Notas Taquigráficas
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| R | O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Bom dia a todos! Agradeço a Deus a oportunidade por mais essa audiência pública aqui na Comissão de Meio Ambiente. Havendo número regimental, declaro aberta a 6ª Reunião da Comissão do Meio Ambiente. Quero iniciar justificando o meu atraso. Eu estava na Comissão de Direitos Humanos, numa audiência pública também de grande relevância. Eu fui, neste final de semana, visitar os povos guaranis-kaiowás, em Dourados, pela segunda vez, que estão sendo dizimados, infelizmente. Como essa audiência pública também envolvia os povos originários, eu tive que ir lá dar uma contribuição. Por isso, o meu atraso aqui. Peço perdão, porque não tenho o hábito de atrasar, mas por circunstâncias alheias à minha vontade isso teve que acontecer hoje. A presente reunião destina-se à realização de audiência pública em atendimento ao Requerimento nº 9, de 2020, da CMA, de minha autoria, com o objetivo de instruir o PL 5.028, de 2019. Esta é a terceira das quatro audiências que realizaremos sobre o tema. Muito sucintamente, na primeira reunião, realizada em 20 de fevereiro, vimos a necessidade de uma futura política de pagamento por serviços ambientais representar toda a classe de potenciais provedores desse serviço. Na segunda, dia 3 de março, identificamos a necessidade de uma terminologia precisa. Ouvimos, por exemplo, que serviços ambientais são executados por pessoas em apoio aos serviços ecossistêmicos, esses realizados pela natureza, com as suas funções ecológicas. Entendemos também a importância da objetividade do texto de lei que trate do tema e a necessidade de não inviabilizar o PSA para situações práticas já atestadas sob a égide do Código Florestal, bem como para deixar claras as origens dos recursos que alimentarão os pagamentos, sobretudo quando públicos. Já não restam dúvidas quanto à relevância do PSA para a promoção de atividades favoráveis ao meio ambiente, o que nos reveste, nesta Comissão, de grande responsabilidade para construir, em termos jurídicos, um texto que faça a aproximação do mundo real com o idealizado no projeto que sairá daqui. No olhar econômico, o projeto precisa, consideradas as externalidades e, em especial, o mercado, reconhecer o valor de cada ação ambiental. |
| R | Para aprendermos sobre as questões jurídicas e econômicas envolvidas na criação da Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais, realizaremos o encontro de hoje e, em complemento, atendendo a requerimentos dos membros da CMA, a última audiência no dia 19 de março. A reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados por meio do Portal e-Cidadania na internet, em senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone 0800-612211. A Secretaria trará à Mesa algumas perguntas para enriquecer o debate, e o relatório completo, com todas as manifestações, estará disponível no e-Cidadania, assim como as apresentações que forem utilizadas pelos expositores. Nos termos da Instrução Normativa 9/2017 - SGM, a Secretaria solicitará a degravação da presente reunião para que as notas taquigráficas sejam anexadas à respectiva ata. Na exposição inicial, cada orador usará da palavra por até 15 minutos e, antes de encerrarmos, se o tempo permitir, poderá apresentar suas considerações finais em 5 minutos. A palavra será concedida aos Senadores inscritos para fazerem suas perguntas ou comentários em 5 minutos após as exposições iniciais. Neste momento, convido para compor a Mesa o Sr. Ludovino Lopes, advogado especialista em serviços ambientais; o Sr. Marco Fujihara, sócio-administrador da Radce Consultoria e Participações, engenheiro agrônomo especialista em financiamento e recursos na área ambiental; Sra. Linda Murasawa, sócia-diretora da Fractal Assessoria de Desenvolvimento de Negócios, especialista em transformação dos modelos de negócios para uma economia de baixo carbono e sustentável; o Sr. Raul Silva Telles do Valle, diretor de Direitos e Justiça Socioambiental da WWF - Brasil. Mais uma vez, agradeço o comparecimento de todos vocês e quero deixar claro que esta Comissão estará sempre de portas abertas. Esta Comissão é da academia, é das universidades, é dos movimentos sociais, é da sociedade civil organizada, é das instituições, é do público, é do privado; é de todo aquele que tem um olhar humanizador e entende que defender o meio ambiente é sair em defesa da vida humana em sua plenitude. Eu fico muito feliz de estar aqui presidindo esta Comissão num momento tão delicado pelo qual passa o Brasil na área ambiental, num momento de total desmantelamento na área ambiental, que é um direito humano essencial, um direito humano constitucional, previsto no art. 225. Infelizmente, o Chefe do Executivo queria acabar com o Ministério do Meio Ambiente de direito. Ele não conseguiu, mas está acabando de fato, quando acabou com a Secretaria de Mudanças Climáticas, quando acabou com o Departamento de Educação Ambiental, com o Plano de Combate ao Desmatamento, quando reduziu a participação da sociedade civil, os membros do Conama, que eram 96, para vinte e poucos, quando criminaliza ONGs, quando prolifera a autorização de agrotóxicos. Só em 2019 foram 504 autorizações de novos agrotóxicos; agrotóxicos que são proibidos no Reino Unido, na Europa. A herbicida que está na nossa água é 300 vezes pior do que aquela que é permitida. A atrazina, o acefato... E agora, extração de minério em terra indígena, extração de petróleo na cabeceira da foz do Rio Amazonas. O que mais pode acontecer? Eu já estou perdendo a paciência com tanto desmantelamento na área ambiental. E, infelizmente, a população não está abrindo os olhos, porque ela está tendo uma visão míope, imediatista. Ela não entende que ela é parte significante disso. Será quando que a população vai acordar? Porque sem a floresta em pé na Amazônia não temos os rios voadores, não vai fazer chover no Sul, não vai fazer chover no Nordeste, no Norte, no Sudeste. Se nós não defendermos as nossas costeiras, como ficam a comunidade Marinha, Abrolhos, tantos santuários? Será difícil entender isso? |
| R | Então, este é um momento, nesta audiência pública, de a gente também ter a serenidade, a sobriedade e o equilíbrio emocional para entender que é possível, sim, a gente fazer um pagamento por serviço ambiental. É possível perfeitamente caminhar de mãos dadas, sustentabilidade gerando emprego e renda, alavancando a economia, mas tudo com responsabilidade, preservando o meio ambiente. Perdoem-me o desabafo. E agora com a palavra do Sr. Ludovino Lopes para suas considerações em, no máximo, 15 minutos. Muito obrigado. O SR. LUDOVINO LOPES (Para expor.) - Senador Fabiano Contarato, é um prazer estar aqui com V. Exa., uma honra também. Senadores, senhoras e senhores, é um prazer e um bom-dia para todos aqui. Bom, eu queria aproveitar esta oportunidade em que V. Exas. nos trouxe aqui para podermos conversar e fazer uma pequena viagem pelo tempo do ponto de vista da análise jurídica, para que nós possamos entender, pelo menos na perspectiva histórica, o que que estamos enfrentando do ponto de vista das questões jurídicas. Se a gente volta ao século XIV, ao século XV, constata que a questão da titularidade da propriedade era exclusivamente do rei. Então, você não podia sequer caçar na terra ou utilizar os recursos dela sem a autorização do rei. A gente precisou esperar até 200 anos atrás, com o Código Napoleônico, para que a gente tivesse o conceito de propriedade privada, e esse conceito de propriedade privada nos trouxe, então, um novo mundo, onde o privado poderia, portanto, se apropriar e ter o direito a essa propriedade privada. De lá para cá, Senador, a propriedade e o direito de propriedade vieram sendo moldados por uma coisa chamada função social. E a função social nos trouxe um conjunto de novos elementos que também estão conectados com a função ambiental e com um conjunto de novos formatos de uso e de limitação desse uso para determinadas funções que estão sendo estruturadas. E nós não estamos preparados, e ainda não estávamos preparados, para entender o que significa legislar ou criar novos ativos ambientais dentro desse conceito de propriedade. É por isso que a gente está tentando criar, então, os novos conceitos de carbono, de água, de biodiversidade, do próprio uso do solo e um conjunto de elementos que fazem parte de um novo modelo do ponto de vista jurídico e de qualificação dessas novas formulações jurídicas para as quais a gente precisa dar valor econômico. Aqui eu queria, então, estabelecer dois ou três pontos fundamentais para que a gente pudesse tentar separar conceitualmente algumas coisas. Uma coisa é o pagamento por serviços ambientais e a formulação jurídica de um mecanismo jurídico ou de um contrato para alicerçar o pagamento por serviços ambientais; a outra coisa diferente é nós conceituarmos o ativo ambiental, o bem jurídico ambiental. E eu acho que a gente está fugindo da verdadeira questão. |
| R | E eu acho que a gente está fugindo da verdadeira questão porque, ao tentarmos criar um modelo jurídico conforme o pagamento por serviços ambientais sem entregar a qualificação jurídica da natureza do bem ambiental, nós estamos correndo o risco de criar a forma e não o conteúdo e de perdemos a oportunidade de criar uma verdadeira economia ambiental dentro da estrutura jurídica do País. Eu vou tentar explicar isto. O que nós temos hoje, na verdade, é um ativo ambiental que está nas nossas florestas que podemos chamar de - vou usar o conceito de floresta nesse caso aqui, ambiental - recurso natural ou de capital natural, vamos chamá-lo assim. Esse recurso natural, esse capital natural, tem sido objeto de estudos científicos de várias naturezas, aos quais a gente acabou chamando, por exemplo, de serviços ambientais: a produção de carbono ou de água, a regulação de água, por aí afora. Mas esse conceito é um conceito científico, não é necessariamente um conceito jurídico. Quando eu copio e colo o conceito de serviços ambientais da ciência para o jurídico, eu tenho um pequeno problema, porque provavelmente algumas das coisas que estão ali dentro são produtos, não são serviços e, se são produtos, eles caem na categoria de ICMS e não na categoria de ISS. E, se eu optar por qualificar isso como um serviço, o fluxo da riqueza vai fluir através dos Municípios. Ao contrário, se eu o qualificar como um produto, esse fluxo da riqueza vai fluir através dos Estados. A fórmula pela qual vamos ter que desenhar essa estrutura vai ser extraordinariamente importante. Então, se nós criarmos apenas e nos preocuparmos apenas com a criação de um instrumento jurídico contratual para regular um contrato propriamente dito, estamos esquecendo toda a base, estamos criando o telhado em vez das fundações. O que que eu quero dizer com isso? Eu quero dizer basicamente o seguinte. Hoje nós já temos algumas legislações nacionais que nos indicam esse caminho. A lei do PIB Verde, de 2017, já nos diz que o Produto Interno Bruto deverá ser composto por esses ativos que estão qualificados como ativos ambientais, e o nosso Código Florestal já nos diz claramente qual é a natureza jurídica dos serviços ambientais. Então, legislar novamente sobre a concepção jurídica do que é um serviço ambiental não me parece necessário neste momento; parece-me mais necessário legislar sobre o ativo ambiental propriamente dito e legislar sobre a natureza econômica desse ativo. O que eu quero dizer nesse sentido? Se nós formos hoje procurar a qualificação econômica, por exemplo, da atividade de conservação de florestas nativas, nós vamos encontrar um código de atividade econômica que se chama conservação de florestas nativas, mas não compreende a conservação da floresta nativa, o que significa dizer que, se eu quiser hoje transformar, como atividade econômica, a conservação de florestas, eu não consigo porque eu não tenho um código de atividade econômica e, aí, a partir desse conceito, a Linda não vai poder transformar isso num ativo financeiro, o Marco Antonio Fujihara também não vai conseguir transformar isso num ativo financeiro, porque eu não tenho um código nacional de atividade econômica para atividades de conservação ambiental no sentido pleno do termo. Então, eu diria que a gente precisa pensar um dia num ativo ambiental. Ele nasce um ativo ambiental, precisa ser um ativo contábil, transformar-se num ativo econômico para, depois, se transformar num ativo financeiro. Essa cadeia precisa ser tratada e regulada do ponto de vista jurídico. Eu preciso definir claramente a natureza do ativo ambiental. Público? Privado? Ele é um produto? Ele é um serviço? Ele vai pelo caminho do ICMS? Ele vai pelo caminho do ISS? Embora hoje não esteja estruturado e compreendido na lei do ISS, ele tem uma rubrica contábil onde eu posso ativá-lo tanto como ativo público como ativo privado? Ele tem a capacidade de ter um código nacional de atividade econômica onde eu posso estruturar um contrato e aí, sim, valorar economicamente esse ativo? E, a partir daí, se ele é um ativo econômico, ele pode ser objeto de uma transação de custódia e de estruturação financeira que tem toda a sua cadeia estruturada no mercado financeiro. |
| R | Então, o meu desafio é: como é que nós fazemos para que um ativo ambiental possa se transformar efetivamente num ativo financeiro, passando por um ativo econômico dentro dessa estrutura? E como é que o jurídico pode ajudar na construção destas bases do ponto de vista da concepção jurídica deste ativo ambiental, deste bem econômico que está na base das nossas florestas? E, aí, há algumas concepções aqui, Senador, que são fundamentais também. Uma é o conceito de serviço ecossistêmico; a outra coisa é o conceito de serviço ambiental no sentido conceitual propriamente dito, isto é, aqueles serviços que a nossa Constituição já define como serviços ecossistêmicos e que são prestados pela própria natureza em si. A natureza - costuma-se brincar - não tem um CNPJ, mas ela pode ter uma forma de ser remunerada em relação a esse valor econômico. Hoje a nossa reserva legal está transformada num passivo. Ela não necessita ser um passivo, ela pode ser um ativo, e ela tem como ser um ativo com valoração econômica capaz de gerar uma atividade econômica produtiva se o conceito de código nacional de atividade econômica for mudado e, para mudar isso, Senador, não precisa mais do que chegar lá no IBGE e mudar a rubrica conceitual para que isso possa se transformar num ativo econômico. Esse é o primeiro ponto. O segundo ponto é: a atividade que gera o serviço ambiental pode ser de duas naturezas, ela pode ser positiva, uma obrigação de fazer positiva, ou uma obrigação de fazer negativa, como não matarás, não desmatarás, certo? Então, esse serviço ambiental que está sendo prestado e remunerado se exerce sobre a remuneração daquela atividade que leva à conservação ou ao incremento do bem ambiental e do produto ambiental, e é em cima dessa lógica que me parece que precisamos construir uma economia ambiental propriamente dita. Eu passei, há uns nove meses ou um ano atrás, num país chamado Nepal e pude perceber que, na Constituição do Nepal, já há o conceito de serviço ambiental e já há o conceito de serviço de carbono constitucionalmente consagrado. Eles já colocaram dentro da Constituição esse conceito dessa nova economia, transformando isso numa atividade constitucionalmente reconhecida. Então, esse caminho da economia ambiental, onde o capital natural se transforma num produto ou num serviço, que tem uma rubrica contábil que pode ser passiva ou negativa, que se transforma num ativo econômico com um código de atividade específico para o desenvolvimento dessa economia e depois leva a uma economia que se transforma num ativo financeiro capaz de ser transacionado nos mercados, nos daria, então, sim, uma transversalidade do ponto de vista da conceptualização desses ativos para que, então, a gente pudesse criar um mecanismo jurídico de regulação dessa estrutura. |
| R | Agora, se criarmos só o mecanismo jurídico como um contrato sem pensar no alicerce e no fundamento, nós vamos ter problema no futuro. E termino por aqui. O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Obrigado, Sr. Ludovino Lopes, pela forma didática, pela clareza e pelo alerta que demonstra na sua exposição. Eu espero que quem esteja aqui esteja tomando nota, porque as audiências públicas têm esta finalidade: obter as contribuições e ver realmente como nós podemos adequar isso nesse projeto que está em tramitação. Neste momento, eu passo a palavra ao Sr. Marco Fujihara. O SR. MARCO FUJIHARA (Para expor.) - Obrigado, Senador. Foi muito bom o Lopes ter colocado a questão jurídica antes de eu falar, porque agora a gente pode pegar toda a "longetividade" - sei lá qual seria a palavra mesmo - que você colocou e tentar transformar isso em alguns ativos e não precisar só... O que eu tenho visto nesse projeto de lei é o seguinte. É um projeto que regula basicamente contratos, e a gente precisa ser um pouco mais agressivo nisso e transformar a questão ambiental em ativos de fato, ativos que possam ser transacionados. Aí todo mundo fala: "A reserva legal tem garantia". Não há um banco neste País que use a reserva legal como garantia de nenhum empréstimo! Isso dá para ser regulado no Banco Central, não precisa ser regulado pelo projeto de lei, não é? Qual é o valor de uma reserva legal? Se você sabe o valor, o banco pode usar isso como uma garantia para fazer outras coisas. Então, como é que a gente transforma ativos, que a gente entende que são ativos, em instrumentos financeiros que possam ser colocados no balanço das empresas? O exemplo mais simples que eu vejo é que a maioria das empresas brasileiras de médio e grande porte fazem inventário de emissões. Quantas colocam nos seus balanços isso? Nenhuma. Então, a gente não está atribuindo às coisas que a gente faz um valor que seja reconhecido no balanço contábil. Se a gente não está atribuindo esses valores, como é que a gente quer reconhecer isso? Se uma empresa tinha emissões de dez e, no ano seguinte, ela passou a ter emissões de oito, esses dois são um ativo que tem que estar colocado no seu balanço. E por que não se faz isso? É porque não há regras? Não, é porque as empresas entendem que talvez isso não seja importante. Aliás, há uma empresa que faz isso no Brasil e, assim mesmo, com notas de rodapé de balanço, que é a Natura, mas muito timidamente faz isso. Então, como é que a gente faz para reconhecer isso? Como é que a gente faz para reconhecer que a gente tem ativos e que a gente pode colocar esses ativos? É que, na maioria das vezes, as áreas de meio ambiente, Senador, e as áreas de sustentabilidade das empresas não conversam com a área financeira, elas nem sequer sabem da existência uma da outra. Então, como é que a gente faz para trazer a área de sustentabilidade para perto da área financeira para começar a conversar e começar a ativar isso nos seus balanços? Começar a trazer... Pagamento por serviços ambientais? Vai ser um enrosco para as empresas isso. Elas não vão saber nem onde colocar isso no balanço! A minha percepção clara é que, se a gente não trouxer a área ambiental e a área de sustentabilidade das organizações para perto da área financeira, não vai acontecer nada. Outro dia, eu ouvi uma declaração do Presidente do Banco Central brasileiro dizendo que mudanças climáticas vão mudar o fluxo de capital do Planeta. Vai. Vai. Claro que vai, não é? E a gente está fazendo o quê? A gente não consegue nem legitimar as ações que a gente faz no balanço... As empresas ficam colocando lá o relatório de sustentabilidade, mas ninguém lê, é passarinho voando e não sei o quê, mas não colocam isso como um ativo e não discutem com o banco que aquilo pode ser colocado como uma garantia real. Então, eu acho que a gente tem que começar a pensar que instrumentos financeiros se criam no dia a dia, não se cria por decreto um instrumento financeiro. Instrumento financeiro se cria pela necessidade dele. O mercado de carbono no Brasil não vai existir porque vai haver um decreto que vai dizer isso, vai ser por causa do custo de oportunidade de redução de emissões no Brasil ser mais barato do que nos Estados Unidos, por exemplo. |
| R | Então, com essas coisas a gente precisa começar a impregnar a sociedade: "Você quer conservar? Isso tem um valor. Reconheça esse valor no seu balanço, reconheça esse valor nas coisas." Conservação tem um valor. Quem não sabe o valor não conserva. Então, eu acho que a grande contribuição que o Senado pode dar a essa discussão é: como internalizar essas discussões em normas? Por exemplo, o Instituto Brasileiro de Contabilidade tem normas para isso. Existem normas de ativo biológico. No seu Estado, no Espírito Santo, já vi empresas que fazem avaliação de ativos biológicos. Mas fazem avaliação e deixam lá no balanço num cantinho. Então, como é que a gente faz para instrumentalizar tudo isso? Se a gente conseguir instrumentalizar tudo isso, será a partir de dois conceitos, e aí são dois conceitos absolutamente importantes. O primeiro conceito é adicionalidade: tem que ser sempre adicional ao que se faz. A grande discussão de que eu me lembro da época do Protocolo de Kyoto era a reserva legal. Se eu enriquecer uma área de reserva legal, eu posso ter crédito de carbono nessa área? "Ah, mas já há uma lei que diz que tem que conservar." Bom, essa é uma discussão absolutamente complexa, na minha opinião, mas que, independentemente da lei, precisa ser conservada, independente de qualquer coisa. Então, como é que se valoriza isso? Bom, como instrumentos de mercado, Senadora... Eu tenho certeza de que o mercado de capitais brasileiro, por menor que seja, por mais incipiente que seja, tem todos os sistemas de garantia que podem acontecer. Por exemplo, a gente evitar uma dupla venda de serviços ambientais: a Cetip faz isso no mercado de capitais muito bem. O mercado de capitais é regulado pela CVM. O mercado de ativos ambientais da Califórnia é regulado pelo órgão de mercado de capitais. Então, a gente não precisa inventar muita coisa. A Cetip faz toda uma regulação de dupla contagem. Eu não posso vender o mesmo serviço ambiental para o senhor e para aquela pessoa da frente, porque eu não estou regulando o serviço, eu estou regulando a transação. E quando a gente passa a regular a transação, fica muito mais fácil. A lei tem que determinar o que é serviço, o que não é serviço, mas, se a gente quiser instrumentos de controle e instrumentos financeiros, eles têm que ter regras claras. Nenhum investidor entra num negócio que não tem regra clara, ele foge disso. Então, os instrumentos de mercado de capitais de que o Brasil dispõe, via mercado de capitais, via CVM, via bolsa de valores, são instrumentos absolutamente satisfatórios para a gente controlar todos os ativos ambientais que possam vir a ser criados a partir dessa legislação. Eu não entendo que a gente precise criar novas normas. Eu entendo que a gente precisa adaptar as normas que já existem. O melhor exemplo que eu tenho é a Califórnia, a Califórnia faz isso muito bem. Então, eu acho que, no Brasil, a gente tem um espaço bacana para trabalhar isso. Há a questão da adicionalidade e há outra questão que me parece importante: é a linha de base. A linha de base é onde eu começo a contar serviços ambientais. E a preocupação que eu tenho tido ultimamente, Senador - eu quero externar aqui a minha preocupação -, é que as práticas que estão sendo feitas no Brasil relativamente a isso são práticas muito sofríveis, algumas são práticas muito complicadas do ponto de vista de enganar a população mesmo, de trabalhar com o crédito que não é crédito, de trabalhar com coisas que eu entendo que são bem complexas e que eu entendo que têm outras variações que não necessariamente a questão ambiental. |
| R | Então, a minha preocupação, Senador, é que a gente estabeleça mecanismos de práticas e serviços ambientais que sejam regulados na transação, porque o mercado de capitais faz isso e funciona. A questão básica hoje é: como fazê-lo? A lei vai determinar o que é legislação, o que é serviço "a", serviço "b", como é que se quantifica, tudo mais, mas se a gente não fizer alguma coisa em que a gente aproveite a regulação de mercado de capitais que a CVM já tem... A gente talvez consiga inventar regras de novo, mas talvez não seja necessário fazer isso. Muito obrigado. O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Obrigado, Sr. Marco Fujihara. Imediatamente passo a palavra para a Sra. Linda Murasawa para sua fala em, no máximo, 15 minutos. A SRA. LINDA MURASAWA (Para expor.) - Obrigado, Senador. É um prazer estar aqui com os colegas. A ideia aqui é fazer uma complementação. Já sabendo que o Ludovino é advogado e o Fuji trabalha nessa parte de mercado financeiro há muito tempo, a ideia é tentar trazer um pouco as questões de mercado e como essa lei vai combinando com tudo isso. Então, na hora em que a gente começa a pensar nessa questão de pagamento de serviços ambientais, o mercado olha um instrumento que você precisa precificar, só que esta é a questão: como criar um sistema de preços que incentive os agentes a tomar decisões ambientalmente corretas? Isso é muito complexo. É o que o Fuji colocou, é o que o Senador colocou, porque a questão é da valoração à vida, que não necessariamente significa precificação. São termos diferentes. A valoração à vida precisa ser prioritária em relação a qualquer valoração econômica. Então, na hora em que nós olhamos serviços ecossistêmicos, precisamos entender que essa valoração é a prioridade em função de uma continuidade de vida, não simplesmente da continuidade de um modelo. Aqui eu não vou me aprofundar muito, porque todo mundo aqui sabe o que é que são os projetos que estão ligados à recuperação da vegetação e a pagamentos de serviços ambientais. Eu já começo a entrar aqui um pouco na questão dos modelos que foram discutidos. Eu vi vários PLSs, várias discussões que estão sendo feitas aí durante a tramitação do PL. Algumas foram até colocadas, como a possível consideração de um fundo federal de compensação por serviços ambientais. O ponto de atenção é justamente quando eles colocam a questão... Se eu conseguir acertar aqui... Bem, ali onde estão as comunidades, há um "recebe um recurso em dinheiro". Esse aspecto em relação à questão de receber o dinheiro está vinculado à questão de uma doação. Então, esse é um ponto que eu quero que vocês lembrem. O segundo é parecido, só que ele traz uma questão de financiamento com juros diferenciados. Então, significa uma taxa de juros menor com um longo prazo. Que cuidados a gente tem que ter quando a gente olha esses tipos de instrumentos que estão sendo colocados? É necessário você trabalhar com dinâmicas de mercados, como colocaram o Fuji e o Ludovino, já conhecidas. Então, você não vai sair inventando nada, mas você vai tentar trazer, junto ao mercado financeiro... Quais instrumentos de mercado, que ativos você qualifica, que produtos você pode utilizar e por quê? Porque você tem que trazer todo e qualquer serviço baseado em atratividade de investimentos. |
| R | Então, para a sustentação de qualquer fundo, a pergunta básica é: quem é o investidor? Quem vai fazer a manutenção desses fundos? Como é que você sustenta qualquer modelo ou qualquer lei baseada em um mercado? Portanto, na hora em que a gente olha o pagamento de serviços ambientais, percebe que eles precisam ser reconhecidos juridicamente e financeiramente, mas é preciso criar modelos com que o mercado possa trabalhar. Um exemplo disso é a cidade de Nova York, com Catskill, em que a demanda foi: como manter a questão da segurança hídrica para a população da cidade de Nova York? Eles começaram, em 1996, com uma preocupação de abastecimento de água da população e, naquela época, simplesmente o sistema de tratamento de água pensou num projeto tradicional: vamos pegar água do Rio Hudson, fazer o tratamento e sair distribuindo. Só que aí vários cientistas apontaram que não só a questão da vazão, mas a poluição e todas as atividades não dariam essa sustentação a longo prazo. O que significa isso? E na época eles falaram assim: "Olha, um projeto de uma estação de tratamento de água vai custar US$6 bilhões com US$250 milhões de manutenção/ano". Até que alguém chegou lá e falou assim: "Temos um outro modelo, chamado ecosystem payments, que é o pagamento serviços ambientais. Esse modelo traria uma parceria público-privada, com US$1,5 bilhão de investimento e US$167 milhões/ano para manutenção. Por que eu estou trazendo tudo isso? Porque, na hora em que houve uma legislação... Nova York trouxe uma legislação, um reconhecimento do ativo que deveria existir de ecossistemas. Só que esses ecossistemas não existiam mais na cidade Nova York, Nova não tinha mais condições de ter esses serviços ecossistêmicos. Eles foram buscar onde? Numa cidade chamada Catskill. Essa cidade de Catskill é basicamente de produtores rurais, com os quais a cidade de Nova York fez um contrato para a manutenção não só do que a gente poderia chamar aqui no Brasil de reserva legal, mas também para aumentarem suas áreas, que se tornariam RPPNs. Então, esses produtores fizeram contratos com a cidade de Nova York reconhecidos juridicamente, reconhecidos economicamente. São contratos de 30 anos ou contratos vitalícios. Aqueles que tornaram em RPPN fizeram contratos vitalícios em que, mesmo sendo vendidas para terceiros, será mantida a funcionalidade daquele uso de solo, preservando, assim, os ecossistemas e trazendo receitas adicionais, porque, de toda a água de Nova York que é paga, uma parte é transformada em receita para os produtores manterem todas essas áreas. E um detalhe: como aumentaram, expandiram essas áreas, eles criaram ecoturismo. Para quem estava para investir 6 bilhões e investiu 1,5 bilhão, já houve uma eficiência de recursos públicos imensa, só que houve geração de empregos e ainda houve geração de receitas. Esse projeto trouxe um adicional de US$100 milhões/ano em receitas de ecoturismo. |
| R | Então, é possível você transformar modelos de modo a fazer valoração e enxergar que aquilo ali traz uma preservação não só ambiental, mas para a qualidade de vida. E esse é um dos cases que são mais estudados no mundo. Todo mundo analisa e estuda esses modelos econômicos, e ninguém consegue dizer que esse modelo não funciona. E a valoração de tudo isso... Inclusive, vários PhDs econômicos dizem o seguinte: valorar um serviço ecossistema é impossível; o ser humano pode fazer várias intervenções, mas a natureza cria serviços que nós não conseguimos reproduzir. A geração de água é um deles. Então, na hora em que a gente começa a olhar que é possível fazer uma convivência, mas uma convivência de planejamento de longo prazo, você começa a ver que é possível reproduzir, como é o caso de Extrema, em Minas Gerais. Em Extrema houve uma reprodução desse modelo de Catskill em Nova York, em que você também parte de uma área prioritária... O importante quando a gente pensa em legislar é entender também quais são as áreas críticas. Extrema tem o Rio Jaguari, que é um dos grandes rios que alimentam a Bacia do PCJ. E essa Bacia do PCJ é uma das grandes responsáveis por alimentar o Sistema Cantareira, ali em São Paulo. Então, na hora em que você olha que não é simplesmente uma atividade local... Essa atividade fez uma movimentação de um conjunto de leis que já existiam, como a questão da bacia - a ANA atuou em conjunto com os sistemas que eles colocaram no Município -, uma legislação em que você pode reconhecer esse tipo de atividade, esse tipo de serviço, eles fizeram uma valoração desses serviços. Em 2013, os produtores rurais estavam recebendo cerca de R$198 por hectare/ano para manter esse serviço ligado ao conceito de conservação das águas. Isso tudo trouxe um modelo de água potável, todo um projeto voluntário, uma vegetação que foi aumentando. Há também um ponto que o Ludovino trouxe, que é a questão do direito consagrado do usufruto da propriedade privada. Em todo projeto que a gente olha em termos de legislação, qual é o cuidado? Não haver uma interferência do Estado sobre um bem que é privado. Nesse sentido, em todas as legislações, tanto de Nova York quanto de Extrema, assim como do Estado do Senador, o Espírito Santo - eu só não trouxe aqui, Senador, porque vi que no outro debate já foi feita toda essa discussão -, a gente começa a ver que os modelos conceituais trazem grandes vantagens para todos. Na hora em que você conserva essas produções, você traz para as cidades água, produtos agrícolas, lazer, bem-estar, conservação, traz ainda inovações em pesquisa e desenvolvimento, atrai investidores através de multilaterais, bilaterais, doações, incentivos tributários. Quando você vai fazer uma pesquisa no desenvolvimento a partir de uma indústria, por exemplo, de fármaco ou até de alimentos, você pode ter a junção de outros incentivos fiscais que o Brasil já tem, do tipo Lei do Bem etc., e você começa também a trazer, dentro do planejamento do setor público, uma eficiência de recursos. Traz planejamento de longo prazo e, melhor ainda, torna obrigatório o mapeamento de áreas sensíveis e críticas, porque - como no caso de Extrema, em que a cidade foi um dos grandes fatores de alimentação do Sistema Cantareira - você começa a trazer benefícios que devem ser reconhecidos. Se um produto serve para todos, por que não todos colaborarem com esse produto? Então, nesse ponto você traz cada vez mais as questões ligadas às legislações, em que a gente precisa garantir segurança jurídica através desses instrumentos, como o PL, e fomentar essa segurança hídrica, alimentar e de conservação. |
| R | Essa integração de arranjos institucionais vai atrair novos programas - principalmente pensando que não devem desestimular programas existentes, como o do Estado do Espírito Santo ou de Extrema - e trazer modelos que se sustentem a longo prazo, porque, se você simplesmente criar um fundo que tenha, um começo, meio e fim em termos de doação, você não estará olhando a longo prazo. Você pode enxergar por um prazo de três, cinco, até dez anos, mas ele não traz um modelo de manutenção autossustentável. E, se você não traz um modelo de autossustentação, você não atrai investimentos. E, se você não consegue atrair investimentos, você pode engessar todo e qualquer modelo que venha a ser discutido em lei ou até mesmo nesse serviço. Deixo essas palavras, Senador. Muito obrigada. O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Obrigado, Sra. Linda Murasawa, por suas considerações, por sua fala. Passo agora a palavra ao Sr. Raul Silva Telles do Valle, da WWF Brasil. O SR. RAUL SILVA TELLES DO VALLE (Para expor.) - Bom dia a todos. Bom dia, Senador. Agradeço o convite para participar desta Mesa sobre esse assunto, que é tão importante. Estamos há anos aqui, vários de nós, acompanhando esse projeto de lei. Estamos muito felizes por saber que ele já veio para o Senado. A gente tem certeza de que este ano a gente conseguirá aprovar um projeto moderno e positivo para o País. Eu vou tentar me centrar aqui no projeto de lei. Acho que esse é o nosso objetivo aqui. Não vou tentar fazer grandes divagações sobre o PSA e tudo mais. Vou tentar focar naquilo que eu acho que interessa e em como que a gente consegue aprimorar um texto que é um texto que já veio da Câmara com um grande acordo. Aliás, acho que isso é positivo. Queria aqui ressaltar que nós, do WWF e de outras organizações, vemos com felicidade que ele tenha sido aprovado nesse ambiente de agenda positiva, num momento em que País precisa disso. Não queremos apenas ficar falando do que há de negativo. Bom, a primeira questão que vem é a seguinte. Para que a gente precisa de uma lei de pagamento por serviço ambiental? Se a gente olhar para as experiências ao redor do mundo e no Brasil também, a gente vê que grande parte dos programas, ou iniciativas, de pagamento por serviço ambiental são programas públicos, são feitos pelo Estado. O Estado mobiliza recursos e faz o pagamento. Existem outros programas que seriam, digamos, público-privados, em que o Estado de alguma forma cria um mercado, com obrigações, cap-and-trade, para que agentes privados possam distribuir os recursos de pagamento pelo serviço ambiental, mas a partir de uma obrigação imposta pelo Estado. E existem mecanismos privados também, que são uma minoria. Vários deles, uma grande parte, são de organizações da sociedade civil sem fins lucrativos, então, de alguma forma, têm fins públicos também. Mas também temos empresas que se interessam... O caso de Nova York, que foi colocado aqui, é um caso, embora seja uma cidade, era uma concessionária de serviço público. Pode-se dizer que tem uma lógica empresarial. Na ponta do lápis, fazia sentido ela fazer aquele mecanismo. Pensando nisso, acho que a gente tem que diferenciar... Portanto, a lei vai servir para utilidades diferentes. Uma é para o mecanismo de serviços ambientais, de pagamento de serviços ambientais feitos pelo Poder Público e pelos particulares. E para ambos tem que haver coisas diferentes, a gente não pode tratar tudo no mesmo saco, porque se não vai haver problema. |
| R | Então, para que a gente precisa de uma lei? Primeiro, a gente precisa de uma lei que possa reconhecer que existem serviços ambientais. Isso é importante, ou seja, essas coisas existem. Existem atividades prestadas por nós, pela sociedade humana, que geram externalidades positivas, e essas externalidades positivas que aproveitam a todos nós da sociedade são externalidades que podem ser remuneradas, que podem ser reconhecidas, que têm um valor econômico, o que justifica ao Estado poder destinar recursos para isso. A gente tem que lembrar que, no caso do Governo do Estado, vige o princípio da legalidade estrita: ele só pode fazer aquilo que a lei autoriza. Então, para que o Governo, o Poder Público, o Estado possa destinar recursos para um particular em função de qualquer atividade, é importante que a lei reconheça que aquela atividade é passível de remuneração. Então, para os mecanismos públicos de PSA, faz sentido haver uma lei que em nível nacional reconheça: isso existe, tem valor e podemos despender recursos públicos para isso. Então, essa é uma primeira utilidade. A segunda utilidade que pode ter uma lei nacional de PSA é alocar recursos, criar mecanismos que possam trazer recursos para o pagamento, seja criando um fundo nacional, seja pegando dinheiro de royalties do petróleo, de alguma Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, seja destinando recursos de impostos, seja criando mercados, como fez o Código Florestal com a Cota de Reserva Ambiental. Criou mercado: todo mundo tem que ter um mínimo de reserva legal; quem não tem pode adquirir uma cota de alguém que tenha mais; e criou-se um mecanismo de transação. É uma forma de fazer pagamento de serviço ambiental, porque lá na ponta você tem um produtor que tem um déficit de reserva legal pagando para um produtor que tem reserva legal adicional. "Pode-se enquadrar como tanto", isso a lei pode fazer também; criar mercados para tanto, alocar recursos. E a terceira finalidade que uma lei pode ter é, para os mecanismos privados, identificar quais são os problemas que nós temos hoje que criam insegurança jurídica. A lei pode pacificar essa insegurança jurídica para facilitar as transações privadas, dentro do princípio - eu acho que é importante ter isso claro - de que as transações privadas têm que gozar da maior liberdade possível para que elas possam fazer o que bem entenderem, desde que não seja ilegal e desde que você possa ter segurança de que as partes vão poder fazer. Então, a lei poderia facilitar algo que hoje tenha algum problema e que, porventura, precise de algum esclarecimento na lei, porque vai demorar para o Judiciário fazer ou para que outros órgãos possam fazer. Essas são as três grandes finalidades que, a meu ver, uma lei tem que trazer e que demandam uma lei. O projeto que está aí, que foi aprovado na Câmara, de alguma forma cumpre com o primeiro requisito, ou seja, ele traz, sim, alguns conceitos gerais sobre o que que é serviço ambiental, reconhece a existência e permite o pagamento do Estado para particulares. Então, o.k. O segundo, que é destinar recursos, pela nossa situação fiscal no Brasil, o projeto não tem. Então, poderia trazer, não traz... Acho que, tudo bem, é uma opção, e talvez seja a única opção disponível neste momento, mas não trouxe recursos novos, não criou um fundo, não criou um mercado nem nada. Porém, isso pode ser feito posteriormente, não tem problema. Seria ideal que tivesse acontecido, mas, se não aconteceu, a gente pode avançar sem isso. |
| R | E a terceira questão, que eu acho que é a mais problemática, na qual eu gostaria de me centrar um pouco, diz respeito às iniciativas privadas. A pergunta é: será que esse projeto está solucionando os problemas jurídicos que nós temos hoje, para facilitar que as transações privadas possam acontecer, ou não? Então, vou agora descer um pouco ao detalhe. A meu ver, o texto, embora seja novo - queria aqui parabenizar o acordo que houve na Câmara, o esforço de todos que estamos debruçados sobre isso para avançar -, traz alguns pequenos problemas que acredito que o Senado possa corrigir. Um deles, a meu ver, é uma centralização excessiva dentro desse mecanismo federal que está sendo criado no texto. Então, ele, por exemplo, cria um colegiado ligado ao Ministério de Meio Ambiente, que vai determinar algumas regras para a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais. Isso se aplica, portanto, pela regra do texto, não só a um futuro e eventual programa federal, que não existe hoje, mas que pode vir a existir, mas a programas estaduais, a programas municipais, inclusive atividades particulares, porque está escrito lá que esse colegiado vai definir regras que valem para o País inteiro, para política nacional. E dentre elas, por exemplo, a do art. 14 diz que esse colegiado vai definir métricas de valoração dos contratos e definir os critérios de proporcionalidade no pagamento por serviços ambientais que envolvam recursos públicos. A meu ver, esse dispositivo é um risco. Por que é um risco? Porque esse colegiado vai começar a definir para o País inteiro métricas para valoração. E você pode ter, como já tem hoje, programas estaduais e municipais que tenham métricas diferentes. E não há nenhum problema, porque o que é importante é deixar que as coisas aconteçam. Então, se, de repente, esse colegiado define uma métrica de valoração que é distinta, por exemplo, do Programa Reflorestar, no Espírito Santo, que é o caso de maior sucesso no País até hoje, o programa do Espírito Santo vai passar a estar ilegal no dia seguinte, porque a métrica dele é diferente. Ou ele vai ter que ajustar a métrica dele para algo que não é o ideal, para cumprir com uma determinação de um colegiado federal. Não me parece fazer sentido isso. Da mesma forma, o critério de proporcionalidade que um contrato particular possa ter... Não faz sentido que você tenha uma regra definida por um colegiado nacional que tenha que se aplicar a todas as hipóteses, ou seja, nesse caso, nós não deveríamos permitir que tenhamos uma lei que tenha aquela coisa one size fits all, ou seja, que todo mundo tenha que se ajustar a uma grande regra nacional, porque, por mais boa vontade, por mais capacidade de técnica que esse colegiado possa ter, é impossível que ele consiga apreender todas as especificidades dos programas locais. E, portanto, nesse critério, a lei deveria permitir - e a Linda colocou isto aqui - que os programas locais possam continuar; que eles não tenham que se ajustar no detalhe a regras definidas por esse colegiado. Da mesma forma, eu penso que o projeto, embora seja positivo, porque ele tenta - eu entendo a boa intenção - trazer cláusulas essenciais aos contratos de pagamento por serviço ambiental, isso também pode acabar engessando programas locais, ou seja, em alguns programas locais pode não fazer sentido aquelas cláusulas estipuladas na lei. Temos que lembrar: quando a lei estipula uma cláusula, vira um contrato regulado, ou seja, todos os contratos de pagamento por serviço ambiental têm que ter aquelas cláusulas, como acontece com contratos de aluguel e outros contratos, poucos casos no Brasil, que são contratos regulados por lei. Nesse caso, pode fazer sentido aquela cláusula em vários casos, mas pode haver alguns casos nos quais não faça sentido ter aquelas cláusulas, modalidades de pagamento por serviço ambiental que não estão pensadas na lei federal. E aqueles casos vão ter que se ajustar, de alguma forma, digamos, quase que fake, para cumprir com uma obrigação legal, e isso não faz sentido. Então, na nossa avaliação, métricas, definição de proporcionalidade, o que pode ser pago, o que tem que estar no contrato, isso tudo tem ser definido em cada um pelos Estados e pelos Municípios. Poderia a lei, sim, trazer quais são as regras para um programa federal. Faz sentido. E o programa federal pode servir de inspiração, de guia para os programas locais, mas não deveria a lei permitir que um colegiado central ou que uma regra federal venham engessar os programas que ainda estão começando. Eu acho que disso é importante a gente ter clareza também. Não é que nós temos uma larga experiência e isso acontece em todos os cantos. Não. Programas de pagamento por serviço ambiental são poucos. Estão começando. É um mercado nascente. Um mercado nascente tem que ter mais liberdade de crescer e não ter uma regra que vai engessá-lo nesse momento. |
| R | Um terceiro ponto que eu sei que já foi bastante debatido aqui, mas ao qual eu queria voltar, é essa regra de que não se pode fazer pagamento por serviço ambiental genericamente sobre APP e reserva legal. Eu acho que esse é um ponto que vale a pena nós detalharmos e pensarmos um pouco. Vou voltar aqui no que foi tema da semana passada. O Programa Reflorestar, do Espírito Santo, que, de novo, é o maior programa em escala, o que mais tem feito a diferença no País, tem mais áreas, tem mais continuidade, ou seja, é aquele que está melhor estruturado, faz justamente pagamento para restauração de APP, que é uma obrigação do produtor, mas que, sem aquele programa, não teria acontecido. A gente pode ver isso na paisagem do Espírito Santo. Quem vai lá conhece, sabe o que está acontecendo. Então, por que o programa do Espírito Santo, assim como outros programas, que é o caso do Produtor de Água, que é o caso de Extrema, que são vários casos... A grande maioria dos casos de pagamento por serviço ambiental no Brasil hoje se ancora na legislação florestal e faz o pagamento para cumprir aquilo que está na lei. É um auxílio ao cumprimento da lei. Mas por que ele poderia fazer isso? Porque tem adicionalidade. Então, acho que uma coisa que o projeto poderia trazer é um conceito melhor de adicionalidade. Adicionalidade não é aquilo que é diferente do que está na lei, aquilo que vai além da lei só. Em alguns casos, pode ser, mas, em muitos casos, pode não ser. Adicionalidade é aquilo que é diferente do que é praticado comumente na realidade, no chão, o chamado business as usual. Então, o caso do Espírito Santo é um caso muito claro, ou seja, muito embora exista uma lei há décadas, dizendo que as nascentes têm que ser preservadas e, se desmatadas, têm que ser recuperadas, a realidade é que há um conjunto muito grande de pequenos produtores que não têm renda ou conhecimento ou condições técnicas suficientes para fazer aquilo, e aquelas nascentes que, embora protegidas há décadas, estavam desmatadas há décadas e não seriam recuperadas, com o programa começaram a ser. Isso é adicionalidade. Esse foi o critério consagrado para o Protocolo de Quioto, que não olhava para a lei. Falava: bom, esse projeto muda a realidade ou não muda a realidade? É necessário fazer um pagamento ou ter algum tipo de incentivo para que aquele agente particular assuma um ônus que ele não teria que assumir, ou teria por lei, mas não assumia e não ia fazer diferente, para que ele possa ter uma atitude que é positiva para a sociedade? Essa é lógica da adicionalidade. É diferente do business as usual e cobre um custo de oportunidade do particular que, se não fosse com aquilo ali, não o faria, ou seja, ele tem que adotar uma postura... Para ele fazer algo que é positivo para a sociedade, ele tem que fazer algo que é negativo para ele. Eu me lembro do caso do Programa Proambiente, que foi uma primeira tentativa de programa nacional de pagamento por serviço ambiental, que mirava o quê? Ele mirava pequenos produtores que queriam fazer transição agroecológica. E como ele mensurava, nesse caso, o pagamento? Ele mensurava em horas de trabalho. Por quê? Porque para aqueles pequenos produtores, que estavam acostumados a fazer roçagem ou a ter criação de gado, fazer uma agrofloresta, muito embora economicamente na ponta do lápis fizesse muito sentido - você não precisava nem de algum incentivo, na ponta do lápis -, aquilo dava um trabalhão danado, porque demora muito mais tempo, exige muito mais esforço do que você fazer uma roça de milho ou fazer criação de gado. Então, foi esse tempo que passou a ser valorado e remunerado. Para aquele produtor ter... (Soa a campainha.) |
| R | O SR. RAUL SILVA TELLES DO VALLE (Para expor.) - ... ter uma ação de serviço ambiental que é fazer um plantio agroflorestal, ele tinha um custo privado, um ônus. E aquele pagamento cobria aquele ônus. É simples assim, tinha adicionalidade: não se olhava se aquilo era reserva legal, se era APP, se era outra coisa; fazia-se porque aquilo fazia a diferença. Então, eu acho que o projeto pode trazer um critério de adicionalidade, em vez de ficar discutindo se pode ou não pode genericamente pagar por APP ou reserva legal. Porque, por exemplo, se eu sou um produtor e faço uma reserva legal de 40% da minha área no Espírito Santo, eu tenho 20% acima do que a lei permite ou do que me exigiria, mas é reserva legal. Eu vou proteger para sempre e não posso ser remunerado por aquilo. A lei, do jeito que está, está proibindo isso. Ou se eu fizer uma RPPN: uma vez feita uma RPPN, eu tenho que proteger; se eu tenho que proteger, não posso receber. Bem, com isso eu finalizo aqui. Vamos partir para os debates. Agradeço. O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Obrigado, Sr. Raul. Mais uma vez agradeço a participação de todos os palestrantes, lembrando que à tarde haverá uma reunião técnica com todos vocês para se debruçarem e, de forma concreta, pontuarem todas essas considerações para melhor elaboração desse projeto. Mais uma vez eu quero agradecer-lhes. Esta audiência está sendo veiculada e todos que desejarem participar deste evento podem enviar perguntas e comentários por meio do Portal e-Cidadania, no endereço www.senado.leg.br/ecidadania ou pelo telefone 0800-612211. Aqui quero agradecer a participação da população, em especial do Bertrand Guedes, de Pernambuco. O Bertrand questiona: "Quais serão as fontes dos recursos para o pagamento dos serviços ambientais?". Boa pergunta, porque todo mundo quer saber quem vai pagar essa conta. Então, está bastante atento o Bertrand Guedes, de Pernambuco, que ainda questiona: "Haverá dotação orçamentária do Governo Federal?". Patricia Freitas, de São Paulo, também dá a sua contribuição - obrigado, Patricia -: "Este projeto de lei poderia incentivar os proprietários rurais a promoverem ações destinadas à preservação ambiental?". São duas colocações aqui. E aos palestrantes que se sentirem à vontade para responder eu agradeço. Aqui há dois questionamentos da equipe que eu quero passar para vocês também, se vocês ficarem à vontade, por favor. A política nacional deve enquadrar o serviço ambiental prestado como instrumento econômico ou financeiro? Que efeitos uma e outra classificação trariam para a implementação da lógica de pagamentos? Isso eu acho que foi muito bem abordado pelo Ludovino Lopes, na sua fala, complementando aqui o Marco. No sentido de criar segurança jurídica para as experiências já existentes, sem limitar a entrada de outros provedores, o que deveria ser reavaliado no texto do projeto de lei? Essa é a preocupação que o Sr. Raul e a Linda também vieram aqui enaltecer. Então, eu agradeço e agora abro para o Sr. Ludovino fazer suas considerações finais. E, se quiser e se sentir à vontade, pode responder qualquer uma dessas perguntas. Em seguida, na ordem, o Sr. Marco, a Sra. Linda e o Sr. Raul. Muito obrigado. O SR. LUDOVINO LOPES (Para expor.) - Senador, obrigado. Bem, a pergunta de US$1 milhão ou de mais de US$1 milhão, na verdade, é essa questão do ponto de vista financeiro. Eu diria o seguinte: se olharmos em volta do planeta, quando olhamos diversos lugares do mundo, a gente vai poder perceber que já existem mercados de serviços ambientais e mercados ambientais há bastante tempo. Isso não é uma coisa nova, digamos assim. A água sempre foi um ativo ambiental fundamental para a raça humana, para o ser humano. Então, isso já acontece há muito tempo. O ponto é que hoje a gente está trazendo esse ativo ambiental e esse serviço ambiental para uma modelagem que precisa galgar os conceitos não apenas econômicos, mas trazer para o setor financeiro. E a gente tem essa diferença de conceptualização. |
| R | E aí o ponto fundamental é: se fizemos um levantamento dos mercados e dos ativos ambientais, vamos encontrar mercados de carbono, de biodiversidade, de água... Mais de 240, 250 mercados já foram identificados, por exemplo, por uma instituição que chama Ecosystem Marketplace. Se vocês procurarem lá, vocês vão poder perceber que há uma lista de mercados de ativos ambientais, mercados ambientais que estão funcionando no mundo já há bastante tempo. Há estruturas como, por exemplo, em Illinois, onde você já tem um registro de ativos ambientais que fundamentam a economia do próprio Estado e da estrutura do Estado. O registro eletrônico de Illinois tem água, tem biodiversidade, tem carbono, tem um conjunto de elementos lá dentro. Então, já é possível de verificar que existem esses mercados. Não é uma novidade aquilo que a gente está estruturando aqui. Do ponto de vista jurídico, a gente já tem, Senador, na nossa legislação nacional, a previsão de criação desses mercados. O art. 9º da Política Nacional sobre Mudança do Clima já tem o mercado de carbono estruturado, que, inclusive, já foi de alguma forma criado lá atrás pela Comissão de Valores Mobiliários. E o §5º do art. 41 do Código Florestal já promove a criação do mercado de serviços ambientais como referência para o desenvolvimento do plano do Programa de Incentivos por Serviços Ambientais, que o próprio art. 41 já estipula. Então, eu diria que a gente já tem um conjunto de elementos na nossa legislação... A própria definição de serviço ambiental já está na nossa lei, no 41. Não precisamos inventá-la de novo. Então, o que nós precisamos, sim, é criar essa distinção, que o Dr. Raul colocou ainda pouco muito bem, entre quais são as normativas estruturais para um programa público de serviços ambientais e quais são os enquadramentos econômicos que precisam ser estruturados por um programa privado para fomentar e incentivar esse programa. Eu diria que a visão que tem sido colocada ao redor do mundo não é mais a de pagamento apenas; é a visão de fomento, incentivo e criação de mecanismos econômicos e financeiros para levar a uma economia ambiental que geram os serviços ambientais. Então, quando a gente coloca a questão apenas do ponto de vista do pagamento, significa que alguém vai ter que pagar e alguém vai ter que receber. E aí vem a pergunta: onde está o dinheiro? Onde está a conta para fazer esse pagamento? Então, o que nós podemos e precisamos colocar é um conceito um pouco mais abrangente, de fomento e incentivo, que nos leva a uma nova dimensão de pensar essa estrutura legal, que nos leva a um novo modelo de estruturação desse processo. E aí, baseado em quê? Em ativos econômicos ambientais. Para isso, precisamos trabalhar a questão de transformar... (Soa a campainha.) O SR. LUDOVINO LOPES (Para expor.) - ... respondendo à sua pergunta - de transformar esse instrumento jurídico que está sendo colocado na lei de pagamento por serviços ambientais - eu diria que ela deveria ser de fomento e incentivo a serviços ambientais, como um sistema -, mas transformá-lo num instrumento econômico que possa dar, com grau de segurança e acurácia, para os mercados financeiros essa estrutura. Não me parece que a gente precise regular a questão financeira nesse sentido, porque os instrumentos financeiros já existem. O Marco falou sobre isso, a Linda falou sobre isso. Eles já estão aí. A gente não precisa inventar a roda, porque, quando a gente inventa a roda, a gente a faz quadrada, porque, para inventar uma roda nova, há que se fazer alguma coisa diferente. |
| R | Agora, precisamos, sim, qualificar a natureza jurídica do ativo ambiental. Precisamos criar regras ou adaptar essas regras do ponto de vista contábil para ativar esse ativo no patrimônio público ou privado. Precisamos fazer com que a nossa propriedade possa amanhã ter lá dentro a propriedade, o averbamento do carbono, da biodiversidade, da água, da capacidade de gerar esses ativos para dar mais valor à própria propriedade e ela se transformar, então, num todo. Não apenas o valor da terra que leva à produção agrícola ou à pecuária ou florestal; ele precisa incluir os outros ativos lá dentro, como a água, a biodiversidade: o quanto de água a minha propriedade produz, o quanto de carbono ela pode efetivamente produzir. E, ao incrementar a produção de carbono, eu estou incrementando a conservação, porque eu não vou vender árvore, quando eu vendo carbono. E, vejam, o interessante é o seguinte: o carbono não é um ativo propriamente só econômico; ele já é um ativo financeiro, porque ele é um título transacionável nos mercados. Então, ele já passou essa conceptualização de apenas ativo ambiental para um ativo econômico, para um ativo financeiro. O que eu estou vendendo no carbono, o que eu estou remunerando é a atividade humana que levou à conservação que resultou numa redução de emissões através de um modelo metodológico certificado, validado pelos mercados internacionais. Então, o título jurídico carbono é um ativo financeiro já hoje nos mercados. Ele já fez esse percurso de maturidade do ponto de vista jurídico. Então, precisamos trazer essa lógica dentro do possível, para a biodiversidade, para a água, para a própria beleza cênica, para o uso do solo, desde que esses ativos possam ser apropriados individualmente e precificados, como diz a Linda. E aí esse é o ponto fundamental, o.k.? O SR. MARCO FUJIHARA (Para expor.) - Em dois mil e... Quando que você, Flávia, escreveu o seu livro, de que eu fiz o prefácio? (Intervenção fora do microfone.) O SR. MARCO FUJIHARA (Para expor.) - Em 2002, aquela moça escreveu um livro e eu tive o prazer de escrever o prefácio sobre CDMs e coisas do tipo, do Protocolo de Quioto. Em 2005, eu fui chamado à Costa Rica, e a gente fez uma debênture no mercado de capitais, em que a garantia da debênture era o carbono. Então, a gente passou a ter um ativo que não era só a precificação pela transação, mas a precificação de garantias. Então, eu conseguia que o mercado de capitais reconhecesse uma garantia a partir de um ativo ambiental. Isso mudou a Costa Rica. Isso criou toda uma abordagem diferente na Costa Rica, do PIB Verde, de toda a questão que a gente conhece de como evoluiu rapidamente a Costa Rica. E por que evoluiu rapidamente? Porque o mercado de capitais começou a reconhecer esses ativos que existiam na Costa Rica. Eu quero responder uma pergunta aqui: de onde vem o dinheiro? Quem paga a conta? Quem tem que pagar essa conta é quem precisa dos serviços. Existem algumas teorias de algumas pessoas que dizem: "Ah, mas o serviço é da sociedade, então o Estado tem que pagar a conta". Caramba, não vai pagar nunca. Se depender disso, a gente morre de fome amanhã. Então, quem precisa do serviço é que tem que pagar esse serviço. Então, nós temos que criar a necessidade de haver uma oferta e a necessidade de haver uma demanda por esse serviço. Se a gente tem a necessidade da oferta e a necessidade da demanda, a gente tem a necessidade da transação. Então, quem paga a conta é quem precisa dele. E eu queria colocar uma outra questão, da segurança jurídica, porque, assim, quanto mais clean, quanto mais regras claras e transparentes existirem, maior é a segurança jurídica. Quanto mais regra a gente fizer que não esteja muito clara, a insegurança jurídica aumenta. E, nessa questão ambiental, um monte de gente quer dar palpite, cada um quer dar um pitaco diferente. Então, a minha percepção é que tem que ser a mais simples possível, Senador. Pelo amor de Deus, não invente muito, não! O mercado vai olhar aquilo e vai falar: "Pelo amor de Deus, nunca vou entrar nesse treco!". E, se a gente não tem quem paga a conta, que é o Estado, quem tem que pagar a conta é quem precisa. Então, as regras têm que ser muito simples, porque, senão, a gente não vai encontrar esse tipo de coisa. |
| R | As experiências brasileiras são muito pequenas ainda perto das experiências internacionais. A experiência internacional mais importante está na Costa Rica, em alguns países na América Central e, principalmente, na Califórnia, que tem algumas coisas importantes. Mas eu entendo que as regras simples é que fazem a coisa. E o que virou o jogo na Costa Rica foi exatamente o reconhecimento de ativos pelo setor financeiro. A SRA. LINDA MURASAWA (Para expor.) - Em relação a essa questão, quero entrar um pouco no ponto da questão do pagamento, de quem paga ou quem vai sustentar isso como um investimento. Se a gente for olhar a quantidade de instrumentos financeiros que existem, eu não vou nem entrar na meritocracia, porque já existem muitos, como o mercado de capitais, todo um trabalho do sistema financeiro, o reconhecimento do mercado de carbono internacional. Na época em que eu estava no ABN Real, a gente discutiu isso na Europa, montamos Mesa, fizemos o reconhecimento de um carbono como commodity, introduzindo isso para o mercado de capitais. Agora o que acontece, por exemplo, quando você traz... O que eu ressalto muito? Eu trouxe, na apresentação, a questão do modelo em si, porque, dependendo do modelo, você acessa determinados instrumentos. Então, no caso de Catskill, quem é que trouxe o dinheiro? Eles fizeram esse projeto e fizeram a sua emissão de bonds no mercado. Então, eles foram buscar, fizeram a busca dos investidores, os investidores colocaram e fizeram a aquisição dos papéis, e conseguiram fazer o levantamento de US$1,5 bilhão. Então, na hora em que você traz o modelo, não necessariamente você fica preso a um modelo, como o Dr. Raul foi alertando, de a gente não engessar. Então, se você traz e coloca na lei que tem que ser dessa forma - o incentivo através de um tributo, por exemplo -, você começa a engessar tanto que não consegue fazer com esses mecanismos existentes se correlacionem e se transformem. Então, na hora em que a gente olha a questão da garantia, olha o modelo financeiro, uma gestão financeira... Por que aquele modelo de garantia de um carbono ou até mesmo de uma propriedade ou de uma reserva legal é importante? Porque a gente tem que olhar o risco de performance. Na hora em que a gente olha que não há uma performance futura - e vamos olhar que todo e qualquer produto do planeta é dependente de água, não existe nenhum produto no mundo que não utilize água -, a gente tem que associar o risco de não haver água para determinados consumos. Então, se não havia essa correlação, no mercado financeiro, a gente fazia a análise do estresse hídrico em cima de cada um dos produtos. Na hora em que você vai falar: "Para produzir esse celular, eu preciso de água"... Se há água naquela localidade, se aquela localidade tem uma tendência de desertificação, isso aumenta o risco, aumenta o risco de performance e aumenta a não atratividade de investimentos. Então, todos esses instrumentos estão correlacionados. |
| R | Quando você olha o pagamento de serviço ambiental, ele tem que ser visto como uma grande mitigação de risco, se eu olhar pelo lado do setor financeiro, se eu olhar pelo lado da sociedade e se eu olhar pela questão do Planeta, porque, se a gente não tiver hoje um ecossistema de produção de alguns produtos e serviços que a natureza nos dá, nós não vamos ter nem o que ficar pensando em busca de financiamento. Então, esse é um ponto. Quando se começa a trazer a questão de formulação de modelos financeiros, é muito importante que haja, Senador, uma conversa com os legisladores financeiros. Por quê? Eu trabalhei muito com a questão de trazer os créditos de carbono, fazer a venda dos CDMs aqui, o que era ligado ao Protocolo de Kyoto, para os clientes europeus. E qual era a grande dificuldade? Internalizar o dinheiro aqui no País, porque não há reconhecimento, por exemplo, no registro de operações financeiras do Bacen. Ele simplesmente entrava como others e tinha que haver uma justificativa para não ser caracterizado como lavagem de dinheiro. Havia um instrumento que a gente reconhecia como mercado de carbono, havia o Protocolo de Kyoto, havia projetos em cima disso e não havia instrumentos adequados. Então, você tinha que fazer uma série de adaptações. E aí, na hora em que você ia olhar o carbono lá fora, era a coisa mais simples, porque era um mercado, como disse o Dr. Ludovino, era um título. Então, você traz o título e fala: "Eu vim vender isso aqui". O cuidado que a gente tem que ter quando a gente olha também para a questão do pagamento de serviços ambientais... (Soa a campainha.) A SRA. LINDA MURASAWA (Para expor.) - ... é não cometer algumas falhas que nós tivemos no passado. Já temos instrumentos e temos benchmarks de mercado internacional. Por que a gente não pode utilizar tudo isso, introduzir de forma tranquila e trazer cada vez mais o reconhecimento contábil? Se não houver o reconhecimento contábil, nós nunca conseguiremos dizer se uma empresa ou um produtor estão melhorando a sua performance só olhando alguns itens econômicos, sendo que todas essas partes ambientais e sociais não estão sendo contabilizadas. Já foi dito aqui pelo Fuji e pelo Ludovino que isso entra como uma nota de rodapé, só que essa nota de rodapé tem um custo, é valorada e pode ser simplesmente para melhor ou para pior. Quantas e quantas empresas têm multas ambientais que não estão colocadas nos seu balanço explicitamente? Geralmente eles entram onde? Na linha dos others. Então, o cuidado que a gente tem que ter é internalização desses valores numa contabilização que mostre realmente se aquele negócio ou aquele produto está sendo, de fato, sustentável ou não. Hoje as máscaras que a gente tem em termos dos modelos não nos permitem que a gente faça esse tipo de análise, a não ser que a gente entre num grau de profundidade absurdamente grande. Deixe-me encerrar aqui. Obrigada, Senador. O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Obrigado, Sra. Linda. Sr. Raul, mais uma vez obrigado. Suas considerações. O SR. RAUL SILVA TELLES DO VALLE (Para expor.) - Eu vou tentar responder aqui todas as questões. As primeiras são mais breves. Para ser claro com o telespectador aqui, esse projeto não está trazendo recurso novo. Então, para as duas perguntas aqui, ele não vai trazer dinheiro, feliz ou infelizmente não vai trazer. A situação econômica do País é difícil mesmo, mas ele pode, digamos, deitar as bases para que, mais para frente, isso possa acontecer. Então, não virá dinheiro com esse projeto. Ele é um projeto mais conceitual. E aí eu vou trazer um caso aqui, Senador, para poder responder às duas perguntas da sua equipe. Eu tive oportunidade, enquanto trabalhei brevemente no Governo do Distrito Federal, de ajudar a elaborar o Programa de Regularização Ambiental. E o PRA aqui do DF trouxe a seguinte disposição: "Olha, queremos incentivar os agricultores familiares a restaurar sua reserva legal, a APP, a ter mais floresta na paisagem". Isso traz benefícios múltiplos para a sociedade, como água, biodiversidade, carbono. E como o PRA fez isso? De várias formas. Uma delas criou o seguinte dispositivo: aquele produtor que vende seus produtos, sua mandioca, seu milho, sua alface, para o Poder Público, para os mecanismos de compras públicas, e são vários os que existem para escolas, hospitais, creches, asilos; aquele que o faz e consegue comprovar - e nós temos hoje um mecanismo simples de comprovação, que é o Cadastro Ambiental Rural - que tem suas APPs preservadas, que tem sua reserva legal preservada, algo que não é o comum, ou seja, a maior parte não tem 5% preservados, mas alguns têm, poderá vender seus produtos ao Governo por um preço melhor, com até 30% de benefício no preço. |
| R | Quando criamos esse dispositivo, a primeira pergunta que veio do pessoal do Tribunal de Contas foi: porque você vai pagar mais? Tenho duas mandiocas aqui, são iguais, tem o mesmo peso, mesma qualidade. Por que essa vale 30% a mais do que esta aqui? Porque esta daqui tem serviço ambiental associado. Mas, se eu não reconhecer que ele existe, eu não tenho como justificar esse pagamento, esse dispêndio de recursos públicos. Então, respondendo a primeira pergunta, ele deve ser um instrumento econômico, que pode se transformar em alguns instrumentos financeiros, mas é, sobretudo, um instrumento econômico, o qual não vai existir - e eu acho que essa é uma limitação que está no projeto - apenas pela via contratual. A via contratual é um dos modelos de endereçar esse pagamento, mas, se eu fizer uma isenção, se eu criar um crédito, são outras formas com que eu chego ao mesmo lugar, que é fazer um incentivo, um pagamento por um serviço ambiental que não é contratual. Por exemplo, a cidade de Montes Claros tem um caso interessantíssimo, que eu acho que foi até explorado aqui. Criaram um ecocrédito. A prefeitura falou que todo mundo que tem, em algumas bacias que eles definiram como prioritárias, mata ciliar preservada, vai ganhar um crédito por hectare preservado. Esse crédito é um título que pode circular na cidade e dá direito à isenção de impostos municipais. Então, seja o próprio produtor rural ou se ele vai à venda e compra arroz com esse título, o dono da venda pode pagar menos ISS, pode pagar menos IPTU com aquele título. É um mecanismo de isenção de impostos, é um pagamento por serviço ambiental, que não é contratual, mas é um pagamento. Essa lei deveria dar segurança jurídica para que isso exista, e não deveria de alguma forma atrapalhar, porque, se você colocar todo mundo apenas no modelo contratual, um mecanismo como o de Montes Claros, por exemplo, passa a ser outra coisa que não é pagamento por serviço ambiental, embora eu entenda que é. Então, dou dois exemplos, mas acho que o princípio dessa lei - acho que todos falaram na mesma linha - tem aqui poucas e boas. Vamos deixar a liberdade para os particulares fazerem desde que não seja ilegal... (Soa a campainha.) O SR. RAUL SILVA TELLES DO VALLE (Para expor.) - ... e vamos tentar qualificar aquilo que é necessário, ter segurança. Aqui foi falado, por exemplo, que a natureza jurídica é algo que talvez seja fundamental a gente poder qualificar ou pelo menos chancelar o que já está aí, porque são poucos os casos de empresas fazendo, mas eu sei que todas elas têm uma questão sobre a incidência de tributos. Devo pagar tributo? Mas qual tributo eu pago? Então, às vezes, ele deixa de fazer o negócio com receio de ter problema com a Receita lá na frente, porque não pagou, sonegou tal imposto, porque não está claro qual imposto tem que ser feito. Então, acho que a questão tributária, parece-me, é um assunto que pode facilitar atividades particulares. É isso. O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Eu queria agradecer a todos a contribuição, a explanação, os alertas. |
| R | Eu queria quebrar um pouco o protocolo aqui, porque eu amo falar que eu tenho duas missões na vida: uma é ser delegado de polícia, o que sou há 27 anos, e a outra é ser professor. E eu venho - não o digo por vitimismo - de uma família muito pobre. Meu pai era motorista de ônibus; minha mãe, semianalfabeta, criou seis filhos; e eu sou o filho mais novo. Por que estou falando isso? Porque eu sempre estudei em escola pública. E lembro que, quando eu passei, na minha época, era Escola Técnica Federal do Espírito Santo - só havia uma; depois, passou para Cefet; e, agora, é Ifes. E eu recebo, com muita satisfação, a informação de que um aluno do Ifes, o jovem Antônio Victor, foi aprovado em uma das melhores universidades do mundo, num momento em que o Brasil tem um total descaso com a educação - só no orçamento deste ano o corte na educação pública foi de R$10 bilhões -, no momento em que nós temos - eu tenho até vergonha de falar - que 27,3% das escolas públicas de ensino fundamental, apenas 27,3%, contam com biblioteca, apenas 37,2% contam com quadras de esporte e apenas 8,1% desses estabelecimentos têm laboratório de ciências. Os professores desvalorizados, os pedagogos, os mestres... Eu devo tanto, eu devo tudo na minha vida a esses mestres das escolas públicas. Eu fico até emotivo quando eu falo nisso, porque é muito triste você viver num país em que a premissa constitucional é a de que todos somos iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza. É muito triste você ver que, dentro dos direitos sociais, no art. 6º, está lá expresso o direito à saúde, à educação, à moradia, ao lazer, ao vestuário, e nós temos aí um país com uma desigualdade social enorme, um país com 25 milhões entre desempregados e subutilizados, um país em que o Governo Federal criminaliza as universidades federais, criminaliza os institutos federais, criminaliza os funcionários públicos, criminaliza os professores. Por isso, eu tomo a liberdade de falar, porque tudo passa pela educação. Nós estamos falando de meio ambiente, nós temos fazendo esta terceira de quatro audiências públicas, mas, se nós analisarmos, nós temos um tripé com três sustentáculos de fundamental importância para tudo dentro do Estado democrático de direito: o primeiro é a fiscalização; o segundo, a educação; e o terceiro, uma legislação, que, quando violada, tem que dar a certeza da punição. Agora, infelizmente, o Brasil vai na contramão disso tudo: ele não fiscaliza, ele não educa e ele não legisla. É preciso que nós políticos façamos nossa mea-culpa ou ela inteira, porque nós aqui no Senado Federal infelizmente estamos deitados eternamente em berço esplêndido. Enquanto o mundo já está preocupado com isso, enquanto nós já temos experiências, nós criamos dificuldades em tudo: é para aprovar uma lei, não simplificar... Quando o colega falou, eu pensei: "É óbvio! O que ele está falando está corretíssimo: tem que ser uma coisa bem transparente, bem clara, bem objetiva; tem que ser sedutora para atrair as pessoas". |
| R | Agora, infelizmente, esta não é uma Casa que representa a população brasileira. Esta é uma Casa que representa uma camada social: a camada de brancos, representada, na sua maioria, por políticos brancos, engravatados, ricos, que estão lutando não por aqueles que mais precisam - pobres, negros, mulheres, índios, quilombolas, deficientes e desempregados. Infelizmente, todos nós não somos iguais perante a lei atualmente no Brasil. Eu sonho um dia em que mais uma vez eu vou estar aqui nesta Comissão ou no Plenário falando que eu tenho orgulho de dizer que nós vivemos em plena democracia, na qual todos somos iguais perante a lei. Hoje o que eu falo, na minha modesta opinião, é que nós estamos vivendo uma ditadura em plena democracia. Perdão pelo desabafo! Agradeço aos cientistas, especialistas e técnicos que se reunirão hoje à tarde para dar prosseguimento aos trabalhos, iniciando a consolidação do que ouvimos e aprendemos aqui hoje. Alguns desses convidados participarão por videoconferência. Essa modalidade está à disposição das Comissões, pois, além de economizar recursos públicos, não gera emissões de gases de efeito estufa e contribui para o alcance dos compromissos assumidos pelo País. Antes de finalizarmos os trabalhos, proponho a dispenso da leitura e a aprovação da Ata da 5ª Reunião, realizada em 3 de março de 2020. Aqueles com concordam permaneçam como se encontram. (Pausa.) A ata está aprovada e será publicada no Diário do Senado Federal. Nada mais havendo a tratar... Agradeço a Deus, agradeço a todos os participantes, a você que está aí tendo paciência, nos assistindo, nos ouvindo, a todos, à equipe aqui da Comissão, aos meus colegas, aos meus amigos, ao cinegrafista, enfim, aos funcionários terceirizados, por quem eu tenho um carinho, um amor grande. Perdoem-me mais uma vez, vocês não sabem - mas é aquilo que eu falo, e Platão sempre falou isso, que a sabedoria está na repetição. Aqui a gente fala que todos são iguais perante a lei, mas o Estado criminaliza a pobreza aqui dentro. Os funcionários efetivos não passam pelo detector de metal, os funcionários comissionados não passam, mas os terceirizados passam, como se pré-requisito para ser criminoso fosse ser pobre. Eu fui utilizado pelo Estado como delegado por 27 anos, e eu não vejo a polícia dando geral em playboy em bairros nobres, mas eu vejo violando direitos de toda a população carente nos bairros carentes, vulneráveis, que são os que mais precisam. Infelizmente o ser humano e o Estado criminalizam a pobreza, e isso está se repetindo aqui. Onde já se viu uma Casa de leis em que, por ser Senador, o elevador privativo meu? Mas aqui eu não represento o povo? Todo poder não emana do povo? Mais uma vez, esse princípio de que todos somos iguais perante a lei começa a ser violado aqui, diuturnamente. E o que nós estamos fazendo para mudar isso? A consciência de cada um é que vai responder. Muito obrigado. Que Deus abençoe a todos! Declaro encerrada esta reunião. (Iniciada às 10 horas e 45 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 11 minutos.) |

