4ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA
56ª LEGISLATURA
Em 13 de setembro de 2022
(terça-feira)
Às 9 horas
93ª SESSÃO
(Sessão de Debates Temáticos)

Oradores
Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES. Fala da Presidência.) - Declaro aberta a sessão.
Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos.
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A presente sessão semipresencial de debates temáticos foi convocada, nos termos do Ato da Comissão Diretora nº 8, de 2021, que regulamenta o funcionamento das sessões e reuniões remotas e semipresenciais no Senado Federal e a utilização do Sistema de Deliberação Remota, em atendimento ao Requerimento nº 650, de 2022, de autoria desta Presidência e de outros Senadores, aprovado pelo Plenário do Senado Federal.
Esta Presidência informa que os cidadãos podem participar desta sessão de debates temáticos através do endereço www.senado.leg.br/ecidadania. É esse serviço que propicia que as pessoas entrem, aqui na audiência, conosco - ou também pelo telefone 0800 0612211.
A Presidência informa ainda que as apresentações e os arquivos exibidos durante esta sessão ficarão disponibilizados na página do Senado Federal referente à tramitação do requerimento que originou esta sessão.
A sessão é destinada a receber os seguintes convidados, a fim de “discutir o cumprimento das metas da NDC brasileira pactuada na COP 26 e os desafios e propostas do Brasil para a COP 27”:
- Sra. Caroline Prolo, Advogada Especialista em Mudanças Climáticas e Diretora Executiva da LACLIMA, organização de juristas dedicados ao desenvolvimento do direito das mudanças climáticas na América Latina;
- Minha querida Sra. Mônica Sodré, Diretora na Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps), de que com muito orgulho eu faço parte, muito obrigado, mais uma vez, por estar aqui;
- Sr. Diosmar Filho, Professor e Coordenador Acadêmico da Pós-Graduação de Ensino a Distância, em Estado e Direito dos Povos e Comunidades Tradicionais, da Superintendência de Educação a Distância e Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (UFBA);
- Sr. Tasso Azevedo, Engenheiro Florestal, Consultor e Empreendedor Social em Sustentabilidade, Floresta e Clima, Coordenador do Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima e do Projeto de Mapeamento Anual da Cobertura e Uso do Solo no Brasil (MapBiomas);
- Sra. Marina Marçal, Coordenadora do Portfólio de Política Climática do Instituto Clima e Sociedade (ICS);
- Sra. Leta Vieira, Gerente Técnica da América do Sul na organização Governos Locais pela Sustentabilidade (ICLEI);
- Sr. Juliano Bueno, Diretor Técnico do Observatório do Petróleo e Gás e do Instituto Internacional Arayara;
- Sr. Sergio Xavier, Consultor do Centro Brasil no Clima (CBC);
- Sra. Renata Potenza, Coordenadora de Projetos da Iniciativa Clima e Cadeias Agropecuárias no Imaflora;
- Sra. Viviane Romeiro, Assessora Técnica do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds);
- Sra. Priscila Matta, Gerente de Sustentabilidade da Natura;
- Sr. Alexandre Prado, Diretor de Economia Verde do WWF-Brasil; e
- Sra. Natalie Unterstell, Presidente do Instituto Talanoa e Membro do Painel de Acreditação do Green Climate Fund.
Quero agradecer a presença de alunos da faculdade UDF que estão aqui no Plenário, uma faculdade por que eu tenho um carinho muito grande, na qual eu fiz um semestre no curso de Psicologia. Por circunstâncias alheias à minha vontade, da minha correria, eu optei por outro caminho e hoje estou na Filosofia. Muito obrigado e um beijo carinhoso para a UDF.
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É sempre muito bom ver a comunidade acadêmica nesses espaços, que têm que ser ocupados. Eu acho que passou da hora de a política abrir isso cada vez mais à participação da população como um todo, da comunidade científica, do meio acadêmico. Eu fico muito feliz, porque sou professor no curso de Direito há 24 anos, lecionando Direito Penal e Processo Penal, e fazer parte de estimular a transformação através desses jovens que ingressam num curso de graduação e, depois, na pós-graduação lato sensu ou stricto sensu é de fundamental importância.
Muito obrigado aos queridos alunos da UDF por estarem aqui no Plenário. E, como sempre, gosto de citar Irene no Céu: entrem, vocês não precisam pedir licença. A Casa é de vocês.
A Presidência informa ao Plenário que serão adotados os seguintes procedimentos para o andamento da sessão: será inicialmente dada a palavra aos convidados, por oito minutos; após, será aberta a fase de interpelação pelos Senadores inscritos, organizados em blocos, dispondo cada Senador de cinco minutos para suas perguntas; os convidados disporão de três minutos para responder à totalidade das questões do bloco; os Senadores terão dois minutos para a réplica.
As inscrições dos Senadores presentes remotamente serão feitas através do sistema remoto.
As mãos serão abaixadas no sistema remoto, e neste momento estão abertas as inscrições.
Convido para compor a primeira mesa os seguintes convidados: Sr. Diosmar Filho, Professor e Coordenador Acadêmico da Pós-Graduação de Ensino a Distância, em Estado e Direito dos Povos e Comunidades Tradicionais, da Superintendência de Educação a Distância e Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (UFBA); Sra. Marina Marçal, Coordenadora do Portfólio de Política Climática do Instituto Clima e Sociedade (ICS); Sra. Viviane Romeiro, Assessora Técnica do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds); Sra. Caroline Prolo, Advogada especialista em mudanças climáticas e Diretora Executiva da LACLIMA, organização de juristas dedicados ao desenvolvimento do direito das mudanças climáticas na América Latina - pelo sistema remoto; Sr. Tasso Azevedo, Engenheiro Florestal, Consultor e Empreendedor Social em Sustentabilidade, Floresta e Clima, Coordenador do Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima e do Projeto de Mapeamento Anual da Cobertura e Uso do Solo no Brasil (MapBiomas); e Sr. Juliano Bueno, Diretor Técnico do Observatório do Petróleo e Gás e do Instituto Internacional Arayara.
Comunico que o Sr. Tasso Azevedo e a Sra. Marina Marçal terão participação pelo sistema remoto.
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Senhoras e senhores, meus queridos aqui presentes, desde 2019, quando iniciamos o mandato, ocupando a Presidência da Comissão de Meio Ambiente do Senado Federal, acompanhamos e exercemos a fiscalização da política ambiental brasileira. Desde então, procuramos fortalecer o nosso compromisso social com a pauta do meio ambiente e dos povos tradicionais, por entender que defender o meio ambiente é defender toda e qualquer forma de vida que há por vir, como uma garantia constitucional expressa no art. 225, mas também como um direito humano essencial.
Neste contexto, a avaliação das medidas adotadas pelo Governo, com vistas ao cumprimento das metas assumidas no Acordo de Paris, assumiu relevo natural, pois sancionada por uma das atribuições e competências mais importantes do Poder Legislativo: a fiscalização dos atos do Poder Executivo. Acompanhamos, assim, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas 2019 (COP 25), em Madri, na Espanha, e a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2021 (COP 26), realizada em Glasgow, no Reino Unido.
Agora, damos sequência a este trabalho com os preparativos para a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2022, conhecida como COP 27, a ser realizada no Egito, em novembro deste ano, avaliando os desafios e propostas do Brasil com a discussão do cumprimento das metas das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC) pactuadas na conferência anterior, de 2020, a COP 26.
O propósito desta sessão temática é reunir subsídios para serem debatidos na próxima conferência, a COP 27. Acreditamos que esse formato, uma sessão temática reunindo especialistas e cientistas da área, seja o mais adequado, pois poderemos contar com o olhar diferenciado da ciência - tão atacada nos últimos tempos -, seguramente o mais preparado a oferecer visão mais clara do estado da arte de uma área caracterizada por densa produção científica e inovações tecnológicas de ponta. Da mesma forma que a ciência ofereceu a solução para superarmos a epidemia da covid, ela poderá oferecer o melhor diagnóstico da situação atual, bem como sugerir e apontar as soluções mais adequadas para a preservação do meio ambiente.
Quero aqui fazer o alerta de que está sendo exibida simultaneamente, aqui no painel do Senado, a quantidade de árvores derrubadas atualmente na Floresta Amazônica. Então, basta acompanhar ali, e você vai verificar os números, que são alarmantes.
A NDC brasileira pactuada na COP 26 ratificou forte retrocesso na política ambiental brasileira, com frustração das metas apresentadas, descrição vaga e imprecisa dos meios para se chegar às metas propostas e clara ausência de indicadores que atestassem o seu cumprimento.
A estratégia do Governo veio em linha com a sua orientação para o desmonte das estruturas de fiscalização e de governança e o desmantelamento das políticas públicas para o meio ambiente, ou seja, consiste em dourar a pílula, em face das pressões internacionais, que passaram a afetar desfavoravelmente os interesses geopolíticos brasileiros, ameaçando, inclusive, mercados tradicionais das exportações de commodities nacionais e negociações internacionais importantes, como o ingresso do Brasil na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
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Não posso deixar de ressaltar que o atual Presidente da República tornou o Brasil um país inimigo do esforço global contra as mudanças climáticas e pela preservação das florestas e do respeito aos povos indígenas. Tudo que o Governo fez desde sua posse representa um forte ataque às políticas de proteção socioambiental. É preciso dizer isso. É preciso sempre estar falando isso. A sabedoria às vezes está na repetição, porque contra fatos não há argumentos - contra fatos não há argumentos! O ataque que este Governo faz à pauta ambiental é sistemático. Eu não me canso de falar isso; quem me conhece já sabe disto: acaba com a Secretaria de Mudanças Climáticas, com o plano de combate ao desmatamento, com o Departamento de Educação Ambiental; criminaliza ONGs, reduz a participação da sociedade civil, prolifera autorização de agrotóxicos, quer autorizar extração de minério interno indígena, arma grileiro, enfraquece os órgãos de fiscalização. Isso tem que ser dito porque são fatos! Eu não me canso de... E me perdoem o desabafo.
Eu fui Relator de um projeto de lei, na Comissão de Meio Ambiente, em que um Senador queria acabar com o porte de armas para os funcionários do Ibama e do ICMBio. Quer dizer, eles estão jogados à própria sorte, na Amazônia. O Governo tem uma política armamentista para armar grileiro e enfraquece os órgãos de fiscalização. Isso tem que ser dito. Isso não é ideologia política, de forma alguma. Esses são fatos. Quando ele acaba com o Departamento de Educação Ambiental, com o plano de combate ao desmatamento, quando ele reduz a participação da sociedade civil, quando ele criminaliza ONGs, são fatos.
Tudo que o Governo fez desde sua posse representa um forte ataque às políticas de proteção socioambiental. Para isso, priorizou matérias, no Congresso Nacional, que são verdadeiros retrocessos. Estão aqui fatos; fatos! Estou me referindo ao PL 2.159 - licenciamento ambiental; PLs 2.633 e 510 - grilagem; 490 - marco temporal; 191 - garimpo em terra indígena; PL 1459 - pacote do veneno. Aqui, vale ressaltar que desde 2019, início deste Governo, já foram liberados mais de 2 mil registros de agrotóxicos. Esse número equivale a cerca de 40% do total de produtos liberados nos últimos 22 anos. Cerca de 30% dos produtos que utilizamos em nossa agricultura são proibidos em outros países. E o PL 1.293/21 - conhecido como PL do autocontrole, que retira do Estado e passa para as empresas a fiscalização agropecuária.
O desmatamento, em todos os biomas, segue avançando em ritmo alarmante. Na Amazônia, 2021 alcançou a maior taxa de desmatamento dos últimos 15 anos. Nestes primeiros dias de setembro, tivemos novo recorde de focos de fogo no bioma, cuja fumaça, produto das queimadas, chegou, mais uma vez, a cidades de diferentes regiões do Brasil.
O Cerrado, berço das nascentes de oito das nossas principais bacias hidrográficas, também vem sendo ameaçado. Estudo liderado por pesquisadores da Universidade de Brasília aponta que a conversão de áreas nativas do Cerrado para pastagens e agricultura já tornou o clima na região quase 1°C mais quente e 10% mais seco. Isso sem contar com os efeitos das mudanças climáticas em nível global, que poderá deixar o cenário ainda pior.
Não é possível, porém, tapar o sol com a peneira. Hoje, teremos oportunidade de debater índices de desmatamento, de ocorrência de queimadas e de eventos climáticos extremos e de seus impactos, indicadores de variação climática, dados sobre invasões de terras indígenas, quilombolas e públicas, marcadores de contaminação de rios, de nascentes e de redução de espelhos-d'água, estimativas de atos de violência e de homicídio dos povos tradicionais e de profissionais envolvidos com a questão ambiental, entre outros.
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Devemos debater as oportunidades que se abrem para o Brasil na exploração da floresta em pé. O desenvolvimento de uma agricultura de baixo carbono e de fontes alternativas de energia verde, a regulamentação do mercado de carbono e a expansão da bioeconomia sugerem potencialidades econômicas extremamente positivas para que possamos ser uma das maiores potências da exploração do meio ambiente por meio da sua preservação.
É preciso zelar pela preservação do meio ambiente e pela conservação dos povos tradicionais.
Com esse apelo, declaro aberta esta sessão temática.
Era o que tinha a dizer.
Muito obrigado.
Excelente dia para todos nós.
Concedo a palavra ao convidado Sr. Diosmar Filho, Professor e Coordenador Acadêmico da Pós-Graduação de Ensino a Distância em Estado e Direito dos Povos e Comunidades Tradicionais da Superintendência de Educação a Distância e Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (UFBA), por oito minutos.
Muito obrigado, Professor, por sua colaboração e por seu comparecimento.
O SR. DIOSMAR FILHO (Para exposição de convidado.) - Bom dia a todos os presentes.
Eu queria muito agradecer ao Senador Fabiano Contarato por este momento, este encontro aqui com esta agenda tão importante.
E queria agradecer, saudando-os, a todos que estão aqui presentes, às companheiras e aos companheiros que estão online neste momento e a todos que estão assistindo.
Eu gostaria aqui de agradecer muito a saudação e a minha apresentação com a Universidade Federal da Bahia, na qual fui Professor, Coordenador Acadêmico da Especialização e também mestre, formado na universidade, mas hoje estou aqui como pesquisador associado à Associação de Pesquisa Iyaleta - Pesquisa, Ciências e Humanidades, cuja sede é na cidade de Salvador.
Nossa missão aqui é se integrar a essa rede de organizações que estão em uma luta pela preservação do planeta, mas, para se preservar o planeta, a gente vai precisar fazer debates como este que vai ter na COP 27, no Egito, em que a agenda que a gente está defendendo e levando com força tem a ver com adaptação, perdas e danos. Pensar em adaptação, perdas e danos, Senador e Senadoras presentes e todos aqui, está relacionado a esta apresentação que o senhor nos fez sobre pensar degradação ambiental, pensar aquilo que é desertificação, pensar que é impacto de longo alcance, pensar o que é o Cerrado passar hoje por uma savanização, assim como a Amazônia.
Nós, enquanto Associação de Pesquisa Iyaleta, estamos, desde 2020, com um estudo sobre as nove capitais da Amazônia Legal, estudando sobre desigualdade e impactos das mudanças climáticas, entendendo que o que está acontecendo no território brasileiro, somente na escala dos municípios, é a gente trabalhar com uma política chamada de planos diretores, que está na política do Plano Nacional de Adaptação, mas uma política de plano diretor de verticalização e de segregação urbana, em que a gente não está conseguindo fazer projetos e ações que linquem mudanças climáticas com aquilo que são os compromissos do Estatuto da Cidade, aprovado em 2001, no Brasil. Então, a gente fala que, 20 anos depois do Estatuto da Cidade, nós estamos vivendo aquilo que é a verticalização e a segregação urbana. Os planos diretores não respondem à agenda que foi discutida em Glasgow, em 2021, na COP 26; àquilo em que estão as negociações de Bonn que aconteceram agora na Alemanha para os documentos que vão ser aprovados na COP 27; e àquilo que é pensar o que é impacto de perdas e danos.
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O que é impacto de perdas e danos? Como isso está afetando a vida das pessoas nos territórios? Como isso afeta a vida dos povos indígenas e das comunidades quilombolas?
Quanto ao território brasileiro, Senador, a gente falou de várias leis aqui, mas o Brasil abandonou o Plano Nacional de Adaptação. Não se fala nem do Plano Nacional de Adaptação. Nós temos áreas no Nordeste brasileiro, o Semiárido, que, quando a gente pensa em perdas e danos, desertificação faz parte da agenda do território brasileiro. Nós temos um Semiárido, nós temos Caatinga e do Plano Nacional de Adaptação não se fala mais, daquilo que é referente à desertificação.
Desertificação: nós temos que a maior parte das comunidades quilombolas hoje certificadas no Brasil está no Semiárido, está nas áreas que a gente chama de áreas que estão delimitadas como área suscetível à desertificação. E a gente precisa tocar nessa agenda para consorciar a transição justa de uma energia renovável, que é a energia eólica, com as áreas suscetíveis à desertificação. Mas a gente tem desafios, a gente tem desafios que é pensar a adaptação. Adaptação em áreas urbanas é você trabalhar com planos de mudanças climáticas e com uma relação direta com os planos diretores, onde moradia seja capaz de responder àquilo que são as metas do Brasil.
As ambições do Brasil foram reduzidas, não é? Nós estamos indo para uma COP bem já relatada, onde nossas ambições para 2025 e as metas para 2030 foram reduzidas. Para você trabalhar com avanço de medida de perdas e danos que não impacte a saúde, o saber indígena, o patrimônio cultural, a juventude, os territórios e que reduza e tenha preocupação com o aumento do nível do mar, você precisa de perdas e danos com ambições maiores. A gente precisa de ambições de NDCs maiores do que essas que então aí. Nós precisamos de um governo comprometido. E aí não é só o Governo Federal; também convocamos os governos estaduais e convocamos os 5,7 mil municípios deste país para se preocuparem com os impactos das mudanças climáticas.
Nós temos chuvas, nós vivemos um cenário, entre o final de 2021 e até junho deste ano, no Nordeste brasileiro, dos impactos das chuvas. Nós contamos os números, falamos de economia, o dinheiro apareceu para resolver os impactos das chuvas que aconteceram naquele momento, mas não temos políticas para falar em adaptação, financiamento público e privado para adaptar. Nós precisamos avançar na agenda de adaptação no Brasil. Nós precisamos da agenda de médio/longo prazo para a política climática no Brasil. É algo em que não estamos trabalhando, e precisamos de Governo no seu pacto federativo: União, estados e municípios trabalhando forte.
O Governo atual abandonou a agenda ambiental e política brasileira, e a gente está tratando aqui, como o Sr. Relator... A palavra certa é aquilo que o Senador Abdias do Nascimento já falou nesta Casa: genocídio é o que a gente está vivendo. Nós estamos falando de genocídio. Foi o que o nosso ancestral, que esteve aqui neste Plenário, Abdias do Nascimento, relatou e trouxe em 1978 no seu livro O Genocídio do Negro Brasileiro. Ele já anunciava isso aqui. E, no que a gente está vivendo, com a agenda climática, se a gente não tomá-la, enquanto sociedade, enquanto Estado, como responsabilidade do Estado brasileiro, nós vamos viver genocídio. Esse é um ciclo histórico do Brasil que se repete e não se abandona.
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Quando nós falamos de NDCs...
(Soa a campainha.)
O SR. DIOSMAR FILHO - Chegou meu tempo, não é?
Só para concluir, por favor, Senador.
Quando falamos de NDCs, nós estamos falando de metas e ambições para 56% da população brasileira. Isso significa a população negra. Nós não podemos falar de NDCs e de transição climática sem citar quem é que vai ser impactado positiva e negativamente. Quando falamos hoje de NDCs no Brasil, é um país de maioria de mulheres, e este país de maioria de mulheres precisa ser respondido com metas de saúde, de habitação, de segurança pública, de proteção social e de ciência. Nós precisamos da ciência, e é isso que nós fazemos.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Obrigado, Prof. Diosmar.
Neste momento eu concedo a palavra à Sra. Marina Marçal, Coordenadora do portfólio de Política Climática do Instituto Clima e Sociedade (ICS), por oito minutos.
Ela encontra-se no sistema remoto, não é? (Pausa.)
A convidada está com problema de conexão.
Vamos conceder a palavra agora para a Sra. Viviane Romeiro, Assessora Técnica do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds), por oito minutos.
Obrigado, Sra. Viviane. Com a palavra.
A SRA. VIVIANE ROMEIRO (Para exposição de convidado.) - Bom dia a todos e todas. Agradeço o convite, a gentileza, a oportunidade de falar aqui.
Meu nome é Viviane Romeiro, minha formação é jurídica, tenho doutorado em energia com foco em política climática no Brasil e governança. Venho do terceiro setor, trabalhei por muitos anos no World Resources Institute (WRI). Atualmente apoio o portfólio de Clima do Instituto Clima e Sociedade (ICS) e também sou responsável pela Câmara Técnica (CT) do Clima do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds).
O convite de hoje foi para falar um pouco sobre um tema, que é a Parceria de Marraquexe no âmbito do Acordo de Paris, que é o Marrakech Partnership. Eu imagino que outros colegas - inclusive a Marina Marçal, que também é do ICS - vão falar em breve sobre o global stocktake, que é uma ferramenta de transparência do Acordo de Paris, o balanço global, e sobre uma narrativa muito importante, que é o fortalecimento do papel dos atores não estatais, dos atores dos governos subnacionais na implementação da agenda da política climática do Brasil. Então, fazendo um link com a apresentação da Marina, que seria prévia à minha, sobre o balanço global, o que a gente vem trabalhando muito com a sociedade no Brasil é justamente esse empoderamento, o fortalecimento dessas iniciativas subnacionais e do setor empresarial, da academia, das minorias, enfim, como todas essas iniciativas se coadunam e se alinham para fortalecer a implementação no âmbito nacional e também para descentralizar um pouco a agenda.
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A Parceria de Marraquexe traz essa aliança de ação climática - ela foi criada em 2016, após o Acordo de Paris, na COP 22, de Marraquexe -, com o objetivo justamente de acelerar a implementação da agenda climática no âmbito das Contribuições Nacionalmente Determinadas. E um objetivo muito grande que ela traz também é justamente o que é chamado de internalização dos nonparty stakeholders, ou seja, todas as partes interessadas, que vão além das partes oficiais que respondem diretamente à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, que são os governos nacionais. Então, como trazer os diversos atores e setores para o que a gente chama de governança multinível, uma governança climática multinível, que seja mais descentralizada? No caso do Brasil, historicamente, a gente tem essa governança muito centralizada no Governo Federal, especialmente Ministério do Meio Ambiente, Ministério das Relações Exteriores e, enfim, com o apoio de outros ministérios, como o da Ciência, Tecnologia e Inovação, mas nos últimos anos a gente vem presenciando também uma internalização dessa agenda, perpassando não somente uma agenda ambiental, mas uma agenda de desenvolvimento, então, Ministério da Economia, Ministério da Agricultura... E fica este questionamento: como a gente pode fortalecer para que os planos e medidas incorporem mais uma visão setorial e uma visão descentralizada dos diversos atores? Como melhor alinhar a implementação dos planos estaduais, planos municipais, planos do setor empresarial para movimentar, para fortalecer essa agenda no âmbito climático?
E um desafio muito grande que a Parceria de Marraquexe estabelece vem dessa ausência de tomadores de decisão, dessa diversidade de atores como tomadores de decisão, como a gente traz esse compromisso net-zero, esse compromisso da neutralidade climática de uma maneira mais descentralizada, entendendo que há uma diversidade de trocas, de lições aprendidas, de arranjos institucionais que podem favorecer ou mesmo dificultar, através dessas lições aprendidas, não é? Quais são esses arranjos que funcionaram bem ou não? Por que eles não vêm funcionando? Obviamente, não somente como uma medida de governo, mas uma medida de Estado. Eu acho que, pela nossa atual governança climática, se historicamente consideradas as suas fragilidades, nós temos várias lições aprendidas para entender como reposicionar esse arranjo institucional, quais são os elementos cruciais para uma governança mais robusta e, novamente, essa governança multinível que fortalece essa cooperação na capacidade da resolução dos problemas.
Dentre as missões da Parceria de Marraquexe, fazendo esse link novamente com os governos locais, com o setor empresarial, um ponto muito importante é o de sinergia: como aumentar a sinergia para mitigação, adaptação e meios de implementação, entendendo os meios de implementação como acesso ao financiamento, transferência de tecnologia e capacity building? Então, aqui no Brasil, tanto pelo Cebds quanto pelo iCS, a gente vem desenvolvendo capacitação: como capacitar os atores, empoderar esses atores para que haja uma maior internalização na política de fato, com medidas concretas, não somente passando por medidas de comando e controle incisivamente, num advocacy, mas também políticas de mercado, como essas duas vertentes dialogam e aceleram esse movimento de ambição?
E a Parceria de Marraquexe, a gente traz muito no âmbito de um tripé, que é aumentar a ambição para revisitar as Contribuições Nacionalmente Determinadas, fortalecer a implementação e aumentar a transparência. E aumentar a transparência entra muito num contexto de não somente dar acesso à informação, de disponibilizar a informação, mas de engajamento dos atores, de capacitar esses atores para que, de fato, haja uma incisão; uma incidência, perdão, na tomada de decisão. E a ideia é que haja um alinhamento das diversas plataformas, ferramentas. Atualmente, no Brasil, a gente tem várias iniciativas importantes, nas diversas esferas, nos governos subnacionais, com setor empresarial, academia, movimentos indígenas. E como que a gente faz para alinhar tudo isso, para que, de fato, haja uma maior cooperação e uma maior incidência?
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Por fim, eu acho que é importante também a gente colocar um ponto: historicamente, no Brasil, a gente já teve uma iniciativa que trazia um pouco desse elemento, que era o Núcleo de Articulação Federativa para o Clima, nos idos de 2012, pelo Ministério do Meio Ambiente e também pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações e Ministério da Fazenda até então, em que a ideia era justamente internalizar mais e fortalecer essa discussão com os atores, com os entes federativos.
(Soa a campainha.)
A SRA. VIVIANE ROMEIRO - Então, para finalizar, eu reforço esta mensagem: que para a COP 27 a gente traga essa discussão mais robusta dessa governança multinível, trazendo a diversidade dos atores e dos setores como um componente fundamental de participação social para a revisão da NDC do Brasil, para que, de fato, haja uma participação social para além dos relatórios bianuais, em que o Brasil se diz incluindo essa participação social. Então, que ela entre realmente numa prática e que a gente consiga avançar em trazer essa pluralidade dos atores e setores.
Muito obrigada e bom dia.
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Obrigado, Viviane Romeiro, por sua exposição. (Palmas.)
Neste momento convido a Sra. Caroline Prolo, advogada especialista em mudanças climáticas e Diretora-Executiva da LACLIMA, organização de juristas dedicados ao desenvolvimento do direito das mudanças climáticas na América Latina, que vai fazer sua exposição pelo sistema remoto, por oito minutos.
Quero, antes de transferir a palavra, agradecer a presença dos alunos do Curso de Estado-Maior para Oficiais Superiores da Escola de Guerra Naval do Rio de Janeiro.
Muito obrigado pelo comparecimento. A Casa é de vocês. Obrigado, mais uma vez.
Concedo a palavra à Sra. Caroline Prolo.
A SRA. CAROLINE PROLO (Para exposição de convidado. Por videoconferência.) - Bom dia a todos e todas.
Exmos. Sras. e Srs. Senadores, ilustres colegas expositores, primeiramente gostaria de agradecer o convite, a oportunidade de fala nessa discussão tão importante. Eu venho aqui na condição de fundadora e Diretora-Executiva da LACLIMA, que é a primeira rede de advogados de mudanças climáticas da América Latina, e também como advogada dedicada ao direito das mudanças climáticas, especialista no tema dos instrumentos de mercado de carbono e há dez anos atuante no ambiente das negociações internacionais de mudanças climáticas da ONU, por meio de organizações internacionais.
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Gostaria de concentrar a minha fala em três temas: primeiro, falar de emergência climática; depois, do papel dos mercados de carbono; e da importância de um ambiente de mercado de carbono regulado pelo Governo.
Primeiro, então, falando de emergência climática, acredito que muitos aqui já estejam cansados até de ouvir falar da ciência do clima, mas é importante que a gente reforce que é, de fato, graças ao avanço da ciência que hoje nós sabemos que, se houver um aumento de um 1,5ºC na temperatura da terra em relação aos níveis pré-industriais, haverá danos irreversíveis e devastadores para a vida humana na terra. A ciência diz que, se mantidas as condições atuais, nós vamos chegar a esse patamar em meados de 2040. Para evitar isso, a gente precisa cortar as emissões líquidas de gases de efeito estufa globais pela metade até o ano de 2030.
Então, esse é o desafio da emergência climática e esse também é o objetivo do Acordo de Paris, da ONU, esse tratado internacional que promove cooperação entre 193 países, que são praticamente todos os países do mundo, para enfrentar a crise climática. Ao aderir ao Acordo de Paris, os países assumem um compromisso de apresentar cada um a sua meta de limitação de emissão de gases de efeito estufa por um período de cinco anos, as chamadas NDCs, as Contribuições Nacionalmente Determinadas, e devem renovar essa meta periodicamente. Assim, a soma das NDCs apresentadas por todos os países membros do Acordo de Paris precisa ser suficiente para garantir que nós não vamos chegar a esse aumento de temperatura perigoso.
Apesar de haver esses compromissos jurídicos e esses dados tão claros da ciência, esse tema não tem sido tratado com a devida urgência. O Brasil ratificou o Acordo de Paris em setembro de 2016. De lá para cá, já apresentou três NDCs perante o Acordo de Paris, mas até hoje não explicou como vai cumprir essas metas, não adotou políticas domésticas que sejam suficientes para nos fazer cumprir essas metas, não revisou sua política nacional de mudanças climáticas, não buscou elaborar estudos, discussões organizadas e robustas no nível de governança multinível e também no nível interministerial, tampouco esses diálogos com a sociedade civil ou mesmo os setores envolvidos para que pudesse chegar a um pacote de iniciativas por meio das quais o país vá cumprir suas metas climáticas. E, aí, vejam que, ao se submeter ao NDC, o Brasil assume um compromisso de se esforçar para se manter dentro de um determinado orçamento de carbono, ou seja, o Brasil assume a obrigação de buscar se esforçar para limitar a quantidade de gases de efeito estufa que serão emitidos pelo país ao longo de um período de cinco anos.
Então, para cumprir esse orçamento de carbono, a gente precisa de uma estratégia clara: de onde serão cortadas essas emissões de carbono, quais são as políticas setoriais e os instrumentos usados para isso, inclusive os instrumentos econômicos. Aí que entra o mercado de carbono regulado pelo Governo como um instrumento que pode ajudar nisso. E aqui eu me refiro primeiramente ao mercado de carbono estabelecido pelo Governo como forma de limitar a quantidade de emissões de gases de efeito estufa que determinados setores econômicos poderão gerar, de modo que os agentes dentro desses setores regulados só podem emitir carbono se tiverem permissões para cada unidade de CO2 emitida. E assim se estabelece um mercado entre os agentes regulados, que podem transferir essas permissões entre si conforme eles sejam mais ou menos eficientes em controlar as suas próprias emissões de gases de efeito estufa. O Governo, por sua vez, vai gradualmente reduzindo essa quantidade de permissões que é disponível para o setor, para os agentes regulados, com isso vai cortando as emissões de gases de efeito estufa do setor de uma forma agregada. E aí essa escassez acaba por aumentar a precificação dessas permissões de carbono, o que por sua vez leva os agentes regulados a buscarem soluções menos custosas para reduzir as suas emissões de gases de efeito estufa, ou seja, o mercado de carbono regulado pode ajudar o Brasil a cumprir a sua NDC, além de colocar um preço no carbono, fazendo com que o setor privado passe a incorporar esse custo e assim tenha incentivos para promover a descarbonização.
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Além disso, também o Acordo de Paris criou instrumentos de mercado de carbono entre os países para facilitar e acelerar o processo de descarbonização e o cumprimento das NDCs desses países. Isso significa que, se o Brasil for capaz de gerenciar bem o seu orçamento de carbono, ele pode promover reduções de emissões de gases de efeito estufa para além da meta que assumiu na sua NDC e assim comercializar esse excedente com outros países membros do Acordo de Paris.
Por outro lado, aqui cabe lembrar que também existem os chamados mercados voluntários de carbono, que são movidos, como o nome diz, pelo interesse voluntário de empresas e entidades em comprar créditos de carbono de projetos para compensar as suas emissões de gases de efeito estufa. E esses mercados são importantes para acelerar a ação climática e auxiliar na transição para um modelo regulado. Então, eles servem como alternativa para setores que ainda não venham a ser regulados por um mercado governamental, do ponto de vista estratégico, para que essa regulação seja gradual. Mas, ainda que existam esses mercados voluntários, é importante se saber que isso é um cenário provisório, temporário. É importante, no fim do dia, que haja uma política de precificação de carbono no nível de Governo para criar um sinal de preço estável e seguro para o mercado, em comparação com preços voláteis e a demanda imprevisível dos mercados que se estabelecem de uma forma voluntária.
E, para encerrar, acabei não podendo falar aqui mais sobre o contexto regulatório do Brasil, em que estamos vendo projetos de lei em tramitação para discutir essa implementação de mercado regulado de carbono, vimos também um decreto, mas a verdade é que a gente ainda precisa avançar nesse ambiente de regulação. Essas discussões demandam um processo político, consciência, com dados, com diálogos, com ampla participação pública, espaços como este, para que inclusive se possa fazer as escolhas certas e hábeis em relação a quais setores serão regulados, quando e em que medida.
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A gente sabe que essas não são decisões simples, mas já existem estudos, instituições e espaços que podem ser usados para essa finalidade. É um processo que precisa ser percorrido de qualquer forma, dadas a complexidade e a relevância do mercado de carbono como um instrumento de mitigação e também dada a absoluta urgência da crise climática e do desafio da descarbonização.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Muito obrigado, Sra. Caroline Prolo.
Neste momento, eu concedo a palavra ao Sr. Tasso Azevedo - que também pelo sistema remoto fará a sua exposição -, que é engenheiro florestal, consultor e empreendedor social em sustentabilidade, floresta e clima e Coordenador do Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima e do Projeto de Mapeamento Anual da Cobertura e Uso do Solo no Brasil (MapBiomas), por oito minutos.
O SR. TASSO AZEVEDO (Para exposição de convidado. Por videoconferência.) - Olá! Bom dia!
Não sei se consigo compartilhar a tela aqui. Estou tentando, mas tenho que ser autorizado.
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Já está autorizado.
O SR. TASSO AZEVEDO (Por videoconferência.) - Vou compartilhar aqui.
Bom dia a todos!
Desculpem-me por estar no remoto. Sofri um acidente, estou com o braço imobilizado e não pude viajar.
Eu vou fazer uma apresentação, falando sobre os desafios que nós temos para as mudanças climáticas, no momento, no Brasil. Os dados que estou apresentando aqui são de dois projetos, o projeto MapBiomas, que monitora a cobertura e o uso do solo do Brasil, e o Seeg, que é o Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa, que estima as emissões de gases no Brasil desde 1970, tanto para o Brasil quanto para os estados e municípios.
O Brasil é hoje o quinto maior emissor de gases de efeito estufa no planeta. A gente só fica atrás da China, dos Estados Unidos, da Índia e da Rússia, sendo que, nesses países, a principal fonte de emissão é a queima de combustíveis fósseis, e, no caso do Brasil, a principal fonte de emissões é a forma como a gente usa o território, o uso da terra. Setenta e três por cento das emissões de gases de efeito estufa no Brasil, em 2020, vieram do setor de uso da terra. Em 2021, esse percentual pode ser até um pouco maior; os dados vão ser publicados em outubro. Nós vemos uma trajetória de crescimento dessas emissões, sendo que as mudanças do uso da terra, que incluem o desmatamento, que incluem as transições, os diversos tipos de transições de uso, como o tempo de pastagem para a agricultura, a agricultura para a floresta, a floresta para a mineração e assim por diante, respondem por 46% das emissões. E a agropecuária responde por 27% dessas emissões. Nós vemos um período de queda das emissões, que aconteceu no período de 2003 até 2010, 2011, 2012, e depois a gente vem num crescente dessas emissões, até chegar a 2,1 bilhões de toneladas de CO2 equivalente em 2020.
As mudanças de uso da terra respondem pela maior parte das nossas emissões. A gente tem estudado bastante essas mudanças. Elas resultam tanto em emissões quanto resultam em remoções, que vêm principalmente do crescimento de vegetação secundária e também das áreas protegidas mantidas no Brasil. Mas ainda as emissões que nós temos são bem maiores do que as nossas remoções pelo uso da terra.
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Quando a gente compara o Brasil em 1985, que é o primeiro ano da série histórica de acompanhamento anual da cobertura de terra no Brasil, e compara isso com 2021, a gente vê uma transformação importante que está acontecendo no território. O que mais chama a atenção aqui é uma perda líquida de 84,7 milhões de hectares de vegetação nativa entre 1985 e 2021. É uma área que equivale, se pensarmos, por exemplo, que o Estado do Rio de Janeiro tem 4,5 milhões de hectares, a 20 vezes o Estado do Rio de Janeiro, isso perdido em termos de vegetação nativa no Brasil que foi convertida para uso da terra, notadamente, 96% disso, convertida para uso agropecuário no país. Essa perda significa que, em relação ao que nós tínhamos em 1985, perdemos 3,1% de cobertura de vegetação nativa nesse período.
Essa perda tem dois reflexos. Essa transformação gerou uma emissão de gás de efeito estufa em grandes quantidades, bilhões e bilhões de toneladas, de um lado. De outro lado, ela reduz a quantidade de área que nós temos no Brasil capturando carbono. Então, do ponto de vista climático, essa é a operação que está sendo feita.
O Brasil tem muitas áreas em regeneração, mas 8,2% de toda a área de vegetação nativa que nós temos no Brasil hoje não são mais vegetação nativa primária. Isso quer dizer que ela foi desmatada pelo menos uma vez nesse período de 1985 até 2020. São 45 milhões de hectares. Usando o Estado do Rio de Janeiro como comparação, é como se a gente tivesse dez vezes o Estado do Rio de Janeiro em áreas de regeneração. Isso pode parecer uma notícia boa, mas também pode ser uma notícia não tão boa. Ela é boa no sentido de que você tem áreas sendo regeneradas. Mas o motivo pelo qual essas áreas estão sendo regeneradas é o abandono dessas áreas, especialmente por baixa produtividade.
Na semana passada foi publicado um paper na revista Science que mostra que 90% a 99% da conversão de florestas tropicais na região tropical inteira são devidos a atividades agropecuárias, mas praticamente metade dessa área se torna área produtiva. Boa parte é abandonada. Isto é um reflexo do que a gente vê aqui no Brasil: uma área importante que foi abandonada e que está em regeneração.
Sem descontar a regeneração, o Brasil perdeu 96 milhões de hectares nos últimos 30 anos. E uma parte importante do que o Brasil está perdendo é a própria vegetação secundária.
Então, 17% daquilo que foi desmatado no Brasil são como se fossem o segundo desmatamento. Você tem o primeiro desmatamento; e, depois, quando a floresta está se regenerando, você volta a ter o desmatamento. Então, são dois tipos de desmatamento acontecendo. Em 2019, que é o último dado que a gente tem completo, a área de desmatamento em vegetação secundária foi um terço do desmatamento total que nós tivemos no Brasil.
Em regiões como a Mata Atlântica, que é muito importante, um terço da vegetação secundária na Mata Atlântica é removida antes de completar dez anos, ou seja, ela começa a se regenerar, vai crescendo, vai se transformando numa floresta, e um terço disso já é removido, desmatado novamente, antes de completar dez anos.
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Uma outra consequência dessas transformações no uso do território é a grande área que nós temos de queimadas e incêndios florestais, que estão se tornando mais frequentes. Nos últimos 36 anos, o Brasil queimou... O Brasil teve uma superfície queimada que equivale a quase 20% do território, ou seja, quase 20% do território pegou fogo pelo menos uma vez nos últimos 36 anos, e metade disso pegou fogo mais de uma vez. Então, é uma área que faz com que os incêndios que a gente vê, por exemplo, na Califórnia, na Europa se tornem quase que um pedaço muito pequeno, não é? Isso dá uma área média de queimadas no Brasil de 150 mil quilômetros quadrados, isso é dez vezes a área desmatada. Então, a gente queima no Brasil uma área muito maior do que a área desmatada, e o principal vetor para essa queimada é realmente fogo antrópico, de origem antrópica, e não natural.
Outra consequência que a gente tem ao longo desse tempo é a perda da superfície de água. Ela já mostra uma parte de impactos de mudança climática, associada também à perda de cobertura vegetal. Então, nos últimos 30 anos, o Brasil perdeu 15% da superfície de água. A gente mostra isso aqui tanto do ponto de vista anual quanto na série mensal. A gente calcula a superfície de água do Brasil mensalmente desde 1985, e vocês podem ver os picos e vales, entre as cheias e vazantes durante os anos, e ver que o Brasil tem perdido superfície de água. Isso gera prejuízos importantes como a seca, a desertificação, e a gente tem visto, por exemplo, as perdas anunciadas esse ano para a safra de soja, que pode perder 20 milhões de toneladas em função da seca. Tem impacto também na nossa geração de energia elétrica, que fica mais cara quando você tem que acionar as termoelétricas.
Bom, nos últimos anos, nós temos andado na contramão dessa urgência climática. O desmatamento aumentou em todos os biomas entre 2019 e 2021, como mostra o Relatório Anual do Desmatamento, que foi lançado em julho. As emissões de gases de efeito estufa no Brasil também aumentaram nos últimos três anos, inclusive durante a pandemia, quando elas se reduziram no mundo inteiro, e o Brasil foi no sentido contrário, aumentou as emissões. No Brasil, mesmo em áreas em que a gente tem muito avanço, nós reduzimos... Nos últimos anos - é uma coisa louca -, a gente reduziu a mistura de biodiesel nos combustíveis. Estamos retrocedendo nessa política, não é? Voltamos a fazer leilão de fontes de energia fósseis, além de estarmos agora subsidiando termoelétricas. Estamos andando na contramão mesmo. Então, o Brasil com isso está se distanciando da meta de redução de emissões do Acordo de Paris - acho que Natalie vai falar mais sobre isso. Nós estamos nos distanciando da meta em vez de estarmos nos aproximando da meta, não é?
E aí termino aqui com o que nós precisamos fazer. O Brasil precisa voltar ao rumo na agenda climática. Para isso, três coisas importantes de serem feitas o mais rápido possível: estabelecer uma governança de clima que tenha autoridade para garantir o cumprimento do Acordo de Paris, do acordo de florestas, a que o Brasil se associou, e também do acordo de metano, a que o Brasil se associou e ainda nem apresentou a meta - precisa fazê-lo rapidamente.
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A gente precisa tornar o desmatamento zero e a restauração dos biomas e dos solos uma obsessão nacional, porque esse é o nosso calcanhar de aquiles, mas pode ser o nosso passaporte para ser uma liderança global nessa área. Nenhum país no mundo, entre as grandes economias, pode chegar às emissões líquidas zero em toda a sua economia tão rápido e de forma tão clara quanto o Brasil, mas é preciso tornar isso uma obsessão.
E, por fim, a gente precisa, como a Caroline colocou aqui anteriormente, regulamentar de forma abrangente, moderna e ambientalmente robusta o mercado de carbono no Brasil.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Obrigado, Sr. Tasso Azevedo. (Palmas.)
Neste momento, concedo a palavra ao Sr. Juliano Bueno, Diretor Técnico do Observatório do Petróleo e Gás e do Instituto Internacional Arayara, por oito minutos.
Antes de passar a palavra, quero aqui registrar a presença dos Srs. JP Amaral, coordenador do programa Criança e Natureza, e Tayanne Galeno, Analista de Relações Governamentais, representantes do Alana, que é uma organização brasileira de impacto socioambiental que promove o direito das crianças ao desenvolvimento integral e fomenta novas formas de bem-estar.
Muito obrigado pelo comparecimento.
Com a palavra o Sr. Juliano Bueno.
O SR. JULIANO BUENO (Para exposição de convidado.) - Bom dia, Senador Fabiano Contarato!
Parabenizo esta mesa, todos os colegas ambientalistas e, é óbvio - eu o vejo aqui -, um ícone do ambientalismo brasileiro, que está aí há quase 40 anos, Pedro Ivo. Que venham mais anos na sua luta, porque a sua luta também é nossa!
A gente tem um objetivo hoje aqui de falar, Senador, de transição energética justa: a pauta da energia brasileira, do transporte, e o que isso está significando nestes últimos quatro anos enquanto política energética que nos levou e nos levará para um cenário de grandes emissões fósseis, haja vista as escolhas que foram feitas na nossa matriz energética.
A gente vai colocar aqui alguns dados extremamente importantes.
Há mais de 70 novas termelétricas a gás e a carvão projetadas para o Brasil. Isso vai significar que teremos a triplicação das emissões de gases de efeito estufa na matriz energética do país. São três vezes mais emissões. E isso, infelizmente, está sendo desconsiderado.
Quando nós fazemos uma análise... O Instituto Arayara, o Observatório do Petróleo e Gás, a Coalizão Gás e Energia, a Coalizão Não Fracking Brasil, o Observatório do Clima, dentro das temáticas de energia, nós realizamos um estudo em que se apresentam alguns riscos extremamente importantes. Um deles é: quando um país faz uma escolha para uma matriz energética baseada em gás, nós estamos falando de uma commodity precificada em dólar, importada; nós estamos falando de GNL; estamos falando que o risco energético e a própria segurança energética do país é colocada em risco; e temos um componente de fortes emissões que não estão sendo hoje consideradas porque a política pública energética assim não o faz. Então, isso precisa ser modificado.
Outro aspecto é o do racismo energético. Só aquilo que vai ser implementado agora... O país decidiu, por causa da crise hídrica, fazer um leilão, que é o PCS, em que há térmicas que custam sete vezes mais do que uma eólica. Sete vezes mais! E isso nos traz uma razão de inflação; isso nos traz razões de perda de competitividade para o país; isso nos traz, num horizonte de dez anos, um implemento de emissões de quase três vezes e um detalhe importante: mais de 250% de projeção do aumento do custo tarifário; ou seja, nós temos aí uma política energética que empurra o país para uma energia cara e uma energia suja.
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Nós não podemos nos esquecer dos 9 milhões de brasileiros que hoje estão desconectados da rede elétrica. Ele fica um, dois, três meses sem pagar; quando chega lá a companhia de luz, ele vai à lotérica e paga; ou dos 2 milhões de brasileiros que hoje estão desligados, estão sem energia. De onde vai vir essa energia? Essa energia está ligada na tomada, numa térmica a carvão, numa térmica a gás. Há 54 bilhões de passivos ambientais e climáticos advindos dessa indústria. Isso, infelizmente, precisa ser tratado. Não existe, até hoje, no Brasil, legislação para o phase-out das térmicas ou das minas de carvão. Aí são mais de mil minas abandonadas, onde há milhões de brasileiros sendo intoxicados todos os dias.
Mas é óbvio, há soluções. Aqui o colega Sergio vai falar logo mais sobre hidrogênio verde. O país tem que ter uma política robusta de uma mudança do Plano Nacional de Energia, em que tenhamos a geração de 20 milhões de novos empregos, em que tenhamos, dentro de todas as cidades, um plano ambicioso de eficiência energética como um componente de redução de emissão. Vamos lembrar o que aconteceu lá no Japão quando Fukushima parou de funcionar e de fornecer um terço da energia daquele país. Eles implantaram, num período de oito meses, o maior plano de eficiência energética do mundo; não precisaram fazer termelétrica nova, e, portanto, houve uma redução das suas emissões.
No cenário que se apresenta sobre novas térmicas, leilões de petróleo e gás que a Agência Nacional do Petróleo promove, eu tenho ouvido, de alguns diretores da ANP, uma fala que nos assusta: "Temos que vender o petróleo e o gás do Brasil a qualquer preço, e tem que ser agora, porque a transição energética já chegou". Daí nós temos que lembrar: um poço de petróleo e gás demora oito anos, dez anos para iniciar a sua produção. Como vimos, recentemente, lá na Inglaterra, o caso da crise energética... E a gente tem que lembrar: crise energética, crise climática, competição pela energia, e temos, neste momento, um país que é refém e que está colocando na mesa, já colocou na mesa um plano ambicioso de implantação do uso do GNL. Daí nós vamos pagar essa conta. A conta chega para qualquer um dos brasileiros, para qualquer empresário, para qualquer agricultor. Todos nós não vivemos sem energia.
Então, energia, crise climática, crise hídrica... Qual é a solução? A solução precisa existir de um plano ambicioso de eletrificação. Isso vai gerar milhões de empregos no país. Isso não está hoje posto pelo atual Governo. A gente espera que, nos próximos anos, esta Casa Legislativa apresente essas necessidades.
Por último, nós temos dois leilões nos próximos dias, no nosso país. Um deles da Aneel, que prevê novas termelétricas, que prevê a contratação da reserva de capacidade, que vai gerar um custo estimado, projetado para os próximos dez anos, de um aumento de 250% do custo energético e a triplicação dessas emissões.
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Há, inclusive, uma das contas... Esse é um estudo que está sendo realizado pelo Idec, pelo Inesc, pelo Iema, pela Arayara e por outras instituições, que diz que, se continuarmos com essa curva energética de subida, nós vamos ter o momento do rompimento do acordo brasileiro, porque...
(Soa a campainha.)
O SR. JULIANO BUENO - ... como vamos conciliar uma energia cara e suja com os compromissos internacionais e com o risco de perdermos o repasse robusto de bilhões de euros e dólares dos fundos de transição energética?
Esta própria Casa, Sr. Senador, pode e deve apresentar a criação do fundo de transição energética do nosso país, que ainda não existe. E vou mais adiante, enquanto proposta política para o novo gestor. A criação de uma secretaria nacional que coloque a questão climática como uma posição interministerial, intersetorial, em que a Casa Civil fique responsável por isso, é uma necessidade dos compromissos políticos e climáticos do nosso país.
Era isso.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Muito obrigado, Sr. Juliano Bueno.
Quero aqui também saudar e agradecer a presença do meu querido Pedro Ivo, que sempre foi um aguerrido na pauta ambiental e pela sustentabilidade. Muito obrigado, Pedro.
Neste momento, eu peço que nós procedamos à composição da segunda mesa e agradeço a presença de todos e de todas.
Convido a Sra. Mônica Sodré, Diretora na Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps); o Sr. Sergio Xavier, Consultor do Centro Brasil no Clima (CBC); Sra. Renata Potenza, Coordenadora de Projetos da Iniciativa Clima e Cadeias Agropecuárias no Imaflora; Sra. Priscila Matta, Gerente de Sustentabilidade da Natura; Sr. Alexandre Prado, Diretor de Economia Verde do WWF-Brasil; Sra. Natalie Unterstell, Presidente do Instituto Talanoa e membro do Painel de Acreditação do Green Climate Fun; Sra. Leta Vieira, Gerente Técnica da América do Sul na organização Governos Locais pela Sustentabilidade.
Muito obrigado a todos que estão aqui e fazem parte desta segunda mesa.
Concedo a palavra à Sra. Mônica Sodré, Diretora da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps), por oito minutos. Muito obrigado.
Queria aqui registrar a participação e a presença da Sra. Tatiana Oliveira, que é assessora política do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos), e membro do Grupo Carta de Belém. Muito obrigado pela colaboração, pelo empenho e pela dedicação.
Concedo a palavra à Sra. Mônica Sodré.
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A SRA. MÔNICA SODRÉ (Para exposição de convidado.) - Bom dia a todos e a todas.
Eu gostaria de iniciar minha fala cumprimentando o Senador Fabiano Contarato, que preside a nossa sessão, agradecendo pelo convite que me traz a esta Casa. Eu gostaria de cumprimentar também o Senador Rodrigo Pacheco, nosso Presidente do Congresso Nacional, todos os Senadores e Senadoras que aqui estão e também todos aqueles que nos acompanham online.
Eu sou Mônica Sodré, cientista política e Diretora Executiva da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps), organização apartidária, independente, sem fins lucrativos, que tem uma missão, que é também a missão que me traz a esta Casa hoje: a de que sustentabilidade e desenvolvimento sustentável sejam uma prioridade dos agentes políticos de todo o Brasil e a de que sejam vistos acima de diferenças partidárias e ideológicas. A Raps hoje tem, entre a sua rede de membros, 45 membros do Congresso Nacional, de quase todas as posições no espectro político-ideológico. E eu, com muito orgulho, dirijo essa organização, que tem o Senador Fabiano como um dos seus membros.
A razão que me traz aqui hoje é uma fala sobre florestas públicas não destinadas. Essas áreas são áreas sob o domínio do poder público que não tiveram ainda a sua destinação, a sua finalidade estabelecida pelo Estado e que são, portanto, patrimônio público. Essas áreas hoje encontram-se, por conta da falta de fiscalização e da falta de controle, legadas ao crime, à violência e à ilegalidade. Em especial, eu me refiro a desmatamentos e grilagens. Isso é patrimônio público sendo manejado e sendo apropriado por interesses privados e particulares. A minha fala, que tem sete minutos, se divide na apresentação do problema e depois em uma sugestão de ação.
As florestas públicas não destinadas compõem hoje 14% do bioma amazônico, o que representa a área somada de Portugal e Espanha. Em 2012, com a criação do Cadastro Ambiental Rural (CAR) no âmbito do Sinima (Sistema Nacional de Informações sobre o Meio Ambiente), a gente passou a ver um novo tipo de crime. O Cadastro Ambiental Rural é um instrumento de controle, é autodeclaratório. E o que a gente passou a ver foi a inserção de supostas propriedades dentro do sistema - propriedades que inexistem na prática - para simular um direito à propriedade que aquele infrator não tem. O que acontece com isso é que a ligação entre CAR e retirada da floresta se tornou bastante evidente. Dados do Ipam demonstram que 30% dos Cadastros Ambientais Rurais ilegais estão em áreas de floresta pública não destinada, e essas áreas correspondem a 66% do desmatamento nesse período. Desmatamento importa, porque, como a gente ouviu nas falas anteriores, essa é a nossa principal contribuição em relação às nossas emissões de gases de efeito estufa. É notório, senhoras e senhores, que o CAR deixou de ser um instrumento de controle e passou a ser um mecanismo desvirtuado de regularização fundiária, se tornando parte do processo de apropriação irregular do patrimônio público.
Do ponto de vista das mudanças do clima, a degradação da floresta nos coloca em uma situação bastante delicada: a floresta, em tempo muito breve, vai começar a se comportar como uma floresta que emite carbono ao invés de sequestrar carbono. Por outro lado, a gente já sabe que o regime de chuvas no Sul, Sudeste e Centro-Oeste do país será impactado, gerando quebra de safra. Quebra de safra significa menos alimento ou alimento de pior qualidade ou alimento mais caro no prato do brasileiro. E isso importa a todos nós. Com isso, com a degradação da floresta, perde o mundo um instrumento de estabilização do clima global, perde o Brasil um instrumento fundamental para contribuição em relação às suas NDCs.
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No entanto, Senador Fabiano, como diretora de uma organização que acredita que a política tem o poder de mudar a vida das pessoas, nos interessa muito contribuir com soluções. E foi, imbuídos desse espírito, que nós recentemente realizamos uma parceria com o Ipam e também com o Senador José Serra e auxiliamos na elaboração da PEC 7, de 2022, que contou com a adesão de mais 26 Senadores desta Casa.
A PEC está hoje na Comissão de Constituição e Justiça e visa justamente fazer aquilo que eu comentei anteriormente: cancelar o Cadastro Ambiental Rural em área de floresta pública não destinada. A PEC está na Comissão de Constituição e Justiça desta Casa e tem como membro Relator designado o Senador Fabiano Contarato.
A aprovação dessa PEC, senhoras e senhores, é fundamental para combater desmatamento e grilagem do país. E isso não só precisa ser encarado a partir do seu viés ambiental, mas precisa ser encarado também a partir do seu potencial impacto econômico, uma vez que a gente sabe que, em tempo muito breve, o país vai começar a enfrentar restrições comerciais em cenário internacional por conta da ligação dos seus produtos com a ilegalidade.
Em novembro do ano passado, quando eu tive a oportunidade de participar de uma sessão temática como esta, mas a convite da Câmara dos Deputados e com intenção de levar contribuições naquele momento à COP 26, eu mencionava que são as oportunidades que movem o mundo, que o mundo estava se movendo para frente e nós estávamos ficando para trás por conta do desmatamento. O cenário não mudou muito de lá para cá e o que mudou não é positivo. Reparem vocês que a proposta que eu trago aqui hoje de cancelamento do Cadastro Ambiental Rural em terra de floresta pública não destinada não é uma proposta em princípio supercomplexa. Ela não trata de novos arranjos produtivos, ela não trata sobre a gente ter uma nova visão estratégica para o uso da terra no Brasil. Ela pode até ser considerada por muitos uma medida um tanto quanto básica. No entanto, eu aprendi, nos últimos anos, que no Brasil o básico às vezes é revolucionário. E, num país em que nasceu a apropriação do público pelo privado e é marcado por ela, a oportunidade de separar essas duas coisas por meio dessa PEC para mim é revolucionária.
Essa oportunidade de fazer essa separação, assim como essa responsabilidade de fazê-lo, hoje reside nesta Casa e está nas mãos das Sras. e dos Srs. Senadores.
Muito obrigada.
(Soa a campainha.) (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Obrigado, minha querida amiga Mônica Sodré, sempre de forma muito pontual e didática. Quero aqui mais uma vez reforçar meu compromisso com a pauta ambiental e a minha felicidade nessa designação da relatoria dessa PEC. Pode ter certeza de que eu vou me empenhar não só para apresentar esse relatório o mais rápido possível, mas também sensibilizar a Presidência da CCJ e o Presidente Pacheco, que é um Presidente a quem eu quero aqui tecer o meu agradecimento especial enquanto Senador desta Casa.
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O Senado Federal tem tido uma postura de que eu venho me orgulhando no que tange ao retrocesso na pauta ambiental. Às vezes, aqui nesta Casa, nós temos travado embates no campo das ideias e impedido um retrocesso ainda maior. Então, o comprometimento do Presidente do Senado, Senador Rodrigo Pacheco, me conforta, e eu tenho certeza de que vamos nos empenhar para aprovar essa PEC o mais rapidamente possível, assim como todas as contribuições.
Quando eu vejo aqui... Podem ter certeza de que esta sessão tem que ter resultado, tem que ter um desdobramento. Por isso, vocês não têm ideia como para mim é difícil ter que limitar tempo aqui em um assunto tão delicado, com tanta complexidade, para falar por oito minutos - tempo em que vão ter que falar - e soar a campainha.
Na verdade, a cada um de vocês aqui eu quero aqui agradecer e falar do meu reconhecimento. Podem ter certeza de que esta sessão vai ter desdobramento. Eu quero é resultado efetivamente. É para esse resultado que nós estamos promovendo.
Sempre que eu faço uma audiência pública - por exemplo, na Comissão de Meio Ambiente ou em qualquer Comissão em que eu esteja sendo o proponente -, ao término da Comissão ou daquela sessão, nós vamos ver o que nós podemos dar de um retorno no campo legislativo, o que pode ser feito no campo jurídico, o que pode ser feito no campo administrativo. Tem que ter um desdobramento do que vai sair disso, porque é um resultado; senão nós perderíamos o sentido de ficar só dando a palavra por oito minutos, falar, expor.
Eu quero aqui falar e pedir perdão a vocês pela limitação do prazo, do tempo, mas isso é porque infelizmente é o que se impõe aqui. Se pudesse eu ter mais tempo para debater isso de forma muito mais profunda... Mas podem ter certeza de que, independentemente da sessão, o nosso mandato sempre está à disposição. Vocês têm o conhecimento do meu comprometimento com essa pauta, que para mim é uma efetivação daquilo que está expresso no art. 225 da Constituição Federal. Não tenho dúvida disso e não tenho dúvida do meu empenho em todas essas pautas de que eu falei no início da minha fala, desses projetos que, mais uma vez, vêm atacar a pauta ambiental, e nós temos que estar ali.
E nós também temos que ter muito essa percepção mais social também. Quando a gente avalia a fala do colega que fala assim "o reflexo disso, o desdobramento disso", ele está sendo impactado também. Isso tem que ser dito.
Eu vou falar aqui uma coisa muito particular da minha vida. Eu fui Delegado de polícia por 27 anos e eu fui utilizado pelo Estado para agir de forma contundente contra pobres, pretos. E isso é muito grave, porque o Estado criminaliza a pobreza. Então, o ataque ao meio ambiente vai repercutir numa população que eu também sei qual é: são pobres e pretos. Não tenho dúvida disso. Vira e mexe, eu tenho aprendido aqui, amigos, que o ótimo é inimigo do bom. Às vezes, eu idealizo um projeto que é fantástico, mas daquele jeito eu não vou conseguir. O ótimo é inimigo do bom. E a gente vai, e vai caminhando.
Então, eu tenho aqui pleiteado que crime praticado por políticos com desvio de verba pública, por exemplo, de programas sociais tem que ser considerado crime hediondo, porque dinheiro público não é dinheiro de ninguém, é dinheiro de todo mundo. E a corrupção, minha gente, mata. Mata não só a integridade física, mas mata sonhos, sonhos nas universidades, na educação básica. Então, tudo isso é de forma entrelaçada e interdisciplinar.
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Nós temos que entender, quando a gente faz esse recorte da população carcerária - pobres, pretos e semialfabetizados -, quando os crimes que maior prejuízo trazem são os crimes praticados por políticos... São crimes de sonegação fiscal, crimes contra a ordem tributária, crimes contra o sistema financeiro, crimes ambientais, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, concussão, contrabandos, descaminho - e as cadeias lotadas de pobres e pretos, que são vilipendiados nos seus direitos elementares, como educação pública de qualidade, saúde pública de qualidade, iluminação pública, saneamento básico. Isso tem que ser dito.
Então, por esse recorte, quando se fala no efeito do ataque à pauta ambiental, nós temos que ver quem está sendo vítima nisso, nesse contexto geral, quem vai sofrer mais, e mais uma vez eu sei: são pobres, pretos, pardos, população indígena. Eu não me canso de falar e vou repetir isso aqui: quando eu fui Presidente da Comissão de Meio Ambiente, fui visitar os índios guaranis-kaiowás em Mato Grosso do Sul. Estão sendo dizimados, um genocídio que está acontecendo. A Funai os confina num espaço cercado pelo agronegócio. Ninguém me falou isso. Eu vi. O agronegócio aplica o agrotóxico com aviões, sobrevoando as comunidades, com mulheres grávidas, idosos, crianças. Febre, vômito, diarreia. Estão sendo dizimados. Então nós temos que fazer isso.
E eu falo para os meus colegas aqui: o Senado, o Parlamento é a Casa do Povo, mas será que efetivamente o Parlamento representa o povo? Eu queria, do fundo do meu coração... Este é meu primeiro mandato, eu nunca fui político, mas eu queria que entrassem aqui e sentassem nessas cadeiras, como Senador, representantes dos pobres, dos pretos, dos índios, dos quilombolas, (Palmas.)... das mulheres. Porque falar que todos somos iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza é muito bonito, é romântico. Falar que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações... Olha, minha gente, eu estive em Mato Grosso do Sul, na Assembleia Legislativa: 24 Deputados, todos homens. Isso tem que me dizer alguma coisa. Cinquenta e dois por cento da população são de mulheres. Dos três Poderes, o único que nunca foi presidido por uma mulher foi esse. Salvador: 85% da população de Salvador são de pretos e pardos, e nunca se elegeu um Prefeito preto ou pardo. Se isso não me disser nada, se isso não me inquietar, não tem razão eu ser político. Então, eu sempre falo nesta Casa aqui, que tem que representar o povo: mas será que representa o povo? A gente tem que fazer essa reflexão. E me desculpem o desabafo aqui.
Durante 52 anos da minha vida, eu criminalizei a política. Falavam em política para mim, eu dizia: "Isso não é para mim". Hoje eu faço uma verdadeira... A quem está nos acompanhando, eu faço um apelo: filiem-se a um partido político, pretos, pardos, indígenas, quilombolas, mulheres, pessoas com deficiência, pessoa que vive com HIV, filiem-se a um partido. Se você não quiser ser candidato, ajude a construção de um projeto de governo para o seu município, para o seu bairro, para o seu estado, para o seu país, porque só através da política é que você vai transformar este país em um Brasil mais justo, mais fraterno, mais igualitário, mais inclusivo e mais plural.
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Desculpem o desabafo. (Palmas.)
Concedo a palavra ao Sr. Sergio Xavier, Consultor do Centro Brasil no Clima (CBC).
O SR. SERGIO XAVIER (Para exposição de convidado.) - Bom dia.
Caro Senador Fabiano Contarato, muito obrigado pelo convite e parabéns pela iniciativa.
Por tudo que foi falado aqui, a gente percebe que precisa chegar ao fim essa era de degradação, em todos os aspectos, inclusive nestes aspectos que o Senador acabou de falar: as tragédias sociais, as tragédias étnicas, esses genocídios visíveis que a gente vem vivenciando e que se entrelaçam com a degradação ambiental. Portanto, é disto que a gente precisa tratar: do fim de uma era de degradação social e econômica.
Essa economia, esse modelo econômico está no fim, ele não se sustenta mais, ele é impossível de ser sustentado. As tragédias sociais são os aspectos mais dolorosos dessa degradação. Portanto, está na hora de criarmos políticas regenerativas, governos regenerativos, parlamentos que façam políticas públicas regenerativas; que a gente tenha, sobretudo, uma economia regenerativa.
Então, meus amigos e amigas palestrantes aqui hoje, colegas ambientalistas, meu amigo Pedro Ivo, estudantes aqui presentes, Senadores e Senadoras, eu queria aproveitar esse pouco tempo aqui para apresentar algumas sugestões que eu considero que são fundamentais para lidar com essa nova era da regeneração.
A gente precisa recompor, precisa recuperar. E isso começa na política, Senador Contarato. A forma mais imediata de fazer a regeneração de que o Brasil e o mundo precisam é fazendo o que o Senador acabou de falar: participando da política.
O Brasil está numa situação de degradação absurda da política, portanto é prioridade a gente ter neste processo eleitoral uma preocupação regenerativa, inclusive da cultura. A cultura brasileira foi atacada e está sendo corrompida, corroída por conta de todas essas questões.
Por tudo isso que foi falado aqui - pelo que o Juliano apresentou muito bem, sintetizando um olhar sobre as energias fósseis, sobre o que foi falado aqui pelo Tasso Azevedo, mostrando as questões... -, o Senador Contarato fez um painel, conseguiu trazer aqui um painel muito rico, com diversas percepções, com olhares muito diversos para que a gente possa, a partir desse painel, pensar realmente quais são as soluções. E por onde a gente começa isso?
Eu queria dizer que o primeiro desafio é fazer um planejamento multiconectado, é fazer políticas públicas interconectadas, em que o social, o ambiental e o econômico têm que estar de forma muito conjunta. O Parlamento brasileiro, as Casas Legislativas precisam começar a pensar em como formular leis que não olhem só para aquele setor, mas que transformem aquele setor, como o de energia, por exemplo, numa mola propulsora para puxar a reconstrução social, a recomposição ambiental.
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Quando se faz política de energia, por exemplo, olha-se simplesmente a eficiência, o lucro, o resultado financeiro, as questões técnicas, mas não se olha como a energia, por exemplo, pode ser uma mola propulsora para reduzir a pobreza do Nordeste. É possível! Hoje os parques eólicos solares estão sendo instalados no Nordeste, mas não se está reduzindo a pobreza, pelo contrário; os modelos são concentradores.
Portanto, é importante pensar políticas interconectadas, planejar uma transição harmônica - Juliano falou sobre isso aqui -, ter um fundo de transição energética. O Senado, a Câmara dos Deputados e todos os Parlamentos do Brasil nos estados precisam pensar como fazer um planejamento sistêmico desse processo de transição que eu chamaria de transição de harmônica. É preciso reduzir os investimentos fósseis, migrar os empregos fósseis para empregos sustentáveis e para ativos sustentáveis, para ativos regeneradores. E isso exige um planejamento. Não dá para você jogar fora os ativos que foram investidos inclusive com dinheiro público, como é o caso da Petrobras. Você tem que pensar de forma muito cuidadosa como fazer essa redução do petróleo e o aumento planejado dos processos que vão equilibrar essa matriz energética.
Outro aspecto importante é ter instrumentos de gestão sistêmica. Os governos não estão preparados para lidar com educação, saúde, meio ambiente, economia, geração de emprego, tudo junto, e tem que ser assim. Esse é o grande desafio. A gente não avança mais porque as soluções estão desconectadas. Tem muita solução específica em cada setor, mas esses setores não conversam, não se integram. Portanto, os governos e o Parlamento precisam realmente de cuidar disso.
E há aqui diversos aspectos importantes, diversos eixos que podem facilitar esse processo de reestruturação. A gente tem trabalhado num laboratório na Caatinga, lá no Nordeste, tentando criar exatamente essas políticas públicas interconectadas. Estamos trabalhando a implementação de um laboratório de economia regenerativa em Paulo Afonso, na Bahia, que fica ali na divisa entre Bahia, Alagoas, Pernambuco e Sergipe, buscando criar exatamente modelos que possam ser replicados em escala para outros biomas brasileiros.
Inclusive, Senador, tive contato recentemente com o Governador Casagrande, do seu estado. Lá estamos também pensando em criar um laboratório da Mata Atlântica, exatamente para construir modelos econômicos para o bioma.
Esses laboratórios têm a presença: da academia, do conhecimento acadêmico e também do conhecimento das populações tradicionais; da cidadania, representada ali pelas comunidades e também por organizações não governamentais; do setor empresarial e também dos governos, ou seja, criando espaços para construir de maneira integrada essas novas políticas interconectadas. Esses projetos são: HidroSinergia e o Projeto Nordeste Potência, projetos que estão sendo articulados pelo Centro Brasil no Clima com muito apoio do Instituto Clima e Sociedade (ICS), com participação ativa, liderança do Instituto ClimaInfo; o Grupo Ambientalista da Bahia, o Gambá; o Fundo Casa Socioambiental e diversos parceiros nacionais.
(Soa a campainha.)
O SR. SERGIO XAVIER - Portanto, eu queria já sugerir esses espaços para que a gente pudesse fazer essa discussão prática, buscar realmente um ambiente onde se construíssem as soluções juntamente com as comunidades, governos, academia e organizações não governamentais e se trouxessem políticas muito consistentes para serem apresentadas nesta Casa e se transformarem em leis. Portanto, é nesse sentido que eu agradeço a oportunidade de estar aqui.
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Fico à disposição do Senador para trabalharmos os desdobramentos. Conforme o senhor falou, realmente esta é a urgência: é fazer com que os nossos discursos se transformem em ações concretas, práticas.
Em larguíssima escala, o Brasil vai ganhar muito com isso e, com certeza, vai influenciar um novo modelo de desenvolvimento para o mundo.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Obrigado, Sr. Sergio Xavier.
Gostaria de registrar a presença do Sr. Roger Amarante, Diretor de Relações Institucionais e Internacionais do Instituto Nacional de Reciclagem, Inesfa.
Quero pedir permissão à composição desta mesa porque, agora, a convidada da primeira mesa Sra. Marina Marçal conseguiu estar conectada, e eu vou conceder a palavra para ela por oito minutos.
Concedo a palavra à Sra. Marina Marçal, Coordenadora do Portfólio de Política Climática do Instituto Clima e Sociedade (iCS).
A SRA. MARINA MARÇAL (Por videoconferência.) - Bom dia a todos.
Todos me escutam?
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Perfeitamente.
A SRA. MARINA MARÇAL (Para exposição de convidado. Por videoconferência.) - Maravilha, Senador.
Bom dia. Sou Marina Marçal. Obrigada pelo convite.
Desculpe-me, Senador, a intercorrência do meu voo. Estou muito triste de não poder estar aí com os colegas.
Sou advogada, sou Mestra e doutoranda em Sociologia e Direito pela Universidade Federal Fluminense e também Mestra em Relações Étnico-Raciais pelo Cefet, Rio de Janeiro
Este ano, eu tive a oportunidade de realizar parte do meu doutorado na Universidade de Direito de Columbia em Nova York, no programa de Meio Ambiente e Energia. E também sou ponto focal do Independent Global Stocktake, que é o assunto que vou abordar aqui.
Estou aqui, hoje, como Coordenadora de Política Climática, representando o Instituto Clima e Sociedade, que é uma organização filantrópica que apoia projetos e instituições dedicados aos enfrentamentos das mudanças climáticas no Brasil.
Eu não poderia deixar de agradecer imensamente a convocação deste debate, Senador Fabiano Contarato, que é, sem dúvida, um Parlamentar referência da agenda de clima nesta Casa legislativa e na COP 26, no espaço da sociedade civil brasileira, o Brazil Climate Action Hub.
Queria também agradecer o excelente trabalho que tem feito a Frente Parlamentar Ambientalista pela mobilização do público.
Agradeço aos parceiros do Congresso em Foco, do Instituto Ethos, do IDS e da Rede Advocacy Colaborativo além de todas as outras organizações do terceiro setor e especialistas que estão aqui presentes tanto virtual quanto presencial.
Senadores e Senadoras presentes na Casa e toda a sociedade civil brasileira, o meu papel aqui hoje é falar sobre a importância do Global Stocktake, também conhecido como Balanço Global, que é um mecanismo de relato e de transparência estabelecido pelo Acordo de Paris como um processo formal de balanço periódico do progresso coletivo em direção às suas metas de longo prazo, envolvendo uma avaliação periódica a cada cinco anos como parte do processo regular para aumentar a ambição dos componentes climáticos, além de um cronograma que seja claro e executável entre 2022 e em 2023.
Para o primeiro processo do Global Stocktake, importa promover também a clareza sobre como as informações serão preparadas e disponibilizadas em momento apropriado, quando os resultados da avaliação serão devidamente comunicados aos formuladores de políticas climáticas deste país.
Então, o Global Stocktaker começou na COP 26 e vai culminar na COP 28.
A primeira reunião do Diálogo Técnico foi realizada em junho deste ano, conjuntamente com a 56ª sessão dos órgãos subsidiários, em Bonn, na Alemanha, onde eu estive, que contou com a participação do Governo brasileiro além de muitas outras organizações que estão aqui hoje.
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Vale lembrar que a NDC apresentada pelo Governo Federal em dezembro de 2020 foi inclusive judicializada pela argumentação da chamada pedalada climática. Mas, mais importante do que publicar uma NDC que seja compatível com a ambição climática necessária, para lidarmos com o desafio da emergência que esta década nos impõe é necessário que o Brasil tenha capacidade de comunicar claramente as políticas e medidas setoriais específicas tomadas. É muito relevante não só para os efeitos de transparência, mas para permitir que os diferentes stakeholders contribuam para a implementação dos compromissos climáticos. Então, no Brasil, um compromisso robusto de governança climática multinível precisa promover a coordenação entre os diferentes ministérios, tanto do nível federal como no nível de União, estados e municípios. E vai ser fundamental, para evitar lacunas institucionais e sobreposições, fazer o melhor uso desses recursos e estimular sinergias numa ambiência política.
Então, eu destaco que o balanço global não se restringe aos atores governamentais, mas também ao setor privado, e precisam demonstrar os esforços de implementação das políticas de redução de emissão de gases. Daí a importância da convocação deste debate. A redução ou a falta de transparência e clareza pode inclusive comprometer potenciais apoios financeiros de outros países. O Brasil, seja pela União, seja por estados, municípios ou setor privado, não pode mais ir a uma conferência do clima, que este ano vai se realizar no Egito, sem demonstrar, Senador, sem apresentar com clareza o que tem feito para implementar as ações de nível local para a redução de emissão de gases. Isso afeta a credibilidade e legitimidade brasileira para cobrar o financiamento climático de um país que já foi protagonista do clima e precisa retomar isso. O argumento de que os países em desenvolvimento poluíram e agora estão exigindo do Brasil ações de forma desproporcional não se sustenta, uma vez que, por mais de uma metodologia de ranking, o Brasil está entre o quarto ou sexto maior país emissor de gases de efeito estufa.
Então, os financiadores estão atentos - eu estarei embarcando amanhã para a Semana do Clima em Nova York -, a comunidade internacional está atenta. E os brasileiros e brasileiras têm demonstrado também a sua preocupação com a questão ambiental e que isso, sem dúvida, se refletirá em sua escolha principalmente de Parlamentares nesta eleição.
Então, o Global Stocktake é um mecanismo de transparência, é um cobrador de promessas, como eu ouvi de uma liderança jovem do Engajamundo, a Isvilaine. E esse cobrador de promessas acontece nesse ciclo, a sociedade civil brasileira está atenta, vai cobrar, vai denunciar e vai litigar, se preciso for. Esperamos que não precise chegar a esse ponto da parte dos estados, do município e da União em mostrar o que tem feito para implementar essas ações. É importante que a sociedade esteja atenta e cobre, porque, como foi falado aqui antes, a gente sabe a cor, a raça, a classe, inclusive o gênero dos maiores afetados pela mudança climática. E esta década é decisiva pelo bem do planeta, contra o racismo ambiental.
Muito obrigada, Senador, Senadores e todos que estão presentes na Casa neste momento. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Obrigado. Muito obrigado, Sra. Marina Marçal.
Quero aqui registrar também a presença dos alunos do Curso de Estado-Maior para Oficiais Superiores, da Escola de Guerra Naval do Rio de Janeiro. Obrigado por terem comparecido. Fiquem à vontade. Muito obrigado.
Concedo a palavra agora à Sra. Renata Potenza, Coordenadora de Projetos da Iniciativa Clima e Cadeias Agropecuárias no Imaflora, por oito minutos.
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A SRA. RENATA POTENZA (Para exposição de convidado.) - Olá! Bom dia a todas e todos que estão presentes aqui hoje!
Eu gostaria de agradecer imensamente ao Senador Fabiano Contarato por este convite e por abrir esta pauta e esta agenda, para que a gente possa discutir aqui, ao lado de colegas especialistas, essa temática.
Então, é um grande prazer estar aqui, falando com vocês hoje. A minha fala vai trazer muito a questão sobre o Koronivia. Eu venho acompanhando essa agenda junto ao Imaflora. O Imaflora é uma instituição que, há mais de 27 anos, vem trabalhando e atuando nesta agenda da produção agropecuária e florestal sustentável, aliada à conservação dos nossos recursos florestais, e, mais especificamente, no meu caso, vem atuando diretamente nesta agenda de agropecuária de baixo carbono seja no âmbito internacional ou nacional.
Eu acho que vale a pena trazer um pouco o que é o Koronivia. Muitas vezes, é um nome que causa certo estranhamento. Quase ninguém sabe do que se trata. Ele é uma agenda, é um grupo de trabalho sobre agricultura que fica sob o guarda-chuva da Convenção das Nações Unidas hoje. Ele é um grupo paralelo ao Acordo de Paris para discutir especificamente sobre adaptação, resiliência e vulnerabilidade dos nossos sistemas agropecuários. Ele foi criado, foi estabelecido em 2017 pela Convenção e não tem como objetivo principal estipular metas ou regras para o Acordo de Paris e, sim, trazer debates e discussões temáticas, técnicas e políticas sobre a agricultura e a agropecuária no mundo.
Inicialmente, ele foi criado com um ciclo de quatro anos. Então, de 2018 a 2021, foram realizados diversos workshops temáticos, com os mais variados temas dentro dessa agricultura sustentável, de que hoje nós falamos, e com menor impacto, passando por temas como bom manejo das pastagens e dos animais e uso eficiente das terras e da água. E aí foi finalizado na COP 26, em Glasgow, no ano passado.
Hoje, onde nos encontramos nessa temática? Este ano de 2022, com a COP 27, é um ano muito importante para esse grupo de trabalho sobre agricultura, porque é um ano em que se vai definir qual é o futuro desse grupo de trabalho, para onde ele vai, se ele vai continuar ou não, devido à agenda que já foi cumprida e estipulada para esse último ciclo.
Então, trago a importância da discussão dos pontos. Quais são os pontos de discussão importantes para esse grupo, para esse próximo ciclo, sobre agricultura? Então, o primeiro ponto que eu queria deixar aqui registrado é que, sim, é extremamente importante que esse grupo continue sendo um grupo de trabalho, com um comitê técnico, com um comitê de discussão sobre o Koronivia. É um espaço muito importante para o setor agrícola, para o setor da agricultura e pecuária. Então, a gente precisa fomentar. O Brasil se posiciona de uma forma positiva também. Acho que a parte em que mais se tem consenso em relação à continuação desse grupo é que todas as partes, todos os países observadores se posicionam favoravelmente à continuação desse grupo. Mas eu gostaria de fomentar e de pontuar aqui que é extremamente importante que ele continue, mas que ele traga transparência e a participação também de multiatores, para que seja um processo participativo e bem construído.
Outros pontos que são importantes a gente trazer para essa agenda em relação ao setor agropecuário também já foram trazidos um pouco pelo Tasso. Esse grupo de trabalho foi delineado, como comentei com vocês, para tratar especificamente sobre adaptação, resiliência e vulnerabilidade dos nossos sistemas agropecuários e sobre segurança alimentar. Mas a gente entende que, por ser um espaço de extrema importância dentro das Nações Unidas, dentro dessa agenda internacional climática, é importante que haja uma abrangência desse tema, do escopo do que vem sendo falado. Então, é extremamente importante que esse grupo também fale sobre mitigação e desmatamento.
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Hoje, o Brasil, como já mostrado por outros colegas, tem como a sua principal fonte de emissão de gases de efeito estufa o setor de mudança de uso da terra e o setor agropecuário. A ideia, a intenção não é diminuir a importância da agenda de adaptação. Ela é extremamente importante, principalmente para os países mais vulneráveis, em desenvolvimento e subdesenvolvidos, mas é muito importante que o Brasil, como um dos maiores emissores de gases de efeito estufa nesse setor de mudança de uso da terra e agropecuário, se posicione para também trazer alternativas, soluções e discussões sobre a mitigação e também sobre o desmatamento. É extremamente importante a gente se associar a essa questão da eliminação do desmatamento nessa agenda do setor agropecuário.
E um último ponto importante - tem vários outros, mas, devido ao pouco tempo, a gente acaba escalando e elencando os principais pontos - é que essa agenda, esse grupo de trabalho sobre agricultura também saia, ele continue com essas discussões técnicas e teóricas, mas que ele também adentre num plano de implementação, em planos de ações. Então, nós precisamos fomentar, nós precisamos avançar nessa agenda de também ir para o campo, em fomentar a transferência de tecnologia, a assistência técnica ao produtor e realmente conseguir fazer com que toda essa discussão teórica vá para o campo, vá para a implementação e seja um grupo também de ação.
Então, para finalizar aqui a minha fala, eu gostaria de resgatar e relembrar que o Brasil tem um grande potencial em ser protagonista dessa agenda que nós estamos trabalhando aqui, conversando hoje. Ele pode ser referência na agricultura de baixo carbono, nessa transição para uma agricultura de baixo carbono. Tasso também já comentou isso com a gente. Mas, para isso, é preciso que o Brasil traga mais ambição nos seus compromissos, que o Brasil traga mais ambição nos seus acordos, na sua NDC, para que esse cenário de aumento das emissões de gases de efeito estufa desses setores tão importantes para o país seja revertido, para que o Brasil tenha um posicionamento mais ambicioso em todos esses acordos, em todos esses espaços e grupos de que nós fazemos parte...
(Soa a campainha.)
A SRA. RENATA POTENZA - ... e possamos avançar. E, com isso, o Brasil precisa investir, precisa incentivar, fomentar, monitorar os seus compromissos e se comprometer especialmente com essa transição para uma agricultura de baixo carbono e livre de desmatamento.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Muito obrigado, Sra. Renata Potenza.
Eu quero aqui registrar aos convidados que existem várias perguntas que foram feitas pelo Portal e-Cidadania que serão disponibilizadas aos convidados. Ao término, havendo tempo suficiente, quem se sentir à vontade na melhor pergunta pode pedir o uso da palavra para responder. Depois, eu vou citar o nome de participação das pessoas que estão dando as suas contribuições.
Neste momento, concedo a palavra à Sra. Priscila Matta, Gerente de Sustentabilidade da Natura, por oito minutos.
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A SRA. PRISCILA MATTA (Para exposição de convidado.) - Bom dia a todos e todas!
Em primeiro lugar, eu queria cumprimentar o Senador Fabiano Contarato pelo convite feito à Natura, ao abrir um espaço às empresas para estarem aqui participando deste debate tão importante para a sociedade.
Também queria cumprimentar e saudar todos os Senadores e Senadoras presentes e todos aqueles que estão nos acompanhando aqui, presencialmente, e virtualmente.
O foco aqui da minha fala é justamente pensar essa interligação entre biodiversidade, mudanças climáticas e defesa dos direitos humanos. Então, esse é o foco desta fala.
O desafio de enfrentamento das mudanças climáticas não se limita a um setor, indústria ou marca, mas constitui um desafio da humanidade, é um desafio global, e a solução passa pelo desenho de uma nova economia, que depende da colaboração de todos nós. Nesse sentido, este espaço de discussão é fundamental, porque converge os interesses da sociedade, no olhar dos Parlamentares, para esse caminho de transição para essa nova economia focada no baixo carbono.
Acreditamos que o Brasil tem a capacidade de estabelecer metas climáticas mais ambiciosas para 2030 e viabilizar um ambiente de negócios baseado numa economia de carbono zero. Nesse sentido, é preciso canalizar os investimentos para tecnologias focadas em soluções baseadas na natureza, que se conectam diretamente à vocação de um país de base florestal, como é o Brasil. Com isso, a gente tem a oportunidade de gerar emprego e renda de forma acelerada, alçando o país novamente ao protagonismo das negociações climáticas multilaterais.
Acreditamos, ainda, que essa é uma ação conjunta entre o setor público e o privado, uma vez que esse alinhamento, com políticas e metas claras, pode favorecer um círculo virtuoso de transformação, para acelerar a descarbonização total da economia, aliando a redução das emissões com a reversão da perda da biodiversidade e o respeito aos direitos humanos. Hoje vivemos um cenário reverso, no qual as mudanças climáticas são um dos fatores de perda da biodiversidade e de prejuízos sociais.
Como Natura, assumimos há muitos anos o compromisso com a neutralidade de carbono e priorizamos esforços de redução de emissões de gases de efeito estufa em nossas operações e na cadeia de valor. Fomentamos parcerias com fornecedores para o desenvolvimento de soluções que viabilizem reduções e possam, inclusive, remover carbono da atmosfera por meio de princípios de regeneração e circularidade. Para isso, temos várias marcas, como Ekos e Biome, que estão baseadas em cadeias de valor a partir de SAFs (sistemas agroflorestais) e também na desmaterialização das embalagens, por exemplo. No entanto, a gente continua compensando as emissões que não conseguimos evitar com créditos de carbono de alta qualidade, por meio de plataformas, como o Compromisso com o Clima, como forma de aprimorar o mercado voluntário de carbono. Esse é o tema fundamental.
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Priorizamos os projetos de compensação oriundos de soluções baseadas na natureza, como aqueles focados em regeneração, como o que eu citei, de SAFs (sistemas agroflorestais) e de REDD+, além daqueles de reflorestamento. Dado o seu potencial para a redução de emissões, de benefícios de adaptação às mudanças climáticas e conservação da biodiversidade, além do impacto social positivo que geram, esse é um tema fundamental.
Também priorizamos povos e comunidades tradicionais, como diferencial estratégico, principalmente na Pan-Amazônia, e atuamos junto às comunidades agroextrativistas, que proveem insumos da sociobiodiversidade, e junto aos parceiros dos territórios onde nós temos relacionamento. Aí fazemos com que essa integração entre carbono e cadeias da sociobiodiversidade potencializem a renda para povos e comunidades tradicionais. Esse é o foco prioritário que a gente tem que, aqui, levar em consideração.
Vale reforçar que temos metas de emissões líquidas zero de gases de efeito estufa até 2030, quando 100% de todo material de embalagens deverá ser reutilizável, reciclável e compostável; e temos 20% ou mais como meta - buscamos ter 20% ou mais como meta -, menos material de embalagens em peso, olhando para 2030.
Entendemos que os esforços do setor privado para reduzir as emissões de gases de efeito estufa são muito importantes como exemplo do compromisso das empresas para enfrentar a crise climática, mas sabemos que, no caso do Brasil, o cumprimento da NDC depende fortemente do combate ao desmatamento, com destaque para a Amazônia, sem desconsiderar, obviamente, os outros biomas, da recuperação das áreas degradadas e do fortalecimento e da ampliação de áreas protegidas. Nesse sentido é fundamental que essas diretrizes componham a NDC, com metas claras que possam ser acompanhadas por planos e recursos para a sua implementação.
A Natura escolheu, há 20 anos, trazer a Amazônia e os povos e as comunidades tradicionais como parte do seu modelo de negócio e fazer dessa estratégia a sua plataforma de inovação, a partir de parcerias com comunidades para a pesquisa de ingredientes e desenvolvimentos de cadeias da sociobiodiversidade. Assim, fica evidente - acho que esse é o ponto central...
(Soa a campainha.)
A SRA. PRISCILA MATTA - ... que é possível produzir, gerar riqueza e, ao mesmo tempo, conservar e regenerar a Amazônia e outros biomas.
Dessa forma, contribuímos para manter a floresta em pé, garantindo a proteção da biodiversidade, impulsionando a economia e colaborando efetivamente para a manutenção do clima do planeta, mas, para isso, é preciso contarmos, cada vez mais, com políticas públicas que incentivem a economia circular de baixo carbono. É preciso criar caminhos para tornar a descarbonização uma oportunidade de desenvolvimento econômico e alavancagem dos ganhos sociais.
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Estamos também aqui para reverberar a necessidade de unirmos esforços pelo desmatamento zero e pela proteção das florestas, uma vez que a mudança do uso da terra é o principal fator de emissão de CO2 no Brasil, e por isso desenvolvemos,...
(Soa a campainha.)
A SRA. PRISCILA MATTA - ... para finalizar, uma plataforma denominada PlenaMata, em parceira com o MapBiomas, o HackLab e o InfoAmazonia, que está apresentando os dados de árvores derrubadas em tempo real e do desmatamento na região, e com isso também trouxemos para Brasília, no Conic, um painel com esses dados, para chamar atenção para essa situação, no dia 5, que foi o Dia da Amazônia.
Só para finalizar, senhores, é importante dizer que, nesses oito minutos de fala, mais de 12,8 mil árvores foram derrubadas na Amazônia. Então, temos chance de interromper esse movimento. Sem dúvida, o Brasil é parte dessa solução, mas para isso é importante agir agora! E eu espero que, num próximo momento, em vez de estarmos olhando esse contador com árvores derrubadas, a gente esteja olhando para um contador com áreas conservadas.
Muito obrigada.
(Soa a campainha.) (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Muito obrigado, Sra. Priscila Matta.
Neste momento, eu concedo a palavra ao Sr. Alexandre Prado, Diretor de Economia Verde do WWF-Brasil, que fará sua manifestação pelo sistema remoto, por oito minutos.
O SR. ALEXANDRE PRADO (Para exposição de convidado. Por videoconferência.) - Bom dia, Senador! Bom dia, companheiros, companheiras, "companheires"!
Foi-me pedido aqui para fazer uma discussão sobre governança climática. Eu fico feliz porque foi citada por vários colegas a questão de governança e de como a gente chegou a uma... o futuro.
Eu vou dividir essa fala em três partes: uma do que foi, outra de onde estamos e outra para onde queremos ir.
Do que foi. No Brasil, se a gente separar esse tempo de compromisso e discussão sobre mudanças climáticas, foi o período até 2017 que ganhou complexidade de governança, porque, no primeiro momento, ainda estava focado olhando a obediência de como seguir o Protocolo de Kyoto, de como o Brasil se inseria numa discussão do Protocolo de Kyoto, focado em secretarias e coordenações específicas a isso, ganhando complexidade ao longo do século XXI, no começo do século XXI, com novas secretarias, coordenações, o Fundo Amazônia, o Fundo Clima, a política nacional, o plano nacional de mudanças climáticas; e chegou, no final desse período, até 2018, com em torno de 35 órgãos, departamentos que integraram e colocaram o país numa posição de liderança nas discussões de mudança climática.
Obviamente, essa governança não era perfeita, tinha considerações, melhorias a serem feitas, como todo processo humano, mas obviamente o que aconteceu a partir de 2019 foi uma destruição de toda essa governança, esse aprendizado da sociedade brasileira. E a gente chega ao momento atual com o Fundo Amazônia paralisado; o Fundo Clima integrando um projeto para uma agenda específica, quando toda expectativa era de que ele olhasse a questão de populações vulneráveis e apoiasse o país numa agenda de adaptação às mudanças climáticas; um país que chega sem ferramentas e mecanismos para implementação da sua agenda de mudanças climáticas. Também nestes últimos anos, obviamente, o Brasil, como disse o Tasso, é o único país do mundo que, durante a pandemia, aumentou as suas emissões de gás de efeito estufa. Também é um país que, nas suas duas últimas NDCs, liderou o mundo em como fazer uma pedalada climática, em como entregar um retrocesso em relação ao que foi acordado no Acordo de Paris.
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É um país que construiu a sua NDC sem informar à sociedade, sem engajar a sociedade civil, sem engajar o setor privado e sem nenhum processo de transparência. O único citado durante a NDC foi o Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, completamente aparelhado pelo atual Governo.
Aqui, Senador, companheiras e companheiros, o Brasil se encontra em um daqueles momentos históricos. O que queremos para os próximos meses? O Brasil tem a possibilidade de criar uma nova governança, considerando uma nova NDC que seja ambiciosa, como colocado por vários colegas, como já apresentado pelo Observatório do Clima, pela Iniciativa Clima e Desenvolvimento, chegando a 2030 com a eliminação total do desmatamento. Um país que pode chegar com um processo maior de mitigação, que olhe a adaptação, que tenha estratégia de adaptação considerando a emergência climática, as populações indígenas, negras e de periferia; que olhe o mecanismo de financiamento robusto, como falou a Caroline, com transparência, mensuração, relatórios e verificação de resultados. O Brasil que nós queremos é um país em que o Governo nacional estabeleça um quadro regulatório consistente, que mobilize finanças, que induza cooperação, que monitore e faça gestão sobre a informação. É um país onde a governança tem que olhar a nossa atividade, a nossa efetividade e a nossa transparência, que tenha representatividade e legitimidade. Nesses próximos meses é quando a gente pode definir se é um país que vai olhar para o século XX, como disse o nobre Senador no começo, em que serão aprovados projetos de retrocesso, de criminalização na sociedade civil, de flexibilização de licenciamento, de grilagem, do marco temporal, de garimpo em terra indígena, do pacote do veneno - esse é o país do século passado; ou se é um país que vai olhar as oportunidades, como também foi falado anteriormente, que vai se mover para o futuro, para o século XXI, considerando uma nova governança, considerando a aprovação da PEC, considerando que, aproveitando uma lei recente aprovada na Comunidade Europeia, a nossa agropecuária seja de fato sustentável, sem desmatamento, sem crime organizado, sem violência contra os povos da floresta, com mais tecnologia, aproveitando o século XXI para gerar um desenvolvimento mais equânime, inclusivo e sustentável.
É isso.
Muito obrigado, Senador. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Muito obrigado, Alexandre Prado.
Neste momento, eu concedo à palavra à Sra. Natalie Unterstell, Presidente do Instituto Talanoa e membro do Painel de Acreditação do Green Climate Fund, por oito minutos.
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A SRA. NATALIE UNTERSTELL (Para exposição de convidado. Por videoconferência.) - Muito obrigada, Senador Contarato.
Nobres colegas, que prazer estar aqui hoje já em preparativos para a COP 27.
Eu queria, em primeira mão, lançar - eu não vou conseguir projetar aqui, mas vou anunciar para vocês, em primeira mão - o plano de dez pontos para descarbonização da economia brasileira, que é fruto de um esforço coletivo relacionado à iniciativa Clima e Desenvolvimento, da qual o Senador Contarato participou no ano passado, junto de mais de 300 atores políticos e especialistas brasileiros, outros colegas aqui presentes hoje na audiência e outros Senadores também participaram.
Um dos focos principais dessa proposta é que a gente tenha um programa de metas para 2025, que a gente implemente de fato as metas climáticas do curto prazo, com as quais o Brasil se comprometeu lá no Acordo de Paris. Depois, como o Alexandre já brilhantemente expôs, houve uma série de percalços, há inclusive ações na Justiça tentando corrigir os problemas. Mas, a bem da verdade, para 2025, nós temos uma referência, que é limitar as nossas emissões em 1,3 gigatonelada. Isso é muita coisa, mas, ainda assim, é quase metade das emissões que nós temos hoje.
E essa proposta do plano de dez pontos para descarbonização está bastante inspirada no que está acontecendo na África do Sul e que vem se espraiando aí por outros países, como a Indonésia e a Nigéria, que são os pacotes de financiamento da transição energética justa. Isso é algo que terá grande atenção na COP 27, começou lá na COP 26, com a África do Sul movimentando, criando a partir da sua NDC esse pacotaço climático e, de lá para cá, muitos outros países, inclusive os Estados Unidos, estão apostando nessa mesma direção.
O Brasil ainda não tem algo oficial, negociado nessa direção e só vai de fato conseguir botar algo na mesa para atrair investimentos como isso que nós estamos propondo se a gente recuperar a nossa credibilidade com metas climáticas íntegras, transparentes e, claro, ações reais. Mas a sociedade brasileira tem sim propostas construtivas para que, uma vez virada essa página triste de fogo, fumaça e invasões de terras públicas da nossa história, a gente possa seguir e recosturar as relações com parceiros internacionais dentro da nossa próxima sociedade.
Eu anuncio isso agora, em primeira mão, e os senhores e senhoras poderão ver esse relatório e o seu resumo no site: clima2030.org.br/publicacoes. E ele tem a ver com uma agenda muito crítica da COP 27, sobre a qual eu fui convidada a expor hoje, que é a agenda de a gente mudar os trilhões de dólares que vêm sendo injetados nas indústrias mais emissoras para financiamento de indústrias mais limpas e ações baseadas na natureza. Todos aqui que estiveram na COP 26 ou a acompanharam vão se lembrar que um dos mais celebrados resultados e uma das mais difíceis negociações dentro do Pacto Climático de Glasgow foi justamente o texto que falou da eliminação gradual de subsídios a combustíveis fósseis. Foi a primeira vez que a palavra, que a expressão "combustíveis fósseis" apareceu num texto de decisão e agora, na COP 27, que é uma COP de implementação, isso vai ser reavaliado.
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Nós estamos, junto de parceiros internacionais e nacionais, trabalhando com um conceito muito importante e novo, que é o de financiamento líquido zero. A gente acredita que é um importante caminho a seguir, porque, apesar de muitas promessas de net zero, ou seja, esses compromissos de a gente zerar as emissões líquidas na metade do século, e isso já alcança mais de 90% do PIB global, ainda assim os investimentos em combustíveis fósseis são vultosos. Para que se tenha uma ideia, há uma estimativa de que os 60 dos maiores bancos globais investiram cerca de US$4,6 trilhões em combustíveis fósseis desde que o Acordo de Paris foi assinado, incluindo US$742 bilhões em financiamento fóssil só em 2021, segundo a iniciativa Banking on Climate Chaos. A gente tem defendido, portanto, que esse financiamento climático líquido seja aplicado de forma que os países não só financiem a transição e esses pacotes de transição justa que eu mencionava há pouco, mas também retirem os estímulos, os recursos das indústrias mais emissoras. E a gente precisa fazer isso rápido, porque o investimento em soluções climáticas precisa escalar rapidamente, precisa crescer mais de cinco vezes e alcançar 4,35 trilhões por ano até 2030. Então, é bastante coisa, se a gente quer alcançar os objetivos de Paris.
E já foi falado hoje, aqui nesta audiência, do grande objetivo global desse nosso acordo, que é limitar o aquecimento global em 1,5 grau, no máximo 2 graus, mas, junto desse objetivo, vêm outros dois: um deles é o objetivo global de adaptação, e o terceiro é fazer tornar os fluxos financeiros consistentes com o caminho para baixas emissões de gases de efeito estufa e desenvolvimento resiliente ao clima. Portanto, um dos três objetivos do Acordo de Paris é o chamado Artigo 2º, parágrafo 1 (c), que representa uma superoportunidade para a gente cumprir tanto a mitigação quanto a adaptação. Como a ex-Secretária-Executiva da Convenção-Quadro da Mudança do Clima Christiana Figueres gosta de dizer ou já disse muitas vezes, para onde vai o dinheiro vão as emissões. Portanto, se a gente colocar o dinheiro nas coisas certas, a gente vai ter uma transição mais rápida, e, claro, o contrário é a mesma coisa. Então, há uma agenda de financiar a transição e outra de transição dessas finanças.
Importante mencionar que para a COP 27 muitos grupos de países têm manifestado interesse em adotar um processo para operacionalizar oficialmente o 2º, 1 (c), do Acordo de Paris. Isso inclui países aqui da região, via Alalc, que é um grupo que reúne vários dos nossos vizinhos latino-americanos, e também a União Europeia. Os grupos dos quais o Brasil participa não têm sido tão vocais, e por isso que eu fiz questão de colocar essa agenda aqui em tela.
Não existe de fato uma agenda ainda acordada para essa operacionalização acontecer. Não temos, portanto, indicadores, metas, guias para demonstrar progresso em relação à transição das finanças, e isso, é claro, contrasta com outros objetivos do Acordo de Paris, como o de mitigação, que está em discussão, como o próprio processo de avaliação global - o global stocktake, que foi mencionado antes aqui pela Vivi e por outros.
A intenção na COP 27 tanto dos observadores como de alguns grupos de países é fazer com que o objetivo de tornar as finanças compatíveis com 1,5 grau e com o objetivo global de adaptação cresça politicamente.
Então, há duas negociações técnicas acontecendo: a primeira delas é dentro do Comitê Permanente de Finanças, e a segunda faz parte dessas novas discussões de metas de financiamento climático após 2025. A gente tem visto muita coisa fora da convenção, sim, ocorrendo e maravilhosamente avançando, mas ainda falta.
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O próprio Secretário-Geral da ONU lançou um plano de cinco pontos para a gente fazer uma revolução das energias renováveis. Eu vou estar em Nova York no domingo. A gente já está discutindo isso ao longo dessa semana e, no domingo, a gente vai tratar disso, mas esse plano de cinco pontos fala em triplicar os investimentos, tanto públicos quanto privados, em energias renováveis, indo para 4 bilhões por ano, e em transferir os subsídios aos combustíveis fósseis para pessoas vulneráveis que desejam se engajar. Portanto, na COP 27, a gente vai, enfim, promover essa agenda de ter um pacote de financiamento climático que inclua a operacionalização desse ponto, e se espera de fato um compromisso para acabar com o apoio internacional a combustíveis fósseis a carvão.
Eu fecho dizendo o seguinte: como já foi brilhantemente colocado aqui pelos colegas, o Brasil é um país que tem colocado também subsídios, tanto na forma de jabutis da medida provisória da Eletrobras como em propostas que ainda podem ser, enfim, aprovadas, como o chamado Brasduto, um investimento vultoso em gasodutos, que é algo de que a gente não precisa. E nós temos visto nas próprias campanhas, agora, presidenciais e tal, rotular-se o gás como um combustível de transição. Ora, isso não faz qualquer sentido. Nós estamos no Brasil, que tem uma matriz elétrica extremamente limpa, a gente fazer transição das renováveis para o gás não é transição para frente, é voltar ao passado; na verdade, é fazer uma volta para algo de que a gente absolutamente não precisa. Então, cabe aqui também dizer que, desde que nós ratificamos o Acordo de Paris em 2016, nós sabemos que as decisões das COPs têm força de lei doméstica e, portanto, tudo que acontece nas COPs não fica só nas COPs, mas deve ter efeitos reais sobre a nossa economia, a nossa política doméstica, e essa agenda de reforma de subsídios e transição das finanças é estritamente importante. Por isso, é crítico que o Brasil reforce a operacionalização do objetivo de tornar os fluxos financeiros compatíveis e crie essa agenda interna.
Mais uma vez, a proposta do plano de dez pontos de descarbonização está na mesa, vocês podem acessá-la em clima2030.org.br. E teremos muito trabalho daqui até a COP e lá.
Muitíssimo obrigada, Senador, e um ótimo fim de audiência para todos nós.
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Muito obrigado, Natalie, por sua contribuição.
Imediatamente, concedo a palavra à Sra. Leta Vieira, Gerente Técnica da América do Sul na organização Governos Locais pela Sustentabilidade (ICLEI), que também fará sua manifestação pelo sistema remoto, em oito minutos.
A SRA. LETA VIEIRA (Para exposição de convidado. Por videoconferência.) - Bom dia.
Queria agradecer a todas as Senadoras e Senadores na pessoa de V. Exa., Senador Contarato. Obrigada pelo espaço de debate, que é fundamental, ainda mais com companheiros tão qualificados para o debate sobre a emergência climática.
Meu nome é Leta Vieira, eu sou Gerente Técnica do ICLEI, Governos Locais pela Sustentabilidade, na sua sede da América do Sul, onde a gente representa 107 associados e, entre eles, 70 somente no Brasil.
A minha fala vai ser no sentido de colaborar com o debate sobre financiamento de projetos que contribuam para reduzir os efeitos da crise climática, especialmente focando nos governos locais e, mais especificamente ainda, nos municípios. Eu fui requisitada para responder à pergunta do cidadão Elvis Luiz, de São Paulo, pelo e-Cidadania. Ele pergunta: "Em nível de desempenho ambiental, o Brasil [...] [está em 81º entre 180 países]. Estamos trabalhando para obter uma honrosa posição?".
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Bom, como apontado aqui pelos distintos colegas e pelo Senador Contarato também, a gente entende que os esforços para o cumprimento das NDCs brasileiras precisam não só ser retomados, mas também ser ampliados, com o foco na implementação dos projetos que tenham realmente impacto. Então, respondendo, eu acho que somente assim a gente tem como ter uma melhoria desse desempenho, reduzir a nossa injustiça climática e poder atuar como um país que é líder no processo de desenvolvimento sustentável.
O Brasil possui uma posição única no espaço internacional. Ele tem uma oportunidade de se posicionar no seu lugar de direito, que é de líder no processo do desenvolvimento sustentável, com centralidade nos governos locais para o cumprimento das suas NDCs, ou seja, com políticas públicas que sejam feitas num nível municipal e que tenham capacidade de implementação. Para isso, a gente precisa de financiamento dos projetos e que esse financiamento seja alcançável aos municípios. E é por isso que, dentro do ICLEI, a gente tem investido muito em ações financiáveis, em como estimular essas ações financiáveis.
Até retomando a fala da Natalie, que falou que a gente necessita, no mundo, de mais de US$4 trilhões anuais para poder combater a crise climática, eu trago, adicionando a essa informação, que os nossos fluxos financeiros para as cidades no mundo giram em torno de 400 milhões, ou seja, a gente está muito aquém da necessidade real para a gente poder ter essa transição necessária e a gente poder realmente cumprir o Acordo de Paris.
Na nossa experiência do ICLEI, a gente percebe que, no nível municipal, as principais barreiras para o financiamento climático costumam estar entre barreiras organizacionais e de gestão do município, quer dizer, a falta de conhecimento técnico para elaborar projetos, a rotatividade também do corpo técnico municipal; o alto custo de ações climáticas que sejam mais impactantes. Se a gente considera o orçamento das cidades, que é extremamente limitado já para as suas questões básicas, financiar ações de alto impacto é muito difícil para um município somente com o seu orçamento.
A gente também tem a questão da flutuação cambial na taxa de juros, principalmente quando o município consegue acessar um financiamento externo; os projetos... Isto é muito relevante: nos municípios brasileiros de médio e pequeno portes é difícil você ter projetos com o tíquete mínimo que as instituições financeiras requerem, que é normalmente de em torno de US$10 milhões. As cidades têm muita dificuldade de alcançar esse tíquete mínimo.
Um último desafio que a gente identifica é que a avaliação de crédito e obtenção de crédito externo é complicada para os municípios. Então, você tem que ter a nota Capag, a aprovação das transações com os entes externos pelo Senado, e esse processo burocrático, às vezes, é bastante complicado para municípios menores. Mesmo para municípios maiores e capitais brasileiras, a gente tem tido esse desafio sempre apontado como uma barreira fundamental.
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Nesse sentido, eu queria trazer, como sugestão para V. Exas., Senadoras e Senadores, três possíveis formas de a gente colaborar de uma maneira bastante objetiva para o acesso dos municípios ao financiamento climático>
Primeiro, destravando o crédito privado externo. A gente entende que a maior parte do financiamento climático na América Latina hoje é de fonte privada, mas os municípios precisam de aprovação do Senado para poder contratar esse crédito externo. Então, a gente se pergunta e a gente instiga o Senado Federal a pensar como pode contribuir para a aceleração desse processo para obtenção dos financiamentos externos para os municípios.
O segundo ponto é promover a coordenação de projetos climáticos em nível estadual. Os Srs. Senadores e as Sras. Senadoras, como representantes dos seus estados, poderiam, juntamente com os seus Governadores, buscar contribuir como pontes entre esses municípios para a gente buscar as iniciativas climáticas que são semelhantes. Dessa maneira, os municípios, unidos, vão ter como juntar os seus muitos e pequenos projetos para que eles se tornem poucos, porém grandes projetos climáticos, agregando financeiramente para poder superar esse tíquete mínimo, que são esses tíquetes impostos pelas instituições financeiras de no mínimo R$10 milhões.
Bom, por último, a gente entende que seria relevante uma destinação específica das emendas parlamentares para projetos especifica e exclusivamente de busca da redução da crise climática.
Eu queria, por último, chamar atenção para o fato de que, quando a gente contribui para o financiamento de projetos climáticos, especialmente em municípios de médio e pequeno porte, mas também nos municípios grandes e nos estados, a gente, aumenta o alcance da justiça climática, o que foi tantas vezes falado aqui. A gente alcança melhores resultados na redução das vulnerabilidades climáticas, que atingem de maneira diferenciada as mulheres pretas das grandes cidades, as comunidades quilombolas, os pequenos agricultores e os nossos povos originários.
Queria agradecer a possibilidade de estar aqui representando o ICLEI e também a oportunidade de estar aqui com companheiros tão relevantes da agenda climática, podendo trazer um pouquinho deste olhar para o financiamento climático, trazendo também um pedido para a gente poder conseguir sentar à mesa de uma maneira que a gente traga sugestões para que V. Exas. possam contribuir ainda mais para o desenvolvimento de nossos governos locais.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Muito obrigado à Sra. Leta Vieira.
Imediatamente, eu concedo a palavra ao meu querido Senador Wellington Fagundes, que está inscrito para se manifestar.
Um abraço carinhoso, meu querido Senador Wellington Fagundes.
Com a palavra está V. Exa.
O SR. WELLINGTON FAGUNDES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - MT. Para discursar. Por videoconferência.) - Boa tarde a todo o Brasil.
Na sua pessoa, meu caro companheiro Fabiano Contarato, quero cumprimentar todos que estão à mesa e cumprimento-o também por ter sido Presidente da Comissão do Meio Ambiente, com toda a competência com que V. Exa. sempre agiu, inclusive com seu idealismo, mas com imparcialidade. Quando o tema era para ser discutido, V. Exa. sempre se manteve sereno, ouvindo, dando as sugestões de acordo com a sua visão, com o seu pensamento, respeitando todos.
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Então, Sr. Presidente Contarato, cumprimento todos os palestrantes. O nível deste evento é extremamente importante neste momento em que, inclusive, estamos discutindo o processo eleitoral brasileiro. Por quê? Porque é importante que a população brasileira acompanhe isso, neste momento em que cada um vai escolher o Presidente da República, vai escolher os nossos Governadores, Senadores, Deputados Federais e Estaduais. Isso é extremamente importante, porque esse tema é um tema sobre cuidar das futuras gerações não só do Brasil e do mundo de hoje, mas principalmente do Brasil de amanhã, da nossa juventude, das nossas crianças.
Então, quero começar dizendo aqui também, Sr. Presidente, que sou do Mato Grosso, esse estado gigante, de 900 mil quilômetros quadrados, com população relativamente pequena ainda - somos apenas 3,5 milhões de habitantes -, mas um estado com uma biodiversidade exuberante. Nós temos aqui o Pantanal Mato-Grossense, temos aqui a nossa Amazônia - tanto é que Mato Grosso está todo ele na Amazônia Legal -, temos o Cerrado, com essa capacidade de produção. Aqui no Mato Grosso, estou no Centro-Oeste, temos uma extrema produtividade, competindo com países como Estados Unidos, mesmo com uma logística ainda precária. Nós estamos no centro geodésico da América do Sul, que é a nossa capital Cuiabá, no coração do Brasil, onde a água é boa, no Araguaia. E ainda temos toda a biodiversidade da região do Araguaia ali, com o Xingu, a divisa de Tocantins e tudo mais.
Por isso eu falo com entusiasmo, Contarato, e também porque vi, pelas discussões que nós tivemos... V. Exa. era Presidente da Comissão de Meio Ambiente quando aconteceu aquele desastre no nosso Pantanal, as queimadas no Pantanal, que nós sofremos, que o mundo sofreu. Aquelas imagens lá, colocadas para o mundo inteiro, das labaredas, Sr. Presidente e todos que nos assistem, brasileiros que nos assistem, mundo que nos assiste, aquilo ali foi de apenas uma parte que foi queimada. A queimada mais profunda se deu exatamente no subsolo, onde as onças iam buscar água pela seca. Lá no pantanal seco, elas queimavam as patas, porque continua a queimada na macega, ou seja, naquele capim acumulado por falta exatamente de uma legislação.
Sr. Presidente Contarato, em função disso, eu fui nomeado pelo Presidente Rodrigo Pacheco e formamos uma Comissão Externa do Pantanal. Pudemos ver, junto com os nossos pantaneiros, a cultura secular da convivência do Pantanal com a criação de gado, com os quilombolas, com os ribeirinhos, com os indígenas, com os proprietários de pousadas, do turismo, que estão ali gerando no emprego.
Por isso, Sr. Presidente, eu quero também aqui agradecer o Presidente Jaques Wagner, que me nomeou, criando uma Subcomissão da Comissão de Meio Ambiente. Eu, juntamente com o Senador Jayme Campos, com o Senador Carlos Heinze, também com o Senador Izalci e outros companheiros, como participantes também dessa Comissão, propusemos - eu fiz essa proposta, está tramitando no Congresso Nacional, no Senado da República, para que a gente possa aprovar - o Estatuto do Pantanal, para trazer uma regulação para que a gente possa promover no Pantanal não só a sustentabilidade, mas promover... Nós temos que promover, acima de tudo, a sustentabilidade, e não pensar só na preservação, porque, quando se fala em preservação, é para deixar algo intocado; agora, quando se fala em sustentabilidade, é exatamente aproveitar toda essa riqueza com preservação, sim, mas principalmente com cuidado com a vida, com a vida das pessoas, e tudo isso que nós já citamos.
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E eu quero parabenizar V. Exa., Senador Contarato, porque V. Exa. começou citando os nossos africanos que para cá vieram. Nós temos em Vila Bela da Santíssima Trindade, a nossa primeira capital, que eu sempre faço questão de dizer, Tereza de Benguela, uma mulher preta que dominou por 40 anos a primeira capital, tornando para si um reinado. Isso representa a força da mulher brasileira, da mulher mato-grossense. E olha, Sr. Presidente, em Vila Bela da Santíssima Trindade, nós temos aproximadamente 50% da população formada de africanos originários, que agora estão com seus filhos aqui. Uma população trabalhadora, ordeira, linda, na divisa lá com a Bolívia, assim como temos outras cidades. Eu fui esta semana a General Carneiro, 50% da população é formada de indígenas, xavantes, bororos. Esse é o nosso Mato Grosso.
Mas ainda somos um país de muitas, muitas desigualdades. V. Exa. cita aí exatamente os quilombolas, os indígenas, essa população que ainda é oprimida. Desculpe-me, eu não estou falando para V. Exa., mas, olha, ao ver essa mesa aí, nós não temos nenhum representante dos negros, não temos representantes dos indígenas, que sofrem o impacto dessa evolução da sociedade mundial, que fala que o Brasil tem que ter, sim, preservação, mas nós precisamos fazer uma conservação. Acima de tudo, o que nós temos real é o ser humano.
Por isso, Sr. Presidente, nós estamos fazendo aqui uma revolução, sim. O maior problema do Mato Grosso, principalmente na questão ambiental, é a regularização fundiária. São mais de 80 mil famílias que vieram para cá, chamadas pelo Governo à época da revolução para ocupar a Amazônia, para não entregar a Amazônia. E essas pessoas estão sem apoio da ciência, da tecnologia, da pesquisa, do financiamento, sem documento - essas pessoas estão abandonadas. E aí há depredação. Não sabem o que fazer. Essas pessoas precisam de apoio, precisam de documentos. Felizmente, hoje, nessa parceria que conseguimos construir no Mato Grosso, com o Presidente Bolsonaro, com o Governador Mauro Mendes, nós estamos titulando mais de 80 mil famílias. Agora, Senador Contarato, é entregando documento, a escritura na mão, com registro, sem ninguém ter que pagar nada. Eu fiz, sim, coloquei recurso no Orçamento, mais de 80 milhões, para que essa revolução acontecesse no Mato Grosso.
Mas nós estamos falando do mundo, nós estamos falando do Brasil. Então, falando do mundo e do Brasil, eu quero, sim, aproveitar este espaço para chamar a atenção daqueles que querem fazer a conservação. Eu falo conservação, porque preservação é deixar algo intocado. Nós precisamos fazer a conservação, que nos ajuda, que venha verdadeiramente trazer recursos para o Brasil, e não fazer a biopirataria, que é tanto feita. Hoje nós temos aí o nosso ouro, o nosso diamante, as nossas riquezas, a madeira, a nossa biodiversidade sendo pirateados por países ricos, levando a nossa riqueza. Então, eu coloco isso em questionamento, Sr. Presidente. Eu vou deixar uma pergunta - ou duas até - para que isso sirva inclusive de reflexão a todos.
Eu vou tentar ser breve, mas eu quero dizer que ainda há, certamente, muito preconceito que coloca a relação desenvolvimento agrícola e agrário como sendo algo contrário à preservação do clima e do meio ambiente, e isso precisa ser desmistificado.
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A partir da fala do Ministro Joaquim Leite, começo afirmando que o Brasil é, sim, um país focado na sustentabilidade dos negócios e no desentrave de muitos aspectos burocráticos que teimam em frear os diversos setores da economia.
Seguimos, Sr. Presidente, focados, obviamente, em manter nossos compromissos firmados na ocasião da COP 26, em especial aqueles que visam punir o desmatamento ilegal, ao contrário dos demais países do mundo que têm como emissores de gases de efeito estufa os principais - olhe só, os principais! - combustíveis fósseis em processos industriais. Portanto, essa é a maior causa dos problemas mundiais.
Por isso, Sr. Presidente, o nosso Brasil, titular de terras, favorece esse compromisso. Dar dignidade ao produtor, desburocratizando processos, também é um ponto fundamental nessa batalha, com a qual o Presidente Bolsonaro está comprometido e com a qual também estamos trabalhando.
Quero parabenizá-lo também, Sr. Presidente, mais uma vez, por debater, com todos os vieses possíveis, esse tema sensível ao desenvolvimento do nosso país.
Também quero aqui registrar o papel da Ministra Tereza Cristina, que fez um trabalho brilhante. Nós precisamos avançar muito ainda nesse tema.
E aí, como pergunta, Sr. Presidente, quero deixar aqui... Quero dizer, primeiro, para os nossos palestrantes: nos últimos meses, vários efeitos climáticos extremos estavam ocorrendo ao redor do mundo. Podemos citar, entre outros, a longa estiagem no sudoeste dos Estados Unidos, as ondas de calor e seca na Europa e também a seca na China. Uma das consequências do aquecimento global é justamente o aumento da frequência de eventos externos. Já passamos do ponto em que esses eventos extremos - quero repetir: extremos, não externos - se tornaram o novo normal? Isso é o novo normal? E qual o efeito de queimadas como as do Pantanal, que tentamos muito coibir com o Estatuto do Pantanal, de minha autoria, nesses padrões de emissões nacionais e internacionais?
Segundo, Sr. Presidente, caso o aquecimento global não seja mantido sob controle, as nações do mundo precisarão se adaptar às novas condições climáticas? Que projetos de infraestrutura serão necessários no Brasil para a adaptação a situações como o aumento do nível do mar, o aumento e diminuição da pluviosidade em várias regiões e também o aumento da frequência de enchentes, queimadas, estiagens e outros efeitos do aquecimento?
Assim, como nos ensina também a Fundação Getúlio Vargas, precisamos, então, conter o aquecimento global em até 1,5ºC em relação aos períodos pré-industriais, e, para isso, todas as estratégias devem ser ponderadas, debatidas e consideradas, é claro sempre com o preconceito que exclui o fator preservação por método produtivo, respeitando o trabalho das famílias e dos pequenos, médios e grandes produtores.
Então, eu deixo aqui, Sr. Presidente, esta contribuição, mas muito mais queremos exatamente a contribuição que V. Exa. provoca neste momento ao debater um tema tão importante.
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Quero finalizar aqui, Sr. Presidente, parabenizando o nosso companheiro de Parlamento, meu amigo de Mato Grosso, o Senador Jayme Campos, que completa hoje 71 anos de vida, ele que teve todas as oportunidades. Eu sei que é um homem temente a Deus, foi um homem muito grato, porque eu comecei minha vida política também com ele, sendo candidato em 1990, quando tive a oportunidade de ser eleito Deputado Federal. A minha vida política confunde-se muito com a vida política do Senador Jayme Campos e também do seu irmão Júlio Campos, da família Campos.
Então, eu o parabenizo pelo aniversário do Senador Jayme, ele que foi Prefeito de Várzea Grande, foi Governador, foi Senador pelo segundo mandato, e agradeço também, Senador Jayme Campos, pelo apoio que tenho tido nessa campanha eleitoral. E tenho certeza de que estamos juntos.
E aí, como eu sempre digo, me sinto pronto, preparado, energizado para que a gente possa fazer mais pelo Brasil, por Mato Grosso e pelo mundo, principalmente, Senador Fabiano Contarato, por essa causa que é a questão da preservação ambiental, da conservação do meio ambiente, para que as nossas futuras gerações tenham um mundo melhor.
Parabéns, Senador! E, mais uma vez, Senador Contarato, quero que V. Exa. venha aqui ao Pantanal, que V. Exa. venha conhecer as belezas da Chapada dos Guimarães, conhecer Nobres, de que a gente fala, Senador Contarato: Nobres é mais do que Bonito; é lindo. Entendeu? E temos um problema lá, exatamente a regularização fundiária, uma área extremamente linda. Conhecer a Amazônia mato-grossense; conhecer a exuberância desse Pantanal. V. Exa., como todos que ajudam o Brasil, venha ajudar também Mato Grosso.
Muito obrigado! Felicidades! Parabéns!
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Muito obrigado pela participação do querido Senador Wellington Fagundes. E também quero aqui registrar e transmitir as minhas felicitações pelo aniversário do nosso querido Senador Jayme Campos.
Encontram-se aqui algumas manifestações feitas pelo Portal e-Cidadania. Registro aqui Ícaro da Costa, do Paraná; Elvis Luiz, de São Paulo; Arthur de Souza, do Rio de Janeiro; Haroldo José, do Paraná; Francisca Dalila, do Ceará; Jonatha Douglas, de Goiás; Sued Marai, do Distrito Federal; Matheus Fideles, de São Paulo; César Rodrigues, do Rio Grande do Sul; Ítalo Henrique, do Ceará.
E os convidados que se sentirem à vontade para responderem assim o façam, com a brevidade do tempo, por gentileza.
Antes, porém, eu queria aqui autorizar a exibição de um vídeo que a colega, após a sua apresentação, deveria ter exibido, o que vai ser feito neste momento.
(Procede-se à exibição de vídeo.)
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Muito obrigado.
Eu quero agradecer aqui particularmente a todos os convidados, todos aqueles que participaram e, mais uma vez, ressaltar que esta sessão não termina aqui.
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Tanto a minha equipe do gabinete como a Comissão de Meio Ambiente... Quero aqui registrar o brilhantismo, na condução da Presidência da Comissão de Meio Ambiente, do meu querido colega e companheiro, Senador Jaques Wagner, que, com sua sobriedade e sua serenidade, seu equilíbrio emocional, tem conduzido a Presidência da Comissão de Meio Ambiente desta Casa.
Agora, eu passo a palavra e convido a Mônica, por gentileza, para fazer a sua manifestação e responder uma das perguntas, com a brevidade do tempo, por gentileza.
A SRA. MÔNICA SODRÉ (Para exposição de convidado.) - Obrigada, Senador.
Obrigada, Ícaro, do Paraná. Eu vou responder a sua pergunta, que é: "Como [...] desenvolver as questões ambientais propostas por organismos estrangeiros sem ferir" - desculpa pela minha voz - "sem ferir o interesse e a soberania nacional?".
Ícaro, eu não posso deixar de ressaltar o fato de que eu acredito que hoje é o brasileiro quem está comprometendo a soberania nacional. Se a gente for olhar estudos da Amazônia 2030, nós temos que a ocupação irregular da terra, a exploração ilegal de madeira e a exploração ilegal de ouro são as três atividades mais predatórias para a Amazônia no Brasil hoje. E isso coloca, por conta da ilegalidade, do crime, em risco a nossa soberania nacional. É brasileiro quem está desmatando; não se trata de ação de nenhum organismo estrangeiro.
Considerando a brevidade do tempo que o Senador Fabiano me pediu, eu vou encerrar a minha fala com um recado, na verdade com um chamado, que o Senador Wellington também deixou. Em 2 de outubro a gente tem a oportunidade de eleger 27 Senadores, 513 Deputados Federais, 27 Governadores e Vices, 1 Presidente da República e um Vice, e mais 1.094 Deputados Estaduais. Tudo sempre tem espaço para melhorar. A gente pode fazer melhor em outubro.
Obrigada.
Obrigada, Senador, mais uma vez. Parabéns pela condução dos trabalhos! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Eu pediria ao Diosmar para fazer a gentileza de responder a pergunta do Haroldo José, do Paraná.
O SR. DIOSMAR FILHO (Para exposição de convidado.) - Responderei de forma breve, Senador e Haroldo José.
"[...] muitas áreas urbanas já estão consolidas nas margens de rios e fundos de vales, como amenizar esse problema histórico?"
Nós estamos dentro de uma realidade de um país cuja população, nas áreas urbanas, vive em aglomerados subnormais e favelas. Então, esse é um desafio dentro de pensar perdas e danos.
No Acordo de Paris, o Artigo 8º (parágrafo 1) trata de perdas e danos, na questão dos desastres - cuidar dos riscos e desastres, como amenizar -, assim como o programa de trabalho de Nairóbi vai tratar sobre populações vulneráveis e adaptação. São duas agendas que estão na COP: os planos nacionais de adaptação e o programa de Nairóbi, que vai tratar sobre adaptação e vulneráveis. Então, esse é um desafio dentro dessa agente para as áreas urbanas no Brasil.
As tragédias quando acontecem, a gente lembra que a população mora em áreas de rios, mas a gente teve aqui projetos de lei, a gente teve um debate no Brasil para a liberação de construções e ocupação de áreas de restingas, aquelas áreas de preservação permanente urbana, inclusive, o que foi judicializado.
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Então, a gente precisa fazer uma política que traga os planos diretores urbanos para a agenda climática. Nós precisamos trazer os planos diretores urbanos para trabalhar em conjunto com o Plano Nacional de Adaptação. Nós precisamos fazer ações dentro desse campo.
E uma das coisas que a gente precisa fazer - já concluindo aqui a minha fala, pela brevidade -, é que o dia 2 de outubro seja o dia de a gente fazer essa mudança. No dia 2 de outubro, a gente precisa convocar a sociedade brasileira para isso, porque a gente precisa também, no dia 2 de outubro, parar de falar do passado do Brasil e assumir que nós temos 56% de população negra, no presente, que não é de africanos, é população do Brasil.
(Soa a campainha.)
O SR. DIOSMAR FILHO - E, dia 2 de outubro é o nosso momento para resolver problemas como esse.
Obrigado, Haroldo. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Eu pediria, por gentileza, à querida colega Priscila para responder a pergunta do Arthur de Souza, do Rio de Janeiro
A SRA. PRISCILA MATTA (Para exposição de convidado.) - Arthur, do Rio de Janeiro. A pergunta é: "Os sistemas alimentares contribuem para o efeito estufa e a perda de biodiversidade. O que o Brasil pode fazer para melhorar esse cenário?".
Acho que o importante a destacar aqui é que se trata de uma jornada, tanto para as empresas quanto para os países, só que as empresas não têm como construir essa jornada sozinhas. Então, do ponto de vista das empresas, o fundamental é incorporar no seu modelo de negócio um impacto social e ambiental positivo. Isso tem que estar dentro do modelo de negócio, como eu apresentei, por exemplo, pela Natura. Hoje, a gente tem 40 comunidades de relacionamento na Amazônia, contribuímos com 2 milhões de hectares conservados e geramos renda para mais de 8 mil famílias. Então, esse é um movimento importante.
O segundo ponto está relacionado a políticas públicas, dado que as empresas não conseguem trilhar essa jornada sozinhas. Então, precisamos de políticas públicas que contribuam para essa transição para uma economia de baixo carbono, como, por exemplo, o PL da biodiversidade e o PL de bioeconomia, que deverá ser discutido nesta Casa, com foco na natureza, na vocação deste país, que é de base florestal e que está permeado por povos e populações tradicionais. Então, quando a gente for discutir uma política de bioeconomia, a gente tem que trazer, como referência, a sociobiodiversidade, e isso é muito importante porque se trata do Brasil.
O terceiro ponto é o seguinte: ele está relacionado à movimentação dos recursos financeiros. Então, os recursos financeiros, como a Natalie colocou, têm que estar direcionados para incentivar essa economia de baixo carbono. Esse é o último ponto que eu teria para colocar aqui.
Muito obrigada.
Ah, só há mais um ponto. Eu acho que só recuperando o vídeo...
(Soa a campainha.)
A SRA. PRISCILA MATTA - ... que foi passado e que está lá no Conic e já reforçando algumas falas que foram feitas aqui, é muito importante que a gente vote consciente, que a gente vote com esse foco de descarbonização, de inclusão social e de estancar essa perda da biodiversidade, porque isso é uma importante divisa para o nosso país.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Muito obrigado.
Convido o Sr. Sérgio Xavier para responder à pergunta de Sued Marai, do Distrito Federal.
O SR. SÉRGIO XAVIER (Para exposição de convidado.) - Obrigado, Senador.
Sued pergunta: "[...] em 2021 o Brasil registrou o aumento de 121% da emissão de gases. Quais medidas serão tomadas?"
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Bom, na verdade, o Governo Federal não tem anunciado nenhuma medida nesse sentido, pelo contrário, as políticas públicas estão sendo tratadas de uma maneira a desconstruir os processos de planejamento da redução de emissões, do cumprimento da NDC brasileira, etc. etc.
Portanto, o que eu vou falar aqui são sugestões que a gente pode apresentar no sentido de reverter esse processo, e para isso a gente precisa impulsionar e acelerar as cadeias econômicas regenerativas inclusivas, ou seja, a economia hoje pode gerar emprego, renda, incluir as pessoas em processos de regeneração florestal, em processos de energias renováveis, em negócios circulares, em bioeconomia, pequenas fábricas, biofábricas... Em todos os biomas, é possível você gerar produtos que deixem os biomas de pé, que regenerem os biomas usando inclusive suportes para as comunidades que já fazem uso de muitos vegetais, por exemplo, da Caatinga, do Cerrado, da Amazônia.
Portanto, nesse sentido, eu queria destacar o eixo do mercado de carbono, que já foi falado aqui. O mercado de carbono pode ser um grande eixo econômico do Brasil e ter resultados importantes em termos internacionais. Nesse sentido, o nosso laboratório de economia regenerativa do São Francisco está implementando... com o apoio das comunidades locais, está apoiando a cooperativa de crédito de carbono da Caatinga; a gente está experimentando o modelo cooperativo exatamente para integrar as comunidades nesse processo de acesso aos créditos de carbono.
Outro eixo é a economia das florestas, como...
(Soa a campainha.)
O SR. SÉRGIO XAVIER - ... o Tasso Azevedo apresentou. Existe uma possibilidade imensa, aí, de economia de reflorestamento. Há a agricultura de baixo carbono. Água e saneamento são processos que também podem regenerar o ambiente e ser algo importante das empresas de água e de saneamento. E a transição energética, o hidrogênio verde, por exemplo, pode ser uma grande solução para o Nordeste, não apenas para combinar a produção para exportação, mas também para aplicar na economia do Brasil, ou seja, termos uma indústria brasileira com produtos descarbonizados; a partir de energia renovável, o hidrogênio verde pode gerar emprego no litoral, com as plantas de hidrogênio, que é a separação do H2 do O da água, um processo com energia limpa, e as fontes de energia serem feitas no interior do Brasil, no semiárido brasileiro, por exemplo, criando emprego e renda para as comunidades dessas regiões desertificadas e que não têm água.
A indústria da...
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
O SR. SÉRGIO XAVIER - O meu tempo esgotou.
Eu queria agradecer mais uma vez e parabenizar o Senador por esse encontro.
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Muito obrigado.
Eu convido o Sr. Juliano a responder a pergunta de Matheus Fideles, de São Paulo.
O SR. JULIANO BUENO (Para exposição de convidado.) - Matheus, a sua pergunta foi: Existe alguma maneira de promover tanto o desenvolvimento industrial e tecnológico do país quanto a preservação do meio ambiente?
Com certeza. É para isso que nós temos a chamada da transição energética que perpassa a transição tecnológica. E, acima de tudo, você tem que ter um plano robusto no qual você associa geração de emprego, geração de impostos, preservação ambiental e obviamente uma mudança de matriz. Há cem anos, a indústria fabricava carroças e todo mundo queria manter essas carroças. Hoje, nós temos o momento da transição veicular da frota do país, que é importante enquanto emissora de gás de efeito estufa e gera aí uma série de transtornos.
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Então, quando a gente associa o desenvolvimento tecnológico de P&D não só baseado na floresta, mas também nas novas tecnologias, nós estamos reduzindo o custo de vida da população, bem como gerando aquilo que chamamos da matriz da nova economia. Nós temos que perpassar aquele modelo extrativista, que hoje causa danos a diversos territórios, como bem disse o colega Sergio Xavier. Hoje, o Nordeste brasileiro e a Bacia Amazônica têm uma pressão agigantada... Senador, quase um terço da Bacia Amazônica brasileira foi vendido e leiloado para mineradoras e para empresas de petróleo e gás que querem ali implementar um novo modelo energético, o modelo do século passado, do veículo que hoje está sendo substituído em todo o mundo.
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Muito obrigado.
Convido a Sra. Renata a responder à pergunta do César Rodrigues, do Rio Grande do Sul.
A SRA. RENATA POTENZA (Para exposição de convidado.) - Obrigada, Senador.
A pergunta do César Rodrigues, do Rio Grande do Sul, foi: "Como desenvolver uma agricultura de baixo carbono no país que seja suficientemente rentável e enseje a adesão efetiva do setor rural?".
Eu quero começar esta resposta dizendo que nós já temos as soluções, muitas dessas soluções, para realizar essa transição de agricultura de baixo carbono. Dentro do Imaflora, a gente atua nessa temática há muito tempo, e nós temos muitos exemplos de projetos ao longo do território nacional que mostram que é possível ter uma agropecuária de baixo carbono eficiente, com ganhos econômicos e sociais. Então, as nossas soluções já estão aí, as tecnologias de baixo carbono já estão aí, já estão sendo implementadas, inclusive dentro do próprio programa de agricultura de baixo carbono do Ministério da Agricultura.
O desafio que nós temos hoje e que é mais urgente é o desafio da escala e da velocidade de implementação dessas soluções. Então, é extremamente importante que o setor privado e o setor público tenham mais ambição no momento de trazer essas tecnologias, no momento de trazer e fomentar, para que cheguem essas informações até o campo. Nós temos uma barreira muito grande da transferência de tecnologia, uma barreira muito grande de assistência técnica para essas tecnologias. Então, é aí que está o nosso desafio: é fazer esse pacote, fazendo com que essas soluções cheguem ao produtor e sejam aceitas ali e com que seja feita uma assistência técnica para que eles consigam implementar, além, obviamente, de um maior financiamento, de um maior acesso facilitado ao crédito para esses produtores rurais. Aí, com isso, a gente consegue ter uma agricultura menos impactante, mais sustentável, com ganhos sociais e de biodiversidade também.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Fabiano Contarato. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - ES) - Muito obrigado.
Eu queria aqui agradecer a todos que contribuíram para que esta sessão fosse efetivada neste dia.
Eu quero agradecer, mais uma vez, ao Presidente do Senado, o Senador Rodrigo Pacheco, por sua sensibilidade.
Eu quero agradecer a presença de todos e de todas que estão aqui, dos convidados. Eu quero pedir perdão pelo tempo que é extremamente exíguo, um tempo curto, para debater um assunto com tantas vertentes e com tantas formas de se explorar.
Eu quero agradecer a presença dos alunos da UDF.
E quero pedir perdão por não ter feito todas as perguntas do Portal e-Cidadania, mas o tempo é curto, e nós temos outros compromissos já agendados.
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Eu também queria fazer um apelo a todos e todas. Dia 2 de outubro é um momento singular no Brasil. Esta fala que eu vou tomar a liberdade de fazer aqui não é uma fala de partido político. Defender ditadura em plena democracia é fácil; difícil é defender democracia estando numa ditadura. A escolha é defender e proteger o meio ambiente; a escolha é acabar com o Brasil sexista, racista, homofóbico, misógino, xenofóbico; a escolha é defender a imprensa, defender a Ordem dos Advogados do Brasil, defender a autonomia e a harmonização dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário; a escolha é reduzir a desigualdade, é lutar para reduzir esse abismo entre milhões de pobres e a concentração de riquezas na mão de tão poucos. Essa é a escolha.
Eu venho da escola pública, eu tenho orgulho de falar que meu pai foi motorista de ônibus por 40 anos na Grande Vitória; minha mãe, semialfabetizada, criou seis filhos. Eu estudei no hoje Ifes, mas na minha época era escola técnica. Tinha apenas um, hoje tem 22. Então, quando você vem de escola pública, quando você vem do Sistema Único de Saúde, quando você tem empatia, que é a capacidade que a gente tem de se colocar na dor do outro... Por isso é que eu sou um eterno defensor, quando eu falo aqui das mulheres e quando eu vejo Senadores, Parlamentares falando... É óbvio que eu também reconheço que eu ocupo um local privilegiado, porque eu sou um homem branco, cis, num Brasil que mais mata a população LGBTQIA+ no mundo, num Brasil em que a população preta e parda é vítima sistematicamente do próprio Estado, num Brasil em que nossas crianças não têm oportunidade de acesso a uma educação básica porque 83% das escolas não têm laboratório de ciências, 73% não têm quadra poliesportiva, não têm acessibilidade. Por isso é que eu morro defendendo o sistema de cotas e as políticas afirmativas, porque a concorrência é desleal.
Eu me lembro da minha família, como eu falei, seis filhos. Imagine o sonho dessa família, Pedro, em que o jovem lá quer entrar num curso de Medicina: se não for o sistema de cotas, ele não entra - isso tem que ser dito.
Então, dia 2 de outubro é a escolha entre a democracia... Porque atacar as instituições, atacar a Ordem dos Advogados, criminalizar ONGs, reduzir a participação da sociedade civil, atacar o meio ambiente, atacar o Ministério da Educação, da Ciência e Tecnologia... Contra fatos não há argumentos.
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Eu espero, do fundo do meu coração, que a população saiba escolher os seus representantes tanto no Legislativo como no Executivo, para que nós possamos ter um Brasil muito mais justo, muito mais igualitário, muito mais inclusivo, muito mais plural, e que nós tenhamos aqui uma representatividade maior das mulheres, dos pretos, dos pardos, dos indígenas, dos quilombolas, porque essa concorrência é desleal. Eu, vira e mexe, aqui, nesta Casa, falo que, mais uma vez, estamos nós aqui, na nossa grande maioria homens brancos, ricos e engravatados, decidindo a vida de milhões de pobres, 80 milhões de brasileiros em situação de pobreza, extrema pobreza, 25 milhões de desempregados, subutilizados, com precarização da relação trabalhista. Vilipendiaram a CLT em 2017, vilipendiaram com a reforma da previdência em 2019, com o discurso de que isso iria alavancar a economia, gerar emprego e renda.
Passou da hora de este Senado fazer o seu dever de casa. Está na Constituição Federal que a União tem que instituir imposto sobre grandes fortunas. Se isso fosse feito, nós atingiríamos a 0,096% da população, o que ia dar uma receita corrente líquida de bilhões para União, estados e municípios e que ia reduzir a desigualdade, ia dar saúde pública de qualidade, educação pública de qualidade, saneamento básico, redução da carga tributária, gerar emprego e renda, alavancar a economia, preservar o meio ambiente de forma sustentável.
Eu acredito, eu tenho esperança de que nós tenhamos um Brasil melhor.
Finalizo aqui, com toda humildade, com uma frase de que eu gosto muito de Victor Hugo, quando ele fala assim: "Não existe nada mais poderoso do que uma ideia quando seu tempo chega". E a ideia e o tempo estão chegando: em 2 de outubro, exerça o seu direito, porque ser cidadão não é apenas viver em sociedade, mas é transformar essa sociedade.
Muito obrigado.
Declaro encerrada a presente sessão. (Palmas.)
(Levanta-se a sessão às 12 horas e 22 minutos.)