4ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA
55ª LEGISLATURA
Em 19 de abril de 2018
(quinta-feira)
Às 9 horas
51ª SESSÃO
(Sessão Especial)

Oradores
Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Declaro aberta a sessão.
Sob a proteção de Deus, iniciamos nossos trabalhos.
A presente sessão especial destina-se a homenagear os povos indígenas, em razão do Dia do Índio, nos termos do Requerimento nº 11, de 2018, do Senador Telmário Mota e outros Senadores.
Para compor a Mesa, eu convido a Srª Maira dos Santos Bentes Tapuia, graduada na 11ª turma de Medicina da Universidade Federal de Tocantins, uma honra para os povos indígenas. (Palmas.)
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Convidamos também Marcos Terena, Coordenador dos Jogos Mundiais dos Povos Indígenas e membro da Comissão Justiça e Paz, da CNBB. (Palmas.)
Convidamos Carlos Felipe Alencastro Fernandes de Carvalho, Diretor-Geral do Departamento Penitenciário Nacional. (Palmas.)
Convidamos o representante do Colegiado da 6ª Câmara do Ministério Público Federal... (Pausa.)
Se estiver presente, peço que se encaminhe, porque não foi fornecido o nome. (Pausa.)
Convidamos Álvaro Fernandes Sampaio Tukano, Diretor do Memorial dos Povos Indígenas de Brasília, líder indígena de São Gabriel da Cachoeira, do Estado do Amazonas. (Palmas.)
Convidamos Tuire Kayapó, líder de Redenção, no Estado do Pará.
Naturalmente, sofre muito o povo ali do Pará. Meu Deus do céu! (Palmas.)
Convidamos a Srtª Maria Angelita da Silva, da Universidade Estadual de Maringá, no Paraná. (Palmas.) (Pausa.)
Para compor também a Mesa, chamamos Paulinho Paiakã. Por favor. (Palmas.)
Convidamos também o Subprocurador-Geral da República e membro da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão, Dr. Rogério de Paiva Navarro. (Palmas.)
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Convido a todos para, em posição de respeito, acompanharmos o Hino Nacional em guajajara, que será executado pelos cantores Genilson e Fraciomar.
(Procede-se à execução do Hino Nacional em guajajara.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Eu quero agradecer a todos que aqui compõem a Mesa, a todos que estão no plenário.
Hoje, sem nenhuma dúvida, é um dia extremamente importante para os povos indígenas, um dia simbólico. E, na verdade, o nosso objetivo em fazer esta sessão solene especial - hoje é o Dia do Índio - é, sobretudo, para fazermos uma grande reflexão sobre a real situação dos povos indígenas no Brasil.
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Temos aqui um dado: a data de 19 de abril foi escolhida como Dia do Índio no Primeiro Congresso Indigenista Interamericano, realizada na cidade de Patzcuaro, no México, em 1940. Foi nesse dia que os representantes dos povos indígenas começaram a participar efetivamente do encontro.
De acordo com a recomendação aprovada na época, a data é dedicada aos estudos das questões indígenas nas instituições de ensino. No Brasil, o Dia do Índio foi instituído por meio de um decreto-lei de Getúlio Vargas, em 1943.
Olha que obra do destino, não é? É nós estamos hoje no Partido de Getúlio Vargas, no PTB.
O encontro no México foi de 14 a 24 de abril, com representantes de quase todos os países da América. Apenas Paraguai e Haiti não enviaram delegação. O Brasil foi representado por Roquette Pinto, membro do Conselho Nacional do Serviço de Proteção ao Índio.
Apesar de o Congresso ser voltado a temas indígenas, somente quatro países contavam oficialmente com índios em suas delegações: Estados Unidos, México, Panamá e Chile. Daí o receio inicial que tinham de participar da assembleia.
Segundo pesquisadores, antes de descobrirmos o Brasil havia cerca de 8 milhões de habitantes na Região Amazônica. Oito milhões de habitantes na Região Amazônica! Atualmente, temos cerca de 900 mil pessoas indígenas declaradas, em um total de 305 etnias, de acordo com o IBGE.
As línguas indígenas faladas chegam a 274, também de acordo com o instituto, e as 480 terras indígenas reconhecidas pelo Estado ocupam mais de 1 milhão de quilômetros quadrados, 12,5% do Território nacional, sendo que 98% dessa área está na Amazônia Legal.
Aí, os ruralistas entendem que os povos indígenas não podem ter área demarcada. Nós temos 12%, quando 100% eram dos povos indígenas. Imaginem. Quer dizer, de 100%... Oito milhões, que são dos povos indígenas, hoje reduzidos a menos de 1 milhão, têm 12%, e eles acham que têm terra demais.
Então, o grande objetivo nosso, hoje, desta reunião, e nós vamos aqui dar dez minutos para cada membro da Mesa se pronunciar, podendo prorrogar esse tempo um pouquinho, sem nenhuma dúvida, é que nós precisamos trabalhar, hoje, num momento de muita reflexão. Muita reflexão.
Uma das coisas que a gente tem que observar... Por exemplo, a figura do índio representa a essência do povo brasileiro. O índio tem a cara do povo brasileiro. Muitos anos se passaram, mas alguns hábitos não foram modificados. A simplicidade é ponto número um nos povos indígenas. Vimos isso pelos nossos cantores. Eu estava olhando para eles e me lembrando disso. A simplicidade no vestir, a simplicidade na alimentação, a simplicidade no transporte, e a total desambição.
Os povos indígenas - e eu digo isso com muita propriedade: nasci e vivi dentro de uma comunidade indígena - são a sociedade mais social do mundo. Do mundo. Não há igual. Têm a disciplina, em alguns lugares caciques, em outros, tuxauas... Têm o segundo tuxaua, têm o capataz, têm os diretores, digamos assim, os chefes das comunidades... No entanto, são todos por um e um por todos. Esse é o sentimento básico dentro de uma comunidade indígena. Se um tem um transporte, esse transporte acaba servindo a todos; se um tem alimentação e outro não tem, ela é compartilhada - ela é compartilhada. É um sentimento de cooperação, é um sentimento de amor, é um total desprendimento de ambição, que só quem nasceu, quem viveu e quem vive dentro das comunidades indígenas é capaz de compreender.
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Eu lamento profundamente que as pessoas confundam simplicidade, humildade com incapacidade. O índio pode não ter até uma faculdade, como a nossa futura doutora vai ter e tantos outros vão ter, mas ele tem uma inteligência ímpar, dele, da vida, da natureza, da compreensão.
Hoje, com a tecnologia avançada dentro das comunidades, diariamente, converso com vários deles daqui e vejo o sentimento do jovem, dos líderes, dos professores, dos agentes de saúde. E a gente naturalmente forma todo o juízo.
Uma coisa que não consigo entender, meu líder e público presente, é que, apesar de a gente manter a simplicidade, de a gente manter uma cultura básica, a gente está permitindo ainda... Olhem só: quase 500 anos se passaram. Os invasores europeus, ao chegarem aqui, tentaram escravizar os povos indígenas e não conseguiram. Naquela época, eles não aceitaram ser escravizados, mas hoje, com o tempo, talvez de forma impercebível, os povos indígenas estão sendo escravizados pelo poder econômico. Hoje há uma divisão, estão brigando entre si.
Eu, quando cheguei aqui, vim no propósito de que o índio está preparado para conduzir o seu destino. E há quadro altamente suficiente e preparado para conduzir todo o destino dos povos indígenas nos diversos setores, seja na área de saúde, seja na área educacional, seja na Funai, seja nesse DSEI, que trata da saúde, seja em qualquer lugar, mas é incrível, pois, quando você indica um nome, recebe uma manifestação de um grupo dos povos indígenas - dividem-se em grupos - contrário a esse ou àquele nome. Isso é tudo que alguns que têm segundas intenções e que usam os povos indígenas querem, pois manipulam esses interesses.
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Eu aqui quis indicar para Presidente da Funai a Iza que está ali. Indiquei-a para Presidente da Funai. Não havia resistência à indicação no Planalto, a resistência veio dos povos indígenas. Quando eu peguei o DSEI Ianomâmi, eu indiquei um indígena, mas o Davi foi contra - um cara que era como um filho dele.
Nós temos que acabar com isso. Nós temos que começar a entender os nossos valores. É isto que nós temos que discutir: os nossos valores, aonde queremos chegar, como vamos chegar e porque queremos chegar. Do contrário, nós vamos ficar como o bom soldado marchando em cima do mesmo passo, marcando passo.
Eu quero registrar a presença da Senadora Regina. Uma salva de palmas para ela, porque é uma defensora dos povos indígenas. (Palmas.)
Eu costumo dizer que hoje a luta dos povos indígenas é como uma coceira de macaco: não termina nunca. Ele avança um degrau e logo ali há um adversário que quer retroagir dois degraus. Ficamos marcando passo.
O povo indígena tem que viver a realidade que a gente vive hoje.
O meu Estado é o que tem hoje a maior área demarcada, 46% das suas áreas hoje são áreas demarcadas: Ianomâmi, Raposa Serra do Sol, São Marcos e tantas outras demarcações expressivas. Ali ninguém está perdendo a sua cultura, ninguém está perdendo o seu hábito. Nós travamos uma briga eterna contra a mídia, contra os latifundiários, pois eles tentam culpar o não desenvolvimento do meu Estado aos povos indígenas.
Agora mesmo, com esse tal de Bolsonaro que está aí, ele, sem conhecer a realidade de Roraima, disse que Boa Vista estava em um atraso absoluto por conta dos povos indígenas - até confundiu Boa Vista, que é a capital, com o Estado de Roraima, por ser mal assessorado, querendo jogar para a plateia. Hoje, o sentimento da mídia, em meu Estado, é contrário aos povos... Hoje mesmo, agorinha, fiquei sabendo que os meios de comunicação do Senador mais corrupto do País, que domina lá a rádio e a televisão, estão dizendo que, enquanto os índios não deixam a energia passar para Roraima, o Telmário está fazendo a solenidade, no Senado, para os povos indígenas. Então, é uma demarcação sórdida, é uma demarcação covarde, é uma demarcação mentirosa, mas que não me assusta, que, ao contrário, me fortalece, me vitamina, porque eu sei que estou no caminho certo.
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Ninguém pode dizer que o atraso de Roraima são os povos indígenas, pois ainda há 2,5 milhões hectares de terras disponíveis. O que atrasa Roraima são os políticos ladrões do meu Estado; o que atrasa o Brasil são os políticos ladrões do País; o que atrasa a Funai é trocar um Presidente seu para atender demandas políticas. E isso não é agora não, é sempre assim. Isso é que está errado, isso é que está errado.
Se não houver união dos povos indígenas, nós vamos ser sempre derrotados por interesses outros, que estão longe de ser os interesses dos povos indígenas. O resultado é que cada dia mais estamos mais fracos. Podem acreditar nisso. Nós estamos individualistas, nós estamos perdendo aquela essência do sentimento cooperativista, do sentimento de irmão, de dividir o seu pirão, por conta de muitos anseios, de muitas lutas, que não têm avanço. Nós estamos como aquela historinha de dois animais que queriam comer uma moita, um puxava para um lado, o outro puxava para outro, e a moita ficando no meio, salva. Na hora em que eles entenderam que estavam fazendo forças antagônicas, que eles tinham que caminhar no mesmo sentido, os dois se alimentaram. É isso que os povos indígenas têm que entender. Nós não temos que ter vaidade, nós não temos que ter aqui o orgulho, nós não temos que ter aqui a prepotência que têm os brancos, na grande maioria. Nós não podemos perder esse hábito, essa cultura. Na hora em que nos afastamos dela, nós nos enfraquecemos cada dia mais.
Este dia é exatamente para essa reflexão.
Hoje, convidamos até um membro do sistema carcerário, pois os presídios estão superlotados de membros indígenas. Há prostituição, há o trabalho de subemprego, porque, lá na comunidade indígena, não há espaço, não há alimentação natural e não há apoio político.
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E olhem a gravidade do que vamos apresentar. O Governo Temer, neste último Orçamento, de 2018, através do Ministério do Planejamento, por sua indicação, com o Ministro que está lá, que ninguém conhece... Nem sei o nome do novo Ministro, porque não tem um nome nacional, de reputação; ele está a serviço de um Senador - por isso, está ali e, por isso, o Orçamento saiu dessa forma. Eu vou citar somente a parte indígena, sem falar em outras partes sociais. No saneamento básico, eles cortaram 99% em relação a 2017. No orçamento de saúde, 99% dos recursos. Na assistência social, eles cortaram 97,1%. E aí entram moradia, educação, transporte, alimentação etc. Na reforma agrária, 86%. Na educação do campo, que atinge diretamente os povos indígenas, 86%. Prestem atenção: no apoio ao desenvolvimento sustentável em comunidades quilombolas, povos indígenas e comunidade tradicional, eles cortaram sabem quanto? Eles cortaram 100%. Não querem o desenvolvimento sustentável dos povos indígenas. Para quê? Para dominar. E nós brigando entre nós. Nós vamos vencer quando? Nunca. Em demarcações e fiscalização das terras indígenas e proteção dos povos indígenas isolados, cortaram 48%, ou seja, demarcação zero, povos isolados zero. Isso tem um olhar político. Primeiro, naturalmente, é um Presidente que não foi eleito pelo sentimento popular; e segundo, são as forças contrárias aos povos indígenas. Eu ouvi aqui o Hino Nacional ser cantado numa língua mãe. E muitos aqui atípicos, com vestes naturais da sua cultura. Este Governo que está aí cortou 44,1% da cultura dos povos indígenas. Espera aí! O Governo que está aí vai ajudar os povos indígenas e o povo brasileiro nas universidades federais?! Vai mesmo! Em 2015, eram 15 bilhões; em 2018, 5 bilhões.
Eu queria passar esses dados e agora gostaria de franquear a palavra. Que possamos entender que precisamos buscar sempre o entendimento, a união e, sobretudo, fazer pauta daquilo que realmente diz respeito aos povos indígenas.
Vamos começar com a nossa futura médica Maíra. Faça uso da palavra. Pode usar a tribuna por dez minutos. Sinta-se hoje Senadora da República. (Palmas.)
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A SRª MAÍRA DOS SANTOS BENTES TAPUIA - Bom dia a todos!
Gostaria de cumprimentar (Fora do microfone.) o Presidente requerente desta sessão de homenagem aos povos indígenas no Dia do Índio, Sr. Telmário Mota, macuxi; o Subprocurador-Geral da República e membro da sexta Câmara de Coordenação e Revisão, Sr. Rogério de Paiva Navarro; o Coordenador dos Jogos Mundiais Indígenas e membro da Comissão Justiça e Paz da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Sr. Marcos Terena; o Diretor do Memorial dos Povos Indígenas de Brasília e líder indígena de São Gabriel da Cachoeira do Estado do Amazonas, Álvaro Fernandes Sampaio Tukano; a nossa liderança indígena mulher de Redenção do Estado do Pará, a Cacica indígena caiapó Tuire Kayapo; a nossa liderança indígena também de Redenção do Pará, Paulinho Paiakã; e Maria Angelita da Silva.
Também gostaria de agradecer e cumprimentar os Senadores, as autoridades aqui presentes, além das Lideranças do plenário e as lideranças indígenas que se fazem aqui presentes. E queria demonstrar o meu especial carinho às crianças indígenas, que são o futuro da nossa nação indígena e que estão hoje ocupando todas as cadeiras do plenário. É uma linda visão de que um dia o futuro da nossa nação estará garantido. (Palmas.)
Gostaria de cumprimentar também os povos indígenas do meu querido Baixo Tapajós e do Tocantins, que sempre me acolheram com grande apoio.
Anos atrás, Senador, comecei a minha jornada acadêmica com muito esforço, com muita garra; saí da minha terra para uma terra distante, desconhecida. Assim como muitos dos 34 mil indígenas que estão na universidade hoje lutando para adquirir conhecimento e somar aos nossos conhecimentos ancestrais, aos nossos conhecimentos indígenas, aos nossos conhecimentos naturais, somar a isso, lá entrei pelo sistema de cotas. Por quê? Porque muitos antes da minha entrada sentiram a necessidade de tentar sanar a dívida que o Brasil tem com os povos indígenas desta Nação.
O sistema de cotas foi implementado através de muitas lutas de grandes guerreiros indígenas que viram esta necessidade, a necessidade de não ter um porta-voz, não ter alguém para falar por si; e, sim, nós povos indígenas podermos falar de igual com os brancos, nós povos indígenas podermos ter voz, domínio e propriedade intelectual do conhecimento branco para poder nos defender e defender nossas terras. Pois, Senador Telmário Mota, a dificuldade que temos hoje é imensa. E necessitamos, sim, equivaler os nossos conhecimentos, equalizar e sanar essas dificuldades.
Porque hoje quando alguém invade nossas terras, quando alguém tira o nosso peixe, polui os nossos rios, corta as nossas árvores e tenta nos tirar o pouco ainda que há da nossa terra, evitando assim as demarcações, isso é um crime ambiental. Não é considerado um crime - não é um crime. Lá estão invadindo os nossos lares, estão invadindo a nossa terra. Na sociedade branca, se alguém for invadir sua terra, alguém for invadir a sua casa, isso é um crime. Lá não: é um crime ambiental. E hoje nós precisamos mudar essa realidade, mudar isso.
Hoje eu gostaria de ter mais coisas para comemorar. Hoje todos os índios são bonitos, todos os índios aparecem. Mas hoje eu queria ter mais o que comemorar. Temos que lembrar que as nossas bases são deficientes, por isso nós entramos para as universidades, para sanar essa precariedade, para que nós possamos, de igual para igual, cuidar dos nossos povos, para que possamos assumir as cadeiras da saúde, da educação e sermos advogados, nós mesmos detentores da propriedade do nosso povo. Assim, podemos enfrentar as adversidades e, assim, sanar essas precariedades.
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Hoje, o sistema de cotas da universidade está implementado, é uma certeza, mas tem que ser ampliado e ajustado, Senador; tem que ser ajustado à nossa necessidade, pois hoje ela está estagnada. Como o senhor bem disse, todos os anos seguem cortes para a educação, que já tem muito pouco.
Precisamos de moradia, precisamos de auxílio, auxílio-moradia, precisamos do auxílio-permanência. Precisamos, necessitamos terminar a nossa faculdade, porque entrar, o ingresso, é difícil; sair das nossas aldeias é difícil; entrar na universidade fazendo uma prova de conhecimento totalmente branco é difícil. Mas precisamos não só entrar, mas, sim, ter condições de terminá-la, ter condições de estar lá dentro e sermos equivalentes aos conhecimentos que nos são dados. Precisamos, hoje, de que a visibilidade que temos dentro a universidade seja implementada, seja uma assessoria, seja um conhecimento equivalente, porque nós precisamos estar nivelados.
Senador, hoje precisamos - e eu faço aqui, deixo meu pedido nesta tribuna - de que tenhamos uma Bolsa Permanência ampliada. É uma grande vitória, mas ela precisa ser ampliada. Precisamos de uma Bolsa Permanência que tenha data certa para sair, porque, como muitos sabem aqui, nós não somos detentores de riquezas, nós não acumulamos riqueza. O único sustento, quando saímos da nossa aldeia como estudantes, sem conhecimento do mundo lá fora, é o auxílio, é o apoio da universidade.
Não precisamos de que haja mais cortes, não precisamos de que esse direito seja usurpado. Nós precisamos de que hoje ele seja ampliado, Senador. E, assim, eu peço às autoridades aqui presentes que a nossa Bolsa Permanência tenha um dia específico para sair. Precisamos de que os nossos recursos universitários sejam ampliados. Precisamos de que a nossa contribuição dentro da universidade, a nossa voz seja mais ouvida dentro da universidade, para que o conhecimento que levamos para dentro da universidade seja ampliado.
Nós não podemos ser uma minoria esquecida dentro da universidade. Nós precisamos ser ouvidos e atendidos, precisamos levar esse conhecimento, sair das universidades, levar esse conhecimento para as nossas aldeias, para os nossos povos, porque nós somos quem precisamos defender, nos defender, e, assim como o Senador bem disse, precisamos nos unir.
Gostaria muito de agradecer a todos.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Antes de a gente ouvir o próximo convidado, eu quero aqui agradecer a presença do Embaixador da República da Namíbia, o Sr. Samuel.
Uma salva de palmas para ele. (Palmas.)
Embaixador da Malásia, o Sr. Lim Jin.
A representante, interina, do Ministério do Meio Ambiente, Srª Juliana Simões. (Palmas.)
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Presidente da Câmara da Câmara Municipal de Pacaraima, em Roraima, Sr. Emanuel Silva Coelho. (Palmas.)
Ministro Conselheiro da República Islâmica do Irã, Sr. Morah Ali. (Palmas.)
Assessor de Assuntos Políticos, Diplomacia Pública e Cultura do Reino dos Países Baixos, Sr. Rob Keizers. (Palmas.)
Ministra Conselheira da Embaixada do Canadá, Srª Alison Grant. (Palmas.)
Primeira-Secretária da Delegação da União Europeia, Srª Cécile Merle. (Palmas.)
E quero agradecer aos nossos músicos, que aqui já se apresentaram; e agradecer aos Caciques Francisco Filho Guajajara, Geneílson Lopes Guajajara, José Aurico Machado; e às senhoras e aos senhores. (Palmas.)
Continuando, vamos agora ouvir o Marcos Terena.
Com a palavra Marcos Terena.
Sinta-se Senador da República hoje, Senador dos povos indígenas, você que já foi Embaixador do Futebol, em Tocantins. Sinta-se assim.
O SR. MARCOS TERENA - Bom dia, pessoal! Bom dia, irmãos indígenas, lideranças, nossas autoridades, não só as que estão aqui dentro, mas também as que estão em nossas aldeias festejando de alguma maneira este dia consagrado como o Dia Nacional do Índio, como disse o Senador Telmário, comemoração que nasceu lá no México, em 1944, logo ao final da Segunda Guerra Mundial.
É uma grande satisfação estar aqui neste templo da democracia brasileira, templo de vários Senadores dos nossos Estados do Brasil. Temos 81 Senadores nesta Casa, Senadores de Brasília, de Mato Grosso, de Mato Grosso do Sul, de Roraima.
Nesta oportunidade que me é dada neste momento, eu gostaria de destacar a importância de estarmos dentro deste Senado, porque aqui são tomadas várias decisões em relação ao Brasil e também em relação a nós indígenas. Não é fácil a gente convencer o Congresso Nacional a respeito dos nossos direitos. O próprio Senador Telmário deu alguns exemplos disso. Nós temos que estar aqui dentro vigilantes, trabalhando, conversando com eles, para que eles possam votar a favor dos nossos direitos quando os nossos direitos estiverem pautados nesta Casa.
Também gostaria de agradecer à nossa Senadora... Eu não me lembro de quantas Senadoras há aqui no Congresso Nacional, mas aqui há uma que é uma lutadora, que é uma mulher simples que veio do Piauí. Ela quebrava coco para sobreviver, para ter dinheiro para comprar suas coisas, o seu pão de cada dia. Hoje ela é Senadora aqui neste Congresso: a Senadora Regina, que está ali. (Palmas.)
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Eu também queria destacar aqui a importância do Senador Telmário Mota. Como ele contou aqui para nós, ele nasceu numa comunidade indígena também, lá em Roraima. Eu conheço bem Roraima: é uma terra de muitos recursos minerais. E foi muito trabalhoso... Eu fiz um trabalho aqui dentro do Congresso, junto com o Álvaro Tukano, que está aqui, para que nós conseguíssemos a demarcação do grande território dos ianomâmis. E diziam que era impossível demarcar aquele território porque lá havia muita cassiterita, havia muito ouro. Para que o índio quer ouro? Para que o índio quer cassiterita? E a gente sabia que, além disso, havia um metal muito importante para o mundo - não é só para o Brasil, mas para o mundo - chamado nióbio. O que é nióbio? Quase ninguém fala no Brasil. O brasileiro, muitas vezes, não sabe o que é nióbio. O nióbio é um metal para fazer satélites, aqueles aviões - explicando aqui aos nossos irmãos - que vão até à Lua, que ficam perambulando pelo Universo, procurando outras terras no Universo. É aquele metal que aguenta o vento do Universo. Não é qualquer metal, não. Está lá na terra dos índios de Roraima.
Aproveito também para falar aqui do Álvaro de novo. A terra do Álvaro tem metal, material para fazer a bomba atômica. São recursos que estão dentro da terra, mas o índio brasileiro nunca ligou para essas coisas. Protegeu, está cuidado, mas em termos, né? Porque há muitos empresários chamados privados que estão trabalhando aqui dentro do Parlamento brasileiro para abrir as terras indígenas: "O índio tem que sair da frente porque o desenvolvimento tem que acontecer", e eles têm que vender esse patrimônio dos recursos naturais. Mas por que a empresa quer se tornar dona disso se esses recursos, na verdade, na verdade, pertencem à soberania do nosso Brasil? Por quê? E o povo brasileiro, muitas vezes, não sabe disso. A imprensa não fala. Os jornais e as televisões não levam isso para um debate sério. Nós índios temos de levantar a voz dos recursos naturais das nossas terras e também dos recursos minerais que estão escondidos.
Esses dias, aqui em Brasília, houve o debate sobre água, essa água que nós estamos bebendo aqui. Grandes empresas internacionais querem ter o direito de serem donas das minas de água. Nós, que nascemos na aldeia, sabemos que lá no meio do mato nasce um pouquinho de água; daqui a pouco vira lagoa; daqui a pouco vira córrego; daqui a pouco vira rio.
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Quem é o dono dessa água? Nós falamos: é o grande Criador, o grande Espírito é o dono dessas águas. Por isso os nossos pajés, os nossos líderes tradicionais... Quando chegaram as religiões católicas e evangélicas, nós não entendíamos bem o que eles queriam dizer sobre a cruz, sobre o céu. Nós não entendíamos; mas nós entendíamos que o grande Espírito existia. Podem perguntar para os guajajaras que estão aqui, para os tapuias, para os tucanos, para os caiapós que estão aqui, para os terenas.
Independentemente de sermos de diversas línguas, costumes, nós sempre agradecemos ao grande Espírito: agradecemos a chuva, agradecemos a criança, que está aqui tomando os assentos dos Srs. Senadores, e agradecemos também a vida todos os dias. E ninguém nos ensinou isso. Aprendemos com as nossas tradições. Quando a gente escuta um passarinho cantando, de noite, de dia, quando a gente olha para o céu, as estrelas, riqueza que o índio tinha.
Aí, quando chegou o europeu, ele disse: "Vocês têm que ter religião." Aí começou a confusão. O que nós vamos ser: evangélicos ou católicos? Uns viraram evangélicos; outros viraram católicos. E, aí, dividiram o Deus deles. Nunca dividimos o nosso Deus. O nosso Deus nós não dividimos. Nós nem levantamos a cabeça para ele, porque ele é sagrado. Assim fala, por exemplo, o pai do Álvaro, que é um grande líder espiritual lá na fronteira com a Colômbia.
Por isso, pessoal, meus irmãos, eu queria agradecer ao Senado Federal por este Dia do Índio e agradecer especialmente ao Senador Telmário Miranda pela coragem dele.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Marcos, é Mota. Telmário Mota.
O SR. MARCOS TERENA - Não é Miranda, não?
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Ainda não quis o Miranda. Só deixei o Mota.
O SR. MARCOS TERENA - Miranda é lá de Tocantins, não é?
Telmário Mota. Como ele disse, pessoal, ele sempre defendeu o índio na Presidência da Funai. Aliás, cadê a Funai? Cadê o Presidente da Funai? Aliás, Senador, até poderíamos perguntar aqui para o Governo brasileiro: quem é o Presidente da Funai hoje? Cadê ele?
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS TERENA - Isso significa que nós não temos o Presidente da Funai. Ele tinha de estar aqui, no Dia do Índio, junto conosco. Nós iríamos fortalecê-lo.
O Governo está cortando todo o dinheiro da Funai. Eu fiz uma conta assim rápida, antes de vir para cá, baseada nesses estudos que o Senador apresentou. Nós índios valemos R$1 para o Governo Federal por ano. Um real por ano! Quanto vale um preso que está na penitenciária? Dois mil reais, pelo menos, por mês.
Nós somos as primeiras nações do Brasil. Nós não somos os últimos. Nós estávamos aqui.
Por isso a gente tem que agradecer, enaltecer essa coragem do Senador Telmário, ao levantar a nossa voz aqui dentro do Senado Federal.
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Vamos ter agora, por exemplo, daqui uns dias, as eleições. O Brasil vai escolher o Presidente do Brasil, do nosso País. Quem será que vai ser o Presidente do Brasil? Nós tivemos vários presidentes que se comprometeram com a gente, inclusive quem andava com a gente na luta pela liberdade democrática.
Eu e o Álvaro somos os criadores do primeiro movimento político no Brasil, enfrentando a ditadura militar, enfrentando os militares que dominavam a Funai, enfrentando os estrategistas militares lá no Palácio do Planalto. Nunca tivemos medo deles, mas eles tinham medo da gente, parece; mas sempre os respeitamos, porque autoridade do Brasil tem que ser respeitada, homem, mulher, qualquer que seja. Assim aprendemos a respeitar as nossas autoridades nas nossas aldeias.
E, para terminar essa rápida análise, essa mensagem, eu queria dizer também ao Senado Federal, ao Congresso brasileiro que - apesar de os Senadores não estarem aqui, a não ser os dois; eu vi o Senador Requião também mais cedo aqui - nós os índios caminhamos em direção ao futuro. Nós não queremos desaparecer do mapa do Brasil, mas nós também não queremos que o Brasil seja pobre. Como eu falei, esses recursos estratégicos estão nas terras indígenas. Durante muito tempo nós fomos considerados obstáculos para o desenvolvimento do País, mas hoje nós somos parte.
Está aí a futura doutora médica a ser formada. Nós temos índios advogados, temos índios administradores de empresa, temos índios também engenheiros. Índios e índias, homens e mulheres se formando, se gabaritando; temos índios que falam inglês, falam francês, falam espanhol. Qual o problema, Senador Telmário - é esta mensagem que eu gostaria de transmitir ao Senado Federal -, de termos um índio de verdade na presidência da Funai. Qual o problema? Nós temos índios muito mais preparados para conduzir não só os direitos indígenas, mas também a soberania do nosso Brasil - a soberania do nosso Brasil. Soberania quer dizer comida para todo mundo, não só plantar grãos, soja, que não alimentam ninguém; plantar mandioca, arroz, feijão; criar porco, criar gado, para alimentar o nosso Brasil. Nós índios terenas e os cadiuéus somos índios vaqueiros, como os macuxis também em Roraima. Então, nós sabemos o valor da vaca, do cavalo e da terra.
Por isso, nós queríamos que o Senador Telmário, junto com a gente, ajudasse a gente a apresentar uma proposta real, um plano de ação para os próximos quatro anos ao Governo brasileiro a ser eleito. Há vários candidatos. Quem vai chegar lá ainda não sabemos, mas os nossos pajés estão tocando a porunga deles, para que esses candidatos enxerguem a gente.
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Eu não vejo a Funai em extinção, Senador. A Funai, para quem mora lá na aldeia, é necessária, assim como a Sesai. A Sesai também não veio aqui, não é?
Mas, no dia em que nós tivermos um índio ministro de assuntos indígenas, vamos poder sonhar em termos um índio, uma indígena aqui como Senador da República também.
Eu quero estimular aqui...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS TERENA - Estou terminando já.
Quero estimular aqui o Álvaro Tukano, esse jovem guerreiro que está aqui, para que ele seja eleito. Assim como em 1982 o Mário Juruna foi eleito, ele seja eleito Deputado Federal por Brasília.
E eu aproveito esta propaganda gratuita do Senado Federal para estimular o eleitor de Brasília a acreditar no voto indígena, no candidato indígena, porque nós sabemos olhar pelas crianças, pelos velhos, pelas mulheres e vamos olhar pelo Brasil também.
Viva o Dia do Índio! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Sem nenhuma dúvida, Marcos, você...
Cadê ele? Está subindo aí, não é?
Ele dá uma aula. Conhece, acostumado, calejado nessa luta, sabe realmente para onde devemos seguir, o caminho que devemos percorrer.
E quero registrar a presença do Senador João Capiberibe, que é um indigenista nato. Uma salva de palmas, porque ele merece. (Palmas.)
Casado com uma indígena, a Deputada Janete, que abraça a causa indígena como ninguém. E Macapá sempre trazendo essas coisas boas.
Queremos aqui pedir uma salva de palmas, mas uma salva de palmas bem forte, porque este Senado tem mania de não bater palmas, e da palma eu gosto, porque nas igrejas a gente bate palmas para Deus, e aqui nós temos que bater palmas também para o nosso povo, que merece. E quando eu digo que merece, eu estou falando de você, Tenente do Exército Brasileiro - é a primeira mulher a ocupar esse cargo - Srª Sílvia Nobre Waiãpi. Uma salva de palmas. Fique em pé, por favor. (Palmas.)
Você nos orgulha. Parece com a Janete, não é? Típico da etnia de lá, rostinho fino. Que bacana. Está vendo?
Essas vitórias, essas conquistas são muito mais pessoais, Senador João Capiberibe, mesmo com o incentivo das políticas públicas. E agora bem colocou o Marco, que disse assim: "Cadê o Presidente da Funai?" Cadê? Porque o que está lá não está, e o que vai chegar ninguém sabe quem é. Então, dado esse hiato aí, esse vácuo entre uma nomeação e outra, ele só mandou um agradecimento ao convite, mas já não se sentia na autoridade de vir falar em nome da Funai, porque já estava na iminência de perder a caneta das decisões.
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E sobre essa indecisão é que eu quero aqui falar para o povo de Roraima, que está me ouvindo e quero que seja anotado.
Vejam só, a população atroari uaimiri sentou-se com a Funai, acertou, fez os acordos necessários para retomar a negociação para passar a linha de Tucuruí no Estado de Roraima. No entanto, por interesses políticos, o Senhor Presidente da República, Michel Temer, anunciou a saída do Presidente da Funai. E o índio... O Juruna já demonstrava isto, ele andava com um gravador, porque já não acreditava nas mentiras do homem branco. Gato escaldado tem medo de água fria. Então, sabendo que o Presidente da Funai está saindo e que o Temer não honra compromisso - este Governo não honra compromisso nenhum, é um Governo que não tem nenhuma autoridade, que não honra nada do que promete -, os atroaris uaimiris suspenderam a negociação.
Acabei de receber a informação de que só vão retomar depois das eleições, porque o Senador Romero Jucá, Líder do Governo - e que vai ficar fora, porque o povo de Roraima não vota em corrupto -, está dizendo que está abrindo essa negociação e, com isso, atingiu os povos atroaris uaimiris. E eles não são moeda de troca nem de enganação. Eles trabalham com a realidade e, por isso, estão suspendendo.
Lamentavelmente, mais uma vez, a política mal conduzida, dos maus-caracteres, atrapalha o povo de Roraima. E depois querem culpar os povos indígenas.
O Senador João Capiberibe, havia pedido a palavra... (Pausa.)
Ele saiu.
Estão aqui nas galerias vários jovens do colégio St Paul, que estão aqui conhecendo o nosso trabalho.
Muito obrigado. Sejam bem-vindos. Esta é a Casa do povo. (Palmas.)
Eu, de vez em quando, tenho que me referir ao Estado de Roraima, porque lá a gente recebe uma mídia que não tem nenhum princípio ético. Então, ela fica passando informação mentirosa para a população do nosso Estado e colocando os povos indígenas... (Pausa.)
O Senador João Capiberibe retornou e queria fazer uso da palavra. (Pausa.)
Senadora Regina, V. Exª também vai fazer uso da palavra? (Pausa.)
V. Exª quer um aparte?
Vai esperar a Senadora Regina falar?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Senadora Regina.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Quero cumprimentar o Presidente Telmário Mota pela iniciativa e cumprimentar toda a Mesa, em nome da Maíra. Quero parabenizá-la pela sua fala e pela sua determinação de ser médica, de enfrentar dificuldades e conquistar o seu título de médica.
Eu estou usando o microfone agora e eu sei que o microfone hoje tem que ser de vocês, porque vocês falam pouco para o mundo e para o Brasil; mas eu tenho que viajar, porque a gente só viaja na hora em que as empresas querem. Elas botam os aviões nos horários que lhes convêm. Então, tenho que ir, senão eu perco uma atividade ainda, porque se eu não for agora, eu só vou à noite.
Então, peço desculpas; mas vou falar bem pouquinho.
Primeiro, quero cumprimentar também essa plateia, principalmente as crianças, que, se Deus quiser, ocuparão boa parte dessas cadeiras aqui, definitivamente, quando estiverem preparadas para isso.
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Eu sei que a gente está diante de um povo ameaçado pela ganância. Sempre foi assim e continua sendo: a ganância do latifúndio. Principalmente, vemos agora a disputa na Funai, a disputa se é o general ou se é um ruralista que vai conduzir a Funai. Então, isso é muito sério, sem falar nos cortes orçamentários que já foram falados aqui.
Eu queria lembrar que recebi uma vez uns caciques do Xingu, e eles fizeram alguns pedidos. Entre esses pedidos, um era a energia limpa, porque eles tinham lá só um motor, uma hora por dia, um motor a diesel. Eu ainda conversei com alguns Senadores da região para ver se colocavam lá umas emendas, mas não resultou... Encaminhamos ofícios para o Governo, mas não houve resultado concreto, para se sentir o descaso com a...
Falo também da Lei 11.645, da educação, que fala da obrigatoriedade do estudo da cultura indígena. Hoje certamente nossas escolas estão cheias de meninos e meninas pintadinhos como índios, vestidos como índios, sem saber o significado daquilo. A lei não é para isso, a lei é para estudar a fundo a cultura, é para compreender, para ver se muda a atitude, e só se muda a atitude se compreender a cultura.
Então, eu quero dizer para vocês que eu aprendi muito nesses anos em que estou na CDH, na Comissão de Direitos Humanos. Por aqui, vocês têm passado todo ano, às vezes muitas vezes ao ano, tentando buscar seus direitos, principalmente a questão da demarcação das terras, embora do nosso último encontro não tenhamos boas lembranças. Acho que quem estava aqui lembra que foram recebidos com cavalaria, com o Exército, com as Forças Armadas, com escudos. Parecia que estavam recebendo, que o Congresso estava sendo invadido. Os indígenas sabiamente disseram que não queriam mais entrar. E nós fomos fazer a audiência pública lá no acampamento, que vai começar na próxima semana. Estaremos lá com vocês. Nem marcamos a audiência aqui, nós vamos para o Acampamento Terra Livre na semana que vem.
Um abraço a todos e até lá.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Obrigado, Senadora Regina.
A Senadora Regina é uma voz sempre em defesa dos direitos humanos, como Presidente da Comissão de Direitos Humanos, e também tem um carinho muito especial pelas causas indígenas.
O Senador João Capiberibe, antes de eu ser Senador, era e é um dos grandes defensores dos povos indígenas.
Uma salva de palmas para o Senador João Capiberibe. (Palmas.)
O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PSB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito bom dia a todos e a todas.
Cumprimento a Mesa e parabenizo o Senador Telmário Mota pela iniciativa de promover esta sessão exatamente no dia 19 de abril; cumprimento as lideranças presentes à Mesa; cumprimento o Subprocurador-Geral da República, Sr. Rogério de Paiva Navarro; cumprimento o Sr. Marcos Terena, que conheço de longas datas, conheço a sua luta; cumprimento o Sr. Álvaro Fernandes Sampaio Tukano, a Srª Tuire Kayapó. Seja muito bem-vinda a esta Casa que, muitas vezes, pratica grandes injustiças em relação aos povos indígenas e, poucas vezes, faz-lhes justiça. É mais raro fazer justiça que agredir direitos dos povos indígenas.
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Cumprimento o Sr. Paulinho Paiakã, seja muito bem-vindo; cumprimento a Srª Maria Angelita da Silva e agradeço por sua presença aqui na Casa; cumprimento a Srª Maira dos Santos Bentes Tapuia, também aqui conosco, e todos os indígenas que participam desta sessão solene, que é uma sessão de luta dos povos indígenas, que é uma luta incessante. Eu queria também cumprimentar a Tenente do Exército Brasileiro Sílvia Waiãpi, que é lá do oeste do meu Estado.
Eu conheço os povos Waiãpi, participei do processo de demarcação da área Waiãpi. Inclusive, é um processo inovador a demarcação da área, porque, além das coordenadas geográficas, a população indígena é que fez a demarcação. Em toda a fronteira, eles plantaram árvores frutíferas para demarcar. Um trabalho belíssimo, e eu tive a oportunidade de comemorar junto com eles, em 1996, o dia da homologação da Terra Indígena Waiãpi, que era a última terra indígena que nos faltava homologar no nosso Estado.
Eu gostaria que essa realidade do Amapá se reproduzisse em Mato Grosso, no Pará, em todas as regiões do País. Isso demonstra claramente que, numa sociedade democrática, que é o que se pretende no Brasil... Aliás, o Brasil tem pouca cultura democrática. O Brasil não é um país que tem um longo histórico de democracia. Nós temos um histórico de autoritarismo, de escravagismo, de perseguição às populações locais. Mas, numa sociedade que nós pretendemos democrática, é preciso que haja representação de todos os povos que convivem nessa sociedade. E essa representação muito nos faz falta aqui no Senado e na Câmara Federal. Aqui há Parlamentares que defendem a causa indígena, mas eles não são escolhidos, não são eleitos pelos povos indígenas, e precisamos construir, Senador Telmário, essa possibilidade de introduzirmos mecanismos constitucionais para que os povos indígenas, que já representam 1 milhão de pessoas no País, tenham, definitivamente, uma representação no Parlamento escolhida por eles.
Os dramas da sociedade brasileira são representados por esta Casa pela maioria de empresários. Aqui no Senado, 80% dos Senadores são empresários. Então, há uma representação descompensada, porque, numa fábrica, numa indústria, nós não temos 80% de donos; ao contrário, nós temos 80%, 90% de trabalhadores, ou, no máximo, um, dois ou meia dúzia de proprietários. Então, o Parlamento tem essa representação completamente descompensada e, evidentemente, prevalecem os interesses dos grandes empresários, principalmente do capital financeiro.
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Nós estamos com um problema sério no nosso País, porque nós temos uma dominação... Para vocês terem uma ideia, normalmente acompanhamos as dificuldades de recursos da Funai. A Funai, muitas vezes, não tem dinheiro para comprar medicamentos para atender à comunidade indígena.
Agora, de outro lado, a metade de tudo aquilo que nós pagamos de impostos vai para pagar juros e serviços da dívida pública, a metade. Ou seja, a metade do esforço do povo brasileiro é exatamente para pagar a dívida.
Vocês imaginem o que seria este País se nós não tivéssemos essa dependência brutal. Nós somos submetidos à lei do mercado financeiro, não é mais ao setor produtivo. O setor produtivo perdeu importância nos últimos anos, assim como o trabalho.
Enfim, tenho discutido e conversado sobre a possibilidade de apresentarmos uma proposta, para que os povos indígenas possam trazer para o Senado, para o Parlamento, para a Câmara Federal uma representação escolhida pelas diversas etnias que vivem em nosso País.
O modelo é uma dificuldade até para promover um tipo de eleição. Mas hoje, com a tecnologia em rede, com a tecnologia digital, com a comunicação em rede, esse problema está resolvido. Não há dificuldade nenhuma. A dificuldade é política. É essa que nós vamos ter que superar, para poder garantir uma representação dos povos indígenas.
Era isso, Sr. Presidente.
Mais uma vez, eu o parabenizo pela iniciativa e saúdo todas as lideranças indígenas. E lhes digo: nós estamos desse lado, nós temos posições tomadas, o nosso campo é o campo em que os povos indígenas nos chamarem. A luta que vocês travarem, podem contar conosco nessa luta.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Obrigado, Senador João Capiberibe.
Continuando a fala dos nossos convidados, convido agora, para fazer uso da palavra, o nosso Dr. Rogério de Paiva Navarro, Subprocurador-Geral da República e membro da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão.
O SR. ROGÉRIO DE PAIVA NAVARRO - Bom dia a todos.
Sr. Presidente, peço licença para falar daqui mesmo, da Mesa.
Bom dia a todos. Sou Rogério Navarro, aqui estou representando a 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, uma câmara temática, que cuida da matéria indígena e, enfim, também das comunidades tradicionais em todo o País. Nós realizamos a coordenação e a revisão das atividades do Ministério Público Federal nas suas atuações administrativas, através dos órgãos de atuação em todo o País.
Neste momento, em primeiro lugar, quero cumprimentar a Mesa na pessoa do ilustre Senador Telmário Mota e agradecer imensamente o convite que foi formulado ao Ministério Público Federal através da sua 6ª Câmara.
Cumprimento também o Plenário, particularmente os representantes das várias etnias aqui hoje presentes, também os representantes de governos estrangeiros, as crianças. É uma beleza ver as crianças aqui no plenário.
Muito obrigado, Sr. Senador.
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Eu aqui inicio a minha fala relembrando a questão do Dia do Índio, em 1943. O Sr. Presidente muito bem observou a passagem de tempo desde então. E a origem, a razão de ser da criação do Dia do Índio foi uma tentativa de voltar ao estudo, de destacar a questão do estudo, enfim, quanto à temática indígena.
Nós aqui no Brasil estamos atrasados, penso eu, em relação a isso. Muito poderíamos ter evoluído ao longo dessas décadas; não aconteceu. No entanto, é com imensa alegria que eu vejo o mundo acadêmico se voltar para esse tema, se voltar para o mundo indígena, inclusive através das cotas, como muito bem observou aqui a Maíra, que muito bem ocupou a tribuna e fez menção a esse tópico.
Esse sistema das cotas tem propiciado o ingresso de indígenas e, enfim, levado ao ambiente acadêmico, através da experiência, através da vivência, um pouco desse mundo tão desconhecido aos não indígenas.
Também com muita alegria eu vejo que a instituição que aqui represento, o Ministério Público Federal, se volta para essa temática. Recentemente, na semana passada, aliás, para sermos mais exatos, a Escola Superior do Ministério Público da União promoveu um curso sobre a temática indígena, com a participação de vários integrantes da comunidade acadêmica daqui de Brasília. Esperemos que isso prossiga, que esse rumo siga adiante, sempre nesse norte, que é o correto.
Lembro também que não há que se falar em cotas, em ingresso em universidades, como bem observou a Maíra, sem antes uma tarefa, uma atuação, enfim, uma visão voltada para as bases, para o estudo de bases. É necessário que o estudo nas aldeias, nas comunidades indígenas seja cada vez mais aprimorado. Para isso, contamos, e só podemos contar, com a participação das autoridades constituídas, dos Poderes Públicos. É necessária uma visão mais aguda dos Poderes Públicos em relação a essas necessidades, não apenas de educação, mas também de saúde.
Vejo hoje com tristeza que há um certo... Não digo abandono, porque a meu sentir nunca ocorreu, não houve um movimento de ida e de volta. A meu sentir, esse movimento de ida, não com o desejo que se tem, jamais ocorreu, e é preciso que ocorra. Mais do que tardio está esse rumo que o Governo brasileiro deve adotar.
Lembro também a fala do Senador Telmário Mota em relação à simplicidade dos povos indígenas, das comunidades indígenas - essa simplicidade, essa humildade, que em nenhum momento deve ser confundida, como erroneamente às vezes ocorre, com fraqueza. Os povos indígenas são extremamente fortes, e a demonstração de que sobreviveram até os dias de hoje é o melhor exemplo disso. Não há argumentos que consigam derrubar esse fato - contra fatos não há argumentos.
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E, no entanto, esses povos, com rara sensibilidade, estão sempre dialogando conosco. De um contato que eu tive através da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão com os povos indígenas, é exatamente essa a sensação que eu tenho. Este é o conceito que eu tenho, este que foi trazido pelo Senador Telmário Mota: a simplicidade, a sociabilidade dos povos indígenas.
Agora, essa sociabilidade, devo destacar, é facilitadora do diálogo. Um diálogo que, infelizmente, não está ocorrendo nas bases corretas. Penso eu que, justamente pela facilidade que os povos indígenas concedem ao diálogo com os não indígenas, com as autoridades constituídas, que é maior o dever dos Poderes Públicos e daquelas autoridades que estão neles investidos, que abram esses canais de diálogo. Um instrumento jurídico, legal, para ser mais exato, supralegal, porque está acima da lei e abaixo da Constituição. Um instrumento normatizado, positivado no Direito brasileiro, é a consulta prévia, estabelecida pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, que não está sendo cumprido em terras brasileiras.
Então, quando eu digo simplicidade, quando eu digo sociabilidade, quando eu digo canais de diálogo permanentemente abertos, o que eu percebo, no meu trato diário com as comunidades tradicionais como um todo - também os quilombolas, as ribeirinhas e todas as demais comunidades brasileiras -, é que a falta de diálogo, se há, vem por parte do Poder Público. O canal positivo, jurídico, para que se estabeleça, pelo menos agora, é através da Convenção 169 e através da consulta prévia.
Eu quero, então, aproveitar este momento, Senador, aproveitar este canal privilegiado no Senado Federal para fazer aqui um apelo e, por que não dizer, uma verdadeira petição em favor da consulta prévia para que ela seja atendida em relação a todas as comunidades tradicionais no País.
Menciono aqui também em relação à consulta prévia que o País se coloca em grande risco ante a sua não obediência. O País se coloca, perante o mundo civilizado, como aquele que, tendo um instrumento supralegal, um instrumento de ordem internacional, não o aplica deliberadamente. Isso expõe o País aos olhos da ordem civilizada. É impositivo que o Brasil adote o sistema da consulta prévia.
Eu peço aqui, também, licença. Eu quero ver se consigo encontrá-lo. Nós temos aqui, Sr. Presidente, uma nota, que foi divulgada pela 6ª Câmara, e eu peço a atenção e a autorização dos senhores para fazer a leitura dela. É breve, mas simboliza bem o sentimento de nós, integrantes da 6ª Câmara do Ministério Público Federal, em relação ao dia de hoje.
Passo à leitura:
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O Dia do Índio, 19 de abril, é data para celebrar a diversidade cultural de nosso País, reconhecer que a riqueza única cultura brasileira, expressada nas 305 etnias e 274 idiomas, é motivo de orgulho para toda a sociedade.
É dia de lembrar que as injustiças do passado para com esses povos merecem reparação imediata no presente e que os direitos hoje existentes são frutos de conquistas muito árduas.
É necessário que se tenha claro que índio, palavra que utilizamos para simplificar os inúmeros povos distintos de nossa Nação, não é um ideário ou uma lembrança folclórica de nosso passado. Ao contrário, representam o nosso presente. E a garantia de seus direitos indisponíveis é dever do Estado, e não liberalidade, incluído, entre outros, o direito à demarcação de suas terras, de reconhecimento de sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, bem como a saúde e a educação escolar diferenciadas.
A Constituição da República, há 30 anos, inaugurou um Estado multicultural e pluricultural com garantia a diversos direitos aos povos indígenas e honrou o Ministério Público Federal com a atribuição de defesa dos direitos e interesses dos povos indígenas no Brasil [é uma imensa honra que a instituição recebe da Constituição Federal].
Reconhecendo que há muito que avançar, a 6ª Câmara de Coordenação e Revisão, responsável pela atuação temática da instituição na defesa desses povos, reafirma o compromisso de lutar para efetivação dos direitos indígenas em todo o País.
Assinado pela 6ª Câmara de Coordenação e Revisão.
Meus senhores, muito obrigado pela atenção. (Palmas.)
E salve o Dia do Índio.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Obrigado, Dr. Rogério. V. Exª nesse pronunciamento enfatizou a questão da consulta. Inclusive o Estatuto do Índio, que está aqui tramitando na CCJ, traz essa segurança, essa necessidade da consulta, porque, como bem colocou, verificamos no cotidiano, toda hora, essa falta do cumprimento do que ficou acertado na Organização Internacional do Trabalho, da qual o Brasil participou, concordando com essa situação. E naturalmente é o que está acontecendo hoje no Uaimiri-Atroari, onde queriam passar a energia sem a devida consulta, querendo pular essa etapa tão importante para os povos indígenas, porque eles precisam saber se é bom, se não é bom, e como podem ser compensados. E, como bem colocou V. Exª, estão sempre abertos ao diálogo.
Também nos honra aqui o Senador Paulo Rocha, do Pará, para quem vamos abrir a fala, ele tem pressa porque vai viajar.
Uma salva de palmas para o nosso paraense Senador. (Palmas.)
O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Queria saudar todos e todas, Presidente, nossos convidados, nossas lideranças indígenas e nossa plenária.
Quero dar uma palavrinha aqui também. Essas sessões que a gente faz aqui nem sempre são para homenagear: terras indígenas, o Procurador faz toda uma deferência às questões multirraciais, etc.
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Nós, quando provocamos estas sessões de homenagens, aproveitando já que é o Dia do Índio, é para chamar a atenção - Não só para homenagear, mas para também chamar a atenção - de todo mundo, do Plenário do Senado, dos Senadores, das Senadoras, do Congresso Nacional, do Governo e da própria sociedade, para dizer que esse povo existe.
Então, o que aconteceu ao longo do tempo? Porque eu quero, exatamente, deixar um recado aqui de que nós estamos num momento anormal do País. Tudo aquilo que o Procurador leu ali, a consulta, a legislação, as estruturas criadas na Constituição, etc, tudo isso é direito conquistado. Mas funciona quando nós estamos num momento normal do País e daquilo que nós conquistamos, que é a democracia.
Mas, ao longo do tempo, as forças poderosas foram processando exclusão de alguns. E os primeiros excluídos neste País, apesar de tanta riqueza e tanta terra, foram, exatamente, vocês, os índios. E, cada vez mais, há pressão. À medida em que chegam os poderosos, o capital no campo, vocês vão sendo mais empurrados... Há tanta terra para pouco índio. Sempre o argumento é assim: "Nós temos que deixar terra para produzir", não sei o que mais, etc.
Então, nós estamos vivendo hoje um momento... Eu queria chamar a atenção, o diálogo, o processo reivindicatório normal, tudo isso faz parte de um momento quando o País está funcionando normalmente. E é só na democracia que os pobres, os indígenas, os explorados conseguem justiça, paz, dignidade. É só no processo democrático. Mas o que nós estamos vivendo hoje e que nós estamos perdendo aquilo que conquistamos no processo democrático. Portanto, só o diálogo não funciona. O diálogo só funciona na democracia. Mas o que nós estamos vivendo hoje não é um processo normal de democracia.
Tanto assim que por causa da retomada do poder, através do impeachment e do golpe, retomaram para si o controle da política e da democracia, a partir da visão deles, e isso racha, inclusive, a Justiça.
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O Supremo, por exemplo, está fazendo leituras diferenciadas do que está na Constituição para favorecer este ou aquele.
Há um desmonte da conquista. Por exemplo, o Temer está desmontando a Funai, está desestruturando a Funai, que é uma conquista e é uma política pública, através de um órgão do Estado, para poder assegurar o direito à cidadania, à dignidade, às terras, às riquezas indígenas, o respeito à cultura etc.
Então, não estamos um processo de normalidade. Estão desmontando estruturas que protegem os nossos povos indígenas e estão fazendo leituras a partir da Constituição para favorecer os poderosos.
Por isso, eu queria deixar a mensagem aqui de que, além de dialogar, de conversar, é importante que a gente se mobilize para poder recuperar a normalidade no País, que é a democracia, para, aí, sim, a gente poder eleger os nossos representantes, para virem aqui e serem porta-vozes dos interesses dos povos; para a gente poder eleger governos populares que assegurem o que está na Constituição brasileira para todos e que façam políticas públicas que resolvam o problema do nosso País, não só os problemas dos grandes, mas os problemas de todos.
E todo mundo sabe que em certas áreas de ampliação do agronegócio estão empurrando os nossos índios para o gueto. Por isso, é fundamental que, ao homenageá-los, no Dia do Índio, a gente deixe a palavra de que além de continuar no diálogo, continuar na briga pelos interesses, é preciso se mobilizar, se unir a todos os outros povos para recuperar a normalidade no País, que é a democracia, porque, só através da democracia, a gente vai conquistar representantes que venham para cá defender os interesses de todos, conquistar governos que assegurem o processo de desenvolvimento e de crescimento econômico, com distribuição de renda, e dar oportunidade igual para todos, principalmente para os nossos índios. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Obrigado, Senador Paulo Rocha.
Quero registrar a presença do Senador Vicentinho Alves, do Tocantins.
O SR. VICENTINHO ALVES (Bloco Moderador/PR - TO) - Presidente, posso fazer uso da palavra?
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Concedida a palavra.
Pode fazer.
O SR. VICENTINHO ALVES (Bloco Moderador/PR - TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Fá-lo-ei daqui, já cumprimentando V. Exª pelo requerimento, cumprimentando-o por presidir esta sessão importantíssima em homenagem aos povos indígenas.
Aí, na Mesa, Presidente, eu vou citar dois grandes amigos: Marcos Terena, meu colega, aviador, quando voava na Funai e eu também, na Amazônia, um velho amigo, de mais de, aproximadamente, 40 anos; e Paulinho Paiakã, porque voei muito lá, pelas aldeias do Aukre, do Kikretum, do Gorotire.
Quando chegava à aldeia, Presidente, eu, muito jovem, voando, as criancinhas falavam como, Paiakã? "Lá vem o Vicentinho", um simples aviador, que nunca imaginei que um dia sairia da condição de aviador para ser Senador da República do nosso País.
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Então, esta é uma data que me marca profundamente, por duas razões: a primeira, porque é o dia do aniversário do meu saudoso e querido pai, Comandante Vicentão, piloto também, pioneiro na Amazônia, com uma história bonita. Para se ter uma ideia, Presidente, em 1958, ele saiu da nossa cidade, Porto Nacional, foi até os Estados Unidos buscar o aviãozinho dele, com mais cinco, para sustentar a nossa família e desbravar a Região Norte e a Região Amazônia. Portanto, falecido, quero registrar e homenagear o meu saudoso e querido pai nesta data do dia 19 de abril.
Outro item a que quero me referir é sobre os nossos indígenas. Se aqui estou, Presidente, com esse sentimento de solidariedade com todos... Além de ter nascido e sido criado no meio dos xerentes, dos javaés, dos karajás, dos krahôs, eu, quando aviador, fui voar na Amazônia, na região deles, dos kayapós. Tive um acidente e fui salvo pelos kayapós, na selva. Fui salvo pelo Pedro, por Lerecra, pelos índios ali do Aucri Paiakã. Você sabe desses que estou dizendo.
Então, se eu estou aqui, com a minha solidariedade, é por causa do débito que eu tenho com os povos indígenas. Tenho feito isso na prática, todos os anos. Se se olhar o Orçamento da União, os recursos são colocados através de emendas e etc. para os povos indígenas do Tocantins e, às vezes, lá para o Aucri. Há recursos nossos destinados, tempos atrás, para a aldeia Kikretum, Niti, filho do saudoso Tutu Pombo, kayapó, nosso grande amigo.
Agora mesmo, recentemente, a semana passada, nós entregamos mais quatro caminhonetes para a Funai. Se a Funai hoje funciona no Tocantins, modéstia à parte, é por causa dos veículos entregues por mim e pelo Deputado Federal Vicentinho Júnior, meu filho, para dar melhor condição de trabalho e apoio aos nossos índios do Estado.
No mês de janeiro, quando muitos vão para as praias, este modesto Senador vai para as aldeias. Vou lá, vou conviver com a minha gente, com o meu povo, com as pessoas a quem quero bem. E digo mais: sou muito bem recebido.
Nas eleições - é claro, se estou aqui é por causa dos votos - , é raríssima uma aldeia que não me dá noventa e tantos por cento dos votos. É muito simples, é só o relacionamento, a convivência, a prestação de serviços e a solidariedade.
Portanto, estar aqui hoje homenageando a todos os povos indígenas... Já fizemos, inclusive, os Jogos dos Povos Indígenas, no Tocantins, por duas vezes, Presidente, junto com Marcos Terena, com o Carlos, na minha cidade, em Porto Nacional, e depois em Palmas.
De modo que tudo que a gente pode fazer aqui no Senado, tanto na viabilização de recursos quanto na questão de votos... A minha posição, por exemplo, com relação à PEC 215, a minha, a posição do Deputado Vicentinho Júnior, é radicalmente contra! O Congresso Nacional não é palco para se discutir isso.
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Aí nós temos a Funai, o Ministério da Justiça, os antropólogos e etc... o Ministério Público, que ali está presente, com o Subprocurador - e eu o cumprimento.
De modo que é na prática e nas ações nossas que eu me manifesto, hoje, em prol dos povos indígenas.
É muito bom vê-lo, Paiakã, um amigo de 40 anos mais ou menos, não é, Paiakã? Eu até tenho que ir lá, à sua aldeia, naquela cachoeira que você me falou, esses dias, ao telefone. Ele mora a 300 metros de uma cachoeira das mais bonitas, lá perto do Rio Fresco. E eu tenho saudade e vontade de ir lá.
Eu agora, Paiakã, com essa eleição suplementar que vai haver no Tocantins, hoje, daqui a pouco, irei fazer um pronunciamento, licenciando-me por 40 dias, para colocar o nome para governador do Estado, porque vai haver eleição no dia 3. E, se Deus e o povo permitir, nos tornaremos o primeiro filho do Tocantins a governar o povo dele. "Essa é a vez dos tocantinenses" é o slogan, lá, do Estado.
Portanto, eu quero dizer a você que, passando o dia 3, como governador, como Senador, enfim, como seu amigo, no mês de julho, eu quero dar um pulo lá na sua casa. Vamos pousar, ali no Kikretum, subir de barco e ficar lá uns dois dias, proseando e matando a saudade.
É uma alegria enorme poder estar aqui, Presidente, mais uma vez, por fim, presente nesta sessão solene, como não poderia faltar, e parabenizar V. Exª, pela forma do requerimento, pela felicidade que teve, pela iniciativa.
E V. Exª, que atua tão bem, representando o povo de Roraima, com a sua forma simples, mas muito preparado e qualificado, eu o saúdo e cumprimento.
No mais, fica registrada a minha solidariedade, a minha homenagem, que não é apenas só minha; é de todos os tocantinenses. E, em nome de todos os povos lá do Tocantins, eu vou citar o nome de um ancião, o Sr. Getúlio Krahô, uma referência lá. Ele deve estar nos assistindo; senão, eu vou mandar o vídeo para ele.
Quando eu vou à aldeia Krahô, lá em Itacajá, sempre faço questão de encontrá-lo. Ele está feliz.
Lá, na região de Itacajá, nós conseguimos a reforma do CTL e já destinamos, agora, uma dessas quatro viaturas, que já são mais de 15 entregues à Funai. A Funai está se estruturando no Tocantins, graças, modéstia à parte, a essas nossas ações. Não apagam o incêndio, mas são gotas que chegam para ajudar no combate ao incêndio.
E garanto a vocês que, todos os anos, nós temos esse compromisso de sempre estarmos ali, trabalhando firmemente pela valorização dos povos indígenas. Vocês merecem. Vocês merecem!
Para vocês terem uma ideia, a nossa convenção vai ser no domingo, e já deve estar nas redes sociais o painel, em que, atrás, eu estou abraçando uma índia javaé, uma criancinha.
Então, isso é um símbolo de respeito aos povos indígenas, que merecem isso da nossa parte.
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Portanto, como governador ou como Senador, sempre terão em mim um apoio firme, solidário e permanente.
(Soa a campainha.)
O SR. VICENTINHO ALVES (Bloco Moderador/PR - TO) - Obrigado, Presidente. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Obrigado, Senador Vicentinho. V. Exª sempre gentil, muito cortês, muito humilde.
Eu dizia, no início da minha fala, que o povo indígena tem a essência do povo brasileiro, e V. Exª tem a essência dos povos indígenas. A gente logo percebe que a sua fala não é uma fala política, oportunista. Ela é uma fala real, do seu sentimento, do seu comportamento, do seu estilo, do seu modelo, e isso que é importante. Os cargos que hoje ocupamos são efêmeros, passageiros. O homem fica. E, quando o homem fica, ele lembra essas passagens bonitas da sua vida, voando sobre a nossa Amazônia e, sobretudo, levando aquele contato, ou talvez aquele socorro, ou aquela presença tão importante às nossas comunidades tão isoladas. Desejo para você sorte, sucesso, e que você não se empolgue muito e fale muito tempo, porque nós temos, daqui a pouco, um horário corrido. Mas V. Exª está com a palavra.
O SR. VICENTINHO ALVES (Bloco Moderador/PR - TO) - Trinta segundos. É só para fazer justiça a Piu-Djô, que não citei, inclusive, no meu acidente, porque eu me lembro bem da solidariedade dele comigo, na selva. Então, eu queria registrar o nome de Piu-Djô, um grande guerreiro kayapó, que não poderia deixar de citar. Era apenas isso, Presidente.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Um abraço. Obrigado.
Então, continuando o nosso trabalho, convidamos agora Álvaro Fernandes Sampaio Tukano, Diretor do Memorial dos Povos Indígenas de Brasília e líder Indígena de São Gabriel da Cachoeira, do Estado do Amazonas.
Com a palavra.
É uma honra tê-lo aqui.
O SR. ÁLVARO FERNANDES SAMPAIO TUKANO - Quero cumprimentar o amigo irmão, Senador Telmário Mota, por essa sua habilidade, nosso bom irmão dos povos indígenas, que conhece a realidade dos índios e da Amazônia, de modo geral. Quero cumprimentar os demais Senadores que aqui passaram e cumprimentar também os diplomatas presentes e o povo, de modo geral. Quero cumprimentar o meu amigo irmão Paulinho, que é um grande guerreiro da atualidade, a minha irmã Tuire, minha jovem médica que está aqui, o Procurador, a nossa parceira aqui, parceiros do Brasil e parceiros internacionais.
Eu venho de uma região onde produzimos polêmicas, polêmicas por falarmos de autodeterminação desde 1970, porque ouvir palavras de missionários, de políticos, das ONGs, não satisfaz a nossa realidade.
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Então, por isso temos buscado as autoridades brasileiras, para ver o que é que está acontecendo neste País quando surgem muitos problemas.
Também, ao longo desses anos, ouvimos histórias bonitas de ambientalistas. Eles nos ensinam a viver como índios. Mas eu quero dizer aqui para o Brasil que eu sou Álvaro Tukano, mas não sou bicho de estimação de ninguém. (Palmas.)
Eu venho aqui falar desta tribuna para o País, porque lá no Rio Negro existem 23 povos indígenas que precisam viver dignamente, que precisam de um governo realmente forte, através da Presidência da Funai, ausente hoje, no Dia do Índio.
O Rio Negro faz parte do Brasil, em uma região onde existem muitas riquezas minerais. Eu vivo em cima de uma mina de nióbio. Noventa e oito por cento dessa matéria está na minha região. Todo o Rio Negro tem esse problema de mineração. Do Amapá até a região de Cabeça do Cachorro, essa cordilheira, há muitas riquezas minerais.
Não podem, hoje, os Deputados, outros ambientalistas, terceiros, fazer leis por nós leis, para sermos meramente ambientalistas miseráveis, sem escola, sem saúde, sem transporte, sem leis neste País.
Eu vivo em cima dessa mina. Há 27 anos eu defendo uma estrada simples, para sair de São Gabriel a Cucuí, juntamente com meus parentes ianomâmis, que estão lá em Maturacá, e outros. Vem o Instituto Chico Mendes dizer que nós não podemos tirar madeira, tirar piçarra, abrir o leito da estrada... Ele nos impõe uma lei que nós não praticamos, que nós não inventamos.
Eu quero que o representante da 6ª Câmara vá lá, visitar a realidade da situação da estrada BR-307, que liga São Gabriel a Cucuí, que está nos matando e nos isolando. Para nós, esse tipo de modelo de ambientalista não presta. Não queremos.
Viramos inimigos do Governo brasileiro, porque há pessoas que não conhecem os índios, que só querem salvar minhoca, que só querem salvar outros animais irracionais, que não fazem falta na minha comunidade. Fazem falta na minha comunidade a escola, a saúde, a presença de autoridades para discutir sobre a segurança nacional. (Palmas.)
As riquezas que existem nas terras indígenas - água, riquezas minerais, madeira, a biodiversidade - pertencem ao povo brasileiro.
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Todas essas terras indígenas da Amazônia e do Brasil foram demarcadas pelas Forças Armadas, e nunca, em nenhum momento, nós procuramos as ONGs nacionais, estrangeiras para defender os nossos direitos, a não ser o Governo brasileiro. Então, as Forças Armadas demarcam as terras indígenas no Rio Negro, por exemplo.
Nós também apoiamos, como lideranças de um grupo pensante: como é que nós vamos participar da segurança nacional? Estivemos aqui, eu estive aqui, muitas vezes, no Palácio do Planalto, para dar aval político, junto com meu grupo, para instalar os doze quartéis que se encontram no Rio Negro. Nesses doze quartéis, 70% de soldados brasileiros são meus netos, meus sobrinhos, são índios. Assim, nós participamos da segurança nacional nas fronteiras. Isso é nacionalismo, isso é defender o povo, isso é praticar a lei. Eu venho de uma região onde tenho irmãos padres, freiras, pastores, pastoras, oficiais do exército. Por isso, nós temos que dizer que nós seguramos a segurança nacional nessa faixa de fronteira onde há contrabando de minérios e de madeira, desordens.
Quem deveria fazer funcionar essas leis era Franklimberg, porque ele passou muito tempo no Comando Militar da Amazônia fazendo esse tipo de operações. Se o Governo quer defender este País, tem que colocar na Funai Álvaro Tukano, Marcos Terena e outras pessoas que realmente são índios que conhecem e que defendem a luta e os direitos dos povos indígenas e nunca mais indicar a gosto de um Deputado ou de um partido que venha usar a Funai para os interesses pessoais. A Funai não pode estar a serviço de ONGs, de partidos que não conhecem os índios, que não conhecem as leis do Brasil.
Nenhum Deputado ou Senador pode fazer a lei para roubar as riquezas que se encontram nas terras indígenas, porque elas pertencem a todo o povo brasileiro. É isso que o Brasil tem que entender, é isso que a sociedade do Brasil tem que entender.
Hoje, eu sou Diretor do museu para combater o preconceito contra os povos indígenas. Eu estou aqui em Brasília não, como eu falei, como bonequinho, como modelo de vitrine. Não sou. Eu sou uma das lideranças ao lado do Paiakã, ao lado do Marcos Terena, e nós continuamos a luta do saudoso Mário Juruna. Estamos aqui ao lado do Megaron e de outras tantas pessoas ilustres que existem neste País, formamos uma nova geração de lideranças...
(Soa a campainha.)
O SR. ÁLVARO FERNANDES SAMPAIO TUKANO - ... novas neste País para defender a Constituição Brasileira. (Palmas.)
Para defender a Constituição Brasileira, Senador, preciso de apoio real para estudantes de Brasília, porque eles não são espíritos, eles têm que comer, eles têm que viver todos os dias. Que a Funai e o Ministério da Saúde tratem com carinho para garantir a bolsa de estudos aos universitários e a outros de todo o Brasil.
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É meu pedido também a esta Casa, para quem não fica fugindo de índios, quando se trata de leis. Eu queria abraçar aqui meus Senadores do Estado do Amazonas, que só aparecem na hora da eleição. Isso é muito ruim, para mim principalmente.
Eu quero dizer aqui que hoje foi um dia muito importante, Senador Mota, falar de uaimiri-atroari e de outros interesses do povo brasileiro.
Se eu fui rígido com o Estado brasileiro, é meu jeito de ser. Sempre fui assim. Não sou invasor, Senador. Os invasores são eles que estão acabando com os nossos direitos, para roubar os minérios, a madeira e tudo mais.
Por isso, nós precisamos fortalecer as nossas organizações indígenas deste País. E nós sempre contaremos com V. Exª e com os demais aliados. Aliança não se faz ensinando o índio a rezar o Pai Nosso e outras coisas; aliança se faz com questões concretas.
O Estado brasileiro não pode ficar omisso. Senão, nós vamos ter que processar o Estado brasileiro na ONU. O Brasil sempre tem que ficar no banco dos réus, porque não está cumprindo as suas obrigações de casa, que é atender as comunidades indígenas.
Enfim, quero dar abraços a todos os estudantes do Brasil, à minha família, que está aí, meu filho Lula, minha nora, minha mulher, à minha geração; quero saudar os índios do Brasil, porque nós viveremos aqui como nossos antepassados. Somos os verdadeiros brasileiros nesta terra. Por isso, queremos igualdade em todos os sentidos. Nunca mais queremos ver a morte. Nunca mais queremos ver uma Funai enfraquecida. A Funai defende os índios. Quem defende a demarcação das terras indígenas defende a vida dos povos indígenas.
Salve o dia dos povos indígenas! Viva o Senado Federal! Viva o Telmário! A V. Exª um abraço especial. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Obrigado, Álvaro.
Por isso, eu digo: uma sessão desta reúne o sentimento nacional. Eu lamento e até entendo que, como, na próxima semana, vão fazer o Acampamento Terra Livre, talvez até a nossa equipe tenha cometido um erro em não ter deixado esta sessão, com a presença da população indígena de um modo geral, para o movimento da Terra Livre, mas hoje se valorizou muito este dia. Então, a questão de não deixar passar do dia 19 e fazer numa outra data naturalmente criou esse descompasso.
Eu quero aqui já registrar a presença da nossa Senadora, a mãe da educação brasileira e nossa futura Governadora do Rio Grande do Norte. Daqui a pouco, ela vai fazer naturalmente uso da palavra.
Eu quero dizer, Álvaro, que a sua fala - e foi bom a sua fala na presença do nosso Subprocurador-Geral Dr. Rogério - é o sentimento hoje das comunidades. Eu acho que as comunidades não podem perder o seu hábito, perder a sua cultura, mas, como a população indígena aumentou, não há mais como eles viverem, por exemplo, só da caça, só da pesca, andarem nus. O Álvaro disse bem: "Eu não sou nenhum bibelô de ambientalista." Eles querem viver hoje... A internet está lá dentro, wi-fi está lá dentro, os meios de comunicação estão lá dentro. Então, nós temos que fazer essa adaptação. O índio pode, sim, viver bem, viver saudável, viver com dignidade, de forma sustentável. Ele preserva toda a sua natureza...
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No meu Estado de Roraima, se juntar hoje o gado das comunidades, eles são os maiores fazendeiros do nosso Estado. São 70 mil cabeças de gado, chegaram a 80 mil, já perderam 10 mil, porque eles estão matando, pois não têm do que viver. Eles vão para a cidade, não há emprego, vão para a prostituição, vão para o crime.
Hoje, para um líder segurar um jovem dentro da comunidade, é muito complicado. Na minha época, eu vivi até os 11 anos numa comunidade. Analfabeto de pai e mãe, eu vivia na escuridão do analfabetismo. Às 6h da tarde, a gente ia dormir - era lamparina - e acordava às 4h, 5h. Então, a rádio que havia era com A Voz do Brasil e chiava mais do que tudo, por causa da interferência da Venezuela, pois era na fronteira. Hoje, não. O jovem fica 10, 11 horas ouvindo. E o homem é produto do meio. O que os olhos não veem o coração não sente. Como a gente não via, o coração não sentia, mas eles sentem hoje. Eles olham um jovem indo para uma balada numa moto, num carro, uma televisão. Com isso, nasce uma expectativa dentro deles. Eles olham para o céu, e o teto está encostando na cabeça. Eles não vão pegar mais numa enxada, num enxadeco, num ciscador para ir a uma roça produzir, pois é impossível. Hoje, produzir é para a subsistência, mas não é fácil ir para a roça capinar para produzir, para gerar riqueza. Então, eles vão para a cidade, onde são peça fácil de ser recrutado pela criminalidade, por algo errado. Então, nós temos que observar isso.
E também isto é um ponto, Álvaro, que tem que ser dito: as universidades e os institutos técnicos têm que casar os cursos com a realidade do homem do campo. Levar mais agropecuária para ele produzir na agricultura, produzir na pecuária, criar peixe, produzir o que for possível dentro da sua terra, para viver com dignidade. Isso permite que as lideranças das comunidades tenham mais domínio e vivam mais pacificamente.
Eu queria falar exatamente para o Procurador, porque tudo o que é atrito morre lá. Então, é lá que ele vai entender essa parte. E, com a fala do Álvaro hoje, eu ganhei esta sessão. Eu precisava ouvir uma fala igual à sua, Álvaro, com a luta que você tem, com a experiência que tem, com suas conquistas. E você hoje chegou a essa conclusão.
Eu tenho dito isto sempre para a Iza: a Funai tem que mudar o foco indigenista dela. Ela tem que estar aparelhada. E o Governo, na verdade, foi desidratando a Funai. Tiraram tudo. Tiraram a saúde. A Funai hoje é um bibelô, está funcionando com emenda parlamentar. Ela não tem nenhum orçamento que realmente atenda as suas demandas. Então, é preciso que a Funai retome o seu objetivo principal para dar proteção aos povos indígenas, se necessário, para levar o aparelhamento necessário. Através da Funai, podem botar a pecuária, a agricultura. As políticas públicas têm que chegar. A escola, a educação é fundamental.
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Eu acho que, para isso, nós - todas as lideranças que estão aqui, todo mundo - temos que sair daqui com um documento, para usar este mandato. Este mandato de Senador não é meu, é do povo. Eu sempre digo: meu pai era um vaqueiro, minha mãe era uma índia, empregada doméstica, e Deus quis que eu estivesse aqui. Eu não vou passar aqui em branco. Eu tenho que passar aqui e fazer alguma coisa.
Minha mãe sempre dizia o que eu disse um dia desses aqui:
Nunca te esqueça que os índios são teus parentes e nunca te esqueça que ser pobre não é defeito. Defeito é fazer coisa errada. Se for um homem honesto, sempre vai ter a tua força e a tua cabeça erguida. Trilhe por esse caminho, meu filho, que nunca ninguém vai te humilhar.
É nesse caminho que eu estou aqui. Estou aqui não pelas mãos econômicas, não estou aqui pela mão dos poderosos, não estou aqui pela mão da corrupção. Estou aqui, porque Deus quis e estou aqui para defender os humildes. (Palmas.)
E eu faço isso!
Quando o Vicentinho disse que teve oitenta e não sei quantos votos, eu quase ri, porque eu tive quase 100% dos votos indígenas. Então, é minha obrigação.
O Álvaro me empolgou. É por isso que eu estou conversando muito. Ouviu, Álvaro? É você que me envolveu nessa fala, que achei extremamente...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Tuire, agora é a sua vez. Estavam só os homens falando. Iniciamos com mulher e agora será ela.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Ela vai falar na língua dela. Quem vai traduzir?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Paiakã, se vira agora.
A SRª TUIRE KAYAPÓ (Tradução consecutiva.) - Bom dia a todos e bom dia para meu parente, Senador.
Hoje é Dia de Índio. Eu não sei se o povo está conhecendo, se está entendendo. Eu não sei se as pessoas sabem se hoje é Dia de Índio. Eu não sei se estão alegres com a gente, eu não sei se estão com raiva da gente. Eu não sei. Eu quero saber, quero entender se Dia de Índio é uma comemoração, se é uma lembrança de nós índios. Eu quero saber.
Eu quero aproveitar e lembrar o tempo passado, quando nosso povo caiapó, junto com outros índios, com outros indígenas, veio para ter audiência, para discutir interesses. Esse povo foi muito bem recebido com autoridades do passado.
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De agora em diante, estamos vendo o que está acontecendo quando o povo indígena vem para ter audiência, vem para receber apoio: o tipo de apoio que o povo indígena está recebendo é pimenta em spray, é bala de borracha, é violência. Então, é isso que nós indígenas estamos recebendo.
Eu entendi que todos nós temos a boca para falar, nós temos ouvido para escutar. Então, nós somos iguais. Ser humano índio e ser humano branco, todos nós somos iguais, somos seres humanos. E nós indígenas somos os primeiros ocupantes desta terra e estamos vivendo em cima das nossas riquezas, e é onde todo mundo está interessado, e, se eles estão interessados, têm que conversar com nós. É por isso que eu estou falando que nós temos a boca para falar, para dialogar, para ouvir um ao outro.
Agora, não ficar assim como eu vou dizer: enganando, roubando essa nossa riqueza sem conversar, sem nós participarmos, sem a nossa presença, sem nos ouvir; estão explorando essa riqueza sem o nosso consentimento. Então, eu quero dizer: para falar com nossas autoridades indígenas tem que ter respeito para receber e conversar. É para isso que vocês são autoridades. É para isto que o povo não índio e nós índios votamos, elegemos: para vocês serem nossas autoridades e para nos atender, mas não sendo autoridades nossas, deste País, para ir enganando, matando, autorizando a violência... Então, isso não pode acontecer. Daqui em diante a autoridade tem que respeitar nós índios para que nós tenhamos respeito dentro da nossa terra, dentro da nossa cultura, dentro de todos os nossos direitos. É nisso que eu quero que o Governo daqui em diante comece a pensar.
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Daqui a pouco vão chegar muitos, a quem vocês chamam de lideranças, de nós índios. Com certeza, eles vão querer ter audiência, mas eles têm que ser recebidos como eles são: autoridades. E eu quero dizer que autoridade é para receber autoridade.
(Soa a campainha.)
A SRª TUIRE KAYAPÓ - Então, é isto que eu quero dizer para todos vocês: quando houver uma audiência, tem que receber nossos chefes, nossos caciques como autoridades.
Eu queria estar no lugar do Governo para não ficar... para mostrar o meu trabalho, dizendo que todos nós somos iguais. Índios, não índios, todos são meu povo. Então, é assim que o Governo tem que tratar todo mundo, mas não criando várias divisões para atender.
Era só isso. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Veja que o sentimento...
A Senadora Fátima está presente. Ela já vai pegar o voo, mas pediu a palavra, que já vai ser franqueada.
Mas veja que, na voz da Tuire, ela nem português fala. Ela não frequentou uma faculdade, mas passa sua mensagem, da inteligência, como eu digo, que é natural, que é dela, nativa dela, e ela passa o seu sentimento. Quer dizer, se ela fosse governadora, se ela fosse presidenta da República, ela iria mostrar que há igualdade. Ou seja, dentro da sua concepção natural, ela entende que o indígena é tratado desigualmente.
Senadora Fátima, com a palavra.
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A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Meu querido companheiro, Senador Telmário, a quem quero saudar pela iniciativa, sim, desta importante sessão solene de 19 de abril, dia em que celebramos, no Brasil, o Dia do Índio.
Essa iniciativa só poderia partir do mandato do Senador Telmário, pela identidade que ele tem com a luta em prol da causa indígena. A mãe do Senador Telmário era índia, e ele sempre faz questão de dizer aqui as mais belas lições que a mãe dele deixou. Primeiro, ao lhe dizer: "Meu filho, nunca esqueça, nunca abandone a comunidade indígena"; depois, ao lhe dizer: "Meu filho, você vai entrar para a política; vai entrar para a política para servir à coletividade, não para se servir; você vai entrar para a política, é um grande desafio, mas vai fazer do exercício da política um instrumento de realizar o sonho de que as pessoas possam viver com dignidade, com justiça e com felicidade" - tendo como um cuidado especial, um olhar especial exatamente a luta dos povos indígenas.
Então, Senador Telmário, quero aqui, já em nome do Partido dos Trabalhadores, dizer da alegria e da honra de estar aqui nesta tribuna, neste exato momento, participando desta sessão de autoria de V. Exª.
Quero saudar todos os nossos convidados e convidadas - permitam-me fazê-lo na pessoa da nossa índia que acabou exatamente de falar, Tuire Kayapó. Linda a fala dela.
Enfim, quero aqui dizer que hoje, também por se tratar do Dia do Índio, é também um dia, Senador Telmário, de a gente aqui denunciar o desmonte deste Governo ilegítimo e cobrar respeito para com a comunidade indígena.
Veja bem, aqui já foi dita a questão da Funai - o desmonte violento da Funai. E a Funai não é uma instituição qualquer para os povos indígenas. Pelo contrário, a Funai é a estrutura de que o Estado brasileiro dispõe para levar adiante as políticas públicas de promoção, de defesa dos interesses da comunidade indígena.
E o que este Governo ilegítimo tem feito? Tem feito exatamente o contrário: o desmonte da Funai. Em matéria de Orçamento, está aqui: por exemplo, o valor disponível para investimento na Funai em 2018 é de R$7,5 milhões, 23% menor do que o valor empenhado em 2015, que era de R$9,7 milhões.
Com relação à saúde, Senador Telmário, olhe aqui que absurdo, que ato criminoso deste Governo ilegítimo: as dotações da Lei Orçamentária Anual (LOA) para a saúde indígena tiveram redução de 22% entre 2017 e 2018, passando de R$1,7 bilhão para R$1,4 bilhão.
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Outro absurdo, porque este Governo é assim! Essa dupla Temer e Meirelles, o que eles sabem é cortar; o instrumento que eles mais usam é uma tesoura. Agora, a tesoura é para cortar os direitos dos povos indígenas, os direitos da maioria do povo trabalhador deste País; é cortando, reduzindo o orçamento destinado para as chamadas áreas sociais.
Olha aqui outro absurdo! O valor disponível para o custeio da Funai, em 2018, é de R$100 milhões, 31% menor do que o valor empenhado em 2014, que foi de R$145 milhões. Some-se a isso, Senador Telmário, que no ano passado nós tivemos aquele corte de cargos e o fechamento - não foi isso? - de unidades da Funai pelo País afora.
Enfim, esses números expressam os impactos da emenda constitucional do teto de gastos sobre os povos indígenas. Para 2019, o Governo ilegítimo já enviou projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias anunciando já um corte de 23% nas despesas discricionárias, para cumprir o chamado teto de gastos. Assim, o impacto será ainda maior sobre o custeio e o investimento das políticas voltadas para os povos indígenas.
Volto a repetir, desde que o Governo ilegítimo assumiu é corte nas áreas sociais, é desmonte de programas importantes nas áreas sociais, inclusive os programas voltados para a promoção e defesa dos interesses da comunidade indígena.
Evidentemente que tudo isso decorre dessa lógica fiscalista, dessa política de austeridade que estabelece uma lógica de alterar a Constituição para colocar na Constituição que durante 20 anos tem que congelar os gastos nas áreas sociais. Aos banqueiros tudo, porque para eles não há teto de gastos. Agora, para o povo, nada. Para o povo, repito, é desmonte, é corte de Orçamento, é menos recursos. Isso vai significar o quê? Menos saúde, menos educação, menos assistência social, menos direitos para as chamadas - no caso aqui em tela - comunidades indígenas. Por isso é que nós temos que denunciar isso, Senador Telmário, e lutar para reverter.
Mas, Senador Telmário, ainda quero também aqui, rapidamente, trazer para reflexão dados do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) que apontam que a violência contra os povos indígenas no Brasil levou à ocorrência de 118 assassinatos em 2016. Ainda de acordo com o Conselho Indigenista Missionário, 106 indígenas se suicidaram em 2016 e 735 crianças indígenas, menores de 5 anos, morreram por diversas causas, entre elas a desnutrição infantil.
Isso significa que o genocídio dos povos indígenas segue adiante. Isso significa que é preciso superar uma certa indignação seletiva e compor as trincheiras da resistência indígena, amplificando o grito dos povos indígenas em defesa da Constituição, pois os seus direitos estão inscritos na Carta Magna.
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Se a Constituição Federal verbaliza que as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios são bens da União e atribui à União o dever de demarcá-las e protegê-las, não podemos permitir que os ruralistas, que infelizmente contam com uma Bancada numerosa no Parlamento brasileiro, invadam as terras dos povos indígenas e promovam todo o tipo de violência física e simbólica.
De acordo com Lúcia Helena Rangel e Roberto Antônio, que participam ativamente da luta em defesa dos direitos dos povos indígenas, abro aspas:
[...] o poder Legislativo se tornou, através da bancada ruralista, o principal articulador e mobilizador das teses anti-indígenas no país. Eles promovem diversas campanhas, via parlamento e através das redes sociais, dentre outras, contra os direitos dos povos indígenas e das comunidades quilombolas. Em essência, o que [a Bancada Ruralista] [...] pretende é legitimar todas as formas de violência, tendo em vista a exploração das terras, de modo predatório. Diante deste quadro, os projetos, as leis...
(Soa a campainha.)
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) -
... e emendas à Constituição Federal elaborados por parlamentares para aniquilar com a possibilidade das demarcações de terras serem realizadas, em regra, devem ser caracterizados como ilegais. Para se ter uma ideia da articulação e da força que se volta contra os povos indígenas, [...] [sabem quantos projetos tramitam hoje, no Congresso Nacional? Projetos para tirar os direitos de vocês? Sabem quantos? Mais de cem], mais de 100 proposições que alteram artigos concernentes aos direitos indígenas e quilombolas.
Vejam como a nossa luta é árdua, como o nosso desafio é grande!
Não é possível [de maneira nenhuma, repito] dissociar...
(Soa a campainha.)
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) -
... os altos índices de assassinatos e suicídios ocorridos no Brasil ao longo do ano deste contexto.
Fecho aspas. Isso é o que diz o estudo realizado por Lúcia Helena e Antônio Roberto.
De forma que eu quero concluir, Senador Telmário, dizendo aqui que o Parlamento brasileiro deve uma resposta aos nossos povos originários. E falo aqui em nome do PT. Quero aqui, em nome da Bancada do meu Partido, o Partido dos Trabalhadores, dizer a vocês que estaremos sempre ao lado de vocês nessa luta, estaremos sempre aqui para cobrar deste Parlamento respeito para com a história dos povos indígenas, respeito para com os seus direitos, porque nós temos consciência da importância dos povos indígenas para o nosso País. Por isso temos que estar juntos com vocês, com os movimentos sociais, com a Igreja, para barrar os retrocessos e zelar pela cidadania das comunidades.
Aos povos indígenas lá do meu querido Rio Grande do Norte, do Nordeste, de todo o Brasil, quero aqui dizer que estaremos aqui vigilantes na luta, inclusive para defender um orçamento que signifique garantir assistência, saúde, educação e a sustentabilidade dos seus territórios.
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Por isso, concluo mais uma vez saudando o Senador Telmário e dizendo aqui, por dever de justiça, que ele é um grande defensor, é a voz dos povos indígenas aqui, no Congresso Nacional.
(Soa a campainha.)
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - E é uma voz com legitimidade. É uma voz de quem tem raízes nessa história, de quem conhece, de fato, o drama que os povos indígenas vivem no seu Estado, vivem no País, pelo quanto, infelizmente, de direitos ainda lhes são negados.
Por isso, Senador Telmário, nenhuma vida indígena a menos. Chega de genocídio. Vivam os povos indígenas do Brasil! Demarcação e proteção já! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Que bom. Sempre é bom ouvir a Senadora Fátima.
A Senadora Fátima bota o seu mandato a serviço do povo, principalmente das pessoas excluídas. Todas as causas daqueles que, realmente, não recebem a política pública necessária...
(Soa a campainha.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - ... a Senadora Fátima levanta a sua voz nesse sentido.
Eu não tenho nenhuma dúvida de que, com toda a sua experiência de luta pelo povo, mesmo sem mandato, depois com mandato federal, agora como Senadora, Fátima, você está preparada, preparadíssima para assumir o Governo do seu Estado.
O Rio Grande do Norte passa pela pior crise da sua história. E a crise do Rio Grande do Norte é a crise do meu Estado, é uma crise de continuidade das mesmas famílias. Está na hora do Rio Grande Norte experimentar a administração da Fátima, porque a Fátima tem amor pelo povo. E gosto quando você diz que o povo precisa ter o seu espaço. Tomara que lá tenha! Que as comunidades indígenas tenham o aconchego da Governadora Fátima.
Um abraço. (Palmas.)
Deixe-me falar... Sempre que se faz audiência aqui, a gente passa uma hora, duas horas a mais. Já vamos para uma hora a mais do que o previsto. Então, eu quero aqui só dizer que nós temos mais três vozes para serem...
Primeiro, eu quero agradecer a presença dos servidores da Funai aqui. Muito obrigado.
Mas eu quero aqui ainda conceder a palavra para três pessoas: primeiro você, Paulo, Paulinho Paiakã, vai falar; em seguida, a Ten. Sílvia vai falar também, por cinco minutos; e você também vai falar por cinco minutos.
Vamos ouvir o Paulinho Paiakã.
O SR. PAULINHO PAIAKÃ - Bom dia a todos. Bom dia, meus parentes; bom dia, Senador; bom dia, meus parentes, Marcos Terena, Álvaro Tukano, nosso Procurador.
Eu tenho um ponto para falar sobre o que nós indígenas estamos vendo. Eu não vou falar como o índio que se formou no conhecimento da sociedade branca; mas eu vou usar a linguagem de vocês, a linguagem portuguesa.
Eu sou cacique, eu sou líder, eu sou guerreiro, eu sou caiapó. E lutei e até hoje estou lutando ainda pelos nossos direitos, dos povos indígenas.
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Eu quero citar primeiro ponto, falar primeiro ponto, Senador, como a minha prima Tuire falou: autoridade é autoridade, mas não é autoridade de ficar falando mal, ficar criticando. Nós indígenas estamos recebendo muitas críticas. E essas críticas que os Parlamentares fazem contra nós... Eu acho que eles estudam para fazerem isto, para fazerem crítica.
Como algum dos amigos Senadores falou, vou repetir, é muita terra para pouco índio. Eu estou devolvendo a mesma crítica também: as pessoas que falam isso têm ciúme. E a verdade é que não têm... Então, por isso estão falando de nós índios, que pouco índio tem muita terra. E não sabem que nós somos os primeiros habitantes, que temos direito de ter, de ter muita terra. Quando chegou o povo português aqui, viu que nós já ocupávamos essa terra. Então, esse político tem que entender isto: de 1500 a 2018, somos resistentes no nosso País, nesta terra que é chamada Brasil.
O segundo ponto que eu quero falar - a Senadora acabou de falar sobre a Funai, meu irmão Álvaro Tukano falou, e outros Senadores falaram também - é sobre a Funai. Senador, eu tenho dito para algum Presidente da Funai a importância da Fundação Nacional do Índio. A Fundação Nacional do Índio é muito importante. É importante por quê? Porque essa instituição federal está tomando conta de nós povos indígenas e precisa ser respeitada e precisa ser fortalecida para que a Funai continue cuidando, tomando conta de nós povos indígenas.
Eu vi, acompanhei que muitas pessoas, como antropólogos, entraram na terra nossa, na terra de índio, nas aldeias; foram muitas pesquisas, muito estudo feito sobre nós índios. E que resultado essas pessoas têm para devolverem para nós? O que é que nós somos? Sem resultado, eu vou responder: nós índios estamos sendo considerados como objeto; só pesquisas, pesquisas, e não há resultado de volta para os povos indígenas. E, quando vão pesquisar as riquezas, há resultados: há tantas toneladas de minério, há tantas toneladas de não sei quantas riquezas... Há resultados. Agora, quando estudam a questão do índio, eles somem com os resultados.
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Então, Senador, parentes, estou aproveitando para falar isso, repetindo o que falou minha prima.
Naquele tempo, autoridades brancas recebiam nossos parentes, autoridades indígenas, nas décadas de 30, 40, 50, 60, 70, 80 até 90. De 1990 em diante, as autoridades passaram a receber os indígenas com spray de pimenta. Eu quero que o Senado acompanhe isso e nos ajude quando nós viermos para as audiências, para que possamos ter liberdade como brasileiros natos, brasileiros legítimos, para que possamos ter autoridade para conversar com o nosso Governo.
Senador, há muitas coisas que a própria sociedade não indígena faz e que coloca nós índios como culpados. Nós índios estamos consertando, estamos tentando consertar os erros que o branco faz. Quantas barragens foram feitas nos rios e que estragaram nossos rios? Quantas estradas passam pelas florestas, destruindo as nossas florestas, destruindo nossos animais, destruindo nossos rios? Isso é erro de índio? Índio não sabe fabricar máquinas. É tanta degradação que o homem branco comete! Enquanto um índio, como meu irmão Alvaro Tukano falou, é proibido... Quem poderia dizer para o branco o que é proibido seríamos nós índios.
Nosso Procurador, eu quero pedir que o povo respeite o que está na lei. Antes de aprovar um projeto, antes de escrever um projeto, tem que ouvir a comunidade; e não ficar isolando essa lei, fazer o projeto; e, depois do projeto, avisar o índio. Isso não pode acontecer mais.
Essa é a minha fala, fala que eu quero deixar para os nossos parentes e para as nossas autoridades.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Eu queria, antes de convidar a nossa próxima convidada para vir à tribuna...
Cadê o Jair? Está aí? Aqui, Jair, venha pra cá.
E a Rayane? Rayane, venha aqui rapidinho.
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A Rayane e o Jair são os dois servidores indígenas que nós temos no Senado. A cara do Jair já diz tudo. Não precisa de outra coisa. A Rayane também é servidora do Senado. Ela é uma pessoa muito importante aqui dentro. Tenho dito que tem de aumentar... O Jair é do quadro definitivo, não é Jair? Ele é do quadro e é temporária. Então, são dois servidores.
Façam a foto aqui! É importante. Venham aqui, gente. Façam a foto aqui! Venham cá! Hoje é o dia mais lindo dele, porque eu vou colocar o cocar nele. Ele fica desesperado. (Risos.)
A Rayane, inclusive, agora foi a Roraima coordenar a campanha dos jogos indígenas. Colocamos recursos para o Ministério do Esporte, e ela foi lá. Então, quero parabenizá-la. Ela é muito guerreira e lutadora.
Uma salva de palmas para os dois. (Palmas.)
A Rayane é bonita, o Jair é médio! (Risos.)
Um abraço.
Agora eu queria franquear a palavra, já para encerrar, à Tenente.
Tenente, cinco minutos para você, e cinco minutos para a nossa querida Angelita.
A SRª SILVIA NOBRE WAIÃPI - Awari Katuté. Indé iaponé? Iaponé i'jhé.
Primeiro, falo na minha língua, para que vocês saibam que eu existo, porque um povo que não preserva a sua identidade nem guarda a memória dos seus mortos não sabe de onde veio nem sabe para onde vai.
O que nós fazemos aqui? Vou-me remontar a um passado: 19 de abril de 1649, em Guararapes, brancos, negros e índios fundamentavam a história deste País, lutando por uma República - num dia 19 de abril.
Hoje, em 2018, vemos o mais novo desmonte da Funai. Falam tanto em brasilidade, em valores históricos, em amor à Pátria, em valores éticos e condutas morais, e o que nós vemos hoje?
Eu lutei para chegar até aqui. Eu passei fome, eu vendi pedra na rua, eu fui estuprada e fiz da minha dor a minha força, para alcançar o que alcancei nesta sociedade. E ninguém bateu à minha porta.
Hoje o que eu vejo? Novamente, um desmonte. E o nosso povo vai ser dividido. A Funai está sucateada, e um dos nossos grandes valores também de brasilidade, que é o Franklimberg, está sofrendo todas as pressões, tendo o seu nome vituperado, tendo a sua administração destruída por interesses escusos.
Então, o que eu observo...
(Intervenção fora do microfone.)
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A SRª SILVIA NOBRE WAIÃPI - Exatamente. Nós precisamos justamente disto: de transparência. Agora é impossível, é impossível tendo isso com povos indígenas divididos. E é isto que as pessoas estão fazendo: tentando nos dividir.
Eu quero finalizar apenas com um texto, de aprovação da Raquel, que gosta muito dele, que acho que vai finalizar isso tudo. Ele diz assim:
Pinto o meu corpo com as cores da mata.
Enfeito-me com as penas dos pássaros.
E tento fugir daqueles que mentem.
Daqueles que prometem e não cumprem.
Daqueles que tentam calar a nossa voz.
[São] Mil guerreiros!
[Milhões de] [...] espíritos!
Milhões de sonhos...
Nosso povo iludido e massacrado
chora pela terra que não é mais sua,
[chora] pela terra banhada com o sangue dos nossos bravos!
Sei que tu me olhas e pensas:
- Que animal é esse?
- Que ser estranho é esse que vem da floresta e contesta?
[...]
Contesto o amor prometido e que nunca veio!
[Contesto a lei que os invasores impuseram.]
[...]
Contesto o deus que me obrigaste a servir!
Brigo pela terra que era minha!
Pelo sonho que não se perdeu!
Brigo [em nome] [...] dos meus antepassados.
Brigo em nome do Espírito do nosso Deus!
Onde estavas tu, quando os pássaros para nós cantavam?
Onde estavas tu, quando nossas [mulheres choravam ou quando os nossos homens morriam] [...]?
[...]
Tu não choras, porque essa terra não é tua.
Tu não choras porque o [sangue não é teu] [...].
Tu não choras porque o sangue vertido nas matas não é
e nem será o do teu filho! Mas será o do meu! (Palmas.)
[...]
Porque um povo que não preserva a sua identidade e nem guarda a memória dos seus mortos não sabe de onde veio e nem sabe para onde vai...
É por isso que não te comoves!
É por isso que não me ajudas...
[...] porque a dor não é tua.
Mas o lamento é meu!
Tu não choras
porque essa Terra não é tua!
Esse sonho não é teu!
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Arrasou! Eu acho que ela tinha que encerrar, porque agora até o Paulo Paim está chorando para poder ir para lá. Olha, Silvia, vou te contar uma coisa: fiquei sem palavras. Você tocou profundamente. Ganhamos a manhã em te ouvir. Obrigado por você estar presente. Hoje é o Dia do Exército. Para você representa duas vezes: representa o seu povo e representa a sua carreira, a sua profissão.
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Quando você estava ali naquela tribuna, os seus olhos falavam com o seu coração, falavam do seu amor, falavam do seu sentimento. Tudo o que você sentia, você fez todos aqui sentirem, as dificuldades que lhe foram impostas, os traumas que você viveu. Mas sabe, Silvia, todos os escolhidos de Deus não tiveram vida fácil. Jó, Davi e Daniel sofreram muito, mas chegaram lá. E você é uma abençoada de Deus. Você chegou lá.
Uma salva de palmas, porque ela merece. (Palmas.)
Chegou agora o pai dos servidores do Brasil, o Senador Paulo Paim.
Eu quero uma salva de palmas para ele. (Palmas.)
Ele fez de tudo para estar aqui conosco.
Eu passo a palavra rapidamente para Angelita, por cinco minutos.
Em seguida, o Paulo Paim encerra a nossa sessão. Está bom?
Obrigado.
A SRª MARIA ANGELITA DA SILVA - Eu saúdo as crianças, porque, quando eu cheguei aqui, perguntei a uma menina indígena: o que você veio fazer aqui? Você está numa festa ou num encontro político? Ela sorriu para mim e disse que estava numa festa. Eu saúdo as mulheres que estão aqui, os anciãos, as anciãs. Eu saúdo todas as pessoas. Eu saúdo as pessoas da Mesa. Eu saúdo o Senador Telmário Mota.
Peço licença para fazer um trabalho de memória.
Na semana do índio, em Maringá, no sul do País, no Estado do Paraná, eu era professora de terceiro ano de 38 crianças, num colégio confessional. E eu precisava trabalhar a data comemorativa do Dia do Índio e a Páscoa, que coincidiram de ser na mesma semana.
Quando eu coloquei em letras garrafais a palavra índio, numa cidade burguesa, do sul do País - normalmente as pessoas costumam dizer que o sul do País é quase uma Europa no sentido do frio e de outros aspectos -, eu imaginava que as crianças de oito anos de idade dissessem assim para mim: "Professora, a palavra que eu relaciono com índio é flecha, é rio, é mata, é oca." Para minha surpresa, depois de alguns segundos agonizantes de um silêncio infernal na sala de aula, o povo do fundão - não há o povo do fundão? -, um menino que estava lá no final, na última fila, levantou o dedo e falou: "A única palavra que eu relaciono com índio, professora, é pobre."
Nesse momento, eu fiquei aflita, porque minha aula foi desmontada. A partir de uma única palavra que uma criança de oito anos de idade de uma cidade de médio porte no Paraná podia me dizer, eu voltei para a universidade. E voltando à universidade, eu procurei o Laboratório de Etnografia e História. Hoje eu faço doutorado em educação, na Universidade Estadual de Maringá, na temática indígena. Lá um professor me contou que, naqueles dias, aconteceria uma oficina de revitalização da cultura e da língua de um povo originário e do nosso Estado. E, pasmem, eu não conhecia esse povo, nunca tinha ouvido falar, e sou maringaense, sou do Paraná. Era o povo xetá. Houve uma aproximação, eles me acolheram e eu comecei a trabalhar com as crianças.
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Em 2015, Senador Telmário Mota, eu estava em casa às 9h da manhã e meu pai gritou lá de cima: "Gel, sobe aqui que há um negócio acontecendo na televisão e eu acho que te interessa." Era uma sessão especial em homenagem ao Dia do Índio, e eu vi essa imagem na televisão: era a imagem de um Senador da República com um cocar bem grandão e colorido. E a gente tem um pouco de desconfiança deste lugar. Eu fiquei grudada na tela da televisão, na TV Senado, nesse dia, era uma quinta-feira, dia 19 de abril de 2015. E ele, entre outras coisas, disse que se reconhecia um Senador dos povos indígenas do Brasil. Então, eu falei: ele tem que saber da existência do povo xetá.
No dia seguinte, eu fui para a universidade, porque a gente nunca tem dinheiro para pagar crédito de celular, e eu tinha - agora eu vou contar em rede nacional que eu tinha um código - um código do ramal e liguei para o gabinete desse Senador. Ele tinha voltado para o seu Estado de origem, o que é de praxe acontecer. E eu falei: meu nome é Maria da Silva, sou aqui do sul do País, e aqui existe um povo chamado xetá. Se esse Senador se considera o defensor nesta Casa das populações e dos direitos indígenas, ele tem que vir ao Paraná conhecer esse povo.
Ele não estava lá, mas um assessor dele estava. Então, cinco minutos depois, esse assessor ligou para mim e falou: "Olha, no adiantar da hora, eu não sei se eu consigo fazer com que se organize a agenda do Senador para ele estar no Paraná." Eu liguei, Senador, para dizer que aquela sessão tinha me emocionado. É como os irmãos disseram bala de borracha, spray de pimenta, falando que tacacá é coisa que não pode entrar no Senado. De repente, vimos toda a Casa colocada nesse sentido.
E esse assessor, que se chama João Rios, falou: "Não sei se consigo fazer com que o Senador esteja aí no próximo mês, porque teríamos um congresso internacional de educadores sociais." Mas você liberou o seu assessor para estar lá. E, naquele mês, ele esteve na terra indígena e conheceu o povo xetá. E muito da regulamentação do educador social - e eu sou educadora social - está acontecendo hoje aqui por conta desse telefonema, porque um assessor tomou as rédeas e falou: "O Senador vai estar lá de alguma maneira."
A história que eu estou contando está neste livro. O curioso é que as crianças xetás hoje, quando vão estudar a história e geografia do Paraná, têm que aprender que elas não existem, porque os livros didáticos dizem que elas não existem, que o povo foi extinto, que hoje só há um, dois, cinco ou sete indígenas do povo xetá.
Nós hoje estamos aqui, Senador Telmário Mota, e eu vou passar a minha palavra para o Vice-Cacique Claudemir da Silva, cujo pai lutou muito aqui e morreu aqui em Brasília, lutando, para presentear o senhor; e, ao presenteá-lo, presentear todo mundo que está aqui, porque hoje, para desmentir a tese da extinção, nós temos um livro da memória atual do povo xetá dos últimos sete anos. (Palmas.) E nós temos um livro da memória ancestral, que tem fotografias inéditas, que eram fotografias de álbum de família. Eu fui a Umuarama, falei com a Tiguá, e o álbum de família dela é dos ancestrais, daqueles antropólogos que tiraram fotos.
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(Soa a campainha.)
A SRª MARIA ANGELITA DA SILVA - Então, por favor, Claudemir da Silva, Vice-Cacique do povo xetá, ocupe o lugar do Senado, da tribuna, para que você possa apresentar esse presente.
Eu queria pedir uma salva de palmas para o povo xetá e para o Claudemir da Silva. (Palmas.)
O SR. CLAUDEMIR DA SILVA - Bom dia a todos e a todas. Bom dia a todos os meus parentes, porque quando se fala dos povos indígenas, nós não definimos a etnia que é, mas sim somos todos parentes. Porque o sofrimento de um indígena é de todos. A minha luta é a luta de cada indígena que aqui se encontra hoje.
Eu vou falar pouquinha coisa, porque a maioria já foi falada. Até inclusive a questão do recebimento dos indígenas aqui nesta cidade chamada Brasília.
Quando nós indígenas vimos aqui a esta cidade, somos considerados os maiores bandidos, os maiores desertores, recebidos à pancada, à bala de borracha, a spray de pimenta. Então nós somos a maior ameaça dentro desta cidade chamada Brasília.
Para mim hoje, eu quero que vocês me desculpem, porque vocês estão fazendo uma coisa muito linda, a homenagem a nós indígenas, mas eu tenho com a minha pessoa que este dia 19 de abril, para mim, eu não comemoro. Vocês me perdoem do fundo do meu coração. Eu admiro e respeito cada um que aqui hoje se encontra. Mas para mim este dia não é um dia comemorativo, que foi o dia em que se fala que foi descoberto o nosso querido Brasil, mas muito pelo contrário: foi invadido, e foi um massacre de nós indígenas. Vocês me perdoem essa minha palavra, mas se eu não falasse isso, eu não ia voltar feliz para a minha aldeia.
E quero agradecer desde já a essa Mesa maravilhosa e a todos os parentes, aos demais Senadores que aqui se encontram.
Eu gostaria de presentear o Senador Telmário Mota com este livro, que eu quero que... Aqui está a história de um povo que, no Estado do Paraná, dizem que não existe, que é um fantasma. Mas aqui está um fantasma vivo, presenteando um Senador com a nossa história do povo xetá. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - O João fica todo alegre, porque o João foi quem foi designado para ir lá ao Paraná ver essa questão do povo xetá, junto com a...
Muito obrigado, muito obrigado. (Palmas.)
Obrigado, obrigado.
Criança xetá. Lindos!
Bom... Aqui é bom, a gente quebra tudo quanto é protocolo.
A SRª MARIA ANGELITA DA SILVA - Minha gente, parentes, pessoas que estão por aí, até quem estiver fora, hoje às 15h, na Biblioteca do Senado, haverá o lançamento desses livros. Do Nhanderetá, que é um livro de contos, de literatura, que usa a mitologia xetá para contar a história xetá. E haverá o lançamento do livro Criança xetá - da memória da Infância à resistência de um Povo.
Nós esperamos todas e todos lá.
Obrigada.
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(Durante o discurso da Srª Maria Angelita da Silva, o Sr. Telmário Mota deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pelo Sr. Paulo Paim.)
(Durante o discurso da Srª Maria Angelita da Silva, o Sr. Paulo Paim deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pelo Sr. Telmário Mota.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Está dado o recado. (Palmas.)
Já encerrando aqui, nós não poderíamos deixar de ouvir essa voz que acalenta o servidor, que acalenta o trabalhador, que acalenta os idosos. Essa voz sempre está ativa, ela sempre está a serviço, não do Rio Grande do Sul, mas a serviço de todo o Brasil.
É uma honra enorme, em uma sessão solene como esta, especial, onde a gente pôde debater toda as causas indígenas dentro do que foi possível, ouvir agora nosso querido e amado Senador Paulo Paim, que está com a palavra. (Palmas.)
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Meu querido amigo Senador Telmário Mota, eu estava presidindo uma outra sessão que discutia a dívida dos Estados.
Confesso a vocês que eu estava presidindo lá, mas o meu coração dizia... (Pausa.)
Tu tens que ir ao plenário... (Pausa.)
Recebi o discurso pronto, ele está aqui. Ele é técnico, é ilustrativo, fala da dívida que este País tem com vocês, mas eu não vou ler o discurso. Deixo nos Anais.
Telmário, uma sessão como esta tem que ficar cravada em nossas mentes e tem que ir para a história do nosso País. Quem de nós não tem claro - eu digo meu Deus, meu Deus - que a nação indígena, em sua grande maioria, foi violentada, assassinada, torturada e retirada do seu berço natural que é a terra? Quem não sabe?
Este País tem uma dívida histórica com vocês. Tem com os negros? Tem. Eles foram sequestrados em seu continente natal, o continente africano, e aqui viraram escravos. Mas vocês estavam aqui, cultivando a terra, defendendo o meio ambiente, sendo parceiros da natureza, amando o rio, as águas, as florestas, o sol, as estrelas.
E vocês só queriam isto: "Deixem que a gente viva em paz nesta terra chamada de Pau-Brasil." E ali surgiu o nome.
Hoje, na Comissão de Direitos Humanos, e digo que, nesses anos todos que eu passei por lá, foram inúmeras audiências. E aqui vocês dizem corretamente, o protesto. Audiência, sim; discurso, sim, mas muito poucas foram as soluções.
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Onde estão as soluções para garantir definitivamente os espaços dos seus antepassados? Aqui? Ao longo dos corredores, onde vejo crianças sentadas com as mães, como se estivessem na oca, como V. Exª dizia?
O Brasil tem uma dívida com vocês que não é paga com dinheiro, mas é paga, sim, com infraestrutura, atendendo às demandas, mantendo as tradições da comunidade indígena, com carinho e o amor que vocês merecem. Claro que eu entendo, jovem, quando vai à tribuna e diz: "Eu não estou aqui para festejar porque eu não tenho nada a festejar. Eu estou aqui para protestar", e é assim que eu subi nesta tribuna irmanado com vocês, solidário a vocês.
Eu recebo, Telmário, principalmente por teu intermédio, muitos relatos da realidade do povo indígena e aqui da tribuna, Telmário, eu só quero dizer que dizem que quem defende quilombola e indígena não ganha voto. Eu diria para aqueles que dizem isso que eles não entendem que as políticas humanitárias é que norteiam a nossas vidas. Com voto ou sem voto, eu quero dizer que eu amo o povo indígena. (Palmas.)
Quero dizer que caminharemos juntos como sempre caminhamos, Telmário. Tantos anos nesta Casa - desde a Constituinte estou - e muitas vezes vi, sim, quando a delegação indígena chegava, aquele preconceito que têm contra negro e que existe contra indígena também. Eu via no olhar de alguns e, vocês sabem que existe, dizia: Qual é o problema? São nossos antepassados que estão aí, que é a mistura do nosso povo. Mas via no olhar de cada um - e aqui vocês representam toda a nação indígena do nosso País - o olhar de esperança, o olhar de dizer, não pedindo, implorando nada: "nos deem somente aquilo que é nosso, somente aquilo que é nosso". E vocês, com o olhar, apontavam.
Aqui, por mais que eu lesse esse pronunciamento, nem chegaria perto das falas das duas últimas que ouvi aqui: daquela Srª - como é o nome da senhora? -, a Tenente Silvia; e da outra senhora que ouvi quando cheguei e que foi a última a falar, a Angelita. Vocês - e também quando é um discurso lido - falavam e falavam com a alma, com o coração, com sentimento, com a energia, diria, das florestas, dos rios, da natureza, dos animais, mas principalmente falavam com a alma do povo indígena.
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Um dia, eu ouvi uma frase que jamais esqueci que diz o seguinte: "Quando eu morrer, enterre meu coração na curva do rio." Foi um grande cacique indígena que disse essa frase. Isso mostra o amor por aquilo que é mais nobre, que é a vida, porque a vida é a água, a vida é o rio, a vida é o vento, a vida são os pássaros, a vida são os animais na floresta, a vida é o que vocês plantam para alimentar seus filhos e a caça, que é natural.
Amigos, se eu pudesse, eu confesso... Uma vez, aqui, na Constituinte, recusaram um aumento mínimo do salário mínimo. Eu queria só que o salário mínimo chegasse a US$100. Saí da tribuna, fui ali, me ajoelhei e pedi. Eu quero terminar com isso. Telmário, permita-me... Telmário, eu quero sair da tribuna... Porque não é o discurso que resolve, mas eu acho que o gesto vale mais que mil palavras.
Eu vou sair daqui, vou me ajoelhar ali e vou pedir perdão ao povo indígena. Mas que esse meu gesto, de joelhos, pedindo perdão em nome de todos os brasileiros, seja uma mensagem para que atendam às reivindicações básicas dessa gente tão querida, tão sofrida, tão amiga...
E lembro aqui que, lá no meu Rio Grande, quando queriam invadir o Brasil, foi Sepé Tiaraju que disse "esta terra tem dono", e ninguém entrou por aquela fronteira. Eles pelearam, pelearam até morrer.
Vida longa à nação indígena! Que a imagem de Sepé e de tantos líderes da história do povo indígena nunca seja esquecida!
Permita-me, Telmário, que eu saia da tribuna e faça este gesto, que é um gesto de coração. Eu quero pedir perdão a esse povo todo. Perdão! Perdão, nação indígena! Perdão! Perdão!
Um abraço a todos vocês.
DISCURSO NA ÍNTEGRA ENCAMINHADO PELO SR. SENADOR PAULO PAIM.
(Inserido nos termos do art. 203 do Regimento Interno.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Moderador/PTB - RR) - Esse é o Senador Paulo Paim. Esse é o homem que dá um exemplo vivo.
Inclusive, quero agradecer a presença aqui, na galeria, de todos os universitários dos cursos de Contabilidade e Administração da UniEvangélica, de Anápolis, Goiás.
Obrigado pela presença.
É muito bom vocês estarem aqui, nesta sessão solene, porque amanhã vocês serão, sem nenhuma dúvida, os contabilistas da iniciativa privada e os administradores da coisa pública e privada. E é bom que universitários como vocês possam presenciar que nem todo homem público está corrompido, que nem toda a nossa política está destruída; ainda há pessoas com o espírito e o sentimento que o Paulo Paim aqui demonstrou.
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Bem, agora, cumprida a finalidade da sessão, agradeço a todas as personalidades que nos honraram com seu comparecimento e encerro a presente sessão.
Muito obrigado a todos.
(Levanta-se a sessão às 12 horas e 40 minutos.)