06/05/2021 - 4ª - Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional

Horário

Texto com revisão

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A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO. Fala da Presidência.) - Bom dia a todos.
Eu cumprimento o nosso Chanceler Carlos Alberto Franco França e lhe dou as boas-vindas ao Senado Federal, à nossa Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional.
Declaro aberta a 4ª Reunião, Ordinária, da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 56ª Legislatura.
A presente reunião tem como objetivo cumprir o disposto no art. 103, §2º, do Regimento Interno do Senado Federal.
Para a reunião, foi o convidado o Chanceler Carlos Alberto Franco França, Ministro das Relações Exteriores.
A Presidência informa ao Plenário que serão adotados os seguintes procedimentos para o andamento da reunião: o Chanceler disporá do tempo necessário para a sua apresentação inicial; após sua fala, será aberta a fase de interpelação pelos Senadores e Senadoras inscritos, organizados em blocos, dispondo cada Senador de cinco minutos para as suas perguntas. O Ministro, posteriormente, disporá de dez minutos para responder à totalidade das questões do bloco. As inscrições dos Senadores presentes remotamente serão feitas através do sistema remoto. As mãos serão abaixadas no sistema remoto, e, neste momento, serão abertas as inscrições dos Senadores titulares, dos Senadores suplentes e dos Senadores não membros, mas que têm o direito de participar.
Informo ao Chanceler que todos nós aqui no bunker estamos usando máscara, mas, no momento em que o senhor for usar a palavra, se se sentir mais à vontade e melhor sem a máscara para falar, pode ficar à sua escolha. Eu vou fazer o mesmo para fazer algumas considerações iniciais ao Chanceler e aos meus colegas membros da CRE, com quem eu terei o prazer de conviver como Presidente nestes próximos dois anos - 2021/2022.
Dando segmento à missão do Senado Federal de zelar pelo cumprimento dos princípios e das normas constitucionais, temos hoje a honra de receber, na CRE, o Ministro de Estado das Relações Exteriores, Embaixador Carlos Alberto Franco França.
Carlos Alberto Franco França, aos 12 anos de idade, passou em frente ao Palácio do Itamaraty, em Brasília, e gostou tanto do que estava vendo que disse ao seu pai: "Gostei desse palácio e vou trabalhar aqui um dia". Dito e feito, aos 12 anos de idade. Em 29 de março de 2021, 45 anos depois da sua frase profética, o menino que nasceu em Goiânia, em abril de 1965, chegou ao comando do palácio que o encantou aos 12 anos e se tornou Ministro das Relações Exteriores do Brasil aos 57 anos de idade.
Sobrinho, para minha surpresa, do artista plástico Siron Franco, o Chanceler é graduado em Direito e em Relações Internacionais pela UnB e diplomata de carreira, formado pelo Instituto Branco, em 1991.
Advogado, diplomata e escritor, o Chanceler atuou em missões do Brasil nos Estados Unidos, no Paraguai e na Bolívia. Também foi Chefe do Cerimonial do Itamaraty e Chefe do Cerimonial do Palácio do Planalto.
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A sua responsabilidade é grande, Chanceler.
A política externa brasileira precisa voltar ao seu leito tradicional. Os excessos retóricos, desvios ideológicos e incidentes diplomáticos acumulados nos últimos dois anos ocasionaram forte desgaste de nossa imagem no exterior, além do surgimento de obstáculos a negociações comerciais estratégicas. A Comissão de Relações Exteriores e Defesa do Senado Federal tem o dever de garantir que semelhantes equívocos não sejam repetidos, por este ou por qualquer outro Governo. Nossa obrigação, como Senadores e Senadoras, é atuar em defesa do interesse nacional, guiados pelos princípios de relações internacionais listados no art. 4º da Constituição Federal e pelos dispositivos constantes dos artigos 49 e 52 de nossa Carta Magna.
Não se trata, Sr. Chanceler, de subtrair atribuições do Poder Executivo. Pelo contrário, queremos contribuir para o sucesso das atividades externas empreendidas pelo Governo Federal, como o fazem os Parlamentos das principais democracias do mundo. Exemplo disso vemos no trabalho desenvolvido pela Comissão de Relações Exteriores do Senado norte-americano, que participa ativamente na formulação, no acompanhamento e na fiscalização da política externa da principal potência mundial.
O Presidente Joe Biden, quando era Senador, atuou por mais de 20 anos na CRE. Chegou mesmo a presidi-la, sem que isso jamais afetasse a natureza presidencialista do regime político dos Estados Unidos. Como nos ensinou Montesquieu, em seu livro clássico Do Espírito das Leis, publicado em 1748, “para que não haja abuso de poder, faz-se necessário, pela disposição das coisas, que poder limite poder”. Esse é conceito do equilíbrio de Poderes em uma república e do sistema de freios e contrapesos, fundamental para a vida democrática.
Queremos, por conseguinte, trabalhar em conjunto com o Itamaraty, numa parceria respeitosa e complementar, com vistas a estimular os necessários ajustes na política externa brasileira. Precisamos também, como representantes da sociedade brasileira e do equilíbrio federativo, evitar a repetição de erros e desvios que possam afetar a renda, o emprego e a saúde dos brasileiros.
Atenta a esses parâmetros, pretendo, nesta oportunidade, apresentar pontos importantes que deverão pautar o nosso trabalho no biênio 2021/2022.
O primeiro ponto diz respeito aos acordos comerciais que serão negociados. O Senado Federal precisa acompanhar essas negociações, inclusive para auxiliar o Itamaraty no processo de interface com especialistas em comércio exterior, entidades de classe, representantes da sociedade civil, os Congressos internacionais, os Congressos de outros países, e outros entes federativos. Nesse contexto, temos a intenção de promover atividades que ampliem o debate e resultem em propostas concretas e recomendações por parte do Senado Federal. Isso dará maior transparência e legitimidade aos processos negociadores em curso com diversos países asiáticos e, no caso do Acordo Mercosul-União Europeia, que enfrenta resistências em diversos Parlamentos de países europeus.
Um segundo ponto, Chanceler, refere-se às questões ambientais. O tema do meio ambiente é hoje um dos eixos centrais da geopolítica mundial. Como vimos no último dia 22 de abril, por ocasião da Cúpula de Líderes sobre o Clima, as principais nações do planeta estão empenhadas na promoção do desenvolvimento sustentável e na mitigação da mudança climática. Essa nova tendência irá pautar as transformações econômicas e sociais do futuro.
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Até o final deste ano, teremos dois eventos internacionais de importância na área ambiental:
- A COP 15 da Convenção das Nações Unidas sobre Biodiversidade, a ser realizada de 11 a 24 de outubro, em Kunming, na China; e
- A COP 26 da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, a ser realizada de 1º a 12 de novembro, em Glasgow, no Reino Unido.
Nos últimos dois anos, o Brasil deixou de ser um protagonista nesses debates. Aos olhos do mundo, nos distanciamos de nosso firme compromisso anterior com a redução de emissões de Gases de Efeito Estufa e progressiva eliminação do desmatamento ilegal. Em consequência, passamos a enfrentar crescentes dificuldades políticas e comerciais. Essa situação de isolamento precisa ser revertida.
A esse respeito, temos mantido um excelente diálogo com especialistas, ex-Ministros do Meio Ambiente, representantes do agronegócio e entidades que reúnem os interessados na matéria. Tencionamos trazer esse debate para dentro da CRE, em parceria com a Comissão de Meio Ambiente do Senado, com vistas a formularmos indicação parlamentar e eventuais projetos de lei que sanem problemas e orientem as posições negociadoras do Governo brasileiro em foros internacionais na questão ambiental.
Um terceiro ponto, Sr. Chanceler, diz respeito às relações Brasil-China. A China é, desde 2009 - portanto, por 12 anos -, o maior parceiro comercial do Brasil. Temos com essa potência asiática uma relação muito positiva, tanto do ponto de vista comercial quanto no tocante a investimentos. Em 2020, a China absorveu 32,3% de exportações brasileiras, o que propiciou ao nosso País um superávit comercial de US$33,8 bilhões.
O Brasil responde, hoje, por 4% de tudo o que a China importa. Esse número cresce para 22%, no caso do agronegócio. Temos espaço para avançar. Caso a China cresça a uma taxa anual de 4,6% na próxima década, as exportações do agronegócio poderão saltar de US$34 bilhões para US$53 bilhões ao ano. E nada nem ninguém pode vetar ou atrapalhar ou impedir essa grande perspectiva para o nosso País.
O quarto ponto, Chanceler, para o qual chamo a atenção, trata do planejamento estratégico do Itamaraty e de nossas embaixadas em cada país do mundo. Para responder da forma devida aos desafios dos próximos anos, o Ministério das Relações Exteriores (MRE) precisa definir as prioridades, os objetivos gerais e as metas específicas da política externa brasileira. É o que esperamos hoje de V. Exa. em suas palavras. O Senado Federal tem igual interesse em contribuir com o esforço de adequação dos meios de que dispõe nossa diplomacia, para maximizar os benefícios dos recursos públicos investidos e, sobretudo, ampliar nossa capacidade de resposta aos desafios e oportunidades do cenário internacional. O Brasil não pode consentir representar apenas um 1,9% do comércio internacional.
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E, como quinto e último ponto, Chanceler, chamo a atenção para o papel da política externa brasileira na redução das desigualdades regionais em nosso País.
Como representante de um Estado, Tocantins, e de uma região com enormes desafios de desenvolvimento econômico e social, espero que a diplomacia brasileira, tendo à frente V. Exa., avance, cada vez mais, em ações que resultem efetivamente nessa direção, conforme prevê a nossa Constituição.
A inserção nos mercados globais dos Estados e regiões mais vulneráveis economicamente, como é o caso do Norte e Nordeste do Brasil, faz parte do conjunto estratégico de ações desta Comissão de Relações Exteriores do Senado.
A inserção internacional pode ser um vetor de redução de nossas desigualdades, aproveitando as novas potencialidades e os nossos recursos que podem gerar riquezas e desenvolvimento econômico e social por meio do aumento das exportações dessas regiões; da atração de investimentos externos para essas regiões; da transferência de tecnologia; do financiamento externo com os organismos multilaterais para projetos estruturantes; e da promoção internacional da nossas atrações turísticas e culturais.
Vejamos a realidade e o potencial a ser explorado do Matopiba, a última fronteira agrícola mundial, com a renda per capita menor que as Regiões Norte e Nordeste, que oficialmente já possuem as mais baixas rendas per capita do Brasil.
Podemos transformar a realidade socioeconômica não somente no Norte e Nordeste ou no Matopiba, mas em sub-regiões localizadas no Sul, Sudeste e Centro-Oeste, que claramente precisam se desenvolver com novos instrumentos e políticas. Cito aqui algumas sub-regiões de regiões consideradas ricas, mas que têm suas sub-regiões que também precisam de apoio. Menciono o Vale do Jequitinhonha, no norte de Minas; a Metade Sul do Rio Grande do Sul; o Vale do Ribeira, em São Paulo; a Grande Fronteira do Mercosul, que abrange Municípios do Paraná, de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul até o Estado de Mato Grosso do Sul.
Assim, além do fortalecimento da diplomacia estratégica e comercial que favoreça a participação crescente do Brasil e das empresas brasileiras no comércio internacional, acredito e tenho a convicção de que o Itamaraty está preparado para que possamos, em parceria com esta Comissão, desenvolver ações de redução das desigualdades regionais do Brasil.
Digo a V. Exa. que terá sempre o apoio desta Comissão, o apoio do Senado da República, que é a Casa do equilíbrio federativo, para que a diplomacia brasileira contribua mais e mais com o crescimento do País e com o bem-estar do povo brasileiro, que espera de nós apenas ousadia e coragem!
Seja muito bem-vindo ao Senado Federal, Sr. Chanceler, com todo seu staff e todos os Embaixadores e diplomatas que estão aqui presentes.
Antes de passar a palavra ao Chanceler, eu quero colocar em apreciação dos colegas Senadores e Senadoras desta Comissão - isto será distribuído para cada membro titular e suplente - a metodologia para avaliação dos senhores e contribuições, a metodologia de apreciação de candidatos à chefia de missão diplomática.
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Considerando que a Carta Magna estabelece, em seu art. 52, a prerrogativa do Senado Federal de aprovar, previamente, por voto secreto, após arguição e sessão secreta, a escolha dos chefes de missão diplomática de caráter permanente, considerando que o Regimento Interno do Senado Federal (RISF) regulamenta em seu Título X, Capítulo II, arts. 383 a 385 os procedimentos a serem adotados para a apreciação dos nomes propostos, de acordo com a Constituição, dos embaixadores que irão representar o Brasil no mundo.
Considerando que o RISF faculta, em seu art. 383, que, além da arguição do candidato e do disposto no art. 93, a Comissão poderá realizar investigações e requisitar, da autoridade competente, informações complementares; considerando que essa mudança propiciará uma melhor compreensão da racionalidade da escolha do perfil dos indicados a embaixadores no mundo, que deve ser embasada nos critérios de eficiência, experiência e adequação ao posto específico; considerando que, ao vincular a aprovação de chefes de missão diplomática permanente e de missão ou delegação permanente junto a organismo internacional, há um planejamento estratégico apresentado e arquivado na Comissão; o Senado contribui para dar estabilidade, assim, ao serviço diplomático.
Esta Presidência submete aos membros da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional o seguinte regulamento interno da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional.
Repasso o ato antes de ser lido, por conta de que, posteriormente, poderemos ter contribuições preciosas dos colegas Senadores, mas o Ato nº 1, de 2021, da CRE disciplina a apresentação de planejamento estratégico da missão ou delegação pelo Ministério das Relações Exteriores para a análise dos candidatos pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional.
Muito obrigada pela atenção de todos.
E passo a palavra ao nosso Chanceler França para fazer as suas considerações.
O SR. CARLOS ALBERTO FRANCO FRANÇA (Para expor.) - Muito obrigado, Presidente Kátia Abreu, pelas palavras e até por rememorar momentos da minha infância e das raízes, que eu divido entre Goiânia, onde eu nasci, onde está a família do meu pai, e a cidade de Ribeirão Preto, São Paulo, onde fui criado até os 17 anos de idade e onde está a família da minha mãe.
Antes de mais nada, anotei e terei a oportunidade de falar aqui depois todos os pontos que V. Exa. tão bem houve por bem transcrever - poderei me aprofundar depois de fazer a apresentação inicial. Tenho certeza de que as ideias, Presidente, que V. Exa. lança neste momento enriquecem o debate e me permitirão transmitir um pouco das ideias que tenho para a minha gestão frente ao Itamaraty.
Como disse, agradeço a V. Exa. e a cada um dos excelentíssimos membros desta Comissão a oportunidade desta audiência.
Ao iniciar minha apresentação, permitam-me uma breve e merecida referência aos acontecimentos desses últimos dias no campo da diplomacia da saúde, que contaram com a participação crucial de V. Exa. e do Congresso Nacional.
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Em nosso trabalho ininterrupto pela busca de vacinas para salvar vidas de milhões de brasileiros, eliminar a presença da Covid-19 em nossa sociedade e garantir uma rápida normalização de nossa economia, recebemos, nesse último fim de semana, cerca de 4 milhões de doses, no âmbito da iniciativa Covax Facility. É o primeiro grande resultado satisfatório de uma corrida contra o tempo que tem envolvido, além do trabalho do Itamaraty, a atuação rápida, direcionada e decisiva de V. Exa., bem como do Presidente desta Casa, Senador Rodrigo Pacheco; do Presidente da Comissão de Relações e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, Presidente Aécio Neves; e do Presidente daquela Casa, o Deputado Arthur Lira.
Em justas argumentações e reivindicações apresentadas diretamente ao Secretário-Geral da ONU, António Guterres, e ao Diretor-Geral da OMS, Dr. Tedros Adhanom, assim como ao Presidente do Conselho da Aliança Global de Vacinas (Gavi), José Manuel Durão Barroso, entre outros interlocutores, V. Exas. contribuíram para a pronta liberação e antecipação, com a urgência necessária, das doses alocadas ao Brasil, neste primeiro semestre pelo consórcio Covax, com base nos critérios de risco sanitário e de gravidade da incidência local da Covid-19.
Sra. Presidente, permita-me relacionar brevemente as evidências dessa postura proativa: V. Exa. e o Presidente Aécio Neves enviaram cartas e mantiveram videoconferência com o Diretor-Geral da OMS e com o Presidente do Conselho da Gavi. O Presidente desta Casa, Senador Rodrigo Pacheco, enviou cartas e manteve diálogo telefônico com o Secretário-Geral António Guterres, no que foi secundado pelo Presidente da Câmara dos Deputados, Deputado Arthur Lima. V. Exa. também manteve interlocução com os Embaixadores europeus, em Brasília, sempre no espírito, no esforço de garantir o principal interesse da sociedade brasileira, neste momento - vacinar, conseguir vacinas para os brasileiros com a urgência que a gravidade da situação exige.
Havíamos recebido, em março, o primeiro lote de 1 milhão de vacinas pela Covax de um total de 10.672.800 doses alocadas ao Brasil pela iniciativa neste primeiro semestre, 48% de toda a cota do consórcio para América do Sul até junho. Diante da forte pressão internacional sobre a oferta limitada de vacinas, é um grande êxito termos trabalhado juntos - Congresso e Itamaraty - pela entrega antecipada dessas 4 milhões de doses ao Brasil. Estou convencido, Sra. Presidente, de que o prosseguimento desse curso de ação proativa e determinada de sua parte e de nossa parte será crucial para continuarmos a garantir a entrega rápida e imediata de vacinas para acelerar a imunização do povo brasileiro. Ainda devemos receber 4 milhões de doses adicionais neste mês de maio. Prosseguiremos juntos nesse trabalho para garantir que a cota originalmente alocada ao Brasil pela Covax, nesse semestre, se encontre integralmente em Território brasileiro e, em seguida, seja aplicada nos braços dos brasileiros no prazo estipulado.
Garanto-lhe que, de minha parte e de parte do Itamaraty, continuaremos, Sra. Presidente, a trabalhar para que a diplomacia parlamentar tenha um papel cada vez mais expressivo tanto no campo sanitário - o mais urgente no momento - quanto em outros âmbitos, como no ambiental, econômico, político, de segurança e em todas as temáticas que devem e precisam ser avaliadas e avalizadas pelos representantes do povo. Queremos que nossos Parlamentares estabeleçam, mantenham e reforcem laços com Parlamentares latino-americanos, norte-americanos, europeus, asiáticos e africanos.
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É importante termos todos em mente que o trabalho do Itamaraty, o trabalho de nossos diplomatas em outros países requer, acima de tudo, entrada e acesso a círculos de poder, de tomada de decisões, para garantir, na medida do possível, que essas decisões levem em conta ou ao menos não contrariem interesses brasileiros. É o que faz a diferença para garantir o êxito dos interesses brasileiros no exterior.
Estou seguro de que uma diplomacia parlamentar mais forte, mais proativa e atuante ampliará aos nossos diplomatas no exterior o acesso de que precisam a esses círculos de poder e de tomada de decisões. Sairemos todos ganhando: diplomatas, Parlamentares, empresários, acadêmicos, enfim, a sociedade brasileira em seu conjunto.
Sra. Presidente, como sabem, estive no dia 28 passado perante a Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados. Compareço agora no Senado Federal a esta Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional. Estou convencido de que terei a honra e a satisfação de retornar a esta Casa muitas outras vezes, sempre que me permitam.
Isso porque a política externa, como procurei enfatizar em meu discurso de posse, é, antes de tudo, uma política pública. E, como política pública, será tão mais sólida e eficaz quanto mais incorpore a pluralidade de visões da nossa sociedade - visões que encontram no Congresso, a Casa do povo, sua caixa de ressonância por excelência. Como mencionou aqui V. Exa., Presidente, o Senado é a Casa do equilíbrio legislativo. Gostei dessa frase.
Assim, venho aqui para expor-lhes aspectos da política pública que cabe ao Itamaraty executar, mas, do mesmo modo, venho para ouvir V. Exas. a respeito dessa mesma política. Ouvi-los e dar o encaminhamento merecido e necessário ao que eu aqui ouvir. Nossas ações diplomáticas só farão ganhar força nesse diálogo.
Sra. Presidente, Sras. Senadoras, Srs. Senadores, como tenho dito, e como sabemos todos, o momento é de urgências. Venho falando, desde minha posse, nas três urgências que o Presidente Jair Bolsonaro me instruiu a enfrentar no Itamaraty, na medida das nossas competências institucionais: a urgência da pandemia; a urgência da retomada do crescimento e da geração de empregos; e a urgência do desenvolvimento sustentável.
A propósito dessas urgências, permito-me um breve comentário conceitual que, acho, poderá ser útil.
Recordo termos consagrado o conceito de desenvolvimento sustentável na Conferência do Rio de 1992. O conceito, que já se vinha consolidando, tem uma abrangência que desejo aqui ressaltar. Penso no fato de que, não custa lembrar, o desenvolvimento sustentável tem três pilares interligados: o social, o econômico e o ambiental. Ou seja, o conceito de desenvolvimento sustentável pôs fim à noção de que seria possível cuidar do meio ambiente sem atentar para as questões sociais e econômicas - ou tratar do social e do econômico sem atenção ao ambiental. E, depois de ouvir V. Exa., Presidente Kátia Abreu, eu até acrescentaria: sem tratar do social, do econômico e também do desenvolvimento regional.
Por outras palavras, essas três dimensões, na perspectiva do desenvolvimento sustentável, caminham, necessariamente, lado a lado. Uma depende da outra. Pois bem, quando olhamos para as três urgências que nos orientam no Itamaraty, temos diante de nós manifestações de cada um dos pilares do desenvolvimento sustentável: 1) o social, expresso na prioridade que atribuímos à saúde pública, em nossa luta comum contra a pandemia; 2) o econômico, expresso na prioridade que atribuímos à retomada do crescimento e dos empregos; 3) e o pilar ambiental, expresso na prioridade que atribuímos ao combate à mudança do clima.
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Nossas urgências são impostas pela situação concreta do Brasil e do mundo, mas não me parece ser mera coincidência esse entrelaçamento entre nossas três urgências e os três pilares do desenvolvimento sustentável. Essa correlação reflete uma circunstância fundamental: a de que, no fim das contas, os pilares social, econômico e ambiental são mesmo, na realidade das coisas, estreitamente interconectados, ainda quando não tenhamos consciência disso. Daí a validade, a funcionalidade e a urgência do conceito de desenvolvimento sustentável.
Sra. Presidente, passo a estender-me um pouco sobre cada uma das nossas urgências. Em grandes linhas, gostaria de indicar a V. Exas. o que temos feito para atacá-las. Será inevitável repetir muito do que disse na Câmara, de modo que peço a compreensão dos que aqui já me assistiram na semana passada. O fato é que não posso me furtar a compartilhar, também com o Senado Federal, alguns dos principais traços da nossa atuação diplomática frente às urgências que nos mobilizam.
Todos sabemos, e V. Exas. melhor do que ninguém, que, na maior parte das vezes, problemas complexos pedem respostas complexas. Certamente, desafios como os que agora somos chamados a enfrentar não admitem soluções fáceis ou imediatas. O esforço em que estamos empenhados é o da construção de caminhos que sejam firmes, caminhos que, na política externa, levem a fórmulas consistentes na luta contra a pandemia, na recuperação da atividade econômica, no combate à mudança do clima.
Sras. Senadoras, Srs. Senadores, a questão sanitária exige o concurso de uma variedade de atores. No Governo, há sem dúvida um papel para o Itamaraty.
O trabalho pelo acesso a vacinas e a outros medicamentos para o combate à Covid-19 é hoje o pão nosso de cada dia no Itamaraty e em nossas missões no exterior. De iniciativa própria, ou acionados por diferentes interlocutores Brasil afora, mapeamos ofertas de insumos médicos, procuramos facilitar tratativas específicas, ao mesmo tempo em que levantamos outras informações relevantes sobre a evolução das políticas públicas no mundo de combate aos efeitos da pandemia. Pronunciei-me ao iniciar esta apresentação sobre a chegada de vacinas no âmbito da iniciativa Covax; falo agora sobre os demais esforços empreendidos no contexto de nossa diplomacia da saúde.
Uma prioridade tem sido assegurar os insumos do chamado “kit intubação”. Estamos em busca de doações e de estoques disponíveis para compra. Já cuidamos, em Washington, de viabilizar aquisições por meio do Fundo Estratégico da Organização Panamericana da Saúde, a Opas. Recebemos no dia 27 a doação do Governo espanhol, pela qual poderei agradecer pessoalmente à Chanceler Arancha González, que se encontra hoje e amanhã em Brasília em visita oficial.
Como assinalei na semana passada perante a Comissão da Câmara dos Deputados, um esforço crucial do Itamaraty tem sido evitar que as informações que recolhemos em distintas partes do mundo se venham a perder. Há que sistematizá-las e há que fazer que cheguem, com rapidez, às instituições relevantes, em particular o Ministério da Saúde. No aprimoramento desse exercício de coordenação, criamos o Grupo de Trabalho da Diplomacia da Saúde, que já está em pleno funcionamento.
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De minha parte, estou pessoalmente engajado na nossa diplomacia da saúde. No que diz respeito ao diálogo com outros países, sobre o combate à pandemia, a China é, sabidamente, país decisivo nas cadeias de suprimento da indústria farmacêutica. Em conversa telefônica que mantive, no dia 9 de abril, com o Ministro do Negócios Estrangeiros Wang Yi, ainda nos meus primeiros dias como Ministro, fiz a ele dois pedidos: que apoiasse a aquisição pelo Brasil de 30 milhões de doses da vacina da Sinopharm, para entrega ainda no segundo trimestre deste ano e que nos auxiliasse no fornecimento de insumos farmacêuticos ativos, com vistas à produção, no Brasil, de um total de 60 milhões de doses da vacina Oxford-AstraZeneca. O Ministro Wang comprometeu-se a fazer todo o possível para cooperar; reservará e fornecerá ao Brasil, o quanto antes, cota maior de IFAs para a produção da vacina citada; pediu nossa compreensão para o fato de que abril seria mês crítico na China e que precisavam acelerar a vacinação interna, o que eles têm feito. Já aplicaram cerca de 250 milhões de doses. Porém, o Ministro antecipou que, em maio e junho, haverá grande aumento da produção e da capacidade de exportação.
Seguiremos trabalhando e dialogando constantemente, o tempo todo, com o Governo chinês. Nossa embaixada, em Pequim, acompanha, em bases permanentes, os processos de autorização, de exportação de IFAs e tem sempre agido com rapidez necessária.
Temos atuado também junto à Índia, outro país chave nas cadeias de suprimento da indústria farmacêutica. Buscamos a liberação das 8 milhões de doses pendentes da vacina da Oxford-AstraZeneca produzidas pelo Instituto Serum, da Índia, que se somariam às 4 milhões já recebidas pelo Governo brasileiro. A crise sanitária na Índia, como temos visto, vem se agravando. Temos de reconhecer que a Índia enfrenta desafios internos, mas, pelos canais adequados, estaremos agindo para que autorizem exportações para o Brasil.
Buscamos cooperação, ainda, com diversos outros parceiros de diferentes quadrantes. Reino Unido, Israel e Rússia são alguns exemplos. No caso da Rússia, o Presidente Bolsonaro conversou por telefone com o Presidente Putin no início de abril. Trataram de diferentes temas, inclusive da aquisição pelo Brasil - e da produção no Brasil - da vacina Sputnik V. Como disse na semana passada, na Comissão da Câmara dos Deputados, e reitero aqui, esperamos que as questões pendentes para aprovação da vacina possam ser solucionadas de modo satisfatório para a Anvisa, de modo a podermos eventualmente contar, no médio prazo, com mais uma vacina em nosso esforço nacional de imunização e superação da pandemia. O Itamaraty tem prestado à Anvisa, e continuará a prestar, todo o apoio necessário.
O Brasil tem também participado de movimentos multilaterais em favor do acesso a vacinas e tratamentos seguros e eficazes.
V. Exas. bem sabem, mas eu me permito recapitular que estamos associados a iniciativas como o ACT-Accelerator, o Solidarity Call to Action e o Covax Facility. A adesão ao Covax Facility garantirá ao Brasil 42,5 milhões de doses; trata-se, portanto, de cobertura para 10% da nossa população. Com o início da vacinação em vários países, instamos o Covax a garantir, de imediato, o acesso a vacinas aos países participantes. A recente chegada de 4 milhões de doses ao Brasil é um passo positivo nesse sentido.
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Queremos influenciar a governança do Covax, razão pela qual apresentamos candidatura do Brasil à sua Comissão Executiva. Ao mesmo tempo, o Itamaraty vem propondo junto a Governos e organismos internacionais a atualização urgente dos critérios para alocação de doses pelo Covax, para conferir peso adequado aos países que mais têm sofrido, no cenário mais recente, os impactos da pandemia em seus sistemas de saúde e em cifras de letalidade.
A diplomacia da saúde não se limita, porém, ao âmbito multilateral político; estende-se também ao multilateral econômico: na Organização Mundial do Comércio, o Brasil, com outros países de perfil variado, tem conferido apoio a propostas apresentadas pela nova Diretora-Geral, a nigeriana Ngozi Okonjo. Ela está trabalhando arduamente para que a OMC possa identificar, nos mais diversos mercados, capacidade ociosa para produção de vacinas, bem como incentivar acordos de licenciamento voluntário e de transferência acelerada de tecnologias e insumos. As iniciativas vêm adquirindo contornos mais bem definidos, com participação ativa do Brasil.
Para dar contornos concretos a essa agenda, a OMC promoveu, em 14 de abril, evento com a OMS, a Organização Mundial de Propriedade Intelectual e os principais países produtores de vacinas, entre os quais o Brasil, onde estiveram também representantes do setor privado e da sociedade civil. Penso que essa é mais uma frente da qual poderão surgir contribuições importantes para o combate à crise sanitária que nos atinge a todos.
Também na OMC, é relevante mencionar que o Brasil apoia a Iniciativa sobre Comércio e Saúde. Temos conosco Austrália, Canadá, Chile, México e União Europeia, entre outros atores. O objetivo é garantir acesso a vacinas, equipamentos médicos e outros insumos essenciais importados em caso de pandemias, mediante i) a identificação e o uso de capacidade instalada para a produção; ii) a facilitação de acordos de licenciamento para a transferência de tecnologia, expertise e know-how; e iii) a identificação e resolução de forma consensual de qualquer barreira comercial à produção e à distribuição desses produtos, inclusive os relacionados à propriedade intelectual.
Como fiz na semana passada, gostaria de referir-me à hipótese da chamada “quebra de patentes” - que corresponde ao licenciamento compulsório. Há muito a dizer sobre esse assunto, que é da maior relevância. Nos meus comentários poderei tecer alguma consideração sobre a recente mudança de posição nesse sentido, apresentada, na noite de ontem, pelo Governo norte-americano, e, hoje pela manhã, pelos representantes da União Europeia na OMC.
Nesta minha apresentação inicial, limito-me a dois breves comentários.
O primeiro comentário é que o maior gargalo hoje, para o acesso a vacinas, são os limites materiais da capacidade de produção. E o fato é que, segundo os especialistas, vacinas são quase impossíveis de se copiar, a curto ou médio prazo, sem o apoio dos laboratórios que as desenvolveram - mesmo com o auxílio da patente. Os países de menor desenvolvimento relativo já contam com uma moratória aplicável a todo tipo de propriedade intelectual e nem por isso, infelizmente, têm conseguido assegurar suprimentos de imunizantes.
Isso dito - e este é o segundo comentário -, sabemos que, sendo preciso, o Acordo Trips da OMC (sobre direitos de propriedade intelectual relacionados ao comércio) e a própria lei brasileira já permitem o licenciamento compulsório de patentes de forma ágil e adequada, sem qualquer ruptura com nossos compromissos internacionais.
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Mais adiante terei prazer em retomar a questão nas suas implicações diplomáticas, se assim desejarem V. Exas.
Por fim, na nossa vizinhança, o esforço do Brasil é para que continue a predominar o signo da cooperação no tratamento da pandemia. Temos procurado manter as fronteiras abertas, respeitando as decisões soberanas de cada país em matéria sanitária.
No Mercosul, usamos recursos do Focem, Fundo de Convergência Estrutural do bloco, para medidas de teste e prevenção contra a Covid-19. No Prosul, o foco em 2020 e em 2021 tem sido a colaboração no combate à pandemia, mediante busca de pontos de financiamento para necessidades comuns. Reitero: estamos intensificando e melhor articulando, em distintos planos, as ações de nossa diplomacia da saúde.
Sra. Presidente, outra área em que o brasileiro tem pressa, e com razão, é a econômica. Quando superávamos uma severa recessão, eclodiu a pandemia, e o resultado na economia é o que conhecemos: redução na atividade e desemprego. Temos todos em mente que a retomada de um ciclo virtuoso de crescimento e de geração de empregos - e empregos de qualidade - depende largamente dos esforços que levamos adiante aqui dentro: trajetória de equilíbrio fiscal, marcos regulatórios ajustados às realidades contemporâneas, mercado de crédito mais competitivo, avanços em infraestrutura. Esses são alguns dos itens de uma agenda em que o Congresso é claramente decisivo e que V. Exas. tão bem conhecem.
Mas há uma vertente em que a política externa tem aportes significativos a oferecer nesse processo: a vertente da diplomacia econômica, que também passa pelo Senado e que V. Exas. também conhecem bem. Se eu tivesse de resumir, eu diria que uma diplomacia econômica atrelada às necessidades do Brasil, como pretendemos seja a nossa, deve concorrer para que o País esteja cada vez mais e melhor integrado aos fluxos globais de comércio, investimentos e conhecimento, sempre à luz de nossos valores e interesses.
Essa é a lógica que permeia a nossa ação externa no domínio econômico, que preside nossa atuação do Mercosul e nos guia nos fóruns multilaterais, como a OMC, que impulsiona a nossa aproximação com a OCDE, que inspira, enfim, nossas medidas de atração de investimento para o PPI e para além dele.
No Mercosul, ao lado da pauta de dinamização do bloco, temos dado especial atenção às negociações de acordos comerciais com parceiros externos. O horizonte é a abertura de mais mercados para nossas exportações é a obtenção de maior acesso a importações de alto conteúdo tecnológico. Queremos, em suma, ampliar a nossa competitividade. Num mundo que, com todos os sobressaltos continuará marcado pela globalização econômica, é, portanto, essa via a seguir.
Nesse espírito, temos negociações em curso, vale lembrar, com o Canadá, Singapura, Coreia do Sul e Líbano. Propusemos um início de negociações a todos os países da América Central. Estamos prontos a aprofundar os acordos que temos com o México, a Índia e Israel, e estamos explorando terreno para negociações abrangentes com os Estados Unidos, o Japão e o Reino Unido.
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Creio oportuno aqui repisar uma observação que tenho feito: não se ignora, obviamente, que os sócios do Mercosul podem ter tempos diferentes quando se trata de iniciar novas negociações, de apresentar ofertas, de concluir processos em curso. São diferenças naturais que devem ser respeitadas, mas estamos convencidos de que o Mercosul é capaz das flexibilidades necessárias para o progresso da sua pauta de negociações externas.
Outra prioridade nossa tem que ver com o acordo Mercosul/União Europeia, cuja aprovação na Europa encontra resistências. A essas resistências, que vêm disfarçadas muitas vezes em preocupações ambientais, temos procurado reagir com fatos. Alguns buscam apresentar objeções com base em questões de proteção ambiental, que, embora reflitam temática cada vez mais dominante na opinião pública e mesmo nos hábitos pessoais do eleitorado dos países europeus, refletem agendas de viés claramente protecionista. O esforço não é simples. Há uma acirrada disputa de narrativas. Em nosso favor, temos a realidade de uma produção agropecuária que, intensiva em tecnologia, é altamente sustentável; uma matriz energética das mais limpas do mundo; um acordo, como o que desenhamos com os europeus, que incorpora o mais moderno capítulo de desenvolvimento sustentável entre os já negociados até então pela União Europeia - esse último dado, de resto, é reconhecido pelo próprio Comissário de Comércio da União Europeia.
Ainda assim, o Brasil estaria aberto à negociação de um documento paralelo - uma side letter, como chamamos no nosso jargão em diplomacia - para reafirmar os compromissos em matéria ambiental e social. O que nos cabe evitar, penso eu, é a reabertura do acordo, de um acordo que resultou de negociação longa e complexa.
Sra. Presidente, Sras. Senadoras, Srs. Senadores, para além do Mercosul, também bilateralmente, estamos engajados com uma multiplicidade de parceiros em pauta que poderemos caracterizar como de prosperidade compartilhada. Ficarei aqui com alguns exemplos.
O Acordo de Livre Comércio com o Chile, firmado em 2018 e hoje em tramitação na Câmara dos Deputados, é um exemplo. É o mais amplo acordo comercial assinado pelo Brasil em temas não tarifários: contempla compras governamentais, serviços, investimentos, facilitação de comércio, regulamentos técnicos; tem o potencial de trazer ganhos concretos para a nossa indústria e nosso agronegócio; deverá facilitar a aprovação dos estabelecimentos exportadores do nosso setor de carnes; deverá reduzir significativamente a burocracia para todo o comércio.
Apelei aos Deputados e Deputadas presentes na semana passada por uma tramitação tão expedita quanto possível deste importante acordo com o Chile, apelo que antecipo hoje a V. Exas. para quando este acordo chegar a esta Casa.
Com os Estados Unidos, concluímos um protocolo sobre regras comerciais e de transparência assinado em outubro passado e enviado pela Presidência da República ao Congresso Nacional no último dia 26 de abril. O protocolo está totalmente em linha com os objetivos do Acordo de Comércio e Cooperação Econômica Brasil-Estados Unidos, de 2011, e é composto por três anexos: facilitação de comércio e administração aduaneira é o primeiro anexo; boas práticas regulatórias é o segundo anexo; e anticorrupção é o terceiro anexo. O instrumento tem por objetivo a simplificação de trâmites de comércio exterior e diversificar os fluxos bilaterais de comércio e investimentos. Também aqui me permito apelar, quando chegar o momento do Senado avaliá-lo, por uma tramitação tão célere quanto possível.
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A China, como não poderia deixar de ser, é outro país junto ao qual trabalhamos prioritariamente. Trata-se, é evidente, do maior parceiro comercial do Brasil e um dos cinco maiores investidores estrangeiros no Brasil. Não mencionarei muitos números, até porque são conhecidos, direi apenas isto: o comércio bilateral cresceu, em 2020, apesar da pandemia, para volume recorde de US$102,5 bilhões, com saldo superavitário, também recorde para o Brasil, de US$33 bilhões. Já no primeiro trimestre de 2021 há mostras de que essa tendência deve perdurar.
Mas queremos um relacionamento econômico e comercial com a China ainda maior e ainda mais diversificado. Nossas exportações para a China, ainda concentradas em poucos produtos primários, poderão expandir-se em quantidade e em variedade. Caminhos possíveis passarão pela aprovação de mais Organismos Geneticamente Modificados (OGMs) e pelo aumento da venda de proteína animal, com habilitação de mais estabelecimentos.
Está por novamente reunir-se, em princípio do segundo semestre deste ano, a Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação (Cosban). É um fórum de alto nível e, do lado brasileiro, liderado pelo Vice-Presidente da República Hamilton Mourão. Será oportunidade para um encaminhamento de questões que ajudarão a intensificar o comércio, os investimentos e a cooperação com a China.
Destaco aqui a V. Exas. que a 5ª edição da Cosban, realizada em maio de 2019 em Pequim, havia determinado a atualização da estrutura da Comissão e elaboração de novo plano para a cooperação bilateral, cabendo ao Brasil preparar as duas propostas iniciais.
O projeto do Governo brasileiro de reestruturação da Cosban trabalha em três eixos: economia, comércio e infraestrutura é o primeiro eixo; ciência, tecnologia e inovação é o segundo eixo; e o terceiro eixo é o eixo da cooperação.
O plano estratégico Brasil-China 2022/2031, por sua vez, orientará as relações bilaterais na próxima década, constituirá marco institucional para que ações específicas sejam acordadas, tais como, iniciativas para diversificar e ampliar o comércio bilateral e os novos projetos de cooperação entre os dois países.
Ainda na manifestação bilateral da nossa diplomacia econômica, o empenho junto aos países árabes tem igualmente rendido frutos. Temos apresentado potenciais investidores na região e oportunidades de negócio no Brasil. O Fundo de Investimento Público saudita, por exemplo, sinalizou planos de investir até US$10 bilhões no Brasil. Os países do Golfo, que contam com alguns dos maiores fundos soberanos no mundo, mantêm já expressivos investimentos no Brasil, mas queremos mais, e a carteira do PPI tem despertado particular interesse a esses fundos.
Na esfera comercial é também nítida a complementariedade entre as economias do Brasil e dos países árabes em geral. A exportação de produtos brasileiros halal é hoje sinônimo de confiança mútua. Planejamos novas visitas de alto nível para aprofundar um relacionamento que, já significativo, é ainda promissor.
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Registro também progressos na agenda econômica com Israel; em especial temos uma parceria bilateral em defesa que envolve integração de cadeias de produção. São investimentos e transferências de tecnologia que contribuem para o desenvolvimento da nossa indústria de defesa, segmento tão rico em inovação.
Sra. Presidente, senhoras e senhores, outra tradição do Brasil é o fomento do comércio nas instâncias multilaterais. Uma reforma bem conduzida da OMC será instrumental para que a organização ganhe nova vitalidade e concorra para a recuperação da economia mundial no pós-pandemia.
Seguimos engajados nas negociações para a 12ª Conferência Ministerial da OMC no final do ano. Uma reforma bem conduzida da OMC será instrumental para que a organização ganhe nova vitalidade e concorra para a recuperação da economia mundial no pós-pandemia. O Brasil, na OMC, busca prioritariamente combater restrições às exportações de bens agrícolas e subsídios que distorcem o comércio desses bens, eliminar subsídios à pesca ilegal e subsídios distorcivos no setor, conceder um acordo sobre facilitação de investimentos baseado em maior transparência e na simplificação de procedimentos, completar nossa acessão ao Acordo sobre Contratações Governamentais da OMC, concluir acordo sobre comércio eletrônico e concluir acordo sobre regulamentação doméstica de serviços.
Do ponto de vista da modernização da nossa economia, não menos importante é a crescente aproximação com a OCDE. Já somos o país não membro mais alinhado às práticas da organização. Há, é claro, desafios para a nossa acessão plena e assim são esses processos, mas será um desdobramento natural de uma relação que já é antiga e que é cada vez mais densa.
Também aqui, Presidente, somos movidos por nossos valores e interesses. Identificamos na OCDE hoje um espaço privilegiado de intercâmbio sobre políticas públicas de ponta de convergências regulatórias, de construção de padrões que terão impactos sobre as decisões de comércio e de investimento mundo afora. É por isso que com pragmatismo participamos das atividades da organização.
Gostaria de fazer uma merecida e devida menção à África. A África é uma fronteira agrícola de grande potencial e não menos importante vem se firmando como uma das regiões de maior crescimento econômico mundial. Acompanhamos com muito interesse o potencial econômico comercial aberto pela implementação da Zona de Comércio Livre Continental Africana, desde 1º de janeiro de 2021, uma das mais arrojadas decisões de integração na história. Notamos, especialmente, o seu potencial de formar um mercado de 1,3 bilhão de habitantes, com um PIB de mais de US$3 trilhões e a ambição de duplicar o comércio intra-africano no curto prazo ao longo dos próximos anos.
O Governo do Presidente Bolsonaro tem buscado dar novo impulso às relações com a África, articulando uma visão em torno dos pilares de comércio com protagonismo do setor privado, maior estruturação do diálogo em segurança e defesa, cooperação técnica e valores compartilhados. O pilar de cooperação técnica, em especial, privilegia a transferência de capacidades com vista ao desenvolvimento do continente. Há diversos projetos em andamento ou concluídos com sucesso na área da saúde (como os bancos de leite humano, o combate à tuberculose e ao HIV e a produção de antirretrovirais), de agricultura (como os vários programas relacionados ao cultivo de algodão, café, cana e mandioca), entre outras. Esperamos estar habilitados, em futuro próximo, a fortalecer a vertente da diplomacia da saúde em nossas relações com o continente africano.
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Sra. Presidente, a questão da mudança do clima - e as questões ambientais e, mais amplamente, de sustentabilidade - representam, para o Brasil, uma oportunidade.
É do interesse do Brasil preservar os seus biomas porque eles são um patrimônio valioso, e, da sua preservação, dependem as gerações futuras. E é do interesse do Brasil mostrar ao mundo que de fato os preservamos, por meio de uma agropecuária que vive da tecnologia e de uma legislação ambiental das mais rigorosas - porque, hoje, mostrar sustentabilidade é medida de acesso a mercados e a investimentos.
Pois as mensagens que o Presidente Bolsonaro transmitiu na semana passada, por ocasião da Cúpula do Clima, apontam, justamente, para um país que, nas suas palavras, “está na primeira linha do combate ao aquecimento global”.
O Presidente Bolsonaro pôs na justa perspectiva a participação do Brasil na mudança do clima. Ele lembrou que a queima dos combustíveis fósseis ao longo dos últimos dois séculos é a causa maior do problema. O Presidente lembrou que o Brasil participou com menos de 1% das emissões históricas de Gases de Efeito Estufa, mesmo sendo uma das maiores economias do mundo, e que, atualmente, o Brasil responde por menos de 3% das emissões globais anuais. Com isso, o Presidente ressaltou o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, princípio pelo qual cabe às economias desenvolvidas parcela maior do ônus na empreitada da proteção ambiental.
O Presidente Bolsonaro também fez referência aos mais de 20 milhões de brasileiros que vivem na Amazônia. São homens, mulheres e crianças que precisam de meios de vida sustentáveis e dignos. Não se pode querer preservar a floresta em prejuízo da qualidade de vida dessas pessoas.
Está aí mais um exemplo da interdependência entre os pilares social, econômico e ambiental do desenvolvimento sustentável.
Ao mesmo tempo, o Presidente Bolsonaro, em seu discurso, renovou o tradicional compromisso do País com a defesa do meio ambiente. Falou das nossas credenciais, salientou a ambição da nossa Contribuição Nacionalmente Determinada e fez anúncios que confirmam nosso continuado engajamento: a antecipação em dez anos, para 2050, da nossa meta de neutralidade climática; e o objetivo de eliminar o desmatamento ilegal até 2030, além do compromisso com duplicação de recursos para fiscalização ambiental.
São mensagens que, veiculadas no mais alto nível, corroboram uma ideia que me parece crucial: não há por que adotarmos posturas defensivas em meio ambiente. Pelo contrário, temos o lastro de um acervo de realizações que se estende até o presente e que nos dá autoridade para uma atitude propositiva.
Trata-se de posição que reforcei em meu primeiro contato com o Enviado Especial do Governo norte-americano para o Clima, John Kerry, na videoconferência que mantivemos em 30 de abril. Discutimos sobre desafios comuns no enfrentamento da mudança do clima e sobre os compromissos anunciados pelos nossos mandatários na Cúpula do Clima. Fortalecemos compromisso de que Brasil e Estados Unidos seguirão trabalhando juntos para promover a proteção do meio ambiente e o desenvolvimento sustentável.
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Temos mantido e reforçado essa atitude propositiva também no plano regional, na Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, no Pacto de Letícia, em iniciativas como o Fundo para o Desenvolvimento Sustentável e a Bioeconomia da Amazônia, do Banco Interamericano de Desenvolvimento, o BID. É essa atitude propositiva que nos tem caracterizado nas negociações multilaterais - será uma vez mais no caso da COP 26, prevista para realizar-se em novembro, na Escócia.
Temos elevada expectativa para a COP 26. Como se sabe, a conferência irá, como uma de suas missões, regulamentar os mecanismos de mercado de carbono previstos no Acordo de Paris. Esses mecanismos serão fonte de recursos para impulsionar a ação climática, inclusive no Brasil. Chegaremos à COP dispostos a construir consensos. E contamos com a mesma disposição por parte dos outros principais atores.
A frase pode estar batida, Presidente, mas diz uma verdade: desafios globais requerem ações globais. E o Brasil, cito novamente o Presidente Bolsonaro, está aberto à cooperação.
Sra. Presidente, esses são, de forma sucinta, alguns dos esforços com que buscamos dar sentido prático ao enfrentamento das nossas urgências. Urgências que, volto a dizer, refletem cada um dos três pilares do desenvolvimento sustentável: a urgência da saúde pública, que reflete o pilar social; a urgência da retomada do crescimento e dos empregos, que reflete o pilar econômico; e a urgência do combate à mudança do clima, que reflete o pilar ambiental.
Como os pilares do desenvolvimento sustentável, nossas urgências, se não se confundem, se acham intimamente interligadas. E é com essa perspectiva de conjunto que continuaremos a fazer-lhes frente.
Agradeço muito a atenção e coloco-me à disposição das Sras. e dos Srs. Senadores.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Chanceler Carlos França.
Vamos começar agora o chamamento dos Senadores inscritos.
Por enquanto, tenho aqui dois Senadores inscritos apenas, duas mãos levantadas. Eu gostaria que pudessem levantar suas mãos aí na tela do computador.
Com a palavra o Senador Esperidião Amin.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Esperidião Amin.
Com a palavra o Senador Esperidião Amin.
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC) - Pois não, Presidente.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Com a palavra, Senador, por cinco minutos. Por favor.
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - SC. Para interpelar.) - Muito bom dia a todos!
Eu procurarei respeitar o tempo.
Quero, em primeiro lugar, cumprimentar a senhora pela nova orientação do art. 383. Que socialize com as outras Comissões! Nós temos já bons estudos. Eu encomendei, em 2019, um estudo sobre a mineração de dados em todas as autoridades que são aprovadas pelo Senado. Aliás, geralmente, na CRE, nós aprovamos pessoas de carreira, ou seja, funcionários estabelecidos, reconhecidos; nas outras, nós corremos mais riscos. Só isto que eu queria dizer como estímulo à sua competente iniciativa.
Namastê!
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Quanto à fala do nosso Chanceler - eu quero cumprimentá-lo - eu não vou abordar todos os pontos, mas separei três.
Nessa prioridade número um que o Presidente da República lhe deu, saúde, vacina, por favor, nos ajude a focar em autonomia. Esta não é a primeira pandemia. A gripe espanhola, a mais conhecida dos antigamente recente, em que se recomendava quinino. Nos conselhos ao povo, lá estava como quinto conselho: quinino 50mg antes do almoço - conselhos ao povo da gripe espanhola.
Foco em uma palavra, Ministro: nos ajude a termos autonomia. Nós não temos o direito, pelo peso que o País tem, de ficar dependendo de IFA de ninguém, e esse objetivo tem que ser alcançado com diplomacia, com parceria. E o Senador Izalci pode complementar o que eu estou dizendo. Ele, que defende tanto, junto comigo, o fundo de desenvolvimento da ciência e tecnologia.
Segundo, Amazônia. Dos nossos seis biomas, o que desperta mais interesse, nem sempre um interesse construtivo, há muita concorrência por baixo, sem dúvida é a Amazônia. Então, eu gostaria que o senhor nos ajudasse na condução da diplomacia, que não pode ser defensiva.
Aplaudo a sua ideia. Nós não somos devedores ao mundo. Não somos. Não adianta querer nos empurrar o remorso que os já desenvolvidos não carregam. Querem transferir para nós o remorso, não só a pena, mas o remorso. Estimule o uso de indicadores que associem o IDH, especialmente dos povos da Amazônia, dos mais de 20 milhões de brasileiros da Amazônia, com o indicador ambiental, porque só nos criticar num e esquecer o outro tem sido o recurso dessas nações.
O senhor deve ter lido, mas releia a CPI da Amazônia, encerrada em 1989, que teve um relatório brilhante do Senador Jarbas Passarinho. O discurso é o mesmo, só mudam os personagens, só atualizam os nomes. CPI da Amazônia, 1989/90. Vai ver o Gorbatchov defender a soberania relativa. Então, indicadores têm que ser o nosso rumo.
E, finalmente, fiquei muito interessado em tentar iluminar essa condução da nova negociação da diversificação de itens com a China. O senhor já pensou se eu fosse capitão do Exército e soubesse que o Brasil vai comprar 225 veículos de quatro eixos, sucessores do nosso antigo Cascavel, da China, que é quem apresentou esses veículos com menor preço, na tomada de preços que o Exército abriu em dezembro passado? Eu ia ficar muito constrangido porque antigamente nós exportávamos. Agora nós vamos importar veículos.
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Então, nós temos que diversificar essa pauta para não sermos só exportadores de commodities. Joga para nós o problema ambiental e o problema logístico e troca um navio de 300 mil toneladas por um contêiner de chip. Essa relação de troca vai precisar de uma atuação de diplomacia econômica inteligente do Itamaraty. E eu confio, pelo que eu ouvi do senhor, que nós teremos essa inteligência para nos ajudar.
E aqui nós contamos com a participação muito ativa sempre da nossa Senadora Kátia Abreu. Nós poderemos ser parceiros. Troca críticas, mas seja parceiro. Esse eu acho que vai ser o nosso melhor entrosamento.
E uma última palavra. Ajude que o Brasil não seja continuadamente enganado nos acordos sobre pesca. Nós estamos sendo continuadamente enganados nos acordos sobre pesca. Nós compramos atum que outros pescam no nosso mar, ou seja, importamos o nosso atum porque os nossos limites, as nossas cotas são sempre insuficientes. É um exemplo, apenas. Último item, portanto, pesca. Coloque o seu olho nisso.
Muito obrigado e parabéns.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Senador Esperidião Amin.
E confesso que, na elaboração desse novo formato, desse novo modo de trabalho, eu por várias vezes pensei em V. Exa. E eu tinha a impressão de que V. Exa. iria gostar do que nós estamos propondo. Muito obrigada! Isso me dá muito estímulo.
Com a palavra, por cinco minutos, o Senador Nelsinho Trad, ex-Presidente desta Comissão, que prestou um grande trabalho para o Senado Federal. Por favor, Senador Nelsinho Trad.
Izalci não está inscrito. Pretende falar, Senador Izalci? (Pausa.)
Está no celular.
Por favor, Nelsinho Trad.
O SR. NELSINHO TRAD (PSD - MS. Para interpelar.) - Senadora Kátia Abreu, digna Presidente da Comissão de Relações Exteriores, em seu nome, com muito prazer, gostaria de saudar os colegas que se fazem presentes nesta manhã de trabalho: o Líder Izalci Lucas, o nosso guru, Senador Esperidião Amin, Senador Fernando Collor, Senador Jarbas, Senador Veneziano, Senador Carlos Fávaro.
Digno Chanceler Ministro França, é um grande prazer tê-lo na situação em que se encontra V. Exa. hoje. Nós realizamos inúmeras viagens internacionais juntos, construindo para o nosso País um caminho saudável, um caminho de ação produtiva. E fico realmente muito satisfeito em tê-lo na condição em que V. Exa. se encontra.
Vou fazer algumas considerações e, no meio delas, as perguntas. V. Exa., se puder, anota e, na resposta que fizer do bloco, se atente àquilo que for especificado.
A pandemia trouxe à tona a relação entre saúde e diferentes setores. Uma realidade diferente da que a gente tinha. Hoje em dia muito se fala em diplomacia da saúde e geopolítica das vacinas. Não dá para descolar o Brasil dessas discussões. Primeira pergunta: quais são as linhas de ação que a política externa brasileira tem priorizado nesse âmbito? Quais os resultados que o Brasil pode esperar da chamada diplomacia da saúde, do Itamaraty, dignamente chefiado por V. Exa.?
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Dois: quanto à relação saúde e propriedade intelectual, temos assistido ao debate da Organização Mundial do Comércio, a OMC, e acompanhado a posição brasileira em priorizar a transferência de tecnologias e licenças voluntárias para aumentar o acesso global às vacinas. Isso é o que todo mundo quer.
Ontem os Estados Unidos apresentaram seu interesse em buscar discutir medidas extremas para as situações extremas, ou seja, estão abertos a discutir medidas para ampliar esse acesso. E já estão sendo seguidos pela União Europeia. Ninguém disse que vai acompanhar a posição desse ou daquele país - especificamente, da Índia, considerada extrema -, mas estão abertos a discutir suas posições sobre novas bases.
Pergunta: tomando em conta que o acesso universal a vacinas depende da discussão sobre vacinas como bem público global, muito bem demandado como prioritário trabalho da nossa atual Presidente da Comissão de Relações Exteriores, Senadora Kátia Abreu, eu pergunto qual a disposição do Brasil em acompanhar esse debate sobre novas bases e eventualmente alterar posições do nosso País, ou seja, se abrir a esse debate para achar um caminho mais resolutivo para que a população brasileira possa ter mais acesso às vacinas? Uma vez que, até o que nos consta, é o único caminho que nós temos para poder combater esse maldito e terrível vírus que botou todos nós de joelhos, fechou cidades, fechou Paris, fechou Nova York, fechou Tóquio e fez com que as nossas economias todas entrassem nesta situação calamitosa em que estão.
São essas as considerações, sem deixar antes, porém, Senadora Kátia, de parabenizar V. Exa. pela sua persistência, pela sua forma altiva e guerreira de se portar frente a essas situações tão delicadas que o Brasil vem atravessando.
E também parabenizo o Ministro Carlos França. Quero dizer que terá, no Senado da República, o apoio necessário para evoluir na política internacional brasileira. Esse é o nosso sonho, esse é o nosso objetivo.
Muito obrigado!
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Senador Nelsinho Trad.
Eu passo a palavra para o Senador Veneziano Vital do Rêgo, da Paraíba.
O SR. VENEZIANO VITAL DO RÊGO (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - PB. Para interpelar.) - Kátia Abreu, querida Senadora, saúdo nosso Chanceler Carlos França, cumprimento todos os demais companheiros que integram a Comissão de Relações Exteriores, na figura do ex-Presidente, querido amigo e irmão, que tão competentemente se houve durante os dois últimos anos, Senador Nelson Trad, minha estima, minhas referências ao seu trabalho.
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E que bom que esse sequenciamento se dê da forma que mais poderíamos desejar. Não houve quebra em termos de concepção de projetos. Às mãos, aos ombros briosos da Senadora Kátia, a gente tem a certeza de que aquilo que foi pautado, aquilo que foi tratado, aquilo que foi, de uma forma tão efetiva, feito pela Comissão que outrora esteve, nos dois últimos anos, haverá também, neste Colegiado e com esta formação, de ser feito.
Parabéns à Senadora Kátia pelas suas iniciativas, pela sua intransigência. Somos todos prova inconteste da sua determinação, em especial nesses últimos doze meses, e particularmente nesses últimos quatro meses, quando essa agonia maior do povo brasileiro se deu, em razão da ausência de um cronograma, da ausência de iniciativas que fossem concretas, confiáveis por parte do Governo Federal em relação à vacinação.
Eu fiquei sinceramente muito aliviado, Senadora Kátia, companheiros e companheiras e Ministro Carlos França. É algo que nos chama de imediato a atenção. É um novo ambiente. É um ambiente que saudável é e desejado por todos nós, institucionalmente. É a oportunidade de receber o Chanceler que tem uma visão e que tem um propósito de manter rijas as relações institucionais, de não chegar entre nós, vindo ao Parlamento simplesmente para fazer provocações ou simplesmente a desconhecer que as nossas preocupações e que as nossas intenções não são senão as intenções de um povo que deseja ter uma representação nas relações externas, representação essa efetiva, respeitosa, reconhecida.
A sua presença, Ministro, traz-nos isso. Eu tenho tido essa oportunidade de lê-lo, de ouvi-lo e faço este depoimento nesta reunião proposta pela CRE, através da iniciativa da Senadora Kátia, para publicamente registrar isso.
Agora, eu queria, feitos os registros, que não são meramente protocolares, são de sentimentos em reconhecimento à sua postura, quando V. Exa., em minutos, pondera sobre as preocupações, citando os três eixos de atuação, eu perguntaria a V. Exa., para encerrar, como é que se dará, com a sua visão, um homem que mostra as preocupações em relação à pandemia, nela, as preocupações em manter laços firmes, fortes, indissociáveis, sem arroubos, sem sobressaltos nas relações externas? Como se dará, quando V. Exa. fala sobre as preocupações da mudança climática, no item desenvolvimento sustentável, quando o Governo, no qual V. Exa. se insere e se encontra, a responder por uma pasta tão importante e que historicamente fez que o Brasil também sobressaísse no reconhecimento e no respeito mundial? Nós sabemos que o Presidente da República e muitos que o acompanham têm uma visão diferente, têm uma visão distorcida das relações multilaterais.
Ontem mesmo, ou anteontem, algumas outras infelizes declarações foram proferidas pelo Presidente da República, atingindo não apenas um grande parceiro comercial, mas um parceiro que tem dado ao Brasil o alento e a sobrevida nessa vacinação, que é a China. Quando nós falamos sobre mudanças climáticas, o Governo representado pelo Presidente Jair Bolsonaro também se mostra cético em relação ao que a ciência, os estudiosos, a todos aqueles que mostram a preocupação sobre as realidades atuais, climáticas, demonstram.
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Então, eu queria aqui, Presidenta Kátia Abreu, mais uma vez ressaltando aqui a importância do seu trabalho, fazer essas considerações a respeito do que pensa o Ministro quando, sabidamente, temos nós, nesses dois anos, posições diametralmente opostas por parte do Governo Federal.
Um abraço a todos. Muito grato.
Parabéns, Ministro!
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Senador Vital do Rêgo, pela sua participação.
Eu passo a palavra para o Chanceler, por dez minutos, para dar as suas respostas.
O SR. CARLOS ALBERTO FRANCO FRANÇA (Para expor.) - Muito obrigado, Presidente Kátia Abreu, pela palavra. Agradeço aos Srs. Senadores que, tão gentilmente, me dirigiram as perguntas que me permitirão discorrer sobre temas aqui com um pouco mais de tempo, temas que enunciei no meu discurso de abertura.
Senador Esperidião Amin, de Santa Catarina, V. Exa. me pergunta sobre a diplomacia da saúde e pede que o Itamaraty nos ajude a focar em autonomia. E V. Exa. bem aqui defende que não podemos depender do IFA de ninguém. Eu gostaria de dizer que, realmente, eu tenho muita facilidade, como diplomata de carreira e como uma pessoa que veio do Itamaraty, instituição - e não me canso de repetir - onde há 200 anos se pensa a soberania nacional.... A opção do Governo Jair Bolsonaro pelo acordo de transferência de tecnologia da Fundação Oswaldo Cruz, da Fiocruz, com a Oxford, da AstraZeneca, é uma decisão que vai, justamente, no sentido da autonomia da soberania nessa área de saúde. Isso porque fazemos um acordo que nos permitirá, de maneira autônoma e independente, a partir de poucos meses - acredito que a partir de setembro, pelo que tenho falado com a Dra. Nísia, da Fiocruz -, vamos dominar todo o ciclo da produção da vacina: a geração da célula-mãe, a produção do IFA e, depois, então, a produção da vacina, numa produção bastante elevada, já com a atual capacidade que tem a Fiocruz, sem necessidade de expansão. Trata-se de 1 milhão de doses por dia, a partir de setembro. Se trabalharmos, então, apenas nos dias úteis, 20 milhões de doses ao mês, com o intercâmbio tecnológico que permitirá ao Brasil atualizar essa vacina para eventuais novas variantes que surjam, de maneira que, então, não dependeremos de fontes externas para esse combate à pandemia e, como bem disse V. Exa., um inimigo comum que hoje afeta todo o mundo.
De todo o modo, ainda que se pense, realmente, que não podemos depender do IFA de ninguém, eu gostaria, neste momento aqui, fazer o registro da grande contribuição que temos tido da China na questão do IFA. Eu hoje recebi, logo cedo... O Itamaraty não para, não é, Senador Esperidião Amin? É mais ou menos como aquele império em que o sol nunca se põe. Então, há sempre uma embaixada acordada enquanto a gente aqui dorme. De modo que hoje eu acordei já com notícias positivas lá do nosso Embaixador Paulo Estivallet, na China, que nos dizia que o Governo chinês havia autorizado a exportação de IFA, o IFA previsto para o mês de maio. Lembrou o Embaixador Estivallet que hoje, 6 de maio, é o primeiro dia útil na China, e que a liberação do IFA, que foi feita em abril, ocorreu na mesma data. Então, dizer que nós também, na diplomacia da saúde, temos atuado junto aos Governos estrangeiros - Índia, China - no sentido de garantir essa matéria prima.
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Ontem mesmo, eu recebi um telefonema do Ministro Antônio Imbassahy, do Governo do Estado de São Paulo, me perguntando sobre essa questão do IFA e pedia o auxílio, também, do Governo Federal, da diplomacia da saúde, do Itamaraty, para o fornecimento que recebe lá o Instituto Butantan. A Dra. Nísia, da Fiocruz - ontem, eu acompanhei o Presidente Jair Bolsonaro ao Rio de Janeiro -, entrou em contato comigo e me perguntou como estavam as tratativas. Então, quero dizer que eu acho que não há, hoje, nenhum problema político que, nessa questão, permeie ou atrapalhe a nossa produção de vacinas aqui.
O Embaixador da China no Brasil, com quem tenho muito boa relação, outro dia recordava que 80% do IFA exportado pela China vem para o Brasil, ou seja, de cada 100 litros de IFA exportado pela China 80 são destinados ao Brasil. Eu acho que isso dá a medida da importância estratégica que a relação tem. Não só da importância que a China tem para o Brasil, mas eu sempre gosto de falar também da importância que o Brasil tem para a China: somos grandes parceiros e não há razão para que deixemos de ser.
V. Exa., Senador Esperidião Amin, trata depois sobre a questão da Amazônia. Realmente eu não conhecia o relatório da CPI da Amazônia, de 1979 a 1990. Tratarei, realmente, de ler. No Itamaraty, nós trabalhamos muito com a memória. Durante muito tempo se orgulhou o Itamaraty de ser o melhor arquivo da Esplanada dos Ministérios. Trabalhamos sempre com antecedentes, de modo que isso ilumina a visão futura, o antecedente ilumina a visão futura, nos guia. Então, lerei com muita atenção e agradeço a recomendação de V. Exa.
Agradeço as palavras que o senhor me fala aqui de que não somos devedores do mundo, não precisamos ter postura defensiva e sobre a necessidade de associar o IDH aos indicadores ambientais. Isso é realmente fundamental. E eu me permito aqui a fazer uma pequena digressão para entrar num tema tratado pela Presidente Kátia Abreu: é a questão do desenvolvimento regional. Os acordos comerciais, as parcerias que fazemos com todo o mundo têm que produzir impactos positivos de desenvolvimento local. A Senadora mencionou, por exemplo, o Matopiba. Eu tive oportunidade de visitar a cidade de Estreito, no Maranhão, visitei lá as plantações de soja próximas ali à Hidrelétrica Estreito, no Rio Tocantins. Visitei Carolina, ali próximo, que tem recursos quase inimagináveis de turismo ecológico, cachoeiras belíssimas ainda pouco exploradas, um potencial turístico riquíssimo que precisa ser desenvolvido. De modo que eu penso que, realmente, a atuação brasileira aí fora precisa pensar em carrear os recursos de investimentos, não apenas para a transferência de tecnologia, no caso do agro - no que eu acho que até nós temos mais a ensinar do que a aprender -, mas sobretudo para poder, também, atrair investimentos para essas áreas.
Saiba V. Exa. que eu, dos 12 anos que passei no exterior, mais da metade - seis anos e meio -, servi na Embaixada do Brasil em La Paz, na Bolívia. É um país riquíssimo, que tem um imenso potencial hidroenergético, tem imensas reservas de gás natural, tem imensas reservas de lítio, tem uma biodiversidade também que é exemplar, porque eles têm vários biomas. A Bolívia é andina, mas também é amazônica. Ela faz fronteira com o Mato Grosso do Sul, do Senador Nelsinho Trad. No entanto, o IDH da Bolívia é ridículo. É um país com uma grande área, com pouca população e, no entanto, o IDH ainda é bastante baixo.
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E eu me recordo de que, numa ocasião, fiquei muito impressionado, porque houve um movimento ali de bloqueio, e houve uma hidrelétrica que foi invadida e, com isso, a cidade de La Paz ficou sem energia. Num primeiro momento, fiquei muito irritado com aquilo, porque estava sem energia em casa. Aí, fui verificar essa hidrelétrica, a hidrelétrica de Zongo, que abastecia a cidade de La Paz. Houve lá a manifestação da população local, porque, imagine V. Exa., as pessoas que ali viviam usavam lamparina de querosene para iluminar suas casas, porque, apesar de serem vizinhos da imensa hidrelétrica, o impacto da hidrelétrica não chegava ali, não chegava à população local.
Isso é claro que não é sustentável, enfim, em grandes empreendimentos da área energética ou do agro ou do turismo, que essas iniciativas, que esses empreendimentos não gerem um impacto local para que aqueles habitantes ali se beneficiem. E eu acho que esse exemplo serve para a Amazônia. Não adianta defender a Amazônia, não adianta você querer combater a ação climática e colaborar nesse processo, porque é preciso, também, que os mais de 20 milhões de habitantes da Amazônia tenham ali, sofram um impacto positivo dessa atitude do Governo. Senão, será uma atitude vazia.
Na negociação, V. Exa. fala aqui da diversificação do comércio com a China, na parte de inteligência econômica, sobre o que o Itamaraty gostaria de fazer. Penso que nós precisamos, realmente, diversificar, com a China, a nossa atuação. Pretendo, se houver espaço no orçamento, levar isso ao Presidente Bolsonaro ainda neste ano, a ideia de que nós possamos ampliar a lotação das nossas embaixadas e dos nossos consulados na China.
Acho que na China nós temos uma rede consular hoje que é subdimensionada. Quando comparo com a rede consular que nós temos no Japão, sinto que na China nós poderíamos, talvez, ter, ali na parte central, um consulado mais dedicado à parte de comércio e, sobretudo, de ciência e tecnologia.
Gostaria de recordar uma coisa aqui. Em dezembro de 2022, quando terminar a primeira gestão do Presidente Jair Bolsonaro, a China inaugurará uma estação espacial orbital dela, China, chinesa, e de hoje, desse mês aqui de maio até dezembro do ano que vem, eles levarão a cabo dez lançamentos de foguetes, dez missões ao espaço. Trata-se, portanto, de um gigante da ciência e tecnologia. Não estou falando apenas de um comprador de bens primários do Brasil.
Então, essa parceria brasileira, sino-brasileira tem que entrar também no campo da ciência e tecnologia, no campo de um comércio mais sofisticado e penso que o Itamaraty pode contribuir e precisava se aparelhar melhor, Senador Esperidião Amin, para essa tarefa. E é dessa maneira que eu preciso.
Farei, depois, uma consideração, porque não sei se o tempo aqui me será suficiente, mas, quando se fala da relação com a China, uma coisa importante é que, na verdade, nós estamos falando da relação com o Pacífico, com o indo-pacífico. Este século muda, há mudança do centro estratégico da geopolítica. Ele sai de onde estava e vai para a região do indo-pacífico.
Então, na verdade, trata-se de adensar as relações, claro, com a China, que é um grande país, um parceiro tradicional, mas também com os países ali da Ásia, porque a Ásia passa a ser um centro estratégico na geopolítica diferente.
Sobre a pesca, V. Exa., em Santa Catarina, tem o maior defensor dela, que é o Secretário Jorge Seif, que nos ilumina sempre com as suas ideias. Na OMC, estamos prontos aí para defender o fim dos subsídios à pesca ilegal. E o Governo Federal, com o apoio do Itamaraty, tem estado atento a essa questão dos subsídios ilegais, à questão da pesca em território brasileiro sem que possamos controlá-la, nas águas territoriais brasileiras, claro, e estamos atentos a essa questão de V. Exa., que é uma questão muito importante e que afeta bastante aí Santa Catarina.
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Passo, agora, aqui às considerações feitas ao Senador Nelsinho Trad, ex-Presidente desta Comissão, que, com muita gentileza, recordou as viagens internacionais em que ele, integrando a comitiva do Presidente da República, permitiu que eu tivesse com ele uma maior aproximação, conversamos muito, aprendi muito com o Senador Nelson Trad em relação à política internacional e ao trabalho que ele fez enquanto antecedeu aqui a Presidente Kátia Abreu.
V. Exa. bem diz aqui que a pandemia traz à tona temas como a diplomacia da saúde, a geopolítica das vacinas; o que se espera do Itamaraty e quais são as linhas de ação do governo? Bom, gostaria de dizer aqui a V. Exa., Senador Nelson Trad, que o Governo Federal não está parado numa única linha de ação. Como disse, nós defendemos com muita clareza, e me parece muito fácil defender essa posição soberana de autonomia aqui, junto à Fiocruz, mas gostaria de dizer a V. Exa. que há muitas ideias do Governo Federal a esse respeito. Essa posição nossa não é estática, não é uma posição em que, enfim, em que estamos congelados. Muito pelo contrário.
Esta semana aqui, na terça-feira, houve uma reunião de Ministros, presidida pelo Presidente Jair Bolsonaro, em que muitas ideias vieram à tona sobre isso. Por exemplo, o Presidente, o Ministro Paulo Guedes acha que, ao lado de termos as estatais Fiocruz e Butantan no desenvolvimento da vacina, nada impede também que o setor privado seja chamado com mais vigor a atuar. Por exemplo, a criação, e fica talvez mais evidente isso agora com a questão das patentes ou possibilidade de quebra das patentes, de que Pfizer e Johnson, por exemplo, montem fábricas no Brasil e produzam aqui, de forma privada, para venderem também no mercado privado. Essa é uma posição que encontra ali na economia um maior eco. E todas essas posições são coordenadas, claro, não apenas pelo Presidente da República, mas pelo Ministério da Saúde, que é a pasta a qual incumbe, em primeira análise, tratar desse assunto.
A Ministra Tereza Cristina, da Agricultura, sua conterrânea, e o próprio Ministro Gilson Machado, agora no Turismo, mas que cria gado no Tocantins aqui da Senadora Kátia Abreu, lembraram que o Brasil produz, acho, 2 bilhões de vacinas animais por ano, exportamos para vários países, e que temos uma capacidade instalada aqui gigantesca, que se encontra, de certo modo, ociosa, e que essas plantas de vacina animal poderiam ser adaptadas ou transformadas para a produção de vacinas para seres humanos aqui.
O Ministro Gilson, inclusive, nessa reunião, lembrou: olha, aqui no Brasil já existem plantas da Pfizer, já existem plantas da Bayer, já existem plantas da MDS. Então, por que não aproveitar essa capacidade? Para dizer a V. Exa. que, enfim, não há uma única visão, que a visão não é, enfim, a postura não é uma postura congelada, uma postura imutável; é uma postura que se adapta à questão, enfim, às circunstâncias do mundo.
Falarei um pouquinho agora aqui sobre essa questão da mudança da posição norte-americana. O que está em debate hoje na OMC? Quer dizer, nós tínhamos três posturas: a primeira, que era favorecida pelos países envolvidos, como os Estados Unidos, que não queriam a aplicação das exceções previstas nos arts. 30, 31 e 31 bis do Acordo Trips. Eles alegavam que a quebra de patentes puniria as empresas e instituições de pesquisa que empenhavam esforços no desenvolvimento de vacinas contra a Covid-19 e que o fizeram à custa de muito investimento privado e em tempo recorde.
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A segunda postura era ligada à proposta apresentada pela Índia e pela África do Sul, que advogavam uma dispensa, um waiver das obrigações relativas aos direitos de propriedade intelectual de maneira bastante ampla, uma coisa que ia muito além do disposto nos arts. 30, 31 e 31 bis. E era uma proposta que equivalia, na visão do Itamaraty, a uma quebra radical de patentes relativa a produtos e pesquisas na área farmacêutica. Operaria, na verdade, como uma espécie de suspensão do próprio Acordo Trips.
A visão que o Governo tinha, ou tem até hoje - essa é a posição, não mudou -, uma posição que é coordenada pelo Ministério da Saúde, junto com o Itamaraty, o Ministério da Economia e o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação, é a de que poderemos nos aproximar ou considerar como maior ganho a chamada terceira proposta ou terceira via, que era uma proposta construída por Canadá e Chile, com o apoio da atual Diretora-Geral da OMC, com quem já tive contato, já fiz uma videoconferência logo nos primeiros dias da minha gestão, em que o objetivo era a correta aplicação dos dispositivos previstos nesses arts. 30, 31 e 31 bis, de maneira a facilitar a produção local das vacinas contra a Covid e um maior acesso a elas por parte dos países em desenvolvimento.
Por que pensamos que essa seria a correta? Porque a proposta da quebra de patentes não tinha o apoio de membros da OCDE e não nos parecia realista diante das farmacêuticas. Dizer que é quebra de patentes, num primeiro momento, só favoreceria os países detentores de tecnologia, que poderiam imediatamente agir no sentido de suspender as patentes.
Os Estados Unidos agora... Nós ainda estamos analisando a posição norte-americana, amanhã eu já tenho uma videoconferência marcada com Embaixadora Katherine Thai, da USTR, quando terei oportunidade de pedir a ela que explique com mais detalhes a posição, mas nós entendemos que é uma proposta mais focada, de uma negociação que levará tempo, e não me parece claro ainda se esse processo realmente irá lograr consenso de um lado e que países terão capacidade para produzir mais.
Nossa impressão é de que a maioria dos países continuará dependendo da cooperação das farmacêuticas, e eu penso que o Brasil não pode se afastar de investidores exportadores de vacinas nem, por exemplo, afetar negociações como essa que nós temos aqui com a AstraZeneca e outros produtores.
Eu me dirijo agora aqui ao Senador Veneziano Vital do Rêgo, da Paraíba. Paraíba do Ministro Queiroga, da Saúde, e tenho aqui dois amigos que são paraibanos ilustres também: o Frei Josué, do Recanto Mel de Deus, uma comunidade terapêutica e evangelizadora, aqui no Entorno de Brasília, no Estado de Goiás, em Luziânia; e o Procurador Eduardo Albuquerque, que foi Procurador-Geral do Distrito Federal. São paraibanos que, como V. Exa., engrandecem o Brasil.
V. Exa. me pergunta como se dará a atuação sobre a preocupação do Brasil com urgências climáticas e se a visão de outras instâncias do Governo não afetaria a atuação do Itamaraty. Esse é um tema, como diz V. Exa., bastante sensível; é um tema em que o Brasil adquiriu uma liderança desde 1992, liderança que eu penso nós não precisamos e não temos por que perder. Na negociação para a participação do Presidente Bolsonaro na Cúpula do Clima, agora, no dia 22 de abril deste ano, eu pude testemunhar a maneira muito republicana e muito ativa como o Ministro Salles, do Meio Ambiente, agiu nessa questão, estabelecendo um contato direto com o enviado especial dos Estados Unidos, John Kerry; ele fez conferências prévias com os embaixadores da União Europeia, dos Estados Unidos, da Noruega, da Alemanha, do Reino Unido; colheu desses interlocutores as suas posições; manteve contatos também com a imprensa, de maneira a transmitir a narrativa brasileira; ouviu ponderações da Ministra Tereza Cristina, posições da área técnica do Itamaraty. E devo até dizer a V. Exa., Senador Veneziano Vital do Rêgo, que muitas das posições que o Ministro Salles sugeriu para o discurso do Presidente, que o Presidente efetivamente acatou, foram até mais ambiciosas do que a área técnica do Itamaraty, num primeiro momento, queria. Eu cito, por exemplo, o fato da antecipação de 2060 para 2050 da meta de neutralidade de carbono. De modo que eu penso que, como disse no meu discurso de posse, a política externa brasileira não se inicia comigo e não terminará comigo. O que cabe, a meu ver, ao Ministro das Relações Exteriores, sobretudo sendo ele um diplomata de carreira como eu, é, como eu disse, atualizar a linha de continuidade que existe da política externa brasileira, fazendo mudanças, ajustes na modulação e no tom; porém, eu penso que a defesa que nós fazemos hoje do desenvolvimento sustentável não é muito diferente daquela posição que nós adotamos em 1992.
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A propósito, eu queria lembrar - e até tenho dados aqui que acho que são importantes, que o Senado, que a Presidente Kátia Abreu possam acompanhar também, e talvez até em debates públicos, em audiência públicas, nós possamos ter também a posição de outros interlocutores, da sociedade civil, interlocutores independentes da área ambiental, até de outros países - que o Brasil emite apenas 2,9% dos gases de efeito estufa do mundo; os Estados Unidos, 13,6%; e a China, 23,9%. Ou seja, se somarmos China, Estados Unidos, Índia (6,8% da emissão de gases de efeito estufa do mundo) e União Europeia, que tem o mesmo percentual (6,8%), nós temos que 51,2% da emissão de gases de efeito estufa no mundo advêm desses países: Estados Unidos, China, Índia e União Europeia. De modo que eu penso que também nós temos de debater como esses países chegarão a atingir a meta.
Eu acho que - vamos dizer assim - a desconfiança, se é que ela existe, não precisa estar apenas do lado brasileiro. Quer dizer: por que duvidar que nós vamos cumprir aquilo que o Presidente Bolsonaro disse que irá cumprir? Como a China vai cumprir? Como os Estados Unidos, que têm uma indústria petrolífera tão atuante, vão fazer a transição energética para a área do hidrogênio ou para a parte dos automóveis elétricos? Conseguirão fazê-lo no tempo a que o Presidente Joe Biden estipulou?
É preciso que haja também um acompanhamento do trabalho desses países. Até porque, dos 2,9% de emissão de carbono que nós temos aqui no Brasil, cerca de 1,5% apenas tem a ver com as queimadas. E esse é um problema sério, claro que é - a questão da queimada, do desmatamento -, mas é um problema cuja resolução é de baixa complexidade se nós compararmos, por exemplo, com os países em desenvolvimento que têm que atuar na redução de gases de efeito estufa mudando a sua matriz energética - que não é limpa como a brasileira, não é? - e diminuindo a questão da fonte de combustível para os seus veículos, porque as frotas são muito elevadas.
De modo que eu sou, sim, Senador Veneziano Vital do Rêgo, otimista em relação às metas que nós adotamos.
Muito obrigado.
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A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO. Para interpelar.) - O Senador Carlos Fávaro, do Mato Grosso, que pediu a palavra, está presente? (Pausa.)
Ele está com o vídeo fechado.
Chanceler, eu vou fazer alguns questionamentos. Eu sempre deixo os meus questionamentos por último para dar oportunidade aos colegas. Então, vamos lá.
Embaixador Chanceler, algumas das suas observações foram feitas baseadas num Brasil de ontem. Ontem, já no final do dia, nós tivemos uma notícia muito desagradável de uma fala muito negativa do Presidente da República, que eu, sinceramente, gostaria de estar tão otimista e tão calma como o senhor está com relação ao fato de ontem.
O Presidente da República - não foi um Ministro de Estado, que pode ser demitido - acusa e faz insinuações gravíssimas com relação à Covid, com relação ao vírus, que pode ser uma guerra química, bacteriológica; menciona, inclusive, os militares de forma muito estranha, impactante.
Em todo o seu discurso, quando eu digo que ele é de ontem, de um Brasil de ontem, antes dessa declaração, o senhor fala que para as vacinas a China tem um papel fundamental; é o maior parceiro comercial, tem um papel decisivo nas vacinas; a China exportou 80% de todo o seu IFA para o Brasil; até o mês passado 80% das vacinas aplicadas eram chinesas, agora que as outras vacinas estão chegando, esse percentual caiu para 50%, mas quem aguentou a barra, a dureza da falta de vacinas, por um longo período, foi a China. O senhor disse ainda do nosso superávit de 2020 de US$50 bilhões. E eu só gostaria de dizer a todos que nos seguem neste momento que se nós retirarmos o comércio com a China, seria reduzido a US$18 bilhões esse superávit. Então, dos US$50 bilhões, grande parte deles são graças ao comércio com a China.
Então, respeitando - e gosto da sua tranquilidade -, eu gostaria que o senhor me tranquilizasse também, porque, sinceramente, eu não dormi bem esta noite muito preocupada com as consequências de uma acusação tão grave como a que foi feita ontem. O senhor sinceramente acha que nada vai acontecer? Que foram só palavras ao vento do Presidente da República e que isso não vai implicar nos seus planos, tão bem descritos até agora, sobre as suas perspectivas? O senhor acha que o Brasil continuará sendo o mesmo na relação com a China daqui adiante, depois dessa gravíssima declaração?
Isso porque há muitos colegas - inclusive eu - que pretendemos trazer aqui o GSI; pretendemos trazer aqui a Abin e representantes do Exército para nos esclarecer, se não houver um esclarecimento sobre isso, do que o Presidente insinuou quando disse que os militares sabiam do que ele estava falando.
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Então, eu queria que o senhor acalmasse não só a mim, mas aos produtores e ao agronegócio, que vem me ligando desde ontem à tarde; hoje, quando eu abri o celular, havia milhares de mensagens do agronegócio brasileiro, apavorado com as declarações, preocupadíssimo com essas declarações, com medo de alguma retaliação por parte da China, não só com relação ao comércio, que, ao fim e ao cabo, é ruim, mas a retaliação com relação às vacinas.
O senhor está tranquilo? Nós todos podemos ficar tranquilos? Essas declarações não significam nada? Por favor.
O SR. CARLOS ALBERTO FRANCO FRANÇA (Para expor.) - Muito obrigado, Presidente Kátia Abreu, por me dirigir essas questões.
Eu acho que, por definição, não consigo, não me cabe comentar as declarações do Presidente da República. Eu sempre digo que ele é quem deve comentar o que eu falo, avaliar o meu desempenho.
Mas eu entendo que V. Exa. se refere à manifestação que o Presidente teria feito ontem, eu penso, durante uma cerimônia no Palácio do Planalto, à qual eu não assisti. Mas eu estive com o Presidente Bolsonaro ontem à tarde e à noite, estivemos no Rio de Janeiro, onde ele manteve encontro com o Governador do Rio, naquele Estado, e depois foi até o aeroporto do Galeão, onde estava estacionada aeronave presidencial e pôde, então, receber lá o Robson Nascimento de Oliveira, que foi um brasileiro que esteve... Até o Senador Nelson Trad teve uma participação bastante grande no tratamento humanitário dispensado no indulto recentemente concedido pelas autoridades russas a esse cidadão brasileiro, simples, que foi, portando, um medicamento controlado, porém autorizado aqui no Brasil - que é vendido com receita nas farmácias, um medicamento lícito -, e chegando à Rússia, o Governo Russo, muito diligentemente, aplicando lá a lei, indicou que aquele medicamento não podia ser internado - ele não sabia disso, o Robson - e houve, então, a prisão. E numa associação do Governo, do Executivo com o Legislativo - Senador Nelson Trad levou uma carta do Presidente Bolsonaro ao Presidente Putin, solicitando o perdão, que foi, realmente, concedido; o indulto foi dado agora no dia da Páscoa ortodoxa russa, que aconteceu domingo passado -, esteve lá recebendo o Robson o Presidente Bolsonaro.
E o que o Presidente Bolsonaro falou nesse momento? Eu estava lá, ao lado dele, Presidente Kátia Abreu, e posso dizer à senhora, quando perguntaram a ele sobre isso, ele falou: "Olha, eu não falei da Rússia; eu, como militar, tratei aí de assuntos que aprendi na Academia Militar das Agulhas Negras, uma questão de várias modalidades de guerra. Nunca mencionei a China, e o que eu quero dizer que a China é um grande país, nós temos uma parceria com todos os melhores países do mundo, e a parceria que temos com a China é uma parceria positiva". Eu vi o Presidente dizer que a relação com a China era uma relação positiva e que não se alterava.
Em relação às vacinas, V. Exa. aponta com muita clareza e com muita certeza: a primeira vacina aplicada aqui no Brasil foi realmente a vacina chinesa, a CoronaVac. E eu também gostaria de indicar aqui: a primeira vacina, o primeiro país a começar a vacinar no mundo o fez em dezembro do ano passado, e o Brasil fez dois meses depois.
Então, eu acho também que aqui nós temos uma, vamos dizer assim, uma atuação do Governo Federal, que cumpriu a sua palavra. O Presidente Bolsonaro disse: "Olha, assim que a Anvisa aprovar os imunizantes, eles estarão disponíveis à população brasileira independentemente de uma obrigatoriedade. Agora, quem quiser, havendo a vacina, será vacinado".
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Eu não penso que, enfim, ainda que o meu discurso tenha sido feito ontem, ele foi hoje atualizado. Nós temos a questão aqui dos Estados Unidos, da posição. O Embaixador Paulo Estivallet hoje cedo já recebi uma mensagem dele dizendo: "Olha, todo o IFA que a China nos prometeu enviar em maio foi enviado." De modo que eu não penso... Nós estamos atualizando a Cosban, uma proposta feita em 2019 pela China. Eu gostaria de dizer que o Chanceler da China foi o primeiro Chanceler a receber o meu pedido, por telefonema. Quando fiz os pedidos, no dia 6 de abril, dois ou três dias depois, ele já atendeu. Ele fez a gentileza de me atender num sábado lá em Pequim, e eu fiz a gentileza de ficar até as 11h da noite aqui, mas não foi gentileza, era o meu dever ficar trabalhando. E ele teve a gentileza de me atender naquele dia.
De modo que eu penso que as relações são amplas. Elas perpassam pela questão da vacina, sim, mas elas vão além. O crescimento da China é bom para o Brasil. E V. Exa. falou em sua fala, e eu gostaria aqui de dizer que o ritmo anual das exportações agrícolas, se se mantiverem, do Brasil com a China permitirá que nós superemos US$65 bilhões em 2030. É uma relação em que nós podemos ganhar mutuamente. Sem dúvida alguma, há uma dependência da China em relação ao Brasil também.
E eu acho que o trabalho da diplomacia deveria ser neste momento, Presidente Kátia Abreu, superar inclusive essas dependências. É como eu digo: eu acho que nós podemos ter um intercâmbio maior na parte da ciência e tecnologia. Eu sinto que o Brasil pode ganhar mais, se nós tivermos uma participação dos consulados e da Embaixada brasileira mais vigorosa naquele país. A China tem uma rede consular também aqui no Brasil que é bastante expressiva.
De modo que eu acho que nós podemos ir além. Eu realmente não tenho receio de que essa parceria se manterá dessa maneira. Tenho, na verdade, muita confiança de que essa parceria será cada vez maior.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Chanceler.
Então, apenas repetindo: ele considera o discurso dele atualíssimo e que nós podemos ficar despreocupados que não teremos consequências negativas com relação ao episódio e à fala do Presidente. Eu quero muito crer nisso e vou, com certeza, torcer para isso, Chanceler, para que as coisas continuem o seu curso normal.
Eu gostaria de mencionar ainda uma pergunta sobre a questão climática. Na verdade, Chanceler, eu confesso ao senhor que, se o senhor falasse comigo há 15 anos, o senhor iria encontrar uma outra pessoa com relação aos conceitos, às teses sobre a questão ambiental. Princípios não se mudam. O princípio da justiça, o princípio de seguir a ciência, o princípio de ouvir a academia, de respeitar o que esses estudiosos falam. E eu, então, ao longo do tempo, evoluí, justamente porque sou uma ótima estudante. Não sou estudiosa especialista, mas sou uma pessoa aplicada para entender as coisas, por obrigação de ofício do mandato que tenho pelo Estado do Tocantins. E compreendi, nesse período todo, Chanceler, que nessa questão ambiental o que vale é a narrativa e o que vale é o que pensa o consumidor.
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Quando nós discutimos, no passado, a questão ambiental, a gente sempre falava muito de uma guerra entre governos que querem diminuir o Brasil, que querem inferiorizar o Brasil, porque o Brasil é forte. Mas, hoje, eu compreendo que muito mais importante do que uma guerra entre governos, por trás disso tudo está a excelência, o consumidor. O consumidor trabalha, dá duro na vida, para comer o que ele quiser, para comprar o que ele acha que é importante para a sua geladeira, para a sua despensa e para a sua mesa.
Então, eu digo isso pensando no consumidor europeu. Eu tenho opções de não vender para a Europa, de o Brasil dizer que não quer vender alimentos para a Europa, porque são muito exigentes, porque falam muito da questão ambiental, porque não querem comprar comida do desmatamento. É uma opção? É. Não sei se o Brasil está preparado para essa opção; não sei se nós estamos em condições de retaliar o consumidor europeu, que é o segundo maior espaço, o segundo maior lugar, no mundo, das nossas exportações depois da China. Então, eu não discuto com o consumidor; o consumidor para mim sempre tem razão, e a minha opção é vender ou não vender - e eu acho que esta opção não existe.
Então, fazer um cabo de guerra... A gente brincava muito na infância de cabo de guerra, a gente sabe como funciona. Então, um cabo de guerra com a Europa e com os Estados Unidos, e o Brasil na outra ponta, não é um cabo de guerra justo com o Brasil. É uma escolha muito difícil, muito dura e, com certeza, nós perderemos nesse jogo.
Nós não temos que ser lenientes, subservientes, mas temos que ter humildade com altivez. A humildade com altivez - nós, que não temos força militar, não temos força econômica, não temos grande força tecnológica, e a grande paixão que este Brasil tem é dada pela natureza. É a natureza que nos dá um forte agronegócio com as pesquisas e a ciência, praticadas no Brasil, especialmente pela Embrapa; o nosso turismo que é dado pela natureza. Então, Deus foi bondoso conosco e nos deu essas duas oportunidades já, pois, do ponto de vista prático e da construção, nós não conseguimos concorrer com esses países.
Então, esse cabo de guerra não pode ficar de pé, ele não pode continuar, porque sempre o lado brasileiro vai cair sentado no cabo de guerra, vai cair deitado nesse cabo de guerra. Cabe a nós cumprirmos com a nossa obrigação. Nós temos uma legislação ambiental em que não foram os europeus que votaram nem os americanos; foram os brasileiros que votaram nessa lei. E nós impusemos na legislação o que é desmatamento legal e o que é desmatamento ilegal. Então, o que o mundo lá fora solicita, os consumidores, é o que é verbalizado pelos Parlamentares, ou, por acaso, eu sou uma Senadora que vou verbalizar o que o povo do Brasil ou o do Tocantins não quer?
Então, quando nós, Senadores do Brasil e Deputados, também fazemos as nossas lutas, é baseado no que nós ouvimos da nossa sociedade, dos nossos eleitores, dos nossos representados. Isso é uma obrigação legítima. Então, eu não gosto e não quero ver o Brasil sempre sentado ou deitado do outro lado do cabo de guerra. Nós precisamos é cumprir com a nossa obrigação legal.
E o Ministro do Meio Ambiente, com quem tenho procurado ter e manter um diálogo bastante civilizado, claro e muito sincero, ele não tem o direito de colocar o Brasil todos os dias de pé nesse cabo de guerra, para levar um tombo. Quando ele discute que o Brasil é credor, eu acho ótimo, porque eu também acho que o Brasil é credor. Agora, isso não pode ser uma condicionante para que o Brasil cumpra com a sua obrigação, porque nós só vamos perder. Enquanto ele grita por crédito pelo que nós fizemos, nós vamos ter um débito e um negativo muito grande nas nossas exportações. Se nós continuarmos nesse cabo de guerra, nós vamos perder exportações. E, atrás das exportações... Povo brasileiro que está aqui nos assistindo - a audiência da TV Senado é grande -, não são pessoas que vão perder dinheiro no bolso, não são grandes empresários que vão quebrar e perder suas empresas; são os empregos que serão diminuídos. Essa é a minha maior preocupação.
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Eu torço pelos empresários. Que eles façam muito sucesso! Que eles ganhem seu dinheiro para que eles possam manter milhares e milhares de empregos!
Ainda ontem, uma cadeia grande de supermercados na Inglaterra já vetou produtos do Brasil por conta do desmatamento. Então, essa questão ambiental na Europa e nos Estados Unidos, principalmente com a ascensão do Presidente Biden, se tornou um dos centros mais importantes da geopolítica mundial. Então, lutar contra isso com argumentos vazios que parecem ser óbvios - e o são - não vai convencer as pessoas lá fora se nós não reduzirmos o desmatamento.
Eu pergunto a V. Exa., Chanceler... É sempre bom a gente olhar o outro lado da moeda. Eu sei que o senhor é um homem muito bem-intencionado - estou falando isso aqui com muita franqueza. Todas as informações que nós temos a seu respeito são as melhores possíveis com relação à sua ética, à sua moral, ao seu caráter. Então, não há nenhuma forma aqui de querer constrangê-lo - ao contrário. Uso o meu instrumento legítimo, numa Comissão importante do Senado Federal, para que nós possamos discutir. Então, eu lhe pergunto... O senhor mesmo diz que os Estados Unidos contribuem com 13% das emissões de gases; que a China contribui com 23%; que a Índia contribui com 7%, pode olhar que eu sei de cor; e que o Brasil está entre os dez maiores emissores, com quase 4%, não é menos de 3%, com 4% o Brasil contribui, e, por isso, estamos entre os dez. Meu sonho é sair da lista dos dez - meu sonho é sair da lista dos dez! É desproporcional o percentual de emissões. Agora, eu lhe pergunto: é proporcional o tempo de redução dessas emissões - do mesmo tamanho - ao desses países que precisam reduzir muito mais? É justo que a China, que emite 23%, precise fazer tudo em 60 anos e o Brasil, que emite 4%, ter 50? Será que é justo os americanos, que emitem 13%, precisarem de um prazo até 2030 para reduzir 50%, e nós, que emitimos 4%, precisarmos do mesmo período para reduzir as nossas emissões? Será que nós agimos com inteligência na Cúpula do Clima, no dia 22? Eu vou lhe explicar por que não e quero ouvir as suas impressões.
Diferentemente da China, da Índia, dos Estados Unidos e do resto do mundo, a redução deles tem um custo altíssimo financeiro e econômico, porque eles têm que mudar a matriz energética. A matriz energética deles é altamente poluente. Então, além de haver um esforço sobre-humano de consciência, de normas, de leis, de policiamento, eles vão precisar de alguns bilhões e bilhões de dólares para fazer essa substituição. Enquanto isso, o Brasil, além de ter apenas 4% das emissões, não precisará, como diz o Ministro, de US$1 bilhão para reduzir o desmatamento neste ano. Nós estamos com um orçamento de R$150 milhões, aliás, R$130 milhões. Já falei com o Relator Eduardo Gomes e com o Ministro Paulo Guedes, por mensagens. Se nós dobrarmos esse valor para mais R$130 milhões, R$150 milhões, nós conseguiremos, sim, fazer uma grande força-tarefa para reduzir o desmatamento neste ano. Por isso, protocolei um projeto de lei, Chanceler, alterando a meta brasileira de 2030 para 2025. Alguém poderia me perguntar assim: "Mas a senhora, Senadora, está querendo fazer bonito para os europeus ou para os americanos? Está querendo fazer bonito para os ambientalistas?". Não! Eu sou uma mulher pragmática, eu sou uma mulher focada. Eu tenho certeza de que nós conseguimos fazer essa redução com vontade política, dura e forte, porque nós fizemos, antes dos dois atrás.
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O que eu quero, na verdade, é fazer bonito para os meus exportadores brasileiros. Eu quero eles tenham as portas abertas com maior velocidade lá fora. Se nós reduzirmos o nosso desmatamento, as nossas emissões em 50%, que seria a exigência até 2030, se conseguirmos fazer isso até 2025, o que vai acontecer? Qual é a consequência disso? Não é uma fotografia e uma manchete; é comércio, é mercado, é o Acordo Mercosul-União Europeia se concretizando com realidade, porque esse desmatamento de dois anos impediu que o Acordo Mercosul-União Europeia não fosse concretizado no tempo devido, no avanço devido que nós tivemos depois de quase 20 anos, de quase mais de duas décadas. Dois anos de desmatamento destruíram a possibilidade de um acordo comercial Mercosul-União Europeia que representaria 25% do PIB mundial; que representaria uma subida, em dez anos, da renda per capita brasileira duas vezes mais do que sem o acordo; que representaria... As nossas transações comerciais, que hoje são de R$70 milhões, poderiam ser dobradas com o acordo, com cálculos econométricos da maior grandeza.
Então, o fato de não termos R$300 milhões para combater o desmatamento está fazendo com que o Brasil perca bilhões e bilhões de reais. E eu repito: não estou preocupada com os empresários apenas, porque eles sobrevivem, são pessoas ricas que sobreviverão, mas que poderão fechar suas fábricas, poderão colocar milhares de pessoas na rua se nós não ampliarmos as nossas exportações.
Nós temos, para exportar para a China, quase que o dobro do que exportamos hoje, se nós conseguirmos habilitar os frigoríficos de frango, de suínos e de bovinos, que já estão funcionando e que poderão ampliar os seus empregos - se nós conseguirmos habilitar com a China os novos frigoríficos. Mas, com um clima desses que está sendo criado, com que cara nós chegaremos até lá pedindo essas habilitações?
Nós precisamos de paz, Chanceler! O senhor está trazendo paz para o Itamaraty, mas sozinha uma andorinha não faz verão. Nós precisamos ter uma conversa muito firme. Nós não estamos falando de política eleitoral. Nós teremos muitos candidatos a Presidente, e eu não quero nem saber como isso está. Não é hora de discutir isso. É hora de conversar, sim. Com todos os candidatos a Presidente que me convidarem eu vou conversar sobre o Brasil e sobre o futuro do Brasil. Eu sou uma pessoa civilizada, mas não significa fazer escolhas neste momento. As minhas escolhas hoje estão direcionadas, exclusivamente, à vacina e ao comércio, para que nós possamos sair do buraco.
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Então, eu gostaria de ouvi-lo a respeito desta ambição mais ousada que nós poderemos ter, que nós deveremos ter com relação ao desmatamento. Para aqueles que estão nos ouvindo na TV Senado, nós respondemos por 4% das emissões do mundo. Quem é que está poluindo, aqui no Brasil, para a gente poder ajudar a diminuir esses 4%? Metade é desmatamento. Se nós reduzimos o desmatamento, nós já alcançamos, nos próximos três, quatro anos, a nossa meta, antecipadamente, e isso vai abrir portas para o nosso comércio, porque, quando você faz um acordo União Europeia-Mercosul, qualquer país que faça um acordo com a Europa, isso significa uma abertura de portas, porque vários outros países copiam o que a Europa faz.
Então, Chanceler, eu gostaria muito de ouvir os seus comentários sobre o que nós podemos fazer com relação a essa narrativa, a essa ambição. Por isso insisti com o senhor, por várias vezes, que eu queria ver, como Presidente da CRE, Comissão de Relações Exteriores, eu queria ver a proposta do Brasil na Cúpula do dia 22 de abril, não é porque eu sou curiosa pura e simplesmente - nós mulheres somos curiosas -, mas curiosas para trabalhar positivamente, e não para criticar. Porque, se o senhor me contasse dessa meta para 2030, tão desigual com relação aos outros países, eu o teria aconselhado, conhecedora de pouca coisa que sou no mundo, gente, mas se há uma coisa que entendo minimamente é a agropecuária brasileira. Eu poderia ter contribuído para que a gente pudesse ter sido mais ousado e dado uma surpresa ao mundo com uma redução do desmatamento até 2025, mas, infelizmente, foi tudo fechado em copas, e nós só tomamos conhecimento do que aconteceria poucas horas antes dessa cúpula.
Então, esse é um exemplo específico, direto e concreto do porquê de a CRE não mais pegar carona ou ser apenas um coadjuvante nos acordos comerciais, nas cúpulas, nas reuniões, nos entendimentos. Nós queremos, Chanceler, somente ajudar. De minha parte, não erguerei nunca uma palha para prejudicar o País e, claro, o meu Estado, o Tocantins.
Então, gostaria de ouvi-lo a respeito dessa ousadia maior de nós avançarmos um pouco mais. Aprovar o projeto de lei no Senado, com o apoio do Governo, seria o melhor dos mundos, porque mostraríamos unidade. Cabe a mim convencer os meus colegas Deputados e Senadores, mas com o apoio do Governo. Eu faço questão de ter o apoio do Governo; eu gostaria de ter o apoio do Governo. Eu não queria aprovar um projeto, porque o Governo é contra, absolutamente!
O que eu estou propondo é factível. A Ministra da Agricultura sabe disso, os especialistas em agronegócio sabem disso. Nós fizemos agora, há pouco tempo. E por que não faremos de novo?
Vamos ser ousados, ambiciosos e tirar o Brasil desse isolamento diplomático, comercial, com tão poucos acordos! Não é culpa deste Governo. Faz muitos anos que nós não temos acordo nenhum além de Mercosul e União Europeia; justiça deve ser feita. Mas, no momento em que o Presidente Bolsonaro estava pronto para fazer um gol, um gol de placa como dizem os homens que adoram futebol - eu ouço em casa todos os dias -, quando ele estava pronto para fazer um gol de placa, que era, enfim, finalizar o Acordo Mercosul-União Europeia, alguém lhe roubou a bola e saiu correndo. Quem roubou a bola do pé do Bolsonaro foi quem permitiu a ampliação do desmatamento de forma desenfreada.
Por favor, Sr. Chanceler.
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O SR. CARLOS ALBERTO FRANCO FRANÇA - Senadora Kátia Abreu, eu queria agradecer a V. Exa. a exposição. V. Exa. não é mais uma estudante; não, V. Exa. já dá aula a todos nós aqui sobre esta questão, porque, enquanto eu consultava aqui a minha "colinha", feita aqui - até quem me mandou foi o meu amigo Fernando Rodrigues, do Poder360, que faz infográficos muito ilustrativos -, V. Exa. já tinha os dados todos de cor, de cor e salteado, como diziam, na minha Ribeirão Preto, quando eu era criança.
Na fala inicial de V. Exa., V. Exa. já bem colocou aqui que o meio ambiente é um dos eixos centrais da geopolítica mundial. É bem verdade. Eu, depois, na minha fala, ao responder a pergunta aqui do Senador Esperidião Amin, disse que acho que nós temos hoje uma mudança do centro estratégico da geopolítica para a região do Indo-Pacífico. Acho que essas são duas coisas que devem nos nortear no relacionamento internacional.
A narrativa ambiental e a questão de acesso aos mercados consumidores V. Exa. trata de uma maneira com a qual eu queria lhe agradecer, realmente muito ampla, bastante clara, na sua exposição. Fui testemunha da participação ativa de V. Exa. Eu nem bem havia tomado posse ainda, e V. Exa. já me procurou, iniciamos um diálogo, tive oportunidade de recebê-la lá no Itamaraty. Foi uma conversa muito agradável. A senhora mesmo marco ou tempo. Falou: "Olha, estamos falando aqui há duas horas e meia", tratamos de muitos assuntos, inclusive assuntos internos ao Itamaraty. Agradeço o carinho que V. Exa. tem em relação à nossa Casa.
Espero, realmente, que a esta Comissão e, mais ainda, o Senado Federal sejam parceiros do Governo Federal e do Itamaraty nesta questão, a questão do meio ambiente, que é uma questão que não é exatamente do meu ministério, é do Ministério do Meio Ambiente, mas o Itamaraty, claro, tem alguma coisa, tem bastante a dizer.
Inicialmente, quero agradecer a V. Exa. as menções elogiosas à minha ética, atributos morais e tudo.
Quero dizer que estou muito agradecido ao Presidente Bolsonaro pela confiança que ele depositou em mim, ao honroso convite para chefiar a Casa de Rio Branco, a Chancelaria brasileira. Eu espero estar à altura do convite que ele me fez. Tenho orgulho de fazer parte deste Governo.
De novo, sinto que foi uma proposta que nós pudemos fazer, que a mim me pareceu, neste momento, adequada, ainda que eu entenda a posição de V. Exa. sobre a questão de uma ambição ainda maior. Já anotei aqui as frases. Tinha anotado a primeira: o Senado é a Casa do equilíbrio legislativo; unidade com altivez. Estou fazendo um caderninho com os ensinamentos de V. Exa. e vou levar.
V. Exa. põe duas questões que a mim me parecem claras aqui: o Brasil tem uma legislação ambiental rígida e temos um mercado de crédito de carbonos que podemos ainda explorar. Essas são duas questões, dois parâmetros que podem nos levar a avançar nessa questão. V. Exa. fala bem. Eu já havia, de alguma maneira, dito isso: uma das principais causas dos problemas no Brasil é o desmatamento. A resolução do problema do desmatamento é de baixa complexidade quando nós comparamos com as alterações, com as mudanças que precisarão fazer países, por exemplo, como China ou Estados Unidos, que precisarão alterar suas fontes de energia e controlar a queima de combustíveis. O desmatamento, portanto, tem um custo muito mais baixo.
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O Ministro Salles já havia dito que o Brasil tem um volume certificado pela ONU de créditos de carbono que daria ao Brasil a oportunidade de vender mais de US$130 bilhões, em créditos, desde o Governo de Dilma Rousseff. Então, nós teríamos, vamos dizer assim, um passivo, enfim, um ativo a cobrar do mundo. Ainda que isso não seja factível, eu acho que nós vamos precisar, de alguma maneira, do esforço em realmente pedir a implementação do Artigo 6º do Acordo de Paris, porque o orçamento brasileiro é limitado. Eu louvo o projeto de lei que a senhora propôs aqui, alterando a meta de 2030 para 2026; 2025, perdão. De modo que eu creio que é preciso montar um cronograma físico financeiro para que isso aconteça e ver de que maneira nós vamos adquirir esses recursos.
E aí eu volto à questão do desenvolvimento regional, em que V. Exa. tocou, quer dizer, esses acordos que nós celebramos aí fora criam impactos positivos de desenvolvimento local. Então, a questão que me parece também importante - que pode ser debatida nesta Casa, através de audiências públicas; acho que nós sempre podemos aprender com iniciativas de outros países, aprender com a visão de especialistas - é como nós vamos financiar essas questões; não apenas questões de comando e controle, mas, por exemplo, o que fazer com invasões em terra indígena, em áreas que não estão hoje sujeitas a desmatamento, em áreas de mineração, quer dizer, como nós vamos dar sustentação a essas pessoas.
O Ministro Salles uma vez me explicou e me fez muito sentido; ele disse: "Olha, como é que eu chego a Altamira, resolvo com o Comando e Controle uma situação, se eu não der possibilidade àqueles habitantes ali, para que eles tenham uma fonte de renda digna? A Área de Comando e Controle, a Força Nacional sai de lá e, imediatamente, eles voltam para aquela área", ou seja, há a ideia de que apenas o Comando e Controle não funciona. Eu me alinho a essa visão, Presidente Kátia Abreu. Eu acho que é preciso encontrar maneiras para que também nós possamos financiar o desenvolvimento de outras atividades a essas pessoas que hoje estão, vamos dizer assim, na ilegalidade, ou numa atividade que nos comprometem na meta que nós assumimos de diminuir o desmatamento ilegal.
Na questão de habilitação de frigoríficos - V. Exa. fala bem aqui -, é preciso incentivar a habilitação de plantas, para que possamos exportar mais para a China. Com a Rússia, o Presidente Bolsonaro, recentemente, no dia 6 de abril, teve um encontro, teve um telefonema internacional, com o Presidente Putin, e ele, então, tratou também aí, pediu que houvesse um empenho russo no sentido de habilitar plantas brasileiras aqui. Recentemente, fruto de diligências do Itamaraty, de providências, o Governo peruano habilitou os regulamentos sanitários que permitirão, sobretudo, aos países do Norte, aos Estados aqui do Norte - Acre, sobretudo, e Rondônia -, a exportação de carne suína para o Peru; isso interessa diretamente à população e aos empresários do Acre.
E, aqui, quero até fazer um parêntese, para dizer que o Presidente Bolsonaro, como V. Exa., tem a mesma opinião sobre a iniciativa privada. Ele sabe que quem cria riqueza - ele já disse isso, em várias ocasiões -, quem cria emprego e riqueza é o setor privado; ele sempre disse isso. O Governo, quando muito, consegue dar aí um DAS, mas o emprego vem, é gerado pelo setor privado; é do setor privado que advém a riqueza.
Com a Ministra Tereza Cristina, tenho o maior intercâmbio sobre essas questões. Enfrentamos problemas recentemente na Arábia Saudita, estamos somando esforços para resolvê-los. De modo que eu penso que o Governo Federal - o Itamaraty, o MAPA, o Ministério da Agricultura - está sempre atento a essa defesa do empresariado. E aí não conto nada de novo a V. Exa., que foi Presidente da CMA, que foi Ministra da Agricultura e conhece como muitos essa questão e tem experiência como poucos quanto a essa questão.
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Sobre acesso ao mercado, isso é uma realidade inafastável. Cada vez mais os produtos precisam ter esse selo ambientalmente sustentável. Eu tenho um amigo, desde 1990, o Marcos Molina, hoje Presidente da Marfrig. Quando eu o conheci, ele era um jovem, mais jovem que eu até, tinha 19 anos de idade, tinha só uma Saveirinho. Ele andava ali pelo interior de São Paulo, com pouco dinheiro no bolso, e hoje é um gigante da exportação, um gigante do agronegócio brasileiro, exporta para os Estados Unidos e criou aí o hambúrguer verde, que não é verde na cor, mas é verde na sua fabricação. E com isso ele ganha mercados de outras empresas gigantes, tem uma presença grande nos Estados Unidos e no continente europeu, e eu creio que esse é o caminho.
E o caminho que o Executivo pode fazer - e eu acho que pode ter muita ajuda, realmente, aqui do Parlamento, que traz, como V. Exa. bem disse, aqui, esse equilíbrio legislativo - é criar condições ao nosso empresário, para que a gente possa produzir de maneira cada vez mais sustentável e economicamente rentável.
Obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Chanceler, por sua resposta.
Nós temos muitas perguntas aqui do e-Cidadania, mas, em todos os momentos, na participação dos Senadores, praticamente todas foram respondidas. Há uma aqui que eu achei especial, mas acho que a Apex não está sob a guarda do ministério... Hoje, está no Itamaraty. Então, Fernando Luiz, de São Paulo: "O Sr. Ministro pode dar o seu parecer acerca da integração da pasta com a Apex para promoção da indústria nacional, a exemplo da Embraer?". Então, esta é uma pergunta que eu não vi ser respondida em nenhum momento; as demais eu observei que sim.
E mais um questionamento, Sr. Chanceler, é sobre a quebra de patentes. A sensação que eu tenho - e eu tenho lutado muito por essa quebra de patentes; apesar de ser uma liberal, eu acredito no mercado, na livre iniciativa, no respeito ao conhecimento intelectual, aos investimentos em pesquisa -, tudo isso é fantástico, mas não fui eu que construí o Acordo Trips. Esse acordo prevê, no Artigo 30, que há possibilidade de quebra de patentes. Então, não é o fim do mundo. Nós não estamos propondo uma bomba atômica; nós estamos propondo com que os países concordaram, quando assinaram esse acordo, que, em casos extremos e graves, a hipótese é, sim, necessária e permitida. Então, o Brasil é signatário desse acordo. Por que essa resistência tão grande a essa quebra de patentes?
E uma coisa tem que ficar muito clara para o contribuinte brasileiro. Quando nós propusemos - e estamos propondo, via lei, quebra de patentes -, não foi de graça, não. Nós queremos fabricar quantidades para fornecer para os brasileiros, mas nós ainda temos capacidade de fornecer para a América Latina toda; nós temos capacidade, as nossas fábricas, de fornecer para a África. Então, nós queremos produzir para nós e ajudar o mundo. E o importante é que nós vamos pagar royalties; não é de graça, nós não estamos queremos de graça! Os donos dessas patentes - por um período "x"; é uma quebra de patente temporária - não vão ter prejuízo. Nós iremos pagar a vacina, assim como os demais países.
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Então, sinceramente, eu sinto agora, com muita tristeza, que nós ficamos, mais uma vez, isolados, Chanceler - e me corrija se eu estiver errada, eu quero aprender essa questão diplomática, como é que funciona isso; eu não sou especialista -, nós deixamos de ficar aliados de cem países, comandados pela Índia e pela África do Sul. Nós dissemos não a esses países: "Nós não vamos estar com vocês, porque não concordamos com a quebra de patentes", cem países, sendo que um deles é fabricante, e nós precisamos muito das vacinas fabricadas lá, que é a Índia! Tudo bem. Ficamos do outro lado: "Não, vamos nos comportar como liberais, porque essa questão fere o mercado", e fomos atropelados ontem por esse grupo com o qual nós nos aliamos, que são os Estados Unidos e a Europa, sem dar nenhum aviso para ninguém, nem para o Canadá, nem para a Austrália, a não ser que tenham avisado, e eu não sei. Nós fomos pegos de surpresa. Quer dizer, nós nos aliamos a um grupo que, mais uma vez, tirou a bola do jogo, sem nos avisar, e saiu correndo. Então, nós ficamos contra cem países e, agora, estamos espremidos por duas grandes potências.
Os outros dois países que poderiam nos ajudar estão em silêncio, com relação à quebra de patente, que são a Rússia e a China, que são dois grandes produtores. Com a Rússia, nós estamos numa situação também difícil, Chanceler, porque 56 países aprovaram a vacina Sputnik; aqui na Argentina, estão tomando a Sputnik. O que aconteceu com esses países? Alguém morreu com a Sputnik? Eu não quero aqui contestar a ciência e os técnicos, mas eu preciso de respostas. Por que o Brasil não aprovou a vacina Sputnik em detrimento de 56 países? Isso dá o direito a nós, Chanceler, de ficarmos confusos, no mínimo; de ficarmos, no mínimo, confusos! Então, não deixa de ser um atrito, porque agora a Sputnik quer entrar com uma ação contra a Anvisa por perdas e danos econômicos e morais por ter dito que a vacina não serve. Eu, se fosse eles, faria a mesma coisa, faria a mesma coisa, absolutamente a mesma coisa!
Então, esse isolamento me preocupa com relação a essa quebra de patentes. Eu não quero dar prejuízo econômico para ninguém. O Brasil não é mendigo; o Brasil consegue pagar as suas vacinas. Então, por que não entrarmos com essa pressão, porque o que pretendeu a Índia e a África do Sul com cem países foi o máximo, foi para o teto, quebra total de tudo. Isso tudo, Chanceler, pelo que eu sei de negócios que eu pratico mal e mal, na área rural, a gente sempre vai muito em cima para depois ter uma proposta um pouco mais abaixo. Como se diz no interior do Estado, às vezes, a proposta vem alta igual a urubu, a gente vem baixo igual a tatu, e, no fim, as coisas se encontram e dá tudo certo. Então, o Brasil se recusou a entrar no grupo da pressão, de vir alto igual a urubu, para depois se encontrar aqui na área das águias, dos falcões. E nós não nos aliamos a quem estava pressionando os grandes países. Ficamos do lado deles, e eles cederam à pressão de quem nós não nos aliamos.
Então, essa é uma situação sobre a qual eu queria que o senhor falasse alguma coisa para mim. Eu estou errada. Com certeza, será que eu estou errada? Será que esses países, cem países estão errados, e o Brasil está certo? E agora cem países, não; 101, com a Europa, e 102, com o bloco europeu, que são mais 23; então, agora são 125 países a favor da quebra de países. Nós estamos certos, e esses países errados? Gostaria que o senhor pudesse comentar. Não é ainda hora, e chance, e oportunidade de nós também declararmos a nossa aliança à quebra de patentes e sermos uma grande farmácia da América Latina, como a Índia é a farmácia do mundo? Nós, pelos menos, poderíamos ser a fábrica de vacinas e medicamentos para a América Latina.
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E já aproveito, que são dois questionamentos em um só: o que nós faremos - o Senado quer ajudar, quer apoiar e não quer ficar para trás, não quer que o Brasil fique para trás, não é nem o Senado - na liderança da América Latina? Existe um conceito em vários setores, em várias situações: quem é grande lidera, e o Brasil é grande. O mundo lá fora está observando o nosso enfraquecimento na liderança na América Latina. E também quero ser justa, não é de dois anos para cá, não; é de mais tempo para cá, acho que houve um enfraquecimento da nossa liderança. Vez por outra, nós estamos vendo votações em organismos internacionais, com a América Latina totalmente desarticulada, votando um contra o outro. Isso não pode acontecer.
Então, eu gostaria muito de ver a sua posição de como nós faremos para unir a América Latina. O Brasil como um país grande, que tem uma economia muito maior do que os seus vizinhos, como é que nós poderíamos, respeitando a soberania de todos eles, mas, como um país grande, liderar os problemas, os desafios, encontrar caminhos? Esse é um papel do Brasil. O que o Itamaraty pretende a esse respeito?
Esses são os meus últimos comentários.
Por favor.
O SR. CARLOS ALBERTO FRANCO FRANÇA - Presidente Kátia Abreu, muito obrigado.
Eu vou me permitir um comentário mais breve aqui sobre o e-Cidadania e depois entro nas considerações que V. Exa., com tanta propriedade, fez aqui sobre a questão de quebra de patentes, sobre a questão do licenciamento da vacina Sputnik V, da Rússia, pela Anvisa e sobre o papel que o Brasil teria ou tem, vamos dizer assim, numa liderança na América do Sul/América Latina.
Bom, a pergunta do Fernando Luiz, do e-Cidadania, de São Paulo - a quem eu de antemão já agradeço - é sobre o que é que pode fazer a Apex, que realmente é uma agência do Itamaraty, na promoção da indústria nacional; é o caso, por exemplo, da Embraer. A Apex, desde o Governo Temer, foi transferida do antigo Mdic, Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, para o Itamaraty. Num primeiro momento, junto com a Camex, e depois a Camex retornou acho que para o Ministério da Economia, e nós ficamos com a Apex.
A Apex, nesses dois primeiros anos do Governo Bolsonaro, praticamente os dois anos, foi chefiada pelo Almirante Segovia, que fez ali um excelente trabalho, e recentemente, por decisão do Presidente da República, foi substituído por um diplomata de carreira que tomará posse no dia 12 de maio. E a ideia é que seja um diplomata de carreira a novamente dirigir, ficar ali como Diretor-Presidente dessa agência, o que eu acho que é fundamental para não apenas abrir mercados aí fora, mas também para promover a indústria nacional. E o caso da Embraer é um caso realmente emblemático, porque envolve a ciência e a tecnologia, envolve a criação de empregos muito qualificados aqui no Brasil, envolve também a inserção do Brasil em cadeia de valor com países mais avançados que nós, no caso dos Estados Unidos, por exemplo, em que nós temos realmente muitos ganhos. Acho que a indicação de um diplomata de carreira para a Presidência da Apex dá justamente o sinal de que nós queremos dar realmente um viés mais técnico a essa área e com foco na promoção não apenas de produtos industriais, mas também do agro.
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Há um departamento do agronegócio no Itamaraty e eu pretendo também criar sinergia com isso, porque, quando a gente pensa num produto primário, no caso do Brasil, como eu disse, e quando o mundo compra alimentos do Brasil, na verdade, o Brasil está exportando tecnologia. Nesse sentido, nós temos a questão da informatização e da digitalização do agro e de fazer chegar a rede 5G também ao campo. Isso é fundamental para aprimorar, como V. Exa. sabe, os meios de produção. De modo que eu pretendo, sim, inserir a Apex, até porque ela tem uma liberdade administrativa muito maior do que o ministério - ela é uma entidade de direito privado - para poder atuar. Este ano, a Apex terá uma participação: ela vai gerir o Pavilhão Brasil na Expo Dubai, que deve acontecer em novembro deste ano, se Deus quiser, de forma presencial. De modo que vamos estar presentes, sim, e não apenas para, enfim, divulgar a Embraer, mas também outras empresas muito grandes.
Tenho tido contato também com o Presidente, Carlos Melles, do Sebrae. Recentemente, deu-me a honra de fazer uma visita o Presidente da CNI, Robson Andrade. De modo que o setor privado - quer dizer, a pequena e média empresa, mas também as grandes empresas, simbolizadas ali pela CNI ou agregadas à CNI - tem um contato com o Itamaraty. Todos os acordos internacionais que nós fazemos, Presidente, têm também foco o setor privado: de que maneira nós podemos estimular o setor privado para uma maior competitividade, de que maneira nós podemos ampliar o ganho de mercados para as nossas empresas brasileiras. Isso é uma preocupação. Posso garantir a V. Exa. e a quem nos ouve - hoje aqui é o Fernando Luiz, de São Paulo - que é uma preocupação presente na Casa do Rio Branco.
Sobre a questão de quebra de patentes, eu queria dizer que eu não tenho amor a nenhuma dessas posições aqui. O Embaixador Marcelo Dantas, que assessora a Comissão aqui, é economista e talvez ele se lembre das aulas no Instituto Rio Branco com o Ministro Raphael Valentino, que nos dava aula de relações econômicas internacionais. Ele era um diplomata muito espirituoso e contava uma piada, que hoje, se contada for, talvez a gente fosse... Não sei, porque ela tem um conteúdo, assim, um pouco machista. Sempre que ele era confrontado num fórum internacional e diziam: "Mas, olha, V. Exa. não defendeu uma posição diferente ontem? Como é que o senhor está defendo outra hoje?", ele dizia: "Olha, as nações realistas, os homens inteligentes e as mulheres bonitas têm sempre direito de mudar de opinião". Então, eu acho que nós temos sempre o direito de mudar de opinião, se isso for para defender os mais legítimos interesses do Brasil.
Nesse sentido, eu não acho que o Brasil esteja isolado, Presidente Kátia Abreu, porque nós tínhamos, como eu disse, três posições na OMC: a primeira, que era uma postura favorecida a países desenvolvidos, como os Estados Unidos, que era absolutamente contra a quebra de patentes; uma segunda postura, liderada pela Índia e África do Sul, que eu entendo não atendia aos legítimos interesses do Brasil, porque nós não temos condição ou um parque produtivo de vacinas ou medicamentos capaz de se beneficiar da quebra de patentes. Mas, ainda mais do que isso, é uma dificuldade achar que esse caminho permitiria uma ampliação da produção de vacinas e a superação dos gargalos logísticos. Eu acho que hoje este é o problema: como produzir vacina e como vencer o gargalo logístico.
Eu acho que nessa direção vai uma ponderação do Diretor-Geral da OMS, Dr. Tedros Adhanom, que disse que, se a pandemia ensinou algo para a gente - e há muitos, Presidente Kátia Abreu, que acham que esta é a primeira de muitas pandemias, infelizmente, que nós vamos sofrer -, uma das lições que nós temos que ter é justamente pulverizar a base geográfica de produção de vacinas, para que nós possamos ter produção de vacina na África, na Ásia, enfim, em todos os continentes, de maneira que amanhã, se formos confrontados com uma ameaça dessa, e permita Deus que não o sejamos, nós tenhamos condições globais de dar uma resposta, então, a resposta de cooperação. O Brasil, a postura do Governo brasileiro - de novo, que é do Executivo, tomada pelo Itamaraty, pelo Ministério da Saúde, pelo Ministério da Economia e o pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação - era uma proposta que nós estávamos aí na boa companhia do Canadá, do Chile e com o apoio da atual Diretora-Geral da OMC, que dizia o seguinte que não precisamos quebrar patente, porque o nosso problema é aplicar corretamente waivers que a legislação de Trips já permite e, dessa maneira, facilitar a produção local de vacinas contra o Covid e permitir um maior acesso às estas a partir dos países em desenvolvimento.
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Essa postura nova dos Estados Unidos e hoje acompanhada pela União Europeia... Por isso que eu digo que o meu discurso pode ser de ontem, mas a atualização vem a todo momento, porque, hoje cedo, os colegas da Embaixada da nossa missão em Genebra junto à OMC, Embaixador Alexandre Parola, já me pediu para informar: "Olha, a União Europeia adotou aqui a posição dos Estados Unidos". Ontem, quando nós recebemos a notícia de que os Estados Unidos mudavam a posição, eu já me apressei e pedi uma chamada. Entendo que a Embaixadora Katherine Tai vai poder manter amanhã, às seis da tarde, hora de Brasília, uma videoconferência comigo, e nós vamos poder aprofundar. Então, digo que a posição que o Executivo tem hoje nada impede que amanhã seja atualizada, se, nessa atualização, estiverem refletidos os mais legítimos interesses do Brasil.
Eu até me permitiria aqui fazer algumas considerações sobre essas implicações do anúncio da USTR em relação à moratória de Trips para a vacina contra a Covid-19. O anúncio feito ontem pela USTR sobre o apoio dos Estados Unidos a uma moratória da aplicação de Trips, circunscrita às vacinas contra a Covid-19 na OMC, não alterou a posição do Executivo brasileiro em relação ao PL 12, que, do nosso ponto de vista, conflita com os termos vigentes no Acordo de Trips. O anúncio do USTR - é importante, Presidente, que a gente tenha isso presente - e uma flexibilização da Índia e da África do Sul em relação à proposta de waiver, no nosso entender aqui do Itamaraty, nessa primeira avaliação, podem criar condições para um encaminhamento multilateral do tema na OMC. Penso que o encaminhamento multilateral nos favorece, a nós, Brasil. Trata-se de um encaminhamento que se dará em base diferente da proposta originalmente apresentada pela Índia e África do Sul, porque essa proposta original deles abarcava todo o escopo de bens, insumos e equipamentos para o combate à Covid-19. De modo que não é que os Estados Unidos e também a União Europeia estão embarcados nessa proposta da Índia e África do Sul. Na verdade, na primeira avaliação que nós pensamos, há também uma flexibilização da postura original desses dois países. Então, terá que se buscar na OMC um consenso, com escopo essencialmente aplicado às vacinas.
Nossa primeira avaliação: as negociações podem demorar algum tempo. Mesmo se houver o apoio dos Estados Unidos, da União Europeia e da OCDE, terá que haver uma flexibilidade por parte dos proponentes originais do waiver - Índia e África do Sul -, e um entendimento multilateral pode, então, vir a ser alcançado. É um entendimento que fortalece os esforços da nova Diretora-Geral da OMC, em prol de um mapeamento da capacidade ociosa para a produção de vacinas e um estímulo para que as empresas detentoras de patentes compartilhem a sua tecnologia e know-how. Isso é excelente! Se isso acontecer, é excelente! Agora, isso vai tomar tempo. Nós não imaginamos que isso possa ser para amanhã. Essas empresas detentoras de patentes poderão entrar em acordo para compartilhar tecnologia e know-how. Por que a posição brasileira, no primeiro momento, foi contra a quebra de patente? Porque, assim como V. Exa. bem aqui anotou, o mundo hoje procura produtos verdes, produtos criados de maneira sustentável, produzidos segundo as mais rígidas normas ambientais, e também o Brasil, para atração de investimento, não pode estar sujeito a riscos reputacionais, sanções, singularização negativa por parte de companhias detentoras de tecnologia, que podiam ficar assustadas com a quebra de patente e, talvez, impedir aí acordos futuros ou investimento em outras áreas de infraestrutura. De todo modo, a avaliação do Itamaraty é que, em qualquer cenário que ocorra, mesmo diante de um waiver multilateral, serão fundamentais os esforços de cooperação propostos pela terceira via, à qual nos ilhamos no primeiro momento, para efetiva produção de vacinas em países em desenvolvimento, de modo que o que eu procurarei aconselhar o Presidente da República, se ele assim quiser me ouvir, é que nós possamos adotar uma postura flexível e pragmática no que tange à negociação desse waiver, na busca de um consenso que beneficie a todos no combate à pandemia da Covid-19.
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Em relação à Sputnik V aqui, a Anvisa - sabe V. Exa., sabem os ouvintes aqui, os telespectadores da TV Senado - é uma agência reguladora e, portanto, independente. Ela conduziu uma inspeção à Rússia, teve o apoio do Itamaraty, da nossa Embaixada em Moscou, do nosso Embaixador Tovar Nunes, que fez um excelente trabalho na assistência lá ao Robson do Nascimento e também no apoio à missão da Anvisa. Ele, sabe V. Exa., em breve, será sabatinado aqui quando V. Exa. determinar e esta Casa puder. Ele vai ser o nosso Embaixador lá em Genebra, junto à OMS, OIT e outros tantos organismos, e vai desempenhar lá uma função fundamental também. Ele prestou apoio. Houve a missão, que colheu seus resultados, voltou para cá e soltou um parecer, um parecer negativo, no primeiro momento, de adoção da Sputnik V. Porém, eu entendo que há negociações. É claro que o lado russo disse, como V. Exa. bem falou: "Olha, já estou em 56 países, nossa vacina é segura, tem sido aplicada na Rússia, até o corpo diplomático sediado na Rússia foi vacinado com a Sputnik". Eu entendo que quem quis pôde se vacinar. Desconheço se há efeitos adversos. De todo modo, a competência é da entidade hoje presidida pelo Almirante Barra.
Eu tenho mantido com a Anvisa um contato bastante estreito. Praticamente toda semana nós mantemos um encontro. Futuramente, agora em breve, nas próximas duas semanas, vou visitar a Anvisa, vou conhecer o trabalho que lá se faz. Mas eu entendo que esse diálogo, a parte de uma certa irritação do lado russo em relação à possibilidade até de entrar com uma ação jurídica sobre essa decisão da Anvisa, é um diálogo que está ocorrendo na parte técnica e nós vamos chegar, estou seguro, a um bom porto.
A América do Sul e a América Latina, eu sou realmente da geração de diplomatas que acha que a América do Sul, mais até do que a América Latina, é o espaço por excelência de atuação do Brasil. A associação que tivemos com o Paraguai, em Itaipu, com a Argentina, no caso da Abacc, com a Bolívia, no caso do gasoduto Bolívia-Brasil, entre outras, a nossa presença na OTCA, tudo isso nos faz acreditar que são oportunidades para vencer possíveis rivalidades, que a cooperação se sobrepuja a essa aparente rivalidade ou diferenças, e todos saímos ganhando. Em relação a isso, por exemplo, na CAF agora vamos apoiar um nome colombiano para a Presidência da CAF, antiga Corporação Andina de Fomento, que agora se chama Banco da América do Sul. Na negociação que se fez aqui no apoio brasileiro a esse candidato colombiano, a ideia é que nós possamos ter cada vez mais diretores brasileiros nessas instituições multilaterais de crédito aqui na nossa região, que nós possamos influenciar na governança, modernizar a governança. Assim temos feito também em relação ao Mercosul, de propor uma flexibilização e avanço, que acho que é necessário, para que criemos também mais riqueza para o bloco. O Brasil e o Mercosul não podem ficar tão fechados. Tive outro dia um encontro breve, porém muito agradável, com o Embaixador da Argentina aqui. E ele dizia: "Olha, vocês não podem ficar fechados na proposta com o Uruguai. É preciso negociar". Eu falei: "E negociar não significa aceitar também a proposta da Argentina, significa negociar", como V. Exa. bem falou. Negociação exige que cada um saia da sua zona de conforto, que cada um busque o mesmo objetivo. Qual é? É avançar, é realmente modernizar. É o que nós precisamos aqui na América do Sul e na América Latina. Eu acho que o Brasil, seguramente, tem um grande papel a exercer nessa área. E eu não teria o menor problema em orientar, enfim, em aconselhar o Presidente Bolsonaro sempre que ele me pedir isso. Mas sinto já no Governo brasileiro, no Executivo muita disposição nesse sentido, como a candidatura do Dr. Rodrigo Mudrovitsch para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos. A ideia é de que, em organismos como o BID e agora o CAF, nós possamos ter um número crescente de funcionários brasileiros. Presidente, hoje, dentro dos organismos internacionais, a presença de nacionais brasileiros ainda é muito reduzida quando comparada a outros funcionários de outros países. É algo que nós podíamos trabalhar para que, realmente, possamos ter ali um maior entrosamento e, num maior entrosamento, trazer também um reflexo mais positivo para o nosso País.
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Não sei se respondi tudo que V. Exa. me pediu.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Obrigada, Chanceler.
Gostaria de apenas informá-lo de que nosso quórum hoje está concorrendo com outras duas audiências muito importantes: às 10h, a CPI e, também às 10h, o Colégio de Líderes. Esta Comissão recebe sempre uma audiência muito grande por parte dos colegas Senadores.
Eu fico muito feliz quando o senhor diz que o Brasil pode mudar de posição, sim, com relação à quebra de patentes. Mudar de posição é sempre um ato estratégico. Se for para o melhor, qual é o problema mudar de posição? Não estou mudando de princípios, de caráter, a minha ética. Estou mudando estrategicamente de acordo com o que o momento requer e exige. E eu gravei muito uma frase que o Diretor-Geral da OMS me falou numa reunião on-line que tivemos com ele. O Sr. Tedros Adhanom disse que, se não for o momento ideal para praticar o Artigo 30 do Acordo Trips, ele não sabe qual será o momento de usar esse Artigo 30, que é quebra de patentes, numa pandemia mundial, internacional, especialmente com alguns países sofrendo muito: os Estados Unidos, primeiro; depois, o Brasil; e agora também a Índia. Então, se não for este o momento, qual será?
E eu imagino que o Presidente foi também aconselhado, óbvio - eu sei como é funciona governo -, pelo Ministério da Economia. E os economistas precisam entender que não existe mercado sem gente. Nós precisamos primeiro salvar as vidas para depois garantir que o mercado funcione. Então, quanto a esse medo de que não teremos investimentos, não teremos a consideração do mundo, os investidores fabricantes não virão para o Brasil, não é hora de analisar isso, no meu entendimento. Eu sei que não foi o seu parecer, não foi a sua opinião, com certeza pode ter sido até vencida a sua opinião, mas eu quero declarar que acho que o Ministério da Economia cometeu um grave equívoco, se foi só esse ministério ou outros que orientaram o Presidente de que isso poderia ser um risco para o comércio brasileiro.
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Nós estamos praticando outras ações muito mais perigosas para o mercado brasileiro do que quebrar a patente e que não traz vacina para nós. Então, a quebra de patente das vacinas não iria prejudicar mercado nenhum, não estaríamos agredindo ninguém, apenas cumprindo o que determina um acordo em que somos signatários, quebra de patente num momento gravíssimo. Nós estamos alcançando já 500 mil mortos, fora a quantidade de pessoas doentes com a produtividade baixíssima, que não estão trabalhando, que não podem trabalhar, além da despesa excessiva que as famílias tiveram por conta da ausência das vacinas.
Mas eu quero, então, encerrar, Chanceler, agradecendo, mais uma vez, ao senhor e a todo o seu staff que está aqui presente, aos diplomatas e, fazer esse encerramento dizendo que a Comissão de Relações Exteriores estará sempre à disposição do MRE, para que nós possamos combinar as coisas de forma transparente, de forma ativa, para que nós possamos avançar. Nossa disposição é total em cooperar e criticar quando necessário for.
Cumprida a finalidade desta reunião, a Presidência declara encerrados os trabalhos e oportunamente, em conformidade com a decisão da Comissão Diretora, esta Presidência convocará a próxima reunião e dará ciência aos membros da CRE.
Muito obrigada a todos que estão nos seguindo, nos acompanhando no e-Cidadania, a todos os colegas Senadores, aos seus assessores. E quero agradecer, mais uma vez, à equipe da CRE, que já foi apresentada aqui, na audiência passada, com os militares comandantes e o Ministro da Defesa.
Muito obrigada à equipe toda que está nos apoiando também aqui no bunker do Senado Federal.
(Iniciada às 10 horas e 04 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 54 minutos.)