2ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA
57ª LEGISLATURA
Em 17 de abril de 2024
(quarta-feira)
Às 11 horas
42ª SESSÃO
(Sessão de Debates Temáticos)

Oradores
Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG. Fala da Presidência.) - Declaro aberta a sessão.
Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos.
A presente sessão de debates temáticos foi convocada em atendimento ao Requerimento nº 238, de 2024, de autoria desta Presidência, e tem como objeto promover o recebimento, a exposição e o debate do anteprojeto elaborado pela Comissão de Juristas responsável pela revisão e atualização do Código Civil.
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Compõem a mesa os seguintes convidados: Exmo. Sr. Ministro Alexandre de Moraes, Ministro do Supremo Tribunal Federal e Presidente do Tribunal Superior Eleitoral; Exmo. Sr. Ministro Luis Felipe Salomão, Ministro do Superior Tribunal de Justiça e Presidente da Comissão de Juristas responsável pela revisão e atualização do Código Civil; Exmo. Sr. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Ministro do Superior Tribunal de Justiça e Vice-Presidente da Comissão de Juristas; Sr. Flávio Tartuce, Professor e Relator-Geral do anteprojeto; e Sra. Rosa Maria de Andrade Nery, Professora e Relatora-Geral do anteprojeto.
A Presidência informa que esta sessão terá também a participação dos seguintes membros da Comissão, que farão uso da palavra: Sr. Carlos Eduardo Elias de Oliveira, Professor, Consultor Legislativo desta Casa e Relator Parcial da Subcomissão de Direito de Contratos; Sr. José Fernando Simão, Advogado, Professor da Universidade de São Paulo e Relator Parcial da Subcomissão de Direito das Obrigações e Títulos de Crédito; Sra. Laura Porto, Advogada, Professora e Relatora Parcial da Subcomissão de Direito Civil Digital; Sr. Mário Luiz Delgado Régis, Advogado e Relator Parcial da Subcomissão de Direito das Sucessões; Sr. Nelson Rosenvald, ex-Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado de Minas Gerais e Relator Parcial da Subcomissão de Responsabilidade Civil; Sr. Pablo Stolze Gagliano, Juiz do Tribunal de Justiça da Bahia e Relator Parcial da Subcomissão de Direito da Família; Sra. Paula Andrea Forgioni, Professora da Universidade de São Paulo e Relatora Parcial da Subcomissão de Direito de Empresa; Sr. Rodrigo de Bittencourt Mudrovitsch, Vice-Presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos e Relator Parcial da Subcomissão de Parte Geral; e Sr. Marco Aurélio Bezerra de Melo, Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro e Relator Parcial da Subcomissão de Direito das Coisas.
A Presidência ressalta que a Comissão também contou com importante contribuição dos seguintes membros: Sra. Maria Isabel Diniz Gallotti Rodrigues, Ministra do Superior Tribunal de Justiça; Sr. João Otávio de Noronha, Ministro do Superior Tribunal de Justiça; Sr. Marco Buzzi, Ministro do Superior Tribunal de Justiça; Sr. Cesar Asfor Rocha, ex-Ministro do Superior Tribunal de Justiça e Presidente daquela Corte; Sr. Marcelo de Oliveira Milagres, Desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais; Sr. Moacyr Lobato de Campos Filho, Desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais; Sra. Maria Cristina Santiago, Juíza do Tribunal Eleitoral da Paraíba; Sra. Patrícia Carrijo, Juíza e Professora; Sr. Rogério Marrone Castro Sampaio, Juiz do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo; Sr. Vicente de Paula Ataídes Júnior, Juiz Federal e Professor da Universidade Federal do Paraná; Sra. Fernanda da Silva Rodrigues Fernandes, Defensora Pública; Sr. Edvaldo Brito, Vereador pelo Município de Salvador, Advogado e Professor da Universidade Federal da Bahia; Sra. Ana Cláudia Scalquette, Advogada e Professora; Sra. Angélica Luciá Carlini, Advogada e Professora; Sr. Carlos Eduardo Ruzyk, Advogado e Professor da Universidade Federal do Paraná; Sra. Claudia Lima Marques, Advogada e Professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Sr. Dierle José Nunes, Professor; Sr. Flávio Galdino, Advogado e Professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro; Sra. Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, Professora da Universidade de São Paulo; Sr. Gustavo José Mendes Tepedino, Advogado e Professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro; Sr. Jorge Miguel, Professor da Fundação Armando Alvares Penteado; Sr. Marcus Vinicius Furtado Coêlho, Advogado, Professor e ex-Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil; Sr. Maurício Bunazar, Advogado e Professor; Sr. Ricardo Campos, Advogado e Professor; Sr. Rolf Hanssen Madaleno, Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Sr. Carlos Antônio Vieira Fernandes Filho, Advogado; Sr. Daniel Carnio Costa, Advogado; Sra. Layla Abdo de Andrada, Advogada; Sra. Maria Berenice Dias, Advogada; Sra. Estela Aranha, Advogada; Sra. Judith Martins-Costa, Advogada; e Sra. Laura Schertel Mendes, Advogada.
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Convido a todos para, em posição de respeito, acompanharmos o Hino Nacional, que será interpretado pela Banda Sinfônica da Polícia Militar do Distrito Federal.
(Procede-se à execução do Hino Nacional.)
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O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG) - Eu gostaria de saudar de maneira muito especial a presença de S. Exa. o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, também Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, que hoje, nesta sessão de debates, representa o Supremo Tribunal Federal.
E peço a V. Exa., Ministro Alexandre, que transmita, em nome da Presidência do Senado, um agradecimento especial ao Ministro Edson Fachin, que contribuiu de maneira muito efetiva para os trabalhos dessa Comissão de Juristas, inclusive se dignando a participar de uma de suas audiências públicas, com um brilhantismo muito singular, contribuindo, certamente, para o trabalho da Comissão e de todos os seus membros.
É uma alegria receber o Ministro Alexandre de Moraes no Senado Federal.
Saúdo também S. Exa., o Ministro Luis Felipe Salomão, e aqui faço um especial e carinhoso agradecimento desta Presidência por sua dedicação, ao longo desses 180 dias, na Presidência desta Comissão de Juristas, emprestando toda a sua sabedoria, toda a sua experiência, todos os seus conhecimentos relacionados ao Direito Civil, para que houvesse a atualização na proposta formulada nesse anteprojeto.
Portanto, muito obrigado, Ministro Salomão, por sua dedicação, e a mesma gratidão e empenho ao seu Vice-Presidente, que também se dedicou bastante a esta Comissão, o Ministro Marco Aurélio Bellizze. Portanto, o Superior Tribunal de Justiça confere ao Senado Federal, de fato, dois de seus grandes quadros para conduzirem, como Presidente e Vice-Presidente, esta Comissão.
Saúdo os nossos Relatores Gerais, a Relatora Rosa Maria de Andrade Nery e o Relator Flávio Tartuce - este último meu conterrâneo e amigo, um grande doutrinador. Ambos se incumbiram de concatenar e organizar todas as ideias de todos os membros da Comissão, dividindo-os em Comissões Temáticas, com um trabalho que foi realmente um trabalho muito dedicado.
Faço um agradecimento muito especial a todos os membros da Comissão, todas as senhoras, todos os senhores que aqui estiveram conosco ao longo desse tempo para poder realmente conferir ao Brasil, através do Senado da República, um anteprojeto, que é a semente que se planta para poder termos a atualização do Código Civil brasileiro. E, de fato, depois de 20 anos de vigência do Código Civil de 2002, nós todos haveremos de reconhecer que esses 20 anos representaram um período muito maior, por conta de todas as transformações que o Brasil e o mundo viveram nesses últimos 20 anos, sendo obviamente muito imperioso que se inicie o debate sobre essa atualização.
Portanto, a cada uma das senhoras, a cada um dos senhores, em nome da Presidência do Senado Federal, o meu especial agradecimento.
Antes de dar início ao meu singelo pronunciamento, eu queria também registrar a presença do ilustre Deputado Federal por Minas Gerais Lafayette de Andrada, que é um notável conhecedor da matéria jurídica também e na Câmara dos Deputados desempenha um excelente trabalho; do Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Sr. Herman Benjamin; do Conselheiro Nacional de Justiça, Luiz Fernando Bandeira de Mello, egresso deste Senado Federal; representando o Governador do Estado de Rondônia, Sr. Alex Wendel; Procuradora do Ministério Público do Trabalho do Estado de Pernambuco, Sra. Janine Rêgo de Miranda; Defensor Público do Estado do Rio Grande do Sul, Sr. Rafael Raffaelli; Defensor Público-Geral do Distrito Federal, Sr. Celestino Chupel; representante do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Sra. Isabella Nogueira Paranaguá; Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil do Estado do Espírito Santo, José Carlos Rizk Filho; também da Ministra do Conselho de Estado da França, Sra. Isabelle de Silva; representante do Ministério Público do Amapá, Sr. Paulo Celso Ramos dos Santos; representante da Defensoria Pública do Estado do Pará, Sra. Anelyse Santos de Freitas.
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E também um registro muito especial. Hoje nós recebemos diversos Procuradores Gerais de Justiça dos estados brasileiros, que se reuniram pela manhã e elegeram um mineiro Procurador-Geral de Justiça de Minas Gerais, Dr. Jarbas Soares Júnior, como novo Presidente do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais. E também nós temos a honra de recebê-los no Plenário do Senado Federal nesta manhã. Portanto, meu cumprimento e meu agradecimento ao Ministério Público do Brasil, aqui muito bem representado.
Senhoras e senhores, em uma era de frequentes e profundas transformações, como a que estamos vivendo, a atualização do arcabouço legal é um imperativo. Nesse sentido, a presente sessão de debates pode ser vista como prova da nossa disposição em identificar lacunas e agir firme e rapidamente para supri-las.
Sintonizado com isso e cioso do seu papel de intérprete dos anseios coletivos, o Senado Federal decidiu promover a atualização do Código Civil. Tal reciclagem começou a ganhar forma em agosto de 2023, quando foi instituída a Comissão de Juristas responsável pela revisão e modernização do código. O colegiado foi integrado por mais de 30 grandes civilistas brasileiros e teve os seus trabalhos coordenados por S. Exa. o Ministro Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça.
Ao longo desses meses, a Comissão realizou diversas audiências públicas, ouvindo a comunidade jurídica e colhendo sugestões da população. Em paralelo, seus membros também trocaram experiências legislativas com juristas e Parlamentares argentinos. O caráter plural e diversificado dos esforços evidencia o pendor democrático da Comissão. Estou convicto de que a conformação de ambiente tão aberto ao diálogo foi fundamental para que ganhasse corpo a proposta moderna e abrangente sobre a qual esta Casa agora se debruçará.
Além dessa postura gregária e da dedicação à causa, há que se ressaltar também o lustro dos membros da Comissão. Somente uma composição com tamanha estatura poderia entregar, dentro do prazo acordado de poucos meses, o trabalho qualificado que nos é submetido nesta sessão.
Senhoras e senhores, foi sob a égide desses predicados e premissas que o colegiado concluiu, no dia 5 de abril, a votação das propostas de alteração da lei civil brasileira. Um feito. Afinal, concordamos todos que o ineditismo e a complexidade de alguns temas, a diversidade do tecido social brasileiro e a própria natureza da atividade legislativa não são desafios triviais.
Ainda assim, a Comissão não se omitiu diante de tema algum e produziu uma peça capaz de dialogar com a onda de inovações tecnológicas, mudanças comportamentais e alterações demográficas que estão em curso. É de notar as próximas etapas desse processo.
No que tange ao Senado Federal, posso dizer, sem exageros, que ganhamos uma bússola. Repito que esse tipo de normatização é tarefa extensa, sensível e delicada. Sei que nosso esforço não deixará de ser exaustivo, mas tende a ser muito mais seguro e preciso graças a esse anteprojeto.
Certamente, os Parlamentares vão trazer muitas contribuições ao texto, aprimorando, alargando, eventualmente restringindo seu alcance. Mas o fato é que a peça produzida por esta Comissão de Juristas é o alicerce a partir do qual as paredes de um Código Civil atual e moderno serão edificadas.
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Convictos da relevância de tudo que foi feito até o momento, voltemos os olhos, então, para o que está por vir, afinal, resta clara a necessidade de entregar à nação um texto capaz de acompanhar a acelerada marcha da história e de regular as suas implicações. Tal premência decorre das repentinas demandas e dos novos fenômenos com os quais o atual Código Civil vem deparando.
À guisa de exemplo, lembro que na virada do século não existiam redes sociais, que diversos direitos ainda não haviam sido institucionalizados e que os arranjos familiares oficialmente aceitos eram bastante restritos. Não é por acaso, portanto, que o anteprojeto sob nosso escrutínio contempla um livro inteiro ao direito digital, consolidando normas atinentes à já corriqueira interação no ambiente cibernético. Em outra frente, o texto procura adequar o direito da família às múltiplas manifestações afetivas e às consequências jurídicas dessas novas matrizes, um trabalho de fôlego, sem dúvida.
Minhas senhoras e meus senhores, conduzir o Brasil a uma legislação civil renovada e atualizada é o desafio que nos toca a todos. A arquitetura que buscamos precisa ser, ao mesmo tempo, ampla e detalhista, popular e sofisticada, sólida e flexível. O texto de alta qualidade aqui produzido vai garantir segurança jurídica e promover mais justiça no dia a dia de todos os cidadãos, com normas civis mais claras, modernas e efetivas. Tenho absoluta certeza de que o Senado vai se desincumbir desta atribuição com a sensibilidade e o elevado espírito público que sempre caracterizaram esta Casa.
Por tudo isso, faço uma exortação final a todos, todos que desejam contribuir para esta realização da atualização do Código Civil. Venham conhecer, venham debater, venham aperfeiçoar, sugerir, modificar, alargar ou restringir conceitos contidos no anteprojeto! Vamos dedicar nossas melhores energias a este tema!
É uma oportunidade de ouro para reafirmar o império da lei como fio condutor da nossa vida em sociedade, uma sociedade cada vez mais complexa, com novos desafios a cada dia, porém, com nosso esforço e compromisso, uma sociedade cada vez mais amparada pela lei.
Muito obrigado a todos os membros da Comissão de Juristas. (Palmas.)
Registro também a presença do Defensor Público-Geral da União, também mineiro, Leonardo Magalhães.
Seja muito bem-vindo!
Como forma de simbolizar a materialização do eminente trabalho realizado pelo Colegiado, convido S. Exa. o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão, Presidente da Comissão de Juristas responsável pela revisão e atualização do Código Civil, a proceder à entrega do anteprojeto a esta Presidência.
(Procede-se à entrega do anteprojeto do novo Código Civil.) (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG) - Registro a presença também do Deputado Federal Antonio Brito no Plenário do Senado Federal, Líder do PSD na Câmara dos Deputados, com muito orgulho do seu pai, que contribuiu muito para a Comissão de Juristas, nosso Prof. Edvaldo Brito.
Neste momento, passa-se ao uso da palavra pelos convidados.
Concedo a palavra ao Exmo. Sr. Ministro Alexandre de Moraes, Ministro do Supremo Tribunal Federal.
O SR. ALEXANDRE DE MORAES (Para exposição de convidado.) - Bom dia a todos.
Eu quero cumprimentar todos os Parlamentares na pessoa do Exmo. Presidente do Senado Federal e do Congresso Nacional, Senador Rodrigo Pacheco; cumprimentar os magistrados presentes na pessoa do Presidente da Comissão de Juristas e Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Ministro Luis Felipe Salomão; cumprimentar os membros da Comissão na pessoa da Relatora-Geral da Comissão de Juristas, a Professora de São Paulo - não mineira -, minha ex-colega no Ministério Público de São Paulo, a Profa. Rosa Maria de Andrade Nery.
Quero cumprimentar todos os senhores e senhoras e dizer da minha grande satisfação, Presidente Pacheco, de poder participar desta entrega. Eu, mesmo que de longe, acompanhei esse trabalho coordenado e comandado pelo Ministro Luis Felipe Salomão. Tivemos, inclusive com a presença de V. Exa., a possibilidade de participar de um evento onde houve diversas discussões sobre os temas mais importantes de que a Comissão tratava.
Veio em boa hora a iniciativa de V. Exa. em constituir esta Comissão para atualizar e para tratar de questões complexas que surgiram nos últimos 20 anos. Um antigo Professor de todos nós, Professor de Direito Civil, já falecido, o Prof. Junqueira, da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, dizia que o Código Civil - o direito civil - é a Constituição do dia a dia da população, que regulamenta as questões do dia a dia. Então, quanto mais moderna, quanto mais simplificada for, menos litígios vamos fazer surgir, menos problemas sociais nós vamos ter.
E há a necessidade da regulamentação de novas modalidades contratuais que surgiram: a questão de costumes, como V. Exa. bem colocou; novas relações familiares; novas modalidades de se tratar as questões do direito de família e sucessões; a tecnologia; a inteligência artificial; novas formas de responsabilidade civil. Isso é importantíssimo.
V. Exa. lembrou que na virada do século não existiam redes sociais - nós éramos felizes e não sabíamos... (Risos.)
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Há necessidade dessa regulamentação, do tratamento da responsabilidade, do tratamento de novas formas obrigacionais. Então, a Comissão fez exatamente isso.
Eu tive também, Presidente, a possibilidade de receber vários membros da Comissão no Tribunal Superior Eleitoral na semana retrasada. V. Exa. soube, de maneira ímpar, escolher os comandantes e os coordenadores dessa Comissão, tanto o Presidente, o Ministro Salomão, quanto o Vice-Presidente da Comissão, o Ministro Bellizze, que souberam reunir um time de primeira. E esse time hoje apresenta o resultado, que, sabemos nós que participamos das instituições, é um passo inicial, um passo importantíssimo inicial, para que os Parlamentares possam discutir, para que primeiro o Senado, depois a Câmara possam discutir e que a própria população possa discutir.
Parabéns à Comissão, parabéns aos seus coordenadores e, principalmente, parabéns ao Presidente do Senado, que teve essa iniciativa!
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG) - Agradeço ao Ministro Alexandre de Moraes, ao Supremo Tribunal Federal, e concedo a palavra neste instante ao Ministro Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça e Presidente da Comissão de Juristas.
O SR. LUIS FELIPE SALOMÃO (Para exposição de convidado.) - Bom dia a todos.
Permitam-me uma saudação inicial ao idealizador dessa Comissão, o dinâmico Presidente do Senado Federal, Senador Rodrigo Pacheco. Quero, nesta oportunidade, agradecer esse prestígio, essa confiança que nos dedicou. E, de público, quero dizer que é uma das maiores tarefas que eu já tive ao longo desta já prolongada carreira: um desafio enorme de trazer atualização para esse texto do Código Civil, cuja primeira reunião da Comissão anterior ocorreu 40 anos atrás. O Código tem vigência há 20 anos, um período em que a humanidade experimentou uma série de avanços e diversas modificações, tanto pelo impacto da tecnologia como também pelo próprio avanço civilizatório, pelas mudanças que a sociedade mundial experimentou nesse período. De modo que é um dos maiores desafios que enfrentamos - eu digo isso em nome de toda a Comissão, em especial dos Relatores, agradecendo a confiança que nos foi dispensada e dizendo que esperamos não decepcioná-lo com esse texto, o mais técnico possível, que foi proposto aqui, como disse o Ministro Alexandre, por uma plêiade de extraordinários juristas civilistas reconhecidos no país ao longo desse período.
Então, essa primeira palavra é de agradecimento em meu nome e de todos os colegas integrantes da Comissão.
Também quero registrar meu penhorado agradecimento à presença do Ministro Alexandre de Moraes, que tem sido um dinâmico defensor da democracia no nosso país, com um sacrifício que nós todos que acompanhamos de perto como amigos de S. Exa. sabemos. De modo que a presença dele aqui, hoje, acompanhando os nossos trabalhos, é um presente para todos nós.
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Também registro a parceria, o trabalho conjunto, o apoio que tive do colega Ministro Bellizze, dividindo comigo todos os principais momentos da Comissão, auxiliando o trabalho.
Contei - acho que talvez a melhor escolha que poderíamos fazer - com os dois Relatores que tivemos, tanto a Profa. Rosa Nery quanto o Prof. Flávio Tartuce, que fizeram um trabalho exemplar, dedicados oito meses e debruçados sobre esse texto que apresentamos agora, de modo que é muito honroso poder agora aqui da tribuna agradecer-lhes.
Eu pediria aqui para todos uma salva de palmas para os Relatores. (Palmas.)
Também peço licença para cumprimentar todos os integrantes da Comissão, nas pessoas dos dois colegas do Superior Tribunal de Justiça que hoje acompanham a nossa sessão: a Ministra Isabel Gallotti, que também trabalhou intensamente nesse texto; o Ministro Cesar Rocha, ex-Presidente do STJ, ambos integrantes da Comissão e que deram o melhor de si para que nós pudéssemos produzir esse trabalho que apresentamos agora.
Registro aqui, Presidente - sei que a nominata é grande, mas vou me permitir fazer uma saudação especial também a todos os presentes na pessoa dele -, a presença do Ministro Herman Benjamin, que é colega do Superior Tribunal de Justiça e contribuiu decisivamente para a nossa Comissão. É uma honra tê-lo aqui hoje, Ministro Benjamin, acompanhado da Ministra do Conselho de Estado da França, Sra. Isabelle de Silva, cuja presença também é muito honrosa hoje para nós. Portanto, nas pessoas deles, para simplificar, e também do Conselheiro Bandeira, que acompanha os nossos trabalhos, nas pessoas de todos eles, eu peço que os nossos visitantes hoje se sintam cumprimentados, Presidente.
Essa Comissão foi instalada em 4 de setembro de 2023; são oito meses de trabalho. Nesse período nós contamos com uma valiosa colaboração dos integrantes da Consultoria da Casa, Presidente. Nós tivemos, além dos integrantes da Comissão, alguns membros consultores que foram designados, à mercê da compreensão do Presidente, Ana Cláudia Scalquette, Fernanda da Silva Fernandes, Layla Abdo de Andrada, Maurício Bunazar, Vicente de Paula Ataídes Junior, Jorge Miguel - fez a revisão de português - e todos os servidores envolvidos a quem eu quero aqui cumprimentar e agradecer.
A estrutura do Senado, Presidente, é extraordinária. Parabéns pelo corpo de servidores: Leandro Bueno, Lenita Cunha e Silva, Gabriel Udelsmann, Bruno Gonçalves, Luciano Oliveira de Moraes, Breno de Lima Andrade, Henrique Cândido Evangelista da Silva, Geovanny de Almeida Santos.
Como eu disse, foram oito meses envolvidos nesse trabalho. A Comissão enviou cerca de 400 ofícios a entidades representativas da sociedade civil, faculdades de direito, órgãos públicos e associações, comunicando a abertura do prazo para sugestões. Vieram da sociedade civil, Presidente e integrantes da Comissão, 280 sugestões. Elas foram examinadas ao longo desses meses de trabalho, quando realizamos quatro audiências públicas nos quatro cantos do país, sem prejuízo de inúmeros debates em academia, em universidades, em eventos jurídicos que realizamos ao longo desse período. E em uma delas, como já lembrou o Presidente Pacheco, no seu preciso discurso inicial, contamos com a participação do Ministro Fachin, da Suprema Corte brasileira, especialista no Direito Civil, além do Ministro da Suprema Corte argentina Ricardo Lorenzetti, e da jurista que foi a Relatora para o Código Civil argentino, a Profa. Aida Kemelmajer.
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Nesse período, também chegaram inúmeras contribuições de participação popular pelo canal e-Cidadania. E os membros da Comissão, Presidente, essa plêiade de juristas que foi aqui mencionada, ao longo de quase 70 horas de trabalho, só em comissões, só em audiências públicas, só em reuniões, fora o tempo que dedicaram durante esses oito meses para a elaboração desse texto, essa Comissão criou uma interação entre si, que eu posso dizer aqui hoje, mesmo nas divergências mais centrais, há uma camaradagem, há um bem-querer entre todos que foi se formando, justamente pela busca de um texto que fosse atual, projetado para o futuro e, ao mesmo tempo, que nós pudéssemos trazer ao Senado todos os avanços técnicos jurídicos que nós conseguimos obter, seja pelo consenso da doutrina, seja pelos avanços da jurisprudência, seja pelos enunciados em jornadas que foram realizadas ao longo desse tempo. Tudo isso foi consolidado nesse texto, mercê do talento dos juristas que aqui hoje participam dessa entrega simbólica, mas, ao mesmo tempo muito carregada de conteúdo que nós apresentamos ao eminente Presidente.
Nesse texto, Presidente, nós temos alguns avanços muito significativos. Eu sei que estou me estendendo um pouquinho, mas vou fazer uma pincelada de dois ou três minutos com esses avanços tantos que trouxemos para o exame do Senado. Por exemplo, nós garantimos a proteção a pessoas que hoje são impossibilitadas de se exprimir a sua vontade. O texto contempla, de acordo, em linha com o que tem o Estatuto da Pessoa com Deficiência.
Nós trouxemos a afirmação do direito da vontade quanto ao próprio corpo e após a morte. Nós trouxemos garantia para o nome da pessoa e para o uso da sua imagem.
Categorizamos os animais como seres sencientes e apresentamos uma ideia que imaginamos seja definitiva para acabar com a polêmica relacionada à prescrição e decadência no âmbito do nosso Código Civil.
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No caso dos títulos de créditos, nós o adaptamos ao cenário virtual, criamos a seção da posição contratual, tudo em linha com os maiores avanços da doutrina.
Nos contratos, nós tratamos de um capítulo especial para contratos empresariais, dando uma estatura a essa condição e tratando com regras especiais dessa que nós imaginamos seja um incremento ao empreendedorismo, à busca do investimento, ao desenvolvimento social.
Acrescentamos um capítulo somente para a prestação de serviços e do acesso a conteúdos digitais. Incluímos o princípio da confiança.
No campo da responsabilidade civil, apresentamos os maiores avanços que hoje a doutrina e a jurisprudência no mundo já conhecem, que é uma concessão de uma autonomia aos demandantes para eleger entre reparação de danos, restituição de ganhos indevidos ou valor que seria pago, um formato de recomposição adequado das perdas, uma compreensão da responsabilidade civil como um sistema de gestão de risco, atuando na prevenção. Nós também trazemos uma expectativa em relação à desburocratização das empresas e à centralidade do direito empresarial.
No campo do direito das coisas, estabelecemos uma proposta de titularidade sobre bens imateriais, aperfeiçoamos o usucapião familiar, proporcionamos a possibilidade do pacto marciano para grandes empreendimentos, posse e usucapião da laje, maior funcionalização dos direitos de vizinhança e a proteção adequada ao meio ambiente, como sugeriu e acompanhou de perto o Ministro Herman Benjamin.
No direito de família, talvez o centro maior dos nossos debates, nós avançamos muito para colocar a proposta de acordo com o que a jurisprudência já vinha reconhecendo. Disciplinamos a filiação socioafetiva, a multiparentalidade, reconhecemos que o casamento, para além da hipótese de marido e mulher, é uma união entre duas pessoas, adoção de regras sobre convívio e compartilhamento de despesas dos animais domésticos - hoje uma realidade que nós encontramos -, admissão do registro imediato em nome do pai, desde que haja se recusado a se submeter ao exame de DNA e tantas outras inovações no campo da disciplina do direito de família.
No caso das sucessões, do direito das sucessões, falamos sobre o fim do direito da concorrência entre ascendentes e descendentes, o reconhecimento quanto à reprodução post mortem - regulamos essa espécie -, admitimos a criação da modalidade de testamento em braile e em libra. E quanto ao livro de direito digital, uma grande inovação, diferentemente do que acontece em outros países que já estudam essa possibilidade, nós estamos propondo a inclusão de um livro próprio para o direito digital, que vai conversar com todos os outros livros, estabelecer as regras gerais para definição de ambiente digital, para definição do direito das pessoas em ambiente digital, os neurodireitos, a previsão no direito ambiental digital de um meio seguro e transparente para a moderação de conteúdo, para a aquisição de patrimônio digital, proteção integral de crianças e adolescentes no ambiente digital e até mesmo a regulação dos smart contracts, que hoje são uma realidade no dia a dia da população.
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Então, Presidente, eram essas as ideias que eu queria trazer, pedindo escusas pela extensão, mas volto aqui a repetir: foi uma imensa honra. Nós estamos à inteira disposição do Senado para dialogar sobre esse texto. Cada um de nós teremos a enorme satisfação de podermos voltar aqui, conversar com a situação, com a oposição, com o Governo, com segmentos da sociedade, onde nós possamos apresentar as ideias que nos motivaram a apresentar esse texto ao Senado.
Muito obrigado pela atenção com que me ouviram. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG) - Eu agradeço ao Ministro Luis Felipe Salomão, por seu pronunciamento, por sua dedicação à Comissão de Juristas.
E tenho a satisfação de passar a palavra ao Exmo. Sr. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Ministro do Superior Tribunal de Justiça e Vice-Presidente da Comissão de Juristas.
Por favor, Ministro.
O SR. MARCO AURÉLIO BELLIZZE (Para exposição de convidado.) - Bom dia a todos.
Exmo. Sr. Presidente do Senado Federal, Senador Rodrigo Pacheco, que preside esta sessão tão especial para todos nós; Exmo. Sr. Ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, também Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, que nos honra com a presença; Sr. Presidente da Comissão de Juristas, Ministro do Superior Tribunal de Justiça e meu amigo antigo, colega de Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Ministro Luis Felipe Salomão; Exma. Sra. Rosa Nery, Relatora-Geral da Comissão de Juristas e Professora; Exmo. Sr. Flávio Tartuce, Advogado, Professor e Relator-Geral também da Comissão de Juristas; nas pessoas dos Ministros do STJ presentes, Ministra Isabel Gallotti, Ministro César Rocha, Ministro Herman Benjamin, cumprimento todos os colegas do Judiciário.
Peço, Sr. Presidente... Sei da generosidade de me conceder a palavra, o regime é presidencialista. O Presidente da minha Comissão, Ministro Luiz Felipe Salomão, já esgotou a pauta no sentido de informar como trabalhou a Comissão, como foi composta a Comissão e como foram desenvolvidos os trabalhos. E eu só abusei da generosidade para falar, porque gratidão não prescreve, então não podia perder a oportunidade, Sr. Presidente, de agradecer primeiramente a V. Exa., parabenizar V. Exa. pela formação da Comissão. Há um mosaico de interesses e de situações não contempladas na lei civil que precisam, para a segurança de todos nós, vir para a lei civil. Então, V. Exa. teve essa percepção. Então, meus parabéns pela formação da Comissão. Minha gratidão eterna pelo convite, foi uma honra participar e, mais do que contribuir, eu recebi dessa plêiade de juristas excepcionais.
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Meu agradecimento ao Ministro Luiz Felipe Salomão, que me convidou e me deu essa oportunidade de estar nesta Comissão, porque nós participamos também com a contribuição doutrinária, com a nossa experiência, mas a função principal era coordenar os trabalhos, e foi um prazer, não foi um trabalho, foi um prazer, um aprendizado constante. Então, expresso minha gratidão pelo Presidente do Senado, pelo Presidente da Comissão, pelos Relatores-Gerais, nas pessoas da Profa. Rosa e do Prof. Flávio Tartuce, que foram espetaculares e se desdobraram nesse tempo todo, em todos os momentos.
Eu cumprimento cada um dos colegas da Comissão, cada um dos consultores e servidores. Foi um prazer enorme, um aprendizado completo, um mestrado e doutorado em Direito Civil em oito meses. Aguardamos o certificado - eu não sei se o Senado pode fornecer o certificado de doutorado e pós-doutorado em Civil, porque foi, para quem teve oportunidade de receber todos os inputs de todas as subcomissões, um aprendizado.
Sr. Presidente, eu só destacaria duas coisas que deram norte à Comissão de V. Exa.: a própria forma, a composição - V. Exa. foi feliz na composição -, com escolas de pensamentos diferentes, juristas, acadêmicos, advogados, juízes, cada um trazendo a sua contribuição. Não foi raro, no meio de uma discussão, levantar a mão um juiz, uma juíza, em particular: "Olha, isso não funciona no interior". Ou era o Pablo, ou era a Patrícia: "Olha, no dia a dia, não funciona assim". E aí os colegas acadêmicos pensaram, e isso foi muito importante. Então, eu agradeço e parabenizo pela composição.
No método, V. Exa. foi categórico: "Olha, quero ouvir todo mundo. Ampla discussão, todo mundo fala". Fizemos audiência pública em que falou quem quis e que terminou na hora em que o último falou, quando não tinha mais ninguém, e todos nós lá - não só pacientemente, não, porque foi prazeroso. Então, pela composição, pelo método de funcionamento, Sr. Presidente, o produto final não poderia ser diferente do que veio: um material que vai servir certamente de base e pode servir de base para o Parlamento discutir, na sua liberdade de discutir. O aspecto político de todos esses institutos cabe ao Parlamento, é o Parlamento que conduz a discussão dos assuntos de interesse da sociedade.
E, por último, Sr. Presidente, em nome também da gratidão, eu não poderia deixar de destacar o papel de qualidade dos servidores do Senado e dos consultores que nos atenderam que foram fundamentais. Sem eles, certamente, nós não teríamos condições de... A experiência deles foi fundamental para que o trabalho fosse organizado. Eles souberam nos disciplinar e nos fazer atender aos prazos, à forma, ao formato das proposições. Então, agradeço a V. Exa. e parabenizo o Senado por esse corpo funcional e esses consultores, que são fundamentais.
Terminando e pedindo desculpas pelo abuso, porque a Comissão fala por seu Presidente, eu não poderia deixar de expressar a minha gratidão e meu agradecimento a V. Exa., ao Ministro Salomão e a todos os componentes da Comissão, incluindo consultores e servidores.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG) - Agradeço ao Ministro Marco Aurélio Bellizze, em especial pela deferência e pela referência feita aos servidores desta Casa. De fato, é um corpo muito qualificado, e, em nome deles, agradeço o reconhecimento feito por V. Exa.
E a ideia do certificado foi excelente! Já comandei à nossa Secretaria-Geral da Mesa - não sei qual vai ser o valor... (Risos.) ... mas certamente haverá um valor sentimental de um reconhecimento pelo Senado, material e documental, da participação de cada uma das senhoras e de cada um dos senhores na Comissão de Juristas.
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Concedo a palavra ao Prof. Flávio Tartuce, Relator-Geral do anteprojeto.
O SR. FLÁVIO TARTUCE (Para exposição de convidado.) - Bom dia ou boa tarde, dependendo da circunstância. É uma grande honra poder falar nesta Casa, Presidente.
Quero saudar a mesa na pessoa do Presidente do Senado, do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco, nosso amigo de tantos anos; do Presidente da Comissão, Ministro Luis Felipe Salomão; do Vice-Presidente da Comissão, Ministro Bellizze; também do Presidente do TSE e Ministro Alexandre de Moraes. E a minha saudação muito especial à Profa. Rosa Nery.
Como já disse, em várias oportunidades a todos os colegas da Comissão e também em outras manifestações, em nosso tempo de debate, essa é a primeira vez na história que um Código Civil no Brasil é escrito também por mulheres e é a primeira vez na história que, além de todas as senhoras que estão aqui na Comissão, civilistas e privatistas - como gosta a Profa. Paula Forgioni -, nós temos um toque de classe feito pelas mulheres nessa Comissão. Isso pode ser percebido em vários trechos do projeto, do anteprojeto, não só em direito de família, em direito das sucessões, mas em direito de empresa, direito contratual, entre outros livros que nós trabalhamos.
Então, Profa. Rosa, foi um grande prazer, uma grande honra - V. Exa., que foi minha professora, fez parte da minha banca de doutorado - poder ter trabalhado todo esse tempo. Espero que sigamos com os debates que ainda ocorrerão nesta Casa sobre esse anteprojeto.
Eu quero começar a minha fala prestando também uma homenagem aos membros da Comissão, os civilistas, as civilistas, as privatistas, os privatistas, que ajudaram a construir esse texto. Foram meses de muito trabalho, de embates, de consensos e, como já foi dito pelo nosso Presidente, apesar de não ser um trabalho perfeito - porque ninguém consegue desenvolver um trabalho perfeito -, nós estamos entregando para esta Casa, aos Senadores e Senadoras, um projeto que expressa a posição hoje do direito civil brasileiro. E cabe agora ao Congresso Nacional analisar aqueles textos, aquelas alterações que convêm e aqueles que não, mas nós acreditamos, excluídos os eventualmente ressentidos, que esse texto que nós estamos entregando representa a posição majoritária do direito civil brasileiro.
Esse texto traduz a jurisprudência hoje dominante, a jurisprudência dominante dos tribunais superiores. Ele traduz, como disse aqui o nosso Presidente, a posição hoje consolidada nas nove Jornadas de Direito Civil, evento esse que foi concebido por um grande civilista, Ministro Ruy Rosado de Aguiar Júnior, que trouxe essa experiência para cá e propiciou que, nesses últimos 20 anos, a gente pudesse debater intensamente o Código Civil e o direito civil. Não é um projeto de 180 dias, é um projeto de 20 anos, porque, afinal de contas, nos últimos 20 anos, nós tivemos um debate constante e estamos colocando nesse anteprojeto aquilo que acreditamos que é relevante para o debate no Parlamento.
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Como disse o Ministro Salomão, foram quase 70 horas de trabalhos dentro da Comissão. São quase 70 horas de vídeos das audiências, das audiências públicas, das reuniões que fizemos e também do esforço concentrado de votação, em que, ouvindo quem assistiu, nós tivemos a exposição do direito civil vivo que nós temos hoje na realidade brasileira.
Como sempre gosta de dizer o Prof. José Fernando Simão e eu faço questão de repetir, os civilistas estão na Terra há milhares de anos com um propósito: resolver e melhorar a vida das pessoas. Acredito que cumprimos a nossa função nesse aprimoramento que nós fizemos.
Não é um novo Código Civil, é um projeto de reforma que trabalha menos da metade do texto, porque muitas alterações foram alterações apenas de ajustes.
Tivemos todos nós vitórias e derrotas doutrinárias e jurisprudenciais. Isso faz parte da democracia. Como eu gosto sempre de dizer aos meus colegas, é preciso saber perder. E tivemos todos várias derrotas, mas é o texto com que a maioria pensa o direito civil.
É a reforma do Código Civil mais democrática da história. Além da pluralidade da Comissão, foram cinco audiências públicas, dezenas de eventos pelo país, e ainda seguiremos - fica este compromisso - debatendo esse Código Civil onde for necessário.
É preciso aqui esclarecer também algumas notícias que foram ditas a respeito do projeto.
O projeto reconhece a pessoa humana antes mesmo do nascimento, porque atribui alimentos ao nascituro, porque reconhece a dignidade humana a partir da concepção. E ele trata também de efeitos post mortem, como o tema da herança digital.
E, como eu sei, já caminhando para o fim, que todos aqui falarão, eu vou destacar na minha fala uma parte que na Relatoria-Geral me foi muito cara que é a parte que eu vou aqui denominar de direito patrimonial. O Código precisa de alguns ajustes nesse tema, sem falar, por exemplo, da parte do direito digital. Hoje, o Código Civil trata da formação do contrato à distância por carta, algo que é totalmente superado. Nós estamos tratando da formação dos contratos pela internet. Como foi dito em várias outras oportunidades, em matéria de direito contratual, direito obrigacional, direito de empresa, nós estamos reduzindo a burocracia, estamos facilitando a circulação de contratos, estamos facilitando a concessão de crédito. E eu destaco o trabalho que foi feito pela Comissão de Direito das Coisas no tema, por exemplo, do penhor rural, em que nós temos uma facilitação, uma redução de burocracias muito relevante para facilitar a concessão de crédito para o agronegócio. Temos também, como disse o nosso Presidente, pela primeira vez de forma inédita no Código, um tratamento sobre contratos empresariais, uma maior liberdade para negócios jurídicos paritários, negócios jurídicos simétricos na linha da Lei de Liberdade Econômica, ao passo que o projeto de reforma do Código Civil traz em vários aspectos uma redução de entraves no direito negocial, obrigacional e contratual.
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E eu quero encerrar a minha fala prestando uma homenagem a quem, como eu já destaquei em outro evento, tem se revelado um grande privatista que é o nosso Presidente Rodrigo Pacheco, que, apesar de sua formação no direito penal, nos últimos anos trouxe para os civilistas leis de grande relevância para o direito privado: alteração da Lei de Recuperação de Empresas; Lei do Superendividamento; trabalhou efetivamente, logo que veio para o Senado, na Lei da Liberdade Econômica - aliás, alguns membros da Comissão tiveram a oportunidade, na ocasião, de mandar algumas propostas para V. Exa., que acabaram sendo transformadas em lei -; e hoje o civilista Rodrigo Pacheco, que assim pode ser batizado, traz para o direito privado esse projeto que, sem dúvida alguma, para a nossa geração, é o mais importante neste momento que vivemos.
E eu queria aqui homenagear o nosso Presidente, que eu conheço há tanto tempo, e homenagear todos vocês, as origens de vocês - cada um aqui tem a sua origem -, porque, meu amigo Pacheco, acho que, na década de 80, na década de 90, quando vivíamos em Passos, pela Praça Geraldo da Silva Maia, pela Igreja Matriz, pela Rua Deputado Lourenço de Andrade, no Grupo Wenceslau Braz, no Colégio Imaculada Conceição, onde estudamos, nunca poderíamos imaginar, nas nossas origens, que teríamos esta oportunidade de mexer naquela que, para nós, é a lei mais importante para o cidadão comum, que é o Código Civil, como dito, inclusive, pelo Ministro Alexandre de Moraes.
Muito obrigado por esta oportunidade dada a todos nós, para que nós possamos trazer a maior contribuição que um civilista, que um jurista, que um professor, que um juiz, que um magistrado e também, a partir de agora, que um Parlamentar pode trazer para a sociedade, que é melhorar a vida das pessoas.
Muito obrigado. Foi uma honra ter participado desse projeto com todos vocês.
E viva o direito privado brasileiro! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG) - Muito obrigado, Prof. Flávio Tartuce, por sua dedicação na relatoria desse anteprojeto.
Tenho a satisfação de conceder a palavra à Sra. Rosa Maria de Andrade Nery, Professora e também Relatora-Geral do anteprojeto.
Com a palavra, Professora.
A SRA. ROSA MARIA DE ANDRADE NERY (Para exposição de convidado.) - Exmo. Sr. Presidente do Senado da República Federativa do Brasil, Senador Rodrigo Pacheco; Sr. Ministro Alexandre de Moraes; Exmos. Srs. Presidente e Vice-Presidente da Comissão de Juristas encarregada de apresentar estudos de atualização do Código Civil brasileiro, Ministros Luis Felipe Salomão e Marco Aurélio Bellizze; Sras. Senadoras, Srs. Senadores; Prof. Flávio Tartuce; prezados colegas componentes da Comissão de Juristas que ora presta conta de seu trabalho; equipe de trabalho do Senado; senhoras e senhores, espera-se que a sociedade organizada tenha normas que não sejam contraditórias, que essas normas sejam funcionais, que elas se prestem a plasmar aquilo que nós pensamos que possa servir à justiça e à paz.
Sr. Presidente Pacheco, repercutimos aqui a fala que já ecoou neste Palácio da Federação: a nação nos mandou executar um serviço; nós o fizemos com amor, aplicação e sem medo. Os numerosos aspectos técnicos da reforma sugerida serão aos poucos compreendidos pelo Parlamento e pela sociedade civil e, por certo, serão objeto de amplos e profícuos debates. Afinal, Sr. Presidente, a vida convide com o imponderável, e é disto que trata o Direito Civil: trata de nossa natural propensão de projetar nossa ação para o futuro.
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Cresce a importância, nesse sentido, da expressão biopolítica, para significar um esforço do poder político em favor da vida e em suas condições de precariedade, como dito, ou em seus momentos de vulnerabilidade estrutural - o menor, o incapaz, o interditado, o desprovido de recursos materiais, o deficiente, o estrangeiro, o apátrida, o refugiado - ou de vulnerabilidade ocasional, como ocorre nas relações mantidas em espaço de tutela, ou como se passa hoje no espaço virtual, onde se cria e se estabelece uma nova e curiosa vulnerabilidade.
Gostaria, por isso, de realçar rapidamente dois pontos fundamentais para a compreensão da atualização do Código Civil brasileiro, em vigor desde 2002.
Em primeiro lugar, a centralidade da pessoa no contexto de sua experiência humana, jurídica e civil. Esse ponto foi perfeitamente considerado pela douta Comissão de que tive a honra de participar, principalmente pelas doutas Subcomissões de teoria Geral, de Direito Digital e de Direito de Família, capitaneadas pelo Profs. Mudrovitsch, Porto e Stolze. Os múltiplos aspectos da vivência pessoal, familiar e patrimonial de cada um e seus ambientes de interesse.
Somos, antes de tudo, senhores e senhoras, alguém na centralidade da família, espaço onde a vida tem condições de medrar. Os nascimentos, a formação da capacidade da pessoa, a responsabilidade pelo futuro das novas gerações, bem como com o término da existência humana, vida, existência e finitude, tudo tem lugar no Código Civil e está contemplado, de alguma maneira, neste estudo, como tesouro que demanda cuidado extremado de todos os membros da Comissão. Nada do que é humano deixou de ser considerado pelos estudiosos desta Comissão, Sr. Presidente, que trouxeram respostas às aflições cotidianas de nosso povo, de acordo com suas tradições culturais e de seus anseios de progresso.
Reverbera em todos nós a grave advertência de Edith Stein, filosofa judia que abraçou o cristianismo e vislumbrou, a partir dos retratos vivos da miséria humana e da dor aguda que experimentou, a complacência, a brandura, a clemência de quem busca compreender, dizendo: "Não quero viver num ingênuo autoengano, num tenso idealismo ético; é necessário ter a mente aberta a tudo que é humano".
E o segundo ponto, Sr. Presidente, ao lado do ser, vamos olhar para o ter. As doutas Subcomissões de Direito das Coisas, de Contratos, de Obrigações, de Empresas, de Sucessões, de Digital e de Responsabilidade Civil, capitaneadas pelos Profs. Delgado, Carlos Elias, Simão, Bezerra de Melo e Rosenvald e pela Profa. Paula Forgioni, cuidaram de olhar a pessoa e seu patrimônio em harmonioso contexto, atualizando institutos, fomentando a circulação de riquezas, garantindo a estabilidade do patrimônio mínimo, oferecendo meios técnicos institucionais para a segurança das relações pessoais e patrimoniais, para o fomento de atividades de produção, de vitalidade econômica do patrimônio da pessoa natural e da empresa, de justa, exata e facilmente apreciada indenização por danos.
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Penso, Sr. Presidente, que nós cumprimos o dever cívico que nos foi confiado, com o concurso inestimável da competentíssima equipe desta Casa, que homenageio nas pessoas dos Drs. Gabriel, Lenita e Bruno.
Agradeço o rico e profícuo convívio que se estabeleceu entre os colegas da Comissão e o faço nas pessoas das Professoras Titulares, que iluminaram, com sua rica trajetória, o seu modo próprio e humano de ver e compreender a civilidade, Giselda Hironaka e Paula Forgioni, da Universidade de São Paulo, e Cláudia Lima Marques, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Aos nossos competentíssimos consultores também agradeço, na pessoa do Prof. Jorge Miguel.
Lembro aqui, com reverência e gratidão, pelo fato que me proporcionou trazer para o cumprimento desta missão, a casa de cultura onde me encontro a longos 46 anos, a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, de onde brota e jorra seiva de justiça e de paz.
Ao grupo de ministros do Superior Tribunal de Justiça, que nos deram suporte constante durante todos os dias de estudo e de debates, agradeço também agora, na pessoa da Ministra Isabel Gallotti.
Ao Prof. Flávio Tartuce, querido colega, cuja inteligência eu devo enaltecer, agradeço a leal parceria, as boas e inteligentes discussões e os debates durante o longo, rico e exaustivo trabalho que tivemos.
Agradeço a V. Exa., Sr. Presidente Pacheco, em nome de todos os professores, especialmente ao Presidente e Vice-Presidente da nossa Comissão, Ministros Salomão e Bellizze, a generosidade de nos confiar tão importante encargo, com sabedoria e compreensão.
Por fim, Sr. Presidente, eu diria, copiando Cora Coralina:
Este livro
[também] foi escrito
Por [...] [mulheres]
Que [...] [fizeram] a escalada da
Montanha da Vida
Removendo pedras
[...] plantando flores.
Este livro:
Versos... Não.
Poesia... Não.
[Apenas] um modo diferente de contar velhas estórias. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG) - Agradeço à Profa. Rosa Nery por sua dedicação à relatoria desse anteprojeto de atualização do Código Civil, cumprimentando-a pelo belo pronunciamento.
Registro a presença do Deputado Federal Marcelo Queiroz também entre nós, do Rio de Janeiro - é uma alegria tê-lo conosco -; também da nossa Senadora Damares Alves, do Distrito Federal, e do Senador Eduardo Girão, do Estado do Ceará.
Sejam, naturalmente, todos bem-vindos ao debate e à discussão.
Concedo a palavra, neste instante, e assinarei o prazo de cinco minutos, para os sub-relatores parciais das Subcomissões da Comissão de Juristas, começando pelo Sr. Carlos Eduardo Elias de Oliveira, professor, Consultor Legislativo desta Casa e Relator Parcial da Subcomissão de Contratos, que pode ocupar a tribuna para o seu pronunciamento.
O SR. CARLOS EDUARDO ELIAS DE OLIVEIRA (Para exposição de convidado.) - Bom dia a todos e todas.
Presidente Pacheco, fico muito feliz e muito honrado por ter tido esse privilégio de ter participado de um dos projetos ou anteprojetos que eu considero mais importantes na nossa história. Poucas normas retratam tanto a cultura de um povo como o Código Civil.
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O Código Civil de qualquer país é o retrato, é o espelho do dia a dia do homem comum e também do dia a dia das grandes empresas. Então, desde grandes e poderosos até pessoas mais humildes, o Código Civil dá o forro, dá o suporte para o cotidiano, prestigiando a propriedade, prestigiando a segurança, prestigiando a liberdade e, principalmente, a justiça.
Fico muito feliz porque o Presidente Rodrigo Pacheco, além de ser um homem público de tanta dedicação, é também um jurista. E, por isso, só uma mente tão privilegiada como essa poderia ter nesse momento e nessa oportunidade histórica, ter podido idealizar esse anteprojeto do Código Civil.
Ministro Luis Felipe Salomão e Ministro Marco Bellizze, sei que não haveria melhor regência que poderia ter orquestrado todos esses trabalhos se não fosse a maestria de V. Exas. São juristas, são civilistas, que, antes mesmo da produção jurisprudencial muito rica, já produziam e contribuíam para o direito civil em todas as suas escritas e produção. Então, tivemos nesses dois maestros uma grande regência desse trabalho.
Relatores gerais, Profa. Rosa Nery e Prof. Flávio Tartuce, dois gigantes do direito civil com produções já de muitos e muitos anos pelo direito civil, conseguiram imprimir a todo o trabalho da Comissão um equilíbrio. E é isso, Presidente Pacheco e demais amigos e amigas, que eu queria realçar.
Nossa Comissão teve essa diretriz, a diretriz de sobriedade, a diretriz de positivar aquilo que já estava admitido pela jurisprudência, pela doutrina. E até nas questões mais novas, aquilo que a jurisprudência muito provavelmente iria dizer caso fosse provocada.
E na nossa Comissão tivemos a participação de grandes juristas. Prof. Carlos Eduardo Pianovski, meu xará e amigo, Professor da Universidade Federal do Paraná; Profa. Angélica Carlini, que é sem dúvida alguma uma máquina não só de trabalho como de produção de conhecimento, com um vasto e enciclopédico conhecimento; Profa. Claudia Lima Marques, que já há muitos anos se dedica de forma incrível pela produção e melhora do direito. E tivemos, portanto, uma Comissão muito rica que trabalhou na parte de contratos.
Quando a gente para ler não só a parte de contratos, eu percebi isso também nas outras subcomissões, com as quais, inclusive, mantemos contato constante; quando a gente para para ler esse anteprojeto, eu diria, não fiz esse cálculo, mas eu diria que apenas 20% ou 30% são inovações propriamente, porque a verdade é que todos os dispositivos que foram alterados, quando nós observamos, é um retrato daquilo que a jurisprudência e a doutrina já admitiriam.
Na parte de contratos, por exemplo, nós disciplinamos os smart contracts. É uma realidade. Vários contratos hoje, na verdade, são celebrados e executados por máquinas, de forma cibernética. Mas é necessário que essa atividade...
(Soa a campainha.)
O SR. CARLOS EDUARDO ELIAS DE OLIVEIRA - ... das máquinas esteja sujeita, obviamente, à vontade humana. E isso nós disciplinamos. Quando nós disciplinamos, na prática, nós fizemos aquilo que a jurisprudência muito provavelmente também faria.
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Termino dizendo que tenho que agradecer muito a esta Casa. Sou Consultor Legislativo do Senado também e lembro que, numa sexta-feira, depois de uma reunião, eu encontrei o Bruno Lunardi, que também é um Consultor Legislativo com o qual tenho a honra de trabalhar, e ele estava, literalmente, com os mesmos olhos de ontem. Não tinha dormido. Tinha trabalhado a noite inteira para poder produzir o texto que serviria depois de trabalho.
Então, quero também registrar, na pessoa do nosso querido amigo e colega de trabalho Bruno Lunardi, queria homenagear todos os trabalhos que foram desenvolvidos por esta Casa, na pessoa do Bruno Lunardi, da Lenita, do Bruno e de todos os demais, e do Geovanny, também Consultor...
(Soa a campainha.)
O SR. CARLOS EDUARDO ELIAS DE OLIVEIRA - ... que também dedicou algumas horas dessa noite para o trabalho desta Comissão.
Muito obrigado e espero que este Código Civil realmente retrate - e tem retratado - a sociedade. Como diziam os romanos, o direito nasce dos fatos, e este anteprojeto nasce desta sociedade atual, que mudou e que, naturalmente, precisa de respaldo normativo.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG) - Agradeço ao Consultor do Senado Carlos Eduardo Elias de Oliveira e concedo a palavra ao Sr. José Fernando Simão, Advogado, Professor da Universidade de São Paulo e Relator Parcial da Subcomissão de Direito das Obrigações e Títulos de Crédito.
V. Exa. tem a palavra.
O SR. JOSÉ FERNANDO SIMÃO (Para exposição de convidado.) - Muito obrigado, Sr. Senador Presidente do Senado Rodrigo Pacheco, Ministro Salomão, Ministro Bellizze, Profa. Rosa e Prof. Tartuce, queria pedir licença a todos para os cumprimentos irem para: a Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, aqui representada pela Profa. Paula Forgioni, para a nossa escola, que em breve completará os seus 200 anos de tradição; a Profa. Giselda Hironaka, que não está presente aqui conosco agora, mas é uma das que participou atenta e cuidadosamente do projeto; e o Prof. Tartuce, que conheci naqueles bancos escolares, Senador Pacheco, não tanto quanto V. Exa., porque naquele tempo nós não dialogávamos muito, pois o Prof. Tartuce era mais dedicado aos esportes radicais e eu, mais ao estudo do Direito Civil.
Dito isso, os meus agradecimentos vão ao Prof. Edvaldo Brito, que me suportou, não no sentido de support, do inglês, mas que me aguentou, no bom vernáculo pátrio, nesses quatro meses de convívio, seis meses de convívio, muito me ensinou e que eu tenho a honra de hoje chamar de amigo, seguindo a melhor tradição baiana do nosso mestre Orlando Gomes.
Eu queria agradecer também ao meu amigo, que também carregou o peso comigo, hoje Consultor desta Comissão - não está aqui presente -, o Prof. Maurício Bunazar, com quem tive a honra de debater a Teoria Geral das Obrigações com afinco.
E queria dizer aos senhores e senhoras: eticidade, socialidade e operabilidade, os três pilares norteadores da codificação de Miguel Reale, estão presentes na lei que preconiza a reforma do anteprojeto do Livro das Obrigações.
Estão presentes por quê? Pilar da operabilidade: ajustar artigos cuja compreensão confusa, difícil vinha desde o tempo de Beviláqua. Eu e a Profa. Rosa tivemos alguma reflexão, por exemplo, sobre artigos confusos da compensação, que foram ajustados para dar operabilidade onde ela não existia.
Sobre artigos em que havia dúvida doutrinária, como, por exemplo, as obrigações indivisíveis e solidárias, dúvidas estas sanadas em Jornadas de Direito Civil, nós refletimos e elas foram apropriadas pelo anteprojeto para dar atenção à operabilidade preconizada por Miguel Reale.
Artigos com defeito de redação, como os de assunção de dívida, grandes brigas doutrinárias e de difícil compreensão foram por nós ajustados de acordo com as Jornadas de Direito Civil, dando a eles operabilidade.
Não se reescreveu na Teoria Geral das Obrigações um novo Código. Não, se ajustou o pensamento de Agostinho Alvim com a batuta mestra de Miguel Reale.
Portanto, não se iludam! Não há um novo Código Civil! Há um anteprojeto que ajusta, com respeito aos antigos civilistas, pequenas questões.
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Ousamos? Um pouco, não muito. Alguns artigos, como por exemplo, a criação da cessão de posição contratual, já presente nos diplomas italiano e português e que, portanto, também não representa um rompimento sistêmico. Ao contrário, dá atenção ao sistema vigente, porque nos baseamos no direito estrangeiro, na experiência luso-italiana para trazer quatro ou cinco artigos de cessão de posição contratual.
Fomos muito longe? Não, ajustamos as questões à Lei de Liberdade Econômica, tão cara ao Senador Pacheco, por exemplo, separando multa, cláusula penal, dos contratos paritários e simétricos em relação aos demais.
Fomos muito longe? Não, onde pudemos limitar a atuação judicial para aplicar às astreintes a limitação da cláusula penal, o fizemos expressamente.
Juros, o tema talvez mais inoperável do Código Civil ao lado da concorrência sucessória, ficou a cargo do Prof. Mario Delgado. Sugerimos pela Subcomissão quatro possibilidades de ajuste ao projeto. A Relatoria-Geral escolheu uma delas, juros fixos de 1% ao mês. Portanto, a Subcomissão não se arvorou no direito de determinar qual seria a taxa de juros, mas sugerir aos relatores gerais, com base em sua experiência...
(Soa a campainha.)
O SR. JOSÉ FERNANDO SIMÃO - ... qual seria a melhor forma de encarar a taxa de juros para o projeto que se apresenta.
Eu queria, nessa parte final da minha fala, responder a uma pergunta que foi formulada na Folha de S. Paulo: onde grassam as imprecisões e contradições? As imprecisões e contradições, ministros e Senadores, elas grassam na chamada barca dos ressentidos. Eu também não estou inovando, estou citando o Orlando Gomes no seu passado, no artigo do grande baiano e grande jurista da terra de Pablo Stolze. E a barca dos ressentidos é composta por aqueles que democraticamente se recusaram a debater conosco, quebrando a boa-fé objetiva, deixaram o barco e depois saíram da toca como o coelho da Alice, "estou atrasado, estou atrasado, estou atrasado". E hoje a barca dos ressentidos tende a ter o destino do Medusa, pintado por Théodore Géricault, que está no Louvre: o naufrágio.
Obrigado a todos e todas e que este projeto vire lei, porque ele melhora a vida do brasileiro médio, e é isso que o Brasil precisa, menos proselitismo e mais atuação na vida de quem precisa.
Obrigado, Senador, pela oportunidade e ao Sr. Ministro Bellizze, pela confiança. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG) - Muito obrigado, Prof. Simão.
Eu concedo a palavra neste instante à Dra. Laura Porto, Advogada, Professora e Relatora Parcial da Subcomissão de Direito Civil Digital.
A SRA. LAURA PORTO (Para exposição de convidado.) - Bom dia a todos, bom dia a todas.
É uma alegria estar aqui.
Quero cumprimentar os ministros, todos os ministros presentes, Ministro Bellizze, Ministro Salomão, quero cumprimentar os relatores, meus queridos companheiros de Comissão da reforma, foi uma alegria conhecer todos os senhores, a quem hoje posso chamar de amigos, foi uma jornada sensacional.
E que alegria estar nesta Casa, na presença do Presidente Rodrigo Pacheco, a quem eu quero agradecer pela confiança que me foi depositada para relatar esse livro, este novo livro ao lado da minha querida Subcomissão, com o Prof. Dierle e o Prof. Ricardo Campos, que é o que eu posso chamar de uma das maiores e mais necessárias inovações jurídicas brasileiras.
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O que eu venho apresentar hoje para os senhores coloca o Brasil numa posição de vanguarda frente aos demais países. Foi-nos pedido, de forma visionária, que criássemos um novo livro, como já foi dito aqui, dentro do Código Civil, com conceitos principais, fundamentos e princípios do direito digital. E, dessa forma visionária que nos foi pedida, nós entregamos um novo livro. Nós estamos vivendo em uma era totalmente digital, em que as novas tecnologias permeiam todas as esferas das nossas vidas, e elas transformaram radicalmente toda a nossa forma de nos relacionar, de trabalhar e até de interagir. Nesse contexto, torna-se imprescindível que o nosso arcabouço legal esteja alinhado com os desafios e as demandas deste mundo contemporâneo.
Sendo assim, a atualização do Código Civil incorpora o que hoje chamamos - na verdade, chamaram, os nossos Relatores, queridos Relatores-Gerais, Rosa Nery e Flávio Tartuce, a quem agradeço tanto pelo auxílio nesse período - de direito civil digital e que trouxemos neste novo livro, chamado de Direito Civil Digital, com dez capítulos. Venho, então, neste prazo curto - vou correr - apresentar rapidamente esse novo livro para todos os senhores.
Temos o Capítulo I, Disposições Gerais, sobre o qual eu brinco que é o coração do nosso livro, em que nós trazemos princípios, conceitos e fundamentos gerais muito importantes, como, por exemplo, respeito à privacidade, à liberdade da expressão, e outros que são pilares que norteiam todo o livro e que aqui sustentam os demais capítulos.
No Capítulo II, Da Pessoa no Ambiente Digital, temos direitos e deveres no ambiente digital e temas muito importantes, como neurodireitos, direito à desindexação, exclusão de dados pessoais e informações que seguem critérios muito objetivos.
No Capítulo III, Das Situações Jurídicas no Ambiente Digital, trouxemos conceituações e regramentos específicos sobre o tema.
No Capítulo IV, Do Direito ao Ambiente Digital Transparente e Seguro, trouxemos um direito, ou melhor, asseguramos um direito ao ambiente digital seguro e confiável, com transparência, boa-fé, em que as plataformas devem demonstrar medidas de diligência para garantir esses direitos, inclusive a adequação dos seus termos de uso, dos quais por muitas vezes ficamos reféns.
O Capítulo V, Patrimônio Digital, traz importantes conceituações sobre o que é o patrimônio digital, o que compõe esse patrimônio digital e a forma da sucessão deste patrimônio, aqui conhecido como a herança digital, de que já foi falada.
(Soa a campainha.)
A SRA. LAURA PORTO - O Capítulo VI, A Presença e a Identidade de Crianças e Adolescentes no Ambiente Digital, garante a proteção integral desses que necessitam tanto dos nossos cuidados, visando garantir o seu livre desenvolvimento e proteção dos menores.
O Capítulo VII, Inteligência Artificial, com conceito geral sobre o tema da inteligência artificial e um tema muito importante que é a criação de imagem tanto de pessoas vivas como falecidas por meio da inteligência artificial.
Da Celebração de Contratos por Meio Digitais: hoje já foi dito aqui a importância de quantos contratos celebramos pelo meio digital. Então, trouxemos conceitos, princípios e regulações muito importantes sobre o tema e também os famosos já utilizados smart contracts.
No Capítulo IX, Assinaturas Eletrônicas, trouxemos as modalidades de assinaturas eletrônicas.
E o Capítulo X, Atos Notariais Eletrônicos - e-Notariado, que é um provimento do CNJ que funciona muito bem, mas que foi feito durante a pandemia. Então o trouxemos para o Código para legitimá-lo por via legislativa.
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Esse é, sem dúvida, um passo que coloca o Brasil em uma posição de vanguarda frente aos demais países, e, ao incorporar o direito digital em nosso Código Civil, estamos demonstrando nosso compromisso com a inovação e com o progresso, ao mesmo tempo que reafirmamos valores fundamentais. Estamos nos posicionando como líderes na proteção dos direitos individuais, no ambiente digital e no estabelecimento de um ambiente jurídico propício à inovação e ao desenvolvimento tecnológico com segurança.
Juntos podemos construir um futuro digital mais seguro, justo e inclusivo para todos os brasileiros.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG) - A Presidência agradece à Profa. Laura Porto e concede a palavra neste instante ao Sr. Mário Luiz Delgado Régis, advogado e Relator Parcial da Subcomissão de Direito das Sucessões.
O SR. MÁRIO LUIZ DELGADO RÉGIS (Para exposição de convidado.) - Obrigado, Sr. Presidente, Senador Rodrigo Pacheco, a quem eu agradeço a oportunidade de integrar esta Comissão, que fez esse trabalho absolutamente fundamental para o avanço, para a melhoria da sociedade brasileira.
Muito obrigado também aos nossos Presidentes: Ministro Salomão, Ministro Bellizze.
Cumprimento os nossos Relatores-Gerais, que tão bem conduziram os trabalhos dessa Comissão.
Rapidamente, Sr. Presidente, quero apenas falar do que nós estamos propondo para a sucessão hereditária.
O trabalho da Subcomissão - e eu preciso mencionar aqui as pessoas da Profa. Giselda Hironaka, do Prof. Gustavo Tepedino, do Ministro Cesar Asfor Rocha, que dividiram conosco esse trabalho - foi um trabalho de aprimoramento e simplificação das regras atinentes à sucessão hereditária, a partir das pesquisas realizadas perante a sociedade civil, perante a comunidade jurídica, a jurisprudência, os enunciados das jornadas promovidas pelo Conselho da Justiça Federal e as experiências legislativas de outros povos.
Nessa perspectiva, um dos primeiros temas que foram tratados diz respeito à revogação do art. 1.790 do Código Civil atual, para a equiparação das regras sucessórias entre cônjuges e companheiros. A união estável é uma realidade de fato, uma família como qualquer outra, com ou sem diversidade de sexos ou gênero entre seus partícipes, não merecendo ou comportando tratamento diferenciado em relação ao casamento no plano sucessório.
A proposta em matéria de sucessões também volta sua atenção para as pessoas em situação de vulnerabilidade, preocupação que se concretizou, por exemplo, com a ampliação do direito real de habitação, de modo a extrapolar a titularidade de cônjuges e companheiros, atingindo outros herdeiros e sucessores que convivessem com o autor da herança.
Na linha de extensão dos espaços de autonomia privada na sucessão, o anteprojeto pretende ampliar a liberdade do testador em prol dos herdeiros vulneráveis, inspirando-se na última codificação argentina de 2015, quando propõe dispositivo que autoriza ao testador destinar um quarto da legítima a descendentes e ascendentes em situação de vulnerabilidade.
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Os reflexos do planejamento familiar no âmbito dos direitos sucessórios não foram esquecidos. A proposta de alteração do art. 1.798 tenta superar as discussões que grassam em torno da legitimidade sucessória dos embriões extracorpóreos.
O anteprojeto também apresenta grandes inovações na disciplina da sucessão testamentária, no sentido de incluir as novas tecnologias da sociedade da informação, de modo a possibilitar a elaboração de todas as formas de testamento e também do codicilo, por meio de recursos digitais e de audiovisual, o que vai representar um grande incentivo para popularizar o seu uso sem comprometer os valores de certeza e segurança, além da disponibilização de tecnologia assistiva às pessoas com qualquer tipo de restrição em razão de deficiência.
(Soa a campainha.)
O SR. MÁRIO LUIZ DELGADO RÉGIS - O texto projetado demonstra em diversas passagens a preocupação com a atualização do ato de última vontade com base na convenção das pessoas com deficiência e na Lei Brasileira de Inclusão.
Dentro - já finalizando, Sr. Presidente - dessa diretriz de inclusão, estão sendo propostas novas formas testamentárias, como o testamento pupilar e o testamento quase-pupilar. Não foi esquecida a disciplina da transmissão sucessória dos bens digitais e nem tampouco - e talvez esse seja o principal objetivo da reforma em matéria sucessória - a simplificação do processo de inventário, que hoje é um grande problema na advocacia, na prática sucessória. Nós trazemos diversas propostas de desjudicialização do procedimento de inventário e de simplificação, de modo a antecipar a partilha em favor dos herdeiros em diversas situações.
Enfim, Sr. Presidente, finalizo dizendo e manifestando a minha convicção de que as propostas apresentadas simplificarão a vida do cidadão e facilitarão o acesso à Justiça. Razão pela qual reiteramos a nossa honra de submeter agora a V. Ex. essas propostas.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG) - Agradeço a V. Exa.
Concedo a palavra, neste instante, ao Prof. Nelson Rosenvald, Procurador de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais, Relator Parcial da Subcomissão de Responsabilidade Civil.
O SR. NELSON ROSENVALD (Para exposição de convidado.) - Bom dia a todos.
Quero saudar o Senador Rodrigo Pacheco, comandante dessa nau tão bem conduzida, por sinal. Muito obrigado por seu apoio durante todo esse processo.
Ministro Bellizze, é uma honra trabalhar com V. Exa.
Profa. Rosa Nery e Prof. Flávio Tartuce, parabéns. Parabéns pelo modo firme e companheiro pelo qual vocês conduziram todos esses trabalhos.
Eu me dirijo a V. Exas. para uma breve explanação daquilo que nos tocou no projeto de reforma do Código Civil.
Incumbe-nos a relatoria da Subcomissão de Responsabilidade Civil, tendo como inseparáveis companheiras de jornada a Ministra Isabel Gallotti e a Juíza Patrícia Carrijo, atual Vice-Presidente da AMB, as quais, garanto, emprestaram brilhantismo a esse trabalho em todos os momentos.
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A responsabilidade civil de 2024 se encontra em um momento muito distante do estado da arte dos anos 70, época em que foi forjado o Código Civil. Não se trata apenas de um hiato de 50 anos, porém de meio século que transformou a vida humana e os seus costumes de modo mais significativo que os últimos 2 mil anos de civilização. Fato é que a responsabilidade civil exerce um papel fundamental em qualquer sistema jurídico. Ela sempre solucionou as patologias do direito de propriedade e da violação de contratos. Como se não fosse suficiente, nos últimos tempos a responsabilidade civil também passou a equalizar as lesões aos direitos da personalidade, além das disfuncionalidades da conjugalidade e parentalidade. Por fim, é na responsabilidade civil que encontramos tutela diante de danos causados por tecnologias emergentes, vazamento de dados e violações a direitos fundamentais no ambiente digital.
Ao mesmo tempo que a pressão sobre a responsabilidade civil cresce exponencialmente, constata-se que os dispositivos do Código Civil de 2002 em muito se distanciam daquilo que precisamos para um nivelamento com os instrumentos europeus mais recentes - e mesmo mirando para a vizinhança, com o elogiado Código Civil da Argentina, de 2015. Isso porque a realidade não corresponde mais àquela em que os danos eram exclusivamente patrimoniais e individuais, solucionados com uma simples indenização em dinheiro. Em sociedades plurais e complexas, grande parte dos danos são extrapatrimoniais, metaindividuais, atingindo interesses difusos ou individuais homogêneos, não raro, como visto nos desastres ambientais de Minas Gerais, sendo danos irreparáveis, posto anônimos, dispersos ou catastróficos.
Para evitar que prevaleçam respostas desordenadas aos novos desafios, consideramos a necessidade de atualizar a responsabilidade civil para que seja compreendida, como disse aqui o Ministro Salomão, como um sistema de gestão de riscos. Assim, para além de uma contenção de danos, há a necessidade de uma contenção de comportamentos antijurídicos mediante a introdução das funções preventiva e pedagógica, com seguros parâmetros de moderação de poderes judiciais contrabalançados por uma função promocional aos agentes econômicos que investirem em governança e accountability. Ou seja, temos em mente que um sistema equilibrado de responsabilidade civil requer uma convergência entre a proteção da liberdade de iniciativa em uma economia de mercado e a mais ampla tutela das vítimas de danos e da coletividade perante toda sorte de ilícitos.
Aliás, há uma particularidade da responsabilidade civil, o fato de ser um conjunto de normas precipuamente dirigidas aos magistrados. A maior parte das demandas cíveis no Brasil, desde os juizados especiais até os tribunais, conecta-se ao tema da responsabilidade civil em sentido amplo, tutelando vítimas de acidentes, vítimas contratantes e vítimas consumidores.
Enfim, e concluindo, se o que pretendemos é conceder segurança jurídica e mitigar a discricionariedade judicial, o primeiro passo consiste em oferecer critérios objetivos para a compensação e quantificação de danos. Afinal, sem jamais sacrificar a integral reparação das vítimas...
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(Soa a campainha.)
O SR. NELSON ROSENVALD - ... o custo das demandas deve gerar previsibilidade para os empreendedores, o que requer não apenas clareza nas regras, mas racionalidade e coerência quando da atribuição da obrigação de indenizar.
Essas são as nossas brevíssimas considerações. Muito obrigado ao corpo de servidores e consultores. Colocamo-nos à disposição desta Casa para o que for necessário. Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG) - Agradeço ao Prof. Nelson Rosenvald, e concedo a palavra ao Sr. Pablo Stolze Gagliano, Juiz do Tribunal de Justiça da Bahia e Relator Parcial da Subcomissão de Direito de Família.
Com a palavra, Dr. Pablo.
O SR. PABLO STOLZE GAGLIANO (Para exposição de convidado.) - Exmo. Presidente Senador Rodrigo Pacheco, dirigindo-me a V. Exa., cumprimento os Parlamentares presentes.
Registro aqui um agradecimento aos Ministros Luis Felipe Salomão e Marco Aurélio Bellizze, nossos comandantes nessa jornada, e às senhoras e aos senhores membros da Comissão. Tive a honra de trabalhar ao lado do grande Ministro Marco Buzzi, com os Profs. Rolf Madaleno e Maria Berenice Dias. Cumprimento também os Relatores-Gerais, incansáveis, pelo trabalho desempenhado.
A minha dúvida era se eu deveria, nesses breves cinco minutos, Prof. Simão, pincelar o que consta ou o que não consta no livro de família. E aí eu me convenci, Presidente Pacheco, em relembrar um fato que eu narrei na Comissão do Senado, em que eu terminava uma aula minha, na universidade federal, e minha mãe, que deve estar assistindo neste momento, uma senhora septuagenária já, portanto idosa, mandou uma mensagem tensa para mim dizendo: "Pablo, me ligue agora". Eu então liguei para ela, era a respeito de uma notícia que ela havia lido sobre a reforma do Código Civil. Ela então disse: "Meu filho, aborto? Aborto, meu filho?". Eu disse: "Não, minha mãe, não há regra nenhuma sobre aborto". Ela então continuou: "Pablo, três pessoas vão casar - três pessoas vão casar?". Eu disse: "Minha mãe, não há nenhuma regra sobre casamento poligâmico". Ela então fez uma pausa - o Ministro Salomão vai lembrar disso -, e esse foi o momento mais inusitado, ela fez: "Pablo, família multiespécie - família multiespécie?". Eu então disse: "Minha mãe, [na verdade eu falei mainha] a senhora sabe o que é família multiespécie?". Ela falou: "Não". E o mais interessante é que sequer haveria tempo, nesses breves minutos, para explicar aos senhores e senhoras que não há no livro do Direito de Família uma regra reconhecendo esse núcleo familiar. O que existe no livro do Direito de Família é um atendimento a uma expressa diretriz do Ministro Salomão e do Ministro Bellizze: avanço com segurança jurídica.
Eu destaco aqui, em dois minutos, por exemplo, o divórcio. Acolhendo um pronunciamento, uma proposta do Senador Pacheco, o divórcio unilateral, que recebe críticas de quem ou não compreende o instituto ou não conhece a realidade brasileira, porque eu conheci uma senhora humilde, Profa. Angélica, que sofreu muito com o marido e que me disse assim... Eu perguntei: "Por que a senhora não pediu o divórcio para ele?". Ela disse assim, essa senhora: "Meu filho, porque ele nunca me deu o divórcio", como se fosse uma caixinha. Infelizmente, muitos brasileiros sofrem com isso. O divórcio unilateral vai acabar com esse tipo de sofrimento.
Um dado interessante no campo do direito patrimonial - eu sou fã dessa cláusula, Tartuce sabe que eu falaria nela -, há a sunset clause, a possibilidade, Ministro Luis Felipe Salomão, de se pactuar a alteração automática do regime de bens após o transcurso de um lapso temporal. Muitas vezes você se casa e está um pouco tenso com o seu casamento: "Será que vai dar certo?". Você, então, opta para, no primeiro ano, o regime ser de separação convencional e, ultrapassado o primeiro ano, uma conversão automática para a comunhão parcial de bens, como se dissesse: "Bom, isso está dando certo. Vamos converter para um regime um pouco mais, digamos, comunitário". É uma ideia que vem da experiência estrangeira e que dialoga com a autonomia privada, facilita a vida dos brasileiros.
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Mas, se eu pudesse, Presidente Pacheco, destacar um avanço no campo de família, nesse minuto final, marcou-me muito o evento que houve aqui no Senado, com a presença do Presidente da Suprema Corte da Argentina, em que a Profa. Aída Kemelmajer, Relatora da reforma argentina, destacou o dispositivo da nossa reforma como sendo um dos grandes avanços da reforma do Código Civil brasileiro.
Hoje, segundo dados noticiados pela Arpen, em 2022, mais de 100 mil crianças foram registradas sem o nome do pai - somente em 2022. E, atualmente, nascida uma criança, se o pai não registra e a mãe vai ao cartório, ela não pode, não estando o pai presente, lançar o nome dele no registro, porque é um ato personalíssimo. Então, o que nós temos hoje, Presidente Pacheco, é uma lei que estabelece o seguinte: o sujeito não comparece ou se recusa, essas peças vão ao Ministério Público, que ajuíza uma ação de investigação de paternidade, atividade nobilíssima desempenhada pelo MP, pela Defensoria Pública. Sucede que essa ação investigatória de paternidade pode durar meses ou anos. E a proposta na reforma aqui olha para essas mães, porque - vou frisar -, notificado pessoalmente esse suposto pai - notificado pessoalmente -, se ele não comparece ou, comparecendo, se recusa a se submeter ao exame de DNA, o nome dele é lançado no registro, e vai caber a ele propor uma ação para contestar a paternidade, lógico, retirando de mães e de filhos um peso terrível - e só quem sofre entende - de uma paternidade não reconhecida.
Como eu disse em mais de uma oportunidade - e encerro -, essa reforma não foi pensada para uma elite acadêmica, mas em prol de toda a sociedade brasileira.
Muito obrigado, Presidente. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG) - Muito obrigado, Dr. Pablo.
Sem dúvida alguma, sem prejuízo, obviamente, da importância de todas as subcomissões e de todos os livros, de fato, esse é o livro mais sensível, que gera mais polêmicas e, consequentemente, gerou mais desinformação.
De fato, esse esclarecimento precisa ser feito, e o episódio do Dr. Pablo com a senhora mãe dele é um pouco de uma síntese - viu, Dr. Pablo? - que a gente vive diariamente durante um bom tempo, não é? São essas incompreensões. No meu caso, a minha mãe já não está mais viva; então, ela não sofre com essas incompreensões. Mas é justamente isto: muita desinformação, muita incompreensão, muita falta de conhecimento sobre do que se trata. Obviamente, é absolutamente razoável e compreensível isso. Ninguém é obrigado a compreender aspectos técnicos de direito civil, da lei civil, e cabe muito à opinião pública, à imprensa dar essa informação para poder fazer esse esclarecimento.
Então, o seu pronunciamento, apesar do período curto de cinco minutos, foi realmente muito importante para poder repor as coisas e a importância da evolução da lei civil, de acordo com o que já é uma realidade da sociedade brasileira, é uma adequação, é uma atualização. Por isso que eu disse que esses últimos 20 anos, de fato, equivaleram em muitos aspectos a um século de existência no nosso país, em razão de adventos - e cito dois, basicamente: o advento da rede social e da internet, e o enfrentamento de uma pandemia, que mudou o comportamento das pessoas.
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É natural que o Código Civil precise, então, ser atualizado; não refeito, mas atualizado. Então, quero cumprimentá-lo pelo seu pronunciamento, pela sua coragem e pelo desafio que teve à frente, juntamente com seus pares, dessa subcomissão especificamente.
Concedo a palavra à Sra. Paula Andrea Forgioni, Professora da Universidade de São Paulo, Relatora Parcial da Subcomissão de Direito da Empresa.
Por favor, Professora.
A SRA. PAULA ANDREA FORGIONI (Para exposição de convidado.) - Boa tarde a todos.
Senador Rodrigo Pacheco, muito obrigada e os meus parabéns por essa iniciativa fantástica para a sociedade brasileira!
Eu gostaria de saudar - ele não está mais aqui - o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Prof. Alexandre de Moraes, o novo Professor Titular de Direito Eleitoral da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco.
Ministro Luis Felipe Salomão, gostaria de lhe agradecer - não só parabenizar, mas agradecer - e notar o que já foi falado aqui do método democrático; da sensibilidade social e do método democrático utilizado nesta Comissão. Realmente foi uma ebulição. Os debates foram intensos, mas eu tenho certeza de que foi feito o melhor trabalho possível para a sociedade brasileira. Realmente, os meus parabéns - observei muito a sua condução e aprendi muito com ela; é uma grande contribuição para o nosso país -, meus mais sinceros parabéns!
Ministro Marco Aurélio Bellizze, com uma grande sensibilidade para o direito empresarial, mas realmente singular, uma preocupação com a segurança, com a previsibilidade, tão necessárias ao direito empresarial.
Ilustres Relatores-Gerais, Profa. Rosa Nery, a quem agradeço as elogiosas referências, e Prof. Flávio Tartuce, muito obrigada.
E eu gostaria também de ressaltar um outro aspecto da condução do Ministro Salomão: abertura a críticas, abertura a ouvir de toda a sociedade. Nem todos concordam com o que está sendo feito aqui. É importante ouvir, é importante não desqualificar o interlocutor, ainda que, às vezes, óbvio, isso mexa com a vida das pessoas, as críticas sejam veementes, às vezes, injustas, mas o espírito democrático e a abertura para críticas, durante todo o processo e agora também, são dignas de nota, e é isso que faz uma democracia forte. Muito obrigada e meus parabéns, Ministro!
Bom, eu gostaria de agradecer um presente que nos foi dado que é a Subcomissão de Direito Empresarial. Aqui, infelizmente, não está presente o Desembargador Moacyr Lobato, uma das maiores lideranças do direito empresarial brasileiro. A senioridade do Desembargador Lobato traz tranquilidade e segurança para todos nós. Ele é um líder e foi uma honra poder contar com os seus ensinamentos e com a sua contribuição na Comissão.
Nosso bâtonnier, eterno bâtonnier, que não está presente aqui, o Prof. Marcus Vinicius Furtado Coêlho, que lutou muito pelo direito empresarial, e pela segurança, e pela previsibilidade. Contar com ele, em todo esse trabalho, será uma dívida eterna do direito empresarial com o nosso Prof. Coêlho.
Prof. Flávio Galdino, que está aqui presente, reconhecidamente um dos melhores advogados de direito empresarial do nosso país, conhecido e reconhecido não apenas por sua inteligência, mas pela sua lealdade aos clientes, às causas e ao direito empresarial. Nós todos pudemos desfrutar dessa seriedade, desse comprometimento, dessa inteligência. Foi realmente uma contribuição inigualável.
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Também agradeço ao Prof. Daniel Carnio, que deixou a magistratura recentemente e que agora está do outro lado do balcão, sofrendo as agruras do empresariado brasileiro, ao lado do empresariado brasileiro; e também à nossa secretária, que tanto trabalhou sem nada receber - apenas os nossos agradecimentos -, a Dra. Maíra Rocha.
A matéria de direito empresarial, nós já tivemos a oportunidade de ressaltar, não é atrativa; ela não é família, ela não é sucessões; ela não trata de trisal, de direitos da amante, não trata de nada disso. Ela trata de regência supletiva, de sociedade limitada, de coisas que não despertam tanto a atenção das pessoas, mas é uma área diferente do direito civil, é uma área do direito empresarial que lida somente com as empresas. E são as empresas e a nossa área que vão auxiliar em colocar comida na mesa das pessoas, na geração de empregos, no recolhimento de impostos, possibilitando, assim, que as empresas cumpram a sua missão constitucional que é a sua função social. E aqui nós não falamos apenas da indústria e do comércio, nós falamos do agronegócio deste país, com a colaboração que dá para o nosso PIB...
(Soa a campainha.)
A SRA. PAULA ANDREA FORGIONI - Há muito tempo, não se trabalha apenas com o Estatuto da Terra.
O escopo da nossa intervenção foi atualizar, simplificar e desburocratizar o direito empresarial ligando para a jurisprudência do STJ. Como bem ressaltou o Ministro Salomão aqui, é um capítulo específico, tratamento específico para os contratos empresariais. Nós procuramos solucionar, sempre com base na jurisprudência do STJ, as dúvidas que pairavam sobre as sociedades limitadas, sempre buscando segurança e previsibilidade.
A Comissão de Direito da Empresa tem a grande esperança de que os avanços ora trazidos a esta Casa em muito contribuirão para o desenvolvimento nacional e tem a certeza de que os representantes do povo brasileiro trabalharão para que avancemos ainda mais.
Muito obrigada...
(Soa a campainha.)
A SRA. PAULA ANDREA FORGIONI - Muito obrigada pela atenção de todos. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG) - Agradeço à Profa. Paula Andrea Forgioni.
E concedo a palavra, neste instante, ao Sr. Rodrigo de Bittencourt Mudrovitsch, Vice-Presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos, Relator Parcial da Subcomissão da Parte Geral do Código. Um brilhante advogado, o Dr. Rodrigo Mudrovitsch. Tem a palavra.
O SR. RODRIGO DE BITTENCOURT MUDROVITSCH (Para exposição de convidado.) - Boa tarde a todos e todas.
Exmo. Sr. Presidente, muito obrigado, muito obrigado essencialmente pela honra de poder participar deste trabalho tão importante, tão bonito.
Na sua pessoa quero cumprimentar todos os Parlamentares presentes nesta Casa.
Um cumprimento muito especial também ao Ministro Luis Felipe Salomão, a quem também agradeço pela oportunidade de poder participar deste trabalho; ao Ministro Marco Aurélio Bellizze; aos Relatores-Gerais; e a meus colegas e minhas colegas de Comissão de Juristas.
Eu quero fazer também um cumprimento muitíssimo especial aos meus colegas de Subcomissão: ao Prof. Rogério Marrone; ao Ministro João Otávio de Noronha, mineiro, que foi o condutor, que foi o verdadeiro Relator, eu queria dizer aqui, dos nossos trabalhos, porque, com sua experiência, com sua longa trajetória como magistrado e também, anteriormente, como advogado, foi quem nos guiou ao longo de todo o trabalho; assim como também um cumprimento à Profa. Estela Aranha.
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Quero dizer que eu não sou um civilista, e foi um desafio dos maiores poder participar justamente de um trabalho que envolvia a Parte Geral. Talvez por isto tenha vindo o convite: tentar ter alguém com uma visão um pouco mais de fora. Enfim, foi um desafio que encarei com muita alegria e com muita honra.
Muito já foi dito, e eu não quero ser repetitivo, mas, trago aqui um curto resumo do que eu reputo que ainda não foi mencionado de mais importante nas propostas que nós trouxemos. Em primeiro lugar, é muito difícil propor mudança na Parte Geral, e foi uma diretriz nossa, desde o começo, tentar ser econômico, tentar ser respeitoso, com uma preocupação muito grande, como já pontuado pelo Prof. Simão, com a operatividade das normas jurídicas.
Então, o que eu queria destacar aqui, especificamente em relação às propostas que nós trouxemos, agora já como anteprojeto trazido pela Comissão?
Primeiro, o art. 1º e o art. 11. Acho que isso é extremamente importante, porque é uma novidade. É justamente a novidade de trazer o protagonismo das pessoas naturais no âmbito internacional. Isso confirma e ressalta a importância dos tratados internacionais que foram incorporados pelo Brasil em âmbito nacional e também garante a proteção da personalidade individual em todas as suas dimensões. Isso é extremamente importante.
E nós estipulamos normas que reafirmam a personalidade civil do nascituro e mantivemos a sua proteção, o que é extremamente importante - isso, no art. 2º -; voltamos com a proteção destinada àqueles que não podem assumir sua vontade, no art. 3º; e destacamos, como já pontuado no início pelo Ministro Luis Felipe Salomão, os avanços trazidos pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência.
Também inovamos com a proteção da autonomia da vontade, assegurando às pessoas a liberdade de se manifestar e afirmar sua vontade sobre procedimentos médicos a serem submetidos ou não.
E trouxemos talvez o tema que mais gerou debate nas discussões sobre a Parte Geral - confesso que para mim foi uma surpresa, mas, de fato o tema trouxe muita discussão; depois, cheguei à conclusão de que era importante que essa discussão existisse, e acho que nós conseguimos chegar a uma boa proposição -, que foi a questão que envolve os animais, seres constantes em nossa vida social e que foram objeto de amplo estudo por parte da nossa Comissão. E nós trouxemos, então, uma proposta que fala que são seres sencientes e passíveis de proteção jurídica própria, com uma participação extremamente importante e que eu quero agradecer aqui - não sei se ele está presente - do Professor e Magistrado Vicente, que foi realmente uma pessoa que participou desde o começo, apaixonadamente, mas trazendo sugestões muito importantes e que foram, depois, incorporadas dentro dessa discussão.
De maneira muito breve também, em relação a decadência e prescrição, gostaria de dizer aqui que nós, em primeiro lugar, buscamos incrementar a segurança jurídica com relação aos atos e negócios jurídicos que admitam registro; adotamos, no art. 189, formalmente, a teoria da actio nata subjetiva para as pretensões que se relacionam com a responsabilidade civil extracontratual e da actio nata objetiva para os debates que englobem responsabilidade civil contratual; estabelecemos, ainda, um limite de tempo máximo para ajuizamento da respectiva ação judicial; unificamos o lapso temporal de prescrição geral para os casos de reparação civil contratual e extracontratual e para a pretensão de ressarcimento por enriquecimento sem causa, em clara comunicação com o CDC; buscamos evitar, por meio de proposta de redação do art. 200, que se permitisse uma situação de verdadeira imprescritibilidade, com base em ação originada em fato apurado na esfera criminal, tudo isso, Sr. Presidente, com objetivo de trazer mais segurança jurídica, prazo mais curtos, mais clareza...
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(Soa a campainha.)
O SR. RODRIGO DE BITTENCOURT MUDROVITSCH - ... e mais operatividade ao Código.
Eu teria aqui outras menções, mas acho que, essencialmente, são essas que eu gostaria de destacar. Acho que já tenho aqui que me encaminhar para o fim da minha fala.
Gostaria de dizer que foi um trabalho muito gratificante. Aprendi muito com todos os colegas e todas as colegas da Subcomissão. Vou sempre me recordar desse trabalho e, uma vez mais, agradeço ao Presidente, Ministro Salomão, e aos Relatores-Gerais pela oportunidade.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG) - Agradeço ao Dr. Rodrigo Mudrovitsch.
Eu gostaria de registrar a presença também do ex-Deputado Federal por Minas Gerais e meu primeiro suplente no Senado Federal, Renzo Braz. Seja muito bem-vindo, Deputado Renzo Braz... Senador Renzo Braz.
Concedo a palavra ao Sr. Marco Aurélio Bezerra de Melo, Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro e Relator Parcial da Subcomissão de Direito das Coisas. V. Exa. tem a palavra.
O SR. MARCO AURÉLIO BEZERRA DE MELO (Para exposição de convidado.) - Exmo. Sr. Rodrigo Pacheco, Presidente do Congresso Nacional, a quem parabenizo pela iniciativa; eminente Ministro Luis Felipe Salomão, querido amigo; Ministro Bellizze, pela confiança agradeço também. Como eu já disse a V. Exa., nem nos meus sonhos mais otimistas eu imaginei que um dia teria oportunidade de trabalhar na revisão do Código Civil. Quero também agradecer e parabenizar o meu querido amigo Flávio Tartuce, a Profa. Rosa Nery, incansáveis, competentes. Fizeram um trabalho, como dito por todos, primoroso.
A mim cabe o Livro do Direito das Coisas. Eu iniciaria dizendo que nós conseguimos, com o apoio inestimável dos membros da Comissão - dos paraibanos, Dra. Maria Cristina Santiago, o Dr. Carlos e um mineiro, o Desembargador Marcelo Milagres - estabelecer, assim, uma atualização do trabalho feito neste livro pelo Desembargador Ebert Chamoun, que cuidou do Livro do Direito das Coisas, estabelecendo valores importantíssimos, como a autonomia da posse, a função social da posse, independentemente da propriedade, e a nossa Comissão teve o cuidado de respeitar os princípios que nortearam esse livro. Também o Prof. Edvaldo Brito teve a participação muito intensa do Prof. Orlando Gomes. Passagens do anteprojeto do Prof. Orlando Gomes, nos direitos da vizinhança, nos inspiraram muito. Então, eu acho que essa memória tem que ser trazida à consideração.
Também ao grande Ruy Barbosa, porque ele já defendia a possibilidade de posse de direitos pessoais, que nós acabamos também propondo ao Senado, a possibilidade da posse de bens imateriais, dialogando com a Comissão de Direito Digital, a possibilidade de uma herança digital, a definição de patrimônio digital, marcas, patentes e tantos bens imateriais nessa sociedade desmaterializada que nós temos.
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Muito bem.
Também trouxemos a ideia do abuso de confiança, substituindo o vocábulo "posse precária", que gerava muita confusão nas decisões judiciais, e também a cláusula constituti, de larga aplicação nas transações imobiliárias.
No campo da propriedade dos direitos reais, estamos fazendo justiça ao trabalho desenvolvido pelo Ministro Moreira Alves, que já defendia, na sua obra Propriedade Fiduciária, que a propriedade fiduciária não era apenas para fins de garantia, mas também para fins de gestão do patrimônio. Quer dizer, a propriedade fiduciária gestão, a propriedade fiduciária função. É algo, assim, de grande valia para os negócios empresariais sobretudo, Profa. Paula Forgioni.
Também destacamos, com muito cuidado, a funcionalização das titularidades, na ideia de que, efetivamente, a propriedade obriga. Ela é um direito e também é um dever. É o dever da prestação, por parte do proprietário, da função social e econômica da titularidade.
(Soa a campainha.)
O SR. MARCO AURÉLIO BEZERRA DE MELO - No campo do condomínio edilício, cuidamos tão somente, como fala muito bem o Prof. Simão, daquilo que dá problema. Onde está o problema? Garagem, que não tinha uma regulamentação; a personalidade jurídica do condomínio; fixação de 10% de multa, com juros moratórios na forma do atual - esperamos ser - 406, do Código Civil, dando segurança jurídica, e até a possibilidade excepcional de exclusão do condômino antissocial, algo que estava nas notícias aí no Rio de Janeiro.
Tratamos os direitos reais de garantia com um diálogo muito próximo das entidades do agronegócio - como foi dito aqui, movimentam o nosso PIB - e nós temos um tratamento das garantias reais muito defasado, extremamente defasado com outros códigos...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCO AURÉLIO BEZERRA DE MELO - ... e também a questão dos fundos de investimento, em diálogo com a Comissão de Valores Mobiliários.
Eu acho que são essas as considerações.
No mais, muito obrigado a todos os membros e todas as pessoas da Comissão do Senado, porque foram oito meses de muito, muito, muito aprendizado.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG) - Muito obrigado, Desembargador Marco Aurélio Bezerra de Melo.
Nós encerramos a fase da exposição dos nossos Relatores das Subcomissões.
Eu quero, de fato, lembrado pelo Desembargador, fazer um registro da participação mineira nessa Comissão de Juristas, do Desembargador Marcelo Milagres, do Prof. Dierle, do nosso querido Nelson Rosenvald, que foi meu professor, do meu também professor Moacir Lobato, na faculdade de Direito, e do nosso grande... Ah, o Flávio Tartuce é mineiro de origem, embora radicado em São Paulo. A Consultora Dra. Layla também, que nos honrou com a sua participação na Comissão de Juristas, e, realmente, fazer um reconhecimento muito especial ao Ministro João Otávio de Noronha, do Superior Tribunal de Justiça, um grande jurista e que orgulha a todos nós em Minas Gerais, na sua posição no âmbito do Superior Tribunal de Justiça.
Eu concedo a palavra agora aos Senadores inscritos.
Temos aqui a presença e quero aqui fazer um agradecimento à Senadora Damares Alves, que permaneceu por toda a sessão presente no Plenário do Senado Federal, a quem eu tenho a honra de dar a palavra.
Senadora Damares Alves. (Palmas.)
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A SRA. DAMARES ALVES (Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF. Para discursar.) - Boa tarde, Presidente. Boa tarde a todos os senhores.
Por que eu fiquei? Na verdade, muitos Senadores queriam estar aqui agora e participar desse momento com os senhores, mas quarta-feira é um dia muito ruim para todos nós e nós fizemos ali meio que um acordo que eu me organizaria. Deixei um monte de gente no gabinete esperando para estar aqui para dizer aos senhores o respeito a essa Comissão. Eu precisava consignar isso em nome de todos os Senadores e para dizer como nós reconhecemos o trabalho dos senhores.
E, quando os senhores falaram 70 horas, é porque vocês não contaram as horas que os consultores não dormiram. Foram muito mais de 70 horas. E dizer para os senhores, aos relatores, todos os senhores, a gente não estava presente lá no trabalho, mas a gente chegava em casa e por muitos dias foram os vídeos das reuniões que foram os nossos companheiros de madrugadas, muitas vezes.
Inclusive, eu tenho conversado com alguns estudantes de Direito e tenho dito: "assistam aos vídeos, aqueles vídeos das audiências são aulas de Direito, é um curso de mestrado e doutorado que com certeza quem assistir só ao debate vai sair assim enriquecido".
Eu estou muito feliz com o trabalho entregue. Claro, agora começa o trabalho dos Senadores, ouvir a população de uma outra forma. Não vai ser fácil, senhores, mas eu sei que nós podemos contar neste Senado com Parlamentares muito éticos, acreditem nisso. Nós vamos receber esse anteprojeto com muita ética, com muito respeito.
Nós já tivemos em um passado não muito longe, no Senado, Comissões de Juristas apresentando anteprojetos que não tiveram a consideração que deveriam ter com o trabalho feito, mas eu estarei aqui por mais seis anos e meio. Eu espero que a gente consiga uma vitória, aprovar essa reforma, que urge. Gente, urge a necessidade dela, urge, mas esses seis anos e meio que eu terei para frente, eu acho que esse vai ser um dos maiores desafios do meu mandato, participar das reuniões, dos debates, conduzir essa reforma.
Estive na reforma do Código Civil lá atrás, em 2002, como assessora, e vocês não imaginam, senhores, a angústia que era eu não poder convencer o Parlamentar, a angústia. Hoje eu sou Parlamentar e vou trazer as minhas angústias, as minhas expectativas para os debates que acontecerão.
E aí, Senador Rodrigo, parabéns pela iniciativa. E eu sei que isso aqui vai caminhar de uma forma muito madura porque o senhor vai estar na condução.
Obrigada a todos os juristas que participaram. Obrigada. Eu sei que alguns abriram mão de família, de horário de lazer, de trabalho, se sacrificaram. Obrigada por essa entrega. E agora vamos, vamos para os debates, vamos trabalhar de uma forma muito madura. E aí, por mais crítica, eu vi, eu li as críticas, eu li e eu fiquei muito triste porque eu lia o currículo dos senhores e aquilo me angustiava.
Quem veio da área jurídica, eu conheço alguns. Eu sou fã de alguns aqui, a Profa. Paula, a Profa. Rosa. E as críticas me incomodavam muito, mas, acreditem, nós vamos conduzir com muita serenidade. O Brasil precisa dessa reforma.
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Muito obrigada por essa entrega e, Senador Rodrigo, muito obrigada pela iniciativa. Eu acho que o senhor caminhou aí anos com essa iniciativa, e vamos agora para os debates, ouvir o nosso povo e, com certeza, no diálogo, trazer o consenso para a gente entregar para o Brasil uma reforma, que não vai ser perfeita, nunca, mas uma reforma que atenda às necessidades do nosso povo.
Que Deus abençoe todos os senhores e suas famílias!
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG) - Meus agradecimentos, em nome da Presidência, à Senadora Damares Alves, cujo pronunciamento - quero me dirigir aos membros da Comissão de Juristas para dizer - é uma síntese muito perfeita do sentimento dos Senadores e das Senadoras, de reconhecimento, de agradecimento à Comissão de Juristas de uma reforma reputada por todos nós como necessária.
Naturalmente que o anteprojeto é a peça inicial desse processo legislativo, que sofrerá, naturalmente, mutações, modificações, com acréscimos, com supressões. Isso faz parte do processo legislativo. Agora, sim, é o momento de os Parlamentares dialogarem com a sociedade brasileira acerca de todos os temas ali contidos.
Portanto, eu quero agradecer o pronunciamento da Senadora Damares Alves, que, de fato, repito, sintetiza o sentimento do Senado Federal em relação à Comissão de Juristas, agradecendo, uma vez mais, a presença de todos. Àqueles que não puderam participar também aqui dedico o meu agradecimento em nome da Presidência do Senado.
Cumprimos uma etapa realmente digna de nota, histórica para o Senado Federal com a apresentação deste anteprojeto e agora iniciaremos o processo legislativo numa forma que em breve nós anunciaremos o encaminhamento disso no âmbito do Senado Federal em relação à Comissão Especial, à Comissão de Constituição e Justiça, às audiências públicas. Por certo, V. Exas. não estarão dispensados de estarem conosco na discussão do processo legislativo em si, até para externarem o que for a posição de juristas nas muitas audiências públicas que aqui faremos.
Portanto, fica este sentimento de dever cumprido de cada um dos senhores, de cada uma das senhoras e um agradecimento profundo por parte desta Presidência.
Cumprida a finalidade desta sessão, agradeço às personalidades que nos honraram com a sua participação.
Está encerrada a sessão.
Muito obrigado. (Palmas.)
(Levanta-se a sessão às 13 horas e 42 minutos.)