2ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA
57ª LEGISLATURA
Em 14 de junho de 2024
(sexta-feira)
Às 10 horas
80ª SESSÃO
(Sessão Não Deliberativa)

Oradores
Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR. Fala da Presidência.) - Bom dia a todos!
Sessão não deliberativa de 14 de junho de 2024, às 10h.
Declaro aberta a sessão.
Sob a proteção de Deus, iniciamos nossos trabalhos.
A presente sessão não deliberativa destina-se a discursos, comunicações e outros assuntos de interesse partidário ou parlamentar.
Vamos passar, então, à lista de oradores.
Convido o Senador Eduardo Girão, do Ceará, para a tribuna.
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O SR. EDUARDO GIRÃO (Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE. Para discursar.) - Paz e bem, Sr. Presidente desta sessão, Senador Sergio Moro, uma das inspirações que eu tive para vir para a política, como integrante, juiz da força-tarefa da Lava Jato, que, junto com outros servidores exemplares do Ministério Público, da Polícia Federal, enfim, de instituições seriíssimas, fizeram um trabalho que lavou a alma do brasileiro. Eu sou muito grato por isso, eternamente grato por isso.
Eu quero cumprimentar as Sras. Senadoras, Srs. Senadores, funcionários desta Casa - muito obrigado -, assessores, brasileiras, brasileiros que estão nos acompanhando agora pelas lentes da equipe da TV Senado, a partir de um trabalho também muito competente da equipe da Rádio Senado e da Agência Senado.
Em primeiro lugar, eu tenho que agradecer a V. Exa. por abrir esta sessão, Senador Sergio Moro, nesta sexta-feira, um dia que não com muita frequência nós temos sessão; agradecer ao Presidente Rodrigo Pacheco por ter feito essa concessão, para que nós possamos, de forma democrática, debater sobre assuntos de interesse. Muitas vezes o que sobra para nós da oposição é o parlar, o falar, o denunciar, e fico muito grato com essa atitude democrática do Presidente Rodrigo Pacheco de abrir essa exceção para que uma pessoa que não fosse da Mesa pudesse abrir uma sessão não deliberativa, para que possamos exercer a plenitude do nosso mandato.
Eu quero aproveitar e saudar aqui pessoas que estão nos visitando neste momento: a pré-candidata a Prefeita de Canoas, no Rio Grande do Sul, Nilce Schneider, que está aqui presente; a Vice-Presidente do PL Mulher, também de Canoas, Oriana Tonetto; a Dra. Fábia Condé Della Garza, que é mineira e está aqui em Brasília, muito dedicada à educação, com equilíbrio, com serenidade, com seu filho, Bruno Guerra - sejam muito bem-vindos ao Plenário do Senado Federal.
Senador Sergio Moro, nós temos muitos assuntos que a gente delibera aqui, assuntos para debater, e esta semana foi tão corrida, tão corrida, com tantas Comissões, e a semana que vem vai ser também, mas eu não podia terminar esta semana produtiva sem falar sobre o que aconteceu lá na França. Meu discurso hoje é sobre uma questão internacional que tem me preocupado muito, porque envolve, de certa forma, não só a política francesa, como também da Europa, e os conflitos que nós temos naquela região, Rússia, Ucrânia. E não é por acaso que o senhor está presidindo esta sessão, porque esse discurso eu tentei fazer na segunda, na terça, mas aí foram chegando outros prioritários... Mas ainda bem que eu estou terminando esta semana falando do que fez o Presidente Emmanuel Macron, porque muito me preocupa não apenas o que ele fez no domingo passado, mas o que ele tem feito ultimamente, a sua postura beligerante, que não condiz com o discurso de que a gente precisa neste momento delicado da humanidade.
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Então, logo depois da derrota acachapante do Presidente da França, Emmanuel Macron, nas últimas eleições para o Parlamento Europeu, ele tomou uma atitude surpreendente, dissolvendo a Assembleia Nacional, que é o Congresso Nacional do país, e convocando novas eleições parlamentares para 30 de junho, o primeiro turno, e 7 de julho, o segundo turno. A grande vitoriosa foi a sua principal adversária, Marine Le Pen, cujo partido obteve o dobro dos votos do partido de Macron, agora, no último final de semana - não deu nem uma semana ainda.
Nessas eleições ao Parlamento Europeu, composto por representantes de 27 países, a direita foi a grande vitoriosa, o conservadorismo venceu. Com a nova composição, os Deputados conservadores de direita e centro-direita serão 402 do total de 720, num domínio inédito de 56%. Essa é uma resposta evidente da insatisfação em relação às políticas globalistas da União Europeia nos últimos anos. Além da dissolução do Parlamento francês, o Primeiro-Ministro da Bélgica renunciou ao seu cargo. A eleição mostrou um dos resultados mais significativos dos conservadores desde a fundação da União Europeia. Isso sinaliza claramente uma tendência em nível mundial - quero deixar isto claro: em nível mundial, isso é uma tendência, inclusive nós estamos vendo-a aqui na América do Sul. É o que aconteceu recentemente na Argentina e que também deve se dar nas eleições presidenciais deste ano nos Estados Unidos, com a vitória dos republicanos.
O jornal The New York Times já emitiu opinião nesse sentido. Atenção: a repercussão foi geral.
O jornalista brasileiro Jamil Chade, há mais de 20 anos trabalhando como correspondente europeu, ressaltou que - abro aspas -: "Pela primeira vez existem vozes contrárias ao projeto europeu de integração com um espaço suficiente para influenciar no futuro da agenda do bloco. [...] [Esses] resultados revelaram uma crise existencial na [...] [União Europeia], com repercussões que serão sentidas pelos próximos [...] anos".
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Essa decisão, Sr. Presidente, radical, de Macron, não chega a ser um golpe: é prevista na Constituição, porque trata de um dispositivo da Carta Magna francesa há mais de um século, mas que foi utilizado oito vezes, de forma excepcional, ao longo da história republicana daquele país. Mas é uma decisão de altíssimo risco político.
Não podemos esquecer que, na França, o seu voto é facultativo - eu acredito que o Brasil também deveria ter voto facultativo -, ou seja, são eleitores, lá na França, conscientes que se dirigem às urnas, ou seja, têm esse sentimento de cidadania. E o mais importante: diferentemente do Brasil, lá não existe um TSE, que interfere parcialmente nas eleições, comportando-se como um verdadeiro partido político. Foi isso que a gente viu nas eleições de 2022, e eu já falei dos casos escandalosos que a gente viu aqui - aqui eu já abordei esse assunto algumas vezes.
Depois de dois anos do seu mandato como Presidente, Macron já não tem maioria no Parlamento francês. Uma das reivindicações da oposição é por fim à imigração em massa, além da insatisfação crescente com as políticas econômicas.
Agora, chega um ponto que me toca profundamente a alma e que eu acho que é o princípio do fim dessa ideologia que move esse Presidente beligerante, intolerante, que é Emmanuel Macron: a defesa da vida desde a concepção, a defesa da família, que é a base de uma sociedade saudável, e o enfrentamento às drogas, à corrupção, à ideologia de gênero são algumas das principais bandeiras da direita conservadora em todos os países do mundo. Eu chamo atenção para essas bandeiras porque o Macron promulgou recentemente - ele comemorou, as imagens são chocantes da celebração - a inclusão do aborto como direito na Constituição francesa e afirmou o desejo de ver o aborto legalizado em toda a Europa.
Olha só, não sai da minha cabeça aquele momento, parece-me um pouco aquela passagem de Jesus que diz: "[eles] não sabem o que estão fazendo!", comemorando algo que o mundo todo está repensando e já começa a retroceder, como os Estados Unidos, onde o aborto era legalizado até dois anos atrás. Depois de 50 anos, com o avanço da ciência, com as estatísticas sociais mostrando que duas vidas são devastadas com essa nefasta prática, os Estados Unidos entenderam, pela Lei Heartbeat - que é "a lei do coração batendo", porque com 18 dias da concepção já tem um coraçãozinho batendo no ventre da mãe -, e já começaram a recuar com relação a isso e, em muitos estados, já é proibido.
Ele comemorou o fato - o Macron - de a França ter sido o primeiro país da Europa a não reconhecer o direito à vida do bebê no ventre materno como um direito humano universal. Que moral esse Presidente tem para falar em direitos humanos?! Que moral?! Que moral as pessoas, traçando um paralelo com o Brasil, têm para falar em direitos humanos defendendo o aborto, não visitando os presos do 8 de janeiro, não defendendo os presos como tem... Temos muitos aqui no Brasil, especialmente representantes, tanto na Câmara como no Senado, vendo a injustiça que está acontecendo: pessoas que não era para estarem no STF, porque não têm foro, sendo arroladas para lá, num sentimento de vingança, de mandar recado, desrespeitando a Constituição do Brasil.
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Olha a familiaridade, olha a sintonia negativa que tem, de algumas lideranças políticas do nosso país. Até o Presidente, que recebeu o Macron um dia desses aqui, o Presidente Lula, e as outras instituições do nosso país, estendendo um tapete para... Vocês vão ver o que ele fala sobre a guerra também aqui, qual o posicionamento dele. O Brasil é de paz. O Brasil tem uma história, na diplomacia, de imparcialidade, quando não de buscar o equilíbrio, buscar a pacificação. Essa é a história do Brasil, dos grandes diplomatas; um deles, aqui, o nosso patrono Ruy Barbosa.
Mas olha o que está acontecendo lá na França. O que foi comemorado é o direito de assassinar um ser humano indefeso e inocente, do modo mais cruel e desumano, sem direito à defesa.
A insatisfação do povo francês à política de Macron é crescente. Ele agiu como um ditador, dissolvendo o Parlamento. O tiro pode sair pela culatra, e ele pode ser esmagado pela oposição nas eleições convocadas para o final de junho. Marine Le Pen celebrou a decisão de Macron de convocar as eleições na França. Abro aspas: "Essa votação histórica mostra que quando as pessoas votam, elas vencem", disse Le Pen.
O descontentamento do povo francês também cresceu com as manifestações de Macron sobre a guerra na Ucrânia, que só fizeram aumentar as tensões mundiais. No começo do ano, ele declarou que poderia enviar tropas aliadas da OTAN à Ucrânia, afirmando, abro aspas - prestem atenção ao que ele disse -: "Qualquer coisa é possível se nos ajudar a alcançar nosso objetivo. Faremos tudo o que for necessário para que a Rússia não vença essa guerra".
Eu vou fazer um discurso, na semana que vem, sobre essa questão da Ucrânia e da guerra da Ucrânia e da Rússia, em que o Brasil tem dado um péssimo exemplo. Só recebe um lado, só ouve um lado. Ontem mesmo, o Presidente Lula falou com o Putin ao telefone; mas aqui, há meses - e eu tenho um requerimento na Comissão de Relações Exteriores, que não foi votado -, o Brasil não recebe o Presidente da Ucrânia. São dois pesos e duas medidas. É um claro alinhamento do Brasil contra a Rússia, quando nós temos, aqui no Paraná, Senador Sergio Moro, uma grande colônia de ucranianos, sobretudo no Paraná e em Santa Catarina. O Brasil está desprezando essas pessoas. O seu Presidente não está tendo a receptividade que deveria ter, equilibrada com o outro lado, que é o da Rússia. É muito preocupante essa posição beligerante desse Presidente. Ele falou muito mais coisa sobre isso, num tom desafiador, com a Rússia. Essa é a minha grande preocupação, esse tom beligerante. E você vê aqui a filosofia dessa turma - ele disse, entre outras palavras, aqui: "Qualquer coisa é possível se nos ajudar a alcançar [...] [o] objetivo", ou seja, para ele, os fins justificam os meios; os fins justificam os meios.
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O ditador Putin - outro ditador - num tom ameaçador, respondeu imediatamente à provocação do Presidente francês, olha só - abro aspas -: "Acho que tudo é possível no mundo moderno. [...] [Repito que o envio de tropas à Ucrânia significa que se estará a] apenas um passo [...] [da] Terceira Guerra Mundial [...]. Acho que ninguém está interessado nisto", fecho as aspas.
Olha só o desastre que essas falas estão acarretando. Falas de Líderes que deveriam buscar a paz, mas quem fez o primeiro passo, com a ameaça, foi o Macron. E eles se pintam de bons, de direitos humanos, de pacificadores, de defensores da paz. Tudo mentira!
É sempre bom lembrar que Rússia e Estados Unidos detêm 90% das ogivas nucleares do mundo. São 1.710 ativas e implantadas, cerca de 900 mísseis balísticos terrestres e mais de 600 mísseis lançados por submarinos. Esses arsenais bélicos têm poder para destruir todo o planeta duas vezes - duas vezes.
Encaminhando para o fim, Sr. Presidente, o fato é que o povo francês deverá se manifestar nas eleições convocadas para o final de junho e poderá comprovar um resultado que expressa o desejo por uma política que realmente leve em conta o bem-estar da população, e não os interesses das grandes corporações, de organismos internacionais e ONGs que querem impor uma agenda antivida, antifamília, que está destruindo os pilares da civilização ocidental cristã. Parece-me que, ali, a ideologia está acima da busca do bem-estar, de resolver os problemas do cidadão.
Assim como se deu no Parlamento europeu, renovado com mais conservadores, esperamos que o mesmo fenômeno ocorra nas eleições municipais deste ano no Brasil. Será uma resposta dos conservadores brasileiros, nas urnas, contra essa política perdulária, irresponsável, repressora, praticada pelo PT e seus aliados, com o vergonhoso aval do STF e de parte expressiva da grande mídia.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
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Saúdo os brasileiros que estão nos visitando aqui, na tribuna do Senado Federal. Sejam sempre muito bem-vindos aqui!
Eu fico feliz cada vez que vejo vocês nos corredores, visitando os museus, visitando o nosso túnel do tempo. Vocês são de qual estado? De vários estados, não é isso?
(Manifestação da plateia.)
O SR. EDUARDO GIRÃO (Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Bahia; Piauí, vizinho lá do Ceará; Pará; Maranhão; Rio de Janeiro; Rondônia; Rio Grande do Sul, de Canoas; Paraná... Olha aqui, tem um pessoal de Canoas que está com a gente, está aqui embaixo assistindo também. Tem do Paraná também, não é? Terra do Senador Sergio Moro, que está presidindo a sessão.
Então, muito obrigado, Senador, pela sua tolerância.
E que Deus abençoe o final de semana de todos! Sejam bem-vindos. Muita paz.
Muito obrigado.
(O Sr. Sergio Moro deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pelo Sr. Eduardo Girão.)
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Pessoal, nós estamos numa sessão não deliberativa. Hoje não tem votação aqui. É sessão de debates, sessão de discursos. Então, eu acabei de fazer meu pronunciamento, e agora quem vocês - e todos os brasileiros que estão nos assistindo e nos ouvindo pela TV Senado, pela Rádio Senado, repercutido pela Agência Senado - vão ouvir falando é o Senador Sergio Moro, do Estado do Paraná.
O senhor tem a palavra por até 20 minutos, com a tolerância desta Casa, Senador Sergio Moro.
O SR. SERGIO MORO (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR. Para discursar.) - Agradeço, Senador Girão. Não devo usar todo esse tempo.
Quero aqui, inicialmente, saudar V. Exa., presidindo esta sessão não deliberativa agora, saudar igualmente os servidores aqui da Casa, com toda a sua dedicação, e cumprimentar os ilustres visitantes, tanto os que estão aqui embaixo como os que estão ali em cima, especialmente o pessoal do Paraná, embora seja claro que temos apreço por todos do Brasil afora.
Senador Girão, esta semana ficamos com a impressão de que o Governo Lula está derretendo. E infelizmente... ou felizmente, na verdade. Infelizmente para o país, porque o pais merecia um Governo melhor, mas felizmente isso vem se sucedendo semana a semana, e isso dá maiores expectativas, esperanças de que nós possamos avançar em pautas positivas.
Mas não é sobre o Governo Lula que gostaria de falar no momento. Nós estamos aqui, no Senado Federal, sob o busto de Ruy Barbosa, que foi um grande Senador da República, foi o maior jurista brasileiro, autor intelectual da nossa primeira Constituição republicana, de 1891, advogado, candidato a Presidente - na chamada campanha civilista, contra Hermes da Fonseca - e também candidato outras vezes.
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Mas ele foi também, Senador Girão, um grande defensor da independência da magistratura, e nos deixou escrita uma das mais belas páginas da história brasileira quando defendeu o Juiz Alcides de Mendonça Lima aqui no Supremo Tribunal Federal. Tinha uma condenação injusta que havia sido exarada contra ele pelo então Superior Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Essa história é bastante pertinente no momento, e a gente sabe que existe um certo rancor atual em relação aos juízes, a magistraturas, mas é importante lembrar, como dizia o próprio grande Ruy Barbosa, que a independência da magistratura é "a alma e o nervo da liberdade". O juiz vinculado à lei, Senador Girão, é uma garantia da liberdade e dos direitos do cidadão. Podemos até discordar de decisões judiciais, o Judiciário está sujeito a crítica, mas juízes independentes e vinculados à lei são fundamentais para a nossa liberdade.
A história - vou tomar a liberdade aqui de relatar - ocorreu nos seguintes termos. No final do século XIX, os estados tinham competência para legislar sobre direito processual, ou seja, não havia um código nacional de processo civil e processo penal. E o Estado do Rio Grande do Sul, então governado pelo chamado Presidente Júlio de Castilhos - na época não era "Governador", era tratado por "Presidente" -, editou um novo Código de Processo Penal, no qual o julgamento pelo júri não era mais sigiloso. Os jurados tinham que revelar publicamente a sua posição quanto ao veredito.
Isso era um problema, Senador Girão, porque deixava os jurados à mercê das tiranias locais, dos caudilhos locais, dos poderosos locais, que, então, dominariam ali a Justiça. E a Constituição de 1891 garantia entre os direitos fundamentais a soberania do júri. E o júri, mais do que uma instituição de julgamento, é uma garantia também de o cidadão ser julgado pelos seus pares, por juízes leigos, muitas vezes menos infensos à influência do poder político.
E, num caso específico submetido ao Juiz Alcides de Mendonça Lima lá no Rio Grande do Sul, o juiz entendeu que aquela norma do Código de Processo Penal do Rio Grande do Sul era inconstitucional e deixou de aplicar a lei, exercendo aquilo que se chama de controle de constitucionalidade difuso e incidental. O Júlio de Castilhos, que era o Presidente do Estado do Rio Grande do Sul, ficou furioso e determinou, foram estas as palavras dele, que se processasse aquele "juiz faccioso". E ele foi, então, condenado no Superior Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por dois votos a um, por crime de abuso de autoridade.
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E aí vem Ruy Barbosa, que está aqui, um dos maiores juristas e políticos brasileiros, um símbolo de integridade, diplomata bem-sucedido - como V. Exa. disse, o Águia de Haia -, mas acima de tudo um defensor das liberdades aqui no Brasil. Pois bem, ele assumiu a defesa do Juiz Alcides perante o Supremo Tribunal Federal, ingressou com habeas corpus e escreveu uma das mais belas peças da nossa literatura jurídica, que qualquer um pode encontrar na internet: Posse de direitos pessoais: o júri e a independência da magistratura. E Ruy Barbosa diz, nesse texto, primeiro, que o Juiz Alcides de Mendonça Lima estava certo: era essencial à soberania do Tribunal do Júri que fosse mantido o sigilo sobre os vereditos dos jurados, para que os jurados não ficassem expostos a pressões ou retaliações dos poderosos locais.
Mas ele vai além e diz que, ainda que o juiz estivesse errado, nós não podemos criminalizar a hermenêutica, nós não podemos criminalizar a interpretação da lei, porque isso equivale a criminalizar o direito de opinião de cada cidadão. E aí nós não teríamos juízes independentes e servos da lei, mas juízes tementes à retaliação dos poderosos; juízes que ficariam sujeitos às pressões políticas para que proferissem julgamentos de interesse dos poderes políticos daquele momento. E vejam: Ruy Barbosa!
Por que eu coloco isso, Senador Girão? Infelizmente, hoje nós temos juízes no Brasil que cumpriram o seu dever e que sofrem uma tremenda injustiça, sendo tratados de maneira inadequada, às vezes pelos próprios órgãos do Poder Judiciário. Porque, quando a gente fala em independência do juiz, não é só independência frente a influências externas, mas igualmente em relação a influências internas. E nós temos pelo menos dois exemplos, que a meu ver são categóricos, de Desembargadores, pessoas honradas lá do Rio Grande do Sul, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: o Desembargador Carlos Thompson, que já foi Presidente daquela Corte, e o Desembargador Luciano Flores de Lima, que estão afastados por uma decisão administrativa do Conselho Nacional de Justiça.
Respeitamos o Conselho Nacional de Justiça, mas a função primordial do Conselho Nacional de Justiça, Senador Girão... Claro que é importante buscar uma melhor organização e regulação dos serviços judiciários, claro que é importante exercer seus poderes disciplinares. Há juízes que merecem punição: o juiz que se corrompe, o juiz que comete a peita, que era como se chamava a corrupção antigamente judiciária, mas jamais, jamais servir como uma espada em cima da cabeça do juiz que cumpre o seu dever, que é o caso desses dois Desembargadores do TRF4. Foi uma decisão por maioria, que eu espero sinceramente que o CNJ possa rever, em breve, para que esses juízes voltem à sua atividade e tenham também a sua honra pública resgatada, porque nada fizeram que justificasse esse afastamento.
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E me socorro, aqui, do voto, Senador Girão, que foi categórico, foi brilhante - à altura da defesa que fez Ruy Barbosa ao Juiz Alcides de Mendonça Lima -, do Ministro Barroso. Sei até que V. Exa. tem críticas ao Ministro Barroso, mas, nesse julgamento, ele foi brilhante, fez um voto contundente. E a principal função do Conselho Nacional de Justiça é distinguir o joio do trigo. Ele não pode servir como ameaça, como um veículo de intimidação de juízes ou um risco à independência da magistratura.
Na próxima semana, nós teremos aqui a sabatina do Ministro Mauro Campbell, lá na CCJ - um ministro honrado, com histórico profissional significativo, que vai assumir esse cargo -, e vou fazer questão de contar essa mesma história, ainda que ela leve um pouco de tempo. Isso foi em 1896, e estamos retrocedendo no que se refere às garantias e à independência da magistratura. Isso não são privilégios: não é um privilégio do juiz, um privilégio do desembargador, um privilégio do magistrado! Se nós não tivermos garantia da independência da magistratura, se nós não tivermos juízes que sejam protegidos contra a retaliação dos poderosos, quem vai ousar enfrentar esses interesses especiais contrariados? Quem vai ousar, por exemplo, ser um juiz na Operação Lava Jato, se vai ficar sujeito depois a toda espécie de retaliação?
Eu tenho a esperança de que o CNJ reveja em breve essa decisão, que foi, a meu ver, absolutamente injusta - com todo o respeito aos integrantes que assim votaram -, porque não serve o CNJ ao seu papel próprio ao cometer um erro dessa magnitude.
Também aqui registro a minha expectativa de que, nos processos administrativos abertos contra esses magistrados e contra outros magistrados que trabalharam na Operação Lava Jato - estes que não foram afastados: a Juíza Gabriela Hardt, o Juiz Danilo Pereira Júnior -, se apurem ali os fatos, porque ninguém tem receio de apuração nenhuma, e que sejam devidamente arquivados já que o que se vislumbra de pronto são acusações as mais fantasiosas que se podem conceber pela mente humana. Cogitar acusar os juízes por cumprirem o seu dever com valentia, com coragem, juízes vinculados à lei? Podemos seguir por esse caminho, Senador Girão. Por isso que eu digo aqui que, mesmo que a gente discorde de uma decisão judicial, temos que recorrer nos processos, temos que buscar enfrentá-la, reformá-la, criticá-la até - o poder político pode criticar decisões, não tem problema nenhum! Agora, utilizar o peso desvirtuado administrativo, disciplinar ou criminal contra juízes que cumpriram seu dever, juízes da Lava Jato?! E não falo isso em causa própria, sou Senador agora, não estou mais sujeito ao poder disciplinar do Conselho Nacional de Justiça, mas tenho essa obrigação de defender a magistratura, mesmo não sendo mais um magistrado, mas sabendo da importância da magistratura para a liberdade e para os direitos de cada cidadão.
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Muito obrigado, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Muitíssimo obrigado, Senador Sergio Moro, do Estado do Paraná. Parabéns pelo seu pronunciamento.
Eu fiz um discurso aqui a respeito, muito duro, há dois dias, sobre essas recentes decisões do CNJ. O brasileiro que tem condições de acompanhar - porque muitos deles que estão ali tentando levar o pão de cada dia para as suas famílias não têm como acompanhar... Cada vez mais os brasileiros têm gostado de política, têm acompanhado e estão vendo essas decisões esdrúxulas, que não se sustentam em pé, que são um ato de vingança, de revanche a serviço de poderosos. Porque a gente está vendo não apenas o que aconteceu com o Dr. Carlos Thompson e com o Dr. Luciano Flores de Lima, mas também estamos vendo o caso da Gabriela - que não se concluiu ainda, não teve o afastamento, está ainda em fase de recurso -, a Gabriela Hardt, do Dr. Danilo, que são pessoas que cumpriram o seu dever, que fizeram um trabalho pela Justiça do Brasil, um trabalho para que a Justiça seja para todos.
De onde ele caiu? Caiu do céu o dinheiro da Lava Jato? Caiu de onde o dinheiro que a Lava Jato descobriu? E os esquemas de corrupção, o petrolão? Os bilhões e bilhões que já voltaram para os cofres públicos? E outros que estão voltando? E a gente está vendo aí, nas canetadas, anulando-se julgamento, inviabilizando-se depois de... Esse dinheiro veio de onde? Ele caiu do céu? Ele estava onde? E as colaborações premiadas, as chamadas delações premiadas, cuja urgência a Câmara dos Deputados, na calada da noite, resolveu votar?
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E o senhor fez um discurso muito firme essa semana sobre a importância da delação premiada de pessoas que não estavam presas. E citou casos em que fizeram delação, lá no esquema do petrolão, e ajudaram a desbaratar isso. Quer dizer, é um instrumento importante no enfrentamento à impunidade e à corrupção neste país, que parecem ter voltado com toda a força.
E aí me lembra um pouco - eu conheço; o senhor também é um conhecedor - a questão lá da Itália, do caso da Operação Mãos Limpas, onde o crime começou a reagir e a perseguir aqueles que cumpriram a lei. É o sistema. A gente não pode aceitar o que está acontecendo com Deltan Dallagnol, outro servidor público que não tem tido paz. É uma caçada implacável contra o Deltan Dallagnol e o Juiz Bretas, do Rio de Janeiro. São nomes pelos quais a gente deveria ter o maior respeito e consideração num país de gente honesta. A maioria do brasileiro é de gente íntegra, trabalhadora, correta e que está vendo esses símbolos aqui de coragem e de cumprimento da lei sendo intimidados, perseguidos. É um momento de sombras, eu acredito, isso vai passar, mas as pessoas de bem precisam se manifestar.
Então, parabéns pelo seu pronunciamento, Senador Sergio Moro. Que o bom-senso prevaleça. Eu acredito também, porque eu sou otimista como o senhor... O senhor acredita que isso possa ser revisto no CNJ, e, por mais que se pense que não, eu também acredito na capacidade de reflexão de cada um. Já deu! Já deu! Está feio! Está feio!
Outra coisa que me deixa muito esperançoso é ver cada vez mais brasileiros... Enquanto o senhor estava falando, vieram mais dois grupos aqui nos visitar. São pessoas de diferentes estados e até de nações que vêm conhecer o Senado Federal, o Congresso Nacional brasileiro. Isso é muito bom! Nós estamos nos 200 anos desta Casa Revisora da República. Olha que honra para a gente, Senador Sergio Moro! Eu sou do Ceará, o senhor é do Paraná, e nós somos 2 dos 81 Senadores do Brasil! Por quê? São 108 milhões, e nós somos 2 dos 81. Olha que privilégio, que possibilidade boa de representar e de fazer o bem. Que oportunidade!
Neste Bicentenário, venha visitar você também aqui a Casa. É muito bom você conhecer a história. Tem museus maravilhosos com a história da República. Tem museu que mostra a tribuna do Senado quando era ainda no Rio de Janeiro. Tem muita coisa interessante para você conhecer da história aqui. Tem o Túnel do Tempo... Você vai às salas das Comissões ver como funcionam a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a Comissão de Assuntos Econômicos e as outras Comissões. É muito interessante! Venha aqui no Plenário também.
Então, para que você possa visitar o Congresso Nacional, basta acessar o site www.congressonacional.leg.br/visite. Vou repetir: você acessa o site www.congressonacional.leg.br/visite, tudo junto. Aí você marca a sua vinda para cá. É muito bom.
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Particularmente, nós gostamos de encontrar vocês nos corredores. Eu acho que é importante nós termos esta possibilidade de olhar nos olhos das pessoas que nos visitam nesses momentos em que a gente está decidindo os rumos no país.
A visitação pode ser realizada em dias úteis - exceto terças e quartas -, aos finais de semana e feriados também. Das 9h às 17h, você pode vir.
Nós vamos encerrar esta sessão.
Quero apenas convidar você, que está nos ouvindo, nos assistindo agora, pelas Rádio Senado e TV Senado: segunda-feira, mais ou menos neste horário, na verdade mais cedo, às 9h da manhã, segunda-feira que vem, dia 17 de junho, nós vamos ter este Plenário lotado, se Deus quiser. Há muito interesse da sociedade por esse assunto. Eu convido você, especialmente você. Eu sei que, dos rincões do Brasil, é muito difícil você ter condição de vir, segunda-feira, para participar dessa sessão de manhã. Eu vou explicar qual é a sessão. É muito difícil, eu sei, mas, se puder vir, venha. Agora, quem mora aqui em Brasília ou na região, até em Goiânia, se der para fazer esse esforço e vir, vai ser histórico.
Nós vamos fazer uma sessão de debates temáticos, com os dois lados presentes, sobre essa história macabra da assistolia fetal, essa decisão que suspendeu, por parte do Ministro Moraes, lá do STF, a resolução do Conselho Federal de Medicina que proibia injeção no coração de bebê para fazer aborto, injeção de cloreto de potássio, que é uma tortura, que é proibida até em animais irracionais, pelo Conselho Federal de Medicina Veterinária. Mas, nos humanos, pode, segundo essa decisão. É algo gravíssimo, que afronta - afronta! - os valores e princípios do povo brasileiro, que, majoritariamente, 85% no mínimo, é contra o aborto.
Essa medida, nós vamos debater aqui, ouvindo os dois lados, com muito respeito, para procurar compreender, para que a gente possa se mobilizar por aquilo em que acreditamos. Então, segunda-feira, dia 17 de junho, a partir das 9h da manhã até as 12h30, 13h, nós estaremos juntos. Se você não puder vir, pelo menos acompanhe, divulgue, para acompanhar essa sessão, aqui no Plenário, sobre esse tema tão importante que está angustiando muita gente. Enquanto a gente está conversando aqui, bebês estão sofrendo essa violência, e as mães também. A ciência já mostra que são duas vidas envolvidas: a da criança, que é assassinada, e da mãe, que fica com sequelas emocionais, psicológicas, mentais e até físicas com o aborto.
A Presidência informa às Senadoras e aos Senadores que estão convocadas às seguintes sessões: sessão de debates temáticos na segunda-feira, dia 17 de junho, às 9h, destinada a debater o procedimento de assistolia fetal previamente aos procedimentos de interrupção de gravidez; e sessão não deliberativa, também na segunda-feira, às 14h.
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Agradecendo a todos os membros aqui da Secretaria-Geral da Mesa, agradecendo ao Presidente Rodrigo Pacheco por esta oportunidade de estarmos sexta-feira aqui, exercendo, na plenitude, o nosso mandato, agradecendo ao Senador Sergio Moro por ter vindo aqui abrir esta sessão, agradecendo a todos vocês pela paciência e pelo interesse nas discussões nacionais, desejo, eu, o Senador Sergio Moro e os outros Senadores, com certeza, todos, um final de semana de muita luz, paz, harmonia, saúde e bençãos para você e para a sua família.
Até segunda, se Deus quiser.
Cumprida a finalidade desta sessão, a Presidência declara o seu encerramento.
Deus abençoe.
(Levanta-se a sessão às 10 horas e 53 minutos.)