4ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA
55ª LEGISLATURA
Em 21 de março de 2018
(quarta-feira)
Às 13 horas
31ª SESSÃO
(Sessão de Debates Temáticos)

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Declaro aberta a sessão.
Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos.
A presente sessão de debate temático destina-se a discutir o tema fake news e o impacto nas eleições de 2018, nos termos do Requerimento nº 41, de 2018, do Senador Telmário Mota e outros Senadores.
Passo agora à composição da Mesa, convidando S. Exª, o Ministro Tarcisio Vieira, Ministro do Tribunal Superior Eleitoral.
Convido o Secretário-Geral da Presidência do Tribunal Superior Eleitoral, o Sr. Carlos Eduardo Frazão do Amaral.
Convido para compor a Mesa o Presidente do Conselho de Comunicação Social do Senado Federal, o Sr. Murilo de Aragão.
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Convido o Promotor de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios e Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Digital, o Sr. Frederico Ceroy.
Convido a Presidente do Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo, a Srª Angela Pimenta.
Convido o Diretor da Sucursal da Folha de S.Paulo em Brasília, o Sr. Leandro Colon.
Convido o Consultor de Segurança Digital, o Sr. Daniel Nascimento.
Informo aos presentes que o Dr. Paulo Tonet Camargo, Presidente da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), teve um problema no deslocamento até Brasília, mas já comunicou que deverá chegar no transcorrer da sessão, para participar da sessão temática.
Eu convido todos para que, em posição de respeito, possamos acompanhar o Hino Nacional.
(Procede-se à execução do Hino Nacional.)
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O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Antes de passar a palavra ao Senador Telmário Mota, subscritor do requerimento, eu gostaria de, em nome do Senador Eunício Oliveira, Presidente do Senado Federal, agradecer a presença de todas as senhoras e de todos os senhores, que gentilmente acolheram o convite do Senado Federal para debate de tema tão atual, com uma expressão estrangeira fake news, que não passa de mentira.
Na verdade, o fake news é, em bom português, uma mentira, uma inverdade, e isso tem-se propagado muito na rede mundial de computadores, na internet e, sobretudo, no processo eleitoral que se avizinha, tem sido uma preocupação manifesta do Tribunal Superior Eleitoral, da Justiça Eleitoral como um todo, da imprensa brasileira, do Parlamento nacional, para que nós possamos debater sobre esse fenômeno que tem trazido transtornos à vida dos cidadãos brasileiros, daqueles que militam ou não na política.
Daí por que quero louvar a iniciativa do Senador Telmário de sugerir esta sessão de debates temáticos no plenário do Senado, para que nós possamos aprofundar a discussão sobre o tema e ouvir especialistas, ouvir autoridades envolvidas diretamente com o tema.
Portanto, o Senado da República sente-se profundamente honrado com a presença de V. Exªs e agradece a contribuição que será dada nesta sessão.
Concedo a palavra ao Senador Telmário Mota, autor do requerimento.
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O SR. TELMÁRIO MOTA (Bloco Moderador/PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Cássio Cunha Lima, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, quero aqui também saudar todos os nossos convidados que ora compõem a Mesa, o Sr. Ministro do Tribunal Superior Eleitoral, Sr. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto; o Presidente do Conselho de Comunicação Social do Senado, Sr. Murillo; o Sr. Promotor de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios e Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Digital, Sr. Frederico Ceroy; a Presidente do Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo, Srª Angela Pimenta; o Diretor da Sucursal da Folha de S.Paulo em Brasília, Sr. Leandro Colon; o Secretário-Geral da Presidência do Tribunal Superior Eleitoral, Sr. Carlos Eduardo; o Consultor de Segurança Digital, Sr. Daniel Nascimento; e também as demais autoridades presentes no plenário.
Sr. Presidente, esse nosso requerimento foi subscrito por mais 18 Senadores, entre eles a Senadora Ângela, que está presente, e V. Exª, que preside esta Casa e que naturalmente a gente já arrola como um dos que também provocaram esta sessão tão importante, principalmente para o momento político que se avizinha.
Sr. Presidente, o tema fake news, notícias falsas, como V. Exª bem colocou no nosso corriqueiro português, as mentiras colocadas nas redes sociais, está cada dia mais presente em discussões, tanto no cenário político como no cotidiano dos cidadãos. A proliferação de notícias falsas, sobretudo nas redes sociais e na internet, não só influencia as pessoas de forma errônea, tendenciosa e perigosa, mas também afeta a vida de muitos, muitas vezes de maneira irreversível.
Recentemente vimos a avalanche de notícias falsas veiculadas a respeito da Vereadora Marielle, que foi brutalmente assassinada no Rio de Janeiro. Na ocasião, lamentavelmente, uma desembargadora do Rio de Janeiro compartilhou informações que diziam que Marielle era engajada com bandidos, que havia sido eleita pelo Comando Vermelho. Veja que situações como essa trazem grande prejuízo à reputação e transtorno inimaginável para os familiares, que ainda amargam o sofrimento da grande perda.
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Além disso, faz-se extremamente necessário debater este assunto tendo em vista que estamos às vésperas do início da campanha eleitoral de 2018. É essencial que façamos um mapeamento por meio dos padrões de uso desses mecanismos, a fim de evitar intervenções ilegais no debate, como já verificado em outros países.
No encalço dessa problemática, relembramos, Sr. Presidente, que, no Congresso Nacional, já houve uma discussão sobre notícias falsas. O Conselho de Comunicação Social do Congresso promoveu um seminário para debater os perigos e os efeitos das falsas notícias sobre política publicadas nas redes sociais, que ocorreu em dezembro de 2017.
Destacamos também o empenho do Tribunal Superior Eleitoral, sob o comando do Ministro Luiz Fux, que, desde antes de assumir a Presidência do TSE, já demonstrava sua preocupação em combater as famosas fake news. Na ocasião de sua posse como Presidente, o Ministro Luiz Fux destacou enfaticamente que uma de suas metas à frente do TSE seria o de combater as fake news e garantir a lisura da disputa eleitoral.
Atualmente, Sr. Presidente, a Alemanha é um dos poucos países com legislação vigente com punição àqueles que divulgam e compartilham notícias falsas. Contudo, sabemos da dificuldade de rastreamento e a justa aplicação de sanções a essas pessoas devido ao anonimato que o meio virtual proporciona.
Dessa forma, Sr. Presidente, visualizando o grande desafio que enfrentaremos nesta e, talvez, nas próximas disputas eleitorais, é que convocamos esta sessão de debate temático sobre as terríveis fake news e seu poder devastador de influência nas pessoas e dentro da nossa sociedade.
Portanto, Sr. Presidente, o que esperamos exatamente desta sessão temática é que, com os nossos convidados e com a população posteriormente se comunicando com o próprio Senado, daqui saia um balizamento para que realmente possamos controlar e, com efeito eficaz, proibir essas divulgações dessas notícias falsas.
Nós temos algumas sugestões próprias aqui, mas eu prefiro proferir no final do debate, depois que ouvirmos os nossos convidados. Tenho certeza de que cada um vai trazer experiência e sugestões. E esta Casa, como a Casa do povo e, com certeza, com esse olhar preocupado, Sr. Presidente, vai saber fazer o encaminhamento das sugestões aqui hoje colocadas, sobretudo para que possamos realmente, numa só caminhada, combater essa onda de crime, porque quem pratica isso é criminoso. Eles aproveitam esse momento de uma socialização, da comunicação, que são as redes sociais, e não há essa preocupação da filtragem. Eu citei aqui até o caso da desembargadora para mostrar que uma pessoa do nível de uma juíza, de uma desembargadora é capaz de cair numa armadilha desse tamanho, que eles usam hoje nas redes sociais.
Então, as redes sociais hoje, em função das notícias verdadeiras e também das notícias falsas, estão criando dois pontos: aqueles que já não acreditam mais em nada e aqueles que acreditam em tudo. E a pessoa precisa ter a sensibilidade e a noção de que sempre está em jogo a reputação, a dignidade e a vida de uma pessoa e, talvez, da família dessa pessoa. Então, é importante que esses dados que hoje são facilmente... Só com um clicar você pode transmitir para várias pessoas ou não. Mas que elas tenham grande responsabilidade.
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Assim como cada brasileiro ou brasileira hoje quer ser jornalista, quer ser informante, que tenham o zelo e o cuidado de um bom jornalista, para fazer as filtragens necessárias e impedir que uma falsa informação possa destruir de forma talvez irreversível a dignidade, o caráter de uma pessoa.
Era o que tínhamos, Sr. Presidente, neste momento, para colocar.
O nosso muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Agradeço, Senador Telmário.
Esta Presidência informa que esta sessão está sendo realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. As pessoas que têm interesse em participar com comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do portal e-Cidadania, no link www.senado.leg.br/ecidadania e do Alô Senado, através do número 0800-612211.
Já tivemos, inclusive, algumas perguntas encaminhadas pela Srª Juliana Santos Queiroz; pelo Pedro Silva, que fez duas perguntas, que serão registradas ao final da fala dos convidados; pelo Gustavo Camargo Oliveira; pelo Adriano Silva, também com duas perguntas. Eles já manifestaram interesse de participação nos debates.
Eu, neste instante, concedo a palavra a S. Exª o Ministro Tarcisio Vieira, para que ele possa trazer a sua contribuição para nossa sessão temática.
O SR. TARCISIO VIEIRA DE CARVALHO NETO - Muito boa tarde a todas e a todos. É um prazer imenso comparecer à tribuna do Senado Federal.
Eu gostaria inicialmente de agradecer ao eminente Senador Cássio Cunha Lima, Vice-Presidente da Casa e que preside os trabalhos de hoje à tarde. Eu gostaria de agradecer também imensamente ao eminente Senador Telmário, que nos dá oportunidade de meditação coletiva sobre esse tema, que é bastante caro ao processo eleitoral que se avizinha e à democracia brasileira como um todo.
Quero saudar os colegas de Mesa, o Prof. Carlos Eduardo Frazão, Secretário-Geral do Tribunal Superior Eleitoral; o Prof. Murillo de Aragão, Presidente do Conselho de Comunicação Social; o Dr. Frederico Ceroy, do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios; Drª Angela, é um prazer; o Dr. Leandro Colon, da Folha de S.Paulo; o Dr. Daniel Nascimento.
Nesta primeira fase de abordagem do tema, a ideia é perpassar algumas impressões do Tribunal Superior Eleitoral sobre essa matéria, sem prejuízo da complementação a partir do debate na fase própria.
Entre os inúmeros desafios que assaltam o Tribunal Superior Eleitoral em anos eleitorais, neste ano, podemos eleger, como principais, três: a questão do financiamento eleitoral, o financiamento da democracia, com decisões recentes, inclusive, da Suprema Corte, do Tribunal Superior Eleitoral no sentido da repartição mais equânime desses valores; a questão da impressão do voto, que é um tema latente a respeito do qual, inclusive, tivemos oportunidade de participar, há um par de semanas, no âmbito da Comissão de Constituição e Justiça, um tema bastante palpitante; e, finalmente, mas não menos importante, a questão das fake news. Este é um tema que, de fato, povoa a meditação coletiva de todos aqueles que se atrevem a trabalhar o tema das eleições no Brasil e no mundo.
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Há pouco mais de dez dias, nós recebemos, no Tribunal Superior Eleitoral, uma visita bastante instrutiva do FBI norte-americano, do seu comitê de crimes cibernéticos. E eles nos passaram um panorama bastante preocupante das dificuldades que são enfrentadas no tratamento desta matéria, sobretudo à luz da própria principiologia constitucional e jurídica atinente à liberdade de expressão. A própria conceituação jurídica do que venha a ser fake news e dos terrores e dos medos que esse instituto possa gerar é de difícil operacionalização técnica.
Ainda assim, a legislação brasileira e a legislação mexicana avançaram bastante e têm sido consideradas, em colóquios internacionais, legislações bastante evoluídas. Ainda que seja muito difícil, muito complexa a matéria, isso não tem inibido o Congresso Nacional, que é a seara própria, soberana para a confecção de normas primárias em torno deste tema, de enfrentar este problema que é, como dizíamos nós, digno de nota.
Recentemente, o ex-Presidente norte-americano Barack Obama, em entrevista ao jornalista David Letterman confessava também a sua imensa preocupação no trato desta matéria, sobretudo fazendo alusão a este sistema, hoje crescente, não só de versões para determinados fatos, mas até mesmo de fatos alternativos.
E, no contexto das eleições, o poder destrutivo das informações falsas é indiscutível.
Nós do Tribunal Superior Eleitoral temos uma imensa preocupação, que advém de uma certa impotência do próprio Direito para lidar com este problema, que é um problema de tecnologia, de modificação quase viral das estruturas dessas comunidades tendentes ao descumprimento da lei. Mas temos também nos assenhorado de ferramentas e de instrumentos que estão ao nosso alcance, se não para banir esse fantasma das eleições, algo que seria, a meu sentir pessoal, praticamente impossível, pelo menos para diminuir ao máximo essas tentativas mais grosseiras de desnaturação da boa informação que deve subsidiar sempre as escolhas políticas conscientes e refletidas por parte do eleitorado.
Nós sempre nos beneficiamos largamente do uso da tecnologia. É importante ressaltar isso. A Justiça Eleitoral brasileira é reconhecida pelo uso maciço de tecnologia, a começar há décadas pela informatização do cadastro eleitoral; pelo desenvolvimento e implantação da urna eletrônica, em atividade há mais de 20 anos ininterruptamente; pela questão da biometria. Nós já alcançamos mais da metade do eleitorado brasileiro em termos de biometrização. Isso porá fim a um tipo mais sofisticado de fraude de pessoas comparecerem às urnas em nome de outras, mas também deitará reflexos muitos virtuosos em outros setores da realidade nacional.
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Apenas para mencionar um exemplo, em relação ao Cadastro Nacional de Pessoas Desaparecidas, que é uma questão bastante preocupante, a localização dessas pessoas será muito mais fácil depois da biometrização da população brasileira. Mas também há alguns reflexos interessantes na área de segurança pública, no controle das identidades.
Nós já temos na legislação eleitoral, portanto, um material muito importante para a atuação da Justiça Eleitoral. Além da previsão como crime - e nós percebemos até a existência de alguns projetos de lei em gestação nesta linha ideológica de criminalização da disseminação de informações falsas -, a lei atual, nessa última reforma política de 6 de outubro do ano passado, já prevê como crime, no art. 39, §5º, inciso IV, a publicação de novos conteúdos ou o impulsionamento de conteúdos nas aplicações da internet. Parece-nos que o legislador fez uma opção bastante inteligente por atacar esse tema não no varejo, mas nesse fluxo mais destrutivo que advém do impulsionamento de conteúdos. E segue sendo proibida como regra a publicidade paga na internet, mas passa a ser permitido o impulsionamento com algumas travas normativas de segurança, a meu sentir, muito bem engendradas. Por exemplo:
Art. 57-C. É vedada a veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet, excetuado o impulsionamento de conteúdos, desde que identificado de forma inequívoca como tal [...].
Isso é interessante porque passa a ser possível a exigência, pela Justiça Eleitoral, de que essa matéria eleitoral impulsionada pela internet venha classificada como propaganda eleitoral, para que o eleitor, quando receber esse material no seu dispositivo, nos seus aplicativos, perceba justamente o que é aquele material, uma propaganda eleitoral, e faça o seu juízo de valor devido. Mais ou menos o que ocorre no impulsionamento de material publicitário comum relativamente àquela tarja da página patrocinada. É uma questão interessante.
Outra questão interessante que já está sacramentada na norma de regência das eleições vindouras é a de que a contratação desse impulsionamento só pode se dar exclusivamente por partidos políticos, coligações, candidatos e representantes,...
(Soa a campainha.)
O SR. TARCISIO VIEIRA DE CARVALHO NETO - ... o impulsionamento fora desses contratantes seria também per se ilegal.
Para não ocupar demasiadamente o tempo dos demais colegas e do distinto auditório, eu agradeço até aqui a participação e fico à disposição para eventuais complementações.
Obrigado, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Ministro Tarcisio, eu quero esclarecer a V. Exª e aos demais convidados que o acionamento da campainha é automático.
O SR. TARCISIO VIEIRA DE CARVALHO NETO - Pois não.
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Eu não cometeria a indelicadeza de interromper a fala de V. Exª e de nenhum dos convidados, mas o sistema do Senado faz acionar com um minuto para o fim do prazo a fim de alertar o orador da proximidade do tempo. Então, como estamos concedendo dez minutos para cada um dos convidados, no nono minuto, portanto, a campainha será acionada. Mas poderemos prorrogar o tempo, não há um rigor absoluto em relação ao tempo para se concluir um raciocínio. Não há nenhum tipo de tratamento rigoroso na questão do tempo. Então, dando sequência à fala dos convidados, eu concedo a palavra ao Dr. Carlos Eduardo Frazão do Amaral, Secretário-Geral da Presidência do Tribunal Superior Eleitoral, igualmente pelo tempo de dez minutos.
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Repito e insisto: no nono minuto, automaticamente, a campainha será acionada, e, se for preciso, posso prorrogar o tempo para a conclusão do raciocínio.
O SR. CARLOS EDUARDO FRAZÃO DO AMARAL - Boa tarde a todos.
Inicialmente, gostaria de registrar os cumprimentos e agradecimentos na pessoa do 1º Vice-Presidente do Senado e Presidente da sessão, Senador Cássio Cunha Lima. Cumprimento também o Ministro Tarcisio, do Tribunal Superior Eleitoral, um grande parceiro da nossa presidência, um grande parceiro do Tribunal e com quem travamos grandes e profícuos debates eleitorais sobre os mais diversos institutos, inclusive no que tange ao combate às fake news. Cumprimento também o Senador Telmário Mota, requerente desta sessão de debates temáticos; o Presidente do Conselho de Comunicação Social do Senado, Dr. Murillo de Aragão; o Promotor Frederico Meinberg Ceroy; a Presidente do Instituto de Desenvolvimento do Jornalismo, Angela Pimenta; o Diretor Leandro Colon; e o Consultor de Segurança Digital Dr. Daniel Nascimento.
Meus amigos, falar depois do Ministro Tarcisio é sempre um ônus, sempre um fardo, porque ele, de maneira sempre muito sintética, sempre de maneira muito concisa e profunda, consegue praticamente exaurir uma temática tão espinhosa, trazendo os principais assuntos, aspectos, as principais dificuldades e desafios de um tema tão complexo, que é o combate às fake news.
Eu sempre costumo iniciar as minhas exposições sobre fake news citando um grande estadista, que disse, certa vez, que as mentiras dão uma volta inteira no mundo, e a verdade ainda nem começou a se vestir. Esse é um dado. Talvez os psicanalistas devam saber as razões pelas quais isso se justifica, isso ocorre. O fato é que nós temos um alcance muito maior e muito mais elastecido das notícias falsas do que de notícias efetivamente verdadeiras, fazendo um contraponto.
Esse debate sobre fake news ganhou uma grande projeção, Presidente Cássio, com a eleição do Trump. Se formos buscar naquele Google Trends, a expressão "fake news" ganha uma grande projeção e as pessoas começam a se interessar sobre o tema, a partir da eleição do Presidente Trump. No Brasil, curiosamente foi quando o Tribunal Superior Eleitoral, ainda na gestão do Presidente Ministro Gilmar Mendes, criou o Conselho Consultivo de combate às fake news, com órgãos de inteligência governamentais e entidades da sociedade civil.
Agora, o combate às fake news, eu acho que é apenas uma parte do problema. Há, sim, um problema de desinformação, o problema de propagandas enganosas. No entanto, existem outros problemas, como sabotagens, que são igualmente nefastas no processo eleitoral; problemas, às vezes, de alterações de algoritmo. Também há uma pesquisa do Prof. Robert Epstein, em que ele induziu 20% de um eleitorado numa pesquisa que ele fez simplesmente alterando a ordem de algoritmo, de informações que apareciam no Google.
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Então, vejam que a divulgação de notícias falsas é um problema, sim, mas uma parte do problema.
No caso da eleição do Macron, o Macron Leaks, na França, nós tivemos sabotagem misturada com fake news, por exemplo. Devassaram o e-mail do Emmanuel Macron, quando ainda era candidato, divulgaram às vésperas da eleição e ainda fizeram uma manipulação nos registros de e-mails, na caixa de e-mails.
A imprensa francesa tomou ciência disso, houve uma divulgação, e não houve a exploração do episódio, mas, na eleição americana, por exemplo, tivemos episódios de jovens na Macedônia, que supostamente ficavam divulgando matérias pró-Trump simplesmente com intuito econômico, como eles disseram. Houve um que ganhou, sei lá, €1,8 mil, num mês, quando a média salarial na cidade da Macedônia - acho que é Veles, se não me engano - era €350.
Então, vejam que essa preocupação de combater as fake news é uma parte considerável do problema, mas existem outros igualmente relevantes; outros até que talvez não beirem a ilicitude, como uma alteração na ordem de busca numa ferramenta de pesquisa, numa plataforma de pesquisa.
Então, o Tribunal Superior Eleitoral tem-se debruçado sobre a temática e tem-se preocupado. O Ministro Tarcisio, na parte final de sua exposição, falou, por exemplo, de quem pode impulsionar propagandas eleitorais. O próprio legislador aqui, por uma opção, a meu ver muito correta, definiu quem eram os legitimados para impulsionar campanhas. Isso, para o TSE, já é uma diretriz importante, porque, se eventual impulsionamento não for levado a efeito por qualquer um dos legitimados, é possível que nós, diante de uma representação por propaganda irregular, já possamos tomar as providências cabíveis que a legislação autoriza, como aplicação de multas, ou, por exemplo, eventual direito de resposta concessivo.
E, aqui, a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral já sinaliza no sentido de não aceitar, por exemplo, propagandas negativas, propagandas difamatórias. Essa é uma diretriz já antiga, muito criticada por alguns setores da doutrina, mas é uma jurisprudência que, a meu ver, tem forte embasamento teórico e que, provavelmente, essa Corte não deve modificar - pelo menos é a impressão que eu tenho das manifestações dos demais Ministros. Isso já evidencia também que a Corte vai-se preocupar, diante dos litígios concretos, com a veiculação de matérias falsas ou enganosas.
Sobre os expedientes de notícias falsas, os estudiosos do tema costumam apontar, como finalidade: o desvio da atenção midiática de certa matéria que prejudique o candidato - então, para você desviar a atenção midiática de determinado assunto que lhe é desfavorável, você começa a divulgar e pipocar notícias enganosas -; a necessidade de ampliar a sua base de apoio; e outra - esta, sim, que talvez se conecte com a propaganda eleitoral, que é o descrédito a adversários e aos opositores, fazendo com que se estenda o alcance das mentiras e se crie um ambiente de desinformação mesmo.
Mas qual é para mim o grande problema das fake news?
O problema das fake news - e acho que este é um tema relevante, a que o Tribunal Superior Eleitoral está atento - é que você prejudica a qualidade do voto do cidadão. Esse ambiente de divulgação de notícias que, supostamente, tendam a não refletir, consciente ou inconscientemente, o que efetivamente acontece prejudica a formação de um voto consciente por parte do eleitorado, por parte dos cidadãos.
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Então, um processo eleitoral hígido, um processo eleitoral legítimo pressupõe que as pessoas estejam bem informadas. A liberdade de expressão é um valor em si e é um pressuposto, sim, para uma efetiva democracia, para um verdadeiro Estado democrático de direito. No entanto, em um ambiente em que pululem notícias falsas, eu tenho um pouco de dúvida se, efetivamente, nós conseguiremos atender a esse desiderato, esse ideal de uma eleição legítima, uma eleição idônea.
Nos Estados Unidos - o Ministro Tarcisio mencionou aqui -, não se faz controle de conteúdo. Essa, inclusive, é uma das críticas à jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, porque existiria um direito fundamental de enganar ou de ser enganado. Mas o fato é que o processo eleitoral tem singularidades que fazem com que haja uma preocupação maior com a circulação de informações, como, por exemplo, a possibilidade de você, às vésperas da eleição, quase derreter uma candidatura se, eventualmente, você colocar uma informação desabonadora contra um determinado player do processo eleitoral.
Então, lá no âmbito do Tribunal Superior Eleitoral, já na gestão...
(Soa a campainha.)
O SR. CARLOS EDUARDO FRAZÃO DO AMARAL - ... do Ministro Gilmar, repito, já me encaminhando para o final, foi criado um conselho consultivo de combate às fake news, e nós temos debatido instrumentos para tentar pelo menos amainar, pois, como o Ministro Tarcisio falou, acho que erradicar é impossível - comungo da mesma preocupação dele -, os efeitos deletérios dessa divulgação de notícias falsas.
Então, agradeço a atenção. Muito obrigado. Eventualmente, no debate a gente desenvolve um pouco mais.
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Dr. Frazão, muito obrigado, inclusive, assim como o Ministro Tarcisio, pela rigorosa observância do tempo.
Concedo, neste instante, a palavra ao Dr. Frederico Ceroy, que é Promotor de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios e Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Digital, por, naturalmente, igual tempo, de dez minutos.
O SR. FREDERICO MEINBERG CEROY - Senador Cássio, começo fazendo uma homenagem aqui ao Senador Eunício Oliveira, Presidente desta Casa, que desde o ano passado tem se debruçado, tem demonstrado interesse pelo tema.
Quero parabenizar o Senador Telmário Mota.
Senador, é a segunda vez que tenho o prazer de vir a esta Casa. A primeira vez foi para atender a um requerimento de V. Exª, na Comissão de Ciência e Tecnologia, para falar sobre o PLS 330. Foi uma experiência fantástica. Tanto é que produzimos uma nota técnica à época. O Senador Aloysio Nunes pegou essa nota técnica em grande parte e apresentou o Substitutivo nº 1 à matéria. Agradeço novamente o convite.
Senadora Ângela Portela, subscritora do requerimento, agradeço demais o convite.
E homenageio os demais Senadores aqui presentes.
Senador Cássio Cunha Lima, Presidente desta sessão, minhas homenagens a V. Exª.
Demais integrantes da Mesa, teremos dez minutos, e eu já gastei quase um e meio.
Vou homenagear aqui o Murillo de Aragão e estender as homenagens aos demais integrantes da Mesa.
Pois bem, vamos ao que interessa aqui: fake news.
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Fake news, nós temos que entender, falei isso naquele congresso que nós tivemos no Interlegis, do Conselho de Comunicação Social, fake news tem que ser entendida dentro de um ecossistema. Um ecossistema, Senador Telmário Mota, que é o ecossistema da atenção.
As plataformas de tecnologia vivem da atenção dos usuários. Não sou eu que estou falando isso, não estou inventando a roda, é um professor da Universidade de Columbia, chamado Tim Wu. Ele escreveu um livro, em 2016, chamado Os mercadores da atenção; escreveu um paper que talvez seja o paper mais fantástico para a gente entender o fenômeno das fake news, que é um paper bem provocativo que tem o seguinte nome, traduzindo para o português: "A primeira emenda à Constituição dos Estados Unidos está obsoleta?". Ele pergunta isso. E a primeira emenda trata do quê? De liberdade de expressão, de liberdade religiosa e principalmente, Leandro, de liberdade de imprensa. E o Tim Wu faz um trabalho fantástico em cima disso, mostrando que essa suposta liberdade de discurso que a gente tem nas redes sociais, está na verdade, de uma forma ou de outra, matando as outras formas de liberdade de expressão. E ele mostra isso trazendo o exemplo chinês e o exemplo russo.
Isso que nós estamos vivendo hoje, essa guerrilha virtual na internet, isso é uma criação de arma de guerra. Isso foi criado na Rússia, originalmente, isso foi aplicado na China, originalmente, como o quê? Arma de Guerra e arma para perseguir os opositores.
Então, se o Leandro hoje publica uma matéria contra a minha pessoa, e eu sou um governante de um país autoritário, eu vou botar uma milícia virtual para atacar o Leandro, para fazer chantagem com a Folha de S.Paulo, fazer chantagem com relação aos meus opositores. Então, nós temos que entender que, hoje, o que está acontecendo no Brasil e no mundo, o que aconteceu nos Estados Unidos, são simplesmente armas de guerra, armas para calar a liberdade de expressão, usadas contra a liberdade de expressão.
É importantíssimo a gente trazer... Antes de falar isso, quero lembrar que esse artigo do Tim Wu de que eu estou falando aqui, ele compilou isso numa reportagem, num editorial para o The New York Times. E ele deu esse nome: "O Twitter matou a primeira emenda?" E ali ele explica todo esse artigo de forma fantástica.
Então, nós temos o ecossistema da atenção, Senador Cássio Cunha Lima, e nós temos outra coisa que é o vício. A grande discussão dos Estados Unidos da América hoje é: as plataformas são plataformas para viciar os usuários. Um smartphone que nós temos é uma máquina de vício. Chegou a um ponto em que os acionistas da Apple fizeram uma carta aberta à Apple, para ela transformar os produtos em menos viciantes.
Basta lembrar que, quando a gente atualiza o nosso e-mail no celular, aquilo ali é inspirado numa máquina caça-níquel de cassino. Aquelas bolinhas de notificações de e-mail ou WhatsApp, aquilo ali foi pensado por neurocientistas para quê? Para manter a gente o maior tempo possível grudado naquela tela.
E entrando especificamente em fake news, o que a eleição do Trump nos Estados Unidos mostrou, principalmente a investigação do Robert Miller III, que é o procurador especial responsável pela investigação da influência russa na eleição americana? Mostrou principalmente que fake news não funciona como a gente imagina que funciona, simplesmente aparecendo no feed de notícias e influenciando a população. O Roberto Miller III deixou muito claro, no relatório dele, que fake news que influencia eleição age de outro modo. Número um, ela é um roubo de identidade virtual.
Então um hacker russo pega a foto de um policial negro de Boston e cria um grupo no Facebook, policiais negros de Boston contra a violência. E começa a aglutinar policiais ali, 2 mil, 3 mil, 4 mil, e produz fake news dentro daquele grupo.
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Então, fake news não é simplesmente aquilo que aparece no feed de notícias nosso. Fake news que abala a eleição, que abala a democracia é um movimento coordenado que, muitas vezes, está por debaixo dos panos e nós não estamos vendo.
Daqui a pouco, vou trazer como combater essa fake news que a gente não vê.
Um recente estudo do MIT mostrou rapidamente o quê? Nós, seres humanos, preferimos fake news a notícias verdadeiras. Uma fake news se espalha quase o dobro mais rápido do que uma notícia verdadeira.
Como combater isso? Vamos imaginar uma cebola, então. A primeira casca dessa cebola é provavelmente o que a Angela vai tratar aqui, o que ela faz muito bem. Essa primeira casca da cebola é a educação: ensinar os jovens, a população, as pessoas a verem uma notícia e a validar aquela notícia. E validar como? Indo a um órgão de mídia tradicional. As agências de checagem de notícia são de suma importância. Essa é a primeira camada.
A segunda camada é uma coisa que eu fiz, ajudei a construir lá em 2016, por meio do programa Humaniza Redes, que é o quê? Nós usarmos os termos de uso e a política de privacidade das plataformas de tecnologia para derrubar conteúdo.
É óbvio que você não pode subir um conteúdo de nudez de criança no Facebook. Isso está violando os termos de uso e a política de privacidade. Então, a segunda camada da cebola é derrubar esse conteúdo, usando os termos de uso e a política de privacidade.
Terceira camada. Essa terceira camada, eu opero há dez anos. Fazendo o quê? A ação conjunta das autoridades com as plataformas. E aqui vale a pena relatar isso. Isso funciona muito bem para algumas empresas e muito mal para algumas outras empresas. Hoje a relação que nós temos com o Facebook, com a família Facebook, é a pior possível. O Facebook não entrega, Senador Cássio Cunha Lima, conteúdo de comunicações de usuários e não entrega conteúdo de postagens. Isso é um problema seriíssimo. Isso é uma violação clara ao Marco Civil da Internet.
Então, nós temos uma distopia enorme dentro da comunidade de tecnologia. Nós temos outras empresas colaborando com as autoridades - basta dizer Google, Microsoft, Twitter - e o Facebook se negando a cumprir a legislação brasileira.
A título de exemplo, se a Ministra Cármen Lúcia, a maior autoridade do Judiciário brasileiro, requisitar conteúdo de postagem, conteúdo de comunicações de traficantes de armas brasileiros, o Facebook vai falar: "Não, não vou fornecer". Ministra Cármen Lúcia, você leve essa ordem ao Ministério da Justiça, que vai entregar para o Itamaraty, que vai entregar para a Embaixada dos Estados Unidos, que vai entregar para o Departamento de Justiça dos Estados Unidos, para ver se vai entregar. Nessa brincadeira, dois anos - o traficante de armas até já se aposentou há tempo.
(Soa a campainha.)
O SR. FREDERICO MEINBERG CEROY - E a quarta camada.
Senador, o senhor me concede três minutos a mais, para eu terminar isto aqui?
E a quarta camada, talvez a que mais se está discutindo no mundo, é a legislação. Como combater fake news por meio de legislação? E aqui eu deixo muito clara a minha opinião com relação à alteração da legislação eleitoral e da legislação criminal: acho que isso não vai resolver.
O que acho que pode ser feito, se assim a sociedade entender, se assim esta Casa entender, é a gente olhar, com um olhar especial, a legislação hoje vigente na Alemanha.
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Eu sempre olhei com muita atenção a legislação alemã, mesmo porque meu sobrenome é Meinberg. Eu tenho sangue alemão. Então, sempre olhei com algum interesse a legislação alemã. A gente não pode acusar a Alemanha de ser uma ditadura. A gente não pode acusar a Alemanha de não ter um Estado de direito forte. A gente não pode acusar a Chanceler Angela Merkel de não ser democrata. É uma pessoa que nasceu na Alemanha Oriental, foi criada na Alemanha Oriental. Então, eu acho que a Alemanha não é exemplo de um país que não preze a democracia, o Estado democrático de direito.
O que há hoje na Alemanha, Senador Cássio Cunha Lima? Uma legislação que é muito inteligente. Não estou defendendo a legislação alemã; estou dando essa opção para esta Casa, para a sociedade. É uma legislação que vai responsabilizar quem? As plataformas de tecnologia. Eu acho que é um grande erro a gente tentar responsabilizar o usuário que está compartilhando isso. As fábricas de fake news, a gente consegue combater por meio da legislação criminal que existe. A gente precisa da ajuda das empresas. Mas a legislação alemã o que faz? Cria camadas de proteção. Notícias da Folha de S.Paulo, de O Globo ou do Estadão não estão incidentes nessa legislação. Startups não estão incidentes, porque essa lei só vai incidir sobre plataformas que tenham mais de dois milhões de usuários. Essa legislação não vai incidir se uma plataforma não obtiver lucro. Essa legislação não vai incidir em algumas situações. Não vai incidir, por exemplo, sobre o WhatsApp, que é um comunicador entre pessoas. Ela está focada em redes sociais. Basicamente, o que a legislação alemã vai trazer é o seguinte: se um conteúdo foi sinalizado pelo usuário, o usuário sobe um conteúdo: "Vamos bater em mulheres no Brasil! Vamos trazer o partido nazista para o Brasil!". É um conteúdo que, claramente, segundo a legislação alemã, é ilegal. Isso é ilegal. Pela legislação brasileira, isso é ilegal pelos termos de uso e política de privacidade. Então, essa plataforma vai ter em regra 24 horas para analisar aquilo. Se aquele conteúdo realmente for ilegal, a plataforma vai bloqueá-lo ou suspendê-lo. Assim, a gente tira a responsabilidade do Estado ou do usuário e leva a responsabilidade para quem me parece ser o responsável por isso, quem está lucrando bilhões com as redes sociais, que são as próprias redes sociais.
Então, nós temos que olhar ao pensar, se a opção brasileira for legislar - eu acredito que é - e pôr na prateleira as ideias criminais, as ideias de alterações eleitorais. Vamos focar na legislação alemã. Ela é perfeita? De forma nenhuma. Mas é o que nós temos. É um grande laboratório e ela será aperfeiçoada. E o mais interessante. Houve uma chiadeira de todas as empresas, e o que aconteceu hoje, Senador Cássio Cunha Lima? Está todo o mundo adaptado, dentro das possibilidades.
(Soa a campainha.)
O SR. FREDERICO MEINBERG CEROY - Para finalizar, Senador Telmário, deixo aqui o meu contato. O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios está à disposição desta Casa. Nossa ideia é produzir cada vez mais notas técnicas para poder subsidiar o trabalho dos senhores e, ao final, chegar a uma sociedade mais protegida e mais justa.
Obrigado a todos.
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O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Muito obrigado, Dr. Frederico, pela sua contribuição.
Nesse instante, eu concedo a palavra à Drª Angela Pimenta, Presidente do Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo.
Pode ficar à vontade, fale de onde a senhora se sentir mais confortável.
A SRª ANGELA PIMENTA - Então, começando, pela terceira vez, eu gostaria de iniciar agradecendo o convite do Senado, na pessoa do seu Vice-Presidente, Senador Cássio Cunha Lima, também ao Senador Telmário Mota, que requereu essa sessão tão importante. Gostaria de saudar o Ministro Tarcisio Vieira, do TSE, o Dr. Murillo de Aragão, Presidente do Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional, as Senadoras e Senadores presentes e meus colegas debatedores.
Eu gostaria de começar dizendo que nós do Projor acreditamos que o termo "notícias falsas" é impreciso para tratar desse fenômeno novo. Trata-se de poluição informativa no espaço digital, lixo. Por isso, nós preferimos o termo desinformação.
E eu gostaria de citar uma pesquisadora britânica, ela se chama Claire Wardle, uma grande especialista no tema, inclusive em checagem. Ela dirige o que era uma ONG que se chama First Draft News. A qualidade do trabalho dela e equipe é tão grande que ela foi convidada a integrar a Universidade de Harvard e agora o First Draft News é parte da Escola Kennedy do governo.
Muito bem, o que é que ela diz? Ela diz que combater a desinformação é como varrer as ruas. Trata-se de um trabalho diário, intensivo e minucioso. Nesta tarefa, nós acreditamos que jornalistas, veículos jornalísticos e entidades de classe e associações como o Projor precisam trabalhar de forma colaborativa. Trata-se de um fenômeno inédito e de uma escala gigantesca.
Isso, a nosso ver, faz com que a gente precise trabalhar junto. É claro que a participação do Governo, dos três Poderes é imprescindível, seja na tarefa de regular e zelar pela governança da internet, seja educando a população sobre a natureza do espaço digital. Mas o Projor não acredita que a aprovação de novas leis que visem tipificar a desinformação, as fake news, seja necessária ou desejável. Por quê? Primeiro, porque nós sabemos que a Constituição e o Código Penal já dão conta de tipificar os crimes contra a honra, como calúnia, injúria, difamação, além da apologia ao crime. No que diz respeito especificamente ao Marco Civil da Internet, ele determina a guarda dos registros de logs, permitindo rastrear a identidade do computador ou do celular de onde tenha partido uma atividade criminosa.
E eu gostaria, então, de citar a jurista Taís Gasparian quando diz que novas leis que tentem punir a desinformação podem banalizar a figura legal da remoção de conteúdo e isso poderia, potencialmente, trazer graves prejuízos à liberdade de expressão e à tarefa da imprensa de cobrir a campanha eleitoral. Tipificar criminalmente a mentira e suas várias faces é uma tarefa complexa e arriscada.
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E eu volto a citar a Claire Wardle. Ela formulou, no ano passado, "O ecossistema da desinformação". Isso pode ser comparado à tabela periódica da mentira. E ela identificou sete tipos possíveis de manipulação de um conteúdo informativo. Eu vou citar os sete para os senhores terem uma ideia de como isso é complexo e nuançado. São eles: primeiro, falsa conexão, quando manchetes, ilustrações ou legendas não confirmam o conteúdo; falso contexto é o segundo, quando o conteúdo genuíno é compartilhado junto com a informação falsa; manipulação do contexto é o terceiro tipo, quando a informação ou a imagem genuína é manipulada para enganar; quarto, sátira ou paródia.
Vejam bem, elas não têm intenção de prejudicar, mas podem enganar o público, os incautos. Aqui eu cito especificamente os sites The Piauí Herald e Sensacionalista. Do ponto de vista teórico da informação, fazem parte, são vizinhos dos outros tipos de mentiras e criam um problema para a tipificação.
Passo, então, ao próximo, que é conteúdo enganoso, uso enganoso de informações para enquadrar uma questão ou indivíduo; o conteúdo impostor, que é o sexto, quando fontes genuínas são imitadas, vozes que se dizem passar por outras pessoas e não são - a gente viu recentemente, num grupo de aplicativos, a voz do ex-Presidente Lula sendo usada dessa forma, que é o conteúdo impostor -; e, finalmente, a mentira 100%, o conteúdo fabricado, criado para ludibriar e prejudicar.
Claire Wardle acrescenta, senhoras e senhores, que o fenômeno só pode ser devidamente compreendido se analisarmos seus agentes, motivações e o processo de criação e compartilhamento.
Se nós não acreditamos em leis para tipificar a mentira, o que fazer? Para além da questão criminal, o combate à desinformação requer, a nosso ver, três tipos de iniciativas articuláveis. Nesse tripé, o primeiro pilar é a checagem e a verificação. E o que é a checagem de fatos? É a autenticação do discurso de fontes oficiais, como as Srªs e os Srs. Senadores, como políticos, estatísticas. A checagem requer protocolos claros. A Rede Internacional de Checadores, a sigla em inglês é IFCN, sediada no Instituto Poynter, na Flórida, leva em conta critérios como clareza, precisão, relevância, impacto e corroboração no seu método de checagem. Ou seja, para se tentar localizar uma mentira, isso tudo aqui precisa ser levado em consideração. E a IFCN conta hoje, no Brasil, com três agências associadas: a Agência Lupa, o Aos Fatos e a Agência Pública. E diga-se que grandes portais, por exemplo, o G1 e o UOL, já têm plataformas de checagem.
Passando à verificação. O que é verificação? É a autenticação de fontes não oficiais. Ela é focada na verificação de posts e mídias sociais, inclusive áudio, vídeo e os chamados memes. Ela analisa aquilo que, no nosso jargão jornalístico, chama-se de chorume, o pior tipo de lixo digital. Um bom exemplo, o trabalho do site Boatos.org, que desmentiu o post mentiroso de que a Vereadora Marielle Franco foi casada com o traficante Marcinho VP.
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Tanto a checagem quanto a verificação se apoiam no trabalho jornalístico combinado com o monitoramento computacional, softwares poderosos. Eles são capazes de prever o potencial de viralização de determinado conteúdo, que, em questão de minutos, pode ser compartilhado por milhões de pessoas. Logo, antes que algo malicioso seja compartilhado pelos internautas em escala maciça, é possível identificar de onde partiu a mentira e, a partir daí, desmascará-la.
Eu gostaria, então, de citar duas iniciativas internacionais do gênero. Em 2017, o projeto CrossCheck, liderado pelo First Draft News, obteve resultados expressivos na campanha presidencial francesa. Ele contou com uma coalizão de 37 veículos - os principais veículos franceses, como Le Monde, Libération, agência AFP - e publicou 57 checagens. O CrossCheck desmascarou, por exemplo, um boato de que o então candidato Emmanuel Macron teria usado um ponto eletrônico no ouvido durante um debate eleitoral.
(Soa a campainha.)
A SRª ANGELA PIMENTA - No México, uma nova coalizão da imprensa acaba de lançar o Verificado 18 para a próxima campanha presidencial mexicana, cuja eleição é agora em julho.
Nós acreditamos que o jornalismo brasileiro tem capacidade e disposição para uma iniciativa nesses moldes. Em termos de curto prazo, essa é a melhor abordagem contra a desinformação. O nosso trabalho jornalístico poderia ajudar a polícia e o TSE a responsabilizar criminalmente agentes da desinformação.
O segundo pilar que, a nosso ver, serve para combater a desinformação é a valorização da informação de qualidade de conteúdo jornalístico. Eu estou falando especificamente do Projeto Credibilidade. Em parceria com a Universidade Estadual Paulista (Unesp), o Projor mantém, desde 2016, o Projeto Credibilidade. Nós somos o capítulo brasileiro do The Trust Project, que é sediado no Centro Markkula de Ética Aplicada da Universidade de Santa Clara, da Califórnia. O Trust é liderado, nos Estados Unidos, pela jornalista Sally Lehrman.
O Prof. Francisco Belda, da Unesp, e eu coordenamos o projeto, que, além da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), conta com a participação de 17 veículos de imprensa parceiros, veículos brasileiros. O nosso projeto é patrocinado pelo Google Brasil. Nós trabalhamos em parceria com os veículos para ajudá-los a adotar e/ou aprimorar padrões de governança editorial através de um sistema de oito indicadores de credibilidade, que chamamos de dados nutricionais da notícia.
Em função do tempo, vou mencionar apenas um indicador, mas o que nós queremos é deixar cada vez mais transparente para quem lê, ouve, assiste a notícias qual foi o processo de apuração, edição e publicação, além do feedback com o público. Eu vou mencionar as melhores práticas, que são declarações dos veículos sobre sua missão, valores editoriais, dados da empresa publicadora e políticas para apuração e correções, entre outras.
O terceiro pilar no combate à desinformação é a educação midiática. Trata-se da educação de crianças, jovens e adultos sobre o ambiente digital e a informação nele produzida e compartilhada. Essa educação tem que ser parte dos currículos escolares, do ensino básico às escolas de jornalismo e também de demais áreas das ciências humanas. Eu gostaria de citar duas iniciativas: uma nascente aqui do Projor, que é uma parceria que nós estamos estabelecendo com o Instituto Palavra Aberta, que é presidido pela Conselheira Patrícia Blanco, deste Conselho.
(Soa a campainha.)
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A SRª ANGELA PIMENTA - E, finalizando, Sr. Presidente, eu gostaria de mencionar uma publicação nova do nosso instituto. É um guia básico sobre essas questões que nós estamos discutindo, e lá estão as causas desse fenômeno, qual é o cenário, a história da mentira para fins políticos, as relações entre jornalismo e democracia, o fenômeno da desinformação, com esse arcabouço teórico que eu descrevi, e o nosso sistema de indicadores de credibilidade.
Eu deixo aqui, então, o endereço na internet: www.manualdacredibilidade.com.br.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Muito obrigado, Drª Angela, também por sua contribuição ao nosso debate.
Na sequência, concedo a palavra ao Dr. Murillo de Aragão, Presidente do Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional.
O SR. MURILLO DE ARAGÃO - Sr. Presidente, Vice-Presidente do Senado, Senador Cássio Cunha Lima, Senador Telmário Mota, autor do requerimento desta audiência, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, demais membros da Mesa, palestrantes, conselheiros do Conselho de Comunicação Social do Congresso aqui presentes, membros do corpo diplomático, demais autoridades, senhores e senhoras, venho aqui na qualidade de Presidente do Conselho de Comunicação Social, sendo um representante da sociedade civil do Instituto Brasileiro de Direito Eleitoral.
Em boa medida, os Constituintes, em 1988, criaram o conselho, que é um mecanismo que pode colaborar muito para o debate dos temas de comunicação social no País. Em novembro do ano passado, durante a cerimônia de posse dos membros do conselho, o Presidente Eunício Oliveira nos orientou para que tratássemos do tema das fake news e em relação à questão eleitoral.
Na sequência e com apoio decisivo da Secretaria-Geral da Mesa, realizamos um grande seminário sobre o tema e, para a nossa satisfação, alguns dos palestrantes que participaram do debate estão hoje aqui presentes nesta sessão temática. Do nosso debate, recolhemos diversas sugestões e pedimos também à Consultoria Legislativa do Senado que elaborasse um estudo sobre o assunto, a partir das tendências mundiais e dos eventos recentes ocorridos nos Estados Unidos e na Europa, e assim foi feito.
Neste momento, um grupo de conselheiros, sob a liderança do Conselheiro Miguel Matos, debruça-se sobre todos os projetos de lei - são cerca de oito projetos de lei - sobre o tema, bem como os valiosos insumos da Consultoria Legislativa para se manifestar de forma clara e específica nos próximos 30 dias. Nossa contribuição ficará disponível aos Parlamentares e será entregue ao Presidente do Congresso Nacional no momento certo.
Agora, vale aqui retomar um pouco o tema a partir de uma perspectiva não histórica, mas recente. O ano de 2016 é considerado o ano das fake news, em especial por conta do efeito das fake news no processo eleitoral que elegeu Donald Trump. As últimas eleições nos Estados Unidos revelaram uma guerra midiática para a qual o país não estava preparado.
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Na semana passada, o Senador Presidente da Comissão de Defesa disse, num evento em Austin, que os Estados Unidos gastam US$700 bilhões com a defesa, mas custou menos do que um caça F-18 bagunçar toda a questão eleitoral por meio das fake news. Então, todo o aparato bélico norte-americano não estava preparado para se defender da guerra midiática pela qual o país foi atingido.
Enfim, apesar do interesse do Senado, do Tribunal Superior Eleitoral, do próprio Conselho de Comunicação Social e da sociedade, que trabalham em torno da questão, eu não acredito que nós estejamos preparados para lidar com o tema frente ao desafio que temos com a nossa eleição.
E o pior: estamos sendo enganados também por outro fenômeno que eu chamo que de fake interpretations, as notícias distorcidas. Apenas nos últimos 12 meses, produziram-se 11,4 milhões notícias no Brasil e 7 bilhões de postagem no Twitter. Quantas dessas informações eram falsas? Quantas eram verdadeiras? Ninguém sabe.
Porém, não devemos, ao tratar do tema, nem de longe nem de perto ameaçar a liberdade de expressão. Assim, toda a questão deve ser tratada tendo como marco a proteção à liberdade de expressão e o combate a qualquer forma de censura.
Sabemos, senhoras e senhores, que as reflexões sobre o tema, no momento, devem considerar - discordando aqui da ilustre opinião da Drª Angela Pimenta sobre deixar de lado a mudança da legislação - a necessidade, sim, de se mudar a legislação, de se aperfeiçoarem os mecanismos legais para o combate da questão. E esse ponto não quer dizer que possamos admitir a censura. São duas coisas completamente diferentes. Há uma tentativa de se embargar o debate sobre a legislação de fake news dizendo que ela poderia ensejar a censura, o que não é verdade. Combatemos até a morte em defesa da liberdade de expressão.
Nesta semana, por exemplo, foi revelado um esquema de manipulação de dados que envolveu 50 milhões de contas do Facebook nos Estados Unidos. A gravidade do episódio está fazendo com que legisladores americanos, Senadores e Senadoras, discutam a possibilidade da criação de uma agência de proteção digital, não apenas a aprovação de leis mais duras, mas sim a criação de uma agência de proteção digital. Estão sendo abertas investigações muito importantes sobre o tema. Hoje mesmo a Comissão de Comércio do Senado americano abriu investigações sobre o tema.
Então, não há como fugir de um debate mais aprofundado sobre o tema alegando que eventualmente se possa trazer algum embargo ou alguma dificuldade à circulação de informações. Não é o caso. Aliás, a estratégia de lincar uma coisa com a outra é antiga e velha. Não podemos cair nessa armadilha.
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O Brasil tem uma importância estratégica para o Facebook já que nós representamos a segunda fonte de tráfego, perdendo apenas para os americanos e na frente dos ingleses e franceses. Por mês, são dois bilhões de visitas feitas a partir do nosso País. O Brasil responde por 66% do total de usuários ativos por mês no Facebook no Planeta. Estamos falando de 130 milhões de contas ou perfis brasileiros. Aqui, no Congresso Nacional, 507 dos 513 Deputados e 80 dos 81 Senadores, segundo um indicador de alcance social da Bites, têm perfis ativos no Facebook e são seguidos por 66 milhões de outros perfis.
Estamos às portas de uma eleição geral no Brasil que será profundamente afetada pelas novas regras, inclusive de financiamento, e que aumenta a relevância das redes sociais. Já no ano passado, segundo pesquisa tanto da FGV quanto do Ibope sobre a importância das redes sociais na formação da opinião política do eleitor, as redes sociais assumiram a primeira colocação, à frente da imprensa, à frente da imprensa. Isso é um dado muito importante e está disponível, porque a pesquisa foi feita e é pública.
Será a primeira eleição, como prevê a atual legislação, em que os candidatos poderão impulsionar seus conteúdos no Facebook e no Google. E não devemos nos preocupar apenas com a eleição presidencial, mas também com a eleição para as assembleias legislativas, para a Câmara e para o Senado. O risco de que as plataformas digitais no Brasil sejam utilizadas para afetar campanha eleitoral é mais do que evidente. E até agora, salvo melhor juízo, não creio que as nossas respostas institucionais ao problema tenham sido as mais adequadas.
Assim, sintetizando a minha fala e sem, evidentemente, adiantar as conclusões que o Conselho de Comunicação Social adotará sobre o tema, devemos considerar que as redes sociais têm o poder de multiplicar de forma exponencial a difusão de notícias e informações verdadeiras ou não. As plataformas digitais devem ser responsabilizadas pelas notícias que veiculam da mesma forma que a imprensa é responsabilizada por suas reportagens.
(Soa a campainha.)
O SR. MURILLO DE ARAGÃO - Não faz sentido - já concluindo, Presidente - haver punições em um determinado sistema de comunicação e não em outro. É preciso considerar haver um mecanismo para que se identifique quem posta informações nas redes sociais. E, mediante decisão judicial, os sites que propagam notícias falsas devem ser rapidamente retirados do ar.
Informações de conteúdo político devem passar por checagem de veracidade pelas plataformas e pelas iniciativas de checagem da sociedade civil. E deve haver ainda ações importantes de educação sobre fake news. O melhor combate será feito pela educação.
Por fim, as plataformas digitais devem ser convocadas a explicar, perante o Congresso Nacional, o que fazem e sobre o que pensam frente aos acontecimentos verificados recentemente nos Estados Unidos e que envolvem importantes plataformas sociais que têm amplo impacto na vida política e social do nosso País.
Muito obrigado pela atenção.
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Agradeço, Dr. Murillo, pela contribuição à nossa sessão temática.
Como penúltimo inscrito... Antes, farei uma indagação: até o presente momento o Dr. Tonet não conseguiu chegar à sessão e ele estava representando a Abert. Recebo uma comunicação da Secretaria-Geral da Mesa de que o Dr. Marcelo Bechara, não sei se ele se encontra no plenário, estaria representando a Abert. Talvez não esteja presente também, porque eu facultaria também a palavra para a Abert. Está presente.
Então, ao final, caso o senhor queira fazer uso da palavra, também poderei facultar-lhe a palavra. Sente-se e fique à vontade no nosso plenário, por favor.
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Concedo, neste instante, a palavra, portanto, ao Dr. Leandro Colon, Diretor da sucursal da Folha de S.Paulo em Brasília, que terá, naturalmente, o tempo de dez minutos.
O SR. LEANDRO COLON - Boa tarde a todos. Boa tarde, Sr. Presidente.
Queria, antes de tudo, agradecer o convite para participar deste importante debate. Agradeço também a presença dos convidados e dos demais Senadores.
É uma honra para mim participar de um debate aqui no Senado, porque eu falo não só em nome da Folha, mas também como repórter. Passei dez anos trabalhando aqui nesta Casa, ali na tribuna de imprensa, cobrindo o dia a dia do Senado Federal. E eu falo aqui em nome do jornal, mas também como jornalista.
Acho que nunca o jornalismo profissional foi tão necessário como hoje em dia, em tempos de fake news. E eu falo isso porque acho que é importante, nesta discussão. E, recentemente - não lembro o nome -, um Senador ou Deputado tentou tratar o noticiário da imprensa profissional - uma denúncia, uma acusação - como fake news. São coisas completamente distintas, Senador. Eu acho que a gente precisa pontuar isso.
Um jornal, sabe-se o nome do diretor do jornal, o repórter que assinou a reportagem, o seu editor e onde fica a empresa. Há mecanismos legais para se pedir reparação, para processar por danos morais, por calúnia, por difamação. As instituições funcionam para que se busque reparação em relação a possíveis injustiças cometidas pela mídia profissional. Fake news, não! Fake news, na maioria das vezes, a gente não sabe a origem, a gente não sabe de onde veio, nem o objetivo.
Eu vou citar, como exemplo, uma reportagem da Folha de S.Paulo, do dia 19 de fevereiro de 2017, do jornalista Fábio Victor, chamada: "Como funciona a engrenagem das notícias falsas no Brasil". É uma das melhores reportagens que a imprensa no Brasil já publicou sobre fake news.
A Folha foi a Poços de Caldas investigar o site Pensa Brasil, que é - pelo menos até o ano passado - um dos maiores disseminadores de fake news no País. Funcionava numa salinha de 10m2, lá em Poços de Caldas, com uma pessoa trabalhando, buscando disseminar fake news em busca de anúncios e receita. Ou seja, são coisas completamente diferentes.
Uma matéria da Folha, do dia 8 de fevereiro, mostrou que, no último trimestre do ano passado - de outubro até fevereiro deste ano -, as páginas brasileiras de notícias falsas e sensacionalistas tiveram mais engajamento do que o jornalismo profissional. Uma análise que o jornal fez, em 21 páginas que postam fake news e 51 páginas de jornalismo profissional, mostrou que a taxa média de interações no primeiro grupo - de fake news - aumentou 61% entre outubro do ano passado e janeiro deste ano; já o segundo grupo - de jornalismo profissional - teve uma queda de 17% no período.
Como muitos sabem, em fevereiro, a Folha anunciou que deixaria de publicar seu conteúdo no Facebook. Isso se deu depois que o algoritmo do Facebook passou a privilegiar conteúdos de interação pessoal em detrimento dos distribuídos por empresas, como do jornalismo profissional. Na opinião do jornal, isso reforça a tendência de o usuário consumir cada vez mais conteúdo com o qual tenha afinidade em detrimento dos distribuídos pelas empresas, favorecendo a criação de bolhas de opiniões e convicções e a propagação de fake news.
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A Folha já escreveu, e eu reforço aqui, que os gigantes da tecnologia, o que o Promotor Ceroy disse há pouco, também se transformaram em gigantes de mídia. Eles devem, sim, assumir suas responsabilidades de propagação desse material.
As redes sociais surgiram como uma promessa de ambiente de convívio, intercâmbio de ideias. Elas tinham esse objetivo, pelo menos lá atrás, mas, por trás delas, as empresas se tornaram grandes poderes emergentes da nova era.
Por isso, eu gostaria de reforçar isso. O Senado vem discutindo, o Conselho de Comunicação do Senado vem discutindo o tema fake news. É importante diferenciar jornalismo profissional de fake news. Os jornais erram? Erram. A Folha de S.Paulo tem uma seção Erramos. Eu, como repórter, já errei, e temos que nos retratar, mas não podemos transformar isso em censura. Não podemos transformar isso em censura prévia. São coisas completamente distintas.
Temos, sim, que buscar a propagação: quem está propagando fake news? Quem são os órgãos, os veículos que disseminam fake news? E criar mecanismos de defesa, que as instituições já criam, para você se defender, pela Lei de Imprensa, cartas ao leitor, procurar seus direitos perante a Justiça e as instituições. Acho que esta Casa tem o dever de diferenciar isso neste momento.
Eu termino a minha fala, Presidente, citando o Diretor de Redação da Folha, Otávio Frias Filho. A decisão da Folha de deixar o Facebook colocou o jornal, principal jornal do País, mais uma vez em posição equivalente à da aldeia do Asterix dos quadrinhos: um foco de resistência e vigilância crítica aos poderes constituídos.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Muito obrigado, Dr. Frederico.
Eu havia, há poucos instantes...
Leandro, perdão. Perdão, Leandro. Perdão.
Eu havia há poucos instantes anunciado que o Dr. Marcelo Bechara poderia falar em nome da Abert, mas o Dr. Paulo Tonet já está presente. Convido-o para compor a Mesa ao nosso lado.
Concedo a palavra ao Dr. Daniel Nascimento, que é Consultor de Segurança Digital, e, na sequência, ouviremos então a palavra da Abert, com a manifestação do Dr. Paulo Tonet.
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS) - Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Senador.
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS. Sem revisão do orador.) - Só aproveitando para registrar que está presente aqui no plenário, para nossa honra também, o jornalista Marcelo Rech, Presidente da ANJ e Vice-Presidente da RBS.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Seja muito bem-vindo. O Senado o acolhe de forma fraternal.
Dr. Daniel, tem V. Sª a palavra.
O SR. DANIEL NASCIMENTO - Exmo Sr. Vice-Presidente do Senado e Presidente desta sessão, Senador Cássio Cunha Lima; Exmo Sr. Senador Telmário Mota, agradeço o convite por estar aqui compondo esta Mesa; senhoras e senhores convidados, Srªs e Srs. Senadores, eu venho trabalhando, ao longo dos últimos 15 anos, muito próximo da segurança digital. Já vi de perto como a tecnologia pode ser usada tanto para o bem quanto para o mal, pois eu já estive do outro lado. Não se pode menosprezar a realidade em que vivemos, a realidade em que a internet, as redes sociais e a falta de cuidado das pessoas, quando compartilham conteúdo nessas plataformas, podem representar um grande estrago no exercício da verdade e da democracia.
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Hoje, fala-se muito em criar comitês, criar listas de veículos confiáveis em que grupos de jornalistas, ou grupos de mídia, ou profissionais de terno e gravata vão dizer o que é ou não verdade. E isso é um grande atentado à democracia e à livre expressão. Denúncia veiculada pela mídia tradicional pode, ou não, ser válida, assim como denúncias da chamada nova mídia.
Não podemos nos esquecer do nosso passado, em que veículos ditos isentos apoiaram golpes e incriminaram donos de escola dizendo que eles praticavam pedofilia com os alunos - lembram-se do caso da Escola Base? -, e depois tudo se provou falso. Isso já era o que a gente chama hoje de fake news disseminadas por grandes veículos de comunicação. Aliás, não faltam exemplos de notícias inventadas por meios de comunicação que hoje se dizem muito preocupados com a circulação de notícias falsas.
Muitos colocam a imprensa tradicional como "equilibrada" e "confiável" como o verdadeiro filtro para onde as pessoas têm que ir para saber se algo é verdade ou não. Os senhores aqui presentes, muitos vítimas de notícias sensacionalistas e sem fundamento, sabem que isso não é verdade. Não podemos permitir que, sob o discurso de combater fake news, se interditem as vozes que não fazem parte da grande imprensa tradicional, que se criminalize a liberdade de expressão, especialmente no mundo digital.
O ser humano é falho. Todos nós erramos em alguns momentos das nossas vidas. Por isso mesmo, por que não contar com a ajuda da tecnologia para nos trazer respostas do que é ou não uma notícia falsa? E mais: por que não usar a tecnologia para rastrear as pessoas que iniciarem a disseminação dessas informações inverídicas e entregar esses dados nas mãos das autoridades competentes?
Hoje, tudo isso é possível, sim. O problema é o processo, ainda muito demorado e burocrático. Os senhores contam com os maiores hackers do mundo no Brasil.
Um dos pontos que fazem isso ficar complicado é que atualmente dependemos de grandes empresas internacionais, que têm lá suas ferramentas de controle desse tipo de conteúdo, mas, verdade seja dita, agem de acordo com seus interesses. Não devemos ficar nas mãos de Google, Facebook, Twitter, porque nossa agenda é outra. Eles podem, sim, eliminar postagens inverídicas baseadas em denúncia, mas só apagam aquelas que são mentiras muito óbvias, de que qualquer cidadão deveria desconfiar. Todo o resto continua no ar. Enfim, assim é a democracia e a livre expressão.
Mas por que não usar a inteligência artificial e a análise de dados para detectar todas essas ocorrências e agir instantaneamente? Dá pra fazer isso tendo como base um banco de informações alimentado por toda a sociedade, envolvendo agentes da mídia, governo, representantes de sindicatos dos jornalistas, representantes das plataformas tecnológicas e redes sociais, entidades que já promovem a checagem de fatos na internet e todo o ecossistema. É fundamental a união de todos nesse assunto.
A eleição do próximo semestre vai ser um campo minado na internet. Já existem pessoas vendendo programas capazes de espalhar fake news e controlar parte da opinião pública tendo candidatos como alvo. É só pagar uma assinatura para esses criminosos e esperar o estrago ser feito. Mas não podemos deixar que eles ganhem espaço.
Hoje, já se fala muito a respeito da necessidade de o leitor checar fontes, de se certificar de que a informação é confiável antes de compartilhar um link. O problema é que a maioria não faz isso por preguiça, ou porque quer acreditar naquilo que leu, ou porque nem sabe como buscar a checagem desses fatos, como é a maioria dos casos.
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Às vezes, a resposta está num site oficial, num relatório, num documento pouco amigável para a leitura. E se houvesse um sistema que entregasse na mão do cidadão a checagem dos fatos com apenas um clique e de uma forma intuitiva? É a solução que eu considero mais eficaz para o combate às fake news.
Imaginem um sistema de robôs capaz de checar uma determinada hashtag! Exemplo: #fakenewsautentica. Basta a pessoa incluir essa hashtag no texto da postagem e o robô checa o banco de dados com as informações apuradas e devolve na hora, naquela mesma discussão, trazendo a informação correta antes que aquilo se propague cada vez mais. Se a resposta para aquele caso ainda não estiver no nosso banco de dados, uma mensagem padrão é postada e algum de nossos colaboradores checa a informação, com a ajuda de veículos parceiros ou de jornalistas parceiros. Assim que a resposta for apurada, esse conteúdo é acrescentado. Isso diminui o estrago de uma postagem maliciosa, porque a checagem das informações vai ter seu início o mais perto possível do momento zero. A solução já vem rapidamente. Não só essa hashtag pode ser monitorada, mas qualquer palavra-chave envolvendo candidatos, escândalos, histórias mal contadas e por aí vai. Esse banco de dados vai sendo alimentado com o tempo, ficando cada vez maior, e a intenção é que as pessoas conheçam, utilizem cada vez mais essa ferramenta.
Para que isso aconteça, precisamos ter empresas como Google, Facebook, Twitter e outras aliadas nesse combate, mas também precisamos entender que não é total responsabilidade deles a checagem das fake news e retirada desse conteúdo do ar, basicamente porque o negócio deles é outro. Já abordei esse tema no início da minha fala.
Tem ainda outro ganho com esse sistema. Como as postagens maliciosas serão catalogadas nessa plataforma, será mais fácil identificar a fonte dessas postagens e quem foi o primeiro a divulgar tal informação. Esse relatório pode ser entregue às autoridades competentes. A partir de então, esses órgãos usarão suas ferramentas para investigar o caso e ir atrás da origem da notícia falsa, seja ela criada por um usuário qualquer da internet ou, por que não, por uma grande redação da imprensa tradicional.
Destaco mais uma vez a importância dessa plataforma ser aberta, colaborativa, envolvendo todos do ecossistema. Repito: é fundamental a união de todos nesse sentido.
Sabemos que essa é uma eterna corrida de gato e rato, mas, quanto mais rápido agirmos, menos estrago vai ser feito. Os Estados Unidos, com todo o aparato tecnológico que têm, ainda não conseguiram resolver essa questão, e estão tentando faz tempo! Mas, se nós conseguimos ser pioneiros no tema do Marco Civil, graças à nossa capacidade de diálogo e de encontrar soluções criativas para os problemas, acredito que temos, sim, plena capacidade de sermos pioneiros também no combate às fake news, com uma solução bastante simples, criativa e eficaz, da nossa forma brasileira.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Muito obrigado, Dr. Daniel.
Encerrando esta primeira etapa da nossa sessão, eu concedo a palavra ao Dr. Paulo Tonet Camargo, Presidente da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert).
Dez minutos, Paulo.
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O SR. PAULO TONET CAMARGO - Sr. Presidente da Mesa, Senador Cássio Cunha Lima, Vice-Presidente do Senado Federal; meu caro Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho, do Tribunal Superior Eleitoral, meu caro amigo; Presidente do Conselho de Comunicação Social, meu amigo Murillo de Aragão; Promotor de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios e Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Digital, Dr. Frederico Ceroy; Presidente do Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo, Srª Angela Pimenta; diretor da sucursal da Folha de S.Paulo em Brasília, Leandro Colon; Secretário-Geral da Presidência do Tribunal Superior Eleitoral, Carlos Eduardo Frazão do Amaral; Sr. consultor de segurança digital, Daniel Nascimento...
E peço licença, Presidente, para saudar os demais Senadores que estão nesta Casa na pessoa de um querido amigo conterrâneo, o Senador Lasier Martins, que aqui se encontra.
Quero saudar também o Dr. Marcelo Rech, Presidente da Associação Nacional de Jornais, que nos prestigia.
A vantagem do orador que fala por último é poder fazer uma síntese do que os outros disseram. Eu falo por último, e não tive a vantagem, porque, por razões alheias à minha vontade, me atrasei e não pude ouvir a explanação dos meus companheiros de Mesa, exceto de apenas dois. Mas acho que, em relação ao tema, que já foi suficientemente debatido aqui, eu diria que nós temos alguns pontos para ressaltar.
O primeiro deles é o de que o ambiente digital em que estão as redes sociais e o uso das redes sociais por parte da população brasileira e do cidadão são algo inexorável. Não trabalhemos com o pensamento de que podemos retroceder em relação à tecnologia. Ela está aí, está posta, tem vantagens e, lógico, tem desvantagens. Mas, o que acho que nós não podemos negar é a inexorabilidade da existência das redes sociais.
E por elas - e o tema que nos traz aqui hoje - trafegam as chamadas fake news. E há um aspecto perverso da fake news, porque a notícia deve retratar o fato, mas, quando determinado fato, ainda que não verdadeiro, corrobora com o entendimento de determinada pessoa, aquela passa a ser a sua verdade. E, sendo ou não notícia verdadeira ou falsa, essa pessoa propaga. Ora, se eu tenho uma crença e, de repente, recebo uma notícia que corrobora a minha crença, aquilo, embora seja falso, é algo agradável para mim. O que eu faço? Eu distribuo para as pessoas que conheço.
Então, há esse lado perverso da fake news e há esse lado perverso das redes sociais, o de que elas acabam transformando a pregação nos convertidos, os clusters. Então, quem tem um determinado tipo de ideia conversa com quem tem essa ideia; quem tem outro tipo de ideia conversa com quem tem outro tipo de ideia. E se perde uma das mais importantes coisas da democracia, que é a capacidade de dialogar, que é a capacidade de entender e de ouvir a opinião contrária.
Mas, enfim, essa é uma realidade que está acontecendo. E aí, dentro dessa realidade, eu não vejo outra forma de nós nos defendermos da notícia falsa, senão com duas frentes. Uma delas é o que chamo de jornalismo na veia.
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Não há forma de certificação melhor para a notícia do que o jornalismo. Por quê? Em primeiro lugar, porque o jornalismo é profissional e aqui eu faço uma profissão de fé aos jornalistas, aos profissionais que ocupam e que dedicam a sua vida a esta atividade de apurar a verdade; e, segundo, porque este jornalista tem cara, endereço, e-mail publicado e pode ser responsabilizado se errar. Há pouco nós dizíamos aqui: nós erramos? Erramos. Os veículos de comunicação erram? Erram, mas assumem a responsabilidade pelos seus erros. Aquele que se sente lesado com uma determinada notícia ou com uma calúnia, ou com uma injúria, ou com uma difamação sabe a porta em que bater para processar criminal e civilmente os responsáveis por esses atos.
Então, eu não quero aqui entrar na discussão de retirar ou não retirar conteúdo que esteja nas redes. Disso já se ocupou o Marco Civil da Internet e lá está bem claro como essas coisas devem se comportar. Não se trata disso, porque, se nós formos discutir como ter mecanismo de retirar determinada informação, determinada notícia, seja ela falsa ou não, nós vamos descambar para uma discussão do ponto de vista de censura ou de liberdade de imprensa que não vai enriquecer o nosso debate, primeiro, e que não vai solucionar o problema que nos traz aqui, que é como conviver, como resolver essas fake news que andam aí sendo disseminadas pela rede.
Então, deixando de lado a questão do conteúdo, de retirar ou não retirar, ou da obrigação de retirar ou não retirar o conteúdo, eu acho que a solução possível, a solução que está ao nosso alcance e que, de certa forma, já foi experimentada em outros lugares - eu cito o exemplo da Alemanha - se resume a uma coisa: responsabilidade. Não existe possibilidade, num Estado democrático de direito, numa economia de mercado, de alguém que faz da disseminação de notícias, do trânsito de notícias e de expressões seu negócio - e um milionário negócio - e que não queira por esse negócio assumir responsabilidades. Então, eu acho que a pedra de toque para a solução do problema é uma só: é nós trabalharmos com responsabilidade. Se os nossos veículos divulgam uma notícia falsa, temos responsabilidade criminal e civil. Então, quem distribui notícias, quem é o disseminador das notícias tem que assumir responsabilidades.
Eu vinha para cá e ouvi a notícia de que, se não me engano, o Facebook está fazendo investimento de US$300 milhões para combater essa questão da fake news. Eu faço um repto aqui: peguem esses US$300 milhões e contratem jornalistas para verificar as notícias e para certificar a notícia que é verdadeira ou falsa, para apurar essas notícias, para que tenham responsabilidade naquilo que estão fazendo a disseminação. Não me parece que haja outra maneira senão o caminho da responsabilidade, e a responsabilidade civil, neste caso - porque a responsabilidade penal precisaria ser apurada -, pelas notícias que são disseminadas. Quem é veículo... É muito engraçado, porque algumas dessas plataformas dizem: "Não, nós não somos veículos, somos plataformas de tecnologia", mas só no Brasil plataforma de tecnologia comercializa espaço publicitário como os veículos de comunicação normais o fazem.
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Então, quem leva mensagem, quem leva notícia, quem leva entretenimento é veículo de comunicação, sim. E, sendo veículo de comunicação, tem que assumir responsabilidades.
Esta, Sr. Presidente, é a posição da Abert.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Agradeço a colaboração da Abert, através da manifestação do Dr. Paulo Tonet.
Indago ao Senador Lasier se deseja fazer uso da palavra, porque nós temos algumas perguntas que foram enviadas à Mesa pelo canal de interatividade do Senado Federal.
Tem V. Exª a palavra.
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - RS. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, apenas me congratular com os pronunciamentos já ouvidos e realçar aquilo que está sendo uma constatação muito valiosa para nós: esta é a hora de se reafirmar a imprensa tradicional, porque, como disse agora o nosso último orador, meu prezado conterrâneo, esta é a hora em que devemos acreditar, pelas alternativas que tem aquele que se julgar injuriado, enquanto que na fake news nós ficamos aí atarantados, sem saber, muitas vezes, de onde procede.
Eu me congratulo com a iniciativa do Senador Telmário, que propôs esta sessão, e acho que estamos chegando a um bom termo no momento em que este tema está em alta.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Deixarei registrada a participação e comentários com perguntas do Portal da Cidadania, começando pela Srª Juliana Santos Queiroz, do Distrito Federal, que indaga se haverá a criação de leis que penalizarão a difusão da fake news. "Há como punir os propagadores das notícias falsas e aquele que a criou? Como punir figuras públicas que são formadoras de opinião e se valem da difusão de fake news para defenderem algum posicionamento?".
O Pedro Silva, de Minas Gerais, pergunta: "O WhatsApp é o canal mais usado para difundir notícias falsas. Existe a intenção de obrigar o aplicativo a rastrear as mensagens para identificar os autores e divulgadores de notícias falsas?". Igualmente, o mesmo Pedro Silva, de Minas, pergunta: "As autoridades que compartilharem notícias falsas sobre a Vereadora Marielle podem ser responsabilizadas penal e civilmente?".
Gustavo Camargo de Oliveira, do Rio de Janeiro, indaga: "Como estabelecer modelos investigativos rápidos e efetivos contra práticas nocivas e criminosas de maneira ágil, barata, sem ferir liberdades?".
Adriano Silva, do Rio de Janeiro, tem duas perguntas. A primeira delas: "Calúnia e difamação são crimes. O Governo deveria reforçar isso aos desavisados e punir esse tipo de conduta sem privilegiar grupos ou ideias favoráveis ao Governo. Hoje, tais crimes são utilizados como plataforma de Governo. Há muito tempo não vejo propaganda eleitoral limpa". Ainda, do Adriano Silva, do Rio de Janeiro: "O WhatsApp pertence ao Facebook e é uma empresa dotada de polêmica sobre segurança e manipulação de informação, sendo uma das mais utilizadas. Que tipo de cobrança ou fiscalização o Brasil possui para combater a disseminação dessa manipulação?".
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O objetivo desta sessão temática é exatamente discutir tudo que está formulado nessas indagações. Acredito que, pela novidade do assunto, no que diz respeito aos acontecimentos das eleições últimas, sobretudo nos Estados Unidos, e com a proximidade do pleito no Brasil, a presença de S. Exª o Ministro Tarcisio, de S. Exª o Dr. Frazão, Secretário-Geral da Presidência do TSE, é extremamente válida nesta sessão, neste debate.
É por isso que novamente agradecemos a contribuição não apenas dessas duas autoridades, mas também de todos que dispuseram gentilmente do seu tempo para suscitar esta discussão. São vários os caminhos, as posições contraditórias em relação àquilo que se defende. E a postura do Senado será aprofundar as discussões. Acredito que temos que ampliar as discussões para que tenhamos a capacidade, se for o caso, de legislar de forma a preservar como um bem intocável a liberdade de expressão - este é um bem intocável em qualquer democracia - e, ao mesmo tempo, buscar, com a utilização das tecnologias, como foi sugerido aqui por vários palestrantes, os mecanismos para coibir, para inibir a propagação, a difusão dessas notícias falsas nas suas várias categorias, como foi também apresentado ao longo deste debate.
Então, vamos continuar, a partir da iniciativa do Senador Telmário, aprofundando esta discussão. Há uma característica muito viva no Senado Federal, no Congresso, de debater os temas de interesse nacional. A nossa intenção é sempre buscar caminhos que possam encontrar soluções conciliatórias, com a participação ativa da sociedade, dos atores envolvidos em determinados assuntos. Esta é uma característica de um Parlamento democrático, esta é uma tradição desta Casa, e assim nos comportaremos daqui em diante. E a realização desta sessão temática é o primeiro grande exemplo da nossa disposição de ouvir as vozes diversas, de receber as contribuições várias para o tema.
Antes de encerrar a sessão, concedo, mais uma vez, a palavra ao autor da propositura, o Senador Telmário Mota.
O SR. TELMÁRIO MOTA (Bloco Moderador/PTB - RR. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, muito obrigado.
Eu quero de antemão agradecer a presença de todos os nossos convidados. Eu acho que aqui naturalmente cada um trouxe a sua contribuição. E V. Exª tem toda a razão, ou seja, ao serem todas elas condensadas, podemos, a partir daqui, iniciar um caminho para que realmente possamos coibir os exageros que hoje existem nas fake news.
Eu queria, Sr. Presidente, antes de encerrar, dizer que ouvi atentamente a fala de cada um e parabenizo a todos eles. Mas houve três falas que me chamaram muito a atenção aqui. A primeira foi a do Ministro, a quem eu quero fazer uma pergunta, e também a fala do Procurador Frederico, a quem também quero me dirigir. Eu gostei também da fala do Paulo, que falou que a punição individual é importante até no sentido de não irmos só pela plataforma.
Então, eu queria aproveitar para fazer uma sugestão. A gente vê que essas delegacias especiais, esses juízos especiais têm uma celeridade nas apurações. Assim, Presidente, nesse processo político em que a gente se encontra, talvez a gente não tenha mecanismos tão rápidos e fortes, dentro da legalidade, que possam dar uma resposta para a sociedade sobre o que realmente a gente precisa. Então, eu queria fazer uma sugestão para o Ministro e também para o Frederico, porque um representa a Promotoria e o outro representa o Judiciário, ou seja, se o Supremo criasse esses juízos especiais para isso, com delegacias especiais, em 72 horas, nós teríamos já a punição ou a localização do responsável. É coisa rápida.
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Por exemplo, se eu me sinto atacado em uma rede social, faço um print, vou a um cartório, registro uma ata, vou à delegacia especial, registro. No dia seguinte, está na mão do juiz. No outro dia, há acareação. No terceiro dia, em 72 horas, nós estamos com a punição, que pode ser: o cara que é o autor, que criou, tem uma punição mais severa e também depois as punições criminais; e há também a punição daquele que é reprodutor, que reproduz aquilo que recebeu. De ordem que, quando dá no bolso - eu sempre digo -, dói. Então, quando o cara sentir que a Justiça está atenta, que ele está sendo punido, que ele realmente está sendo chamado à ordem para que possa ser responsável por aquele ato, assim como a notícia falsa corre rápido, a verdadeira também vai correr: "Olha, a Justiça está punindo quem fez isso." Então, num tempo muito rápido, a gente vai tomar uma medida que, é claro, acho que é paliativa, mas que pode ser fundamental para o processo eleitoral.
Eu queria fazer essa colocação e, mais uma vez, agradecer a todos.
O SR. TARCISIO VIEIRA DE CARVALHO NETO - Eminente Presidente, agradeço a lúcida indagação do Senador Telmário. De fato, já há consenso sobre os efeitos nocivos das fake news. Não há consenso ainda, embora haja uma convergência crescente de opiniões no sentido da melhor metodologia de se atacar esse problema. Além da legislação mencionada, essa que veio a lume na última reforma política, que já prevê, inclusive, como crime a disseminação ilegal desses conteúdos no atacado, assim, pelo impulsionamento, eu verifiquei, eminente Senador, que já há, em tramitação no Congresso, que é o lócus adequado para esse debate mais verticalizado, para que se alcance em consensos soberanos, que é o local adequado, projetos de lei os mais variados.
Eu tenho em mãos aqui um projeto de lei do Sr. Deputado Luiz Carlos Hauly, atribuindo a pena de detenção de dois a oito meses e multa por divulgar e compartilhar informação falsa ou prejudicialmente incompleta; do Carlos Sampaio, também na mesma linha, na Câmara dos Deputados; do Deputado Pompeo de Mattos, acrescentando dispositivo ao Código Penal para tipificar esse crime de divulgação de informação falsa. Inclusive, no nomen iuris do projeto, há referência a essa terminologia fake news, embora ela não seja a mais adequada dentro de um rigorismo acadêmico maior. Inclusive, esse projeto equipara a divulgação falsa em matéria eleitoral a também desvirtuamento da verdade em relação à saúde, segurança, economia, em pé de igualdade, porque são elementos caros à boa ordem democrática. O Francisco Floriano também institui, no âmbito da Câmara, em projeto de lei, fake news como crime, dando outras providências, como reclusão de dois a seis anos. Há um projeto de lei do Senado Jovem também nessa linha de que qualquer cidadão... É interessante, inclusive, realçar essa legitimidade ativa, a mais ampla possível, à moda do que ocorre hoje, por exemplo, relativamente às ações populares. Então, por esse projeto de lei, qualquer cidadão seria parte legítima para propor ação judicial, questionando a divulgação de conteúdos falsos.
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Então, parece-me que, muito ao contrário do que possa parecer a alguns olhos desavisados da comunidade não tão informada, o Congresso Nacional tem envidado, sim, todos os esforços no sentido de abordar esse problema da melhor maneira possível. E eu falo com conhecimento de causa, porque recentemente, em congresso internacional, recebi e trago ao Congresso Nacional um elogio da comunidade ibero-americana pelo avanço da nossa legislação, que se não é ideal é tendente a ser ideal dentro das nossas possibilidades.
O SR. FREDERICO MEINBERG CEROY - Senador Telmário Mota, obrigado pela pergunta.
Antes de responder, eu queria só agradecer a presença do Senador Lasier. Em 2016, salvo engano, eu e o Consultor Legislativo Francisco Schertel publicamos um artigo na revista da Consultoria Legislativa e, ao final, fizemos uma proposta de legislação. O Senador Lasier pegou essa proposta de legislação e propôs um projeto de lei do Senado. O meu agradecimento principal a ele é devido ao crédito. Toda vez que o Senador Lasier foi inquirido sobre o projeto de lei, ele dizia: "Esse projeto de lei foi inspirado no artigo que foi publicado." Agradeço a presença. Eu nunca tive a oportunidade de agradecer, Senador, e agradeço agora nesta oportunidade.
Senador Telmário Mota, o Ministério Público está aberto para todo tipo de discussão. Estamos abertos para discutir essas propostas. Agora, o que nós acreditamos muito é em atacar o problema não só de fake news, mas do conteúdo ilegal, que é como a legislação alemã faz: você atacar de uma maneira macro. E aí nós estamos falando de tudo. É fake news quando ela viola a legislação brasileira. Estamos falando do tráfico de armas, tráfico de drogas, pedofilia, violência contra a mulher, discurso de ódio. Então, particularmente, eu acredito muito nesse ataque macro às coisas. Mas obviamente qualquer proposta que os senhores tiverem aqui nós estamos totalmente abertos a discutir e, se for o caso, levar à frente.
Senador Cássio, só para terminar aqui, falando dessa proposta macro, todos nós acompanhamos, desde sexta-feira, esse grande problema dos 50 milhões de usuários americanos que, de uma forma ou de outra, ficaram vulneráveis pela empresa Cambridge Analytica. Eu quero só informar que nós, no Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, por meio da Comissão de Proteção de Dados Pessoais, instauramos um inquérito civil público exatamente para investigar isso, para ver se há algum tipo de repercussão no Brasil, porque a empresa Cambridge está operando no Brasil desde o final do ano passado.
Então, terminando, seria isso.
Obrigado a todos.
O SR. PRESIDENTE (Cássio Cunha Lima. Bloco Social Democrata/PSDB - PB) - Ao final dessa sessão, quero mais uma vez parabenizar o Senador Telmário Mota pela iniciativa, quero renovar de forma reiterada o agradecimento pelo acolhimento do convite a todos que compuseram a Mesa, de forma muito especial ao Ministro Tarcisio, que dispôs do seu tempo, sempre muito atribulado, para trazer essa contribuição.
O debate prossegue, o debate continua. O Senado e o Congresso Nacional estarão atentos ao tema, e a contribuição que foi dada aqui, durante esta sessão temática, será de grande valia para que nós possamos aprofundar as discussões e chegar a um ponto de consenso, de entendimento, como tem acontecido nesta Casa em vários outros temas.
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Então, agradeço, mais uma vez, a presença prestigiosa de todos.
Está encerrada a presente sessão.
(Levanta-se a sessão às 15 horas e 20 minutos.)