperdia. Eles não têm diabetes, mas precisam das tiras. Então, a gente precisa superar esses obstáculos. Precisamos superar os obstáculos e propiciar aos pacientes com glicogenose o acesso, de fato, integral às suas necessidades. A Portaria 199, de 2014, traz que compete ao Ministério da Saúde estabelecer, através de Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas, que são os PCDTs, as recomendações de cuidado para tratamento de doenças raras, incluída nelas a glicogenose. Então, a gente precisa aqui, de forma muito objetiva, desenvolver um PCDT para que as tecnologias necessárias, que são poucas e de custo não tão elevado para o sistema de saúde... Se para um indivíduo que ganha um salário mínimo isso é muito alto, talvez para o Sistema Único de Saúde sejam valores muito pequenos. E nós necessitamos do apoio do Ministério da Saúde para, de fato, termos implementado um PCDT para as glicogenoses e que as necessidades terapêuticas de uso dos pacientes sejam incorporadas pela Conitec. Renato, a gente conta com a sua sensibilidade, com o seu apoio, para a gente poder avançar nesse tema. |
| R | Qual é a nossa prioridade? Qual é a prioridade da Abglico em relação ao tema? A Abglico entende, como prioridade número um, o estabelecimento de um PCDT para o tema, para a glicogenose; investimentos em pesquisas e capacitação profissional - como a Dra. Carolina trouxe aqui, o diagnóstico da glicogenose não é caro, não é tão complexo, mas é preciso conhecimento. Se a gente não tiver conhecimento sobre a doença disseminado no País, crianças vão continuar morrendo, o País vai continuar deixando de ter pessoas que podem ser produtivas, que podem trazer avanço para o nosso País e passar a ter pessoas que vão ser dependentes do sistema de saúde. Nós não queremos mais crianças sequeladas; nós queremos crianças capazes, adultos que sejam produtivos. Esse é o nosso objetivo; e nós precisamos de políticas públicas política para apoiar as famílias com glicogenose. Foi um grande avanço o projeto de lei de iniciativa do Senador Romário aprovado e que trouxe a possibilidade aos pacientes com deficiências e doenças raras possam ter redução de horário no serviço público, mas é preciso que isso avance também para a iniciativa privada. As pessoas precisam ter condição de cuidar das crianças. Isso é o mínimo necessário para as crianças se desenvolverem de uma maneira adequada. Então, dentro desse contexto, Senador Flávio, a gente clama pelo apoio do Senado Federal para a gente seguir o sonho. É um sonho que deixou de ser individual; hoje o sonho não é mais ter o meu filho com uma boa condição de saúde. Graças a Deus ele tem, ele está se desenvolvendo de forma normal, mas o sonho é maior: o sonho é para os pacientes de glicogenose do País. E a gente conta com o apoio de todos os senhores, do Ministério da Saúde, do Senado Federal, da equipe de Porto Alegre. Enfim, a gente conta com o apoio dos pacientes com glicogenose para nos unirmos e podermos alcançar esse objetivo maior. (Soa a campainha.) O SR. LEANDRO RODRIGUES PEREIRA - Agradeço, Senador Flávio, a oportunidade. A Abglico está à disposição de todos para qualquer ação que se faça necessária para se implementarem políticas em prol dos pacientes com glicogenose. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Eu quero dizer para a assessoria e para os presentes que o Leandro Rodrigues Pereira, além de pai e membro fundador da associação, reside aqui em Brasília também. Então, é bastante facilitado o aspecto de se sentar junto com o Renato e com esta Comissão para colocarmos no papel tudo isso. Está certo? Você nos ajuda também? Parabéns pela apresentação, que foi muito boa! Parabéns! Passo em seguida a palavra ao Dr. Aníbal Gil Lopes. Tanto se falou de qualificação, de formação, de conhecimento, e o Dr. Aníbal é membro da Câmara Técnica de Doenças Raras do Conselho Federal de Medicina. Com a palavra o Dr. Aníbal. |
| R | O SR. ANÍBAL GIL LOPES (Para expor.) - Em primeiro lugar, eu gostaria de agradecer o convite do Senador Flávio Arns para que o Conselho Federal de Medicina aqui estivesse representado. Eu acho que a sequência das falas é importante, porque nós, até o momento, ouvimos uma série de problemas e dificuldades, todavia, nós temos que encontrar caminhos de solução. Eu gostaria de lembrar que, quando a gente olha uma doença que gera incapacidade, que gera dependência, que gera deterioração de saúde, uma doença em particular, às vezes a gente esquece que são milhares de doenças semelhantes. Hoje nós estamos tratando de uma, mas são pelo menos 8 mil doenças raras - em torno disso -, e o número de doenças raras só crescerá à medida que a capacidade diagnóstica for se aprimorando. Ao lado das doenças raras, que geram deficiência, dependência e sofrimento, acima de tudo, para a família, gostaria de lembrar que há inúmeras outras causas de deficiências, que vão desde os acidentes - talvez os acidentes automobilísticos no País sejam uma das coisas mais graves como geradores de mutilações e dependências -, a toda a questão do aumento da sobrevivência com outras lesões, em que as demências, o AVCs... Portanto, nós temos um grande contingente de pacientes, que são muitos milhões, que dependem de ações muito semelhantes em termos de cuidados. Uma coisa é eu tratar de doença, outra coisa é eu cuidar de pessoas. Gostaria de enfatizar isso, porque, se eu for pensar em termos de saúde pública, eu tenho que sempre estar tentando descobrir ações que sejam simples, que sejam executáveis e que tenham um grande impacto. Quer dizer, quais são as pequenas ações com grandes impactos? Então, acho que essas são perguntas... Quando a gente olha saúde pública e o bem-estar do nosso cidadão brasileiro, eu tenho que sair em busca de soluções que contemplem esses milhões e milhões de pessoas que vivem em situação de restrições e que não são pessoas unicamente. Imagine um pai e uma mãe, uma família que tem que cuidar durante dez, vinte, trinta anos ou mais de uma pessoa de qualquer idade - pode ser um recém-nascido, pode ter 90 anos de idade - com restrições que envolvem o seu dia inteiro, o cansaço, o sofrimento em todos os níveis. Às vezes a gente não considera o sofrimento emocional como uma doença para ser tratada, mas eu acho que um dos pontos fundamentais são os cuidadores. Quais são as ações que nós temos para que os cuidadores suportem esse pesadíssimo encargo - que pode ser feito com todo o amor, e ele não fica menos pesado? E eu diria que, em termos de doenças raras, um número considerável de pais abandona suas esposas diante de uma grave doença rara, ficando a mulher com a responsabilidade integral de todos os cuidados. Isso é extremamente comum, quem tem prática médica sabe que isto é talvez 50% - esse número sai da minha experiência, não é um dado científico, mas um número considerável de pais abandona. Ou seja, há um número expressivo de mulheres que carregam uma carga extremamente pesada. |
| R | Há algumas coisas que eu acho que a gente poderia pensar e encaminhar. O Conselho Federal tem tentado olhar a questão das doenças raras na perspectiva de que, se eu for capaz de agrupar essas doenças por certos sintomas comuns, eu posso mais facilmente preparar o médico na ponta para que ele desconfie da presença de uma doença rara. Não é diagnosticar a doença, é saber que ele está diante de uma criança com uma doença rara, que necessitará, portanto, de uma abordagem especializada. Para isso, o Conselho Federal tem desenvolvido uma série de vídeos, em associação com a Sociedade Brasileira de Genética Médica, genética clínica, e estamos nesse momento terminando mais uma série de vídeos, disponibilizados no portal do Conselho Federal. A tentativa é de que qualquer médico possa em algum momento compreender a questão das doenças raras. É impossível num currículo de seis anos de um curso médico eu apresentar doenças. Eu apresento mecanismos básicos de doenças, grupos de doenças, mas eu não vou ter o ensino dessas 8 mil doenças no curso médico, não existe tempo para isso, é inviável. Mas é viável que o médico desenvolva a percepção da possibilidade de um diagnóstico de doença rara. Portanto, o Conselho Federal age nessa direção, e acho que todas as sociedades de pacientes ligados a doenças particulares de alguma forma poderiam divulgar o nosso trabalho no meio médico, porque eu não posso esperar que o médico lá conheça isso, não faz parte da formação geral do médico. E no País, salvo engano de minha memória, nós não devemos ter mais do que 300 médicos especializados em genética médica, genética clínica - no País inteiro. O último número que eu tinha era em torno de 270, 280; eu estou dizendo 300, mas não deve haver 300 ainda neste momento. Portanto, incentivos educacionais. A segunda coisa extremamente importante é que nós devemos... É muito importante sabermos quais são os doentes e onde eles estão, não de uma doença, mas de todas as doenças. É uma coisa urgentíssima, Sr. Senador, que se crie um prontuário eletrônico nacional. É alguma coisa viável, depende de uma série de, eu diria, desejos políticos, mas é impossível que a gente não desenvolva na contemporaneidade a possibilidade de cada pessoa deste País ter um prontuário acessível onde quer que ele esteja. Se ele for atendido em uma emergência, não é um paciente desconhecido, entra-se e se tem o prontuário. Isso tem várias vantagens, todos os registros desse paciente poderão ser acompanhados por qualquer médico em qualquer situação. |
| R | Acho que seria um dos grandes avanços para a Medicina brasileira termos a vontade política e pagarmos o custo do desenvolvimento. O desenvolvimento não é um segredo. Fazer um prontuário nacional não é um segredo. Há prontuários hospitalares. A questão é a intercomunicação, portanto, a adoção de padrões uniformes para que haja um prontuário nacional. Particularmente para doenças raras, isso seria de extrema utilidade, porque, tendo em vista que os sintomas e os tratamentos não são usuais, a presença disso no prontuário supera, eu diria, em larga escala, um protocolo, porque o protocolo a pessoa tem que conhecer. E, se esse protocolo estiver embutido no próprio prontuário do paciente, ele será muito mais bem tratado. Então, Sr. Senador, gostaria de que a ideia de um prontuário eletrônico nacional fosse realmente levada adiante. Já se falou muito nisso, e não se tem caminhado nessa direção. O prontuário nacional permitiria o cadastro nacional dos pacientes, permitiria uma série... Claro, se eu tenho o prontuário, tenho formas, palavras-chave para recuperar informações. Inclusive, sem um prontuário médico eletrônico nacional, pesquisa médica no País é altamente restrita. Tenho que fazer corte encontrando pessoas, enquanto, com o prontuário nacional, eu tenho todos os pacientes, com todas as suas variáveis, todas as suas características. Protocolo terapêutico. Por acaso, também sou membro da Conitec, que é o organismo que... O Ministério da Saúde promove a elaboração dos protocolos, a Conitec analisa e dá um parecer, uma recomendação ao próprio Ministério para que esse protocolo seja incorporado ou não. A questão dos protocolos exige que haja um grupo que suscite a discussão. A gente não faz protocolos, é impossível fazer, se não houver grupos de pessoas especializadas capazes de fazer um bom protocolo. Pela apresentação de hoje, eu entendo que há um grupo capaz de propor um protocolo. Portanto, essas coisas são muito simples, basta entrar em contato com a coordenação da Conitec, com o Ministério da Saúde. São caminhos bastante simples. Às vezes, a gente se assusta com a estrutura de Governo, a gente acha que a estrutura de Governo está muito longe da gente, mas essa estrutura de Governo, se eu conhecer, é de acesso muito facilitado. Então, segunda proposta que eu faço no dia de hoje: que se encaminhe a criação, a elaboração de um protocolo. O simples fato de ter um protocolo traz resultados muito limitados. Por quê? Porque o médico que atende aquele paciente, aquela criança, no caso, não conhece o protocolo. Ele não vai conhecer todos os protocolos. E nós temos que aumentar a sensibilidade diagnóstica, e não por doença, mas por grupo de doenças. É a abordagem que o Conselho Federal tem tomado, e talvez possa ser expandida dentro de outras associações. Temos uma necessidade urgente de ter programas que levem ao médico de ponta os conhecimentos mínimos necessários para desconfiar do diagnóstico de uma doença rara. Se ele desconfiar, ele encaminha. É o outro ponto. |
| R | Eu tenho mais uma questão. Acho que eu estou ficando velho. A gente esquece as coisas. Diagnóstico precoce, grandes impactos... O último ponto que eu gostaria de tocar: hoje nós estamos formando no sistema universitário brasileiro, e nos sistemas universitários paralelos, que são os dos países vizinhos: Paraguai, Argentina, Bolívia, um número imenso de médicos sem o mínimo de qualificação - sem o mínimo de qualificação. Não é que ele não saiba diagnosticar doença rara. Ele não é capaz de passar no exame Revalida. E diria mais: dos médicos formados no País, um número considerável não passaria no nos exames mínimos de qualificação, como, por exemplo, o que durante vários anos o Conselho Regional do Estado de São Paulo fez, que não traz nenhuma restrição à atividade profissional, mas revela, como um diagnóstico, que nossos médicos recém-formados - são recém, mas depois estarão com 10 ou 20 anos de formados -, que a qualificação profissional está em crise. É impossível termos 340 escolas médicas no País. Nós não temos professores, hospitais, lugares para o seu preparo. Nós temos 60 mil alunos matriculados nas escolas de fronteira, do lado de lá da fronteira, mas que se preparam para voltar para o País. Portanto, a questão do Revalida é fundamental. Não adianta eu discutir uma doença, esperar que alguém saiba diagnosticar se eu não trato de um problema fundamental: formação de médico. Então, esses seriam os pontos, Sr. Senador, que eu acho que... Eu sou formado há muitos anos. Minha vida foi pesquisa de bancada em laboratório, trabalhando com mecanismos moleculares, portanto... A professora foi muito sintética, porque os detalhes bioquímicos são imensos. Nós investimos muito pouco em pesquisa básica. De vez em quando, a gente tem, eu diria, um acesso espasmódico em que eu vou dar um dinheiro para um tipo de pesquisa. Pesquisa não se faz espasmodicamente. O conhecimento tem que ser adquirido, desenvolvido sem finalidades práticas, porque é nesse momento que eu descubro aquilo que não se sabia que eu vou correlacioná-lo com a realidade, com a doença, com o alvo terapêutico, com o desenvolvimento terapêutico. Então, Sr. Senador, eu acho que este momento é extremamente importante, porque nós, colocando-me aqui junto, as duas subcomissões conseguiram reunir em torno de uma doença a questão do sofrimento humano, a questão de quais são aquelas ações factíveis que podem alterar esse sofrimento humano. Doença é sofrimento. Doença que gera incapacidade é sofrimento familiar, é sofrimento estendido. |
| R | E nós muitas vezes imaginamos que vamos cuidar de uma doença. Eu tenho que cuidar do doente e de sua família. Às vezes, não é o remédio o fundamental; é uma série de outras coisas, como acompanhamento, e não só psicológico. Quem é que pode dividir o tempo? Qual a importância, por exemplo, de ter uma pessoa que passe um dia por semana com o doente para dar folga para mãe, para que ela possa ir ao seu próprio médico, ao supermercado, à loja, pagar conta? Quer dizer, como é que o serviço público, através de atendimento domiciliar, pode ter uma presença substitutiva? Isso vale mais do que muitos remédios. Então, que a gente sempre tenha um olhar para o bem-estar da pessoa, o bem-estar da pessoa no seu meio, porque as nossas ações, às vezes a gente esquece, podem ser muito singelas. Um pequeno elevador para transferir um doente da cama para a cadeira tem um impacto imenso. E a gente não desenvolve no País pequenos aparelhos para o que eu vou chamar de manipular, mexer com o paciente. Agradeço. Desculpe-me por ter falado além dos dez minutos. Gostaria de colocar também a Câmara Técnica de Doenças Raras como o espaço onde ideias podem ser trocadas com o próprio Senado, a Câmara, o Governo, o Ministério da Saúde. Obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Muito bom em todos os aspectos. O SR. ANÍBAL GIL LOPES (Fora do microfone.) - Encontrar soluções. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Encontrar soluções. É isso mesmo. A gente fala muito isto em termos de pessoa com deficiência, às vezes, as pessoas falam assim: da pessoa com deficiência como uma dificuldade. Eu digo: não, pessoa com deficiência, família que tem um filho com deficiência precisa saber, ter a certeza de que o que ele precisa vai ser encontrado - escola, tecnologia, material. Doença rara, a mesma coisa. Achar soluções, construir soluções. Nós passamos a aplaudir depois da segunda apresentação, mas vamos aplaudir a Carolina, que foi a primeira, não é? (Palmas.) (Risos.) É que nós não estávamos... A segunda foi a mãe, depois nós continuamos. E vamos aplaudir o Renato também - não é, Renato? -, porque vai trazer soluções para tudo agora. Mas eu acho que você não deve ter essa preocupação. Eu acho que nós temos que ter a boa vontade, a sensibilidade do Ministério da Saúde. Tendo isso, já será metade do caminho andado. Junto com a federação, com a associação, com a parte médica, construir uma solução, quer dizer, tem que ser construída. Então, com a palavra o Renato Teixeira. O SR. RENATO ALVES TEIXEIRA LIMA (Para expor.) - Gostaria de cumprimentar o nobre Senador Flávio Arns. Nós estamos, em algumas audiências aqui, juntos. E o senhor conduz sempre com muita sabedoria esta Comissão. Meus parabéns também ao senhor. Estou aqui hoje representando a Coordenação-Geral de Atenção Especializada do Ministério da Saúde, que tem como uma das pautas as doenças raras. Já tive o privilégio, como disse aqui anteriormente, de estar com o Senador Flávio em outras audiências, falando de outras doenças também raras. |
| R | Como já foi bem colocado, nós temos cerca de 8 mil, entre 6 mil a 8 mil doenças. E a gente sabe que nossos dados epidemiológicos hoje sobre essas doenças, até do número de doenças ao número de pacientes, não são conhecidos. Para isso o Ministério da Saúde lançou um edital este ano, se não me engano, em julho deste ano, justamente para termos estas respostas: quantas são as doenças, quantos são os pacientes que têm essas doenças raras aqui no Brasil, para, a partir de um conhecimento epidemiológico, traçarmos novas estratégias. É preciso saber com o quê e quanto estamos lidando aqui no nosso País. Em relação à glicogênese, como foi bem colocado aqui pela Dra. Carolina, que nos falou de uma forma bastante sintetizada, mas de bem fácil entendimento, trata-se de um grupo de doenças para as quais realmente o diagnóstico, para quem entende, para quem tem uma formação, se torna fácil, mas para quem não tem noção acaba se retardando o diagnóstico, levando, como o Leandro colocou aqui, a sequelas que, às vezes, podem causar a morte. Bem, em relação à Portaria 199, que foi colocada aqui, que é a portaria que trata das doenças raras no Brasil, ela foi colocada de maneira dividida em eixos, porque, como estamos falando de várias doenças, e não de uma doença única, foi alocada em eixos. E são esses eixos que nos promovem a questão das diretrizes para podermos juntar algumas doenças com características semelhantes a fim de adotar as ações necessárias. Já foi colocado dentro do Ministério da Saúde, discutido, que é necessária a revisão da portaria, que essa portaria tem falhas e que se faz necessário escutar a questão social, as associações, os que representam normalmente os pacientes. Na última audiência em que estivemos juntos, Senador, fizemos o compromisso da formação de uma comissão dentro do Ministério da Saúde com participação dos gestores e também da sociedade, representada por essa associação. E foi plenamente atendida, vista com muita sensibilidade e boa vontade por parte dos gestores que estão hoje dentro do Ministério a questão de realmente fazemos essa comissão e, junto com essa participação social, determinarmos uma nova portaria, na verdade, fazermos uma readaptação dessa Portaria 199 para que sejam atendidas as necessidades em relação a essas inúmeras doenças, 8 mil, vamos tratar desse número. O Ministério da Saúde está bastante sensível. Estamos lá na Coordenação, que é a responsável no Ministério da Saúde por atendê-los. Como o Dr. Aníbal colocou, às vezes, as associações, os pacientes entendem o Ministério, a gestão como algo distante, mas não. Estamos lá disponíveis para recebê-los e para caminhamos juntos, para que os pacientes e também os familiares sejam atendidos, como foi colocado aqui, em diversas situações. Temos de tratar os doentes, mas temos de dar condições para que os familiares e o SUS desenvolvam esse trabalho. Na verdade, o pai, a mãe, os familiares é que estão ali junto a quem necessita de um atendimento de uma forma especial. Trago essas palavras aqui, tanto as do nosso Secretário quanto as do nosso Diretor, no sentido de colocar o Ministério à disposição. Vamos fazer com que essa nova portaria seja publicada de forma mais efetiva para dar esse atendimento ao País. |
| R | Obrigado, Senador. Estou à disposição. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Habitualmente, de acordo com o Regimento, a gente não aplaude nem vaia, porque todo mundo tem de ter a liberdade de falar aquilo que achar importante, mas, da minha parte, foi muito interessante tê-lo escutado, e é motivo de aplauso mesmo o estudo, a luta, a luta da família, o trabalho da família, a organização de uma federação, a perspectiva do Conselho Federal de Medicina e do Ministério da Saúde. Eu comentava isso com o Leandro também, porque eu penso que há soluções que servem para todos. O prontuário eletrônico, por exemplo, serve para todo mundo, tenha doença rara ou não. Aí cada pessoa teria... Se eu fiz os exames em Curitiba e vou para a Bahia, se me sinto mal na Bahia, não preciso fazer todos os exames de novo, pois estão todos no prontuário, eventualmente. Esse seria um avanço interessante. Porém, ao mesmo tempo, temos que lidar com o dia a dia de um problema que existe, de uma necessidade que existe. Por isso, eu comentava com o Leandro, que faz parte de uma federação brasileira que congrega as pessoas todas, sobre colocarmos tudo isso numa proposta, com cronologia e tudo, para conversarmos com o Ministério da Saúde em conjunto, para construímos alguma coisa factível, boa, acessível. Como foi colocado, muitas situações não são situações dispendiosas, caras. Há o próprio fato de não haver uma consulta genética ou um geneticista à disposição. É uma situação em que não há muita gente no Brasil também. Mas existe a necessidade de haver isso. Eu fui anotando algumas coisas. Por exemplo, quanto à alimentação, é claro, se você vai ao supermercado e compra uma caixinha de maisena, é um preço, mas, se compra 50 caixas de maisena todo mês, já fica diferente. Mas aí alguém vai dizer: "Não, mas isso é alimento, não é remédio". E a gente tem de dizer: "É um alimento, mas é a mesma coisa que uma medicação ou outros produtos que vêm de fora". Há outros testes que têm de continuar também, testes com amido. É preciso haver o protocolo também para trabalharmos nisso, a biópsia, o diagnóstico de alto custo. O que é necessário? O que pode ser feito? |
| R | Então, eu penso que uma audiência pública como esta serve para a sociedade continuar organizada. O maior instrumento para a mudança é haver uma federação boa, forte e atuante, haver uma área técnica, médica, acadêmica que se articule, seja o Conselho, seja a Federação, para se articular com tudo isso. Mas a Federação deve saber que pode contar com o Congresso Nacional, para, juntos, apoiarmos aquilo que for necessário. A Federação traz a necessidade para o Congresso, e, no Congresso, todos nós temos que ajudar na construção de uma solução, que é da sociedade toda. Para o Congresso é muito mais fácil pedir para o Ministro da Saúde vir explicar, ou a Conitec ou o setor de doenças raras, do que a sociedade muitas vezes conseguir isso. Mas também o que o Congresso faria sem a pesquisa que está acontecendo lá? O que a gente faria sem o Conselho Federal de Medicina? Então, é a soma de tudo que vai dar um bom resultado ao final. Muito bem! Estamos indo para o final. Eu gostaria agora de, rapidamente, conceder dois ou três minutos para cada um. Vou passar a palavra de novo na mesma ordem, pedindo, inclusive, para que a Dra. Carolina e o Leandro reforcem a situação do Congresso na semana que vem. Então, passo a palavra, em primeiro lugar, para a Carolina, para ela fazer as considerações finais e alguma consideração a mais de encaminhamento. A SRA. CAROLINA FISCHINGER MOURA DE SOUZA (Para expor.) - Eu acho que este evento aqui... Eu já participei de inúmeros eventos para tratar sobre doenças raras e vejo que o nível aqui foi extremamente elevado, com considerações muito importantes, com a composição da visão de todas as pessoas que estão envolvidas em toda a questão do cuidado dos pacientes com glicogenose. Do meu ponto de vista, até por já ter sido Presidente da Sociedade Brasileira de Genética Médica, tenho algumas considerações a fazer em relação ao Ministério da Saúde. A minha sugestão já tem sido a de criar uma secretaria específica para tratar das doenças raras, porque, atualmente, as doenças raras estão dentro de um contexto de condições que são frequentes também e que demandam bastante energia. Quanto à questão do PCDT, mesmo não havendo uma medicação de alto custo vinculada, ele é extremamente importante porque uniformiza o cuidado do paciente em todos os níveis. Então, muitas vezes, o paciente não precisa chegar a um centro terciário para o acompanhamento clínico, porque a maioria dos exames são exames de atenção primária: glicose, ácido lático, enzimas hepáticas, enzimas musculares. Se pudéssemos ter acesso a um protocolo também na atenção básica, isso seria importante. Acho que isso é factível para um grande número de pacientes que precisam de cuidados mensais, trimestrais ou a cada seis meses. Então, se houvesse uma uniformização do cuidado, isso seria importante. |
| R | Eu e a nossa equipe, junto com outros profissionais e pesquisadores do Brasil, colocamo-nos à disposição do Ministério da Saúde para colaborar nesse protocolo de diretrizes terapêuticas. Acho que ele não está nem caindo de maduro, já caiu, e a gente tem de dar andamento a ele. A gente acaba pensando em construir protocolo só quando há uma vinculação de um tratamento de alto custo, mas esse é um tratamento que prevê cuidados, e cuidados também são muito importantes. Eu dou o exemplo do PCDT para a síndrome de Down, que nem é considerada uma condição rara, mas que é bastante frequente. Eu o utilizo sempre na minha vida privada e pública, porque é um protocolo clínico muito bem elaborado que define para o médico quando e quais exames ele tem de pedir e o que ele tem de ter como atenção. Então, acho que isso é muito importante. Quanto ao estímulo da pesquisa, volto a mencionar que precisamos de recursos financeiros para desenvolver as nossas tecnologias e não depender só de tecnologia externa. Neste momento, para o tratamento de doença rara, a gente tem dependido muito de tecnologia externa. O terceiro ponto é o acesso dos pacientes. Os pacientes com uma condição como essa não têm como esperar na fila, porque eles morrem. Então, a gente precisa definir quais são as prioridades de atendimento e como é que a gente vai fazer um paciente que vem de uma região com um cuidado mais precário chegar a um centro de atenção. Ele não precisa continuar acompanhando, mas ele precisa ser visto uma ou duas vezes em um centro de atenção terciária. Com um PCDT, esse paciente poderia continuar o seu acompanhamento na sua região. Então, acho que esses são os pontos que eu considero mais importantes. Obviamente, quem puder participar do Congresso Internacional de Glicogenose em Porto Alegre... Vai ser uma honra... A associação é que está organizando junto com um grupo de pesquisadores de Porto Alegre. É um trabalho enorme. A gente está trabalhando nisso há dois anos e meio. Isso vai se concretizar. Certamente, vai ser um momento muito emocionante. Se alguém do Ministério da Saúde pudesse participar, isso seria interessante, porque a visualização real dos pacientes e das pesquisas é interessante para o âmbito do conhecimento médico do Brasil. Obrigada. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Muito bem! Passo, em seguida, a palavra para a Danila. A SRA. DANILA VIEIRA ROCHA MANTOVANI (Para expor.) - Eu gostaria de agradecer a oportunidade de ter falado aqui. Quero pontuar realmente a importância da atenção com os familiares de portadores de glicogenose também. Isso é extremamente importante, porque realmente temos uma rotina muito, muito difícil. Às vezes, a gente acaba se suprimindo em detrimento da própria criação dos filhos e da ajuda à pessoa portadora de glicogenose. Eu deixo minha mensagem final no sentido de que eu, como mãe da Rafa, espero que saia a cura; é isso que a gente almeja daqui a um tempo, se for possível. Mas hoje nós temos que trabalhar com a vida. Então, temos que manter a vida dela. E, assim como minha filha tem a oportunidade de ter uma vida saudável hoje, eu gostaria que essa oportunidade fosse concedida a todas as pessoas, e não só a mim. Eu tenho certa condição que me permite dar um tratamento bom para a minha filha. Essa não é a realidade de todos. Então, o meu desejo é que esse tratamento seja oportunizado para todas as famílias, para que, lá na frente, nós possamos curá-las dessa doença rara, para vivermos uma vida plena e feliz. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Muito bom! Parabéns também pelos depoimentos, Danila! Com a palavra o Leandro. O SR. LEANDRO RODRIGUES PEREIRA (Para expor.) - Quero agradecer a oportunidade do debate tão interessante na causa da glicogenose. Quero dizer que a Abglico estará atenta à revisão da Portaria 199, mas, antes disso, antes dela, eu também concordo que a gente não pode perder mais tempo. A gente precisa, sim, do desenvolvimento desse protocolo. Hoje, é um protocolo certamente simples. A pesquisa, Danila, para a cura da glicogenose está em andamento. Há um protocolo misto nas fases 1 e 2, que está sendo muito bem-sucedido. Mas isso ainda vai levar algum tempo nessa discussão. O Ministério tem se preparado nessa discussão da geração de valor, do valor em saúde, que é algo que virá para todas as terapias gênicas que estão em curso e que são, de fato, de custo muito alto para o Ministério, mas que agregam bastante valor também e mudam a vida das pessoas. Eu acho que não é este o momento que estamos agora na glicogenose. A gente está falando de acesso, talvez, à atenção básica, de acesso a amido de milho, de acesso à tira de glicemia. São acessos como esses que a gente precisa trabalhar. A gente precisa ter o mínimo necessário, para fazer um paciente chegar a um centro para ter o seu tratamento, que vai ser um tratamento simples. Ele vai ter uma dose de amido, ele vai ter um consumo "x" de proteína. Enfim, é nisso que a gente precisa avançar. A gente conta com o Ministério, para que isso não seja tratado apenas após a revisão da Portaria 199, para que a gente, sim, consiga avançar, para montar uma agenda de imediato, para poder construir esse protocolo, para poder de fato implementar condições para que todos os pacientes com glicogenose no País possuam um tratamento adequado. É isso, então. Muito obrigado a todos. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Agradeço também ao Leandro Pereira, Presidente, ou melhor, fundador da Associação Brasileira de Glicogenose. O SR. LEANDRO RODRIGUES PEREIRA - Sou um dos membros fundadores. O nosso Presidente é o Maurício Meneghel. Agradeço a oportunidade de estar aqui também. Ele está nos assistindo. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Meneghel? O SR. LEANDRO RODRIGUES PEREIRA - Meneghel. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - É do Paraná ou não? O SR. LEANDRO RODRIGUES PEREIRA - Não, ele é do Rio Grande do Sul, mas não é parente da Xuxa. (Risos.) O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - É que nós temos a família Meneghel também no Paraná, particularmente no oeste do nosso Estado e também no norte pioneiro, em Bandeirantes. Não sei se são parentes da Xuxa; nunca perguntei isso a eles. Passo a palavra ao Dr. Aníbal Gil Lopes. Conte a sua relação com o meu tio Dom Paulo. O SR. ANÍBAL GIL LOPES (Para expor.) - Eu conheci o seu tio antes de ele ser arcebispo. Trabalhamos muito com a questão da aids. Trabalhamos com a Zilda também e com o Leonardo Steiner. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Sim, o Leonardo Steiner! O SR. ANÍBAL GIL LOPES (Para expor.) - Portanto, tenho uma longa trajetória. Muito bom! |
| R | Eu gostaria de, nessa busca de pequenas ações com grandes impactos, dizer que há uma primeira coisa muito simples: tem de ser demandada, alguém tem que ter demandar. Ou é a sociedade ou é... Alguém tem que demandar a construção de um PDCT. O Ministério funciona a partir de demandas. Algumas são demandas internas; outras, a maioria, são demandas externas. Então, o quanto antes, que se demande a construção de um PDCT, indicando inclusive os recursos humanos técnicos capazes de colaborar na sua elaboração. Eu acho que, se na semana que vem se fizer o pedido, começar a se encaminhar, é questão de todo o procedimento de consulta pública, elaboração, que leva em torno de um ano, mas nós teremos um PDCT certamente submetido à Conitec e aprovado. Isso é uma pequena ação que pode ter uma grande repercussão. A segunda ação é um pedido. Eu acho que a Sociedade Brasileira de Genética Clínica e o CFM fizemos, eu diria, um bom esforço, de termos um conjunto de vídeos exatamente para alertar o médico na ponta sobre a questão do diagnóstico. Eu acho que todas as sociedades de doenças raras poderiam se envolver na divulgação disto. Não adianta termos um excelente material se ele só circula em um meio muito restrito. Então, cada vez que se encontrar um médico que nunca ouviu falar, que se informe isso, inclusive através das publicações, das comunicações. Eu acho que é nesse sinergismo de capacidades que a gente vai encontrando soluções que, primeiro, alimentam as nossas esperanças; segundo, nos confortam, porque não estamos sozinhos. Uma das maiores dores que pode existir é a dor do abandono, da solidão. Quando a gente sabe que partilha com o outro, que o outro me entende, que o outro é capaz de colocar em comum o que ele tem, eu acho que esse é um dos grandes sustentáculos para que a gente supere dificuldades. Então, eu proporia nesta fala final - estou insistindo - que a gente tenha ações concretas. E essas duas pequenas ações eu acho que são factíveis a curto prazo. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Sem dúvida alguma. Obrigado, Dr. Aníbal. Passo a palavra ao Renato Teixeira, do Ministério da Saúde. O SR. RENATO ALVES TEIXEIRA LIMA (Para expor.) - Bem, quero novamente parabenizar. Hoje foi muito proveitosa esta audiência. Quero enfatizar que é necessária realmente a participação social, representada por especialistas ou por entidades, como a associação aqui representada pelo Leandro e por familiares, representados aqui pela mãe da Rafaela, com bem colocado, para que possamos avançar. Insisto muito na questão da revisão da portaria, porque existem aí 8 mil doenças raras, e a elaboração de 8 mil protocolos clínicos não é tão simples, denota um tempo. E uma portaria em que possamos abranger, pelo menos de forma semelhante, e criar regulações para centros de referência ou mesmo criar centros de referência aqui no Brasil, para tratar algumas dessas doenças específicas, seria uma forma mais concreta de agirmos. |
| R | Estamos totalmente abertos - ouviu, Leandro? - a uma agenda no Ministério da Saúde para recebê-los com a proposição de colocarmos realmente em prática ações. Eu sou cirurgião, sou médico cirurgião de formação e gosto muito de um resultado com um perfil mais imediato. Então, estamos à disposição, trazendo aqui a sensibilidade e a vontade do Ministério em resolver e dar um conforto, tratamento e um conforto para família. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - PR) - Quero agradecer a presença de vocês que participaram. Muita qualidade, muita competência, muito comprometimento com essa causa. A Daniela, que também é mãe da Rafa, e o Leandro, que é pai do Gustavo, são uma mãe e um pai nessa luta, apoiados aqui pela Dra. Carolina, pelo Dr. Aníbal, pelo Renato, sabendo que estamos juntos nessa caminhada e juntos com o Congresso também. Eu quero justificar publicamente a ausência da Senadora Mara Gabrilli, que é Presidente da Subcomissão de Doenças Raras - esta audiência é em conjunto: Pessoa com Deficiência e Doenças Raras -, porque ela própria está com uma dificuldade de saúde também. Ela está um pouco afastada, mas é uma batalhadora, sem dúvida alguma, nessa área. Eu quero, antes de encerrar os trabalhos, propor a dispensa da leitura e a aprovação da ata desta reunião. Todos os que aprovam queiram permanecer como se encontram. (Pausa.) Aprovada. A ata será publicada no Diário do Senado Federal. Agradeço novamente. Agradeço a todos que nos acompanharam pelos meios de comunicação do Senado. Nada mais havendo a tratar, declaro errada a presente reunião. Obrigado. (Iniciada às 14 horas e 44 minutos, a reunião é encerrada às 16 horas e 35 minutos.) |
