1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA
57ª LEGISLATURA
Em 3 de maio de 2023
(quarta-feira)
Às 10 horas
40ª SESSÃO
(Sessão Especial)

Oradores
Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG. Fala da Presidência.) - Declaro aberta a sessão.
Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos.
A presente sessão especial foi convocada em atendimento ao Requerimento nº 155, de 2023, de autoria do Senador Rogério Carvalho e de outros Senadores, aprovado pelo Plenário do Senado Federal.
A sessão é destinada a comemorar o Dia do Parlamento e os 200 anos da instalação da Primeira Assembleia Constituinte e Parlamentar.
A Presidência informa que esta sessão terá a participação dos seguintes convidados: Senador Rogério Carvalho, autor do requerimento; Senador Randolfe Rodrigues, Líder do Governo no Congresso Nacional; S. Exa. o Presidente José Sarney, a quem saudamos de maneira muito especial por mais uma vez nos brindar com a sua presença na sua Casa, o Senado Federal; S. Exa. o Sr. Ministro Gilmar Mendes, Ministro do Supremo Tribunal Federal, decano da Suprema Corte; Exmo. Sr. Procurador-Geral da República, Dr. Augusto Aras; e Sr. Leandro Grass, Presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
São todos muito bem-vindos ao Senado Federal. Saúdo todas as senhoras e todos os senhores e convido a todos para, em posição de respeito, acompanharmos o Hino Nacional, que será executado pelo dueto da Banda de Música do Corpo de Bombeiros do Distrito Federal.
(Procede-se à execução do Hino Nacional.)
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O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MG) - A Presidência agradece ao Dueto do Corpo de Bombeiros do Distrito Federal pela execução belíssima do Hino Nacional. Muito obrigado a ambos.
Eu saúdo também o Brigadeiro Francisco Joseli, aqui presente, Presidente do Superior Tribunal Militar; igualmente o Deputado Federal Lafayette de Andrada, que representa a Comissão instituída na Câmara dos Deputados para a celebração do bicentenário da Assembleia Nacional Constituinte e da Constituição do Império de 1824.
Assistiremos agora a um vídeo que foi produzido pela TV Senado especialmente para esta sessão.
(Procede-se e à exibição de vídeo.)
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O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MG. Para discursar - Presidente.) - Senhoras e senhores, nós iremos receber na sessão de hoje nas galerias do Plenário os alunos dos Colégios Marista João Paulo II, Objetivo e Adventista.
Esses estudantes assistiram agora há pouco no Salão Negro a uma apresentação teatral que reproduz a sessão de instalação da Assembleia Constituinte de 1823, um dos marcos da criação do nosso Parlamento.
Agradecemos a presença dos estudantes, o apoio dos educadores e esperamos que o evento tenha ajudado a fortalecer a educação cidadã desses adolescentes.
Registramos também que, na manhã de hoje, o Supremo Tribunal Federal, por iniciativa de sua Presidente, Ministra Rosa Weber, realiza um seminário acerca do mesmo tema - os 200 anos da Assembleia Constituinte de 1823 - e lá participam diversos juristas a respeito da discussão desse tema. Então, na pessoa do Ministro Gilmar Mendes, eu gostaria também de enaltecer, elogiar e agradecer a iniciativa do Supremo Tribunal Federal de celebrar uma data muito importante para o Parlamento brasileiro.
Igualmente registramos o apoio do Sindilegis na realização dessa iniciativa junto à comunidade escolar e para a realização também desse evento. Nossos cumprimentos a todos os integrantes do Sindilegis.
Senhoras e senhores, saudando uma vez mais todas as autoridades que compõem esse dispositivo, todos os que nos honram com suas presenças nesta sessão especial, gostaria de destacar aqui a presença dos Srs. Embaixadores, encarregados de negócios e demais membros dos corpos diplomáticos da Áustria, do Irã, Luxemburgo, Malta, República Dominicana, Tunísia e União Europeia.
O Presidente da Comissão Organizadora do Bicentenário da Constituinte de 1823 da Câmara dos Deputados, uma vez mais saudado, o Deputado Federal Lafayette de Andrada, meu conterrâneo de Minas Gerais; a Sra. Deputada Federal Benedita da Silva; o Ministro do Tribunal Superior do Trabalho Sr. Alberto Bastos Balazeiro, representando o Presidente do Tribunal Superior do Trabalho; a nossa Diretora-Geral do Senado Federal, Ilana Trombka; o Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal, Sr. Desembargador Eleitoral Roberval Casemiro Belinati; o Sr. Procurador-Geral de Justiça do Distrito Federal, Sr. Georges Seigneur; Procurador do Trabalho do Mato Grosso do Sul Sr. Paulo Douglas Almeida de Moraes, representando o Procurador-Geral do Trabalho; Secretário Executivo de Segurança Pública, Sr. Alexandre Rabelo Patury, representando a Secretaria de Estado de Segurança Pública do Distrito Federal; o Secretário de Estado, em exercício, da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Distrito Federal, Sr. Carlos Alberto Júnior; Conselheiro do Conselho Nacional de Justiça, filho desta Casa, Sr. Luiz Fernando Bandeira de Mello Filho; Presidente da Associação Nacional dos Advogados da União, Sr. Clóvis dos Santos Andrade; Presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, Juiz Frederico Mendes Júnior, a quem agradecemos também pela presença; Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, Sr. Luiz Antonio Colussi, seja muito bem-vindo; Presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil, Juiz Nelson Gustavo Mesquita Ribeiro Alves; o Presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, o Sr. Ubiratan Cazetta; o Consultor-Geral da União, o Sr. Andre Augusto Dantas Motta Amaral, representando a Advocacia-Geral da União; o membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, o Sr. André Heráclio do Rêgo, representando o Sr. Presidente; a Diretora-Geral do Arquivo Nacional, a Sra. Ana Flávia Magalhães; a Diretora de Assuntos Jurídicos da Associação Nacional dos Procuradores e Procuradoras do Trabalho, a Sra. Procuradora do Trabalho Carolina Pereira Mercante, representando a Associação; a Conselheira da Ordem dos Advogados do Brasil do Distrito Federal, a Sra. Joana Mello, representando a OAB-DF. São todos muito bem-vindos.
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Esta sessão especial tem por objetivo celebrar os 200 anos da primeira Assembleia Constituinte, a criação do Poder Legislativo no Brasil e o Dia do Parlamento.
A Constituinte de 1823 foi o primeiro experimento constitucional genuinamente brasileiro. Foi, ao mesmo tempo, uma afirmação da independência nacional e uma vivência dos ideais iluministas, que influenciaram alguns dos grandes eventos históricos da época - as Revoluções Americana e Francesa.
Não tivemos êxito em produzir aquilo de que o país tanto precisava. A Constituinte foi dissolvida, e a Constituição de 1824 foi um texto outorgado, que conservou aspectos característicos do Antigo Regime, como o Poder Moderador e a religião oficial. Também prolongou o maior dos nossos traumas históricos: a odiosa escravidão.
Ainda assim, a Constituinte de 1823 significa um marco na história pátria, porque introduziu no ordenamento jurídico as ideias de direitos individuais, separação de Poderes e limitação do poder do Estado, temas fundamentais ao desenvolvimento de um Estado de direito. Ao fazê-lo, ainda inaugurou o Poder Legislativo nacional - antes, as deliberações se restringiam ao âmbito local ou às cortes portuguesas.
O Dia do Parlamento foi concebido como uma homenagem à Constituinte de 1823. Em 1973, sesquicentenário dessa Constituinte, o projeto de lei que criou o Dia do Parlamento foi proposto ao Congresso Nacional.
Eram os anos de chumbo, os piores da ditadura militar. Celebrar o Dia do Parlamento nessas circunstâncias era um grito de socorro, mas também de esperança. Quando o projeto foi aprovado, em 1975, já vivíamos o início da fase de distensão, mas a sonhada democracia tomaria mais de uma década para vir à luz.
Em 2023, no bicentenário, nós comemoramos o dia 3 de maio num quadro distinto. Vivemos sob o regime da Constituição de 1988, a Constituição Cidadã, a mais rica em direitos individuais e sociais da nossa história.
O que significa o Dia do Parlamento nesse contexto? - indago.
São bem conhecidas as competências clássicas de um Parlamento, estatuídas pelo Barão de Montesquieu em sua teoria da tripartição de Poderes: o Governo administra, a Justiça julga, o Parlamento legisla.
Eis que, no ordenamento atual, a competência de legislar se desdobra. O Parlamento hoje não só legisla. O Parlamento autoriza, o Parlamento fiscaliza, o Parlamento delibera. Mas, antes de mais nada, o Parlamento expressa, o Parlamento afirma. O Parlamento representa.
E a representação de todos - o Brasil em sua pluralidade - é uma das grandes missões do Parlamento brasileiro em nosso tempo. Isso é o que dá cor e forma ao Dia do Parlamento em 2023. Então, neste 3 de maio, celebremos as glórias do Parlamento brasileiro, o Parlamento onde José Bonifácio, Joaquim Nabuco e Ruy Barbosa nos brindaram com suas ideias; onde Ulysses Guimarães clamou por liberdade, soberania e justiça; onde Tancredo Neves fez, em um de seus maiores discursos, seu elogio ao menino pobre de Diamantina, que se tornou sucessivamente operador de telégrafos, médico urologista, policial militar, Prefeito, Governador, Deputado Federal e Presidente da República: Juscelino Kubitschek. Mas não nos limitemos a esses. Celebremos também o Parlamento onde atuou Almerinda Farias Gama, mulher negra, sindicalista, delegada de classe na Assembleia Nacional Constituinte de 1933. Celebremos também o Parlamento onde Bertha Lutz falou em favor da participação das mulheres na política, em seu discurso de posse no cargo de Deputada Federal em 1936. Celebremos também o Parlamento onde participou o Deputado e Senador Abdias Nascimento, economista, ícone da cultura brasileira e um dos principais militantes contra o racismo da história nacional. Celebremos, enfim, um Parlamento plural e aberto, pronto a defender os valores da Constituição Federal. O jornalista britânico Walter Bagehot, um estudioso do Parlamento de seu país, escreveu em seu livro A Constituição Inglesa, em 1873: "A responsabilidade do Parlamento deve ser sentida pelo Parlamento".
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O Parlamento brasileiro hoje sente o peso de suas responsabilidades. Neste 2023, o Estado Democrático de Direito no Brasil sofreu um dos maiores e mais graves ataques da sua história: uma horda de extremistas invadiu o Palácio do Congresso, depredando e desonrando a representação da sociedade brasileira, como o fez no Palácio do Planalto e no Supremo Tribunal Federal. Como sabemos, os extremistas e essa horda de 8 de janeiro deixaram um rastro de destruição muito além do dano patrimonial, mas as instituições brasileiras, fortalecidas em sua união na defesa do Estado de direito, reagiram de maneira firme, levando os responsáveis por esses atos covardes à Justiça, dizendo não ao golpismo e ao autoritarismo, e sim - um sim rotundo - à democracia.
Reagir, no entanto, não basta. É preciso que sejamos inflexíveis na promoção dos valores democráticos em nosso país, para que nunca mais ataques como esse e os ideais que os inspiram voltem a assombrar a vida pública nacional. Sejamos 594 Parlamentares combatentes, incansáveis em favor da democracia em nosso país.
Outra de nossas responsabilidades consiste na superação de males históricos que afligem nosso país. Falo da desigualdade social e de problemas correlatos, incluindo o aumento assustador da pobreza, da carestia e da fome que vivemos nos últimos anos. A esse respeito, o Parlamento deve dedicar atenção concentrada; deve ter no desenvolvimento um tema de consenso, acima de qualquer disputa eleitoral ou partidária; deve superar as diferenças em favor das necessidades urgentes da população; e deve fazê-lo por princípio, priorizando em suas deliberações um modelo de crescimento inclusivo e pró-social.
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Senhoras e Senhores, um Parlamento moderno, eficiente, em permanente diálogo com o povo e cioso de suas responsabilidades; um Parlamento que traga os cidadãos e as cidadãs para o debate político respeitoso e saudável pela via presencial e pela via digital-virtual das redes sociais; um Parlamento em que a população participe e onde ela se sinta representada é o Parlamento que desejamos para o Brasil.
Este deve ser, Presidente José Sarney, o espírito do Poder Legislativo, que V. Exa. representou tão bem e por tantos anos: ser uma arena de direitos, uma arena de consensos, uma arena de articulação respeitosa e eficiente em favor do povo brasileiro.
A luta inaugurada pela Assembleia Constituinte de 1823 segue nos inspirando, 200 anos depois.
Um feliz Dia do Parlamento ao Brasil!
Muito obrigado. (Palmas.)
Passo a palavra, neste momento, à S. Exa. o Senador Rogério Carvalho, Primeiro-Secretário da Mesa Diretora do Senado Federal, para que faça o seu pronunciamento - S. Exa. é o autor do requerimento para a realização desta sessão.
O SR. ROGÉRIO CARVALHO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - SE. Para discursar.) - Sr. Presidente Rodrigo Pacheco, Presidente do Senado Federal, meus cumprimentos ao ex-Presidente da República Federativa do Brasil e ex-Presidente do Senado Federal, o Senador José Sarney, por quem todos têm uma grande admiração e respeito; ao Ministro do Supremo Tribunal Federal, o Ministro Gilmar Mendes, representando aqui o STF; ao Primeiro-Secretário do Senado Federal, de quem não preciso falar, que sou eu... (Risos.)
Eu queria cumprimentar o Senador Randolfe Rodrigues, Líder do Governo no Congresso Nacional; o Procurador-Geral da República, o Sr. Augusto Aras, aqui presente; e o Presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, o Sr. Leandro Grass.
Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, a data de hoje é um marco na história do país. Hoje celebramos o Dia do Parlamento, os 200 anos da primeira Assembleia Constituinte e da criação do Poder Legislativo do Brasil. E não poderíamos deixar de também dizer da data em que o Brasil começa a se conformar enquanto nação. É dia, portanto, em que devemos comemorar a resiliência histórica deste Poder, que em nosso país sempre se colocou como instrumento contra o arbítrio e os excessos cometidos contra o povo brasileiro.
Há 200 anos, quando D. Pedro I apontou que a Assembleia Constituinte demonstrava ao mundo que o Brasil seria mais que um império, o país seria o império livre, com efeito o Parlamento da época, em clima de efervescência, discutiu temas avançados para a época, como a liberdade de imprensa, bem como apresentou o esboço de Constituição de Andrada Machado, o qual é tido como grande referência de modernidade.
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A fala de D. Pedro I ainda hoje é atual. Podemos afirmar que o respeito ao Poder Legislativo é um dos pilares da liberdade de uma nação, é aqui que se fazem as grandes discussões com respeito à vontade da maioria, porém sem descuidar da representação das minorias no processo legislativo.
Nesse sentido, não podemos deixar de mencionar as cicatrizes da nossa democracia depois dos ataques de 8 de janeiro. É importante reafirmar que nem mesmo a violência desses atos será capaz de retirar a nossa esperança em um país melhor. Diante desses graves fatos, o Parlamento se reafirma e ressurge como arena política, reforçando sua relevância como instrumento de resolução de confiança, de ideias e de controvérsias em nossa sociedade. Noutras palavras, fora da política há apenas a barbárie, como vimos recentemente. É preciso, portanto, qualificar cada vez mais o nosso debate político, nunca calando as vozes da nossa sociedade.
Nessa linha, relembro que políticas públicas da mais destacada importância, como o Bolsa Família, o Auxílio Gás, o auxílio emergencial, bem como a PEC da Transição, assim como tantas outras matérias que, durante a pandemia, garantiram o funcionamento do nosso país, foram aprovadas aqui, neste Congresso Nacional. E continuaremos aprovando outras matérias de igual relevância em benefício do bem-estar do povo brasileiro.
É importante sempre lembrar: não fosse a criação deste Senado da República, talvez não tivéssemos essas dimensões continentais que o Senado conseguiu garantir com a representação através de um frágil Parlamento no início da sua jornada. Por isso devemos muito aos Constituintes daquela ocasião, daquele momento, ao próprio D. Pedro, a todos que fizeram e que deram origem ao Poder Legislativo brasileiro.
Muito obrigado.
Que possamos seguir sempre na direção do fortalecimento das nossas instituições e da democracia! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MG) - Obrigado, Senador Rogério Carvalho, autor do requerimento para esta sessão solene.
Registro também a presença dos nossos colegas Senadores: Senador Humberto Costa, do Estado de Pernambuco; Senador Wilder Morais, do Estado de Goiás; Senador Sérgio Petecão, do Estado do Acre. Sejam muito bem-vindos também a esta sessão!
Neste momento passo a palavra a S. Exa. o Senador Randolfe Rodrigues, Líder do Governo no Congresso Nacional, para que faça o seu pronunciamento.
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/REDE - AP. Para discursar.) - Senador Rodrigo Pacheco, Presidente do Congresso Nacional, caríssimo Presidente, da mesma forma que eu o saúdo, também o cumprimento pelo pronunciamento de ainda há pouco, que reafirma a atualidade e a importância de nosso Parlamento.
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De igual modo, quero aqui externar meus cumprimentos ao Presidente José Sarney, Presidente nosso de ontem, de hoje e de sempre, ex-Presidente da República Federativa do Brasil e Presidente deste Senado da República por diversas vezes e Presidente do Congresso Nacional, aqui muito nos honra a sua presença nesta sessão; de igual forma, ao eminente Ministro Gilmar Mendes, que representa neste ato o Supremo Tribunal Federal e que aqui externa as homenagens da Suprema Corte ao Parlamento; ao autor desta sessão, Senador Rogério Carvalho, meu caríssimo colega, e, na sua pessoa, cumprimento todos os demais colegas Senadores aqui presentes. Estendo, de igual forma também, os cumprimentos ao Dr. Augusto Aras, Procurador-Geral da República; e, de igual forma também, ao meu caríssimo Leandro Grass, Presidente do Instituto do Patrimônio Histórico Nacional, que tem significado diagnóstico pelo ato da sua presença também neste evento. Permitam-me também estender aqui os cumprimentos ao meu caríssimo Lafayette Andrada, colega da Comissão Curadora da Câmara dos Deputados, por ocasião das celebrações do Bicentenário, e colega também na celebração agora dos 200 anos do Parlamento, assim como à caríssima Deputada Benedita da Silva. Permitam-me também cumprimentar a Dra. Ilana Trombka, Diretora-Geral do Senado Federal; e um especial cumprimento ao Sr. Ministro Tenente-Brigadeiro do Ar Francisco Joseli Parente Camelo, Presidente do Superior Tribunal Militar. Aos representantes das delegações estrangeiras aqui presentes e dos demais tribunais superiores, os meus cumprimentos.
A celebração da data de hoje é a celebração de uma instituição indispensável para a formação de nosso país. Não é demasiado dizer que o Brasil surgiu com o Parlamento, com um antecessor histórico, a convocação das Cortes de Lisboa, em 1819, onde 60 Parlamentares brasileiros, representando naquele momento a condição de Reino Unido do Brasil, Portugal e Algarves, lá participavam. Aquele momento primeiro, a convocação das Cortes de Lisboa, externava uma circunstância: a insistência da então ainda metrópole em manter sob seu jugo, não mais na condição de reino unido, mas retrocedendo à condição de colônia, a sua principal extensão do império colonial português na América do Sul. A convocação das Cortes de Lisboa, logo após a Revolução do Porto, é o prenúncio dos momentos que antecedem ao 3 de maio de 1923, da convocação da Assembleia Geral, da Assembleia Geral Constituinte, que é dada por nós, na celebração de hoje, como data de instituição do nosso Parlamento.
Um segundo momento a esse se sucede. Dias antes, por ocasião de José Bonifácio de Andrada, meu caríssimo Lafayette, Gonçalves Ledo e outros, pais fundadores de nossa nação, convocavam a Assembleia Geral das Cortes do Brasil, em uma clara demonstração de ruptura às intenções das Cortes de Lisboa.
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Um pouco antes da nossa independência, em 3 de junho de 1822, o noticiário do Rio de Janeiro, sob a impressão mais uma vez de José Bonifácio e de Gonçalves Ledo, proclamava a irresignação brasileira sobre a realização de Cortes tão distantes e apontava a necessidade de ruptura, a inevitabilidade naquele momento de ruptura com Portugal.
Em 3 de junho de 1822, foi expedido o decreto convocando eleições para a Assembleia Geral Legislativa e Constituinte do Brasil. Em carta a D. João VI, D. Pedro já proclamava o seguinte e afirmava a necessidade de termos um Parlamento próprio - dizia D. Pedro: "O povo tem razão. Sem Cortes, o Brasil não pode ser feliz". Concluía D. Pedro: "Leis feitas tão longe de nós por homens que não são brasileiros e que não conhecem as necessidades do Brasil não podem ser leis boas". Meses depois, o Brasil rompia com Portugal e se assumia como nação independente.
Tão logo, dois atos consolidam a formação de nosso país, a formação daquela nação que surgia: a própria coroação de D. Pedro em 12 de outubro de 1822, e, seis meses depois, em 3 de maio de 1883, a convocação da primeira Assembleia Geral Constituinte.
Essa primeira assembleia geral, como muito bem foi dito pelo Sr. Senador Rodrigo Pacheco, Presidente desta Casa, era inspirada pelos ideais iluministas, pelo princípio de Montesquieu de separação dos Poderes, de necessidade de, naquele momento, instituirmos um regime monárquico, mas termos um regime monárquico constitucional.
A Constituinte de 1823 tem idas e vindas; é fechada logo depois pelo Imperador. A ideia de independência é modelada por uma repartição de Poderes em que instituíam um tal Poder Moderador, que, na verdade, concentrava mais poderes em torno do Imperador. De qualquer forma, de qualquer sorte, a formação final da Assembleia Constituinte de 1823 marca o nascimento de nosso país, com todas as limitações, com o voto censitário, mas marca o nascimento do nosso país já com o princípio da necessidade da separação dos Poderes. É a isso que celebramos.
Da Constituinte de 1823, com todas as suas idas e vindas, à Constituição de 1988, nós tivemos oito textos constitucionais. Evoluímos a cada momento. A cada texto constitucional, nós incluímos o cidadão e chegamos à Constituição de 1988, a mais avançada de nossa história, a que declarou, a que instituiu uma declaração de direitos do cidadão, a que trouxe e elevou a nossa Constituição e elevou o nosso Estado a uma condição de democracia semidireta, proclamada no parágrafo único do art. 1º, onde se diz que o poder é exercido pelo povo ou por seus representantes e pelo povo diretamente, nos termos do art. 14, inciso I, II e III da Constituição, onde a soberania popular pode ser exercida através do plebiscito, do referendo, da iniciativa popular de leis.
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Trouxe um capítulo inovador em relação ao meio ambiente, como o direito das atuais gerações e das gerações futuras, e trouxe um outro capítulo inovador, reconhecendo a fundação e a permanência neste país dos povos originários. Separou os Poderes e elevou o Parlamento à sua condição. Assim foi proclamado em 1988, e o Presidente José Sarney, neste Congresso Nacional, estava presente, com o Presidente Ulysses Guimarães, que disse, naquele momento histórico, em 5 de outubro de 1988, que o Parlamento havia largado os seus afazeres, havia largado as suas atribuições.
O Parlamento sai de 1823, chega até 1988 e chega aos dias atuais como instituição indispensável para a formação nacional. O Parlamento esteve presente na fundação do país. O Parlamento, mesmo vilipendiado, como já foi dito pelo Presidente Rodrigo Pacheco, em data recente, de infâmia, do 8 de janeiro, se afirma como instituição indispensável. É muito melhor um Parlamento funcionando com todos os seus defeitos e vicissitudes do que o Parlamento fechado, do que o Parlamento sob o arbítrio, quando a expressão da vontade popular não tem espaço, não tem vez.
Os fundadores desta nação tiveram assento no Parlamento. Por aqui passaram Antonio Carlos, Martim Francisco, Belchior, José Bonifácio, Gonçalves Ledo e tantos e tantos outros.
O Parlamento foi a voz de diferentes posições nos debates acirrados dos anos 1960.
O Parlamento foi Ruy Barbosa, que aqui se tornou, ao longo de sua história, inclusive, patrono de nossa instituição.
O Parlamento foi Rubens Paiva, que foi tirado de sua casa sob a força do arbítrio e assassinado, para que fique presente na nossa memória que nunca mais nós podemos viver sob a égide de um regime autoritário.
O Parlamento foi Ulysses Guimarães, segundo o qual, também na Constituição de 1988, na sua promulgação, no seu célebre discurso, preferimos um Parlamento fechado porque temos sobretudo "ódio e nojo" à ditadura em qualquer lugar que ela se estabeleça, sobretudo na América Latina.
Neste momento de celebração dos 200 anos da nossa primeira Constituição e de instituição do Dia do Parlamento, temos o prazer, Presidente Rodrigo Pacheco, de entregar aos presentes a esta sessão os livros que constam sobre as mesas de V. Exa. e de fazer o lançamento formal deles.
As Fallas do Trono é um lançamento do Conselho Editorial do Senado Federal. As Fallas do Trono representam o conjunto de obras, o conjunto de pronunciamentos de D. Pedro I, D. Pedro II e Princesa Isabel, desde as primeiras sessões de instalação do Parlamento, desde o primeiro pronunciamento feito por D. Pedro I, em 1825, na primeira sessão do Parlamento, até o último pronunciamento antes do fim do regime monárquico.
Na sessão de abertura da Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império, D. Pedro falou pela primeira vez aos Parlamentares como Imperador do Brasil.
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Depois, até o final do período imperial, em 1889, D. Pedro I, D. Pedro II e a Princesa Isabel repetiram esse ritual no início e no encerramento de 20 sessões legislativas. O conjunto de obras hoje lançado pelo Conselho Editorial do Senado reúne 127 falas que ofereceram um retrato dos principais momentos do Brasil no Império, revela a relação institucional do Executivo, exercido pelo Imperador e pelo seu conselho de ministros naquele momento e o Legislativo.
As Fallas do Throno são um antecessor histórico do pronunciamento do Presidente da República na abertura do período legislativo a partir do advento da República. São quatro volumes, que totalizam 2.476 páginas. Essa coleção, Sr. Presidente, ora editada, reúne uma transcrição desse conjunto de documentos históricos para o português corrente e outras informações sobre esse período em que nasce e é constituída a nação brasileira. Em cada um dos volumes, estão as respostas dos Senadores aos discursos dos monarcas. Nunca antes selecionadas e publicadas, as imagens dos originais assinados do próprio punho retratam o contexto histórico do Brasil, em que falavam os monarcas e em que também falava o Parlamento.
Os volumes 1 e 2 apresentam As Fallas do Throno acompanhadas dos votos de graça, como também eram chamadas as respostas das Casas legislativas ao monarca, ao discurso de abertura de cada ano legislativo. Todo processo de discussão, aprovação e até apresentação ao monarca pelo Senado foi pesquisado e extraído dos 66 anais do Senado do Império. Cumprindo a tradição, a Câmara dos Deputados também aprovava separadamente a sua resposta à fala de abertura do ano legislativo, com conteúdo publicado pela primeira vez em coletânea em 1889 e reeditado agora pelo Senado.
Nos volumes 3 e 4, a coleção traz um panorama histórico do que acontecia no Brasil no momento dessas falas, na forma de cronologia dos principais momentos do Império, entre 1798 e 1889, as respectivas fontes primárias, os atos legislativos e outros documentos que fundamentavam essa fala.
Quero aqui, Sr. Presidente, fazer algumas homenagens a essa produção da parte do Conselho Editorial do Senado: mais uma vez, a Dra. Ilana Trombka, por todo o apoio para que se concretizasse; ao Sr. Rafael Chervenski, Diretor da Secretaria de Editoração e Publicações do Senado, responsável pela edição da obra, que conta que é a sede de um projeto em conjunto da historiadora e Mestre em Gestão da Informação e Conhecimento, Dra. Rosa Vasconcelos, à qual também presto homenagens. A Dra. Rosa inclusive foi chefe de serviço de arquivo do Senado, e da jornalista Virgínia Galvez, ex-Diretora da Secretaria de Comunicação Social, servidora do Senado.
Essa produção não seria possível se os originais desse arquivo, Presidente, não se encontrassem. E o Presidente Sarney, várias vezes na Presidência deste Senado, assim destacava, o que é razão de muito orgulho para todos nós, Senadores, que é a existência aqui do Arquivo do Senado, o segundo, meu caro Leandro Grass, maior arquivo historiográfico da história do Brasil.
Isso é o resultado da pesquisa desses servidores do Senado, desses historiadores e do trabalho a partir da máquina do tempo da história, que é o Arquivo do Senado da República.
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Esta produção é resultado de três anos de estudo, pesquisa e redação produzidos por jornalistas. A publicação é também ilustrada por imagens do período. É razão de muito orgulho para nós ter gravuras de Debret que muito retratavam todo o drama da formação do país no século XIX. Entre outras imagens de fotografias, quadros, gravuras de outros grandes artistas além de Debret, retrata paisagens, cenas do cotidiano, das guerras e conflitos, da triste chaga da escravidão naquele período.
Quero também aqui destacar que a cronologia do Império teve a supervisão, o acompanhamento e a produção do Prof. Luiz Fernando Saraiva, Professor Doutorando da Universidade Federal Fluminense e autor dessa vasta produção acadêmica sobre o Brasil Império.
Nós optamos, Sr. Presidente, por fazer, na data de hoje, na Data do Parlamento, o relançamento de As Fallas do Throno, obra deste Senado Federal, deste Conselho Editorial, que retrata a fundação do país, sobretudo para lembrar para as gerações de ontem, para gerações de hoje e para as gerações do amanhã que não existiria a formação deste país sem o Parlamento, não existiria a fundação do país sem a Assembleia Geral Constituinte de 1823, não existirá país sem Parlamento.
Como também o Dr. Ulysses outrora disse, é preferível o Parlamento aberto com todos os seus defeitos e vicissitudes, mas retratando e expressando a sociedade brasileira, a ele fechado, quando retrata o arbítrio e a ditadura.
O Parlamento é a expressão da democracia. Ele funcionando é a expressão de que o Brasil caminha para o destino que se espera. Não há outro destino ao nosso país - e isso está desde o nascedouro - que não seja com a participação e a presença do Parlamento. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MG) - Agradeço ao Senador Randolfe Rodrigues e o cumprimento pelo trabalho feito à frente do Conselho Editorial do Senado Federal.
Saúdo também a presença dos Srs. Embaixadores e demais Membros dos Corpos Diplomáticos de Cuba e da Síria; também a Presidente da Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos Federais, Dra. Rivana Barreto Ricarte; o Presidente do Instituto Cultural D. Isabel I a Redentora, Sr. Bruno da Silva Antunes de Cerqueira; a Diretora da Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos Federais, Sra. Liana Lidiane Pacheco Dani. São todos muito bem-vindos!
Eu tenho a honra de passar a palavra, neste instante, a S. Exa., o ex-Presidente desta Casa e ex-Presidente da República, José Sarney. (Palmas.)
Registro também a presença da Senadora Jussara Lima, do Estado do Piauí, e do Senador Luis Carlos Heinze, do Estado do Rio Grande do Sul.
Com a palavra, o Presidente José Sarney.
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O SR. JOSÉ SARNEY (Para discursar.) - Exmo. Sr. Senador Rodrigo Pacheco, Presidente do Senado Federal e do Congresso Nacional; Exmo. Sr. Ministro Gilmar Mendes, que aqui, sem dúvida, representa o Poder Judiciário, uma das colunas mestras de qualquer democracia do mundo; 1º Secretário do Senado Federal, autor do requerimento desta sessão, Senador Rogério Carvalho; Senador Randolfe Rodrigues, a quem cumprimento pelo belo discurso que acaba de fazer; Sr. Procurador-Geral da República, Senador - não estou fazendo profecia -, Sr. Procurador-Geral da República Augusto Aras; Presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Sr. Leandro Grass; Sra. Diretora-Geral do Senado Federal Ilana Trombka; meus senhores e minhas senhoras.
Quando estreei na vida parlamentar, há 68 anos, a Câmara dos Deputados funcionava no Palácio Tiradentes, no Rio de Janeiro. Ali erguera-se desde 1640, a chamada Cadeia Velha, sede do Senado da Câmara. Os portugueses, onde chegavam, não deixavam de fundar sempre o Senado da Câmara, para representar o povo, e a Santa Casa de Misericórdia.
Em 1822, o Governo reformou-a para acolher os representantes de todas as províncias do país e a 17 de abril de 1823, ali instalou-se a Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil, convocada por D. Pedro.
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Imaginemos, voltemos nossa memória para o passado. Aquele prédio, simples, branco, erguido em taipa de pilão, com as janelas emolduradas em cantaria, uma grande porta principal, pedra de lioz importada de Portugal, o Plenário num espaço ampliado, com cortinas que se elevavam para evitar o sol do meio-dia. Na lateral, um trono se eleva sobre um pequeno palanque. No estrado central, numa grande mesa, dirige os trabalhos, como primeiro Presidente da Assembleia, o Bispo Capelão-Mor D. José Caetano da Silva Coutinho, com homens vindos de todo o país entre as cadeiras arrumadas em círculo.
Esses homens eram os homens mais capazes do Brasil. Talvez nunca tenha se formado um grupo tão representativo e tão expressivo. Aos três Andradas - José Bonifácio, Antônio Carlos, Martim Francisco - juntavam-se os futuros Marqueses de Abrantes, de Barbacena, de Queluz, de Olinda; os jornalistas Araújo Guimarães e Francisco Jê Acaiaba de Montezuma, que seria o futuro Visconde de Jequitinhonha; os filósofos Antônio Ferreira França e Francisco Carneiro de Campos, que mais tarde seria o redator da Constituição de 1824, outorgada por D. Pedro I; o Padre Belchior Pinheiro, testemunha do Ipiranga.
O Padre Belchior Pinheiro estava no momento em que D. Pedro recebeu as cartas mandadas pela D. Leopoldina, vindas de Portugal, que exigiam que o imperador voltasse a Portugal e, enfim, praticamente acabava com o Brasil. O medo de todos era que voltasse a ser colônia, e o próprio D. Pedro julgava uma vergonha que o Brasil tivesse, durante tantos anos, sido colônia. Esse Padre Belchior foi a quem primeiro, depois de ler as cartas, o D. Pedro I as mostrou. Depois de lê-las, vira-se para ele e pergunta: "E agora, Padre Belchior, o que vamos fazer?". E em seguida é que ele proclama o grito da independência: "Independência ou morte!".
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Estavam ali também o inconfidente de 1792, José de Resende Costa; José da Silva Lisboa, o futuro e célebre Visconde de Cairu; Nicolau Campos Vergueiro, o famoso Senador Vergueiro, que teve uma grande influência na formação do país e do Império; José Joaquim também foi regente; José Joaquim da Rocha e Carneiro da Cunha; entre outros homens que fixaram o imaginário do seu tempo. Eles estavam ali reunidos para abrir a primeira assembleia do Brasil.
Quando se anuncia a aproximação do Imperador, que vinha para abertura dessa sessão, sai a esperá-lo uma comissão daqueles homens que estavam ali reunidos: o Barão de Santo Amaro, o Padre Belchior, José Bonifácio e mais nove Deputados. À porta - este gesto para nós, hoje, com o tempo, é um gesto simbólico que representa muito para o nosso país - D. Pedro retira a coroa e coloca... Isso significa um gesto em que ele achava que a assembleia era soberana. A própria assembleia se julgava soberana, no regimento que tinha feito, ela se dizia soberana.
A assembleia legislativa é o coração do povo em qualquer lugar do mundo. Não pode haver democracia sem haver Parlamento. Sem Parlamento forte, não pode existir democracia forte. Sem Parlamento não existe democracia. Ele representa o povo, representa a população geral, total que ali constitui a democracia representativa que os ingleses formaram, quer dizer, desenvolveram e chegaram a ela
À porta, o gesto central de D. Pedro, ao retirar a coroa, é um gesto simbólico que representa o fim de um período que era o período em que o Brasil deixava de ser Brasil para se tornar um grande país que despertava na imaginação de todos aqueles homens o que era o futuro; imaginavam, sem dúvida alguma, que nós aqui também, 200 anos depois, estaríamos comemorando o gesto que eles tomavam e que fizeram.
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D. Pedro vai à tribuna e lê um discurso que tinha sido feito a duas mãos - por ele e por José Bonifácio -, que acumula os papéis de Deputado, Ministro, alter ego do Imperador. E o que diz ele na fala do trono?
Faço parênteses aqui para louvar o Senado Federal pela obra que acaba de publicar, dirigida pelo nosso conselho editorial do Senador Randolfe Rodrigues, em quatro volumes, com as falas do trono de todo o Império, iluminadas com as respostas do Senado e muitos outros elementos que a tornam uma edição excepcional, como o Senador Randolfe Rodrigues ressaltou aqui.
Nas outras edições - nós já fizemos uma edição de Falas do Trono -, não incluímos as respostas que tinham sido dadas a essas falas. Esta edição, em quatro volumes, é um trabalho gigantesco, é uma edição que vai ficar para os bibliófilos guardarem por muitos e muitos séculos no Brasil.
Se ainda fosse Senador, eu pediria, Sr. Presidente, um registro de louvor para as funcionárias Virginia Galvez, que o organizou, funcionária que eu conheço desde o tempo em que fui Presidente e Senador nesta Casa, onde passei 40 anos - é um trabalho gigantesco pegar todos esses documentos, peregrinar por todos os arquivos, não só o arquivo do Senado, mas também o arquivo da Biblioteca Nacional, o do Instituto Histórico, todos os arquivos onde se podiam recolher documentos primários, quer dizer, fontes primárias, aquelas onde a história é registrada em primeiro lugar -, e também para a Rosa Maria Gonçalves Vasconcelos, outra funcionária exemplar desta Casa, que apoiou o trabalho, ajudou o trabalho, com a aprovação e a cobertura administrativa e intelectual de Ilana Trombka, Diretora-Geral responsável pela administração geral da Casa, que está fazendo uma administração marcante nesta Casa
Mas, o que dizia D. Pedro naquela fala do trono? Uma primeira constatação: Portugal nunca quis que - falava de Portugal, sua pátria - "os povos do Brasil gozassem de uma representação igual à que tinham [na metrópole]. Enganaram-se em seus planos conquistadores.". "Por isso, o Brasil, por 300 anos, sofreu o indigno nome de "Colônia", [a que já me referi], vítima de um sistema destruidor."
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E, com sua elevação a Reino de Portugal, "bramiu de raiva, tremeu de medo" o país que conquistou o Brasil.
Repete o que disse ao sagrado Imperador: "Com a minha espada [defenderei] a Pátria" - diz D. Pedro na Assembleia - "a Nação e a Constituição" - e aí vem a frase que deu muito o que falar - "se [for] digna do Brasil e de mim". Essa condicional se estende: pede que ajudem quem está fazendo.
Sentindo que tinha dito uma frase com que, de certo modo, ele restringia a Assembleia e a Constituição que seria feita, ele procura aliviar e diz: "Uma Constituição sábia, justa e executável, ditada pela razão e não pelo capricho, que tenha em vista tão-somente a felicidade geral, que nunca pode ser grande sem que esta Constituição tenha bases sólidas".
Começa, assim, o grande momento da interpretação dos sonhos, o primeiro deles, a fixação definitiva e irrevogável de sua expressão por representantes do povo na antiquíssima forma constituída por Sólon e Clístenes: o debate livre, o Parlamento. Sólon e Clístenes são os autores mais antigos e talvez os primeiros que se conhecem sobre democracia, sobre a necessidade de ter a representação do povo para governar. Sólon faz uma primeira carta, que é quase que uma Constituição com as diretrizes que devia seguir uma nação. E Clístenes faz a segunda, que era um Parlamento livre, um Parlamento de total independência e de liberdade.
Sr. Presidente, senhoras e senhores, mas os sonhos do Brasil não nasceram ali, vinham de longe, como o próprio D. Pedro lembrava; vinham dos primeiros contatos entre os povos originários e os portugueses, já prevenidos por Vicente Yáñez Pinzón, espanhol, e Duarte Pacheco Pereira, português, autor do Esmeraldo de Situ Orbis, que é um livro interessante, porque tem o título em latim, mas é escrito em português, ao contrário de todos os outros.
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E buscavam uma terra que não era, sabiam eles, a falsa Índia do genovês, que era aquela que o Cristóvão Colombo tinha descoberto. Aliás, no livro do Duarte Pacheco Pereira, isso tinha sido interpretado pelos historiadores como uma missão que o Rei tinha mandado para percorrer e descobrir que, além do continente descoberto por Colombo, tinha outro. E, portanto, dois anos antes de Cabral chegar ao Brasil, ele já tinha dado ao Rei todas as informações sobre um continente, que era esse continente que é o Brasil. Ele, então, cita alguns lugares que até eu, como maranhense, puxando com a brasa para a minha sardinha, achei que - um dos pontos de que ele falava - era Turiaçu, no Maranhão.
Do sonho de Martim Afonso de Sousa, que comandou a primeira esquadra em 1530, que veio designada também para conhecer o Brasil, conhecer aquele continente que o nosso Cabral tinha descoberto, e que gabava a El-Rei D. João III a bondade e a largueza da terra do Brasil, e o Rei: "Que vos parece, Martim Afonso [então, se o Brasil é tão grande, tão extraordinário], passemo-nos para o Brasil?" "Por certo, Senhor, que doudice era ela, que pudera fazer um rei sisudo, e não viver dependente da vontade dos seus vizinhos, podendo ser monarca de outro maior mundo". E Martim Afonso de Sousa era um grande nome e comandava a primeira expedição que veio ao Brasil, e também ele levava as notícias do que vira e do quanto ficara impressionado, de tal modo que, quando ele relatou ao Rei, o Rei queria logo transferir a sede do Reino de Portugal para o Brasil.
Foi um sonho no desejo místico do grande caminhante José de Anchieta - quer dizer, todos esses homens sonharam com um país extraordinário - e a ele acorriam em sua viagem entre Salvador e São Vicente num só povo. Achava que aquilo era o paraíso.
Sonho grande também sonhado por Antônio Vieira, que propunha ao Rei D. João IV construir no Brasil o novo Império. Ele o chamava de o Quinto Império.
E o de D. Luís da Cunha, que era um grande do reino também, Embaixador de Portugal que firmou o Tratado de Utrecht, que foi um tratado muito importante para o Brasil, porque incorporou aquela parte do norte da Amazônia, do Amapá.
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Depois nós tivemos a Questão do Acre, no princípio do século, em 1903, no século anterior. Ele já dizia que esse território passava a ser brasileiro, delimitou as fronteiras do Brasil ali no Rio Oiapoque.
E o de D. Luís da Cunha, grande do reino, Embaixador de Portugal, que também firmou esse tratado, sugerindo que se proclamasse Imperador do Ocidente: "O Rei não pode manter Portugal sem o Brasil; entretanto que, para manter o Brasil, não necessita de Portugal."
A gente vê o sonho dessa gente toda que passou pelo Brasil durante esse tempo, a visão da grandeza e do destino extraordinário destinado à nossa pátria.
Em 1808 os conselheiros do Regente D. João se dividiram, uns querendo a amizade dos franceses, outros, a dos ingleses. O partido inglês vencia. D. Rodrigo de Sousa Coutinho, depois Conde de Linhares, há muito queria a solução tão repetida: a fundação de um novo império aqui no Brasil - em vez de ser ligado a Portugal, a independência, já sonhava com isso. E o Conde trouxe a Corte pensando que vinham para sempre, tanto que ele carregou a Biblioteca Real com a Bíblia de Mogúncia, que é o primeiro livro impresso por Gutenberg, raríssimo - talvez não tenhamos cinco exemplares no mundo, e um ele trouxe para o Brasil e se encontra aqui, na Biblioteca Nacional. Carregou a Bíblia de Mogúncia e trouxe também a modernidade, porque pensavam que chegavam para ficar: a abertura dos portos, a liberdade para as indústrias, a Casa de Suplicação - o nosso Ministro Gilmar sabe o que era a Casa de Suplicação, que é de recursos, que não existia -, a Impressão Régia e o Banco do Brasil.
Assim, ao longo da história, formava-se para o Brasil um sonho de grandeza.
Mas os brasileiros tinham também a ideia de liberdade. Não pensemos só que foi um gesto de D. Pedro I. Não, o desejo de liberdade do Brasil foi, durante muitos anos, de geração em geração, uma ideia que não morria, que estava sempre presente no povo brasileiro. Assim, ao longo da história, formava-se o sonho de grandeza.
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Mas os brasileiros tinham também a ideia da liberdade. Desde que se haviam juntado africanos, indígenas e portugueses para expulsarem invasores - os franceses do Maranhão, o gênio empreendedor dos holandeses da Bahia e de Pernambuco -, a aliança de mostrou poderosa. Foram esses brasileiros que, por muitos e muitos anos, surraram ingleses, surraram holandeses, surraram franceses que quiseram se instalar no Amazonas. Está cheia a história de pequenas lutas e guerras que representavam esse desejo. E também, um dia, um príncipe negro resolveu fazer um país em Palmares, e esse preto era o Zumbi, Zumbi dos Palmares.
Sr. Presidente, meus senhores e minhas senhoras, perdão por estar me alongando tanto.
Ao nascer do século XIX, um estudioso brasileiro, santista, tornou-se o maior intelectual da língua portuguesa. Seus estudos de mineralogia não limitavam o seu interesse por tudo. Logo era Secretário Perpétuo da Academia de Ciências de Lisboa, a que eu tenho a honra também de pertencer - e aqui faço o meu comercial.
Quando a Corte veio para o Brasil, não hesitou. Alguém tinha que enfrentar os franceses. Herói, continuou dando palpites. Um dia, a saudade bateu. Em 1819, despediu-se da casa dizendo do Brasil: "Que país este para uma nova civilização e para um novo assento das ciências!" - ele que era um cientista, José Bonifácio. "Que terra para um grande e vasto império!" E veio construir. Vejam as datas: em 1819, chega ele ao Brasil; em 1820, numa expedição científica, manda dizer ao Regente: "Dá socorro, pronto e seguro, ao índio tosco, ao negro, ao pobre desvalido". Tudo que nós reivindicamos ainda hoje, ele, José Bonifácio, preconizou naquele tempo, de modo a dizer que a Independência não tinha se completado porque não tínhamos resolvido a questão dos escravos nem a questão dos índios, onde existia a política de enfrentamento, que era a de matar as tribos.
Dizia mais. Em agosto, ele tornava-se membro do Conselho do Estado. Seu conselho é conhecer a terra, cuidar do índio, acabar com as queimadas, fazer academias, viver liberdade. Vejam o homem genial, o Patriarca da Independência, José Bonifácio. Nós falamos isso hoje e ele já o falava há tantos anos.
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D. Pedro, em nome dos paulistas, diz que, se aceitar as exigências que as Cortes de Lisboa pediam, que era que ele voltasse a Portugal - talvez, um dos notáveis documentos da nossa história seja a resposta -, em dezembro, D. Pedro escreve em nome dos paulistas e diz que aceitar as exigências será responder por rios de sangue. O Príncipe manda divulgar a carta que ele recebeu. E, sete dias depois do Fico...
E do Fico tem uma historinha que eu não resisto contar. É que havia uma divisão entre os paulistas, liderados por José de Bonifácio, e os do Rio de Janeiro, por Gonçalves Ledo. E Gonçalves dizia que o Fico tinha sido sugerido ao Imperador por ele, e José Bonifácio veio de São Paulo com uma delegação da Câmara de São Paulo, pedindo a D. Pedro que ficasse no Brasil. Então, ele diz: "Ele ficou, porque São Paulo pediu para ele ficar", e o Gonçalves Ledo dizia: "Ele ficou porque no teatro eu o convenci, em uma conversa com ele, que ele ficasse, e ele me disse: 'Eu fico'".
E quando as cartas chegaram, que foram para o Ipiranga, a Princesa Leopoldina estava no oitavo mês de gravidez e ela então mandou que José Bonifácio fosse o mais rápido possível mandar essas cartas para D. Pedro. E ela foi uma das grandes defensoras da independência. Essa mulher é, de certo modo, esquecida no Brasil com a função de estadista que ela foi. E recomendou aos cavaleiros que iam levar, aos mensageiros: "Aluguem dez cavalos e vão o mais rápido possível, porque, se vocês não entregarem essas cartas rapidamente, vocês jamais serão mensageiros aqui do Rei".
José Bonifácio governa, convoca o Conselho de Procuradores da Província, convoca a Constituinte. Decidem. D. Leopoldina escreve a D. Pedro: "Só a presença sua, muita energia e rigor podem salvar o Brasil da ruína". E José Bonifácio: "Senhor, o dado está lançado: de Portugal não temos a esperar senão escravidão e horrores". Avisa ao mensageiro: "Se não arrebentar uma dúzia de cavalos, nunca mais será correio". Veja o que fez. E ainda é a independência o gesto dos laços fora, o gesto da liberdade. E chegamos hoje aos 200 anos.
Sr. Presidente, o que sonhava José Bonifácio para o Brasil? Ele assistira à Revolução Francesa, vira Talleyrand ser Arcebispo de Autun, onde ele assistiu à comemoração da Federação, Lafayette fazer o juramento da assembleia constituinte, conhecera as pessoas - conhecia profundamente as teorias políticas, mas tinha ideias suas. Para a sua, o que ele pensava? O fim da escravidão com a distribuição sistemática dos libertos, sua integração à sociedade; para os indígenas dar justiça, "não esbulhando mais os índios das terras que ainda lhes restam e de que são legítimos senhores" - são palavras de José Bonifácio, escritas -, dar brandura, "que nos cumpre como usurpadores", levar vacinação, educação. E, para todo o país, mais educação primária a universitária, ciências, reforma agrária - reforma agrária escreveu José Bonifácio -, unidade política, uma capital central. Joaquim Nabuco, uma capital central é Brasília na cabeça primeiro deste homem extraordinário, o patriarca da nossa independência.
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Mas o Brasil tinha outras ideias.
Enquanto a América espanhola tinha sido dividida toda por guerras, o Brasil manteve-se unido, porque nós não fomos um país formado por batalhas. Nós somos um país que foi construído por civis, civilistas, e a prova disso é que a primeira coisa que se fez depois da independência, seis meses, foi convocar a Assembleia Constituinte para que nós tivéssemos realmente uma nação que fosse constituída pela liberdade, pelos direitos humanos, pela justiça social, como realmente eles pensavam naquele momento.
Nós consolidamos essas ideias já no século passado com Ruy Barbosa, que foi o civilista que divulgava as ideias que nós devíamos constituir sempre, jamais irmos pela força. Já em 1798, nós tínhamos tido também já a Revolta dos Alfaiates, na Bahia, que eles tinham levantado. Já em 1817, em Pernambuco, os povos pernambucano, paraibano, potiguar, cearense, baiano tinham proclamado a República em lugarezinhos pequenos, até no Maranhão fundaram uma República em Grajaú: deram a ela a esfinge para despistar as autoridades e chamavam a República de A Esfinge.
A brutal repressão e os fuzilamentos em massa vieram depois contra essas manifestações. Depois do fuzilamento de muita gente, houve a morte de Frei Caneca, Antonio Carlos, José Martiniano de Alencar, com o Padre Muniz Tavares participando da política do Império. Ao menos uma mulher, D. Bárbara de Alencar, que tinha uma grande fortuna em Pernambuco, financiou grupos pela independência em Pernambuco e até no Piauí. Do Piauí, depois da Batalha do Jenipapo, eles atravessaram para o Maranhão, foram a Caxias, em Caxias eles já estavam quando da vitoriosa batalha dos que lutavam pela independência. Quando o Lorde Cochrane chegou e forçou que a Câmara Municipal, que era a Câmara do Senado, como ele chamava, decretasse a independência, a adesão do Maranhão à independência, que já tinha sido proclamada. Por isso, nós comemoramos, no Maranhão, a independência em 28 de julho, porque tinha sido feita um ano depois - quase um ano depois - da data da independência. O Brasil tinha o sonho de grandeza. Encarnava, ao longo desse tempo todo que eu fiz nessa longa e monótona descrição, a destinação histórica de ser uma grande nação, de se formar pelo poder civil, de ter união, de não ser decidido. Quando o mundo atravessa a revolução digital, uma grande transformação, o país não pode ficar atrasado por divisões internas nem por atos como aquele de 8 de janeiro, que envergonharam o país e que devem ser punidos para que não se repita isso jamais na história do Brasil.
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(Palmas.)
Portanto, o que nós vimos através do que eu quis dizer dessa longa explanação, o discurso, é que nós sempre quisemos ser grandes, nós sempre quisemos ser um grande país, de tal modo que Stefan Zweig escreveu um livro: Brasil, País do Futuro. Até os estrangeiros sonhavam com isso quando vinham aqui, e nós, muitas vezes, vacilamos na crença de nosso destino, vacilamos na crença do nosso progresso, da nossa grande destinação histórica.
Pois bem, isso bate muito nas costas dos políticos, mas os políticos são aqueles que harmonizam os conflitos da sociedade, os políticos dedicam parte de sua vida, ou, às vezes, toda a sua vida pelo país.
Assim, eu termino estas palavras, convocando todos os políticos, convocando todo o povo brasileiro para que nós não percamos jamais esse ideal que vem dos primórdios e que levou à independência, chagando a esse dia que nós comemoramos, porque é através da assembleia do povo que se constitui uma democracia. A assembleia, a Câmara dos Deputados, o Senado Federal constituem o coração da democracia brasileira. Portanto, a eles toda a força, todo o respeito, porque eles é que garantem que o povo tenha os seus direitos assegurados através da proteção que tem, com o Supremo Tribunal Federal guardando a Constituição.
Muitos morreram por esse ideal e muitos de nós estamos vivendo e devemos viver por esse ideal. Assim, vamos ser grandes! (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MG) - Eu agradeço a S. Exa. o ex-Presidente desta Casa e ex-Presidente da República José Sarney por seu denso pronunciamento nesta sessão especial.
Tenho a honra de conceder a palavra, neste instante, a S. Exa. o Ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal.
O SR. GILMAR MENDES (Para discursar.) - Boa tarde a todas e a todos.
Quero cumprimentar o eminente Presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco; cumprimentar também o Presidente José Sarney, que nos brindou com uma aula de história neste momento; cumprimentar o Senador Rogério Carvalho, Primeiro-Secretário do Senado e que teve a iniciativa de indicação da celebração desta data; o Senador Randolfe Rodrigues; o Sr. Procurador-Geral da República - não sei se posso chamá-lo de Senador Augusto Aras também, mas nosso colega Procurador-Geral -, Augusto Aras; o Sr. Presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Leandro Grass; cumprimentar todos os servidores do Senado na pessoa da Sra. Ilana Trombka; cumprimentar todos os senhores presentes; e o Presidente do STM.
Devo dizer que esta vinda hoje aqui me fez rememorar uma série de fatos, a visita dos alunos aqui no Plenário do Senado me fez lembrar dos meus tempos de estudante. Eu estudei na Universidade de Brasília, entre 1975 e 1978, e como sabem 1975 é depois de 1974. Em 1974, nós tivemos aquilo que foi considerado uma grande revolução civil, que foi o resultado eleitoral de então, em que quase um terço do Senado foi eleito pela oposição. E nós vínhamos então aqui, já em 1975 e em 1976, assistir aos grandes embates que se travavam no Senado Federal e que foram matrizes certamente do encadeamento da chamada abertura constitucional, da abertura do regime militar.
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Quantas vezes naquelas tardes eu assisti aos embates! Esta Casa se enchia com a presença, na tribuna, Presidente José Sarney, de Paulo Brossard, talvez - eu pelo menos não tenho na memória - o maior orador que já vi e que produziu, sem dúvida, peças importantíssimas e decisivas para aquela travessia.
Mas, sobre o tema de hoje, duas notas. Disse: "Assomou finalmente o dia suspirado, objeto dos desejos e votos dos brasileiros, confusão e desesperos de seus inimigos".
Com tais palavras embebidas de um indisfarçável júbilo, o periódico O Espelho noticiou a sessão inaugural da Assembleia Constituinte de 1823, que ocorrera aos 3 de maio. Iniciava-se, também ali, nosso Poder Legislativo, e penso, Presidente Sarney, que, dentre os vários méritos da obra de José Honório Rodrigues dedicada ao tema, está o de enfatizar que a Assembleia Constituinte também se compreendia Assembleia Legislativa.
Deu-se também, no mesmo 3 de maio de 1823, a instalação do Poder Legislativo. Essa instalação assentara-se no pressuposto do senso de dignidade acerca da função representativa, era uma reconcepção do modelo autoritário até então dominante.
Um episódio narrado por José Honório o evidencia. Quando da discussão de um tema aparentemente banal, qual seja, o lugar que deveria ser ocupado por D. Pedro I na sessão da instalação da assembleia, o Constituinte José Custódio Dias advogou que ao Imperador fosse designado assento no mesmo plano onde estiver o Sr. Presidente da Assembleia, cabeça inseparável, naquele ato, do corpo moral que representa a nação. Dessa premissa, rapidamente passou-se ao argumento liberal: o Imperador deriva seu poder da Assembleia, que, por sua vez, possui o poder que lhe dá o povo.
Todos nós sabemos qual posição o herdeiro dos Braganças assumiu diante das pretensões liberais de fundar um Estado limitado pelo Direito. A dissolução, como já se viu e já se falou tantas vezes, não tardou a acontecer, sobreveio, em 1824, a Constituição Imperial, mas por outorga de um soberano que se nominava defensor perpétuo do Brasil.
Nem tudo estava perdido, nem tudo se perdeu. O arroubo de D. Pedro veio acompanhado de custos. A Confederação do Equador, de 1824, foi apenas o mais evidente.
De modo geral, o Imperador contratou as condições que o inviabilizaram na chefia do Estado. A célebre divisa "reina, mas não governa", do constitucionalismo francês, assenta-se na prudência de canalizar o desgaste político aos componentes substituíveis do Governo, os ministros, arrogando para si a função de endereçamento político, em leitura do Poder Moderador, tributária do ancien régime.
O Monarca trai igualmente as expectativas por mudança. Em 1831, elas chegam em ponto de não retorno, e D. Pedro I abdica.
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Resultado que se coloca na linha normal do desdobramento dos fatos.
O Brasil experimentara o gosto da liberdade política com a Assembleia de 1823. Dela não iria esquecer tão facilmente, como também não se esqueceu dos trabalhos gestados na Constituinte. Vários dos 272 artigos constantes do projeto da Constituição de relatoria do Deputado Antônio Carlos de Andrada foram incorporados à Carta outorgada de 1824.
Como estamos no Congresso Nacional e no Dia do Parlamento...
Eu ainda recordava agora com o Presidente Pacheco que esse dia foi eleito, foi fixado nos 150 anos desta celebração de 1823 e, portanto, ainda em pleno regime autoritário, em 1973.
Esses dispositivos foram incorporados à Carta outorgada de 1824.
Como estamos no Congresso Nacional e no Dia do Parlamento, atenho-me ao art. 179, I, do anteprojeto da Constituinte de 1823, que rezava: "Nenhum Cidadão pode ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude da lei", tal como está no texto de 5 de outubro de 1988.
A pretensão de que o direito deve expressar-se por meio de leis traduz o princípio da legalidade, como todos nós sabemos - ou mais modernamente enfatizamos a ideia da chamada reserva legal -, postulado que fez parte de todos os textos constitucionais desde então, à exceção, como sabem, da Carta, que também foi chamada a Carta Polaca, de 1937.
O postulado da legalidade traduz essa concepção moderna de lei como instrumento de proteção das liberdades individuais, que permitiu a formação de um Estado de direito distinto e contraposto ao Estado absoluto ou ao Estado de polícia dos séculos XVII e XVIII.
Em conferência pronunciada no Ateneu de Paris, em fevereiro de 1819, Benjamin Constant, notório inspirador da Constituição Imperial Brasileira - inclusive seria o conceptor, o pai da ideia do Poder Moderador -, chegou ao ponto de elevar o princípio da legalidade a traço que diferencia a liberdade dos antigos da liberdade dos modernos. Esta consiste no direito de cada um a não se submeter, senão à lei. No Estado de direito, impera o governo das leis, e não o dos homens. A legalidade, entretanto, não é o fim da história.
Eu aproveito para registrar que esse debate, especialmente no Dia do Parlamento, é extremamente relevante. Em um texto que fiz já há algum tempo, eu lembrava uma reflexão do jurista alemão Jahrreiss, em que ele dizia que legislar é uma experiência que se faz, mas diz que a mais difícil das experiências, a experiência com o destino humano.
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E é interessante, Senador Randolfe, que essa expressão, Presidente Pacheco, encontrou talvez uma formulação extremamente digna em português. Isso vem do mineiro, nosso colega do Supremo Victor Nunes Leal, grande jurista conhecido de todos. Num texto primoroso sobre técnica legislativa, que está nos estudos de Direito Público, Victor Nunes diz:
Tal é o poder da lei, que a sua elaboração [e isso é muito importante, falando para Parlamentares] reclama precauções severíssimas. Quem faz a lei [o lado imagético é interessante] é como se estivesse condicionando material de explosivos; as consequências da imprevidência ou da imperícia não serão tão espetaculares e quase sempre só de modo indireto atingirão o manipulador, mas podem causar danos irreparáveis.
Certamente, se nós apelássemos à memória de vários Deputados e Senadores, eles se lembrariam de algum acidente de trabalho: de uma vírgula mal colocada que produziu depois dezenas, senão milhares de processos. Por isso, tanto essa frase de Arrais, de que legislar é fazer experiência com o destino humano - portanto, uma experiência extremamente grave -, como esta, do Victor Nunes Leal, devem ser lembradas neste dia, a ideia de que quem lida com leis é como se estivesse acondicionando explosivos: os resultados podem não ser tão espetaculares e eventualmente não atingir o próprio autor, mas podem causar danos imensos.
A legalidade, entretanto, não é o fim da história. O Ocidente precisou de todo o século XIX para compreender que o problema do Direito apenas começa com a lei. Embora o Brasil pós-1824 se orientasse pela noção de que a lei veicularia os direitos e deveres dos cidadãos, a ausência de vontade política para aprovar uma lei abolindo a escravidão seria o suficiente para manter vários seres humanos afastados da condição de cidadão.
Como se sabe, o constitucionalismo mundial resolveu esse impasse evolutivo, conferindo centralidade aos direitos fundamentais, o que implicou a ampliação do campo de eficácia de tais normas, a ponto de imputar ao Legislador o dever de colmatar omissões inconstitucionais.
O postulado da legalidade é importante demais para não ser exercido. Essa é a síntese de uma linha sobre esse aspecto central do Estado democrático de direito.
O caráter augusto deste Congresso Nacional deriva também da dignidade da legislação, atribuição que, há exatos 200 anos, é exercida por suas Casas com altivez, a despeito dos arroubos autoritários que, vez por outra, assaltam o país há cerca de 200 anos.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MG) - Eu agradeço a S. Exa., o Ministro Gilmar Mendes, por seu pronunciamento e, na pessoa de S. Exa., cumprimento todos os representantes do Poder Judiciário.
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Gostaria também de registrar a presença nesta sessão do Senador Renan Calheiros, ex-Presidente desta Casa; da Senadora Eliziane Gama; do Senador Weverton Rocha; da Senadora Zenaide Maia; do Senador Cleitinho, do nosso Primeiro-Vice-Presidente, Senador Veneziano Vital do Rêgo; e também do ex-Senador Cássio Cunha Lima.
O Senador Petecão foi registrado logo no início da sessão - seja bem-vindo, Senador Sérgio Petecão, que está desde o início da sessão; muito obrigado pela presença.
Saúdo também a presença do Sr. Ministro de Estado do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Deputado Paulo Teixeira, também entre nós - seja muito bem-vindo.
Passo a palavra, neste instante, ao Exmo. Sr. Procurador-Geral da República, Dr. Augusto Aras.
O SR. AUGUSTO ARAS (Para discursar.) - Boa tarde a todas e a todos.
Cumprimento o Exmo. Sr. Presidente do Senado Federal, Senador Rodrigo Pacheco, na pessoa de quem cumprimento todos os Parlamentares aqui presentes.
Cumprimento o Exmo. Sr. José Sarney, 31º Presidente da República Federativa do Brasil e por muitos mandatos presidindo esta Casa da República.
Cumprimento S. Exa., o Ministro Gilmar Mendes, representando o Supremo Tribunal Federal, decano da nossa Corte Suprema, professor de muitos de nós, na pessoa de quem cumprimento todos os membros do Poder Judiciário.
Cumprimento o 1º Secretário do Senado Federal, Senador Rogério Carvalho, que teve a iniciativa deste evento.
Cumprimento o Senador Randolfe Rodrigues.
Cumprimento também o Sr. Presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Senador Leandro Grass.
Cumprimento o Presidente do Superior Tribunal Militar, Joseli Camelo, e o Ministro Alberto Balazeiro, representando a Presidência do Tribunal Superior do Trabalho.
Cumprimento todos os representantes dos corpos diplomáticos, membros do Ministério Público brasileiro, advogados, autoridades, profissionais da imprensa, servidoras e servidores, minhas senhoras, meus senhores.
Neste 3 de maio, Dia do Parlamento, celebramos os 200 anos de sua origem: a instituição da primeira Assembleia Constituinte brasileira, considerada o embrião do nosso Poder Legislativo.
O Ministério Público brasileiro rende suas homenagens a esta Casa, que, desde seus primórdios, soube defender uma equilibrada organização tripartite de poder, necessária para coibir tentações autoritárias, no exercício das funções de quaisquer postos de decisão e de comando.
A Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil, instalada em 3 de maio de 1823, é monumento expressivo e singular, na evolução dos tempos, do Poder do Parlamento, que qualifica, desde sempre, os rumos e a vocação permanente de nossa história constitucional.
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A Assembleia se compunha do melhor da intelectualidade brasileira de então e, chamada a operar a constitucionalização do Brasil, independente, contra os interesses da recolonização, tinha de o fazer, como uma obra de delicada composição, fugindo dos opostos extremos, dos mais aferrados monarquistas e dos mais açodados republicanistas. Conquanto Dom Pedro I não lhe tenha dado, no início da sua concepção, um reconhecimento de soberania ilimitada, mas apenas aquela porção de soberania que essencialmente reside no povo, consoante registra o Diário da Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império Brasil, de 1823, edição Senado Federal, nas palavras do Barão Homem de Melo, é importante registrar que os pendores da Assembleia eram de nos afirmar a representação da mais ampla soberania popular, inclusive no estabelecer limites ao Poder Executivo, a exemplo do veto meramente suspensivo que constava do projeto elaborado por Antônio Carlos, um dos três célebres irmãos Andrada. E aqui cumprimento, na pessoa do Deputado Lafayette de Andrada, representante da saga dos Andrada desde o patriarca, a história do Parlamento brasileiro.
Já na abertura dos trabalhos da Assembleia, há precisos 200 anos, comparecia Dom Pedro I, em resposta à decisão da Assembleia votada no curso da sessão preparatória, sem sua coroa, como registrado pelo Presidente Sarney, que tirara de sua cabeça ao entrar no recinto. Mas, na ocasião, dentre outras, pronunciaria as seguintes palavras - aspas: "Espero que a Constituição que façais mereça a minha imperial aceitação, seja tão sábia e tão justa quanto apropriada à localidade e civilização do povo brasileiro; igualmente, que haja de ser louvada por todas as nações; que até nossos inimigos venham a imitar a santidade e sabedoria de seus princípios; e que, por fim, a executem".
Como sabemos, nem chegou a desfecho a aprovação última do texto da nossa então futura Constituição, que, às sombras da "noite da agonia", como alguns chamaram, caía, por decreto do Imperador sobre a Assembleia, na madrugada de 12 de novembro de 1823.
Importante obra de Eunápio Deiró publicada pela livraria desta Casa indaga sobre os motivos reais e ocultos do procedimento arbitrário e opressivo do governo imperial daquela conjuntura.
Devemos nos lembrar, contudo, que a obra da constitucionalização do Brasil independente era um acontecimento completamente ajustado ao seu tempo. O mundo sofria ainda o influxo das duas grandes evoluções liberais: a estadunidense e a francesa - esta com a marca da ideia da necessidade de uma Constituição escrita.
O ideal de liberdade era o ideal do governo constitucional, e a sua mais plena afirmação estaria na democracia fundada no reconhecimento de direitos.
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Era natural, destarte, que, nos primeiros decênios dos Oitocentos, a grande preocupação das monarquias fosse garantir a sua estabilidade, protegendo-se contra os excessos do ideal democrático, ou "democratismo", e, ao mesmo tempo, proclamando liberdades constitucionais - direitos e garantias - para os cidadãos.
A própria França, no seu Iluminismo, que influenciou também as experiências portuguesa e espanhola e reconhecidamente a brasileira, conheceu essas contradições do processo histórico. Tivemos, pela Europa, o fenômeno da Restauração, mas, a despeito de tudo isso, os eventos políticos revolucionários alteraram o mundo. As composições e as aberturas faziam-se e fizeram-se necessárias.
Desse modo, mesmo a "dissolução" imposta por D. Pedro I, assinalou Aurelino Leal, "produziu [...] um duplo efeito", ou seja, "deixou a Constituinte cair de pé, e forçou, pela própria impressão que o golpe causou, a pronta outorga da Carta de 1824" - palavras de Aurelino Leal, em obra publicada nesta Casa.
Mas o Imperador, ao outorgar a Carta de 1824, manteve os ideais maiores proclamados na Assembleia Constituinte, entre os quais registramos a presunção de inocência, o direito à propriedade, a liberdade de expressão, a inviolabilidade de domicílio, à liberdade religiosa, a liberdade de imprensa - estes estavam naquele primeiro arcabouço constitucional relatados pelo Deputado Antônio Carlos de Andrada e Silva. E a Assembleia - abro aspas, no dizer de Aurelino - "cai de pé" - fecho aspas - sem retroceder sobre os pontos do seu empenho liberal.
Mas aquele primeiro esboço constitucional não era republicano nem democrático, pois que previa voto censitário, ou seja, um voto pela quantidade da renda de cada eleitor, mantendo a escravidão e instituindo uma monarquia constitucional representativa. No entanto, lá já estavam as sementes dos direitos e das garantias fundamentais como as que temos hoje.
Mesmo a Constituinte tendo sido posteriormente dissolvida pelo Imperador, muitos dos seus temas originários foram outorgados na Carta de 1824, o que mostra a força daquela Assembleia, bem como um ambiente simpatizante com os princípios liberais da época, essenciais ao Estado democrático de direito.
Após 200 anos, a jornada de nosso processo civilizatório, por meio de instituições constitucionais e, especialmente, o Poder Legislativo, perdura firme, buscando sempre encontrar e fazer do Brasil a nação que todos queremos.
E aqui posso registrar que essa Carta de 1824, nascida da Assembleia Constituinte, hoje bicentenária, inaugura não só o constitucionalismo brasileiro, mas, acima de tudo, reconhece que a institucionalidade é o que faz com que uma nação se mantenha forte e pungente.
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A Constituição de 1988, promulgada desta mesa, diz no art. 2º: "São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si" - e começa pelo Legislativo -, "o Legislativo, o Executivo e o Judiciário." Essa harmonia, que John Jay, em O Federalista, dizia ser indispensável para a independência, se mantém, 200 anos depois, absolutamente necessária.
Diálogo, integração, cooperação entre os Três Poderes e todas as instituições do Estado e da sociedade são indispensáveis para que tenhamos o desenvolvimento socioeconômico sustentável no universo de um regime político democrático e de uma sociedade de economia aberta. É com essa perspectiva, num caminhar bicentenário, que vimos a esta tribuna do Senado com a grata satisfação de ouvir todos os palestrantes, a aula magna do Presidente Sarney, para dizer: nós, o povo brasileiro, temos no Parlamento a nossa maior representação. Cada Parlamentar representa segmento relevante para que a República Federativa do Brasil realize os seus objetivos que estão lá no art. 3º, dentre eles os mais importantes no inciso I: "uma sociedade livre, justa e solidária".
É preciso que nós nos encontremos institucionalmente para que personalismos não se exacerbem, para que fatos como os de 8 de janeiro não voltem mais a ocorrer, porque são as instituições, em especial os partidos políticos, que devem promover a mediação entre a sociedade e o Estado para que todos tenhamos as condições necessárias para manter uma democracia baseada em racionalidade, não em violência; para que a democracia se faça com política, e política se faça com políticos, com pessoas, homens e mulheres, e que, assim, todos nós encontremos o consenso social, sempre necessário, para que a nação brasileira alcance o seu destino de estar, num futuro quiçá não tão distante, sentada não somente no Conselho de Segurança da ONU, mas de estar participando ativamente da tomada de decisões da comunidade planetária.
O Ministério Público brasileiro nesta oportunidade, Sr. Presidente Rodrigo Pacheco, tem a grata satisfação de dizer que a nossa instituição, que recebeu deste Parlamento tantos poderes, recebeu também muitos deveres. Dentre eles, cumprir a Constituição, cumprir a lei e preservar os interesses nacionais são deveres absolutamente intransigíveis.
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E eu tenho certeza de que os meus colegas de todo o Ministério Público brasileiro têm ciência de que devemos, com tudo o que nos foi concedido, da segurança alimentar do café da manhã até o evento post mortem, zelar pelo bem-estar de todos, com as dificuldades naturais dos seres humanos, que não são perfeitos e são seres em constante aprimoramento.
Encerro, Sr. Presidente Rodrigo Pacheco, Sr. Presidente Sarney, senhores membros da bancada, Srs. Senadores, Parlamentares, autoridades presentes, com uma evocação da Bahia, de 2 de julho, com uma evocação de 28 de julho, do Maranhão, lembrando o Hino da Bahia, onde uma frase específica diz:
Nunca mais, nunca mais o despotismo
Regerá, regerá nossas ações
Com tiranos não combinam
Brasileiros, brasileiros corações
E concluo, Sr. Presidente Rodrigo Pacheco, dizendo que o caminho para que não haja tiramos é o caminho da democracia, é o caminho da paz, é o caminho da tolerância, é o caminho da busca de uma fraternidade que é inerente ao povo brasileiro, pelo seu pluralismo político e pelo seu multiculturalismo, o que faz com que sejamos uma nação única no mundo, uma nação que, podemos dizer, de um modo geral, se, neste momento, a polarização tomou conta, precisamos voltar a que façamos a festa da democracia todos os dias, pela arte do encontro, na busca pelo consenso social.
Muito obrigado; (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MG) - Meus cumprimentos ao Dr. Augusto Aras, Procurador-Geral da República, pelo seu pronunciamento. Agradeço, uma vez mais, a sua presença e, em nome de quem, saúdo todos os membros do Ministério Público brasileiro.
Concedo a palavra neste instante, antes registrando a presença do Senador Marcelo Castro e da Senadora Mara Gabrilli nesta sessão especial do Senador Federal, ao Deputado Federal Lafayette de Andrada, Presidente da Comissão Organizadora do Bicentenário da Constituinte de 1823, representando a Câmara dos Deputados.
O SR. LAFAYETTE DE ANDRADA (Para discursar.) - Muito obrigado, Sr. Presidente. Cumprimento V. Exa., Exmo. Sr. Senador Rodrigo Pacheco, Presidente do Senado federal. Cumprimento o nosso eminente ex-Presidente da República e ex-Presidente do Senado, Sr. José Sarney. Cumprimento aqui o eminente Ministro do Supremo Tribunal Federal, Sr. Gilmar Mendes, representando aqui o Poder Judiciário. Cumprimento o 1° Secretário do Senado Federal e requerente desta sessão, o Sr. Senador Rogério Carvalho. Cumprimento o eminente Senador Randolfe Rodrigues, que comanda o Conselho Editorial do Senado e também a comissão que coordena os festejos do Bicentenário do Parlamento. Cumprimento o eminente Procurador-Geral da República, Dr. Augusto Aras. Cumprimento, representando aqui o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, o Embaixador José Heráclito.
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Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, Srs. Deputados, demais autoridades, serei bastante breve, mas é importante assinalar que exatamente nesta data, há 200 anos, dava-se início à primeira Assembleia Constituinte brasileira, que, de fato, era a instalação do primeiro Parlamento, a instalação do nosso Parlamento, e que representava a consolidação da independência. A Constituinte era a consolidação daquele grande sonho de construção de uma grande nação dos trópicos, que os pais da pátria iniciaram com a evolução da independência do Brasil, representada no grito do Ipiranga do Sete de Setembro. Mas a Constituinte era isso, a Constituinte era consolidação da independência.
Como falou aqui o nosso eminente Presidente Sarney, a intelectualidade da época foi convocada para representar o Brasil, para fazer a nossa Constituição. E a Constituição que estava sendo construída, que estava sendo elaborada era uma constituição extremamente avançada para a época. Como citou aqui o Procurador-Geral, Dr. Aras, e também o eminente Presidente Sarney, conceitos importantíssimos e avançadíssimos para a época estavam consignados naquela Constituição que estava sendo elaborada. E lembrando aqui: a liberdade de opinião, a liberdade de imprensa, a presunção de inocência, os três Poderes, isso tudo era novidade naquela época. Hoje a gente fala com naturalidade, mas eram conceitos extremamente avançados naquele momento. A imunidade parlamentar, o tribunal do júri, ou seja, conceitos importantes que se consolidaram através dos tempos em outros países também, depois de nós, já tinham sido pensados por aqueles Constituintes lá em 1823.
Apenas fazendo aqui um pequeno contexto histórico: a independência havia acontecido no Sete de Setembro e a coroação de D. Pedro, em dezembro; faltava ao Brasil a sua Constituinte, a sua Constituição. E, como eu disse aqui, a Constituição que estava sendo criada era uma Constituição não só avançada, mas uma Constituição liberal. Ela previa o voto censitário, mas o voto censitário à época era algo extremamente moderno também, posto que não havia eleição em lugar nenhum. E o conceito que criaram àquela época... As pessoas hoje, no anacronismo, falam: "Era uma Constituição elitista, porque o voto censitário era pela renda". Não existia eleição em lugar nenhum, e os Constituintes da época conceberam o sistema semelhante ao que hoje temos em um condomínio do prédio: quem paga governa, quem paga decide - no conceito de que não existia eleição em nenhum lugar. Então, bem diferente do que às vezes alguns historiadores falam, de que era uma Constituição elitista e que só quem tinha dinheiro podia votar, não; era uma Constituição democrática, extremamente avançada. E a prova disso é que, quando D. Pedro desfaz a Constituinte e impõe no ano seguinte uma nova Constituição, a de 1824, ele se inspirou, praticamente copiou o texto dos Constituintes de 1823.
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Eu, antes de concluir aqui minhas palavras, em que eu não quero me alongar, dado o adiantado da hora, apenas quero fazer também aqui um registro histórico, que é importante também.
Naquela Assembleia Constituinte, além desses conceitos que eu disse aqui, eles debateram temas atualíssimos e importantes para a época, como a preservação do meio ambiente, que foi discutida lá, a extinção da escravidão, a integração dos índios foi discutida, a construção da nova capital no centro do Brasil, inclusive sugerido o nome de Brasília. Isso tudo foi discutido naquela Assembleia Constituinte. Se, por um lado, a construção da Independência do Brasil teve o José Bonifácio como a sua principal figura, o patriarca da Independência - ele que de fato orientou o D. Pedro nos principais passos, e o grande desafio na época era manter a unidade nacional, porque precisamos também recordar que, naquele tempo, não tinha as facilidades da comunicação de hoje... Neste vasto território, que é o Brasil, não havia comunicação entre as províncias. Eram todas muito independentes e ligadas a Portugal diretamente. Então, a unidade nacional é que foi o grande desafio e a grande obra que o José Bonifácio conseguiu ao lado de D. Pedro I.
Na Assembleia Constituinte - e aí já vou encerrar, Sr. Presidente -, de fato a grande figura foi o irmão de José Bonifácio, muitas vezes pouco lembrado, Antônio Carlos. Antônio Carlos foi o homem que elaborou esse texto da Constituição, ele foi o Relator e ele, que escreveu esse texto - ele mesmo confessa isso e vários contemporâneos afirmaram isso também -, tinha sido representante do Brasil nas Cortes de Lisboa e tinha sido líder da delegação brasileira. As Cortes de Lisboa é que, em última análise, pressionaram pela Independência. O Brasil era Reino Unido quando as Cortes de Lisboa exigem o retorno de D. João VI e começam a legislar no sentido de tornar o Brasil de volta à colônia. Isso é que revoltou os brasileiros e isso é que impulsionou o movimento da Independência, veio o Fico e aquele conjunto de eventos que o Presidente Sarney aqui citou.
Lá na Constituinte, já consolidada praticamente a Independência, a grande figura de fato foi o Antônio Carlos.
E eu, para terminar aqui, vou apenas citar o que dois historiadores do século XIX que estudaram e conheceram vários contemporâneos dos Constituintes falaram sobre o Antônio Carlos. Eu peço aspas aqui. Um deles é Sisson. Sisson escreveu Galeria dos brasileiros ilustres e ele falava sobre Antônio Carlos:
Sua figura gigante avulta no pórtico da Independência, como um dos criadores de nossa nacionalidade. [...] Enquanto houver um culto pelos grandes homens, e a virtude cívica inspirar a gratidão, o Brasil inteiro repetirá com religioso respeito o nome de Antônio Carlos, que irá abrindo um sulco luminoso através dos séculos futuros! (SISSON).
E Joaquim Manuel de Macedo, também no século XIX, fala sobre a atuação de Antônio Carlos na Constituinte: "Em 1823, é Antônio Carlos o vulto homérico da constituinte brasileira: foi o mais eloquente e prestigioso orador dessa augusta assembleia" - dessa augusta assembleia que deu início ao Parlamento brasileiro; daquela augusta assembleia que trouxe para todos nós princípios democráticos, princípios liberais tão importantes, até hoje cultuados; daquela augusta assembleia que teve a coragem de enfrentar toda a oposição que havia no sentido da nossa independência.
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Infelizmente - para concluir o desfecho histórico da Constituinte -, ao longo da Constituinte, começa a haver um embate entre brasileiros e portugueses que havia no Rio de Janeiro. A Constituinte, obviamente, tinha uma postura nacionalista, e D. Pedro, aos poucos, após a independência, após a coroação, que havia sido em dezembro, começa a se aproximar de novo dos portugueses, e isso começa a criar um desconforto entre os brasileiros, entre os Constituintes, e começa, então, um movimento de oposição à Constituinte, a assembleia passa a fazer oposição ao governo. Por fim, D. Pedro entende que é necessário encerrar os trabalhos da Constituinte. De maneira brusca, põe as tropas na rua, cerca o prédio da Constituinte, a cadeia velha. Os Deputados, ainda, de maneira muito brava, se declaram em sessão permanente e passam a discutir, pela madrugada, o que é que estava acontecendo lá fora, aquele movimento de tropas, até que, no dia seguinte... E essa noite, essa madruga é conhecida pela história como a Noite da Agonia. Discursos brilhantes aconteceram naquela noite. Na manhã do dia 12, chega o oficial informando aos Srs. Deputados que D. Pedro ordenava a extinção da Constituinte. Vários Deputados foram presos, os irmãos Andrada foram exilados, e D. Pedro encerra aquela Constituição.
Apenas uma curiosidade, Sr. Presidente, antes de encerrar - e agora é uma curiosidade muito breve. Na Constituinte, como bem lembrou o Presidente Sarney, dois dos inconfidentes mineiros, de 1789... Lembrando que Tiradentes foi enforcado, os inconfidentes foram todos exilados, e dois só retornaram ao Brasil: José de Resende Costa Filho - porque o pai e o filho foram exilados; o filho voltou, o pai morreu no exílio, todos os demais morreram no exílio - e o Padre Manuel Rodrigues da Costa. Esses dois foram eleitos Constituintes. O prédio onde funcionou a Assembleia Constituinte era a cadeia velha, era a cadeia onde eles ficaram presos por três anos. Então, há o registro histórico, às vezes do Padre, às vezes do José de Resende Costa olhando os ambientes da Assembleia, os quartos, o Plenário, recordando os locais onde eles estiveram presos por três anos, 40 anos atrás, 40 anos antes.
Mas, Sr. Presidente, cabe aqui encerrar. Quero aqui, neste fim de manhã, já neste início de tarde, celebrar os 200 anos da instalação do Parlamento no Brasil, um dos parlamentos mais antigos. O Parlamento mais antigo é o da Inglaterra; em segundo lugar, o dos Estados Unidos; o Brasil vem logo depois - França e logo depois Brasil. E não há democracia sem Parlamento, Sr. Presidente. O Parlamento é o bastião da democracia. Se hoje estamos aqui, a comemorar os 200 anos de início do Parlamento no Brasil, estamos a comemorar os 200 anos da democracia brasileira.
Parabéns, Sr. Presidente! Parabéns a todos! Muito obrigado, e fica aqui a nossa saudação. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MG) - Agradeço ao Deputado Lafayette de Andrada. Duzentos anos depois da inauguração do Parlamento, um Andrada ocupa a tribuna para poder fazer justiça e homenagear os seus antepassados - Antônio Carlos, José Bonifácio, Martim Francisco. E faço um registro também, Deputado Lafayette, acerca de seu pai, Bonifácio de Andrada, que foi meu colega na Câmara dos Deputados, com nada menos que dez mandatos como Deputado Federal. Ele contribuiu muito para a República brasileira e, sobretudo, para o Parlamento brasileiro. E V. Exa. está seguindo os caminhos de seu pai e de toda a sua família Andrada, agora responsável por esta Comissão de celebração do bicentenário do nosso Parlamento.
Muito obrigado, Deputado Lafayette de Andrada, do Estado de Minas Gerais.
Concedo a palavra, neste instante, ao Sr. Leandro Grass, Presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), para o seu pronunciamento.
O SR. LEANDRO GRASS (Para discursar.) - Boa tarde a todos e a todas.
Em primeiro lugar, quero agradecer a oportunidade, Presidente Rodrigo Pacheco, e saudar esta Casa e todos os Senadores e Senadoras que estão aqui celebrando a Constituição brasileira de 1823 e, acima de tudo, celebrando a história do nosso país. Saúdo nosso querido Presidente Sarney, o Ministro Gilmar Mendes, o Senador Rogério Carvalho, o Senador Randolfe Rodrigues, nosso Procurador-Geral Augusto Aras, que nos saudaram aqui com belíssimas aulas de história e de memória. É muito importante recordar e fazer jus àqueles que construíram o nosso país. Saúdo aqui, na pessoa da Senadora Eliziane, todas as mulheres presentes, as Senadoras, as lideranças, as dirigentes. Também quero deixar aqui uma saudação ao nosso querido Dr. Belinati e ao Dr. Georges, ambos aqui do Distrito Federal.
De forma muito breve, Presidente Rodrigo Pacheco, quero aqui agradecer o convite e, em nome do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e mais ainda também do Ministério da Cultura e da Ministra Margareth Menezes, quero dizer da alegria de participar desta celebração e mais ainda de, neste momento da história, poder também construir a própria história, reforçando a importância da memória, porque a política histórica, a política de patrimônio cultural, a política de memória não são sobre o passado, são, acima de tudo, sobre o futuro do país.
A Constituição de 1823 bem como as seis que vieram após ela foram construindo esse caminho que nos traz aqui, especialmente a de 1988, que, no seu art. 216, diz sobre a importância da política do patrimônio cultural e da política de memória para que os erros do passado, para que as injustiças cometidas ao longo do tempo não se repitam no futuro. Daí a importância não só do Iphan, mas de todas as ações estaduais e municipais, dos institutos de história e de geografia, dos institutos de patrimônio, das secretarias e departamentos de patrimônio.
Quando a gente está falando de patrimônio histórico e está afirmando a importância disso, acima de tudo a gente está apontando um caminho para a frente, que é um caminho também de correção. Nós temos, ao longo desse tempo, através de processos de tombamento, por exemplo, de casas de câmara, de terreiros de matriz africana, através do tombamento de prédios importantes no nosso país... Quando a gente tomba algo não é só para dizer que aquilo precisa ser preservado materialmente, mas é porque ali se abriga, porque ali está residindo parte importante da nossa história.
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Da mesma forma, quando nós registramos os bens imateriais, de maneira especial, daquelas comunidades, daqueles grupos, daqueles detentores que foram excluídos ao longo do tempo, nesse distanciamento da cidadania formal para a cidadania real. E mais ainda quando nós construímos a política de memória através da educação patrimonial. É muito bonito ver as crianças aqui, os adolescentes visitando esta Casa, porque eles têm que ter admiração e pensar que esse lugar é deles e não embarcarem nas armadilhas da criminalização da política, da criminalização do Parlamento, da criminalização do Estado.
É nesse conjunto de ações que hoje o Iphan, ao longo de seus 86 anos de história, soma-se a este Parlamento. Eu quero aqui dizer da nossa intenção, Presidente Rodrigo Pacheco, de construirmos parcerias, porque este Parlamento, há pouco mais de 3 meses, assim como o Supremo Tribunal Federal, o Palácio do Planalto, ambos foram atacados E eu gostaria de falar um pouco sobre esse momento em que nós reconstruímos, não fisicamente, porque fisicamente os servidores desta Casa, bem como os da Câmara, do STF e do Palácio deram uma resposta brilhante.
Aqui eu queria saudar, na pessoa da nossa Diretora Ilana, todos os servidores aqui desta Casa que em pouquíssimo tempo restauraram as obras de arte danificadas, fizeram a recomposição do mobiliário, assim como no STF, um trabalho brilhante do acervo do STF; do Palácio do Planalto, as vidraças recompostas. O físico é muito simples de ser recomposto, agora nós precisamos recompor o sentimento de pertencimento da sociedade brasileira, a conexão dela à sua própria história e à sua memória.
Esse é o grande trabalho que nós temos por fazer, porque o 8 de janeiro é um capítulo de várias outras situações, de vários outros episódios da nossa história, de invasões de terreiro, de invasões de comunidades indígenas, de territórios indígenas, para dizimação desses povos. O 8 de janeiro é o trauma da escravização de pessoas negras não devidamente tratado. O 8 de janeiro é o trauma da ditadura militar não devidamente tratado. Da violência contra as mulheres em nosso país não devidamente tratada. O 8 de janeiro nos impõe mais do que recompor o que é físico, recompor a cidadania nesse país. Cria para nós um horizonte de possibilidades que inclui a responsabilização daqueles que atacaram a democracia e tentaram fazer o golpe, mais ainda envolve uma projeção do futuro, a partir das crianças, dos adolescentes e dos jovens principalmente.
Nós precisamos ocupar a Praça dos Três Poderes e não isolar a população de lá. Nós precisamos fazer com que a população entenda que esses três edifícios que foram sinalizados numa perspectiva teórica e legislativa na Constituição de 1823, que esses três edifícios representam nós mesmos, representam o equilíbrio, representam as liberdades, representam a dignidade do povo brasileiro através de um Estado que o protege.
Então, eu deixo aqui, Presidente Rodrigo Pacheco, primeiro o nosso compromisso, especialmente nesse ciclo que se inicia desse novo Governo, um Governo democrático, popular, um Governo que tem o retorno do Ministério da Cultura e das políticas culturais, da política de patrimônio como uma estratégia de democratização do país, eu quero aqui reafirmar o nosso desejo de construir com esta Casa, a qual respeito, como Parlamentar também que fui e sei que o Parlamento, como disseram vários aqui, o Parlamento é um lugar sagrado, porque é o lugar onde se faz o pluralismo, porque é o lugar onde se faz o consenso no dissenso, que é a base da democracia.
Que nós possamos fazer parcerias. E aqui quero deixar o Iphan à disposição tanto do Senado, da Câmara, como também do STF, de todas as instituições do Estado brasileiro, para que a gente possa construir isso juntos, para que a gente possa construir isso em parceria. Construir o quê? Construir um projeto de educação histórica e de educação patrimonial - não sobre o passado, digo de novo, mas, acima de tudo, sobre o futuro.
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E é isso que nós temos feito no Iphan, reconstruindo o órgão que estava deteriorado, degradado, aparelhado, para que ele possa, a partir dos seus servidores - os quais parabenizo também -, desenhar essas estratégias.
Então, muito me alegro em participar desse momento, que é um momento histórico, 200 anos, coincidentemente em 2023, neste ano em que tentam violar as liberdades, tentam violar o Estado democrático de direito, afrontando, atacando as instituições. Que nós sejamos resilientes, altivos, vigilantes, porque a democracia nunca está pronta; ela é sempre um produto em construção.
Então, muito obrigado pela oportunidade. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MG) - Muito obrigado, Sr. Leandro Grass, Presidente do Iphan.
Senhoras e senhores, no âmbito das comemorações dos 200 anos do nascimento do Parlamento brasileiro, a Revista de Informação Legislativa, editada pelo Senado Federal, abriu chamado especial de artigos científicos com o eixo temático "Senado 200 anos - atuação e desafios".
O mais longevo periódico na sua área de estudo, a Revista de Informação Legislativa é uma publicação trimestral editada ininterruptamente desde março de 1964, completando, portanto, 60 anos em 2024. Classificada como A2 pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), a revista publica artigos acadêmicos nas áreas de direito, ciência política e relações internacionais.
Os artigos que postulem publicação da edição comemorativa "Senado 200 anos - atuação e desafios" devem ser enviados pelo e-mail ril@senado.leg.br, e aqueles selecionados serão publicados na primeira edição do próximo ano, referente ao primeiro trimestre.
Também, a TV Senado está preparando uma série de programas especiais sobre a transformação do Senado Federal e da legislação que vem mudando a vida do brasileiro e da brasileira nos últimos 200 anos. Serão entrevistas com especialistas e personalidades conhecidas, documentários, reportagens e campanhas de esclarecimento para a programação e redes sociais.
A primeira série de reportagens estreou em abril e mostra as mudanças que as Constituições brasileiras sofreram desde 1823. E, nesta semana, foi ao ar campanha com o episódio sobre os direitos trabalhistas, no dia 1º de maio.
As produções também estão no site e no canal da TV Senado no YouTube.
O objetivo da emissora é mostrar como a história do Senado se mistura com a própria história de modernização da sociedade como a conhecemos hoje.
E, por último, compreendendo a importância de se resguardar e dar fruição à memória do Poder Legislativo, o Senado Federal lança a obra As Fallas do Throno - já aqui citada pelo Senador Randolfe Rodrigues, pelo Presidente José Sarney - Senado e Câmara na construção do Império do Brasil, que traz, de maneira inédita, a transcrição das comunicações do monarca regente com o Poder Legislativo e as respostas deste para o regente.
Ao longo de 66 anos, compreendidos da instalação da Assembleia Geral Constituinte Legislativa de 1823 e as 20 legislaturas subsequentes, até a suplantação do império pelo Governo republicano em 1889, o Poder Legislativo recebeu do monarca as diretrizes de atuação para o período seguinte, das quais se derivava a produção de códigos e leis que melhor organizassem a vida em nosso território. Tais falas versaram sobre os mais variados temas, dos assuntos de economia interna até as relações internacionais, do custo de vida na metrópole até as condições sanitárias de nossas cidades. Portanto, uma obra que passo às mãos do Presidente José Sarney; do Ministro Gilmar Mendes; do Presidente do Iphan, Leandro Grass; do Senador Rogério Carvalho, autor do requerimento; também do Senador Weverton Rocha, nosso membro da Mesa Diretora; Dr. Augusto Aras, Procurador-Geral da República; e com os cumprimentos e agradecimentos ao Senador Randolfe Rodrigues, que tão bem cuida do nosso Conselho Editorial do Senado Federal, responsável por essa obra.
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Então, dou-a como lançada, nesta sessão de hoje, e faço votos que tenham uma boa leitura sobre esse registro, desse acervo riquíssimo da história do Brasil.
Cumprida a finalidade desta sessão especial do Senado Federal, agradeço a todos que nos honraram com a sua participação.
Está encerrada a sessão.
Muito obrigado.
(Levanta-se a sessão às 12 horas e 49 minutos.)