3ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA
55ª LEGISLATURA
Em 13 de março de 2017
(segunda-feira)
Às 11 horas
22ª SESSÃO
(Sessão Especial)

Oradores
Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Pedro Chaves. Bloco Moderador/PSC - MS) - Declaro aberta a sessão relativa à comemoração do centenário do poeta Manoel de Barros.
Sob a proteção de Deus, iniciamos nossos trabalhos.
A presente sessão especial destina-se a comemorar o centenário do poeta Manoel de Barros, nos termos do Requerimento nº 958, de 2016, da lavra deste Senador e de outros Senadores.
Farei agora, com muito prazer, a composição da Mesa.
Inicialmente, convidamos, com muito prazer, o Senador Waldemir Moka para participar da Mesa. (Pausa.)
O Senador Thieres Pinto. (Pausa.)
O Deputado Federal Izalci Lucas. (Pausa.)
A Presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), Srª Maria Inês Fini. (Pausa.)
O Vice-Presidente do Conselho Curador da Fundação Manoel de Barros, Sr. Marcos Henrique Marques. (Pausa.)
E representante do Ministro de Estado da Educação, Srª Regina de Assis. (Pausa.)
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Neste momento, eu convido a todos para, em posição de respeito, acompanharmos o Hino Nacional.
(Procede-se à execução do Hino Nacional.) (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Pedro Chaves. Bloco Moderador/PSC - MS) - Neste momento, com prazer, eu passo a Presidência dos trabalhos ao Senador Waldemir Moka, para eu fazer o meu pronunciamento.
(O Sr. Pedro Chaves deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pelo Sr. Waldemir Moka.)
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O SR. PRESIDENTE (Waldemir Moka. PMDB - MS) - Assumindo a Presidência, concedo a palavra ao Senador autor deste requerimento subscrito por vários outros Senadores, inclusive este que fala.
Com a palavra o Senador Pedro Chaves.
O SR. PEDRO CHAVES (Bloco Moderador/PSC - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Exmo Sr. Presidente, Senador Waldemir Moka, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, familiares do homenageado, amigas e amigos que participam desta sessão histórica.
Eu gostaria inicialmente de agradecer ao Presidente desta Casa, Senador Eunício Oliveira, por atender a nossa proposição para a realização desta sessão especial, em comemoração ao centenário de nascimento do poeta Manoel de Barros.
É uma honra ser um dos propositores desta homenagem que o Senado Federal faz a um dos mais importantes poetas do Brasil: Manoel Wenceslau Leite de Barros ou, simplesmente, Manoel de Barros, como ele gostava de ser chamado.
O poeta nasceu em Cuiabá, no dia 19 de novembro de 1916, mas, ainda criança, sua família se transferiu para Corumbá, cidade importante que hoje pertence a Mato Grosso do Sul, e, depois, mudou-se para uma fazenda no pantanal da Nhecolândia, onde o menino Manoel passou a ter contato com as criaturas que povoam sua poesia, como sapos, formigas, passarinhos, borboletas, aves, peixes, árvores, flores, a chuva, os rios e os povos pantaneiros.
Esse universo mágico, fantástico, que Manoel guardou na memória, foi muito bem retratado, anos mais tarde, na rica, plural e universal linguagem poética do nosso homenageado.
Manoel de Barros iniciou seus estudos no ambiente pantaneiro, em 1922, com o apoio da família. A alfabetização foi feita com uma tia que visitou a casa onde a família morava e que levou cartilhas, cadernos e lápis.
O garoto pantaneiro completou o primário (hoje ensino fundamental I) em 1928, num colégio interno de Campo Grande, atual capital de Mato Grosso do Sul.
Ainda em 1928, para aprofundar os estudos, Manoel de Barros pegou a Maria Fumaça na estação de Campo Grande e rumou em direção ao Rio de Janeiro, numa viagem de mais de três dias, para cursar o ginásio e o colegial (hoje ensino básico), em regime de internato, no tradicional Colégio São José, dos Irmãos Maristas, no Bairro da Tijuca,
O Rio de Janeiro era o centro político e cultural do Brasil. Os grandes nomes da literatura moravam na cidade ou a visitavam constantemente. As bibliotecas e livrarias ofertavam o que de mais precioso havia para Manoel na produção política e literária da década de 1930.
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Essa atmosfera nova e encantadora da então capital da República foi explorada com astúcia e competência por nosso poeta.
A produção de autores modernistas, como Raul Bopp, Mario de Andrade, Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Guimarães Rosa, e os escritos de Camões - poeta português -, inspirados no século XIV, se converteram na base importante e segura para que Manoel de Barros se tornasse poeta dos grandes e intelectual brilhante.
Em 1935, um ano depois de entrar para a faculdade de Direito, ainda muito jovem, no Rio de Janeiro, ele entrou para o Partido Comunista do Brasil (PCB), numa época marcada por forte repressão. Viu o manuscrito do seu primeiro livro, Nossa Senhora da Minha Escuridão, ser apreendido pela polícia política de Getúlio Vargas, em represália por ele ter pichado uma obra pública da Cidade Maravilhosa, com a frase "Viva o comunismo!"
Na década de 1940, Manoel de Barros já era poeta festejado nas rodas intelectuais do Rio de Janeiro. Seus livros Poemas concebidos sem pecado, lançado em 1937, e Face imóvel, de 1942, mostravam a força e a originalidade da sua poesia.
Ainda jovem, ele integrava a seleta turma dos poetas modernistas, que abriam novos horizontes para a poética nacional.
O jornalista Gustavo Vilela, na edição de 5 de novembro de 1942, do jornal O Globo, destacou que Manoel de Barros, então com 25 anos, já era um poeta modernista. A matéria também assinalava que alguns dos seus poemas tinham virtudes maiores, como a síntese.
Antes de sair do Brasil para conhecer a literatura e seus mestres em outros países, Manoel trabalhou como advogado do Sindicato dos Pescadores do Rio de Janeiro.
Provavelmente foi essa a forma que ele encontrou, como humanista, para colaborar com o processo de organização da classe trabalhadora e de voltar às suas raízes, quando convivia naturalmente com as comunidades ribeirinhas do Pantanal.
O poeta e sua poesia ganhavam asas e voaram para conquistar o mundo. Tanto que, entre 1943 e 1945, ele esteve em Nova Iorque, Paris, Roma, Lisboa e em algumas metrópoles da América Latina, onde se desenvolvia cultura de primeira grandeza.
Nesse périplo, em busca de cultura universal, visitou museus, estudou cinema e pintura e conheceu de perto a produção de autores consagrados, como Picasso, Fellini, García Lorca, Thomas Stearns, Ezra Pound, Stephen Spender e outros não menos importantes, que escolheram a literatura e as artes para falar das suas angústias e de todos os seus sonhos.
Em 1947, no Rio de Janeiro, escolheu Stela dos Santos Cruz para ser sua esposa e companheira por toda a vida. Com ela teve três filhos: Pedro, Martha e João Leite de Barros.
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Na década seguinte, depois de ter lançado o livro Poesias, Manoel voltou a dividir seu tempo entre a fazenda no Pantanal e o Rio de Janeiro.
Nas idas e vindas do Pantanal ao Rio de Janeiro, lançou, em 1961, uma de suas obras mais famosas, Compêndio para Uso dos Pássaros, que conquistou o Prêmio Orlando Dantas, do Diário de Notícias do Rio de Janeiro.
Oito anos depois, em 1969, ele presenteia seus leitores e leitoras com a obra Gramática Expositiva do Chão. O livro conquistou o Prêmio de Poesia de Brasília e o Prêmio da Fundação Cultural do Distrito Federal.
Nessa época, eu morava no Rio de Janeiro, no final da década de 60, e ficava orgulhoso com o sucesso editorial - porque Manoel escrevia em diversos jornais - e de crítica do meu conterrâneo, que falava do Pantanal com leveza, clareza e simplicidade.
Na década de 70, em Campo Grande, tive o prazer de conhecê-lo pessoalmente. Falamos do Rio de Janeiro, de Campo Grande, de poesia, política, educação, de música e das belezas naturais e culturais do nosso rico e frágil bioma Pantanal.
Aos poucos, selamos uma amizade sincera e profunda. Sempre que podia, eu me dirigia a sua casa para beber da sua sabedoria. Ele gostava de falar que sua matéria era a palavra...
(Soa a campainha.)
O SR. PEDRO CHAVES (Bloco Moderador/PSC - MS) - ... não era a paisagem, nem a ecologia. Seu universo era o de "desencantar as palavras".
Certa feita, ele falou sobre a força das manifestações artísticas. Disse: "Conheça o mundo, leia os grandes poetas, os grandes escritores, nunca passe correndo por uma obra de arte. Você só poderá ser grande se conhecer os grandes."
Manoel era um homem cosmopolita. Sabia de tudo e tinha uma cabeça privilegiada que encantava a todos. Era talento e simplicidade, uma coisa rara de se ver em um só homem.
Fiquei muito feliz em ver a poesia de Manoel de Barros conquistar novos e importantes espaços, com o apoio de intelectuais e admiradores como Millôr Fernandes, Fausto Wolff, Antônio Houaiss, José Mindlin, Siron Franco, e outros nomes da literatura nacional e internacional, que não mediram esforços para divulgar a sua genialidade.
Eu me considero suspeito para falar sobre a brilhante carreira do nosso homenageado. Sou admirador da sua obra e de sua personalidade. Tanto que, em 1998, pouco tempo depois de ter fundado a Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal, a Uniderp, decidi criar a Fundação Manoel de Barros, para fomentar a pesquisa e a extensão. E Manoel estava presente nessa inauguração, juntamente com sua esposa. Essa fundação se dedicava especialmente à pesquisa do Pantanal, lugar que o poeta amava e cantava nos seus lindos versos imortais.
Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Senadores, familiares do nosso homenageado, amigos e amigas que participam desta solenidade, quando Manoel partiu, no dia 13 de novembro de 2014, deixou um imenso legado, um manancial de palavras só comparável à biodiversidade do Pantanal.
A produção de 28 livros publicados - fora aquele levado pela polícia política, em sua juventude - mostra muito bem o poder criativo e a capacidade de trabalho do nosso poeta.
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O grande brasileiro Carlos Drummond de Andrade, de Itabira, em uma definição magistral, assinalou que Manoel de Barros era mesmo eterno. Drummond disse que a eternidade de Manoel vem desse tempo sem tempo de sua poesia; dessa geografia sem mapa, que nos orienta por regatos e percursos os mais escondidos nos desvãos da memória: matéria de poesia.
Manoel de Barros recebeu duas vezes o Prêmio Jabuti, duas vezes o Prêmio Nestlé e também foi premiado pela Biblioteca Nacional e pela Associação Paulista de Críticos de Arte.
Creio que, em sua modéstia, Manoel de Barros iria ficar extremamente feliz com essa homenagem, mas manteria sua serenidade. Como homem simples e culto, ele também tinha a capacidade de acolher todas as manifestações com imensa alegria, sabia celebrar a vida, embora tivesse discreta dificuldade para se manifestar publicamente. Ficava sempre realmente no anonimato quando ele podia. Não que ele fosse avesso a palavras de reconhecimento de seu talento e de sua obra, é que para ele o maior reconhecimento vinha daquelas pessoas anônimas, nas milhares de correspondências que recebia.
Para ilustrar minha fala, quero dividir com os presentes este belo verso, do meu amigo Manoel, que ressalta muito bem a sua força poética. Dizia Manoel:
Venho de nobres que empobreceram.
Restou-me por fortuna a soberbia.
Com esta doença de grandezas:
Hei de monumentar os insetos!
(Cristo monumentou a Humildade
quando beijou os pés dos seus
discípulos)
São Francisco monumentou as aves;
Vieira, os peixes;
Shakespeare, o Amor;
A Dúvida, os tolos.
Charles Chaplin monumentou os vagabundos.
E eu, com esta mania de grandeza:
Hei de monumentar as pobres coisas do chão molhadas de orvalho.
Por tudo isso, Srªs e Srs. Senadores, convidados, parentes, como parte das comemorações do centenário de nascimento de Manoel de Barros, fizemos essa importante homenagem, que, sem dúvida, ficará registrada nos Anais desta Casa de leis, que é o Senado Federal, a Casa de todos os Estados brasileiros.
Por último, quero dizer, com muito orgulho e profunda admiração, que o poeta Manoel de Barros foi um dos grandes nomes da poética nacional e internacional. A força da sua poesia ultrapassou todas as fronteiras. Manoel virou um artista do mundo. Seu legado, para nossa imensa alegria, se tornou instrumento de reflexão para todos aqueles e aquelas que sonham com a construção de um mundo mais culto, mais justo, plural e fraterno.
Era o que tinha a dizer.
Muito obrigado. (Palmas.)
(O Sr. Waldemir Moka deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pelo Sr. Pedro Chaves.)
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O SR. PRESIDENTE (Pedro Chaves. Bloco Moderador/PSC - MS) - Retomando aqui a Presidência do Senado, eu gostaria de enumerar algumas autoridades presentes: Corregedor-Geral de Justiça do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, Desembargador Romero Lopes, é muita alegria minha que estejam presentes nesta homenagem; Reitora do Centro Universitário Iesb, Drª Eda Coutinho; Tenente-Coronel de Artilharia do Exército, Sr. Diego Simões dos Reis da Costa; Vereadores do Município de Campo Grande, Sr. Betinho e Sr. Vinicius Siqueira; Diretor Executivo da Rede Salesiana Brasil, meu querido amigo, Reverendo Sr. José Marinoni; Diretor de Relações Institucionais do Grupo Marista, Sr. Ednilson Guioti - todos são meus grandes amigos e, certamente, amigos de Manoel de Barros -; Diretora Executiva do Instituto Moinho Cultural, Srª Márcia Rolon; 1º Secretário da Associação Comercial e Industrial de Campo Grande, Sr. Roberto Oshiro; Gerente Regional do Centro-Oeste do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea), Sr. Jary de Carvalho e Castro; artista intérprete da música O Menino e o Rio, de sua autoria em parceria com Manoel de Barros, Sr. Márcio Rogério Pereira de Camillo; poeta Sr. Antonio Miranda; e demais autoridades aqui presentes.
Concedo, agora, a palavra, com muito prazer, ao Senador Waldemir Moka.
O SR. WALDEMIR MOKA (PMDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente da Mesa e requerente da presente sessão de comemoração, ilustre Senador Pedro Chaves; Sr. Senador Thieres Pinto; Sr. Deputado Federal lzalci Lucas; Presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas, Srª Maria Inês Fini; Vice-Presidente do Conselho Curador da Fundação Manoel de Barros, Sr. Marcos Henrique Marques; representando o Ministro de Estado da Educação, Srª Regina de Assis; eu quero, inicialmente, dirigir-me aos familiares do poeta Manoel de Barros e dizer da minha alegria em estar na tribuna. Não da alegria de comemorar o centenário, mas da alegria de poder, através do requerimento do Senador Pedro Chaves, prestar, ainda que singela, essa homenagem a uns... Eu tenho dificuldade com os cuiabanos para isso, porque Manoel de Barros só nasceu em Cuiabá, e logo em seguida já mudou para Corumbá e ficou lá. Então, eu tenho certa dificuldade, Marinoni.
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A verdade é que Manoel de Barros nasceu - como Manoel Wenceslau Leite de Barros, mas gostava de ser chamado, como já disse, Pedro Chaves, de Manoel de Barros, em Cuiabá - em Mato Grosso, no dia 19 de dezembro de 1916, e morreu aos 97 anos, em 13 de novembro de 2014.
Pode-se dizer que Manoel de Barros foi o poeta que retratou com maior fidelidade a vida no Pantanal, tanto em relação ao homem pantaneiro quanto à fauna, à flora e à região. Importante deixar claro, no entanto, que Manoel não era poeta pantaneiro; ele era do mundo, embora suas obras tenham demorado a chegar, digamos, às pessoas. Manoel de Barros foi reconhecido, vamos dizer, no Brasil e no mundo, nas últimas duas décadas. Embora um grande poeta, ele demorou a ser reconhecido como tal.
Manoel nasceu e cresceu em pleno Pantanal. Ainda criança, sua família mudou-se para Corumbá - tanto que, em Campo Grande, o chamam de corumbaense -, a nossa cidade branca, hoje Município localizado em Mato Grosso do Sul. Apelidado - confidenciou-me um amigo que conviveu com ele - de Neguinho pela família, a criança passou sua infância sentindo a textura da terra nos pés, brincando e correndo entre personagens que definiriam sua obra, os currais e os objetos que chamavam a atenção do futuro escritor.
Sua formação escolar começou... E, na verdade, ele se mudou para Campo Grande, diz sua biografia, aos 13 anos. Então, nós podemos dizer que, embora tenha começado o ensino fundamental ainda em Corumbá, ele concluiu em Campo Grande, a capital do meu Mato Grosso do Sul, o hoje chamado ensino fundamental, que, na minha época e na de Pedro Chaves, era o ginásio. Na verdade, ele morou muito tempo em Campo Grande mesmo, seguindo logo depois para o Rio de Janeiro. Essa situação, em princípio, desagradou o menino, acostumado a acordar com o canto dos pássaros de que tanto gostava.
Sem a natureza ao seu redor e para diminuir a saudade da família, o menino mergulhou nos livros. Foi aí que ele teve o primeiro contato com os livros do Padre Antônio Vieira, ao mesmo tempo em que descobriu que não precisava assumir nenhuma responsabilidade com a prática da verdade na literatura, e, sim, com a verossimilhança. Enquanto tomava conhecimento das disciplinas do ensino primário e ginasial, como Língua Portuguesa e Matemática, Manoel de Barros não dispensava a leitura de autores famosos.
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Com memória aguçada, atento aos detalhes e às nuances da natureza, escreveu seu primeiro poema aos 19 anos, a partir do qual não parou mais. Embora calado, de voz mansa e muito retraído, o escritor teve sua fase de militância política. Por volta de 1935, engajou-se no Partido Comunista.
No entanto, o jovem Manoel de Barros abandonou o Partido por se sentir profundamente desapontado com Luís Carlos Prestes. Manoel entendia que Prestes não deveria dar as mãos a Getúlio Vargas, até então algoz dos membros do Partido Comunista. Para não ser preso, o escritor decide voltar para casa, ou seja, a fazenda da família no Pantanal.
A literatura, evidentemente, agradeceu muito. Manoel passou um período na Bolívia e no Peru, depois partiu para Nova York, onde residiu por um ano, estudando cinema e pintura, povoando, assim, sua poesia com as imagens mais ricas e distintas.
Ao retornar para o Brasil, o poeta conhece Stella, sua futura esposa. Com ela, teve três filhos, Pedro, João e Marta, e sete netos.
Após muitas aventuras, ele volta ao Rio de Janeiro para fazer Direito, geralmente o curso frequentado pelos amantes da literatura naquela época. Em 1949, aos 33 anos, formou-se em Direito, retornando para Corumbá, onde herda a fazenda que era do seu pai.
Tive a oportunidade de conversar com amigos do poeta, como o jornalista, professor e documentarista Cândido Alberto Fonseca, que, como ele mesmo diz, teve o privilégio de entrevistar Manoel algumas vezes. Segundo Cândido, Manoel de Barros era um homem simples, arredio à entrevista e fugia das câmeras como o diabo foge da cruz. A conversa andava bem, até o holofote da câmera ser ligado.
(Soa a campainha.)
O SR. WALDEMIR MOKA (PMDB - MS) - Uma das lutas de Manoel de Barros era pelos direitos autorais, dos quais não abria mão. Como era pouco conhecido, o que era seu de fato e de direito não chegava até ele, disse-me o documentarista. Cândido contou que o poeta mato-grossense e sul-mato-grossense só começou a receber parte dos seus direitos quando passou a ganhar prêmios de entidades conhecidas do mundo literário.
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Pouco conhecido pelo público, Manoel, no entanto, tinha muitos admiradores entre os próprios escritores. O primeiro a elogiar o trabalho de Manoel de Barros foi Antonio Houaiss, um dos maiores críticos literários do País, morto em 1999.
A primeira obra nasceu no Rio de Janeiro e lá despertou para o público, há mais de 60 anos, e foi batizada de Poemas concebidos sem pecado, lançada em pequena tiragem com a ajuda de um grupo de amigos. Depois vieram muitos outros livros.
O poeta ganhou prêmios importantes, como o Prêmio Orlando Dantas, em 1960, dado pela Academia Brasileira de Letras, pelo livro Compêndio para uso dos pássaros. Sua obra posterior, Gramática expositiva do chão, foi contemplada com o prêmio da Fundação Cultural do Distrito Federal, enquanto Livro sobre nada ganhou outra honraria, desta vez de contexto nacional.
Apesar de ser pouco popular comparado a poetas pós-modernistas, como Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto e Ferreira Gullar, por exemplo, as obras de Manoel de Barros invadiram livrarias do mundo todo.
Manoel de Barros, a quem Carlos Drummond de Andrade qualificou de o "poeta maior" do Brasil, morreu em 13 de novembro de 2014, em Campo Grande, onde residia há décadas, de onde saía somente para sua fazenda no Pantanal.
Concluo essa simples homenagem citando frase do próprio Manoel de Barros que demonstrava a sua paixão pelas coisas simples da vida, abro aspas:
Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
das tartarugas mais que a dos mísseis.
Tenho em mim um atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos.
Tenho abundância de ser feliz por isso.
Meu quintal é maior do que o mundo.
Fecho aspas.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Pedro Chaves. Bloco Moderador/PSC - MS) - Eu gostaria de agradecer a presença do Senador Garibaldi Alves; do Tenente-Coronel Diego, neste ato representando o Exmo Sr. General do Exército Juarez; da Fernanda Araújo, representante da Federação das Fundações do Estado de Mato Grosso do Sul.
Passo a palavra agora ao nosso querido amigo Izalci, Deputado Federal, pelo Distrito Federal.
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O SR. IZALCI LUCAS (PSDB - DF) - Cumprimento o nosso Presidente e também requerente da presente sessão comemorativa, o Sr. Senador Pedro Chaves. Cumprimento também o Senador Waldemir Moka e o Senador Thieres Pinto; a nossa Presidente do Inep, a Srª Maria Inez Fini; o Vice-Presidente do Conselho Curador da Fundação Manoel de Barros, o Sr. Marcos Henrique Marques; e, representando aqui o nosso Ministro da Educação, a Srª Regina de Assis. Cumprimento também o Senador Garibaldi e demais convidados.
O poeta mato-grossense Manoel de Barros completaria cem anos em 19 de dezembro do ano passado, e esta homenagem que o nobre Senador Pedro Chaves faz aqui, no Plenário do Senado Federal, demonstra a importância desse grande mestre das letras.
A poesia de Manoel de Barros é a poesia do menino do mato, crescido em fazenda e com o olhar para a natureza que o envolvia. Mas Manoel viajou, andou pela Europa, viveu em metrópoles como Rio de Janeiro e Nova York, voltou para a terra e viveu no Pantanal por quase dez anos, trabalhando na formação de sua fazenda.
Segundo o crítico e ensaísta Ítalo Moriconi, a poesia de Manoel de Barros é uma poesia aferrada à terra, ao chão, ao corpo. Quando voa, é o voo de animal passarinho. Creio que seja por isso que Manoel de Barros encanta tanto a juventude com a sua poesia.
Sr. Senador Pedro Chaves, parabenizo V. Exª pela brilhante iniciativa em homenagear esse grande poeta, que descobri somente há pouco tempo, há muito pouco tempo, e me surpreendi com a força e a beleza de seus versos. Não conheço a sua obra, apenas alguns poemas que tive a sorte e alegria de ler. Dentre estes, há um de que gosto muito: "O menino que carregava água na peneira", que diz assim:
Tenho um livro sobre águas e meninos.
Gostei mais de um menino
que carregava água na peneira.
A mãe disse que carregar água na peneira
era o mesmo que roubar um vento e
sair correndo com ele para mostrar aos irmãos.
A mãe disse que era o mesmo
que catar espinhos na água.
O mesmo que criar peixes no bolso.
O menino era ligado em despropósitos.
Quis montar os alicerces
de uma casa sobre orvalhos.
A mãe reparou que o menino
gostava mais do vazio, do que do cheio.
Falava que vazios são maiores e até infinitos.
Com o tempo aquele menino
que era cismado e esquisito,
porque gostava de carregar água na peneira.
Com o tempo descobriu que
escrever seria o mesmo
que carregar água na peneira.
No escrever o menino viu
que era capaz de ser noviça,
monge ou mendigo ao mesmo tempo.
O menino aprendeu a usar as palavras.
Viu que podia fazer peraltagens com as palavras.
E começou a fazer peraltagens.
Foi capaz de interromper o voo de um pássaro botando ponto final na frase.
Foi capaz de modificar a tarde botando uma chuva nela.
O menino fazia prodígios.
Até fez uma pedra dar flor.
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A mãe reparava o menino com ternura.
A mãe falou: Meu filho você vai ser poeta!
Você vai carregar água na peneira a vida toda.
Você vai encher vazios
com as suas peraltagens,
e algumas pessoas vão te amar nos seus despropósitos!
Parabéns, Senador Pedro Chaves, pela homenagem a esse grande poeta.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Pedro Chaves. Bloco Moderador/PSC - MS) - É com grande prazer que convido o Senador Garibaldi Alves Filho para fazer uso da palavra.
O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - Sr. Presidente, eu gostaria de fazer um pedido a V. Exª: deixe-me por último, na minha constatação evangélica de que os últimos serão os primeiros. Isso pode ser uma pretensão.
O SR. PRESIDENTE (Pedro Chaves. Bloco Moderador/PSC - MS) - Com muito prazer, eu convido o Senador educador aqui do nosso Congresso, do nosso Senado, Cristovam Buarque, para fazer uso da palavra. S. Exª esteve presente com Manoel de Barros em Campo Grande, e foi um momento muito raro e muito sublime.
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Bom dia a cada um e a cada uma.
Eu quero, primeiro, agradecer ao amigo Senador Pedro Chaves pelo fato de V. Exª ter tomado a iniciativa de fazer uma homenagem a um poeta. Aqui, Senador Moka, a gente faz muita homenagem a políticos, militares, cientistas e até escritores em geral, mas a poeta é muito raro. E o poeta é quem faz a maneira como a gente, de fato, vê o mundo. Imaginem, sem Castro Alves, como teria sido o Brasil não apenas para perceber a escravidão mas, sim, para sentir indignação moral com aquilo.
É o poeta que faz a cabeça do povo. No caso do Brasil, têm sido mais os poetas ligados à música. Nós pensamos como Chico Buarque, como Caetano Veloso, Gilberto Gil e todos os outros, mas Manoel de Barros traz para nós uma maneira de ver a natureza diferente daquela que é vista em geral. Graças a Manoel de Barros, a gente ouve a natureza, ela fala com a gente. Hoje mesmo, abri um livro e estava lá: "Hoje, eu me sinto como se fosse uma árvore". É preciso muita poesia para alguém ter esse sentimento e escrever isso. E o resto da poesia é melhor ainda, mas não é hora de ler aqui.
Foi graças e ele que descobrimos a personalidade das rãs, dos sapos, dos grilos, das formigas. A gente ouve a natureza quando lê Manoel de Barros. Por isso, meu primeiro agradecimento ao Senador Pedro, por ter organizado esta solenidade. Mas tenho um segundo: ele me apresentou Manoel de Barros. E me apresentou provocando um fato que só com um poeta, acho, poderia ter acontecido.
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Eu fui fazer uma palestra na Universidade do Senador, ainda não Senador Pedro, e eu disse que queria uma coisa: visitar o poeta. E foi-me dito, não me lembro se pelo próprio Senador ou por alguém, que ele estava muito abatido, porque tinha perdido um filho num acidente aéreo - não era um homem jovem, tanto que isso deve fazer uns cinco, seis anos, e já estamos no centenário -, e que ele estava muito amargurado e exigente, que era preciso chegar às 7h da manhã para poder falar com ele, e não levasse fotógrafos nem muita gente.
Nós chegamos às 6h50 e ficamos na calçada esperando que dessem 7h. Quando deu 7h, tocamos a campainha. Veio uma senhora muito simpática - eu adoraria ter anotado o nome dela para fazer uma referência aqui - que se surpreendeu com a minha presença e disse que estava muito contente de me ver ali, e pediu para entrar.
Entramos, ela nos trouxe pão de queijo, conversamos, o tempo passou, e eu tive a sensação de que não estava na casa do poeta. E não estava, erramos a casa. (Risos.)
E quando se descobriu e afirmamos para ela que não estávamos fazendo uma visita a ela e, sim, procurando Manoel de Barros, ela disse: "É muito interessante, é que ele mora nesse mesmo número, mas na rua de trás". E aí fomos.
Aí, veio a surpresa: ele veio ao portão com um sorriso enorme nos lábios, nos recebeu, conversou tanto que quase eu perco o avião. Não deu tempo nem de ir àquele árabe que eu gosto de ir quando eu vou lá para comer pastel. Como é o nome?
O SR. PRESIDENTE (Pedro Chaves. Bloco Moderador/PSC - MS) - Thomaz.
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - É, Thomaz.
E conversamos muito, Moka, com ele. E nos contou a história dele, o tempo que viveu fora do Pantanal, a volta para o Pantanal. Falou de tudo. Não falou das poesias. Poeta não fala das próprias poesias, quer que os outros leiam.
E eu quero dizer que aqui estamos nós com uma pessoa que não morre, porque poeta não morre. Há muitos desconhecidos. Há muitos que a gente não toma conhecimento, como tomou conhecimento dele. Eu coloco como uma das boas coisas que eu tive, de pessoas que eu conheci, esse encontro com Manoel de Barros, de quem eu conhecia muito a poesia, e agradeço muito o Senador Pedro, meu colega, meu amigo, por esta solenidade, por aquele encontro, também pela palestra, pelo jantar na sua casa naquele dia, mas, sobretudo, pela possibilidade de conhecer aquele homem frágil no corpo, simples e com aquele coração, aquela cabeça que deixa o Brasil inteiro orgulhoso de ele ter passado por aqui, feito suas poesias e partido, mas não falecido do ponto de vista de morrer, tanto que estamos aqui lembrando dele com aquele sorriso maravilhoso.
É diferente ler uma poesia de um poeta antes e depois de conhecê-lo. E depois que eu o conheci, as poesias dele adquiriram um sabor ainda maior. Eu não digo valor, o valor é fruto de uma análise, ficou igual, porque era alto, mas o sabor, deu um sabor diferente. E deu um sabor também a essa história.
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Como muitos dizem, às vezes até as coisas erradas são boas quando nos deixam a possibilidade de contá-las. Eu tenho um amigo que diz - eu não recomendo a ninguém - que ele não teria o menor problema de, numa viagem por aí, ser assaltado, porque ganharia uma boa história para contar. Pois bem, nós temos essa boa história e as maravilhosas poesias desse grande poeta.
O Brasil, hoje, fala tanto que não tem políticos, que não tem isso, que não tem aquilo, que não tem lideranças. Mas hoje é um tempo em que nós não temos "o poeta". Todo povo tem um poeta, em algum momento, que encarna a poesia, como tivemos Drummond, por exemplo. Está faltando, hoje, esse poeta - dos vivos, eu falo. O Manoel talvez tenha sido o último deles - embora Ferreira Gullar eu coloque também nessa dimensão -, aquele poeta que a gente cita as coisas dele por aí. Como cita que "hoje eu acordei como se fosse árvore".
Então, esse tipo de poeta que marca, Ferreira Gullar marcou a minha geração - e o Moka, mais moço, um pouco, mas deve lembrar - com aquela famosa... Com aquelas ideias dele sobre o regime militar: aquela sensação de que, acontecesse o que acontecesse, a gente estava vivo e iria continuar lutando.
Manoel passa a ideia de que o Pantanal tem uma vida diferente do resto. E essa vida não é só de gente: é de pessoas, mas é de animais, da água, e que nos faz sentir orgulho, como brasileiros, de termos um Pantanal.
Finalmente, para concluir, falei aqui de cientistas e vou falar de um detalhe que tem a ver com Manoel de Barros e com um grande matemático, um matemático alemão que viveu na França e que tem um nome muito complicado - não vou nem tentar lembrar. Ele disse que, quando era pequeno, judeu, não pôde estudar e foi à escola aos 15 anos. E, aí, o professor mandou ele fazer a dedução do Teorema de Pitágoras. Ele não fez de uma só forma, ele fez de três maneiras diferentes, e o professor não aceitou porque não era a maneira que o professor queria e conhecia. Ele morreu na mesma semana de Manoel de Barros.
(Soa a campainha.)
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - E, na mesma semana em que vi da morte dele, eu li do Manoel de Barros uma referência a uma fala dele que mostra como... E nós aqui somos da área da educação e eu não consigo falar sem falar em educação, e por isso é que eu estou citando isto: Manoel de Barros conta que, quando era menino, foi à escola, ensinaram a ele, na aula de geografia, o que era um rio; ele aí descobriu que aquilo, quando ele era pequeno, ao redor da casa dele, que passava rodeando, não era uma cobra de vidro, era um rio.
Um poeta e um matemático quase perdem a criatividade por causa da escola. A escola negou a um a criatividade de descobrir o Teorema de Pitágoras...
(Soa a campainha.)
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - ... com uma dedução diferente - ele podia ter se inibido a partir daí -; e a Manoel de Barros, que foi salvo apesar da geografia, porque a geografia, nominando como "rio" algo que ele imaginava como uma cobra de vidro, quase mata a criatividade dele. Ele se salvou. O matemático se salvou; ele se salvou como grande matemático. É preciso que a escola seja o caminho da gente, mas que ela não tolha a liberdade de sonhar e de pensar, como fazem os poetas.
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Manoel de Barros é não apenas um grande poeta, mas um sobrevivente da escola. A escola não conseguiu fazer o que faz hoje com milhões de meninos e meninas: tolher o sentimento poético que as crianças carregam dentro de si. E é por isso que tanto Picasso como Manoel de Barros gostavam tanto de falar fazendo poesia, como se fossem crianças - o outro, pintando, e ele, escrevendo. Manoel de Barros é um exemplo de como a criatividade resiste mesmo às escolas que não permitem a criatividade. E nos deu essas maravilhas que, quando a gente as lê, não sabe de onde saíram, que nada têm a ver com a lógica, mas têm a ver com isso que brota de dentro de um poeta, que é o sentimento do mundo e o sentimento de dizer as coisas de maneira bonita.
Parabéns, Senador! Parabéns, Mato Grosso do Sul! Parabéns para o Brasil pelo grande nome que tem, vivo, com suas poesias - Manoel de Barros. (Palmas.)
O Sr. Waldemir Moka (PMDB - MS) - Manoel de Barros é do Mato Grosso. Na verdade, ele nasceu quando o Estado era uno - Mato Grosso. Então, não precisamos brigar por isso.
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Eu prefiro dizer que ele é brasileiro, ser humano - mas vivia, no final, no Mato Grosso do Sul. E a homenagem é do Senador Pedro, que representa esse belo Estado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Pedro Chaves. Bloco Moderador/PSC - MS) - Convido o Senador Cristovam para fazer parte da Mesa.
Depois dessas belas palavras do nosso querido Senador Cristovam Buarque, eu queria agradecer a todas as autoridades presentes não nominadas, e agradecer também a presença de todos os acadêmicos do Iesb e demais professores que estão aqui juntamente com os familiares.
Passo a palavra agora ao nobre Senador Garibaldi Alves Filho.
O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Eminente Senador Pedro Chaves, eu gostaria de fazer um pedido à Mesa: que ela me enviasse o nome das pessoas que estão nos honrando com a sua presença na direção dos trabalhos.
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Eu cumprimentaria o meu colega, o Senador Waldemir Moka. Cumprimento o Sr. Senador Thieres Pinto, cumprimento o Deputado Federal Izalci Lucas - estou de acordo com o cerimonial. Cumprimento a Presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, a Srª Maria Inês Fini; cumprimento o Vice-Presidente do Conselho Curador da Fundação Manoel de Barros, o Sr. Marcos Henrique Marques; cumprimento a representante do Ministro de Estado da Educação, a Srª Regina de Assis.
Eu gostaria de dizer, Sr. Presidente, Senador Pedro Chaves, que me associo inteiramente à iniciativa de V. Exª e pediria desculpas ao Senador Waldemir Moka e ao Senador Cristovam Buarque pela intimidade que eles demonstraram com a obra do nosso homenageado, o poeta Manoel de Barros.
Eu confesso a minha ousadia, porque não tive o privilégio de estar com ele, de conhecer, até mesmo, melhor a sua obra. E, antes que me perguntem o que eu estou fazendo aqui, eu diria aos senhores e às senhoras que fui movido aqui por um dever de homenagear um poeta, num momento dos dias correntes em que até parece paradoxal, parece até fantasioso imaginar que a arte da poesia ainda se afiguraria como modelo superior de representação da alma humana. Por que eu digo isso, Sr. Presidente?
Afinal de contas, o canto dos poetas parece converter-se paulatinamente em assobios ralos, longe do toque mágico que outrora provocava nos corações de homens e mulheres aqui e no mundo inteiro. Na era atual - e eu não sou muito familiarizado com isso -, na era atual dos tuítes, a arte digital em profusão nos leva a que não sobre mais tempo para uma apreciação mais detida sobre a composição de uma construção poética. Com franqueza, isso é lamentável. Isso é uma pena. Não é nostalgia; pode até parecer, pelos cabelos brancos que eu ostento, mas, mesmo assim, ainda em dias recentes - e foi isso que me trouxe à tribuna -, quando surge um expoente do calibre do notável Manoel de Barros, isso desaparece. Isso muda, Senador Waldemir Moka.
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Na verdade, a impressão que se tem é de que a poesia, de tempos em tempos, ressurge das cinzas e desponta novamente como uma arte nobre e renovadora do espírito criativo. Posso estar sendo até pessimista, mas creio que estou sendo realista.
Ao longo do seu excepcional trabalho artístico, o mato-grossense Manoel de Barros demonstrou tanta suavidade estilística quanto alto rigor linguístico.
A senhora vai me permitir, mas eu pedi uma pesquisa à consultoria do Senado, e os consultores são, às vezes, segmentados e têm a oportunidade de conhecer várias obras. É por isso que estou dizendo que, atravessando uma vida - hoje, comemoramos o seu centenário -, Manoel de Barros jamais abriu mão de suas conexões telúricas com a lavoura, com o cheiro e as coisas da terra. Isso já foi dito aqui magistralmente, muito melhor, pelo Senador Pedro Chaves, pelo Senador Waldemir Moka, por Cristovam Buarque. É sempre muito difícil falar depois de Cristovam Buarque! Falar depois do Senador Cristovam Buarque, sim, é muito difícil!
Não é por acaso que assim se definiu, certa vez, e em um curto poema:
A maior riqueza do homem é a sua incompletude.
Nesse ponto sou abastado.
Palavras que me aceitam como sou - eu não aceito.
Simplicidade formal e orgânica combinada, nesse poeta, com a complexa filosofia existencial: eis o segredo de seu imbatível sucesso literário.
Sr. Presidente, senhoras e senhores convidados que aqui vieram, revistas internacionais dão conta de que o ser humano tem uma apreciação inconsciente de obras poéticas, e o fenômeno estaria ligado a aspectos da construção do texto, como a rima e o ritmo. Em suma, a poesia, tão popularmente cantada e exaltada até há bem pouco tempo, parece embutida, como se fosse uma intuição profunda. À luz dessas considerações, Manoel de Barros merecidamente deveria ter ocupado lugar de destaque no panteão das letras portuguesas e brasileiras.
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Na correspondência atual, uma cadeira na Academia Brasileira de Letras teria sido de ideal tamanho. Com certeza, eu, que não tenho - e confesso novamente - a intimidade com a vida literária dele, tenho certeza de que oportunidades e convites não lhe faltaram.
No entanto, na modéstia que lhe era bem afeita, jamais reivindicou reconhecimento para além dos elogiosos comentários que abundaram ao seu redor, com a justa conta da infinita qualidade de suas obras.
Sua consagração somente se deu nas décadas de 1980 e 1990, quando Millôr Fernandes publicou suas poesias nos maiores jornais do País.
Manoel de Barros era considerado um poeta espontâneo, como já foi dito aqui. Quem fala por último corre um risco: o de se tornar repetitivo. Mas, para homenagear um esteio da literatura como Manoel de Barros - e esse sorriso dele conquista qualquer um -, quantas vezes se repetirem, mais vezes se tornarão necessárias.
Então, Sr. Presidente, eu gostaria de homenageá-lo, dizendo que, por uma feliz coincidência, amanhã, dia 14 de março, transcorre o Dia Nacional da Poesia. Como ocorre desde a segunda metade dos anos de 1970 - não é lá em Corumbá, mas em Natal -, será comemorada a data com várias atividades. Eu acredito que também lá.
Mas o que é certo é que quero pegar aqui uma carona no meu discurso - e todos os convidados irão permitir a partir da Mesa -, para, ao mesmo tempo que homenageio esse grande poeta pelo seu centenário, saudar a poesia potiguar, saudando muitos poetas.
Corro até o risco da omissão de algum nome, mas gostaria de lembrar Auta de Souza, Diógenes da Cunha Lima, Esmeraldo Siqueira, Fabião das Queimadas, Falves Silva, Ferreira Itajubá, Henrique Castriciano, Homero Homem, J. Medeiros, Luís Carlos Guimarães, Marize Castro, Moacy Cirne, Nei Leandro de Castro, Newton Navarro, Nísia Floresta e Zila Mamede.
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Houve um tempo em que se dizia na minha terra que, em cada esquina, havia um jornal e que, em cada cidade, havia um poeta.
Viva Manoel de Barros!
Agora, eu direi: viva Manoel de Barros e viva a poesia brasileira!
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Pedro Chaves. Bloco Moderador/PSC - MS) - Quero agradecer ao Senador pelas suas belas palavras.
Agora quero convidar o Vice-Presidente do Conselho Curador da Fundação Manoel de Barros, Sr. Marcos Henrique Marques, para fazer uso da palavra.
O SR. MARCOS HENRIQUE MARQUES - Em nome do Presidente da Mesa e do idealizador deste evento, Senador Pedro Chaves, cumprimento todos os membros da Mesa e todos os convidados.
Para Encontrar o Azul Eu Uso Pássaros, Manoel de Barros.
A Fundação Manoel de Barros está extremamente agradecida e honrada por esta homenagem ao centenário do poeta Manoel de Barros.
Também nós queremos dizer que a Fundação Manoel de Barros, criada em 1998, na época, pelo Prof. Pedro Chaves, com a finalidade de promover a arte, a cultura, a assistência social, a pesquisa e o ensino, abre as portas todos os dias para encontrar o seu azul, para atingir as suas limitações pelas asas da integridade, pelas asas do trabalho e pelas asas do amor à cultura e à sociedade sul-mato-grossense.
Essa mesma equipe que abre as portas para atingir essas finalidades também se inspira na obra do poeta Manoel de Barros para promover a arte e a cultura.
Uma das atividades é o concurso de redação "Um Passeio com Manoel", quando nós trazemos para o seio da Fundação quase 10 mil jovens, quase 10 mil alunos do ensino médio, para que eles possam ser estimulados e produzam textos sobre a obra e a vida do poeta Manoel de Barros.
Mas e o poeta? E a sua obra?
Bem, onde o rio abraça a floresta, onde as águas beijam as árvores e onde nunca temos tanta certeza da presença de Deus, que é o Pantanal, cresceu Manoel de Barros.
Como ele dizia, aos 13 ele começou a ter gosto pela literatura e buscou, na caixa da sua memória, todo aquele ambiente e, usando da criatividade, da ousadia das palavras, realmente ele produziu uma gama de poesia que encanta todos nós.
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O homem Manoel de Barros foi finito, como todos nós somos, mas a sua obra, pautada na criatividade, pautada na ousadia das palavras e também nesse belo sorriso que os senhores e as senhoras podem perceber, permanecerá para sempre, geração após geração.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Pedro Chaves. Bloco Moderador/PSC - MS) - Quero agradecer ao Marcos Henrique pelas suas palavras. Muito obrigado.
Vou chamar, logo em seguida, o poeta Antonio Miranda. Esse é poeta.
O SR. ANTONIO MIRANDA - Muito prazer. Estou realmente emocionado de o meu amigo Pedro Chaves me chamar à Mesa como poeta e não como Diretor da Biblioteca Nacional de Brasília.
Devo dizer que eu conheci Manoel de Barros não como poeta - ele veio da minha juventude, da minha formação; nós poetas chamamos isso de paideia: são aqueles autores que forjaram a nossa personalidade como ser humano e, no caso, como poeta, como criador também -, mas principalmente quando estivemos na casa de Manoel de Barros - o Prof. Pedro Chaves e o nosso amigo Valdemar Ottani, que está aqui conosco -, numa visita há mais de dez anos. Foi muito significativa para mim, porque estava conhecendo uma pessoa que fazia parte da minha vida, da minha formação. Também fiquei muito emocionado agora, quando o Senador citou uma grande amiga minha, Zila Mamede, outra grande escritora, uma grande poeta.
Eu queria fazer um convite a vocês. Eu tenho um site na internet que leva meu nome - é um portal de poesia ibero-americana: www.antoniomiranda.com.br. Basta vocês colocarem lá, no computador, Manoel de Barros e, ao lado, Antonio Miranda e vão encontrar duas páginas que eu criei em homenagem a Manoel de Barros, uma delas como o grande poeta do Pantanal, em que aparecem poemas, textos sobre ele, imagens de todo tipo, vídeos, enfim, é um pouco da sua trajetória artística e literária. Mas eu criei também uma outra página que foi realmente surpreendente, uma página da poesia infantil de Manoel de Barros. O meu site, antoniomiranda.com.br, está no ar há 15 anos. Ele já teve mais de 30 milhões de visitas do mundo inteiro, e um dos poetas mais visitados é quem? Manoel de Barros.
Para finalizar, eu quero dizer o seguinte: é realmente emocionante dizer que a maioria das pessoas que entram no site e o visitam, que leem Manoel de Barros são crianças. Isso é extraordinário. Isso realmente me faz crer que essa figura é imortal.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Pedro Chaves. Bloco Moderador/PSC - MS) - Muito obrigado, nosso poeta e Diretor da Biblioteca Nacional.
Eu vou chamar agora a Senadora Fátima Bezerra para fazer uso da palavra. Depois, passo à senhora para usar da palavra.
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A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Senador Pedro Chaves, Senador Waldemir Moka, Profª Regina, em nome de quem quero saudar toda a Mesa e os presentes a esta sessão solene, em boa hora convocada pelo Senador Pedro Chaves, pelo Senador Moka, para homenagear, sem dúvida alguma, o grande brasileiro, o grande poeta que foi Manoel de Barros.
Vou repetir o que já foi dito sobre ele, Senador Pedro Chaves, inclusive através do bonito discurso que V. Exª fez. Portanto, quero aqui me associar às homenagens que estão sendo prestadas a Manoel de Barros.
Quero fazê-lo, permitam-me, lendo um dos poemas dele, que considero muito bonito. Aliás, foi um dos poemas escolhidos pela população, a legião de admiradores de Manoel de barros, como um dos mais bonitos. Então, permitam-me fazê-lo agora.
O título do poema é: Retrato do artista quando coisa.
A maior riqueza
do homem
é sua incompletude.
Nesse ponto
sou abastado.
Palavras que me aceitam
como sou
- eu não aceito.
Não aguento ser apenas
um sujeito que abre
portas, que puxa
válvulas, que olha o
relógio, que compra pão
às 6 da tarde, que vai
lá fora, que aponta lápis,
que vê a uva etc. etc.
Perdoai. Mas eu
preciso ser Outros.
Eu penso
renovar o homem
usando borboletas.
Manoel de Barros.
Lindo esse poema. (Palmas.)
Quero cumprimentar o Miranda, Diretor da Biblioteca.
É lindo esse poema de Manoel de Barros. Expressa o quanto Manoel de Barros era um homem ligado à terra.
É importante a gente destacar isso, porque Manoel de Barros, assim como tantos outros brasileiros e brasileiras que têm muito talento no campo da poesia, da escrita, da prosa, ficou no anonimato. É importante a gente fazer o registro aqui de que ele só veio ser descoberto pelo País muito recentemente, não é, Miranda? Há cerca de uns 20 anos.
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Um homem, inclusive, que mereceu o elogio de pessoas como Carlos Drummond de Andrade, como Antonio Rassi e tantos outros imortais da nossa literatura.
Mas, a meu ver, Senador Pedro Chaves, isso demonstra ainda o quanto o Estado brasileiro precisa avançar, para promover o livro e a leitura no Brasil, porque, repito, um homem da grandiosidade da obra de Manoel de Barros só veio, volto a dizer, a ser conhecido em todo o País muito recentemente. E precisa ser muito conhecido ainda. Ele e tantos outros. Os que já se foram e os que estão aí presentes na vida. Porque, veja bem, de que País nós estamos falando? De um País, por exemplo, do qual, de uma população de mais de cerca de 104 milhões, que foi o universo pesquisado, nós constatamos que apenas 56% dos leitores, 56% da população, têm acesso ao livro. E ainda de que forma? Com o seguinte retrato, que é o de o brasileiro ler apenas 4,96 livros por ano - não chega a cinco livros. Eu estou falando por ano! Por ano! Esse é o índice de leitura no Brasil. Eu não estou falando de um livro por semana, de um livro por mês, eu estou falando de cinco livros por ano. Essa é a média do índice de leitura do povo brasileiro. E com um detalhe: desses, 0,94 são indicados pelas escolas.
Sem dúvida nenhuma é um programa muito importante, vale ressaltar, que nós temos no Programa Nacional do Livro Didático no Brasil, um dos maiores programas de inclusão social, no campo da leitura, voltado para a educação, não só no Brasil como no mundo. E um programa, inclusive, que precisa ser preservado, aperfeiçoado e cuidado com muito carinho.
Pois bem, Senador Pedro Chaves, esse é o índice de leitura no Brasil: em média cinco livros, 4,96... Vamos arredondar para cinco livros. Cinco livros por ano, dos quais 0,94 são indicados pela escola e 2,88 lidos por vontade própria.
E livrarias? Os senhores e senhoras sabem quantas livrarias resistem ainda no Brasil? Apenas 3.100 livrarias. A Unesco recomenda que deve se ter uma livraria para cada 10 mil habitantes. Eu estou falando de um País de mais de 200 milhões de habitantes e nós temos apenas 3.100 livrarias.
Eu estou falando de um País no qual, com respeito à maior rede de ensino, que é a rede de educação básica, a rede pública de educação básica em todo o País, nós não conseguimos ainda, por exemplo, garantir que em todas as escolas nós tivéssemos uma biblioteca. E uma biblioteca não apenas com o nome de biblioteca, mas uma biblioteca com acervo, uma biblioteca com profissional qualificado lá dentro, porque não basta só ter o livro, não basta só ter o acervo, é preciso ter o profissional qualificado lá dentro, para orientar e para motivar as pessoas a terem acesso ao livro.
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Então, volto a dizer: sou admiradora de Manoel de Barros, e todas as homenagens aqui a ele são mais do que merecedoras. Ouvi aqui o discurso também do Senador Garibaldi Filho.
Concluo aqui, Senador Pedro Chaves, fazendo um convite a V. Exª e a todos os Senadores e Senadoras desta Casa para integrarem a Frente Parlamentar Mista em Defesa do Livro, da Leitura e da Biblioteca, que coordeno nesta Casa. Nós vamos, inclusive, retomar as atividades da frente agora no biênio 2017/2018, com um objetivo agora traçado de imediato, que é aprovar o projeto de lei, de minha autoria, que vai instituir, pela primeira vez, no Brasil, o marco regulatório voltado para promover a leitura e a escrita no Brasil, porque é fato que muito foi feito nesta área, mas ainda de forma insuficiente, até porque, nesses últimos 12, 13 anos, é verdade, nós tivemos um bom debate em torno do livro e da leitura. Nós chegamos a ter o Plano Nacional do Livro e Leitura, que promoveu, incentivou o debate nos Municípios e nos Estados, no que diz respeito aos planos municipais e estaduais do livro e da leitura, mas isso tudo ainda é tão insuficiente, que todas essas políticas ainda estão, Profª Regina, no estágio de decreto. Essas políticas têm que ganhar o status não só de programas de Governo. Elas têm que ganhar o status, Senador Pedro Chaves, de políticas de Estado, Prof. Miranda. Por isso, nós queremos aprovar esse projeto de lei. E é simples. É simples. E eu vou concluir.
Ele apenas institui a política nacional da leitura e da escrita como uma estratégia permanente, para que a gente possa promover a expansão e o fortalecimento da biblioteca, da literatura, do livro, da escrita, etc. De que forma? Numa gestão compartilhada com os Estados e Municípios, numa gestão compartilhada também com a sociedade civil. Aliás, foi a sociedade civil quem trouxe para mim a ideia de apresentar esse projeto de lei. Isso foi fruto de um intenso debate.
E eu rendo minhas homenagens aqui ao Prof. José Castilho, que, durante esses últimos anos, foi o Secretário Executivo do Plano Nacional do Livro e Leitura, e, em nome dele, dirijo-me a todos aqueles e aquelas que militam, que trazem consigo esse sonho de ver o Brasil avançar, no sentido de que a gente possa dizer um dia: este é um Brasil que lê; esta é uma Nação leitora; o livro se tornou, finalmente, acessível a todos e todas.
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Então, é em nome deles que eu quero, aqui, mais uma vez homenagear, porque eu sou apenas a porta-voz de todo esse debate que foi feito, ao apresentar esse projeto de lei. E convoco os Srs. Senadores e as Srªs Senadoras a fortalecermos esse movimento.
Ele já está, Senador Pedro Chaves, na Comissão de Educação e Cultura, em caráter terminativo. Nós esperamos, agora, com a retomada dos trabalhos legislativos, Senador Moka, aprová-lo, para que ele imediatamente siga à Câmara e nós possamos celebrar, este ano ainda, a aprovação daquilo que seria o primeiro marco regulatório voltado para promover uma política nacional do livro e da escrita.
Penso que essa, Manoel de Barros, é a melhor forma de homenageá-lo.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Pedro Chaves. Bloco Moderador/PSC - MS) - Quero agradecer à nossa querida Senadora Fátima Bezerra as suas palavras.
E vou me engajar totalmente nessa Frente.
Muito obrigado.
Vou chamar o nosso amigo, Desembargador Romero Osme, que foi amigo particular do Manoel de Barros e que frequentava a casa dele sistematicamente, para fazer um depoimento. Depois, passarei a palavra à nossa querida Professora Regina de Assis, representante do MEC. (Pausa.)
O SR. ROMERO OSME DIAS LOPES - Em homenagem ao amigo Senador Pedro Chaves, que me colocou nesta fria, porque nós não combinamos nada, eu tenho, sim, de desempenhar pelo menos três minutos. E eu seria o melhor orador de todos, se eu dissesse à plateia: "O almoço está servido." Seria ou não?
Eu gostaria apenas de ratificar - não evidentemente repetindo - todos os que me antecederam sobre o grande poeta sul-mato-grossense ou mato-grossense - pouco importa, Senador Moka -, o grande Manoel de Barros. Eu queria apenas comentar duas ou três coisinhas, só para completar o que foi dito aqui.
Por exemplo, citaram o grande amigo do Manoel de Barros, que, inclusive, escreveu um livro que nem sei se é inédito. Eu nunca tive a oportunidade de ver. João Guimarães Rosa visitou-o em Nhecolândia, na década de 50, e foi ciceroneado pelo nosso poeta maior, o Manezinho. E lá eles tiveram um diálogo. O Manoel que me contou isso, e acredito que isso não esteja escrito em nenhum livro do Manoel, porque acho que não cabia. Ele disse que os dois estavam lá, no Porto da Manga, e o João Guimarães Rosa viu uma menina depenando um pássaro. Ele chegou perto da menina e falou assim: "Como é que se chama esse passarinho?" Ela respondeu: "Não carece pôr nome neles, não. Eles são muitos." Olhem que bonitinho. Olhem que coisa mais pueril, vindo de um poeta como o Manoel de Barros e de seu ídolo, João Guimarães Rosa.
Outra feita, nós estávamos tomando vodca. Costumeiramente, todo domingo, nós tomávamos. Ele tomava sua vodca, e acho que a Dona Stella não sabia disso, não. Mas ele tomava a vodcazinha dele. Eu era mais liberal comigo mesmo e tomava mais de uma. E nós conversávamos com o Paim, o Isaías Paim, um dos maiores psiquiatras que o Brasil conheceu, autor de 16 livros, a maioria deles adotada em Portugal.
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E estávamos lá, com o Desembargador Ruy Celso também, os quatro, quando o Isaias Paim, o cientista, falou assim... E também isso não está escrito. São memórias que eu quero dividir aqui, porque elas são engraçadas. Elas têm que ser eternizadas nas nossas mentes. Aí o cientista falou assim: "Manoel, por um estranho fenômeno físico, ouvi falar que a Lua está 70 centímetros mais perto da Terra". O Manoel olhou para o Paim, olhou para os outros dois - para mim e para o Ruy - e falou assim: "Paim, a única coisa científica que eu escrevi na minha vida é que o arco-íris, quando se aproxima mais do Sol, fica mais cheiroso." Olha que loucura! Esse é o Manoel de Barros.
Agora, só para fazer um contraponto, evidentemente sem intenção de polemizar... E nem iria tocar nesse tema, mas como foi dito pela Senadora que me precedeu, sobre a educação, a importância dos livros, que Manoel de Barros deveria ser homenageado... Manoel me contou uma vez... Qual o parente do Manoel que está aqui? A Márcia está aqui? Não? É uma pena. Bom, e lá, na sua casa, ele disse que recebeu a visita de uma secretária de educação de um determinado Município - que por uma questão de ética eu não vou mencionar, porque esse Município já foi mencionado aqui -, e ela se virou para o Manoel, dentro de sua residência... Eu achei isso realmente um absurdo, mas a historinha termina bem. Nós demos uma roupagem a ela que faz com que essa agressão verbal ao poeta tenha sido reparada. E por quem? Pelo próprio poeta. Segundo o Manoel, que me contou isso, ela se virou e falou assim: "Manoel de Barros, quando vejo que textos de seus livros caem em vestibulares, para que os alunos façam uma análise, vem uma onda de [posso falar a palavra?] merda na minha cabeça." Isso, dito por ela, dentro da residência do Manoel. O Manoel respondeu como? Como ele se reergueu depois dessa ofensa que o diminuía demais? Ele se virou e falou assim: "Eu sou apenas um poeta."
Este é o poeta Manoel de Barros, cujo centenário está sendo comemorado, acredito eu, até no mundo inteiro, porque ele era admirado, principalmente, na Espanha.
Eu me esqueci de cumprimentá-los. Ficam todos cumprimentados pelo amigo Pedro Chaves e pelos que compõem esta Mesa aqui.
Meu muito obrigado. E desculpem-me se eu falhei em alguma coisa.
O almoço não está servido. Era brincadeira. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Pedro Chaves. Bloco Moderador/PSC - MS) - Quero agradecer ao Desembargador e amigo Romero Osme, que foi amigo particular do Manoel.
E agora, para encerrar, vamos convidar com muito prazer a representante do Estado de Educação, Professora Regina de Assis.
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A SRª REGINA DE ASSIS - Cumprimento o Sr. Senador Pedro Chaves, em nome de quem eu cumprimento todos os políticos, Senadores e Deputados, e as demais autoridades presentes.
Em nome do nosso Ministro de Estado da Educação, Mendonça Filho, eu trago aqui as homenagens do Ministério da Educação e, como sou professora, com mais de 50 anos de carreira, trago, com o coração cheio de alegria, a mensagem de milhares de professores brasileiros e - posso dizer com certeza - de milhares de estudantes, porque é este lugar de onde eu falo, representando o nosso Ministro de Estado da Educação, o lugar dos professores.
Atualmente, sou a titular da Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino de todo o País. Então, nós temos contato com os 26 Estados, o Distrito Federal e os 5,568 mil Municípios. E, por toda a minha vida profissional, o meu trabalho me levou, tanto como professora de carreira, desde a educação infantil até a pós-graduação - sou professora aposentada da UERJ, do Rio de Janeiro, mas fui professora da PUC e da Unicamp -, como também fui Secretária Municipal de Educação do Rio de Janeiro, que, na época, tinha a maior rede pública de ensino do País, uma mega rede de escolas, de modo que eu pude dialogar muito diretamente com os nossos professores da educação infantil, do ensino fundamental. Mas falo também em nome dos professores do ensino médio, porque Manoel de Barros, o grande e querido Manoel de Barros, é amado - mais do que respeitado, ele é amado. E acho que isso faz muita diferença para nós que lidamos com educação.
Então, muito rapidamente, eu queria usar aqui alguns trechos de um livro maravilhoso, um dos muitos que ele escreveu, o Livro sobre Nada, que, para nós, professores, que lidamos com tudo aparentemente, faz todo o sentido. O Livro sobre Nada, para nós, professores, gestores da educação brasileira, tem conselhos inestimáveis. O primeiro deles diz assim: "Há muitas maneiras sérias de não dizer nada, mas só a poesia é verdadeira."
Eu queria usar essa primeira reflexão, tão intuída, tão verdadeira desse grande poeta, para dizer o seguinte: nós, professores, que temos por missão, que temos por profissão, por escolha a responsabilidade de constituir conhecimentos e valores nos corações e mentes de milhares de crianças, adolescentes e jovens brasileiros, muitas vezes, somos educados nas universidades para usar muitas maneiras sérias de não dizer nada. E, com certeza, junto com Manoel de Barros, nós só diremos coisas que façam sentido se nós usarmos a poesia, porque é ela que sensibiliza corações e mentes; é ela que navega e flutua pela memória deste País, pela memória das várias etnias que compõem o nosso País. De modo que, para mover, para transformar, que é, ao fim e ao cabo, a nossa responsabilidade maior em educação, sem poesia, nada feito.
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E nós aqui vamos seguindo as suas várias reflexões, quando ele diz: "Sou muito preparado de conflitos." Que professor terá êxito em seu trabalho se não souber enfrentar os conflitos, se não for muito preparado de conflitos? Porque lidamos atualmente, no Brasil, com um momento de muita intolerância, com um momento de muita violência, de muita incompreensão. E, nós, professores, nas universidades, em geral, não somos preparados para lidar com conflitos, com a inconstância da possibilidade do diálogo, que é a matéria-prima do nosso trabalho. Então, trazer aos professores, ainda nas universidades, a consciência de que temos que ser muito preparados de conflitos é fundamental.
Estamos trabalhando, inclusive, nos grandes centros com alunos imigrantes, imigrantes do Haiti. Já chegam às nossas escolas imigrantes da Síria, do Oriente Médio. Como vamos falar com esses imigrantes, vítimas de conflitos? Como vamos falar, nas escolas, com os diferentes povos indígenas, com as diferentes etnias, com as diferentes memórias e histórias que estão diante de nós e com as quais temos que constituir conhecimentos e valores? Outra vez, com o nosso querido Manoel de Barros e seu sorriso irresistível: "Sou muito preparado de conflitos."
Assim, se tivermos a oportunidade de, nas universidades, sabermos como enfrentar as diferenças, as desigualdades... O Brasil é uma maravilha na sua diversidade cultural, mas ainda é uma grande tristeza e um desafio para todos nós pela sua falta de equidade social. O nosso trabalho de educação é um trabalho que leva para adiante as gerações, sobretudo com a consciência de que está em nossas mãos, corações e mentes a capacidade de transformar, seja em casas, como esta em que estamos agora, seja aqui ao lado, seja em frente, seja junto ao Judiciário, mas sempre, em qualquer humilde sala de aula deste País, teremos a capacidade de, entendendo a desigualdade, trabalhar pela equidade.
Então, nós, professores, temos, muitas vezes que meditar sobre o que ele escreveu, dizendo: "Sábio é o que adivinha!", porque nem sempre nós, professore ou gestores da educação, temos as respostas claras, as respostas postas, de maneira que possamos equacionar as questões, os problemas e levar adiante as soluções. Por que não adivinhar? O que é adivinhar? É mergulhar na própria consciência, às vezes, até no inconsciente, às vezes, até nos sonhos, mas é buscar as melhores respostas.
Então, ele diz: "Para ter mais certezas, tenho de me saber de imperfeições." Ora, essa é uma questão magistral, porque o professor que se crê todo-poderoso ou a professora que se crê capaz de entender e resolver todas as questões vai ter problemas, porque, como ele nos ensina: "Para ter mais certezas, tenho de me saber de imperfeições."
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Somos todos imperfeitos, falta sempre um pedaço, e será sempre assim. Daí a importância de nós, aqueles que escolhemos professar o trabalho de constituir conhecimentos e valores, entendermos que nós somos seres, mulheres e homens, responsáveis por tocar, com poesia, com sensibilidade, com competência, com responsabilidade, corações e mentes de crianças, adolescentes e jovens.
Uma das coisas que foi falada, inclusive aqui pela Senadora Fátima Bezerra, é a dificuldade que ainda encontramos no Brasil da proficiência na leitura, na escrita, no cálculo, de termos crianças, adolescentes, que, no seu processo de constituir conhecimentos e valores, o façam de maneira alegre, de maneira criativa, de maneira competente, mas o façam, que aprendam a ler e escrever sem maiores tropeços, sem maiores dificuldades. Mas, aqui, vou dizer para vocês, pela experiência que eu tenho com crianças pequenas e com crianças que adoram entender o que é ler e escrever, não alfabetizar. Alfabetizar é aprender o alfabeto. As crianças não querem isso.
Aliás, isso - desculpe a palavra que eu vou usar - é muito chato. Manoel de Barros não usava isso. Manoel de Barros o que usava? Palavras! E é isso que a gente tem que saber usar com as crianças: enunciados, enunciados poéticos por meio dos quais as crianças comecem a entender que o enunciado é um composto de palavras.
As palavras têm sentido, têm um sentido muito próprio, muito particular, como disse quem me precedeu agora, sobre aquela menina que falou: "Uai!, não carece de dar nome, eles são tantos!" Não é? Então, esse é o sentido que aquela menina deu para a multiplicidade dos pássaros.
Então, para ensinar a ler e a escrever, gente, não é ensinar letras, não é ensinar alfabetizar; é ensinar o sentido das coisas ou acolher o sentido que crianças, adolescentes e jovens trazem para nós dos seus dramas, das suas alegrias, das suas tristezas, dos seus sonhos, e transformar isso em conhecimento, em significado socialmente aceito.
Eu me lembro de uma professora no Rio de Janeiro, com a qual a gente teve um entrevero. Vocês devem lembrar da chacina da Candelária de tristíssima memória. Pois bem, um daqueles meninos sobreviventes da Candelária era nosso aluno, e ele estava numa escola onde nós fazemos um trabalho muito intenso para justamente respeitar o sentido das palavras que essas crianças traziam, para, daí, trazer um significado socialmente aceito, para eles começarem, de fato, a ler e escrever pela norma culta.
A professora dizia: "Esse menino não tem jeito!" Então, fomos discutir para ver por que ele não tinha jeito. E fomos ver um escrito desse menino. O escrito estava um pouco truncado, mas ele contava o seguinte, que, na hora em que vieram os homens com as armas e começaram a atirar nos colegas dele, ele lembrou de um filme que ele viu na Sessão da Tarde, em que um homem caía, fingia-se de morto e ali ficava. E ele disse: "Foi o que eu fiz. E, na hora em que eu ouvi as portas dos carros se fechando, eu abri o olho devagarzinho, vi aquela gente toda indo embora, eu me arrastei, e assim eu vivi e eu estou aqui."
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Era essa a história que o menino contava para a professora, que não via sentido no que ele escrevia. Como não ver sentido nisso? Como não levar desse sentido para um significado mais amplo, talvez até com uma leitura indesejável, mas muitas vezes necessária, sobre a violência, sobre as causas da violência, tanto dentro das escolas, quanto dentro da sociedade? Manoel de Barros, então, tem essa percuciência, essa capacidade de entender que é do pequeno, que é do modesto, que é do cotidiano que a gente vai chegar ao universal, ao científico.
E, aí, já encaminhando uma conclusão, ele diz assim: "Palavra poética tem que chegar ao grau de brinquedo para ser séria." Só quem não entende de criança, de adolescente, de jovem não vai acreditar nisso que o nosso poeta disse. Vou repetir: "Palavra poética tem que chegar ao grau de brinquedo para ser séria."
O que ele queria dizer com isso? Que não há como a gente instituir seriedade na educação se, antes, a gente não der lugar para o prazer, para a beleza, para a estética, para a fruição da diversidade cultural, para a beleza que existe na vida das crianças, na vida dos lugarejos, das cidades e do nosso País. Manoel de Barros faz, em toda a sua criação poética, a apologia da ciência, do conhecimento, do conhecimento científico rigoroso em suas bases,...
(Soa a campainha.)
A SRª REGINA DE ASSIS - ... quando ele chama atenção para a necessidade de olhar para a natureza, de interagir com a natureza.
Finalizando, eu vou me permitir repetir o trecho final do poema O menino que carregava água na peneira, porque é para todos nós que aqui estamos e que temos variadas responsabilidades, mas sobretudo para aqueles de nós que estamos nos sistemas públicos de ensino, entender qual é a nossa missão. Ele diz assim:
[...] Com o tempo descobriu que escrever seria o mesmo
que carregar água na peneira. [Quer dizer, um ofício exigente.]
No escrever o menino viu que era capaz de ser
noviça, monge ou mendigo ao mesmo tempo. [Ou seja, escrever e ler é ter a liberdade de criar.]
[...] O menino aprendeu a usar as palavras.
Viu que podia fazer peraltagens com as palavras.
E começou a fazer peraltagens [...].
Nossas crianças vão escrever e ler com proficiência quando elas tiverem o prazer de fazer peraltagens com as palavras, mesmo que seja uma peraltagem dramática como a do menino sobrevivente da Candelária, mas também peraltagens do cotidiano de cada criança urbana, suburbana, rural, de populações indígenas, quilombolas. E nós todos temos que reconhecer as crianças que também são portadoras de deficiências - que não escutam, que não veem, que não andam com facilidade -, essas crianças também podem ler e escrever com prazer, entendendo que esse ofício, que nos torna cidadãos de pleno direito, é um ofício viável, é um ofício que traz prazer, que traz alegria.
E por fim:
[...] Foi capaz de modificar a tarde botando uma chuva nela. [Olhe que coisa mais bonita!]
[...] O menino fazia prodígios.
Até fez uma pedra dar flor.
A mãe reparava o menino com ternura.
A mãe falou: Meu filho você vai ser poeta!
Você vai carregar água na peneira a vida toda.
Você vai encher os vazios
com as suas peraltagens [...].
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Como professora, eu desejo isso para todas as crianças, adolescentes e jovens brasileiros, e que seus professores, suas famílias e nós, que ocupamos vários postos de autoridade, entendamos isso, porque, ao final, a mãe diz para o menino: "e algumas pessoas vão te amar por seus despropósitos!", assim como nós te amamos, Manoel de Barros, com o coração cheio de emoção e te agradecemos e te homenageamos.
Muito agradecida. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Pedro Chaves. Bloco Moderador/PSC - MS) - Eu queria parabenizar a Profª Regina de Assis por essa aula maravilhosa e, ao mesmo tempo, informar que está presente entre nós o nosso Senador Wellington Fagundes, Líder do Bloco Moderador, que vai usar da palavra, encerrando a parte de oratória. Quero lembrar que Wellington é cuiabano, conterrâneo do Manoel de Barros, não é, Wellington?
O SR. WELLINGTON FAGUNDES (Bloco Moderador/PR - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Pedro Chaves, quero cumprimentá-lo em nome de todos os Senadores que já falaram, o Senador Waldemir Moka, nosso companheiro, também o Senador Garibaldi Alves, que ali está. E, claro, cumprimentar a nossa representante no Ministério da Educação, que falou brilhantemente, com toda a sua competência, D. Regina de Assis, e também o Marcos Henrique Marques, que é Vice-Presidente do Conselho de Estudos Anísio Teixeira, o Inep. Em nome deles, cumprimento a todos que estão presentes neste plenário.
É um mérito muito grande deste Senado prestar uma homenagem a Manoel de Barros. Por isso, Senador Pedro Chaves, quero cumprimentá-lo por ter sido também um Parlamentar em defesa dos interesses do povo do Estado do Mato Grosso do Sul e, claro, do Brasil todo, atuante aqui na esfera federal, um homem sensível e respeitável, fundador da maior universidade privada de Mato Grosso do Sul, a Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal, a Uniderp.
Quero aqui dizer que tive, a rigor, o privilégio de estudar na Moderna Associação Campograndense de Ensino, a Mace, da qual V. Exª, Senador Pedro Chaves, foi sócio fundador.
Pelo seu histórico, reitor, interessado na defesa do ensino de qualidade, equilibrado em suas posições, excelente articulador, a relatoria da reforma do ensino básico, um dos capítulos mais desafiadores dos últimos tempos, ficou em boas mãos. E V. Exª soube desempenhar muito bem essa função delegada pelo nosso Bloco, o Bloco Moderador. Por tudo isso, é o indicado também do nosso Bloco agora, para este ano, para ser o Vice-Presidente da Comissão de Educação do Senado da República.
Mas hoje, senhoras e senhoras, as homenagens são para Manoel de Barros. Como mato-grossense e com grande parte da minha vida acadêmica realizada em Mato Grosso do Sul, eu não poderia jamais deixar de estar presente nesta linda homenagem prestada pelo Senador Pedro Chaves e todos os outros que aqui estão.
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Manoel de Barros foi considerado o maior poeta da literatura brasileira. Tinha a mesma estatura de Guimarães Rosa, com quem manteve relacionamento pessoal e literário. Ainda na década de 90, falaram a Carlos Drummond de Andrade que ele seria o maior poeta vivo no Brasil, mas Drummond discordou e disse: "Não!!! Não sou o maior poeta, porque existe Manoel de Barros".
A biografia de Manoel de Barros confirma que, nos rincões do oeste brasileiro, onde se localizam os irmãos Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, a cultura sempre foi efervescente.
Manoel de Barros nasceu em Cuiabá, na região do Porto, em 19 de dezembro de 1916, filho do capataz de uma fazenda. E pôde conviver ainda com nosso Estado uno durante 71 anos, pois Mato Grosso do Sul foi criado em 1987. Eu ainda estudava em Campo Grande. Quero dizer que nós de Mato Grosso comemoramos hoje a criação de Mato Grosso do Sul, porque foi extremamente importante para o desenvolvimento dessas duas unidades. Mato Grosso ainda continua gigante. Temos 900 mil quilômetros quadrados, um Estado com apenas 3,5 milhões de habitantes ainda, uma grande nova fronteira agrícola brasileira. Portanto, Mato Grosso do Sul, com a sua cultura e, principalmente, com sua colonização muito mais próxima de São Paulo, era importante a criação dessa unidade da Federação.
Quero dizer aqui que Manoel de Barros, logo criança, mudou-se para Corumbá, hoje Mato Grosso do Sul. Criado no Pantanal, extraiu desse lugar um mundo repleto de personagens únicos, apresentados por Manoel de Barros com estilo próprio. Ele mesmo gostava de dizer que, de suas percepções infantis, construiu sua obra, que lhe rendeu vários prêmios e o reconhecimento nacional e internacional.
Ele era avesso às exposições na mídia e dizia sempre que, se escondendo, ele aparecia mais.
O primeiro prêmio veio em 1960, Prêmio Orlando Dantas, conferido pelo jornal Diário de Notícias, com o livro Compêndio para uso dos pássaros. E podemos incluir nessa extensa lista o Prêmio Jabuti de literatura, na categoria poesia, com o livro O Guardador de Águas. Outro Prêmio Jabuti viria com a obra de ficção O Fazedor de Amanhecer. Quero aqui dizer que o Prêmio Jabuti é o mais importante prêmio literário do Brasil, considerado o óscar da literatura.
Como eu estava dizendo, o Pantanal é o lugar e o cenário da vida de Manoel de Barros, de onde extraiu toda a imagem poética do homem e das coisas pantaneiras tão presentes em sua obra.
Tinha apenas um ano de idade quando foi para Corumbá, onde o pai resolveu montar uma fazenda. Lá, ele cresceu brincando no terreiro em frente da sua casa, com o pé no chão, entre os currais e as coisas, como ele dizia, "desimportantes".
Depois, foi estudar em Campo Grande e também no Rio de Janeiro, onde descobriu os livros do Padre Antônio Vieira, sua primeira influência literária. Durante a vida, recebeu influência de vários outros escritores e percorreu as diversas escolas literárias.
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E chegou a perder um livro. Esse livro era Nossa Senhora da Minha Escuridão, sequestrado por um policial que levou a brochura. Como era o único exemplar que o poeta havia escrito, parece-me que ele não teve oportunidade de editá-lo nem de recuperá-lo.
Logo depois, ele voltou para o Pantanal, mas, antes, percorreu a Bolívia e o Peru. Também morou em Nova York por um ano, onde fez o curso de cinema e pintura e ganhou reforço no seu sentido de liberdade ao conhecer a arte de Picasso, Chagall e Van Gogh. Manoel de Barros encantou-se por Charles Chaplin, Federico Fellini, Akira Kurosawa e também Luis Buñuel.
Depois de se casar, foi morar definitivamente no Pantanal.
O mundo só começaria a conhecê-lo quando Millôr Fernandes, nos anos 80, começou a mostrar em suas colunas a poesia de Manoel de Barros. Passou a vida gostando do anonimato. Apesar disso, hoje o poeta é reconhecido nacional e internacionalmente como um dos mais originais do século e mais importantes do Brasil.
Embora tenha sido, por várias vezes, o poeta que mais vendeu livros no Brasil, Manoel chegou a comentar que gostaria de também ter sido mais avaliado pelos grandes críticos literários do País.
Morreu aos 97 anos, em novembro de 2014. Nos últimos anos de sua vida, buscou ainda mais o isolamento, principalmente após perder seu segundo filho em consequência de um acidente vascular cerebral. "Foi-se apagando como uma velinha", como dizia sua filha Martha.
Deixou como legado a sua dedicação aos versos, sua simplicidade e capacidade de ver o mundo pela lente da beleza.
Quero aqui não recitar, porque não tenho essa competência, mas vou aqui ler um deles:
A poesia está guardada nas palavras - é tudo que eu sei.
Meu fado é o de não saber quase tudo.
Sobre o nada eu tenho profundidades.
Não tenho conexões com a realidade.
Poderoso para mim não é aquele que descobre ouro.
Para mim poderoso é aquele que descobre as insignificâncias (do mundo e as nossas).
Por essa pequena sentença me elogiaram de imbecil.
Fiquei emocionado.
Sou fraco para elogios.
Esse é o Tratado geral das grandezas do ínfimo.
Obrigado, poeta Manoel de Barros!
Obrigado, senhoras e senhores!
Quero aqui, Senador Pedro, ao cumprimentar todos, agradecer esta oportunidade de estar aqui na tribuna juntamente com V. Exª e dizer que, este ano, Mato Grosso do Sul fará 30 anos em outubro.
Fazia parte da pesquisa e está aqui conosco a minha esposa Mariane de Abreu Fagundes, que vinha lendo no carro um pouco da história de Manoel. Ela dizia, e eu vou propor lá da tribuna, já, ao meu companheiro Pedro Chaves, bem como ao nosso Senador Moka, que a gente faça uma sessão especial, no dia 30 de outubro, em conjunto, homenageando a criação de Mato Grosso do Sul. Para nós de Mato Grosso - volto a repetir -, não só faz parte da nossa cultura como também da nossa riqueza, principalmente esse trabalho de irmandade que temos feito aqui, as duas Bancadas, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, em prol do desenvolvimento do Brasil, em especial, claro, da nossa Região Centro-Oeste e, mais ainda, do nosso Pantanal, que é o patrimônio da humanidade.
Muito obrigado! (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Pedro Chaves. Bloco Moderador/PSC - MS) - Eu quero agradecer ao nosso Líder, o Senador Wellington, pelas suas belas palavras que robusteceram e enriqueceram muito mais esta nossa sessão especial.
Vamos agora passar à segunda parte, que é a do vídeo.
Nós assistiremos agora a um pequeno vídeo, com depoimentos de amigos e admiradores do poeta Manoel de Barros, que mostra a grandeza da sua obra.
(Procede-se à exibição de vídeo.) (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Pedro Chaves. Bloco Moderador/PSC - MS) - Vamos ter como fase final da nossa sessão especial uma apresentação musical muito importante.
Ouviremos agora a apresentação musical do cantor, compositor e instrumentista de Mato Grosso do Sul, o artista Marcio de Camillo, que vai apresentar a música O Menino e o Rio, que faz parte do projeto Crianceiras, baseado nos poemas de Manoel de Barros.
Então, convido o artista Marcio para fazer a sua apresentação.
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O SR. MARCIO ROGÉRIO PEREIRA DE CAMILLO - Boa tarde a todos.
Eu passei cinco anos com o poeta, criando esse projeto chamado Crianceiras. A gente levou essas palavras inventadas do poeta para mais ou menos 260 mil crianças no Brasil inteiro, através de um CD, de um espetáculo e agora de um aplicativo, cujo download é possível fazer gratuitamente.
Esta pequena apresentação é uma tentativa de fazer da minha voz a voz do poeta Manoel de Barros.
(Procede-se à execução da música O Menino e o Rio.)
O SR. MARCIO ROGÉRIO PEREIRA DE CAMILLO - Para meu gosto, a palavra não precisa significar; é só entoar.
Obrigado. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Pedro Chaves. Bloco Moderador/PSC - MS) - Neste momento, eu quero convidar a educadora e diretora da escola Mace, minha esposa, Reni Domingos dos Santos, para, juntos, entregarmos a placa que registra a homenagem que o Senado Federal faz ao poeta Manoel de Barros.
Para receber essa homenagem, convido o Sr. Marcos Henrique Marques, Vice-Presidente da Fundação Manoel de Barros, neste ato representando a família do poeta.
(Procede-se à entrega da placa ao Sr. Marcos Henrique Marques, representante da família do poeta Manoel de Barros.)
O SR. PRESIDENTE (Pedro Chaves. Bloco Moderador/PSC - MS) - Cumprida a finalidade desta sessão especial, agradeço aos colegas Senadores e Senadoras, Deputados federais e estaduais, autoridades e personalidades que nos honraram com suas presenças nesta importante homenagem, adequada à simplicidade do nosso querido Manoel de Barros, homem reservado, de poucas palavras, mas de imensa sabedoria.
Agradeço aos familiares, aos convidados, aos acadêmicos e a todos.
Nosso muito obrigado.
Está encerrada a solenidade. (Palmas.)
(Levanta-se a sessão às 13 horas e 34 minutos.)