4ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA
56ª LEGISLATURA
Em 1º de junho de 2022
(quarta-feira)
Às 9 horas
61ª SESSÃO
(Sessão de Debates Temáticos)

Oradores
Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES. Fala da Presidência. Por videoconferência.) - Declaro aberta a sessão.
Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos.
A presente sessão remota de debates temáticos foi convocada, nos termos do ato da Comissão Diretora nº 8, de 2021, que regulamenta o funcionamento das sessões e reuniões remotas e semipresenciais no Senado Federal e a utilização do Sistema de Deliberação Remota, e em atendimento ao Requerimento 317, de 2022, de minha autoria e de outros Senadores, aprovado pelo Plenário do Senado Federal.
Esta Presidência informa que os cidadãos podem participar desta sessão de debates temáticos através do endereço www.senado.leg.br/ecidadania. É esse serviço que propicia que as pessoas entrem aqui na audiência conosco ou também podem participar pelo telefone 0800 0612211.
A Presidência se informa ainda que as apresentações e os arquivos exibidos durante esta sessão ficarão disponibilizados na página do Senado Federal referente à tramitação do requerimento que originou esta sessão.
A sessão é destinada a receber os seguintes convidados a fim de debater os impactos da violência no trânsito e as possíveis soluções para um trânsito seguro. Convidados: Sr. José Aurelio Ramalho, Diretor-Presidente do Observatório Nacional de Segurança Viária; Sra. Sheila Sibaldo Zambone, Gerente de Educação de Trânsito e Estatística do Detran - ES; Sr. Luís Carlos Paulino, Coordenador Socioeducativo da Associação Brasileira de Educação de Trânsito (Abetran); Sr. Alysson Coimbra, representante da Comissão de Assuntos Políticos da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet); Sra. Juliana de Barros Guimarães, especialista em psicologia do trânsito e Diretora Científica da Associação Brasileira de Psicologia de Tráfego (Abrapsit); Marcos Paulo Silva Duarte, Presidente da Federação Espírito Santense de Ciclismo (Fesc) e a Sra. Elvina de Carvalho Littig, representante das famílias do grupo folclórico alemão Bergfreunde.
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A Presidência informa ao Plenário que serão adotados os seguintes procedimentos para o andamento da sessão: será inicialmente dada a palavra aos convidados, por até 10 minutos; após, será aberta a fase de interpelação pelos Senadores inscritos, organizados em blocos, dispondo cada Senador de 5 minutos para suas perguntas; os convidados disporão de 3 minutos para responder à totalidade das questões do bloco; os Senadores terão 2 minutos para a réplica; as inscrições dos Senadores presentes remotamente serão feitas através do sistema remoto.
As mãos serão abaixadas no sistema remoto e, neste momento, estão abertas as inscrições.
Caras e caros convidados, caras colegas Senadoras, caros colegas Senadores, bom dia a todos e todas. Em 15 de abril deste ano, data em que foi atropelada, a estudante universitária Luísa Lopes tinha apenas 24 anos e a vida inteira pela frente. Ciclista, Luísa pedalava pela Av. Dante Michelini, uma das mais importantes de Vitória, no Espírito Santo, quando teve a vida subitamente e estupidamente ceifada ao ser abalroada por um veículo automotor.
Segundo relatos, a motorista e a acompanhante que seguia no carona do veículo apresentavam sinais de embriaguez. Demonstravam dificuldade para comunicar-se e balbuciavam palavras sem sentido. A motorista de 33 anos de idade recusou-se a passar pelo teste do etilômetro, mas foi autuada, mesmo assim, por dirigir sob influência do álcool.
Luísa Lopes, que Deus a tenha, agora integra a absurda, inaceitável e certamente subdimensionada lista de crimes com vítimas fatais ou não, envolvendo ciclistas - lista que, apenas neste ano, no meu Estado do Espírito Santo, já soma mais de 160 registros.
Entre 2010 e 2019, conforme dados da Associação Brasileira de Medicina do Tráfego, a quantidade de acidentes envolvendo ciclistas, no Brasil, aumentou quase 60%. Cerca de 14 mil internações hospitalares decorreram desses acidentes, o que gerou ao Sistema Único de Saúde, a cada ano, gasto da ordem de R$15 milhões. Pelo menos 13 mil ciclistas perderam a vida durante os dez anos abarcados pela pesquisa, a maioria atropelados, como aconteceu com a jovem Luísa Lopes.
Senhoras e Senhores, esta sessão de debates temáticos se destina, nos termos do Requerimento nº 317, a discutir os impactos da violência no trânsito e as possíveis soluções para um trânsito seguro. “Violento” e “inseguro” são adjetivos intensos, mas que carecem de força necessária para descrever a barbárie, a loucura, a brutalidade vivida nas ruas, avenidas e estradas brasileiras.
Perdemos todos os dias 89 vidas em decorrência de acidentes de trânsito. Uma média de três vítimas fatais por hora. Em 2020, das 33.716 vítimas fatais de acidentes de transporte, 1.352 eram ciclistas, como a Luísa Lopes; 5.120 eram pedestres; e 11.853 eram motociclistas. Os números do Datasus são estarrecedores: mais da metade das vítimas fatais em acidentes de transportes registrados em 2020 veio de um desses três grupos. Ciclistas, pedestres e motociclistas representam as categorias mais vulneráveis da epidemia da insegurança viária em nosso país.
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O caso de Luísa Lopes levanta, também, mais uma vez, a questão da embriaguez ao volante e do consequente sentimento generalizado de impunidade dos condutores alcoolizados.
Um dos últimos levantamentos da Pesquisa Nacional de Saúde, de 2019, evidenciou que quase 20% dos motoristas brasileiros admitiam ter ingerido bebida alcoólica antes de conduzir veículo automotor.
No enfrentamento dessa questão, a Lei 14.071, de 2020, trouxe algumas inovações importantes. Quando da votação do projeto que deu origem a essa lei, tive a felicidade de ver aprovada emenda de minha autoria que determinou a impossibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos, nos casos de condenação por homicídio culposo ou lesão corporal culposa na direção de veículo automotor, quando o condutor estava sob influência de álcool ou qualquer substância de efeito psicoativo que determine dependência. Em termos mais simples e diretos: quem bebe e dirige, quem usa drogas psicoativas e dirige, se matar ou lesionar alguém, agora vai preso e vai permanecer preso.
Senhoras e senhores, meus mais de dez anos de experiência como delegado de trânsito ensinaram-me que o maior custo da violência no trânsito é de natureza psicossocial. Por trás dos números macabros e surreais da quantidade de crimes, para além de quaisquer milhões ou bilhões que se possam calcular, existe a dor da perda, existe o trauma do familiar que se vai, do amigo, da pessoa que perdeu a vida, de forma violenta e inesperada, em um crime de trânsito. E existe, também, o trauma de quem sofreu um crime de trânsito e sobreviveu.
O Departamento Estadual de Trânsito do Espírito Santo vem realizando, há mais de dez anos, serviço pioneiro de acolhimento especializado às vítimas de crimes de trânsito e aos seus familiares. Essas pessoas precisam de atendimento humanizado, precisam de ajuda para enfrentar a perda, para enfrentar o sofrimento emocional. Precisam de ajuda para lidar e para viver com possíveis - diria, até mesmo, prováveis - sequelas psicológicas. É um tipo de serviço, senhoras e senhores, que poderia muito bem ser estruturado e expandido no plano nacional. Apresentei, nesse sentido, sugestão formal ao Ministério da Saúde para que determine a criação de serviço de atendimento psicológico às vítimas de acidentes de trânsito no âmbito do Sistema Único de Saúde.
Na verdade, a humanização do atendimento às vítimas e aos familiares de vítimas de acidentes de trânsito é questão que vai além até mesmo da vasta competência do SUS. Tal tratamento deveria ser ofertado nas delegacias e nos departamentos médico-legais, bem como nos demais órgãos públicos que têm de receber e atender, com a devida atenção, com compaixão, sensibilidade e empatia, as centenas - senão milhares - de brasileiros e brasileiras que se acidentam diariamente em nossas estradas. Ao encerrar minha manifestação, reforço, mais uma vez, que a segurança no trânsito é, de todas, minha principal preocupação como Parlamentar e que os recursos, as portas de meu gabinete estarão sempre abertas e disponíveis para a discussão de quaisquer temas relacionados ao trânsito. Por ora, era o que eu tinha a dizer, mas, antes de finalizar a minha fala, eu quero simplesmente fazer um relato sobre a minha experiência na delegacia de delitos de trânsito.
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Foge à lei natural um pai sepultar um filho. O último lugar que um pai pensa em procurar um filho é na delegacia ou no DML, que cheira à morte. Infelizmente, muitos policiais ficam embrutecidos pelo tempo e não têm aquela empatia de acolher as famílias das vítimas de trânsito.
Eu presenciava lá a dor de um pai ou de uma mãe que estava liberando a vítima fatal. Passavam-se três meses, e só vinha a mãe. Eu perguntava: "Cadê seu esposo?". Ela falava: "Nós nos separamos". O Estado não dá apoio psicossocial a essas famílias. Aquela família se desmantelava. Toda a família adoece quando ocorre um crime de trânsito. Eu lembro que, lá, muitas vezes, o avô que perdia a neta entrava em depressão. Aquela é uma morte resultante de um crime de trânsito. O irmão sente a falta da irmã. Cai seu rendimento escolar, e ele começa a usar a uma droga lícita ou ilícita. Essa é outra morte decorrente do trânsito, sem falar no impacto no Sistema Único de Saúde, na previdência social, na economia. É de mais de R$50 bilhões o custo desses crimes de trânsito por ano. E são mais de R$200 milhões também, sob o aspecto econômico, sob o aspecto do SUS, que esses crimes geram ao país. E quem está pagando a conta somos todos nós.
Como delegado, registro que há três fatores que são fundamentais para se mitigar ou reduzir qualquer crime; primeiro, fiscalização; segundo, educação; e, terceiro, legislação eficiente. Infelizmente, no Brasil, o Estado falha na fiscalização. O motorista teria de sair de casa com a certeza de que ele seria parado em uma blitz, mas isso não acontece. O Estado falha na educação.
O art. 76 do Código de Trânsito diz que a educação para o trânsito será promovida nas escolas de ensino fundamental, médio e superior, e até hoje a letra da lei está lá deitada eternamente em berço esplêndido. Essa disciplina deveria ser inserida na grade curricular, seja como disciplina eletiva, seja para trabalhar a transversalidade.
Eu apresentei uma proposta para implementar, nos cursos de graduação de Direito, uma disciplina de Direito de Trânsito, porque, só no Código de Trânsito, nós temos mais de 300 artigos e quantas resoluções? É necessário que, também na educação básica, se trabalhe trânsito de forma contínua e permanente, porque só assim o motorista vai mudar o comportamento.
Então, se o poder público falha na fiscalização, se o poder público não educa e se o poder público, através do Parlamento, se nós não legislamos de forma eficiente, esses três elementos são fundamentais, infelizmente, para que nós ostentemos, em nível mundial, a terceira colocação entre os países que mais matam pessoas no sistema viário, sem falar na dor de como trabalhar a autoestima de uma moça de 19 anos que, da noite para o dia, ficou paraplégica; de um jovem que ficou com deformidade permanente; de um jovem que ficou tetraplégico; que teve uma deficiência mental com o impacto, com aquele crime de trânsito.
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Então eu defendo que dentro do DML deveria ter uma equipe humanizadora com alunos de Psicologia, alunos de Serviço Social, uma equipe de acolhimento, para acolher no momento pior, que é quando um pai procura o DML para liberar aquela sua filha ou aquele seu filho ou aquele seu pai ou aquela sua mãe. Eu defendo que dentro das delegacias de delitos de trânsito estejam permanentemente alunos do curso de Direito para dar uma orientação sobre a responsabilidade penal, civil ou administrativa decorrente daquele crime de trânsito. Eu defendo que dentro dos DETRANs deva haver três grupos de atendimento psicológico: um para trabalhar as famílias no luto, aquelas famílias que perderam alguém nos crimes de trânsito; outro para trabalhar a sequela do crime para as vítimas que sobreviveram; e um terceiro para trabalhar a conduta dos motoristas, para aqueles motoristas que estavam lá - eu presenciava mulheres, por exemplo, que, quando se envolviam em crimes de trânsito, não queriam mais dirigir.
É necessário que o poder público dê vida àquilo que está na Constituição Federal, no art. 37, onde se fala que são princípios que regem a administração pública a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência. O poder público tem de ser eficiente, ele tem que ter empatia, se colocar na dor do outro. Então eu defendo que o Detran tenha três grupos de atendimento psicossocial, que trabalhem em rede com alunos de Serviço Social e com alunos de Psicologia para fazer esse trabalho de monitoramento: a família está recebendo a pensão pela morte? A família está recebendo a pensão por invalidez? Aquele jovem recebeu uma prótese? Aquele jovem está tendo fisioterapia? Aí, sim, o Estado estaria dando efetividade àquela eficiência como uma garantia constitucional expressa no art. 37 da Constituição Federal.
Esse dia ainda não chegou, mas eu estarei aqui. Como diz o nosso Hino: "Verás que o filho teu não foge à luta.". Contem sempre comigo!
Muito obrigado. Por agora, essa é a minha manifestação.
Concedo a palavra aos convidados. Inicialmente, ao Sr. José Aurelio Ramalho, Diretor-Presidente do Observatório Nacional de Segurança Viária, por até dez minutos.
Muito obrigado, querido José Aurelio Ramalho, mais uma vez é uma grata surpresa revê-lo.
O SR. JOSÉ AURELIO RAMALHO (Para exposição de convidado. Por videoconferência.) - Bom dia a todos. Bom dia aos que nos acompanham pela internet.
É um prazer estar com todos aqui. Abraço os colegas Paulino e Juliana, que são ligados ao observatório através dos observadores certificados e o parabenizo, Senador, pela emenda - desculpe, mas o termo técnico às vezes me foge - que foi colocada na 14.071. Aos 45 minutos do segundo tempo, o senhor, de uma maneira muito inteligente, porque é um tema muito polêmico, conseguiu encaixar a questão da penalidade do álcool e direção. Então, meus parabéns. Nós precisamos agora é garantir que isso aconteça, porque a gente tem notado que ainda estão conseguindo driblar algumas situações como essa.
Senador, eu não posso deixar aqui de colocar um posicionamento do observatório. Nós somos uma organização social criada em 2010, quando surgiu a década de redução. Eu estive em Moscou, e, quando voltei de lá, eu era da iniciativa privada, decidi sair da iniciativa privada e montar esse projeto, tamanha a minha indignação ao chegar em Moscou e não ter um ministro de Estado. Chegando lá era uma reunião ministerial, tínhamos mais de 200 ministros de Estado, e o Brasil não tinha um representante. Estávamos lá, eu, o Deputado Hugo Leal, na época representando a Casa, o Legislativo, e um membro do Ministério da Saúde. Então, quando eu voltei de lá, decidi montar esse projeto, que o senhor conhece muito bem, pois a gente tem feito muito trabalho junto aí com o seu apoio.
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Somos uma organização extremamente técnica. Entendemos tudo que o senhor disse a respeito das vítimas, tanto é que nós temos um projeto chamado Recomeço, para dar assistência às vítimas de acidentes de trânsito e encaminhamento para elas ao mercado de trabalho, não é? Então, existe todo um projeto do observatório nesse sentido.
Mas a sequência para a qual eu gostaria de pedir muito a ajuda do senhor e que a gente vem debatendo nos bastidores... E o observatório vem sendo cobrado, mas como o nosso foco é fortemente a educação, os estudos, as pesquisas, nós vamos até aí, e nossos estudos, pesquisas são encaminhados aos órgãos competentes. E a gente tem notado que o principal fator daquela sequência que o senhor comentou - fiscalização, educação e penalização -, é que a sequência mais lógica seria primeiro a educação, não é? Ela já está prevista lá no artigo. O observatório, não sei se o senhor tem conhecimento, doa todo o conteúdo didático pedagógico da primeira à nona série, que se chama Programa Educa. Está disponível lá no Ministério da Infraestrutura, na Senatran. Já faz dois anos que a gente não vê um movimento de sequer um órgão público interessado em implantar isso. Antigamente, a gente escutava esse discurso de que não tinha conteúdo, não tinha: "Ah, porque não tem material, porque não tem". Agora o material está lá, aprovado pelo Contran, aprovado pela Senatran, aprovado pelo Ministério da Educação, e a gente não vê nenhum movimento nesse sentido.
Eu entendo que a educação é aquela máxima - não é, Senador? -, que, ao invés de construir presídio, vamos construir escolas. Nesse caso é a mesma coisa, ou seja, ao invés de... Para nós diminuirmos a assistência à vítima - tudo que o senhor falou para mim é muito pertinente e coerente: temos psicólogos, temos pessoas mais preparadas para atender a vítima -, nós temos que trabalhar lá na raiz, na educação, porque reduzindo isso eu reduzo a fiscalização, a penalização e consequentemente o atendimento às vítimas.
Agora eu pergunto ao Senador - e essa pergunta eu tenho feito a muitos entes públicos -: quem é que está olhando quanto está sendo investido por parte do poder público na educação para o trânsito que está previsto em lei? A arrecadação de multas, de infração de trânsito deveria ser investida em educação. Existe uma certa, vamos chamar, flexibilização por parte da Senatran, em que o recurso é utilizado para outros fins também, que também são importantes - equipamentos -, e eu não vou ficar aqui narrando todos os detalhes. Mas o item principal, para o que nasceu e para o que se origina o dinheiro da multa, não é usado. Eu pediria que o senhor pedisse um levantamento à sua assessoria de quantos por cento cada ente público utiliza, os 27 estados, quantos por cento estão usando efetivamente na educação - efetivamente na educação. Nós não estamos vendo isso.
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Então, estou alinhado com você, acho que essa sua proposta de humanizar e melhorar o atendimento deve seguir em frente, porque a dor é impressionante, é uma coisa que tem que ser tratada, e o efeito colateral, como o senhor mesmo disse, é avassalador.
Na parte técnica, para o senhor ter uma ideia, de 20% a 25% da queda de energia elétrica no país é causada por postes derrubados por ocorrências de trânsito. Isso é um dado das empresas de energia. Quando não tem energia, não tem escola, não tem pãozinho, não tem médico, não tem hospital, tudo para. O efeito da ocorrência de trânsito é avassalador. Ela tem um desdobramento, a questão do congestionamento, da mercadoria que não chega. Então, tudo isso, se a gente atacar a questão da educação, muda muito.
E outro tema, Senador, que eu gostaria de deixar apontado para o senhor: além da educação de trânsito nas escolas, há a questão da formação do nosso condutor. Nós adestramos as pessoas a tirar habilitação. O senhor sabe muito bem disso, nós fomos adestrados a decorar placa, a nos preparar para, como chamado popularmente, tirar a nossa carta. E nós temos uma... Eu queria pedir ao senhor que olhasse - esse assunto está sendo tratado hoje na Senatran - a questão da Resolução 726. Ela foi publicada, Senador, em dezembro, acho que de 2018, a Resolução 726. Dois meses depois, Senador, depois de três anos de trabalho - trabalho feito pela Abrapsit, pela Abramet, pelo Observatório, pelas associações de Detran, pelas associações dos centros de formação de condutor... Três anos, Senador, três anos de trabalho, e dois meses depois de a resolução ser publicada, ela foi revogada. São mais de 800 páginas de estudos que provam e mostram como deveria ser a formação do condutor. Por que ela foi revogada, Senador? Quem vai fazer essa pergunta? Nós temos que parar de brincar de fazer lei, de brincar de fazer as coisas. A legislação brasileira já contempla uma dezena, uma centena de situações que não são cumpridas pelo próprio poder público. Então fica muito, muito difícil essa situação.
Nós precisamos agir nesse sentido, ou seja, que as legislações básicas de disciplinamento, fiscalização, investimento na educação para reduzir o número de ocorrências de trânsito sejam enfrentadas. Nós estamos indo agora, dia 22, para Nova York. Nós vamos participar do conselho da ONU novamente. O Observatório Nacional de Segurança Viária é a única entidade que esteve presente em todos os fóruns, desde a sua origem em Moscou, em 2009, e nós vamos levar de novo temas como esse para serem discutidos e avaliados e ver como os outros países têm resolvido essa situação.
Eu agradeço ao Senador a oportunidade de estar aqui falando. Abraço aos demais colegas que virão na sequência.
Temos, sim, que fiscalizar; temos, sim, que penalizar; temos, sim, que dar assistência às vítimas, mas se a gente não preparar a educação... E a pandemia, finalizando a minha fala, Senador, foi o maior exemplo. As ações da pandemia, nós tivemos que trabalhar de forma coletiva, não adianta só eu usar a máscara, do ponto de vista individual, só eu manter o distanciamento. Foi uma ação coletiva, todos tiveram que se unir. E a mesma coisa é o trânsito. O trânsito são protocolos, iguais aos da pandemia: pare na faixa, respeite a velocidade, não beba e dirija.
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Aí é uma reflexão, Senador, até para nós, que estamos aqui, pregando, porque nós estamos aqui, parece que estamos evangelizando as pessoas, é uma pregação. Eu falo que é pregando para convertido. Nós já sabemos o que é.
Eu pergunto: quem, no último deslocamento que fez com o veículo, não usou o celular enquanto dirigia? Respeitou o limite de velocidade? Usou o cinto de segurança? Deu seta em todas as manobras?
Então, Senador, eu só peço, para finalizar a minha fala... Está mais nas mãos da população do que do próprio poder público do ponto de vista da mudança. Eu sei que mudança cultural é muito difícil, mas, a partir do momento em que toda a nossa sociedade decidir usar cinto, respeitar limite, não usar o celular, tudo isso que a gente já narrou, nós vamos quebrar a indústria da multa, porque não vão ter como multar, porque todo mundo está cumprindo a regra, e os índices de ocorrência de trânsito cairão vertiginosamente.
É diferente de uma pandemia, que eu não sei de onde vem o vírus, de onde vem o mosquito da dengue, tratando em paralelo. O nosso maior vírus de ocorrência de trânsito é o fator humano, é o ser humano. É a única situação em que gente mata gente, é a única situação em que pessoas matam pessoas, Senador, sem ser guerra. É dramático isso!
Eu encerro aqui e agradeço novamente ao Senador pela oportunidade.
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Tenha certeza de que eu já estarei me debruçando em cima da Resolução 726. Naquilo que o Parlamento, o que nós pudermos cobrar dos órgãos competentes sobre destinação da verba, conforme preceitua o art. 320 da Lei 9.503/97, que determina que toda receita arrecadada com as multas de trânsito deve ser aplicada exclusivamente em fiscalização, engenharia de tráfego, de campo, policiamento e educação para o trânsito. Nós poderemos também cobrar dos órgãos públicos qual é o percentual e para onde está sendo destinado esse recurso originário dessa fonte, que é da lavratura de auto de infração dentro do sistema viário.
Muito obrigado por sua participação.
Concedo a palavra à Sra. Sheila Sibaldo Zambone, Gerente de Educação de Trânsito e Estatística do Detran Espírito Santo.
A SRA. SHEILA SIBALDO ZAMBONE (Para exposição de convidado. Por videoconferência.) - Bom dia a todos. Quero agradecer a participação. Debater trânsito é muito importante, é uma responsabilidade de todos, e nós precisamos entender que essa discussão não pode parar por aqui, não pode ficar só aqui.
A partir do momento em que nós trabalhamos, neste ano, o tema do Maio Amarelo, "Juntos salvamos vidas", a gente entende isso como um clamor de trazer toda a sociedade para junto... Não são só os DETRANs, não é só o Senador, não é só o poder público, a sociedade - todos. Nós precisamos estar engajados nessa grande discussão, porque, como o Senador já falou anteriormente, quando Diretor do Detran Espirito Santo, temos um núcleo de atendimento, apoio psicológico a familiares de vítimas de acidentes de trânsito.
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Em uma reunião que nós estivemos presentes com ele, foi dito que, desde a época em que ele era o diretor aqui do Detran, ele já presenciava a dificuldade dessas famílias de aceitar esse atendimento. Isso não mudou, e já tem sete anos. Eu estou aqui na gerência desde 2015, e é uma dificuldade. As psicólogas fazem busca ativa, procuram. Por quê? Nem sempre eles aceitam, nem sempre eles querem falar sobre essa dor, eles querem voltar a esse assunto, porque nós sabemos que a impunidade ainda é muito grande. Então, eles se sentem não acolhidos pelo Estado muitas vezes, eles sabem que, para a pessoa que bebeu e dirigiu, que assumiu esse risco de cometer esse crime, não vai dar nada. Essas famílias se sentem muito injustiçadas. Elas procuram muito por justiça, é o que nós temos visto porque nós temos muito contato com alguns que trabalham conosco inclusive - quando eu digo que trabalham é porque nos ajudam, nos apoiam em palestras. E quando eles estão presentes, nós percebemos que o foco muda, as pessoas param para prestar atenção. Mas não adianta só prestar atenção naquele momento. A gente precisa sensibilizar. Enquanto essa dor não chegar a mim, não chegar até o meu lar, parece que isso não me afeta em nada.
Então, como afetar essas pessoas? Como trazer essas pessoas para essa discussão? Nós trabalhamos... Nós temos um projeto, que é o Detranzinho Itinerante. Nós percorremos os 78 municípios. Nossa equipe é muito pequena, mas não deixamos de atender nenhuma solicitação que recebemos, porque nós entendemos a importância disso. E temos um retorno muito bom das famílias, porque, quando estamos nesses municípios, os pais procuram as nossas meninas para dizer: "Olha, você que é do Detran? Meu filho já está me cobrando, dizendo que não podem andar três na moto; meu filho está me cobrando: que eu tenho que usar o capacete, o cinto". Então, as crianças precisam, sim, ter educação para o trânsito. Eu não tive educação para o trânsito, mas muita reprodução eu tenho hoje em dia por procurar, ler, entender a importância do uso de um capacete, do uso de um cinto de segurança.
Quando o Ramalho fala: "Quem nunca cometeu uma infração no trânsito?", eu tenho uma fala sobre isso. Em 2015, eu entrei no Detran por meio de um processo seletivo - eu preciso dizer isso, Senador, se o senhor me permitir -, um processo seletivo que o Senador abriu. Não fosse isso, eu não estaria aqui com certeza. E, aí, eu fui passando pelas etapas até a última etapa, que foi a entrevista. Quando eu disse que tenho carteira desde 1998, que eu nunca tive uma infração na minha carteira e me orgulhava muito disso, tomei um tapa do Senador quando ele disse assim: "Quem nunca cometeu uma infração? Quem nunca usou o celular enquanto dirigia? Quem nunca fez uma conversão errada? Isso prova o quanto o sistema é falho". Eu tenho essa fala até hoje, porque é verdade. Hoje eu mudei o meu comportamento, e ainda continuo sem infração. Fico muito feliz e orgulhosa disso, mas com consciência. Eu fui sensibilizada. O Detran precisou mudar a minha vida no sentido de entender que a dor do outro também é minha. Isso pode me afetar, isso pode chegar à minha família.
Então, neste momento em que nós trabalhamos o Maio Amarelo, que foi um mês incansável... A gente trabalha o mês inteiro, a gente não para, a gente trabalha sábado, domingo, feriado. Para a gente, não tem essa. A gente sabe que maio é o mês em que ninguém pode tirar férias, ninguém pode tirar folga, porque a gente foca muito nisso. A gente não para em maio, não. A gente está, de janeiro a dezembro, incansavelmente, trabalhando. E a sensação que eu também tenho junto a algumas famílias é que parece que o nosso trabalho é em vão, porque a gente trabalha, a gente faz, a gente luta, a gente está ali nas escolas, a gente está em faculdades, e parece que as pessoas não reconhecem isso. Parece que elas não veem que as coisas estão acontecendo. Então, por isso que a gente busca parceria, a gente chama pessoas para estar com a gente, outros órgãos públicos. Sozinhos nós não somos nada e nós não vamos conseguir avançar.
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Então, essa discussão aqui é importante. É importante trazer familiares para estar junto com a gente. É um convite que a gente sempre faz: levá-los às empresas para mostrar para aquele trabalhador, aquele motorista que está ali com seu caminhão muitas vezes sendo imprudente, o motociclista que às vezes nem habilitação tem, mas que precisa levar o sustento para dentro da casa dele... Ele precisa entender que tem alguém esperando por ele em casa. E quem sofre é quem está ficando. Ele às vezes comete essa infração impensável porque ele acha assim: "Não vai dar nada. Não acontece nada". É o que eu falei: a sensação da impunidade ainda é muito grande.
Então, nós precisamos debater esse tema. Nós precisamos trabalhar incansavelmente, como nós sempre fazemos, porque, quando eu falo de estatística, para alguns é estatística, mas para nós são vidas. Quando eu tenho uma mãe que perdeu uma filha, eu não vou falar que a filha dela é uma estatística; foi uma vida que foi ceifada ali. Então, a gente precisa brigar por isso, sim. Nós precisamos levar essa consciência, nós precisamos tornar esses jovens multiplicadores.
E eu queria só contar uma experiência que a gente teve agora em Maio Amarelo. Nós provocamos muito a sociedade para trabalhar com a gente, para nós levarmos as ações educativas. Fomos procurados por alguns. E, infelizmente, para uma ação que a gente havia agendado a faculdade nos ligou, no dia anterior, dizendo que queria cancelar. E eles disseram que estavam cancelando porque viram, na previsão do tempo, que ia chover e os alunos não iam participar. "Ah não vai dar quórum, então a gente vai ter que cancelar". Isso me entristeceu de uma forma... Porque eu falei: "Gente, mas é um debate tão importante. Como a faculdade leva isso para os seus alunos? Vai chover e ninguém vai participar?". Então, o tema trânsito parece ser algo ainda banal para alguns, parece: "Essa discussão não chegou até a mim".
E, numa reunião que nós tivemos até com o Senador, uma mãe falou: "Quando eu assistia na televisão às jovens que morreram em acidentes de trânsito, eu dizia 'que pena, tão bonita, tão nova, morreu'". Mas isso aconteceu dentro da casa dela, com a filha dela. Ela está vivenciando agora uma outra realidade e ela entende essa dor. Então, nem sempre a gente precisa passar pela dor para estar brigando junto com o outro, porque eu tenho família, eu tenho filho, eu tenho amigos, irmãos, e eles estão na estrada, eles estão no trânsito. E o que está acontecendo? Quem é que está vindo? São vidas inocentes que às vezes estão ali fazendo tudo que é certo, mas, infelizmente, o outro ainda assume esse risco porque a impunidade ainda é muito grande. Ele sabe que não vai dar nada. Três mil reais às vezes vale uma vida. É só isso. E a mãe e o pai que às vezes dependiam financeiramente dessa família sofrem. O psicológico dela é muito afetado. E foi o que o Dr. Fabiano falou: essas famílias se destroem. Ela não consegue mais falar sobre uma filha que ela perdeu.
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Então, para nós, vidas importam. Nós precisamos trabalhar e dizer: "Vamos ficar sensibilizados com o outro". Conscientizar o outro talvez eu não vá conseguir, mas sensibilizar sim. Eu preciso dessa sensibilização. E não é estudar, trabalhar o código de trás para frente, primeiro pela fiscalização. Eu preciso começar pela educação. A educação vem primeiro no Código de Trânsito. Então, por que não colocar isso nas escolas? É preciso mostrar para os alunos: "Olha, você tem que ter esse papel no trânsito!". O pedestre tem responsabilidade, bem como o ciclista e o motociclista. Todos nós temos responsabilidade. Não é só culpar o outro. Essa história de que o maior protege o menor a gente não vê. A gente vê os ciclistas brigando por isso, bem como os motociclistas e os pedestres, mas eles também têm que entender o papel deles no trânsito.
Então, a partir do momento em que nós estamos trabalhando de forma contrária, em que nós estamos punindo e não educando, essa punição, infelizmente, nem sempre chega.
Então, eu queria dizer aqui, para finalizar a minha fala, além de agradecer pela oportunidade: debater trânsito é sempre muito bom, muito importante, porque nós sabemos que vidas, famílias estão aqui precisando de ajuda, e nós estamos aqui para isso. Então, incansavelmente, vamos continuar trabalhando com a criança e dizer: "Adultos, vocês também têm responsabilidade, vocês são exemplo e precisam mostrar isso para os seus filhos e para as suas famílias".
Muito obrigada pela oportunidade. Estamos de portas abertas. O Detran do Espírito Santo está aqui para quem quiser e precisar de algum apoio, de alguma ajuda.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES. Por videoconferência.) - Obrigado, querida Sheila. Você me fez recordar o período em que eu fui diretor, o curto período em que eu fiquei à frente como Diretor-Geral do Detran. Você, hoje, aqui, é uma testemunha viva de que eu sempre trabalhei com processo seletivo, para que esses cargos comissionados não fossem de indicação política.
Eu lembro que, quando eu assumi a direção do Detran, muitos políticos vinham: "Ah, porque eu quero fulano em cargos aqui e ali!". Eu dizia: "Não, aqui não. Aqui eu vou fazer um processo seletivo. As pessoas vão ter que entrar aqui por competência, por mérito". E aí a Sheila está aqui hoje. E, desde quando fiz processo seletivo, o mérito é dela - é dela! -, é de quem se manteve no cargo até hoje. E é um cargo comissionado. A competência foi dela, e ela é oriunda de um processo seletivo.
Quero dizer para você, Sheila, que, quando assumi como Senador aqui - este é meu primeiro mandato -, quase 100% de todas as vagas no meu gabinete aqui e no Espírito Santo também foram ocupadas por processo seletivo.
Quero até aproveitar e fazer um alerta: está publicizado nas minhas redes que há uma vaga para jurídico legislativo, para trabalhar em Brasília, por meio de processo seletivo mais uma vez.
Parabéns pelo seu trabalho! Parabéns à Direção-Geral do Detran!
Concordo com você que, quando eu tentei instituir esse projeto humanizador, estabelecendo os grupos de atendimento psicossocial... Aí eu queria fazer um apelo à minha querida Juliana, da Abrapsit, por quem tenho um amor incondicional; quando eu vejo aqui o Alysson, da Abramet, quando eu vejo a Juliana, eu falo: "Meu Deus, eles sabem! Nós falamos a mesma língua!".
Eu queria muito que vocês fizessem uma manifestação aos DETRANs e à Polícia Civil, falando da importância de haver estudantes de Psicologia dentro do Departamento Médico Legal para fazer uma equipe de acolhimento. É preciso haver dentro do Detran esses alunos de Psicologia para dar esse suporte.
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É difícil! Eu lembro que... Até nisso, a gente tem que ter uma técnica. Olhem que eu não sou da psicologia, mas eu falava que não tinha como eu falar para uma mãe que está liberando uma vítima fatal que tem um serviço de atendimento psicológico, pois eu tenho que respeitar o tempo dela, o luto dela, o momento dela. Aí eu lembro que eu deixava passar uns três meses e aí eu mesmo, às vezes, ligava. Por exemplo, para D. Dete, que perdeu o filho Maycon: "D. Dete, aqui é o Contarato. Olhe, sabia que tem, dentro do Detran, um serviço de atendimento psicológico? Vá lá. Eu só peço que você vá uma vezinha lá, tente ver como é que funciona. Vai ajudar muito". Fazer esse trabalho de sedução não é fácil; tem que ter muito amor, tem que ter empatia, tem que se colocar na dor do outro e tem que respeitar o momento. Então, eu faço este apelo à Abrapsit: é de extrema importância vocês estarem dentro do Departamento Médico Legal. É aquilo que eu fiz lá quando eu Delegado de Trânsito: eu mandei pintar uma sala dentro do DML, uma sala com cor diferente, com flores, botei bonbonnière, eu queria colocar ali alunos de psicologia e serviço social para acolherem as famílias quando iam ao departamento para reconhecer ou liberar uma vítima fatal, quer seja por crime de trânsito, quer seja por disparo de arma de fogo, quer seja por qualquer crime violento, em qualquer morte violenta. É necessário que o poder público exerça essa eficiência. Daí a importância de a Abrapsit estar dentro desses espaços, dentro do Departamento de Trânsito, dentro das delegacias de trânsito, dentro do DML. Aí, sim, nós estaremos dando um serviço de extrema qualidade à população brasileira. Faço essa sugestão e esse apelo.
Antes de passar a palavra ao próximo convidado, eu registro aqui a presença online do Senador Wellington Fagundes e consulto se o querido Senador quer fazer uso da palavra, mas, antes de ele responder, eu quero aqui externar meus parabéns a V. Exa., pois hoje é seu aniversário, assim como é aniversário da Senadora Soraya Thronicke. Que Deus os abençoe com muita saúde, muita paz, muito amor, muita serenidade e equilíbrio emocional! Que sempre exerçam empatia, se colocando na dor do outro. Eu acho que a função do Parlamentar é essa. Se me perguntam "Contarato, o que você tem aprendido como Senador, você que nunca foi político?", o Parlamentar tem que ter a sensibilidade de usar a palavra para apresentar o Brasil ao Brasil. Ele tem que usar a palavra para se colocar na dor do outro. Então, parabéns, meu querido Senador Wellington Fagundes. Parabéns pelo seu aniversário. E, caso V. Exa. queira fazer uso da palavra, eu estou à disposição. (Pausa.)
Se não quiser, vou passar imediatamente a palavra ao Sr. Luís Carlos Paulino, Coordenador Socioeducativo da Associação Brasileira de Educação de Trânsito (Abetran).
Muito obrigado, Luís Carlos, por ter aceito o convite para estar aqui neste debate. Muito obrigado.
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O SR. LUÍS CARLOS PAULINO (Para exposição de convidado. Por videoconferência.) - Bom dia, Senador Contarato. Bom dia aos demais participantes desta audiência.
Quero externar, em nome da nossa Associação Brasileira de Educação de Trânsito, o nosso reconhecimento a S. Exa. o Senador Fabiano Contarato pela iniciativa de mais um debate voltado à segurança do trânsito um debate voltado à segurança do trânsito, desta feita, tendo como objeto a educação para o trânsito.
Eu queria aqui fazer uma confidência de público, Senador: eu participo de inúmeros grupos de profissionais do trânsito, de estudiosos, pesquisadores, e, quando da eleição de V. Exa. ao Senado, muita gente, a maioria das pessoas com quem nós trocamos ideias e travamos esses debates viu com uma expectativa muito positiva esta eleição, a eleição do senhor para o Senado, porque nós sempre estivemos esperando - os profissionais, os pesquisadores - alguém que encampasse, de fato, esta luta em prol de um trânsito mais humanizado e seguro. E, quando V. Exa. foi eleito, muita gente apostou: "Agora...". Depois, alguém que ficava ali meio com o pé atrás e dizia assim: "Será que não vai ser uma decepção?" E eu quero aqui, de público, fazer esse reconhecimento de que, hoje, entre os profissionais do trânsito, entre os pesquisadores, esse reconhecimento é unânime. Então, nós nos sentimos muito felizes e nos sentimos representados; eu, aqui do Ceará, me sinto muito bem representado por V. Exa. Eu queria fazer aqui essa confidência de público.
Queria fazer aqui um reconhecimento também ao trabalho do nosso amigo Ramalho, que é o Presidente do Observatório Nacional de Segurança Viária, parabenizá-lo pela exposição nos antecedendo; queria também parabenizar a Sheila pela excelente exposição; as reflexões que foram feitas até aqui. E queria até aproveitar alguma coisa dessas reflexões, do que o próprio Senador falou, a Sheila colocou, o Ramalho... Falou-se aí sobre essa questão dos efeitos devastadores desse sinistro de trânsito em relação às famílias das vítimas, e eu diria que até em relação aos familiares também dos autores, das pessoas que se veem envolvidas nesse contexto, tanto a da pessoa que mata, como a família da pessoa que morre, a vítima fatal desse sinistro. E a gente faz a seguinte reflexão: nos acidentes de trânsito, se a gente não pode dizer que o resultado desses sinistros é contagioso, não é uma doença contagiosa, eles são contagiantes, sem dúvida alguma - não são contagiosos, mas são contagiantes. É como o Senador falava, é como a Sheila colocava, as famílias ficam devastadas, são afetadas, sem dúvida alguma.
No contexto atual, Senador, nós entendemos que é inconteste a necessidade de uma repactuação, de um novo pacto em prol desse trânsito mais humanizado, esse trânsito mais seguro e, nesse sentido, tem uma reflexão que nós fazemos de forma recorrente que é a seguinte... E eu também achei interessante quando a Sheila falava e mencionava ali o art. 29, aquela questão das prioridades, porque a gente diz sempre que ali é o mundo ideal. No mundo ideal, o maior cuida do menor; o motorizado, do não motorizado; e, todos juntos cuidam do pedestre. E a gente sabe que, na prática, a coisa, muitas vezes, é até o inverso disso - o que se tem na prática.
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Também trazendo aqui para esse plano ideal - porque eu acredito que a gente discute é buscando sempre esse mundo ideal, é buscando se aproximar o máximo possível desse universo ideal -, eu costumo fazer a seguinte reflexão: a educação para o trânsito tem a missão de convencer a maioria a cumprir as normas, e, num segundo momento, aqueles que não ficarem convencidos pela educação teriam que cumprir a norma por força da fiscalização. Essa relutância tem que ser quebrada por uma fiscalização vigorosa, uma fiscalização eficiente. É inconteste que o mundo ideal é esse mundo onde a educação faça o convencimento da maioria, senão de todos.
E tem outra reflexão que a gente costuma fazer nessas discussões com os profissionais, e, quando a gente faz essa colocação num primeiro momento, as pessoas às vezes até não compreendem bem. É quando eu digo o seguinte... Primeiro, eu coloco desta forma: eu não considero que a educação seja o elemento mais importante. Eu já faço essa colocação para chocar as pessoas que estão ali participando da discussão, para dizer em seguida o seguinte: a gente não pode menoscabar a importância dos outros elementos - da fiscalização, das intervenções de engenharia. Então, eu nem coloco que a educação é o elemento mais importante, eu coloco ali em pé de igualdade, uma relação horizontal.
Agora, a educação tem um diferencial - tem um diferencial. E que diferencial é esse? Educação é muito mais abrangente do que as outras ferramentas. A educação é muito mais abrangente e, nesse sentido, consegue ter um alcance muito maior e tem um potencial para ser muito mais eficiente do que essas outras ferramentas de dissuasão ou de convencimento. Por quê? Porque nós aqui, discutindo agora neste debate, já estamos promovendo, em alguma medida, a educação para o trânsito. Eu tive a oportunidade de me deslocar para vários estados, para várias cidades diferentes, e lá eu tento dar a minha contribuição ao debate e, nesse sentido, eu estou ali, em alguma medida, semeando a educação para o trânsito. Em sentido diverso, nenhum de nós aqui que estamos participando deste debate, por mais qualificados que sejamos - nem o Senador, nem o Luís Carlos, que está falando agora, nem a Sheila, nem o Ramalho -, pode sair ali do seu estado, da sua cidade e fazer fiscalização de trânsito noutra cidade; e eu não posso fazer nem na minha cidade, porque eu não sou agente de trânsito aqui, eu não sou agente da autoridade de trânsito, eu não sou autoridade de trânsito, mas eu posso, sim, semear a educação para o trânsito aqui, a gente pode sair daqui e promover a educação para o trânsito em outra cidade, promover num sentido mais amplo, como estamos fazendo agora num debate deste, que está sendo veiculado para todo o Brasil. Então, a educação para o trânsito tem esse diferencial de ser muito mais abrangente, chega muito mais longe e pode ser feita por um universo muito maior de combatentes, digamos assim. Então, nós temos uma frente que é muito mais ampla.
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A frente dos educadores para o trânsito consegue chegar mais longe, consegue atuar nos locais mais inusitados e mais diversos, consegue chegar aonde a fiscalização não chega - consegue chegar aonde a fiscalização não chega.
É por meio da educação para o trânsito que a gente vai, em alguma medida, instituir ou melhorar essa cultura de segurança, que é um ponto que eu, em particular, considero muito deficitário, muito deficiente. Eu acho que nós não temos - eu gosto de fazer essa reflexão - uma cultura de segurança. E, se a temos, ela é algo ainda muito incipiente.
Eu gosto de colocar como exemplo, trazendo aqui para a nossa realidade do Nordeste, a questão do capacete, Sheila - a questão do capacete. Nós motociclistas não usamos o capacete, não costumamos usar o capacete na perspectiva da segurança, da autoproteção, do self-care, como foi colocado. Nós não usamos esse equipamento nessa perspectiva. Só para concluir, a gente usa na perspectiva de não ser autuado, de não ser penalizado. E, como usamos nessa perspectiva incorreta, que é a de não ser autuado, de não ser multado, utilizamos de forma incorreta, e o equipamento mais importante para esses usuários da motocicleta se torna ineficiente, porque, o mais das vezes, a gente se depara com as pessoas utilizando o capacete com a cinta jugular desafivelada ou com a cinta jugular previamente afivelada e com uma folga de quatro ou cinco dedos, uma folga enorme. O mesmo capacete... O exemplo melhor é a questão dos mototaxistas, muito presentes aqui no Nordeste. O profissional mototaxista tem um capacete em que a cinta jugular já é previamente afivelada, enferrujada e nem abre mais. E ela é no tamanho maior, que é para dar para qualquer usuário que tenha a cabeça menor ou que tenha a cabeça maior. Quando ocorre um sinistro de trânsito, um choque, uma colisão, o capacete cai antes do usuário. Tenho vários vídeos aqui que, inclusive, demonstram isso. Então (Falha no áudio.)
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES. Por videoconferência.) - Retornou a conexão. Pode concluir, colega.
O SR. LUÍS CARLOS PAULINO (Por videoconferência.) - Não consigo entender aqui a partir de que momento a conexão ficou ruim, mas eu me dou por satisfeito, Senador.
Quero somente agradecer pela oportunidade e pelo espaço e dizer que o debate é importantíssimo.
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES. Por videoconferência.) - Apenas para confirmar como é verdade o que você está falando, o meu querido Muller que está aqui nos auxiliando - aliás, uma equipe maravilhosa; quero aqui estender meu agradecimento a todos - falou: "É isso mesmo, Senador, o que ocorre. Eu sou lá do Nordeste e é desse jeito mesmo". (Risos.)
Obrigado, Luís Carlos Paulino.
Espero, numa oportunidade, o mais rápido possível, encontrá-lo pessoalmente, dar um abraço carinhoso e agradecer pelo apoio ao nosso mandato.
Neste momento, concedo a palavra a minha querida amiga Juliana de Barros Guimarães, especialista em Psicologia do Trânsito e Diretora Científica da Associação Brasileira de Psicologia de Tráfego (Abrapsit). Quero que estenda um beijo carinhoso a todos psicólogos e a todas psicólogas da Abrapsit.
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A SRA. JULIANA DE BARROS GUIMARÃES (Para exposição de convidado. Por videoconferência.) - Obrigada, Senador, sempre tão gentil conosco.
Bom dia a todos e todas.
Em primeiro lugar, eu gostaria de agradecer esse convite do Exmo. Presidente do Senado Federal, Senador Rodrigo Pacheco, que convocou esta sessão de debates, com a participação de tantos colegas, tantos representantes aqui de órgãos e entidades que atuam na defesa da segurança no trânsito e consequente preservação da vida, seja através da educação, da fiscalização, da saúde, de tudo aquilo que faz esse trânsito plural e diverso, para nos proteger e nos defender.
Eu quero cumprimentar a todos os Exmos. Srs. Senadores e Sras. Senadoras na pessoa do meu - vou chamá-lo assim - querido amigo Senador Fabiano Contarato, que é o autor do requerimento que nos reúne aqui hoje para debatermos esses impactos da violência no trânsito e as possíveis soluções para um trânsito seguro, a quem, em meu nome e em nome da Associação Brasileira de Psicologia de Tráfego (Abrapsit), parabenizo e agradeço imensamente por sua luta incansável em defesa de vidas no trânsito, o que tanto nos toca. Eu não canso de repetir isto: o senhor toda vez me faz chorar, tem o dom de emocionar, e os seus projetos, todos eles, de humanizar a dor, sobretudo... O senhor estava falando como é ser Parlamentar - eu que tenho aprendido - e eu digo que o senhor ensina para a psicologia. Eu digo que a psicologia perdeu um grande psicólogo quando eu vejo o senhor falando sobre a atuação da nossa área de saúde. Quero cumprimentar a todos os ilustres palestrantes aqui, na pessoa da colega Sheila Sibaldo, para que eu não esqueça o nome de todos aqui conhecidos e queridos.
A gente sabe que a violência do trânsito transcende fronteiras. Não é de hoje que ela é considerada uma questão de saúde pública mundial, de acordo com a Organização Mundial da Saúde. É como uma grande epidemia, morre-se mais no trânsito que em guerras ou pela violência urbana.
Então, eu vou aqui focar um pouco, complementando os meus queridos amigos, na saúde. Nós temos vivido um momento singular com a pandemia da covid, que fez o mundo inteiro vivenciar uma mudança de paradigmas, de atitudes, de comportamentos, e que inclusive nos fez perceber a importância da saúde mental e da mobilidade humana na vida de todos nós.
Mas eu gostaria de chamar a atenção aqui dos senhores e senhoras porque o mundo, antes da covid, já vivia uma pandemia silenciosa, há décadas, chamada trânsito. Milhões de vidas são ceifadas a cada ano, dezenas de milhões de sequelados e feridos física e emocionalmente. Então, a gente sabe que o impacto da violência do trânsito é de alto custo financeiro ao Estado e à população, mas, além disso, precisamos entender que o ser humano é o maior ator, mas também é a maior vítima desse triste cenário.
Como psicóloga, não posso deixar de trazer para o foco do nosso debate o ser humano, a equação mais complexa e também a mais importante do nosso debate, esse humano carregado de emoções, histórias, pessoas, alegrias e dores. Para além dos custos econômicos que os sinistros de trânsito trazem, é preciso olhar para os efeitos gerados pelas mais diversas perdas ocasionadas nesse contexto. É impossível quantificar o sofrimento de cada envolvido ou o preço da desestruturação de núcleos familiares e sociais inteiros! Como mensurar os custos de uma família destruída?
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Pesquisas na Europa, por exemplo, acompanharam, ao longo de dez anos, famílias de vítimas desses sinistros e, dez anos depois, não tinham se reconstruído. Não é algo tão simples.
Um sinistro de trânsito gera um sofrimento psíquico e emocional silencioso que necessita de atenção. Como bem vinha falando o Senador Fabiano, a dificuldade de acessar, e Sheila trouxe também, essa dor. Os efeitos da violência no trânsito nas condições psicológicas da nossa sociedade são significativos. Embora, a gente chame, olha que ironia, de sequelas invisíveis, porque a gente não enxerga não significa que elas não existam.
Dados de pesquisas estimam que de 10% a 40% das pessoas que passam por um sinistro de trânsito desenvolvem um quadro de estresse pós-traumático no primeiro ano após o impacto. Além de que 80%, gente, 80% destas também desenvolvem outras condições, como a depressão, mais de 40% da população, ansiedade generalizada, quase 60% da população, ansiedade fóbica, específica a situações de trânsito, entre outros. A gente ia ficar discorrendo aqui muito tempo. Isso, em nosso país, que, hoje, para deixar claro para vocês, já é o primeiro do mundo - primeiro - em número de casos de pessoas diagnosticadas com transtornos de ansiedade, ou seja, hoje, mais de 10% da nossa população, já é atingida por esse problema.
Somos o quinto país do mundo em casos de depressão, mais de 6% dos brasileiros são diagnosticados, o que implica que a gente tem um número muito mais elevado do que isso, porque a gente sabe, como bem estavam colocando, inclusive a Sheila, que as pessoas não vão necessariamente se cuidar dessa ordem. Então, eu estimo - eu estimo - que isso daí você pode ampliar em dez vezes, aquelas pessoas que não vão pedir ajuda.
As pesquisas estimam que a gente tem 3% da população brasileira que apresenta transtorno exclusivo e intermitente. Estamos falando de violência no trânsito. Não sei se sabem, transtorno exclusivo e intermitente são rompantes de raiva que ocorrem fora da dimensão. Imagina isso no espaço do trânsito e, nisso, a gente tem 5% da nossa população que possui como hábito comportamento agressivo ao volante. O que é hábito? Hábito é o seguinte, a primeira resposta inconsciente que eu tenho, que eu reajo a um evento no trânsito é agressiva. Isso é o hábito, eu faço primeiro, penso depois.
Vejam como a saúde e o comportamento também tem importância, colegas. Nesse cenário, a gente já tem várias iniciativas nacionais e internacionais, sobretudo nessa área de intervenção, de educação, porque a gente tem, por exemplo, o Maio Amarelo, um movimento já internacional de conscientização, que os colegas falaram, que estimula a participação da população, das empresas, do Governo, das entidades e a conscientização. O amarelo de atenção, como a gente costuma dizer, que a gente encerrou ontem e trouxe como tema de trabalho este ano uma mensagem fundamental: Juntos salvamos vidas. Salvamos a educação, a fiscalização, a prevenção à saúde, o poder público, todos juntos. Isso é o trânsito.
A segunda década de ação pela segurança no trânsito, 2021 a 2030, da OMS, com a meta de prevenir ao menos 50% das mortes e lesões no trânsito até 2030, com o plano global de ações desenvolvido em conjunto, mas a gente sabe que a gente refez a segunda década no ano passado, porque a primeira década ainda não foi suficiente para nos conscientizarmos nem nos sensibilizarmos, não é, Sheila? Então, a gente precisa adotar mais ações para preservar e salvar vidas.
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Temos o nosso Pnatrans (Plano Nacional de Redução de Mortes e Lesões no Trânsito), que traz 160 ações prioritárias. Ou seja, são várias iniciativas maravilhosas que dialogam já entre si, mas que estão sendo executadas com diversos parceiros, desde os órgãos públicos às entidades civis e científicas, inclusive com a parceria de muitos de nós aqui presentes. Nesse Pnatrans, eu acredito que a maioria dos colegas que eu vi aqui está lá junta, atuando nos diversos contextos.
A Abrapsit desenvolve, além de pesquisas científicas e a formação continuada dos profissionais da psicologia de tráfego, várias iniciativas e projetos para trabalhar tanto a prevenção, como também o cuidado, a formação e a educação no contexto de tráfego. Parcerias, por exemplo... No contexto de tráfico, a gente tem o Rotas da Saúde, o Anjos da Boleia, o Rotas da Educação. O Rotas de Saúde faz o acolhimento, a gente faz o atendimento psicológico a pessoas que estão em condições ocasionadas por esse estresse de tráfego. Os Anjos da Boleia é um atendimento que a gente realiza para o caminhoneiro, para o profissional das vias nas estradas. E temos o Rotas da Educação para uma formação continuada, porque os nossos agentes de trânsito, os nossos formadores, o pessoal da educação precisa também entender de comportamento humano, precisa saber como abordar, como sensibilizar, e a psicologia está aí também para contribuir com isso.
Temos parcerias aqui com o Detran Pernambuco, como a operação de prevenção Segundos que Salvam Vidas, em que a gente trabalha os conflitos e a violência no trânsito, diretamente nas ruas. A gente colocou, Senador, psicólogos nas ruas, nós fomos para as ruas numa ação conjunta com as psicólogas e a equipe de fiscalização e educação do Detran Pernambuco, para atuar juntos saúde, educação e fiscalização lá, para apoiar, acolher e ajudar a mudança de comportamento no trânsito - lá! Eles não chegam à gente, mas a gente vai até eles, para que a gente possa fazer esse acolhimento e escutar. E tivemos exemplos, assim, impressionantes com isso. Às vezes, quando entra diretamente ao vivo, nos jornais locais, que a gente está fazendo uma ação, a gente já viu pessoas saírem de outro lado da cidade ou de outra cidade da região metropolitana para irem aonde a gente está fazendo, para poder organizar isso.
Então, eu queria, para concluir, me colocar à disposição completamente para desenvolver esse projeto junto com o senhor, para implantar isso em nível nacional, para a gente desenvolver estratégias para mudança de paradigma da utilização do contexto de trânsito e mobilidades urbanas atuais, para a compreensão de um espaço de convivência com foco na mobilidade humana segura, inclusiva, democrática, saudável e cidadã.
E, para concluir, eu gostaria de deixar uma reflexão aqui, nas palavras de Marc Augé, etnólogo e antropólogo francês, que diz o seguinte:
Pensar a mobilidade é pensá-la em diversas escalas para tentar compreender as contradições que minam nossa história [...]. É preciso aprender a sair de si e de seu entorno, e compreender que é a existência do universal que relativiza as culturas e não o inverso. [...]
É chegado o tempo da mobilidade planetária e de uma nova utopia da educação, mas só estamos no começo dessa nova história, que será longa e, como sempre, dolorosa.
Vamos juntos assumir esse compromisso de salvar vidas, pois cada vida conta.
Obrigada pela oportunidade.
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES. Por videoconferência.) - Obrigado, querida Juliana. É muito bom te ouvir. Muito sensível, desempenha o papel efetivamente. Eu acho que é essa a função do profissional. Quando se ama o que faz, você emana isso, isso flui, isso passa no olhar, no falar, no tocar, no sentir. Pode ter certeza de que você faz isso muito bem, e eu me sinto um privilegiado por ser e também por me intitular seu amigo.
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Concedo agora a palavra a alguém que também é outro amigo, que eu falo que eu conquistei, eu acho que Deus também me deu, e eu acho que foi depois que eu fui eleito Senador, que é o próximo convidado, o Sr. Alysson Coimbra, representante da Comissão de Assuntos Políticos da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), a quem eu quero aqui, mais uma vez, agradecer a participação e me colocar à disposição. E quero falar, Alysson, que eu também considero você muito amigo, um querido e um excelente profissional. Queria mandar um beijo carinhoso a todos os médicos e médicas da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego.
Com a palavra Alysson Coimbra.
O SR. ALYSSON COIMBRA (Para exposição de convidado. Por videoconferência.) - Bom dia! É um prazer estar aqui. Cumprimento todos e todas que me antecederam e os que ainda falarão. Um abraço especial a todos que nos assistem pela TV Senado, através do YouTube.
E quero dizer, Senador Contarato, do nosso reconhecimento, não somente como Abramet, como médicos do tráfego, mas como cidadãos, pois V. Exa. cumpre exatamente a regra que fala que o Senador é da República. Então, agradecemos aos nossos irmãos capixabas pela grande virtude de ter presenteado o Brasil e todos nós com esse mandato plural, esse mandato aberto. E eu digo isso, eu cheguei depois, e as portas estiveram sempre abertas, e é minha obrigação também mostrar para as pessoas que o senhor é uma pessoa muito acessível, um coração ímpar e que vai fazer a diferença muito mais do que já fez até agora.
Para nós da Abramet, que já estamos há mais de 40 anos trabalhando com medicina do tráfego, com saúde dos motoristas, é um grande desafio representar os milhares de médicos na formulação de diretrizes, de normativas, de sensibilização do poder público, do Poder Legislativo quanto à necessidade do aprimoramento e até mesmo da elaboração de novas leis que favoreçam a preservação de vidas no trânsito. Como foi dito, nós temos sempre que reconhecer que nós falhamos na última década, mas que, mais uma vez, nós temos essa oportunidade e vamos aprimorar.
O Maio Amarelo foi um mês intenso, de muito trabalho, a mídia brasileira tem aberto cada vez mais espaço para o trânsito, pois entenderam que o nosso partido é a preservação de vidas, o nosso discurso não é polarizado, a ciência no trânsito comprovadamente salva vidas, a lei das cadeirinhas, a lei seca, tudo que surgiu de diretrizes e de mobilizações científicas da Abramet. A Abrapsit é o braço psicológico, pois uma habilitação precisa desses dois parâmetros, avaliação psicológica e avaliação das condições de saúde.
Essa nova década, Senador e todos que que nos assistem, traz alguns pilares, que eu separei, porque estamos em uma reunião, para que a gente possa falar. A gestão de segurança no trânsito: o Brasil, nas rodovias federais, ainda possui um alto índice de multas por excesso de velocidade. Nós ainda não atingimos, desde 2019, os níveis de fiscalização em horas pela Polícia Rodoviária Federal. Nós precisamos entender que, muitas vezes, trechos com alta sinistralidade não são passíveis de uma modificação estrutural pela escassez de recursos - isso é compreensível -, mas há outras medidas muito mais baratas, como a mensuração da velocidade, não a instantânea, que é aquela que é feita, mas a gente fala de velocidade média; ou seja, vamos instalar mais câmeras de radar, vamos melhorar a fiscalização. Uma, duas, três vidas serão salvas com essas modificações das formas de fiscalizar.
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Infelizmente também, pelo levantamento da Polícia Rodoviária Federal em 2021, as autuações por uso de álcool e de substâncias psicoativas cresceram. Mesmo com redução do número da fiscalização também presencial da Polícia Rodoviária - lembro, mais uma vez, que são dados divulgados pela própria corporação -, apontaram um aumento do número de infrações, ou seja, estamos com um número viciado. Então, é só aumentar o número de fiscalização, quer seja de velocidade ou de bafômetro.
Precisamos de uma maior pressa para definição e aplicação logo do drogômetro. Desde o ano passado, o Ministério da Justiça tem se empenhado, os estudos foram realizados em fase final, e estamos agora só nessa fase de comprovação laboratorial dos valores obtidos. Precisamos que o drogômetro esteja... O rigor da lei seca também tem desviado esses motoristas para o uso de substâncias psicoativas.
Precisamos cuidar, Senador, das pessoas mais vulneráveis, pessoas em bicicletas, os pedestres, pessoas com um grau de mobilidade reduzida. É urgente e necessária a discussão, assim como acontece em países europeus, como a França e a Inglaterra, da redução da circulação de tráfego em zonas de maior circulação de pessoas. A população precisa, urgentemente, ter uma percepção de segurança: calçadas, arborização, segurança, iluminação.
Precisamos integrar as nossas vozes, pois, cada vez mais, as pessoas estão investindo no transporte privativo, e fica difícil, realmente, para as empresas de ônibus manterem o sistema, as passagens são mais elevadas, e, mais uma vez, quem sempre sofre é a população de menor renda: ela mora longe do seu local de trabalho, ela depende exclusivamente do transporte público.
Nós precisamos rever. Essa conta não está fechando. A inflação, o aumento do diesel é para todos os integrantes, inclusive para as pessoas comuns. Essa conta não pode ser, mais uma vez, paga somente por essas pessoas de menor renda.
Outro ponto que eu gostaria de destacar é que a Meta 6 da ONU nos coloca com essa missão de reduzir em até 50% essa velocidade de circulação dos veículos.
Estamos atravessando, Senador, um momento difícil também em relação ao transporte rodoviário de cargas e de passageiros. É notório o aumento dos sinistros envolvendo ônibus, ônibus clandestinos, as questões da saúde do motorista, ou seja, os veículos pesados correspondem hoje a 5% da frota total, e eles respondem por 47% das mortes e 31% dos ferimentos. Então, essas jornadas exaustivas, baixa remuneração, insalubridade, a precarização do trabalho, as dificuldades com a manutenção e a renovação da frota. Alguns estudos dizem que a nossa frota média de caminhões tem de 14 até 21 anos.
São muitos insumos que precisam estar nessa conta das despesas fixas e variáveis desses motoristas. Ou seja, o que está acontecendo, Senador? A inflação no setor de transporte rodoviário é aplicada com o aumento da insegurança. E quem está pagando essa conta? Todos nós.
Então, nós estamos perpetuando uma cadeia desleal, desigual, que, além da baixa remuneração, induz ao vício, induz à precarização do serviço. Nós temos uma grande promiscuidade dessas remunerações pelo cumprimento de metas, ou seja, se eu entrego o meu frete antes do programado, eu vou ganhar dinheiro. O que isso estimula? O descumprimento da lei do descanso, o excesso de velocidade, o comportamento infracional.
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E a gente tem, Senador, desde 2015, a Lei 1.303, que fala que o motorista profissional tem que ter um incentivo gratuito a programas de formação, serviço de medicina ocupacional, tratamento de motoristas profissionais dependentes de substâncias psicoativas. Nós precisamos de uma descentralização do atendimento no SUS, pois o motorista que sai do Acre e vai fazer uma entrega no Paraná, se ele passar mal, não tem um lugar para ele. Dizem: "Ah, ele tem a Unidade de Pronto Atendimento". Mas precisamos de que, pela Carteira Nacional de Habilitação ou por um cartão do caminhoneiro, um cartão do motorista, ele seja instruído em caso de problema de saúde, que ele procure esse serviço.
Outro ponto que nos preocupa é a remuneração do trabalho, a legislação trabalhista.
Por fim, eu acredito - eu acredito, não; a Abramet acredita e eu também - que pensar em um modelo de transporte rodoviário socialmente responsável só será possível através da participação ativa de todos os integrantes: poder público, sociedade civil, entidades. É a hora de nos abstermos de discussões calorosas e entendermos que os últimos dados mostrados pela Polícia Rodoviária Federal, os levantamentos das entidades científicas estão acenando para mais um aumento do número de mortes. Será que a gente vai ter que continuar esperando que o trânsito entre nas nossas vidas da maneira mais trágica e letal possível para que a gente possa encarar esse tema com a responsabilidade devida?
Quero dizer ao senhor, às brasileiras, aos brasileiros que é um compromisso inegociável: a Abramet é uma associação que trabalha com a ciência. Aprendemos e evoluímos com a criação da nossa Comissão de Assuntos Políticos, pois entendemos que é nosso papel auxiliar Deputadas, Deputados, Senadoras e Senadores na formulação e no entendimento de propostas legislativas. E mais uma vez parabenizo o senhor pela sensibilidade de sempre fazer matérias inéditas e, muitas vezes, em sintonia contínua com o que acontece fora, o que mostra que a sua assessoria, os seus funcionários e o senhor estão em sintonia direta com a preservação de vidas no trânsito.
A Abramet reitera o seu papel. Precisamos, como o senhor disse, humanizar - humanizar a dor, humanizar a educação. Precisamos entender o porquê da não aplicação dos recursos que são arrecadados com o Funset, com as multas, com o DPVAT. Eles precisam ser melhor aplicados. A educação é um princípio fundamental. Precisamos de que o trânsito seja discutido nas nossas escolas, ou seja, pelo que já conversamos aqui e pelo que eu acabei de dizer, nós temos muitas dificuldades, mas elas são proporcionais à nossa capacidade e ao nosso esforço.
Mais uma vez, parabenizo a todos e agradeço, na pessoa do nosso Presidente do Congresso Nacional, Senador Rodrigo Pacheco, por abrir este espaço qualificado de discussão. E que a Abramet, mais uma vez, possa integrar futuras discussões, futuras reuniões, pois é o nosso papel trabalhar pela preservação de vidas no trânsito.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES. Por videoconferência.) - Muito obrigado, querido Alysson, mais uma vez, por sua contribuição.
E eu quero mais uma vez reforçar tanto à Abramet, como à Abrapsit, a todos os convidados que o nosso mandato está à disposição. Eu fico muito contente... Em dois anos de mandato, nós alteramos o Código de Trânsito para determinar cadeia para motorista que bêbado matar ou lesionar. Não cabe mais substituição de pena. Diante de todas as atrocidades que foram feitas em alteração negativa no Código de Trânsito Brasileiro, essa foi uma iniciativa que, graças a Deus, para mim, vai salvar muitas vidas. E vai tirar um pouco dessa sensação de impunidade para as famílias das vítimas.
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Eu quero falar também para vocês, com muita alegria - eu queria que o Congresso, que a Câmara dos Deputados se sensibilizasse e aqui faço um apelo a todos vocês para mobilizar os Parlamentares -, que existe um projeto de lei do Senado, de autoria do meu querido Senador Wellington Fagundes, que hoje está fazendo aniversário - mais uma vez quero parabenizá-lo -, que foi o PLS 32, do qual eu fui Relator e que já foi aprovado no Senado e foi remetido à Câmara. Esse projeto é de extrema importância. O que ele estabelece? Em virtude de crimes de trânsito por motorista embriagado, o custo dentro do Sistema Único de Saúde quem tem que pagar é o motorista que ocasionou. Nada mais justo, porque não é justo a população brasileira, brasileiros e brasileiras pagarem esse custo bilionário que entra no Sistema Único de Saúde.
Então, eu quero parabenizar o Senador Wellington Fagundes por ter essa iniciativa de elaborar esse projeto de lei; agradecer a ele e ao Presidente Pacheco por ter me designado Relator; agradecer por ter pautado esse projeto; e agradecer a todos os Senadores e Senadoras por terem votado favoravelmente. E essa matéria, esse PLS 32 hoje está na Câmara dos Deputados.
Faço um apelo tanto ao meu querido Wellington Fagundes como a todos aqueles que estão aqui: que mobilizem suas bases para conscientizar os Deputados Federais para a aprovação desse PL. Por quê? Porque está tirando o ônus daquele brasileiro e brasileira. Claro que a saúde pública é universal e gratuita. Não está se cobrando da vítima, mas daquele que ocasionar o custo ao redor daquelas vítimas dentro do Sistema Único de Saúde.
Eu volto a falar: eu percorri os hospitais quando eu fiquei dez anos à frente da Delegacia de Delitos de Trânsito. Mais de 70% dos leitos do setor de ortopedia, traumatologia são vítimas de acidente de trânsito. O custo disso, de R$50 bilhões por ano, quem paga é a população brasileira. Isso não é justo, isso não é razoável. Isso fere a razoabilidade.
Então, aí eu quero mais uma vez parabenizar o Senador Wellington Fagundes. E, de novo, ao parabenizá-lo, consulto se V. Exa. quer fazer uso da palavra.
Com a palavra o Senador Wellington Fagundes.
O SR. WELLINGTON FAGUNDES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - MT. Para discursar. Por videoconferência.) - Meu caro companheiro, Presidente desta sessão temática, Senador Fabiano Contarato, eu quero agradecer muito as palavras elogiosas de V. Exa.
Com certeza, precisamos fazer aí um grande trabalho para que a gente possa cada dia mais humanizar o trânsito no Brasil, seja nas estradas, seja na cidade, seja nas vias urbanas, enfim. E, por isso, eu quero parabenizá-lo por trazer esse tema aqui, que tem o objetivo de maior conscientização sobre a segurança viária como um dos caminhos mais eficazes para se reduzirem os acidentes e mortes no trânsito no país.
E aí eu quero dizer que os acidentes de trânsito estão entre os eventos que mais tiram vida das pessoas no Brasil e também no mundo. São mais de 33 mil vítimas fatais, conforme os dados do Datasus, só em 2020.
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Recentemente, Presidente Contarato, ao relatar uma medida provisória que abria crédito extraordinário em favor do Ministério da Infraestrutura, exatamente para a recuperação de estradas danificadas em função das chuvas ocorridas principalmente no final do ano passado e também no início deste ano, eu já dizia - e aí eu quero falar como Presidente da Frente Parlamentar de Logística e Infraestrutura - que a questão da infraestrutura, embora seja uma pauta desenvolvimentista, representa muito, muito mesmo para a saúde do ser humano, para a vida do ser humano. Acidentes e mortes no trânsito também ocorrem devido às condições ruins da infraestrutura rodoviária. Aí é bom lembrar que o Brasil é um país rodoviário, pois a maioria das cargas nossas são transportadas através de rodovias. Por isso, uma rodovia malconservada resulta, quase sempre, em acidentes de elevada gravidade.
Nas nossas estradas, temos uma circulação de mais de dois milhões de veículos pesados, entre carretas, caminhões e ônibus, embora seja preciso considerar que a idade média dos caminhões tenha, inclusive, aumentado de 2014 para cá. Naquele ano de 2014, a média dos veículos era de 9 anos e 7 meses, mas atingiu agora 11 anos e 7 meses. Portanto, há uma elevação também da vida desses veículos que passam e perpassam por todas as nossas estradas.
Eu quero registrar que um estudo realizado pelo Ipea em 2020, assinado pelo pesquisador Carlos Henrique Ribeiro, mostrou que acidentes de trânsito no Brasil matam cerca de 45 mil pessoas por ano e deixam mais de 300 mil pessoas com lesões graves. Por isso, esse tema é extremamente relevante.
Em uma estimativa conservadora, os acidentes em rodovias custam à sociedade brasileira cerca de R$40 bilhões por ano, enquanto os acidentes nas áreas urbanas custam em torno de R$10 bilhões, sendo, então, um custo relativo à perda da produção humana devido a esses acidentes, e isso responde pela maior fatia desses valores, seguido também, é claro, pelos custos hospitalares.
Ainda, de acordo com o IBGE, o Brasil possuía, em 2006, um total de 45 milhões de veículos de todos os tipos, e, desses, 27 milhões, ou seja, 61% do total, eram carros e 9 milhões, 20%, eram motocicletas. A frota nacional, portanto, passou a contar com 107 milhões de veículos, e, desses, 58 milhões, ou seja, 53%, são carros e 28 milhões são motos, ou seja, há 26% de motos. Sr. Presidente, um perfil das vítimas de trânsito no Brasil mostra que 36% dos ocupantes de motocicletas morreram nas ruas e avenidas do Brasil inteiro.
Então, Sr. Presidente, a legislação de trânsito - é bom registrar isto também - é reconhecida como uma das mais avançadas e completas do mundo. Quem atesta isso é o próprio Observatório Nacional de Segurança Viária.
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E, aí, num relatório sobre segurança viária publicado em 2018 pela OMS, o Brasil é encarado como exemplo positivo em três aspectos principais, o que é importante citar: a política de zero tolerância de álcool em direção, o uso de cinto de segurança nos carros e também a obrigação de botar o capacete entre os usuários de motocicleta.
Nesse tema, V. Exa., Presidente Contarato, sabe muito, porque também foi um grande profissional nessa área como Delegado.
Eu quero dizer também que, segundo esse relatório, o Brasil peca, no entanto, em outros quesitos, que são: o limite de velocidade e a adoção de cadeirinhas para menores de dez anos no banco traseiro de automóveis.
Eu quero, já finalizando, dizer que temos, portanto, de seguir um destino na melhoria da fiscalização para que as leis tenham melhor aplicabilidade.
Por isso, Sr. Presidente, este encontro é estimulante. Seguiremos trabalhando muito para aperfeiçoar a legislação. Inclusive, nesse sentido, eu quero aqui também relatar o pedido à Câmara dos Deputados para que vote esse projeto que V. Exa. relatou, de minha autoria, porque creio também que é mais uma forma não só de chamar atenção, mas, claro, quem cometeu um crime no trânsito... E é bom dizer que todos têm que ter a responsabilidade de, ao dirigir e ter ingerido qualquer droga ou bebida alcoólica, passar a ter a grande possibilidade de causar acidentes, inclusive acidentes graves, não só pelo custo, mas também principalmente pela perda de vidas.
Eu quero aqui agradecer muito, Sr. Presidente, a oportunidade de trazer aqui, ainda mais uma vez, o apelo para que possamos avançar sobre três temas: primeiro, é o processo de conscientização dos condutores, com campanhas consistentes, a começar pela educação nas escolas, de que é possível exercer na plenitude princípios da cidadania; segundo, trabalhar sempre, sempre, a todo tempo, pelo fortalecimento da nossa legislação, para que, se é uma das mais completas do mundo, seja cada vez melhor; e ainda a melhoria da nossa infraestrutura viária. Aí eu quero chamar muito a atenção. Ontem mesmo, eu estive com o Ministro Marcelo, Ministro da Infraestrutura, com toda a Diretoria do Dnit. E nós temos que trabalhar ainda, Presidente Contarato, para que esse ministério tenha recursos suficientes para manter as nossas estradas e até, se possível, melhorar a qualidade das nossas estradas.
Eu sou do Mato Grosso, nós somos do centro do Brasil, nós estamos no centro geodésico da América do Sul na nossa capital Cuiabá, em um estado extremamente produtor, exportador e importador - exportador de produtos agropecuários. Hoje, sem dúvida nenhuma, há fome, e é estratégica principalmente a produção de alimentos. Portanto, a segurança alimentar é extremamente importante, mas, para que nós possamos produzir mais, temos que ter realmente uma infraestrutura de logística viária.
Eu agradeço muito. Deixo um abraço a todos os que estão participando desta excelente audiência pública. E eu tenho certeza de que todos nós brasileiros vamos aprender muito após essa audiência.
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Muito obrigado, Sr. Presidente, felicidade e que Deus nos abençoe! E agradeço por ter se lembrado também do meu aniversário. Eu sempre digo, Senador Fabiano, que o voto é uma confiança que o eleitor deposita no político, e a melhor forma de a gente retribuir essa confiança é com trabalho, e é isso que estamos fazendo aqui.
Muito obrigado e felicidade a todos!
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES. Por videoconferência.) - Obrigado, meu querido Senador Wellington, parabéns novamente!
E, agora, eu vou conceder a palavra a uma pessoa que... Eu quero fazer um breve relato. No meu Estado do Espírito Santo, no Município de Mimoso do Sul, um crime de trânsito envolvendo dois caminhões, um carro e um micro-ônibus, resultou - na BR-101, sul do Estado do Espírito Santo - na morte de 11 pessoas; 9 eram integrantes de um grupo folclórico do Município de Domingos Martins, perto da capital, e 9 ficaram feridas, quer dizer, 11 mortos e 9 feridos. E, para representar essas famílias, eu concedo a palavra à Sra. Elvina de Carvalho Littig, representante das famílias do grupo folclórico alemão, lá de Domingos Martins, porque infelizmente essas pessoas perderam a vida e essa representante está aqui.
Com a palavra a Sra. Elvina de Carvalho Littig.
A SRA. ELVINA DE CARVALHO LITTIG (Para exposição de convidado. Por videoconferência.) - Bom dia, Fabiano!
Eu agradeço muito pela oportunidade. E, pelo que eu pude entender, eu sou representante da maioria da população, que infelizmente perdeu familiares nessa guerra que é o trânsito. Guerra, sim, Dr. Fabiano, porque, Senador, além da minha filha, há mais outras 11 pessoas mortas, como o senhor disse aí na sua fala, ao me apresentar. A minha filha morreu por... O rapaz não estava alcoolizado; o caminhão dele tinha mais de cem multas, mais de cem multas! Ele ultrapassou num lugar em que não poderia ter ultrapassado, numa curva. E a gente está lutando, Senador Fabiano, por justiça, justiça por esse crime! Foi um crime o que aconteceu com a minha filha.
Eu agradeço muito ao senhor. No primeiro ano... Esse acidente aconteceu no dia 10 de setembro de 2017 e, no primeiro ano, foi feita uma oração na praça de Domingos Martins; no segundo ano, foi feita uma carreata. Salvo engano, eu acho que o senhor estava presente nessa caminhada, nessa caminhada por justiça; justiça essa que, até hoje, não nos foi apresentada. E nós estamos lutando à nossa maneira.
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A gente confessa que está desanimado, mas parece que agora apareceu um novo ânimo para a gente chamado Fabiano Contarato, um anjo que apareceu, que parece que vai nos ajudar a fazer justiça por esses meninos, esses meninos que morreram tão jovens. O senhor vê aqui: o meu neto tinha dez anos - ele tinha -, este ano ele seria um adolescente. Foi tirado de mim, Contarato, o direito de comemorar o Dia das Mães com minha filha. Foi tirado de mim muita coisa, muita coisa mesmo. O meu dia começa pensando neles e termina pensando neles. E a gente está lutando, a gente pede, implora, implora para vocês ajudarem a gente a fazer justiça, porque, no primeiro ano, não foi feito o julgamento; no segundo, também; no terceiro e quarto, estão alegando a pandemia e tudo; e agora parece que eu não sei o que vai acontecer com a gente, sabe? Parece que agora foi falado que iria a júri popular, mas a gente não tem data, não tem nada. A gente está tentando fazer com que... E os culpados continuam soltos, prontos para fazerem mais vítima, mais vítima no trânsito. É isso que a gente não quer. Eles recorrem, a Justiça concede mais prazo.
Nós fomos para Mimoso do Sul - não sei dizer, salvo engano, foi em 2020 - e fizemos uma manifestação em frente ao fórum. Eu e mais alguns membros de outras famílias dos que morreram. Fomos lá e fizemos. A juíza atendeu a gente. Não sei se foi a juíza. Não me recordo se foi a juíza ou a promotora que nos atendeu e que conversou um pouco lá. Aí, logo a seguir, veio a pandemia. No ano seguinte, veio a pandemia, e aí travou tudo, porque, no Brasil, no mundo inteiro, travou tudo. Aí, então, a gente agora está esperando para ver se acontece alguma coisa para ajudar a gente a conscientizar essas pessoas, esses juízes, para ver se a gente consegue a justiça.
Fabiano, muito obrigada por você estar do nosso lado. Você não sabe a força que você dá para a gente. Você é um anjo que apareceu, você é um anjo que apareceu na vida dessas pessoas que tiveram a família destruída pelos acidentes no trânsito, coisa que a gente vê todos os dias na televisão. As pessoas precisam se conscientizar de que carro é uma arma também na mão de quem não sabe usar. O veículo é uma arma muito poderosa.
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Você veja, levaram 11 pessoas, Contarato; foram 11 pessoas que levaram. E foram 11 dias que nós esperamos para enterrar os nossos entes queridos, porque nós não tínhamos... Porque pegou fogo, teve um incêndio no ônibus, queimou, precisamos passar por exame de DNA no outro dia após o acidente. "Acidente", entre aspas, porque isso não foi acidente, não. Isso aí não foi acidente, foi imprudência do Wesley Rainha Cardoso, que foi o motorista do caminhão. Olhe, eu fico muito triste por todos os dias a gente ver na televisão vítimas de trânsito. Então, é muito importante o que você está fazendo para a gente. O que você está fazendo é conscientização no trânsito.
A Dra. Juliana falou aí agorinha sobre sequelas invisíveis, mas não são sequelas invisíveis, não; são sequelas visíveis. Olhe aqui a minha camisa. Olhe o meu rosto banhado de lágrimas pela minha filha e pelo meu neto. Isso aqui é uma sequela visível, Fabiano. Isso aqui é o resultado da imprudência de um cara irresponsável que pega um caminhão e da empresa também, que eu não vou dar o nome aqui, mas é...
O que aconteceu foi que caiu uma pedra em cima do micro-ônibus em que eles estavam, e a minha filha, o motorista e o meu neto foram os primeiros a morrer. A gente não tem perspectiva nenhuma de quando será esse julgamento. A gente queria mais ação por parte... Porque falação a gente já tem demais. Do que a gente precisa agora é de ação. A gente precisa de ação para ver o que vai acontecer com esses caras, gente. Essas pessoas não podem sair impunes.
Muito obrigada, Fabiano. Muito obrigada por essa oportunidade. Eu e as dez famílias atingidas agradecemos a você por tudo que você está tentando fazer por nós.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES. Por videoconferência.) - Obrigado, D. Elvina.
Quero deixar claro para a senhora que eu estive nessa caminhada em Domingos Martins. Eu já não fazia parte mais da delegacia de trânsito, mas essa é uma pauta que me toca muito, tanto é que o que me fez postular uma vaga no Senado foi a temática do trânsito, porque eu fico triste quando as pessoas não conseguem ter a empatia de se colocar na dor do outro. Essa dor que você muito bem relatou não é uma dor invisível, é uma dor que está estampada no seu rosto, estampada na sua vida. Eu fico muito triste quando eu vejo que quem pode fazer alguma coisa não está fazendo.
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Como eu explico para vocês, familiares, que um crime de trânsito dessa natureza, que matou 11 pessoas e vitimou mais 9, ocorreu em 2017 e até hoje não teve a primeira sentença? Veja que eu não estou falando nem que está sendo julgado pelo Tribunal de Justiça, que é segunda instância, nem pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça), nem pelo STF. Eu estou falando a primeira instância. O primeiro julgamento até hoje não foi feito.
Ruy Barbosa falava que justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta.
Então, essas famílias... A D. Elvina é um dos inúmeros, dos milhares exemplos, porque no Brasil essas estatísticas estão subdimensionadas. Na verdade, nós temos mais de 50 mil pessoas que morrem por ano, mais de 300 mil que ficam com sequelas irreparáveis. O Brasil é o terceiro país que mais mata no trânsito no mundo - no mundo! E nós banalizamos o principal bem jurídico que é a vida humana. Quando a senhora relata essa dor, eu imagino, eu tento me colocar na dor da senhora, mas só quem vive isso para retratar. Não tem como eu ter esse local de fala, por mais que eu tenha vivido a minha vida dentro do Detran, dentro do DML, dentro da Delegacia de Trânsito. Como que eu explico para uma mãe que perdeu uma filha e perdeu um neto, de quem foi retirado o direito de comemorar o dia do aniversário, o Natal, o Ano-Novo, o Dia das Mães, o Dia da Avó? Como se explica isso? Como que eu explico para a população que a nossa lei garante não a sensação, mas a certeza da impunidade, porque ninguém fica preso por crime de trânsito no país?
Nós políticos temos que fazer a nossa reflexão e dar uma resposta à população. Não é ser punitivista exacerbado, não, mas tratar igualmente os iguais na medida em que eles se desigualem, ou seja, dar tratamento uniforme a comportamento uniforme, mas eu não posso achar razoável que um motorista embriagado, seja pelo álcool ou qualquer substância de efeito psicoativo que determine dependência, ocasione a morte ou uma lesão corporal de natureza grave ou gravíssima e não fique um dia preso. Isso mudou agora com uma emenda minha, mas só depois da sentença condenatória, porque, antes disso, a todos os indiciados e acusados em geral serão assegurados o contraditório e a ampla defesa. Então, as pessoas não têm a percepção de que uma coisa é a prisão cautelar, que é aquela oriunda do auto de prisão em flagrante, do decreto de prisão preventiva, do decreto de prisão temporária, e outra é aquela prisão pena decorrente de uma sentença condenatória transitada em julgado. Então, apenas após a sentença condenatória transitada em julgado - com a emenda que eu fiz e que hoje é lei, no Código de Trânsito - é que não pode mais haver substituição quando o motorista matar ou lesionar estando em estado de embriaguez.
Agora, é muito triste! E é isso que me tocou, D. Elvina. E pode contar comigo, independentemente de qualquer coisa. Eu vou sair daqui de Brasília, eu quero voltar aí a Domingos Martins, vamos nos reunir com os familiares não só desse bárbaro crime de trânsito, mas com todas as famílias vítimas de acidente de trânsito.
Quero falar também que eu, antes de ser político, como delegado, consegui instituir o Dia em Memória das Vítimas de Acidentes de Trânsito, que é no primeiro domingo de agosto, de que o Detran sempre participa. Vamos fazer um grande movimento nesse dia, no domingo, em memória às vítimas de acidente de trânsito.
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E aí eu faço um apelo à Sheila e ao Luís Carlos, para mobilizarem em suas redes ou onde couber; à Juliana, para mobilizar lá na Psicologia; ao Marcos; à D. Elvina, com os familiares; ao Alysson, lá na Abramet: vamos nos contagiar, vamos fazer uma grande corrente, vamos nos unir, porque só assim nós vamos mudar esse triste quadro.
Eu lembro, D. Elvina, que, dos inúmeros crimes de trânsito que eu apurei, houve um em que uma mãe perdeu as duas filhas - as duas únicas filhas. Ela só tinha duas filhas, um motorista bêbado e sem habilitação matou as duas filhas. Todo dia aquela mãe ligava para mim, porque até hoje eu tenho aqui no meu celular. Se você pegar o meu celular pessoal, você vai ver aqui: Dete, mãe do Maycon; Emeri, pai do Gabriel; e, assim, sucessivamente com todas as vítimas fatais ou não fatais que estão aqui, porque essa é uma pauta para mim.
Eu amo ser policial, servidor público, e amo ser professor no curso de Direito, eu estou como Senador. Eu vim para cá com uma mola propulsora: o que me motivou foi alterar esse Código de Trânsito, em que, infelizmente, a único condenada é a família da vítima, que sofre pela dor da perda e pela certeza da impunidade. Então, vamos nos unir, vamos nos mobilizar, mas para isso é necessário que as famílias das vítimas também parem um pouco, com todo o respeito, de ficar chorando por seus filhos em casa e venham para as ruas. Vamos nos mobilizar, vamos pedir justiça, vamos chegar e vamos cobrar, vamos cobrar do Poder Judiciário, vamos cobrar do Ministério Público, porque não é razoável eu falar para uma família que, desde 2017, um crime de trânsito até hoje não teve a primeira sentença. Como eu explico isso para a D. Elvina? Como se explica isso para todas as milhares de vítimas? Isso é a certeza da impunidade, e nós não podemos permitir isso.
Então, naquilo que for de competência aqui do Senado Federal, mais uma vez, eu quero deixar claro que o nosso mandato está aberto. Por quê? O que me trouxe aqui foi a dor dessas famílias que, infelizmente, sofrem diuturnamente, perdendo seus pais, mães, avôs, tios, sobrinhos, netos, filhos, irmãos, irmãs, e, infelizmente, ninguém fica preso neste Brasil, porque o Congresso Nacional é elitista, é patrimonialista, banaliza a vida humana, não quer ver os filhos da classe média alta atrás das grades, porque, infelizmente, o Estado brasileiro criminaliza a pobreza, porque, infelizmente, quem está preso é pobre, preto e afrodescendente.
Eu fui utilizado pelo Estado por 27 anos só para agir com o rigor da lei contra pobres e pretos, quando os crimes de maior prejuízo são crimes praticados por políticos, porque, quando um político desvia verba da saúde, ele está matando milhões de pessoas, e a saúde pública está esse caos; quando um político desvia verba da educação, ele está matando o sonho de milhões de jovens e não pensa naquele morador lá da favela, cujo sonho daquele jovem ou daquela jovem é fazer um curso de Direito ou um curso de Medicina e que, se não for pelo sistema de cotas, ele não entra na universidade federal, pois não tem dinheiro para pagar. Hoje 80 milhões de brasileiros estão em situação de pobreza ou extrema pobreza, 30 milhões estão desempregados, subutilizados. Nós somos um dos primeiros países que mais matam no trânsito e ninguém fica preso.
Então, é necessário que nós não percamos a capacidade de indignação. Nós temos que nos unir, unir o setor público, o setor privado, a sociedade civil, a universidade, os movimentos sociais, os movimentos estudantis e falar que não queremos isso mais, queremos um Estado eficiente, que cumpra o art. 37 da Constituição Federal. São princípios que regem a administração pública: a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência. E é por essa eficiência que eu estou lutando aqui com toda a minha força, com saúde, com determinação para que nós possamos mudar essa triste realidade. Porque, quanto vale uma vida humana? Quanto vale uma perda de uma função locomotora? Eu tive casos de pais em que o filho ficou tetraplégico e que morava no terceiro andar de escada, em que a mãe e o pai tiveram que sair do emprego. E quem vai manter aquela família? Quem vai manter? E nós banalizamos isso tudo.
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Eu lembro que, quando eu era Delegado de Trânsito, as pessoas ficavam lá porque eu era rigoroso com motorista bêbado, apenas com bêbado que dirigia alcoolizado. Eu fixava R$10 mil de fiança. A lei, o Código de Processo Penal, me falava que eu tinha de um a cem salários mínimos. Eu falava: "R$10 mil. Se pagou, sai; se não pagou, vai para a cadeia. Aí eu quero ver". Entrava com medida cautelar - porque o Detran demora cinco anos para suspender uma carteira -, e a Justiça determinava a suspensão cautelar da CNH. E quem não tinha habilitação? Entrava com medida cautelar para impedir que ela tirasse. Aí, sim, representei a todos os ministérios públicos do estado e dos municípios para entrar com uma ação de improbidade contra as secretarias de escola que não implementassem educação para o trânsito, conforme determina o art. 76. Aspas: "A educação para o trânsito será promovida nas escolas de ensino fundamental, médio e superior". Então, se o Estado não educa, se o Estado não fiscaliza e se a legislação é falha, nós vamos ter que continuar ostentando a terceira colocação em nível mundial em crimes de trânsito.
Agora, além dessa morte real lá que a D. Elvina está sentindo, existem outras mortes para as quais o Estado faz vistas grossas, que são essas mortes que doem tanto quanto a morte real. Quem vai mensurar essa tortura emocional e psicológica que D. Elvina e tantas famílias sofrem diuturnamente? Então, é preciso que nós tenhamos essa percepção.
Agora, eu faço um apelo: minha gente, ser cidadão não é apenas viver em sociedade, mas é transformar essa sociedade. Volto a falar: se as famílias das vítimas ficarem em casa, enlutadas, chorando a morte dos seus entes queridos, nada vai mudar. Você tem que sair e pedir, participar, cobrar do Detran, cobrar da polícia, cobrar do Ministério Público, do Poder Judiciário, cobrar do seu Parlamentar, do seu Vereador, do seu Prefeito, do seu Deputado Estadual, do seu Deputado Federal, do seu Senador, do seu Governador, do seu Presidente da República, mas você tem que cobrar, porque todo poder emana do povo e deve ser exercido pelos seus representantes legitimamente eleitos.
Agora, eu não me furto em dizer que este Congresso é elitista. Este Congresso banaliza a vida humana. Basta você verificar a composição do Congresso Nacional, a grande maioria: homens, brancos, ricos, engravatados, decidindo a vida de milhões de pobres. Nós tínhamos que ter uma representatividade maior das mulheres, da população quilombola, dos índios, da população LGBTQIA+, das pessoas com deficiência, dos pretos, dos pardos. Infelizmente, não é essa a realidade.
Vocês me perdoem o desabafo, mas eu não tenho como mensurar uma dor de uma mãe como a de D. Elvina, que eu presenciei dez anos dentro do DML quando aquela mãe que perdeu as duas únicas filhas toda semana ia à delegacia e falava: "Dr. Fabiano, eu perdi minhas filhas. Eu sonho em ver minhas filhas e sonho para esse dia chegar logo".
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É muito ruim ouvir isso, muito ruim ouvir uma mãe que já não tem mais sentido na vida por ter perdido tudo que era a vida dela. Por isso que eu dei meu nome para que a população capixaba pudesse avaliar, para estar aqui hoje, para lutar para mudar essa triste realidade, porque eu aprendi que o principal bem jurídico que tem que ser protegido pelo Estado brasileiro é a vida humana, o respeito à integridade física e à saúde, e esse bem jurídico está sendo violado diuturnamente, com a digital do Estado brasileiro.
Nesse momento, concedo a palavra ao Sr. Marcos Paulo Silva Duarte, Presidente da Federação Espírito Santense de Ciclismo. (Pausa.)
Por gentileza, habilite o som.
O SR. MARCOS PAULO SILVA DUARTE (Por videoconferência.) - Agora foi?
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES. Por videoconferência.) - Perfeito.
O SR. MARCOS PAULO SILVA DUARTE (Para exposição de convidado. Por videoconferência.) - Bom dia a todas as pessoas presentes. Eu gostaria de agradecer ao Exmo. Sr. Senador Fabiano Contarato, o qual estimo bastante, sou fã do seu trabalho. Fui aluno do Prof. Fabiano Contarato, e é uma grande honra estar presente aqui com diversas pessoas com nobres conhecimentos.
Também gostaria aqui de mencionar... Infelizmente, a dor da D. Elvina é muito difícil. Iniciar uma fala depois de uma fala tão emocionada... A gente realmente, de fato, não consegue sentir a dor dela, mas a gente consegue sentir a energia. Eu, como Presidente da Federação de Ciclismo há dois anos, mas presente no ciclismo há mais de 15, como atleta e também como diretor, estive presente e vi diversas vítimas do trânsito. Vou mencionar alguns nomes aqui: por exemplo, o Danilo Simões, uma pessoa muito querida, que infelizmente teve a vida ceifada por um motorista alcoolizado no outro lado da via, e foi realmente uma imagem muito chocante, vê-lo debruçado, a parte do corpo dele, da cintura para baixo, para fora da caminhonete na página do jornal; e outros membros, outras pessoas, como, infelizmente, há pouco tempo, o Pepê, que era uma pessoa maravilhosa, que foi atropelada por um condutor de ônibus; e também, infelizmente, um que ficou paraplégico, que é o Fábio Mengali, estive presente também na residência dele.
A partir do momento em que eu me tornei Presidente da federação, de imediato nós criamos a Comissão de Segurança para o Ciclista, onde todos os ciclistas, de diversas formas de ciclismo... A gente fala "formas" para tentar simplificar o debate, são ciclistas que utilizam bicicletas como meio de transporte, são ciclistas urbanos, ciclistas esportistas, os ciclistas desportistas que utilizam as BRs, as ESs, ou seja, rodovias para fazerem seus treinamentos. Então, a gente de fato criou essa comissão para dar voz e discutir com os órgãos melhorias na capacidade do tráfego de ciclistas.
A gente sofre muito com a questão de educação para o trânsito. Eu vi no início do debate aqui a fala da falta, do não respeito ao art. 76, questão da educação de base, educação no ensino superior, e também, o que não foi infelizmente mencionado no debate, a questão de capacitação nos centros de formação dos condutores e também no Sest Senat, porque muitos dos acidentes envolvendo os ciclistas são ocasionados por condutores de veículos pesados.
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A gente já viu algumas ações. Por exemplo, uma ação talvez reconhecida pelos senhores, que é, no caso, quando se coloca um motorista de veículo pesado em cima da bicicleta presa num suporte, o conhecido rolo de treino, e o veículo passa ao lado, bem próximo, bem rente àquele condutor, e ele sente aquela pressão que o ciclista sente, não na mesma capacidade, considerando que o ciclista, estando na via, não tem um tipo de suporte, ou seja, ele conta com o próprio equilíbrio. Então, naturalmente, acontece, inclusive, de haver sucção, de puxar aquele ciclista para debaixo do veículo.
Então, dentro dessa Comissão de Segurança, a gente luta para diminuir a velocidade das vias. A gente tem feito parceria com diversos órgãos, inclusive com o Detran do Espírito Santo, ultimamente, na campanha da Semana Nacional do Trânsito, nós ajudamos a Labfar. Foi muito bacana. O Detran realmente tem feito um trabalho que a gente tem muito a agradecer por essa oportunidade de estar junto com eles, trabalhando essa questão de educação para o trânsito.
Mas é fundamental também diminuir a velocidade das vias e também melhorar a infraestrutura de trânsito, principalmente a infraestrutura cicloviária. A gente vê que houve alteração no Código de Trânsito, como parar em uma ciclovia, por exemplo, se tornou multa gravíssima, mas, na realidade, além de a gente ter a nossa infraestrutura invadida pelos veículos automotores, a gente sofre também com a falta de uma infraestrutura decente, ou seja, muitos buracos, até mesmo postes dentro de ciclovia. Então, isso coloca realmente em risco o nosso maior bem, a nossa vida humana.
No início da fala, no início da sessão, o Senador Contarato falou sobre a questão de blitz, ou seja, o motorista deveria sair de casa com o entendimento de que ele cairia em uma blitz para, no caso, ser checado ali. A gente vê que, infelizmente, falta não só a blitz, agentes fiscalizadores, mas também faltam agentes orientadores.
Eu participei, eu trabalhei, durante quatro anos, na Gerência de Educação para o Trânsito da Prefeitura de Vitória. Diante de algumas ações, a gente fazia algumas blitze educativas. Porém, a gente entendia que aquelas blitze educativas eram o mesmo que enxugar gelo, porque a gente não vê - voltando àquela questão acadêmica - nas escolas de ensino médio, de ensino fundamental até mesmo uma orientação dos próprios ciclistas, que se colocam em posição de vulnerabilidade e acabam também sendo agentes ocasionadores de acidentes diante dos pedestres, até mesmo porque nós também, ciclistas, precisamos cuidar dos pedestres.
Porém, diante das parcerias que a gente tem buscado junto à Comissão de Segurança - na última agora, por exemplo, nós firmamos uma parceria com a Polícia Rodoviária Federal daqui do estado, com a Polícia Militar -, a gente tem feito, junto aos ciclistas, palestras para mostrar onde eles estão errando e onde também os condutores estão errando, buscando orientar, de fato, as pessoas. O principal disso tudo é humanizar o trânsito, é ter, realmente, empatia, buscar medidas dentro da legislação para que os ciclistas possam, de fato, trafegar com segurança.
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Realmente, infelizmente, nós somos nada mais do que um obstáculo na via. Os condutores veem a gente como um obstáculo. Eu vejo isso, por exemplo, na fala, infelizmente, sobre o triste falecimento do nobre amigo PT, que era um grande amigo, um grande incentivador, nos passeios ciclísticos, de pessoas iniciantes. Infelizmente, eu estive no local e presenciei a fala do condutor para a imprensa. Falou que, infelizmente, ele estava no lugar errado, quando o Código de Trânsito diz que, na falta de infraestrutura cicloviária, o ciclista deve trafegar no bordo lateral da pista, justamente onde ele estava.
Então, é muito triste a gente ver essas situações como a da D. Elvina. Sinceramente, eu não sei mensurar a dor dela, como a dor de outros colegas: da Stael, que é esposa do Danilo, com quem estou constantemente conversando; com a com a irmã do Fábio, que está aí brigando. O Fábio, infelizmente, foi atropelado por um motorista alcoolizado. Ele tinha acabado de gastar cinco mil reais... Passou a noite numa boate, gastou cinco mil reais. Era filho de um Procurador de Justiça. Posteriormente, ele foi preso por estar cometendo rachas. Então, são situações tristes que envolvem essa questão da nossa participação no trânsito.
E a nossa luta é para a gente deixar de ser um obstáculo na via, para as normas de trânsito, as leis de trânsito serem respeitadas.
A gente pede a compreensão do Senador Fabiano Contarato e do Senador Wellington Fagundes, a quem, inclusive, parabenizo pelo seu dia, e agradece por estarem lutando pela gente. Não só... Eu sei que aqui, neste momento, a gente está falando de todas as vítimas de trânsito, mas para também terem um olhar especial para os ciclistas. Infelizmente, a gente sofre bastante pela falta de educação, falta de infraestrutura, falta de conhecimento tanto dos condutores como, até mesmo, também, dos ciclistas, pela falta de educação de base. Muitos ciclistas se colocam em posição de vulnerabilidade, se colocam numa posição de andar em contramão da via.
Também, dentro do contexto não de obrigatoriedade, mas de itens de segurança, a gente não vê, por exemplo, na legislação, algo que... Assim, sobre capacete para o ciclista, o Código de Trânsito não tem sequer uma orientação. A gente vê, por exemplo, que, quanto ao retrovisor na bicicleta, muito se discute, e dizem que, realmente, aquilo, de fato, em vez de ajudar, acaba atrapalhando. Então, é preciso discutir normas para que a gente possa, de fato, estar seguro na via. Há uma frase que a gente ouve de todos os ciclistas: "Eu estou saindo de casa; será que eu vou voltar?". Então, é uma reflexão que a gente tem que, de fato, fazer. Ou seja, de fato, a gente está cuidando dos ciclistas?
A gente tem colocado, por exemplo, nas rodovias estaduais e federais, aquele mencionado art. 58, que diz que o veículo precisa passar a um 1,5m de distância da bicicleta? Porque ali não é a bicicleta que é importante, é a vida da pessoa. Então é uma reflexão que eu faço para todos aqui. Eu sei que, repetindo, aqui a gente está discutindo sobre diversas vítimas de trânsito de diversas áreas, mas a gente pede também um olhar especial para os ciclistas. A gente tem sofrido bastante. E a gente tem ciclistas que utilizam bicicleta para o meio de sustento, para caminhar para o trabalho, para o esporte, que é bom para a saúde, para o atleta, para o desportista... Por exemplo, nós temos aqui, no Espírito Santo, uma ciclista - hoje ela não é mais atleta - que foi campeã brasileira, a Ana Paula, que foi atropelada numa BR aqui, ou seja, ela estava treinando para o campeonato brasileiro e ela foi atropelada. Ela foi jogada no meio do mato, quase que ela teve a vida dela ceifada. Então, é essa a reflexão que a gente pede em nome de todos os ciclistas.
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Olha a situação, que iniciou, inclusive, esse debate, da Luísa, ou seja, da motorista totalmente embriagada. A gente via, nas redes sociais, em todos os jornais, a fala daquela condutora. Infelizmente, a gente sentiu ali junto com aquelas vítimas de trânsito, naquele momento do ato em homenagem àquela vítima, todas aquelas pessoas que perderam seus entes queridos.
Então, é realmente, de fato, aqui um apelo para que, no caso, as nossas vidas sejam realmente respeitadas.
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES. Por videoconferência.) - Muito obrigado, querido Marcos Paulo.
Estamos encaminhando para o final dessa sessão. Eu mais uma vez quero agradecer o comparecimento de todos os convidados e reafirmar aqui o meu comprometimento com essa pauta. Coloco o nosso gabinete à disposição de todos vocês, tanto no Espírito Santo como aqui em Brasília.
Quero agradecer a participação das pessoas que fizeram as suas contribuições no Portal e-Cidadania. Faço aqui o registro do Luiz Sérgio, do Espírito Santo; da Maria Cecília, do Rio Grande do Norte; do Douglas Henrique, de São Paulo; do Marcos Aurélio, do Distrito Federal; do Weslley Barreto, do Rio de Janeiro; da Luciane, do Espírito Santo; da Regiane Severini, da Bahia; do Guilherme Gilson, de São Paulo; e Hermes Corrêa, do Pará. E, tendo em vista o adiantado da hora aqui para a sessão, essas perguntas serão encaminhadas a todos os participantes para que, na medida do possível, respondam e nós possamos devolver a importante contribuição desses brasileiros e brasileiras.
Quero também fazer um apelo para que entrem na minha página do Senado, como Senador, ou nas minhas redes sociais, no Instagram - não importa -, porque muitos projetos de lei... Eu lembro que eu aprovei um projeto de lei do trânsito que foi oriundo de uma pessoa que entrou no Direct do meu Instagram e me mandou uma mensagem sugerindo uma ideia que eu achei fantástica. Liguei depois para ele daqui de Brasília e agradeci. E coloquei, inclusive, na justificação, que o que motivou a elaboração daquele projeto de lei foi uma iniciativa feita por um brasileiro ou uma brasileira. Então, por favor, se você que está nos acompanhando tiver alguma ideia para melhorar, para, de alguma forma, mitigar os danos dos crimes de trânsito, o nosso mandato está à disposição.
Antes de encerrar, eu quero também aqui agradecer ao querido Muller Medeiros, que está aqui nos auxiliando, ao Anderson, à Renata, ao Cidelcino, ao Jaerson, ao Márcio, ao Prodasen, Alessandro Pereira, ao Sóstenes, ao Vinícius, à TV Senado, ao Erasmo, ao Ribamar, Francisco Cosmo, Edilson... É claro que agradeço a toda a direção, ao Presidente Rodrigo Pacheco, ao Diretor do Prodasen, à direção, à minha equipe - faço aqui um registro especial -, nas pessoas da Regina, da Vanessa e da Lisandra, minha chefe de gabinete, enfim a toda a minha equipe. Sem eles, sem vocês, nada disso seria possível.
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Muito obrigado! Muito obrigado!
Quero, num curto espaço de tempo, marcar um encontro presencial com todos vocês, para que nós possamos tomar um café e trocar ideias, para contribuir para a construção de um Estado muito mais seguro no trânsito, para preservar o principal bem jurídico, que é a vida humana.
Cumprida a finalidade desta sessão remota de debates temáticos, a Presidência declara o seu encerramento.
Muito obrigado.
(Levanta-se a sessão às 11 horas e 21 minutos.)