4ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA
56ª LEGISLATURA
Em 25 de novembro de 2022
(sexta-feira)
Às 9 horas
114ª SESSÃO
(Sessão Especial)

Oradores
Horário

Texto com revisão

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A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. PDT/PDT - DF. Fala da Presidência.) - Bom dia a todas e a todos!
Declaro abertos os trabalhos do Seminário Inovação e Iniciativas para Eliminação de Violências contra as Mulheres.
O evento é uma iniciativa da Procuradoria Especial da Mulher do Senado Federal, da Liderança da Bancada Feminina do Senado Federal e da Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados.
O evento acontece no Dia Internacional da Não Violência contra as Mulheres, data que marca internacionalmente, o início da campanha dos 16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres.
Ao meu lado nós temos aqui, compondo a nossa mesa, e já agradeço a todos os convidados e a todos que estão presentes nos acompanhando nesta sessão, o Sr. Embaixador de Israel, Sr. Daniel Zonshine. (Palmas.)
A Sra. Senadora Soraya Thronicke, grande parceira aqui na caminhada da Bancada Feminina no Congresso e no Senado Federal. Grata pela presença, Senadora. (Palmas.)
A Diretora-Geral do Senado Federal, a Sra. Ilana Trombka. (Palmas.)
Solicitamos a todos para, em posição de respeito, ouvirmos o Hino Nacional, a ser executado pelo trio musical Segura Elas.
Agradecemos já a presença e a participação delas conosco neste evento.
(Procede-se à execução do Hino Nacional, executado pelo trio Segura Elas.)
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A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. PDT/PDT - DF) - Agradecemos ao trio Segura Elas, composto por: Any Lopes, na flauta; Iza do Cavaco, no cavaco e Nathália Marques, no pandeiro.
Obrigada, meninas. (Palmas.)
Bom, acho que hoje todos perceberam que eu estou de verde, verde-bandeira.
A estreia do Brasil foi ontem, não é, Senadora Soraya, Embaixador Daniel e Ilana também?
Estou feliz não só pela estreia, mas pelo futebol que o Brasil apresentou. Eu fiz parte de esporte coletivo e a gente sabe que a gente pode ter individualmente grandes jogadores, mas no esporte coletivo todos têm que funcionar. E isso é um exemplo para o Brasil: só juntos conseguiremos fazer o Brasil avançar nas pautas femininas, na economia, na questão social. Enfim, o esporte, como sempre, como a nossa cultura, como a nossa ciência, dando exemplo mundo afora.
Peço uma salva de palmas para o Brasil, para a nossa cultura e para a ciência do país. (Palmas.)
Inicio as minhas palavras agradecendo a Deus pelo dom da vida e pelo privilégio de participar desse importante evento, destinado a debater um dos temas mais importantes da contemporaneidade: a violência contra as mulheres.
O seminário Inovações e Iniciativas pela Eliminação da Violência contra as Mulheres é uma iniciativa do Senado Federal, demonstrando nosso compromisso com a mobilização e o enfrentamento de todas as formas de opressão, preconceito e discriminação e, em particular, da violência de gênero de todas as formas em que se apresenta.
Em 1999, a Organização das Nações Unidas instituiu o 25 de novembro como um dia de reflexão em todo o mundo sobre a opressão violenta contra a mulher. Nesta data, em vários países, inicia-se uma jornada de atividades de conscientização denominada Campanha dos 16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres.
O Brasil não apenas reconhece a data e promove importantes discussões sobre o tema como estabeleceu que o período de 16 dias de ativismo aqui seria ampliado para 21 dias. Isso se deve ao fato de que a campanha se inicia no dia 20 de novembro, quando celebramos o Dia da Consciência Negra. Dessa forma, é possível conectar dois temas de extrema importância que merecem a máxima atenção da sociedade e do poder público.
Senhoras e senhores, os dados sobre a violência de gênero no Brasil são estarrecedores e, nos últimos anos, os números relativos a alguns registros como a violência sexual têm aumentado.
De acordo com a pesquisa Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, de 2021, realizada pelo Instituto DataSenado, 86% das mulheres brasileiras percebem um aumento da violência contra as pessoas do sexo feminino no ano anterior à pesquisa. Esse dado revela um crescimento de 4% em relação ao estudo anterior, realizado dois anos antes.
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A mesma enquete demonstrou que, segundo 71% das mulheres entrevistadas, o Brasil é um país muito machista.
A história do Brasil é fortemente marcada por características como o patriarcado, o sexismo e a misoginia. São crenças, tradições e condutas cotidianas fortemente enraizadas em nossa cultura que, ao longo dos anos, levaram à naturalização da violência contra a mulher.
Esse quadro é complexo e precisa ser enfrentado de maneira firme e incisiva. Necessitamos de ações conjuntas em diversos setores, mobilizando a sociedade e os organismos estatais. Nesse contexto, é fundamental dar voz às mulheres.
As políticas públicas relativas ao tema precisam ser construídas e aperfeiçoadas com a efetiva participação da sociedade e, mais especificamente, das entidades que representam as mulheres.
Os dados coletados no relatório da Violência contra Mulheres, em 2021, para o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, de 2022, realizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, mostram uma situação diante da qual não podemos deixar de sentir uma enorme indignação. Passo a citar:
- uma menina ou mulher é estuprada a cada dez minutos no Brasil;
- três mulheres são vítimas de feminicídio a cada dia;
- um travesti ou mulher trans é assassinada a cada dois dias;
- 21 mulheres, pasmem, sofrem agressão física, por hora, no nosso país;
- 97% das mulheres brasileiras já foram vítimas de assédio em meios de transporte.
Se considerarmos apenas o período compreendido entre março de 2020 e dezembro de 2021, que é o último mês com dados disponíveis, ocorreram 2.451 feminicídios e 100.398 casos de estupro e estupro de vulnerável, de vítimas do gênero feminino no Brasil. São números impressionantes!
Senhoras e senhores, a tudo isso, somemos o desrespeito às vítimas. Frequentemente, as mulheres submetidas à violência, em especial aquelas que sofreram violência sexual, são humilhadas e revitimizadas nas instituições e por autoridades que deveriam oferecer acolhimento, amparo e tratamento digno. Muitas vezes nem o choro dessas mulheres é respeitado!
Cada autoridade pública e cada pessoa de destaque na sociedade que se utiliza de sua visibilidade para manifestar desprezo pelas mulheres ou minimizar e distorcer informações acerca das formas de violência a que estão expostas é cúmplice desses crimes!
Submetida à violência e à opressão, a mulher é silenciada, e, assim, as relações de poder e desigualdade e a hierarquização dos sexos, são perpetuadas. É fundamental desnaturalizar a violência contra a mulher. É necessário ampliar, por todos os meios possíveis, a consciência acerca dos direitos das mulheres e ocupar todos os espaços de poder, tanto no setor público quanto nas entidades privadas.
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Nos últimos anos, os discursos de ódio e a apologia às armas e à violência se espalharam pela sociedade brasileira. Em vez de se propagar a percepção das fragilidades de segmentos da nossa população, incentivou-se a violência contra os mais vulneráveis, justamente aqueles que o Estado, por determinação constitucional, deveria proteger.
Um dos maiores flagrantes da atuação omissa do Estado está na análise da execução do orçamento destinado à Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres. A pasta é responsável por programas de proteção à mulher, pela Casa da Mulher Brasileira e pelo Ligue 180, Central de Atendimento à Mulher.
O orçamento global destinado à pasta variou ao longo dos anos no atual Governo Federal: 71,95 milhões em 2019; 132,5 milhões em 2020; 61,40 milhões em 2021; 43,28 milhões em 2022; e só 13 milhões para 2023.
Pior que a tendência decrescente global de dinheiro previsto é o exame do dinheiro efetivamente gasto, a chamada execução orçamentária. A situação da Casa da Mulher Brasileira, que é um dos equipamentos de ponta da política de combate à violência contra a mulher no Brasil, é reveladora disso.
Em 2019, a Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres não executou nada (nada mesmo, 0%) dos R$22,73 milhões destinados ao programa.
Em 2020, a execução foi pífia: dos R$71,75 milhões, apenas R$310 mil foram gastos - de R$71 milhões, R$310 mil foram gastos em 2020.
Em 2021, a execução foi também pífia: dos R$21,8 milhões destinados ao programa, apenas R$ 1,1 milhão foi gasto.
Em 2022, dos R$7,7 milhões previstos para o programa, nada (0%) havia sido executado até o dia 26 de julho, ou seja, durante todo o primeiro semestre.
Recursos destinados à implementação da Casa da Mulher Brasileira e de Centros de Atendimentos às Mulheres constam entre os vetos que o atual Governo fez em agosto deste ano à Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2023, que havia sido aprovada por este Congresso.
Esses vetos ainda serão examinados pelo Congresso, agora no contexto da transição para um novo Governo, do qual todas nós esperamos - e exigimos! Isso é um recado para o novo Governo em transição - um olhar mais detido nas questões da mulher.
Hoje, uma das principais preocupações de todos e todas nós que acreditamos na força da cidadania e na construção de um país mais justo é a luta contra a misoginia, a homofobia, o racismo e outras formas de preconceito e discriminação. Precisamos unir esforços para, com a ampla participação da sociedade, reerguer as instituições de proteção social em uma perspectiva ampliada e verdadeiramente cidadã.
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Por tudo isso, iniciativas como o seminário que ora iniciamos são fundamentais. É preciso dar voz às mulheres, permitir que, com a legitimidade que o seu lugar de fala lhes confere, apresentem suas propostas e contribuam para apontar alternativas para a construção de um Brasil mais justo, humano e, acima de tudo, igualitário.
Dirijo, portanto, minhas saudações e, desde já, meus sinceros agradecimentos a todos e todas presentes.
De forma muito especial, agradeço à Sra. Lili Ben-Amin, ativista israelense que se juntou a nós para compartilharmos nossas experiências, nossos desafios e, por que não, as vitórias já alcançadas.
Seja bem-vinda, Sra. Lili!
Por favor, uma salva de palmas. (Palmas.)
Desejo a todos e todas que tenhamos um dia produtivo, com trocas muito ricas e pleno de alegrias e, acima de tudo, muita sensibilidade.
Muito obrigada. (Palmas.)
Informo aos convidados que, ao longo do evento, teremos uma apresentação em inglês. Aos que desejarem, temos rádios de tradução disponíveis na porta do Plenário.
Chamo à mesa a Senadora Ivete da Silveira.
Seja bem-vinda, Senadora! (Palmas.)
É nossa Bancada Feminina crescendo.
Seja bem-vinda! (Pausa.)
Para continuarmos a abertura, vou convidar para sua fala a Diretora-Geral do Senado da República, Sra. Ilana Trombka.
Seja bem-vinda, Ilana!
A SRA. ILANA TROMBKA (Para discursar.) - Obrigada, Senadora.
Bom dia a todos e a todas!
Bom dia, Senadora Soraya, Senadora Ivete, Senadora Leila!
Bom dia, Sr. Embaixador de Israel, Daniel Zohar Zonchine. É um prazer, uma honra tê-lo aqui!
Eu gostaria de iniciar minha muito breve fala com uma homenagem a duas mulheres, duas mulheres que estão hoje entre nós e que, durante muito tempo, estiveram no Senado Federal como companheiras de dois grandes Senadores.
Eu me refiro à Desembargadora Fátima Bezerra Maranhão, viúva do nosso querido Senador José Maranhão, que tantas e tantas vezes ocupou esta mesa, essa tribuna, a Presidência desta Casa, em momentos muito importantes para a nossa história. A presença da senhora aqui mostra que a política e a participação na vida de um povo se faz em conjunto, homens e mulheres. (Palmas.)
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A senhora, Desembargadora, honra a memória do Senador José Maranhão. Muito obrigada por estar conosco!
Igualmente falo da Senadora Ivete da Silveira, viúva do Senador Luiz Henrique, outro homem público que muito fez pelo Brasil e muito esteve aqui no Senado - eu mesma convivi com os dois.
É uma alegria muito grande tê-la conosco brevemente como Senadora titular, uma vez que assumirá o mandato no final deste ano, e já nesses meses fazendo parte do nosso Colegiado. Muito obrigada pela sua contribuição, pelo diálogo sempre muito tranquilo com a administração da Casa. Seja muito bem-vinda sempre! (Palmas.)
Eu quero começar minha fala contando para vocês algo que vocês provavelmente não saibam, porque é algo de foro muito íntimo meu.
Em 2018, Israel fazia 70 anos de independência e, por homenagem pelos 70 anos, o Parlamento de Israel, Knesset, fez um grande seminário internacional. Lá estava eu representando o Parlamento brasileiro, na Sala Jerusalém, quando, em formato da Organização das Nações Unidas, sentados em círculo, cada país se apresentava. Quando chegou o momento de apresentar o Parlamento brasileiro, eu disse que aquele era um momento especialmente emocionante, porque eu falava representando o meu país, o país que acolheu a minha família, quando, há mais de cem anos, fugindo da perseguição, chegou ao Brasil, muito pobre, sem falar português, sem nacionalidade, e aqui foi acolhida. E aqui estou eu, parte da minha família, a outra parte retornou a Israel e mora em Israel, acolhida, e parte ativa da sociedade brasileira, no país do meu povo, da minha religião. E hoje eu tenho a mesma emoção inversa. Estou eu aqui falando da tribuna do Senado Federal, como Diretora-Geral desta Casa, o que já sou há oito anos, para um evento organizado em conjunto com a Embaixada de Israel, o país do meu povo.
É especialmente emocionante saber que podemos aprender uns com os outros, países tão distantes, tão diferentes. Israel é uma pequeníssima nação, do tamanho do Estado de Sergipe; o Brasil, um povo enorme, de dimensão imensa, em que os portugueses - este ano comemoramos os 200 anos de independência - fizeram um enorme esforço para que ficássemos assim. Israel, um país com enorme investimento em tecnologia, um dos países que mais desenvolvem a tecnologia, a inovação, e foi por isso que em setembro deste ano estive lá, para conhecer as iniciativas de tecnologia de informação no país; o Brasil, um país em desenvolvimento, mas que já aparece com grande quantidade de unicórnios, um país em que a criatividade do seu povo sempre fez com que vencêssemos as dificuldades.
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E assim foi, através de tecnologia, inovação e criatividade, que, quando a pandemia começou, em 2020, este Parlamento, esta Casa, o Senado Federal, foi o primeiro Parlamento do mundo a deliberar remotamente. Neste país, que não é o que mais investe em tecnologia, não é o que mais investe em inovação, mas que tem um povo muito especial. Então, não deixa de ser uma alegria redobrada poder fazer parte desta Mesa.
De outro lado, preciso contar para vocês que, nessa recente viagem à Israel, também representando esta Casa, assinei um acordo de cooperação com o Knesset, e, depois desse acordo assinado no dia 18 de setembro, este é o primeiro evento que fazemos, já fruto dessa abertura de diálogo, dessa amizade entre o Brasil e Israel.
Temos muito o que trocar, eu falei, mas o Brasil também pode ensinar muito. Nesta Casa foram votadas leis que são modelos internacionais, como a Lei Maria da Penha, a Lei do Feminicídio e a Lei do Stalking. Muito precisamos avançar na implementação de todo esse cabedal normativo que o Parlamento já ofereceu ao país, e ouso dizer que talvez, junto com a Senadora Leila, uma atleta olímpica, com o Senador Romário, também um campeão no futebol, tenhamos outros heróis brasileiros, uma delas, a Maria da Penha, sem dúvida, uma mulher que não só dá nome à lei, mas que mudou toda a forma com que trabalhamos a questão da violência doméstica.
De outro lado, e infelizmente, as experiências que nos remetem para dentro da violência doméstica acontecem em qualquer canto do planeta. E, por isso, é muito bem-vinda a presença da Dra. Lili Ben-Ami neste Plenário, hoje, onde ela nos contará a experiência do Michal Sela Forum, uma ONG criada a partir dessa dolorosa experiência, que é o feminicídio de uma pessoa próxima. Seja por ela, pela Michal, seja pela Maria da Penha, seja por qualquer uma de todas essas mulheres que sofrem no feminicídio, que deixam os filhos órfãos, família despedaçada e que não têm a oportunidade de concluir o seu ciclo de vida, por todas elas, estamos aqui para essa troca de experiências e para que possamos muito aprender.
Agradeço a oportunidade e me desculpo previamente, porque tenho uma reunião com o Presidente do Senado, agora, às 10h, e terei que sair, mas voltarei.
Sei que depois da experiência de hoje sairemos todos e todas muito enriquecidos.
Muito obrigada pela oportunidade e bom seminário a todos! (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. PDT/PDT - DF) - Grata, Ilana, pelo relato, pela força e pela parceria. Maravilhosa!
Eu passo a palavra, agora, para a Senadora Soraya Thronicke.
A SRA. SORAYA THRONICKE (Bloco Parlamentar União Cristã/UNIÃO - MS. Para discursar.) - Bom dia, é um prazer estar aqui hoje.
Quero iniciar cumprimentando a nossa Procuradora Especial da Mulher, aqui, no Senado Federal, Senadora Leila Barros; o Embaixador de Israel, Sr. Daniel Zohar Zonshine; a Senadora Ivete da Silveira; a nossa querida Diretora-Geral do Senado Federal, Ilana Trombka.
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Quero cumprimentar todos que aqui estão, principalmente na pessoa da nossa Desembargadora Fátima Maranhão, esposa do nosso querido e saudoso Senador Maranhão.
Estou muito feliz, Desembargadora. A sua presença aqui hoje é realmente emocionante. Muito obrigada!
Quero cumprimentar também a Lili, que vai nos dar a palestra, vai ser uma das palestrantes.
Quero dizer que foi muito emocionante - Ilana chora hoje e quase me faz chorar. Naquele evento na Embaixada de Israel, nós terminamos o evento assim: muito emocionadas.
Muito obrigada por provocar em nós esse sentimento!
Bom, também quero aqui iniciar a minha fala parabenizando a organização deste seminário por ter enfatizado a palavra "violências", assim mesmo, no plural. Por quê? Porque as agressões contra as mulheres se dão pelas mais diversas formas e nas mais diversas circunstâncias: podem ser físicas, psicológicas, morais, sexuais, materiais ou até mesmo violência política - e, sobre a violência política, falarei mais adiante. Com uma frequência preocupante, essas muitas formas de agressão são subestimadas, esquecidas ou até mesmo ignoradas.
Muitas vezes, até mesmo as estatísticas têm dificuldades em traduzir a dura realidade das mulheres brasileiras. Um exemplo nos é trazido pelo Atlas da Violência, publicado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Em sua edição de 2021, no capítulo dedicado à violência contra a mulher, pode-se encontrar uma informação, que, a princípio, parece positiva. Informa-se que, no ano de 2019, houve uma redução de 17,3% no número de mulheres assassinadas no Brasil. Porém, essa informação positiva se desfaz logo a seguir quando, no mesmo período, se percebe que houve um aumento de 21,6% nos registros de mortes violentas de mulheres por causas indeterminadas.
Em 2019, o SIM/Datasus informa que 3.737 mulheres foram assassinadas no Brasil; outras 3.756 foram mortas de forma violenta no mesmo ano, mas sem indicação de causa, ou seja, não se sabe se essas mulheres foram vítimas de homicídio, acidente ou suicídio. Temos aí um problema na captação de informações, que não acontece só nesses dados, não; em tudo aqui no Brasil, é assim, infelizmente.
Além disso, segundo a mesma edição do Atlas da Violência, 66% das mulheres mortas eram negras ou pardas. Esse grupo, além disso, no que diz respeito aos homicídios, tem uma taxa de mortalidade 65,8% superior em relação ao grupo de mulheres que não são negras ou pardas.
Ainda é importante observar que aumentou o número absoluto de mulheres negras e pardas assassinadas entre 2009 e 2019. Naquele primeiro ano, foram 2.419 vítimas e, dez anos depois, foram 2.468 vítimas.
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O grupo, que inclui as demais mulheres, ou seja, que não são negras ou pardas, viu uma tendência inversa, com um decréscimo significativo no número de vítimas de assassinato. Em 2009, foram 1.636 mulheres mortas, enquanto, em 2019, foram 1.196.
Em relação a esses dados, em âmbito nacional, é importante observar que, entre 2009 e 2019, houve um aumento de 10,6% no número de assassinatos de mulheres dentro de suas residências. Por outro lado, houve uma redução de 20,6%, no mesmo período, para mortes de mulheres fora do domicílio. Vê-se aí que o perigo mora pertíssimo - aliás, dentro da mesma casa muitas vezes.
Também gostaria de acrescentar algumas informações específicas em relação ao meu Estado, o Mato Grosso do Sul. Por quê? Porque ali nós temos uma média de homicídios de mulheres superior à nacional. Enquanto no Brasil inteiro a taxa média é de 3,5 por 100 mil mulheres, no Mato Grosso do Sul, o meu Estado, a média é de 4,4 por 100 mil mulheres. O governo estadual publicou em 2019 o mapa do feminicídio. Naquele ano, foram registrados, por exemplo, 30 mulheres vítimas de feminicídio, 98 sobreviveram para contar suas histórias. A cada mês, 130 mulheres registraram boletim de ocorrência por estupro. A cada semana, 150 mulheres sofreram agressões físicas tipificadas como lesão corporal dolosa. A cada dia, 51 mulheres denunciaram terem sofrido algum tipo de violência doméstica. E, a cada hora, duas mulheres foram vítimas de ameaça.
Além disso, a conclusão do relatório é que:
No ano de 2019, 23 municípios sul-mato-grossenses registraram mortes violentas de mulheres por questões de gênero, tendo a residência como local de predominância dos crimes, a autoria por companheiros ou ex-companheiros, a arma branca utilizada na maioria das vezes e, como motivo alegado, principalmente, o inconformismo do autor com a manifestação de vontade da vítima de separar-se, o que evidencia o machismo e o sentimento de posse, de pertencimento, de objetificação daquela mulher-vítima pelo homem-agressor.
Posto isso, pode-se ver o quanto é disseminada a violência contra a mulher. O fundamental - e esse é um dos méritos deste encontro - é a busca de soluções. Como já afirmei, uma das questões a ser enfrentada é a das diversas formas que a violência contra a mulher pode assumir.
A violência física, como se depreende da análise das muitas estatísticas que apresentei, é a mais visível. No entanto, existem outras formas, Lili, como conversamos na embaixada, outras formas de abuso que se concretizam por meio da violência psicológica ou moral. São medidas que visam a desmoralizar, a humilhar e a desvalorizar a mulher. Todas nós já vimos - ou vivemos - muito disso.
Enquanto o homem é assertivo, a mulher é mandona. Enquanto o homem é sério, a mulher é arrogante. Enquanto o homem é decidido e firme, a mulher é "surtada". Logo, esse é um outro aspecto da violência contra a mulher que merece a nossa atenção.
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E é dentro dessa violência psicológica e moral que eu gostaria de lembrar de uma que ainda é pouco discutida: a violência política contra a mulher. A maioria de nós aqui, que ocupamos cargos políticos vivenciamos isso na pele de alguma forma, seja com a falta de espaço e oportunidades, juntas, que não nos são oferecidas, seja com atitudes que prejudicam as candidaturas femininas.
Em 2021, tivemos um avanço com a sanção da Lei de Combate à Violência Política contra a Mulher. Foi a Lei 14.192, de 2021, aprovada nesta Casa. Essa lei estabelece normas para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher durante as eleições e também no exercício de direitos políticos e de funções públicas. Essa lei altera o Código Eleitoral para proibir a propaganda partidária que deprecie a condição de mulher ou estimule sua discriminação em razão do sexo feminino ou em relação a sua cor, raça ou etnia, considerando violência política contra mulheres toda ação, conduta ou omissão com a finalidade de impedir, obstaculizar ou restringir os direitos políticos das mulheres.
Mas questiono aqui todos os presentes: será que uma lei é capaz de coibir a violência política contra a mulher? Eu posso dizer, por experiência própria da recente experiência que eu tive na campanha política em nível nacional, que não. Não! Não coíbe, não amedronta. É preciso muito mais que uma lei para que as mulheres tenham, dentro dos seus partidos, as mesmas condições ao concorrer ao pleito, para que não sejam ameaçadas, para que sejam respeitadas nos eventos políticos, para que não sejam atacadas em sua honra nas redes sociais.
Temos muito a melhorar em relação a isso e para dar reais condições para que mulheres queiram participar da política e tenham a segurança de que não serão expostas. Esta é uma luta para todas nós, principalmente para quem ocupa cargos representativos e de poder: estimular a participação feminina e ajudar a abrir espaços para outras mulheres.
Na sequência, eu gostaria apenas, para terminar, de destacar três projetos da minha autoria que se caracterizam como iniciativas importantes para desestimular a prática de violências contra a mulher e assim protegê-las com verdadeira eficácia.
O primeiro deles é o PL 1.096, de 2022, que tem por objetivo alterar a Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, para determinar que os municípios com mais de 100 mil habitantes possuam delegacias especializadas de atendimento à mulher. As Deams, que são essas delegacias, são as principais portas de entrada na rede de atendimento e proteção às mulheres em situação de violência doméstica. Mesmo assim, nem 10% dos municípios brasileiros mantêm tais estruturas administrativas.
O segundo deles é o PL 2.452, de 2019, que acrescenta os §§2º e 3º ao art. 1.575 da Lei 10.406, para dispor sobre a fraude na partilha de bens por dissolução do casamento. Essa medida é importantíssima para proteger a mulher contra maridos ou companheiros, numa situação de união estável, que adotem mecanismos de desvio ou ocultação de bens e valores. Muito comum esse tipo de fraude na partilha, e a fraude utilizada por meio de pessoas jurídicas. Hoje, infelizmente, o ordenamento jurídico brasileiro é bastante omisso em relação a circunstâncias semelhantes. Infelizmente, o fraudador não perde os bens quando descoberto, como acontece no caso de inventários, na ocultação de bens na partilha. E é isso que nós estamos trabalhando para que aconteça.
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O terceiro deles é o PL 2.083, de 2022, que altera os arts. 50, 52 e 86, da Lei 7.210, que é a Lei de Execução Penal, para estabelecer medidas destinadas a reforçar a proteção da mulher vítima de violência doméstica e familiar, especialmente contra a reiteração de ameaça de violência perpetrada por agressores condenados ou submetidos à prisão provisória. E aí eu quero destacar que a esse projeto de lei eu dei o nome de Lei Barbara Penna. Foi construído a seis mãos, construí junto com o Ministro Sergio Moro, recentemente eleito Senador, e também com a Deputada eleita Rosangela Moro, em homenagem a Barbara Penna, uma gaúcha que sobreviveu. Aos 19 anos - isso já tem 10 anos -, ela tentou terminar o relacionamento com o antigo companheiro e ele ateou fogo nela. Pegando fogo, ela pulou ou foi jogada do terceiro andar, sobreviveu. Ficou internada muito tempo, mas, na sequência desse fato, ele ainda matou as duas crianças do casal. Hoje, ela... É triste contar tudo isso assim. Eu conheci essa mulher, ela disputou as eleições conosco. Infelizmente, pouquíssimas mulheres foram eleitas. Barbara Penna seria muito importante ter uma cadeira aqui no Legislativo. Enfim, não foi desta vez, mas eu continuarei ajudando Barbara para que um dia ela chegue aqui. É uma pessoa que conhece muito o tema, uma pessoa que está refazendo a sua vida. Esse senhor... Hoje, Barbara está casada, já tem outro filho, mas essas marcas na sua vida são impossíveis de serem apagadas, na sua vida, na sua família. Esse senhor está preso, lá no Rio Grande do Sul. E manda ameaças, manda recados para ela de dentro da prisão. Então, a intenção aqui é que esses agressores saíam de perto da vítima, saíam do estado, que não fiquem presos ali onde podem, de uma maneira ou outra, ter contato.
Então, aqui, Barbara, vai o meu carinho, a minha admiração e o meu abraço para você. Barbara, inclusive, sofreu violência política porque assumiram um compromisso com ela de um valor "x". Ela fez compromissos e, no meio da campanha, cortaram. Ela estava sendo escorraçada nas redes sociais porque não tinha dinheiro para pagar cabos eleitorais, e prometeram que ela teria. Barbara sofreu muito, muito, muito nessas eleições. Então, em homenagem a ela... Fico até emocionada em falar da Barbara, mas... É triste tudo isso.
Enfim, estamos aqui para encontrar soluções.
Mais um projeto de lei que eu gostaria... Na verdade, é uma PEC, a PEC 6.
É a Dra. Amini que está aqui, não é? - eu estou com lente de contato...
(Pausa.)
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Acabei de falar para a Desembargadora - perdão, Fátima; perdão, Desembargadora -, disse a ela, dessa PEC, a PEC 6, de 2022, que determina que a cada duas listas sêxtuplas para a carreira de desembargadores, ministros nos tribunais superiores, nos tribunais de justiça, a cada duas listas sêxtuplas para o quinto constitucional do MP e da OAB, e essas duas listas podem ser listas mistas, que a terceira lista seja composta apenas de mulheres. (Palmas.)
Por incrível que pareça, nós somos a maioria nas faculdades de direito, inclusive, estudamos... Hoje, muitas mulheres passam em concursos, mas, quando a ascensão é por nomeação, por questões políticas, as mulheres ficam para trás, o que é uma lástima!
Enfim, é um prazer estar aqui!
Estou ansiosa para assistir, vê-la - perdão por me delongar.
Contem comigo, contem conosco aqui, no Senado Federal, para que consigamos, todas juntas, com o Poder Judiciário, com o Poder Executivo e com a sociedade, trazer soluções efetivas para o nosso país. Nós estamos aqui fazendo a nossa parte.
Muito obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. PDT/PDT - DF) - Excelente, Soraya! E parabéns pelas iniciativas!
Realmente, eu tenho muito orgulho de fazer parte dessa Bancada Feminina nesta atual legislatura. Em toda pauta que envolve mulheres, não tem essa questão, enfim, de em qual campo estamos. Quando é mulher, quando é família, nos unimos muito em prol dessa defesa.
Eu tenho muito orgulho também, quando se fala de iniciativas... Por exemplo, a lei do stalking foi iniciativa minha, da minha equipe, a quem eu muito agradeço. E qual a mulher que não foi vítima de perseguição na sua vida? Tipificar o crime de perseguição, Dra. Amini, trouxe para nós uma estatística estarrecedora, porque, muitas vezes, um feminicídio começa com uma perseguição, um stalking. Então, é fruto de um trabalho não só de uma Senadora, de sua equipe, mas de toda a bancada, que se mobilizou para aprová-lo aqui na Casa.
Então, é um orgulho tremendo e já estou empolgada com as que estão chegando, que, certamente, estarão conosco nessa frente aí, nessa batalha diária aqui. Isso aqui é... Para isso aqui tem que ter as costas quentes e ser muito forte mentalmente, para suportar essa pressão aqui. Mas Deus é maior e a gente tem um propósito, que é o mais importante. O propósito é o que nos faz é continuar nessa luta.
Eu gostaria, rapidamente, de registrar algumas presenças.
Desembargadora Dra. Fátima Maranhão. Doutora, seja bem-vinda! Quero dizer do nosso carinho, do nosso respeito. Eu, em particular, como a Soraya também, tive a oportunidade de conviver com o saudoso Senador José Maranhão, um homem generoso, um homem com a alma pública, que nos faz muita falta aqui nesta Casa, mas estendo o nosso carinho e a nossa solidariedade, acima de tudo, a nossa gratidão por todo o trabalho que ele desenvolveu nesta Casa e para todos os brasileiros. Seja muito bem-vinda!
Vereadora do Município de Castro, no Rio Grande do Sul, a Sra. Cláudia Oliveira.
Procuradora da Mulher da Câmara de Vereadores do Município de Castro, no Rio Grande do Sul, a Sra. Cláudia Piccolo.
Conselheira dos Direitos da Mulher da Secretaria de Estado da Mulher do Distrito Federal pela Central Única dos Trabalhadores, a Sra. Thaísa Borges de Magalhães.
Conselheira dos Direitos da Mulher da Secretaria de Estado da Mulher do Distrito Federal pela Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Distrito Federal, e líder do Comitê de Combate à Violência contra as Mulheres e Meninas do Mulheres do Brasil, a Sra. Joana Mello.
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Seja bem-vinda, Joana!
Representando a Comissão Nacional da Mulher Advogada, a Sra. Rejane da Silva Sánchez; o trio musical Segura Elas, mais uma vez. Quero também registrar a presença da Deputada Federal reeleita Bia Kicis.
Bia, seja muito bem-vinda! É um prazer tê-la conosco, uma parceira e grande companheira de bancada.
A Conselheira da Embaixada da República Dominicana, a Sra. Sandra Rosario; e o Professor e Coordenador do Plano de Paz nas Escolas do Distrito Federal e representantes da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal, Sr. Tony Marcelo Gomes de Oliveira.
Sejam todos bem-vindos!
Eu vou passar a palavra rapidamente, aqui, para a nossa nova representante da Bancada Feminina - e, na sequência, para o nosso Embaixador Daniel Zonshine -, a nossa querida Senadora eleita Ivete da Silveira.
Seja bem-vinda, Senadora!
A SRA. IVETE DA SILVEIRA (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - SC. Para discursar.) - Muito obrigada, Sra. Presidente Leila Barros.
Saúdo as Senadoras já mencionadas aqui e o Embaixador de Israel, Sr. Daniel Zohan Zonshine.
Seja bem-vindo ao nosso país, trazendo novas experiências.
Na minha cidade, Joinville, Santa Catarina, tem um senhor, que talvez o senhor conheça, Miguel Abuhab, que trouxe a inovação para a nossa cidade. Ele tem um complexo de inovação fantástico. Ele, que é filho de israelenses e mora em Joinville há uns 50 anos, é um empresário muito conhecido lá e que traz sempre novas tendências, como trouxe, agora mesmo, uma escola onde, às vezes, a pessoa tem uma certa deficiência em determinada atividade escolar, mas essa criança é direcionada. Às vezes, se ele é bom em matemática, então é direcionado para matemática. Se é para as ciências, então ele é mais direcionado para as ciências. É uma escola fantástica!
Mas, hoje, estamos aqui para tratar da mulher, da mulher que foi espancada, que foi brutalmente assassinada, e nós, mulheres aqui do Senado, vamos nos unir para combater todo tipo de ataque à mulher.
Primeiramente, entendo ser extremamente importante que a realização deste seminário seja feita no Plenário do Senado Federal. Isso porque demonstra que esse tema está entre as principais pautas de discussão nesta Casa.
Combater a violência contra as mulheres é uma questão humanitária e precisa ser enfrentada pelo Poder Público. O Parlamento brasileiro já aprovou diversas normas legais que trouxeram grandes avanços nessa temática, contudo ainda existe muito a ser feito.
Por mais que, atualmente, o tema de combate à violência contra a mulher seja constante em nosso Parlamento, no mundo, as garantias legais foram incluídas muito recentemente.
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Apenas em 1993 foi formalmente reconhecida pela Conferência das Nações Unidas sobre os direitos humanos a violência contra as mulheres como uma das formas de violação desses direitos.
Após esse reconhecimento, os países passaram a incluir o combate à violência contra as mulheres entre as suas pautas de políticas públicas.
Contudo, ainda há muito a ser feito, mas tenho a convicção de que estamos no caminho certo. Contem comigo nessa luta.
Meu muito obrigada a todas.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. PDT/PDT - DF) - Grata, Senadora Ivete...
A SRA. IVETE DA SILVEIRA (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - SC) - Só uma observação, Presidente.
Eu era primeira suplente do Senador Jorginho Mello, de Santa Catarina, e como ele se elegeu Governador em nosso estado, eu assumi em agosto porque ele pediu licença para fazer a campanha. Eu serei efetiva a partir de fevereiro do próximo ano.
E com muito orgulho quero dizer também que a Vice-Governadora eleita foi delegada - hoje ela é aposentada - e ela instalou a primeira delegacia da mulher em Joinville, Santa Catarina, em 1996, se eu não me engano. Ela vai ficar à frente, com toda certeza, na Secretaria da Mulher... Certeza absoluta eu não tenho, mas ela vai trabalhar pelos direitos da mulher, para combater o feminicídio, para combater essas arbitrariedades em que as mulheres estão sendo envolvidas.
Era só isso que eu queria acrescentar.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. PDT/PDT - DF) - Grata, Senadora Ivete, pelas informações - eu já estava aqui "oh, gente..."
Mas, enfim, vou passar agora a palavra para o nosso querido Embaixador de Israel, o Sr. Daniel Zonshine, que fará o seu pronunciamento.
Seja bem-vindo, Embaixador.
O SR. DANIEL ZOHAR ZONSHINE (Para discursar.) - Muito obrigado.
Sra. Procuradora Especial da Mulher do Senado, Senadora Leila Barros, Senadora Soraya Thronicke, Senadora eleita Ivete da Silveira, Deputada Federal Bia Kicis e todos parceiros e amigos que estão aqui, hoje é um dia importante, importante para mulheres, importante para homens, importante para a sociedade toda em qualquer país, em qualquer lugar.
A violência contra mulheres é um fenômeno que não podemos aceitar, temos que condenar e, além disso - e mais importante -, eliminar.
A luta contra esse tipo de violência é um valor que deve estar na base da sociedade. Manter a dignidade do ser humano é a base de toda sociedade democrática e liberal. Zero tolerância para esse tipo de violência.
As maneiras com que podemos lutar: tem-se que fazer com educação em toda a sociedade, em todos os quadros e de uma maneira dura.
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Hoje está conosco Lili Ben-Amin. Eu acredito que Lili preferiria não estar aqui hoje, e continuar a sua vida em Israel, na área da educação, mas a realidade bateu na cara, na vida dela, na vida da família dela. A irmã dela, Michal Sela, foi assassinada pelo marido, mas, com esse sentimento duro e difícil de luto, Lili saiu para uma jornada, com uma missão muito importante, diminuir e eliminar o feminicídio.
Lili encontrou com todo mundo, cada pessoa, cada organização, cada órgão possível, trouxe ideias e tecnologias de vários campos da vida e criou essa organização, o Fórum Michal Sela, que está fazendo um importante trabalho.
O trabalho dela é um exemplo do ecossistema israelense na era da inovação. Trazer, maneiras de resolver problemas, trazer ideias de vários campos de vida, pensar fora da caixa, quebrar tradições e juntar forças e cabeças de várias escolas e campos da vida.
Lili tem visão, determinação, e vai ter sucesso. E o sucesso dela é o sucesso de todos nós.
Quero agradecer ao Senado Federal e a todos vocês pela oportunidade de estar aqui, de fazer este evento. E tenho certeza de que as coisas que nós fazemos hoje terão continuação, como a Ilana mencionou, com a cooperação entre as Casas Parlamentares do Brasil, do Senado, e o Parlamento de Israel, mas também entre a sociedade israelense e a sociedade brasileira.
Então muito obrigado. Espero que tenhamos um dia interessante. Sucesso.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. PDT/PDT - DF) - Grata pela presença, mais uma vez, Embaixador Daniel, e a todas as nossas colegas aqui.
Eu agradeço às autoridades, e vamos finalizar esta mesa de abertura. Já peço aqui aos presentes que possamos desfazer e convidar as nossas debatedoras, as oradoras, que vão nos ajudar nesta manhã aqui no seminário.
Eu informo que, na sequência dos trabalhos deste seminário, nós teremos uma palestra em inglês, com tradução simultânea.
E aos que necessitarem do dispositivo de tradução, mais uma vez, informo que esses dispositivos estão na entrada deste Plenário, caso alguém tenha necessidade desse equipamento.
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A Dra. Amini Haddad, Juíza Auxiliar da Presidência do Conselho Nacional de Justiça, responsável por auxiliar a política de combate à violência às mulheres.
Vou convidar a senhora para vir aqui para a mesa.
Por favor, Doutora. (Palmas.)
A Coordenadora da Rede de Equidade do Senado Federal, a Sra. Maria Terezinha Nunes. (Palmas.)
A Coordenadora do Observatório da Mulher contra a Violência no Senado Federal, a Sra. Maria Tereza Prado. (Palmas.)
A Coordenadora-Geral de Pesquisa do Observatório Nacional da Mulher na Política, a Sra. Ana Cláudia Oliveira. (Pausa.)
A Analista de Programas e Líder da Equipe de Governança e Participação Política da ONU Mulheres, a Sra. Ana Cláudia Pereira. (Palmas.)
A CEO da Startup Brasileira Sisterwave, Sra. Jussara Pellicano Botelho. (Palmas.)
E por fim, e por fim, a presença mais, digamos, esperada também e que nós agradecemos muito a presença, porque as demais sempre estão conosco aqui nos debates, na Casa, já agradeço mais uma vez a colaboração e participação de todas, mas peço uma salva de palmas muito carinhosas à fundadora da Associação de Prevenção à Violência contra a Mulher "Michal Sela Fórum", a Sra. Lili Ben-Ami (Palmas.)
Para dar continuidade à mesa, nós gostaríamos de introduzir as nossas palestrantes. Cada uma terá dez minutos para suas falas.
E a primeira oradora, apesar de eu já ter declarado por último aqui há pouco a compor a Mesa, é a Sra. Lili.
Se quiser já usar o dispositivo.
E quem precisar do tradutor, com licença, porque o meu inglês...
A SRA. LILI BEN-AMI (Para discursar. Tradução simultânea.) - Muito obrigada, Brasil e Embaixador de Israel.
Eu vim aqui de Jerusalém, 24 horas de voo, três voos diferentes e eu estou honrada em estar aqui especialmente no dia de hoje, em que o Brasil está tendo a Copa, e vocês são grandes vencedores. Então, obrigada.
Meu nome é Lili Ben-Ami. A minha jovem irmã, Michal Sela, foi brutalmente assassinada três anos atrás pelo marido, na própria casa, na frente da filha pequena, de oito meses de idade. Eu fui a última pessoa a vê-la viva. Eu estava com a Michal uma hora e meia antes de ela ter sido assassinada com uma faca na cozinha. Nós não vimos nada. Nós descobrimos que não tinha histórico de violência física antes de ela ser assassinada. Tinha violência emocional no relacionamento.
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Quando eu estudei isso, eu descobri que metade das vítimas de feminicídio não passa por violência física antes. Tem violência emocional, como controle, verificar onde você está o tempo inteiro. E elas são assassinadas quando querem sair do relacionamento.
Minha irmã falou: "Eu quero o divórcio"; e ele disse: "Eu vou me matar se você me deixar". Mas minha irmã era muito forte. Então, depois de um ano de casamento, ela disse "já chega" e anunciou que estava indo embora. Naquela noite, ele pegou uma faca e a assassinou. Ela não sabia que a vida dela estava em perigo.
Depois da morte dela, eu fundei o Fórum Michal Sela, uma ONG dedicada a salvar vidas de mulheres com tecnologia e inovação. Nós estamos trazendo o campo da violência doméstica para 2022, para o futuro, estamos fazendo prevenção e previsão de violência doméstica e também estamos trabalhando com políticas, educação e campanhas.
Eu quero falar sobre a legislação que aprovamos no ano passado, uma legislação muito especial. Na verdade, Israel é o único país no mundo que tem essa lei, e eu vou falar sobre ela.
Quando a minha irmã foi assassinada, os serviços de assistência social nos disseram sobre o bebê dela, que tinha oito meses à época, que o assassino que foi preso pelo assassinato era o pai biológico - ele era o pai -, e nós seríamos os pais adotivos, mas ele iria poder decidir tudo: nome, educação, as viagens da criança. E eu tive que levar o bebê da minha irmã assassinada toda semana para a cadeia para visitar esse homem. Essa era a situação, essa era a realidade também em outros países. Eu disse: "Isso é inaceitável!". E o Gideon Sa'ar, que é o Ministro da Justiça, e o Oded Forer, que é o Ministro da Agricultura, nós aprovamos uma lei com sucesso, com zero voluntários, o que significa que, se você assassinar a sua parceira íntima ou se você tentar assassiná-la ou se você estuprar um filho, você vai perder a guarda. Então, hoje em dia, o assassino da minha irmã não é mais o pai do bebê dela.
No Fórum Michal Sela, nós estamos pensando fora da caixa para resolver o fenômeno de mulheres sendo assassinadas em suas próprias casas. Até o dia do assassinato da minha irmã, esse tema era responsabilidade dos assistentes sociais, e, para vítimas de violência doméstica, tínhamos três opções do que fazer: você pode ir para um abrigo, você pode buscar a polícia e pegar um mandado contra o seu agressor ou ir até o centro de violência doméstica.
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Todas essas três são só depois de algo muito ruim acontecer, algo muito estranho, porque você tem que esperar algo muito ruim acontecer para buscar um abrigo num centro de violência doméstica. Todas as três ficavam só nos ombros da vítima, todas essas soluções são as mesmas soluções que tinham sido adotadas por 70 anos, desde Israel ser estabelecido como país.
O que está acontecendo? Estamos em 2020, a raça humana avançou muito, nós usamos soluções avançadas em outros campos. E eu descobri que a violência doméstica, o feminicídio são os únicos campos em que temos situações de vida e morte e não existe prevenção. Para a covid-19, vocês usam máscara, nós tomamos vacina; para acidente de carro nós usamos cinto; para o câncer nós fazemos prevenções, exames; então, você olha para qualquer campo em que existe risco de vida e usamos tecnologia, inovação e prevenção, mas, para as mulheres estarem seguras em sua própria casa, por que nesse caso nós esperamos algo muito ruim acontecer para agir? Por que só nesse caso todas as soluções são as mesmas usadas há tanto tempo? Por que nesse caso a própria vítima tem que se esconder, ela tem de ser esconder no abrigo?
Eu digo que a vítima não deve se esconder, não deve ter medo; o agressor é que tem que ter medo. Ela deve estar segura e forte, todo mundo deve apoiá-la. As mulheres que sofrem violência doméstica na própria casa geralmente pisam em ovos, é como se a sua casa fosse um campo minado e você precisa ter cuidado para não pisar em uma granada. Elas precisam de nós, elas precisam das pessoas que não sofrem violência doméstica, elas precisam que vocês desenvolvam ideias e soluções para salvar a próxima Michal, para salvar a próxima vítima, porque as mulheres que estão lá agora estão sequestradas, estão em cativeiro. Elas não são fracas, elas são fortes; o agressor que é fraco. Elas estão em modo de sobrevivência.
Ele diz: "Se você me deixar, eu vou machucar você ou vou machucar as crianças, vou machucar você ou vou mandar suas fotos íntimas para alguém na internet". Abandonar a um predador sozinha é quase impossível, e esse é um momento de sobrevivência. Elas fazem o que fazem para sobreviver. A minha irmã disse: "Eu não vou ficar mais". A vida dela estava em risco. Quase todas as vítimas de feminicídio são assassinadas ao tentar ir embora, ao tentar pedir o divórcio. É por isso que é uma situação de sequestro, de cativeiro, e é nossa responsabilidade salvar essas pessoas.
Em Israel nós criamos a hashtag que diz "Que sua memória seja a revolução". Nosso objetivo é zero feminicídio por ano, nosso objetivo é que o feminicídio seja história.
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Nós usamos a tecnologia e eu quero usar um vídeo de um minuto no qual vocês podem ver como usamos a tecnologia para trazer a minha irmã de volta à vida.
(Procede-se à exibição de vídeo.) (Palmas.)
A SRA. LILI BEN-AMI (Tradução simultânea.) - Sabe o Waze, aquele aplicativo de GPS? É uma invenção de Israel.
Israel é uma nação de startups e somos especialistas em segurança interna. Nós sabemos salvar vidas com tecnologia. Em Israel, nós usamos as melhores mentes de alta tecnologia e de segurança interna e, junto com especialistas em violência doméstica, nós desenvolvemos novas tecnologias para salvar a vida de mulheres que sofrem de violência doméstica. Nós construímos soluções tecnológicas e algumas inovadoras que não são tecnológicas.
Uma delas eu quero falar, é o uso de cachorros treinados para salvar essas mulheres. Então, uma mulher que é ameaçada e não mora mais com o parceiro recebe um cachorro que é treinado por seis meses. É a única solução, uma solução a longo prazo, porque ela recebe esse cachorro dentro de sua casa e também é uma maneira de curar o trauma e a solidão. Por que ela deve se esconder? Agora, com um cachorro treinado é muito mais difícil alcançá-la.
Esta semana nós mostramos essa solução para o BPCães e eles ficaram muito empolgados, deram-me um certificado e fizeram uma demonstração exatamente do que estamos fazendo em Israel. Vocês têm especialistas no Brasil que sabem como fazer isso. Então, eu perguntei ao Comandante da Polícia Militar do BPCães - ele é dessa altura, dois metros, grandão - se ele já protegeu uma mulher ameaçada? E ele falou: "Eu já usei os cachorros para muitas coisas, mas nunca para mulheres ameaçadas". E eu perguntei o porquê, porque temos tantas soluções avançadas para salvar vidas em outros campos, temos que pegar isso e trazer para a violência doméstica.
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A Uber mudou o campo de transporte, iFood, Facebook, outros, e nós queremos também mudar o campo de violência doméstica.
Todos anos, em Israel, nós temos um hackathon, e nós fazemos isso todos os anos - chama-se safe at home, seguro em casa - para todo o público, é aberto ao público. Nós chamamos todo mundo para pensar fora da caixa, trazer ideias tecnológicas para salvar vidas. Até hoje, mais de 450 ideias tecnológicas foram conceitualizadas e construídas no hackathon, e nós conduzimos isso com empresas de alta tecnologia, como Google, Meta, Sony, Philips. Depois do hackathon... Você pode ver aqui a plataforma virtual de que engenheiros do mundo todo e de Israel, claro, podem participar porque é virtual. No último dia, fazemos pessoalmente, na casa do Presidente de Israel.
Então, cada equipe trabalha em um estande assim, como você pode ver, e também temos mesas de especialistas jurídicos, em privacidade, marketing. Aqueles engenheiros de software aconselham os empreendedores. Eles sentam, pensam, escrevem código, e é a primeira vez que esses engenheiros trabalham com o assunto de violência doméstica. Para mim, é empolgante, porque é exatamente isto que eu estou falando: precisamos trazer novos atores para o campo da violência doméstica. Eles precisam sentar e pensar de forma interdisciplinar para podermos vencer esse fenômeno.
Esses são o Presidente de Israel e o Primeiro-Ministro, que acabou seu mandato agora.
Quando termina o hackathon, nós fazemos um programa de três meses. É um acelerador. Pegamos os dez melhores projetos que passam pela academia de startup da Google. Eu posso dar um exemplo: uma empreendedora construiu um aplicativo que é um botão de pânico, mas com sua voz. Você escolhe uma palavra, que é o código que ativa o botão de pânico no aplicativo, manda uma mensagem para duas pessoas que você escolhe, duas pessoas de segurança e, se você quiser, também pode escolher uma empresa de segurança ou a polícia. Isso liga o celular para gravar o som e captar tudo que está acontecendo.
Também temos outro programa em que as mulheres mandam informações sobre a violência sofrida para uma cápsula. Se várias pessoas mandarem informações sobre a mesma pessoa...
(Soa a campainha.)
A SRA. LILI BEN-AMI (Tradução simultânea.) - ... vai aparecer e talvez elas possam decidir ir à polícia e denunciar essa pessoa juntas.
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Outra pessoa era uma artista plástica, e ela fazia colares, anéis que tinham um botão de pânico embutido. Outra pessoa inventou um aplicativo que detecta se há espionagem no seu celular ou no seu computador. E há tantas outras ideias que podem ser usadas para salvarmos vidas juntas.
Então, meu sonho é que, daqui a alguns anos, eu me veja sentada na praia com a filha da minha irmã, que já terá crescido, e que eu possa dizer a ela: um tempo atrás havia o fenômeno do feminicídio, as mulheres morriam na sua própria casa e sua mãe foi vítima desse fenômeno. Ela lutou, lutou, até que sua luz foi desligada. Mas nós mantivemos a sua luz ligada, a sua chama acesa e hoje não há mais vítimas de feminicídio. Que a sua memória seja revolução.
Muito obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. PDT/PDT - DF) - Grata pela participação, Lili.
E, quando nós vemos, o quanto Israel conseguiu avançar com o apoio da ciência e da tecnologia - não é, Soraya? -, nesses instrumentos de ação que ajudam a combater a violência contra a mulher em seu país, eu penso o quanto enfim... Vocês prestaram atenção na minha fala, das políticas que foram desconstruídas, do orçamento que não foi utilizado, do decréscimo de recursos no orçamento, que não foi investido ou que teve e que também não foi executado.
Quer dizer, o próximo Governo tem que pensar... Quando a gente escuta a Lili falando, é uma questão de política macro. Não adianta cada um na sua ilha desenvolver uma política, sendo que, como o nosso país é continental e é uma situação que exige uma abordagem mais coletiva, de uma política mais consistente em nível de país mesmo, de Estado, a gente tem que de alguma forma buscar esses exemplos, ver as prioridades.
E agora com os investimentos que esta Casa... E nós vamos cobrar - não é, Soraya, e demais Parlamentares que estiverem presentes? Quando falamos de orçamento, nós conseguimos aprovar ano passado algo inédito, que é recurso, porque nós temos uma legislação... Acho que a Maria da Penha é uma das três melhores legislações no mundo de combate à violência contra a mulher e para a qual não tinha recurso. A gente tem a legislação, mas a gente não tem recursos para ter os mecanismos necessários para protegê-las. E agora, ano passado, nós aprovamos para o Fundo Nacional de Segurança Pública 5%. Vocês vão falar: "Ah, mas 5%?!". Já é um avanço, Lili! Já é um avanço para nós em termos de país, entendendo que o nosso país é um país continental. Então, que esse recurso seja aplicado - não é, Soraya? -, que esse recurso, de fato, chegue na ponta e que a gente consiga implementar essas políticas tão necessárias. Depois de ouvir uma fala como essa, quer dizer, é como a Lili falou: que as pessoas comecem a pensar fora da caixa. Que a gente consiga entender que o agressor que é o fraco. Fortes somos nós, que muitas vezes queremos sair dessa condição e somos reféns de uma situação, porque estamos em modo sobrevivência. E a gente sabe da realidade das mulheres no Brasil.
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Então, assim, eu agradeço a sua participação, a sua fala e vou passar para a nossa próxima oradora, a Sra. Maria Terezinha Nunes, que é Coordenadora da Rede de Equidade, trabalha há mais de dez anos com o tema da equidade de gênero e raça no Senado Federal, tendo atuado como advogada voluntária em projetos de atendimento às mulheres em situação de violência doméstica e familiar aqui no DF.
Seja bem-vinda, doutora! Querida, não é? Fique à vontade, pode ser aqui, pode ser no púlpito.
A SRA. MARIA TEREZINHA NUNES (Para discursar.) - Bom dia a todos e todas e "todes". É uma honra estar aqui com tantas pessoas engajadas nesse tema da violência doméstica e familiar. E eu vou trazer um pouquinho dos meus estudos, da minha experiência no comitê e agora na Rede Equidade.
Cumprimento a mesa, cumprimento a todos vocês, na pessoa da Senadora Leila Barros.
Bom, pode passar, então, para o próximo eslaide. (Pausa.)
Pode passar o próximo eslaide, por favor? (Pausa.)
Bom, coube a mim trazer um pouco da legislação desse tema da violência doméstica familiar, e eu vou fazer um recorte, dado que nós temos muita legislação, muito esforço nessa temática. Então eu vou me concentrar especificamente na questão da violência doméstica familiar.
Eu não poderia deixar de falar que a nossa legislação começou já colocando a mulher como cidadã de segunda categoria. A gente herdou da legislação portuguesa a condição da mulher como frágil, como incapaz, como subalterna, e isso provocou vários interditos para ela em todos os espaços da vida social. Em 1830, com o Código Criminal, essa legislação foi retirada. Havia também autorização - e isto é importante falar - na esfera criminal, para que pais, o pai e o marido, pudessem cometer abusos e maus-tratos contra as mulheres.
Essa legislação foi posteriormente retirada do Código Criminal, mas remanesceu a legislação civil, que legitimava a estrutura patriarcal. Havia hierarquização da família, e a mulher tinha o dever de obediência ao homem. Posteriormente nós tivemos, no Código Civil de 1916, a primeira oportunidade de mudar esse status, mas infelizmente não houve alteração, não veio a igualdade tão esperada.
Mais à frente, nós tivemos o Estatuto da Mulher Casada, e o estatuto já avançou um pouco, trouxe várias garantias na esfera civil.
Mais à frente, tivemos também a Lei do Divórcio, que foi uma grande oportunidade para as mulheres saírem do ciclo da violência. Mas essa legislação, que foi avançando paulatinamente na legislação civil, não foi acompanhada na legislação criminal. E a mesma legislação era aplicada. Vamos supor, se um homem chegasse e contasse que foi vítima de uma violência, de uma lesão corporal, ele não recebia o mesmo tratamento de uma mulher que chegasse à delegacia e contasse que havia sido vítima de uma lesão corporal pelo homem. Havia essa mesma... Bom, se ela recebesse um tratamento da lei, um tratamento objetivo, até que seria muito bem-vindo, mas ali era perguntado a ela como é que ela iria colocar um pai de família... (Pausa.)
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Obrigada.
Então, tinha toda uma questão de cultura machista, naquela época, patriarcal, que questionava o procedimento da mulher quando ela buscava ali o seu direito de viver sem violência.
A questão da violência doméstica e familiar foi trazida para a agenda pública a partir dos movimentos sociais feministas, numa época - ali no final dos anos 70, início dos anos 80 -, num contexto de abertura política em que os movimentos sociais, em geral, trouxeram várias demandas: comida na mesa, creches, "n" demandas. E coube aos movimentos sociais feministas encampar essa pauta da violência doméstica e familiar.
O que causou indignação, naquela época, foram os assassinatos das mulheres por seus maridos. Fizeram a campanha "Quem Ama Não Mata", da qual a gente ouve falar como ela foi importante naquela época. Mas ela trazia ali, à baila, os casos mais emblemáticos que chegavam à mídia, em geral de mulheres de classe alta que sofriam esse tipo de violência.
Então, os movimentos sociais começaram a se questionar: o que fazer para a prevenção? Nesse caso, as mulheres estão morrendo. Havia, naquela época, uma argumentação que justificava a morte de mulheres, que foi construída pela defesa e que de forma nenhuma integrava a legislação nacional: era a legítima defesa da honra. Essa legítima defesa da honra "justificou", entre aspas, a absolvição de muitos homens que matavam as suas mulheres. Recentemente, há muito pouco tempo, o Supremo Tribunal Federal colocou uma pá de cal nesse tipo de argumentação dizendo ser inconstitucional. Mas ele foi bastante utilizado.
Então, esses movimentos sociais feministas se perguntaram o que poderiam fazer para a prevenção. E foi aí que veio a ideia do atendimento às mulheres em situação de violência doméstica familiar. Elas abriram o SOS Mulher. E a demanda foi tão grande, tão variada - queriam a guarda dos filhos, queriam verificar a questão do afastamento do lar, queriam, também, a reparação criminal, a assistência social, que elas foram verificando que era um fenômeno social complexo, de grande alcance, e que certamente acontecia no interior do Brasil afora. E refletiram sobre a necessidade de trazer à responsabilidade do Estado brasileiro.
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Daí vieram algumas ideias, entre elas, a criação das delegacias de atendimento à mulher, que foram muito importantes naquela época e, até hoje, se fazem muito importantes. Temos, infelizmente, poucas delegacias, num contexto de mais de 5 mil municípios brasileiros, temos poucas delegacias, mas o grande diferencial que esses movimentos sociais buscaram era que o atendimento fosse feito por um corpo feminino, que tivessem um acolhimento, que elas não voltassem para casa sem que a demanda delas de violência fosse compreendida e que elas tivessem ali uma solução.
Bom, eu costumo falar que, se temos avanços, isso se deve ao protagonismo tanto desses movimentos sociais quanto da Bancada Feminina no Congresso Nacional. Esse esforço conjugado faz toda a diferença. E eu vou trazer um exemplo aqui que foi um marco temporal na questão da violência doméstica familiar na época da Constituição de 1988. A Bancada Feminina naquela época recebeu o nome de Lobby do Batom. Eram 26 Deputadas, e não havia nenhuma Senadora. Até trouxe... Deixem-me ver se está aparecendo a foto. (Pausa.)
Eu coloquei, para fazer um contraponto, essa foto, em que, acho, são dez Senadoras. Mas, vejam bem, na Constituinte de 88, não havia nenhuma Senadora; hoje, a gente tem uma representatividade entre 10%, 15%, girando entre 10%, 15%. Então, sempre foi baixa essa representatividade. O Brasil tem uma das piores condições em se tratando de mulheres na política, uma das piores posições em nível mundial.
Nessa época, foi incluído no texto constitucional, §8º do art. 226, no capítulo da família, que o Estado deveria coibir a violência das relações familiares. E eu vou trazer uma história aqui que a Professora e também grande ativista Silvia Pimentel contou. Assim que terminaram de incluir esse artigo...
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA TEREZINHA NUNES - ... saiu um jornal, um Deputado fez uma matéria num jornal de grande circulação, dizendo: "Como que a bancada, o Lobby do Batom incluía um artigo desses na Constituição Federal se as mulheres gostam de apanhar?" - isso para se ter uma ideia de que o avanço legislativo causa estranheza, ainda naquela sociedade muito, muito machista e patriarcal.
Então, por aí, a gente tem uma ideia do quanto foi difícil o trabalho dessas pioneiras que se juntaram - ali também os movimentos sociais estavam próximos, estavam junto com elas, trouxeram as demandas das mulheres brasileiras numa carta e aprovaram outras matérias superimportantes, inclusive a igualdade de direitos e obrigações na sociedade conjugal, que foi um marco muito importante também para o avanço da igualdade na família.
Bom, coloquei aqui também as convenções internacionais - até a Senadora Ivete já colocou. Tivemos importantes marcos temporais nas convenções. Em 1993, sim, a violência doméstica e familiar foi declarada como violação de direitos humanos. Posteriormente, nós tivemos a Convenção Cedaw, de 1979, da ONU, muito importante também para o avanço dos direitos das mulheres; e, em 1995, a Convenção Belém do Pará, que foi específica na questão da violência doméstica e familiar.
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Bom, outro marco importantíssimo também foi a criação da Lei Maria da Penha, que mudou completamente o paradigma de atenção à violência doméstica e familiar. Até então, embora lá em 1988 tenha sido incluído esse artigo, não havia uma legislação específica. Mesmo com todo esse avanço nas convenções internacionais e a sua ratificação pelo Brasil, não havia uma legislação específica.
A legislação existente banalizava a violência doméstica e familiar. Era uma lei geral, ela não foi feita para a questão da violência doméstica e familiar. Era a Lei n° 9.099, que trazia para a sociedade um simbolismo muito ruim, ou seja, de que a violência doméstica e familiar era barata; ela podia acontecer, porque, quando chegava no juizado, havia um acordo, uma transação penal, um pagamento de cesta básica, um buquê de flores. Assim, banalizava-se completamente a questão da violência doméstica, e a violência tende... É uma dificuldade - muitas pesquisas dão isso - as mulheres chegarem até a delegacia. Quando elas chegam, raramente é um primeiro caso. Ali são vários casos. Então, ela chegava ali, e não tinha uma resposta do Judiciário.
Novamente, um grupo de advogadas feministas de vários movimentos sociais formaram um consórcio de ONGs e deram início ao texto de uma nova lei, trazendo toda essa experiência anterior de trabalho de observação dos atendimentos nas delegacias, nos juizados, consultando as leis já existentes em outros países, e fizeram um pré-projeto. Esse pré-projeto foi entregue à Secretaria de Políticas para as Mulheres, que novamente trouxe a debate a questão, mas havia uma resistência muito grande a tirar, de vez, a aplicação dessa Lei n° 9.099, exatamente porque pairava sobre a sociedade a ideia de que a violência doméstica e familiar é algo privado. Por que o Estado se imiscuir tanto nessa questão? Foi dada entrada na Câmara dos Deputados, e, ali, a Bancada Feminina foi essencial, crucial para a promulgação dessa lei. A Deputada Jandira Feghali foi a Relatora; no Senado, foi a Senadora Lúcia Vânia. E mudou! Ela foi promulgada depois de dois anos de tramitação. A Deputada levou aos estados, buscou subsídios para o aperfeiçoamento. E ela foi promulgada em 7 de agosto de 2006, recebeu o n° 11.340, de 2006, e homenageou Maria da Penha, essa que está sentada ali no meio. Ela ficou paraplégica. Por duas vezes, ela sofreu tentativa de homicídio.
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Uma das coisas também que contribuiu muito para que essa lei realmente viesse a ser gestada, debatida e verificada a sua importância foi que o Brasil recebeu uma "sanção", entre aspas, recebeu muitas recomendações. E Maria da Penha teve a coragem, junto com duas outras organizações, a Cladem e a Cajil, de levar às instâncias internacionais o seu caso...
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA TEREZINHA NUNES - Ela denunciou o Brasil pela morosidade no julgamento do seu caso, e isso contribuiu bastante para que essa lei saísse como foi imaginada pelos movimentos sociais feministas e como foi debatido aqui também no Congresso Nacional.
Eu costumo dizer que o eixo principal dessa lei é a prevenção e proteção, mas ela recebeu tantas... Principalmente, o mundo jurídico foi tão reativo com essa lei que a gente teve juízes, inclusive, que disseram ser uma lei do demônio, que disseram, toda vez, que ela era inconstitucional, e isso atrasou... Não sou de dentro do Judiciário, Dra. Amini, mas atrasou bastante a aplicação da Lei Maria da Penha.
Aqui, eu vou mostrar algumas...
(Soa a campainha.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. PDT/PDT - DF. Fora do microfone.) - Desculpa... Não! Pode falar...
A SRA. MARIA TEREZINHA NUNES - Eu estou atrasada com a minha exposição, então, vou adiantar um pouquinho, porque, inclusive, a Senadora já falou dos avanços da lei, mas eu queria destacar que a questão das medidas protetivas de urgência trouxe para dentro da lei a importância de ser uma conjugação de esforços. Não adianta só a União, só o Estado. Têm que ser todos ali nessa mesma a conjugação de esforços. Os serviços de atendimento têm que ser interligados para que a mulher vá ao serviço de atendimento e ali ela não seja desestimulada a continuar com a denúncia.
A violência... A Lei Maria da Penha foi inovadora, porque colocou que independe de orientação sexual...
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA TEREZINHA NUNES - ... ela proibiu o pagamento de cestas básicas, multas ou quaisquer outras penas pecuniárias, trouxe todos os tipos penais, como a Senadora já falou.
O que eu acho - até coloquei como primeiro aqui - é que, na interpretação da lei, tem que ser vista a condição peculiar da violência doméstica familiar. É isto que tem que ser sempre dito e repetido: ela não é um crime como outro crime qualquer. Ela tem peculiaridades. Em geral, é cometida por um parceiro íntimo nas relações afetivas. É algo completamente diferente e depende de capacitação, depende de um conhecimento mais profundo do que é realmente a violência doméstica familiar.
Então, só para finalizar agora, bem rapidamente... Não estou conseguindo passar... (Pausa.)
O próximo eslaide. (Pausa.)
Bom, tivemos muito reforço no aperfeiçoamento da legislação.
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Eu destaquei algumas leis - são muito mais do que essas. Vou só passar, porque a Senadora Leila já comentou e acho que vale como destaque. A Lei do Feminicídio, que foi muito importante para diferenciar do homicídio comum o homicídio contra a mulher; a destinação de recursos, que é muito importante, porque o Brasil é continental, então, precisa realmente de mais serviços de atendimento; e a questão do crime de stalking, que é muito presente na questão da violência doméstica familiar. Terminar um namoro com uma pessoa que não aceita o final do relacionamento é risco para a mulher e, em geral, ocorre, sim, a perseguição.
Terminando, eu queria só pontuar rapidamente que, no âmbito administrativo também, nós estamos trabalhando com a questão da violência doméstica e familiar, e eu reputo muito importante a constituição do comitê. Hoje eu estou no Comitê de Promoção da Igualdade de Gênero e Raça, também no Comitê da Rede Equidade, porque é aí que a gente vai trazer o tema a debate. Nós temos colegas de trabalho que já sofreram violência doméstica, nós temos colegas que sofreram assédio. Então, as violências estão presentes, inclusive no mundo laboral, e é importante que a gente se sensibilize e busque debater o assunto.
Nós instituímos uma cota de 2% no contrato de terceirização, que vai contribuir para a autonomia econômica das mulheres em situação de violência doméstica familiar. Hoje nós temos cerca de, mais ou menos, 30 contratadas. Isso foi uma parceria com o Governo do Distrito Federal, surgiu desse trabalho no comitê. Foi uma ação que nós fizemos, uma visita à Casa Abrigo, e, a partir da sensibilização - a Diretora Ilana teve um protagonismo nessa medida, nessa ação -, hoje, ela é replicada por vários órgãos públicos, foi para a Lei de Licitação.
Por último, eu queria falar do curso Dialogando sobre a Lei Maria da Penha, em parceria com o ILB. Já certificamos mais de cem mil pessoas nesse tema - ele traz um pouco da história da lei. E, por fim, a Rede Equidade. São onze instituições: o Senado e mais dez instituições, inclusive o CNJ.
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA TEREZINHA NUNES - A partir da conjugação, cada vez mais, desses esforços, é que a gente vai desnaturalizar a violência doméstica, que, sim, tem que ser falada no âmbito do trabalho, e é o que a gente está pretendendo fazer.
Muito obrigada, Senadora.
Obrigada a todos e a todas.
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. PDT/PDT - DF) - Nós que agradecemos, Maria. Grata pela participação.
Eu vou passar a palavra agora para a Sra. Ana Cláudia Oliveira, Coordenadora-Geral de Pesquisa do Observatório Nacional da Mulher na Política e assessora legislativa da Secretaria da Mulher, na Câmara dos Deputados; Mestre em Igualdade e Gênero pela Universidade de Málaga, na Espanha; e Especialista em Parlamento e Direito pelo Centro de Formação, Treinamento e Aperfeiçoamento da Câmara dos Deputados.
Com a palavra, Ana Cláudia.
A SRA. ANA CLÁUDIA OLIVEIRA (Para discursar.) - Muito obrigada, Senadora.
Cumprimento todas as minhas colegas e ao colega aqui de bancada.
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Em primeiro lugar, queria dizer que eu estou bem emocionada de estar aqui nesta tribuna, falando hoje. Eu coordeno a pesquisa, sou Coordenadora-Geral de Pesquisa do Observatório Nacional da Mulher na Política na Câmara. E eu sei que, com relação à pesquisa, há muitos que dizem que tem que ser uma atividade de neutralidade, mas eu acho que, para quem é mulher e para quem é feminista, falar sobre participação da mulher na política nunca vai ser uma coisa neutra para quem pesquisa isso. Não tem como ser pesquisadora desse tema e, ao mesmo tempo, não ser ativista. Então, para mim, é emocionante estar aqui nesta tribuna do Senado, que é tão representativa da luta pela participação das mulheres na política no país.
Um pouco antes de subir à tribuna, eu fui ao banheiro, aqui atrás, e lembrei-me da notícia de que, só em 2015, foi instalado um banheiro feminino aqui no Plenário do Senado Federal, em dezembro de 2015. Faz sete anos somente que há um banheiro para as mulheres Senadoras que atuam aqui nesta Casa. Isso é muito simbólico do quanto é árdua a luta pela participação das mulheres na política no nosso país.
Então, eu vim aqui para falar para vocês sobre o Observatório, que é esse núcleo de pesquisas, agregador de pesquisas sobre mulheres na política, que foi criado lá na Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados, há cerca de um ano, e que tem como um dos eixos de pesquisa a violência política contra a mulher. Mas antes de falar sobre a violência política contra a mulher, eu queria apresentar para vocês, já que é relativamente nova a constituição do Observatório, um pouco do nosso trabalho.
Vou colocar ali um eslaide.
Bom, o Observatório foi criado há pouco mais de um ano, em junho de 2021. O objetivo do Observatório é o de investigar, produzir, agregar e disseminar conhecimento acerca da atuação política de mulheres no Brasil e sobre o processo de construção e fortalecimento do seu protagonismo político. Ele foi criado por portaria, em junho de 2021, mas, recentemente, nós conseguimos que ele fosse incluído também na estrutura regimental da Câmara dos Deputados, o que deu um caráter de permanência, de continuidade ao trabalho do Observatório.
Nós temos, então, como eu havia falado antes, alguns eixos de pesquisa, três eixos de pesquisa: o primeiro deles é o de violência política contra a mulher, o segundo é o de atuação parlamentar e representatividade feminina, e o terceiro, de atuação partidária e processos eleitorais. Temos também um Conselho Consultivo que integra a nossa estrutura; núcleos estaduais formados pelas assembleias legislativas, nos estados; a Coordenação-Geral de Pesquisa, a qual eu integro; e temos também o apoio técnico lá da Secretaria da Mulher.
Nesse primeiro ano de existência, nós tivemos já mais de 30 pesquisadoras e pesquisadores que são integrantes dos eixos de pesquisa do Observatório, pesquisadores de todo o Brasil, inclusive, algumas do exterior. Temos, até o momento, 20 assembleias legislativas que integram nossos núcleos estaduais e também o Conselho Consultivo do Observatório e 16 entidades parceiras que também integram o Conselho Consultivo. Entre essas entidades parceiras, nós temos institutos de pesquisa, organismos internacionais e ONGs que trabalham também nessa questão da participação feminina na política.
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Eu vou passar muito rapidamente aqui pelos eventos que nós fizemos no ano passado, que uma das atividades do Observatório é trazer a público o debate do que está sendo estudado sobre a participação feminina na política no país. Então, nós fizemos eventos sobre os desafios enfrentados pelas mulheres nas eleições, sobre a reforma política, sobre os avanços legislativos, que foram muitos, de ações afirmativas para impulsionar a participação feminina na política, sobre violência política contra as mulheres também...
Eu não sei se sou eu que estou passando. Eu acho que é o rapaz. Então, eu vou parar de mexer aqui.
Enfim, pode ir seguindo.
É mesmo só para fazer um apanhado. E eu vou disponibilizar, depois, essa apresentação na página do Observatório na internet. Todos esses eventos foram gravados. Então, quem quiser acompanhar... Vários especialistas falando sobre o tema, Parlamentares... São eventos que agregam muito conhecimento à pesquisa sobre mulheres na política no país, e vale muito a pena acompanhar esses eventos. Então, todos estão na nossa página no YouTube, e vocês podem acompanhar acessando a nossa página.
Pode passar, por gentileza.
E as nossas pesquisas, que é o núcleo duro do Observatório, pesquisas que nós impulsionamos com as nossas pesquisadoras e pesquisadores associados; essas pesquisas estão disponibilizadas na nossa página também em formato de nota técnica ou de artigos publicados na imprensa. Então, acessando a nossa página também vocês têm acesso a todas essas pesquisas.
E uma das coisas também que a gente conseguiu colocar na nossa página que é muito interessante é um painel, vários painéis, na verdade, dinâmicos, com dados das eleições, dados de candidaturas, em que é possível verificar se houve o cumprimento dos partidos no número mínimo de candidaturas de mulheres nas últimas eleições, não só na última de agora, mas também nas passadas, se houve destinação correta dos recursos para a campanha de mulheres... Tudo isso nesses painéis dinâmicos, interativos. É possível filtrar por partido, por cargo, por unidade da Federação, e isso serve de acompanhamento não só para quem estuda o tema, mas também para quem é curioso sobre o tema, serve de fonte para a imprensa, serve de fonte para formuladores de políticas públicas sobre esse tema... Então, está bem interessante.
Pode passar, por gentileza.
Nós também temos pesquisas que são desenvolvidas em parceria com instituições externas. Por exemplo, nós temos agora um projeto que está em andamento sobre as eleições de 2022 que foi feito com a UnB. Essa pesquisa já tem alguns frutos, já tem alguns resultados, que estão também no nosso site. Estamos também com uma parceria com o Instituto Artemísia agora que vai investigar a gestão das Prefeitas na Região Nordeste. Esse estudo também em breve a gente vai divulgar na nossa página e foi financiado pela Agência Francesa de Desenvolvimento. Então, nós temos parcerias com entidades estrangeiras e nacionais para financiamento de pesquisas também sobre esse tema.
Pode passar, por gentileza.
E, para a próxima legislatura, nós temos várias pesquisas que estão em andamento e que vão estar disponibilizadas também no nosso site. A ideia é que o nosso portal funcione como um repositório sobre pesquisas que estão sendo feitas no Brasil e no mundo sobre a questão das mulheres na política. Pretendemos lançar também um manual de boas práticas, cujo objetivo é aumentar o protagonismo das mulheres nas assembleias legislativas estaduais. Pode passar, por favor.
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Também vamos realizar uma série de seminários e eventos com esse tema no ano que vem e publicar um livro com artigos de autoria das nossas pesquisadoras, também sobre esse tema.
Pode passar, por gentileza.
Então, eu convido todos para que acessem a nossa página na internet, camara.leg.br/onmp e confiram essas pesquisas que estão lá.
Por que eu quis falar do observatório antes de falar da questão da violência política contra a mulher? Bom, porque este seminário é de inovação e iniciativa da eliminação da violência contra as mulheres, de violências diversas, essas violências acontecem no âmbito doméstico, como foi bastante falado aqui sobre a Lei Maria da Penha, que é uma lei que serve para prevenir esse tipo de violência, mas ela também acontece bastante no âmbito público, que é o âmbito em que, apenas no último século, pouco menos de um século, as mulheres foram de fato autorizadas no país a participar ativamente. O direito ao voto no Brasil acabou de completar 90 anos, então, faz pouco tempo, se considerarmos toda a nossa história, que as mulheres frequentam esses âmbitos públicos da política, do trabalho, de fato autorizadas a fazer isso neste país.
(Soa a campainha.)
A SRA. ANA CLÁUDIA OLIVEIRA - E, junto com essa possibilidade de estar presente no âmbito público, vieram também as formas de violência que visam excluir as mulheres e impedir que estejam em âmbito público. Uma dessas violência é a violência política contra a mulher, que é uma violência que agora está tendo muita visibilidade na lei, na imprensa, porque a gente tem uma legislação recentemente aprovada, mas é uma violência que existe desde que existe política, desde que existe mulher. Mesmo antes de entrar mulher como essa categoria que dentro do patriarcado é hierarquizada e colocada abaixo do homem, hierarquicamente, socialmente, mesmo antes de a mulher entrar na política, quando ela lutava para entrar, quando grupos de mulheres brigavam pelo direito ao sufrágio, essa violência já existia contra as mulheres. Há mulheres que morreram nessa luta pelo sufrágio ao redor do mundo.
(Soa a campainha.)
A SRA. ANA CLÁUDIA OLIVEIRA - E, depois que elas entraram na política, a violência continuou, para que elas tivessem suas vozes caladas, para que não tivessem protagonismo dentro das casas, para que não fossem eleitas. Hoje em dia nós temos aqui no Senado cerca de 17% das cadeiras ocupadas por mulheres, na Câmara, 15%, para a próxima legislatura aumentou um pouco na Câmara e diminuiu no Senado, porque essas violências persistem contra as mulheres e impedem que mais mulheres venham para a política e fazem com que as que estão na política não tenham o protagonismo devido.
O observatório existe como esse espaço que, através de pesquisa científica, através de dados concretos, vai ajudar a elaborar políticas públicas que auxiliem no enfrentamento desses desafios, para que as políticas públicas não sejam baseadas no achismo ou na mera importação de ideias de outros países, mas baseadas na nossa realidade, nas características do nosso sistema político e eleitoral, na realidade das nossas mulheres. Então, a partir de pesquisas é que nós vamos conseguir construir melhores políticas públicas e conseguir, de fato, ampliar a participação feminina na política, por isso é tão importante incentivar esse tipo de trabalho.
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Recentemente, então, foi aprovada aqui, no Brasil, uma lei de violência política contra as mulheres, tem pouco mais de um ano que essa lei foi aprovada, e essa lei foi um grande avanço, sem dúvida nenhuma, mas os estudos que nós estamos fazendo lá pelo observatório mostram que ainda há espaço para o aprimoramento dessa lei, e é trabalhando no meio desse espaço que a gente quer aprofundar essas pesquisas, entender para que lado.
(Soa a campainha.)
A SRA. ANA CLÁUDIA OLIVEIRA - O que nós devemos fazer? Qual é a prioridade para proteger essas mulheres?
A Senadora Soraya Thronicke estava aqui falando, antes de a gente subir aqui à tribuna, que só ter a lei não é o suficiente. E por que só ter a lei não é o suficiente? Porque a lei ainda precisa ir a um nível de detalhamento que talvez ela ainda não tenha chegado.
A Lei Maria da Penha, hoje em dia, é considerada uma das melhores leis de proteção das mulheres no mundo em termos de violência doméstica. E a gente precisa fazer com que a lei de violência política brasileira alcance esse mesmo nível. Como a gente pode fazer isso? Definindo melhor o que é a violência política contra a mulher, categorizando os tipos de violências, assim como é feito na Lei Maria da Penha, em que nós temos, hoje em dia, mais recentemente, até violência psicológica tipificada dentro da Lei Maria da Penha. É preciso fazer o mesmo com a lei de violência política, que se especifique melhor...
(Soa a campainha.)
A SRA. ANA CLÁUDIA OLIVEIRA - ... que se categorize melhor de que maneiras essa violência pode acontecer.
Atualmente, se uma mulher, uma candidata, uma mandatária recebe uma ameaça durante a sua campanha ou durante o exercício do seu mandato, isso está claramente enquadrado ali dentro da lei e vai ser punido, pode ser punido com pena de um a quatro anos de prisão e multa. Agora, e se uma mulher não recebe o dinheiro que ela deveria receber para a sua campanha e isso a impede de se eleger? Isso já não está claramente punido por essa lei.
Então, talvez a gente precise realmente aperfeiçoar a lei para que mais ações que obstaculizam a presença da mulher na política, que impedem que a mulher esteja presente e tenha protagonismo e tenha sua voz escutada, talvez esses caminhos de aperfeiçoamento não sejam suficientes porque a gente precisa também de toda uma mudança cultural para que isso aconteça, mas é um bom caminho...
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
A SRA. ANA CLÁUDIA OLIVEIRA - Eu vou finalizar agora, gente.
Como a minha colega Maria Terezinha falou antes, a lei pode não ser o suficiente para mudar, mas traz uma mudança de paradigma, e eu acredito que a gente teve, aqui no Brasil, uma grande mudança de paradigma com a aprovação da lei de violência política, antes praticamente não se falava desse tema aqui no Brasil, na mídia, na imprensa e, agora, é bastante falado; então, uma mudança de paradigma acredito que já tivemos, agora falta mudar a realidade dessas mulheres para que mais e mais mulheres possam estar aqui ocupando esta tribuna, ocupando a tribuna na Câmara e todos os demais espaços de poder na política brasileira. E, para isso, o observatório também existe, para ser uma dessas iniciativas que ajudam no enfrentamento da violência contra a mulher no Brasil.
Obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Leila Barros. PDT/PDT - DF) - Excelente, Ana Cláudia, grata pela sua presença, representando aqui o Observatório Nacional da Mulher na Política e assessora legislativa da Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados.
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Mande um abraço à minha colega de bancada Celina, que hoje é Vice-Governadora aqui do DF.
Vou passar a palavra agora para a Sra. Maria Tereza Prado, Coordenadora do Observatório da Mulher contra a Violência do Senado Federal, Analista do Senado Federal, formada em Comunicação pela Universidade de Brasília e especialista em Inovação pela Universidade de Cambridge.
Seja bem-vinda, Maria Tereza!
Grata, mais uma vez, por estar aqui conosco.
A SRA. MARIA TEREZA PRADO (Para discursar.) - Um bom dia a todas e a todos.
Cumprimento os colegas palestrantes, a Sra. Senadora Leila Barros e o Sr. Embaixador Daniel Zonshine.
Eu sou a Maria Tereza, servidora do Senado, Coordenadora do Observatório da Mulher contra a Violência. É impossível começar esta apresentação sem dizer o quanto representa para mim estar aqui hoje, ao lado dos senhores e das senhoras, falando deste Plenário, desta Mesa. Nesta Casa, eu comecei como estagiária, fui terceirizada e, com muito orgulho, passei no concurso de 2008 para ser servidora do Senado e estar aqui hoje significa muito nessa minha caminhada.
Agradeço o convite da Procuradoria Especial da Mulher, à Senadora Leila e à Coordenadora Isis, que são parceiras fundamentais do Observatório. Agradeço à Diretora da Secretaria de Transparência, Elga Lopes, a confiança.
Tenho apresentação.
Eu vou começar falando um pouquinho aqui sobre quem somos no Observatório.
O Observatório da Mulher contra a Violência do Senado é uma assessoria técnica que faz parte do Instituto DataSenado dentro da Secretaria de Transparência. Na Secretaria, trabalho com uma equipe técnica altamente qualificada e tem sido um período de muitos aprendizados, mas, acima de tudo, um período de mergulho na temática da violência contra a mulher. Sinto-me honrada em estar aqui hoje representando o nosso time e trazendo os resultados do trabalho que só é possível graças à dedicação e ao empenho de toda a equipe.
O OMV tem em sua missão contribuir para o fim da violência contra as mulheres. Nós sabemos que para isso precisamos fazer o melhor que podemos dentro de nossos objetivos e precisamos ser uma referência no trabalho para o qual fomos criados. Para o Observatório, é muito importante este espaço de interação em que podemos apresentar um pouco dos resultados do nosso trabalho e aproveitar muito do que aprendermos aqui, aprendizados fundamentais para o aprimoramento do que nós fazemos.
A Pesquisa de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher é uma parceria do Observatório com o DataSenado e é a série histórica mais antiga a respeito do tema no Brasil. Ela é uma pesquisa de abrangência nacional. Já entrevistamos mais de 12 mil mulheres. O início dela foi em 2005 - então ela é anterior à criação da Lei Maria da Penha -, e foi encomendada para servir de insumo para a criação da lei. Já temos nove edições; agora, em 2023, teremos a décima edição da pesquisa. Ela é uma referência em dados e já foi citada em mais de 1,5 mil pesquisas e trabalhos acadêmicos.
Eu vou trazer agora alguns destaques da série histórica da pesquisa.
Então, neste primeiro bloco, eu vou apresentar essas perguntas que são importantes para a gente entender a violência contra a mulher ao longo dos últimos anos. Aqui uma fala, que estava até na fala da Senadora Leila: a percepção do aumento da violência contra as mulheres segue em linha ascendente e chega a 86% na última pesquisa.
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Mostrando aqui os tipos de violência na percepção das mulheres, à exceção da violência física, que se mantém estável, todos os demais tipos de violência registram aumento significativo nas menções, o que sugere uma maior consciência das brasileiras sobre as várias formas de manifestação da violência contra a mulher no país.
O que leva as mulheres a não denunciarem? Nesse resultado aqui dessa série histórica, podem estar indícios fortes dos principais medos das mulheres. Sinaliza questões que podem ser trabalhadas por meio de políticas públicas.
Pensando na pandemia, talvez o momento tenha apresentado outras questões para as mulheres além do medo do agressor. E, assim como na percepção dos tipos de violência, a percepção naquele momento de contingência de uma pandemia de que a dependência econômica, por exemplo, pode ser um grande empecilho para uma denúncia.
Para 54% das entrevistadas, as mulheres não são tratadas com respeito no Brasil. E o lugar onde essas mulheres acham que são menos respeitadas é a rua, com 45%.
Analisando aqui a série histórica, em que momento as mulheres se sentiram mais respeitadas?
Revisitando os dados das pesquisas anteriores, é interessante notar que no ano de 2013, com uma mulher na Presidência, temos o pico do sentimento de respeito em relação às mulheres. O que isso pode sugerir é algo que temos tratado em outras pesquisas em uma temática para a qual nós, do Observatório do DataSenado, estamos bem atentos, que é a presença das mulheres na política, incluindo estudos sobre violência política, que acaba sendo uma barreira para muitas mulheres. Não vou me alongar muito nesse assunto, mas deixo aqui uma semente para a reflexão dos senhores e das senhoras.
A Lei Maria da Penha, que completou 16 anos agora em 2022, está presente desde sempre na história da pesquisa de violência doméstica. As edições de 2013 a 2017 mostram que todas as brasileiras já ouviram falar da lei. No entanto, temos agora que 81% das brasileiras afirmam conhecer pouco ou nada sobre a lei, que é uma referência. Os percentuais são semelhantes aos apurados no levantamento realizado em 2019 e sugerem pouco avanço na divulgação do conteúdo, a necessidade de um maior aprofundamento do conhecimento das mulheres sobre a lei.
Nesse segundo bloco, eu vou apresentar os dados da violência colhidos a partir das respostas de mulheres que foram agredidas. A agressão sofrida se refere sempre à mais grave.
Então, temos aqui que 27% das mulheres declararam ter sofrido violência doméstica por um homem. Apesar de o número se manter estável nos últimos anos, veremos que as mudanças e os avanços estão nos detalhes, mas é impactante a gente pensar que uma em cada quatro mulheres brasileiras já sofreu violência doméstica.
Trago aqui mais uma vez a questão dos tipos de violência. Agora aqui o resultado a partir das mulheres que sofreram violência. E o resultado de 2021 traz mais uma vez a violência física e psicológica como as mais citadas. No entanto, se a gente analisa a série histórica dos tipos de violência sofrida, observamos que a psicológica, a moral e a patrimonial atingem o maior índice da história, agora em 2021. Podemos nos perguntar se isso é um reflexo da pandemia, um aumento no número geral das mulheres agredidas, mais a forma como são agredidas e a percepção maior dessas violências.
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Na apresentação da pesquisa, em 2019, muito foi falado sobre o não reconhecimento das mulheres em relação às violências sofridas. Aqui, na pesquisa de 2021, entre as respostas de mulheres agredidas, podemos voltar a sugerir o que mostramos quando eu falei da violência percebida, que é uma maior consciência dessas brasileiras sobre as várias formas de manifestação da violência contra a mulher no país. A mulher está entendendo melhor os outros tipos de violência.
Em 2019, pela primeira vez, o questionário trouxe uma questão com situações de agressão que são prontamente reconhecidas como tais. Quando a situação é relatada na pergunta, é uma forma mais apurada de a gente perguntar, não é? Às entrevistadas foi apresentada uma lista de 12 situações de violência, como insultos, ameaças, humilhações, e às mulheres foi perguntado se vivenciaram uma delas nos últimos 12 meses. A partir das respostas a essa pergunta, estima-se que 25 milhões de mulheres tenham sofrido pelo menos uma dessas situações nos últimos 12 meses.
Buscamos aqui o entendimento de que a violência se veste de muitas formas. Muitas vezes, as mulheres nem sabem que aquela situação vivida é uma situação de violência.
Mas a mudança vem. Em 2019, a pesquisa trouxe dados que foram agrupados no título "Mulheres sofrem caladas." Eram números relativos à procura de assistência à saúde. Nenhuma atitude em relação à última agressão. E mulheres que ainda conviviam com o agressor após a última agressão. Agora temos que cresce o número de mulheres que procuram assistência à saúde, de 25% para 36%; diminui o número de mulheres que convivem com o agressor após a última agressão, de 24% para 18%. Mulheres estão buscando mais ajuda. Crescem os pontos finais em relações abusivas.
A correlação de afastamento do agressor por parte da mulher agredida está diretamente ligada ao vínculo. Então a gente vê ali que, quando o vínculo é de casamento, possivelmente vão pesar aqueles fatores levantados como motivos para não denunciar o agressor: preocupar-se com a criação dos filhos, depender financeiramente do agressor. E, quando o agressor era apenas namorado, o afastamento foi de 100%.
Em 2019, afirmamos que as mulheres estavam deixando o agressor, mas não podíamos afirmar que era pela agressão. Naquele momento, era uma inferência. Mas essa pergunta entrou na pesquisa de 2021, e temos o achado da pesquisa de 2021, que foi que 90% das 79 casadas e 100% daquelas que namoravam terminaram a relação com o agressor e apontaram que a agressão foi o principal motivo para o término da relação.
Mas ainda temos um longo caminho.
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E depois de ouvir o relato da Lili na segunda-feira, na embaixada, naquele dia eu não dormi. Foram dois os principais motivos: primeiro, pela história; segundo, pela sua força, pelo que você fez a partir daqui ali, pela transformação que você trouxe. Aí eu falei: "Eu tenho que mudar a minha apresentação, eu tenho que trazer alguma coisa". E fiquei pensando muito no quanto ainda temos que caminhar por aqui, em quantas vidas de mulheres perdemos que são mortes anunciadas, estampadas, sentenças de morte dadas que apenas aguardam o momento de execução.
Trago dois exemplos bem recentes, apenas para termos uma pequena amostra dos absurdos que ainda vivemos aqui no Brasil. Aqui está uma manchete: "Vídeo mostra homem atirando em ex-mulher e filho em frente à escola em SP; suspeito tem licença de colecionador para uso de arma." Isso daqui foi em setembro. Michelle Nicolich, de 37 anos, e Luiz, de 1 ano, foram assassinados próximo à escola dos filhos. O suspeito é seu ex-companheiro, Ezequiel Lemos Ramos, um homem com histórico extenso de agressões que já havia sido preso, em maio, por ameaçar Michelle com uma arma, mas que, mesmo assim, possuía licença para ter arma de fogo. Michelle se mudou de cidade, saiu de Ponta Porã...
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA TEREZA PRADO - ...e foi para São Paulo com os filhos por medo. Michelle tinha uma medida protetiva.
Aqui, mais um caso, outra manchete. Aquela de setembro, esta do final do outubro: "Mulher morta pelo ex-marido na frente dos filhos em Curitiba no período em que prisões são proibidas evidencia necessidade de rever lei eleitoral, avaliam juristas; entenda." Esses dois casos foram filmadas, com vídeo, as mortes dessas mulheres. Aqui temos Suellen Helena Rodrigues, de 29 anos, morta a tiros na frente de seus filhos. O suspeito é o seu ex-marido, Jaminus Quedaros de Aquino, advogado e ex-policial civil. Suellen tinha esgotado todos os mecanismos jurídicos disponíveis para fugir do ciclo da violência doméstica. Ela registrou boletim de ocorrência, pediu medida protetiva, acionou a polícia quando o ex-marido violou a medida e até se mudou de cidade com os filhos.
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA TEREZA PRADO - A exemplo do que ouvimos da Lili, quando esses números ganham nome, ganham história, o nosso olhar se aproxima, nossa empatia nos impossibilita ficarmos indiferentes.
Há muito a ser feito, muito o que pode ser feito por aqui, por esta Casa. Essas pautas precisam de um olhar atento, precisam de prioridade. Estamos falando de vidas que poderiam ser preservadas.
Quando eu apresentei os resultados da nossa última pesquisa, no final do ano passado, eu terminei a apresentação falando sobre a missão do OMV, do Observatório, de contribuir para o fim da violência contra as mulheres. Falei, naquele momento, que deveríamos ir além e buscar os caminhos para evitar que a violência aconteça.
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA TEREZA PRADO - Hoje, depois de tudo o que ouvimos de Lili, do seu projeto, das ações, dos avanços na prevenção dessa violência, penso no quanto cada um de nós aqui pode contribuir dentro dessa perspectiva do prevenir.
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O acesso a mais informação sobre o que são situações de violência doméstica e familiar é importante, a rede de apoio eficiente é importante, as leis de proteção são importantes, mas o olhar para a prevenção é fundamental; políticas públicas que se orientem por dados exatamente com o objetivo de enxergar onde está o previsível, o que pode ser evitado.
Precisamos de maior apoio para as pautas de violência contra a mulher que tramitam no Congresso, sobre proibir o porte de arma a agressores, o aumento da representatividade feminina em espaços de poder e tantas outras pautas...
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
A SRA. MARIA TEREZA PRADO - ... que, com certeza, serão fundamentais nessa prevenção e no enfrentamento amplo à violência contra a mulher.
Muito obrigada a todos. (Palmas.)
(Durante o discurso da Sra. Maria Tereza Prado, a Sra. Leila Barros deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pela Sra. Soraya Thronicke.)
A SRA. PRESIDENTE (Soraya Thronicke. Bloco Parlamentar União Cristã/UNIÃO - MS) - Maria Tereza, muito obrigada pelo seu trabalho, pelo seu estudo.
E, antes de passar para a próxima oradora, eu gostaria aqui de apenas dizer que a Senadora Leila teve um compromisso inadiável, não foi possível conciliá-lo com a sessão e aí eu termino, presidindo para ela, o evento de hoje.
Quero só lembrar um fato, que estou tentando até buscar aqui no Google, mas eu não sei se foi a Presidente de um país, uma presidente mulher, um país da Europa - estou tentando aqui - eu vi, me veio à memória agora, ela estava comentando sobre um caso de violência que aconteceu e ela não citou o nome do agressor. Achei interessantíssimo. Por quê? Porque ela disse o seguinte: certos narcisistas, psicopatas têm esse anseio de aparecer, seja de uma forma ou de outra. Quem assistiu ao documentário sobre a Daniella Perez viu bem esse tipo de coisa. Eles querem aparecer. E ela falou: "Eu não vou, de maneira nenhuma, citar o nome desse senhor, porque tudo que ele quer é aparecer". Achei interessante. É mais uma forma de lidarmos com isso não dar holofotes. Dar holofotes para elas e não, no caso, para os agressores. Mas é algo que a gente pode começar a fazer também.
Muito obrigada.
Parabéns!
Vamos passar para a próxima oradora, a Sra. Ana Cláudia Pereira, Analista de Programas e Líder da Equipe de Governança e Participação Política da ONU Mulheres, Doutora em Ciência Política pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade Estadual do Rio de Janeiro.
Está com a palavra a Dra. Ana Cláudia.
A SRA. ANA CLÁUDIA PEREIRA (Para discursar.) - Bom dia.
Eu saúdo a Presidente da Mesa, agora a Senadora Soraya Thronicke. Na sua pessoa, saúdo todas as autoridades aqui presentes e também todas as mulheres que fizeram e fazem este momento possível não só no Brasil, mas em todo o mundo.
Foi muito emocionante ouvir o relato da Sra. Lili Ben-Ami, trazendo também um pouco da história desse caso da Michal, que aconteceu em Israel. Eu acredito que ele mostra também para a gente o quanto esse problema é um problema global. A violência contra as mulheres é um problema que acontece em todo o mundo, que a gente vê se repetir em todo o mundo e, pelos dados hoje disponíveis, sabemos que nenhum país no mundo trata tão bem as suas mulheres quanto trata os seus homens. Isso é sempre uma informação muito chocante. Se a gente pensar que, em termos de índices de desenvolvimento, acesso à renda, educação, trabalho, segurança, no mundo todo, nós mulheres usufruímos de condições piores somente pelo fato de sermos mulheres.
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Então, é por isso que existe a campanha dos 16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres, pela eliminação da violência contra as mulheres, que é celebrada em todo o mundo e que, aqui no Brasil, foi estendida pelas ativistas, contemplando também o dia 20 de novembro, quando, no país, é celebrado o Dia da Consciência Negra, transformando-se, assim, em uma campanha de 16 dias de ativismo pela eliminação da violência.
No Brasil, neste ano, a ONU Mulheres tem um mote para essa campanha que é: "Como é o Brasil das mulheres que precisamos construir?". Então, que mundo diferente - começando aqui no nosso país, porque existem esforços também nos outros países - nós queremos construir? E qual a cara dele? Hoje, nós vamos lançar, inclusive, um filtro no Instagram com esse convite à reflexão. Convidamos vocês a entrarem aí no perfil da ONU Mulheres nas redes sociais, no Instagram, e que também se juntem e contem para a gente qual é a cara desse Brasil para as mulheres que nós vamos construir.
Falando um pouco sobre o tema da inovação e das iniciativas para eliminação da violência, foi muito fortuito fazer a minha exposição depois das que me antecederam e que foram tão potentes e cobriram tantas áreas diversas, porque, como já foi falado diversas vezes, a violência contra as mulheres é um fenômeno complexo, é um fenômeno, como eu dizia, que afeta todas as sociedades; então, não existe uma medida única que possa saná-lo.
Mas a gente viu aqui como as mulheres se mobilizam. Tivemos esse exemplo aqui de como as mulheres tomam a frente, seja para criar legislação, colocar esse tema no debate, na agenda pública, criar medidas e respostas concretas, produzir dados. Então, é sempre a ação das mulheres que tem trazido avanços nessa pauta, e acredito que vai ser a ação das mulheres também... Nós da ONU Mulheres apoiamos as mulheres para que elas sigam nesse caminho de buscar a igualdade e a justiça.
Eu vou falar, então, em três dimensões particulares. Falávamos já de como a legislação, por si... A legislação é um passo importante, é um reconhecimento do país sobre os fenômenos e a necessidade de proteger os direitos das mulheres, mas também temos aí ações complementares, as políticas públicas, que são fundamentais para que a legislação se torne realidade na vida das mulheres. E, aí, eu vou falar de três dimensões: dos dados, do desenho das políticas públicas e do aspecto específico da prevenção.
Quanto aos dados, a gente tem aí a pesquisa do Observatório junto com DataSenado, que representa, no Brasil, uma das melhores fontes de dados que nós temos sobre a violência, mas a gente sabe que ainda existem vários pontos sobre os quais nós não temos tantas informações. E, aí, eu quero destacar algo importante que a Sra. Procuradora Especial da Mulher da Câmara trouxe, qual seja, o fato de que existe uma maior incidência de homicídios sobre as mulheres negras; mas a gente ainda sabe muito pouco, tem muito pouco documentado qual é a dinâmica, qual é a especificidade da dinâmica da violência contra as mulheres negras. Isso requer mais estudos, requer dados desagregados, não somente para entender se acontece mais violência, mais casos, mas também se existem formas específicas dessa violência.
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E eu dou um exemplo, que saiu na mídia alguns anos atrás, de uma professora universitária que sofreu algumas ofensas raciais por ser uma mulher negra, enfim. Em um contexto social de festejo, um homem - um homem branco - dizia para ela que, se ela fosse escrava, como os dentes dela eram muito bonitos, ela poderia ser vendida por um preço altíssimo e perguntava se os pelos pubianos dela eram iguais aos do cabelo.
Essa mulher foi até uma delegacia da mulher para registrar uma ocorrência, fazer uma reclamação e reivindicar seus direitos. E o que ela ouviu na delegacia da mulher foi: "Esse não é o local para fazer essa denúncia, porque a gente só acolhe casos de violência contra as mulheres".
Isso mostra que...
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. ANA CLÁUDIA PEREIRA - Exato.
Então, assim, isso mostra que é necessário ainda um diálogo maior com quem também opera a lei e os serviços.
E a ONU Mulheres recentemente teve um exemplo de colaboração com o Município de Itabira, em Minas Gerais, no qual nós trabalhamos com a rede de atenção às mulheres em situação de violência para que as próprias operadoras, operadores nos trouxessem exemplos ou as percepções que tinham ao atender as mulheres negras nos serviços de atenção. Então, foi muito interessante porque a gente não tem um modelo pronto, mas, a partir dessa conversa, as próprias pessoas que estão ali na ponta, fazendo atendimento, nos trouxeram a necessidade de um olhar mais atento.
O mesmo vai acontecer se a gente pensar em mulheres com deficiência; o mesmo vai acontecer se a gente pensar, por exemplo, em mulheres indígenas, que vivem em territórios muitas vezes remotos, para os quais existem especificidades na legislação.
Então, eu penso que um primeiro avanço é que, para compreendermos melhor e gerarmos melhores respostas, precisamos desses dados, precisamos aprimorar e inovar na produção dos dados, sempre em diálogo com as mulheres, porque são elas que conhecem a realidade e podem trazer informações que nem imaginávamos.
O segundo diz respeito ao desenho. Então, tendo esses dados e em diálogo com a sociedade civil organizada, com as mulheres das próprias comunidades, nós podemos pensar, por exemplo, esses serviços de acolhimento, de resposta à violência para os mais diversos contextos, considerando, por exemplo, as mulheres negras como eu já disse; as mulheres indígenas; as mulheres do campo; as mulheres da cidade; as mulheres em situação de violência; as trabalhadoras domésticas, para as quais também se aplica, no caso, a Lei Maria da Penha. Então, podemos avançar nesse desenho e pensar como a política pode chegar até cada uma dessas realidades. No caso, por exemplo, das mulheres indígenas, nos equipamentos, por exemplo, de saúde ou de atendimento à população indígena, ainda não existe um marco robusto de atenção à violência. Então, muitas vezes, se entende a violência como um fenômeno...
(Soa a campainha.)
A SRA. ANA CLÁUDIA PEREIRA - ... cultural, e isso deixa de ser observado ou tratado por quem está ali na ponta, sendo que precisa... É claro que a gente tem que ter uma sensibilidade cultural. Não se trata de criminalizar cultura, mas existem diálogos possíveis, existem diálogos e uma atenção a essas mulheres que reportam casos de violência e muitas vezes são ignoradas.
Também no sentido de aprimoramento do desenho das políticas, e aí com o papel fundamental do Congresso Nacional, nós temos a possibilidade de pensar um orçamento público - já falamos da baixa execução que tivemos no último ano da política de enfrentamento à violência - que reflita as mulheres, que traga as mulheres em sua totalidade, pensando não só as ações...
(Soa a campainha.)
A SRA. ANA CLÁUDIA PEREIRA - ... e programas específicos, mas também trazendo marcadores que nos permitam ver em que medida, por exemplo, ações no campo da renda e do trabalho decente chegam até as mulheres, da educação, da ciência e tecnologia, da saúde, da empregabilidade.
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Enfim, o orçamento é uma peça muito importante, seja para monitorar os programas de enfrentamento à violência, como estão sendo executados, seja também para pensar essas outras dimensões, que, como nós já dissemos, são muito importantes para que a mulher, de fato, uma vez que se encontre em situação de violência, consiga sair dela. Então, a gente ter esse retrato, por meio do orçamento, de para onde os recursos públicos vão, como as políticas públicas chegam ou não até as mulheres, vai permitir um aprimoramento e um grande passo.
Por fim, caminhando para o encerramento da minha fala, eu vou falar da dimensão da prevenção - isso também já foi trazido -, que é um aspecto sobre o qual nós temos...
(Soa a campainha.)
A SRA. ANA CLÁUDIA PEREIRA - ... menos experiências e vimos alguns exemplos aqui.
Eu vou citar dois exemplos bastante pontuais, que se somam a tantos outros, a tantas outras iniciativas que temos visto.
Uma delas é o projeto "Uma Vitória Leva à Outra", que é desenvolvido pela ONU Mulheres, com o apoio do Comitê Olímpico Internacional, que é um programa realizado com meninas no esporte. Esse programa traz paras as meninas a possibilidade de desenvolverem habilidades para a vida e também de buscarem alternativas. Ali elas se unem e podem compreender os seus direitos, num espaço também de reflexão, para que conheçam seus direitos, que se reconheçam enquanto cidadãs e que saibam que elas podem aspirar a mais da vida e lutar pelos seus direitos.
Uma segunda iniciativa é o currículo "O Valente não é Violento", que é uma campanha, também global, da ONU Mulheres que...
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
A SRA. ANA CLÁUDIA PEREIRA - ... no caso do Brasil, desenvolveu um currículo para a formação de professoras e professores para que possam trabalhar esses conteúdos em sala de aula, buscando um caminho de mudança de normas sociais. A gente sabe que, sem essa mudança no nível da cultura, das crenças e dos valores, a violência... A gente vai precisar ter, praticamente, um policial ou uma policial em cada casa, e muitas vezes essa pessoa, também, está ali envolvida na dinâmica da violência.
Então, avançando nessa dimensão da prevenção, trabalhando a partir das escolas, a gente também vê mais um caminho possível de inovação. E que, finalmente, a gente possa, cada vez mais, nos dias 25 de novembro de cada ano, celebrar os avanços e as conquistas das mulheres no Brasil e no mundo.
Muito obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Soraya Thronicke. Bloco Parlamentar União Cristã/UNIÃO - MS) - Obrigada, Ana Cláudia, pela sua contribuição.
Antes de chamar a próxima palestrante, eu gostaria de dar um tchau para todos vocês, alunos do ensino fundamental do Colégio Pequeno Príncipe de Goiânia.
Obrigada. Obrigada pela presença. Obrigada aos professores e ao Colégio Pequeno Príncipe!
Quero ressaltar a importância de conhecerem aqui. Vocês, que estão perto, têm uma sorte danada de poderem vir aqui. Acredito que essas crianças jamais esquecerão. Eu, que estudei no Mato Grosso do Sul, não tinha a oportunidade de fazer essas viagens. A gente só via tudo, via Brasília, conhecia Brasília, pelas fotos dos nossos livros. Então, estar aqui é algo que vai ficar na memória deles.
Um abraço. Tchau, tchau. Bom retorno para a casa de vocês, viu?
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Vamos agora ouvir a Juíza Amini Haddad, Juíza Auxiliar da Presidência do Conselho Nacional de Justiça; Pós-Doutora em Ações Coletivas e Direitos Sociais pela Universidade de Salamanca, na Espanha; Doutora em Processo Civil e Efetividade do Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; Doutora em Direitos Humanos Multiculturalismo e Gênero pela Universidade Católica de Santa Fé, na Argentina; e Membro da International Association Women Judges.
Conheci Dra. Amini naquele momento do Afeganistão para dar apoio a juízas afegãs que estavam sendo perseguidas. Até hoje temos um grupo no WhatsApp, Doutora, e parabéns pelo seu trabalho, parabéns mesmo! Muito emocionante... Eu não sei se a senhora vai tratar desse tema, mas nos dê notícias, atualize-nos sobre a situação das juízas afegãs.
Muito obrigada pela presença aqui hoje.
A SRA. AMINI HADDAD (Para discursar.) - Obrigada.
Primeiramente, meu bom-dia. Eu cumprimento a mesa, essa rica mesa representativa, na pessoa da nossa Senadora Soraya Thronicke. Temos caminhado em muitas pautas, Senadora; essa citada é uma delas. E hoje nós estamos aqui para falar a respeito dos avanços do Poder Judiciário, trazendo essas inovações, após a Lei Maria da Penha.
Nós sabemos que a lei inaugurou uma nova trajetória sistêmica no Brasil. Não que o Brasil já não estivesse compromissado no ambiente internacional com legislações específicas - sim, já estava: o Brasil é signatário da Convenção Cedaw, no ambienta da ONU, é signatário da Convenção de Belém do Pará, no ambiente da OEA -, mas sabemos que esse caminhar se deu de uma forma lenta. A lei veio após o Brasil ser responsabilizado, no ambiente internacional, no caso Maria da Penha, uma grande mulher, uma força a exemplo da história a que hoje assistimos.
Parabéns por esse trabalho belíssimo de vocês, pela missão que vocês assumem, que é representativa de um novo tempo! Eu acredito nisso. São ações assim que transformam.
Assim como nós tivemos esse exemplo de Israel, tivemos aqui o exemplo da nossa Maria da Penha, uma mulher forte, que se encontrava enfrentando um processo judicial que quase chegou à prescrição, vítima de duas situações de tentativa de assassinato. Hoje nós temos uma tipologia, nós falamos do feminicídio, porque há um elemento nuclear nessa dimensão de análise, que é a subjugação, o controle, a codificação, a apropriação desse feminino, que é essa desqualificação existencial do feminino. E ela levou a história dela e conseguiu trazer, como realidade do Brasil, a Lei Maria da Penha em decorrência da responsabilização internacional. Inaugurou-se uma nova temporada no Brasil.
Não que tenha sido fácil, após a dimensão da Lei 11.340, de 2006 - nós sabemos que não; inclusive, no próprio ambiente do Poder Judiciário, nós tivemos questionamento a respeito da constitucionalidade dessa lei, como aqui já foi citado -, mas tivemos importantes marcos dentro do Judiciário também. O Supremo Tribunal Federal, inclusive, reconheceu a constitucionalidade, pacificando essas situações que dificultavam a efetividade da lei, quando assumiu o campo dessa normatividade, pacificando o entendimento constitucional com a ADC nº19, ação declaratória de constitucionalidade, da Lei 11.340, rechaçando, então, a ADI 4.424, que questionava a normatividade para que ela viesse ao campo da declaração de inconstitucionalidade.
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Recentemente, nós tivemos no Supremo Tribunal Federal a ADPF 779, arguição de descumprimento de preceito fundamental, que veio afastar qualquer argumento de legítima defesa da honra para controle de vida ou morte das mulheres.
Esses avanços são avanços substanciais no sentido da normatividade a ser implementada quando da jurisdição da atividade judicial. Mas isso não era suficiente. Nós precisávamos avançar em dados concretos no sentido de que esse Judiciário, de que essa tutela jurisdicional pudesse, de fato, assumir as necessidades no que se refere ao acolhimento dessas vítimas, a procedimentos específicos, inclusive na construção de redes que viessem, de fato, a tornar concreta a dimensão de proteção. Então, o Judiciário assumiu capacitações, e aqui eu falo especificamente do âmbito do Conselho Nacional de Justiça, criou grupos de trabalho específico, delimitou o campo informativo e formativo nas escolas da magistratura, desenhou normatividade interna nas suas resoluções... Nós temos a Resolução 254, a 255 e também o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero. Além disso, nós temos um fórum nacional que debate a temática da violência contra a mulher. Temos também a Jornada Maria da Penha, anualmente, no âmbito do nosso Conselho Nacional. Soma-se a isso também a atuação da gestão da nossa Ministra Rosa Weber, que inaugurou um seminário sobre representatividade feminina no Poder Judiciário em decorrência das dificuldades que ainda sofremos, inclusive magistradas, no âmbito da representação na Corte.
Não só isso. Nesse seminário, a Presidente do Conselho Nacional de Justiça e do Supremo Tribunal Federal lança a campanha, como política judiciária nacional, "21 Dias de Ativismo pela Equidade e Fim da Violência contra Mulheres e Meninas", inaugurando, na verdade, uma reflexão interna, uma análise interna de funcionalidade do Poder Judiciário, das Cortes, no que se refere ao acolhimento das vítimas e também no sentido de questionar se há prioridades dentro das políticas judiciárias nacionais no que se refere à atuação nesses casos específicos de violência contra a mulher, com varas equipadas para receberem vítimas, com instrumentais qualificados no sentido, também, de acolher essas vítimas, com modalidades de oitiva que também preserve esse acesso à Justiça na sua dimensão de inafastabilidade, e isso requer um corte substancial no que se refere ao conceito, no próprio Poder Judiciário.
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Então, trazer esse diálogo interno também projeta um efeito comunitário, não só no sentido de que as cortes devem estar compromissadas com o ambiente internacional, no que se refere a essa ação de política de Estado inaugurada pelo Brasil, desde a instrumentalização do compromisso internacional com a Cedaw, convenção no ambiente da ONU contra toda e qualquer discriminação contra a mulher, mas também, de forma mais substancial e concreta, quanto da Lei Maria da Penha, em 2006.
Sabemos que essa lei inovou a normatividade, nós tivemos outras legislações que já foram citadas aqui, no ano passado, inclusive, inúmeras legislações, e aqui eu posso citar algumas: a 14.188, por exemplo, que trata de violência psicológica, facilitação com relação à defesa, o "x" na mão, atuação das mulheres nas denúncias, nos ambientes públicos, facilitando então esse diálogo de compromisso social também com a causa da violência contra a mulher; tivemos também a Lei 14.245, Lei Mariana Ferrer, que traz muito a questão da funcionalidade do ambiente judicial quando do acolhimento das vítimas e nos traça também o objetivo interno a ser devidamente cumprido...
(Soa a campainha.)
A SRA. AMINI HADDAD - ... tivemos também a questão da violência política, que eu acho que também é outro mapa que precisa ser descrito como normatividade exemplar no ambiente internacional, a Lei 14.192. Então, o Brasil inaugura outras possibilidades de diálogo, compromisso, ações substanciais concretas na política de Estado, na política pública.
E, Senadora, é inaceitável que tenhamos um orçamento não realizado nessa temática. Ouvindo a Senadora Leila Barros, eu fico a pensar: estamos ou não estamos compromissados com essa pauta? O que temos a dizer no ambiente internacional e no ambiente interno?
Há muito para ser construído, sem sombra de dúvida. E essa missão não é só institucional, é de todos nós. Esses desequilíbrios sociais...
(Soa a campainha.)
A SRA. AMINI HADDAD - ... prejudicam toda a dinâmica relacional social. Isso já faz parte de estudos internacionais muito sérios, desde a pesquisa de Lori Heise, na década de 90, que tornou esse diálogo possível inclusive para a Declaração de Pequim, com relação às projeções das violências nas suas mais diversas formas, o quanto isso prejudica toda a sociedade, todo o equilíbrio social, todo critério de justiça, toda assimilação substancial do que é a equidade como parâmetro concreto de conduta e ação.
Então é uma missão de todos nós.
Mas o que eu quero trazer aqui é esse compromisso do Poder Judiciário, esse compromisso do nosso Conselho Nacional de Justiça e aqui, especificamente, de uma política de gestão centrada na pauta de direitos humanos da nossa Ministra Rosa Weber.
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
A SRA. AMINI HADDAD - Que possamos inaugurar esse novo tempo.
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E eu termino aqui com um vídeo institucional da nossa campanha, com esse compromisso público que o Conselho Nacional de Justiça traz e, de fato, tende a construir com todos os âmbitos institucionais. Esse seminário é uma prova de que esse diálogo pode acontecer de uma maneira efetiva, concreta e positiva.
Convido todos a assistirem, mas, para além desse âmbito, que possam realizar concretamente, em atitudes, condutas e ações, a pauta da equidade.
Obrigada. (Palmas.)
(Procede-se à exibição de vídeo.)
A SRA. PRESIDENTE (Soraya Thronicke. Bloco Parlamentar União Cristã/UNIÃO - MS) - Quero parabenizar a Dra. Amini pela sua atuação, pela sua disposição em ajudar e por estarmos juntas aqui no combate à violência contra a mulher.
Quero dar um oi para os novos visitantes que aqui estão. Muito prazer e sejam bem-vindos!
Quero passar para a última exposição da nossa manhã.
A próxima oradora será a Sra. Jussara Pellicano Botelho. Ela é CEO da Sisterwave, comunidade da mulher que viaja. É uma startup brasileira campeã da III Competição Global de Startups e Turismo realizada pela Organização Mundial do Turismo (OMT). Venceu na categoria do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 5: Equidade de Gênero e ganhou o Desafio Turistech, do Ministério do Turismo e Wakalua.
O propósito da Sisterwave é trazer mais equidade de gênero nas viagens, isso é feito por meio da união do poder da sororidade e da tecnologia. A Sisterwave encoraja mulheres a viajarem com mais liberdade e com menos medo.
Seja bem-vinda! É um prazer tê-la aqui.
A SRA. JUSSARA PELLICANO BOTELHO (Para discursar.) - Muito obrigada.
É uma grande honra e emoção estar aqui presente na Casa das leis, no Senado.
Gostaria da apresentação, por gentileza.
Primeiramente, gostaria de cumprimentar a Mesa; a Embaixada de Israel; a Presidente da Mesa, Soraya; a Lili, que com uma fala muito inspiradora tocou o coração de todas as mulheres, com certeza, aqui presentes.
Iniciando, um pouco sobre a Sisterwave. Não tem como falar da Sisterwave sem falar um pouco da minha história porque elas se mesclam. Eu sou uma mulher viajante. Na minha primeira viagem, eu tive muito medo, como vocês podem imaginar, e todo o meu arredor incentivava mais esse medo: "Mas você vai viajar sozinha? E se colocarem drogas na sua bebida? E se te sequestrarem?". Então, com uma série de medos, me amedrontaram, mas assim mesmo eu fui para a minha primeira viagem realizar o sonho de conhecer o Butão, um país em que a felicidade é uma política de governo - é interessante trazer esse elemento para esta Casa.
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Nessa viagem, eu conheci muitas pessoas que também estavam viajando sozinhas e desconstruí a lógica de viagem, porque a minha lógica anterior era: viagem é igual a férias, e, como uma pessoa autônoma, eu teria que voltar muito para poder realizar uma viagem. Conheci muitas pessoas que viajam seis meses, um ano, cinco anos e vi que, na verdade, elas faziam da viagem um estilo de vida, é o tal nomadismo digital que, depois da pandemia, ficou mais comum, com o home office e o teletrabalho. Essa viagem me inspirou tanto que meus projetos anteriores não estavam fazendo mais sentido, o que estava fazendo sentido era realizar o sonho de conhecer todos os continentes do mundo, o que ainda está em aberto. Nesse caminho, eu passei seis meses na América do Sul, três meses na Europa e, dos estados do Brasil, conheço 18 dos 26 estados. Esse caminho foi uma viagem transformadora e surpreendente em que eu vivi e vi muito.
A viagem mostra, realmente, paisagens extremamente interessantes e diversas do mundo, culturas; mostra também as nossas diferenças, mas também o tanto que a gente pode compartilhar de similaridades e ter empatia pelo diferente; e mostra, principalmente, o autoconhecimento, porque, uma vez que você está viajando sozinha, você está com a sua companhia em todos os momentos, então, tem um grande poder de decisão e, principalmente, a oportunidade de responder a si perguntas existenciais que nos acompanham, por exemplo: qual é o meu propósito? Por que eu estou aqui? Eu tive a oportunidade, viajando, de conhecer qual é o meu propósito e, principalmente, ao voltar, vi como o Brasil é uma grande potência turística subaproveitada. A gente tem aqui uma... Nós somos o segundo destino de ecoturismo do mundo, em potencial de ecoturismo, temos grandes culturas, grandes povos originários e uma natureza maravilhosa, assim como alguns festivais, assim como cidades que mostram esse paradoxo entre a natureza e a inovação.
Nesse caminho, eu encontrei muitas, e muitas, e muitas mulheres inspiradoras que me mostraram que, sim, é possível viajar sozinha e que, sim, a gente se reconhece como mulher. Eu aprendi bastante com essas mulheres, aprendi principalmente a identificar o que é um lugar seguro e o que é um lugar hostil para as mulheres e como a gente pode se prevenir. Existem detalhes em cada cultura, códigos sutis que a gente vai aprendendo aos poucos, e é interessante aprender isso com outras mulheres.
Descobri também um termo que eu cunho como: toque de recolher invisível, que é quando uma mulher, ao sair à noite, em determinado horário ou em algum lugar, se, por acaso, algo acontecer com ela, é vítima e é culpabilizada: "Mas o que você estava fazendo ali? O que você estava fazendo ali àquela hora? Que roupa você estava usando?", como se a gente não tivesse o nosso direito de ir e vir. E vi também como são invisíveis alguns problemas que nós mulheres enfrentamos - e não precisa viajar para enfrentar esses problemas - e a importância de a gente ter essa rede de apoio entre mulheres.
Então, eu também aprendi, viajando, que é muito diferente a resposta de uma mulher da resposta de um homem - a da mulher é muito mais rica em detalhes - e senti, na prática, o poder da sororidade. A sororidade, para quem não sabe, é a relação de irmandade entre mulheres, é o feminino de fraternidade, é quando uma mulher reconhece a outra como uma irmã e esse é o pilar principal da Sisterwave.
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Vi também que esse não é um problema do Brasil. É um problema global, que pode aumentar ou diminuir dependendo do país, mas que se encontra em três principais eixos: o medo do assédio e violência contra a mulher, o julgamento pelo falo de estar sozinha. E eu achei muito interessante a fala da Soraya sobre as violências porque são violências às vezes sutis. Por que você está ali sozinha? Como se a gente não tivesse também esse direito. E o sentimento maior de vulnerabilidade, o que faz com que muitas mulheres que têm tempo, têm condições financeiras para viajar deixem de fazer isso por conta do medo.
E uma fala que me tocou muito no encontro de segunda-feira, da Lili, foi que a linguagem da violência é universal. E eu participo também de alguns eventos internacionais da Finlândia, Espanha, entre outros países e vejo como existem essas similaridades.
Apesar disso, a tendência de viajar sozinha tem crescido tanto no Brasil quanto no mundo. Os dados são muito grandes. Mais de 100 milhões de mulheres viajaram só em 2017, sozinhas pelo mundo. A Europa, por questões de segurança e de facilidade de transporte, é o continente que mais atrai mulheres viajando sozinhas. E esse termo tem crescido no Google, com 131% de buscas.
E, para encorajar cada vez mais mulheres a viajarem com mais liberdade, com muita conexão local e sem carregar tantos medos na nossa bagagem, a gente criou a Sisterwave, que desde a semente a gente vê como algo global. Uma rede global de apoio local que oferece apoio mútuo entre mulheres. Então, a gente conecta a viajante a moradoras locais também a outras viajantes.
O nosso propósito está muito ligado aos objetivos de desenvolvimento sustentável da ONU. A gente quer justamente trazer mais equidade de gênero nas viagens. Nós somos um negócio de impacto social. A gente visa o lucro, mas o cerne do nosso negócio é o impacto social. Então, quanto mais a gente lucrar, mais esse impacto positivo na sociedade é realizado.
E a gente impacta as mulheres, tanto a moradora, através da geração de renda, intercâmbio cultural e a chegada da viajante inspira a moradora a também realizar as suas viagens; quanto a viajante, a gente traz essa experiência local, que é a mistura do global com o local, em que a viajante pode acessar uma rede que visa ser global e ter uma experiência como uma moradora, como uma local.
É uma forma de viajar carregando menos medos e contando com uma rede de apoio de mulheres, que sabem, mais do que qualquer outra pessoa, como é ser mulher naquele destino. Então, essa é a importância das sutilezas de cada destino e essa relação entre mulheres pode nos libertar e pode fazer com que a gente chegue muito mais longe.
E por que através das viagens? Eu costumo dizer que viajar sozinha é a forma mais deliciosa de se experimentar o empoderamento feminino. Através das viagens, a gente consegue entender os contrastes culturais, a gente consegue quebrar preconceitos que a gente nem sequer sabia que estavam em nós e através da realidade a gente quebra esses preconceitos...
(Soa a campainha.)
A SRA. JUSSARA PELLICANO BOTELHO - ... a gente consegue perceber as diferenças entre liberdades de diversos países.
A gente consegue sair de uma gaiola. E uma vez que a gente saiu de uma gaiola, por exemplo, andar sozinha às 10h da noite em determinada cidade e me sentir tranquila, eu não quero mais voltar para a minha gaiola; eu quero que outras mulheres possam ter acesso a isso. É uma grande saída da zona de conforto. Então tudo aquilo a que você está habituada já é um pouco diferente. Você tem acesso a culturas e pessoas que vão ampliar a sua visão de mundo e vão fazer você crescer como pessoa e se desafiar inclusive em relação a línguas, a novas formas de trabalho e experimentar, na prática, o que é ser uma mulher do mundo e ter essa troca entre nós.
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E como é que a gente faz isso através da nossa plataforma? Ali tem o QR code, se vocês quiserem acessar. A Sisterwave permite que a sister...
(Soa a campainha.)
A SRA. JUSSARA PELLICANO BOTELHO - ... possa buscar e oferecer serviços de viagem entre mulheres. Nessa plataforma, pode compartilhar suas experiências através de um chat e dos grupos, que funcionam como fórum.
Fora da plataforma também, nós temos a Conexão Sister, que é um programa com conversas de mulheres inspiradoras, e o blogue, com informações mais específicas de viagem.
Nossa comunidade tem mais de 20 mil mulheres espalhadas por todos os estados do Brasil. E a gente tem um pré-cadastro de mulheres ao redor do mundo.
Nós já ganhamos importantes prêmios, com destaque a esse da Organização Mundial do Turismo, e foram mais de 10 mil competidores de 138 países e apenas 25 ganhadores. E com muita honra, a Sisterwave inaugurou a presença do Brasil nesse prêmio. E ganhamos a categoria equidade de gênero.
Já participamos de diversas formações, com destaque para a Estação Hack, do Facebook...
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
A SRA. JUSSARA PELLICANO BOTELHO - ... na Espanha. Essas duas foram com destaque, porque foram imersivas.
A gente já apareceu na imprensa internacional e nacional diversas vezes.
Mas o maior combustível para a gente continuar com essa inovação são justamente depoimentos como este da Valeska, que fala sobre sua sister: "Mônica é uma pessoa maravilhosa. Foi uma viagem muito transformadora para a minha vida viajar sozinha. Ela me recebeu, me mostrou a cidade, aproveitamos. Muito obrigada. Agora minha vida é viajar e viajar, seja acompanhada ou sozinha." E esse é um caso de uma mulher que nunca tinha viajado sozinha e, através do Sisterwave, viu como uma plataforma, uma ferramenta para realizar esse sonho.
E o que é que a gente quer? A gente quer ampliar cada vez mais a ocupação das mulheres no espaço de poder, assim como são as mulheres na política...
(Soa a campainha.)
A SRA. JUSSARA PELLICANO BOTELHO - ... assim como são as mulheres no empreendedorismo, e também a ocupação de espaços de experiência, em que as mulheres podem viajar, as mulheres podem estar no esporte, nas lutas e quebrar estereótipos convencionados. A gente quer que nenhuma mulher deixe de viajar por conta do medo. E temos a Sisterwave como essa ferramenta. E nós unimos o poder da tecnologia e o poder da comunidade em prol da sororidade. E a longo prazo, o que eu quero é que a Sisterwave não tenha nenhum motivo de existir. Que eu fale que estou criando uma plataforma somente para mulheres, e as mulheres se veem com essa existência.
E aqui tem algumas proposições, não é? Enfim. E se o sujeito da violência fosse incluído nessa conversa? Por exemplo, neste seminário, se fosse um seminário de inovação e iniciativas para eliminação de violências realizadas por homens...
(Soa a campainha.)
A SRA. JUSSARA PELLICANO BOTELHO - ... em grande maioria contra mulheres. E se a gente inverter a lógica de intimidação? Ao invés de uma mulher se sentir intimidada de denunciar porque acha que sua índole vai ser manchada, por que não intimidar o homem, que é o violentador? E se dentro de casa a gente ensinar as nossas crianças que o mundo é um lugar que pode ser alcançado por mulheres e homens e que a casa é um lugar de que os dois necessitam cuidar? E se os sintomas mínimos de violências e padrões de violências forem reconhecidos na raiz? Que a gente não precise que a dor de um feminicídio aconteça para que isso seja punido realmente. E se a gente moldasse os nossos espaços de acordo com essa equidade de gênero, realmente?
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Esta é uma Casa que foi construída pensando em homens.
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
A SRA. JUSSARA PELLICANO BOTELHO - O primeiro banheiro feminino desta Casa foi construído em 2006. Então, arquitetonicamente a gente tem uma violência e fisiologicamente a gente não poderia ocupar este espaço.
E se a gente estimular, cada vez mais, as mulheres para que pensem grande e para que possam ousar ser presidentes, ousar ser governadoras, ousar ser CEOs de grandes empresas, ousar ser campeãs olímpicas?
Então, convido vocês a olharem ao redor. Acho que essa é uma representatividade muito baixa de homens, também, numa discussão para a qual a gente tem que trazer os homens para discutirem junto com a gente. Esta Casa, como a Ana falou, é composta por 83% de homens e a gente está vendo essa representatividade muito baixa neste momento.
Para finalizar, tem uma frase que diz que quando uma mulher...
(Soa a campainha.)
A SRA. JUSSARA PELLICANO BOTELHO - ...ocupa um espaço de poder ou de experiência, ela não ocupa apenas para si, mas para o ser mulher e mostra para as outras mulheres que é possível. Então, a representatividade importa, e importa muito.
Se vocês querem participar dessa família e acreditam que o lugar da mulher é onde ela quer estar, convido vocês a participarem da Sisterwave.
Muito obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Soraya Thronicke. Bloco Parlamentar União Cristã/UNIÃO - MS) - Muito obrigada, Jussara, pela sua contribuição.
Eu gostaria...Você pode responder daí mesmo. Nós temos dados, estatísticas, de que pessoas não viajam para o Brasil - ou viajam menos do que gostariam - justamente porque um dos aspectos do nosso país é a violência, violência em geral. Eu gostaria que você colocasse... Não quero fazer nenhuma propaganda negativa de nenhum país. Se isso não for... Não sei... Mas eu acho que é importante você colocar aqui para nós. Existe algum país realmente hostil e perigoso para as mulheres viajaram? O que você pode falar sobre isso?
A SRA. JUSSARA PELLICANO BOTELHO - Excelente pergunta.
Existe um estudo. Foram analisados 50 países que são mais turísticos no mundo. O Brasil está dentro desse estudo e ocupa a segunda posição de mais violento.
A SRA. PRESIDENTE (Soraya Thronicke. Bloco Parlamentar União Cristã/UNIÃO - MS) - Contra a mulher também? Contra a mulher ou em geral?
A SRA. JUSSARA PELLICANO BOTELHO - Sim. Ele perde apenas para a África do Sul. Então, foram analisados vários elementos, o gap de gênero, o índice de feminicídios naqueles países. Há vários dados sobre isso. Infelizmente, o Brasil ocupa um lugar muito desfavorável. E também a imagem do Brasil lá fora é muito manchada nessa questão da violência.
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Sobre isso, como uma experiência pessoal, muitas vezes, me falaram: "Ah, meu sonho é conhecer o Brasil", mas sempre vinha com "mas é muito violento". E aí é muito violento e não só em relação à violência contra a mulher, mas a outros tipos de violência. E eu acho que é interessante trazer para o turista, e também é o papel da Embratur divulgar o país, mostrando as diversas facetas do Brasil, porque, muitas vezes, o acesso que uma pessoa de fora tem é através da mídia e através de filmes.
Então, existem filmes, como Tropa de Elite, Carandiru, que falam muito de violência. É um fato? É um fato, mas o Brasil é muito maior do que isso.
A SRA. PRESIDENTE (Soraya Thronicke. Bloco Parlamentar União Cristã/UNIÃO - MS) - Você já esteve no Marrocos?
A SRA. JUSSARA PELLICANO BOTELHO - Ainda não. Gostaria.
A SRA. PRESIDENTE (Soraya Thronicke. Bloco Parlamentar União Cristã/UNIÃO - MS) - O que você... Para que nós possamos evitar fake news. Volta e meia, eu leio alguma coisa sobre perigo de mulheres no Marrocos. É verdade isso? Você tem dados sobre isso?
A SRA. JUSSARA PELLICANO BOTELHO - Dados, realmente, eu não tenho, mas eu já tive contato com pessoas do Marrocos e foi justamente essa quebra de preconceitos que a gente... Eu já morei, inclusive, com uma marroquina e ela não era nada, como se diz, conservadora, assim.
Então, acho que é importante a gente trazer a história de um país, mas não a história única. Então, vermos de diversas formas. Inclusive, tem uma fala de uma nigeriana que me inspira muito, que é a Chimamanda, uma escritora, em que ela fala sobre o perigo da história única, porque a história única não é que ela seja uma mentira, mas ela é apenas uma versão daquela realidade. A realidade como a de um país, de uma cultura é multifacetada.
A SRA. PRESIDENTE (Soraya Thronicke. Bloco Parlamentar União Cristã/UNIÃO - MS) - Muito obrigada pela sua contribuição.
E nós vamos para a nossa última oradora agora, a nossa Deputada Bia Kicis, Deputada aqui do Distrito Federal.
É uma honra tê-la aqui, Bia, na nossa Casa!
Você está com a palavra. (Palmas.)
A SRA. BIA KICIS (Para discursar.) - Bom dia a todos, todos os presentes, tantas mulheres e homens valorosos aqui.
Eu quero cumprimentar a nossa Senadora que preside esta sessão, a Senadora Soraya Thronicke.
Estivemos juntas em Israel e hoje temos a honra de ter aqui o nosso querido Embaixador de Israel; a nossa Embaixatriz; a Lili, que está aqui - nós estivemos juntas, na segunda-feira, na Embaixada, para uma experiência, realmente, muito tocante; Ed, que está ali também.
Eu não vim com o propósito de falar, mas quero aproveitar esta oportunidade para dizer algumas palavras. Fiquei bastante entusiasmada com essa sua palestra agora, Jussara. A gente vem para tratar de violência, a gente acha que vai ter só momentos tensos, difíceis e, de repente, a gente vem e assiste a uma palestra sobre uma proposta tão desafiadora.
Quero dizer que, como mulher, nós enfrentamos muitos desafios, de fato, e cada uma de nós enfrenta suas próprias limitações, até mesmo limitações que a gente constrói, muitas vezes, são imaginárias, ou oriundas das nossas experiências pessoais. E, de fato, existem muitos tipos de violências. E a gente quer aproveitar momentos como este para que a gente se enxergue e, pela experiência de outras mulheres, pelo desafio que outras mulheres enfrentam, a gente vá conseguindo superar as nossas próprias limitações.
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De fato, a experiência que a Lili trouxe, tão dura, da perda de uma irmã pela violência doméstica nos faz pensar que nós precisamos de trabalhar, sim, na prevenção. Isso é fundamental! Não podemos esperar sempre o pior para, depois, chorarmos as nossas dores. Nós, mulheres, precisamos nos unir e trabalhar, cada vez mais, pela segurança e na prevenção da violência contra as mulheres, contra os nossos filhos.
O que posso dizer é que, como mulher, uma das maiores violências que ataca as mulheres, que destrói uma mulher é a violência contra os nossos filhos, a violência também contra os entes queridos, aqueles que nós amamos.
Quero dizer que saio daqui com esse desafio também, Jussara, porque, realmente, eu sou uma pessoa que não gosta de viajar sozinha. Gosto de ter os meus momentos sozinha, mas gosto de viajar acompanhada, e digo que o medo do desconhecido, do que a gente pode enfrentar é algo real. E eu já entrei no Instagram, já curti ali a página de vocês e quero fazer parte também desse mundo. Acho que é sempre bom enfrentarmos desafios, mas é preciso que a gente trabalhe também em segurança.
Então, nós, como legisladores, Senadora Soraya, temos essa missão também de trabalharmos para que a gente possa viver em um mundo, em um país, em uma cidade mais seguros.
Quero agradecer por esta oportunidade, deixar um abraço caloroso a todos que estão aqui. Estamos vendo ali pessoas que também cuidam da nossa segurança - e temos aqui também os Aspar das Forças. E dizer que é realmente uma honra poder falar aqui desta tribuna para tantas pessoas valorosas.
Muito obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Soraya Thronicke. Bloco Parlamentar União Cristã/UNIÃO - MS) - Obrigada, Deputada Bia Kicis, pela sua participação.
Quero agradecer a presença de todas as pessoas que nos acompanharam nesta manhã. Quero agradecer a presença da Desembargadora Fátima Maranhão e de todos que aqui estão. Quero agradecer a todos que estão nos acompanhando pela TV Senado, pelas redes sociais, na pessoa da Thaís. Thaís, muito obrigada a você e a todos vocês que estão conosco aqui presentes sempre, sempre, sempre, ainda que à distância, mas muito presentes.
Quero agradecer à Jussara Pellicano Botelho, Lili Ben-Amin, à Sra. Maria Terezinha Nunes, Maria Teresa Prado, Ana Cláudia Oliveira, Ana Cláudia Pereira, à Dra. Amini Haddad, ao nosso Embaixador de Israel, Embaixador Daniel, à Senadora Leila, que é a nossa Procuradora da Mulher aqui na Casa, bem como à presença da Bia aqui conosco. E terminar agradecendo a presença dos homens aqui.
Como a Jussara mesmo disse, essa não é uma pauta feminina. Por que a presença majoritária de mulheres? Nós esperávamos aqui a presença majoritária de homens, de homens!
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E eu acho que existe nas duas Casas, Bia... Eu já falei daquela tribuna para o Presidente Rodrigo que nós gostaríamos de que dessas pautas de violência contra as mulheres, contra as crianças, contra os mais vulneráveis fossem destinadas as relatorias dos projetos de lei para os homens e entregues nas nossas mãos outras pautas.
Nós temos condições de tratar de economia, orçamento, temos condições de tratar de infraestrutura e por que essas pautas ficam com os homens? Porque aí há algo velado. Isso é uma violência conosco sabem por quê? Fomos eleitas e tudo, mas aqui dentro, para termos pautas de poder, que envolvem dinheiro, que envolvem recurso... (Palmas.) Nós não temos essas relatorias.
Não temos também, eu acho - olha, alguém me corrija, por favor - que vai ser uma exigência dos próximos candidatos aqui para a próxima Presidência do Senado Federal que, no mínimo, uma mulher seja titular na Mesa.
Que eu saiba, estão aí vocês, nós nunca tivemos uma mulher com uma cadeira titular na Mesa Diretora do Senado Federal. Temos, acho, hoje a Senadora Leila, ou já foi há dois anos atrás, mas era suplente.
Chega disso! E que essas pautas relativas à violência fiquem com a relatoria dos homens.
E quero também aos homens por votarem em nós mulheres, porque a maioria dos homens... Nós avançamos nas nossas pautas e nos espaços de poder porque tínhamos homens votando aqui para que alcançássemos isso, mas, assim, é no freio de mão. É uma coisa que anda muito lentamente.
Mas eu não posso deixar de agradecer aos homens por eu ter sido eleita. Eu acredito que eu tive votos majoritariamente masculinos. E aí foi uma conversa que eu tive com a Desembargadora Fátima: por que as mulheres não votam nas mulheres? Interessante isso.
No Mato Grosso do Sul, em 2018, das 24 cadeiras para a Assembleia Legislativa, nós não elegemos, no Mato Grosso do Sul, nenhuma mulher. Agora, neste pleito elegemos apenas uma mulher.
Então, isso é muito sério. Não temos que votar em mulheres apenas por serem mulheres, mas pela sua capacidade. Mas também não podemos deixar de votar em uma mulher por ela ser mulher.
Então, que possamos pensar sobre tudo isso e agradecer por esse momento em que estamos aqui tratando de coisas tão sensíveis - toca na ferida -, foi um momento emocionante. Estamos aqui reunidas por um problema não só brasileiro, mas um problema mundial.
Mas eu saio deste evento cheia de esperança, porque estamos aqui unidos, e que consigamos, independentemente de qualquer ideológica, qualquer diferença partidária, que possamos estar unidos, como brasileiros e brasileiras, em prol de um bem muito maior do que os limites da nossa nação.
Muito obrigada pela presença de vocês aqui hoje e que vocês possam retornar para casa em segurança, e que permitam que vocês retornem para casa, não é? Que desbloqueiem qualquer BR que esteja bloqueada para que todo mundo possa tocar a sua vida adiante.
Muito obrigada.
Bom fim de semana a todos. (Palmas.)
(Levanta-se a sessão às 12 horas e 36 minutos.)