3ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA
56ª LEGISLATURA
Em 13 de setembro de 2021
(segunda-feira)
Às 10 horas
109ª SESSÃO
(Sessão Especial)

Oradores
Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF. Fala da Presidência.) - Declaro aberta a sessão.
Sob a proteção de Deus, iniciamos nossos trabalhos.
A presente sessão especial remota foi convocada nos termos do Ato da Comissão Diretora nº 8, de 2021, que regulamenta o funcionamento das sessões e reuniões remotas e semipresenciais no Senado Federal e a utilização do Sistema de Deliberação Remota, em atendimento ao Requerimento nº 1.439, de 2021, do Senador Flávio Arns e outros Senadores, aprovado pelo Plenário do Senado Federal.
A sessão é destinada a homenagear o centenário de nascimento de D. Paulo Evaristo Arns.
A Presidência informa que esta sessão terá a participação dos seguintes convidados: Sr. Reverendo D. Joel Portella Amado, Bispo Auxiliar da Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro e Secretário-Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB); Sr. Reverendo Cardeal D. Odilo Pedro Scherer, Arcebispo Metropolitano de São Paulo; Sr. Reverendo Padre Júlio Lancellotti, Pároco na Paróquia São Miguel Arcanjo, na Cidade de São Paulo; Sr. Pedro Simon, Senador da República pelo Estado do Rio Grande do Sul no período de 2007 a 2015; Sr. Nelson Arns Neumann, Coordenador Nacional Adjunto e Coordenador Internacional da Pastoral da Criança; Sra. Anita Sue Wright, Vice-Presidente do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic); e Sr. Reverendo Frei Fidêncio Vanboemmel, Ministro Provincial na Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil.
Convido a todos para, em posição de respeito, acompanharmos o Hino Nacional.
(Procede-se à execução do Hino Nacional.)
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O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Eu quero saudar aqui todos os nossos convidados e também os nossos queridos Senadores e Senadoras.
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Minhas senhoras e meus senhores, hoje estamos aqui para celebrar o centenário de nascimento de D. Paulo Evaristo Arns, um dos mais honrados homens que este País já viu. Independentemente da fé religiosa de qualquer um dos presentes, D. Evaristo é uma daquelas pessoas que nos servem como guia moral e espiritual. É um exemplo com o qual podemos nos tornar seres humanos melhores, mais decentes, mais corretos.
Nascido em Forquilhinha, em Santa Catarina, foi ordenado padre aos 24 anos. Logo depois, imbuído de uma tremenda curiosidade intelectual, obteve os mais distintos títulos acadêmicos, inclusive o de doutor em Línguas Clássicas, pela Universidade Sorbonne, uma das mais conhecidas do mundo e também conceituada.
Ele poderia ter sido restringido à atividade puramente intelectual e o teria feito com enorme mérito, como demonstra sua tese de doutorado publicada com o título "A técnica do livro segundo São Jerônimo", mas teve a vontade de ir muito além: trabalhou em favelas, construiu escolas, deu pão aos famintos, abrigo aos que tinham frio, consolo aos que sentiam desespero.
Se o Brasil tivesse tido uma vida política mais tranquila, talvez ele não tivesse se transformado em um nome conhecido de todos nós. Todavia, é nos momentos de maior escuridão que os homens - e foi o caso de D. Evaristo - trazem à tona aquela chama de grandeza, de decência e de dignidade que têm dentro de si, e foi isso o que fez com que D. Evaristo se tornasse um nome conhecido de todos nós.
No início da década de 70, o Brasil vivia um dos seus piores momentos. Na superfície, era o Brasil, o país que vai para frente. No subterrâneo, eram os cárceres da ditadura, em que se torturavam e assassinavam brasileiros.
Foi justamente em outubro de 1970, no auge do terror da ditadura, que D. Paulo se tornou Arcebispo Metropolitano de São Paulo.
Foi na Catedral da Sé, em 1975, juntamente com o Rabino Henry Sobel e o Reverendo Jaime Wright, que ele celebrou o culto ecumênico em memória do Jornalista Vladimir Herzog, torturado e assassinado pela ditadura. Acompanhado por 8 mil brasileiros, foi evento marcante na nossa história e marco decisivo para se pôr fim à ditadura.
Anos depois, junto com o Reverendo Wright, foi um dos coordenadores do projeto Brasil: Nunca Mais, um retrato terrível, mas necessário, dos porões da ditadura militar no Brasil.
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D. Evaristo sempre se guiou pelo respeito aos seres humanos e pela volta da democracia, sempre e estritamente dentro da perspectiva cristã, principalmente pela ótica da justiça social, característica da Igreja no pós-Segunda Guerra.
D. Evaristo ajudou ainda a criar a Comissão Justiça e Paz, que abrigou e salvou a vida de vários perseguidos pelo regime militar. Ele arriscou a própria vida ao se expor publicamente contra a ditadura e, ao fazer isso, ele transformou a Arquidiocese de São Paulo em um ponto de referência na defesa da vida do homem.
Ele se dizia guiado por quatro princípios expostos pela Pacem in Terris, Paz na Terra, do Papa João XXIII: justiça social, solidariedade, verdade, liberdade, mas respeitando, sobretudo, a liberdade dos outros. São princípios cristãos pelos quais vale se guiar para se ter uma vida justa.
A vida, é claro, não é fácil, e ele nos lembrou disso em entrevista ao programa Roda Viva em 1995. Naquela oportunidade, ele afirmou que a vida é realmente um desafio, é preciso preparar-se para ela porque ela é braba, mas acrescentou: "Nós precisamos agora de muita coragem, de muita esperança". Hoje, neste momento em que o Brasil enfrenta uma crise sanitária, política e econômica como poucas na história, é preciso coragem e esperança.
Muito obrigado, D. Paulo! Todos nós emocionados ao lembrar de sua figura tranquila, de sua voz contida e de seus gestos serenos. Obrigado por nos mostrar, por meio de seu exemplo, que somos capazes, sim, de ter coragem e esperança mesmo nos momentos mais sombrios.
Era o que tinha a dizer.
Muito obrigado.
Assistiremos agora a um resumo da biografia do homenageado desta sessão.
(Procede-se à exibição de vídeo.)
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O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Passo a palavra ao nosso requerente desta sessão, nosso colega, amigo, Senador Flávio Arns.
O SR. FLÁVIO ARNS (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PODEMOS - PR. Para discursar.) - Quero cumprimentar V. Exa., Senador Izalci Lucas, do Distrito Federal, amigo, presidindo esta sessão solene, que também é Vice-Presidente da Frente Parlamentar Mista da Educação - Câmara e Senado.
Quero cumprimentar também D. Odilo Scherer, grande amigo, cuja família é do Paraná. Quero cumprimentar D. Joel Portella Amado, Secretário-Geral da CNBB; o Padre Júlio Lancellotti, grande amigo de D. Paulo Evaristo; e também Frei Fidêncio Vanboemmel, Ministro Provincial na Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil; de maneira muito especial, a Sra. Anita Sue Wright, filha de Jaime Wright, grande amigo de D. Paulo Evaristo; Nelson Arns Neumann, primo, Coordenador Nacional Adjunto e Coordenador Internacional da Pastoral da Criança; e o ex-Senador Pedro Simon, que tinha por D. Paulo grande carinho e grande amizade. Eu pude testemunhar a grande amizade, respeito e carinho que D. Paulo tinha por Pedro Simon.
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Quero cumprimentar os Senadores e as Senadoras que acompanham esta sessão solene e também todos e todas que a acompanham pelos meios de comunicação do Senado.
Nós estamos juntos, hoje, com alegria, para homenagear o querido tio D. Paulo Evaristo Arns, que completaria cem anos amanhã, dia 14 de setembro. Sua história e seu legado merecem nosso reconhecimento e valorização, principalmente por sua caminhada de vida a favor do ser humano, da cidadania, dos mais vulneráveis e por sua incansável luta em defesa da democracia.
Nós assistimos agora há pouco a um resumo da história de D. Paulo e relembramos sua história de vida, que nos inspirou e continua nos inspirando, até hoje, a seguir lutando por um País mais igualitário e justo.
Gostaria de trazer para este momento de homenagem e exaltação de sua trajetória um paralelo, uma reflexão sobre o significado da vida de D. Paulo e o Brasil que vivemos hoje.
D. Paulo teve sua vida e seu trabalho, como já foi dito, baseados no lema que adotou para a vida religiosa: "de esperança em esperança". Esse lema foi materializado em suas ações, que o tornaram conhecido por todos como o Cardeal da Esperança. D. Paulo acreditava que, mesmo com todos os males presentes no mundo por meio das ações humanas, somos chamados a caminhar de esperança em esperança. Esse cidadão do céu e da terra, pastor e profeta, de inquebrantável força moral tinha no trato com cada pessoa a confirmação do profundo respeito pelo ser humano e pela sua dignidade. Pela sua palavra e pela sua ação, D. Paulo se tornou agente de vida, e vida plena para todos, em especial aos pequenos e esquecidos; lutou por direitos e praticou a solidariedade.
A palavra solidariedade traz dois significados fundamentais: solidariedade, que destaca o aspecto gratuito da benevolência, da compaixão e da misericórdia; e também lealdade, que valoriza o compromisso. É uma prática que envolve sentimento, opção, adesão e ação transformadora. E D. Paulo, na observância do direito dos pobres, na prática da solidariedade, transformou-se no arauto da paz. Exemplos não faltam em sua história. Acreditando no poder da comunidade, foi incentivador, apoiador e mentor de diversos movimentos pastorais, como a Pastoral da Criança, cuja criação tive a honra de acompanhar de perto, ao lado da também querida Tia Zilda Arns. Também teve papel importante D. Paulo na criação da Pastoral da Pessoa Idosa, Pastoral do Povo da Rua, Pastoral Operária, Pastoral de DST/Aids. Quando ele estava sendo velado na Catedral Metropolitana de São Paulo, a gente sentiu essa proximidade do povo com a fila que se fazia, lá na catedral, até o meio da praça, e todas as pastorais presentes para dizer: "Que bom, D. Paulo, estivemos juntos e vamos continuar juntos!". A opção pelos mais vulneráveis também se fez presente em outras passagens emblemáticas da vida de D. Paulo, como, quando vendeu - e é bom repetir isso - o Palácio Episcopal da Arquidiocese de São Paulo e usou o dinheiro arrecadado para criar centros comunitários na periferia da capital paulista. D. Paulo acreditava no poder do povo organizado e trabalhou arduamente para criar mais de 2 mil comunidades eclesiais de base, aproximando a Igreja do povo mais carente, uma ação que ecoa nas periferias até os dias de hoje.
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E não há como falar de D. Paulo sem destacar sua atuação em defesa da democracia; certamente este é um de seus principais legados. Em um período em que o Brasil vivenciou as consequências sombrias da ditadura, D. Paulo não só resistiu, mas também agiu. Ao lado do Pastor presbiteriano Jaime Wright, representado aqui pela Anita Wright, sua filha, e do Rabino Henry Sobel, idealizou o projeto que resultou no livro Brasil: nunca mais. A iniciativa deu voz a muitas pessoas que foram mortas ou torturadas durante o regime militar, em nosso País. Destaco as palavras de D. Paulo no prefácio do livro: "As angústias e esperanças do povo devem ser compartilhadas pela Igreja. Confiamos que esse livro, composto por especialistas [ele dizia], nos confirme em nossa crença no futuro. Afinal, o próprio Cristo, que passou pela terra fazendo o bem, foi perseguido, torturado e morto. Legou-nos a missão de trabalhar pelo Reino de Deus, que consiste na justiça, verdade, liberdade e amor".
A lembrança de D. Paulo, neste momento crucial da vida de Nação e do seu povo, deve servir, tem que servir de inspiração para a descoberta de caminhos de superação das injustiças, das divisões, das exclusões, dos radicalismos, dos preconceitos e das discriminações. Sem o acolhimento do grito dos excluídos, no sentido da superação do enorme fosso das desigualdades, jamais caminharemos no sentido de uma nação justa e acolhedora para todos os seus filhos e filhas. O direito a uma vida digna é um direito inalienável, e um caminho de direito e de solidariedade só pode se concretizar num clima sadio de democracia. D. Paulo foi uma voz que se ergueu pela democracia, pelo direito, pela justiça, sem medo e com destemor contra todos os abusos violadores dos direitos humanos. Neste momento de nossa Nação, que a lembrança do nascimento de D. Paulo sirva para suscitar cidadãos e cidadãs artífices da justiça e construtores da paz. Viva D. Paulo! E como ele dizia: coragem! Esperança! Obrigado.
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O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Obrigado, Senador Arns.
Passo imediatamente a palavra ao nosso querido Senador Antonio Anastasia.
O SR. ANTONIO ANASTASIA (PSD - MG. Para discursar.) - Bom dia, eminente Presidente desta sessão, Senador Izalci. Permita-me cumprimentar nossos pares na pessoa do autor dessa proposição, Senador Flávio Arns, a quem cumprimento pela brilhante iniciativa dessa homenagem do centenário de nascimento do eminente Cardeal D. Paulo Evaristo Arns. O Senador Flávio, secundando o Senador Izalci, ambos, de maneira muito clara, de maneira muito feliz, demonstraram a trajetória ímpar desse brasileiro que honrou, de modo singular, a sua dedicação, o seu amor pela paz, pela fraternidade, em especial pelos mais humildes, aqueles que foram e que são ainda hoje, infelizmente, necessitados da atenção da Igreja, do Poder Público e de toda a sociedade.
E me permita levar igualmente, na pessoa do eminente Cardeal D. Odilo Scherer, a minha saudação a todas as autoridades eclesiásticas aqui presentes. Minha palavra, eminente Presidente Senador Izalci, Senador Flávio, será curta, mas, ao mesmo tempo, simbólica: de um abraço especial de nós mineiros, de meu Estado, Minas Gerais - o Senador Izalci, a despeito de representar o Distrito Federal com muito garbo e orgulho, tem também a sua certidão de nascimento em nosso Estado -, por um apreço imenso que temos pela memória do Cardeal Arns. De fato, pelo seu empenho, pelo seu desenvolvimento nos trabalhos e, sobretudo, pelo exemplo que ele legou a tantas e tantas pessoas no Brasil e pelo mundo afora.
Como aqui foi dito - e muito bem - pelo Senador Izalci e pelo Senador Flávio Arns em especial: o momento do Brasil é um momento de pacificação. Nós precisamos nos inspirar nesses exemplos como foi de D. Paulo, exatamente com o objetivo de superarmos esses conflitos, essas contradições, esse momento de acirramento, infelizmente agora ainda mais agravados por essa terrível pandemia. Se D. Paulo estivesse entre nós, tenho, sim, certeza: teria sempre uma palavra de equilíbrio, uma palavra de concórdia, uma palavra de pacificação e de fraternidade para superarmos esses momentos e, ao mesmo tempo, de consolo e acolhimento para aqueles que estão doentes.
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Desse modo, é com imensa satisfação que eu me somo a esta homenagem - e, mais uma vez, cumprimento a iniciativa feliz do Senador Flávio Arns - e aos nossos colegas do Senado Federal para homenagearmos a memória tão bela de uma página de vida única e extraordinária na história não só da Igreja Católica no Brasil e no mundo, mas, sobretudo, um exemplo maiúsculo da figura humana, cuja sensibilidade nós todos reverenciamos.
Muito obrigado. Meus cumprimentos.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Obrigado, Senador Anastasia.
Concedo a palavra ao Sr. Reverendo D. Joel Portella Amado, Bispo Auxiliar da Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro e Secretário-Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
O SR. JOEL PORTELLA AMADO (Para discursar.) - Obrigado, Senador Izalci, a quem saúdo. E, na sua pessoa, saúdo os demais Senadores e a instituição democrática e republicana Senado Federal.
Saúdo, dentre o corpo de Senadores, o Senador Flávio Arns, sobrinho, e, na sua pessoa, a família, por meio da qual fomos presenteados com o Cardeal Paulo Evaristo Arns.
Nas pessoas do Cardeal Odilo Pedro Scherer e também da Pastora Anita Sue Wright, saúdo os religiosos e religiosas das diversas confissões religiosas que aqui estão.
Saúdo os demais que fazem parte desta sessão e quem nos acompanha pelos diversos meios de comunicação, por meio dos quais esta sessão está sendo transmitida.
Em nome da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, eu agradeço o convite para participar de uma sessão tão significativa a celebrar o centenário do nascimento de D. Paulo Evaristo Arns. Agradeço ao Senado Federal a iniciativa desta justa homenagem.
A minha presença nesta sessão especial hoje como Secretário-Geral da CNBB é uma presença institucional. Isso significa que eu tenho a missão de, em nome de todos os irmãos bispos, dos quais alguns conviveram muito de perto com o Cardeal Arns, agradecer a Deus, que presenteou o mundo e a Igreja com a pessoa e com a vida, como nós chamamos, de D. Paulo. Um pouco dessa vida já nos foi aqui recordada pelo Senador Izalci, pelo Senador Flávio Arns e também pelo vídeo que nos foi apresentado.
Sendo, portanto, institucional a minha fala, eu me permito tomar as palavras do então Secretário-Geral da CNBB D. Leonardo Steiner, meu predecessor, por ocasião do falecimento de D. Paulo Evaristo, no dia 14 de dezembro de 2016. Naquele dia, assim, em nome de todos nós, D. Leonardo se expressava:
[...]
Em seu ministério episcopal, especialmente durante os penosos anos do regime de exceção vividos pelo Brasil, ele foi sempre um pastor símbolo da fidelidade à Palavra de Cristo e aos Ensinamentos a Igreja. Dom Arns [continua D. Leonardo] tornou-se um verdadeiro ícone da defesa dos desamparados e perseguidos. [...] Sua palavra sempre trouxe especial alento ao coração dos cristãos e deu significativa contribuição na luta contra a tortura e o restabelecimento da democracia.
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Essa foi a fala, esse foi o texto de D. Leonardo no dia do falecimento, e, de fato, minhas irmãs, meus irmãos, D. Paulo foi um homem de fé. O fundamento da sua vida, a razão da sua missão, como já lembrado aqui, era Jesus Cristo, o Deus feito homem, homem simples e solícito de Nazaré ao qual D. Paulo Evaristo, no caminho de São Francisco de Assis, se empenhou por configurar a cada dia.
E nessa conferência, num tempo desafiador como foi o do regime de exceção, D. Paulo primou sempre pela unidade e pela colegialidade, tratando todas as pessoas com respeito, particularmente quem pensava diferente dele. As diversas celebrações em homenagem ao seu centenário servem para refletirmos sobre o exemplo de alguém que soube viver na adversidade, mantendo, porém, a unidade e o respeito.
Durante os penosos anos do regime de exceção vividos no Brasil, D. Paulo demonstrou com sua própria vida, como já destacado aqui pelos que falaram antes de mim, que a virtude da fé é inseparável da esperança e se concretiza na caridade, na solidariedade. Com fé em Deus e esperança num Brasil que viraria a sua página, D. Paulo exerceu a caridade e se tornou, assim, ícone da defesa dos desamparados e perseguidos.
As memórias relatadas em diversas fontes dentro e fora do nosso País nos autorizam a dizer que muitos engajados na luta contra a tortura e o restabelecimento da democracia devem suas vidas a esse incansável defensor dos mais fragilizados.
Senhores e senhoras, eu finalizo esta minha breve fala recordando o lema episcopal de D. Paulo já tão mencionado aqui: de esperança e esperança. D. Paulo nos ensinou a beleza e a firmeza da esperança traduzida em solidariedade, deixando-nos a lição de que somente assim efetivamente superaremos o que nas mais diversas situações da vida nos parece insuperável.
Para além das nossas diferenças, nós somos seres de esperança, e a esperança é chamada a se concretizar em atitudes de solidariedade. O testemunho de D. Paulo Evaristo se torna para nós um legado que devemos acolher e levar adiante. E Deus nos dê forças, contínuas forças, para em nossos dias trabalharmos pelos mesmos ideais de vida, de paz, de justiça social, de democracia e de direitos humanos que marcaram a vida de D. Paulo Evaristo.
Ao Senador Izalci e aos demais, obrigado pela atenção.
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O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Obrigado, D. Joel.
Passo imediatamente a palavra ao eminente Sr. Cardeal D. Odilo Pedro Sherer, Arcebispo Metropolitano de São Paulo.
O SR. ODILO PEDRO SCHERER (Para discursar.) - Bom dia a todos e a todas! Saúdo de maneira especial o Senador Izalci, Líder que está presidindo esta sessão; também o requerente da sessão, Senador Flávio Arns, sobrinho do Cardeal Paulo Evaristo Arns; assim como os demais ilustres Senadores, entre os quais vejo também, com ilustre mérito, o grande amigo de D. Paulo, Senador Pedro Simon, a quem saúdo carinhosamente. Saúdo também, na pessoa de D. Joel, Secretário-Geral da CNBB, as demais autoridades religiosas presentes; também a Sra. Anita Sue Wright, filha do Pastor Wright, muito próximo, muito amigo do Cardeal Arns; e também a todos os que acompanham, que assistem a esta sessão.
A essas alturas, a gente arrisca repetir o que já foi dito - e tantas coisas bonitas já foram ditas, e eu assino embaixo. Eu gostaria de destacar alguns aspectos daquilo que motivou o Cardeal Arns e o situou no seu momento histórico, porque todos nós estamos situados num tempo, num momento e numa situação e ali exercemos a nossa parte, vivemos a nossa vida. O Cardeal Arns, de maneira particular, desempenhou sua missão dentro de um contexto histórico da sociedade, do mundo e também da Igreja. Desejo lembrar, como já foi dito também, que ele foi um homem de esperança e seu serviço à Igreja e à comunidade humana teve sempre a marca da esperança. Seu lema, "de esperança em esperança", é inspirado na palavra de Deus e serviu de orientação para a vida e ação episcopal do Cardeal. E aí eu quero recordar o contexto no qual ele foi chamado a ser Bispo e também a exercer o seu ministério em São Paulo como Arcebispo e Cardeal e as circunstâncias da Igreja e também da vida do Brasil.
Ele foi chamado a ser Bispo em maio de 1966, menos de um ano após o encerramento do Concílio Vaticano II, celebrado entre 1962 e 1965. O concílio havia despertado grandes esperanças e trazido a promessa de uma nova primavera para a Igreja, que necessitava muito de renovação na sua vida interna, ainda fortemente marcada por circunstâncias vividas por ela no século anterior. O Magistério da Igreja havia feito severas desaprovações ao modernismo, ao nacionalismo e a ideologias totalitárias, que levaram o mundo a duas grandes guerras, e a ideologias avessas à dimensão religiosa da vida humana e da cultura. O Magistério da Igreja também havia condenado com firmeza as ideologias materialistas, não apenas pelo cerceamento à liberdade religiosa, mas também por causa da violação sistemática de outros direitos humanos fundamentais. Superados, portanto, os dramas da Segunda Guerra Mundial, a humanidade queria paz, e os povos do terceiro mundo aspiravam à independência e a condições de vida dignas.
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Com esforço internacional para tecer novas relações entre os povos, também a Igreja passou a rever suas relações com o mundo. O Papa João XXIII, ao convocar o Concílio, queria deixar entrar ares frescos, ares novos na Igreja, fazendo-a passar de uma posição fechada e defensiva para uma atitude mais acolhedora e dialogante em relação à cultura, à ciência, à política e às religiões. Ela não abdicou de suas convicções, mas se dispunha a encontrar e ouvir mais, para perceber melhor as razões das outras partes. Propunha-se a somar com todos aqueles para melhor poder entender as razões das outras partes. Propunha-se a somar com todos os que buscassem sinceramente o bem da humanidade. Assim as convicções, mesmo diferentes, poderiam colaborar para o bem da humanidade.
O início da Constituição Pastoral Gaudium et Spes do Concílio sobre a Igreja no Mundo Contemporâneo expressou muito bem essa nova postura da Igreja. Aspas: "As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje [...] são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo", fecho aspas.
Foi no contexto desse tempo novo, marcado por otimismo e esperança, que D. Paulo foi consagrado Bispo Auxiliar de São Paulo com o seu lema "ex spe in spem" - "de esperança em esperança" -, inspirado na Carta aos Romanos 1:17, que, porém, fala da fé: "ex fide in fidem" - "da fé para a fé" -, e inspirado também na Carta aos Hebreus, onde o autor exorta perseverar na esperança sem esmorecer, aspas, "pois é fiel aquele que fez a promessa" (Hebreus 10:22-25).
As virtudes teologais da fé, esperança e caridade devem ser a marca distintiva do cristão. A esperança como virtude humana leva a uma atitude positiva diante da vida, desencadeando energias aptas à superação de dificuldades e a alcançar as metas com dedicação e paciência. A esperança cristã nos projeta ainda para mais além daquilo que humanamente seriamos capazes de alcançar e sua base é, de fato, a fidelidade de Deus, que se faz fiador da nossa esperança (Hebreus 6:13).
Objeto maior da esperança cristã são as promessas divinas da misericórdia, do perdão, da vida, da felicidade eterna. Esses bens, no entanto, não estão desvinculados das justas esperanças para esta vida. Pelo contrário, tornam-se fonte de dinamismo e de paciente busca dos bens que expressam a dignidade, o valor e a beleza da vida neste mundo.
Com o passar dos anos, o lema de D. Paulo mostrou-se cada vez mais inspirador e confortador para ele e, naturalmente, também para a sociedade. Em 1970, com apenas quatro anos de episcopado, ele foi nomeado Arcebispo de São Paulo pelo Papa Paulo VI, que lhe confiou o pastoreio de toda a metrópole paulistana.
Na mesma época, São Paulo e o Brasil viveram anos difíceis, durante os quais D. Paulo, com destemor e paciência, indicou caminhos de esperança e superação, como já foi bem lembrado.
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Diante das situações aviltantes da dignidade humana, ele empenhou-se na realização de pequenas e grandes esperanças das comunidades da periferia urbana e do povo empobrecido. D. Paulo também se empenhou e encorajou muitos outros a se empenharem na normalização da vida democrática no Brasil.
As esperanças de D. Paulo para o povo e para a Igreja continuam a ser também as nossas esperanças. Ele queria uma Igreja para o povo de Deus onde todos tivessem o seu lugar, participassem da missão do testemunho de Jesus Cristo, do Evangelho, lutando por justiça e pela dignidade de todos. Ele queria uma sociedade livre, respeitosa, justa, livre de violências, livre de perseguições políticas, respeitosa da diversidade de opiniões e de posições políticas. Queria D. Paulo a superação das grandes desigualdades e injustiças sociais e econômicas do Brasil e do mundo. Ele sonhava com as cidades sem ninguém abandonado nas periferias e pelas ruas e praças. Esperava que todos pudessem ter trabalho digno, moradia, educação e saúde. Esperava que o convívio urbano fosse sem violência e todos pudessem viver em paz e harmonia nessa casa comum.
Pois bem, nos perguntamos hoje se as esperanças de D. Paulo já foram realizadas ou continuam ainda em aberto. Lembrar o centenário de D. Paulo é para todos nós, certamente, momento também de lembrar que as suas esperanças são as nossas esperanças e que a sua luta é também a nossa luta e a luta de toda a sociedade brasileira. Portanto, que recordar D. Paulo se torne para nós motivo de um novo empenho, um novo compromisso para construir um Brasil melhor e, para nós, como ele foi um homem de Igreja, motivo para edificar a Igreja voltada para a pessoa humana, para o bem comum e para os valores do Evangelho, que fazem muito bem à sociedade.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Obrigado, Cardeal D. Odilo.
Eu concedo a palavra imediatamente ao Rev. Pe. Júlio Lancellotti, que é pároco da Paróquia São Miguel Arcanjo, na cidade de São Paulo.
O SR. JÚLIO LANCELLOTTI (Para discursar.) - Neste momento desta homenagem a D. Paulo, saudando os Srs. Senadores e o Presidente desta sessão, saúdo também, com muito afeto, o Senador Flávio Arns, sobrinho de D. Paulo.
Para nós, D. Paulo é uma força viva, é uma força de esperança que continua nos alimentando na luta na defesa dos direitos humanos, na luta na defesa dos mais pobres, dos mais fracos, dos abandonados, dos esquecidos.
Eu tenho muito diante dos meus olhos D. Paulo criando a Pastoral do Menor junto com D. Luciano Mendes de Almeida, pedindo que a Igreja se fizesse presente na vida dos mais abandonados. Assim também, a criação da Pastoral de Rua, o Vicariato Episcopal do Povo da Rua, que D. Paulo criou no dia de Natal - na missa do dia de Natal, às 6 da tarde, ele criou o Vicariato Episcopal para a população em situação de rua -, e a Pastoral Carcerária, com a presença da Igreja, a evangelização junto dos prisioneiros, das prisioneiras, dos presos políticos, na defesa dos direitos humanos, na luta contra a tortura.
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D. Paulo lutou muito pela saúde, junto com a Dra. Zilda, na criação da Pastoral da Criança, que marcou a vida do Brasil e marcou a vida da Dra. Zilda Arns e de D. Paulo no mundo todo, com a Dra. Zilda levando a Pastoral da Criança.
Então, lembrar o centenário de D. Paulo, como já nos disse o eminente Cardeal D. Odilo Pedro Scherer, é compromisso, não é simplesmente fazer uma celebração, uma memória, mas é um compromisso de continuarmos a luta por essas esperanças, a luta pelos direitos humanos, a luta pela dignidade da vida, a luta pelos pobres, pelos esquecidos, pelos abandonados, uma luta de compromisso e transformação.
Este momento que cabe a nós viver é um momento de alimentar a esperança sem criarmos conflitos, mas enfrentando os conflitos que são postos, os conflitos que estão presentes.
D. Paulo sempre animou todos os padres e sempre pediu aos padres: "Estejam na luta, estejam comprometidos, e cada um escolha um compromisso, seja com a juventude, seja com os encarcerados, seja com as crianças e jovens abandonados, seja com a população em situação de rua. Leve uma palavra de esperança". E o que D. Paulo nos ensinou sempre foi: "Não faça por eles, faça com eles, forme comunidades com os mais pobres". D. Paulo semeou a periferia de São Paulo de comunidades eclesiais de base para que o povo pudesse dizer a sua palavra, viver a sua esperança e viver a sua fé.
Eu só queria finalizar lembrando que nós vivemos uma feliz coincidência neste ano, celebrando o centenário de dois Paulos: D. Paulo Evaristo Arns e Paulo Freire, que eram muito próximos, muito amigos. E é muito feliz a coincidência de celebrar no mesmo ano o centenário de nascimento de dois grandes brasileiros, de dois grandes homens: D. Paulo Evaristo Arns e Professor Paulo Freire.
Viva D. Paulo! D. Paulo vive para sempre!
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Obrigado, Padre Júlio.
Passo imediatamente a palavra ao Sr. Pedro Simon, que é nossa referência e sempre Senador da República pelo Rio Grande do Sul. (Pausa.)
Está fechado o fone. É só apertar o aviso aí, Senador Pedro Simon. (Pausa.)
É só abrir aí.
O SR. PEDRO SIMON (Para discursar.) - Meu querido Presidente; Sr. Odilo Pedro Scherer; meu irmão querido Senador Flávio Arns, é com muita emoção que, ainda que longe, volto ao Senado, numa hora como esta, nesta homenagem tão justa e tão significativa pelos cem anos desse grande brasileiro e desse grande cidadão do mundo, Dom Evaristo Arns.
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Sinceramente, na minha longa vida política, nos meus 90 anos, que tenho hoje, a figura de Dom Evaristo foi uma figura que sempre me emocionou. Sempre olhei com carinho e com admiração sua capacidade, sua garra, sua competência, a luta destemida que ele fez em um dos momentos mais difíceis no nosso Brasil, em que ele, não tenho nenhuma dúvida, com grande liderança, representou os humildes, os sofredores, os abandonados, na luta pela resistência.
Com toda a sinceridade, a figura de Dom Evaristo Arns, a sua maneira de ser, o carinho com que ele falava, a meiguice das suas exposições, a humildade com que ele avançava fazem com que o Brasil reconheça que Dom Evaristo foi a pessoa de mais garra, de mais competência, de maior luta nos anos da tortura e da dor. Não tenho nenhuma dúvida de que nós temos de destacar que, entre grandes líderes, entre grandes políticos, entre grandes brasileiros da mais variadas atividades e profissionais, Dom Evaristo ficou como símbolo, sim, de esperança, dia após dia cuidando dos mais humildes, dos mais desamparados, dos mais necessitados.
Dom Evaristo teve a palavra firme, teve a liderança, indo às cadeias, procurando os torturados, dizendo, com garra e com firmeza, para nos unirmos na expectativa do Brasil de hoje. Dom Evaristo... Olhem, meus irmãos, eu, nos 32 anos que passei no Senado... Sua figura e a figura de Dona Zilda representam, não tenho nenhuma dúvida, aquilo por que o Brasil mais lutou, aquilo que o Brasil mais desempenhou, mais desenvolveu na busca do seu futuro.
Dom Evaristo sofreu decepções, sofreu porque, a cada dia, ele buscava uma fonte nova de luta e de trabalho. Ele foi o homem... Todos nós, de uma forma ou de outra, não aceitávamos aquela imposição de uma ditadura brutal, mas queríamos e tínhamos confiança no Brasil do futuro, no Brasil da fé, do cristianismo, da democracia. Dom Evaristo foi um grande nome, um grande homem!
Olhe, meu querido Presidente, o meu bravo companheiro Flávio Arns! Debatendo no Senado, desiludido, ele foi para casa, mas Deus foi buscá-lo novamente para voltar para o Senado e ser essa voz que todos nós respeitamos.
Meu querido Dom Odilo Scherer, nós estamos vivendo uma das horas mais difíceis e dramáticas da vida brasileira. Não temos tortura, temos uma democracia, temos a liberdade, mas estamos em uma confusão!
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Seria bom e necessário que alguém com a voz de D. Evaristo falasse a todos nós, a todos nós que radicalizamos, a todos nós que pensamos ser o dono da verdade, mas que não apresentamos uma palavra, uma orientação nessa hora que nós estamos vivendo. Seria necessário realmente que nós tivéssemos a humildade de nos darmos as mãos, aqueles que querem realmente mudar, que querem melhorar, que querem salvar o nosso Brasil neste momento. Em vez de radicalizar, em vez de ir à rua a favor de A ou a favor de B, buscar (Falha no áudio.) ... um grande entendimento, uma grande fórmula através da qual podemos vencer... Há necessidade de que todos nós olhemos (Falha no áudio.)
Tivemos horas de choro, horas de sofrimento, horas em que parecia impossível frear. Nessas horas de tanto terror, o que devemos fazer? Essa é a hora em que eu não digo que um, mas que alguns devem fazer aquilo que tenho certeza de que D. Evaristo Arns faria.
Meus cumprimentos, meus irmãos, meu carinho e minha admiração a esta sessão. Vejo que D. Evaristo Arns, nestes seus cem anos que festejamos aqui, deverá ser e será para nós uma orientação, um caminho, um guia, uma voz que nos dê coragem de avançar! Vamos adiante na nossa igreja, no nosso Senado, no nosso Brasil!
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Obrigado, Senador Pedro Simon.
Passo a palavra imediatamente ao Sr. Nelson Arns, que é o Coordenador Nacional Adjunto e Coordenador Internacional da Pastoral da Criança.
O SR. NELSON ARNS NEUMANN (Para discursar.) - É uma grande alegria estar aqui.
Eu estou na Diocese de Registro, junto com os nossos líderes da Pastoral da Criança, cuja ideia D. Paulo trouxe quando James Grant provocou: "Nós temos tecnologia e podemos salvar milhares de vidas, mas não alcançamos os mais pobres e sabemos que a Igreja Católica do Brasil alcança os pobres. Então, precisamos chegar até eles". D. Paulo, então, chamou minha mãe, a Dra. Zilda, e criou-se a Pastoral da Criança.
Além disso, o que me chamou muita atenção foi que, uma vez, a mãe - foi citada a questão da oposição, do jeito dele - se queixou de que alguém tinha feito um abaixo-assinado contra a pastoral. Ela estava muita chateada. Daí ele olhou bem nos seus olhos e falou: "Zilda, se você não tiver oposição, crie. Ninguém é capaz de fazer um bom governo sem ter a oposição, sem respeitar a oposição. Você pode rezar para ser uma oposição honesta, mas precisamos desses alertas para nos mantermos no nosso caminho".
Finalmente, nas férias, quando a gente caminhava, a mãe reclamava, às vezes: "A igreja deve...". Ele parava e dizia assim: "Zilda, quem é a igreja? Igreja somos todos nós".
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Eu acompanhei, eu estava na casa de D. Paulo, quando o ator Carlos Zara foi pedir intercessão, porque o seu irmão estava nas garras do governo militar. Como criança, fui, com D. Paulo, a um congresso da UNE, clandestino, com a ditadura matando, perseguindo desaparecidos. A gente viu toda essa luta. Então, ele nunca abandonou a sua convicção, nunca deixou de respeitar a oposição, mas chamou a cada um de nós. E nós devemos fazer essa diferença nessa hora.
Consigamos assim, como o Flávio lembrou... A despedida dele era sempre: "Coragem! Vamos em frente!".
Vamos nós também mudar o Brasil que nós tanto precisamos, que tanto amamos, em que os pobres precisam ter a sua bênção e o seu lugar.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Obrigado, Sr. Nelson Arns.
Passo a palavra agora à Sra. Anita Sue Wright, que é Vice-Presidente do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic).
A SRA. ANITA SUE WRIGHT (Para discursar.) - Nós, Conselho Nacional de Igrejas Cristãs, agradecemos o convite para fazer parte desta sessão solene em comemoração ao centenário do nascimento de D. Paulo Evaristo Arns.
Além de ser Vice-Presidente do Conic, também sou a filha caçula do Reverendo Jaime Wright. Então, trarei essa perspectiva também na minha fala.
Brasil, década de 70: ditadura militar, com porões sombrios, cheios de pessoas sendo torturadas por sonharem com um Brasil (Falha no áudio.) ... princípios democráticos, mais justo, com eleições presidenciais, com a revogação dos atos institucionais e da censura.
Brasil, década de 70: Reverendo Jaime Wright, pastor presbiteriano, perde seu irmão, Paulo Stuart Wright, para os porões da ditadura, onde foi preso, torturado e morto.
Brasil, década de 70: D. Paulo era uma voz que clamava no deserto, que não se calava nem se curvava à repressão, se colocando ao lado dos oprimidos e reprimidos. E foi a defesa da vida e dos direitos humanos que uniu o Reverendo Jaime Wright e D. Paulo. A amizade cresceu e se transformou em parceria de trabalho, e o pastor presbiteriano ganhou uma sala de trabalho ao lado de D. Paulo na Arquidiocese de São Paulo.
O Reverendo Jaime e D. Paulo eram como colunas que guiavam o povo hebreu no deserto: uma coluna de nuvem de dia, para proteger do sol causticante e da aridez da repressão; e uma coluna de fogo à noite, para iluminar e aquecer as noites frias e sombrias das torturas nos porões da ditadura.
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O pastor presbiteriano e o cardeal trabalhavam lado a lado, numa vivência ecumênica que exercitava a chamada Teologia das Brechas, aproveitando momentos oportunos para fazerem a diferença na vida das pessoas e da sociedade. E foi nesse espírito ecumênico que Reverendo Jaime e D. Paulo se uniram ao Rabino Henry Sobel para a celebração ecumênica em memória do jornalista Vladimir Herzog, em 1975. A Catedral e a Praça da Sé estavam lotadas; o povo, cercado por policiais fortemente armados.
A concepção do projeto Brasil: Nunca Mais aconteceu em reunião informal, com militantes de direitos humanos. Havia a preocupação de que houvesse um incêndio criminoso para queimar a documentação produzida nos anos chumbo da ditadura militar. Uma pequena equipe foi montada, estratégias foram pensadas e conseguiu essa equipe fotocopiar todos os processos contra presos políticos que tramitavam no Superior Tribunal Militar, em Brasília. Os dados coletados foram sistematizados e o seu resumo se transformou no livro Brasil: Nunca Mais, que foi o livro mais vendido por semanas seguidas.
Em 2011, o acervo de microfilmagens do Brasil: Nunca Mais retornou de Genebra ao Brasil, o que contou com a participação do Secretário-Geral do Conselho Mundial de Igrejas, uma das entidades que financiou o projeto. Em seu discurso, o Reverendo Olav disse: "É importante ver o que acontece quando trabalhamos juntos. Os momentos que experimentamos hoje mostraram claramente o papel que o movimento ecumênico desempenha nesse tema, oferecendo apoio e também uma estrutura para que os projetos se tornem realidade. Brasil: Nunca Mais, para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça".
Ao celebrarmos o centenário do nascimento de D. Paulo, nós agradecemos a Deus por sua dedicação e serviço ao próximo, erguendo sua voz quando os direitos humanos estavam ameaçados. Agradecemos o seu espírito solidário e ecumênico, que nos ensinou a viver, como ele gostava de afirmar, de esperança em esperança. E é por isso que estamos aqui para, como dizia o Profeta Amós, trazer à memória o que nos dá esperança.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Obrigado, Sra. Anita.
Passo imediatamente a palavra ao Sr. Reverendo Frei Fidêncio, que é o Ministro Provincial da Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil.
O SR. FIDÊNCIO VANBOEMMEL (Para discursar.) - Bom dia a todos, minha fraterna saudação de paz e bem a todos os irmãos e irmãs presentes nesta sessão solene para louvar e agradecer o dom da vida de D. Paulo Evaristo Arns.
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Eu começaria dizendo que D. Paulo foi um privilegiado porque nasceu no dia em que a Igreja celebra a Exaltação da Santa Cruz. A mesma cruz que pode representar um instrumento de suplício, de dor, de morte e de sofrimento se torna, para todos nós, sinal de esperança, sinal de vida, sinal de ressurreição.
Eu quero crer que D. Paulo, desde o seu nascimento até a sua morte, abraçou a cruz e Jesus, como fiel discípulo do Evangelho. "Quem quiser vir após mim renuncie a si mesmo, tome a minha cruz, abrace a minha cruz e me siga". E eu creio que D. Paulo - seja como frade menor, seja como membro de sua família, que ele tanto amava, seja como bispo pastor dessa grande arquidiocese, referência para toda a Igreja do Brasil -, mais do que nunca, abraçou esta cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo.
D. Paulo, para nós, frades menores da Província Franciscana da Imaculada Conceição, como para toda a Ordem Franciscana, foi um referencial muito importante, significativo do apreço e do cuidado para com os pobres de Deus, as pessoas mais fragilizadas.
No seu pequeno livro Um Padre em Sete Morros Abençoados, D. Paulo mesmo narra um pouco da sua trajetória, sobretudo como formador de frades menores. Nesse livro, ele relata uma tragédia que aconteceu na cidade de Petrópolis. No mesmo ano em que ele foi nomeado bispo auxiliar de São Paulo - em 1966, no primeiro semestre -, houve ali uma grande tragédia. O que D. Paulo fez? Ele pediu que os frades tirassem os seus hábitos religiosos, vestissem calças, botas e fossem socorrer as pessoas feridas, as pessoas machucadas e ajudar a recolher os mortos. Foi um trabalho incansável durante o dia. Depois, ele mesmo fala: "À noite, recolheram os mortos no salão da Igreja da Ordem Terceira Franciscana em Petrópolis. Fizemos escala, e os frades, após o banho, trajando seus hábitos religiosos, passaram a noite ao lado dos mortos no salão da Ordem Terceira; rezaram e cantaram a noite inteira para evitar a confusão do choro e a reclamação contra Deus, que não havia evitado uma quase impossível calamidade".
Então, essa expressão é, de fato, a expressão de um homem educador, formador de religiosos, formador de sacerdotes: ele, professor e mestre, levando seus confrades para uma realidade sofrida, abraçando esta cruz para ser, naquele momento, sinal de esperança.
E D. Paulo gostava de cantar o cântico atribuído a São Francisco, que nós sabemos que não é de São Francisco: "Senhor, fazei de mim um instrumento de vossa paz". Todos sabemos que esse hino, esse poema nasceu dentro do contexto da Primeira Guerra Mundial, quando alguém escreveu esse poema, intercedendo a São Francisco pelo fim da desastrosa guerra: "Senhor, fazei de mim um instrumento de vossa paz. Onde houver ódio, que eu leve o amor". Quem de nós não se lembra de uma das últimas apresentações de D. Paulo na Catedral da Sé, quando ele, após receber um quadro de São Francisco, tomou o microfone na mão e cantou este canto: "Senhor, fazei de mim um instrumento de vossa paz"? Eu acho que essa paz é, na verdade, essa paz que passa às vezes por realidades e cruzes, sobretudo as cruzes da vida do povo de Deus.
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Então, D. Paulo, mais do que nunca, para nós, frades, foi de fato esse formador, esse educador, estimulador para que nós, frades menores, junto com a Igreja de Deus, junto com o povo sofrido, pudéssemos ser hoje mais do que nunca instrumentos da paz e do bem.
Louvamos a Deus, agradecemos a Deus por essa figura extraordinária. Agradecemos à família, representada na pessoa do Senador Flávio Arns e do Nelson. Agradecemos a esse irmão necessário que Deus nos deu, mas um irmão também dado para a Igreja, um irmão dado para o nosso povo brasileiro. Que D. Paulo interceda por nosso País nesse momento tão delicado, tão difícil que nós atravessamos.
A todos, muito obrigado, especialmente por esta sessão maravilhosa. Deus lhes pague. Deus abençoe o nosso País.
Amém!
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Obrigado, Frei Fidêncio.
Passo a palavra agora ao nosso Senador Humberto Costa.
O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Para discursar.) - Sr. Presidente Izalci Lucas; Sr. Senador Flávio Arns, inspirador da realização desta sessão tão importante; eminente Cardeal D. Odilo Scherer; eminente Bispo D. Joel Portella, Secretário-Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil; Sra. Anita Wright; Padre Júlio Lancellotti; Frei Fidêncio; Sr. Presidente; Sras. Senadoras e Srs. Senadores; convidadas e convidados, estamos aqui reunidos nesta sessão especial para celebrar o centenário de D. Paulo Evaristo Arns, um dos símbolos da resistência e da esperança em nosso País.
Reconhecido mundialmente por sua atuação para garantir os direitos civis e humanos, D. Paulo Evaristo Arns destacou-se por seus trabalhos voltados aos mais pobres, aos trabalhadores, à formação das comunidades eclesiais de base e, sobretudo, à defesa e promoção dos direitos da pessoa humana.
Ordenado Sacerdote na década de 40, D. Evaristo Arns tornou-se Arcebispo de São Paulo na década de 70, marcada por um momento crítico para a história social e política brasileira. A ditadura militar jamais enfraqueceu, jamais dobrou D. Paulo Evaristo Arns; pelo contrário, esse período nefasto nos mostrou quão forte era esse homem.
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A atuação desse importante ator da história brasileira ganhou destaque quando religiosos eram perseguidos e presos, porque se opunham às crueldades e aos desmandos de militares que foram alçados ao poder após o golpe de 1964 ou simplesmente porque ajudavam os militantes e as militantes que lutavam bravamente pela democracia no Brasil. D. Paulo, que nunca teve medo de encarar aqueles que comandavam o País no desastroso período da ditadura, liderou o "Testemunho de paz", documento que trazia duras críticas à ditadura militar. Em 1973, dando mais um passo em busca das garantias civis e humanas, D. Evaristo presidiu a Celebração da Esperança, missa em memória do estudante universitário Alexandre Vannucchi Leme, morto pelos ditadores.
Sras. Senadoras, Srs. Senadores, quero aqui, neste momento, lembrar um outro ator muito importante para a nossa história: Vladimir Herzog. O mês de outubro próximo marcará 46 anos do assassinato deste jornalista, que é mais um símbolo da luta pela democracia no Brasil. Chamo a atenção para o nome de Herzog porque D. Evaristo deixou viva a memória e a honra deste herói ao celebrar, em 1975, na Catedral da Sé, um culto ecumênico para homenagear este grande brasileiro.
Outro grande símbolo que D. Evaristo Arns nos deixou foi o projeto Brasil: nunca mais. Coordenado também pelo Pastor Jaime Wright, este trabalho realizado, de forma sigilosa, resulta da cópia de mais de 1 milhão de páginas de processos da Justiça Militar. O Brasil: nunca mais é ainda hoje um dos principais registros das sangrentas violações de direitos humanos cometidas por militares durante a verdadeira ditadura que se instalou no nosso País, durante os anos de chumbo. O Brasil: nunca mais além de evitar que os processos judiciais por crimes políticos fossem destruídos com o fim da era militar, assim como ocorreu em outros períodos da história, é uma rica fonte de informações sobre os crimes legitimados pelo Governo sangrento e possui grande importância acadêmica notadamente na educação em direitos humanos. D. Paulo foi ainda um dos criadores da Comissão Justiça e Paz de São Paulo e incentivou a criação da Pastoral da Moradia e da Pastoral Operária.
O compromisso de D. Paulo com a população mais vulnerável não se restringia à tirania que tinha se instalado no Brasil, nos anos mais duros da nossa história. Em São Paulo, promoveu a venda do Palácio Episcopal com o objetivo de arrecadar dinheiro para a construção de centros comunitários nas periferias da capital paulista. E, ao lado de sua irmã, a médica Zilda Arns - outra grande liderança social nas áreas da saúde e dos direitos humanos -, criou as Pastorais da Criança, da Pessoa Idosa e de DST/Aids.
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Símbolo da resistência e da esperança, D. Paulo é, sem sombra de dúvidas, uma das maiores lideranças da Igreja Católica no Brasil. Foi o homem que enfrentou os militares e ouviu as vozes das periferias. D. Arns demonstrou, até o seu último dia de vida, sua fidelidade àquilo que acreditava ser um dos principais ideais da vida sacerdotal: fé e vida em comunhão com a comunidade. D. Paulo sempre militou ao lado daqueles que escolheram apostar na esperança, ao lado daqueles que escolheram dar voz aos que sempre foram silenciados pelo Estado, pelos tiranos que nunca tiveram um verdadeiro projeto de país. D. Paulo sempre gritou pelos excluídos.
Esta sessão, Senador Flávio Arns, é importante para que também possamos lembrar as lições de D. Paulo Evaristo Arns para não cometermos hoje os erros que outrora cometemos, para lembrarmos o quanto foi difícil chegar até aqui e pelo que temos de lutar diariamente, seja aqui no Parlamento, seja nas ruas. D. Arns segue vivo e cada vez mais presente na nossa história. Falar de D. Paulo é falar sobre o Brasil do passado e o Brasil atual, já que as atrocidades e o desrespeito aos direitos humanos que outrora sangraram nosso País estão novamente sendo escancarados diante de nossos olhos; mas nós estamos cada vez mais fortes e essa força vem de todos os ensinamentos deixados por D. Paulo Evaristo Arns.
Como Presidente da Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal quero deixar registrado aqui nesta sessão, senhoras convidadas e senhores convidados, que é com o espírito de D. Paulo que hoje lutamos contra a violência do Estado, contra a violência aos direitos humanos, contra os sistemáticos ataques à nossa democracia, contra a perseguição aos movimentos sociais, à cultura, aos jornalistas, contra aqueles que insistem em cercear o direito à liberdade de expressão e à liberdade de gênero.
Sras. Senadoras, Srs. Senadores, gostaria de finalizar aqui a minha fala com o trecho da apresentação do livro Brasil: Nunca Mais:
De esperança em esperança esse mesmo povo em outras épocas peregrinou por caminhos semelhantes, de aberturas políticas que acabaram durando pouco. Anos de mais tolerância frente a opiniões discordantes e maior preocupação com nossos problemas sociais deram lugar, já antes de 64, a outras etapas de intransigência, perseguições e até mesmo desprezo pelas reivindicações dos marginalizados. Isso não pode se repetir agora, mais uma vez. A esperança que renasce hoje não pode ser novamente passageira.
D. Paulo Evaristo Arns presente!
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Obrigado, Senador Humberto.
Passo imediatamente ao Senador Marcelo Castro.
O SR. MARCELO CASTRO (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - PI. Para discursar.) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores e todos que nos acompanham pela internet: bom dia!
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É com muita honra que participo desta justa e merecida homenagem a D. Paulo Evaristo Arns pelo centenário do seu nascimento, um intelectual brilhante, uma alma generosa, um homem de rara coragem.
Poucos brasileiros fizeram um trabalho tão revolucionário em defesa da dignidade humana e da visibilidade dos marginalizados. Seu trabalho humanitário é reconhecido mundialmente.
Aproveito a ocasião para saudar o ilustre Senador Flávio Arns, seu sobrinho, e também os demais signatários do Requerimento nº 1.439, de 2021, que deu origem a esta sessão especial.
Saúdo também os convidados: Cardeal D. Odilo Scherer; Bispo D. Joel Portella Amado; Padre Júlio Lancellotti; Frei Fidêncio Vanboemmel; Sr. Nelson Arns Neumann, da Pastoral da Criança; Sra. Anita Wright, do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil; e o ilustre e grande Senador da República Pedro Simon.
Falar sobre D. Paulo Evaristo Arns é falar sobre caridade, direitos humanos, justiça social, liberdade, esperança e resistência. Não quero abusar da atenção de V. Exas. revisitando toda a biografia do nosso querido Cardeal da Esperança; contudo, alguns fatos não podem deixar de ser lembrados, não somente para nós aqui no Congresso, mas principalmente para as novas gerações, para os cidadãos mais jovens que nos acompanham pelas redes sociais, pela Rádio Senado e pela TV Senado.
D. Paulo foi um grande professor e um intelectual de primeira linha. Era profundo conhecedor de Teologia, de Filosofia Cristã e de línguas clássicas, essas que foram objeto de seus estudos quando se doutorou pela Universidade de Sorbonne, uma das mais conceituadas do mundo, aos 31 anos de idade. Escreveu mais de 56 livros e foi laureado com 24 títulos honoris causa em universidades de todo o mundo.
Somente pelo seu brilhantismo acadêmico D. Paulo já seria digno dos nossos aplausos, porém certas pessoas ao que parece realmente já vêm ao mundo com alguma missão especial designada por Deus. E foi justamente quando se tornou Arcebispo Metropolitano de São Paulo, em 1970, no período mais difícil da ditadura, que o nosso homenageado abraçou a sua grande missão neste mundo: lutou incansavelmente pelas populações mais vulneráveis e buscou aproximar a Igreja da sociedade.
Durante os governos militares, enfrentou generais, sofreu ameaças de autoridades, denunciou mortes e torturas praticadas na ditadura, abriu as portas da Igreja para abrigar os perseguidos e registrou os anos de chumbo em livro para que o Brasil nunca mais esqueça e não permita a volta de regimes autoritários.
D. Paulo Evaristo Arns tem e sempre terá um papel de destaque na história brasileira. É um dos principais símbolos do combate à ditadura, defensor do restabelecimento da democracia e do voto das Diretas Já.
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Enquanto esteve à frente da arquidiocese, D. Paulo trabalhou incansavelmente para ajudar os necessitados, criando centros comunitários na periferia. Chegou mesmo a vender o Palácio Episcopal para a construção de 1,1 mil centros comunitários. Com a ajuda da também saudosa Zilda Arns, sua irmã, atuou na criação, por exemplo, das conhecidas Pastorais da Criança e da Pessoa Idosa.
Na seara política, D. Paulo se tornou voz forte e perene de oposição à ditadura militar. Ele usava corajosamente o seu carisma, a sua condição de pessoa pública e, principalmente, sua autoridade moral para conscientizar a população e denunciar os excessos do regime.
Quando o Brasil viveu os tempos sombrios da ditadura militar e da tortura, D. Paulo Evaristo Arns visitou inúmeros presos políticos e organizou a Comissão da Justiça e Paz em sua arquidiocese para dar-lhes assistência. Não bastasse isso, por diversas vezes D. Paulo chamou para si a arriscada incumbência de ir aos quarteis, em plenos anos de chumbo - de chumbo, meus ilustres pares -, para dialogar com os militares, intercedendo por muitos presos políticos.
Um homem de grande erudição - porém, humilde -, de uma generosidade ativa e empreendedora, de uma coragem mansa e desarmada; porém, sem limites. Foi D. Paulo Evaristo Arns, em um culto ecumênico na Catedral da Sé de São Paulo, lotada, com a presença da imprensa estrangeira, que denunciou a morte e tortura de Vladimir Herzog, contestando o que estava sendo divulgado pela imprensa, que ele havia se suicidado.
Sras. e Srs. Senadores, cidadãs e cidadãos que nos acompanham nesta sessão especial, na minha modesta opinião, por todas as suas realizações D. Paulo Evaristo Arns merece ser incluído no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria. Para os cristãos, fica o exemplo apostólico de um homem comum que fez da sua vida um exercício perene de fé viva e amor incondicional ao próximo, seguindo os passos de São Francisco, de quem era devoto. Para quem não é cristão, fica exemplo do verdadeiro humanista, um homem que, por meio do diálogo franco, pacífico e destemido, ajudou seus semelhantes de diversas formas, um homem que lutou contra a injustiça social e a opressão política do seu tempo e que procurou deixar o mundo melhor para gerações futuras.
Senhoras e senhores, são muitas as razões que nos levam a homenagear D. Paulo Evaristo Arns. Aqui destaco: amigo do povo, cardeal da esperança, defensor intransigente da democracia e dos direitos humanos, advogado por uma educação de base, exemplo prático de solidariedade, de fraternidade, de busca da verdade e da justiça e defensor de presos e de perseguidos pelo regime militar. D. Paulo Evaristo Arns foi também, senhoras e senhores e cidadãs que nos acompanham, um grande aliado das mulheres e do protagonismo feminino. Inspiração para todos os brasileiros e brasileiras, D. Paulo Evaristo Arns nos deixa de legado a essência da vida pública, que é trabalhar pelo bem da coletividade e colocar o ser humano em primeiro lugar sempre.
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Com todos esses feitos, ainda foi uma pessoa sem vaidade. Portanto, ao diletíssimo Cardeal da Esperança, no centenário do seu nascimento, registro aqui o nosso sincero e comovido muito obrigado. Que as novas gerações nunca se esqueçam de agradecer aos heróis do passado, aos gigantes sobre cujos ombros podemos hoje nos erguer e vislumbrar horizontes mais claros. E, lembrando seus feitos, inspirando-se em seus exemplos, que os nossos jovens possam renovar as esperanças e lutar sempre por dias cada vez melhores.
Era o que tinha a dizer.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Obrigado, Senador Marcelo Castro.
Antes de encerrar, nós assistiremos a um vídeo de homenagem.
(Procede-se à exibição de vídeo.)
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O SR. PRESIDENTE (Izalci Lucas. Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Quero agradecer ao Senador Flávio Arns pelo privilégio de presidir esta sessão; e agradecer às personalidades, aos convidados que nos honraram com suas participações.
Declaro encerrada esta bela sessão solene.
Muito obrigado.
(Levanta-se a sessão às 11 horas e 40 minutos.)