Notas Taquigráficas
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| R | O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Bom dia a todos! Agradeço a Deus a oportunidade de realização de mais uma audiência pública da Comissão de Meio ambiente do Senado. Eu gostaria de iniciar a reunião de hoje justificando a minha ausência na última audiência pública, na terça-feira, dia 18, realizada nesta Comissão, com o intuito de debater sobre as inundações nos Estados do Sudeste, nos últimos meses, em decorrência das chuvas e consequentes inundações, principalmente no Estado do Espírito Santo, em que dez pessoas perderam a vida. Depois de uma agenda junto a organizações não governamentais e a membros da academia para tratar de ações de combate à poluição atmosférica da Grande Vitória, o chamado pó preto, um problema que se arrasta por muitos anos no Estado do Espírito Santo, houve atraso no voo de volta e não pude estar presente, inclusive com a presença de dois convidados para aquela audiência. Agradeço imensamente ao Senador Styvenson por presidir a reunião, à Senadora Leila, por sua sempre ativa participação nesta Comissão, aos nossos convidados, Sr. Sérgio Ludemann, Sr. João Bosco de Azevedo, Sr. Paulo Canedo e Sr. Osvaldo de Moraes, pela relevância dos aspectos trazidos ao debate. Por estarem no mesmo voo que eu, também não puderam comparecer a Sra. Tchenna Maso, do Movimento dos Atingidos por Barragens, e o Major Maurício, da Defesa Civil do Espírito Santo. Voltando à nossa audiência pública de hoje, trataremos de discutir o PL 5.028/2019, que pretende instituir a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais. Esta será a primeira de uma série de três audiências públicas preparadas para discutir a matéria, dada sua importância para nossa economia, meio ambiente e justiça social. Cabe ressaltar que a matéria é fruto de debates extensos na Câmara dos Deputados, com envolvimento de diferentes atores, e se desenrolou ao longo de alguns anos. Agora o Senado, cumprindo seu papel de Casa revisora, deverá prestar a devida atenção aos detalhes finais desse importante tema. O debate de hoje nos dará oportunidade de entender o ponto de vista daqueles que lidam no seu dia a dia com a dificuldade de garantir a preservação ambiental em nosso País e qual a importância da instituição de uma política de pagamento por serviços ambientais, uma vez que são provedores diretos ou indiretos desses serviços. Havendo número regimental, declaro aberta a 4ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Meio Ambiente. Esta reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados, por meio do Portal e-Cidadania, em https://www12.senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone 0800-612211. A Secretaria trará à Mesa algumas perguntas para enriquecer o debate. O relatório completo com todas as manifestações está disponível no e-Cidadania, assim como as apresentações que forem utilizadas pelos expositores. Nos termos da Instrução Normativa 9, de 2017, da SGM, da SGM, a Secretaria solicitará a degravação da presente reunião para que as notas taquigráficas sejam anexadas à ata da presente reunião e auxiliem na instrução da matéria. |
| R | Na exposição inicial, cada orador usará a palavra por até 15 minutos e antes de encerrarmos, se o tempo permitir, poderá apresentar suas considerações finais por cinco minutos. A palavra será concedida aos Senadores inscritos para fazerem suas perguntas ou comentários em cinco minutos, após as exposições iniciais. Convido para compor a mesa a Sra. Angela Kuczach, bióloga, especialista em conservação e proteção de áreas naturais e Diretora Executiva da Rede Nacional Pró Unidades de Conservação. O Sr. Elcio Manchineri atuou como defensor dos povos indígenas do Acre, sul do Amazonas e nordeste de Rondônia, desde 1988; Coordenador de Área de Territórios e Recursos Naturais da Amazônia na Coordinadora de las Organizaciones Indígenas de la Cuenca Amazónica; representante da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil. Sr. Ivanildo Brilhante, graduado em etnodesenvolvimento e com especialização em gestão agroextrativista para território de uso comum na Amazônia; articulador social do Conselho Nacional de Populações Extrativistas (CNS). Sr. Nelson Ananias Filho, Coordenador de Sustentabilidade da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Sr. Ronaldo de Lima Ramos, Assessor da Secretaria de Política Agrícola da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) - agricultores e agricultoras familiares. Desde já, agradeço o comparecimento de todos os convidados. Quero sempre deixar esta Comissão de Meio Ambiente à disposição da comunidade científica, da academia, das ONGs, da sociedade civil, de todos os órgãos, estaduais, municipais ou federais, que direta ou indiretamente têm a ver com a preservação do meio ambiente como uma garantia constitucional. Quero aqui pedir permissão para, antes de dar a palavra aos convidados, fazer algumas ponderações que eu reputo importantes e que, em que pese não serem o cerne disso, eu não posso me furtar em dizer. É muito fácil dizer que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações. Isso está no art. 5º da Constituição Federal, desde 1988. Mas será que efetivamente homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações? Eu tenho a plena convicção de que não e dou um exemplo. Com a Constituição de 1988, as mulheres tiveram direito à maternidade. Palmas para o legislador. Mas o que o ser humano faz? Hobbes já dizia, na obra Leviatã, que o homem é mau por natureza, é lobo do próprio homem. As empresas passaram a não contratar mulher ou a exigir atestado de esterilidade ou negativo de estado gestacional. Apenas em 1995, veio uma lei federal criminalizando essa conduta, porque é princípio constitucional que não há crime sem lei anterior que o defina nem pena sem prévia cominação legal. Então, eu tinha um fato moralmente reprovado, mas legalmente permitido. Homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações. Na iniciativa privada, vai ver quanto ganha uma mulher e compara com o salário de um homem. Ouso dizer que até no serviço público, nos concursos públicos, a mulher entra em igualdade, mas para ascensão na carreira, há um preconceito. Infelizmente, homens e mulheres ainda, no Brasil, efetivamente não são iguais em direitos e obrigações. |
| R | Eu costumo sempre fazer essa crítica e essa reflexão, porque nós não estamos falando da época medieval. A mulher, quando ficava grávida e o suposto pai fosse casado, não tinha o direito de entrar com uma ação de investigação de paternidade. A mulher, até bem pouco tempo atrás, era considerada semi-incapaz; usava o mesmo CPF do marido. Por que estou falando isso? Em 2017, nós tivemos uma reforma trabalhista que fulminou com vários direitos dos trabalhadores, inclusive permitiu que mulheres grávidas e lactantes trabalhassem em ambiente insalubre. Tudo isso com o aval deste Senado e da Câmara dos Deputados. E, se não fosse o Supremo, como guardião do Estado democrático de direito, as mulheres grávidas e lactantes poderiam continuar trabalhando em ambiente insalubre. Em 2019 - olha, 2019, ano passado -, havia um projeto de lei que queria acabar com a participação das mulheres nas eleições, que hoje já é uma garantia. Fala-se que a cota de 30% é da mulher. Nem isso a lei fala: a lei fala 30% para um gênero e 70% para o outro. Eu posso ter um partido com candidatura de 70% só de mulheres e 30% só de homens, mas até nisso nós somos preconceituosos: estabelecemos que 30% são das mulheres. Dos três Poderes - Legislativo, Executivo e Judiciário -, o único que até hoje não foi presidido por uma mulher foi justamente este aqui, o Congresso Nacional, e todos somos iguais perante a lei. Homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações Talvez os senhores devam estar se perguntando por que eu estou falando isso. Bom, eu vou ler por que eu estou falando isso: requeiro, nos termos do art. 222 do Regimento Interno do Senado Federal, inserção em ata de voto de repúdio ao Sr. Paulo Guedes, Ministro de Estado da Economia, pelas declarações preconceituosas e discriminatórias direcionadas às empregadas domésticas, proferidas quando discursava em evento realizado na última quarta-feira. Ele surpreendeu a todos com um discurso repleto de preconceito e discriminação, dessa vez contra as trabalhadoras domésticas, uma das categorias profissionais que historicamente mais tem sofrido com a relação laboral desigual, com a ausência de direitos e mesmo com a dificuldade em acessar o Poder Judiciário para terem cumpridos os poucos direitos conquistados a duras custas. A infeliz fala do Ministro ocorreu quando discursava no seminário de abertura do ano legislativo promovido pela revista Voto. No dia em que o dólar o quarto recorde histórico seguido, alcançando a marca de R$4,35, Guedes afirmou - aspas: "Não tem negócio de câmbio a R$1,8. Vou exportar menos, substituição de importações, turismo, todo mundo indo para a Disneylândia, empregada doméstica indo para a Disneylândia, uma festa danada. Mas espera aí? Espera aí. Vai passear ali em Foz do Iguaçu, vai ali passear nas praias do Nordeste, está cheio de praia bonita. Vai para Cachoeiro do Itapemirim, vai conhecer onde o Roberto Carlos nasceu. Vai passear no Brasil, vai conhecer o Brasil, que está cheio de coisa bonita para ver". Não é novidade. É preciso destacar que o Ministro da Economia, titular de uma das principais pastas ministeriais, em vez de se dedicar à recuperação da saúde econômica brasileira, à redução das desigualdades, à geração de emprego e de renda, tem frequentemente contribuído para acentuação das crises produzidas pelo atual Governo. Repudiamos com veemência o discurso de Paulo Guedes, embora ele não mais nos surpreenda ao explicitar o seu preconceito de classe. |
| R | Na semana anterior, o Ministro havia associado servidores públicos a parasitas. Parasitas são banqueiros, parasitas são os empresários, parasita é o Governo. Porque chamar de parasita aquela auxiliar de enfermagem que está cuidando dos pacientes nos corredores dos hospitais públicos sucateados, chamar de parasita um bombeiro que está salvando as nossas vidas, a Polícia Militar, a Polícia Civil, a Polícia Federal, a Guarda Municipal, que renunciam às suas famílias para nos proteger... Esses são parasitas? Diante de tamanhos e reiterados absurdos, este já é o quarto voto de repúdio que apresentamos em desfavor do Ministro Paulo Guedes. É preciso que o Parlamento cobre do Poder Executivo o decoro necessário dos atuais ocupantes dos cargos públicos, o que também pretendemos com essa manifestação. Ao repudiarmos a fala do Ministro, fazemos, nessa mesma oportunidade, um desagravo a todas as empregadas domésticas do Brasil. O esforço do Congresso Nacional precisa ser o de promover a redução das desigualdades e garantir que todos os brasileiros e brasileiras possam ter condições de viajar para onde quiserem, até mesmo para a Disneylândia, sem sofrerem preconceito de qualquer ordem. É o que propomos. Bom, esse foi o voto de repúdio que eu tive a oportunidade de ter aqui feito, porque, mais uma vez, quem está sendo atacado é a camada menos favorecida, são as empregadas domésticas, é a mulher brasileira. E o outro fato vindo do Chefe do Executivo: o Presidente da República, na manhã de terça-feira, fez graves ofensas de teor sexual à jornalista Patrícia Campos Mello durante entrevista coletiva concedida em frente ao Palácio do Planalto. É descabido reproduzir a repugnante fala do Presidente, representante maior da Nação brasileira; seria como colocar luz sobre a grave agressão perpetrada pelo Presidente. Ele violou mais uma vez o decoro próprio do cargo que ocupa. Não podemos nos calar diante desse ignóbil ataque feito pelo Presidente. O Parlamento brasileiro deve rechaçar de forma incisiva a agressão feita pelo Presidente da República. Não podemos tolerar a normalização de atos que subjugam, menosprezam, rebaixam, humilham as mulheres; não podemos tolerar a banalização do ódio e da violência; por fim, não podemos, sobretudo, conviver com tentativas de calar a imprensa livre, importante fiadora de nossa democracia. Repudiamos com veemência a asquerosa declaração feita pelo Presidente da República, ao tempo em que nos solidarizamos e fazemos um desagravo à competente jornalista Patrícia Campos Mello. Eu fico até envergonhado, como homem, diante de tantos ataques, diante do comportamento preconceituoso, machista, misógino, sexista pelo qual o Brasil vem desempenhado. Desculpem o desabafo, desculpem a fala, desculpem por ter lido esses requerimentos. Eu queria ter tido a oportunidade de ter feito isso ontem, mas, como não houve sessão, aqui estamos. É necessário que a população tenha conhecimento e que o Parlamento faça o que nós pudermos fazer para frear essas graves violações, principalmente agora, mais do que nunca. Eu digo como conselheiro do Conselho Nacional de Direitos Humanos: nós temos que estar atentos a esse comportamento. Esses requerimentos que eu li aqui já foram apresentados e considerados lidos e aprovados no Plenário de ontem do Senado Federal. Neste momento vamos dar início à audiência pública. Com a palavra, a Sra. Angela Kuczach. Desde já eu agradeço, Angela, a receptividade com que me acolheu na diligência que fiz em Foz do Iguaçu, naquela tentativa de se abrir a Estrada do Colono, que é uma grave violação àquele local. E a população pode contar comigo e com a equipe toda. Agradeço ao Airton, aos colaboradores, ao cinegrafista, ao fotógrafo, aos funcionários terceirizados. |
| R | E eu não me canso de falar que isso criminaliza a pobreza. Esses funcionários terceirizados são vilipendiados em seus direitos diuturnamente, mas sempre terão em mim uma voz de alento e de luta por eles, não tenham dúvida disso. Ontem mesmo eu falei isso na Presidência do Senado. Com a palavra a Sra. Angela para as suas considerações. A SRA. ANGELA KUCZACH (Para expor.) - Bom dia, Senador, bom dia a todos. Eu é que agradeço a oportunidade. É com muito orgulho que eu participo desta Mesa e ouço o seu discurso inicial que, com certeza, representa todas as mulheres porque - eu até me emociono nesse momento - é muito difícil, muito difícil você ser uma mulher em qualquer posição neste País. Seja numa posição, num cargo menor ou num cargo mais alto, as mulheres são continuamente perseguidas e continuamente rechaçadas das mais variadas formas. Então, para mim, é um orgulho estar aqui nesta Mesa hoje. Ouvir o seu discurso foi de lavar a alma. Muito obrigada. Desculpem-me todos, mas é muito emocionante. Desculpem-me. Falando um pouco do assunto que nos traz aqui hoje, eu queria começar falando que este ano é um ano muito decisivo para a biodiversidade brasileira, é um ano em que a gente vai discutir a Agenda 2030 da COP da biodiversidade que vai ser realizada na China no segundo semestre. Essa COP tem a pretensão de discutir não os próximos 10 anos dos mecanismos e de onde se quer chegar com a proteção de biodiversidade, mas, sim, levar isso para uma discussão de uma agenda de 30 anos. Num momento em que o mundo passa por uma situação muito delicada, em que o Planeta nos dá o recado, não são mais os ambientalistas que falam em defesa da natureza, é o Planeta que fala em sua própria defesa quando coloca as catástrofes que estão acontecendo, as queimadas que estão acontecendo, as tempestades que estão acontecendo, como em Belo Horizonte, como em São Paulo, como em tantos outros lugares, como no Espírito Santo, como em tantos lugares que vêm sofrendo coisas que estão completamente fora do nosso alcance, do nosso escopo e do que se teve até hoje como normalidade. O novo normal é catastrófico, o novo normal é tempestuoso. Por que eu falo isso? Nós perdemos até hoje 83% das populações de vertebrados silvestres da Terra, mais de 60% das nossas áreas naturais e o resultado está aí. Por que a gente precisa disso tudo? A gente precisa disso tudo para viver. A gente não consegue viver num mundo em que a intrincada teia da vida não esteja bem equilibrada e bem representada. Em essência, a gente precisa de que o Planeta funcione para que a gente tenha os benefícios e os serviços ecossistêmicos de que a gente precisa: água, solo, polinização e microclima. Tudo isso vem da natureza, e a natureza só funciona se estiver em equilíbrio. Nisso, a gente tem um mundo de quase 8 bilhões de pessoas que precisam ser alimentadas, que precisam de água, que precisam continuar vivendo. Como a gente faz isso num mundo de quase 8 bilhões de pessoas onde todo mundo precisa de espaço, onde todo mundo tem as suas ambições, onde todos nós temos as nossas próprias pretensões e os mesmos direitos - e temos que ter e assim tem que ser? Como a gente equaciona essa situação? Como a gente equilibra essa situação? No meio disso, o pagamento por serviços ambientais pode ser não só a forma como a gente equaciona, mas também a nossa forma de se colocar no Planeta diante dessas necessidades, que, no fundo, são nossas. O Planeta não precisa da gente; a gente precisa do Planeta. |
| R | Ao mesmo tempo, a gente tem alguns mecanismos já estabelecidos que trazem esses serviços, fazem esses serviços acontecerem: unidades de conservação... O Sistema Nacional de Unidades de Conservação aqui no Brasil e as áreas protegidas no mundo nos trazem muitos desses benefícios, muitos desses serviços ecossistêmicos. Para vocês terem uma ideia, no livro Quanto Vale o Verde, publicado em 2017, organizado por Carlos Eduardo Young e Rodrigo Medeiros, alguns dados chamam atenção: por exemplo, 24% da água que abastece as cidades brasileiras vêm de dentro das unidades de conservação; cerca de 34 mil toneladas de peixes podem ser retiradas de dentro de unidades de conservação, especialmente, nesse caso, as de uso sustentável. Em 30 anos, a gente tem um potencial de ação financeira a partir do manejo florestal, ou seja, da retirada ordenada de madeira das UCs de uso sustentável da ordem de R$20 bilhões. E, em carbono - a gente está falando disso só dentro das unidades de conservação, a gente não está falando ainda de fora -, são R$130 bilhões em potencial de arrecadação. O ICMS Ecológico hoje rende ao Brasil para os Municípios que recebem nos Estados que têm essa legislação cerca de R$750 milhões já pagos. Ou seja, a gente tem um imenso potencial que ainda não está nem perto de ser explorado. A gente tem um potencial que tem algumas pinceladas, algumas amostras do que já está sendo utilizado por aí, mas que ainda não tem esse ordenamento, e a política aqui proposta, a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais pode promover esse ordenamento. Dentro disso, a gente pode, por exemplo, falar de exemplos nacionais, internacionais, estaduais, municipais e privados. O PSA já é uma realidade e ele já está acontecendo Brasil afora. Quando a gente fala, por exemplo, no cenário internacional, o Fundo Amazônia não deixa de ser uma forma de Pagamento por Serviço Ambiental, em que alguns países da Europa têm pagado para o Brasil para que o Brasil continue conservando suas florestas e, assim, mantendo os estoques de carbono; já é uma forma de serviço ambiental que vem acontecendo. Em nível estadual, algumas iniciativas chamam atenção: o Estado do Paraná, por exemplo, promove hoje o Pagamento por Serviços Ambientais para RPPNs, através de editais de chamamento anuais. Aconteceu no final do ano passado acho que o primeiro ou o segundo edital. E aí eu chamo atenção para isso porque a RPPN, dentro do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, é a única categoria que é privada. E, dentro disso, você tem um proprietário que está se dispondo a proteger aquela área, criando essa área e a transformando em unidade de conservação, garantindo a perpetuidade dessa área e que pode e merece ser beneficiado. A gente está encaminhando para a Secretaria aqui e para o senhor, Senador, uma carta da Confederação de RPPNs, pedindo um especial destaque, dentro da Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais, mas eu entendo que ela não deve, apesar de ter esse destaque merecido, ser excludente quanto a outros tipos de proprietários, sem dúvida, a outras formas, outras unidades de conservação, outras categorias também. A gente tem exemplos no setor privado. Ainda ontem, eu soube que, no Estado do Mato Grosso, a Liga do Araguaia está promovendo, através do desmatamento evitado, um mecanismo que é um piloto ainda, mas de pagar para o proprietário o valor que ele receberia por hectare por soja ou criação de gado. Isso está ainda numa escala pequena, mas está sendo já implementado. |
| R | Em nível municipal, a gente tem inúmeros exemplos de captação de água. A cidade de Extrema, em Minas Gerais, por exemplo, com o Projeto Conservador das Águas, paga para os proprietários, remunera os proprietários pela proteção das nascentes. A mesma coisa eu também posso falar de iniciativas da sociedade civil organizada, como a Fundação Grupo Boticário, que, através do programa Oásis, também paga pela proteção de nascentes vinculadas ao abastecimento de água em alguns lugares. E aí a gente tem o quê? A gente tem esse imenso potencial, a gente já tem coisas que estão acontecendo, e a gente tem acima de tudo uma oportunidade de se estabelecer. Nesse momento em que o Brasil passa por um cenário extremamente delicado em nível internacional, em que está sendo questionado internacionalmente sobre a sua postura diante da questão ambiental, atacada dia após dia, atacada de forma rasa e superficial, atacada de forma a deixar de lado a ciência, por exemplo, e os nossos compromissos, aquilo que a gente já tem assumido há anos, a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais pode ser um resgate da gente como sociedade e como a gente se coloca perante o mundo, porque é uma agenda comum ao setor do agronegócio, ao setor da proteção da biodiversidade, que podem caminhar juntos buscando um jeito de proteger biodiversidade, de proteger os nossos serviços que são necessários para a nossa sobrevivência, remunerando quem de fato protege a natureza, permitindo que essas pessoas ganhem o merecido valor por conta daquilo que já fazem e que vai além do Código Florestal, por exemplo. E aí a gente passa a dar um recado para o mundo de que a gente é sério no nosso compromisso de proteção da biodiversidade. A gente também, através da Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais, vai promover o fortalecimento do próprio Sistema de Unidades de Conservação, que não necessariamente está dentro da política, mas, quando você protege áreas de entorno, você protege e promove conectividade entre áreas que já são protegidas pelo Poder Público, e isso é fortalecer o sistema, isso é um olhar sistêmico sobre o território. Então, a minha recomendação especifica é em relação às RPPNs, e o questionamento que fica, na verdade, é de que a ideia é muito boa, mas de onde vem o recurso para se pagar? Acho que esse é o nosso desafio. Eu entendo que a política aqui proposta é muito acertada no sentido de não centralizar o mecanismo de pagamento, porque você tem um mercado que se regula, você tem iniciativas estaduais, privadas, municipais, enfim, uma infinidade de formas de pagamento por esse serviço que podem ser desenvolvidas, mas a política deve ser um direcionador claro e consistente daquilo que pode ser feito em nível nacional para promover o ganho para quem já conserva e principalmente para a gente trazer de novo essa imagem, levar de novo para o mundo essa imagem concreta e correta de que o Brasil protege, está interessado, tem compromisso com a biodiversidade, tem compromisso com o Planeta, e cumpre aquilo com que se compromete em níveis internacionais. É isso. Muito obrigada. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Obrigado, Sra. Angela Kuczach, pela sua contribuição, colocação de forma didática, precisa. Nesse momento, eu passo a palavra ao Sr. Elcio Manchineri para sua manifestação. O SR. ELCIO MANCHINERI (Para expor.) - Primeiro de tudo, agradeço o convite em nome da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, a APIB, que congrega as cinco maiores organizações do Estado brasileiro de povos indígenas, desde a Amazônia ao Nordeste e ao Sul. É um tema bastante interessante a questão de Pagamento por Serviços Ambientais. Aqui no Brasil, fala-se muito dos defensores da floresta, dos guardiões da floresta. No Equador, eles falam que os povos indígenas não são guardiões das florestas; são parte da floresta. Eu acho que é um termo bastante interessante a ser trabalhado, porque, como povos, as florestas são a nossa casa. Ali também podemos dizer que está o nosso supermercado, ali está o nosso Banco Central também. E tudo o que se passa dentro da floresta é relacionado aos povos indígenas. Se formos tratar, por exemplo, dessa compensação - vamos dizer assim -, a única compensação que os povos indígenas receberam durante todo esse processo de colonização e da chegada do homem branco a essas terras foi a questão da discriminação e da morte. Vivemos no século XXI, e me parece que a ideia do colonizador ainda não acabou, porque ainda vê os povos indígenas como pessoas inferiores que não sabem o que querem na vida. Mas, se hoje o Brasil ainda tem uma imensa floresta verde para a humanidade - para o povo brasileiro, mas também para a humanidade do Planeta -, nós devemos dar graças aos povos indígenas, porque, com suas vidas, eles vêm protegendo os seus lares, que são as florestas. O Estado brasileiro não reconhece esse trabalho que os povos indígenas há muito tempo já vêm realizando, tanto é que, se nós pegarmos o estudo feito pelos nossos parceiros sobre desmatamento em terras indígenas, nós temos pouco desmatamento, e isso em relação até à unidade de proteção. O desmatamento em terras indígenas é pequeno. Por quê? Porque o nosso modo de vida é totalmente diferente daquele do homem ocidental, do homem não indígena. Geralmente o homem não indígena, os grandes empresários trabalham para terem mais riqueza. Se ele tem um avião, ele quer ter três. Nós trabalhamos para que as riquezas do nosso território, as riquezas da nossa cultura permaneçam para as gerações atuais e para as futuras gerações. É por isso que nós conseguimos fazer a preservação da floresta. |
| R | Aí muita gente diz: "Mas os índios não trabalham?" Os índios trabalham muito. Na minha terra que é a Terra Indígena Mamoadate, lá no Estado do Acre, na fronteira entre Brasil e Peru há 314 mil hectares, na base de 1,5 mil pessoas. Lá se faz produção de arroz, de feijão, de milho, cria-se gado, porco, galinha, mas, se for ver, 97% do território estão intactos porque nós trabalhamos a questão do manejo. Esta é a questão: o desenvolvimento só vai ser realmente chamado de desenvolvimento se ele incorporar os conhecimentos locais, o conhecimento regional. E também se ele olhar para a questão social, porque não há desenvolvimento apenas no econômico. A gente vê muito isso como povos indígenas e principalmente como povo manchineri. Se nós queremos desenvolvimento, se nós queremos ter, vamos dizer, duas canoas, e o nosso parceiro não tem nenhuma, nós vamos lá e o ajudamos a fazer a canoa dele. Outra coisa em relação a serviços ambientais: hoje o Brasil só conseguiu honrar seus compromissos em nível internacional sobre desmatamento graças aos territórios indígenas. Por quê? Porque as terras indígenas também são uma barreira para a questão do desmatamento, para grilagem. Por isso que muitas lideranças indígenas estão morrendo, porque estão na frente da batalha para que essa floresta venha realmente pertencer ao nosso povo, mas também pertencer à sociedade brasileira e à sociedade internacional. Então, a questão dos serviços ambientais nós já vínhamos fazendo há muito tempo. O que seria bom para nós seria o respeito do Estado com relação ao cumprimento das leis, ao cumprimento dos dois artigos, o 231 e o 232, da Convenção 169 da OIT, que diz que o Estado tem que consultar os povos indígenas na construção de qualquer nova lei. Se o nosso Estado respeitasse os povos indígenas, nós teríamos muito mais a contribuir. Agora, para nós, é muito importante a questão do pagamento por serviços ambientais, porque não adianta nós trabalharmos em prol do nosso povo, mas também em prol de outros povos, se aquelas famílias não têm um incentivo para permanecer, para fortalecer a sua cultura, porque, caso contrário... A gente sempre fala: se os povos indígenas são respeitados, se os seus direitos são respeitados, a Amazônia está garantida. Se os povos indígenas forem tirados de seus territórios e jogados nas periferias da cidade, a Amazônia, principalmente a Amazônia brasileira, está detonada. Então, precisamos trabalhar essa questão para que os serviços ambientais, o pagamento por serviços ambientais venha para fortalecer as iniciativas dos povos indígenas, porque isso é interessante para a gente. Fortalecer a nossa cultura, fortalecer a nossa identidade cultural como povos indígenas, como povos nativos dali e que ali existem, é isso que nós queremos. |
| R | Outra situação: como se participa de todos esses acordos que o Brasil tem, principalmente na implementação do REDD? Nós não nos vemos dentro acordo. É claro que é de Estado para Estado, mas aí há uma grande questão: se os povos indígenas contribuem muito com a questão, por exemplo, da redução do desmatamento, com a questão do aquecimento global, por que não há uma linha especificamente a que os povos indígenas possam ter acesso? E não só os povos indígenas amazônicos. A Amazônia contribui com todos os biomas ou com todos os povos da terra, mas por que também não pensar um programa que amplie para outros povos, como, por exemplo, os nossos parentes do Nordeste, que estão lá em uma situação bastante precária? Então, se nós temos uma riqueza, nós temos que distribuir essa riqueza entre a gente. Nós temos que ter essa humildade e olhar e utilizar essa riqueza para que todos possam usufruir, principalmente o nosso povo brasileiro. Então, a gente vê que a questão dos serviços ambientais é interessante, mas é interessante num momento em que tanto o Governo Federal como os governos estaduais olhem e chamem os povos indígenas para o debate; em que os povos indígenas possam dizer que tipo de programas eles querem para utilizar esses recursos. Essa é uma das questões que nós trabalhamos sempre, como a Apib e como a Coiab também, porque a Coiab é da Amazônia brasileira. Então, nós trabalhamos dessa forma: que os Estados respeitem, que os Estados convidem, mas que criem programas específicos para os povos indígenas; que os recursos não venham num bojo total em que façam concorrência, mas que venham para fortalecer as iniciativas dos povos indígenas. E aí pergunto: qual seria o mecanismo para trabalhar a questão dos recursos dos povos indígenas? Em nível de Amazônia, nós temos o Podáali, que é o Fundo Indígena da Amazônia Brasileira. Trabalhamos durante dois anos para a construção desse fundo. E esse fundo está pronto, já tem uma equipe montada para a questão de receber recursos, principalmente da área ambiental. Então, temos todo esse caminho trabalhado e queremos ajudar, mas também queremos ser reconhecidos e respeitados como povos indígenas que detêm um conhecimento e que detêm em seu poder uma grande Floresta Amazônica, que tem vida, tem alma e tem riqueza. Temos que olhar a Amazônia não apenas com o olhar simplesmente econômico. Nós temos que olhar a Amazônia com um olhar mais penetrado nas riquezas que ela pode nos oferecer. É desmatá-la? Talvez não. Quanto medicamento poderíamos produzir com as plantas medicinais que ali existem, com o conhecimento dos povos indígenas? Pena que o Estado não olhe isso. Pena que o Estado só queira realmente... Principalmente no atual Governo, que apenas entrega a Amazônia para terceiros para que eles possam lapidar toda a riqueza, tirar toda a riqueza dos povos indígenas e de todo o povo brasileiro. |
| R | A questão, por exemplo, da lei sobre o pagamento por serviços ambientais, para nós é bastante bem-vinda. É uma coisa que já vínhamos trabalhando nesse sentido também, de haver alguma coisa que pudesse fortalecer as nossas iniciativas. Então, é muito interessante. A minha recomendação, nessa questão sobre a lei, era que se criasse um mecanismo específico para os povos indígenas poderem acessar os recursos. Senador Contarato, eu fico muito orgulhoso de participar desta Mesa, principalmente com o senhor presidindo. Tenho acompanhado alguns trabalhos do senhor, e deixa-me muito orgulhoso o seu posicionamento, principalmente com relação às mulheres. No meu povo, são as mulheres, vamos dizer assim, que comandam os homens na comunidade. Então, quando vem de um homem um palavreado daquele, isso nos envergonha a todos, não é? E tira a nossa essência como seres humanos, porque nós estamos denegrindo a imagem de um semelhante. Então, acho que isso é muito ruim para nós, para nós brasileiros, para nós homens. Essa era a minha contribuição. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Obrigado, Sr. Elcio Manchineri. Eu tenho até vergonha de ler o que eu vou ver aqui, mas foi veiculado, não é? O Presidente da República afirmou, nesta quinta-feira, 23, que - aspas - "índio está evoluindo e cada vez mais é um ser humano igual a nós". Eu estive pessoalmente visitando os guaranis kaiowás no Mato Grosso do Sul. A população indígena está sendo dizimada - não há outra palavra, não -, está sendo aniquilada nos seus direitos mais elementares. Eles tiraram as comunidades, vários povos indígenas, colocaram-nos em uma área restrita, confinados, em uma área improdutiva, sem água, sem saúde, sem saneamento, sem nada, desprovidos, ao lado de fazendeiros. Agrotóxico passa, vai tudo para a população indígena. Ficam todos com dor de cabeça, vômito, diarreia. Isso ninguém me falou; eu vi lá os guaranis kaiowás no Mato Grosso do Sul. Estive em Aracruz, no Espírito Santo. E pretendo fazer isso durante este ano, visitando os povos originários, visitando as comunidades quilombolas. Então, eu fico muito feliz quando ouço o Sr. Elcio Manchineri falando isto - é uma lição para mim: o índio, os povos originários não são os principais protetores do meio ambiente; eles fazem parte, eles são o próprio meio ambiente. Naquela ocasião, eu postando nas minhas redes sociais, muito feliz, porque eu vi que eles têm um compromisso, um professor indígena me pegou pelo braço e falou assim, naquela terra é improdutiva: "Senador, vem aqui que eu quero te mostrar uma coisa". Ele me levou até a um olho d'água que estava morrendo. Ele estava reflorestando, junto com os indígenas, para salvar aquele olho d'água. Então, a preocupação, a relação do índio com o meio ambiente é totalmente diferente da nossa. Eu fico triste quando vejo pessoas esclarecidas falando assim: "Mas o índio está cada vez mais - entre aspas - 'civilizado'; o índio usa celular". Aí eu respondo: será que se eu, por estar usando esta pulseira ou um cocar ou um colar, eu passei a ser índio? |
| R | Porque nós temos o Japão, que é uma das civilizações mais antigas, tradicionais, mas que também é uma das civilizações mais tecnológicas. Então, é um ledo engano. Eu fico aqui pensando - é de envergonhar - como é que nós, seres humanos, principalmente o intitulado homem branco, que se diz tão evoluído, vem permitindo essa violação aos povos originários. Eu quero deixar claro para o senhor, Sr. Elcio Manchineri, que, independentemente de ser Presidente da Comissão de Meio Ambiente, neste mandato como Senador eu sempre estarei em defesa dos povos originários. Vai ser cumprido o art. 231, o art. 232, todos os tratados e convenções internacionais dos quais o Brasil for signatário. No que depender de mim, isso vai ser feito, assim com a luta pelas mulheres, assim como a luta pelos negros. A humanidade tem uma dívida eterna com as mulheres. A humanidade tem uma dívida externa com os negros, com os índios, com os pobres. Prova disso é isto aqui. Prova disso é até a composição desta Mesa: nós temos apenas uma mulher. Prova disso é que o perfil aqui do Senado é de homens brancos engravatados ricos decidindo a vida de 220 milhões de brasileiros e brasileiras. Muito obrigado pela sua contribuição. Eu tenho muito orgulho dos povos originários, o senhor pode ter certeza. Em seguida, passo a palavra ao Sr. Ivanildo Brilhante. O SR. IVANILDO BRILHANTE (Para expor.) - Bom dia a todos e a todas. Quero saudar a plenária na pessoa do Senador Fabiano e dizer que nós, populações extrativistas, somos povos do uso responsável dos recursos naturais renováveis. Somos populações que nascemos, crescemos nas beiras dos rios, nas florestas, em diversos biomas brasileiros; que desde o nascimento já temos na cultura o uso responsável dos recursos naturais. Assim como fala o nosso colega originário indígena, parente, a floresta é a nossa casa, é o nosso abrigo, é a nossa mãe, é parte. As populações tradicionais vêm nesse aprendizado dessa relação dos povos da floresta. E os nossos territórios falam por nós. Quando você tiver a oportunidade de colocar um drone sobre os territórios de populações tradicionais, que usam de forma responsável os recursos naturais, não como donas, mas como partes também do recurso; que pensam um envolvimento... Acho que a palavra desenvolvimento tem nos maltratado ao longo da história deste País, que, quando pensa desenvolvimento, pensa destruição. Geralmente o desenvolvimento coloca a floresta como um atrapalho. É só olhar: a história do Estado brasileiro já fala por si só, desde os investimentos de crédito, de acesso às políticas públicas, etc. Isso fala por si só. Para nós é pensar um envolvimento, onde nós, homens e mulheres desses territórios, possamos ser ouvidos; que os saberes e os fazeres da nossa tradicionalidade, da nossa ciência, a partir da vivência, possam ser escutados por quem formula política pública neste Estado. |
| R | Então, temos as unidades de conservação, e elas são muito dinâmicas e plurais. E o Estado brasileiro é ímpar no mundo, porque a população tradicional da floresta solicitou a criação de unidades de uso sustentável, que são as reservas extrativistas. Quando a gente coloca uma unidade de conservação, o que vem na cabeça da maioria dos brasileiros é uma área sem gente, para cuidar de bicho. E nós achamos que os bichos, os animais, os vegetais são importantes e devem ser cuidados também, mas que o homem e a mulher são parte desse ambiente; não podemos separar. Então, historicamente, o investimento do Estado brasileiro, quer seja no período do Ibama, quer seja no órgão gestor, no ICMBio, sempre foi para priorizar as unidades de proteção integral, que são importantes de serem cuidadas. O investimento do Estado brasileiro geralmente ultrapassa 70% em áreas que não têm gente. E, em áreas que têm a população tradicional, em que muitos se definem como extrativista ou agricultor familiar ou quilombola ou de outras etnias ou grupos, o investimento é menor. E hoje o Estado brasileiro, através do ICMBio - num cadastro, numa política não bem estruturada, mas já com algumas ferramentas de medição -, apresenta que a cobertura vegetal das unidades de conservação extrativistas, na sua maioria, está melhor do que a de muitos parques com investimento gigantesco de grana. E quem faz esse serviço são as populações tradicionais que moram nesses espaços e usam esses espaços de forma responsável. Eu estava olhando aqui o projeto de lei. Embora pensemos que o serviço do ar, da água, ambiental não deveria ser comercializado - eu acho que não deveria -, a sociedade não está preparada para não valorizar, então acaba que o dinheiro virou um parâmetro de reconhecimento. E aí o que está proposto para as unidades de conservação, aqui na Seção III, no art. 7º, é que os recursos oriundos em unidade de conservação são passados para o órgão gestor. Está muito ruim, porque, ao passarem pelo órgão gestor, historicamente, as compensações, as multas dos projetos em áreas de uso sustentável, quando colocam no uso gestor, vão todas para área de proteção integral, nem voltam para a área que recebeu o dano ambiental, que tem população tradicional. Então, precisa ter uma parcela o órgão gestor - acho que o órgão gestor é importante - para poder funcionar e fazer o aparato do Estado, mas é preciso repassar o recurso às populações, que sempre fizeram o serviço ambiental como uma forma de se relacionar, de viver e produzir. E aí, quando nós tratamos das medidas, de ver a importância a partir do econômico, uma economia gigantesca que é a dos recursos naturais historicamente ficou na clandestinidade, porque nunca teve o financiamento adequado, nunca teve estudo, porque ela é muito plural e dinâmica, não é um mesmo produto, não está numa escala de uma produção única. Alguns produtos, sim - a borracha em determinado período ganhou escala, o açaí, a castanha -, mas uma diversidade dessa cesta, que nós chamamos de cesta de produtos da floresta, não tem estudo. Ela sai da economia informal, não sai contabilizada. Então, uma riqueza extraordinária não é vista porque não tem como ser medida nessa questão econômica. |
| R | Então, os serviços ambientais historicamente - trazidos pelo Fundo Amazônia e por outros fundos - são sempre pensando muito em recuperar áreas desmatadas, e nunca foram para valorizar quem historicamente fez a conservação. Se existe floresta conservada é porque existiu gente cuidando dessas florestas, e gente da tradicionalidade, do uso responsável e gente que abre mão de determinado espaço de consumo porque ela vê a floresta como território sagrado, como território da parte dela, e porque ela pensa que o filho dela pode usar o prazer do ar, uma água potável e outros recursos que vêm. Então, quando a gente pensa a floresta, a gente pensa a maior fábrica de produção de água desse Planeta. A água saudável está nas florestas. E a gente pensa a floresta com uma diversidade de bichos, de vegetais, de animais, que são partes de vidas. Um dos grandes desafios do Conselho Nacional é ser incluído inclusive na legislação... Em determinadas políticas, a gente tem que dizer que é o outro, e é muito ruim a gente querer ser o outro; a gente quer ser parte, quer ser protagonista da nossa cultura, da nossa história. Nesse espaço também do clima, a gente tem uma relação boa com a Conaq, com os companheiros quilombolas, que precisam também ser reconhecidos pelos seus serviços ambientais no seu território, que precisa ser demarcado. Nas populações tradicionais extrativistas do território amazônico que é chamado de áreas isoladas ou áreas remotas, a energia não é acessada pela maioria de nós. E a energia é importante no campo produtivo. É preciso pensar em energia renovável, eficiente. Então, os serviços ambientais podem vir também em serviços de energias renováveis. Isso será muito louvável porque vai possibilitar dignidade. A gente pensa, na floresta, que a nossa maior fome não é de comida, embora alguns grupos, dependendo do contexto, podem passar fome de comida, mas geralmente a comida é fartura. A nossa fome é de ter acesso aos direitos iguais, com as nossas diferenças, porque se estabelecem direitos iguais e as nossas diferenças não são iguais, não têm a equidade do pensar o per capita alimentar dos outros grupos. Os nossos meninos e meninas passam mais tempo viajando do que estudando e precisam de refeições na escola. Na saúde, a gente tem dificuldade de comunicação porque não tem energia. Então, a gente precisa ser incluído em direitos mínimos para a gente elevar o nosso padrão do desenvolvimento, das nossas tecnologias, porque nós temos muitas ciências desenvolvidas, aprendizados fantásticos nessa relação homem-natureza - e pensando o homem como parte e não como dono da natureza. Mas nós nunca fomos vistos pelo Estado brasileiro como protagonistas de um legado extraordinário de conservação e de uso responsável dos recursos naturais. Eu acho que, olhando a lei, a gente precisa melhorar algumas redações. É preciso incluir territórios nossos que não são vistos como unidade pelo Estado brasileiro, como unidade de conservação, mas não podemos esconder os projetos de assentamento agroextrativista. Para o Estado, nós somos assentados. Não, nós fomos só reconhecidos, não. Vamos levar... Nós estávamos lá antes do decreto dos projetos de assentamento. O Estado brasileiro não consegue nos fornecer uma DAP. Eu estou falando de 300 territórios só no Estado do Pará, com 500 mil famílias. Não existem 50 mil famílias com DAP A, que é o DAP especializado. Então, se nós não temos acesso ao direito de nós sermos incluídos na política pública, imaginem em financiar o taperebá - para nós é o taperebá, e para vocês é o cajá -, o buriti, o açaí, o piquiá, o bacuri, o cacau nativo, as sementes oleaginosas - uma riqueza extraordinária. O Pronaf Florestal não consegue ter parâmetro para financiar um conjunto de produtos que têm sustentabilidade; e o IBGE não consegue contabilizar e os Municípios não conseguem se organizar para que essa produção tenha uma relação formal, porque aí passaria a ser vista pelo setor econômico. |
| R | Então, não é verdadeiro esse mito covarde de dizer que nós somos improdutivos. Nós produzimos conhecimento, produzimos tecnologia e produzimos economia. O Estado foi que nos ignorou historicamente, e nós precisamos, no serviço ambiental, ser reconhecidos como atores protagonistas, e esse serviço precisa ser valorizado, inclusive para levar política pública, que já deveria ter acontecido, e para o acesso à energia. (Soa a campainha.) O SR. IVANILDO BRILHANTE - Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Obrigado, Ivanildo Brilhante, por suas colocações e pelo desabafo. Realmente, essa violação de direitos tem que ser corrigida o mais rápido possível. Eu acho que este é um momento muito positivo para discutir, e a equipe tem que ficar atenta a isso, para ver como é que nós podemos avaliar isso da melhor forma possível. Neste momento eu passo a palavra ao Sr. Nelson Ananias Filho, para a sua fala. O SR. NELSON ANANIAS FILHO (Para expor.) - Bom dia a todos. Gostaria de agradecer ao Senador Fabiano Contarato, a todos os colegas de Mesa pela oportunidade de ouvir e dar a minha contribuição, a contribuição da agropecuária brasileira, nesse importante assunto, nesse importante instrumento de preservação da sustentabilidade dos recursos naturais do nosso País, e propor alguma contribuição da nossa Confederação da Agricultura, que foi aqui convidada. Quero agradecer em nome do Dr. João Martins, o qual venho substituir aqui, essa contribuição do setor agropecuário. Antes de mais nada, gostaria, Senador, de render aqui as minhas homenagens e de reconhecer a competência das mulheres que trabalham lá junto com a gente na CNA. A agricultura já se rende a elas, pois já existem programas de incentivo à capacitação das mulheres no campo, e isso se reflete muito na confederação. Por isso, gostaria de aproveitar o ensejo de seu discurso, da sua fala, para render a minha homenagem à competência de Cláudia, Fabíola e Zoraide também, que nos acompanham aí. Sem elas, nós não conseguiríamos desenvolver esse papel aqui no Senado e no Brasil como um todo. A agricultura brasileira nunca esteve tão à vontade para discutir a questão da sustentabilidade e principalmente diante dos instrumentos e das ações que vem desenvolvendo nos últimos anos, talvez até bem antes do Código Florestal, mas houve esse marco legal do Código Florestal, que trouxe à sociedade as verdades. Muitos dos dados que a gente conseguiu durante todos esses anos trazer mostram que a agricultura brasileira continua líder mundial em sustentabilidade, que vem trabalhando fortemente na questão de cumprir a legislação ambiental, de ter o seu papel de provedora de serviços ecossistêmicos através de uma ação de serviços ambientais bem definidos e pronunciados, não só aqueles que são exigidos por lei, mas também aqueles que são voluntários e que nos levaram a ser um dos detentores do grande patrimônio ambiental no Brasil, comprovados aí por diversos - que eu vou abordar - levantamentos. |
| R | Então, o Código Florestal é uma lei que já está aí há sete anos e que ainda exige muito de regulamentação. E a gente vem trabalhando junto a esta Casa, junto à Câmara para que essas regulamentações entrem efetivamente em ação, para que a gente consiga mostrar tudo aquilo que se tem feito no setor agropecuário brasileiro, para que isso possa retornar para a gente, entre diversos instrumentos, entre outros instrumentos, com o pagamento por serviços ambientais, que foi muito ventilado à época de discussão do texto do Código Florestal brasileiro e que nos leva a mostrar aquilo que vem sendo feito, dentro da porteira, na produção agrícola nacional. Muitas das vezes, a gente acha que a CNA é composta apenas pela confederação, mas, não: ela tem um braço de aprendizagem rural e ela tem um braço que desenvolve estudos. Eu trouxe essas contribuições para dizer que, como serviço ambiental é um conceito que precisa ainda ser definido ou refinado, todas as ações, não só remuneração em espécie financeira pelos serviços ambientais prestados, podem ser um serviço ambiental, mas podem ser uma capacitação, levar conhecimento ao pequeno, ao grande e ao médio produtor. Fazer estudo, promover ações dentro da porteira que levam a um uso mais efetivo dos recursos naturais, isso também é um serviço ambiental prestado pelo setor produtivo brasileiro na medida em que cada vez se utilizam menos recursos naturais para garantir a segurança alimentar, para garantir a manutenção das exigências do Código Florestal e de outras legislações que nos exigem ações dentro da porteira. Então, o meu papel hoje - e o convite foi para isto... Não é desserviço, sobrou um "s" ali, mas é: "provedores de serviços ambientais" - peço desculpa, pois digitei errado ali, não é? (Risos.) Na própria lei, na própria proposta de projetos de lei, a ideia é uma pessoa física ou jurídica de direito público ou privado, ou um grupo familiar ou comunitário que, preenchidos os critérios de elegibilidade, mantêm, recuperam ou melhoram as condições ambientais dos ecossistemas. Isso está lá no projeto de lei. A gente entende que nisso, já durante todo esse processo de discussão - e não é a primeira versão do PL de pagamento por serviços ambientais -, a gente está trabalhando. E houve uma grande evolução nas ações que foram desempenhadas, no afinamento do que se propõe para o pagamento por serviços ambientais. Então, o pagamento por serviços ambientais não está só nesse PL. No Código Florestal, como a gente falou, também já havia a previsão, no seu art. 40, da questão do pagamento por serviços ambientais. Então, se a gente está propondo uma atividade individual ou coletiva que favoreça a manutenção, a recuperação e a melhoria dos serviços ecossistêmicos, o Código Florestal já trazia o conceito de pagamento por serviços ambientais, com retribuição, monetária ou não, às atividades de conservação e melhoria dos ecossistemas. Então, a gente já tem uma lei que trata disso, que exige também uma regulamentação. Como sugestão aí para o PL, a gente precisa afinar também para que não haja, na verdade, um conflito de legislação entre essas duas ações. |
| R | Não vou ler tudo, mas o projeto de lei que a gente está avaliando e fazendo sugestões agora prevê esses quatro tipos de serviços. São serviços ecossistêmicos nos quais, se a gente ler aqui, a agricultura e a agropecuária brasileiras e a propriedade rural hoje se enquadram, em qualquer um desses. A gente tem condição de promover serviços de provisão, serviços de suporte, serviços de regulação - serviços culturais é um pouco menos, e a gente deixa aí para quem tem mais conhecimento desse assunto. Mas nesses três itens que estão previstos na lei, perfeito, a gente pode se enquadrar, dentro da porteira, em qualquer um desses serviços ecossistêmicos. No Código Florestal já existe uma caracterização do que é serviço ambiental. Então, sequestro, conservação, manutenção, aumento do estoque e diminuição do fluxo de carbono. Isso é claro, não é? Quando você tem uma atividade cada vez mais efetiva e principalmente aquelas que são elegíveis como metas para a política nacional de mudanças climáticas - que é outra que já está prevista na lei que a gente precisa trabalhar conjuntamente -, a atividade agropecuária brasileira se mobilizou, investiu e está trabalhando e implantando cada vez mais ações no sentido de uma agricultura de baixa emissão de carbono. Isso é um serviço ambiental. Também a conservação da beleza cênica natural; a conservação da biodiversidade através do cumprimento do Código Florestal (APP e reserva legal); a conservação de água de serviços hídricos, pois é na propriedade rural como também nas áreas de unidades de conservação, como também nas áreas indígenas que se produz a água. Então, a gente tem um programa de recuperação de nascentes, porque nós temos obrigação de fazer isso, em função do Código Florestal, mas também produzimos água para nós mesmos. Nós irrigamos, nós usamos a água para a atividade agropecuária. A atividade agropecuária, sem água, também não funciona, não é? Regulação do clima também, com ações de plantio, recuperação e todas aquelas elegíveis para o programa de agricultura de baixa emissão de carbono. A conservação e melhoria do solo também, pois somos grande. O principal patrimônio do produtor rural brasileiro é o solo. E a manutenção de APP, reserva legal e área de uso restrito, que é uma questão que não está contemplada nesse PL e que a gente gostaria muito de discutir e incorporar: APP, reserva legal e áreas de uso restrito também são áreas passíveis de pagamento pelos serviços ambientais, não é? Então, quais são as estratégias sugeridas pela CNA para que a gente possa trabalhar um PSA e dar sugestões a essa proposta legislativa? Primeiro, a conservação da vegetação nativa e a restauração de vegetação nativa - as duas. A gente precisa incentivar o produtor rural, principalmente aqueles pequenos e médios, para que possam ter condições de recuperar aquele eventual passivo ambiental que eventualmente seja indicado pelo Cadastro Ambiental Rural. E boas práticas produtivas. Então, se a gente, dentro da propriedade, tem que cumprir a questão de uma quantidade mínima de vegetação nativa, também tem que incentivar atividades práticas que conservam o solo, que fixam carbono no solo ou produtos de fixação de carbono. A gente tem conservação de água, produção de água, tudo isso faz parte do sistema produtivo. Isto aqui eu vou passar bem rapidamente. A gente tem um ativo ambiental, passível de pagamento por serviços ambientais, muito grande, não é? Então, 66,3% - esse número já é público, é da Embrapa - do Território brasileiro estão em vegetação nativa. Ao contrário e cumprindo o setor produtivo, a gente tem a obrigação de produzir e garantir a segurança alimentar do País, não só economicamente, mas também por questões estratégicas. Entretanto, com os nossos competidores, temos exigências muito maiores. Por isto é que eu trago esses eslaides: para dizer que APP e reserva legal precisam também entrar no sistema de pagamento por serviços ambientais. Então, os nossos concorrentes, se você for comparar, precisam cumprir muito menos responsabilidade de recuperação ambiental do que a gente. |
| R | O produtor rural aderiu ao Cadastro Ambiental Rural. Então, hoje o produtor rural tem endereço. Se ele tem um serviço ambiental, se é responsável por cumprir APP, reserva legal ou áreas que voluntariamente a gente tem que conservar, ele tem aquele endereço e aderiu ao CAR. E hoje, se ele não cumprir isso, a gente sabe que o monitoramento e a cobrança vão em cima dele, porque ele deu o endereço. Então, sabe-se o que é produtor rural e o que são outros atores que não conservam ou que não tratam da biodiversidade dentro da sua propriedade. Hoje nós temos também, bem rapidamente, cerca de 282 milhões de hectares em vegetação nativa declarados dentro do CAR, dentro de propriedade privada, e a avaliação definirá o total conservado. Aqui eu passo bem rapidamente. Se a gente está falando na questão de recuperação da vegetação, manutenção e recuperação da vegetação e incentivo a atividades mais carbono-efetivas, que utilizam muito mais os recursos naturais, o produtor rural investiu durante todos esses últimos 40 anos. Se a gente tivesse a mesma produtividade de 40 anos atrás, hoje a gente deveria ter uma área 450% maior em termos de produção, 450 vezes mais. Então hoje, para produzir o mesmo que tínhamos em 1976, um pouquinho mais de 40 anos atrás, seriam necessários mais 190 milhões de hectares, que é quase três vezes o que a gente ocupa hoje com atividade agropecuária no Brasil. Então, esse investimento poupou, sim - a gente chama de poupança agrícola -, recursos naturais, poupou avanço em novas áreas, quando a gente verticalizou a produção, produzindo mais, utilizando os recursos naturais mais efetivamente e diminuindo essa ação. Então, isso aqui também, rapidamente. Se a gente for comparar, o Brasil é ocupado 30% com atividades produtivas e 66% que advêm daquele mapa que eu já mostrei na ação anterior. Se a gente trabalha de uma forma na preservação da vegetação nativa, APP, reserva legal, recuperação, por outro lado, na área que é passível de utilização, a gente investiu também em sustentabilidade. Então, todas essas tecnologias são aquelas mais carbono-efetivas, muitas delas, se bem manejadas, podem até ter um balanço positivo de carbono, que também a gente precisa incentivar através de pagamento por serviços ambientais, para mudar essa questão de degradação de pastagem para pastagens efetivas, sistema simples para integração lavoura-pecuária-floresta, e qualquer uma dessas outras atividades que são muito carbono-efetivas. Isso se deu e a gente mostra. Isso aqui é um eslaide no Ministério da Agricultura dizendo que, dentro daqueles compromissos que a gente tinha de redução... (Soa a campainha.) O SR. NELSON ANANIAS FILHO - ... de emissão de carbono, nós estamos já com 105% da meta em carbono, dentro da porteira do Brasil, já cumpridos. Então, se a gente já se comprometeu, a gente já está cumprindo. Faltam ainda grandes passos, novos passos, a gente precisa ir bem além. Entrando na questão do projeto mesmo, esse aqui é o conceito do que é pagamento por serviços ambientais. Desculpe, já estou acelerado e terei de acelerar por causa do tempo. Mas a ideia é de que se separe, dentro da proposição e do PL, o joio do trigo, em ecossistemas e sistemas ambientais. A propriedade rural já trabalha com questão de pagamento por serviços ecossistêmicos, mas o serviço ambiental o produtor já faz. Por quê? Porque se ele quer uma reserva legal reservada, conservada, para fins de cumprimento do Código Florestal, ele tem que cercar, fazer o aceiro, evitar incêndio, evitar caça, evitar entrada nessas áreas; ele tem que evitar tanta coisa que já faz um serviço ambiental e não é reconhecido nem remunerado por isso, tanto em APP quanto em reserva legal. |
| R | Então, a gente precisa saber que serviço ecossistêmico está sendo prestado, mas precisa de um serviço ambiental para que esse serviço ecossistêmico se perpetue. Vou passar bem rapidamente também essa aqui. Então, a realidade é essa. Nós temos pagamento por serviços ambientais, que precisam ser definidos, valorados; eles precisam ser classificados, monitorados e remunerados, não só financeiramente, mas também com outras ações que nos tornam um serviço ambiental com diferencial competitivo, por exemplo. Por que a gente pode vender qualquer produto agropecuário no mercado externo, contra nossos competidores... Vocês viram lá que nossos competidores não têm metade do nosso ativo ambiental. A gente não precisa receber mais por isso, a gente precisa ter uma preferência por esse produto, no mercado internacional, no qual eu vou comprar produto brasileiro porque eles têm esse ativo ambiental. E isso é um pagamento por serviço ambiental que também pode ser valorado e precisa entrar, porque no PL não se preveem essas questões de diferencial, de propaganda, ou um mecanismo que privilegie nossos produtos em detrimento dos outros. Então, como estratégias sugeridas, rapidamente também - meu tempo já está adiantado -, a gente pode trabalhar com possíveis fontes de pagamento - que é um grande problema, um marco que arrastou essa discussão e a aprovação desse PL - através da regulamentação do art. 41 do Código Florestal. Fazer da propriedade, da recuperação ambiental, da regeneração um negócio que renda, que faça com que o produtor rural tenha aquele serviço, que ele já presta, remunerado, e que aquilo seja um negócio para ele, como é agricultura, como é pecuária. Através disso, a gente pesquisou o Fundo Verde para o Clima, que eu vou deixar aqui. Ele tem um valor. Esse tem 5,2 bilhões aprovados com entidades, são elegíveis todas as entidades privadas. Então, aqui tem uma ação que a gente pode trabalhar, como elegibilidade ou como ação... (Soa a campainha.) O SR. NELSON ANANIAS FILHO - ... que pode ser prevista dentro do projeto de lei para captar esses fundos. A gente pode... A CNA está aí para ajudar nesse trabalho. Os eixos estratégicos do fundo são esses, entre eles, agricultura e florestas. Lá tem restauração, conservação e reflorestamento, agricultura de baixa emissão de carbono e adaptação no setor produtivo. Eu preciso falar aqui que esses eslaides me foram cedidos pelo Rodrigo Lima, da Agroicone. Gostaria de agradecê-lo. Os direitos são dele. Mas existe sim, dentro do fundo. E outro mecanismo é o Artigo 6 do Acordo de Paris, que está sendo negociado este ano, nessa COP, que, dependendo da forma como esse acordo desse mercado de carbono for feito, a gente pode captar, lembrando que dentro desse processo a gente tem aquele fundo de 100 bilhões por ano, que podem ser revertidos no Brasil como pagamento por serviços ambientais. E a gente também gostaria de trabalhar e conversar aqui com o Senado para montar uma estratégia de atuação nisso aqui. Contexto internacional. Então, se você... A apresentação estará aí. A gente vai trabalhar... E existem outros programas de conservação. Nos Estados Unidos, o programa de conservação de reserva prevê US$66 bilhões para implantação de APPs dentro das propriedades americanas. Eles não só pagam pela conservação, mas pagam pela recuperação. Então, existem programas internacionais que já preveem esse pagamento por serviços ambientais dessas atividades. |
| R | Isso aqui é quanto se paga por acre, mais ou menos 2,5%. O acre são 2,5 hectares. Vão mais ou menos US$200 por hectare, paga-se lá. Nos Estados Unidos ainda, se você quiser recuperar sua APP, eles pagam para isso. Então, já existem programas. Na União Europeia é da mesma forma. Prevê-se recuperação de 10% da área agrícola, com custo de 2 bilhões de euros. Em Portugal também há programas. Por causa do tempo, não vou conseguir explicar isso, mas existem também outras iniciativas, tanto nos Estados Unidos como na União Europeia, de pagamento por serviços ambientais, para essas áreas. Aí é o último eslaide. Uma série de ações que a gente julga pertinentes para se incorporarem ao relatório do projeto de lei, que seria adequação e remuneração da APP - eu só falarei de alguns -, que é o art. 8º, que incentiva... O PL precisa incentivar a adoção de tecnologias ABC como objetivo, fomentar o PSA como diferencial competitivo, nas suas modalidades, e também a gente se dispõe à contribuição do Senar como assistência técnica prevista no art. 10, de valoração desses pagamentos por serviços ambientais. Eu peço desculpa, é muita coisa para falar em pouco tempo. Peço desculpa pelo avançado do tempo, mas, mais uma vez, a CNA está aqui disposta, quer trabalhar e quer contribuir para esse projeto de lei, para esse texto, a fim de que a gente consiga fazer valorar o que o produtor rural já faz, tudo aquilo que ele pode ter e o potencial que ele tem ainda de promoção de serviços ecossistêmicos. Muito obrigado. E a gente está à disposição. O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Obrigado, Sr. Nelson Ananias Filho, pela sua colaboração. Quero deixar claro que nós temos a responsabilidade também de entender que não há radicalismo. É perfeitamente possível, com floresta em pé, nós alavancarmos a economia, com sustentabilidade. Nós temos como promover uma economia verde e isso é o que nós estamos buscando. Não tenho dúvida de que a agricultura e a pecuária do Brasil possuem esse comprometimento. Vocês, mais do que ninguém, têm interesse em que haja isso, porque não adianta você produzir se não tiver para quem vender. A China já esteve aqui e falou: olha, nós acreditamos efetivamente na economia verde. Então, eu quero aqui deixar claro isso, que jamais, pelo menos na minha postura, haverá um comportamento radical. Nesse extremo, nesse radicalismo é que todo mundo perde. Nós temos como conciliar sustentabilidade com preservação. Há um avanço nesse pagamento por serviço ambiental. Essa é uma realidade e um sonho de todos nós. E vai corrigir injustiças, efetivamente. Neste momento, eu passo a palavra para o Sr. Ronaldo Ramos, para sua fala. O SR. RONALDO DE LIMA RAMOS (Para expor.) - Bom dia, Senador. O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Interrompendo, a palestrante Sra. Angela Kuczach, terá de se ausentar agora, tendo em vista o voo. Eu, desde já, agradeço. Os questionamentos que forem feitos, a equipe vai passar para o seu e-mail, está bem? Muito obrigado e transmita um beijo e um abraço a todos. A SRA. ANGELA KUCZACH (Fora do microfone.) - Obrigada. O SR. RONALDO DE LIMA RAMOS (Para expor.) - Angela, eu queria pedir licença ao Senador para cumprimentar a Mesa na sua pessoa, representando todas as mulheres, e dizer o seguinte, a todas as empregadas domésticas, a todas as mulheres, a todos os trabalhadores e trabalhadoras, jovens, homens e pessoas da terceira idade: uni-vos, porque nós precisamos mais do que nunca entender o que está acontecendo neste País. |
| R | Senador, eu gostaria de agradecer o convite e dizer que trago aqui o agradecimento da Diretoria da Contag por estarmos participando dessa audiência. Infelizmente, não é possível termos aqui um diretor ou uma diretora. Inclusive, eu estou aqui, na realidade, numa situação difícil, porque nós estamos hoje concluindo uma oficina de planejamento estratégico, e na hora de planejar, nós precisamos de todos e de todas ali, para conversar, para discutir e para decidir as questões importantes. Eu queria dizer, primeiro, o que tem de novidade nesse momento? Porque os provedores de serviços ambientais e as provedoras de serviços ambientais não são novidade. Aqui nós temos a representação dos extrativistas, a representação dos povos indígenas e povos tradicionais. Então, eles são provedores de serviços ambientais. A novidade nesse momento é a tentativa, mais uma vez, de criar e de regulamentar, na forma de lei, o pagamento, ou seja, o reconhecimento por esses serviços que são prestados há muito tempo. Então, essa é a novidade. Nós gostaríamos de iniciar fazendo algumas sugestões ao PL 5.028. A primeira delas diz respeito ao art. 2º, no seu inciso II, que diz respeito aos serviços ecossistêmicos. Da forma como estão escritos, nos serviços ecossistêmicos, os serviços culturais, não é dada a relevância necessária para isso. Portanto, não se reconhecem os serviços culturais das populações e povos tradicionais. A gente precisa trabalhar melhor essa redação. No art. 3º, das modalidades de pagamento, aparece, no inciso IV, o comodato. Esse é um questionamento: de que forma o comodato pode se constituir numa modalidade de pagamento pela prestação de serviços ambientais? Como nós vamos enquadrá-lo como uma modalidade de pagamento? O art. 4º, que trata dos objetivos do projeto, está escrito da seguinte forma: "desestimular a perda". Isso é muito estranho. Como eu vou desestimular a perda? Porque ninguém estimula a perda. Ou alguém estimula a perda? Então: "IV - desestimular a perda de vegetação nativa, a fragmentação de habitat, a desertificação e outros processos de degradação dos ecossistemas nativos e fomentar a conservação sistêmica da paisagem". Outra coisa que me parece estranha é você ter no início do inciso um sentido negativo, de coisas negativas, e, ao final, você trabalhar com outro sentido que é a conservação, algo extremamente positivo. |
| R | Então, a nossa proposta é de nova redação para o inciso IV: "IV - combater ou evitar a perda de vegetação nativa, a fragmentação de habitat, a desertificação e outros processos de degradação dos ecossistemas nativos". E, para aquele final, que é "e fomentar a conservação sistêmica da paisagem", a proposição da Contag é incorporar ao inciso II ou incluir novo item. Portanto, se a primeira proposta fosse consentida, ficaria: "II - estimular a conservação sistêmica da paisagem, dos ecossistemas, dos recursos hídricos, do solo, da biodiversidade, do patrimônio genético e do conhecimento tradicional associado." Ou, se fosse inserir um novo item, seria direto: "III - fomentar a conservação sistêmica da paisagem." Temos aqui um questionamento: por que nesse artigo não se incluíram ou não se citaram os impactos ambientais ocasionados pelas atividades da mineração e pelo uso dos organismos geneticamente modificados? A não ser que não se reconheçam os impactos que estão aí colocados. Na realidade, a mineração vai na contramão do que o PL propõe, que é pagar por serviços ambientais. A mineração, todos nós sabemos que traz grandes impactos do ponto de vista de degradação, do ponto de vista de contaminação com metais altamente pesados, que são extremamente prejudiciais à saúde das pessoas e dos demais seres vivos que vivem naqueles ambientes. E nós estamos passando por um momento onde os povos e comunidades tradicionais, especialmente as comunidades indígenas, as populações indígenas, têm ameaçado o seu território, porque a gestão atual do País pode trabalhar intensamente para liberar a mineração nos territórios indígenas. Uma outra coisa é em relação aos transgênicos. Nós sabemos e vimos aqui nos gráficos apresentados anteriormente que a tecnologia, que não está restrita ao uso de organismos geneticamente modificados, é uma grande responsável pelo aumento progressivo na produtividade, nós reconhecemos isso. Mas também reconhecemos, não podemos deixar de citar que o uso de organismos geneticamente modificados causa, sim, impactos ambientais do ponto de vista da degradação da biodiversidade, de contaminação da biodiversidade, especialmente da cultura do milho, cuja polinização se dá principalmente pelo vento, assim como pelo uso articulado e necessário, obrigatório, por exemplo, dos adubos químicos e dos venenos. Porque contaminam solo, contaminam água e são, na realidade, não só um problema ambiental, mas um problema de saúde pública para a população brasileira. Ao art. 6º, que trata das ações a serem promovidas pela política, nós propomos novo item, que é "Estimular práticas de produção e reúso de água." |
| R | Para o art. 7º, que trata dos objetos da política - já foi falado aqui pelos companheiros que me antecederam. O inciso III trata das: "unidades de conservação de proteção integral e áreas silvestres das unidades de conservação de uso sustentável, das zonas de amortecimento e dos corredores ecológicos, nos termos da Lei n° 9.895, de 18 de julho de 2000." Nós propomos aqui também incluir as reservas extrativistas. Já foi proposto pela Angela colocar RPPNs e foi proposto aqui pelo Ivanildo colocar também os assentamentos agroextrativistas. No art. 7º, ainda continuando, nós propomos a inclusão de um novo inciso, que diz: "Áreas de assentamentos da reforma agrária e do crédito fundiário, da agricultura familiar e de empreendedores familiares rurais." O art. 10 trata de como o Poder Público vai fomentar a assistência técnica e extensão. Nós temos alguns questionamentos em relação a isso. Como esse artigo será cumprido, tendo em vista a redução progressiva do orçamento destinado aos serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural? Nós tivemos um pico de valor de orçamento entre 2014 e 2015 que superou os R$600 milhões, hoje nós temos menos de 10% disso. Quem prestará serviços: são as empresas públicas, são as empresas privadas ou, como já falou o companheiro que me antecedeu, o Senar? Pois existe uma estratégia hoje, em âmbito nacional, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, de trabalhar fortemente com o Senar, que tem recursos para isso. E o que nós vamos fazer com as empresas públicas? E o que nós vamos fazer com as empresas privadas, que foram fortemente estimuladas, inclusive, a se articularem em redes entre 2004 até 2010, quando houve o advento da Lei Geral de ATER (12.188/2010)? O que vamos fazer com essas empresas privadas? Outro questionamento. Os serviços contratados terão a Política Nacional de ATER e a Lei Geral de ATER (12.188/2010) como marco legal? Ou seja, nós vamos estar embasados na Pnater? (Soa a campainha.) O SR. RONALDO DE LIMA RAMOS - Haverá a III Conferência Nacional de ATER, conforme previsto na Lei 12.188? Até o momento, só foram realizadas a primeira e a segunda. Este ano é o prazo limite para realizar a terceira. Com relação às cláusulas do contrato, §3º, vou ler só a preocupação. Garantir que o provedor não tenha possibilidade de pactuar a exploração, ainda que extrativa, de produtos da área contratada para fins de serviços ambientais. Esse parágrafo dá plenos direitos de acesso tanto à documentação quando à área que está sendo contratada. |
| R | Há uma outra preocupação em relação ao art. 14, que trata do órgão colegiado. Ele é paritário e tem representação do Governo, dos produtores e das organizações da sociedade civil. Qual é a preocupação? Quais serão as regras para composição do colegiado quanto à representação das entidades da sociedade civil? Ou seja, quem decidirá sobre a ocupação dos assentos? Recentemente, antes de vários comitês e conselhos serem acabados, quem decidia, por exemplo, a representação - escutem bem isto -, quem decidia a representação, por exemplo, da sociedade civil no Condraf era o Governo. Isso é absurdamente inaceitável! Com relação aos provedores de serviços ambientais, falo rapidamente. Nós temos aqui um conjunto de experiências tanto no Brasil quanto no mundo. Eu só vou me ater aqui ao Brasil, no caso do Pró-Ambiente, do qual vou falar um pouquinho mais. Houve uma experiência, ocorrida a partir do início dos anos 2000, que, infelizmente, não chegou a concretizar o seu grande foco, que era o pagamento por serviços ambientais; o Bolsa Floresta, que é uma ação estadual; o Programa Plantar; no Acre, a Política de Valorização do Ativo Ambiental, cujo pagamento seria por bônus, valorizando as florestas nativas ou cultivadas e demais formas de vegetação nativa. E, mais uma vez, aqui aparece um gargalo, que é assistência técnica e extensão rural, porque essas áreas precisariam ser certificadas. E quem faria esse serviço? O Serviço de Assistência Técnica e Extensão Rural, que nós vimos como está hoje. Mas, nem tudo está perdido. Em 2014, no Plano Safra 2014/2015, foi criada uma modalidade do Pronaf chamada de PPO (Pronaf Produtivo Orientado), com recursos que não impactam os recursos do Orçamento Geral da União, porque são dos fundos constitucionais - FCO, FNO e FNE - mas, pasmem, até hoje nenhuma proposta foi contratada. A Contag já entregou por mais de uma vez ao Governo Federal proposta para execução, implementação e prestação contínua de serviços de ATER por sete anos para as comunidades. Eu já passei do meu tempo. Eu gostaria de somar a esse processo uma coisa extremamente importante, que é a implementação da Década da Agricultura Familiar. Que a gente consiga discutir também no âmbito do programa a implementação da Década da Agricultura Familiar. E, partindo para a finalização, quero dizer o seguinte. No CAR, que foi mostrado aqui também na apresentação do Nelson: existem 6,4 milhões de cadastros ambientais rurais no sistema, porém apenas 3% foram analisados. Significa dizer que, se não tomarmos cuidado, algumas pessoas poderão ser beneficiadas com pagamento por serviços ambientais sem que o seu CAR esteja devidamente analisado. (Soa a campainha.) O SR. RONALDO DE LIMA RAMOS - Gostaria de agradecer o convite e a oportunidade de estar aqui. |
| R | O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Eu é que agradeço a todos os palestrantes. Quero lamentar - eu já até pedi isso à equipe -, eu não gosto muito quando a audiência pública tem vários convidados porque você limita o raciocínio deles. Só que aqui nós estamos fazendo um ciclo de três audiências públicas. Então, hoje foi necessário, sim. Normalmente, eu tenho limitado esse número para três ou quatro expositores, que aí têm oportunidade de falar com maior propriedade. Não é nada agradável para mim aqui ouvir essa campanha, eu acho que tinha que mudar esse barulho que deixa a gente atordoado até. Eu acho que você limita o raciocínio sobre um tema tão importante como é esse do PSA. Eu queria aqui fazer algumas considerações. Eu já disponibilizei para vocês os questionamentos que foram feitos pelo Portal e-Cidadania, da população. Então eu vou oportunizar a vocês para, se se sentirem à vontade de responder a alguma delas, fazerem uso da palavra. Esses são alguns questionamentos que eu e minha equipe estamos fazendo, vocês se sintam também à vontade para responder. No art. 7º, §1º, encontramos: § 1º Os recursos decorrentes do pagamento por serviços ambientais pela conservação de vegetação nativa em unidades de conservação devem ser aplicados pelo órgão ambiental competente em atividades de regularização fundiária, elaboração, atualização e implantação do plano de manejo, fiscalização e monitoramento, manejo sustentável da biodiversidade e outras vinculadas à própria unidade. § 2º Os recursos decorrentes do pagamento por serviços ambientais pela conservação de vegetação nativa em terras indígenas devem ser aplicados em conformidade com a política de gestão ambiental dessas terras. Qual é a posição dos senhores sobre esse trecho da proposição? E o outro questionamento é relativo ao parágrafo único do art. 8º, que dispõe o seguinte: Parágrafo único. O uso de recursos públicos para pagamento de serviços ambientais em Área de Preservação Permanente, Reserva Legal e outras sob limitação administrativa nos termos da legislação florestal é permitido somente por meio de remuneração não monetária em bacias hidrográficas consideradas críticas para o abastecimento público de água, assim definidas pelo órgão colegiado referido no art. 14 desta Lei. É uma redação longa, talvez dúbia. Parece-lhes legítimo excluir alguns serviços ambientais sob certas condições predefinidas? Então, que vocês fiquem à vontade. Pelas perguntas, eu quero agradecer a todos que estão participando. Todos que desejarem participar deste evento podem enviar perguntas e comentários para o Portal e-Cidadania, no endereço www.senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone 0800-612211. Agradeço a participação de Karla Regina, de São Paulo, que pergunta: "O pagamento por serviços ambientais é viável para obter uma melhora no que tange ao desmatamento desenfreado?". Franciele Brito, da Bahia: "De qual maneira será a gratificação para os que possibilitarem esses serviços ambientais?". Gilberto Shinzato, de Minas Gerais: "Que as matas ciliares sejam no mínimo de profundidade x largura. E depois as reservas legais. Onde foi desmoronado deverá plantar vegetação." Clarissa Saraiva, do Ceará: "Qual o principal objetivo deste projeto de lei?". Então, neste momento eu abro. Quem se sentir à vontade peça e pode já responder. Muito obrigado. Com a palavra o Sr. Nelson. O SR. NELSON ANANIAS FILHO (Para expor.) - Bom, eu acho que são perguntas que fizeram com que a lei chegasse neste momento e tivesse várias versões. Então, como em muitas dessas perguntas, a gente também gostaria de chegar a um senso comum e ter convicção de que isso é um serviço ambiental que cumpre todos os seus objetivos, que traz segurança a quem provê e a quem cumpre esse serviço ambiental, e de que isso funciona num princípio não só do pagador, mas pelo conservador e recebedor, de forma que a gente consiga manter esse tripé da sustentabilidade - o econômico, o social e o ambiental - e que isso gere riqueza, desenvolvimento, para todas as atividades que são desenvolvidas no interior do País e traga essa segurança de que quem paga e quem compra poderá continuar promovendo e provendo esses serviços ambientais. |
| R | Quanto à pergunta relativa ao art. 7º, eu acho que há gente até mais qualificada para trabalhar com isso, mas a sugestão nossa é que esse recurso do pagamento de serviços ambientais também seja voltado para a questão da regularização ambiental de propriedades dentro de unidades de conservação de proteção integral que foram criadas - e a gente tem vários exemplos aí -, em que o produtor rural está lá dentro, ele está causando algum impacto à unidade de conservação - no entanto, o Estado não tem recursos para desapropriá-lo e tirá-lo dali -, e poderia ser revertido para essas ações, e de que jeito a gente pode também trabalhar dentro do texto. No art. 8º, a questão... O artigo restringe, sim, muitos serviços ambientais que já são desenvolvidos pelo produtor rural. Acho que essa indicação de que a remuneração só pode ser para questões diárias de recarga, de produção de água, limita muito a atividade, apesar de que a gente entende que também temos esse papel de produção dos recursos de garantia, mas não é só ali. A gente produz, e a água chega ali, e ela está disponível, e ela recarrega o aquífero, porque a gente tem muitas ações de recuperação de área de recarga de aquífero, porque a gente tem todas as propriedades - matas ciliares conservadas, nascentes conservadas... Se você for conservar só aquela e você incentivar a recuperação e a manutenção só daquelas, em áreas em que existe conflito pelo uso ali, principalmente para abastecimento humano e dessedentação animal, isso aí vai restringir muito, e não reflete todo um sistema de recarga de aquífero e produção de água dentro da propriedade rural. Isso é um papel primordial da propriedade rural e precisa ser garantido. Então, se somente reservar e restringir a esse público, a esse tipo de produção, de proprietários rurais, o projeto fica muito aquém daquilo que ele pode alcançar. Vou responder a só mais uma, para liberar a palavra. Então, na verdade... Da Karla Regina, de São Paulo: "O pagamento por serviços ambientais é viável para obter uma melhora no que tange ao desmatamento desenfreado?". A gente tem que separar isso, o desmatamento legal do desmatamento ilegal, aquilo que é garantido dentro da legislação e aquilo que não é. O produtor rural, como disse na minha fala, tem endereço hoje. Ele é obrigado a cumprir não só a legislação do Código Florestal, mas a legislação de águas, a legislação de uso de agrotóxicos, toda uma série - de uso do solo, de água e tudo. A gente tem uma série de legislações que regulam o produtor rural, e esse produtor rural tem endereço. Ele precisa, se tiver passivo, recuperar; se ele tiver ativo, ele está lá, cumprindo toda essa ação. Então, o desmatamento precisa ser combatido e, sim, o pagamento por serviço ambiental nos dá uma alternativa de uso daquela área, daquele espaço, no qual eu abro mão de uma produção econômica qualquer, em cima de uma remuneração que não precisa ser aquela que valora, efetivamente, o serviço ambiental prestado como manutenção da biodiversidade, que tem um valor imenso, a produção de água, que tem o seu valor também... Então, tudo isso. |
| R | O simples custo de oportunidade de não se abrir essa área já é uma proposta... (Soa a campainha.) O SR. NELSON ANANIAS FILHO (Para expor.) - ... uma boa proposta. Então, eu acho que é isso. Eu acho que, sim, o pagamento por serviço ambiental dá alternativa ao uso alternativo de solo e promove essa manutenção dessas vegetações. Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Obrigado. Eu passo a palavra ao Sr. Elcio Manchineri, caso queira fazer alguma consideração. O SR. ELCIO MANCHINERI (Para expor.) - Bom, primeiro, quero agradecer a participação, Senador, dizer que vou ler melhor o projeto de lei e que nós vamos mandar uns comentários oficiais, via Apib, para colaborar com o projeto de lei. Em relação aos serviços de pagamento ambientais, principalmente na questão dos povos indígenas, nós temos a lei da PNGATI, que é a Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial em Terras Indígenas, não é? Ela versa sobre a questão, por exemplo, de utilizar o recurso para a recuperação de área degradada, para fortalecimento dos povos indígenas em instâncias, e o reconhecimento também do serviço que os povos indígenas fazem. Então, o pagamento, nas questões indígenas, teria que ser via lei da PNGATI. Com relação à pergunta da Regina, de São Paulo - "O pagamento por serviço ambiental é viável para obter uma melhora no que tange ao desmatamento desenfreado?". Aí, do meu ponto de vista, não é pagar para... Tipo assim, "nós estamos pagando para você não fazer nada", mas a questão é obedecer às leis que existem hoje no País, e o pagamento nada mais é, na questão dos povos indígenas, para que se venha a fortalecer sua organização social, seu modo de vida naquele território. E o pagamento não vem, por exemplo, por família. Ele vem como um projeto que realmente venha a beneficiar toda uma comunidade ou todo um povo. Então, ele tem que vir para beneficiar toda a comunidade. Isso também responde à da Franciele, da Bahia, que coloca assim: "De qual maneira será a gratificação para os que possibilitarem esses serviços ambientais?". No nosso caso, é como eu falei: através de projetos que beneficiem toda a população, e não apenas beneficiem famílias - como eram as propostas de algumas "bolsas verdes" que apareceram muito tempo atrás -, que venham realmente a beneficiar toda a população. E, talvez, a questão do pagamento por serviço não venha apenas na questão da água, mas englobe outros serviços que são feitos pelas populações indígenas, extrativistas e quilombolas. Que isso seja também olhado e colocado na lei. Mas aí nós vamos fazer um comentário oficial, via Apib. Obrigado. O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Obrigado, Sr. Elcio Manchineri. Neste momento passo a palavra ao Sr. Ivanildo Brilhante. O SR. IVANILDO BRILHANTE (Para expor.) - Quero agradecer aqui, em nome das mulheres, das águas e das florestas, ao Senador e aos companheiros de Mesa, à Plenária, a oportunidade. Acho que a pergunta da Karla é uma pergunta bem difícil, não é? Vamos ver, acho que o tempo trará a resposta. |
| R | Eu penso - e o debate das populações traz isso - que quem protege floresta precisaria ter um bônus por isso, quer seja pela produção, quer seja pelo serviço ambiental que presta à Nação. Deveria ter pelo menos a chegada da política pública, deveria ter pelo menos o acesso a direitos básicos, enquanto... Não digo cidadãos, porque não somos homens e mulheres da cidade; nós somos homens e mulheres da floresta, do rio. Podemos pensar a "florestania", a "aguabilidade", num contexto do território. Eu penso que, se a gente melhorar o projeto de lei, incluindo as nossas ideias, para que a gente seja contemplado, para que os resultados cheguem a quem, de fato, faz o serviço ambiental... Porque geralmente, muitas vezes, fica na ponta. Não chega à ponta: fica no meio. Então, se só repassar recursos para o Estado brasileiro, talvez ele tenha outras prioridades que não as populações que conservam. Então, eu acho que nós precisamos incluir o que vai... Priorizar, fazer o recurso chegar às pontas, a quem faz, de fato, os serviços ambientais. Este é um desafio: de construir a legislação - e aprovar - que inclua, de fato, os direitos das populações. E eu acho que o principal objetivo da lei... Há vários, não é? Eu acho que há vários interesses para aprovar a legislação, desde quem polui a quem conserva. Então, nós esperamos que... Se a gente premiar, se a gente bonificar quem já faz, pela sua cultura, a conservação - ou por uma obrigação legal -, tal pessoa vai ser incentivada a produzir floresta, a produzir fábrica de fazer água neste País, o mangue e outros ecossistemas que produzem a conservação e a despoluição do ar. Então, eu penso que, para as populações tradicionais, que buscam os territórios coletivos, que para nós são assegurados quando se mantêm as reservas criadas e criam-se novas reservas - esse é o nosso desafio -, e se reconhecem outras modalidades que têm população... Porque um protege o outro. É o comunitário, porque, na sociedade, nós somos desafiados a ser consumistas e, para desenvolver o bem-estar social, a gente precisa usar os recursos de forma sustentável. (Soa a campainha.) O SR. IVANILDO BRILHANTE - Coletivamente: é a possibilidade de um fiscalizar o outro, de um controlar o outro, para que possamos manter os recursos. Eu penso que tem que haver o equilíbrio entre cuidar de quem está doente e cuidar de alguém para não adoecer, e, se a gente cuida para não adoecer, a gente não chega a ficar doente. Se a gente cuida de quem protege floresta, incentiva, dá dignidade, a gente não vai ter desmatamento. Acredito muito nisso, e o CNS trabalha nessa perspectiva. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Obrigado, Ivanildo Brilhante. E, agora, para as suas considerações, Ronaldo de Lima Ramos. O SR. RONALDO DE LIMA RAMOS (Para expor.) - Obrigado, Senador. Eu gostaria de aproveitar e falar um pouquinho mais do Pró-Ambiente, que foi o Programa de Desenvolvimento Socioambiental da Amazônia, no início, porque ele foi pensado, discutido com várias organizações sociais, movimentos organizados da Amazônia e também com a Federação de Trabalhadores Rurais da Amazônia. Foram criados 11 polos, chamados "polos pioneiros", formados, cada um, por 500 famílias de agricultores e agricultoras, em assentamentos ou não. Mas, quando ele foi ascender para o nível de política pública e passar para âmbito nacional, infelizmente, nós não conseguimos efetivá-lo. É uma pena. |
| R | E eu gostaria já de contar com a colaboração do Senador e de outros Parlamentares da Casa para que a gente volte a discutir a estratégia do Pró-Ambiente. Ela é, sem sombra de dúvidas, algo muito bem construído, muito bem elaborado, e que pode colaborar fortemente para a política nacional de pagamento por serviços ambientais. Segundo, eu gostaria de dizer o seguinte: existem algumas agendas comuns. A Angela já trouxe que essa questão do pagamento por serviços ambientais é, de fato, uma agenda que une vários setores da sociedade - vários setores econômicos inclusive. Uma outra é a produção de alimentos saudáveis. Essa é uma pauta que unifica tanto pessoas da área rural quanto pessoas da área urbana. Ninguém quer comer coisa que vai lhe fazer mal à saúde. Eu sei que comem, mas não querem. O que se está discutindo em nível mundial são os sistemas agroalimentares de produção de alimentos saudáveis. Em janeiro de 2017, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul promoveu a 3ª Conferência Internacional sobre os Sistemas Agroalimentares, especialistas do mundo inteiro estiveram lá falando sobre isso. É um caminho sem volta. Nós também podemos, e precisamos, discutir a questão dos sistemas agroalimentares de produção. Com relação a fontes de financiamento. Olha, eu, de cara, parto de duas. Primeira: utilizar para o pagamento dos serviços ambientais as multas ambientais, porque existe um caixa expressivo de multas ambientais, recurso que ainda não foi carimbado para estabelecer para onde vai. E a segunda, que inclusive é pauta da Casa, é a questão da isenção dos tributos... (Soa a campainha.) O SR. RONALDO DE LIMA RAMOS - ... dos agrotóxicos. São cerca de R$10 bilhões por ano - que deixam de entrar nos cofres públicos - que são colocados para os agrotóxicos. Por que não trabalharmos isso e trazermos esses recursos para o pagamento de serviços ambientais? E, por último, dialogar com os companheiros dos assentamentos agroextrativistas, porque falaram que, de mais de 300 mil famílias, pouco mais de 50 mil têm a DAP A. Ora, nós sabemos das dificuldades que existem no Incra para isso. Se o Incra, hoje, está desistindo de processos de assentamento de famílias que já estavam assentadas, imaginem emitir DAP A para essas pessoas. E eu sugiro que vocês entrem em contato com a Federação dos Trabalhadores Rurais e Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado do Pará, a nossa Fetagri-Pará, para discutir de que forma os nossos sindicatos, que são credenciados e são emissores de DAP, podem contribuir com vocês. Nós não podemos emitir DAP A se não tivermos convênio com o Incra, mas, se for necessário, a Federação, provavelmente, para atender essa causa, fará convênio com o Incra e vai atender às demandas dessas populações dos assentamentos agroextrativistas. Eu gostaria de terminar falando uma frase que resume, de forma muito popular, a necessidade de articulação e de união das pessoas. Ela está escrita na parede, na frente da parede, do Sindicato de Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Município de Acopiara no Ceará e diz o seguinte: "Ou nós se junta ou nós se lasca". |
| R | Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Obrigado. Quero agradecer a todos os participantes e agradecer a todos aqueles que estão nos assistindo, nos ouvindo, pela participação. Quero colocar esta Comissão do Meio Ambiente, mais uma vez, à disposição como um espaço democrático para dialogarmos e construirmos uma sociedade mais justa, fraterna e igualitária na defesa do meio ambiente, que é uma garantia constitucional. Coloco-me à disposição como Presidente desta Comissão, mas também como Senador, e que nós possamos, sim, construir um pagamento para o serviço ambiental de forma justa, de forma a corrigir essas injustiças. Eu, mais uma vez, agradeço a participação de todos vocês. Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada esta audiência pública. Muito obrigado. (Iniciada às 10 horas e 19 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 17 minutos.) |

