3ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA
55ª LEGISLATURA
Em 11 de maio de 2017
(quinta-feira)
Às 9 horas e 30 minutos
62ª SESSÃO
(Sessão de Debates Temáticos)

Oradores
Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Declaro aberta a sessão.
Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos.
A presente sessão destina-se ao debate temático sobre a reforma trabalhista, que se encontra em tramitação no Senado Federal por meio do Projeto de Lei nº 38, de 2017.
Nesta sessão, aqui ao meu lado a Presidente da Comissão de Assuntos Sociais, Senadora Marta Suplicy.
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Esta sessão temática, que tenho a honra de presidir, é uma iniciativa da Comissão de Assuntos Sociais, presidida pela Senadora Marta Suplicy, e também da Comissão de Assuntos Econômicos, presidida pelo Senador Tasso Jereissati.
Para iniciar os nossos trabalhos, tenho a honra de convidar para compor a Mesa o Exmº Sr. Ministro do Tribunal Superior do Trabalho Mauricio Godinho Delgado.
Igualmente, convido à Mesa o Professor da USP, Presidente e cofundador do Ibret Hélio Zylberstajn.
Com elevada honra, convido para compor a Mesa o Exmº Sr. Juiz Federal do TRT da 9ª Região Marlos Melek.
Com igual honra, convido para compor a Mesa o Presidente Nacional da central da Força Sindical, Paulo Ferreira da Silva, Deputado Federal Paulinho da Força.
Convido também o Diretor Técnico do Dieese Clemente Ganz Lúcio.
E, por fim, concluindo a composição da Mesa, convido o Professor de Direito do Trabalho Antonio Galvão Peres.
Agradecendo a presença já em plenário do Senador Moka e do Senador Ricardo Ferraço, a presente sessão temática, como eu já havia consignado, por iniciativa da CAS e da CAE, tem por objetivo discutir a reforma trabalhista, que já foi aprovada pela Câmara e nos foi encaminhada recentemente. O objetivo é permitir que, com um debate amplo, com a discussão plena do tema, que é de grande relevância para todo o povo brasileiro, para as pessoas, para a sociedade de forma geral, nós tenhamos a oportunidade de trazer contribuição dos especialistas sobre o tema.
É natural que cada um traga a sua visão ideológica, a sua visão e compreensão do sistema trabalhista brasileiro. E o Senado sente-se honrado em poder realizar este encontro.
Naturalmente, em nome do Presidente do Senado Federal, o Senador Eunício Oliveira, trago as boas-vindas aos participantes deste encontro, que nos emprestarão seu tempo e seus valiosos conhecimentos sobre a questão, para esclarecer dúvidas e enriquecer este debate.
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O que nós pretendemos, no Senado, é a discussão de fato, plena, ampla, completa, sem nenhum tipo de embargo, da matéria, para que nós possamos ter, sobretudo, a desmistificação de alguns pontos que ainda não estão devidamente esclarecidos. E há um receio por parte significativa da população em relação a mudanças que estão sendo propostas na CLT, que, como todos sabem, é uma legislação de 1943 que ao longo do tempo vem sendo transformada e modificada e que agora está sendo objeto de uma atualização bastante significativa.
Não há como imaginar que a legislação brasileira, seja ela trabalhista, cível, penal, qualquer que seja, comercial ou tributária, permaneça estática ao longo do tempo, sobretudo diante das transformações que o mundo experimenta na atualidade. São transformações profundas, que naturalmente atingem a relação de trabalho.
É óbvio que unanimidade não será encontrada praticamente em nenhum dos pontos, mas particularmente vejo como necessário nos depararmos e enfrentarmos desafios como o teletrabalho, o trabalho remoto, que é uma realidade na vida das pessoas, que é uma realidade na vida das empresas, e que não está ainda devidamente regulamentado no nosso País.
Portanto, Senador Paim, agradecendo a presença sempre assídua de V. Exª, nós estaremos aqui para promover este debate amplo, esta discussão aberta e transparente, em que todas as matizes de pensamento doutrinário, ideológico e político terão oportunidade de se manifestar.
Para que possamos dar início a este nosso encontro, eu gostaria de informar que a Mesa Diretora estabeleceu o prazo de quinze minutos para cada um dos convidados. Creio que é tempo suficiente para que todos possam expor o seu pensamento, o seu ponto de vista. A Mesa terá sempre uma tolerância com relação a esse tempo, pedindo a compreensão de todos os convidados desde já para que possamos, na medida do possível, observar o tempo estabelecido de quinze minutos, para que possamos, a partir de agora, dar início a esta sessão temática realizada pela Comissão de Assuntos Econômicos e pela Comissão de Assuntos Sociais.
Portanto, com o tempo de quinze minutos, concedo a palavra ao Exmo Sr. Juiz Federal da 9ª Região Marlos Melek.
Espero que a pronúncia Melek esteja correta.
O SR. MARLOS MELEK - Sr. Primeiro Vice-Presidente do Senado Federal, Senador Cássio Cunha Lima, Srª Senadora Marta Suplicy, Presidente da Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal, Senador Tasso Jereissati, querido Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Maurício Godinho Delgado, estimado Prof. Hélio Zylberstajn, Paulinho da Força, Sr. Clemente Ganz Lúcio e Sr. Antonio Galvão Peres, em nome de quem saúdo a todos os presentes nesta sessão e também aqueles que acompanham pela internet ou pela televisão.
Nós vivemos um momento histórico no País e se faz necessário, neste primeiro momento, um agradecimento pelo convite da Comissão de Assuntos Econômicos e também da Comissão de Assuntos Sociais para que, com muita paciência, Vossas Excelências possam ouvir um juiz de primeiro grau nesta manhã, aqui no Senado Federal.
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Faz-se necessária uma breve apresentação.
Eu comecei a trabalhar, Senadora Marta, com 14 anos de idade, com carteira assinada, pegando ônibus lotado, trabalhando muito numa tornearia mecânica, num bairro chamado Boqueirão, em Curitiba, quase na Região Metropolitana, na periferia da cidade. Depois disso, fui jornalista. Abri uma empresa em seguida, e vendi essa empresa, com mais de mil empregados, dez anos depois. Eu tive a honra de ter a carteira de trabalho assinada e também de assinar milhares de carteiras de trabalho em todo o País. Depois, vendi a minha empresa para um grande grupo e resolvi me dedicar ao meu sonho, o sonho de ser juiz. Fui aprovado dois anos depois num concurso da magistratura, aqui em Brasília.
De lá para cá, fui Juiz Auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça, nos tempos da querida Ministra Eliana Calmon, também Juiz Auxiliar da Presidência da Corregedoria Regional da 9ª Região, no Paraná, e Juiz Auxiliar da Presidência, recentemente, no Tribunal Superior do Trabalho, aqui em Brasília. Por isso, posso lhes assegurar que tenho um ponto de vista bastante firme em relação ao que se está passando nessa modernização da lei trabalhista brasileira.
Tive a honra de ser convidado pela Casa Civil da Presidência da República, no final do ano passado, para desenvolver e ajudar em alguns textos legais trabalhistas e, neste ano, com muita honra, fui convidado pelo Deputado Rogério Marinho para integrar a comissão de redação final da modernização da lei trabalhista brasileira, o que fizemos com muito amor ao País, com muita responsabilidade e com elevado espírito republicano.
Dentro desse contexto, gostaria de dizer aos senhores que o Estado brasileiro trata com profunda hostilidade o empreendedor brasileiro. Eu não estou me referindo apenas ao Direito do Trabalho, Srs. Senadores. Estou me referindo especialmente ao Direito Administrativo. Todos sabemos que, para se conseguir um alvará numa prefeitura do Brasil, é muito complicado. Para se conseguir uma licença ambiental é um caos.
E o Direito Tributário, o que é? Se vocês venderem este copo como água, serão tributados como água. Mas, se o empreendedor brasileiro colocar três gotas de limão no copo d'água, o Direito Tributário brasileiro leva de três a cinco anos para dizer se isso aqui é água, água saborizada, suco ou refrigerante, cuja variação tributária é de mil por cento. E não há quem consiga ter o mínimo de previsibilidade e o mínimo de planejamento neste País. Até chegarmos ao Direito do Trabalho, que muitas vezes é colocado como o grande vilão da economia brasileira, mas é apenas uma ponta da hostilidade com a qual o Estado trata o empreendedor brasileiro.
Quando digo empreendedor, não é o grande dono do capital, como já tivemos outrora. É, na verdade, o pequeno e o microempresário, que geram, segundo o Ipea, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada do Governo Federal, de 60% a 70% dos empregos no Brasil, empresas que têm até 15 empregados.
Toda a redação da nova lei trabalhista brasileira foi pensada no pequeno e microempresário. A CLT, hoje, trata desiguais de forma igual, trata a pequena panificadora, a pequena padaria do seu bairro da mesma forma que trata a Petrobras, trata a pequena oficina mecânica - como aquela em que eu comecei a trabalhar com 14 anos de idade, no bairro do Boqueirão, em Curitiba - da mesma forma que trata o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal.
Rui Barbosa já ensinava que seria injusto tratar os desiguais de forma igual, pois todos devem ser tratados igualmente, mas à medida da sua desigualdade.
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Nós temos um custo Brasil embutido nas ações trabalhistas que é algo sensacional. Para vencer uma ação trabalhista, um pequeno empresário gasta pelo menos R$6 mil. E isso muitas vezes é utilizado como chantagem para se fazer um acordo a qualquer custo no primeiro grau.
Estou trazendo para os senhores a minha experiência não só de trabalhador, mas como empresário e também como juiz e professor de pós-graduação.
Três grandes princípios foram observados na escrita da nova lei trabalhista brasileira, que veio um tanto tímida do Governo Federal e foi robustecida graças ao Poder Legislativo, que foi o único Poder da República que conseguiu catalizar o sentimento brasileiro desse momento que nós vivemos, de uma CLT que é muito desequilibrada, porque o empregador de hoje é o desempregado de ontem.
A Câmara Federal, os senhores Deputados Federais foram os que conseguiram catalizar o sentimento da sociedade brasileira neste momento. E eu passei a respeitar e ter amor pelo Poder Legislativo brasileiro por ter a coragem de enfrentar essas questões tão delicadas.
Por que protelar tanto as reformas se são as reformas que vão devolver a prosperidade ao brasileiro?
Três grandes princípios foram observados para a construção e a escrita da nova lei trabalhista brasileira: os princípios da liberdade, segurança jurídica e simplificação.
Muitos criticam a velocidade com que tramitam na Câmara Federal e aqui no Senado as propostas de reforma trabalhista. Entretanto, quero lembrar aos senhores que é o trabalhador desempregado que engrossa uma fileira de 24 milhões de pessoas desocupadas no País, em idade economicamente ativa, engrossam uma fileira de 13 milhões de desempregados. Se isso que está aí é tão bom hoje, a que patrocinam então 13 milhões de desempregados.
A velocidade com que tramita a nova lei trabalhista brasileira nessas Casas Legislativas é aquela com a qual o trabalhador tem uma conta de luz em cima da geladeira, que vence depois de amanhã, e não tem dinheiro para pagar, é a velocidade com a qual o boleto bancário está embaixo da fruteira, em cima da mesa da cozinha, e a família desesperada do desempregado não tem condições de pagar. É essa a velocidade que a reforma trabalhista merece e que está sendo impressa nas Casas Legislativas desta Nação.
A nova lei trabalhista brasileira gera oportunidades, porque dá segurança jurídica para quem emprega. Dinheiro não leva desaforo para casa. Como o exterior olhará para o País se fizermos apenas pequenas emendas na lei brasileira? Quando todos, brasileiros e estrangeiros, olharem para o nosso País tão sofrido e virem que essa reforma é séria, profunda, com a mudança de mais de duzentos artigos da CLT, talvez passemos a ser olhados com mais seriedade pelo nosso povo brasileiro e também pelos estrangeiros, que são quem investe no Brasil. E são os investimentos que geram empregos, são os empregos que geram renda, é a renda que gera o tributo e tudo isso move a nossa economia.
Faço um apelo para que o nível do debate seja elevado, para que parem de estampar nas ruas, de forma covarde, o rosto e o nome dos Deputados que votaram a favor dessa reforma. Essas pessoas que patrocinam isso deveriam ter o mínimo de responsabilidade e assumir a parcela de culpa pela qual mergulharam este País numa recessão sem precedentes na história.
Qual direito a reforma retira do brasileiro? Qual direito?
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Olha, não resistem ao mínimo de racionalidade os discursos emotivos e ideológicos que estão sendo plantados.
Eu pergunto para você, trabalhador brasileiro: qual o direito que está sendo retirado? Vou dar alguns exemplos.
Muitos pensam que o aumento para 45 dias para colocar uma empresa na negativação é algo prejudicial ao trabalhador. Negativo! A execução, ou seja, a cobrança do devedor continua, Senadora Marta, começando em 48 horas - 48 horas, veja a velocidade da Justiça! Apenas a negativação do nome da empresa ou do sócio é que vai ter que esperar 45 dias, por quê? Para viabilizar que a empresa consiga um empréstimo para pagar a dívida trabalhista.
Outro exemplo. Covardemente foi colocado que a reforma permitiria que o trabalhador passasse a trabalhar diuturnamente 12 horas, isso não é verdade! Apenas foi legalizada a jornada 12 por 36, que é aquela do vigilante, da técnica de enfermagem, do médico, que já existe e que inclusive tem o selo de qualidade do Tribunal Superior do Trabalho. O trabalhador continuará laborando 8 horas por dia.
O problema da gestante. A nova lei não permite que a gestante trabalhe em ambiente insalubre, não permite! O texto da redação foi cuidadoso, coloca que somente poderá trabalhar, desde que ela, por livre e espontânea vontade, apresente atestado de médico da confiança dela. E caberá ao médico dizer se aquela insalubridade afeta ou não a saúde daquela trabalhadora, da lactação ou do bebê, e foi a própria Bancada Feminina que convergiu sobre isso na Câmara Federal. Muitas médicas trabalham em ambientes pouco insalubres e deixam de auferir valores expressivos ao final do mês. É por isso que isso foi feito. E insalubridade em grau máximo a própria lei definitivamente não permite.
A questão do art. 384, que determina que a mulher tenha 15 minutos de intervalo antes da jornada extraordinária. Foi retirado, sim. Parece um direito que foi retirado? Não é! É porque ela faz 15 minutos, mas, depois, sai 15 minutos mais tarde. Pergunte para qualquer trabalhador se ele quer isso?
Não perguntem para os burocratas de Brasília se a reforma vai gerar empregos. Não perguntem para os burocratas de Brasília se a reforma vai gerar empregos; perguntem para o setor produtivo, perguntem para quem assina a carteira de trabalho, perguntem para quem paga salário e dá emprego. Perguntem!
As horas in itinere. Na minha pequena jurisdição, na cidade de Campo Largo, o empregador concede uma van confortável, com ar condicionado, passando filminho da Maiara e Maraisa cantando, com banco reclinável. O sujeito fica lá 40 minutos, uma hora, para ir trabalhar de madrugada, e a empresa pode vir a ser condenada a horas extras por dar esse conforto.
Quando se retira da CLT o problema das horas in itinere, vai se permitir que as empresas sejam encorajadas a dar um transporte de qualidade para o empregado. Vocês sabem que, em São Paulo, qualquer um acorda às 4h30 da manhã para chegar ao trabalho às 8h. Pega o ônibus, metrô lotado, massa humana na Praça da Sé. E quem usa transporte público, que está sujeito a assalto, a chuva, a intempérie, a estupro, esse não tem hora in itinere; mas aquele que vai em uma van confortável tem, o que faz com que as empresas retirem isso.
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Na minha pequena jurisdição, na cidade de Campo Largo, no Paraná - terra do nosso querido Senador Roberto Requião -, o que aconteceu? As empresas tiraram essas vans confortáveis. E o que apareceu na minha vara, na minha unidade judiciária? Uma série de acidentes de percurso, porque o sujeito vai trabalhar de moto, na chuva, no frio, no escuro, e acaba se machucando.
Então, só quem não trabalha, só quem nunca trabalhou é que imagina que as horas in itinere são uma vantagem para o trabalhador.
O meu tempo está se esgotando. Vou passar à conclusão e dizer o seguinte: a reforma cuidou de três grandes eixos.
A racionalização das demandas. Hoje, segundo o CNJ, nós temos uma taxa de congestionamento na execução de 86%. A Justiça brasileira consegue resolver apenas 13% de tudo o que entra. Se tirarmos executivo fiscal e falarmos só da Justiça do Trabalho, o congestionamento é de 59%.
(Soa a campainha.)
O SR. MARLOS MELEK - A preservação dos direitos e a segurança jurídica. Temos muitas revoluções no direito do trabalho brasileiro, que eu colocarei na minha réplica ou tréplica se o tempo me for concedido.
E eu termino, neste primeiro momento, agradecendo a audição de todos.
E encerro com uma pequena música de Elis Regina, que me toca muito:
[...]
A esperança
Dança na corda bamba
De sombrinha
E em cada passo
Dessa linha
Pode se machucar
A esperança equilibrista
Sabe que o show
De [um povo] [...] artista [e tão sofrido]
Tem que continuar.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Agradeço ao Dr. Marlos Melek pela rigorosa observância do tempo, em primeiro lugar - contribui para o bom andamento dos trabalhos.
Para que nós possamos fazer o primeiro contraditório no âmbito da Justiça do Trabalho, concedo a palavra ao Exmo Sr. Ministro Maurício Godinho Delgado, do Superior Tribunal do Trabalho. (Pausa.)
Apenas um esclarecimento para os que não estão habituados ao sistema do Senado: esta campainha, quando falta um minuto para ser concluída a fala, ela é automática - para não parecer que este modesto Presidente é um indelicado, que fica a acionar a campainha. O sistema de som do Senado aciona automaticamente, independente da minha vontade, o alerta sonoro, para avisar ao orador que resta um minuto.
Tem V. Exª a palavra.
O SR. MAURÍCIO GODINHO DELGADO - Bom dia a todas e a todos.
Eminente Presidente, Senador Cássio Cunha Lima, meus cumprimentos especiais. Eminente Senadora, meus cumprimentos especiais, minhas homenagens. Eminentes Senadores, presidentes das comissões desta Casa que irão examinar esse projeto, meus cumprimentos também especiais.
Senadores presentes, demais autoridades, componentes dessa Mesa, agradeço o convite, que me traz a oportunidade de expor algumas ponderações sobre a reforma.
Eu tenho muito respeito pelo Parlamento. Estudo o trabalho do Parlamento há apenas 38 anos, como professor universitário. Fiz e fui professor de Ciência Política por 15 anos, mestre em Ciência Política, e depois me dediquei mais estritamente ao Direito. A minha admiração pelo Parlamento é significativa. O Parlamento é que fez a Constituição da República Federativa do Brasil, que é o documento jurídico e político mais importante deste País, da nossa história.
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A reforma trabalhista atual, nos meus curtos 15 minutos - por isso, naturalmente, a introdução tem que ser exígua -, é feita para todos os brasileiros. Ela deve, portanto, tomar em consideração o interesse de todos os brasileiros. A perspectiva tem de ser também a perspectiva humanística e social da Constituição da República Federativa do Brasil. A Constituição é o grande espelho, é o grande facho iluminador de qualquer modificação. Assim tem atuado o Parlamento ao longo dos últimos 27, 28 anos. E não poderia ser diferente nessa reforma trabalhista.
A reforma, como todos sabem, é bastante larga, profunda e é uma reforma que, com todo respeito, retira muitos direitos, mas com uma inteligência, com uma sagacidade sem par. Ela não faz a retirada automática. Ela permite que os direitos sejam retirados na prática. Então, aqueles que dizem que não há retirada de direito também não estão cometendo inverdades. Os direitos não estão exatamente todos sendo retirados. Poderão ser retirados no dia a dia da relação de emprego.
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - E nem precisa ser chamado de covarde por causa disso. Nós não vamos chamar ninguém de covarde porque fez isso.
O SR. MAURÍCIO GODINHO DELGADO - Os direitos podem ser retirados porque um dos grandes eixos da reforma é retomar uma realidade jurídica filosófica que já foi abandonada pelo Direito civilizado na Europa Ocidental há mais de 100 anos - no Brasil, há cerca de 70 anos.
Nós estamos diante de um contrato que é claramente de adesão. Todos nós sabemos disso. Nós, como consumidores, jamais aceitaríamos um Código de Defesa do Consumidor, construído por este Parlamento, que... E é uma das grandes obras deste Parlamento, entre tantas, porque, naturalmente, entende que a relação de consumo é uma relação desigual. Se o Código sufragar isso, ele, obviamente, não cumprirá o seu papel e, certamente, seria uma lei da qual todos nós teríamos nos esquecido. Entretanto, o Código do Consumidor, técnica e corretamente, entende que são poderes absolutamente diversos e, por essa razão, busca trazer um equilíbrio nessa relação jurídica.
Algum de nós vai dizer que isso prejudicou o País? Nunca, jamais prejudicou. Ao contrário, aperfeiçoou o nosso sistema econômico. Esse é o papel da legislação trabalhista.
A reforma trabalhista, entretanto, retoma um tipo de poder individual do empregador próprio do Código Civil de 1916, o qual este Parlamento já revogou - e produziu, inclusive, um Código Civil diferente, com mais de dois mil artigos, em 2002; vigora no País, portanto, há cerca de 15 anos e é também um grande diploma normativo.
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São três eixos centrais da reforma, do ponto de vista do projeto civilizatório constitucional, humanístico, social da Constituição da República, e, nessa medida, lamentavelmente a reforma vai de encontro a esse projeto civilizatório. Em primeiro lugar, como dito, ao exacerbar, alargar, retirar amarras jurídicas civilizatórias ao poder individual do empregador. Não se trata mais apenas de permitir a redução de direitos por negociação coletiva, não. Essa era a ideia que tínhamos no segundo semestre do ano passado quando se falava na reforma trabalhista. E já nos atemorizava, porque a negociação coletiva não foi feita na história para isso - eu chego a ela em um minuto.
O projeto, entretanto, foi muito além, ele se extremou, ele retomou uma prática do Código Civil de 1916, que considerava a relação de emprego como locação de serviços - filosoficamente, essa é a lógica do projeto -, e deu poderes quase incontrastáveis ao empregador individualmente, numa relação que é uma relação de um contrato de adesão, como se se tratasse de uma situação entre iguais. Obviamente que nós sabemos que toda a legislação civilizada do Ocidente já superou essa concepção individualista de igualdade meramente formal - a Constituição da República, o Código do Consumidor -, e o direito do trabalho, pioneiramente, havia feito isso.
Então, há várias, várias autorizações - várias! Obviamente, pelo tempo, não vou citá-las, mas todos da área conhecem bem; elas podem ser arroladas em texto escrito, minucioso, à disposição do Parlamento, como nós sempre fizemos na República.
A primeira vez em que estive no Parlamento foi em 1993 e aqui venho por todos esses anos, portanto, são mais de 20 anos contribuição desinteressada, desinteressada, à República, de um professor universitário de 38 anos, de um magistrado de 28 anos, de um autor de livros também de cerca de 30 anos.
O segundo aspecto é grave também, grave!
A lei também, voltando ao primeiro aspecto, já, de uma vez, elimina alguns direitos. Ela já diz, por exemplo, que várias parcelas não têm natureza salarial - várias; parcelas que hoje têm natureza salarial. Ao fazer isso, tecnicamente, ela já está rebaixando o ganho econômico do trabalhador, sem contar que está rebaixando também a arrecadação do Estado, mas está rebaixando o ganho econômico do trabalhador.
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Ao eliminar vários direitos que estão hoje consolidados - alguns já foram dados aqui como exemplo anteriormente - está-se rebaixando, sim, o patamar civilizatório mínimo alcançado pela legislação brasileira. Mas tão grave quanto isso, senão mais grave, exacerba novamente, voltando ao passado, o poder individual do empregador de determinar o piso de contratação. Há alguns institutos nessa linha que me parece que o Senado tem que extirpar. A população brasileira não merece regra dessa ordem.
A jornada intermitente é um contrato de servidão voluntária, é um contrato de servidão voluntária. Alguns de nós imaginam-se submetidos à jornada intermitente? O indivíduo simples, porque ele é o que mais vai se submeter à jornada intermitente, fica à disposição, na verdade, o seu tempo inteiro, ao aguardo de três dias de convocação, que vai fixar um certo tipo de horário de trabalho que pode variar de inúmeras maneiras. E ele vai receber por aquilo que trabalhou. Esse indivíduo sequer poderá ter crédito bancário, porque o salário dele é absolutamente desconhecido, nem o empregador sabe, nem ele saberá, depende da semana, do mês, do dia, do semestre. Realmente, é um contrato de servidão voluntária a que as pessoas pobres, trabalhadoras, humildes vão ter que se adequar.
Eu creio que o Parlamento não precisa fazer isso com os trabalhadores brasileiros. E o sistema capitalista não precisa disso para bem se desenvolver. Todos sabem disso, tanto que as grandes empresas jamais pensaram nesse tipo de vantagem tão extremada, desproporcional, exacerbada.
O segundo grande eixo - porque o meu tempo já está se encerrando - é o direito coletivo do trabalho. O direito coletivo do trabalho está sofrendo modificações que podem inverter a lógica da atuação dos sindicatos. Os sindicatos realmente existem para defender os trabalhadores; é natural que assim seja, assim como as entidades empresariais naturalmente defendem os interesses empresariais.
Na verdade, na sociedade simplificada sob esse ponto de vista da perspectiva das pessoas mais simples, os sindicatos estão se tornando a única instituição que fala na perspectiva dos trabalhadores. Todos nós sabemos que a grande mídia não solta uma única linha na perspectiva dos trabalhadores; é sempre na perspectiva contrária, numa linguagem altamente sofisticada, é claro, com todas as técnicas.
O projeto, entretanto, transforma o sindicato potencialmente num adversário dos trabalhadores, potencialmente, porque o sindicato vai poder retirar vários direitos trabalhistas pela negociação coletiva. É a instigação das más práticas individuais e coletivas.
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Imaginem a pressão que os dirigentes sindicais vão sofrer para retirar direitos. Esse não é o papel histórico dos sindicatos. Uma coisa é se fazer a adequação setorial negociada de alguns aspectos que podem e devem, como já se acolhe, fazer alguns ajustes.
(Soa a campainha.)
O SR. MAURÍCIO GODINHO DELGADO - Outra coisa é praticamente instigar os sindicatos a que reduzam direitos. Mas o próprio sindicato é enfraquecido. O projeto tem vários aspectos aparentemente contraditórios, mas, dentro de uma lógica de rebaixar o valor trabalho - compreende-se -, enfraquece fortemente os sindicatos brasileiros. Não há nenhuma razão para o sindicato não participar ativamente dessa representação dentro da empresa, nenhuma razão técnica, lógica. É evidente que essa representação não pode ser adversária do sindicato e vice-versa, pela lógica.
Finalmente, no plano processual, Sr. Presidente, também o projeto, no chamado Direito Processual do Trabalho,...
(Soa a campainha.)
O SR. MAURÍCIO GODINHO DELGADO - ... praticamente fecha o Judiciário às pessoas simples do País. Traz segurança jurídica? Sim, traz segurança jurídica, contra os direitos sociais individuais. Se você reduz os direitos sociais individuais, se a lei passa a criar várias fórmulas de supressão de direitos individuais sociais ao longo do contrato, se a lei transforma o sindicato em mais um agente de redução de direitos individuais e sociais, se a lei cria fórmulas sequenciais de quitação, se a lei abre espaço para a arbitragem privada no campo do direito individual do trabalho, quem paga o árbitro?
(Soa a campainha.)
O SR. MAURÍCIO GODINHO DELGADO - Por isso, a arbitragem privada não entra nesse tipo de relação. A arbitragem privada é fundamental para vários setores do direito, jamais para um campo das relações individuais sociais trabalhistas. São fórmulas de supressão manifestas do direito, comprovadamente.
Existem várias regras no projeto, e eu me disponho a ofertar por escrito documento que facilite essa compreensão - estou fazendo uma síntese, estou terminando. No plano do Direito Processual do Trabalho, fecha-se o Judiciário ao pobre e à pessoa simples trabalhadora do Brasil.
(Soa a campainha.)
O SR. MAURÍCIO GODINHO DELGADO - Ingressar com ação trabalhista, se aprovada essa fórmula, torna-se um risco terrível para o pobre. Só falta isto: o pobre ainda correr risco de sair com um passivo trabalhista às avessas. Gravíssimo. Há vários tópicos em que ação trabalhista vai ser fechada ao trabalhador brasileiro.
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Então, parece-me que, nos três planos, Direito Individual, Direito Coletivo e Direito Processual, o projeto, lamentavelmente, traz uma regressão profunda no Direito do Trabalho brasileiro e me parece que o sistema empresarial brasileiro é muito eficiente, nós somos uma economia muito forte e essa economia passa também pela população brasileira, pelos trabalhadores, trabalhadoras...
(Interrupção do som.)
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Ministro, Sr. Ministro, Sr. Ministro, por gentileza. Eu vou conceder mais um minuto para conclusão da fala de V. Exª. Apenas peço a compreensão. Já são três minutos além do tempo regulamentar, quatro. O meu receio é de que outros da Mesa possam me autuar por horas extras excedentes.
O SR. MAURÍCIO GODINHO DELGADO - Sr. Presidente, muito obrigado. Peço desculpas, então, por ter me alongado. Eu fiz um estudo, Sr. Presidente. Sempre que eu ingresso em qualquer matéria, eu me aprofundo, é a minha vida. Eu sou magistrado, professor e intelectual 24 horas por dia. Fiz um estudo profundo, mas, obviamente, em 15 minutos, é impossível que esse estudo seja trazido.
Eu quis aguçar a atenção do Senado da República, que é também a Casa da população brasileira. Parece-me que o Senado pode e deve corrigir excessos e desproporcionalidades do atual projeto de reforma trabalhista.
Presto minhas homenagens, mais uma vez, aos Senadores da República.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Ministro, eu agradeço a compreensão de V. Exª. Naturalmente e oportunamente, ao longo do debate, V. Exª terá a oportunidade de continuar expondo o seu conhecido saber jurídico no mundo do Direito do Trabalho.
Concedo a palavra, igualmente com o tempo de 15 minutos, ao professor da USP, Presidente e cofundador do Ibret, Hélio Zylberstajn.
O SR. HÉLIO ZYLBERSTAJN - Quero cumprimentar os Senadores da Mesa, os meus companheiros debatedores, e agradecer a oportunidade de poder contribuir para este debate. Espero trazer uma visão que complemente as visões que já foram e que serão apresentadas nessa Mesa.
A minha intenção hoje é refletir um pouquinho sobre a natureza de reformas trabalhistas e a possibilidade que existe em compará-las. Então, eu começo com esta pergunta: reformas trabalhistas são comparáveis? Eu vou tomar dois casos: a Europa continental e o nosso caso brasileiro, que está no processo de aprovação, de votação de uma reforma trabalhista bastante profunda.
Alguns itens para comparar. A Europa tem um problema de desemprego estrutural, um desemprego alto e perene. Já há mais de três décadas as taxas de desemprego europeias são enormes. Em contraste, o Brasil, historicamente, tem taxas pequenas, e o desemprego, quando cresce, é por fatores conjunturais, quer dizer, é o ciclo econômico, é a queda na atividade da economia que faz crescer muito o desemprego. Na Europa, também há um ciclo que afeta a taxa de desemprego, mas a patamares mais altos. Então, essa é uma diferença importante.
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Outra diferença importante está nos traços característicos dos sistemas europeus, que restringem o poder da empresa de demitir. Há uma restrição muito forte na demissão. Isso também contrasta com o nosso sistema, em que as empresas têm liberdade para demitir. Eu não quero entrar no mérito de se isso é bom ou ruim; eu estou constatando diferenças, e são importantes essas diferenças para entendermos objetivos e métodos de reformas trabalhistas.
Outra coisa importante na Europa: o sistema de negociação é plenamente desenvolvido. Aliás, a negociação precedeu a lei. Os trabalhadores conquistaram seus direitos, antes, pela via da negociação e, aos poucos, foram consolidando o que era preciso consolidar para construir o patamar mínimo pela legislação. No Brasil, a negociação coletiva é pouco desenvolvida, é muito truncada, é muito incompleta. Essa é uma outra comparação importante.
Foco das reformas no Brasil e na Europa. Na Europa, para enfrentar o problema do desemprego estrutural, o foco tem sido diminuir a rigidez na demissão. Há uma controvérsia enorme entre os economistas sobre se essa medida é correta ou não, os efeitos dessas medidas. Há mais de 30 anos eles fazem reformas nessa direção. Esse é o foco lá, o objetivo lá é flexibilizar a demissão. No Brasil, a reforma que está sendo discutida hoje tem um foco diferente: ela foca na negociação coletiva, no crescimento do espaço da negociação coletiva.
Objetivos da reforma na Europa: criar empregos diretamente pela reforma. Esse é o objetivo da reforma. O diagnóstico é que o emprego é impedido de crescer pela rigidez da demissão; então, nós vamos mexer na demissão para criar empregos. Se está certo ou não, esse é o objetivo, esse é o desenho. No Brasil, o que nós estamos fazendo neste momento é atuar nestas direções: estamos tentando reduzir custos de transação, ver incertezas, modificar atitudes dos atores sociais, ampliar o espaço da negociação e, indiretamente, criar empregos.
A mensagem dessa primeira parte da minha exposição é muito simples: não dá para comparar as reformas, porque muita gente tem argumentado que, como as reformas na Europa não são muito bem sucedidas, na visão de alguns analistas, o mesmo acontecerá no Brasil. Mas esse é um argumento falho, porque as reformas são diferentes. O objetivo lá é diferente do objetivo aqui.
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Eu quero mostrar para os senhores a natureza do nosso desemprego. Aqui, a linha azul é a taxa de desemprego medida pela pesquisa PNAD Contínua. Ela é muito recente, começou em 2012, mas vejam que há uma natureza cíclica. O desemprego começa a crescer quando começou o processo recessivo. O mesmo IBGE tinha uma pesquisa - que não existe mais, foi substituída pela PNAD Contínua -, que era a PME. A PME durou um espaço de tempo maior, e podemos ver, com mais clareza, a natureza cíclica do desemprego brasileiro. O desemprego brasileiro era alto no início da década de 2000 e foi diminuindo à medida que a atividade econômica cresceu. Quando começamos o processo recessivo, volta a crescer o desemprego.
Na Europa, nesses 18 países da Zona do Euro - são taxas anuais e, mais ou menos, o mesmo período -, há também um componente cíclico, mas fica claro que o piso da taxa de desemprego é muito mais elevado do que o nosso, só para mostrar a característica estrutural do desemprego e a preocupação da reforma trabalhista na Europa com esse fator.
Quais são os objetivos da nossa reforma, na minha avaliação? Ampliar e garantir o espaço da negociação, reduzir custos de transação, reduzir incertezas, modificar atitudes e criar empregos, como efeito disso tudo.
Eu separei sete medidas que mexem com a questão da negociação. Obviamente, a mais importante é a ideia da prevalência do negociado sobre o legislado, que é uma inovação. É uma inovação importante, apesar de ter sido proposta há muito tempo, mas essa vai ser uma inovação importante, porque vai criar oportunidades para ganhos mútuos. Na medida em que se pode aplicar um direito trabalhista de uma forma diferente, os dois lados podem ganhar com isso. Essa é uma perspectiva importante, que está sendo trazida pela proposta de reforma.
Há diversos outros itens que lidam nessa área do fortalecimento da negociação, e eu destaco a representação dos empregados na empresa, que, embora não seja sindical, vai exercer uma função muito importante na administração do conflito, pela via da negociação.
A dúvida que tem sido levantada: será que os nossos sindicatos são capazes de fazer essa negociação, ou eles serão massacrados?
Eu trago para apreciação dos senhores alguns resultados de um projeto que eu desenvolvo na Fipe, em São Paulo, e este aqui é o levantamento, desde 2008, da proporção de acordos e convenções coletivas dos reajustes negociados em relação ao INPC. Essa faixa mais escura representa a proporção de negociações que resultaram em reajustes menores do que a inflação, em que a mediana é menor do que a inflação. A faixa azul não tão escura, a proporção de reajustes iguais à inflação. E a faixa mais clara, acima da inflação.
Vejam que, mesmo no período mais profundo de recessão, em 12 meses, a proporção de reajustes abaixo da inflação nunca passou de 50%. Quer dizer, isso mostra que nossos sindicatos sabem negociar salários e sabem negociar também pisos. Vejam a evolução dos pisos medianos comparada com a mancha azul, que é o salário mínimo. Então, esses pisos são sempre elevados quando comparados com o salário mínimo, e essas barras de baixo mostram a relação entre piso e salário mínimo sempre acima de um, no eixo da direita, e às vezes se aproximando de 50%. Então, os sindicatos sabem negociar reajustes e sabem negociar pisos.
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Se eles têm esse know-how, essa tradição de bons negociadores, por que essa avaliação, a priori, de que eles não saberão negociar a aplicação dos direitos que hoje existem? Pelo menos duvidoso esse cenário.
Agora, o que os nossos sindicatos não sabem é negociar a solução de conflitos. Mas isso não é culpa só deles; é culpa do nosso sistema, porque o nosso sistema foi feito para que não haja negociação de conflitos, para que não haja administração de conflitos diretamente entre os atores envolvidos. O conflito é todo remetido para a Justiça do Trabalho.
Esse gráfico mostra, nas barras avermelhadas, o nível de emprego desde 1990. Vejam que em 2014 nós chegamos quase a 50 milhões de empregos formais e hoje nós estamos abaixo de 47 milhões.
A linha azul de baixo é a quantidade de reclamações na primeira instância da Justiça do Trabalho. No ano passado, nós quase chegamos a 3 milhões de reclamações novas.
A linha negra representa a taxa de reclamação. Eu divido a quantidade de reclamações no ano pelo nível de emprego no ano. E essa taxa, historicamente, é de 5%. Quer dizer, de cada cem trabalhadores formais, há cinco reclamando. Uma taxa de litigiosidade altíssima. Nenhum país tem isso aqui. E há países que têm Justiça do Trabalho, mas ela é usada excepcionalmente. Por quê? Porque os sindicatos e as empresas lá sabem e têm os mecanismos para administrar esses conflitos. Nosso sistema não foi desenhado para isso, e aí parece, para nós, natural que isso tudo seja encaminhado à Justiça do Trabalho. Mas não é assim no resto do mundo.
Então, a reforma tem esse segundo objetivo de reduzir esses custos de transação representados por essas reclamações, e essa é uma lista do que a reforma está fazendo nessa área. E a mensagem que sai dessa lista nessa área é que, se a reforma for implementada desse jeito, nós vamos atingir um objetivo muito importante: que a rescisão do contrato vai rescindir o contrato de trabalho. Hoje a rescisão não rescinde. A rescisão é só um recibo de quitação das verbas que a empresa diz que está pagando, e fica aberta a possibilidade de continuar o litígio na Justiça do Trabalho. Com a reforma, nós vamos trazer esse problema para os dois lados resolverem, e vai haver uma base jurídica, uma base legal segura para fazer isso.
Reduzir incertezas.
Eu contei 21 medidas, provavelmente, a mais. Então, essas são medidas importantes que vão conter, uma vez implementadas, o ativismo da Justiça do Trabalho, que gera tanta incerteza e tanta insegurança. Outra área muito importante dessa reforma.
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Mais ainda, só na área de jornada, há nove medidas que também vão reduzir a incerteza nessa área, algumas delas já foram mencionadas aqui.
Modificar atitudes.
Essa reforma vai modificar atitudes se ela for implementada e aceita, porque ela vai aperfeiçoar e simplificar o processo trabalhista. E aí são 18 medidas que eu identifiquei no projeto que vão nessa direção. Eu imagino que vai haver uma redução muito grande de reclamações na Justiça e as que forem à Justiça vão...
(Soa a campainha.)
O SR. HÉLIO ZYLBERSTAJN - ... ter um processo muito mais simplificado e muito mais eficiente na Justiça do Trabalho.
Há medidas opcionais, combate à informalidade. A reforma já olha para o futuro, já lança um desafio para a negociação coletiva regulamentar sem estarmos rompendo a nossa tradição. Nós vamos construir uma regulamentação do trabalho a distância por via da negociação primeiro, e, depois, pela legislação, e o trabalho intermitente, que é uma coisa muito importante, que está sendo enfrentada também.
O grande desafio é o fim da compulsoriedade da contribuição sindical. E aqui eu lanço uma pergunta. A CLT dos anos 30 e 40 enfraqueceu o movimento sindical, porque ela remeteu a estrutura sindical para a base territorial do Município. Ela estabelece que a menor base territorial...
(Soa a campainha.)
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB. Fora do microfone.) - Pode concluir.
O SR. HÉLIO ZYLBERSTAJN - Eu termino em um minuto.
A CLT remeteu o sindicato para a base territorial mínima, que é o Município, e deu a contribuição sindical. Vejam que a CLT não se preocupou em diminuir a base territorial, por exemplo, para a empresa, foi o Município. Depois, a Constituição em 1988 deu aos trabalhadores o poder de eles definirem as suas categorias, também com base territorial mínima no Município, e, uma vez reconhecida, aquela categoria passava a receber a contribuição sindical.
Então, a CLT foi a responsável pela fragmentação do sindicato brasileiro. Nos outros países, o número de sindicatos é muito menor, porque eles são sindicatos nacionais. E nós aqui induzimos à fragmentação, os nossos...
(Soa a campainha.)
O SR. HÉLIO ZYLBERSTAJN - ... sindicatos são municipais. Claro, isso é um desafio, o fim da compulsoriedade é um enorme desafio. Mas talvez ele reverta em fortalecimento do movimento sindical, talvez ele reverta esse processo de fragmentação, porque ele pode induzir fusões nos sindicatos. Como eles vão se sentir enfraquecidos e isolados, talvez eles se aproximem e formem entidades de maior envergadura, de maior densidade e maior poder.
E o emprego.
Como eu disse, a prevalência da negociação vai oferecer oportunidades, enormes oportunidades, vai melhorar a relação entre o empregado e a empresa, vai induzir o crescimento da produtividade, porque ela vai reduzir todos esses custos e o impacto será positivo, mas não é imediato. E não é certo também, porque ele vai depender dessas...
(Soa a campainha.)
O SR. HÉLIO ZYLBERSTAJN - ... coisas, amplitude da adesão - muitas das coisas são voluntárias, a própria prevalência da negociação é voluntária -, escolhas e adaptação dos atores sociais - eles vão ter espaço para escolher, esperamos que escolham na direção correta. Vai depender da rapidez com que essas mudanças vão ser induzidas e vai depender do comportamento da Justiça do Trabalho também. Vamos ver o que vai acontecer.
Muito obrigado. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Agradeço ao Prof. Hélio pela colaboração também com o tempo.
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Palmas pela elegância do debate.
Quero cumprimentar o doutor que usou a tribuna neste momento.
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Concedo agora a palavra ao Deputado Paulinho da Força.
Ao Deputado Paulinho não preciso fazer a justificativa de que a campainha aciona automaticamente. Paulinho é Parlamentar experimentado. Apenas faço a ressalva para que eu não pareça indelicado com os convidados, mas o acionamento é automático da campainha.
Tem V. Exª a palavra, Deputado Paulinho.
O SR. PAULO PEREIRA DA SILVA - Quero cumprimentar todos os Senadores - o Presidente Cássio, a Senadora Marta Suplicy, o Senador Tasso Jereissati -, cumprimentar todos os debatedores, cumprimentar todas as pessoas que estão aqui, especialmente o Sérgio Nobre, Secretário Geral da CUT, e o Mancha, do Conlutas, que estão presentes.
Queria dizer o seguinte: não podemos dizer que não houve debates lá na Câmara. Na verdade, houve lá uma série de reuniões, de audiências públicas, só que o Relator só ouviu e não aceitou nada do que foi falado. As centrais sindicais todas foram lá, apresentaram suas propostas e, infelizmente, o Relator se fechou e não tratou de nenhum dos assuntos.
Eu espero, Senador Cássio, que o Senado faça os reparos, porque há coisa aqui impressionante aqui que foi feita. Eu até imaginei que o relatório tinha sido feito por alguém que não entendia muito do mundo do trabalho, por isso um relatório tão ruim. Depois imaginei que, como há uma insatisfação popular contra nós políticos, a Câmara fez uma espécie de vingança contra o povo. Só isso podia explicar o que foi feito.
Eu queria até começar essa discussão - eu pedi aqui ao Ministério do Trabalho agora que me mandasse a relação de sindicatos do Brasil -, porque há uma discussão de que aqui existe sindicato demais. Então, o Ministério do Trabalho me mandou agora a quantidade oficial de sindicatos que existe no Brasil. Eu tenho dificuldade, por isso estou demorando. Aqui, no Brasil, há 11.327 sindicatos de trabalhadores, sendo 2.916 sindicatos rurais e 8.411 sindicatos urbanos; há 5.190 - as pessoas nunca tocam muito nesse assunto, não sei se se não interessam, Paulo Paim - sindicatos patronais, sendo 1.618 rurais e 3.572 urbanos; há 585 federações, sendo 411 de trabalhadores e 174 patronais; há 49 confederações, 36 de trabalhadores e 13 rurais.
Como vou entrar nesse assunto aqui, queria falar também do imposto sindical porque dizem... Normalmente, quando se fala de imposto sindical, há a impressão de que só os trabalhadores recebem. Então, os sindicatos de trabalhadores receberam no ano passado, Senador Tasso, R$2,172 bilhões.
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Os sindicatos patronais receberam R$777 milhões. E o Ministério do Trabalho recebeu R$582 milhões. Portanto, a contribuição sindical foi de R$3,532 bilhões.
Eu estou começando por isso porque aqui é muito sindicato? São muitos, essa quantidade de sindicato que temos? Nós temos que levar em conta, viu Hélio, quando você compara com outros países, normalmente compara com a França, um país deste tamanhinho. Aqui é um Pais continental, primeiro. São 5.570 Municípios, 16 ramos de produção - não é nem categoria, são ramos de produção, e o sindicatos representam categoria. Se você imaginasse ter um sindicato por cada município, portanto já haveria sindicato de menos aqui. Mas então há essa discussão de que aqui tem sindicatos demais.
E aqui os sindicatos defendem a categoria, e não os associados. É bom deixar claro isso porque quando o sindicato trabalha lá e defende a sua categoria, ele negocia para todo mundo, para os sócios e para os não sócios. Não dá para diferenciar se o sócio vai receber uma maior parte e o não sócio a menor parte.
Eu estou falando aqui como uma pessoa que defende a livre negociação, inclusive desses itens que estão aqui. Eu já apanhei muito do movimento sindical por falar isso, mas por que que eu defendo? Porque lá atrás, quando eu fui diretor dos metalúrgicos de São Paulo, havia a hiperinflação. Nós tínhamos até uma tabela, acho que vários sindicatos tinham uma tabela com os salários de todo mundo porque os salários eram indexados à inflação. Todo mês saía lá a inflação, nós soltávamos a tabela e os trabalhadores comparavam ali para verem o seu salário, que aumentou mês a mês.
Lá no Plano Real, no Governo Fernando Henrique, acabou então a indexação do salário com a inflação e nós passamos a fazer a livre negociação do salário. E o próprio Hélio, a quem nós respeitamos muito, apresentou aqui que, mesmo no ano passado - e o próprio relator na Câmara admite isso -, os sindicatos, mesmo na crise econômica que nós estamos vivendo, 52% dos trabalhadores do Brasil tiveram aumento de salário acima da inflação no ano passado. Se você voltar um pouco antes - está aqui o nosso diretor técnico do Dieese que pode apresentar isso -, se você voltar ao ano anterior, 92% dos trabalhadores tiveram aumento real de salário por causa da negociação dos sindicatos.
Então, esse punhado de sindicato que todo mundo fala que não serve para nada é o que aumenta o salário dos trabalhadores todos os anos na livre negociação. E graças a esses trabalhadores, a esses sindicatos, que muitos também dizem que não servem para nada, nós garantimos o mercado interno para poder comprar e fazer a economia girar.
Eu estou falando um pouco isso porque há uma onda aqui no Congresso contra o movimento sindical dos trabalhadores, porque do lado patronal não tem nada. Eu estou dizendo isso porque, a princípio, parece que não tira direito, não tem nenhum direito sendo tirado, eu vou mostrar aqui daqui a pouco, se o tempo permitir, que vários direitos foram tirados, mas cria-se... Veja bem o que vocês estão fazendo. O Hélio também citou isso aqui, disse que a coisa mais importante que tem aqui é a comissão de fábrica. A comissão de fábrica é uma comissão do patrão, porque ela não será eleita pelo sindicato.
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A comissão que nos interessa é a comissão que sirva como um braço do sindicato dentro da empresa. Além disso, o Relator - isto precisa ser corrigido - atribui uma série de questões que os sindicatos negociam para essa comissão negociar. Essa comissão é uma comissão eleita lá dentro da fábrica.
Primeiro, se há 11 mil sindicatos de trabalhadores hoje, pode acreditar, vai haver milhões de sindicatinhos, porque todas as empresas com mais de 200 trabalhadores vão poder criar sua comissão. E essa comissão, com as atribuições que foram dadas aqui pelo Relator, passa a ser uma espécie de sindicato de empresa. Então, quem está reclamando de 11 mil... Vai haver um milhão de empresas no Brasil, pelo menos, para defender o trabalhador local lá. Além disso, ele acrescenta que o acordo vale mais do que a convenção nessa questão.
Por outro lado, Hélio, tira o imposto sindical dos trabalhadores. Tira de todo mundo: tira dos trabalhadores, tira dos empresários. Só que eu mostrei aqui que o dinheiro que vai para os empresários é deste tamanhozinho: não toca num item do Sistema S. Vinte e dois bilhões, no ano passado, recebeu o Sistema S. Isso ninguém fala. Alguém pode dizer: "Não, mas o Sistema S é para garantir os cursos, a formação". Vai lá para ver quanto custa pôr seu filho para estudar. Vai lá para ver.
Além disso, os prédios. Aqui mesmo, do lado da minha casa - eu moro aqui na 202 -, pode ir lá: há um punhado de prédios lá, feitos por uma confederação patronal e alugado, inclusive, para o Ministério Público, para a Polícia Federal, para o Banco do Brasil. Está ali, do lado da minha casa. E para onde vai aquele aluguel? Vai para o Sistema S ou para a confederação?
É muito fácil tirar o dinheiro dos sindicatos e manter intacto o setor patronal. Quando você mantém intacto o setor patronal, destrói o lado de cá e desequilibra a negociação. O que estamos falando é exatamente isto: neste primeiro momento, estão todos os direitos garantidos, mas, na medida em que os sindicatos não têm recursos nem para andar de ônibus, como vai negociar? Como vai defender os trabalhadores?
Então, o que foi feito aqui foi um jeito, uma maneira... E agora se começa a descobrir, depois que vi aqui uma das pessoas falar, quem foi quem montou esse sistema. É um sistema para destruir a organização dos trabalhadores e manter intacto o setor patronal. Aí falam: "Vai negociar". Amarram a mão, amarram as pernas e falam: "Agora vai lá brigar com o cara". É isso que está sendo feito.
Por isso, o Senado precisa corrigir, porque senão se destrói a nossa organização dos trabalhadores, que nem a ditadura desorganizou, Marta. Nem a ditadura conseguiu. Mesmo na ditadura, os sindicatos negociavam.
Agora, o que nós estamos fazendo na tal da democracia é destruir a organização dos trabalhadores do Brasil inteiro, criar milhões de sindicatinhos e aí dizer - deixe-me até olhar o tempo ali, para entrar em outros assuntos - que estamos na livre negociação.
Eu sou defensor da livre negociação. Acho importante passar esses itens para os sindicatos negociarem. Acho quer vai funcionar. Agora, não se pode amarrar a mão e os pés dos sindicatos e dizer: "Vai negociar". Esse é o problema, porque, aí sim, todos os direitos dos trabalhadores vão ser perdidos.
Veja bem o negócio do PJ, que está aqui. Diz-se assim: você não pode pegar um trabalhador aqui e transformá-lo em PJ. Tem de ser com 18 meses. Mas eu posso mandar o trabalhador embora e pôr outro no lugar como PJ, ou não posso? Está aqui no projeto. Ou seja, todo mundo vai ser PJ. E ser PJ o que significa? Não tem férias, não tem décimo terceiro, não tem mais nada. Ele vai receber pelo contrato de trabalho e o Governo vai se lascar com isso, porque ele só vai pagar 10%, de acordo com a microempresa.
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Aqui há uma série de problemas.
Na questão do trabalho intermitente, o trabalhador vai ficar à disposição da empresa - vou pegar alguns detalhes para mostrar que tem que mudar isso aqui -, esperando uma ligação do patrão, para ver se ele vai trabalhar ou não e, se ele cometer alguma falha, ele paga 50% do salário. Se, por acaso, deu um problema na casa dele, se o filho ficou doente e tem de levá-lo ao médico, vai pagar 50% de um salário que ele nem recebeu, porque ele não trabalhou.
Permite que, para pessoas com mais de R$11 mil, é livre a negociação, vai negociar direto com o patrão. Qual a força de negociação que esse trabalhador tem?
As homologações passam a ser feitas nas empresas. Instituíram o caixa dois para pagar direito trabalhista agora, porque pode pagar em dinheiro. Querem que eu leia para vocês? Eu vou ler porque isso aqui é muito grave. Deixe-me achar aqui. (Pausa.) Vou pegando alguns aqui, que estão na lista. São coisas com que eu acho que vocês têm de se preocupar, senão o Governo é que vai perder com isso.
Parágrafo único do Art. 444: "A livre estipulação a que se refere o caput deste artigo aplica-se às hipóteses previstas no art. 611-A desta Consolidação, com a mesma eficácia..."
É isto que eu falei da pessoa que pode negociar diretamente com o patrão: "Art. 452-A, §4º: Aceita a oferta para o comparecimento ao trabalho, a parte que descumprir, sem justo motivo, pagará à outra parte, no prazo de trinta dias, multa de 50% (cinquenta por cento)..."
Isso aqui é para o trabalho intermitente que alguns de vocês estão considerando a melhor coisa do mundo.
Isso aqui é para problemas do caixa do Governo:
Art. 457 .....................................................................................................................................................................
§2º As importâncias, ainda que habituais, pagas a título de ajuda de custo, auxílio-alimentação, [vedado o pagamento em dinheiro, neste caso] diárias para viagem, prêmios e abonos não integram a remuneração do empregado...
Sabem o que vai acontecer aqui? As empresas vão pagar um salariozinho deste tamanho e o resto é tudo abono, tudo por fora. Ou seja, o Governo não receberá mais nada.
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO PEREIRA DA SILVA - Por último, eu queria dizer o seguinte:
Art. 477. Na rescisão do contrato de trabalho, o empregador deverá proceder à anotação na Carteira de Trabalho e Previdência Social, comunicar a dispensa aos órgãos competentes e realizar o pagamento das verbas rescisórias no prazo e na forma estabelecidos neste artigo.
..............................................................................
§4º O pagamento a que fizer jus o empregado será efetuado:
I - em dinheiro [...]
Aqui que estou dizendo que é o caixa dois para pagar direito trabalhista.
Além disso, tem um artigo muito grave aqui, o art. 484-A, que diz: "O contrato de trabalho poderá ser extinto por acordo entre empregado e empregador."
Caso aprovado isso, não demora seis meses e o Fundo de Garantia se acaba, porque permite que o trabalhador e o empregado possam fazer acordo e aí, sim, ele vai receber a metade dos direitos trabalhistas.
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO PEREIRA DA SILVA - Ou seja, ele vai fazer um acordo lá e vai-se pagar a metade, então, dos fundos, principalmente do Fundo de Garantia. Isso, com certeza, destruiria o Fundo de Garantia imediatamente.
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Então, há uma série de questões aqui que eu diria que precisam ser corrigidas.
O Senado tem a obrigação - pela importância que tem nessa discussão e por ser o órgão revisor - de revisar. Eu sei que o Governo está dizendo: "Nós vamos fazer a correção numa medida provisória." Aí vocês, aqui no Senado, aprovam uma loucura como essa que foi feita aqui. Eu diria o seguinte: o modelo é interessante - livre negociação -, mas isso não pode amarrar os sindicatos, não pode quebrar a estrutura sindical, não pode criar comissão para criar milhares de sindicatinhos, não pode deixar aqui...
Há aqui uma série de artigos que eu já passei, inclusive, para o Senador Romero Jucá e que quero passar para o Ferraço, nesta semana, e também para a Senadora Marta, para que a gente possa fazer essa correção aqui.
Não dá para esperar o Governo, ou acreditar que o Governo possa mandar uma medida provisória.
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO PEREIRA DA SILVA - Só para encerrar, Sr. Presidente.
O Governo, dias atrás, nos disse: "Olha, na questão a terceirização, vamos aprovar a terceirização que está na Câmara e vamos aprovar a terceirização que está no Senado. Aí a gente faz uma medida provisória para fazer a correção das duas." Até ontem não saiu a medida provisória.
Eu não posso reclamar que o Governo não tem ouvido, mas o Governo está parecendo o papagaio do português: ouve muito, mas não age. Ou seja, o Governo tem ouvido, mas não tem agido. Agora, ele diz: "Vamos fazer uma medida provisória". Quem é que garante que, na medida provisória, sairão as correções? Eu acho que precisamos fazer as correções. Eu diria que o Senado pode fazer isso, para ajudar, com certeza, a haver uma relação capital e trabalho moderna e justa para frente.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Agradeço ao Deputado Paulinho da Força.
(Soa a campainha.)
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Antes de passar a palavra ao próximo palestrante, ao próximo expositor, que será o Prof. Antonio Galvão, eu quero, com muita alegria e elevada honra, registrar a presença, nas galerias do Senado Federal, de professores e estudantes da Unesc.
Sejam muito bem-vindos! (Palmas.)
A Unesc é de Campina Grande, minha cidade natal.
E, para aumentar a minha emoção, coordenando esse trabalho, a Profª Heloísa, que foi minha professora no curso de Direito.
Então, tenho a honra de tê-los aqui, as demais professoras e os professores. O Senado da República os acolhe de forma muito fraterna.
Sejam muito bem-vindos!
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Ensinou bem. O aluno era ruim, mas a professora era boa.
Concedo a palavra ao advogado e professor de Direito do Trabalho, Antonio Galvão Peres, com igual tempo de 15 minutos, para que nós possamos, ao final desta etapa, ouvir o Diretor Técnico do Dieese, Dr. Clemente. Na sequência, passaremos então a ouvir a participação das Senadoras e dos Senadores.
Tem a palavra V. Sª.
O SR. ANTONIO GALVÃO PERES - Senador, antes de tudo, agradeço o convite feito pelo Senado. É uma honra estar aqui hoje, participando desses debates. Agradeço, na pessoa de V. Exª.
Estou impressionado também com as colocações que foram feitas, demonstrando que aqui se pretende um debate racional, se pretende um debate afastando argumentos extremados, extremistas, que é o que se tem visto no dia a dia, nos jornais, na posição dos movimentos nas ruas. Muitas vezes, acaba se ignorando o que de fato está no projeto e se passam a apresentar teses e considerações que acabam levando a uma deturpação do que está efetivamente ocorrendo, do que está previsto no projeto.
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Então, começo destacando que a dificuldade de debater esse projeto é exatamente a dificuldade de uma racionalidade - os extremos. Há um argumento constantemente apresentado de que há retirada de direitos nesse projeto.
Como já reconheceram expositores que me antecederam, efetivamente não há. Há, por exemplo, a possibilidade de uma negociação coletiva mais ampla. Isso pode ensejar a retirada de alguns direitos? Pode, de forma negociada, se o sindicato que representa os trabalhadores aceitar. Obviamente, como já demonstrado pelo Prof. Hélio Zylberstajn, existe um temor muito grande sobre a efetiva força dos sindicatos, que é contrariado, por exemplo, pelos salários que são alcançados, os reajustes superiores à inflação.
Então, essa ausência de racionalidade, esse debate pelos extremos, pode comprometer uma discussão mais séria, mais transparente e pode, eventualmente, influenciar alterações perigosas nesse projeto.
Outra questão que dificulta o debate de uma proposta de reforma como essa diz respeito a temas que são muito técnicos, é um debate muito técnico na doutrina trabalhista ou na jurisprudência trabalhista. Um exemplo: conceito de grupo econômico. Existe até hoje - a CLT é de 1943 - uma discussão nos tribunais sobre quais são os requisitos para que sejam consideradas as empresas integrantes de um grupo econômico. Ora o Tribunal Superior do Trabalho tem um entendimento, ora tem outro entendimento. Nos tribunais regionais do trabalho há uma variação de entendimentos, e esse projeto tenta definir, de forma clara, o que é um grupo econômico.
Agora, essa discussão pressupõe conhecimento desses debates que hoje acontecem na jurisprudência. O projeto tem a virtude de trazer para o texto da lei critérios mais claros, afastando a insegurança jurídica. Mas isso acaba exigindo um conhecimento de um plano de fundo disso, o que se discute nos tribunais a respeito desse tema.
Outra dificuldade para os debates são ideias boas que estão nesse projeto, mas que podem ter efeitos perversos. Um exemplo que me parece bem claro disso está na tarifação ou na definição de critérios para danos extrapatrimoniais. Por exemplo, um dano moral que tenha sido ocasionado a um empregado pelo empregador ou ao empregador pelo empregado. O critério que utiliza o projeto é o salário do empregado. Então, para uma ofensa leve, até tantas vezes o salário; para uma ofensa média, até tantas vezes o salário. Ora, ao dizer isso, esse projeto acaba dizendo também que a moral de um executivo da empresa vale mais do que de um empregado que tem um salário menor, porque a legislação está tarifada com base no salário.
A ideia é excelente, porque há uma grande insegurança jurídica. Os juízes hoje estipulam indenizações sem qualquer parametrização - e o projeto traz esses parâmetros. A ideia é excelente, foi até elogiada por outro Ministro do Tribunal Superior do Trabalho que já participou de assembleias aqui no Senado, mas me parece que o critério pode ser revisto, pode ser melhorado.
O projeto original na Câmara, como já foi dito anteriormente, ele tratava de quatro temas principais. E o coração daquele projeto era a definição dos limites da negociação coletiva - esse era o coração daquele projeto. E a definição dos limites da negociação coletiva é um debate antigo no Brasil. Já se tentou fazer isso no Governo FHC, já se tentou fazer isso no início do Governo Lula, no Fórum Nacional do Trabalho, e é sempre abandonado esse debate. E o projeto retoma esse debate.
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Então, esse debate já foi defendido em diversos governos anteriores. Em 2001, houve um projeto de lei também para alterar o art. 618 da CLT com esse objetivo. No Fórum Nacional do Trabalho, no início do primeiro governo Lula, também era uma das discussões que se apresentava. E, agora, retoma-se esse debate.
O método que usa o projeto é definir as matérias em que é possível negociar e as matérias em que não é possível negociar. Retomamos uma discussão antiga, colocada também em exposições anteriores. O que fazer primeiro? Uma reforma sindical ou definir de forma clara quais são os limites da negociação coletiva?
Então, há um temor de que ao definir de forma clara os limites da negociação coletiva, permitindo de forma clara a negociação de determinadas matérias, se os sindicatos são fracos, como se alega, haveria um prejuízo aos trabalhadores. Ora, ouvimos aqui, hoje, expositores que demonstraram que os sindicatos não estão negociando mal, e ouvimos também um representante histórico no movimento sindical favorável a essa negociação. Então, parece-me que esse é um temor exagerado.
Agora, obviamente, o ideal seria uma reforma sindical prévia para estabelecer uma efetiva liberdade sindical no Brasil, para depois definir melhor as regras de negociação. Mas isso exigiria uma reforma constitucional - os critérios estão na Constituição - e isso tem sido feito, ao longo dos anos, com algumas reformas. Por exemplo, já houve a alteração do sistema do poder normativo, já houve o fim da representação classista nos tribunais, já houve, com a Constituição de 1988, mudança do parâmetro do Estado Novo - o fim da interferência do Estado na organização sindical. Então, já houve alterações no modelo criado na Era Vargas, mas ainda persiste a unicidade sindical, limitando a forma de criação dos sindicatos, e ainda persiste também o imposto sindical, a contribuição sindical compulsória. Ambas as questões, tanto a unicidade sindical quanto a contribuição sindical compulsória, são entendidas pela doutrina, pela OIT, como violadoras do conceito de liberdade sindical.
Então, o Brasil não pode ratificar a Convenção 87 da OIT, que é a convenção que disciplina a liberdade sindical, porque o Brasil ainda, até hoje, mantém um modelo que foi criado na Era Vargas para cooptar os sindicatos, e mantém, até hoje, a contribuição sindical compulsória e a unicidade sindical. Os trabalhadores não têm liberdade para criar os seus sindicatos: eles podem criar observando as amarras da Constituição e as amarras da lei. Os empregados não podem optar quanto contribuir para o sindicato: eles são obrigados a uma contribuição mínima fixada pela lei. Então, isso é antidemocrático, isso viola a liberdade sindical, conforme critérios defendidos internacionalmente em convenções da Organização Internacional do Trabalho.
Hoje existem ainda muitos entraves à negociação coletiva. Havia a figura do poder normativo que, no caso do insucesso da negociação coletiva, as partes poderiam recorrer aos tribunais regionais ou ao Tribunal Superior do Trabalho, dependendo do âmbito, para que o tribunal definisse as condições de trabalho naquela empresa ou para aquela categoria, dependendo do tipo de dissídio coletivo. Então, isso, na verdade, acabava frustrando a negociação, porque, se não houvesse uma solução na negociação, já se sabia de antemão qual seria a resposta dos tribunais, porque os tribunais, em vez de examinar a realidade concreta de cada empresa ou a realidade concreta de cada categoria, criavam os chamados precedentes normativos. Então, se havia conflito, o tribunal aplicava o precedente normativo na sua solução, ou seja, já se antecipava uma solução no caso de insucesso da negociação coletiva. Isso não era bom nem para as empresas nem para os empregados, porque já se sabia de antemão qual seria uma possível resposta caso as partes tivessem que ir ao Judiciário.
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Existe também, como entrave à negociação coletiva, a falta de representatividade de alguns sindicatos. Isso é fato, não é possível ignorar isso.
Existe também, como entrave à negociação coletiva, uma constante presunção de fraude pelos tribunais, inclusive pelo Tribunal Superior do Trabalho. Há um grande número de reclamações trabalhistas, de ações civis públicas, nas quais acabam sendo anuladas normas coletivas que foram legitimamente negociadas pelos sindicatos que representam os trabalhadores. Há um sem número de hipóteses em que isso acontece. Eu posso dar algumas mais adiante.
E um entrave novo criado pelo Tribunal Superior do Trabalho é a ideia de ultratividade da norma coletiva. Ou seja, expirado o prazo de vigência da norma coletiva, enquanto não houver uma norma coletiva negociada pelas partes, a anterior continua valendo. Ora, isso também não é bom nem para os empregados nem para os empregadores. Então, se for negociada uma norma coletiva em um momento de crise, por exemplo, reduzindo alguns benefícios que eram concedidos anteriormente, o empresário vai dizer: "Não, não vou negociar, porque, se eu não negociar, eu continuo aplicando a antiga." Para os empregados, a mesma coisa. Se for negociada uma norma coletiva com muitos benefícios, eles ficam nesta posição cômoda: "Eu não vou negociar, porque, se eu negociar, eu posso ter que, na negociação, na barganha, retirar algumas coisas que eu já conquistei na norma atual."
Parece-me que a lógica de quem defende a ultratividade é sempre um constante crescimento, um acréscimo de benefícios. Ora, mas faz parte da negociação a barganha, faz parte da negociação a troca. Então, num momento pode ser melhor ter um plano de saúde de determinado tipo ou modelo; em um momento pode ser melhor ter um reajuste salarial muito superior à inflação. Cabe às partes, a cada momento, negociar isso de forma livre, de forma transparente, de boa-fé. Ao criar esse critério de ultratividade enquanto não houver nova negociação, o Tribunal Superior do Trabalho acaba desestimulando a negociação coletiva.
Aliás, uma outra coisa que deve ser mencionada: há um constante embate atual entre decisões do Tribunal Superior do Trabalho e decisões do STF. Essa súmula do Tribunal Superior do Trabalho que criou esse critério da ultratividade foi objeto de uma liminar no STF, suspendendo seus efeitos. Então, isso demonstra a importância que V. Exªs têm, como Senadores, em definir os critérios, em deixar clara qual é a regra. Porque, senão, caberá, no caso a caso, na casuística dos conflitos, aos tribunais definirem qual é a regra aplicável, só que depois que o fato aconteceu. Então não se sabe de antemão qual é a regra. Depois que o fato aconteceu, pode haver a definição: "Não, não era assim, é assado" - após o conflito instaurado.
Então esse projeto tem também a virtude de, ao definir critérios que hoje são controvertidos, ao adotar uma posição sobre questões controvertidas, reduzir a insegurança jurídica e trazer novamente ao Congresso Nacional o poder e a responsabilidade de legislar, de criar a norma original que vai ser depois interpretada pelos tribunais.
A negociação coletiva, como eu já mencionei, é tratada na Constituição Federal, é defendida de forma ampla pela Organização Internacional do Trabalho, e o Comitê de Liberdade Sindical tem um ementário de decisões com vários verbetes. E nesses verbetes fica claro que viola a liberdade sindical limitar a negociação coletiva. Então esse projeto, ao dizer de forma clara o que pode e o que não pode negociar, excluindo, por exemplo, questões que estão protegidas pela Constituição, questões que dizem respeito à saúde e à segurança do trabalho, está privilegiando a liberdade sindical, está definindo de forma clara o que pode negociar. Portanto, privilegiando a liberdade sindical.
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A meu ver, este é o aspecto mais importante desse projeto: permitir que os empregados sejam efetivamente representados pelos sindicatos nessa negociação.
Alguns exemplos apenas para demonstrar essa insegurança jurídica. Há uma portaria do Ministério do Trabalho com poder regulamentar, concedido legalmente, que admite o controle de ponto por exceção, ou seja, só são feitos os registros das exceções: o atraso, a hora extra. Presume-se a jornada contratual. Então, essa portaria admite esse controle por exceção quando decorrente de uma negociação coletiva. Essa portaria é de 2011, mas essa regra já existe desde uma portaria de 1995. Há muitas decisões no sentido de que, ainda que tenha havido uma efetiva negociação coletiva, uma norma coletiva disciplinando essa matéria...
(Soa a campainha.)
O SR. ANTONIO GALVÃO PERES - ... entendem que não é válida, porque não é a regra da CLT.
Então, vejam: o legislador delega ao Ministério do Trabalho o poder de regulamentar questões como essa; o Ministério do Trabalho regulamenta; a empresa negocia com o sindicato; e, depois, o Judiciário diz: "Não, essa negociação não é válida, e, como esse controle é inválido, presumo como verdadeiras as horas que estão indicadas na petição inicial da reclamação trabalhista." Então, vejam como isso pode gerar conflitos.
Outro exemplo, que já mencionei, a ultratividade das normas coletivas. Essa Súmula nº 287, do Tribunal Superior do Trabalho, teve, de repente, a redação alterada de um sentido para outro. E, quando houve essa alteração, em uma arguição de descumprimento de preceito fundamental, o Supremo Tribunal Federal concedeu uma liminar para suspender os efeitos dessa súmula. Vejam, mais uma vez, um exemplo de insegurança jurídica por falta de regulamentação de questões importantes no País.
A questão da redução do intervalo intrajornada. Mais uma vez, a CLT delega ao Ministério do Trabalho o poder de regulamentar determinadas questões.
(Soa a campainha.)
O SR. ANTONIO GALVÃO PERES - Há uma portaria de 2007, que ficou em vigor até 2010, permitindo a negociação coletiva da redução do intervalo intrajornada - o intervalo para refeição e descanso. A jurisprudência não admitiu isso: havia uma portaria do Ministério do Trabalho permitindo a negociação; houve a negociação, legítima; e, nessa negociação, ela não é respeitada pelo Tribunal Superior do Trabalho. Então, são muitos exemplos que podem ser dados.
A virtude desse projeto: definição de temas controvertidos, como mencionei; grupo econômico; sucessão trabalhista; trazer para a CLT também o precedente de desconsideração da personagem jurídica; definir quais são as responsabilidades do ex-sócio; definir quando há e quando não há tempo efetivo à disposição do empregador. E também, como já mencionado por expositores anteriores, outro marco desse projeto é a tutela da boa-fé. Então, os efeitos da quitação, conforme decisões do STF, quando há acordo coletivo....
(Soa a campainha.)
O SR. ANTONIO GALVÃO PERES - ... em plano de demissão voluntária, a definição...
A SRª PRESIDENTE (Marta Suplicy. PMDB - SP) - O senhor me desculpe.
O SR. ANTONIO GALVÃO PERES - Pois não.
A SRª PRESIDENTE (Marta Suplicy. PMDB - SP) - O seu tempo esgotou, por favor.
O SR. ANTONIO GALVÃO PERES - Então, há muitas questões. E esse projeto me parece um projeto muito importante, que deve ser debatido com racionalidade e boa-fé por V. Exªs, como é da natureza deste Senado Federal.
Muito obrigado a todos pela atenção. (Palmas.)
(Durante o discurso do Sr. Antonio Galvão Peres, o Sr. Cássio Cunha Lima, 1º Vice-Presidente, deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pela Srª Marta Suplicy.)
A SRª PRESIDENTE (Marta Suplicy. PMDB - SP) - Agradeço ao Prof. de Direito Antonio Galvão Peres.
Agora, com a palavra o nosso último expositor, Sr. Clemente Ganz Lúcio, Diretor Técnico do Dieese, por 15 minutos, por favor.
O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - Bom dia, Senadora Marta Suplicy, Senador Tasso Jereissati, demais Senadores e Senadoras, colegas deste debate. Queria agradecer o convite ao Dieese para participação nesta sessão e registrar a importância deste debate.
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Eu queria começar dizendo que a abordagem sobre a reforma trabalhista é fundamental, porque nós estamos falando da regulação das relações sociais de produção, e, ao longo da história, especialmente nos últimos 100, 150 anos, as sociedades desenvolveram sistemas de regulação, para que as relações sociais de produção pudessem ser feitas com certa intencionalidade. De um lado, garantir que a produção econômica tenha um incremento de produtividade; e, de outro lado, que elas possam ser realizadas com proteção social, dado que há um desequilíbrio estrutural na relação entre o trabalhador e a empresa contratante.
E aí o Hélio tem toda a razão quando diz que cada contexto histórico e nacional construiu, naquele contexto, o seu sistema de relações de trabalho e de regulação das relações sociais de produção, com uma legislação e com um sistema de negociação que estabelecem a relação de composição das regras das relações de produção. Mais lei, mais negociação, cada contexto histórico define - e aí um ponto fundamental - por algum nível de pactuação social. Portanto, sempre a construção dos sistemas de relações sociais de produção é resultado de algum nível de pactuação. E aqui há o primeiro problema com esse projeto: esse projeto não é resultado de nenhum processo de pactuação social das regras que vão reger as relações sociais de produção.
O Poder Executivo tomou a iniciativa de encaminhar para o Congresso um projeto de lei com meia dúzia de aspectos controversos. O Congresso Nacional, através da Câmara dos Deputados, toma a iniciativa de apresentar um projeto radical de mudança do sistema de relações de produção no Brasil. Em duas semanas, comunica o projeto e vota, sem nenhum debate. Como que nós podemos imaginar que as regras que vão reger uma relação social, para construir acordo, são feitas sem a construção de um pacto para reger as regras que vão elaborar as relações sociais de produção? Ela é uma imposição às partes de uma nova regra.
Eu quero resgatar três coisas do ponto de vista histórico. Eu tenho 40 anos de trabalho junto ao movimento sindical: participei, no governo Itamar Franco, do Fórum Nacional do Contrato Coletivo, no qual o Ministro Barelli conduziu, durante quase seis meses, um debate com empregadores e trabalhadores sobre as mudanças nos sistemas de relações de trabalho; participei de várias negociações do governo Fernando Henrique para as mais de 40 leis elaboradas e aprovadas aqui no Congresso, que flexibilizaram o direito do trabalho; participei, em 2003 e 2004, de mais de 500 horas de negociação multipartite - empresários, trabalhadores e Governo -, para construir um projeto de reforma sindical.
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Eu posso dizer, com toda a segurança, que nós temos acordo em várias coisas. Nós temos acordo, primeiro, de que estamos maduros, no Brasil, para estabelecer uma nova relação entre o que é legislado e o que é negociado. Então, nós acreditamos que é importante a valorização da negociação. Temos acordo. Temos acordo também de que, para a valorização da negociação, é preciso nós fortalecermos a capacidade das entidades representativas de interesses coletivos, trabalhadores e empregadores, que elas sejam altamente representativas. Temos acordo também de que o processo de negociação tem que ser feito em um ambiente de equilíbrio de forças e que há uma desigualdade entre o contratante e o contratado. Temos acordo também de que nós queremos que o resultado do processo seja acordos ou convenções com alta segurança jurídica para as empresas e para os trabalhadores. E temos acordo também de que nós todos queremos que os conflitos tenham solução voluntária e ágil. Sobre isso nós temos acordo.
Entretanto, esse projeto que é apresentado com esses fundamentos vai no sentido contrário desses fundamentos, porque um sistema de relações de trabalho tem que pensar o sujeito de representação, que nós dizemos aqui que é o sindicato; o processo de negociação; os instrumentos da negociação; a substância, lei e acordo; e qual o equilíbrio que nós queremos ter entre quanto da lei ou quanto do acordo.
Há um sentido que está sendo apresentado em que nós queremos migrar mais da lei para o acordo. E há um relativo debate no movimento sindical em que pode fazer sentido isso. O Paulinho mesmo disse - creio eu, disse ele - que gostaria que mais a negociação ocupasse sobre o direito do que a legislação. Para isso, nós temos que redesenhar o sistema de relações de trabalho. Nós temos que dizer o que é o sindicato e como ele é representativo, qual o processo de negociação na relação capital e trabalho, quais são os instrumentos que derivam e sobre qual objeto que ele pode construir.
Essa proposta de reforma enfraquece o sindicato, fragiliza a negociação, reduz o objeto da negociação e estabelece um sistema de segurança jurídica às empresas. Ela intencionalmente desequilibra a relação. Por quê? Porque há uma intencionalidade clara, no contexto das reformas que se apresentam neste momento no País e para a estratégia que está em curso, de que é necessário constituir uma base constitucional que permita uma redução estrutural do custo do trabalho. E para isso o projeto é perfeito. Ele permite uma redução estrutural do custo do trabalho.
Como disse o Godinho, ele não retira imediatamente nenhum direito. Ele é inteligente. Ele cria um processo que permite uma redução estrutural e permanente ao patamar necessário do custo do trabalho, para que nós, integrados internacionalmente, possamos competir com o custo do trabalho que for necessário: chinês, nigeriano, não importa qual. As nossas instituições hoje com todas as suas fragilidades, seja a Justiça, seja o sindicato, são uma trava a essa redução, e aí nós fazemos com a informalidade, com a rotatividade.
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A história mostra que nós temos diálogo social suficiente para fazer mudanças. Do jeito que está sendo feito não está sendo feito a partir do diálogo. E vai ser um desserviço a esse sistema, porque a história mostra que essa construção social é resultado de diálogo e de pactuações ou é resultado de muito conflito, cujo custo social para regular lá na frente é muito caro.
Então, a primeira coisa é que, se nós vamos mexer - e essa mexida pode significar um aguçamento dos conflitos -, o custo social e econômico para corrigi-lo lá na frente pode ser muito alto. A segunda dimensão importante desse nosso debate é que, se nós queremos construir essa intencionalidade, valorizar negociação, fortalecer sindicatos, solução voluntária e ágil dos conflitos e segurança jurídica, nós temos que repensar o sistema, temos que fortalecer os sindicatos. E, no caso, uma representação forte dos sindicatos no local de trabalho é fundamental.
Fala-se que, na Alemanha, há 16 sindicatos. Mas não se fala que esses 16 sindicatos têm de 60 a 100 mil organizações sindicais no local de trabalho, eleitas a cada três anos. Ninguém diz isso. Ninguém diz que a base de negociação disso não são 11 mil sindicatos. Talvez sejam 100 mil sindicatos no local de trabalho. Para comparar economias grandes.
Ninguém diz que a saída econômica da Alemanha foi uma saída negociada com sindicatos de acordos que conduziram a Alemanha à superação da crise, diferente de outros países, pactuada com os sindicatos, porque esses sindicatos têm um enraizamento na base social e econômica que permite que eles construam acordos de validade geral - acordo no local, acordo nacional e acordo intermediário.
Qual é o sistema que nós queremos? Nós queremos um sistema que pactue acordos no local de trabalho? Temos de ter um instrumento, se é para negociação, para fazer essa pactuação. Por que o projeto intencionalmente diz que a organização que vai pactuar no local fica proibida de ter a participação no sindicato se o objetivo não é retirar o sindicato dessa capacidade? Se nós queremos uma organização capaz de pactuar, o sindicato deve ter sua representação no local e uma organização coerente com ela. Os instrumentos devem ser coerentes, e o sistema de relação deve ser coerente.
Por que nós temos medo da ultratividade? Por quê? Por que a ultratividade faz mal? Nós temos de responder a essas coisas. O projeto responde a priori. Quanto do que está na legislação pode vir para a negociação? Esse é um acordo que nós temos de construir.
Num projeto de reforma... Quando discutimos, por exemplo, o projeto de reforma no Fórum Nacional de Trabalho, em 500 horas de negociação, a principal conclusão a que chegamos foi que, mais importante do que o produto final, é o processo de transição. Mais importante do que o modelo final é como nós transitamos do modelo atual para o novo modelo. A transição ajuda a desenhar o modelo final. E ele pode ser, inclusive, construído durante o processo de transição, de tal forma que o resultado final seja um processo de acúmulo da experimentação que resulta num padrão novo de relações de trabalho: mais negociação, menos legislação; mais fortalecimento dos sindicatos, mais negociação, mais instrumentos específicos ou gerais.
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Então, precisamos ter claro que, se nós queremos fazer... E nós temos afirmado, há décadas, que nós precisamos modernizar o nosso sistema de relações de trabalho. Estamos satisfeitos com ele? Não, 40% da força de trabalho não tem proteção sindical, vive na informalidade e provavelmente não terá proteção previdenciária. Esse projeto aumenta a exclusão do acesso à previdência, precariza, fragiliza.
Se é isso que nós queremos, nós estamos no bom caminho. A previdência ficará equilibrada, não vai haver aposentado, nós vamos diminuir o número daqueles que acessam a previdência, ela se equilibra. Mas não me parece que seja esse o nosso objetivo. Se nós queremos favorecer a negociação, fortalecer o entendimento, favorecer a pactuação, nós precisamos ter um sistema coerente com essa nossa intenção. Estamos dizendo: estamos maduros para superar aquilo que a CLT dizia de hipossuficiência na relação entre trabalhadores e empregadores, dando maior capacidade política para que os trabalhadores determinem o modelo de relações de trabalho. Criemos instrumentos para isso. O projeto não faz isso.
Se nós queremos ter um sistema de mediação - e é disso que nós estamos falando - que permita que as relações de trabalho sejam relações que sustentem uma estratégia de crescimento econômico, assentado na agregação de valor, assentado no incremento de produtividade, assentado no fortalecimento do mercado interno pela geração de emprego e pela geração de salário, o sistema...
(Soa a campainha.)
O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - ... tem que ser coerente com esses princípios. Ele tem que expressar esses valores. O projeto não pode ser um atalho para permitir que as empresas tenham legalizadas as inúmeras formas de trabalho precário.
Então, é evidente que um projeto como esse, na medida em que faz essa afirmação indireta, induz a uma visão do que nós seremos como sociedade e como economia. Nós não seremos, como somos, uma das maiores economias do Planeta, uma sociedade desenvolvida se não tivermos capacidade de imaginar um sistema de relações de trabalho que seja capaz de dar suporte ao crescimento econômico, ao crescimento da produtividade e à sua repartição, pelo emprego e pelo salário e pelas políticas sociais. Esse projeto não está preocupado...
(Soa a campainha.)
O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - ... com nada disso. Para que nós tenhamos condições, é preciso fazer um outro projeto.
A nossa primeira sugestão, para terminar, era que nós pudéssemos elaborar, de forma multipartite, sob o comando do Congresso, um verdadeiro projeto de modernização das relações de trabalho no Brasil, chamando os empresários, os trabalhadores, o Poder Executivo, as justiças, e dizermos: está aqui o projeto. Em dois, três, quatro meses de trabalho, nós elaboramos. Nós já fizemos isso.
Em segunda parte, que nós pudéssemos ter, a partir dessa formulação, as escolhas dos caminhos que nós queremos trilhar enquanto sistema de relações de trabalho, que dá suporte ao nosso desenvolvimento econômico. E que nós tivéssemos a clareza, pela experiência histórica e internacional, que nenhum tipo de modernização desse tipo gera emprego. O que ele faz é dar sustentação a que uma economia, orientada para a intencionalidade de um sistema que fortalece a relação capital-trabalho, é capaz de sustentar transformações econômicas e sociais no longo prazo, que, para uma economia desenvolvida, gera emprego e gera salário. Se nós errarmos na direção, nós afundamos a nossa economia. Se nós errarmos na direção, nós aumentamos a pobreza. Se nós errarmos na direção, nós aumentamos os conflitos no espaço de trabalho.
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Talvez daqui a alguns meses ou anos estejamos aqui discutindo as graves crises no interior das empresas que um sistema frágil de relações de trabalho não permite mediar. Não me parece que é isso que o Brasil precisa. Por isso a urgência de nós darmos um outro...
(Interrupção do som.)
O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO (Fora do microfone.) - ... tratamento a este projeto.
Obrigado. (Palmas.)
(Durante o discurso do Sr. Clemente Ganz Lúcio, a Srª Marta Suplicy deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pelo Sr. Tasso Jereissati.)
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Agradeço aos nossos convidados, e passamos agora ao debate que teremos então.
Estão inscritos aqui, presentes, o Senador Ferraço, como Relator; a Senadora Marta Suplicy, como Presidente da CAS; e presentes aqui, dos inscritos, Senador Paulo Rocha e Paulo Paim. O Lindbergh Farias está? O Lindbergh está aqui e o Requião saiu.
Passo a palavra, então, ao Senador Ricardo Ferraço, como Relator deste projeto. A princípio, para que haja uma interação, um maior dinamismo, Senador Ferraço, eu estou propondo para que a gente faça cinco minutos, para que haja uma possibilidade de uma réplica, de uma tréplica se for necessário, na primeira parte da pergunta, já que nós temos poucos Senadores.
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - Pois não, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - De acordo?
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - Perfeitamente.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Senador Paim, que sempre reclama de mim? (Risos.)
Então, passo a palavra ao Senador Ricardo Ferraço.
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Tasso Jereissati, Presidente da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado; Senadora Marta Suplicy, Presidente da Comissão de Assuntos Sociais; as duas Comissões que, de forma conjunta, estão fazendo esta sessão temática para debater este tema de absoluto interesse do nosso País. Quero cumprimentar os nossos convidados e agradecer a contribuição.
O contraditório que foi estabelecido aqui é fundamental para que nós possamos ampliar, aperfeiçoar a nossa massa crítica e o nosso juízo de valor em relação às controvérsias todas que, naturalmente, estão subordinadas a um tema como esse. Mas há algumas questões às quais eu gostaria de dirigir, Sr. Presidente, de forma objetiva aos nossos convidados, saudando e agradecendo a cada um deles.
O Dr. Mauricio Godinho Delgado, digno Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, fez aqui algumas afirmações extremamente preocupantes. Uma delas é que nós, se aprovarmos este projeto, estaríamos, por lei ordinária, desobedecendo determinação constitucional. Por óbvio, uma lei ordinária não tem força para se confrontar com qualquer artigo da nossa Constituição Federal, considerando a hierarquia das leis.
Eu me refiro, portanto, ao art. 7º da Constituição Federal e os seus 34 incisos, que consagram os direitos fundamentais da pessoa que trabalha na área urbana ou que trabalha na área rural. E uma dessas questões está exatamente no caput do art. 7º da Constituição Federal, quando consagra que são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros, que visem à melhoria da sua condição social. A melhoria da sua condição social.
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A quem é dado o direito de definir esta classificação? Ao trabalhador ou ao juiz? Ao trabalhador ou ao Estado?
Há uma questão conceitual que nós precisamos enfrentar, porque a CLT foi editada numa outra circunstância política, numa outra circunstância econômica e social, com um intervencionismo, com o Estado tutelando a vida e os valores individuais e coletivos das pessoas. Então, essa é uma primeira questão que está no contorno dessa afirmação que fez V. Exª, de que estaria o Congresso brasileiro, por lei ordinária, invadindo o que está consagrado na Constituição Federal.
Mais adiante, fala V. Exª, e estou me dirigindo a V. Exª porque essas são questões preliminares. Essa é uma questão central. A partir dessas observações, as demais questões de mérito, por mais relevantes que sejam... Mas esta é uma questão preliminar que dialoga, enfim, com o Estado de direito democrático.
A outra questão é que afirma V. Exª que essa legislação inibe, proíbe, dificulta o acesso à Justiça do Trabalho das pessoas mais pobres. Em nome de quem nós devemos estar aqui, direcionando as nossas atenções e as nossas atitudes? Isso também fere um outro artigo da Constituição, o inciso LXXIV do art. 5º, que determina que...
(Soa a campainha.)
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - "O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos". Portanto, por lei ordinária, de novo, eu não posso subtrair esse direito que está garantido ao cidadão brasileiro pela nossa Constituição Federal.
O art. 790 da atual CLT estabelece, no seu § 3º, que:
É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior ao dobro do mínimo legal, ou declararem, sob as penas da lei, que não estão em condições de pagar as custas do processo sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família.
Há indicativos de que, hegemonicamente, grande parte daqueles que vão a juízo declaram serem pobres, mesmo não sendo. Então, o que faz a mudança e, para isso, peço a observação e o concurso de V. Exª. Qual é a mudança que se tem aqui? Continua sendo facultado ao juiz àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. Isso acolhe aproximadamente 80% dos nossos trabalhadores. E 62% dos nossos trabalhadores recebem até dois salários mínimos.
Mas, além disso, no § 4º do mesmo artigo proposto, o benefício da Justiça gratuita será concedido à parte que comprovar insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo.
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É uma questão essencial, porque se nós inviabilizamos o acesso da pessoa mais desprotegida, mais vulnerável, à Justiça do Trabalho, isso é muito perverso.
Então, eu gostaria de merecer uma atenção de V. Exª em relação a esse tema, porque me parece que há aqui contradições que eu não estou conseguindo... E, na condição de Relator, eu preciso firmar um juízo de valor em relação a esse tema, porque jamais eu colocarei na minha biografia, em meu relatório, algo que possa obstruir o acesso da pessoa mais frágil, mais pobre à Justiça. Imagina! Isso não teria pé e não teria cabeça. Seria, como diz o poeta: "O avesso do avesso do avesso". Mas entendo eu que isso tem proteção constitucional.
Então, eu queria merecer uma abordagem de V. Exª à luz dos fatos, e os fatos são muito fortes.
Eu também gostaria de merecer de V. Exª uma atenção em relação a um fato que para mim é muito caro, porque passa a impressão de que nós estamos aqui legislando para o conjunto da sociedade brasileira. E nós não estamos legislando para o conjunto da sociedade brasileira, pois o IBGE e mesmo o Dieese asseguram que o Brasil tem 137 milhões de pessoas em idade laboral. Dessas, 49 milhões de pessoas, 50 milhões de pessoas estão protegidas, blindadas pela CLT. Mas outros 90 milhões de brasileiros não estão blindados pela CLT: pela informalidade, que nós sabemos, que campeia em nosso País. Esse é um dado da vida real.
Então, na condição de Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, como o Tribunal Superior do Trabalho convive, dialoga, enfrenta essa questão do necessário esforço que precisamos fazer para formalizar o emprego, que garante, inclusive, benefício para os nossos trabalhadores, o que é uma coisa central.
Então, eu gostaria de merecer de V. Exª essas observações.
Ao Dr. Melek - cumprimentando e agradecendo a sua presença -, V. Exª fala que essa proposta dialoga hegemonicamente com o micro e o pequeno empresário, que é gerador de quase - ou mais um pouco - 50% dos empregos que são gerados neste País, e isto é muito importante, porque revela a capacidade empreendedora da população brasileira. Quais são as evidências objetivas, na nova proposta, que trabalha o fortalecimento ou a flexibilização,...
(Soa a campainha.)
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - ... sempre com proteção, desta questão?
Do Dr. Hélio - já vou encerrar, Sr. Presidente - eu gostaria de uma abordagem mais aprofundada a respeito do acordado versus o legislado, porque há decisões do Supremo Tribunal Federal, inclusive com repercussão geral, garantindo essa situação. E muito se tem falado que o acordado sobre o legislado também confrontaria um princípio e um direito fundamental. E eu gostaria que V. Sª pudesse nos honrar aqui com uma avaliação a respeito dos impactos do que está previsto neste projeto e foi alvo da fala que V. Sª fez, na medida em que isso dialoga e...
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
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O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - A outra questão, eu gostaria que V. Sª também, com o amplo conhecimento que tem, pudesse falar um pouco da jornada intermitente. A jornada intermitente é uma invenção brasileira?
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Senador Ferraço, só lembrando que os vossos cinco minutos foram os cinco minutos mais alongados...
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - Mais dilatados.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - ...da história.
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Senador Tasso, eu ia sugerir que ampliasse para todos dez minutos. Cinco minutos é muito pouco tempo num debate como esse. Ninguém vai falar em cinco minutos. O Senador já falou mais de dez minutos e eu também quero dez minutos. Eu acho que o ideal seria estender para todos os Senadores.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Eu estava dando um tratamento um pouco diferenciado ao Senador Ferraço pelo fato de ele ser o Relator.
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Nós temos todo o tempo para debater isso aqui. Eu não vou falar sobre a reforma trabalhista em cinco minutos.
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - Eu já estou encerrando, Sr. Presidente, pedindo desculpas a V. Exª, e, aos meus colegas, escusas, mas eu já vou encerrar.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Nós vamos, atendendo ao Senador Lindbergh, estender para dez minutos.
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Pronto.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - E alongamos aí.
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Muito obrigado, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - E V. Exª, por favor, conclua para que a gente...
O SR. HÉLIO JOSÉ (PMDB - DF) - Sr. Presidente, inscreva-me por favor.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Porque nem todos... V. Exª já está inscrito.
O SR. HÉLIO JOSÉ (PMDB - DF) - Obrigado.
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - Já caminho para o encerramento, Sr. Presidente.
Ao Prof. Hélio Zylberstajn, cumprimentando e agradecendo a presença de V. Sª, uma palavra sobre a jornada intermitente, sobretudo na atividade comercial e de serviços.
Há uma preocupação com a banalização da jornada intermitente para além...
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - Uma avaliação de V. Sª em relação a esse tema: jornada intermitente. Esse tema dialoga, acho eu, muito mais com a atividades de comércio e serviços, e das consequências para uma banalização para a atividade industrial, para o chão de fábrica de questões ligadas à jornada intermitente.
Ao Diretor do Dieese, o Sr. Clemente Lúcio, V. Sª fez aqui uma fala que este projeto valoriza de fato a negociação e que, nessa negociação, a partir desse novo marco, há um desequilíbrio nessa negociação entre sindicatos e empreendedores, enfim, empresários e trabalhadores. Eu gostaria que V. Sª pudesse, de alguma forma, falar sobre contribuições que poderiam estar sendo incorporadas nessa...
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - Que pudessem trabalhar o fortalecimento para que essas negociações individuais ou coletivas pudessem se dar em equidade, com equilíbrio, o que também considero ser fundamental num sistema capitalista, mas um sistema capitalista que não seja primitivo, muito menos selvagem.
São essas as considerações que faço, Sr. Presidente, agradecendo a V. Exª a generosidade pelo tempo a este modesto relator.
Muito obrigado.
(Durante o discurso do Sr. Ricardo Ferraço, o Sr. Tasso Jereissati deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pela Srª Marta Suplicy.)
(Durante o discurso do Sr. Ricardo Ferraço, a Srª Marta Suplicy deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pelo Sr. Tasso Jereissati.)
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, Senador Ferraço.
Passo, então, a palavra à Senadora Marta Suplicy.
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP. Fora do microfone.) - Hélio José é antes.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Mas V. Exª é Presidente. Estou dando-lhe como Presidente da CAS essa preferência.
A ideia é que nós façamos em bloco de três Senadores.
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Gostaria de saudar os palestrantes, que em cada audiência nós temos conseguido, realmente, fazer os aprofundamentos necessários. E faremos todas as audiências necessárias para que consigamos ter os esclarecimentos para cada Senador e Senadora se sentirem contemplados nas suas dúvidas.
R
Eu gostaria... Eu estava tentando achar aqui no meu celular. Se o João Paulo puder me enviar de novo, porque eu não estou achando, a questão dos 15 minutos das mulheres... É que elas têm 15 minutos antes da hora extra para poderem descansar. E eu tenho aqui o Juiz Federal do TRT, Dr. Marlos Melek, que fez uma consideração contrária, dizendo que isso não tinha mais sentido de existir, porque inclusive a mulher quer sair antes, e tem que ficar 15 minutos a mais. Ontem eu ouvi de outra pessoa que isso já passou, que a mulher não quer mais essa prioridade.
A minha questão é a seguinte: eu acho que se fala que é uma prioridade, mas agora ela tem igualdade e tal. Que eu saiba, homem não menstrua. Por que eu digo isso? Porque, para uma mulher que está menstruada e trabalhou oito horas, com intervalos, etc., esses 15 minutos podem ser muito importantes para ela. E a maior parte da classe trabalhadora não é mulher pós-menopausa; é mulher em idade reprodutiva.
Então, eu gostaria que V. Exª fizesse uma reflexão. Bom, se algumas mulheres não necessitam, porque o período menstrual é de uma vez por mês, se algumas mulheres não necessitam, porque não necessitam mais e se algumas mulheres não acham isso necessário, como é que nós poderíamos fazer?
Estou tentando encaminhar alguma coisa de bom senso, porque simplesmente retirar pode prejudicar. Simplesmente dizer para as mulheres que cada um faz como quer vai criar uma confusão na empresa. Então eu gostaria, se algum de vocês... Quem mencionou isso foi o Dr. Melek, por isso estou dirigindo a pergunta a ele, mas que os outros pudessem fazer uma consideração sobre isso, porque é uma coisa real.
A outra questão é da insalubridade. Por isso estou querendo achar o artigo... Espere aí, agora já achei. Está aqui, é o 394.
V. Exª deu uma explicação, que eu entendi, mas a sua explicação era o contrário do que eu tinha entendido aqui. Vou ler:
A empregada gestante ou lactante somente poderá trabalhar em ambiente insalubre mediante apresentação de atestado médico que comprove que o ambiente não afetará a saúde ou oferecerá algum risco à gestação ou lactação.
Aqui está muito claro que ela só vai poder trabalhar em ambiente insalubre se apresentar o atestado médico. O atestado médico que ela tem que apresentar é de que ela é gestante. Fora isso, ela não tem que apresentar atestado médico de que o ambiente não afetará a saúde. Hoje a lei não exige isso.
(Soa a campainha.)
A SRª MARTA SUPLICY (PMDB - SP) - Então, gostaria que V. Exª pensasse sobre essa questão, porque nós sabemos que esse é um direito que existe no interior do Estado mais carente, como existe como existe no Estado de São Paulo e em grandes empresas. Aliás, quanto maior a empresa, as regras são mais respeitadas, mas nas empresas menores vão dizer para essa mulher... Onde ela vai arrumar um médico? Em algumas empresas, espertamente - sabemos que às vezes ocorre -, vão arrumar o médico da empresa para dizer não é uma insalubridade tão ruim assim que vá afetar o feto. Então, eu acho que isso é muito sério e gostaria que V. Sª pudesse emitir alguma reflexão.
R
Gostei muito da exposição do Sr. Clemente Ganz, do Dieese, que falou do equilíbrio de forças. Outros também falaram sobre o equilíbrio de forças. O Dr. Delgado também mencionou, porque a questão do negociado versus legislado, nós temos que chegar a um consenso sobre isso, porque é bom, no sentido de que as empresas já fazem, as pessoas querem, vai aliviar o Ministério do Trabalho. Tudo isso indica que há alguma coisa que tem que acontecer, mas eu fico com uma questão: se nós estamos enfraquecendo os sindicatos, e parece que é nessa direção que a reforma está, como vamos fazer essa negociação para o trabalhador estar protegido? Isso foi levantado aqui. E eu gostaria então... Dos que se posicionam diferente, eu quero ver a argumentação. Não tenho uma coisa fechada. Quero ouvir a argumentação de quem garante que teremos um sindicato que não vai ser como o Paulinho colocou, uma comissão de fábrica que acaba não tendo força. Não temos o equilíbrio. Esta Casa não quer ser meramente uma casa carimbadora. Nós queremos fazer o melhor. E o melhor muitas vezes não está claro para nós.
Então nós vamos fazer, mesmo que seja difícil, o enfrentamento político, qualquer coisa desse gênero. Nós vamos fazê-lo, desde que tenhamos a convicção de que é o melhor para o Brasil, para a dinâmica da economia, para a modernização da reforma trabalhista. E aqui há um consenso de que deve ser mexida, mas também que o trabalhador não seja um perdedor nessa história, sem politização e sem ideologização, porque a minha preocupação como Presidente da CAS é dar o melhor encaminhamento, honesto, correto, do que estamos vivendo hoje.
E há outra questão - ainda tenho dois minutinhos. O Sr. Antonio Peres falou da parametrização, que é bom, mas tem que ser melhorado. Eu gostaria de ouvir também, na sua avaliação, rapidamente, quais seriam os principais itens para essa melhoria.
São esses os meus pontos.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, Senadora, principalmente dando o exemplo e cumprindo rigorosamente os dez minutos, menos de dez minutos.
Passo a palavra então ao Senador Hélio José.
O SR. HÉLIO JOSÉ (PMDB - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, senhores debatedores, bom dia a todos. Parabéns por estarem aqui.
Este é um momento muito importante para a classe trabalhadora brasileira, o momento de esclarecermos as propostas que estão sendo colocadas. Realmente há uma inquietação muito grande em todos os setores.
R
Eu não consegui, até hoje, entender. Depois do trabalho intenso que o Ministro do Trabalho teve, de unificar a classe trabalhadora via centrais sindicais e o setor produtivo, de se reunir com o Presidente da República, de encaminhar um projeto amplamente apoiado por todos os setores, pelas centrais sindicais, pelo setor produtivo e pelo Governo, via Ministério do Trabalho, o projeto ser tão desconfigurado como chegou ao Senado Federal.
Então, como a nossa nobre Senadora Presidente da CAS, Marta Suplicy, coloca... Nós, inclusive, tivemos uma reunião da nossa Bancada com o Senhor Presidente da República nesta semana. Nós não somos carimbadores do que vem da Câmara. Esta é uma Casa revisora.
Sinceramente, sou ferrenho defensor da proposta inicial, apresentada pelo Ministro do Trabalho, que garante a relação entre patrão e empregado de uma forma mais harmoniosa, que garante a sobrevivência dos sindicatos, entidades importantes para todos nós e para os trabalhadores, que garante o direito do setor produtivo de ter uma relação de trabalho melhor, mais embasada, mais real e faz a revisão do que tem que ser feito na CLT, sem selvageria.
Tive a oportunidade de ser signatário de um documento que o PMDB fez ao Senhor Presidente da República, solicitando que não sancionasse o projeto da terceirização da forma que foi votado na Câmara. Era um projeto que, naquele momento, não correspondia à situação real do trabalho.
O Senador Paulo Paim, eu e vários outros fizemos um longo debate do PLC nº 4.030 aqui nesta Casa e no Brasil inteiro. Estava amadurecendo uma proposta mais adequada com relação à questão da terceirização. Por isso nós solicitamos que não sancionasse aquele projeto, aprovado de uma forma muito rápida na Câmara Federal, da noite para o dia. Ele estava engavetado. O Presidente da República anterior tinha colocado que aquele projeto não coincidia com as questões do Governo. E, para mim, um governo é a continuidade do outro. A República continua. Muda o governo A, B, C ou D, e a República continua.
Por isso uma parcela significativa de Senadores do PMDB, compreendedores da situação...
Sou do setor elétrico. Fui do sindicato do setor elétrico. Fui da Central Única dos Trabalhadores por muito tempo, não escondo isso. Fui do Partido dos Trabalhadores por 30 anos. Vivi a relação e a conquista dos trabalhadores, dos seus direitos. Não podemos assinar embaixo da retirada de todos os direitos da forma que está sendo colocada.
Consequentemente, eu gostaria de ouvir de cada um dos debatedores por que não retornar ao projeto que foi amplamente apoiado pelo setor produtivo e pelas centrais sindicais? Se houver mais algum ajuste, que o Governo o faça por medida provisória, faça como quiser.
A gente volta ao projeto original. Aprovemos aqui. A Câmara volta a discutir o projeto original, que foi amplamente apoiado por todos. O Presidente da República tem outros instrumentos se necessitar fazer algum aperfeiçoamento, que eu não conheço.
Eu apoio o projeto do Governo, o projeto encaminhado pelo Ministro do Trabalho, Ronaldo, que foi desconfigurado pela sanha selvagem daqueles que querem precarizar e destruir a relação de trabalho e emprego e os seus representantes em nosso País.
R
Então, deixei claro para o Presidente da República. Eu tenho compromisso com o Governo, apoiando o projeto que o Governo encaminhou na Câmara dos Deputados, no qual houve consenso entre central sindical e setor produtivo. Quanto a esse projeto que veio do nosso Ilustre Marinho, aprovado pela Câmara como foi, eu não tenho compromisso em votá-lo nem em apoiá-lo.
Então, precisamos aperfeiçoá-lo nesta Casa. Precisamos avançar nessa discussão. Na nossa CAS, com a nobre Senadora que está aqui, vamos fazer um intenso debate. Eu sou membro da CAS. Sou membro também da CCJ, onde haverá um debate. Não sou membro da CAE nesta oportunidade, mas tenho certeza de que os colegas que estão na CAE farão um grande debate nesse sentido complementar.
Estava olhando os planos na Espanha e do México que em nada contribuíram para o aumento do emprego. Um país que está com 14 milhões de desempregados, um país que está precisando retomar o crescimento e o desenvolvimento optar por situação que vai precarizar mais, que vai diminuir o salário, que vai achatar mais a situação, eu não vejo como isso possa contribuir para a retomada de um país que nós queremos que volte ao crescimento. Então, eu sou apoiador do Governo, mas não estou aqui para carimbar tudo aquilo que vem a fórceps, e não vai nos atender.
Então, eu queria que os nossos nobres debatedores pudessem dizer qual é a incoerência de voltarmos à proposta original do Governo, porque foi amplamente discutida e apoiada pelas centrais sindicais e pelo setor produtivo, retirando a selvageria.
Com relação à questão da terceirização, o setor elétrico, aonde trabalhei por 36 anos da minha vida, não admite erro. Não adianta o eletricista ir lá... Se pegar no lugar errado, morre, é carvão. Não tem conversa. É da vida que se está tratando. Então, não dá para pegar o cara que ganha três salários mínimos e contratar um que ganha um ou ganha um e meio para colocar no lugar, sem formação e sem condições de trabalhar.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. HÉLIO JOSÉ (PMDB - DF) - Pois é. Esse é o mundo real. Não dá.
A Senadora Marta colocou a questão da insalubridade para as pessoas que trabalham em certas repartições, sobre a vida, a condição orgânica delas. Vai ficar muito mais difícil a velhice dessas pessoas. Por isso essas pessoas precisam ser percebidas de uma forma distinta e têm que ter oportunidades diferentes de trabalho, com espaçamento adequado.
Eu, eu aqui, euzinho aqui, Senador da República do Brasil, tive a oportunidade de vestir a roupa de limalha de prata e de me sentar na linha energizada com 500 mil volts para ver como se trabalha para substituir uma cadeia de isoladores, para substituir um equipamento. Eu sei o que é a pessoa estar submetida, de fato, a um risco, a uma situação que não permite vacilo. Então, não dá para pegarmos atividades-fim e, de forma intempestiva, precarizar tudo.
Precisamos urgentemente que o PLC nº 30 venha a plenário para podermos votá-lo, permitindo que essa sanha de terceirização selvagem seja contida. Não podemos permitir essa pejotização total, pela qual o mais prejudicado vai ser o brasileiro pobre, porque não vai ter o recolhimento adequado de imposto. As pessoas não recolherão. O nosso nobre Rachid tem deixado claro o descontentamento com relação a isso, que é preciso consertar também nesse projeto.
R
E há essa questão de substituir a relação do trabalhador com o sindicato e com o patrão. Se o patrão, hoje, chegar para o trabalhador, que é o fragilizado, que está numa condição difícil, e disser: "Você vai ter o emprego só se reduzir o salário ao meio", o trabalhador, coitado, para não passar fome, acaba cedendo. É por isso que tem que haver um sindicato. Então, não dá para admitirmos essa intermediação direta.
Outra questão: é incompreensível tirar a homologação do sindicato. A homologação era a garantia de uma demissão justa para o trabalhador, porque o sindicato fazia a correção, através de seus advogados, através das pessoas. Isso acontecia com a homologação sendo feita pelo sindicato; de repente, o sindicato não serve mais para fazer homologações.
(Soa a campainha.)
O SR. HÉLIO JOSÉ (PMDB - DF) - Quer dizer, são coisas pequenas, mas que são grandes para a relação do trabalho. E precisamos retirar e mudar.
Eu vou ficando por aqui, dizendo que nós temos lado: o nosso lado é o lado do Brasil, é o lado da volta do desenvolvimento, é o lado da realidade.
Ninguém está aqui, como a nossa nobre Senadora Marta Suplicy colocou, para carimbar obrigatoriamente o que vem da Câmara. Respeitamos a Câmara como instituição, mas o Senado brasileiro tem direito de fazer as mudanças necessárias, de aperfeiçoar projetos e der fazer com que os...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. HÉLIO JOSÉ (PMDB - DF) - Ô, Paim, desculpa, meu Líder. Você é nosso Líder.
A SRª PRESIDENTE (Marta Suplicy. PMDB - SP) - Senador.
O SR. HÉLIO JOSÉ (PMDB - DF) - Concluo, então, Senadora Marta Suplicy, agradecendo a V. Exª por esse espaço.
Fico aqui para ouvir os nossos nobres colegas falando que concordam 100% com o nosso Ronaldo Curado Fleury, Procurador-Geral do Trabalho, e com suas transparências.
Muito obrigado. (Palmas.)
(Durante o discurso do Sr. Hélio José , o Sr. Tasso Jereissati deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pela Srª Marta Suplicy.)
A SRª PRESIDENTE (Marta Suplicy. PMDB - SP) - Obrigada, Senador.
Com a palavra o Senador José Medeiros.
V. Exª abdica a sua fala? (Pausa.)
Então, o próximo é o Senador Raupp; não está. Rose não está. Dário Berger não está. Ana Amélia não está.
Paulo Rocha.
O SR. TASSO JEREISSATI (Bloco Social Democrata/PSDB - CE. Fora do microfone.) - Você fez com quatro Senadores.
A SRª PRESIDENTE (Marta Suplicy. PMDB - SP. Fora do microfone.) - Faltou um?
O SR. TASSO JEREISSATI (Bloco Social Democrata/PSDB - CE. Fora do microfone.) - Não. O bloco era de três.
A SRª PRESIDENTE (Marta Suplicy. PMDB - SP) - Já fizemos três?
O SR. TASSO JEREISSATI (Bloco Social Democrata/PSDB - CE. Fora do microfone.) - Faz bloco de quatro.
A SRª PRESIDENTE (Marta Suplicy. PMDB - SP) - Então, vai ser bloco de quatro, tudo bem? Bloco de quatro.
O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Sr. Presidente da CAE, nossos convidados, Parlamentares, trabalhadores que estão assistindo ao nosso debate aqui, no plenário, e todos aqueles que nos assistem pela TV Senado, é fundamental esse processo de debate.
Primeiro, eu queria que ficasse registrado nas atas que esta é uma comissão conjunta da CAE e da CAS que estamos realizando no plenário do Senado. Isso é muito fundamental e muito importante para assegurarmos um calendário de discussão, dada a complexidade do tema envolvido aqui. Os dois nobres Presidentes das duas Comissões sabem por que estamos falando isso. Então, é fundamental que fique registrado isso.
Segunda coisa, nós somos Senadores da República e representamos a chamada Federação; no entanto, aqui também há uma pluralidade que representa também os interesses dos vários setores da sociedade brasileira. Aqui estão representantes dos bancos, representantes dos grandes empresários, representantes do capital produtivo, representantes dos trabalhadores, das mulheres, dos negros, enfim, de todos os setores da sociedade, até porque nós vivemos numa sociedade de interesse. Então, nós respeitamos todos os nossos convidados, exatamente para trazermos o que a chamada sociedade organizada está pensando sobre o tema.
R
Estou falando isso para chamar a atenção do primeiro convidado, o Sr. Juiz do Trabalho, Sr. Marlos Melek, que fez uma intervenção aqui, ao meu ver, meio atabalhoada. Felizmente os nossos outros convidados resgataram a qualidade do debate político, mas, se fosse nos termos em que V. Sª começou, inclusive desrespeitando a acusação daqueles que pensam diferente...Felizmente os nossos outros convidados resgataram a qualidade do debate e do tema, que é fundamental.
Eu queria falar um pouco sobre a história da classe trabalhadora no País, que sempre buscava, através das suas lutas, os seus interesses, como melhor organização entre capital e trabalho e o equilíbrio, de que falou o Clemente, sobre essa questão da relação entre capital e trabalho.
Foi no período de 1903, acho, que iniciou a qualificação desse processo, quando a classe trabalhadora criou a central sindical, a chamada COB (Confederação Operária Brasileira). Ali começou, digamos assim, uma forma mais qualificada e organizada nesse debate em busca do equilíbrio da relação capital e trabalho.
E, na década de 30, a principal bandeira que se levantava da relação capital e trabalho era a questão da jornada de trabalho, porque existia uma jornada de trabalho estafante, até escravista, de 12, 14, 16 horas de trabalho. Pois bem, foi ali que a classe trabalhadora levantou, como forma de reorganização do capital e do trabalho e desse chamado equilíbrio na relação capital e trabalho, a jornada como principal bandeira, porque era o que apertava mais sobre os trabalhadores.
Tanto assim, que, pela força do processo de organização dos trabalhadores, o governo de então foi obrigado a ceder. E, para não atender aquilo que o Paulinho levantou, da questão das diferenças e de sindicato, criaram-se, para intervir na organização dos trabalhadores, os chamados sindicatos oficiais - e só tinham acesso àquele direito aqueles que fossem filiados aos sindicatos oficiais. Quanto aos sindicatos que não estavam na oficialidade, aqueles trabalhadores não tinham direito àquelas conquistas. Os oficiais nós chamávamos de sindicatos amarelos.
Pois bem, processou-se a luta e avançou-se mais ainda; tanto assim, que forçou-se Getúlio Vargas a implementar o compêndio chamado CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), que ele importou da chamada Carta del Lavoro, da Itália, que era uma experiência a partir do governo autoritário.
R
Estou dizendo isso para falar o seguinte: eu faço parte da história da luta dos trabalhadores, venho de um movimento sindical em que nós já nascemos questionando alguns pontos da CLT; era papel do Estado intervir na relação entre capital e trabalho; e nascemos sob a égide da chamada Convenção 87, na qual nós defendíamos, a organização para se buscar esse equilíbrio em relação a liberdade e autonomia sindical.
É fundamental colocarmos isso aqui, porque este projeto que está aí - a chamada reforma trabalhista, que foi tão defendida, apaixonadamente, pelo nosso juiz lá de Campo Largo - traz o retrocesso de tudo aquilo que a organização da classe trabalhadora, pela sua história, conquistou. São avanços importantes, que retornam décadas - se não século -, neste processo da relação capital e trabalho. E foi exatamente esta a história da classe trabalhadora: a busca da respeitabilidade.
Pela concepção que veio aí, acha que a geração de emprego é um favor que o setor produtivo cria para os trabalhadores. É um favor: "Ah, eu tenho necessidade de pagar a minha luz ao final do mês, portanto eu tenho que agradecer aquele que está me gerando um emprego e eu tenho que aderir, de qualquer forma, a esta forma de emprego." Isso nós já deixamos para trás há algum tempo. Nós nos organizamos e colocamos, na Constituição Brasileira de 1988, avanços fundamentais, que trazem esse equilíbrio e empoderam a organização sindical, a organização dos trabalhadores e a organização patronal, para buscar, na negociação coletiva, este equilíbrio, valorizando e respeitando o capital, mas valorizando também a mão de obra. Não é favor nenhum criar emprego! "Só tenho que lhe dar emprego por causa da sua necessidade de pagar, ao final do mês, as suas contas..."
Eu venho de um Estado em que os conflitos maiores se davam exatamente na questão da terra, e há uma região chamada Ilha do Marajó - é a região mais pobre do Brasil. E vem, ainda desta época, esta relação na qual as grandes fazendas davam, como favor, para a pessoa trabalhar - porque não havia local para morar, tudo era ocupado pelos grandes latifúndios -, a casa e davam a comida. A pessoa tinha autorização para pescar no rio o peixe para poder comer.
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) - Isso aí significa o seguinte, pela visão que está sendo proposta: nós temos que trocar o emprego por esta relação entre capital e trabalho lá de trás.
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Ou seja, o que é esta chamada lei trabalhista? Primeiro, há ilegitimidade na sua iniciativa, porque está sendo imposta por um Governo que não representa, hoje, esta democracia que nós conquistamos, e ela traz, parece, uma imposição de setores que também não vai resolver a questão do emprego. Essa combinação da reforma trabalhista e da reforma da previdência se submete a interesses do capital financeiro internacional e que acaba não gerando...
(Interrupção do som.)
O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) - ...aquilo que o nosso juiz disse, a geração... (Fora do microfone.)
... do emprego, porque o capital financeiro não gera emprego. Nenhum país, na história de seu desenvolvimento, desenvolveu-se só a partir do capital especulativo.
Por isso, essa legislação que está sendo proposta não só tira o poder do trabalho - aquilo que já conquistamos na relação equilibrada de capital e trabalho - como dá poder ao empregador. E o trabalhador apenas adere... Ela não estabelece uma relação de contrato de trabalho, conforme já foi falado aqui; faz uma adesão, da forma como se estabelece nessa legislação, tirando direitos.
Portanto, ela desorganiza a estrutura sindical e tira direitos já conquistados ao longo do tempo.
Por isso...
(Interrupção do som.)
O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA. Fora do microfone.) - Mais um minuto, só para concluir.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Acabou... Mais um minuto.
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) - Nós vamos fazer todo um esforço, com todos os setores, com os Senadores e as Senadoras, de buscar que a gente corrija esse projeto que veio da Câmara. Da forma que veio, ele não vai resolver o problema da nossa economia, nem o problema do emprego e vai tirar direitos dos trabalhadores e desorganizar a estrutura sindical, que precisa ser modernizada, precisa avançar; mas não vai dar conta de resolver esses problemas.
Portanto, é problema de concepção, não são pontos ali e acolá que têm que ser consertados. É questão da concepção da legislação que está posta aí.
(Durante o discurso do Sr. Paulo Rocha, a Srª Marta Suplicy deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pelo Sr. Tasso Jereissati.)
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, Senador Paulo Rocha.
Nós vamos passar, então, a palavra aos nossos convidados, para que respondam às indagações feitas por quatro Senadores. Em seguida, nós temos aqui inscritos o Senador Paulo Paim, o Senador Lindbergh, a Senadora Regina e a Senadora Gleisi. A proposta seria que nós fizéssemos esse grupo de Senadores após a resposta dos senhores convidados.
Vou respeitar a ordem de palestra dos senhores convidados.
Com a palavra o Exmo Sr. Marlos Melek, Juiz Federal do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região.
R
O SR. MARLOS MELEK - Obrigado, Senador, pela palavra.
Vou iniciar, então, respondendo aos questionamentos da Senadora Marta Suplicy, primeiramente, em relação ao artigo 384 da CLT, que prevê 15 minutos de intervalo para a mulher depois do expediente ordinário.
Na minha explanação inicial, eu não tive oportunidade, pela limitação do tempo, de aprofundar o tema, o que vou fazer agora para V. Exªs.
Em primeiro lugar, o art. 384, que prevê 15 minutos de intervalo para a mulher, teve uma equiparação pelo Supremo Tribunal Federal também para a figura do homem. Segundo, quando você dá esse intervalo de 15 minutos, esse intervalo tem que ser computado pela lei atual ao final da jornada, e não há nenhum trabalhador que queira sair mais tarde ainda do trabalho.
Outro aspecto importante para se colocar é que não é proibido, muito ao contrário, que a mulher - no exemplo pontual que a Senadora Marta Suplicy nos apresentou, que pode estar nos dias de menstruação ou no dia de alguma inconveniência física - possa se dirigir ao toalete, que ela possa realizar suas higienes pessoais.
Então, o que nós estamos tratando, na verdade, são de 15 minutos no momento em que a empresa mais necessita, que é o da hora extraordinária. Imaginem os senhores parar a fábrica inteira ou parar uma aeronave voando para fazer 15 minutos de intervalo.
Outro detalhe é que esses 15 minutos são tratados pela própria CLT, ao final do Capítulo da Proteção ao Trabalho da Mulher, como infração administrativa. E os tribunais do trabalho construíram o julgamento, de maneira jurisprudencial, de que isso é hora extra. Então, em verdade, esses 15 minutos hoje estão em descompasso com a necessidade do próprio trabalhador que vai mais tarde para casa. E nada impede que a mulher ou o homem possam realizar a higiene pessoal antes do início da jornada.
Eu não sei, Senador Jereissati, por gentileza, quanto tempo eu tenho para fazer a explanação. Já está na tela? Perfeito, cinco minutos. Certo.
Um dado fundamental, para encerrar essa colocação dos 15 minutos, é de que, em 80% dos casos, as horas extras realizadas a partir do final da jornada ordinária são inferiores a uma hora. Vamos conceber que, em grande percentual, a hora extra vai ser de meia hora ou de 15 minutos. Então, esses 15 minutos de parada só servem hoje, na verdade, para atrapalhar a vida do próprio trabalhador, de maneira que - repito - nada impede que seu asseio e sua higiene pessoal possam ser feitos, sem nenhum problema, ao término da jornada ordinária.
Outra colocação que foi feita pela Senadora Marta Suplicy é o negociado versus o legislado. Na verdade, não se trata de um sistema eliminar o outro. Por um determinado tempo convencionado pelos sindicatos, a convenção coletiva vai ter privilégio em relação à lei, que não deixa de existir, e todas as garantias constitucionais do trabalhador previstas no art. 7º não podem ser negociadas por convenção coletiva. Isso está no novo art. 611 da proposta legislativa.
Em relação ao que diz o médico da grávida ou da gestante, veja, ela não é obrigada a trabalhar num ambiente insalubre.
(Soa a campainha.)
O SR. MARLOS MELEK - Se for do interesse dela trabalhar num ambiente insalubre, partirá dela o desejo de apresentar esse atestado médico de um médico de confiança para trabalhar. Mas a mulher não é obrigada a trabalhar num ambiente insalubre.
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Em relação ao enfraquecimento dos sindicatos, não vemos que haja enfraquecimento sindical, na medida em que a contribuição assistencial, a contribuição obrigatória, chamada imposto sindical ou a contribuição assistencial, criada por normas autônomas, continuarão existindo, mas serão facultativas. E os sindicatos, como qualquer instituição hoje no Brasil, terão que - abre aspas - "mostrar trabalho, mostrar serviço" para receber essa parcela patrimonial do trabalhador ou mesmo do patronal para o financiamento de suas atividades.
Então, não vamos confundir poder, que é dado aos sindicatos, na medida em que poderão celebrar convenções coletivas para...
(Interrupção do som.)
O SR. MARLOS MELEK - Um minuto para concluir. Eu agradeço.
Então, dinheiro é uma coisa, poder é outra, e elas não se misturam.
Respondendo rapidamente também ao Senador Ferraço. Quais os tratamentos diferenciados para microempresa? Critério de dupla visita para fiscalização, exceto para registro de carteira de trabalho; depósito recursal, 50% de desconto para micros e pequenas empresas; quarenta e cinco dias para negativação do devedor, para que consiga um empréstimo bancário. E temos outras colocações que eu escrevi aqui, mas que não dará tempo de mencionar.
Em relação à terceirização, é um debate realmente muito importante, que certamente voltaremos a ele na sequência. E também usarei um outro tempo para fazer as ponderações em relação ao Senador Paulo Rocha.
Por hora é isso.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Com a palavra (Fora do microfone.) o Exmo Sr. Maurício Delgado, Ministro do Superior Tribunal do Trabalho.
(Interrupção do som.)
O SR. MAURÍCIO GODINHO DELGADO - Sr. Presidente, muito obrigado pela gentileza.
Eu sigo a ordem. Agradeço ao Senador Ricardo Ferraço pelas suas indagações realmente muito importantes, Senador. Espero que consiga dar uma resposta neste curto prazo - são várias indagações também dos outros Senadores - satisfatória.
Com relação à questão da constitucionalidade, Senador, a Constituição da República inicia, desde o preâmbulo, com um conteúdo humanístico e social muito forte, muito claro. Ela coloca a pessoa humana no vértice da ordem jurídica e, portanto, no centro da ordem social, da ordem econômica.
Existem vários títulos, artigos, preceitos que vão nessa direção. Se nós quisermos, há vários estudos nessa linha que apontam vários princípios constitucionais, humanísticos e sociais. Estou tentando ser muito rápido, não vou citá-los todos. A boa doutrina cita 12 princípios humanísticos e sociais desta Constituição. Esta Constituição é um elogio ao trabalho Parlamentar constituinte de 5/10/88.
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Por essa razão, nós falamos que o projeto - e temos a maior tranquilidade de dizer isso - da maneira como ele está, não em todos os pontos, mas em vários pontos que são pontos fundamentais, entra em contraponto com a lógica constitucional.
Cito o art. 7º. No caput do art. 7º, claramente, a Constituição da República incorporou um princípio trabalhista muito importante, que é o princípio da norma mais favorável. Inclusive V. Exª o leu: "São assegurados direitos aos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria da sua condição social".
Toda a boa doutrina e a jurisprudência também afirmam que se trata do princípio da norma mais favorável. O projeto vai no sentido contrário. Ele diz: "Não há princípio da norma mais favorável." A negociação coletiva prevalece sobre a lei. Mais do que isso: a vontade contratual do empregador com o seu trabalhador - lembremos que é um contrato de adesão - pode prevalecer, sim, sobre vários dispositivos legais. E vai além o projeto: o acordo coletivo prevalece sobre a convenção. Todos sabemos, todos sabemos que a convenção é quase sempre, em 90% das vezes, mais favorável do que o acordo. Ou seja, o projeto adota várias medidas, em vários locais, que, no somatório, provocam, sim, uma redução drástica de direitos trabalhistas, permitem essa redução drástica.
E vou além. No art. 5º, §2º da Constituição, que é "Dos Direitos e Garantias Fundamentais", está dito que prevalecem, no Brasil, os princípios e regras que sejam compatíveis com o regime adotado no Brasil, que é o regime do Estado democrático de direito, e aqui ele é subscrito por tratados e convenções internacionais. Nós somos o quinto país em subscrição de convenções da OIT. Tudo isso está desconsiderado no projeto, porque pode se seguir agora, se prevalecer, a regra mais desfavorável; prevalece agora um suposto princípio da regra menos favorável. Isso está em várias passagens do projeto, em inúmeras passagens. Citei algumas apenas.
Então, rapidamente, parece-me que, se preservado o projeto da maneira como está, sem dúvida nenhuma, ele traz uma rápida, acentuada, contínua e progressiva redução de direitos trabalhistas no País.
(Soa a campainha.)
O SR. MAURÍCIO GODINHO DELGADO - Com relação ao acesso à Justiça, Senador, há um conjunto de regras no projeto, um conjunto significativo de regras - não tenho como citar todas imediatamente, mas o farei o mais rapidamente possível - que fecham o acesso à Justiça.
Esse art. 790, lido por V. Exª, já é uma mudança drástica, porque a Justiça gratuita, segundo o projeto em exame pelo Senado, não resolve o problema dos honorários periciais, que hoje é pacificado. No caso da Justiça gratuita, o próprio legislador já determinou que a União, num limite fixado bem razoavelmente, num limite sem exagero, é que responde pelos honorários periciais. Agora, não. Quem responde é o trabalhador; quem responde é o trabalhador...
(Interrupção do som.)
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(Soa a campainha.)
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Tem mais um minuto.
O SR. MAURÍCIO GODINHO DELGADO - Pelos honorários advocatícios também o trabalhador vai responder. Mais do que isso: agora, a sucumbência é recíproca. Então, a possibilidade de um indivíduo entrar com uma ação, fora outras apenações várias, e sair devendo é muito grande - é muito grande! E as pessoas são inteligentes, vão perceber que o Estado brasileiro fechou o Judiciário para elas. O Judiciário deixa de ser um canal de acesso para as pessoas simples.
O Senador Hélio José também lançou algumas ponderações, mas V. Exª lançou uma terceira ponderação diretamente para mim. A CLT é informalidade. Eu creio que o País já demonstrou que, se adotar uma estratégia de aplicação da legislação e de continuidade no tempo, há uma possibilidade...
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
O SR. MAURÍCIO GODINHO DELGADO - ... muito grande... (Fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Mais um minuto.
O SR. MAURÍCIO GODINHO DELGADO - ... de aprofundamento e de alargamento da legislação trabalhista no País. Isso está comprovado também por dados históricos mostrados até na curva do emprego e desemprego aqui, em uma das exposições anteriores. Então, parece-me que, efetivamente, é preciso se fazerem ajustes.
O Senador Hélio José também fez ponderações. A Senadora Marta Suplicy fez ponderações. Concordo com as ponderações. Acho que a saúde está acima de qualquer outro interesse. Não se pode flexibilizar nesse campo da saúde. O projeto flexibiliza fortemente no campo da saúde; fala que intervalos não têm relação com saúde. A todo médico que nós vamos, o médico fala da relevância dos intervalos em qualquer situação. E o projeto, taxativamente, proíbe a conexão...
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
O SR. MAURÍCIO GODINHO DELGADO - ... da limitação do tempo.
É o que eu posso trazer.
Agradeço.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, Ministro Maurício Delgado. (Fora do microfone.)
Com a palavra o Prof. Hélio Zylberstajn.
O SR. HÉLIO ZYLBERSTAJN - O.k. Muito obrigado.
Eu vou falar sobre alguns pontos que foram dirigidos diretamente a mim. Vou começar pelos pontos que o Paulinho levantou. Ele, basicamente, dirigiu toda a apresentação dele em resposta à minha apresentação.
A primeira crítica dele ao projeto foi que o representante ou a comissão ou, como ele chamou, a comissão de fábrica não é sindical. Eu acho importante lembrar que os representantes dos trabalhadores, em alguns países, são representantes sindicais e, em outros países, não são representantes sindicais.
Agora, o que se observa internacionalmente é que o sindicato acaba tendo uma influência decisiva nessa eleição. Então, esse é mais um espaço de desafio para a atuação sindical, espaço para ser ocupado pelo movimento sindical para participar com seus candidatos nessas eleições. Não é porque ele não seja sindical que ele não terá, necessariamente, nenhuma ligação ou nenhuma relação com o sindicato.
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Outra coisa que o Paulinho afirmou - eu até anotei assim - é que todo mundo vai ser PJ. Essa foi a afirmação dele. E isso é uma coisa que aparece comumente neste debate. Eu só gostaria de lembrar que o projeto não revogou o art. 3º da CLT. O art. 3º da CLT é o que define as condições para o reconhecimento do vínculo, que é a subordinação, a independência econômica, a existência de horário, a frequência. Se uma empresa contrata um PJ e, nessa relação, existem todas essas condições, isso é fraude! E o projeto não deixou de considerar isso como fraude, não revogou a CLT quando determina o conceito de vínculo. Então, para uma pessoa que é contratada num regime chamado de PJ e tem horário para chegar, horário para sair, depende economicamente da empresa, é subordinado à empresa e tem vínculo, ela está fraudando, ela e a empresa estão fraudando, isso não foi mudado. Então, essa ideia de que, de repente, a gente vai "pejotizar" o mercado de trabalho absolutamente não se sustenta.
Uma coisa que achei interessante é que o Paulinho levanta a questão do financiamento da contribuição sindical e do Sistema S. Quero lembrar que a contribuição sindical, de acordo com o projeto, deixa de ser compulsória para o sindicato dos trabalhadores e também para o sindicato patronal; quer dizer, essa não compulsoriedade atinge os dois. Agora, de fato, o Paulinho levanta uma questão importante, que é a questão do Sistema S. Acho que isso é uma coisa interessante e não deve ser o único ponto que o projeto da reforma trabalhista vai levantar. Esse projeto vai levantar diversas lebres, essa é uma delas, talvez esteja na hora de a gente rediscutir o Sistema S. Ele não precisa estar, necessariamente, nesse projeto, mas esse é um bom ponto para a gente discutir e talvez redefinir. E há muitas outras coisas...
(Soa a campainha.)
O SR. HÉLIO ZYLBERSTAJN - ... que esse projeto, com certeza, vai suscitar durante a sua implementação.
Respondendo ao Senador Ferraço - acordado sobre legislado. É muito importante entender que esse princípio não revoga a CLT, não é obrigatório. Os trabalhadores que não quiserem fazer um acordo nesses termos não são obrigados, ele só vai ser feito se for do interesse da empresa e dos trabalhadores.
Agora, o que ele cria, o discurso que se ouve mais comumente é o de que esse princípio vai retirar direitos, vai rebaixar o nível de proteção dos trabalhadores. Mas não é verdade isso ou, pelo menos, não é, necessariamente, verdade.
(Soa a campainha.)
O SR. HÉLIO ZYLBERSTAJN - O que isso está abrindo é uma oportunidade para aproveitar melhor os direitos que hoje existem. O exemplo mais frequente é o do horário de almoço, o intervalo interjornada. Se os trabalhadores querem só meia hora para almoço, eles vão sair mais cedo, ganham com isso; e, se ele sai mais cedo, a empresa fecha, desliga a luz, desliga as máquinas, e vai economizar com isso. Então, esse é um acordo que, ao utilizar mais inteligentemente um direito, proporciona ganhos para os dois. E é um exemplo só.
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Jornada intermitente.
Senador, acho que é muito importante dizer que esse projeto não está inventando nada. A jornada intermitente já existe hoje, só que existe da pior forma possível. Quer dizer, o restaurante que precisa reforçar o time de garçons no fim de semana não pode ter esse time ocioso e pagando salário inteiro do mês durante todo...
(Interrupção do som.)
O SR. HÉLIO ZYLBERSTAJN - Estou terminando. O que ele faz hoje, então, é informalizar esses intermitentes. Então, o que o projeto está criando é uma legalização dessa situação. É mais uma opção. E, ao contrário do que foi dito, ele não vai ter que pagar uma multa de 50%. Quando ele é convocado, isso está no texto do projeto, o trabalhador pode dizer: "Olhe, esse fim de semana, eu não posso". E aí ele não pode. Agora, se ele se comprometer e não for, aí ele tem a penalidade. Então, só se conta essa penalidade, mas não se conta o parágrafo anterior a ela.
Então, é preciso olhar com muito cuidado tudo o que está nesse projeto. Eu convido todos à leitura do projeto e, principalmente, à leitura da exposição de motivos, que está muito didática e muito bem feita.
Vou terminar.
A Senadora Marta nos perguntou a todos: "Será que o sindicato vai conseguir equilibrar o jogo?"
Alguns sindicatos são muito fortes. E a função social do sindicato é exatamente essa de equilibrar o jogo. Agora, o sindicato que não se sentir apto a equilibrar o jogo não é obrigado a entrar nesse tipo de acordo. Esse tipo de acordo é voluntário.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, professor.
Passo a palavra agora ao Sr. Clemente Ganz Lúcio, Diretor do Dieese.
Pela ordem é o senhor mesmo. Está registrado aqui. Pelo menos eu, como obediente, vou seguindo a ordem.
O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - Vou me concentrar na questão do Senador Ferraço - e de todos - sobre o negociado/legislado, o papel do sindicato e a negociação.
O Galvão falou - acho que é uma lembrança importante - que, quando fizemos, no Fórum Nacional do Trabalho, o debate sobre reforma sindical e reforma trabalhista, nós discutimos o método de fazer a construção do desenho. Identificamos que era necessário, primeiro, desenhar a reforma sindical, desenhar o processo de negociação para que, derivado, do desenho do sistema de relações de trabalho, nós víssemos o que poderia ser colocado como objeto da negociação. Ou seja, de que maneira nós poderíamos ter, em um sistema com aquele desenho, a relação entre o que é o negociado e o que é o legislado.
Por isso o sentido de que a reforma sindical precede a reforma trabalhista. Ela desenha o sistema e diz: nesse sistema cabe trazer para o objeto da negociação tudo isso que está na lei para a negociação, inclusive a solução do conflito. Lá nós discutimos.
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A grande maioria dos processos na Justiça são ações de debates sobre o valor indenizatório, dois terços. Qual é o sentido de nós continuarmos entulhando a Justiça com esses processos? A relação tem que construir soluções seguras para a solução desse conflito. Qual é a estrutura para dar solução a isso? Então, o sistema de representação e de negociação precede. Nesse sistema, cabe trazer isso para solução? Cabe ou não cabe. É uma escolha. E o sistema tem que responder a isso.
Por exemplo, naquele momento, nós discutimos que era fundamental haver uma organização no local de trabalho. Debate: é uma organização sindical ou é uma organização dos trabalhadores autônoma do sindicato? São dois modelos. E os dois modelos existem no mundo. Só que, no mundo, onde há a comissão autônoma, no geral o sindicato organiza uma seção sindical.
Os empresários nos disseram: "Vocês estão loucos! Vai haver duas organizações no local de trabalho? Nós não queremos". Dissemos: "Mas pode haver só organização sindical, que cumpre o papel de representar os trabalhadores e estabelecer acordos no local de trabalho". "Assim nós topamos". Bom, então, essa é uma negociação. Uma comissão sindical no local de trabalho, eleita pelos trabalhadores, com um regimento interno que a empresa conhece e com boa-fé, que significa responsabilidade. Por exemplo, os trabalhadores têm responsabilidade de sigilo sobre informações que a empresa coloca na mesa de negociação. Por exemplo, têm responsabilidade. Então, é responsabilidade compartilhada entre as partes. Esse é o desenho do sistema. E isso é uma organização no local de trabalho para dar solução a conflitos. Por que uma comissão? Porque essa comissão representa o interesse coletivo.
Sempre que nós - e no projeto é clara a intencionalidade - transferirmos o poder para o indivíduo, não há possibilidade de equilibrar, entre o indivíduo e a empresa, essa relação. É uma relação de subordinação que só é compensada quando os trabalhadores têm uma representação coletiva que tenha estabilidade para representá-lo, porque, na nossa relação de emprego no Brasil, não há a garantia de emprego. A garantia do emprego está na mão do empregador. Ele contrata e demite sem dizer o motivo pelo qual o trabalhador está sendo demitido. Não precisa nem chamar à presença o trabalhador. Comunica por carta que ele está demitido. Nada mais do que isso.
O projeto prevê, inclusive, que a empresa poderá fazer demissão coletiva sem comunicar o motivo. Nos demais países, a demissão coletiva é precedida, no mínimo...
(Soa a campainha.)
O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - ... por uma negociação com o sindicato.
Então, o sentido primeiro da constituição da representação é para que, nessa representação, se dê a ela o seu papel. Nós acreditamos que um projeto que fortalece uma negociação começa com uma organização sindical representativa no local de trabalho e uma estruturação de um sistema de negociação coletiva do local de trabalho em âmbito nacional. Podemos ter o acordo do setor do comércio com as grandes diretrizes para o trabalho no setor do comércio, por exemplo, o trabalho intermitente. Por que não podem ser negociadas lá, na condição do comércio, as regras para o trabalho intermitente? E isso faz parte de um acordo não para generalizar essa condição de trabalho, mas para atender a uma situação específica. Por que a lei tem que normatizar uma coisa que, na nossa visão, devia ser exceção e não a regra? Então, nós damos ao instrumento, que é...
(Soa a campainha.)
O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - ... o instrumento de representação, um poder de negociação num sistema que deve ter lógica. O direito vai estar na lei naquilo que precisa dar substância ou que precisa subsidiar o processo de negociação.
Então, esse é o primeiro entendimento.
O segundo ponto que eu queria comentar é sobre a informalidade.
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No Brasil, 90% da informalidade está concentrada em micro e pequena empresa. Micro e pequena empresa no Brasil têm 10% da produtividade da grande empresa. Na Alemanha, a micro e pequena empresa têm 60% da produtividade da grande empresa. O nosso gargalo na informalidade é econômico. O País precisa ter estratégia de desenvolvimento econômico e colocar as micro e pequenas empresas para adensar a sua capacidade produtiva. Não há renda para garantir a esses trabalhadores a proteção.
Então, o nosso problema não vai ser resolvido com...
(Interrupção do som.)
O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - ... tendo o patamar do direito a essa condição econômica que nós vamos promover bem-estar social. Na negociação, como que nós vamos fazer com que essa população cresça junto com o crescimento dessas empresas? Faz parte da estratégia econômica. Não há solução separada.
E, por fim, queria que nós pensássemos, no método, Senador Tasso, da construção, em preceder esse desenho dos instrumentos para que nós possamos ver o que esses instrumentos nessa lógica são capazes de dar conta. Nós não vamos equilibrar a relação transferindo para o indivíduo uma relação que ele não consegue realizar em uma relação desequilibrada.
Quero só contar um caso, porque acho que é paradigmático. Na greve de Jirau e Santo Antônio, naqueles conflitos, nós centrais sindicais propusemos aos trabalhadores, ao Governo e aos empresários uma mesa...
(Interrupção do som.)
O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - ... um acordo nacional para regular as relações de trabalho no espaço das relações na construção. O último aspecto foi comissão sindical no canteiro de obra. Os empresários não queriam a comissão. Nós insistimos e fizemos voluntário, quem quisesse fazer. Se a empresa quisesse, o sindicato faria. Várias empresas fizeram.
Um ano depois, nós fizemos uma pesquisa sobre todo o acordo: 80% dos empresários disseram que a melhor cláusula daquela convenção foi a comissão sindical no canteiro de obra, porque ela resolveu conflitos que não eram jamais resolvidos, diminuiu a judicialização e criou uma paz no canteiro de obra que não tinha existido. Eles disseram: "A melhor cláusula que nós construímos foi haver uma representação que desse solução ágil e voluntária aos conflitos".
Parece-me que isso tem que fazer parte do nosso projeto. Esse projeto caminha na contramão desse sentido...
(Interrupção do som.)
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Só concluindo.
Muito obrigado, Sr. Clemente Lúcio.
Com a palavra o Sr. Antonio Galvão Peres, professor de Direito do Trabalho.
O SR. ANTONIO GALVÃO PERES - Sr. Presidente, eu agradeço mais uma vez a palavra.
Gostaria de começar com uma ponderação recorrente que é feita e até foi objeto de uma pergunta específica da Senadora Marta Suplicy: sobre em que medida esse projeto enfraquece os sindicatos.
Então, é preciso criar uma distinção, antes de tudo, sobre sindicato e sindicalismo. Talvez esse projeto, do jeito que está, enfraqueça, sim, alguns sindicatos, porque, primeiro, ele cria supostamente uma concorrência, que seriam as comissões no local de trabalho. Alguns sindicatos têm enxergado essas comissões como um órgão concorrente na representação.
Por outro lado, nós podemos dizer, existe mais um órgão na defesa dos interesses dos trabalhadores e no diálogo com as empresas mais próximo dos trabalhadores, porque nós não podemos esquecer que há empresas, há inclusive empresas com mais de 200 empregados, que jamais tiveram uma efetiva participação sindical. Seus trabalhadores jamais puderam efetivamente contar com o sindicato no local de trabalho.
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Então, trazer e regulamentar essa matéria, regulamentando um direito que está previsto na Constituição de 1988, que até hoje está carente de uma norma para regulamentá-lo, é algo importante.
Agora, os sindicatos veem isso como uma concorrência. Esse projeto pode também enfraquecer sindicatos em razão da contribuição sindical compulsória, o fim dessa contribuição. Então, pode enfraquecer aqueles sindicatos que não representam os trabalhadores, porque o sindicato que representa os trabalhadores, que está agindo legitimamente em nome dos trabalhadores, terá as contribuições. Isso inclusive é bandeira de muitos sindicatos. O fim das contribuições sindicais compulsórias é bandeira de muitos sindicatos que realmente são legítimos, defendem de forma coerente e forte o interesse dos trabalhadores.
Para demonstrar que é possível um modelo sindical sem essas garantias que são impostas pela lei, vejamos o surgimento das centrais sindicais no Brasil. Até há pouco tempo eram entidades que existiam à margem da lei, e foram durante muitos anos, e são ainda, os entes sindicais mais fortes do País. Existiam à margem da lei e, até há pouco tempo, sem a contribuição sindical compulsória. Espontaneamente houve organização nesse sentido e, de forma legítima, defenderam durante anos e anos os interesses dos trabalhadores.
Então, esse projeto pode enfraquecer sindicatos, sim, alguns sindicatos, mas ele fortalece o sindicalismo, ele fortalece a negociação coletiva, ele empodera o sindicato ao dizer o que pode e o que não pode ser negociado. Então, parece que há um receio e um discurso que tem em mente aquele sindicato que não é o bom sindicato, que é o sindicato que não pode contar com a efetiva participação dos trabalhadores na sua receita sindical.
Respondendo também uma questão específica, que foi apresentada pela Senadora Marta e dirigida a mim, eu ponderei que, no que diz respeito ao dano extrapatrimonial, não me parece adequado utilizar como critério para indenização o valor do salário, na medida em que estaríamos tarifando a moral de um trabalhador de forma diversa de outro trabalhador. Então, um executivo poderia ter uma indenização maior só porque seu salário é maior, por uma eventual ofensa moral que tenha recebido no local de trabalho, um assédio moral, um assédio sexual, ou o que seja. Basta substituir esse critério por outro. Pode ser tantas vezes o salário normativo na categoria, ou tantas vezes o salário mínimo. Basta substituir o salário do trabalhador por outro critério mais amplo, aplicável a todos da empresa.
(Soa a campainha.)
O SR. ANTONIO GALVÃO PERES - Qualquer pessoa que examinar esse projeto dificilmente vai ser favorável a todos os artigos. Sempre há algo que pode ser objeto de discordância.
Por exemplo, a questão da dispensa coletiva. O projeto fez uma escolha de tratar a dispensa coletiva como uma dispensa individual. A tendência, na doutrina, a tendência em organizações de outros países, é tratar de forma diferenciada, criando regras para que haja dispensa coletiva. Então, hoje a ausência de regras é que é um problema, porque não se sabe o que é dispensa coletiva e o que não é dispensa coletiva no Brasil, e o Tribunal Superior do Trabalho entende que ela não é possível sem negociação coletiva. Então, na medida em que eu não sei o que é dispensa coletiva, isso causa uma grande insegurança jurídica. Esse projeto poderia regulamentar essa matéria, poderia avançar nesse estudo.
Voltando à questão do trabalho intermitente, ao meu ver, essa alegação de que o trabalho intermitente traz uma espécie de servidão ao trabalhador não é verdadeira, pelas regras que estão no projeto. Então, o trabalhador pode recusar a convocação.
(Interrupção do som.)
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O SR. ANTONIO GALVÃO PERES - Se o trabalhador se omitir na convocação, é entendido que houve recusa. Mesmo assim, continua existindo o contrato de emprego. Então, não é que ele esteja desobedecendo uma ordem do empregador se não acatar a convocação.
Isso resolve, por exemplo, o problema de garçons, como já mencionou o Prof. Hélio. Então, imagine um hotel que seja um centro de convenções e que, para determinado evento, precise de 150 garçons. Esse hotel não vai ter 150 garçons na folha, e esse projeto permite trazer da informalidade essas pessoas, porque o valor que o hotel pagar para esse garçom vai ter FGTS, vai ter repercussões no cálculo das férias, INSS. Vai ter todas as repercussões, porque ele é um empregado. E, no tempo em que ele não está trabalhando para aquele tomador de serviço, para aquele empregador, ele pode ter outras atividades.
Então, o que o projeto está fazendo é trazer para a formalidade setores que hoje estão na informalidade. O receio, e é um receio legítimo que alguns apresentam, é que haja substituição do empregado com contrato de trabalho que podemos chamar de ordinário por essa forma de...
(Interrupção do som.)
O SR. ANTONIO GALVÃO PERES - Mas, para solucionar isso... Se há realmente esse receio, é porque sempre se pensa na fraude no Brasil. Sempre se pensa que, ainda que seja uma boa ideia, existe o risco de fraude. Para sanar esse tipo de problema, basta criar, talvez, limitações. Então, limitação do número de empregados na empresa ou limitação para as demais atividades.
Então, o projeto pode, sim, ser objeto de críticas, mas o seu conjunto tem o grande mérito de trazer segurança jurídica para as relações de trabalho no País.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, Dr. Antonio Peres.
Voltamos, então, ao novo bloco de Senadores. Nós temos cinco Senadores inscritos. Talvez, se fizermos blocos de cinco, facilite a vida dos debatedores, pois alguns deles têm problemas em relação a voos marcados.
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ. Fora do microfone.) - É o último bloco.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Último bloco.
Senador Paulo Paim.
O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO. Fora do microfone.) - Sr. Presidente, me inscreva, por favor.
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, quero lembrar que são dez minutos para cada um.
Sr. Presidente, começo cumprimentando V. Exª e todos os que estão na Mesa. Na minha avaliação, de fato, o projeto é muito ruim. O projeto é perverso, o projeto desumaniza a relação entre o empregado e o empregador.
Ontem, eu fiz um pronunciamento forte lá na Comissão de Assuntos Sociais, mas, quanto mais material eu recebo, mais eu me assusto. Eu me assusto! Vou dar um dado aqui. Tivemos um debate numa convenção nacional do PTB, e eu falei de forma dura quanto a esse contrato intermitente. Falou depois de mim o Ministro do Trabalho. Sabem quando ele foi mais aplaudido? Quando ele disse: "Olha, Paim, não bota na conta do Governo esse contrato intermitente. O Governo não tem nada a ver com isso. Isso é coisa lá daquela Câmara dos Deputados".
E daí? Como se faz agora? Palavras do Ministro do Trabalho, que é gaúcho e eu conheço muito bem. E eu tive de ficar... Bati palmas para ele. Se nem o Governo defende isso que os senhores formularam... Olhando mais para o juiz, porque ele sabe o que eu estou dizendo. Nem o Governo defende. O senhor sabe muito bem o que eu estou dizendo: quem formulou e quem ajudou a construir. Nem o Governo defende.
Aqui, pelo que ouvi de todos os painelistas, a não ser uma exceção cujo nome não vou citar, todos mostraram algumas preocupações.
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Mas, então, para não ficar só no discurso...
Não, mas eu tenho que dizer isso também: sabem o que eu acho que é covardia? Covardia não é você pegar o nome no painel ali de voto por voto de Deputado e Senador, porque isso é democracia, e a base de cada um tem que saber como votou! Você acha que é covardia dizer isso? Não é covardia! Nós estamos numa democracia, de transparência absoluta. Você foi à tribuna, e é covardia dizer o nome de quem votou a favor da reforma trabalhista na Câmara! Tem mais é que dizer! Essa é a lista número um que tem que circular! E cada um assume a sua responsabilidade.
Eu tive um debate com um Senador e ele me disse: "Eu voto dessa forma, Paim, e assumo a minha responsabilidade". É assim que o Parlamento tem que agir, e não com o voto secreto, escondido, para que ele fique bem com quem financia sua campanha, e nós sabemos quem financia. Quem financia a campanha está negociando inclusive emenda, cargos e sei lá o quê, financiamento de campanha para o futuro. Então, esse, além de ser malandro, ainda não quer que o nome dele saia, mostrando como ele votou nas reformas. Aí não dá, né?
Era só essa preliminar.
Mas vamos! Eu vou me debruçar aqui, porque dizem: "mas diga onde, Paim, que tem mesmo problema nessa reforma!" Então, vamos lá!
Primeiro, isso tem que ser dito. Eu vou repetir, Hélio José. O PL que veio do Governo tinha sete artigos. Esse substitutivo tem mais de cem, duzentas mudanças. Vão me dizer que o Deputado leu isso? Eu fui Deputado por quatro mandatos. Nem no meu tempo, nem agora! Vocês acham que eles leram isso que votaram? Não leram! E esta Casa não é uma Casa carimbadora, não! Aqui todos são homens experientes: ex-governadores, ex-Deputados Federais, ex-prefeitos, Senadores... Homens que têm experiência na vida! Eles não podem pegar esse projeto agora, como alguns estão propondo, e votar em 10 ou 15 dias. Mas vão votar conhecendo o quê? Será que vão ter coragem de chegar a seus Estados, a seus Municípios e dizer: "eu votei"; aí o cara pergunta: "mas o que você votou?"; "Ah, eu não sei. Não me pergunta, porque eu não sei!" Pergunte para 90% dos Deputados se eles conhecem o que votaram. Vocês sabem que eles não conhecem. Eu não preciso dizer aqui. O Brasil sabe.
Mas vamos lá! Só alguns pontos desse bendito projeto.
Primeiro, da forma que está, subverte a lógica e a realidade da força do Direito do Trabalho, porque acaba com a proteção do trabalhador, razão de ser da própria CLT.
A CLT veio para quê? Eu acho que Getúlio deve estar chorando lá em cima. Deve estar dizendo lá para Covas, para Ulysses, para Tancredo e tantos lá: "olha o que estão fazendo lá embaixo!" "Estão rasgando a Constituição cidadã", vai dizer o Ulysses. O Getúlio vai perguntar: "E a nossa CLT?" E o Jango diz: "Não acredito!" Parece que eu estou ouvindo o diálogo que está acontecendo lá em cima. Como não reduz? Aí falam: "Diga onde tem um direito!" Eu vou começar a ler então, porque aí vocês poderão contestar, dizendo se é verdade ou não.
Reduzir ou retirar direitos reconhecidos pela lei e pela jurisprudência.
Enfraquece, sim, os sindicatos. Aqui tem uma meia reforma sindical escondida. E nem estou falando dessa história de imposto sindical. Eu não vou entrar nesse debate porque, senão, vou ter que entrar no debate do Sistema S, e eu quero ver alguns aí concordarem, porque todo mundo sabe os bilhões, ultrapassando os R$15 bilhões, que são arrecadados, e sabemos para onde vão, inclusive para confederações e federações. Nem quero entrar nesse debate.
Permite que a negociação coletiva reduza direitos assegurados em lei. Agride a Convenção nº 98 da OIT.
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Ontem aqui foi confirmado, estava aqui no debate: fornece instrumentos para o calote de maus empregadores, quitação anual, acordos extrajudiciais com eficácia liberatória, negociação de verbas rescisórias. Está tudo escrito lá.
Redução de direitos. Retira direitos de forma direta no próprio projeto e indireta via a tal de negociação. Eu vou entrar também na negociação. Eu conheço bem o que é negociação. Fui sindicalista muitos anos. Não venham com a farsa da livre negociação, onde todos os obstáculos são criados para que não haja livre negociação, e, sim, a imposição do grande empregador sobre o frágil trabalhador.
Acaba com as horas intermitentes - já foi dito. Ninguém contestou porque sabe que acaba mesmo.
Dispensa em massa, sem um mínimo de negociação coletiva.
Rescisão por acordo com a metade do aviso prévio e multa do FGTS.
Empregado passa a ser responsável até para lavar o uniforme que ele usa. Eu trabalhava em fundição. Mas a empresa me dava dois macacões por semana, limpinhos, me dava bota e me dava capacete. Eu pergunto: como é que vai ser isso agora? Eu vou ter que levar pra casa para lavar tudo direitinho para não me acidentar?
Essas perguntas são o mundo real.
Horas extras se tornam raras. E não pense que o trabalhador gosta de fazer hora extra. Vocês pensam que ele gosta? Eu não gostava. Eu queria ir pra casa, poder abraçar meus filhos, ficar em casa, mas era obrigado, pelo salário vil que é pago neste País. Ou o salário não é vil? Ontem foi mostrado aqui que o salário/hora no Brasil é pior que o da Índia. Está aí no documento, Senador Hélio José, na sua mão, e foram comparados os países.
Então, ninguém faz hora extra porque gosta; faz porque é obrigado. E não faça, para ver se o empregador precisar: "Olha, vou precisar de você ficar aqui mais três, quatro horas hoje". Não fique, pra ver. Está no olho da rua no outro dia: "Está no olho da rua no outro dia se não ficar quando eu mandar".
Retirada de direitos, de forma indireta de direitos. Tudo que for objeto da negociação individual ou coletiva.
Pessoal, vocês vão ver que em muitos artigos aqui que são negociação individual. Na negociação individual, quem tem força? Digamos que eu tenha dez empregados. Eu digo para o cara: "Meu amigo, você tem que abrir mão aqui no mínimo de 15 direitos seus - eu vou citar depois os 15, inclusive. Desses 15 direitos, você vai ter que abrir mão. Você quer trabalhar ou você quer ir pra rua?" Ele vai dizer: "Eu quero trabalhar". Eu faria isso também. O que eu vou fazer? Eu tenho pão, tenho leite, tenho aluguel para pagar.
Mas é tanta coisa!
Vamos para a terceirização. Todo mundo sabe, e eu vou dar o exemplo desta Casa aqui. Vou olhar para cima aqui - por favor, Zezinho, pede para os dois seus parceiros aí que estão na sua frente, desculpa a expressão, para que olhem para cá. Estão vendo esta Casa aqui? Só aqui dentro, num ano, tiveram oito empresas terceirizadas que não pagaram seus trabalhadores. E não pagaram e foram embora. E eles estão aqui dentro a ver navios!
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Vão à Comissão de Direitos Humanos, vão para cá, vão para lá: "Paim, mas não nos pagaram nada. O que eu faço?" Vão para a Justiça. Vão procurar o Ministério Público do Trabalho e não recebem. Aqui dentro! A última foi a Qualitec, uma vergonha! Quatrocentos trabalhadores sem receber nada.
É isso que vocês querem para 45 milhões de trabalhadores? Porque agora se permite, pela lei, terceirizar tudo. Ou não permite? E há ainda uma decisão, se eu não me engano do Supremo Tribunal Federal, que diz o seguinte: quando for prestar serviços para o Estado, se a terceirizada não pagar, o Estado também não paga. Mas que País é este? E decisão, se não me engano, do Supremo. Foi do Supremo. O Estado não é responsável.
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Então, o malandro do picareta, o gato - como diz o trabalhador - presta serviço para este Congresso ou mesmo para o Executivo ou para o Judiciário, não paga ninguém e some. O Judiciário não tem a responsabilidade solidária? Não, diz que agora não tem.
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Sr. Presidente, eu vou acelerar porque, de fato, é muita coisa, mas eu espero que V. Exª seja um pouco tolerante comigo porque esse tema merece um carinho especial de todos nós.
Sobre contrato intermitente, eu já falei rapidamente. Negociado sobre o legislado, pessoal, num País como o nosso? Nós tratamos de trabalho escravo ainda. Eu sou o Relator de um projeto aqui que vai regulamentar ou não o trabalho escravo. Como é que a gente pensa? São Bernardo é uma coisa, o meu sindicato até de Canoas é outra coisa, o bancário de São Paulo é outra coisa, mas eu quero saber o sindicato lá de Capão do Leão, de Capão do Tigre, lá de Cachoeirinha - estou dando alguns exemplos. Que poder tem esse sindicato numa negociação com o empregador, quando o cara chega e diz: "Tua empresa de calçado está aqui [um exemplo muito comum no Nordeste], estamos propondo isso, vocês concordam? Se não, eu vou para outro Estado." E vocês sabem que fazem assim porque fizeram inclusive no Rio Grande do Sul.
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Sem uma reforma sindical, aí sim antes, que discuta tudo isso - Sistema S e contribuição sindical -, discuta tudo isso, não temos condição de aplicar o negociado sobre o legislado. É que nem entregar, como a gente fala no Rio Grande, para que a raposa vá cuidar do galinheiro. É isso. Quem é que vai ter força nessa negociação?
Negociação individual. Esse é o absurdo do absurdo do absurdo. Chama o peãozinho na mesa, inclusive na rescisão de contrato, e diz: "Ó, assina aqui. Tu queres receber isso aqui ou queres brigar na Justiça durante 10, 20 anos?". Ele vai dizer o seguinte: "Vou pegar o que eu posso". Eu acho que, isso, sim, é covardia. Te confesso que acho que é covardia.
Estou terminando, Presidente, porque aqui são só citações. Rapidamente, aqui são frases somente e acho que, em um minuto, eu termino.
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Regulamenta o teletrabalho e sem definição de jornadas e horas extras; estabelece prescrição intercorrente no processo trabalhista; acaba com a ultratividade das normas coletivas - e aqui tem dedo também do Supremo Tribunal Federal -, que eu acho um absurdo. Se eu não fechei o acordo porque não houve condições entre empregado e empregador por que não pode prevalecer pelo menos o acordo anterior? Pelo menos isso? Não, agora é não. Então, tudo o que tudo o que você tinha até agora morre e, daqui para frente, é zero.
Dificulta a gratuidade da justiça tanto para as custas processuais quanto para os honorários periciais; alteração das regras de equiparação de trabalho, de remuneração de empregados; elimina a homologação - esse é o último, e eu termino, Presidente - com a participação dos sindicatos.
Eu só peço uma coisa, e eu nem quero que vocês respondam nada se não quiserem.
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Todos aqui, de uma forma ou de outra, claro que ilustram para nós o nosso ponto de vista pela decisão que vamos tomar. Eu acredito muito neste Senado, este Senado tem história. Todos os projetos mais reacionários que a Câmara aprovou, aqui não passaram. Nenhum deles passou. Nenhum! Isso aqui é pior do que tudo que a Câmara aprovou até hoje. Aqui nós não vamos só carimbar.
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Quero me dirigir com muito carinho ao Relator Ferraço: sei da tua sensibilidade, Ferraço, sei das tuas preocupações. Não é que eu vou dizer aqui: "Olha, aqui nada presta, não quero nada, e tudo o que o Ferraço pensar eu sou contra". Não, mas eu sei que nós vamos discutir profundamente sobre o teu acompanhamento, com os nossos Líderes de todas as comissões deste Plenário, para construir o que for possível. E não querer, e vir com uma história de que vai haver uma medida provisória, aprovar como está, e esperar a medida provisória? Ah, isso é conto da carochinha, não é? Eu estou com quase 70, Senador Tasso Jereissati.
(Interrupção do som.)
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Estou com 67 e vou com orgulho, se Deus quiser, para 68.
Agora, vir com uma história de que vai haver uma medida provisória, para aprovarmos como está, porque daí, na medida provisória, a gente ajusta? Ah, aí é achar que eu não tenho dente na boca! Estou meio velhinho, mas os dentes ainda estão aqui. Aí não dá!
Eu respeito a todos. Eu acho que eu fui um pouquinho mais duro com o nosso Juiz, mas sei um pouco também, talvez, da tua juventude e da minha velhice. Eu disse que eu, quanto mais velho, fico mais bravo. E talvez, na rebeldia da juventude, tu tens o teu ponto de vista, que eu tenho que respeitar.
Enfim, cumprimento a todos, mas eu tenho certeza de que o Senado não vai carimbar isto aqui. Vai discutir, vai aprofundar e vai construir uma reforma possível e humana, porque esse projeto é desumano.
Obrigado, Sr. Presidente.
(Manifestação da galeria.)
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, Senador Paim.
Senador Roberto Requião.
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) - Na verdade, Presidente, a minha inscrição é para a sessão plenária do Senado Federal que sucede esta sessão de debates temáticos. Eu não estou inscrito.
Mas, já que V. Exª me deu a oportunidade, eu quero dizer...
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Senador, já ia lhe agradecer penhoradamente, mas...
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Eu quero dizer apenas que esta reforma trabalhista não deve apenas ser rejeitada: ela tem que ser exorcizada. É uma coisa de uma crueldade extrema! Eu diria, teologicamente, que não é uma obra de Deus, é uma obra do diabo.
Por exemplo, Sr. Presidente, agora há pouco, eu cometi uma grande infração. Eu fui, durante a sessão plenária, a que estou presente, ao banheiro. E eu já via alguns dos "palestristas" sugerirem que um trabalhador resolvesse a sua higiene pessoal antes do expediente. Talvez, avançando um pouco mais, ele pudesse sugerir também que almoçasse e jantasse nas férias para não interromper o período de trabalho. É uma verdadeira barbaridade o que está se discutindo aqui! O Senador Paim desmontou isso.
E eu não falo agora, porque já fiz um discurso aprofundado numa sessão anterior, examinando, item por item, as barbaridades, as crueldades dessa reforma trabalhista, que se suporta na legislação de Reagan depois dos benefícios do Franklin Delano Roosevelt no New Deal dos Estados Unidos.
Eu vejo com um verdadeiro horror a participação de alguns dos "palestristas" da Mesa. Crueldade rigorosamente absoluta. E eu me pergunto: são realmente intelectuais, examinando a legislação trabalhista, ou são assessores da Fiesp? Ou são assessores dos grandes capitais financeiros que estão comandando a política do Brasil? Já falei sobre essa barbaridade e eu recomendo ao Plenário o exorcismo, não apenas a rejeição.
Foi urdida por Satanás essa proposta!
(Manifestação da galeria.)
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Senador Lindbergh.
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, eu espero que o Senado cumpra o seu papel.
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Acho que o Senador Paulo Paim foi muito feliz quando disse que esse PL começou com mudanças de sete artigos da CLT. Houve 12 audiências públicas em cima dos sete artigos. Aí aparece um relatório com mudança de mais de 97 artigos da CLT. Cento e onze artigos e mais 200 dispositivos da CLT alterados, Sr. Presidente.
A gente fez um acordo aqui, na semana passada, de tramitar pelas três Comissões. Quero dizer, Sr. Presidente, que nós não vamos aceitar que o Governo rompa esse acordo. Tem que passar pela CAE, depois vai para a CCJ, depois vai para a Comissão de Assuntos Sociais.
E espero que este Senado tenha juízo, porque essa proposta do Governo do Temer é indecorosa: "Ah, não, o Senado vota tudo como está, e eu edito uma medida provisória depois". Isso seria abrirmos mão do nosso papel como Senadores.
Agora, Presidente, acho que há uma falta de juízo total das elites deste País. Nós estamos aqui entrando no terreno da pura irresponsabilidade. O que querem? Colocar o País num momento de guerra de classes? Luta de classes escrachada na esquina? Um Governo, como esse, que tem 4% de apoio popular aprovar algo como isso?
Os senhores vão jogar o País numa convulsão social, acreditem! Os senhores estão subestimando a reação do povo. A greve geral do dia 28 foi uma greve forte. Houve adesão de trabalhadores, sim, contra essas duas reformas.
Então, quero chamar à responsabilidade este Congresso Nacional. Veja bem, há um Deputado do PSDB - não é essa reforma trabalhista, é uma outra, sobre trabalhadores rurais -, Deputado Nilson Leitão, do PSDB, o moderno PSDB, que está defendendo sabe o quê? Que o trabalhador rural, em vez de receber salário, possa ser pago com moradia e alimentação. Está lá no projeto. É a volta do regime de servidão, que é trabalho análogo ao trabalho escravo. Eu citei aqui, inclusive, um filme da Tizuka Yamasaki, Gaijin, que falava de imigrantes japoneses que vinham trabalhar e que ficavam devendo na venda. Eram os antigos barracões. Mas o Deputado vai mais além. Diz o seguinte: 18 horas de dias seguidos de trabalho. Acaba com o repouso no domingo. É isso que os senhores querem?! Passar por cima do povo? É guerra de classes declarada. É uma irresponsabilidade!
Eu trago aqui, Presidente, capa de O Globo, de 1962, quando Jango criou o décimo terceiro salário. O que diz? "Considerado Desastroso para o País um 13º [...] salário". Em 1962, eram as mesmas elites, que não merecem o nome de elites, que são, no máximo, classes dominantes que não têm projeto algum. É impressionante o nível do despreparo. O que diziam? Que isso ia quebrar as empresas, ia parar o País. O que houve foi justamente o contrário naquele período, porque o salário que o trabalhador recebe vai todo para a economia.
O que está por trás dessa reforma - não nos enganem! - é a redução do custo de trabalho, é só isso. É no momento de crise econômica... Porque o golpe foi dado por isso. Esse golpe foi um golpe de classes. Então, eles, num momento de crise econômica, decidiram o seguinte: "Olha, nós vamos resolver os nossos problemas, os das empresas, apertando os trabalhadores." Então, esse é o debate que nós temos que fazer aqui. Nós mostramos outro caminho porque, nos governos do Presidente Lula e da Dilma, nós aumentamos o salário mínimo em mais de 70% acima da inflação. O que aconteceu? A economia cresceu.
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Nós estamos, Senador Paulo Paim - quero chamar a atenção -, num momento de recessão violentíssima, com quase 8% do PIB. O consumo das famílias está lá embaixo. Hoje, o consumo das famílias equivale a mais de 60% do PIB. Eu quero dizer: você associar essa reforma trabalhista à reforma previdenciária, nós vamos aprofundar a situação da desaceleração econômica. Nós estamos fazendo o inverso do que Lula dizia. Lula dizia sempre o seguinte: "Colocar dinheiro na mão do pobre é importante. Aquilo estimula a economia." E nós estamos tirando dinheiro das mãos dos pobres.
Aqui está havendo um ajuste fiscal e um ajuste do mercado de trabalho. Um ajuste fiscal também, Senador Tasso. É tudo em cima do pobre. É mexer no benefício da prestação continuada; é a reforma da previdência; é o intervalo do almoço. Eu pergunto: em relação ao ajuste fiscal, qual é a medida para o andar de cima? O que estão pedindo de contribuição dos grandes empresários, dos multimilionários, dos banqueiros? Nada! Absolutamente nada!
Eu encerro, trazendo aqui - acerca da discussão de que essa reforma vai gerar emprego - um estudo do Banco Mundial, de 2003, que diz o seguinte: "Ao nível macroeconômico, taxas maiores de sindicalização levam à menor desigualdade nos rendimentos e podem aumentar a performance econômica (na forma de taxas menores de desemprego e inflação e respostas rápidas aos choques)."
Quero trazer também um estudo da Organização Internacional do Trabalho, de 2015, que quero divulgar e entregar na mão de cada Senador que vai discutir essa reforma trabalhista. É um estudo muito denso, que acaba chegando à conclusão, Senador Paulo Paim, de que essas reformas têm levado à diminuição da proteção dos trabalhadores, não geram aumento do emprego e não reduzem a taxa do desemprego.
Por fim, é impressionante esse discurso da modernidade. Eu quero só citar alguns exemplos, perguntando: que modernidade é essa em que a jornada de trabalho poderá ser autorizada até 12 horas ininterruptas se, hoje, são de 8 horas?
Que modernidade é essa em que as férias corridas de trinta dias são partidas em três períodos curtos?
Que modernidade é essa que mexe no tempo do descanso do almoço, que vai ser reduzido para trinta minutos, em vez de uma hora, como é hoje?
Que modernidade e essa em que as mulheres grávidas estarão liberadas para trabalhar em ambientes insalubres?
Que modernidade é essa em que o tempo do deslocamento no transporte fornecido pela empresa não será mais deduzido da jornada de trabalho?
Que modernidade é essa em que o trabalhador será obrigado a pagar as custas do processo em caso de derrota da causa na Justiça do Trabalho?
Que modernidade é essa do trabalho intermitente em que o trabalhador fica à disposição do patrão, mas só receberá pelo tempo trabalhado e, pior, será multado em 50% da remuneração, caso falte o dia da convocação?
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Eu chamo a atenção, Senador Paulo Paim: na Inglaterra, há o banco de horas, e os trabalhadores recebem algo em torno de 40% a menos. Chamo a atenção para os garçons do Brasil, do meu Rio de Janeiro, que vão ser demitidos. Vão ser contratados para o final de semana por banco de horas, mas, na segunda, na terça, na quarta-feira, quando a movimentação é menor, eu não tenho dúvidas de que vão ser dispensados.
Que modernidade é essa que fala em negociação individual e a aceita? Qual é a condição de equilíbrio entre o indivíduo e o patrão ali?
Senhores, eu peço aqui juízo deste Senado Federal. Os senhores estão brincando com fogo, estão brincando com fogo. Os senhores podem levar este País a uma convulsão social. Volto a dizer: é preciso responsabilidade. Nós queremos, pelo menos, que haja o debate nas comissões.
(Soa a campainha.)
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Nós queremos fazer o debate, com o máximo de calma possível, em todas as comissões.
Encerro dizendo que não vamos aceitar, como Senadores da República, não vamos tolerar que eles passem por cima sem discussão nas comissões e que tragam esse processo para urgência no plenário. Esse foi um acordo estabelecido, que eu espero que seja mantido. Eu sei que o Presidente da Comissão de Assuntos Econômicos foi um dos fiadores do acordo, e nós sabemos da boa intenção do Presidente Tasso Jereissati. Nós queremos discutir, comissão por comissão, essa reforma.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Eu não vou trazer esse debate para aqui, agora, mas lembro que nós acordamos que esse debate faria parte... Nós apenas mudamos a localização física da CAE. Nós conversamos, inclusive, a priori, sobre mudar a localização física para este plenário.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Fora do microfone.) - Não houve acordo sobre isso. Vou falar sobre isso na minha fala. Inclusive, liguei para V. Exª.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Eu comuniquei a senhora, Senadora, e o Senador Lindbergh aqui - inclusive nós voltamos a falar isso por telefone.
Eu não vou fazer esse debate aqui. Depois, na Comissão, nós debateremos sobre o assunto.
Com a palavra a Senadora Regina.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, senhores convidados, Senadores e Senadoras, primeiro, eu quero pedir desculpas por não estar aqui para ouvir os convidados. Eu estava na Comissão de Direitos Humanos, da qual sou Presidente, fazendo uma audiência pública sobre o Dia Internacional da Mãe Terra, estabelecido pela ONU.
Os dados são alarmantes. Nós estamos consumindo um planeta e meio. Como nós só temos um planeta, por isso há fome; por isso uns comem todo dia e outros passam o dia sem comer. E nós não vemos providência nesse sentido. Foi uma audiência com o Embaixador da Bolívia; com a Secretária-Geral da Embaixada do Chile; com a CNBB; com o Cimi, o conselho indigenista; e com mais outros convidados.
Anteontem, a Comissão de Direitos Humanos lançou, com a OIT, o Protocolo 29, que é uma ampliação da Convenção 29, de 1930, que trata exatamente do trabalho escravo. Então, os assuntos se encontram. No Brasil, em 20 anos, 52 mil trabalhadores foram resgatados do trabalho escravo, porque não há fiscal. Se houvesse mais fiscais, teriam resgatado muito mais. Então, é a mentalidade do patronato brasileiro, principalmente no campo - e nós estamos falando aqui do patrão brasileiro -, dizer que é moderno flexibilizar tudo isso que está aqui.
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O Brasil vai assinar o protocolo. A Casa Civil já sinalizou. O Brasil vai entrar numa encrenca, porque ao mesmo tempo em que assina o protocolo, porque, ali sim, é moderno, é contra o trabalho escravo, ele manda uma legislação dessa aqui que permite o trabalho escravo, porque se já se fazia o trabalho escravo sem ser permitido, imagine agora com essa legislação.
Há uma contradição também: o Ministro do Trabalho disse que fez um acordo com os sindicatos, com as centrais sindicais, em que ele não aceita a pejotização, a regulamentação sindical e o trabalho intermitente. Ele diz: "São pontos fundamentais em que eu, como Ministro do Trabalho, não vou surpreender o movimento sindical, faltando com eles a minha palavra." Essas são as palavras do Ministro do Trabalho. Quero ver como é que o Governo vai se sair dessa.
Voltando aqui à questão do trabalho intermitente, um dia desses, eu fiz uma fala aqui e perguntei: quem aqui que já teve patrão? Infelizmente não havia quem me respondesse. Quem já teve patrão? Quem já fez uma greve para melhorar sua vida, seu salário, suas condições de trabalho? Quem já botou os pés num canavial, para ver como é que trabalham as pessoas? Numa roça de um pequeno agricultor? Essa reforma saiu da cabeça de patrões. Isso rolou, na Câmara, dizendo que vinham por e-mails os textos já prontos e que os Deputados repetiam até os erros de português que vinham, nas emendas que colocavam. Por isso, deu mais de cem artigos. Alguém falou aqui.
Sobre trabalho intermitente, Valor, da semana passada, traz aqui uma matéria: "Reforma não prevê limite para adoção de trabalho intermitente". Ele traz o exemplo da Itália, da Alemanha e de Portugal. E o Brasil não copia. Quer dizer, o Brasil gosta de copiar só a parte ruim, porque aqui ele diz, inclusive, que é só em altas temporadas, em alta demanda, que não é o caso do Brasil, e em certas áreas: alimentação, turismo e outras como hotelaria, mas em alta temporada, período de alta demanda. E ainda descreve aqui que há compensação pelo período que fica sem trabalhar. Por que o Brasil não copia essas coisas?
Eu vou falar ainda do negociado sobre o legislado. Eu trago uma questão aqui de bancários que me mandaram uma pergunta de se vai valer o negociado sobre o legislado. Os bancários das estatais, dos bancos públicos ganham acima do teto, mas eles negociaram. Eles estão perguntando se vai valer ou se vão reduzir os salários deles para o teto. Eles ganham acima do teto, mas como foi negociado. Então, eles estão fazendo essa pergunta que eu não sei responder.
Eu quero falar também do intervalo do almoço. Eu queria saber aqui quem é que almoça em 15 minutos e que volta para o batente, mesmo para o ar-condicionado? E onde é que fica a medicina do trabalho? Onde é que fica a saúde do trabalhador? É mais um profissional desempregado: os médicos do trabalho, porque eles não recomendam isso. Quando você come, você tem que fazer um pouco... Está lá toda uma regra do que você tem que fazer depois das refeições, para o organismo se adaptar para poder voltar para a jornada. Como é que fica? É mais uma categoria desempregada, não é? Não vai haver mais médico do trabalho, porque não precisa. É aquela história de sanduíche numa mão e operando a máquina com a outra, que alguém já sugeriu aqui também.
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Sobre a questão da mulher, vão dizer: "Ah, ela não é obrigada." Como não é obrigada? Se não tivessem a intenção de colocar a mulher para trabalhar em trabalho insalubre, não precisava constar isso na lei. Mas aqui está clara a intenção de colocá-la para trabalhar em trabalho insalubre. "Ah, ela vai se ela quiser." Meu Deus, aqui já foi dito: poder de negociação individual se coletivo já é difícil? Eu fui sindicalista, eu sei o que é sentar de um lado da mesa defendendo o trabalhador frente às confederações defendendo o capital. Eu sei o que é isso. Imaginem uma negociação individual.
Um dia eu assisti a uma palestra de um desembargador do trabalho que dizia que há dois tipos de motivação: a motivação por sedução, em que você coloca um ambiente de trabalho bonito, uma música ambiente; e a motivação por estupro, em que - eu não vou dizer as palavras que ele disse - ou você aceita, ou você aceita. É essa a livre negociação que vai haver diante da fragilidade do trabalhador individualmente e diante do desemprego porque mesmo o trabalho precário que ele pratica há muitas pessoas lá fora querendo.
A questão da representação. O que vai acontecer, pelo que eu conheço dos meus tempos de sindicalista, e não mudou muita coisa, é que o patrão vai dar um jeito de eleger aquele funcionário que ele considera padrão, o bonzinho, o puxa-saco, o dedo-duro. Não vai ser eleito... Eu conheço, eu lidava com isso no Bradesco, eu sou bancária e sei o que é eleger um representante no local de trabalho.
Há outra questão que quero colocar. Não dá para dizer que isso aqui é bom para o trabalhador. Não pode. Primeiro, o melhor dos mundos para o empregador nunca é o melhor dos mundos para o empregado.
Nessa solenidade da OIT... Aliás, quero convidar todo mundo a assinar #AssinaBrasil, que é para o Brasil assinar. Há um dispositivo, na agência bancária aqui, que é muito interessante, você assina e cai uma gota de tinta de caneta, isso é pelo celular. Não dá para acharmos que é possível essa livre negociação.
Eu volto a dizer, ouvi um depoimento de um menino de 24 anos, que aos 12 anos trabalhava no canavial - isso agora em 2003, 2004, neste século -, levando água para onde o trabalhador estava cortando cana. Ele ia deixar água que ele pegava no córrego para o trabalhador beber. E ele também bebia, só comia feijão e arroz. No dia em que ele quis sair, esse menino fez esse depoimento aqui na Comissão de Direitos Humanos, apresentaram para ele uma conta de que ele estava devendo muito dinheiro à empresa. E ele perguntou que dívida era aquela. Era da comida, era da ferramenta do pai dele...
(Soa a campainha.)
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - ... porque o pai também trabalhava na cana. Ele estava devendo. Portanto, ele não podia sair, senão o pai dele ia ter que aumentar a meta.
Eles disseram também que viram um trabalhador morrendo, e foi livre negociação. O trabalhador assinou que ia cumprir uma meta em toneladas de cana por mês. E ele trabalhou tanto que morreu no meio do canavial. Esse foi um depoimento, ao vivo, que eu escutei. E aí alguém vem me falar em livre negociação, com a mentalidade do patrão brasileiro, principalmente no campo.
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A proposta está aqui dizendo... Achava que a reforma trabalhista era uma só; não, há a reforma trabalhista do campo, do Deputado Nilson Leitão. O repouso semanal poderá ser substituído por contínuo, com até 18 dias de trabalho seguidos. Vão em um canavial ver como é que trabalha um cortador de cana para saber se ele aguenta trabalhar 18 dias seguidos! Ele morre antes!
Isso aqui é uma indecência com o trabalhador brasileiro.
Muito obrigada.
(Durante o discurso da Srª Regina Sousa, o Sr. Tasso Jereissati deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pelo Sr. José Medeiros.)
(Durante o discurso da Srª Regina Sousa, o Sr. José Medeiros deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pelo Sr. Tasso Jereissati.) (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, Senadora Regina.
Antes de passar a palavra para a Senadora Gleisi, o Ministro Maurício Delgado tem horário a cumprir, pede licença, em função do seu horário, para se retirar e queria fazer apenas um agradecimento.
O SR. MAURÍCIO GODINHO DELGADO - Sr. Presidente, eu gostaria de agradecer a V. Exª, aos eminentes Senadores e dizer da minha honra em estar participando de um debate tão importante. Deixei umas palavras de contribuição desde a minha primeira fala, como também na segunda fala.
Eu cancelei um compromisso a uma hora, imaginava que terminaria, mas não posso efetivamente cancelar um compromisso às 14 horas, é inviável para mim.
Peço desculpas, presto minhas homenagens aos eminentes Senadores e realmente creio que se trata de um momento cardial que a nossa democracia vive, a nossa República, o nosso País e a nossa Constituição da República.
A Constituição da República é aquilo que nós fizermos no dia a dia, na prática e na legislação infraconstitucional.
Muito obrigado a todos. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado. Nós é que agradecemos e agradecemos pela paciência, Ministro.
Passo a palavra, pedindo que se cumpra, porque vários dos nossos convidados estão aqui desde 9h30 e têm horários, passagens e compromissos a cumprir.
Com a palavra a Senadora Gleisi.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Sr. Presidente.
Eu queria só aproveitar para, antes de o Dr. Maurício sair, agradecê-lo. Nós estávamos falando aqui, Dr. Maurício, V. Exª é o maior escritor da história do Direito do Trabalho, é uma honra e um prazer muito grande tê-lo aqui conosco nesta Mesa e neste debate. Espero que tenhamos outras oportunidades de tê-lo aqui durante esse processo que vai continuar.
Eu queria, Sr. Presidente, primeiro, cumprimentar a Mesa, cumprimentar V. Exª, mas eu queria lamentar a pressa e o afogadilho como foram marcadas essas audiências. Na realidade, aqui nós não temos uma audiência pública, nós temos uma sessão de debates feita no plenário do Senado da República.
Nós falamos com V. Exª, na semana passada, e combinamos de fazermos sessões conjuntas, sim, da CAE e da CAS e da CAE, da CAS e da CCJ, mas, para que essas audiências se realizassem, a matéria teria que estar na comissão. Jamais pensei que os senhores iriam juntar as audiências públicas para fazer de uma forma rápida o debate aqui. Nós não podíamos, por exemplo, estar fazendo uma audiência... Podemos estar fazendo da CAE, mas a de ontem, da CAS, não poderia ser conjunta com a CAE, porque nós não tínhamos deliberado, na Casa, ainda sobre os requerimentos, as pessoas que nós tínhamos ou que gostaríamos de indicar nem sobre o calendário dos trabalhos. Então, o que nós estamos vendo, na prática, aqui é um regime de urgência que foi colocado na matéria.
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Eu gostaria de pedir a V. Exª - aliás vamos apresentar o requerimento - que a gente pudesse honrar o que nós combinamos. Não vejo problema nenhum ter feito ontem na CAS, fazer este debate temático aqui,...
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Senadora.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - ... fazer também na semana que vem.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Senadora.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Eu já lhe falo, só quero terminar o meu raciocínio.
Fazer na semana que vem aqui. Mas não dá para abrir mão de fazer um debate na CAE do ponto de vista da economia do País e a reforma trabalhista.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Eu só quero afirmar aqui que eu estou cumprindo e honrando os nossos compromissos. Se V. Exª tem um entendimento diferente, eu lamento. Vamos discutir isso na Comissão.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Na CAE.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Nós temos ainda duas... Isso inclusive, foi explicado o porquê aqui no Plenário. O Senador Paim, em determinado momento, achou que seria uma maneira de se evitar ou dar alguns passos. Foi explicado para ele, expliquei, tanto a V. Exª, quanto ao Senador Lindbergh, que a ideia era fazer uma coisa mais ampla, de maneira que de todos os debates, todos os Senadores pudessem participar, como foi feito aqui hoje. Estiveram sindicalistas, sentaram, estiveram presentes, não sindicalistas, advogados, para fazer um debate o mais amplo possível. Foi essa a intenção. Senão não teria sentido nenhum, Senadora, eu estar sentado aqui. Eu não sou Presidente do Senado. Nem da Mesa eu sou, do Senado. Eu estou sentado aqui, como estava sentado lá, desde 9h30 da manhã, junto com outros Senadores, por esta e única razão. É isso que eu queria dizer. Mas gostaria que nós fôssemos ao debate, e nós discutiríamos isso na reunião da CAE, terça-feira.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Não, nós vamos discutir, eu só gostaria...
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Que será aqui, inclusive.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Eu gostaria só que V. Exª restituísse meu tempo desta intervenção, para que eu possa discutir a matéria.
O que eu quero só deixar claro, Presidente, é que não há problema nenhum fazer audiência no Plenário do Senado, fazer o debate público, não há problema nenhum. O problema é que nós estamos fazendo de maneira açodada. A matéria está na CAE ainda. Nós já fizemos, vamos fazer, já há três audiências públicas marcadas em conjunto com a CAS, sendo que a matéria não chegou à CAS. Nós vamos querer também fazer audiência pública na CCJ. É só isso.
A impressão que nós temos é que o regime de urgência está se dando na prática aqui, e nós tínhamos discutido neste Plenário que essa matéria não teria regime de urgência na Casa.
Mas enfim, eu queria, Sr. Presidente, e também os convidados, a quem eu cumprimento todos, queria chamar a atenção para um aspecto: a CAE é a Comissão de Assuntos Econômicos. Eu penso que na próxima audiência, com todo o respeito a quem está debatendo - e eu acho que o debate e as exposições foram de nível -, mas nós temos que trazer economistas para a Mesa. Porque a reforma trabalhista não pode ficar circunscrita apenas em relação ao interesse do patrão e do empregado. Nós temos que discutir, sim, o direito dos trabalhadores, temos que discutir, sim, os interesses das empresas, não há problema nenhum, vamos fazer isso. Mas nós temos que discutir o impacto que essa reforma trabalhista vai ter para a economia do País, Senador Paim. É isso que nós temos que discutir aqui. Que modelo de País e de desenvolvimento nós queremos? Retirando direitos, diminuindo salários, diminuindo a distribuição de renda? Que economia nós vamos ter? Nós temos uma economia altamente concentrada e financeirizada no Brasil. Nós conseguimos melhorar a performance da nossa economia quando nós aprovamos direitos para os trabalhadores, quando nós melhoramos o salário mínimo, demos aumento real. São esses os dados que nós temos aqui da economia. Toda vez que a gente retira direitos, toda vez que a gente reduz salário, toda vez que nós mexemos naquilo que é conquista dos trabalhadores e do povo brasileiro, a gente tem problemas na nossa economia.
Esse estudo que o Senador Lindbergh citou, do Banco Mundial, é muito interessante, é importante que todos os Senadores leiam. Só houve dois países que, de 1985 a 2015, não tiveram aumento da desigualdade social: foram Brasil e França. Foram justamente os que não fizeram reforma trabalhista.
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Nós temos que discutir isso. Como nós estamos impactando a vida do País? E é uma coisa que trabalha contra nós. Esta Casa aqui é pródiga em dar direitos a empresários e direitos aos grandes. Que tipo de discussão nós estamos fazendo aqui, Senador Tasso?
Acabamos, recentemente, o Brasil... O Governo acabou recentemente, de perdoar 25 bilhões do Banco Itaú - 25 bilhões do Banco Itaú! Aprovamos aqui uma medida provisória, a 766, que permitiu o parcelamento de dívidas fiscais, um Refis supergeneroso para as grandes empresas. Também discutimos aqui e aprovamos, na semana passada, a MP das concessões, que permite que a gente prorrogue os contratos de grandes empreiteiras sem fazer licitação. Agora, recentemente, o Governo diz que vai dar anistia aos produtores rurais que não pagaram o Funrural.
E aí nós queremos resolver o problema da economia retirando dos mais fracos? O que nós estamos fazendo aqui? Até porque a maioria que está discutindo aqui e propõe isso tem estabilidade no emprego. Está aqui o Juiz do Trabalho da 9ª Região, que é lá do Paraná, do meu Estado. V. Exª tem garantias no seu trabalho, não vai ter trabalho intermitente, não vai ter problema de férias. Muito pelo contrário, V. Exª tem duas férias por ano, como os Parlamentares. Então, talvez, a gente teria que começar a discussão da reforma do trabalho por esses cargos, que têm todas essas garantias, e não pelos trabalhadores. (Palmas.)
Professor. O senhor também é professor da USP, uma universidade pública. O senhor tem todas as garantias também, não vai ter trabalho intermitente, não vai ter problema de férias, não vai ter problema de aposentadoria, não é? Mesmo nós aqui, que nos elegemos a cada oito anos, não podemos reclamar também, porque temos condições boas de vida e de salário. O senhor, que é advogado de empresa, também tem boas condições, escritório forte, rico.
Então, vejam o que nós estamos fazendo. Gente que tem esses direitos vem aqui e discute que o trabalhador, aquele que tem pouquíssima proteção, pode ter seus direitos mexidos, pode ter trabalho intermitente, pode ser demitido coletivamente, pode ter, inclusive, a discussão patrão-empregado, a negociação prevalecendo. Eu fico perguntando se nós teríamos coragem aqui de discutir isso para juiz, para promotor, para professor de universidade. Não tem. Esta Casa não tem coragem. Sabe por quê? Porque vocês vêm fazer lobby aqui dentro. O trabalhador pobre não vem aqui dentro fazer lobby. Ele é vítima do que nós discutimos aqui e da visão da maioria aqui, que é uma visão muito mais para os ricos do que para os pobres.
É lamentável o que nós estamos vendo no nosso País. É lamentável, lamentável na questão da reforma da previdência, lamentável na retirada de dinheiro da educação e da saúde quando desvinculamos impostos. E fazemos isso com uma calma, como uma serenidade como se nós estivéssemos discutindo não a vida das pessoas. Estamos discutindo números. Estamos discutindo o faturamento das empresas, o lucro, porque, quando o lucro aperta, porque a economia decai, tem que retirar daqueles que ganham menos.
Então, Senador Paim, V. Exª tem razão em dizer que nós temos que ser bravos. Nós não podemos ser mansos aqui não. Se nós formos mansos aqui, quem vai pagar a conta é o povo brasileiro - é o povo brasileiro. Nós vamos ser muito aguerridos nesta Casa e nós não vamos aceitar um regime de urgência dessa matéria. Não vamos aceitar! Não há por quê! Nós vamos discutir à exaustão, assim como nós vamos discutir a reforma da previdência.
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Querem retirar direitos? Coloquem a carinha, digam o que querem e aguentem a discussão. Não queiram fazer isso num fast track, não, porque é difícil discutir, é difícil sustentar com o povo brasileiro, então quer fazer tudo muito rápido. Um Governo que nem legitimidade de voto tem, que está lá simplesmente para entregar para o capital financeiro e para entregar para os mais ricos deste País a melhoria das condições de vida deles, e não dos pobres.
É lamentável o que nós estamos vendo aqui, lamentável. E mais lamentável ainda, é ver quem tem os seus direitos garantidos falar sobre a precarização do direito alheio e achar que isso é justo.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, Senadora Gleisi.
Com a palavra o último Senador inscrito, Senador Ataídes, que tem a palavra.
O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, a princípio, agradeço a presença dos nossos convidados. Quero dizer, Sr. Presidente, que, no começo da minha vida, eu tive o privilégio de lecionar direito do trabalho e processo do trabalho. Eu queria ter chegado aqui no início desses trabalhos, mas, infelizmente, eu tive outras atividades. Mas eu pude ouvir o Dr. Prof. Antonio e também o nosso magistrado, Juiz Marlos. Só quem conhece da legislação trabalhista no Brasil, que conhece a CLT, sabe do tamanho da necessidade que é esta reforma.
Eu tenho o maior respeito, Sr. Presidente, aos meus colegas Senadores e Senadoras - aqui está o amigo, Paim -, o discurso deles é aceitável, é admissível, eles são Oposição. Agora, não dá para aceitar um convidado, que não conhece da legislação trabalhista, vir aqui dizer que essa legislação é coisa do demônio. Isso não dá para admitir! Falar que esta reforma está tirando direito do trabalhador, isso não é verdadeiro - e eu posso falar como ex-professor e contador que fui durante 14 anos. Se fosse para tirar direito do trabalhador, eu jamais apoiaria esta reforma. E interessante é que o PT não fez as reformas que tinham que fazer, Sr. Presidente - essa trabalhista, previdenciária, tributária. E o PT, hoje, posa de bonzinho, de vítima.
Mas, para encerrar esse ponto, Sr. Presidente, o PT, salvo alguns colegas nossos, gosta tanto do pobre, mas gosta tanto do pobre, que multiplicou o número deles. Esta é verdade no Brasil: esses vinte e tantos milhões de desempregados no Brasil é coisa do PT, não adianta esconder isso! Essa herança maldita é do PT, esses R$4,3 bilhões da nossa dívida é coisa do PT, não é coisa de Presidente Michel Temer.
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Ontem, eu fiz aqui uma prestação, uma avaliação de um ano de Governo. Eu nunca tinha visto o Presidente Michel Temer na minha vida, mas está caminhando no rumo certo.
E, aqui, Sr. Presidente, portanto, eu encerro esta parte dizendo que só quem não apoia essa reforma do jeito que ela se encontra, do jeito que ela veio ... É claro que ela pode não ser, Dr. Antonio e Dr. Marcos, a melhor. Eu até concordo, porque dei uma lida rapidamente, ela precisa ser melhorada. Concordo, mas, no momento, ela vai atender a princípio.
E eu volto a dizer o que disse ontem: a retomada do emprego no Brasil passa obrigatoriamente por essa reforma trabalhista - passa por essa reforma trabalhista. Esse trabalho intermitente, por exemplo, nós vamos trazer muita gente da informalidade. O senhor disse, Dr. Antonio, a respeito da contribuição sindical, e eu vou falar sobre o S em minutos. V. Exª disse que vai fortalecer o sindicalismo. Claro que vai, porque agora quem pagar vai pagar sabendo que está pagando certo e vai ter o seu retorno. Isso é fato.
E aí, Sr. Presidente, vamos para o Sistema S, porque todo mundo aqui na Casa sabe que eu sou um estudioso do Sistema e sou um defensor. Escrevi um livro A caixa preta do Sistema S. Nós temos que baixar o custo Brasil, isso é fato. Se nós não baixarmos o custo Brasil, não sei aonde vamos parar.
Na folha de pagamento bruta do trabalhador, desconta-se 3,1 sobre o seu salário bruto para o Sistema S: 2,5 para as categorias - indústria, comércio, transporte, etc. - mais 0,6 para o Sebrae. Isso, simplesmente, em 2016. Está aqui um documento da CGU. Em 2016, somou, mesmo com a crise e com o desemprego, R$32 bilhões.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. ATAÍDES OLIVEIRA (Bloco Social Democrata/PSDB - TO) - Bi, bilhões de reais. Só de contribuições sociais é algo em torno de R$23 bilhões, porque eles, inclusive, Sesi e Senai, recolhem 56% das suas contribuições diretamente com os grandes empresários, cometendo um grande crime que é o recolhimento de impostos diretamente do consumidor.
E aqui, Sr. Presidente, há um outro documento, também da CGU, que diz que a disponibilidade financeira aplicada no mercado financeiro é R$24,5 bilhões. Ou seja, o que esse Sistema S está fazendo? Sendo que a função é qualificar a mão de obra do trabalhador, levar lazer e saúde e dar cursos profissionalizantes. Não é, Dr. Marlos? Quantos milhares de nem-nem, nem estuda e nem trabalha, estão precisando de um curso profissionalizante? Como o Senador Paim fez lá no início, fez um curso de torneiro, que V. Exª me disse, lá no Senai e foi para o mercado de trabalho. Só que hoje, se fizer esse curso, tem que pagar algo em torno de R$3 mil pelo curso.
Então, o Sistema S virou negócio, virou business. Gratuidade não passa de 15% de toda essa avalanche de dinheiro público que cai dentro.
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Apresentei o Projeto de Lei nº 386, que designa 30% de todos esses recursos que eles não usam para a Seguridade Social, Senador Paim, especificamente para o Funrural, que é o grande problema. Mas, infelizmente, a Casa não aceitou o meu projeto. Também agora apresentei uma emenda na CAE, pedindo a extinção dessas contribuições. E digo mais: sobre a folha de pagamento bruto, todos pagam 0,20% ao Incra. Ninguém sabe disso. Acho que poucos aqui sabem disso. Isso é uma anomalia jurídica. Eu tenho um projeto aqui também para que se acabe com isso, mas não se acaba.
Enfim, acho que é o momento, Sr. Presidente, de passar o País a limpo e fazer as correções.
Repito: eu admito, aceito o contraditório por parte dos meus colegas da oposição. Agora, quem conhece a Consolidação das Leis do Trabalho, quem conhece as convenções coletivas, quem conhece os acórdãos, quem conhece a jurisprudência, quem conhece o volume que é hoje a legislação trabalhista que estou colocando sobre a minha mão - e os doutores sabem -, sabe exatamente a necessidade dessa reforma trabalhista.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado.
Senador Paim, eu tinha falado que o Senador Ataídes era o último orador, mas acabou de chegar aqui o nosso Senador Jorge Viana, a quem passo a palavra, como último orador.
O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Eu agradeço, Presidente. Estive aqui mais cedo, na abertura, e me inscrevi, mas, nessa correria para um lado e para outro, mesmo sendo uma quinta-feira, V. Exª também fez o mesmo. Eu agradeço. Não vou usar de jeito nenhum, nem tenho o direito, o tempo dos colegas. Vou usar os cinco minutos originais, no máximo. Quando esta sessão começou, era assim. Depois, foi alongado para dez.
Eu não podia me ausentar, porque defendi, no Colegiado de Líderes, que debates como este acontecessem - eu e o Senador Paim -, mas lamento que o Senado possa estar incorrendo no erro, apesar de elogiar - estamos aqui no plenário, fazendo este debate -, de apressar algo que não pode ser feito, senão vira crime, na minha opinião, com pressa. Devemos ter pelo menos o tempo necessário para que uma análise mínima possa ser feita.
Nossas leis trabalhistas estão completando 74 anos. Começaram com Getúlio Vargas no século passado. Nós estamos num mundo que está mudando também. Profissões estão desaparecendo. Outras atividades estão vindo. Fala-se que 30% dos empregos novos serão de atividades que não conhecemos no futuro.
Eu penso um pouco assim, ou seja, defendo a modernização das leis do trabalho, a atualização da legislação. Claro que defendo. Mas como fazer algo que está mexendo com o cidadão em todos os Municípios?
Vim do Acre esta semana, estive reunido com quatro centrais de trabalhadores, com dezenas de sindicatos. Assumi o compromisso de ser um pouco a voz deles aqui, como os colegas que estão fazendo o mesmo.
Esta sessão começou, e um dos debatedores, a quem cumprimento, foi o Paulinho da Força, adversário político nosso, aliado deste Governo, que veio dizer que nesse formato que estão fazendo, de projeto de lei misturado com medida provisória, ele não acredita. Eu não vou entrar no mérito de acreditar ou de não acreditar. Nós temos uma oportunidade de debater. O que eu queria buscar era o bom senso.
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Esse projeto de lei tinha originalmente, na ideia inicial, sete artigos. Agora tem mais de 100, mexe em 200 dispositivos das leis trabalhistas, a ponto de animar um Deputado Federal do PSDB a dizer: "Olha, também temos que regulamentar uma relação de trabalho do século passado, do tempo da escravidão, em que você trabalha em troca da dormida e da comida". Isso está sendo debatido, Senador Paim. Está-se querendo colocar no projeto.
Eu vi V. Sª fazer ponderações de um ouvir o outro. Eu queria isso, agora como é que nós vamos levar em conta - eu vi bem a sua explanação aqui e concordo com ela -, como é que nós vamos ouvir e prestar atenção nos outros se não temos tempo? Está aqui o Senador Ferraço, que é um dos Relatores. E está desde cedo aqui, porque é Relator. Faltou a algumas comissões porque é Relator.
Sinceramente, nós já debatemos temas importantes. Eu fui Relator do Código Florestal. Passei quase um ano discutindo como modernizaríamos o Código Florestal. Fizemos um trabalho que teve o apoio de mais de 70 Senadores. Agora nós vamos mexer numa das leis mais importantes da relação humana, a relação de trabalho! Quem não quer enfrentar esse drama de 14 milhões de desempregados? Quem não quer desburocratizar as regras trabalhistas, que também são perversas para o empregador? Eu quero. Mas sabem o que estão propondo, convidados, todos os que me acompanham na Rádio e na TV Senado? Fazer isso em uma semana no Senado Federal! Uma semana de audiências como esta. Uma semana de que eu estou falando são alguns dias de uma semana, porque são duas semanas, mas vão acontecer em quatro ou cinco dias os debates. Então, você faz uma modificação que o Brasil demorou 74 anos aperfeiçoando, porque depois é votação rápida, no rolo compressor, nas comissões por que passa.
Eu só faço um apelo: mesmo o Governo que não passou nas urnas, que, independentemente de qualquer coisa, está aí, comandando o País, leve em conta e use o bom senso para que a gente possa sair desse enfrentamento. Estabeleça prazo. O Senado poderia dizer: "Olha, o Senado vai ter no máximo três meses" - já seria um absurdo - "para apreciar nas comissões, no plenário, nas audiências esta matéria". Três meses. Será que é muito em 74 anos, Senador Paim?!
Estou defendendo essa tese para que todos os lados, quem tem opinião, quem diverge, quem tem sugestão, quem quer aperfeiçoar, possam se manifestar.
Era isso que eu queria trazer, porque acho que o Brasil precisa, sim, trazer as suas leis, os regramentos da relação de quem emprega, do empregador para o Século XXI, mas lamento afirmar que, com essa proposta que está vindo por parte do Governo Federal, apoiada pela Câmara, nós estamos levando para o começo do Século XX, e não andando para frente, andando para trás.
O apelo que eu faço é que o Senado Federal, em nome dos trabalhadores e das trabalhadoras do Acre, dos sindicalistas, das federações, em nome dos empresários que precisam, sim, sair de uma situação que é difícil para eles, que consideremos um tempo mínimo necessário para apreciar esta matéria, para que possamos entender que é uma matéria que tem mais de mil dispositivos - mil dispositivos! -, alguns que precisam ser modificados, sim, alguns que precisam ser retirados da legislação, mas que pelo menos se tenha o tempo. É só isso.
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Eu vi e queria dar o meu testemunho, para concluir, Sr. Presidente. O Presidente Lula, quando recebeu a visita do Presidente Michel Temer no hospital, ainda quando sua esposa estava no leito de morte, Dona Marisa, eu estava do lado. Ele solicitou que eu e o ex-Ministro Jaques Wagner acompanhássemos a audiência com o Presidente Michel Temer, lá no Hospital Sírio Libanês. E fez um pedido ao Presidente Michel Temer e ao Ministro Henrique Meirelles. Falou: façam a reforma da previdência de vocês, façam as modificações trabalhistas, mas não façam do jeito que vocês estão fazendo, tirando o direito das pessoas. Façam no seu tempo. Eu fiz a minha reforma da previdência, faça a sua, Temer, mas faça de modo que o Brasil fique melhor. E fez um apelo ao Ministro da Fazenda também nesse sentido em relação às leis trabalhistas.
Sinceramente, acho que o Brasil podia, sim, e até deve fazer uma reforma trabalhista, mas para atualizar toda a nossa legislação, facilitar a geração de emprego e renda, a vida dos empresários e garantir, com algumas obrigações, o direito dos trabalhadores. Era só isso que eu queria: um tempo razoável, um tempo adequado. Será um desastre se o Senado botar para funcionar esse calendário que foi feito para se resolver em trinta ou quarenta dias uma legislação que diz respeito à vida do cidadão, do trabalhador e das trabalhadoras de um País continental como o nosso.
Muito obrigado, Sr. Presidente. E desculpe pela impertinência de chegar a ser o último orador desta sessão importante.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, Senador Jorge Viana.
Passo, então, a palavra aos nossos convidados e ilustres debatedores, que estão aqui desde as 9h30 da manhã, para que não só respondam às questões que foram levantadas pelos Srs. Senadores, mas aproveitem e façam as suas considerações finais.
Com a palavra o Juiz Federal do TRT da 9ª Região, o Sr. Marlos Melek.
O SR. MARLOS MELEK - Obrigado, Senador.
Iniciarei respondendo às ponderações muito bem elaboradas pelo Senador Paulo Paim, ao qual agradeço a compreensão na minha meninice, na sua velhice e no nosso sentimento de convergência para fazer o melhor pelo Brasil, embora com algumas ideias um tanto quanto diferentes, mas buscando o mesmo objetivo comum.
Vejam, em relação ao Sistema S, isso não foi tratado. E, na minha concepção, é um assunto que merece ser tratado.
Em relação à negociação de verbas resilitórias ou rescisórias, que é o acerto final do trabalhador, ao meu ver, com todo o respeito, o projeto não trata da possibilidade de parcelamento, muito pelo contrário. O projeto manda pagar multa se atrasar o pagamento das verbas rescisórias.
Em relação à jurisdição voluntária, o que é isso? É a possibilidade de se fazer um acordo extrajudicial para que se leve à Justiça para homologação, para fazer com que a Justiça do Trabalho deixe de ser de conflito e passe a ser uma Justiça ainda mais de conciliação. Um juiz do Trabalho que tem o mínimo de experiência vai saber se aquele valor que está sendo proposto para "x" tempo de trabalho para aquela profissão é razoável ou não para ser homologado. E o juiz não é obrigado a homologar o acordo por sentença.
Então, esse acordo extrajudicial, cada um com o seu advogado - foi criada essa salvaguarda -, vai levar à Justiça um acordo. Muitas vezes se faz uma lide simulada para ter a segurança jurídica da assinatura do juiz para que se paguem as verbas que se entendem controvertidas, além das rescisórias, de outras coisas.
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Então, seria bastante razoável que a jurisdição voluntária, que já existe no processo civil, também viesse, como tem vindo, para o processo do trabalho.
Em relação à dispensa em massa, o raciocínio que foi feito é que se se dificultar a dispensa de um trabalhador, já que hoje, no Brasil, bem ou mal, a legislação permite a dispensa sem justa causa... A vedação da dispensa em massa, que nada mais é do que a somatória do individual, poderia fazer com que o empresário tivesse receio de contratar, porque depois não poderia dispensar. Então, é esse o raciocínio, um raciocínio de mais liberdade, para que não se tolha a possibilidade de contratação vedando, depois, lá na frente, ou criando dificuldades para a dispensa. Bem ou mal, é a regra do jogo. E essa regra do jogo seria assimilada por todos.
O distrato.
Olha, Senador Paulo, esta é uma questão interessante porque, no dia a dia das audiências trabalhistas... Eu faço cerca de 20 a 30 audiências unas por dia, de segunda à quarta, às vezes de segunda à quinta e, às vezes, até de segunda a sexta, por dia, na Justiça do Trabalho. É muito comum, todos os dias acontece isso, o trabalhador que diz na minha frente, sem saber que hoje isso é considerado um crime: "Olha, eu fiz acordo para sair. Eu não queria mais trabalhar, mas não queria perder tudo." Então, o que nós fizemos foi propor que a culpa recíproca, que já existe na CLT hoje, seja trazida à possibilidade de se fazer o distrato.
O Direito do Trabalho é tão conflitivo que hoje só permite, Senador Jereissati, que se faça a dispensa, "te mando embora", ou o contrário, "entrego a minha demissão e não ganho nada." Então, nós fizemos mesmo um meio termo, porque isso, na prática, já existe. E isso foi muito ponderado. O trabalhador terá direito a todas as verbas salariais sem um centavo de desconto - eu tenho pouco tempo, então serei bastante objetivo -, poderá receber 20% da multa do FGTS, já que houve um acordo para sair, também sacará 80% do saldo do FGTS, mas não terá direito ao seguro-desemprego, para que não se incentive a rotatividade. Então, esse é o distrato. Se até casamento no Brasil pode...
(Soa a campainha.)
O SR. MARLOS MELEK - ...terminar por acordo, por que não um contrato de trabalho? E isso acontece muito.
A limpeza do uniforme. Ora, se o trabalhador fosse trabalhar com a roupa normal, com uma camiseta e uma calça, ele teria que lavar. Então, por que ele tem que ser indenizado pela empresa por lavar o uniforme? O projeto traz com cautela, com cuidado que se for uma roupa que depende de um asseio especial, algo assim, a empresa terá que pagar os produtos e a lavagem. Isso está escrito no projeto. Agora, se for um uniforme comum, um jaleco do dia a dia, a roupa normal que ele teria que lavar da mesma forma, esse é o espírito da ideia da lei.
Em relação à terceirização, a terceirização existe praticamente no mundo inteiro. Eu reconheço, Senadores, que nós temos argumentos muito fortes para ambos os lados nesse caso. Entretanto, permite-se no Brasil há muitos anos a terceirização da chamada atividade meio. E o Brasil e a Espanha são os únicos países do mundo que fazem a diferenciação...
(Soa a campainha.)
O SR. MARLOS MELEK - ...de atividade meio e fim, sendo que na Espanha essa diferenciação é apenas para fins tributários e no Brasil, para fins trabalhistas também.
Então, a abertura do mercado para a terceirização de qualquer atividade, inclusive da principal, vai trazer consigo a responsabilidade subsidiária e aquela cláusula de salvaguarda que cria 18 meses para poder recontratar o trabalhador como um CNPJ. É para dar um recado à sociedade brasileira de que, neste momento cultural do Brasil, não se aceita a figura da pejotização. Como bem colocou o Prof. Hélio Zylberstajn, nós temos a possibilidade de o juiz do trabalho reconhecer o vínculo empregatício nessas situações, se houver subordinação, etc. e tal.
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O trabalho escravo, que foi citado tantas vezes, tem sido citado - eu peço licença aos senhores -, é uma exceção à regra. É um assunto muito grave, muito sério, muito profundo, mas é um ilícito penal. Por isso, não precisa de tanta luz aqui na reforma, que trata de 98% a 99% dos empregos, que, bem ou mal, têm um mínimo de patamar civilizatório. Agora, aqueles que forem trabalho escravo ou condição análoga estão diante de um ilícito penal. Isso não será tolerado pelo Poder Judiciário, por um magistrado, nem por ninguém desta Casa de forma alguma!
Em relação à reforma sindical, há aquela coisa: para o Brasil voltar a crescer como se faz? A primeira, reforma sindical, aquela, aquela outra... Foi feita essa. E, aqui, com o imenso respeito que eu nutro por todas V. Exªs, poderiam ter proposto um projeto nesse sentido então, mas não o fizeram. Então, começou pela trabalhista.
Rogo eu, como brasileiro, que venham todas as outras; mas todas: reforma da matriz energética, da matriz comercial, do Judiciário. Que venham todas essas reformas para se passar este País a limpo de uma vez por todas.
O teletrabalho. A norma do teletrabalho foi inspirada no Ministério Público Federal, que é o órgão que fiscaliza o País.
(Soa a campainha.)
O SR. MARLOS MELEK - As normas do teletrabalho foram inspiradas nas normas do Ministério Público Federal.
A questão da ultratividade é muito interessante. Além da decisão do Supremo, que não cabe a mim comentar, por que o projeto preferiu a vedação da ultratividade? Nós temos a lei, que serve para todos, tem efeito erga omnes, vale para todo mundo. Então, por que não permitir que uma convenção coletiva continue tendo validade até que venha uma outra? Porque a própria lei diz que ela é um contrato por prazo determinado, feito pelos entes coletivos, pelos sindicatos. E um argumento que pesou muito na Comissão foi o seguinte: se o poder econômico comprar, eventualmente, um sindicato, para que se faça uma convenção coletiva ruim, e depois não se faça outra, aquilo vai vigorar ad aeternum, para sempre, em detrimento do trabalhador. Então, não havendo a convenção coletiva, o trabalhador tem o instrumento da greve, que é o instrumento da pressão para se fazer uma nova norma coletiva. E, na falta da norma coletiva, volta a valer a CLT para aquele caso.
O problema da Justiça gratuita hoje no Brasil: 100% dos trabalhadores hoje no Brasil têm Justiça gratuita. Há algum problema nisso? Em partes, porque, vejam, tem sujeito que ganha R$30 mil por mês, R$20 mil por mês, R$10 mil por mês, e não quer pagar 2% de custas para o Poder Judiciário. O que diz a Constituição Federal, que foi tão citada hoje nesta sagrada Casa Legislativa? Na Constituição Federal, está escrito que o Estado prestará assistência judiciária gratuita àqueles que comprovarem a necessidade. Não fui eu que inventei; está lá na Constituição Federal: àqueles que comprovarem a necessidade. Então, o projeto partiu de uma premissa de que, para quem ganha até 40% do teto previdenciário, nós vamos presumir a gratuidade; além disso, tem que comprovar de alguma forma, por mais simples que seja, mas tem que comprovar.
Bem, espero ter, no meu curto espaço de tempo, respondido com todo carinho e respeito ao eminente Senador Paulo Paim.
(Soa a campainha.)
O SR. MARLOS MELEK - E quero fazer, agora, algumas considerações rápidas, muito breves mesmo, com a sua permissão, Sr. Presidente, sobre a jornada de 12 horas. Reafirmo, repito: isso não existe. O projeto não permite, nunca permitiu, nem se chegou perto disso. Só se permite a 12 por 36, a que o próprio TST já deu o selo de qualidade como uma jornada mais benéfica ao trabalhador, para aquele que trabalha à noite - o técnico de enfermagem, o médico, o vigia, o vigilante e tantas outras profissões.
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Os 30 dias de férias, que só poderão ser parcelados em até três etapas, sendo que uma delas não poderá ser inferior a 14 dias, exatamente de acordo com a Convenção 132, da OIT, com a expressa anuência do trabalhador. E ainda criamos uma salvaguarda, que não existia, de que as férias não podem ser concedidas dois dias antes do sábado, do domingo e do feriado, para que o trabalhador não perca.
Caso ele seja pressionado, existem várias instituições, como a Superintendência do Trabalho e Emprego, o Ministério Público do Trabalho e a própria Justiça do Trabalho, que estará de portas abertas...
(Soa a campainha.)
O SR. MARLOS MELEK - ... para receber esse trabalhador, inclusive de forma anônima, em órgãos de fiscalização.
Bom, finalmente, termino dizendo quem, em hipótese alguma, o projeto afasta o trabalhador das portas do Poder Judiciário. Hoje nós temos 11 mil novas ações trabalhistas por dia no Brasil. É um número avassalador. Nós não podemos continuar dessa maneira. Então, o que nós propomos é que nós tenhamos mais racionalidade no Poder Judiciário trabalhista. Como mencionei há pouco, a taxa de congestionamento na execução bate 86%; no Judiciário trabalhista, a taxa de congestionamento é de 59%. Nós precisamos racionalizar os processos trabalhistas, e atuamos em algumas frentes em relação a isso; mas o prazo prescricional para o trabalhador ingressar com uma ação na Justiça continua sendo de dois anos, que é matéria constitucional. Ou seja, não mexemos em direito algum.
Em relação às convenções coletivas, que é o negociado, que não prevalece sobre o legislado, apenas é prestigiado em relação...
(Interrupção do som.)
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Para concluir, por favor. (Pausa.)
(Soa a campainha.)
O SR. MARLOS MELEK - ... aos dados objetivos apresentados de que as convenções coletivas em 52% dão reajustes acima da inflação.
E, para terminar, finalmente, ocupando esse pouco tempo que me resta, eu gostaria de dizer aos senhores que sou um juiz de primeiro grau, assim como Senador é Senador. Eu não sou assessor de ninguém, assim como ele também não é assessor do falecido Hugo Chávez, por exemplo, mas eu fiz meu trabalho com temor a Deus e com amor a este País. Por mais que eu possa estar errado, Senador Paulo Paim, eu fiz com amor o meu trabalho. E, por tantas horas que falei, em menos de um minuto, eu não citei três vezes o nome do demônio.
E, para concluir, Senadora Gleisi, por quem nutro o maior respeito e carinho, eu comecei a trabalhar com 14 anos de idade, lá no bairro do Boqueirão, numa tornearia mecânica; eu não tinha estabilidade. Depois, como empresário por dez anos, não tive estabilidade. Quando fui advogado e professor universitário, não tive estabilidade. E, agora, estou como magistrado há 12 anos.
(Interrupção do som.)
O SR. MARLOS MELEK - Então, já estive dos dois lados. Já regulei a marca do iogurte que eu compro sábado no supermercado, já tive as limitações da vida de um trabalhador, e também conheci muito de perto os desafios que informam a vida de um pequeno e médio empresário no País. Isso, de certa forma, me credencia, se assim a sociedade brasileira entender, a dar alguma contribuição para esse projeto.
Mas esta é a beleza da democracia: eu acredito que dessa forma nós conseguiremos, todos juntos, entender o que é o melhor para o Brasil e construir um novo Direito do Trabalho, porque a CLT, da década de 40, realmente está muito ultrapassada.
Agradeço a compreensão de todos. Muito obrigado pelo convite realizado pelas Comissões de Assuntos Econômicos e Sociais do Senado.
E nós estaremos sempre, sempre trabalhando com amor pelo nosso País.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, Sr. Juiz Marlos Melek por sua presença e por suas exposições tão claras.
Passo a palavra ao Prof. Hélio Zylberstajn, professor da USP e - só chamando atenção aqui -, com certeza, Senadora Gleisi, um dos mais importantes e respeitado economistas do País.
R
O SR. HÉLIO ZYLBERSTAJN - Obrigado, Sr. Presidente. Eu vou ser muito breve.
Eu vou citar alguns dos qualificativos que foram feitos ao projeto aqui por vários dos senhores: ele é subversivo, desumano, covarde, cruel e indecoroso. Esses são alguns deles. Quer dizer, isso mostra a veemência dos comentários que foram feitos aqui.
Eu acho que temos que respeitar, evidentemente, mas eu achei muito importante os esclarecimentos detalhados que o nosso Juiz Marlos deu, mostrando que há uma lógica, há uma racionalidade nesse projeto, e o objetivo dele é simplificar, é modernizar, é facilitar - longe desses objetivos que foram aqui listados.
Alguns comentários muito breves. O Senador Lindbergh citou diversos estudos de entidades profundamente respeitáveis que concluem que as reformas trabalhistas não surtem efeitos no sentido da promoção do emprego. É uma pena que ele tenha chegado atrasado e não tenha visto o meu comentário logo no início da manhã, em que eu mostrei exatamente que a reforma do Brasil não pode ser comparada com essas reformas que foram feitas na Europa, em outros países. O objetivo da nossa reforma é diferente.
A Senadora Gleisi fez uma menção a um dos estudos e ressaltou uma das conclusões, de que a França e o Brasil foram os dois únicos países que não fizeram reformas trabalhistas e, por isso, não tiveram uma piora na distribuição de renda, ou tiveram uma melhora na distribuição de renda. Eu estou estranhando esse comentário, porque - pelo que eu sei - a França, no período indicado, fez diversas reformas, e reformas, inclusive, nas questões ligadas à negociação coletiva. Houve um processo de descentralização, de nova formatação para a negociação coletiva naquele país exatamente nesse período que foi mencionado.
Um comentário do Senador Lindbergh me chamou muito a atenção. Eu acho que ele não era nascido na data do jornal que ele mostrou, mas ele fez menção à criação do décimo salário do João Goulart e enalteceu essa ideia. Esse foi um dos exemplos que ele deu sobre a necessidade de ter uma riqueza na legislação trabalhista, de vários direitos instituídos por lei.
Eu me lembro muito bem, eu era muito jovem nessa época, do que aconteceu: o Presidente João Goulart criou o décimo terceiro no mês de outubro, e as empresas tiveram de sair correndo para pagar o décimo terceiro até dezembro. E o Brasil, no ano seguinte, teve uma inflação de 100%, e aquele décimo terceiro foi comido por essa inflação. Ele continua aí hoje, só que ele já não existe mais, ele foi comido lá atrás. Isso para mostrar a limitação do alcance de determinadas normas trabalhistas e a necessidade de darmos mais atenção para a negociação coletiva, porque essa, sim, tem o poder de sempre se renovar.
Gostaria também que fazer um comentário que não foi ainda feito sobre a questão da homologação.
(Soa a campainha.)
R
O SR. HÉLIO ZYLBERSTAJN - Eu acho que foi o Senador Lindbergh - posso estar enganado - que mencionou que a reforma está eliminando a homologação. Isso não é verdade; a homologação pelo sindicato deixa de ser obrigatória, mas o trabalhador que quiser homologar no sindicato pode fazer isso. E tudo isso veio dentro daquela lógica que mostrei, em minha apresentação, de redução dos custos de transação e de caminhar no sentido de que a rescisão rescinda o contrato de trabalho.
Jornada de 12 horas já foi falado.
Eu queria fazer um comentário muito rápido sobre ultratividade. A ultratividade atrapalha o processo de negociação. É muito importante, no processo de negociação, que as partes saibam que aquilo que está vigendo tem um prazo, e elas normalmente estão negociando no último mês da vigência daquela convenção ou daquele acordo. E essa necessidade de procurar um novo acordo ou uma nova convenção antes do fim da vigência ajuda o processo a ser concluído. Então, é muito importante que haja essa finalização, esse prazo. Não é um detalhe ilegal, mas é um detalhe importante para promover o processo de negociação.
Agora, eu queria fazer dois comentários. Eu fiquei muito feliz quando fui convidado para vir aqui e, durante quase todo tempo, nós tivemos um debate respeitoso - claro -, não convergente, mas todos puderam expressar suas opiniões; mas duas das opiniões me deixaram muito infeliz. Primeira, a do Senador Requião que deu a entender que nós que estamos aqui, nesta Mesa, estaríamos defendendo interesses. Quer dizer, a sensação que eu tenho é que, se ele encontra alguém que discorda do que ele acha, é porque essa pessoa que discorda dele está discordando porque tem algum interesse para defender. E este não é o meu caso. Eu estou aqui para manifestar a minha posição desinteressada sobre esse assunto e sobre esse projeto de lei. Eu espero que o Senador reflita e retire essa afirmação que ele fez; ela é profundamente ofensiva.
E para a Senadora Gleisi: eu também me senti atingido, Senadora... Ah, ela não está. Ela deu a entender que, pelo fato de alguém ter um bom salário ou estabilidade, ele não pode ter uma opinião a favor desse projeto. Isso é um absurdo. Eu sou professor aposentado da Universidade de São Paulo. Eu estou aposentado, continuo a dar aula na faculdade e não recebo pelas aulas que dou - nós temos um regime de professor sênior. E eu estou aqui para expressar a minha manifestação; não é porque eu ganho bem ou porque eu tenho uma boa aposentadoria.
Eu queria também dizer que tenho me dedicado ao debate sobre a reforma trabalhista e também sobre a reforma da previdência. E eu tenho me manifestado, sempre que eu posso, a respeito das aposentadorias generosas e a dos funcionários públicos. E, quando eu falo sobre isso nas audiências em que participo, sempre me incluo entre os que têm aposentadorias generosas. E falo que precisaríamos rever esse regime de generosidade com os funcionários públicos. Eu não defendo interesses nem de grupos, nem de empresas e nem os meus pessoais. Eu me senti também profundamente atingido pelo comentário infeliz e eu espero que ela também reflita e retire esse comentário.
Eu quero agradecer a oportunidade. Acho que tivemos uma manhã alongada, mas eu espero que a minha participação tenha contribuído para enriquecer o debate, para apresentar alternativas de modos diferentes de enxergar a questão.
Muito obrigado.
R
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Eu que agradeço, Professor Zylberstajn, e peço desculpas em nome dos Senadores por qualquer palavra que tenha sido ofensiva ou que tenha vindo, de alguma maneira, a magoar um dos nossos convidados, principalmente quando esses se dispuseram, gratuitamente, sem nenhum interesse, sem nenhuma remuneração - homens do porte de todos que estão aqui -, a se deslocarem e ficarem sem almoçar desde 9 h da manhã até esta hora.
Eu peço desculpas e faço um apelo aos Srs. Senadores para que isso não se repita, porque é importante que a gente mantenha o nível, a cordialidade. Na maior discordância, nós podemos manter a cordialidade e a elegância na discussão, até pelo bem da racionalidade que nós pretendemos imprimir a este debate.
Muito obrigado.
Passo a palavra ao Sr. Clemente Ganz Lúcio, Diretor do Dieese.
O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - Dado o adiantado da hora, eu só queria fazer dois comentários. Acho que todas as intervenções, na verdade, só revelam a necessidade de nós qualificarmos o debate primeiro.
Fiquei me lembrando do Keynes, que, 1933, no meio daquela depressão, afirmava que, em crises tão graves como aquela, talvez como a que nós vivemos hoje, a relação entre a observação crítica da realidade e a solução é gravemente esgarçada. Nós vemos, nos debates profundos como os que essa reforma exige, o quanto esse esgarçamento nos impede de fazer uma compreensão de um olhar crítico sobre a realidade.
E a minha experiência mostra - mesmo nesta Mesa, com todas as nossas diferenças - que, se nós tivéssemos um cuidado de sistematizar este debate, veríamos que temos grande convergência sobre a análise crítica da realidade e temos divergências sobre as soluções. O diálogo social é justamente a construção compartilhada da solução para um problema que nós identificamos como comum.
Se nós olharmos em boa parte dos problemas aqui, temos concordância de que é um problema que gostaríamos de resolver. O que estamos dizendo é que, na nossa interpretação, parte do que está colocado no projeto, na nossa visão, não resolve o problema, apesar de termos concordância com o problema. O diálogo, provavelmente, levaria a construirmos soluções que são compartilhadas, e o compartilhamento da solução é algo essencial para um sistema de relações de trabalho.
Eu tenho dito que o impacto econômico, social e fiscal da reforma trabalhista é centenas de vezes mais importante e mais amplo do que o da reforma da previdência - é muito mais grave do que todas as repercussões -, porque ela incide sobre todo o sistema de produção econômica. Nós estamos alterando as relações de produção de toda a economia brasileira.
R
Então, o cuidado para olhar que esse sistema seja um sistema de apoio ao incremento do crescimento, à produtividade, à repartição desses ganhos é fundamental. Se nós errarmos na dosagem do sistema, podemos destruir o sistema de produção, aumentando o conflito, aumentando a judicialização, aumentando a insegurança para o trabalhador e para o empresário.
Eu acho que é o cuidado de olharmos para problemas que compartilhamos como problemas e que precisam ser tratados num diálogo de construção de um sistema que vai superar ao longo da história. Não é de um direito que vai ser acessado - é o caso da previdência. Estamos falando de regras que regerão relações sociais o tempo todo, o dia a dia, cada minuto no chão da empresa. É disso que nós estamos falando. Esse cuidado é o que eu queria levantar como primeira preocupação.
A segunda é a de que essa construção precisa vir acompanhada de compromissos que vão ser compartilhados, no dia a dia, como compromissos de uma construção de cujos resultados ninguém tem certeza.
Por isso, a etapa de transição em um modelo é muito importante. É muito importante que as inovações processuais, as inovações do ponto de vista da constituição de sujeitos - do sindicato, da representação, do poder dado ao sindicato, a negociação - possam ser monitoradas, avaliadas, para ver se os efeitos que nós imaginamos estão sendo gerados. E, se não estão sendo gerados, que elas possam ser gradativamente corrigidas...
(Interrupção do som.)
O SR. CLEMENTE GANZ LÚCIO - ... no estilo que nós queremos. (Fora do microfone.)
Creio que pensar a transição... E esse projeto não tem nenhuma proposta de transição para o sistema; aceitando-se que ele fosse bom, não há transição, não há um processo de ajuste ao longo do tempo, nas profundas transformações que ele faz.
E, por último, creio que a dimensão implícita no projeto da reforma sindical deveria preceder esse debate, para que tivéssemos a clareza de qual é o sentido para a negociação; e, nessa negociação, quais são os sujeitos e os poderes que são dados a eles, para que o objeto possa ser trazido coerentemente com esse processo.
Creio que há um desequilíbrio estrutural sobre a dimensão individual dada a ele, sobre o caráter não sindical da comissão, que precisa ser corrigido. Se nós queremos manter aquilo que tem sido afirmado como a nossa intenção, se nós queremos ter uma comissão não sindical, isso tem que repercutir na organização do sistema, de forma coerente. Do jeito em que está, há um desequilíbrio, e isso precisa ser corrigido.
Então, eu me coloco à disposição, em nome do Dieese. É o Dieese colocando-se à disposição dos Senadores, para colaborar nesse debate, interagir nesse debate que abrimos aqui. Creio que nós podemos, nessa interação, ajudar a aprimorar o projeto, para que ele seja um projeto que, de forma verdadeira, ajude numa modernização que faça o País retomar o crescimento e sustentá-lo com justiça social.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, Sr. Clemente Ganz Lúcio, pelas suas profundas e ponderadas observações.
Agradeço enormemente a sua presença aqui, a paciência também de ter estado, desde de manhã, desde as 9h da manhã até esta hora, prestando a sua colaboração a esta Casa.
Como último palestrante, o Sr. Antonio Galvão Peres, professor de Direito do Trabalho, que vai responder às colocações feitas pelos Senadores e fazer as suas observações finais.
R
O SR. ANTONIO GALVÃO PERES - Senador, agradeço, mais uma vez, a palavra.
Compartilho da preocupação apresentada pelo Prof. Hélio. Logo no início da minha exposição, no primeiro eslaide que apresentei, ao indicar as dificuldades deste debate da reforma trabalhista, a primeira delas é a falta de racionalidade que está havendo em algumas manifestações.
O debate, fora do Senado Federal - se é boa ou se não é boa a reforma -, está um debate pelos extremos. Se examinarmos esse projeto no detalhe, ele tem regras que favorecem muito os trabalhadores; tem regras que podem ser boas e vão ser boas para ambas as partes; tem regras que, ao definir um critério que hoje é controvertido na jurisprudência, pode ser que o projeto, em um momento, adote uma posição que, hoje na jurisprudência, favoreça mais os trabalhadores e, em outros momentos, mais os empresários, mas ele tem o mérito de definir uma regra.
Então, esse projeto tem que ser examinado com cuidado pelos senhores, porque muito do que foi dito aqui não é verdade. A questão da jornada de 12 horas não é verdade. O projeto não contempla isso. Que, no trabalho intermitente, o trabalhador permanece à disposição do empregador também não é verdade. Examinando o projeto, ele permite a recusa, pelo empregado; permite que o empregado tenha outras atividades, e tem o grande mérito de que, neste momento, quando há o pagamento, isso é considerado salário, com todas as repercussões. Pode ser melhorada essa regra? Eu comecei dizendo também que acredito que esse projeto pode ser melhorado. Fiz algumas críticas específicas. Poderia fazer mais, mas não há tempo necessário.
E aí me preocupam também afirmações de que há lobby, de que eu sou advogado, ponderações que foram feitas aqui, como se estivéssemos aqui defendendo interesses, como disse o Prof. Hélio. Então, eu tenho a experiência de advogado, mas não estou aqui hoje como advogado. Como advogado, eu poderia defender o projeto como um todo ou atacar o projeto como um todo, porque eu defenderia o interesse em um ou em outro sentido. E, como advogado, tenho experiência de ser advogado de empresas e de empregados, porque um advogado não defende jamais interesse próprio; ele defende o interesse do cliente. E eu tenho clientes que são empregados e tenho clientes que são empresários. Venho aqui como professor também manifestar a minha posição pessoal, nem mesmo posição de entes ou de estudo do qual participo. São posições minhas. É essa racionalidade no debate que eu almejaria muito que ela existisse, porque algumas ponderações não são verdadeiras, não são corretas da forma como foram apresentadas.
Aproveitando já um comentário feito pelo Prof. Hélio com relação à outra atividade, e aproveitando também uma consideração que foi feita pelo Ministro Maurício Godinho Delgado sobre a questão da exclusão, por exemplo, dos prêmios, na natureza salarial dos prêmios. Vejam, em uma negociação de um acordo coletivo, se o empregador, aquela empresa que participa da negociação sabe que, ao negociar, pode ser que não consiga mais retirar aquela concessão momentânea, que deveria ser temporária, no futuro, a tendência é não conceder ou conceder menos.
Então, essa outra atividade, na prática, muito embora não pareça, pode prejudicar os trabalhadores, porque vai desestimular concessões, vai desestimular vantagens que poderiam ser negociadas, colocadas na mesa e aceitas naquele momento pelo empregador.
Agora, se o empregador aceita a inclusão e depois tem dificuldade de excluí-la numa nova negociação - porque basta o sindicato dizer "não negocio" para que aquilo se protraia no tempo -, o incentivo, a mensagem da outra atividade é a seguinte: "Não ceda, não conceda, não ofereça contrapartidas". Então, isso prejudica muito a negociação coletiva. O mesmo ocorre quando se entende que tudo é salário, que qualquer parcela recebida pelo trabalhador tem natureza salarial.
R
Já houve reformas anteriores, alterando, por exemplo, o art. 458 da CLT, para dizer claramente que algumas parcelas não têm natureza salarial. Por exemplo, plano de saúde, previdência privada também - a Constituição trata disso no art. 202. São parcelas de que a lei expressamente exclui a natureza salarial como uma forma de incentivar a concessão pelo empregador.
Vejam, se o empregador, ao conceder um plano de saúde, correr o risco de que aquele plano de saúde tenha natureza salarial, na prática ele não vai conceder. Já houve uma reforma muito anterior para dizer isso claramente.
Essa reforma também pretende, naqueles tópicos, incentivar, por exemplo, a concessão de prêmios aos trabalhadores, afastando uma discussão, uma controvérsia que hoje existe na jurisprudência.
Então, Sr. Presidente, a sugestão humilde de um professor de Direito do Trabalho, que também é advogado, é que esse debate seja apresentado e colocado com a maior racionalidade, a partir do que está escrito no projeto. Esse debate pelos extremos pode não levar a mudança alguma, e as mudanças são necessárias.
Acho que estamos todos de acordo de que há um consenso no diagnóstico. O problema é o prognóstico. Então, algo tem que ser feito. O que será feito?
Eu concordo com muito do que está aqui, e o Prof. Hélio também, mas há divergências. Essas divergências têm que ser objeto de debate para que seja alcançado um consenso, ou, eventualmente, uma posição prevalecerá sobre a outra pela maioria, como é democrático também e como é natural a esta Casa.
Agradeço, mais uma vez, Sr. Presidente, o convite para estar aqui hoje. Fico feliz por isso estar sendo debatido em várias audiências públicas, como o foi na Câmara dos Deputados. Espero que as minhas considerações tenham contribuído também para o debate.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Tasso Jereissati. Bloco Social Democrata/PSDB - CE) - Muito obrigado, advogado Antonio Galvão Peres, professor de Direito do Trabalho.
Agradeço, mais uma vez, a presença de todos, a paciência de todos, que inclusive estão aqui desde as 9h30 da manhã, sem almoçar, sem ter um mínimo período de descanso. Agradecemos não só pela presença, mas também pelas importantes contribuições que foram dadas ao nosso debate e que espero que sirvam realmente para construir uma proposta melhor aos trabalhadores, aos empregadores e ao Brasil, principalmente.
Fica, portanto, encerrada esta sessão temática, que é feita pela CAS, da Senadora Marta, e pela CAE, que nós presidimos.
Muito obrigado.
(Levanta-se a sessão às 14 horas e 48 minutos.)