1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA
56ª LEGISLATURA
Em 14 de março de 2019
(quinta-feira)
Às 9 horas
22ª SESSÃO
(Sessão Especial)

Oradores
Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. Bloco Parlamentar PSDB/PODE/PSL/PSDB - MG) - Declaro aberta a sessão.
Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos.
A presente Sessão Especial é destinada a comemorar os 98 anos do jornal Folha de S.Paulo e a homenagear, in memoriam, o Diretor de Redação Otávio Frias, nos termos do Requerimento nº 15, de 2019, de autoria da Senadora Kátia Abreu e de outros Senadores.
Tenho a honra de convidar para comporem a mesa o Exmo. Sr. Presidente da Câmara dos Deputados, Deputado Federal Rodrigo Maia; S. Exa. a Senadora Kátia Abreu, requerente da presente sessão; o Exmo. Sr. Ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes; o Exmo. Sr. Governador do Distrito Federal, em exercício, Paco Britto; o eminente Vice-Presidente do Conselho Federal da Ordem, Dr. Luiz Viana; e a Diretora de Editorial e Redação do jornal Folha de S.Paulo, Sra. Maria Cristina Frias. (Pausa.)
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Convido a todos para, em posição de respeito, acompanharmos o Hino Nacional brasileiro.
(Procede-se à execução do Hino Nacional.)
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O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. Bloco Parlamentar PSDB/PODE/PSL/PSDB - MG) - Eminente Presidente da Câmara dos Deputados, Deputado Federal Rodrigo Maia; Sra. Senadora Kátia Abreu, requerente desta sessão; Exmo. Ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes; Exmo. Governador do Distrito Federal em exercício, Paco Britto; eminente Vice-Presidente do Conselho Federal da Ordem, Dr. Luiz Viana; Exma. Sra. Diretora de Redação do jornal Folha de S.Paulo, Maria Cristina Frias; autoridades civis e militares aqui presentes; Sras. Senadoras e Srs. Senadores, "realizam-se amanhã, em todo o território da República, as eleições dos representantes dos Estados ao Congresso Nacional". Essa era parte da notícia estampada em um emaranhado de caracteres, sem fotos ou leiaute rebuscado, na edição nº 1 da então Folha da Noite.
O mundo acabava de sair da grande guerra. E 1921 foi o ano em que Albert Einstein foi reconhecido com o Nobel de Física e em que, nas páginas do recém lançado jornal, uma manchete anunciava também a morte da Princesa Isabel. De lá para cá, quantas eleições cobriu? Quantos fatos noticiou? Quantas opiniões veiculou?
Com o fim da República Velha, adquirida, então, por um liberal cafeicultor, a então Folha da Manhã se posiciona contrária ao Estado Novo. Pouco a pouco, o jornal cresce em tiragem e em leitores, quando, em 1945, adota "a busca da imparcialidade" como política redacional.
Continua, assim, acompanhando a história, ajudando a construir o Brasil, relatando os fatos, como a disputa entre um marechal do Exército e um brigadeiro à Presidência da República; o retorno e o suicídio de Vargas; a chegada de Juscelino ao poder; a transferência da Capital para Brasília; as polêmicas e a renúncia de Jânio Quadros; as reformas de base; as controvérsias em torno de Jango; os acontecimentos de 1964. Dessas histórias, nenhum capítulo se passou sem que fosse relatado e debatido nas páginas da Folha.
E foi em 1962 que Octavio Frias de Oliveira e Carlos Caldeira Filho assumiram o controle acionário do veículo de comunicação. Nesse período, nosso homenageado, Otavio Frias Filho, ainda com cinco anos de idade, crescia, junto com o jornal de seu pai.
No regime militar, a Folha viveu, como o Brasil, a efervescência da época. Se, em um primeiro momento foi cobrada pelo apoio dado ao regime durante o início de sua vigência, posteriormente foi um dos veículos mais críticos ao sistema. E não se furtou de décadas mais tarde, sob o comando de Frias Filho, em editorial corajoso e histórico, reconhecer equívocos. "Este jornal deveria ter rechaçado toda violência, de ambos os lados, mantendo-se um defensor intransigente da democracia e das liberdades individuais", afirmou em 2014.
Foi no turbilhão do regime militar, das discussões políticas e sociais daquela época, que crescia e se formava Otavio Frias Filho. Vivia ele, àquela altura, como qualquer jovem, com seus momentos de dúvidas, de contestação e de angústias. Convivia, ao mesmo tempo, com alguns dos mais célebres nomes da cultura e do jornalismo brasileiro. Pensava em ser cientista, professor universitário, político, psicanalista. Mas foi obrigado a, literalmente, morar no jornal para evitar a exposição e os riscos ao regime, época em que caminhões e veículos da empresa foram queimados.
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Faço todas essas reminiscências, Sras. Senadoras, Srs. Senadores, eminentes autoridades, porque nós somos o fruto da nossa história. E a Folha ajudou a construir e a contar, diariamente, a história do Brasil dos últimos quase 100 anos. E isso não é pouca coisa.
Foi assim, com incentivo e permanente carinho do pai, que Otavio Frias Filho assumiu o protagonismo na Folha.
Em 1984, ele começou a revolucionar não apenas o jornal de sua família, mas o jornalismo no Brasil, no processo conhecido por todos como Projeto Folha. O jornal lança seu manual de redação, até hoje referência na imprensa, em que oferece nova proposta editorial, com um jornalismo crítico, pluralista, apartidário e moderno.
Em um período de intensas transformações no Brasil, a Folha também se transformava e transformava, junto, a forma de se produzir e de se pensar o jornalismo em nosso País.
A Folha participou, não apenas como órgão noticioso, mas como verdadeiro agente transformador, do processo de redemocratização, da discussão e promulgação da Constituição Cidadã, da eleição e impeachment do Presidente Collor, do Plano Real, do Governo de Fernando Henrique, de Lula, Dilma e Michel Temer, ajudando a construir, a escrever e a noticiar a nossa história.
Como diretor de redação, Otavio Frias Filho, da mesma forma, foi protagonista da sua história, da de seu jornal e do jornalismo brasileiro contemporâneo.
Merece, pois, nosso reconhecimento, aplausos e homenagens porque, com isso, ajudou a consolidar nossa imprensa e nossa democracia, ainda, na época, frágil e cheia de falhas, mas, agora, cada vez mais forte e com vontade e disposição de melhorar.
Por vezes - e isso acontece - a imprensa pode errar, pode incomodar, pode não ser justa, mas o jornalismo - sério, isento, objetivo e responsável - continua sendo cada vez mais fundamental para a democracia; para denunciar aquilo que não está correto; para dar luz e voz àquilo que muitas vezes se quer esconder; para fazer com que a política, a sociedade e a Nação possam evoluir e se desenvolver social e democraticamente.
O mundo muda. As ideias mudam. As pessoas passam. Mas o bom jornalismo não pode e não vai morrer.
Celebrar hoje os 98 anos da Folha e homenagear a história e o nome de Otavio Frias Filho é valorizar o trabalho e a dedicação de tantos profissionais jornalistas que deram e dão suas vidas por aquilo que acreditam, que, com seu esforço e labor, buscam colaborar para o fortalecimento de nossa cidadania.
Os desafios são intensos e perenes. A situação do nosso País ainda não é boa. Mas, vejamos todos, como já avançamos e evoluímos. E parcela significativa dessa evolução foi possibilitada por causa do esmero e do trabalho jornalístico
Continuaremos, Sras. e Srs. Senadores, eminentes autoridades, sendo, muitas vezes, criticados, justa ou injustamente. Continuaremos concordando ou discordando de pontos de vistas, do enfoque ou das manchetes de determinadas matérias. Continuaremos informando e sendo informados, ora como fontes, ora como leitores. E - isto é o mais bonito na democracia -, daqui da tribuna deste Senado Federal, continuaremos sempre defendendo a liberdade de expressão e de imprensa, um Brasil democrático, mais justo, menos desigual e muito mais desenvolvido. É assim que deve ser. É assim que será.
Que a Folha possa continuar ajudando a construir, a noticiar e a escrever nossa história. E que o vigor, a ousadia e a determinação de Otavio Frias Filho possam inspirar novas gerações de jornalistas corajosos, responsáveis e comprometidos com um País melhor.
Muito obrigado. (Palmas.)
Concedo a palavra à eminente Senadora Kátia Abreu, autora do requerimento desta sessão de homenagem.
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A SRA. KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO. Para discursar.) - Bom dia a todos!
Quero cumprimentar o nosso Presidente Antonio Anastasia, nosso competente Senador; o Presidente da Câmara dos Deputados, que nos honra com a sua presença, Deputado Federal Rodrigo Maia; o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Sr. Gilmar Mendes - muito obrigada pela presença -; Governador em exercício do Distrito Federal, Sr. Paco Britto; Vice-Presidente do Conselho Federal da OAB Nacional, Sr. Luiz Viana; e a Diretora de Editorial e Redação do jornal Folha de S.Paulo, Sra. Maria Cristina Frias.
Quero cumprimentar a todos os jornalistas que aqui se encontram, Embaixadores, Conselheiro do Conselho Nacional de Justiça, Sr. André Luis, Diretor-Geral da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão, Sr. Cristiano Flores, Diretor-Executivo da Associação Nacional de Jornais, Sr. Ricardo Pedreira, todos os familiares de Otavio Frias Filho, Sérgio Dávila, Diretor-Executivo da Folha de S.Paulo, enfim todos os jornalistas, colunistas importantes do Brasil.
Obrigado a todos pela presença, especialmente a grande maioria da própria Folha de S.Paulo que está aqui no dia de hoje.
Ao celebrar os 98 anos do jornal Folha de S.Paulo e relembrar abriu a biografia e memória do notável Jornalista Otavio Frias Filho, ex-Diretor da Folha, que faleceu no ano passado, aos 61 anos de idade, estamos homenageando também a democracia, a liberdade de expressão em todas as formas, sem distinção ou partidarismos, sobretudo neste tempo de redes sociais, de notícias falsas, de fake news e de duros ataques a quem trabalha para levar aos brasileiros informação essencial à existência de qualquer democracia. Onde há desenvolvimento e nações fortes, existe imprensa livre e independente!
Jornalismo informativo e combativo, como sempre fez a Folha de S.Paulo ao longo de sua história, desde Octavio Frias pai, é essencial para a manutenção de qualquer Estado democrático. Os problemas não estão na imprensa, mas sim nas práticas criminosas, injustiças e irregularidades que ela denuncia com o seu trabalho. A função básica de quem atua com jornalismo é informar e ajudar na correção de rumos, seja de empresas, de governos, ou mesmo da sociedade em seu conjunto. Se a imprensa incomoda é porque está fazendo o seu papel!
Os excessos e abusos cometidos pela imprensa devem ser levados à Justiça, com todo o rigor, por quem se sente injustiçado. E também defendo, com veemência, que seja dado aos inocentados o mesmo espaço dado na imprensa à época das acusações.
Otavio Frias Filho foi, sem dúvida, um desses homens que cumpriu importante papel na modernização da imprensa no Brasil. Foi um dos mais cultos e talentosos do País. Como bem escreveu o jornalista Reinaldo Azevedo, Frias foi "dramaturgo de primeira, jornalista rigoroso, ensaísta ousado, dono de uma inteligência fulgurante e de uma discrição como não se vê". Reinaldo Azevedo descreveu exatamente quem era Otavio Frias.
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Sempre elegante no trato das matérias intelectuais e profissionais, Otavio Frias Filho comandou, por décadas, o maior jornal do País, que completou 98 anos no último 19 de fevereiro, sem perder de vista o contraditório, a pluralidade e a diversidade de vozes. E isso está presente na imensa obra que construiu.
Conheci Otavio em um almoço de trabalho na sede da Folha de S.Paulo. Uma situação comum para ele, mas incomum para mim. Na ocasião, Otavio ouviu com atenção e interesse o que eu disse em defesa da agricultura brasileira e me perguntou: "O que podemos fazer para dar mais atenção ao campo?".
Falei sobre a necessidade de ouvir os produtores a respeito das leis ambientais. Argumentei que a defesa do meio ambiente não é bandeira deste ou daquele grupo, que o ecossistema sustentável é causa da humanidade.
Falamos também sobre a insegurança jurídica, que tanto prejudica a atividade produtiva no País, no campo e na cidade. Falamos sobre os preconceitos contra o setor agropecuário. Falamos sobre economia, falamos sobre política.
Apesar de sua posição de destaque, Otavio sempre conversava com as pessoas, com seu jeito gentil, de saber ouvir, de se interessar pelo que o outro dizia, mesmo se estivesse discordando.
Acertamos outras conversas depois deste almoço de apresentação e iniciamos ali um diálogo que durou uma década e uma amizade que levarei sempre comigo. E, ao longo desses anos, conversamos muito sobre a vida, sobre tudo, sobre o País, que para mim é maior que a política. Nós dois tínhamos histórias radicalmente diferentes, mas havia um ponto em comum: tanto eu quanto ele assumimos cedo responsabilidades muito grandes.
E, cada vez em que eu abria a Folha de S.Paulo todas as manhãs, ficava mais claro para mim que aquele homem havia cumprido todas as obrigações que foram exigidas dele.
Amigo a gente não conhece, amigo a gente reconhece, disse Vinícius de Moraes. Desde o almoço em que o conheci até setembro de 2017, quando ele adoeceu, Otavio Frias agiu como um amigo querido, atento e cuidadoso.
Fiquei honrada e feliz quando o convidei e ele aceitou visitar o Tocantins. Além de Palmas e Formoso do Araguaia, um grande polo de produção de grãos, estivemos também no Jalapão. O excepcional jornalista crítico, apartidário e pluralista que deixou o jornalismo muito melhor - e muito maior - do que encontrou estava ali, ao lado dos artesãos e das artesãs do meu Estado, no Jalapão, conversando sobre a realidade do nosso Brasil profundo. Apreciou os pontos turísticos de uma beleza esplendorosa no Jalapão: tomou banho no fervedouro, caminhou pelas dunas alaranjadas e se emocionou com a força da Cachoeira da Velha.
Se ele estivesse na sede da Folha de S.Paulo ou no interior do Tocantins, era a mesma pessoa: sinônimo de simplicidade e de correção. A vida feliz não se vê com os olhos, disse Santo Agostinho. A vida feliz é a que temos até chegar a noite. Não conheci alguém mais civilizado e mais culto que Otavio Frias Filho, sempre interessado no futuro do País, sempre disposto a discutir saídas para o Brasil, sem que tivéssemos de estar de acordo com ele ou ele conosco.
Naquela altura, fui convidada por Maria Cristina Frias a escrever na coluna Mercado. Escrevi, com total liberdade, centenas de artigos para a Folha dizendo respeito à agricultura brasileira.
Pela primeira vez, de forma contínua e persistente, durante tanto tempo, os produtores rurais participavam do debate nacional através da minha coluna na Folha de S.Paulo. Toda semana, um artigo explicando a força da nossa agricultura, um espaço extraordinário para esse mundo rural, que tanto ajuda o País.
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A exemplo de tantos brasileiros e de tantas brasileiras de todos os matizes políticos, sou testemunha de uma verdade incontestável: Otavio foi um dos principais construtores e um dos maiores responsáveis pelo ambiente democrático deste País.
Aprendi com meu amigo: o bom jornalismo é o melhor antídoto para a notícia falsa e para a intolerância. Também aprendi que um jornal não se faz só por quem o escreve, mas também por quem o lê. Precisamos, cada vez mais, de espaços para o contraditório e para o debate feito com liberdade e independência. Nós somos um mundo civilizado.
Otavio, assim como nós, enfrentou tempos complicados. A destruição dos sonhos dos mais novos, a pobreza entre a maioria da população, os impostos sem as devidas contrapartidas, as políticas sem comando, a sucessão de medidas equivocadas foram e são testes diários à capacidade de não desistir da política, porque ela traz boas soluções para as pessoas e a sociedade. A capacidade de encontrar, dentro de nós mesmos, a força e o amor para continuar a trabalhar por um Brasil melhor e mais justo, a política é capaz disso.
(Soa a campainha.)
A SRA. KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - A Folha de S.Paulo, solidificada a partir do projeto de Otavio, tem imperfeições, como ele admitia, por ser feita diariamente, às pressas, a sangue quente; mas é um jornal com vida, com inconformismo e liberdade de pensamento, como acredito que um jornal de verdade deve ser.
A informação, gostemos ou não, tem o poder de mudar e transformar a vida das pessoas. Quando eu cheguei ao meu Estado, o Tocantins, eu não sabia absolutamente nada sobre agropecuária. Era apenas uma recém-formada psicóloga. E foi com base nas informações, sobretudo as claras e precisas, que criei, por exemplo, meu senso crítico sobre a agropecuária. E isso me ajudou no desafio de me tornar líder nesse importante setor da economia.
Todo brasileiro tem o direito de decidir sobre seu destino. E, em tempos de fake news, informação de qualidade é essencial nesse processo. É esse um dos serviços que cabe à imprensa. Qualquer tentativa de intimidação desse importante pilar da democracia será inaceitável barreira para o acesso à informação ao cidadão. É também negação à democracia.
Por isso, quero agradecer, como cidadã, à imprensa brasileira, da qual muitas vezes fui vítima, e lembrar os inúmeros jornalistas que fazem dessa tarefa de informar o seu trabalho diário. Quero lembrar os mais famosos, além de Otavio, como o jornalista Ricardo Boechat, falecido em tragédia de acidente aéreo no início deste ano, e recordar também os demais operadores diários do mundo da informação, tão essenciais, como é o caso de fotógrafos, cinegrafistas, radialistas.
Encerro com uma frase do jornalista Alberto Dines, um grande pensador, sobre o papel da imprensa:
A imprensa é o espelho do País, mas, como todos os espelhos, é um instrumento polido e trabalhado para que possa representar não só a imagem daquilo que está refletindo, mas aquilo que o objeto gostaria de parecer. A imprensa não deve ser reprodução exata do país que a produz. Tem de ser melhor, para servir de estímulo e fornecer os desafios.
O Brasil tem muitos e enormes desafios neste momento, e penso que precisaremos superá-los. E isso só será possível com a imprescindível atuação da imprensa. Foi duro chegar até aqui. Não aceitaremos retrocessos. São mais de 200 milhões de brasileiros que optaram pela democracia. Custou, inclusive, muitas vidas. Tomografia da democracia: se pudesse ser tirada em qualquer momento, nós examinaríamos o exame de tomografia e enxergaríamos na transparência as instituições, a liberdade de imprensa e o Estado de direito.
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Muito obrigada.
Parabéns, Otavio Frias Filho, por tudo você representou para nós, e à Folha de S.Paulo. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. Bloco Parlamentar PSDB/PODE/PSL/PSDB - MG) - Cumprimentando a eminente Senadora Kátia Abreu, autora do requerimento desta sessão de homenagem extremamente oportuna, eu tomo a liberdade de convidar S. Exa. para assumir a Presidência dos trabalhos.
(O Sr. Antonio Anastasia, 1º Vice-Presidente, deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pela Sra. Kátia Abreu.)
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Mais uma vez, bom dia a todos, todas as autoridades da Mesa, nós iniciaremos com os oradores inscritos pelo Senado Federal, com a representação pelos Líderes dos partidos. Todos os Senadores poderão usar a palavra, mas nós iniciaremos com os Líderes de cada partido, inscritos e convidados indicados pelos titulares.
Senador Eduardo Braga, Líder da Maioria, do PMDB, do Amazonas.
O SR. EDUARDO BRAGA (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - AM. Pela Liderança.) - Sra. Presidente, eminente Senadora Kátia Abreu; eminente Ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, que nos dá a satisfação e a honra de recebê-lo nesta Casa; eminente representante do Governador do Distrito Federal e Governador em exercício, nosso conterrâneo, Sr. Paco Britto, filho do Senador Flávio Britto, de saudosa memória em nosso Estado; Vice-Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados, Sr. Luiz Viana; e eminente Diretora de Editorial e Redação do jornal Folha de S.Paulo, Sra. Maria Cristina, em nome de quem eu quero cumprimentar todos os familiares e todos os funcionários e trabalhadores responsáveis por essa importante instituição da democracia brasileira que representa a Folha de S.Paulo e, em nome também da senhora, quero cumprimentar todas as demais autoridades aqui presentes, que justa sessão especial se realiza hoje neste Plenário, na qual prestamos homenagem a um dos grandes jornais mundiais: a nossa Folha de S.Paulo.
O requerimento, como já é de conhecimento de todos, da Senadora Kátia Abreu e outros colegas desta Casa, não poderia ser mais oportuno. Mais do que nunca, precisamos celebrar o Governo representativo e democrático; mais do que nunca, precisamos celebrar a tolerância e a diversidade de opiniões; mais do que nunca, precisamos celebrar a liberdade de imprensa e a liberdade de expressão.
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Esses valores e essas liberdades, não por acaso, compõem a profissão de fé da Folha de S.Paulo, um jornal que, ao longo de seus quase cem anos de existência, guiou a sua atuação pelos princípios do apartidarismo, do pluralismo e da crítica fundamentada.
O que seria de nós, homens públicos, se não houvesse críticas? O que seria de nós, homens públicos, se não houvesse a liberdade de expressão? E o que seria de nós, homens públicos, se não houvesse o contraditório?
O exercício diário desses princípios faz surgir um jornal de credibilidade ímpar, tornando a Folha a principal referência do jornalismo impresso brasileiro e impulsionando uma série de marcos que compõem a belíssima história dessa publicação quase centenária.
A Folha, Sras. e Srs. Senadores, é um jornal de pioneirismos. É impressionante a lista de inovações que ela introduziu no jornalismo brasileiro, das quais passo a citar algumas.
Desde 1986, a Folha é o jornal de maior circulação no Brasil e, em 1994, foi o primeiro jornal brasileiro a bater a marca de 1 milhão de exemplares aos domingos.
Em 1995, a Folha construiu, e ainda detém, o mais avançado parque gráfico da América Latina. Além disso, em 1968, já havia sido o primeiro grande jornal latino-americano a ser integralmente impresso em offset; em 1971, foi o primeiro jornal brasileiro a adotar a fotocomposição eletrônica, aposentando definitivamente os velhos moldes de chumbo que caracterizavam as gráficas de antigamente; e, em 1983, inaugurou a era das redações informatizadas não apenas no Brasil, mas em toda a América do Sul.
Foi o primeiro jornal a divulgar seu modelar Manual de Redação, aqui já referido. Em 1984, foi o primeiro jornal brasileiro a ter um ombudsman, em 1989.
Para além desses e de outros pioneirismos, o Grupo Folha também atua nas áreas de pesquisa, logística, conteúdo on-line em tempo real, agência de notícias e mais. É uma empresa marcada por um compromisso inarredável com a inovação, a informação, a divulgação livre e democrática de fatos e opiniões, sempre em busca da verdade.
Uma homenagem a um veículo de comunicação da grandeza da Folha de S.Paulo representa, na essência, uma homenagem aos milhares de profissionais que passaram pela redação dos diversos jornais desde a iniciação da imprensa impressa no Brasil - e, no caso da Folha, desde a sua fundação, em 1921. Na impossibilidade de mencionarmos todas essas pessoas aqui, lembramos uma delas, que, tenho certeza, representa o espírito da Folha como poucas e por intermédio de quem celebramos o trabalho de todos aqueles que contribuíram para que a Folha de S.Paulo seja, hoje, uma referência de jornalismo mundial. Refiro-me, obviamente, a Otavio Frias Filho, morto precocemente, seis meses atrás, aos 61 anos de idade.
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Otavio Frias Filho personificava, como poucos, o estilo da Folha e de fazer um jornal e um jornalismo crítico, que dava espaço aos vários lados da mesma história, que buscava o máximo de imparcialidade possível, um jornalismo que respeita a inteligência de seus leitores, apresentando os fatos com isenção e deixando que cada um de nós chegue às suas próprias conclusões. Esse é o verdadeiro jornalismo, que, lamentavelmente, ao redor das mudanças mundiais, seja das novas plataformas de mídia, seja da interatividade direta com setores da opinião pública, muitas vezes, tem sido esquecido nos mundos modernos.
Recentemente, dois grandes professores da questão social e da questão política de uma renomada universidade americana, Harvard, escreveram um livro que hoje é livro de cabeceira de todos aqueles que querem compreender os movimentos sociais e os movimentos democráticos do mundo: Como as Democracias Morrem. As democracias não morrem mais por golpe de Estado. As democracias, em todos os lugares do mundo, estão morrendo, muitas vezes, por autocratas vestidos de democratas, que chegam ao poder e, depois de chegarem ao poder, corrompem a liberdade de imprensa, corrompem o Estado democrático de direito e quebram os fundamentos e os pilares necessários para uma democracia equilibrada e justa.
Para concluir, Sr. Presidente, repito aqui um trecho do depoimento que dei por ocasião da morte desse grande brasileiro:
Comandante de uma revolução jornalística que influenciou positivamente toda a imprensa brasileira [e mundial], foi responsável pela implantação do Manual [repito] de Redação da Folha de S.Paulo com regras plurais, imparciais e democráticas. Sob sua direção, Otavio estimulou a modernização do jornal, hoje uma referência no tratamento dos temas mais diversos com pluralidade e independência.
Não poderia encerrar, como representante do Estado do Amazonas e da Amazônia nesta Casa, sem registrar um episódio que aconteceu comigo, Ministro Gilmar, logo quando assumi o Governo do Estado do Amazonas, lá nos idos de 2003. Chegava eu, um jovem Governador do Estado do Amazonas, à Folha de S.Paulo para conversar com o Dr. Frias sobre a Amazônia. Nós podíamos ver exatamente o brilho nos olhos de alguém que queria conhecer e queria viver...
(Soa a campainha.)
O SR. EDUARDO BRAGA (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - AM) - ... as fronteiras do desenvolvimento e as fronteiras do grande patrimônio brasileiro que é a megabiodiversidade da Amazônia.
Nós brasileiros precisamos conhecer cada vez mais o nosso Brasil, interpretá-lo, decodificá-lo e poder garantir às futuras gerações que teremos um país mais justo, mais plural, mais democrático.
Parabéns à Folha de S.Paulo! Parabéns à Senadora Kátia Abreu! Esperamos todos nós que o Brasil que possamos entregar às próximas gerações seja um Brasil mais plural, mais diverso e mais democrático.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Obrigada, Senador Eduardo Braga.
Convido para a tribuna o Senador Alvaro Dias, Líder do Podemos.
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Registro a presença dos jornalistas Leandro Colon, Thais Arbex, Daniela Lima, Daniela Carvalho, Bruno Boghossian e Orlando Brito.
Com a palavra, Senador.
O SR. ALVARO DIAS (Bloco Parlamentar PSDB/PODE/PSL/PODE - PR. Pela Liderança.) - Presidente Kátia Abreu, inicialmente, os meus cumprimentos pela oportuna iniciativa, inteligente e necessária iniciativa de V. Exa., que aplaudo neste momento.
Saúdo as demais autoridades já nominadas.
Pretendo ser bastante sucinto para reduzir o cansaço que, certamente, toda sessão de homenagens proporciona àqueles que aqui comparecem. Mas, sem dúvida, este tem que ser um momento solene e, muitas vezes, repetitivo.
Há frases que vêm de longe, mas devem ser repetidas para alimentar as nossas convicções democráticas de hoje, especialmente neste momento dramático, histórico e de transição para o nosso futuro, momento da maior importância, que nos convoca à responsabilidade certamente. Por isso, frases que vêm de longe são oportunas nos dias de hoje.
Thomas Jefferson: "Melhor uma imprensa livre sem governo do que um governo sem imprensa livre".
E relembro o conceito de Alex Campos: "Quando se trata de corrupção e impunidade, até um jornalista tem que ter lado. Nenhum de nós pode se dar ao luxo de ser covarde ou demagogo, se escondendo atrás dos compromissos de isenção, imparcialidade e neutralidade". "A imprensa tem, sim, o poder de iluminar histórias obscuras, reacender memórias apagadas e restabelecer verdades distorcidas".
Mais do que nunca, neste momento, a imprensa tem que ser o retrato dessa realidade descrita por aqueles que vivenciaram a construção da democracia em várias nações do mundo. A difusão da informação é a verdadeira guardiã da liberdade.
A ex-Presidente da nossa Suprema Corte, Cármen Lúcia, não nos deixa esquecer que o analfabetismo político se vence com informação. Por isso, a liberdade de imprensa há de ser festejada sempre em todo o mundo.
No marco da celebração desses 98 anos do jornal Folha de S.Paulo, devemos reverenciar a figura emblemática do seu Diretor de Redação, Otavio Frias Filho, falecido no ano passado, responsável pela modernização do jornalismo brasileiro nos idos dos anos 80.
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Ao longo dos 34 anos em que comandou o jornal, ele transformou a Folha no maior e mais influente periódico do País, líder em audiência e circulação, um veículo crítico, independente, pluralista, necessário - eu diria imprescindível.
Acompanhei, durante muitos anos, nesta Casa do Congresso Nacional, a presença do jornalismo investigativo em momentos fundamentais para a limpeza exigida pela sociedade brasileira, especialmente quando da efetivação de Comissões Parlamentares de Inquérito da maior importância, como a dos Correios, a do Mensalão e tantas outras. O jornalismo investigativo, presente sobretudo na Folha de S.Paulo, foi essencial para alimentar as convicções daqueles que entenderam ser necessário aprofundar investigações, revelar fatos. As CPIs não poderiam se constituir instrumentos para esconder e, sim, para revelar as verdades muitas vezes afogadas por aqueles que, exercendo atividade pública preponderante no País, preferiam a escuridão do que a clareza dos fatos.
Frias afirmava com precisão e realismo que o jornalismo, apesar de suas severas limitações, é uma forma legítima de conhecimento sobre o nível mais imediato da realidade. Para firmar sua autonomia, precisa cultivar valores, métodos e regras próprias.
À frente do grande projeto editorial da Folha, cujo mote era que o caos da informação exige jornalismo seletivo, qualificado e didático, Otavio Frias foi um jornalista competente, engenhoso e transformador, que honrou a democracia e a liberdade de imprensa. Os nossos cumprimentos também à jornalista Maria Cristina Frias, Diretora de Redação da Folha, louvando o seu desejo de que a Folha continue um jornal inquieto e em renovação constante.
Para concluir, creio que a melhor forma de conclusão é lembrar Ruy Barbosa que, certamente, com a sua presença aqui, nos convoca também à responsabilidade diante dos fatos vividos hoje neste País:
A imprensa é a vista da nação. Por ela é que a nação acompanha o que lhe passa ao perto e ao longe, enxerga o que lhe malfazem, devassa o que lhe ocultam e tramam, colhe o que lhe sonegam, ou roubam, percebe onde lhe alvejam, ou nodoam, mede o que lhe cerceiam, ou destroem, vela pelo que lhe interessa e se acautela do que a ameaça. [...]
Um país de imprensa degenerada ou degenerescente é, portanto, um país cego e um país miasmado, um país de ideias falsas e sentimentos pervertidos, um país que, explorado na sua consciência, não poderá lutar com os vícios, que lhe exploram as instituições.
Que Ruy Barbosa inspire-nos no dia de hoje.
Muito obrigado, Sra. Presidente. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Muito obrigada, Senador Alvaro Dias. Eu gostaria de ressaltar, agradecendo ao Senador Nelsinho Trad, que é o Presidente da Comissão de Relações Exteriores, que a Comissão começaria às 9h, e a TV Senado deveria estar gravando ao vivo, mas ele adiou o horário de início da Comissão para que esta sessão pudesse ser divulgada na TV Senado e na Rádio Senado.
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Agradeço ainda aos jornalistas Pedro Ladeira, Mônica Bergamo e Eliane Cantanhêde - muito obrigada pela presença - e aos profissionais da TV Senado, da Rádio Senado e da Agência Senado.
Eu pediria permissão aos colegas Senadores e oradores inscritos para que o Ministro da Suprema Corte Gilmar Mendes pudesse usar a palavra, para que possa cumprir os seus compromissos no Supremo.
Muito obrigada.
Com a palavra o Ministro Gilmar Mendes.
O SR. GILMAR MENDES - Bom dia a todos.
Quero cumprimentar a Senadora Kátia Abreu, que me dirigiu esse convite para aqui estar nesta homenagem à Folha de S.Paulo e ao Otavio Frias. Quero deixar os cumprimentos também ao Presidente Rodrigo Maia; ao Sr. Governador em exercício do Distrito Federal, Paco Brito; e ao Vice-Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Sr. Luiz Viana. Cumprimento, especialmente, a Diretora de Editorial e Redação do jornal Folha de S.Paulo, Sra. Maria Cristina, e, ao fazê-lo, cumprimento todos os membros, todos os integrantes desse importante órgão de mídia.
Quando a Senadora Kátia Abreu me convidou para participar desta homenagem, sobretudo para falar nesta homenagem, eu me senti extremamente honrado, porque, como todas as testemunhas da história sabem, vivi, ao longo desses anos, uma relação muito especial com a imprensa e, especialmente, com a Folha de S.Paulo. Eu poderia brincar, Sérgio Dávila, dizendo que eu, em alguns momentos, poderia ser até caracterizado como um de seus ombudsmen. Quantas vezes nós nos falávamos - com você e com Otavio - e quantas vezes a Folha me deu o direito de resposta ou espaço?! E foi assim que aprendi a respeitar Otavio Frias, nesses diálogos que tivemos ao longo de muitos anos.
Otavio Frias, como sabem, já teria, sem nenhum favor, seu retrato na galeria dos grandes brasileiros só pelo jornalista e publisher que foi. Honrou seus pais, seu País; honrou seus colegas de profissão. Em sua proverbial descrição, quase tão grande como seu talento, foi também escritor, dramaturgo, ensaísta, um pensador do nosso tempo por sua inquietude intelectual a serviço da modernização das relações sociais e políticas. Era adversário do atraso, da pompa, das tradições mortas. Mas jamais um inimigo da institucionalidade, da democracia, da pluralidade.
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Como sabem, escolhi fazer carreira na vida pública e já sou um dos mais longevos. Quando olho lá, a minha vida começada nos anos 90, já vejo que lá se vão muitos anos e que muitos que lá estavam já não mais estão.
Todos os que estamos aqui e que levamos o nosso trabalho com seriedade sabemos que isso não é fácil. É claro, como já disse, nem sempre gostei do que a Folha publicou sobre o meu desempenho. Discordei da opinião do jornal muitas vezes. Mas sempre considerei que a imprensa livre não existe para agradar a esse ou àquele. Tampouco a mim deveria ser assim. E sempre reconheci no jornal e naquele que o comandou com talento, com brilho e com firmeza a honestidade de propósito. Isso é fundamental. Nós nos respeitamos exatamente se percebemos essa lealdade. Apesar das divergências, há honestidade de propósito.
Em dias como os que vivemos, cumpre lembrar que o grande valor da democracia está na convivência entre os divergentes, na existência de regras de jogo que nos permitem ser diferentes na emergência das demandas da sociedade para as quais o Poder e os Poderes nem sempre estão preparados.
A democracia é o regime que se afirma abraçando a negação, porque, sabem V. Exas., também é possível dizer "sim" nas ditaduras, nas tiranias, nos regimes de força. Não é o dizer "sim" que caracteriza os regimes abertos. É a possibilidade de dizer "não" que marca esses regimes.
Aqui e ali, essa possibilidade de dizer "não" pode ser um valor em baixa. Jamais o será para mim, para este estudioso do direito, para este magistrado. E sempre vi na Folha que Otavio Frias reinventou, junto com o reflorescimento da democracia, uma parceira exemplar. Não uma parceira de minhas ideias necessariamente. Não uma parceira de meus votos necessariamente. Não uma parceira de minhas afinidades intelectuais necessariamente. Mas uma parceira na defesa das liberdades fundamentais, dos direitos humanos, da divergência daqueles que não têm voz, de minorias que, não fosse o tal valor afirmativo da negação, essência dos regimes democráticos, não teriam como expressar.
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Eu me lembro - e a vantagem, talvez uma das poucas de ir se tornando mais velho, é que nós vamos acumulando experiências - que participei de inúmeros debates na Folha de S.Paulo, depois muitas vezes seguidos de almoço e de diálogos. E eram interessantes tertúlias, desafios e era perceptível a alegria do Otavio de ver os embates, o contraditório. Ainda há pouco vi aqui Eliane Cantanhêde, e lá estive uma vez num embate a propósito das discussões que ainda hoje se articulam com muita frequência no Brasil, até porque o Brasil também é muitas vezes repetitivo, leva muito tempo para resolver os seus problemas, era a questão das ações policiais e dos habeas corpus, Senadora Kátia Abreu.
Então, Eliane Cantanhêde me perguntava por que que nós no Supremo, Josias, dávamos habeas corpus a ricos? E eu então respondi: "Nós damos habeas corpus no Supremo a ricos e pobres". "Mas por que eu só vejo vocês darem habeas corpus para ricos?" Eu disse: "Porque jornalista gosta de ricos, não gosta de pobres". Otavio Frias riu bastante com essa resposta, porque claro isso não era objeto, os habeas corpus a pobres não são contabilizados.
E depois, no almoço, nós tivemos a oportunidade de dialogar e ele repetiu isto. E isso depois compôs, inclusive, o editorial do jornal.
Eu vou ler o Editorial, parte dele, de 27/03/2010.
(Soa a campainha.)
O SR. GILMAR MENDES - O título do Editorial é: Gilmar Mendes [minha despedida na Presidência do Supremo Tribunal Federal].
Gilmar Mendes
Defensor intransigente dos direitos individuais, o ministro ficará como um dos mais polêmicos e ativos presidentes do STF.
Apreço pelo confronto público de ideias e temperamento dado à polêmica são características, em princípio, indesejáveis num juiz [dizia o editorial]. A combativa personalidade do Ministro Gilmar Mendes, no entanto, se mostrou valiosa para enfrentar resistências e impor à Justiça brasileira uma gestão modernizadora nos dois anos em que esteve à frente do Supremo Tribunal Federal.
O estilo também é condizente com outras duas marcas de seu mandato: a defesa intransigente dos direitos individuais e a consolidação do STF como corte constitucional, cuja função é arbitrar omissões ou conflitos de princípios da Carta de 1988.
Ocasionais embates com os demais poderes da República surgiram desse movimento de afirmação do Judiciário, ainda que Mendes não tenha resistido, muitas vezes, a cometer excessos retóricos na defesa do que em inglês se chama law and order.
Houve também conflitos internos. Sob seu comando, a imensa máquina do Judiciário foi objeto de um salutar choque gerencial. O Conselho Nacional de Justiça, dirigido pelo Presidente do STF, ganhou a legitimidade e os recursos necessários para cumprir sua missão de aumentar a transparência administrativa dos tribunais e elevar a eficiência do trabalho dos juízes.
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O órgão tem buscado estabelecer indicadores de desempenho e metas de produtividade. O objetivo de que todas as causas iniciadas antes de 2006 tivessem uma sentença até o fim de 2009, anunciado por Mendes, não foi alcançado, mas contribuiu para reduzir a morosidade na análise de casos pela Justiça. Não é desprezível, diga-se, a marca de 60% dos processos pendentes resolvidos dentro do prazo previsto.
No Supremo, o momento mais dramático [dizia o editorial], estima o próprio Mendes, foi o episódio dos dois habeas corpus concedidos em sequência ao banqueiro Daniel Dantas. O recurso é uma garantia constitucional dos cidadãos contra abusos de autoridade - e cabia a Mendes julgar o caso. O juiz de primeira instância havia decretado uma primeira ordem de detenção provisória contra o banqueiro, que o Presidente do Supremo decidiu reverter.
O juiz decretou então nova prisão [parece que estamos falando de tempos atuais, embora estivéssemos em 2010]. Ainda que agisse dentro de suas prerrogativas, o gesto ganhou contornos de provocação. Não houve equívoco nem exagero do Presidente do Supremo ao determinar que o banqueiro fosse novamente libertado.
É um erro considerar o episódio de forma isolada. Mendes defendeu o mesmo princípio quando comandou os chamados mutirões carcerários, em 20 Estados, que colocaram em liberdade cerca de 20 mil pessoas indevidamente encarceradas.
Num País marcado pela impunidade, pode soar impróprio - e é certamente impopular - defender suspeitos da sanha persecutória de setores do Estado. Mas é tarefa da Justiça fazê-lo, e Mendes cumpriu com desassombro sua função.
E o editorial então encerrava: "Ao transferir o cargo para Cezar Peluso, no final de abril, Gilmar Mendes ficará não apenas como um dos mais polêmicos, mas também como um dos mais ativos presidentes da história do Supremo Tribunal Federal".
Isto era Frias com toda a sua capacidade de perceber as sutilezas das coisas que iam nas engrenagens do Estado.
Otavio Frias Filho nos deixou precocemente, mas fica a sua grande obra, que vemos hoje multiplicada em vários empreendimentos do Grupo Folha. E todos eles solidamente comprometidos com uma sociedade mais livre, mais aberta, mais plural.
Dia desses, um importante ministro de Estado citou o monopólio que tem o Estado do uso legítimo da violência, princípio que não tem origem num defensor de tiranias. Ao contrário: estamos falando de Max Weber, que era muito caro a Frias. Delega-se tal monopólio ao Estado justamente para que as sociedades não sejam tomadas, e não podem ser, por milícias armadas, que se imponham pela força, pela intimidação, pela truculência. Eis um papel indeclinável, sim, do Estado: o exercício desse monopólio, do monopólio legítimo da força.
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Isso está, como sabem, na grande obra de Weber, A Política como Vocação (Politik als Beruf).
Mas nem Estado, nem grupos de pressão que dele queiram se assenhorear têm o monopólio da verdade. Tampouco tem a imprensa, é claro. Por isso mesmo, ela deve se abrir para o contraditório, para a diversidade, para a pluralidade. E isso, Otavio Frias Filho realizou na Folha. Não conheço um só especialista ou estudioso da área que lhe negue o papel de fundador de um novo tempo na imprensa brasileira, não mais a serviço do grupo de opinião, de grupos de pressão, de grupos de interesse. Posso estar errado, Maria Cristina, que hoje conduz a Folha com a régua e o compasso herdados do grande mestre, mas me parece que o jornal sente até certa satisfação intelectual quando colunistas ou articulistas convidados deixam claro, nas páginas da própria Folha, as de papel ou as eletrônicas, que discordam do jornal. Esse modelo, que abriga a divergência sem abrir mão de deixar claro qual é o seu norte, é o melhor espírito a que Otavio deu vida na nossa imprensa.
Eu encerro, Presidente, dizendo: a obra de Otavio é imensa. Ele, de fato, é um dos fundadores, senão primus inter pares da moderna imprensa brasileira. Não está mais entre nós, mas vive em sua obra, que continua a render frutos. O que mais pode querer um homem? O que mais poderiam querer os que o amavam e o admiravam? Otavio se multiplica, vive e se multiplica. Essa é a boa notícia.
Obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Obrigada, Ministro Gilmar Mendes. Obrigada pela sua presença, pela sua brilhante homenagem.
Registro a presença, nas galerias, dos estudantes do ensino médio do Colégio José Carrilho, de Goianésia, Goiás. Sejam muito bem-vindos ao Senado Federal.
Assim como registro também, agora há pouco saiu das galerias, a organização privada Yu Si Zhang, da China, arquitetos da China, que vieram conhecer a arquitetura da Câmara e do Senado. Obrigada pela presença.
Convido para uso da palavra o Senador Weverton Rocha, Líder do PDT.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar Senado Independente/PPS - MA) - Presidente Kátia, só a título de informação: consta inscrição minha, Presidente? Porque na minha ordem, eu estava em uma outra ordem. Só a título de informação. V.Exa. pode me informar?
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Está inscrita, sim, Senadora Eliziane Gama, do nosso Maranhão, PPS.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar Senado Independente/PPS - MA) - Muito obrigada.
O SR. JORGE KAJURU (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - GO) - Presidente, a minha também está, por fineza?
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Sim, claro, Kajuru.
O SR. JORGE KAJURU (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - GO) - Obrigado, querida.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Como ex-jornalista da Folha de S.Paulo, Senador da República, não poderia...
O SR. JORGE KAJURU (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - GO) - Muito obrigado.
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O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - AP) - Excelência, Randolfe Rodrigues, pela Liderança da Rede.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Também, Randolfe, com certeza.
O SR. WEVERTON (Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - MA. Pela Liderança.) - Sra. Presidente Kátia Abreu, autora do requerimento que faz esta justa homenagem ao Jornalista Otávio Frias Filho e aos 98 anos da Folha de S.Paulo; Sr. Ministro do Supremo Gilmar Mendes, que me antecedeu nas palavras; Vice-Governador do Distrito Federal, Paco Britto, aqui representando o Governador Ibaneis; Vice-Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Sr. Luiz Viana; Sra. Diretora de Editorial e Redação do jornal Folha de S.Paulo, a Sra. Maria Cristina Frias; autoridades; embaixadores; imprensa; telespectadores; ouvintes da Rádio Câmara... Da Rádio Senado. É o costume, Sra. Presidente; oito anos lá na Câmara, agora... Ouvintes da Rádio Senado; galeria; demais autoridades e colegas Senadores.
Ao comemorarmos hoje, aqui, os 98 anos da Folha de S.Paulo e fazer esta justa homenagem ao Diretor de Redação Otávio Frias, por requerimento de V. Exa., também homenageamos a vida brasileira, que passou e passa por suas páginas, que estão registradas em seus arquivos, fotografadas pela lente profissional dos que lutaram pela construção de uma sociedade mais justa, de um Brasil justo, digno de orgulho de seus filhos.
Digo isso porque é consenso que, ao longo do tempo, a Folha tem sido um instrumento ágil, rápido, eficaz, em que o debate é amplo e as correntes de pensamento manifestam-se intensa e livremente, por exemplo, por meio de sua página 3. Jamais, em tempo algum, soube-se que tivesse havido alguma negativa à publicação de artigos que trouxessem ideias novas, muitas vezes contrárias à linha editorial do jornal.
A Folha destaca-se como um jornal que teve a coragem de fazer - e faz, diariamente - uma autocrítica, na medida em que criou a figura do ombudsman, crítico do próprio jornal. Essa figura preza pela democracia, ou seja, a ideia de que nela, na democracia, pode haver acertos e pode haver erros. A Folha teve sabedoria política extraordinária, compatível com o sistema participativo: a ideia de que é preciso autocriticar-se, de que é preciso verificar quais são os seus erros e quais são os seus acertos.
Portanto, com essa linha editorial - em primeiro lugar, independente; em segundo lugar, dando oportunidade para que as várias manifestações de pensamento sejam nela acolhidas; e, em terceiro, pela crítica permanente que faz do seu próprio trabalho -, a Folha dá um exemplo para todos nós, do Poder Legislativo, que vivemos da contrariedade, da controvérsia, da contestação, da oposição de ideias.
Exemplo dos melhores, da abertura ao debate, comparecem diariamente às suas páginas, as mais diversas correntes políticas. Expoentes de todos os pensamentos ali encontram o espaço para apresentar suas ideias, argumentos, fomentando discussões extremamente salutares para a cultura e a informação de seu privilegiado público leitor.
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Quero destacar a figura do homenageado, in memorian, o Otávio Frias Filho. Ele que é o grande responsável pela reforma editorial que começou a ressuscitar a imprensa brasileira, em meados da década de 70, acordando do sono letárgico em que fora arremessada pela censura.
Em Otávio identificam-se vários escritores e jornalistas, numa simbiose feliz, pois, por usar a expressão comum de Aníbal Fernandes, combatente jornalista, pernambucano, dos anos 40 e 50: "Nem todo escritor é jornalista, mas todo jornalista deve ser um escritor".
A Otávio deve-se a renovação gerencial e editorial do jornal, no chamado Projeto Folha, que atraiu numerosos talentos, recrutando jovens egressos da Universidade Paulista, que trouxeram ao batente o contributo de novas ideias e ajudaram na consolidação editorial do veículo.
Ele quebrou todos os tabus e convenções, acabando com um tipo de "jornalismo pronto-a-vestir", que existia para adaptar-se a todos os gostos políticos, servindo à Ia carte, indistintamente, a políticos e a governos de ocasião.
Trouxe para a redação da Folha a aplicação prática da máxima cunhada por Juan Luís, famoso jornalista espanhol, que fala no seu livro "Carta a um Jovem" acerca dos jornalistas - abro aspas: "Só há dois gêneros de jornalistas: os que escrevem bem e os outros". Fecho aspas.
Com Otávio Frias Filho, na Folha, o jornalismo brasileiro definitivamente fixou a sua credibilidade editorial, abalada por tantos anos de interferência de Governos na orientação da mídia e também pela ingerência da censura, que abafou vozes e amesquinhou o papel da imprensa, retardando a redemocratização do Brasil.
Cabe aqui uma reflexão: a imprensa e o Parlamento são instituições permanentes da sociedade democrática. Os governos passam. Elas resistem, todavia, às vicissitudes do tempo, aos ataques dos radicais e dos fundamentalistas, que não aceitam a crítica.
Não somos, porém, instituições perfeitas. Refletimos a opinião pública e, parodiando Churchill, quando ele diz: "Construímos a opinião publicada".
Ao longo da história, a opinião pública apoiou ditadores absolutos e liberais, exultou com os demagogos, consentiu aristocracias, aplaudiu democracias, derrubou Parlamentos. Nada se fez que a opinião pública não consentisse ou aprovasse, de forma tácita ou explícita. Nela, o político vai buscar aquela reserva de poder que o sustenta na renovação do seu mandato popular. Nela, os jornais apoiam-se para corrigir os rumos, mudar seções, orientar editoriais, melhorar seu padrão gráfico, criar e oferecer serviços ao universo dos leitores. O Parlamento e o jornal — e essa responsabilidade muito cabe à Folha de S.Paulo — devem contribuir cada vez mais para as suas expectativas e aspirações de desenvolvimento econômico com a justiça social.
Mas novos desafios se fazem presentes a cada momento neste mundo em estado de efervescência. As novidades tecnológicas brotam a todo momento e mudam a forma como as pessoas interagem entre si e com as mídias tradicionais e as novas, particularmente as redes sociais. Hoje somos, em diferentes níveis, produtores e receptores críticos de conteúdo, e tudo num simples clique.
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Finalizo, desejando que a Folha siga, para o bem da democracia, priorizando o apartidarismo, a imparcialidade e a interpelação jornalística das autoridades públicas, fazendo da informação do conteúdo o seu maior capital.
Vida longa à criatividade, à inventabilidade e à liberdade de imprensa a serviço do nosso Brasil!
Eu queria aqui, com muita honra, Sra. Presidente, Kátia Abreu, que é colega de Partido, o nosso PDT, dizer que, não só justa, mas neste momento difícil que estamos vivendo da quadra do nosso País, eu lhe confesso - sou do Maranhão, Nordeste brasileiro: pela primeira vez, na história, nós não vimos, no primeiro escalão do Governo Federal, nenhum representante do Norte e do Nordeste. Nós estamos vendo pouco a presença das mulheres no Executivo. Estamos sentindo um clima, nos corredores do Congresso Nacional, de medo, de pessoas cautelosas, com medo de expressar as suas opiniões, por eventuais perseguições. Nós estamos percebendo um ambiente extremamente difícil. E há poucos. E os líderes que restam precisam ter a coragem de dizer que o fascismo não pode vencer a democracia. E a imprensa tem que ter, mais do que nunca, essa altivez, para ter a coragem de se unir nessa quadra e dizer que ela é muito maior do que qualquer projeto de poder de quem quer que seja.
Por isso, parabéns, Otávio! Eu tenho certeza de que, in memoriam, ele representa todos esses brasileiros que acreditam numa democracia forte, numa imprensa livre e também numa Política, com "p" maiúsculo, funcionando, porque, só através dela, a gente vai conseguir construir um Brasil mais justo, mais igualitário, para as nossas crianças e para as próximas gerações.
Muito obrigado, Presidente. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Obrigada, Senador Weverton.
Convido, para fazer uso da palavra, a Senadora Líder do PPS, Eliziane Gama. E o próximo será o Líder do PSB, Senador Kajuru e, depois, o Líder da Rede, Senador Randolfe.
Eu gostaria de registrar a presença aqui, nas nossas galerias, de turistas de vários países que visitam o Senado Federal, da Holanda, do Reino Unido, do Uruguai, da China, da Alemanha... Muito obrigada pela presença e sejam bem-vindos ao Senado Federal!
O SR. JAYME CAMPOS (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - MT. Pela ordem.) - Presidente, pela ordem. Senador Jayme Campos, Mato Grosso.
Presidente, Kátia Abreu, indago a V. Exa. se são só as Lideranças partidárias que podem se inscrever para falar em homenagem a Otávio Frias.
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Não. O senhor pode falar em nome do DEM.
O SR. JAYME CAMPOS (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - MT) - Muito obrigado, Sra. Presidente. Só essa indagação, tendo em vista...
Muito obrigado.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar Senado Independente/PPS - MA. Pela Liderança.) - Sra. Presidente, Senadora Kátia Abreu; os meus cumprimentos também ao Governador em exercício aqui, Sr. Paco Britto; cumprimento também o Sr. Luiz Viana, Vice-Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; e os nossos cumprimentos, de forma muito especial, a Maria Cristina Frias, Diretora de Editorial e Redação do jornal Folha de S.Paulo.
Hoje, na verdade, é uma homenagem importante, Senadora Kátia Abreu - os meus cumprimentos a V. Exa. por esta iniciativa. Eu, particularmente, fico feliz de estar hoje aqui. Digo isso como jornalista que sou e como admiradora da Folha de S.Paulo.
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Sou jornalista formada pela Universidade Federal do Maranhão e, ao longo de toda a nossa trajetória de caminhada - digo isso como nordestina -, temos os sonhos e as aspirações que regem o nosso Brasil, que regem o profissionalismo e os sonhos da nossa juventude brasileira. Dentro desse sonho, estava em nós também o sonho de um dia figurar nos jornais brasileiros, nos grandes jornais, nos grandes editoriais e, portanto, também, no jornal Folha de S.Paulo. E digo isso, iniciando a minha fala, porque acho que esse é um sentimento da juventude brasileira, do jornalismo brasileiro, daqueles que são aspirantes, que estão dentro da universidade, e daqueles também que são egressos da universidade.
O jornal Folha de S.Paulo marcou e marca uma época no Brasil, sobretudo por ser, hoje, o complexo mais influente deste País, como comunicador, como formador de opinião e como alguém que faz o agendamento social - aliás, é esse o papel da comunicação na nossa Nação brasileira -, como alguém que marca, na verdade, uma geração e uma época.
Naturalmente, aqui, os colegas que nos antecederam já destacaram, de forma mito clara, como foi toda a história do jornal Folha de S.Paulo, seus momentos áureos, seus momentos de glória, que, aliás, ainda vivemos, como também, naturalmente, momentos em que a sua própria linha editorial chegou a ser questionada. E, aí, eu destacaria, nesse sentido, o papel muito importante do Jornalista Otávio Frias, que, pela sua juventude, pela sua pujança, pela sua determinação e pela sua ousadia, fez, na verdade, uma reorganização e trouxe uma sensível mudança, tornando mais plural... Trazendo, aliás, os grandes jornalistas para a sua redação e protagonizando, logo após os anos 70, mais precisamente 1976, dando ao jornal um novo caráter editorial e marcando, de uma forma histórica, o jornalismo brasileiro pós-ditadura.
Naturalmente, nós temos vários outros jornais no Brasil que tiveram o seu protagonismo e a sua atuação, mas é justo dizer que o jornal Folha de S.Paulo foi o jornal que mais se notabilizou nessa transição, do período da ditadura para o período democrático brasileiro, e, portanto, mais precisamente ali, no momento da Diretas Já, eu diria o momento mais rico da sua história, que marcou uma época e marcou, na verdade, as nossas vidas.
Aliás, o jornal Folha de S.Paulo acabou sendo, no meu entendimento, um instrumento muito importante para se evitar que informações fossem colocadas debaixo do tapete ou fossem escondidas. O jornal Folha de S.Paulo teve um papel muito preponderante e trouxe à tona as informações, cumprindo o seu papel de protagonista.
Nesse sentido, quando a Senadora Kátia Abreu faz esta homenagem, nesta Casa, ela está, sobretudo, trazendo a todos nós esse sentimento de reconhecimento e de demonstração de que esse jornal teve, tem e continuará tendo um papel preponderante e de protagonismo na história política e econômica, porque também acaba tendo uma influência no nosso País.
Eu gostaria também de dar um destaque muito especial ao fato de que o jornal Folha de S.Paulo - e eu digo isso como jornalista também - vive os temores e a pressão que a força do poder político, às vezes, infelizmente, acaba acarretando, em relação à comunicação como um todo em nosso País. E, aí, não é uma situação apenas da Folha de S.Paulo, mas de várias outras mídias, que acabam sendo, neste exato momento, vilipendiadas pelos arautos do poder, tentando mudar uma forma editorial, mas que todos nós sabemos, como jornalistas, que isso acaba sendo um combustível para trazer à luz a verdade, para fazer a transcrição real dos fatos que acontecem no dia a dia.
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Destruir ou tentar, pelo menos, destruir essa comunicação social é tentar, na verdade, manipular. No meu entendimento, é uma tentativa vã, é uma tentativa em que não se tem resultados, quando se trabalha ou quando se ataca um órgão com tanta substância, com tanta força e com tanta história arraigada no sentimento brasileiro, como é o caso do jornal Folha de S.Paulo.
Vemos por aí, por exemplo, a tentativa da manipulação, a utilização de fake news e de tantos outros instrumentos para tentar barrar essa comunicação tão importante, mas todos nós sabemos, como comunicadores, que essa é uma tentativa que não terá, na verdade, êxito, porque o jornalismo é muito maior do que os medos e essas tentativas.
E, nesse sentido, me faz lembrar aqui uma frase que é muito adequada para o jornal Folha de S.Paulo, do grande jornalista Zuenir Ventura, quando ele diz: "A imprensa não é o quarto poder, a imprensa é o contrapoder". E é exatamente esse papel que a Folha de S.Paulo faz em nossos dias.
Portanto, de forma muito breve, eu queria deixar os meus cumprimentos à Folha de S.Paulo, deixar o nosso reconhecimento e a nossa torcida, para que esse jornal continue a marcar os nossos tempos, a trazer à tona a verdade, a trazer à tona, a cada dia, a transcrição da verdade.
Aliás, o jornal Folha de S.Paulo tem feito um papel muito importante, que é fazer a crítica como ela precisa ser feita, que é dar a todos o direito do contraditório, que é ter um papel importante, inclusive, dentro do Congresso Nacional, quando faz a sua crítica e faz, naturalmente, também, esse agendamento social.
Por fim, os meus cumprimentos, mais uma vez, a todos os editores, jornalistas e profissionais do jornal Folha de S.Paulo e à Senadora Kátia Abreu, pela iniciativa desta homenagem.
Muito obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Obrigada, Senadora Eliziane Gama, PPS, Líder, do Maranhão.
Eu gostaria de pedir à Secretaria-Geral da Mesa para dar como lido o pronunciamento do Governador do Distrito Federal em exercício, Sr. Paco Britto, que deverá se retirar para compromissos do Governo.
Muito obrigada pela sua presença.
Gostaria de agradecer as presenças do Embaixador do Reino da Tailândia, Sr. Surasak Suparat, e do Embaixador da Espanha, Fernando García.
Convido para usar a tribuna o Senador Kajuru, Líder do PSB, Senador do Estado de Goiás.
DOCUMENTO ENCAMINHADO PELA SRA. SENADORA KÁTIA ABREU.
(Inserido nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)
Matéria referida:
- Discurso do Sr. Paco Britto, Vice-Governador do Distrito Federal.
O SR. JORGE KAJURU (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - GO. Para discursar.) - Que dia especial!
Kajuru agora quebrar protocolos. Então, já vou começar, aqui, dando um tchauzinho para os estudantes de Goianésia, que vieram me conhecer.
(Manifestação da galeria.)
O SR. JORGE KAJURU (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - GO. Pela Liderança.) - Não, não, não pode bater palma. Não pode bater palma. Pelo Regimento não pode.
Vieram me conhecer. Bom, não é?
Presidente Kátia Abreu, eu vou falar a verdade para V. Exa.: a imprensa brasileira tem que enaltecê-la por esta homenagem. Sabe por quê? Porque eu acho que há tanta homenagem inútil aqui neste Congresso Nacional... Tanta bobagem... Eu fui vereador lá em Goiânia e registrei em cartório que eu jamais faria homenagem a ninguém, comemoração de data, entrega de título de cidadão... Parlamentar tem que apresentar é projeto.
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Agora, uma homenagem dessas tem que ser reconhecida, porque - V. Exa., Maria Cristina Frias, tenha certeza - sua família atingiu algo difícil no mundo de hoje: atingiu a glória! Não é fácil atingir a glória, não - pouquíssimos: Gandhi... E alguns outros. A sua família atingiu a glória!
Primeiro, sou um dos únicos deste Congresso Nacional que recebi salário da Folha de S.Paulo. E engraçado: sabe o que seu irmão fazia, o Otávio? Era decisão dele: a cada coluna que eu escrevia - fiquei dois anos lá. E vou contar por quê -, e eu mandava a coluna, tipo, 18h30, e, na minha conta bancária, o pagamento da coluna chegava antes. Eu nunca vi isto: receber antes. Essa é a Folha de S.Paulo. Eu recebia antes! Detalhe: eu fui o primeiro jornalista brasileiro, para quem não sabe, a ser demitido ao vivo - ao vivo! -, mas também fui o primeiro jornalista brasileiro a pedir demissão ao vivo também - por duas vezes. E, quando eu pedi demissão ao vivo, na Rede TV! - eu estava sem emprego -, quem me chamou para trabalhar, para substituir o Tostão, o genial Tostão, nas férias e para mandar dois artigos semanais no caderno de esportes? A Folha de S.Paulo, o único veículo. Corajoso, não?! Detalhe: foi o único veículo de comunicação, senhoras autoridades, senhores presentes aqui, o único que não censurou Kajuru. E eu escrevia cada barbaridade...
Eu queria que V. Exa. anotasse aí, no seu papelzinho, quando chegar à Folha, a data de 17 de julho de 2002 - 17 de julho de 2002, antes das eleições presidenciais. Quem quiser entre no UOL e pegue lá no arquivo "Coluna Jorge Kajuru". E o título. Nossa, mas eu escrevi cada... Eu falava: "Gente, eles não vão deixar. Essa não vai". Foi tudo! Nenhuma palavra foi retirada! Recebi um telefonema do Mário Magalhães. Ele falou assim: "Kajuru, essa expressão aqui você quer retirar ou manter?" Eu falei: "O que que você acha?" Ele falou: "Não, você é que decide". "Mantém!". Manteve. Dia 17 de julho de 2002. Não há como esquecer.
Mas a Folha de S.Paulo tem que ser reconhecida por quê? Primeiro: quando alguns atacam a Folha... E eu falo assim: "Folha, pega mais um quadro e coloca aí na sua galeria", porque, quando atacam a Folha, isso é, para mim, sinal de atestado de idoneidade. Eu sou assim: quando alguém me critica, eu falo: "Quem? Esse aí?!". Ou quando alguém me processa: "Esse aí?!". Isso é um atestado de idoneidade para mim.
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A Folha recebeu vários atestados de idoneidade - e os recebe até hoje - quando é atacada.
Quando, por exemplo, dizem: "Ah, a Folha de S.Paulo é um jornal de oposição". Ora, o Millôr Fernandes tinha toda a razão: "Imprensa é oposição, o resto é armazém de secos e molhados". A imprensa não foi feita para bajular ninguém, não! E a Folha de S.Paulo é um exemplo exatamente nesse sentido.
Você busca uma seleção - para mim, a maior seleção brasileira de jornalistas de todos os tempos que escreveram e que escrevem na Folha - e você vê lá: uma seleção de Alberto Dines, Claudio Abramo, Paulo Francis, Carlos Heitor Cony, Clóvis Rossi, Josias, Gaspari, Mônica, Eliane, Matinas Suzuki, Fernando Rodrigues, Juca Kfouri, Tostão, Mário Magalhães, Caio Túlio Costa, Marcelo Coelho, Boris Casoy, Gilberto Dimenstein, Ruy Castro, José Simão e este idiota aqui. Escrevi na Folha. O José Luiz Datena falou assim para mim: "Meu irmão, você não precisa fazer mais nada na imprensa". Eu disse: "Por quê?" E ele: "Porque o cara que escreve na Folha não precisa de mais nada, é o maior patrimônio, é o maior prêmio, é o maior diploma de um jornalista".
E é bom lembrar: a Folha de S.Paulo foi o único veículo de comunicação deste País que deu espaço para perseguidos políticos que não podiam escrever em lugar nenhum, para intelectuais e jornalistas perseguidos - e um jornalista perseguido não é o algoz, é a vítima. E a Folha deu espaço, a vida inteira, para esse pessoal.
O Grupo Folha, ao perder o seu diretor talentosíssimo - talento abismal o seu irmão tinha, abismal, abismal -, de imediato, definiu o quê? Definiu que o cargo pela primeira vez seria ocupado por uma mulher que aqui está, Maria Cristina Frias. E ela já se colocou, diante da circunstância, em vantagem sobre a concorrência. Eu cito aqui, inclusive, a própria Maria Cristina Frias - aspas: "Ser mulher ajuda nessa busca de equilíbrio de opiniões e fontes diversas nas nossas páginas, na elaboração de pautas que interessem a um público cada vez mais amplo. Assim como os principais jornais do mundo, a Folha se preocupa em entender como ampliar o eleitorado feminino" - fecho aspas. Foram suas palavras.
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E, para concluir, cito novamente V. Exa., Maria Cristina Frias, a homenageada de hoje, deste dia especial, com um trecho da sua entrevista concedida ao próprio jornal, no último domingo, dia 10 de março. Com propriedade, Maria Cristina Frias, aqui presente, definiu que o papel do jornal é o de - aspas - "iluminar os debates dos problemas coletivos com informações bem embasadas e apuradas, monitorar o que fazem os políticos, além de se comprometer em defender a democracia e fatores que levem ao desenvolvimento do País" - fecho aspas. Belíssima a sua entrevista, belíssima a sua declaração. Parabéns de forma sincera - e, se existe uma coisa que eu não faço na minha vida, é puxar saco, até porque não preciso, de ninguém.
Concluo lembrando, aqui não sei se todos lembram, o melhor slogan - eu amo frase e amo slogan - de um veículo de comunicação que eu vi até hoje. Foi o seu irmão quem criou, Otavio, Otavinho. Eu, inclusive, no dia, fui lá dar um abraço nele, dar parabéns a ele. Lembram-se daquele slogan: Rabo preso só com o leitor? E eu o imitei quando eu tinha a minha rádio, que foi cassada, a Rádio K do Brasil, lá em Goiás, de que a Senadora Kátia se lembra. Eu falava: Rádio K do Brasil, Rabo preso só com o ouvinte, imitando a Folha. A Folha, o rabo preso dela é só com o leitor.
Assim, eu concluo, desejo longa vida ao jornal Folha de S.Paulo e repito: a família Frias atingiu o que poucos conseguem, a glória.
Agradecidíssimo. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Muito obrigada, Senador Kajuru, Líder do PSB.
Quero registrar também aqui a presença dos estudantes de Direito da Faculdade Uniplan, aqui do Distrito Federal. Sejam bem-vindos.
Quero convidar o Senador Randolfe, Líder da Rede, para uso da palavra.
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - AP. Pela Liderança.) - Sra. Presidente, Senadora Kátia Abreu, quero cumprimentar algumas das autoridades que por aqui já passaram: S. Exa. o Presidente da Câmara, Deputado Rodrigo Maia; S. Exa. o Ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes; e o Governador do Distrito Federal em exercício Sr. Paco Britto. Cumprimento, ao mesmo tempo, o Sr. Luiz Viana Filho, Vice-Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Meus cumprimentos externados à Dra. Maria Cristina Frias, Diretora de Editorial e Redação do jornal Folha de S.Paulo.
Meus senhores, minhas senhoras, demais autoridades aqui presentes, esta é uma sessão solene que tem dupla homenagem: ao quase centenário, 98º aniversário, da Folha de S.Paulo e ao nosso querido Otavio Frias. Eu o conheci pouco, em algumas visitas à Folha de S.Paulo, mas tive nele a referência como leitor da Folha de S.Paulo e, desde militante político, desde o movimento estudantil, tive na Folha de S.Paulo uma referência do jornalismo brasileiro comprometido com a democracia.
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Esse legado de Dr. Otavio, de Otavinho, como vocês o conheciam, essa referência deixada e mantida como um baluarte de fundação da Folha de S.Paulo é o que deve ser principalmente homenageado no dia de hoje, porque, nesta data de hoje, esta é uma das primeiras homenagens que esta Casa fará à imprensa brasileira, ao jornalismo brasileiro. Nós estamos numa quadra da história do Brasil que não é a primeira quadra, que não é a única quadra, mas nós estamos em um momento da história do Brasil em que é necessário reafirmar princípios basilares. Liberdade de imprensa, por exemplo, Dra. Maria Cristina, como a senhora e Otavio Frias muito bem sabiam, é princípio fundante do Estado moderno como conhecemos.
O Estado moderno como conhecemos tem suas bases alicerçadas em três revoluções democráticas burguesas do século XVIII: a inglesa, em 1648, a americana, de 1776, e a francesa, de 1789. É na Revolução Americana que um dos founding fathers, pais fundadores da democracia americana, Alexander Hamilton falava do alicerce da liberdade de imprensa. Dizia em O Federalista, a principal obra fundante do Estado moderno democrático como conhecemos, Hamilton: "A liberdade de imprensa é o direito de publicar impunemente a verdade, por bons motivos, para fins justificados, sem olhar o governo, os magistrados, os indivíduos".
Faço citação de Hamilton, citação fundadora da liberdade de imprensa comum dos baluartes do Estado moderno, do Estado democrático de direito, porque, desde fevereiro de 1921, esse princípio basilar esteve presente no então Folha da Noite e no hoje Folha de S.Paulo; esteve presente nas posições críticas do jornal mesmo diante da ditadura getulista; esteve presente na primeira reabertura política em 1945 e acompanhando a Constituição redemocratizadora de 1946; esteve presente sempre denunciando a corrupção, tendo como princípio basilar da República o respeito à coisa pública e sendo vigilante nesse sentido; esteve presente não só denunciando os arbítrios do regime autoritário instalado em 1964, mas se opondo, estabelecendo o espaço para o contraditório, quando as oposições não podiam falar, garantindo as vozes das oposições.
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Essa posição da Folha de S.Paulo, me permita dizer, Dra. Maria Cristina, teve uma relação particular com a minha vida de então militante do movimento estudantil no final dos anos 80, início dos anos 90. Naquele período, nas manifestações da minha geração do movimento estudantil, a Folha de S.Paulo foi a primeira a cunhar para a minha geração a consigna de -abre aspas - "caras pintadas" - fecha aspas -, dando foco às primeiras manifestações estudantis que ocorriam naqueles anos 90. E foi a partir daí que, inclusive, acompanhamos todo o desenrolar daquela crise política do início dos anos 90 pelas páginas do jornal Folha de S.Paulo.
Eu quero aqui, ao fazer este brevíssimo retrato histórico, reiterar o que eu tenho certeza, Dra. Maria Cristina, de que o seu irmão estaria reafirmando nos dias atuais. O jornalismo brasileiro, a Federação Nacional dos Jornais, a Federação Nacional dos Jornalistas, a Associação Nacional dos Jornais, Associação Brasileira de Imprensa e a OAB trouxeram enorme contribuição para a nossa redemocratização em 1988, quando se consagra, na Constituição, no art. 5º, a reprodução do princípio de Hamilton, em O Federalista, com outras palavras. Dizia - está na Constituição - que nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, à liberdade de expressão e de manifestação. Não ter impedimento de veicular o que quiser e garantia do sigilo da fonte são princípios basilares do Estado democrático de direito. São princípios basilares!
Os senhores e a senhoras podem dizer: "Mas está falando o óbvio!" Às vezes, o óbvio deve ser dito. Quando estamos sob a vigência de um tempo em que o mais alto mandatário da Nação, reiteradas vezes, propagandeia mentiras contra jornalistas, ataca jornalistas e ataca diretamente os meios de comunicação, é necessário restaurar os dizeres de Hamilton como princípio civilizatório do Estado de direito. É necessário reafirmar o que diz a Constituição como princípios fundamentais da Constituição, da redemocratização e do estabelecimento das bases do Estado democrático de direito, como nós temos hoje no Brasil. É necessário, principalmente desta tribuna, da tribuna do Parlamento, proclamar isso, fazendo as homenagens a Otavio Frias, fazendo as homenagens à trajetória da Folha de S.Paulo, mas fazendo as homenagens para garantir o que é fundamental, que esteve presente no ontem, que permanece no hoje e que tem que ser reafirmado para o futuro. Esses princípios não são de ocasião. Não será um Governo de plantão ou de passagem que porá a eles fim. Não será a circunstância que os deterá. São princípios com os quais a humanidade chegou até aqui, evoluindo até eles. Os princípios aqui proclamados são os princípios da Constituição, da forma mais evoluída de Estado que a humanidade teve até hoje, que é o Estado democrático de direito.
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Eu quero reafirmar isso, eu faço questão de destacar isso, porque me alinho para julgar que, em uma democracia, só há estabilidade e segurança no pleno exercício desses direitos. O direito à liberdade de imprensa e de manifestação, com a inviolabilidade da atuação dos jornalistas, é um princípio de direito humano fundante do Estado moderno, fundante da nossa Constituição.
E, aproveitando, eu acho que é necessário também dizer isso desta tribuna, porque não são tempos normais quando, a exemplo do mais alto mandatário da Nação, outros setores buscam destruir a reputação de jornalistas e buscam atacar a nós, figuras públicas que somos, 81 Senadores da República neste Plenário, alguns de direita, outros de esquerda, outros de centro. Nós temos um princípio que é a exposição pública e, como exposição pública, é necessário sermos fiscalizados. Aliás, nós somos remunerados pelo Erário público, nesta Casa, para representar a Federação brasileira. E, para tal função, não existe fiscal melhor de nossa atuação que não seja a atuação livre e independente da imprensa.
Por isso, as formas de intimidação da imprensa se manifestam de formas distintas. No passado, era invadindo, empastelando, fechando os jornais. No presente, como já disse, pode ser através de alguma rede social, atacando jornalistas e atacando meios de comunicação. Um dia desses, foi com o Estadão, outro dia, foi com a Folha, antes, foi com a Globo, e pode ser com qualquer outro meio de comunicação, que tem a prerrogativa de garantir que a democracia seja assegurada para todos.
E me permitam concluir aqui citando novamente Hamilton. É Hamilton que também, em O Federalista, diz: "O preço da liberdade é sempre a eterna vigilância." E a eterna vigilância, em uma democracia, Senador Kajuru, se processa pela atuação independente do Parlamento, do Congresso; se processa pela participação dos atores sociais, dos cidadãos e cidadãs; mas se processa principalmente com a atuação livre e independente da imprensa.
Esta homenagem do dia de hoje - eu queria cumprimentá-la, Senadora Kátia Abreu - é mais do que uma homenagem à Folha de S.Paulo, é mais do que somente uma homenagem ao Dr. Otavio Frias; ela é, sobretudo, uma homenagem aos princípios que devem ser mantidos, a garantia da liberdade de imprensa, princípio por que seu irmão lutou, que defendeu e sustentou e que, eu tenho certeza, é a base da atuação desse jornal. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Muito obrigada, Senador Randolfe. Parabéns pelas palavras.
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Eu convido o Líder do Bloco Vanguarda, Líder do PR, Wellington Fagundes. Em seguida o Senador José Serra, cedido o espaço pela indicação de Líder de Renan Calheiros, que passará adiante. Então, Wellington Fagundes; posteriormente, Senador José Serra; depois, Humberto Costa, Jayme Campos e Renan Calheiros. E passaremos aos nossos oradores convidados.
O SR. WELLINGTON FAGUNDES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PR - MT. Pela Liderança.) - Nossa nobre companheira Senadora Kátia Abreu, que propôs esta sessão solene, eu quero cumprimentar também a filha do nosso querido homenageado, Sra. Maria Cristina Frias - tem que estar muito fria para receber, neste momento, a emoção de lembrar de uma pessoa tão importante no contexto da democracia brasileira e no desenvolvimento do País.
Eu quero, Sra. Presidente, me associar a V. Exa., que encabeçou o requerimento para a realização desta sessão especial, e a todos os demais colegas com quem compartilho a alegria de homenagear os 98 anos de fundação da empresa Folha da Manhã, origem desse admirável jornal a serviço do Brasil que é a Folha de S.Paulo.
É uma alegria, Sra. Maria Cristina Frias, que, com certeza, se mescla com o nosso profundo pesar pelo falecimento, há pouco mais de seis meses, do Diretor de Redação, o brilhante e saudoso jornalista Otavio Frias Filho, também homenageado nesta sessão.
Sra. Presidente, a empresa e o jornal nasceram e cresceram sob o signo da luta pela liberdade de informar e opinar sobre os rumos da sociedade brasileira. Nada mais justo e natural, portanto, que sejam celebradas pelo Parlamento brasileiro, pois, como aprendemos com a história contemporânea, pode até existir Congresso sem democracia, mas a democracia não existe sem o Congresso.
Neste seu quase século de vida, a Folha de S.Paulo forjou sua têmpera, afiou seu gume e amealhou o imenso capital de credibilidade pública que hoje possui combatendo as oligarquias de todos os matizes.
No século passado, esse compromisso de informar e, ao mesmo tempo, formar a cidadania teve um dos seus momentos mais gloriosos na campanha das Diretas Já, marco do processo de reconquista da democracia que empolgou toda a Nação, tendo na Folha o mais fiel, abnegado e intransigente porta-voz.
E aqui quero lembrar o meu companheiro mato-grossense Dante de Oliveira. Inclusive, conheci Otavio junto com o Dante nas conversas, nas rodas políticas aqui em Brasília, eu curioso nessa discussão, em que se aprendia o que é construir a democracia brasileira. Portanto, faço uma homenagem também aqui à história de Dante de Oliveira.
De lá para cá, ao longo desses quase 35 anos de restabelecimento das liberdades civis e políticas, um dos mais combativos e competentes times de profissionais da imprensa brasileira, liderado por Otavio Frias Filho, exerceu impecavelmente o papel de guardião sempre alerta do interesse público, doa a quem doer, pois a Folha não tem partido, ou melhor, seu partido é o Brasil.
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Aproveitando, como estou falando também do Mato Grosso, eu quero aqui registrar, porque a construção de um jornal tão grande, como é a Folha de S.Paulo, tem todas as dificuldades para a sua existência, para a sua permanência, principalmente de um jornal impresso.
Eu quero aproveitar também para aqui homenagear todos os jornais brasileiros, principalmente os do interior. Quero falar também da minha cidade, do Jornal A Tribuna, que está completando 50 anos. Esta semana mesmo eu conversava com o seu diretor, Samuel Logrado - aí eu quero homenagear também o Aroldo Marmo de Souza, que foi o seu fundador -, que me dizia da dificuldade, Samuel, do que é manter um jornal impresso ainda hoje. Mas ele dizia que exatamente pela tradição, por essa força do que representa ainda o papel, de alguém levá-lo para casa e de estar ali como um documento guardado, ele fazia questão de manter ainda o jornal impresso.
Aqui vale a pena abrir breves aspas para um significativo trecho de um documento ao qual Frias Filho contribuiu com o seu costumeiro brilhantismo e que, apesar de redigido há quase 40 anos, preserva todo o vigor das ideias permanentemente atuais: a luta mais importante a ser travada pelo jornalismo é - abre aspas - "contra o preconceito, contra o senso comum, contra a falta de clareza e concisão, contra as informações incompletas e ambíguas" - fecha aspas.
Sras. e Srs. Senadores, a coerência na fidelidade a esses princípios fez de Otavio Frias Filho e continuará fazendo da Folha de S.Paulo uma presença produtiva no cotidiano dos seus inúmeros leitores e também um firme aliado do povo brasileiro na promoção da causa da liberdade, do progresso e da justiça social.
Parabéns aqui a todos os profissionais que construíram, junto com Otavio, essa história que perdura e que, com certeza, perdurará muito no fortalecimento da democracia brasileira.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Obrigada, Senador Wellington Fagundes.
Convido o Senador José Serra para o uso da palavra.
O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Parlamentar PSDB/PODE/PSL/PSDB - SP. Para discursar.) - Eu queria cumprimentar a Senadora Kátia Abreu pela iniciativa e pela condução dos trabalhos, como vem fazendo até agora.
Eu queria aqui cumprimentar a posteriori todos que estiveram presentes, incluindo o Ministro Gilmar Mendes, que fez um pronunciamento realmente marcante. Eu disse a ele estar muito satisfeito de ter ouvido uma análise naquele nível e com aquela profundidade.
Eu queria cumprimentar muito especialmente a Cristina Frias, que eu conheço já de tantos anos, desde que ela era criança, quando frequentava a Folha - e já explico por quê.
Mas nós estamos homenageando hoje aquele que é o principal personagem da renovação da nova e da moderna imprensa brasileira, que é o Otavio Frias Filho.
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Eu fiquei impressionado quando, depois do seu falecimento, inclusive, órgãos concorrentes de imprensa na área de opinião emitiram esse juízo. Otavio tinha sido o jornalista mais importante da sua época, que mais pesou na reformulação e na modernização, um novo tipo de imprensa no Brasil.
Quais são as características do modelo Folha? É o pluralismo, a independência, a combatividade, a inovação permanente e até a autocrítica. É o jornal que introduziu a figura do ombudsman na nossa imprensa.
Tenho uma história muito especial com a Folha, porque a Folha acolheu, desde os anos 70, muitos daqueles que eram perseguidos pela ditadura militar. No meu caso, voltava do exílio de 14 anos, em 1978. Nessa época, o Cláudio Abramo, que cuidava do painel da Folha e de editoriais, me convidou para escrever, ocasionalmente, na página 3. Eu me via antes exilado e, depois, com a possibilidade de falar ao País ainda durante a moldura do regime autoritário, que a Folha rompeu nesse sentido. Posteriormente, embora professor da Unicamp e pesquisador do Cebrap, me integrei à Folha como editorialista. Fiz parte da equipe de editorialistas durante quatro anos e lá convivia, dois ou três dias por semana, com o Sr. Octavio Frias, pai, com o Otavio, que era estudante de Direito, ainda fazia movimento estudantil naquela época, e com a própria Cristina, que frequentava o jornal, sentava numa mesa, escrevia, olhava, observava. Para mim foram anos fundamentais. De alguma maneira, foi o que marcou a minha reinserção no Brasil e na política brasileira.
As características que o Octavio Frias, pai, e o Otavio Frias Filho tinham em comum eram, eu diria, acima de tudo, o pragmatismo sem qualquer sopro de oportunismo, uma grande inteligência intelectual e inteligência emocional e também uma inesgotável curiosidade. Algo que os dois tinham era a curiosidade por fenômenos estranhos, por coisas desconhecidas, por questões sociais, por questões de qualquer natureza que se referissem à sociedade.
O Otavio, como eu disse, era estudante, mas integrava a equipe de intelectuais. E quero dizer que ele era o melhor texto da equipe. O Cláudio Abramo tinha tido a ideia de fazer uma equipe de intelectuais para escreverem. Eu vi com espanto que o Otavinho, ainda estudante de Direito, escrevia melhor que nós todos. E não só isso, revisava os editoriais. Revisava-os na edição final, de maneira sempre oportuna, sempre indiscutível, sempre impecável. Eu ficava realmente assombrado com essa capacidade. Na verdade, ele desdobrou essa capacidade em várias áreas, não apenas do jornalismo, mas também da literatura, do teatro, da crítica literária inclusive.
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Com a sua personalidade aparentemente pouco expansiva, sua postura de austeridade e de discrição, tinha uma enorme produtividade e era também - e queria dizer algo que já foi dito - corajoso. Eu presenciei aqui um momento em que essa coragem se exibiu - e talvez tenha sido o maior de toda a gestão dele à frente da Folha: foi quando de um confronto com o Governo Collor, que foi muito agressivo em cima do jornal, e o Otavio escreveu um editorial de primeira página, um texto incrível pela sua contundência, pela qualidade da redação. É um documento histórico que valia a pena ser olhado. Na primeira página! Partiu para o enfrentamento.
Lembro-me até de que ele veio a Brasília e, aqui, estivemos juntos analisando as repercussões, que acabaram sendo tratadas no Plenário da Câmara, uma vez que o Governo entrou pesado na Justiça contra o jornal. E o jornal não só não se intimidou como, através desse editorial de primeira página, chamemos assim, contra-atacou. Foi um episódio muito tenso e que merece ser reconstituído em algum momento, e, ao meu ver, foi a marca definitiva do jornal, foi quando se afirmou a natureza da Folha. Isso se deu no começo dos anos 90.
Essa homenagem, portanto, para mim, tem um grande significado: tem um significado político, geral, em relação ao País e em relação à imprensa por tudo aquilo que a Folha representa, mas tem também uma questão que toca a mim e ao meu passado. Por isso, Kátia, eu fiz questão de vir a esta tribuna dizer essas coisas, porque, para mim, é um orgulho saber que a Folha fez parte da minha formação.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Muito obrigada, Senador José Serra. Parabéns pelas palavras.
Antes de chamar o próximo orador, eu convido as personalidades que usaram da palavra para compor a mesa: o jornalista Josias de Souza e Ricardo Pedreira, Diretor Executivo da Associação Nacional dos Jornais (ANJ).
Com a palavra o Senador, Líder do PT, Humberto Costa.
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O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Pela Liderança.) - Sra. Presidente desta sessão, nossa querida companheira Senadora Kátia Abreu, Sra. Diretora de Editorial e Redação do jornal Folha de S.Paulo, Maria Cristina Frias, o Sr. Vice-Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Sr. Luiz Viana, o jornalista Josias de Souza, o Sr. Ricardo, também aqui presente, compondo essa Mesa dos trabalhos, inicialmente eu queria parabenizar a Senadora Kátia Abreu, autora do requerimento para esta homenagem, não somente pela justeza da homenagem, mas, principalmente, pela propriedade de fazê-la neste momento que nós vivemos em nosso País.
Queria também dizer que nós, do PT - eu, na condição de Líder -, fizemos questão que o Partido estivesse aqui representado. Nós estamos tendo um seminário o dia inteiro sobre a reforma da previdência, mas não poderíamos deixar de participar. Não somente pelo que representa a Folha de S.Paulo, pelo papel que ela desempenhou e desempenha na história da imprensa em nosso País, mas, especialmente, pelo que ela faz hoje e pelo momento que nós estamos vivendo no Brasil.
Lembrou muito bem o Kajuru a manifestação de Millôr Fernandes, em um determinado momento, ao dizer que a imprensa é oposição. Ainda que em muitos momentos possa desagradar a quem esteja exercendo temporariamente o poder - e isso vale para todos os seguimentos, valeu para nós nos momentos em que estivemos à frente deste País -, o papel da imprensa é esse, é fiscalizar, é denunciar, é construir uma visão crítica, é mostrar, muitas vezes, defeitos, problemas e insuficiências. Refiro-me aqui a governos, ainda que isso possa agradar mais ou menos a uns ou a outros e, muitas vezes, até possa acontecer algum tipo de exagero em algum tipo de cobertura ou de colocação ou de manifestação de opinião, mas é para isso mesmo que existe a imprensa.
Eu acho que a Folha de S.Paulo cumpre muito bem esse papel. Teve uma função primordial na reconquista da democracia em nosso País, teve um papel muito importante de defesa da cidadania em todos os governos que vieram posteriormente à Constituição de 1988 e, hoje, cumpre um papel central. Cumpriu, nessa eleição, quando corajosamente denunciou interferência importante no processo eleitoral, sem se preocupar se eventualmente a candidatura que foi denunciada ganharia ou não, ou seja, colocou-se ao lado do que é o justo, do que é o correto, independentemente do que pudesse acontecer.
Assume, hoje, uma posição extremamente corajosa em criticar coisas que tenham uma possibilidade ou que tenham, às vezes, até uma intenção de agredir a democracia, de desrespeitar a Constituição. Então, nós não poderíamos nunca deixar de estar aqui para externar o nosso reconhecimento ao Dr. Octavio Frias, que eu conheci, ao seu filho, Otavio Frias Filho, e à Folha de S.Paulo e dizer que contem conosco. Podemos ter divergências de visão sobre a sociedade, mas temos uma congruência importante, que é defesa da democracia, da liberdade, em particular da liberdade de imprensa. Nós não podemos nos calar em nenhum momento quando se tenta fazer, inclusive, a intimidação pessoal, quando se tenta fazer uma intimidação cujo objetivo é gerar medo. A Folha de S.Paulo nunca teve medo, e seus jornalistas também nunca tiveram medo. Para isso, contem conosco como partido, como Senadores que vão denunciar quando isso acontecer, que vão se colocar na defesa desse posicionamento, dessas iniciativas. Podem ter certeza de que o que vocês estão fazendo neste momento de defesa da democracia, da liberdade, de crítica aos que querem atacar essa mesma democracia, não entendendo, talvez, o papel grandioso que têm quando estão no exercício do poder, é algo que, para nós, para a nossa atividade política, é muito importante.
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Muitas e muitas vezes nós aqui usamos a tribuna e apresentamos proposições que partem de um trabalho investigativo importante que foi feito pelo jornal ou de uma opinião que representa o que pensa e o que deseja a maioria da população brasileira.
Então, mais do que me congratular e dar os parabéns por esta homenagem que vocês recebem, gostaria de pedir que continuem a fazer esse trabalho importante, que é muito sério e fundamental para o Brasil e para todos nós.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Muito obrigada, Senador Humberto Costa, por suas palavras. Parabéns!
Convido à tribuna - ainda faltava o Senador Jayme Campos, mas não está no Plenário - o último orador, o Senador Renan Calheiros, pela Liderança do PMDB, das Alagoas.
O SR. RENAN CALHEIROS (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - AL. Pela Liderança.) - Presidente e requerente desta sessão de homenagem, Kátia Abreu, parabéns pela iniciativa e pela oportunidade que você oferece ao Senado Federal de comemorarmos os 98 anos do jornal Folha de S.Paulo e de homenagearmos, em memória, o Diretor de Redação, Otavio Frias!
Diretora de Editorial e Redação do jornal Folha de S.Paulo, Maria Cristina Frias, é uma honra muito grande tê-la aqui no Senado Federal, assim como Josias de Souza e Renato Pedreira.
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Eu quero, posteriormente também, como fez aqui o Senador José Serra, cumprimentar o Ministro Gilmar Mendes, que esteve aqui. Eu tive um compromisso anterior e, por isso, me atrasei indevidamente e perdi a oportunidade de cumprimentar o Ministro Gilmar.
Cumprimento também jornalistas queridos que estão ou estiveram aqui, como a Mônica Bergamo, o Leandro Colon, o Sérgio Dávila, o Daniel Carvalho, a Thais Arbex, o Bruno Boghossian, a Daniela Lima. Ao cumprimentar esses jornalistas, eu quero cumprimentar todos os jornalistas que estiveram presentes nesta sessão.
Estou, Senadora Kátia Abreu, honrado por, em nome do MDB, numa deferência do Líder Eduardo Braga, expressar-me nesta sessão, discorrer sobre os 98 anos da Folha de S.Paulo e as virtudes de Otávio Frias Filho, seu precoce falecimento, aos 61 anos de idade, e reprisar a catequese centenária e incessante sobre o pilar democrático que ele defendeu intransigentemente e um dos mais sagrados da democracia, a liberdade de expressão.
A tarefa, que é eterna, equivale à condenação de Sísifo. Quando pensamos ter concluído nossa missão, precisamos novamente empurrar a pedra montanha acima, já que, em diversas fases recentes da nossa jovem democracia, esse valor vem sendo ameaçado, sob vários pretextos e estratagemas. Por isso, esse esforço continuado não é inútil.
Pensador irrequieto, dramaturgo, escritor, executivo, entre tantas outras atividades, a trajetória de Otávio Frias é a síntese, Josias, do bom jornalismo, uma atividade devotada ao pluralismo, à crítica, à independência e ao apartidarismo, princípios editoriais invioláveis perseguidos diuturnamente pelos profissionais do jornal Folha de S.Paulo, que, comandado por seu impetuoso diretor de redação, promoveu diversas modificações e avanços. Entre elas, a criação em 1991, do primeiro ombudsman na Folha de S.Paulo, espaço democrático, como todos sabem, para acolher reclamações, críticas e contestações.
A iniciais do nome Otavio Frias Filho representam o off, mas ele era um jornalista do on. Nada às escondidas, tudo em "on", aspeado.
Otávio Frias, com quem tive a honra de estar em várias oportunidades, assumia as suas ideias, era franco, direto, tinha uma honestidade intelectual incomum e defendeu valores democráticos no exercício da sua atividade, a partir da sua formação pessoal e humanista.
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Nós homens públicos enfrentamos tempos novos. A revolução tecnológica incluiu na rotina das civilizações modernas a interatividade, a velocidade nas respostas e a agilidade na solução de problemas. Os avanços são positivos e irrecusáveis, porém a hiperconectividade e o explosivo fenômeno das redes sociais jogaram luz sobre a produção de conteúdos para os ambientes digitais.
Nunca se consumiu tanta informação e, em várias delas, a origem é desconhecida, assim como a apuração, a checagem e a edição. O termo fake news, para atacar ou desqualificar, está incorporado nessa rotina. O relato fidedigno de fatos caracteriza a notícia e é o antídoto eficaz contra a falsas notícias.
Toda a sociedade, acredito nisso, irá amadurecer nessa interação com as redes sociais.
Por ora, há um excesso de malícia e milícias robóticas tentando se sobrepor à notícia, à própria opinião pública e manufaturar verdades inexistentes. Precisamos unidade na defesa da verdade, que é única e insubstituível. A verdade não é e não será a versão do poderoso da ocasião.
De outro lado, nenhuma instituição, pública ou privada, pode se achar perfeita a ponto de prescindir de aprimoramentos. Todas precisam ser refeitas diariamente. Aquelas que têm a humildade de assimilar as críticas, que são permeáveis às mudanças e admitem corrigir erros mantêm sua respeitabilidade.
Por isso, sempre repito: para corrigir os erros da democracia, mais democracia; para corrigir os excessos da imprensa, mais liberdade de expressão.
Da nossa perspectiva, temos que reiterar uma firme posição em defesa da democracia e seu mais importante reflexo, a liberdade de expressão, interditando qualquer ensaio na tentativa de controlar o livre debate no País. O modelo democrático brasileiro, a exemplo das nações modernas, se opõe ao pensamento único e monocrático, inservível à própria democracia.
Vamos respeitar a divergência, conviver com o contraditório e até com os excessos, sem assassinar a verdade. Isso é democracia.
A propósito desse ponto, destaco, pela oportunidade, o excelente artigo da pesquisadora Ilona Szabó de Carvalho, na Folha de S.Paulo de ontem - Ilona, com quem tive o prazer de conviver quando Ministro da Justiça: "Se perdemos a capacidade [diz a Ilona] de distinguir fatos de imposturas e se nossas instituições não responderem à disseminação de notícias falsas e à propaganda extremista, nossa democracia estará condenada".
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(Soa a campainha.)
O SR. RENAN CALHEIROS (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - AL) - A liberdade de expressão revela, portanto, o grau de civilidade e amadurecimento de uma coletividade. Tão importante quanto a liberdade de imprensa é a responsabilidade no manuseio da informação, que será consumida e reproduzida por milhões de pessoas na presunção da verdade.
O ensinamento de Thomas Jefferson, um expoente democrático, permanece inalterado e contemporâneo: "Onde a imprensa é livre e todo homem é capaz de ler, tudo está seguro".
Quanto mais livre a imprensa, maior a liberdade de expressão, mais robusta estará a democracia, mais forte estará a sociedade e maior será o controle público.
Muito obrigado, Senadora Kátia Abreu, pela oportunidade que V. Exa. me concede de falar aqui.
Mais uma vez cumprimento todos, Cristina, que fazem a Folha de S.Paulo, que, mais do que nunca, precisa, com o vigor de sempre, com a histórica participação, continuar na moldagem dessa democracia, que ainda não foi construída totalmente. Nós vivemos desafios, a partir do desafio de termos que lutar, continuar lutando para assegurar os próprios direitos consagrados na Constituição e nas demais legislações, que fazem parte desse nosso cipoal.
Isso tudo não será possível sem a determinação, sem a isenção, sem a independência, sem o vigor, mais do que nunca, exigidos da Folha de S.Paulo.
Parabéns. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Obrigada, Senador Renan Calheiros, por sua participação e presença.
Terminam os oradores, Senadores presentes - praticamente todos os partidos se fizeram representados -, e eu passo a palavra para o Vice-Presidente da OAB Nacional, representando Felipe Santa Cruz, o Dr. Luiz Viana.
Com a palavra, por favor.
O SR. LUIZ VIANA QUEIROZ - Exma. Senadora proponente e Presidente desta belíssima sessão, Maria Cristina Frias, representando a família de Otavio Frias e a Folha de S.Paulo, Josias de Souza, Renato Pedreira, Sras. Senadoras, Srs. Senadores, senhoras e senhoras, uma saudação muito rápida da Ordem dos Advogados do Brasil.
O Presidente Felipe Santa Cruz, que estava agendado para estar aqui presente, teve que retornar à sua casa no Rio de Janeiro e me pediu para representá-lo, trazendo uma rápida palavra da Ordem dos Advogados do Brasil.
E eu começo de onde terminou o Senador Alvaro Dias, citando Ruy Barbosa, que está aqui presente encimando este belíssimo Plenário, em A Imprensa e o Dever de Verdade, de 1920:
A imprensa é a vista da Nação. Por ela é que a Nação acompanha o que lhe passa ao perto e ao longe, enxerga o que lhe malfazem, devassa o que lhe ocultam e tramam, colhe o que lhe sonegam, ou roubam, percebe onde lhe alvejam, ou nodoam, mede o que lhe cerceiam, ou destroem, vela pelo que lhe interessa, e se acautela do que a ameaça.
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Hoje, nesta bela sessão de comemoração, eu trago o abraço da Ordem dos Advogados do Brasil à família de Otavio Frias, trago a homenagem à Folha de S.Paulo. Na sessão, está escrito ali "comemorar". Comemorar é tornar memorável com, fazer desta oportunidade uma oportunidade para que nós possamos manter vivos na memória tanto o passado da Folha de S.Paulo, quanto a própria vida de Otavio Frias Filho.
O tempo, 98 anos, por si só já seria suficiente para esta homenagem, Presidente, mas essa longevidade é uma longevidade com qualidade. Vim, portanto, aplaudir a família de Otavio Frias e a ele próprio, aplaudir a Folha de S.Paulo e, ao mesmo tempo, colocar a Ordem dos Advogados do Brasil ao lado da Folha, da imprensa livre deste País, em defesa da liberdade de expressão, em defesa da liberdade de imprensa.
Também, quero colocar a Ordem dos Advogados do Brasil ao lado das entidades que congregam os jornalistas. Sabem os jornalistas aqui presentes mais do que eu - aliás, a própria Folha de S.Paulo destacou isso em 2018 - que, entre 2010 e 2017, o Brasil foi o segundo País da América Latina na morte de jornalistas no exercício da profissão. Portanto, é preciso reforçar a liberdade de imprensa e a segurança dos profissionais.
E não há democracia sem liberdade de imprensa, porque a liberdade de imprensa é também um direito fundamental, compõe o conjunto, o núcleo duro dos direitos humanos, e não há democracia sem a garantia da eficácia dos direitos humanos, como não há direitos humanos senão na democracia. Isso está escrito na Carta Democrática da Organização dos Estados Americanos.
Não há democracia sem transparência, e eu quero concluir voltando a Ruy Barbosa, no mesmo texto de 1920: "Nenhum país salva a sua reputação com os abafos, capuzes e mantilhas da corrupção encapotada".
(Soa a campainha.)
O SR. LUIZ VIANA QUEIROZ - Nada tão atual quanto isso.
Quero concluir dizendo que, nesta gestão de Felipe Santa Cruz, a liberdade de imprensa é tão importante que um dos primeiros atos foi a criação de um Observatório da Liberdade de Imprensa no Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, que será coordenado pelo advogado Pierpaolo Bottini e que se coloca aqui à disposição do Senado, ilustre Senadora, como das demais entidades ligadas à liberdade de imprensa.
Faço votos, Maria Cristina Frias, de que o passado da Folha de S.Paulo seja uma garantia do seu futuro e de que nós possamos continuar contando com esse trabalho tão brilhante que foi realizado, que esperamos continue nessa trajetória de busca e divulgação da verdade.
Parabéns à família. Parabéns à Folha. Parabéns, Senadora Kátia Abreu. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Muito obrigada, Dr. Luiz Viana, Vice-Presidente da OAB, e quero parabenizar toda a diretoria e Felipe Santa Cruz pela criação do Observatório da Liberdade de Imprensa, isso para nós é fundamental, mesmo porque a OAB é uma entidade totalmente isenta e poderá divulgar isso para todo o nosso País, para saber se a nossa democracia está mesmo segura. Gostaria de convidar Ricardo Pedreira, Diretor Executivo da Associação Nacional de Jornais (ANJ), e ainda registrar a presença da jornalista Denise Rothenburg, do Correio Braziliense.
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O SR. RICARDO PEDREIRA - Bom dia a todos! Meus cumprimentos à Presidente desta sessão, Senadora Kátia Abreu, autora da iniciativa desta comemoração, desta homenagem. Meus cumprimentos aos integrantes da Mesa: Maria Cristina; Dr. Luiz Viana, da OAB; Josias, velho colega de antigas coberturas; Editor-Executivo da Folha, Sérgio Dávila; Diretor da sucursal, Leandro Colon; Senador Kajuru.
Para a Associação Nacional de Jornais (ANJ), é uma imensa honra participar desta sessão no Senado. A Folha de S.Paulo é um dos dez jornais que, há 40 anos, criaram a nossa associação. Hoje, a ANJ tem mais de cem jornais associados, que representam cerca de 90% da audiência dos jornais brasileiros, no impresso e no digital. A Folha de S.Paulo é parte essencial da história da ANJ e, por isso, temos tanta satisfação em homenageá-la.
Otavio Frias Filho, também homenageado hoje, foi o idealizador do Código de Ética da ANJ, que contém os princípios de autorregulamentação da nossa entidade, princípios esses que consagram tudo aquilo que simboliza o bom jornalismo que defendemos: independência, a busca permanente da verdade, profissionalismo, compromisso com os valores da democracia e reconhecimento e correção de erros.
Os 98 anos que a Folha de S.Paulo completa agora em 2019 também simbolizam esses princípios. Toda essa longevidade está diretamente relacionada à capacidade da Folha de fazer jornalismo profissional e de qualidade, de se modernizar e se atualizar, de estar atenta aos anseios e interesses da Nação, dos cidadãos e dos seus leitores.
Foi em sintonia com as mudanças que o Brasil atravessou na década de 80 que Otavio Frias Filho implantou na Folha o Projeto Editorial, que resulta no jornalismo crítico, plural e irrequieto, que são a marca desse grande jornal. O Projeto Folha, como passou a ser chamado, é um marco na história do jornalismo brasileiro.
Essas qualidades são evidentes na Folha em benefício dos seus leitores e em meio à revolução deflagrada pela internet, pelas mídias digitais, pelas redes sociais. As informações e as opiniões trafegam em alta velocidade em todas as direções, e isso é muito positivo. Mas cresceu assustadoramente a disseminação da informação falsa, conferindo ainda mais valor à informação de credibilidade, que é a essência do bom jornalismo que a Folha de S.Paulo representa.
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Contra as informações falsas, o melhor antídoto é mais jornalismo, é mais liberdade de imprensa. Por isso, é essencial a existência de veículos como a Folha. E é auspicioso o crescimento que a Folha e tantos outros jornais brasileiros e fora do Brasil estão tendo nas suas audiências digitais, pois a verdade é que, ao contrário do que muita gente diz, nunca se leu tanto jornal quanto nos dias de hoje.
Há três anos, a ANJ fez uma campanha que dizia o seguinte: "Antes, a gente lia jornal todo o dia. Hoje, a gente lê jornal o dia todo". Não apenas no papel, mas, nos computadores e, principalmente, nos celulares, a gente tem na palma da mão a notícia apurada com profissionalismo, editada e contextualizada com critério e ética, dentro do objetivo maior de dar aos cidadãos a visão do mundo que as cerca.
Por isso, o livre exercício do jornalismo é tão importante para as nossas vidas e é inseparável da democracia. Só com informação de qualidade, com o debate aberto, poderemos construir os consensos necessários à prosperidade.
Ao homenagear nesta sessão especial do Senado a Folha de S.Paulo e Otavio Frias Filho, estamos homenageando, acima de tudo, o jornalismo e a liberdade de imprensa.
Otavio nos deixou precocemente, mas iluminou nosso caminho com seu apreço pelo profissionalismo, com sua obstinação pela informação precisa e com a valorização do pluralismo.
A Folha segue com brilho a direção apontada por Otavio, agora com a Maria Cristina na difícil tarefa de substituí-lo. A ANJ cumprimenta Maria Cristina e todos aqueles que fazem, a cada dia, a cada minuto, a Folha de S.Paulo. Que vocês prossigam com sua missão, assim como todos os que fazem jornalismo profissional, independente e de qualidade em nosso País. Repito: precisamos de mais e mais jornalismo, precisamos de mais e mais liberdade de imprensa.
Parabéns à Folha e saudades de Otavio. Para a ANJ, é um privilégio ter a Folha de S.Paulo como companheira de jornada.
Muito obrigado e bom dia a todos. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Muito obrigada, Dr. Ricardo Pedreira, diretor da ANJ. A sua presença nos honra muito.
Com a palavra o jornalista, colunista Josias de Souza, do UOL, Folha de S.Paulo.
O SR. JOSIAS DE SOUZA - Bom, em respeito a Ruy Barbosa, que nos observa de cima, eu não vou cometer a ousadia de fazer discursos aqui. Vou fazer algumas observações, observações rápidas, para realçar a importância desta sessão.
Antes eu cumprimento todos. Estamos aqui agora numa reunião quase intimista. Faço uma menção especial à Senadora Kátia Abreu, para elogiá-la por esta iniciativa de propor, num momento tão oportuno, esta homenagem à Folha, muito bem representada aqui por sua diretora de redação, Maria Cristina Frias. É uma homenagem extensiva a Otavio Frias Filho, um personagem por quem eu tenho especial apreço e admiração.
A homenagem à Folha vem em boa hora não apenas por conta do aniversário do jornal, mas porque há, na conjuntura atual, muita gente que suspira comovida só de ouvir falar em liberdade de expressão, liberdade de imprensa. O sonho de algumas dessas pessoas é de se verem livres da imprensa. Uma sessão como esta no Senado da República constitui uma oportunidade fabulosa para a gente alardear que a liberdade de imprensa, a livre manifestação do pensamento são bens imateriais e inegociáveis.
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Aqui, a propósito das tentativas de desqualificar jornalistas e meios de comunicação, eu abro um rápido parêntese para lembrar algo que tive a oportunidade de contar num texto recentemente. Eu disse que era muito fácil reconhecer o Otavio Frias Filho numa roda de jornalistas. Ele era o que estava falando mal do jornalismo. Antes de sua morte, eu tive a oportunidade de perguntar: "Por que você tem essa visão tão corrosiva sobre o seu próprio ofício?". Ele me devolveu a pergunta, falou: "Por que você escolheu ser jornalista?". E eu disse: "Não é na imprensa que a história vai buscar boa parte dos dados de que se alimenta?". E o Otavio disse: "É por isso que a história está cada vez mais confusa e imprecisa". No longo convívio profissional que tivemos, a qualidade que mais admirei no Otavio foi a sua devoção pela autocrítica. O seu grande acerto na condução da Folha de S.Paulo foi essa obsessão pelo reconhecimento dos próprios erros. Foi nessa atmosfera, que eu tive o privilégio de respirar por mais de 20 anos, que eu me habituei a praticar o jornalismo. Num ambiente assim, as críticas que vêm de fora, em vez de abaterem, fortalecem. E aqui eu fecho o parêntese.
Com todo o respeito às pessoas que pensam de modo diferente, eu digo que a nossa democracia, a democracia brasileira, está doente. Ela sofre de uma espécie de esquizofrenia. É como se o Brasil estivesse no divã, submetendo-se à uma terapia grupal para tratar as suas próprias loucuras. O País, às vezes, sofre um surto regressivo, briga consigo mesmo, briga com a realidade. Passado o transe, o Brasil não consegue se dar alta. O País está apaixonado pelo ódio e vem sendo plenamente correspondido. A grande sorte é que a democracia produz os antídotos contra os seus próprios venenos.
Num comentário que escrevi sobre o massacre ocorrido ontem na escola de Suzano, em São Paulo, eu dizia que bondade e solidariedade viraram gêneros de primeira necessidade no Brasil. As pessoas andam mal-humoradas. Aluno agride professor e vice-versa. Conversa entre membros da mesma família vira bate-boca e, às vezes, descamba até em troca de tapas. O debate político só é considerado eficiente quando uma parte consegue obrigar a outra a calar a boca. E há gente achando que a solução é distribuir armas. Num ambiente assim, pintar o noticiário de cor-de-rosa seria como retocar uma radiografia. Obviamente, não resolve o problema. É preciso tratar a doença. E a cura só será obtida com dois remédios: a honestidade no diagnóstico - e nisso veículos como a Folha são especialistas - e doses cavalares de amor: amor pela diversidade de ideias, amor pela fricção proporcionada pelo exercício do contraditório, amor pela liberdade de imprensa, amor pelo País. Amor pela diversidade de ideias, amor pela fricção proporcionada pelo exercício do contraditório, amor pela liberdade de imprensa, amor pelo País. Parece fácil, mas o único problema é que amar não é coisa para amadores.
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Para encerrar, eu quero enaltecer duas habilidades que eu reconheço nos adversários da liberdade de imprensa. Mesmo não suportando a imprensa, que exerce a saudável atribuição de imprensar, eles continuam lendo os jornais, seja em que plataforma for, continuam assistindo aos telejornais, e é muito bom saber que leem e assistem ao noticiário sobre o que se passa fora da bolha de suas redes "antissociais". A satisfação nasce de uma constatação básica - e aí faço o elogio às duas qualidades dos inimigos da imprensa: se leem e assistem, é porque são alfabetizados e não são cegos. Munidos dessas duas habilidades essenciais, vão acabar percebendo que numa democracia um agente político que se queixa da imprensa é mais ou menos como um comandante de navio que reclama do mar. Os navios e seus comandantes passam, o mar permanece.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Parabéns, Josias de Souza, esse grande e brilhante jornalista do Brasil, da Folha e do UOL. Muito obrigada pela sua participação não só pelo que você representa, mas pela preciosidade das palavras.
Agora convido Maria Cristina Frias, Diretora Editorial e de Redação da Folha de S.Paulo, irmã de Otavio Frias Filho, que será a nossa última convidada a usar a palavra.
Sinta-se à vontade, Maria Cristina.
A SRA. MARIA CRISTINA FRIAS - Bom dia.
Gostaria de cumprimentar os membros que compuseram esta Mesa, a quem agradeço as palavras generosas na pessoa da Senadora Kátia Abreu. Saúdo os colegas da imprensa.
Senhoras e senhores, todos os Senadores e oradores do Senado Federal, é a segunda vez que tenho a honra de vir a esta Casa para agradecer uma homenagem. Cá estive para um reconhecimento a Otavio Frias de Oliveira, fundador da Folha moderna e meu pai, e hoje tenho a satisfação de retornar para uma homenagem aos 98 anos da Folha e ao jornalista Otavio Frias Filho, proposta pela Senadora Kátia Abreu, cuja deferência muito nos sensibiliza. Ambos, Otavio pai e Otavio filho, nos fazem muita falta, à Folha e ao jornalismo brasileiro.
Desde que assumi a direção editorial e de redação do jornal, por indicação de meu irmão Otavio, tenho me dedicado a perseguir os princípios do Projeto Folha, que foi patrocinado por ele desde os anos 1980.
Uma ideia central do jornalismo que praticamos é que os poderes numa sociedade democrática precisam ser contrastados, não podem ser exercidos sem crítica nem contrapeso, sob o risco de se desviarem para o arbítrio.
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Entre outras instituições, cabe à imprensa livre e profissional exercer o papel fiscalizador em nome da sociedade civil. No âmbito dos Poderes constituídos, fiscalizar a Presidência da República é uma das funções nobres do Congresso Nacional.
O Senado, esta Casa no Brasil já quase bicentenária, tem a tarefa de modular e equilibrar o próprio Legislativo.
O jornalismo, por sua vez, como entendido pelo saudoso Otavio, tampouco deveria ser exercido num vácuo de autocrítica e controles internos. Mesmo praticado sob estritos protocolos técnicos, sua capacidade de enxergar todo o campo em que atua é limitada, até pela natureza apressada do nosso ofício, e incompleta do nosso objeto, um fiapo de história que ainda não se revelou por inteiro. O jornalismo está sujeito, portanto, a cometer erros e impropriedades, tão mais frequentes quanto menos presentes e eficazes forem seus mecanismos de autocontrole.
Daí surgiram algumas das inovações que revolucionaram a imprensa brasileira. A Folha estabelece, e cumpre como rotina inarredável, a obrigação de ouvir os argumentos de pessoas e organizações criticadas em nosso noticiário e de publicá-los. Diariamente, corrige seus erros de modo transparente, sob a rubrica "erramos". Contrata uma profissional, a ombudsman, cuja responsabilidade é criticar o nosso jornalismo com autonomia.
A Folha cultiva a pluralidade na definição de seu quadro de jornalistas, colunistas e articulistas. E queremos avançar na diversidade com mais mulheres, negros, um leque mais amplo de perfis ideológicos e de formação não só na redação, como em nosso leitorado.
A direção do jornal está de portas sempre abertas aos representantes da sociedade e do Estado, interessada sobretudo em ouvir os seus questionamentos aos conteúdos que publicamos e em saber de experiências, acontecimentos e visões de mundo que muitas vezes não aparecem como deveriam em nossas páginas.
Todo esse arcabouço foi desenhado no intuito de permitir o florescimento de um jornalismo que seja, sim, crítico, como dele se espera, mas que seja, ao mesmo tempo, mais preciso e leal com leitores, fontes e personagens da notícia. Cremos que, com isso, damos nossa modesta contribuição para o aperfeiçoamento da democracia e para a diminuição das injustiças sociais no Brasil. É o mesmo papel que, na escala institucional que lhe é de direito, desempenha esta Casa sob a égide da Constituição de 1988.
Muito obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Kátia Abreu. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - TO) - Obrigada, Maria Cristina Frias, pelas suas palavras, pela sua presença aqui nesta importante sessão para todos nós, não só para a Folha.
Hoje, nós estamos homenageando o aniversário da Folha e também trazendo a lembrança de Otavio Frias, que faleceu há seis meses, mas, de certa forma, nós estamos aqui falando de toda a imprensa brasileira, num momento crítico para o Brasil, num momento crítico pelo qual a democracia está passando.
Nada é mais importante do que isso. Eu não conheço nenhuma democracia no mundo onde a imprensa seja amordaçada, calada, destruída, criticada, abusada. Contestar, sim! Esse é um direito que todos nós temos se nos sentirmos injustiçados, como disse agora há pouco.
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Temos a Justiça para isso. Podemos abrir processos e nos defender. É um direito que nós temos e não devemos temer isto também: quando nos sentirmos atacados injustamente dar o grito dos injustiçados, mas calar a imprensa é inadmissível!
Começamos com ataques à Rede Globo de Televisão, começamos depois com ataques à Folha de S.Paulo, depois ao Estado de S. Paulo e, agora, não há mais limites.
Mas eu quero dizer a todos vocês que não posso falar por 100% desta Casa, mas pela grande maioria dos Senadores desta Casa, que aqui nós não permitiremos nada contra a democracia. E para valorizar, defender e proteger a democracia, a liberdade de imprensa está incluída nesse rol. Fiquem despreocupados.
Muito obrigada a todos pela participação.
Registro a presença do Senador Reguffe, de Brasília, do DF, e também do Senador Luis Carlos Heinze, do Rio Grande do Sul.
Muito obrigada a todos que participaram deste evento. Mando também uma lembrança especial a toda a imprensa do Estado do Tocantins, ao Jornal do Tocantins, a todos os blogues da capital e do interior, a todas as rádios comunitárias e privadas, à imprensa de televisão, às empresas de televisão, a todos vocês. E também me dirijo a cada um de vocês pela liberdade de imprensa. Quero dizer que esta Casa está pronta para defender todo o jornalismo brasileiro, toda a imprensa brasileira do Oiapoque ao Chuí.
Dou por encerrada esta sessão de homenagem aos 98 anos do jornal Folha de S.Paulo e em homenagem, in memoriam, ao Diretor de Redação Otavio Frias Filho.
Muito obrigada. (Palmas.)
(Levanta-se a sessão às 12 horas e 21 minutos.)