4ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA
55ª LEGISLATURA
Em 7 de maio de 2018
(segunda-feira)
Às 11 horas
62ª SESSÃO
(Sessão Especial)

Oradores
Horário

Texto com revisão

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A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Bom dia a todos e a todas.
Declaro aberta a presente sessão.
Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos.
A presente Sessão Especial destina-se a celebrar a Campanha da Fraternidade de 2018, nos termos do Requerimento nº 22, de minha autoria e de outros Senadores e outras Senadoras.
Ao mesmo tempo em que agradeço a presença, quero ter a honra e a alegria de convidar para compor a nossa mesa, nesta sessão de homenagem à Campanha da Fraternidade de 2018, as seguintes autoridades: Revmo Sr. D. José Aparecido Gonçalves de Almeida, Secretário-Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e o nosso Bispo Auxiliar de Brasília. (Palmas.)
Convidar aqui também a Reverenda Srª Pastora Romi Márcia, Secretária-Geral do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil - Conic. (Palmas.)
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Convidar o Coordenador Executivo das Campanhas da Fraternidade, Revmo Sr. Pe. Luís Fernando da Silva. (Palmas.)
Advogado e presidente da OAB no período de 1991 a 1993, Dr. Marcello Lavenère. (Palmas.)
Advogada e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Srª Isabel Figueiredo, por favor, venha também fazer parte da nossa mesa. (Palmas.)
Quero aqui registrar com muita alegria a presença dos nossos estudantes do Centro de Ensino Médio aqui da Ceilândia. Muito legal a presença de vocês. Muito obrigada. (Palmas.)
Quero registrar também a presença dos nossos Senadores aqui já presentes, o Senador Garibaldi Filho, da nossa Bancada potiguar, Senador Elmano Férrer, do Piauí, Senadora Regina Sousa, Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Senadora também pelo Estado do Piauí, Senador Hélio José, que também já se encontra presente.
Quero registrar também, com muita alegria, a presença entre nós do nosso ex-Ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, do Embaixador da República Oriental do Uruguai, Gustavo Balbela, da Primeira Secretária da Embaixada da República do Haiti, Srª Christine, do Presidente do Sindicato dos Servidores do Poder Legislativo Federal e do Tribunal de Contas da União (Sindilegis), Petrus Elesbão.
Enfim, à medida que forem chegando aqui os nomes de mais convidados, nós vamos aqui fazendo o registro.
O Dr. Marcello Lavenère está nos lembrando aqui da presença dos estudantes do Centro de Ensino Médio de Ceilândia, de Brasília, que muito nos honram com a sua presença. (Palmas.)
Quero registrar também a presença de mais um Senador da Bancada potiguar, o Senador do Rio Grande do Norte, Senador José Agripino.
Bom, convido todos agora para, em posição de respeito, para acompanharmos o Hino Nacional e, em seguida, o Hino da Campanha da Fraternidade, executados pelo Coral do Senado.
(Procede-se à execução do Hino Nacional.)
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(Procede-se à execução do Hino da Campanha da Fraternidade.)
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A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Queremos aqui também registrar e agradecer a presença das esposas dos adidos militares acreditados no Brasil.
Sejam bem-vindas.
Peço a Senadora Regina Sousa, que também subscreve o requerimento comigo e é Presidente da nossa Comissão de Direitos Humanos, que presida os trabalhos agora enquanto faço uso da tribuna.
(A Srª Fátima Bezerra deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pela Srª Regina Sousa.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Com a palavra a Senadora Fátima Bezerra, autora do requerimento que nós subscrevemos.
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Senadora Regina, em nome de quem quero saudar os demais Senadores aqui presentes, os telespectadores da TV Senado, os ouvintes da Rádio Senado, os que nos acompanham pelas redes sociais neste exato momento.
Mais uma vez, o meu abraço afetuoso aos que compõem a mesa: Dom José Aparecido, Secretário-Geral da CNBB; o Rev. Pe. Luís Fernando da Silva, Coordenador Executivo das Campanhas da Fraternidade; Dr. Marcello Lavenère; Pastora Romi, à Isabel e aos membros do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Aos estudantes aqui presentes, o nosso agradecimento.
Quero aqui iniciar a nossa fala, o nosso diálogo, dizendo que o tema escolhido pela CNBB para a Campanha da Fraternidade deste ano: "Fraternidade e Superação da Violência", bem como o lema da Campanha "Vós sois todos irmãos" são extremamente atuais e nos convidam a um momento de reflexão sobre os caminhos que a sociedade brasileira está tomando, especialmente nesses últimos dois ou três anos em que a intolerância, infelizmente, tem tomado conta das relações sociais e políticas em nosso País.
O tema da violência, claro, é bastante complexo e pode ser abordado a partir de múltiplas perspectivas. A violência está presente nas ruas, dentro de casa também, pode ser motivada por questões de gênero, etnia, orientação sexual, crença religiosa, diferenças políticas, domínio de territórios por facções do crime organizado, mas ela está sempre relacionada às desigualdades do ponto de vista social e à cultura do ódio e da intolerância.
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O Brasil infelizmente é campeão de homicídios no mundo. Um País que tem também uma das maiores populações carcerárias também do mundo. Em 2016, foram cerca de 70 mil mortes violentas, índice só comparável aos países em guerra e que representa 12% do total de registros em todo o planeta. Vejam só: uma em cada 10 mortes violentas no mundo acontece no Brasil! Vou repetir. É um dado muito triste e perigoso porque isto se assemelha a tempos de guerra: uma em cada 10 mortes violentas no mundo acontece no Brasil!
O meu Estado, o Rio Grande do Norte, infelizmente, não foge à regra. A violência tem se agravado muito nos últimos anos e isso pode ser constatado através de estudos, pesquisas feitas, por exemplo, pelo Observatório da Violência Letal Intencional (Obvio), que é uma instituição vinculada à Universidade Federal do Semiárido e que faz um trabalho pautado, com muita seriedade, dedicado a acompanhar os índices no que diz respeito à questão da violência no Rio Grande do Norte. E repito: infelizmente, esses índices têm crescido de forma assustadora. Claro que o problema não é de hoje, já vem de muito e muito tempo, mas, para se ter uma ideia, segundo o Obvio, são mais 6 mil homicídios nos últimos três anos, mais de 6 mil homicídios nos últimos três anos lá no Rio Grande do Norte. Natal, a nossa querida Natal, a capital do nosso Estado, foi apontada recentemente por uma ONG mexicana como a capital mais violenta do Brasil. E, mesmo diante desse quadro em que a população vive amedrontada, insegura, totalmente angustiada, repito, o Governo Federal vetou a destinação emergencial de recursos do BNDES para o Rio Grande do Norte, alegando a falta de saúde financeira do Estado! Isso é inaceitável!
Repito, o Rio Grande do Norte, a exemplo dos demais Estados do Brasil, também está inserido nesse quadro dramático do aumento de homicídios, do aumento da violência, Senador Elmano. Por quê? Porque as ações voltadas lá para garantir a segurança pública da população cada vez mais mostram um grau de ineficiência que tem levado a esse crescimento de forma assustadora lá no Rio Grande do Norte.
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E, por sua vez, mesmo quando o Governo Federal anunciou recentemente a liberação de empréstimos via BNDES para os Estados, o Rio Grande do Norte foi excluído. Por quê? Porque não tem saúde financeira o Estado do Rio Grande do Norte. E a população que fique entregue exatamente à míngua e à sanha dos bandidos.
A entidade Small Arms Survey, considerada uma referência mundial na questão da violência armada no mundo, considera que a situação da violência no Brasil é mais grave que a situação na Índia, Síria, Nigéria e Venezuela.
Para a entidade, três fatores contribuem para os índices elevados: a falta do Estado de direito, a falta de cidadania para uma expressiva parcela da população, a cultura da violência e o chamado crime organizado.
Outro estudo, do Instituto Igarapé, enfatiza que as principais causas do alto índice de mortes incluem a desigualdade, o desemprego - especialmente entre os jovens -, a baixa escolaridade, a urbanização rápida e irregular, drogas ilícitas e armas.
Somadas a isso, há, evidentemente, questões de natureza políticas, fruto da irresponsabilidade, fruto da não priorização dos diferentes níveis de governo, além da impunidade, resultado da baixa taxa de investigação e elucidação dos crimes, aponta o estudo do mencionado e respeitado Instituto Igarapé.
Ora, é comprovado, Senadores e Senadoras, que a taxa de violência é inversamente proporcional ao nível de escolaridade da população. Não é por acaso que países como a Islândia, Isabel, a Dinamarca e a Suécia são considerados os mais tranquilos do mundo e não é por acaso que esses países apresentam as mais altas taxas de permanência dos jovens na escola.
Então, veja, não há como aqui a gente dissociar a influência do contexto socioeconômico no aumento da violência.
Aliás, o grande mestre, sempre mestre Darcy Ribeiro já alertava as autoridades, quando dizia que quanto menos escolas, D. Ernane, a gente construísse, mais presídios o Brasil ia precisar exatamente no futuro.
Então, está comprovado que quanto maior for a taxa de escolaridade, se caminha exatamente para quê? Para diminuir o quadro da violência.
E nesse sentido, quero, enfim, aqui ressaltar que a principal medida macroeconômica do Governo Temer de congelar por 20 anos os gastos nas políticas sociais tem se revelado a principal causa do elevado índice de desemprego, contribuindo fortemente para o aumento da violência urbana e rural.
Mais uma vez, volto aqui a enfatizar: ainda não foi inventada uma melhor forma de se enfrentar a problemática da violência do que a inclusão social com destaque para a inclusão educacional.
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E, neste aspecto aqui, quero, mais uma vez, chamar a atenção, infelizmente, sobre as consequências perversas dessa medida do Governo Temer, aprovada pela maioria dos que fazem o Congresso Nacional, a Emenda 95 - chamada de teto de gastos -, que congelou os gastos nas áreas sociais pelos próximos 20 anos. Inclusive, tirou o piso mínimo destinado à educação, luta histórica nossa, também suspendendo por 20 anos. E as consequências nós estamos vendo por aí se refletirem no chão das universidades, dos institutos federais, com o contingenciamento de recursos para a área da educação.
Desde o início do seu pontificado, o Papa Francisco vem alertando que a exclusão e a desigualdade social provocarão a explosão da violência no mundo. Em seu primeiro grande documento, em 2013, ele já denunciou que o atual sistema econômico mundial é extremamente injusto e que ele mata!
Diz o Santo Papa Francisco: "Acusamos os pobres da violência, mas, sem igualdade de oportunidades, as diferentes formas de agressão e de guerra encontrarão terreno fértil que, tarde ou cedo, provocará a explosão"- fecho aspas - disse o Santo Papa, sabiamente, na exortação traduzida para o português como "A Alegria do Evangelho".
Portanto, eu quero aqui dizer, D. Aparecido, que parabenizamos a CNBB pela escolha de tema tão relevante. A CNBB também provoca o Congresso Nacional no sentido de nos convocar a congregar esforços para a construção de uma cultura da paz em nosso País. E isso só acontecerá quando percebermos que somos todos irmãos - como lembra o santo evangelho - e que juntos devemos lutar em defesa da democracia, das instituições democráticas, da inclusão social e econômica de toda a população, em defesa dos direitos humanos e contra toda e qualquer forma de discriminação, de intolerância, de ódio e de opressão.
Além disso, diante da gravidade da situação que atinge - como disse aqui - não só o meu Estado, mas todo o País, temos o dever também de fazer daqui, do Parlamento, um espaço de reflexão aprofundada sobre a violência, para que nós possamos elaborar propostas que dialoguem com essa realidade. Propostas, inclusive, no campo da segurança pública, que venham rumo àquilo que o povo brasileiro mais sonha: uma segurança pública e cidadã.
Ou seja, mais do que nunca entendo que o Congresso Nacional deve fazer esse debate com muita profundidade, muita seriedade, muita responsabilidade.
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Nós não precisamos aqui de propostas midiáticas. Nós precisamos de propostas, repito, eficazes, que dialoguem com o retrato do caos e da tragédia que é a falta de segurança pública hoje no nosso País, para que possamos apontar o remédio correto, os caminhos adequados.
Aqui, por exemplo, cito, já nesse primeiro semestre, o debate que o Senado vem fazendo, em que inclusive conseguimos aprovar matérias importantes na área de segurança pública. Destaco aqui o PLS nº 32, de 2018, que obriga a instalação de bloqueadores de sinal de telefones celulares em penitenciárias e em presídios de todo o País. Isso já foi aprovado aqui pelo Senado. Destaco aqui também o PLS nº 90, de 2007, complementar - esse é fundamental, principalmente nesses tempos de Emenda nº 95, de congelamento dos gastos nas áreas sociais. Eu me refiro ao projeto de lei que proíbe o contingenciamento de recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública. Há ainda o PLS nº 25, de 2014, que impede o contingenciamento de créditos orçamentários programados para o Fundo Penitenciário Nacional.
Mas isso não é suficiente, Isabel, de maneira nenhuma. Temos que avançar. Por isso que quero aqui, neste momento, conclamar o Senado e o Congresso Nacional para avançarem no debate que considero fundamental, do ponto de vista de pensar e de implementar uma Política Nacional de Segurança Pública para o Brasil. Eu me refiro à necessidade aqui de avançar no debate do PLC nº 19, de 2018, que cria o Sistema Único de Segurança Pública (Susp) e a Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Nacional. Essa proposta, inclusive, já foi aprovada na Câmara dos Deputados e encontra-se aqui no Senado. Ela está, neste exato momento, na CCJ.
Esse projeto fala por si só, pelo que ele significa do ponto de vista de pensar uma Política Nacional de Segurança Pública que, primeiro, responda um item fundamental, que é a necessidade de integração. Ou seja, através de um planejamento estratégico, haver ações articuladas entre todos os entes federados - um Plano Nacional dos Estados, dos Municípios, da sociedade civil e dos demais Poderes. Isso é fundamental. Repito: fundamental! É um passo imprescindível, porque nós não podemos mais conviver, de maneira nenhuma, com a falta de integração e de planejamento estratégico na área da segurança pública.
Temos de trabalhar também ainda pela liberação dos recursos contingenciados, porque não adianta ter um bonito plano, um Sistema Único de Segurança Pública, e, de repente, os recursos ficarem aprisionados por conta do contingenciamento, inclusive, mais agravado ainda, repito, nesses tempos de emenda de teto de gastos.
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Então, quero aqui, portanto, mais uma vez, afirmar que é importante e imperativo assegurar a liberação dos recursos. É importante aqui a gente lutar pela reestruturação do sistema...
(Soa a campainha.)
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - ... penitenciário, pela valorização dos profissionais da segurança pública, pelo fim dos autos de resistência e por uma nova política de drogas, que leve em consideração o fracasso da guerra e o êxito de políticas que estão sendo experimentadas em vários países do mundo.
Ademais, nós sabemos que também não vamos superar o triste estágio em que nos encontramos apenas investindo em segurança pública. É preciso investir também em educação, cultura, geração de emprego e renda, esporte e lazer, de modo a tornar a atividade criminosa menos atrativa para aqueles que olham para o futuro e não enxergam o direito de viver com dignidade.
É por isso que, mais uma vez, aqui me somo aos que defendem a revogação da Emenda Constitucional 95, de 2016, pois ela representa uma violência contra o povo mais pobre do nosso País.
Por fim, Senadora Regina, não poderia aqui deixar de - ao concluir meu pronunciamento nesta sessão solene, que trata exatamente da questão da violência - destacar a situação absurda e arbitrária que vive hoje o ex-Presidente Lula. O Presidente, inclusive, quando teve a oportunidade de governar este País, seguramente fez o governo que mais se voltou para combater a violência no País, porque fez um governo que governava para todos e todas. É inquestionável o olhar social que o governo do Presidente Lula teve, voltando-se exatamente para os mais humildes, para os mais sofridos, para os pequenos, como diz exatamente o nosso santo Evangelho.
O Presidente Lula deu uma contribuição inestimável no combate às desigualdades sociais e econômicas - portanto, no combate à violência - quando passou para a história como o Presidente que mais investiu em educação, o Presidente que fez mais universidades, o Presidente que mais construiu escolas técnicas, o Presidente do Fundeb, a política de financiamento para olhar a educação básica como um todo, garantindo que o filho das famílias pobres deste País tivesse o direito ao estudo desde a creche até o chamado ensino médio, o Presidente que criou o piso salarial nacional para os profissionais da educação, hoje, infelizmente, ameaçado. Enfim, o Presidente que ficou reconhecido não só no Brasil - por isso, ele é tão amado -, mas internacionalmente, pelo mais importante legado que ele deixou, que foi o legado das políticas de inclusão social, que tiraram, inclusive, milhares de famílias da pobreza absoluta.
Então, quero aqui dizer que é evidente que não poderia concluir este nosso pronunciamento sem destacar que o ex-Presidente Lula está preso injustamente. Faz exatamente um mês hoje. E, portanto, quero afirmar aqui que a prisão política do ex-Presidente Lula também é uma violência contra a democracia e contra a esperança do povo brasileiro.
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Também não poderia deixar de recordar, neste momento, o assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes - assassinato brutal e covarde -, que continua, até o presente momento, impune, apesar da propagandeada intervenção militar lá no Rio de Janeiro.
Aliás, a própria CNBB destacou - em carta recentemente publicada - que a controversa prisão do ex-Presidente Lula foi marcada por um processo caracterizado pela politização judicial. Por isso mesmo, seguiremos aqui sempre firmes, cobrando justiça e denunciando o avanço do Estado de exceção instalado em nosso País.
Viva a Campanha da Fraternidade! Chega de violência e de medidas de exceção, o Brasil não conseguirá se reencontrar com a paz sem que se reencontre também com a democracia e com a soberania do voto popular.
Viva a Campanha da Fraternidade! Chega de violência! (Palmas.)
E Lula livre!
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI) - Obrigada, Senadora Fátima.
Ao mesmo tempo, devolvo a Presidência a V. Exª, autora do requerimento desta sessão.
(A Srª Regina Sousa deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pela Srª Fátima Bezerra.)
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Dando continuidade à nossa sessão solene, nós vamos, agora, passar a palavra para os nossos convidados, começando por D. Aparecido, Bispo Auxiliar e Secretário-Geral da CNBB.
D. Aparecido com a palavra.
O SR. JOSÉ APARECIDO GONÇALVES DE ALMEIDA - Srª Senadora Fátima Bezerra, nossa Presidente desta Sessão, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, Dr. Marcello, Pastora Romi, Ministro Gilberto Carvalho, queridos amigos e amigas, na impossibilidade apresentada pela ausência de D. Sérgio da Rocha do Brasil, por razões de serviço à Sé Apostólica, e do nosso querido Secretário-Geral da CNBB, D. Leonardo Steiner, por razões de saúde, fui convidado por D. Sérgio a representar a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil nesta sessão tão importante de comemoração da Campanha da Fraternidade.
Nesse sentido, quero manifestar a sincera gratidão de toda a conferência episcopal brasileira pela iniciativa da realização desta sessão pelo Senado Federal, requerida pela Srª Senadora Fátima Bezerra e seguida por outros Senadores e Senadoras.
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Quero felicitá-la pela iniciativa de especial importância, porque muito colabora para a realização dos objetivos da Campanha da Fraternidade, cujo tema, este ano, como nos demais, é de interesse nacional.
Como bem sabemos a importância da Campanha da Fraternidade tem crescido a cada ano, graças a Deus, repercutindo não apenas no seio das comunidades católicas, mas também em diversos ambientes da sociedade.
Pela sua natureza, a campanha tem contado, cada vez mais, com a participação de muitas entidades da sociedade civil, de escolas, de órgãos públicos e de outras comunidades cristãs que consideramos irmãs nossas na fé em Cristo.
Cada campanha quer nos ajudar a viver a fraternidade num campo da vida ou da realidade social brasileira, que necessita também de grande atenção e de maior empenho.
O tema deste ano é de grande atualidade e de grande urgência, como ressaltava a Presidente desta sessão, Senadora Fátima Bezerra. Construir a fraternidade e a cultura da paz, da reconciliação e da justiça, para superar a violência, é o objetivo da Campanha da Fraternidade deste ano, que, para além dos aspectos celebrativos no período quaresmal da liturgia católica, se estende por todo o ano como fonte de inspiração, de ação e de reflexão por todos aqueles que se reconhecem e querem ser cada dia mais cidadãos desta nossa Pátria querida.
A realidade da violência, com suas múltiplas faces, tem se revelado cada vez mais cruel e assustadora, duramente sentida pela população e estampada diariamente pela mídia.
A vida e a dignidade das pessoas e de grupos sociais mais vulneráveis têm sido continuamente violadas de muitos modos. O assunto é urgente. Não pode ser descuidado nem deixado para depois. Requer a atenção, o compromisso e a participação de todos.
A gravidade do problema não pode levar a soluções equivocadas, de cunho emocional, que tendem a agravar ainda mais a situação; tendem a criar polarização na sociedade ou aumentar a polarização já existente.
Querer superar a violência com mais violência não é solução. A busca da justiça que conduz à paz não se faz através da violência. Análises simplistas ou reações puramente emocionais de fato não resolvem, como nós bem temos notados nesses últimos tempos.
A Campanha da Fraternidade nos estimula a pensar juntos sobre o significado e as causas da violência, para encontrar saídas condizentes com a dignidade humana e com a ordem democrática, bem como condizentes com uma ordem jurídica justa, equânime, dentro de um sistema juridicamente capaz de dar respostas ao nosso povo.
A violência não se reduz à violência diretamente retratada pelos noticiários. Ela permeia também práticas sociais e relações cotidianas. Dentre os seus múltiplos fatores, está o contexto socioeconômico e cultural, também ilustrado pela Senadora Fátima, no seu discurso há pouco feito.
O necessário investimento em segurança deve ser acompanhado de investimentos ainda maiores, para assegurar condições de vida digna e direitos fundamentais à população, especialmente os direitos dos mais pobres e fragilizados. A justiça social, como expressão de fraternidade, é caminho para a construção da paz e de superação da violência.
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Para tanto, consideramos necessário unir as forças e estabelecer parcerias. A superação da violência é tarefa coletiva. Necessita da atenção e dos esforços de todos.
Há muito a ser feito por cada um espontaneamente, nos diversos ambientes em que vive, mas, embora seja importante o que cada um pode fazer pessoalmente, são necessárias iniciativas e ações comunitárias, a partir da realidade local, sem perder de vista o âmbito nacional. Além disso, os temas trabalhados pela Campanha da Fraternidade têm exigido uma maior participação da sociedade civil organizada, bem como a participação dos Poderes Públicos. E o tema deste ano, pela sua natureza, exige ainda mais a ação efetiva das autoridades e dos órgãos públicos nos diversos níveis.
Por isso consideramos de especial importância esta sessão que hoje se realiza nesta nobre Casa Legislativa. E renovamos, nesse sentido, a nossa gratidão, a gratidão da Igreja Católica no Brasil, por essa feliz iniciativa, Senadora Fátima Bezerra.
A palavra de Jesus, "vós sois todos irmãos", lema desta Campanha da Fraternidade, nos ilumina e orienta as nossas ações. A Igreja não pretende oferecer, através dos seus pastores, soluções técnicas para os problemas sociais. Oferece aquilo que tem de mais precioso, conforme a sua missão profética, à luz da fé com os valores do Evangelho e a força do amor, do amor de Deus, que nos quer todos irmãos, do amor fraterno, que nos leva a reconhecer no outro não um inimigo, mas o irmão, a irmã a ser amados. E, se necessário, através do perdão e da ajuda fraterna.
Contando com a atenção e os esforços de todos, esperamos contribuir para a superação da violência, construindo a fraternidade e a paz.
Em nome dos que fazem a Campanha da Fraternidade, expresso o muito obrigado da Conferência Episcopal Brasileira a todos os presentes. De modo especial, reafirmo os nossos agradecimentos ao Senado Federal, Casa que nos acolhe, à Senadora Fátima Bezerra, assim como a todos os Srs. Senadores e Senadoras que têm, ao longo desses anos, acompanhado e apoiado a Campanha da Fraternidade.
Deus nos abençoe a todos. Abençoe os que têm se empenhado na realização da Campanha da Fraternidade, empenhando os melhores esforços em prol da superação da violência.
Muito obrigado, Senadora Fátima Bezerra. Obrigado a todos os presentes e a quantos se irmanam neste esforço de paz, de fraternidade e de fraterna solidariedade. Muito obrigado. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Cumprimentamos D. Aparecido pelo importante pronunciamento que acaba de fazer.
E convidamos agora o Rev. Pe. Luís Fernando, que é o coordenador executivo das Campanhas da Fraternidade.
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O SR. LUÍS FERNANDO DA SILVA - Boa tarde a todos e a todas.
Uma saudação especial à Exma Srª Senadora Fátima Bezerra, Presidente desta sessão solene, e, na pessoa de V. Exª, saúdo cada um dos presentes nesta Mesa. Uma saudação especial a S. Exª, o Revmo D. José Aparecido Gonçalves, Bispo Auxiliar de Brasília, que representa nesta sessão o eminentíssimo Sr. Cardeal D. Sérgio da Rocha, Arcebispo Metropolitano de Brasília e Presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil.
Primeiramente, em nome da Secretaria Executiva da Campanha da Fraternidade, composta de membros de diversas partes do nosso Brasil, ligada à Conferência Episcopal, quero agradecer a todos os que se empenharam na feliz iniciativa de promover e celebrar esta solene sessão que homenageia a Campanha da Fraternidade 2018.
Em 1964, em pleno desenvolvimento do Concílio Vaticano II, realizou-se a primeira Campanha da Fraternidade em âmbito nacional, nascida no Rio Grande do Norte, Estado da Senadora que preside esta nossa sessão. E, hoje, anos depois, em 2018, continuamos com essa iniciativa de promover, todos os anos, uma Campanha da Fraternidade, com temas de relevância social, para ajudar o nosso povo brasileiro a crescer e a se promover, socialmente, espiritualmente.
Foi escolhido o tema "Fraternidade e a Superação da Violência", e o lema, extraído do Evangelho de Mateus, "Vós sois todos irmãos", com o objetivo de construir a fraternidade, promover a cultura da paz, da reconciliação e da justiça, à luz da Palavra de Deus, como caminho para a superação da violência.
Esse tema pretende considerar que a violência nunca constitui uma resposta justa. A Igreja proclama, com a convicção da sua fé em Cristo e com a consciência de sua missão, que a violência é um mal, que a violência é inaceitável como solução para os problemas, que a violência não é digna do homem.
A busca de soluções alternativas à violência para resolver os conflitos assumiu, atualmente, um caráter de dramática urgência. É, portanto, essencial a busca das causas que originam a violência, em primeiro lugar as que se ligam a situações estruturais de injustiça, de miséria, de exploração, sobre as quais é necessário intervir, com o objetivo de superá-las.
O lema "Vós sois todos irmãos" busca resgatar o sentido da fraternidade dos povos, pois somos todos irmãos e irmãs, filhos e filhas de um único e mesmo Pai. Por isso, iluminados pelo Evangelho do Reino, somos chamados à não violência.
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil convida todos os homens e mulheres de boa vontade para percorrer o caminho da superação da violência crescente, em todos os níveis, em nosso País.
A violência, como já nos disse a Senadora Fátima no seu discurso, se apresenta de variadas formas: física, psicológica, institucional, sexual, doméstica, simbólica, religiosa... Superar as várias faces da violência é uma tarefa de todos. Exige o compromisso de cada cristão e cristã, no enfrentamento das múltiplas formas de ofensa à dignidade humana que se naturalizam escandalosamente em nossa sociedade.
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O Brasil apresenta evidentes avanços e conquistas sociais. Contudo, ainda não são suficientes para eliminar a desigualdade. Uma vez que cresce a desigualdade, cresce também a violência.
A falta dos direitos elementares das pessoas constitui um nascedouro para a violência em sociedade.
O direito à proteção é para todos, e, se alguns estão tolhidos desse direito, isso se dá pelo fato de não haver políticas públicas que favoreçam a todos. E, ainda, os impostos estão sendo escoados por causa da corrupção.
A violência não é um fenômeno apenas cultural, mas, ao se instalar na sociedade, vai se sistematizando. Tal sistema é bipartido e polarizado: de um lado estão os que querem a todo custo tirar vantagens econômicas, lucrando com aparatos de segurança; do outro lado, as vítimas da desigualdade. Por sua vez, as instituições que deveriam, por primazia, zelar pelos direitos elementares de segurança, justiça e paz, acabam sendo pouco eficazes no cumprimento de sua missão.
A sociedade ainda se pauta na reação, e não na prevenção; na punição, e não na educação. Com o passar dos tempos, os sistemas que deveriam ser um serviço à seguridade social tornam-se instituições sobre as quais a desconfiança cresce dia por dia.
O descarte do ser humano, seja ele vítima ou autor do malefício, não é o caminho. Não se pode alimentar um sistema maniqueísta, que separa bons e maus, justos e injustos. É preciso voltar-se ao senso de alteridade: o outro é meu irmão; e, se é meu irmão, quando erra, eu não o descarto, mas o ajudo a se reeducar no caminho do bem. Isso não exime, de modo nenhum, os que erram de serem responsabilizados por seus atos. Contudo, responsabilização e descarte não são soluções da mesma natureza.
É preciso passar de um sistema excludente, elitista e descartável, para uma sociedade fraterna, responsável e includente.
As pessoas não estão inseridas no mundo para viver como pessoas isoladas. Portanto, dependem do outro para viver. Esta condição favorece a prática relacional, desafia todos, como sujeitos da própria história, a cuidar do outro; ou seja, a fazer parte da história do outro.
A superação da violência passa pela conversão pessoal. É preciso assumir a espiritualidade do seguimento de Jesus; seguir Jesus, que é o modelo para toda pessoa humana. Ele foi vítima da violência, num julgamento feito à noite, sem direito de defesa, seguido de tortura e morte por crucifixão. Ele, vítima da violência, propõe o caminho da não violência.
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O mundo muda quando a pessoa muda. Para que isso aconteça, é preciso adotar uma postura correspondente à de Jesus, promovendo a cultura da paz, adotando mídias alternativas que não tratam a violência com sensacionalismo, participando dos conselhos paritários e da elaboração de políticas públicas para a superação da violência, valorizando a instituição familiar, vivendo uma vida menos consumista, pedindo e oferecendo perdão, adotando a cultura da empatia, e recordando-se sempre de que o outro não é apenas o outro, mas o meu irmão.
A superação da violência começa pelo respeito à dignidade humana...
(Soa a campainha.)
O SR. LUÍS FERNANDO DA SILVA - ... defendendo e promovendo a dignidade da vida humana em todas as etapas da existência, desde a fecundação até a morte natural, tratando o ser humano como fim e não como meio. A proposta é a superação da violência.
Para concluir, bastam as palavras do Santo Padre, o Papa Francisco, no encontro com os Presidentes Abbas e Peres, da Palestina e de Israel, no ano de 2014 nos jardins do Vaticano:
Ouvimos uma chamada e devemos responder: a chamada a romper a espiral do ódio e da violência, a rompê-la com uma única palavra: "irmão". Mas, para dizer esta palavra, devemos todos levantar os olhos ao Céu e reconhecer-nos filhos de um único Pai.
Em nome da Secretaria Executiva da Campanha da Fraternidade, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, aqui representada por D. José Aparecido, nós agradecemos a todos os que promoveram esta iniciativa. Agradecemos a esta Casa, agradecemos a todos que, nas comunidades, com pequenas e grandes iniciativas, promovem a cultura da superação da violência, juntos, por um mundo mais fraterno, mais igualitário, mais irmão.
Muito obrigado a todos. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Quero aqui cumprimentar o Pe. Luís Fernando, Coordenador Executivo das Campanhas da Fraternidade, pelo bonito pronunciamento que acaba de fazer. E é isso mesmo, Pe. Luís Fernando. A inspiração para a realização da Campanha da Fraternidade nasceu exatamente lá no meu querido Rio Grande do Norte, sob a coordenação de D. Eugênio e de D. Nivaldo Monte.
Inclusive, aproveito aqui este momento para dizer que o nosso Arcebispo de Natal, D. Jaime, foi convidado para a presente sessão solene, mas, infelizmente, houve um imprevisto, e ele não pôde comparecer.
Aproveito aqui também para registrar a presença da ex-Senadora, hoje Prefeita de Mossoró, Rosalba Ciarlini. Seja bem-vinda, Prefeita, à sessão solene que hoje celebra a Campanha da Fraternidade.
Vamos passar, agora, a palavra à Revª Srª Prª Romi Márcia, Secretária Geral do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic).
A SRª ROMI MÁRCIA BENCKE - Eu vou falar daqui, porque me sinto mais à vontade.
Em primeiro lugar, eu quero saudar nossa querida Senadora Fátima Bezerra por esta sessão solene; e saudar também D. Aparecido, Pe. Luís Fernando e meus demais companheiros e companheiras.
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A dimensão do Evangelho que esta Campanha da Fraternidade de 2018 recupera é a perspectiva do amor, um amor que nos torna todos irmãos e irmãs. Isso é um mandato que nós recebemos do próprio Jesus Cristo, como bem já foi lembrado.
No entanto, eu gostaria de trazer alguns fatos da nossa realidade. O Brasil, apesar de ser um País religiosamente plural e apesar de ser um País que tem um número cada vez maior de pessoas que não professam tradição religiosa alguma, nós ainda somos um País majoritariamente cristão.
Alguns dados apontam que existe uma estimativa de que, a cada duas horas, surge uma nova igreja aqui no nosso País. Dados assim deveriam fazer com que o Brasil fosse um país com uma cultura de paz, porque, se nós temos uma maioria de pessoas que professam a fé em Jesus Cristo, automaticamente, deveríamos imaginar que a violência não poderia fazer parte da nossa realidade. No entanto, não é assim.
Casualmente, ontem à noite, assisti a um filme de um pastor norte-americano que conduzia uma igreja bastante grande nos Estados Unidos, que fazia a pregação da condenação dos que iriam para o inferno e dos que iriam para o paraíso. Para o inferno, iriam todas aquelas pessoas consideradas pecadoras: gays, ladrões, mulheres e assim por diante. Para o paraíso, iriam aquelas pessoas que, em tese, aparentemente seguiam um padrão moral considerado adequado para aquela igreja. Por várias razões, esse pastor passou por uma grande crise de fé e, nesse processo, fez uma grande descoberta: não existem pessoas condenadas e pessoas que vão para o paraíso, porque o amor de Deus é para todas as pessoas. Então, destinar alguém para o inferno já seria em si um ato de violência. Então, ele resolveu mudar o conteúdo de sua pregação. E, ao mudar, a igreja se esvazia, ele perde a igreja, porque a acusação que ele recebeu é a de que ele estava desvirtuando a mensagem do Evangelho. Esse filme me trouxe uma reflexão bastante interessante: na verdade, nós não queremos ouvir sobre o amor, nós queremos ouvir sobre a condenação.
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A violência, na verdade, é o discurso, é a reflexão, é a prática que orientam cada um e cada uma de nós. É muito confortável condenar, é muito confortável, como já foi lembrado aqui, dividir a sociedade entre bons e ruins. Então, a pregação do amor é uma pregação relativa; a prática do amor, a ideia de que somos todos irmãos e irmãs aqui, no Brasil, não é uma prática presente. Só nesses últimos períodos, vimos o quanto a nossa realidade social, cultural, política e econômica no Brasil não se orienta pelo amor, mas pela condenação.
Já foi lembrado aqui da Vereadora Marielle e do Anderson. Eu me lembro do Pe. Amaro, no Pará, que está preso por argumentos dos mais absurdos possíveis. Eu me lembro da chacina de Pau D'Arco. Eu me lembro de toda a execração sofrida pela Presidenta Dilma. Independentemente de se concordar com o mandato que ela fez ou não, a execração pública que ela recebeu, como mulher, como ser humano, é um fato realmente vexatório do qual todos e todas deveríamos nos envergonhar. Eu me lembro da prisão também do Presidente Lula. E outra vez eu digo que, independentemente de se concordar ou não com ele, o fato de uma pessoa que está presa ser limitada no receber visitas, inclusive do seu médico, é um atentado aos direitos humanos. E há a intolerância religiosa, mas também a violência religiosa, que tem sido cada vez mais praticada no nosso País, que é uma violência que se faz exatamente pelo discurso de que existem os bons e de que existem os maus, de que existe o inimigo que deve ser combatido ou demônio, a ser eliminado.
Nesse contexto, não surpreende que a democracia tenha sofrido um forte retrocesso, porque como é que nós vamos ter um País democrático quando a desigualdade impera, quando a violência é legitimada, quando a concentração de renda é naturalizada?
A Senadora Fátima falou que nós somos um dos países mais violentos no mundo, e a nossa violência tem vários níveis e também várias dimensões.
Primeiro, há a dimensão histórica. Historicamente, no nosso País, existe a cultura da negação do outro, a negação dos povos indígenas, a negação da população negra através do racismo, a negação das mulheres.
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Por fim, há a violência que se externaliza, que é expressada através da negação das transformações das estruturas econômicas e sociais. Não aceitamos a distribuição de riquezas e também não aceitamos a remuneração justa pelo trabalho.
O terceiro, também, como já foi lembrado, é a educação. Para uma cultura de paz, necessariamente, é preciso um sistema de educação forte e universal, mas que tem sido ameaçado.
(Soa a campainha.)
A SRª ROMI MÁRCIA BENCKE - E, por fim, há a cultura punitiva, que, automaticamente, também nos leva à cultura do linchamento. Esse linchamento tanto pode ser simbólico como pode ser físico.
E aí há os vários projetos que estão em curso no País, que automaticamente irão aumentar a violência. Como já foi lembrado, são a PEC dos gastos, o risco da privatização da água, da concentração agrária e da sempre de novo discussão da redução da maioridade penal, as ameaças ao SUS e ao Estatuto de Desarmamento.
Há a cultura do estupro coletivo.
Tudo isso, na verdade, são questões que nos caracterizam como sociedade.
Nesse sentido, acho que a Campanha da Fraternidade deste ano é uma convocação para que nós nos repensemos como País, para que cada um e cada uma olhemos para as responsabilidades que temos no fortalecimento das estruturas de violência.
Eu finalizo com um pequeno trecho de um livro que li e que diz assim: talvez uma das nossas tarefas atuais seja desenterrar os cacos de centenas e até milhares de anos de idade e usá-los nas próprias fundações de nossa existência e dos lugares que nos moldam, porque são exatamente esses fragmentos que constroem uma nova imagem da realidade e mudam a percepção das relações, lembrando-nos de nossa própria fragilidade. Então, nós temos a tarefa, o compromisso e o desafio de desenterrar os cacos que formam o nosso País. Que, nesse processo de desenterrar esses cacos, consigamos olhar para os vários processos históricos que têm nos transformado neste País que somos, um País que naturaliza, justifica e legitima a violência, porque tem uma dificuldade histórica de superar as suas estruturas de desigualdade.
Obrigada. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Eu quero aqui cumprimentar a Pastora Romi Márcia pelo pronunciamento que acaba de fazer, dando uma grande contribuição em termos de reflexão para o tema ora em debate.
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Vamos agora convidar, para fazer uso da palavra, o Dr. Marcello Lavenère, advogado, que foi Presidente da OAB no período de 1991 a 1993.
O SR. MARCELLO LAVENÈRE MACHADO - Exma Srª Senadora Fátima, em cuja pessoa cumprimento todos os nossos participantes desta reunião, com os cumprimentos especiais ao D. Aparecido, que representa aqui a CNBB, a Igreja Católica, que, neste momento, neste ano, traz para a nossa reflexão e atuação um tema tão importante como é a Campanha da Fraternidade.
O tom dos discursos não nos leva a imaginar que estamos num bom momento para aqueles que defendem a paz, a fraternidade, o amor, o entendimento entre os homens. Talvez por isso mesmo é que é extremamente oportuna essa Campanha da Fraternidade. O nosso desejo, Senadora Fátima, D. Aparecido, seria que essa mensagem pudesse, por um dom do Espírito Santo, penetrar em cada coração de brasileiro e de brasileira, pudesse produzir uma mudança muito profunda de tal forma que o povo brasileiro pudesse voltar a ter um mínimo de unidade, um mínimo de tolerância, um mínimo de reconhecimento no outro, não como um inimigo, mesmo quando adversário político, mesmo quando não integrando a mesma categoria social e econômica, mas que não se tornem essas pessoas, assim diferentes, como inimigos.
O discurso, a manifestação da Senadora Fátima e, depois, o discurso da Prª Romi mostram a evidência de quantas chagas, de quantas mazelas nós estamos tendo que apontar no nosso País, atualmente. E lamentando que essas mazelas estejam, recentemente, crescendo cada vez mais, exponencialmente.
Isso nos leva à convicção de que o campeão da paz no mundo - que é o Santo Padre, o Papa - deve ser, a cada momento, lembrado quando diz que o teto, o trabalho e a terra são bens sem os quais não pode haver justiça, e, sem haver justiça, não pode haver paz. É ilusório, é absolutamente um sonho ou um pesadelo pensar que, em um País com a desigualdade que nós temos, com os preconceitos étnicos, raciais, de gênero, regionais que nós temos, nós vamos conseguir bons resultados na instauração de um país homogêneo, unido, fraterno, que se congraça, que se dá as mãos e que constrói esse objetivo tão perseguido que é a paz.
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Portanto, lembrando a mensagem do Santo Padre, nós queremos dizer que, enquanto neste País não houver acesso à casa própria, ao teto; enquanto neste País nós convivermos com índices tão dramáticos e desumanos de desemprego e de subemprego; enquanto neste País o cidadão, o agricultor, o lavrador não tiver acesso à terra, nós estaremos mantendo uma cultura de desigualdade, que é a maior inimiga da paz e da fraternidade.
Portanto, a minha convicção e a mensagem que, neste momento, tenho a honra de passar, com a deferência de ter me sido dada a palavra, são cumprimentar a Senadora Fátima por essa iniciativa; cumprimentar a CNBB por essa iniciativa; e lembrar que, sem teto, trabalho e terra - portanto, com desigualdade -, nós não chegaremos a essa paz e a essa fraternidade tão desejada.
Muito obrigado, Senadora. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Cumprimento aqui o Dr. Marcello Lavenère, que é, para nós, uma referência na luta em defesa da democracia, na luta em defesa da cidadania do povo brasileiro. Eu o cumprimento pelo pronunciamento que V. Sª acaba de fazer, contribuindo - e muito - para a reflexão do tema da Campanha da Fraternidade de 2018.
Passo imediatamente a palavra à advogada e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Isabel Figueiredo. Logo em seguida, vamos passar imediatamente para os Parlamentares, cuja inscrição vai obedecer a ordem de chegada.
Com a palavra a Drª Isabel.
A SRª ISABEL FIGUEIREDO - Obrigada, Senadora.
Bom, eu queria começar agradecendo o convite, saudando todos e dizendo, Senadora, que eu me sinto muito honrada de ter sido convidada para participar deste evento não só pela importância da pauta em si - que vem a calhar, no mínimo, pois estamos numa situação bastante séria no País -, mas também, hoje, por compor aqui uma Mesa com qualidade de gênero, algo muito raro de vermos aqui, no Congresso Nacional, e em outros órgãos públicos. Então, a gente tem sempre que deixar isso registrado quando se depara com esse tipo de situação.
Fiquei numa situação aqui um pouco infeliz de ser a última a falar depois de intervenções de oradores tão preparados e tão, de alguma forma, engajados nessa questão. Mas vou tentar, de alguma forma, colocar um tijolinho aí nessa construção.
Bom, eu trabalho já há muitos anos na área de segurança pública, e a minha fala vai ser mais focada na questão de criminalidade do que em outras formas de manifestação de violência, que, como foi bem dito pelo nosso Secretário Executivo da Campanha, se manifesta num rol bastante grande de vieses possíveis na nossa sociedade. Mas acho que vale a pena, embora a Senadora Fátima já tenha trazido alguns dados que são bastante relevantes, eu também separar algumas informações que acho que, de algum jeito, são legais para a gente organizar um discurso.
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O Fórum Brasileiro de Segurança Pública, há muitos anos, é o responsável extraoficial pela formulação de estatísticas nacionais de segurança pública no País - extraoficial porque um dos problemas de gestão da segurança pública que a gente tem no País é exatamente o desconhecimento e a ausência de bancos nacionais confiáveis com estatísticas criminais e também sobre o sistema penitenciário.
E o último anuário do Fórum, que foi lançado no ano passado, trazendo dados de 2016, traz um cenário por demais preocupante. A gente traz lá mais de 61 mil crimes violentos e letais intencionais e mais de 71 mil pessoas desaparecidas, que também é outro tema que a gente não olha tanto, mas que é fundamental olhar. Traz um dado também alarmante: o aumento do número de pessoas mortas em ações policiais, que passa de 4,2 mil pessoas naquele ano.
E não posso deixar de trazer para cá também um outro recorte bastante fundamental, que é o aumento no País do número de profissionais de segurança pública que estão sendo assassinados. No ano passado, a gente teve mais de 500 profissionais de segurança pública que foram assassinados. Este ano, só até abril - eu não tenho dados nacionais -, no Rio de Janeiro, já chegou a quase 50. No Estado de V. Exª, Senadora, 12 profissionais de segurança pública já foram assassinados neste ano, algo bem grave também. A gente, de alguma forma, tem que estar olhando muito para os nossos defensores de direitos humanos, que são, muitas vezes, executados pelo seu trabalho, mas tem que olhar também para esses profissionais de segurança pública, que estão lá na ponta e hoje, em alguns Estados, estão sendo dizimados em decorrência da ausência, como disse a Senadora, de uma política nacional de segurança pública.
Existe uma série de pesquisas - o Fórum participou de algumas - acerca da questão da percepção da violência e da criminalidade no País. Acho que alguns dados também merecem ser, de alguma forma, ressaltados: 50% da população do Brasil acreditam que é forte ou razoável a possibilidade de existência de crime organizado na sua vizinhança; mais de 50 milhões de pessoas com mais de 16 anos conheceram pessoas que foram vítimas de homicídios; 40% dos homens do País também conheceram alguém que foi vítima de homicídio; mais de 5 milhões pessoas no Brasil sofreram ferimentos por armas de fogo; e 16 milhões de pessoas chegaram a ser ameaçados de homicídios. O resultado disso tudo, fora o caos por si, é bastante sério. Ele vai trazer, por um lado, mudança no comportamento das pessoas, que deixam, de alguma forma, de frequentar ambientes, de sair em determinados horários, de exercer, de alguma forma, o seu direito à cidade e à devida convivência social e familiar.
A gente tem uma segunda consequência, que é uma consequência econômica grave. De acordo com uma estimativa um pouco mais conservadora do Daniel Cerqueira, um pesquisador do Ipea, o País hoje gasta o equivalente a 6% do seu PIB com questões de consequência da violência e da criminalidade. A gente tem pesquisas que levam esse percentual a 13,5% do PIB. É um valor bastante alto. A gente tem a indústria como um todo gastando muito do que ela poderia investir em pesquisa hoje na contratação de empresas de segurança, na questão de seguros e também repensando onde vai instalar suas bases produtoras. De acordo com índices de criminalidade, 30% dos empresários da indústria dizem claramente que levam isso em conta. Quer dizer, o próprio desenvolvimento econômico também se enrosca por conta da nossa questão de violência e criminalidade.
Mas há outro fator que hoje anda muito me preocupando, ainda mais em um ano eleitoral: a sensação de medo que perpassa o País faz com que a gente tenha um aumento de tendências autoritárias e conservadoras.
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Então, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública fez uma pesquisa bastante importante, em conjunto com o Datafolha, que mostra que, em uma escala de 0 a 10, o índice de autoritarismo no Brasil está em 8,1. E o Ibope - que também, já há alguns anos, tem um índice para medir a questão do conservadorismo da sociedade brasileira - também aponta 0,68 em uma escala de 0 a 1. A do Ibope é interessante porque tem uma série histórica e vai mostrando o aumento desta tendência conservadora, que se traduz, em última instância, em duas questões que estão interligadas e que são muito fundamentais: a primeira, que o medo faz com que a gente passe a tolerar a redução de direitos, o que é muito sério; e, em um segundo momento, que corresponde também a essa primeira ideia, que faz com que a gente passe a tolerar a existência de um sistema de segurança pública violento e que, consequentemente, desrespeite direitos.
Eu acho que nos últimos anos temos visto alguns dados em alguns cenários que são dados que estão muito me preocupando. Vou trazer um caso particular, que é o caso do Estado de São Paulo, e que vem apresentando, ao longo dos anos, uma política consistente de redução de criminalidade violenta letal, do número de homicídios, mas não tem conseguido fazer a mesma coisa no que diz respeito à violência policial. Existem anos no Estado de São Paulo em que os mortos pela polícia do Estado chegam a mais de 15% do total de homicídios praticados naquele Estado, e a sociedade, cada vez mais com medo, acaba, de alguma forma, tolerando esse tipo de situação.
Eu acho que houve uma fala bastante importante do nosso Secretário Executivo no sentido de que acabamos focando muito em uma questão de repressão - que neste caso que estou dizendo vem ligado à redução e à violação de direitos -, deixando de lado o outro pé desta história, que é o pé da prevenção.
A Senadora foi muito feliz em sua fala com relação à questão da educação. O próprio Daniel Cerqueira - que eu já citei aqui, um pesquisador bastante importante do Ipea - tem uma pesquisa muito fundamental que mostra como o investimento, não só nas políticas de prevenção como um todo, mas particularmente na educação, é o caminho para que a gente, de alguma forma, melhore essa nossa situação de violência e criminalidade no País.
Mas, vejam, quando eu estou falando de questões relacionadas à violência e à criminalidade, eu preciso de alguma forma ter um equilíbrio de ações. Eu não posso só pensar, embora deva pensar, em medidas que vão surtir efeitos no médio e longo prazos, como é o investimento em políticas sociais, em políticas de educação, etc. Eu preciso também, de alguma forma, conseguir imaginar respostas que sejam respostas imediatas, e acho que é aí, Senadora, que está o desafio - e eu poderia dizer da esquerda brasileira. Temos ainda alguma dificuldade em lidar com a questão da repressão qualificada: qual é a resposta imediata que nós podemos dar para um Estado que vai ter lá 15 mil homicídios por ano ...
(Soa a campainha.)
A SRª ISABEL FIGUEIREDO - ... ou 6 mil homicídios por ano, seja o que for, dentro da legalidade?
E acho que essa é uma provocação que temos que nos colocar durante todo o tempo. Quer dizer, a Bancada ou a ideologia do tiro, porrada e bomba é um terror, ela só alimenta a violência, mas nós temos de alguma forma conseguir imaginar estratégias de melhoria de gestão, de planejamento operacional e de emprego das forças policiais para que tenhamos respostas a essa situação posta hoje, em que cerca de nove pessoas são assassinadas por hora em nosso País.
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Bom, essa questão passa - e acho que é muito importante também que estejamos falando isso no Senado Federal - também por uma atuação parlamentar qualificada.
Eu fiquei muito feliz com os projetos que a senhora citou, mas tenho de dizer que eles, infelizmente, são exceção do ponto de vista da produção do Congresso Nacional no que diz respeito à segurança pública.
O Congresso Nacional...
(Interrupção do som.)
A SRª ISABEL FIGUEIREDO - Bom, o Congresso Nacional, em última instância...
Achei que estavam bravos porque eu estava falando da produção no Congresso Nacional. (Risos.)
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - De maneira nenhuma. Esta campainha funciona para vocês e para os Senadores, e é chata pra medonho. (Risos.)
Mas jamais nós iríamos cortar a palavra quando a senhora...
A SRª ISABEL FIGUEIREDO - Foi uma brincadeira.
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - ... está fazendo um chamamento ao Congresso Nacional, ao Senado.
Com a palavra, Isabel.
A SRª ISABEL FIGUEIREDO - O Congresso Nacional tradicionalmente responde às crises de segurança. Mas, primeiro, só às crises; não há um trabalho consistente na área de segurança pública. Segundo, a resposta normalmente se dá baseada num tripé que não só no País, mas internacionalmente já se tem mostrado ineficaz. Qual é esse tripé? Tipificação de novos crimes, aumento de pena de crimes já existentes e endurecimento do cumprimento de regime das penas dos condenados. Isso é a resposta tradicional que o Congresso consegue fazer. E já temos um milhão de pesquisas, além da nossa vida real, mostrando que isso não funciona, que isso não soluciona, que há outras alternativas que são alternativas mais fundamentais.
Nesse sentido, é muito importante que retomemos, no Congresso e no Senado, a tramitação do Projeto de Lei do Susp, que é um projeto que traz a ideia muito bem-vinda de se discutir um Sistema Único de Segurança Pública neste momento. Já passamos da hora de aprovar uma legislação sobre esse tema.
Mas é um projeto que, infelizmente, foi feito no afogadilho, que tem uma sequência de problemas e que, de fato, não soluciona os piores, os principais problemas da área de segurança pública no que diz respeito à gestão, que é a inexistência de mecanismos claros de cooperação inter e intrafederativa, mas também de fonte de financiamento da segurança pública.
A ideia de impedir o contingenciamento da segurança pública é um passo fundamental que o Congresso vem dando, mas precisamos também, mais do que impedir o contingenciamento, garantir a existência orçamentária. Não é possível que os gestores, a cada ano, fiquem inseguros em relação à possibilidade de continuação das políticas públicas de segurança que estão sendo desenvolvidas.
No outro sentido, Senadora, acho fundamental também que o Congresso Nacional fortaleça a sua função atípica de fiscalização do Poder Executivo, no sentido de ter uma maior proximidade com o que vem sendo feito no âmbito dos Estados e particularmente da União em relação à segurança pública.
A partir da mudança de governo, nestes dois últimos anos, não houve, por exemplo - e vou dar um exemplo bem simples -, um único edital de convênios para a área de segurança pública publicado pelo Governo Federal. Foram feitos convênios só oriundos de emendas parlamentares. Nada contra as emendas parlamentares, mas me parece que não é o mecanismo mais democrático e, mais do que isso, mais efetivo do ponto de vista de gestão técnica, para que invistamos os recursos federais na área de segurança pública.
Bom, eu teria muito, muito a falar. É uma área que me empolga muito. Mas eu queria terminar dizendo que a ideia da campanha me parece fundamental. Eu me lembro muito da época da campanha do desarmamento e da participação fundamental das igrejas naquele processo. A gente que trabalha na área de segurança tem uma clareza muito grande do como esse ator é um ator que, de fato, tem uma capacidade de mudar coisas.
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Então, nesse sentido, eu acho que a gente tem que estar claramente, primeiro, na briga pela manutenção do Estatuto do Desarmamento, que não pode, em nenhuma medida, ser mais flexibilizado do que já foi, e também na formação ideal...
(Soa a campainha.)
A SRª ISABEL FIGUEIREDO - ... de que as pessoas comecem a perceber que ninguém está seguro enquanto alguém estiver inseguro.
Eu não sou católica - na verdade eu não tenho religião -, mas me parece que quando vocês trabalham com a ideia dos irmãos eu leio desse jeito; eu leio com uma ideia de que se o outro não está seguro, eu também não estou, ainda que me pareça que eu possa estar lá no meu condomínio ou lá no meu carro. Ninguém está seguro se alguém não está. E acho que bater nessa tecla em grandes campanhas é fundamental.
Obrigada, Senadora. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Olha, Isabel, quero agradecer a você pela contribuição, enfim, tão qualificada que você está trazendo aqui para o nosso debate. Você tem sido uma pessoa que tem se dedicado tanto ao tema da questão da segurança pública no nosso País. Por isso, é muito importante os dados aqui apresentados por você.
Nós vamos, agora, imediatamente, facultar a palavra aos Parlamentares, e, conforme eu já adiantei, vamos fazê-lo pela ordem de chegada.
O primeiro a chegar foi o Senador Garibaldi Filho, lá do nosso Estado, o Rio Grande do Norte.
O SR. JOSÉ AGRIPINO (Bloco Social Democrata/DEM - RN) - Senadora Fátima, só para dizer que eu permutei com o Senador Elmano Férrer, que teve que se ausentar.
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Está certo, Senador.
Então, V.Exª será o segundo.
Senador Garibaldi Filho.
O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (Bloco Maioria/PMDB - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Cumprimento a Presidente, requerente desta sessão, a Srª Senadora Fátima Bezerra. Cumprimento o Secretário-Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e Bispo auxiliar de Brasília, Revmo. Sr. D. José Aparecido Gonçalves de Almeida. Cumprimento o Coordenador Executivo das Campanhas da Fraternidade, o Rev. Pe. Luís Fernando da Silva. Cumprimento a Secretária-Geral do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil, Srª Romi Márcia Bencke. Cumprimento o advogado e ex-Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Dr. Marcello Lavenère. Cumprimento a advogada e membra do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Srª Isabel Figueiredo. Cumprimento o Dr. Gilberto Carvalho - mas acho que ele teve que se ausentar. Cumprimento a Prefeita Rosalba Ciarlini, do Município de Mossoró, no Rio Grande do Norte. Cumprimento, também, os Senadores que aqui estão.
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O Papa Francisco - como já foi dito aqui, mas eu quero enfatizar também -, ao dirigir-se ao povo brasileiro, no início da Quaresma deste ano, chamou a atenção para a Campanha da Fraternidade de 2018 e sua proposta de construção da paz com a força da fraternidade. Então, não é pelo fato de eu ser um dos últimos a falar - porque os últimos muitas vezes têm que repetir as coisas -, que se trata aqui de mera repetição, principalmente se tratando do Papa. O Papa afirmou então que: "A Campanha da Fraternidade de 2018 nos convida a reconhecer a violência em tantos âmbitos e manifestações, e, com confiança, fé e esperança, superá-la pelo caminho do amor visibilizado em Jesus [Cristo] Crucificado".
Percebeu bem o Papa Francisco o verdadeiro alcance da Campanha da Fraternidade de 2018, pois não se constrói a paz se não buscando a reconciliação, cujo alicerce e instrumento é a fraternidade.
E ainda seguindo a inspiração da mensagem do Papa aos brasileiros, não se cresce na reconciliação e na fraternidade como norma de vida se não se tem como fim a implantação da Justiça.
Essa tríplice dimensão, Srª Presidente, senhores membros dessa Mesa, senhor representante da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, vem mesmo desde a origem da Campanha da Fraternidade, movimento anual adotado por toda a Igreja brasileira, sob o patrocínio da CNBB, campanha anualmente reiterada.
Permito-me relembrar, então, a iniciativa pioneira da Igreja do nosso Estado do Rio Grande do Norte, ainda em 1962, sob a liderança do então Bispo Auxiliar e Administrador Apostólico de Natal, D. Eugênio de Araújo Sales, depois Cardeal de São Salvador da Bahia, Primaz da Igreja Brasileira.
Dessas raízes, senhores membros da Mesa dirigente dos trabalhos, dessas raízes potiguares e nordestinas, que em todos os sentidos e por todas as razões têm sede de paz, de reconciliação, fraternidade e justiça, creio haver brotado, há mais de cinquenta anos, o clamor de hoje: "Fraternidade e Superação da Violência", tema da Campanha deste ano.
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A superação, Srª Presidente, da violência só se faz com a implantação da cultura da paz, advertiu o Papa. E onde buscar essa cultura, implantada pela raiz na vontade de todos e no sentimento de cada um, se não na fraternidade e seus valores? Daí haver dito o Papa ser preciso trilhar o caminho do amor visível no Crucificado. Esse caminho é assim visível porque é do mesmo Crucificado a afirmação incisiva e cheia de esperança, lema da Campanha da Fraternidade, como já foi dito aqui, de 2018: "Vós sois todos irmãos".
Srª Presidente, D. Aparício, nesta sessão, proposta pela Senadora Fátima Bezerra, permitam-me um breve olhar sobre o contexto em que Cristo fez essa constatação, assim tão direta quanto singela: "Vós sois todos irmãos".
Em suas constantes altercações contra as autoridades farisaicas de seu tempo, Jesus ensinava na oportunidade que ninguém deve submeter outrem por arbítrio próprio: "O maior dentre vós será aquele que serve", são as Suas palavras. Então, todos somos irmãos, verifica o Mestre, e somos irmãos não só por afeto, nem carinho, nem família; todos somos irmãos porque todos somos iguais.
Srªs e Srs. Senadores, faço essas reflexões, autoridades presentes na mesa, vivendo - como foi dito aqui, já, por todos os que se pronunciaram antes de mim - os angustiantes tempos brasileiros atuais, com a violência nas ruas, nas relações domésticas, ofendendo pobres, indefesos, vulneráveis, e também agredindo, com visíveis propósitos autoritários, as mais preciosas instituições e os mais caros valores nacionais. O enfrentamento não pode ser com mais violência, porque - volto a lembrar as palavras do Papa aos brasileiros - é preciso instaurar a cultura da paz. Essa cultura se semeia no terreno fértil da fraternidade, com os apetrechos e as artes da Justiça.
O Brasil é atormentado pela desigualdade, pelo tratamento caprichoso de um em detrimento de outro, de poucos contra quase todos, sem qualquer outra razão a não ser a exploração, a ganância, a submissão de milhões por alguns. É preciso um pacto com força ética e social, mas também e especialmente pessoal.
(Soa a campainha.)
O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (Bloco Maioria/PMDB - RN) - Começou a campainha. Ela é implacável.
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Bem, Srª Presidente, vou finalizar.
O grande mérito da Campanha da Fraternidade é este sacudir interior, que deve ir ao chacoalhar - desculpe o termo - da alma, para que ninguém se cale e cada um tome consciência do que pode fazer.
Assim, podemos alimentar a esperança de conviver com a cultura da paz, que não é a mera ausência de violência, mas a convicção de que tudo quanto viole a justiça deve ser eliminado, no coração de cada um e no seio da sociedade.
Se, como profetizara já o Papa Paulo VI, o desenvolvimento é o nome da paz entre as nações, a justiça e a igualdade sejam o nome da paz entre os brasileiros, como diziam aqui todos os oradores, o nosso Coordenador Executivo das Campanhas da Fraternidade, o Rev. Sr. Pe. Luís Fernando.
Senhoras e senhores, esta sessão deverá contribuir para que o Senado Federal possa continuar a trilhar o caminho já iniciado da votação de medidas que sejam capazes de arrefecer esse ímpeto da violência que tomou conta do nosso País.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Quero cumprimentar o Senador Garibaldi Filho, Senador da Bancada potiguar, pelo pronunciamento que acaba de fazer. E quero agradecer mais uma vez, Senador Garibaldi Alves Filho, a sua presença aqui, na sessão solene.
E passo agora, imediatamente, a palavra a outro integrante da Bancada potiguar, o Senador José Agripino.
O SR. JOSÉ AGRIPINO (Bloco Social Democrata/DEM - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente desta sessão, Senadora Fátima Bezerra; Revmo D. Aparecido, Secretário-Geral da CNBB e Bispo Auxiliar de Brasília; Revmo Pe. Luís Fernando da Silva, Coordenador Executivo das Campanhas da Fraternidade; Revª Srª Prª Romi Márcia Bencke; Dr. Marcello Lavenère Machado, ex-Presidente da OAB; Drª Isabel Figueiredo, advogada e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública; senhores convidados, Srª Prefeita de Mossoró, Senador Garibaldi Alves, Srªs e Srs. Senadores, senhoras e senhores.
D. Aparecido, eu quero voltar um pouco no tempo, à década de 60, para rememorar uma figura que talvez o senhor tenha conhecido bem, porque foi uma figura admirada pelo Brasil inteiro.
Eu estou me referindo a D. Eugênio Sales. Ele foi bispo auxiliar e foi bispo de Natal.
No ano de 62, Drª Isabel, D. Eugênio, que foi um grande potiguar e um grande brasileiro, iniciou uma coisa chamada Movimento de Natal, que foi precursor da Campanha da Fraternidade.
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Ele evoluiu da Igreja pastora de almas para pastora de corpos e desenvolveu ações efetivas, mobilizando paróquias, para que as paróquias fizessem trabalhos que variavam de reunião para reunião. Às vezes, o tema era água; outras vezes, era educação; outras vezes, era fome; outras vezes, era família... Agora, é segurança.
Aquilo que o Movimento de Natal fez em 1962/64, criando inclusive a Rede Rural de Rádios de Comunicação, para a mobilização da sociedade cristã, - ele se antecipou em muito no tempo, D. Eugênio Sales - transformou-se, no Brasil inteiro, num belíssimo movimento cristão chamado Campanha da Fraternidade, que tem a função precípua de mobilizar os cristãos, via paróquias, em torno de temas como o que agora nos leva a esta sessão, que é o tema da segurança, que é uma coisa que aflige o Brasil inteiro.
Outro dia eu vi uma pesquisa de opinião, D. Aparecido, em que se perguntava aos brasileiros qual era o maior problema, o que é que mais os afligia: se era desemprego, se era saúde, se era educação, se era segurança... E esperava-se que fosse desemprego ou que fosse saúde, e uma resposta que me impactou foi a de um cidadão que disse - e acho que ele falava por milhões: "Meu maior problema é segurança, porque emprego eu até tenho e, se não tivesse, eu sobreviveria. Agora, segurança me leva ao medo de sair de casa, porque eu posso ser assassinado." Esse é o sentimento dominante na sociedade brasileira.
Na minha cidade de Natal, que é hoje, num ranking mundial, uma das mais violentas do mundo, as pessoas têm medo de sair à noite de casa. Estão deixando de frequentar lugares públicos.
Eu fui em janeiro à Procissão da Redinha, mais uma vez - porque já fui a várias, enormes procissões. A deste ano foi uma procissão pequena. Por quê? Porque as pessoas, mesmo à tarde, tinham medo de se aglomerarem e, mesmo em aglomeração, terem as suas vidas arriscadas.
Então, é uma questão absolutamente fulcral para a sociedade brasileira.
Revª Prª Romi, a questão que hoje congrega a Campanha da Fraternidade, a questão da segurança, mobilizando as paróquias e, pelo púlpito, os padres, mobilizando as pessoas a se juntarem em nome da fraternidade, pela paz, pela segurança, contra a violência, é uma coisa admirável e é o que me faz vir aqui para agradecer, agradecer à Igreja Católica.
Eu sou católico, católico praticante, sou adepto da Igreja Católica, fiz curso primário - e sou do tempo de ginásio - no Colégio Marista. Fiz escola em colégios católicos, meus netos estudam em colégio católico, e acho que a Campanha da Fraternidade é uma das coisas mais meritórias.
Mas não é importante apenas isso, porque, mais do que cidadão, eu sou Senador. E eu tenho obrigação de fazer alguma coisa. E venho prestar contas, aqui, aos senhores, sobre dois projetos importantes, meus, que estão em tramitação.
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É claro que o objetivo geral da Campanha da Fraternidade é construir a fraternidade promovendo a cultura da paz, da reconciliação e da justiça, à luz da palavra de Deus, como caminho de superação da violência.
Isso é importante, mas é importante e muito importante você fazer projeto como o PLS 309, de 2016, um projeto, permitam-me dizer, que é de minha autoria, que determina que o Fundo Penitenciário Nacional (Funpen), que existe, que recebe dinheiro todo ano, seja gerido por um conselho gestor e que seus recursos possam ser aplicados, sem objeto de contingenciamento, em ações de combate a situações de calamidade por grave pertubação da ordem social.
Decretada a situação de calamidade por gravíssima pertubação da ordem social, como ocorreu recentemente no Rio Grande do Norte, o governador do Estado ou os governadores dos Estados farão uma solicitação específica, e os recursos obrigatoriamente serão liberados, com a máxima urgência, de forma restaurar a paz social.
Ou seja, um fundo que já existe, por esse projeto de lei, automatizado na sua liberação, para atender, claro, à consequência de um problema. Mas, de qualquer maneira, é um instrumento financeiro de ação.
E esse projeto se encontra em tramitação. Ele está avançando e é muito provável que seja aprovado. É uma iniciativa parlamentar que eu tomei e da qual presto contas a V. Exªs, V. Revmªs, na manhã desta sessão de homenagem e de reconhecimento ao trabalho da Igreja, da Campanha da Fraternidade.
Um outro projeto: combate às drogas - o PLS 304, de 2016.
Todos nós sabemos que a droga está na raiz da geração de assassinato de menores, de conflito de crianças, muitas vezes crianças.
A droga é o mal do século, e esse meu projeto torna obrigatório o repasse mínimo pela União de 70% dos recursos do Fundo Nacional Antidrogas (Funad), para financiar o combate à produção, ao comércio e ao uso de drogas em programas realizados pelos Municípios, porque é no Município onde reside o problema. Eu não tenho guerra de traficante de droga em Natal, ou em Florianópolis, ou no Rio de Janeiro; eu tenho é em Caicó, eu tenho é em Santana do Seridó. Nos menores Municípios existe guerra de traficante. E quando está estabelecida a guerra de traficante, há morte de menor contra menor ou de maior contra menor.
Portanto, esse projeto leva os recursos ou descentraliza os recursos para os Municípios, onde reside o problema. Os recursos do Funad têm ficado concentrados em ações da União, enquanto o problema das drogas precisa receber...
(Soa a campainha.)
O SR. JOSÉ AGRIPINO (Bloco Social Democrata/DEM - RN) - ... atenção conjunta e coordenada de todas as unidades da Federação, em especial dos Municípios.
O repasse ocorrerá em parcelas semestrais, nos meses de janeiro e julho de cada ano, e a divisão dos recursos entre as cidades será realizada segundo os mesmos critérios utilizados para a distribuição do Fundo de Participação dos Municípios (FPM).
A descentralização é a forma mais eficaz de garantir que as ações cheguem efetivamente ao cidadão.
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Eu presto contas dessas ações a autoridades da Campanha da Fraternidade, a padres, a bispos, a educadores, a advogados, para que os senhores saibam que existe essa ação também no Congresso Nacional e que nós temos, claro, que somar as nossas ações, em benefício do combate a um mal que está destruindo o nosso País, que é a falta de segurança.
Sejam, portanto, todos muito bem-vindos.
Muito obrigado pela colaboração que dão nas suas tarefas, cada qual no seu nicho de atividade. E posso dizer que o Congresso Nacional os reconhece e estabelece, com...
(Interrupção do som.)
O SR. JOSÉ AGRIPINO (Bloco Social Democrata/DEM - RN. Fora do microfone.) - ... V. Sªs, uma sadia parceria. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Quero cumprimentar o Senador José Agripino pelo pronunciamento que acaba de fazer.
E passo agora a palavra, imediatamente, para a Senadora Regina Sousa.
Em seguida, o Senador Hélio José e, depois, o Senador Paim.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Srª Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, telespectadores da TV Senado, senhores convidados, quero cumprimentar o Secretário-Geral da CNBB, D. Aparecido; o Coordenador Executivo das Campanhas da Fraternidade, Pe. Luís; a Prª Romi Márcia, do Conic - obrigada -; o Dr. Marcello Lavenère, meu quase conterrâneo, porque a filha dele é muito minha amiga lá no Piauí, defensora pública, foi chefe da Defesa Civil; e a Srª Isabel Figueiredo, que é advogada do Fórum de Segurança Pública.
Eu não vou fazer o discurso que iria fazer, mas preciso pelo menos fazer uma fala. Vou fazer o discurso à tarde, completo.
Eu queria parabenizar a CNBB pela escolha dos temas. Ultimamente têm sido temas muito relevantes aqui, muito atuais. A partir dos textos do Papa Francisco, a gente tem tido muito subsídio para fazer o debate, inclusive nesta Casa e em outros espaços.
Agora, eu entendo que não se deve falar em violência, no singular, mas temos que falar em violências, puxando todos os esses possíveis - violências -, porque, senão, a proposição que está tramitando aqui vai canalizar para o conceito de segurança pública como aparato para fazer a defesa das cidades nos Estados.
Então, nenhum plano vai contemplar, vai resolver a questão da segurança, se ele se voltar... É claro que é necessário. Precisa-se do aparato, precisa-se de mais policiais, precisa-se melhorar o salário, precisa-se dar condição de trabalho para eles, mas esse não pode ser o único foco, senão a gente vai perder muito, e não vai haver políticas públicas para combater a verdadeira violência, de que vou tratar.
Eu acho que a gente precisa lembrar, nesse plano, todas as formas de violência, para poder canalizar para essas políticas, porque o que a gente vê é que no orçamento se coloca o aparato, mas não se colocam as políticas. Você vê os orçamentos das Secretariais que tratam do social... São orçamentos vergonhosos.
Então, eu acho que a gente tem que se lembrar de todas as violências, a começar pela institucional, do Estado, que extermina a juventude negra; que não vê, não quer enxergar 300 mil pessoas em situação de rua, que não têm endereço e que, por isso, não são nem contadas. A gente diz 300 mil pela boa vontade do Pe. Júlio Lancellotti, lá em São Paulo, pelo Pe. João Paulo, lá no Piauí, que fazem essas contagens nas pastorais, da população em situação de rua.
O Estado não ouve aquelas mães de maio lá de São Paulo, que estão lá há muito tempo, querendo só expressar a sua dor - dor indizível - de não poder enterrar seus filhos. Ninguém faz nada por aquelas mulheres. Já tive audiência lá, em São Paulo, levei com o Paulo Teixeira ao promotor, mas não andou muita coisa. Então, se a gente não olhar para todo esse pessoal...
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A própria instituição não dá segurança aos seus policiais, porque todo dia morre policial também, morto pelas milícias e por outras coisas.
Ele permite os autos de resistência como uma licença para matar. Tem que acabar isso. Não é possível. Auto de resistência é uma licença para matar, principalmente naquilo que está acontecendo lá em São Paulo.
Ele tolera o trabalho escravo, pois não há política de combate ao tráfico. Na verdade, parece que o Estado brasileiro nem quer ver a cara do tráfico, porque vai buscar só no morro, e ele pode estar no asfalto. O Estado só vai buscar no nosso. Em vez de vigiar a fronteira, faz intervenção no Rio de Janeiro, sendo que o Exército nem foi treinado para isso.
Eu queria falar dessas violências estatais, do Estado mesmo, que prende, que julga, que condena - é o contrário: investiga, condena, julga e prende - por convicção. É o novo ordenamento jurídico, literatura jurídica: por fatos indeterminados. É só olhar os processos que estão rolando aí da Lava Jato, uma boa parte deles é assim, como o do Presidente Lula, por exemplo: por convicção. Então, é um novo ordenamento jurídico que está se instalando neste País. Então, que se escreva na Constituição. Senão, nós vamos ter uma Constituição de Curitiba.
Ele cria leis que retiram direitos, como a reforma trabalhista que retirou direito, que está ameaçando de desemprego, pois já gerou uma massa de desempregados imensa.
Há a violência contra a mulher, contra os negros, contra as religiões, principalmente de matriz africana, contra a população LGBT e contra os povos indígenas. Nós tivemos debates nesse mês de abril. É uma pena, pois eles têm que comprovar que são donos da terra, porque aparece alguém com um pedaço de papel obtido num cartório, sabe-se lá a troco do quê, e aí eles não são donos. Eles dizem assim: "Como que índio não é dono da terra, se tataravô de índio nasceu lá, de bisavô de índio nasceu lá, se avô de índio nasceu lá, se pai de índio nasceu lá, se índio nasceu lá e tem 40 anos? Como não ser dono da terra?" Mas há sempre alguém para proteger quem chegou com um pedaço de papel dizendo que é dono.
Eu acho que se a gente não se voltar para essas violências...
E há o relatório da CPT, que é também gritante, porque a violência cresceu bastante no campo, com chacinas. Pelo relatório da CPT, essa violência no campo cresceu 105% de 2013 para cá, com 70 execuções em 2017. Isso é uma guerra! Eu vou simbolizar essa violência no campo com o assassinato do líder Nazildo dos Santos agora, em abril, do Quilombo Turê III. Estiveram aqui comigo aqui representantes, na quinta-feira, para denunciar, porque não confiam mais no aparato de segurança de lá, pois eles acham que protege os empresários. Há uma empresa que está poluindo os rios, que está plantando palma para produzir dendê, que invadem a terra quilombola. Quando eles denunciam, eles são assassinados. Eu vi o vídeo de outro, depois da morte do Nazildo, que está todo ensanguentado narrando que atiraram no carro dele. Ele se salvou, porque conseguiu descer e se arrastar.
Se a gente não levar em conta essas coisas, não há plano de segurança que resolva, não adianta SUSP cheio de dinheiro se for só para o aparato policial, porque mais mortes vão acontecer.
Eu vou parar por aqui - depois, eu faço o discurso completo-, porque eu sei que o horário está ruim para vocês e para nós também, que temos que voltar daqui a pouco para a sessão.
Muito obrigada. (Palmas.)
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A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Agradeço à Senadora Regina e a parabenizo pela reflexão importante que acaba de fazer. Sem dúvida nenhuma, Senadora Regina, ela enriquece - e muito - o debate feito nesta manhã, início da tarde de hoje, sem prejuízo do discurso que V. Exª fará mais tarde.
Imediatamente, passo a palavra para o Senador Hélio José, de Brasília.
O SR. HÉLIO JOSÉ (Bloco Maioria/PROS - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Eu quero cumprimentar todos os nossos ouvintes da TV e Rádio Senado; cumprimentar a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) na pessoa do nosso nobre D. Aparecido, que tem andado muito por Brasília e conhece a realidade da nossa cidade; cumprimentar também D. Sergio, embora saiba que ele está em Roma; cumprimentar D. Marcony, D. Leonardo e D. Valdir, todos da CNBB, do Distrito Federal, da cúpula da Arquidiocese de Brasília; e cumprimentar o nosso nobre Pe. Luís Fernando da Silva, que está na coordenação executiva desta importante Campanha da Fraternidade deste ano. Eu não poderia deixar, de forma nenhuma, de me pronunciar aqui. Embora com milhares de afazeres, de reuniões, coisa e tal, estou aqui desde o início, porque sei da importância desta sessão. Cumprimento V. Exª, Senadora Fátima Bezerra, por esta iniciativa que, de pronto, também subscrevemos e apoiamos. Cumprimento a nossa querida Revª Prª Romi Márcia Bencke. Eu acho que a unidade das Igrejas Cristãs é fundamental, e a presença da senhora aqui reforça essa unidade. Nós estamos aqui para defender a família, a vida, o meio ambiente, para defender uma situação fraterna e humana de vida. Então, a unidade das Igrejas Cristãs é importante demais, e a sua presença aqui representa isso. Meu nobre Marcello Lavenère, da OAB, advogado, símbolo da luta pelos direitos humanos, meus cumprimentos. Senhora advogada e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública Isabel Figueiredo, meus cumprimentos também.
Mais uma vez, como fazemos todos os anos, reunimo-nos em sessão especial para celebrar a Campanha da Fraternidade, lançada pela Igreja Católica e organizada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
A Campanha da Fraternidade constitui sempre um convite a que nós brasileiros façamos uma reflexão em favor de um mundo melhor, mais justo e mais solidário, e a que transformemos a reflexão em ações concretas.
Sempre muito apropriado para o momento, o tema da Campanha deste ano põe em realce a violência que causou ao País 61 mil homicídios, somente no ano passado, o que é um absurdo. Eu acho esse tema muito atual, como foi o tema do ano passado. Então, não podemos deixar de cumprimentar a CNBB pela oportunidade de trazer esse tema ao debate.
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Isso é num país em que a falência do sistema prisional está à vista de todos; em que a maior parte das penitenciárias é dominada pelo crime organizado; em que o cidadão sai de manhã para trabalhar, mas não tem certeza se volta vivo para casa à noite lamentavelmente; num país cuja antiga capital, o Rio de Janeiro, está sob intervenção federal do Exército - Rio de Janeiro, onde policiais militares vêm sendo executados como moscas (foram 137 no ano passado e 36 somente este ano); Rio de Janeiro, onde, há pouco, se cometeu um crime político da maior gravidade e significado, que foi a execução de Marielle Franco, uma vereadora, uma representante do povo, homicídio de autoria ainda não identificada.
E, assim como no Rio, em muitas outras cidades do Brasil, a violência se alastra. Em Brasília, não é diferente. Em Brasília, o povo está com medo, está preocupado. Em especial no Nordeste, em capitais como Fortaleza, Natal e Maceió, a área da segurança pública encontra-se fora do controle das autoridades.
Srª Presidente, o tema da campanha em 2018, oportuno, como eu disse, é: "Fraternidade e Superação da Violência". O eixo que eu gostaria de dar a esse tema resume-se na indagação: como tomar as medidas necessárias para combater a violência no Brasil - muitas vezes, medidas que não são claras, que não são duras - sem perder o sentido da fraternidade e garantir o respeito aos direitos humanos? Formulada de maneira alternativa: como conseguir trazer paz e segurança para a população sem que haja o embrutecimento dos agentes públicos e da sociedade? Eu não tenho resposta detalhada a dar para essas perguntas, Srª Presidente, senhoras e senhores ouvintes aqui, mas podemos refletir sobre a necessidade de ações.
Há mais três ou quatro páginas aqui, mas eu vou fazer uma fala aqui de improviso e depois vou para os três últimos parágrafos.
Da minha parte, como Parlamentar, como Senador da República, titular de mandato do Distrito Federal, eu não tenho dúvida de que o mais importante é fazer a ação de cada um.
A CNBB recomenda para este ano: não vote em ficha-suja, não vote em corrupto, não vote em pessoas que façam malversação do dinheiro público. Parabenizo a CNBB por essa posição e todos que se congratulam com essa posição. Eu acho que é momento de reflexão e é momento de votar, realmente, em pessoas com ficha limpa, que tenham experiência, que tenham, realmente, trabalho prestado, que demonstraram que não fazem malversação das verbas públicas e que nem utilizaram do desvio de conduta para fazer suas oportunidades.
Da minha parte, nesta Casa, recomendado pela CNBB, votei e fiz todo o trabalho contra a reforma trabalhista, porque ela aumenta a violência e o desemprego no Brasil inteiro. Por isso, perdi meus postos no Governo, mas não perdi minha dignidade, a vergonha na cara e o dever cívico de representar o nosso povo com a presteza que é necessária para cada político que aqui o representa.
Sou das comunidades eclesiásticas, faço parte do Encontro de Casais com Cristo, do Encontro Ágape e do Encontro Matrimonial Mundial. Acho que a CNBB, meu nome Padre, deveria estar mais presente nesta Casa, principalmente com seus atores, seus parceiros e amigos que tem aqui nesta Casa. Lamentavelmente, nos meus quatro anos de mandato, eu tenho sido muito pouco utilizado por esta importante entidade, a CNBB, tanto quanto pelo Conic também, minha nobre Reverenda, porque nós que somos cristãos, que praticamos a fé e que fazemos as coisas aqui de forma adequada deveríamos estar ajudando mais a família, a vida, o meio ambiente, as coisas adequadas.
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Da minha parte, também atendendo à CNBB, fui Relator da CPI da Previdência, provei por "a", "b", "c" e "d" que este Governo mente com relação às propostas da Previdência, mente com relação a dizer que servidor público é um privilegiado, mente para a população brasileira para agradar banqueiro, para agradar os não pagadores da Previdência Social, os da JBS, os da Rede Globo, os inimigos da população brasileira, que se locupletam e se bastam com presentes e mais presentes de Refis e outras formas para não pagar imposto e querer sacrificar a população pobre e carente de nosso País.
Por isso, creio que é importante uma participação mais efetiva da CNBB e das entidades representativas da cristandade aqui, nesta Casa, para que tenhamos realmente uma posição mais adequada.
As eleições se aproximam, D. Aparecido. É importante que nós da CNBB e das igrejas cristãs nos organizemos para, de fato, trazer Parlamentares sérios e honestos para a Câmara Federal, para o Senado Federal, para a Câmara Legislativa, para as Assembleias Legislativas, para os governos dos Estados e para a Presidência da República, porque o povo brasileiro não pode ficar sendo vítima dos maus políticos e de atitudes indevidas.
Quando fui o Vice-Presidente da Comissão da Medida Provisória 759, fizemos a Lei 13.465, a lei que garante a regularização fundiária, o direito à terra, de quem nela vive e de quem nela trabalha. Precisamos de uma atuação mais dura da CNBB, que é vítima aqui no Distrito Federal em relação a uma série de templos que até hoje não foram regularizados...
(Soa a campainha.)
O SR. HÉLIO JOSÉ (Bloco Maioria/PROS - DF) - ... por termos um Governo incompetente, que não tem realmente diálogo com a sociedade de Brasília. Mais de 1,5 milhão de pessoas vivem em condomínios, e há igrejas que são derrubadas e perseguidas, e há condomínios que são derrubados e perseguidos, enquanto há uma lei nacional aprovada que garante formas de fazer a regularização fundiária, para dar uma cidadania a quem merece ter cidadania, que é o povo brasileiro que mora neste País imenso, maravilhoso, que tem condição de ter uma vida digna. Então, o nosso trabalho nós estamos fazendo.
Eu parabenizo a CNBB pela posição, parabenizo o Conic, parabenizo o Brasil que nos ouve.
Eu quero deixar claro que o meu mandato, como servidor público concursado, como uma pessoa que está aqui não para fazer política como político profissional, mas para defender a população brasileira, está, continua e continuará em função da família, em função da vida, em função do meio ambiente, da fraternidade e da humanidade.
(Interrupção do som.)
O SR. HÉLIO JOSÉ (Bloco Maioria/PROS - DF) - Muito obrigado.
Um forte abraço, Padre, um forte abraço D. Aparecido, minha querida Fátima Bezerra, minha colega, Revª Bencke...
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Márcia - Romi Márcia.
O SR. HÉLIO JOSÉ (Bloco Maioria/PROS - DF) - Revª Márcia, Lavenère e a nossa nobre jurista aqui, um forte abraço a todos.
Que a luta continue, sem dúvida nenhuma.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Eu quero aqui cumprimentar o Senador Hélio José pelo pronunciamento que acaba de fazer, aqui trazendo toda a sua indignação, diante destes tempos de violência que nós estamos vivendo, de tanta violência aos direitos dos trabalhadores e do povo brasileiro.
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Quero imediatamente chamar o Senador Paulo Paim.
Obrigada pela presença, Senador Hélio José.
Chamo agora, imediatamente, o Senador Paulo Paim.
Registro a presença de Thiago Alves, que aqui representa o Movimento dos Atingidos por Barragens. Obrigada, Thiago, pela presença.
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senadora Fátima Bezerra, primeira signatária desta sessão tão importante que trata da CNBB, que mais uma vez está com uma Campanha da Fraternidade apontando para o nosso País que essa violência é insuportável. Não podemos continuar assim.
Quero cumprimentar o Revmo Sr. D. José Aparecido Gonçalves de Almeida, representante da CNBB; o Coordenador Executivo da Campanha da Fraternidade, Rev. Pe. Luis Fernando da Silva; a Secretária-Geral do Conselho Nacional das Igrejas Cristãs do Brasil, Revª Srª Prª Romi Márcia Bencke; o advogado e Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, conhecido de todos nós, Marcello Lavenère; e a advogada e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Srª Isabel Figueiredo.
Olha, a esta altura do campeonato, todos com fome, estão aqui desde as 9h da manhã, mas tiveram de esperar a sessão iniciar às 11h. Eu estava presidindo a outra sessão. Terminei lá e pude vir para cá.
Eu só queria dizer rapidamente - não vou usar o tempo do meu pronunciamento e vou tentar falar em cinco minutos - que a CNBB tem uma história, uma história, de fato, fraternal, carinhosa, respeitosa, eu diria até ecumênica com todo o povo brasileiro.
A CNBB esteve nos momentos mais difíceis aqui. Por exemplo, eu queria muito aprovar o Estatuto do Idoso: a CNBB fez a Campanha da Fraternidade vinculada ao idoso, e aprovamos naquele ano. Eu queria muito aprovar o Estatuto da Pessoa com Deficiência: a CNBB veio aqui, visitou a Presidência da Casa, e aprovamos o Estatuto da Pessoa com Deficiência. Eu queria muito aprovar o Estatuto da Igualdade Racial: a CNBB esteve junto, parceira, movimentando, combatendo todo o tipo de preconceito, e hoje é uma realidade. Nós queríamos muito aprovar - e eu fui Relator - o Estatuto da Juventude: a CNBB, mais uma vez, esteve junto conosco, e o estatuto é lei, é uma realidade.
Agora, nós estamos vivendo um momento de total intolerância, de ódio, de desrespeito, de agressão. Hoje é proibido pensar diferente. Hoje eu vejo como alguns tratam inclusive migrantes e imigrantes. Não importa se vêm de outro País. Se mudou de Estado, já há uma intolerância. Eu não consigo entender, no mundo da própria política: por ser de partido diferente, é ódio. É como se fossem inimigos de morte, quando a democracia é isto: o direito de cada um pensar diferente e defender os seus pontos de vista.
Eu digo sempre, de forma até repetitiva: quem pensa que é dono da verdade não entendeu nada da vida. Eu fico com a ingenuidade das crianças, como diz a canção, e me considero um eterno aprendiz - não é, meu amigo Moura, de tantas jornadas, de lutas?
Agora, o que estamos vendo hoje: violência contra criança e adolescente; violência contra sindicalista; violência que bota um Presidente da República na cadeia sem respeitar sequer os prazos - isso é inquestionável, e não respeitaram sequer os prazos -; violência, nós que aqui trabalhamos na CPI de jovens assassinados e vimos, em que a cada dez jovens, oito são negros covardemente assassinados.
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Eu vi hoje pela manhã e confesso que fiquei indignado: numa escola em Goiás, uns cinco, seis, sete meninos batendo num menino sentado na cadeira, e ele só fazia assim com as mãos. Estou ligando para Goiás. Vou chamar uma audiência pública para discutir a violência dentro das escolas.
A violência no Rio de Janeiro é um símbolo, mas a violência está em todo o País. As facções mandam neste País. A que ponto nós chegamos?
Por isso quero só cumprimentar a CNBB pela iniciativa brilhante para que a gente possa, repito, de forma ecumênica, suprapartidária, caminhar neste País para um projeto de Nação, com a solidariedade entre todos, e não permitir o que está acontecendo hoje na nossa querida Pátria.
Eu vinha, agora de manhã, discutindo concentração de renda no Brasil, na Comissão de Direitos Humanos. E quando me dizem lá que seis pessoas mandam em mais de 51% deste País... Seis pessoas, seis pessoas! Vi lá também uma cidadã que diz que vive com R$47,00. Quando eu li, eu pensei, claro, que fosse por dia, não é? Porque não dá, não é? Mas é por mês: R$47,00 por mês! A que ponto nós chegamos? O Brasil dispara como sendo o País com a maior concentração de renda do mundo. Isso tudo é uma violência que faz com que nós tenhamos que aprofundar o debate.
Vejo jovens e adultos sendo assassinados. Vejo policiais sendo assassinados, porque acham... E agora inventaram aí que direitos humanos não olham para o policial. Claro que olham, com a mesma preocupação. São seres humanos, como aquele outro que foi vítima, enfim, de um assalto ou não. Mas quantos policiais? Dizia-me o Moura que só este ano mais de 40 foram assassinados. Onde estamos?
E por isso a CNBB, com esse olhar cristão, de fazer o bem sem olhar a quem, de se colocar no lugar do outro, vem no momento certo e adequado.
Eu estou preocupado com a nossa frágil democracia. Venho andando por este País, e vejo alguns me perguntando: "Mas vai haver eleição mesmo, Paim?". Eu quero mais que cada um indique o seu candidato, cada partido, e deixe o povo decidir. Não estou preocupado com esse ou aquele nome. O povo que decida quem vai ser o futuro Presidente da República. Que o povo decida quem vai ser o novo Congresso. Que o povo decida quem vão ser os Governadores, os Deputados Estaduais.
Eu sou daqueles que dizem que com a democracia, tudo; sem a democracia, nada. A democracia é o melhor sistema que se inventou no mundo. Não há um sistema melhor que a democracia, inclusive para combater a violência.
Eu nasci em 1950. Com 14 anos, eu era afastado da presidência de um ginásio noturno porque defendia a democracia, a liberdade e o direito de ir e vir. Com 15, eu era afastado dum outro colégio noturno, porque virei presidente de novo. Aí, com 16, me mandaram para outro, e eu desisti! Desisti e fui para as fábricas e, claro, não deixei de procurar estudar o mínimo que eu pudesse.
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Mas isto tudo me preocupa: esse leque da violência, da intolerância. Como é que alguém pode ser morto, covardemente, por sua orientação sexual, por exemplo? Também isso. Mas o que é isso? Concordar, discordar, é um direito de cada um.
Agora, bater, assassinar as pessoas? Ou por religião diferente, seja de matriz africana, seja católica - e eu sou católico, todo mundo sabe, e nunca escondi a minha posição -, seja evangélica. Fui até conselheiro da CNBB lá no meu Estado. Estive aqui diversas vezes na CNBB.
Enfim, termino, pois já falei demais, só dizendo: vida longa à CNBB! Que ela avance nessa linha! Não é minha esta frase, mas termino com esta; ela é do Mestre lá de cima: "Fazendo o bem sem olhar a quem".
Termino, dizendo uma frase de que gosto muito: "Que bom saber que, no mundo, existem pessoas iguais a você", na linha de melhorar a qualidade de vida do povo brasileiro e da própria humanidade.
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito obrigado a todos. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Gostaria de agradecer ao Senador Paim, que também subscreve o nosso requerimento. Ele é Vice-Presidente da Comissão de Direitos Humanos e, desde o início, também se empenhou na realização desta sessão solene.
Em face do adiantado da hora, consultaria aqui os nossos convidados se poderíamos agora já partir para o encerramento da presente sessão.
Quero pedir, neste momento, que a assessoria aqui faça divulgar um vídeo, Rev. Luís Fernando, da Campanha da Fraternidade, para, em seguida, encerrarmos a nossa presente sessão solene.
Por favor.
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(Procede-se à exibição de vídeo.) (Palmas.)
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A SRª PRESIDENTE (Fátima Bezerra. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Bom, nós vamos agora partir para a conclusão aqui dos nossos trabalhos, mas, antes, muito rapidamente, quero parabenizá-lo aqui, Pe. Luís Fernando, pelo vídeo da Campanha da Fraternidade. Esse vídeo fala por si só. O vídeo é o retrato daquilo que temos dito: que o combate à violência não passa apenas pelos investimentos na chamada segurança pública. São fundamentais os investimentos nas áreas sociais, inclusive no campo da educação. É fundamental, por exemplo, desenvolvermos a cultura da paz, promovendo os valores da solidariedade, da tolerância, do respeito às diferenças.
Quero aqui, do fundo do meu coração, em nome da Presidência do Senado e de todos os que subscreveram o presente requerimento, agradecer a presença de cada um e de cada uma das senhoras, de Isabel, que traz aqui a voz da sociedade civil, como integrante do Fórum Brasileiro de Segurança Pública; do Dr. Marcello Lavenère, com toda sua trajetória de luta em defesa da cidadania do povo brasileiro, em defesa da democracia; da Prª Romi, que aqui fez uma fala muito bonita, convidando-nos a fazer uma reflexão do ponto de vista de pensar as violências em curso hoje no nosso País; do Pe. Luís Fernando, que é o coordenador da Campanha Nacional da Fraternidade; e do nosso D. José Aparecido, Bispo Auxiliar de Brasília, bem como Secretário-Geral da CNBB.
Eu espero, D. Aparecido, que momentos como este contribuam para fazer com que o Congresso brasileiro se dê conta do tamanho da responsabilidade que tem em suas mãos; que se dê conta no sentido de que cabe a nós apontar saídas do ponto de vista legislativo. E, em se tratando de um tema como este, a questão da segurança pública, um tema tão desafiador e ao mesmo tempo de uma complexidade tão grande, é preciso que o Congresso Nacional se dê conta dessa responsabilidade, do quanto exige, antes de mais nada, um debate aprofundado, um debate em que escutemos os diversos segmentos da sociedade como um todo, e não apenas só as instituições, o chamado Poder Público, para que, ao final, o Congresso Nacional possa apontar saídas legislativas que venham contribuir e não atrapalhar, e não piorar cada vez mais o quadro de violência que toma conta do nosso País.
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Por isso que hoje dizíamos aqui da necessidade de iniciativas legislativas importantes, de proibir contingenciamento de recursos, de proibir contingenciamento do orçamento para a segurança pública, de colocar os bloqueadores nos presídios, e, sobretudo, do debate que está sendo colocado agora, que é a construção de um Sistema Único de Segurança Pública, para que nós venhamos a ter um Plano Nacional de Segurança Pública que possa fazer aquilo que é extremamente necessário: ações integradas, planejadas, estratégicas, envolvendo todos os entes federados, os demais Poderes e a sociedade civil.
Lembremos sempre que essa segurança pública com cidadania que nós tanto sonhamos, calcada na cultura da paz, só vai ser uma realidade se o povo brasileiro se reencontrar, trazendo de volta a democracia, bem como o respeito à soberania do voto popular.
Está encerada a presente sessão solene.
E, mais uma vez, nossas saudações, repito, à CNBB pela edição de mais uma Campanha da Fraternidade, pelo quanto contribui para a luta em defesa dos direitos e da cidadania do povo brasileiro.
Cumprida a finalidade da sessão, agradeço as personalidades que nos honraram com o comparecimento.
Está encerrada a presente sessão. (Palmas.)
(Levanta-se a sessão às 14 horas e 17 minutos.)