2ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA
57ª LEGISLATURA
Em 1º de abril de 2024
(segunda-feira)
Às 10 horas
29ª SESSÃO
(Sessão Especial)

Oradores
Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Fala da Presidência.) - Declaro aberta a sessão.
Sob a proteção de Deus, iniciamos nossos trabalhos.
A presente sessão especial foi convocada em atendimento ao Requerimento nº 88, de 2024, de autoria desta Presidência, e, eu diria, de todos os outros Senadores e Senadoras e aprovado pelo Plenário do Senado Federal.
A sessão é destinada a celebrar o Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo.
A primeira mesa já está composta. Teremos, nesta sessão, duas mesas: a primeira delas bastante simbólica, com a presença de crianças e adolescentes, e a segunda mesa, na sequência, quando as crianças e adolescentes se sentarão aí, no Plenário do Senado Federal, com a participação de pessoas, de famílias, de profissionais que apresentarão os desafios nessa área do autismo.
Gostei muito de uma expressão que o nosso jogador brasileiro Vinicius Jr. utilizou noutro dia, quando ele disse: "Olha, eu faço o que faço porque eu tenho um irmão de cinco anos de idade e eu não quero que esse meu irmão, criança, sinta os percalços, os desafios, os problemas que eu, Vinicius Jr. estou sentindo". Então, que eles tenham mais chances, mais dignidade, mais acolhimento, mais humanidade.
Aqui é a mesma coisa, nós temos crianças e adolescentes sentados à mesa, para que todos nós, do Brasil, possamos dizer: "Que se abram as portas, que se cumpra a lei existente, que as chances de oportunidade aconteçam - como os adultos vão dizer - para que eles tenham mais oportunidades na vida". Então, isso é muito importante, é o simbolismo que esta mesa carrega.
Estão sentados nesta mesa, com muito orgulho - eu gostaria só de que levantassem a mão quando fossem chamados, para o público identificar vocês -, o Arthur Campos Oliveira, que é aluno do 7º ano, do Colégio Edusesc de Taguatinga, Distrito Federal.
Só levante a mão. (Pausa.)
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Isso.
A Melissa Rodrigues Sales, aluna do Jardim 2 do Colégio Renascença.
Quem que é a Alissa? (Pausa.)
Ah, levantar a mão. Que bom, Alissa... Melissa. Melissa, não Alissa.
E Yan Ko Mello Pereira Fernandes Medeiros, aluno do Infantil 5 do Colégio Objetivo de Brasília. (Pausa.)
Isso. Seja bem-vindo.
Bianca Loschi, 5º ano, escola Indi. (Pausa.)
Isso aí.
E o Sérgio Abner Rocha Gomes de Souza, aluno da Escola 31, de Ceilândia. (Pausa.)
É você, né?
Mas eu não citei o seu nome, né?
A SRA. MELISSA RODRIGUES SALES - Melissa.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Não. O seu é Melissa. E da sua amiga?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Ah, Alice... Desculpe-me. Eu é que estou aqui, ó, na página seguinte.
Alice... Alice Soares de Queiroz, aluna do 4º ano da Escola Classe Agrovila de São Sebastião, Distrito Federal.
Então, Alice está lá na ponta.
Sejam muito bem-vindos, bem-vindas, aqui ao Senado Federal e sentando-se na Mesa Diretora, para que a gente possa fazer essa primeira parte dessa cerimônia de celebração do Dia Mundial de Conscientização do Autismo.
Eu convido a todos e todas agora, para, em posição de respeito, acompanharmos o Hino Nacional, que será interpretado pelo jovem estudante do 9º ano João Daniel Coutinho Leite, cantor profissional e vocalista da banda Hey Johnny.
(Procede-se à execução do Hino Nacional.)
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O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Vamos assistir agora a um vídeo do cantor João Daniel - obrigado, João Daniel, pelo Hino Nacional. Esse vídeo foi preparado especialmente para esta sessão.
(Procede-se à exibição de vídeo.)
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O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Pois não, pai do João Daniel.
O SR. EDUARDO SILVA SIMÕES (Para discursar.) - Eu só queria dizer a todos que puderem e quiserem seguir a banda que é Banda Hey Johnny. Começa com banda, "h", "e", "y".
Eu quero agradecer ao Senado na pessoa do Senador. Muitíssimo obrigado. É muito importante este dia. A gente vive um momento em que a gente precisa dar muita atenção para essas pessoas.
Obrigado, gente. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR. Para discursar - Presidente.) - Agradeço ao Eduardo, ao João Daniel. Parabéns pelo Hino Nacional e também parabéns pela banda, por todo o trabalho desenvolvido! Continuem firmes.
De fato, a autoria do requerimento também teve a participação de vários Senadores, mas eu posso dizer ao Brasil que há um clima de solidariedade, de apoio, de segurança e de participação de todo o Senado Federal a favor da área do autismo, das outras áreas também e dos assuntos que interessem à população.
Obrigado, Eduardo. Seja sempre muito bem-vindo, assim como o João Daniel.
Eu quero lembrar a todos que a presente sessão destina-se a celebrar o Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo, ou seja, trata-se de uma ocasião propícia a garantirmos maior visibilidade ao transtorno do espectro autista (TEA).
Comemorada mundialmente em 2 de abril, desde 2007, por iniciativa da Organização das Nações Unidas, a data passou a integrar o calendário brasileiro com a publicação da Lei 13.652, de 2018. Há alguns anos, portanto, a data tem servido para estimular o debate social e parlamentar, de modo a resultar em inovações legislativas e em novas medidas de apoio tanto aos indivíduos, às pessoas com transtorno do espectro autista - crianças, adolescentes, adultos, idosos -, quanto aos seus familiares, aos profissionais da saúde, da educação, aos cuidadores, aos professores e às demais pessoas envolvidas.
O 2 de abril - que é amanhã, e estamos celebrando hoje - serve para ajudar no combate ao preconceito e na reflexão sobre os desafios vivenciados pelas pessoas com autismo tanto na esfera familiar quanto no âmbito social e também serve para discutirmos a legislação e as políticas públicas voltadas para essa população e para os seus cuidadores, mas esse debate não pode acontecer somente em função de uma data; tem que ser permanente e envolver toda a sociedade. É com base nesse propósito que todos nós, Senadores e Senadoras, temos promovido iniciativas que tragam luz a esta discussão e principalmente resultem em ações práticas em benefício das pessoas com autismo e suas famílias. Cumpra-se a lei, em outras palavras.
Nesse sentido, gostaria de destacar dois momentos importantes que vivenciamos nesta Casa no ano passado. Refiro-me às audiências públicas promovidas sobre a temática do autismo: a primeira, no âmbito da Subcomissão Temporária de Assuntos Sociais das Pessoas com Deficiência, para discutir avaliação, diagnóstico e atendimento às pessoas com transtorno do espectro autista; e a segunda, promovida pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, presidida pelo Senador Paulo Paim, em ocasião do Dia do Orgulho Autista, celebrado em 18 de junho.
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Nas duas ocasiões tivemos a participação de pessoas com autismo, familiares, especialistas e movimentos sociais ligados à causa, lembrando um pensamento nesta área: "Nada sobre nós sem nós". Em tudo que estiver sendo discutido, debatido, que haja participação da pessoa com autismo, da sua família, para que as políticas públicas sejam organizadas.
Foram apontados diversos desafios que precisam ser superados. Durante a preparação das audiências públicas, promovemos uma pesquisa junto a entidades ligadas à área, famílias e profissionais especializados, para identificar quais as principais necessidades enfrentadas. O levantamento mostrou como principal obstáculo a dificuldade do diagnóstico precoce e, consequentemente, o acesso a medicamentos e terapias, apoio educacional, programas assistenciais e inserção no mundo do trabalho. A pesquisa concluiu que, em geral, todos esses direitos estão previstos na legislação, porém, não há efetivamente o seu cumprimento - integral, pelo menos. Dessa forma, o que se busca é a transformação dos direitos em realidade, tirando-os do papel e levando-os à vida diária, ou seja, se fôssemos resumir essa luta em uma expressão, esta poderia ser: cumpra-se a lei. Esta é a causa que deve unir todos nós, pessoas com autismo, pais, mães, famílias, movimentos sociais, Parlamentares de todos os partidos políticos, gestores públicos e sociedade.
Nesta sessão, procuramos convidar pessoas com autismo, familiares, movimentos, pesquisadores, ativistas, enfim, todos nós estamos aqui para defender esta causa e chamar a atenção de toda a sociedade para a importância desse debate. É por isso, inclusive, que esta sessão especial, pelos meios de comunicação do Senado, está sendo transmitida para o Brasil e ficará à disposição de todas as pessoas que queiram novamente escutar ou ver ou, enfim, pensar sobre o que for dito nessa data, porque a data continua no decorrer de todo o ano.
E que essa mobilização, portanto, seja permanente, pois os desafios batem a nossa porta todos os dias, em todos os aspectos da vida, seja na saúde, na educação, no acesso ao mundo do trabalho, na vida em sociedade. Nós devemos sempre ter como princípio o conceito de cidadania plena - e isso vale para a pessoa com autismo, com deficiência, doenças raras, em situação de vulnerabilidade, enfim, todas aquelas pessoas que lutam para ter seus direitos realizados -, cidadania plena em todos os sentidos e em todas as fases da vida.
É com esse espírito que vamos ouvir agora, em primeiro lugar... Se alguém de vocês quiser usar o microfone também para dizer alguma coisa para o pessoal que está aqui ou nos acompanhando pelo Brasil nessa primeira fase da sessão especial, antes de convidarmos a segunda mesa... Esperamos que a mensagem de vocês e de todas as demais pessoas que virão após as crianças e adolescentes que estão aqui traga eco para toda a sociedade.
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Obrigado.
Então, eu pergunto, em primeiro lugar, se alguém quer fazer uso da palavra.
Arthur, quer começar? Quer dizer alguma coisa? A Melissa, depois, também vai falar, dar um oi para a turma? Vai dizer o que você está achando de tudo isso? A Alice, também. E também, além da Alice, a Bianca, o Yan Ko, se quiser dizer um oi também, o Sérgio, se quiser falar alguma coisa também. Vocês que decidem, está bom?
Arthur começa.
O SR. ARTHUR CAMPOS OLIVEIRA (Para discursar.) - Bom dia!
Meu nome é Arthur. Estou com 12 anos de idade. Estamos aqui para comemorar o Dia de Conscientização do Autismo, um dia muito importante aqui para todos nós.
O autismo é uma deficiência. Alguns acham que é uma doença, e a gente está provando que não é. Então, a gente tem que aprender a respeitar os direitos das pessoas com autismo.
Eu tenho uma pergunta aqui para todos vocês: vocês já ouviram algum autista falar que sofreu algum preconceito aqui? Levantem a mão.
(Manifestação da plateia.)
O SR. ARTHUR CAMPOS OLIVEIRA - É uma coisa muito ruim, não é? Então, a gente tem que evitar que essas coisas aconteçam. Se eu não estivesse aqui, o autismo estaria com grandes problemas.
E o grande inimigo das pessoas com autismo é o bullying, o que muitas pessoas acabam passando. Não é só com autista, não; é com qualquer pessoa. Esse motivo acontece por diferenças. Bom, como passou a música bem ali, ninguém é igual, e a gente tem que aprender a respeitar as diferenças das pessoas. Então, é melhor parar de ficar fazendo esses preconceitos bobos. É um erro grande. A pessoa tem que ser respeitada! E os autistas estão aqui para comemorar esse combate ao preconceito.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Muito bom, Arthur Campos Oliveira, que é aluno do 7º ano do colégio Edusesc de Taguatinga, Distrito Federal. Muito bem.
O Sérgio quer falar? Então, está bom. Pode falar o que você quiser.
O SR. SÉRGIO ABNER ROCHA GOMES DE SOUZA (Para discursar.) - Bom dia.
Meu nome é Sérgio Abner. Tenho dez anos e sou autista nível 1. Eu estou muito feliz de estar aqui, vendo o pessoal aqui que também tem filhos com autismo. E eu estou muito feliz de estar aqui.
Era só isso que eu queria falar mesmo. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Muito bem, Sérgio Abner Rocha Gomes de Souza, que é aluno da Escola 31 de Ceilândia, Distrito Federal.
Aqui alguém, no lado de cá...
A Bianca... Quer falar, Bianca? (Pausa.)
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A SRA. BIANCA LOSCHI (Para discursar.) - Obrigada por pensarem na gente. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - A Bianca Loschi, 5º ano, Escola Indi.
Parabéns, Bianca!
Vamos em frente.
E a Melissa que está firme aí também... (Pausa.)
Diga: "Mando um abraço para todo mundo".
Não? (Pausa.)
Está bem, Melissa, obrigado.
Melissa Rodrigues Sales, que é aluna do Jardim II do Colégio Renascença.
Parabéns, Melissa!
Uma salva de palmas. (Palmas.)
E uma salva de palmas para o Yan Ko também. (Palmas.)
E agora vamos...
A Alice quer falar? Então, a Alice... (Pausa.)
Não quer? (Pausa.)
Então, uma salva de palmas para a Alice também. (Palmas.)
Antes de a gente compor, então, a segunda mesa, quero agradecer a vocês por terem vindo.
Agora vocês vão se sentar aqui nas cadeiras do Plenário, mas para todo mundo entender e deixar muito claro o simbolismo desta mesa: crianças e adolescentes que estão aí e que querem também respeito, dignidade, que o mundo seja melhor, com chances e oportunidades, como foi dito, para todas as pessoas; que não sintam, pelo menos, muitas das dificuldades pelas quais os adultos que virão falar daqui a pouco passaram; e que o mundo seja melhor, com mais direitos respeitados, com leis transformadas em realidade e com políticas públicas adequadas. Não é verdade? (Pausa.)
Vamos em frente, então.
Estão animados? (Pausa.)
Vamos embora? (Pausa.)
As meninas também aqui?
Está bem dividido, três meninas e três meninos, crianças e adolescentes.
Uma salva de palmas para eles e para elas. (Palmas.)
Agora vocês podem se sentar lá na primeira fileira ou na segunda, onde vocês quiserem.
Obrigado, muito bom.
Tenho certeza de que o Brasil gostou muito de vocês também.
Parabéns para a Bianca, para a Melissa e para a Alice! (Pausa.)
Destaco também, no Plenário, o Arthur Medeiros, que é representante do Ministério da Saúde.
Passamos, então, agora, para a segunda mesa com os seguintes convidados: a Sra. Deputada Estadual Andréa Werner, Deputada pelo Estado de São Paulo; o Sr. Edilson Barbosa do Nascimento, Diretor-Presidente do Movimento Orgulho Autista do Brasil (Moab), advogado e pai de dois jovens com autismo; a Sra. Flávia Luciana Guimarães Marçal Pantoja de Araujo, Advogada e Professora Adjunta da Universidade Federal Rural da Amazônia; a Sra. Érica Fernanda Ursulino Lemos, colunista, mãe atípica e militante da causa PcD; a Sra. Priscilla Silva Damasceno, servidora desta Casa Legislativa desde 2010 e representante do Grupo SenAutismo; e a Sra. Érika Karine Rocha Dallavechia, Fundadora-Presidente do Projeto Social Angelina Luz e Coordenadora do Movimento Orgulho Autista Brasil no Estado do Rio Grande do Sul (Moab-RS).
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Quero cumprimentar novamente a Flávia também, que veio lá de Belém do Pará agora.
A SRA. FLÁVIA LUCIANA GUIMARÃES MARÇAL PANTOJA DE ARAUJO (Fora do microfone.) - Sim.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - É uma viagem longa também. Seja muito bem-vinda.
Eu acho que já tinha cumprimentado as demais pessoas também. Sejam bem-vindos e bem-vindas.
A Érika Karine Rocha Dallavechia está remotamente.
Muito bem. Então, bem-vindos, bem-vindas.
E passo, em primeiro lugar, então, a palavra à Deputada Estadual Andréa Werner, Deputada pelo Estado de São Paulo, pelo PSB, que é jornalista, mulher autista, ativista pelos direitos de pessoas com deficiência há mais de dez anos e mãe do Theo, um adolescente autista.
Então, muito bem-vinda, Andréa Werner, com quem já tive a ocasião de participar de reunião no Conselho Nacional de Educação. Tem a palavra S. Exa.
A SRA. ANDRÉA WERNER (Para discursar.) - Obrigada pelo convite. Queria cumprimentar a mesa; há muitas pessoas conhecidas, mas vou cumprimentar a mesa inteira na figura da minha amiga Flávia.
Queria me descrever para as pessoas que estão nos acompanhando pela internet: eu sou uma mulher de pele branca, de 48 anos, cabelos castanhos lisos até os ombros, com luzes, e eu estou usando um vestido preto.
Bom dia a todos e todas que estão aqui, que nos acompanham pela internet. Eu queria começar dizendo que o autismo definiu a minha vida de muitas formas. Primeiro, com a minha jornada na maternidade e no ativismo; e depois que eu tive o Theo e ele teve o diagnóstico - o Theo agora está com 15 anos. O Theo se comunica com um tablet que tem um aplicativo de comunicação alternativa, porque o Theo é um autista não oralizado grau 3, com deficiência intelectual, então ele precisa de bastante suporte. Está com 15 anos, 1,83m e está na escola comum pública, Senador. A experiência do Theo mostra que a inclusão é possível, mas ela é possível quando a lei é cumprida. E nós temos tantas leis que falam disso: a Lei Brasileira de Inclusão, a Lei Berenice Piana... Então, desde que a lei seja cumprida e que o aluno autista tenha suportes principalmente baseados em evidência, a inclusão é possível.
O autismo também definiu quem eu sou, porque eu sou uma mulher autista que foi diagnosticada tardiamente. Eu sou bem diferente do Theo em muitas coisas, porque o Theo é um autista grau 3 e eu sou uma autista grau 1; mas eu tive problemas na escola, eu perdi a oitava série, eu tive problemas no trabalho, eu tive problema nos relacionamentos. E, se eu soubesse naquela época o que eu sei hoje, eu poderia ter me preservado melhor, eu poderia ter buscado formas mais sustentáveis de me relacionar com as pessoas, eu poderia ter evitado riscos aos quais eu me expus porque eu não sabia que eu era uma pessoa autista.
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Tem uma estatística muito triste do Reino Unido que diz que nove em cada dez mulheres autistas sofrem abuso ou violência sexual - nove em cada dez.
Ano passado, nessa mesma data, eu comentei que era hora de a gente passar da conscientização e ir para a aceitação, mas eu vou precisar voltar um pouquinho atrás. Eu omiti algumas coisas, até porque eu não estava vivendo isso naquele momento. O Theo agora está na escola estadual, escola do Estado de São Paulo, e eu estou processando o Estado de São Paulo. E veja bem que ironia: eu sou uma Deputada Estadual em São Paulo e estou processando o estado. Por quê? A Diretoria Regional de Ensino de Campinas, da região onde eu moro, proibiu a entrada da acompanhante pessoal do Theo na escola, mas não forneceu uma acompanhante especializada para ele, que é um autista grau 3 de suporte. O que ele tem hoje na escola é assegurado por uma liminar. A diretora me disse que não tem acompanhante especializado, que tem uma liminar aberta, mas que não sabem quando esses profissionais vão chegar e nem qual especialização eles vão ter. E a gente sabe que não basta boa vontade e nem amor no coração para incluir um aluno autista. A ideia era que ele ficasse sozinho por um mês para que eles pudessem analisar o Theo e entender de quais suportes ele precisa. Pode até parecer uma ideia sensata, mas se a gente considerar que ele já veio da rede municipal, onde ele foi de fato acolhido, incluído, tinha professora de educação especial, tinha sala de AEE, tinha tudo o que a lei garante, uma acompanhante com ele e vários relatórios do progresso dele, qual sentido faz deixar o meu filho sozinho por um mês em uma sala, sendo que ele não vai nem ao banheiro sozinho, se a gente não perguntar se ele quer ir no banheiro, porque queriam analisá-lo para entender que suporte ele precisa? A escola estadual jogou tudo isso fora, todos os relatórios que vieram da municipal, e queria deixar um autista de alto nível de suporte sozinho para avaliá-lo em uma sala lotada, porque a gente sabe que a rede estadual é bem pior.
"A escola não pode ter nenhum profissional de saúde" - eu coloco isso entre aspas, essa frase não é minha. Essa é uma fala que se repete muito quando o debate é sobre alguns projetos de lei, sobre o parecer do CNE. Essa fala veio muito na época do PL 3.035, que estava tramitando na Câmara, de que a relatoria é do meu colega de partido Deputado Duarte Jr; quando veio o meu PL também, para ser sancionado pelo Governador Tarcísio, que era o PL 454, que virou a Lei 17.798, mas com muitos vetos. E é o que uma minoria diz em coro, repetidamente, contra o Parecer 50 do Conselho Nacional de Educação, que traz diretrizes para a educação de autistas baseadas em evidências. É o melhor documento que a gente já teve neste país sobre a educação de autistas no ensino regular.
E é por isso que a gente precisa voltar para a conscientização, porque é preciso entender que pessoas autistas são diferentes, portanto elas precisam de suportes diferentes. Alguns precisam de suporte que seja só pedagógico, outros precisam de suporte que é pedagógico e terapêutico, alguns não precisam de suporte específico na escola. Só que a gente tem que entender que a acessibilidade para um autista é diferente da acessibilidade para um cadeirante, para um surdo, para um cego.
A EPTV, que é afiliada da Globo lá na região de Campinas, fez uma reportagem com um jovem autista que hoje está cursando Fonoaudiologia - uma coisa linda a reportagem -, é o Alisson. Nas minhas redes eu publiquei um trecho e lá ele conta a própria história, inclusive ele cita como foi essencial para ele ter uma acompanhante especializada. O Alisson fala, é um autista oralizado.
Outra autista que fala abertamente sobre isso e eu acho que nós vamos ter um vídeo dela aqui hoje é a Carol Souza. Ela deu entrevista para o Bial uma vez falando como foi essencial que na faculdade se fizessem adaptações para que ela pudesse concluir a faculdade e como essa falta na escola regular fez com que ela abandonasse os estudos na escola regular. E me entristece muito ouvir vozes desses autistas apagadas ou ignoradas. A gente não pode se enganar. Quando alguém define o que não pode ser acessibilidade para um autista, silencia quem precisa e exclui quem se beneficia disso.
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Eu também me preocupo muito com o que eu vejo como uma regressão no nível do debate. Vejo grandes defesas sendo feitas de práticas usando empirismo, achismo, sem números, sem análises, sem estudos. Uma observação empírica pode, sim, ser o ponto de partida para algo mais substancial, para uma pesquisa, uma descoberta, mas é muito diferente você usar isso como ponto de partida e usar isso como evidência máxima. A gente está falando de ciência aqui, não pode esquecer que experiência pessoal não conta como prova. Se fosse assim, o pessoal que usa placebo estaria muito feliz. Não é assim que funciona.
Mas, se você acha que essa sua experiência empírica é uma prova... Por exemplo, desenho universal. Diz-se muito sobre o desenho universal para que não se façam adaptações para autistas. Se você usou o desenho universal com algum aluno autista e ele aprendeu, que bacana! Agora, se você acha que isso vai servir para todas os outros autistas porque foi a sua experiência particular, aí eu sinto dizer que você está enganado porque muitos autistas vão, sim, precisar de adaptações além desse desenho universal. Mas se você acha isso mesmo, produza estudos para que possamos ter evidências sérias a respeito disso. Eu convido vocês a produzirem estudos a respeito.
O meu sonho, Senador, é que neste país a gente tenha políticas públicas baseadas em evidências, como muitos países sérios já têm. Por que o dinheiro público é escasso, a gente sabe disso. O orçamento é escasso. Falando nisso, homologa Camilo, Ministro Camilo, que está aí com o Parecer 50 do CNE! A gente espera esse grande passo do senhor.
A nossa necessidade de voltar à conscientização não para só na inclusão escolar, pois 70% dos alunos que estão incluídos não participam efetivamente da escola. Essa foi uma pesquisa da revista Nova Escola, do ano passado. Também está cruelmente disseminado no sistema de saúde público e privado - nos dois. O problema começa muito cedo, nos diagnósticos. Tem gente ficando na fila dois anos para conseguir um diagnóstico. Lá no meu gabinete, eu recebi denúncia de cidade com 110 mil habitantes que tem só um neuropediatra para fazer diagnóstico. E tem cidade que está encaminhando as crianças para profissional particular, porque não tem profissional no SUS para fazer esse diagnóstico. E o que acontece quando uma criança com alto nível de suporte, pequena, tem que esperar dois anos por um diagnóstico? A família perde uma janela essencial para o desenvolvimento dessa criança, em que ela poderia ter adaptações, terapias e desenvolver mais autonomia. O que acontece em termos práticos e financeiros é que o Estado está economizando aqui no início com contratação de profissionais, mas ele vai ter muito mais gastos no futuro, porque sem acompanhamento e adaptações, essas pessoas podem não conseguir desenvolver toda a sua autonomia. Isso quer dizer que elas vão precisar de mais acompanhamento no SUS, de mais assistência social no futuro, vão ficar mais dependentes de benefícios e vão precisar de uma moradia dada pelo Estado, ou seja, a economia que está sendo feita hoje é o gasto de amanhã.
Quando o diagnóstico chega, os problemas se multiplicam, porque não tem fono, não tem terapeuta ocupacional, não tem professor preparado para dar suporte nas escolas. É muito comum que no SUS aconteça terapia uma vez a cada 15 dias para essas crianças que conseguem, uma vez a cada 15 dias em grupos, e às vezes é fono junto com TO, com crianças com condições totalmente diferentes, abarrotando uma sala. Os pais não recebem nenhuma orientação de como continuar em casa esse suporte, de como poderiam agir para complementar, até porque a gente sabe que 80% dos pais... Quando dizemos pais, são mães, não é, Senador? Há uma pesquisa que diz que 78% dos pais abandonam o lar quando vem um diagnóstico de deficiência ou doença rara de um filho. Então as mães acabam ficando com isso sozinhas, na maior parte do tempo.
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Falta tudo: faltam lugares adequados, faltam especialistas preparados no processo diagnóstico, inclusive tardio, como foi o meu caso. Aí, as famílias se veem numa sinuca: muitas vezes, cortam aqui, cortam ali, fazem uma faxina extra para poder pegar um plano de saúde. E o plano decide, do nada, mandar um aumento de 50% para essa família de um ano para o outro, ou manda uma cartinha informando que decidiu rescindir aquele contrato, porque aquele paciente não é relevante para ele, porque está dando muito gasto. Só no último ano, no meu gabinete, foram 850 denúncias relacionadas a cancelamento unilateral de plano de saúde - que é ilegal, porque você não pode cancelar plano de saúde de quem está em tratamento - e descredenciamento de clínicas que atendiam pessoas com deficiência, principalmente autistas. Eu levei essas denúncias para o Ministério Público, que abriu cinco inquéritos, só no Estado de São Paulo, contra planos de saúde. E esse tipo de cancelamento, descredenciamento ficou mais comum depois da aprovação da Lei 14.454, que trouxe de volta o rol exemplificativo. Inclusive, gostaria de novo de deixar um agradecimento aqui: foi essencial a participação de Senadores aqui, para que essa lei fosse aprovada, do Senador Romário, do Senador Kajuru e de vários outros que ficaram com a gente nessa batalha.
Eles dizem que o autismo está mais caro que câncer, inclusive que autismo nem é doença, mas eles não especificam o que entra nessa despesa, porque tem tipo de câncer que basta uma cirurgia pequenininha que você já resolveu, e o autismo é uma coisa para a vida inteira. Eles usam formas desonestas de querer desqualificar os autistas, trazem exemplos extremos, dizendo que tem criança fazendo 80 horas de terapia - e isso eu não conheço, eu nunca vi isso na minha vida, criança autista fazendo 80 horas de terapia, e eu gostaria muito de ver a Abramge e a FenaSaúde nos darem como exemplos quantos por cento dos clientes autistas que eles têm fazem mais de 20 horas de terapia por semana.
Um ano depois de eu começar o mandato, eu fico muito triste de ver que não só a gente não está conseguindo resolver problemas urgentes, como também agora tem um fla-flu que leva em conta tudo menos os autistas diferentes, que precisam de coisas diferentes, suportes diferentes, que as famílias precisam de apoio, que as mães precisam de ajuda, que as professoras estão desesperadas, em burnout, sem suporte, sem a ajuda de um acompanhante especializado dentro da sala, sem formação continuada adequada, que é uma coisa que está no parecer do CNE.
Neste mês, é disto que a gente precisa ter consciência: a gente entender que autistas são diferentes, que as acessibilidades são diferentes, que autistas crescem - eu mesma só fui diagnosticada com 48 anos de idade. Então, é muito bom a gente poder contar com a parceria desta Casa para atualizar políticas que já estão antigas e trazer mais políticas públicas para autistas em todas as idades.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Agradeço, Andréa Werner Silva Bonoli, pela exposição e também pela indicação de que esses desafios sejam enfrentados por todos nós, pelos estados, pela sociedade, que é o grande objetivo desta sessão especial: colocar os holofotes sobre a área, os desafios que existem.
Eu quero cumprimentar também, com muito prazer, o Fernando Cotta, que está aí, Presidente de Honra do Moab (Movimento Orgulho Autista Brasil)... (Palmas.)
... um trabalho, assim, de muita relevância, e cumprimentar todos e todas que estão no Plenário, assim como todas as pessoas que nos acompanham pelo Brasil.
Passamos, em seguida, a palavra ao Edilson Barbosa do Nascimento, que é advogado, pai de dois jovens autistas e Diretor-Presidente do Movimento Orgulho Autista Brasil.
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Eu só quero lembrar que habitualmente a gente tem uma campainha aqui quando está a cinco minutos, mas nós pedimos para cancelar, porque ela faz um barulho muito grande e incomodaria muitas pessoas. Então, a campainha... (Palmas.)
É só para a pessoa acompanhar mais ou menos. Lá tem os relógios para acompanhar o tempo.
Seja muito bem-vindo, Edilson.
Agradeço de novo à Andréa Werner. Foi uma exposição das mais importantes.
Edilson.
O SR. EDILSON BARBOSA DO NASCIMENTO (Para discursar.) - Bom dia a todos. Bom dia a todas.
Meu nome é Edilson Barbosa. Sou advogado e estou na Presidência do Movimento Orgulho Autista Brasil (Moab).
Como o nome já diz: orgulho autista, essa entidade que tem aqui o prazer de ter o Presidente de honra, Fernando Cotta, que já teve sua salva de palmas merecida.
Em 2005, várias mães vieram a Brasília, vários pais, vários autistas e montaram o Moab. Hoje, maior de idade - 19 anos vai fazer -, estamos em todas as Regiões do Brasil: na Região Norte, na Região Sul, na Região Centro-Oeste, Sudeste e Nordeste.
Quero parabenizar cada uma e cada um que é coordenador e coordenadora deste país, que, em momento algum, deixa a peteca do autismo cair. Parabéns a vocês que estão nos seus municípios, nas suas cidades e aqui no Distrito Federal também. Nós temos coordenadores e coordenadoras nas regiões administrativas, até porque o DF não completou a democracia, não elegemos os prefeitos, os vereadores, mas temos cidades constituídas.
Eu vim de uma cidade, Ceilândia, que é a maior cidade do DF, com mais de 600 mil habitantes, muitos autistas, muitas crianças, muitos adolescentes, muitos adultos e muitos idosos autistas. Vários estão agora, Senador, tendo seus diagnósticos. E eles falam assim, "uai, então é por isso que eu era assim? É por isso que eu sofria tanto?", depois dos seus diagnósticos.
Hoje, pessoal, é uma data para o mundo discutir o autismo, e não só o Brasil. Nós do Moab e de tantas outras entidades solicitamos, Senador Flávio Arns, a realização desta sessão e estamos aqui hoje. Muito obrigado, Senador, por ouvir e também ao Presidente desta Casa, Rodrigo Pacheco, por ter aceitado estarmos aqui discutindo o autismo.
Em 2012, esta Casa aprovou uma lei - eu também estava aqui, Fernando, pressionando, porque não é fácil votar e aprovar uma lei, pessoal -, a Lei 12.764, de 2012, uma lei federal que vale em todos os municípios brasileiros. Em 2012, ela, que deu nome à lei, Berenice Piana, que é mãe de um autista do Rio de Janeiro, de Itaboraí, simbolizou os pais e as mães e vieram a esses corredores e a este Plenário para aprovar essa lei.
Como a Deputada Andréa Werner falou, temos muitas leis: municipais, estaduais e federal. Ora, mas se essa lei não for implementada, de nada adiantou. Essa lei tem que pegar, e as leis para os autistas, pessoal, têm que pegar. Só pega uma lei quando a gente conhece, quando a gente sabe que ela é importante.
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Por isso que, neste dia, nós queremos que todos vocês leiam a lei. Vocês sabiam que são somente oito artigos? E essa lei mudou a vida dos autistas. Mudou sabe por quê? Porque, a partir de 2012, o autista é considerado pessoa com deficiência. Olha que coisa mais bonita e importante. E tem alguns estados, como aqui, no DF, em que alguns médicos estão dizendo que o autista não é PCD. Então, estão desconsiderando o que esta Casa aprovou, e o Judiciário, como sempre, está colocando o direito de volta, está colocando que aqueles que passaram no concurso são PCD.
Então, nós temos que brigar para que essa lei valha e que essa lei pegue.
Essa lei deu também o direito de ter o acompanhante especializado - um nome tão difícil, não é? Nós fizemos uma pesquisa, tem município que chama, Senador, de babá. E o que importa o nome? O que importa é se aquele menino, se aquele autista está sendo acompanhado na sala de aula, junto com a professora regente.
Essa lei também trouxe a prioridade no atendimento. O autista, como tem uma deficiência oculta, na maioria das vezes, tem problemas para ter o atendimento prioritário nas filas, mas esta Casa também aprovou a Lei Romeo Mion, que é a da Ciptea, a qual, apresentando na fila, você terá direito de ter atendimento prioritário. Você não tem a cadeira de rodas, você não é uma pessoa idosa, você não é uma mulher grávida, uma mulher ou um homem com uma criança no colo; você é autista, e o autista nível 1 de suporte tem esses problemas, mas o Brasil precisa entender que o autista é pessoa com deficiência.
Essa lei garante o laudo precoce, os atendimentos nas terapias, os medicamentos. Pasmem: a maioria dos estados não oferece isso, Senador. No Distrito Federal, a gente luta pelo centro de referência de atendimento aos autistas.
Um dia desses, fui convidado para uma palestra na UBS 9, em Ceilândia, a cidade em que eu moro, no P Sul: 17 mães, com 17 crianças, sem ter o laudo e sem ter o acesso aos médicos para terem os seus laudos. Mães sofrendo no Distrito Federal.
Nós precisamos ter os centros de referência. Parabenizamos vários Prefeitos, vários Governadores que entenderam e estão implementando centros de referência de atendimento ao autismo.
Esta Casa falou sobre as pessoas com síndrome de Down. Aqui, no DF, nós temos o CrisDown, que é lá no Hran, para quem conhece Brasília, mas o autista não tem. A gente precisa ter centros de referência de atendimento aos autistas.
Essa lei garante também que não se pode negar, Deputada Andréa, autista não pode ser negado no plano de saúde. Estão não só negando como também tirando arbitrariamente os autistas dos planos de saúde. Isso é contra a lei e é uma violência. Essa lei também garante - eu não falei oito artigos? - que não se pode negar matrícula para alunos autistas no Brasil. E negar é negar quando você vai à escola, diz que tem a vaga; quando você vai, toda feliz, fazer a matrícula, quando apresenta o laudo, a vaga acabou. Uma coisa é não ter a vaga, que tem escolas que realmente não têm a cadeira para o menino sentar e não está negando. Agora, quando tem e depois nega, é contra a lei. E olha: a multa é de 2 a 20 salários mínimos. E pode também, se for reincidente, ter a demissão - é claro, depois do PAD, que é o processo administrativo.
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Então, pessoal, esta Casa já apresentou ao Brasil uma lei. Nós temos que conhecer, temos que cobrar e temos que nos juntar.
Sabe como nós nos juntamos? É cada um de vocês que estão aqui. Cada uma de vocês e cada um de vocês que estão nos ouvindo no Brasil, se juntem, pessoal. Se não é o Moab, é o que o Fernando fala, nosso Presidente de Honra: a melhor entidade é aquela que o acolhe. Abracem, vão, juntem-se e vamos garantir os nossos direitos, porque é assim que a gente terá, no futuro e no presente, qualidade de vida, porque esse é o objetivo.
Essas pessoas autistas têm direito a ter qualidade de vida, e a qualidade de vida é quando apresenta a política pública para que esses direitos sejam válidos.
Por último, nós temos aqui no DF a Lei Fernando Cotta, em homenagem ao Fernando - dez artigos -, e vários outros estados também têm as suas leis. Conheçam as leis, pessoal. Conheçam, para garantir os direitos.
E encerro com a questão do Parecer 50 do Conselho Nacional de Educação.
Eu gostaria, dessas pessoas que são contra, que lessem, porque, pessoal, eu, como advogado, tenho dificuldade de implementar os direitos dos autistas nas salas de aula, porque nós não temos nada escrito para garantir. É tudo subjetivo. O parecer é alguma coisa concreta. Quem for contra é porque nunca pisou numa sala de aula e nunca viu um menino rolando na sala de aula e quebrando.
O Parecer 50, do CNE, discutido com especialistas, com entidades, vai mudar a vida dos autistas. Por isso, Ministro da Educação, Camilo, homologue.
Vocês vão ter o PEI, vocês vão ter as famílias nas escolas, através de algo escrito.
E, para encerrar, neste dia tão importante do autismo, eu queria, Senador, propor: o Senado Federal tem que criar o observatório do autismo. A gente tem que ter uma equipe de Senadores e servidores e entidades para discutir e verificar se essas leis estão sendo implementadas no Brasil, nos municípios, porque nós precisamos garantir direitos, e só garantimos os direitos se a gente estiver fiscalizando e ajudando até as prefeituras, os governos estaduais e os ministérios a implementar essas políticas.
Essa é a proposta do Moab, que a gente crie um observatório, no Senado Federal, de implementação das leis e, principalmente, da Lei do Autismo, que é a Lei 12.764, de 2012, que vocês vão ler e brigar para ela valer e para ela acontecer.
Um grande abraço e vivam todos os autistas nível 1, nível 2 ou nível 3 de suporte, seja criança, adolescente, adulto ou idoso. Todos têm que estar no mesmo barco. O barco é o Brasil.
Muito obrigado. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Agradeço e me permita chamá-lo de você, porque já o conheço há tantos anos, Edilson Barbosa do Nascimento, Diretor-Presidente do Movimento Orgulho Autista Brasil (Moab), e, por extensão, Fernando Cotta, a quem também já conheço há tantos anos, Presidente de Honra do Moab.
Passo em seguida a palavra à Flávia Luciana Guimarães Marçal Pantoja de Araujo - e enquanto vai até a tribuna... -, que é Professora Adjunta da Universidade Federal da Amazônia, advogada, Doutora em Ciências Sociais e Mestre em Direito pela Universidade Federal do Pará, especialista em direito do estado pela Universidade da Amazônia - escola de Governo do Estado do Pará. E nos recebeu, assim como o Conselho Nacional de Educação, com uma acolhida extraordinária em Belém do Pará, numa reunião descentralizada.
Com a palavra, Dra. Flávia.
A SRA. FLÁVIA LUCIANA GUIMARÃES MARÇAL PANTOJA DE ARAUJO (Para discursar.) - Bom dia a todos. Vou iniciar fazendo minha audiodescrição. Eu sou uma mulher negra, com mais ou menos 1,68m. Estou trajando um blazer branco, uma camisa do meu querido grupo Mundo Azul, que deve estar me assistindo de Belém do Pará. Estou com os cabelos na altura dos ombros e eles são iluminados.
Bem, primeiramente eu gostaria de agradecer o convite deste Senado, na pessoa do Senador Flávio Arns, que é sempre um exemplo da luta pela inclusão neste país.
Gostaria de falar neste momento sobre três pontos que eu considero primordiais quando a gente trabalha no campo das políticas públicas. Há muitos anos, eu venho acompanhando - na verdade, desde o diagnóstico do meu filho, no ano de 2013 -, e eu percebi o quanto era necessário levarmos a sério as políticas públicas. Foi um ano depois da aprovação da Lei 12.764, de 2012, que realmente transformou a vida das pessoas com autismo no país, ao considerar a pessoa com autismo como pessoa com deficiência.
Há algum tempo, eu já estudava sobre o tema políticas públicas e sempre me perguntei quando o tema do autismo se tornaria um tema de relevância pública. E hoje a gente consegue perceber o avanço destas políticas, mais ainda, a falta de implementação. Avanço de políticas do ponto de vista legislativo, nós conseguimos avançar de uma forma muito significativa. E eu quero deixar aqui novamente minha congratulação a esta Casa, porque o Senado brasileiro foi essencial para que nós tivéssemos a votação e a aprovação de diversas leis que hoje fazem toda a diferença para nós que somos pais de pessoas com autismo e para pessoas com autismo, mas ainda é preciso avançar quando nós falamos do processo de implementação.
Eu costumo dizer que hoje o tema do autismo... E muitas pessoas sempre me perguntam, Senador: "Mas por que se fala tanto de autismo?", "Será que isso não é discriminatório com as outras deficiências?". Mas, quando trabalhamos com políticas públicas, nós temos que pensar naquilo que é do interesse da nação. E hoje, quando olhamos os dados estatísticos ou o diálogo com qualquer gestor público da área da saúde, da educação ou da assistência social, nós temos a absoluta certeza de que o tema do autismo precisa ser uma pauta prioritária neste país.
Os índices de pessoas com autismo coletados, por exemplo, no CDC norte-americano, quando são rebatidos ao Brasil, já demostram que a condição do autismo é maior do que muitas das condições de deficiência, como deficiência visual, como síndrome de Down, o que de modo algum significa que nós iremos discriminar qualquer outra deficiência, mas nós temos uma responsabilidade quando falamos de políticas públicas. Nós precisamos estar atentos àquilo que é a maior demanda da sociedade, para que justamente nós possamos tratar a todos com equidade. Se equidade é dar mais para quem mais precisa, eu preciso estar atento a que hoje nós temos um problema de saúde pública e educacional quando se trata da inclusão de pessoas com transtorno do espectro do autismo. E, por isso, eu quero lembrar de três pontos que continuam sendo essenciais quando nós falamos de políticas públicas.
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O primeiro desses temas é a saúde. Muito se avançou no direito de saúde, muito se avançou nas discussões sobre essa temática, inclusive com a aprovação em relação ao rol taxativo, mas ainda nós temos uma deficiência significativa na questão da construção de centros especializados em transtorno do espectro do autismo. Não é possível avançar numa política mais ampla para todas as pessoas com deficiência se nós não enxergamos as particularidades, as peculiaridades do transtorno do espectro do autismo. Por isso a criação de centros especializados é essencial para que, inclusive, o país possa desenvolver ainda mais pesquisa no campo da saúde de pessoas com transtorno do espectro do autismo. Imagina você ter uma produção continuada em um centro que atenda 24 horas pessoas com autismo. Naturalmente a expertise que será gerada naquele local, a tecnologia da área da saúde que será gerada naquele local certamente será muito mais ampla, e você conseguirá avançar de uma forma muito mais rápida do que quando você pulveriza esse atendimento numa rede que não consegue se especializar, exatamente porque você não tem os profissionais com aquele processo de formação. Isso é o que acontece em várias políticas públicas. Isso acontece, por exemplo, no Centro Dia; isso aconteceu, por exemplo, quando se trabalhou uma série de outras condições dentro do país, dentro de políticas públicas no campo da saúde. Então a criação de centros é essencial, ela é uma urgência. Recentemente houve, inclusive, um veto à questão orçamentária para essa temática, cuja alegação do Governo Federal foi exatamente de que não havia regulamentação ainda sobre esses centros. Então essa é uma temática que é urgente.
Eu quero falar aqui novamente da minha Amazônia, do meu Estado do Pará. O Senador Flávio Arns esteve conosco conhecendo a rede de saúde do Estado do Pará, que, desafiando todas as regras, onde muitas vezes se acredita que a Amazônia, até por uma visão preconceituosa, pode ser mais atrasada do que outras áreas do país, mas, na Amazônia, no Estado do Pará, através do Governador Helder Barbalho, a quem deixo a minha congratulação pública, nós temos já centros especializados em transtorno do espectro do autismo que inclusive atendem nos interiores da Amazônia. Então a gente já conseguiu internalizar esses processos. A minha amiga Andréa Werner também já esteve conhecendo. Ainda há muito o que avançar, mas é possível fazer e é necessário fazer com comprometimento, orçamento e políticas públicas voltadas para essa temática.
Precisamos avançar também na área da assistência social, que é um tripé essencial na questão da garantia de direitos. E aqui, na assistência social, é necessário que a gente destaque o cuidado com os cuidadores. Nós precisamos... Há uma política de cuidados sendo descrita pelo Governo Lula, mas é preciso que essa política avance para chegar a quem mais precisa, inclusive com políticas públicas como a de sua lavra, Senador, em relação ao benefício de prestação continuada. O senhor tem um projeto de lei que justamente visa a ampliar esse acesso para pessoas com transtornos do espectro do autismo para que a gente possa, enfim, dar uma segurança àqueles que exercem o cuidado. E muitas pessoas inclusive questionam: "Mas por que se fala só dos pais e das mães? Por que não da pessoa com autismo?". Porque a gente precisa entender que muitas dessas pessoas com autismo, até que elas alcancem a maioridade, serão representadas pelas suas famílias, elas terão nas suas famílias o seu principal porto seguro e as possibilidades de avanço. E, fora isso, nós também precisamos lembrar que muitas dessas pessoas com autismo mesmo quando atingem a maioridade ainda dependem dos cuidados. Esses cuidados eles vão se estender por toda a vida. Portanto, ter a sério uma política de cuidados nesse país é algo necessário para que a gente avance nessa política.
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E, por fim e não menos importante, nesse tripé que todos nós que trabalhamos com a área de políticas públicas e que lutamos por direitos sabemos que é necessário, que é a saúde, a assistência social e a educação, eu quero novamente falar da importância do Parecer Orientador nº 50, do Conselho Nacional de Educação. Eu tive a honra de contribuir ao lado de pessoas que lutam há muitos anos para ver a educação efetivamente acontecendo, através do trabalho que é realizado pela universidade a qual eu represento, a Universidade Federal Rural da Amazônia.
Nós queremos novamente, assim como o meu amigo Edilson falou, convidar todos à leitura desse documento. Esse documento é um documento denso, ele tem mais de 80 páginas. Para que nós tenhamos um comparativo, o último documento emitido pelo Ministério da Educação que fala sobre uma política para atendimento de estudantes que são pessoas com autismo data de 2013 e ele tem quatro páginas. Então, de quatro para oitenta, é claro que nós temos muita coisa para conversar, nós temos muita coisa para trabalhar, nós temos muita coisa para avançar juntos, mas é essencial que a gente tenha o comprometimento de saber aquilo que nos une. É preciso que a gente avance nessas políticas públicas não somente para dizer aquilo que é preciso avançar do ponto de vista orçamentário, mas aquilo que tecnicamente poderá fazer a diferença na realidade desses estudantes.
Uma preocupação muito profunda que nós tivemos, e ainda em respeito à época da pandemia, porque... Para as pessoas que sempre nos perguntam: "Por que o parecer orientador falar tanto de práticas baseadas em evidência?", é porque nós temos memória. Não faz nem quatro anos que todo o Brasil discutia a importância da ciência para salvar a sociedade, discutíamos sobre a importância de que as vacinas, de que o conhecimento científico fossem valorizados, de que fosse produzida ciência para que as políticas públicas fossem implementadas. E é dessa história, é dessa memória que o parecer orientador se baseia em políticas, em práticas com evidência científica para apontar um caminho. Além disso, nós acreditamos que, sem a ciência, Senador, nós não teremos nenhuma chance. Eu quero dizer para vocês que não é uma escolha hoje acreditar na ciência, é a nossa única oportunidade: ou fazemos ciência e políticas a sério nesse país, ou nós não conseguiremos avançar nem um milímetro no processo de inclusão.
Então, ficam aqui as minhas palavras e o meu pedido público novamente ao Ministro Camilo Santana: Ministro, por favor, homologue o Parecer nº 50. Esse é um pedido de toda a sociedade, esse é um clamor das redes, esse é um clamor dos pesquisadores, esse é um clamor daquelas pessoas que são comprometidas com a causa da educação inclusiva no nosso país. Se esse parecer for homologado, é muito importante lembrar que ele será sempre um parecer orientador. Nós sabemos dos desafios. É claro que aquilo que é implementado em plena Transamazônica nem sempre será idêntico ao que é implementado numa capital do país, mas é importante que a gente tenha um caminho, a gente tenha um norte, a gente saiba qual o caminho que a gente deve trilhar.
Para finalizar as minhas palavras, Senador, eu gostaria de lembrar um período muito significativo da nossa história. Ontem, dia 31 de março, se comemora a importância da democracia neste país, se lembra da importância do direito à memória e à verdade. Eu quero dizer, para finalizar as minhas palavras, da importância de participação de todos. Quero dizer que, em que pese alguns movimentos e algumas pessoas, muitas vezes, tentarem silenciar a voz de pessoas com autismo e de suas famílias, este é um país democrático, esta Casa é democrática. Não haverá nenhum autista que voltará para casa sem seu direito de fala resguardado, nenhuma família terá o seu direito de fala retirado.
Nós continuaremos lutando juntos, porque nós acreditamos que é com democracia, conhecimento e ação que nós vamos mudar essa realidade.
Muito obrigada, parabéns a todos nós. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Muito bom, Flávia Marçal. Parabéns pela exposição.
Quero destacar a presença no Plenário também da Presidente da União Brasileira das Associações de Musicoterapia, a Sra. Marly Chagas - está lá a Marly, também um projeto de lei foi aprovado no Senado duas semanas atrás - e também da Elaine Cristina, que é Presidente do Projeto Incluir Valparaíso, em Goiás - está lá no fundo também. Sejam muito bem-vindas! (Palmas.)
Passo em seguida a palavra à Sra. Érica Fernanda Ursulino Lemos, que é também mestre em Psicologia Educacional, pós-graduada em Neurociências Aplicada à Educação e Transtornos Psíquicos da Infância, Autismo, TDAH e Dislexia, também especialista em Autismo e Educação Especial, mãe atípica e militante na causa PCD, colunista do jornal Correio Paulista. Atualmente trabalha na Gerência do Atendimento Educacional Especializado, da rede municipal, na Secretaria de Educação de Osasco, São Paulo.
Seja muito bem-vinda, Érica. Com a palavra.
A SRA. ÉRICA FERNANDA URSULINO LEMOS (Para discursar.) - Muito obrigada. Quero agradecer primeiramente ao Presidente e requerente desta sessão, Senador Flávio Arns.
Eu sou Érica Lemos. Vou me apresentar, me autodescrever, para garantir a inclusão de quem não está presente nas redes sociais e mesmo do deficiente visual: eu sou uma mulher preta, estrutura mediana baixa, cabelos curtos acima do ombro e estou vestindo um terno azul-claro.
Eu estive aqui presente em 2019, na Comissão de Direitos Humanos, presidida pelo Senador constituinte Paulo Paim, há cinco anos. E eu gostaria muito de trazer hoje, depois de cinco anos, Senador, notícias boas, de falar que é claro que a gente teve avanço - tivemos, sim. Na minha rede de ensino, por exemplo, onde trabalho, são 68 mil alunos, 150 escolas, 8 mil professores, e nós tivemos avanços, sim, consideráveis: nós tivemos a municipalização da lei federal, Lei Romeo Mion, da carteirinha de identificação do autismo; nós temos o Decreto Municipal 12.891, de uma semana de conscientização, instituído pelo Prefeito - esta semana, do dia 2 ao dia 6, estaremos em todas as escolas articulando esse decreto, trazendo à conscientização. É muito bom ver políticas públicas sendo implementadas, mas, no dia 2 de abril, o Dia Mundial da Conscientização, a gente não quer só trazer visibilidade para o autismo, porque todos têm, todo mundo aqui tem uma criança, um parente, um aluno... O número trazido pelo CDC americano era de 1 para 36 no ano passado, em 2023 - já se fala em mais -, 1 para 36 nascimentos de TEA.
Eu sou mãe de autista. Meu filho tem 20 anos, um autista nível 1 de suporte, altamente funcional, trabalha, vaga PCD, mas nem sempre foi assim. Ele foi diagnosticado aos três anos, nível 2 de suporte. Eu sei o que é estar dentro da estatística de ser mãe solo e correr atrás do diagnóstico, nunca num único lugar, mas correndo atrás. Enquanto em outros países, nos Estados Unidos, por exemplo, o atendimento vai in loco na casa da criança e acompanha toda a rede de cuidadores, aqui a mãe tem que pegar ônibus, se transportar, ir até os equipamentos públicos, quando encontra. Fora o convênio, porque não é mais vantagem nenhuma hoje ter o convênio, como a nossa Deputada falou. A gente tem sofrido aí cerceamento de direitos, tendo a deficiência, a condição do autismo comparada a uma doença como o câncer, por exemplo, que nada tem a ver quando a gente fala da complexidade do autismo.
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Hoje eu não estou aqui falando como mãe. Eu quero representar a área da educação, que é uma das mais atingidas. Eu venho falar e representar os professores que estão sofrendo com a síndrome de burnout, que estão se afastando. E muitas dessas professoras também são mães de autistas ou tem um sobrinho autista. E elas se veem em uma situação, eles se veem em uma situação desumana em sala de aula.
Quando falamos de movimento de inclusão, nós temos aí os inclusionistas totais, lá de 2008, quando a política nacional, na perspectiva inclusiva, determinou que fossem excluídas as salas especiais, as escolas especializadas, e que todos deveriam fazer parte da escola regular de ensino. Realmente, a escola é para todos, isso é um direito constitucional; mas nem todos são para essa escola que nós temos hoje, infelizmente.
Eu estou falando de práticas baseadas em evidência - novamente a gente precisa falar isso. Nos Estados Unidos, há punição para os gestores públicos que usam o recurso, o dinheiro público sem efetivação científica. Lá existe um princípio de economicidade do Estado, e alguns órgãos reguladores, como o National Autism Center, o National Clearinghouse on Autism, falam que não há inclusão sem capacitação, não existe inclusão sem capacitação.
Então, esse professor de sala de aula hoje é tão vítima quanto as crianças, os próprios alunos autistas, porque eles se deparam com criança de nível 1, 2 e 3 de suporte em escola em tempo integral. Ora, como é que essa criança tem condição de acompanhar uma escola em tempo integral se ele precisa fazer, no contraturno ao horário escolar, as terapias? Mas que terapias, já que o Sistema Único de Saúde não contempla?
Essas crianças estão desreguladas. Esses professores estão ficando doentes e solicitando afastamento. E não se trata de má vontade, não se trata de não ter amor no coração. É uma visão muito romantizada essa. O professor precisa de capacitação, precisa de recurso, precisa de apoio especializado.
A própria Lei 12.764, de 2012, garante o direito do autista a um acompanhante especializado. Agora, eu pergunto: quem é esse acompanhante especializado? Quem determina a necessidade dessa criança de ter um acompanhante especializado? É a família? É o sistema? É o médico?
A visão do Brasil é a visão biomédica, uma visão ultrapassada. A gente tem que falar de visão biopsicossocial, da equipe multidisciplinar presente nas escolas: saúde, educação e assistências atuando juntas.
O Brasil é hoje o país que mais tem legislação acerca da inclusão. É lindo de se ver. A gente tem a Lei 13.146, cujo art. 28 fala dos quatro princípios: o acesso - não se pode negar matrícula, porque é crime -; a permanência, mas as crianças não ficam em tempo total na escola, o horário é reduzido, porque a própria criança não tem tolerância, e os professores não conseguem dar aula; a participação; e a aprendizagem. Esses são os quatro princípios compostos na Lei 13.146 (LBI), art. 28, no entanto a gente não consegue dar conta dessa demanda.
E eu não estou defendendo como mãe; eu estou falando como professora que sou - eu sou professora e tenho acompanhado o sofrimento das escolas e desse profissional.
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A gente tem, por exemplo, em países como a Finlândia e mesmo nos Estados Unidos, uma proposta de salas de transição. Recentemente, em nosso município, fizemos uma conferência intermunicipal com 13 municípios da macrorregião para discutir como a criança com autismo nível 1, nível 2 e nível 3... Porque não é porque é nível 1 que é menos autista. O nível 1 tem tanta especificidade e necessidade quanto os níveis 2 e 3.
As pessoas têm uma ideia, tem uma crença de que o nível 1 precisa ficar invisibilizado na escola porque ele é quietinho, não dá trabalho, não tem crise - isso quando a gente ouve crise, não é? Pior é quando a gente chega na escola e ouve surto. Então, é importante saber que o autista de nível 1 de suporte precisa tanto de adaptações curriculares, de adaptação de horário, de um plano educacional individualizado como os níveis 2 e 3 de suporte, porque esses sofrem mais e estão, de certa forma, invisibilizados não somente na educação e na saúde pelo poder público. Autismo, hoje, Senador, é questão de saúde pública, não dá mais para falar de visibilidade, não dá mais para falar de legislação. A gente precisa de política efetiva, política pública educacional efetiva, e a gente precisa ser mais duro com relação a isso.
Desde 2001, foi aprovada uma lei nos Estados Unidos com a utilização de prática baseada em evidência com o tema "Nenhuma criança deixada para trás". E é muito bonito de se ver: nenhuma criança! Mais do que dizer que a escola é para todos, é entender que nenhuma criança pode ser deixada para trás, independentemente de ela ser uma criança autista, com deficiência visual, auditiva, com síndrome de Down, preta ou pobre. Nós estamos falando de todas as crianças.
A gente costuma dizer assim: o autismo é uma vítima perfeita para o bullying no Brasil, porque é uma deficiência oculta, não é visual. Se a criança não tem o cordão que a identifica, é uma vítima perfeita e vai sofrer com a intenção de ofensa dos colegas e da sociedade porque ela não se comunica, porque ela não olha nos olhos, porque ela tem estereotipias. E a gente vê essas crianças sofrendo e indo para outra estatística muito triste. A expectativa de vida do TEA na vida adulta é de 16 anos a menos da de uma pessoa neurotípica.
Este dado é um dado importante a se trazer: enquanto, nos Estados Unidos, uma pessoa neurotípica vive 72 anos, uma pessoa com TEA vive 36; enquanto, na Suécia, uma pessoa neurotípica vive 70 anos, uma pessoa com autismo vive 54. Ou seja, por que as causas de morte são precoces? Porque eles têm 40 vezes mais chances de sofrer acidentes graves envolvendo afogamento, atropelamento, asfixia, porque eles têm de duas a quatro vezes maior exposição à depressão e porque eles são nove vezes mais expostos a ideação suicida. Quanto mais o nível de suporte for leve, nível 1 de suporte, mais ideação suicida. Esses dados, é claro, não são notificados pela OMS, mas estão aí. A gente vê muitas mães de autistas sucumbindo, mães solo, famílias de autistas sofrendo, a família toda sofre.
A gente tem que pensar que não é só a criança, a gente tem que pensar que, em termos de voto de eleitores, uma família, uma comunidade autista traz muitos votos. Está na hora de pensar que a política pública tem que começar lá no município.
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Eu acho que a esfera federal tem que entender, trazer para a discussão - não uma discussão moral, mas uma discussão epistemológica - prática baseada em evidência, capacitação profissional, e trazer também a questão de que não dá para a gente viver essa utopia da inclusão total; não dá. Porque é bonito de se falar "toda criança na escola regular", mas essa escola regular não tem acessibilidade. E não é só acessibilidade arquitetônica, construção de rampa, eu estou falando do intérprete de libras, eu estou falando do piso tátil, eu estou falando do Decreto 6.949, de 2009 - não é isso? -, que fala das adaptações razoáveis de pequeno e grande porte.
Mas eu não trago somente reclamação nem queixumes. Eu trago também, Senador - e apresento para vocês hoje -, um projeto de lei que institui o Programa Nacional de Incentivo à Capacitação Técnica para o Atendimento e a Assistência às Pessoas com Deficiências na Área de Reabilitação, Inclusão Escolar e Assistência Social. Os dados são de 2020 e trazem, pelo Crefito, que nós temos registrados no sistema 17,5 mil terapeutas ocupacionais no Brasil. Ora, gente, 17,5 mil! Em São Paulo, 6 mil terapeutas ocupacionais. A gente não tem demanda para atender a criança com TEA. O terapeuta ocupacional, o fisioterapeuta, o cuidador, eles precisam de um incentivo para poderem fazer cursos de graduação, pós-graduação lato sensu, para poderem se especializar e dar conta dessas crianças.
Essas são as minhas palavras, e eu espero ter deixado o meu recado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Agradeço, Érica Lemos. Permita-me, você trouxe o projeto de lei. Já apresentou aqui? Gostaria de deixar aqui com a Mesa?
A SRA. ÉRICA FERNANDA URSULINO LEMOS (Fora do microfone.) - Sim, claro. Quero entregar em mãos.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Então... (Pausa.)
Isso.
Você quer vir aqui também? (Pausa.)
Muito bem.
A SRA. ÉRICA FERNANDA URSULINO LEMOS (Fora do microfone.) - Espero que...
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Vamos aqui só mostrar para a TV Senado também que o projeto de lei está sendo entregue, para que nós prestemos contas depois, da discussão e dos encaminhamentos.
A SRA. ÉRICA FERNANDA URSULINO LEMOS (Fora do microfone.) - Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Obrigado, Érica.
Quero destacar, antes de passar a palavra à Priscilla, a presença do Leandro Brito Lemos, que é assessor especial da Casa Civil da Presidência da República. O Leandro está aqui na frente. (Palmas.)
Seja muito bem-vindo também.
Passo, em seguida, a palavra à Sra. Priscilla Silva Damasceno, que é servidora desta Casa Legislativa desde 2010, mãe de duas crianças com autismo e representante do Grupo SenAutismo, que é um grupo criado em 2016 e que atualmente conta com 28 membros; entre eles, servidores, servidoras que estão dentro do espectro autista e também servidores que são pais e mães - conforme relatado -, tios, tias de pessoas com TEA do Senado Federal.
Com a palavra, Priscilla.
A SRA. PRISCILLA SILVA DAMASCENO (Para discursar.) - Obrigada. Bom dia a todos.
Eu faço a minha descrição: eu sou uma mulher branca; eu trajo um blazer branco e um vestido preto; eu possuo... (Pausa.)
Mamãe...
Eu porto o crachá do autismo.
Queria agradecer, primeiramente, o convite do Senador Flávio Arns. O nosso grupo é um grupo, então, formado por servidores do Senado. Como bem disse o Senador, somos tanto servidores dentro do espectro autista como também servidores que são pais e mães de pessoas autistas.
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Eu, particularmente, sou uma autista nível 1 de suporte, eu possuo dois filhos nível 2 de suporte e sou casada também com um autista nível 2 de suporte. A gente brinca que a nossa casa é 100% autista.
Eu aqui venho trazer, então, uma mensagem do nosso grupo, que peço licença para ler, o.k.?
O diagnóstico de autismo é o início de um processo de autodescoberta, mas também da descoberta de outras pessoas com dificuldades, necessidades e anseios semelhantes. Assim, nasceu o Grupo SenAutismo, formado por servidores do Senado. Entre nós, temos adultos no espectro e pais e mães de autistas.
Com a descoberta do autismo, descobrimos que autistas podem estar em qualquer lugar, até no quadro de servidores do Senado. Eu tenho a honra de estar aqui hoje, particularmente, porque eu sou chão de fábrica desta Casa. Há quase 15 anos, sou servidora concursada do Senado.
Infelizmente, com o autismo, descobrimos que a sociedade em geral ainda não está adequadamente preparada para acolher os autistas com suas características peculiares. Descobrimos também que a oferta de diagnóstico e tratamento adequado do transtorno do espectro autista é bastante limitada até mesmo para pessoas com acesso a bons planos de saúde e consultas particulares - o que dirá, então, para a grande maioria da população que depende do Sistema Único de Saúde?
Eu peço licença para falar da nossa história, da minha casa. Nós, eu e meu marido, só tivemos o diagnóstico após o diagnóstico dos nossos filhos. Imagino que isso seja algo muito comum, principalmente para adultos nível 1 de suporte até nível 2, como é o caso do meu marido, de perceber nos nossos filhos as características e também perceber em nós mesmos. Mesmo a nós, que somos privilegiados e que temos acesso a convênios e consultas particulares, o quanto demorou para esse diagnóstico chegar - nós tivemos o diagnóstico por volta dos 40 anos apenas.
No momento, porém, estamos descobrindo o poder da união de propósitos em torno de objetivos comuns. Nosso grupo abriu interlocução com a administração da Casa e temos sido ouvidos e atendidos, na medida do possível, em demandas administrativas.
Estamos à disposição para acolher outros servidores que descubram o espectro autista tanto em si quanto na sua família e, além disso, desejamos também contribuir com o Senado na sua missão institucional de efetivar os direitos dos cidadãos no espectro com o olhar preciso que só quem vive o autismo no seu dia a dia pode ter.
E eu fecho essa fala dizendo que... Não falo, obviamente, o nome de todos os autistas, mas a nossa percepção é a seguinte: o que nós queremos é que as nossas potencialidades possam ser atingidas, que a gente tenha essa possibilidade de dar o nosso máximo. E é o que eu desejo para todo mundo nesse dia.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Agradecemos à Priscilla Silva Damasceno, até apontando essa alternativa para que ela possa ser replicada em assembleias legislativas, em tribunais de Justiça, tribunais de contas, para identificar e apoiar, a própria instituição apoiar. Parabéns pelo trabalho!
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Passo, em seguida, de maneira remota - teremos mais duas falas, agora uma fala, depois um vídeo no encerramento -, à fala da Sra. Érika Karine Rocha Dallavechia, que é fundadora, Presidente do Projeto Social Angelina Luz e Coordenadora do Movimento Orgulho Autista Brasil, no Estado do Rio Grande do Sul - Moab/RS.
Seja muito bem-vinda, Érica Dallavechia. Com a palavra.
A SRA. ÉRIKA KARINE ROCHA DALLAVECHIA (Para discursar. Por videoconferência.) - Bom dia a todos e a todas.
Primeiramente, eu quero agradecer ao Senador Flávio Arns pelo convite de estar presente nesta sessão especial em que falamos sobre o transtorno de espectro autista. É um prazer poder compartilhar dessa mesa tão potente com ativistas tão fervorosos.
Eu me chamo Érika Rocha, sou mãe atípica de uma menina com autismo, níveis 2 e 3 de suporte. Moramos aqui no Município de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Sou Presidente do Projeto Social Angelina Luz e Coordenadora do Moab/RS. Eu quero me descrever também: sou uma mulher branca, de 1,76m, de cabelos loiros, estou usando óculos e vestindo a camiseta do projeto que tem a nossa logo.
Ouvindo as falas da Andréa Werner, do Presidente Edilson e de todos que aí na mesa estão, eu me sinto reflexiva e faço da palavra de todos eles as minhas também.
Eu queria hoje pontuar a respeito dos autistas sem oralidade, sem a fala funcional, assim como o filho da Andréa Werner, assim como a minha filha Angelina e assim como muitos autistas que não possuem a oralidade. Eu questiono sempre que nós temos, sim, que ter um grande cuidado e uma implementação da comunicação alternativa para essas pessoas, para essas crianças dentro das escolas poderem se comunicar, porque a comunicação vai além das palavras, e nós não podemos seguir calando e tirando, não dando acesso de comunicação para esses autistas, para essas pessoas. Nós precisamos urgentemente que, não apenas nas escolas, mas em todos os lugares, nós tenhamos o acesso à comunicação alternativa. Uma criança dentro de uma escola ou de qualquer outro ambiente que não consegue se comunicar e se fazer entender é uma criança que, com certeza, vai ter uma crise. Porque imagina a gente querendo falar, se comunicar, se fazer compreender e não ter acesso a isso. Então, é muito importante que se tenha um olhar para a implementação, para todo um cuidado de comunicação para essas pessoas. Nós não podemos seguir calando essas centenas de pessoas que não têm a comunicação funcional. Os autistas que não têm essa comunicação ficam à deriva de inúmeras, inúmeras violências.
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A gente tem um índice enorme de autistas que sofrem abusos sexuais dentro de casa, em clínicas, em muitos lugares. E, aí, eu me pergunto, enquanto mãe que fica com o coração tão apertado, porque a minha filha, ela não consegue me dizer se tem uma dor de barriga, por qual motivo ela está triste; ela não consegue me contar... E, quando chega a uma situação, porque isso existe, isso acontece muito: qual é o peso da palavra das pessoas que não se comunicam funcionalmente? Nós precisamos dar acesso para essas pessoas, porque é o mesmo - não tendo uma comunicação alternativa implementada dentro da escola, fora da escola, em todos os locais -, é como se a gente tivesse um deficiente físico que faz uso de uma cadeira de rodas, e a gente dissesse para ele: "Levanta e caminha!"; ou desse um livro para um cego, sem esse livro estar adaptado em braile e dissesse...
(Interrupção do som.)
A SRA. ÉRIKA KARINE ROCHA DALLAVECHIA (Por videoconferência.) - ... para uma educação inclusiva.
Foi falado a respeito dos monitores, o que é essencial. O que nós temos hoje nas escolas são pessoas com autismo, crianças matriculadas dentro do ambiente escolar - porque negar matrícula é crime -, mas são crianças que não são pertencentes a esse local, porque o estar matriculado está muito longe de ser incluído, pertencente. Seguem, ano após ano, reduções de horário; seguem as mães tendo que levar as crianças para a escola e permanecer do outro lado do portão, porque a permanência delas é de 30 minutos, uma hora, porque não se tem a capacitação e o manejo necessários para poderem incluir e fazer dessa pessoa uma pessoa pertencente àquele local.
Nós temos inúmeras leis: a LBI, a Lei Berenice Piana; aqui no Rio Grande do Sul nós temos a Lei Gaúcha Pró-Autismo, leis municipais. A nossa estadual diz quem é esse professor de apoio, e ali diz que é um profissional devidamente capacitado. O que nós temos - a realidade hoje - é a falta total desse profissional de apoio; é uma sala de aula lotada com professor regente, que tem que dar conta de toda a turma e dar conta de incluir uma, duas, três crianças de inclusão numa sala de aula; é a falta de sala de recurso; é o não acesso ao PEI, aos materiais adaptados.
Então, hoje a educação inclusiva tem e precisa caminhar, mas não em lentidão, não engatinhando e não mais num passinho de cada vez. Nós precisamos capacitar todos e, principalmente, que esses profissionais, monitores - que agora são agentes de inclusão -, sejam pessoas que tenham uma capacitação para poder lidar adequadamente com as crianças autistas e as demais crianças com deficiência dentro do âmbito escolar.
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A gente sabe também que uma criança... Falando das pessoas em vulnerabilidade social, e eu me incluo nessas pessoas porque, sim, eu sou uma mãe solo, eu sou uma mãe periférica, eu sou uma mãe que depende, sim, do Sistema Único de Saúde, minha filha hoje vai fazer oito anos em maio e é uma criança que nunca teve acesso às intervenções terapêuticas pelo Sistema Único de Saúde, e isso é uma realidade em massa. Uma criança sem terapia e intervenção é uma criança que dentro da escola também vai ser complicado... O triângulo saúde, escola, assistência social, com a família junto, incluída, fazendo parte desse contexto, é a única forma de avançar, de incluir e de não fantasiar uma educação inclusiva que, na verdade, quem está lá na ponta da corda, quem vivencia sabe que não chega.
Todos os anos as mães vêm adoecendo - sim, adoecemos -; muitas famílias em depressão; muitas mães, se suicidando, porque a pior dor de uma mãe é gritar, bater em todas as portas, e não é para pedir favor, é para pedir acesso a direitos, direitos constitucionais, direitos humanos, porque, antes de qualquer diagnóstico, de qualquer CID, nossos filhos são seres humanos e eles merecem respeito.
Eu tenho aqui comigo... Muitas pessoas acham que o meu ativismo chegou junto com a minha filha, e isso não é verdade. Eu tenho comigo um menininho que hoje tem 18 anos, o Denílson, que eu carreguei no colo, que é uma pessoa autista, com síndrome de Down, com epilepsia. Ele nunca teve acesso a intervenção terapêutica. O Denílson conseguiu frequentar a escola com 13 anos de idade e, agora, com 18 anos, ele fez em fevereiro, foi totalmente desligado do Sistema Único de Saúde, sem acesso à única coisa que ele tinha: um psiquiatra e um neurologista. O Denílson, assim como milhares de autistas que estão fora do radar, em prisão domiciliar, esquecidos, negligenciados ... Nós precisamos ter um olhar urgente também para essa parcela da população, que está em vulnerabilidade social. Eles precisam ser acolhidos e essas mães precisam ser cuidadas.
(Interrupção do som.)
A SRA. ÉRIKA KARINE ROCHA DALLAVECHIA (Por videoconferência.) - Sobre o auxílio para as mães atípicas de autistas nível 3 de suporte, em que não consta na Certidão de Nascimento o nome do genitor, isso é uma divisão na comunidade autista que não pode acontecer, porque, eu digo para vocês: quantos autistas órfãos de pais vivos nós temos? Quantos autistas cujo nome do genitor consta na certidão, e é apenas isso? Eu queria pedir um olhar referente a esse projeto de lei, para que não aconteça divisão dentro da comunidade, porque, sim, as mães com autistas nível 1 de suporte, nível 2 de suporte precisam também, tanto quanto as mães de crianças nível 3 de suporte. Nós precisamos ser acolhidas num todo.
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Então, esse é o meu pedido, isso é o que eu deixo aqui hoje: que as pessoas em vulnerabilidade social, as pessoas de comunidades, as pessoas periféricas, que elas sejam enxergadas, e não ignoradas. Que essas mães sejam realmente cuidadas, acolhidas e abraçadas, porque ninguém doente cuida de ninguém. Nós precisamos estar bem para cuidar de alguém.
Em pleno 2024, parece que estamos todos dentro de uma canoa, com muitos braços fortes remando, e essa canoa faz círculos, e a gente não sai do lugar. Sim, muitos projetos de lei, muitas leis vieram, sim, mas a gente precisa que, para além, sejam implementadas, que saiam da teoria para a prática, que a gente que está lá na ponta da corda tenha acesso.
Minha filha foi diagnosticada com um ano de idade. Se a minha filha tivesse tido acesso desde o diagnóstico, ela, com certeza, hoje estaria voando. E assim o é: os autistas desassistidos, negligenciados, esquecidos, e as mães adoecendo sem uma mão estendida, sem um olhar.
Precisamos fazer com que as leis sejam implementadas, que cheguem e acolham a todas essas pessoas.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Muito bem!
Agradecemos a você, Érica Lemos... Não, Érika Dallavechia. A Érica Lemos já tinha falado, já tinha entregado o projeto de lei inclusive.
Agora nós vamos passar...
À Erika Dallavechia, inclusive, agradeço de novo, porque tem participado de muitas iniciativas aqui no Senado Federal relacionadas ao tema. Parabéns pelo trabalho! Que deixemos de remar e fazer círculos com o barco. Concordo amplamente com o que você colocou.
Passamos, em seguida, a um vídeo com depoimento importante da Dra. Caroline Souza, que é a última exposição. A Caroline Souza é pedagoga, influenciadora digital e pessoa com autismo. Caroline, é Carol. Eu tenho uma filha chamada Caroline também, e a gente a chama de Carol. A Carol utiliza a comunicação aumentativa e alternativa, que é um conjunto de ferramentas e estratégias que o indivíduo utiliza para resolver os desafios de comunicação do cotidiano.
Então. Com muita alegria - vai ser um depoimento importante - peço que o vídeo possa ser apresentado.
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(Procede-se à exibição de vídeo.)
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O SR. PRESIDENTE (Flávio Arns. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - PR) - Quero lembrar que a Caroline de Souza, que teve o vídeo apresentado, como ela falou, é autista de nível 2 de suporte. É formada em pedagogia, criadora do canal @carolsouza_autistando, no Instagram, em que compartilha as suas experiências e informações sobre autismo. A Carol, como já dito, utiliza comunicação aumentativa e alternativa, um conjunto de ferramentas que ajuda quem tem dificuldade em se expressar oralmente por meio de aplicativos para tablets, pranchas impressas e imagens associadas a palavras.
Eu quero dizer que eu também, pessoalmente, fiquei muito impressionado com o vídeo que Caroline produziu especialmente também para esta sessão especial.
Ao chegarmos perto do encerramento da sessão especial, eu já gostaria de pelo menos dar três encaminhamentos.
O primeiro deles: recebemos o projeto de lei já colocado pela Karine também... Desculpe, pela Érica, não pela Karine; pela Érica Lemos. Vamos dar seguimento para que seja apreciado também, em primeiro lugar, pela consultoria, para que a gente possa discutir e ver se existe a necessidade de alguma adaptação ou não para que possa ter tramitação no Senado.
O segundo objetivo é todos nós que participamos desta sessão especial assinarmos um documento para que o Ministro da Educação, Camilo Santana, homologue o Parecer nº 50 do Conselho Nacional de Educação, que é muito importante, como já foi bem ressaltado nas exposições. E o Ministro Camilo Santana é uma pessoa extremamente sensível, ponderada, dialoga, escuta. Estão aqui presentes o Assessor Especial da Casa Civil, que já se prontificou a trabalhar nesse sentido, e também o assessor da Ministra da Saúde. Também estava presente o José Roberto, assessor do Ministério da Educação. E a própria Comissão e o próprio Plenário podem fazer este encaminhamento de homologação do parecer de 80 páginas, ao contrário de quatro páginas, como foi dito. É algo orientativo, é o caminho orientativo, para que o Brasil saiba o quê, como, de que maneira, como é que o resultado pode ser feito.
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E o que foi, assim, bastante discutido foi também que as leis existem, e esse é o parecer inclusive da Consultoria do Senado, quando as demandas foram trazidas. As demandas já estão previstas em lei, o que é necessário é fazer com que a lei seja cumprida, quer dizer, temos as leis, temos tudo, mas precisamos ter efetividade.
Então, nesse sentido, nós, inclusive, já discutimos também, o Edilson, do Moab Brasil, sugeriu que fosse criado um observatório no Senado Federal. Então, essa ideia já está acolhida por esta sessão plenária, mas é importante que o Moab também oficie para o Senado Federal, para que tenhamos o documento de um observatório no Senado Federal para acompanhar o cumprimento, a efetivação, a transformação da legislação aprovada em ações efetivas. Aliás, até eu diria todas as legislações, porque há muita Assembleia que aprova, por exemplo, acessibilidade física, e a pessoa não consegue chegar ao banheiro, tem um degrau, tem a rua, quer dizer, de uma maneira geral, mas nós estamos aqui falando especificamente do transtorno do espectro autista.
Espero que todos tenham entendido, ao final desta sessão especial, a composição de duas mesas. A primeira, com as crianças e adolescentes, no sentido de apontar para que essas crianças e adolescentes e as futuras crianças e adolescentes não sintam os obstáculos, as dificuldades que os adultos, que as pessoas que estão trabalhando na área, necessitando de apoio na área estão sentindo hoje em dia. Que haja mais esperança, mais ação, mais efetivação, uma união, como foi dito, de todas as pessoas a favor do que a área necessita.
Então, eu quero, em meu nome e dos demais Senadores e Senadoras - e podem ter absoluta certeza de que existe solidariedade nesta Casa em relação à área -, agradecer a presença de vocês, me permitam chamar assim, expositores e expositoras, crianças e adolescentes, todos que estão aqui no Plenário, todos e todas vocês que nos acompanham pelo Brasil. Agradeço e ressalto que o Senado Federal está sempre de portas abertas e continuará sendo um espaço não só de promoção de debate, mas de luta e mobilização para que possamos transformar direitos em realidade. Contem sempre com o Senado Federal.
Cumprida a finalidade desta sessão especial do Senado Federal, agradeço a todos e todas que nos honraram com sua participação. Está encerrada a presente sessão especial.
Obrigado. (Palmas.)
(Levanta-se a sessão às 12 horas e 20 minutos.)